novos recetores de aniões baseados em homooxacalixarenos

127
Novos recetores de aniões baseados em homooxacalixarenos fluorescentes com potenciais aplicações biotecnológicas Micael Alexandre Santos Miranda 2016

Upload: vuonghuong

Post on 10-Jan-2017

219 views

Category:

Documents


3 download

TRANSCRIPT

  • Novos recetores de anies baseados em

    homooxacalixarenos fluorescentes com potenciais

    aplicaes biotecnolgicas

    Micael Alexandre Santos Miranda

    2016

  • Novos recetores de anies baseados em

    homooxacalixarenos fluorescentes com potenciais

    aplicaes biotecnolgicas

    Micael Alexandre Santos Miranda

    Dissertao para obteno do Grau de Mestre em

    Biotecnologia dos Recursos Marinhos

    Projeto de Mestrado realizado sob a orientao da Professora Doutora Paula M. Marcos e orientao interna do Professor Doutor Professor Raul J. Bernardino

    2016

  • Novos recetores de anies baseados em

    homooxacalixarenos fluorescentes com potenciais

    aplicaes biotecnolgicas

    Copyright 2016, Micael Alexandre Santos Miranda, ESTM, IPL

    A Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar e o Instituto Politcnico de Leiria tm o direito, perptuo e

    sem limites geogrficos, de arquivar e publicar esta dissertao atravs de exemplares impressos reproduzidos

    em papel ou de forma digital, ou por qualquer outro meio conhecido ou que venha a ser inventado, e de a

    divulgar atravs de repositrios cientficos e de admitir a sua cpia e distribuio com objetivos educacionais ou

    de investigao, no comerciais, desde que seja dado crdito ao autor e editor.

  • i

    NDICE

    Agradecimentos

    Resumo

    Abstract

    ndice de Calixarenos

    ndice de Esquemas

    ndice de Figuras

    ndice de Tabelas

    Smbolos e Abreviaturas

    1. INTRODUO

    1.1. Origem dos Calixarenos 01

    1.2. Sntese de Calixarenos Precursores 03

    1.3. Propriedades 06

    1.3.1. Propriedades fsicas 06

    1.3.2. Propriedades espectrais 07

    1.3.3. Propriedades conformacionais 08

    1.4. Sntese de Calixarenos Funcionalizados 11

    1.4.1. Reaes na coroa superior 11

    1.4.2. Reaes na coroa inferior 12

    1.5. Calixarenos Quirais 13

    1.6. Complexao em Soluo 14

    1.6.1. Espcies neutras e catinicas 14

    1.6.2. Espcies aninicas 18

    1.7. Aplicaes Biotecnolgicas 23

    1.8. Patentes 29

    2. RESULTADOS E DISCUSSO

    2.1. Homooxacalixarenos Funcionalizados com Grupos Ureia ou

    Tioureia na Coroa Inferior 31

    2.1.1. Bis[[(naftilureia/naftiltioureia)butil]oxi]-dibutoxi-dihomooxa

    calix[4]areno 31

    2.1.1.1. Sntese 31

    2.1.1.2. Anlise estrutural 33

    2.1.2. Tri[[naftilureia)butil]oxi]-hexahomotrioxacalix[3]areno 38

    2.1.2.1. Sntese 38

  • ii

    2.1.2.2. Anlise estrutural 39

    2.2. Complexao de Anies por RMN 40

    2.2.1. Consideraes gerais 40

    2.2.2. Bis[[(naftilureia)butil]oxi]-dibutoxi-dihomooxacalix[4]areno 41

    2.2.3. Tri[[naftilureia)butil]oxi]-hexahomotrioxacalix[3]areno 45

    2.2.4. Concluses 49

    2.3. Complexao de Anies por Espectroscopia de Absoro no UV-Vis 49

    2.3.1. Consideraes gerais 49

    2.3.2. Recetores do tipo Bis[[(naftilureia/fenilureia)butil]oxi]-

    dibutoxi-dihomooxa calix[4]areno 50

    2.3.3. Tri[[naftilureia)butil]oxi]-hexahomotrioxacalix[3]areno 55

    2.3.4. Concluses 58

    2.4. Complexao de Anies por Espectroscopia de Emisso em Estado

    Estacionrio 58

    2.4.1. Consideraes gerais 58

    2.4.2. Recetores do tipo Bis[[(naftilureia/fenilureia)butil]oxi]-

    dibutoxi-dihomooxa calix[4]areno 59

    2.4.3. Tri[[naftilureia)butil]oxi]-hexahomotrioxacalix[3]areno 63

    2.4.4. Concluses 66

    2.5. Fotodegradao 66

    2.5.1. Diclorometano e Acetonitrilo 66

    2.5.2. Clorofrmio 69

    2.5.3. Concluses 71

    2.6. Concluses Finais 71

    3. PARTE EXPERIMENTAL

    3.1. Homooxacalixarenos Funcionalizados com Grupos Ureia ou

    Tioureia na Coroa Inferior 73

    3.1.1. Equipamento e reagentes 73

    3.1.2. Sntese de bis[[(naftilureia/naftiltioureia)butil]oxi]-dibutoxi-

    dihomooxacalix[4]arenos 74

    3.1.2.1. 7,13,19,25-Tetra-terc-butil-27,29-bis[(cianopropil)oxi]-

    28,30-dihidroxi-2,3-dihomo-3-oxacalix[4]areno (38a) 74

    3.1.2.2. 7,13,19,25-Tetra-terc-butil-28,29-bis[(cianopropil)oxi]-

    27,30-dihidroxi-2,3-dihomo-3-oxacalix[4]areno (38b) 74

    3.1.2.3. 7,13,19,25-Tetra-terc-butil-27,29-bis[(cianopropil)oxi]-

    28,30-dibutoxi-2,3-dihomo-3-oxacalix[4]areno (39) 75

  • iii

    3.1.2.4. 7,13,19,25-Tetra-terc-butil-27,29-bis[(aminobutil)oxi]-

    28,30-dibutoxi-2,3-dihomo-3-oxacalix[4]areno (40) 75

    3.1.2.5. 7,13,19,25-Tetra-terc-butil-27,29-bis[[(N'-naftilureia)butil]

    oxi]-28,30-dibutoxi-2,3-dihomo-3-oxacalix[4]areno (41) 76

    3.1.2.6. 7,13,19,25-Tetra-terc-butil-27,29-bis[[(N'-naftiltioureia)butil]

    oxi]-28,30-dibutoxi-2,3-dihomo-3-oxacalix[4]areno (42) 77

    3.1.3. Sntese de tri[[(naftilureia)butil]oxi]-oxi-hexahomotrioxa

    calix[3]areno 78

    3.1.3.1. 7,15,23-Tri-terc-butil-25,26,27-[(aminobutil)oxi]-2,3,10,11,

    18,19-hexahomo-3,11,19-trioxacalix[3]areno (44) 78

    3.1.3.2. 7,15,23-Tri-terc-butil-25,26,27-[[(N'-naftilureia)butil]oxi]-2,3,

    10,11,18,19-hexahomo-3,11,19-trioxacalix[3]areno (45) 78

    3.2. Complexao de Anies por RMN 79

    3.3. Complexao de Anies por Espectroscopia de Absoro no

    UV-Vis e de Emisso em Estado Estacionrio 80

    4. BIBLIOGRAFIA 81

    APNDICES 87

    ANEXOS 92

  • iv

  • v

    Agradecimentos

    Uma Tese de Mestrado com base num trabalho de investigao um processo

    solitrio a que qualquer investigador est sujeito. uma batalha dura muitas vezes

    vencida pelo cansao ou frustrao, mas com a ajuda de vrias pessoas torna-se mais

    fcil arranjar fora e vontade para continuar e alcanar o objetivo final. Durante este

    ano e meio contei com o apoio e confiana de inmeras pessoas, sem as quais esta

    jornada no teria sido possvel e s quais estarei eternamente grato. O espao

    limitado desta seco de agradecimentos, seguramente, no me permite agradecer a

    todas essas pessoas que de uma forma direta ou indireta me ajudaram a conseguir

    realizar mais esta etapa da minha formao acadmica.

    Coordenadora do Mestrado em Biotecnologia dos Recursos Marinhos,

    Professora Doutora Cllia Paulete Afonso, agradeo a oportunidade e o privilgio de

    frequentar este Mestrado que muito contribuiu para o engrandecimento da minha

    formao acadmica e cientfica. E ainda por toda a disponibilidade, preocupao e

    amizade que demonstrou desde a Licenciatura. Muito obrigado Professora.

    O meu profundo agradecimento Professora Doutora Paula Maria de Jorge

    Marcos, orientadora desta Tese, por todo apoio, dedicao, interesse, disponibilidade

    e amizade demonstrados. Foram muitas horas de laboratrio e de reviso de todo o

    texto, muitos e-mails e telefonemas, foi a pessoa que acima de tudo nunca me deixou

    desistir e sempre esteve quando e onde era necessrio, com quem eu aprendi muito e

    de quem tento absorver a maior quantidade de informao possvel, tanto em termos

    profissionais como pessoais. Mais uma vez o meu muito obrigado.

    Ao Professor Doutor Raul Jos Silvrio Bernardino, orientador interno deste

    trabalho, estou grato pela oportunidade e apoio prestado.

    Ao Professor Doutor Mrio Nuno Berberan e Santos, do IST, por toda a ajuda e

    disponibilidade demonstradas. Foi um orientador com o qual pude contar a qualquer

    hora do dia, sem o qual grande parte deste trabalho no teria sido possvel. Estarei

    sempre grato por todas as horas de reunies a analisar resultados e a decidir qual

    seria o melhor caminho a tomar. Uma pea fundamental no s pelo seu vasto

    conhecimento em fotoqumica, como tambm pelo seu companheirismo, preocupao

    e boa vontade em me receber e ajudar no que fosse necessrio.

    Ao Professor Doutor Jos do Rosrio Ascenso, do IST, agradeo a

    colaborao ao nvel da Espectroscopia de Ressonnmcia Magntica Nuclear,

    nomeadamente na interpretao de alguns espectros.

    A Filipa Teixeira, por toda a partilha de informao e auxlio prestado na

    sntese e purificao dos compostos estudados nesta Tese.

  • vi

    A Liliana Martelo, por toda a pacincia, dedicao e amizade demonstradas,

    dentro e fora do laboratrio. Foi de facto uma pea fundamental neste trabalho, esteve

    sempre presente com uma palavra amiga e de fora.

    Ao Centro de Qumica Estrutural e ao Centro de Qumica Fsica Molecular, pela

    utilizao das suas instalaes na realizao deste trabalho e por me permitirem fazer

    parte de dois Centros de Investigao de to alta qualidade e exigncia. A Aleksander

    Fedorov e aos meus colegas do CQFM, David Conceio, Diana Ferreira,Tiago

    Palmeira, Bruno Pedras, Tnia Sousa, Joana Ricardo, Maria Joo Sarmento, Tnia

    Santos, Estr Ventura e Lus Arajo, pela amizade, companheirismo e ajuda, bem

    como pela partilha de conhecimentos. Um especial agradecimento tambm ao

    Professor Doutor Manuel Prieto e Professora Doutora Ana Coutinho por toda a boa

    disposio e preocupao que tiveram comigo.

    Susana Ribeiro, um muito obrigado por todo o carinho, preocupao e

    amizade que sempre manifestou, foi sem dvida a pessoa mais importante desta

    jornada. Por isso aqui fica o meu agradecimento, de uma forma especial, por toda a

    ajuda, por todo o apoio e por todas as palavras que disse, nos momentos de maior

    aflio. Nunca teria sido possvel sem a sua pacincia e dedicao.

