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INOVAÇÃO E TECNOLOGIA para a TRANSFORMAÇÃO DA SOCIEDADE MOSTRA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA IMED 2016 MOSTRA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA IMED 2016

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INOVAÇÃO ETECNOLOGIA para aTRANSFORMAÇÃODA SOCIEDADE

MOSTRA DE INICIAÇÃOCIENTÍFICA IMED 2016

MOSTRA DE INICIAÇÃOMOSTRA DE INICIAÇÃOCIENTÍFICA IMED 2016

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Passo FundoEditora IMED

2016

INOVAÇÃO E TECNOLOGIA PARA A TRANSFORMAÇÃO DA SOCIEDADE

X Mostra de Iniciação Científica e Extensão Comunitária e IX Mostra de Pesquisa de Pós-Graduação da IMED

Faculdade IMED

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DOI: http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3

Diretor GeralEduardo Capellari

Diretora AcadêmicaDaiane Folle

Diretora AdministrativaMarilú Benincá de David

Diretor de Relações com o MercadoWilliam Zanella

Diretor de Pesquisa e Pós-Graduação Stricto SensuJoão Alberto Rubim Sarate

Coordenador da Escola de AdministraçãoAdriano José da Silva

Coordenadora da Escola de Arquitetura e UrbanismoRenata Barbosa Ferrari Curval

Coordenador da Escola de DireitoLuciano de Araújo Migliavacca

Coordenador da Escola de Engenharia CivilPietro Rafael Ferreira

Coordenador da Escola de Engenharia MecânicaRichard Thomas Lermen

Coordenadora da Escola de MedicinaRaquel Scherer de Fraga

Coordenador da Escola de Medicina VeterináriaDeniz Anziero

Coordenador da Escola de OdontologiaLeodinei Lodi

Coordenador da Escola de PsicologiaLuiz Ronaldo Freitas de Oliveira

Coordenador da Escola de Sistemas de Informação e Ciência da ComputaçãoAmilton Rodrigo de Quadros Martins

© 2016 Autores

Filiada a

Este trabalho está licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional. Para ver uma cópia desta licença, visite http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/.

Editora IMEDR. Senador Pinheiro, 304 - Rodrigues99070-220 - Passo Fundo/RS, BrasilFone: (54)3045-9081E-mail: [email protected]/editora

Responsável Editora IMEDWanduir Rudinei Sausen

CIP – Dados Internacionais de Catalogação na Publicação ___________________________________________________________

M915i Mostra de Iniciação Científica e Extensão Comunitária (10.: 2016: Passo Fundo, RS)Inovação e tecnologia para a transformação da

sociedade / [coordenação editorial] Faculdade Meridional. –Passo Fundo : IMED, 2016.

7 Mb ; e-BOOK.

Disponível eletrônico: http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3

Inclui bibliografia.ISBN 978-85-99924-85-3

1. Pesquisa – Congressos. 2. Abordagem interdisciplinar do conhecimento. 3. Inovações tecnológicas. I. Faculdade Meridional – IMED.

CDU: 001.8: 061.4___________________________________________________________

Bibliotecária responsável Angela Saadi Machado - CRB 10/1857

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SUMÁRIO

Apresentação .............................................................................................. 5

Proposta de sistema integrado de utilização de águas de reúso para a cidade de Passo Fundo, RS, Brasil: sugestão e análise ....................................................................................... 6Tauana Bertoldi, Alcindo Neckel

Habilidades sociais em professores: uma revisão de literatura ............. 14Juliana Piccinini da Silva, Jéssica Piccinini da Silva, Thiago Fortes Wagner, Marcia Fortes Wagner

A comunicação dos requisitos da norma de desempenho ABNT NBR 15575:2013 para o usuário final da edificação ................... 20Juliane Barquete, Elvira Lantelme

O sofrimento animal como objeto da criminologia ............................... 27Karine Agatha França, Mariangela Matarazzo Fanfa Colognese, Marília de Nardin Budó

O efeito do estado emocional na relação entre o tipo de consumo e a felicidade .......................................................................... 35Elem Rabelo Duarte Vaz, Franciele Lorenzato, Manueli Tomasi, Kenny Basso

ABNT NBR 15575-4 – vedações verticais: o impacto nos custos ........... 43Gustavo Zanotto, Elvira Lantelme

Programa Minha Casa Minha Vida na cidade de Passo Fundo, RS ........ 50Laíse Schenatto Carlotto, Caliane Christie Oliveira de Almeida

A mediação de conflitos: um olhar a partir da teoria dos jogos ............ 60Janine Taís Homem Echevarria Borba, William Picolo Fibrans, Thaise Nara Graziottin Costa

Marketing social e saúde coletiva: em busca de uma sociedade melhor .... 69Sidimar Meira Sagaz, Deison Alencar Lucietto

Economia verde: qual o devir da sustentabilidade a partir da política jurídica? ..................................................................... 77Rafaela Rovani de Linhares, Sérgio Ricardo Fernandes de Aquino

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S U M Á R I O

APRESENTAÇÃO

Caro leitor,É com grande satisfação que apresento esta obra intitulada Inovação e Tecnologia

para a Transformação da Sociedade, resultado da X Mostra de Iniciação Científica e Extensão Comunitária e IX Mostra de Pesquisa de Pós-Graduação da IMED. Nesta edição estão reunidos os melhores trabalhos que contaram com participação de todas as Escolas IMED, Saúde, Politécnica, IMED Business School, Direito e Agrárias.

Justifica-se a importância desta publicação pelo investimento e crença constante da IMED na pesquisa como fundamental em graduação e pós-graduação. Recente-mente a IMED teve mais três mestrados acadêmicos recomendados pela CAPES que se somam aos mestrados em Direito e Administração. Foram aprovados os cursos de mestrado acadêmicos em Arquitetura e Urbanismo, Engenharia Civil e Odonto-logia. A estrutura ampliada de pesquisa da IMED fomenta ainda mais os programas de iniciação científica e tecnológica na instituição, que contam com bolsas CNPq, FAPERGS e IMED, além de parcerias com outras instituições de pesquisa para rea-lização de projetos em conjunto e mobilidade internacional.

A participação de alunos de graduação em projetos de pesquisa é estratégica e fundamental para a consolidação da cultura de pesquisa na IMED. Esse movimen-to convida alunos de graduação e pesquisadores à experiência transformadora da investigação científica e às possibilidades de resultados de seus trabalhos, através de impacto intelectual, social e econômica.

Por fim, agradeço sinceramente a todos que trabalharam dedicadamente na realização da X Mostra de Iniciação Científica e Extensão Comunitária e IX Mostra de Pesquisa de Pós-Graduação da IMED.

Grande abraço e ótima leitura.

João Alberto Sarate, Dr.Diretor de Pesquisa e Pós-Graduação Stricto Sensu da IMED

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S U M Á R I O

http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3-1

PROPOSTA DE SISTEMA INTEGRADO DE UTILIZAÇÃO DE ÁGUAS DE REÚSO PARA

A CIDADE DE PASSO FUNDO, RS, BRASIL: SUGESTÃO E ANÁLISE

Proposal for integrated water reuse for the city of Passo Fundo, RS, Brazil:

suggestion and analysis

Tauana BertoldiGraduanda em Arquitetura e Urbanismo da IMED.

Pesquisadora voluntária de iniciação científica do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Mobilidade Urbana (NEPMOUR) da IMED, sobre as linhas de pesquisa

Governança nas Cidades Sustentáveis e Mobilidade Urbana, em que se discutem Diagnóstico e Planejamento da Mobilidade Urbana com bases sustentáveis para

a Cidade de Passo Fundo, RS, Brasil. Tem experiência em AutoCad, Sketchup, ProMob. Bolsista PROBITI FAPERGS.

E-mail: <[email protected]>.

Alcindo NeckelPrograma de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo – PPGARQ.

Escola de Arquitetura e Urbanismo da IMED. Núcleo de Estudos e Pesquisas em Mobilidade Urbana – NEPMOUR. Passo Fundo, RS, Brasil.

E-mail: <[email protected]>.

Resumo

A disponibilidade de água potável para consumo humano é cada vez menor, de-vido à utilização de maneira irracional. A fim de mudar essa realidade, a presente pesquisa tem como objetivo propor um sistema de reutilização de águas cinzas para a cidade de Passo Fundo, RS, Brasil, a fim de reduzir o consumo de água potável de edificações localizadas na Avenida Brasil. Esse sistema poderá facilitar e incentivar o reúso de águas em escala urbana, e contribuir com a conservação de mananciais que abastecem a cidade de Passo Fundo e região.Palavras-chave: Águas residuais. Conservação. Reúso.

Abstract

The availability of drinking water for human consumption is dwindling due to its inappropriate use. In order to change this reality, this research aims to propose a grey

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Proposta de sistema integrado de utilização de águas…

water recycling system to the city of Passo Fundo/RS, Brazil, in order to reduce the consumption of drinking water in buildings located on Avenida Brasil. This system will facilitate and encourage the reuse of grey water in urban scale, and will contribute to the conservation of water sources that supply the city of Passo Fundo/RS and region.Keywords: Wastewater. Conservation. Reuse.

Introdução

A disponibilidade dos recursos hídricos potáveis para a população é cada vez menor, isso porque é utilizada de maneira irracional e devolvida ao seu hábitat sem qualquer tratamento (GOELLNER, 2010). Exemplo dessa falta de cuidado, segundo Goellner (2010), Romero, Dey e Fisher (2014), Rice, Westeroff (2015), Fournier et al. (2016), Verbyla et al. (2016), Franklin et al. (2016), consiste no fato de que a maioria das indústrias, principalmente do segmento da metalúrgica e mineração, e a agri-cultura necessitam de grandes volumes para irrigação e para a pulverização de áreas com produtos químicos, um dos principais poluidores dos recursos hídricos.

Para Philippi Jr. (2003), 8% da água doce mundial encontram-se no Brasil, sendo que 80% estão distribuídos pelo estado da Amazônia e os outros 20% abastecem 95% de toda a população nacional. Precisa-se ter mais consciência do seu uso, pois 65% da água doce mundial são destinados para o uso agrícola; 25%, para indús-trias; e 10%, para uso urbano, sanando a sede da população. Segundo Philippi Jr. (2003), no gerenciamento do uso de água, é imposta uma taxa mensal referente ao seu consumo, mas usada muitas vezes de forma ineficiente, sem qualquer tipo de reaproveitamento.

Por isso, a necessidade de pensar em sistemas alternativos, que envolvam o reúso da água, em um cenário caótico, como definido por Verbyla et al. (2016), em que cerca de 33% da população mundial vivem em situações precárias, sem saneamento básico, e mais 21% não possuem tratamento de esgoto. A falta de infraestrutura bá-sica acarreta a contaminação das águas superficiais através de patógenos fecais e, con-sequentemente, contamina o ambiente, colocando em risco a saúde de consumidores de alimentos irrigados por águas sem tratamento adequado.

A vantagem de pensar sistemas de reúso em um contexto municipal, conforme Bischel et al. (2012) e Verbyla et al. (2016), é a economia no tratamento de águas residuais, possibilitando seu uso para diversas naturezas: irrigação de jardins, áreas agrícolas, aumento do ecossistema, alimentação de aquíferos, refrigeração e proces-samento industrial, entre outras.

Ao se considerar essas necessidades referentes à importância no tratamento e disposição da água de reúso, atribuiu-se enfoque ao município de Passo Fundo, RS, Brasil, por causa das suas riqueza hidrográfica, com nascentes que dão origem a cin-co das vinte e cinco bacias hidrográficas do Estado do Rio Grande do Sul (RS) (Ba-cia do Rio Passo Fundo, Bacia do Alto Jacuí, Bacia do Apuaê-Inhandava, Bacia do Taquarí-Antas e Bacia do Rio da Várzea) (NECKEL; GOELLNER; PICCOLI, 2013).

A cidade de Passo Fundo possui duas estações de tratamento de águas residuais para tratamento de diferentes formas de consumos: a estação de tratamento Arau-cária, que está localizada no bairro Alexandre Zachia, às margens da BR 285; e a estação de tratamento da Universidade de Passo Fundo (UPF), que está localizada no

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T. Bertoldi, A. Neckel

Campus I da UPF, bairro São José. Esta pesquisa objetiva, de forma geral, sugerir um novo sistema para destino reaproveitável das águas de reúso das respectivas ETEs.

A presente pesquisa sobre a reutilização de água tratada (reúso) objetiva, de forma específica, pensar formas eficientes para abastecer os prédios residenciais, escolas, indústrias, concessionárias de automóveis, entre outros usuários que se en-contram localizados principalmente no decorrer da Avenida Brasil Leste e Oeste da cidade de Passo Fundo, a fim de reduzir o consumo de água potável para práticas como irrigação de jardins, uso em bacias sanitárias e lavagem de carros e calçadas. Consequentemente, visando reduzir o custo mensal de água potável e energia elé-trica. As edificações escolhidas são de diferentes naturezas, porém possuem índices elevados de consumo mensal de água.

Procedimentos metodológicos

Situada no norte do estado do Rio Grande do Sul, a cidade de Passo Fundo lo-caliza-se entre as coordenadas geográficas 28º07´ e 28º25́ de latitude Sul e 52º17´ e 52º41’ de longitude Oeste; perfaz atualmente uma área territorial de 754,40 km². A área de estudo consiste no decorrer de toda a Avenida Brasil, compreendida pela Avenida Brasil Oeste e Avenida Brasil Leste (figura 1).

Figura 1: Trajetória percorrida para a aplicação de questionários

Fonte: Adaptado do Google Earth pelos autores (2016).

A escolha das empresas entrevistadas se deu considerando o Método de Prefe-rência Declarada (MPD). Entre os três grupos classificados por Bates (1991) quanto aos dados obtidos de experimentos de PD (escala de avaliação ou rating; ordem de preferência ou ranking; e escolha da mais atrativa ou choice), optou-se pelo método de ordenação das alternativas (ranking), em que alternativas são simultaneamente apre-sentadas aos entrevistados com o objetivo de colocá-los em ordem de preferência.

Posteriormente, os dados das entrevistas realizados entre as doze empresas fo-ram tabulados. E, assim, foi realizado um levantamento de custos e de material para sugerir um sistema de reúso, de modo que essa água possa chegar até as empresas.

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Proposta de sistema integrado de utilização de águas…

Resultados e discussões

Na tabela 1, percebe-se que, das doze empresas entrevistadas, apenas quatro pos-suem práticas voltadas para amenizar os problemas ambientais com a reutilização da água de chuva. Estas utilizam sistemas de reaproveitamento de água da chuva, armazenando-a em cisternas para fins como lavagens de carros, calçadas e para bacias sanitárias.

Convém lembrar que 100% das empresas entrevistadas utilizam sistemas de tra-tamento da água antes de devolvê-la ao corpo receptor. Por exemplo, o sistema com-posto por caixas separadoras a fim de retirar o óleo e a graxa da água pelo processo de decantação; outras empresas a liberam na rede de esgoto após depositarem-na em um poço com aproximadamente seis metros de profundidade que possui no fundo uma camada de Pedra Negra, a qual retira as impurezas da água, deixando-a infiltrar para sua liberação no lençol freático.

Pode-se observar que empresas que aderem à prática de reaproveitamento de água possuem poços artesianos próprios, não havendo ligação com concessionárias de serviços hídricos em relação ao consumo de águas. Seus vínculos com essas con-cessionárias são através de taxas, que variam em torno de R$ 100,00 mensais.

Em contrapartida, oito das doze empresas não possuem reaproveitamento de água, e liberam-na sem tratamento no corpo receptor. Uma das empresas pesqui-sadas possui poço artesiano; e as outras sete empresas, que possuem vínculo com a concessionária de distribuição de água, pagam em média R$ 395,50 mensais. Esses valores consumidos variam entre R$47,00 e R$1.300,00.

Na relação a seguir, encontra-se também a empresa quatro (tabela 1), que oferece serviço de manutenção de automóveis, contendo em seu estabelecimento oficina e lavagem. Embora pratique reaproveitamento de água, necessita consumir ener-gia elétrica para sua operacionalização, dependendo, assim, da captação de água de chuva para a diminuição dos seus custos mensais. Esses valores variam de R$140,00 até R$12.875,00, obtendo-se como média R$ 3.525,04 mensais.

Tabela 1: Custo mensal de energia e água das doze empresas pesquisadas, e se realizam captação de água da chuva ou não

Empresas entrevistadas

Consumo de energia elétrica (R$)

Consumo de água (R$)

Aproveitamento de água de chuva

Empresa 1 1.000,00 1.300,00 NãoEmpresa 2 3.500,00 180,00 SimEmpresa 3 2.000,00 - Não Empresa 4 12.875,00 100,00 SimEmpresa 5 900,00 250,00 NãoEmpresa 6 8.000,00 - NãoEmpresa 7 3.000,00 200,00 NãoEmpresa 8 3.000,00 - SimEmpresa 9 6.000,00 - NãoEmpresa 10 782,00 47,00 NãoEmpresa 11 140,00 - SimEmpresa 12 10.000,00 180,00 Não

Fonte: Pelos autores (2016).

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T. Bertoldi, A. Neckel

Ainda são poucas as empresas que possuem práticas de reaproveitar água de chuva. Portanto, ao visionar as aplicabilidades de ações e possibilitar um futuro sustentável para as águas das estações de tratamento de Passo Fundo (RS), pretende--se propor a criação de uma subestação para armazenamento e distribuição dessas águas liberadas depois do tratamento feito pelas ETEs.

A utilização da água de reúso se dará pelas duas estações de tratamento de efluentes (ETEs). Segundo Goellner (2010), a Estação de Tratamento Araucárias ocupa uma área de aproximadamente 26 hectares, acomodando quatro lagoas (uma lagoa com processo anaeróbio, uma com processo facultativo e duas para a matu-ração). A respectiva trabalha com uma vazão de 100L/s, acarretando 3000m³/dia de esgoto. Já a estação de tratamento do campus I da Universidade de Passo Fundo (UPF), diferentemente da estação de tratamento Araucárias, trabalha com um pro-cesso tecnológico de digestão anaeróbia em reatores de fluxo ascendente em manta de lodo do tipo UASB, reator biológico aeróbio e decantador secundário.

A construção da subestação central para receber as águas de reúso das duas ETEs necessitaria ser localizada na área de abrangência da Embrapa Trigo, situada às margens da BR 285, pelo fato de ser região centralizada e a 659m de altitude. Pois, a ETE Araucária, em relação a esse ponto, encontra-se a 636m de altitude, o que corresponde a 23 metros de declive planialtimétrico, com 1.273km de distância do ponto de captação; e a ETE da UPF encontra-se a 71m de altitude, o que corres-ponde a 588m com menor altitude do ponto localizado na Embrapa Trigo, e a uma distância de 2003,30 km (figuras 2 e 3).

Figura 2: Localização das estações de tratamento e do ponto escolhido para a implantação da estação de encontro

Fonte: Adaptado do Google Earth pelos autores (2016).

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Proposta de sistema integrado de utilização de águas…

Figura 3: Representação da distância das estações de tratamento em relação à Embrapa

Fonte: Autores (2016).

A rede que fornecerá essa água será comporta por quatro caixas d’água: uma será a receptora do material proveniente das duas ETEs; e três servirão como caixas reserva, em que a água poderá permanecer por até 25 dias armazenada. Segundo Goellner (2010), a água de reúso pode ser armazenada e redistribuída, pois, quanto mais tempo é armazenada, mais diminui a quantidade de micro-organismos nela presentes.

A partir disso, pode-se sugerir um sistema com adutoras ao longo da Avenida Brasil, com ramificações secundárias abastecendo edificações. Para isso, é necessá-rio ser instalado em cada empresa que se ligar ao sistema um marcador de consumo (relógio), válvula e hidrômetro. Uma das vantagens desse sistema é que não neces-sita de reservatórios (caixa de água), utilizando, assim, ligação direta com a rede (figura 4). Além disso, a água se deslocará da estação receptora para os usuários por ação de gravidade, o que ajudará a reduzir gastos com a energia elétrica das empre-sas, que não precisarão utilizar muito bombeamento dos seus poços artesianos.

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T. Bertoldi, A. Neckel

Figura 4: Esquema da rede de distribuição e respectivos receptores

Fonte: Autores (2016).

Considerações finais

A pesquisa destaca que, apesar de o reúso de águas ser assunto debatido há alguns anos, ainda são poucos os que demonstram interesse praticando algumas ações, como algumas empresas pesquisadas na cidade de Passo Fundo (RS). Essas poucas empresas que possuem sistema de reaproveitamento de água utilizam-na para lavagem de calçadas, de carros e para bacias sanitárias.

Visando contribuir para a sustentabilidade do ambiente construído, esta pesqui-sa comprova que a água proveniente da rede de esgoto, após passar por tratamento necessário, pode ser reaproveitada para diferentes práticas. Esse sistema poderá tra-zer consequências benéficas aos estabelecimentos que se ligarem ao sistema, como a redução do custo mensal na tarifa de água e de energia elétrica.

Referências

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http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3-2

HABILIDADES SOCIAIS EM PROFESSORES: UMA REVISÃO DE LITERATURA

Social skill teachers: a literature review

Juliana Piccinini da SilvaAcadêmica de Psicologia da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Jéssica Piccinini da SilvaAcadêmica de Psicologia da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Thiago Fortes WagnerAcadêmico de Psicologia da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Marcia Fortes WagnerDoutora em Psicologia. Orientadora e

professora do Curso de Psicologia da IMED. E-mail: <[email protected]>.

Resumo

Habilidades sociais podem ser definidas como comportamentos de um indivíduo ne-cessários para um bom desempenho social; dentre elas, a empatia merece destaque, pois está relacionada à capacidade de identificação dos sentimentos e pensamentos dos outros, o que contribui para um relacionamento interpessoal saudável. O pre-sente estudo tem como objetivo realizar uma revisão de literatura a respeito do tema habilidades sociais em professores, a partir da busca em bases de dados nacionais e li-vros da área, utilizando os unitermos “habilidades sociais”, “empatia” e “professores”. Conclui-se que os professores necessitam apresentar um bom repertório de habilida-des sociais e empatia, pois tais comportamentos estão diretamente relacionados com um ambiente de trabalho saudável e qualidade na formação dos educandos.Palavras-chave: Habilidades sociais. Empatia. Professores.

Abstract

Social skills entail the abilities needed for good social performance. Empathy is one of them, and it deserves special attention, because it is the ability to acknowledge the

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Habilidades sociais em professores...

feelings and thoughts of others, contributing to healthy interpersonal relationships. This study aims to conduct a literature review on the subject of social skills in teachers, based on national databases and books from this field of knowledge, using “so-cial skills”, “empathy”, and “teachers” as keywords. We have concluded that teachers need to present good social skills and empathy, because such characteristics are di-rectly related to a healthy work environment and improved quality in the training of students.Keywords: Social Skills. Empathy. Teachers.

Introdução

A sociedade vem passando por grandes transformações, o que exige do educador preparação para lidar com as mudanças propostas para o século XXI. E, dentre os inúmeros desafios, está a necessidade de formar alunos com pensamento crítico, capazes de resolver problemas, com raciocínio lógico bem desenvolvido, criatividade, capacidade de trabalhar com ética, responsabilidade, eficiência e eficácia, além de am-pla capacidade para obter conhecimento e articulá-lo com seu cotidiano (SÁ, 2015).

Tem sido cada vez mais importante formar pessoas que possuam outras compe-tências e habilidades que não somente o conhecimento técnico. A afetividade e as emoções possuem papel importante na educação, conforme afirmam Chibás e Braz (2015), como meio de incentivar a formação de indivíduos conscientes que promo-vam e participem de modo integral do meio em que estão inseridos.

Estudos sobre habilidades sociais têm aumentado, em decorrência dos proble-mas que um repertório deficitário nessas habilidades pode desenvolver na saúde e na qualidade de vida dos indivíduos (PUREZA et al., 2012). Dentre as habilidades sociais, a empatia se destaca pela sua função relacionada às relações interpessoais, vis-to que é uma habilidade de comunicação que cada vez mais parece se encaixar nas necessidades do mundo em que estamos vivendo (FALCONE, 1999), considerada de grande importância para o desenvolvimento saudável (PAVARINO; DEL PRETTE, A.; DEL PRETTE, A. P., 2005).

O presente estudo tem como objetivo realizar um estudo bibliográfico a respeito do tema habilidades sociais em professores. Esta pesquisa foi realizada a partir da busca de publicações nas bases de dados nacionais e livros da área, utilizando os unitermos “habilidades sociais”, “empatia” e “professores”.

Habilidades sociais

Habilidades sociais são conjuntos de comportamentos sociais que o sujeito apre-senta em situações interpessoais (CARNEIRO; TEIXEIRA, 2011), que maximizam os ganhos e minimizam as perdas (BOLSONI-SILVA; CARRARA, 2010). Estudar as habilidades sociais apresenta relevância por elas serem necessárias e indispensá-veis para um bom desempenho social, o qual, por sua vez, também contribui para a saúde e a qualidade de vida dos indivíduos.

Feitosa (2013) defende a hipótese de que as habilidades sociais podem servir à proteção e promoção de saúde mental. Ter habilidades sociais desenvolvidas torna--se fundamental no que diz respeito ao bom desempenho no local de trabalho, pois

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J. P. da Silva, J. P. da Silva, T. F. Wagner, M. F. Wagner

sujeitos habilidosos socialmente têm mais probabilidade de apresentar competência pessoal e interpessoal e, assim, constituir relações mais satisfatórias tanto pessoal como profissionalmente (CERUTTI; WAGNER, 2014).

O conceito de “competência social” está ligado à capacidade de se expressar de forma honesta, defender seus direitos, alcançando seus objetivos e os dos outros, o que visa potencializar as consequências positivas e minimizar as perdas. Já o com-portamento socialmente habilidoso nem sempre alcançará todos esses aspectos de funcionalidade ou o seu grau máximo, conforme referem Del Prette e Del Prette (2008). Para esses mesmos autores, a funcionalidade está voltada à capacidade do su-jeito de estruturar seus desempenhos comportamentais, cognitivo-afetivos e fisioló-gicos às necessidades interpessoais da situação e da cultura. Sendo assim, para julgar se um comportamento é competente socialmente, é levado em conta um conjunto de normas e expectativas relacionadas às características dos interlocutores, da situação e da cultura em que a interação acontece (DEL PRETTE, A.; DEL PRETTE, A. P., 2008).

Empatia

Empatia pode ser considerada a capacidade de identificar sentimentos e pensa-mentos em relacionamentos interpessoais, envolvida com o interesse genuíno em sa-ber como o outro se sente e expressar respostas comportamentais em relação a essa constatação (FALCONE et al., 2008). Tal capacidade de compreender com exatidão os sentimentos e pensamentos dos outros e demonstrar isso sensivelmente e de forma apropriada, para Falcone (1999), tem grande valor nas relações interpessoais.

