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3 GENÉTICA Respire fundo! O amor está no ar! 4 A arte e a técnica de fabricar instrumentos musicais LUTERIA 18 LIVROS-REPORTAGEM www.feiradecursos.ufpr.br Edição Especial - Jornalismo Científico Agosto de 2010 Assassinatos, pé na estrada, torcidas organizadas e outras histórias reais Notícias da O amor, o passado, os vírus minùsculos, a nanotecnologia, a água, o meio ambiemte, ufa...Na UFPR tudo pode virar conhecimento. Aceita o desafio? O MUNDO DA PESQUISA PERTINHO DE VOCÊ

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Ano 9 | Agosto de 2010 | Edição especial da UFPR: Feira de Cursos e Profissões

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Page 1: Notícias da UFPR

3 GENÉTICARespire fundo! O amor está no ar! 4 A arte e a técnica de fabricar

instrumentos musicais

LUTERIA 18 LIVROS-REPORTAGEM

www.feiradecursos.ufpr.br Edição Especial - Jornalismo CientíficoAgosto de 2010

Assassinatos, pé na estrada, torcidas organizadas e outras histórias reais

Notícias da

O amor, o passado, os vírus minùsculos, a nanotecnologia, a água, o meio ambiemte, ufa...Na UFPR tudo pode virar conhecimento. Aceita o desafio?

O MUNDO DA PESQUISA PERTINHO DE VOCÊ

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Agosto2010

O jornal Notícias da UFPR é uma publicação da Assessoria de Comunicação Social da Universidade Federal do Paraná.Rua Dr. Faivre, 405 - CEP: 80060-140 Fones: 41 3360-5007 e 41 3360-5008 Fax: 41 3360-5087 E-mail: [email protected]

Reitor Zaki Akel Sobrinho | Vice-Reitor Rogério Mulinari | Pró-Reitor de Administração Paulo Roberto Rocha Kruger | Pró-Reitora de Extensão e CulturaElenice Mara de Matos Novak | Pró-Reitora de Gestão de Pessoas Larissa Martins Born | Pró-Reitora de Graduação Maria Amélia Sabbag Zainko

Pró-Reitora de Planejamento, Orçamento e Finanças Lúcia Regina Assumpção Montanhini | Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Sérgio ScheerPró-Reitora de Assuntos Estudantis Rita de Cássia Lopes | Chefe de Gabinete Ana Lúcia Jansen de Mello Santana.

Assessor de Comunicação Social e Jornalista Responsável Mário Messagi Júnior - Reg. Prof.: 2963 | Edição geral Myrian Regina Del Vecchio de Lima Projeto Gráfico e Diagramação Juliana Karpinski| Capa Bernardo Staut e Juliana Karpinski (Einstein em Pop Art) | Revisão Ciro Campos

Impressão Imprensa Universitária - Rua Bom Jesus, 650 | Tiragem 20 mil exemplares

A difusão do conhecimento tornou-se uma das facetas mais relevantes do trabalho de pro-dução científica. As instituições voltadas para a pesquisa, sobre-tudo as financiadas com recursos públicos, têm, hoje, não apenas o desafio de produzir conhecimen-to, mas também de comunicá-lo, de prestar contar e de dissemi-nar ciência.

O jornalismo científico é uma das facetas deste trabalho de disseminação. Esta edição do Notícias da UFPR, voltada para a juventude pré-universitária, pre-tende contribuir na divulgação da pesquisa realizada na UFPR, mas há dois outros fatores que são fundamentais também.

Por um lado, mostrar aos jo-vens que a UFPR não é apenas um conjunto de cursos, mas tam-bém uma instituição voltada para a produção do conhecimento. Assim, os alunos terão forma-ção profissional na mais antiga universidade do Brasil, mas tam-bém entrarão em contato com a produção do conhecimento em diversas áreas, podendo partici-par deste processo e até mesmo iniciar aqui carreiras bem-suce-didas como pesquisadores.

Por outro lado, esta edição é fruto da parceria da Assessoria de Comunicação Social com o curso de Jornalismo da UFPR. Os textos, produzidos e edita-dos pelos alunos do curso, sob supervisão de docentes da área, são parte fundamental de seu processo formativo.

É uma forma de mostrar os talentos da UFPR. E eles não são poucos. Além disso, estamos levando a ciência às pessoas ao mesmo tempo em que apoiamos a formação de profissionais que tenham competência e interesse na área de jornalismo científico.

Pesquisa, uma ideia para seu futuro

Editorial

Parceria pela ciência

Olá vocês,Esta é uma edição especial do Jornal da UFPR. Eu diria, muito

especial. Ela foi elaborada, com cuidado, por dez estudantes de Jorna-lismo da universidade, que produziram matérias sobre resultados ou temáticas de pesquisa que povoam os laboratórios, corredores e salas de aula da instituição. Os meninos e meninas do jornalismo produzi-ram estes textos pensando em vocês, outros milhares de meninos e meninas, que neste momento se preparam para tentar uma vaga na UFPR. E mais do que isto: ainda se perguntam sobre a escolha de uma profissão que seja mais do que que uma forma de garantir economica-mente o futuro, mas que se transforme em um modo de viver a vida pessoalmente gratificante e útil para a sociedade e o planeta.

Mesmo sem poder abarcar todas as áreas do conhecimento de nos-sa universidade, tentamos aqui, com este recorte de temáticas (gené-tica, biologia celular, luteria, saúde e ambiente, engenharia elétrica, arquitetura, nanotecnologia, ecotecnologia, arqueologia, jornalismo e línguas), mostrar as possibilidades da pesquisa. Ou seja: a idéia não é enaltecer esta ou aquela área, mas sim acentuar o mundo de caminhos e alternativas em pesquisa científica que o ingresso na universidade oferece ainda mesmo na graduação, por meio das práticas de iniciação científica, trabalhos de conclusão de curso e interação professor-pes-quisador/aluno; e no seguir adiante da pós-graduação, em torno dos mestrados e doutorados.

Também faz parte desta edição especial, a consciência da necessi-dade permanente de divulgar ciência e conhecimento, disseminando seus resultados e construções para que atinja pessoas de todas as idades e profissões, de forma a permitir novos olhares sobre o mun-do e seus fenômenos. Esta é uma missão fundamental do Jornalismo Científico, que pauta esta edição.

O jornal também resume o resultado de um exercício didático-pe-dagógico, realizado, em parte, durante a disciplina optativa de “Jorna-lismo Especializado”, do curso de Jornalismo, durante o primeiro se-mestre de 2010; e em outra parte, durante as experiências de alunos de jornalismo em práticas e estágios profissionais diversos.

A gente espera que vocês gostem das matérias e, sobretudo, que elas lhes inspirem, ainda com mais força e dedicação, no objetivo de adentrar na Universidade Federal do Paraná. Aqui, onde além das sa-las de aula, existe um mundo de possibilidades de construção do co-nhecimento, por meio da pesquisa em Ciência.

Myrian Del Vecchio de Lima,Jornalista e professora do Curso de Comunicação Social da UFPR

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ApresentAção

Zaki AkelReitor da UFPR

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Agosto2010 GenéticA

Se naquela balada do final de semana você levou um fora e não sabe o porquê, não se preocupe. A explicação pode estar nos seus genes. Mais precisamente na região cro-mossômica responsável pelo sistema imunológico. Isso pode parecer muito estranho aos nossos ouvidos, mas, de acordo com evidências cientí-ficas, essa região cromossômi-ca, aparentemente inocente, pode exercer um papel decisi-vo na escolha de um parceiro.

As pessoas, inconsciente-mente, tendem a escolher, pelo olfato, parceiros com consti-tuição genética da região do DNA que controla o sistema imunológico bastante diferente da sua. Essa foi a conclusão de uma pesquisa do Laboratório de Imunogenética e Histocompa-tibilidade do Departamento de Genética da Universidade Fede-ral do Paraná (UFPR), apresen-tada no Congresso da Sociedade Européia de Genética Huma-na, em Viena, Áustria.

“O sistema imune é uma ferramenta biológica que evolutivamente foi moldada para a defesa do organismo contra a invasão de agentes es-tranhos, como vírus e bactérias”, conta a ge-neticista Maria da Graça Bicalho, coordenadora do es-tudo. Até hoje a ciência não tem conhecimento de uma região tão diversificada do genoma humano quanto a do MHC – Complexo Principal de Histocompatibilida-de, na sigla em inglês. “Essa variabilidade influencia uma maior resistência imuno-lógica”, aponta Bicalho. “O que é vantajoso para a espécie humana,

pois quanto maior a variabilidade genética, maior a defesa do orga-nismo e a chance de perpetuação da espécie”.

Os diferentes se atraem

Como em uma conhecida lei da física moderna – lembra-se da Lei de Coulomb? –, os diferen-tes de fato se atraem na genética humana, e o olfato desempenha um papel central no processo. Uma das hipóteses levantadas seria a de que moléculas do MHC parcialmente degradadas e presentes nos fluidos corpo-rais volatizariam, como se fos-sem perfumes, e seriam capta-das por receptores olfativos. De acordo com os pesquisadores, o odor corporal seria uma das referências para identificar pos-síveis parceiros geneticamente distintos, à semelhança de fero-mônios (substâncias químicas que permitem que dois seres da mesma espécie se reconheçam e tenham relações).

De acordo com a geneticista da UFPR, este odor corporal é extremamente sutil e caracte-rístico do MHC. “Os seres hu-manos o percebem por meio de um ‘nariz primitivo’ ligado ao sistema límbico (região cerebral responsável pelo processamen-to das emoções)”.

A pesquisa analisou o MHC de 90 casais casados e cruzou os dados aleatoriamente, formando 152 casais virtuais. De acordo com João Carlos Magalhães, bi-ólogo do Departamento de Ge-nética, os indivíduos dos casais reais têm grande diferença no Complexo, além do que era es-perado. “Eles tiveram uma dife-rença de até 3,6 %, que, embora pareça pequena, evolutivamen-te é bastante significativa”.

O próximo passo da equipe é investigar a morfologia facial como um outro sinal possivel-mente associado ao MHC e in-vestigar a influência de pistas visuais na escolha do parceiro

As regras do amor são mais complexas do que imaginamos: as diferenças genéticas percebidas pelo olfato podem influenciar na escolha de parceiros sexuais

Luan [email protected]

com MHC diferente.Camisetas suadas: termômetrO da atraçãO

Os pesquisadores lembram do primeiro estudo do gênero, feito em 1995, na Universidade de Berna, Suíça, pelo biólogo Claus Wedekind. Camisetas de algodão foram dadas para uni-versitários do sexo masculino usarem por duas noites segui-das, na hora de dormir. Durante o período, eles se abstiveram de fumo, sexo, desodorante e alguns alimentos. Depois do segundo dia, as camisas foram postas em caixas e um grupo de estudantes do sexo feminino foi convidado a, literalmente, cheirar as camise-tas e avaliar os odores.

Surpreendentemente, as mulheres preferiram odores de homens com MHCs diferen-tes dos delas. Até hoje, esse famoso experimento é conhe-cido como “the sweaty T-Shirt study” (estudo da camiseta su-ada). Embora não conclusivo, o resultado da pesquisa suíça foi, ao menos, provocativo.

“Repetimos esse experimen-to em 2005 na UFPR”, conta Bicalho. Mas, em vez de ca-

misetas, usamos colares com sachês de algodão. “Com o teste do cheiro, chegamos a conclusões muito semelhan-tes às dos pesquisadores su-íços”, explica a cientista.

A geneticista da UFPR reconhece que os mecanis-

mos de atração em humanos não podem ser reduzidos a pa-drões genéticos. Diferente de outros seres, temos uma série de fatores culturais e psicológicos que influenciam nossas escolhas. Mas os componentes biológicos de uma escolha não podem ser ignorados. Se pudessem, Darwin, onde quer que esteja, estaria

muito decepcionado. Afinal, como Bicalho lembra, somos parte do reino animal.