    Ao Joo Dias, por todo o companheirismo, ajuda e amizade que demonstrou

    ter por mim e por todas as horas e dias que partilhmos juntos.

    Joana Galrinho pela amizade e pelas sbias palavras no momentos cruciais.

    Por toda a dedicao e ajuda demonstradas, mesmo estando noutro continente.

    A todos os meus amigos, Ana Marques, Ana Pinto, Ana Vieira, Carla Firmo, Isa

    Ferreira, Joo Portal, Letcia Silva, Liliana Gomes, Raquel Nunes, Rita Vaz, Tiago

    Santos, Vasco Mota, Vanda Silva e Jos Aparcio que de alguma forma contriburam

    para a realizao deste trabalho, com todos os momentos de amizade e descontrao.

    E por fim, mas no menos importante, tenho e quero agradecer minha

    famlia. O maior e mais especial agradecimento para os meus pais, por todo o apoio

    e segurana que me deram, por terem sempre uma palavra amiga, por me ajudarem

    nas decises difceis, por me incentivarem a ser mais e melhor, porque a eles que

    lhes devo tudo, uma dvida que terei com eles para o resto da minha vida. minha

    irm e ao meu cunhado por toda a ajuda e disponibilidade prestadas ao longo desta

    Tese. minha tia Ana e minha av Mena por todo o apoio, fora e palavras

    carinhosas. Aos meus primos Ana, Bruna, Daniela, Diogo, Mrcia, Rafaela e Solange

    por estarmos juntos desde sempre.

    Quero ainda deixar um agradecimento especial MyCamp que sempre contou

    comigo e onde aprendi muito, por tudo isso um obrigado a esta famlia, Ana Catarina

    Carvalho e Silva, Bruna Domingos, Eduardo Reis, Filipa Nobre e Laurinda Santana.

  • vii

    Resumo

    A reao de condensao de fenis para-substitudos com formaldedo em

    meio bsico conduz formao de calixarenos, compostos macrociclcos com

    cavidades que podem exibir diversos tamanhos e conformaes. Estes compostos tm

    sido alvo de grande interesse devido sua capacidade complexante e de transporte

    seletivo de ies e molculas neutras, para alm de serem usados como plataforma na

    obteno de molculas recetoras mais complexas.

    Nesta Tese de Mestrado realizou-se a sntese de novos recetores de anies

    baseados em homooxacalixarenos fluorescentes contendo grupos ureia ou tioureia na

    coroa inferior e determinaram-se as suas propriedades complexantes relativamente a

    anies com diversas geometrias.

    Primeiramente, efetuou-se a sntese de dois derivados dihomooxa-

    calix[4]arenos (a partir do precursor p-terc-butildihomooxacalix[4]areno), compostos

    bidentados contendo grupos naftilureia (ou tioureia) na coroa inferior, atravs de um

    espaador com quatro tomo de carbono, e de um derivado tri-substitudo idntico, a

    partir do precursor p-terc-butilhexahomotrioxacalix[3]areno. Os novos compostos

    foram caracterizados atravs das tcnicas usuais e foi feita a sua anlise

    conformacional por RMN.

    Em seguida investigaram-se as propriedades complexantes de anies de

    diferentes geometrias (esfrica, linear, trigonal planar e tetradrica) com dois dos

    recetores sintetizados. Estes estudos foram realizados por RMN de proto e por

    espectroscopia de absoro no UV-Vis e de emisso em estado estacionrio,

    utilizando trs solventes diferentes (clorofrmio, diclorometano e acetonitrilo). Um

    terceiro recetor bidentado anlogo j existente (dihomooxa fenilureia) foi tambm

    estudado por espectroscopia de absoro e emisso.

    De um modo geral, o derivado hexahomotrioxa trinaftilureia mostrou uma

    afinidade ligeiramente superior para com os anies. Todos os recetores apresentaram

    as maiores constantes de associao para o anio fluoreto. Foram ainda feitos

    estudos de fotodegradao que indicaram a impossibilidade do uso do clorofrmio

    como solvente nos estudos por fluorescncia.

  • viii

  • ix

    Abstract

    The base-induced condensation reaction of para-substituted phenols with

    formaldehyde yields to the formation of calixarenes macrocyclic compounds that

    have cavities with different sizes and conformations. These compounds have been the

    subject of great interest due to its ability to complex and selectively transport ions and

    neutral molecules, along with their use as a platform to obtain more complex receptor

    molecules.

    In this Master Thesis, new anion receptors based on fluorescent homooxa-

    calixarenes containing urea or thiourea groups at the lower rim were synthesized and

    their binding properties regarding anions with different geometries determined.

    Firstly, the synthesis of two dihomooxacalix[4]arene derivatives (from the parent

    p-terc-butyldihomooxacalix[4]arene), bidentate compounds containing naphthylurea or

    thiourea groups at the lower rim through a spacer with four carbon atoms, were

    synthesized, as well as a trisubstituted derivative analogue, from the partent p-terc-

    butylhexahomotrioxacalix[3]arene. The new compounds were characterized by usual

    techniques and its conformational analysis was done by NMR.

    Secondly, the complexation properties of two of these synthesized receptors for

    anions of different geometries (spherical, linear, trigonal planar and tetrahedral) were

    evaluated. These studies were performed by proton NMR and by Uv-vis absorption and

    steady state emission spectroscopy, using three different solvents (chloroform,

    dichloromethane and acetonitrile). A third analogue bidentate receptor (dihomooxa

    phenylurea) was also studied by absorption and emission spectroscopy.

    In general, the hexahomotrioxa trinaphthylurea derivative showed a slightly

    higher affinity for the anions than the other receptors. All derivatives exhibited the

    highest association constants for fluoride. Finally, some photo-degradation studies

    were also made, indicating the impossibility of using chloroform as a solvent in the

    fluorescence studies.

  • x

  • xi

    ndice de Calixarenos

    Nmero Nome Abreviado Estrutura Pgina

    3 p-terc-butildihomooxa

    calix[4]areno

    2

    4

    p-terc-

    butilhexahomotrioxa

    calix[3]areno

    4

    20c

    Bis[[(fenilureia)butil]oxi]-

    dibutoxi-dihomooxa

    calix[4]areno

    21

  • xii

    41

    Bis[[(naftilureia)butil]oxi]-

    dibutoxi-dihomooxa

    calix[4]areno

    32

    42

    Bis[[(naftiltioureia)

    butil]oxi]-dibutoxi-

    dihomooxacalix[4]areno

    32

    45

    Tri[[(naftilureia)butil]oxi]-

    hexahomotrioxa

    calix[3]areno

    38

  • xiii

    ndice de Esquemas

    Pgina

    Esquema 1.1. 4

    Esquema 1.2. 12

    Esquema 1.3. 24

    Esquema 1.4. 26

    Esquema 2.1. 32

    Esquema 2.2. 38

  • xiv

  • xv

    ndice de Figuras

    Pgina

    Figura 1.1. 1

    Figura 1.2. 3

    Figura 1.3. 6

    Figura 1.4. 8

    Figura 1.5. 8

    Figura 1.6. 9

    Figura 1.7. 9

    Figura 1.8. 10

    Figura 1.9. 16

    Figura 1.10. 22

    Figura 2.1. 34

    Figura 2.2. 34

    Figura 2.3. 35

    Figura 2.4. 35

    Figura 2.5. 36

    Figura 2.6. 37

    Figura 2.7. 39

    Figura 2.8. 40

    Figura 2.9. 42

    Figura 2.10. 42

    Figura 2.11. 45

    Figura 2.12. 47

    Figura 2.13. 47

    Figura 2.14. 48

    Figura 2.15. 48

  • xvi

    Figura 2.16. 52

    Figura 2.17. 52

    Figura 2.18. 53

    Figura 2.19. 54

    Figura 2.20. 54

    Figura 2.21. 56

    Figura 2.22. 57

    Figura 2.23. 57

    Figura 2.24. 60

    Figura 2.25. 61

    Figura 2.26. 61

    Figura 2.27. 62

    Figura 2.28. 62

    Figura 2.29. 63

    Figura 2.30. 64

    Figura 2.31. 65

    Figura 2.32. 65

    Figura 2.33. 67

    Figura 2.34. 68

    Figura 2.35. 69

    Figura 2.36. 70

    Figura 2.37. 70

    Figura 2.38. 71

  • xvii

    ndice de Tabelas

    Pgina

    Tabela 1.1. 28

    Tabela 2.1. 43

    Tabela 2.2. 44

    Tabela 2.3. 46

    Tabela 2.4. 51

    Tabela 2.5. 55

    Tabela 2.6. 59

    Tabela 2.7. 64

  • xviii

  • xix

    Smbolos e Abreviaturas

    Abs Absorvncia

    Ar Aromtico

    Bn Benzilo

    BNAH 1-Benzil-1,4-dihidronicotinamida

    iso-Bu iso-butilo

    n-Bu n-Butilo

    t-Bu terc-Butilo

    Bz Benzolo

    cat Catalisador

    CMPO xido de octil(fenil)-N,N-diisobutil-carbamoilmetil-fosfina

    COSY Correlated Spectroscopy

    d Dupleto

    DEPT Distortionless Enhancement by Polarization Transfer

    DMF Dimetilformamida

    DMSO Dimetilsulfxido

    equiv. equivalente

    HCV Hepatitis C Virus

    HIV Human Immunodeficiency Virus

    HPLC High Performance Liquid Chromatography

    ISE Ion Selective Electrode

    I Intensidade

    IV Infravermelho

    J Constante de acoplamento

    Ka Constante de acidez

    Kass Constante de associao

    Log Logaritmo

    m Multipleto

    Me Metilo

    NADH Dinucletido de nicotinamida e adenina

    NOE Nuclear OverHouser Effect

    NOx xido de Azoto

    p. f. Ponto de fuso

    PAHs Hidrocarbonetos aromticos policclicos

    Ph Fenilo

    ppm Partes por milho

    Pr Propilo

    PVC Policloroeteno

    RMN de 1H Ressonncia Magntica Nuclear de proto

    RMN de 13C Ressonncia Magntica Nuclear de carbono-13

    S Seletividade

    s Singuleto

    t. amb. Temperatura ambiente

    t Tripleto

  • xx

    TBA Tetrabutilamnio

    THF Tetrahidrofurano

    u.a Unidades arbitrrias

    UV-Vis Ultravioleta-Visvel

    Calor ou Diferena

    Desvio qumico

    Coeficiente de absoro molar

    max Coeficiente de absoro molar mximo

    emi Comprimento de onda de emisso

    exc Comprimento de onda de excitao

    f Tempo de vida de fluorescncia

    f Rendimento quntico de fluorescncia

  • 1

    1. INTRODUO

    1.1. Origem dos Calixarenos

    A descoberta dos teres de coroa por Charles Pedersen em 1967 fez aumentar o

    interesse no estudo das interaes moleculares no-covalentes, a base da Qumica

    Supramolecular. Esta rea est intimamente relacionada com a formao de complexos

    hspede-hospedeiro, bem como com o reconhecimento molecular.1

    Uma das famlias mais interessantes da qumica hspede-hospedeiro a dos

    calixarenos,2-6 compostos macrociclos resultantes da condensao direta de fenis para-

    substitudos com formaldedo, em meio bsico (equao 1.1).