Entre o grande número de classes de comportamentos sociais, a empatia vem sendo considerada de grande importância para o desenvolvimento saudável (PA-VARINO; DEL PRETTE, A.; DEL PRETTE, A. P., 2005). Profissionais de diversas áreas do conhecimento têm-se interessado pelo estudo da empatia por esta represen-tar um papel importante no desenvolvimento de habilidades tanto sociais quanto cognitivas e afetivas (AZEVEDO, 2014).

Habilidades sociais e empatia em professores

Apresentar habilidades sociais satisfatórias propicia uma boa atuação profissio-nal. No ambiente de trabalho, as HS podem apresentar função de mediar as relações com os colegas e auxiliar na execução das atividades profissionais. Um bom repertó-rio de HS propiciará um ambiente de trabalho saudável e produtividade (FEITOZA et al., 2008); e sujeitos socialmente habilidosos, segundo Cerutti e Wagner (2014), tendem a ter maior satisfação tanto no âmbito pessoal quanto no profissional.

Rodrigues, Araújo, Ribeiro e Rubio (2015) referem que, para um trabalho gru-pal, é necessário o monitoramento do próprio comportamento e do comportamento da equipe, o que exige um amplo repertório de condutas, entre as quais as compe-tências gerenciais ou de coordenação de grupos, de caráter social. Nesse sentido, é possível afirmar que os estudos das habilidades sociais profissionais apresentam grande relevância e podem trazer importantes contribuições tanto para as organi-zações quanto para as pessoas, propiciando um ambiente de trabalho mais saudável.

Em qualquer contexto que exija relação interpessoal, torna-se indispensável um

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Habilidades sociais em professores...

bom repertório de habilidades sociais. E, quando se fala em habilidades sociais volta-das para professores, é necessário pensar no ensino dessas habilidades, para que es-ses profissionais tenham condições favoráveis e possibilitem a aprendizagem dessas habilidades também pelos alunos, favorecendo o processo de edificação do conheci-mento (FORNAZARI et al., 2014).

Autores como Rosin-Pinola e Del Prette (2014) enfocam o papel das habilidades sociais educativas (HSE), destacando o impacto das habilidades sociais do professor no desempenho escolar dos alunos. Em relação à formação e atuação dos profes-sores, as autoras reforçam a ideia de que, além dos conhecimentos curriculares, os profissionais da educação necessitam ter em sua prática habilidades de reflexão so-bre essa prática e outras tantas habilidades que direcionam a sua ação educativa. Já Formiga (2012) afirma que o construto da empatia é indispensável para o processo de aprendizagem, desenvolvimento e experiência social do ser humano, pois auxilia no uso eficaz das capacidades comunicativas e afetivas nas relações interpessoais.

Conforme definiram Del Prette e Del Prette (2008), existem 32 habilidades so-ciais educativas, que podem ser agrupadas em quatro classes mais gerais: 1) estabe-lecer contextos potencialmente educativos; 2) transmitir ou expor conteúdos sobre habilidades sociais; 3) monitorar positivamente; 4) estabelecer limites e disciplina. As classes amplas eram, portanto, compostas de outras mais específicas como, por exemplo, “estabelecer contextos potencialmente educativos” incluía organizar mate-riais, alterar distância e proximidade, etc.; “transmitir ou expor conteúdos de habili-dades sociais” incluía fazer perguntas de sondagem ou desafio, apresentar objetivos, entre outras. Certamente, um passo preliminar importante é o de avaliar necessida-des de professores e alunos em relação a tais habilidades.

Em um estudo realizado por Reis, Prata e Soares (2012), constatou-se que a maio-ria dos professores participantes apresentou repertório elaborado de habilidades sociais, e que isso pode se dar pelo fato de que os docentes são profissionais que usam da habilidade social para desempenhar sua função de mediadores entre o conhecimento e o aluno. O papel desempenhado pelo professor exige que apresente um repertório de habilidades amplo, principalmente no que diz respeito às habilida-des sociais, pois esse profissional está em constante interação social (SOARES et al., 2009).

Para Resende e Resende (2015), os conhecimentos dos professores são cons-truídos a partir de sua própria experiência, relacionada ao que estudam nos cursos de formação; e gostar do que fazem é de grande importância para que os alunos aprendam. Reforçam que o papel do professor é estimular a aprendizagem social e acadêmica, ter comportamento modelo, possibilitando que os alunos desenvolvam habilidades sociais e atitudes.

Considerações finais

É possível concluir que as habilidades sociais são elementos fundamentais no processo de ensino e aprendizagem, fortalecendo vínculos entre professores e alu-nos, além de facilitar a aquisição de conhecimento. Nesse contexto, é necessário estimular nos professores o aperfeiçoamento das suas próprias habilidades sociais, entre elas a capacidade de empatia, para que o ensino possa ser um espaço de apren-dizagem e afeto, propiciando que os alunos também desenvolvam as suas habilida-des sociais e estabeleçam relações interpessoais mais saudáveis.

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J. P. da Silva, J. P. da Silva, T. F. Wagner, M. F. Wagner

Para Del Prette e Del Prette (2008), a escola deve priorizar o trabalho de desen-volvimento das habilidades sociais e ampliar a formação educacional enfocando a competência social e cognitiva. Com isso, os indivíduos que apresentarem um bom repertório de habilidades sociais e empatia terão maiores probabilidades de estabe-lecer relacionamentos interpessoais saudáveis e, consequentemente, obter melhores oportunidades de desenvolvimento na sua vida pessoal e profissional.

Referências

AZEVEDO, C. R. Instrumentos de avaliação da empatia: uma revisão sistemática da literatura. Monografia (Especialização) – Instituto de Psicologia, Porto Alegre, 2014.BOLSONI-SILVA, A. T.; CARRARA, K. Habilidades Sociais e Análise do Comportamento: compatibilidades e dimensões conceitual-metodológicas. Psicologia em Revista, Belo Horizonte, v. 16, n. 2, p. 330-350, 2010.CARNEIRO, A. A.; TEIXEIRA, C. M. Avaliação de Habilidades Sociais em alunos de graduação em Psicologia da Universidade Federal do Maranhão. Psicologia: Ensino & Formação, São Paulo, v. 2, n. 1, p. 43-56, 2011.CERUTTI, P. S.; WAGNER, M. F. Habilidades Sociais no Atendimento ao Público. Revista de Psicologia, IMED, Passo Fundo, v. 6, n. 1, p. 40-46, 2014.CHIBÁS, F.; BRAZ, A. L. N. A gestão das emoções na educação: reflexões, propostas e desafios. Revista de Educação, São Paulo, v. 15, n. 19, p. 95-109, 2015.DEL PRETTE, Z. A. P.; DEL PRETTE, A. Um sistema de categorias de habilidades sociais educativas. Paidéia, Ribeirão Preto, v. 18, n. 41, p. 517-530, 2008.FALCONE, E. A avaliação de um programa de treinamento da empatia com universitários. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 23-32, 1999.FALCONE, E. M. de. O. et al. F. Inventário de Empatia (I.E): Desenvolvimento e Validação de uma Medida Brasileira. Avaliação Psicológica, Rio de Janeiro, v. 7, n. 3, p. 321-334, 2008.FEITOSA, F. B. Habilidades sociais e sofrimento psicológico. Arquivos Brasileiros de Psicologia, Rio de Janeiro, v. 65, n. 1, p. 38-50, 2013.FEITOZA, S. et al. O repertório de habilidades sociais de profissionais que atuam com vendas no setor comercial de tecnologia da informação e suas implicações na qualidade da prestação de ser-viços. In: ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO. A integração de cadeias produtivas com a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, Brasil, 2008.FORMIGA, N. S. Os estudos sobre empatia: reflexões sobre um construto psicológico em diversas áreas científicas. Revista Eletrônica Psicologia, p. 1-14, 2012. Disponível em: < http://www.abepro.org.br/biblioteca/enegep2008_tn_stp_070_502_11817.pdf>. Acesso em: 25 de jul. 2016.FORNAZARI, S. A. et al. Programa informatizado para capacitar professores em habilidades sociais: contribuições para a inclusão. Psicologia da Educação, São Paulo, n. 38, p. 17-34, 2014.PAVARINO, M. G.; DEL PRETTE, A.; DEL PRETTE, Z. A. P. O desenvolvimento da empatia como prevenção da agressividade na infância. Psico, Porto Alegre, v. 36, n. 2, p. 127-134, 2005.PUREZA, J. D. R. et al. Treinamento de Habilidades Sociais em Universitários: uma proposta de intervenção. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, Rio de Janeiro, v. 8, n. 1, p. 2-9, 2012.REIS, V. T. D. C.; PRATA, M. A. R.; SOARES, A. B. Habilidades sociais e afetividade no contexto escolar: Perspectivas envolvendo professores e ensino-aprendizagem. Psicol. Argum., Curitiba, v. 30, n. 69, p. 347-357, 2012.RESENDE, A. T.; RESENDE, L. T. O conhecimento profissional docente: relatos de professores dos anos iniciais do ensino fundamental. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 16, n. 1, p. 67-80, 2015.

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Habilidades sociais em professores...

RODRIGUES, M. S. et al. Habilidades interpessoais nas competências gerenciais e de liderança. In: DEL PRETTE, Z. A. et al. Habilidades sociais: diálogos e intercâmbios sobre pesquisa e prática. Novo Hamburgo: Sinopsys, 2015. p. 462-496.ROSIN-PINOLA, A. R.; DEL PRETTE, Z. A. P. Inclusão Escolar, Formação de Professores e a Assessoria Baseada em Habilidades Sociais Educativas. Revista Brasileira de Educação Especial, v. 20, n. 3, p. 341-356, 2014. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382014000300003>. Acesso em: 20 abr 2016.SÁ, L. C. B. M. Competências para o século 21: o caso da Escola Estadual Julião Mendes. Revista Pesquisa e Debate em Educação, Juiz de Fora, v. 4, n. 1, 2015.SOARES, A. B. et al. Estudo comparativo de habilidades sociais e variáveis sociodemográficas de professores. Psicologia: teoria e prática, São Paulo, v. 11, n. 1, p. 35-49, 2009.

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S U M Á R I O

http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3-3

A COMUNICAÇÃO DOS REQUISITOS DA NORMA DE DESEMPENHO ABNT NBR 15575:2013

PARA O USUÁRIO FINAL DA EDIFICAÇÃO

The communication of performance standards requirements ABNT NBR 15575:2013 to building end users

Juliane BarqueteAcadêmica do curso de Arquitetura e Urbanismo da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Elvira LantelmeEngenheira Civil, Doutora, professora da Escola de Engenharia Civil da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Resumo

O presente trabalho possui como finalidade apresentar as principais dificuldades encontradas para comunicar a ABNT NBR 15575:2013, Norma de Desempenho, ao usuário final de edificações. Constatou-se que as informações contidas na norma em questão são de caráter técnico, sendo difícil a compreensão para pessoas leigas no assunto. A fim de melhor entender como informar dados técnicos ao usuário final, foi constatada a necessidade de analisar as percepções de profissionais envol-vidos no ciclo de vendas de um imóvel. Desta forma, foram realizadas entrevistas com corretores e especialistas da Norma de Desempenho, a fim de obter diversas opiniões sobre o tema em questão. Constatou-se que o repasse de informações ao usuário final deve ocorrer de forma clara e compreensível. No entanto, para definir o melhor meio de comunicação, é necessário o prosseguimento das entrevistas e questionários, a fim de obter maior embasamento técnico.Palavras-chave: ABNT NBR 15575:2013. Desempenho. Comunicação.

Abstract

This work aims to present the main difficulties in communicating the NBR 15575: 2013 to building end users. This study has found that information in the perfor-mance standards mentioned are mostly technical and difficult for ordinary people to understand. In order to better understand how to inform technical data to end users, it was found the need to analyze the perceptions of key professionals and spe-cialists involved in the selling process of a property in the building. Thus, interviews were conducted with real state agents and specialists in the Brazilian Performance

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A comunicação dos requisitos da norma de desempenho…

Standards in order to get different perspectives on this topic. We have found that passing information to end users is necessary understandable to way. However, fur-ther studies with interviews and questionnaires are needed to find improved ways to communicate technical data to end users.Keywords: ABNT NBR 15575:2013. Performance. Communication.

Introdução

O presente estudo pertence a um projeto de pesquisa do Centro de Gestão e De-sempenho de Edificações da Escola de Engenharia da Faculdade IMED cujo objeti-vo é avaliar o impacto da Norma de Desempenho NBR15575: 2013 sobre o processo de projeto.

O trabalho em questão possui significativa importância pois evidencia a rele-vância em comunicar informações técnicas contidas na Norma de Desempenho ao cliente, e busca meios de repassar tais dados ao usuário final, de modo que sejam compreensíveis a este.

Em 2013, a ABNT NBR 15575:2013 Edificações habitacionais – Desempenho foi lançada, apresentando sua segunda edição. A norma informa quais são o desempe-nho mínimo e os padrões técnicos mínimos que as construtoras brasileiras devem respeitar e garantir nas edificações a serem construídas. Segundo Borges (2008), a Norma de Desempenho serve como ponto norteador para os diversos profissionais da construção civil, com o propósito de obter maior excelência em seus produtos, aumentando a satisfação dos clientes.

Por tratar-se de uma norma relativamente recente, grande parte dos fornecedo-res, fabricantes e profissionais ligados ao setor da construção civil estão em processo de organização a fim de poder informar dados da norma de desempenho presentes em seus produtos aos seus clientes. Constata-se a presença de inúmeras dúvidas para todos os envolvidos na cadeia produtiva da construção civil (MIRANDA, 2014).

Os dados presentes na norma são apresentados em forma de conteúdo técnico, para profissionais da área, sendo de difícil compreensão ao usuário leigo. Assim, este trabalho possui como objetivo construir canais de comunicação sobre desem-penho em edificações que possam fornecer informações de qualidade, de forma a orientar o usuário final no processo de decisão de compra de um imóvel.

Também se busca identificar os critérios de qualidade da informação sobre de-sempenho de edificações; definir canais e formas de comunicação (meio escrito, imagens, táteis, sons, etc.) mais eficazes para a comunicação com o usuário final; avaliar as principais formas de comunicação existentes com o usuário e como po-dem contribuir para os objetivos do projeto; construir informação de qualidade e acessível ao usuário final; estabelecer experimentos de comunicação com o usuário final e avaliar sua eficácia.

Revisão bibliográfica

Norma de desempenho

A edificação possui desempenho, ou é bem “comportada”, quando dispõe de carac-terísticas que, quando impostas a algumas condições de exposição e uso, cumprem

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J. Barquete, E. Lantelme

as funções para as quais tal edificação foi projetada ao longo do seu ciclo de vida (BORGES, 2008).

A Norma de Desempenho 15575:2013, em sua forma atual, está dividida em 13 requisitos dos usuários: segurança estrutural, segurança contra incêndio, segurança no uso e operação de desempenho acústico, desempenho térmico, desempenho lu-mínico, estanqueidade, saúde, higiene e qualidade do ar, acessibilidade, conforto an-tropodinâmico e tátil, durabilidade, manutenibilidade e impacto ambiental (ABNT NBR 15575-1:2013, p. 11). Tais requisitos possuem inúmeros dados necessários a serem comunicados aos clientes interessados em comprar um imóvel (de modo que atendam o desempenho mínimo necessário da norma). No entanto, de acordo com Borges (2008), as informações presentes na NBR são apresentadas de forma técnica e menos conceitual. Sendo informações técnicas, tais dados tornam-se de difícil compreensão ao usuário leigo.

Direito a informação

Repassar informações técnicas ao cliente é indispensável, pois, conforme a lei n. 8.078 (BRASIL, 1990, p. 2), que dispõe sobre a proteção do consumidor, é direito básico deste obter “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”.

A legislação de proteção ao consumidor considera como infração penal realizar uma declaração ilegítima, ou emitir informações significativas referentes a natu-reza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços, levando a detenção de três meses a um ano, e multa (BRASIL, 1990, p. 18).

Portanto, entende-se que, se um indivíduo efetua a compra de um imóvel, ele possui o direito de ser informado acerca dos atributos de seu produto.

Atributos valorizados pelo cliente x reclamações dos clientes após entrega

Deve-se levar em consideração o que realmente o cliente valoriza em uma edi-ficação e quais são as suas reclamações após a entrega de imóveis adquiridos, a fim de criar um meio de comunicação eficaz e direto, que seja expressivo e chamativo aos olhos do usuário.

Diversos fatores são analisados no momento da compra: preço, condições de pagamento, prazo de ocupação, localização, planta, questão estética, entre outros. Também, existem elementos inf luenciadores: amigos, familiares, corretores e o marketing do imóvel em questão. Todos esses aspectos influenciam na decisão de compra, portanto o processo tende a ser mais complexo e demorado comparativa-mente ao de outros produtos (CAMPOS, 2012).

Para a maior parte dos consumidores, é de grande dificuldade identificar a qua-lidade presente em um imóvel, principalmente se for analisado em planta, com es-pecificações gerais. Mesmo quando o imóvel está pronto, não se pode ver o que está por trás do reboco. Devido ao fato de que a compra de um imóvel envolve altos in-vestimentos, a inserção de formas que visem diminuir o risco notado pelos clientes é de significativa importância (DALLAROZA, 1999 apud LOPES, 2004).

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A comunicação dos requisitos da norma de desempenho…

Segundo Campos (2012), clientes da classe C julgam a compra de uma edificação como algo penoso e de significativo risco, em virtude principalmente do alto valor de aquisição, responsabilidades atribuídas e, geralmente, inexperiência em relação ao assunto. Constata-se, através de entrevistas realizadas pelo autor, que a comuni-cação em forma de marketing, pessoal ou impessoal, induz a escolha pela compra, pois repassa ao cliente a sensação de minimização de riscos.

No entanto, para a classe A, Campos (2012) menciona, é necessário compreender as necessidades dos clientes e, assim, investir em comunicação, a fim de demonstrar que seus imóveis irão atender as expectativas desse público-alvo. Conforto, qualida-de de vida e contatos sociais são elementos pertinentes a serem vistos.

O aprendizado adquirido remete a pesquisas que mostram estas entre as prin-cipais falhas de qualidade das habitações: corrosão, trincas, fissuras, rachaduras, degradação do concreto, manchas, descolamento de revestimentos em fachadas e infiltrações (PINA, 2013).

Os requisitos de desempenho definidos pela NBR 15575:2013 (ABNT, 2013) focam basicamente nos principais problemas (patologias) e reclamações dos clientes na fase de uso. Cada um dos requisitos apresentados na norma possui significativa importân-cia, pois a Norma de Desempenho foi criada exatamente a partir da necessidade de atender as necessidades dos usuários das habitações.

Método de pesquisa

A primeira parte da pesquisa baseou-se na revisão bibliográfica referente ao con-ceito de “desempenho”, à criação da Norma, sua importância no setor da constru-ção civil, ao direito a informação do consumidor e ao processo de decisão de com-pra de imóveis. Como fontes de referências, foram utilizados documentos nacionais e internacionais, como teses, dissertações e relatórios.

As entrevistas foram iniciadas após o embasamento bibliográfico necessário, tendo em vista que seria necessária a colaboração de todos os profissionais envolvi-dos no ciclo de venda de uma edificação habitacional, a fim de encontrar a melhor forma de comunicar a Norma de Desempenho ao cliente.

Foram escolhidos, para a realização das entrevistas, corretores e especialistas da norma, selecionados conforme amostra por conveniência.

Os corretores foram selecionados pois são profissionais amplamente ativos no processo de venda de um imóvel, possuindo relação direta com o usuário. Os es-pecialistas foram escolhidos porque possuem o conhecimento técnico sobre a nor-ma. Todas as entrevistas foram gravadas com permissão verbal dos entrevistados e, posteriormente, transcritas para análise.

Corretores de imóveis

Os profissionais da área de corretagem de imóveis foram os primeiros a ser en-trevistados. Tais eventos aconteceram em duas imobiliárias, localizadas em Passo Fundo (RS), em dezembro de 2015, com duração de aproximadamente 1 hora cada, e média de 10 participantes.

As seguintes perguntas foram elaboradas, em forma estruturada aberta: O que vocês conhecem sobre a NBR 15575? O que vocês entendem por desempenho?

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J. Barquete, E. Lantelme

Como vocês irão vender e demonstrar para o cliente que o imóvel atende a norma de desempenho? O que gostariam de saber em relação à norma a fim de realizar as vendas dos imóveis?

As perguntas foram aplicadas em forma oral e presencial das autoras e respectivos corretores de imóveis.

Especialistas

As entrevistas com os especialistas iniciaram em março de 2016, via Skype, com perguntas estruturadas abertas: Quais são, em sua opinião, os benefícios da Norma de Desempenho (ou do requisito específico) para o usuário final? O que da Norma de Desempenho você considera que deva ser informado ao cliente? Como isto deve ser informado? Que tipo de linguagem (texto, imagens, sons, etc.) você considera que teria mais impacto? Você poderia citar exemplos ou dar sugestões?

Apresentaram-se estes participantes: engenheira civil e doutora em Engenha-ria, consultora que participou do processo de discussão da Norma de Desempenho no processo de elaboração; especialista em Marketing Imobiliário; engenheiro civil, mestre, professor da UFRGS, pesquisador na área de desempenho e presidente do comitê de discussão da Norma de Desempenho de um Sindicato Patronal.

O processo de entrevistas está em andamento, sendo que serão realizadas entre-vistas com especialistas de cada requisito da Norma de Desempenho.

Resultados

Corretores

Em suma, os corretores possuíam um breve conhecimento sobre a norma. Poucos conheciam todos os requisitos que a norma abrange, sendo, em grande maioria, fri-sados apenas os itens acústico e térmico. Alguns mencionaram a questão de que a norma dará mais segurança aos clientes pelo fato de que irão comprar um imóvel com qualidade superior à proporcionada atualmente, com maiores responsabilida-des aos profissionais envolvidos no empreendimento (maiores cuidados em todos os processos do empreendimento), por atribuir uma vida útil ao bem e por criar um padrão mínimo a ser atendido na área imobiliária; também, que a empresa que atender os níveis mínimos de desempenho possuirá um diferencial no mercado, e, por conseguinte o imóvel terá maior valor agregado, resultando assim em maior qualificação na área.

De acordo com respostas obtidas nas duas entrevistas, o entendimento relativo à palavra “desempenho” remete a maior qualidade e eficiência do imóvel, em que se empregam materiais com propriedades satisfatórias principalmente em requisitos acústicos (elemento com maiores citações devido ao fato de ser essa a maior preocu-pação apresentada pelos clientes), térmicos, vedações, cuidados com acessibilidade e maior respeito e prudência em relação a outras normas, melhorando, assim, a qualidade de vida do usuário.

Em relação à questão de como será realizada a venda demonstrando para o cliente que o imóvel atende a norma de desempenho, surgiram estas ideias:

◆ realizar comparativos de materiais com dados de fácil compreensão (como porcenta-gem), como itens pertinentes à atenuação acústica – por exemplo: “essa manta reduz x% de impacto”;

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A comunicação dos requisitos da norma de desempenho…

◆ conceber uma cartilha de venda comercial (bem visual, de fácil compreensão e que convença o cliente) e uma técnica (como um memorial descritivo), com cada item da norma, demonstrando os diferenciais que o empreendimento possui;

◆ mostrar ao cliente um vídeo com explicações especificadas, demonstrando etapas de construção do imóvel – por exemplo: estruturação do piso, vedações, esquadrias;

◆ apresentar quadro principal no apartamento decorado contendo especificações técni-cas de todos os elementos do imóvel, ou quadros espalhados pelos ambientes e locados conforme a localização do material/elemento;

◆ conceder plantas do apartamento, como as plantas arquitetônica, estrutural e das ins-talações;

◆ oferecer material ao cliente, não muito extenso, demonstrando por que o empreen-dimento possui diferenciais em relação a outros. Perceber o que atraiu o cliente no imóvel e, assim, explicar com maiores detalhes e especificações o item em questão, a fim de não cansar o cliente com informações que ele não almeja.

Atualmente, está sendo aplicado um questionário on-line, com perguntas fecha-das e abertas, o qual se encontra em andamento até a obtenção do número suficiente de respostas.

Especialistas

De acordo com as ideias dos especialistas, os principais benefícios da Norma de Desempenho para o usuário final são os seguintes:

◆ estabelecimento de critérios de como a edificação se comportará durante sua vida útil; ◆ regulamentação para requisitos novos, para os quais não havia normas, e indução ao

atendimento de Normas que não eram respeitadas anteriormente; ◆ representa um avanço no setor, pois eleva o nível de desempenho em relação ao que o

usuário possuía antes.

Quanto aos requisitos que devem ser melhor informados aos clientes, foi consi-derado o seguinte:

◆ estrutural: difícil de informar ao cliente, pois é um item bastante técnico; ◆ acústico: item bastante técnico, porém existem formas de explicar para o cliente sem

repassar informações técnicas; ◆ informar como o usuário deve utilizar e realizar a manutenção de cada sistema, e

estabelecer conhecimento mútuo entre construtor e cliente em relação à vida útil e prazos de garantia;

No que diz respeito a como as informações referentes à norma devem ser repas-sadas ao usuário final, recomendam-se as seguintes ações:

◆ manual de uso, operação e manutenção, utilizando textos e imagens; ◆ sistema de classificação dos empreendimentos baseado em desempenho; ◆ cartilha orientadora ao usuário informando o ponto de vista legal da compra; ◆ criar showroom a fim de demonstrar o desempenho para itens que possam ser perce-

bidos visual ou auditivamente; ◆ criar um serviço de atendimento ao consumidor (SAC), no qual o usuário possa bus-

car informações mais qualificadas sobre os atributos do empreendimento; ◆ criar selo de garantia idônea demonstrando que a norma está sendo atendida; ◆ memorial descritivo adaptado para o cliente leigo;

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J. Barquete, E. Lantelme

◆ utilizar cinco itens: durabilidade, segurança, conforto térmico, conforto acústico, preocupação ambiental – pois fazem mais sentido para o usuário; e criar um parágrafo que traga um pouco do técnico sobre eles, mas com linguagem codificada pelo cliente;

◆ falar dos itens da norma de uma forma simples, não técnica, e colocar no site da empre-sa material mais detalhado, como, por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor.

Considerações finais

Constata-se que corretores e especialistas entrevistados possuem pontos de vista diferentes sobre como informar os requisitos da norma para o usuário final e a sua respectiva importância perante a venda do imóvel.

Conclui-se que repassar informações técnicas ao usuário final é de suma impor-tância e deve ocorrer de forma clara e compreensível, mesmo que tais informações sejam de difícil comunicação ao usuário final. Portanto, o prosseguimento das en-trevistas e questionários é necessário.

Percebe-se que é necessária a criação de uma fonte de informações, confiável e isenta, a fim de qualificar os empreendimentos que realmente atendem a Norma de Desempenho, transmitindo maior confiabilidade ao cliente.

