módulo ii – conselhos dos direitos no brasil · 71 módulo ii - conselhos dos direitos capítulo...

72
Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil Consultor: Roberto Monte

Upload: phambao

Post on 25-Nov-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

Módulo II – Conselhos dos Direitos no BrasilConsultor: Roberto Monte

Page 2: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

70

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

Capítulo 1Participação e controle social na garantia dos direitos humanos

Em nossa história política, a participação e o controle social1 têm adquirido significados distintos na luta pelaconcretização dos direitos de cidadania. Como direito e prática política, tais conceitos possuem relação deinterdependência, embora, para fins didáticos, serão abordados distintamente.

CCoonnttrroollee SSoocciiaall

Apresentaremos duas formas de abordagem do conceito de controle social. O primeiro, exercido pelo Estadosobre os indivíduos e grupos. Historicamente este controle assumiu várias modalidades e conteúdos, considerandoas especificidades dos modos de produção e os regimes políticos. A história ocidental exemplifica como “ControleSocial” o exercício do Estado nas suas funções clássicas de dominação. O segundo,refere-se à participação socialna elaboração e fiscalização de políticas públicas em contextos democráticos. O controle do Estado sobre osindivíduos ocorre tanto por mecanismos jurídicos e políticos quanto por processos culturais e educativos. Doscastigos, dos mitos e dos processos de socialização até a justiça e a segurança, atravessam dispositivos de controledo Estado. Enquanto em um contexto autoritário, observa-se a redução da participação e o aumento demecanismos de controle, em regime democrático, o processo se inverte. No caso atual do Brasil, a Constituição de1988 assegura juridicamente a participação e o controle social como mecanismos de democratização dos direitoscivis e políticos. Nesse sentido, o termo controle social está intrinsecamente articulado com a democraciarepresentativa, que assegura mecanismos de participação da população na formulação, deliberação e fiscalizaçãodas políticas públicas. Conferências e Conselhos são formas de participação social e mecanismos conquistados paraexercer o controle social.

PPaarrttiicciippaaççããoo

Participação pode ser compreendida como um processo no qual homens e mulheres se descobrem comosujeitos políticos, exercendo os direitos políticos, ou seja, uma prática que está diretamente relacionada àconsciência dos cidadãos e cidadãs, ao exercício de cidadania, às possibilidades de contribuir com processos demudanças e conquistas. O resultado do usufruto do direito à participação deve, portanto, estar relacionado aopoder conquistado, à consciência adquirida, ao lugar onde se exerce e ao poder atribuído a esta participação.

“A participação é requisito de realização do próprio ser humano e para seu desenvolvimento social requerparticipação nas definições e decisões da vida social.” (SOUZA, 1991, p. 83). A participação sempre estevecomprometida com aquilo que Marx e Engels apontam como pressupostos da existência humana: “o primeiro

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Célia Maria Escanfella

2

Page 3: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

71

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos

pressuposto de toda a existência humana e, portanto, de toda a história, é que os homens e mulheres devem estarem condições de viver para poder fazer história. E para viver é preciso antes de tudo comer, beber, ter habitação,vestir-se e algumas coisas mais”.2

Vamos fazer uma rápida viagem pela realidade sóciopolítica brasileira no último século e verificar três formasbásicas de compreender a participação que se fizeram presentes.

AA ppaarrttiicciippaaççããoo ccoommuunniittáárriiaa – surge no início do século XX, compondo a ideologia e a prática dos centroscomunitários norte-americanos. Nesse contexto, “comunidade” significa “agrupamento de pessoas que coabitamem um mesmo meio ambiente, ou seja, compartilham o que se deveria chamar de condições ecológicas deexistência, independente dos fatores estruturais ou conjunturais que lhes dão origem” (CARVALHO, 1995 p.16). NoBrasil desenvolvimentista dos anos 50, as contradições geradas pelo crescimento econômico tornaram-se cada vezmais evidentes: aumento da inflação, arrocho salarial, movimentos reivindicatórios da classe operária por melhorescondições de vida e trabalho, entre outros. Por outro lado, o processo de industrialização neste período, exigia umanova estrutura do mercado de trabalho, uma política de modernização, com ênfase na formação técnica eprofissional competente e na especialização da mão-de-obra. Nesse cenário, a participação consistia em envolveras comunidades na realização de atividades em que o trabalho da população teria uma direção desejável para osistema, quer dizer, deixava intocada a estrutura de classes e as relações de produção e de dominação. Nas décadasde 1950 e 1960, a participação comunitária foi utilizada como dispositivo de controle do Estado em relação aosaglomerados urbanos, como mecanismo de controle social. A medida em que o modelo neoliberal colocouexigências para o Estado, no sentido de reduzir a sua participação na garantia dos direitos e responsabilidadessociais, ocorreu a reedição das antigas práticas de colaboração da sociedade na execução das políticas sociais pormeio do voluntariado com apelo à solidariedade dos cidadãos.3

AA ppaarrttiicciippaaççããoo ppooppuullaarr –– significa a crítica e a radicalização das práticas políticas opositoras ao sistemadominante face ao agravamento das desigualdades sociais. Surge ao final da década de 1960 e se firma na décadade 1970, com a entrada dos novos movimentos sociais, fundamentais para o processo de redemocratização dasociedade e do Estado brasileiro. No período da ditadura militar em 1964, a participação popular caracterizou-secomo estratégia da oposição e expressou a reação da população no regime ditatorial existente naquele momento.

Este período recente da história política brasileira, entre 1964 e 1984, como disse Chico Buarque, foi “umapágina infeliz de nossa história”4. Denominado de “os anos do terror”, o golpe militar inaugurou, em 31 de marçode 1964, o período da Ditadura Militar, também conhecido como os anos de chumbo: colocou, por um lado, aslutas políticas na clandestinidade, e por outro, aprofundou a política da arbitrariedade, usurpou as liberdades,prendeu, torturou e matou centenas de militantes que se dedicavam à causa da defesa e da promoção dos direitossociais, políticos e econômicos. Foi o período dos atos de exceção, quando o controle era exclusivo do Estado sobrea sociedade. Os direitos políticos foram suspensos. Em contrapartida, é desta época o surgimento de novos

3

Page 4: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

72

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

movimentos sociais na luta por melhores condições de vida. Aqui, a categoria “comunidade” é substituída pelacategoria “povo” que significa, de acordo com Carvalho (1995 p.21), um determinado segmento da populaçãoexcluído, marginalizado ou subalternizado no seu acesso aos bens e aos serviços essenciais.

Trata-se de uma população excluída social, econômica e politicamente das decisões do Estado.

Apesar do terror do Estado e da ausência de democracia, os movimentos sociais resistiram e continuaram aslutas por liberdade e por democracia.

Vários movimentos e organizações surgiram na década de 1970, em atos de resistência ao terror do Estado, emdefesa da redemocratização do País e de melhores condições de vida, como:• O movimento contra a alta do custo de vida, liderado especialmente pelas mulheres nas periferias, com o apoio

das organizações eclesiais de base.• O movimento pela anistia dos presos e exilados políticos, a Comissão de Justiça e Paz da arquidiocese de São Paulo.• No final da década de 1970, o movimento dos trabalhadores por melhores salários e contra o desemprego,

culminou com as grandes mobilizações do movimento sindical no ABC (região em volta da cidade de São Pauloformada pelas cidades de Santo André, São Bernardo e São Caetano) o surgimento de lideranças dos trabalhadores.

A saturação da política repressiva do Estado e da ditadura militar, por um lado, e a mobilização contra a ditadurae por liberdade política, de outro, provocou o chamado processo de abertura, que teve nas mobilizações pelaseleições diretas para presidente da república o seu marco político.

A ditadura militar instituíu o processo de eleição indireta, por meio de um colégio eleitoral onde apenas osdeputados e senadores podiam votar no candidato a presidente da república. A campanha por eleições diretas,conhecida como campanha pelas “Diretas Já” foi responsável pela mobilização de milhões de pessoas que forampara as ruas e praças manifestarem-se a favor da eleição direta para presidente da república. A campanha foiderrotada na votação histórica que manteve o colégio eleitoral, mas foi vitoriosa à medida que Tancredo Neves, em1985, foi o último presidente eleito de forma indireta. O povo foi às ruas e resgatou seu direito a votar parapresidente e representantes em todos os níveis.

AA ppaarrttiicciippaaççããoo ssoocciiaall – é a nova modalidade de participação instituída na década de 1980, cuja categoria centralnão é mais “comunidade”, nem “povo”, mas a “sociedade”. A participação da sociedade organizada ocorreu emtodos os níveis de pressão por liberdade e democracia. Nas manifestações de rua, na organização de agrupamentossociais, nas eleições, na organização dos trabalhadores urbanos e rurais, na organização e luta das mulheres contraa discriminação e pela conquista de direitos, dos negros, dos estudantes, enfim, do empresariado, dos políticos,nas mais variadas formas de manifestações. O processo de abertura abriu espaço para uma diversidade deinteresses e de projetos colocados na arena social e política. Teve sua sustentação na grande mobilização pelas

4

Page 5: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

73

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos

“Diretas Já” e na mobilização social dos diversos segmentos da sociedade civil organizada por inclusão, ampliaçãoe universalização dos direitos no processo Constituinte.

A década de 1980 foi, portanto, marcada por grandes mobilizações e profundas modificações nademocratização do País. Isto gerou conquistas e uma delas foi a criação, em 1983, do primeiro conselho dacondição feminina, no âmbito estadual, em São Paulo que estimulou a criação de órgãos similares em todo o País,até mesmo no âmbito nacional. Estes conselhos foram espaços de conquista de cidadania, de participação e decontrole social. No entanto, tinham caráter apenas consultivo e, em alguns casos, de assessoria às políticas públicaspara enfrentamento da discriminação praticada contra as mulheres.

O poder centralizado desde 1930, deu lugar ao processo de participação, descentralização e redesenho do PactoFederativo aprovados na Constituição Federal de 1988, que desenhou a unidade nacional com as subnacionais,com repasse de recursos e autonomia decisória para Estados e municípios, dando novo significado ao controlesocial e à participação da sociedade civil nas decisões políticas.

Com a nova Constituição, os mecanismos de participação e de representação institucionalizam-se e os órgãoscom esta finalidade passam a ser não mais espaços de consulta, mas normativos, definidores de parâmetros edeliberadores de políticas. É o que veremos no próximo capítulo, que abordará o tema: “A constituição de 1988,a democracia participativa e o surgimento dos conselhos”.

Notas1 Para uma melhor compreensão e aprofundamento dos significados de controle social e participação, sugerimos a leitura do

artigo Participação e controle social, Rodriane de Oliveira SOUZA, utilizado para esta apresentação. In: SALES, Mione Apolinário;MATOS, Maurílio Castro; LEAL, Maria Cristina (Org.). (Política social, família e juventude): uma questão de direitos. São Paulo:Cortez, 2004, p. 167-187.

2 MARX, Karl ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã (Feuerbach).3 Este processo tem semelhanças ao que acontece nos dias atuais, conseqüência da política neo-liberal de "Estado Mínimo".4 Música "Vai Passar" - Autor: Chico Buarque de Holanda.

Referências

SOUZA, Maria Luiza. Desenvolvimento de comunidade e participação. 3o ed. São Paulo: Cortez, 1991.

5

Page 6: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

74

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

SOUZA, Rodriane de Oliveira. (Participação e controle social). In: SALES, Mione Apolinário; MATOS, MaurílioCastro; LEAL, Maria Cristina (Org.). Política social, família e juventude: uma questão de direitos. São Paulo:Cortez, 2004, p. 167-187.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã (Feuerbach). São Paulo: Hucitec, 1996.

Sugestão de leitura

SOUZA, Rodriane de Oliveira. Participação e controle social. In: SALES, Mione Apolinário; MATOS, MaurílioCastro; LEAL, Maria Cristina (Org.). Política social, família e juventude: uma questão de direitos. São Paulo:Cortez, 2004, p. 167-187.

6

Page 7: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

75

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 2 - A Declaração Universal de Direitos Humanos e os Sistemas Internacionais de Proteção de Direitos Humanos

Capítulo 2A Constituição de 1988 e a democracia participativa

A palavra democracia (governo do povo) tem origem na Grécia antiga e o princípio democrático tal qualconhecemos hoje tem suas bases nos ideais da igualdade, da liberdade e da fraternidade adotados na RevoluçãoFrancesa, no final do século XVIII.

Em nosso País, como foi mencionado no capítulo anterior, a vivência democrática têm sido enorme desafio econstrução recente, destacando-se o período histórico-político do século XX e mais, enfaticamente, a partir dadécada de 1980.

Democracia e direitos humanos caminham juntos. “Não há democracia sem direitos humanos e não há direitoshumanos sem democracia” (PIOVESAN, 2003).5 No caso do Brasil, a história dos direitos humanos está diretamentevinculada com a história das constituições brasileiras.

A primeira Constituição brasileira data de 1824 – a Constituição Imperial, outorgada6, e apesar de concentrarmuitos poderes nas mãos do imperador – a prerrogativa para intervir, não sem protestos, nos Poderes Executivo,Legislativo e Judiciário – trás os primeiros registros da inviolabilidade dos direitos civis e políticos e a consagraçãodos Direitos Humanos no Brasil.

