o avesso da paisagem cultural em laguna · guerra dos farrapos e da república juliana no século...
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O AVESSO DA PAISAGEM CULTURAL EM LAGUNA
REITZ, LUCAS (1); YUNES, GILBERTO S. (2)
.
1. Universidade Federal de Santa Catarina. Departamento de Arquitetura e Urbanismo. Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade/
PGAU -Cidade. Núcleo de Investigação em Configuração e Morfologia na Arquitetura e no Urbanismo. Centro Tecnológico, Campus Universitário – Trindade. 88040-900 – Florianópolis –
2. Universidade Federal de Santa Catarina. Professor Adjunto do Departamento de Arquitetura e Urbanismo e do Programa de Pós-Graduação em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade/
PGAU -Cidade.Coordenador e Pesquisador do Núcleo de Investigação em Configuração e Morfologia na Arquitetura e no Urbanismo. Centro Tecnológico, Campus Universitário –
Trindade. 88040-900 – Florianópolis – SC. [email protected]
RESUMO O artigo utiliza a aquarela que representa a paisagem do município de Laguna, Santa Catarina, elaborada em 1827 por Jean-Baptiste Debret, para o entendimento da definição da cidade como paisagem cultural. Analisa sua interpretação dos elementos que compõem o registro e identificam seu tempo. Não existem evidencias oficiais da visita do artista à cidade e a imagem foi criada a partir de relatos, resultando de filtros que a tornam constituída de elementos selecionados por sua subjetividade e construção cultural. Utilizando-se do conceito de Pechman, de que a “imagem não é mais uma paisagem, embora simule sê-la” (2012), parte-se da ideia de uma representação definida como o avesso da paisagem, calcada na técnica e subjetividade do artista. A partir do estudo do “avesso da paisagem”, o artigo desenvolve a hipótese e verifica como as imagens percebidas e registradas contribuem para a criação de ficções e invenção de urbanidades, tomando como estudo de caso a cidade de Laguna. Resultado do processo histórico de ocupação e da morfologia natural, o conjunto paisagístico do município desempenhou importante papel nacional. Inicialmente como ponto divisor do Tratado de Tordesilhas, foi posteriormente palco da Guerra dos Farrapos, sendo também importante porto e polo cultural catarinense. Esta paisagem começa a ser valorizada a partir da década de 1950, quando recebe sua primeira ação de preservação com o tombamento pontual da Casa de Câmara e Cadeia. Consecutivamente, variadas edificações isoladas são tombadas no âmbito municipal e estadual até o ano de 1978, coincidindo com a elaboração do plano diretor. Nota-se uma tendência de tombamento de edificações de tempos e linguagens específicas, além de algumas com caráter monumental. A partir deste final de década, ocorre a expansão mais significativa do núcleo inicial em direção ao oceano, com a criação do balneário praia do Mar Grosso, cujo adensamento vai ocasionar uma mudança no caráter econômico e espacial da cidade. Em 1985, o núcleo fundador é tombado pelo IPHAN, por considera-lo “fundamental para a manutenção da identidade dos brasileiros e da paisagem urbana de Laguna” (CITTADIN,2010). É definida uma poligonal de tombamento que estabelece os limites de preservação da paisagem no município, um recorte espacial identificado como o mais representativo de sua eleição como imagem desejada. A partir deste tombamento de seu núcleo
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fundador e seu contexto paisagístico, Laguna passa a ser um destino turístico de interesse também por sua imagem histórica divulgada, desprestigiando as continuidades espaciais da cidade que configuram seu conjunto urbano como processo de construção coletiva. Assim, identifica-se que, também os estudos realizados atualmente acerca de sua definição como paisagem cultural, tendem a valorizar a paisagem natural, a morfologia do núcleo fundador e algumas relações antrópicas pontuais. A partir do estudo das cartografias e documentação visual, chega-se à conclusão de que a construção da paisagem cultural aqui ocorrida, ao eleger elementos específicos do passado para seu entendimento presente, mantém relação com a interpretação de Debret. Esta também seleciona elementos escolhidos como significativos para a elaboração de uma imagem institucionalizada, reforçando a versão do avesso da paisagem em Laguna. Palavras-chave: Paisagem; Urbanização; Representação; Laguna.
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A Laguna de Debret e o Avesso da Paisagem
As imagens registradas do passado nos ajudam a remontar os modos de representar e pensar
de uma época. Nos anos de consolidação do território brasileiro, as pinturas de paisagem
foram um dos registros responsáveis por noticiar um Brasil pouco conhecido.
