“o grito tem que ser potente”: o feminismo ... ressignificar a raça, o movimento negro indaga a...

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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X “O GRITO TEM QUE SER POTENTE”: O FEMINISMO NEGRO DE MC CAROL E KAROL CONKA Jaqueline Sant’ana Martins dos Santos 1 Natasha Fernandes Mendes Brasil 2 Resumo: A ampliação do acesso à internet alterou as fronteiras de informação nas últimas décadas, com as redes sociais adquirindo um papel importante para difusão de discussões sobre temas como gênero e raça. Nesse contexto, surgem duas cantoras negras, periféricas, que ganharam fama através da internet e mostram uma forma de falar de feminismo que vai além das teorias. Neste trabalho, buscamos analisar as contribuições discursivas das cantoras MC Carol e Karol Conka para o debate do lugar social da mulher negra através de suas músicas. Com grande visibilidade no funk e no rap, essas artistas vêm firmando uma postura de resistência e representatividade na música e na sociedade. Adotaremos o gênero como categoria analítica para pensar as relações de poder na sociedade. A reflexão sobre as especificidades e o entrecruzamento de marcadores sociais seguirá as contribuições de Crenshaw (2002) e Piscitelli (2008). Com Carneiro (2003) destacaremos a invisibilidade das mulheres negras e suas pautas no feminismo hegemônico. Para falar de raça e sociedade, utilizaremos os pressupostos teóricos de Hall (2013) e Munanga (2000), aliados às reflexões de Bakhtin (1997) sobre o papel da linguagem. Palavras-chave: Gênero. Raça. Feminismo. Música. Na atual conjuntura política mundial, em que o avanço dos governos de direita foi reforçado com as últimas eleições em países como Argentina, França e Estados Unidos, além do golpe contra a presidente eleita no Brasil, Dilma Rousseff, é possível considerar que há um movimento de ampliação dos posicionamentos conservadores, principalmente no que se refere às questões de gênero, raça, classe e sexualidade. Nesse contexto, podemos perceber, principalmente no Brasil, a grande ação dos políticos para reduzir/cortar os poucos direitos conquistados nos campos ligados às minorias sociais. No âmbito federal, podemos destacar a extinção do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos, além da redução de 35% dos recursos destinados às políticas para mulheres, negros, população LGBT e direitos humanos. Paralelamente, encontramos na internet um espaço de discussão que vem sendo utilizado como ferramenta de formação e resistência, não só oferecendo fontes alternativas de informação, 1 Doutoranda em Ciências Humanas (Sociologia) pelo PPGSA/UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil. 2 Mestra em Relações Étnico-raciais (CEFET/RJ). Pesquisadora do GEPARREI/Colégio Pedro II e PRADISIS/CEFET/RJ, Rio de Janeiro, Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

“O GRITO TEM QUE SER POTENTE”: O FEMINISMO NEGRO DE MC CAROL E

KAROL CONKA

Jaqueline Sant’ana Martins dos Santos1

Natasha Fernandes Mendes Brasil2

Resumo: A ampliação do acesso à internet alterou as fronteiras de informação nas últimas décadas,

com as redes sociais adquirindo um papel importante para difusão de discussões sobre temas como

gênero e raça. Nesse contexto, surgem duas cantoras negras, periféricas, que ganharam fama através

da internet e mostram uma forma de falar de feminismo que vai além das teorias. Neste trabalho,

buscamos analisar as contribuições discursivas das cantoras MC Carol e Karol Conka para o debate

do lugar social da mulher negra através de suas músicas. Com grande visibilidade no funk e no rap,

essas artistas vêm firmando uma postura de resistência e representatividade na música e na

sociedade. Adotaremos o gênero como categoria analítica para pensar as relações de poder na

sociedade. A reflexão sobre as especificidades e o entrecruzamento de marcadores sociais seguirá as

contribuições de Crenshaw (2002) e Piscitelli (2008). Com Carneiro (2003) destacaremos a

invisibilidade das mulheres negras e suas pautas no feminismo hegemônico. Para falar de raça e

sociedade, utilizaremos os pressupostos teóricos de Hall (2013) e Munanga (2000), aliados às

reflexões de Bakhtin (1997) sobre o papel da linguagem.

