nº 373 edição brasil

68
ARMAS NOS EUA PROBLEMA MEXICANO MAPA DO CRÉDITO COMO FUGIR DO APERTO A FLORESTA PRECISA DEFINIR UM MODELO SUSTENTÁVEL PARA CONVIVER COM O AGRONEGÓCIO, OU PODE VIRAR SAVANA. DILEMA AMAZÔNICO ESPECIAL ENERGIA OS PRÓXIMOS MEGAWATTS www.americaeconomia.com.br 15 DE MARÇO, 2009 BRASIL Nº 373

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AméricaEconomia: Revista de Economia e Negócios Latino-americana

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ARMAS NOS EUAPROBLEMA MEXICANO

MAPA DO CRÉDITOCOMO FUGIR DO APERTO

A FLORESTA PRECISA DEFINIR UM MODELO SUSTENTÁVEL PARA CONVIVER COM O AGRONEGÓCIO, OU PODE VIRAR SAVANA.

DILEMA AMAZÔNICO

ESPECIAL ENERGIAOS PRÓXIMOS MEGAWATTS

www.americaeconomia.com.br15 DE MARÇO, 2009

BRASIL

Nº 373

BANCO Das grandes empresas

Apresentamos os frutosde grandes parcerias.

SAC 0800 729 0722 - Ouvidoria BB 0800 729 5678 - Deficientes Auditivos 0800 729 0088

Mat

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ter

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008.

Tran

sportes

Em

bala

gens

San

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ento

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méticos

Pap

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Cel

ulose

US$ 265,979,751.89Pre-Export Finance

R$ 260.000.000,00Capital de Giro

US$ 183,511,598.97Pre-Export Finance

US$ 30,000,000.00Pre-Export Finance

R$ 50.000.000,00Finame

R$ 150.000.000,00Capital de Giro

R$ 52.000.000,00Aquisição de Recebíveis

US$ 40,950,000.00BNDES Exim

R$ 37.000.000,00Capital de Giro

R$ 70.000.000,00Finame

R$ 37.800.000,00Finame

R$ 167.000.000,00BNDES - Programa de

Modernização e Expansão da Frota de Navios

US$ 300,000,000.00BNDES Exim

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15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 3

NESTA EDIÇÃONº 373 / 15 DE MARÇO, 2009

SEÇÕES 4 Índice 6 AE.com 9 Memo10 Cartas11 Editorial12 Pistas13 Movimentos39 Ferramentas58 Capital Aberto60 Interfaces61 Clics & Chips62 Negócio Fechado63 Radar M&A64 Raio X65 Visões66 Linha Direta

PMES GLOBAIS

38 Contra o calotePequenas empresas têm de aprender

a avaliar a capacidade de pagamento

de seus clientes.

DEBATES

40 Celeiro em riscoApesar das iniciativas civis e empre-

sariais, a Amazônia ainda sofre com

o lobby agropecuário.

45 PanorâmicaAbraham Lowenthal sugere como

Obama pode melhorar as relações

dos EUA com a região.

46 NarcoarmasO contrabando de armas dos Estados

Unidos alimenta a força do narcotráfi co

contra o governo mexicano.

49 OpiniãoA América Latina não deve esperar de

braços cruzados que as soluções de

seus problemas cheguem do exterior,

diz Javier Santiso.

ESPECIAL FINANÇAS

50 A grande buscaO crédito está estancado, mas há algu-

mas opções para que as corporações

obtenham fi nanciamento.

53 Corrida às multilaterais BID, BM, CAF, FMI. Todos os que neces-

sitam de dinheiro batem à sua porta.

56 Fundos assustadosOs fundos soberanos não querem nada

com os países desenvolvidos. Olharão

para a América Latina?

59 FinançasAs moedas da região fi zeram um passeio

de montanha-russa e ainda continuam

com enjoo, diz John Edmunds.

NEGÓCIOS

30 Aço sem forçaO setor siderúrgico enfrenta outros de-

safi os além da recessão global.

32 Plano de obrasA brasileira Camargo Corrêa está

pronta para aproveitar novas opor-

tunidades.

34 Gruas non stopMercado imobiliário da região voltado a

escritórios comerciais ainda desperta

o interesse de investidores.

36 Latinas de baixo custoCompanhias aéreas se adaptam à

realidade do mercado e criam novos

modelos de negócio.

37 Batata que não se exportaApesar de ícone da culinária local,

a batata peruana ainda não obedece

padrões internacionais.

- Os projetos não se detêm devido à crise - Lítio, o novo ouro da América do Sul - O desafi o chileno- Pemex: reforma deformada

América LatinaEnergia

na

CAPA

: OTH

ER IM

AGE

18

Especial:

4 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

ÍNDICE DE EMPRESASOS NÚMEROS REFEREM-SE À PRIMEIRA PÁGINA EM QUE AS EMPRESAS SÁO CITADAS.EXCLUI AS EMPRESAS QUE FIGURAM EM GRÁFICOS E RANKINGS

a-b

Abeceb ......................................31

Aços Arequipa ..........................30

Admiralty Resources .................25

Advent .......................................56

Aerocondor ...............................36

Aeroméxico ...............................36

AES Gener ................................21

AIG ...........................................52

Altos Hornos .............................30

Amdocs .....................................14

Aros ...........................................19

Autopark ...................................13

AvMan .......................................36

Azul Linhas Aéreas ...................36

Bain & Co. ................................36

Baldin ........................................20

Banamex....................................14

Banco Fator ...............................33

Banif Securities ...................33, 51

BHP Billiton..............................57

Bice Investimentos ....................31

BMW ...................................14, 25

Bogaris ......................................15

Bulltick Capital Markets ...........58

BYD ..........................................25

c-d

Camargo Corrêa ........................32

CAMS .......................................15

CB Richard Ellis .......................34

Cedae .........................................56

Cemig ........................................20

Cencosud ...................................34

Cerro Vanguardia SA ................16

Changan Automotive Group .....13

Chemetall ..................................24

Chery .........................................13

Chevron .....................................20

Cifi USA....................................51

Citigroup .......................12, 14, 57

Click ..........................................36

Comerci .....................................50

Compañía de Aceros

del Pacífi co ..........................31

CPFL ...................................20, 33

Cramer .......................................14

CSH ...........................................31

CSN ...........................................31

DCNS ........................................14

Devon ........................................20

Dewey Lebouf ...........................57

Dubi International Capital .........56

e-f

Ecobase .....................................17

EDF ...........................................21

EDP ...........................................21

Eletrobrás ..................................21

Endesa .................................16, 21

Enercons ....................................19

Equity International ..................52

ERNC ........................................16

Euromonitor ..............................17

Everis ........................................20

Factoring Corporativo ...............50

FAW Group ...............................13

FMC ..........................................25

Ford Motor Company ................25

g-i

Gás Energy ................................20

Geely Holding ...........................13

General Electric ........................14

Geração Futuro ..........................30

Gerdau .......................................30

Gestión e Ingeniaría IDC ..........33

Global Insight ............................13

GM ............................................25

Gol .............................................36

Google .......................................39

GP Investimentos ......................56

Grameen Bank ..........................40

Grupo Bolloré ...........................24

Grupo Matte ..............................12

Grupo Posadas ..........................36

Impsa .........................................19

j-k

JetBlue Airways ........................36

JMalucelli ..................................38

JWT ...........................................16

Kayco International Group .......35

l-m

LAN ..........................................36

Larrain Vial ...............................52

Lehman Brothers .................52, 59

Levant Power Corp....................60

Link ...........................................12

Lithco ........................................25

Mapfre .......................................38

Mario Sureda Negocios

Inmobiliarios .......................34

Melhoramentos .........................12

Mexicana ...................................36

Microrate ...................................39

Minera Triton Argentina ...........16

Mitsubishi ...........................24, 31

Monitor Group ..........................56

n-o

NAI Global ................................35

Odebrecht ......................14, 21, 42

p-r

Patrimonio Estrategias

Inmobiliarias .......................35

Pemex ........................................29

PeopleSoft .................................14

Pescarmona ...............................19

Petrobras ........................30,33, 56

Petroclean ..................................17

Philips .......................................61

PricewaterhouseCoopers ...........26

Real State Options .....................34

Reporte Inmobiliario S.A. .........34

Roskill Consulting Group .........23

Ryan Air ....................................36

s-t

Sadia ..........................................40

Samsung ....................................61

Saraceni Energia

& Logística..........................20

Securus SA ................................16

Sentient Executive .....................25

Serasa Experian ...................38, 58

Sierra Exportadora ....................37

Sigma Systems ..........................14

SN Power ............................16, 21

Southern Cross ..........................56

SQM ..........................................24

Stanwich Advisors ....................56

Suez ...........................................16

Sumitomo ..................................24

Suzlon .......................................18

TAM ..........................................36

Techint/ Ternium .......................31

Temasek ....................................56

Tenaris .......................................31

The Setai ...................................35

Transpetro .................................30

u-v-w

Unilever .....................................17

Unique .......................................33

Usiminas ...................................30

Vale ...........................................30

Varig ..........................................36

Vector Casa de Bolsa ................14

Vestas ........................................16

Vinhas Advogados ....................20

Volaris .......................................36

Vostu..........................................39

Votorantim ...........................21, 33

Wal-Mart ...................................60

Western Union...........................14

Windservice ..............................16

BANCO Das grandes empresas

Apresentamos os frutosde grandes parcerias.

SAC 0800 729 0722 - Ouvidoria BB 0800 729 5678 - Deficientes Auditivos 0800 729 0088

Mat

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sportes

Em

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ento

Cos

méticos

Pap

ele

Cel

ulose

US$ 265,979,751.89Pre-Export Finance

R$ 260.000.000,00Capital de Giro

US$ 183,511,598.97Pre-Export Finance

US$ 30,000,000.00Pre-Export Finance

R$ 50.000.000,00Finame

R$ 150.000.000,00Capital de Giro

R$ 52.000.000,00Aquisição de Recebíveis

US$ 40,950,000.00BNDES Exim

R$ 37.000.000,00Capital de Giro

R$ 70.000.000,00Finame

R$ 37.800.000,00Finame

R$ 167.000.000,00BNDES - Programa de

Modernização e Expansão da Frota de Navios

US$ 300,000,000.00BNDES Exim

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O S N E G Ó C I O S D A A M É R I C A L A T I N A O N L I N E

DEFESA BRASILEIRAApós vários anos de estagnação de suas For-ças Armadas, o Brasil começa a esquentar seus motores. Especialistas apontam que as recentes aquisições militares e o lançamento da Estratégia Nacional de Defesa mostram a intenção do País em se tornar um ator re-gional preponderante. Contudo, ainda há um longo caminho a ser percorrido para o plano deixar o papel, já que o documento não esta-belece metas e prazos e, embora tenha levan-tado o debate sobre o tema, o Brasil nunca defi niu o objetivo de reforçar o poderio mili-tar, destaca o especialista Expedito Bastos, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Leia mais no site.

O lítio é visto como a commodity do futuro pela forte demanda que as baterias de automóveis elétricos – que já estão sendo desenvolvidos na China, Europa e Estados Unidos – irá gerar. Além da reportagem publicada nesta edição (ver pág. 23), veja no site outros desafi os para a consolidação da indústria do lítio. Entre elas, legislações como a da Bolívia, que afastam investidores estrangeiros, e a tarefa de aprender o que fazer com o descarte das baterias para reduzir o impacto do material na natureza.

QUAL É A SUA APOSTA PARA A COTAÇÃO DO DÓLAR DAQUI A SEIS MESES?

6 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

ENQUETE38%

13%

MENOS VALORIZADO

MESMO PATAMAR ATUAL

MAIS VALORIZADO

50%

AINDA NÃO RECEBE? LEIA O QUE ACONTECE NOS PRINCIPAIS SETORES DA ECONOMIA E DOS NEGÓCIOS REGIONAIS EM SEU E-MAIL. ASSINE.

PROMESSA ENERGÉTICA

PLATAFORMA ONLINE

O Brasil está perto de entrar em um novo ciclo da indústria de jogos eletrônicos, com base na plataforma online. E, segundo executivos do setor, o que não falta é potencial intelectual e consumidores para desenvolver um mercado que ainda engatinha no País. Embarcando nessa onda, aparece uma nova mídia: os consoles digitais. O primeiro a entrar em operação no Brasil será o Zeboo, para o qual os usuários comprarão créditos para “baixar” jogos da web, sem cartuchos ou discos.

• Melhor Banco Private em serviços, de toda a América LatinaEuromoney, Private Banking Awards 2009

• Melhor Banco de Câmbio Exterior da América Latina Global Finance, World’s Best Foreign Exchange Banks 2009

• Melhor Banco de Cash Management da América Latina• Melhor Banco em Gestão de Liquidez da América Latina• Melhor Banco em Gestão de Risco da América Latina• Melhor Banco para Pagamentos e Cobranças da América Latina• Melhor Banco conectado ao sistema CLS da América Latina Global Finance, World’s Best Treasury and Cash Management

Providers 2009

• Número 1 em Cash Management da América LatinaEuromoney, Cash Management Poll 2009

• Melhor Banco Sub-Custodiante da América Latina Global Finance, Best Sub-Custodians 2008

• Melhor Banco de Investimento• Melhor Debt Bank• Melhor Banco em Fusões e AquisiçõesGlobal Finance, World’s Best Investment Banks 2008

• Melhor Banco da América Latina em Serviços de Gestão de Investimentos• Melhor Banco da América Latina em Cash Management Online• Melhor Banco da América Latina em Serviços de Trade Finance• Melhor site de Corporate Bank integrado da América Latina• Melhor Banco da América Latina em iniciativas de Segurança da InformaçãoGlobal Finance, World’s Best Internet Banks 2008

• Melhor Debt House da América Latina Euromoney, Awards for Excellence 2008

• Melhor Loan House da América LatinaLatin Finance, Deals of the Year 2008

© 2009 Citibank, N.A. All rights reserved. Citi and Arc Design is a trademark and service mark of Citigroup Inc., used and registered throughout the world.

Fazer parte Estar no topo do Ranking da América Latina. do Ranking.

(Resgate bancário)

Algo está mudando em...

OS NEGÓCIOS DA AMÉRICA LATINA ONLINE

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 9

MEMO

Felipe Aldunate M.Diretor Editorial

DIRETOR Elías Selman C.

Certifi cado Licitud de Título Nº 4090 . Certifi cado Licitud de Contenido Nº 3346 . AméricaEconomía is a Nanbei Ltd. Monthly publication

VICE-PRESIDENTE-EXECUTIVA Gloria Landabur

DIRETOR EDITORIAL Felipe Aldunate M.EDITOR ADJUNTO Rodrigo Lara

DIRETOR DE ARTE Álvaro Araya UrquizaEDITORES-EXECUTIVOS Solange Monteiro, Juan Pablo Rioseco, Eduardo Thomson

EDITOR BRASIL Dubes SônegoASSISTENTE DE EDIÇÃO Sérgio Spagnuolo

ESCRITÓRIO EDITORIAL BRASIL (55 11) 3063-2049

EDITOR MÉXICO Arly FaundesEDITOR MIAMI Antonio María Delgado

EDITOR DE FOTOGRAFIA Miguel CandiaREPÓRTERES Soledad Gómez, Matías Rodo Yuricevic (Santiago)

CORRESPONDENTES•ARGENTINA Juan Pablo Dalmasso•COLÔMBIA Lucía Valdés •MÉXICO Carolina Solís •PERU Cecilia Niezen•URUGUAI Guillermo Pellegrino

•VENEZUELA Dorothy Kronick •AMÉRICA CENTRAL Ricardo Castillo

•MIAMI Carlos Molina •WASHINGTON Antonieta Cádiz

COLUNISTAS•Susan Kaufman Purcell•Félix Peña•Abraham Lowenthal •John Edmunds •Javier Santiso

DIAGRAMAÇÃO Riffka Schiro-kauer J., Sebastián Caro P. •ILUSTRADORES Soledad Tirapegui, Rodrigo Díaz Carrizo

REVISORA Adriana Casarotti

AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE(estudos e projetos especiais) •DIRETOR Rodrigo Díaz

•SUBDIRETOR Jaime Contreras•COORDENADORA DE ESTUDOS Daniela González

•EDITORA Karin Hernández •PESQUISADOR SÊNIOR Pablo Hernández

AMÉRICAECONOMIA.COM •EDITOR ESPANHOL Eduardo Coronado

•EDITOR BRASIL Mel Bornstein•SUBEDITORMarcelo García•REPÓRTERES Marcelo Galli, Pablo Jamett, Alejandra Clavería

•REDATORES Patricia Zvaighaft, María paz ördenes•TRADUTOR Juan Pardo

•WEBMASTER José Fuentes

DIRETORA COMERCIAL EUA Verónica Lizama • DIRETORA COMERCIAL MÉXICO Juliana Kollinger • VENDAS PUBLICIDADE Jannifer Price (Miami), Rafael

Solís, Tanya Mejía Maya (Cidade do México •DIRETOR DE MARKETING Marcelo Silva Symmes• DIRETORA COMERCIAL CHILE María Alejandra Vigh • VENDAS

CHILE Tibisay Campbell, Paz Lecea • DIRETORA COMERCIAL PERU AlejandraBustamante •EXECUTIVA DE VENDAS PERU Maria Claudia Díaz-Dulanto •GERENTE DE PRODUÇÃO Constanza del Río Moreno •DIRETOR DE CIRCU-

LAÇÃO Marcial Delcorto •GERENTE DE INFORMÁTICA E LOGÍSTICA Óscar Sánchez

• BRASIL•HV2 Comercialização de Mídia•DIRETOR-GERAL Hélcio Vieira

•GERENTE DE PUBLICIDADE Oscar da Silva Alves•GERENTES DE NEGÓCIOS Nícolas Cardoso Slamek

•GERENTE DE MARKETING Denise TerranovaRua Cel. Arthur de Paula Ferreira, 59 - cj 111-

São Paulo - SP - BrasilCEP 04511-060 Tel.: 5511-3846-5588

ESCRITÓRIOS COMERCIAIS • EUA Tel: 305/648-9071•MÉXICO Tel: 5255/5254-2400 Fax: 5254-7510

• ARGENTINA Claudia DassoTel: 5411/4383-8410 - 4383-8416

•CHILE Tel: 562/290-9400 Fax: 341-5687 • AMÉRICA CENTRAL Julio Lemus

Tel-Fax: 502/2261-0278 • PANAMÁ Yadyra de Paz y MiñoTel: 507/271-5327 - 507/66787564

• PERU Patricia Anduaga 511-6107217, María Claudia Díaz-Dulanto 511-6107216

REPRESENTANTES INTERNACIONAIS •ALEMANHA 49211/887-2328 • ESCANDINÁVIA 4755/92-5192 Fax: 92-5190 •

ESPANHA 3491/441-6266 Fax: 441-6549 •FRANÇA 331/4143-7057 • ITÁLIA 3902/670-73383 •

REINO UNIDO 4420/7538-5811 •SUÍÇA 411/269-7070

REDAÇÕES • SANTIAGO 562/290-9400 • CIDADE DO MÉXICO 5255/5254-2400 • BUENOS AIRES 5411/4383-8410 • MIAMI 305/648-9071

AméricaEconomia é uma publicação mensal da Nanbei Ltd. •Impressa na Quebecor World Chile S.A. Publicação periódica•Registro PP09-0011

PRESIDENTE Nils Strandberg CHAIRMAN Robert R. Paradise

OUTRAS URGÊNCIASUM DOS MAIORES PERIGOS da crise fi nanceira é que deixamos de atender outros problemas urgentes. A conservação da Amazônia pode se

tornar um deles. A grande fl oresta tropical que cobre parte da superfície de nove países da América do Sul também é sua principal fonte de recursos. Dela depende a geração da chuva que torna a terra cultivável na região central do continente, uma das mais férteis do planeta. Além de ser o entorno em que vivem e convivem mui-tas comunidades nativas de nossa cultura e uma fonte de biodiversidade cujo valor ainda não se pode estimar em sua totalidade. O problema é que a devas-tação provocada sobretudo pela atividade agropecuária ameaça toda a enorme rique-za que a fl oresta envolve. Es-ta é a história que nos conta Solange Monteiro, editora executiva da edição brasi-

leira de AméricaEconomia. “Há alguns projetos empresariais que buscam mudar essa relação e desenvolver uma economia de mercado sustentável”, diz Solange. “Mas, além disso, é necessário estabelecer políticas públicas coordenadas para fazê-la sobreviver.” Esse não é o único problema urgente. De Washington, Antonieta Cádiz nos escreve sobre como evolui o debate pela posse de armas nos Estados Unidos. Um direito ao qual, graças à Segunda Emenda, todo cidadão do país pode aspirar, mas que está alimentando os cartéis do narcotráfi co no México. Além disso, este número traz outro desafi o da região. Juan Pablo Rioseco (Santiago), Antonio Delgado (Miami) e Jean Friedman (Bolívia) fi zeram uma pesquisa completa sobre o negócio do lítio, um metal leve usado na fa-bricação de baterias e cuja demanda deverá se intensifi car à medida que se aprimorem os modelos de carros elétricos. Chile, Bolívia e Argentina são de longe os maiores provedores de lítio do mundo, graças a seus salares. Estas são apenas algumas das grandes histórias desta edição, que também inclui um balanço dos projetos de geração de energia da América Latina e um especial sobre as alternativas de fi nanciamento existentes para as em-presas da região.

FERN

AND

O CA

RRAS

CO C

RUCH

AGA

SOLANGE: PELO VERDE

[email protected]

[email protected]@americaeconomia.com

Com apenasum clique, novos serviços da AméricaEconomia

Informação parcialFelicito-os pela qualidade de suas pesquisas, mas mui-tas vezes em suas seções re-fl etem profusamente notícias positivas dos países alinha-dos às propostas neoliberais (Colômbia, Chile, México e Peru) e notícias negativas de países contrários a elas (Ve-nezuela, Bolívia, Equador, Nicarágua e Argentina). Nos últimos meses, a Venezuela assinou acordos comerciais com importantes países não-alinhados (Índia, China e Rússia), gerando grandes planos de investimentos, en-

quanto o restante dos países desenvolvidos os prorrogam.

Fernando A. Sanguino

Falcón, Venezuela

Reagendem as eleiçõesMuito interessante sua nota sobre eleições e crise (“De-mocrise”, AméricaEcono-mia N° 372, 21 de fevereiro de 2008). Fica em evidência o problema de tantas cam-panhas fundamentais na região se concentrarem em tão pouco tempo. A região deveria coordenar suas elei-ções presidenciais de forma

que estivessem mais bem distribuídas ao longo dos anos. Isso é fundamental para amortizar certos ciclos e fomentar a estabilidade da região em seu conjunto.

Francisco Rojas S.

Madri, Espanha

Brasil e seus vizinhosHá anos recebo a edição em espanhol de sua revista que me permite praticar esse idioma com temas muito úteis para o meu negócio. Tenho uma empresa de con-sultoria que oferece gestão de TI para recursos huma-nos e constantemente busco oportunidades em países da América do Sul. E sempre nos recebem muito bem. Acho que essa crise é uma excelente oportunidade para que as empresas brasileiras cresçam no restante da re-gião e estejam em dia com um processo de integração empresarial ao qual chega-ram tarde, mas através do qual podem ir longe.

João Macias

São Paulo, Brasil

Chávez e o papel do dinheiroSua revista novamente co-mete descritérios editoriais com o governo de Hugo Chávez. Em sua última edi-ção (“Chávez e as eleições”,

AméricaEconomia N° 372, 21 de fevereiro de 2009), profetizam as sete pragas da economia venezuelana devido à queda do preço do petróleo. A economia ve-nezuelana está muito mais ordenada do que vocês afi rmam. E a carência de uma indústria fi nanceira é uma fonte de fortaleza, pois permite que os recursos se dirijam à produção e ao bem estar dos venezuelanos. A crise fi nanceira demonstra que o papel fundamental do dinheiro não é multiplicar-se de forma artifi cial nos siste-mas bancários. O dinheiro deve ser gerido para criar integração, trabalhos e bem-estar para a sociedade. E isso Hugo Chávez consegue fazer.

Alberto Rosendo

Caracas, Venezuela

Mudanças na BolíviaGosto muito da sua revista e de suas análises, mas sempre olho com pena a ausência da Bolívia nelas. A Bolívia é um país pequeno mas onde as coisas estão mudando muito. Hoje a Bolívia conta com um nível signifi cativo de reservas internacionais, o que lhe permitiu congelar o câmbio e planejar investi-mentos de US$ 1 bilhão. O que será do país nas mãos dessa administração?

Harold Torrico

La Paz, Bolívia

10 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

CARTAS

AP

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 11

EDITORIAL

Em três oportunidades anteriores, AméricaEconomiadedicou este espaço ao tema da legalização das dro-

gas. O fato de voltar a fazê-lo é um mau sinal. Além dos 5 mil mortos na virtual zona de guerra no norte do México, lentamente começam a emergir evidências de que cartéis colombianos, com eventuais sócios brasileiros, se torna-ram um fator de instabilidade política em várias nações do Golfo da Guiné, na África Equatorial. Especula-se até a respeito de sua participação em um magnicídio.Certamente esse será um tema contingente em Viena, na próxima cúpula de ministros e mandatários. Enquanto isso acontece no Velho Continente, o governo de Barack Obama acaba de nomear Gil Kerlikowske, com uma bem-sucedida carreira policial, como novo czar antidrogas. Não é pouco. Os EUA registram o maior consumo de dro-gas no mundo e é onde mais se gasta para preveni-lo.Hoje já são muitas as evidências que confi rmam que a atual estratégia de luta contra as drogas – com base na erradicação, interdição e criminalização do consumo – fracassou. A produção anual de cocaína atualmente se encontra no patamar de 900 toneladas, o mesmo que há dez anos, enquanto as plantações de papoula, para produ-zir ópio, dispararam. Também se registra uma manuten-ção do número estimado de usuários de drogas ilegais em algo mais de 200 milhões, que equivalem aos mesmos 5% da população adulta de dez anos atrás. Enquanto isso, os efeitos diretos da luta contra as drogas – a organização de grupos criminosos, a criação de um negócio de alta ren-tabilidade para os distribuidores, a corrupção, a crescente onda de violência pelos esforços estatais por erradicá-las e os altos custos orçamentários necessários para levar essa guerra a cabo – tornam a situação atual insustentável.A América Latina é uma das regiões do planeta que re-cebem esses impactos mais diretamente. Hoje a região continua sendo a maior exportadora de cocaína e maco-nha do planeta, e cresce sua importância como fornecedor

de ópio e heroína. A violência está crescendo também na América Central, enquanto a organização de cartéis tem crescido no Equador, na Venezuela e no Brasil. A Bolívia, por sua vez, cresce como país exportador, nutrindo merca-dos próximos como o chileno e o argentino.Os esforços policiais podem ser vistos na TV: imagens de quilos e mais quilos de drogas sendo queimados, junto a estatísticas que mostram o aumento das apreensões. Mas nas ruas o preço não sobe. Ao contrário, popularizam-se drogas de menor qualidade e de efeitos mais nocivos.Não são poucas as vozes que se unem à demanda por um novo plano antidrogas. Uma das mais articuladas tem sido a dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso (Brasil), Ernesto de Zedillo (México), e César Gaviria (Colômbia), que apoiaram um relatório da Latin American Commis-sion on Drugs and Democracy. Tal documento convida a criar um novo paradigma com base em três princípios: reduzir os efeitos das drogas que são consumidas, reduzir o consumo através da educação, e combater o crime or-ganizado de forma agressiva. No fundo, mudar o foco, da repressão à educação. Um plano de ação que deve incluir a legalização nos paí-ses que registram maior consumo e uma formalização dos canais de distribuição. O estabelecimento de fornecedo-res formais pode levar à produção de drogas com menos efeitos nocivos. Tal legalização ainda poderia contemplar a proibição estrita de seu consumo por menores de idade com um sistema efetivo de multas aos pais. Medidas co-mo estas permitiriam trabalhar de melhor forma a reabi-litação de viciados, tirando das máfi as parte essencial de seu negócio: os usuários recreativos.Não é uma ideia fácil de vender, especialmente nos EUA e na Europa. Não obstante, em um mundo carente de ideias para renovar uma guerra sem resultado, a América Latina pode fazer com que essa proposta seja ouvida e apostar na conquista de novos resultados.

UMA GUERRA PERDIDA

12 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

SEGUINDO A PISTA

DEFAULT À VISTA?PUBLICAMOS: Na verdade, o que as autoridades querem, explica a economista argentina Victoria Giarrizo, “é o fl uxo de quase US$ 4 bilhões anuais dos afi liados das AFJPs”. Como “as contas vêm apertadas em 2009, com isso se evita o default, mas – que ironia – o lava.” (“A discórdia da aposentadoria”, AméricaEconomia Nº 368, 17 de novembro, 2008)

O NOVO: Nem tarifa de exportação para os grãos, nem o dinheiro dos planos de apo-sentadoria. Ainda que a Argentina possa sobreviver com as contas pagas em 2009, a classifi cadora de riscos Moody’s colocou à prova a capacidade de o país saldar suas dívidas em 2010. Para a agência, uma forte queda no superávit fi scal primário no país o forçaria a buscar outras fontes de fi nanciamento, como o Banco Central e seus depósitos no sistema de crédito doméstico, o que reduziria as opções para 2010.

DÓLAR, PRA QUÊ?PUBLICAMOS: Quando lança-ram o acordo, os presidentes do Banco Central argentino, Martín Redrado, e do brasileiro, Henrique Meirelles, afi rmaram que “a criação do sistema bilateral de pagamentos em moeda local serviria como an-tecedente para uma eventual implementação posterior nos demais países do Mercosul”. (“O sonho das moedas gême-as”, AméricaEconomia Nº 367, 27 de outubro, 2008)

O NOVO: O Brasil está atraindo mais um sócio para o plano de abandonar o dólar. Em meados de fevereiro, os presidentes Lula e Uribe discutiram sobre uma futura reunião entre os ministros da Fazenda e os presidentes do BCs de Brasil e Colômbia para negociar um acordo de intercâmbio em moeda local semelhante ao que o primeiro tem com a Ar-gentina. “Podemos apelar mais a nossas moedas nas relações comerciais”, defendeu Uribe na ocasião. Os dois presidentes concordaram que tal substitui-ção do dólar poderia agilizar e incrementar o comércio entre os dois países, que em 2008 alcançou os US$ 3 bilhões. Esse mecanismo está sendo usado entre Brasil e Argentina desde outubro do ano passado. Através dele, o exportador recebe o pagamento na moeda de seu país, graças à interme-diação dos bancos centrais. Uma grande iniciativa, ainda que o atual momento não seja o mais propício: recentemen-te, o governo argentino tem buscado ampliar as barreiras à entrada de produtos brasilei-ros no país.

