newen, 1997 - o desenvolvimento da filosofia da linguagem wittgensteiniana de 1929 a 1932

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    ALBERT NEWEN

    ODESENVOLVIMENTO DA FILOSOFIA DA LINGUAGEMWITTGENSTEINIANA DE 1929A 1932

    Marcos SilvaPs-Doutorando na Universidade Federal do Cear

    Bolsista FUNCAP/CAPES

    Natal, v. 22, n. 39

    Set.-Dez. 2015, p. 211-241

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    Princpios:Revista de Filosofia, Natal, v. 22, n. 39, set.-dez. 2015.ISSN1983-2109

    0. Ponto de partida e tese1Em um modo de considerar grosseiro diferenciado, na maioria

    das vezes, somente um jovem Wittgenstein de outro tardio, o autordo Tractatusde 1918 do autor das Investigaes Filosficas publi-cada postumamente em 1953. A riqueza dos escritos pstumos nospermite, entretanto, identificar uma imagem clara do desenvol-vimento de seu pensamento, onde se podem descobrir posies detransio [bergangspositionen] interessantes.

    Apesar da diferena nos modelos para o desenvolvimento dopensamento wittgensteiniano domina o consenso de que i) os anos

    de 1929-32 so especialmente importantes para a formao dafilosofia tardia, ii) que as observaes sobre filosofia da linguagemcompem o ncleo da filosofia wittgensteiniana e iii) que a discus-so da excluso das cores desempenha papel central nela. A exclu-so das cores afirma que duas cores no podem estar ao mesmotempo no mesmo lugar. Em funo do papel proeminente destetema, a investigao posterior de tal forma posta que primei-ramente a questo especfica esclarecida: como a filosofia da

    linguagem de Wittgenstein se modificou atravs das teses sobre aexcluso das cores no ensaio Some Remarks on Logical Form (emseguida, brevemente, como Some Remarks ou RLF) em compara-o com a sua posio no Tractatus Logico-philosophicus (em se-guida, brevemente, como Tractatusou TLP). mostrado que, j noSome Remarks, podemos encontrar um claro desenvolvimento[Weiterentwicklung] de sua filosofia da linguagem. Esta posio identificada como posio de transio do Tractatuspara uma teo-

    ria do significado [Bedeutung] baseada na noo de clculo2. Todas

    1Traduo feita a partir do original Die Entwicklung der WittgensteinischenSprachphilosophie von 1929-1932, Zeitschrift fr philosophische Forschung,Band 51 (1997), 3, p. 427-447. Agradeo a um parecerista annimo por valio-sas correes a uma verso anterior desta traduo. (N. T.)2 Traduzo Kalkltheorie der Bedeutung e Gebrauchstheorie der Bedeutungcomo teoria do significado baseada na noo de clculo e teoria do signi -

    ficado baseada na noo de uso, respectivamente. Embora esta escolha noseja a mais elegante em portugus, preserva o sentido orginal. Em tempo,

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    estas posies se movimentam em uma teoria da figurao3enten-dida de modo geral, que constantemente minada [unterhhlt]

    atravs das mudanas e somente em 1932/33 substituda[abgelst] por uma teoria do significado baseada na noo de uso.Este passo no ser mais discutido aqui. O modelo do desenvol-vimento da filosofia da linguagem de Wittgenstein pode sercaracterizado como a imagem da mudana global [insgesamt]abrangente, mas realizada gradativamente, da teoria do signifi-cado lingustico [Theorie der sprachlichen Bedeutung], na qual oensaio Some Remarksmarca uma clara etapa, que se direciona para

    uma teoria do significado baseada na noo de clculo4

    . Esta tese comprovada ao se mostrar que a teoria do significado lingusticono Tractatus, em Some Remarks5, nas Observaes Filosficase emWittgenstein e o Crculo de Viena em cada caso distinta e comoestas teorias gradativamente emergem umas das outras [ausein-ander hervorgehen].

    1. Classificao em uma discusso sobre o ensaio

    Some Remarks on Logical FormNo centro do ensaio Some Remarksde 1929 est a excluso de

    cores. Esta foi apresentada como um tema central para o desenvol-vimento de seu pensamento logo aps a publicao dos primeirostextos do esplio de Wittgenstein6. Por consequncia, ela encon-

    todas as tradues do alemo e de outros textos em ingls so de minharesponsabilidade. (N. T.)3 Acompanho aqui a traduo cannica de Luiz Henrique Lopes dos Santospara Bildtheorie e Sachverhalt como teoria da figurao e estado decoisas.(N. T.)4 Entretanto, todas estas etapas intermedirias [Zwischenstufen] merecemapenas condicionalmente a designao de teorias, porque elas so somenteposies sedimentadas no meio do caminho [halbwegs]. Elas tm mais umcarter de esboo.5Assim como na tradio alem, o importante artigo de Wittgenstein de 1929tambm comumente apresentado na discusso acadmica brasileira usando-

    se seu ttulo original em ingls. (N. T.)6Edwing B. Allaire: Tractatus6.3751. p. 104.

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    trou espao nas apresentaes gerais [Gesamtdarstellungen] dodesenvolvimento do pensamento wittgensteiniano7, onde Hacker

    atribui excluso de cores a maior importncia [Bedeutung] para odesenvolvimento: A primeira filosofia de Wittgenstein colapsa porconta de sua inabilidade para resolver um problema excluso decores8. Alguns novos trabalhos, entre os quais me remeto sobre-tudo ao ensaio de James Austin9, precisaram a imagem comum nasapresentaes gerais do desenvolvimento do pensamento deWittgenstein, concentrando-se no problema da excluso das cores: defendido que o ensaio Some Remarks marca a passagem da

    teoria da figurao no Tractatuspara a teoria do significado basea-da na noo de uso na filosofia tardia. J nas ObservaesFilosficas(PB) encontramos, correspondente a isto, uma primeiraverso da teoria do significado baseada na noo de uso que sganha ento uma forma mais sofisticada com os Cadernos Azul eMarrom(BB) at asInvestigaes Filosficas(PU). Um passo essen-cial nesta apresentao a aceitao de uma abrangente e rpidamudana da filosofia wittgensteiniana10.

    Ao contrrio disto Don Sievert tenta primeiramente mostrar quea soluo do problema da excluso das cores a mesma em SomeRemarks e nas Observaes Filosficas, e em seguida, que ela nocontm nenhuma renncia [Abkehr] da filosofia do Tractatus, mas, ao invs disso, compatvel com ela. A sua tese de que s h umaposio em Wittgenstein em relao excluso de cores se adequa

    7Dignos de observao so, sobretudo: Anthony Kenny: Wittgenstein, captulo6, p. 103-119 e P.M.S. Hacker:Insight and Illusion,p. 86-94.8P. M. S. Hacker:Insight and Illusion, p. 86.9 James Austin: Wittgensteins solution to the color exclusion problem. Cf.tb. Dale Jacquette: Wittgenstein and the color incompatibility problem.10 Em uma nova apresentao geral [Gesamtdarstellung], esta perspectiva defendida por Stephen Hilmy: A evidncia mostrou que no comeco da dcadade 1930, Wittgenstein j tinha mudado para a linguagem ordinria como odomnio apropriado da lgica e repudiado suas vises metalgicas anteriores,assim abrindo as portas para a investigao lgica de conceitos psicolgicos

    que o ocuparam tanto durante as ltimas duas dcadas de sua vida. StephenHilmy. The later Wittgenstein, p. 66.