Palavras-chave: Gênero. Raça. Feminismo. Música.

Na atual conjuntura política mundial, em que o avanço dos governos de direita foi reforçado

com as últimas eleições em países como Argentina, França e Estados Unidos, além do golpe contra

a presidente eleita no Brasil, Dilma Rousseff, é possível considerar que há um movimento de

ampliação dos posicionamentos conservadores, principalmente no que se refere às questões de

gênero, raça, classe e sexualidade. Nesse contexto, podemos perceber, principalmente no Brasil, a

grande ação dos políticos para reduzir/cortar os poucos direitos conquistados nos campos ligados às

minorias sociais. No âmbito federal, podemos destacar a extinção do Ministério das Mulheres, da

Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos, além da redução de 35% dos recursos

destinados às políticas para mulheres, negros, população LGBT e direitos humanos.

Paralelamente, encontramos na internet um espaço de discussão que vem sendo utilizado

como ferramenta de formação e resistência, não só oferecendo fontes alternativas de informação,

1 Doutoranda em Ciências Humanas (Sociologia) pelo PPGSA/UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil. 2 Mestra em Relações Étnico-raciais (CEFET/RJ). Pesquisadora do GEPARREI/Colégio Pedro II e

PRADISIS/CEFET/RJ, Rio de Janeiro, Brasil.

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mas também reunindo pessoas para movimentos de enfrentamento, através da organização de

manifestações e protestos, que saem do mundo virtual e ganham as ruas.

É nesse cenário que duas cantoras negras e periféricas, a niteroiense MC Carol e a curitibana

Karol Conka, conseguem falar sobre a realidade da mulher negra para todo o país, através de suas

músicas e de seus posicionamentos. Este trabalho pretende analisar, através do princípio dialógico

da linguagem sistematizado por Mikhail Bakhtin (1997), de que forma as vozes do feminismo negro

aparecem no trabalho dessas duas artistas.

Algumas considerações sobre raça e linguagem

Não é possível pensar em relações sociais sem o uso da linguagem: é através dela que

ocorrem as interações entre os diferentes sujeitos. Muito mais do que um simples código, a

utilização da língua pode ser vista como uma atividade, uma vez que se trata de uma prática social.

É o que possibilita a cada membro marcar sua posição na sociedade, mediante sua capacidade de

entender e produzir discursos. Considerando o princípio dialógico da linguagem (Bakhtin,1997), em

que nenhum sujeito falante é fonte da linguagem/do discurso, cada discurso (fala) é fruto de

diversos outros discursos que o atravessam, resultado da visão de mundo, experiências e diversas

relações vividas pelo enunciador.

Na concepção de linguagem de Mikhail Bakhtin, teórico russo nascido no final do século

XIX, “a palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial. É

assim que compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que despertam em nós

ressonâncias ideológicas concernentes à vida” (2006, p. 96). Para o autor, o enunciado é a menor

unidade de estudo da língua em uso a que é possível atribuir sentido. Portanto,

A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos), concretos e

únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana. O

enunciado reflete as condições específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas, não

só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operada nos

recursos da língua — recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais —, mas também, e

sobretudo, por sua construção composicional. Estes três elementos (conteúdo temático,

estilo e construção composicional) fundem-se indissoluvelmente no todo do enunciado, e

todos eles são marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação (BAKHTIN,

1997, p. 279).

