o duelo- churchill x hitler - john lukacs

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    O socilogo lida com seu material como se o desfecho j se apresentasse nos fatos conhecidos:

    simplesmente procura a forma pela qual o resultado j se achava determinado pelos fatos. O historiador,

    no: ele tem de manter sempre uma viso no determinista em relao ao tema. Tem de se colocar,

    constantemente, num ponto passado em que os fatores conhecidos ainda parecem permitir diferentes

    resultados. Se falar de Salamina, deve ser como se os persas ainda pudessem vencer.

    Johan Huizinga

    The Idea of History

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    IO duelo de oitenta dias

    No ano de 1940, a Pscoa ocorreu muito cedo. Isso queria dizer que odomingo de Pentecostes tambm chegaria cedo, no dia 12 de maio. Na

    Inglaterra e na Europa, eram dois dias de feriado.No dia 10 de maio, uma sexta-feira, em toda a Europa ocidental a noite

    estava clara e estrelada, prenunciando um belo dia de primavera. Naprimeira hora desse dia, um trem incomum, puxado por duas grandeslocomotivas a vapor e composto de dez vages verde-escurosexcepcionalmente compridos, deslizou at parar num desvio perto daestao de Hagenow, no trajeto longo e retilneo entre Hannover eHamburgo. Tratava-se do trem especial com carros especiais fabricadopara Adolf Hitler e sua comitiva, macio, escuro e reluzente, um dosimpressionantes instrumentos do Terceiro Reich, feito do melhor aoalemo. Seu codinome era Amerika.

    Poucos minutos depois da meia-noite, hora da Europa ocidental, essetrem mudou de rota to eicaz e silenciosamente que diicilmente algum deseus ocupantes acordou para notar que tinha comeado a se mover denovo, e em direo diferente da anterior. Estava se dirigindo para o norte.Seus ocupantes no haviam sido informados para onde; o destino pareciaser Hamburgo. A maioria deles achava que o Fhrer ia para a Noruega,pas cuja maior parte fora conquistada por suas foras durante as trssemanas anteriores. Ele mesmo izera uma observao indireta, nessesentido, a uma de suas secretrias. Agora, uma da manh, no horrio deBerlim (os relgios alemes haviam sido adiantados uma hora quando aguerra comeara), o grande trem comeou a fumegar para o oeste.

    Quatro horas mais tarde, apitou anunciando uma parada. O interior

    daqueles carros amplamente blindados e estofados foi despertado com aagitao abafada que d o tom matutino de todos os vages-dormitrio.Seus ocupantes levantaram as cortinas, entrevendo um prdio de estaosem nenhuma placa de letreiro. Todas as placas tinham sido retiradas. Oque eles podiam ver por toda parte eram os sinais e indicadores amarelosda Wehrmacht alem. Sabiam agora que estavam em Euskirchen, pequenacidade alem entre Bonn e Aachen, perto da fronteira belga. Foram entolevados para um grupo de quartis no alto da colina da aldeia de Rodert,

    no Mnstereifel. Seria esse seu espartano quartel-general nos prximosvinte e trs dias, numa clareira de loresta que muitos deles iriam recordarcom prazer por causa das muitas rvores e da interminvel variedade de

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    pssaros que gorjeavam e chilreavam. Seu codinome era Felsennest, oNinho na Rocha.

    O Chef (era assim que os auxiliares de Hitler se referiam a ele) estavabem-disposto, determinado, enrgico. Sua presena naquela hora erabastante inabitual. Era seu costume recolher-se tarde. Num dia normal,no se levantaria e no faria sua toalete antes das onze horas. Acenou paraos auxiliares, que rapidamente se reuniram sua volta, ansiosos paraouvir o que o Fhrer tinha a dizer. Senhores, disse ele, a ofensiva contraas potncias ocidentais comeou. Imediatamente, eles puderam ouvir, distncia, o estrondear amortecido da artilharia. A loresta, o canto dospssaros e o fogo dos canhes: naquela grande hora da aurora alem, erauma felicidade estar vivo.

    A maior aventura da carreira de Adolf Hitler comeava agora. Elaganharia velocidade numa proporo inimaginvel para qualquer um,inclusive ele prprio. Em menos de quarenta dias, ele seria o senhor daEuropa, talvez da maior parte do mundo. Sua nova bandeira alem seriadesfraldada do cabo Norte aos Pireneus. Seus exrcitos conquistariam aEuropa ocidental a um custo de homens e equipamento menor do quegastara o exrcito imperial alemo, num perodo de tempo comparvel, emfuno de uns poucos quilmetros atravs das trincheiras na Primeira

    Guerra Mundial.Grande parte disso seria o resultado de decises militares que ele,Hitler, havia tomado. Vinte anos antes, depois de ter resolvido ser umpoltico, as pessoas o rejeitaram: como podia aquele intruso sem instruoser o lder de um importante partido poltico alemo? Ele as enganou:mostrou que era um mestre em poltica nacional alem; ele venceu.Tornou-se o chanceler alemo e as pessoas novamente o subestimaram: oque esse demagogo, de mentalidade provinciana, podia entender de

    diplomacia e de Europa? Ele as enganou: mostrou-se um estadistaformidvel. Em seis anos tornara a Alemanha maior do que Bismarck aizera, e conseguira tudo isso sem guerra. As pessoas ento disseram: umaguerra? Que tipo de guerra? Com uma Alemanha privada do tipo demarinha, colnias, implementos e bens que a Alemanha imperial tivera em1914? Ele de novo as enganou. Em maio de 1940, a estratgia dacampanha na Europa ocidental fora escolhida por Hitler o plano deatacar pelas Ardenas, enganar os Aliados, investir diretamente contra o

    canal da Mancha. Era um plano de gnio.Napoleo uma vez disse que, na guerra como na prostituio, os

    amadores freqentemente so melhores que os proissionais. Hitler pode

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    ter sido um amador no generalato, mas possua o grande talentoproissional que se aplica a todas as questes humanas: uma compreensoda natureza humana e a compreenso das fraquezas de seus adversrios.Isso foi suficiente para lev-lo muito longe.

    Muito longe. Ele varreria a Frana e expulsaria os ingleses da Europa.Depois, estabeleceria suas condies de paz para os ingleses, que teriamde aceit-las.

    Estava quase certo quanto a essas questes naquele 10 de maioensolarado e com pssaros cantando. Quase, mas no completamente.Tambm estava tenso: ansioso para ver se os planos para o principalgrupo de exrcito funcionariam; ansioso a respeito do clima; ciente de queas notcias decisivas a respeito de seu plano o Sichelschnitt, ou Golpede Foice em direo esquerda, atravs do extremo norte da Frana,surpreendendo os exrcitos franceses e britnicos na Blgica noestariam disponveis ainda por alguns dias. No entanto, tudo parecia irbem naquele dia. Quando ainal caiu aquela noite de maio, ele e seu staff jse sentiam em casa, j haviam desfeito as malas e se abrigado no Ninho daRocha. Ele teve uma breve reunio na pequena sala dos mapas, antes de serecolher excepcionalmente cedo (mas tambm tinha se levantadoexcepcionalmente cedo). Antes disso, leu, entre os vrios despachos

    recentes do mundo l de fora, trazidos e organizados para ele por WaltherHewel, homem de ligao do seu ministro das Relaes Exteriores Joachimvon Ribbentrop em seu quartel-general, que do outro lado da ManchaWinston Churchill se tornara o primeiro-ministro da Inglaterra.

    Isso aconteceu em algum momento do incio da noite. No temosnenhum registro das palavras com que Hitler reagiu notcia. Ele sabiaque uma crise poltica estivera sacudindo Londres por alguns dias.Podemos icar razoavelmente seguros de que Hitler no icou surpreso. J

    tinha observado certa vez que um dia Chamberlain poderia sair e que osingleses ento dariam uma oportunidade a Churchill. Uma oportunidade,no muito mais que isso. Sabia que Churchill era um dos mais implacveis,talvez o mais implacvel, de seus inimigos. Por isso, mas tambm poroutros motivos, Hitler o desprezava.

    Estava errado em faz-lo. perigoso para um homem subestimar umadversrio determinado. De qualquer maneira, no sabemos o que Hitlerachava da notcia vinda de Londres quando se recolheu na noite de 10 de

    maio. Parece que ainda no compreendia totalmente at onde por trs epara alm da grande guerra de exrcitos e marinhas e povos inteiros queele ento desencadeara na Europa ocidental se envolveria em algo como

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    um duelo direto com Churchill.Churchill diicilmente poderia ter sido mais diferente de Adolf Hitler;

    assim como foram diferentes os dias de cada um naquele 10 de maio.A aparncia sica dos dois no podia ter sido mais diferente. Ao entrar

    no quartel naquela manh, Hitler trajava sua farda simples. Churchilltrajava um pijama de seda, o robe multicor descuidadamente enlaado nacintura e pantufas nos ps descalos. Andava maciamente com elas portoda parte, respirando pesadamente. Hitler tomava um frugal caf damanh. Churchill cedo se sentava para uma grande travessa de bacon comovos fritos, acendendo ento o primeiro charuto.

    Na mesma hora, talvez no mesmo momento em que Hitler deu aquelainformao a seus auxiliares, s cinco e meia da manh naquela clareira daloresta, Churchill acordara quando o telefone tocou na mesinha-de-cabeceira de seu apartamento, no alto da sede do Almirantado, emLondres. Os alemes estavam invadindo a Holanda. Por um momento oalcande da notcia no icou claro: somente a Holanda? Ou era o comeo dogrande ataque alemo de um lado a outro da Europa ocidental? Menos deuma hora mais tarde, icou tudo bastante claro. Eles estavam invadindotanto a Blgica como a Holanda e bombardeando aeroportos da Frana. Aessa altura, a claridade da manh de maio absorvera a aurora. O enorme

    aglomerado enfumaado de Londres era inteiramente inundado pelaplida luz azul.Londres, na poca, ainda era a maior cidade do mundo, com mais

    habitantes do que Nova York, Moscou, Berlim e Tquio. A maior parte deseu povo ainda no havia sido afetada pela guerra. O povo ingls,evidentemente, no era um mero espectador do duelo prestes a comear.Tampouco o povo alemo. Tanto Hitler como Churchill dependiam de seuspovos mas havia uma diferena. Hitler estava no posto de comando, e

    Churchill no, ou, pelo menos, ainda no. E esses postos no eram de modoalgum semelhantes, tampouco o apoio que tinham. O povo alemo era forte,disciplinado, obediente, em grande parte nada disposto a ocupar a cabeacom algo alm das coeres obviamente eicazes dessa obedincia. Ocarter e as experincias do povo britnico eram diferentes. Suademocracia poltica, se no completamente social, com o governoparlamentar, tinha tornado seus governantes dependentes de seu estadode esprito. As prprias condies e processos pelos quais o estado de

    esprito do povo era avaliado pela liderana poltica eram complicados eindiretos.

    O povo ingls no muito racional. Tambm no se mostra

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    freqentemente disposto a pensar sobre certas coisas, embora essaresistncia seja diferente de sua variedade germnica. No se mostradisposto a tomar uma deciso ou mudar de idia at que a forte impressode um sinal inevitavelmente visvel o obrigasse a faz-lo. Atravessaremosessa ponte quando chegarmos a ela: poucas expresses inglesas so maistpicas do que essa. Em 10 de maio de 1940, muitos deles, inclusive seusrepresentantes eleitos no Parlamento, achavam que tinham alcanado umadessas pontes. Por estranho que parea, isso nada tinha a ver com atremenda notcia desse dia, segundo a qual, com a invaso alem daEuropa ocidental, a Segunda Guerra Mundial realmente havia comeado. Oque estava acontecendo era a cristalizao de um sentimento nacional:substituir Chamberlain no comando do governo.