NA ESPREITAPUBLICAMOS: Uma compra com esse

perfi l no México é dada como certa. E a crise bancária mundial ofereceria boas

oportunidades para o Itaú entrar em novos mercados. “Eles podem comprar as

operações internacionais de algum banco global”, diz Celso Borin Jr, analista-chefe da corretora Link. (“De olho no mundo”,

AméricaEconomia Nº365, 29 de setembro, 2008)

O NOVO: No fi nal de fevereiro, o Itaú admitiu em teleconferência com analistas de mercado que poderá avaliar a compra do Banamex, segundo maior do mercado

mexicano, caso o Citigroup decida vendê-lo. Apesar de o Citi ter declarado que a venda do banco mexicano seria sua

última opção, a legislação mexicana impede que bancos estrangeiros com mais de 10% de seus ativos nas mãos do governo operem no país.

PUBLICAMOS: A presença no México, na Colômbia, no Uruguai, na Argentina e no Peru, além de escri-tórios comerciais ao redor do mundo, já não é sufi -ciente. Tudo indica que os Matte querem estender grande parte de suas empresas além das fronteiras chilenas. (“Papel principal”, AméricaEconomia Nº 362, 11 de agosto, 2008)

O NOVO: Agora o chileno Grupo Matte está próximo a confi rmar sua aterrissagem no Brasil. No começo de março, a empresa avaliava a compra da Melho-ramentos – cujo faturamento anual gira em torno de US$ 200 milhões. Com a possível aquisição, o objetivo dos Matte é consolidar sua posição como maior produtor de lenços de papel (tissue) da Amé-rica Latina. Para isso, a empresa também anunciou que construirá uma nova fábrica na Colômbia, com investimentos de US$ 60 milhões, que começaria a operar em 2010.

Nº 365

Bancoplanetário

BRAÇO VERDE-AMARELO

DDDDDÓÓÓÓÓLLLAAARR P

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 13

MOVIMENTOS

A CHANGAN AUTOMOTIVE GROUP, uma das maiores automotivas chinesas de capital misto, teve um fevereiro agitado. Por um lado, anunciou a comercialização de seus produtos no Chile, e por outro fi rmou um acordo macro com a mexi-cana Autopark para criar uma joint venture para comercializar seus carros e construir uma mon-tadora com capacidade anual de produção de 50 mil unidades no país asteca. Seu objetivo? Aten-der ao Nafta e à América Latina com uma linha de produtos que competirá com os “microcarros ao estilo Hyundai Getz, subcompactos como o Gol e furgões pequenos como o Kangoo”, diz Gui-

do Vildozo, analista para a América Latina da consultoria Global Insight. Com essa tacada, a ChangAn une-se a compatriotas como FAW Group, Geely Holding e Chery, que já estão en-trando na América Latina. Por que escolheram a região como ponta-de-lança? “Porque estão em plena globalização, mas não atendem os pa-drões de qualidade do Primeiro Mundo” explica Sudarshan Mahtre, analista líder para Ásia e Pa-cífi co do PwC Automotive Institute. Conseguirão conquistar uma posição dominante na região? Difi cilmente, se não melhorarem a qualidade, concordam os analistas.

JUAN PABLO DALMASSO / BUENOS AIRES

tocam a buzinaOs chineses CHANGAN:

PISANDOFUNDO

AFP

14 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

MOVIMENTOS

O CONVITE PARA PARTICIPAR da construção dos cinco submarinos enco-mendados pela Marinha brasileira à francesa DCNS poderá signifi car à Ode-brecht muito mais do que parte dos 7 bilhões de euros do contrato. Analistas avaliam que o projeto a permitirá entrar no milionário mercado de navios de combate. Consultada por AméricaEconomia, a Odebrecht não confi rmou tal interesse, mas o governo brasileiro não esconde seu desejo de desenvolver uma indústria militar privada forte. Algo semelhante ao que aconteceu há alguns anos quando pedidos estatais conduziram à reativação da indústria naval no País. A DCNS afi rmou que escolheu a Odebrecht por sua experi-ência na construção de instalações nucleares e de plataformas marítimas. Mas, para a Odebrecht, o maior benefício seria a absorção de know-how em “projeto, gestão e controle, que lhe darão competitividade em escala no aces-so ao mercado de produtos duais (de aplicação civil e militar)”, diz Salvador Raza, coordenador do curso de Relações Internacionais da Facamp. Com essa base, poderia desenvolver tecnologia própria específi ca para navios de combate. E não apenas para submarinos, afi rma o professor Hector Saint Pierre, da pós-graduação de Relações Internacionais da Unesp.

Mares inexplorados

DUBES SÔNEGO / SÃO PAULO

ARLY FAUNDES / CIDADE DO MÉXICO

O mexicano Roberto Hernández, presidente do Banamex, renunciou ao conselho de direção do Citi-group. A demissão aconteceu logo que surgiram boatos sobre desa-venças entre Hernández e Vikram S. Pandit, gerente da companhia em difi culdades, e especulações sobre a venda do Banamex.

A Western Union criou uma nova equipe de Administração de Produtos Hispânicos, encabeçada por Victoria López-Negrete. A exe-cutiva terá a tarefa de gerenciar as relações com os consumidores latinos nos EUA e a logística com a América Latina, além de dirigir as operações mexicanas da companhia.

Marcelo Mosci, presidente de General Electric para América Latina desde 2006, foi nomeado presidente da GE Healthcare na China. O executivo brasileiro substituirá o chinês Chic Chen, que se aposentará, depois de ocupar a posição por 25 anos.

A empresa canadense de tec-nologias da rede Sigma Systems escolheu Alejandro Couce como gerente geral para a região da América Latina e Caribe. Ante-riormente, Couce trabalhou para Amdocs, Cramer e PeopleSoft.

Arturo Piñeiro, atual presidente do BMW Group Argentina, assumi-rá como vice-presidente da Região Central do BMW Group nos Estados Unidos. Piñeiro será responsável pelas vendas das marcas BMW e Mini em 15 estados dos EUA.

Questão de pesoDESDE QUE EXPLODIU A CRISE, o peso mexicano perdeu um terço de seu valor: caiu dos 10 pesos por dólar, que chegou a registrar em julho, a um nível atual de 14,8 a 15 pesos, mesmo após o Banco do México ter injetado US$ 18 bilhões (equivalentes a 22% de suas reservas) para tratar de conter a tendên-cia. Mas ainda quando a desvalorização monetária traz seus próprios proble-mas, também é certo que oferece ao menos um importante benefício: ajuda a realçar a competitividade das exportações. “A desvalorização gera um descon-to no preço de venda ao exterior, o que abre um espaço para poder baixá-lo se é denominado em dólar”, diz Carlos Hermosillo, analista da Vector Casa de Bolsa. “O preço é negociado em dólares, mas eventualmente há margem de negociação para ganhar uma participação de mercado caso a concorrência se mostre difícil.” Ao menos neste sentido, cumpre-se o velho adágio de que não há mal que não venha para o bem.

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ROBERTO HERNÁNDEZODEBRECHT: ABSORVENDO

KNOW-HOW

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15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 15

MOVIMENTOS

O AZEITE DE OLIVA ESPANHOL sempre foi considerado um produto de luxo na América Latina. Mas hoje são os espanhóis que estão buscando a região – mais especifi camente, o Chile – para elaborar azeites ainda mais saborosos. Esse é o caso do grupo ibérico Bo-garis, que em 2008 investiu US$ 18 milhões em mil hectares plan-tados, e agora busca investidores para novos projetos de produ-ção de azeite. Em 2009, espera produzir 100 mil litros; e, em 2014, chegar 1,7 milhão. “Nosso plano de expansão contempla continuar plantando mil hectares ao ano até alcançar os 5 mil hectares no Chile”, diz Hugo Regojo, gerente da fi lial local. E não é só. A Bogaris Energy, fi lial energética do grupo, está desenvolvendo um estudo de viabilidade com um sócio canadense para desenvolver um pro-jeto de biocombustíveis no país a partir da lignocelulose, ou resídu-os de produção fl orestal. O projeto demandaria um investimento em torno de US$ 30 milhões. Somado a isso, o conglomerado espanhol pretende utilizar o Chile como base para o desenvolvimento de pro-jetos energéticos na América do Sul. “Nossos três países objetivo são Brasil, Peru e Colômbia”, afi rma.

SIR ALLEN STANFORD NÃO inventou nada novo, mas passará à história por apostar na cobiça: defraudou US$ 9,3 bilhões de grandes investidores, muitos deles latinoamericanos. Somente na Venezuela, as perdas com os fraudulen-tos certifi cados de depósito emitidos pelo Stanford International Bank so-mam US$ 2,5 bilhões. Do México, se conhecem denúncias de perdas nos EUA de outros US$ 300 milhões, mais o que poderia se somar vindo do Panamá, Colômbia, Equador e Peru. “O mais surpreendente é que investidores desse porte tenham caído num velho truque como o da pirâmide”, alarma-se o me-xicano Alberto Avila, sócio da CAMS e especialista certifi cado contra lavagem de dinheiro. “Sequer contemplaram conceitos básicos, como contratos que fossem em uma jurisdição que desse garantia de controle”, diz. Stanford sou-be tirar proveito das debilidades do ser humano. Tinha armado uma rede de relações com reconhecidos líderes empresariais e políticos, além de prometer escandalosos lucros (de 85%), que os primeiros investidores conseguiram ganhar, explica Avila.

A RETRAÇÃO ECONÔMICA no Japão poderá refl etir-se em um

aumento populacional no Brasil. Essa é a estimativa do Consulado

Japonês no Paraná e do Sebrae. As duas instituições prevêem

que a crise pode forçar o retor-no ao Brasil de entre 10 mil e 30 mil dekasseguis (descendentes

de japoneses que vão ao país asiático para trabalhar) somente

no primeiro trimestre de 2009. Nos anos anteriores, registrou-

se uma média de retorno de 500 pessoas nesse período. Dados ofi ciais indicam que cerca de

316.900 brasileiros (nem todos descendentes de japoneses)

trabalham atualmente no Japão, 80 mil oriundos do Paraná e o restante originários sobretudo

de São Paulo. A colônia japonesa no Brasil é formada por cerca de 1,5 milhão de habitantes. Segun-do o projeto de empreendimento para dekasseguis do Sebrae, até agora os setores que mais regis-

traram demissões no Japão foram o automotivo e o eletroeletrônico.

Há oferta em indústrias como a hoteleira e a alimentícia, mas es-sas pagam em média 20% menos

do que as fábricas, tornando-se menos atraentes.

MATÍAS RODO Y. / SANTIAGO

SOLANGE MONTEIRO / SANTIAGO

JUAN PABLO DALMASSO / BUENOS AIRES

Potência oliveira

O preço da cobiça

Sayonara

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REGOJO: EXPANSÃO REGIONAL

CRISE: DO JAPÃO AO

BRASIL.

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16 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

MOVIMENTOS

DARIA UM ROTEIRO de cinema: uma carga de ouro e prata vai rumo ao

outro lado do mundo, em uma longa travessia que inclui cruzar um de-serto, desbravar mares traiçoeiros em uma casca de noz e - fi nalmen-te - sobrevoar um continente e um oceano. Essa história terá um fi nal feliz? Ainda não sabemos, já que a trama se mostra complexa. O navio pesqueiro chileno Polar Mist afun-

dou em condições suspeitas em meados de janeiro no Atlântico com uma carga de 9,5 toneladas de me-tais preciosos, avaliados em US$ 20

milhões, depois de fi car abandonado por um dia e enquanto era rebocado

com bom tempo. E o que aumenta a perplexidade dos proprietários

(Cerro Vanguardia SA (CVSA), Mi-nera Triton Argentina SA.), é que a

empresa seguradora Securus S.A. se negou a pagar a ordem de sinistro.

Segundo Jorge Palmé, gerente geral da Cerro Vanguardia, isso aconteceu porque a seguradora não considera a carga perdida “e, sim, em trânsito”.

O executivo considera o conceito “peculiar”, já que e ouro e a prata es-tão “embaixo d’água, a 75 metros de

profundidade”. Há outra versão da história, que defende que a demora se deve à avaliação do que se pode

resgatar desse tesouro submerso.

ENQUANTO MUITAS EMPRESAS apertam o cinto, as agências perua-nas de publicidade demonstram ainda gozar de boa saúde. “Apesar de o setor publicitário estar experimentando uma profunda crise no mundo, em nosso país está em pleno desenvolvimento”, diz Milagros Plaza, gerente geral da agência JWT, que destaca que até o momento não registrou corte em investimento publicitário. O que sim, tem visto, é a busca por um gasto mais inteligente. É por isso que, segundo a publi-citária, as agências hoje têm a missão de transformarem-se em sócias estratégicas das empresas, oferecendo atenção integral aos clientes, e não serem simplesmente fornecedoras. Algumas empresas focadas nessa direção passaram a incluir em sua oferta serviços de marketing BTL (below the line) e de Relações Públicas. Não obstante, o mercado peruano ainda é pequeno. Segundo a Associação Nacional de Anun-ciantes (Anda), o investimento publicitário no Peru chegou a US$ 240 milhões em 2008, o que representa um aumento de 20% em relação ao ano anterior. Para 2009, a previsão de Milagros é de crescimento entre 10% e 15%.

OS AEROGERADORES DESTINADOS a obter energia da força do vento ain-da são poucos no Chile. Mas nem por isso deixam de signifi car um mercado apetitoso, se levado em conta que o governo deseja que em 2024 a geração de energia renovável não-convencional (ERNC) represente 10% do consumo do país. Hoje, por trás de pouco mais da metade dos aerogeradores presen-tes no Chile está Juan Walker, diretor executivo da Windservice, fornecedora de equipamentos da dinamarquesa Vestas responsável pela instalação dos parques de Alto Baguales (2 MW), da Saesa, e Canela (de 18 MW), da Endesa Eco. E irá além. Em 2009, instalará um parque para a SN Power e outro para a Suez, que juntos representam 84 MW. “As ERNC já não são só uma moda”, diz Walker, enquanto sonha que o Chile algum dia seja como a Europa, onde os parques eólicos somam 60 mil MW de capacidade instalada. Apesar de na América Latina existir menos de 1 mil MW - com Brasil, México e Chile liderando o ranking -, Walker confi a em um futuro promissor e quer expandir suas operações ao Peru, Equador, Colômbia, Uruguai e República Dominica-na. “Queremos ser atores regionais, com foco em energia eólica, maremotriz, solar, geotérmica, hidrelétrica e de biogás”, diz.

MATÍAS RODO Y. / SANTIAGO

NATALIA VERA / LIMARODRIGO LARA / BUENOS AIRES

Publicidade em alta

Drama decinema

Vento a favor

WALKER: LIDERANDO O

MERCADO

PLAZA: CONTAS NO AZUL

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15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 17

MOVIMENTOS

Seu derrame, meu negócio

O sabordo riscoENTRE AS EXPLICAÇÕES de por que o mundo está em crise, são poucas as vezes em que a indevida adminis-tração do risco é listada como uma das causas. Mas são muitos os peca-dos que poderiam ser evitados se os agentes tivessem prestado a devida atenção a esse fator. “Ao fazer um exame dos fatores que conduziram à atual crise creditícia, se evidencia que a administração do risco não foi vista como um elemento central para a tomada de decisões estraté-gicas”, afi rmou Wilfredo Rubiños, so-cio principal da área de auditoria da KPMG no Peru. Segundo o relatório da empresa, 76% dos executivos de banca global afi rmam que a admi-nistração de risco ainda se encontra estigmatizada como uma função de suporte no interior dos bancos. Somente 48% disseram que a tarefa é entendida como uma responsabili-dade de todos, e outros 45% afi rma-ram que seu conselho carece de ex-periência sobre o tema. O relatório ainda aponta que 64% dos entrevis-tados acham que seus responsáveis por estudo de risco deveriam ter uma maior infl uência sobre o desen-volvimento de estratégias.

A CRISE NÃO conge-lará o crescimento no consumo de sorvete nos próximos anos na região. Segundo um estudo da empresa Euromonitor, as ven-das do produto em todas as suas cate-gorias – incluindo os sorvetes artesanais, os de compra impul-siva, os de consumo no lar e o iogurte congelado – au-mentaram 86% nos

últimos cinco anos e continuarão cres-cendo em um ritmo anual de 8% até 2013, graças a um aumento generalizado na ren-da disponível para o consumo. O estudo também revela que há diferenças entre os gostos de cada país. Os sabores de chocolate e baunilha estão sempre entre os mais buscados, mas na Argentina há certa

predileção ao doce de leite. Já o sorvete de coco está entre os favoritos no Brasil, enquanto o mix de chocolate, baunilha e morango é um dos mais vendidos no Chile. A Euromonitor ressalta a entrada no México dos sorvetes “saudáveis”, comer-cializados por gran-des empresas como Unilever, e produzi-dos com leite de soja.

NÃO HÁ MAIS POR QUE chorar tanto pelo petróleo derramado. Se não acredita, pergunte à chilena Regina Cohen, dona da Petroclean, para quem um desastre ambiental como esse é sinônimo de oportunidade de negócios. Seu produto, de origem 100% vegetal, é capaz de ab-sorver e degradar completamente o petróleo e seus derivados, ótima alternativa quando se necessita retirar substâncias poluentes do meio ambiente. “Tem, inclusive, um efeito fertilizante para o solo”, diz Cohen, ao converter os hidrocarbonetos em matéria orgânica. Este ano a em-presa espera dar um salto importante. “Graças à ProChile, consegui-mos um convênio com uma empresa (a portuguesa Ecobase) que nos pede que forneçamos em um mês o que hoje produzimos em um ano.” Em 2008, sua empresa faturou aproximadamente US$ 155 mil, com a venda de 120 toneladas do produto. Agora busca fi nanciamento públi-co para aumentar sua capacidade e ser capaz de atender ao pedido de 100 toneladas mensais. “Com ou sem crise, as empresas deste setor têm que despoluir quando acontece um acidente”, diz Cohen.

NATALIA VERA / LIMA

SOLEDAD GÓMEZ / SANTIAGO

Freezer sem crise EDUARDO THOMSON / SANTIAGO

PETROCLEAN: FATURANDO COM O

SUJEIRA ALHEIA

SORVETES: SABORES QUE REN-DEM DIVIDENDOS

Correntecontínua

18 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

ENERGIAESPECIAL

Dubes Sônego e Sergio Spagnuolo, São Paulo

As belas praias do pequeno município cearense de Caucaia, próximo de Fortaleza, vêm atraindo nos últimos anos milhões de dólares em recursos para a construção de resorts e condomínios de luxo. Apesar

de a natureza aberta para o mar fazer do turismo a vocação natural da cidade, ela poderá transformar-se em breve também em um dos polos brasileiros de produção de equipamentos de geração de energia eólica. Tudo depende da concretização dos planos da indiana Suzlon. Dona de um terreno de 200 mil metros qua-drados em Caucaia, a companhia quer erguer ali um complexo

industrial que deverá consumir cerca de R$ 80 milhões apenas em fábricas para a produção de pás e outros componentes dos aerogeradores. O sinal verde para que o projeto saia do papel depende apenas de uma sinalização mais concreta da demanda brasileira e latinoamericana. Algo que Maurício Araújo, diretor de vendas no Brasil, diz esperar para este ano. “Nossa expec-tativa é refl exo da expectativa do setor; de uma série de sinais que, reunidos, nos dão a sensação de que efetivamente teremos algo acontecendo em termos de marco regulatório e abertura de mercado”, afi rma o executivo.

D b Sô S i S l S P lD b Sô S i S l Sã P l

Apesar da crise, os projetos e investimentos em energia continuam. A urgência de modernizar a matriz elétrica e de desenvolver ener-

gias alternativas, além da existência de contratos de fi nanciamento já assinados, impulsionarão a infraestrutura energética da América

Latina nos próximos anos

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 19

ENERGIAESPECIAL

Mais concretos são os planos da argentina IMPSA, do grupo industrial Pescarmona. No fi nal de 2008, a companhia inaugurou uma fábrica de turbinas eólicas em Pernambuco, com capacidade para construir cerca de 300 geradores eólicos por ano, de 1,5 a 2,1 Mega Watts (MW). Um projeto que custou aproximadamente US$ 85 milhões. “É a maior fábrica de geradores da América Latina”, diz Luis Pescarmona, diretor do grupo encarregado de desenvolver os negócios de energia eólica através da IMPSA Wind. A importância dada à tarefa é tal que ele se mudou re-centemente para o Brasil, com o objetivo de supervisionar este e outros projetos no país.

A construção de fábricas de turbinas eólicas na América Latina é resultado de uma tendência auspiciosa: apesar da cri-se fi nanceira global, a região continuará inaugurando projetos energéticos nos próximos anos. Em função de contratos pré-existentes de fi nanciamento de longo prazo e da urgência de modernização da matriz elétrica da região, a grande maioria das obras programadas pelo setor seguirá o cronograma inicial. Sejam elas de usinas térmicas, hidrelétricas ou eólicas.

“Os investimentos vão continuar, tanto para melhorar a matriz energética quanto para racionalizar a produção existente”, diz Nelson Wilson, sócio responsável pelo segmento de indústria na consultoria Everis Brasil. Ele não descarta o adiamento de um ou outro projeto, mas enfatiza que, por ora, “não é o que se observa no mercado”. “Os fi nanciamentos para o setor normalmente já são concedidos sob tantas garantias que não se sentirá de forma tão intensa a restrição de crédito”, diz Ivo Pugnaloni, diretor da consultoria Enercons. “Além disso, a energia é um insumo tão essencial que não há a menor previsão de queda na demanda. Ninguém está blindado contra a crise, mas seria um contrassenso deixar de investir num setor que tem demanda cativa”. A essa solidez de fi nanciamentos energéticos é preciso ainda somar o esforço estatal de países como Brasil, México, Colômbia, Peru e Chile para incluir o desenvolvimento de projetos energéticos entre suas prioridades de investimentos no combate à crise.

Mas, ainda que os recursos disponíveis cheguem de forma crescente a projetos de energias alternativas, como a mencio-nada energia eólica, pequenas centrais hidrelétricas e plantas de geração de energia elétrica a partir de biomassa, são os grandes projetos de usinas termoelétricas e hidrelétricas que continuarão a receber a maior parte dos investimentos. E o setor presenciará também a entrada em operação de novas plantas de liquefação e regaseifi cação de gás natural, além de uma consolidação entre

atores pequenos e médios no segmento de petróleo.

DECOLAGEM EÓLICAO ano de 2009 será es-

pecialmente dinâmico para a indústria eólica da América Latina. Hoje, os 769 MW de potência instalada em turbinas eólicas na região representam 0,6% do total global. Mas, se as projeções

de crescimento da As-

sociação Latinoamericana de Energia Eólica (Lawea, na sigla em inglês) se concretizarem, a esse montante se somarão 1,2 mil MW, até dezembro deste ano, e pelo menos ou-tros 1000 MW, em 2010. Considerando que os desembolsos na indústria da geração de energia eólica estão atualmente na casa dos US$ 2 milhões por MW construído, os investimentos totalizariam US$ 2,4 bilhões nestes dois anos. “A regu-lamentação em alguns países e as condições de mercado asseguram a viabilidade de mais projetos eóli-cos”, diz Mauricio Trujillo, diretor executivo da Lawea, de seu escritório no México.

Os países que mais cresceram no ano passado foram Uruguai e Nicarágua, que de quase zero, alcançaram algumas dezenas de MW. Mas também há crescimento no Chile, onde o setor acaba de ganhar impulso com o anúncio de um grande projeto da mineradora estatal Codelco, que realizará uma licitação internacional para a construção de uma planta eólica com capacidade de geração de entre 20 MW e 40 MW. Não menos importante foi o avanço do México, que saltou de 88 MW para 155 MW. Apesar de tudo, a maior parte da ação estará no Brasil. Este ano o país realizará pela primeira vez um leilão exclusivo para a contratação de energia eólica. O que levará também à discussão de uma regulamentação para este segmento. A regulamentação é considerada premissa fundamental para que os investimentos deslanchem, tanto de fornecedores de equipamentos quanto de geradoras. Um tema fundamental é o preço pelo qual será vendida cada unidade de energia e a quantidade de energia eólica que o governo se comprometerá a adquirir. “Hoje, há 2,4 mil MW autorizados, projetos que poderiam começar a ser construídos amanhã”, diz Fábio Dias, secretário-executivo da Associação Brasileira de Pequenos e Médios Produtores de Energia Elétrica (APMPE).

Mas é a Argentina o país com maior potencial eólico de toda a América Latina. Pelo menos se considerado o fator de parque - a proporção de tempo do ano em que a turbina estará produzindo energia em função do regime de ventos -, o país tem zonas que estão entre as mais favoráveis do mundo. Na Patagônia, por exemplo, há lugares aonde o fator de parque chega a 60%. O percentual é o dobro da média europeia e supera com folga as melhores áreas do Brasil e do Chile, onde pode chegar a pouco mais de 45%. “Na América Latina há muitas zonas com fator de parque de 40%, que é muito competitivo”, diz Pescarmo-na, da IMPSA. Embora sua companhia esteja desenvolvendo grandes projetos eólicos na Argentina como investidora junto a outros sócios, a lei não a ajuda. “Hoje, há na Argentina um preço artifi cial de energia, que pode acabar matando iniciativas que poderiam ser a solução no futuro”, diz Oscar Schweitzer, consultor da Aros.

PACOTE DE VANTAGENSOutro segmento que segue em crescimento e vem ganhando relevância nos planos de investimentos de geradoras e grandes consumidores de energia é o de Pequenas Centrais Hidrelétri-

20 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

ENERGIAESPECIAL

A Cemig, uma das maiores empresas energéticas brasileiras, por exemplo, possui 22 PCHs em implantação, com potencial de 329 MW. É o Brasil também o país que mais concentra projetos do gênero. Somente este ano, eles poderão ajudar a ampliar em entre 800 MW e 1 mil MW sua potência instalada. “Esses empreendimentos devem signifi car investimentos de R$ 5 bilhões, levando-se em conta o cálculo de R$ 5 mil por KW. Do total, entre 20% e 25%, cerca de R$ 1,3 bilhão, de capital próprio”, afi rma Dias, acrescentando que existem outros 2,3 mil MW autorizados para construção, ainda que parte deles com pendências ambientais a serem resolvidas.

Outros países da região, como o Chile, que hoje gera pouco menos de 1% de sua energia com PCHs, também vêm prestando maior atenção a esta alternativa. Uma lei recentemente aprova-da no país penalizará as geradoras que, entre 2010 e 2014, não produzirem pelo menos 5% de sua energia a partir de fontes renováveis. Levantamento realizado no Chile pela Comissão Nacional de Energia (CNE) e pela Comissão Nacional de Irri-gação (CNR) apontou potencial de geração de 860 MW, com a construção de 290 centrais de entre 2 MW e 20 MW. Cerca de 600 MW seriam rentáveis com os preços atuais da energia. Mas o potencial pode ser ainda maior, levando-se em conta centrais com potencia menor que 2 MW.

Segundo Wilson, da Everis, o incentivo à exploração de PCHs é uma tendência também em outros países da região, donos de recursos hídricos, mas pobres em combustíveis fósseis, como Costa Rica e Nicarágua.

RENDA EXTRAMenos disseminada na América Latina, a geração e a cogeração a partir de biomassa também tendem a ganhar espaço. De novo, o Brasil é a sede das principais iniciativas nessa área, principal-mente em função dos projetos de cogeração em desenvolvimento na indústria de etanol, que precisa lidar com toneladas de rejeitos da cana-de-açúcar. Um exemplo é a associação recente entre a produtora de etanol Baldin e a CPFL Bioenergia, empresa do grupo CPFL criada em 2008, com foco na cogeração de energia só a partir da queima do bagaço de cana. A Baldin processa atualmente 660 mil toneladas de cana por safra, volume que a CPFL Bioenergia se comprometeu a comprar para gerar energia. “A cogeração será inevitável, até para garantir a competitividade do negócio”, diz Renata Pereira, sócia-diretora da consultoria Saraceni Energia & Logística.

São projetos que se somam aos 31 já garantidos pelo leilão de energia de biomassa, realizado em agosto do ano passado. Parte deles está programada para entrar em funcionamento este ano, adicionando ao sistema 230 MW. Os demais devem começar a operar em 2010, acrescentando mais 2.150 MW à matriz energética brasileira.

REDUZINDO RISCOSMas não é possível falar de energia na América Latina sem fazer referência aos hidrocarbonetos, responsáveis por mais da metade da geração elétrica em países como Argentina, México, Bolívia, Nicarágua e Honduras. Os projetos de exploração e produção de novas reservas deverão manter-se, ainda que ana-listas prevejam uma mudança de foco. “Em petróleo, quando a economia desacelera, reduz-se o investimento na busca do que

não é conhecido”, afi rma o analista independente brasileiro, John Forman. “Não será como nos últimos três ou quatro anos, com dinheiro para qualquer projeto”, diz Guilherme Vinhas, advogado especializado em petróleo, sócio do escritório Vinhas Advogados, no Rio de Janeiro.

Segundo Forman, no Brasil, projetos de exploração de petróleo que vão até 2011 e já estavam programados antes da descoberta do pré-sal, tendem a manter o cronograma de realização. Tanto na Petrobras como em companhias independentes. Os investimentos da Devon, no Campo de Polvo, em fase inicial de produção, e o da Chevron, no Campo de Frade, com perspectiva de entrar em produção este ano, por exemplo, deverão continuar. Mas, dentro do cronograma de exploração do pré-sal, “a Petrobras vai concentrar investimentos inicialmente na costa do Espírito Santo, onde os campos estão a profundidades menores e mais próximos da costa”, diz.

Muita coisa deverá acontecer também no México, país rico em hidrocarbonetos, mas carente de uma lei que permita inves-timentos privados na área petrolífera. Uma reforma aprovada no ano passado para o setor dominado pela Pemex permitirá a participação de companhias privadas em certos projetos (ver matéria na pág. 29).

Mas, se as grandes do setor, com caixa acumulado no lucrativo período de alta do petróleo, tendem a passar a crise sem grandes solavancos, o mesmo não se pode dizer de companhias pequenas e médias. Na opinião de Forman, é possível que muitas delas se tornem alvo de aquisição de companhias maiores. Em especial aquelas que se fi nanciavam em bolsas de valores e terão mais difi culdade para levantar dinheiro a partir de agora. “Pode haver outra onda de fusões e aquisições, como no fi nal da década de 1990”, avalia o consultor.