O enunciado é, desse modo, considerado irrepetível, uma vez que resulta de um

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acontecimento único. Embora que não tenha repetibilidade, o que justifica seu estudo é que os

objetos aqui são os aspectos e as formas das relações dialógicas entre enunciados e entre suas

formas tipológicas. Cada enunciado funciona como a réplica de um diálogo e isso o torna diferente

de outros enunciados. Quando produzimos um discurso, estamos dialogando com muitos outros

discursos, como mostra Bakhtin:

Não pode haver enunciado isolado. Um enunciado sempre pressupõe enunciados que o

precederam e que lhe sucederão; ele nunca é o primeiro, nem o último; é apenas o elo de

uma cadeia e não pode ser estudado fora dessa cadeia. Existe entre os enunciados uma

relação impossível de definir por termos de categorias mecânicas ou linguísticas. Esta

relação não tem analogia (IBID. p. 375).

Toda enunciação, portanto, funciona como uma réplica, uma resposta a várias outras

enunciações, passadas e futuras: mesmo que não haja marcas explícitas como numa paráfrase ou na

intertextualidade comum, essas outras vozes estão presentes. Dessa forma, o dialogismo pode ser

visto como modo de funcionamento real da linguagem.

Pensando na linguagem como atividade social, é possível entender como os discursos

desempenham um papel real no processo de construção de conceitos. É o que acontece como a ideia

de raça, por exemplo. A ciência já comprovou que não há diferença biológica que justifique a

classificação dos seres humanos em raças, mas sabemos todos que o conteúdo da raça é social e

político. Se para o biólogo molecular ou o geneticista humano a raça não existe, ela existe na cabeça

dos racistas e de suas vítimas (Munanga, 2000).

A noção de raça que empregamos aqui é a defendida por Stuart Hall: “uma construção

discursiva, um significante deslizante”. Embora provado que não existem raças humanas enquanto

“uma questão de fatores genéticos, biologia, características fisiológicas, morfologia do corpo”, isso

não significa que a discussão sobre a não-existência de raças humanas está encerrada. De tempos

em tempos, aparecem novos cientistas tentando provar que existe alguma relação entre

“características genéticas vinculadas a racialidades e desempenho cultural” (Hall, 2013, s/n). A

raça é aqui entendida como categoria discursiva porque está em constante ressignificação.

Podemos considerar que se trata um marcador utilizado para informar como as

características físicas influenciam a forma como um determinado grupo aparece na sociedade em

relação às condições econômica, acadêmica, cultural, etc., como também hoje simboliza o

reconhecimento de uma identidade, através de um novo sentido construído pelo movimento negro

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no Brasil. A ex-ministra e professora Nilma Lino Gomes afirma que

Ao ressignificar a raça, o movimento negro indaga a própria história do Brasil e da

população negra em nosso país, constrói novos enunciados e instrumentos teóricos,

ideológicos, políticos e analíticos para explicar como o racismo brasileiro opera não

somente na estrutura do Estado, mas também na vida cotidiana das suas próprias vítimas

[...] Ao politizar a raça, esse movimento social desvela a sua construção no contexto das

relações de poder, rompendo com visões distorcidas, negativas e naturalizadas sobre os

negros, sua história, cultura, práticas e conhecimentos; retira a população negra do lugar da

suposta inferioridade racial pregada pelo racismo e interpreta afirmativamente a raça como

construção social; coloca em xeque o mito da democracia racial.(GOMES, 2012, p. 731)

Percebemos, portanto, que a linguagem pode ser utilizada criar uma realidade, a partir das

relações que são construídas nas interações sociais. Mesmo assim, um novo significado atribuído a

um enunciado não apaga todas as outras construções: no caso de raça, a prova de que não existe

sentido biológico não invalida o uso ainda hoje como elemento para exclusão e dominação.

Feminismo e interseccionalidade

Assim como as discussões sobre raça passam por um processo de ressignificação, os

discursos em torno das noções de gênero sofrem diversas reformulações ao longo da história.