    Nos outros aspectos, a manh avanava como sempre. As casas dossubrbios, com seus tijolos castanhos e amarelos, o bronze reluzente nasportas de Mayfair, os nibus vermelhos atravancando aqui e ali, o cheirode carvo e pelcia do metr, a jardinagem e os jogos programados paraos dois dias de Pentecostes eram slidos, familiares, aparentementeinalterveis. A guerra havia comeado para valer, mas nenhumbombardeiro alemo apareceu sobre a Inglaterra.

    Nesse dia, em Westminster, uma ponte foi atravessada. A histria desse

    dia, e de seus desdobramentos de hora em hora, tem sido contada muitasvezes por historiadores, por participantes, bigrafos e memorialistas,inclusive o prprio Churchill (que, decerto sem o saber, e com nenhumbenecio para seu relato, se enganou sobre a data de um encontro crucialque ocorrera, na verdade, na vspera). Foi um dia excepcional paraChurchill, como o foi para seu inimigo, trezentos e tantos quilmetros aleste. Para Churchill era dicil, assim como para Hitler, se levantar maiscedo (enquanto Hitler no devia ser incomodado at as onze, Churchill, de

    vez em quando, despachava seus papis e dava ordens da cama ou dabanheira). Nessas circunstncias, ele tomou o caf da manh bem antesdas sete. As notcias da guerra estavam chegando. Ele estava pronto parasair do Almirantado, nessa clara e fria manh, para a reunio deemergncia no Gabinete de Guerra.

    Desde a tarde anterior ele sabia que a ponte seria atravessada, queseria nomeado primeiro-ministro. Dissera-o sucintamente ao ilho, na noiteanterior, pelo telefone. Quando icou pronto para sair, a secretria

    particular veio correndo: o ilho estava ao telefone de novo. O pai foi breve:Oh, no estou sabendo a esse respeito. Nada importa agora a no serderrotar o inimigo. Isso no era para consumo externo. H todos os

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    motivos para crer que ele falava a srio. Uma das coisas surpreendentessobre Churchill naquele dia a ausncia de qualquer sensao de triunfono momento em que a ponte devia ser aberta para ele.

    Surgiu ento um obstculo. Chamberlain tinha mudado de idia. Navspera, dissera a Churchill e Halifax que devia renunciar. Agora,novamente se agarrava ao poder. Quando o Gabinete se reuniu, com asnotcias da guerra se precipitando, Chamberlain disse que julgava quedevia permanecer at o resultado da grande batalha na Blgica, que estavacomeando. Churchill no disse nada. Mais tarde, nessa manh, alguns dosantigos seguidores de Chamberlain o abandonaram. Havia acordo unnimesobre uma coisa: devia ser formado um governo nacional, com aparticipao dos ministros trabalhistas. O Comit Executivo Nacional doPartido Trabalhista realizou sua assemblia anual nas salas e no subsolode um hotel de classe mdia de Bournemouth. Seus representantes tinhamairmado que no cooperariam com Chamberlain, mas sua declarao inalainda no fora feita. s onze e meia, houve outra reunio do Gabinete deGuerra. Pra-quedistas alemes tinham tomado o aeroporto de Rotterdam.A corte e o ministrio holandeses estavam fugindo do pas. Churchill trouxe tona algumas questes tcnicas. A impresso que causou foi deindiferena. s quatro e meia, o Gabinete se reuniu de novo. As cenas

    dramticas atravs da Mancha relampejavam de longe. A reunio searrastava numa lengalenga, como muitas vezes ocorre em encontros deministrio ou de comit. No entanto, todos sabiam que o que importavaagora era o que os polticos do Partido Trabalhista numericamentefalando, uma minoria muito reduzida na Cmara dos Comuns iriamdizer sobre um governo nacional. Por volta das cinco horas, deram suaresposta por telefone. No participariam com Chamberlain como primeiro-ministro. Churchill permaneceu em silncio. Chamberlain ainda se abstinha

    de mencionar o nome de Churchill. Finalmente, j cansado no desfechodaquela ltima reunio ministerial do dia, Chamberlain declarou que tinhade renunciar.

    Em seguida dirigiu-se ao palcio de Buckingham para informar ao rei.Foi depois da hora do ch real. Jorge VI se entristeceu: coniava emChamberlain e no estava seguro com relao a Churchill. Esperava quefosse Halifax. Uma hora depois, Churchill foi conduzido ao palcio. O rei orecebeu de maneira muito afvel. Houve um momento de moderao

    inglesa, destitudo de toda pompa, com o rei provocando Churchill, que lherespondeu com naturalidade. O rei riu e disse: Preciso de voc paraformar um governo. Churchill disse que o faria e, em seguida, esclareceu

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    alguns detalhes.Londres ento estava imersa num crepsculo de luz azulada. A

    distncia do palcio de Buckingham Casa do Almirantado pequena e emlinha reta. Atrs do motorista, Churchill estava acompanhado apenas peloinspetor W.H. Thompson, seu guarda-costas. Durante um longo minuto,Churchill se manteve em silncio. Em seguida, disse que Thompson deviasaber por que ele havia sido chamado ao palcio. Thompson respondeuque sim, felicitou Churchill e disse: Eu s queria que o senhor tivessechegado a esse cargo em dias melhores, pois tem uma enorme tarefa pelafrente. Churchill, ao contrrio de Hitler, era um homem de sentimentosno reprimidos. Em algumas ocasies, lgrimas lhe vinham aos olhos. Estafoi uma delas. Disse a Thompson: S Deus sabe como grande. Esperoque no seja tarde demais. Tenho muito receio de que seja. S podemosdar o melhor de ns. Ento mordeu os lbios e saltou do carro, subindo osdegraus da sede do Almirantado com expresso severa e determinada.

    A ponte, agora, estava atrs dele. Depois de um dia muito longo (eprivado de sua habitual e reparadora sesta da tarde), lanou-se com todaenergia aos pormenores. Escreveu muitas cartas, inclusive uma aChamberlain, generosa. Quando, depois da guerra e muitos anos maistarde, ele descreveu os acontecimentos desse dia, disse que podia ter sido

    inexato num ou outro detalhe. Mas, no inal, h uma passagem reveladora.Quando fui para a cama, l pelas trs da madrugada, tinha conscincia deuma profunda sensao de alvio. Ainal, eu dispunha de autoridade paracomandar o cenrio todo. Sentia como se estivesse caminhando com odestino e como se todo o passado da minha vida no tivesse sido senouma preparao para essa hora e essa experincia. Concluiu essapassagem com uma frase que soou como um estranho baque surdo: Fatosso melhores que sonhos. Talvez pretendesse dizer a seus leitores que

    cara ento num sono abenoadamente calmo e sem sonhos.Isso foi s trs da manh do dia 11 de maio, sbado. Hitler dormia asono solto. Havia comeado o dia mais cedo do que Churchill, mas este foialm dele nesse dia. Pode ter havido um pressgio nisso. Mas pressgios,como tais, so assuntos que s podemos ver em retrospecto.

    Assim chegamos histria do duelo entre Adolf Hitler e WinstonChurchill durante os oitenta dias de 10 de maio a l de agosto do ano de1940. Desse duelo, em maio, junho e julho, dependeram a Segunda Guerra

    Mundial e o destino do mundo da para a frente. Durante esses oitentadias, apenas Churchill se colocou no caminho de Hitler para impedir queganhasse a guerra. Depois desses oitenta dias, outras importantes

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    presenas lanaram suas sombras no cenrio mundial. As situaes dosduelistas mudaram. Hitler comeou a considerar a possibilidade de umainvaso da Rssia, que podia anteceder a da Inglaterra, ou mesmo eliminarsua necessidade. Essa considerao, na cabea de Hitler, comeou a seconsolidar exatamente no momento em que a simpatia de FranklinRoosevelt pela Gr-Bretanha de Churchill e sua antipatia pela Alemanha deHitler inalmente se concretizaram em sua determinao de passar dedeclaraes de no-neutralidade a atos de no-neutralidade. Depois deagosto de 1940, Churchill j no estava s. Quinhentos dias mais tarde, osEstados Unidos de Roosevelt e a Rssia de Stlin entravam na guerra. Mas,ainda que a Gr-Bretanha de Churchill pudesse ter perdido a batalha daInglaterra, em agosto e setembro de 1940; ainda que Churchill e os Aliadospudessem ter perdido a guerra em 1941 e talvez at em 1942; ainda quedepois disso tivesse icado cada vez mais evidente que a Gr-Bretanha nopodia derrotar a Alemanha mesmo com a plena participao dos EstadosUnidos na guerra devemos considerar duas questes que soinsuicientemente reconhecidas, se tanto. Uma delas que, duranteaqueles oitenta dias de maio, junho e julho de 1940, Hitler chegou maisperto de vencer a guerra do que fomos acostumados a pensar. A outra que a posio de Churchill no era to forte quanto fomos acostumados a

    pensar. Tanto Hitler como Churchill sabiam disso. Tambm se conheciambem um ao outro, embora no se tenham encontrado. Da o fascnio doduelo, que foi, evidentemente, um duelo de crebros.

    No devemos dramatizar demais essa igura de linguagem. Ohistoriador, uma vez ciente do risco doentio de auto-engano latente em suaproisso de f em alguma espcie de objetividade cientica, devetambm estar ciente das tentaes de excessiva dramatizao que envolve,inevitavelmente, o mau uso das palavras. Um duelo, por sua prpria

    natureza, sico. Tem as marcas de alguma coisa feudal ou medieval: umtorneio. Bem, Churchill pode ter sido um cavaleiro medocre, mas no dotipo que se reveste de armadura reluzente (estranhamente, foi o plebeuHitler que um artista alemo, certa vez, retratou envergando umaarmadura completa e segurando uma soberba lana: a pintura foiimpressa num selo postal alemo). Num duelo, cada um dos doisadversrios tem a oportunidade de matar ou, pelo menos, derrubar ooutro. Em 1940, tudo o que Churchill podia fazer era aparar os golpes de

    Hitler e talvez feri-lo aqui e ali de quando em quando; mas no tinha nemcomo mat-lo, nem derrub-lo, nem feri-lo mortalmente. No entanto, decerta forma, ele derrotava ou melhor, superava seu oponente, uma

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    vez que este comeara a mudar de opinio.Tudo isso desmente a ilosoia determinista e sociocientica (e, pelo

    menos num sentido, democrtica) do mundo moderno, segundo a qual ahistria feita pelas condies materiais, pelas instituies e suaorganizao, e no mais moldada pelas idias, palavras e atos (em suma:pelo carter, uma palavra em si fora de moda, evitada por cientistaspolticos e socilogos) dos homens importantes. No pode haver nenhumadvida de que, em 1940, o destino da maior parte do mundo e o destinosubseqente de grande parte do sculo XX dependeu desses doishomens, Hitler e Churchill (e, mais tarde, de Roosevelt, Stlin e de Gaulle,sem os quais o desenrolar da Segunda Guerra Mundial teria sido bemdiferente).