    1.1

    A histria destes compostos remete-nos qumica do fenol-formaldedo e remonta

    ao ano de 1872, quando o qumico Adolph von Baeyer, Nobel da qumica em 1905, fez

    reagir pela primeira vez formaldedo aquoso com fenol obtendo um produto resinoso e

    impossvel de caracterizar. J no incio do sculo XX, Leo Baekeland, o inventor do papel

    fotogrfico Velox, utilizou a reao de Baeyer para produzir um material muito resistente

    e elstico. O processo foi patenteado em 1907 e o produto comercializado com o nome

    de Bakelite (figura 1.1), iniciando-se a chamada era moderna dos plsticos sintticos.

    Figura 1.1. Representao da matriz do polmero Bakelite exibindo as ligaes ramificadas.

    A comercializao desta resina levou ao estudo aprofundado do processo de

    condensao por parte de diversos laboratrios, destacando-se as pesquisas de Alois

    Zinke e do seu colaborador Erich Ziegler. Na dcada de 40 do sculo XX, Zinke e Ziegler

  • 2

    simplificaram a reao anterior ao utilizarem fenis para-substitudos em alternativa ao

    fenol. Deste modo, eliminavam a reao de condensao na posio para, obtendo

    apenas polmeros lineares. Estes investigadores condensaram diversos p-alquilfenis

    com formaldedo aquoso e hidrxido de sdio obtendo produtos insolveis com pontos de

    fuso elevados. Zinke atribuiu a estes compostos estruturas tetramricas cclicas, com

    base na determinao do peso molecular do acetato do produto obtido a partir do p-terc-

    octilfenol. Estas reaes foram repetidas em 1955 por John Cornforth com dois fenis

    para-substitudos (o p-terc-butil e o p-terc-octil), isolando em cada caso um par de

    produtos com pontos de fuso distintos. Este facto parecia indicar que se tratava de

    ismeros conformacionais dos tetrmeros cclicos. Posteriormente, Hermann Kmmerer e

    John Munch verificaram atravs de estudos de RMN de proto a temperatura varivel

    que ocorria interconverso conformacional rpida temperatura ambiente, invalidando a

    hiptese de Cornforth sobre o par de compostos isolados.

    No incio da dcada de 70, o qumico americano David Gutsche da Universidade

    de Washington focou-se nos tetrmeros cclicos de Zinke vendo nestes compostos

    cavidades apropriadas para a obteno de simuladores enzimticos. Assim, as

    investigaes realizadas pelo seu grupo demonstraram que a condensao direta de

    fenis para-substitudos com formaldedo em meio bsico produzia misturas de

    oligmeros cclicos com anis de diferentes tamanhos. Utilizando o p-terc-butilfenol (o

    fenol mais estudado) obtinham-se o tetrmero (1), o hexmero (2), o octmero, o

    composto dihomooxa (3), anlogo do calix[4]areno mas no qual uma ponte metilnica

    (-CH2-) substituda por uma oxadimetilnica (-CH2OCH2-), e ainda pequenas

    quantidades de pentmero e heptmero cclicos.

    O nome calixareno foi proposto por Gutsche aquando da comparao do modelo

    molecular de um dos confrmeros do tetrmero cclico com um vaso grego (calix crater).

    Esta designao resulta da unio entre calix (vaso) e areno, indicativo da presena de

    anis aromticos (figura 1.2).

    1 2 3

  • 3

    Figura 1.2. Estrutura de um calix[4]areno (conformao cone) e representao de um vaso grego.

    O tamanho do macrociclo, a natureza e a posio dos substituintes nos anis

    aromticos so indicados por nmeros e prefixos adequados. Assim, por exemplo, o

    nome do composto 1 5,11,17,23-tetra-terc-butil-25,26,27,28-tetrahidroxicalix[4]areno ou

    simplesmente p-terc-butilcalix[4]areno, onde o nmero entre parnteses retos indica o

    tamanho do macrociclo e os restantes nmeros e prefixos indicam a natureza e a posio

    dos substituintes. No caso do composto 3, o prefixo dihomo refere-se presena de dois

    tomos adicionais (um de carbono e outro de oxignio) e oxa indica um tomo de

    oxignio em substituio de um de carbono. Relativamente sua estrutura, os

    calixarenos so geralmente desenhados com os substituintes para voltados para cima, a

    que se deu o nome de coroa (ou bordo) superior e com os grupos hidroxilo direcionados

    para baixo, designando-se por coroa (ou bordo) inferior (figura 1.2). Denominam-se,

    ainda, como calixarenos precursores os que apresentam grupos OH livres.

    Apesar da longevidade dos calixarenos as suas grandes potencialidades em

    Qumica Supramolecular s foram descobertas num passado relativamente recente. O

    crescimento quase exponencial no estudo destes compostos deu-se durante as dcadas

    de 80 e 90. Atualmente os calixarenos so vistos como uma importante classe de

    hospedeiros sintticos, capazes de incluir diversos tipos de substratos como ies e

    molculas neutras, para alm de serem utilizados como "blocos de construo" na

    obteno de molculas hospedeiras altamente sofisticadas.

    1.2. Sntese de Calixarenos Precursores

    Os calixarenos precursores so obtidos atravs da condensao direta de fenis

    para-substitudos com formaldedo em meio bsico. Este mtodo produz uma mistura de

    compostos, cujos rendimentos vo depender das condies experimentais, como a razo

    molar dos reagentes, a quantidade de base, o catio e a temperatura.2,5

    possvel sintetizar os p-terc-butilcalix[4], [6] e [8]arenos com rendimento aps

    recristalizao de 50, 85 e 63 %, respetivamente, de acordo com os procedimentos

  • 4

    otimizados por Gutsche.7 Assim, para a formao do tetrmero 1 as condies so baixa

    concentrao de base (0,045 moles de NaOH por cada mole de p-terc-butilfenol) e altas

    temperaturas (refluxo em ter difenlico), para o hexmero 2 so fundamentais

    quantidades mais elevadas de base (0,35 moles), caties maiores (K+ ou Rb+) e

    temperaturas mais baixas (refluxo em xileno) e, por ltimo, no caso do octmero so

    necessrias quantidades muito reduzidas de base (0,03 moles) e uma temperatura

    idntica do hexmero. Os calixarenos anlogos que contm um nmero mpar de anis

    aromticos, como os p-terc-butilcalix[5], [7] e [9]arenos, tm tambm sido sintetizados por

    condensao direta, mas com rendimentos significativamente inferiores aos acima

    referidos (< 20 %).2 Calixarenos contendo at 20 unidades fenlicas foram j isolados e

    caracterizados por espectrometria de massa e RMN.8

    No caso do composto dihomooxa 3, inicialmente obtido por Gutsche9, preparado

    atravs de um procedimento simplificado usando as mesmas condies experimentais do

    octmero e com um rendimento de aproximadamente 24 % (esquema 1.1.a).10 Outro

    homooxacalixareno precursor tambm sintetizado por Gutsche11, o p-terc-

    butilhexahomotrioxacalix[3]areno, obtido atravs de uma sntese em dois passos, em

    que o p-terc-butilfenol convertido no 2,6-bis(hidroximetil)-p-terc-butilfenol, o qual

    refluxado em o-xileno originando o hexahomotrioxa 4 em cerca de 15 % de rendimento

    (esquema 1.1.b).

    Esquema 1.1. Sntese dos homooxacalixarenos: a) p-terc-butildihomooxacalix[4]areno (3); b) p-terc-butilhexahomotrioxacalix[3]areno (4).

    Para alm do p-terc-butilfenol, o mais utilizado na reao de formao dos

    calixarenos, tm sido estudados outros fenis.5 o caso dos p-terc-pentil e p-terc-octil

    a)

    b)

    3

    4

  • 5

    fenis contendo tambm carbonos quaternrios diretamente ligados ao anel fenilo e do p-

    iso-propilfenol, que reagem de forma semelhante ao p-terc-butilfenol, mas com

    rendimentos mais reduzidos. O p-cresol, o p-etilfenol, o p-fenilfenol, bem como fenis

    com grupos n-alquilo de cadeia longa em posies para tm tambm sido utilizados.

    A sntese dos calixarenos catalisada por base inicia-se com a formao do anio

    fenxido que ataca o grupo carbonilo do formaldedo resultando o hidroximetilfenol. Este

    condensa posteriormente com o fenol de partida, resultando em dmeros, trmeros,

    tetrmeros, etc. (equao 1.2). A desidratao entre pares de hidroximetilfenis pode

    tambm ocorrer levando formao de fenis ligados por pontes tipo ter dibenzlico

    (equao 1.3).4 Assim, obtm-se misturas contendo compostos lineares com pontes CH2

    e CH2OCH2 em diferentes graus de oligomerizao.

    O mecanismo para a ciclizao daqueles oligmeros lineares em calixarenos no

    totalmente claro. Contudo, Gutsche props as duas vias representadas na figura 1.3.4 A

    via A permite a formao do calix[4]areno e do dihomooxacalix[4]areno, enquanto que a

    via B apenas conduz formao do primeiro.

    Ao contrrio do que acontece na sntese de calixarenos por condensao direta,

    possvel obter-se calixarenos com substituintes diferentes nas posies para atravs da

    sntese em vrios passos. Este mtodo , contudo, mais demorado devido ao grande

    nmero de etapas e origina rendimentos totais muito baixos. Para combater estas

    desvantagens foram propostas snteses convergentes, que recorrem condensao de

    fragmentos reduzindo assim o nmero total de passos. A maioria destas snteses tem

    1.2

    1.3

  • 6

    sido direcionada para a produo de calix[4]arenos, embora tenham tambm sido

    aplicadas a calix[6] e [8]arenos.4

    Figura 1.3. Vias possveis para a formao de calix[4] e [8]arenos. Reproduzida da ref. 4.

    1.3. Propriedades

    1.3.1. Propriedades fsicas

    Os calixarenos precursores apresentam pontos de fuso muito elevados, de um

    modo geral acima dos 300 C. Estes valores aumentam com o aumento do tamanho do

    anel, apresentando geralmente os compostos mpares pontos de fuso inferiores aos dos

    pares. Este facto explicado pela existncia de grupos OH livres. Nos precursores pares

    todos os grupos formam ligaes de hidrognio intramoleculares, enquanto nos mpares

    existe um grupo hidroxilo que no as consegue formar.6 A introduo de substituintes,

    tanto na coroa inferior como nas posies para (ver ponto 1.4), afeta igualmente o ponto

    de fuso dos calixarenos.5

    Outra caracterstica muito relevante dos calixarenos precursores a sua

    insolubilidade em gua, mesmo em condies bsicas e a baixa solubilidade em

    solventes orgnicos.4 No entanto, so suficientemente solveis em solventes orgnicos

    comuns o que permite a sua caracterizao espectral. A solubilidade influenciada pela

    introduo de grupos substituintes nas coroas superior e inferior. O primeiro calixareno

    solvel em gua (5), contendo grupos cido carboxlico na coroa inferior, exibe uma

    solubilidade de cerca de 104 M. J os calixarenos 6, com grupos sulfonados na coroa

    superior, e o 7 exibem solubilidades bastante superiores ( 0,1 e 0,3 M, respetivamente).4

  • 7

    5 6 7

    A acidez dos calixarenos influenciada pelas ligaes de hidrognio

    intramoleculares presentes nestes compostos. A dissociao do primeiro proto nos

    calix[4]arenos d-se a valores de pH bastante baixos, quando comparados com os dos

    fenis correspondentes, pois a carga do monoanio formado estabilizada por fortes

    ligaes de hidrognio.2b Para os restantes pKa os valores so iguais ou superiores, visto

    que nestes casos a estabilizao dos ies por ligaes de hidrognio no capaz de

    contrariar as repulses electroestticas. Nos calix[5] e [7]arenos a rede de ligaes de

    hidrognio mais fraca do que nos calix[4], [6] e [8]arenos levando a que os valores da

    primeira constante de ionizao sejam mais baixos para os trs ltimos.12

    Os momentos dipolares de diversos calix[4]arenos foram obtidos atravs de

    estudos computacionais, os quais indicaram que estes decrescem na seguinte ordem de

    conformaes: cone > cone parcial > 1,2-alternada > 1,3-alternada (ver ponto 1.3.3).2c