O Amorestá no ar D

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Uma arte que também é ci-ência. Assim é a luteria, ofício que dá vida à madeira bruta e faz dela instrumentos de corda, como violinos, violas e violon-celos, contrabaixos, violões e alaúdes. Por trás do encanto das melodias esconde-se um sofisticado trabalho braçal, ba-seado em técnicas construtivas de tradição secular. Há tempos esse saber é transmitido de mestre para discípulo. Agora o aprendizado está disponível em salas de aula, pois a UFPR fundou recentemente o primei-ro curso superior do gênero na América Latina.

“Em todo o mundo, há pou-cos cursos de luteria”, diz Le-

andro Mombach, mestre lutier e mentor da nova graduação. No âmbito do ensino superior, há cursos apenas na Alemanha, Es-tados Unidos e Itália. As demais iniciativas vêm de pequenas es-colas, que atendem um número limitado de alunos. No Brasil, a formação em luteria é ofertada no Conservatório Dramático Musical Dr. Carlos de Campos, em Tatuí (SP), e no ateliê do lutier Túlio Lima, em Petrópo-lis (RJ). “Mas são cursos com uma série de limitações”, diz Mombach. O curso da UFPR é direcionado para a confecção de instrumentos de corda tanto para orquestra (violinos, vio-las, violoncelos e contrabaixos) quanto para a execução de mú-sica popular brasileira (violão,

bandolim, cavaquinho e viola caipira, entre outros) – o que o torna um dos cursos mais com-pletos do gênero.

A formação do lutier é pro-fundamente interdisciplinar. “Para se tornar um profissio-nal, é necessário aprender desde botânica e química até desenho e técnicas de restau-ração museológica”, afirma Mombach. “Além de muita te-oria musical, é claro!”

dandO vida à madeira

O primeiro passo na cons-trução de um bom instrumento é selecionar a matéria-prima. “É preciso escolher a madeira certa, com configuração celular especial”, revela Mombach. A luteria trabalha com árvores

de regiões frias, em especial do hemisfério norte. Lá, como o inverno é longo, a madeira cresce mais devagar, apresen-tando anéis de crescimento bem condensados. “O parên-quima [tecido relacionado com armazenamento e distribuição de substâncias nutritivas] fica mais denso. A madeira, mais dura, e também mais sonora.”

Há outro segredo ainda: a árvore deve ser cortada no in-verno. E em seções radiais – isto é, todos os cortes devem passar pelo cerne do tronco, o que garante maior estabilida-de à madeira. Outra regra de ouro da luteria é que cada ins-trumento deve ser construído com madeira da mesma árvo-re. As melhores madeiras vêm

O primeiro curso de luteria da América Latina ensina o delicado ofício de construir instrumentos como violinos, violoncelos e contrabaixos.

Mas também ensina a confecção dos populares violões, bandolins, cavaquinhos e violas caipiras

Dar vida à madeira para fazer música

Henrique [email protected]

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dos bordos (como Acer plata-noides) e pinhos (como Picea abies), originários de países setentrionais. Mombach lem-bra que, ao beneficiarmos 1 metro cúbico de madeira para produzir móveis, o valor agre-gado ao produto é de cerca de R$ 20 mil. Mas beneficiando o mesmo volume de madeira para a construção de instru-mentos musicais, esse valor pode ultrapassar R$ 200 mil.

Escolhida a boa matéria-pri-ma, a etapa seguinte é trabalhar no projeto acústico do instru-mento. É quando se definem detalhes como desenho, volu-me de ar na caixa e espessura dos tampos. “Quanto menor a massa do instrumento, mais sensível à vibração da corda ele será”, explica Mombach. “Isso significa que ele responderá mais prontamente aos coman-dos do músico, com mais brilho e volume.”

O passo seguinte é a prepa-ração artesanal dos vernizes. São receitas tradicionais e cada lutier desenvolve a sua. “Faze-mos vernizes que duram sécu-los, e para cada região do mundo há um tipo específico, que varia segundo o clima local.” Além do verniz, o lutier aplica substâncias mineralizantes que atuam nos poros da madeira, cristalizando e criando pontes entre as mo-léculas para preencher espaços vazios. “Assim fortalecemos o instrumento.” Esses processos químicos já eram pesquisados na Roma Antiga, para fabricar armas como balestras, catapultas e aríetes. Mombach conta que, como era preciso estocar as ar-mas e mantê-las em bom estado, a ciência bélica da época desen-volveu esses métodos de preser-vação – que os lutiers da tradição italiana passaram a usar em seus instrumentos.

Após os processos quími-cos, o instrumento finalmente é montado em uma delicada marcenaria. A finalização de um violino pode exigir até seis meses de trabalho. E os custos são altos. “Um ateliê completo de luteria pode ser três vezes mais caro que um consultório odontológico de última gera-ção”, diz Mombach. Ferramen-

tas como goivas, plainas, for-mões e serras específicas para a atividade, forjadas à mão, são caras e disponíveis em poucas lojas do mundo.

a harmOnia da natureza

Há séculos se discute qual é o segredo de um instrumento perfeito. Mitos já foram criados e lendas ainda perduram. Mom-bach explica que o mistério está nos números. “A harmonia de um instrumento resulta das proporções entre seus elemen-tos formais.” Um dos segredos é o uso da progressão áurea, baseada em um número extra-ído da sequência de Fibonacci. Trata-se de uma constante real algébrica irracional expressa pela letra grega φ (fi), com va-lor aproximado de 1,618.

Não é um número mágico. É apenas um valor que os mate-máticos observam nos variados detalhes da natureza: a geome-tria do casco de um caracol; a angulação do crescimento de folhas ao redor de um galho; a própria razão entre as me-didas dos membros de um ser humano. Em todos os casos se aplica a razão 1.618, que já era conhecida dos sábios antigos. Para exemplificar uma aplica-ção desse número, Mombach cita as falanges dos dedos. “Se você medir sua falange maior e dividir por 1,618, terá o tama-nho de sua falange média. Se fizer o mesmo com a falange média, terá o tamanho da falan-ge menor.”

Leonardo Fibonacci (1170-1250), matemático italiano, viajou para o oriente e de lá trouxe o conhecimento acer-ca de tais proporções, muito usado ao longo da história da arte. “Bom exemplo disso é a arquitetura do Parthenon, ba-seada em retângulos que res-peitam a proporção ensinada por Fibonacci”, conta Momba-ch. “As pinturas renascentistas também consideravam tais re-lações.” Na luteria não foi dife-rente. Ao construir um violino ou outro instrumento, a razão entre suas medidas deve res-peitar as mesmas regras. “Elas aproximam o instrumento das leis da natureza.”

A origem da luteria se perde na aurora dos tempos. Instrumentos de cordas existem há pelo menos quatro mil anos, mas no Ocidente tudo co-meçou com o alaúde. O instrumento chegou na Europa lá pelos idos do século IX, trazido pelos mouros com o nome de oud; em pouco tempo ficou conhecido como lut (na França) e liuto (na Itália). Daí a origem do termo liuteria, ou simplesmente luteria. Embora o nome remeta apenas ao alaúde, a técnica se refere à construção de instrumentos de corda em geral.

Com o surgimento das grandes orquestras e amplas salas de concerto, o velho oud, com seu som tímido, imortalizou-se em passado. Os ins-trumentos de arco, de sonoridade imponente e projeção mais vibrante, roubaram a cena. No sé-culo XVI, a luteria viveu anos de ouro, com auge na Renascença e no Barroco. “São do período os primeiros violinos produzidos no formato seme-lhante ao conhecido hoje”, diz Mombach.

Na Itália essa tradição construtiva teve seus maiores mestres. As cidades de Verona, Brescia e Cremona se consagraram como os primeiros grandes centros de luteria. De lá são os notáveis lutiers que fizeram história, como Andrea Amati (1505-1578), Mathias Albani (1621-1673), Anto-nio Stradivari (1648-1737), Giuseppe Guarnieri (1698-1744). “Esse grupo levou a luteria a um ponto que jamais foi superado”, afirma Momba-ch, discípulo da tradição italiana. Muitas técnicas utilizadas por esses mestres se perderam no tem-po. Mas algumas escolas preservam parte desse saber – decisivo nos bastidores da história da música. Ainda hoje a profissão é um tanto desco-nhecida. “Mas quem ouve boa música”, garante Mombach, “ouve o resultado do bom trabalho de um lutier”.

A históriada arte do lutier

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O almoço está servido. À mesa, um filé de peixe à mila-nesa, acompanhado por batata--palha e folhas de alface, tudo temperado com azeite, sal, to-xinas, metais e organoclorados. Alheios aos riscos deste tempe-ro inusitado, os que se encon-tram à mesa se deliciam com o alimento contaminado e colo-cam a própria saúde em risco.

A cena, embora hipotética, tem grandes chances de ser verdadeira: águas de lagos e reservatórios por todo o país encontram-se potencialmente contaminadas por substâncias nocivas à saúde. Os riscos que essa situação traz é tema de di-versas pesquisas realizadas pe-los integrantes do Laboratório de Toxicologia Celular da UFPR.

Criado em 1997, pelos profes-sores Ciro Oliveira Ribeiro e Mar-co Ferreira Randi, o laboratório reúne estudantes de graduação e pós-graduação. Ali, eles ava-liam os efeitos de poluentes em organismos aquáticos e, indireta-mente, em seres humanos. ”No começo, trabalhávamos apenas com metais tóxicos, como mer-cúrio, chumbo e estanho; com o tempo passamos a estudar outros contaminantes, como os orga-noclorados e os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos”, explica Ribeiro. “Ao observar os efeitos em alguns animais aquáticos, é possível avaliar os danos sobre o equilíbrio do ambiente (ecossis-temas) e, em alguns casos, sobre as pessoas que têm contato direto ou indireto com a água.”

Em princípio, qualquer subs-tância pode contaminar ou into-xicar uma pessoa: se estiverem em concentrações mais altas do

Água e alimentos comprometidosA análise das células de peixes e outros organismos aquáticos encontradas nos reservatórios de água que abastecem as cidades

revelam efeitos de poluentes de diversas origens - a contaminação leva perigo ao ambiente e à saúde das pessoas

que o normal, mesmo elementos essenciais ao organismo, como o cobre e o zinco, podem alterar algumas funções biológicas. Re-síduos industriais, além de expor os seres vivos a substâncias tó-xicas, podem interferir no equi-líbrio ambiental. Um fenôme-no comum, é a eutrofização de águas (aumento na quantidade de nutrientes). Com alimento de sobra, certos tipos de bactérias — as cianobatérias — começam a se reproduzir de forma descon-trolada e a prejudicar outros or-ganismos. A isso, dá-se o nome de “floração de bactérias”.

É o que ocorre nos casos de maré vermelha: cianobactérias avermelhadas que, por causa da riqueza dos nutrientes na água, se reproduzem em um ritmo anormal e mudam a coloração do líquido. O fenômeno aconte-ce por diversas razões, dentre elas o despejo de lixo urbano e industrial. As toxinas liberadas por essas algas são altamente nocivas para organismos aquá-ticos e seres humanos, além de prejudicar o equilíbrio do ecos-sistema local.

tOxinas nas águas

As florações deste tipo de bactérias podem ser especial-mente perigosas quando ocor-rem em águas de reservatório ou de lagos com população ao redor. “A situação já é ruim pelo lado ambiental. Quando afeta diretamente as pessoas, é ainda pior”, ressalta o biólogo Rodrigo Silva, doutorando em Biofísica da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que faz experimentos no Laboratório de Toxicologia da UFPR. Sua pesquisa envolve os efeitos causados por cianotoxi-nas (substâncias nocivas produ-zidas pelas cianobactérias) em

peixes e, por aplicação, em seres humanos. “Além dos danos pro-priamente ditos, investigamos se as toxinas ficam acumuladas no organismo mesmo quando ele não está mais exposto”, aponta.