Destacamos aqui, a Missão Francesa de 1816, que objetivava revolucionar as artes na
colônia e imprimir no novo mundo as marcas profundas e úteis dos artistas franceses (Souza
e Silva, 2009). Um de seus maiores expoentes, Jean-Baptiste Debret, contribuiu fortemente
com relatos escritos e pictóricos, culminando na publicação de Viagem pitoresca e histórica ao
Brasil, entre 1834 e 1839.
O artista dedicou-se a retratar um Brasil a partir de temáticas civilizatórias, como a relação
europeus-indígenas e economia escravocrata. Entretanto, não podemos considerar a sua,
como uma visão pura e real – “virtualmente inexistente”, já que ele parte de uma reelaboração
da tradição neoclássica e iconográfica europeia (Squeff, 2008). Assim, pode-se dizer que:
“A obra de Debret, como qualquer outra produção humana, não escapa a
inexorabilidade de constituir-se numa interpretação construída por um sujeito
inserido no mundo. Seu plano de interpretação do Brasil só pode ser pensado
como possuindo firme alicerce nas ideias de seu tempo e no referencial de
seu passado europeu” (Batista, 2013).
O eco de suas obras remonta à exposição itinerante, “Debret – Viagem ao Sul do Brasil”,
curada por Anna Paola Batista em 2011. Nela, um conjunto de aquarelas e desenhos
realizados pelo artista por volta de 1827, retrata as paisagens sul-brasileiras, apontadas como
“uma das principais fontes da memória da sociedade brasileira na primeira metade do século
XIX” (Batista, 2013)
Dentre elas, destacamos o panorama a partir do hospital, em Laguna – influente porto e centro
urbano no século XIX, ao sul do estado se Santa Catarina.
Nessa aquarela, concluída em 1828, Debret contraria sua marcante característica de
intimidade e proximidade com a cena, retratando o porto de um ponto de observação distante
e alto (Batista, 2013). Nas paisagens do Sul do Brasil, Debret repete “um cacoete compositivo
(...), os personagens de costas a caminho ou observando a localidade retratada” (Batista,
2013). Alguns historiadores acreditam que essa constante distância, se deve ao fato de que a
viagem ao sul nunca fora realizada, tendo o artista “se utilizado de relatos e desenhos de
outros viajantes para compor os trabalhos” (Batista, 2013).
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Debret também se utiliza de aspectos morfológicos e signos na paisagem não
correspondentes aos reais, estes ganham um caráter homogêneo e simbólico. Conforme
observa-se na Figura 1, os morros muito lembram as paisagens europeias; o balcão asséptico
do hospital; os inúmeros barcos denotando a vocação da cidade e o espectador
desconhecido; todos compõem uma feição “etérea que apontam pra a construção visual do
conceito de sublime” (Batista, 2013).
Figura 1 - A imagem representando o olhar de distância de Debret sobre a paisagem. Jean Baptiste Debret – Vista de Hospital
em Laguna, 1827. (Fonte: Museus Castro Maya)
Endente-se que a aquarela de Debret pode ser considera uma representação do real,
interpretada pela ótica da técnica e da subjetividade do pintor. Portanto, como representação,
essa “imagem não é mais uma paisagem, embora simule sê-la”, conforme propõe Pechman
(2012). Para entender como essa paisagem não constitui um registro, se recorre ao conceito
de avesso. Por essa ótica, a paisagem, dotada de processos espaciais no tempo é o
antagônico da imagem, destituída de passado. Sobretudo na paisagem urbana, a imagem
destrói a própria cidade, compõe um lugar imaginário de desterritorialização contemporânea:
“(...) a cidade com o peso de sua história, com a presença de sua arquitetura
e com a veemência de sua urbanidade passa a ser temida como um
empecilho à travessia dos fluxos e de toda a natureza” (Pechman, 2012,
p.258)
Assim, a imagem opera como um simulacro na “transformação da cidade numa imagem de
cidade” (Pechman, 2012), transformando e desmanchando a urbanidade. Portanto, mesmo
com a possível inexistência da viagem da viagem de Debret ao sul do Brasil, as
representações nos servem como construção artística e mental da paisagem de um tempo,
para todos os efeitos: um avesso.
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Hoje Laguna carrega um importante legado na história do Brasil. No ano de 1494, a cidade foi
apontada como ponto divisor das terras portuguesas e espanholas no Tratado de Tordesilhas,
onde pela primeira vez configura nos domínios da corte. Desempenhou, posteriormente,
importante papel no século XVII, durante as expansões territoriais, além de ser palco da
Guerra dos Farrapos e da República Juliana no século XIX.