    1.3.2. Propriedades espectrais

    As propriedades espectroscpicas dos calixarenos precursores so influenciadas

    pelas ligaes de hidrognio extremamente fortes que se formam entre os seus grupos

    OH, podendo esta fora ser estabelecida por IV ou por RMN de proto.2 Os calixarenos

    exibem absores de alongamento dos seus grupos hidroxilo a frequncias relativamente

    baixas, no intervalo de 3100 a 3500 cm1. No que diz respeito ao RMN de 1H, as ligaes

    de hidrognio intramoleculares provocam um aumento do desvio qumico do grupo OH,

    que tanto maior quanto maior for a fora dessas ligaes.2c

    Devido simetria existente nos calixarenos a interpretao dos seus espectros de

    RMN mais simples do que a dos seus homlogos acclicos. O espectro de RMN de

    proto do p-terc-butilcalix[4]areno temperatura ambiente apresenta singuletos para os

    protes dos grupos terc-butilo e hidroxilo, bem como para os protes aromticos e um par

    de dupletos para os protes CH2 das pontes, que assume o aspeto mais interessante e

    importante do espectro (figura 1.4). Verificou-se que este par de dupletos em clorofrmio

    e a 20 C colapsava para um singuleto a 60 C. Posteriormente, atravs de tcnicas de

    NOE, atribuiu-se o dupleto de menor desvio qumico aos protes equatoriais, mais

  • 8

    prximos dos anis aromticos, e o de maior desvio aos protes axiais, mais prximos

    dos grupos OH. Os espectros de 13C apresentam para os p-terc-butilcalix[n]arenos quatro

    linhas para as ressonncias correspondentes aos carbonos aromticos, uma para os

    carbonos metilnicos e duas para os carbonos do grupo terc-butilo.4

    Figura 1.4. Espectros de RMN de 1H do p-terc-butilcalix[4]areno em CDCl3: a) 20 C; b)

    temperatura varivel (zona metilnica).

    A espectrometria de massa e a cristalografia de raios-X permitem tambm obter

    importantes informaes estruturais para a caracterizao destes macrociclos. O primeiro

    espectro de massa de um calixareno foi obtido em 1964 por Erdtman, em Estocolmo.2c

    1.3.3. Propriedades conformacionais

    Um dos aspetos mais interessantes dos calixarenos poderem assumir diversas

    conformaes. Os calix[4]arenos podem existir em quatro conformaes mais estveis

    devido inverso dos anis fenilo relativamente ao plano mdio da molcula, como

    props Cornforth em 1955. Mais tarde, Gutsche atribuiu os nomes cone, cone parcial,

    1,2-alternada e 1,3-alternada a estas conformaes (figura 1.5). O aumento do nmero

    de unidades fenlicas leva ao aumento do nmero de conformaes mais estveis,

    apresentando os calix[6] e [8]arenos oito e dezasseis conformaes, respetivamente. J

    os calix[5]arenos apresentam o mesmo nmero de conformaes que os tetrmeros.5

    Figura 1.5. Conformaes mais estveis dos calix[4]arenos.

  • 9

    Nos dihomooxacalix[4]arenos o nmero de conformaes possveis aumenta

    devido existncia de uma ponte -CH2OCH2- que implica a perda de simetria da

    molcula comparativamente do calix[4]areno. Como tal, o composto 3 possui seis

    conformaes mais estveis sendo elas a cone, a cone parcial A, a cone parcial B, a 1,2-

    alternada, a 1,3-alternada e a 1,4-alternada (figura 1.6).13

    Figura 1.6. Conformaes mais estveis dos dihomooxacalix[4]arenos.

    No que diz respeito aos hexahomotrioxacalix[3]arenos, as trs pontes

    oxadimetilnicas conferem uma total simetria molcula, levando a que o composto 4

    apresente apenas duas conformaes mais estveis, a cone (trs planos de simetria) e a

    cone parcial (um plano de simetria) (figura 1.7).6

    Figura 1.7. Conformaes mais estveis dos hexahomotrioxacalix[3]arenos.

    Os calixarenos precursores so conformacionalmente mveis em soluo e

    temperatura ambiente. Kmmerer mostrou, por RMN de proto a temperatura varivel,

    que as quatro conformaes de um calix[4]areno eram convertveis entre si.2a,4 Assim, os

    estudos em clorofrmio mostraram que a ressonncia dos protes metilnicos

    apresentava-se como um par de dupletos a temperaturas inferiores a 20 C, os quais

    colapsavam para um singuleto a 60 C, como mencionado anteriormente (figura 1.4.b).

  • 10

    Este comportamento indica a existncia de uma interconverso entre uma conformao

    cone e a sua imagem no espelho, processo que ocorre rapidamente a altas temperaturas

    mas de uma forma lenta a temperaturas mais baixas.2c A temperaturas altas, o proto

    equatorial (HB) em A transforma-se em axial em B e vice-versa, produzindo apenas um

    sinal mdio no espectro de proto (figura 1.8).

    Figura 1.8. Interconverso da conformao cone num calix[4]areno.

    A inverso conformacional envolve a rotao dos grupos OH atravs do interior do

    anel, direcionando os p-substituintes para fora. No caso dos calix[4]arenos, o movimento

    de rotao contrrio, atravs da coroa superior, est impedido seja qual for o tamanho do

    substituinte na posio para. Estes substituintes tm assim pouca influncia na barreira

    de energia que leva inverso do anel. Em contrapartida, a polaridade do solvente, o

    tamanho do calixareno e a sua capacidade de formar ligaes de hidrognio

    intramoleculares tm uma elevada influncia na conformao adotada por cada

    macrociclo em soluo.2 semelhana do que acontece no estado slido, os calix[4], [5],

    dihomooxacalix[4] e hexahomotrioxacalix[3]arenos adotam tambm uma conformao

    cone em soluo, estabilizada por fortes ligaes de hidrognio intramoleculares.6

    Embora os calixarenos possuam capacidade para incluir variadas espcies

    qumicas, no apresentam cavidades rgidas devido sua mobilidade conformacional.

    pois necessrio fix-los, impedindo a inverso conformacional. Isto possvel atravs da

    introduo de grupos substituintes suficientemente volumosos ou estabelecendo pontes,

    nas duas coroas. Nos calix[4]arenos a rotao dos anis arilo impedida pela

    substituio dos tomos de hidrognio dos grupos hidroxilo por grupos de maior tamanho

    do que o etilo, tornando-se assim possvel fixar as quatro conformaes e isol-las como

    confrmeros estveis, os quais podem ser facilmente diferenciados por RMN de 1H

    (tabela 1, Apndice A).2,5

    No que diz respeito aos dihomooxacalix[4]arenos, cuja cavidade maior do que a

    dos calix[4]arenos, a inverso conformacional impedida pela substituio dos

    hidrognios dos grupos OH por grupos maiores do que o propilo. Estes compostos

    dihomooxa possuem seis conformaes mais estveis e apenas se conseguem distinguir

    por RMN de proto confrmeros com um plano de simetria (cone e 1,2-alternado), com

    A B

  • 11

    um eixo de simetria (1,3-alternado e 1,4-alternado) e nenhum elemento de simetria (cone

    parcial A e B) (tabela 2, Apndice A).4 No entanto, o RMN de 13C permite diferenciar os

    confrmeros com o mesmo elemento de simetria recorrendo regra de Mendoza que,

    embora enunciada para os calix[4]arenos, tem tambm sido aplicada com sucesso a

    outros oligmeros cclicos, incluindo os dihomooxa. Mendoza14 verificou que quando dois

    anis arilo adjacentes esto numa orientao syn (ambos para o mesmo lado) a

    ressonncia do grupo ArCH2Ar aparece a cerca de 31 ppm e quando esto numa

    orientao anti (um para cima e outro para baixo) a mesma ressonncia aparece a

    aproximadamente 37 ppm.

    No caso dos hexahomotrioxacalix[3]arenos, as suas duas conformaes so

    facilmente diferenciadas por RMN de proto, visto uma ser totalmente simtrica,

    apresentando trs planos de simetria (conformao cone) e a outra ter apenas um plano

    (conformao cone parcial).6

    1.4. Sntese de Calixarenos Funcionalizados

    Muito do interesse dos calixarenos surge pela sua potencial utilizao num grande

    nmero de aplicaes biotecnolgicas (ver ponto 1.7). Na maioria dos casos, esta

    depende no s do seu carcter para atuar como molcula hospedeira, mas tambm da

    presena de grupos funcionais apropriados que lhes iro conferir menor flexibilidade, de

    modo a possibilitar a incluso de espcies como anies, caties ou molculas neutras.

    Como tal, os calixarenos podem ser funcionalizados quer ao nvel da coroa superior, por

    reaes de substituio nas posies para, quer ao nvel da coroa inferior, por reaes

    dos grupos hidroxilo.2

    1.4.1. Reaes na coroa superior

    A funcionalizao da coroa superior comea com a remoo dos grupos terc-

    butilo das posies para atravs da reao de Friedel-Crafts inversa catalizada por AlCl3

    e na presena de um aceitador apropriado, como o tolueno. As posteriores reaes de

    substituio eletrfila, com vista introduo dos vrios grupos funcionais, no tm

    funcionado diretamente nos fenis, pelo que a maioria destas reaes d-se em

    derivados de teres alqulicos, particularmente o ter metlico. Contudo, tanto a

    sulfonao como a nitrao tm sido conseguidas diretamente a partir dos calixarenos

  • 12

    fenlicos e os derivados nitro obtidos tambm atravs dos compostos sulfonados

    (esquema 1.2).5

    Esquema 1.2. Funcionalizao da coroa superior de calixarenos.

    A remoo dos grupos terc-butilo por reao de Friedel-Crafts inversa no

    aplicvel aos p-terc-butilhomooxacalixarenos devido fragilidade da ligao ter

    dibenzlica em condies acdicas, o que promove a sua clivagem.4 Como tal, a

    introduo de diferentes grupos funcionais na coroa superior dos homooxacalixarenos

    tem que ser feita variando o substituinte para no fenol inicial.