Durante muitos anos, tanto no contexto militante como no acadêmico, trabalhou-se com ideia de

três grandes ondas do feminismo, com a primeira delas tendo início no final do século XIX e

estendendo-se até a Segunda Guerra Mundial. Segundo o panorama oferecido por Carla Gomes e

Bila Sorj (2014), esta luta inicial foi centrada na conquista de direitos fundamentais como o voto,

acesso à educação e funções consideradas masculinas e uma inserção digna das mulheres no

mercado de trabalho. O Segundo Sexo, obra de Simone de Beauvoir publicada originalmente em

1949, é comumente citada como o marco inicial da segunda onda do movimento feminista, no final

dos anos 1960 e a década de 70, uma vez que a célebre afirmação “Ninguém nasce mulher, torna-se

mulher” foi abraçada tanto pela militância feminista como pela produção acadêmica da época,

ressaltando a força das convenções culturais em torno dos papeis sexuais.

A terceira onda estaria localizada no final dos anos 1980, inaugurando a ideia da articulação

de múltiplas opressões e a proliferação de diversas categorias identitárias de mulheres que atacam a

construção discursiva binária que antigamente colocava apenas homens e mulheres em lados

opostos. De forma mais ampla, a história “não é simplesmente sobre a relação entre negros e

brancos, entre homens e mulheres, mas sobre como as categorias de brancura e negritude,

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masculinidade e feminilidade, trabalho e classe passaram a existir historicamente desde o início”

(McClintock, 2009, p. 39).

O aprofundamento da questão da interseccionalidade de marcadores sociais de diferença

mobilizou discursos não hegemônicos tais como aqueles produzidos pelas mulheres dos países do

Sul, imigrantes, orientais, indígenas, islâmicas, negras, transexuais, lésbicas e bissexuais.

Compreendendo a história de forma não linear, afastada desse “ethos organizacional” da militância,

cabe pensar nas contribuições intelectuais que apontaram de forma precursora a necessidade de um

olhar mais generoso e de uma estratégia analítica mais ampla para uma melhor compreensão do

mundo social e da complexidade das suas relações, do entrelaçamento das múltiplas identidades

passíveis de serem assumidas por um indivíduo, das diferenças intra grupos e das opressões

cotidianas que foram naturalizadas pela história. De forma sucinta, Angela Davis resume a operação

de identidades de classe, raça e gênero, marcadores que se cruzam e não se excluem:

Raça é a maneira como a classe é vivida. Da mesma forma que gênero é a maneira como a

classe é vivida. A gente precisa refletir bastante para perceber que entre essas categorias

existem relações que são mútuas e outras que são cruzadas. Ninguém pode assumir a

primazia de uma categoria sobre as outras (DAVIS, 1997, s/n)

O feminismo negro norte-americano e o movimento brasileiro de mulheres, através de

intelectuais e militantes como Angela Davis, bell hooks, Kimberlé Crenshaw e Sueli Carneiro,

pontuaram os limites do feminismo em sua forma mais tradicional, mobilizado por mulheres

brancas, europeias ou estadunidenses e de camadas economicamente privilegiadas. Nessa

concepção seminal do feminismo, a categoria mulher era percebida como uma identidade única e

fixa, que sofria as mesmas opressões e teria anseios comuns rumo à emancipação feminina. De

acordo com a filósofa Sueli Carneiro,

O feminismo esteve, também, por longo tempo, prisioneiro da visão eurocêntrica e

universalizante das mulheres. A consequência disso foi a incapacidade de reconhecer as

diferenças e desigualdades presentes no universo feminino, a despeito da identidade

biológica. Dessa forma, as vozes silenciadas e os corpos estigmatizados de mulheres

vítimas de outras formas de opressão além do sexismo, continuaram no silêncio e na

invisibilidade (CARNEIRO, 2003. p. 118).

É fato que os feminismos seguem o espírito da época e as aspirações existenciais de cada

geração, e nisso reside grande parte de sua diversidade. Contudo, cabe reconhecer as limitações

históricas do campo teórico no que diz respeito às múltiplas identidades e vivências de grupos

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políticos minoritários.