Por conseguinte, as informações recolhidas são insuficientes para definir qual a melhor maneira de informar desempenho ao cliente, sendo que, atualmente, está sendo aplicado um questionário aos corretores da cidade de Passo Fundo (RS), com perguntas abertas e fechadas, a fim de obter informações mais precisas referentes ao assunto em questão. Também, nacionalmente, estão em processo as entrevistas com um especialista de cada requisito presente na Norma de Desempenho.

Agradecimentos

À empresa Incoben Construções e Incorporações Ltda, pelo apoio financeiro à realização desta pesquisa.

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S U M Á R I O

http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3-4

O SOFRIMENTO ANIMAL COMO OBJETO DA CRIMINOLOGIA

Animal abuse as an object of criminology

Karine Agatha FrançaAcadêmica de Direito da IMED. Bolsista PROBIC/FAPERGS.

E-mail: <[email protected]>.

Mariangela Matarazzo Fanfa CologneseMestranda da IMED. Bolsista PROSUP/CAPES.

E-mail: <[email protected]>.

Marília de Nardin BudóDocente da Graduação e do Programa de

Pós-Graduação em Direito da IMED. E-mail: <[email protected]>.

Resumo

O modo de produção capitalista tem colidido frontalmente com a saúde do sistema ecológico, por meio da exploração desenfreada dos recursos naturais e da poluição. Muitos são os atores que lucram com esse cenário, sobressaindo-se as grandes cor-porações. Além de causarem danos irreparáveis ao meio ambiente e à vida huma-na, essas entidades têm garantida a própria imunidade, e o Direito é montado para manter sua desresponsabilização. Estudar os maus feitos das corporações é um dos objetivos do olhar criminológico estendido sobre os poderosos, com suas formas de criminalidade que alcançam um indeterminado número de sujeitos e ecossistemas. Este trabalho tem por objetivo analisar de que maneira os abusos cometidos contra animais pela indústria correspondem à categoria do dano social para constituir-se como objeto de uma criminologia crítica. Através do método dialético, parte-se das contradições envolvidas no discurso criminológico tradicional para estabelecer a necessidade de substituição do conceito de “crime” pelo de “dano social”. Em segui-da, estuda-se a maneira como a criminologia crítica, para além de sua emancipação do racismo e do patriarcalismo, também deve deixar o antropocentrismo, mirando uma compreensão global dos danos sociais no sistema capitalista.Palavras-chave: Criminologia crítica. Crimes dos poderosos. Dano social. Direitos dos animais. Crimes corporativos.

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K. A. França, M. M. F. Colognese, M. de N. Budó

Abstract

The capitalist production system has collided head-on with the health of the ecolo-gical system, through the unbridled exploitation of natural resources and creation of pollution. Many actors are able to generate profit within this scenario, mainly corporations. In addition to causing irreversible damage to the environment and human life, these corporations have found ways to guarantee legal immunity, and inappropriate legislation encourages such recklessness. Studying these misconducts of corporations is one of the purposes of Criminology, an action extended to the upper class, with their crime reaching a great number of subjects and ecosystems. This work aims to examine how corporate animal abuse can resemble social harm, constituting an object of critical criminology. By using the dialectical method of research, we start by analyzing the contradictions of the traditional criminological discourse, to highlight the need to replace this concept of crime by social harm. Later, we deliberated how critical criminology, beyond their emancipation from ra-cism and sexism, should also leave anthropocentrism, aiming at a comprehensive understanding of social harm in the capitalist system.Keywords: Critical criminology. Crimes of the powerful. Social harm. Animal rights. Corporate crimes.

Introdução

O movimento constante do capitalismo tem tornado os problemas ambientais a ele associados cada vez mais frequentes. A finalidade desse modelo econômico, que é o desenvolvimento infinito com a exploração de recursos finitos, não se coaduna com o potencial da natureza e, inevitavelmente, disso resulta a destruição do ecossistema.

Diante disso, exige-se maior consciência das consequências das atividades hu-manas e da amplitude das suas responsabilidades. Novos contextos de danos sociais de grande envergadura não podem ser ignorados pela criminologia. Em razão disso, a noção de “dano social” revela um quadro amplo, que os estudos tradicionais de crime e criminoso são incapazes de abordar. Assim, o objeto deste estudo são os resultados de sofrimento humano e não humano, e do prejuízo ambiental global, causados por poderosos, os quais agem na legalidade e são imunes ao sistema penal. Tal imunidade, contudo, não é percebida desde um ponto de vista ingênuo: o siste-ma penal é seletivo e montado para a preservação das estruturas de propriedade e poder no sistema capitalista (BARATTA, 2002).

A partir de uma abordagem criminológica verde, é possível ampliar o objeto de estudo não só dos danos contra a humanidade e o meio ambiente, mas também dos causados aos animais, posto que também são partes integrantes do meio ambiente. Isso exige o reconhecimento de que os seres humanos não são os únicos mas apenas parte de um ecossistema complexo, e a superação do especismo.

Práticas abusivas contra animais não humanos possuem várias tendências de estudo e estão focadas especialmente em práticas que, do ponto de vista antropo-cêntrico, são comuns e habituais, como a utilização de animais para consumo e em experiências científicas. Esses estudos fornecem uma profundidade que atualmente ainda é pouco trabalhada na literatura criminológica, mas que se compatibiliza per-feitamente com os ideais que estão por detrás da criminologia crítica: as buscas pela

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emancipação social e pela redução da dor provocada pelo sistema penal. Colocar frente a frente os dois campos se torna fundamental para encontrar outras maneiras de lidar com os danos causados pelo capitalismo.

Estudar os maus feitos das corporações é um dos objetos do olhar criminológico estendido sobre os poderosos, com suas formas de criminalidade que alcançam um indeterminado número de sujeitos e ecossistemas. Este trabalho tem por ob-jetivo analisar de que maneira os abusos cometidos contra animais pela indústria correspondem à categoria do dano social para constituir-se como objeto de uma criminologia crítica. Através do método dialético, parte-se das contradições en-volvidas no discurso criminológico tradicional para estabelecer a necessidade de substituição do conceito de “crime” pelo de “dano social”. Em seguida, estuda-se a maneira como a criminologia crítica, para além de sua emancipação do racismo e do patriarcalismo, também deve deixar o antropocentrismo, mirando uma com-preensão global dos danos sociais no sistema capitalista.

Crimes dos poderosos e danos sociais associados ao capitalismo

A instabilidade ambiental e a desorganização ecológica por meio da exploração desenfreada dos recursos naturais e da poluição são resultado inevitável do capita-lismo. Esse é um assunto que vem sendo amplamente discutido ao longo dos últimos vinte anos pelos teóricos da criminologia verde (green criminology). Duas figuras--chave na fundação da criminologia verde, Piers Beirne e Nigel South, argumentam que, num nível mais abstrato, ela inclui o estudo e reconhecimento de danos contra a humanidade, contra o meio ambiente (incluindo o espaço) e contra os animais não humanos (BEIRNE; SOUTH, 2013). Na busca por uma construção teórica aberta e múltipla, a criminologia verde reúne uma série de questões de fundamental impor-tância na atualidade, incluindo os crimes, os danos, os desastres ambientais, assim como as diversas formas de injustiças relacionadas ao meio ambiente, às espécies animais e ao planeta (NATALI, 2015).

Beirne e South (2013, p. 9, tradução nossa) apontam que esses danos podem ser causados “tanto por instituições poderosas (por exemplo, governos, corporações transnacionais, aparatos militares) quanto também por pessoas comuns”. Ao focar sobre os crimes/danos ambientais cometidos/causados por instituições poderosas, como Estados e corporações, reitera-se que o capitalismo e a natureza não cami-nham de mãos dadas1.

Esse é um fato que pode ser atribuído às próprias finalidades do capitalismo: a maximização do lucro, a exploração do trabalho, o aumento da taxa de produção, a redução dos custos, o aumento das vendas (MARX, 1996). Os grandes protagonistas do desenvolvimento econômico, os Estados e as corporações, impulsionam a expan-são do capitalismo com a criação de bens e necessidades que alimentam o consu-mo desenfreado. Daí a demonstração do discurso do desenvolvimento sustentável

1 Barak explica que, diante da maneira como a economia e a política dialetizam nessa área, o estudo dos crimes dos poderosos tem sido classificado em sete campos de atividades: 1) crimes da globalização; 2) crimes corporativos; 3) crimes ambientais; 4) crimes financeiros; 5) crimes estatais; 6) crimes estatal-corporativos; 7) crimes rotinizados do Estado. A principal caracterís-tica unificadora dessas categorias é que lidam com importantes influências, sendo protegidas pelo aparato de controle da criminalidade do Estado capitalista (BARAK, 2015).

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como contraditório (BUDÓ, 2014). A extração de gases naturais, petróleo e miné-rios causa mudanças nas paisagens naturais, poluição do ar e das águas, mudanças climáticas e o decréscimo das áreas verdes e da diversidade de animais – tudo em nome daquele que lucra e daquele que alimenta essa voracidade: o consumidor.

A partir dessas considerações, o conceito de “dano social” abre possibilidades de novos olhares criminológicos. Os danos sociais vinculados às grandes corporações transnacionais e ao Estado são ainda mais gravosos que os do capitalismo clássico, sobretudo quando se considera a sistemática jurídica através da qual as empresas hoje se constituem e garantem sua desresponsabilização (TOMBS; WHYTE, 2015). Pad-dy Hillyard e Steve Tombs (2007) sugerem que os danos sociais formam um quadro mais amplo das causas do sofrimento humano e do prejuízo ambiental global do que apontam os estudos tradicionais de crime e criminoso. É importante ressaltar que o conceito de “dano social” torna possível estender o olhar criminológico para além das suas fronteiras epistemológicas e incluir atos (i)legais e lesivos envolvendo elites poderosas, tais como governos, corporações e líderes políticos.

Portanto, é vital a percepção de novas e emergentes formas de criminalidade e comportamentos nocivos que, a despeito de sua (i)legalidade, têm alcançado inde-terminado número de sujeitos e ecossistemas. É nessa categoria de análise que se encaixam a macrocriminalidade ambiental e a vitimização massiva. Partir dessa macroestrutura é necessário para compreender o potencial imensurável dos proces-sos de degradação ambiental, ultrapassando o conceito de “crime”, já que a excessiva atenção dada aos casos que são definidos como crimes pelo direito penal faz desviar a atenção de danos mais graves (HILLYARD; TOMBS, 2007). O seu pertencimento, porém, à criminologia crítica faz com que a criminologia verde tampouco venha a sucumbir às ilusões do sistema penal; “não se trata de um punitivismo de esquerda que, ao buscar denunciar a criminalidade dos poderosos, acaba legitimando a ação do sistema penal que é estruturalmente montado para funcionar a serviço do capital” (BUDÓ, 2015, p. 259).

Compreender a macrocriminalidade desvela não só a cumplicidade de institui-ções poderosas, mas a razão de sua invisibilidade às abordagens criminológicas tra-dicionais. Dentro desse contexto, faz-se necessário um pensamento criminológico capaz de abarcar não só os danos contra a humanidade e o meio ambiente, mas tam-bém os danos causados aos animais não humanos, pois todos os sujeitos de vida de-vem ser tratados como um fim em si mesmos, e não como meio ou instrumento. Em relação a esses danos, Rob White (2008) critica a compreensão da justiça ambiental antropocêntrica, que ignora a questão mais ampla de justiça ecológica (reconheci-mento de que os seres humanos são apenas uma parte de um ecossistema complexo), e também da justiça dos animais e das espécies. Indo ao encontro desse argumento,

Na verdade, esta crítica pode ser cobrada na própria perspectiva construtivista, dado que falar de “ambiente” e “natureza” como conceitos socialmente construídos limita toda a questão em percepções humanas de danos e narrativas humanas. A pergunta feita por muitos comentaristas na área, portanto, é como as abordagens como as descri-tas acima podem refletir uma perspectiva mais ecocêntrica, dando voz ao próprio meio ambiente e aos animais. (HALL, 2015, p. 51, tradução nossa).

Na impossibilidade de esclarecer esses aspectos, porque animais não humanos não podem ser entrevistados ou colocados em um grupo de foco, permanece, por

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definição, a crítica positivista da objetividade do conhecimento científico tradicio-nal, o que precisa ser questionado nessa área.

Desenvolvimentos recentes na teoria ética sobre um estatuto moral dos animais exigem uma reconsideração das atitudes especistas e práticas que permeiam as rela-ções com os animais. O tema mais evidente que vem à mente, de um ponto de vista criminológico, é o abuso de animais ou a violência contra animais. Nesse ponto, duas observações são importantes: a negligência ou a seletividade em dar uma de-finição de “abuso de animais” ou “violência contra animais” revela a atenção unila-teral da criminologia em instâncias individuais, negligenciando instâncias institu-cionalizadas de abuso de animais (NURSE, 2016); a violência estrutural, teorizada por Galtung (1990) e debatida por Baratta (1993) no campo da criminologia crítica, pode auxiliar nessa perspectiva: toda a repressão das necessidades fundamentais é violência – daí o impacto do modelo de produção capitalista na geração de sofri-mento humano e animal.

O desaparecimento de espécies animais, tanto através de meios legais como de ilegais, “garante a mercantilização da natureza” e a melhor realização do valor eco-nômico, porque “a degradação ambiental e a destruição são, para alguns, rentáveis” (WHITE, 2008, tradução nossa). Uma compreensão mais detalhada de como ocor-rem esses crimes/danos contra os animais exige abordagens sutis e orientadas.

A criminologia verde e as práticas especistas: um estudo sobre abuso de animais

A primeira análise que deverá ser feita a partir dos estudos da criminologia verde sobre o abuso animal é acerca do conceito de “especismo”. A palavra foi utilizada pela primeira vez em 1970, por Richard Ryde, ao protestar contra a experimentação animal na Universidade de Oxford (SOLLUND, 2013). Posteriormente, o conceito foi utilizado por Singer (2004) no livro de maior reconhecimento mundial para a causa animal: Libertação animal.

A palavra “especismo” refere-se à doutrina de que os seres humanos são superio-res a outras espécies de animais e, portanto, possuem o direito de fazer com eles o que bem entenderem. Entretanto, a senciência animal (FURTADO, 2012) tornou-se a maneira mais sólida e concisa de suprimir a argumentação especista. Para Ryder (2005), a felicidade somente poderá ser alcançada com a libertação de todas as for-mas de dor e sofrimento interespécies.

Beirne (2013) menciona que frequentemente os seres humanos discriminam se-res de espécies não humanas, em vez de as espécies não humanas discriminarem outros seres. Por essa razão, a explicação da lógica especista deve ser observada com muita atenção e de forma crítica. A ideia especista tem sido equiparada com ou-tras formas de opressão, tais como, a discriminação racial, a sexista e a imperialista (BRÜGGER, 2009). Isso ocorre pelo fato de que o especismo também reflete práti-cas, ideologias e preconceitos, reciprocamente (SOLLUND, 2013). Muitas práticas discriminatórias contra animais não humanos advêm de hábitos culturais. “O espe-cista pensa que os animais só têm valor ou nos impõem obrigações éticas na medi-da em que eles atendem nossos interesses, propósitos, necessidades e preferências” (NACONECY, 2006, p. 70).

Por outro lado, o movimento animalista vem ganhado força e apoio até mesmo da comunidade científica, através da realização de estudos e pesquisas acerca dos

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direitos dos animais e da ética abolicionista animal. No que tange à criminologia, o ramo green já conta com um par de décadas de história, promovendo e desen-volvendo uma conscientização crítica de atos exploratórios humanos contra outras espécies de animais.

Na visão criminológica verde, as práticas abusivas contra animais não humanos possuem várias tendências de estudo: se os abusos são psicológicos ou físicos; se são aprovados ou reprovados socialmente; se tais práticas são necessárias ou desnecessá-rias, ou seja, se a utilização de animais para vestimentas, experiências, consumo e en-tretenimento é realmente necessária, ou não, para o ser humano (SOLLUND, 2013).

Sollund (2013) cita algumas formas de abuso animal que deveriam ser repro-vadas socialmente mas atualmente são aceitáveis: uso de animais em experiências científicas, para consumo, vestimenta, entretenimento, assim como os abusos de animais domésticos e o tráfico de animais selvagens.

Mesmo sendo ainda um campo incipiente de estudos e pesquisas dentro da cri-minologia verde, há um interesse substancial e crescente pelo sofrimento animal. Nos últimos anos, houve uma maior atenção legislativa e judicial acerca dos direitos do meio ambiente e dos direitos de certas espécies de animais não humanos, para viverem livres de abuso humano, tortura e degradação (WHITE; SOUTH, 2013).

Angus Nurse (2013) aponta que os animais também têm direitos, especialmente aquele de viver livre da interferência humana. Questões como por que as pessoas maltratam, ferem, matam animais são pontuais para Nurse, para quem existe uma gama diversificada de perigos discretos que ameaçam animais domésticos, de cam-po, dos esportes e da cultura, troféus de caça e espécies selvagens.

As análises indicam amplamente que os agressores de animais cometem seus crimes, pelas seguintes razões gerais: 1. o lucro (em sentido lato) ou ganho comercial; 2. emo-ção ou esporte; 3. necessidade de obtenção de alimento; 4. antipatia em relação a or-ganismos governamentais e aplicação da lei; 5. razões de tradição e cultura. (NURSE, 2013, p. 88, tradução nossa).

Os danos verdes podem não ser considerados crimes pelos Estados, mas o pon-to de vista crítico da criminologia não pode ignorar as condutas antropocêntricas que exterminam o meio ambiente e a vida de animais. A criminologia crítica deve averiguar alguns elementos como o caráter dos crimes de massa, a impunidade, a substancial aceitação por parte de opiniões públicas, bem como ir mais além dos terríveis danos sociais (BERNAL et al., 2014).

Os estudos apresentados e debatidos pela criminologia verde sobre o abuso de animais estão progredindo, principalmente nos casos de abusos contra animais do-mésticos (BEIRNE, 2012). As condutas que causam dor e sofrimento aos animais podem não estar tipificadas no sistema penal, entretanto isso não significa que se-jam corretas, pois muitas ações danosas ainda são permitidas pelas leis dos Estados. Somente através da conscientização social será possível abandonar os paradigmas antropocêntricos que massacram e exterminam espécies de animais. Ora, a educa-ção ambiental é a forma como a linha especista e antropocêntrica deverá ser rom-pida, assim como qualquer ação de dominação sobre o outro, como o racismo, o sexismo e o imperialismo (BRÜGGER, 2009).

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O sofrimento animal como objeto da criminologia

Considerações finais

Os grandes protagonistas do desenvolvimento econômico, os Estados e as cor-porações, impulsionam a expansão do capitalismo e são, de forma isolada ou con-junta, os maiores responsáveis pela degradação ambiental, cujas vítimas e danos são incontavelmente maiores que aqueles considerados pela criminologia tradicional. O conceito de “dano social” possibilita um novo olhar sobre os crimes ambientais e oportuniza outras perspectivas criminológicas às relações sociais e formas alterna-tivas de conceber a justiça.

A criminologia verde é um campo da criminologia que adota uma perspectiva para além dos crimes, atingindo os danos provocados contra seres humanos, contra o meio ambiente, contra os animais não humanos e outras espécies. Para tanto, po-rém, não é possível manter uma perspectiva antropocêntrica em relação aos estudos do sistema de controle e do dano social. Assim como a criminologia crítica apontou claramente o caráter racista, classista e patriarcal da criminologia positivista (ZA-FFARONI, 1991), é necessário a ela realizar sua autocrítica em direção à superação do especismo e da visão antropocêntrica de que em geral parte para lidar com seus objetos. Esse é o convite que os criminólogos verdes vêm fazendo no mundo todo, de modo a visibilizar outros sofrimentos que não são inferiores ou menos importan-tes que o sofrimento humano.

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http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3-5

O EFEITO DO ESTADO EMOCIONAL NA RELAÇÃO ENTRE O TIPO DE CONSUMO E A FELICIDADE

Effects of emotional state in the purchase-happiness relationship

Elem Rabelo Duarte VazAcadêmica da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Franciele LorenzatoAcadêmica da IMED, bolsista PROBIC/ FAPERGS.

E-mail: <[email protected]>.

Manueli TomasiAcadêmica da IMED, bolsista PROBITI/ FAPERGS.

E-mail: <[email protected]>.

Kenny BassoDocente da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Resumo

Esta pesquisa tem como objetivo verificar a relação entre o tipo de compras e a fe-licidade. Para testar as hipóteses, foi desenvolvido um experimento com 97 alunos, através de um questionário estruturado com perguntas fechadas, em que foram ma-nipulados dois tipos de compras: a compra de uma experiência e a compra de um bem material. Os resultados obtidos demonstraram que as pessoas se sentem mais felizes ao consumirem experiências que ao consumirem bens materiais. Espera-se que o estudo possa contribuir com a teoria, ao passo que pesquisadores buscam en-contrar o quanto as pessoas se consideram felizes, e o que fazem para se realizarem plenamente; e para ampliar o interesse na realização de pesquisas pelo método de experimento devido à carência dessa metodologia de estudos no Brasil.Palavras-chave: Tipos de consumo. Bens e serviços. Estado emocional. Felicidade.

Abstract

This research aims to determine the relationship between purchase and happiness. In order to test our hypothesis, we have conducted an experiment with 97 students, using a structured questionnaire with closed questions that depicted two types of

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purchases: the purchase of an experience and the purchase of goods. Results have shown that people tend to feel happier when purchasingexperiences rather than ma-terial goods. This study is expected to contribute to the studies that seek to find out when people consider themselves happy, and what they do to fully achieve happiness; and we also expect this work to encourage researches that use the experiment method, since there are only a few studies that use this methodology in Brazil.Keywords: Types of consumer goods and services, emotional state, happiness.

Introdução

Um dos grandes debates acadêmicos das últimas décadas implica compreender o comportamento do consumidor na decisão de compra e como isso influencia para que as pessoas se considerem felizes (MATTOS; CASTRO, 2008; LIN; DESAI, 2013). Neste contexto, é importante que se entendam os tipos de compra – a compra de bens materiais (tangível) e a de experiências (intangível) –, buscando relacionar o tipo de compra com a felicidade.

O consumo de bens materiais (tangível) é caracterizado como a intenção pri-mária de se adquirir um bem material, um objeto tangível, que é mantido na posse de alguma pessoa (VAN BOVEN; GILOVICH, 2003). No consumo de experiências (intangível), a decisão pelo consumo é mais cautelosa, por se tratar da compra de uma expectativa, uma ilusão (BENI, 1997). Neste sentido, como a experiência so-mente será conhecida após vivenciada, a satisfação do consumidor se torna mais difícil de ser mensurada (BENI, 1997).

Com a análise do tipo de compra relacionado à felicidade, torna-se mais fácil entender o processo de percepção do consumidor, considerando o seu grau de feli-cidade e bem-estar. Assim, todo o processo de decisão de compra possui relevância significativa, pois, somente após passar por todas as etapas do processo, os consumi-dores podem avaliar sua experiência de consumo e efetivamente transpor seu nível de felicidade e bem-estar advindo dele.

Para Bauman (2008), o consumo não é sinônimo de felicidade, nem é conside-rado uma atividade que provoque a felicidade. Leifer (1997) trata esse consumismo como um ciclo sem fim, que consiste em trabalhar para adquirir renda, gastar em compras, acumular dívidas e trabalhar para conseguir pagá-las, gerando, assim, uma espécie de tortura diária ao indivíduo.

Diante deste questionamento, despertou o interesse em compreender a relação do tipo de compra com a felicidade, visando, assim, ao bem-estar subjetivo do con-sumidor. Considerando as argumentações expostas, a pergunta fundamental do presente estudo será esta: qual o efeito do consumo de bens materiais ou de expe-riências na felicidade?

O objetivo geral deste estudo é analisar a relação entre o tipo de compra, cuja composição se dá através de bens ou experiências, e a felicidade.

Tipos de consumo

Muitos estudos (TEIXEIRA; HERNANDEZ, 2012; LIN; DESAI, 2013) descrevem o termo “consumir” como uma atividade que pode trazer satisfação e realização aos consumidores (COSTA FILHO, 2005). O consumo pode, ainda, estar relacionado a

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sentimentos e valores que ultrapassam a materialidade do bem adquirido (MATTOS; CASTRO, 2008).

Quando o consumidor é orientado por outras pessoas, pode ser classificado em social, pelo fato de estar ligado à expressividade, ou em espiritual, de acordo com sua prática social. E, à medida que o consumidor é auto-orientado, o consumo pode ser hedônico ou utilitário (HANKS; MATTILA, 2012).

O termo “hedônico” (de “hedonismo”) propõe a ideia de que a satisfação e o prazer que o produto proporciona ao consumidor dependem dos tributos desse pro-duto (BESANKO et al., 2004; HANKS; MATTILA, 2012). Já no consumo utilitário, o foco da atividade de consumo é deslocado das propriedades específicas dos bens para elementos que são distintos do seu valor de uso, ou seja, um valor estritamente utilitário (RETONDAR, 2007).

O propósito principal de qualquer tipo de consumo, seja material ou experiên-cia, é sempre trazer mais satisfação e bem-estar subjetivo, também conhecido como bem-estar hedônico, que se refere à qualidade das emoções das experiências viven-ciadas pelo indivíduo no seu dia a dia (SCHAFRANSKI, 2012). Outro fato relevan-te que deve ser levado em consideração é que o consumo, tanto de bens materiais como de experiências, é fortemente influenciado pela renda disponível e a situação econômica do consumidor (MIOTTO, 2013).

A renda disponível seria o valor que sobra depois de pagar os impostos, moradia, roupas, transporte e alimentação; enquanto que a renda discricionária seria o valor que sobra após o pagamento dos impostos e itens de necessidade básica – restando somente diferenciar, de acordo com a interpretação de cada consumidor, o que é luxo e o que é considerado necessidade básica (KERIN et al., 2011).

Consumo de bens materiais

A compra de bens materiais é definida por Van Boven e Gilovich (2003) como aquela com a intenção primária de adquirir um bem material, um objeto tangível, que é mantido na posse de alguma pessoa. Pine e Gilmore (1999) afirmam que, claramente, os consumidores desejam experiências, mesmo no consumo de bens materiais. A mudança de comportamento começa com a aquisição de commodities pelos consumidores, quando o mercado se volta para o consumo de manufaturados devido aos avanços da economia industrial.

Dentre as características objetivas que o produto apresenta, pode-se levar em consideração cor, peso, formato, dentre outras; em relação às quais os consumido-res incorporam uma personalidade através de vários tipos de respostas subjetivas, como sentimentos, crenças e emoções. Assim, a diferença entre as experiências de consumo se faz pela objetividade das características ou pela subjetividade das res-postas (ADDIS; HOLBROOK, 2001). Cada vez mais são levadas em consideração as experiências sensoriais recebidas de produtos e serviços na escolha entre as opções concorrentes (SOLOMON, 2008).