Até o momento, a pesquisa verificou que os animais aquáti-cos testados permaneceram com as toxinas no organismo mesmo após vinte dias do contato com elas. Há vários tipos de ciano-toxinas: hepatotoxinas (atacam o fígado); neurotoxinas (prejudi-cam o sistema nervoso); derma-totoxinas (causam dano à pele); e as citotóxicas, que podem da-nificar qualquer tipo de célula do organismo. As concentrações e a forma como o organismo entra em contato com as toxinas – ina-lação, ingestão, contato físico – também interferem nos efeitos produzidos. (ver Box)

Quando há excesso de ciano-bactérias no ambiente, existem duas alternativas: aguardar o restabelecimento do equilíbrio, o que pode levar meses, se a causa for climática ou devido a resíduos urbanos e industriais; ou eliminar as cianobactérias e

tratar quimicamente as toxinas. A segunda alternativa, embo-ra pareça simples, traz sérias dificuldades. “Primeiro, se as bactérias forem eliminadas sem cuidado, suas células se rompem e liberam mais toxinas”, alerta o biólogo. “Além disso, o trata-mento químico pode tornar as toxinas ainda mais nocivas.” O método mais comum é a adição de cloro, que quebra as partí-culas das cianotoxinas e pode potencializar seus efeitos nega-tivos. Está em estudo o uso de semente de moranga em pó para neutralizar essas substâncias.

fígadO, órgãO purifiCadOr

Nos seres humanos e em outros animais vertebrados, o fígado é o órgão responsável por metabolizar substâncias estra-nhas ao organismo e torná-las menos nocivas, eliminando-as. “Uma das maneiras de avaliar a qualidade da água de um reser-vatório”, explica a estudante de graduação em Biologia, Paola Nagamastu, “é analisar as cé-lulas do fígado dos organismos que nela vivem”. Para isso, é es-colhida determinada espécie de peixe. Após a coleta em diver-sos pontos dos reservatórios, os animais são levados ao labo-ratório para análise das células do fígado, avaliando-se se há alterações causadas pelas ciano-toxinas ou outros poluentes.

Outra linha de pesquisa desenvolvida no Laboratório é a de avaliar quais poluentes causam determinados danos. “Nesse caso, além de elaborar uma técnica de análise padrão, é preciso avaliar isoladamente a ação de cada substância”, de-talha a mestranda em Biologia, Daniele Dietrich. As respostas do organismo variam, da mor-

BioloGiA celulAr

Guilherme de [email protected]

A pesquisa verificou que os

animais aquáticos testados

permaneceram com as toxinas no organismo mesmo após vinte dias do

contato com elas

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Água e alimentos comprometidosA análise das células de peixes e outros organismos aquáticos encontradas nos reservatórios de água que abastecem as cidades

revelam efeitos de poluentes de diversas origens - a contaminação leva perigo ao ambiente e à saúde das pessoas

te de células à manifestação de câncer, danos neurológicos ou no sistema imunológico. Aná-lises de hormônios no sangue revelam a presença de poluen-tes desreguladores e como o organismo reage à sua ação.

Além de interferir nos orga-nismos, os poluentes interagem quimicamente entre si e podem, por essa razão, produzir efeitos diferentes. “Depois de testar os poluentes separadamente, faço análises dos efeitos que eles causam quando misturados”, explica a doutoranda em Biolo-gia Celular, Heloísa de Oliveira, que atua no Laboratório há dois anos. Heloísa enumera pelo menos três poluentes especial-mente danosos: o DDT (inseti-cida proibido no Brasil); o tribu-til-estanho (usado antigamente no revestimento de navios); e o benzo-pireno (produto da quei-ma incompleta da matéria orgâ-nica). Algumas dessas substân-cias, já estudadas há décadas,

continuam no ambiente mesmo quando param de ser emitidas, o que as torna ainda mais poten-cialmente nocivas.

“O caso do benzo-pireno é muito complicado porque ele se torna mais tóxico depois que é metabolizado pelo fígado”, aler-ta Heloísa. O DDT, apesar dos riscos à saúde, é uma das poucas substâncias eficazes no combate ao mosquito transmissor da ma-lária. O tributil-estanho não é tão nocivo para seres humanos, mas pode prejudicar o comportamen-to reprodutivo de outros animais. Por permanecerem no ambiente, algumas dessas substâncias são chamadas de POPs:poluentes--organo-persistentes’.

um mundO a ser estudadO

Para a maioria das pessoas, as análises feitas no Laboratório pa-recem simples, um trabalho que pode ser concluído em poucas semanas. Na verdade, há tantas variáveis envolvidas – os testes

com as substâncias, a coleta de animais e a descoberta de resulta-dos estatisticamente relevantes – que garantem aos pesquisadores meses de tarefas e desafios. “Os trabalhos são longos, desde a co-leta de animais até o preparo das células”, detalha o estudante de Biologia Dandie Bozza, aluno de iniciação científica, que participa há seis meses das pesquisas.

“As coletas de material po-dem levar um dia inteiro. Além

A Síndrome de Caruaru

Em 1996, na cidade de Caruaru (PE), 60 pacientes de uma clínica de hemodiálise morreram e dezenas ficaram doentes de-vido às cianotoxinas. De acordo com as investigações realiza-das, a água usada para consumo e nos aparelhos de hemodiálise estava contaminada. O episódio, conhecido na imprensa como Síndrome de Caruaru, levou o Governo Federal a trocar os equi-pamentos e enrijecer os padrões de tratamento de água no país. “A Síndrome de Caruaru é um episódio conhecido, mas há mui-tos outros casos de contaminação sendo avaliados hoje”, aponta Rodrigo Silva.

disso, é preciso superar difi-culdades de acesso, impostas pela distância e pelos terrenos dos reservatórios”, relata. No momento, estão em análise amostras de água coletadas nos reservatórios do Passaúna e do Iraí, região metropolitana de Curitiba, que abaste-cem a popu-lação.

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Agosto2010ArquiterurA sustentável

A partir deste ano, pode-se dizer que preocupação em ser “verde” também está presen-te na Universidade Federal do Paraná. Ela é o primeiro órgão público do Sul do País a unir tecnologia, pesquisa e sustenta-bilidade em um único ambiente com a certificação Leadership in Energy and Environmental Design (Leed), concedido pelo Green Building Council Brasil. Um prédio com este selo co-meçou a ser erguido no campus Politécnico. Embora no Brasil existam vários edifícios lan-çados com o rótulo de susten-táveis, este será o terceiro do país com a certificação oficial.

A construção vai abrigar os laboratórios integrados de

genética humana e biologia molecular – o Laboratório de Imunogenética e Histocompa-tibilidade (Ligh) e de Citogené-tica Humana e Oncogenética –, além de um memorial dedicado ao geneticista e ex-professor da universidade Newton Frei-re Maia. O espaço também vai se transformar em um palco de teatro giratório, onde duzen-tas pessoas poderão assistir a apresentações artísticas.

Mas não é só pela versatili-dade que essa edificação chama a atenção. A construção da obra envolve conceitos de arquitetu-ra sustentável e de paisagismo, com destaque para a preservação da mata ciliar ao redor do terre-no. Em outras palavras, o prédio será integrado ao ambiente, e não o contrário. Também haverá aproveitamento dos recursos na-

turais disponíveis, como o uso da água das chuvas e a separação de resíduos orgânicos.

prOjetO de muitas mãOs

O arquiteto responsável pelo prédio do Ligh, José San-chotene, conta que a planta fi-nal foi estruturada após um ano de muito estudo e acertos com toda a equipe. “O projeto do prédio verde é uma integração entre escritórios de arquitetu-ra”, explica.

Dos 3.500 m² de terreno, o laboratório vai utilizar apenas 1.200 m². O espaço restante será ocupado por estaciona-mento e vegetação local. O pré-dio se adaptará ao relevo e será voltado para o eixo norte-sul da cidade, permitindo conforto térmico e aproveitamento da iluminação natural.

“A projeção do edifício não terá a movimentação de tone-ladas de terras que as constru-ções normais costumam reali-zar. Os ambientes aproveitarão a luz natural e os espaços serão otimizados através de divisórias removíveis para melhor apro-veitamento”, esclarece o con-sultor da Associação Brasileira de Escritórios de Arquitetura, divisão Paraná, Frank Siciliano.

A obra se baseia em cinco estratégias. A primeira foi o emprego de um programa com-putacional que integrou o pro-jeto arquitetônico, a topografia do terreno e o paisagismo. A segunda, quando a construção estiver pronta, será a utilização diferenciada da água. A ideia é que esta não chegue até a rede de captação sem ter sido apro-veitada de alguma forma. Se-

“Prédio Verde”

Nos últimos anos, estamos reaprendendo a comer, vestir, transportar, consumir e morar, para encontrar um padrão de vida mais sustentável.

Até os edifícios públicos começam a se adequar, com a arquitetura projetando “prédios verdes”, conceito que vai muito além da cor das árvores.

Luciane [email protected]

O que é isso?

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gundo o cálculo dos arquitetos responsáveis, apenas 38% dos fluidos pluviais devem cair di-reto no esgoto. Os outros 62% serão direcionados para uso nos vasos sanitários.

“O jardim vai favorecer a infiltração da água e deixá--la mais limpa e pura”, conta Siciliano. Além disso, com o uso de dispositivos hidráulicos mais econômicos, o consumo de água tratada cairá em 30%, contabilizando uma economia de 12 milhões de litros, isto é, 55 mil reais por ano. “Também está previsto que a irrigação dos jardins seja feita a partir do tratamento dos efluentes sani-tários o que gera mais econo-mia e preservação ambiental”, explica o arquiteto.

A terceira etapa diz respeito ao consumo energético. A ino-vação começará nas paredes, que serão removíveis confor-me as necessidades. As divisó-rias também terão isolamento térmico. O ecotelhado é outra característica marcante no pro-jeto, de forma a reduzir infiltra-ções e garantir o isolamento térmico do prédio.

A refrigeração dos ambien-tes funcionará conforme o uso. Por exemplo, quando uma das janelas for aberta, o sistema

de ar condicionado da sala será desligado automaticamente, assim como o compressor res-ponsável pelo gasto de energia. A fonte solar também atuará no pré-aquecimento da água. Com o uso de luz natural e artificial, o prédio vai economizar 25% da energia elétrica total, uma eco-nomia de 100 mil reais por ano.

O bem-estar das pessoas foi um quesito priorizado no proje-to. Estudos indicam que passa-mos 90% de nosso tempo em lo-cais fechados, onde a qualidade do ar pode ser de 10 a 50 vezes mais poluído do que o externo. Poluentes internos vão de toxi-nas (como o amianto) a formal-deídos, encontrados em mate-riais de construção e causadores de alergias, além de fungos e bactérias. A agência ambiental americana EPA (Environmental Protection Agency) os chama de uma ‘sopa química’. “Nos laboratórios, a filtragem do ar vai diminuir a disseminação de agentes infecto-contagiosos be-neficiando a saúde dos funcioná-rios”, afirma Sanchotene.

Por fim, a quinta estratégia sustentável incorporada foi o uso de ecomateriais, produzidos próximos à construção, valori-zando e incentivando a mão-de--obra local. Aliás, a questão social

O QUE É UM PRÉDIO VERDE

Um prédio que leva o meio ambiente em consideração no seu processo de concepção, projeto, construção e operação. Algumas das características mais comuns: uso racional da água, eficiência energética, emprego de materiais e recursos menos agressivos ao meio, escolha adequada do local, redução dos impactos no entorno e a qualidade ambiental interna.

ARQUITETOS SUSTENTÁVEIS NO MUNDO

Desde meados do século passado, a Arquitetura tem incor-porado diversos conceitos sustentáveis em projetos e produ-tos. Novas edificações são concebidas para impactar o mínimo possível o meio à sua volta, consumindo menos recursos na-turais durante sua vida útil. Ken Yeang e Bill Dunster são dois exemplos atuais de profissionais que conciliam o belo, o útil e o natural.

Yeang nasceu na Malásia em 1948 e além de arquiteto é ecologista. Seus projetos são marcados por instalações ecoló-gicas e bioclimáticas há 40 anos, e sua característica marcante é a construção de arranha-céus e ecoprédios.