    1.4.2. Reaes na coroa inferior

    A funcionalizao da coroa inferior muito importante, principalmente no domnio

    da qumica hspede-hospedeiro, dado que so os grupos substituintes desta coroa que

    vo determinar as afinidades da cavidade. A substituio dos tomos de hidrognio das

    funes hidroxilo por grupos maiores que impeam a rotao das unidades arilo pode ser

    feita por esterificao ou eterificao.5

    Os steres foram os primeiros derivados de calixarenos a serem obtidos. Este

    processo pode ocorrer em todos os grupos OH de um calixareno, utilizando um excesso

    de reagente, como o cloreto de acetilo ou o cloreto de benzolo e na presena de bases

    como a piridina, o NaH ou o AlCl3.5 Outras acetilaes tm sido feitas usando o anidrido

    actico na presena de H2SO4. A esterificao parcial tem tambm sido conseguida

    atravs do uso de halogenetos de cidos em quantidades limitantes e na presena de

    bases mais fracas ou utilizando reagentes mais volumosos.2c Relativamente aos teres,

    um mtodo til na sua obteno fazer reagir os calixarenos com halogenetos de alquilo

    em refluxo de THF/DMF na presena de NaH, uma vez que a alquilao completa dos

    grupos hidroxilo s conseguida se os reagentes em causa forem bastante reativos. Tm

  • 13

    sido sintetizados diversos teres metlicos, etlicos, proplicos, allicos, benzlicos, entre

    outros.5 Esta reao tem sido estudada de uma forma sistemtica para os

    calix[4]arenos,15 mas tambm tem sido utilizada com sucesso em macrociclos de ndice

    superior, como os calix[5],16 [6],17,18 [8],17,18 dihomooxacalix[4]13,19,20 e hexahomotrioxa-

    calix[3]arenos.19,21,22 A eterificao parcial tem sido efetuada atravs, por exemplo, do uso

    de bases mais fracas como o K2CO3 e o CsF. Compostos 1,3-di-substitudos tm sido

    obtidos na presena de diazometano e de tosilatos. Halogenetos de alquilo substitudos

    do tipo XCH2Y, onde X um grupo abandonante e Y um grupo funcional, tm tambm

    sido utilizados como agentes alquilantes, obtendo-se derivados com grupos ster (8a),23

    cetona (8b)23 ou amida (8c).24 A partir destes tm sido sintetizados outros derivados,

    como cidos carboxlicos (8d),25 cloretos de cidos, tioamidas (8e),26 etc. A utilizao de

    halogenetos de metilarilo contendo heterotomos tem levado a derivados com grupos

    metilpiridilo (8f).27 Derivados anlogos tm tambm sido obtidos a partir do p-terc-

    butildihomooxacalix[4]areno20,28-30 e do p-terc-butilhexahomotrioxacalix[3]areno.22,31

    Outra maneira de transformar a coroa inferior de um calixareno atravs da

    formao de calixcoroas,32 compostos nos quais uma unidade ter coroa liga dois tomos

    de oxignio fenlicos do calixareno. Compostos do tipo 9 so os mais conhecidos, mas

    tambm existem calixcoroas com pontes na coroa superior ligando duas posies para

    de dois anis arilo. J as reaes de calixarenos com reagentes bifuncionais podem

    conduzir a outras molculas macrocclicas mais complexas, como os calixesferandos, os

    calixcriptandos, os calixarenos duplos ligados por metais, entre outros.4

    1.5. Calixarenos Quirais

    Um dos principais interesses no uso de compostos desta famlia como molculas

    hospedeiras a sua potencial capacidade para reconhecimento quiral. Assim, pode-se

    dizer que a quiralidade uma das caractersticas mais importantes na utilizao dos

    08 a

    10 b

    10 c

    10 d

    10 e

    10 f 09

  • 14

    calixarenos como catalisadores, recetores ou sensores enantiosseletivos de molculas

    quirais, como as aminas e os aminocidos.

    Os calixarenos quirais podem ser obtidos pela introduo de substituintes quirais

    nas coroas superior ou inferior. Os calixarenos podem contudo apresentar outro tipo de

    quiralidade devido no planaridade da sua estrutura. Esta quiralidade intrnseca baseia-

    se na ausncia de um plano de simetria ou de um centro de inverso na molcula como

    um todo. Esta caracterstica resulta do modelo de substituio e/ou da conformao. No

    caso dos calix[4]arenos, a quiralidade intrnseca exige a introduo de pelo menos trs

    substituintes diferentes, se a molcula apresentar a conformao cone e pelo menos dois

    para as outras conformaes. Os tetrmeros cclicos quirais resultantes tero que ser

    conformacionalmente rgidos de maneira a poderem ser resolvidos nos respetivos

    enantimeros.5

    Como referido anteriormente, os dihomooxacalix[4]arenos tm uma simetria

    menor devido ponte oxadimetilnica, o que faz com que estes compostos possam ser

    inerentemente quirais mesmo que os seus substituintes sejam todos iguais. Para isso

    basta que adotem uma conformao cone parcial (totalmente assimtrica) ou as

    conformaes 1,3- ou 1,4-alternadas (eixo de simetria) e que os substituintes na coroa

    inferior sejam suficientemente volumosos para impedir a inverso conformacional.

    Quando estes compostos esto na conformao cone, a quiralidade intrnseca obtida

    com apenas dois substituintes diferentes, incluindo o grupo OH.4

    A quiralidade tem sido demonstrada atravs da utilizao de reagentes

    opticamente ativos, que na presena de calixarenos quirais duplicam os sinais no

    espectro de RMN de 1H. Alguns calixarenos tm sido resolvidos nos seus enantimeros,

    quer atravs de HPLC com colunas com fases estacionrias quirais, quer pela formao

    de diasteremeros.5

    1.6. Complexao em Soluo

    1.6.1. Espcies neutras e catinicas

    Os calixarenos precursores formam compostos de incluso no estado slido com

    diversas molculas e as suas estruturas so estabelecidas por cristalografia de raios-X.

    Em soluo, estes compostos exibem pouca ou nenhuma atividade ionofrica. Como tal,

    so os macrociclos derivados que executam o papel de molculas hospedeiras com

    capacidade para incluir e transportar ies e molculas neutras de forma seletiva.5

  • 15

    A interao entre calixarenos e molculas neutras tem sido estudada, como por

    exemplo no caso do p-terc-butilcalix[4]areno (1) com o tolueno e o clorofrmio, revelando

    complexos fracos e no seletivos. Calix[4]arenos sulfonados na coroa superior com

    funes cido carboxlico e contendo grupos hidroxilo na coroa inferior complexam

    acetonitrilo, acetona e etanol.12 O derivado sulfonado 10a, solvel em gua, extrai o

    fulereno C60 de uma fase orgnica para a gua. Todavia, as cavidades dos calix[5] e

    [6]arenos, bem como dos hexahomotrioxacalix[3]arenos, ostentam um tamanho mais

    apropriado incluso destes compostos, apresentando interaes fortes entre estes e os

    grupos OH dos calixarenos na conformao cone.33 Outros calixarenos solveis em gua,

    como os p-(dialilaminoetil)calixarenos 10b e os p-(carboxietil)calixarenos 10c, formam

    complexos moderadamente fortes com diversos hidrocarbonetos aromticos, em que a

    seletividade depende do tamanho do anel.4

    Tm sido sintetizados calixarenos ionofricos funcionalizados na coroa inferior

    com substituintes contendo grupos carbonilo de steres, cetonas e amidas e as suas

    propriedades de incluso estudadas atravs de experincias de extrao, de transporte a

    partir de membranas lquidas e da determinao de constantes de estabilidade,

    nomeadamente, com caties alcalinos e alcalino-terrosos.31,34-38 Os fatores mais

    relevantes que influenciam a afinidade demonstrada por um calixareno em relao a um

    catio so o tamanho, a conformao e a natureza dos grupos substituintes na coroa

    inferior.

    As principais concluses retiradas dos estudos mencionados anteriormente

    indicam que os derivados steres e cetonas dos calix[4], [5] e [6]arenos, bem como os

    anlogos dihomooxacalix[4] e hexahomotrioxacalix[3]arenos, tm preferncia pelos

    caties alcalinos relativamente aos alcalino-terrosos. Os calix[4] e os hexahomotrioxa so

    seletivos ao io Na+, os dihomooxa preferem o K+, os calix[5] mostram um patamar de

    seletividade K+-Rb+-Cs+, enquanto que os calix[6]arenos tm preferncia pelo io Cs+. De

    um modo geral, as cetonas so ligandos mais fortes do que os steres, embora estes

    ltimos sejam mais seletivos. As tetraamidas tercirias extraem e complexam de uma

    forma mais eficaz os ies alcalinos e alcalino-terrosos do que os ligandos referidos

    anteriormente, mas so menos seletivos do que os steres. Estes ligandos exibem maior

    10 a

    10 b

    10 c

  • 16

    afinidade para os caties alcalino-terrosos. Para alm dos ligandos neutros, derivados

    contendo grupos ionizveis tm tambm sido investigados. Os derivados cidos

    carboxlicos dos calix[4]arenos complexam os ies alcalino e alcalino-terrosos de uma

    maneira ainda mais eficaz que as correspondentes amidas, apresentando uma

    seletividade Ca2+/Mg2+ bastante elevada.

    A maioria dos derivados dos calix[4], dihomooxa e hexahomotrioxa contendo o

    grupo carbonilo apresenta uma conformao cone, na qual os grupos substituintes

    possuem um certo grau de pr-organizao, definindo uma cavidade hidrfila apropriada

    receo dos caties.4,5 Assim, um ligeiro movimento de rotao dos grupos C=O para o

    interior da cavidade coloca o nmero total de locais ligantes em torno do catio, como

    ilustrado na estrutura cristalogrfica de raios-X do complexo K+-p-terc-butilcalix[4]areno

    tetraacetamida (figura 1.9.a). A partir desta estrutura e com base em estudos de RMN, foi

    assumido que os complexos 1:1 idnticos apresentam uma estrutura semelhante em

    soluo. Os caties esto assim localizados no interior da cavidade formada pelos

    tomos de oxignio fenlicos e carbonlicos. Estes complexos io-macrociclo so

    suportados por atraes electroestticas io-dipolo, entre o catio e a extremidade

    negativa dos dipolos C-O e C=O (figura 1.9.b).5

    Figura 1.9. a) Estrutura cristalogrfica de raios-X do complexo (1:1) K+-p-terc-butilcalix[4]areno

    tetraacetamida; b) Localizao de um catio no centro da cavidade hidrfila de um calix[4]areno contendo grupos carbonilo.

    Caties de transio, pesados, lantandeos e actindeos tm sido extrados e

    complexados por calixarenos contendo grupos carbonilo,39-41 principalmente pelos

    derivados amida.24,37,38,42 Embora estes possuam tomos de oxignio doadores duros,43

    exibem contudo uma afinidade elevada para caties macios como o Ag+ e Pb2+, e uma

    preferncia razovel pelo Cu2+, de carcter intermedirio. Calixarenos contendo tomos

    doadores mais macios do que o oxignio, como o azoto (grupo piridilo)44-47 e o enxofre

    (tioamidas)26 tm sido estudados e favorecem a complexao com ies de transio e

  • 17

    pesados, mais macios. Derivados contendo tomos doadores de fsforo tm sido usados

    com eficcia na extrao de lantandeos e actindeos. Por exemplo, calix[4]arenos

    contendo derivados do tipo CMPO (xido de octil(fenil)-N,N-diisobutil-carbamoilmetil-

    fosfina, 11), um agente complexante de actindeos, mostraram resultados de extrao

    superiores aos obtidos apenas com o CMPO e preferncia pelo Th4+ em relao a

    diversos lantanneos.40 Calix[5] e [6]arenos derivados com grupos carboxlicos na coroa

    inferior e grupos sulfonados na coroa superior complexam de um modo seletivo o io

    uranilo (UO2+) presente na gua do mar.5

    11

    Calixarenos funcionalizados na coroa superior tm sido muito menos investigados

    ao nvel da complexao de ies. Existem porm alguns exemplos como os calix[4], [5] e

    [6]arenos substitudos com grupos CH2CH2NH2, SO3H, CH2PO3H2 e bipiridilo com

    afinidade para os metais de transio e, mais recentemente, calix[4]arenos com bases de

    Schiff, capazes de extrair caties de transio e pesados.5 As calixcoroas tm

    demonstrado propriedades ionofricas excelentes no que diz respeito aos caties

    alcalinos, exibindo grande seletividade. As calix[4]-coroas-4 exibem preferncia pelo io