Os países onde operam as empresas mais vulneráveis, na opinião de Forman, são Colômbia, Peru e Argentina. Elas seriam empresas jovens, de marcas pouco conhecidas, com ações em bolsas estrangeiras. “Este seria um bom momento para comprar. Ainda que algumas grandes petrolíferas tenham apresentado prejuízos no fi nal de 2008, têm muito caixa acumulado”, diz Renata Pereira, da Saraceni Energia & Logística.

Wagner Freire, presidente da Associação Brasileira de Pro-dutores Independentes de Petróleo, afi rma não acreditar que uma consolidação leve à aquisição de pequenas companhias no Brasil, em particular. Mas diz que considera natural que peque-nas e médias empresas do setor busquem fusões e aquisições em uma situação como a atual.

DE LÍQUIDO A GASOSO No setor de gás, um dos movimentos mais signifi cativos em andamento é a construção de plantas de liquefação para expor-tação de Gás Natural Liquefeito (GNL) e de recepção, armaze-namento e liquefação de GNL. Existem unidades para recepção em projeto, construção ou em início de operação no Chile, no Brasil, Argentina, Uruguai e Colômbia. E, de liquefação, no Peru e na Venezuela.

Marcos Tavares, sócio-diretor da consultoria Gás Energy, afi rma que a idealização de tais projetos se deve, em boa parte, à instabilidade política e de fornecimento na região, que vinha buscando a integração através de gasodutos como o Brasil-Bolívia e o Argentina-Chile. Com as plantas de liquefação e gaseifi ca-

As novas fontesAlguns dos principais projetos de geração em desenvolvimentona região.FONTE: MIN. DE MINAS E ENER. -BRASIL, PAC - BRASIL, SOC. NAC. DE MIN., PET. Y ENER. - PERÚ, COM. FED. DE ELECTR. - MÉXICO, CNE - CHILE

PAÍS INÍCIO DE 2008 INÍCIO DE 2009

ARGENTINA 27 29

BRASIL 247 344

CHILE 20 20

COLÔMBIA 20 20

COSTA RICA 70 70

CUBA 7 12

EQUADOR 2,4 2

MÉXICO 88 155

NICARÁGUA 0 39

PERU 0,7 1

URUGUAI 0,7 21

CARIBE 53 53,2

TOTAL 536 769

NOMBRE PAÍS TIPO MW

Jirau Brasil Hidroelétrica 3300

Santo Antônio Brasil Hidroelétrica 3150

Estreito Brasil Hidroelétrica 1087

Manzanillo México Termoelétrica 900

Foz do Chapecó Brasil Hidroelétrica 855

La Yesca México Hidroelétrica 750

Central Carboeléctrica del Pacifico México Carboelétrica 700

Central de ciclo combinado Norte II México Termoelétrica 550

Do Atlântico Brasil Termoelétrica 490

Candiota II Brasil Termoelétrica 350

Santa María Chile Carboelétrica 343

Bocamina II Chile Carboelétrica 342

Simplício Brasil Hidroelétrica 334

Dardanelos Brasil Hidroelétrica 261

São Salvador Brasil Hidroelétrica 243

Nueva Ventanas Chile Carboelétrica 242

Campiche Chile Carboelétrica 242

Quintero Chile Termoelétrica 240

Angamos I Chile Carboeléctrica 232

Angamos II Chile Carboeléctrica 232

El Pantanal Perú Hidroelétrica 220

Chilca I Perú Termoelétrica 194

Kallpa II Perú Termoelétrica 192

Kallpa III Perú Termoelétrica 192

Santa Rosa II Perú Termoelétrica 187

Tierra Amarilla Chile Termoelétrica 165

La Higuera Chile Hidroelétrica 155

La Concluencia Chile Hidroelétrica 155

La Venta III México Eólica 100

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 21

desenvolvimentosem desenvolvimentoe

ENERGIAESPECIAL

Vento a favorEvolução da capacidade instalada de energia eólica naAmérica Latina – em MWFONTE: WEA

ção, os países consumidores e exportadores poderão negociar com uma gama maior de parceiros comerciais. Outra vantagem seria a segurança no abastecimento. No Chile, a chegada do gás por via marítima permitirá a reconversão das termoelétricas que foram convertidas para operar com óleo, após a interrupção do fornecimento pela Argentina.

Isso está dando um impulso extra às termoelétricas, que já vinham ganhando espaço graças ao desenvolvimento de países com abundantes reservas de hidrocarbonetos, como o Peru. No país andino, onde funcionam quatro plantas do gênero, entrarão em operação outras quatro, em 2010 e 2011, quase dobrando a capacidade instalada. No Brasil, há a perspectiva de entrada em operação de duas novas usinas em 2011 e outras quatro, em 2013, além da unidade da Petrobras em Cubatão, de 400 MW, prevista para a virada deste ano. “É um segmento que atrai tanto tradicionais companhias investidoras no setor, como Vale, Gerdau, Votorantim e Odebrecht, quanto grandes grupos inter-nacionais, como EDF e EDP”, diz Tavares. Somente no Brasil, ele calcula que anualmente serão investidos cerca de US$ 1,5 bilhão na construção de termoelétricas a gás.

HIDRELÉTRICASMas o grande impulso em geração continuará a ser dado mesmo pelo desenvolvimento de grandes centrais hidrelétricas. Segundo Wilson, da Everis Brasil, não há escapatória. Apesar da crescente resistência de setores da sociedade a grandes projetos em redu-tos como a Amazônia, o Sul do Chile e da Argentina, os custos por MW ainda são dos mais baixos, a tecnologia é amplamente dominada e existem recursos inexplorados abundantes. O que manterá os projetos do gênero nos planos de grandes companhias internacionais geradoras com atuação na região, como Endesa, AES Gener e SN Power.

Dois grandes destaques regionais, na opinião do consultor, são os projetos do complexo hidroelétrico do Rio Madeira, com usinas programadas no Brasil e na Bolívia, que deverá consumir

R$ 28,4 bilhões apenas no trecho brasileiro. E o complexo de Trayenko, no Chile, com custo estimado em aproximada-mente US$ 1 bilhão.

Existe uma série de outras iniciativas, como o projeto de construção de 15 usi-nas da brasileira Eletrobrás em solo peruano para abastecer o Brasil, que com investimento de cerca de R$ 20 bilhões geraria entre 10 mil MW e 12 mil MW. A perspectiva é de que a construção das cinco primeiras uni-dades comece no segundo semestre, e ainda há estudos para um projeto semelhante com a Argentina.

Levando-se em conta as imensas demandas e defi ciências energéticas da América Latina, aindapode ser pouco. Mas, para um período de crise, o cenário não é nada mal.

Com Felipe Aldunate, Santiago, e Marcelo Galli,São Paulo

PUBLIRREPORTAGEM

“The best stimulus for the economy is to invest in women entrepreneurs,” sta-ted Lars H. Thunell, CEO of the Interna-tional Finance Corporation – the private sector arm of the World Bank – at an International Women’s Day event. That remark may seem hyperbolic to some economists, but it reflects a reality at two levels – first, the growing tide of wo-men entrepreneurs worldwide, and se-condly, proven U.N. studies which show that increased earnings among women results in improved healthcare and edu-cation of their families. In other words, upgrading women’s economic status is key to sustainable development and according to the IFC’s CEO, key to eco-nomic recovery globally.Within the last two decades, women’s entrée into business ownership has grown dramatically. In the United Sta-tes alone, 44.4% of all privately held fir-ms are now women-owned, and women now comprise the majority of new U.S. small business owners. Those busi-nesses now generate $2 trillion in reve-nues yearly, according to the Center for Women’s Business Research, and they employed 13 million people last year. In Europe, one out of every three sma-ll businesses is owned by women. In Japan, the second largest economy in the world, it’s one out of four, and in China, one out of five. In every corner of the world, women have come to mi-croentrepreneurship in majority num-bers as well, catapulting many families out of poverty. In Rwanda, a country best known for genocide that killed so

WHY WOMEN MEAN BUSINESS By Irene Natividad, President, Global Summit of Women

many of the country’s men and boys, women now own 40% of the nation’s businesses and growing. It is also the only country in the world where women parliamentarians at 55% form the ma-jority, and many say that it’s a direct consequence of their growing econo-mic power. One minister stated that the Rwandan economy recovered on “the backs of its women.”Since small businesses form the back-bone of every economy in the world, the fact that women are a growing group of those owners signals a shift that needs to be accelerated, according to the IFC. Right now, government-sponsored sti-mulus packages around the world are focused on infrastructure projects that are meant to generate jobs. What the IFC is signaling is that some of those funds should be targeted at buttressing small businesses that depend on loans to survive and thrive, but especially for women-owned enterprises, which have more tenuous lifelines. In addition to women’s growing econo-mic clout as entrepreneurs, women also play a pivotal role in the global economy in two other key aspects – as workers and as consumers. Right now, women now make up 30-50% of the paid wor-kforce in every corner of the world and their numbers are growing, both as a consequence of sheer need that forces many to seek employment outside the home, and as many more of them re-ceive advance training and education which makes them more marketable. In Europe, Japan and South Korea, which

are all facing a rapidly aging workforce, training women for the jobs of the pre-sent and the future are key to survival. Lockheed Martin’s CEO stated the bu-siness case starkly, when he stated the threat of the departure of “baby boomer” engineers to the viability of the company he leads. What he was pointing to is the sheer reality that developing women’s business leadership is also key to a competitive 21st century workforce.As women’s income has risen due to entrepreneurship or employment, so has their earning power. The result is that women in the developed econo-mies now make the majority of buying decisions – 80% in the U.S. alone. American women are the majority of car buyers, Internet users, education and healthcare consumers, not to mention office equipment purchasers for their own enterprises or the organizations they work for. What this means is that what a woman decides to buy is key to profitability of many companies in every country.To sum up, women not only bring in-come home to their families, they also create jobs and impact their local and national economies by what they decide to buy. It is clear that they are critical to any economic recovery, and stimu-lus packages worldwide should consi-der the gender impact of any proposed plans.Irene Natividad is President of the Global Summit of Women, which will be held in Chile from May 14-16th at the Sheraton Santiago Hotel.

Onde estão as baterias?Maiores produtores mundiais de lítioFONTE: SQM

SQM

CHINA

CHEMETALL

OUTROS

FMC

30%

24%

28%

1%

17%

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 23

Os sauditas do sul

ENERGIAESPECIAL

Oplano de estímulo anunciado pelo presidente Obama nos Estados Unidos é uma caixa de surpresas. Entre resgates fi nanceiros e nacionalização de empresas,

seu governo decidiu destinar US$ 16,8 bilhões à efi ciência energética. Destes, US$ 2 bilhões serão investidos na pes-quisa de baterias elétricas para veículos que sejam mais efi cientes. O governo quer que em 2015 haja 1 milhão de carros elétricos no país.

O mais provável é que muitos destes usem bateria de lítio, metal com alta capacidade de armazenamento de energia. As mesmas já e cada vez mais usadas em telefones celulares, notebooks, iPods e toda classe de equipamentos tecnológicos. Uma crescente demanda que deverá ser satisfeita pela América do Sul, mais precisamente por Chile, Bolívia e Argentina, países que concentram mais de 75% das reservas mundiais estimadas de lítio, encontrado principalmente na placa líquida que ocultam os enormes salares andinos.

Os três têm em suas mãos um mercado que em 2008 movimentou cerca de US$ 590 milhões e cuja demanda tem crescido a um ritmo anual de 8% entre 2003 e 2007, segundo dados da empresa britânica de consultoria Roskill Consulting Group. E diferentemente de outras commodities, seu preço não caiu com a crise. Segundo estudos do setor, o valor da tonelada de carbonato de lítio subiu de US$ 5,5 mil em 2006 para US$ 6 mil em 2007, e em 2008 girou em torno dos US$ 6,2 mil. Uma situação que deverá melhorar com a chegada do carro elétrico. Através de diferentes es-tratégias, os três países latinoamericanos buscam garantir sua fatia de mercado. Mas, fi éis à tradição latinoamericana,

Com três estratégias distintas, Chile, Bolívia e Argentina buscam aproveitar o enorme negócio do lítio para baterias de carros elé-tricos. Mas nenhum deles planeja criar uma indústria viável que agregue valor a esse metalJuan Pablo Rioseco, Santiago, Antonio María Delgado, Miami

nenhum apresenta planos viáveis para aproveitar o acesso privilegiado a este recurso e desenvolver uma indústria de maior valor agregado.

Talvez o Chile seja o país mais bem preparado para obter os benefícios desse futuro boom. O país produz lítio desde meados dos anos 90, enquanto a Bolívia ainda não come-çou a explorar suas reservas e a Argentina o faz em menor escala. Além disso, é onde os recursos naturais foram mais estudados e os custos de extração são menores. Segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos, o Chile tem cerca de 3 milhões de toneladas de lítio sob a terra, que correspondem

Echazú: a Bolívia

oferece o Salar de Uyuni, mas a exploração tem

que ficar nas mãos do Estado.

AFP

24 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

Em plena carga

ABI

ENERGIAESPECIAL

Carros com bateria a lítio:a aposta da indústria

a 70% do material já comprovado como economicamente vi-ável do planeta, principalmente nas salmoneiras do Salar de Atacama. Ainda que ao falar de reservas base – as que ainda não foram bem calculadas ou ainda não se defi niu sua viabi-lidade econômica –, o boliviano Salar de Uyuni registre 5,4 milhões de toneladas, é de um material de menor qualidade: no Atacama, há 1,92 g de lítio por cada litro de salmoura, enquanto na Bolívia essa cifra cai a 0,3. No Salar de Hombre

Muerto – o único explorado na Argentina –, a cifra é de 0,4 g, e no Salt Lake, nos Esta-

dos Unidos, é de apenas 0,07 g por litro.A fabricante de nitratos e potássio chilena SQM é uma das

empresas que não tira o olho desse mercado. É a maior mi-neradora não-metálica do mundo e a única do setor no Chile. Lidera o mercado mundial de carbonato de lítio (matéria-prima que está um passo atrás do lítio metálico) com 30%, tem pro-dução anual de 27,5 mil toneladas e vendeu em 2008 cerca de US$ 180 milhões. A segunda é a alemã Chemetall, com 28% do mercado e da produção, principalmente nos Estados Unidos e um pouco no Chile, através da Sociedade Chilena de Lítio (que em 2008 extraiu cerca de 10% do extraído pela rival chilena). A SQM também é líder no mercado de fertili-zantes especiais – seu principal negócio, representando 55% de sua receita – e de iodo. Em 2008, suas vendas totais foram de US$ 1,77 bilhão, 49,4% mais do que em 2007.

Segundo as projeções – conservadoras – da SQM, a de-

manda mundial do componente crescerá acima de 5% ao ano no período 2008-2018. As baterias recarregáveis serão as protagonistas desse aumento, com taxas próximas dos 10% ao ano. Até 2018, representarão 42% da demanda por lítio (em 2008 essa cifra foi de 27%), e as destinadas para veículos representarão entre 10% e 15%. “A partir de 2010 ou 2011 deverão começar a aparecer lentamente os carros comerciais a bateria”, diz Christian Contreras, analista da Banchile In-versiones, em Santiago. “A demanda está crescendo muito devido ao uso em celulares e notebooks, mas nada se compara ao que poderá acontecer com os carros híbridos.”

Para Patricio Contesse, gerente geral de SQM, a pressão das autoridades na Europa, Estados Unidos e Japão para o desenvolvimento de carros elétricos está cada vez maior. “E o desenvolvimento tecnológico indica que o uso de baterias em geral será cada vez mais massivo.” E como o país tem reservas sufi cientes para satisfazer várias vezes a demanda mundial, a SQM acaba de aumentar sua capacidade de produção de 30 mil para 40 mil toneladas anuais, parte de um plano de US$ 1 bilhão em três anos, envolvendo a companhia em geral.

MÃO DO GOVERNOMas o reinado chileno pode ser posto em xeque pela Bolívia. Afi nal, o Salar de Uyuni é a maior reserva do mundo e os bolivianos estimam que poderia ter muito mais lítio do que se calcula, já que nunca foi feito um estudo detalhado de seu potencial. “Se eles decidem explorar seus recursos, podem perfeitamente igualar ou superar a atual produção do Chile, que está se expandindo”, diz Roberto Mallea, especialista do Centro de Pesquisa Mineira e Metalúrgica (Cimm), em Santiago.

O governo de Evo Morales já fi nanciou uma fábrica pilo-to para produzir carbonato de lítio (US$ 5,3 milhões) e está buscando sócios para uma operação maior. Companhias como as japonesas Sumitomo e Mitsubishi, e o Grupo Bolloré da França, querem participar do negócio para garantir o forne-cimento de lítio para as baterias dos carros que desenvolvem. “Teremos um grande potencial”, diz Saúl Villegas, diretor da Corporación Minera de Bolivia (Comibol), ala operacional

Apesar de haver diferentes tecnologias em estudo, a maior parte

da indústria automotiva está apostando no desenvolvimento de

baterias elaboradas à base de lítio. Para Jeff Chamberlain, este

metal é o que oferece as maiores vantagens. “É muito leve e tem

mais capacidade de armazenamento de energia por densidade.”

Ainda que a volatilidade do lítio o torna vulnerável a detonações,

a indústria está superando esses problemas. “Há diferentes

sistemas com base em baterias de lítio e cada uma apresenta

seus problemas, mas estão muito perto de solucioná-los”, diz

o assessor da indústria automotiva Keith Evans.

De fato, os esforços por torná-las seguras e seu elaborado

processo de fabricação são os principais motivos pelos quais as

baterias para carros são tão custosas, com um preço em torno

de US$ 5 mil a unidade. Se chegar a converter-se em padrão

Contesse: a SQM ampliou sua capacidade de produção de lítio de 30 mil a 40 mil toneladas anuais.

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 25

MIG

UEL CAND

IA

ENERGIAESPECIAL

do Ministério de Minas.O país é o único entre os três sulamericanos que declarou

a intenção de ir além da produção de carbonato de lítio. A Bolívia também quer produzir o lítio metálico usado como anodo nas baterias dos carros elétricos e, quem sabe, ba-terias. Luis Alberto Echazú, ministro boliviano de Minas, criou um comitê de especialistas no metal e de companhias automotivas para ajudar o país no desenvolvimento de uma possível nova indústria. “Temos uma política: industrializar nossos recursos”, diz Echazú. “Preferimos produzir menos, mas com mais valor agregado ao lítio e à industrialização do país.” Thierry Marraud, diretor de fi nanças do Grupo Bollo-ré, já disse a Morales que lhe convém processar o lítio. “Se quer (instalar) uma planta automotiva na Bolívia, podemos ajudá-lo. Por que não? Não é impossível”, afi rmou à mídia. De qualquer forma, o país quer que a operação seja 100% controlada por bolivianos. “Nada de exclusividades, nada de monopólios, e maioria na participação dos frutos da explo-ração do Estado boliviano”, diz o ministro.

Mas a história indica que a industrialização sempre foi esquiva aos países latinoamericanos. Bendita com grandes quantidades de tudo, a própria Bolívia continua sendo a mais pobre da América do Sul, com mais da metade da população abaixo da linha de pobreza. E não há nada que faça pensar que deixará de sê-lo. Sem ir mais longe, em 1996 uma companhia chamada Lithco pretendia investir US$ 100 milhões no Salar de Uyuni, mas as organizações locais protestaram e o projeto foi abortado. “Era completamente inaceitável”, lembra Ville-gas, que explica que o contrato entregaria uma grande porção do salar à companhia sem nenhum compromisso.

No Chile, a SQM se sente tão cômoda com seu negócio que não tem nenhum projeto para ir além da exploração da commoditie. “Como empresa, não somos capazes de subs-tituir toda a pesquisa nos milhares de tipos de baterias que há”, diz Contesse. Além disso, destaca que o Chile não tem a tecnologia nem a capacidade científi ca que essa indústria requer. “Teríamos que investir nos EUA, na Europa ou no Japão.” Tampouco tem interesse em investir em explorações fora. “Muito se tem falado, mas sempre chegamos à mesma

conclusão: de longe, a maior possibilidade de desenvolvimento está no Chile”, diz Contesse. Ele sabe que as salmoneiras de outros países são de qualidade inferior, com maior custo de produção. Inclusive, analistas afi rmam que a empresa pode-ria ser benefi ciada se a Bolívia entrar no mercado. “Poderia perder sua posição dominante, mas tiraria proveito de sua efi ciência”, diz Francisco Errandonea, analista do Santan-der Investment, em Santiago. “Se um produtor com menos experiência chega a produzir, é porque os preços estão altos, e cairia muito bem para o Chile.”

A Argentina é o grande coringa que pode surgir no mercado mundial, mas

a iniciativa local é praticamente inexistente. Por enquanto, a única operação é a da norteamericana FMC, que extrai 17 mil toneladas anuais do Salar Hombre Muerto, praticamente toda a produção da companhia. A este se somará o projeto do Salar Rincón, que a australiana Admiralty Resources acaba de vender ao fundo da Sentient Executive por US$ 33 milhões. Mas há muitos salares com bom potencial na Ar-gentina cuja importância ainda se desconhece. “Há alguns antecedentes que indicam reservas de 800 mil toneladas no país”, diz Mallea, do Cimm. “Mas isso é de um salar. E entre Salta e Jujuy deve haver, ao menos 10 ou 15 salares desse tamanho”, que estariam dentro de Argentina. Um gigante adormecido.

Com Jean Friedman-Rudovsky

dentro dessa indústria, esse metal branco poderia se tornar

um componente tão apetitoso quanto o negro petróleo. Se a

quarta parte dos 72 milhões de carros produzidos hoje chegar

a ser elétrica, a indústria teria que duplicar as 27,4 mil tone-

ladas de lítio metálico por ano que hoje produz para atender

à demanda de baterias para celulares, notebooks e artigos

eletrônicos portáteis em geral, a fabricação de vidro e seu uso

farmacêutico (para combater a depressão). Isso sem contar que

é um dos ingredientes-chave para fabricar o combustível das

centrais nucleares de fusão que Europa e EUA desenvolvem.

“É muito difícil de prognosticar o que uma demanda desse tipo

signifi caria para os preços”, diz Robert Baylis, analista sênior

da consultoria Roskill Information Services Ltd.

Apesar de os grandes fabricantes de carros enfrentarem pro-

blemas com a crise, estão se preparando para introduzir no

mercado novas linhas de carros elétricos. A GM avança em

seu amplamente divulgado Chevi Volt, com previsão de sair à

venda na segunda metade de 2010, competindo com o Nissan

Electric Car e o Mini Electric Car, de alemã BMW. Mas o mais

provável é que a corrida para sair primeiro seja vencida pela

chinesa BYD, cujo modelo F3DM cruzaria a linha de chagada

com meses de antecedência. Até agora, a Ford Motor Company

não parece estar entre os líderes, mas isso não quer dizer que

não esteja trabalhando. Seu presidente executivo, Alan Mulally,

garantiu no começo de março que o futuro da companhia é

elétrico, e que entre 10 e 12 anos esses carros corresponde-

rão ao grosso de sua frota. Enquanto isso, há tempo para que

todos carreguem suas baterias.

Questão desobrevivência

“Veja, cortaram de novo a luz!” Esta provavelmente foi uma das frases mais utilizadas no Chile em 1999, quando o país sofreu um forte racionamento de energia devido à

seca que assolou o país no ano anterior. Depois, em 2004, veio a redução do fornecimento de gás pela Argentina, de quem o Chile comprava mais de 90% de seu consumo – 37% da geração de eletricidade, por exemplo, dependia do insumo do vizinho. E no fi nal de 2007, até meados de 2008, os chilenos viveram com o temor constante de que o fi lme se repetisse. Não é para menos. Hugh Rudnick, professor titular da Faculdade de Engenharia da PUC, lembra que o Chile importa mais de 70% da energia que consome, e a única alternativa para o país é apostar em alternativas que sejam sustentáveis e que conciliem economia e segurança, respeitando o meio ambiente.

Mas esse cenário parece fi nalmente estar mudando. Os pla-nos lançados pelo governo em 2008 para diversifi car a matriz energética parecem mostrar seus primeiros resultados. Desde 2007 até agora, o país soma projetos de US$ 20,77 bilhões, equivalentes a 13.946 MW de capacidade instalada, somente no Sistema Interconectado Central (SIC). Destes, quase 10% correspondem a parque eólicos (1.214 MW), cifra inimaginável há pouco tempo. Os projetos que usam diesel representam qua-

se a mesma quantidade de capacidade instalada (1.290 MW). Outros 4.115 MW correspondem a centrais hidroelétricas, 879 MW a GNL, e 6.350 MW a projetos a carvão. Do total, 3.131 MW (US$ 3,32 bilhões) já estão aprovados e 10.815 MW (US$ 17,45 bilhões) em avaliação.

No Sistema Interconectado do Norte Grande (SING), que junto com o SIC é o principal sistema elétrico do país, as inicia-tivas lançadas nesse período somam 1.195 MW de capacidade instalada, equivalentes a US$ 2,13 bilhões em investimento. Já os investimentos entre 2008 e 2012 somam US$ 27 bilhões, o que representa cerca de 43% do total estimado em grandes investimentos para o período. “As medidas que foram tomadas tanto em nível governamental quanto em nível privado foram bem sucedidas”, diz Luis Flores, diretor da Pricewaterhouse-Coopers e especialista no setor.

Apesar de no Chile o investimento em energia e as empresas do setor estarem em mãos privadas, o Estado é quem fi xa as tarifas e coloca as regras do jogo. O problema é que, nas úl-timas décadas, o país experimentou crescimento signifi cativo do consumo, enquanto sua matriz de geração dependia do gás argentino, que por ser barato desincentivou o investimento em outras fontes de energia. Para se ter uma ideia, somente nos

Governo chileno se empenha em diversifi car a matriz energéti-ca do paísMatías Rodo Yuricevic, Santiago

Tokman:sem cortes

26 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

ENERGIAESPECIAL

O reino da águaCapacidade SIC + SING (dezembro 2008)FONTE: CNE

Hidráulica

Gás natural

Biomassa

Petróleo

Carvão

Eólica

37,2%

35,2%

1,3%

10,8%

15,4%

0,1%

últimos dez anos o consumo energético no país aumentou em média 2,8% ao ano, enquanto o consumo elétrico aumentou 6% em média. A capacidade instalada do país é de cerca de 13 mil MW e a geração total bruta supera os 55 mil GWh. As princi-pais tecnologias de geração são a hidroeletricidade, as plantas a carvão e as “duais” (gás natural e diesel).

O ministro de Energia Marcelo Tokman defende que é indis-pensável que a matriz se diversifi que. Nesse contexto, devem ser consideradas todas as fontes energética viáveis. “Fontes diferentes implicam diferentes fortalezas”, diz Tokman. A ex-secretária executiva da Comissão Nacional de Energia (CNE) María Isabel González reforça essa ideia: quanto menos se dependa de uma só fonte, mais forte será o sistema. “Se alguma falha, as restantes podem suprir a demanda.”

A ideia de Tokman é que o Esta-do reduza o risco dos investidores, incentivando diferentes opções. “A contribuição de cada fonte tem que ser avaliada de acordo às ne-cessidades de curto, médio e longo prazo”, diz.

Mas em qual fonte se deve apos-tar? Não são poucos os analistas que votam pela hidrelétrica. Estimativas indicam que seu potencial poderia alcançar os 20 mil MW de capacidade instalada. Para Flores, da Pricewaterhou-seCoopers, a grande capacidade hídrica do país “contribuiria para a conquista da tão desejada diversifi cação e autonomia energética”. Além disso, é limpa e de baixo custo. Ramón Galaz, gerente geral da consultoria Eco-fysValgesta, estima que a geração hidrelétrica, em pequena e grande escala, é e continuará sendo uma parte relevante da matriz nacional ao menos dentro dos próximos 30 ou 40 anos. De acordo as projeções realizadas utilizando o modelo do plano de obras indicativo da CNE, entre 2008 e 2020, cerca de 34% da expansão dos sistemas SIC e SING serão cobertos por projetos hidrelé-tricos convencionais (pouco mais de 4,4 mil MW de um total de quase 13 mil MW a serem instalados).

VIVA O CARVÃO?Não obstante, o alto preço do pe-tróleo registrado nos últimos anos incentivou o surgimento de projetos a carvão. Segundo estimativas da CNE, até 2020 cerca de 20% da matriz energética se fundamentará em centrais ali-mentadas por esse combustível. Para González, o carvão terá um papel importante no abastecimento energético do país. Hoje, mais de 30% da energia elétrica em nível mundial são gerados com carvão. “É uma fonte segura, já que é um combustível

abundante e disperso no mundo, e por isso não está sujeito a preços monopólicos”, diz. Para Rudnick, o carvão representa a melhor alternativa de geração elétrica térmica para o país, que deve complementar o desenvolvimento hidrelétrico.

Mas o carvão está ganhando cada vez mais inimigos. Am-bientalistas se opõem a esse tipo de central devido a poluição, o que obrigaria que os projetos reduzissem suas emissões de CO2 e mitigassem seus efeitos, aumentando o custo dos projetos.

O Chile entretanto não depende apenas do carvão para diversifi car sua matriz. As energias renováveis não-convencionais têm um papel fundamental, pois não dependem das fl utuações dos preços internacionais. “Como governo, estamos dando um grande apoio para que se removam quaisquer bar-reiras que limitem seu desenvolvimento”, diz Tokman.

Em 2008 o Chile aprovou uma lei para o desenvolvimento das ERNC que a partir de 2010 obrigará as empresas elétricas que comercializam energia a incluir na totalidade de energia injetada no sistema um percen-tual gerado por fontes não-convencionais, sejam estas próprias ou contratadas. Entre 2010 e 2014 a obrigação é de 5%. A partir de 2015, irá aumentando gradualmente, até chagar a 10%, em 2024.

Para Flores, essas fontes alternativas deveriam tomar um papel importante no país que, devido à sua geografi a, possui um grande potencial de desenvolvimento para as energias solar, geotérmica, maremotriz e eólica. As estimativas da CNE sobre o potencial técnico e econômico de geração indicam que com as tecnologias atualmente disponíveis é possível instalar uma

capacidade que supera os 12 mil MW. Entretanto, admite que “o alto custo de desenvolvimento dessas fontes só se jus-tifi ca em um mercado de altos preços dos combustíveis comerciais tradicionais, como o carvão e o petróleo”.

E quanto à energia nuclear? O governo ainda não conclui os estudos para avaliar se esta é conveniente para o Chile, que é um país altamente sísmico. A princípio, parece ser uma alternativa viável. “Tem baixos custos de produção e não emite CO2, o que impacta positivamente na economia e no meio ambiente”, diz Tokman.

O governo também tem buscado formas de incentivar o desenvolvimento do mercado dos biocombustíveis, através de isenções tributárias. De fato, segundo o Ministério

de Energia, os antecedentes técnicos e econômicos disponíveis até o momento sugerem que os biocombustíveis poderiam cobrir até 10% da demanda dos veículos terrestres até 2020.