Consumo de experiências

O consumo de experiências está diretamente associado ao tempo livre do indiví-duo – o tempo disponível após a realização das obrigações familiares, profissionais,

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sociais e de cuidados pessoais (GOUVEIA; LIMEIRA, 2008). O tempo livre está associado ao tempo de descanso, e não a um dia útil de trabalho, de realização de tarefas cotidianas (BARBOSA, 2010).

Assim, do ponto de vista econômico, o consumo de lazer vem depois de consi-derado o orçamento, ou seja, depois de distribuída a renda em consumo obrigatório das necessidades vitais (alimentação, moradia, vestuário, higiene) e não tão vitais, dependendo do nível de vida (empregados, carros, livros) (SOLOMON, 2008).

Já do ponto de vista psicológico, o consumo de lazer só vem depois que todas as necessidades vitais foram satisfeitas, pois as pessoas entendem que o lazer é uma necessidade social (SOLOMON, 2008). Como exemplo, pode ser citado o turismo: as pessoas acreditam que viajar pode determinar seu status e, dessa forma, gerar estima pelo grupo em que estão inseridas (SOLOMON, 2008).

Neste sentido, pode-se perceber que o indivíduo não busca somente bens mate-riais para a sua satisfação, mas que, muito habitualmente, procura por experiências como forma de suprir a carência de felicidade. Solomon (2008) afirma que, de acor-do com descobertas de pesquisas psicológicas com foco na experiência emocional, o consumidor prefere experiências adicionais a bens adicionais à medida que sua renda aumenta.

Felicidade

Em vários países, pesquisadores buscam encontrar o quanto as pessoas se consi-deram felizes, e o que fazem para se realizar plenamente (SIQUEIRA; PADOVAM, 2008; JINGJING; HAIYANG; NEAL, 2013; LIN; DESAI, 2013). Nesta linha de pen-samento, ao procurar sentir-se bem, as pessoas devem avaliar as emoções positi-vas e negativas às quais são submetidas, ou seja, realizar avaliações de suas vidas (DIENER; SUH; OISHI, 1997) e acerca de o que consideram importante (BECKER, 2009). A felicidade pode ser expressa como o conjunto de experiências emocionais positivas, predominando a ocorrência de afeto positivo sobre o negativo, e tem pa-drões de representações culturais, em que está englobado o julgamento de o que é ser feliz (GONÇALVES, 2006).

Quando se fala em estudar a felicidade, sempre surge o questionamento de como mensurá-la; Schafranski (2012) afirma que medir a felicidade é possível, desde que sejam aplicados a esse fim instrumentos de pesquisa e metodologia validados cien-tificamente. “As pessoas medem a felicidade por aquilo que consomem, seja por meio de bens tangíveis (mercadorias ou produtos), ou intangíveis (bens culturais).” (CORRÊA, 2009, p. 82).

Muitas pessoas acreditam que a felicidade é alcançada pela aquisição e consumo de bens (LEIFER, 1997; LIN; DESAI, 2013); que, do ponto de vista econômico, tam-bém está relacionada ao consumo e à posse de bens materiais (COBRA, 2004). Co-bra (2004) acredita que um problema relacionado a essa busca é o de que as pessoas são levadas a trabalhar mais para poder consumir mais e, assim, buscar a felicidade.

Bauman (2008, p. 61) apresenta uma visão contrária à abordada por Cobra (2004): afirma que “novos incrementos de renda não aumentam o volume de fe-licidade”. Não existem evidências de que o número de pessoas que afirmam que se sentem felizes aumenta com o crescimento do consumo em geral (BAUMAN, 2008). Para Costa Filho (2005), a associação entre produto e felicidade não é falsa e, ao mesmo tempo, não é verdadeira; ele esclarece que os produtos de consumo são

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relacionados a diversas formas de prazer, e cita como exemplo pertencer a um grupo social, degustar um alimento, aliviar o estresse ou enfrentar o medo.

Diante das teorias expostas, foi elaborada a primeira hipótese da pesquisa: o nível de felicidade será maior para os sujeitos expostos à compra de uma experiência do que para os sujeitos expostos à compra de bens materiais.

Método

Delineamento da pesquisa

Para consecução dos objetivos propostos, foi realizada uma pesquisa de nature-za quantitativa, classificada como causal, para testar a relação de causa e efeito entre o consumo de bens materiais e experiências e a felicidade. A população destinada ao estudo foi composta por alunos do curso de Administração da IMED – Faculdade Meridional. Foi possível coletar um total de 97 questionários: 51 se referiam ao con-sumo de experiência (viagem em cruzeiro marítimo) e 47 se referiam ao consumo de bens materiais (Smart TV) – essa amostra foi suficiente para análise dos dados e obtenção dos resultados da pesquisa.

Para possibilitar a pesquisa, foi utilizado como instrumento de coleta de dados um questionário, estruturado, com perguntas fechadas. Como a pesquisa foi através de um experimento, o questionário inicialmente narrava situações de compras que foram manipuladas através de dois tipos de cenários diferentes. Esse método consiste na elaboração de histórias que abordam as variáveis estudadas, neste caso, a variável independente, que é o tipo de compra. A primeira condição iniciava com a narrativa de uma situação de consumo de uma experiência (uma viagem a um cruzeiro marí-timo), enquanto o outro narrava a situação de um consumo de bem material (uma Smart TV), para que os consumidores se sentissem o mais próximo da situação.

Logo após a descrição dos cenários escritos, o questionário abordava questões em que o respondente analisava a compra supostamente realizada; foram abordados aspectos sobre a felicidade como consequência da compra realizada, o bem-estar subjetivo, além de aspectos demográficos.

A terceira parte do questionário foi elaborada contendo vinte adjetivos que des-crevem sentimentos diferentes; cada adjetivo citado foi classificado em uma escala de sete pontos, que variam de “nada ou muito pouco” até “extremamente”, de acor-do com os sentimentos vivenciados pelo respondente no momento da pesquisa. A escala utilizada foi adaptada da escala traduzida por Galinha e Ribeiro (2005): sete dos itens referentes ao afeto positivo permaneceram os mesmos e três deles foram substituídos, acreditando que assim seriam mais convenientes à pesquisa – excita-do, caloroso e surpreendido foram substituídos por empolgado, orgulhoso e alegre. Também, no que se refere aos afetos negativos, foram utilizados sete itens da escala de Galinha e Ribeiro (2005), tendo sido igualmente três substituídos: amedrontado, medo e repulsa por tristeza, arrependimento e chatice. Os itens substituídos foram testados no pré-teste, não apresentando problemas expostos pelos respondentes; as-sim, foram efetivamente utilizados na pesquisa final. Os dados foram analisados através do software estatístico Package Used for Statistical Analysis (versão 20).

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Resultados

Checagem da manipulação – Qui-Quadrado

Os grupos entrevistados foram questionados sobre se a situação apresentada no texto inicial do questionário se referia à compra de um produto ou de uma experiência. O propósito desta questão foi justamente avaliar se a manipulação das variáveis independentes foi realmente a causa dos efeitos observados sobre as variáveis de-pendentes. Os resultados encontrados apontam que 83,7% do grupo respondente à compra de experiência afirmaram que o texto inicial se tratava de uma experiência, e 16,3% consideraram tratar-se da compra de um produto. Já no grupo respondente à compra de bem material, 76,6% afirmaram que o texto apresentado inicialmente se referia à compra de um produto, enquanto que 23,4% disseram que se referia à compra de uma experiência (χ2 =35,099, p<0,01).

Outra variável comportamental utilizada na checagem da manipulação foi a questão que indicava se o serviço/produto descrito no texto inicial se tratava de algo tangível ou de algo intangível. Entre os entrevistados do grupo do consumo de experiência, 67,3% consideraram que o texto se referia a algo intangível; 32,7%, que se referia a algo tangível. Entre os entrevistados do grupo de consumo de bem ma-terial, 60,4% afirmaram que o texto inicial se tratava do consumo de algo tangível, enquanto 39,6% consideraram o consumo de algo intangível (χ2 =32,259; p<0,01).

Teste da hipótese

Para o teste do efeito do tipo de compra na felicidade, foi realizada uma ANOVA, tendo como fator o tipo de compra (experiência ou produto), e como variável depen-dente a felicidade. Nesse teste, verificou-se que há um efeito significativo do tipo de compra na felicidade do cliente (F(1, 94)=9,252; p<0,01).

A variável felicidade, classificada como dependente, apresentou uma média mais alta para a compra de experiência (M=5,70) em relação à compra de bens materiais (M=5,06). A felicidade foi mensurada ao passo que os indivíduos foram expostos a situações de compra de bens materiais e de experiências e, ao se imaginarem nes-tas, foram questionados sobre o quanto se sentiram felizes com a compra realiza-da, apresentando resultado maior para compra de experiências. Assim, os valores encontrados nas médias indicam que a compra de experiências proporciona mais felicidade do que a compra de bens materiais.

Considerações finais

Através deste estudo, permite-se afirmar que os consumidores se sentem mais felizes ao consumirem experiências do que bens materiais. A compra de experiên-cia apresentou maior nível de felicidade comparativamente ao grupo que optou por compra de bens materiais, como apresentado na primeira hipótese.

Ao avaliar o efeito do estado emocional na relação entre o tipo de compra e a felicidade, foram analisadas as variáveis do estado emocional: dez delas se referiam a emoções positivas (interesse, empolgação, entusiasmo, inspiração, orgulho, ale-gria, encantamento, determinação, surpresa e atenção); e as outras dez, a emoções

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O efeito do estado emocional...

negativas (chatice, irritação, culpa, arrependimento, tristeza, nervosismo, raiva, medo, susto e perturbação).

Ao analisar as variáveis interesse e entusiasmo, foi possível constatar que, quanto maiores forem elas, maiores serão o impacto na relação de tipo de compra e a feli-cidade percebida pelos sujeitos que compraram experiências do que para os sujeitos que compraram o bem material. Outra variável que apresentou efeito foi o encanto: o efeito percebido deixou claro que, quando o encanto é demonstrado em níveis mais elevados, também se eleva o efeito na relação entre o tipo de compra e a feli-cidade; e, à medida que o encanto apresenta níveis mais baixos, já não existe efeito nessa relação. Assim, um conjunto de emoções positivas e negativas pode sim, alte-rar a relação entre o tipo de compra e a felicidade.

Em relação às contribuições teóricas, o estudo demonstrou que o estado emo-cional apresenta efeito na relação entre o tipo de consumo e a felicidade, e isso con-sequentemente gera mais bem-estar ao consumidor. O estudo mostrou, ainda, que, ao buscarem mais felicidade, os consumidores pedem por experiências; ora, as em-presas deverão estar preparadas para essas escolhas. Além disso, as empresas de-vem conhecer seus consumidores. As emoções geradas pelo consumo de produtos e serviços devem ser levadas em consideração, pois possibilitam desvendar alguns desejos dos consumidores e, consequentemente, obter mais assertividade em rela-ção à oferta de produtos e serviços por parte das empresas, que atendam as suas necessidades e proporcionem mais felicidade ao consumidor.

O fato de se optar por um estudo com o método de cenários escritos, em que o tipo de compra (cruzeiro marítimo ou Smart TV) já estava definido previamente pela pesquisadora, pode ter interferido na avaliação das alternativas. Sugere-se, para estudos futuros, alternativas diversificadas de consumo, de modo que os responden-tes possam sugerir tipos de compra.

Por fim, com a pesquisa realizada, o caminho do processo de decisão de compra pode se tornar mais ameno e seguro para o consumidor. Entendendo o processo de decisão de compra e as percepções dos consumidores, considerando o grau de felicidade proporcionado, as empresas podem levar vantagem competitiva diante de seus concorrentes.

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ABNT NBR 15575-4 – VEDAÇÕES VERTICAIS: O IMPACTO NOS CUSTOS

ABNT NBR 15575-4 – Vertical seals: their impact on costs

Gustavo ZanottoAcadêmico da IMED. Bolsista PIBIC CNPq. E-mail: <[email protected]>.

Elvira LantelmeEngenheira Civil, Doutora, professora da Escola de Engenharia Civil da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Resumo

A Norma de Desempenho ABNT NBR 15575:2013, para ser aplicada, requer capaci-tação, orientações claras e estudo sistematizado. Na fase de projeto, um dos primeiros sistemas construtivos a ser analisado é o sistema de vedações verticais. O presente estudo tem como objetivo comparar os custos de sistemas de vedações verticais in-ternas e externas de uma planta tipo de uma edificação em fase de projeto, analisan-do os impactos sobre o custo nas vedações verticais para que a referida norma seja atendida. Com base nos dados referentes ao sistema construtivo, foi desenvolvida uma tabela comparativa de custos para diferentes tipologias de vedações verticais. Observou-se que, visando atender a NBR 15575, foi necessário utilizar uma maior variedade de variações de blocos em uma mesma planta tipo, o que poderá impactar na necessidade de um maior controle na execução da obra. Analisando as diferentes soluções para o sistema de vedação vertical dessa planta tipo, o menor impacto gera-do nos custos foi de 9,82%, e o maior, de 30,15%, em relação ao sistema de referência, ou seja, o sistema anteriormente utilizado pela construtora. O sistema escolhido pela empresa como solução final para atender a norma de desempenho representou um impacto de 19,50% no custo.Palavras-chave: Norma de Desempenho NBR 15575. Sistema de vedações verticais. Custos.

Abstract

In order to apply The Brazilian Performance Standard ABNT NBR 15575: 2013, there is a need for training, clear guidelines and systematic study. In the design phase, one of the first points analyzed was the vertical sealing system. This study aims to compa-re the vertical sealing system costs of a building plant, in order to analyse how much

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G. Zanotto, E. Lantelme

the cost of the vertical sealing system must raise so that the performance standard is met. Based on the data of different vertical sealing systems, a comparative analysis of the costs was carried out. It was observed that to meet NBR 15575, it was necessary to use more variations of blocks, which could impact the control and execution of the work. The lower impact generated was 9.82%; the highest, 30.15%, when compared with a reference system. The impact of the selected system in cost was 19.50%. Keywords: Performance Standards. Vertical Seal System. Costs.

Introdução

Com a entrada em vigor da Norma de Desempenho ABNT NBR 15575:2013, os projetistas e as construtoras têm encontrado dificuldades para a seleção de compo-nentes, materiais e sistemas construtivos que atendam os requisitos de desempenho da referida norma. Isto se deve, por um lado, à falta de informações quanto ao de-sempenho de sistemas construtivos comumente empregados no mercado. Muitos fornecedores não conseguiram ainda se adaptar às exigências de comprovação de desempenho da NBR 15575:2013. Os fabricantes indicam a falta de uma rede la-boratorial e altos custos dos ensaios como os fatores principais para essa falta de informações. Porém, também se observa o desconhecimento de normas técnicas e a não conformidade intencional de determinados fabricantes, bem como a pouca exigência por parte de construtoras e projetistas, como outros fatores que podem justificar os fatos mencionados.

Conforme Oliveira (2012), o fato de não considerar os aspectos de desempenho na fase de projeto não significa que o sistema não atenda os critérios de desempenho exigidos, porém qualquer alteração necessária para o atendimento mínimo da nor-ma pode gerar altos custos.

Dentro desse contexto, optar por uma solução construtiva no que se refere a vedações verticais, que atenda a Norma de Desempenho e que não fuja, exagera-damente, dos custos que vinham sendo praticados pelo mercado, representa atual-mente um grande desafio para as construtoras e incorporadoras.

O objetivo deste estudo foi verificar o impacto do atendimento à Norma de De-sempenho nos custos das vedações verticais, através de uma análise comparativa entre o custo dos sistemas de vedações verticais internas e externas habitualmente utilizados por uma construtora em edificações já finalizadas e outros sistemas de vedações ver-ticais possíveis de execução e que atendam os requisitos da Norma de Desempenho.

Segundo Construção Mercado (2008), as vedações verticais, tanto paredes quan-to esquadrias, representam aproximadamente 20% do custo total da construção de uma edificação.

Este estudo faz parte de um projeto de pesquisa desenvolvido pelo Centro de Gestão e Desempenho de Edificações da Escola de Engenharia da Faculdade Meri-dional, cujo objetivo é analisar os impactos da implantação da Norma de Desempe-nho NBR 15575:2013 sobre o processo de projeto.

Método de pesquisa

O estudo foi realizado em um empreendimento em fase de desenvolvimento de projetos, cujo acesso foi disponibilizado por uma construtora e incorporadora parceira da pesquisa.

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ABNT NBR 15575-4 – vedações verticais…

Especificamente, o estudo das vedações verticais foi escolhido por representar uma mudança importante no processo construtivo da empresa, que vinha atuando com o sistema construtivo de alvenaria estrutural de blocos cerâmicos e, no novo empreendimento, definiu utilizar a alvenaria racionalizada de blocos cerâmicos como forma de buscar uma maior racionalização do processo construtivo.

Também, a empresa identificou que uma das primeiras decisões a serem toma-das em relação ao desempenho da edificação seria quanto ao sistema construtivo de vedações verticais internas e externas, pois impactaria todos os demais projetos da edificação, bem como o processo de produção de uma edificação, relacionada ao custo, logística e planejamento da obra.

Para a realização do estudo, primeiramente foi feito um levantamento quantita-tivo das vedações verticais da planta tipo da edificação, calculando as áreas de cada um dos diferentes tipos de vedações verticais, conforme as necessidades de desem-penho definidas na NBR 15575-4 (ABNT, 2013):

a. paredes externas;b. paredes entre unidades autônomas (onde não haja ambiente dormitório);c. paredes entre unidades autônomas (onde um dos ambientes seja dormitório);d. paredes corta-fogo (ao redor de escadas de emergência);e. paredes cegas entre unidades autônomas e áreas de circulação;f. paredes divisórias no interior das unidades autônomas.

Foi realizado um levantamento de vários sistemas construtivos de vedações verticais, com suas respectivas características de desempenho térmico, acústico e tempo requerido de resistência ao fogo, de acordo com os critérios da NBR 15575-4. O resultado foi apresentado à construtora, porém, devido à cultura regional do usuário e à cultura da própria construtora, que já executava edifícios com alvenaria estrutural, optou-se por não desviar do sistema construtivo convencional em blocos cerâmicos. Ao mesmo tempo, a construtora escolheu utilizar os blocos cerâmicos de um fabricante específico, o único no estado do RS que apresentou dados técnicos e laudos de ensaios de desempenho de seu produto.

A fim de obter um comparativo de custos entre diferentes sistemas construtivos, foram calculados os custos de diferentes tipos de paredes e, posteriormente, feitas diferentes composições de blocos para o projeto em análise:

O quadro 1 mostra as diferentes tipologias de paredes que foram combinadas para formar diferentes sistemas construtivos para a planta tipo [próxima página].

Para o levantamento, foram montadas as composições de custos de cada uma das tipologias, considerando os consumos unitários de materiais e mão de obra. Os dados utilizados para montar as composições foram obtidos com base na expe-riência da construtora. Posteriormente, os preços de materiais e mão de obra foram pesquisados junto aos fornecedores e com a construtora.

Utilizando os custos de cada um das tipologias de paredes, foram montadas di-ferentes opções de sistemas construtivos de paredes internas e externas, atendendo o desempenho requerido pela NBR 15575, dentro de opções possíveis para a cons-trutora. Com essas informações, foram geradas tabelas de custos para cada vedação vertical versus seu desempenho necessário.

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G. Zanotto, E. Lantelme

Quadro 1: Tipologias de paredesTipologia Características

Paredes externas

Bloco cerâmico estrutural 7MPa, nas dimensões 14x19x-29cm e 19x19x29cmBloco cerâmico de vedação (furos verticais), nas dimensões 14x19x29cm e 19x19x29cmBloco de Concreto Celular espessura de 20cm

Paredes internas entre unidades autônomas (UA) (onde não haja ambiente dormitório)

Bloco cerâmico estrutural 7MPa nas dimensões 14x19x-29cm Bloco cerâmico estrutural 18MPa 14x19x29cm

Paredes internas entre unidades autônomas (UA) (onde um dos ambientes seja dormitório), con-sideradas paredes “acústicas”

Bloco cerâmico estrutural 7Mpa 14x19x29cm + Gesso acartonadoBloco cerâmico estrutural 18MPa 14x19x29cmBloco cerâmico de vedação 9x19x29cm + Câmera de ar 4cm + Bloco cerâmico de vedação 9x19x29cmBloco cerâmico de vedação 9x19x29cm + Câmera de ar 4cm + Bloco cerâmico de vedação 11,5x19x29cm

Paredes ao redor de escada, con-sideradas corta-fogo

Bloco cerâmico estrutural 7MPa 14x19x29cmBloco de concreto celular espessura de 10cm

Paredes internas cegasBloco cerâmico estrutural 7MPa 14x19x29cmBloco cerâmico de vedação 11,5x19x29cmBloco cerâmico light 9x19x29cm

Fonte: elaboração dos autores.

Resultados

Inicialmente, foi calculado o custo do sistema construtivo utilizado pela empre-sa antes da exigência mínima da Norma de Desempenho, denominado Sistema de Referência (SR): paredes externas: bloco cerâmico light 14x19x29cm; paredes inter-nas (todas): bloco cerâmico light 11,5x19x29cm; paredes corta-fogo: bloco de con-creto celular espessura 10cm.

Foram definidas nove opções de sistemas construtivos para execução das veda-ções verticais da planta tipo:

a. Sistema 1: paredes externas, internas entre UA, internas cegas e corta-fogo de bloco cerâmico estrutural 7MPa 14x19x29cm + paredes acústicas bloco cerâmico de veda-ção 9x19x29cm + câmera de ar 4cm + bloco cerâmico de vedação 9x19x29cm;

b. Sistema 2: paredes externas, internas entre UA, internas cegas e corta-fogo de bloco cerâmico estrutural 7MPa 14x19x29cm + paredes acústicas bloco cerâmico estrutural 18Mpa 14x19x29cm;

c. Sistema 3: paredes externas bloco cerâmico light 19x19x29cm + paredes internas en-tre UA, internas cegas e corta-fogo de bloco cerâmico estrutural 7MPa 14x19x29cm + paredes acústicas bloco cerâmico de vedação 9x19x29cm + câmera de ar 4cm + bloco cerâmico de vedação 9x19x29cm;

d. Sistema 4: paredes externas bloco de concreto celular com espessura de 20cm + pare-des internas entre UA, internas cegas e corta-fogo de bloco cerâmico estrutural 7MPa 14x19x29cm + paredes acústicas bloco cerâmico de vedação 9x19x29cm + câmera de ar 4cm + bloco cerâmico de vedação 9x19x29cm;

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ABNT NBR 15575-4 – vedações verticais…

e. Sistema 5: paredes externas, internas entre UA e corta-fogo de bloco cerâmico es-trutural 7MPa 14x19x29cm + paredes internas cegas bloco cerâmico de vedação 11,5x19x29cm + paredes acústicas bloco cerâmico estrutural 18MPa 14x19x29cm;

f. Sistema 6: paredes externas e internas entre UA bloco cerâmico estrutural 7MPa 14x19x29cm + paredes internas cegas bloco cerâmico light 9x19x29cm + paredes acústicas bloco cerâmico estrutural 18MPa 14x19x29cm + paredes corta-fogo bloco de concreto celular espessura de 10cm;

g. Sistema 7: paredes externas bloco de concreto celular espessura de 20cm + paredes internas entre UA e acústicas bloco cerâmico estrutural 18MPa 14x19x29cm + pa-redes internas cegas bloco cerâmico light 9x19x29cm + paredes corta-fogo bloco de concreto celular espessura de 10cm;

h. Sistema 8: paredes externas, internas cegas e corta-fogo de bloco cerâmico estrutural 7MPa 14x19x29cm + paredes internas entre UA e acústicas bloco cerâmico estrutural 18Mpa 14x19x29cm;

i. Sistema 9: paredes externas, internas entre UA, internas cegas e corta-fogo de bloco cerâmico estrutural 7MPa 14x19x29cm + paredes acústicas bloco cerâmico de veda-ção 9x19x29cm + câmera de ar 4cm + bloco cerâmico de vedação 11,5x19x29cm.

Dados referentes a essas nove opções estão compilados e apresentados no quadro 2:

Quadro 2: Comparativo de custos – diferentes sistemas construtivos para a planta tipoSistemas

construtivos Descrição Total do sistema

% custos em relação SR

Sistema de referência (sr)

Sem considerar desempenho: - Paredes externas bloco light 14 cm - Paredes internas bloco light 11,5 cm - Paredes corta-fogo bloco celular 10 cm

Mão de obra R$ 19.106,67

Material R$ 21.656,40

Área (m²) 538,07

Peso (kg) 39.422,58

Total R$ 40.763,07

Sistema 1

- Paredes externas blocos estrutural 14 cm - Paredes internas blocos estrutural 14 cm- Paredes acústicas bloco 9cm + câmera de ar 4cm + bloco 9cm

Mão de obra R$ 20.762,39 8,67%

Material R$ 28.532,88 31,75%

Área (m²) 538,07 0,00%

Peso (kg) 58.236,55 47,72%

Total R$ 49.295,27 20,93%

Sistema 2

- Paredes externas blocos estrutural 14 cm- Paredes internas blocos estrutural 14 cm- Paredes acústicas blocos estrutural 14cm 18MPa

Mão de obra R$ 20.494,43 7,26%

Material R$ 28.218,42 30,30%

Área (m²) 538,07 0,00%

Peso (kg) 58.016,73 47,17%

Total R$ 48.712,85 19,50%

Sistema 3

- Paredes externas bloco light 19 cm- Paredes internas bloco estrutural 14 cm- Paredes acústicas bloco 9cm + câmera de ar 4cm + bloco 9cm

Mão de obra R$ 20.777,90 8,75%

Material R$ 30.217,39 39,53%

Área (m²) 538,07 0,00%

Peso (kg) 61.039,66 54,83%

Total R$ 50.995,30 25,10%

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G. Zanotto, E. Lantelme

Sistemas construtivos Descrição Total do

sistema% custos em relação SR

Sistema 4

- Paredes externas bloco celular 20 cm- Paredes internas bloco estrutural 14cm- Paredes acústicas bloco 9cm + câmera de ar 4cm + bloco 9cm

Mão de obra R$ 20.106,58 5,23%

Material R$ 32.948,58 52,14%

Área (m²) 538,07 0,00%

Peso (kg) 59.533,20 51,01%

Total R$ 53.055,16 30,15%

Sistema 5

- Paredes externas bloco estrutural 14cm- Paredes entre UA bloco estrutural 14 cm- Paredes internas cegas bloco vedação 11,5 cm- Paredes acústicas bloco 18MPa- Parede corta-fogo bloco estrutural 14cm

Mão de obra R$ 20.172,63 5,58%

Material R$ 24.916,81 15,06%

Área (m²) 538,07 0,00%

Peso (kg) 49.257,32 24,95%

Total R$ 45.089,44 10,61%

Sistema 6

- Paredes externas bloco estrutural 14cm- Paredes entre UA bloco estrutural 14cm- Paredes internas cegas bloco light 9cm- Paredes acústicas bloco 18MPa- Parede corta-fogo bloco celular 10cm

Mão de obra R$ 19.768,63 3,46%

Material R$ 24.998,14 15,43%

Área (m²) 538,07 0,00%

Peso (kg) 45.292,60 14,89%

Total R$ 44.766,77 9,82%

Sistema 7

- Paredes externas bloco celular 20 cm- Paredes entre UA bloco 14cm 18MPa- Paredes internas cegas bloco light 9cm- Parede corta-fogo bloco celular 10 cm

Mão de obra R$ 19.139,21 0,17%

Material R$ 31.887,34 47,24%

Área (m²) 538,07 0,00%

Peso (kg) 54.583,18 38,46%

Total R$ 51.026,55 25,18%

Sistema 8

- Paredes externas bloco estrutural 14cm- Paredes entre UA bloco 14cm 18MPa- Paredes internas e corta-fogo blocos estrutural 14cm- Paredes entre UA bloco 14cm 18 MPa

Mão de obra R$ 20.622,29 7,93%

Material R$ 28.900,79 33,45%

Área (m²) 538,07 0,00%

Peso (kg) 63.090,86 60,04%

Total R$ 49.523,09 21,49%

Sistema 9

- Paredes externas blocos estrutural 14 cm- Paredes internas blocos estrutu-ral 14 cm- Paredes acústicas bloco 9cm + câmera de ar 4cm + bloco 11,5cm

Mão de obra R$ 20.762,39 8,67%

Material R$ 28.662,81 32,35%

Área (m²) 538,07 0,00%

Peso (kg) 58.500,32 48,39%

Total R$ 49.425,20 21,25%

Fonte: elaboração dos autores.