Com a proclamação da República, em 1889, surgiu a primeira Constituição Republicana, datada de fevereiro de1891, inspirada na Constituição dos Estados Unidos da América. Aproximadamente 100 artigos estabelecem aforma de Estado (Federação); a forma de governo (República); e o sistema de governo (Presidencialismo). Do pontode vista dos direitos humanos, manteve aqueles poucos consagrados na Constituição Imperial e os ampliou, porexemplo, com o estabelecimento do voto direto para deputados, senadores, presidente e vice-presidente darepública. No entanto, à apenas alguns setores da população era conferido este direito. Apesar de ter abolido aexigência de renda como critério de exercício dos direitos políticos, determinou que os mendigos, os analfabetos,os religiosos, não poderiam exercer tais direitos políticos (Samanieco, 2000).

Em 1934, o País conquistou sua primeira “Constituição social”. Após a revolução constitucionalista de 1932, foinomeada pelo governo provisório uma comissão para elaborar o projeto de constituição. Com pouca participaçãopopular, a Constituição de 1934 introduziu algumas garantias individuais; assegurou direitos sociais aos cidadãos,notadamente direitos trabalhistas, tais como proibição de diferença de salário para um mesmo trabalho, em razãode idade, sexo, nacionalidade ou estado civil; proibiu o trabalho para menores de 14 anos de idade, noturno para

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Célia Maria Escanfella

7

Page 8: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

os menores de 16 anos e insalubre para menores de 18 anos e para mulheres; determinou a estipulação de umsalário mínimo capaz de satisfazer às necessidades do trabalhador, o repouso semanal remunerado e a limitaçãode trabalho a oito horas diárias, entre outras garantias sociais. Para as mulheres esta constituição foi um marco amedida que instituiu o Voto Feminino. No entanto, esta Constituição teve vida curta de apenas 3 anos!

No período de 1937 a 1945, sob inspiração nazi-fascista, nosso País viveu a “ditadura de Vargas”. A Constituiçãodo “Estado Novo”, de 10 de novembro de 1937, suprimiu as liberdades, centralizou o poder no Presidente daRepública, instituiu os tribunais de exceção. Este período foi abordado recentemente no filme “Olga” que retratatanto a luta pela liberdade e direitos sociais, quanto as barbaridades praticadas pelo terror do Estado e a relaçãocom a ordem nazi-fascista. O mundo vivia o pesadelo da Guerra e como diz Piovesan “a Segunda Guerra trouxe aruptura com os direitos humanos e o Pós-Guerra trouxe a leitura da sua reconstrução”7.

As liberdades políticas e os direitos humanos foram reconquistados e ampliados com a Constituiçãoredemocratizadora de 1946 (dois anos antes da Declaração Universal dos Direitos Humanos). Entre outros direitosampliados, o trabalho noturno a menores de 18 anos foi proibido, institucionalizou-se o direito de greve, houvefortalecimento da Federação. A Constituição redemocratizadora vigora por quase 20 anos até o golpe militar.

Em 1964, o Brasil sofre mais um golpe no processo democrático e, em conseqüência, os direitos humanos e asliberdades são novamente usurpados. Passam a vigorar os Atos Institucionais com punições e arbitrariedades, tendono AI-5 a expressão máxima do terror e do medo provocado pela ditadura militar. A tortura, a ausência deliberdade, as perseguições e assassinatos políticos marcaram este período.

““O Brasil estava salvo do comunismo! Os crioulos não invadiriam mais as casas das pessoas de bem!”

“As empregadinhas voltariam a ficar de cabeça baixa!”

GGeenneerraall HHuummbbeerrttoo ddee AAlleennccaarr CCaasstteelllloo BBrraannccoo8

JJoorrnnaalliissttaa:: Se o Sr. Ganhasse um Salário mínimo, o que faria?JJooããoo FFiigguueeiirreeddoo9:: Dava um tiro na cabeça!

O aparato legal deste cenário político foi garantido na Constituição de 1967 e posteriormente na Constituiçãode 1969 que incorporou as arbitrariedades dos Atos Institucionais.

Ao final da década de 1970, por pressão dos movimentos sociais na luta por direitos, liberdade e democracia,o País conquista a Anistia por meio da Lei nº. 6.683 de 28 de agosto de 1979 que inicia o processo de aberturapolítica que culmina, em 1985, com a queda do Regime Militar e a emenda constitucional no 25 a qual convocaas eleições para a Assembléia Nacional Constituinte.

76

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

1964

1985

8

Page 9: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

77

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 2 - A Declaração Universal de Direitos Humanos e os Sistemas Internacionais de Proteção de Direitos Humanos

AA CCoonnssttiittuuiiççããoo CCiiddaaddãã10 ddee 11998888

O Brasil, como vimos, desde a independência é regido por Constituições que ao longo da história refletiram asdiferentes dimensões e o conceito dos direitos humanos.

A Constituição Federal de 1988 é um marco! Segundo Piovesan, é um marco simbólico que reinventa a nossacidadania, é o marco da transição democrática e da nacionalização dos direitos humanos no país.11

Em seu preâmbulo, a Constituição de 1988, institui o Estado Democrático de Direito destinado a assegurar oexercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade ea justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmoniasocial. Estabelece em seu primeiro artigo, o fortalecimento da Federação, formada pela união indissolúvel dosEstados e Municípios e do Distrito Federal, declara seus princípios fundamentais e afirma a soberania popular. Alémde instituir como novo paradigma, a democracia participativa.

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípiose do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:I - a soberaniaII - a cidadaniaIII - a dignidade da pessoa humanaIV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativaV - o pluralismo políticoParágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos oudiretamente, nos termos desta Constituição. (CONSTITUIÇÃO FEDERATIVA DO BRASIL, 1988)

Garantiu entre seus princípios fundamentais a redução das desigualdades, considerando a diversidade sexual,de raça, geração, e o combate a qualquer forma de discriminação, expressos em seus artigos terceiro e quinto.

Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:I - Constituir uma sociedade livre, justa e solidáriaII - Garantir o desenvolvimento nacionalIII - Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionaisIV - Promover o bem de todos, sem preceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outrasformas de discriminação. (CONSTITUIÇÃO FEDERATIVA DO BRASIL, 1988)

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aosbrasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, àigualdade, à segurança e à propriedade. (CONSTITUIÇÃO FEDERATIVA DO BRASIL, 1988)

9

Page 10: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

Além disso, nossa Constituição Cidadã, primou pela garantia dos direitos humanos, dos direitos sociais epolíticos, em seus artigos 5º ao 11º e do 14º ao 16º. É, sem dúvida, um novo paradigma no arcabouço jurídico edemocrático brasileiro.

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, aprevidência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na formadesta Constituição. (CONSTITUIÇÃO FEDERATIVA DO BRASIL, 1988)

Segundo Moroni, “a Constituição Federal de 1988 inova em aspectos essenciais, especialmente no que serefere à gestão das políticas públicas, por meio do princípio da descentralização político-administrativa,alterando normas e regras centralizadoras e distribuindo melhor as competências entre o poder central(União), poderes regionais (Estados e Distrito Federal) e locais (municípios). Com a descentralização, tambémaumenta o estímulo à maior participação das coletividades locais – sociedade civil organizada –, criandomecanismos de controle social”12.

Estes são alguns dos motivos porque a Constituição de 1988 é considerada como a mais democrática dentretodas aquelas constituições brasileiras.

Se a participação popular institucionaliza-se a partir da Constituição de 1988, sua efetividade já vinha sendoconstruída no período pré - Constituição e consolida-se durante os anos 1990.

Os movimentos sociais mobilizaram-se e participaram ativamente na elaboração do texto constitucional. Asmulheres, por exemplo, tiveram seus direitos assegurados e ampliados, como a licença-maternidade, a introduçãoda licença-paternidade e a perspectiva jurídica da igualdade de direitos.

O movimento de defesa dos direitos de crianças e de adolescentes, por exemplo, apresentou proposta com 1,5 milhãode assinaturas que referendou a emenda popular responsável pelo artigo 227, base para posterior elaboração do Estatutoda Criança e do Adolescente. Dessa forma, crianças e adolescentes conquistaram na lei o status de sujeito de direitos e aprimazia no atendimento. A instituição do crime de racismo foi uma decorrência da Constituição de 198813.

AA DDeemmooccrraacciiaa ppaarrttiicciippaattiivvaa

Todo cidadão possui direitos políticos garantidos na Constituição Federal de 1988. O principal direito político eo mais exercido por todos é o direito de votar e ser votado. Mas a participação da população não se limita ao votopara a escolha de seus representantes no Poder Executivo e no Poder Legislativo. A Constituição de 1988possibilitou participação dos cidadãos e cidadãs nos rumos da cidade, Estado e País.

78

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

10

Page 11: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

79

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 2 - A Declaração Universal de Direitos Humanos e os Sistemas Internacionais de Proteção de Direitos Humanos

Estão previstos no artigo 14 da Constituição Federal, o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular, tambémcomo direitos políticos.

Art. 14 – A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, comvalor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:I - PlebiscitoII - ReferendoIII - Iniciativa Popular. (CONSTITUIÇÃO FEDERATIVA DO BRASIL, 1988)

Estes direitos políticos foram regulamentados apenas dez anos após a promulgação da Constituição Federal de1988, com a publicação da Lei nº 9.709 de 18 de novembro de 1998. O primeiro exemplo de plebiscito no Paísocorreu em 1993 quando a população foi consultada sobre o tipo de governo que o Brasil deveria adotar(presidencialismo, parlamentarismo ou monarquia).

O Plebiscito é a consulta inicial ao cidadão, sobre como deve o Poder Legislativo agir em relação a determinadoassunto. Esta definição consta da Lei nº 9.709/98, no artigo 2º.

O Referendo é outra forma de consulta popular na qual o povo manifesta-se sobre uma lei após ela estarconstituída. Neste caso o cidadão deverá apenas ratificar ou rejeitar o que lhe é submetido. Um exemplo foi aproibição do comércio de armas de fogo e munição no Brasil rejeitada por quase dois terços dos eleitores, emreferendo no dia 23 de outubro de 2005.

A Iniciativa Popular também foi regulamentada na lei nº 9.709/98, sendo que são requisitos para suaimplementação:

• A apresentação de projeto de lei sobre determinado assunto específico.• Assinatura de, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com

não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.

Para dar viabilidade a este direito, a Câmara dos Deputados criou a Comissão Permanente de LegislaçãoParticipativa, que acolhe as iniciativas populares.

QQuueemm ppooddee aapprreesseennttaarr ssuuggeessttõõeess LLeeggiissllaattiivvaass??

Associações e órgãos de classe, sindicatos e entidades da sociedade civil, exceto partidos políticos. Desde quetenham participação paritária da sociedade civil, também podem apresentar Sugestões Legislativas aos órgãos e àsentidades da administração pública direta e indireta, como o Conselho Nacional de Saúde, o Conselho Nacional deAssistência Social etc. Não é permitida esta iniciativa aos organismos internacionais.

11

Page 12: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

Se o significado de democracia é governo do povo, sem a garantia de participação da população não existedemocracia de fato. Sem a sociedade organizada participando das questões estatais, há sempre o risco para queregimes autoritários surjam e ocorram retrocessos nos direitos conquistados.

Nessa perspectiva, a Constituição Federal de 1988, ao incorporar os direitos humanos e a democracia plena emnosso País, impôs ao legislativo a regulamentação de tais direitos e o incentivo de uma participação cada vez maiordos cidadãos e cidadãs.

É com este intuito que a partir de 1988 os vários setores da sociedade organizada pressionam e colaboram naelaboração e aprovação das legislações complementares, com objetivo de regulamentar e aprofundar os direitoshumanos, os direitos sociais e a democracia participativa.

AA iinnssttiittuucciioonnaalliizzaaççããoo ddooss ccoonnsseellhhooss

Em 1990, a Lei Federal nº 8.142, que dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Únicode Saúde e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outrasprovidências, cujo primeiro artigo diz que:

Art. 1º O Sistema Único de Saúde (SUS), de que trata a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990,contará, em cada esfera de governo, sem prejuízo das funções do Poder Legislativo, com asseguintes instâncias colegiadas:I - a Conferência de Saúde; eII - o Conselho de Saúde.§ 1º A Conferência de Saúde reunir-se-á a cada quatro anos com a representação dos váriossegmentos sociais, para avaliar a situação de saúde e propor as diretrizes para a formulação dapolítica de saúde nos níveis correspondentes, convocada pelo Poder Executivo ou,extraordinariamente, por esta ou pelo Conselho de Saúde.§ 2º O Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto porrepresentantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na formulaçãode estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nosaspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmenteconstituído em cada esfera do governo.(CONSTITUIÇÃO FEDERATIVA DO BRASIL, 1988)

80

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

Notas5 Anais da V Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – Brasília 2003, palestra de Flávia Piovesan.6 Constituição outorgada: é redigida e imposta pelo poder governante, normalmente monarcas absolutistas, ditadores e juntas golpistas.

12

Page 13: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

81

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 2 - A Declaração Universal de Direitos Humanos e os Sistemas Internacionais de Proteção de Direitos Humanos

Referências

LYRA, Rubens Pinto, OOss ccoonnsseellhhooss ddee ddiirreeiittooss ddoo hhoommeemm ee ddoo cciiddaaddããoo ee aa ddeemmooccrraacciiaa ppaarrttiicciippaattiivvaa, textodisponível em: http://www.dhnet.org.br/w3/ceddhc/ceddhc/rubens2.htm

MORONI, José Antônio, PPaarrttiicciippaammooss,, ee ddaaíí?? - Artigo publicado pelo Observatório da Cidadania, membro doColegiado de Gestão do Instituto Nacional de Estudos Socioeconômicos - Inesc, dezembro de 2005.

BOBBIO, N. OO ffuuttuurroo ddaa ddeemmooccrraacciiaa. Rio e Janeiro: Paz e Terra, 1986.