É assim que governo e empresas esperam reduzir a pro-babilidade de um racionamento como o de 1999. Por ora, a população pode dormir tranquila, já que ao despertar terá luz elétrica.

Em busca de autonomiaEvolução da capacidade instalada SIC + SINGFONTE: CNE (2008)

EÓLICABIOMASSA

PETRÓLEOCARVÃO

GÁS NATURAL-GNLHIDRÁULICA

20.000

15.000

10.000

5.000

2.500

2.000

1.500

1.000

Capacidade nova em MWCapacidade

total em MW

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15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 27

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ENERGIAESPECIAL

O Circuito Latinoamericano de Tênis da ATP deste ano foi inaugurado com a 16ª edição do Movistar Open, disputado entre 31 de janeiro e 8 de fevereiro no popular balneário de Viña del Mar, no Chile. O evento, que existe desde 1993, teve como campeão, pela quarta vez, o chileno Fernando Gonzalez. Durante o torneio foram promovidas as Clínicas de Tênis, nas quais reconhecidos jogadores treinaram com jovens do programa PRONI-ÑO da Movistar, que busca erradicar o trabalho infantil. Os tenistas também tiveram a oportunidade de dar autógrafos e compartilhar com seus amigos e sua família.

MOVISTAR OPEN NO CHILE, MAIS QUE TÊNIS

Jaime Fillol, presidente do Movistar Open, Catherine Cristo, subgerente de Marketing de MEGA, e Álvaro Fillol, diretor do Movistar Open, durante a festa dos jugadores

Fernando González, campeão do torneio pela quarta vez, com o troféu do Movistar Open 2009.

Gianfranco Basollo com as modelos do Movistar durante a clínica de tênis. O chileno Nicolás Massú durante a clínica de tênis.

O tenista argentino Juan Mónaco dando autógrafos durante o torneio de tênis da ATP de Viña del Mar. Stefano Baraldo, Potito Starace e Pablo Andujar na festa dos jogadores.

SOCIAL

A reforma se deforma

AFP

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 29

Não faltam recursos energéticos no mundo. Faltam investidores. Este foi o diag-nóstico da Agência Internacional

de Energia ao analisar os riscos desse setor para os próximos anos. E é justamente o que acontece com a companhia Petróleos Mexi-canos (Pemex), que depois de décadas fi nalmente ganhou uma reforma que a dota de maior autonomia de gestão e mais recursos para investir, mas que enfrenta desafi os como garantir e otimizar seus futuros investimentos. O simples fato de aprovar a reforma não é sufi ciente. O desafi o para a Pemex e para o México é implementá-la a tempo e da melhor forma para garantir investimentos capazes de livrar a companhia de décadas de atraso. “A pergunta principal é se esses investimentos vão nos render mais petróleo, petróleo em quantidade sufi ciente pa-ra a exportação e o consumo nacional”, afi rma Duncan Wood, pesquisador do Instituto Tecnológico Autónomo do México (Itam).

O desafi o da Pemex é complexo. A empresa enfrenta uma severa queda no preço do petróleo, o rápido declínio de seu megacampo Cantarell, desatualização tecnológica e a lentidão de uma classe política na implementação de uma reforma aprovada em outubro de 2008.

O preço do petróleo e a desvalorização do peso mexicano terão um papel preponderante no futuro dos investimentos que a Pemex poderá realizar. “O potencial energético do Mé-xico em matéria de investimentos depende muito do preço do petróleo”, diz Wood. Dos 2,68 milhões de barris diários que a Pemex produziu no ano passado, foram exportados

O futuro da paraestatal Petró-leos Mexicanos depende da rápida execução de alterações na legislação energética Marisol Rueda, Cidade do México

quase 50% a um preço médio de US$ 37,65 o barril. A cifra é menos da metade dos US$ 80,15 alcançados em janeiro de 2008, nublando as estimativas de caixa que se possa de-dicar ao investimento. O México, calcula Wood, conseguirá manter este ano uma produção aproximada de 2,6 milhões de barris diários devido ao rápido declínio de Cantarell, localizado no Golfo de México. Em janeiro, o megacampo produziu uma média de 772 mil barris diários, frente a 902 mil em outubro.

Além disso, o potencial da Pemex se reduz com cada diz-que-me-diz da classe política. “O potencial da Pemex não é reduzido, mas na medida que for melhor desenvolvido poderão ser feitos mais e melhores projetos, que lhe dariam mais valor”, diz David Shields, especialista em energia. “O problema possivelmente é de que não há muita vontade po-lítica para implementar a reforma e aplicá-la bem.”

Um exemplo concreto desse risco é o atraso de dois meses do presidente Calderón em enviar ao Congresso sua proposta

de nomes de quatro conselheiros profi ssionais para formar o conselho de administração da Pemex.

O conselho foi uma das conquistas da reforma, e seu objetivo é dotar a

empresa de mais especialistas em petróleo e negócios. O atraso

na nomeação e posterior aprovação atrasam a im-

plementação da reforma. “Se esses conselhos não forem nomeados, tam-pouco se constituirá o novo conselho de administração, não se poderá aprovar um novo esquema de contratos para a

Pemex, nem integrar um plano estratégico de

negócios”, diz Shields. “É o primeiro passo para que

se sigam os demais.”E a Pemex não pode esperar

mais para concretizar as conquistas alcançadas com a reforma. Os investi-

mentos que a empresa pode canalizar para a exploração em águas profundas, para inovação tec-

nológica e para petroquímica, entre outros, só darão frutos no longo prazo, e a companhia não pode esperar muito. Não só porque a estatal enfrenta difi culdades geológicas na ex-ploração de seus campos, o que torna a atividade mais cara do que a realizada até agora, mas porque é preciso começar a investir antes que as alternativas ao petróleo que devem surgir no longo prazo afetem a rentabilidade dos projetos – que chegam a ter vida útil de 30 anos.

Os cálculos mais otimistas entre especialistas do setor apontam que a Pemex poderá elevar sua produção signifi ca-tivamente até 2018 somente se a implementação da reforma for executada rapidamente. “Caso contrário, poderá não garantir resultados”, diz Shields.

ENERGIAESPECIAL

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30 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

Se você quer acabar com a indústria siderúrgica de seu país, e vive na América

Latina, simplesmente compre títulos do Tesouro.

Em tempos turbulentos, as conexões entre os proces-sos econômicos ficam mais visíveis e retorcidas: na crise mundial, por exemplo, a fuga dos investidores financeiros

está deteriorando as contas externas de economias como a brasileira. A ironia é que os capitais fogem via instrumentos de créditos estatais dos EUA, França ou China, os mesmos países que já não compram os bens da região. Como resul-tado, as indústrias de ferro e aço viram cair primeiramente sua demanda externa, depois

a interna e, ainda, seu acesso a linhas de financiamento locais baratas.

Como se isso não fosse suficiente, algumas vozes começaram a advertir que a demanda de aço será alterada radicalmente quando a recessão acabar, devido a uma mudan-ça tecnológica não vista no último século e meio dentro

do setor.Mas o “depois da crise” é

um futuro ainda distante para as siderúrgicas. Na Argentina, a queda na produção interanu-al de aço bruto, de janeiro de 2009 contra janeiro de 2008, alcançou 31,9%. No México, a administração de Altos Hor-nos (AHMSA) teve 50% de pedidos a menos e opera com a metade de sua capacidade. No Brasil, gigantes como a Transpetro, Usiminas e Vale se enfrentaram em uma dura briga verbal em fevereiro, com acusações de dumping, quan-do a primeira – subsidiária da Petrobras – comprou aço de empresas chinesas e ucranianas com 30% de desconto frente ao oferecido pela Usiminas. No Peru, a Aços Arequipa para-lisou sua usina em novembro passado, a reativou em 12 de janeiro, e anunciou que rea-lizaria somente 50% de seu investimento planejado para ampliar a produção de 650 mil a 1,2 milhão de toneladas, por se tratar de compromissos inexoráveis.

SEM LUZO grave é que a luz no fim do túnel não passa, por enquanto, de pura miragem. “Não há sinal de recuperação em nenhum lugar do planeta”, diz Carlos Fernando Kochenborger, ana-lista de siderurgia da Geração Futuro Corretora de Valores, em São Paulo. “Se imaginava que o quarto trimestre de 2008 seria o pior”. Neste momento a queda nas vendas da Usiminas e Gerdau foi de 30%. “Agora – continua – tudo indica que este primeiro trimestre será, todavia, pior: com os núme-ros que dispomos vindos de diálogos com empresas, a expectativa é uma queda de 15% a 20% sobre o trimestre anterior”.

Além disso, perderam for-ças as expectativas de uma

NEGÓCIOS SIDERURGIA

NERVOS DE AÇO,FUTURO INCERTO A crise econômica é apenas um dos desafi os que o setor siderúrgico terá pela frente nos próximos anos Rodrigo Lara Serrano, Buenos Aires

AFP

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 31

recuperação dos estoques durante o primeiro semestre. Ela apenas aconteceria no se-gundo semestre, “e em níveis inferiores aos antecedentes”, antecipa Kochenborger.

O grande mistério é qual será o impacto real dos planos de recuperação dos EUA, China, Brasil e México. As grandes esperanças iniciais estão sendo reduzidas com rapidez. “São medidas que tardam a dar re-sultados e não representarão a solução do problema”, diz o analista.

Na Argentina, afirma Ma-riano Lamothe, economista da Abeceb, “é mínimo o impulso das obras públicas, de qualquer montante”. O ponto principal, a seu ver, é que “há fortes ex-cedentes de aço no mundo”. E enquanto “as empresas de minério de ferro se concen-traram e colocaram pisos nos custos”, na siderurgia a imensa dispersão dificulta evitar uma corrida bem ao estilo cada um por si.

O pessimismo também é grande no Chile. “No curto prazo, não acreditamos que uma recuperação será obser-vada, devido ao fato de que não existe a mesma disciplina de produção como entre os grandes atores da produção de ferro, nem há sinais definitivos de recuperação da demanda”, diz Leonor Skewes, da Bice Investimentos.

“BUY BYE”Contudo, os chilenos obser-varam com surpresa como a Mitsubishi comprou 6,42% da Compañia de Aceros del Pacífico (CAP) por US$ 170 milhões. Com essa fatia, os japoneses controlam 18,93 das ações.

Para Skewes, a aquisição “foi pensada como algo de lon-go prazo, já que eles são sócios há muitos anos do negócio de mineração e o momento era

uma boa oportunidade apro-veitando a significativa queda nos papéis”. E não é só isso: a companhia japonesa aposta no ferro nas mãos dos chilenos, já que a “CAP mantém importan-tes reservas com elevado grau de qualidade, embora saiba que o tamanho delas é muito pequeno se comparado ao das grandes companhias brasileiras e australianas”.

Mesmo assim, no primeiro trimestre, é provável que a filial siderúrgica da empresa, a CSH, registre perdas operacionais. “Até o segundo semestre de 2009, esta situação deve melho-rar”, mas apenas “levemente, devido a quedas nos preços do carvão e do minério de ferro”, diz o analista.

Em termos simbólicos, será importante para a região o que será da medida “Buy America”, hoje em debate nos EUA. Um estudo da Alliance for Ameri-can Manufacturing (que inclui siderúrgicas e o sindicato do setor) assegura que financiar projetos só com aço estadu-nidense criaria 77 mil postos

na indústria; outro estudo – do Peterson Institute – indica que a quantidade seria de apenas 1.000, porque a demanda adi-cional de aço seria apenas de meio milhão de toneladas, uma parte ínfima para o setor global. Mesmo assim, a senadora Eva Contreras, do Partido Ação Nacional (PAN), indicou que a disposição transgride o Capítulo X da TLCAN, que proíbe que as compras governamentais sejam discriminadas entre os signatários. A CANACERO (Câmara Nacional da Indústria

de Ferro e Aço) prepara uma ofensiva.

No México, o setor repre-senta 9% do PIB industrial, e é o principal consumidor de eletricidade (7,3%) e gás, ao mesmo tempo que cria 53 mil postos de trabalho diretos e meio milhão de indiretos.

NANOSSIDERURGIAAlém dos dias negros vividos pelo mundo do aço, o maior desafio para a sobrevivência da indústria está em outro polo. “Vamos assistir a uma mudança dramática e estrutural na indústria do aço como não se vê desde 1870”, diz Carlos Schwartzer, especialista em economia industrial. O aço está sendo substituído pelo alumí-nio, o vidro e o policarbonato. “A construção seca não utiliza aço, as pontes já não são feitas mais de aço, e sim de cimento e fibra”, explica.

Schwartzer vê maus pres-ságios para as siderúrgicas latinoamericanos com esta mudança. “Creio que, salvo algum player brasileiro, não

há muitas possibilidades. Não será um clube de pequenos. Não é um problema de fle-xibilidade empresarial, é um problema de acesso a capital”. Para ele, “os que participarem deste jogo vão ter que ter forte apoio político”.

O especialista diz que, por exemplo, a empresa argentina (com sede em Luxemburgo) Techint/Ternium “no longo prazo vai decair e agora está refletindo se volta ao setor de construção”.

Mas do que se trata esta

revolução? O Dr. Gustavo Bianchi, especialista em tecno-logias de materiais e química, diz que se trata de “nanotecno-logias que permitem produzir aços resistentes à corrosão”. Já existem “os chamados duplex, aços inoxidáveis a base de cromo. No futuro, vamos ver a produção de aços de baixo custo e alto desempenho graças a estas tecnologias”. Técnicas como “nanoestruturados de su-perfície” vão mudar a maneira de criar aço. E produtos como o buckypaper, um “papel” feito de nanotubos de carbo-no, mas 250 vezes mais forte que o aço, revolucionarão a siderurgia.

O problema é que “nesta crise, a primeira coisa que acontece é a paralisação de investimentos em pesquisa e desenvolvimento”. Mas, a seu ver, empresas como a Tenaris “possuem altos investimentos em P&D tanto na Argentina quanto na Itália”.

Para sobreviver em 2009 e 2010, como para se renovar, é preciso dinheiro. Muito di-

nheiro. Quem tem os recursos? Kochenborger diz que CSN e Usiminas estão em boa situação, “um pouco melhor do que a Gerdau”. As duas empresas possuem liquidez abundante por conta da ven-da de ativos e economias da época de vacas gordas. Algo importante, já que, no mundo que virá, não só será preciso ter nervos de aço, mas bolso de aço também.

com Dubes Sônego,São Paulo

Especialistas advertem que avanços tecnológicos provocarão

mudanças dramáticas na indústria e exigirão disponibilidade de capital.

32 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

NEGÓCIOS CONGLOMERADOS

Oque há de comum entre fa-bricar um barco e vender uma bolsa feminina? A

resposta é que os dois negócios fazem parte do portfólio de projetos do grupo brasileiro Camargo Corrêa. O grupo, que nasceu há 70 anos como uma empresa de engenharia e cresceu amparado em projetos públicos, hoje é um sofisticado conglomerado com presença em 20 países e em mais de

30 diferentes negócios. Das sandálias Havaianas e dos tênis Topper à fabricação de plataformas petrolíferas, bar-cos, pontes, imóveis, estradas e gestão de aeroportos, hoje parece que nenhum negócio pode ficar de fora do esque-ma corporativo da Camargo Corrêa. “Tivemos alguns anos muito bons nos quais crescemos muito em nossas áreas-alvo e conseguimos

ser fortes em novas áreas de negócios”, diz Vitor Hallack, presidente do conselho de administração da empresa. “Estamos em setores muito relacionados ao crescimento interno do País.”

As cifras do grupo confir-mam esse bom desempenho. Cifras não-oficiais indicam que o grupo fechou 2008 com vendas de US$ 6,3 bilhões, 6% mais que em 2007, mas mais

que o dobro do faturamento de 2004. Hoje o desafio da empresa é manter as tendên-cias em um ano em que parece que tudo vem abaixo. “Os investimentos privados estão se detendo e isso vai afetar a parte de nossos negócios tanto na área de engenharia e construção como nas ou-tras”, afirma Hallack. “Mas ao mesmo tempo esperamos que o investimento estatal na

PLANO DE OBRASCom uma estratégia fi nanceira conservadora e diversifi cada, a holding Ca-margo Corrêa aposta que continuará a crescer nos próximos trimestres. Em boa parte, dando suporte ao setor público Felipe Aldunate M.

Hallack: Restabelecendo

pontes com o Estado

GRU

PO P

ERFI

L

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 33

área de infraestrutura cresça, o que compensará em parte a queda de nossos negócios com clientes privados.” Trata-se de uma situação paradoxal, mas foi uma crise, a do pe-tróleo, nos anos 70, que levou a Camargo Corrêa a buscar novas oportunidades fora da esfera estatal e deu início a sua etapa de diversificação. Mas esta crise a está levando novamente a buscar negócios com os órgãos públicos. Em 2005, somente 20% de seu negócio de engenharia e construção, o mais importante de todos, estava vinculado a projetos estatais. Em 2008, esse porcentual foi de 30%, e a tendência é de alta em 2009.

Mas a Camargo Corrêa não buscará apenas o Estado para estender suas redes. De fato, o grupo quer aproveitar sua sólida situação financeira para fortalecer as áreas em que está presente. Por exemplo, no final de janeiro comprou a participação de 14,3% que seu rival Grupo Votorantim tinha na CPFL Energia, por US$ 1,2 bilhão. Isso aconte-ceu poucos dias depois que, junto com seus sócios chilenos Gestión e Ingeniería IDC, e o suíço Unique, comprou a ope-ração do aeroporto de Curaçao, por US$ 25 milhões, o qual registra fluxo de 1,8 milhão de passageiros ao ano.

“Mas trata-se de um grupo conservador quanto à exposi-ção financeira”, diz um analis-ta da Banif Securities em São Paulo, que pediu para não ser identificado. “Apesar de serem ativos em aquisições, não co-meçarão agora uma etapa de crescimento superacelerado e não vão comprar empresas simplesmente porque estão baratas. Eles sempre buscam negócios que tenham sentido estratégico, sinergias.” A cautela financeira da Camargo

Corrêa não é um tema menor. Especialmente porque dezenas de empresas do Brasil registra-ram bilhões em perdas depois de apostarem em derivativos cambiais e serem surpreendidas pela desvalorização do real. “A aposta em derivativos, em arbitragem de moedas – pois no fundo estamos falando disso – não é compatível com uma gestão mais conservadora como a nossa”, diz Hallack. “Essa atividade pode gerar um lucro substancial, mas como não tínhamos a compreensão necessária para aproveitá-la, optamos por não fazê-lo.”

Para analisar as possibilida-

des de negócios do grupo para este ano é preciso entender sua estrutura corporativa. A holding possui cinco grandes divisões. Engenharia e construção é a maior e mais antiga. Depois vem o negócio de cimento; têxteis (calçados, jeans e outros) e siderurgia formam a terceira divisão – pois a pessoa respon-sável domina bem ambas as áreas. Na sequência vem con-cessões, com a qual manejam desde aeroportos e estradas à centrais de eletricidade. A úl-tima grande área é composta

pelos negócios imobiliários, de gestão ambiental e corporativa. “Os setores que compreende-mos como core business, como nossos negócios centrais e nos quais buscaremos crescimento acelerado são os de construção – que é parte de nosso DNA – cimento e concessões”, conta Hallack.

Dentro da área de conces-sões, umas das mais novas é justamente a gestão de aero-portos. Através de sociedades, a companhia tem presença no Chile, na Colômbia, em Honduras e Curaçao. Também está inaugurando seu negócio de fabricação de barcos. Isso

porque a Camargo Corrêa foi uma das empresas brasileiras que respondeu ao chamado da Petrobras para construir uma estrutura naval para seus ne-gócios ultramarinos. O grupo investiu recentemente US$ 240 milhões, juntamente com um grupo de sócios, na constru-ção de um estaleiro. As obras ainda estão em andamento, mas a unidade já fabrica suas primeiras embarcações.

Hallack também está preo-cupado com o destino de suas marcas têxteis. “Queremos que

a Topper se transforme em uma marca esportiva relevante em toda a América Latina, e que as Havaianas passem de marca de chinelo à marca de uma nova e ampla linha de produtos, como bolsas de mulher e outros”, conta o brasileiro.

Desafios não faltam na trajetória do grupo. “Há áreas em que esperávamos melhores resultados para a Camargo Corrêa. O setor imobiliário, por exemplo, no qual a companhia registrou mais gastos do que o esperado e uma queda no caixa”, diz Eduardo Silveira, analista do Banco Fator. “Mas trata-se de um setor que só tem registrado notícias negativas, e com certeza o grupo tem muita força, o que impede que os problemas de liquidez de sua subsidiária sejam pre-ocupantes.”

Isso porque o grupo conta com linhas de crédito dispo-níveis. “Para nossos reque-rimentos, podemos acudir a capital próprio, empréstimo bancário e inclusive à venda de algum de nossos negócios que deixem de ser estratégi-cos”, afirma Hallack.

A diversificação internacio-nal, entretanto, se deterá nessa temporada. O plano do grupo é crescer nos mercados em que já está presente, e que não são poucos: vários países da Amé-rica do Sul, além de Angola e Moçambique, na África. O grupo inclusive tem presença em países que tomaram medi-das agressivas contra investi-mentos internacionais, como Venezuela, Bolívia e Equador, que entraram em atrito com outras empresas brasileiras recentemente. Hallack não valoriza o fato. “É o risco de fazer negócio”, diz. “Quando se decide investir em um país, há riscos inerentes. O impor-tante é mitigá-los, e isso se conquista conhecendo melhor o país onde se está.”

2004 2005 2006 2007 2008

Faturamento 2780 2772 3903 5956 6300*

Lucro líquido 212 82 405 835 N/D

EM ALTACifras anuais consolidadas do grupo, em US$ milhões

LEQUE DE ATUAÇÃOPaíses nos quais o grupo desenvolve e controla projetos

PAÍSES

Divisão de engenharia e construção BRASIL- BOLÍVIA- COLÔMBIA- PERU- VENEZUELA

Divisão de cimento BRASIL-BOLÍVIA-PARAGUAI-ARGENTINA

Divisão de calçados, têxteis e siderurgia BRASIL- URUGUAI-CHILE-ARGENTINA- VENEZUELA

Divisão de concessões

-Energia

-Transportes

-Aeroportos

BRASIL

BRASIL

CHILE-COLÔMBIA-AMÉRICA CENTRAL- CARIBE

Divisão imob. meio ambiente y corporativa BRASIL

FONTE: CAMARGO CORRÊA

* = ESTIMATIVA

Divisão de concessões

-Energia

-Transportes

-Aeroportos

BRASIL

BRASIL

CHILE-COLÔMBIA-AMÉRICA CENTRAL- CARIBE

34 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

O PODER DO TIJOLO

Real State Options: reformas na parte antiga

da Cidade do Panamá

Quando o mundo entrou em crise em 2002, Mario Sureda, dono da Mario

Sureda Negocios Inmobilia-rios, escutava a mesma per-gunta constantemente: “Os preços vão baixar em Punta del Este”, e a resposta do uru-

guaio também era sempre não. “Atualmente, alguns também perguntam se os preços vão cair devido à crise mundial. E respondemos o mesmo: não”, sentencia, categórico, Sureda. E não é para menos. Pese que a velocidade de venda possa

diminuir, os preços estratosfé-ricos dos imóveis nessa cidade costeira impulsionaram um boom imobiliário com pou-cas perspectivas de deter-se, apesar de que alguns projetos atrasaram por problemas de financiamento. Atualmente

O desenvolvimento imobiliário já não perece ser o negócio mais rentável do mundo. Mas na América Latina ainda há demanda Soledad Gómez, Santiago

há 679 mil metros quadrados em obra nessa área, a um preço médio de US$ 3 mil o metro quadrado, segundo estudo da empresa Reporte Inmobiliario S.A. Mas não apenas nessa cidade costeira há movimento de cimento. Em toda a América Latina, as gruas continuam operan-do em meio a um ambiente econômico incerto.

Sem dúvida que notícias como o freio na construção do projeto Costanera Center, do grupo Cencosud, em Santiago do Chile – que contemplava a torre de escritórios mais alta da América do Sul, além de dois hotéis e um centro comercial – ou a saída de alguns investi-dores europeus da ensolarada costa uruguaia, causam ruído. Mas o continente continuará albergando oportunidades no setor da construção e está atraindo investimentos de quem vê uma luz em meio a um obscuro panorama global. “Acho que a América Latina tem sido afetada por tudo o que está passando, mas também há muitas oportunidades”, diz Michael Teich, sócio princi-pal da Real Estate Options, empresa com sede em Nova York. “Pode-se aproveitar a desvalorização das moedas locais. É um bom momento para entrar no mercado”, aponta Teich.

E as oportunidades parecem não ser poucas. Para começar, as taxas de desocupação de escritórios continuam sendo baixas nos mercados mais in-teressantes. Segundo Richard Wong, gerente de estudos para as Américas da CB Richard Ellis, “em Santiago do Chile é de 0,7%, a mais baixa da região, e o Peru também apre-senta números interessantes”. Para Wong, “a oferta é tão baixa que continua existindo a percepção da necessidade, e apesar de que alguns projetos

NEGÓCIOS IMOBILIÁRIOS

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 35

atrasarão por problemas de financiamento, continuará existindo demanda, especial-mente quando o mercado se recuperar”. Segundo o analista da CB Richard Ellis, a taxa de desocupação em São Paulo é de 5,7%; na Cidade do México, de 4,7%; e em Buenos Aires, de 2,1%. David L. Berger, gerente para a América Latina e o Ca-ribe da NAI Global, concorda com Wong. “Esperamos que as taxas de desocupação se mantenham estáveis. Inclusive, que baixem em alguns casos, com a demanda excedendo a oferta nos principais merca-dos regionais”, diz Berger. Isso transforma o setor de escritórios em um dos mais atraentes.

José Robledo, gerente ge-ral da Patrimonio Estrategias Inmobiliarias (PEI), na Co-lômbia, indica oportunidades inclusive devido à queda nos investimentos das empresas. “Muitas multinacionais conti-nuarão crescendo no mercado colombiano, mas decidiram reduzir seu investimento de capital a zero”, diz. “Até há pouco tempo eram donos de seus centros corporativos e de todos os seus imóveis, mas agora estão abertos a que o mercado possa lhes oferecer projetos sob medida e entregar para aluguel àqueles que não tenham que fazer esse investi-mento”, afirma. Essa modalida-de oferece a vantagem de evitar experiências desagradáveis como a que afetou o Cenco-sud. Atualmente, o PEI, que opera uma construtora própria, além de um fundo de investi-mento imobiliário REIT, está desenvolvendo um complexo de 130 mil metros quadrados, que oferecerá 90 mil metros quadrados de escritórios a 1 km do aeroporto El Dorado, em Bogotá.

Outro setor que espera con-tinuar crescendo é o de casa

para os segmentos de baixa e média renda, aos quais o go-verno está colocando ênfase em meio à atual crise. “Há muitas pessoas que não têm uma casa e, por outro lado, um sistema governamental que as apoia”, diz Teich da Real Estate Options. “Há um déficit de moradia em toda a região. De 7 milhões de uni-dades no Brasil, 2,5 milhões na Colômbia, 2 milhões no Peru e pouco menos de 1 milhão no Chile. Essa é uma demanda considerável e uma grande oportunidade.” Sua

empresa está envolvida em vários projetos desse tipo na América Latina. Um deles é o Serenita, na capital paulista. A queda da inflação e a atitude agressiva dos bancos centrais será benéfica para esse segmen-to, já que a queda nas taxas de juros fomentará a compra de casas, diz o presidente da As-sociação de Desenvolvedores Imobiliários do Chile, Vicente Domínguez.

Não obstante as oportuni-dades, Berger destaca que “a atitude, em geral, é de espe-rar para ver o que acontece”. Segundo Domínguez, “o caso do Costanera no Chile é, até

o momento, bastante excep-cional. Em geral, os projetos grandes são feitos por etapas, mas não há outro fenômeno semelhante a esse. Quem começou a construir dificil-mente detém a obra, porque as perdas são maiores”. De qualquer forma, reconhece que se reduziu a velocidade com a qual se concretizam projetos que estão atualmente no papel.

Mas continua existindo interesse por Santiago, diz Marcos Kaplún, diretor da Kayco International Group,

que assessora estrangeiros que investem no mercado imobiliário chileno e re-gional. “Estive reunido em Montevidéu com um grupo de portugueses que desejam construir hotéis em Santia-go”, conta. Um deles seria um hotel quatro estrelas para a exclusiva região fi-nanceira de El Golf, onde só há hotéis cinco estrelas. “O outro será um hotel butique em Vitacura”, acrescenta. E ainda que os investimentos turísticos sejam catalogados pelos analistas como os menos atraentes, devido à redução do fluxo de viajantes dos EUA

e Europa, hotéis continuam a ser erguidos por toda a re-gião. “Estamos investindo em um hotel na parte anti-ga da Cidade do Panamá. Achamos que é uma grande oportunidade, pois as taxas de desocupação estão baixas”, diz Michael Teich, da Real Estate Options. Robledo, da PEI, também garante que es-tudam construir hotéis, desta vez destinados ao mercado de turismo corporativo, no qual ainda há pouca oferta na capital colombiana.

Os tijolos ainda parecem resistir à tormenta econômica na América Latina, apesar de que em poucas partes se observa a resistência dos pre-ços observada em Punta del Este. Segundo Mario Sureda, isso se deve ao fato de nes-sa região as transações não envolverem bancos, já que a maioria dos compradores de imóveis novos pode pagar à vista. “Construir em Punta del Este, uma praça que durante anos demonstrou não desmo-ronar frente à crise, dá uma maior tranquilidade porque os valores de investimento mantêm-se no tempo dentro de parâmetros seguros”, diz. Como indica o gestor chileno Kaplún, “os tijolos são uma alternativa interessante de investimento em momentos incertos como agora”.

Existem projetos atraentes, como o The Setai, do empre-sário Jorge Tchinnosian, que contempla um investimento de US$ 120 milhões, e o do edifício Yoo II, segunda etapa do projeto inspirado em Phi-lippe Starck, sobre a Avenida Roosevelt, mas não são os únicos que estarão prontos para entrega este ano. “Uma vez por semana, ou a cada 15 dias, recebemos gente que vem em busca de terras para comprar e construir”, conta Sureda.

O PEI aposta no projeto El Dorado,

na Colômbia.

