monografia tcc frederico a coelho silva rev06
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SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE MARABÁ
FACULDADE DE DIREITO
Frederico Augusto Coelho Da Silva
Extinção do crédito tributário na execução fiscal.
Alguns efeitos controversos da decadência e da prescrição.
MARABÁ
2010
SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
CAMPUS UNVERSITÁRIO DE MARABÁ
FACULDADE DE DIREITO
Frederico Augusto Coelho Da Silva
Extinção do crédito tributário na execução fiscal.
Alguns efeitos controversos da decadência e da prescrição.
Monografia apresentada à Banca
Examinadora do Departamento de
Ciências Jurídicas da Universidade
Federal do Pará, campus de Marabá,
como exigência parcial para obtenção do
grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professora. Francielle Pires
Duarte Sommer.
Área: Direito Tributário
MARABÁ
2010
BANCA EXAMINADORA
Professora Francielle Pires Duarte Sommer
Orientadora
Professora Rejane P. Lima
Membro da Banca
Dedico este trabalho aos meus amados
pais, Sídio e Vanda, pelo apoio e amor,
perenes e incondicionais.
À minha amada esposa, Cinthia, pelo
suporte e estímulo, sempre presentes.
À minha amada filha, Sofia, porque é dela
que emana a força pra eu nunca fraquejar.
AGRADECIMENTOS
Ao povo brasileiro que com seu trabalho e sacrifício, possibilitou a
mim e a tantos outros, através da educação pública e gratuita, a aquisição do
conhecimento que aqui, em parte, se materializa, firmando em mim uma dívida a ser
paga, por meio do exercício digno e corajoso do Direito, ao longo de minha vida
profissional que aqui se inicia.
À minha orientadora, Francielle Pires Duarte Sommer, pela
paciência, e compreensão quando da tolerância nos adiamentos de prazos, além da
ação saneadora ao final deste trabalho.
À colega e amiga Joselde Maria Santos Soares...pelos incontáveis
auxílios prestados durante o curso, quando sempre me mantinha avisado de eventos
acadêmicos, ajudando a amenizar minha ausência na convivência universitária em
razão do trabalho, e me suprindo das lições das disciplinas em sala quando das
minhas faltas às aulas.
RESUMO
Entre os mais importantes institutos do direito figuram a prescrição e a decadência.
Ambos agem de modo a reforçar a segurança jurídica, no sentido de que a atividade
judicial tem que ter um fim alcançável, ao invés de ser arrastada indefinidamente,
onerando o aparelho estatal, contribuindo pra sua ineficiência e afastando-se de seu
maior objetivo que é promover a justiça. A tributação, por sua vez, figura entre as
mais importantes atividades do Estado, representando a invasão direta ao
patrimônio do cidadão como contrapartida à ação maior e organizadora da vida
social, própria do Estado. Apesar de incomum, os institutos da prescrição e da
decadência assumem formas distintas no direito tributário, distantes dos conceitos
originais do direito civil, produzindo efeitos tributários importantes, amparados na
Constituição Federal de 1988 e no Código Tributário Nacional, lei complementar que
o regula, bem como da Lei n.° 6.830/80. Dentre estes efeitos controversos está a
produzida pela confusão estabelecida no CTN, atribuindo aos dois institutos a
mesma conseqüência de extinguir o crédito tributário equiparando crédito e
obrigação tributária. Outrossim, no caso particular de lançamento por homologação
sem pagamento do tributo há-se mostrado controverso e polêmico o entendimento
sobre a incidência e a contagem dos prazos decadenciais e prescricionais com
manifestações jurisprudenciais por vezes excêntricas, chegando a mais que duplicar
prazos e concorrendo nocivamente para o direito dos contribuintes e para o
abarrotamento dos tribunais com causas de pouca efetividade para o erário e mal
usando os recursos da fazenda pública.
Palavras-chave: direito tributário, prescrição, decadência, prescrição intercorrente,
lançamento por homologação, execução fiscal.
SUMÁRIO
Introdução....................................................................................................................2
1. Conceitos fundamentais do direito civil e processual civil.......................................4
1.1 Sobre a Prescrição.............................................................................................4
1.2 Sobre a Decadência...........................................................................................5
1.3 A Prescrição e a Decadência no CC de 2002....................................................5
1.3 Conceitos de defesa processual........................................................................7
1.3.1 Defesa processual em sentido estrito..........................................................8
1.3.2 Objeção processual.....................................................................................9
1.3.3 Distinções entre exceção em sentido estrito e objeção processual...........10
2. Conceitos fundamentais do direito tributário..........................................................11
2.1 Conceitos de Obrigação e Crédito tributário....................................................11
2.2 Casos de suspensão e extinção do crédito tributário.......................................13
2.3 Conceitos de decadência e prescrição no direito tributário..............................19
2.4 Prescrição intercorrente...................................................................................24
3. Alguns aspectos polêmicos da prescrição e decadência do crédito tributário......29
3.1 Conseqüências da igualdade de efeitos atribuídos à decadência e à
prescrição na execução fiscal................................................................................29
3.2 Decadência. Caso de lançamento por homologação, sem pagamento do
tributo.....................................................................................................................32
Considerações finais..................................................................................................39
Referências................................................................................................................46
Introdução
Não é raro, em qualquer instância da vida de qualquer cidadão
brasileiro, ouvir falar sobre a morosidade da justiça do nosso país. As análises são
muitas, com muitas causas apontadas como preponderantes para tal fenômeno,
mas certamente uma causa das que mais povoa essas tantas dissecações, deste
verdadeiro flagelo brasileiro, é a grande quantidade de processos de execução fiscal
que pousam nas prateleiras dos tribunais brasileiros.
Estudar este fenômeno mesmo que em olhar superficial, em um de
seus muitos aspectos e facetas, que implicam em morosidade judicial, que minam a
crença na justiça, é impositivo quando se almeja um sistema judicial pleno, atuante,
permeável e acessível a todas as camadas da população e patrocinador da justiça.
Este trabalho tem a pretensão de colocar um pouco mais luz sobre
este tema, focando em específico a decretação oficial do Estado da extinção tanto
do processo como do direito em si, eximindo o contribuinte da obrigação de pagar e
do ônus de ser cobrado, a prescrição e a decadência tributárias além de alguns de
seus efeitos mais controversos na execução fiscal,
Ilidir o avanço de um processo que deve ser natimorto é um grande
passo no combate ao verdadeiro engarrafamento que aflige aos nossos tribunais,
notadamente na seara tributária, nos processos de execução fiscal, onde, contando
em números recentes, tramitam mais de 25 milhões de processos.
A compreensão dos efeitos da extinção do crédito tributário de que
temos falado envolve não só o estudo da natureza jurídica da prescrição e
decadência tributárias, mas também da sua congênere no campo do direito civil,
pois as diferenças entre ambas residem principalmente nos efeitos e nas
conseqüências de ambos os institutos.
O estudo aqui levado a cabo pretende abarcar a defesa processual e
a prescrição e a decadência como instrumentos para sua manifestação. Também
pretende esmiuçar a natureza jurídica da prescrição e decadência tributária,
identificar as condições em que deve ser decretada de ofício, além dos efeitos que a
ambos os institutos se atribuem, pois é neste tocante que se observam os maiores
desmandos no âmbito das fazendas públicas do Brasil, quando, mesmo depois da
decretação da prescrição tributária pelo Estado, via decisão judicial, esses órgãos
estatais, independente das razões que os levem a dar interpretação tão peculiar à
norma, insistem em negar a certidão negativa da dívida ativa aos contribuintes que
foram beneficiados com a decretação da prescrição tributária.
É mister, nesse sentido, estudar, ainda que na superfície, o
nascimento da obrigação tributária e a constituição do respectivo crédito tributário,
por essenciais à lógica que rege a vida e validade destes objetos do direito tributário.
Como forma de colocar à prova a idéia que aqui propugnamos
entendemos oportuno e a medida que os conceitos forem avançando faremos uma
colação do entendimento da doutrina especializada além da nossa jurisprudência,
onde procuraremos abarcar as mais significativas sentenças prolatadas na
expectativa de retratar o melhor possível a compreensão dos nossos tribunais.
1. Conceitos fundamentais do direito civil e processual civil
O tempo é um parâmetro humano que atua não só na sua vida
biológica, mas também na sua vida privada e coletiva, influindo fortemente nas
relações interpessoais, e como o direito faz parte deste universo de relações
humanas descrito, num círculo mais restrito, também segue afetado. Influi, certas
vezes, no nascimento de um direito ou no seu fim, atua como condição para seu
exercício; outras vezes é, por determinação legal, parâmetro de validade de outra
lei; outra circunstância é a que o tempo é o critério principal para determinação da
capacidade civil do indivíduo. Onde o tempo também deita sua ação, e aqui mais
nos interessa, é quando é critério de consolidação ou extinção de direitos subjetivos.
Aqui fixaremos atenção nas circunstâncias em que o tempo, aliado a
outros fatores, causa aquisição, extinção ou é critério de validade de algum direito.
No primeiro ângulo de vista, e sobre certas relações jurídicas de direito, o tempo
torna inatacável a situação daquele que a vem exercendo continuadamente sendo
causa de aquisição de direitos; é a chamada prescrição aquisitiva. Num outro ângulo
de vista o tempo conduz à extinção da relação jurídica (aqui se leia: do processo)
que não se exercita por certo lapso ou período, em razão da inércia do titular da
relação; é a prescrição extintiva. Por fim, já noutro ponto de vista, enxergaremos o
tempo como o critério de validade para alguns direitos, que somente podem ser
exercidos dentro de certo prazo, findo o qual, tais direitos, se não exercidos,
perecerão ou caducarão, deixando inexoravelmente de existir; é a chamada
decadência do direito.
1.1 Sobre a Prescrição
Da prescrição aquisitiva nos deteremos pouco por se alhear dos
nossos objetivos neste trabalho. Esta modalidade de prescrição é mais conhecida
como Usucapião e é, no dizer de Caio Mário da Silva Pereira1, a aquisição do direito
real pelo decurso do tempo e é instituída em favor daquele que tiver, com ânimo de
dono, o exercício de fato das faculdades inerentes ao domínio, ou a outro direito
real, relativamente a coisas móveis ou imóveis, por um período prefixado pelo
1 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro, Forense, 1961-1976, p.587
legislador. Assim, para se adquirir o direito nessa modalidade de prescrição há que
se verificarem dois critérios: a posse e o tempo.
Enquanto a prescrição aquisitiva age forjando o direito, criando-o e
moldando-o, segundo critérios predeterminados, a prescrição extintiva, ou
liberatória, vai ao sentido oposto, agindo de modo a prejudicar o direito do titular
negligente e a liberar o réu, após certo lapso de tempo decorrido. É essa a
modalidade de prescrição que nos interessa e que abordaremos.
1.2 Sobre a Decadência
Decadência significa o perecimento do direito, ocasionado pela falta
de exercício, dentro de certo prazo de tempo preestabelecido. Incidindo a
decadência não sobrevive o direito, operando-se a sua morte e de todos os efeitos
que outrora decorriam dele.
Enquanto a prescrição é a morte da ação2 a decadência atua mais
profundamente na relação jurídica, aniquilando o direito em si. A prescrição
representa o fim do direito de pretender, direito de processar, que não tinha prazo
para acabar, mas que encontrou seu fim diante da inatividade do titular, que inerte e
negligente, não agiu e deu causa a perda desse direito. Na decadência, o direito é
sepultado porque não foi exercido em certo tempo prefixado dando ensejo ao seu
fim prematuro, antes mesmo de nascer a relação processual. Do visto depreende-se
que decadência e prescrição nunca serão contemporâneos em uma mesma relação
jurídica, nunca serão observados ou evocados nessa mesma relação jurídica.