______. Crise e redefinição do Estado brasileiro. In: LESBAUPIN, I; PEPPE, A. (Orgs.). RReevviissããoo ccoonnssttiittuucciioonnaall eeEEssttaaddoo ddeemmooccrrááttiiccoo. Rio de Janeiro: Centro João XXIII, 1993.

FALCÃO, M. C. A seguridade na travessia do Estado Assistencial Brasileiro. In: SPOSATI, A. et al. Os direitos(dos desassistidos) sociais. São Paulo: Cortez, 1991.

RAICHELIS, Raquel. A construção da esfera pública no âmbito da política de assistência social. Tese(Doutorado em Serviço Social). São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1997.

SOUZA FILHO, R. Rumo à democracia participativa. 1996. Dissertação (Mestrado em Serviço Social), Escolade Serviço Social, Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro.

SAMANIEGO, Daniela Paes Moreira. Direitos humanos como utopia. JJuuss NNaavviiggaannddii, Teresina, a. 4, n. 46, out.2000. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=76.

ANAIS DA V CONFERÊNCIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - Brasília 2003,palestra de Flávia Piovesan. Disponível em: http://www.mj.gov.br/sedh/ct/conanda/anais.pdf

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - disponível em: http://www.presidencia.gov.br/CCIVIL/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm

LEI FEDERAL 8142 - Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS - disponível em:http://portalweb05.saude.gov.br/portal/saude/area.cfm?id_area=169

7 Anais da V Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – Brasília 2003, palestra de Flávia Piovesan.8 Primeiro presidente do regime militar.9 Último presidente do regime militar.10 Nome dado por Ulysses Guimarães à Constituição Federal de 1988.11 Idem.12 Moroni, José Antônio, PPaarrttiicciippaammooss,, ee ddaaíí??- artigo publicado pelo Observatório da Cidadania, membro do Colegiado de Gestão do

Instituto Nacional de Estudos Socioeconômicos – Inesc, dezembro de 2005, disponível no site: http://www.ibase.br/pubibase/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1183&sid=127

13 Anais da V Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente - Brasília 2003, palestra de Flávia Piovesan.

13

Page 14: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

82

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os Capítulo 3

Controle Social e Conselhos de Direitos no Brasil

O processo constituinte aprofundou a questão colocada pelo movimento social ao final da década de 1970 einício dos anos 1980 sobre a democratização do Estado e os mecanismos necessários para torná-lo público.Segundo Moroni, o movimento trás para o processo constituinte, além da democratização e publicização doEstado, a necessidade de controle social, em cinco dimensões: formulação, deliberação, monitoramento, avaliaçãoe financiamento das políticas públicas”14.

A Constituição de 1988 apresentou grandes avanços em relação aos direitos sociais, introduziu instrumentos dedemocracia direta (plebiscito, referendo e iniciativa popular), instituiu a democracia participativa e abriu apossibilidade de criação de mecanismos de controle social, como, por exemplo, os conselhos de direitos, depolíticas e de gestão de políticas sociais específicas.

Os conselhos como mecanismos de participação e de legitimidade social iniciam-se no Brasil, segundo Gohn,como fruto da organização e das lutas sociais. A mediação povo-poder por meio dos conselhos como esferaspúblicas de exercício do poder no Brasil, surgem nas décadas de 1970-90 (Gohn-1995). Dentre os tipos básicos deconselhos criados ao longo desse período, destaca a autora, alguns aparecem na cena política a partir da iniciativapopular ainda no contexto ditatorial, a exemplo dos conselhos comunitários, e outros foram criados por exigênciasconstitucionais e legais, como os conselhos de políticas públicas e os de direitos.

É com o retorno do exercício dos direitos civis e políticos que os conselhos como esferas públicas entram emcena na institucionalidade democrática, como mecanismos institucionais de participação da sociedade civilorganizada. A Constituição de 1988 cria as condições jurídico-políticas para a criação e funcionalidade de órgãosde natureza plurirepresentativa com função de controle social e de participação social na gestão da coisa pública.

Os conselhos de políticas públicas e de direitos são, portanto, formas concretas de espaços institucionais deexercício da participação social.

Segundo Frischeisen, “a implementação efetiva dos direitos depende da realização de políticas públicas, cujas linhasgerais estão previstas na Constituição Federal, assim como a participação popular na elaboração na formulação, dentreoutras, das políticas públicas da saúde, assistência social, educação e direitos da criança e do adolescente. Essaparticipação ocorre por meio dos conselhos respectivos, em especial dos Conselhos Municipais, aqueles que maispróximos estão dos interesses da comunidade, que são, portanto, gestores de políticas públicas”.15

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Célia Maria Escanfella

14

Page 15: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

83

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

osArzab enfatiza a necessidade de “leis, regulamentos e medidas públicas de promoção e fortalecimento desses

direitos, e os direitos sociais podem somente ser realizados por meio das políticas públicas, que fixam de maneiraplanejada diretrizes e os modos para a ação do Poder Público e da sociedade”.16

Os conselhos institucionalizados a partir da Constituição de 1988 são órgãos colegiados, permanentes,consultivos ou deliberativos, incumbidos, de modo geral, da formulação, da supervisão e da avaliação das políticaspúblicas de garantia dos direitos humanos, em âmbito federal, estadual e municipal.

Se em âmbito nacional os conselhos de políticas públicas como saúde, educação e outros foram paulati-namentecriados como órgãos de gestão e de monitoramento da gestão das políticas sociais, no campo dos conselhos dedireitos e defesa dos direitos humanos, só após a Constituição Cidadã de 1988 com a institucionalização do EstadoDemocrático de Direito é que os órgãos de defesa dos direitos humanos ampliam-se na cena política brasileira.

No âmbito nacional, no campo dos direitos humanos, pelo menos dois destes conselhos merecem referência porsua criação pioneira, anterior à Constituição de 1988. São eles: o Conselho de Defesa dos Direitos da PessoaHumana e o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher.

O Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, de âmbito nacional foi criado através da Lei 4.319 esancionada em 16 de março de 1964, numa conjuntura política crítica, anterior ao golpe militar de 31 de marçode 1964. Com o processo ditatorial, desfavorável ao exercício dos direitos civis e políticos, o CDDPH figurou pormuito tempo com funções legais de promoção e defesa dos direitos humanos impossíveis de efetuação, tais como:

Intervir na promoção, defesa e divulgação dos direitos da pessoa humana (...) receber representaçõesou denúncias de violações de direitos humanos (...) determinar diligências (...) promover inquéritos einvestigações em qualquer parte do país (...) tomar depoimentos de autoridades (...)inquirirtestemunhas (...) requisitar às repartições públicas e os agentes públicos informações e documentos(...) transportar-se para lugares onde se fizer mister a sua presença.(ESPINOLA, 1996).

Sua instalação só ocorreu em 24 de outubro de 1968, mas sua atuação foi muito restrita no período ditatorial,vez que as denúncias de violações eram prontamente arquivadas. Durante o período da “Nova República”, segundoEspínola, é que o CDDPH começou a receber as denúncias de violações de direitos humanos. Mas somente após aConstituição Federal, a partir de 1993, o conselho passou a ter um importante papel na articulação com asociedade civil no sentido de avançar a legislação interna de proteção dos direitos humanos e os encaminhamentosde adesão aos mecanismos internacionais de proteção dos direitos humanos.

O Conselho Nacional dos Direitos da Mulher surge a partir das lutas e das reivindicações dos movimentos sociaisfeministas e de mulheres impulsionado na década de 1970 com a instituição do Ano Internacional da Mulher, em

Capítulo 3 - Controle Social e Conselhos de Direitos no Brasil

15

Page 16: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

84

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os 1975, pela ONU. “Em agosto de 1985, finalmente, foi atendida a histórica reivindicação das mulheres e criado o

Conselho Nacional de Políticas para as Mulheres (CNDM), vinculado ao Ministério da Justiça, com o objetivo de“promover em âmbito nacional, políticas que visem a eliminar a discriminação da mulher, assegurando-lhecondições de liberdade e igualdade de direitos, bem como sua plena participação nas atividades políticas,econômicas e culturais do país”. A mesma lei cria o Fundo Especial de Direitos da Mulher que dotaria o CNDM dosrecursos necessários para o desenvolvimento de suas atividades. A estrutura do CNDM era, então: ConselhoDeliberativo, Assessoria Técnica e Secretaria Executiva”.17

No período pré-Constituição, o CNDM articulou junto com os movimentos feministas e de mulheres, osconselhos estaduais e municipais e a Bancada Feminina no Congresso Nacional, estratégias visando a inclusão dosdireitos humanos das mulheres na Constituição de 1988. A campanha “Constituinte para valer tem que ter palavrade mulher” e o “lobby do batom” resultaram na “Carta das Mulheres aos Constituintes” e em 1988 a novaConstituição incorporou a maioria das reivindicações deste movimento.18

Em comum, estes dois conselhos são órgãos colegiados, de caráter consultivo e integrantes respectivamente daestrutura da Secretaria Especial dos Direitos Humanos e da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, ambosda Presidência da República, com status de Ministérios.

Entre os conselhos ancorados ou criados a partir da Constituição de 88, vale uma distinção a quatro que foramregulamentados por meio de legislação ordinária. São eles os conselhos de saúde, de assistência social, dos direitosda criança e do adolescente e do idoso. Estes conselhos, como destaca Arzabe, “são caracterizados pelo poderdeliberativo de todas as suas atribuições. Seja de formulação de políticas, seja de controle ou de avaliação e implicaa vinculação do governo em cada uma das instâncias as deliberações do colegiado”.

Nos próximos capítulos, falaremos um pouco mais sobre as características e as atribuições dos conselhos dedireitos.

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

Notas14 Participamos, e daí?- artigo de José Antônio Moroni, membro do Colegiado de Gestão do Instituto Nacional de Estudos

Socioeconômicos – Inesc, dezembro de 2005. 15 Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, “Políticas Públicas: Planejamento, Desenvolvimento e Fiscalização - Conselhos Gestores e

Democracia Participativa — O papel do Ministério Público”, disponível no site: http://www.dhnet.org.br/direitos/textos/politicapublica/luizacf.htm

16

Page 17: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

85

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 3 - Controle Social e Conselhos de Direitos no Brasil

16 Arzabe, Patrícia Helena Massa, Conselhos de Direitos e Formulação de Políticas Públicas, disponível no site:http://www.dhnet.org.br/direitos/textos/politicapublica/patriciamassa.htm

17 CNDM – Breve Histórico – site da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, disponível:http://www.presidencia.gov.br/spmulheres/cndm

18 Histótico do CNDM

Referências

GOHN, M. G. M. História dos movimentos e lutas sociais. São Paulo: LOYOLA, 1995.

MORONI, José Antônio. Participamos, e daí?- artigo publicado pelo Observatório da Cidadania, membro doColegiado de Gestão do Instituto Nacional de Estudos Socioeconômicos - Inesc, dezembro de 2005.,

FRISCHEISEN, Luiza Cristina Fonseca. Políticas públicas: planejamento, desenvolvimento e fiscalização –Conselhos Gestores e Democracia Participativa – O papel do Ministério Público, disponível em:http://www.dhnet.org.br/direitos/textos/politicapublica/luizacf.htm

ARZABE, Patrícia Helena Massa. Conselhos de direitos e formulação de políticas públicas, disponível em:http://www.dhnet.org.br/direitos/textos/politicapublica/patriciamassa.htm

LYRA, Rubens Pinto. Os conselhos de direitos do homem e do cidadão e a democracia participativa .Disponívelem: http://www.dhnet.org.br/w3/ceddhc/ceddhc/rubens2.htm

"CNDM - Breve Histórico" – site da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República.

"Histórico do CNDCM" – Disponível em: http://www.wmulher.com.br/template.asp?canal=etiqueta&id_mater=2660

17

Page 18: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

86

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os Capítulo 4

Natureza jurídica dos conselhos dos direitos e a legislação complementar

A natureza jurídica dos conselhos está ancorada nos dispositivos constitucionais que instituem a democraciaparticipativa e asseguram a participação popular na gestão da coisa pública, na formulação e no controle daspolíticas, na defesa dos direitos humanos e na distribuição e aplicação dos recursos. Em todo o texto constitucionalestão presentes mecanismos que institucionalizam o controle social participativo da gestão pública pelos cidadãose cidadãs.19 Os conselhos dos direitos constituem-se em uma das formas de participação e controle socialassegurados nos dispositivos constitucionais.

Este novo paradigma do Estado Democrático de Direito que valoriza e institucionaliza a participação e ocontrole social, para que se efetive, exige uma mudança da cultura política brasileira e o rompimento com atradição autoritária, patrimonialista, de desigualdades e exclusão sociais presentes na vida da populaçãobrasileira por séculos, refletida no modelo de Estado autocrático e centralizador. É, portanto, enorme desafio,quase uma revolução na relação Estado e sociedade e na gestão da coisa pública. Um desafio que vale a pena,pois este novo paradigma é uma das maiores conquistas da sociedade brasileira em sua história políticacontemporânea.

Considerando que as políticas sociais existem para garantir os direitos humanos fundamentais à vida, à saúde,à educação, à liberdade, entre outros, a existência dos conselhos dos direitos e seu funcionamento eficaz cumpreum papel fundamental na formulação e controle dessas políticas e, por sua vez, na promoção, controle e defesadesses direitos, zelando para que eles não sejam violados. Os conselhos são espaços em que a sociedade e governodialogam, negociam, deliberam e devem ter sempre a perspectiva da garantia destes direitos.