    O que interessa o carter espiritual, ainda mais que o material, de umhomem. Hitler e Churchill eram poderosos pensadores. Tudo dependia decomo e sobre o que realmente pensavam, inclusive o elemento primordialde seu duelo: como suas mentes se percebiam e se projetavam. Nem Hitler,nem Churchill tinham uma idia inteiramente original, pois no existe algocomo uma idia inteiramente original. Mas cada simples pensamento nestemundo percebido (e expresso) de maneira diferente por cada serhumano. O que interessa neste mundo o que as pessoas, inclusive Hitler

    e Churchill em 1940, pensam e em que acreditam: mas suas crenas, idiase pensamentos no existem independente delas mais do que elas prpriasexistem independentemente do resto do mundo. As idias s importamquando homens as encarnam. A esse respeito, no apenas materialistascomo Marx, mas idealistas como Dostoievski estavam errados. Em suma, amente no apenas mais importante do que a matria e a ela anterior,mas o que o homem faz com as idias tanto mais importante e mais realdo que o que as idias fazem com os homens.

    H idias que podem ser imortais. Mas sua concepo quase semprehistrica isto , elas no so imaculadas. Em 1940, Hitler e Churchilleram os principais antagonistas de uma luta tremenda, no apenas entrediferentes naes, com seus diferentes exrcitos, produtos, hbitos,costumes, leis. Representavam tambm dois dos trs enormes movimentoshistricos cujas lutas, tendo eclodido aps a Primeira Guerra Mundial echegado a um clmax em 1940, dirigiram a histria de quase todas asnaes.

    Na poca em que escrevemos, cinqenta anos depois de 1940, pelomenos uma, talvez duas geraes icaram adultas vendo a histria dosculo XXmarcada pelo conlito global do capitalismo contra o comunismo,

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    dito ainda da democracia contra o comunismo. Essa perspectiva falsa.O principal aspecto do panorama histrico do sculo XX o das duas

    guerras mundiais. Elas so as duas grandes cadeias de montanhas sobcujas sombras ns ainda agora vivemos. Elas mudaram o mundo mais doque quaisquer das guerras mundiais e revolues dos sculos que asantecederam. Elas nos separaram do mundo antes de 1914, que nosomente para ns como j para a gerao que se seguiu Primeira GuerraMundial parece, e pareceu, extremamente remoto. A revoluo bolchevistana Rssia, a ascenso dos Estados Unidos posio de superpotncia domundo, o im dos imprios coloniais, a bomba atmica etc. etc., foram asconseqncias dessas guerras, no suas causas.

    insensato considerar as idias como se fossem independentes dosseres humanos. Isso verdade a respeito de cada uma das foras emovimentos da histria, que fundamentalmente so mais os resultados deidias do que dos elementos materiais, j que estes no so senodecorrentes de idias. As encarnaes dos principais fatores histricos soagora, assim como tm sido por vrios sculos, as naes do mundo. Issonem sempre foi assim no passado, e no ser sempre assim no futuro. Anao moderna to diferente do Estado de um desenvolvimentorelativamente recente. No obstante Marx e Lnin, e grande parte da

    cincia social democrtica, as grandes guerras e lutas do sculo XXforam, eainda so, as das naes, mais do que as das classes do mundo. Assim, asduas guerras mundiais foram, em grande parte, embora no inteira ouexclusivamente, os resultados da luta da Alemanha contra outras naes,da ascenso da nao alem posio de potncia mundial, de suapotencialidade para o domnio da Europa em retrospecto, a ltima dastentativas militares e polticas de faz-lo por parte de uma grande nao eEstado europeu. Mas havia ainda muito mais do que isso.

    A fora mais importante do sculo XXfoi o nacionalismo. O erro fatal ouquase fatal do comunismo, assim como da democracia, foi ignor-lo at quefosse quase tarde demais. O maior e mais poderoso apstolo donacionalismo moderno foi Adolf Hitler. Mas tambm ele no estava sozinho.Ele era uma encarnao superlativa (no estou empregando essa palavraem seu sentido laudatrio) de um movimento histrico que, em suas novasformas, pelo menos por vinte ou vinte e cinco anos pareceu inundar omundo. De cerca de 1920 a 1945, o quarto de sculo que corresponde ao

    espectro da carreira poltica de Hitler (embora no da de Churchill), ahistria do mundo (e no apenas da Europa) foi assinalada por uma lutatriangular. Havia o comunismo, ento encarnado e representado pela

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    Unio Sovitica; havia a democracia parlamentar e, de um modo geral, ademocracia liberal , encarnada e representada pelas naes de lnguainglesa e pela maior parte das naes do Ocidente e da Europasetentrional; e havia uma nova fora histrica, inadequadamente chamadafascismo, cuja primeira incidncia nacional foi a ditadura de Mussolini naItlia, mas cujo poder de atrao se mostrou depois eclipsado pelo TerceiroReich de Hitler na Alemanha, um Estado nacional-socialista quepermaneceu sua principal encarnao at a derrota da Alemanha em1945.

    Nesse ano crucial de 1940 bem como por muitos anos antes e poralguns anos depois , o nacional-socialismo era a mais vigorosa dessastrs foras. Sabemos, e muitas vezes esquecemos, que ainal foramnecessrias as foras combinadas da aliana (em muitos aspectos inusitadae efmera) da Gr-Bretanha, Estados Unidos e Rssia sovitica paraderrotar a Alemanha. Nenhum deles nem mesmo a aliana de doisdentre eles, nem mesmo o formidvel peso material dos imprios britnicoe americano poderia realizar isso. Isso no era to-somente o resultadoda capacidade combativa, da organizao e da disciplina das forasarmadas alems, embora tivesse muito a ver com isso. Tinha muito, talvezainda mais, a ver com o fato de que a idia que Hitler encarnava e

    representava era muito poderosa. Por isso no s historicamente erradocomo perigoso ver Hitler e o hitlerismo como apenas um estranhoparntese na histria do sculo XX, a transitria ascenso e queda de umlouco.

    Apesar de suas pretenses internacionais e da propaganda, ocomunismo no avanara muito fora da Unio Sovitica. Lnin estavaconvencido de que a tomada do poder pelos comunistas na Rssia, em1917, havia sido apenas um acaso auspicioso, que o que ocorrera ali logo

    se repetiria em muitos outros Estados na Europa e na sia (na opinio deLnin, antes de tudo na Alemanha). Mas isso no ocorreu. Solitrio dentreas grandes revolues do mundo considere-se apenas como asrevolues americana e francesa logo haviam sido imitadas por umaquantidade de outros povos, na Amrica Latina e na Europa ocidental,muitas vezes sem o apoio dos exrcitos americano ou francs , ocomunismo s conseguiu alcanar o poder em algum lugar fora da UnioSovitica aps a Segunda Guerra Mundial. De fato, dentro do prprio

    imprio russo, o preo que Lnin teve de pagar pela sobrevivncia do seuregime comunista foi um encolhimento daquele imprio, um recuo dosdomnios russos em direo ao leste. Em 1924 ele foi sucedido por Stlin

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    que, ao contrrio de Lnin, era um estadista mais do que umrevolucionrio, um nacionalista e no um internacionalista, e umisolacionista nos muitos anos que estavam por vir.

    Porm, durante a dcada de 1920 e sobretudo a de 1930, no s ocomunismo mas igualmente a democracia estavam recuando. Por um curtoperodo aps 1918, pareceu que a vitria das democracias ocidentais naPrimeira Guerra Mundial levaria naturalmente ao predomnio dademocracia parlamentar liberal na maioria das naes do mundo,sobretudo na Europa. Isso no durou. Durante os vinte anos anteriores a1940, a democracia parlamentar liberal fracassou e foi abandonada pelospovos da Itlia, Turquia, Portugal, Espanha, Bulgria, Grcia, Romnia,Iugoslvia, Hungria, Albnia, Polnia, Estnia, Letnia, Litunia, ustria,Alemanha sem falar no Japo, China e muitos pases da Amrica Centrale do Sul. Essas mudanas no resultaram de presso externa, mas dedesdobramentos espontneos. J em 1930 parecia (e isso se deu trs anosantes de Hitler chegar ao poder na Alemanha) que a ascenso dasditaduras autoritrias como conseqncia do fracasso da democraciaparlamentar e capitalista era um fenmeno natural e mundial. Veremosque o prprio Churchill tendia a considerar dessa maneira. O carterdessas ditaduras variava de pas para pas. A maioria delas no era

    totalitria, no sentido posteriormente aceito desse termo. Algumas dessasditaduras nacionais resistiram a Hitler. Mas, em conjunto, a democraciaestava recuando. Ela dava a impresso de instituies e idias esgotadas eobsoletas. O prprio mapa poltico da Europa reletia isso. Na Europaocidental e setentrional, a democracia parlamentar ainda predominava. NaEuropa central, meridional e oriental, ela cedera lugar a ditadurasnacionalistas. Nas regies mais orientais da Europa, isolado do resto docontinente por sua Cortina de Ferro, estendia-se o gigantesco Estado da

    Rssia comunista, solitrio, confuso e sombrio.Houve uma outra mutao, mais profunda. Na poca da PrimeiraGuerra Mundial, era razovel e adequado pensar e falar em uma guerraque envolvesse a Alemanha, Frana, Gr-Bretanha. O fato de essasnaes terem constituies e sistemas de governo diferentes era um fatorsecundrio. Quando a Segunda Guerra Mundial estourou em 1939, eranovamente uma guerra de naes, envolvendo a Alemanha, Polnia,Frana, Gr-Bretanha mas todos sabiam que no se tratava s disso. A

    Alemanha de 1939 no era a Alemanha de 1914 e no s porque AdolfHitler era um homem diferente de Guilherme II. Havia ento umaAlemanha nacional-socialista, um Terceiro Reich, uma encarnao de uma

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    ilosoia e uma ideologia que era um elemento essencial, talvez oelementoessencial, em seu carter e comportamento. E havia ainda uma outra e nomenos importante mutao. Durante todas as guerras na histria dahumanidade existiram pessoas em todas as tribos, Estados, imprios ounaes que se opuseram quelas guerras e, por conseguinte, ao respectivogoverno que a estava travando. Mas em 1914 havia poucas pessoas quedesejassem e que efetivamente trabalhassem para a vitria de um inimigo.Mesmo Lnin, que desejava o desmoronamento do governo czarista russo,no queria ver a vitria da Alemanha. Ele aceitaria fundos alemes eauxlio alemo, mas no era um agente alemo. Em 1940, muita coisa haviamudado. Havia pessoas, em muitos casos uma minoria considervel, que seopunham ao governo e guerra por este conduzida no por motivospaciistas, mas por motivos polticos e ideolgicos, dentre os quais seincluam suas simpatias pelos sistemas polticos e ideolgicos dos inimigosda sua nao. Dentro da Alemanha havia uma pequena mas historicamentememorvel minoria de homens e mulheres decentes que desejavam aqueda de Hitler se necessrio, por meio de uma derrota militar de suanao levada a cabo pelos adversrios. Em praticamente todas as naesdo mundo havia conventculos de comunistas que, sem o mais leveescrpulo de lealdade para com o seu pas e governo, aspiravam e se

    dispunham a ampliar o poder da Rssia sovitica. Em todas as naes,inclusive das democracias ocidentais, havia pessoas que no s seopunham guerra esta guerra, contra o Terceiro Reich alemo , mascuja oposio era inseparvel de seu desdm pela poltica democrtica epelo governo de sua prpria nao (na verdade, com freqncia suaoposio era motivada por esse desdm) e de seu conseqente respeitopelo que Hitler e seu sistema pareciam representar. Nos pasesconquistados por Hitler, Tchecoslovquia, Dinamarca, Noruega, Holanda e

    Blgica, os objetivos dos colaboracionistas isto , pessoas quedesejavam exercer inluncia e poder por meio de sua aceitao dasupremacia alem raramente eram independentes de seu respeito pelaAlemanha de Hitler, que, segundo eles acreditavam, estava no svencendo a guerra mas merecia venc-la, assim como, na realidade, seussistemas liberais e democrticos anteriores haviam merecido desaparecer.Dentro da Frana, os simpatizantes convictos do nazismo eram poucos,mas havia muitos homens e mulheres cujo desdm pelo seu sistema

    governamental e social aparentemente corrupto e ineicaz desembocavanaturalmente na averso pelo fato de a Frana empreender a guerra emaliana com a Gr-Bretanha. Mesmo nos Estados Unidos, onde o

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    isolacionismo era muito difundido e politicamente forte, os isolacionistasdecididos eram muito raros. A maioria deles, adversrios implacveis deRoosevelt e de sua administrao, no se opunha a armamentos e forasarmadas. Eles se opunham a esta guerra, a guerra empreendida pelosenvelhecidos e corruptos imprios britnico e francs contra a Alemanha,e tendncia de Roosevelt e de outros de tomar o partido daquelesimprios.