1.3 A Prescrição e a Decadência no CC de 2002
O antigo Código Civil Brasileiro, de 1916, carecia de sistemática ao
comandar e distinguir os prazos prescricionais e decadenciais, fixando em um
mesmo Título (III, Livro III, Parte Geral), com a mesma denominação ("Da
prescrição"), os prazos prescricionais e decadenciais, tarefa que foi assumida ao
longo das décadas pela jurisprudência e pela doutrina, na qual se notabilizou a
2 Há autores, entre eles Caio Mario da Silva Pereira, que não acatam a idéia de que a prescrição extingue apenas o direito de agir, de processar, pois argumentam haver falta de sentido e coerência em manter-se vivo o direito sem dar condições ao seu titular de exercê-lo.
distinção e classificação de Agnelo Amorim Filho, até o surgimento do novo código,
em 2002. Segundo o citado doutrinador, citado por Charles Andrade Froehlich,
levando em conta a classificação ternária das ações de CHIOVENDA –
condenatórias, constitutivas e declaratórias –, apenas as ações condenatórias
poderiam sofrer a incidência da prescrição, posto que são as únicas que ensejam a
possibilidade de uma pretensão, caso o direito subjetivo associado a ela seja
descumprido. Assim, resumidamente, o efeito extintivo chamado de prescrição
atingiria aos direitos que ensejam pretensão (os direitos subjetivos a uma
prestação), os quais, via de regra, são postulados através de uma ação
preponderantemente condenatória. O efeito extintivo chamado de decadência
atingiria aos direitos sem pretensão (direitos formativos/potestativos), os quais são
veiculados, via de regra, mediante ação preponderantemente constitutiva (positiva
ou negativa).
Nesse novo código, o CC/2002, foi sistematizada a matéria,
tratando da "Prescrição e da Decadência" (Título IV, Livro III da Parte Geral),
definindo prazos prescricionais, que aqui atingem as pretensões – não as ações –
respectivas e especificando prazos decadenciais quando necessário ao longo do
corpo do Código. Nesse sentido, dita o artigo 189 do Código Civil que “violado o
direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos
prazos a que aludem os arts. 205 e 206.”. Assim, a guisa de direção geral, o prazo
prescricional máximo fixado no art. 205 é de 10 anos, podendo a lei especificamente
fixar-lhe tempo menor como ocorre no art. 206. Já os prazos decadenciais estão
dispersos pelo Código, regendo situações específicas e atuando sobre direitos
formativos, direitos potestativos ou de sujeição, os quais são veiculados, na sua
grande maioria, mediante ações predominantemente constitutivas.
Até fevereiro de 2006, mandava o Código Civil, segundo a regra
estabelecida no art. 210, que era dever do juiz conhecer de oficio a decadência, e,
segundo o § 5º do artigo 219 do Código de Processo Civil, deveria ser da parte o
ônus de evocar a hipótese de prescrição, como soe ser o conceito disseminado na
doutrina e no direito positivo em todo o mundo. Agora, e a partir da data citada
antes, com a sanção da Lei 11.280/2006, tal dispositivo foi alterado radicalmente,
indo na direção diametralmente oposta, autorizando o reconhecimento de ofício à
manifestação da prescrição. Até então dispunha tal artigo do Código civil: “não se
tratando de direitos patrimoniais, o juiz poderá, de ofício, conhecer da prescrição e
decretá-la de imediato”; agora preconiza: o juiz pronunciará de ofício, a prescrição.
1.3 Conceitos de defesa processual
Junto do direito de ação nasce o direito de defesa, como um espelho
da física nas ciências da natureza, um reflexo da 3ª lei de Newton, onde a cada ação
corresponde uma reação em sentido oposto e de mesma intensidade. Assim são o
direito de ação e direito de defesa, direitos de mesma natureza, constitucionais
(CF/88, art.5º, XXXV), e, portanto da mesma importância e magnitude. É capital, no
entanto, realçar neste ponto não só a natureza bilateral do processo, no sentido da
dualidade opostas de pretensões, mas o destinatário principal do processo que é o
Estado, e este como prestador jurisdicional deverá cumprir essa função da forma
mais eficiente e pronta possíveis.
O direito de defesa de maneira abrangente, não significa a
contestação propriamente dita, mas uma permissão ao réu de manifestar-se no
processo. Trata-se do conjunto de possibilidades que o réu possa vir a se utilizar,
em qualquer tipo de processo, a fim de responder ao seu chamado ao processo,
aduzindo em favor de si razões, sejam elas de qualquer natureza e de qualquer
forma, que destruam as pretensões do autor. “A ação, como direito de pedir a tutela
jurisdicional para determinada pretensão fundada em direito material, tem, assim,
uma espécie de réplica na exceção, como direito de pedir para a tutela jurisdicional
requerida pelo autor seja denegada por não se conformar com o direito objetivo.”
CINTRA at al.(2003, p. 272).
Segundo CINTRA at al.(2003, p. 272), do ponto de vista do
conhecimento e recebimento da ação pelo juiz3 a defesa chamada de objeção é a
defesa que pode ser conhecida de ofício, sendo o ônus de alegá-la relativo para o
réu, e de exceção em sentido estrito à defesa que só pode ser conhecida quando
alegada pelo réu, sendo aqui absoluto seu ônus para o mesmo (v. CPC, art. 128,
parte final).
3 Há outros critérios de classificação das exceções, ou de outra forma, das defesas disponíveis ao
réu.
O nosso Código de Processo Civil abre três formas distintas de
defesa ao réu, que são: a Contestação (art. 300 / 303 do CPC), a Reconvenção (art.
315 / 318 do CPC) e a Exceção (art. 304 / 314 do CPC), usando o termo exceção
para indicar algumas defesas ou exceções processuais, e contestação para toda e
qualquer outra defesa. As duas primeiras são defesas de mérito e a última é defesa
processual. Na contestação e na reconvenção o réu mira o direito em si, negando a
pretensão do autor, seja alegando que sua demanda não é amparada na lei, quer
negando os fatos alegados, ou mesmo direito conexo ao trazido na exordial bem
como fatos novos que tragam nova luz sobre a subsunção fática à lei. Na exceção o
réu ataca a relação processual, antevendo que não subsistindo o processo não
poderá ser prolatada sentença de mérito que o atinja.
As defesas processuais elencadas acima, as objeções e as
exceções em sentido estrito atacam o processo e tangenciam o mérito não
adentrando em sua seara.
1.3.1 Defesa processual em sentido estrito
A defesa processual própria ou em sentido estrito, ou ainda, defesa
peremptória, é assim considerada a defesa que propugna pela extinção do processo
sem resolução do mérito.
A classificação antes aludida é de autoria do processualista italiano
do século passado, Giuseppe Chiovenda, que tratou de relacionar e classificar os
tipos de defesa disponíveis ao réu, usando como critério a possibilidade da sentença
de rejeição à pretensão do autor ser declarada de ofício ou não, caso em que
afirmativa esta proposição, seria nominada, esta modalidade de defesa, como
objeção, ao passo que se dependesse da atividade pessoal do réu seria nominada
de exceção. Esse autor diferençou as exceções da seguinte forma: Em sentido
largo deverão expressar todo o meio oponível ao exposto pelo autor. Em nível
intermediário, serão as defesas de mérito, consistindo de fatos impeditivos,
modificativos e extintivos do direito do autor e, por fim, em limites mais estreitos,
abrangem a oposição ao fato constitutivo descrito pelo autor, que não infirma, nem
desestabiliza a relação, indo em direção diversa, anulando a ação.
A esse último tipo de exceção Chiovenda4 a nominou de exceção em
sentido próprio e afirmou:
A exceção distingue-se dos demais direitos de impugnação exatamente em que, nessa modalidade, sua eficácia de anulação se limita à ação. Ao passo que os direitos de impugnação têm extensão maior ou menor conforme a intenção a que se propõe o autor, e, em regra, se dirigem contra toda a relação jurídica, a exceção tem, por definição, confins obrigatórios: não pode produzir outro efeito que não o de anular a ação, a saber, somente a ação que se propõe e contra a qual a exceção se volve, deixando intacta a relação jurídica com todas as demais ações que dela possam decorrer para o futuro.
A exceção em sentido estrito se exercita mediante a alegação do
réu e trata da incompetência relativa, suspeição ou impedimento do juiz, e está
prevista no art. 304 do Código de Processo Civil.
1.3.2 Objeção processual.
Fala-se em exceção em sentido amplo, como sinônimo de defesa do
réu em relação à pretensão do autor. A objeção processual é, no conceito de
Chiovenda, uma exceção em sentido amplo, indicando a defesa que pode ser
conhecida de ofício (p. ex., incompetência absoluta, coisa julgada, pagamento). É,
sobretudo defesa processual e se faz como preliminar da contestação por serem
matérias processuais de ordem pública, que o juiz deve conhecer de ofício como a
inexistência ou nulidade de citação, incompetência absoluta, inépcia da petição
inicial, perempção, litispendência, coisa julgada, conexão, incapacidade da parte,
defeito de representação ou falta de autorização, carência da ação, falta de caução
ou de outra prestação que a lei exige como preliminar (v. art. 301 CPC).
Conforme esta definição a prescrição seria uma exceção em sentido
estrito vez que demandaria o movimento do réu na sua alegação. Porém, com a
sanção da Lei 11.280/2006 esta condição foi modificada drasticamente e agora ao
juiz cabe decretar a prescrição de ofício. Diz o Código de Processo Civil, alterado
pela citada lei, no seu art. 219, §5º que “ O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição”.
4 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. 4ª Ed. Campinas:
Bookseller, 2009, p413.
1.3.3 Distinções entre exceção em sentido estrito e objeção
processual
As objeções, segundo os estudos de Giuseppe Chiovenda, são
matérias que independem de sustentação pela parte, devendo ser objeto de
conhecimento obrigatório do Estado, aspecto esse que é o divisor de águas entre
ambas as defesas, a exceção e a objeção. Em relação à primeira o réu tem ônus
relativo de alegá-la, quanto à segunda, o ônus é absoluto.
Outra é a diferença, que é elemento central da lógica desse trabalho,
que são os efeitos produzidos em ambas as situações. Em se tratando de objeções,
e assim da decadência e da prescrição posto serem objeções, em regra, os efeitos
que advêm da sua decretação de ofício serão sentidas em toda a relação jurídica e
não só na ação em questão, a saber, no próprio direito material que sustenta o
processo. Já, em se tratando de exceção em sentido estrito os efeitos verificados
têm menor extensão, com conseqüências restritas à ação, impedindo seu
nascimento, porém salvando o direito material que sustentou sua criação.
2. Conceitos fundamentais do direito tributário.
Antes de tudo, cabe aqui frisar uma diferença, crucial, existente
entre o Direito Civil e o Direito Tributário, diferença esta que norteia toda a lógica
deste trabalho e que é fundamental pra seu entendimento. É na divisão clássica do
direito, entre público e privado que reside a diferença entre ambos, sendo o Direito
Civil de ordem privatista e o Direito Tributário de ordem pública, cujo interesse
protegido é o da coletividade e suas normas são cogentes. Essa diferença produz
efeitos diferentes em institutos que norteiam um e outro, como é o caso da
prescrição e da decadência, como se tem e será visto ao longo deste texto.