Não podemos deixar de lado o sistemático apagamento das contribuições femininas críticas,

o silenciamento de discursos embasados e as histórias de resistência e mobilização social que foram

varridas para debaixo do tapete da história. A negação de acesso aos espaços de poder, de tomada

de decisão e de produção do conhecimento contribuiu para a exclusão material e subjetiva da

população negra, que até hoje tem dificuldade para conhecer a sua história e suas tradições.

“Já que é pra tombar... Tombei”

“Tá rolando uma reeducação cultural no Brasil. Nós, feministas sim, vamos ajudar o país a

chegar para frente. Aceita porque dói menos, queridos machistas! ” Já no primeiro encontro entre

MC Carol e Karol Conka, em março de 2016 durante o festival de música independente

Lollapalooza, realizado anualmente em São Paulo, a rapper deixou claro o alinhamento

compartilhado pelas cantoras, que até então não se conheciam pessoalmente. É importante conhecer

um pouco sobre a história dessas artistas para entendermos as influências que resultaram na

parceria.

Nascida em Niterói (RJ), Carolina de Oliveira Lourenço atua profissionalmente desde 2010,

quando lançou pela equipe Furacão 2000 o sucesso “Bateu uma Onda Forte”. Em 2011, participou da

faixa “Vou Largar de Barriga”, do MC Parafuso, e emplacou seu maior sucesso solo, a música “Meu

Namorado é o Maior Otário”, seguida por “Minha Vó tá Maluca”. Em suas músicas, Carol aciona temas

característicos do funk carioca, como situações cotidianas entre familiares e vizinhos, violência e sexo

explícito. Através do deboche, desestabiliza expectativas e coloca sob holofotes comportamentos desviantes

e inesperados, marcados pelo exagero e pela informalidade. Sua carreira deu uma guinada após a

participação no reality show “Lucky Ladies”, que mostrava o convívio de cinco funkeiras em um mesmo

apartamento enquanto ensaiavam para um grande show. Produzido pela emissora FOX, o programa foi

transmitido pela TV e pela internet em 2015 e contava com a apresentação de um dos maiores ícones do funk

carioca, a MC Tati Quebra Barraco. Após o reality, MC Carol foi abraçada por um público diferente, mais

estudado, jovem e de classe média.

Karoline dos Santos Oliveira, a Karol Conka, nasceu em uma família humilde em Curitiba e

atualmente é um dos maiores nomes da cena rapper brasileira. Diferentemente da maioria dos seus

colegas de gênero musical, ela consegue circular com extrema facilidade pela grande mídia: atual

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apresentadora do programa de beleza “Superbonita”, produzido pelo canal pago GNT, ela acumula

versões de seus maiores sucessos em campanhas comerciais como a da telefônica NET e o banco

Caixa Econômica Federal. Lançando músicas soltas em plataformas digitais como o Myspace desde

2011, ela já havia emplacado a música “Gandaia” em festas de black music antes de alcançar

notoriedade com o hit “Tombei”, sua canção de maior apelo popular e sucesso nas rádios. Seu

videoclipe foi lançado em 2015 pela plataforma Skol Music, ligada ao grupo Ambev, e em 2016 se

tornou tema de abertura de “Chapa Quente”, série cômica da Rede Globo. Mais interessante ainda,

essa música deu nome a um movimento que mobiliza jovens negros e militantes em redes sociais, o

chamado “tombamento”, que envolve a ideia de chamar a atenção de forma ousada, com a intenção

de chocar ou deixar alguém sem resposta, embasbacado, diante de um discurso, resposta, look ou

atitude.

Duas mulheres negras, periféricas, muito diferentes do padrão “mulata exportação”, que

alcançaram fama e se conheceram através da internet. Após o encontro no festival em março de

2016, em outubro do mesmo ano a parceria se materializou com “100% Feminista”, produzida por

Leo Justi e o duo Tropkillaz e segunda música de trabalho do álbum Bandida, lançado por MC

Carol no segundo semestre de 2016.