Dunster desenhou, no Reino Unido, um modelo de con-domínio líder em sustentabilidade urbana, a partir do projeto BedZED, Beddington Zero Energy Development (Empreen-dimento de Energia Zero), que beneficia mais de 200 pessoas. A fama ganhou o mundo e o projeto do arquiteto já pode ser visto em países como Portugal, França e China. Os moradores também são incentivados a deixar o carro em casa e utilizar a bicicleta como meio de transporte.

também foi pensada. Diferente do que acontece na maioria dos prédios da UFPR, que é antiga, deficientes físicos terão acesso facilitado no “prédio verde”.

dOis em um: arquitetura sustentável e genétiCa

O Ligh abrigará o Centro de Referência e Atendimento ao Doador Voluntário de Medula Óssea, referência em pesqui-sas genéticas no Brasil. “Quan-do a possibilidade de construir um novo laboratório surgiu, comecei a pesquisar projetos que se adaptassem ao conceito de sustentabilidade e inovação tecnológica e permitissem a expansão de uma forma de edi-ficação nova”, conta, animada, a diretora do Ligh, Maria da Gra-ça Bicalho.

Após muita conversa entre

universidade, arquitetos e di-retoria optou-se pelo edifício verde. As primeiras reuniões começaram em 2007, quando o projeto foi esboçado. Apesar dos longos meses de planeja-mento, a obra só será entregue em 2012, no centenário da Uni-versidade. Sua realização tem apoio financeiro do Ministério da Educação e Cultura (MEC).

Por enquanto, a UFPR não planeja construir outro prédio com a mesma estrutura, porque o dinheiro para o financiamento não supre a realização de outras obras. “O financiamento ainda é um limitador na elaboração de obras como essa, mas estamos adequando os novos prédios aos conceitos de arquitetura sustentável”, afirma o pró-rei-tor de Administração da UFPR, Paulo Kruger.

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José Sanchotene, dedicação aosprojetos “verdes”.

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Agosto2010sAúde e Meio AMBiente

A epidemia é termômetro da situação social do país. E mais: a história de que na região Sul não existe a doença, não passa de “versão da carochinha”.

Aquecimento faz dengue avançar no Sul do Brasil

O papel principal nessa his-tória é de uma ilustre conhe-cida: a dengue. Que ela assola nosso país tropical há algum tempo, isso já se sabe. Que devemos colocar areia em va-sos de planta e evitar acumu-lar água parada, entre outras medidas preventivas, também já sabemos. Mas se temos co-nhecimento disso tudo, por que existem mais de 400 mil casos registrados no Brasil só nesse ano e porque se observa um au-mento de mais de 300% nos re-gistros da doença no Paraná? A resposta para tal dúvida reside na ciência e está relacionada ao famoso aquecimento global e à desigualdade social.

A verdadeira história da ca-rochinha de que o Sul do Brasil é imune à dengue está caindo por terra com um trabalho que investiga a dispersão da doença na região. Segundo a pesquisa, o aquecimento gradual da área

onde se encontram os estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul têm garantido condições climáticas propícias para que os mosquitos trans-missores da dengue se repro-duzam também nessa parte do país. Cerca de mais de 5% de todos os casos de dengue no Brasil estão situados no Sul. “A dengue não é uma doença desta ou daquela região. Para exis-tir, depende do clima tropical--subtropical”, afirma o geógrafo Francisco de Assis Mendonça, professor da Universidade Fe-deral do Paraná (UFPR) e coor-denador do estudo.

Segundo Mendonça, exis-te uma forte relação entre o aumento do número de casos de dengue e o aquecimento da região. Análises de dados cli-máticos de mais de 200 esta-ções meteorológicas do Paraná revelaram que, de 1970 para cá, a temperatura do estado aumentou aproximadamente 1,5ºC. “Pode parecer pouco para leigos, mas esse aumento

pode causar mudanças drásti-cas no ambiente”, alerta o pro-fessor da UFPR. “Da região Sul inteira, o Paraná é o mais quente, o que contribui para a reprodução do mosquito trans-missor da doença”.

dengue: termômetrO dOs aspeCtOs sOCiOeCOnômiCOs

Trata-se de uma doença para a qual não existe contro-le clínico por meio de vacinas ou medicamentos específicos, portanto, as medidas preventi-vas e de controle são baseadas no conhecimento do meio am-biente e do modo de vida das populações humanas.

Em 1999, o biólogo inglês Paul Reiter liderou um estudo sobre a dengue na fronteira dos Estados Unidos com o México. Separadas pelo rio Grande, as cidades de Laredo, no Texas, e de Nuevo Laredo, no México, tinham as mesmas condições necessárias ao desenvolvimen-to da doença. Mas esta só se desenvolveu em Nuevo Lare-

do. Enquanto os texanos viviam em ambientes climatizados e usavam carros com ar-condi-cionado – mantendo-se distan-tes do mosquito da dengue –, o povo de Nuevo Laredo ficava à mercê das picadas do inseto. As condições de vida das pessoas fazem toda a diferença.

Os mosquitos contaminados transmitem a doença às vítimas de sua picada, sem fazer distin-ção de etnia, credo ou posição social. Mas na prática as classes mais baixas são as mais atingi-das. “Não há como controlar o vetor [o mosquito transmissor] sem investir na melhoria da qualidade de vida das pessoas”, diz o geógrafo.

Para combater de fato o mos-quito, portanto, além de sim-plesmente injetar milhões no setor de saúde e em campanhas publicitárias (só neste ano fo-ram investidos R$ 40 milhões), faz-se necessário um maciço in-vestimento governamental em saneamento básico. Para Men-donça, o estudo de Reiter sobre

Luan [email protected]

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A epidemia é termômetro da situação social do país. E mais: a história de que na região Sul não existe a doença, não passa de “versão da carochinha”.

Aquecimento faz dengue avançar no Sul do Brasil

a incidência da dengue na fron-teira dos Estados Unidos com o México exemplifica o ‘sucesso’ do mosquito entre os mais po-bres. Segundo a Organização Mundial da Saúde, são contabi-lizados 50 milhões de casos da doença por ano.

patinhO feiO dO sul

O Paraná é o estado com o maior número de registros de dengue há tempo. Os primeiros casos surgidos na região ocor-reram em 1993, em Ibiporã, norte do estado. Mas a doença só adquiriu proporções epidê-micas dez anos depois, na vizi-nha Londrina, onde foram con-firmados 9 mil casos. ”O ano de 2003 foi excepcional no Paraná, sobretudo em Londrina”, diz Mendonça.

Segundo ele, a dengue pode ter atingido 10% da população do município, levando-se em conta que um expressivo per-centual de pessoas doentes não procura socorro médico, o que inviabiliza as notificações.

Outro surto alarmante ocorreu em Maringá, em 2007, onde fo-ram contabilizados mais de 50 mil casos. Em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, o ano de 2002 foi o mais preocupan-te, quando foram registrados respectivamente cerca de 400 e 500 casos.

A dengue foi erradicada no Brasil nos anos 1950, mas re-apareceu no Rio de Janeiro nos anos 1980. Na região Sul, até aquela década, os únicos regis-tros eram de casos importados (os infectados vinham de fora). O aparecimento da doença na região na década de 1990 coin-cidiu com o fato de que essa foi, de acordo com especialistas, a década mais quente nos últi-mos 200 anos.

mais de um vilãO? As campanhas veiculadas

nos meios de comunicação tor-naram o mosquito Aedes aegyp-ti conhecido como o vilão que transmite o vírus da dengue. Na verdade, porém, o mosqui-

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to divide esse mérito com um parente do mesmo gênero: o Aedes albopictus. Enquanto o aegypti é prefere o meio urba-no, o albopictus prolifera-se na zona rural. Como a doença é mais combatida nas cidades, o A. aegypti ganhou a fama.

Mas as diferenças acabam por aí. Ambos os mosquitos são de clima tropical-subtropical e dependem de condições espe-cíficas para proliferar: chuvas intermitentes e temperatura superior a 18ºC. É no intervalo entre as chuvas que o mosquito bota seus ovos. Segundo Men-donça, essas condições existem no Sul entre novembro e abril.

“No dia de finados (em no-vembro), por exemplo, muita gente deposita vasos de flores nos cemitérios, criando possí-veis focos da doença”, afirma. Mas é entre março e abril, no final da estação chuvosa, com precipitações menores e tem-peraturas ainda altas, que a dengue se espalha com mais intensidade.

Da região Sul inteira,

o Paraná é o mais quente, o que

contribui para a reprodução do mosquito

transmissor da doença”

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Geográfo

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Agosto2010nAnotecnoloGiA

Nanotubos de carbono

Como dar nó em um material duro

como diamante

Ciências interdisciplinares, que evoluíram da necessidade de expandir

o conhecimento além das limitações de cada área científica, os estudos das nanoestruturas

podem ser utilizados da medicina ao meio ambiente. Mas sua ampla utilização aponta para a necessidade do uso consciente.

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Imagine um cilindro feito de um material muito mais duro do que o diamante. E, ao mesmo tempo, extremamente flexível. Tão flexível que é possível dar um nó nele, por exemplo, e vol-tar. Então, temos um material muito difícil de ser quebrado, de alta resistência e flexibilida-de. Assim são os nanotubos de carbono, produtos resultantes de uma das pesquisas que se encontra em estágio avançado na UFPR.

Vista com grande entusias-mo pelos cientistas, essas es-truturas são a nova menina dos olhos da ciência. “Os nanotubos de carbono são materiais muito especiais. Isso porque suas pro-priedades jamais foram encon-tradas em outros compostos”, afirma Aldo Zarbin, coordenador do Núcleo de Excelência em Nanotecnologia e Nanomate-riais da UFPR, que faz parte do Programa de Apoio a Núcleos de Excelência (Pronex), instru-mento de estímulo à pesquisa e ao desenvolvimento científico ligado ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Os nanotubos são formados somente por átomos de carbo-no. E, quando esses elementos químicos se ligam entre si, ob-têm-se compostos com diferen-tes estruturas e propriedades. Os exemplos mais clássicos são o grafite e o diamante – ambos constituídos apenas por car-bono —, porém, a forma como os elementos estão ligados em cada um desses compostos é completamente diferente, o que faz com que as caracte-rísticas de cada um também o sejam. Nos nanotubos de car-bono, os elementos unem-se formando um cilindro ou, como o próprio nome já diz, um tubo. Só que a dimensão dessa estru-tura é nanométrica. “É como se fosse um tubozinho oco, forma-do somente por átomos de car-bono”, resume o professor.

Mesmo entre os nanotubos, encontram-se múltiplos arran-jos na disposição dos átomos

de carbono. Em laboratório, os cientistas são capazes de sinte-tizar essas substâncias, criando diferentes configurações mole-culares que resultam em aspec-tos físicos e químicos diversos.

Outra característica que torna os nanotubos um ma-terial tão especial é sua alta condutividade elétrica, do tipo metálico ou semicondutor, de-pendendo da forma como os átomos de carbono estão or-ganizados “Isso permite uma ampla utilização em eletrôni-ca, por exemplo, em circuitos. Também é um material que tem alta condutividade térmi-ca”, aponta Zarbin.

Com tantas propriedades em um mesmo material – e todas superlativas em relação a outros compostos – as pos-sibilidades de aplicação dos nanotubos de carbono são vas-tas. Por ora, a maioria está re-lacionada à eletrônica, propor-cionando aumento significativo da capacidade de equipamentos eletrônicos e computacionais e a diminuição de seu tamanho. A conservação e a transmissão mais eficientes de energia tam-bém são aplicações vantajosas na área.

No ramo da construção ci-vil, a alta resistência dos nano-tubos de carbono poderia ser utilizada na substituição dos cabos de aço. Na indústria têx-til, substituiriam outras fibras

na composição de tecidos de alta resistência. “E não para por aí. As aplicações estão em todas as áreas e só dependem de muito estudo”, conclui o professor de química.

desafiO CientífiCO

Ainda que a utilização prá-tica da nanotecnologia na in-dústria seja um dos aspectos que mais chama atenção dos pesquisadores, Zarbin destaca que os estudos em nanociên-cia na UFPR devem valorizar também o desafio científico. “A ideia foi montar um grupo de pesquisa que estuda o início e o fim do processo, e não só a aplicação na indústria. Ou seja, eu saio da preparação e chego à aplicação. E em todas as etapas tenho interesse científico en-volvido, porque por trás disso temos a formação de recursos humanos”, diz.