36 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

NEGÓCIOS AVIAÇÃO

No final do ano passado, a companhia aérea comer-cial Mexicana, do México,

lançou uma nova imagem de marca mais moderna e flexí-vel. Foi o toque final em uma mudança de estratégia que a companhia começou a imple-mentar quando o Grupo Posadas se tornou acionista principal, há três anos. Um processo que contemplou principalmente a redução de custos e a distribui-ção de rotas entre a Mexicana e seu braço low cost (baixo custo), exclusivamente para voos domésticos. “Deixamos o mercado nacional à Click, que tem custos muito meno-res devido aos aviões que usa e os contratos coletivos que tem”, diz Isaac Volin, dire-tor corporativo comercial da

Mexicana.A Click, porém, não é uma

companhia de baixo custo ortodoxa. Ao contrário de ex-poentes europeias do gênero, como a Ryan Air, que estaria planejando cobrar até pelo uso do banheiro, ela inclui características do modelo tradicional, como serviço de bordo e a partida de aeroportos principais, como o da Cidade do México. “O conceito low cost puro está desaparecendo no mundo”, diz Volin.

De fato, longe de ser exce-ção, a estratégia adotada pela Mexicana é uma tendência no setor aéreo latinoamericano, aonde diversas companhias vêm “tropicalizando” o mode-lo de baixo custo para ganhar competitividade sem deixar

de atender às demandas de conforto e comodidade dos consumidores. O próprio Mé-xico oferece outros exemplos. A Aeroméxico, de perfil tradi-cional, adquiriu recentemente sete aviões EJR-45, menores e mais econômicos que os de sua frota, para operar onze destinos através de sua filial Aeromé-xico Connect. E a Volaris, apesar de continuar operando de um aeroporto secundário, o de Toluca, passou a oferecer serviço de bordo.

No Brasil, onde no final do ano passado estabeleceu-se a Azul Linhas Aéreas, do empresário David Neeleman, proprietário da também da norteamericana JetBlue Ai-rways, a TAM se esforça para manter a competitividade nos

À MODA TROPICALCompanhias aéreas latinoamericanas adaptam modelo europeu de baixo custo à realidade local para ganhar es-paço no mercado Arly Faundes Berkhoff, Ciudad de México

Volin: estratégia mista

preços. “Estão oferecendo uma diversificação de tarifas com serviços diferenciados”, diz André Castellini, analista da Bain & Co. E a Gol, dona também da Varig, segue com sua estratégia mista de berço. “A Gol não opera um modelo low cost como tal. Parte de aeroportos centrais e desde o começo não voava ponto a ponto”.

“Em um primeiro momento, a companhia foi batizada de baixo custo, mas já é só mer-chandising”, diz Roberto Sán-chez de la Vara, coordenador do Mestrado em Administração da Universidad Iberoameri-cana. De fato, no Brasil e no México, as diferenças entre as tarifas oferecidas pelas aéreas tradicionais e as de baixo custo são cada vez menores.

Mas, em países como Peru e Chile, dominados pela LAN, acontece algo um pouco dife-rente. No Peru, por exemplo, onde a companhia é dona de 73% de participação nos voos domésticos e 36% nos inter-nacionais - dados da Direção Aeronáutica Civil do país -, as aéreas de baixo custo não con-seguiram se posicionar porque “lhes falta uma estratégia ade-quada e porque lutam com um concorrente muito grande”, diz Carlos Doimi, gerente geral da Aerocondor e ex-presidente da Câmara Nacional de Turismo do Peru. No Chile, porém, a concorrência já levou a LAN a incorporar estratégias de baixo custo dentro de suas operações domésticas, como promoções via internet. “Mas acho que há lugar para as companhias de baixo custo em um mercado emergente doméstico e regio-nal, que é onde o crescimento se concentra”, diz Bobby Booth, consultor da AvMan em Miami. A questão será achar o equilíbrio entre preço e serviço que mais agrade aos latinoamericanos.

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 37

NEGÓCIOS EXPORTAÇÃO

Quando em setembro de 2007 o presidente Alan García declarou à mídia

que o Peru exportaria tonela-das de batata à Argentina, não imaginou que esse país rejeitaria as amostras enviadas por con-siderar, depois de uma análise, que o tubérculo peruano não era apto para consumo. Também não imaginou que o mesmo aconteceria na Venezuela. E, mais de um ano depois, a situação permanece a mesma. Em fevereiro foi o Panamá quem devolveu 28 toneladas de batata fresca.

O resultado disso é um paradoxo: em 2008, o Peru, que se considera o berço desse tubérculo e possui mais de 4 mil variedades dele, exportou 1 mil toneladas do produto e importou 22 mil.

A principal causa que afasta o produto peruano do merca-do internacional é uma praga chamada “verme branco”, uma larva que penetra nos tubérculos e os apodrece. Juntamente com a traça dos Andes e os vermes da terra, é uma das principais ameaças à batata.

“Temos alguns problemas nos protocolos fitossanitários para poder exportar. O que se está fazendo é exportar batatas nativas tipo chips”, diz o mi-nistro da Agricultura, Carlos Leyton. “Há mais de 30 anos que o Peru pretende exportar batata. Tem-se exportado, mas são vendas que se realizam na medida em que se apresentam deficiências em um país por problemas climáticos, de de-manda ou conjunturais”, afirma o engenheiro Gastón Benza

Pflucker, presidente executivo da Sierra Exportadora.

CARÊNCIASOutro grande problema da batata no Peru é, segundo es-pecialistas, a falta de padrões técnicos. O rendimento médio por hectare do tubérculo é de 12,6 toneladas. Um nível baixo se comparado com a média mundial (16,6 toneladas/ha), e à da Holanda, país que em 2007 contou com o maior rendimento do mundo, de 44,7 toneladas/ha.

Para o Dr. Enrique Chujoy, geneticista e chefe da Unidade de Aquisição e Distribuição de Germoplasma do Centro Internacional da Batata (CIP), a solução é “identificar as áreas adequadas com as condições fi-tossanitárias requeridas”. Além

BATATA PERUANA NÃOCRUZA A FRONTEIRAProblemas técnicos e de produção impedem que o Peru se consolide como exportador do tubérculo ícone de sua cultura gastronômica Efrén Vidal, Perú

Baixo rendimento: faltam padrões técnicos ao cultivo

disso, diz que se deveria usar semente certificada e aplica-ções para o controle de pragas e rotação de cultura.

Alfredo Menacho, presiden-te do Comitê Agropecuário da Associação de Exportadores, soma a essas debilidades a ca-rência de infraestrutura viária e a falta de acesso a crédito ban-cário por parte dos produtores. “A estrutura socioeconômica dos produtores das montanhas é do século 16”, diz.

Para Javier Verástegui, consultor internacional em Biotecnologia, a solução ao problema da batata peruana é a modificação genética. “Os vermes brancos não atacam qualquer planta; inserindo um gene de resistência a este inseto se consegue uma mo-dificação que evita a presença do verme branco”, diz. “Em 1990, o CIP desenvolveu uma variedade de batata Bt para reduzir as perdas nas colheitas dos agricultores andinos. Sua liberação experimental em nível de campo e comercial no Peru espera há 10 anos a aprovação do regulamento setorial de biosegurança”, reclama Verástegui. Segundo o cientista, desenvolver uma variedade de batata transgênica demora 5 anos e não se pode perder mais tempo.

Para Silvia Seperack, ge-rente da Câmara de Comércio de Lima, superar os problemas fitossanitários da batata fresca demorará ao menos quatro anos. “Por enquanto, conti-nuaremos exportando batatas nativas tipo chips e tentando colocar batata fresca em países vizinhos com a possibilidade de que não a aceitem.”

É um desafio do qual o go-verno peruano também deverá participar. Afinal, enquanto a FAO declarou 2008 como “O Ano Internacional da Ba-tata”, no Peru foi “O ano de devolução da batata”.

Aansiedade foi geral. Depois das turbulências do final de 2008, as empresas começa-

ram o ano focadas em garantir que suas vendas não descessem a ladeira. E, com a perspectiva de que as águas demorarão um pouco mais a acalmar, outro

fantasma passou a rondar-lhes: o risco da inadimplência nas vendas a prazo.

Os números que apontam um sinal amarelo quanto ao tema da morosidade em geral são claros. No México, por exemplo, os bancos fecharam

CONTRA O APERTOMuitos pequenos empresários terão que aprender a evitar o risco antes de oferecer vendas a prazoSolange Monteiro

2008 com um aumento de 40,75% na carteira vencida. Na Argentina, o percentual de morosidade nos bancos já se aproximou dos 5%, contra 3,5% no final de 2007. Já no Brasil, em janeiro de 2009 o Serasa Experian apontou uma alta de 28,9% na inadimplência de pessoas jurídicas em relação ao mesmo período de 2008.

“Em um panorama assim, as pequenas empresas são as que mais sofrem, pois não possuem uma equipe para analisar riscos e dar suporte às vendas”, diz Sandra Regina Fiorentini, consultora jurídica do Sebrae-SP. E, o pior, são as que têm mais dificuldades para garantir liquidez quando o calote é grande.

Para blindar-se desse risco, a primeira coisa que o pequeno empresário deve fazer, apontam analistas, é aprender a realizar uma análise da capacidade de pagamento de seus clientes. “A contratação de serviços de informação comercial que lhe dão um score e uma análise precisa do comportamento pré-vio de consumo de um cliente é importante”, diz Cristián García Huidobro, secretário geral da Câmara de Comércio de Santiago, no Chile.

“Em geral, se a inadim-plência não ultrapassa 1% do faturamento da empresa, é tolerável. Mais que isso poderá afetar as finanças, e o melhor é começar a transferir o risco, contratando financeiras ou empresas de cartão de crédito”, diz Sandra. “E, sempre que possível, fugir do cheque.” Isso sempre implica um custo, mas analistas garantem que este é menor que o do procedimento de cobranças financeiras. “Na verdade, a adoção de instru-mentos como a aceitação de cartão de crédito é um insumo absolutamente necessário, que

o empresário tem que começar a incluir na formação de preço de seu produto ou serviço,” diz o chileno Huidobro.

Quando a relação comercial se dá entre pessoas jurídicas, outra opção é o seguro de cré-dito, que costuma cobrir atraso de pagamento, concordata ou falência. “Na região em geral é uma cultura que ainda está em fraldas, se comparada à Europa, onde um contrato de seguro pode fazer a diferença entre uma empresa quebrar ou não”, diz Manuel Torres, da Mapfre México. “No Brasil inteiro, por exemplo, há menos de 400 apólices hoje no mer-cado.” diz Eduardo Nóbrega, da brasileira JMalucelli.

O problema para contratar um seguro de crédito, entre-tanto, não é apenas a falta de conhecimento, mas também o preço. “Pode variar entre 0,20% e 0,60% do faturamento anual”, diz Nóbrega, depende do histórico de inadimplência e do risco do setor em que a em-presa atua, o que o torna pouco acessível às empresas menores. “Se a empresa fatura menos que R$ 10 milhões por ano, a colocação do seguro é mais difícil, já que a pulverização do risco é menor”, diz.

Em geral, outra característi-ca desse seguro é que tem que ser contratado pela globalidade das operações, e não apenas para um grupo de clientes. E o ressarcimento pode variar entre 75% e 90% do valor. De qualquer forma, e como seguro morreu de velho, Torres afirma que no México “já se está registrando um aumento do interesse entre empresas de médio porte”, e que estas também fazem parte dos 50% de aumento no número de contratos registrado pela empresa nos últimos seis meses.SO

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PMES GLOBAIS

[FERRAMENTAS] PMES GLOBAIS

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Duro na quedaAinda que as estimativas sejam de um freio no robusto crescimento do setor de microcrédito na América Latina e no Caribe - em 2007, registrou-se aumento de 25% na carteira de valores e de 13% na de clientes - , essa indús-tria já é sufi cientemente sólida para sobreviver à retra-ção econômica. “Em 2009, veremos alguns aumentos de morosidade e de custos fi nanceiros, além de redução da rentabilidade, mas o microcrédito resistirá”, afi rma Fermin Vivanco, ofi cial do Fundo Multilateral de Investimentos (Fumin), órgão ligado ao BID.

Fermin afi rma que as instituições da região contam com a vantagem de ter um bom nível de captação de depósitos e de solvência. “Uma amostra de 42 instituições feita pela empresa Microrate indica que, em 2007, 20% da captação era de dívida nacional e 11% de dívida internacional; 39% eram depósitos, e 30% capital”, diz.Na região, segundo estudo do Fumin com a revista The Economist, o Peru é o país com melhor entorno microfi -nanceiro, com a Bolívia em segundo lugar. “Países popu-losos como Argentina, Brasil e Venezuela ainda têm uma indústria microfi nanceira pouco desenvolvida. México e Colômbia estavam em situação semelhante, mas nos últi-mos anos registraram grande crescimento”, afi rma. Para Vivanco, entre os principais desafi os dessa indústria es-tão tornar-se mais competitiva em preços, “especialmente agora com um estreitamento das margens fi nanceiras”, e fortalecer o capital humano e a gestão das instituições.

KAFIE E SCHLOSSER:COMUNIDADES SOB MEDIDA

NEGÓCIOS EM REDEA febre das redes sociais online – como Facebook e Orkut – também está atraindo a atenção dos em-preendedores latinoamericanos. Entre os primeiros candidatos a se inscrever no concurso Entrepreneur Choice Award (ECA) – promovido por First Tuesday, Endeavor e AméricaEconomia –, duas iniciativas se destacam. Uma delas é a do chileno Carlos Salazar, que no fi nal de fevereiro lançou a versão beta do portal www.mundomedico.net. “A ideia é criar um espaço de intercâmbio entre médicos, pacientes e laboratórios, um canal de relacionamento mais pró-ximo que os serviços oferecidos hoje por algumas clínicas e hospitais, de acesso ao resultado de exa-mes”, conta. A outra iniciativa é a da empresa Vostu (www.vostu.com), do hondurenho Daniel Kafi e e do brasileiro Mario Schlosser (foto). O pulo do gato da Vostu é ofe-recer gratuitamente aos internautas uma plataforma que lhes permite criar sua própria rede social, “como um Orkut exclusivo para os membros de uma família ou os torcedores de um time de futebol”, exemplifi ca Kafi e. O uso da plataforma é livre, e a Vostu ganha 50% da publicidade negociada nessas redes “através do Google Ads”, explica.Os sócios decidiram concentrar seus esforços no mercado brasileiro e não se saíram mal: 50 mil redes criadas em um ano, com um total de 2 milhões de usuários. O próximo passo da Vostu, segundo Kafi e, será criar seus próprios modelos de comunidades a partir da experiência acumulada. “O Brasil é o se-gundo país no mundo em redes sociais, perdendo apenas para o Canadá. Hoje conhecemos o interesse desses usuários melhor que o Orkut”, afi rma.Inscreva sua empresa ou vote no negócio de sua preferência para ganhar o prêmio ECA no site www.

americaeconomia.com/eca. Os vencedores po-derão apresentar-se a potenciais investidores nos EUA.

MICROFINANÇAS NA AM. LAT. E CARIBE

Instituições 565•Clientes 8 milhões•Carteira US$ 9,2 bilhões•

Fonte: Fomin

FERMIN:SETOR SÓLIDO

CELEIRO EM RISCO

40 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

DEBATES AMAZÔNIA

Oatual presidente do Conse-lho da Sadia Luiz Fernan-do Furlan não para. Entre-

tanto, dentro de suas inúmeras atividades – entre elas, fazer a empresa brasileira recuperar-se financeiramente de uma aposta má-sucedida em derivativos –, há um destino inusitado, que ele começou a visitar quando ainda era ministro de Lula e que até agora não saiu de sua agenda: Manaus, capital do Estado do Amazonas. “Durante os quase cinco anos em que estive à frente do Ministério

do Desenvolvimento, tive entre minhas responsabilidades a Agência de Desenvolvimento da Amazônia, e pude experi-mentar uma proximidade e um conhecimento mais profundo da potencialidade e dos desafios da região”, conta.

Foi assim que Furlan somou mais um esforço na luta contra o desflorestamento da região, uma das mais ricas em vida do planeta. Como? Com uma ideia simples: convencer os habitantes da floresta de que é mais rentável não cortá-la.

Desde o ano passado, Furlan preside a Fundação Amazonas Sustentável (FAS), criada em associação com o governo do Estado do Amazonas e o Banco Bradesco, e à qual em feverei-ro deste ano a Coca-Cola se uniu como mantenedora, com um aporte de R$ 20 milhões. Montante que será investido na Bolsa Floresta, versão verde do Bolsa Família que combate o desmatamento no estado do Amazonas. “A Bolsa Flores-ta conta com o investimento em ações comunitárias para

Luta por um modelo de desenvolvimento sustentável para a Amazônia é um desafi o regional imprescindível para evitar a desertifi cação de parte da América do SulSolange Monteiro

geração de renda; ações so-ciais como saúde, educação, comunicação e transporte; transferências mensais de R$ 50 às mulheres das famílias que moram na região e que se comprometem a não desmatar; e outros 10% do total relati-vo ao pagamento às familias que é transferido à associação de moradores para que haja uma governança local. Este último, seguindo o exemplo de iniciativas bem-sucedidas como a do Grameen Bank, de Muhammad Yunus, em Ban-gladesh”, conta Virgilio Viana, diretor da Fundação.

Este semestre, a FAS estima que chegará a atender 6 mil famílias, de um total de 10 mil. A contrapartida desse contrato com o governo do Estado é poder comercializar produtos e serviços ambientais, desen-volvendo o mercado desses produtos. Parece pouco, mas é muito. Furlan diz que parte de seu impulso é levar alguma

Expansão agrária: tiro no pé

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Crianças em Boa Vista, Brasil: Vítimas ou benefi ciarios?

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Outros países amazônicos, como Peru e Colômbia, fariam bem em aprender com os erros do Brasil.

esperança frente à onda de pu-blicidade negativa publicada sobre a Amazônia. “Nosso trabalho é no sentido oposto. Cuidar de uma área de 16,4 milhões de hectares, maior que o território da Inglaterra, e fazer com que nos próximos 20 anos não haja nenhum tipo de devastação.”

Algo relativamente simples de se realizar quando se trata do estado do Amazonas, primeiro do País a ter uma lei relativa a mudanças climáticas: “tem 98% de sua área preservada e um sistema de unidades de conservação que propicia a implantação de um projeto sem os percalços de titularidade de terra, invasões, problemas in-dígenas, entre outros sofridos nos demais estados brasilei-ros”, lembra Furlan.

Mas, ao lado de iniciativas como essa e a de outras mui-tas ONGs que se debruçam na floresta para proteger sua biodiversidade, ainda há um vilão que se impõe: a atividade agropecuária, concentrada na criação de gado e na cultura da soja, especialmente no Estado do Mato Grosso. Isso porque, por trás do orgulho do presidente Lula ao proclamar o sucesso do País no âmbito agropecuário, celebrando o Brasil como “celeiro do mundo”, aloja-se o paradoxal sangramento de quilômetros de floresta amazônica, provocado por esse mesmo setor.

Um estudo do Instituto do Homem e do Meio Ambien-te (Imazon) realizado com verbas das Fundações Ford e Betty & Gordon Moore e da Usaid divulgado em janeiro, por exemplo, indica que 80% do crescimento dos rebanhos registrado no Brasil entre 2002 e 2006 se deram na Amazônia Legal, em uma área estimada em 25,3 milhões de hectares. Ainda, que os picos de desma-tamento aconteceram sobretu-

do no ano posterior ao de alta nos preços do boi gordo e de commodities agrícolas como a soja – que desloca a pecuária para a Amazônia.

Mas por que seria tão ruim

garantir alimento a meio planeta e deixar alguns desses animais em um zoológico para garantir entretenimento e memória? O fato é que, diferentemente dos espelhismos comuns em um

deserto, a projeção de que o Brasil poderia ser os EUA dos alimentos no século 21 pode criar um deserto, devido a uma visão imediatista e pouco calculada.

RIO VOADORPara ter uma ideia desse pro-blema, imagine a Amazônia como a nascente de um rio aéreo que nos abastecesse da água necessária para viver, que é o principal insumo agrícola. E a sociedade secando volun-tariamente esse rio, de forma

irremediável. “Em média, 90% da chuva que cai na área central da América do Sul, de onde provêm 70% do PIB do continente, vêm da Amazônia”, diz o agrônomo Antonio No-

bre, doutor em Biogeoquímica pela Universidade de New Hampshire, representante do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) dentro do Instituto de Pesquisas Espaciais

(Inpe). “Com o desmatamento, se está secando o potencial de chuva responsável por nossa brilhante produtividade e pela própria sobrevivência da flo-resta, que absorve parte dessa água”, afirma, indicando que em um só dia a Amazônia cria um rio aéreo com a evapora-ção de cerca de 20 bilhões de toneladas de água.

Para o climatologista Car-los Nobre, irmão de Antonio, a redução do curso desse rio voador já está dando seus sinais no clima da América do Sul e

poderá mudá-lo drasticamente se nada for feito. Em apresen-tação realizada em janeiro no Woodrow Wilson International Center of Scholars, em Wa-shington, Carlos alertou que

se o aumento da temperatura do centro-leste da Amazônia aumentar 2,5º Celsius, a região poderá entrar em um “tipping point”, ou ponto sem volta, a partir do qual a floresta se

transformaria em uma savana. “E, com isso, a região interna do continente entraria em um processo de desertificação como o que aconteceu no nordeste da Manchúria devido ao abuso do agronegócio, à superexploração, que deixa-ram o lugar em frangalhos”, completa Antonio. “E aí não adianta querer plantar eucalipto, pois se adiantasse os desertos seriam produtivos.”

O biólogo norteamericano Philip Fearnside, há 33 anos radicado na Amazônia, também

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42 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

DEBATES AMAZÔNIA

observa o fato com preocu-pação. “O governo brasileiro tem se posicionado contra a proposta da União Europeia de definir como perigoso o aumento da temperatura em 2º Celsius acima dos níveis pré-industriais, o que signi-ficaria uma concentração de gás carbônico na atmosfera de cerca de 400 partes por milhão (ppm). Mas isso é por temer a pressão que receberá, pois hoje na Amazônia já estamos a 385 ppm”, afirma.

O MAU EXEMPLOE não bastassem as consequên-cias climáticas da falha em seu modelo de gestão, a Amazônia brasileira ainda serve como mau exemplo para os outros países que também abrigam a floresta. Entre eles, o Peru, com a ameaça da soja, e a Colômbia, com a criação de gado.

“O que acontece na Amazô-nia brasileira é inevitável que se reflita aqui, pois o peruano observa e vê que pode ser uma forma de ganhar dinheiro”, lamenta o arquiteto Eduardo Nycander, em Madre de Dios. Ele se apaixonou pela Amazô-nia peruana quando ainda estava na faculdade e viajava em seu tempo livre para fotografar a vida silvestre da região. Quando formado, decidiu instalar-se na floresta, montando sua primeira pousada – de três – em 1989. “O interesse pelo turismo na região tem se intensificado muito. Em Madre de Dios, cresce a 25%, enquanto a média geral do país é de 10%”, diz. Como bom e antigo observador, Nycander cultiva um especial olfato para identificar de onde vem o risco. “A mineração aurífera é um monstro no qual ninguém toca”, diz. “A opinião pública tem força, mas estamos falando de 30 mil pessoas que se dedicam à mineração informal em Puerto Maldonado que ganham 400 soles diarios e não pagam nada

de imposto”, desabafa. Mas hoje o principal receio

de Nycander chama-se Intero-ceânica. A estrada foi idealizada com o objetivo de incrementar o comércio entre o Brasil e o Peru e abrir caminho para o primeiro ao Pacífico. Com mais de 2,5 mil km que ligam a fronteira do Acre a três portos peruanos, e com estimativa de entrar em operação em 2010, Nycander teme que ela se converta em um acelerador da destruição da floresta, como já aconteceu no lado brasileiro. “Agora mesmo já existem terras que são de

livre disponibilidade sobre as quais há uma especulação for-tíssima”, diz Nycander. “Você vai ao registro público, e se lhe veem com cara de quem tem interesse em terra, se aproxi-mam dois ou três tramitadores que se encarregam de ‘sanear’ terrenos para comercializá-los”, afirma. “Tenho entendido que brasileiros estão comprando terrenos em Madre de Dios porque agora que a Intero-ceânica vai ser concluída o volume da soja que se poderá mobilizar é grande e pode ser rentável.”

Algumas iniciativas existem para paliar os danos, e vêm da iniciativa privada. A Ode-brecht, que lidera o consórcio que também será responsável pela operação e manutenção da estrada nos primeiros 25

anos de uso, também está à frente do projeto iSur, buscan-do fontes de geração de renda às populações que vivem à beira da Interoceânica. “Em cinco anos, buscaremos im-plementar 14 projetos dentro de três programas: turismo, econegócios e conservação, com um investimento total de US$ 12,5 milhões”, conta o brasileiro Delcy Machado, diretor de responsabilidade social do projeto iSur desde seu nascimento, há um ano. “É fantástico saber que se pode ajudar, não para levar

modernidade, mas uma melhor qualidade de vida dentro da cosmovisão deles.”

Na parte colombiana da floresta, o desafio é o mesmo. No Instituto Amazónico de Investigaciones Científicas (Sinchi) pesquisadores como Carlos Ariel Salazar trabalham com associações de produtores no desenvolvimento de sistemas sustentáveis para recuperar áreas degradadas. “Não é ne-cessário combater a pecuária ao extremo, mas incluí-la em um sistema de cultivos adequados para a região”, diz. E essa luta demanda ainda mais esforços na Colômbia, se levarmos em conta a estigmatização que permanece devido às atividades relacionadas ao narcotráfico, que afastam investimentos em atividades produtivas.

Além do fato de “as tensões político-militares da guerrilha pressionarem o desalojamento da população”, diz.

Mas se essa herança pre-judica os projetos de sus-tentabilidade, é a atividade pecuária quem mais provoca a devastação na Amazônia co-lombiana. “A maior ocupação está hoje no departamento de Caquetá. Pode-se estimar que há 7 milhões de hectares com intervenção onde o sistema econômico predominante é a pecuária, com cerca de 5 mi-lhões. Putumayo e Guaviare

vão por caminho semelhante.” E, para o pesquisador, toda e qualquer exploração ilegal não acabará enquanto, como no Peru, a forte desigualdade não for erradicada. “Não há dúvida de que na Colômbia há taxas altas de desemprego devido a problemas estruturais de longo prazo, e a região amazônica é sempre uma possibilidade de riqueza.”

FRENTES DE COMBATEMas se a fonte imediata de renda é uma tentação, tanto Peru quanto Colômbia também precisam prestar atenção nos prejuízos que o Brasil conta-biliza com o planejamento mal formulado e atrasado. Hoje, no País, identifica-se que os dois principais problemas da floresta são a ocupação ilegal

Soja: avançando sobre a selva

Bolsa Floresta: fomentando sustentabilidade

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de terras públicas e as linhas de crédito mais baratas para a agropecuária. “Estes acabam se tornando dois tipos de subsídio: um indireto – terras exploradas de graça – e outro direto”, diz Paulo Barreto, pesquisador do Imazon. O primeiro pretende ser resolvido com um plano de regularização fundiária proposto pelo Ministro de Assuntos Estratégicos Man-gabeira Unger. Tal plano promete resolver a situação de 80% dessas ocupações irregulares – cerca de 67 mil hectares – em três anos, mas

sofre resistência do Ministério da Agricultura sobre quem terá a batuta. “Fazendo uma conta básica, se o governo conseguis-se regularizar apenas metade da área registrada em 2003, de 42 milhões de hectares, conseguiria uma arrecadação de R$ 6 bilhões com a venda dessas áreas”, comenta Barreto, do Imazon. Um montante que poderia se reverter em projetos de sustentabilidade.

Para Fearnside, do Inpa, a proposta ainda é uma entre muitas que viu passar nos vários anos que está na Amazônia. “De qualquer forma, não acredito que saia antes das eleições, pois com orçamento reduzido em 2009, e ano eleitoral em 2010, seria mexer num ninho de vespas”, completa Beto Silva, diretor do Imazon. Para Claudio

Maretti, membro do conselho da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), mais do que regularização, o projeto necessita de “clareza fundiária, para não tomar o caminho inverso e estimular ainda mais a grilagem”. E lembra que outro item ainda abandonado é a “concessão de áreas florestais, definida no no-vo modelo de política florestal mais ainda não exercida, que daria margem para começar uma atividade sustentável na Amazônia e inibir a ilegal”.

Já a questão do crédito deu um passo importante no ano passado, quando o Conselho Monetário Nacional decidiu eliminar o finaciamento em alguns municípios e a quem não tivesse terras regulariza-das. Uma iniciativa da então ministra do Meio Ambiente e hoje senadora Marina Silva (ver pág. 44), que foi parcial-mente ofuscada pelo poder de pressão do governador do Mato Grosso Blairo Maggi, um dos maiores produtores de soja do mundo, indicado como um dos responsáveis por sua saída do Ministério. “A retração minguará o poten-cial dos bancos, o que é bom, mas ainda assim é mais fácil ter crédito para agricultura que crédito florestal, às vezes pelo simples motivo de que o

gerente não sabe avaliar”, diz Maretti. O governador Maggi foi contatado por AméricaEco-nomia mas alegou problemas de agenda.

O componente mais recente nessa equação, no entanto, é a crise econômica, que se por um lado corta orçamento de projetos pró-floresta, de outro afeta diretamente a demanda por produtos tirados da região, sejam eles agropecuários, madeira, minério ou energia elétrica, desestimulando sua exploração. Sendo assim, a pergunta que fica é: hoje se-

ria possível tirar proveito do contexto econômico e pensar que os tempos de desacelera-ção são propícios para plantar sementes de soluções?

A princípio, a resposta é sim. “De um modo geral, é um momento positivo devido à redução das pressões eco-nômicas onde se identifica demanda de mercado”, diz Maretti. “Entretanto, a crise só será boa se servir para repensar o modelo de desenvolvimento que temos”, alerta, indicando que os esforços relacionados à busca de sustentabilidade na região são mínimos se comparados à facilidade que se dá ao desmatamento.

Apesar da gravidade do tema e da lentidão dos avan-ços, Antonio Nobre ainda acredita que seria possível

frear essa máquina. “Mas precisamos parar isso já. Não somos contra o agronegócio, mas a forma como é feito. Há diversos estudos que oferecem alternativas mais produtivas”, diz. “Por exemplo, um regime de semiconfinamento para a pecuária, que reduziria a área usada em um décimo, permi-tiria recomposição da floresta original em áreas acidentadas e a venda de créditos de carbo-no. Uma fazenda de proteína 30 vezes mais produtiva com desmatamento negativo.”