2.1 Conceitos de Obrigação e Crédito tributário.
A atividade tributária é atividade puramente estatal, derivada da
soberania do Estado, vista sob o prisma interno, mediante previsão legal, em sentido
estrito deste termo, de modo que apenas àquele compete instituir cobrança de
tributo ao particular. Apesar de ser uma relação de sujeição, é uma relação jurídica e
não meramente uma relação de poder como o foi em outras épocas. A este respeito
ministra Hugo de Brito Machado5:
A instituição de tributo é sempre feita mediante lei, e sua arrecadação e fiscalização constituem atividade administrativa vinculada. A própria instituição do tributo há de ser feita nos termos estabelecidos na Constituição, na qual se encontram os princípios jurídicos fundamentais da tributação.
Ainda volvendo ao Direito Civil, e às suas classificações tradicionais,
encontramos como partição sua, a do Direito das Obrigações, além do Direito das
Pessoas e o Direito das Coisas ou Direito Real. O direito das obrigações atem-se às
relações entre quem deve uma prestação e a quem pode exigí-la, onde um sujeito
ativo atua como credor e um sujeito passivo atua como devedor de um objeto ou
prestação. É geralmente de natureza patrimonial, podendo ser também uma
obrigação de fazer ou de não fazer.
5 MACHADO, Hugo de B. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.56.
O Direito Tributário atende, apesar de sua natureza pública, ao
conceito de obrigação definida no Direto Civil, posto ser uma relação jurídica,
envolvendo o fisco, o contribuinte, ou responsável, e uma prestação que é o tributo.
A obrigação tributária é, assim, a imposição, surgida após a ocorrência de um fato,
hipotético e geral descrito em lei, que surge para o contribuinte em face do Estado.
Nesse sentido, a obrigação tributária, conforme o entendimento de Hugo de Brito
Machado6,
é a relação jurídica em virtude da qual o particular (sujeito passivo) tem o dever de prestar dinheiro ao Estado (sujeito ativo), ou de fazer, não fazer ou tolerar algo no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, e o Estado tem o direito de constituir contra o particular um crédito.
É no artigo 113 do CTN que está definido o conceito de obrigação
tributária, nos seguintes termos:
Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.
§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem
por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se
juntamente com o crédito dela decorrente.
§ 2º A obrigação acessória decorrente da legislação tributária e tem por
objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse
da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.
§ 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância,
converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.
No entendimento da juíza Annamaria Pimentel7 nos termos do
artigo 113 do CTN, “... surge a obrigação tributária principal com a ocorrência do
fato gerador, tornando-se líquida e exigível pela constituição do crédito tributário
através do lançamento, consoante o disposto no art. 142 do mesmo diploma legal”.
Nascida a obrigação tributária, com o surgimento do fato gerador, ou
seja, com a subsunção fática e real à hipótese legal, abre-se ao contribuinte a
oportunidade de satisfazer essa obrigação. A possibilidade de cobrança do crédito
tributário surge com a ocorrência sucessiva de dois fatos, a inadimplência do
6 MACHADO, Hugo de B. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p.56.7 TRF – 3ª Região. AC 89.03.036099/SP. Rel.: juíza Annamaria Pimentel. 3ª turma. Decisão:
25/08/93.DOE de 09/12/93,p.226.
contribuinte e o respectivo lançamento do crédito tributário, tornando a obrigação
líquida e exigível. Obrigação e crédito tributários, apesar de muito semelhantes são
distintos e representam momentos diferentes da relação tributária. Diz o Código
Tributário nacional:
Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o
crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento
administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da
obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o
montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso,
propor a aplicação da penalidade cabível.
No dizer de SABAG8 “o lançamento é o instrumento que confere
exigibilidade à obrigação tributária, quantificando-a (aferição do quantum debeatur )
e qualificando-a (identificação do an debeatur)”. Esse é o entendimento do STJ,
segundo o qual “o crédito não surge com o fato gerador. Ele é constituído com o
lançamento ( artigo 142 do CTN)”. Em sede de agravo, prolatou o ex-ministro do
antigo TRF, Justino Ribeiro9, “... O lançamento é de competência privativa da
autoridade administrativa (art. 142 CTN). Assim, qualquer que seja a modalidade de
lançamento , seja de ofício, por homologação ou por declaração, ele só se completa
com a manifestação da autoridade. Até aí, corre o prazo de decadência; depois,
começa o de prescrição”.
2.2 Casos de suspensão e extinção do crédito tributário.
Como já visto exigível é o crédito tributário, não a obrigação
tributária. São a liquidez e a certeza da quantia a ser prestada ao Estado que tornam
o crédito exigível. Essa exigibilidade pode, no entanto, ser suspensa de modo a não
se fazer mais possível, enquanto durar a suspensão. Seus efeitos se dão de forma
prévia, quando antes de ser concretizado e constituído o crédito, e de forma
8 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p.7629 TRF. Ag 40981/RJ. Rel.: Min. Justino Ribeiro. 5ª Turma. Decisão: 30/03/81.Em. de Jurisp., v. 02-
01,p.37,DJ de 20/08/81.
posterior quando, uma vez já existindo o crédito, posto ocorrido seu lançamento,
seus efeitos são suspensos. Diz o CTN:
Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:
I - moratória;
II - o depósito do seu montante integral;
III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do
processo tributário administrativo;
IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança.
V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras
espécies de ação judicial
VI – o parcelamento.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não dispensa o cumprimento das
obrigações assessórios dependentes da obrigação principal cujo crédito
seja suspenso, ou dela conseqüentes.
Na lição de Hugo de Brito Machado10
As reclamações e os recursos, evidentemente, constituem modalidade de suspensão necessariamente prévia, pois o crédito tributário definitivamente constituído não mais comporta tais medidas. A rigor, o que aqui denominamos suspensão prévia não caracteriza suspensão, mas impedimento.
Entende também o insigne autor que tal crédito, suspenso, deixa
de sê-lo enquanto dure esta instabilidade posto, por definição e natureza o crédito
tributário ser líquido e certo, portanto exigível.
Outros autores, como Kiyoshi Harada, citado por Eduardo Sabag11,
entendem que essa suspensão é sempre temporária, e que essa não desconstitui
o crédito tributário, vez que o mesmo nasceu com seu lançamento, com a
necessária notificação ao sujeito passivo.
Esta discussão a nós interessa porque a constituição do crédito
tributário evita a ocorrência da decadência, prevista no art. 156, V, do CTN. No
nosso entendimento o que se encontra em jogo é a existência do próprio crédito
10 MACHADO, Hugo de B. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.174
11 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p.762
tributário, vez que se seus efeitos ainda estarão em discussão da mesma forma a
sua própria constituição e existência. Assim, se não é ainda, em espécie, crédito
tributário, posto sem efeitos, não poderia interromper a decadência. A
jurisprudência maciça, no entanto enxerga no sentido contrário e, a despeito de
haver discordância em pontos isolados, entende que a suspensão se dá na
exigibilidade e não na própria constituição do crédito tributário, ocorrendo desta
forma a interrupção da decadência. Neste sentido três jurisprudências de tribunais
federais12 e do STJ13.
EMENTA:...A medida liminar pode suspender a exigibilidade do crédito
tributário, mas não pode deferir o respectivo parcelamento, porque essa
atividade tem natureza administrativa e leva em consideração, para
avaliar a necessidade da moratória, o montante do débito e o porte de
empresa, entre outras circunstâncias...”(TRF – 4ª Região.MS
93.04.44765/RS. Rel.: Juiz Ari Pargendler. 1ª turma. Decisão: 16/06/94.
DJ de 06/07/94, p. 36.256.)
EMENTA: ....I – Nos termos do art. 151, inciso II, do CTN, em ação que
não de mandado de segurança, só o depósito em dinheiro do seu
montante integral suspende a exigibilidade do crédito tributário, ainda
que se discuta a constitucionalidade da norma que exige o tributo. ....”
(TRF -1ª Região. Ag 94.01.00973-2/BA. Rel. : Juiz Tourinho Neto. 3ª
turma: decisão 23/02/94. DJ de 28/03/94, p. 12.637.)
EMENTA: TRIBUTÁRIO. (...) MANDADO DE SEGURANÇA. MEDIDA
LIMINAR.SUSPENSÃO DO PRAZO. IMPOSSIBILIADE.(...)3. A
suspensão da exigibilidade do crédito tributário na via judicial impede o
fisco de praticar qualquer ato contra o contribuinte visando a cobrança de
seu crédito, tais como inscrição em dívida, execução e penhora, mas não
impossibilita a fazenda de proceder à regular constituição do crédito
tributário para prevenir a decadência do direito de lançar. 4. Embargos
de divergência providos.(EREsp 572.603/PR, 1ªT, rel. Ministro Castro
Meira, j. 08-06-2005)
12 TRF/1ª, Gabinete da Revista. Código tributário nacional interpretado. São Paulo: Saraiva, 1995. p.
125
13 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p.764
Além da suspensão, o crédito tributário pode também ser extinto,
sendo que as hipóteses em que isso ocorre estão enumeradas no art.156 do CTN,
como se vê a seguir.
Art. 156. Extinguem o crédito tributário:
I - o pagamento;
II - a compensação;
III - a transação;
IV - remissão;
V - a prescrição e a decadência;
VI - a conversão de depósito em renda;
VII - o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos
termos do disposto no artigo 150 e seus §§ 1º e 4º;
VIII - a consignação em pagamento, nos termos do disposto no § 2º do
artigo 164;
IX - a decisão administrativa irreformável, assim entendida a definitiva na
órbita administrativa, que não mais possa ser objeto de ação anulatória;
X - a decisão judicial passada em julgado.
XI – a dação em pagamento em bens imóveis, na forma e condições
estabelecidas em lei.
Parágrafo único. A lei disporá quanto aos efeitos da extinção total ou
parcial do crédito sobre a ulterior verificação da irregularidade da sua
constituição, observado o disposto nos artigos 144 e 149.
Há discordância no que tange à exclusividade do CTN em fixar as
hipóteses de extinção do crédito tributário, sendo que uns entendem ser a relação
ali elencada exaustiva e taxativa, de modo a não poder haver outras formas, e que
qualquer alteração somente mediante lei complementar da União, ao passo que
outros entendem que há outras hipóteses, sempre na lei, mas não apenas no
Código Tributário Nacional, em que se operaria o desaparecimento do crédito
tributário. Na primeira situação militam a maioria dos autores e na seguinte se
afiliam Eliomar Baleeiro e Hugo de Brito Machado.
Importante é saber que há situações em que se extingue o crédito,
mas não a obrigação, ensejando-se assim possibilidade e nova oportunidade de
lançamento e constituição de novo crédito tributário totalmente independente e
autônomo em relação ao anteriormente extinto, mantendo-se como única relação o
fato de se originarem da mesma obrigação tributária. Diz Hugo de Brito
Machado14: “A extinção do crédito, repita-se, pode afetar, ou não, o direito de
constituir novo crédito. O crédito, como se sabe, é distinto da obrigação. É relação
formalizada, acertada, tornada líquida e certa. A extinção do crédito pode afetar
além da forma, também o conteúdo, a própria obrigação tributária. Neste caso não
haverá mais direito de lançar porque não existirá mais a relação obrigacional que
seria o conteúdo do crédito tributário. É possível, entretanto, que a extinção do
crédito afete apenas a forma, sem afetar o conteúdo. Neste caso, em face da
subsistência da relação obrigacional, persiste o direito de lançar, vale dizer, de
constituir novo crédito tributário.”
Das onze hipóteses elencadas no art.156, nos deteremos pouco
em nove delas sendo que apenas duas nos interessam diretamente que são a
prescrição e a decadência, sobre o que deitaremos nosso foco logo mais adiante.