A perspectiva é de que a participação de alunos de ini-ciação científica, mestrado e doutorado na área só aumente. “Ao pesquisar, nós miramos em um ponto, e no meio do cami-nho um leque de novas possi-bilidades se abre. Você acaba percebendo novas realidades que nem imaginava no projeto original. E essas novas possibi-lidades devem atrair cada vez mais gente para a pesquisa”.

uma CiênCia pOlêmiCa

O século XX trouxe muitas incertezas quanto às tecnolo-gias, em especial por causa das conseqüências nem sempre po-sitivas que as novidades pode-riam gerar. Essa insegurança se refletiu até na Literatura. Isaac Asimov, autor do livro I, Robot (Eu, Robô), retrata situações de interação entre robôs e pes-soas. Os contos oscilam entre

Nayara [email protected] [email protected]

Montadores moleculares:

nanotecnologia ou nanoficção?

O responsável por batizar a nanotecnologia, ainda na década de 1980, foi o cientista e enge-nheiro norte-americano Eric Drexler. Em seu livro Engines of Creation (1986, sem tradução em português), o autor descre-ve o uso de máquinas em escala nanométrica, capazes de cons-truir produtos automaticamen-te, por meio da manipulação átomo a átomo. Os chamados montadores moleculares se-riam usados para produzir ou-tros nanomateriais.

Para entender melhor o montador molecular, imagine uma linha de produção toda automatizada. Robôs pegam algumas peças inacabadas em uma esteira e as modificam ou acrescentam materiais à original. A esteira avança, e os robôs adicionam produtos à montagem. Quando tudo está pronto, colocam o material finalizado em outra esteira e voltam a se dedicar a um novo produto inacabado. Agora ima-gine tudo isso acontecendo em escala nanométrica, uma medi-da tão pequena que é invisível aos olhos e que as peças da es-teira sejam átomos.

Em seu livro, Drexler alerta para os riscos da criação de tais máquinas: por serem capazes de construir qualquer outro ob-jeto, os montadores molecula-res poderiam se auto-reprodu-zir e, caso se descontrolassem, essa auto-reprodução poderia ameaçar a vida humana de for-ma semelhante a uma epide-mia. No entanto, os montadores moleculares nunca foram cons-truídos, e ficaram conhecidos como “nanoficção”.

Os nanotubos de carbono são materiais

muito especiais. Isso porque suas

propriedades jamais foram

encontradas em outros compostos”

Aldo José Gorgatti Zarbin. Professor de Química

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Arte com átomos

Ao criar o Microscópio de Tunelamento por Varredura (STM), em 1981, Gerd Binnig e Heinrich Rohrer mudaram a forma de se fazer ciência. Nesse momento, eles ainda não sabiam, mas criaram também uma nova forma de se fazer arte.

“Quando nós ampliamos as coisas de forma tão grande ou vemos tudo tão pequenininho, a perspectiva se torna muito dife-rente”. Quem explica é a artista multimídia, curadora e autora de diversos artigos na área Anna Barros, que se dedica a animações computadorizados com imagens obtidas de microscópios eletrôni-cos. Ao contrário de uma fotografia, na qual são as partículas de luz que geram a imagem, na nanoarte as figuras são dos próprios átomos que constituem o material e, portanto, são todas em preto e branco. Em geral, o que os artistas fazem é processar a imagem no computador, e a partir daí manipulá-la da forma como quiserem.

a nanotecnologia são tóxicas, isso é um absurdo. Temos al-guns materiais dela resultan-tes tóxicos e outros não, mui-to pelo contrário”, diz.

Se o controle e a regulamen-tação dessas inovações ainda não são aplicados extensiva-mente, o mesmo não se pode dizer dos investimentos na área, por parte do governo e da indústria. “Determinadas em-presas terão um giro em função destas novas tecnologias e ino-vações. A divisão entre países pobres e ricos pode se agravar do ponto de vista tecnológico e, consequentemente, econômi-co”, analisa Premebida.

Nesse sentido, a nanotec-nologia pode suscitar debates relevantes sobre a questão trabalhista, discussão que re-monta à Primeira Revolução Industrial, no século XVIII, com a invenção da máquina a vapor e da locomotiva. Mas, a preocupação com a exclusão social não se dá somente no âmbito do papel das novas tec-nologias no sistema produtivo, mas também no monopólio do conhecimento. Premebida cha-ma atenção para a necessidade de criação de políticas públicas de inclusão da sociedade: “A participação da sociedade civil no debate é pífia. Precisamos achar modelos eficientes de integração entre ciência e lei-gos, para que estes participem de fóruns de discussão sobre escolhas de padrões tecnológi-cos”, afirma.

histórias de uma menina com saudades de seu robô, tratado como urso de pelúcia e máqui-nas que tentam governar a so-ciedade. Retrato fictício, porém visível, das incertezas quanto aos avanços científicos.

Quando grandes inovações são anunciadas, é comum a so-ciedade se dividir entre entu-siastas e críticos. Com a nano-tecnologia não seria diferente. As preocupações aparecem em todas as áreas de usos. Para ci-tar um exemplo, na medicina e na farmacologia, questiona-se se a utilização de nanocompos-tos em medicamentos e cosmé-ticos pode influir diretamente na saúde humana.

“O problema é que os pa-drões de segurança dos produ-tos nanotecnológicos ainda pre-cisam ser pensados e regulados, pois o sistema de controle atual é baseado em um padrão tecno-lógico anterior à disseminação destes novos materiais e arte-fatos”, aponta o diretor técnico--científico da Fundação Djalma Batista, do estado do Amazonas, Adriano Premebida.

Zarbin concorda que ques-tões como essas devem ser levadas em conta. Mas, por se tratar uma tecnologia mui-to recente, pouco se sabe so-bre o assunto. “Por enquanto, existe muito folclore, muito achismo, muito chute”. Ele exemplifica com a questão do medo da poluição por na-nocompostos. “Não podemos afirmar que a nanociência e

No Brasil, o laboratório de nanotecnologia do Centro Mul-tidisciplinar para o Desenvolvimento de Materiais Cerâmicos (CMDMC) tem feito diversos trabalhos nesse sentido. Pesqui-sadores e técnicos do Centro, inclusive, ficaram em 2º e 4º luga-res na Mostra Internacional Online Nanoarte 2009-2010.

Mais do que produzir figuras estáticas, outra característica da nanoarte são as imagens tridimensionais. No artigo “Crian-do no escuro tátil das moléculas”, apresentado na 5th Interna-tional Conference on Digital Arts, Anna Barros explica que, nesse ambiente, o sentido do tato é mais importante que o da visão. “Cada objeto tem o seu desenho, a sua composição, e nós interagimos com esses elementos. A procura dos artistas se amplia para apresentar experiências poéticas com base em dados científicos que nos permitam perceber como se compor-tam os átomos e moléculas em seu próprio mundo, sem que sejam uma ilustração ou permaneçam só no visual”, conclui Barros em seu artigo.

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O Núcleo de Excelência em Nanotecnologia e Nanomate-riais é coordenado pela UFPR, mas ela não trabalha sozinha. Ao todo, cinco instituições in-tegram o grupo de pesquisa – a própria UFPR, a Univer-sidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), a Universi-dade Estadual de Ponta Gros-sa (UEPG), a Universidade Estadual de Londrina (UEL) e a Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro).

O professor coordenador do Núcleo, Aldo Zarbin, expli-ca que esse tipo de pesquisa é bastante complexo, por isso, foi criada uma rotina fragmen-tada de trabalho. “São ao todo 17 professores doutores en-volvidos, e cada um tem um grupo de pesquisa, que reúne alunos participantes e é res-ponsável por uma parte dife-rente do projeto. É uma pes-quisa unificada, mas realizada em partes”, descreve.

Graças às pesquisas do

O tratamento magnético na superfície de partículas para que tenham afinidade com pe-tróleo poderia ser a solução para conter o vazamento do óleo, que atingiu as águas do Golfo do México, em 2010. O mecanismo altera a estrutu-ra dos materiais em um nível muito pequeno, invisível a olho nu. Este é apenas um exem-plo do que pode ser feito com os materiais por intermédio da nanotecnologia, recurso que trabalha com partículas em proporção abaixo na escala do nanômetro (nm).

Objetos dessa grandeza so-mente podem ser vistos com o auxílio de equi-pamentos de percepção mui-to poderosos. Para se ter uma ideia, um gló-bulo vermelho do sangue pos-sui de 5 a 7 mil nanômetros, e o diâmetro de um fio de ca-belo apresenta dimensão de 80 a 100 mil nanô-metros. Mesmo esses corpos são gigantes para o padrão trabalhado em nanociência.

Tudo o que existe no mun-do é formado por átomos. Estes, por sua vez, são com-postos por prótons, nêutrons e elétrons. Até onde se sabe, essas são as menores partes da matéria. Mesmo coisas e seres pequenos são formados por bilhões e bilhões dessas partículas. “Quando você tem um sólido, por exemplo, as propriedades daquele objeto dependem da existência des-ses inúmeros átomos. Ou seja, as espécies que formam esse sólido estão juntas numa estru-tura que se repete tridimensio-nalmente”, explica o professor

do Departamento de Química da UFPR, Aldo José Gorgatti Zarbin.

O grande triunfo da nano-tecnologia é trabalhar não com esses bilhões de átomos, mas com apenas alguns milhares deles. Quando um material é produzido em escala tão pe-quena, suas propriedades são completamente novas, além de serem potencializadas. “A gente pode dizer sem nenhum exagero que é o maior avan-ço científico que ocorreu nos últimos tempos, porque isso expande as áreas tradicionais do conhecimento. É uma nova visão e uma nova forma de en-

carar a ciência e a tecnologia, baseada no tamanho das coisas”, afirma Zarbin.

O interesse dos cientistas é aplicar as mo-dificações em âmbito muito pequeno, para criar e melhorar alguns compos-tos. “É nano-tecnologia se a dimensão for relevante para as propriedades, porque exis-te muita coisa que sempre foi pequena, mas nunca foi nano-tecnologia, nem

nanociência”, explica o profes-sor do Departamento de Física da UFPR, Ivo Hümmelgen.

Hoje, os estudos nas nano-ciências são amplos e aplicá-veis a diversas áreas, desde a medicina até o meio ambiente e a eletrônica: sensores, la-sers, aumento da eficiência de catalizadores, agentes bac-tericidas, medicamentos com liberação controlada de subs-tâncias, afinidade de nanoes-truturas para o tratamento de tumores. Os exemplos são diversos.

Revolução invisívelNúcleo, nanomateriais como óxidos, metais e carbono serão utilizados para aplicação nas áreas ambiental, energética (como fonte limpa de energia) e agrícola. “Há materiais sendo preparados para conversão de energia solar em energia elé-trica. Outros, para conversão direta de álcool em hidrogênio, por exemplo. Outros servem como sensor, para se estudar a qualidade de fármacos e quali-dade de alimentos, entre outras várias aplicações”, exemplifica Zarbin.

Com os recursos do CNPq e também da Fundação Araucária (órgão financiador do governo estadual), o professor acredita que o Paraná pode se tornar um centro de referência em nanotecnologia no país. “Aqui na UFPR, nós sempre tivemos referências individuais na área. Agora, vamos dar destaque ao estado e a cada uma das insti-tuições participantes, o que é um diferencial fantástico”.

A gente pode dizer sem

nenhum exageroque é o maior

avanço científ ico que ocorreu nos últimos tempos,

porque isso expande as áreas

tradicionais do conhecimento.”

Aldo José Gorgatti Zarbin. Professor de Química

Nanotecnologia no Paraná: parceria é o diferencial

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Você é cego e acaba de pegar um ônibus. Como ter certeza se o cobrador lhe deu o troco corre-tamente? Em tempos de malan-dragem, é preciso ficar esperto. Contar moedas é fácil, já que elas são diferentes em peso e forma. Mas as cédulas de real são to-das do mesmo tamanho, sendo impossível identificá-las apenas pelo tato. Pensando nisso, uma dupla de pesquisadores da UFPR desenvolveu o primeiro contador de cédulas portátil do Brasil.