Para cumprir o que determina nossa Lei Maior, com a participação e muitas mobilizações sociais, foramelaboradas e aprovadas pelo Congresso Nacional, Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores algumaslegislações complementares, que reafirmam direitos e asseguram a participação na gestão e controle das políticas.É exemplo disso, a Lei nº 8.069 (Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA) que regulamenta entre outros o artigo227 da Constituição e torna obrigatória a criação dos conselhos dos direitos da criança e do adolescente em todosos níveis da Federação (nacional, estadual, distrital e municipal).

Do ponto de vista de sua natureza jurídica o Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente20, é um órgãoestatal especial (não só governo, nem somente sociedade civil), isto é, são espaços públicos institucionais. E não

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Maria Letícia Puglisi Mulhoz

18

Page 19: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

87

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

osinstâncias da sociedade civil ou do governo. Devem ser compostos de forma paritária por agentes públicos

(representantes governamentais e não-governamentais), e seus atos são emanados de decisão coletiva e não deagente singular.

Outro importante exemplo que regulamenta dispositivos constitucionais é a Lei Federal nº 8.842, de 4 de janeirode 1994, que dispõe sobre a Política Nacional do Idoso, cria o Conselho Nacional do Idoso e dá outras providências.Em seu artigo 6º estabelece que: “os conselhos nacional, estaduais, do Distrito Federal e municipais do idoso serãoórgãos permanentes, paritários e deliberativos, compostos por igual número de representantes dos órgãos eentidades públicas e de organizações representativas da sociedade civil ligadas à área”.

Apesar de apresentarem-se com características semelhantes, os Conselhos dos Direitos não são órgãosgovernamentais, isto é, não são organismos que pertencem ao governo, nem tampouco são estruturados pornormas específicas da administração pública (seus membros não são servidores públicos, por exemplo, que sãoadmitidos por meio de concursos públicos), como também não são associações.

Os conselhos integram a estrutura básica do poder executivo, da secretaria ou órgão da área social, possuindofinalidade vinculada a estes órgãos, mas criam estruturas jurídicas próprias, tendo composição e organizaçãofixadas em legislação específica. E, para atender aos preceitos constitucionais, é fundamental garantir a autonomiapolítica.

Os conselhos são, portanto, órgãos estatais especiais, ou mais amplamente, “espaços públicos institucionais”.Daí a razão de se dizer que os Conselhos dos Direitos são instituições inovadoras em sua natureza jurídica.

Esta condição não permite que a criação dos Conselhos dos Direitos Municipais, Estaduais e Nacionais sejafacultativa, ou seja, que ocorra a partir da vontade de alguns interessados que se agrupam e criam uma entidadepara a defesa destes interesses. Ao contrário, a sua criação é obrigatória em determinação de legislaçãocomplementar. Isto significa que, todos os municípios têm de criar e de fazer funcionar os seus Conselhos. Estessão criados a partir de uma atribuição do Poder Executivo de elaborar o projeto de lei da criação do Conselho eencaminhá-lo ao Poder Legislativo para aprovação. No caso de omissão do Poder Executivo, o Ministério Públicopoderá instaurar inquérito civil. Deve-se ressaltar que, em casos de omissão, a sociedade civil deve provocar esensibilizar o poder executivo para esta iniciativa legislativa.

Em 1999, onze anos após a promulgação da Constituição Federal, pesquisa do IBGE já demonstrava a existênciade milhares de conselhos municipais diretamente relacionados às políticas públicas, espalhados pelo País21.Destaque-se que nos casos dos conselhos da saúde, assistência social, educação e da criança e adolescente, suacriação é obrigatória por lei ordinária, em todos os municípios.

Capítulo 4 - Natureza jurídica dos conselhos dos direitos e a legislação complementar

19

Page 20: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

Alguns exemplos de legislação complementar que determina a criação dos Conselhos dos Direitos são:

•• CCDDDDPPHH - Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana - LEI Nº 4.319 - DE 16 DE MARÇO DE 1964. Criao Conselho de Defesa dos direitos da Pessoa Humana.

•• CCOONNAANNDDAA - Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente Lei Federal nº 8.242, de 12 de outubrode 1991. Cria o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) e dá outrasprovidências.

•• CCNNDDII - Conselho Nacional dos Direitos do Idoso - LEI Nº 8.842, DE 4 DE JANEIRO DE 1994. Dispõe sobre aPolítica Nacional do Idoso, cria o Conselho Nacional do Idoso e dá outras providências - artigos 5 a 7. DECRETONº 4.227, DE 13 DE MAIO DE 2002. Cria o Conselho Nacional dos Direitos do Idoso - CNDI, e dá outrasprovidências Revogado pelo Decreto nº 5.109, de 2004.

•• CCOONNAADDEE - Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência. Decreto nº 3.298/99 de 20 dedezembro de 1999 que regulamentou a Lei nº 7.853/89.

•• CCNNCCDD - Conselho Nacional de Combate a Discriminação DECRETO Nº 3.952, DE 4 DE OUTUBRO DE 2001.Dispõe sobre o Conselho Nacional de Combate à Discriminação.

•• CCNNDDMM - Conselho Nacional dos Direitos da Mulher LEI Nº 7.353, DE 29 DE AGOSTO DE 1985. Cria o ConselhoNacional dos Direitos da Mulher - CNDM e dá outras providências.

•• CCNNPPIIRR - Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial. Artigo 3, parágrafo único da LEI Nº 10.678, DE23 DE MAIO DE 2003 que cria a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, da Presidênciada República, e dá outras providências e Decreto nº 4.885, de 20 de novembro de 2003 que dispõe sobre acomposição, estruturação, competências e funcionamento do Conselho Nacional de Promoção da IgualdadeRacial - CNPIR, e dá outras providências.

88

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os NNúúmmeerroo ddee ccoonnsseellhhooss mmuunniicciippaaiiss ppoorr ttiippoo

Tipos de conselhos Número existente Saúde 5.425 Assistência social 5.036 Educação 5.010 Criança / adolescente 3.948 Trabalho / emprego 1.669 Meio ambiente 1.176 Turismo 858 Habitação 439 Transporte 228 Política urbana 188

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

20

Page 21: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

89

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 4 - Natureza jurídica dos conselhos dos direitos e a legislação complementar

Notas19 BORGES, Alice Maria Gonzalez. Democracia participativa. Reflexões sobre a natureza e a atuação dos conselhos representativos

da sociedade civil. Jus Navigandi, Teresina, a. 10, n. 917, 6 jan. 2006. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=775220 Conforme resolução 106 do Conanda – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, os conselhos dos direitos

da criança e do adolescente possuem natureza de órgãos estatais especiais, isto é, são instâncias públicas essencialmentecolegiadas e estão conceituados juridicamente no inc. II do art. 204 da Constituição Federal e no inc. II do art. 88 da Lei Federalnº 8.069/90(Estatuto da Criança e do Adolescente) como órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis,assegurada a participação popular paritária por meio de organizações representativas, segundo leis federal, estaduais, municipaise do Distrito Federal. Disponível em: http://www.mj.gov.br/sedh/ct/conanda/resolucao106_2005.htm

21 FONTE: IBGE. Diretoria de Pesquisas. Departamento de População e Indicadores Sociais. Pesquisa de Informações BásicasMunicipais 1999 – quadro extraído do artigo Conselhos de Políticas, CUNHA, Eleonora Schettini Martins, JARDIM, Laura Silva.Disponível em: http://www.democraciaparticipativa.org/Paginas/instituicoes.htm

Referências

BORGES, Alice Maria Gonzalez. Democracia participativa. Reflexões sobre a natureza e a atuação dos consel-hos representativos da sociedade civil. JJuuss NNaavviiggaannddii, Teresina, a. 10, no. 917, 6 jan. 2006. Disponível em:http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7752

NOGUEIRA Neto, Wanderlino. DDiirreeiittooss hhuummaannooss ddaa iinnffâânncciiaa ee ddaa aaddoolleessccêênncciiaa nnoo SSIIPPIIAA. Fortaleza: CEDECA, 2004.

21

Page 22: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

Capítulo 5Caracterização dos conselhos em âmbito

nacional, estadual e municipal

Como já foi mencionado, os conselhos são novos arranjos institucionais definidos na legislação ordinária paraconcretizar a participação e controle social preconizados na Constituição Federal de 1988. São organismos quearticulam participação, deliberação e controle do Estado. Suas características e atribuições são definidas nalegislação ordinária.

“Os conselhos de direitos, também denominados conselhos de políticas públicas ou conselhos gestores depolíticas setoriais, são órgãos colegiados, permanentes e deliberativos, incumbidos, de modo geral, da formulação,supervisão e da avaliação das políticas públicas, em âmbito federal, estadual e municipal”.22

O caráter deliberativo está assegurado no princípio da participação popular na gestão pública, consagrado naConstituição de 1988, e são instituições cujo sentido é a partilha do poder decisório e a garantia de controle socialdas ações e políticas com fins da garantia de direitos conquistados. Portanto, conselhos são espaços deliberativose de controle social da coisa pública. No entanto, nem todas as legislações ordinárias consideraram este aspectoao definirem a criação e as competências dos conselhos dos direitos.

“Conselhos são instâncias permanentes, sistemáticas, institucionais, formais e criadas por lei com competênciasclaras” (2000, p.24). Além disso, devem ser órgãos colegiados, paritários e deliberativos, com autonomia decisória.Alguns exemplos de legislação ordinária que dispõe sobre conselhos de políticas, de segmentos e temáticos comoa Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seuartigo 88, inciso II, torna obrigatória a existência de conselhos dos direitos da criança e do adolescente em todosos níveis da Federação, destacando-se o caráter deliberativo e controlador das ações, assegurada a participaçãoparitária.

Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente

Art. 88. São diretrizes da política de atendimento:II - criação de conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente,órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, assegurada a participaçãopopular paritária por meio de organizações representativas, segundo leis federal, estaduais emunicipais. (ECA, 1997)

90

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Maria Letícia Puglisi Mulhoz

22

Page 23: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

91

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 5 - Caracterização dos conselhos em âmbito nacional, estadual e municipal

A Lei Federal nº 8.842 de 4 de janeiro de 1994, que dispõe sobre a política nacional do idoso, cria o ConselhoNacional do Idoso e define a criação, a caracterização e as competências dos conselhos nacional, estaduais, distritale municipais dos direitos do idoso, afirmando seu caráter permanente, paritário e deliberativo:

Lei nº 8.842 de 4 de janeiro de 1994, dispõe sobre a Política Nacional do Idoso.

Art. 6º Os conselhos nacional, estaduais, do Distrito Federal e municipais do idoso serão órgãospermanentes, paritários e deliberativos, compostos por igual número de representantes dos órgãose entidades públicas e de organizações representativas da sociedade civil ligadas à área.

Art. 7º Compete aos conselhos de que trata o artigo anterior a formulação, coordenação, supervisãoe avaliação da política nacional do idoso, no âmbito das respectivas instâncias político-administrativas. (Lei nº 8.842 de 4 de janeiro de 1994).

Apesar da lei que estabelece a criação dos Conselhos do Idoso ter sido promulgada em 1994, e determinar oseu caráter deliberativo, apenas 8 anos depois, em 13 de maio de 2002, foi criado por Decreto Presidencial oConselho Nacional dos Direitos do Idoso – CNDI, com caráter reduzido a órgão consultivo. Posteriormente esteDecreto foi alterado pelo Decreto 5.109/04 que muda caráter do Conselho para deliberativo.

É inegável o significativo avanço na criação destas instituições democráticas que ampliam a democracia easseguram a participação e o controle social. No entanto, em se tratando de novas institucionalidadesdemocráticas, ainda são muitos os desafios para a compreensão e efetivação destes espaços como instânciasdeliberativas. Ainda são muitos os conselhos de gestão de políticas e defesa dos direitos que mantém o caráterapenas consultivo ou de assessoramento do executivo, fragilizando desta forma o poder decisório da participaçãoda sociedade na relação com o Estado.

Os conselhos de direitos, independentemente do nível de atuação – nacional, estadual ou municipal – sãoespaços nos quais o governo e a sociedade devem discutir, formular e decidir, de forma compartilhada e co-responsável, as diretrizes para as políticas públicas de promoção e defesa dos direitos.

Conselhos não são, portanto, executores de políticas, são formuladores, promotores de políticas, defensores dedireitos, controladores das ações públicas governamentais e não-governamentais, normatizadores de parâmetros edefinidores de diretrizes das políticas na perspectiva da garantia dos direitos humanos, sociais e políticos.

Em seu artigo sobre Democracia Participativa, Reflexões sobre a natureza e a atuação dos conselhosrepresentativos da sociedade civil, Borges23 explicita que os “Conselhos são órgãos colegiados, que tem, em nossodireito, regras próprias e bem definidas de funcionamento e estrutura”. E destaca que “o funcionamento de umórgão colegiado obedece, em nosso ordenamento jurídico, a coordenadas próprias, muito especiais”. Por exemplo:

23

Page 24: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

• titularidade de seus membros, iigguuaall para todos;• decisões tomadas pela deliberação conjunta de um grupo de pessoas, mediante votação, por unanimidade ou

por maioria de votos. Tais decisões passam a constituir, após a discussão e votação, a expressão da vontade doórgão, como um todo ;

• oorraalliiddaaddee das votações, reduzidas a termo em ata ou resolução;• caráter terminativo da votação, após a proclamação de sua apuração;• responsabilidade una do órgão, como um todo, após a deliberação do grupo;• representação legal por um presidente, que não vota, senão em casos de desempate, e que vai expressar, em

resolução, a vontade do colegiado;• estabelecimento prévio, em regimento, de normas sobre quorum de votação: para a realização da sessão; para

haver deliberação; para a adoção de certas decisões relevantes.