    Um elemento muito freqente nesse tipo de raciocnio era oanticomunismo. A psicologia do anticomunismo uma questo complexaque ainda no recebeu a ateno merecida. A maioria das pessoas que seopunham luta contra Hitler no era necessariamente sua simpatizante.Mas elas estavam convencidas ou, mais precisamente, haviam seconvencido de que o grande perigo para sua nao e para o mundo erao comunismo (e, portanto, a Rssia sovitica em vez da Alemanha nacional-socialista), e Hitler ainal de contas era um anticomunista. O fato detambm na Gr-Bretanha haver pessoas inluentes com tais tendncias eraalgo que Churchill e seus amigos tinham de levar em considerao. Suapresena era um elemento preocupante e de modo algum insignificante.

    No entanto a personalidade de Hitler, fora da Alemanha, era tal que,fosse qual fosse o respeito que ele inspirava e certo respeito lhe era

    ainal quase naturalmente devido ao recorde insuperado de seusespantosos xitos , ele inspirava pouca afeio, quanto mais amor.Mesmo os homens e mulheres que decidiam resolutamente secomprometer com sua causa percebiam a fria lucidez de sua impiedade.Desse homem no emanava muita cordialidade. Havia algo que no erahumano na sua frieza, diferente da frieza maquiavlica isto , racional eladina da mente de Napoleo. Apesar da adulao com que muitosmilhes de falantes de alemo o rodeavam, Hitler era um homem muito

    solitrio.Do outro lado, achava-se Churchill. Acostumamo-nos a v-lo como aencarnao perfeita de John Bull, o buldogue ingls (como algumas de suasfotograias sugerem). Mas nesse momento, quando se inicia o grandeduelo, devemos fazer outra observao. Em conjunto e, estranhamente,nem sempre em desarmonia com essa impresso de buldogue , haviauma rotundidade em Churchill, abrangendo no s dureza mas tambmsuavidade, uma caracterstica humana que era de certo modo prpria de

    av e antiquada. Estou escrevendo isto porque, naquela noite do 10 demaio no 1.940 ano de Nosso Senhor, Churchill representava mais do quea Inglaterra. Milhes de pessoas, especialmente no lado oposto da Europa,

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    ento o reconheciam como o paladino de suas esperanas. (Na distanteBengala, na ndia, houve pelo menos um homem, aquele escritor epensador de admirvel independncia Nirad Chaudhuri, que pregou oretrato de Churchill na parede de seu quarto no dia seguinte.) Churchillera oadversrio de Hitler, a encarnao da reao a Hitler, a encarnaoda resistncia de um mundo antigo, de liberdades antigas, de padresantigos, contra um homem que encarnava uma fora que eraassustadoramente eiciente, brutal e nova. Poucas coisas so toequivocadas quanto a tendncia a encarar Hitler como um reacionrio. Eleera a prpria anttese disso. O verdadeiro reacionrio era Churchill.Naquele momento da histria da humanidade, o que Hitler representavaera a eicincia brutal, e de modo algum ilgica, da fora mecanicamenteorganizada e com apoio popular. O que Churchill representava era areao a isso. A grande pergunta, ento, era: isso bastaria?

    Depois que a guerra se iniciara em setembro de 1939, Simone Weilescreveu em um pedao de papel: precisamos, antes de tudo, ter umaconscincia clara. No pensemos que por sermos menos brutais, menosviolentos, menos desumanos do que os nossos adversrios, levaremos amelhor. Brutalidade, violncia e desumanidade tm um prestgio imensoque os livros escolares ocultam s crianas, que os adultos no admitem,

    mas diante do qual todos se curvam. Para que as virtudes opostas tenhamprestgio equivalente, elas devem ser ativa e constantemente colocadas emprtica. Qualquer pessoa que seja meramente incapaz de ser to brutal,to violenta e to desumana quanto uma outra pessoa, mas que nopratique as virtudes opostas, inferior a essa pessoa tanto em forainterior quanto em prestgio e no resistir em tal confronto.

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    IIA primeira coincidncia

    10 de maioEm maio de 1940, Hitler estava com 51 anos. Churchill tinha 65. Havia

    unidade na vida de Churchill. Desde o incio da juventude ele buscou umacarreira pblica. A vida de Hitler foi dividida ao meio. Ele era um soldadoferido, sozinho em um hospital, quando soube, em novembro de 1918, danotcia da derrota e queda do Segundo Reich alemo. Ento: Deciditornar-me um poltico. Assim ele concluiu a primeira, e autobiogrica,parte de Mein Kampf. Ele reairmou isso, incluindo-o no longo discurso,relativamente desconhecido mas muito impressionante, aos oiciaisalemes em maio de 1944: Quando, no ano de 1918, decidi tornar-me umpoltico, isso signiicou a total transformao de toda a minha vida. Eraverdade. Esse momento crucial (ocorrido relativamente tarde, no trigsimoano de sua vida) se deu por meio de uma sbita e drstica revelao.Houve poucas dessas experincias nas vidas de estadistas e polticos. Era,mais propriamente, algo que acontecia a visionrios e santos, como a Paulona estrada para Damasco, ou a Joana dArc. No caso de Hitler, foi a suareao humilhao e derrota de sua nao. No 16 de maio em 1940 tal

    reao atingiu Charles de Gaulle como uma lecha no corao. Ele adescreveu em suas incomparveis memrias de guerra. Ela ocorreusubitamente quando ele assistiu, pela primeira vez, ignomnia dadebandada francesa. Se eu viver, lutarei, onde for preciso, enquanto forpreciso, at o inimigo ser derrotado e a mcula nacional apagada. Naquelemomento se iniciou a carreira poltica de de Gaulle. Mas a cessa asemelhana. Na prosa de de Gaulle est a essncia de um amor ardorosopor sua nao, um amor que era mais forte do que o dio aos inimigos. No

    caso de Hitler, o oposto era verdadeiro. Ningum pode negar o amor deHitler pela Alemanha, mas esse amor era apenas implcito, subordinadoque era ao rancor contra o que ele considerava seus inimigos, externos einternos.1

    Hitler passou de soldado a poltico, depois a lder nacional e estadista e,a 1 de setembro de 1939, novamente a soldado. Esses foram os captulosde sua vida, cronologicamente deinveis mas no de todo separveis. Emnovembro de 1937, ele mandou seus generais se prepararem para a

    guerra. Em seguida se convenceu de que o tempo estava agindo contra aAlemanha e contra ele. Contra a Alemanha: porque havia comeado orearmamento das democracias ocidentais e porque, como ele disse uma ou

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    duas vezes aos seus conidentes, a vantagem militar com que a Alemanhaento contava se desgastaria aps alguns anos, em 1942 ou 1943.(Mussolini, corretamente, tentou convenc-lo do contrrio. Sem umaguerra em perspectiva, as democracias ocidentais no se empenhariam emum rduo esforo com vistas a preparativos. Mas ele no conseguiuexercer inluncia sobre Hitler.) Contra ele: porque em algum momento,durante o inverno de 1937-38, ele comeou a achar que no estava bem,que no viveria por muito tempo. (Disse isso a muito poucas pessoas,porm as mais prximas testemunharam uma alterao em seus hbitos,na alimentao, no retraimento do convvio com os companheiros e nacrescente dependncia de medicamentos, com a ingesto cada vez maiorde plulas.) Nas primeiras horas da guerra, na manh de 1 de setembrode 1939, ele apareceu no Reichstag com um simples uniforme cinzento,usando a nica condecorao da Cruz de Ferro (primeira classe) queganhara durante a Primeira Guerra Mundial. Anunciou que no trocariaesse uniforme enquanto durasse a guerra e assim fez.

    Foi nesse momento que a estrela-guia de Hitler passou a ser Frederico,o Grande, em vez de Bismarck: o rei-soldado em vez do arquiteto de umaAlemanha unida. Mas, apesar de seu respeito por Bismarck, este nunca foisua verdadeira estrela-guia. No apenas porque ele fez poucas referncias

    a Bismarck durante sua carreira poltica, assim como nos longos discursose monlogos privados; no apenas porque seus mtodos polticoscarecessem da ocasional moderao do Velho Otto; no apenas porque opopulismo de Hitler, com o objetivo simultneo de unir, se no todos, amaior parte dos povos falantes de alemo da Europa em uma AlemanhaMaior e dominar todo o continente, teria sido estranho a Bismarck. O fatoera que, em menos de dois anos, ele, Hitler, alcanara um Reich alemoque era maior e mais poderoso do que a Alemanha criada por Bismarck.

    Ele, Hitler, incorporara Alemanha a ustria, a Bomia e a Morvia, e tudoisso sem sangue e ferro, sem guerra. Mas a guerra havia chegado e, assimcomo na carreira do Grande Frederico, o soldado estava ento fortalecidopelo estadista. Na realidade, os objetivos deste dependiam ento dasdecididas realizaes daquele. Naquele primeiro discurso de guerra, Hitlerse referiu a Frederico. Iria referir-se a ele repetidamente at os ltimosdias da guerra, extraindo inspirao da memria histrica de comoFrederico, o Grande, sitiado por inimigos por todos os lados, inalmente

    triunfou devido sua determinao e irmeza inabalveis, com as quaisdividiu os inimigos enquanto a coalizo destes se desintegrava. Essa eratambm a convico de Hitler, especialmente em dezembro de 1941, ao

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    ver que teria de enfrentar a coalizo da Gr-Bretanha, Estados Unidos eRssia. Uniria os alemes de modo ainda mais compacto. Ele e eles seriaminfatigveis, invencveis, mostrando-se altura das necessidades de umaguerra total at aquela coalizo artiicial dos inimigos se romper. Mas issoainda se achava no futuro estamos nos adiantando em narrativa.