A primeira hipótese de extinção citada no art. 156 do CTN é o
pagamento. Esta é a forma mais corriqueira e normal da satisfação da obrigação,
quando o sujeito passivo (o contribuinte, ou outro qualquer em seu nome) entrega
ao sujeito ativo (o fisco) o valor correspondente ao objeto da obrigação tributária.
Outra hipótese se trata da compensação, que ocorre quando ao
sujeito passivo, devedor da fazenda pública, se atribuir créditos em que a Fazenda
Pública seja devedora deste contribuinte, ensejando um encontro de contas e
extinguindo o crédito tributário.
Chama-se a transação a outra hipótese de extinção do crédito
tributário, na qual, mediante lei que a autorize e regulamente, ambas as partes
transijam de seus interesses para chegar a um ponto benéfico a ambas, porém o
CTN é incisivo ao proibir este tipo de negócio como meio de evitar conflitos entre a
Fazenda e o contribuinte só podendo ser intentado após o conflito estar instaurado
14 MACHADO, Hugo de B. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.183/184
e, como já dito, mediante lei específica. O crédito tributário também pode ser
extinto pelo perdão, ou como denominado no CTN, pela remissão. o art.172 do
CTN detalha as condições em que o Fisco, unilateralmente, poderá dar o perdão e
extinguir o crédito tributário; aduz SABAG15 sobre a remissão que: “Esta deve
emanar do ente político tributante definido na CF como competente para legislar
acerca do gravame em questão”.
Em sede de recursos administrativos ou judiciais o depósito de
valor que garanta a posterior satisfação da obrigação tributária suspende a
exigibilidade do crédito e após a decisão final da contenda, esse depósito é
convertido em renda, caso tal decisão seja favorável à Fazenda ou será restituído
ao sujeito passivo em caso reverso, mas extinguindo o crédito tributário, em ambas
as situações; é a modalidade de extinção do crédito chamada de conversão de
depósito em renda.
Dando continuidade às formas de extinção do crédito tributário,
avançamos à de pagamento antecipado e homologação do lançamento. Esta
modalidade é sui generis visto ter a ordem entre lançamento e pagamento feita às
avessas, assim é que, aqui, o próprio sujeito passivo é quem faz a apuração do
devido e procede ao pagamento, sendo o lançamento somente realizado quando a
o contribuinte informa o que deve, porque deve e quanto deve, ficando à
autoridade competente o dever de tomar conhecimento da materialidade e
conteúdo do lançamento e sobre ele se pronunciar. Ora, caso não ocorra a
intervenção do fisco, seja para confirmar ou infirmar a correção no levantamento
feito pelo sujeito passivo, sucede o que afirma SABAG16: “Após 5 anos, haverá a
homologação tácita, vindo a reboque a perda do direito de lançar. Dessarte,
extingue-se definitivamente o crédito tributário, conforme o art. 156, VII, do CTN.”
A extinção do crédito ocorre com a somatória de dois fatos, o pagamento e o
lançamento, não apenas com o pagamento como se haveria de supor.
É corrente e sabido que a fúria do fisco, do “Leão”, deixa inquieto a
qualquer um, e a impossibilidade de se efetuar ao pagamento, por causas alheias
à vontade e à possibilidade do sujeito passivo levaram o legislador a prever a
15 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p.80916 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p.811
extinção do crédito tributário na modalidade de consignação em pagamento. Como
bem formulou Hugo de Brito Machado o pagamento é além de um dever, um
direito, e deve ser assegurado a quem o deseja fazer e cumprir com suas
obrigações. Nessa trilha o CTN, no art. 164, prevê esta modalidade de extinção
nos casos de: I - recusa de recebimento, ou subordinação deste ao pagamento
de outro tributo ou de penalidade, ou ao cumprimento de obrigação acessória; II -
subordinação do recebimento ao cumprimento de exigências administrativas sem
fundamento legal; III - exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito
público, de tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador. Julgada procedente a
ação de consignação o depósito será levantado e restituído ao contribuinte, caso
contrário será convertido em renda sem prejuízo de outras penalidades passiveis
de imposição.
A decisão judicial, sem mais opções de recurso, que entende
inválido o lançamento também extingue o crédito tributário, da mesma forma que a
decisão administrativa irreformável, quando ainda na esfera administrativa, em
grau de recurso, o contribuinte vê atendido seu pedido impugnatório da
constituição do crédito tributário. Note-se que somente no caso de decisão
favorável isso ocorre, pois se o órgão administrativo decide contrariamente ao
contribuinte ainda restará vivo o crédito e sobrará àquele unicamente o
acatamento desta instância ou a via judicial.
A lei n. 104/2001 normatizou a dação em pagamento com forma
extintiva do crédito tributário; esta modalidade prevê unicamente a dação de bens
imóveis, cujo preço deverá ser estabelecido, respeitando-se os princípios do
Direito Administrativo, e aquiescido pela Fazenda Pública em troca do valor devido
em tributos.
2.3 Conceitos de decadência e prescrição no direito tributário.
É cediço na ciência do direito, como um dos princípios que a
fundamentam, que a segurança jurídica e a paz social são valores que devem ser
perseguidos a todo custo para que a justiça seja alcançada. Assim, o instituto da
decadência vem, nesta esteira, a contribuir com a efetividade do sistema jurídico,
evitando que um direito se perpetue indefinidamente, impedindo, ou dificultando, vez
que os recursos humanos e do sistema judicial são finitos e escassos, dificultando a
que outros direitos possam sem efetivados. A decadência, e também a prescrição,
no dizer de Eurico de Santi, citado por Eduardo Sabbag17, “não são formas de fazer
justiça, mas formas concretas que o direito encontrou para conviver com esse deus
tão poderoso: o tempo”. Oportuno é realçar a impropriedade inscrita no Código
Tributário Nacional, colocando a decadência, ao lado da prescrição como um dos
motores da extinção do crédito tributário, pois que a decadência nunca atingirá a
relação jurídica ao tempo em o crédito tributário esteja constituído e sim, e sempre,
antes da sua constituição, que é feita com o lançamento válido. Neste sentido diz
Eduardo Sabbag18: “Tem-se dito que, constituído o crédito tributário pelo lançamento,
cessa a cogitação de decadência para iniciar-se a cogitação de prescrição. Onde
finaliza a primeira inicia-se imediatamente a segunda sem qualquer hiato”
Preceitua o art. 173 do CTN:
Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário
extingue-se após 5 (cinco) anos, contados:
I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento
poderia ter sido efetuado;
II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por
vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.
Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se
definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data
em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela
notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória
indispensável ao lançamento.
Ocorrido o fato gerador, nasce, em termos gerais, para a Fazenda
Pública, como único sujeito legalmente capaz de fazê-lo, o direito de lançar o débito
respectivo, constituindo dessa forma o crédito tributário; neste momento, já
devidamente individualizado o sujeito passivo, a matéria tributável, e a quantia
devida, o crédito tributário passa a existir e poderá ser exigido. Ocorre que se o
Fisco não atua dessa forma e realiza o lançamento necessário dentro dos prazos
17 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p719.
18 IDEM, p739
estabelecidos no preceptivo acima, sofrerá as conseqüências da decadência. Trata-
se da extinção do direito material, substantivo, indo alcançar a própria relação
jurídica original, a que diz respeito o termo a quo da contagem do qüinqüênio
extintivo do direito, isto é, qual o critério para fixação da data de início do prazo
decadencial e também do objeto da decadência, se o crédito tributário ou se, como
falamos a pouco, a própria obrigação tributária. Ora, se o crédito nasce com o
lançamento, na prescrição do art. 142 do CTN, como poderia a decadência alcançar
o que nem ainda existe, o crédito tributário?
A outra polêmica, com desdobramentos variados em razão das
várias situações reais passíveis de suceder é sobre o termo de início da contagem
do lustro extintivo do crédito tributário. O assunto é tratado em dois artigos do
CTN, no o art. 173 e no art. 150, §4º do CTN. No art. 173 o início é previsto para o
primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido
efetuado, enquanto no art. 150, §4º o dies a quo é contado da data do fato
gerador, quando então serão somados 5 anos pra se cogitar em prescrição.
Na exegese do STJ - resumidamente, pois disto cuidaremos
melhor adiante - o art. 150, §4º do CTN será usado quando estivermos diante de
casos de lançamento por homologação, ou seja, quando o próprio contribuinte
apura e paga o que deve antes da ciência e confirmação da autoridade tributária
competente, cabendo a esta, posteriormente, conferir a exatidão e presteza da
obrigação tributária, cobrando a mais se assim o entender ou anulando qualquer
aspecto da apuração procedida pelo contribuinte, e caso não o faça dará ensejo,
ultrapassado o qüinqüênio legal, ao que se chama de procedimento homologatório
tácito, não podendo mais questionar sobre aquela obrigação, extinta que estará a
mesma. Veja-se o preceptivo inserto no CTN transcrito abaixo:
Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos
cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o
pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo
ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade
assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a
contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a
Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o
lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a
ocorrência de dolo, fraude ou simulação.
No caso de lançamento por homologação, em que o contribuinte
não pagar o tributo declarado, teremos a aplicação do art. 173, I, do CTN, da
mesma forma se houver lançamento direto pelo fisco, também conhecido como de
ofício, lançamento por declaração ou misto. A seguir ementa daquele colendo
tribunal sobre o assunto:
EMENTA: “Se não houver pagamento antecipado pelo contribuinte, é
cabível o lançamento direto substitutivo, previsto no art. 149, V, CTN, e o
prazo decadencial rege-se pela regra geral do art. 173, CTN. Precedentes
da 1ª Seção.(RESP 445.137/MG, 2ª T, rel. Min. Carlos Meira, em agosto
de 2006).
Este entendimento, porém não é consensual na seara do STJ e
há, embora hoje com menor força, interpretação em sentido diferente, e exótico, no
nosso entender, que acaba por duplicar o prazo de decadência, indo de 5 a pouco
mais de 10 anos. Segue jurisprudência daquele tribunal neste sentido:
EMENTA: TRIBUTÁRIO(...)CONTITUIÇÃO DO CRÉDITO
TRIBUTÁRIO.DECADENCIA-PRAZO(CTN, ART 173.(...) III- o termo
inicial da decadência prevista no art 173, I, CTN não é a data em que
ocorreu o fato gerador. IV – a decadência relativa ao direito de constituir
crédito tributário somente ocorre depois de cinco anos, contados do
exercício seguinte àquele em que se extinguiu o direito potestativo do
Estado de rever e homologar o lançamento (CTN, art. 150, parágrafo 4º)
V- se o fato gerador ocorreu em outubro de 1974, a decadência opera-se
em 1º de janeiro de 1985. (RESP 69.308/SP, 1ª T, rel.Min. Humberto
Gomes de Barros,j.04-12-1995)
Constituído o crédito tributário, não há mais que se falar em
decadência, mas sim em prescrição. Esta se dará quando o fisco, por inércia, não
propuser a competente ação de execução fiscal dentro de 5 anos contados da
constituição definitiva do crédito tributário. É o que nos diz o preceito do art. 174 do
CTN.
Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco
anos, contados da data da sua constituição definitiva.