Observa a autora que “o voto do membro do órgão colegiado tem o mesmo valor que qualquer outro, porquenosso direito não acolhe, em regra, votos privilegiados: mas éé aappeennaass uumm vvoottoo”, que deverá ser amplamentefundamentado, alicerçado em razões objetivas. Este quadro, segundo a autora, é válido para qualquer conselho ououtro órgão colegiado.

Os conselhos de direitos, nos três níveis de ação, possuem características comuns diferenciando-se apenas poralgumas particularidades. Mas é fundamental que todos observem os princípios da participação e descentralização,estabelecidos na “Constituição Cidadã” de 1988, cujos dispositivos prevêem a participação da sociedade na gestãoe fiscalização da “coisa pública”.

CCaarraacctteerrííssttiiccaass ccoommuunnss ddooss CCoonnsseellhhooss ddooss DDiirreeiittooss ee GGeessttoorreess ddee PPoollííttiiccaass

• Devem ter poder deliberativo. O fato de serem reconhecidos e de haver legislação que lhes dá poder não bastapara que os conselhos sejam realmente deliberativos. Para ser reconhecido e valorizado, o conselho precisa terlegitimidade tanto na definição de sua composição como na capacidade de interlocução entre seus integrantes.Isso, porém, pode ser um processo longo, que envolve capacitação técnica e política, pois os membros doconselho devem ser capazes de apresentar propostas e de estabelecer alianças, informando e mobilizando ossetores sociais que representam.

• Devem levar em consideração as reivindicações dos diversos grupos sociais e atuar na implementação e controledessas políticas.

• Devem ser criados por iniciativa do executivo ou, em caso de omissão deste, uma ação civil pública podedemandar ao executivo a sua criação. A via judicial deve ser uma alternativa para casos extremos. A negociaçãopolítica é sempre desejável para que o conselho a ser criado nasça baseado na cooperação e não no dissenso.

92

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

24

Page 25: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

93

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 5 - Caracterização dos conselhos em âmbito nacional, estadual e municipal

• Devem ser representativos de legítimas instituições atuantes nos segmentos ligados à área de atuação doconselho.

• Devem ser compostos de forma paritária por representantes do governo e da sociedade. O estabelecimento daparidade vai depender da área temática, dos representantes e também da história, democrática e participativaou não, que levou à construção do conselho.

• Os recursos para o funcionamento dos conselhos devem ser assegurados no orçamento federal, do estado oudo município.

CCaarraacctteerrííssttiiccaass qquuee vvaarriiaamm sseegguunnddoo ppaarrttiiccuullaarriiddaaddeess ddooss ccoonnsseellhhooss

• Número de participantes. Quanto ao número de membros dos conselhos, não há um limite estabelecido. Érecomendável que não seja excessivamente grande para se evitar a dispersão e problemas na operacionalizaçãoe funcionamento do conselho.

• Regimento interno. Cada conselho institui o seu próprio regimento interno, com as normas de conduta eprocedimentos estabelecidos para o desempenho de suas funções. O regimento interno, como todo atoadministrativo, não pode exceder os limites da lei, devendo contemplar os mecanismos que garantem o plenofuncionamento do conselho. Sua publicação deve observar a regra adotada para a publicação dos demais atosnormativos do Executivo.

• Infra-estrutura de funcionamento. Será de acordo com as possibilidades e com o grau de importância dadopelas instituições participantes de cada conselho.

OOss ccoonnsseellhhooss nnaacciioonnaaiiss

Os conselhos nacionais devem estar vinculados administrativamente aos Ministérios respectivos ao seu interessetemático. Deliberam sobre questões no âmbito da política nacional e suas decisões devem ser parâmetros tantopara os órgãos nacionais, quanto para estados e municípios.

No módulo III deste curso trataremos especificamente das informações básica dos seguintes conselhos:

• Conselho Nacional dos Direitos do Idoso – (CNDI)

• Conselho Nacional dos Direitos da Mulher – (CNDM)

• Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência (CONADE)

• Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial – (CNPIR)

• Conselho Nacional de Combate à Discriminação (CNCD)25

Page 26: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

• Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA)

• Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH)

OOss ccoonnsseellhhooss eessttaadduuaaiiss

A maioria dos conselhos estaduais dos direitos existentes no País foi criada nos anos 1990, tendo comocaracterística principal a participação expressiva da sociedade civil e a independência perante o Poder Executivo deseus respectivos Estados. A criação desses conselhos inspirou-se nos princípios da participação e descentralização,estabelecidos na “Constituição Cidadã” de 1988, em cujos dispositivos estão previstos a participação da cidadania

(representação da sociedade) na gestão e fiscalização da “coisa pública”.

Criados por lei estadual, estão vinculados administrativamente às Secretarias de Estado das respectivas áreastemáticas ou de direitos e não devem estar sujeitos a nenhuma subordinação hierárquica. Deliberam sobre questõesno âmbito na política estadual e suas decisões devem ser parâmetros tanto para os órgãos estaduais, quanto paraos municípios.

OOss ccoonnsseellhhooss mmuunniicciippaaiiss

A criação de um conselho municipal dos direitos é uma medida voltada para garantir uma esfera pública comrepresentantes da comunidade local e dos órgãos governamentais, para monitorar o impacto das políticas públicasna proteção e efetivação dos direitos da pessoa humana, e, também, para investigar as violações de direitos noterritório municipal.

O conselho deve ser criado por lei municipal e, para o exercício de suas atribuições, não pode ficar sujeito aqualquer subordinação hierárquica. Deliberam sobre questões no âmbito na política municipal e suas decisõesdevem ser parâmetros para os órgãos municipais e para a execução das ações públicas governamentais e nãogovernamentais.

AA ccoommppoossiiççããoo ddooss ccoonnsseellhhooss

Deve seguir o princípio da paridade e a indicação de seus membros deve refletir o dispositivo constitucional daparticipação indireta da população, por meio de segmentos e de organizações representativas ligadas à área deatuação de cada conselho. Assim, cabe ao governo escolher os representantes do Executivo e a sociedade civil deveescolher seus representantes em fóruns representativos do segmento respectivo. A escolha dos representantes dasociedade civil normalmente ocorre entre os organismos ou entidades sociais, ou dos movimentos comunitários,organizados como pessoas jurídicas, com atuação expressiva na defesa dos direitos e de políticas específicas.

94

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

26

Page 27: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

95

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 5 - Caracterização dos conselhos em âmbito nacional, estadual e municipal

O período do mandato dos conselheiros é normalmente de dois anos, podendo coincidir, ou não, com avigência do mandato do governo. Estas e outras definições de características e funcionamento estão definidasnas respectivas Leis de criação dos conselhos e em seus Regimentos Internos.

Notas22 Definição extraída do artigo “Conselhos de Direitos e Formulação de Políticas Públicas”, de Patrícia Helena Massa Arzabe,

Doutoranda na Faculdade de Direito da USP e Procuradora do Estada de São Paulo. Disponível no site:http://www.dhnet.org.br/direitos/textos/politicapublica/patriciamassa.htm

23 BORGES, Alice Maria Gonzalez. Democracia participativa. Reflexões sobre a natureza e a atuação dos conselhos representativosda sociedade civil. Jus Navigandi, Teresina, a. 10, n. 917, 6 jan. 2006. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7752

24 LYRA, Rubens Pinto Lyra, Formato e papel dos conselhos e ouvidorias nas áreas de segurança e de justiça, trabalho apresentadono 4º Encontro Nacional da ABCP – Associação Brasileira de Ciência Política, área Estado e Políticas Públicas, painel RelaçõesEstado e sociedade na produção de políticas públicas, 21- 24 julho 2004 – PUC – Rio de Janeiro

27

Page 28: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

96

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

Capítulo 6Atribuições e poderes dos conselhos

nacionais, estaduais e municipais

Como órgãos de defesa dos direitos humanos e de promoção e controle das políticas sociais para assegurardireitos, os conselhos precisam ter atribuições claramente definidas para exercerem suas funções. Estandoinvestidos de autonomia e independência como representantes do Estado e da Sociedade, os seus membros têmcomo dever buscar informações sobre os poderes de que são investidos e das atribuições a serem desempenhadasno exercício de suas funções.

A falta de informação sobre suas atribuições pode levar os conselheiros à omissão ou mesmo a atuação aquémdas necessidades demandadas pelo conselho, diante de circunstâncias locais específicas das comunidades querepresentam. A maioria dos casos exige, dos conselheiros, segurança e maturidade em suas decisões. Conhecer alegislação e o seu papel resulta, para os conselheiros, em maior segurança para lidar com situações adversas. Apromoção e a garantia dos direitos humanos nas comunidades depende do grau de comprometimento dosconselheiros associado ao conhecimento de suas atribuições como membro do conselho.

Em linhas gerais, podemos inferir que os conselhos de direitos e de promoção de políticas sociais têm oudeveriam ter, pelo menos, três atribuições para concretizar os princípios e dispositivos definidos na ConstituiçãoFederal.

São eles: deliberar políticas, controlar as ações e influir no orçamento, além do seu papel intrínseco de promoçãoe defesa dos direitos.

Os Conselhos Nacionais, Estaduais e Municipais dos Direitos, portanto, além das características e finalidadesgenéricas comentadas no capítulo anterior, devem possuir atribuições específicas, criadas por leis, e diferenciadasde acordo com suas áreas de atuação.

Se analisarmos o exemplo do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), criadopela Lei Federal nº. 8.242/91, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069/90), tempor competência “elaborar as normas gerais da política nacional de atendimento dos direitos das crianças eadolescentes, fiscalizando as ações de execução, observadas as linhas de ação e as diretrizes estabelecidas nosartigos 87 e 88 ”zelar pela aplicação desta política, além de avaliar as políticas estaduais e municipais e avaliar edar apoio à atuação dos conselhos estaduais e municipais, respeitando o princípio da descentralização das

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Maria Letícia Puglisi Mulhoz

28

Page 29: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

97

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 6 - Atribuições e poderes dos conselhos nacionais, estaduais e municipais

atividades de formulação, fiscalização e avaliação das políticas. Compete também aos conselhos apoiar a promoçãode campanhas educativas, indicando medidas a serem adotadas nos casos de violação dos direitos; acompanhar oreordenamento institucional necessário a partir da Lei nº 8.069; e acompanhar a elaboração e a execução daproposta orçamentária da União, Estados e Municípios indicando modificações necessárias à consecução da políticaformulada para a promoção dos direitos. No caso do conselho dos direitos da criança e do adolescente, compete-lhe também gerir o fundo instituído pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Por último, elaborar o seuregimento interno, aprovando-o pelo voto de, no mínimo, dois terços de seus membros, nele definindo a formade indicação do seu Presidente.

Apesar da maioria dos conselhos convocarem conferências nacionais, estaduais e municipais, nem todos têmesta atribuição definida em legislação. Um bom exemplo de definição de instâncias de deliberação das políticas éa Lei nº 8.142/90 que cria o Conselho Nacional de Saúde e que estabelece formas de participação bem estruturadae prevê a ocorrência das Conferências de Saúde para avaliar a situação da saúde e propor diretrizes para aformulação da política de saúde. Nesta lei, a existência dos conselhos e a realização das conferências se colocamcomo obrigatório como espaços de participação, deliberação e controle da política de saúde no âmbito federal,estadual e municipal. Assim, também, funciona nos Conselhos da Assistência Social.

No caso do Conselho dos Direitos do Idoso, previsto na Lei Federal n. 8.842/94, possui a atribuição de formular,de coordenar, de supervisionar e de avaliar a política nacional do idoso, no âmbito das respectivas instânciasnacionais, estaduais e municipais.

Atribuição peculiar aos conselhos de assistência social, os dos direitos da criança e do adolescente e os de saúde,é o financiamento de ações e dos programas com recursos de fundos especiais acarretando repasse de verbas, daUnião para Estados e Municípios e dos Estados para os Municípios, e destes últimos às organizações sociais deatendimento. Cabe aos conselhos atuar na fiscalização dos gastos das verbas públicas destinadas à execução daspolíticas públicas e às entidades públicas governamentais ou não-governamentais que, eventualmente, sejambeneficiadas por verbas públicas dentro de planos de aplicação específicos.

Um ponto importante a ser observado, relacionado às atribuições dos conselhos e que requer uma necessáriaarticulação entre eles, é o fato de conselhos intersetoriais possuírem atribuições comuns, e, por vezes, seuspoderes deliberativos podem entrar em conflito, trazendo como conseqüência prejuízo ou sobreposição naexecução das políticas formuladas. É o caso, por exemplo, da política de atendimento à criança e ao adolescentedependente de drogas ou com deficiência, que fazem parte das atribuições dos conselhos de saúde, da criançae do adolescente, dos assuntos das pessoas com deficiência. Essa é uma situação nova a se enfrentar.Tradicionalmente, a política foi estruturada de forma compartimentada, fragmentada, centralizada ehierárquica. Este é um grande desafio que exige, em especial, o entendimento e a apropriação do princípio daincompletude institucional e da indivisibilidade dos direitos.