A ideia foi dos estudantes Ricardo Cruz e Walter Steiger, do Departamento de Engenha-ria Elétrica da UFPR. “Quería-mos fazer de nosso trabalho de conclusão de curso algo útil”, diz Cruz. “Então surgiu a ideia de ir ao Instituto Paranaense de Cegos, onde pesquisamos quais eram as principais demandas da-queles deficientes”, conta Stei-ger. Os cegos enfrentam muitas dificuldades diárias, e uma delas é contar seu dinheiro. Assim surgiu a idéia de elaborar um contador de cédulas portátil.

“É uma espécie de mini computador equipado com um mini programa. Assim que in-serimos uma cédula no apare-lho, ele faz uma leitura ótica do papel e emite um sinal em áudio, dizendo, em alto e bom som, de que valor é aquela nota. O processo todo leva menos de

um segundo”, comemoram os estudantes-pesquisadores.

a COnCOrrênCia

O orientador do trabalho, Marlio Bonfim, conta que a Uni-versidade Positivo já havia de-senvolvido um aparelho com a mesma função. “Mas o disposi-tivo era muito grande e pesado”, lamenta o engenheiro. “Além dis-so, ele demorava de dez a quinze segundos para fazer cada leitura.” Segundo Bonfim, era um sistema pouco prático e nada portátil, com utilidade limitada para as reais ne-cessidades dos cegos.

Para as bandas do norte – nos Estados Unidos – também já existe um leitor de cédulas. A empresa responsável pelo apa-rato é a Maxi Aids, que fabrica versões para dólares americanos e canadenses. “Esse, sim, pare-ce funcionar bem. Tanto que o Banco Central do Canadá com-pra e distribui para todos os defi-cientes visuais do país”, contam os pesquisadores. O problema é que ele custa uns US$ 300. “En-quanto o nosso, desenvolvido aqui na UFPR, sai por menos de oitenta pila!”, comemoram.

futurO, COm mais preCisãO

O projeto do novo leitor de cédulas da UFPR começou em agosto de 2009. “Atingimos 90% em precisão de leitura. Mas queremos chegar a pelo menos 95%”, prevê Steiger (a precisão do leitor de cédulas australiano

também é de 90%. Já a precisão do leitor fabricado nos Estados Unidos, ninguém sabe, uma vez que a empresa responsável ja-mais divulgou esse dado).

O dispositivo já está apto a funcionar nas ruas. Mas, dizem as más línguas, as cédulas de real estão prestes a mudar de ta-manho e forma. Segundo nosso Banco Central, a data limite para a mudança completa é 2012. E aí, como fica? O que será do aparelho projetado para ler as notas atu-ais? Isso não preocupa os jovens pesquisadores. “Há vários países que utilizam cédulas do mesmo tamanho, e nosso dispositivo po-deria ser usado em qualquer um deles”, esclarece Cruz. “Basta reprogramarmos os padrões de leitura, o que é bem fácil.”

A ideia dos novos pesqui-

Repórter às cegas: a prova do crime

Era uma típica tarde curitibana. Lá estava eu, na Rua XV, de bengala-guia e óculos escuros à la Bob Dylan. Sim, um pobre repórter disfarçado de cego, determinado a desafiar a honestidade desse povo supostamente educado que vive em Curitiba. É estranho como os transeuntes desviam; louvável como os dignos zelam; mas lamentável como os canalhas en-ganam. O teste: colocar à prova a honestidade de um vende-dor numa banca da Praça Osório. “Com licença, quanto custa uma bala?”, perguntei. “É dez centavos, senhor”, respondeu o moleque. “Então me vê uma”, repliquei, estendendo a mão, com uma moeda de 50 centavos. “Essa moeda é mesmo de dez centavos?”, indaguei fingindo um engano. Eis que vem a surpresa: nada de troco! “Sim, senhor, a moeda é de dez centavos.”

Uma mão na roda para deficientes visuais

sadores é liberar na internet o código do software e o esquema de montagem do dispositivo. As-sim, qualquer pessoa com certo conhecimento em eletrônica po-derá fabricar o leitor de cédulas em casa. “Não temos toda aquela preocupação comercial”, enfatiza Cruz. “Queremos apenas que nosso trabalho seja útil para a so-ciedade.” Mesmo assim, a UFPR já é responsável pela adminis-tração da patente, para evitar eventuais cópias ou apropriações indevidas do produto.

De acordo com a Organiza-ção Mundial de Saúde, existem 45 milhões de cegos no mundo. No Brasil, o número de portado-res de algum tipo de deficiência visual é de 3,5 milhões. Apesar de tão numerosos, suas deman-das ainda são pouco atendidas.

Imagine que você é cego. Como você contaria o

dinheiro de sua carteira?

Henrique [email protected]

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contAdor de cédulAs

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O lixo, o e o descarte correto

Usar o computador em vez do papel parece uma óti-ma contribuição ao meio am-biente. Mas o que acontece quando a máquina torna-se obsoleta? Vira lixo também – e de um tipo bem pior do que seria o caderno. Esse tipo de resíduo, o lixo eletrônico, tem crescido exponencialmente sem que as pessoas saibam o que fazer. Não é à toa que ouvimos tantos casos de con-taineres de lixo sendo envia-dos de um lado para o outro: ninguém quer um problema desse tamanho por perto.

O engenheiro Maurício Beltrão Fraletti, fundador do Instituto Brasileiro de Eco-Tecnologia (Biet), conta que a maior preocupação com este tipo de lixo é o seu descarte. “O Brasil é o país emergente que mais consome eletrôni-

cos, que se tornam ultrapas-sados em uma velocidade alarmante. O problema é que esse material é descartado in-corretamente, normalmente em lixões. O equipamento co-meça a se decompor e libera substâncias tóxicas no meio ambiente”,

Outra prática agravante do problema é o envio do resíduo eletrônico para desmanche em países subdesenvolvidos. “Aí entra a questão social, já que nesses países é utilizada uma mão de obra praticamen-te escrava para retirar metais nobres dos componentes ele-trônicos, como ouro, prata e platina”, revela Fraletti. A riqueza recolhida é vendida para outros países, enquan-to os metais pesados, como mercúrio, cádmio, berílio e chumbo, acumulam-se sem receber tratamento. “Essas pilhas de componentes ficam a céu aberto, liberando um

chorume químico que pene-tra na terra e causa danos terríveis”, completa

lixO e Opções Criativas

A gravidade do problema exige soluções criativas. E foi com muita inventividade que Maurício Fraletti começou a dar um destino correto para o lixo eletrônico: o projeto “Ro-bótica Sem Mistérios” ensina crianças e jovens a construírem robôs a partir do lixo.

A ideia surgiu quando o filho de Maurício, na época com 9 anos, interessou-se por kits de robótica que existiam no mercado. “Como era tudo muito caro resolvi montar, eu mesmo, um kit para ele; aque-le primeiro kit virou o projeto ‘Robótica sem Mistérios’”, re-lata o engenheiro.

O projeto é uma forma de utilizar peças (que acabariam indo para o lixo) para ensinar conceitos de tecnologia, além de ética, cidadania, metodolo-gia, qualidade no desenvolvi-mento e respeito à natureza. “Realizamos oficinas em par-ceria com a UFPR Litoral e o interesse dos alunos – entre 5 e 60 anos – é incrível”, conta Fraletti. “O mais importante é o sentimento coletivo de que a população contribui para algo útil”.

Além disso, o Biet tra-balha com a conscientização local, realizando campanhas para que a população doe seus equipamentos obsoletos para o Instituto, onde o material é separado entre aquilo que pode e que não pode ser reu-

tilizado. Fraletti explica que para algumas substâncias ain-da não foram descobertas so-luções de descarte ou recicla-gem. “Nesses casos, as partes tóxicas são estocadas em am-biente apropriado”.

Os componentes que po-dem ser reciclados e reutili-zados são enviados para em-presas especializadas. “Além de evitar o descarte incorreto, quando reciclamos evitamos tirar mais matéria prima da terra”, argumenta. Os equi-pamentos em boas condições de uso têm destino diverso: são revisados e enviados para entidades carentes, escolas, creches, bibliotecas. Há uma única ressalva: quando o equi-pamento não for mais utilizado deve ser devolvido para o Biet. “Assim podemos dar um desti-no correto e contribuir para a segurança ambiental”.

O Biet mantém parceria com universidades que pes-quisam soluções para esses componentes. “Queremos que a juventude pesquise métodos para acabar com o acúmulo de lixo, contribuindo para seu fu-turo”, afirma o engenheiro.

Desde 2007, o Biet par-ticipa Festival de Inverno da UFPR, em Antonina, onde re-aliza oficinas com crianças por meio do projeto “Robótica sem mistérios”.

serviçO

Sede do Biet: Rua Juvenal Galeno, 477, Jardim Social. Curitiba. PR, Fone [41] 9932-0168, [email protected]

Um instituto de Curitiba promove cursos informativos e até ensina a construir kits de robótica utilizando resíduos eletrônicos

Lilian [email protected]

Projeto ensina crianças e jovens a construírem robôs a partir do lixo

Arq

uivo

pes

soal

roBóticA

lúdico

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Em 2008, dois estudantes de jornalismo abriram um mapa do Paraná, traçaram um destino com uma caneta marca texto, colocaram as mochilas no car-ro e o pé na estrada. Carolina Leal, 22 anos, e Lilo Barros, 24, percorreram seis mil quilôme-tros acelerando em rodovias e sacolejando por estradinhas de terra. Eles perderam a conta de quantas cidades visitaram, mas em 27 delas encontraram o que estavam procurando: boas his-tórias. O resultado virou o livro--reportagem Retalhos que conta os causos de um Paraná que a gente nem imagina que existe.

Ao longo de 30 dias, Lilo e Carol tiveram a ajuda de jorna-listas e moradores locais para garimpar as histórias. Mas mui-tas delas vieram do olho atento e da curiosidade dos dois. “Algu-mas pautas surgiram de ideias que tivemos e fomos atrás, como o caso do trabalho escra-vo em Cerro Azul. Ou frutos de coincidências, como ficarmos hospedados justo na pousada do ex-treinador da seleção brasi-leira de canoagem, em Tibagi”, conta Carol. Talvez um sexto sentido também tenha ajudado, como no caso do barbeiro da Lapa. “Vimos a portinha dele aberta, achamos que podia ren-der um papo legal e foi uma das histórias mais incríveis da via-gem. O cara tinha simplesmente comprado um detector de metal pra achar um tesouro enterrado numa fazenda da cidade... Sen-sacional!”, diverte-se Carol. As histórias costuradas no livro Retalhos transformaram-se no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) dos dois jornalistas.

Themys Cabral, 26 anos, é outra ex-aluna da UFPR que

viveu a aventura de um livro--reportagem. Em 2004, ela e sua colega Aline Anginski, 28, escreveram PFP: histórias de uma prisão feminina. O livro conta a trajetória de sete deten-tas da Penitenciária Feminina de Piraquara, escolhidas entre centenas por sua história de vida e pelos crimes barra pesa-da que cometeram. Themys e Aline queriam dar voz àquelas mulheres, relatar não só por que elas estavam presas, mas também o que aconteceu em suas vidas para que chegassem até ali. Para as detentas, não era fácil relembrar o passado. “Eu procurava olhar bem nos olhos e deixar com que a entre-vistada ganhasse confiança em mim para poder abrir a vida e o coração”, conta Themys.

A primeira leitora do livro foi a jornalista Myrian Del Vecchio, que recorda: “Confesso que chorei, tive uma noite de insô-nia, parei desamparada no meio da rua, com a plena consciência de que outros seres humanos, em todas as horas do dia, estão vivendo partes dilacerantes das mesmas histórias narradas nes-te livro. Sei que elas se repe-tem, se repetem...”.