    Hitler chegou perto de cindir a aliana dos adversrios alguns diasantes daquele fatdico 1 de setembro de 1939. Ele acabara de alcanarum assombroso triunfo poltico, uma revoluo diplomtica imprevista einigualada na histria moderna. A Gr-Bretanha e a Frana estavamcontando com uma aliana com a Rssia sovitica a Rssia sovitica queera inimiga declarada de Hitler, cuja conquista e destruio ele haviaproposto em Mein Kampf. Mas essa aliana russo-ocidental no se efetuou.Em vez disso, foi ele, Hitler, que fez um pacto com Stlin, eliminando aRssia de todos os clculos militares e esperanas das democraciasocidentais. Foi uma faanha superior aos feitos bismarckianos. Contratodas as probabilidades, Hitler coniou em que esse novo e importanteacontecimento por si s dissuadiria os britnicos de honrar a garantiadada Polnia. Isso no aconteceu. Em seguida, durante os seis dias de 25a 31 de agosto (seu plano havia sido iniciar a guerra contra a Polnia nodia 26), ele tentou cravar uma cunha (foram essas as suas palavras) entre

    a Gr-Bretanha e a Polnia. Ele quase teve xito. Houve um rebulio denegociaes confusas, mensagens, intermedirios, intrigas. Em 27 deagosto, dentre outras coisas, Hitler falou com sir Nevile Henderson, oembaixador britnico, no s sobre um acordo mas sobre uma aliana coma Gr-Bretanha. Faamos aqui uma pausa, por um momento. Se tal arranjohouvesse ocorrido, Hitler teria realizado outra faanha superior aos feitosbismarckianos: teria uma aliana tanto com a Rssia quanto com a Gr-Bretanha, com o fim de dominar a Europa entre essas duas. Mas, apesar da

    hesitao, o governo de Chamberlain no respondeu a tal proposta. Eratarde demais e a cunha no se aprofundara o suiciente. Apesar darelutncia, cinqenta e seis horas aps Hitler invadir a Polnia, a Gr-Bretanha e a Frana declararam guerra Alemanha. A Guerra Relutantehavia comeado. Ela terminaria oito meses depois, em 10 de maio de 1940.

    No h dvida de que Hitler desejava uma aliana com a Gr-Bretanha,ou pelo menos a neutralidade dela. Desde a juventude, antipatizava com aFrana e os franceses. Mas respeitava os britnicos. Desde os primeiros

    discursos na carreira poltica e posteriormente em Mein Kampf, manifestoua convico de que o grave erro de Guilherme II e de seu governo haviasido entrar em guerra com a Gr-Bretanha. A tentativa de expanso alem

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    na Primeira Guerra Mundial devia ter sido dirigida para o leste. Depois dese tornar o governante da Alemanha em 1933, ele fez vrias tentativas e, s vezes, declaraes de sua convico, pblicas e privadas, faladas eescritas, com incomum loquacidade para persuadir os ingleses einglesas de que a sua nova Alemanha no tinha nenhuma desavena com oImprio Britnico; na verdade, que ele admirava o Imprio Britnico.Quanto a isso, cumpre-nos fazer uma observao importante. equivocadoacreditar que, at 1940, Hitler queria a dominao mundial. Ele queriagovernar a Europa. Nisso, assemelhava-se mais a Napoleo do que aGuilherme II. Durante muito tempo, ele no entendeu que os britnicos ou pelo menos alguns dos britnicos icariam, na melhor das hipteses,constrangidos e, na pior, hostis diante de tal ajuste. Se, como se costumadizer, o Imprio Britnico se desenvolveu em um momento de irrelexo, omesmo tipo de irrelexo impedia o povo britnico de reletir muito sobredivises do mundo. Seja como for, em 1935 Hitler props, e os britnicosaceitaram, um acordo naval anglo-germnico que mantinha limitado orearmamento naval alemo, com uma tonelagem total no superior a 35por cento da tonelagem britnica. Ele no repetiria o erro de Guilherme dedar incio a uma competio naval com os britnicos, ameaando-lhes oimprio.

    Mas, em algum momento em 1937, Hitler comeou a perceber umadualidade na atitude britnica. De um lado, via a relutncia deChamberlain e de seus partidrios, assim como de muitos ingleses einglesas inluentes e respeitveis, em alinhar a Inglaterra dentre osinimigos da Alemanha. Viu como eles toleraram a conquista da ustria e daTchecoslovquia. Viu sua relativa indiferena aos sinais agressivos doregime alemo. De outro lado e no s devido aos crescentes indcios derearmamento britnico , tinha de levar em conta a crescente

    possibilidade de que a Gr-Bretanha, em algum momento, entraria emguerra com a Alemanha e ele tinha de se preparar para isso. Essaperspectiva no o deixava satisfeito, mas ele achava que poderia lidar comisso. Sabia que essa deciso britnica surgiria com relutncia. Portanto,achava ele e novamente tinha razo em pensar assim , os britnicostambm empreenderiam a guerra contra ele com relutncia. Chegariaento a ocasio em que os convenceria a fazer a paz com ele em ummomento em que estivessem militarmente incapazes de manter a posio

    em qualquer ponto do continente, talvez depois que sua pequena foraexpedicionria houvesse sido obrigada a sair da Europa.

    Seja como for, em 1o de setembro de 1939 Hitler assumiu uma nova

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    funo: a de Fhrer no s do Estado e do povo alemes, mas igualmentedas foras armadas. Durante a campanha polonesa, ele estava cheio devigor. Visitou com freqncia as linhas de frente, examinando por sobre oscampos Varsvia em chamas atravs de um grande periscpio militar.(Essa foi a nica ocasio, durante os seis anos de guerra, que ele foi at asfrentes de operaes; dali em diante, conduziria a guerra do seu quartel-general.) Os generais e planejadores militares se haviam sado bem naPolnia, onde Hitler interferiu pouco na estratgia geral. Alguns dias aps otrmino da campanha polonesa, ele props paz Gr-Bretanha e Franaem um discurso. Sabia que, na Gr-Bretanha, havia pessoas dispostas aconsiderar uma paz sob determinadas condies. No entanto, noexagerou as esperanas a esse respeito. J em 12 de setembro, quando acampanha polonesa estava em pleno andamento, falara a alguns generaissobre a necessidade de preparar uma campanha rpida no oeste. No sesurpreendeu com a pouca disposio dos franceses (e dos britnicos) ematacar suas poucas divises no oeste, enquanto o grosso de seus exrcitosestava empenhado na Polnia. A relutncia das democracias ocidentais emlhe declarar guerra foi seguida pela relutncia em empreender a guerrapara valer. O que Hitler ento queria fazer era forar essa relutnciaadiante: levar os britnicos a compreender que a guerra contra ele no era

    razovel. O instrumento para isso era uma campanha rpida que levasse conquista alem da Europa ocidental. Ele achava que o tempo era damxima importncia. Pela primeira vez, interveio ativamente noplanejamento militar. Pressionou para essa invaso da Europa ocidentalcomear por volta de 12 de novembro. Dessa vez, excepcionalmente, osgenerais o convenceram de que isso era impossvel. Logo um invernoextraordinariamente gelado caiu sobre a Europa. Ele teve de esperar at aprimavera tardia.

    Mas ele ento reivindicara o comando dos planos de guerra e de modoalgum s nominalmente, ou s na condio de dar a ordem inal. Um plano,preparado pelo general Erich von Manstein, o encantou. Aceitou-o comentusiasmo, no parava de examin-lo, revisou-o. Preferiu-o, a ponto de, seManstein foi quem de fato o elaborou, no ser grande exagero dizer queHitler foi o seu arquiteto. Dentre outras coisas, o plano Mansteincomplementava magniicamente sua estratgia poltica. Era o inverso dofamoso plano Schlieffen, da Primeira Guerra Mundial, e no apenas sua

    ampliao, como previram os Aliados ocidentais. Na respeitada opiniodestes, a verso de Hitler de um plano Schlieffen simplesmente estenderiaa invaso alem da Europa ocidental at a Holanda, alm da Blgica; e a

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    resposta ocidental seria um avano at a Blgica, encontrando os alemesa meio caminho atravs daquele pas e no sudoeste da Holanda. (Tanto osalemes quanto os Aliados descartavam operaes importantes ao longoda Linha Maginot, pelo menos durante a primeira etapa decisiva de umacampanha na Europa ocidental. Os dois lados sabiam que um ataquefrontal alemo na Linha Maginot no estava no programa.) O que Mansteine Hitler preferiram, o Schlieffen invertido, foi uma grande investida alem,no da direita para a esquerda, mas da esquerda para a direita: um rpidoavano motorizado pelas colinas cobertas pelas lorestas das Ardenas epelo Meuse, seguindo direto para os portos do Canal, isolando as divisesfrancesas e a pequena Fora Expedicionria Britnica na Blgica. Golpe deFoice, Sichelschnitt, era o nome do plano, apropriadamente, pois ele eraisso. A essa altura da vida e da carreira, Hitler tinha plena certeza de quetanto estava destinado quanto era capaz de comandar a estratgia militardessa guerra; que o destino de um grande estadista e de um grandecomandante era o mesmo, alimentado pelo mesmo tipo de talento.

    Ento surgiu um obstculo mas um obstculo que posteriormenteaumentaria seu prestgio militar. Os britnicos e os franceses logoveremos como e por que estavam tentando abrir outra frente contra aAlemanha distante do oeste, no norte, provavelmente na Noruega. No

    outono anterior, aps a Polnia, o almirante Raeder comeou a conversarcom Hitler sobre a necessidade de ocupar a Noruega. Mas Hitler recusou.S em maro de 1940 se decidiu por um plano rpido e ousado, a im deimpossibilitar que os britnicos conseguissem uma pequena base naNoruega, para se antecipar a eles. Em 1 de abril, o almoo na Chancelaria,em Berlim, foi servido um pouco mais tarde do que de costume. Osgenerais reuniram-se em torno de Hitler. Suas palavras foram registradasno Dirio de Guerra do Alto Comando do Exrcito. Elas nos revelam muito

    sobre a sua inteno e confiana na poca. O Fhrerdescreve esta iniciativa [codinome Weserbung] no s como especialmente ousada, mascomo uma das operaes mais atrevidas da histria militar moderna. Exatamente por esse motivo[grifos meus] ele v a um dos fatores bsicos do seu sucesso.

    Ele, o Fhrer, no um homem que se esquive a decises e lutas necessrias deixando-aspara seus sucessores. Todas essas circunstncias mostram que a situao da Alemanha muitofavorvel, ela no poderia ser melhorada nos anos vindouros.

    Ele prprio possui a coragem exigida para tal luta, ele tambm conhece pessoalmente quasetodos os seus inimigos e os considera inexpressivos. Ele acha que sua personalidade muitosuperior s deles.

    Seu principal adversrio na campanha norueguesa era Churchill. Ali,Hitler sem dvida levou a melhor sobre ele. Assim, Hitler tinha razo paraestar to coniante em 10 de maio quanto estava em 1 de abril se no

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    ainda mais. Provavelmente, essa foi tambm a razo por que, naquele dia,ele parece ter prestado relativamente pouca ateno notcia de queChurchill se tornara o primeiro-ministro britnico.

    Voltemo-nos agora para o progresso poltico de Churchill seprogresso aquilo foi at 10 de maio.