29

Page 30: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

Por fim, analisando a legislação que prevê as atribuições dos Conselhos nacionais, estaduais e municipais, sejano âmbito dos estatutos que estabelecem os direitos, seja da legislação que cria ou regulamenta os conselhos,apenas para efeito didático e de ilustração, podemos encontrar os seguintes exemplos de atribuições conferidas aosconselhos nacionais, estaduais e municipais:

• Deliberar sobre formulação de estratégia e controle da execução da política nacional.• Acompanhar a execução do plano nacional.• Estabelecer diretrizes para o funcionamento da política pública e manifestar-se a respeito.• Propor a convocação e organizar conferências nacionais, ordinariamente, e, extraordinariamente, quando o

conselho assim deliberar.• Assessorar o órgão legislativo no diagnóstico dos problemas, opinar e acompanhar a elaboração de leis federais,

estaduais e municipais.• Analisar e emitir parecer sobre questões relativas à aplicação da legislação correspondente.• Zelar pela efetiva implantação, implementação, defesa e promoção dos direitos da pessoa.• Receber e encaminhar aos órgãos competentes as petições, denúncias e reclamações formuladas por qualquer

pessoa ou entidade, quando ocorrer ameaça ou violação de direitos, assegurados nas leis e na ConstituiçãoFederal, exigindo a adoção de medidas efetivas de proteção e reparação.

• Criar comissões técnicas para discussão de temas específicos e apresentação de sugestões destinadas a subsidiardecisões das respectivas áreas.

• Propor políticas públicas, campanhas de sensibilização e de conscientização e/ou programas educativos, a seremdesenvolvidos por órgãos estaduais e/ou em parceria com entidades da sociedade civil.

• Articular-se com o outros Conselhos e órgãos colegiados afins.• Participar ativamente da elaboração da Lei Orçamentária do município; • Zelar para que o percentual de dotação orçamentária destinado à construção de uma Política seja compatível

com as reais necessidades de atendimento.• Controlar a execução das políticas, tomando providências administrativas quando o Município ou o Estado não

oferecerem os programas de atendimento necessários, acionando o Ministério Público caso as providênciasadministrativas não funcionem.

• Estabelecer normas, orientar e proceder ao registro das entidades governamentais e não-governamentais deatendimento em suas áreas de atuação, comunicando o registro ao Conselho da Criança e do Adolescentes eao Conselho Tutelar (quando houver) e/ou à autoridade judiciária.

• Divulgar os direitos e os mecanismos de exigibilidade dos direitos. • Fiscalizar os programas desenvolvidos com os recursos do Fundo.

Vê-se que algumas atribuições aqui elencadas não compõem o rol de funções de todos os conselhos. Mas, emverdade, demonstram, de maneira generalizada, o poder e as possibilidades de atuação, e, que,fundamentalmente, por meio destas atividades, todos os conselhos de direitos e de promoção de políticas, em

98

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

30

Page 31: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

99

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 6 - Atribuições e poderes dos conselhos nacionais, estaduais e municipais

maior ou menor medida, têm papel importante não apenas na gestão de políticas públicas, mas também na suaformulação e no seu controle e avaliação.

Referências

Texto: Conselhos de Direitos e Formulação de Políticas Públicas - Patrícia Helena Massa Arzab - Doutoranda naFaculdade de Direito da USP e Procuradora do Estado de São Paulo. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/textos/politicapublica/patriciamassa.htm

Texto: Conselhos gestores e democracia participativa - Luiza Cristina Fonseca Frischeisen Caderno da CidadaniaPoder Local.Disponível em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/cadernos/cid200820001.htm

LYRA, Rubens Pinto. A Nova Esfera Pública da Cidadania. 1996. Editora Universitária. UFPB.

PEREIRA, Potyara Amazoneida P. 2005. SDH/SG/PR. Série: Normas e Manuais Técnicos, nº 1.

31

Page 32: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

Capítulo 7Princípios norteadores dos Conselhos

Os Conselhos de Direitos, conforme capítulos anteriores, são criados por determinação de legislação ordinária,com base em princípios e dispositivos constitucionais, que, no desempenho de suas atividades, devem ser por elesrespeitados, para que não perca a razão de suas existências.

Além disso, outros princípios também fundamentam as atividades dos conselhos, aqueles relacionados com asatividades da administração pública. Isso ocorre porque, conforme já foi mencionado, apesar dos conselhos nãopossuírem natureza jurídica estatal, da mesma forma, não são constituídos como associações comunitárias, postoque não surgem meramente da iniciativa de pessoas interessadas, mas por iniciativa do poder executivo; ademais,são considerados espaços públicos, com funções de deliberação, acompanhamento e controle de políticas voltadaspara interesses públicos e para desenvolverem atividades que são custeadas em mais de cinqüenta por cento porpatrimônio público (art. 1º da Lei nº 8.429/92).

Os Conselhos de Direitos devem estar fundados nos seguintes princípios:

DDeesscceennttrraalliizzaaççããoo

A descentralização passou a ser defendida e experimentada como forma de redução do poder centralizado doEstado e pré-requisito da participação. Dessa forma, pretende-se o combate à formação de oligarquias no trato dacoisa pública ou da concentração do poder em poucas mãos; o surgimento de novas lideranças políticasidentificadas com as demandas e necessidades populares; a transformação dos representados em co-responsáveisna produção de leis, nos processos de deliberação sobre temas e problemas comuns e na definição de políticas deintervenção social; o fortalecimento do regime democrático pelo constante controle público de decisões e atos dospoderes constituídos (Executivo, Legislativo e Judiciário); a substituição da estrutura político-administrativacentralizada e vertical, cultivada por lideranças oligárquicas, por outra estrutura descentralizada e horizontal, naqual o poder possa fluir em dois principais sentidos: do Estado para a sociedade e da esfera federal para a estaduale municipal, interligando, assim, os processos de participação e descentralização. É viabilizada por meio dasmodificações profundas das funções de gestão nas instituições, permitindo que as políticas e as decisões sejamformuladas via participação.

Em seu texto Código de Ética: reafirmar a função pública de conselheiros e conselheiras, Rosangela Dias O. daPaz destaca o papel exercido da Constituição de 1988 na alteração do modelo de Estado por meio de uma

100

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Maria Letícia Puglisi Mulhoz

32

Page 33: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

101

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 7 - Princípios norteadores dos Conselhos

importante descentralização política, administrativa e financeira, que garantiu novo papel aos municípios, além dainstalação de novos instrumentos e mecanismos institucionais de participação e controle social, como os conselhosde gestão – instâncias institucionais, paritárias e deliberativas – nas diversas áreas da política social.

O CONANDA, em sua resolução 106 define como descentralização o “exercício de funções administrativasobjetivando descongestionar a administração pública, compreendendo a repartição de encargos entre a União, osEstados, o Distrito Federal e os Municípios, a fim de aproximá-la do cidadão. Já a municipalização significafortalecer os poderes locais, trazendo para a esfera do Município determinadas decisões políticas e a execução deprogramas e ações antes centralizados no âmbito federal”.25

PPaarrttiicciippaaççããoo:: É o requisito para valer o preceito constitucional de soberania popular. “Todo poder emana dopovo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Aparticipação ocorre na medida em que se amplia a participação do cidadão, na atividade pública; está envolvidode maneira direta, por meio de suas ações, em todos os processos de tomada, implementação e avaliação dedecisões. “A participação dar-se-á pela escolha dos organismos da sociedade civil e é exercida por meio do voto edo usufruto da representatividade. Para participar dos Conselhos de forma adequada é necessário buscar oaprendizado e o conhecimento da realidade, com efetiva postura técnica, ética e política para a tomada dedecisões”.26

PPrriinnccííppiioo ddaa ppaarriiddaaddee ee ddaa rreepprreesseennttaattiivviiddaaddee:: Este princípio especialmente caracteriza a composição dos conselhosde direitos, uma vez que, somente fortalece a sua existência e eficiência, o critério de sua formação ser por igual númerode representantes do poder público e da sociedade civil e ser representado por pessoas com representatividade elegitimidade para defender as questões que representam. “Significa igualdade quantitativa. A representaçãogovernamental deve ser em número correspondente à representação das organizações da sociedade civil”.27

CCoommaannddoo úúnniiccoo:: Como entre os conselhos nacionais, estaduais, municipais, e mesmo entre setores intersetoriais,há atribuições similares, ou que exigem a atuação integrada de entidades diversas, este princípio é importante serobservado para que se evite o conflito e, por conseqüência, a ineficiência das suas atividades. Nas palavras dePotyara Amazoneida Pereira, esse princípio tem a finalidade de “garantir, em cada esfera de governo, a coerênciae a racionalidade das ações realizadas, sem os tradicionais desperdícios de recursos, superposições de comandos eatividades, assim como desvios ou pulverizações de verbas entre áreas que pertencem a outras jurisdiçõesadministrativas e políticas.”28

AAuuttoonnoommiiaa:: Vale lembrar que os Conselhos de Direitos deve ter identidade própria e autonomia, uma vez queé um órgão colegiado de composição mista e paritária entre representantes do governo e da sociedade civilorganizada, e detém competência decisória para tudo que pretende realizar; suas diretorias são eleitas e possuempoder de fiscalização, elementos estes necessários para exercer, com independência, a função de fiscalização do

33

Page 34: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

serviço público e de defensor de direitos. “Significa a inexistência de subordinação hierárquica dos Conselhos aospoderes Executivo, Judiciário e Legislativo para definir questões que lhe são afetas, tornando-se suas deliberaçõesvontade expressa do Estado, o que significa dizer que os mesmos possuem autonomia política, vinculando-se aopoder público apenas no âmbito administrativo.”

29

LLeeggaalliiddaaddee:: O princípio da legalidade é a referência essencial do Estado de Direito. Significa a submissão e orespeito à lei. Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administraçãoparticular é lícito fazer tudo o que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a leiautoriza. A lei para o particular significa “pode fazer assim”; para o representante público significa “deve fazerassim”. Como princípio de administração, e das atividades dos conselhos, significa que estas devem estar sujeitasaos mandamentos da lei, e às exigências do bem-comum, e deles não se pode afastar ou desviar. O CONANDA,por exemplo, em sua resolução 106, define como princípio de legalidade que “a lei de criação dos Conselhos dosDireitos só poderá instituir instâncias estatais, isto é, organizações estatais, significando que os Conselhos têm aprerrogativa legal deliberativa para exercê-la, dentro da sua área de competência, na formulação, deliberação econtrole da política dos direitos humanos da criança e do adolescente.”

IImmppeessssooaalliiddaaddee:: O agente público, dentro das possibilidades discricionárias, deve atentar sempreconcomitantemente as circunstâncias fáticas que envolvam o ato e os efeitos sociais de sua consecução do atoadministrativo. Isto é, o princípio da impessoalidade estipula que os fins a serem alcançados pelo administradorpúblico e pelo patrimônio que emprega não podem visar o benefício pessoal, ou diretamente dirigido para umcerto grupo, senão quando tal signifique a consecução de objetivo genérico de interesse de todo o país.

MMoorraalliiddaaddee:: Entende-se por um ato imbuído do princípio da Moralidade aquele que é leal e de boa-fé, pois aocontrário, ensejaria desvio de poder causando nulidade do ato. A moralidade administrativa está intimamenteligada ao conceito do “bom administrador”. Há que se observar, assim, as fronteiras do lícito e do ilícito, do justoe do injusto nos seus efeitos, referindo-se a critérios morais.

PPuubblliicciiddaaddee:: Instrumento democrático de participação popular e controle social da administração pública. Oprincípio da publicidade nasceu na Revolução Francesa. Até aquele momento, o Estado poderia resguardar para sio direito de dizer ou não sobre suas atividades, em regime monarquista absolutista. Em regime democrático, istoé impensável uma vez que inviabiliza a participação popular. Sobre o patrimônio público, deve-se prestar contas aopúblico. Assim, de acordo com este princípio, as atividades exercidas pelos conselhos devem ser previamentedeterminadas, descritas e publicadas, levadas ao conhecimento geral, como forma de controle social e fiscalizaçãopopular. Não é por outro motivo que a administração pública mantém um jornal diário, o DDiiáárriioo OOffiicciiaall. Pelomesmo motivo, a grande maioria das sessões do Judiciário são a portas abertas, acessíveis a todos. No caso dosconselhos, para que todas as suas normas e atos estabelecidos produzam efeitos e validade, devem ser deconhecimento público sob pena de se tornarem inválidos.

102

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

34

Page 35: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

103

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 7 - Princípios norteadores dos Conselhos

A inobservância, por parte dos Conselhos de Direitos, dos princípios que regem a administração pública,notadamente a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a publicidade (conforme art.4º, da Lei nº 8.429/92),comprometem a validade de suas deliberações e atos respectivos, que podem assim ser anulados a pedido dequalquer cidadão, via ação popular (na forma do previsto no citado art.5º, inciso LXXIII da Constituição Federal),Ministério Público ou outro legitimado, sem prejuízo da responsabilidade administrativa, civil e mesmo criminal deseus integrantes e outros envolvidos (conforme arts.1º, 2º, 3º e demais disposições da Lei nº 8.429/92).

Nos próximos capítulos trataremos também dos princípios éticos dos conselheiros de direitos.

Notas25 CONANDA - RESOLUÇÃO Nº 106 DE 17 DE NOVEMBRO DE 2005, anexo Recomendações para elaboração de leis municipais,

estaduais e nacional de criação e funcionamento de Conselhos dos Direitos26 Idem27 Idem28 POTYARA AMAZONEIDA – P. Pereira - CCoonnttrroollee ddeemmooccrrááttiiccoo ccoomm ggaarraannttiiaass ddee ddiirreeiittooss. Potyara Amazoneida P. Pereira. – Brasília:

Subsecretaria dos Direitos Humanos, Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, 2005.29 CONANDA - RESOLUÇÃO Nº 106 DE 17 DE NOVEMBRO DE 2005.

