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No chão da escola:

Acontencências

de

um

universo

apaixonante

ii

Organização

Hellenice Ferreira

Conselho Editorial

Amanda Guerra Cristina Silveira

José Alexandre da Silva Marcia Oliveira Ferreira

Marluce Moraes dos Santos

Revisão

Izis da Costa Guimarães de Oliveira Marcos Vinícius Knupp Barretto

Tiago da Silva Ribeiro

Fotografia da Capa

Everton Barsan

Projeto Gráfico

José Eustáquio de Queiroz Cauper

F441c

Ferreira, Hellenice de Souza, organização.

No chão da escola: acontecências de um universo apaixonante / vários autores. –

Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias, RJ: H. Ferreira, 2011.

1. Escola. 2. Memória. 3. Professores. 4. Sala dos Professores Mestre Paulo Freire

– Brasil. I. Título.

iii

Prefeito

José Camilo Zito dos Santos Filho

Vice-Prefeito

José Amorelli

Secretaria Municipal de Educação

Roberta Barreto de Oliveira

Subsecretaria de Planejamento Pedagógico

Myrian Medeiros da Silva

Subsecretaria de Gestão de Pessoal

Sônia Pegoral da Silva

Assessoria Especial

Angela Regina Figueiredo Lomeu

Departamento de Educação Básica

Mariângela Monteiro

Coordenadoria de Tecnologias da Informação

José Eustáquio de Queiroz Cauper

Sala dos Professores Mestre Paulo Freire

Hellenice Ferreira

iv

“Não sou apenas objeto da História, mas seu sujeito igualmente”

Paulo Freire

v

SUMÁRIO

Apresentação ............................................................................................................... vi

No chão da escola: acontecências de um universo apaixonante ...................................... 1

Escola da minha vida...................................................................................................... 4

Memória sinestésica ...................................................................................................... 5

Ensino Temperado com Afeto ........................................................................................ 7

A turma do sonho .......................................................................................................... 8

Momentos de um dia-a-di@... ....................................................................................... 9

Tempo, tempo, tempo, tempo ..................................................................................... 10

Do pátio da escola ao palco da vida .............................................................................. 12

Educar, um ato de amor ............................................................................................... 14

Sei onde estou: a história de Salviano, por ele mesmo.................................................. 16

Questão de tempo ....................................................................................................... 18

Que surpresa...!!!! ....................................................................................................... 19

As pequenas histórias que mudaram tudo ................................................................... 20

Esquecimento .............................................................................................................. 23

A árvore de Músicas .................................................................................................... 24

A menina que despertou para o universo mágico da leitura ......................................... 25

Santo de casa faz ou não faz milagre? .......................................................................... 28

Legalização: mais do que um ato legal .......................................................................... 30

Mãe Coragem .............................................................................................................. 31

Uma nova chance ........................................................................................................ 33

No chão da escola ........................................................................................................ 35

Chão de escola ............................................................................................................. 37

Mediar, ação literária de amor ..................................................................................... 38

Crianças ....................................................................................................................... 40

Chão da Escola ............................................................................................................. 41

Uma flor no Jardim Gramacho ..................................................................................... 42

Construindo um futuro ................................................................................................ 44

Pó de Giz ..................................................................................................................... 46

Mosaico chão de escola ............................................................................................... 47

vi

Apresentação

Através da educação, deparamo-nos com novas e inusitadas possibilidades de ver o

mundo e, consequentemente, atuar nele. Um dos conceitos de educação inovadora e de

qualidade é o que destaca a capacidade que o professor tem de ser eterno aprendiz e

pesquisador, reconstruindo-se, moldando-se e emoldurando-se, na rapidez das transformações

conceituais.

Já sabemos que o professor é um gestor da sua turma, dos grupos, dos conteúdos, da

disciplina. É ele o gestor do chão da sala de aula, dos passos dos estudantes e dos aparatos que

enriquecerão os seus saberes.

Ao fazer a gestão de sua aula, o professor é capaz de tomar várias decisões. Muitas delas

são pautadas em estudos, pesquisas e leituras, oferecendo resultados mais significativos no

desempenho dos seus alunos. Destaca-se, ainda, o fato de que o estímulo ao confronto de

opiniões, à prática de contextualização e à integração de conhecimentos múltiplos do processo

decisório cria um ambiente apropriado para o aprendizado contínuo.

De fato, não se constrói essa inovação educacional sem alianças, pois muitas vezes a

escola não dispõe de toda a estrutura necessária para motivar o professor. Assim, ambientes

fortalecedores e que propiciam novas oportunidades e criatividade para o professor, tais como

a Sala dos Professores – Paulo Freire, da Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias,

renovam formatos essenciais para o crescimento e para soluções inteligentes, no âmbito da

qualificação profissional.

Hoje, espaços como esse são um pilar imprescindível para bons resultados da união

entre gestão, professor e alunos. A decisão de frequentar e de estruturar esse cenário é apenas

do professor. A decisão de manter um pedacinho do chão da escola no dia-a-dia da

administração é uma “acontecência” coletiva e uma vitória de todos nós.

Roberta Barreto Secretária de Educação de Duque de Caxias

No chão da escola: acontecências de um universo apaixonante

Está quase na hora. Sei que, muito em breve, serei passarela para muitos atores mirins

que por mim passarão com um uníssono objetivo: a instigante busca por conhecimentos

diferentes dos que são aprendidos em outros chãos: o da rua, o de casa, o da pracinha, o do

comércio local, o das casas de familiares e de vizinhos. Enfim, espaços por onde esses

protagonistas circulam e onde aprendem diversas informações que lhes são também úteis no

decorrer de suas caminhadas como cidadãos.

Entretanto, antes da chegada desses personagens tão aguardados por todos que fazem

parte do universo escolar, há toda uma preparação para recebê-los: limpeza (passam-me panos

e até cera para que eu fique brilhante e cheiroso. E devo confessar que adoro esses mimos

feitos pelos profissionais da limpeza! Ah, como é bom sentir a vassoura massageando-me

todo!), organização das carteiras (às vezes, acho que me arranham em demasia) ou,

dependendo da sala, das mesas que serão instrumentos essenciais para a execução das tarefas

propostas por um ator não menos importante: o professor. E lá vem ele, passos firmes,

sincronizados, à espera de dar início a mais uma série de passos que levarão seus discípulos ao

crescimento intelectual. É interessante sentir a desenvoltura desses profissionais que – por

vezes – se emocionam e também se aborrecem com a atitude de certos atores que ainda não

descobriram a importância de sobre mim estarem. Sim, é terrível narrar quantas vezes sou

arranhado, maltratado, pisado com brutalidade por aqueles que ainda não perceberam que

estão em um palco onde têm a chance de errar; já que, em outros chãos, normalmente o erro

implica demissão, punição – enfim – chateação.

Confesso que me sinto deveras importante, uma vez que sobre mim passaram vultosas

personagens. Percebo que isso me sensibiliza. Afinal profissionais de todas as áreas têm de

(devo usar DE quando houver o intuito de marcar obrigatoriedade. Aprendi – certo dia – na aula

de Português, ou você pensa que fico à toa o dia inteiro?) frequentar uma escola e por mim

desfilar. Sei que você estranhou minha nota de tom pessoal feita há pouco, mas saiba que

presto bastante atenção e que – nesses anos – em que sirvo de passarela a todos – também

acumulo conhecimento. Às vezes, divirto-me com a angústia de alguns alunos que – ao fazerem

avaliações – pelas diversas batidas em mim, feitas pelos tênis – sinalizam o nervosismo que

estão sentindo. Ah, se eu pudesse ajudá-los!!! Mas também daria uma boa bronca nesses, já

que – no momento em que a professora estava explicando e com a turma construindo o

conhecimento – aquele nervosinho simplesmente ignorava a tudo e a todos por estar dando

batidinhas com os pés ao lembrar de uma música de que tanto gosta. (Isso é só um dos motivos

que levam muitos a perderem momentos, considerados por mim, imperdíveis!) Veja se o

resultado disso será bom! Não há como acertar mesmo qualquer questão!

Não posso aqui deixar de relatar também os passos de outros que demonstram, pela

segurança no andar, que dirigem com sabedoria e com firmeza a escola: o diretor, figura que – ao

2

caminhar em direção à sala de aula – transforma a postura de grande parte do corpo discente.

Falo grande parte, pois sempre existem aqueles que – mesmo sabendo da importância de ter uma

postura de respeito na escola – teimam em fazer estripulias, que levam a repreensões necessárias

para se manter o espaço escolar disciplinado.

Como me emociono à toa, caro leitor! Também o que não faltam são cenas dignas de

Hollywood. Certo dia, caminhava sobre mim – com muita dificuldade de locomoção – uma linda

menininha. Pelo tamanho de seu pequenino par de tênis, deveria ter – no máximo – sete anos.

Mas apesar de sua dificuldade, seus passinhos me passavam uma vontade e um orgulho em

poder estar pisando o chão da escola, já que – se não fosse o trabalho em conjunto de pessoas

tão interessadas em fazer com que cada brasileirinho saiba o que é ser cidadão – por mim, essa

artista mirim não teria como circular. E captar a energia boa que dela saía e a emoção de pisar-

me pela primeira vez – são cenas que muito me fazem ter orgulho de ser um chão escolar. Mas

não é só isso, há poucos dias – também recebi um aluno especial. A princípio, estranhei o fato

de não sentir seus passos, apenas pneus de uma novinha cadeira de rodas. Depois inferi

(sinônimo de concluir. Já lhe disse, caro leitor, que fico atento às aulas, principalmente de

Português, que é ministrada por uma professora cujos sapatos são enormes! Parece calçar 40!!!

Percebo que é uma mulher grande e forte, mas com uma suavidade e com um carinho com seus

pequenos que me cativa. Acho que estou apaixonado...). Não é muita emoção para um já velho

e gasto chão, minha gente? Não há palavras que consigam dar conta do que senti e do orgulho

que tive ao saber da chegada de alunos inclusivos, que têm o direito, como qualquer outra

criança ou jovem, mas que – sem essa cadeira – ficavam impossibilitados de por mim passar.

Mas isso é passado na história deles, e o que importa é saber que diariamente aquelas rodinhas

circularão freneticamente a caminho da sala de aula, também com uma rampa de acesso (feita

de um primo meu, que veio especialmente para fazer junto a mim um chão que sirva a todos e

onde não haja exclusão) preparada para a livre circulação desses especiais alunos!

Como resolvi me abrir e tive essa chance pela qual muito estou grato, afinal não é sempre

que um simples (isso só para os que não veem em mim a beleza e a importância que tenho) chão

tem a oportunidade de falar tudo o que sente por ser parte integrante desse essencial momento de

vida de qualquer cidadão: ser aluno. Aproveito também para contar que, ao final de um turno, fico

muito deprimido, já que sobre mim jazem pontas de lápis, bolinhas de papel (coitadas das árvores!

Ouço professores que dizem: “Meninos, não arranquem folhas à toa, usem o corretivo.”

Infelizmente, poucos estudantes lhes dão ouvidos e preferem fazer de mim um mar de lixo!) Isso

tudo acontece – bem sei – apesar das constantes conversas que acontecem logo no início do ano,

momento em que o regimento escolar é passado a todos pela equipe diretiva da escola. Só que há

alunos que parecem não ter ouvido nada do que foi dito, ou apenas não veem problema algum em

sujar-me.

Ainda bem que não é só de tristeza que me alimento, visto que todos os profissionais

que são importantes na vida das pessoas (médico, assistente social, psicólogo, professor,

3

políticos) por mim desfilaram e disso sinto-me honrado. Não sei, mas minha afinada percepção

já demonstrava que aqueles passinhos de criança se transformariam em passos importantes

para o futuro e para o desenvolvimento de nosso país. (Estou sentindo as lágrimas escorrerem...

É melhor parar de pensar nisso; já que aprendi, na aula de Ciências, que devemos controlar as

emoções e que, quanto maior a idade, maiores as chances de termos um enfarte!). Prefiro não

citar nomes desses alunos também especiais para não deixar ninguém de fora da enorme lista;

mas basta você, caro leitor, pensar que todos – independentemente da função que exerçam ou

que já tenham exercido fizeram jus aos assíduos passos que deram no decorrer de sua

caminhada diária por mim, velho e gasto chão da escola.