    Um ano antes, Churchill no ocupava cargo poltico algum. Dois anosantes disso ele era, de um modo geral, um poltico desacreditado, evitado ereceado pela maioria de seu prprio partido poltico, o partido dominantena Gr-Bretanha. Os motivos para isso eram tanto genricos quantoespecicos. Falando de modo geral, as pessoas na Gr-Bretanhaconsideravam Churchill impulsivo, excntrico, prolixo, excessivamentecombativo, um dissidente do partido, talvez vido por publicidade emuma palavra, instvel. (Esse era o Churchill que fez com que CharlieChaplin e Albert Einstein o visitassem e se deixou fotografar com eles.) Eletinha seus admiradores, que no s simpatizavam com suas idias comolhe reconheciam o talento excepcional, mas poucos deles exerciaminluncia na poltica da dcada de 1930. Acontecimentos especicos, doinal de 1936 at a primavera de 1939, conirmariam essa impressodesfavorvel. No incio de dezembro de 1936, Churchill decidiu ser umadvogado veemente do desafortunado rei Eduardo VIII. Contra a rgida

    opinio respeitvel que se opunha ao enlace real com a duas vezesdivorciada sra. Simpson, Churchill decidiu defender a causa daquelecasamento e daquele monarca (como veremos mais tarde,equivocadamente). Porm, mais importante e mais duradoura do que alembrana desse episdio foi sua oposio veemente e cada vez maisinlexvel s tendncias e s decises tomadas pelo governo deChamberlain. Churchill no parava de criticar e atacar a grande maioria doPartido Conservador, de que era membro, num perodo em que as

    tendncias e opes desse partido e governo tinham o apoio da maiorparte do povo da Gr-Bretanha e dos pases da Comunidade Britnica dasNaes.

    O problema era Hitler. Para Churchill, durante muitos anos, Hitler e aascenso de sua Alemanha armada e agressiva representavam um perigomortal. At o inal da primavera de 1939, Chamberlain e seuscompanheiros no pensavam assim. No h nenhuma necessidade, nestelivro, de apresentar mais uma anlise dos motivos do apaziguamento,

    uma palavra respeitvel cujo signiicado icaria, posteriormente, maculadodevido associao com a propenso de Chamberlain em estender a suaboa vontade a Hitler. O principal elemento nesse apaziguamento,

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    contudo, no era covardia, mas uma insuicincia de viso. De outro lado, aviso de Churchill signiicava mais do que bravata e no era supericial.Mas isso no contribuiu em nada para a sua reputao na poca. Naverdade, reduziria ainda mais esta reputao, pelo menos por algumtempo.

    O ano de 1938 foi o mais bem-sucedido de Hitler e o pior de Churchill.Naquele ano, o Terceiro Reich de Hitler se tornou a maior potncia daEuropa e talvez do mundo. Ele incorporou a ustria ao Reich. Em seguida,apoderou-se de uma grande poro da Tchecoslovquia e, em toda aEuropa, governos reconheciam que sua existncia dependia das boasrelaes com a Alemanha. O acontecimento fundamental em 1938 foiMunique. A Tchecoslovquia tinha uma aliana com a Frana e com a UnioSovitica. No entanto, a deciso acerca de guerra e paz se subordinava aLondres. Os franceses no apoiariam a Tchecoslovquia a menos que osbritnicos izessem o mesmo. E os russos, de forma muito indireta,tomaram sua deciso inal subseqente dos franceses, especialmentedepois de saberem que os franceses no marchariam. Assim, em Munique,todos cederam a Hitler e muitos saudaram o que consideraram um ato desagaz habilidade poltica de Chamberlain. Churchill no reagiu assim. Antesde Munique, escreveu a um amigo: Parecemos estar muito prximos da

    sombria escolha entre a Guerra e a Vergonha. Minha impresso queescolheremos a Vergonha, ento teremos a Guerra de quebra um poucodepois, em condies ainda mais adversas do que atualmente. A Muniquese seguiu o que pode ter sido uma de suas melhores ocasies: um grandediscurso que ele pronunciou na Cmara dos Comuns. (Estamos napresena de um desastre de grande magnitude. No faamos vistagrossa. E no se suponha que isto o im. Isto apenas o primeiro gole, aprimeira prova de uma taa da amargura que nos ser apresentada.) Mas

    em 1938 no eram muitos os que o apoiavam, tendo sido quase censuradopelos que lhe deram o voto, os eleitores de Epping.O propsito moral e o tom daquele discurso foram magnicos. No

    entanto, em outro nvel, o prtico, Churchill estava equivocado acerca deMunique. Estamos a par, ou devamos estar, de duas questes essenciais arespeito da crise de Munique que Churchill no sabia, ou nem mesmoadmitia. Uma que, para a Gr-Bretanha, teria sido uma catstrofe entrarem guerra em outubro de 1938. Sua fora area progredira muito em

    quadros e eiccia de outubro de 1938 a setembro de 1939. Muitos dospases da Comunidade Britnica no estavam dispostos a entrar em guerrana poca de Munique; em setembro de 1939, no estavam avessos a isso.

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    Em 1938 Hitler no estava blefando. Ele teria esmagado a resistnciatcheca em poucos dias. Depois desse fato consumado, teria proposto, Gr-Bretanha e Frana, uma paz que a opinio pblica nesses pases poderiaestar propensa a aceitar. Durante muitos anos depois, Hitler disse quelamentava no ter entrado em guerra em 1938, dissuadido que fora napoca por Chamberlain. A outra questo essencial envolve a Rssia.Churchill estava convencido ele repetiu isso ainda em 1948, no primeirovolume das suas memrias de guerra de que, na poca de Munique, aRssia se teria juntado s democracias ocidentais contra Hitler, umaassociao que um ano depois no ocorreria. Churchill estava equivocado:todos os indcios que vieram tona apontam que, em 1938, Stlin noestava mais propenso do que Chamberlain a defender a Tchecoslovquia eentrar em guerra com Hitler.

    Em suma, 1938 foi um ano muito sombrio na vida de Churchill. Para oseu povo, ele era impopular. Podia contar apenas com pequenos grupos deamigos e jornalistas polticos, assim como refugiados da Europa central,com quem se encontrava de quando em quando para recolher e examinarinformaes. Eles ouviam-no com respeito. Alguns percebiam que ele nos fazia jus como estava destinado a uma funo importante. Mas como issose daria? E quando? Sua vida pessoal fora afetada pelo isolamento.

    Naquele ano houve noites melanclicas em que ele, que sempre dormiabem, no conseguiu conciliar o sono. As inanas nunca foram uma questoprimordial em sua vida, mas o rendimento do jornalismo no era suicientee suas dvidas pessoais icaram maiores do que de costume. No inal demaro de 1938, ele estava prestes a colocar venda Chartwell, sua amadacasa de campo, quando um dos que o apoiavam, sir Henry Strakosch, uminancista londrino de ascendncia judaica, saldou-lhe as dvidas. EmLondres, Churchill morou no que, para ele, era um domiclio relativamente

    modesto, Morpeth Mansions, 11, perto de Victoria Station, sede ocasionaldas conspiraes com os amigos e simpatizantes contra a poltica deChamberlain. Por sua vez, os melhores amigos de Chamberlain (sir JosephBall e sir Samuel Hoare) estavam fazendo a escuta do telefone de Churchill.

    Em meados de maro de 1939, suas perspectivas se iluminaram. Issofoi obra de Hitler, no sua. Aproveitando-se de uma crise entre eslovacos etchecos, Hitler decidiu marchar sobre Praga e anexar ao Reich o querestava da rea tcheca. Foi um erro, porque o que restara da

    Tchecoslovquia, aps Munique, era um virtual Estado subordinado a ele;porque, ao fazer o que fez, Hitler quebrou pelo menos uma de suaspromessas em Munique; porque tudo isso levou a uma tardia mas pronta

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    revoluo da opinio pblica na Gr-Bretanha. Durante a ltima quinzenade maro de 1939, Chamberlain teve de mudar de atitude. Passou a acharque a nica maneira de evitar a guerra era fazer saber aos alemes o que,vinte e cinco anos antes, um governo britnico no izera: anunciar que aprimeira agresso alem signiicaria guerra com a Gr-Bretanha. Agarantia britnica Polnia (a primeira e ltima vez que a Gr-Bretanha secomprometeria a guerrear em defesa de um Estado da Europa oriental)no dissuadiu Hitler, que sabia que a deciso de Chamberlain era um atorelutante por parte de um governo relutante de uma nao talvez relutante. Mas em maro de 1939 o conceito de Churchill entre oeleitorado comeou a subir. Em conseqncia, Chamberlain se sentiuforado a incluir Churchill no seu governo, no Ministrio da Guerra e onomeou ministro da Marinha. No primeiro dia da guerra, Churchill entrouna mesma sala do Almirantado que ocupara em agosto de 1914, vinte ecinco anos antes.

    Churchill, ao contrrio de Hitler, no vestia uniforme naquele dia.Circulou de terno e colete escuros, usando uma de suas gravatas-borboletadepois, uma corrente de relgio de ouro cintura, e a nica coisa singularem sua aparncia era o chapu preto de copa alta uma iguraimponente com uma aura sica antiquada, quase eduardiana, mas slida.

    S no decorrer da guerra, aps 1940, s vezes vestiria uniformes e usariaquepes da marinha ou exrcito de sua preferncia umacondescendncia ocasional tendncia do homem britnico a se trajar comapuro.

    Durante oito meses e dez dias, Churchill integrou o governo de NevilleChamberlain. O cargo e os poderes eram importantes; na verdade, seampliavam. Mas ele no tinha pleno comando. Seu carter e temperamentoeram muito diferentes dos de Chamberlain. Assim tambm a sua opinio

    sobre a guerra. Dizer que Chamberlain a abominava e que Churchill asaudava pode ser excessivo. Mas, embora imprecisa, essa airmaocontm uma parcela essencial de verdade. H muitos indcios disso. Comdez dias de guerra, Chamberlain escreveu uma carta a Hilda, sua irm econidente, sobre as diiculdades que encontrou quando tentaraexaustivamente protelar o mximo possvel a declarao britnica deguerra. A Cmara dos Comuns estava incontrolvel, rachada pelassuspeitas e propensa a julgar o Governo culpado de qualquer covardia e

    traio. Com seis semanas de guerra, escreveu a Hilda que o afundamentode submarinos alemes lhe causava uma sensao desagradvel. Se eleshouvessem feito escala em portos britnicos em tempos de paz, ns

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    provavelmente diramos como eram bons sujeitos os oiciais e ostripulantes. Ele passara a detestar Hitler, mas no os alemes. Suaaverso guerra era inseparvel da sua disposio de acreditar que aguerra poderia indar logo e que essa guerra deveria consistirprincipalmente em fazer presso econmica sobre a Alemanha. Em 5 denovembro de 1939, escreveu a Franklin Roosevelt que a guerra poderiaterminar logo no porque os alemes seriam derrotados, mas porqueperceberiam que no podem vencer e que no vale a pena continuarem aicar mais fracos e mais pobres. A opinio de Churchill sobre a guerra nopoderia ter sido mais diferente. Mas nem sempre ele infundia respeito. Emmaro de 1940, o presidente Roosevelt enviou Sumner Welles para umavisita s capitais das naes beligerantes. Welles achou que Churchill bebiademais. Em 12 de maro, durante um jantar em Downing Street, comChamberlain, Churchill e outras personalidades do governo, Welles julgouver Churchill bbado. Tambm ouviu sir Samuel Hoare desdenharChurchill: Eleestaria disposto a lutar por cem anos.

    O que causa assombro a lealdade de Churchill a Chamberlain duranteesse perodo. Isso no se devia s prudncia poltica de Churchill.Evidentemente, ele dependia de que Chamberlain o mantivesse noMinistrio da Guerra; sabia tambm que qualquer sinal de sua

    discordncia com Chamberlain seria perigoso para ele, assim como para aunidade do povo britnico e seu esforo de guerra. Entretanto, a ausnciade crticas a Chamberlain no era s pblica, era tambm privada.Chegamos aqui a uma das qualidades mais cativantes de Churchill semdvida, para este autor, a mais cativante a sua magnanimidade. Agenerosidade uma virtude, porm com freqncia no signiica mais doque boa vontade em dispor dos prprios bens. A magnanimidade tantomais rara quanto mais nobre: a capacidade de dispor de si prprio.