    Na+, enquanto que as calix[4]-coroas-5 e -coroas-6 so seletivas para o K+ e o Cs+,

    respetivamente.32

    Os calixarenos tm igualmente capacidade para complexar caties orgnicos.4,6

    Por exemplo, o p-alilcalix[4]areno complexa a terc-butilamina atravs de uma

    transferncia de proto do calixareno para a amina. Derivados teres alqulicos dos

    calix[4], [6] e [8]arenos complexam caties tetraalquilamnio atravs de interaes catio-

    . Os calixarenos sulfonados na coroa superior e solveis em gua tm sido estudados

    na complexao de caties orgnicos contendo o grupo amnio. Os homooxacalixarenos

    precursores (compostos 3 e 4) so tambm capazes de complexar, de uma forma muito

    eficaz, ies de amnio quarternrio, como a acetilcolina.19 Os derivados dihomooxa 12

    contendo grupos teres (R = Bn, n-hexil ou Me)48,49 na coroa inferior complexam

    eficazmente caties alquilamnio lineares e ramificados, assim como caties di-n-

    alquilamnio. Vrias calixcoroas foram utilizadas para distinguir enantimeros de diversas

    aminas e aminocidos quirais.32 Outras tm mostrado uma complexao seletiva do

    catio n-BuNH3+, relativamente aos seus ismeros ramificados.50

  • 18

    1.6.2 Espcies aninicas

    Os anies desempenham papis fundamentais em processos biolgicos e esto

    presentes no ambiente, tendo uma importncia muito grande ao nvel da biotecnologia

    ambiental, farmacutica e industrial.51 Atualmente o desenvolvimento de recetores

    sintticos seletivos a anies assim uma rea de extrema importncia. Grande parte dos

    substratos enzimticos e co-fatores so aninicos e a m regulao de funes aninicas

    pode estimular o desenvolvimento de doenas como a fibrose cstica, o cancro e o

    Alzheimer. A nvel ambiental, anies como o nitrato e o fosfato, por exemplo, so

    responsveis pela poluio de cursos de gua e poos causando grandes danos para o

    meio ambiente e, consequentemente, para a sade humana.

    Como foi evidenciado no ponto anterior, as capacidades complexantes de

    calixarenos funcionalizados na coroa inferior tm sido estudadas extensivamente no que

    diz respeito a caties metlicos. Pelo contrrio, a complexao de anies tem sido menos

    investigada devido sua maior complexidade. Os anies, comparativamente aos caties,

    so maiores apresentando uma razo carga/raio menor o que leva a interaes

    electroestticas mais fracas. Para alm disto, exibem uma maior gama de geometrias e

    so dependentes do pH e da solvatao. Porm, nos ltimos anos, a sntese de

    calixarenos recetores de anies, assim como de outros macrociclos, tem tido um grande

    desenvolvimento.52,53

    Existem vrios tipos de recetores sintticos. No que diz respeito aos recetores

    inorgnicos, Beer e os seus colaboradores tm estudado estes sistemas utilizando

    unidades de cobaltoceno e ferroceno combinadas com grupos amida, para determinar

    electroquimicamente a complexao de anies. Foram obtidos derivados com unidades

    de cobaltoceno carregadas positivamente na coroa superior de um calix[4]areno, como

    o caso do recetor 13a com seletividade para o io H2PO4 relativamente aos anies

    HSO4 e NO3

    (Kass = 6380, 40 e 125 M1 em DMSO, respetivamente)54 e do calixareno

    substitudo na coroa inferior com grupos metilo (13b) com capacidade para complexar

    seletivamente dicarboxilatos.55 Ao contrrio dos recetores com cobaltoceno, os

    calixarenos anlogos substitudos na coroa inferior com unidades de ferroceno originam

    12 a

    10 b

    10 c

  • 19

    sistemas com ligaes de hidrognio neutras. Por exemplo, o recetor 14 seletivo para o

    H2PO4 na presena de um grande excesso dos anies HSO4

    e Cl.56

    Outros estudos tm-se debruado sobre calix[4]arenos substitudos com grupos

    amida e unidades bipiridina de rutnio (II) na coroa inferior, do tipo 15. A introduo

    destes grupos permite a deteo dos anies por tcnicas eletroqumicas, de UV-Vis e de

    luminescncia. O composto 15 seletivo para o Cl e para o Br, enquanto que os

    compostos 16a e 16b mostram uma seletividade maior para o H2PO4 (16b, Kass = 5,2 x

    103 M1 em DMSO), quando comparado com o HSO4 e Cl.52

    No que concerne aos recetores orgnicos,51, 52 estes utilizam grupos capazes de

    estabelecer ligaes de hidrognio, como as ureias, as amidas e os pirrolos. As unidades

    NH destes grupos formam ligaes de hidrognio efetivas e direcionais, qualidades

    indispensveis no design destes recetores.

    Derivados de calix[4]arenos di- e tetra-substitudos na coroa inferior com grupos

    ureia ou tioureia demonstraram seletividade para os anies halogenetos, particularmente

    para o Cl em CDCl3.57 Outras pesquisas mencionam tetrmeros cclicos como as

    13 a

    10 b

    14

    16 a 10 b

    15

  • 20

    calix[4]diquinonas 17 com grupos ureia que exibem maior seletividade para o anio

    tetradrico HSO4 relativamente aos anies Cl, H2PO4

    e CH3COO.58 Outro exemplo o

    de um calixareno duplo unido por dois grupos OCH2CO nas coroas inferiores que mostra

    seletividade para o F em relao ao Cl, HSO4 e H2PO4

    (1330, 172, 21 e 91 M1,

    respetivamente).2c Outros recetores com grupos amida na coroa inferior (18a e 18b)

    revelaram-se eficientes na extrao de ies dicromato de uma fase aquosa para uma

    fase orgnica, principalmente quando o recetor 18b incorporado num polmero.52

    Calix[4]arenos funcionalizados com grupos tioureia na coroa superior foram estudados

    quanto influncia da rigidez da cavidade na selectividade de anies. Os calixarenos

    mais rgidos, substitudos com dois teres coroa na coroa inferior, apresentaram maior

    afinidade para os anies esfricos mas pior para o anio H2PO4 do que os seus

    anlogos mais flexveis substitudos na coroa inferior com grupos propilo.59 Ungaro e

    colaboradores descreveram pptidocalix[4]arenos com seletividade para anies

    carboxilatos e potencial para reconhecimento quiral,52 como o caso do recetor 19 que

    exibe uma grande capacidade complexante para o anio BzO (Kass = 4,4 x 104 M1 em

    (CD3)2CO).

    As propriedades complexantes de dihomooxacalix[4]arenos contendo grupos ureia

    ou tioureia na coroa inferior (20-22) para com diversos tipos de anies foram

    determinadas por RMN de 1H em CDCl3.60, 61 Os resultados mostraram que as constantes

    de associao dependem fortemente da natureza do substituinte (alquilo/arilo) ligado ao

    grupo ureia e diminuiem com a diminuio da basicidade dos anies. A Ph-ureia 20c o

    melhor recetor de anies, exibindo a complexao mais forte para o anio F (log Kass =

    3,10) e tambm uma afinidade elevada para os oxoanies AcO e BzO (log Kass = 2,88 e

    2,93, respetivamente).60 A Ph-ureia 21c e a Ph-tioureia 22 exibiram seletividade para com

    os anies F, AcO, BzO e H2PO4.61 Apesar do aumento da acidez dos seus grupos NH,

    18 a

    10 b

    17

    19

  • 21

    a Ph-tioureia 22 foi, em geral, um recetor mais fraco do que a correspondente ureia 21c.

    As interaes estereoqumicas entre o tomo de enxofre maior e o grupo fenilo

    destabilizam a geometria cis requerida para a complexao dos anies.20 As Ph-tioureias

    apresentam assim uma menor pr-organizao do que as Ph-ureias, sendo portanto

    menos favorveis energeticamente.

    At aqui foram descritos recetores monotpicos de caties ou anies, mas mais

    recentemente tm sido sintetizados recetores heteroditpicos capazes de complexar

    simultaneamente o catio e o anio de um sal. O reconhecimento de pares inicos por

    este tipo de recetores afigura-se uma rea muito promissora na Qumica Supramolecular,

    uma vez que apresenta aplicaes importantes nas reas biolgica e analtica. Estes

    recetores conseguem combinar grupos electroatratores como amidas ou ureias, na

    mesma coroa, com grupos electrodoadores como teres coroa ou steres na outra coroa.

    Por exemplo, um derivado do calix[4]areno com quatro grupos etilster na coroa inferior e

    dois grupos ureia na coroa superior (23), s aps complexao do catio Na+ na coroa

    inferior capaz de se ligar a anies.62 A complexao do catio leva a uma alterao da

    conformao, o que conduz quebra das ligaes de hidrognio intramoleculares,

    impulsionando a complexao dos anies.

    As dihomooxa ureias 20c e 21c foram tambm testadas como recetores

    heteroditpicos para halogenetos de n-butilamnio atravs de titulaes por RMN de 1H

    em CDCl3.63 A incluso do catio n-BuNH3

    + na cavidade dihomooxa foi demonstrada pelo

    aparecimento das ressonncias do grupo alquilo na zona negativa do espectro, enquanto

    a complexao simultnea do anio halogeneto foi evidenciada pelo deslocamento para

    campo baixo dos desvios qumicos dos protes NH. Todos estes sistemas apresentaram

    constantes de associao muito elevadas (Kass > 109 M2). Estes derivados foram ainda

    avaliados quanto ao reconhecimento de monoaminas neurotransmissoras e aminas trao,

    na forma de cloridratos (figura 1.10).63 Os estudos por RMN de proto (CDCl3/CD3OD,

    20 a

    20 b

    20 c

    22

    21 a

    20 b

    20 c

  • 22

    10:1, 40 C) indicaram que a ureia 20c ligeiramente mais eficiente do que a 21c, mas

    ambas apresentam uma seletividade forte para a feniletilamina e a tiramina, cerca de 5 a

    10 vezes superior das outras aminas (20c, Kass = 4,1 x 104 e 3,6 x 104 M2,

    respetivamente).63

    Figura 1.10. Estruturas das monoaminas neurotransmissoras e aminas trao testadas na forma de cloridratos.

    Sensores qumicos fluorescentes foram desenvolvidos baseados em

    hexahomotrioxacalix[3]arenos, evidenciando as suas propriedades heteroditpicas.20 Por

    exemplo, o recetor 24 na conformao cone e incorporando unidades pireno (ligadas ao

    esqueleto calixarnico atravs de grupos triazol), mostrou capacidade para detetar e

    reconhecer ambos os ies Zn2+ e H2PO4 com diferentes sinais ticos. O complexo

    24Zn2+ evidenciou uma seletividade elevada para o anio H2PO4, atravs do aumento

    da emisso de excmero do pireno. O hexahomotrioxa 25, contendo unidades 2,2'-

    bipiridilo na coroa superior ligadas atravs de um grupo carbonilo e de grupos N,N-

    dietilacetamida na coroa inferior, mostrou capacidade para complexar dois caties

    alcalinos e um de transio, de um modo cooperativo. Estudos de RMN de 1H em

    CDCl3/CD3CN indicaram que este recetor heterotritpico complexa o catio Li+ na coroa

    inferior e o Na+ e o Ag+ na coroa superior.

    23 24 25

  • 23

    1.7 Aplicaes Biotecnolgicas

    As aplicaes dos calixarenos dependem da sua capacidade de complexar e

    transportar ies e molculas neutras de um modo seletivo, como foi dito anteriormente. A

    funcionalizao das coroas superior e inferior dos calixarenos, aliada grande variedade

    de tamanhos e conformaes das suas cavidades, permite o controlo da seletividade

    destes macrociclos, tornando-os muito versteis, com aplicaes em diversas reas.