Já está na hora de terminar minhas anotações, já que tenho de me preparar para

recepcionar mais um imenso grupo de alunos que chegarão ansiosos e curiosos para me

explorar. Falo isso; pois – depois que me conhecerão como um todo – muitos até por mim

rolarão (brincadeiras de que muito gosto, pois é um momento em que mais próximo a eles fico

e que posso abraçá-los e senti-los mais perto de mim!) e mais tarde – quando afastados da

escola estiverem, lembrar-se-ão (é mais um uso que devo àquela professora de Português....)

dos mágicos tempos de escola e de tudo por que passaram nela...

Bom, caro leitor, diante desse emocionante texto feito por mim, um tão ignorado chão

de escola, só me resta concluir o seguinte: sou um chão escolar e orgulho-me muito de sê-lo.

Sim é essa a minha simples, todavia apaixonante conclusão! E, como não poderia deixar de

agradecer, sou grato a todos que – de alguma forma – zelaram pela minha manutenção e pela

limpeza de meu corpo tão gasto pelas pisadelas de muitos que de mim nem se lembrarão, mas

que terão belíssimas histórias para relatar desses saudosos tempos de escola! Peço apenas, que

– a partir dessa leitura – todos que por mim circularem retirem um tempo – nem que seja um

segundo – para me contemplar como parte integrante do incrível, emocionante e apaixonante

universo escolar!

Fernanda Lessa Pereira Divisão de Educação Infantojuvenil – Língua Portuguesa

4

Escola da minha vida

Ao ouvir certos discursos sobre a necessidade de tornar a escola um espaço prazeroso,

volto ao tempo e perco-me em minhas reminiscências, pois nunca vivi a escola de uma forma

que não fosse prazerosa. Penso, com certa nostalgia, nos espaços e pessoas e, em todas as

situações vivenciadas, com muita euforia e dinamismo: os recreios e horas vagas, envolvidas

pelos jogos de queimado, pique bandeira, garrafão, elástico... E o despertar para literatura.

Ah, os livros! A fantasia de histórias como: “A Ilha Perdida”, “Cachorrinho Samba”, “O Menino

do Dedo Verde” e, como esquecer, os suspenses de Agatha Christie... As rodinhas de conversa

com os professores e o exercício constante de nossa criatividade: fazíamos teatro, dança,

festivais de música. Tantas as performances! Éramos envolvidos pelas mais diversas

linguagens artísticas. E o envolvimento com o Grêmio Estudantil, as reuniões de

representantes de turma, o despertar do ser político e da consciência da necessidade do

envolvimento nos movimentos que cercavam o nosso Universo.

Caminhávamos confiantes, certos do pertencimento aquele espaço.

Muito do entusiasmo e da eterna certeza de que a escola é o espaço da diferença em

nossas vidas vem desta escola impressa em mim. Registros de um tempo de vivências

significativas e, acima de tudo, prazerosas, que ainda hoje endossam minhas ações e

posicionamentos ao pensar, planejar e realizar em relação à esta Instituição.

Roseli Ramos Duarte Fernandes Secretária de Educação (06/2010 a 07/2011)

Atual Secretária de Ação Social

5

Memória sinestésica

Tudo era muito estranho, novo e intrigante. Sonhara com aquele momento por diversas

noites desde que minha mãe falara que eu iria estudar. Meu irmão já estava estudando e eu

desejava isto mais que tudo.

Havia muita gente na calçada em frente da escola: crianças, pais, bicicletas, tudo que

hoje ainda existe. Mas lá na porta da sala havia uma mulher que hoje não está mais lá, Dona

Maria.

Era uma mulher não muito alta nem muito baixa que usava um jaleco branquinho, muito

comprido. Seus cabelos vermelhos, que depois descobrimos que era pintado, mas não deixava

de ser bonito, não apresentava um fio fora do lugar. Seu rosto, humm... tinha um cheiro bom de

pó de arroz. A boca, esta era muito diferente, era um leve e fino traço de batom no rosto; olhos

claros e com um brilho que me perdia na tomada de lição. Sinto seu perfume até hoje: Madeiras

do Oriente – vendia na farmácia, minha mãe também usava, havia dois palitinhos amarrados

dentro do vidro, eu ficava balançando o vidro horas para vê-los descer lentamente até o fundo

do vidro.

Mas ela não era a única. Havia outras, muito, mas muito atentas às bagunças que

fazíamos. Havia duas que não posso e não quero nunca esquecer o cheiro e os rostos, Dona

Paulina e Dona Arlete. Dona Paulina era uma negra não mais jovem, mas cheia de disposição.

Tinha um jeito mineiro de falar, olhar terno que aquecia quem olhasse. Dona Arlete tinha um

jeitão meio portuguesa, falava alto, mas não deixava de ser terna conosco. Tinha braços fortes,

mãos grandes e dedos gordinhos, muito branquinhos. Elas usavam lenços amarrados na cabeça,

igualzinho quando minha mãe fazia touca no cabelo, mas elas não estavam de touca. Eram as

merendeiras. Nossa, que cheiro gostoso vinha daquela pequena cozinha... Quando chegávamos

para pegar nossos pratos, elas nos serviam com um sorriso nos lábios e uma frase milhões de

vezes repetidas... Cuidado! Está quente!

Ah! Como eu gostava do macarrão com salsicha, da sopa... era tudo novidade; era tudo

como devia ser. Colorido, cheiroso e alegre.

Lembro-me das paredes da sala de aula emprestada – sim, emprestada, já que a escola

funcionava em um prédio cedido pelo Centro Espírita Thiago Apóstolo, que também era o nome

da escola: Escola Municipal Thiago Apóstolo. Era um grande salão dividido por biombos de

madeira em três partes. O telhado de telha de barro ficava tão longe que parecia o céu. As

janelas eram altas e as paredes eram grossas, mas mesmo assim os meninos viviam pulando pra

dentro e para fora quando a professora se distraía.

Havia uma grande mesa com muitos bancos a sua volta e muitos, mas muitos cartazes com

abelhinha, dado, escova, mapas, esqueletos humanos, muitas imagens, sons...

6

Eu gostava de desenhar. Era mágico falar com o papel e ver sair dele esqueletinhos, se

mexendo e falando comigo. Jardins floridos, casas no topo de colinas, nuvens em um céu muito

azul.

A diretora tinha cheiro de jardim, parecia uma atriz de novela, todas, todas pareciam ter

saído de uma página da revista.

Gostava de ver a bagunça que as letras faziam no papel e de tentar entender como era

possível realizar uma divisão tão grande. E pra que dividir se o que eu queria era ficar com todas

as bolinhas de gude.

Em julho era a quadrilha. O ensaio era no terreno baldio próximo da escola. Ele tinha

sido aterrado recentemente, e o barro era bem vermelho, a poeira subia e ficávamos com as

meias da cor da terra.

No dia da festa, meu pai se vestiu a caráter, calça jeans e chapéu de palha; minha mãe

preparou um bolo do norte, aquele de massa puba. Tudo muito enfeitado com pindoba e

bandeirinhas que nós mesmos fizemos.

As prendas... era muito engraçado na pescaria pegar de volta o seu trabalho de

artes...

Tudo tinha cheiro, cor, sabor, tudo era como deveria ser, alegre e novo, tudo.

Todos os anos minha mãe me fazia bordar um tapete de juta com lã em ponto cruz, para

dar de presente no dia do professor.

Mas, no dia das mães, os mais levados eram escolhidos para apresentar versinhos,

cantar músicas, assim como hoje, mas era diferente. Eu chorava todas as vezes que ia recitar o

versinho que tanto ensaiei... eu não sabia porque chorava, até hoje não sei por quê!!!

Ah, quase me esqueci. Por várias vezes soldados iam à escola e faziam perguntas

engraçadas, que eu não sabia como responder: Quem de vinte e cinco tira? E na verdade ele

queria dizer: Quem de vinte, cinco tira, fica com?

Quinze! Quinze era a resposta. Outras vezes iam com médicos, vacinas. Puxa... meu

braço tem a marca até hoje!

E então veio a quinta série. Lá não podíamos mais ficar. Deveríamos fazer o curso de

férias no Fluminense, e a prova do Aquino. Era outro universo, participar da banda marcial, dos

desfiles cívicos, queimada na praça da igreja... Tudo tinha cheiro, cor, sabor. Tudo era como

deveria ser: alegre e novo, tudo...

Lavínia Dolores da Costa Coordenadoria de Nutrição Escolar

7

Ensino Temperado com Afeto

Quando minha mãe separou-se de meu pai, fui enviada para casa de minha tia, que morava no

Espírito Santo. Um lugar estranho para mim, com uma família desconhecida. Eu tinha apenas 5 anos e

encontrei lá mais duas crianças. Eu era a mais velha do grupo. Logo depois, nos mudamos para

Marapé, distrito de Cachoeira do Itapemirim, e lá chegaram mais 4 crianças. Eu teria que lavar, passar,

cozinhar para todos, num total de 7 crianças, contando comigo. Mas, nesse lugar, já na terceira série,

encontrei uma professora que fez a diferença em minha vida. Vivendo nos dias de hoje posso

perceber que ela tinha visão futurista.

Eu estudava à tarde, quando ouvia a sirene tocar para saída do turno da manhã às 12h. Corria

para o rio, tomava banho, colocava o uniforme, do qual me lembro até hoje: saia vermelha

pregueada, blusa de pano de saco, esse que utilizamos como pano de chão, e uma gravata vermelha;

o cabelo ficava para cima. Sapato não tinha, ia descalço mesmo. Às vezes não dava tempo de tomar

banho, aí eu ia assim mesmo e a professora não se importava com o cheiro de xixi, que fazia todos os

dias na cama. Acho que era ansiedade. Para ela isso não significava nada, pois o mais importante era

não faltar aula. O caderno era apenas um. O livro chamava-se meu tesouro e continha todas as

matérias. Era bem grosso e ficava na escola, já que passava de um para o outro a cada ano.

Me lembro dela nitidamente: era alta de pele clara, cabelo pretos, óculos quadrados, grandes

e pretos. Era filha de fazendeiros, não tinha salário, mas estava além de seu tempo. Em apenas quatro

horas de trabalho por dia, ensinava tudo, até mesmo tabuada com premiação, além de ensinar a

cuidar da horta de onde tirávamos a merenda escolar, da qual sinto o gosto até hoje. Tínhamos um

caderno de dedicatória, que ela deu um para cada aluno. Nele, escrevíamos poesias e dedicatórias

para os colegas em casa. Eles transitavam na sala de aula o tempo todo. Lia histórias, fazia brinquedos

cantados e folclóricos conosco num campo de futebol próximo à escola e, nos últimos meses de aula,

dava para cada aluno um poema bem grande para decorarmos no dia de encerramento das aulas.

Nesse dia, íamos sem uniforme com nossa melhor roupa, subíamos na cadeira para declamar e todos

da classe aplaudiam. Ela ainda arranjava tempo para desenhar no canto das folhas de nossos cadernos

e, no final da aula, nos oferecia toquinhos de giz. Em casa, dava aula para as crianças de sabugos de

milho feitos por mim nas horas vagas. Eu sentia muita falta da minha mãe, mas o carinho dela me

fazia sonhar. Sonhar em ser professora. Passei pelas mãos de centenas de professores, muitos

esquecidos, mas ela marcou minha infância e guardo até hoje o nome dela: Genilda Cabelini. Em

minha trajetória educacional e de vida, a tenho como exemplo.

Preciso parar por aqui, pois senão escreverei um livro sobre esse tempo. Acho que meu

talento para arte trouxe de lá. Ela viverá em minhas lembranças para sempre e, onde quer que

ela esteja, tenho a certeza que está feliz, pois seu esforço foi recompensado. Até hoje tenho

meu caderno de dedicatória guardado.