    Freqentemente, a magnanimidade tambm a verdadeira origem dalealdade. Durante os meses da Guerra Relutante, o prprio Chamberlainpassou a ser sensvel a isso. Em muitos aspectos, ele e Churchill seaproximaram mais e no meramente devido necessidade poltica deunidade nacional. s vezes, e pelo menos em uma parte de seu esprito,Chamberlain comeou a achar que talvez ele e Churchill fossemcomplementares nessa guerra, que para algumas coisas Churchill eranecessrio, enquanto para outras, inclusive a liderana, ele, Chamberlain,

    era o homem apropriado. Foi uma espcie de converso: no da inimizadepara a amizade, mas de algo menos categrico porm igualmente maisprofundo, da tendncia desconiana para o aumento da coniana. No

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    foi uma mudana total: j vimos que at 10 de maio Chamberlain ainda noqueria transmitir o governo a Churchill. Mas ela j existia e foi, em grandeparte, operada pela ampla compreenso de Churchill.

    A natureza da Guerra Relutante em nada contribuiu para fortalecer adeterminao do povo da Gr-Bretanha. Ela pode no t-la debilitado(embora tenha ocorrido, em outubro, um pequeno e reprimido movimentoem favor de uma paz conciliatria), mas tampouco a favoreceu. Comfreqncia, no a partir dos registros de polticos e governos quepodemos vislumbrar a atmosfera de uma determinada poca, a disposiomental das pessoas. E.M. Delaield (Elizabeth Monica Dashwood) foi umainglesa encantadora que, na dcada de 1930, ganhou certo renomeescrevendo livros deliciosos, engraados e autodepreciativos, em forma dedirios, cujos ttulos principiavam comA dama provinciana Seu ltimolivro (ela morreria relativamente jovem) foi A dama provinciana em tempode guerra, sobre o outono em 1939. Em 29 de setembro, escreveu ela, otempo continua lindo, o jardim coberto de ster, dlias e capuchinhas falta a rosa do outono, mas no se pode esperar tudo , e tia Blanche e eupasseamos sob as macieiras, contornamos a quadra de tnis e nosperguntamos: quem poderia acreditar que a Inglaterra est em guerra? Aresposta , ai de ns, mais que evidente mas nenhuma de ns a

    pronuncia em voz alta. Seu patriotismo irrepreensvel. Como muitasinglesas de classe mdia, ela anseia por fazer algo para o esforo deguerra. Mas eis Lady Blowield, uma das que a superavam. tilapresentar ao pblico pontos importantes. Sinto-me mais esperanosaquanto a isso e pergunto: que pontos? H, responde Lady Blowield, aquesto das Razes dos Legumes. As donas-de-casa inglesas no sabemaproveit-las da melhor maneira, ao cozinhar. Um folheto atraente sobre otema das Razes dos Legumes poderia ajudar muito neste momento.

    novembro e uma senhora idosa relata, em tom muito magoado, que estavafazendo uma visita na Esccia quando se realizou o Registro Nacional e oanitrio e a anitri a inscreveram, sem seu conhecimento ou permisso.Isso resultou em lhe ser fornecido um carto de racionamento. Ela nodeseja um carto de racionamento. Ela no pediu um carto e no oaceitar. Com relao ao inal de 1939, A dama provinciana em tempo de

    uerra um guia para a atmosfera to bom quanto Desfraldai maisbandeirase Homens em armas, de Evelyn Waugh.

    Em outubro, Churchill e a esposa se mudaram de seu apartamento deandar inteiro para um apartamento no Almirantado. Durante os primeirosquatro meses da guerra, os resultados do Almirantado foram variados.

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    Ainda assim, no conjunto, mais satisfatrios que ruins, o que contribuiupara o crescimento gradual da reputao de Churchill. (Entre outrasocorrncias, um submarino alemo penetrou nas redes e defesas de ScapaFlow e afundou o couraado Royal Oak, mas em seguida o couraadoalemo Graf Spee foi atacado, atingido e forado por trs belonavesbritnicas menores a se dirigir ao porto neutro de Montevidu, depois doque o Graf Speefurou o casco e afundou.) Em seguida ocorreu um dos maisestranhos captulos da guerra. Stlin atacou a Finlndia. 2 Os inlandeseslutaram muito bem e rechaaram os russos em vrios lugares. Os governosbritnico e francs se reanimaram. Eles j se haviam deixado convencerpor especialistas de que a Alemanha de Hitler dependia tremendamentedas importaes do minrio de ferro sueco e que, especialmente durantevrios meses no inverno, o minrio de ferro no poderia ser embarcadopara a Alemanha, a no ser em direo ao sul, ao longo da costa daNoruega.

    Os especialistas em economia estavam lamentavelmente errados, comode costume, mas no era s isso. A guerra inlandesa contra a Rssiasovitica era apoiada em Paris e Londres e tambm nos Estados Unidos,por anticomunistas, republicanos e isolacionistas. Alm disso, nem ogoverno francs nem o britnico eram avessos a abrir uma frente contra

    os alemes, de preferncia longe da Europa ocidental, com riscos e custosrelativamente limitados, em locais onde os alemes icariam tolhidos pelaslimitaes da sua marinha. Assim, durante o glido janeiro de 1940,amadureceu em Londres e Paris a idia de socorrer os inlandeses, talvezenviando uma pequena fora expedicionria Finlndia atravs do norteda Noruega e Sucia, que no caminho assumiria o controle do portonoruegus de Narvik e da ferrovia de minrio de ferro que rumava paral. Em suma, matar dois coelhos de uma cajadada se necessrio, sob o

    risco de iniciar uma guerra com a Unio Sovitica. Esse foi o mais absurdoplano da Segunda Guerra Mundial. De um modo geral, Churchill lhe erafavorvel. Por im, o estpido projeto desmoronou, quando os inlandesesirmaram uma paz com os russos, mais ou menos um dia antes de asprimeiras tropas anglo-francesas zarparem da Esccia, sem saberexatamente para onde. O auge da idiotice foi a subestimao dos russos.(S aps os arquivos britnicos haverem sido franqueados em 1970,descobre-se que at maro e abril de 1940 avies de reconhecimento

    britnicos sobrevoavam o Cucaso, fotografando Batum e Baku e atraindoo fogo antiareo russo ou que em janeiro de 1940 o encarregado denegcios britnico em Moscou informava, despreocupadamente o governo

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    de Chamberlain de que o bombardeio eiciente e contnuo de Baku nodeve apresentar grandes diiculdades para ns e, sozinho, deve sersuficiente para submeter a Rssia em um prazo muito curto.

    Mas a guerra inlandesa ainda no terminara quando ocorreu umprimeiro preldio do duelo, um incidente cujos encadeamentos iriamconduzir ao fatdico 10 de maio, quando principiou o duelo para valer deHitler e Churchill. Esse episdio envolveu no a Finlndia, mas a Noruega.Envolveu no carregamentos de minrio de ferro, mas um choque denavios. OAltmark era um navio de abastecimento alemo, quetransportava no poro marinheiros britnicos, prisioneiros que haviamsido salvos e recolhidos pelo Graf Spee durante suas incurses iniciais noAtlntico Sul e, depois, transferidos para o Altmark. OAltmark avanavalentamente para o sul em guas territoriais norueguesas, dirigindo-se paraum porto alemo. Churchill mandou um contratorpedeiro britnico segui-lo, atac-lo, tom-lo. Isso aconteceu em 16 de fevereiro, em Jssingford.(Depois disso, Vidkun Quisling e seus seguidores pr-alemes na Noruegachamariam os compatriotas pr-ingleses de Jssingers.) A abordagem foirpida e bem-sucedida. Os prisioneiros britnicos no poro ouviram obrado dos seus libertadores: A Marinha est aqui! Esse pequeno dramareverteu em benecio de Churchill. Mas fez Hitler icar alerta e alterar os

    planos. Ele estava ento convencido de que Churchill queria apoderar-seda Noruega. Muito bem: se anteciparia a Churchill. Trs dias aps oepisdio doAltmark, convocou o general Nikolaus von Falkenhorst. Em1918, esse general havia comandado o desembarque de uma pequenafora alem na Finlndia. Hitler disse a Falkenhorst: Sente-se e conte-me oque fez. O general explicou. Em seguida, enquanto andava de um ladopara o outro, Hitler apresentou a Falkenhorst uma lista muitoimpressionante de razes por que tinha de ser a Noruega. (A proteo das

    importaes de minrio de ferro era o item inal e o menos importante emsua lista.) Em 1 de maro a guerra inlandesa ainda no haviaterminado , Hitler ordenou que a invaso da Dinamarca e da Noruegapassasse a ter precedncia sobre a campanha da Europa ocidental.

    importante reconhecer que Churchill izera o primeiro rascunho (umcurto memorando) acerca da colocao de minas nas guas costeiras daNoruega j em 27 de novembro de 1939 ou seja, antes de irromper aguerra inlandesa. A marinha real distribuiria minas nas guas

    norueguesas quer o governo noruegus as quisesse, quer no. Se osalemes se apresentassem para lutar (e Churchill esperava que assimizessem), a marinha estaria l em condies de derrot-los, e ento os

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    britnicos se apossariam dos principais portos da Noruega. Assim, aGuerra Relutante evoluiria para algo importante e efetivo. O teatro daguerra se estenderia at a Noruega, onde a marinha deveria levarvantagem.

    Foi s depois de complexas e cansativas negociaes que, no incio deabril, os gabinetes britnico e francs tomaram a deciso de acordo com avontade de Churchill. Ele estava ento encarregado da questonorueguesa. Na realidade, estava mais envolvido no efetivo planejamentonaval do que Hitler. Alm disso algo com freqncia desconsideradopelos historiadores e bigrafos , o incio de abril correspondia a umafase em que a harmonia e a colaborao entre ele e Chamberlain haviamatingido o ponto mximo. Em 4 de abril, Downing Street anunciou que, daliem diante, o ministro da Marinha dirigiria o Comit de Coordenao Militar,que inclua os chefes do estado-maior. Entre outros ministros militares,que tambm integravam o Ministrio da Guerra, eu era o principal entreiguais, escreveu Churchill em suas memrias de guerra. Em seguida,esforou-se para explicar que eu no tinha, entretanto, poder para tomarou fazer cumprir decises. O alto comit era, ainal, ainda assim umcomit, um grupo varivel e amistoso, mas disperso. Tudo isso eraverdade, mas a responsabilidade pela campanha norueguesa ainda cabia a

    ele.Em 5 de abril, Chamberlain falou na Cmara dos Comuns. Sobre Hitler,ele disse: Uma coisa certa: ele perdeu o trem. Essa frase infeliz iria embreve atorment-lo.3 No inal do dia 7, comeou a colocao de minasbritnicas nas guas norueguesas. Ao longo do dia 8, comearam amultiplicar-se as notcias sobre um movimento de uma frota alem emdireo ao norte. Em meio a uma borrasca, uma fora maior e mais potenteda marinha real se dirigiu para a Noruega. Alguns dos navios

    transportavam algumas unidades britnicas que desembarcariam naNoruega quando fosse necessrio. Eles perderam o trem alemo oumelhor, a frota alem. Ao amanhecer do dia 9, as tropas alems invadirama Dinamarca e desembarcaram em Copenhague, capturando a capital, ogoverno e o rei. Ao mesmo tempo essa era a operao atrevida ,desembarcaram em vrios portos da Noruega, inclusive Narvik no extremonorte, onde ningum, inclusive Churchill, esperara que chegassem.