A prescrição não opera sobre o direito material, substantivo, e sim
sobre o direito processual, adjetivo, caçando o direito subjetivo de o sujeito ativo
usar ação própria pra exigir o adimplemento da obrigação e ter o crédito tributário
lançado convertido em pecúnia. No entanto, a despeito do alarido de longa data
produzido pela doutrina majoritária, que vê no preceito do art. 156, V, CTN, uma
impropriedade técnica com desdobramentos graves, a prescrição não atinge
somente o direito de ação para cobrança do crédito, mas também o próprio direito
material, o crédito tributário e, por conseguinte, a obrigação tributária, posto ser
uma aberração a existência de obrigação tributária sem objeto, sem valor. Ensina-
nos a respeito Hugo de Brito Machado19:
Assim, nos termos do Código, a prescrição não atinge apenas a ação
para cobrança do crédito tributário, mas o próprio crédito, vale dizer, a
relação material tributária. Essa observação, que pode parecer
meramente acadêmica, tem, pelo contrário, grande alcance prático. Se a
prescrição atingisse apenas a ação para cobrança, mas não o próprio
crédito tributário, a Fazenda Pública, embora sem ação para cobrar seus
créditos depois de cinco anos de definitivamente constituídos, poderia
recusar o fornecimento de certidões negativas aos respectivos sujeitos
passivos. Mas como a prescrição extingue o crédito tributário, tal recusa
obviamente não se justifica.
A prescrição pode ser interrompida e suspensa, ao passo que a
decadência não. A interrupção causa o reinício da contagem do prazo qüinqüenal,
zerando o computo temporal já decorrido, ao passo que a suspensão “para” o
tempo, impedindo que o prazo continue a ser contado. Dita o art, 174 do CTN que
a prescrição se interrompe pela citação pessoal feita ao devedor, pelo protesto
judicial, por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor e por qualquer
ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito
pelo devedor.
Quanto à decadência, no entanto, sempre foi obrigação do juízo a
sua decretação imediata, tanto na seara civil quanto na tributária, extinguindo o
19 MACHADO, Hugo de B. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.207
processo e proclamando a não mais existência do direito reclamado.
2.4 Prescrição intercorrente.
O tema da prescrição tributária é deveras controvertido, tendo
causado divergências de entendimento de ponta a ponta na doutrina e
jurisprudência nacionais, e nesta ainda também nas mais altas cortes. Dentre as
muitas polêmicas instauradas na seara da prescrição tributária, cabe deter-nos
especialmente em uma delas que é a chamada prescrição intercorrente.
Ao direito não interessa a eternização dos conflitos e, apesar de o
sujeito ativo ter exercido o direito a ação, impetrando-a competentemente, deverá ter
êxito em determinado tempo caso contrário este direito a pretender será extinto, pelo
em do próprio direito, é a prescrição intercorrente.
A Lei de Execuções Fiscais, Lei n. 6830/80, ou simplesmente LEF, é
lei ordinária que trata da cobrança judicial dos débitos referentes à dívida inscrita da
União, Estados Distrito Federal e Municípios e suas respectivas autarquias, tendo
como norma subsidiária o Código de Processo Civil, como se depreende do seu art.
1º.
Ocorre muitas vezes que, como preconiza o art. 40, § 4º da Lei de
Execuções Fiscais, LEF, no âmbito da execução fiscal, mesmo com a isntauração
da competente ação de cobrança a Fazenda Pública não logra êxito em localizar o
sujeito passivo ou mesmo identificar bens seus para fazer face ao débito exeqüendo,
produzindo a suspensão do processo de execução fiscal, segundo o entendimento
de uns, e do próprio prazo prescricional em si, para outros. Convenhamos que não
faz sentido a tese esposada por aqueles que defendem existir apenas o estancar do
andamento do processo enquanto perdura uma situação de indefinição e não, como
nos parece mais razoável, se suspender o prazo de prescrição posto negar a própria
natureza do instituto.
Preconiza o antes citado art. 40 da LEF:
Art. 40 - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for
localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a
penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.
§ 1º - Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao
representante judicial da Fazenda Pública.
§ 2º - Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja
localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o
arquivamento dos autos.
§ 3º - Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os
bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução.
§ 4o Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o
prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de
ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.
(Incluído pela Lei nº 11.051, de 2004)
§ 5o A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no § 4o deste
artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior
ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda. (Incluído pela
Lei nº 11.960, de 2009)
Da leitura do texto acima se depreende que o prazo prescricional
ficará suspenso por um ano a partir da ordem de arquivamento e passado o lustro
prescricional o juiz do processo poderá declarar de ofício a prescrição intercorrente,
mas não sem antes dar ouvidos à Fazenda Pública, no intuito de saber se há
objeção ou fatos que possam interromper ou suspender a prescrição. Acerca do
tema concorre SABBAG20 afirmando: “Convém detalhar que, decorrido o prazo
máximo de 1(um) ano das suspensão da execução, o juiz deve ordenar o
arquivamento dos autos em cartório (art. 40, §2º, Lei n. 6830/80), até o momento em
que forem encontrados o devedor ou o patrimônio equivalente à divida exeqüível,
ocasião em que os autos serão desarquivados, dando-se prosseguimento normal à
execução”, iniciando-se destarte novamente o qüinqüênio prescricional, que ao seu
final, sem que a Fazenda produza fatos novos, encontrando o devedor e patrimônio
alcançável seu que satisfaça o débito, deverá o juiz ouvir a procuradoria da Fazenda
e se nada sustentável for oposto deverá aquele decretar de oficio a prescrição
intercorrente, fulminando o crédito e também o direito, a própria obrigação tributária,
com todas as conseqüências que isto trás, como veremos mais adiante. Nesta
linha, aduzimos a sumula 314 do STJ: “Em execução fiscal, não localizados bens
penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual inicia-se o prazo de
prescrição qüinqüenal intercorrente.”
20 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p756.
Essa interpretação do art.40 da LEF é deveras esdrúxula, vez que o
texto, com toda a literalidade possível, trata interrupção como se suspensão fosse.
Assim sendo efeitos verificados nas sentenças e acórdãos são típicos de interrupção
de prazo, o que é bastante danoso ao contribuinte, pois em se tratando de
suspensão, o prazo restante após um ano de arquivamento deveria reiniciar a partir
daquele ponto e serem contados mais quatro anos e não cinco como é a atual
hermenêutica do STJ.
Antes de 2004, quando foi publicada a lei 11.015121, perdurava
situação de nítida inconstitucionalidade, com a Lei n. 6.830/80, que em hierarquia é
inferior ao Código Tributário Nacional, propugnando por uma eterna e inconveniente
existência do crédito tributário, pois não dava possibilidade objetiva da decretação
da prescrição de tal crédito ao juiz do processo, situação que, modificada pela lei em
comento, tornou possível ao magistrado decidir de maneira objetiva e prática a
questão. Somado a isso, havia ainda a inconveniência de que, com a
subsidiariedade do Código de processo Civil, não ser permitida decretação de oficio
pelo juiz, em se tratando de direito patrimonial. Porém, também essa situação foi
modificada, e, com a Lei 11.280/0622, o art. 219, §5º do CPC teve seu preceito
alterado estendendo a qualquer caso, mesmo de natureza patrimonial, a
obrigatoriedade da decretação obrigatória da prescrição caso concretizada no
processo.
Hoje a magistratura dispõe de critério objetivo para decidir sobre
processos de cobrança de créditos tributários e que se apresentem inertes e sem
progresso, remansando o fluxo dos feitos nas varas federais e impedindo, dessa
21 Art. 40 - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou
encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de
prescrição.
§ 4o Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois
de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de
imediato. (Incluído pela Lei nº 11.051, de 2004)
22 Art. 219. A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a coisa; e, ainda
quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição.
(Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)
§ 5o O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição. (Redação dada pela Lei nº 11.280, de 2006)
forma, o acesso de muitos à justiça. Assim, quando o magistrado, ao tomar
conhecimento de causa cujo objeto seja cobrança judicial de crédito tributário
deverá, de pronto observar as condições que o autorizam a decretar a prescrição
tributária ou prosseguir com o feito até seu final.
Desta feita é possível descrever um procedimento objetivo segundo
o qual o juiz poderá seguir objetivamente para a decretação de ofício da prescrição
tributária. Em primeiro instante deverá observar a data da efetiva constituição do
crédito tributário, concretizada pela figura do lançamento, que por sua vez depende
do tipo de tributo veiculado na ação; etapa vencida verificará a efetiva localização do
devedor e da sua capacidade patrimonial em saudar a obrigação exeqüenda, ou
seja, se há patrimônio seu que possa ser alcançado e expropriado para a satisfação
da obrigação. Caso hajam sidos localizados devedor e patrimônio, deverá o juiz
liberar o processo e autorizar a penhora, e, caso o próprio devedor não os nomeie, a
Fazenda Pública deverá fazê-lo. Em caso diverso, em que não sejam localizados o
devedor, ou que a Fazenda Pública não identifique e nomeie bens que possam ser
penhorados, deverá o juiz ordenar o arquivamento do processo. Tal arquivamento
deverá durar precisamente um ano, após o qual será iniciado o prazo prescricional,
que é de cinco anos, e que findado, sem que sejam aportados fatos novos, ou seja,
encontrados bens que saúdem o débito, deverá o juiz fazer a oitiva do MP sobre
objeções que possam interromper ou suspender a prescrição que, não existindo, o
autorizarão a decretar de oficio a prescrição tributária, extinguindo não só o crédito,
mas também o direito material e a obrigação tributária.
De salientar-se que os casos em que as mazelas que acometem
nosso sistema judicial e que tornam morosa nossa justiça, inclusive com atrasos em
virtude de determinação judicial, serão impedidos de serem subsumidos à hipótese
legal que aduzimos a pouco, pois seria violar o interesse público creditar à Fazenda
Pública o ônus pela demora não originada em suas ações, ou inações, assim, no
mesmo movimento de fixar entendimentos claros a este respeito o STJ emitiu a
súmula nº 106 no seguinte sentido: “Proposta ação no prazo fixado para o seu
exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não
justifica o acolhimento da argüição de prescrição ou decadência.” De forma mais
cabal e genérica, o entendimento é de que se não houver culpa do fisco pela
inatividade no processo, não haverá prescrição intercorrente.
Finalmente, e para enfeixar este curto estudo da prescrição
intercorrente, cumpre a nós manifestar a estranheza pela exegese da inovação do
art. 40, §4º da LEF, dada pelo STJ, segundo a qual, o fenômeno ocorrido no lapso
de um ano de arquivamento do processo de execução fiscal seria de interrupção e
não de suspensão. Tal estranheza vem da literalidade da lei e de não encontrarmos
em nenhum outro dispositivo de lei algo que produzisse esse entendimento. Tal
entendimento produz efeitos prejudiciais ao contribuinte, pois que ao se optar por
entender que o prazo é interrompido e não suspenso, faz-se com esse seja
reiniciado, zerado, e passe a correr novamente, como se nada houvesse sucedido,
ao passo que se a hermenêutica empregada por aquela corte concluísse pela
suspensão, como várias vezes aparece no texto da lei, o prazo deveria ser
recontado do ponto onde havia sido paralisado, somando ao final, indubitavelmente,
tempo menor para a possibilidade de decretação da prescrição intercorrente.
3. Alguns aspectos polêmicos da prescrição e decadência do
crédito tributário.
A prescrição, assim com a decadência, extingue o crédito tributário.