Cleuza Maria Daniel de Souza – Equipe de Cerimonial e Eventos

8

A turma do sonho

A turma era 801B, classificada pelos professores como a “turma do agito”. Éramos todos

amigos dentro da escola e fora dela, pois morávamos no mesmo bairro. O pátio da nossa escola

era muito pequeno. Devido a isso, na hora do recreio, a diretora autorizava somente as turmas da

oitava série a irem à praça, que ficava em frente à escola. Isso era para nós como um prêmio, por

isso todos os alunos da escola, inclusive o jardim de infância, queriam chegar logo à oitava série.

Lá na praça, nós brincávamos de balanço, jogávamos bola, vôlei, mas o que nós mais

gostávamos era ficar conversando com o “Tião”. Ele era um morador de rua muito conhecido

por todos. A vizinhança cuidava dele, dando comida, roupas e tudo que ele precisasse. O Tião

era muito engraçado e sempre contava umas histórias sem pé nem cabeça, que a turma

adorava ficar ouvindo na hora do recreio.

Todos os dias cada um era responsável por comprar um sonho na padaria para o Tião, porque

o Tião só contava as histórias depois de comer o sonho. Quando acabava o recreio, nós voltávamos

para a escola e o Tião era nosso guardião: levava a turma toda até ao portão da escola, dava um

tchauzinho e abria aquela boca sem dente num sorriso que nos fazia rir mais ainda.

Até que um dia, o sinal do recreio bateu, corremos para a praça, e o Tião não estava lá.

Procuramos, procuramos, procuramos em todos os lugares. Perguntamos aos moradores se eles

tinham visto o Tião. E nada.

Antes de o sinal bater avisando que o recreio tinha acabado, voltamos para a sala de

aula. A diretora, Dona Estela, estranhou, pois todos os dias ia lá na praça buscar a gente, porque

fingíamos não ouvir o sinal comunicando o término do recreio. E assim passaram-se duas

semanas. E o Tião não aparecia.

O recreio não tinha a menor graça, a praça vazia. E ninguém tinha coragem de comer um

sonho da padaria. Os professores também estranharam, porque pela primeira vez a turma 801B

ficou caladinha nas aulas e nem uma confusão surgiu neste período. Foi então que durante a

aula da Dona Marly, professora de matemática, ouvimos uma gritaria lá na rua. Alguém batendo

no portão, gritando: “Sonho, sonho, sonho.”

Corremos para olhar na janela que dava de frente para a rua. Para a nossa surpresa era o

Tião. Saímos da sala correndo, cada um mais rápido que o outro. Quando chegamos ao portão,

o Tião falou assim: “Quero o meu sonho e com doce de leite”

Foi a maior felicidade. Nós abraçamos o Tião e o levamos para a nossa sala de aula. Nesse dia a

Dona Estela autorizou que ele assistisse à aula junto com a turma. Quando o sinal bateu corremos

para a padaria e cada um comprou um sonho pro Tião. Foi o melhor recreio das nossas vidas.

Cristina das Graças Ferreira Vianna Equipe de Leitura

9

Momentos de um dia-a-di@...

Era um dia comum, como outro qualquer... Muitos afazeres, atividades normais de todos

os dias: ler emails, twittar, verificar agenda no docs, corrigir textos, fazer algumas ligações... Por

volta de 13h30, antes de sair pra almoçar, lembrei de ligar para casa e verificar como estavam as

coisas por lá. Minha querida mãe, com todo aquele carinho de sempre, me responde que está

tudo bem (mesmo ouvindo o bagunça dos meus filhos na casa). As crianças já chegaram da

escola, almoçaram e estão assistindo aos desenhos na televisão.

Desliguei o celular, já com saudade daquele barulhinho, e lembrei-me de quando eu tinha a

idade deles, de como era bom chegar da escola e contar as aventuras de uma manhã. E eram muitas...

A escola era um lugar de muita magia, muitos segredos, muitos medos. Era realmente

uma montanha-russa pra mim, mas eu amava aquilo tudo! Até porque eu era muito só, filha

única e cheia de imaginação... Lembrei-me de quando, nas manhãs de verão, ia me arrumar

para estudar. Minha casa tinha um quintal enorme, cheio de árvores e muitas plantas. O sol

entrava na casa junto a uma brisa delicada, que trazia o cheirinho do mato molhado do sereno

noturno. Eu tomava um copo de café com leite, mais leite do que café, uniformizada e ansiosa,

com os olhos atentos no relógio da vovó que ficava na cristaleira.

O sinal tocava e já estava na fila para a forma matinal... “Firme, cobrir, firme... rssss.

Nossa, parecia um quartel, mas a gente se divertia assim mesmo. Fazíamos barulho com os

braços e sempre pesávamos nossa mão no ombro do colega da frente, às vezes até fazíamos

cócegas... O Hino Nacional brasileiro era sempre cantado com muita emoção, e depois íamos

pra sala de aula.

Os professores eram parceiros de momentos únicos, como o de ensinar o plantio de

amêndoas em Técnicas Agrícolas; nos apresentar a arte e a Música com um concerto no Teatro

Municipal; aprender geometria medindo a quadra da escola; conjugar os verbos escrevendo

uma novelinha do jornal da escola. Tudo era ligado e interligado, era tudo junto e misturado e o

mais legal disso tudo: a gente aprendia!!!

O celular toca novamente. Era do trabalho. Precisava voltar para a SME, pois tinha um

professor precisando do auxílio da tecnologia e me esperava para atendê-lo. Volto para o

trabalho e ouço no caminho um som de sirene... Paro no sinal vermelho do trânsito engarrafado

e procuro a escola. Será o sinal da entrada? Será que ainda estou em meus pensamentos e não

acordei? Vejo uma ambulância passando na rua correndo... É... que pena, acordei. E volto para a

realidade de sempre: correria, e-mails, TV’s, DVD’s, notebooks, projetores. Mas feliz, muito feliz

com meu trabalho, meus amigos, minha vida!

Alexsandra Rosas dos Santos Azevedo Coordenadoria de Tecnologias da Informação e da Comunicação –

Núcleo Tecnológico Educacional Municipal

10

Tempo, tempo, tempo, tempo

Estou a dois dias do recesso do mês de julho. Estava ansioso por esta parada tão

benéfica para nós, professores. Tempo de recarregar as baterias, refletir sobre os projetos,

rever rumos. Tempo de dar um tempo! Aproveito este intervalo para esvaziar as gavetas (meu

Deus, quanto papel!) e ouvir alguns CDs esquecidos na estante por conta do corre-corre do

cotidiano. Ouço as melodias de Cartola, Nana, Benito Di Paula (meu Deus, nem sabia que tinha

um CD do Benito!), Lenine, Roberta Sá... No momento, com o rádio ligado, Vanusa me diz que

“que hoje eu vou mudar, jogar fora sentimentos e ressentimentos tolos!” Escuto e acho que ela

tem razão. Pra que acumular tanta coisa? Prossigo esvaziando as gavetas e acreditando que a

vida ficará um pouco mais leve no segundo semestre.

Encontro, em meio aos papéis, muitas fotos antigas. Algumas, rasgo com veemência...

sentimentos e ressentimentos tolos. Outras, acaricio. Observo a simplicidade dos olhares, a

vulnerabilidade da vida, a inexperiência dos começos. Encontro uma foto antiga de uma turma

que tive. Paro por um instante. Volto no tempo e tento recordar o nome de cada criança que

sorri naquele registro. Meu Deus, essa foi a turma mais difícil que tive. Foi com ela que aprendi

a ser professor! Recordo-me que todo dia que ia começar a aula eu tinha que desarmá-los

primeiro:

– Coloquem as armas aqui!

E lá vinham para cima da minha mesa pedaços de canivete, ripas de bambu, soco inglês,

espelho quebrado. Quando eu ousava fazer algum passeio com eles era dor de cabeça na certa.

Iam cuspindo da janela do ônibus nas pessoas que passavam na rua da saída da escola até o

destino derradeiro. Eu voltava para casa chorando escondido dentro do ônibus me prometendo

que se eu conseguisse chegar vivo até o fim do ano, eu daria uma grande festa em

comemoração. Era uma turma tão barulhenta que eu já estava fazendo “xxxiiiii” até para papel

alumínio em casa. Como estratégia de sobrevivência, resolvi adotar o método do “Só por hoje”

dos Alcoólicos Anônimos. Fiz uma lista com regras básicas do tipo: não xingar, não matar, não

cobiçar a mulher do próximo e enumerei cada uma. No início da aula eu sorteava um número

que teria que ser vivenciado naquele dia: só por hoje. Eu sei que era só uma regra, mas se

naquele dia eles não xingassem, por exemplo, já seria um alívio.

Um dia começaram os preparativos para uma festa que aconteceria na escola e todas as

turmas teriam que apresentar uma coreografia. Começava ali o meu tormento! Querendo ser

democrático para parecer um professor “sangue bom”, pedi para os alunos trazerem músicas

para ensaiarmos. Pra que? Surgiram um monte de CDs piratas com aqueles funks mais

cabeludos de corar até os MCs da Furacão 2000. Depois de ouvir muitas pérolas da MPB para

garimpar algo que pelo menos não enfartasse a diretora, encontrei uma música do DJ Malboro

que lá no finalzinho dizia: chega de tristeza! Pronto! Era aquela! Agarrei aquela música como se

fosse o último bote do Titanic e fui para o ensaio. No dia da festa apresentamos. Fomos

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execrados! Alguns membros da comunidade acharam um absurdo eu ter colocado em evidência

na festa, alunos que tinham um péssimo comportamento. Naquele dia chorei um pouco mais no

ônibus. Tinha vontade de desistir, mas como já nos disse Chico Buarque: “meio-dia eu só penso

em dizer não. Depois penso na vida pra levar e me calo com a boca de feijão”. E assim eu fiz.

A partir dali comecei a levar para a escola alguns CDs que eu tinha. Quando eu dava

alguma tarefa para os alunos sempre colocava uma música suave de fundo. Músicas clássicas,

MPB, trilhas sonoras. Parecia que isto não fazia a mínima diferença. Um dia resolvi não colocar

mais as músicas durante as atividades, deixando apenas como fundo musical a balbúrdia

peculiar de cada dia. Um aluno se aproximou e perguntou timidamente:

– Hoje não tem música, professor?

Foi então que percebi que estava fazendo efeito. Quando fomos a uma apresentação

musical dos alunos da Escola de Música do Zeca Pagodinho, ouvimos “Aquarela do Brasil”

orquestrada. Um aluno veio me perguntar:

– Professor, é “Aquarela do Brasil”?

E eu, todo orgulho disse:

– É, sim.

No fim do ano, na Festa da Primavera, a minha turma dançou um bolero: “Solamente

uma vez”. As meninas de vestidos longos e os meninos com as gravatas emboladas no pescoço

num bailado sensível sob os olhares perplexos da plateia presente. Tudo isso por causa de

quem? Do Flávio? Não, do tempo. Aprendi que algumas respostas só o tempo pode dar. A foto

na minha mão me recordou algo que havia esquecido: estou em construção! Sem muitas

respostas, mas cada vez mais ávido pelas perguntas. Respeitando meus limites e oportunizando

algumas sementes. Olho a foto e tento por um momento imaginar o destino que cada aluno

tomou. Será que ainda lembram daquela loucura do “só por hoje!”? Tomara que sim. Tomara

que estejam ainda aplicando nas suas vidas, mas agora com novas regras embaladas pelas

muitas melodias que vivenciaram. Só por hoje serei feliz, só por hoje vou acreditar nos meus

sonhos, só por hoje ajudarei alguém a se reconhecer como gente, só por hoje vou sorrir, só por

hoje vou reservar um tempo para meus amigos e familiares, só por hoje, só por hoje...

solamente una vez!

Um barulho no rádio interrompe a música e desperta meus pensamentos. Minha filha

Helena trocou o CD. Agora, Pe. Fábio de Melo recita um poema que diz: “eu, sacerdote das

divinas causas. Ele, o tempo, sacerdote das humanas razões”. Acho que a vida é mesmo assim.