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ABNT NBR 15575-4 – vedações verticais…

A primeira limitação encontrada para seleção do sistema construtivo foi a cultu-ra regional dos usuários, restringindo a construtora a optar pelo sistema construtivo de blocos cerâmicos. Outra limitação foi encontrar fornecedores que possuíssem os laudos dos desempenhos de seus blocos próximo à região de estudo, na cidade de Passo Fundo, RS. Entrou-se em contato com seis fornecedores: nenhum possuía os laudos solicitados, que comprovassem o seu atendimento à NBR 15575:2013. O úni-co fornecedor encontrado possuía fábrica localizada a 290km e ainda estava desen-volvendo novos produtos que atendessem os requisitos intermediários e superiores da norma. Em relação ao fator custo analisado neste trabalho, foi um ponto negati-vo, em função do preço do frete, que é acrescentado dada a distância.

Verificou-se, então, a partir das nove opções propostas, que o impacto mínimo no custo entre um sistema de vedação de referência, que era utilizado pela constru-tora em estudo, e um novo sistema atendendo a Norma de Desempenho foi de um acréscimo nos custos de 9,82% (como pode ser observado no quadro 2); porém, ha-veria a necessidade de utilizar um total de cinco tipos de blocos enquanto o sistema de referência utiliza apenas três. Para manter o número de variações de blocos, o custo mínimo para atender a norma se elevaria em 19,50%. E a maior variação do custo ficou em 30,15% superior ao sistema de referência.

Considerações finais

Como mencionado anteriormente, a presente pesquisa faz parte de um projeto que visa analisar a seleção de tecnologias construtivas do sistema de vedação ver-tical, e a análise de custos é um dos fatores de maior relevância para uma escolha. Deste modo, mostrou-se que o custo das vedações verticais aumentou em razão da ABNT NBR 15575:2013, porém esta garante ao usuário materiais de melhor quali-dade e desempenho.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento (CNPq), pela concessão da bolsa de pesquisa em iniciação científica.

Referências

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Edificações habitacionais. Desempenho Parte 4: requisitos para os sistemas de vedações verticais internas e externas. ABNT NBR 15575-4. Rio de Janeiro, 2013.CONSTRUÇÃO MERCADO. Orçamento real. Pini, 79, Fevereiro, 2008.OLIVEIRA, L. A., MITIDIERI, C. V. O projeto de edifícios habitacionais considerando a norma brasileira de desempenho: análise aplicada para as vedações verticais. GTP, v. 7, n. 1, São Carlos, p. 90–100, maio 2012.

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S U M Á R I O

http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3-7

PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA NA CIDADE DE PASSO FUNDO, RS

The brazilian housing program in Passo Fundo, RS

Laíse Schenatto CarlottoAcadêmica de Arquitetura e Urbanismo da IMED. Bolsista PROBITI FAPERGS.

E-mail: <[email protected]>.

Caliane Christie Oliveira de AlmeidaDoutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo - Inst. de Arquitetura e Urbanismo de São Carlos, Brasil. Coordenadora do

Mestrado em Arquitetura e Urbanismo da IMED. E-mail: <[email protected]>.

Resumo

A separação física e espacial entre os espaços da elite e os das camadas mais carentes é conhecida como segregação socioespacial. O déficit habitacional é um problema latente em todas as cidades brasileiras e perdura há anos no Brasil. Nesse contexto, o objetivo do presente artigo é analisar a evolução das principais políticas públi-cas de habitação no Brasil e as ações filiadas a elas desenvolvidas em Passo Fundo (RS), estudando os programas, conjuntos e grupos de moradias construídos na ci-dade, principalmente os decorrentes do Programa Federal Minha Casa Minha Vida (MCMV). Objetiva-se, também, apontar se houve crescimento da cidade a partir da implantação das unidades do referido programa. De modo geral, para resolver o problema da crise habitacional no Brasil, e em Passo Fundo, os conjuntos habita-cionais destinados à população de baixa renda foram situados distantes do centro das cidades, geralmente em locais periféricos, sem qualquer tipo de infraestrutura, o que acabou por consolidar a dicotomia centro-periferia. Palavras-chave: Déficit habitacional. Políticas públicas de habitação. Minha Casa Minha Vida.

Abstract

Physical and spatial separation between wealthier and poorer neighborhoods is known as socio-spatial segregation. Housing shortage has been a recurrent problem in all Brazilian cities in the past decades. Thus, the aim of this paper is to analyze the evolution of the main Housing Public Policy in Brazil and affiliated actions to it, specifically in the city of Passo Fundo, located in the state of Rio Grande do Sul. This research was conducted to examine programs and groups of houses built in

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Programa Minha Casa Minha Vida …

Passo Fundo, especially those originated by the Brazilian Housing Program called “Minha Casa Minha Vida” (MCMV). Another objective of this study is to point out whether there has been any improvements to the city of Passo Fundo resulting from the deployment of the house units provided by the MCMV program. In general, the problem of the housing crisis in Brazil and in the city of Passo Fundo has been addressed to the poorer population, by building houses located far from city centers, usually in the suburbs, which, in Brazil, are places that have no infrastructure; and it resulted in the establishment of the center-periphery dichotomy.Keywords: Housing shortage. Housing Public Policy. Brazilian Housing Program.

Introdução

Segundo a Constituição Federal (1988), no seu artigo 6º, a moradia é um dos direitos sociais básicos. Apesar dos programas de habitação e relacionados aos ser-viços e infraestruturas urbanas que intentam melhorar a inclusão social e com-bater a pobreza em nosso país, ainda são precárias as condições da habitação de grande parte da população brasileira, principalmente entre as camadas mais po-bres. As inúmeras iniciativas formuladas pelo governo federal visam, sobretudo, propor soluções e amenizar as consequências do agravamento da crise habitacional (ALMEIDA, 2012). A questão da provisão de habitação é um dos principais entraves sociais urbanos no Brasil. Problemas como a falta de infraestrutura e a morosidade na construção de moradias para suprir a demanda por unidades são constantes na história da moradia brasileira.

Ao longo da história da moradia no Brasil, pode-se perceber que a crise ha-bitacional se agravou devido, essencialmente, ao rápido crescimento urbano nas cidades, processo não acompanhado de medidas de planejamento e/ou controle do uso e da ocupação do solo eficazes. Desde fins do século XIX, com a abolição da escravatura, percebe-se a intensificação da migração da população do campo para a cidade, apresentando como principais consequências maiores demandas por mora-dias, transporte e serviços urbanos – como distribuição de água e coleta de esgotos.

O presente artigo busca, nesse sentido, analisar as políticas públicas de habitação no Brasil, dando especial atenção ao Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), na cidade de Passo Fundo, Rio Grande do Sul. A partir do levantamento bibliográ-fico e de documentos nos arquivos públicos da cidade, foi possível identificar os critérios adotados pelo poder público, bem como as características arquitetônicas e urbanísticas dessa produção, além da contribuição dessas ações para o crescimento da cidade, a partir da implantação do programa, em 2013.

Evolução histórica das políticas públicas de habitação no Brasil

A má distribuição econômica é um fator que caracteriza o quadro social bra-sileiro há tempos, dificultando o acesso à moradia própria ou alugada para toda a população mais carente. Nas últimas décadas, esses aspectos vêm contribuindo significantemente para a segregação, a popularização da periferia e, consequente-mente, as precárias condições de habitabilidade de muitas das moradias no País.

Com a abolição da escravidão, em 1888, milhares de negros foram expulsos do campo e migraram para os principais centros urbanos do Brasil. Como uma das

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L. S. Carlotto, C. C. O. de Almeida

consequências da Revolução Industrial no País, registrou-se o crescimento urbano acelerado para as cidades brasileiras. As péssimas condições de saneamento e de infraestrutura, nesse período, fizeram com que as políticas públicas fossem adota-das para a higienização e o embelezamento das cidades e das moradias em fins do século XIX (ALMEIDA, 2012).

Foi também nesse momento que surgiu no Brasil o interesse por uma melho-ria na saúde e qualidade de vida da população, diante do quadro preocupante de epidemias causadas pela grande aglomeração de pessoas nas cidades vivendo em precárias condições de salubridade. As ações voltadas à implantação de políticas habitacionais e à erradicação de cortiços e favelas insalubres em nosso país foram intensificadas nos primeiros anos do século XX, trazendo a ideia de casas próprias para os trabalhadores. A ação dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs) em 1933 exerceu importante papel para a concepção e produção de moradias para os trabalhadores, com o apoio do Estado para financiamentos e produção de conjuntos habitacionais, junto com as Caixas de Aposentadoria e Pensões (CAPs), originadas em 1923, que ajudaram com significativos recursos financeiros.

Os IAPs foram responsáveis por um grande numero de construções de habitações en-tre os anos 1930 e 1960. Entretanto, apenas os trabalhadores associados tinham direito aos benefícios de financiamentos, excluindo grande parte da população de baixa renda. (ALMEIDA, 2012, p. 51).

A criação do Instituto de Organização Racional do Trabalho (IDORT) também contribuiu para a mudança de moradias no Brasil, realizando Jornadas em 1941 que tratavam de habitações econômicas, ideias de projetos de habitações populares, técnicas urbanísticas (ALMEIDA, 2012).

Com o mesmo objetivo, foi criada a Fundação da Casa Popular (FCP), em 1946, no governo do General Eurico Gaspar Dutra, para a construção de milhares de residências populares à população de baixa renda, com infraestrutura adequada e serviços básicos, no meio urbano e no meio rural. Porém, a fundação, além de não cumprir com os objetivos, foi extinta em 1964; e os seus bens, repassados para o Banco Nacional de Habitação (BNH) (ALMEIDA, 2012).

O Banco Nacional de Habitação (BNH), por sua vez, financiou mais de um mi-lhão de residências populares ao longo dos dezessete anos de existência, e o número de unidades não atendeu como previsto as necessidades do déficit habitacional do País, em relação ao número de demanda. A principal crítica referente ao BNH foi a má qualidade de projeto, sem preocupação com qualidade de moradia e inserção urbana, localizada em grandes conjuntos nas favelas das cidades. Os benefícios e sub-sídios de infraestrutura se direcionavam à população de média e alta renda, ficando distante dos menos favorecidos.

No governo de Collor, em 1990, foi lançado o Plano de Ação Imediata para Habi-tação (PAIH), que, porém, não cumpriu a meta prevista, de construir 245 mil casas em 180 dias. De acordo com Botega (2008), o PAIH também não concedeu as con-dições de saneamento básico e a infraestrutura adequadas para aquelas moradias.

No governo de Lula (2003-2010), foi criado o maior programa de habitação bra-sileiro, o Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), a fim de reduzir a crise ha-bitacional no País, e o qual permanece ainda em execução no governo atual.

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Programa Minha Casa Minha Vida …

Programa minha casa minha vida: critérios e características

O Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) foi criado, mais precisamente, em março de 2009, como um programa social, durante o segundo mandato do go-verno de Luís Inácio Lula da Silva. O objetivo principal objetivava construir 2 mi-lhões de unidades habitacionais para as famílias com renda bruta de até 5.000 reais e com a intenção de facilitar o financiamento de habitações para as famílias de baixa renda em todo o País (FERRETO, 2012).

Segundo Ferreira (2009), o programa é aplicado em duas modalidades: para fa-mílias com até 3 salários mínimos, são concedidas habitações com subsídio do go-verno e taxas de juros zero; para as famílias com até 10 salários mínimos, as taxas de juros são diferenciadas para cada faixa.

De modo geral, as taxas de juros do Programa MCMV são mínimas, e as pres-tações podem se pagar ao longo de prazos que se estendem até 360 meses (30 anos). A política se diferencia em condições e termos, de acordo com cada uma das faixas salariais. Para as famílias com renda bruta mensal de R$ 1600,00, por exemplo, o juro é zero; para aquelas recebedoras de 3 a 5 salários mínimos, os juros são de 5% ao ano, além da TR (Taxa Referencial de Juros); para os núcleos familiares com renda salarial de 5 a 6 salários mínimos, os juros são de 6% ao ano; para os que recebem de 6 até 10 salários mínimos, os juros passam de 8,16% ao ano, além da TR (BRASIL, 2016).

O financiamento é concedido pela Caixa Econômica Federal (CEF). O programa existe também na modalidade rural, podendo-se optar por financiar a reforma do seu imóvel ou adquiri-lo, conforme o site do programa especifica (<http://minhaca-saminhavida.pro.br/minha-casa-minha-vida-2016/>).

Os critérios nacionais para prioridade na aquisição das casas, de acordo com a Caixa Econômica Federal, são estes:

◆ famílias residentes em área de risco ou insalubre, ou que tenham sido desabrigadas; ◆ famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar; ◆ famílias que façam parte do Programa Pessoa com Deficiência (PcD). Nesta categoria,

deve ser apresentado atestado médico que comprove a deficiência alegada e que con-tenha a espécie, o grau e/ou o nível da deficiência, bem como a Classificação Interna-cional de Doenças – CID;

◆ não ter benefício anterior em programas de habitação social do governo, a exemplo do PAR ou mesmo do MCMV em edições anteriores;

◆ não possuir casa própria ou financiamento imobiliário em qualquer unidade da Fe-deração;

◆ estar enquadrado nas faixas de renda familiar atendidas pelo programa.

As unidades habitacionais apresentam tipologia de casas térreas ou apartamen-tos. Os empreendimentos na forma de condomínio devem ser segmentados em nú-mero máximo de 300 unidades habitacionais por condomínio.

Tipologia mínima apresentada para casa térrea: 2 quartos, sala, cozinha, ba-nheiro e área de serviço – área útil mínima de 36m².

Tipologia mínima apresentada para apartamento: 2 quartos, sala, cozinha, banheiro e área de serviço – área útil mínima de 39 m².

Até 2015, mais de 3,8 milhões de moradias foram contratadas pelo programa. Desse total, mais de 2 milhões já foram entregues, havendo ainda 1,6 milhões de casas e apartamentos já contratados, conforme consta no Portal Brasil (CAIXA ECONÔMICA FEDERAL).

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L. S. Carlotto, C. C. O. de Almeida

O Programa Minha Casa Minha Vida em Passo Fundo (RS)

A estrutura territorial em Passo Fundo contém uma grande diferença entre as condições de moradia da população mais abastada e as da carente. A distribuição socioespacial obedece à dicotomia centro-periferia, colocada por Villaça (2012): o centro, e seu entorno imediato, contém o comércio e as classes de renda média/alta; a periferia é conformada pela população mais carente e suas moradias.

Segundo Diego Ferreto (2012), a expansão urbana de Passo Fundo é decorrente de três principais fatores: a produção privada de loteamentos, a produção de conjun-tos habitacionais pelo Estado e as ocupações irregulares ou favelas.

Passo Fundo, apesar de ser considerada uma cidade média, possuindo altos ín-dices de serviços de saúde, comércio, educação e agroindústrias, apresenta graves problemas habitacionais. Barbosa (2010) aponta que 4% das habitações existentes no município estão em setores subnormais e assentamentos precários.

Desde meados do século XX, programas de habitação social são aplicados na ci-dade: as políticas de financiamento e construção de moradias realizada pelos IAPs e pela Fundação da Casa Popular (FCP); a construção de moradias pelas Com-panhias de Habitação (COHABS), por meio do BNH; além dos Programas Habi-tar Brasil, Pró-Moradia, Melhor Morar, Subsídio à Habitação de Interesse Social (PSH), Programa de Arrendamento Residencial (PAR) e o já mencionado MCMV (BARBOSA, 2010).

Atualmente, a produção de habitações sociais se dá em Passo Fundo, em sua qua-se totalidade, pelo Programa Minha Casa Minha Vida, principalmente por meio de financiamentos e da construção de moradias nos bairros Planaltina, Bom Jesus, Santa Martha, Donária II – Jardins Nativos (Bosque das Cerejas, das Pitangas, Azaléias, Hortênsias, Romã, Jasmim, Camélias e Ipê), São José, Loteamento Canaã e São Luiz Gonzaga (FERRETO, 2012; PREFEITURA MUNICIPAL DE PASSO FUNDO, 2016).

Tabela 1: Habitações construídas pelo MCMV em Passo Fundo (RS)SETOR CONDOMÍNIO ANO UNIDADES MODALIDADE TIPOLOGIA

Casas Aptos

Bairro Santa Martha -

Vila Donária

Jardins Nati-vos (Bosque das

Cerejas, Pitangas, Azaleias, Hortên-

cias, Romã, Jasmin, Carmélias e Ipê)

2011 8x24/cada - 2

Unifamiliar Germinadas

em linha com dois dormitó-

rios

Bairro Santa Martha -

Vila DonáriaDonária II 2011 57 - 1 Unifamiliar

Isoladas

Bairro Santa Martha -

Vila Donária

Jardins Nativos - Residêncial Ipê 2015 - 100 2 Conjuntos

Mistos

Bairro Santa Martha -

Vila Donária

Jardins Nativos - Residencial Ipê

Em cons-trução

- 100 2 Conjuntos Mistos

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Programa Minha Casa Minha Vida …

SETOR CONDOMÍNIO ANO UNIDADES MODALIDADE TIPOLOGIA

Casas Aptos

Bairro Pla-naltina Recanto Planaltina 2012 - 220 1 Edifícios

isilados

Bairro Pla-naltina Bom Jesus - 100 - 2 Unifamiliar

isoladas

São José - Leonardo

IlhaLoteamento Canaã 2015 210 - 2 Unifamiliar

isoladas

Fonte: Grupo de Pesquisa Teoria e História da Habitação e da Cidade (THAC) Habitações Irregulares.

Mapa 1: Passo Fundo: Habitação de Interesse Social

Fonte: Ferreto (2012).

O programa conta com duas modalidades: o PMCMV cujos recursos advêm do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), em que a obra é realizada por cons-trutora contratada pela Caixa Econômica Federal; e o PMCMV-Entidades, com re-cursos do Fins de Desenvolvimento Social (FDS), em que a obra é executada por empresas com fins lucrativos (FERRETO, 2012).

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L. S. Carlotto, C. C. O. de Almeida

Dentes essas empresas, pode-se citar a Construtora Priori, que atua na constru-ção de conjuntos residenciais no município de Passo Fundo e atende o Programa Minha Casa Minha Vida. As habitações contam com unidades de aproximadamen-te 38,65m², com plantas compostas por dois dormitórios, sala, cozinha, área de ser-viço e banheiro, além da garantia de tratamento de esgoto, rede elétrica e pavimento das vias de acesso principal. A empresa usa principalmente o concreto como maté-ria-prima para a construção das unidades habitacionais, além de estrutura metálica (CONSTRUTORA PRIORI, 2016).

A Prefeitura de Passo Fundo adota o critério de doação de terrenos em lotea-mentos sociais para a construção de moradias, tanto unifamiliares como condomí-nios fechados, que contam com subsídios do programa Minha Casa Minha Vida. Esses empreendimentos são entregues para as famílias de baixa renda que estão ins-critas no programa, em ordem de prioridade (PREFEITURA MUNICIPAL, 2016).

Desde 2013, com a implantação do MCMV em Passo Fundo, um número signi-ficante de famílias que não tinham onde morar ou condições financeiras de adquirir uma residência própria foi contemplado, e impactando consideravelmente o cresci-mento horizontal da cidade, principalmente nos sentidos oeste, norte e leste (FER-RETO, 2012). Segundo o Portal Brasil, até 2018, 2 milhões de unidades habitacionais serão contratadas através do Programa MCMV.

O grande número de construções de casas e apartamentos de interesses sociais financiadas pelo programa contribui para amenizar o problema do déficit habita-cional em Passo Fundo, que, segundo o Plano Local de Habitação e Interesse So-cial, está em 5 mil moradias. Diversas famílias que não tinham onde morar foram contempladas com uma residência graças ao referido programa habitacional fede-ral. Embora tenha ocorrido um avanço na qualidade das construções, por meio do uso de técnicas construtivas mais elaboradas, as unidades ainda são implantadas nas periferias e nos arrabaldes da cidade de Passo Fundo, por vezes, com precárias condições de infraestrutura, sem contar com equipamentos urbanos, segurança ou mesmo vias de acesso adequadas – acarretando aumento dos índices de segregação espacial locais.

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Programa Minha Casa Minha Vida …

Figura 1: Condomínios Jardins Nativos, Rua Palmares, Vila Donária

Fonte: Grupo de Pesquisa Teoria e História da Habitação e da Cidade (THAC) Habitações Irregulares.

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L. S. Carlotto, C. C. O. de Almeida

Figura 2: Residencial Ipê, Rua Palmares, Vila Donária

Fonte: Grupo de Pesquisa Teoria e História da Habitação e da Cidade (THAC) Habitações Irregulares.

Considerações finais

As políticas públicas de habitação e a construção dos conjuntos habitacionais surgiram em nosso país com o intuito de propor moradias mais adequadas e salu-bres para a população de baixa renda, reduzindo o déficit habitacional e minimizan-do os problemas dos aglomerados subnormais das cidades brasileiras.

A estrutura de Passo Fundo vem se formando a partir dos investimentos pú-blicos e privados, e em parcerias entre a prefeitura e o governo do estado. Com a criação de loteamentos periféricos para a baixa renda, a partir de 1990, e maiores investimentos para as áreas ocupadas pela população de rendas média e alta, a dico-tomia centro-periferia foi agravada.

O programa Minha Casa Minha Vida atuou na cidade de forma significativa, contribuindo consideravelmente para o seu crescimento, minimizando a falta de moradia em Passo Fundo. Porém, como as ações do Programa não foram acompa-nhadas devidamente por um planejamento e políticas de uso e ocupação do solo, ocorreu, além da segregação socioespacial já mencionada, o agravamento de diver-sos fatores associados ao espaço de morar – falta de infraestrutura, de segurança, de transporte coletivo adequado e saneamento básico, por exemplo. O crescimento horizontal da cidade também se mostra um problema a médio ou longo prazo para os cofres públicos, por aumentar as despesas para manutenção da infraestrutura e dos serviços de distribuição de água, energia elétrica, telefônica, coleta de esgotos e, até, transporte público.

Nota-se, assim, que Passo Fundo vem crescendo de maneira descomedida, ne-cessitando, cada vez mais, de maiores investimentos em programas sociais, por par-te tanto da Prefeitura Municipal quanto do governo estadual, principalmente onde houver a implantação de loteamentos e a construção das moradias sociais vincula-das aos programas habitacionais.

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Programa Minha Casa Minha Vida …

Agradecimentos

Agradeço à Fundação Meridional pelas oportunidades de pesquisa, e à FAPERGS pela concessão da bolsa de iniciação científica.

Referências

ALMEIDA, Caliane Christie Oliveira de. Habitação social no nordeste: a atuação das CAPs e dos IAPs (1930-1964). Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Instituto de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2012.ANDRADE, Luis Aureliano G. de.; AZEVEDO, Sérgio. Habitação e poder: da Fundação da Casa Popular ao Banco Nacional de Habitação. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.BARBOSA, Iuri Daniel. Espacialização da desigualdade social na cidade média de Passo Fundo, RS. In: ENCONTRO NACIONAL DE GEÓGRAFOS, 26, 2010, Porto Alegre. Crise Práxis e Autonomia: espaços de resistências e de esperanças. Porto Alegre, 2010.BONDUKI, Nabil Georges. Origens da habitação social no Brasil. Arquitetura moderna, Lei do Inquilinato e difusão da casa própria. São Paulo: Estação Liberdade, FAPESP, 1998.BOTEGA, Leonardo da Rocha. De Vargas a Collor: urbanização e política habitacional no Brasil. Revista Espaço Plural, a. VIII, n. 17, p. 65 -72, jul./dez. 2007.BRASIL. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Minha Casa Minha Vida. 2009. [Cartilha]. Disponível em: <http://downloads.caixa.gov.br/_arquivos/habita/mcmv/CARTILHACOMPLETA.PDF>. Acesso em: 09 maio 2016.______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 10 maio 2016.CONSTRUTORA PRIORI. A empresa. Disponível em: <http://www.construtorapriori.com.br/#!priori/cjn9>. Acesso em: 09 maio 2016. FERRETO, Diego. Passo Fundo: Estruturação urbana de uma cidade média gaúcha. 2012. 176 f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - FAUUSP, São Paulo, 2012.MOTTA, Luana Dias. A questão da habitação no Brasil: políticas públicas, conflitos urbanos e o direito à cidade. 2010. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) - UFMG, Minas Gerais, 2010.PORTAL BRASIL. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/>. Acesso em: 09 maio 2016.PREFEITURA MUNICIPAL DE PASSO FUNDO. Secretaria Municipal de Habitação. Disponível em: <http://www.pmpf.rs.gov.br/>. Acesso em: 10 maio 2016. VILLAÇA, Flávio. Espaço intra-urbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel; FAPESP; Lincoln Institute, 2001.

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S U M Á R I O

http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3-8

A MEDIAÇÃO DE CONFLITOS: UM OLHAR A PARTIR DA TEORIA DOS JOGOS

Mediation: from the perspective of game theory

Janine Taís Homem Echevarria BorbaAcadêmica do 10º semestre do Curso de Direito da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

William Picolo FibransAcadêmico do 10º semestre do Curso de Direito da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Thaise Nara Graziottin CostaDoutoranda da Faculdade Estácio de Sá do Rio de Janeiro, estágio doutoral na

Universidade de Coimbra – Portugal, com bolsa CAPES, no período 2014-2015. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná, advogada, mediadora judicial e professora de Direito Civil, Sucessões e Prática Jurídica IV (Mediação) – ênfase em

Direitos Humanos, pesquisadora da IMED, membro-participante dos Grupos de Pesquisa Multiculturalismo, Minorias, Espaço Público e Sustentabilidade da IMED.