É um município localizado ao litoral sul do estado de Santa Catarina, aproximadamente a
120km de Florianópolis, inserido no Complexo Lagunar Sul Catarinense. Seu nome deriva de
sua conformação geográfica, já que sua área central caracteriza uma porção de terra banhada
por uma laguna – lagoa alimentada por águas fluviais e oceânicas.
As primeiras ocupações do território lagunense remontam aos grupos sambaquianos. No
século XIV, as terras são registradas por jesuítas, até serem ocupadas por bandeirantes e
vicentistas em 1676. A cidade começa sua consolidação urbana quando é elevada à categoria
de vila, em 1714, se desenvolvendo apoiada na economia portuária e como caminho das rotas
de charque e gado para o Rio Grande do Sul.
Após o desvio da rota do gado, entre 1748 e 1756, chegam os imigrantes açorianos, que
mudam drasticamente os hábitos da cidade, redefinindo os costumes e padrões de ocupação
do solo (Campos, 2007, p.35-40).
Em 1847, a vila é elevada à cidade por Decreto Imperial. Nesta época, a população de 9000
habitantes era composta de comerciantes, militares e trabalhadores portuários de classe
média e baixa, que testemunhavam a chegada de imigrantes italianos e alemães.
Na virada do século XIX, a cidade vê um desenvolvimento da economia portuária aliado ao
comercio e indústrias da região, o que a põe em uma “posição econômica invejável
possibilitando com isso, melhores condições de vida a toda a população” (Campos, 2007,
p.41-45).
O fim do século XIX e o início do século XX caracterizam a “época áurea” de Laguna, onde
são implantados variados equipamentos urbanos, de lazer e serviços, ainda concentrados
próximos ao núcleo fundador. Esse período testemunha alterações drásticas nos padrões de
ocupação e modificadores da paisagem urbana.
A queda subsequente da economia portuária entre e pós guerras no século XX, traz o declínio
econômico a cidade, fator que leva a ocupação e consolidação para os bairros além do centro,
provocado pelo deslocamento do porto.
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Ao longo da segunda metade do século XX, a cidade vive um período de incerteza econômica,
o que a faz explorar, a partir da década de 1970, a atividade turística, criando o balneário Praia
do Mar Grosso, oposto geográfico ao núcleo fundador (Campos, 2007, p.41-45). Desse modo,
testemunhou-se um deslocamento de algumas importantes atividades, como os festejos de
carnaval, para outras áreas da península central, como o bairro Magalhães e Mar Grosso.
Atualmente, a cidade vê os resultados da consolidação como balneário, enquanto a economia
se apoia na sazonalidade litorânea, na exploração do turismo com apelo histórico, em
atividades comercias e pesqueiras locais, e, mais recentemente, como polo universitário.
As visões de Laguna pela paisagem
Para abordar os aspectos naturais e antrópicos da paisagem em Laguna, se faz uso da
dissertação de Mestrado de Ana Paula Cittadin, arquiteta responsável pelo Escritório Técnico
do Iphan em Laguna. No trabalho, a autora pretende “introduzir objetivos de proteção ao
patrimônio cultural e natural da paisagem na elaboração de diretrizes de política urbana para o
município de Laguna.” (CITTADIN, 2010, p. 9). Assim, compreende os elementos naturais do
território, elementos antrópicos do processo de ocupação e as unidades de paisagem. A partir
daí, elenca variados aspectos para a caracterização.
Os elementos naturais do território são estudados pela ótica de subcategorias que juntas
englobam: geomorfologia, hidrografia, dunas e vegetação; traçando um quadro geral de
elementos que articulam a paisagem do município. Compreende-se a inserção de Laguna na
Unidade Geomorfológica da Serra do Tabuleiro e a posição divisora das feições
geomorfológicas do litoral brasileiro do Cabo de Santa Marta; a importância da inserção no
complexo lagunar sul catarinense; a conformação das dunas e a inserção no bioma da mata
atlântica.
Já os elementos antrópicos do processo de ocupação, abrangem a “ação conjunta e
prolongada, ao longo do tempo, de fatores bióticos e abióticos sobre o território” (p. 76).
Destaca-se a contribuição humana na modificação e construção da paisagem, vista através
da passagem do tempo e estabelecimento das culturas. Aqui, se aborda as diferentes
ocupações dos grupos Sambaquianos, Jês e Guaranis e mais tarde das ocupações
europeias, chegando até os dias atuais. Aponta estudos desde o primeiro núcleo urbano da
cidade, atual Centro, até a atual ocupação do território.