É a determinação do Código Tributário Nacional, que inapropriadamente atribuiu
efeitos semelhantes a institutos de natureza apenas semelhantes, pertencentes À
teoria Geral do direito, mas na verdade distintos e diferentes. A decadência atinge o
direito material, pela inércia do sujeito ativo em não buscá-lo; a prescrição atua
quando, já podendo exercer o direito de pretensão não o faz, ou, conflitante a
situação, deixa o sujeito ativo de impulsionar o processo, de movê-lo na direção da
prolação da sentença pelo juiz, levando o direito a cassar-lhe este poder para evitar
a perpetuação da contenda. Particularmente no direito tributário, na execução fiscal,
ocorre que mesmo que a parte autora impulsione o processo na tentativa de
alcançar o patrimônio do devedor não o consegue, e passado certo tempo de lei o
direito não mais agasalhará este direto evitando a perpetuação do conflito, atuando
aí a prescrição intercorrente. No art. 156 do CTN ambos têm efeito de extinguir o
crédito tributário a despeito, como já frisado antes neste trabalho, de a decadência
não dever atingir o crédito tributário, instituto do direito tributário bem delineado e
cuja existência é excludente da existência da decadência. Assim, é que a
decadência é contemporânea, na relação jurídica tributária, à obrigação tributária,
enquanto a prescrição o é do crédito tributário. Mas quis o legislador que aos dois
institutos fosse dado idêntico poder, qual seja o de fulminar o crédito que tem o fisco
contra o contribuinte.
Cabe agora discutir a conseqüência desta igualdade de efeitos
imputados a institutos tão diferentes, além de abordar a situação ainda polêmica, e
não pacífica na jurisprudência, do caso da decadência quando o tributo é lançado
por homologação e não há o seu pagamento, ocorrendo interpretações dispares de
modo até a mais que dobrar o prazo decadencial.
3.1 Conseqüências da igualdade de efeitos atribuídos à decadência
e à prescrição na execução fiscal.
Como já relatado antes, o artigo 156 do CTN atribui à ambos os
institutos, a decadência e a prescrição, o mesmo efeito: extinguir o crédito Tributário.
Como primeira observação possível de vislumbre quando ocorre a decadência do
direito de exigir – leia-se cobrar judicialmente - um tributo é a de que, em sendo a
obrigação tributária espécie do gênero obrigação, apesar da autonomia do direito
tributário em relação ao direito civil, implicaria ela, a decadência, na extinção do
direito material que gerou o crédito, importando em que não mais haveria relação de
obrigação entre a Fazenda e o contribuinte, vez que a decadência opera sobre o
direito material e este em matéria tributária é a própria obrigação tributária, que, em
tese deixaria de existir. No entanto, prega o Código Tributário Nacional que a
decadência extingue o crédito tributário e não a obrigação que o originou. Ora,
apesar de o fato gerador produzir a obrigação, que pelo lançamento, atividade
administrativa privativa de autoridade competente, dá origem ao crédito tributário, a
sua a extinção, pela decadência, não deveria produzir o fim do crédito tributário e
sim da obrigação tributária, posto aquele ainda não existir, como prevê o CTN.
Como ambos são separados pelo lançamento, transformando obrigação em crédito,
individualizado, quantificado e qualificado, a decadência deveria operar antes do
lançamento e a prescrição apenas após este acontecer.
Isto dá oportunidade ao questionamento da obrigatoriedade da
repetição do indébito tributário ao contribuinte e da emissão da CNDA, certidão
negativa da dívida ativa, ao contribuinte a favor do qual tenha operado a decadência
de um crédito tributário.
Ilustrativo o entendimento, em face do exposto, no Informativo nº
0397, do Superior Tribunal de Justiça, publicação com abrangência ente o primeiro e
o quinto dia de junho de 2009, tratando de repetição de tributo pago quando já
prescrito:
O recorrente sustenta que o IPTU exigido na execução fiscal foi pago,
contudo estava prescrito, não mais existindo o direito do município contra o
embargante. Aduz que o pagamento efetuado por este, compulsoriamente,
foi, sem qualquer sombra de dúvidas, indevido, transparecendo cristalino o
direito do embargante à repetição desse valor pago indevidamente.
Inicialmente, esclareceu o Min. Relator que a prescrição em matéria
tributária não é regulada pelo CC, mas sim pelo CTN. Segundo o art. 156,
V, do CTN, a prescrição enseja a extinção da ação e do próprio crédito
tributário. Assim, verifica-se que, a partir de uma interpretação conjunta dos
arts. 156, V (que considera a prescrição como uma das formas de extinção
do crédito tributário), e 165, I (que trata da restituição de tributo), ambos do
CTN, há o direito do contribuinte à repetição do indébito, uma vez que o
montante pago foi em razão de um crédito tributário prescrito, ou seja,
inexistente. Diante disso, a Turma deu provimento ao recurso. REsp
646.328-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 4/6/2009.
Entendimento diverso, com relação à prescrição, esposa a maioria
das procuradorias, alegando que sobrevivo está o direito, posto a prescrição operar
a morte da ação e não do direito, à imagem dos efeitos que teriam no direito civil,
assim, pago tributo prescrito, não merecida a repetição, pois existiria ainda o direito,
apenas não poderia mais ser reclamado, merecendo a repetição apenas o tributo
decaído e ainda assim pago, pois aí não mais existiria o direito, a obrigação
tributária. Sobre isto nos fala SABAG23: “...há polêmica sobre o verdadeiro objeto da
decadência: para alguns é o crédito tributário, conforme dispõem os artigos 156, v, e
173 do CTN; para outros, é a própria obrigação tributária...” e mais aduz adiante:
“De fato, quando se tem o decaimento do direito de lançar, perece a relação
obrigacional, extinguindo-se o próprio direito material, não mais existindo a dívida”
Porém, diante destas considerações resta a queixa e demanda, que
muito embaralhou as discussões da doutrina e da jurisprudência nacionais, e ainda
anima a doutrina, sobre o destino da obrigação tributária, vez que sobrevivendo o
direito material, mesmo com a prescrição decretada, restaria poder da Fazenda
sobre o contribuinte.
A situação aludida deve ser mais esmiuçada confrontando o
pagamento de créditos decaídos e de créditos prescritos. Se caduca a obrigação e
pago o valor, não resta dúvida que ao contribuinte seria devida a restituição do
pagamento, posto impensável e injusto a Fazenda locupletar-se de crédito indevido.
Mas se precluso o crédito e ocorre seu pagamento, como, em tese, vivo estaria o
direito material e morto apenas o direito processual, viva ainda estaria a dívida que
fora paga por vontade do sujeito passivo e não se configuraria impropriedade ao
fisco seu recebimento.
Outra conseqüência da extinção do crédito tributário, quando
incidindo a prescrição sobre execução fiscal, é o dever de a Fazenda pública emitir
as certidões negativas de débito, as CND. Ainda hoje há procuradorias das
Fazendas renitentes ao negar a CND alegando que se prescrito o débito, mesmo
assim sobreviveria o direito e desta forma poderiam negar o documento
desvinculante. Na esteira do raciocínio até aqui discorrido, não tem sido esse o
entendimento da jurisprudência maciça que tem ordenado às autoridades tributárias
o fornecimento e emissão destes documentos.
3.2 Decadência. Caso de lançamento por homologação, sem
pagamento do tributo.
23 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p720.
Quando se trata da decadência abordada no CTN temos que nos
reportar aos artigos 150, §4º e ao art. 173, I deste código. Temos também, quando
da contagem de prazos processuais, que definirmos precisamente o dies a quo, que
é o marco inicial da contagem do prazo, o prazo em si, como sendo o tempo
necessário e suficiente para se opere determinado efeito prescrito na lei, e o dies ad
quem, que é o limite temporal final para contagem do prazo.
O lançamento por homologação, já antes tratado, é aquele apurado
pelo próprio contribuinte, cabendo ao fisco acatá-lo, reformá-lo ou não acatá-lo,
devendo aí lançar de próprio ato a correção que entender adequada. Se nenhuma
manifestação advier da autoridade tributária, no prazo de cinco anos, tendo como
dies a quo o fato gerador, se dará a homologação implícita, ou como é comumente
chamada, homologação tácita, deixando entender que a autoridade concorda e
referenda na íntegra a todos os parâmetros da apuração do contribuinte. Neste
sentido, nunca é demais lembrar que o lançamento é ato potestativo e privativo do
fisco, assim, ainda que a apuração seja levada a efeito pelo contribuinte nada
impede que a autoridade tributária interceda no processo explicitamente, caso
contrário ocorrerá o lançamento tácito. Ocorre que, ainda que tenha sido feito o
“autolançamento” poderão ocorrer duas situações com desdobramentos diferentes e
com solução ainda não pacificada: na primeira o contribuinte paga o que apurou e
na segunda não o paga.
O lançamento é ato administrativo potestativo da autoridade estatal,
devendo emanar dela, ainda que apenas o homologue, nas formas descritas acima,
endossando o ato do contribuinte em todas as suas facetas ou o reformando. Na
lição de Hugo de Brito Machado24: “A constituição do crédito tributário é da
competência privativa da autoridade administrativa.” completando logo adiante:
“Sem essa homologação não existirá, juridicamente, o lançamento e não estará por
isso mesmo constituído o crédito tributário.”
O artigo 150, §4º do CTN, prescreve como marco de início da
contagem, não lhe contando o próprio dia, a data da ocorrência do fato gerador,
quando o tributo for de lançamento na modalidade por homologação. Se não
vejamos:
24 MACHADO, Hugo de B. Curso de direito tributário. 23ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.164
Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos
cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento
sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a
referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida
pelo obrigado, expressamente a homologa.
(...)
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a
contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a
Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o
lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a
ocorrência de dolo, fraude ou simulação.
Necessário ressalvar que a expressão inscrita em parte do § 4º “Se
a lei não fixar prazo a homologação” deve ser interpretada, como pensa a maciça
maioria da doutrina, como: “se a lei não fixar prazo a menor”, pois o limite máximo é
o de cinco anos do preceptivo legal. A esse respeito, discorre Luciano Amaro, citado
por SABAGG25, “o código não diz expressamente qual a solução. Ela tem de ser
buscada a partir de uma visão sistemática da disciplina da matéria, que nos leva
para a possibilidade de a lei fixar apenas prazo menor”.
Desde meados dos anos 90 do século passado, o STJ vem
esposando tese controvertida, quando dos seus julgados, em casos versando sobre
decadência de tributos lançados por homologação. A tese defendida é a de que o
prazo decadencial nestes casos deve ser a soma dos prazos dos artigos 150, §4º e
ao art. 173, I do CTN, duplicando de cinco anos para quase 11 anos. A idéia é de
que o prazo decadencial tem início não com a ocorrência do fato gerador, mas, sim,
do primeiro dia do exercício posterior ao ano em que a administração poderia ter
feito o lançamento, pois, segundo este entendimento, não havendo pagamento do
tributo não há o que homologar e a fazenda pública teria os cinco anos seguintes ao
fato gerador a esperar o pagamento, depois do qual só então poderia homologá-lo,
explicita ou tacitamente. Dessa forma, se ainda não houver o pagamento, decorridos
os cinco anos do fato gerador, começaria a contar o prazo segundo o critério do
artigo art. 173, I do CTN, quando a partir do exercício seguinte o fisco teria mais
cinco anos e só após perderia o direito a pleitear o adimplemento. Em outras
25 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p726
palavras, o dies a quo do prazo do artigo 173 é o primeiro dia do exercício seguinte
ao dies ad quem do prazo do artigo 150 do CTN.
A doutrina mais abalizada tem gritado contra este modo de
interpretar os dispositivos legais, por esdrúxula que é. Leia-se a opinião
inconformada e até irônica de Alberto Xavier26 sobre o assunto :
A ilogicidade da tese jurisprudencial no sentido da aplicação concorrente
dos artigos 150, §4º e ao art. 173, I do CTN, resulta ainda evidente da
circunstância de o §4º do art. 150 determinar que se considera
definitivamente extinto o crédito no término do prazo de cinco anos contados
da ocorrência do fato gerador. Qual seria pois o sentido de acrescer a este
prazo um novo prazo de decadência do direito de lançar quando o
lançamento já não mais poderá ser efetuado em razão de já se encontrar
definitivamente extinto o crédito? Verificada a morte do crédito no final do
primeiro qüinqüênio, só por milagre poderia ocorrer sua ressurreição no
segundo.