E-mail: <[email protected]>.

Resumo

O presente artigo visa apontar qual a contribuição que a Teoria dos Jogos de John Nash pode dar aos meios autocompositivos de resolução de conflitos. Para tanto, a pesquisa foi realizada e desenvolvida com base nos métodos dedutivo e descritivo, a partir da leitura do Manual de Mediação Judicial do Conselho Nacional de Justiça, publicado em 2013, com foco no capítulo três, que discorre sobre a participação da Teoria dos Jogos de John Von Neumann. A mediação de conflitos pode utilizar-se de ferramentas adequadas para, em sessões individuais ou conjuntas, o mediador conseguir restabelecer o diálogo, a escuta ativa como forma de cooperação entre as partes, a fim de encontrar formão modo mais adequado de resolução de conflitos. A partir da criação do CNJ e da efetivação de Política Pública de autocomposição, instalou-se um novo paradigma no Poder Judiciário, estabelecendo uma função de centro de harmonização social, de tal modo que os seus usuários sintam-se satisfei-tos com a prestação jurisdicional escolhida, por meio judicial ou extrajudicial.Palavras-chave: Mediação. Autocomposição. Teoria. Jogos. Judicial. Extrajudicial.

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A mediação de conflitos...

Abstract

The aim of this article is to point out how the concept of Game Theory created by John Nash can contribute to a consensus-based form of dispute resolution, the Bra-zilian “autocomposição”. The Judicial Mediation Guidebook (Manual de Mediação Judicial) issued in 2013 by the CNJ – Brazilian National Council of Justice - has gui-ded the development of this research, which has been conducted through deductive approach and descriptive research methods. This study has focused on the Chapter Three of this Guidebook, which elaborates on the collaboration of John Von Neu-mann to Game Theory. By using such concept as a tool, conflict mediation can be applied on individual or joint sessions. The mediator can re-establish communica-tion between the parties and encourage active listening as a form of cooperation in order to find the most appropriate manner to resolve disputes. The Brazilian judi-ciary system has allowed a new paradigm from the CNJ’s Guidebook and a Public Policy on “autocomposição”, establishing social harmonization heart function and your users to feel satisfied with the chosen adjudication, either through judicial or extrajudicial means.Keywords: Mediation. Autocomposição. Game Theory. Judicial Means. Extrajudicial Means.

“A busca por uma resposta forte exige que se ponha em causa este consenso hegemônico, indagando quais as condições

para a construção de um novo senso comum jurídico e o seu papel para emancipação social.”

(SANTOS, 2011, p. 33).

Introdução

À luz das políticas públicas implementadas pelo CNJ, desde sua criação, com a emenda constitucional n. 45, em 2005, da resolução 125/2010 e das Leis 13.140 e 13105/ 2015, iniciou-se uma nova era no Poder Judiciário Brasileiro. Tal marco inau-gurou uma justiça de pacificação de conflitos: houve a implementação das políticas públicas de pacificação de conflitos e a regulamentação da mediação judicial e extra-judicial no Brasil.

Justifica-se o presente artigo pela necessidade da implementação pelo Poder Ju-diciário do sistema autocompositivo de resolução de conflitos a fim de tornar as decisões judiciais satisfatórias. Integra os objetivos demonstrar que a mediação é um método adequado de resolução de conflitos, atendendo diversos princípios ba-silares, e que esse sistema autocompositivo apresenta-se como não adversarial, num viés cooperativo apontado pela Teoria dos Jogos, em que se busca o ganha-ganha entre os interessados.

A problemática repousa justamente no caminho inverso dos objetivos trazidos por este artigo, isto é, há insegurança de parte dos próprios profissionais da lei, e mesmo daqueles que terão de participar diretamente da mediação, em compreen-dê-la como instrumento viabilizador de maximização de ganhos, e não como uma ferramenta que pode ser prejudicial aos interessados.

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J. T. H. E. Borba, W. P. Fibrans, T. N. G.Costa

A pesquisa foi realizada e desenvolvida com base nos métodos dedutivo e des-critivo, a partir da leitura do Manual de Mediação Judicial do Conselho Nacional de Justiça, publicado em 2015, com foco no capítulo três, que discorre sobre a partici-pação da Teoria dos Jogos de John Von Neumann.

Neumann estudou com profundidade a base da competição para fundamentar a teoria econômica e, mais tarde, em 1950, o norte-americano John Forbes Nash trouxe novos conceitos para a Teoria dos Jogos: no conceito de “Equilíbrio de Nash”, demonstra-se que os elementos cooperativos individual e coletivo podem maximizar ganhos aos participantes (AZEVEDO, 2013).

Os meios autocompositivos de resolução de conflitos: conciliação, negociação e mediação

O sistema de justiça brasileiro implementou a utilização dos meios de resolução de conflitos chamados autocompositivos, tais como a negociação, a conciliação e a mediação; porém também resta resguardada constitucionalmente a opção de utili-zar os meios heterocompositivos, que são o processo judicial e a arbitragem.

Costa e Zambam (2015, p. 219) afirmam que “O poder Judiciário no seu sistema processual precisa buscar soluções para ultrapassar esta barreira em que se encontra em vista de assegurar a via preferencial de acessibilidade e efetividade na forma de democratização do acesso à justiça”. Assim, a regulamentação e promulgação do Código de Processo Civil e a Lei da Mediação n. 13.140/2015 apontam para o inte-resse do Poder Judiciário na efetivação das Políticas Públicas de criação de Centros Judiciários de Resolução de Conflitos, na capacitação de mediadores judiciais e ex-trajudiciais, com técnicas e ferramentas advindas de outras áreas do conhecimento – como psicologia, economia, matemática, administração e sociologia – para auxi-liar na pacificação de conflitos de forma diferente e inovadora: conduzindo a justiça a um nível igualitário, preparado para o diálogo cooperativo entre partes e a análise dos sentimentos e necessidades imediatas e subjacentes que podem interferir para um consenso e uma solução satisfatória da controvérsia.

A sessão de mediação é denominada assim pois é a oportunidade que a justiça está oferecendo aos envolvidos de construírem juntos a solução adequada para re-solver os seus conflitos, através do diálogo e de técnicas autocompositivas.

Tanto na negociação quanto na conciliação pode ocorrer a intervenção de ter-ceiros, isto é, o negociador e o conciliador podem oferecer sugestões sobre a melhor opção para resolver o conflito. Todavia, na mediação de conflitos, é diferente: o me-diador não interfere, ele apenas dialoga com os interessados; ele não oferece qual-quer proposta, seus objetivos são desempenhar o papel de elo de comunicação entre as partes e reestabelecer o diálogo.

Pode-se entender a mediação como um processo por meio do qual os litigantes buscam o auxílio de uma terceira pessoa, imparcial, que contribuirá na busca pela solução do conflito. Essa terceira pessoa não tem a função de decidir, mas apenas de auxiliar as partes na obtenção de uma solução para o problema de forma consensual.

Mediação é definida por Nascimento (1999, p. 13) como a “técnica de compo-sição dos conflitos caracterizada pela participação de um terceiro, suprapartes, o mediador, cuja função é ouvir as partes e formular propostas”. Já para Serpa (1999, p. 90) mediação “é um processo informal, voluntário, onde um terceiro interventor,

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A mediação de conflitos...

neutro, assiste aos disputantes na resolução de suas questões”. O papel desse inter-ventor é ajudar na comunicação através da neutralização das emoções, formação de opções e negociação de acordos.

Entende-se a mediação como uma forma autocompositiva, mesmo tendo presente a figura do mediador, terceiro alheio aos interesses individuais das partes em litígio, porque há total autonomia das partes acerca da decisão mais satisfatória para ambas. Nesse caso, cabe destacar que o mediador faz a figura do facilitador: não interfere e não opina sobre como resolver o conflito, apenas se dispõe a dialogar com as partes para identificar seus sentimentos, interesses e necessidades de forma a compreender e refletir sobre a busca cooperativa de soluções que lhes sejam adequadas.

Ainda, a mediação pode ser um meio extrajudicial ou judicial de resolução de conflitos, podendo ocorrer antes, durante ou depois de instalada a controvérsia, ou seja, poderá ter caráter preventivo ou resolutivo, porém sempre de forma voluntária.

Dentre as principais vantagens da mediação estão a rapidez e a eficácia de resul-tados devido à cooperação entre as partes, bem como a redução do desgaste emocio-nal e do custo financeiro para os interessados. Garantem-se os princípios do sigilo e da privacidade das partes envolvidas, além de reduzirem-se a duração e a reincidên-cia dos litígios judiciais, pois é reestabelecido o diálogo não violento e cooperativo.

Outra característica é a voluntariedade; e, por se tratar de ato voluntário, há, sem dúvida, a intenção das partes em compor, o que torna o processo ainda mais simples. Para Bacellar (2004, p. 174),

O procedimento de mediação é informal; começa por uma notificação por meio da qual as partes pedem a atuação dos mediadores; procede-se à reunião com as partes, em conjunto ou separadamente, esgotando-se todos os esforços, durante dias seguidos se necessário, para que os interlocutores sociais cheguem a um entendimento direto.

É preciso que se faça a correta distinção entre mediação e conciliação. A conci-liação é medida judicial, enquanto a mediação é extrajudicial. Bem assevera Nasci-mento (1999, p. 14):

Conciliação é judicial e em alguns casos extrajudicial, enquanto a mediação é extraju-dicial. Logo, se o acordo é em juízo, o nome é conciliação [...]. Na mediação, o mediador é via de regra escolhido pelas partes, embora em alguns casos isso possa não ocorrer, como na mediação da Delegacia Regional do Trabalho, no Brasil; na conciliação nem sempre é assim, pois o conciliador pode ser até mesmo o juiz. Na conciliação geralmen-te atua um órgão permanente destinado a esse fim, enquanto na mediação pode surgir a figura do mediador para cada caso concreto.

Outra diferença existente entre a conciliação e a mediação trata-se do papel exer-cido pelo conciliador ou mediador, respectivamente: o conciliador pode interferir, propor um acordo, possibilidades, formas de pagamentos; já o mediador não pode interferir ou sugerir, deve ser o elo para que as partes decidam pelo diálogo o que será melhor para ambas naquele caso concreto.

Nota-se que as vias conciliativas e mediativas ressurgiram a partir de 2010 pela demanda de uma sociedade cada vez mais dinâmica, líquida e moderna, com prin-cípios valorativos bem definidos pelo tempo e pelo dinheiro – acredita-se que essa sociedade considera que um é sinônimo do outro. Desta forma, constata-se que os processos judiciais não atendem mais as necessidades de uma sociedade em movi-

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J. T. H. E. Borba, W. P. Fibrans, T. N. G.Costa

mento, em transformação e imediatista. Assim, as políticas públicas de tratamen-to de conflitos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) foram implementadas para tornar satisfatória a prestação jurisdicional e sanar o descrédito dos cidadãos ante a morosidade da justiça.

Segundo Amaral (1994, p. 11),

Tudo isso deve-se em grande parte, sem dúvida, à crise da Justiça, posto ser notório que ao extraordinário progresso científico do direito processual não correspondeu o aperfeiçoamento do aparelho judiciário e da administração da Justiça, que se apresen-ta, para quem dele faz uso, extremamente carente de reformulação, desde suas bases.

Este cenário indica que a justiça tradicional, que antes apenas possuía o intuito de julgar e sentenciar, com o advento da inclusão da audiência de mediação, com o Código de Processo Civil, passou a valorizar as vias adequadas de tratamento e harmonização de conflitos. Numa visão futurista, procura-se a participação de to-dos os operadores do Direito a fim de conciliar e prevenir o conflito, incentivando a convivência social pacífica.

Para que ocorra essa evolução cooperativa e participativa dos sujeitos, os estu-diosos da mediação procuraram teorias que a fundamentem e possam dar estrutura científica e base teórica aplicativa, sendo que se aponta para a Teoria dos Jogos e a Teoria do Conflito como opções para a efetivação do novo e harmonizado Direito.

Pretende-se, portanto, apresentar a Teoria dos Jogos, sua conceituação, dinâ-mica e aplicação no âmbito da mediação. Para tanto, foram utilizados o Manual de Mediação Judicial disponibilizado pelo Conselho Nacional de Justiça e a bibliogra-fia oferecida pela disciplina de Mediação e Justiça Restaurativa do curso de Direito da IMED que passamos a expor.

Teoria dos jogos: dinâmica e aplicabilidade na mediação de conflitos

A Teoria dos Jogos utiliza-se dos conhecimentos oriundos da matemática e da economia para entender a mediação. Sua aplicação teve início no ramo da mate-mática e, posteriormente, deu base à fundamentação da economia. Tal teoria busca estabelecer fundamentos e ferramentas para auxiliar a mediação de conflitos em sua aplicabilidade; é baseada em situações estratégicas em que as pessoas analisam as decisões na expectativa de comportamento da pessoa com quem interagem.

Essa abordagem surgiu logo após a Primeira Guerra Mundial, tendo como ob-jeto de estudo o conflito. Para a Teoria dos Jogos, o conflito é uma situação na qual duas pessoas têm que desenvolver estratégias para maximizar seus ganhos, a partir de certas regras preestabelecidas (AZEVEDO, 2013).

Foi o francês Émile Borel, no início do século XX, quem começou a desenvolver o estudo. Borel observava os jogos de mesa como o pôquer, deu atenção ao blefe, bem como às inferências que um jogador deve fazer para analisar as possibilidades de jo-gada dos demais jogadores. Isso quer dizer que um jogador baseia suas ações no pen-samento que ele tem da ação que o seu adversário poderá realizar. Então, podemos afirmar que suas ideias são baseadas nas possibilidades do outro (AZEVEDO, 2013).

John von Neumann foi o responsável pela afirmação da economia como ciência exata, e sistematizou a Teoria dos Jogos formulando sua base teórica. Mais tarde, seu aluno John Forbes Nash trouxe novos conceitos à teoria e revolucionou a economia com o conceito de “equilíbrio” (AZEVEDO, 2013).

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A mediação de conflitos...

John Nash rompeu com um paradigma econômico que era um pressuposto da teoria de Neumann, desde a época de Adam Smith. Neumann trabalhava com a ideia de competição, que consistia em levar seu oponente à derrota para poder ga-nhar – por isso a teoria de Neumann é conhecida como não cooperativa e, assim, não eficaz nas relações continuadas: sempre haverá um ganhador e um perdedor. Nash, por sua vez, introduziu o elemento cooperativo na Teoria dos Jogos: para esse grande matemático, a cooperação não é incompatível com o pensamento de ganhos individuais, de modo que é possível maximizar os próprios ganhos cooperando com o outro participante (não o considerando um adversário, mas um partícipe).

O princípio do “Equilíbrio de Nash” pode ser definido da seguinte forma:

[...] a combinação de estratégias que os jogadores preferencialmente devem escolher é aquela na qual nenhum jogador faria melhor escolhendo uma alternativa diferente dada a estratégia que o outro escolhe. A estratégia de cada jogador deve ser a melhor resposta às estratégias dos outros. (AZEVEDO, 2013, p. 56).

Pode-se dizer que a melhor resposta é aquela de que nenhum dos jogadores se arrepende; na autocomposição, essa solução pode ser utilizada para prever um re-sultado positivo mútuo.

No campo da competição, torna-se impossível não mencionar Adam Smith, com sua posição semelhante à de Charles Darwin, na teoria da seleção natural das espécies. Vale lembrar que, para Darwin, ocorre a seleção natural das espécies, isto é, determinadas espécies possuem capacidade de sobreviver por mais tempo em detrimento de outras; dessa forma, as espécies viveriam em constante competição pela sobrevivência.

Constata-se, pelo estudo realizado, que, para Adam Smith, a regra básica para as relações interpessoais seria a competição: cada competidor lutaria para obter o melhor para si, e o mais qualificado ganharia. No mesmo sentido podemos apon-tar John Von Neumann, que também introduziu o viés competitivo em sua teoria. Ora, Neumann trabalhava apenas com a ideia de que, para ganhar, os competidores deveriam levar o adversário à derrota. Assim, podemos destacar que isso ocorre cla-ramente nas decisões das ações propostas nos tribunais, sempre existe uma disputa: um ganhador e um perdedor, um autor e um réu, um culpado e um inocente.

Para romper o caminho percorrido por Darwin, Smith e Neumann, surgiu teoria de John Nash, baseada na cooperação como meio de obter ganhos individuais, ou maximizá-los. Embora pareça contraditório, cooperar com o até então entendido como adversário é ganhar com tal atitude, é algo que deve ser estudado e aplicado. Nessa ideia repousa indeclinável a solidariedade entre as partes, pois os envolvidos nas relações terão por base dois aspectos: o coletivo e o individual (AZEVEDO, 2013).

Deste modo, se a primeira pessoa cooperar com a segunda, esta poderá sentir-se motivada a cooperar, também, com aquela. Nesse contexto, repousa o aspecto in-dividual: coopera-se com a outra pessoa, tendo por objetivo obter a cooperação da outra pessoa, visando, assim, obter ganhos mútuos. A cooperação revela sentimen-tos muito mais positivos do que os originários da competição. Ainda, se ambos co-laborarem um com o outro, todos ganham – ponto no qual reside o aspecto coletivo.

Esta situação pode ser bem observada na popular história da aplicabilidade cha-mada “O dilema do prisioneiro” (AZEVEDO, 2013), que trata das implicações das opções por ele originadas. O caso consiste na seguinte situação hipotética:

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J. T. H. E. Borba, W. P. Fibrans, T. N. G.Costa

Dois homens, suspeitos de terem violado conjuntamente a lei, são interrogados simul-taneamente (e em salas diferentes) pela polícia. A polícia não tem evidências para que ambos sejam condenados pela autoria do crime, e planeja recomendar a sentença de um ano de prisão a ambos, se eles não aceitarem o acordo. De outro lado, oferece a cada um dos suspeitos um acordo: se ele testemunhar contra o outro suspeito, ficará livre da prisão, enquanto o outro deverá cumprir a pena de três anos. Ainda há uma terceira opção: se os dois aceitarem o acordo e testemunharem contra o companheiro, serão sentenciados a dois anos de prisão. (AZEVEDO, 2013, p. 55).

O dilema supracitado revela-se basilar para a compreensão de por que a coope-ração oferece mais ganhos do que a competição. Em ambas as situações em que um dos prisioneiros resolve entregar o companheiro, pelo menos um deles sai poten-cialmente prejudicado, enquanto o outro pode ser privilegiado (ganho individual). Todavia, se testemunharem um contra o outro, ambos terão maior prejuízo do que se não o fizerem e ficarem calados – isso significaria não aceitarem o acordo e maxi-mizarem os ganhos: conseguir sair da prisão no mesmo tempo e antecipadamente.

Ressalta-se que, se um dos prisioneiros, pretendendo obter ganho individual e ser libertado da prisão, testemunhar contra o outro, porém este também, pensando da mesma forma, testemunhar contra o primeiro, ambos receberão a indicação de dois anos de prisão; enquanto, se ambos rejeitarem o acordo, essa indicação será de um ano. Ora, a colaboração é a única forma que produz ganhos individuais para ambos os prisioneiros.

Conclui-se que, com as técnicas utilizadas pelos mediadores, as partes envolvi-das em qualquer conflito tornam-se flexíveis, dialogam e começam a confiar uma na outra. Nota-se que essa colaboração gera maior ganho individual para ambos e, assim, também, maior ganho coletivo.

A mediação tem ferramentas e técnicas que auxiliam na efetivação do diálogo entre as partes: a inversão de papéis, a geração de opções, o teste de realidade, o en-foque prospectivo, a validação dos sentimentos e a normalização do conflito. Todas as práticas propiciam às partes, conjuntamente, organizarem questões e interesses que estão envolvidos no conflito instaurado; assim, o diálogo pode ocorrer com ga-nhos mútuos, pois estamos tratando de pessoas em relações continuadas – como família, condomínio e vizinhança –, e também pode propiciar ganhos coletivos para os grupos envolvidos.

A Teoria dos Jogos demonstra tal realidade, razão pela qual teve especial análise no presente estudo, pois é uma ferramenta à disposição da mediação, que auxilia no levantamento de questões, na afirmação dos envolvidos confiando um no outro; cola-bora para haver maiores ganhos individuais e, assim, também, maior ganho coletivo.

Acredita-se que a aplicação da Teoria dos Jogos é uma técnica bem produtiva utilizada na mediação de conflitos, pois os participantes da mediação buscam o diálogo e a confiança que necessitam ter um no outro; havendo colaboração para a resolução do problema, há mais ganhos individuais e coletivos.

Nota-se que a mediação propicia esse entendimento positivo em busca de reso-luções para o futuro, pois, quando conseguem dialogar, as partes descobrem que os conflitos sempre existirão e são normais nas relações, porém a forma como encara-mos e buscamos resolvê-los é que faz a diferença.

Então, pode-se mudar a cultura dos cidadãos de que o Poder Judiciário deve ser o responsável por resolver todos os seus problemas. Pelo contrário, a mediação de

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A mediação de conflitos...

conflitos pode auxiliar na transformação dos indivíduos em adquirir uma cultu-ra de responsabilidade coparticipativa e cooperativa dos indivíduos, de modo que cheguem à conclusão de que são capazes de resolver seus próprios problemas, en-contrem soluções e tenham possibilidade e empoderamento quanto às decisões as-sumidas, cumprindo o convencionado, emancipando-se de sua herança de aprisio-namento nas decisões dos tribunais e libertando-se para decidir e tomar as decisões mais adequadas para o caso concreto.

Conclusões

As políticas públicas implementadas pelo CNJ como meios autocompositivos de resolução de conflitos no Brasil iniciou por emendas constitucionais, resoluções, capacitações e até leis ordinárias – como a 13.140 e a 13105/ 2015 – o que comprova a efetivação do Poder Judiciário comprometido com a harmonia social e a solução pacífica de controvérsia, oferecendo ao cidadão uma opção de resolver suas disputas e lides, de forma não adversariais por meios judiciais ou extrajudiciais.

A mediação, a conciliação, a negociação não são métodos novos de solução de conflitos, porém, é perceptível, revelam-se como formas de resolução de conflitos autocompositivas mais adequadas ao tratamento das necessidades e dos interesses das partes envolvidas. Acredita-se que uma mediação realizada por mediadores ca-pacitados e conscientes dos princípios do instituto conduza a uma decisão informa-da e cumprida pelas partes, pois as próprias partes, por meio do diálogo, respeito e escuta ativa, encontram uma decisão satisfatória para cada uma delas, e assim restabelecem a comunicação interpessoal, o consenso pela cooperação, evitando de-mandas repetitivas e intermináveis.

Diante disso, inúmeras são as ferramentas que podem ser utilizadas pelo media-dor a fim de que a mediação seja exitosa. Para além disso, sempre serão garantidos às partes os princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada (art. 166 do CPC). Contudo, estarão sendo privilegiados a comunicação, o sigilo, o diálogo, bem como o princípio da cooperação e do equilíbrio de Nash, pois a Teoria dos Jogos mostra-se uma ferramenta importante para os procedimentos autocompositivos.

A contribuição dessa teoria é apresentar respostas a complexas perguntas: será que a mediação apenas produz bons resultados quando as partes se comportam de forma cooperativa? Como o mediador pode aplicar a Teoria dos Jogos para que pos-sa contribuir a um diálogo ativo e cooperativo, em que todos participem da sessão de mediação, levando as partes à harmonização dos conflitos com ganhos mútuos?

Do estudo realizado, conclui-se que a Teoria dos Jogos auxilia o mediador a abstrair da sessão de mediação os juízos de valores no que diz respeito à conduta dos interessados, pois, como se trata de relações continuadas, o mediador, de forma mais segura, conseguirá auxiliar os interessados a compreenderem a importância da escuta ativa, do diálogo e que essas atitudes não violentas levarão à cooperação das partes para maximizarem seus ganhos individuais e coletivos.

A Teoria dos Jogos ensina as partes a identificar os interesses, as necessidades e as questões conflituosas; também, a identificar que as soluções mais adequadas podem não estar na competitividade, mas, por outro lado, nos ganhos mútuos das soluções cooperativas.

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J. T. H. E. Borba, W. P. Fibrans, T. N. G.Costa

Importante concluir que a cooperação deve ser vista pelo prisma da racionali-dade e não como um altruísmo, isto é, a cooperação visa à otimização dos ganhos mútuos de forma satisfatória, evitando demandas repetitivas e desgastantes.

Referências

AMARAL, Lídia Miranda de Lima. Mediação e Arbitragem: uma solução para os conflitos trabalhistas no Brasil. São Paulo: LTr, 1994. AZEVEDO, André Gomma (Org.). Manual de Mediação Judicial. Brasília: Ministério da Justiça, 2013.BACELLAR, Roberto Portugal. A mediação no contexto dos modelos consensuais da resolução dos conflitos. Revista da Associação dos Magistrados Brasileiros, v. 4, n. 8, jan./jun. 2000.______. Juizados especiais: a nova mediação paraprocessual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.COSTA, Thaise Nara Graziottin; ZAMBAM, Neuro José. Diálogo Ambiental: constitucional e internacional. Coord. Jorde Miranda. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015. (Vol. 3, tomo II).HOUAISS, A. Minidicionário Houaiss da língua portuguesa. 4. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.NASCIMENTO, A. M. Curso de direito processual do trabalho. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.SANTOS, Boaventura de S. Para uma revolução democrática da justiça. São Paulo: Cortez, 2011.SERPA, Maria de N. Teoria e prática da mediação de conflitos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999.

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S U M Á R I O

http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3-9

MARKETING SOCIAL E SAÚDE COLETIVA: EM BUSCA DE UMA SOCIEDADE MELHOR

Social marketing and public health: in the pursuit of a better society

Sidimar Meira SagazBacharel em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda (UNOCHAPECÓ, SC).

Pós-graduando MBA em Marketing (IMED). Membro colaborador externo do Grupo de Pesquisa em Ciências Sociais em Saúde da FASURGS,

na linha de Pesquisa em Marketing e Educação em Saúde. E-mail: <[email protected]>.

Deison Alencar LuciettoCirurgião-dentista (UFSM, RS), mestre e doutor em Saúde Pública (FIOCRUZ, RJ).

Coordenador do Grupo de Pesquisa em Ciências Sociais em Saúde da FASURGS. E-mail: <[email protected]>.