Flávio Valadares E.M. Oswaldo Aranha

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Do pátio da escola ao palco da vida

A leitura está no ar há muito tempo na nossa unidade escolar. Nossas andanças por

esse mágico universo tem nos levado a momentos especiais recheados de risos, choros,

medos, sonhos... Ah! Os Sonhos! Como é bom tê-los e vivê-los. Sonhos movem ações, e

ações tornam-se realidade. Por tal motivo, lendo, relendo e representando juntos, já

sonhamos e vivemos muitas personagens. Com os pés no chão (literalmente), mas com

todos os apetrechos como manda o figurino, sempre fizemos e fazemos “acontecer”.

Por meio do teatro, que nada mais é que leitura em movimento, transformações

reais ocorrem: alunos mais responsáveis, mais parceiros, mais disciplinados, mais LEITORES!

Até mesmo aqueles mais inibidos são contagiados e motivados a deixar a timidez de lado

para viver sonhos!

Tenho convivido e me encantado por meninos e meninas que têm demonstrado

alegria e satisfação em realizar algo que acreditamos valer a pena. E como tem sido válido

cada sorriso, cada conquista, cada superação. Os que concluem o ensino fundamental, na

hora de partir, deixam muitas marcas e histórias inesquecíveis (que me emocionam só em

pensar). É, os que se tornam “ex” deixam saudades e, certamente, as têm também.

Contudo, como se diz, o mundo é pequeno e, às vezes, reencontramo-nos com fortes

abraços e belas lembranças.

Dia desses, uma das minhas estrelas apareceu ao vivo para me ver! Morando no

Canadá, falando inglês fluente, ela me deixou muito orgulhosa da sua vida por lá e por não

ter esquecido que um dia fez parte do grupo de teatro da escola e o quanto isso lhe fez bem

em vários aspectos.

Soube ainda que alguns já são pais e mães de família e a maioria, quem diria,

professores!

Em 2010, quando fomos fazer uma apresentação no Teatro Raul Cortez – como é

bom proporcionar aos meninos esse momento tão sublime que é o de pisar num palco de

verdade –, enquanto passávamos para o camarim, vi, na sala da administração, um rosto

conhecido. Porém, com toda a movimentação da apresentação, não consegui lembrar de

onde! Até que aquela moça bonita, educada, bem vestida veio até mim: – Oi, professora!

Lembra-se de mim?! Eu fui sua aluna de teatro. Nossa! Aí veio tudo a minha memória... e

que alegria! Alegria por vê-la bem, trabalhando (e olha só, no teatro), cursando faculdade

de Comunicação.

É muito gratificante ver minhas estrelinhas participando de algo que vão levar para

sempre em seus acervos pessoais, a ser recordado com satisfação e saudade. Um conjunto

de aprendizado que vão impulsioná-los para futuras conquistas. Alguns saem até dizendo

que ainda vou vê-los atuando como artistas! Torço, torço para que realmente sejam bons

profissionais, independente da área em que venham atuar. Torço para que sejam felizes e

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que façam a diferença por onde passarem. Que sejam sempre ESTRELAS, refletindo boas

ações e transformações no palco da vida real.

E assim seguimos em frente, “teatrando” daqui e dali, mesmo que descalços no chão

da escola, mas flutuando em sonhos e esperanças de que, na vida, o mais importante não é

a situação em que nos encontramos, e sim o rumo que damos a ela.

Izabel Cristina dos Santos Alvarenga Lopes E.M. Nossa Senhora do Pilar

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Educar, um ato de amor

“O noturno é daqueles que, apesar de estarem à margem, nunca perderam a esperança de voltar ao mar”.

Assim, num momento de reflexão, defini a Educação de Jovens e Adultos, minha paixão

dentro do Universo da Educação. Um lugar onde me descobri mestre pela possibilidade de

aprender a me colocar no lugar de aprendiz. A emoção me toma ao falar desta construção.

Quem me conhece e acompanhou minha trajetória junto a este segmento sabe do que falo e do

sentimento que envolve meu discurso.

De toda esta história, não posso me furtar a registrar neste espaço um dos episódios

mais significativos de minha caminhada profissional. Lembro-me de que não só a necessidade

de melhor organizar meu tempo, mas também a frustração na realização de um trabalho, que

me parecia um perfeito desastre, levaram-me a um concurso de remoção, e a uma

oportunidade de trabalhar à noite, num ensino supletivo, que transitava para um então ensino

regular noturno.

O nome da Unidade Escolar, Escola Municipal Todos os Santos, era sugestivo para quem

tinha as pernas, e também o corpo todo trêmulo diante desse novo desafio.

Ao entrar na secretaria e me apresentar, fui focada por olhares descrentes, diante da

minha meninice, nos meus vinte anos, que mais pareciam quinze, tamanha a fragilidade física.

Pedi para aguardar na sala de aula, pois queria um tempo só, para melhor me articular. Ao

entrar na sala, a mesa do professor me pareceu enorme. Um certo constrangimento me

impediu de ocupá-la. Busquei uma cadeira na última fila de carteiras da sala, ali sentei e pensei:

“Se pudesse, nunca mais me levantaria daqui”. O tempo passou e os alunos foram chegando.

Ocupavam seus espaços, conversavam entre eles. Do lugar onde estava, fitava a cada um deles.

Em seus discursos, me apropriava um pouco de suas histórias de vida; ainda estavam despidos

da condição de alunos, e iam expondo um pouco de si mesmos. Alguns me olhavam curiosos,

mas não se aproximaram. Era comum essa rotatividade, a constante presença de novos rostos,

que com o tempo se adaptavam àquela dinâmica. Por um momento ou outro, me lembrava de

minha condição, quando indagavam: “Cadê a professora? No primeiro dia já vai chegar

atrasada?”

Todo aquele transe foi quebrado repentinamente, quando adentrou a sala a diretora da

escola, que me apresentou ao grupo. Por um tempo perdida entre o tempo e o espaço, fui

gradativamente retomando a consciência de minha própria existência, e, para minha surpresa, a

leveza que me invadiu e a empolgação diante de todo aquele rico universo, de múltiplas

possibilidades, me permitiram estar e, muito mais que estar, criar, construir caminhos

diferenciados. A riqueza de nossos contatos permitiu vínculos que até hoje se estabelecem, e,

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muito mais, permitiu uma construção interna de educadora, que se traduz na possibilidade de

compartilhar e de acreditar no potencial e nas possibilidades que envolvem cada ser humano.

Foi um período de desconstruções e reconstruções e, essencialmente, foi um momento

de tamanha amorosidade, a mesma amorosidade que com certeza inspirou tantos escritos de

Paulo Freire, o Mestre, que tão sabiamente nos levou a refletir que a Educação é

verdadeiramente um ato de amor.

Ana Cláudia Gomes Cunha de Carvalho Assessoria de Comunicação

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Sei onde estou: a história de Salviano, por ele mesmo

“(...) A carta chegou e tinha o meu nome... sabia que era importante... Então eu abri e li.

Arrastado, mas li. Era minha aposentadoria. Fiquei muito emocionado por eu ter lido aquilo... Eu

ia ao médico, pois tinha que ir no clínico geral. Eu não sabia ler as placas das portas e ia parar

no cardiologista. Hoje não, mudou tudo. Eu leio na rua, paro na banca de jornal e até tiro uma

casquinha.”

Salviano ingressou na escola municipal Marcílio Dias, na classe de alfabetização de

Jovens e Adultos, depois cursou o Ciclo I, onde ficou dois anos e, por fim, o Ciclo II, onde

também permaneceu por dois anos.

Ele é um senhor de 60 anos, que diz ter 49, porque facilita a paquera. Grandão, com

cabelos grisalhos estilo Roberto Carlos, solteiro, católico, nascido na Paraíba, veio para Caxias

bem jovem.

“Eu sou da Paraíba, vim pra cá com 16 anos, falsifiquei documentos para poder vir para a

cidade. Só grandão que tirei a certidão de nascimento. Me levaram no cartório, fiquei lá cheio de

vergonha.”

Antes de se matricular na escola, já tinha carreira definida. Recebia um salário mínimo

de aposentadoria e complementava sua renda com o serviço de pintor de carros. Seu interesse

na escola não está voltado para o mercado de trabalho. Vai muito além. O que ele conta aponta

para significados mais profundos que a escola traz na sua vida:

“Pra mim é muito importante, porque eu não estudei quando era novo...”

Trabalha em Saracuruna, como lanterneiro; é famoso, conhecido como melhor pintor de

carros da localidade. Um funcionário da escola disse que chega a ter fila de espera para que ele

faça o serviço nos carros.

“Há algum tempo eu já queria estudar, mas eu não sabia onde tinha escola que pegasse

do início. Não tinha. Aí aqui abriu. Me levaram para uma sala, aí eu vi que tava no lugar errado.

Perguntei à professora e ela me levou para a sala certa”.

Quando perguntado quais eram suas metas, desejos em relação ao estudo, ele

respondeu:

“Eu quero aprender. Não tenho definição, eu quero aprender.”

Quando ele diz que estudar é muito importante, porque não estudou quando era novo,

ele demonstra acreditar que havia uma carência na sua vida. O fato de se autossustentar, se

manter financeiramente, não era suficiente para que se sentisse integrado e independente no

mundo. O que ele queria e precisava era saber onde estava, como agir, se virar sem precisar

estar o tempo todo pedindo ajuda.

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“A gente passa a entender alguma coisa, já pega jornal e fica sabendo das coisas. Pega

ônibus, endereço certo, lado par e ímpar da rua. Com pouca coisinha que tá aprendendo já não

precisa ficar alugando todo mundo”.

Relata também o seu olhar para as pessoas que ainda passam por aquilo que ele passou

um dia:

“Outro dia eu vi um sujeito novo para receber no banco, tendo que botar o dedão

(referência à assinatura com a utilização da impressão digital). Às vezes chega alguém no ponto

e pede para mostrar o ônibus, porque não está enxergando. Às vezes acredito, mas às vezes sei

que é porque não lê (os ônibus da cidade de Duque de Caxias se identificam pelo nome do bairro

e não por números)”.

Com essas duas falas, ele mostra, com situações reais e até bem comuns em seu meio,

como é a vida sem estudo, sem saber ler. E o que ele tenta destacar é que saber ou não saber

define o cotidiano de uma pessoa: aonde vai, como vai, sua independência e o seu brio. Para

esse aluno, não ter estudado significava estar uma categoria abaixo, era ser menos que os

outros. Ou, o que era mais grave, não ser ninguém. Ele se desqualificava, por não ter estudado,

independente da vida que possui hoje em dia, da família que criou, dos empregos que

conseguiu, da história de luta, da superação de obstáculos e até da melhoria de vida em relação

à vida de seus pais. Não ser instruído, não ter passado pelo processo de educação formal o

definia.

Hoje Salviano fala com orgulho da independência que conquistou. Não da financeira,

mas da moral, pois já avalia, vê em outros as “deficiências” que tinha e sabe que não tem mais.

“Antes eu não sabia de nada; hoje eu vou no banco e sei onde estou.”

Paula Figueiredo da Silva Camargo Divisão de Educação Infantojuvenil – Filosofia

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Questão de tempo

Sempre que me pergunto: “por que sou professora?”, algum aluno resolve me lembrar

do motivo. Crianças sempre me motivam a escrever algo, geralmente engraçado. Entretanto,

desta vez será algo profundo, pelo menos pra mim. Durante uma roda de conversa, uma aluna

se levantou e começou a me contar que havia visto um programa chamado “Sai de baixo” na

noite anterior à aula. Lembrei que este programa era exibido no tempo em que eu tinha a

mesma idade que meus alunos e exclamei:

– Mas isso é do meu tempo!

Em seguida, outra aluna disse indignada:

– Mas, tia, seu tempo é agora!

Tentei explicar a ela a questão do tempo, que eu me referia a minha infância, porém ela

não se satisfez.

– Mas, tia, você está aqui agora, então também é o seu tempo.

Dei-me por vencida. O que poderia fazer diante desta imensa sabedoria lógica e infantil?

Não pude parar de pensar no que minha aluna disse. Uma criança me fez perceber que

todo tempo em que vivo é meu! Logo eu, saudosista inata, sempre sentindo falta do que

passou... Pensar que a vida é tão curta e que, se não sentirmos e vivermos cada “tempo” como

se fosse o último, podemos perder tanto! Enquanto eu estiver aqui, vivendo, será o meu tempo.