100% Feminista (part. Karol Conka)

Presenciei tudo isso dentro da minha família

Mulher com olho roxo, espancada todo dia

Eu tinha uns cinco anos, mas já entendia

Que mulher apanha se não fizer comida

Mulher oprimida, sem voz, obediente

Quando eu crescer, eu vou ser diferente

(Refrão) Eu cresci

Prazer, Carol bandida

Represento as mulheres, 100% feminista

Eu cresci

Prazer, Carol bandida

Represento as mulheres, 100% feminista

Represento Aqualtune, represento Carolina

Represento Dandara e Xica da Silva

Sou mulher, sou negra, meu cabelo é duro

Forte, autoritária e às vezes frágil, eu assumo

Minha fragilidade não diminui minha força

Eu que mando nessa porra, eu não vou lavar a louça

Sou mulher independente não aceito opressão

Abaixa sua voz, abaixa sua mão!

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Mais respeito

Sou mulher destemida, minha marra vem do gueto

Se ‘tavam querendo peso, então toma esse dueto

Desde pequenas aprendemos que silêncio não soluciona

Que a revolta vem à tona, pois a justiça não funciona

Me ensinaram que éramos insuficientes

Discordei, pra ser ouvida, o grito tem que ser potente

(Refrão)

Represento Nina, Elza, Dona Celestina

Represento Zeferina, Frida, Dona Brasilina

Tentam nos confundir, distorcem tudo o que eu sei

Século XXI e ainda querem nos limitar com novas leis

A falta de informação enfraquece a mente

Tô no mar crescente porque eu faço diferente

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Segundo Sueli Carneiro, “A relação entre mulher negra e poder é um tema praticamente

inexistente. (2009, p. 1). É sobre essa ausência que os discursos de Carol e Karol incidem,

ressaltando um histórico de opressões e silenciamentos que somente agora, graças a diversos

fatores, passaram a ser questionados com maior visibilidade. Os versos em primeira pessoa destacam

um eu poético feminino que rompe expectativas e vocaliza sua autopercepção como um indivíduo com

consciência dos seus direitos e que reconhece a importância da expressão própria.

É possível perceber um duplo movimento de resgate e ruptura nos versos de “100%

Feminista”. A música dialoga com a história de mulheres fortes que marcaram a história, tais como

a líder da resistência brasileira de negros escravizados Dandara, a princesa do Congo Aqualtune,

considerada a avó materna de Zumbi dos Palmares, a escritora Carolina Maria de Jesus, que

imortalizou em seus diários o cotidiano das favelas cariocas na primeira metade do século XX, a

cantora norte-americana Nina Simone, que atuou na luta pelos direitos civis, e a pintora mexicana

Frida Kahlo, cujos sofrimentos pessoais foram extravasados em sua colorida arte, localiza

historicamente o papel social da mulher e o longo percurso de questionamento dessa situação de

opressão. As rimas também destacam um movimento consciente de ruptura, que buscam “fazer

diferente” das outras gerações ao não mais aceitarem os abusos e violências machistas. O

reconhecimento da potência criativa dos guetos urbanos e a valorização dos traços negros também

estão presentes, dando pistas de um exercício de ressignificação dessas construções.

Uma das chaves propostas por esse trabalho é a reflexão sobre essa reação de desconforto

diante da figura da mulher negra consciente da sua história, do seu valor e dos seus direitos

enquanto indivíduo. A inadequação ou a ideia de estar “fora do seu lugar” é revertida na exaltação

de uma identidade negra, moderna e urbana que desafia/afronta o lugar comum ao mesmo tempo

em que rende homenagens àquelas que vieram antes e enfrentaram o preconceito, o racismo e o

machismo.