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    nova apresentao geral de Merrill e Jaakko Hintikka, queprocuram provar uma continuidade muito abrangente entre os

    trabalhos de juventude e os tardios de Wittgenstein11

    .Quanto contenda entre James Austin e Don Sievert em rela-o ao papel da excluso das cores, gostaria de defender a seguintetese: Austin tem razo quando afirma que em relao exclusodas cores h posies diferentes a serem encontradas no Tractatus,no Some Remarks e nas Observaes Filosficas [e tambm nasconversas de Wittgenstein com o Crculo de Viena (WWK) queaconteceram paralelamente]12. Entretanto, a posio de transio

    [bergangsposition] no Some Remarks descrita incorretamente, sefor descrita como uma posio que marca a transio [bergang]da teoria da figurao para a teoria do significado baseada nanoo de uso. Isto tem por razo que, como Sievert mostrou, osaspectos acentuados por Austin, nomeadamente, a renncia[Abkehr] do discurso sobre fenmenos e a introduo do discursosobre regras, no so critrios suficientes para provar que a teoriada figurao do Tractatusfora em princpio recusada13. Um papel

    fundamental da teoria da figurao do Tractatuscontinua subsis-tindo longamente, a saber, a tese que o objetivo [Zweck] da lingua-gem seria a apresentao [Darstellung] da realidade [Wirklichkeit].Se ns entendemos com teoria da figurao sobretudo este aspec-to, ento se deixa mostrar que as modificaes do Tractatus emrelao ao Some Remarks at as Observaes Filosficas e asconversas em Wittgenstein e o Crculo de Vienaso modificaes dateoria da figurao. Entretanto, as modificaes vo to longe que

    o programa da anlise lgica da filosofia do Tractatus rejeitado, esimultaneamente preparam o ncleo para uma teoria do significa-do baseado na noo de uso. A teoria do significado baseada nanoo de clculo assume este estatuto intermedirio de uma amplaaverso [Abwendung] da teoria da figurao e de uma pr-etapa

    11M. e J. Hintikka:Investigating Wittgenstein.12

    J. Austin, p. 142.13D. Sievert, p. 306 et seq.

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    [Vorstufe] da teoria do significado baseado na noo de uso. Aavaliao das mudanas no ensaio Some Remarks chama ateno

    da seguinte maneira: j no Some Remarks encontramos umaprimeira etapa [Stufe] para a mudana na teoria do significadolingustico [sprachlichen Bedeutung] em Wittgenstein. Ela marcauma posio de transio [bergangsposition] importante para ateoria do significado baseado na noo de clculo, que por seuturno, uma posio de transio para uma teoria do significadobaseada na noo de uso.

    2. Os fundamentos comuns no Tractatus Logico-Philosophicus(TLP) e no Some Remarks on Logical Form(RLF)

    A tarefa da filosofia, em especial da teoria do conhecimento, determinada no Some Remarks on Logical Formda seguinte manei-ra:

    Onde a linguagem ordinria disfara a estrutura lgica, onde ela permite

    a formao de pseudoproposies, onde ela usa um termo em umainfinidade de significados diferentes, ns devemos substitu-la por umsimbolismo que d uma imagem clara da estrutura lgica, excluapseudoproposies e use seus termos de maneira no-ambgua.14

    A sua tarefa com isto a mesma que no Tractatus, pois ali oobjetivo da filosofia o esclarecimento lgico dos pensamentos (TLP4.112), onde, em TLP 3.335 e 4.002 e seguintes, as mesmasexigncias so vinculadas a isto: o evitar [das Vermeiden] de

    expresses com diversos significados [mehrdeutigen] e de pseudo-proposies atravs de um simbolismo lgico adequado. Em segui-da, se mantm a ideia fundamental da teoria da figurao[Abbildtheorie] como pano de fundo comum: uma proposio spode figurar a realidade, se as possibilidades lgicas de combina-o dos smbolos simples nas proposies forem as mesmas quenas possibilidades de ligao dos objetos simbolizados nos estados

    14RLF, p.20.

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    de coisas. Uma proposio s tem por isso um sentido, porque uma figurao lgica da realidade (TLP 4.03) e s o caso se a

    situao [Sachlage] por ela descrita puder existir. No menosimportante encontramos nos dois textos a mesma posio[Auffassung] sobre forma lgica: tem-se a forma lgica de umaproposio, caso se substitua todas as expresses no-lgicas daproposio por uma varivel15. A forma lgica de uma expresso[Ausdruck] determinada atravs de um critrio de substituio:duas expresses tm a mesma forma lgica, caso a substituiomtua [wechselseitige Substitution] em proposies arbitrrias no

    resulte no fato de que o valor de verdade da proposio se modi-fique ou que uma proposio significativa [sinnvollen] se torneuma sem sentido [sinnloser]16. A forma lgica de uma expresso caracterizada atravs das regras pelas quais fica determinado emque contextos de expresso ela pode ser usada de maneira signifi-cativa.

    3. As teses no Some Remarks on Logical Form

    Os pontos principais do curto ensaio se deixam resumir em duasteses:

    Primeira tese: Os fenmenos factuais [tatschlichen Phnomene](os fatos) no se deixam representar sem que nmeros ou outrasinformaes de graus [Gradangabe] sejam aplicados nas proposi-es elementares17.

    Ns s podemos alcanar uma anlise correta atravs de umainvestigao lgica dos fenmenos. Uma anlise dos fenmenos

    nos leva a aceitar espao, tempo, cor, sons etc. como fenmenosno-analisveis, isto , predicados de espao, tempo, cor e sons,

    15TLP 3.315; RLF p.2016TLP 6.23. No RLF, nada dito sobre a forma lgica das expresses [Aus-drcken], mas em conversas com o Crculo de Viena, assim como no Tractatus,o critrio de substituio expliciamente mencionado mais tarde (WWK, p.46, 22/12/1929), de maneira que fcil aceitar [nahe liegt anzunehmen] que

    o correspondente no Some Remarksno mudou.17RLF, p.23.

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    etc. so expresses primitivas que no desaparecem em umaanlise lgica das proposies, nas quais elas aconteam. Para

    estes predicados caracterstico que haja um nivelamento gradual[graduelle Abstufung18]. Quando descrevemos fenmenos, nosquais uma propriedade com nivelamento gradual [gradueller Ab-stufung] do fenmeno est envolvida, ento a descrio s possvel, por exemplo, se um nmero do grau for dado a umapropriedade. Porque tambm estados de coisas simples pertencemaos fenmenos factuais, que por exemplo so descritos com predi-cados de cores, ento nmeros e outras informaes de grau

    [Gradangabe] devem ser aplicados em proposies elementares.Segunda tese: Proposies elementares de fato no podem secontradizer, mas possvel, que elas se excluam19.

    Uma contradio tem sempre a forma p. p. A conjuno deduas proposies elementares que se excluem tem uma outra for-ma, por exemplo, RPT & BPT, onde RPT: a cor R se encontra notempo T no lugar P e BPT: a cor B se encontra no tempo T nolugar P. A excluso se origina, porque as duas proposies so em

    certo sentido completas. A forma ( ) PT s deixa lugar para umobjeto [Gegenstand], i.e., ela s pode ser completa, para um P e Tfixos, por um predicado de cor. Uma anlise dos fenmenos darealidade revela que duas cores no podem estar ao mesmo tempono mesmo lugar. Para se afigurar esta realidade de maneira ade-quada na linguagem, a possibilidade de formar a conjuno RPT &BTP, deve ser excluda na linguagem, pois seno a linguagem teriauma multiplicidade maior que a da realidade. No caso de duas

    proposies com as quais dois graus diferentes de uma proprie-dade so atribudos ao mesmo objeto, deve-se excluir a possi-bilidade lgica que pertence ao conectivo [Junktor] comum e queduas proposies articuladas com ele possam ser verdadeiras.