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Enfim, a autora avalia a paisagem de Laguna em três etapas:
Paisagem Atual Rural e Urbana, identificando “características do ambiente, densidade
de assentamentos urbanos e infraestrutura disponível”;
Identificação e Valoração da Paisagem, apontando "as paisagens reconhecidas
legalmente e os valores de paisagem encontrados em cada unidade”;
Dinâmicas e Processos que incidem na Paisagem, definindo quais paisagens são
resultados de processos entre múltiplas dinâmicas atuando em diferentes escalas, como o
crescimento urbano.
Para a complementação do presente estudo, elencando a paisagem como categoria,
evidencia-se que esta não pode ser entendida apenas a partir da visão de uma porção do
espaço, ou de uma única ótica. Para tanto, se recorre aos padrões ocupacionais e ao traçado,
segundo Cosgrove (2008), vestígio histórico urbano de mais longa duração e consequente
testemunho da ação antrópica no território.
A partir dessas categorias, se busca o entendimento da paisagem como um “processo
dinâmico de transformações biofísicas, sociais, econômicas e políticas a partir da escala
urbana” (Alcantara, 2012). Apresentam-se os processos de ocupação na área central do
município, destacando os motores de ocupação e processos socioeconômicos que as
caracterizam.
Aqui, se realiza um recorte mais preciso na paisagem, focando na península central da
cidade, lugar onde os processos da passagem do tempo na paisagem são mais evidentes.
As primeiras impressões deixadas cidade de forma consolidada concentram-se numa área
restrita, ocupada estrategicamente protegida do mar aberto, entre os morros e a Lagoa de
Santo Antônio dos Anjos, para a proteção de ataques. O traçado se constitui a partir de duas
praças – atualmente Vidal Ramos e República Juliana e uma fonte – Bica da Carioca, e sua
conexão com a laguna, onde se situava o porto. A área era ocupada por edificações em fita,
em sua grande maioria, constituindo uma paisagem tendendo a hegemonia quanto a tipos e
unidade de fachada, indicada pela mancha vermelha no infográfico da Figura 2.
Já a virada do século XIX para o XX, é marcada pela ação de modificação do homem na
paisagem, seja por obras de infraestrutura ou de expansão da ocupação, como indicado na
mancha azul do infográfico da Figura 2. Nesta mesma época, começam as obras dos molhes
da barra, para possibilitar um melhor acesso a Laguna e do porto no bairro Magalhães.
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Enfatiza-se que no início do século XX, havia “dois portos; assim, poder-se-ia dizer que a
mudança de localização do porto principal acompanhou a dinâmica da economia carvoeira”
(Elíbio, 2005). Simultaneamente, aterram-se uma faixa da orla do centro e as terras
pantanosas do bairro Campo de Fora para a ampliação da ferrovia e recepção da estação
ferroviária, configurando as mesmas tipologias de ocupação do Centro.
O bairro Magalhães se constitui predominantemente de edificações residenciais isoladas no
lote, tendo como maior exemplar o Palacete de Polidoro Santiago, administrador do porto no
começo do século. Desenvolve-se ao longo da estrada de ligação entre o novo porto e o
centro.
A desativação do porto localizado no Centro acontece no estado novo, entre 1947 e 1945,
período próximo em que o porto, no então bairro Magalhães, chega ao seu pico de
movimentação de embarcações e carga, em 1948 (Elíbio, 2005). O período de declínio
começa a acentuar em 1954, com a ascensão do porto de Imbituba. A partir daí, começa a
operar como porto pesqueiro, de forma local e em reduzida escala.
É na década de 1970 que começa a exploração como balneário turístico, definindo o traçado
atual do Bairro Mar Grosso. Aqui, as vias são reguladas por pequenos loteamentos e
desmembramentos, e a interação com a orla marítima, além da continuação das vias de
acesso ao centro e bairro Magalhães. Essa expansão é indicada pela mancha verde do
infográfico da Figura 2.
Os gabaritos nas edificações sobem, não extrapolando a média de trinta metros de altura. O
bairro se consolida por edificações residenciais e comércio local, adotando a faixa de areia
como o grande espaço público.
Mais recentemente, no fim do século XX e começo do XIX, observa-se o loteamento e
ocupação da Praia do Gi, caracterizado por grandes lotes e condomínios particulares
murados. Nota-se uma tentativa, atualmente sem resultados palpáveis, de deslocamento do
balneário Mar Grosso para a Praia do Gi.