A seguir transcrita, jurisprudência do Superior Tribunal de justiça,
que se irmana nesse entendimento:
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS À
EXECUÇÃO. CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ICMS. LANÇAMENTO POR
HOMOLOGAÇÃO. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 150, § 4º E 173, INCISO
I, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. DECADÊNCIA NÃO
CONFIGURADA. CONTAGEM DO PRAZO. RECURSO CONHECIDO E
PROVIDO. PRECEDENTES.
1. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado que o prazo
decadencial para a constituição do crédito tributário não tem início com a
ocorrência do fato gerador, mas, sim, depois de cinco anos contados do
exercício seguinte àquele em que foi extinto o direito potestativo da
Administração de rever e homologar o lançamento.
2. Não configurada a decadência no caso em exame - cobrança de
diferença de ICMS em lançamento por homologação -, porquanto o fato
gerador ocorreu em junho de 1990, e a inscrição da dívida foi realizada em
15 de agosto de 1995, portanto, antes do prazo decadencial, que só se
26 Xavier, Alberto. Do Lançamento. Teoria Geral do Ato, do Procedimento e do
Processo Tributário, Ed. Forense, Rio de Janeiro, 1998, 2ª Edição, p. 92 a 94
verificará em 1º de janeiro de 2001 (6/90 - fato gerador / + 5 anos = 6/95 -
extinção do direito potestativo da Administração / 1º/01/96 - primeiro dia do
exercício seguinte à extinção do direito potestativo da Administração / + 5
anos = prazo de decadência da dívida / 15/08/95 - data em que ocorreu a
inscrição da dívida / 1º/01/2001 - limite do prazo decadencial).
3. Recurso conhecido e provido. Decisão unânime.
REsp198631/SP, 2ª T, rel Ministro FRANCIULLI NETTO, j.25-
04-2000.
Entretanto há naquele colendo tribunal, nos últimos anos,
dissonância nessa exegese demonstrando tendência a que a doutrina e a
comunidade jurídica majoritária sejam escutadas nos seus reclames. Assim, tem-se
admitido ali a tese de que nos casos de tributos lançados por homologação sem o
devido pagamento, o dies a quo para início do prazo de decadência é o da
ocorrência do fato gerador, como prescreve o artigo 150, §4º do CTN e não mais o
primeiro dia do exercício posterior ao que poderia ser lançado mais cinco anos, a
chamada tese dos cinco mais cinco (5+5).
Vejamos então jurisprudência neste sentido:
PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 557, DO CPC. DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR RESPALDADA EM JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL A QUE PERTENCE. INOCORRÊNCIA. TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. PRAZO PARA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. TERMO INICIAL.1. Recurso em que a Fazenda aponta, preliminarmente, a violação ao art. 557, do CPC, e no mérito aos arts.150, § 4º e 173, I, do CTN, sob o fundamento de que, quando há fraude dolo ou simulação aplica-se o disposto no art. 173, I, do CTN e não o art. 150, § 4º, do mesmo diploma legal, motivo pelo qual, na hipótese dos autos, em que houve fraude, o lançamento poderia ter sido efetuado a partir do momento em que a fraude foi desvendada, in casu, dia 27.07.1999, data em que foi lavrado o auto de infração. não indicando a contrariedade ao art. 45, da Lei n.º 8.212/91. Discussão acerca do termo inicial do prazo de decadência para constituição do crédito tributário.(...)5. Versam os autos, originariamente, agravo de instrumento interposto contra decisão deferiu o pedido de tutela antecipada formulado pelo autor em ação anulatória para determinar que a União se abstivesse da prática de atos referentes à exigência do crédito tributário referente à COFINS no período de junho a dezembro de 1992, haja vista que o auto de infração foi lavrado somente em 27.07.1999, quando já ultrapassado o prazo decadencial para a sua constituição, previsto no art. 173, I, do CTN.(...)7. O crédito tributário constitui-se, definitivamente, em cinco anos, porquanto mesmo que o contribuinte exerça o pagamento antecipado, a Fazenda dispõe de um quinquênio para o lançamento, que pode se iniciar, sponte sua, na forma do art. 173, I, ou tacitamente quando então deve estar
ultimado no quinquênio do art. 150, § 4º. 8. A partir do referido momento, inicia-se o prazo prescricional de cinco anos para a exigibilidade em juízo da exação, implicando na tese uniforme dos cinco anos, acrescidos de mais cinco anos, a regular a decadência na constituição do crédito tributário e a prescrição quanto à sua exigibilidade judicial.9. Inexiste, assim, antinomia entre as normas do art. 173 e 150, § 4º do Código Tributário Nacional.10. Deveras, é assente na doutrina: "a aplicação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173, o que conduz a adicionar o prazo do artigo 173 - cinco anos a contar do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido praticado - com o prazo do artigo 150, § 4º - que define o prazo em que o lançamento poderia ter sido praticado como de cinco anos contados da data da ocorrência do fato gerador. Desta adição resulta que o dies a quo do prazo do artigo 173 é, nesta interpretação, o primeiro dia do exercício seguinte ao do dies ad quem do prazo do artigo 150, § 4º. A solução é deplorável do ponto de vista dos direitos do cidadão porque mais que duplica o prazo decadencial de cinco anos, arraigado na tradição jurídica brasileira como o limite tolerável da insegurança jurídica. Ela é também juridicamente insustentável, pois as normas dos artigos 150, § 4º e 173 não são de aplicação cumulativa ou concorrente, antes são reciprocamente excludentes, tendo em vista a diversidade dos pressupostos da respectiva aplicação:o art. 150, § 4º aplica-se exclusivamente aos tributos 'cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa'; o art. 173, ao revés, aplica-se aos tributos em que o lançamento, em princípio, antecede o pagamento. (...) A ilogicidade da tese jurisprudencial no sentido da aplicação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173 resulta ainda evidente da circunstância de o § 4º do art. 150 determinar que considera-se 'definitivamente extinto o crédito' no término do prazo de cinco anos contados da ocorrência do fato gerador. Qual seria pois o sentido de acrescer a este prazo um novo prazo de decadência do direito de lançar quando o lançamento já não poderá ser efetuado em razão de já se encontrar 'definitivamente extinto o crédito'? Verificada a morte do crédito no final do primeiro quinquênio, só por milagre poderia ocorrer sua ressurreição no segundo." (Alberto Xavier, Do Lançamento. Teoria Geral do Ato, do Procedimento e do Processo Tributário, Ed. Forense, Rio de Janeiro, 1998, 2ª Edição, p. 92 a 94).11. In casu, considerando que os débitos relativos à COFINS referem-se ao período de junho a dezembro de 1992, e que o auto de infração foi lavrado em 27.07.1999, consoante assentado pelas instâncias ordinárias, não merece acolhida a pretensão do recorrente, por isso que o lançamento foi efetivado após do prazo de cinco anos, previsto no art. 150, § 4º, do CTN.12. Precedentes da Primeira Seção: ERESP 276142 / SP ; Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 28.02.2005; ERESP 279473 / SP, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ de 11.10.2004) 13. Recurso especial improvido.
Colaremos aqui informativo do STJ na direção deste novel
entendimento, pugnando pela não cumulação dos prazos dos artigos 154 e 171 do
CTN.
Informativo nº 0402, Período: 10 a 14 de agosto de 2009.Primeira SeçãoRECURSO REPETITIVO. DECADÊNCIA. TRIBUTO. LANÇAMENTO. HOMOLOGAÇÃO.
O prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário lançamento de ofício) conta-se do primeiro dia do exercício
seguinte àquele em que o lançamento poderia ter-se efetuado, isso nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, ele não ocorre, sem constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, inexistindo declaração prévia de débito. Como consabido, a decadência ou caducidade, no âmbito do Direito Tributário, importa perecimento do direito potestativo de o Fisco constituir o crédito tributário pelo lançamento. Ela é regulada por cinco regras jurídicas gerais e abstratas, entre as quais figura a decadência do direito de lançar nos casos sujeitos ao lançamento de ofício ou nos casos dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação em que o contribuinte não efetua o pagamento antecipado. É o art. 173, I, do CTN que rege o aludido prazo quinquenal decadencial, sendo certo afirmar que o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado corresponde ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato imponível, ainda que se trate de tributos sujeitos à homologação. Assim, mostra-se inadmissível aplicar, cumulativamente ou concorrentemente, os prazos previstos nos arts. 150, § 4º, e 173, ambos do CTN, diante da configuração de injustificado prazo decadencial decenal. Com esse entendimento, a Seção negou provimento ao especial regulado pelo disposto no art. 543-C do CPC e Res. n. 8/2008-STJ (recurso repetitivo). Precedentes citados: REsp 766.050-PR, DJ 25/2/2008; AgRg nos EREsp 216.758-SP, DJ 10/4/2006, e EREsp 276.142-SP, DJ 28/2/2005. REsp 973.733-SC, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12/8/2009.
Assim, verifica-se no momento, nos casos de tributos
“autolançados”, sem pagamento da pecúnia, o embate entre ambas as
posições, uma de que o prazo decadencial deva ser regido unicamente pelo
preceptivo do artigo 150, §4º, e iniciando da data do fato gerador estendendo-
se por mais cinco anos a partir dali, e a outra como sendo este o primeiro dia
do exercício tributário desse último prazo citado o inicio de uma segunda etapa
de prescrição, regido pelo artigo 171, inciso I, que deveram serem somados
mais cinco anos, após o que prescrito estaria o crédito tributário. Certo, no
entanto, é de que a balança tende a pesar para o lado da primeira tese, numa
reviravolta ao entendimento quase predominante, na última década no STJ, da
segunda exegese.
Após a colação dos conceitos pertinentes e mais caros ao tema que
aqui abraçamos, passaremos a melhor delinear nossa posição quanto aos
problemas que identificamos na lei e nos entendimentos manifestados pela corte do
STJ, suprema interpretadora da lei nacional.
No que tange às conseqüências da confusão de efeitos atribuídos à
decadência e à prescrição no âmbito de execução fiscal, impostos pelo CTN, a
lógica nos obriga a refutar a tese abraçada pelas procuradorias da Fazenda e por
parte da doutrina, nos fazendo valer da lógica como defesa maior contra o que
entendemos ser um puro sofisma, segundo a qual após a prescrição do crédito esse
ainda se mantenha vivo, além do direito do fisco em poder receber o tributo
prescrito. É o que intentaremos a seguir.
A obrigação tributária é forjada da concretização fática e real de uma
situação, hipotética e geral, tipificada no Códex dos tributos brasileiros, o CTN. É
sobejo o conhecimento e o conceito de que a obrigação tributária só proporciona a
cobrança após líquida e certa a dívida, com o sujeito passivo identificado, a matéria
tributária delimitada e o valor devido computado. Nascido está o crédito tributário,
que por lei se dá em definitivo com o lançamento, sendo este um procedimento
administrativo com este único intuito.
Ora, como a decadência atua sobre o direito não reclamado, sobre a
questão fática não transformada em contenda judicial, de natureza executória,
extinguindo o direito e a possibilidade prévia, antes viva, de entrar com ação para
obter a prestação devida, impróprio o preceito disposto no art. 156, inciso v, do CTN
que manda extinguir o crédito tributário, posto que este ainda não existe, nesta
altura dos acontecimentos. Apesar disto, e como antes aludido, o instituto ganhou
ares diferentes daquele do direito civil e a autonomia do direito tributário autorizou o
legislador a transformar este conceito impróprio em norma.