Mas todos admitem que o lobby do setor agropecu-ário hoje ganha a queda-de-braço dentro do governo e do Congresso. “O agronegócio brasileiro ainda é retrógra-do, não dá para entender por que Lula pensa em apoiá-los. Ele está pedindo para que se multiplique o que aconteceu em Santa Catarina por cinco, seis vezes”, diz Maretti. “O agronegócio como está hoje é como um tumor cancerígeno: é vigoroso, autocentrado, e perde a conexão com o tecido que lhe dá vida até matá-lo e matar-se. É como um autismo: é genial, mas não se comunica à sua volta”, desabafa Nobre. “Já tentei conversar com o governador Maggi, mas ele não dá ouvidos. E se ele ti-vesse real consciência do risco que corre, seria o primeiro a entrar para o Greenpeace, pois saberia que ele também está lutando a favor do seu negócio.”

“O tema já tomou toda a sociedade, mas está claro que, entre anúncios e discussões, o governo ganha tempo”, diz Beto Silva. Mas está mundial-mente claro que esse problema já não pode mais ficar confina-do na retórica. Somente com ação se poderá garantir um melhor proveito da floresta quando os tempos de bonança estiverem de volta.

Nycander: um crítico da Interoceânica

Lula e Maggi: vence o lobby agrícola

44 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

DEBATES AMAZÔNIA

Ex-seringueira, Marina Silva é reconhecida mundialmente por sua defesa da região amazônica e suas conquistas no período em que foi ministra do Meio Ambiente. Ela sabe que

a luta contra a devastação da Amazônia requer persistência. Em entrevista a Solange Monteiro, editora de AméricaEconomia,Marina lembra, entretanto, que evitar as mudanças climáticas não é papel apenas dos países em desenvolvimento.

Marina Silva, senadora, ex-ministra do Meio Ambiente

SEM DEDO NA CARA

Quais os principais desafi os que o governo deve enfrentar para cumprir a meta de reduzir a devastação da fl oresta amazônica em mais de 70% até 2017?Antes de mais nada, continuar implementando as medidas de combate ao desmatamento. E aí é uma combinação de três eixos: combate a práticas ilegais, a questão do ordena-mento territorial e fundiário, e a questão do apoio às atividades produtivas sustentáveis. Qual sua opinião sobre o projeto de regularização fundiária do ministro Mangabeira Unger?Eu não conheço com profun-didade a proposta, mas no meu parecer está dissociada dessa agenda original, e a dissociação da regularização fundiária de uma proposta mais ampla de ordenamento territorial e fundiário no meu entendimento não favorece a implementação dos eixos de apoio à prática produtiva sustentável. Além disso,a ques-tão da Amazônia tem que ser pensada por todos os setores, dentro de uma visão de política ambiental transversal. Acha possível acelerar o processo de combate ao desmatamento e evitar danos ao clima?Acho que temos que qualificar essa discussão. Primeiro, não se pode imaginar que a mudança do sistema climático é única e exclusivamente pelo uso da terra. O uso da terra é respon-sável por 20% das emissões de CO2. Existem dois deveres de casa que precisam ser feitos. O dos países em desenvolvi-mento, no caso Brasil, México, Chile, Índia, porque entre os países em desenvolvimento são os que mais têm emissões, e o dos países desenvolvidos, que são responsáveis por 80% do desmatamento. Porque quando as coisas são colocadas nesses termos, parece que se os países em desenvolvimento fizerem o seu, o problema está

resolvido. E não está. Se os países desenvolvidos não se mexerem, nós seremos igual-mente prejudicados. O Brasil ainda tem 60% de cobertura florestal. Nós não temos que reivindicar o direito de repetir os mesmos erros, mas acho que não tem ninguém com condição de colocar o dedo na cara de ninguém. Qual o seu balanço da gestão do Ministério do Meio Ambiente desde a sua saída?Eu não posso falar muito porque as medidas que foram implementadas nos últimos seis meses de 2008 foram as que eu tomei. O Plano de Mudanças Climáticas estava praticamen-te pronto e foi lançado pelo ministro que assumiu (Carlos Minc); o plano de combate ao desmatamento, a medida de moratória, de suspensão do crédito, criminalização da cadeia produtiva, aumento da fiscalização, tudo isso já estava sendo implementado e isso foi motivo da minha saída quando houve a pressão para revogar as medidas. A partir de agora, o minis-tro começará a colocar uma agenda nova, e é importante que ele faça um esforço para dar continuidade às medidas já tomadas, e para ver como vai trabalhar a questão de enfrentar a crise econômica sem prejudicar a questão am-biental tanto em investimentos de infraestrutura quanto de agricultura. A mim chama a atenção o tensionamento que já está no Congresso e da parte de alguns setores de governo de querer flexi-bilizar a legislação ambiental no licenciamento, com pro-postas simplificadas, o que é complexo e pode ter alto impacto ambiental e social, e também a questão de que-rer mudar o código florestal. Isso para mim é motivo de preocupação.

ABR

15 DE MARÇO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 45

PANORÂMICA POLÍTICA

Professor de Relações Internacionais da Universidade de Southern California e presidente emérito do Pacific Council on International Policy.

Abraham F. Lowenthal

Obama tem que evitar confrontação com Chávez.

A PARTICIPAÇÃO do presidente Barack Obama na Quinta Cúpula das Américas em Porto Espanha, Trinidad e Tobago, entre 17 e 19 de abril, será sua primeira visita à América Latina, não só como presidente dos Estados Unidos, mas em toda sua vida. O fato de o mandatário realizar essa viagem nos primeiros cem dias de sua gestão é um bom sinal para a região, especialmente no contexto da crise econômica que, evidentemente, consome a agenda do novo presidente e a de seus assessores-chave.

A simples presença do presidente Obama em Trinidad servirá para melhorar a atmosfera das relações entre EUA e América Latina. Os líderes latinoamericanos estão ansiosos por conhecer e ser fotografados com Obama, cuja populari-dade na região é tão notável quanto em outros continentes.

A cúpula oferece à nova administração uma oportunida-de excepcional para melhorar a substância das relações entre Estados Unidos e América Latina em um momento crítico, quando os EUA enfrentam uma quantidade de desafi os, tanto em casa quanto no âmbito internacional. O presiden-te Obama pode fazer uso dessa oportunidade se der alguns passos antes da cúpula, manter alguns pontos essenciais em mente e utilizar a cúpula tanto para escutar quanto para falar.

O presidente Obama poderia seguir as seguintes suges-tões.

Cumpra sua promessa de campanha de nomear um en-viado especial para as Américas. E garanta que essa pessoa goze de reconhecimento, de prestígio e de sua confi ança. É preciso que resista à pressão de nomear alguém por meras razões de política doméstica.

Deixe claro que o secretário de Estado Thomas Shan-non será requerido para cumprir um período adicional. É o diplomata norteamericano de carreira mais reconhecido na região, nos últimos 20 anos.

Antes da cúpula, anuncie que sua administração dese-ja colocar fi m a 50 anos de hostilidade mútua com Cuba. Não limite as mudanças em sua política em relação à ilha a um afrouxamento das limitações para viagens e remessas. Transforme as metas dos Estados Unidos de mudança de regime em uma cooperação extensa sobre matérias comuns

Nova era na cúpula das Américas

(tais como narcotráfi co, imigração, poluição ambiental, resposta a desastres naturais, desenvolvimento de energia), sem abandonar o compromisso com os direitos humanos. Um anúncio deste estilo seria uma mensagem bem-vinda em todas as Américas.

Enfatize em Trinidad que os EUA reconhecem a grande diversidade da América Latina e do Caribe, mas também entendem que todos os países das Américas compartilham um compromisso com a governabilidade democrática e que todos enfrentam desafi os semelhantes: desaceleração eco-nômica e desemprego, a necessidade de desenvolver fontes de energia renováveis, segurança cidadã, redução do narco-tráfi co, combate às desigualdades sociais e discriminação, melhora da qualidade da educação em todos os seus níveis para que todos os indivíduos desenvolvam seu potencial e os países possam ser competitivos nesta nova era.

Mencione que as instituições públicas – tanto nos EUA quanto na América Latina – devem se fortalecer, tornar-se mais competentes, efetivas e responsáveis para lidar com assuntos como pobreza, exclusão, desigualdade, crime, se-gurança pessoal, competitividade e regulação.

Reconheça a crescente interdependência demográfi ca, econômica, cultural e política dos EUA. Com seus vizinhos mais próximos, México, países da América Central e Caribe, comprometa-se em um proces-so de permanente cooperação e consulta a respeito do que os desafi os especiais da recessão nos EUA signifi cam para o continente.

Sem excesso de retórica, torne evidente que sua admi-nistração buscará uma cooperação estratégica com o Brasil em segurança energética, estabilidade regional, proteção ao meio ambiente, saúde pública, liberalização e expansão do comércio internacional e fortalecimento da governabilidade global.

Evite confrontar e chamar a atenção de Hugo Chávez ou de qualquer de seus aliados na América do Sul ou Central. Busque formas de trabalhar diretamente com cada país, quando for possível, através de mecanismos multilaterais, em assuntos de interesse comum.

Evite promessas excessivas. Não se comprometa afi r-mando que os Estados Unidos prestarão mais atenção à América Latina. Mostre, por sua vez, que sua administração melhorará a qualidade da atenção que presta às Américas em Washington mudando as mentalidades, entendendo e respeitando diferentes perspectivas e focando-se em oportu-nidades concretas de cooperação.

E, antes de tudo isso, use seus grandes ouvidos para es-cutar. Esse respeito lhe ajudará a construir a confi ança es-sencial da qual, em última instância, a cooperação no hemis-fério ocidental dependerá.

46 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

DEBATES ARMASAP

TIROS DA DISCÓRDIA

Polícia:os desvios de armas não têm fi m

Se um dia encontrar-se em meio a um tiroteio, siga estes conselhos:

jogue-se no chão e cubra a cabeça com ambas as mãos. Se estiver dentro de um carro, deite-se no piso e proteja as crianças. Não saia do carro, pois os criminosos podem confundi-lo com um rival. Espere que cessem os disparos e, mesmo que a polícia chegue, saia com as mãos para o alto para que os agentes tampouco o confundam. Lembre que é

um momento de tensão para todos.

Estas instruções foram publicadas em um dos jornais locais do estado de Durango, no norte do México, uma das regiões mais afetadas pela violência dos cartéis da dro-ga. Camionetas com furos de balas, assassinatos em plena rua, ameaças de morte pi-chadas nos muros... Vê-se de tudo em Durango, bem como em Ciudad Juárez e Tijuana, epicentros de uma onda de

violência que já soma mais de 1,1 mil mortos nos primeiros três meses do ano.

A causa é a guerra do Estado mexicano contra os cartéis da droga. Uma guer-ra travada com armas dos EUA. Segundo o Escritório do Álcool, Tabaco, Armas e Explosivos dos EUA (ATF, na sigla em inglês), 90% das armas confiscadas pelo crime organizado no México provêm desse país. Um problema que se transformou em um dos

Os EUA precisam controlar o tráfi co de armas se querem apoiar o México em sua guerra contra os cartéis da droga Antonieta Cádiz, Washington DC

temas mais urgentes do go-verno de Barack Obama em suas relações com a América Latina.

Não é para menos. No entorno dos 3.141 km de fronteira compartilhada com o México, os EUA amparam 6,6 mil distribuidores de armas autorizados, 12% do total que há no país. Esses pontos-de-venda não devem reportar a compra de grandes quantidades de armas como, por exemplo, réplicas de fuzis de assalto AK-47 – uma das mais usadas pelos cartéis mexicanos – já que entram na classificação de rifles.

Enquanto no México é quase impossível para um cidadão conseguir uma arma, nos EUA muitas pessoas as compram e as desfilam orgu-lhosas. As lojas de armas são verdadeiros supermercados, com salas de prática de tiros, livros, e até camisetas com

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 47

DOMÍNIO BRASILEIRO Principais exportadores de armas aos Estados UnidosFONTE: FOREIGN TRADE DIVISION OF THE US CENSUS BUREAU

PISTOLAS E REVÓLVERES RIFLES ESCOPETAS COMBINACÕES TOTAL

País 2006 2007 VAR. % 2006 2007 VAR. % 2006 2007 VAR. % 2006 2007 VAR. % 2006

Brasil 253.321 397.917 57,1% 68.431 164.308 140,1% 48.367 61.289 26,7% 70.919 73.855 4,1% 441.058

Áustria 327.845 347.188 5,9% 2.296 1.765 -23,1% 3 7 133,3% - - 0,0% 330.144

Itália 69.236 68.060 -1,7% 17.642 20.242 14,7% 170.805 152.053 -11,0% - - 0,0% 257.683

Canadá 12.135 13.654 12,5% 167.142 192.810 15,4% 27.354 27.650 1,1% - - 0,0% 206.631

Croácia 142.050 204.379 43,9% - - 0,0% - - 0,0% - - 0,0% 142.050

Alemanha 160.267 173.397 8,2% 15.236 11.747 -22,9% - - 0,0% 104 27 -74,0% 175.607

Turquia 5.120 7.270 42,0% - - 0,0% 127.178 140.568 10,5% - - 0,0% 132.298

Rússia 5.003 12.045 140,8% 25.763 11.680 -54,7% 43.011 51.783 20,4% 15.505 39.848 157,6% 89.282

os dizeres “os criminosos preferem as vítimas que não portam armas”. Além de uma enorme variedade de revólve-res e rifles semiautomáticos para os cerca de 250 milhões de clientes do país, segundo cifras da Associação Nacio-nal do Rifle (NRA na sigla em inglês).

É o resultado da Segunda Emenda, que transforma o direito de ter uma arma em algo sagrado nos EUA. Um direito tão polêmico que emer-ge como tema de debate em cada campanha presidencial – em que os republicanos já se especializaram em defender, e os democratas, em brigar por limitar.

LEI AMBÍGUAO ambiente era tenso. Às quatro da tarde do dia 23 de fevereiro, na Embaixada do México em Washington, Eduardo Medina Mora, pro-curador geral da República, explicava os resultados de sua reunião com o procurador de justiça dos EUA Eric Holder e com a secretária de seguran-ça interna, Janet Napolitano. “Os EUA compartilham o sentido de urgência de nosso país frente o fluxo de armas e dinheiro que chega aos cartéis”, disse Medina Mora, destapando uma enxurrada de perguntas de jornalistas sobre suas declarações e a imagem de controle que seu governo tratava de projetar. Isso por-que, apesar de ser inegável que a ofensiva do Exército mexicano já mostra resulta-dos, também é certo que as versões sobre um avanço ou retrocesso na segurança do México, e especificamente na área de fluxo de armas, são sempre contraditórias. Por isso, é urgente para o México que os EUA restrinjam sua indústria armamentista de alguma forma.

Mas não é fácil. Em sua história, os EUA só ditaram três normas para restringir a Segunda Emenda. A primeira delas foi a ata de 1968 que proibia as transferências de armas entre diferentes estados, exceto entre distribuidores autorizados. Essa ata proíbe a posse de armas a pessoas condenadas por um crime federal, a fugitivos, viciados em drogas, entre outros. Já a segunda ata, assinada por Bill Clinton em 1993, conhecida como a Lei Brady, determinou que os compradores de armar deveriam ser submetidos a uma vistoria prévia de antece-dentes criminais. E a terceira é de 1994, quando se aprovou uma proibição à venda de armas semiautomáticas para civis. Mas essa prescreveu em setembro de 2004 e não voltou a ser renovada.

A resistência legal à Se-gunda Emenda justifica-se pelas somas investidas em lobby no Congresso. Somente no último trimestre de 2008, a NRA pagou US$ 580 mil a diferentes empresas para proteger a Segunda Emenda. “Dada a influência política do NRA e de outros grupos pró-armas localizados es-pecialmente nos estados do Sul, não existe virtualmente nenhuma oportunidade de que se aplique um controle

mais estrito dentro das leis de controle de armas”, diz Ted Carpenter, vice-presidente para defesa e política exterior do Instituto Cato, centro de estudos liberal que defende o direito dos indivíduos de portar uma arma. No extremo oposto, Vanda Felbab-Brown, especialista em política exte-rior do Instituto Brookings, concorda em indicar as difi-culdades para que haja uma mudança real. “Não acho que seja fácil introduzir mo-dificações relacionadas com porte de armas de fogo nos EUA”, diz Felbab-Brown. “O controle tem sido muito difícil e não muda há muitas décadas, sem importar a situ-ação no México. O governo desse país não poderá contar com mudanças na legislação de armas em Washington co-mo caminho para resolver o problema. Necessitam focar-se no que eles podem fazer internamente.”

Não obstante, o problema é cada vez mais doméstico para os EUA: as armas permitem o tráfico das drogas consu-midas pelos norteamericanos e a violência no país vizinho migra na forma de sequestros, assassinatos e tiroteios vincu-lados com o tráfico e que não puderam ser evitados com a maior supervisão na fronteira. “Há mais consciência sobre o

que não é só um problema do México, mas de toda a região, porque as gangues dos EUA estão intimamente integradas nas operações dos cartéis”, diz Tom Díaz, analista do Centro de Políticas sobre Violência, em Washington.

Foi isso o que inspirou o parlamentar Eliot Engel quando, em meados de fe-vereiro, enviou uma carta ao presidente Obama em nome de 53 representantes de ambos os partidos pedindo a volta da lei de proibição de importa-ção de armas de assalto ou semiautomáticas dentro dos EUA. Além disso, persona-gens respeitados na área de drogas e tráfico e que são ouvidos no capitólio, como o general reformado Barry McCaffrey, afirmam que o México necessita de ajuda e que este não é um problema unilateral. Depois de sua vi-sita ao país em dezembro de 2008, McCaffrey apresentou um relatório em que garantia que as autoridades e o Exército mexicano enfrentam cartéis munidos de armas de alto po-der. “Estas são compradas de distribuidores localizados no Texas, Arizona e Califórnia”, escreveu. “Rifles semelhantes aos AK- 47 são adquiridos as centenas de uma só vez e traficados ilegalmente ao México.”

Não obstante, Obama pode acudir à medidas que não requerem a aprovação do Congresso. Isso porque o Executivo pode interpretar de sua forma uma cláusula da lei de armas que dá margem a interpretações ambíguas. Isso porque, segundo a lei, para entrar no país as armas têm de ser adaptadas para uso esportivo, conceito que não tem uma única definição. “Al-guns presidentes usaram essa ambiguidade para restringir a importação”, conta Díaz. “Mas outros, como George W. Bush, usaram para relaxar a entrada de diferente tipos de armas. Obama pode limitar facilmente o acesso reinterpre-tando o conceito de esportivo.” Com isso, poderia restringir o aumento das importações verificado nos últimos anos, com as armas fabricadas no Brasil entre as favoritas dos norteamericanos (ver tabela). Em 2007, por exemplo, os EUA importaram 2,5 milhões de armas, 18% mais que em 2006. Enquanto a produção local alcançou os 3,5 milhões, com taxas de crescimento anual acima dos 10%.

Outro mecanismo útil para coibir o tráfico e que depende exclusivamente do presidente é uma melhor supervisão dos gun shows, grandes eventos comerciais de armas que in-clusive permitem que privados comuns possam vender suas próprias armas, em um mer-cado secundário que carece de monitoramento.

O SINAL DE OBAMACom uma pistola na mão, He-riberto Zazueta vigiava aten-tamente uma casa no povoado de Las Tapas, 50 km ao norte de Culiacán, Sinaloa. Mas sua arma não foi suficiente para enfrentar o operativo Culiacán-Navolato liderado pelo exército mexicano, que

agora tem Zazueta atrás das grades. Ele foi preso porque o botim que escondia era composto por 12 rifles do tipo AK-47, duas metralhadoras, cinco granadas, 5.210 cartu-chos de diferentes calibres, uma camioneta Hummer, um colete à prova de balas e vários outros elementos que conformavam um verdadeiro arsenal de guerra. Apesar de grande parte dessas armas vir dos EUA, não foram poucos os que sugeriram que cortar as fontes de acesso ao Norte seria suficiente para reduzir a intensidade da guerra, pois

os cartéis poderiam usar outros fornecimentos, ainda que estes fossem mais caros e mais difíceis.

Para muitos a saída estaria em um estratégia global para enfrentar o tráfico de drogas entre México e Estados Unidos e que afetaria diretamente os recursos dos cartéis. Por isso, não chama a atenção o fato de

se intensificarem as correntes a favor da legalização das dro-gas. Os ex-presidentes Ernesto Zedillo (México), Fernando Henrique Cardoso (Brasil) e César Gaviria (Colômbia), defenderam publicamente a possibilidade de buscar vias alternativas para a luta contra as drogas que sejam acom-panhadas da legalização de algumas delas. Uma posição sem dúvida incômoda para os Estados Unidos.

O Instituto México do Woodrow Wilson Center defende outra linha, apesar de também destacar a neces-

sidade de os Estados Unidos imporem algumas proibições efetivas contra o comércio de armas, como a que expirou em 2004, focada nas armas de assalto. Também inclui aumentar o pessoal de segu-rança na fronteira, dedicado a rastrear o tráfico de armas e monitorar os distribuidores. Um estudo de sua autoria

ainda propõe prover um me-canismo para que se possa dar informação anônima sobre as vendas questionáveis e recu-sar a proibição do Congresso sobre os dados que a ATF pode liberar. Hoje esta agência está isenta de submeter-se à Ata de Liberdade de Informação, o que impede uma revisão e análise sobre a estratégia que o governo norteameri-cano aplica contra o tráfico de armas, drogas e lavagem de dinheiro.

O tema convulsionou as sempre intensas relações entre Estados Unidos e México. No início de março, presidente mexicano declarou que “o maior poder dado ao crime organizado através das armas vem dos Estados Unidos. Desde 2006 apreendemos 27 mil armas, de lança mísseis a 2,5 mil granadas, incluindo uniformes e armas do Exército norteamericano.”

Seja mediante uma estra-tégia global ou centraliza-da para limitar o tráfico de armas, os EUA devem dar sinais ao México, que vive seu momento mais delicado. Um deles seria, segundo a embaixadora da Organiza-ção de Estados Americanos (OEA) Harriet Babbitt, a ra-tificação por Washington da Convenção Interamericana contra a Produção Ilícita, Tráfico de Armas, Munições, Explosivos e outros materiais relacionados. Nem os mais otimistas consideram isso possível, ainda que esperem sinais positivos do governo americano na próxima Cúpula das Américas em Trinidade e Tobago, quando o presidente Obama se encontrar pela pri-meira vez com os presidentes latinoamericanos. Será o mo-mento para conhecer a política de armas do novo governo e para onde vão seus disparos contra a narcoviolência.

48 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

DEBATES ARMAS

Importações de armas dos Estados Unidos

2006 2007 VAR. PRINCIPAIS PAÍSES PROVEDORES

Pistolas 1.128.801 1.380.582 22,3% ÁUSTRIA, BRASIL E CROÁCIA

Rifl es 516.112 615.689 19,3% CANADÁ E BRASIL

Escopetas 442.462 469.112 6,0% ITÁLIA, TURQUIA E BRASIL

Total 2.089.381 2.467.390 18,1% BRASIL

NEGÓCIO SEM CRISE

FONTE: FOREIGN TRADE DIVISION OF THE US CENSUS BUREAU

Este é um artigo desportivo

AP

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 49

DEBATES PANORÂMICA

Economista-chefe e diretor-adjunto do Centro de Desenvolvimento da OCDE.

Javier Santiso

EM ESPERANDO GODOT, célebre obra teatral de Samuel Beckett, os vagabundos Vladimir e Estragon esperam em vão a um misterioso personagem que nunca chega, mas ao qual atribuem certas conotações de divindade. Bem-vindo Mr. Marshall, sucesso do cinema dos anos 50, guarda seme-lhanças com a obra de Beckett: um povoado espanhol, Villar del Río, prepara-se para receber um comitê norteamericano que leva a tão desejada ajuda econômica e social do Plano Marshall à Espanha do pós-guerra. No fi lme de Berlanga, Godot tem nome —Estados Unidos da América— e apare-ce, mas somente de passagem, sem parar no povoado.

Concentrar demasiadas expectativas no exterior pode ser perigoso, apesar de que vivemos em um mundo globalizado no qual os mercados fi nanceiros estão irremediavelmente conectados e a recuperação do ritmo de crescimento e de geração de riqueza das economias latinoamericanas passa pela reativação nos países da OCDE, especialmente na lo-comotiva norteamericana. Certamente, a bonança nos sócios comerciais e fi nanceiros supõe uma oportunidade – expor-tar mais, receber mais fl uxos de capital e investimento – da mesma forma que as crises externas não deixam nossas economias à margem, como ilustra perfeitamente a dramá-tica situação atual, originada nas economias da OCDE. Mas a recuperação passa por fazer a lição de casa, independen-temente de que Godot apareça no fi nal da peça ou de que os dólares de Mr. Marshall voltem a fl uir ao sul uma vez supe-rado o ponto mais baixo da crise.

A aprovação de grandes pacotes de estímulo nos EUA (US$ 627 bilhões), no Japão (590 bilhões de euros), na União Europeia (200 bilhões de euros) e mais recentemente na China (465 bilhões de euros) – todos eles importantes sócios das principais economias latinoamericanas – deveria signifi car uma boa notícia para a reativação de um consumo interno em mercados que importam produtos latinoamerica-nos, sempre que não se incluam cláusulas protecionistas co-mo as sugeridas em alguns casos. Como declarou o primei-ro-ministro britânico Gordon Brown em sua recente viagem a Washington, seria desejável que a próxima cúpula do G-20

Esperando Mr. Marshall

em Londres avançasse de maneira fi rme na coordenação fi scal global, como previsivelmente o fará em frentes como a regulamentação fi nanceira, o combate contra os paraísos fi scais ou o reforço da capacidade creditícia do FMI.

Mas a ação externa e a coordenação global são apenas parte da solução para a América Latina. Mais importante ainda é a capacidade endógena de responder à desacelera-ção econômica e à arteriosclerose fi nanceira com medidas fi rmes que estimulem a atividade ao mesmo tempo em que asseguram que os segmentos mais vulneráveis da população não sofram os rigores da crise. Como destacamos no rela-tório Perspectivas Econômicas da América Latina 2009 da OCDE, a política fi scal pode e deve ser uma ferramenta na promoção do crescimento e da estabilidade, ao mesmo tem-po em que favorece a redução da pobreza e da desigualdade no seio das sociedades latinoamericanas. Para aproveitar esse potencial ao máximo, é importante dispor de sistemas fi scais fortes, transparentes e progressivos, que arrecadem de forma equitativa e que gastem de forma efi ciente.

Nos últimos três meses, os governos da região se uniram ao coro dos países que tomaram medidas fi scais voltadas a estimular a demanda agregada. No México, por exemplo, o governo do presidente Calderón se comprometeu a in-crementar em 7,5% o investimento do governo em projetos público-privados, expandindo os benefícios de cobertura de desemprego e outorgando subsídios para as famílias mais pobres. Essas medidas de estímulo somarão 120 bilhões de pesos (1% do PIB) em 2009. No Brasil, além da injeção de US$ 100 bilhões no sistema bancário (com o objetivo de sustentar a liquidez no mercado doméstico) se anunciaram cortes de impostos de US$ 3,6 bilhões e o compromisso de manter o investimento feito através do PAC, que enfatiza o potencial de crescimento em construção civil. No Chile, por sua vez, rapidamente se aprovou um pacote de estímulo fi scal de US$ 4 bilhões (2,8% do PIB).

Precisamos fazer a lição, mas há instrumentos neces-sários para isso? A bonança dos últimos anos tirou muito poder dos defensores de políticas anticíclicas, mas o fato de que esses atores se mantiveram vivos permite agora consta-tar as vantagens de dita política de longo prazo. O eleitorado também reconhece o benefício de uma gestão fi scal respon-sável: a presidente Bachelet, por exemplo, desfruta de 56% de popularidade, boa parte graças a políticas de prevenção e essa maravilha fi scal criada pelos chilenos que lhes dotou de uma capacidade contracíclica única no mundo.

Godot e Mr. Marshall são importantes, mas com o cres-cimento regional previsivelmente abaixo de 1% em 2009 – o FMI o situava em 1,1% em janeiro, e o Banco Mundial recentemente anunciou uma cifra próxima do 0,3% – mais vale aplicar-se do que esperar soluções alheias. Lamentavel-mente, nem todos os países latinoamericanos se encontram com a mesma margem de manobra. Outros, como Chile, Brasil ou México, e também Colômbia ou Peru, para men-cionar alguns, conseguiram dotar-se de capacidades de res-posta e não vão esperar eternamente Godot.

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César Durán, gerente de tesouraria da Factoring Cor-porativo, lembra com nervosismo a semana em que o mercado fi cou sem dinheiro. Os emissores de dívida

vinham operando relativamente bem no México, resistin-do ao turbilhão fi nanceiro internacional. Mas tudo mudou subitamente quando o gigante varejista Comerci admitiu que não podia pagar suas dívidas, gerando uma imediata e aguda crise de confi ança – e, por tabela, de liquidez. “Mui-tos saíram a buscar rollovers totalmente aterrados, mas não havia forma de conseguir fi nanciamento”, diz um executivo

A crise paralisou o fi nanciamento em todo o mundo. Mas na América Latina ainda se encontra alguma liquidez Antonio María Delgado, Miami

da empresa de factoring, que se dedica a comprar com desconto as faturas a cobrar de outras em-presas. “Se não se fizesse algo rápido, tudo ruiria. Os emissores com fi nanciamento no curto prazo teriam tido que sair a pagar. E, ao não conseguirem dinheiro, teriam entrado em default, uma atrás da outra, caindo em cadeia.”

Para sorte dos empresários me-xicano, as autoridades e as próprias empresas atuaram com rapidez. As primeiras implementaram um programa de garantias que ressus-citou parcialmente as colocações de dívida, e as segundas tomaram medidas para se capitalizarem por si só. Essas ações são emblemáti-cas da forma como alguns países da região estão encontrando suas próprias respostas à crise, respostas que, ainda que limitadas e distin-tas, não são encontradas em outras partes do mundo.

Em alguns países, como o Mé-xico, a ajuda do governo permitiu manter vivos os mercados de emis-são de dívidas de curto e médio prazo, pelo menos para fi nanciar as operações do dia-a-dia. Em outros mercados, o fechamento das tor-neiras internacionais de fi nancia-mento resultou em uma explosão da emissão de bônus corporativos ou dívidas de médio prazo. Uma solução que, lamentavelmente, só está disponível para as grandes companhias com um histórico reconhecido pelo mercado, ex-cluindo dessa forma os pequenos negócios.

É oportuno que a região esteja encontrando seus próprios meios de fi nanciamento em meio à crise, já que as portas estrangeiras estão fechadas para qualquer propósito prático. Segundo dados do Instituto

de Finanças Internacionais (IIF), os fl uxos de capital privado às economias emergentes têm previsão de queda para US$ 165 bilhões, em 2009, o que representa uma redução de 82% em relação aos US$ 929 bilhões registrados em 2007.