E pensar que uma menina tão pequena aprendeu isso antes de mim! Faço questão de

agradecer aos meus pequenos mestres sempre que posso pelas lições de vida, pelas pérolas

soltas durante as aulas e por alegrarem os meus dias. Obrigada.

Aline de Souza Fiorentini Creche e Pré-escola Ayrton Senna

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Que surpresa...!!!!

Aquele foi o meu primeiro ano na Educação Infantil, e, apesar de gostar de cantar e

brincar com as crianças, nunca tive muito interesse em trabalhar com crianças muito pequenas.

Acho que tenho um vocabulário mais voltado para alunos com uma faixa etária mais elevada.

A turminha era composta de 20 alunos, sendo dois com síndrome de Down. A rotina

inicial corria bem como todos os dias e eu sempre dedicava uma atenção especial a esses dois

alunos. Num desses momentos, um deles gritou:

– Ô, professora, a Júlia está enchendo uma bola!!!!!

E eu respondi que já ia ver e continuei a ajudar esses alunos na atividade do momento.

De repente, outra criança grita com aquela bocona desdentada que quase todos com

cinco ou seis anos têm:

– Não é bola não, professora... É camisinha.....!!!!!!

Sinceramente, aquilo bateu no meu ouvido e ficou. Eu olhei na direção dos dois e percebi

que realmente a Júlia estava com uma camisinha na mão, quase ficando gigante. Então eu disse:

– Que camisinha o quê, Claudinei? Ninguém vai trazer uma camisinha pequenininha para

a escola. Me dá logo essa bola aí, Júlia.

– Não é bola não, professora, é camisinha – disse o Claudinei.

Olhei pra ele e percebi que ele estava achando muito engraçado o meu comentário.

Neste momento, solicitei que fosse na minha mesa, explicando:

– Meu filho, por acaso você sabe o que é camisinha?

– Claro, professora. É pra colocar onde a gente faz xixi.

Fui ficando vermelha e não sabia mais que rumo dar àquela conversa, mas mesmo assim

continuei falando com ele.

– Quem te ensinou isso?

– Meu pai, professora. Seu pai não te contou não, que fica esperando neném se não

vestir a camisinha?

Neste momento, resolvi mandar o Claudinei sentar no lugar dele e fui fazer uma lista de

coisas que podemos colocar na mochila para levar para a escola.

Na hora da saída, fiquei prestando atenção na chegada da mãe da Júlia, pois queria

conversar com ela sobre o ocorrido e pedir que tomasse mais cuidado com as coisas que a sua

filha pegava em casa. Para espanto meu, a resposta desta mãe foi:

– Só isso professora? Eu sempre dou as camisinhas para eles encherem e brincarem

quando estão me perturbando – e começou a rir.

Iná Maria Teixeira Lavradas – E. M. México

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As pequenas histórias que mudaram tudo

Esse texto não pretende ser um relato de como me tornei professora de crianças aos

“mais de quarenta” anos, mas acho que algumas explicações são válidas, pois não tive uma

carreira muito típica. Na adolescência, eu tinha (ainda tenho) horror à ideia de sujar os dedos

num mimeógrafo, por isso, fui estudar “um tal de Processamento de Dados”, que eu não fazia a

menor ideia do que se tratava, mas que me livraria do Curso Normal. O tal de “Processamento

de Dados” ficou conhecido como “Informática” e me levou a trabalhar em treinamento. E foi

por aí que eu cheguei à educação.

Eu nunca havia trabalhado com crianças, quando cheguei à escola naquela tarde de sol.

A turma com mais de vinte crianças na faixa etária de oito anos me seguiu, desconfiada. Na sala,

lembrei dos livros que tive acesso durante o curso de Pedagogia. Definitivamente, nenhum

autor mencionou que as crianças gritavam tanto! Ao final do primeiro dia de aula, senti um leve

desespero, acompanhado por um zumbido persistente no ouvido. Alguém me disse que era

normal e resolvi acreditar. Saí da sala de aula para assumir outro cargo, cinco anos depois.

Desse período, entre muitas coisas boas, ficaram lembranças de pequenas histórias que desejo

compartilhar.

A surpresa do banheiro

Um dia, uma menininha entrou no banheiro da sala de aula e encontrou, boiando dentro

do vaso, um solitário cocô. Foi um escândalo! Todos correram diante do assombro da colega e

ficaram se acotovelando na entrada do pequeno banheiro. Diante da confusão, organizei

rapidamente uma fila. O método era simples: a criança ficava na fila, entrava no banheiro,

olhava o cocô e voltava para seu lugar. Assim, depois que todos passaram pela fila, pude dar

descarga e tentar retomar a atividade normal. Foi então que a pergunta que não queria calar

veio à tona:

– Tia, aquele cocô era seu?

O saco sem santo

Eu adoro o Dia de Cosme e Damião. Quando criança, era um dia de doces e sorrisos. Ao

longo dos anos, venho mantendo a tradição de distribuir doces no dia 27 de setembro. Esse dia,

para mim, não se reveste de um caráter especificamente religioso, está mais ligado à memória

afetiva. Buscando respeitar a religião das crianças, avisei com antecedência que iria levar doces

para quem quisesse. Algumas crianças disseram que queriam, outras avisaram que não iriam

querer e um menino sugeriu que eu colocasse os doces num saco “sem santo”. E assim foi.

Estava certa de que os santos não se importariam de ficar sem sua imagem para que

algumas crianças pudessem comer doces sem culpa. No dia combinado, na hora da chamada, a

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criança levantava e pegava seu saquinho de doces, se quisesse. Quando, na letra C, chamei o

nome de uma menininha esperta, ela me disse:

– Tia, eu não posso pegar.

– Tudo bem. Eu respondi, e ela completou:

– Tia! Pede a alguém pra pegar para mim!

Caso de trânsito

Um dia, um homem foi atropelado. Ali perto, dentro de uma casa, uma mulher chorou

desesperadamente. O filho dessa mulher perguntou à avó por que a mãe chorava tanto e a

senhora respondeu que aquele homem atropelado era o pai que ele não conhecia. O menino

correu para conhecer seu pai, morto, quase na porta de sua casa. Alguns anos mais tarde,

dentro da sala de aula, o menino me contou essa história, como quem conta um sonho.

A caneta correta

Todos o conheciam na escola. Falava com todo mundo, contava histórias e foi o Rei

Mago mais perfeito que um auto de Natal pode ter. Um dia, fui lhe entregar o material enviado

para crianças como ele, com baixa visão, mas ninguém era como ele.

Quando entreguei o caderno de pauta larga e um lápis bem preto, ele me disse:

– Você não vai me dar uma caneta?

Então, lembrei das orientações sobre a espessura do traço, sobre a cor e demais

especificações técnicas de uma caneta adequada para pessoas com baixa visão e disse que iria

procurar. Não encontrei a caneta perfeita e um dia ele me disse uma frase mágica:

– Eu quero uma caneta que brilha!

E apontou para uma caneta usada na correção dos trabalhos dos alunos. Era uma caneta

com glitter, nada técnica, e ele acrescentou:

– Eu quero essa, mas rosa, não.

E, então, eu lhe dei uma caneta azul, com glitter, tecnicamente inadequada, mas

eficiente o bastante para fazer aquele menino sorrir.

Uma menina com a letra A

Naquela escola, o quarto ano de escolaridade carregava um mito: para aprovação, era

necessário que o aluno estivesse muito bem preparado, pois no quinto ano os alunos aprovados

participavam da festa de formatura. Portanto, dizia a lenda, que, para evitar decepções, era

melhor ficar reprovado no quarto ano do que no quinto.

Na minha turma de quarto ano de escolaridade, havia uma menina que não lia e não

escrevia. Apesar das dificuldades, havia nela uma admirável vontade de tentar e de fazer

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sempre de novo. Ao longo do ano, seu desempenho melhorou o suficiente para que a

possibilidade de reprovação se transformasse em dúvida.

Contrariando todas as regras, fui para a reunião de entrega dos resultados sem saber o

que dizer ao responsável por aquela menina de olhos assustados que já se sentia reprovada.

Seu pai era um homem muito simples que na primeira frase falou de seu grande amor pelas três

filhas. Ele me contou que ela havia procurado, sozinha, uma instituição que oferecia reforço

escolar e material de apoio. Disse também que ela fazia questão de "brincar de escola" para

ajudar as crianças menores. Fizemos, então, uma espécie de acordo. Ela seria aprovada e ele a

informaria que seria preciso esforço para não viver, no ano seguinte, a decepção tão anunciada.

Um ano depois, ela estava entre os aprovados do quinto ano de escolaridade sorrindo

em sua beca improvisada. Decerto acreditando, como nós, que vale a pena continuar tentando.

Fátima Denise Peixoto Fernandes E.M. Walter Russo

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Esquecimento

Aquele dia estava muito agitado. Parecia que, de alguma forma, as crianças estavam a

220v. Essa situação se refletia no refeitório, onde algumas turmas esperavam impacientemente

o almoço que havia atrasado.

No meio daquela confusão, acabei chamando a atenção de uma das minhas alunas. Disse

que falaria com sua mãe. Por um momento, apaguei da mente o nome da mãe da minha aluna.

Por isso, perguntei à Natália o nome de sua mãe.

Ela olhou para mim assustada, coçando a cabeça como se eu tivesse feito uma pergunta

muito difícil. As meninas que estavam com ela indagavam surpresas:

– Natália, o que foi? Você esqueceu o nome da sua mãe?

Ela, na simplicidade que só uma criança seria capaz de ter, me respondeu, justificando

aquela situação.

– Ah, tia não sei. Eu só chamo ela de mãe!

Sorri diante da resposta dela e não forcei a situação. Alguns minutos depois levantou-se

de onde estava, veio correndo na minha direção e eufórica, como se fosse responder a uma

pergunta que valesse um milhão de reais, disse confiante com um sorriso de ponta a ponta:

– É Jaqueline, tia! O nome dela é Jaqueline!

Nice Neves Butta E.M. Paulo Roberto de Moraes

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A árvore de Músicas

Era final da década de noventa, exatamente o ano de 1999. A turma era um quinto ano

de escolaridade dessa rede de ensino. Foi nessa turma que tudo aconteceu, mais ou menos,

como será descrito abaixo.

Eu lecionava para essa turma naquele horário horrível que existia na rede (existia?!) das

9h às 15h e, à noite, cursava o quarto período de Pedagogia.

Havia uma disciplina eletiva chamada “Arte e Educação: Teoria e Prática”. Nessas aulas,

aliada à teoria, o professor nos passava várias atividades práticas para que aplicássemos com

nossos alunos. Essas atividades estavam sempre atreladas a alguma produção escrita.

Resolvi propor uma delas a minha turma. Esse ano, por sinal, foi muito produtivo, a

turma era muito receptiva e tivemos muitas produções tanto artísticas quanto escritas, mas a

que me chamou mais a atenção foi a seguinte.

A proposta era “criar” um cenário que poderia ser interno (uma sala, um quarto, etc.) ou

externo, (uma paisagem qualquer, uma casa, etc.), porém esse cenário deveria ser “construído”

com recortes de revistas, jornais, ou encartes. Não poderia ser recortada uma figura inteira. A

sala, por exemplo, deveria ser montada com “coisas” que seriam encaixadas para formá-la.

Depois vinha a segunda parte que consistia na produção escrita, tomando por base o

cenário criado por cada um.

Um dos alunos que optou pela paisagem externa fez aquele cenário básico conhecido

por todos: uma casinha de um lado, uma árvore do outro, com muitas flores no meio. A árvore

foi feita em duas cores, marrom para o tronco, o verde que serviu para a copa foi retirado de

algum classificado, porém veio a composição escrita que muito me surpreendeu e foi mais ou

menos assim:

“Era uma vez um homem chamado Roberto Carlos que cantava e encantava multidões

com suas músicas que, segundo ele, eram escritas por ele mesmo.

Todo mundo conhecia as músicas desse cantor, o que era desconhecido por todos é que

esse homem tinha um grande segredo. Nos fundos da casa dele, havia uma árvore cheia de

letras de música. Quando ele queria alguma música diferente, era só ir até lá, no Pé de Músicas,

e pegar uma. E tinha cada uma mais bonita que a outra!