Na seqüência, ainda que aceito que a decadência pode extinguir o
crédito tributário, seria prosseguir no erro acatar a tese de que viva ainda estaria a
obrigação tributária, leia-se o próprio direito material, e apesar da autonomia do
direito tributário, deve-se respeito aos princípios da teoria geral do direito que é
edifício coerente e sem contradições e do qual é compartimento o próprio direito
tributário.
Assim, nos trasladando para o direito obrigacional, obrigação no
dizer de Mackeldey, citado por Monteiro27, é “fato que serve de fundamento ao direito
do credor e ao débito do devedor”, fazendo ver que a obrigação é vínculo com
dever, sofrendo de falta de sentido uma obrigação sem dever. Do direito obrigacional
27 MONTEIRO, Washington de Barros.Curso de Direito Civil, v. 4, Direito das Obrigações, 1ª parte. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 3
advém o conceito de obrigação e desse conceito advém seus elementos
constitutivos, sem os quais falta o nexo de razão para falar-se em obrigação. Da
lição de Washington de Barros Monteiro28 tiramos a firmeza do exposto: “Definida a
obrigação, cabe agora, em seguida, analisar os vários elementos em que ela se
desdobra. São eles: duplo sujeito (credor e devedor), objeto da prestação e vínculo
jurídico. Nenhuma relação obrigacional pode existir, ou sobreviver, sem a inevitável
presença de todos esses elementos.” grifo nosso.
Desta forma, ousamos afirmar que ainda que ao legislador aprouve
dar à decadência o condão de extinguir o crédito tributário, da mesma forma que o
fez com a prescrição, essa extinção fulminará também a obrigação tributária, pois
não sobreviveria esta à morte do vínculo e do objeto – neste caso a morte do crédito
tributário - inerentes a toda a obrigação, inclusive a tributária e, conseqüência disto,
o indébito pago ao fisco deverá ser restituída ao contribuinte visto não existir mais o
direito material quando da sua efetivação, ainda que seja em caso de prescrição,
ainda que em caso de decadência.
De outra forma e por outro caminho, iremos elaborar outro
raciocínio, usando as ferramentas e conceitos do direito processual que são
subsidiários ao CTN, para reforçar esse mesmo entendimento.
Com a modificação do CPC, autorizando a decretação da prescrição
de ofício pelo juiz da causa e da mudança do art. 40 da LEF, tornando possível a
decretação da prescrição intercorrente, em certas condições objetivas do processo
de execução fiscal, a prescrição tributária, assim como a prescrição civil, que outrora
caminhavam em trilhas separadas, passaram a ser classificadas como uma mesma
modalidade de defesa tida como objeção e não mais como exceção em sentido
estrito, não mais dependendo de que a parte evocasse tal exceção para que o juiz
conhecesse do fato. Esta modalidade de defesa, segundo Chiovenda, tem o condão
de extinguir não só a ação, mas o próprio direito material. Assim, ocorrendo a
decadência, que deverá se decretada de ofício pelo estado, como sendo uma típica
objeção processual, tem o condão de extinguir não só a ação mas também o direito
material que a justificou. Desta forma, mediante outro raciocínio e por outro caminho
entendemos ter provado a tese de que extinto o crédito tributário, pela decretação de
28 MONTEIRO, Washington de Barros.Curso de Direito Civil, v. 4, Direito das Obrigações, 1ª parte. São Paulo: Saraiva, 2003.p. 12.
ofício, ou pela ocorrência da prescrição ou pela ocorrência da prescrição, da mesma
forma estará extinta a obrigação tributária, o direito material.
Neste momento nos deslocaremos ao problema descrito no item 3.2
deste texto e o enfrentaremos imprimindo nosso entendimento pessoal.
Nossa posição quanto ao estabelecimento do prazo decadencial por
ocasião do inadimplemento de exação lançada por homologação e inadimplida é a
de que esse deve ser regido unicamente pela ordem do artigo 150, §4º do CTN,
pelas razões que a seguir discorreremos.
Num primeiro momento, é importante já atentar para o fato de que o
texto da lei é inaugurado pela referência específica à modalidade de lançamento por
homologação, fazendo inequivocamente entender que este é o dispositivo da lei que
deverá reger aquela situação fática ao passo que o artigo 171, iniciso I, tratará dos
outros casos de lançamento por ofício e por declaração. Em se tratando de
homologação tácita com pagamento, a resolução é imediata, pois a subsunção à lei
se dá sem complicações, no entanto quando não ocorre o pagamento surge a
dúvida de ter ou não havido homologação tácita, portanto não poderia ter-se
manifestado a autoridade diante da inexistência da premissa do lançamento.
Não entendemos assim, pois deve-se abordar a questão de maneira
sistêmica fazendo a interação de todos os conceitos que animam ao direito
tributário, estejam no CTN ou nas demais normas que o complementam. Assim, na
modalidade de lançamento por homologação, na verdade o que há é antecipação do
pagamento, sendo o lançamento, como dita o artigo 142 do CTN, privativo da
autoridade administrativa29, devendo fazê-lo de ofício sob pena, inclusive, de
responsabilidade funcional. Então, apurado o crédito pelo contribuinte, ainda que
não pago, já existe o fato gerador e continua sendo função do fisco o seu
lançamento que pode ser feito de imediato, revendo-o ou confirmando-o. A ordem da
lei é que o fisco teria cinco anos para rever a apuração do devedor e se não o fizer
perderá o direito de fazê-lo posteriormente, nada pondo em dúvida a existência do
29 Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.
fato gerador, que é, pelo dispositivo do artigo 154, §4º, o termo a quo do lustro
decadencial.
A falha no entendimento dos que defendem a tese dos cinco mais
cinco, a nosso ver, está basicamente na falta de integração dos vários preceitos
insertos no CTN e ao seu foco exclusivo no artigo 173, l, do CTN, além do apego
indevido à expressão “poderia ter sido lançado”, pois a atividade de lançamento,
como já visto, não é facultativa, mas sim obrigatória, e deve ser levada a efeito no
exato momento da ciência do fato gerador. Assim, no caso de o contribuinte apurar a
exação e não a pagar, ciente o fisco, deve de imediato lançar, caso não estará
tacitamente concordando com a conduta do devedor e referendando-a. Da lei,
passados então os cinco anos da declaração do devedor, ou seja o fato gerador,
mesmo que não pague o que ele mesmo apurou, extinto estará o crédito posto que
lançado por homologação tácita e não poderá mais ser exigido, posto caduca a
obrigação.
Desta forma acreditamos que da exegese conjunta dos artigos 142 e
150, §4º do CTN, fica clara a definição do prazo decadencial, que é de cinco anos,
nunca podendo ir além, apenas aquém e em razão de lei específica, e seus termos
iniciais e finais, sendo aberrações lógicas as interpretações que fazem a soma dos
prazos dos artigos do códex tributário que tratam de situações fáticas excludentes
concorrendo para a lesão frontal dos direitos do contribuinte. Felizmente esta tese
começou a ser rechaçada no STJ e acreditamos ser a tendência a da sua extinção
dos julgados daquele colendo tribunal.
Aqui, nosso intento foi trazer luz sobre o problema gigantesco do
abarrotamento dos tribunais nacionais - especificamente tangente às causas ligadas
ao direito tributário - causado pela legislação extemporânea, inoportuna em face da
realidade nacional e do tempo que vivemos, e que, mesmo a despeito das últimas
modificações ocorridas tanto na seara do direito processual civil, direito civil e do
direito tributário, ainda assim fica a certeza de que há muito por fazer para tornar
nosso sistema judicial eficiente e, em parte por isto, respeitado. Respeitado por fazer
o que qualquer sistema judicial tem por fito e obrigação fazer que é promover a
justiça.
Muito trabalho e energia devem ser investidos no estudo das
vicissitudes do nosso país e de um sistema jurídico que se adéqüe a ele,
expurgando das nossas leis dispositivos alienígenas, dispositivos inoperantes,
dispositivos contraproducentes.
É custoso a qualquer brasileiro, minimamente responsável e que
sonhe com um país melhor, observar e constatar que a justiça não é justa, que não
é igualitária e que só seja acessível a poucos, estes com recursos para enfrentar
longas e demoradas batalhas nos tribunais, perecendo no caminho os mais
desprovidos e desvalidos. Isso com mais força se aplica nas áreas onde o interesse
público prevalece como princípio de direito, em que as fazendas públicas têm o
dobro dos prazos para recorrer, em que os prazos de decadência e prescrição são
demasiado longos, produzindo longos enfrentamentos judiciais e de resultado pífio,
se não estéreis, e nascidos em um tempo em que a tecnologia não permitia ações
mais efetivas contra devedores inadimplentes. Neste sentido temos o problema da
má gestão da dívida pública, onde são gastos recursos preciosos pra nosso país –
rico em potência, mas ainda pobre e com imensos desafios a vencer - em causas
notoriamente inglórias e inviáveis na tentativa de recolher aos cofres públicos
valores oriundos de tributos não pagos e cuja capacidade financeira dos respectivos
devedores é flagrantemente insuficiente.
Neste sentido entendemos oportuna a citação neste trabalho de
propostas que vêm sendo veiculada nos meios jurídicos e inclusive sendo objeto de
projetos de lei no Congresso Nacional, com propostas que vão inclusive à revogação
da LEF, donde trasladamos alguns principais pontos. A lei mudaria gravemente o
conceito de cobrança do crédito público e trasladaria sua cobrança que hoje orbita
entra a esfera administrativa e judicial para unicamente a esfera administrativa. A
proposta se baseia principalmente em três regras básicas:
1. A Fazenda Pública somente cobrará judicialmente de quem
tenha capacidade de pagamento.
2. A administração pública criará um banco de dados que
concentrará todas as informações patrimoniais dos
contribuintes;
3. Todo crédito tributário prescrito deve ser cancelado, de ofício,
pelo próprio órgão de execução.
Entre muitos críticos de peso no meio jurídico e na doutrina nacional,
destaca-se a OAB como contrária à este tipo de solução. A principal crítica é a de
que o projeto é inconstitucional e afasta o direito constitucional de recurso ao
judiciário.
Particularmente entendemos que este tipo de solução resolve sim o
problema da justiça, desafogando-a, e facilita o trabalho da fazenda pública, mas a
um preço altíssimo, pois colocaria o cidadão nas mãos unicamente do fisco nacional,
principal interessado na cobrança, retirando-lhe a oportunidade de um juiz imparcial.
Além do mais a função do judiciário é julgar e não esquivar-se de sua atividade,
cabendo, no entanto, que esta atividade seja racionalizada e efetiva, de modo que
entendemos que a solução passa pela reformulação dos prazos decadenciais e
prescricionais, levando em conta o atual estágio tecnológico de que dispõe as
Fazendas Públicas, sem que isto signifique a autorização à invasão autoritária na
privacidade dos contribuintes. Passa também pela avaliação da capacidade de
pagamento do contribuinte, hoje com relativa facilidade verificável, evitando
consumo de recursos em atividades executórias de antemão infrutíferas.
Por fim, apesar de estranho ao terreno do direito, mas cabível do
ponto de vista da lógica deste trabalho que é a de por luz sobre causas que
entulham e tornam ineficiente nosso sistema judicial, entendemos que no campo da
política deve-se atuar na direção e uma reforma tributaria que torne o nosso sistema
mais justo e eficiente evitando o conceito de que para combater a fuga de recursos
devido a sonegação deve-se taxar mais e mais o contribuinte, configurando-se a
nosso ver um autêntico e nefasto ciclo vicioso, onde ninguém ganha e todos
perdem.
Referências
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