Para a América Latina, o fl uxo de investimentos cairá 75% nesse mesmo período, para somente US$ 43,1 bilhões. Em 2007 foram recebidos US$ 183,6 bilhões e, em 2008, outros US$ 89 bilhões. “Isso é uma repercussão direta da crise fi nanceira”, diz Frederick Jaspersen, diretor do depar-tamento para América Latina do IIF. “Os credores não estão

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EM BUSCA DO CAPITAL

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emprestando e isso está impactando não apenas no fi nancia-mento como também no volume de investimentos estrangeiros diretos, porque as companhias transnacionais estão se vendo obrigadas a reduzir o gasto, transferindo-se de seu epicentro nos EUA aos países emergentes.”

Em outras palavras, o dinheiro não está fl uindo. “A me-lhor forma de descrever isso é que estamos atravessando uma aversão mundial ao risco, e é uma aversão que se dirige aos mercados de capitais da América Latina, aos mercados creditícios, aos bancos, em momentos em que o crédito está se contraindo em todo o mundo”, diz Jaspersen.

Uma paralisação prolongada dos sistemas fi nanceiros poderia acentuar severamente o impacto do que, desde já, se vislumbra que será uma terrível crise econômica mundial. O fi nanciamento é um dos pilares sobre os quais a economia mundial descansa, já que outorga importantes recursos que são usados na construção de infraestrutura, para agilizar o intercâmbio comercial, investir em capacitação, ou simples-mente para fazer negócios. Seu aperfeiçoamento ao longo dos anos é visto como um dos motores que estão por trás do crescimento sustentável das nações e sua ausência como uma das principais razões da pobreza e do subdesenvolvimento.

A aversão mundial ao risco mencionada por Jaspersen re-duziu ao mínimo as fontes de fi nanciamento disponíveis às empresas latinoamericanas, diminuindo o apetite dos investidores pe-los papéis das companhias. No México, por exemplo, a volatilidade da crise tirou o chão do mercado local de certifi cados bursáteis, um dos instrumentos de dívida mais populares do país, depois que a Co-mercial Mexicana (Comerci) anunciou no início de outubro que as fortes perdas sofridas à raiz das más apostas realizadas com derivativos cambiais não lhe permitiria cumprir com suas obrigações.

SEM APETITE

Odefault afugentou os investidores de um só golpe, colocando em risco a

sobrevivência de centenas de companhias que previam cobrir suas necessidades de fi nanciamento no curto, médio e longo prazos através das emissões de certifi cados na bolsa mexica-na. Foi aí onde as autoridades mexicanas entraram em ação, preparando um programa de emergência para assumir parte do risco do mercado ao garantir através da estatal nacional Financiera até 50% das emissões em caso de default.

O plano de emergência foi bem-sucedido em ressuscitar o mercado, mas este atualmente ainda não funciona em sua totalidade. Os investidores só têm apetite para emissões de de um ou dois meses como máximo, e exigem o pagamento de um alto prêmio de risco, equivalente a 400 pontos base sobre a taxa de referência. Para papéis de duração mais longa, os emissores ainda não encontram compradores.

No Brasil, a crise de confi ança deixou uma marca profunda nas operações do mercados de capitais, reduzindo signifi cati-vamente o apetite dos investidores pelas emissões de dívida. Mesmo assim, o mercado conta com uma demanda mais

sólida do que a do México, e oferece apoio sufi ciente para as emissões de médio prazo. “Ainda há espaço para fi nan-ciamento no Brasil, mas com volumes mais baixos, termos mais duros e taxas mais altas”, diz Atila Noaldo, diretor de mercado de capitais do Banif Securities. “O mercado acionário está muito quieto. O mercado de dívida continua trabalhando com algumas restrições, mas segue adiante.”

Os termos das emissões permaneceram mais ou menos dentro dos parâmetros de um ano atrás, e os spreads aumen-taram ligeiramente. Mas a volatilidade dos mercados está refl etida em uma redução dos prazos. Ainda é possível fazer colocações do mercado de emissões com vencimento de 5 anos, mas a preferência é por papéis de curta duração, de entre 3 e 4 anos para instrumentos de renda fi xa.

BANCOS QUE NÃO EMPRESTAM

De qualquer forma, as emissões são consideradas uma boa opção de fi nanciamento na América Latina em

momentos em que os bancos nacionais se tornaram muito mais seletivos na hora de aprovar seus créditos, endurecendo consideravelmente suas exigências e exigindo mais requisi-tos para outorgar os créditos. Executivos da indústria dizem que os bancos em geral estão se concentrando em atender

as necessidades de seus melhores clientes, fe-chando o acesso ao fi nanciamento ao restante dos solicitantes. A situação é inclusive pior se a empresa tenta conseguir fi nanciamento de um banco estrangeiro, e nem se fala da possibilidade de lançamento de uma emissão no exterior.

“O mercado de bônus (da Europa e dos Estados Unidos) está praticamente paralisa-do”, diz Roldan Trujillo, diretor geral da CifiUSA, instituição fi nanceira dedicada a gerar recursos para pequenos e médios projetos de infraestrutura na América Latina. “Em alguns mercados locais sim, num prazo bem curto, geralmente. Mas internacionalmente o mercado de bônus está praticamente fechado para a maioria dos projetos.”

Trujillo explica que tal situação coloca o fi nanciamento disponível para obras de infraestrutura em risco. Quanto à possibilidade de que estas obtenham fundos de organismos multilaterais como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, o executivo afi rma que a disponibilidade desses fundos é muito limitada. “Todos estão acudindo às multila-terais para fi nanciar-se.

Os organismos multilaterais têm como principal priorida-de o fi nanciamento dos setores públicos, que também estão sendo afetados pela crise, e que são seus acionistas. Essas instituições vivem hoje um dilema, enfrentam a dura escolha entre acomodar bons projetos de desenvolvimento e atender aos pedidos dos governos. É uma situação muito difícil, e o tempo que durar irá defi nir o tempo que o desenvolvimento da região permanecerá estancado.”

Mas vários dos países da região, principalmente aque-les que adotaram políticas fi scais prudentes, poderão viver uma crise mais curta do que a que o primeiro mundo terá

FINANÇASESPECIAL

Obter fi nanciamento de longo prazo para projetos de expansão tornou-se uma tarefa titânica para as companhias da região.

52 AMÉRICAECONOMIIA / 15 DE MARÇO, 2009

que enfrentar. “Independentemente da duração da crise nos Estados Unidos, vários países latinoamericanos levarão menos tempo para estabilizar-se”, diz Thomas McDonald, diretor-chefe de estratégias do fundo de capital de risco Equity International.

Entre esses está o Brasil, cujo panorama no longo prazo é mais atraente, segundo o executivo, do que o de países como China, Rússia e Índia. “O que está acontecendo nos Estados Unidos é uma correção do superendividamento, e os países latinoamericanos não estão superenvididados. Por isso é que eles responderão mais rapidamente às tendências positivas.” Isso é importante porque um bom número de fundos de ca-pital de risco especializados na América Latina têm alguma liquidez à sua disposição, que eventualmente poderia ser canalizada para o fi nanciamento de projetos empresariais na região. Esses recursos, que poderiam somar entre US$ 1 bilhão e US$ 3 bilhões, consistiriam de investimentos que fundos soberanos e fundos de pensão colocaram em fundos de capital de risco e que não foram gastos durante o período de auge.

Mas os fundos não demonstram nenhuma pressa em gastar esse dinheiro. “Os gerentes não vão investir se não identifi -carem as condições ideais”, diz Cate Ambrose, presidente do Latin American Venture Capital Association. “Mesmo quando há companhias que necessitam desse capital, e entre estas há algumas que são potenciais candi-datas a recebê-lo, há sérios problemas neste momento relativos à avaliação do valor das companhias, além das incertezas dos mer-cados, que são fatores que estão freando esse tipo de iniciativa.”

DINHEIRO NO COLCHÃO

Para sorte de alguns países latinoameri-canos, a crise os agarra com os bolsos

cheios de dinheiro, diferentemente de outras regiões emergentes como África e Leste Eu-ropeu, onde as restrições no fornecimento de crédito das instituições multilaterais, o virtual congelamento dos mercados de bônus, a queda do investimento estrangeiro direto e inclusive a fuga dos capitais especulativos estão trazendo repercussões muito mais graves. “Historicamente, a América Latina tem estado mal posi-cionada para enfrentar choques externos dos mercados de capitais”, indica um relatório publicado recentemente pelo IIF sobre os fl uxos de capitais às economias emergentes. Mas, nesta ocasião, alguns países da região “parecem estar bem posicionados para enfrentar as difi culdades mundiais, devido em grande medida à sua prudência durante o auge de crédito posterior a 2002”. Uma das conquistas que dife-rencia a América Latina de outras regiões é seu baixo nível de endividamento em moeda estrangeira. São poucos os países latinoamericanos que contam com uma posição fi nanceira mais folgada que a do Chile. O fi nancia-mento no país sofreu uma forte sacudida no último trimestre do ano passado com a aversão ao risco generalizada propi-ciada pelos problemas do sistema bancário norteamericano e

pelo colapso de gigantes fi nanceiros como a seguradora AIG e o banco de investimentos Lehman Brothers. “Passamos um tempo quase sem nenhum tipo de colocação”, diz Sebasti-án Cereceda, gerente de fi nanças corporativas do banco de investimento chileno LarrainVial. “Mas logo começamos a verifi car um explosivo despertar do mercado e atualmente se produz um número ilimitado de colocações, a ponto de em

janeiro termos registrado um recorde histó-rico de US$ 1,3 bilhão.”

O novo despertar das emissões chilenas veio com uma solução para as companhias frente às difi culdades em obter créditos. “As companhias se depararam com bancos extremamente limitados, tremendamente restringidos em sua capacidade de oferecer dinheiro, e recorreram a mecanismos alter-nativos não apenas ao nível de bônus corpo-rativos, mas também de suporte ao comércio (papéis comerciais).”

Além de México, Brasil e Chile, outros países onde os empresários estão conseguindo fi nanciamento são Peru e Colômbia. Porém, um cenário muito diferente está se desenhan-

do em países menos desenvolvidos, especialmente aqueles que carecem de um ativa participação dos fundos de pensão, que no caso do Chile, por exemplo, estão entre os principais compradores de dívidas corporativas.

Entre estes países em pior situação fi gura a Argentina. A decisão do governo de Cristina Kirchner de nacionalizar os fundos de pensão tirou profundidade do mercado. “O volume de operações diárias caiu dramaticamente, porque não existe mais a presença diária dos fundos de pensão privados”, diz Pablo Vergara, sócio do escritório de advogados Zang Ber-gel y Vines, que assessora várias das maiores emissoras de papéis na Argentina. O governo declarou em várias ocasiões que pretende voltar esses fundos ao mercado, mas até agora isso não aconteceu.

Com Sérgio Spagnuolo, São Paulo

FINANÇASESPECIAL

Eles, sim, conseguemColocações e anúncios de dívida corporativa em 2009FONTE: COMUNICADOS DE IMPRENSA, SEGUNDO FACTIVA

VALORES EM US$ MILHÕES

Empresa País Valor

Petrobras Brasil 1.500

Oi Brasil 1.260

Ultrapar Brasil 506

Enap Chile 324

Bradespar Brasil 300

Tractebel Brasil 260

Bancolombia Colômbia 220

Davivienda Colômbia 220

CCR Brasil 211

SQM Chile 166

As emissões de dívida corporativa ganharam força em alguns países da região, mas são opção apenas para grandes empresas.

A ALTERNATIVAMAIS BUSCADA

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Nada menos do que US$ 200 bilhões. É o que a América Latina necessita para cobrir a brecha entre o nível de investimentos para seguir adiante ou parar (conside-

rando um patamar de 19% a 20% do PIB regional) e o nível necessário para crescer de forma sustentável (investimentos de 25% a 26% do PIB). Essa diferença de 5% a 6% terá que vir de investimentos externos. Mas, apesar de sua posição relativa-mente boa, são poucos os investidores que estão se refugiando no Brasil, na Colômbia, no Peru ou no Chile.

Em tal situação, quando o mar se torna revolto e os salva-vidas passam de itens pitorescos a imprescindíveis, todos estão de olho nos organismos multilaterais de crédito. Hoje, o Banco

Os banqueiros dos organismos multilaterais de crédito vivem um ano glorioso: todos querem fazer negócios com eles Rodrigo Lara Serrano

Interamericano de Desenvolvi-mento (BID), o Banco Mundial e a Corporação Andina de Fomento (CAF) viraram “tios”: antes sempre inconvenientes com suas exigências, mas a quem todos correm em busca de auxílio.

O problema é que, mesmo que o BID tenha prometido empréstimos de US$ 12 bilhões para este ano, e a CAF outros US$ 9 bilhões, não parece que o Banco Mundial vá oferecer nem um quinto dos US$ 179 bilhões restantes (a cifra mais provável oscila ao redor dos US$ 14 bilhões). “A magnitude e a forma com que se deu a crise nos leva a pensar que será difícil que qualquer organismo esteja preparado individualmente para absorver seu impacto”, diz Marce-la Rizzo, docente de Finanças da UDE Business School, em Buenos Aires. “De fato, a partir dessa crise surgiram discussões sobre um novo Bretton Woods, no qual se revisarão as instituições multilaterais e seus contribuintes”, diz.

Para Marcela, “os países que primeiro conseguirem reativar suas economias são os que terão que contribuir para a reativação dos demais”. E o mais provável “é que esta ajuda, no médio prazo, provenha de países como a China, que já apresenta pequenos sinais de recuperação”. Não é à toa que o sorriso de Luis Alberto Moreno, presidente do BID, era grande quan-do ofi cializou a adesão da China à instituição, em janeiro passado.

Os banqueiros multilaterais vivem momentos de plenitude. “Todos estão batendo à porta, pedindo dinheiro”, diz uma fonte desse meio que pede anonimato.

Normalmente as entidades devem buscar bons projetos. “Agora, nós é que elegemos os projetos, ainda que isso seja delicado. Como comparar as coisas quando todos lhe dizem que suas necessidades são vitais?”

De fato, entre 29 e 31 de março, quando o BID celebra meio século de existência – em um encontro em Medellín, na Colômbia –, enfrentará um desses pedidos. Uma solicitação que será coletiva: Belize, Panamá, República Dominicana e Nicarágua querem que a instituição permita que tenham aces-so a empréstimos sob condições de défi cit fi scal maior que o padrão e com menos controle.

De um ponto de vista amplo, a demanda não é insólita: são

Integração de Aplicativos,Web Services, BPM, SOAe Cloud-Computing

VIII Conferência Gartner de Integração Empresarial

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países pequenos, de recursos internos escassos, sem capacidade de adotar políticas anticíclicas, nos quais ajudas de tamanho médio podem ter um impacto decisivo, diferentemente de Ar-gentina, Peru e Brasil.

Contudo, a posição de Moreno para aceitar tal pedido é frágil. O BID perdeu cerca de US$ 1,6 bilhão em cash managementdurante o auge da crise. Tal situação levou a um confl ito de opiniões entre o senador norteamericano Richard Lugar (repu-blicano por Indiana), que enviou uma carta crítica à diretoria do banco, questionando “como a entidade pode perder entre 10 e 100 vezes mais dinheiro que outros bancos de desenvolvimen-to” no mesmo período (no entanto, a CIF, do Banco Mundial, perdeu US$ 539 milhões em 2008).

A resposta de Moreno indicou que “quando se computam os ganhos com juros, de mais de US$ 600 milhões, a perda lí-quida do BID chega a menos de US$ 1 bilhão”. Somente US$ 71 milhões seriam de perdas efetivas; o restante seriam perdas contáveis. Tudo em consequência, disse ele, de uma queda na capacidade creditícia por volta de módicos 2,5%.

“Em relação ao tema das perdas, há muito exagero”, diz uma fonte ligada ao BID. “São papéis que compramos. Não quer dizer que estão em default. Eles seguem sendo pagos”, acrescenta.

Não obstante, alguns enxergam na crítica de Lugar a antecipação de um “não” ou de um “sim” fortemente condicional, de parte do Con-gresso dos EUA, caso o BID decida pedir um aumento de capital a seus membros. “Qual é a posição dos EUA? Não sabemos se os próprios EUA o sabem, é algo que estão decidindo neste momento. A única certeza é que somos apenas uma peça a mais: aqui há um jogo maior, o jogo do G20”, diz a mesma fonte.

No caso do BID, uma comissão a cargo do economista peruano Pedro Pablo Kuczynski entregará, precisamente, uma recomendação a respeito em Medellín e, por ora, se especula que será a favor de fazê-lo. A razão é que “além da crise, o BID, como Banco, não tem cres-cido no mesmo ritmo da região e, quando se trata de reformas de saúde, trabalhistas, de educação e energia, que banco privado poderia ser fonte de fi nanciamento?”

CAF NO BOM CAMINHO

Quem conseguiu enfrentar o temporal foi a CAF. “Nossa liquidez está colocada em bancos e instituições de classifi ca-

ção AAA, em bônus do tesouro. Nossa tesouraria saiu ilesa”, diz Enrique García, presidente da entidade. Em seu caso, as perdas eventuais têm um efeito particular: “os lucros da CAF foram reinvestidos e, em 25% dos casos, redistribuídos em fundos para capital de cooperação técnica não a fundo perdido”, detalha. Em 2008, o lucro líquido foi de US$ 320 milhões.

A CAF vem se expandindo rapidamente. Em membros, agora 18 países, e programas: disponibilidade de recursos para problemas de contingência, capital de trabalho, swaps sobre gastos já realizados e programas de infraestrutura. No entan-to, para García, a ação dos organismos multilaterais não pode compensar a falta de visão dos países que “não maximizaram

a janela de oportunidade de bonança para se moverem de um modelo de vantagens comparativas para outro de vantagens competitivas”.

Para ele, com a crise atual, “abre-se a oportunidade para que realmente se estabeleçam prioridades estratégicas e não apenas se apague o incêndio”.

É algo imprescindible. A razão? “Passado o vendaval, a América Latina pode ter uma surpresa desagradável: a região terá que competir com os EUA e a Europa por recursos”, diz. “Washington e Bruxelas despertarão um dia imersos em gran-des défi cits fi scais”. “E quem vai fi nanciar esses défi cits?”, se pergunta García. Seja quem for, se fi xou que esses países con-tinuarão a ser AAA e isso terá uma consequência forte sobre os spreads e os escassos créditos para a região”.

Alguns esperam que o socorro venha de uma reforma do FMI e de todo o sistema fi nanceiro. Mas, talvez seja esperar muito. “Sou prático, nestes casos”, diz García. “As arquiteturas complexas demoram anos para ser construídas”.

Pamela Cox, vice-presidente do Banco Mundial para a América Latina, por sua vez, não crê que a região sofrerá de maneira importante escassez de crédito quando tiver início a recuperação: “sou otimista a respeito da capacidade de a América Latina continuar a ser um lugar atrativo para investidores”. Por quê? “Creio que nesta crise, até agora, a região tem demonstrado uma melhor ca-pacidade para encarar uma desaceleração econômica global tão forte como a que vivemos. E, em função disso, continuará a ser parte importante dos portfólios de investimento”.

Cox tampouco estima que o Banco Mundial precise de mais recursos. “Neste momento, o banco tem recursos sufi cientes para cobrir as demandas de fi nanciamento de

seus sócios”, diz. É claro que “temos escutado outras institui-ções multilaterais falarem da necessidade de mais fundos, mas não ainda não entramos neste debate, ainda que não possamos descartar a possibilidade”.

O certo é que o Banco Mundial, através da unidade para negócios com empresas privadas, a CFI, está sim em busca de dinheiro fresco. Em fevereiro, conseguiu que o Japan Bank of Internatinal Cooperation (JBIC) contribuísse com US$ 2 bilhões a um Fundo de Recapitalização Bancária de US$ 3 bilhões que está criando. Questionada, Cox preferiu não entrar em detalhes: “esta iniciativa está em processo de preparação e levantamento de fundos. Os detalhes de sua implementação serão conhecidos em breve”.

Mas esse é o futuro. Do ponto de vista do BID, no pre-sente, quem tem mais problemas são países como Nicarágua ou Haiti, que não podem se fi nanciar com as caras linhas de desembolso rápido. “O que fazer com eles? Ainda não se sabe, mas haverá um debate”, diz uma fonte da entidade. Queira ou não, a região dependerá mais dos organismos multilaterais de crédito. E, estes, de seus doadores. Como bem aponta García, “os investidores, não importa a cor ideológica, querem ver políticas conservadoras” no uso de seu dinheiro.

FINANÇASESPECIAL

A crise fi nanceira mundial pode levar a um novo Bretton Woods, no qual se revise o papel das instituições multilaterais no mundo.

OÁSIS DE FINANCIAMENTO

56 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

Odono da empresa de alimentos mexicana pede ano-nimato. Com as constantes notícias sobre violência, narcoterrorismo e sequestros veiculadas todos os dias

nos jornais de seu país, tem pavor de que alguém saiba que conta com liquidez neste momento. Nada menos que US$ 50 milhões, e não provenientes de um banco internacional ou de capital privado. Neste caso, o fi nanciamento tem origem em uma família rica e em um fundo de investimento dos Emira-dos Árabes, intermediado por um escritório internacional de advogados em Dubai.

Mas, não é um crédito direto que será pago com os fl uxos de caixa da empresa. O crédito a juros é proibido nas fi nanças islâmicas. O fi nanciamento é estruturado e tem garantias nos ativos da empresa. Neste caso, seus estoques de alimentos.

O caso desta empresa serve para exemplifi car uma tendência em crescimento na América Latina nos últimos anos e que se acentuou com a crise de crédito mundial: para obter fi nancia-mento, é preciso bater em todas as portas. E, se as portas mais próximas estão fechadas, é preciso bater em portas um pouco mais distantes. Como, por exemplo, as do Oriente Médio e da Ásia.

Neste cenário, os fundos de investimento soberanos, principalmente do Oriente Mé-dio e da Ásia, mas também de outros países petroleiros, como a Noruega, se tornaram atores muito importantes, absorvendo grandes nomes da imprensa ocidental. Alguns foram criticados sob a alegação de que a compra de empresas estratégicas em países ocidentais tinha fi ns políticos (em particular no caso da China Investment Corporation e outros fundos chineses). Mas logo foram alçados a salvadores dos bancos de investimentos de Wall Street e Londres. É natural que as empresas e países da América Latina prestem cada vez mais atenção a essas entidades como uma fonte potencial de fi nanciamento e de investimentos. Mas, para aqueles que não conseguirem atrair fundos soberanos, há outras opções “remotas” que podem ser estudadas, principalmente no Oriente Médio – uma região que, caso se saiba procurar conta com dinheiro e está em busca de opções para aplicá-lo.

Já se verifi cam alguns anúncios públicos, como o da estatal brasileira Petrobras, que disse que buscará fi nanciamento e fundos soberanos dessas regiões, da mesma forma que a companhia de saneamento do Rio de Janeiro, a Cedae, que teve que postergar seus planos de lançar ações na bolsa por conta das turbulências do mercado. Por sua vez, comitivas da Abu Dhabi Investment Authority recentemente visitaram a Colômbia estudando opor-tunidades de investimento.

Não que os fundos soberanos não tenham sofrido com a

crise. Segundo algumas estimativas, em 2008 os ativos sob sua administração perderam entre 18% e 25% do valor, o equivalente a algo entre US$ 500 bilhões e US$ 700 bilhões. Perdas que os fi zeram voltar a atenção principalmente a investimentos em seus próprios países e em regiões vizinhas. O Temasek, um dos fundos soberanos de Cingapura e um dos poucos com escritórios na América Latina (Cidade do México e São Paulo), informou recentemente que o valor de sua carteira de investimentos caiu mais de US$ 30 bilhões entre março e novembro de 2008, para cerca de US$ 85 bilhões. Não é à toa que Sameer Al Ansari, diretor executivo da Dubai International Capital, recentemente comentou que o cenário era “simplesmente perigoso demais para pensar em comprar”.

“Os fundos soberanos de Dubai, Kuwait e China têm sido chamados a resgatar seus próprios sistemas fi nanceiros ou empresas locais”, diz William Miracky, sócio da fi rma de con-sultoria Monitor Group, que faz levantamentos trimestrais dos

investimentos dos fundos soberanos no mun-do. “Se você olhar a evolução dos fundos, é possível identifi car um padrão de conduta no verão boreal de 2008, quando as populações de seus respectivos países viram que seus gi-gantescos investimentos em ativos ocidentais registrariam enormes perdas.”

Prova disso é a enorme queda nos montantes investidos pelos fundos soberanos nos países desenvolvidos que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Eco-nômico (OCDE). Segundo dados do Monitor Group, no primeiro trimestre de 2008 os fundos soberanos investiram US$ 31 bilhões nesses países, cifra que caiu para US$ 9 bilhões no segundo trimestre e a US$ 8 bilhões no ter-

ceiro trimestre.“As condições para obter fi nanciamento dos fundos sobera-

nos do Oriente Médio e da Ásia se tornaram muito mais com-plicadas, mas isso não signifi ca que as portas estão fechadas para todos”, diz Tim Cohan, sócio da fi rma de assessoria em investimentos Stanwich Advisors, que tem feito a ponte entre fundos de capital privado da região e fundos de investidores do Oriente Médio. Cohan afi rma que negociou em nome do fundo de private equity Southern Cross para que vários fundos soberanos participassem como aportantes em seu último fundo de US$ 750 milhões, ainda que não diga os nomes dos fundos do Oriente Médio envolvidos. “Os grandes atores do private equity, como Southern Cross, Advent e GP Investimentos, sempre terão acesso aos fundos. A dúvida, agora, é quanto conseguirão levantar.”

Mas, se uma empresa não tem tanto nome como uma Southern ou uma Advent, outra forma de atrair o interesse dos fundos é

FINANÇASESPECIAL

Os grandes private equitylatinoamericanos terão acesso aos fundos soberanos. Mas não será o caso de atores menores.

Fundos soberanos e famílias árabes ricas são algumas novas opções para as empresas latinoamericanas em busca de capital Eduardo Thomson, Santiago

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ter investimentos vinculados a bens de primeira necessidade. A China Investment Corporation e outros fundos soberanos do Oriente Médio têm declarado que darão ênfase à compra de produ-tos básicos, ativos de mineração e commodities. A indicação de Charles Goodyear, ex-CEO da BHP Billiton, como novo diretor geral do fundo cingapurense Temasek, é visto como um sinal de que este também destinará seus recursos à área de mineração/commodities.

No entanto, nem tudo são fundos soberanos. Fernando Salinas, advogado mexicano e sócio do escritório Dewey Lebouf em Dubai, afi rma que onde se vê interesse de investidores árabes por oportunidades de aplicação de recursos fi nanceiros é nos single family offi ces. E que as visitas de companhias latinoamericanas ao Oriente Médio estão aumentando em número. É que o mundo das “fi nanças islâmicas”, ou seja, aquelas que cumprem com os padrões religiosos muçulmanos, se mantém pratica-mente inexplorado pela maioria das empresas latinoamericanas. E o potencial é enorme para quem souber em que porta bater e como bater, explica José Neif, diretor do escritório de Dubai da ProMéxico, entidade encarregada de fomentar o comércio e os investimentos no país. “Além dos fundos soberanos, há outros privados ou high net worth individuals, de emires e xeques, com muitíssimo dinheiro para investir. Mas é preciso ‘engalanar-se’ para eles e cumprir suas exigências”, diz Neif. De acordo com alguns estudos, apenas em Genebra, famílias islâmi-cas teriam cerca de US$ 200 bilhões em ativos sob administração. “Estamos constantemente tratando de convencer os fundos soberanos e investidores árabes a diversifi car sua atuação

na América Latina”, acrescenta Neif.Há árabes ocidentalizados que estão dispostos a investir

em projetos que em uma breve análise não cumpririam com as leis islâmicas (o que explica por que o príncipe Al Walad, da Arábia Saudita, era até há pouco tempo um dos principais acionistas do Citigroup, sendo que o islã proíbe obter lucro com o dinheiro). Outros fundos e famílias, entretanto, são estritos: nada de lucro, nada vinculado a drogas, álcool ou pornografi a, nada de empresas com mais de 30% de dívida sobre o patrimônio.

Mas há ainda outras opções. O mercado de sukuks, também conhecidos como bônus islâmicos (que devem ser respaldados por ativos com inventários e bens físicos e que só devem ser vendidos por seu valor nominal), está crescendo com força, e há cerca de US$ 70 bilhões em circulação. Além disso, um grupo islâmico não estará disposto a dar crédito com taxas de juros, mas sim a compartilhar riscos, pelos quais têm os acordos mudarabah, ou de risco compartilhado.

São apenas algumas das condições que devem ser consi-deradas para obter fi nanciamento. Mas, em tempos de crédito escasso, não seria nada mal estar de bem com Alá.

FINANÇASESPECIAL

Ativos* País

Abu Dhabi Investment Authority 875 Emirados Árabes - Abu Dhabi

SAMA Foreign Holdings 433 Arábia Saudita

SAFE Investment Co. 347 China

Govt. of Singapure Investment Corp. 330 Cingapura

Govt. Pension Fund 301 Noruega

National Welfare Fund 225 Rússia

Kuwait Investment Authority 203 Kuwait

China Investment Corp. 200 China

Hong Kong Monetary Authority 173 Hong Kong

Temasek Holdings 85 Cingapura

FONTE: SWF INSTITUTE

OS PESO PESADOSMaiores fundos soberanos no mundo

*(bilhões de US$)

58 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

CAPITAL ABERTOhttp://blogs.americaeconomia.com/thomson/

FONTE: ECONOMÁTICADesempenho comparativo das bolsas latinoamericanas durante os dois primeiros meses de 2009.ALGUNS FLUTUAM, OUTROS AFUNDAM

120,00

100,00

80,00

IBOVESPA

IPSA

IPyC

IGBC

IBC

02.01.09 30.01.09 27.02.09

CALOTE EM ALTA

A economia brasileira continua revelando suas fi ssuras. A primei-ra delas foi uma “cataclísmica” queda de 14,5% na produção industrial em dezembro de 2008 em comparação ao mesmo mês de 2007. E agora emerge um aumento do calote entre as companhias brasileiras. Segundo a empresa de informa-ção de crédito Serasa Experian, em janeiro de 2009 a “inadim-plência de pessoas jurídicas” – que leva em consideração tí-tulos protestados, cheques sem fundos e atrasos no pagamento de créditos bancários por parte de empresas em todo o terri-tório nacional – subiu 12,5% frente a dezembro de 2008. Em relação ao mesmo período do ano passado, a variação é ainda maior, de 28,9% . Essa alta deve-se aos efeitos negativos da crise fi nanceira internacional sobre os merca-dos de crédito no Brasil. Isso porque a incerteza causou uma retração na oferta de recursos. Verifi cou-se uma redução nos prazos de pagamento e as taxas de juros subiram, explica o Serasa Experian. Além disso, os bancos se tornaram mais con-servadores na hora de outorgar créditos às empresas.Mas há sinais de recuperação. Ainda que a alta de janeiro te-nha sido signifi cativa, foi menor que a de 36,1% registrada em dezembro de 2008, frente a dezembro de 2007.