Ninguém nunca descobriu esse segredo e o cantor, o Roberto Carlos, continua cantando

e encantado até os dias de hoje”.

Ana Maria Oliveira E.M. Ruy Barbosa

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A menina que despertou para o universo mágico da leitura

Larissa era uma menina tímida, olhava de soslaio, não conversava com ninguém. Logo

que cheguei à escola, ela chamou minha atenção. Vivia pelos cantos, parecia que tinha um

mundo só para ela, onde ninguém adentrava. Passei a observá-la e, quando ela percebia minha

presença, se escondia. Sendo sua professora, não poderia deixar que ficasse recolhida em seu

mundo. Precisava, prudentemente, descobrir a chave para desvendar o que a fazia assim, tão

distante de tudo...

Os dias se passavam e Larissa não se relacionava com o grupo. Cautelosamente, fui me

aproximando dela para trazê-la ao mundo da escola.

Ao entrar em sala de aula dei bom dia à turma, entretanto, Larissa apenas olhou-me. O

mais interessante é que ela dizia muito através dos seus olhos, e isso indicava sensibilidade.

Iniciei a aula com a história de Alice no País das Maravilhas e, logo após, pedi aos alunos que a

comentassem. Larissa continuou muda!

No segundo momento, pedi ao grupo que desenhasse e pintasse a história.

– Não vai desenhar? – perguntei para Larissa.

Ela fez que não, com a cabeça.

Convidei uma aluna para sentar-se ao seu lado e mostrar-lhe o que havia desenhado. Ela

ficou observando a colega pintar.

Tente fazer o seu desenho e pintá-lo – pedi a Larissa, apontando para sua folha vazia.

Você também consegue fazer um.

Larissa não mexeu o lápis. A menina deixava escapar de seus olhos um pedido de

socorro. Senti um rastro de esperança surgindo.

– Sente aqui pertinho de mim – convidei-a.

Ela sentou-se, entretanto, ficou silente.

Revelei-lhe que precisava conversar com sua mãe e entreguei-lhe um bilhete.

No dia seguinte, a mãe de Larissa estava lá para conversarmos a seu respeito. Fitou-me

desconfiada, nem me deu tempo de expor a situação, parecia que adivinhara o que eu iria

explanar. E com um semblante carrancudo, foi logo sentenciando: “Essa menina tem problema

de cabeça, professora”. Fiquei estupefata com a sua afirmação. Com calma, expliquei-lhe que

precisava de seu apoio e que não estava julgando sua filha e nem tampouco ela, como mãe.

Uma coisa era evidente: precisávamos nos unir para o bem de Larissa, pois o envolvimento da

família seria essencial para que a aluna pudesse transpor os obstáculos. Contei-lhe que havia

conversado com a orientadora e juntas fizemos o encaminhamento do caso de Larissa para

avaliação médica. A mãe de Larissa agradeceu-me, porém confidenciou-me não ter mais

esperanças. Não me deixei abater com suas palavras...

26

Já em sala de aula, chamei Larissa para ler. Ela sentou-se ao meu lado e começou a

gaguejar. Sua voz saía rouca, e, aos poucos, esvaía-se até emudecer. Percebi que tinha medo de

errar, esse era seu fantasma!

Cada dia que se passava era um degrau que eu subia juntamente com ela. Larissa estava

começando a ler, entretanto, sua voz ainda sumia.

Enquanto esperávamos o resultado da avaliação, não poderia ficar de braços cruzados,

então, planejei o seguinte: pedi que ela lesse, enquanto eu corrigia uns testes (usei essa

estratégia para que Larissa não se intimidasse comigo prestando atenção na sua leitura). Na

verdade, eu estava prestando bastante atenção na sua leitura, só queria deixá-la à vontade. Foi

então que a luz se acendeu entre mim e Larissa: ela começou a ler perfeitamente, sua voz saía

como canto mavioso, mas notando que eu a olhava começou a gaguejar.

Paulatinamente, Larissa foi se libertando de seus medos. Havia lhe explicado que o erro

faz parte da vida e com ele aprendemos a alçar voos longos e seguros.

Chamei sua mãe novamente e participei-lhe que, segundo a avaliação médica, Larissa

era uma criança normal. Sua mãe ficou surpresa! Deu um suspiro de alívio e, emocionada,

proferiu as seguintes palavras: “Eu ajudo de lá e a senhora ajuda de cá!” Assim, despediu-se,

com um sorriso nos lábios.

De repente, ouvi um: “Bom dia, professora!” E quando olhei para trás, avistei Larissa

sorrindo. Uma enorme satisfação tomou conta de mim, afinal de contas a minha menina estava

se comunicando. Isso era motivo de festejar, e muito!

Aos poucos, Larissa foi obtendo confiança e se desinibindo. Com a minha ajuda e a dos

colegas de classe a menina progredia. Os amigos a encorajavam, auxiliando-a na leitura ou

mesmo nas atividades de escrita. Integrou-se ao grupo de dança, dizia que queria ser bailarina.

Larissa estava se socializando e isso era crucial na sua caminhada. Os meses foram se passando

e, a cada mês, o progresso de Larissa e da turma era irrefutável.

Um dia, a orientadora tomou a lição de todos os alunos. Fiquei aguardando o resultado.

Larissa voltou e disse baixinho que a orientadora solicitava a minha presença em sua sala. Fui

pelo corredor a passos largos, tamanha era a minha vontade de saber do desempenho de meus

alunos. Chegando lá, fui saudada pela orientadora: “Parabéns, professora, todos estão ótimos!”

– O que você está fazendo? – perguntou-me.

– Estou realizando várias atividades pertinentes à aquisição da leitura e conscientizando-

os da importância do letramento em suas vidas, uma vez que ampliará seus horizontes –

respondi, com um largo sorriso. – Podemos viajar pelo mundo que o livro nos desvenda!

– E quanto a Larissa? – perguntou ela, segurando minhas mãos.

27

– Eu li o olhar dela clamando e ouvi a voz do meu coração – revelei. – Com o meu auxílio,

da família e dos amigos, seu desempenho melhorou e, consequentemente, sua autoestima

também.

A Festa da Primavera chegou e Larissa juntamente com seus amigos dançaram muito

bem, arrancando aplausos calorosos da plateia. Eu, orgulhosa da turma, sorria.

Larissa é um exemplo vivo de que, com dedicação, união, compreensão e vontade firme,

é possível plantar a semente, vê-la germinar, crescer, desfrutar de sua sombra amiga, saborear

seus frutos e sentir o perfume de suas flores.

Jurema Nascimento da Silveira E.M. Eulina Pinto

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Santo de casa faz ou não faz milagre?

Costumamos dizer, vulgarmente, que “santo de casa não faz milagre”. Como não

acredito nem em santo nem em milagre, resolvi usar esse provérbio para demonstrar o quanto

somos importantes também em nossas casas. Sim, porque não somos professoras somente com

os nossos alunos. Muitas vezes, temos jornada tripla, ou seja, duas na escola e uma terceira com

os nossos filhos ou com os filhos dos nossos amigos, como é o caso que vou relatar.

Eu, Levada, e minha amiga Fofucha trabalhamos juntas desde 2003, quando atuávamos

no projeto “De professor para professor: um convite ao trabalho cooperativo”, que foi

maravilhosamente bem organizado e coordenado pelas professoras Tereza Barreiros e Marliza

Bodê na rede municipal de Duque de Caxias, onde trabalhamos até hoje. Além disso,

morávamos perto uma da outra nessa época e ela vinha de carona comigo depois das incríveis

reuniões do projeto que ocorriam segunda-feira à noite. Para completar, dois de nossos filhos

estudavam na mesma sala de aula de uma escolinha aqui na Penha.

No ano seguinte, nos separamos, porque o projeto, infelizmente, acabou e só nos

reencontramos em 2007 numa escola onde fomos trabalhar. Em 2009, vivemos uma arriscada

experiência em uma outra escola municipal, onde fomos com o nosso grupo todo tentar fazer

um trabalho sério e diferente. No fim do mesmo ano, nos mudamos para uma outra e hoje,

vivemos no paraíso, a Escola Municipal Zilda Arns Neumann, com parte daquele nosso grupo de

2009. Fazemos um trabalho muito bonito e somos realmente um grupo em todos os momentos.

Estamos conseguindo realizar parte do nosso sonho de ser feliz e trabalhar da melhor maneira

que podemos, mesmo encontrando dificuldades de todos os tipos.

Contei um pouco da nossa trajetória nessa rede para contextualizar a linda vivência que

compartilhamos desde o ano passado.

Em 2010, eu tinha uma turminha fofa de primeiro ano (Turma Maluquinha) e Fofucha

fazia o seu trabalho especial na Sala de Leitura. Conversando, ela me disse que sua filha estava

com muitos problemas para se alfabetizar e que adoraria que ela fosse minha aluna. Eu disse

que ela trouxesse a menina para estudar na minha sala, mas, como moravam em outro

município, isso não era possível. Fui para casa, pensando num jeito de ajudar minha amiga e, a

cada atividade diferente que eu fazia com a turma e que causava alguma euforia, eu pensava

“Joice ia adorar isso”. Tanto pensei, que fui iluminada com uma ideia simples, que acabou

ajudando nesse processo tão metamórfico que é a alfabetização.

Comprei um caderno, encapei, e escrevi um bilhete para a menina, convidando-a para

que participasse da minha ideia: ela receberia aquele caderno toda semana com uma atividade

para cada dia. Faria a atividade e expressaria como se sentiu fazendo através do desenho de

uma carinha feliz se tivesse gostado muito; séria se tivesse suportado; e triste se não tivesse

gostado. Mostrei correndo minha ideia para a Fofucha, que na hora ficou entusiasmada (ainda

tenho na minha mente a carinha dela) e levou o material para casa como se fosse ouro.

29

Precisei aguardar uma semana até que Fofucha voltasse com o caderno para saber como

tinha sido esse primeiro momento. Felizmente, Joice gostou e fez as atividades com capricho e

muita ajuda da mãe e do pai.

Durante todo o ano passado, o caderno foi sendo preenchido e virou um meio de

comunicação entre nós duas. As atividades eram variadas e divertidas. Foram ficando mais

difíceis e ela acompanhando tudo. Ela me mandava desenhos, perguntava a mãe como eu era

fisicamente, me escrevia bilhetes. Eu mandava adesivos, bilhetes de incentivos, lápis de cor para

pintar as tarefas. A nossa pombo-correio nunca falhava e me dizia como tudo tinha sido. Se ela

precisou de ajuda, se desejou fazer, se teve dificuldade, enfim, ia me dando elementos para eu

pensar nas próximas atividades. O esquisito era que a aluna sempre fazia com prazer as minhas

atividades, mesmo que com ajuda, e odiava as que recebia na escola em que estuda. Joice veio

lutando ferozmente e, com a ajuda de todos, alfabetizou-se no fim de 2010.

Em 2011, contamos essa experiência para nossas colegas de escola e duas delas

choraram ao ver o caderno e ouvir nossos relatos. Isso mexeu tanto comigo que resolvi escrever

para dizer que santo de casa faz milagre, sim. Eu tive a ideia e providenciei os meios para que

tudo ocorresse, mas Fofucha e Marcos Paulo fizeram a coisa acontecer. Se eles não tivessem se

proposto a isso, o caderno não teria tido nenhum efeito.

Ainda esse ano, Joice veio à nossa escola e o nosso encontro foi incrível. Parece que nos

conhecemos há muito tempo. Ela ficou grudada comigo e, na hora de ir embora, adivinhem?

Pediu o caderno com as atividades da semana, que eu havia esquecido na minha sala. Hoje,

coloco atividades mais elaboradas com textos, fazemos concurso de adivinhas, escrita de

bilhetes e ela faz tudo com mais autonomia. Já não precisa mais do caderno, mas gosta da

atenção e carinho que recebe por conta dele.

Foi muito gratificante ter participado a distância do processo de alfabetização de uma

criança que, se não tivesse os pais que tem, com seus olhares bem atentos, conhecimento

pedagógico e disposição, poderia ter sido mais uma das muitas crianças que a escola não

consegue ajudar.