Referências

Texto: Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente: transparência de seu funcionamento como condiçãoindispensável à legitimidade e legalidade de suas deliberações, Murillo José Digiácomo - Promotor de Justiça.Disponível em: http://www.redeamigadacrianca.org.br/artigo_transpareciacmdca.htm

Texto: Código de Ética: Reafirmar a função pública de conselheiros e conselheiras, Rosangela Dias O.da Paz -CNAS - Conselho Nacional de Assistência Social

Texto: RESOLUÇÃO Nº 106 DE 17 DE NOVEMBRO DE 2005, CONANDA - Conselho Nacional dos Direitos daCriança e do Adolescente - anexo Recomendações para elaboração de leis municipais, estaduais e nacional decriação e funcionamento de Conselhos de Direitos

Texto: A legalidade Artigo publicado no periódico Jornal da Cidade (Caxias - MA), em 28/11/2004. Máriton Silva Lima

Texto: Controle democrático com garantias de direitos / Potyara. Amazoneida P. Pereira - Brasília : Subsecretariados Direitos Humanos, Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, 2005.http://www.mj.gov.br/sedh/ct/cndi/SEDH_controle_2005.pdf

35

Page 36: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

104

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

Capítulo 8Papel, Função Pública e a Ética das Conselheiras

e dos Conselheiros dos Direitos

Conselhos são instâncias públicas não estatais. Isto quer dizer que sua natureza fundamenta-se nos interessespúblicos, dos sujeitos coletivos. Portanto, governo e sociedade representados por seus membros, os conselheiros eas conselheiras, devem seguir esta premissa e os princípios que regem a coisa pública.

A constituição de esferas públicas implica o fortalecimento dos diversos sujeitos presentes em cena.De um lado, o Estado com suas instituições governamentais, recursos financeiros e humanos e, deoutro, a sociedade civil, com sua diversidade e heterogeneidade. Não se constroem esferas públicasse não houver o fortalecimento dos sujeitos sociais. Não haverá efetividade dos conselhos se nãohouver a presença ativa de governos e sociedade civil, movidos pelo interesse público e com realpoder de decisão sobre a política pública.”30 Destacando-se que “interesse público” é, portanto,“diferente e distinto dos interesses pessoais, particulares e mesmo dos corporativos.

Já se afirmou anteriormente que conselhos são mecanismos de participação garantidos na Constituição Federale na legislação ordinária que os institui. Considera-se que “participação é um exercício de aprendizagem constantee que supõe a criação ou fortalecimento de relações democráticas de reconhecimento da cidadania do outro comocidadão, em todos os níveis. Supõe, sem dúvida, a eliminação da subalternidade de muitos e do mando arbitráriode poucos. E supõe especialmente, ganhar visibilidade as alterações provocadas por um processo de participaçãopopular.”31 As conselheiras e conselheiros têm, portanto, além de outros, papel fundamental na alteração destacultura institucional centralizadora, autoritária e excludente para um novo paradigma da cidadania, da defesa dosinteresses da coletividade, dos princípios constitucionais que visam a distribuição da riqueza produzida no País e aoacesso às políticas sociais, à justiça e à equidade social. Para cumprir seu papel e atingir seus objetivos osconselheiros e as conselheiras devem, em sua prática, afirmar a defesa:32

• Da democracia e do Estado Democrático de Direito.• Da cidadania, enquanto garantia de direitos civis, políticos e sociais a toda a população brasileira, bem como de

acesso universal a serviços públicos, de direito à organização autônoma e de “direito a ter direito”. • Da justiça, eqüidade e liberdade, dos direitos humanos e da autonomia de todos os indivíduos. • Da distribuição de renda e da universalidade de acesso às políticas sociais. • Da diversidade social, de raça / etnia, de gênero e, conseqüentemente, do combate a toda forma de preconceito. • Da gestão democrática e do controle social das políticas sociais.

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Célia Maria Escanfella, Maria de Nazaré Tavares Zenaide

36

Page 37: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

105

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 8 - Papel, Função Pública e a Ética das Conselheiras e dos Conselheiros dos Direitos

Os Conselhos, coerentes com os princípios constitucionais, devem ter suas atividades comprometidas com adefesa da democracia e dos direitos da população.

A função dos conselheiros e das conselheiras é pública e suas atividades não devem ser remuneradas peloconselho. É incompatível com a função pública dos conselheiros e conselheiras o recebimento de remuneração oude presentes em função do exercício da função. Mas é imprescindível para o adequado funcionamento dosconselhos e para que os conselheiros e conselheiras desempenhem seu papel com efetividade, que os conselhosgarantam estrutura e apoio para a realização de suas atividades, por exemplo, custeio de locomoção, hospedagense assessoria técnica quando necessárias.

As funções dos(as) conselheiros(as) estão definidas em leis, resoluções, que legislam a respeito dos conselhos dedireitos em suas várias áreas de atuação. Destacamos a seguir algumas das principais funções dos conselheiros edas conselheiras especificadas em legislação específica.

RReepprreesseennttaaççããoo

• Representar e defender os direitos individuais e coletivos da população usuária das políticas nacionais/estaduais/municipais e do controle social.

• Dialogar permanentemente com os representados, estabelecendo canais de comunicação e deliberação.• Representar o conselho em situações previstas na sua legislação, contribuir com a promoção, a defesa dos

direitos humanos e direitos de cidadania, participar da agenda sobre a Política Nacional, Estadual e Municipal.

PPrroommooççããoo ddaa GGeessttããoo IInntteerrnnaa

• Participar das atividades do Conselho, reuniões plenárias, grupos de trabalho e comissões, desenvolvendo, comresponsabilidade e presteza, todos as atribuições que lhes forem designadas.

• Debater e votar a matéria em discussão e contribuir para a manutenção do espaço do Conselho como esfera dedebate e diálogo, etapa imprescindível para uma deliberação consciente.

• Proferir declarações de voto e mencioná-las em ata, declarando suas posições contrárias por escrito.• Apreciar as atas das reuniões.• Solicitar informações, providências e esclarecimentos ao relator, às comissões permanentes e temáticas, à mesa

e ao órgão encarregado dos serviços de secretaria executiva.• Apresentar relatórios e pareceres dentro dos prazos fixados.• Participar de comissões permanentes e temáticas com direito a voto.• Propor a criação e dissolução de comissões temáticas.• Executar atividades que lhes forem atribuídas pelo plenário.

37

Page 38: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

106

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

• Agir com respeito e dignidade, observadas as normas de conduta social e da Administração Pública. • Zelar pelo patrimônio do Conselho.

DDeeffeessaa ddaa aauuttoonnoommiiaa ddoo CCoonnsseellhhoo

• Zelar pela autonomia dos conselhos, não permitindo subalternidade de suas deliberações à gestão de governos,de entidades ou de corporações em particular.

• Eleger os membros que compõem a presidência (presidente/a, secretários/as, coordenadores/as de comissões)entre seus pares.33

AArrttiiccuullaaççããoo ddaass ppoollííttiiccaass ee iinntteeggrraaççããoo ddaass aaççõõeess ccoomm oouuttrrooss ccoonnsseellhhooss

• Manter diálogo com outros conselhos de gestão de políticas públicas.• Propor políticas articuladas e ações integradas com os demais conselhos.• Conhecer os programas e serviços existentes visando a integração do atendimento.

IInnfflluuiirr nnaa PPoollííttiiccaa ppaarraa ggaarraannttiiaa ddooss ddiirreeiittooss,, eemm ttooddooss ooss nníívveeiiss

• Zelar para o aprofundamento do sistema descentralizado e participativo da política dos conselhos de direitos. • Exercer o controle social sobre a Política Nacional, Estadual e Municipal de sua área e sobre suas ações.

TTeerr ppoossttuurraa ÉÉttiiccaa ee ddee DDeeffeessaa ddooss iinntteerreesssseess ppúúbblliiccooss ee ccoolleettiivvooss

• Zelar pela ética, transparência e honestidade, atuando sempre em defesa do coletivo e jamais em favorecimento próprio. • Defender o caráter público da política de sua área, entendida como proteção social a ser prestada por órgãos

governamentais e por entidades de assistência social a todos que dela necessitarem.• Manter vigilância para que o Conselho cuide da aplicação dos direitos, direcionando a discussão para o

cumprimento da proteção social para as diversas esferas dos poderes públicos e entidades de defesa de direitos.

PPrreessttaarr ccoonnttaass àà ssoocciieeddaaddee ee aaoo EEssttaaddoo

• Garantir a informação e a divulgação das discussões do conselho e de suas deliberações.

OOuuvviirr ee ddeeffeennddeerr ooss iinntteerreesssseess ddaa ccoommuunniiddaaddee

• Estudar e conhecer a realidade dos representados.• Estabelecer diálogo permanente com a sociedade civil organizada e com os fóruns de representação política.

38

Page 39: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

107

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 8 - Papel, Função Pública e a Ética das Conselheiras e dos Conselheiros dos Direitos

• Contribuir para a efetiva participação da população usuária nas decisões do conselho, buscando metodologia,forma e linguagem adequada.

FFaazzeerr cciirrccuullaarr aass iinnffoorrmmaaççõõeess

• Garantir a informação e a divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas e projetos da política de suaárea, bem como dos recursos oferecidos pelo Poder Público e dos critérios para sua concessão.

FFoorrttaalleecceerr ooss eessppaaççooss ddee aarrttiiccuullaaççããoo ddaa ssoocciieeddaaddee cciivviill

• Manter relação com os Fóruns da Sociedade Civil e instituições públicas no âmbito das esferas administrativas.

Se você é conselheiro ou conselheira, percebeu que têm em mãos um poderoso instrumento de defesa e demudança social.

Notas30 Artigo: CCóóddiiggoo ddee ÉÉttiiccaa: Reafirmar a função pública de conselheiros e conselheiras, Rosangela Dias O.da Paz – CNAS – Conselho

Nacional de Assistência Social31 TRABALHANDO CONSELHOS DE DIREITOS - Textos selecionados da literatura técnica, pela AMEPPE e CBIA.32 Artigo: CCóóddiiggoo ddee ÉÉttiiccaa: Reafirmar a função pública de conselheiros e conselheiras, Rosangela Dias O.da Paz – CNAS- Conselho

Nacional de Assistência Social.33 Esta é a situação ideal para os conselhos – a eleição da presidência entre seus pares. No entanto, há muitas legislações que

determinam que o/a presidente/a do conselho deve ser o Secretário ou Ministro, resultando em situações às vezes delicadas, àmedida que os conselhos tem também a função de fiscalização. Por exemplo, se um Secretário é determinado por lei, opresidente de um conselho que tenha a função de fiscalizar presídios, isto pode gerar conflitos de interesses ou quebra deautonomia no exercício da função de fiscalização. Nesses casos, é recomendável rever a legislação ou regimento do conselho.

Referências

PAZ, Rosangela Dias O da. CCóóddiiggoo ddee ÉÉttiiccaa: Reafirmar a função pública de conselheiros e conselheiras. CNAS-Conselho Nacional de Assistência Social.

CONANDA. Resolução 105 - Parâmetros para criação e funcionamento dos Conselhos dos Direitos. Brasília: SEDH.

39

Page 40: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

108

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

BAVA, Silvio C. PPaarrttiicciippaaççããoo,, rreepprreesseennttaaççããoo ee nnoovvaass ffoorrmmaass ddee ddiiáállooggoo ppúúbblliiccoo. São Paulo: Polis/ ProgramaGestão Pública e Cidadania (Eaesp/FGV), 2001.

DAGNINO, Evelina (Org.). AAnnooss 9900: política e sociedade no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1994.

RAICHELIS, Raquel. EEssffeerraa ppúúbblliiccaa ee ccoonnsseellhhooss ddee aassssiissttêênncciiaa ssoocciiaall: caminhos da construção democrática. SãoPaulo: Cortez, 1998.

SPOSATI, Aldaíza. A lei orgânica da assistência social e a política de atenção à infância e à juventude. In:DDiissccuuttiinnddoo aa aassssiissttêênncciiaa ssoocciiaall nnoo BBrraassiill. Ministério da Previdência Social e Fundação do DesenvolvimentoAdministrativo. São Paulo: 1997.

TEIXEIRA, Elenaldo. OO llooccaall ee oo gglloobbaall: limites e desafios da participação cidadã. São Paulo: Cortez, 2001.

TELLES, Vera S.Sociedade civil, direitos e espaço público. In: RReevviissttaa PPóólliiss, no 14. São Paulo: Pólis/FórumNacional de Participação Popular nas Administrações Municipais, 1994.

Outras Referências

RESOLUÇÃO Nº 35, DE 6 DE JULHO DE 2005. Dispõe sobre o Regimento Interno do CONADE. Disponível em:http://www.mj.gov.br/sedh/ct/CONADE/Documentos/RESOLU%C3%87%C3%83O%2035%20REGIMENTO%20INTERNO%20DOU.doc

II Encontro Nacional de Conselheiros de Saúde Tema 7 AAmmpplliiaaççããoo ddoo CCoonnttrroollee SSoocciiaall: Articulação comMinistério Público, Ouvidorias, etc. Disponível em: http://www.datasus.gov.br/conselho/DOCUMENTOS/iiencontro/Tema7.html

RESOLUÇÃO Nº 209, DE 10 DE NOVEMBRO DE 2005.

40

Page 41: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

109

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 8 - Papel, Função Pública e a Ética das Conselheiras e dos Conselheiros dos Direitos

Capítulo 9Representatividade, perfil e habilidades essenciais

dos conselheiros e conselheiras

É essencial reafirmar que, da mesma forma que os conselhos de direitos estão submetidos aos princípios daadministração pública por se caracterizarem como entidades que realizam atividades de interesse público com opatrimônio público, os conselheiros e conselheiras têm funções públicas, isto é, exercem suas funções com aresponsabilidade de praticar seus atos de acordo com os princípios da administração pública.