    18Graduelle Abstufung uma expresso redundante no alemo tanto quantonivelamento gradual em portugus. Porque podemos compor expresseshbridas de origem latina e de origem germnica na lngua alem, a redun-

    dncia no fica to evidente. (N. T.)19RLF, p. 25.

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    RPT BPT

    (V V)

    V F

    F V

    F F

    Esta proibio s pode ser capturada atravs de uma regraadicional da sintaxe lgica: Estas regras tm de nos dizer que nocaso de certos tipos de proposies atmicas descritas em termos das caractersticas defini-das do simbolismo certas combinaes de Ts e Fs tm de ser deixa-das de lado20. Estas regras adicionais so regras limitadoras tantopara o conector e quanto para todas as propriedades que soresponsveis pela forma lgica especial ( )PT.

    4. Apresentao das mudanas em relao s teses noTractatus

    No Tractatus, Wittgenstein no considerou o fenmeno da ex-cluso de cores com a forma RTP & BPT como uma impos-sibilidade lgica fundamental, mas sim como uma impossibilidadelgica superficial, que poderia ser reduzida atravs da anlise

    lgica a uma contradio da forma p . p. Esta avaliao se ba-seia no postulado da independncia para proposies elementarese estado de coisas21. Ele afirma, para proposies elementares, quenenhuma proposio pode estar em contradio com ela. Porqueduas afirmaes sobre cores [Farbaussagen], que se apresentem naforma de RPT & BPT, formam uma contradio, Wittgenstein tira

    20

    RLF, p. 27-28. [N. T.: em ingls no original, p. 171.]21TLP 2.061, 4.211, 5.134.

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    a consequncia que elas no podem ser proposies elementares22.Ao contrrio disso, no Some Remarks, ele desiste do postulado da

    independncia para proposies elementares e estado de coisas,porque ele est convencido que no existe uma anlise das propo-sies com predicados de cores, nas quais estes possam desapa-recer a partir de predicados no-graduais23: Eu mantenho que emuma sentena que atribui um grau a uma propriedade no possvel levar a anlise a diante.24

    As mudanas que so tomadas a partir da filosofia do Tractatuss podem ser adequadamente entendidas se o papel do postulado

    da independncia no Tractatusfor considerado e se for mostrado oque est sendo recusado, consequentemente, com esta exigncia.Conjuntamente com o postulado da independncia se desiste pri-meiramente que a impossibilidade lgica tenha a forma p . p(TLP 5.1241). Se proposies elementares so dependentes umasdas outras, ento uma impossibilidade lgica pode tambm teroutra forma, o que fica claro com as afirmaes sobre cores[Farbaussage]. A independncia de proposies elementares suge-

    re, em seguida, que a proposio elementar s possa ter exata-mente uma forma de negao. Se uma proposio elementar daforma f(a)25 no possa tersomente um oposto [Gegenteil] contra-ditrio, mas sim tambm um oposto contrrio26 diferente, ento

    22TLP 6.375123Um importante gatilho [Auslser] para esta mudana a crtica de Ramseyem uma discusso do Tractatus, Frank Ramsey, Resenha do Tractatus,Mind,32, 1923. [N. T.: H uma traduo brasileira na Revista Philosophos, 17,2012.] Para a apresentao da influncia de Ramsey, v. Dale Jacquette, p. 356et seq.24RLF, p. 25.25f indica uma propriedade e a um indivduo.26Aqui particularmente difcil traduzir kontrres Gegenteil. Esta dificuldadetambm se remete mesma peculiaridade, aludida acima, da lngua alem emconstruir expresses de origem hbrida permitindo redundncias. Gegenteilusualmente traduzido ao portugus como contrrio, mas neste contexto

    perderamos a diferenca central entre Gegenteile kontrres, por isto opteipor oposto. (N. T.)

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    isto significa que No o caso que a f diferente de a no f.A atribuio da propriedade no ser f , por consequncia, porm

    somente diferente da proposio No o caso que a f, se f foruma propriedade gradual. Se f for uma propriedade gradual,ento existem proposies elementares que so excludas por f(a).Assim se perde o postulado da univocidade da negao dasproposies elementares. Para isto necessrio se diferenciar ooposto contraditrio e contrrio. Assim se desiste de uma terceiracaracterstica do Tractatus, a saber, que em proposies elementa-res no apaream sinais lgicos. Porque uma negao interna e

    uma externa devem ser diferenciadas, a forma lgica de umaproposio pode no ser mais visvel, sem que o sinal de negaoaparea em proposies elementares. Como um quarto pontopodemos manter que a sintaxe dos sinais lgicos no pode mais serdeterminada sem a considerao do tipo de proposies logica-mente articuladas. Como ns vimos no exemplo da excluso desentenas sobre cores [Farbaussagen], a sintaxe de e depende dasproposies da forma ( )PT estarem vinculadas entre si. Porque

    em tais formas de proposies [Satzformen] a estrutura interna daproposio se torna relevante para a sintaxe dos conectivos[Junktors], se segue que a anlise completa da proposio, que constituda por uma articulao de proposies elementares pormeio de smbolos lgicos, no pode mais mostrar [zeigen] suaestrutura lgica sem a considerao da estrutura interna dasproposies elementares. forma lgica de uma proposiopertencem a estrutura interna da proposio elementar tanto

    quanto as regras da sintaxe lgica que excluem determinadasarticulaes de proposies [Satzverbindungen]. A quinta conse-quncia significa que as proposies centrais TLP 5 e 6 devem serlimitadas [eingeschrnkt]. A proposio no mais simplesmenteuma operao de verdade de proposies elementares que podemser determinadas atravs das tabelas de verdade para os smboloslgicos, mas sim as operaes de verdade esto sujeitas alimitaes que so expressas atravs de regras complementares da

    sintaxe lgica. A forma geral da proposio [allgemeine Satz-

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    form27], proposta em 6, se evidencia, pela mesma razo, comoespecfica demais. O sexto ponto, e este um ponto central:

    eliminada uma contradio escondida no Tractatus com a recusado postulao da independncia para proposies elementares epara estado de coisas. Para a ontologia, este passo para a elimi-nao da contradio significa que a construo do mundo naforma de uma lgebra booleana construda a partir de estado decoisas elementares perdida: No vale mais que cada articulaode estado de coisas caracteriza um corte do mundo possvel [einenmglichen Weltausschnitt] (ou um mundo possvel), porque algu-

    mas articulaes de estado de coisas esto excludas28

    .Como estas numerosas mudanas podem ser avaliadas dependede qual papel elas desempenham para a central pretenso dafilosofia do Tractatus. Como pretenso central interpretada a

    construo de uma teoria do significado lingustico [Theorie dersprachlichen Bedeutung], de maneira que nas prximas sees seinvestiga de que modo a teoria do significado lingustico semodifica atravs da recusa do postulado da independncia.