Mas, além da comoção, Myrian analisa: ”Ao mesclar emoção e muita informação, Themys e Aline foram gran-des repórteres: souberam perguntar, e sobretudo, ouvir. Anotaram, gravaram, pesqui-saram como gente grande. Redigiram e editaram a quatro mãos, ainda buscando estilo aqui e ali, tentando uma lin-guagem homogênea a partir de duas imprssões/expressões diferentes. Trabalharam como profissionais, mas com idealis-mo estudantil. Foram, sobre-tudo, corajosas e verdadeiras. E fortes, muito fortes, mesmo

Renata [email protected]

Caçadores de históriasMuitos estudantes de jornalismo escolhem fazer um livro-reportagem ao final do curso.

Os temas são os mais variados, mas o resultado é um só: uma lição de vida.

Daqui a 20 anos, quando

lembrarmos dessa viagem,

não será tanto pela produçãodo livro ou das

matérias. Vai ser por tudo

que vimos, ouvimos,

conhecemos...

Carol Leal

Agosto2010JornAlisMo

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quando choraram ao reler cada capítulo pronto”.

abusO sexual, tema dO primeirO livrO

A jornalista e ex-aluna da UFPR, Rita de Cássia Bovo de Loiola foi, em 2003, a primeira autora de um livro reportagem do Curso de Jornalismo. O tema também era pesado: o drama do abuso sexual de crianças em Curitiba, a partir de várias de suas vítimas, adolescentes do sexo feminino, que sofreram violência no âmbito da própria família; o ato é geralmente pra-ticado pelos pais, padrastos ou outros homens da família, mui-tas vezes com o consentimento das mães.

O tema resultou no livro Muralhas de silêncio, orienta-do por Myrian Del Vecchio, que após esta primeira experiência já contabilizou mais de uma dú-zia de orientações de livros re-portagem, como produtros de trabalhos de conclusão de curso de jornalismo. Desta experiên-cia, ela destaca Sobre livros: um painel contemporâneo da prosa ficcional realizada em Curitiba, de Renata Ortega Moritz, que veceu, em 2010, o Prêmio San-gue Novo de Jornalismo, na cate-goria livro-reportagem, promovi-do pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná. “Mas praticamente todos os outros tem muita qualidade, além de serem interessantes, informati-vos e atrativos ao leitor, o que é o principal requisito”, analisa a professora.

“daqui a gente nãO sai”Outro dos professores que

orientou muitos TCCs de livros--reportagem na UFPR é Luiz Paulo Maia, o Lupa. Para ele, esse tipo de trabalho é o que soma mais pontos na formação

do futuro jornalista. “O estudante tem que cumprir várias etapas: pesquisa bibliográfica sobre o livro-repor-tagem em si, ler pra caramba outros livros, entre-vistas, fazer a checagem de todo o material e o texto final”, aponta o professor. Para ele, o texto tem que ser extremamente atraente. “Do contrário, fica uma repor-tagem grande, chata, maçante, e não uma grande reportagem, que é o objetivo final do traba-lho”, completa.

Daqui a gente não sai é um livro que ninguém tira da cabeça de Lupa. A obra conta a história de resistência dos moradores da Vila das Torres, em Curitiba, região que abriga grande parte dos catadores de papel da cida-de. O livro de Fernando Jasper e Anne Warth ganhou o primeiro lugar em um prêmio da Socieda-de Brasileira de Estudos Inter-disciplinares da Comunicação (Intercom). “Ele foi marcante porque eu dei a ideia do tema para os alunos. Eles queriam fa-zer um livro-reportagem e não sabiam exatamente sobre qual tema. E, claro, o desdobramen-to do prêmio nacional”, orgulha--se o professor.

E tem livro-reportagem sobre tudo, até sobre futebol. Só nos úl-timos dois anos, foram três livros sobre a arte de dominar a bola com os pés. O Avesso da Paixão Nacional, escrito por Dâmaris Thomazini e Adriano Ribeiro em 2008, é uma dessas obras. O livro revela a realidade de abandono do futebol feminino no Brasil. Com uma torcida mirrada, pouca vi-sibilidade na imprensa e falta de estrutura para os treinos, mesmo assim as meninas não desistem. Muitas conciliam um emprego durante o dia com treinos à noite e nos finais de semana. A remu-

Caçadores de históriasMuitos estudantes de jornalismo escolhem fazer um livro-reportagem ao final do curso.

Os temas são os mais variados, mas o resultado é um só: uma lição de vida.

neração é péssima, quando existe. Sem contar o preconceito. Tem menina que apanha do pai porque gosta de jogar bola. Outro destaque na área é Paixão Orga-nizada, de Vanessa Prateano, que faz um mergulho aprofundado do mundo das duas maiores torcidas organizadas de Curitiba: a Impé-rio Verde, do Coritiba Football Club, e a “Os Fanáticos”, do Atlé-tico Paranaense.

Histórias para contar não faltam. Escassez, mesmo, só de tempo: um ano para produzir um livro-reportagem é um aperto. Caco Barcelos pesquisou du-rante cinco anos para escrever Rota 66. Dez anos foi o tem-po que o jornalista paranaense Laurentino Gomes levou para escrever 1808. Mesmo corren-do contra o relógio, o professor Lupa acredita que “se o aluno já tem um bom conhecimento so-bre o assunto que vai abordar, o tempo é suficiente”. Para quem investe no sonho de fazer uma grande reportagem, o resultado é compensador e vai muito além do aprendizado jornalístico. É o caso de Carol e Lilo, autores de Retalhos, que depois de seu TCC viraram especialistas em Paraná. “Daqui a 20 anos, quan-do lembrarmos dessa viagem, não será tanto pela produção do livro ou das matérias. Vai ser por tudo que vimos, ouvimos, co-nhecemos... Nós brincamos que o nosso ‘mochilão’ não foi pela Europa nem pela América do Sul; foi pelo Paraná mesmo. E foi ótimo!”, revela Carol.

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ção

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Numa tarde de 1971, Ray Tomlinson digitou uma men-sagem qualquer no correio eletrônico que ele mesmo fez, juntando um programa de en-vio de mensagens que já existia com outro de transferência de arquivos no qual ele trabalhara. O texto foi algo como “QWER-TYUIOP”, ele não se lembra, só tem certeza de que foi tudo em caixa alta. Tomlinson enviou a mensagem para si mesmo, de um computador para o outro que estava logo ao lado. Apesar de próximas, a única ligação entre as duas máquinas era pela Arpa-net, a avó da internet. Naquele instante nascia o e-mail, que em pouco tempo revolucionaria a forma de comunicação entre as pessoas. Só em 2009, cerca de 90 trilhões de emails foram en-viados. Tomlinson nunca rece-beu um centavo por sua criação: ele não fez o registro de patente.

O engenheiro da compu-tação deixou de patentear o e--mail porque não achou que seu invento fosse grande coisa. É provável que haja mais ‘Tomlin-

sons’ por aí. Gente que tem ideias criativas, desenvolve produtos inovadores, mas não registra sua criação. Isso abre brecha para que outras pessoas que não investiram tempo, dinheiro nem esforço em pesquisas se aproveitem comercialmente desses in-ventos. “Patente é um reco-nhecimento do trabalho do inventor. É um título de pro-priedade que o Estado con-

cede em troca da revelação de como se faz aquela inven-

ção”, explica Edmeire Cristina

Os pedidos de patentes — registros de uma invenção — ainda são poucos na UFPR, mas pesquisadores começam a ver nas patentes uma forma de reconhecimento pelo seu trabalho. E de correr o risco de ganhar algum dinheiro...

Um invento para chamar de seu

Renata [email protected]

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Pereira, coordenadora de Pro-priedade Intelectual da Agên-cia de Inovação Tecnológica da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

O título de propriedade é temporário, vale por 20 anos para patentes de invenção e 15 anos para patentes de modelo de utilidade (melhoria feita em algo que já existe). Durante esse período, o dono da patente tem direito a explorar comer-cialmente sua criação sozinho, sem concorrentes. Mas até se chegar a esse ponto o caminho é longo. No Brasil, uma patente demora de sete a dez anos para ser concedida. No entanto, é possível ver a cor do dinheiro antes disso.

O primeiro passo é fazer o depósito do pedido de patente no Instituto Nacional de Pro-priedade Industrial (Inpi) – ór-gão do governo responsável pelos registros de marcas e patentes. E tem que guardar segredo: a invenção ou modelo de utilidade deve ficar em sigilo por 18 meses. Esse é o tempo que o Inpi leva para fazer uma primeira análise do pedido e fa-zer buscas em bases de dados internacionais. Se estiver tudo certo, o inventor recebe um nú-mero de registro e, se quiser, já pode procurar empresários in-teressados em produzir ou uti-lizar sua invenção.

Para ajudar em todo esse processo, desde a formulação do pedido de patente até a busca por empresas interessadas no invento, é que surgiu, na UFPR, a Agência de Inovação. Criada em 2008, a partir do antigo Nú-cleo de Propriedade Intelectual que existia desde 2003, ela tem como objetivo fazer com que as pesquisas realizadas na univer-sidade cheguem ao setor produ-

tivo. A ideia é que todo mundo saia ganhando: sociedade, in-ventores e universidade.

Nos últimos sete anos, fo-ram depositados 94 pedidos de patente pela UFPR. Mas esse número poderia ser bem maior, já que mais de 70% dos docen-tes da universidade têm dou-torado e, mais do que ensinar, eles podem produzir conheci-mentos. Além disso, existem cerca de quatro mil alunos ma-triculados em cursos de mes-trado e doutorado. “Não existe uma cultura de patente, tudo isso ainda é muito recente na universidade”, afirma a coorde-nadora da Agência.

inOvaçãO na universidade

Em 2008, foram publica-dos 30.451 artigos científicos no Brasil, o que coloca o país na 13ª colocação no ranking da produção científica mun-dial. Mas, no mesmo ano, o país obteve apenas 101 paten-tes internacionais, concedidas pelo Escritório Americano de Patentes, nos Estados Unidos. Isso corresponde a 29ª colo-cação mundial, atrás de países emergentes como Rússia, Índia e China e até de pequenos paí-ses como Singapura e Malásia.

Uma explicação para a dis-tância entre a produção cientí-fica e a inovação no Brasil pode ser a falta de conhecimento dos pesquisadores sobre o proces-so de patentes. “A gente acha-va que patente era algo muito complicado e burocrático. Em 2005, o pessoal da Agência de Inovação veio ao Departamento de Química e desmistificou essa ideia”, conta o professor Fer-nando Wypych, o recordista em pedidos de patente na UFPR.

Ao todo, Wypych tem 16 pedidos depositados no Inpi. E

está prestes a ver um de seus inventos ser implantado na in-dústria: já fechou contrato com uma empresa de agronegócios de São Paulo para utilização em larga escala do fertilizante de li-beração lenta de nitrogênio.

O fertilizante é baseado no uso do caulim, um minério en-contrado na argila, abundante no Brasil e de baixo valor agre-gado. O processo químico que garante a liberação lenta do ni-trogênio para as plantas evita a evaporação e não deixa resídu-os no solo. O produto também serve para alimentação de ani-mais, principalmente gado.

O invento foi realizado por Wypych em parceria com o professor Antonio Mangrich, ambos do Instituto de Quími-ca da UFPR, e foi objeto da tese de doutorado da aluna Cristiane Budziak Fukamachi. A ideia de patentear o fertili-zante surgiu durante a banca de defesa de tese. Ao final da apresentação, um dos mem-bros da banca, um professor de São Paulo perguntou: “Por que vocês não patenteiam isso aí? O negócio está muito bonito”. A sugestão foi aceita. “Esse nosso produto é um fertilizan-te inovador. Com isso nós cor-remos o risco de ganhar algum dinheiro”, comenta.

Mais do que a possibilidade de engordar a conta bancária do pesquisador, o registro de patente pode ser o incentivo que faltava para fazer com que as inovações saiam dos labo-ratórios e sejam utilizadas na sociedade. Se o inventor for pesquisador ou aluno da UFPR, a comercialização da patente pode significar também novos laboratórios, equipamentos e recursos para a universidade. Assim o círculo se fecha.

Os pedidos de patentes — registros de uma invenção — ainda são poucos na UFPR, mas pesquisadores começam a ver nas patentes uma forma de reconhecimento pelo seu trabalho. E de correr o risco de ganhar algum dinheiro...