Resumo

Saberes e práticas oriundos do Marketing e da Saúde têm sido manejados em favor da mudança de comportamentos na busca por melhores condições de vida e saú-de. Este artigo teve como objetivo principal analisar definições, usos e relações do Marketing Social e da Saúde Coletiva. Tratou-se de revisão integrativa da literatura, associando pesquisa bibliográfica tradicional e as bases de dados EBSCO, SPELL, BVS e SciELO (2015). Identificou-se que o Marketing Social e a Saúde Coletiva têm especificidades em termos de origens, definições e práticas. Ainda, que conceitos e ferramentas do marketing podem ser utilizados em ações voltadas para a obtenção de saúde pelas coletividades. Há muito mais semelhanças do que diferenças entre eles, especialmente quando se evidencia que Marketing Social e Saúde Coletiva têm, na busca por uma sociedade melhor, sua finalidade principal. Tal entendimento es-timula a aproximação desses campos em um contexto em que os problemas sociais e de saúde exigem respostas interdisciplinares e multiprofissionais. Palavras-chave: Marketing Social. Saúde Coletiva. Mudança de comportamentos. Sociedade. Saúde.

Abstract

Knowledge and practices related to both Marketing and Health have been articu-lated for changing behaviors in the search for better living and health conditions.

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S. M. Sagaz, D. A. Lucietto

This article aimed to analyze definitions, uses and relations of Social Marketing and Public Health. This was an integrative literature review associating the traditional literature to the EBSCO databases, SPELL, VHL and SciELO (2015). We identified that Social Marketing and Public Health have specific characteristics in terms of sources, definitions and practices. We have also found that concepts and marke-ting tools can be used in actions to obtain health by collectivities. There are more similarities than differences between them, especially when showing that the main purpose of Social Marketing and Public Health is to pursuit a better society. This understanding encourages the approximation of these fields in a context where so-cial and health problems require interdisciplinary and multidisciplinary responses.Keywords: Social Marketing. Public Health. Behavioral change. Society. Health.

Introdução

Tendo em vista a crescente mobilização de setores e movimentos sociais em tor-no da busca por melhores condições de vida e de saúde, especialmente em contextos marcados por coparticipação de condições agudas, crônicas, acidentes e violência (MENDES, 2010), a mudança de comportamentos em âmbitos individual e coletivo figura como condição fundamental para a construção de sociedades mais saudáveis.

Saberes e práticas oriundos de campos da Administração, do Marketing e da Saúde têm tratado, a partir de seus referenciais, de tais questões, muitas vezes, bus-cando relações entre eles.

Tendo em vista tal entendimento, este artigo teve como objetivo analisar defini-ções, usos e relações do Marketing Social e da Saúde Coletiva. Ele teve como pres-suposto que táticas típicas do Marketing podem ser utilizadas para promover saúde. Justifica-se por entender que a busca por soluções de necessidades de saúde envolve a articulação de diferentes disciplinas, profissionais, saberes e práticas.

Desenvolvimento

Método

Tratou-se de pesquisa exploratória (GIL, 2010; VASCONCELOS, 2002), do tipo revisão integrativa da literatura (SOUZA; SILVA; CARVALHO, 2010).

Inicialmente, foi conduzida pesquisa bibliográfica (GIL, 2010) em livros, pu-blicações periódicas e em sítios eletrônicos, de modo a fundamentar conceitos do Marketing Social e da Saúde Coletiva. Ela articulou experiências, aprendizados e criatividade (MINAYO, 2008). Depois, foi realizada pesquisa nos bancos de dados eletrônicos EBSCO (com acesso às bases de dados Fonte Acadêmica, Business Sour-ce Elite e Regional Business News), Scientific Periodicals Electronic Library (SPELL), Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Scientific Electronic Library Online (SciELO) – para verificar usos do Marketing Social nas práticas de Saúde Coletiva.

Esta pesquisa foi realizada de forma independente e em duplicata, entre os meses de setembro e dezembro de 2015. Foram conduzidas buscas avançadas em cada base através das seguintes estratégias: “marketing social AND saúde coletiva”; “marke-ting social AND saúde pública”; “marketing social AND promoção da saúde”; “mar-

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Marketing social e saúde coletiva…

keting social AND mudança social”; “marketing social AND campanhas de saúde”; “marketing social AND comportamento”; “marketing social AND marketing de causas sociais”. Foram utilizados como critérios de inclusão artigos completos, com qualquer desenho de estudo, publicados em periódicos brasileiros e em qualquer tempo; e como critérios de exclusão artigos duplicados, que não abordavam a temá-tica e os textos em outros formatos.

Os artigos foram analisados em função dos seus títulos e, depois, pela leitura de seus resumos, a partir do objetivo do estudo. Por fim, os artigos incluídos tiveram seu texto completo analisado. O material coletado foi processado através de proce-dimentos de análise descritiva (RUDIO, 2014).

Marketing social

O Marketing Social surgiu nos anos 1970 (MAZZON, 1982), como disciplina que objetiva influenciar comportamentos capazes de promover mudanças compor-tamentais, de saúde e de bem-estar para um público-alvo ou para a sociedade como um todo, através do uso de ferramentas do Marketing Comercial (KOTLER; LEE, 2011; KOTLER; ZALTMAN, 1971; REZENDE et al., 2015; WEINREICH, 1999).

Contudo, enquanto o Marketing Comercial ocupa-se da venda de produtos e serviços com vistas ao lucro, o Marketing Social objetiva a “venda” de compor-tamentos sociais, sem lucratividade ou favorecimentos pessoais (OLIVEIRA et al., 2012). Ele é visto como um conjunto de esforços depreendidos para estimular práti-cas para o desenvolvimento da sociedade, que possibilitam evitar acidentes e propi-ciam melhorias ao meio ambiente (KOTLER; LEE, 2011).

O Marketing Social é utilizado por organizações que têm em comum o estímulo à mudança de comportamentos, como as de saúde, as quais buscam transformações em dois níveis: tanto no individual (mudar atitudes, intenções e comportamentos) quanto na estrutura do ambiente (MARTINS et al., 2014).

Considerando que a mudança de comportamentos é geralmente voluntária, para obtê-la, é preciso seguir passos dentro de um método de planejamento de Marketing Social (KOTLER; LEE, 2011): 1) definição do histórico, propósito e foco do plano, a partir da identificação da questão a ser modificada; 2) análise da situação em nível ambiental interno e externo; 3) definição do mercado ou público-alvo através de uso de informações demográficas, socioculturais e comportamentais; 4) definição de objetivos e metas; 5) identificação de fatores que atuem como concorrência, barrei-ras e motivadores do mercado-alvo; 6) construção do posicionamento desejado; 7) declaração do mix de marketing estratégico, quando são descritos os produtos, pre-ços, praça e estratégias promocionais (4 Ps); 8) criação do plano de monitoramento e avaliação; 9) definição de orçamento e fontes de financiamento; 10) construção do plano implementação.

Através do adequado planejamento, é possível gerar benefícios perceptíveis ao público-alvo, deixando-os mais atrativos que possíveis comportamentos concor-rentes (BARBOZA, 2012), especialmente quando estes trazem prejuízos pessoais ou sociais, minimizando barreiras que dificultam a adoção do comportamento a ser promovido (MARTINS et al., 2014).

Tal aspecto assume maior importância quando da aplicação do Marketing So-cial em saúde, uma vez que suas estratégias devem considerar os estilos e as condi-ções de vida de indivíduos e populações. Interferir nos comportamentos humanos

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S. M. Sagaz, D. A. Lucietto

em favor de hábitos alimentares saudáveis, da diminuição do consumo de tabaco, álcool e drogas, do estímulo à prática de exercícios físicos e de mudanças favoráveis onde as pessoas vivem e trabalham (PAIM, 2006) representa um importante ganho social, em favor da saúde de coletividades.

Saúde coletiva

A Saúde Coletiva constituiu-se nos anos 1970, como movimento social, em fun-ção da Reforma Sanitária Brasileira (BOTAZZO, 2003), sendo definida como

[...] uma área do saber que toma como objeto as necessidades sociais de saúde (e não apenas as doenças, os agravos ou os riscos) entendendo a situação de saúde como um processo social (o processo saúde-doença) relacionado à estrutura da sociedade e con-cebendo as ações de atenção à saúde como práticas simultaneamente técnicas e sociais. (SOUZA, 2014, p. 11).

Ela representa uma invenção brasileira (CANESQUI, 2010; LIMA; SANTANA, 2006) e possui marcos histórico e conceitual próprios (BIRMAN, 1991), à medida que busca superar as tradicionais distinções entre saúde pública e assistência médi-ca, medicina curativa e medicina preventiva, bem como entre indivíduo e sociedade.

A Saúde Coletiva constitui-se a partir da confluência de pensamentos e concei-tos na busca por melhores condições de vida (BOTAZZO, 2003) e em torno do de-senvolvimento do Sistema Único de Saúde (SUS) (CANESQUI, 2010). Situa-se entre os limites do biológico e do social, e tem como desafios a investigação, a compreen-são e a interpretação dos determinantes sociais do processo saúde-doença (NUNES, 1994). Defende que os problemas de saúde não se restringem à dimensão biológica (BIRMAN, 1991).

Ela promove “nova compreensão na qual a perspectiva interdisciplinar e o de-bate político em torno de temas como universalidade, equidade, democracia, ci-dadania e, mais recentemente, subjetividade emergem como questões principais” (LIMA; SANTANA, 2006, p. 9).

Como campo de conhecimentos e de práticas, investiga a produção e distribui-ção das doenças, analisa as práticas de saúde, analisa como a sociedade identifica necessidades e problemas de saúde, busca sua explicação e se organiza para enfren-tá-los (PAIM; FILHO, 1998). Nela, abrigam-se epidemiologistas, planejadores, ges-tores, profissionais da saúde e pesquisadores das Ciências Humanas e Sociais (CA-MARGO JR., 2001). A multiprofissionalidade representa uma forma de aprimorar o saber fazer em torno das práticas de saúde (NUNES, 1994).

Fundamenta-se, também, na interdisciplinaridade, como forma de construção de conhecimento ampliado em saúde (NUNES, 1994). Na Saúde Coletiva, são pro-duzidos saberes através de várias disciplinas, tais como a Epidemiologia, o Plane-jamento/Administração de saúde, as Ciências Sociais em Saúde e outras (PAIM; FILHO, 1998).

No âmbito das práticas, propõe ações em diferentes organizações e instituições, dentro e fora do setor saúde. Ela fundamenta práticas transdisciplinares, multipro-fissionais, interinstitucionais e transetoriais (PAIM; FILHO, 1998). Os profissionais atuam em espaços sociais diversos, como unidades de saúde, centros de saúde, hos-pitais, escolas, creches, associações de moradores e outras. Além do exercício da clí-nica, eles costumam desenvolver campanhas e programas de saúde com vistas às

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Marketing social e saúde coletiva…

mudanças de comportamentos positivos em saúde e, para isso, precisam planejar, implementar e avaliar ações, de modo a garantir mudanças sustentáveis e duradoras.

Marketing social e saúde coletiva: diferenças, semelhanças e usos

O Marketing Social e a Saúde Coletiva originaram-se num mesmo período histó-rico, os anos 1970, porém em países e contextos distintos. Enquanto o primeiro vin-cula-se aos EUA (KOTLER; LEE, 2011; MAZZON, 1982), a Saúde Coletiva é tipica-mente brasileira (CANESQUI, 2010; LIMA; SANTANA, 2006; PAIM; FILHO, 1998).

O Marketing Social representa a disciplina responsável pelo planejamento e exe-cução de programas para influenciar a aceitação de ideias (KOTLER; ZALTMAN, 1971) e defende que a mudança de comportamentos é fundamental para melhorias na sociedade (KOTLER; LEE, 2011). Articula-se em torno dos benefícios para públi-cos específicos (KOTLER; LEE, 2011; KOTLER; ZALTMAN, 1971).

A Saúde Coletiva, por sua vez, organiza-se como campo de conhecimentos e de práticas interdisciplinar e multiprofissional, contribuindo para a compreen-são do processo saúde-doença (BOTAZZO, 2003; NUNES, 1994; PAIM; FILHO, 1998). Constitui-se em torno dos determinantes sociais da saúde (BIRMAN, 1991; NUNES, 1994; PAIM, 2006; SOUZA, 2014), da saúde como direito, da equidade, da integralidade e da participação social (LIMA; SANTANA, 2006).

A atuação em Saúde Coletiva acontece em espaços sociais diversos e não se limi-ta aos profissionais da saúde (CAMARGO JR., 2001; NUNES, 1994; PAIM; FILHO, 1998). O mesmo verifica-se com a atuação em Marketing Social, à medida que ad-ministradores, profissionais de marketing, publicitários, gestores de saúde e outros (KOTLER; LEE, 2011; MARTINS et al., 2014) atuam em organizações governamen-tais e em empresas privadas (BARBOZA, 2012; KOTLER; LEE, 2011; OLIVEIRA et al., 2012; REZENDE et al., 2015; SILVA; MINCIOTTI, 2005).

De acordo com a literatura analisada, conceitos e ferramentas do Marketing So-cial são (e podem ser) utilizados em ações típicas da Saúde Coletiva (quadro 1):

Quadro 1: Usos do Marketing Social na Saúde Coletiva

Ações de Marketing Social relacionadas à Saúde Coletiva Fonte

Controle da natalidade e diminuição da mortalidade infantil

MINCIOTTI, 1983 SCHNEIDER; LUCE, 2014

Campanhas de vacinaçãoCOSTA et al., 2013 LARA et al., 2015REZENDE et al., 2015

Campanhas de combate a epidemias

COSTA et al., 2013PORTO, 2005 SCHNEIDER; LUCE, 2014REZENDE et al., 2015

Campanhas de doação de sangue e de órgãos

FARIAS; SOUZA, 2008LUDWIG; RODRIGUES, 2005RODRIGUES; REIBNITZ, 2011BARBOZA; COSTA, 2014REZENDE et al., 2015

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S. M. Sagaz, D. A. Lucietto

Ações de Marketing Social relacionadas à Saúde Coletiva Fonte

Promoção da saúde e prevenção de doenças

MARTINS et al., 2014MINCIOTTI, 1983MOTA et al., 2013SCHNEIDER; LUCE, 2014

Fomento à alimentação saudável MAZZON, 1982FREITAS-DA-COSTA; MATOS, 2009

Diminuição do consumo de tabaco

CAVALCANTE, 2005MOTA et al., 2013SCHNEIDER; LUCE, 2014REZENDE et al., 2015

Diminuição do consumo de bebidas alcoólicas COSTA et al., 2013 REZENDE et al., 2015

Combate às drogas REZENDE et al., 2015Fonte: EBSCO, SPELL, BVS, SciELO (2015).

Embora Marketing Social e Saúde Coletiva tenham suas especificidades em ter-mos de origens, conceitos e práticas, a análise da literatura empreendida possibili-tou identificar que possuem pontos comuns; destacam-se estes: 1) surgem em um mesmo período histórico; 2) atuam sobre problemas complexos; 3) situam-se entre o individual e o coletivo; 4) produzem saberes na interface de disciplinas; 5) insti-gam a atuação de diferentes profissionais; 6) visam ganhos e benefícios sociais; 7) estimulam tomadas de decisão a partir da conscientização; 8) estimulam a partici-pação social; 9) utilizam métodos específicos de planejamento e avaliação; 10) têm repercussões sobre projetos de vida individuais e coletivos.

Considerações finais

O Marketing Social busca diminuir ou eliminar os problemas sociais e fomen-tar a saúde e o bem-estar (KOTLER; LEE, 2011; KOTLER; ZALTMAN, 1971; RE-ZENDE et al., 2015; WEINREICH, 1999). Já a Saúde Coletiva, a seu tempo, almeja a saúde e a qualidade de vida populacionais (BOTAZZO, 2003; CANESQUI, 2010; LIMA; SANTANA, 2006; PAIM; FILHO, 1998).

Tendo em vista a revisão de literatura conduzida, advoga-se que a utilização de conceitos e táticas de Marketing Social pode trazer ganhos em favor da promoção da saúde, da prevenção de doenças e da conscientização (educação em saúde) para pú-blicos-alvo. Além de qualificar a atuação dos profissionais, traz maior assertividade para as ações de saúde, contribuindo para a construção do campo da Saúde Coletiva.

Entende-se, então, que há muito mais semelhanças do que diferenças entre os conceitos, especialmente quando se evidencia que Marketing Social e Saúde Cole-tiva têm, na busca por uma sociedade melhor, sua finalidade principal. Tal enten-dimento estimula a aproximação desses campos de saberes e práticas em um con-texto em que os problemas sóciais e de saúde exigem respostas interdisciplinares e multiprofissionais.

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Marketing social e saúde coletiva…

Referências

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S. M. Sagaz, D. A. Lucietto

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S U M Á R I O

http://dx.doi.org/10.18256/978-85-99924-85-3-10

ECONOMIA VERDE: QUAL O DEVIR DA SUSTENTABILIDADE

A PARTIR DA POLÍTICA JURÍDICA?

Green economy: the future of sustainability from a legal policy perspective

Rafaela Rovani de LinharesAcadêmica de Direito da IMED. Bolsista do Programa de Iniciação Científica – PIC IMED.

Membro do Grupo de Pesquisa Ética, Cidadania e Sustentabilidade. E-mail: <[email protected]>.

Sérgio Ricardo Fernandes de AquinoDoutor e mestre em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

Professor permanente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado) em Direito da IMED. Pesquisador da IMED. Membro do Grupo de Estudos Interdisciplinares em

Ciências Humanas, Contingência e Técnica na linha de pesquisa Norma, Sustentabilidade e Cidadania da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Membro associado do Conselho Nacional de Pós-Graduação em Direito – CONPEDI. Coordenador do Grupo de Pesquisa em Ética, Cidadania e Sustentabilidade no Programa de Mestrado em Direito (PPGD) da IMED. Membro do Grupo de Pesquisa sobre Direitos Culturais e Pluralismo Jurídico da IMED.

Membro do Grupo de Pesquisa sobre Transnacionalismo e Circulação de Modelos Jurídicos da IMED. Líder, em participação com o professor doutor Neuro José Zambam, no Centro Brasileiro de Pesquisa Sobre a Teoria da Justiça de Amartya Sen. Membro da Associação

Brasileira de Ensino de Direito (ABEDi). Membro do Grupo de Pesquisa em Direito Empresarial e Sustentabilidade do Instituto Blumenauense de Ensino Superior.

Passo Fundo, RS, Brasil. Currículo Lattes: <http://lattes.cnpq.br/1318707397090296>. E-mail: <[email protected]>.

Resumo

Este artigo científico tem como objetivo geral determinar quais são as recomenda-ções da Política Jurídica para se estabelecer os limites observados pela categoria Sus-tentabilidade na sua dimensão ambiental e econômica a partir daquilo que enuncia o relatório sobre Economia Verde elaborado pelo Programa nas Nações Unidas ao Meio Ambiente (PNUMA). A pesquisa desenvolve-se por meio do método deduti-vo. Pode-se verificar que os significados acerca da Sustentabilidade trazidos pelo re-latório sobre Economia Verde elaborado pelo Programa nas Nações Unidas ao Meio Ambiente nem sempre condizem com os objetivos expressos pela primeira categoria enunciada, especialmente sobre o respeito e proteção à Natureza.Palavras-chave: Economia Verde. Sustentabilidade. Política Jurídica. Devir.

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R. R. de Linhares, S. R. F. de Aquino

Abstract

The aim of this paper is to determine the recommendations of the Legal Policy to establish the limits observed by the Sustainability category in its environmental and economic dimension, from what states the Report on Green Economy prepared by the program of the United Nations for the Environment - UNEP. This research has used the Deductive Approach Method. It is possible to note that the awareness on Sustainability brought by the report on Green Economy, prepared by the United Na-tions Program for the Environment, is not always consistent with the objectives set out for the first category, especially regarding the respect and protection of Nature.Keywords: Green Economy. Sustainability. Legal Policy. Becoming.

Introdução

O relatório sobre Economia Verde1 elaborado pelo Programa nas Nações Unidas ao Meio Ambiente (PNUMA) precisa ser estudado sob o ângulo crítico da Política Jurídica a fim de ratificar seus objetivos de mitigar as atitudes de exploração desme-dida empreendidas pelo ser humano. Neste estudo, demonstram-se como relevantes os aspectos macroeconômicos e questões ligadas à Sustentabilidade.

Ao longo dos anos, o Planeta vem sofrendo profundas transformações decorren-tes da degradação que o assola constantemente. Desde a Idade Média aos meados de 1980, o Homem busca formas para, de alguma maneira, reparar ou recuperar os da-nos causados à Natureza. Esse cenário ocorre devido à preocupação em se manter, em se preservar os ecossistemas para as presentes e futuras gerações. É necessário estabelecer como fundamento da Sustentabilidade uma solidariedade sincrônica e diacrônica entre os seres humanos.

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) lançou em 2008 a iniciativa Economia Verde, na qual se depositaram inúmeras expectativas fa-voráveis no sentido de que poderia haver uma solução para essa crise que a humani-dade enfrenta. A ideia de Sustentabilidade denota o novo paradigma de convivência interespécies, cujos benefícios não se reservam tão somente aos membros da família humana, mas se estendem a todos os seres.

Num primeiro momento deste trabalho, analisa-se como se deu a origem da expressão Economia Verde. Posteriormente, a pesquisa se destina ao estudo da im-portância da Política Jurídica a partir da lege ferenda. Por fim, a pesquisa volta-se à problemática do devir da Sustentabilidade, buscando oferecer respostas a partir da Economia Verde e Política Jurídica.

A pesquisa realiza-se por meio do método indutivo2 e da técnica de pesquisa

1 Para fins desta pesquisa, a expressão é compreendida pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA, 2011, p. 1-2) “[...] como uma economia que resulta em melhoria do bem-estar da humanidade e igualdade social, ao mesmo tempo em que reduz significativa-mente riscos ambientais e escassez ecológica. Em outras palavras, uma economia verde pode ser considerada como tendo baixa emissão de carbono, é eficiente em seu uso de recursos e socialmente inclusiva.”

2 “[...] base lógica da dinâmica da Pesquisa Científica que consiste em pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral” (PASOLD, 2015, p. 213).

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Economia verde…

bibliográfica3, da categoria4 e do conceito operacional5. O problema a ser enfrentado pela pesquisa é o seguinte: quais significados acerca da Sustentabilidade ambiental e econômica a Política Jurídica pode sinalizar a partir do relatório sobre Economia Verde elaborado pelo Programa nas Nações Unidas ao Meio Ambiente (PNUMA)?

Como hipótese para a pesquisa tem-se que os significados acerca da Sustentabi-lidade trazidos pelo relatório sobre Economia Verde elaborado pelo Programa nas Nações Unidas ao Meio Ambiente nem sempre condizem com os objetivos expres-sos pela primeira categoria enunciada.

Verificam-se, ainda, duas situações que não foram mitigadas com esse relatório: a) a persistência do capitalismo como modelo econômico, cujas atividades, especialmen-te as industriais, recebem outra aparência, mais “compatível” com a preservação am-biental; b) o não reconhecimento da Natureza como “ser próprio”, mas, ainda, objeto de livre exploração e dominação pelo Homem, especialmente a partir dos interesses criados pelo capitalismo. Por esse motivo, a Política Jurídica precisa indicar qual o devir da Sustentabilidade a ser preservada, inclusive pelas legislações nacionais.

O objetivo geral deste estudo é determinar quais são as recomendações da Políti-ca Jurídica para se estabelecer os limites observados pela categoria Sustentabilidade na sua dimensão ambiental e econômica a partir daquilo que enuncia o relatório sobre Economia Verde elaborado pelo Programa das Nações Unidas ao Meio Am-biente (PNUMA).

Como objetivos específicos apresentam-se estes: definir o que é o relatório sobre Economia Verde elaborado pelo Programa nas Nações Unidas ao Meio Ambiente; identificar a importância da Política Jurídica na elaboração de estratégias legais de de-senvolvimento dos significados propostos pela categoria Sustentabilidade; avaliar qual é o devir da Sustentabilidade proposto pelo relatório sobre Economia Verde elaborado pelo Programa nas Nações Unidas ao Meio Ambiente a partir da Política Jurídica.

Fundamentos sobre a economia verde

O marco teórico da chamada Economia Verde surgiu recentemente e ganhou uma projeção mais acentuada do Programa das Nações para o Meio Ambiente (PNUMA) por meio da conferência conhecida como Rio+20; pautou-se na ideia de Desenvolvimento Sustentável, buscando levantar evidências sobre os riscos e cus-tos sociais e econômicos gerados pelos atuais padrões de uso excessivo dos recur-sos naturais, bem como destacar as oportunidades de uma transição para práticas mais sustentáveis.

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) lançou em 2008 a iniciativa Economia Verde, que tem por objetivo central apoiar o desenvolvi-mento de um plano global de transição para uma economia verde, que seja domina-da por investimentos e consumo de bens e serviços de promoção ambiental.

3 “[...] técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais” (PASOLD, 2015, p. 215).

4 Nas palavras de Pasold, “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma ideia” (PASOLD, 2015, p. 205).

5 Reitera-se, conforme o citado autor: “[...] definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das ideias que expomos [...]” (PASOLD, 2015, p. 205).

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R. R. de Linhares, S. R. F. de Aquino

Entende-se por economia verde aquela que resulta na melhoria do bem-estar humano e da igualdade social, ao mesmo tempo que reduz significativamente os riscos ambientais e as escassezes ecológicas.

Elaborado pelo PNUMA, em parceria com economistas e especialistas mun-diais, o relatório “Rumo à Economia Verde: caminhos para o Desenvolvimento Sus-tentável e a erradicação da pobreza” procurou defender a proposição da economia verde como uma iniciativa que permitiria fortalecer o crescimento por meio da ge-ração de empregos decentes, consistindo em uma estratégia vital para a eliminação da pobreza.

O referido relatório analisa aspectos macroeconômicos e questões ligadas à Sus-tentabilidade e redução da pobreza, relacionando-os a investimentos em diversos setores da economia, desde energia renovável até agricultura sustentável.

Diante do relatório elaborado, não se pode buscar um diagnóstico imediato sobre as mazelas que ocorrem no Planeta. Ao contrário, tal documento trata-se de um es-forço um tanto quanto sofisticado para demonstrar que é possível resolver os proble-mas da crise ambiental sem alterar a estrutura global de poder no sistema mundial, nem as relações de dominação e exploração existentes, advindas do Capitalismo6.

Por um lado, o relatório foi amplamente documentado sobre os graves proble-mas ambientais enfrentados no planeta; por outro, mostrou-se incapaz de resolver as causas ligadas a esses problemas, justamente porque foram levantadas concep-ções dentro do quadro lógico do crescimento econômico capitalista sem fim. Em que pese a pretensão de apresentar um avanço no qual se elimine a pobreza de for-ma sustentável, fica claro que não se pode acreditar que a mudança tecnológica e o crescimento econômico infinitos permitiriam produzir cada vez menos insumos materiais e energéticos.

Não é possível acreditar na ideia – nem no discurso – do crescimento infinito den-tro de um planeta finito. Por esse motivo é que se considera a Economia Verde uma tentativa de mudança do conceito de Desenvolvimento Sustentável7. O conceito dessa expressão introduzido pelo modelo Economia Verde teve eficácia política e ideológica, pois se acreditou ter dado conta dos desafios do desenvolvimento, à medida que se criou uma ilusão de que seriam tomadas medidas eficazes em relação à crise8.