    5. A mudana da teoria do significado atravs da recusado postulado da independncia

    Antes que avalie as mudanas em Some Remarkspara a teoriado significado lingustico, gostaria de primeiramente rejeitar aargumentao de Sievert de que no h diferena essencial notratamento da excluso de cores no Tractatuse no Some Remarks.Sievert descreve a posio do Tractatusdesta maneira: As contra-

    partes lingusticas da incompatibilidade das cores so (i) a noocorrncia de nenhuma tal atribuio de cor em uma linguagemrestrita afirmao de verdades e (ii) a afirmao metalingusticaverdadeira que no exista tal atribuio verdadeira em uma

    27 No original, Wittgenstein no usa allgemeine Satzform, mas algemeineForm des Satzes. (N. T.)28

    A. Newen: Interpretation und Rekonstruktion der Ontologie in Wittgen-steins Tractatus, p. 34.

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    linguagem objeto.29Segundo Sievert, decisivo o terreno comumentre o Tractatus e o Some Remarks, quando se trata de uma im-

    possibilidade lgica na excluso de cores. Isto se mostrasegundo oTractatus, porque numa linguagem que s descreve fatos (que constituda somente por proposies verdadeiras), de fato noaparece [auftritt] nenhuma conjuno da forma RTP & BTP. Por-que no Some Remarksa diferena entre dizer e mostrar permaneceem vigor, a excluso das cores no detectada neste ensaio atra-vs de uma descrio comum, mas sim atravs de uma regrametalingustica.30

    A apresentao de Sievert da excluso das cores no Tractatusinadequada e com isto colapsa tambm a afirmao de umacontinuidade essencial no tratamento do problema: no Tractatusno esboada nenhuma teoria de uma linguagem que s constituda de proposies verdadeiras. uma caractersticaessencial das proposies que elas tenham sentido independentede serem verdadeiras ou falsas. Isto capturado pela teoria dafigurao no Tractatus31. Em uma proposio se mostra, segundo o

    Tractatus, primeiramente, como as coisas esto32, caso a proposi-o seja verdadeira (TLP 4.022). Segundo ponto: outras proprie-dades internas se mostram independentemente da verdade oufalsidade de proposies, por exemplo, se mostra nas proposiesf(a) e g(a) que ambas falam do mesmo objeto (TLP 4.1211). De

    fato vale no Tractatusa doutrina que todas as propriedades inter-nas ou formais se mostram33, contudo precisamente a propriedadeformal da excluso de cores no pode ser capturada assim: porque

    se trata aqui de uma impossibilidade lgica (TLP 6.375 e seguin-tes) e uma impossibilidade lgica no se mostra atravs de umacombinao no aparecer [auftritt] de fato. Se uma combinao de

    29D. Sievert, p. 306.30Ibidem.31TLP 4.01 junto com o TLP 2.22 e 2.221.

    32Sigo aqui a traduo de Luiz Henrique dos Santos para Es verhlt isch so

    und soem 4.5. (N. T.)33TLP 4.12 et seq., 4.124.

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    objetos de fato no aparece [auftritt], ento fica em aberto noTractatus, se isto apenas casual, ou se esta combinao em prin-

    cpio no pode aparecer [auftretten]34

    . No Tractatusno h nenhu-ma possibilidade da excluso das cores poder se mostrar. Por estarazo, Wittgenstein estendeu, no Some Remarks, a sintaxe doTractatus.

    A anlise lgica de uma proposio da linguagem corrente[umgangsprachlichen Satzes] apresenta, segundo o Tractatus, comoresultado, uma srie [Reihe] de proposies elementares, que soarticuladas umas com as outras atravs de sinais lgicos [logische

    Zeichen]. Esta concepo se mantm ainda no Some Remarks. As-sim vale para ambos os textos que o significado lingustico deproposies complexas reduzido ao significado lingustico daproposio em uma forma analisada. caracterstico do Tractatusque o significado [Bedeutung] de uma proposio complexa de-terminado atravs de quatro aspectos, a saber:

    a) atravs de definies (explcitas), as quais reduzem [zuruck-

    fhren] sinais complexos a sinais simples ou diretamenteaos sinais mais simples, os nomes (cf. TLP 3.261);

    b) atravs do processo de anlise lgica, com o qual proposi-es complexas so transformadas em proposies simples(cf. TLP 3.25, 2.0201);

    c) atravs da relao de substituio [Vertretungsrelation] en-tre os nomes, que ocorrem nas proposies elementares dasproposies logicamente analisadas, e os objetos no mundo

    34Segundo o Tractatus, se se mostraque, por exemplo, uma combinao deum indivduo com uma relao no possa ocorrer, ento isto se mostra naforma lgica do objeto: Neste exemplo, se mostra a impossibildade lgica,porque uma combinao desta forma no pode formar um estado de coisas[Sachverhalt], entretanto no atravs, que de fato, nenhum fato [Tatsache] encontrado, que constitudo somente de um indivduo e uma relao. Umaexplicao da diferena primria entre limitao sinttica, que considerada

    no Tractatus, e as que se tornam necessrias atravs da excluso das cores,ser dada nas pginas seguintes.

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    (cf. TLP 4.0311, 4.0312); ed) atravs das operaes de verdade, que pertencem aos sinais

    lgicos (ou atravs da forma geral da proposio) (cf. TLP5.101 ou TLP 6).

    No Tractatus, h no nvel da proposio logicamente analisadadois modos pelos quais o significado lingustico [sprachlicheBedeutung] das expresses simples contidas ali pode ser deter-minado. Caso a expresso simples for um sinal lgico, ento assim determinado o seu significado lingustico atravs de uma

    tabela de verdade (d). Caso a expresso mais simples seja um sinal[Zeichen] no-lgico, assim o seu significado lingustico o objetoindicado por ele.(c) O significado lingustico de sinais complexos reduzido completamente, atravs da anlise lgica (b) e de defini-es explcitas (a), ao significado lingustico de sinais simples.Porque o significado das proposies complexas o mesmo que osignificado da proposio em uma forma completamente anali-sada, pode-se indicar os aspectos c e d como constitutivos de

    significado em um sentido estrito; ao contrrio disto, so osaspectos a e b somente um meio de transferncia [Mittels desTransfers] do significado de sinais simples de uma proposioanalisada para proposies complexas da linguagem corrente[normalsprachlichen Stzen].

    O ncleo da teoria do significado lingustico que esclarece arelao entre nomes e objetos a teoria da figurao do Tractatus.A lgica desempenha nela um papel especial. teoria da figurao

    pertence a tese que existe somente uma forma lgica, que aforma da realidade [Wirklichkeit] (TLP 2.18 e seguintes]. Umaconfigurao de sinais s pode ento afigurar um estado de coisas[Sachverhalt], caso ela tenha a mesma forma do estado de coisas,isto , caso ela seja logicamente estruturada como a realidade. Osobjetos possuem uma forma lgica e os nomes recebem, com aprojeo de uma proposio ao estado de coisas, a mesma formalgica daqueles objetos representados. essencial para a filosofia

    do Tractatusque somente exista umalgica a qual seja ao mesmo

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    tempo a lgica do mundo e a sintaxe lgica da linguagem: algica no uma teoria, mas sim uma imagem especular do

    mundo35

    . Neste ponto, Wittgenstein mudou sua opinio nos anos20. Estimulado por palestras de Brouwer36, ele assumiu a posiodo intuicionismo lgico, segundo a qual uma lgica no conside-rada como a estrutura dada do mundo, mas sim como um clculoconstrudo para um determinado objetivo. Com isto, o rtulo algica perde o seu sentido, porque existem muitas lgicas com os

    mesmos direitos [gleichberechtigte], as quais somente poderiam serselecionadas relativamente a um determinado objetivo de uso

    [Verwendungszweck].No contexto desta mudana fica compreensvel a expanso[Erweiterung] da teoria do significado lingustico no SomeRemarks. Ao lado dos aspectos c e d, algumas regras devem aindaser consideradas, as quais cuidam que a proposio logicamenteanalisada tenha a mesma multiplicidade lgica [logische Mannig-faltigkeit] da realidade [Wirklichkeit], porque, em oposio aoTractatus, a estrutura lgica dos nomes no ainda completa-

    mente determinada a partir da correspondncia entre nomes eobjetos. O significado lingustico de algumas expresses simplesso determinadas adicionalmente atravs:

    e) de regras, fixadas para alguns determinados tipos de propo-sies elementares, que certas proibem combinaes de V eF.