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Figura 2 - Infográfico. Acima a localização do município. Abaixo, mapa da península central de laguna, indicando as manchas
de expansão mais significativas em relação ao traçado e espacialidade na paisagem da cidade.(Fonte: Prefeitura Municipal
de Laguna, GoogleMaps e Wikipedia – Adaptado pelo autor)
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Dado este conjunto paisagístico singular, em 1954 surge a primeira ação de preservação em
Laguna, ainda em âmbito municipal, investida na Casa de Câmara e Cadeia. A intenção de
manutenção do bem é marcada pelo centenário da morte da onipresente lagunense, Anita
Garibaldi, em 1949. O edifício, então, passa a hospedar o museu intitulado pela heroína da
República Juliana.
Já a partir da década de 1970, o centro fundador começa a apresentar sinais de
desvalorização e esvaziamento de usos, por ser palco de uma “vida urbana tradicional”, frente
aos novos hábitos da modernidade. Diz-se que o deslocamento acelerado para a região
balneária da cidade “proporcionou efeitos não tão benéficos para a área” (Lucena, 2011).
Além disso, em 1978, com a elaboração do primeiro plano diretor, permite-se edificações de
até quatro pavimentos, incentivando a mudança nos padrões ocupacionais da área: “este fato
dá início ao rompimento da volumetria e morfologia do centro” (Cittadin, 2010). Junto ao plano,
edificações são tombadas de forma isolada no bairro Centro e Cadeia e Magalhães.
Após estudos realizados por Tavares (1983), se começa a pensar o tombamento de fração da
cidade em âmbito nacional. Este movimento resulta, em 1985, no tombamento de uma porção
do território do centro fundador, caracterizando uma poligonal de tombamento, indicado pelo
tracejado cinza na Figura 2. Vale ressaltar que algumas edificações de valor cultural
inestimável passaram por processo de demolição na mesma década. Este recurso abrange
uma totalidade aproximada de 700 edificações:
“Estas formam um conjunto com características singulares construídas a
partir do séc. XVIII. São residências térreas, sobrados, edificações de grande
volumetria, em estilos arquitetônicos variados como lusobrasileiro, eclético,
art deco, modernistas, entre outros” (Campos, 2007, p.44)
Na época, a poligonal é inscrita em dois livros de preservação, o Livro do Tombo Histórico e o
Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico. É, importante destacar que,
juntamente ao tombamento das edificações, já há uma preocupação em relação a paisagem.
No relatório do IPHAN (1985) com as recomendações do tombo, o arquiteto Luiz Fernando P.
N. Franco expressa que “em sua dimensão estritamente arquitetônica, o patrimônio
construído do Centro Histórico de Laguna não apresenta as características de
excepcionalidade normalmente adotadas como critério para decidir sobre a oportunidade do
tombamento”. Assim, nota-se que a inserção e posição geográfica adotada pela ocupação é
fator decisivo para a preservação.
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Lucena (2011) ainda defende que, no caso de Laguna, o tombo trata-se de uma “análise
estritamente material do objeto para a preservação”, não levando em consideração os
aspectos históricos e socioeconômicos, associando a paisagem como moldura e cenário do
objeto material principal a ser preservado: o centro histórico. A autora também destaca esta
como uma tendência seguida após as recomendações da Carta de Veneza (1964), a
exemplos de sítios como Paraty e Porto Seguro.
Essa primeira leva de ações de preservação em Laguna engloba somente registros de
patrimônios materiais, compreendendo as modificações tangíveis do homem na paisagem. É
a partir do fim da década de 1980 e começo da década de 1990, que questões relacionadas
ao patrimônio imaterial começam a despontar com força no Brasil, desencadeados por uma
tendência mundial.
É importante assinalar que a constituição de 1988, Cap. III, Art.216, já demonstra tal
preocupação, classificando “bens de natureza material ou imaterial, incluindo o patrimônio
paisagístico que merecem fazer parte do futuro.” (BRASIL, 2004). Porém, somente no ano de
2000, com a lei nº 3551 que o patrimônio imaterial começa a constar num livro próprio. Em
2009, com a portaria nº127, enfim é estabelecida a Chancela de Paisagem Cultural, regendo a
manutenção e gestão das relações antrópicas na/com a paisagem.