    Agora devo voltar-me para um episdio que no tem recebido a

    ateno que merece. Ele envolveu um tiro que no foi ouvido ao redor domundo, mas que pode ter mudado o curso da histria.

    O forte de Oscarborg uma pequena ilha rochosa na extensa baa que

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    conduz a Oslo. A bateria no parapeito de pedra se compunha de trsvelhos canhes de ferro preto, construdos por Krupp em 1892 ecomprados pelo governo sueco. (A Noruega ainda no era um Estadoindependente.) Os trs canhes tinham os nomes de Aaro, Moiss e Josu,tirados do Antigo Testamento. O comandante de Oscarborg era o coronelEriksen, um oficial noruegus prestes a se reformar.

    Os governantes noruegueses sabiam que a sinistra corrida para aNoruega estava em curso e recuaram a im de evitar qualquer possvelpretexto para um ataque alemo. Os comandantes do exrcito e daartilharia costeira receberam instrues para no disparar contra algo quese aproximasse, at novas ordens. Mesmo no dia 8, quando comearam ase acumular os sinais de que navios alemes se dirigiam para a Noruega, ogoverno se absteve de tomar qualquer deciso. Um pouco depois da meia-noite, um velho lana-minas (construdo em 1858) e um baleeiro armadonoruegueses foram impelidos a agir ao toparem com as formas imponentesdos navios de guerra alemes que penetravam na baa de Oslo.Bravamente, investiram contra os alemes e foram feitos em pedaos.

    Nenhum som dos disparos chegou a Oscarborg. s trs horas da friamadrugada subrtica, o coronel Eriksen percorria o parapeito.Subitamente, ele avistou uma sombra escura que bloqueava as luzes de

    uma pequena cidade, trs milhas adiante na baa. Ele logo percebeu queera a silhueta de uma grande embarcao que se aproximava muitodepressa. Em alguns minutos, ela passaria por Oscarborg a sotavento doestreito. Ele ajustou um dos canhes, estimou aproximadamente a distnciae, contra as ordens e sem clculos precisos, disparou. A noite negra seiluminou em um relmpago amarelo. Aquele nico projetil do Oscarborgatingiu o compartimento de munies do grande cruzador alemo Blcher.Ele transportava tropas de ocupao alem para Oslo, cerca de dois mil

    oiciais e soldados, inclusive unidades da Gestapo e SS. O Blchercontinuouavanando. O fogo nos pores o mantinha visvel. Enquanto seguiapesadamente pelo estreito, dois torpedos costeiros o liquidaram. O restanteda fora alem retrocedeu.

    Mais tarde, luz do dia boreal, tropas alems desembarcaram em outroponto da baa. Ao meio-dia, tropas aerotransportadas assumiram ocomando de Oslo. No inal da tarde, ocuparam Oscarborg e o coronelEriksen era seu prisioneiro. (Permitiram-lhe viver com a famlia na cidade

    de Drobak, no outro lado da baa. Ele morreu pouco depois da guerra, apsreceber uma importante condecorao oferecida por de Gaulle.) Poucoshistoriadores da Segunda Guerra Mundial conhecem o seu nome. No

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    entanto, sem o seu disparo, o Blcher teria atravessado o estreito eatracado em Oslo antes da sete da manh, ainda no escuro. O queaconteceu no incio daquela manh em Copenhague teria acontecido emOslo. O canho de Oscarborg possibilitou que um rei e um governoalertados deixassem a capital em direo ao norte sem dar ateno sexigncias do enviado alemo ou s solicitaes de outro coronelnoruegus, Quisling. Se o rei e o governo houvessem sido capturados emOslo, no teria ocorrido nenhuma campanha norueguesa, exceto talvez porNarvik, no extremo norte.

    A campanha norueguesa levou Churchill ao poder. Sem aquele disparode Oscarborg, a culpa poderia ter recado sobre Churchill, em vez de sobreChamberlain. Sem dvida, eu tive uma parcela excepcional deresponsabilidade pela breve e calamitosa campanha norueguesa se que se pode chamar de campanha, escreveu Churchill ao general Ismayaps a guerra. Todavia, enquanto decorria aquele lgubre abril, cada vezmais pessoas se impacientavam no com Churchill, mas com Chamberlain,pois a reao dos Aliados invaso alem era torturantemente lenta,ineiciente, desalentadora. Quase uma quinzena depois dos desembarquesalemes, tropas britnicas e francesas eram colocadas em dois pequenosportos noruegueses. Como expressou Churchill posteriormente, sua

    movimentao de um lado para o outro no era muito mais do que umconfuso patinhar. Eles no eram preo para os alemes. Logo acharammelhor recuar. Mais tarde, depois da guerra, Churchill relatou como osalemes percorreram em sete dias a estrada de Namsos a Mosjoen, que osbritnicos e franceses haviam declarado intransitvel todas as vezes,estvamos atrasados demais. As nossas tropas mais preparadas icaram desnorteadas pelo vigor, arrojo e treinamento dos rapazes deHitler. Essa foi a primeira vez que Churchill reconheceu

    reconhecimento que com freqncia dominaria sua estratgia e opesmilitares ao longo da guerra que o exrcito britnico enfrentava uminimigo que lhe era superior no s em armamentos e organizao, comona firmeza, determinao e mpeto.

    Foi um prodgio, relembrou ele, eu ter sobrevivido e conservadominha posio no apreo pblico e na coniana parlamentar. Havia ummotivo por trs desse prodgio. Muitas pessoas na Gr-Bretanha, e umnmero cada vez maior de seus representantes, achavam que estavam

    fartas de Chamberlain, atribuindo o iasco na Noruega a ele, no aChurchill. Viam em Chamberlain um exemplo de ineicincia originada pelaapatia e por uma insuiciente determinao para lutar. Em Churchill, elas

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    estavam propensas a reconhecer um homem que, pelo menos a respeitode Hitler, evidenciou sua credibilidade porque tivera razo. Estavamigualmente propensas a desconsiderar o fato de que, na Noruega, tambmChurchill estivera errado.

    Em 1 de maio, quarta-feira, Chamberlain convidou Churchill a ir aDowning Street, 10, aps o jantar. Foi um dia frio e tempestuoso, comchuva e vento forte. Se eu fosse o primeiro de maio, deveria icarenvergonhado, disse Churchill a John Colville, secretrio particular deChamberlain. Colville, que antipatizava vivamente com Churchill (mas queem breve mudaria de opinio), escreveu em seu dirio: Da minha parte,acho que ele devia icar envergonhado de qualquer maneira, insinuandoassim que Churchill estava tramando contra seu chefe. Estava equivocado:a conversa de Churchill com Chamberlain foi sincera e amigvel. Dois diasdepois, a oposio na Cmara dos Comuns pediu um debate sobre a guerrae a liderana. Tanto Chamberlain quanto Churchill sabiam que isso iriaocorrer. J em 2 de maio Churchill airmou no ministrio que no desejavadiscutir as operaes da Noruega na Cmara, uma vez que o inimigopoderia obter informaes valiosas. Foi Chamberlain quem airmou queestava fora de questo cancelar o debate pblico sem se expor s maissrias conseqncias polticas.

    Os desdobramentos polticos da tera, quarta e quinta-feiras seguintes,dias 7, 8 e 9 de maio, foram tantas vezes descritos com mincias que, paranossos objetivos, bastar o mais breve resumo. Os ataques maneira comoChamberlain conduzia a guerra choveram sobre sua cabea, de ambos oslados da Cmara ainda mais veementes da parte de algunsconservadores do que dos porta-vozes da oposio trabalhista. Na quarta-feira, o debate adquiriu o cunho de um voto de censura. Churchill foiextremamente leal a Chamberlain, airmando por duas vezes que assumia

    plena responsabilidade pelo que acontecera na Noruega. Lloyd George,que desprezava Chamberlain, disse que a responsabilidade de Churchillera limitada e que este no devia permitir tornar-se um abrigo antiareo,protegendo o resto do governo. Ele exigiu que Chamberlain renunciasse,porque no h nada que possa contribuir mais para a vitria do que eleabandonar o cargo. Seguiu-se o voto de coniana. A diviso revelou queChamberlain havia perdido o apoio de cerca de cem integrantes do PartidoConservador. Chamberlain pediu ento a Churchill para ir a seu gabinete e

    disse que talvez no devesse continuar. Devia haver um governo nacional.No inal da manh seguinte, Churchill soube que seria cogitado paraprimeiro-ministro. Houve uma reunio decisiva entre Chamberlain, Halifax

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    e Churchill. Chamberlain era favorvel a Halifax. Churchill manteve-se emsilncio. Em geral eu falo bastante, mas nessa ocasio iquei calado.Halifax disse que, pelo fato de ser um nobre, no poderia governarefetivamente por causa da Cmara dos Comuns. No im do dia, ChipsChannon, um dos inimigos de Churchill, anotou em seu dirio: Nevilleainda governa, mas s nesse momento. Outro dos inimigos de Churchill,Joseph Kennedy, o embaixador americano, telegrafou a Washington:Ningum faz a menor idia do que deve ser feito. Chamberlain, Halifax eChurchill so incontestavelmente homens cansados. Ele estava errado arespeito de Churchill.

    O que aconteceu no dia 10 foi descrito nas primeiras pginas destelivro. Naquela noite, Chips Channon escreveu em seu dirio: Talvez o diamais sombrio da histria inglesa. Fico paralisado pela consternao emedito sobre este dia fantstico. Fantstico, realmente. Nesse mesmo dia,Hitler havia iniciado a batalha de que dependia o futuro da civilizaoocidental. O fato de esse marco mais, esse momento crucial nas vidasde Hitler e de Churchill ocorrer no mesmo dia foi, porm, uma coincidncia.As coincidncias, escreveu Chesterton certa vez, so trocadilhosespirituais. Ao mesmo tempo, no so o resultado de nada, mas asconvergncias repentinas de inmeros ios isolados. Partidrios muito

    ligados a Chamberlain, como Kingsley Wood, acharam melhor abandon-loe deixar claro que passavam a agir em favor de Churchill. O fruto dessaincmoda luta pelo poder na Inglaterra redunda em muita honra para ademocracia parlamentar britnica. Durante muitos anos, na verdadedcadas, a democracia parlamentar pareceu no s desajeitada, comodestituda de carter representativo e at corrupta, inadequada contra onovo exerccio centralizado do poder pelos ditadores sob muitosaspectos, no destitudo de carter representativo. Contudo, durante

    aqueles dias, foi a democracia parlamentar que ajudou a colocar Churchillno comando. No dia 7, Harold Nicolson escreveu a respeito do clima naCmara: A atmosfera algo mais do que ansiedade, de um medo real,mas um medo muito decidido, e no histeria nem de forma algumacovardia. Na verdade, raramente admirei tanto o esprito da Cmaraquanto hoje. Esse foi o homem que escreveu na primeira pgina de seudirio no dia de Ano-Novo de 1940: Segundo todas as probabilidades, umano de destruio. Ele era aliado de Churchill, mas sabia tambm que

    frente se achava a mais penosa das pocas. Ao tomar conhecimento danotcia da invaso alem da Europa ocidental, em 10 de maio, ele escreveu:O que de certo modo torna isso pior ser um