    A considerao adicional destas regras em razo de trs carac-tersticas uma ampliao [Erweiterung] essencial: Primeiro ponto,as regras chamadas abaixo de e (eu falo de regras da forma e)

    no correspondem a umaexpresso lingustica, apesar delas per-tencerem ao nvel de proposies analisadas, mas sim elas

    35TLP 6.13.36 Compare com a discusso da influncia de Brouwer na formao do

    verificacionismo de Wittgenstein: M. Wrigley. The origins of Wittgesnteinsverificationism, p. 271-275.

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    produzem [herstellen] uma ligao entre os sinais lgicos e ospredicados graduais ou com as proposies elementares formadas

    com eles. Segundo ponto, pode-se construir [aufstellen] uma outrasintaxe lgica, mudando as regras de forma e deixando osaspectos a at d constantes. Terceiro ponto, as limitaes sintticasque tambm so consideradas no Tractatus so de outro tipo queas regras de forma e, porque as primeiras esto implcitas na teoriada figurao e a as ltimas, ao contrrio, no esto.

    A primeira caracterstica significa que o significado lingusticode alguns sinais simples de uma proposio logicamente analisada

    no mais completamente determinado, caso o significado lingus-tico de outros sinais simples permaneam desconsiderados. Asegunda caracterstica permite se falar de diferentes sintaxes lgi-cas em relaes de substituio constantes [konstanter Vertretungs-relation] entre nomes e objetos. Porque a forma lgica expressa(se mostra) na sintaxe lgica, pode-se, ao contrrio disso, marcar aposio do Tractatus da seguinte forma: uma configurao desinais que no tenham asintaxe lgica, no pode de forma alguma

    ser uma figurao [Bild]. Com a ampliao atravs das regras deforma e no Some Remarks se perde a univocidade [Eindeutigkeit]da lgica: Com isto para uma configurao de sinais simples poderser uma figurao, alm disso suficiente que os aspectos c e dsejam satisfeitos, isto , preciso que para cada sinal no-lgico deuma proposio elementar seja atribudo um objeto e as operaesde verdade de sinais lgicos devem ficar fixas [mssen feststehen].Assim permanecem [verbleiben], contudo, tantas possibilidades de

    limitar figuraes quanto existem possibilidades de determinarregras adicionais de forma e. Porque Wittgenstein em SomeRemarksest convicto que a linguagem deva ter as mesmas possi-lidades que a realidade, deve ser dado um conjunto de regrasadicionais de forma e que devem ser selecionadas [heraussondiert]de possveis figuraes, que satisfaam as nomeadas exigncias. essencial em relao segunda caracterstica, que a sintaxe lgicano mais expresse as condies de figurao [Abbildung], porque

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    se alguma coisa pode ser uma figurao, isto j fixo sem as regrasde forma e, enquanto a sintaxe lgica determinada a partir delas.

    A terceira caracterstica pressupe uma determinada interpreta-o da ontologia do Tractatus, a saber, a aceitao que aos seusobjetosno so somente indivduos, mas tambm propriedades erelaes n-rias37. A forma de um objeto , segundo o Tractatus, apossibilidade de sua ocorrncia em um estado de coisas (TLP2.0141). Se aos objetosno Tractatustambm pertenam univer-sais, ento no ocorrem determinadas articulaes [Verbindungen]de objetos no mundo, por exemplo, a articulao de um nico

    indivduo com uma relao binria, porque esta no figura umfato. Correspondentemente, h uma limitao sinttica para asexpresses simples, por exemplo: um nome no pode formar umaproposio em ligao com uma expresso de relao, massomente em ligao com uma palavra de propriedade [Eingen-schaftswort]. Limitaes sintticas desta forma so contidas impli-citamente na teoria da figurao: No possvel fazer a ligao deum nome com uma expresso de relao atravs de uma projeo

    a uma figurao [Bild], porque a ligao de expresses no umaproposio e somente proposies tm uma forma lgica parapoder figurar um estado de coisas. Quando ns ligamos [ver-binden] uma expresso relacional binria, por exemplo, ser idn-ticocom um nome Scrates, ento a estrutura que parece umaproposio [satzartige Gebilde] no tem sentido, porque o nomenecessita de uma palavra de propriedade [Eingenschaftswort] comocomplemento, e na proposio aparente Scrates idntico a

    palavra idntico, como palavra de propriedade, no tem signifi-cado [Bedeutung]38. As limitaes sintticas so parte da teoria dafigurao porque as partes da proposio [Satzteile] somente setornam em estados de coisas, indicaes [Bezeichungen] de indiv-duos, propriedades e relaes a partir da projeo de sinais

    37 Sobre a pergunta a respeito dos universais no Tractatus: W. Sellars,Naming and saying; I. Copi, Objects, properties and relations; A. Newen,

    Interpretation und Rekonstruktion der Ontologie in Wittgensteins Tractatus.38TLP 5.4733

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    proposicionais [Satzzeichen]. Diferentemente se comportam asregras de forma e. Caso, atravs de uma projeo de sinais propo-

    sicionais [Satzzeichen] em um estado de coisas, j esteja fixo o queos sinais simples indicam, ento as regras de forma e garantemadicionalmente que os sinais no tenham um espao de manobralgico [logischen Spielraum] maior que o representado [Be-zeichnete]. Enquanto no Tractatusa forma lgica do representadofica completamente fixa com a correspondncia dos sinais e dorepresentado, ela somente fica completamente determinada, noSome Remarks, com as regras de forma e.

    Eu gostaria de continuar ainda esclarecendo o significado dasmudanas no Some Remakrs, mostrando quais papis desempenhaa introduo de regras de forma e no processo de mudana dafilosofia wittgensteiniana de 1929 a 1931/3239.

    6. Classificao do Some Remarks on Logical Formnodesenvolvimento da filosofia wittgensteiniana dalinguagem

    Tese: A introduo de regras de forma e , por um lado, umprimeiro passo para uma reduo ao absurdo da teoria da figura-o do Tractatuse, por outro lado, um primeiro passo na constru-o de uma teoria do significado lingustico baseada na noo declculo. Ambos os processos so estreitamente ligados um ao outroe marcam, alm disso, a virada de uma filosofia da linguagemideal para a filsofia da linguagem corrente [normalen Sprache].Estes trs aspectos do desenvolvimento da filosofia wittgensteini-

    ana sero esclarecidos a seguir:Uma reduo ao absurdo da teoria da figurao se sucede como

    consequncia de Wittgenstein descobrir [aufdeckt] mais formas de

    39Sero consideradas alm do Tractatuse do Some Remarks on Logical Form,sobretudo os escritos publicados nos volumes 2 e 3 da obras editadas pelaSuhrkamp. O volume 2 contm sobretudo as Observaes Filosficas(PB). No

    volume 3 se encontram as anotaes de Waismann de conversas, que Wittgen-

    stein, do fim de 1929 a meados de 1932, conduziu com os membros do Crcu-lo de Viena.