6 Sob o ângulo da Filosofia Política, a categoria designa um sistema “[...] econômico-social ca-racterizado pela liberdade dos agentes econômicos – livre iniciativa, liberdade de contratar, propiciando o livre mercado – e pelo desenvolvimento dos meios de produção, sendo permitida a propriedade particular destes. Quem aciona os meios de produção (quem trabalha) em regra não os detém” (OLIVEIRA, 2010, p. 85).

7 “[...] é possível compreender o desenvolvimento sustentável como um enfoque diferenciado, que compatibiliza a atividade econômica com a expansão das potencialidades do homem e do meio natural, sem implicar no exaurimento deste. A vinculação entre a política ambiental e a política econômica, tendo por base o desenvolvimento sustentável, é uma ‘estratégia de risco’ com o ob-jetivo de diminuir possíveis tensões entre o desenvolvimento econômico e a sustentabilidade” (BRAGA; OLIVEIRA, 2012, p. 138).

8 “Um número de evidências cada vez maior também sugere que a transição para uma econo-mia verde possa ser inteiramente justificada em termos econômicos e sociais. Há um forte argumento emergindo para que haja uma duplicação do número de esforços feitos tanto pelo governo quanto pelo setor privado no engajamento em tal transformação econômica. Para os governos, esta deve incluir o nivelamento de produtos mais verdes através da eliminação pro-gressiva dos ultrapassados subsídios, a reforma de políticas e o fornecimento de novos incen-tivos, o fortalecimento da infraestrutura de mercado e mecanismos de base de mercado, o redirecionamento do investimento público e tornar mais verdes os contratos públicos. Para o

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Economia verde…

Acontece que, ao não se questionar a lógica da acumulação capitalista e o mo-delo da sociedade industrial e do consumo desenfreado como causas da destruição das condições que tornam a vida possível, opera-se uma globalização9 de certa for-ma liberal, que veio apresentar-se como sustentável mas que, por trás de toda sua retórica, traz consigo uma dinâmica devastadora.

Neste sentido, conforme contextualiza Bauman (2011, p. 21), “[...] vivemos em tem-pos difíceis, pois a própria liberdade do ser humano está em crise.” A partir daí surgem questionamentos a respeito da interação entre a humanidade e a Natureza. Ao longo dos anos, o debate ganhou força, em âmbitos nacional e internacional, pois o Homem percebeu que uma nova consciência em respeito à conservação e à preservação do meio ambiente seria indispensável para a manutenção da vida humana na Terra.

Política jurídica e sua importância a partir da lege ferenda

O novo paradigma da Sustentabilidade10 surgiu em 1980 e ganhou força em todo o mundo, como uma forma de limitar a exploração do meio ambiente e preservar os recursos naturais necessários para as gerações presentes e futuras, pois de ações sustentáveis é que depende a manutenção da vida humana neste planeta.

Nessa linha de pensamento, há necessidade do resgate de um sentimento de per-tença11, que permita a identificação de um ser humano com o outro, tendo em vista a existência de um vínculo antropológico comum. No entanto, essa vida plural vai além do conceito de Sociedade12 que se vive hoje.

setor privado, isso envolveria entender e aproveitar a verdadeira oportunidade representada pela transição das economias verdes em relação a um número de setores chave, e responder à reformas políticas e aos sinais dos preço através de níveis cada vez mais altos de financiamento e investimento” (PNUMA, 2011, p. 1-2).

9 “Globalização é normalmente associada a processos econômicos, como a circulação de capitais, a ampliação dos mercados ou integração produtiva em escala mundial. Mas descreve também fenômenos da esfera social, como a criação e expansão de instituições supranacionais, a uni-versalização de padrões culturais e o equacionamento de questões concernentes à totalidade do planeta (meio ambiente, desarmamento nuclear, crescimento populacional, direitos humanos, etc.). Assim, o termo tem designado a crescente transnacionalização das relações econômicas, sociais, políticas e culturais que ocorrem no mundo, sobretudo nos últimos 20 anos” (VIEIRA, 2002, p. 72-73).

10 Para fins deste artigo, apresenta-se o seguinte conceito operacional para a categoria em estudo: “É a compreensão acerca da capacidade de resiliência entre os seres e o ambiente para se determinar - de modo sincrônico e/ou diacrônico - quais são as condições favoráveis à manutenção, adap-tação e perpetuação da vida equilibrada, seja humana ou não humana, a partir de uma matriz ecosófica que se manifesta pelos critérios biológicos, químicos, físicos, informacionais, éticos, territoriais, culturais, jurídicos, políticos, tecnológicos, científicos, ambientais e econômicos”.

11 “É isso que precisamos enfatizar, ou seja, a possibilidade de criar ambiente favorável para nele medrar a tolerância, o pluralismo de ideias, a aceitação dos valores do outro, sob o pressuposto do respeito recíproco, ou seja da tolerância, no sentido amplo. Isso nos convida a considerar que a democracia, entendida na sua mais elevada acepção, quando transcende a simples arranjos políticos, tem a sua estética própria” (MELO, 1994, p. 62).

12 Para Dias (2010, p. 187), “a sociedade, enquanto fenômeno humano, decorre da associação de homens, da vida em comum, fundada na mesma origem, nos mesmos usos, costumes, valores, cultura e história. Constitui-se sociedade no e pelo fluxo das necessidades e potencialidades da vida humana; o que implica tanto a experiência da solidariedade, do cuidado, quanto da oposição, da conflitividade. Organização e caos são pólos complementares de um mesmo mo-vimento – dialético – que dá dinamismo à vida da sociedade”.

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R. R. de Linhares, S. R. F. de Aquino

Por esse motivo, emprega-se, para este tópico, a categoria Política Jurídica13, a qual, por meio da utopia, não se apresenta como sonho distante, irrealizável. Muito pelo contrário, a Política Jurídica busca conhecer aquilo que é desejável, ético, justo e socialmente útil para organizar e manter uma Sociedade pacífica. A partir das atividades da lege ferenda, tenta-se expressar aquilo que as pessoas, por suas res-ponsabilidades comuns, imaginam como uma utopia da vida cotidiana por meio de valores que ampliem e esclareçam esse vínculo antropológico comum.

A transformação da consciência no sentido da preservação ainda pode ser vista como uma utopia, porém concreta, porque, de certa forma, expressa que o desejável não se limita aos domínios da abstração, mas se torna fenômeno “de carne e osso”14. A ideia da Sustentabilidade ainda caminha a passos lentos porque a mudança tem que partir de todos os sujeitos, em gestos despercebidos, nos lares, nas escolas, nas comunidades, nos bairros e nos municípios.

A produção das leis, o próprio fenômeno normativo advindo de acordos interna-cionais que objetivam proteger e conservar a Natureza, será ineficiente – e até mesmo insuficiente – se os cidadãos do mundo não agirem também para essa finalidade. É cer-to que, a partir desse novo paradigma vigente, querendo ou não, têm-se visto esforços no sentido de que a Sustentabilidade requer muito mais do que ações positivas.

Desse modo, a Política Jurídica não é uma abstração vazia, uma ideia sem senti-do, mas, ao contrário, representa o devir para uma época saturada das “promessas de amante”15 enunciadas pelos seres humanos e para apenas seres humanos. Aqui, existe a persistência saudável e necessária da esperança como aposta no improvável. Eis por que a Política Jurídica é uma utopia concreta que, pouco a pouco e silencio-samente, se manifesta na vida de todos os dias16.

Logo, as preocupações com o futuro não devem limitar-se a um determinado local ou comunidade. Por estarmos no planeta Terra, compartilhando de um lar comum, o alcance da Sustentabilidade faz-se necessário em prol de que o Desen-volvimento Sustentável seja um pensamento comunitário e não individualista. Este deve ser considerado como consciência que se pretende consolidar mundialmente, ao passo que a Sustentabilidade desvela

[...] uma importância decisiva porque engloba as diversificadas necessidades, expecta-tivas e recursos com os quais se relaciona o ser humano, particularmente a correta e criteriosa utilização dos recursos ambientais, as relações familiares e culturais, a orga-

13 “Trata-se da produção, interpretação e aplicação do Direito a partir das proposições éticas e culturais de um determinado povo sob o ângulo de sua época. Não se trata de uma preocupa-ção exclusiva com o Direito que pode vir a ser (devir), mas, também, com o vigente (o Direito que é). Essa manifestação aparece por meio da lege ferenda e sententia ferenda, pois, a partir da escolha dos valores de uma Sociedade, cria-se, a partir da Utopia, a Norma Jurídica ética, justa e socialmente útil” (MELO, 1998, p. 80).

14 “O ponto de contato entre sonho e vida, sem o qual o sonho produz apenas utopia abstrata e a vida, por seu turno, apenas trivialidade, apresenta-se na capacidade utópica colocada sobre os próprios pés, a qual está associada ao possível-real. […] aqui teria lugar o conceito de utópi-co-concreto, apenas aparentemente paradoxal, ou seja, um antecipatório que não se confunde com o sonhar utópico abstrato” (BLOCH, 2005, p. 145).

15 “Expressão retirada de Warat na qual o autor assemelha os fenômenos que ocorrem em ramos do conhecimento como as promessas que os amantes fazem a si, sabendo que não poderão cumpri-las” (WARAT, 2002, p. 13-14).

16 “Somente um pensamento complexo – e não o pensamento simplificador da Modernidade – vai compreender a complexidade do Ser humano, da Vida, da Sociedade, da Ciência” (DIAS, 2009, p. 16).

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Economia verde…

nização e as expectativas de ordem econômica, a complexa arquitetura política interna e externa e o cuidado especial para com as necessidades e as condições para as futuras gerações. (ZAMBAM, 2012, p. 150).

A Política Jurídica é utopia concreta porque torna viável, no momento presente, condições para que o desespero de tempos mais difíceis, de sobrevivência utilitária, de fome, no seu sentido material ou espiritual, de miséria profunda17, de intolerân-cia, não retire de todos a chance de que o momento presente, muitas vezes insusten-tável e insuportável, se torne, mais ainda, uma obra de arte capaz de sinalizar o que se pode insistir e apostar numa autêntica Estética da Convivência.

O devir da sustentabilidade: respostas a partir da economia verde e política jurídica

A necessidade de posturas sensíveis por parte dos seres humanos em relação ao planeta e às gerações futuras ainda encontra resistências na Sociedade, à medida que se acentuam cada vez mais as relações de poder e consumismo. O Desenvolvi-mento Sustentável se choca, muitas vezes, com interesses econômicos e privados que inviabilizam a implementação de ações neste sentido.

No tocante a esse ponto, e de acordo com o que se aduz das bases fundamentais da Economia Verde, percebe-se certa dificuldade em separar o progresso econô-mico do ambiental, ou seja, busca-se desenvolver um modo de vida sustentável ao mesmo tempo que se progrida economicamente. Ora, absolutamente incompatível pensar numa perspectiva sustentável sem que se supere a necessidade de, cada vez mais, desenvolver o mercado consumidor e capitalista.

Por conseguinte, não são a possibilidade de crescimento econômico nem a noção de progresso que irão redirecionar investimento, inovação e tecnologia18 à Economia

17 “Se tudo isso […] não se constituir em apenas um mero jogo de palavras, fugaz retórica ou so-lerte demagogia, então podemos raciocinar que a República Federativa do Brasil tem o dever de construir uma sociedade solidária e de garantir assistência aos desamparados, expressão que deve ser entendida em sentido amplo (econômico e moral), pois o texto constitucional não traz qualquer restrição. Na prática, o que vimos historicamente foi a constante abstenção do Estado em atender a esses casos de necessidades morais. E as razões são várias, entre elas a difícil iden-tificação desse tipo de necessitado, absoluta falta de experiência socorrista oficial nesses casos e a tradição de deixar tal assunto ao encargo da ação caritativa da iniciativa religiosa, mesmo sabendo-se que esta é voluntária, geralmente condicionada e não exigível” (MELO, 2009, p. 103).

18 “Las innovaciones tecnológicas y la eficiencia nos mostrarán también en el futuro el camino hacia una economía más eficiente en el uso de los recursos y ayudarán a dilatar los umbrales ecológicos. Sin embargo, todas las estrategias de una economía verde o de la nueva bioecono-mía deben enfrentarse a los siguientes cuestionamientos: Sí a las tecnologías e innovaciones, ¿pero, para quién? ¿Quién las controla? ¿Con qué consecuencias sociales y ecológicas? ¿Son suficientes o son sólo una estrategia de dilatación frente a un pospuesto, pero inevitable cambio de paradigma hacia una “política del menos /de reducción”? Estas son las preguntas que, muy legítimamente son debatidas con creciente virulencia entre los gobiernos, actores económicos y la sociedad civil. Porque ninguna de las estrategias de la economía verde, desde la OCDE hasta PNUMA, aborda los aspectos del poder y la distribución. Están simplemente ausentes. En ellas, toda nueva iniciativa y programa tiene lugar al parecer en un espacio donde no existe el poder y los intereses. Tanto la OCDE como PNUMA, en forma más explícita, promueven la función del Estado como una institución que debe fijar el marco jurídico, eliminar las subvenciones nocivas para la ecología, formular estándares legales, o impulsar una política industrial ecológica y, so-bre todo, una política de investigación. Pero prácticamente no se plantean como opción política

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Verde, como se pretendeu com o relatório. Aqui, vale lembrar que há um problema antes mesmo do consumismo a ser superado: justamente a questão da má alocação do capital, agravada pelo descaso total em relação ao meio ambiente e à Natureza.

A exploração desmedida do mundo natural, a tentativa do relatório de “mone-tarizar a Natureza”19 para ser compreendida por políticos e empresários a fim de se empreender ações “ecologicamente satisfatórias” é a estratégia para perpetuar a necessidade de produção e estímulo do capital descrito como fonte de inesgotável progresso. Novamente, a Natureza, nessa linha de pensamento, se manifesta como “ser próprio” em sua dimensão utilitária, ou seja, “presta serviços” para a perpetua-ção (exclusiva) da humanidade20.

É preciso compreender a fragilidade e a incompletude da Natureza para ser pos-sível preservá-la, ou seja, necessária se faz a percepção de que se está diante de um planeta com possibilidades finitas. Essa parece uma reflexão que o mencionado rela-tório – elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) – deixa de abordar21.

la posibilidad de fijar metas drásticas para limitar el consumo de energía y la explotación de la naturaleza (los llamados Caps, protección de grandes extensiones de naturaleza, prohibición de explotar materias primas en ecosistemas frágiles como las regiones árticas y las aguas abisales). En la noción de los protagonistas de la economía verde ya no cabe fijar límites, ni como priori-dad ni como requisito” (UNMÜβIG; SACHS; FATHEUER, 2012, p. 26).

19 “Como a atividade econômica normalmente se baseia na desvalorização do capital natural em termos de abastecimento, regulamentação ou serviços culturais, isso está causando o es-gotamento dos recursos naturais e acabando com a habilidade dos ecossistemas de fornecerem benefícios econômicos. De preferência, mudanças em reservas de capital natural seriam avalia-das em termos monetários e incorporadas nas contas nacionais, que é o objetivo que se busca através do contínuo desenvolvimento do Sistema Integrado Ambiental e Econômico (SEEA, da sigla em inglês) pela Divisão de Estatística da ONU, e pelos métodos ajustados de valores líquidos das reservas nacionais do Banco Mundial19. O uso mais abrangente de tais métodos proporcionaria uma indicação mais apurada do nível real e da viabilidade de crescimento de renda e de emprego. A contabilidade verde, ou a contabilidade da valoração ambiental, é uma estrutura disponível que esperamos que seja adotada inicialmente por algumas nações20 e que pavimente o caminho para a medição de uma transição de economia verde no plano macroe-conômico” (PNUMA, 2011, p. 5-6).

20 “¿Pero qué significa exactamente “ponerle valor a los ecosistemas”? No toda monetarización lleva automáticamente a la comercialización de la naturaleza. Una determinación monetaria, aunque sea aproximada, es importante por ejemplo, para medir daños ambientales. ¿Qué multas deben pagar los operadores de “Deepwater Horizon” por los daños en el ecosistema de las aguas abisales en el Golfo de México? ¿Qué daños provoca un barco que surca un arrecife de coral? Ciertamente cabe ponderar también si son más caras las inversiones en el procesamiento de las aguas o en la protección de los acuíferos. Según TEEB (The Economy of Ecosystems and Biodiversity), una iniciativa dirigida por PNUMA, ponerle un precio a la naturaleza podría ayudar a los políticos y empresarios en sus decisiones y esto en un lenguaje que comprenden. Las empresas deben poder reconocer mejor los riesgos y los políticos comprender los costos invisibles y las consecuencias de largo plazo de sus acciones. Pero lo que no consiguen los partidarios de la economización de la naturaleza es una reflexión sobre el contexto social en el que se prestan los “servicios de los ecosistemas” – es más, se podría constatar, que este concepto incluso aumenta la invisibilidad de las relaciones sociales: Porque no es la laboriosa naturaleza la que será remunerada por sus servicios, sino sus propietarios” (UNMÜβIG; SACHS; FATHEUER, 2012, p. 22).

21 “Sin embargo, aporta pocas ideas a la reflexión sobre cómo deberían diseñarse las regulaciones para decarbonizar globalmente la economía mundial y hacer más eficiente su uso de los recur-sos. Las propuestas de mayor alcance son las referidas a la agricultura ecológica y un desar-rollo urbano compatible con el medioambiente. Una de las exigencias más eficaces y de alto impacto es la supresión de las subvenciones a la agricultura y el transporte, así como al petróleo y carbón, que resulten nocivas para la ecología y la sociedad. El PNUMA asigna al Estado un

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Economia verde…

A humanidade passa por um momento de transição, o qual fica cada vez mais evidente em razão do avanço da tecnologia, do encurtamento das distâncias, da industrialização, bem como do surgimento de uma economia global cada vez mais unificada.

De fato, necessária se faz uma adaptação à nova realidade, ao passo que se tor-nou uma questão de necessidade unificar a Natureza como um ambiente limpo e preservado a conceitos modernos como o de Sustentabilidade.

No tocante à produção normativa e em relação às medidas que precisam ser tomadas para que a ideia central da Economia Verde seja efetivada, observa-se a importância da Política Jurídica, que chega como uma expectativa segura de reali-zação, para que a norma jurídica não seja apenas objeto de abstração da vontade do legislador.

A Política Jurídica mostra-se como uma forma possível e importante de estudar os meios capazes de viabilizar, cada vez mais, sentidos concretos à ideia da Econo-mia Verde, de proposição para alternativas que não permitam a exaustão de seres e ambientes, mas constituam um exercício de permanente diálogo dos seres humanos com o mundo natural, para que se reconheçam, igualmente, seus limites, a fim de atender interesses e valores cujos benefícios são destinados tão somente aos mem-bros da família humana.

A crítica da Política Jurídica ao relatório sobre Economia Verde denota a ne-cessidade de se repensar, profundamente, os meios de produção e exploração do Mundo Natural pelo Capitalismo. Não é possível que se consiga um cenário mais economicamente harmônico quando a Natureza é, ainda, objeto de destruição para se criar novos cenários não apenas de consumo, mas de transformação dessa cate-goria em vetor de orientação social – o consumismo22.

Novamente, a pergunta deste artigo parece pertinente: Qual é o devir da Sus-tentabilidade apresentado pelo relatório sobre Economia Verde? O desejável é que se tragam novas possibilidades – sejam culturais, tecnológicas, científicas, jurídicas ou políticas – para desenvolver políticas civilizacionais que reconheçam a necessidade de transformação das atitudes econômicas para além de falas premissas instituídas como progresso por meio de um crescimento econômico infinito.

Algumas dessas situações já podem ser nominadas: o Buen Vivir, na América Latina; a perspectiva do Ecocentrismo; do Descrescimento; da importância acerca das econômicas comunitárias – capazes de fortalecer o convívio entre todos os se-res e ambientes a partir de atitudes que reavaliem os efeitos econômicos do nosso momento presente, reconceituem antigos modelos de consumo, reestruturem novas políticas de Sustentabilidade, redistribuam bens, relocalizem a importância do ter-ritório como elemento de integração entre as pessoas, reduzam os danos causados a humanos e não humanos, reutilizem e reciclem tudo aquilo que não se degrada num longo período de tempo.

importante papel regulador; sin claras normas legales y un ordenamiento estatal no es posible implementar la economía verde” (UNMÜβIG; SACHS; FATHEUER, 2012, p. 21).

22 Segundo Bauman (2008, p. 43), consumismo corresponde “[...] não tanto à satisfação de ne-cessidades (como suas “versões oficiais” tendem a deixar implícito), mas a um volume e uma intensidade de desejos sempre crescentes, o que por sua vez implica o uso imediato e a rápida substituição dos objetos destinados a satisfazê-la. Novas necessidades exigem novas mercado-rias, que por sua vez exigem novas necessidades e desejos; o advento do consumismo inaugura uma era de ‘obsolescência embutida’ dos bens oferecidos no mercado [...]”.

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Todos esses cenários são, como já se afirmou, utopias concretas. Cada uma des-sas alternativas representa um novo horizonte de crítica para um modelo econômi-co cujo objetivo não é apresentar novas proposições para antigos problemas, mas, apenas, mascarar – ou agravar – um estilo de vida humano incompatível com a manutenção, o equilíbrio da vida revelado pela interdependência entre as espécies e os ecossistemas23.

A função da Política Jurídica, nesse caso, é a de permitir que o devir da Susten-tabilidade não se torne mero nome vazio, um pleonasmo ou oximoro cuja aparência é de uma mudança que não ocorre ou dificilmente se manifestará. A legislação am-biental, os crimes contra os animais, a insistência constitucional de assegurar um local sadio para todos – humanos e não humanos – devem sofrer, permanentemen-te, esse constrangimento epistemológico para se enxergar como o conteúdo da pres-crição normativa enuncia algo da vida cotidiana e a necessidade de sua mudança. Na atividade da lege ferenda, esse exercício é ainda mais intenso, pois o arbitramento axiológico não deve ter como medida apenas o humano, mas toda a teia da vida24.

Considerações finais

Verifica-se, a partir da leitura dos argumentos apresentados neste artigo, que a hipótese de pesquisa fora confirmada, pois os significados acerca da Sustentabilida-de trazidos pelo relatório sobre Economia Verde elaborado pelo Programa nas Na-ções Unidas ao Meio Ambiente nem sempre condizem com os objetivos expressos pela primeira categoria enunciada.

As ações no sentido de buscar o equilíbrio ecológico precisam apresentar novas proposições para que se resolvam antigos problemas. A crítica se concentra no atual consumismo desenfreado, que faz com que as pessoas, sem se dar conta, destruam cada vez mais as condições de vida na Terra.

O relatório sobre Economia Verde não elucida como se torna possível desenvol-ver meios para diminuir o ritmo de exploração da Natureza. A linguagem econômi-

23 “A marginalização do mundo natural – sempre descrito como objeto de infinita exploração para se saciar as vontades materiais e ideológicas humanas – encontra-se num momento de saturação. O ‘Véu de Ísis’ não se refere mais aos segredos da natureza e a sua importância, mas à produção da Verdade referente aos enigmas de nossa humanidade. No fundo das aparências, todos os fenômenos não-humanos não atingiram o status de sujeitos. Nenhum mortal ousou levantar o mencionado véu. Retoma-se a necessidade de uma cosmovisão, outra Revolução, na qual se assuma – e se esclareça – a consciência de que todos habitam o Planeta Terra. A distin-ção entre “dominantes” e “dominados” é vazia de sentidos, especialmente quando se observar, de modo claro, o vínculo biológico comum a todos os seres deste território terrestre. Essa se-gregação caracteriza, cada vez mais, a postura antropocêntrica pela expressão homo demens.” (AQUINO, 2016, p. 228-229).

24 Segundo Zambam e Aquino (2015, p. 203-204), “A elaboração da teia da vida não se manifesta de modo imediato para atender aos desejos humanos, tampouco exige das pessoas tempo equivalente para se modificarem. A lenta e constante evolução dos seres, os modos como se comunicam e como interagem fomentam uma vida cooperativa, sem que haja prevalências (ou privilégios) de uma espécie para outra. Essa troca interespécies esclarece ao mundo humano a necessidade de abandono de uma postura excessivamente antropocêntrica para outro que contemple esse diálogo entre humanos e não humanos na Terra. [...] Há uma insistência em dominar, em explorar, em violentar a Natureza sem qualquer responsabilidade ou reconheci-mento pelo ser próprio que é. Sob semelhante argumento, não é preciso ressaltar o genocídio humano que ocorre, todos os dias, em cada nação. A pluralidade de seres e lugares, cada qual com suas próprias características, indica a necessidade de uma Ecosofia, cujo desdobramento – teórico e prático, se manifesta por uma Ecologia Integral. Essa é uma proposta coerente para uma vida sustentável aos humanos e não humanos.”

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ca, a “monetarização do mundo natural”, a destinação dos benefícios da adoção de políticas a partir dessa atitude para – e somente para – os seres humanos, a restrição desse debate apenas às dimensões urbanas e agrícolas não denotam uma preocupa-ção em trazer alternativas – especialmente legislativas – para enfatizar a Sustentabi-lidade como pressuposto do desenvolvimento.

Ao contrário, o relatório reafirma a continuidade do atual modelo econômico e determina tão somente a necessidade de não se reconhecer o Mundo Natural como “ser próprio”, o qual precisa ter respeitados os seus ciclos de regeneração. A leitura desse documento deixa claro que esse respeito à Natureza não existe, pois ainda se persiste numa perspectiva axiológica de classificar os animais, os ecossistemas pela sua utilidade – seja econômica, industrial, científica, tecnológica, cultural, estética, entre outras.

Não há participação, conjugação de esforços no sentido de preservar a vida no sentido mais amplo, porém de explorar uma em detrimento de outra. Insiste-se: nesses moldes, a relação não é simbiótica, mas parasitária. Eis o sentido mais ge-nuíno da expressão Sustentabilidade sem que a sua adjetivação em outras palavras, como Desenvolvimento Sustentável, seja apenas nomes vazios, abstratos, tratados, por exemplo, como pleonasmos ou oximoros.

É preciso repensar, a partir da Política Jurídica e de um olhar crítico da realidade, o que é necessário ser feito para que se possa assegurar um local sadio para todos, para que se possa viver em um Planeta com possibilidades finitas, o qual já se encontra absolutamente saturado. É preciso, sim, delimitar, sinalizar, apresentar oportunidades que, pela lege ferenda, traduzam essa proximidade entre humanos e não humanos, desde uma Consciência Jurídica individual até a Consciência Jurídica mundial.

Verifica-se um avanço civilizacional significativo à medida que a postura an-tropocêntrica, principalmente nas atitudes econômicas, cede espaço para outra, bio-cêntrica, já que essa é a autêntica utopia concreta que aparece como objetivo a ser alcançado pelos povos da Terra.

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