Somente três países conseguiram fechar os dois pri-meiros meses do ano com alta em seus mercados de ação. E ninguém se atreve a falar de descolamento

NÃO HÁ PORTO SEGURO

PASSADOS OS DOIS pri-meiros meses do ano, já deve ter fi cado claro que é pra-ticamente impossível falar de um descolamento entre América Latina e o restante do mundo. É só olhar para as bolsas de valores. Em janeiro e fevereiro deste ano, o S&P 500 acumulou queda de 21%, arrastado pelas notícias da recessão e da crise do setor bancário. Já o Índice de Preços e Cotizações da Bolsa Mexicana de Valores retro-cedeu 24%. Outras bolsas da região também experimenta-ram queda, como o Ibovespa de São Paulo (-5,12%), o Merval, de Buenos Aires (-10,9%), e o IGBVL de Lima (-9%).Estranhamente, as bolsas de outros países da região puderam ignorar a situação nos Estados Unidos para fechar em alta. Foi o caso das bolsas de Caracas, Bogotá e Santiago. A alta de Caracas foi pontual, porque coincidiu com o anúncio do

governo no fi nal de fevereiro de uma oferta pelas poucas ações que seguiam nas mãos de privados da empresa de telefonia CANTV e da Electricidad de Caracas, depois de sua nacionalização em 2008. Seu volume de operações é irrelevante e os controles de capital o tornam pouco atraentes para investi-dores de outras regiões.No Chile e na Colômbia, que fecharam os dois primeiros meses do ano com altas de 2,4% e 1,3%, respectivamen-te, o caso é outro. Segundo Alberto Bernal, economista-chefe do Bulltick Capital Markets, no Chile a situação se deve em grande parte a que o mercado está reconhe-cendo o bom manejo fi scal e monetário. “É um dos pou-cos países com capacidade real de implementar políticas contracíclicas, e ninguém pode duvidar disso.” Para Tulio Vera, chefe de estra-tégia de investimentos da área de administração de

ativos do banco panamenho Bladex, o Chile em maior medida, seguido da Colôm-bia, mostrou uma maior velocidade de reação na implementação de políticas contracíclicas que outras economias emergentes. Para o restante do ano, Bernal recomenda “super-ponderar” os mercados do Brasil, Chile e Colômbia, e evitar o mercado mexicano, que continuará sofrendo as consequências de sua aproxi-mação com Estados Unidos.Mas daí a que o Chile e a Colômbia sejam refúgio para investidores estrangeiros, isso é outro tema totalmente distinto. “Para o bem e para mal, os Estados Unidos ainda ditam o que acontece nos mercados emergentes. É muito cedo para dizer que um país emergente, além do fato de poder ter bons indi-cadores, seja neste momento um refúgio para investido-res”, afi rma Tulio Vera.

Eduardo Thomson

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 59

John C. Edmunds

Doutor em Administração de Empresas pela Universidade de Harvard, professor de Finanças do Babson College de Boston e coautor de Wealth by Association.

FINANÇAS OPINIÃO

É hora de refle-tir se (a alta das ações na Amé-rica Latina) foi um caso de eu-foria ou se ha-via uma funda-ção sólida que a sustentasse.

UM PASSEIO DE MONTANHA RUSSA pode ser emo-cionante. Produz a excitação de uma queda livre sem o risco de morte ou de dano permanente que uma queda descontrolada produziria. Os clientes fazem longas fi las para subir ao brinquedo, sabem o que vem e se preparam para isso.

Nos mercados de divisas, essa experiência não é tão prazerosa. O câmbio de um país sobe e desce abruptamen-te. A queda chega sem advertência, causando prejuízos a muitos que não a viram chegar e não se prepararam pre-viamente.

As divisas de vários dos principais países da América Latina fl utuaram de forma violenta durante os últimos 12 meses. O impacto foi sentido em todo o continente. Houve distorções, lucros de vida curta e perdas abruptas. Importantes setores das economias locais fl oresceram e logo encolheram. Os governos se esforçaram para prote-ger seus países dos efeitos mais severos dessas fl utuações. Não foram capazes de isolar suas economias por comple-to, mas podem sentir-se orgulhosos de que seus sistemas fi nanceiros nacionais resistiram tão bem à turbulência.

O real brasileiro se tornou tão forte que em meados de 2008 os brasileiros se impressionaram com o fato de seu país ter adquirido tão rapidamente uma imagem de sofi s-ticação e prudência fi nanceira. Perguntam-se por que os investidores internacionais se apaixonaram tanto por seu país, se há décadas este era visto com receio. O real, cu-jo valor em 2005 era de R$ 3,5 por dólar, tinha chegado aos R$ 1,55 por dólar. Nesse ritmo, os titulares de ações brasileiras estavam se tornando mais ricos do que jamais sonharam e as exportações brasileiras eram muito caras. Poucas semanas depois, o real caiu de um precipício. O câmbio subiu a R$ 2,51 por dólar. E não houve nenhuma mudança na economia brasileira nesse período que justi-fi casse semelhante perda de valor. O problema surgiu do sistema fi nanceiro norteamericano e de algumas pouco conhecidas vulnerabilidades no próprio sistema fi nanceiro brasileiro. A quebra do Lehman Brothers engatilhou uma série de defaults em todo o mundo. No Brasil, surgiram rumores de que os bancos mais importantes e as grandes companhias estavam impactados por perdas ocasionadas por derivativos – não os tristemente célebres CDS que

Montanha-russa

afundaram tantas instituições nos EUA e Europa – e o medo era de que as contrapartes de algumas coberturas cambiais dessem o calote. Nesse ponto, o gradual decli-ve converteu-se em uma rota. Os investidores sentiram o pânico e venderam suas ações, bônus e divisas.

O violento vaivém da moeda brasileira ocorreu ao mesmo tempo em que vários outros. O peso chileno, que tinha se fortalecido tanto em março de 2008 e que esti-mulou o governo chileno a dar início a um programa para enfraquecê-lo, caiu além das expectativas dos exportado-res chilenos. No México, o valor da moeda fl utuou de 10 pesos mexicanos por dólar a quase 15 pesos num período de seis meses. A causa inicial dessas fl utuações foram os choques externos, mas em cada país houve gatilhos que intensifi caram o efeito e deram a cada queda um caráter nacional único.

Os empresários da região tiveram que manejar múl-tiplas crises a cada dia, enquanto viam suas próprias fi nanças deteriorarem-se. Contiveram a respiração à es-pera do colapso cataclísmico, como os que ocorreram em 1994, 1998 e 2001. Mas o colapso nunca aconteceu. As pessoas que viviam nessa situação eram como os residen-

tes de um povoado à margem de um rio que a cada dez anos transborda. As chuvas chega-ram, o rio subiu, e os morado-res observaram com nervosis-mo, à espera de que as águas arrasassem com tudo, mas os diques conseguiram contê-las.

A região viveu uma forte decolagem e acaba de expe-rimentar uma nefasta queda. O valor das ações comuns na América Latina, bônus e ativos bancários subiu de US$ 1,72 trilhão em 2002 a US$ 6,36 trilhões em 2007, e certamen-te mais que isso na primeira metade de 2008. A alta foi tão

grande que deixou muitas pessoas nervosas. Em compa-ração, o PIB regional foi de US$ 1,65 trilhão. Assim, em relação a 2002, o aumento do valor dos ativos fi nanceiros foi de 2,8 vezes o PIB regional.

É hora de refl etir sobre essa experiência. Essa alta foi um caso de euforia, ou havia uma fundação sólida que a sustentasse? A evidência dita que os novos desenhos en-tregaram resultados, mas ao mesmo tempo volatilidade. Alguns questionam se as reformas garantiram resultados sufi cientes para compensar as altas e baixas, e defendem a restrição dos sistemas fi nanceiros nacionais. Muito poucos, entretanto, desejam voltar às fórmulas tradicio-nais. Estas foram recusadas porque distribuíram menos e eram vulneráveis ao colapso.

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 61

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62 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

NEGÓCIO FECHADO

>> ITÍNEREA operadora viária italiana Atlantia e a espanhola Acciona SA compraram conjuntamente o controle das estra-das operadas no Chile pela Itínere Infraestructuras. A Itínere, que se encontra em vias de ser adquirida por um fundo de investimentos do Citigroup, venderá seus ativos chile-nos por mais de 420 milhões de euros.

>> MTTGO Dresdner Brasil, fi lial do banco alemão Dresdner, foi vendido por valor não divulgado à holding local MTTG. Estima-se que o negócio foi fechado por um valor entre US$ 90 milhões e US$ 110 milhões. O Dresd-ner foi adquirido recentemente pelo Commerzbank na Alemanha e se encontra em processo de reestru-turação.

>> ECOPETROLA petrolífera estatal colombiana comprou a HocolPetroleum Ltd., fi lial da francesa Maurel & Prom, por US$ 748 milhões. Segundo o acordo, a Maurel & Prom reterá algumas das licenças de exploração controladas pela Hocol na Colômbia.

>> EL PASO CORP.A empresa petrolífera norteameri-cana El Paso Corporation anunciou a venda de sua participação na geradora de Porto Velho, Brasil, por US$ 178 milhões e, com isso, sua retirada por completo do mercado brasileiro.

>> GRUPO MEXICANAO Grupo Mexicana e a Boeing anunciaram um acordo para a compra, por parte da companhia aérea, de 25 aviões modelo 717-200. A Boeing também fará o treinamento

da tripulação e a manutenção da MexicanaClick.

>> IBERDROLAA Iberdrola Renovables, uma das principais empresas espanholas do setor de energia renovável, chegou a um acordo com a Comissão Federal de Energia para a construção e ope-ração do La Venta III, parque eólico mexicano de 103 MW, por 20 anos. O projeto deverá entrar em operação em 2010.

>> ITAIPUA empresa binacional de energia e a Administração Nacional de Energia do Paraguai acordaram a construção de uma rede elétrica de US$ 50 milhões. O acordo contempla a melhora e ampliação da distribuição de energia em 17 departa-mentos do país, além da mudança de linhas e postes, e levará o serviço, pela primeira vez, a 150 mil famílias.

>> MONSANTOA empresa norteamericana de agro-químicos e biotecnología adquiriu 49% da companhia brasileira de sementes MDM Sementes de Algodão Ltda., por um montante não divulgado. A Monsanto já possuía uma participação na MDM desde 2007, quando adquiriu a companhia de biotenologia Delta & Pine Land. Atualmente, vende semen-tes modifi cadas de algodão no Brasil.

>> OHLA Obrascon Huarte Lain, através de uma de suas fi liais, adquiriu o contrato de US$ 400 milhões para a construção de uma estrada no Peru. A empresa espanhola construirá uma rede viária de 375 quilômetros entre Pativilca e a região de Lima.

>> TOKIO MARINEA companhia de seguros japonesa Tokio Marine Holdings negociou a ven-da de uma participação de 50% em sua fi lial brasileira Real Tokio Marine Vida e Previdência ao banco Santander por US$ 286 milhões. O negócio dará ao banco espanhol a propriedade de 100% da seguradora no Brasil.

>> EEBA Transcogas Perú, da colombiana Empresa de Energía de Bogotá e da peruana Transportadora de Energía del Interior, adquiriu a concessão de um gasoduto para transportar gás natural à região de Ica. O investimento é de US$ 200 milhões.

>> CORREDOR BIOCEÂNICOO grupo chileno Urenda, controlador da holding Empresas Navieras, chegou a um acordo com o grupo argentino Eurnekian – que controla a Corporaci-ón América, para a construção de um corredor bioceânico entre Valpara-íso e Buenos Aires. O investimento alcançará os US$ 3 bilhões e poderá contar com a participação de outros sócios.

>> VOTORANTIMA brasileira Votorantim Celulose e Papel assinou um acordo com repre-sentantes da família Safra para a compra de 127.506.457 ações comuns da Aracruz. As ações representam mais de 28% do capital com direito a voto e darão à VCP mais de 84% do controle da Aracruz.

>> WAL-MARTO Wal-Mart lançou uma nova oferta de compra das ações e ADRs da chilena D&S, depois de ter adquirido 58,2% do controle da empresa. Com isso, o Wal-Mart espera somar 1,7% da companhia que fi cou fl utuando no mercado. Estima-se que os irmãos Ibáñez Scott reterão 40,1% da propriedade.

>> RIO TINTOO grupo estatal chinês Chi-nalco anunciou que investirá US$ 19,5 bilhões na mineradora Rio Tinto. O acordo garantirá o fornecimento à China e ajudará substancialmente a reduzir a dívida da companhia, que quase chegou aos US$ 40 bilhões antes que esta começasse a vender ativos e negociar fi nanciamento. A operação é o investimento mais vultoso de uma empresa chinesa no exterior.

ENDESAA empresa italiana de energia Enel adquiriu, em uma operação de US$ 14,3 bilhões, 25% da propriedade da multinacional hidro-elétrica espanhola Endesa que eram controlados pela Acciona. Com esta operação, a Enel aumenta sua participação na companhia para 92%, com o objetivo de potencializar seu negócio na América Latina, onde a Endesa concentra grande parte de suas operações.

ENDESA ESPANHA: ENEL AUMENTA SUA PARTICIPAÇÃO

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 63

OPORTUNIDADES DE FUSÕES E AQUISIÇÕES NA AMÉRICA LATINA

Entre em contato com Lisia González [email protected] ou Sergio Spagnuolo [email protected]

RADAR M&A

LATIN AMERICA BUSINESS CON-SULTING (LATBC),consultoria mexicana em gestão e tecnologia, está interessada em fundir-se ou associar-se com empre-sas do setor para crescer no México. “Quere-mos aproveitar a crise fi nancei-ra para buscar oportunidades de negocio”, diz Xavier Espinosa de los Monteros, CEO da empresa. “Esta-mos abertos a ofertas.” Até agora, a companhia cresceu de forma orgâni-ca. Suas vendas chegaram a US$ 10,5 milhões em 2008 e é esperado um crescimento de 30% em 2009.

A TCI, empresa brasileira de business process outsourcing (BPO), mantém sua estratégia de investimentos apesar da crise. “Até onde posso dizer, não estamos dando marcha a ré em nosso plano de inves-timentos”, diz Daniel Guedes, diretor de expansão da empresa. Executivos da companhia afi rmaram que estão em negociações avançadas com cinco diferentes companhias. As candidatas têm volume de vendas anuais entre US$ 3 milhões e US$ 15 milhões. Em 2007 a TCI registrou vendas de US$ 46,8 milhões e estimava fechar 2008 com quase o dobro: US$ 86,6 milhões.

A TELLABS, empresa norteamericana provedora de soluções de TI para o setor de telecom, busca compras para fortalecer seu crescimento na Amé-rica Latina. “A região enfrenta bem a crise, por isso começamos a buscar oportuni-dades na região”,diz Tarcisio Ribeiro, vice-presidente e gerente geral da Tellabs para a América Latina e o Caribe. Até agora, a companhia não realizou nenhuma compra na região. Mas o forte crescimento de sua receita na América Latina, com alta de 69% em 2008, faz das aquisições uma boa opção. A companhia, com base em Illinois, EUA, já tem escritórios na Argenti-na, no Brasil e no México. Tem 3,2 mil empregados e suas vendas globais foram de US$ 1,15 bilhão no quarto trimestre de 2008.

A SOUTHERN CROSS GROUP, empresa de private equi-ty chileno-argentina, está interessada em buscar negócios farmacêuticos no México. A ideia é buscar ativos que lhe permitam fazer a More Pharma, ad-quirida em 2007, crescer. “Estamos interes-sados na indús-tria farmacêutica e de saúde me-xicana porque a consideramos um mercado inte-ressante, graças à ampla classe média do país”,diz César Pérez Barnés, diretor da Southern Cross para o México. Southern Cross Group tem escri-tórios na Argentina, no Chile, México, Brasil e nos Estados Unidos, e fez investimentos de portfólio em mais de 30 compa-nhias desses países, além de Peru, Uruguai, Paraguai e Bolívia.

A AATHUS KARL-SHAMN (AAK), com-panhia sueca dedicada à fabricação de óleos ve-getais, poderá considerar compras para fortalecer seu crescimento na Amé-rica Latina. “Esse tipo de companhia sempre busca novos produtos e oportunidades”,diz Esteban Ríos Gonzá-lez, coordenador de ven-das de sua fi lial no México. “A empresa está aberta a com-pras, poderíamos nos interessar por uma nova fábrica ou em-presa.” Atualmente a companhia tem plantas na Dinamarca, no México, na Holanda, na Inglaterra, na Suécia, no Uruguai e nos Estados Unidos. Somente no México, a AAK tem ca-pacidade de produção de 20 mil toneladas mensais e possui 350 empregados. Seus produtos, entre ou-tros, substituem a mantei-ga de cacau, especializa-dos sem óleo trans para a indústria dos chocolates e da cosmética.

64 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

RAIO X[BOLÍVIA]

SOLE

DAD

TIRA

PEG

UI

Éde se esperar: quem está acostumado a viver nas alturas, com pouco oxigênio, em geral resiste melhor a uma escalada montanhosa do que quem foi criado ao nível do mar. Esta

é exatamente a explicação de por que a Bolívia não mostra até o momento sinais de estresse severo devido à crise mundial. “Nosso sistema financeiro está muito pouco vinculado à econo-mia mundial”, diz Gonzalo Chávez, economista da Universidade Católica da Bolívia. Além disso, “cerca de 60% da população opera na economia informal”.

O país fez disso seu vício, o que se provou ser uma virtude. E é assim que tanto autoridades bolivianas quanto o FMI pre-vêem que o país ficará de fora da epidemia de desaceleração e recessão, com uma taxa de expansão entre 4% e 5%.

Chávez e outros analistas dizem que a cifra é exagerada. “O país vai receber o choque externo pela queda nos preços do zinco, prata e estanho”, explica. A receita de exportações de metais, por volta de US$ 1 bilhão mensais, pode cair em 30% ou 40%. A isto se somam a queda do envio de remessas por parte de bolivianos que moram fora do país e despacham outros US$ 1 bilhão a seus parentes. Uma terceira fonte de ingressos que será debilitada é a do gás. A Bolívia segue cobrando atualmente um valor superior ao de mercado, devido aos mecanismos de indexação que tem com seu principal cliente, o Brasil.

Visões mais pessimistas indicam que o crescimento seria de 1,5% a 2%; o governo de Evo Morales, contudo, tem margem para realizar medidas anticíclicas. Com um superávit fiscal de

O país poderá benefi ciar-se do surgimento de uma economia de consumo mais integradaRodrigo Lara

O DESAFIO DE SEGUIR NO ALTO

5,8% do PIB, foi anunciado um pacote de investimento público recorde, de US$ 1,8 bilhão. Além disso, no ano passado houve aumento na demanda interna, principalmente por conta de programas assistenciais como o Dignidade, aumentos salariais para setores como saúde e educação, e o chamado Bono Juancito Pinto (subsídio único para as crianças que passam de ano).

Para Chávez, esses caminhos de aumento da atividade têm limitações. Em 2008 foram gastos apenas 70% do orçamento, sinal de que é “muito provável que os investimentos públicos anunciados não possam ser executados completamente”.

De qualquer forma, o governo tem um forte incentivo para tentar manter a economia em aquecimento: as eleições presiden-ciais de 6 de dezembro. A seu favor estão a queda da inflação e no preço dos alimentos, contra o aumento previsível no setor de mineração. O economista da Universidade Católica acredita que, por enquanto, o relevante é “que o câmbio real esteja valorizado e que o governo disse que irá mantê-lo”. O peso boliviano va-lorizou 2% entre julho de 2008 e fevereiro. Mas se as moedas

da região continuarem em queda, a Bolívia poderá ser pressionada por uma desvalorização cambial brusca.

Apesar de tudo, o país se en-contra em uma situação singular: existe a possibilidade de que a transferência de recursos da zona oriental ao altiplano esteja criando mercados reais, ao tirar parte da população de economias de sub-sistência. Isto só será sustentável se os níveis de investimento totais permitirem um aumento geral de produtividade.

2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 09e

POPULAÇÃO (MILHÕES) 8,82 9,03 9,23 9,43 9,63 9,83 10,03 10,23

PIB (VAR.%) 2,5 2,7 4,2 4,4 4,8 4,6 6,2 4,2

PIB (MILHÕES US$) 7.917 8.092 8.809 9.574 11.526 13.292 18.938 20.480

PIB PER CAPITA (US$) 897 897 955 1.016 1.197 1.352 1.889 2.003

PIB PC PPC 3.220 3.303 3.454 3.664 3.882 4.084 4.332 4.532

INFLAÇÃO % 2,4 3,9 4,6 4,9 4,9 11,7 11,9 16,0

DESEMPREGO URBANO % 8,7 9,2 6,2 8,1 8,0 7,7 7,7 8,1

IED (MILHÕES US$) 677,0 197,0 86,0 -288,0 281 204 N.D. N.D.

SALDO COMERCIAL (MILH.US$) -221 76 422 609 1.236 1.218 943 -330

PARADOXO ALTIPLÂNICO

FONTES: FMI, CEPAL, BANCO CENTRAL DA BOLÍVIA, INE BOLÍVIA. P/PROJETADO POR AEI

15 DE MARÇO, 2009 / AMÉRICAECONOMIA 65

VISÕES

“Em 20 de fevereiro de 1840, Palmerston deu a ordem. Em junho de 1840, todos os prepa-

rativos navais estavam completos. O Império Qing estava a ponto de sentir todo o poder do narcoestado mais bem-sucedido: o Império Britânico. Provavelmente somente um historiador inglês possua a liberdade e o triste humor para nos lembrar que uma parte significativa do capital que converteu o Reino Unido na potência financeira global do século 19 veio da imposição e do controle do tráfico de drogas no país mais populoso do planeta: a China. E que tal tráfico incidiu em converter o decadente Império médio em um Estado falido, com a consequente morte de 20 milhões a 40 milhões de pessoas.

Em The Ascent of Money (A ascensão do dinheiro), Niall Ferguson defende a tese tão clara quanto difícil de refutar de que “os mercados financeiros (e sua história) são o espelho da humanidade, revelando em cada hora de cada dia de trabalho a forma como valorizamos a nós mesmos e aos recursos do mundo à nossa volta”.

Assim, através de um relato agradável, encantadoramente bem-escrito, e em alguns momentos fascinante, este pesqui-sador de Oxford e professor de Harvard consegue conectar os desperdícios do Duque de Buckingham em seu palácio Stowe House em 1845 com a energia e as necessidades de crédito de Betty Flores, uma empreendedora que vende café em Alto, na Bolívia, em 2007.

Seu olhar sobre a inter-relação entre mercados hipote-cários, financeiros e o papel de certas forças políticas no fomento ao direito à casa própria como base do pacto social na origem das bolhas imobiliárias é magnífico.

O temperamento de Ferguson o obriga a ser audaz. Às vezes, em demasia. Ao escrever sobre o sucesso dos credit default swaps e outros derivativos no capítulo dedicado ao risco, ele augura que: “apesar de terem sido chamados de armas financeira de destruição massiva por investidores mais tradicionais como Warren Buffet (que, não obstante, fez uso dos mesmos), a visão em Chicago é de que o siste-ma econômico mundial nunca esteve mais bem-protegido contra o inesperado”.

Mas não se pode acusá-lo de soberba; ao contrário, de excessiva proximidade temporal: a kryptonita que tira o poder dos historiadores. Nada sabia, enquanto pesquisava para escrever o livro, sobre o que provavelmente se conver-terá em um dos autoenganos interessados mais famosos da história: a inutilidade da ferramenta de medição de riscos universal conhecida como “Gaussian copula function de

David X. Li”, que a revista Wiredrebatizou como “A fórmula que assassinou Wall Street”.

Não obstante, o ímpeto do autor da reconhecida “The War of the World” se destaca posi-tivamente na recompilação de como o mundo financeiro se moveu dos tempos imperiais ingleses à atual “Chimerica”, fusão de China e América (em inglês, quimera se escreve chimera e uma quimera é um animal monstruoso formado por pedaços de diferentes animais). Da mesma forma que em suas reflexões sobre os novos modelos que se focam nos sistemas financeiros como entornos onde as empresas e as práticas são regidas, ao menos parcialmente, pelas leis da evolução biológica.

Entre as páginas mais inquietantes se encontram as que interrelacionam os mercados de bônus e moeda com o estalido catastrófico da Primeira Guerra Mundial.

E mais inquietantes são as lições que Ferguson tira disso. “Na época, tanto quanto hoje, havia uma linha fina entre simbiose e rivalidade.” Naquele momento o centro financeiro do planeta estava em Londres, e o industrial, na Alemanha. Eram os EUA e a China do século 20. Os reis de ambos os países eram primos e ambas as econo-mias, se dizia na época, se necessitavam mutuamente. Pois bem. Os dois países, sem dar-se conta, decidiram arruinar-se.

“Outra importante lição da história é que guerras de grande alcance podem ocorrer ainda quando a globalização econômica está muito avançada e a posição hegemônica de um império de língua inglesa parece muito segura”, adverte. Com o agravante de que “quanto mais tempo o mundo viver sem um conflito maior, cada vez se tornará mais difícil imaginar que ocorrerá um (e, talvez, mais fácil se torna começar um). A atual crise econômica é um exemplo disso. “Como vemos repetidamente, as crises realmente grandes ocorrem justamente por estarem além da memória viva dos executivos bancários, fund managerse traders do presente”, diz.

Com carreiras médias de um CEO de cerca de 25 anos, ninguém tem memórias “vivas” prévias a 1983, dez anos depois da crise do petróleo de 1973 e 38 anos depois do final da Segunda Guerra Mundial.

Ler bons livros de História pode salvar negócios e vidas.

Rodrigo Lara Serrano

O ESPELHO RENTÁVELPesquisador conta a história das fi nanças modernas e aponta forças em ação tão terríveis quanto fascinantes

The Ascent of MoneyNiall Ferguson

The Penguin PressNova York

2008US$ 18

66 AMÉRICAECONOMIA / 15 DE MARÇO, 2009

LINHA DIRETA

[BUENOS AIRES]

MIG

UEL

CAN

DIA

Lembro-me perfeitamente da cena. A mulher do quiosque em Buenos Aires me entregou o troco, no qual vinha uma

moeda de peso falsa. “Ei, mais essa moeda é trucha”, disse a ela. Com a serenidade digna de uma especialista em negocia-ções com a Coreia do Norte, a mulher me respondeu: “Sim. Qual é o problema? Todo mundo a aceita, menos as máqui-nas nos ônibus”. Era 2002. Os gurus prognosticavam o peso argentino a 10 ou 15 por dólar e a volta da hiperinflação. Mas se as pessoas aceitavam as moedas falsas como boas é porque a economia estava desmonetizada, e em uma economia des-monetizada a velocidade de circulação do dinheiro tende a ser zero. Ou seja, longe de inflação, o que se via era deflação.

Então, a Argentina estava quebrada. O que fez para reagir? Duas coisas que os EUA levaram a cabo no século 19, a França no 18 e a Inglaterra no 17: repudiar sua dívida externa e emitir dinheiro sem respaldo.

O que aconteceu para que a Argentina tivesse que desva-lorizar a moeda? Algo muito comum: seus cidadãos e sua elite tinham se autoconvencido que um peso local equivalia a um dólar, tinham se endivi-dado massivamente em dólares (dedicados a consumir) e pensavam que sua produtividade era igual à norteamericana. Qualquer um se dava conta disso. Paul Krugman, por exemplo. O jovem Paul visitou o país em meados dos anos 90 e previu a catástrofe.

Nada tão excessivamente diferente acaba de acontecer nos EUA. O país tem vivido um padrão muito acima de seus meios, financiando-o com dívida externa. E agora que está emitindo para tentar tirar seu sistema bancário do caminho da quebra, os gurus se lamentam sobre a) a inflação que vem; e b) o endividamento terrível que está a caminho. Muitos dirão, “Mas Washington tem uma maquininha de fazer dólar, que é a moeda de referência mundial”. É verdade, e isso é algo que lhes dá uma vantagem especial em relação à Argentina dessa época. E, sobre a maquininha, naqueles dias havia mais que uma: quase duas dúzias.

De fato, as províncias argentinas, quebradas ou não, começaram a emitir suas próprias moedas: lecops, bocones epatacones foram as mais famosas. E por que as pessoas acei-tavam essas moedas truchas? Simples: necessitava-se algo que permitisse as transações. Obviamente dólares, euros e os escassos pesos eram usados como reservas de valor. As outras moedas, para fazer o sistema produtivo sair da paralisia.

À medida que o Estado recuperou o controle e voltou a ser solvente, elaborou-se um cronograma para dar fim a essas pseudomoedas. Isso pôde ocorrer porque as pessoas um dia se

deram conta de que todo o aparato industrial, agroin-dustrial e de serviços estava intacto. E suas

necessidades, também. Enquanto os gurus e o governo duvidavam, as pessoas e

os políticos locais que necessitavam pagar os salários o fizeram.

De forma inconsistente, eles emitiram “moeda com data de vencimento” apta para ser usada até que passasse o medo e as pessoas e os bancos dei-xassem de estar sentados em montanhas de dinheiro detido. Por isso, quando vejo que o Fed e o Banco da Inglaterra enchem os baús de seus ban-

cos, penso que não seria mal dar ao cidadãos uma segunda moeda

com data de validade, que não se pudesse economizar. (Ou uma versão

mais moderna: um cartão de débito com um montante creditado que seja obrigatório

usar antes de uma data determinada).Para quem se horrorizar com essas ideias, é preciso dizer

que não são nem novas nem “argentinas”. John Maynard Keynes e Irving Fisher acompanharam com muito interesse a criação de moedas locais no povo bavário de Schwanenkir-chen e em Wörgl, Áustria, durante a Grande Depressão. Foi um sucesso. As economias locais se reativam rapidamente. Isso os levou a avaliá-lo como um mecanismo para escapar da “armadilha da liquidez”, que Hitler logo universalizou. Mas como garantir que as empresas, além das necessidades da população, as aceitassem? Simples: permitindo o pagamento de imposto com elas.

Rodrigo Lara Serrano

BUSCAM-SE MOEDAS COM DATA DE VALIDADE

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