Um invento para chamar de seu

Mas, se a prática é re-cente na universidade, não é no mundo. A primeira pa-tente de que se tem notícia foi concedida na cidade de Florença, Itália, em 1421. Seu beneficiário era o arqui-teto Filippo Bruneleschi que, entre outras obras-primas, foi responsável pela cúpula da igreja de Santa Maria del Fiore, catedral de Florença. A patente deu a ele, pelo pe-ríodo de três anos, monopó-lio na fabricação de um barco para transporte de mercado-rias. Mas a primeira legis-lação sobre o tema surgiu apenas anos mais tarde, em 1474, em Veneza, na época um grande centro comercial. A partir daí, a prática de con-cessão de patentes dissemi-nou-se pela Europa e depois, com o tempo, para quase to-dos os países do mundo.

No Brasil, a primeira resolução data de 1809, um ano depois da chegada da família real portuguesa ao país. Até então, fábricas e manufaturas eram proibi-das por aqui. Com a vinda do governo português para o Brasil, foi preciso incen-tivar o desenvolvimento in-dustrial. Uma das formas de fazer isso era conceder aos inventores o direito exclu-sivo de explorar a invenção por 14 anos. Dom João VI também liberou recursos para incentivar invenções e dar prêmios. O resultado começou a surgir em 1822, com o pedido de privilégio industrial para uma máquina de descascar e polir café, a primeira patente brasileira.

Na Itália,a primeira patente

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Agosto2010ArqueoloGiA

quisas, independente sobre o que fossem”, conta.

E o gosto só fez aumentar, culminando, em 1960, com o ingresso de Igor no Centro de Estudos e Pesquisas Arqueo-lógicas da UFPR (Cepa), antes mesmo de iniciar a graduação de História e Geografia. Des-de então, passadas mais de quatro décadas, a rotina conti-nua a mesma — só muda nos períodos de viagens para os trabalhos de campo. Por volta das 7h “e pouco”, o arqueólo-go chega ao prédio Dom Pedro

II, no campus da Reitoria da UFPR, pega o elevador até o décimo primeiro andar e cami-nha pelas rampas até o décimo segundo, onde está localizado o Cepa, que dirigiu entre 1966 e 2007.

Na porta do Centro, um “puxe” escrito à caneta convida o visitante a entrar. A sala do professor é a última no final do longo corredor — ladeado por relíquias históricas —, sempre aberta para quem deseja con-versar e conhecer narrativas sobre seus achados e salva-mentos arqueológicos.

O almoço ele traz de casa. Após a refeição, a caminhada

Sabe aquele tirada popular que diz: “Você nasceu para a coisa”? Ela define muito bem a relação do professor Igor Chmyz com a arqueologia. O amor pela pesquisa, o acompa-nha desde a infância. O meni-no, nascido e criado em União da Vitória, PR, era curioso e fazia coleção de tudo o que encontrava pela frente. “Eu lia muito, procurava livros que me atraíam. Gostava de pes-

pelo centro da cidade é sa-grada, e o expediente termi-na, religiosamente, às 17h. “Aproveito as caminhadas para visitar a caixa postal que mantenho no correio da Mare-chal Deodoro ou para analisar algum ponto da cidade onde possamos realizar pesquisas”, diz o professor.

vOCaçãO: pesquisadOr dO passadO

Uma visita ao tio que mora-va no interior do Estado traçou o caminho que o professor Igor seguiria pelo resto da vida. Os dois foram acampar às mar-gens do rio Paraná, ao lado das ruínas da vila espanhola Liber-dad Real Del Guaira (datada de

Sharon [email protected]

Uma vida garimpando vestígios do passado

Há mais de 50 anos, as pesquisas realizadas e orientadas pelo professor Igor localizam e contam um pouco do que foi a nossa história

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1557). “Deixei a pescaria e co-mecei a percorrer as ruínas, a colher material. Quando passei por Curitiba, entrei em conta-to com o Museu Paranaense. O professor Oldemar Blasi sentiu minha tendência para a arqueologia e me convidou para trabalhar com eles, isso em 1959”.

Após o ingresso no Cepa, um ano depois — a convite de José Loureiro Fernandes, então diretor do Centro —, Igor assu-miu, em 1964, sua primeira tur-ma de arqueologia, disciplina que ministrou até 2007, quando foi aposentado por idade.

Afastado das aulas da gra-duação, hoje o professor mi-nistra aulas na pós em Antro-pologia Social e continua com as pesquisas. Atualmente, conclui o relatório com os re-sultados dos estudos realiza-dos durante a reforma da Praça Tiradentes, centro de Curitiba, em 2008 — quando ele e sua equipe encontraram uma cal-çada datada do século XVIII no subsolo da praça. O trabalho fez com que interrompesse, temporariamente, as pesqui-sas sobre os virotes (setas curtas) e as práticas funerárias dos índios tupi-guarani. Além disso, o professor orienta uma tese sobre os contatos interé-tnicos no médio Rio Iguaçu. “Nunca pensei em me aposen-tar, porque achava que poderia continuar contribuindo. Foi uma situação que aceitei com revolta. Por outro lado, agora tenho mais tempo para dedicar à pesquisa do material recolhi-do e catalogado durante todos esses anos”.

simpliCidade e reCOnheCimentO

Para o pesquisador, Eloi Bora, que trabalha há mais de 20 anos com o professor Igor, simplicidade e organização são as palavras que melhor definem o colega. “Ele é superorganiza-do e tem uma metodologia de trabalho impressionante. Pela posição que ocupa na univer-sidade e como pesquisador, po-deria assumir outra postura em relação às pessoas, mas não o faz. É uma das características que mais admiro nele”.

Esta simplicidade reflete--se na maneira de o professor trabalhar. Na sala, ampla e arejada, nada de computado-res, cadeiras estofadas e com rodinhas, ou outras “moder-nidades”. Os móveis são anti-gos. Num dos lados do tapete, as marcas dos pés do profes-sor denunciam os anos que presenciaram seu trabalho de pesquisa. “Há algum tempo eu o virei, para deixar as marcas do outro lado”, ri o professor.

Os registros das pesquisas e os artigos são escritos a lá-pis, com letras miúdas em pa-péis de rascunho, uma herança de muitos anos. “Não gosto muito de computador, penso escrevendo”. Habilidoso com as mãos, é ele quem retrata, com perfeição invejável, os ob-jetos encontrados nas pesqui-sas arqueológicas.

Sobre as diversas honras que recebeu, como o 1º Prê-mio de Ciência e Tecnologia do Paraná, o professor quase não fala. Para ele, o maior re-conhecimento é o que recebe dos alunos e da comunidade, como na ocasião da descoberta da calçada na Praça Tiradentes. “Alunos de diversos cursos se ofereceram como voluntários na pesquisa. As pessoas nos perguntavam o que fazíamos e nos parabenizavam. Isso é re-compensador”, comenta.

Entre as centenas de pedes-tres que param para admirar a calçada diariamente, encontra-mos o casal Luiz, engenheiro de alimentos, e Kati Valle, acu-punturista, que não fazem ideia das técnicas que permitiram a exposição do calçamento, mas reconhecem a sua importância para a população curitibana. “As pessoas podem agora ver um pedaço do que foi a nossa his-tória. Não podemos deixar que isso se perca com o crescimen-to das cidades”, afirmam.

No que depender do profes-sor Igor, isso, realmente, não vai acontecer. “Amo a arqueo-logia, nunca a considerei como um trabalho. Enquanto puder, vou continuar com as pesqui-sas para encontrar os registros da nossa história e apresentá-la para todos”.

Desenho de Igor Chmyz

Das ruínas de Pompéia a Indiana Jones

A arqueologia é a ciência que se dedica ao estudo da cultura das sociedades no passado, a partir da análise dos vestígios de ma-teriais, como ossos, cerâmicas, restos de fogueiras, estruturas arquitetônicas, “escondidas” pela ação do tempo sob o solo ou em grutas e cavernas. Os locais que abrigam tais relíquias são chamados de “sítios arqueológicos”.As pesquisas arqueológicas têm início na Itália do período Re-nascentista (século XVI), incentivadas por humanistas como Francisco Petrarca, após a descoberta das cidades de Pompéia e Herculanum, soterradas pelas lavas do vulcão Vesúvio, em 79 d.C. Já no século XIX, a decifração dos hieróglifos da Pedra de Roseta, no Egito, por Jean-François Champollion, abriu novas perspectivas para esta ciência.Na sociedade contemporânea, a arqueologia foi retratada e ga-nhou fama através do personagem Indiana Jones e dos quadri-nhos do Tio Patinhas e sua turma, na série Ducktales.

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Agosto2010

3Dos 12 aos 14 anos se consolida o

processo de lateralização cerebral. O lado esquerdo associa-se às funções analíticas, lógicas e à comunicação verbal, sendo dominante nos proces-sos de fala, leitura, escrita e matemá-tica em cerca de 95% das pessoas. Já o lado direito está ligado à criatividade, à comunicação visual e aos processos de recepção - impressões, imagens, sons, cores, estruturas geométricas e dados abstratos. Para o bom aprendizado de

uma língua é preciso uma boa ar-ticulação destas funções, porque a fala e escrita utilizam diversas regiões do cérebro ao mesmo tempo. As dificuldades aumen-

tam após os 25 anos, quando um hemisfério quer “se meter nos as-

suntos do outro” de maneira dominan-te, gerando confusões. “Infelizmente, boa parte do ensino de línguas para os adultos ainda prioriza a memorização, mas esse já é um método que não tem mais efeito sa-tisfatório. Há também um número muito maior de materiais didáticos voltados para as crianças do que para adultos”.

2Na infância, os hemisférios

do cérebro atuam de maneira si-milar, pois ainda não há dominân-cia de um sobre o outro (lateralização cerebral). Tanto o hemisfério esquer-do como o direito são eqüipotenciais para a linguagem. Os fatores psicoló-gicos também são considerados: “A criança possui maior capacidade imita-tiva, pois é algo instintivo para ela. Ela imita o professor e não fica constran-gida por isso. Já os adultos se recusam a fazer certas atividades em sala de aula por medo de se sentirem ridicula-rizados. Para a criança, o processo de aprendizagem de uma segunda língua é permeado por um sentido lúdico – seja através de música, jogos, do con-tato com objetos. A metodologia é em

sua grande parte baseada na experiência.

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Por que as crianças têm mais facilidade no aprendizado de

línguas do que os adultos

Nos primeiros anos de vida, as co-nexões neurais estão em sua máxima atividade e integração, prontas para novos conhecimentos. Não há nenhum problema da criança ser alfabetizada em mais de uma língua, pois a crian-ça inconscientemente busca sempre a regularidade. Ou seja, se ela perce-be que o passado do verbo comer é “eu comi”, ela vai aplicar a mes-ma lógica para outros verbos como beber: “eu bebi”. Para lidar com as exceções, há sempre o auxilio dos pais e professores. A criança a par-tir dos 5-6 anos de idade já é capaz de comparar dois sistemas lingüísticos e, além disso, sempre há o recurso visual como, por exemplo, em palavras semelhantes como rua e lua, onde se pode verificar graficamente a diferença dos fonemas. Até os 12 anos a criança apresenta maior sensibili-dade auditiva que permite distinguir melhor a formação dos sons das pa-

lavras. As crianças bilín-gües apresentam maior

agilidade mental, pois desde cedo foram

obrigadas a lidar com mais infor-mações do que crianças mo-

nolíngües.

Para Terumi Koto Villalba, profes-sora do departamento de Letras da UFPR e integrante do programa de Pós-graduação na linha de pesquisa referente ao Ensino, aprendizagem e aquisição de línguasestrangeiras, todo ser humano nasce dotado de uma

capacidade lingüística: “Esta ‘caixa preta’ que todos possuímos no cére-bro é chamada dispositivo de aquisi-ção lingüística. Segundo Chomsky, os seis primeiros anos são os melhores para o aprendizado de línguas, pois há uma maior disposição cognitiva”. Sai-

ba um pouco mais sobre este e outros fatores que facilitam a aquisição de línguas nos primeiros anos de vida. Mas vale lembrar:

Para aprender não existe idade!

Camila [email protected]