Quem diria que, no tempo da internet, um caderno, com atividades coladas, iria cativar

uma criança do mundo moderno? Parece que ela conseguiu sentir o tanto de envolvimento que

todos nós colocamos nesse projeto tão simples e correspondeu à nossa expectativa com o que

tinha de melhor.

Obrigada, Joice. Nunca mais serei a mesma depois dessa experiência.

Luciane Maciel Ceccopieri Belo E.M. Dra. Zilda Arns

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Legalização: mais do que um ato legal

Chego apressada depois de enfrentar um megaengarrafamento e procuro uma vaga para

estacionar. Em vão... Meu horário adiantado rapidamente transforma-se em atraso. A reunião

interna vai começar e preciso apressar‐me. A pauta está pronta e os assuntos são extensos. Os

processos não param de chegar, fruto dos mapeamentos realizados no município. Escolas

nascem de um dia para o outro e precisamos legalizá-las. A Comissão precisa prestar atenção...

mapear não é tarefa fácil, não! Demanda persistência. Bato à porta e nada! O barulho da

criançada ecoa de longe, mas a pessoa que vem à porta jura que naquele espaço não existe uma

escola. Entretanto, o convite está em mãos e calmamente é entregue à senhora que gostaria

muito de ter convencido, mesmo com sua argumentação sem sentido.

Em breve, receberemos nossos convidados em nosso quartel-general. Sim, quartel-

general! Afinal, é na nossa sala de trabalho que encontramos o espaço para as trocas, as

mediações e a aprendizagem coletiva. É nesse cantinho que o administrativo e o pedagógico

dão as mãos, construindo a união necessária à legalidade da educação formal.

Mais uma escola comparece na hora marcada. Chega ansiosa para receber orientações

sobre os procedimentos de autorização para funcionar. Teme que sua escola seja fechada!

Entretanto, entre a orientação acompanhada de um café e um sorriso, a calma e a tranquilidade

se estabelecem. Conquistamos mais uma amiga. Coisa boa... trabalhar e ainda fazer amigos!

Mas o tempo passa muito rápido e mais uma e outra e outra, as escolas são pontuais,

comparecem!

– Hoje viemos entregar documentos. – Hoje passei só para ver vocês. – Preciso de

orientações sobre o regimento escolar...

Amanhã teremos comissão, vamos visitar três escolas! Os processos já estão separados,

os termos de visita também. Escola, lugar do educador que tem como ideal a educação de

qualidade, a educação legal. Ela nos aguarda! Visitar uma escola não é tarefa simples, na

primeira visita é necessário um diagnóstico geral e, assim, olhares atentos! Olhos

administrativos e pedagógicos bem abertos. São três pares de olhos a olhar e a olhar. Em breve,

retornaremos e, de visita em visita, a escola vai se modificando. Logo, logo, será encerrado mais

um processo, emitido mais um parecer. Nossa lista é ampliada e agora é garantir a qualidade da

instituição, do projeto pedagógico, das nossas relações. Legalizamos escolas e a parte legal é

conhecer tantas gentes, tantos lugares, tantas realidades. Descobrir “gentes que fazem” é a

nossa especialidade e, por mais complicado que pareça, é muito legal!

Maria Celeste Rodrigues Pais Alves & Equipe de Inspeção Escolar

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Mãe Coragem

Numa noite estrelada de uma terça-feira qualquer, a menina que cursava a terceira série

primária chorava compulsivamente diante de uma folha de papel de pão onde ela costumava

fazer os seus rascunhos escolares. A mãe, depois de uma longa jornada de trabalho, e já de

volta ao lar, percebendo a aflição em que se encontrava a filha, resolveu perguntar-lhe o que

podia fazer para ajudá-la, uma vez que o choro dela a entristecia por demais. A menina,

mergulhada num choro melancólico e profundo diante de sua dificuldade, não respondia às

indagações feitas pela mãe. Num gesto extremamente afetuoso, a mãe pôs a menina no colo e

perguntou-lhe novamente o motivo do choro. A menina, muito fragilizada, olhou para a mãe

com os olhos vermelhos e lacrimejantes e disse: “Estou muito triste porque não sei fazer a conta

de dividir com dois algarismos”. A mãe olhou para o papel de pão já amassado devido à

quantidade de vezes que a operação matemática fora apagada, disse: “Mas isso é muito

simples, eu vou te ensinar”.

As tentativas da mãe foram inúteis, a menina já bloqueada não acreditava no

conhecimento da mãe, dizia que ela não sabia resolver a questão, pois a única pessoa que sabia

resolver o problema era a professora, Dona Nair. A mãe, já esgotada de tantas tentativas

fracassadas, pois a menina não dava ouvidos às suas explicações, silenciou-se.

Na manhã seguinte a filha ficou surpresa ao perceber que a mãe faltara ao trabalho. Ao

longo de sua vida, a menina não se lembrava de ter testemunhado tal situação. A mãe nunca

faltava ao trabalho. A menina tinha em mente as palavras sempre proferidas com muita

dignidade pela mãe: “O trabalho está acima de tudo, dependemos dele para sobreviver”. Então

a menina perguntou: “Mãe, a senhora vai ficar em casa hoje?” “Vai faltar ao trabalho?” A mãe,

de uma forma bem natural, respondeu que aquele dia ela iria ao médico. Então a menina se deu

por satisfeita e não questionou mais a mulher.

Às 10h30 da quarta-feira, a menina, como em todos os dias do ano, saiu para fazer o seu

trajeto rotineiro de ir para a escola. Naquele dia a mãe seguiu a menina sorrateiramente. Sem

que a menina percebesse, a mãe entrou e esperou que as turmas fossem para as salas de aula.

Aproximadamente às 11h30, alguém bateu na porta da turma 303 da professora Nair, toc, toc,

toc.... Tamanha foi a surpresa de todos ao ouvir uma mulher dizer as seguintes palavras para a

professora: “Bom dia, professora!” “Tudo bem com a senhora?” A professora respondeu

educadamente. Então a mãe continuou: “Eu me chamo Maria, sou a mãe da Joana e vim aqui

para pedir a sua ajuda”. A professora convidou a mãe a entrar na sala.

A menina ao perceber que aquela era a sua mãe afundou na carteira toda

envergonhada. Os colegas de classe começaram a caçoar da menina que àquela altura já estava

chorando. Então a professora perguntou à mãe: “Em que posso ajudá-la, dona Maria?”. Ela com

muita determinação, sempre peculiar a sua pessoa, disse: “Eu hoje faltei ao trabalho para vir até

aqui pedir à senhora que me ensine a resolver a conta de dividir por dois algarismos, pois tentei

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ensinar a minha filha e ela disse que o meu “jeito” de resolver a conta estava errado, apenas a

senhora sabia resolver a conta corretamente. A professora, muito solícita, disse: “Gostaria de

ver o seu ‘jeito’ de resolver a conta”. “A senhora se importa de vir até o quadro”? Nesta altura a

menina já estava de cabeça baixa soluçando. A turma impactada, não tirava os olhos daquela

senhora negra, magra, alta, dona de uma altivez de dar inveja. A professora então passou uma

conta para a mãe de Joana no quadro e entregou um pedaço de giz a ela. Imediatamente, ela

começou a resolver a conta e ao mesmo tempo em que resolvia a operação, narrava em voz

alta: “...quatro vezes cinco, vinte, para vinte e dois, dois..” e desta maneira Dona Maria resolveu

a operação até o final. A professora, uma senhora negra, baixinha e muito segura, olhou

fixamente para a menina que estava sentada no meio da sala, e com muito orgulho disse:

“Joana, sua mãe sabe muito bem resolver esta operação. Parabéns! A senhora merece CEM.” A

turma veio à loucura. Todas as crianças começaram a aplaudir a mãe de Joana. A senhora

humildemente agradeceu a professora, olhou para a menina e disse: “Quando você voltar hoje

pra casa, mamãe vai te ensinar as continhas.”

Aquele foi um dia que ficou marcado na vida de Joana, provavelmente também da

professora e de muitas crianças que testemunharam aquele ato de coragem.

Norma Santos Subsecretaria de Planejamento Pedagógico

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Uma nova chance

Caminhava devagar, tinha a cabeça povoada por dúvidas e lembranças, enquanto

crianças agitadas passavam correndo à sua volta. Deveria realmente ir até lá? O medo era

grande, mas não tanto quanto sua esperança.

Havia acordado bem cedinho, num sobressalto, após a noite mal dormida. Estava muito

ansiosa. Pensou em todas as coisas que faria ao longo do dia e não pôde conter o sorriso, ao

pensar no final do mesmo.

Levantou-se. Depois do banho, passou o pente de dentes quebrados pelos cabelos,

olhou no espelho e gostou do que viu. Já nem se lembrava mais da última vez em que estivera

naquele estado, tão empolgada e confusa ao mesmo tempo. Sentia as emoções num turbilhão

dentro de si, um misto de medo, curiosidade e felicidade que eram concomitantes. Seu coração

estava irrequieto e sua cabeça se negava a focar em outra coisa.

Resolvendo não se antecipar, decidiu não pensar no que a aguardava, não naquele

momento. Foi até a cozinha, preparou o café da manhã da família, regou as plantas, fez comida,

acariciou o cachorro e brincou com o neto, na esperança de viver um dia normal. Mesmo

sabendo ser impossível.

Tentou assistir à TV, mas sempre se distraía. Descobriu não ter sido capaz de gravar uma

única cena, passada na programação diária. Ligou o rádio, fez crochê, mas foi em vão, errou os

pontos repetidos, com destreza, tantas vezes antes. Repousou as palmas das mãos sobre o

rosto e receou passar mal.

Estava tão perto que passou o dia inteiro ouvindo o som da bagunça provocada pelas

crianças excitadas. Por um momento as invejou e desejou que as horas passassem mais

depressa. Conferiu o relógio da parede e percebeu que era a quinta vez em menos de meia

hora, que seus olhos seguiam aquela direção. A sensação que tinha era a de que o tempo não

estava passando, ou então passava mais lentamente como se, egoísta, a envolvesse em uma

brincadeira cruel e indecente.

Pegou papel e caneta, pensou, respirou fundo, olhou-os fixamente, mas não se atreveu a

arriscar. Balançou a cabeça em sinal de negação. Rindo de si mesma, apertou-os contra o peito,

cheirou a folha em branco, após passar suas mãos sobre ela e guardou tudo de novo.

Foi até a cozinha, descobriu-se com a geladeira aberta, embora não tivesse a menor

ideia do que tinha ido procurar ali. Aproveitou e bebeu água.

Foi limpar a casa, a poeira retirada dos móveis parecia solicitar a retirada da poeira

existente nas gavetas de sua memória. Pensou nos dias difíceis vividos na infância, nos sonhos

trocados por vassouras e ferro de passar, nas linhas, agulhas e máquinas de costura na

adolescência. Em como sua vida tinha se desenrolado até aquele momento e no quanto do

mundo ainda tinha a descobrir. Olhou as mãos ásperas e calejadas e não se conteve ao

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relembrar tantas pessoas, tantos momentos, quantos sentimentos e tempo que tinham

escorrido por ali.

Perdeu a conta de quanto tempo tinha estado parada em frente ao móvel, inerte,

perdida em seus próprios pensamentos. Olhou novamente o relógio e resolveu se arrumar.

Colocou uma roupa bonita, prendeu os cabelos em um coque, arrumou suas coisas com

cuidado, tinha comprado cada objeto com muito carinho. Guardou na bolsa o caderno bonito,

ajeitou no estojo o lápis, a borracha, as canetas. Pegou a bolsa e saiu de casa, com a sensação

de exploração de um mundo novo.

Agora estava ali, parada diante do portão. Seu coração batia acelerado como num

compasso de escola de samba. Respirou fundo, ouviu o toque do sinal e os portões abriram-se

lentamente a atraindo como um ímã é atraído à geladeira.