    Estes macrociclos podem ser utilizados em separaes inicas e moleculares, como

    catalisadores, como sensores, como estruturas modelo para biossimuladores, entre

    outras reas.64

    A aplicao dos calixarenos em separaes inicas tem como foco o tratamento

    de resduos radioativos. Estes compostos tm sido usados na remoo de caties Cs+ e

    urnio (io UO22+) de misturas aquosas. A extrao de Cs+ de amostras que simulam

    resduos nucleares tem sido realizada por derivados calix[4]coroa-6.65 J a remoo

    seletiva do io UO22+ importante no tratamento de resduos nucleares, mas igualmente

    importante em questes energticas, devido grande relevncia do urnio neste

    campo.64 Diversas investigaes realizadas com os calixarenos 26 indicaram que estes

    so competentes na remoo de UO22+ da gua do mar e de meios extremos, muito

    cidos ou muito bsicos. O Sr2+ radioativo tem sido eficazmente extrado por derivados

    amida dos calix[4], [6] e [8]arenos, principalmente pelo composto 27a, que exibiu uma

    grande eficcia extractante, com seletividades Sr2+/Na+ acima de 20000. Derivados do

    tetrmero contendo unidades tipo CMPO na coroa inferior (27b) so eficazes na remoo

    de lantandeos e actindeos de solues teste para resduos nucleares.66

    No que respeita a separaes moleculares, os calixarenos tm sido usados como

    fases estacionrias. Por exemplo, o derivado hexaproplico do p-terc-butilcalix[6]areno

    ligado a uma matriz de slica-gel, revelou-se muito eficiente na separao de

    hidrocarbonetos aromticos policclicos (PAHs) e fulerenos, estando esta utilizao j

    patenteada.6

    26 a

    26 b

    26 c

    27 a

    26 b

  • 24

    Em catlise os calixarenos podem funcionar como agentes de transferncia de

    fase ou como recetores na simulao enzimtica. O calix[6]areno 28, por exemplo, foi

    utilizado como agente de transferncia de fase de um modo muito eficaz, tanto na

    catlise da reao de formao de teres, a partir de fenis e halogenetos de alquilo e

    arilo na presena de KOH (esquema 1.3.a), como na reao de formao de steres

    atravs de carboxilatos metlicos e halogenetos de alquilo (esquema 1.3.b).6 Os

    calix[6]arenos 29, solveis em gua, catalisam a reao de hidratao da 1-benzil-1,4-

    dihidronicotinamida (BNAH), um anlogo sinttico do dinucletido de nicotinamida e

    adenina no estado de oxidao reduzido (NADH). A catlise ocorre por um mecanismo

    idntico ao indicado para a hidratao do NADH, catalisada pela enzima gliceraldedo-3-

    fosfato-desidrogenase.67

    Esquema 1.3. a) Reao de formao de teres a partir de fenis; b) Reao de formao de steres a partir de carboxilatos metlicos e halogenetos de alquilo.

    As propriedades ionofricas dos calixarenos so a base da construo de vrios

    tipos de sensores, como os eltrodos seletivos de ies (membrana lquida de PVC). Foi

    construdo um eltrodo contendo o derivado tetrametil ster do calix[4]areno (30a) que

    demonstrou ser muito seletivo para o Na+, mais at que os eltrodos de vidro existentes

    no mercado.4 Na rea da sade, eltrodos incorporando o calix[4]areno 30b foram

    usados na determinao da concentrao daquele io no sangue.64 Foram tambm

    desenvolvidos eltrodos com seletividade para outros caties, como os derivados 30c e

    30d (estando o segundo j a ser comercializado) seletivos para o Cs+ ou para o Pb2+,

    respetivamente.68, 69

    a)

    b) 28

    29 a

    10 b

    30 a

    b

    c

    d

  • 25

    Os homooxacalixarenos tm tambm sido utilizados na preparao ISE.20 O

    derivado ter n-butlico 31a foi incorporado numa membrana lquida de PVC, tendo-se

    obtido um eltrodo muito seletivo dopamina relativamente a outras catecolaminas,

    como a adrenalina e a noradrenalina, assim como aos caties Na+ e K+. Um outro

    eltrodo contendo o ionforo 31b exibiu uma seletividade elevada para a serotonina

    comparativamente a outras aminas biognicas, bem como para caties orgnicos e

    inorgnicos. Alm disso, este eltrodo foi utilizado para monitorizar in situ a acumulao

    de serotonina em lipossomas.

    Os calixarenos tm tambm sido utilizados na produo de sensores ticos

    cromognicos ou fluorescentes, com capacidade para detetar e analisar ies ou

    molculas por alterao da cor ou da fluorescncia, respetivamente. O calixareno 32a em

    soluo de clorofrmio apresenta uma alterao na colorao (de amarelo para azul)

    quando em contacto com o catio Ca2+, o que representa uma elevada seletividade para

    com este io. Esta mudana de cor d-se a pH fisiolgico, permitindo a aplicao deste

    sensor em sistemas biolgicos.70 J o composto 32b consegue extrair seletivamente o

    io Hg2+ de uma fase aquosa para uma fase orgnica na presena de outros caties

    (como Ag+, Tl+, Cd+, Co2+, Ni2+, Zn2+, Pb2+, Cu2+ e Fe3+). Neste estudo o derivado 32b

    mostrou uma diminuio da fluorescncia, o que o leva a ser um timo candidato para a

    construo de sensores fluorescentes para o Hg2+.71

    Calixarenos com propriedades ticas no lineares tm sido utilizados no

    aperfeioamento de materiais que operem como guias de ondas, com potencial a serem

    aplicados em lasers, em dispositivos eletrnicos e de comunicaes.64

    Para alm da simulao enzimtica, as aplicaes dos calixarenos no

    reconhecimento de molculas com importncia biolgica estendem-se por diversos

    31 a

    10 b

    a b

    32

  • 26

    campos. A sntese e as aplicaes de calixarenos glicoconjugados representam uma

    nova funo para os calixarenos, em particular no que diz respeito ao seu papel

    tradicional como recetores inicos e moleculares.72 Experincias preliminares efetuadas

    por Dondoni e Marra mostraram que o composto 33 atua como um inibidor da

    hemaglutinao induzida pelo vrus BK. Em 2008, Mueller e colaboradores investigaram a

    captao e localizao de calix[4]arenos fluorescentes do tipo 34 em organelos celulares,

    conduzindo ao desenvolvimento de calix[4]arenes como sistemas de entrega de

    frmacos.

    A utilizao de calixarenos como uma ferramenta poderosa para o

    reconhecimento e separao de molculas bioativas, tais como aminocidos, pptidos,

    protenas, lecitinas, nucletidos, nuclesidos, sacridos e esteroides tem sofrido um

    avano significativo nos ltimos anos.72 O transporte de ies atravs das membranas

    um dos processos mais importantes em clulas vivas. Em 2007, Davis e colaboradores

    desenvolveram calix[4]arenos na conformao cone parcial (35a e 35b) para controlar o

    transporte transmembranar de Cl (esquema 1.4). Verificaram que o calixareno 35a

    permite o transporte transmembranar de Cl de uma forma muito semelhante ao

    mecanismo natural de transporte de ies atravs da membrana celular, enquanto o 35b

    inibe este processo. Como se pode verificar no esquema 1.4, este processo d-se

    atravs de um gradiente de pH que resulta da adio de uma soluo de NaOH

    extravesicular. A carga causada pelo efluxo de H+ ou pelo influxo de OH compensada

    pela entrada de caties ou pela sada de anies. O aumento do pH intravesicular,

    monitorizado por um corante (HPTS), reflete a taxa de permuta do eletrlito. Estes

    estudos permitiram o desenvolvimento de pequenas molculas que facilitam a troca de

    anies bicarbonato e cloreto atravs das membranas de lipossomas.

    Esquema 1.4. Representao esquemtica do transporte transmembranar de anies mediado pelo composto 35a.

  • 27

    sabido que a toxicidade um obstculo para a descoberta e desenvolvimento

    de frmacos potentes. No entanto, a maioria dos derivados de calixarenos testados

    mostrou pouca ou nenhuma toxicidade em modelos animais. Os calixarenos tm revelado

    atividades antivirais, antibacterianas, antifngicas, antituberculosas e anticancergenas.72

    Calixarenos sulfonados na coroa superior foram testados em ensaios in vitro e in

    vivo como agentes anticoagulantes e antitrombticos e exibiram propriedades similares

    s dos frmacos convencionais heparina e cumarina, mas ainda com menor risco de

    hemorragia.73

    A interao do fator de crescimento derivado das plaquetas com o seu recetor

    provoca o crescimento de tumores e da angiognese, pelo que a perturbao daquela

    interao deve levar reduo do seu crescimento.72 Hamilton descobriu um potente

    antagonista desta ao, atravs da sntese de uma srie de compostos baseados em

    calix[4]arenos do tipo 36.

    A co-infeco com os vrus da imunodeficincia humana (HIV) e o vrus da

    hepatite C (HCV) tornou-se num grave problema de sade pblica, que atinge mais de 10

    milhes de pessoas em todo o mundo. Recentemente, Hamilton descreveu uma srie de

    compostos (37a-g) baseados num tetrabutoxi-calix[4]areno, que possuem dupla inibio

    tanto para o HIV como para o HCV.72 Esta capacidade devida s unidades aromticas

    isoftalato e aos grupos di-cido na coroa superior, com actividade anti-HIV e anti-HCV,

    34 36

    33 35 a

    b

  • 28

    respetivamente. Dos compostos obtidos, o 37b foi o que exibiu a melhor atividade anti-

    HIV. Quando o grupo isoftalato foi substitudo pelo cido asprtico (37e), a atividade anti-

    HIV diminuiu cerca de 10 vezes, mas a atividade anti-HCV foi ligeiramente melhorada,

    enquanto que a citotoxicidade permaneceu a mesma. Isto sugere que os substituintes

    aromticos na coroa superior so melhores que os alifticos para a inibio do HIV,

    enquanto que a atividade anti-HVC no parece ser to sensvel a essa mudana. Alm

    disto, a conformao cone do esqueleto calixarnico de extrema importncia para a

    atividade antiviral.

    Para alm dos exemplos anteriores, vrios calixarenos funcionalizados tm sido

    referidos como possuindo atividade anticancergena.74 Devido sua forma tridimensional

    nica, os calixarenos podem formar complexos de incluso com molculas de frmacos

    com atividade anticancergena. A libertao controlada destes frmacos pelos

    calixarenos pode ter aplicaes em quimioterapia. Algumas destas aplicaes e outras no

    campo farmacutico encontram-se na tabela 1.1.