Destacamos especialmente a menção da veterana sambista Elza Soares, que lançou o disco A

Mulher do Fim do Mundo em 2015 e surpreendeu público e crítica com o conteúdo de suas letras,

que falam abertamente sobre corpo, sexualidade, prostituição, violência, machismo e

envelhecimento. Uma delas, intitulada “Maria da Vila Matilde”, traz uma sagaz estratégia de reação

feminina à violência doméstica, dialogando com o cotidiano apresentado pelas rimas de MC Carol e

Conka:

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Maria da Vila Matilde (... porque se a da Penha é brava, imagine a da Vila Matilde)

Cadê meu celular?

Eu vou ligar pro 180

Vou entregar teu nome

E explicar meu endereço

Aqui você não entra mais

Eu digo que não te conheço

E jogo água fervendo

Se você se aventurar

Eu solto o cachorro

[...]

Mão cheia de dedo

Dedo cheio de unha suja

E pra cima de mim? Pra cima de moi? Jamais, mané!

‘Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim!

O enfrentamento à violência contra a mulher é uma das temáticas mais vocalizadas por estas

artistas negras, que denunciam os abusos que vivenciaram ao longo de suas vidas de forma mais ou

menos direta. A proximidade entre os versos que cantam e suas biografias é evidente, acionando

histórias de domínio público sobre suas vidas pessoais que até recentemente eram percebidas como

motivo de vergonha e humilhação. No Brasil, é conhecimento popular que Elza foi, durante muitos

anos, vítima de violência por parte do seu falecido marido, o célebre jogador de futebol Garrincha, e

MC Carol foi mantida em cárcere privado pelo marido por conta de ciúmes. Denunciado pela

funkeira, ele atualmente cumpre pena em regime semiaberto, mas ainda se relaciona com ela.

A visibilidade de seus discursos e o engajamento na militância negra e feminista não

implica a ausência de contradições discursivas e biográficas, ponto especialmente concentradas na

figura de MC Carol. O jornal El País, em entrevista publicada em julho de 2015 por ocasião do

lançamento da música “Não Foi Cabral”, questionou a artista sobre incongruências entre suas

composições e seu estilo de vida:

El País: Mas várias letras contradizem com a sua realidade. Você canta que o seu

namorado é o “maior otário”, mas diz que seu marido é um exemplo. Você fala do crack,

mas diz que nunca usou drogas... Você se sente representada pelas suas próprias músicas?

MC Carol: Assim, nem tudo o que eu canto eu vivo. A maioria das coisas que eu canto é

coisa que as pessoas querem ouvir, ou que acontece na minha comunidade... Agora, essa

música do crack eu escrevi com 15 anos. Eu não gosto dessa música, não canto em show3.

Já Karol Conka foi duramente criticada4 por lançar uma linha de bolsas com preços altos, de

3Fonte: http://brasil.elpais.com/brasil/2015/07/27/cultura/1438026091_663516.html Acesso em 16 de Dezembro de 2016. 4 Fonte: http://istoe.com.br/karol-conka-lanca-linha-de-bolsas-e-gera-criticas-por-causa-dos-precos/ Acesso em 05 de maio de 2017

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até 745 reais, por não corresponder ao poder de consumo de seu público. Tanto nas cobranças feitas

a MC Carol quanto a Karol Conka, é possível pensar que há um racismo velado. Por que artistas

negras não podem lucrar com sua imagem? Por que não podem cantar sobre experiências diferentes

de sua realidade? Esses mesmo questionamentos não aparecem quando se tratam de artistas brancas.

Mesmo com essas supostas contradições, as artistas seguem também como referencial

estético para as mulheres negras, sendo “garotas-propaganda” da gigante Avon – Karol foi o rosto

da campanha de lançamento da linha de maquiagem Mark, que chegou ao mercado em fevereiro de

2017, além de estrelar a campanha “Um olhar aberto te define” ao lado de MC Carol e da rapper

paulista Lay.