Em Laguna, o primeiro marco do registro imaterial ocorre em 1997, com a Lei municipal nº
521, onde “os habitantes de Laguna, na qualidade de cidadãos, declaram os botos (golfinhos)
da Lagoa de Santo Antônio dos Anjos, patrimônio do município” (Brasil, 1997).
Neste ato a prefeitura se compromete a monitorar, proteger, divulgar e articular
cientificamente a questão da pesca com o auxílio dos golfinhos. Esta prática, mais frequente
nos meses de pesca da tainha, é um, se não o maior, exemplo eleito da interação
homem-natureza na paisagem do município. De cinquenta golfinhos que vivem no Complexo
Lagunar, cerca de vinte – entre adultos e filhotes, cooperam diretamente com a pesca (G1,
2013).
A partir daí, destacam-se estudos para a compreensão do valor material e imaterial da
paisagem de Laguna, apresentados nos trabalhos de Lucena (2011), Campos (2007) e
Cittadin (2010).
Lucena (2011), faz um apelo aos espaços públicos da cidade, sendo estes “espaços
que a sociedade manifesta publicamente seus valores socioculturais, seus anseios, suas
necessidades - do lazer, da palavra, da sociabilidade” (p.12), encarnando aí, a imaterialidade,
ou a urbanidade, no centro da cidade. A autora ainda discorre sobre a intervenção da
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chancela da paisagem cultural em Laguna sob duas alçadas, ambas partindo do centro da
cidade:
“Dentro do centro”: onde a manutenção pela chancela ocorreria nos espaços
públicos e na vida urbana nele inserida – festas, manifestações culturais e religiosas,
rotina e atividades econômicas como a pesca.
“Dentro para fora do Centro”: o “entorno imediato, formado pelos elementos
naturais que interagem e intervém no modo de vida das pessoas” (p.16). Abrange aí a
Lagoa – cenário da pesca e rotas de transporte; e os morros, que ao longo dos anos,
ganharam significado religioso e memorial.
Enfim, ressalta que para o uso da Chancela da Paisagem Cultural, deve-se buscar uma
gestão público-privada, que auxiliem na criação de:
“Instrumentos normativos, de obras de revitalização, de políticas que
valorizem e preservem as configurações sociais existentes no centro
histórico, que estimulam o lúdico, o cultural e a memória urbana nestes
espaços” (Lucena, 2011, p.19)
Nota-se uma preocupação evidente no resgate da urbanidade tradicional, do papel do
“centro histórico” na memória da cidade, e na eleição de elementos pré-industriais na
paisagem como catalizadores da relevância patrimonial frente às demandas contemporâneas.
Já Campos (2007), através da história oral temática, tenta entender como os órgãos de
preservação atuam no centro de Laguna, de forma a realizar o “desejo em visualizar uma
cidade que agrade tanto aos que residem quanto aos visitantes” (p. 94). Tenta entender como
as questões estéticas, funcionais e de gestão podem estar intimamente ligadas com a
questão patrimonial do município.
Enfim, acentua que, em Laguna, “o patrimônio como símbolo ainda não está totalmente
construído (...) suas ligações com a memória individual e coletiva são mais presentes do que
com a idéia de futuro, e de possibilidades” (p.94). E termina assinalando que o patrimônio
ganha sentindo quando relaciona as memórias, o passado, com as dialéticas da atualidade.
A autora propõe um debate acerca de dois tempos na cidade: no passado, onde ocorreu a
produção do patrimônio atual, e o presente, legando este patrimônio para o futuro.
Por fim, Cittadin (2010), após avaliar as questões naturais e antrópicas na paisagem da
cidade, como supracitado, gera propostas para a preservação da paisagem natural e cultural
de Laguna. Entende a chancela como uma proteção integrada do patrimônio, apontando:
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A preservação do patrimônio, material e imaterial, e da paisagem, para valorização da
história e melhora na qualidade de vida os cidadãos.
Organização dos núcleos populacionais, seguindo critérios de ocupação estabelecidos
pelo plano diretor participativo
Manutenção das paisagens naturais para a integração de atividades como turismo,
agropecuária, recursos naturais e laser.
Este estudo, diferentemente dos outros, extrapola os limites da poligonal de tombamento no
centro fundador da cidade, entendendo a paisagem como questão integradora. Assim não
segmenta, ou o faz de forma menos evidente, a paisagem em territórios não articulados,
dividindo-os apenas como recorte de estudos.