    Tabela 1.1. Aplicaes biomdicas de calixarenos

    Tipo Modificaes Atividade Mecanismo de ao

    Calix[4]areno

    Funcionalizado com grupos cido

    metilenodifosfnico e

    hidroximetilenodifosfnico

    Anti-obesidade

    e antidiabtica

    Inibe a protena

    tirosina fosfatase 1B

    Funcionalizado com grupos amina,

    metilo e guanidnio na coroa

    superior e grupos Pr, t-Bu, iso-Bu

    e iso-pentilo na coroa superior

    Anticancergena Inibidor da

    angiognese

    Funcionalizado com compostos de

    platina dinucleares Anticancergena

    Inibe o crescimento

    tumoral

    Funcionalizado com

    polietilenoglicol Anticancergena Terapia fotodinmica

    Funcionalizado com unidades

    timina/adenina 2'-

    desoxinucleotdeos

    Anticancergena

    e antibacteriana

    Inibe a replicao do

    DNA

    Calix[6]areno

    Modificao policatinica Anticancergena Inibe o cresc. tumoral

    Funcionalizado com grupo

    imidazol Anticancergena

    Regula o gene

    supressor de tumores

    Calix[8]areno p-sulfonados Anticancergena Evita a migrao e

    proliferao do tumor

  • 29

    A preocupao ambiental tem levado ao estudo dos calixarenos e dos seus

    derivados com potencial aplicao nesta rea. Existem estudos de nanomateriais

    baseados em calix[4]arenos tetraalquilados com capacidade para encapsular gases NOx

    (os quais tm grande interferncia no aquecimento global) de forma seletiva, reversvel e

    monitorizada pela mudana de cor.75

    1.8 Patentes

    Alm de todas as aplicaes referidas no ponto 1.7, existem mais de 1000

    patentes internacionais registadas, sendo cerca de metade patentes europeias que

    reiteram a utilizao dos calixarenos em reas como a indstria de materiais, a industria

    farmacutica ou no mbito ambiental e da sade.76

    A primeira patente foi registada por Izatt em 1984 e descreve um processo de

    recuperao de csio a partir de desperdcios radioativos, usando calixarenos

    precursores.77 Outras se seguiram, enunciando a remoo de metais de transio,

    pesados, etc., de diversos meios por ao dos calixarenos e seus derivados. Ao nvel da

    industria de materiais, muitas destas patentes descrevem a utilizao dos calixarenos em

    processos de produo de adesivos, tintas para cabelos, como aditivos para

    combustveis diesel, antioxidantes estabilizadores, sensores de temperatura, agentes de

    controlo de carga em torners e em aparelhos electrofotogrficos, entre outras.6

    Uma patente mais recente (2015) descreve a descoberta de uma composio

    fotossensvel que inclu uma resina e um derivado de calixareno sensvel radiao.78

    Este possui uma conformao com um local inico capaz de gerar um cido aps sofrer

    irradiao e um outro com pelo menos um grupo hidroxilo fenlico. A presente inveno

    pode ser aplicvel na fotofabricao e na fotolitografia, ajudando no processo de fabrico

    37

    a

    b

    c

    d

    e

    f

    g

  • 30

    em larga escala de materiais de alta capacidade como micro-fichas. Outra patente, esta

    de 2016, revela a utilizao de derivados de triazina como unidades de induo de

    vidro.79 Vrias aplicaes requerem hoje em dia o uso de materiais processados na forma

    vtrea, principalmente vidros inorgnicos ou polmeros. Molculas mais pequenas so

    tambm uma alternativa muito promissora, devido sua fcil purificao e

    caracterizao. Neste estudo, derivados de triazina conseguem formar fases vtreas que

    recristalizam extremamente devagar, fator importante para a obteno deste tipo de

    materiais. Estes compostos esto ligados covalentemente ao p-terc-butilcalix[4]areno,

    cujos grupos OH vo reagir com os derivados de triazina e ajudar na formao deste

    novo material.

    No que diz respeito s aplicaes biolgicas, destaca-se a patente que descreve a

    utilizao de sais de sulfonato- e acetato-calixarenos na deteo de colesterol contido em

    lipoprotenas de baixa densidade no soro humano.80 No campo farmacolgico,

    designadamente em anestesiologia, os p-sulfonilcalix[6] e [8]arenos foram utilizados

    como agentes quelantes de frmacos de induo de bloqueio neuromuscular.81 Outras

    patentes referentes a calixarenos com atividade biolgica, indicam-nos como sendo

    simuladores de pptidos que apresentam atividade bactericida, antiangiognica e

    antitumoral82 ou a sua utilizao em ensaios imunolgicos.83

    Na rea da sade, uma das patentes registada diz respeito possvel aplicao

    de neurotrofinas modificadas em diagnstico e os seus aspetos teraputicos.84 O estudo

    revela que as neurotrofinas sofrem modificaes que levam apoptose de clulas

    neurolgicas. Os calixarenos utilizados tm um papel de reconhecimento de anticorpos

    atravs da sua ligao s neurotrofinas modificadas, proporcionando agentes teis para o

    tratamento de doenas que envolvam dor crnica e/ou perda de neurnios.

    A nvel ambiental existem tambm diversas patentes que envolvem calixarenos.

    Para alm da j mencionada que utiliza derivados tetraalquilados de calix[4]arenos na

    deteo de gases NOx na atmosfera, uma patente muito recente (maio 2016) refere uma

    membrana polimrica sobre um suporte que inclui um polmero ligado covalentemente a

    um calix[4]areno.85 Este funcionalizado com pelo menos um grupo amina e forma uma

    fase dispersa embebida na matriz do polmero. Estas membranas podem ser usadas

    como filtros, ou quando aplicadas sobre outra membrana, formar uma camada de reforo.

    A filtrao por membranas com base em osmose inversa uma das tcnicas mais

    promissoras para dessalinizar gua do mar ou gua salobra, mas o grande fluxo de gua

    sobre a membrana leva reduo da energia operacional global durante o processo.

    Estas membranas melhoram o fluxo de gua e, consequentemente, o rendimento do

    processo, mantendo uma afinidade elevada para com o sal.

  • 31

    2. RESULTADOS E DISCUSSO

    2.1. Homooxacalixarenos Funcionalizados com Grupos Ureia ou

    Tioureia na Coroa Inferior

    Um dos objetivos deste trabalho foi a sntese de novos homooxacalixarenos,

    nomeadamente dihomooxacalix[4]arenos e hexahomotrioxacalix[3]arenos, fluorescentes

    recetores de anies. Como tal, pretendeu-se introduzir grupos ureia ou tioureia e

    unidades fluorognicas de naftaleno na coroa inferior dos calixarenos atravs de um

    espaador com quatro tomos de carbono. De modo a avaliar a influncia do nmero de

    ligaes de hidrognio doadores dos ligandos, sintetizaram-se derivados bidentados e

    totalmente substitudos.

    2.1.1. Bis[[(naftilureia/naftiltioureia)butil]oxi]-dibutoxi-dihomooxa

    calix[4]arenos

    2.1.1.1. Sntese

    Partindo-se do p-terc-butildihomooxacalix[4]areno (3) e atravs da sequncia

    reacional em quatro passos (esquema 2.1) anteriormente usada na obteno de

    compostos anlogos,60 obtiveram-se os derivados bidentados naftilureia (41) e

    naftiltioureia (42) pretendidos. Primeiramente, tratou-se o calixareno precursor 3 com 2

    equivalentes de 4-bromobutironitrilo e K2CO3 em refluxo de acetonitrilo durante 6 dias.

    Obteve-se, a partir desta reao, uma mistura de dois compostos di-substitudos, o

    derivado 1,3-diciano-dihidroxilo (38a), composto maioritrio, e em menor quantidade o

    derivado 3,4-diciano-dihidroxilo (38b). A separao dos compostos foi conseguida

    recorrendo-se a uma cromatografia em coluna.

    O composto 38a foi posteriormente alquilado com 1-iodobutano e NaH em

    THF/DMF, obtendo-se o derivado diciano-dibutoxi 39 na conformao cone (produto

    maioritrio) e um ismero conformacional na conformao cone parcial A (produto

    minoritrio). O composto 39 (conformao cone) foi reduzido com borohidreto de sdio e

    cloreto de cobalto em metanol dando origem diamina 40, a qual reagiu de imediato com

    1-naftil-isocianato ou 1-naftil-isotiocianato em clorofrmio, obtendo-se os derivados

    naftilureia 41 ou naftiltioureia 42, respetivamente, ambos na conformao cone.

  • 32

    3

    3

    8a

    38b

    39

    4

    0

    41

    42

    Esq

    uem

    a 2

    .1. V

    ia s

    int

    tica

    para

    a p

    rep

    ara

    o d

    os d

    erivados b

    identa

    dos u

    reia

    41 e

    tio

    ure

    ia 4

    2.

  • 33

    No caso dos composto 42, no foi possvel contudo obter-se este derivado com a

    pureza necessria aos posteriores estudos de complexao. O resduo obtido aps

    cromatografia em coluna era composto por duas fraes (A e B), ambas com tioureia

    mais impurezas. A frao A, com mais impurezas e com maior quantidade, foi sujeita a

    uma nova cromatografia em coluna, tendo-se obtido uma frao A1, mais pura do que a

    anterior, mas ainda no satisfatria para a continuidade dos estudos. Posteriormente,

    juntaram-se as fraes mais puras, A1 e B, e foram feitas vrias tentativas de

    recristalizao, mas sem sucesso. Estas fraes foram evaporadas secura e em

    seguida foi realizada uma terceira cromatografia em coluna. O resduo obtido continha

    ainda uma pequena percentagem de impurezas, pelo que no foram feitos estudos de

    complexao com a naftiltioureia 42, apenas foi feita a sua anlise conformacional por

    RMN. Pensa-se que com uma nova sntese seguida de uma purificao por

    cromatografia em coluna usando um eluente ainda menos polar, se consiga obter este

    composto suficientemente puro a fim de se estudarem as suas propriedades

    complexantes de anies.

    2.1.1.2. Anlise estrutural

    Todos os dados espectroscpicos dos compostos 38-40 esto de acordo com os

    publicados na referncia 60. Apresenta-se contudo um resumo da anlise conformacional

    desses compostos, salientando-se os dados de RMN de 13C.

    As ressonncias dos tomos de carbono do grupo ArCH2Ar do composto 38a

    apresentam desvios de 29,3, 30,0 e 32,7 ppm indicando que este derivado est na

    conformao cone, de acordo com a Regra de Mendoza,14 como referido anteriormente.

    O derivado 1,3-diciano (38b) apresenta tambm uma conformao cone de acordo com

    as ressonncias dos seus tomos de carbono para o mesmo grupo ( 30,7 e 31,6,

    correspondendo a um e dois tomos de carbono, respetivamente). A formao

    preferencial do derivado 38a era a esperada, pois assume-se que a substituio se d

    passo a passo, com a substituio de um grupo hidroxilo de cada vez (figura 2.1).30 A

    formao preferencial de I ocorre muito provavelmente devido menor distncia das

    ligaes de hidrognio entre o anio fenxido e o grupo OH, o que confere uma maior

    estabilidade carga negativa do anio formado (figura 2.2). O segundo passo da

    alquilao origina preferencialmente o derivado Ia em que o anio fenxido C

    estabilizado por duas ligaes de hidrognio, enquanto que os intermedirios D e E tm

    capacidade para formarem apenas uma ligao(figura 2.2).

  • 34

    Figura 2.1. Possveis vias para a formao de derivados di-substitudos (setas a tracejado indicam percursos reacionais menos provveis). Reproduzida da ref. 30.

    O derivado diciano-dibutoxi 39 foi obtido numa mistura de conformaes: cone e

    cone parcial A, como j foi mencionado. Para o produto maioritrio, as trs ressonncias

    do grupo ArCH2Ar aparecem volta de 30 ppm, indicando a conformao cone, j para o

    produto minoritrio, estas aparecem uma a cerca de 39 ppm e as outras duas a 30 ppm

    evidenciando a conformao cone parcial A.

    Figura 2.2. Ligaes de hidrognio em anies fenxido do calixareno precursor (A e B) e em derivados mono-substitudos (C, D e E).

    Depois da obteno do derivado diamino-dibutoxi 40, este reagiu de imediato com

    o objetivo de se obterem a ureia 41 e a tioureia 42. No caso da naftilureia 41, este

    composto no apresenta qualquer elemento de simetria, sendo inerentement