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    proposies, que no poderiam ser uma figurao da realidade[Bild der Wirklichkeit], sem que fosse um passo importante atribuir

    a elas um significado lingustico. No Tractatus, as proposies dalgica so caracterizadas como sem sentido [sinnlos] e proposiesticas, estticas e religiosas como absurdas [unsinnig]. Ambos ostipos de proposies no so figuraes. As proposies da lgicamostram a estrutura da realidade e da linguagem. Ao contrriodisto, sobrevem com o emprego de proposies ticas, estticas ereligiosas somente uma tentativa de expresso que vai de encontroaos limites da linguagem.

    Em seus trabalhos posteriores Wittgenstein se ocupou semprenovamente com proposies que expressam impossibilidades enecessidades lgicas. Em Some Remarks so excludas, atravs deregras de forma e, que a um objeto em um instante [Zeitpunkt]sejam atribudos dois diferentes valores de uma propriedade, porexemplo, Este ponto vermelho no tempo T e este ponto azul no tempo T. A excluso desta proposio no contextoda teoria da figurao diz que ela no tem nenhum significado

    lingustico. J em dezembro de 1929 Wittgenstein considerou pro-posies da forma eu no posso sentir a sua dor40. A negao dasproposies deste tipo expressam uma configurao impossvel darealidade, que correspondentemente no pode tambm ser figura-da na linguagem. A sintaxe deve portanto ser ampliada a partir deregras de forma f. Estas so segundo Wittgenstein regras queindicam como a expresso eupode ser eliminada da linguagem41.Outros exemplos de proposies se do em um contexto de consi-

    derao de um jogo de xadrez. o cavalo s pode se movimentarem L, o bispo somente na diagonal e a torre somente em linhareta42. As regras de forma ee f que estavam at agora disposiono excluem estas proposies. Se algum quisesse salvar a teoriada figurao, deveria aqui ainda introduzir outras regras da sinta-

    40WWK, p. 49, 22/12/1929.41Ibidem.42

    WWK, p. 104, 19/06/1930. Exemplos adicionais para tais proposies, queWittgenstein chama de proposies da sintaxe, se encontram em PB, p. 218.

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    xe, que excluam a formao destas proposies. Sobre isto no seacha mais em Wittgenstein nenhuma considerao [berlegung],

    porque as consideraes sobre jogo de xadrez marcam a transiopara a teoria do significado baseada na noo de clculo e com istono mais negado que estas proposies tenham um significadolingustico, apesar de no figurarem nada. Ele toma estas proposi-es como postulados sobre o modo da descrio de fatos43. A re-duo ao absurdo da teoria da figurao fica ainda mais claraquando Wittgenstein percebe quo modesta parte das proposiesda linguagem corrente [normalsprachlichen Stze] ele pode expli-

    car o significado lingustico, porque a teoria da figurao o obrigaa se concentrar em afirmaes. Ao contrrio disso, na teoria dosignificado baseada na noo de clculo no se encontra proble-mas para tratar de imperativos, por exemplo44. Apesar disto, aconsiderao do papel de uma proposio dentro de um sistema deproposies ou ento dentro de um clculo no tem por conse-quncia imediata a rejeio de uma teoria da figurao. Ao contr-rio disto, permanece primeiramente uma caracterstica principal da

    teoria da figurao, a saber, a perspectiva que a finalidade da lin-guagem poder representar a realidade. A introduo de regras desintaxe considerada primeiramente como um mecanismo maiscompleto para o alcance deste objetivo: As regras para o produtolgico etc. no so mesmo independentes de outras regras dasintaxe. Ambas pertencem ao mtodo de figurao do mundo [Ab-

    43PB, p. 218: [...] e a soma dos ngulos de um tringulo so 180 graus querdizer, caso a soma no se mostrar sendo 180 graus quando medida, vou tom-la como um erro de medida. A proposio um postulado sobre o modo dadescrio de fatos.44 Sobre uma garrafa cheia de gasolina que traz uma etiqueta Gasolina,Wittgenstein observa: Esta etiqueta agora um ponto de apoio[Angriffspunkt] para o clculo, a saber, para o uso. Com efeito, eu posso dizerpara o senhor: Pegue, por favor, a gasolina! E atravs desta etiqueta h umaregra, a partir da qual o senhor tem que proceder. Caso o senhor pegue a

    gasolina, isto tambm novamente um passo naquele clculo, que determinado atravs de regras. WWK, p. 168, 21/09/1931.

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    bildung der Welt]45. Uma radical recusa da teoria da figurao sesucede apenas com a desistncia da integrao de um propsito da

    linguagem teoria do significado lingustico. Com a formao deuma teoria do significado baseada na noo de uso, Wittgensteintoma suas investigaes gramaticais como independentes dasinvestigaes de um propsito da linguagem46. O caminho da for-mao da teoria do uso no aqui mais um problema. Com esteesboo curto, deve ter ficado claro que a introduo de regras daforma e para proibir afirmaes sobre a incompatibilidade de cores um importate passo na introduo de uma reduo ao absurdo

    de uma teoria da figurao.O segundo aspecto o papel das mudanas no Some Remarkspara a construo de uma teoria do significado lingustico baseadana noo de clculo que ocorre paralelamente reduo ao absur-do de uma teoria da figurao. Um primeiro passo ser completadocom a considerao de regras da forma e. Wittgenstein caracterizaestas regras em janeiro de 1930 como o que liga [verbinden] pro-posies a sistemas de proposies [Satzsysteme]: Toda proposi-

    o est em um sistema de proposies, que colocado contra arealidade como uma rgua47. Para o significado de uma proposi-o (especialmente uma proposio elementar) essencial saber-mos as ligaes [Verbindungen] dela com outras proposies. Porisso, no mais possvel dar o significado lingustico de umaproposio, sem dar a sua rede de ligaes com outras proposies.Esta rede de ligaes tambm caracterizada como uma rgua quefaz, primeiramente, uma medio possvel. O segundo passo que

    45WWK, p. 81, 2/1/1930.46Uma clara tomada de posio a este respeito se encontra, no mais tardar,emBig Typescript(TS 213) do ano de 1933 no pargrafo 44, p. 191-195: Umsinal est l de fato sempre para um ser vivo, assim este ser deve ser essencialpara o sinal. Certamente: tambm uma poltrona est l sempre somente paraum ser humano, mas ela se deixa descrever sem que ns falemos de umpropsito. De fato, no fim ns no falamos nada sobre as propriedades dossinais, porque estas no nos interessam, mas somente as regras (gerais) de seu

    uso (p. 192).47WWK, p. 76, 2/1/1930.