Nota-se que o foco de ambas as pesquisas é o legado das ações pré-industriais ao presente,
considerando como relevância na paisagem natural, edificada, em suma, cultural, o saber
fazer e as ações antrópicas ditas “tradicionais”. A situação no tempo atual e identificação na
história do tempo presente não relegadas ao enaltecimento de ações e registros materiais
passados. Pouco se aborda sobre as novas dinâmicas da cidade, como o Carnaval e a
balneabilidade, observando-se uma tendência acadêmico-institucional de manter a imagem
de “Laguna tradicional”.
Representações e interpretações da paisagem
É nas representações populares, no cotidiano, que podemos ver como as marcas das
políticas de preservação incidem nas questões de identidade. Não seria a questão
patrimonial, um catalizador de influências para esta representação?
Para Canclini (2000), o patrimônio na modernidade alça questionamentos específicos.
Entende que a perenidade dos bens – materiais e imateriais, os elevam a um valor
inquestionável, tornando-os “fonte de consenso coletivo” (p.160).
De fato, é a partir da preservação, da intervenção com o pretexto de perdurar que,
oficialmente, um bem coletivo passa a dotar de uma “aura” oficializada. A diferença das
manifestações coletivas populares à erudição, e a denominação de algumas delas sob a
égide de denominações como o folclore, ajudam a alimentar essa “teatralização” do
patrimônio coletivo – seja através de pinturas, comemorações, monumentos ou museus
(Canclini, 2000).
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Em Laguna, não é diferente. A valorização da memória na cidade e da cidade, encontra
variadas maneiras de se manifestar e materializar. Assim, fica evidente que “preservar um
lugar histórico (...) e costumes, é uma tarefa sem outro fim que não o de guardar modelos
estéticos e simbólicos” (Canclini, 2000, p.161). Aí, é comum testemunhar manifestações
artísticas que retratam a mesma temática; estabelecimentos comerciais, instituições e
logradouros nomeados aos mesmos heróis e simulações de espaços para a valorização.
Observam-se ações questionáveis sobre a institucionalização de um tempo na cidade,
lançada, principalmente pelos órgãos de preservação.
Ao longo do centro fundador e dos bairros próximos, se vê uma profusão de estabelecimentos
homenageando a República Juliana e a heroína Anita Garibaldi. O Café República (item
número 1 da Figura 3) e o Café Garibaldi (item número 2 da Figura 3), são exemplos desta
tendência.
Na categoria do uso do patrimônio aliado ao apelo turístico, se pode elencar dois exemplos, os
Museu Casa de Anita (item número 3 da Figura 3) e o Museu Anita Garibaldi (item número 4
da Figura 3). O primeiro, erguido em 1711, ao lado da Igreja Matriz, foi o local onde a heroína
vestiu-se para seu primeiro casamento. Hoje, é dedicado a contar a história de Anita, se
afirmando como “relicário histórico” da lagunense. O fato de carregar o nome de “casa”, lugar
de morada, desmonta a historicidade de seu verdadeiro lar, localizado algumas ruas dali.
Já o Museu Anita Garibaldi, a antiga Casa de Câmara e Cadeia, é dedicado à Guerra dos
Farrapos e a República Juliana, instaurada na mesma praça onde se situa o museu. Ao
carregar o nome de Anita, o espaço de limita a atribuir os acontecimentos a uma única
personagem, valorizando-a em prol de um evento com variados protagonistas.
A ponte de nova ligação da rodovia BR-101, com obras iniciadas em 2010, importante fluxo
para o sul do estado e entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul, também recebe o nome de
Anita (item número 5 da Figura 3). Aqui, além de confirmar a onipresença de Garibaldi, a
ponte configura um marco colossal na paisagem da Laguna de Santo Antônio dos Anjos e
sombreia a importância histórica de suas ligações anteriores, marcos essenciais dos ciclos
econômicos alavancados pelo automóvel e pela ferrovia, marcados pela atual ponte de
automóveis e a antiga ponte ferroviária de Cabeçuda (item número 6 da Figura 3).
3° COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO - DESAFIOS E PERSPECTIVAS Belo Horizonte, de 15 a 17 de setembro
Figura 3 - As representações e interpretações do passado marcando a paisagem de Laguna. 1 - Café Rebpública; 2 - Café
Gabribaldi; 3 - Museu Casa de Anita; 4 - Museu Anita Garibaldi; 5 - Ponte Anita Garibaldi; 6 - Ponte Cabeçuda. (Fonte:
Prefeitura Municipal de Laguna, IPHAN, GuiaLitoralSul, Ronaldo Amboni – Adaptado pelo autor)
Já no contra caminho da representação de elementos pré-estabelecidos – principalmente os
ditos “históricos”, algumas produções e instituições se desenvolvem encontrando o caminho
contemporâneo da cidade. Estes atores buscam a convivência com o antigo, entendem seu
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espaço no tempo, e crescem juntos na busca de um futuro integrado também com o presente,
sem evidenciar somente um tempo.