Quando se deu conta, já estava sentada em uma carteira, bem na primeira fila que era

pra não perder de vista nem uma letrinha sequer. Correu os olhos pela sala, viu as paredes

coloridas por letras e desenhos de crianças que tinham estado ali anteriormente, observou a

professora, olhou nos olhos dos colegas de turma e não pôde impedir que uma lágrima solitária,

grata e feliz, se deslocasse de seus olhos e encontrasse seu sorriso.

Sirlane Araujo Marques E.M. Albert Sabin

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No chão da escola

No chão da escola

Olhares que se deitam

Olhares tão pequenos

Horizontes de outros passos

Passos para novas terras,

Passos para novas conquistas,

Passos para ir em frente

Caminhar constante

Corrida permanente

De pés que precisam flutuar neste chão.

Flutuar neste chão?

Pode ser barco de nuvem

Para carregar olhos colados de poeira triste,

E abri-los aos céus.

No chão da escola

Olhares se sentam:

Para ouvir expectativas

Para dizer versos da vida

Para chorar junto algumas tristezas

Para pedir um colinho

Quando a dor aperta

E para pular levadices

Quando a alegria faz sorrir girassóis.

No chão da escola

Olhares que buscam

Olhares que pedem

Olhares que se constroem

Olhares que construímos

Olhares que destruímos?

Viver de reconstruções,

Porque não há como fugir da vida!

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Vivências de quem caminha,

Olhares de quem deseja,

Andar sem ferir os pés.

Mistério de um chão tão mágico

Construído na realidade

Encantado por fadas e bruxas,

Transformador de sapos em príncipes,

Fazendo a vez de todas as cinderelas.

Ensinando que é no chão

Que plantamos sementes

Que serão flores e alimento.

No chão a gente aprende

A brincar de roda e amarelinha

Construir castelinhos de areia

Sorrir junto, cair junto e levantar junto.

Porque cair no chão dói, rala!

A gente chora!

Depois aprende que é só passar merthiolate que sara

E aí vai em frente,

Porque não há como fugir da vida!

No chão da escola,

Aprende-se tudo.

O chão da escola é estrada de todos.

Passamos por ele em todas as vivências.

Pois se a vida é uma escola

A escola que vive,

Sabe transformar acontecimentos

Em um universo apaixonante.

Fabíola de Souza Alves E.M. Bairro Califórnia

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Chão de escola

O chão da escola não é vazio nem frio

é cheio de vida

vidas secruzamselaçamentrelaçameseabraçam ali

o ontem, o hoje, o amanhã.

Quem aprende? Quem ensina?

Cada um deixa uma parte de si no outro

marca única, inconfundível e insubstituível.

O chão da escola não é estéril

nele germinam ideias sorrisos lágrimas

histórias sonhos amigos amores valores...

eu germinei, tu germinaste... nós germinamos...

no chão da escola.

O chão da escola não é inerte

estremece ao pulsar dos corações

nos primeiros amores

(o despertar das emoções)

treme com a energia pura da criança

pulando amarelinha

ou saltando a distância.

Certo dia, no chão de uma escola,

um menino se olhou no espelho

sonhando seu futuro.

Hoje, no chão de uma outra escola,

em um outro espelho,

um homem se olha

sonhando o futuro

de outros meninos...

José de Freitas Silva E.M. Parque Capivari

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Mediar, ação literária de amor

Ensinar o Bê-a-Bá

E também a escrever

Pro professor importante

Com certeza o seu dever.

O desafio do percurso

É criar paixão por ler.

Paixão pela poesia,

Pelo livro, pela história,

Por aquela mais humilde

E outra cheia de glória.

Pra quem é apaixonado

Ler não tem escapatória.

Pra saciar esta angústia

De todo bom professor,

Que promove a leitura

Com carinho e amor,

Abraçamos o projeto

Do “Jovem Mediador”.

Projeto que quer o aluno

Disseminando leitura

Nas escolas de Caxias

Em todas da prefeitura

Fazendo leitura em rodas

Que ao girar ninguém segura.

O mediador de leitura

É um sujeito especial

Lê e fala com postura

Não é aluno normal

Na escola se destaca

Da maneira especial.

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Pra ser bom mediador

Precisa se preparar

Ler jornal, poema, história,

De tudo apreciar,

Pra escolher o melhor livro

E com classe mediar.

Com seu livro de história,

Colcha e almofada à mão,

Lá vai o mediador

Cumprir com sua missão

De disseminar leitura

Pro pequeno e pro grandão.

Este aluno no futuro

Criará comunidade

Comunidade Educadora

Transformará a cidade

Cidadão que faz história

Melhora a sociedade.

Viviane Alves Guimarães E.M. Presidente Costa e Silva

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Crianças

Entre sorrisos e encantos

Perco-me por vezes infinitas

Num perder-se que, entretanto,

Leva-me ao encontro da vida

A cada olhar que me ensina

E um convite me faz

De ser menino ou menina

De ser artífice da Paz.

Cada um é tão real!

Não a promessa de um futuro,

É a certeza de um ideal e

Não um caminho no escuro.

Em seus gestos delicados

Que transbordam energia,

As crianças, aos bocados,

Revelam tamanha alegria!

E sendo assim como são,

Pequeninas e grandiosas,

Elas, em suas emoções,

São as almas dadivosas

Que ensinam mais que aprendem

No universo escolar

Àqueles que as compreendem

De maneira singular.

A escola é, então, um jardim

Em que cada flor cultivada

Transforma o mundo, enfim,

Com o amor e a paz almejada

É ainda mais que um espaço,

É mais que um tempo, ou lugar...

Na escola, cria-se o mundo que,

Enfim se quer transformar

E na criança, esse mundo

Buscamos realizar!

Fatima Anselmo Divisão de Educação Infantojuvenil

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Chão da Escola

Chão de luta e labuta

Força, fé na conduta

Chão de histórias de vidas

Entrelaçadas e aguerridas

Chão que pulsa saber

Troca, mistura e dá prazer

Chão de conhecimento, afeto e emoção

Que faz diferença na população

Chão do valor eterno de aprender

Cidadania, direito e dever

Formação solidária

Chão de vida humanitária

Pise firme neste chão

Escola é a solução

Chão que rege uma Nação

Que não progride sem Educação.

Maria Fátima Martins D’Aqui E.M. Expedicionário Aquino de Araújo

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Uma flor no Jardim Gramacho

Quando cheguei ao Jardim Gramacho,

não vi jardim, nem flor, nem riacho,

mas em pleno verão vi o rastro

de luz brilhando nos muros azuis

da Escola Municipal Mauro de Castro.

Talvez aqui esteja o jardim

Esperançoso pensei assim

Estaria oculto entre as salas?

Não, não senti o aroma das flores

nem vislumbrei das frutas e folhas as cores.

Diziam: “ali a terra é dura,

não há jeito, é um mal sem cura.”

Mas quando a sala olhei por inteiro,

vi em cada aluno uma semente.

Concluí: “Mais que professor, serei jardineiro”

A turma do sexto ano fervia como o verão

Euforia, gritaria, hormônios em ebulição.

Tantos cadernos, professores: tudo novidade!

Ah! nas paredes o cheiro de tinta fresca,

Nas sementes o sonho da felicidade!

O sétimo ano chegou lento como o outono

Muitas sementes se perdem sem dono.

Muitos vão, muitos chegam sem esperança

Cadê a Jéssica, o Maicon, o Ernani?

Está grávida, está trabalhando, está de mudança.

Eis o oitavo ano, frio que nem o inverno

muitas mentes inertes em sono eterno.

Os jardineiros debatemos na reunião:

como cuidar do ramo que desponta?

como salvar a nossa plantação?

Mas com o nono ano irrompe a primavera

e se sempre alcança quem espera

nossos brotos já germinam com vigor

algumas sementes ainda resistem a vingar

enquanto algumas já têm caule e até flor.

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Aconteceu então certo dia

quando eu da sala já saía

encontrei uma dessas flores tão abatida

com olhar distante e pétalas caídas

“O que te aflige, o que te faz tão dolorida?”

Seu nome era Deise, só eu, professor

de inglês sabia que ali estava uma flor.

Mas a margarida de pele negra reluzente

não sorria mais como antigamente

não brilhava mais ao sol nascente.

“Descobri que tenho problema no coração,

não posso brincar, correr: tudo agora é em vão.

Minha vida agora é remédio e hospital

Nada tem mais graça, nem amigos, nem escola

Agora é só aguardar com dó o meu funeral.”

Como um jardineiro, com o olhar atento,

não perdi tempo, nem o alento:

“Coragem, menina, abraça tua vida!

Olha o que tens, vive a cada dia

como se fosse único, alegre e decidida!”

Continuei com palavras aquela flor a regar

E a cada dia cultivava e alegre vi brotar

novas pétalas de esperança

naquele caule adubado em dor,

renascia naquele rosto o sorriso de criança!

O tempo passa, floresceu aquele jardim,

rosa e cravo, azaleia e jasmim,

mas como anda a nossa margarida?

alegrando a terra de outros canteiros

cheia de brilho, cheia de vida!

Como na parábola, muitas sementes no caminho

se perderam, isoladas, sem carinho.

Nessa semeadura, o que nos consola

é descobrir que a cada ano se renova

a confiança de se colher no chão da escola!

André Luiz Lacerda Deschamps E.M. Mauro de Castro

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Construindo um futuro

Quem disse que professor sabe tudo

Vive uma vida de ilusão.

No chão da primeira escola aprendi

Que ser professor é mais que profissão.

Na sala repleta de alunos

O pequeno menino se apresentou.

Não sabia ler nem falava direito,

Mas muitas lições nos ensinou.

A aula ficava emocionante

Com toda experiência que trazia.

E cada assunto que falava

Era motivo de muita alegria.

Um dia o menino triste chegou.

Procurei uma explicação.

Descobri que a violência o marcou,

Ferindo seu pequeno coração.

Quem poderia ter a coragem

De maltratar o menino sonhador?

O que fizeram da aprendizagem

Que o pequeno sempre ensinou?

Mesmo com toda essa tristeza,

O menino voltou a sorrir.

E essa experiência de vida

Tive que registrar aqui.

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Nossos alunos passam problemas

E cada um tem uma reação.

O que você tem feito, professor,

Para amenizar essa situação?

Uns colocam de castigo,

Outros mandam para a Direção.

E o menino que está entristecido

Não vê esperança na Educação.

Por isso, em cada escola que piso,

Deixo as marcas do amor.

Prefiro educar o menino

Para, quem sabe, torná-lo doutor.

Nossas mãos são preciosas

E nossas palavras têm poder.

Eduque, você também, o menino

Para que ele não venha a se perder.

Eloiza Cristina de Freitas da Conceição

E.M. Sônia Scudese

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Pó de Giz

Nas batidas das horas

Assim começa o dia

Com o pó de giz

a construir linhas infinitas

Faz casa e árvore. Casa na árvore.

Casa-árvore, João-de-barro.

E o mundo inteiro

a arder pelas pupilas.

Pó que vai colorindo de vida

Os sonhos do aprendiz

Pó dissolvido no vento

Com restos de vozes

E risos em movimento

Pó de giz

Feito de um traço a outro,

entre um passa e outro,

A escrever no tempo

Tudo o que o sonho diz

Termina o dia e

Um pó de giz

cai no chão da sala.

No avesso do sentido,

A pá não o apaga.

Fica ali latente

para quem quiser resgatá-lo.

Aline Pupato Couto Costa E.M. José Medeiros Cabral

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Mosaico chão de escola

Chão de escola

Que te quero diverso

Qual mosaico de passos rápidos do fulgor da idade

Ou passos lentos da maior idade

Chão de escola

Mosaico de pegadas

Pegadas das rodas circulantes das cadeiras metálicas

Das pontas guias de bengalas que conduzem

Chão de escola

Mosaico de caminhos

De guias e trilhas

Caminhos que se mesclam

Que se diferenciam

Chão de escola molhado

Espelho que reflete tantas formas

Tantas linguagens

Reluz o balé dos corpos que conversam em línguas de sinais

Os rostos brilhantes

Matizes sem iguais

Chão de escola

Chão de vidas

Tão minhas

Tão suas

Tão nossas

Histórias

Ponto de chegada

Ponto de partida

De muitas trajetórias

Edicléa Mascarenhas Fernandes Coordenadoria de Educação Especial