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    uma tal rede de ligaes [Netz der Verbindungen] melhor compre-endida como um conjuto de regras que constituem um jogo. Esta

    perspectiva sugerida atravs da comparao da linguagem comum jogo de xadrez. Com esta comparao desenvolvida umateoria do significado lingustico baseada na noo de clculo, aqual eu gostaria de esboar de maneira curta:

    A sintaxe da linguagem comparada com as regras do jogo dexadrez: A verdade do formalismo a que toda a sintaxe se deixainterpretar como um sistema de regras de um jogo48. Wittgensteincaracteriza um sistema de regras como um clculo49. Os sinais

    [Zeichen] que so utilizados em um clculo recebem o seu signi-ficado no clculo atravs das regras, que constituem o clculo50.Assim como a figura de um peo no jogo de xadrez ganha seusignificado no jogo de xadrez atravs das regras do jogo paraesta figura, assim ganha um sinal lingustico seu papel (signifi-cado) na sintaxeatravs das regras da sintaxe:

    48WWK, p. 103, 19/6/1930.49Com isto, Wittgenstein no quer apenas introduzir uma analogia vaga, massim oferecer uma nova explicao para o significado de expresses lingus-ticas: Existe, pois, entre o modo de uso [Verwendung] de nossas palavras nalinguagem e em um clculo no algo como uma mera analogia, mas sim euposso de fato interpretar o conceito de clculo de tal modo que a aplicao[Anwendung] de palavras includa nele. WWK, p. 168, 21/09/1931. [N. T.:Se as notas de Waismann estiverem de fato corretas aqui, claro que Wittgen-stein usa em um mesmo pargrafo as palavras Verwedung e Anwendung.Entretanto, uma distino mais refinada, apesar de central (e difcil de tradu-zir) em sua filosofia tardia, no me parece desempenhar papel relevante nestecontexto histrico do WWK. De toda forma, uso uso para Verwendung epara aplicao, Anwendung para marcar a distino de palavras, embora adistino conceitual entre as duas em um contexto de discusso menos formalseja mnimo.]50O sistema de regras que determinam um clculo tambm determinam comisto o significado [Bedeutung] de seus sinais. Dito de maneira mais correta:

    A forma e as regras sintticas so equivalentes. Se eu mudar as regras com-

    plemento-as com algo aparente desta forma eu mudo a forma, o significado[Bedeutung] (PB, 152, p. 178).

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    Eu no posso dizer: Este um peo epara esta figura valem esta e aque-la regras do jogo. Mas sim as regras do jogo determinamantes esta figu-ra: O peo a soma das regras atravs das quais ele movimentado

    (tambm o campo uma figura), assim como na linguagem as regras dasintaxe determinam o lgico [das Logische] na palavra.51

    Para o uso do conceito de clculo essencial que Wittgensteinarticule com isto a diferena comum na matemtica entre clculo esua interpretao52. O clculo um sistema de regras que determi-nam quais passos [Zge] podem ser feitos no sistema de regras. Asregras do jogo de xadrez, por exemplo, determinam quais jogadas

    [Zge] podem ser feitas com as figuras. O clculo recebe umainterpretao somente quando, por exemplo, o clculo do jogo dexadrez aplicado a uma batalha entre pessoas, que representadacom o jogo de xadrez.53De acordo com isto a sintaxe como clculosomente determina quais combinaes de sinais so permitidas,quais relaes lgicas existem entre sinais complexos, e assim pordiante. Desta forma fica ainda em aberto como a sintaxe aplicadaou interpretada. A sintaxe determina somente o papel sinttico das

    expresses lingusticas, mas no a sua interpretao ou significadolingustico.O clculo tomado como um sistema de regras que no descre-

    ve nada. Ele um sistema que se deixa aplicar para a represen-tao [Darstellung] de um fenmeno ou no: O clculo no des-creve nada. Ele se deixa aplicar no que ele se deixa aplicar.54Umclculo tambm no se deixa justificar. Ele somente se deixa apli-car com sucesso ou no. A sintaxe no se deixa fundamentar. Ela

    por isso arbitrria. Fora da aplicao, considerada por ela mesmasozinha, ela jogo, tanto quanto um jogo de xadrez.55O discursoque no existe uma justificao para o clculo quer dizer que todoclculo deve ser considerado como tendo o mesmo valor [gleich-

    51WWK, p. 134, 30/12/1930.52WWK, p. 106, 19/6/1930 e p. 113 et seq., 25/9/1930.53WWK, p. 104, 19/6/1930; p. 170, 21/9/1931.54

    WWK, p.106, 19/5/1930.55WWK, p. 105, 19/6/1930.

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    wertig]. Um clculo no qual uma contradio somente tem a formap . p no menos justificado que um que exibe RTP & BTP

    como uma outra forma de contradio. Eles se diferenciam somen-te atravs do seu domnio de aplicao.O que significa aplicar um clculo?56 A aplicao do clculo

    pode se dar de maneira que proposiesverdadeirasefalsascorres-pondam s configuraes do clculo. Desta forma, o clculo resultaem uma teoria que descreve algo57. Como aplicao do clculo,Wittgenstein menciona a representao de uma batalha entrehabitantes de Marte58. O desenvolvimento desta teoria do clculo

    [Kalkltheorie] comea em Some Remarkscom a discusso de re-gras de forma e, porque elas so o primeiro exemplo da conside-rao do papel de uma proposio em um sistema de proposiescom respeito ao significado lingustico de um sinal; isto conduzpara uma teoria do clculo atravs da considerao de outrasformas de regras.

    O terceiro aspecto do desenvolvimento da teoria do significadolingustico de Wittgenstein a transio de uma filosofia da lin-

    guagem ideal [idealen Sprache] para uma filosofia da linguagemcorrente [normalen Sprache]. A filosofia do Tractatus um casoparadigmtico de uma filosofia da linguagem do linguagem ideal.Ela se deixa caracterizar por trs caractersticas: (i) A anlise lgi-ca de proposies da linguagem corrente conduz a proposieselementares que poderiam ser dadas pela teoria do conhecimentodepois de pesquisas posteriores. (ii) O significado de proposiesda linguagem corrente ligado atravs da anlise lgica com o

    significado de proposies elementares e com isto com a relao desubstituio que d significado aos nomes pelos objetos; e de fatos pode haver proposies da linguagem corrente com sentido

    56 Wittgenstein diferencia a aplicao do clculo no sentido de uma consti-tuio de um jogo da aplicao do jogo para a apresentao de fatos [ Sach-lagen]. No que se segue eu s me ocuparei da segunda forma de aplicao.57

    WWK, p. 126, 26/12/1930.58WWK, p. 104, 19/6/1930.

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    porque a relao de substituio nome-objeto existe59. Disto seseguem duas consequncias: (2a) A filosofia pode esclarecer atra-

    vs da anlise lgica o que dito [gemeint] com uma proposioda linguagem corrente e (2b) o entendimento de uma proposiopressupe em algum sentido um conhecimento da relao desubstituio que lhe d significado. (3) A tarefa da filosofia adescoberta de reais [wirklichen] formas lgicas de proposies emoposio a formas lgicas aparentes (4.0031).

    Com a teoria do significado baseada na noo de clculo,Wittgenstein j se movimenta em uma filosofia da linguagem

    corrente, porque se dirige decisivamente contra o ponto nuclear desua filosofia de juventude: (1) Assim eu acreditara que a tarefada anlise lgica era descobrir as proposies elementares. [...] euqueria dizer de fato que se podia mais tarde dar as proposieselementares. [...] Isto um erro. Na verdade ns j temos tudo ealm disso, agora [gegenwrtig], ns no precisamos esperar pornada. Ns nos movemos no domnio da gramtica de nossa lingua-gem comum [gewhlichen Sprache] e esta gramtica j esta l60.