Lacerda destaca a luta por representatividade da estética negra “em espaços de legitimação

do belo: capas de revistas, novelas, filmes, seriados, agência de modelos e editoriais” (2016, s/n).

Ao reclamar espaço na mídia e no universo fashion para uma parte da juventude negra, esse

movimento toca em temas ainda sensíveis para o pensamento social brasileiro, tradicionalmente

apegado a construções narrativas como o “mito da democracia racial”, a subalternidade econômica

da população negra e a mínima representatividade midiática, longe de estereótipos, no que diz

respeito à diversidade de corpos, raças e sexualidades.

Também é possível observar um posicionamento militante das duas artistas no que diz

respeito às pautas feministas e a questão do racismo em suas redes sociais oficiais: no dia

internacional da Mulher, MC Carol publicou no Twitter uma foto inspirada no clássico pôster Rosie

the Riveter, ícone norte-americano da Segunda Guerra Mundial que traz o desenho de uma mulher

operária e os dizeres “We can do it!” (“nós podemos fazer isso!”, em tradução livre).

Temos em ação uma mudança de expectativa da postura subalterna e dos lugares comumente

associados às mulheres negras. Expandindo narrativas e ocupando espaços, tais como o rap, o funk, as

redes sociais, a propaganda, a moda, os sistemas de beleza e cosmética.

Reflexões

Este artigo não esgota as possibilidades de análise das músicas e trajetórias de MC Carol e

Karol Conka. É fundamental reconhecer a importância de mulheres negras que reconhecem sua

identidade racial e se assumem feministas, mesmo sem o vínculo acadêmico que muitas vezes cerca

esses processos. Como símbolos de uma juventude negra militante, elas trazem em suas músicas as

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

vozes de várias outras mulheres que lutaram para que elas pudessem ter espaço tanto no meio

artístico quanto na sociedade, como as lembradas na música “100% Feminista”. Ao romper com a

hegemonia masculina que existe tanto no funk quanto no rap, as cantoras mostram também que não

há limites para a participação das mulheres em nenhuma atividade, ambas sendo grandes sucessos

em seus segmentos.

MC Carol e Karol Conka são duas artistas representativas de um movimento que vem

ganhando cada vez mais visibilidade dentro e fora das redes sociais, uma mobilização cada vez mais

organizada que vem disputando o espaço das narrativas hegemônicas que historicamente excluíram

e ainda excluem mulheres. Atravessado por múltiplas identidades, seus discursos levam a pauta dos

direitos femininos para um público não necessariamente acadêmico e destacam a luta e o

protagonismo de figuras femininas negras e periféricas nas mais diversas arenas da sociedade ao

longo da história.

Trata-se de reconhecer o passado, encarar o presente com consciência do seu lugar no

mundo e garantir uma mobilização para fazer um futuro diferente, livre de opressões de gênero,

raça e classe.

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“The scream must be powerful”: the black feminism of MC Carol and Karol Conka

Abstract: The expansion of Internet access has changed the information frontiers in the last

decades, with social networks acquiring an important role for the diffusion of debates on subjects

such as gender and race. In this context emerged two black female singers, peripheral, who gained

fame through the Internet and show a way of speaking of feminism that goes beyond theories. In

this work, we seek to analyze the discursive contributions of the singers MC Carol and Karol Conka

for the debate of the social place of the black woman through their songs. With great visibility in

funk and rap, these artists make up a posture of resistance and representation in music and society.

We will adopt gender as an analytical category to think power relationships in society. The

reflection on the specificities and the cross-linking of social markers follow the contributions of

Crenshaw (2002) and Piscitelli (2008). With Carneiro (2003) we will highlight the invisibility of

black women and their patterns in hegemonic feminism. To talk about race and society, we will use

the theoretical assumptions of Hall (2013) and Munanga (2000), allied to Bakhtin's (1997)

reflections on the role of language.

Keywords: Gender. Race. Feminism. Music.