Esta é uma geração disposta a “movimentar a cidade e criar uma alternativa de música,
fotografia e artes plásticas” (Bett, 2013). Juntam-se aos coletivos NEO Cult e With Art
Colletive, o Espaço Cultural Richard Calil Bulos – Chachá, as oficinas e cursos do Sesc e
algumas ações conjuntas e parcerias organizadas pela Universidade do Estado de Santa
Catarina. Assim tentam “vivenciar um ambiente que exala história e apreciar os trabalhos de
artistas locais” (Bett, 2013)
Também contemporâneo este acrítico sobre tela de Artur Cook (Figura 4), pintor radicado na
cidade, é intitulado “Laguna”. Nele, se pode observar a densidade de símbolos convivendo no
mesmo espaço físico, compondo uma espécie de alegoria da paisagem lagunense.
Figura 4 - A repetição de símbolos na representação da paisagem em Laguna. Artur Cook - Laguna, acrílico sobre tela.
(Fonte: http://arturcook.blogspot.com.br/p/obras.html
Compõem na mesma representação um panteão de representações (da esquerda para a
direita): a Bica da Carioca, a Casa de Câmara e Cadeia (atual museu Anita Garibaldi),
manifestações folclóricas de Boi de Mamão, estátua de Anita Garibaldi, a fonte da Praça Vidal
Ramos, a igreja matriz, a estátua de Nossa Senhora da Glória, o museu Casa de Anita, a
pesca, a Pedra do Frade e o Farol de Santa Marta.
Assim, de forma orquestrada, Cook representa os símbolos, cores e elementos
institucionalizados: os patrimônios culturais de Laguna. Como síntese das representações
citadas, eterniza estes elementos, elegendo-os como os mais significativos de serem
impressos no tempo e espaço. À sua forma, também cria uma nova paisagem, um novo
avesso.
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Expressado como a ideia de patrimônio se construiu na cidade de Laguna, e a reverberação
cultural que ela gerou, pode-se agora traçar perguntas para estruturar o pensamento do
avesso.
Ao desconstruir o conceito de Pechman (2012), entende-se que o avesso da paisagem
cultural em Laguna, deve muito às das políticas de preservação, que ajudam à mitificação de
elementos e signos em detrimento de outros. Neste caso, a paisagem urbana não
corresponde mais a uma cidade, e sim um “lugar imaginário, uma cenografia urbana”
(Pechman, 2012, p.257).
Testemunha-se uma repetição das representações na cidade. Assim, a paisagem cultural em
Laguna pode transformar-se “num cenário que não é mais um lugar, mas um décor para a
teatralização de fantasias” (Pechman, 2012, p.257).
Pode-se perceber tal fenômeno “de imagem em imagem”: a representação do desconhecido
em Debret; a poligonal de tombamento traçada no centro fundador, ignorando as
continuidades da paisagem; as manifestações artísticas contemporâneas, frutos da eleição de
um tempo.
Ao iniciar esta análise em Debret, entende-se a transformação da paisagem em imagem, a
destituição da realidade. O entendimento da preservação como representação é fundamental
para construir a imagem da atual paisagem lagunense, calcada nesse enaltecimento do
passado e da tradição.
Ao institucionalizar “recantos” da paisagem em Laguna, órgãos e instituições correm o perigo
de desencadear uma alteração da espontaneidade em prol da massificação da cultura, já que
adotam um tempo como “o tempo”. Aos poucos, o “cenário vai substituindo a paisagem da
cidade, provendo-a, sobretudo, de um novo sentido, levando a perda de seu sentido original”
(Pechman, 2012, p.258).
À iminência de transformar-se num artifício, num simulacro, deve-se atentar para as questões
que realmente fazem da paisagem de Laguna um bem cultural. É importante entender que, a
paisagem cultural em Laguna necessita do apoio no passado para o entendimento do
presente e construção futura. Entretanto é salutar atentar-se a outros fenômenos de
transformação na paisagem pelo homem, que acontecem hoje ou que necessitam acontecer
num futuro próximo, destituídos da teatralização e mitificação do passado. Conclui-se que
mais importante que buscar questões sobre a imagem da paisagem cultural, é nos perguntar
constantemente se já vivemos do avesso dela.
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