    Wittgenstein no abre mo somente da esperana de poder darproposies elementares, mas tambm no anexa [beimesse] relao de subsituio nome-objeto qualquer produo de sentido[bedeutungsstifend]. Isto se deixa expressar pela sua explcita recu-sa das consequncias 2a e 2b: (2) A anlise lgica pode de fatoesclarecer, o que ns queremos dizer com as proposies da linguacotidiana [Umgangsprache]? [...] Ns devemos esperar pela anliselgica? Mas que ideia infernal! A filosofia deve primeiro me escla-

    recer o que eu quero dizer com minhas proposies e se eu querodizer alguma coisa com elas. Eu devo poder entender a proposiosem saber a anlise61. Juntamente com a rejeio do programa do

    59TLP 4.0311 e 4.0312.60WWWK, p. 182-183, 9/12/1931. Compare tambm PB, pargrafo 3, p. 52.61 WWK, p. 129-130, 28/12/1930. No contexto de uma discusso sobrecompletude, ns encontramos na PB a seguinte observao: o que eu posso

    entender eu tenho que entender completamente. Isto tem a ver com o fato deuma linguagem, assim como ela , est em ordem e que a anlise lgica, para

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    atomismo lgico, Wittgenstein desenvolve um novo mtodo filos-fico. O trabalho filosfico limita-se tarefa de descrio de regras

    de gramtica: (3) Isto o que acontece na gramtica. Ns nopodemos fazer outra coisa do que tabular regras. Se podemosdeterminar atravs de investigao [befragen] que algum reconhe-ce algumas vezes esta regra outras vezes outra regra para umapalavra, ento diria para ele: Assim voc tem que diferenciar demaneira precisa, comovoc usa esta palavra; e mais do que isso euno preciso dizer62.

    Nesta mudana clara de uma filosofia da linguagem ideal para

    uma filosofia da linguagem corrente, o ensaio Some Remarksdesempenha novamente um importante papel. Se Wittgensteinainda mantm ali a concepo de uma liguagem ideal, ento eleinvestiga factualmente exemplos de proposies da linguagemcorrente em sua forma lgica. Enquanto ele no Tractatusabre moconscientemente de dar exemplos de proposies elementares, eletrata em Some Remarks de proposies na forma A cor R seencontra no tempo T no lugar Pcomo proposies no-analisveis

    de fato, ou seja, como proposies elementares. Proposies dalinguagem corrente, por consequncia, no so mais tratadas comodeficientes [defizitr] em relao a proposies da linguagem ide-al63. Isto se d tambm quando Wittgenstein, pouco tempo depois,rejeita, em princpio a partir da teoria do clculo, a orientao deuma filosofia da linguagem ideal.

    atingir uma clareza perfeita, no deve acrescentar nada ao sentido existentedas minhas proposies. De maneira que a aparentemente no clara propo-sio depois da anlise mantem intacto o seu contedo anterior e somente esclarecida a sua gramtica. (PB, pargrafo 158, p. 188).62WWK, p. 184, 9/12/1931. Compare tambm: Eu apenas fao algum ficaratento ao que ele de fato faz, e me abstenho de qualquer afirmao. Tudodeve proceder ento na gramtica. (WWK, p. 186, 9/12/1931).63 difcil encontrar em que momento Wittgenstein em sua filosofia de juven-tude defendeu que proposies da linguagem corrente so proposies defici-

    entes em qualquer sentido relevante. Pelo contrrio, ele afirma explicitamenteque so proposies logicamente em ordem (TLP 5.5563). (N. T.)

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    Para avaliarmos a significao das mudanas no Some Remarksde maneira resumida, gostaria de tentar em uma forma concisa

    comparar a teoria do significado lingustico no Tractatus com ateoria do significado baseado na noo de clculo. Para o Tractatus caracterstco que os sinais simples, as partes proposicionais deuma proposio completamente analisada, sejam diferenciadas demaneira clara entre categoremticas e sincategoremticas. Ossinais lgicos so sincategoremticos, isto , seu significado[Bedeutung] dado completamente pelo seu papel sinttico (noTractatus atravs de tabelas de verdade) e sinais no-lgicos so

    categoremticos, isto , seu significado completamente dadoatravs do objeto indicado [bezeichneten Gegenstand]; eles tmsomente um significado semntico [semantische Bedeutung]. Nateoria do significado baseada na noo de clculo, sinais simples,que so palavras da linguagem corrente, no se deixam categorisardesta forma.A fortiori, o que acontece que todo sinal lingusticotem um papel determinado atravs da sintaxe, seu papel em umclculo, que pode ser dado atravs das regras sintticas para este

    sinal. Alm disso, alguns sinais no-lgicos tm um significadosemntico que s se deixam coordenar aos sinais singulares, ao seusar o clculo como um todo para a representao de uma situao[Sachlage]: Por exemplo, quando algum utiliza um clculo dexadrez para descrever o comportamento de guerra de habitantesde Marte. Produzir uma correspondncia de nomes e objetos signi-fica usar o cclulo como um todo para a representao de umasituao64. No Tractatus, o significado lingustico de um sinal sim-

    ples no-lgico o objeto indicado [bezeichnete Gegenstand]. Nateoria do signficado baseada na noo de clculo s se deixa dar osignificado lingustico de um sinal simples no-lgico ao se dar as

    64A aplicao de um clculo somente possvel como um todo, porque ele satribui um papel sinttico aos sinais, que pertencem ao clculo, como umtodo. E porque o papel sinttico de um sinal ao menos uma parte de seusignificado lingustico. Entender p quer dizer entender um sistema. Se um p

    passar aparentemente de um sistema para outro, ento na realidade p mudouo seu sentido (PB, 153, p. 180). Compare tambm p. 182 e nota 42.

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    regras sintticas, que valem no clculo, para este sinal e alm dissose determinar ao que o clculo como um todo se aplica.

    De maneira resumida podemos manter: no desenvolvimento dateoria do significao baseada na noo de clculo, a introduode regras da forma eno Some Remarks, em muitos sentidos, umpasso importante: Com elas ampliada a paleta de, segundo oTractatus, proposies no significativas [nicht sinnvollen Stzen],onde tambm fica mais insustentvel [unhaltbarer] atribuir a elasum significado lingustico. Assim, a reduo ao absurdo da teoriada figurao introduzida. Em segundo lugar, so consideradas

    consequentemente como necessrias regras para o significadolingustico de um sinal que no so s coordenadas a um sinalsimples [einzelnen], porque so produzidas com elas relaes comdiferentes sinais (sinais lgicos e sinais no-lgicos). A isso perten-ce tambm que todo predicado gradual destes predicados deter-minado atravs da relao de substituio conjutamente com asregras de forma e. A ampliao destas regras conduz com a ajudada analogia do jogo de xadrez a uma teoria do significado baseada

    na noo de clculo. Em terceiro lugar, os exemplos de proposiesda linguagem corrente marcam o primeiro passo para a mudanade uma filosofia da linguagem ideal para a filosofia da linguagemcorrente.

    7. Observaes finaisAinda que em Some Remarks, e posteriormente, ainda se mante-

    nha aspectos fundamentais da teoria da figurao do Tractatus, h

    importantes aspectos vinculados recusa do postulado da indepen-dncia das proposies elementares e estados de coisas que so osprimeiros passos dados na direo de uma reduo ao absurdo dateoria da figurao, na construo de uma teoria do significadobaseada na noo de clculo e na virada de uma linguagem idealpara uma linguagem corrente. Diferentemente do que Sievert man-teve e e em funo de aspectos diferentes dos levantados porAustin, encontramos no Some Remarks modificaes importantes,

    cuja significncia foi esclarecida atravs da contextualizao no

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    Princpios:Revista de Filosofia, Natal, v. 22, n. 39, set.-dez. 2015.ISSN1983-2109

    desenvolvimento posterior da filosofia da linguagem wittgensteini-ana. Com isso se toma como correta ao mesmo tempo o modelo de

    uma abrangente, mas gradativa mudana posterior do pensamentowittgensteiniano.

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