Para que estes princípios sejam respeitados como devem ser, então, os conselheiros e conselheiras?

O Conanda, em sua resolução 105, traz algumas recomendações para o funcionamento dos conselhos dosdireitos da criança e do adolescente34 e alguns requisitos necessários quanto ao perfil dos conselheiros e dasconselheiras dos conselhos dos direitos em todos os âmbitos: federal, estadual, distrital e municipal. Esses requisitospodem ser estendidos para os diversos conselhos. São eles:

• Ter disponibilidade, tanto pessoal quanto institucional, para o exercício dessa função de relevância pública.

• Estar em exercício da função ou cargo que disponha de condições legais para tomada de decisão, bem como,ter acesso às informações referentes ao órgão que representa.

• Possuir capacidade política e técnica em relação a: direitos humanos, políticas e programas de garantias dedireitos e orçamento público.

Para o exercício de sua função pública e de suas atribuições, é imprescindível que os conselheiros e asconselheiras tenham poder decisório e sejam movidos pelo interesse público da defesa dos direitos sociais dacomunidade ou segmentos representados. Não cabe, no exercício da função pública de conselheiro(a) a defesa deinteresses particulares, pessoais ou corporativos.

Os princípios constitucionais de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência para agestão da coisa pública devem orientar também a prática conselheira e a afirmação de sua ética. Mas paracumprir bem seu papel de conselheiro/a, além de orientar-se por estes princípios, são necessárias algumashabilidades básicas:35

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Célia Maria Escanfella, Maria de Nazaré Tavares Zenaide

41

Page 42: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

110

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

CCaappaacciiddaaddee ddee RReepprreesseennttaaççããoo ee DDeecciissããoo

Conselheiro(a) que representa o governo Conselheiro(a) que representa a sociedade civil

• Deve ter conhecimento das políticas do âmbitofederal, distrital, estadual ou municipal, de atençãoà saúde, educação, assistência social, esportes,cultura e outras que asseguram os direitoshumanos, tendo conhecimento da sua área deatuação para poder representar e articular com opoder público nos encaminhamentos e tomadas dedecisões.

• Deve ter conhecimento sobre as políticas públicas deatenção à população de referência do conselho –particularmente suas limitações e desafios – e capacidadede propor soluções fundamentadas.

• Deve, por meio de encontros e reuniões periódicas,manter-se sintonizado com as organizações da sociedadecivil, para que sua representatividade seja real econstantemente atualizada.

CCaappaacciiddaaddee ddee eexxpprreessssaarr ee ddeeffeennddeerr pprrooppoossttaass

Conselheiro(a) que representa o governo Conselheiro(a) que representa a sociedade civil

• Uma vez indicado pelo presidente, governador ouprefeito e ocupando um cargo de confiança, deveestar apto para defender o ponto de vista daadministração pública, que, no entanto, não podeser particularista, mas refletir e efetivar os valoresrepublicanos e democráticos .

• O(A) conselheiro/a pode representar uma entidade ouorganização da sociedade civil.

• Ou dependendo do modo de escolha dos representantesda sociedade civil o/a conselheiro(a) pode não representaruma única organização da sociedade.

• Ele(a) deve ser capaz de expressar e defender asprioridades eleitas por amplos setores sociais e a posiçãodos representados(as).

• É importante definir com seus representados mecanismosde consulta e diálogo (reuniões, encontros, assembléias,estudos, pesquisas e outros) para não distanciar orepresentante do representado e este poder se alimentarconstantemente das questões regionais, distrital,estaduais e municipais.

• A definição das prioridades é construção social que orepresentante deve considerar e garantir para manter-sena condição de representante.

42

Page 43: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

111

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 9 - Representatividade, perfil e habilidades essenciais dos conselheiros e conselheiras

CCaappaacciiddaaddee ddee nneeggoocciiaaççããoo

Conselheiro(a) que representa o governo Conselheiro(a) que representa a sociedade civil

• Deve estar disposto e/a preparado/a para ouvir asidéias, as críticas e sugestões dos(as) conselheiros(as)que representam a sociedade civil, procurandoconstruir novas reflexões e propostas que devem serpactuadas com os representados para fortalecer equalificar a atuação do poder público.

• Devem incorporar o melhor de ambas as partes(governo e sociedade).

• Deve estar disposto(a) e preparado(a) para ouvir as idéias esugestões dos representados e dos/as conselheiros(as)governamentais. É fundamental que, sem perder de vista asprioridades que representa, esse/a conselheiro/a não caia nojogo fácil e pouco eficaz de só cobrar soluções imediatas edenunciar a administração pública federal, distrital, estadual oumunicipal. É preciso saber convencer e negociar soluções viáveis.

• Para que a negociação seja favorável às partes é necessário queo(a) representante(a) da sociedade tenha a confiança dos seusrepresentados, tenha competência de conhecimento e deargumento, que saiba dialogar e construir consensos, paraencontrar caminhos que avancem a política pública.

TTrraannssppaarrêênncciiaa ee ddiissppoonniibbiilliiddaaddee ppaarraa iinnffoorrmmaarr

Conselheiro(a) que representa o governo Conselheiro(a) que representa a sociedade civil

• Deve oferecer aos conselheiros(as) que representam asociedade civil todas as informações necessárias paraa melhor deliberação e o correto controle das ações:diagnósticos, planos, projetos gestão administrativa,financeira e orçamentária da administração públicafederal, distrital, estadual e municipal.

• Deve conhecer sua instituição para poder saberarticular setores e áreas de modo a dar qualidade naatuação do poder público.

• Além de oferecer aos conselheiros(as) que representam ogoverno todas as informações levantadas pelasorganizações da sociedade civil, deve manter com essasorganizações um intercâmbio constante e transparente deinformações. Ele(a) está a serviço da comunidade e devemantê-la informada.

A regulamentação dos conselhos indica sua natureza e competências. A partir dessa orientação legal cadaconselho pode e deve definir e analisar com seus conselheiros(as) a natureza das ações e os planos de trabalho.Num determinado momento uma ação pode se sobrepor a outras dependendo da necessidade ou das orientaçõespolíticas da composição e da direção.

43

Page 44: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

112

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

Outras habilidades necessárias, de maneira comum aos conselheiros(as) governamentais e da sociedade civil, tãoimportantes quanto as já mencionadas, referem-se ao exercício de sua função pública de garantir direitos, examinare encaminhar ações de defesa nos casos de violações. Citamos a seguir algumas destas habilidades necessárias.

HHaabbiilliiddaaddeess ddee ffiissccaalliizzaarr

Os conselheiros e as conselheiras devem ter habilidades de vistoriar os programas de atendimento, em especialem casos de denúncias de violação de direitos. É preciso, para isso, buscar capacitar-se para exercer esta função.Por exemplo, para realizar vistoria em presídios é necessário conhecer a legislação, ter o Ministério Público e aDefensoria Pública como apoio (no caso de violações de direitos indígenas e quilombolas, por exemplo, é necessárioo apoio do Ministério Público Federal). Em algumas vistorias e fiscalizações há a necessidade de acompanhamentointenso da mídia, como é o caso de conflitos sociais, ações de despejos. A mídia como um dos mecanismos decontrole social pode acompanhar e registrar graves violações aos direitos humanos.

Deve-se sempre buscar articular e envolver os Conselhos de Direitos como parceiros nestas ações. Por exemplo, emfiscalização de denúncia Unidade de Medida Sócioeducativa de Internação é fundamental a articulação entre osconselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e dos Direitos Humanos; Conselhos Profissionais; Ministério Públicoe Defensoria Pública. Em vistoria aos presídios devem ser envolvidos os Conselhos Estaduais de Direitos Humanos, osConselhos de Direitos da Mulher (se for unidade feminina), de Direitos do Idoso, de Promoção da Igualdade Racial, deCombate à Discriminação, entre outros. É fundamental realizar ações articuladas, de forma a trabalhar conjuntamentesem usurpar a função do outro, mas com vistas à complementariedade dos direitos individuais e coletivos.

HHaabbiilliiddaaddee ddee ssee ccoommuunniiccaarr ccoomm aa mmííddiiaa

Os conselheiros e as conselheiras devem ser preparados(as) para se comunicar com a mídia. Não é possível ir paraa mídia sem informações confiáveis. É necessário ter dados e para isso é recomendável um processo de investigaçãoe pesquisa. Não se pode esquecer que se está em exercício da função pública e, portanto é fundamental saber lidare tratar com a coisa pública e transmitir informações verídicas e confiáveis. É necessária a investigação anterior parafalar com exatidão sobre dados, em especial quando se trata de denúncias de violação de direitos. Quando se lidacom a mídia, deve-se evitar a exposição de vítimas ou tratar de casos sem as informações necessárias.

HHaabbiilliiddaaddee ddee mmeeddiiaarr ccoonnfflliittoo

Em situações que envolvem conflitos de terra, comunidade indígena, violência contra mulheres, homossexuaisou negros, por exemplo, é inadmissível chegar com posturas preconceituosas. Os conselheiros e as conselheirasdevem ter habilidades em lidar com situações que exigem postura de respeito às diversidades. É necessárioconhecer a legislação específica e, principalmente, ter conhecimento das demandas desses grupos sociais. Umconselheiro que não estuda, não conhece a legislação específica ou tem preconceitos frente à diversidade

44

Page 45: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

113

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 9 - Representatividade, perfil e habilidades essenciais dos conselheiros e conselheiras

apresentada, terá muitas limitações em acompanhar ou se posicionar frente a situações de violações dos direitosdesses grupos sociais, e, provavelmente, não efetivará a defesa desses direitos ou não conseguirá mediar osconflitos, prejudicando ainda mais as vítimas de violações. Há casos em que há grande distância entre o conselheiroe o público que ele representa. É preciso, sobretudo, conhecer o público que se está representando, conhecer inloco os riscos que corre e suas principais demandas de direitos. Não se concebe julgar, por exemplo, trabalhadoresrurais na praça pública sem conhecer de perto as ameaças e os riscos de vida que estão recebendo de gruposarmados (ex: tirar crianças da praça e devolvê-las a mira dos capangas armados não significa dar proteção).

A segurança e a proteção da população deve permear qualquer ação de mediação ou de gerenciamento decrises de modo a preservar vidas humanas. É dever do Estado proteger todos(as) cidadãos e cidadãs, independenteda origem social, da etnia, do gênero, da orientação sexual ou das suas diferenciações.

Os Conselhos dos Direitos são instâncias de representação da sociedade civil e do governo na definição, nadeliberação e no controle de ações e de políticas públicas que assegurem os direitos civis e políticos e econômicos,sociais e culturais do segmento que lhe compete. A representatividade destes conselheiros/as passa tanto pela suarelação com os segmentos ou órgãos governamentais que representam, quanto por sua capacidade e postura éticade dialogar sobre as demandas e pautas do conselho que compõe.

Notas34 Parâmetros para criação e funcionamento dos Conselhos dos Direitos – Resolução 105 do Conanda.35 Conteúdo cedido pela Modus Faciendi, disponível no site da Risolidaria – Fundação Telefônica. Disponível em:

http://www.risolidaria.org.br/util/view_noticia.jsp?txt_id=200502230018

Referências

CONANDA. Parâmetros para criação e funcionamento dos Conselhos dos Direitos - Resolução 105. Brasília: CONANDA, 2005.

PAZ, Rosangela Dias O.da. CCóóddiiggoo ddee ÉÉttiiccaa:: Reafirmar a função pública de conselheiros e conselheiras. Brasília:Conselho Nacional de Assistência Social - CNAS.

45

Page 46: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

Capítulo 10Empoderamento, um desafio a ser enfrentado

Se considerarmos que “Conselhos são essencialmente espaços de interlocução política, negociação edeliberação, lugares de disputa de projetos e recursos, mecanismos de partilha de poder e de democratização davida social”,36 seu fortalecimento como instância deliberativa e o empoderamento de seus membros como sujeitospolíticos signatários de um mandato público é fundamental para o cumprimento de sua função pública.

Adquirir poder para fazer parte das decisões e das ações que irão influenciar a realidade de uma comunidade.Participar das decisões, sobre assuntos de interesse de todos, são processos que caminham juntos quando se falade empoderamento e democracia. A atuação do conselheiro ou da conselheira de direitos deve guiar-se por essesdois princípios, como meio de estimular as pessoas a tomarem parte na construção de uma realidade mais justapara se viver.

O “Empoderamento” é este processo pelo qual as pessoas, as organizações, as comunidades tomam controlede seus próprios assuntos, de sua própria vida, tomam consciência da sua habilidade e competência para produzir,criar e gerir seus destinos.

O conceito de empoderamento surgiu com os movimentos de direitos civis nos Estados Unidos nos anos de1970, por meio da bandeira do poder negro, como forma de auto-valoração da raça e conquista de cidadaniaplena. Ainda no mesmo ano, o termo começou a ser usado pelo movimento de mulheres.

A capacidade de decidir sobre a própria vida é um dos objetivos de estratégias de empoderamento de pessoase comunidades, mas o poder consiste também na capacidade de decidir sobre a vida da comunidade – do coletivo,na intervenção em fatos que direcionam, impedem, obrigam, circunscrevem ou impedem.

Logo, um processo de empoderamento eficiente deve envolver tanto componentes individuais como coletivos.Só assim é possível desenvolver as capacidades necessárias para que se obtenham reais transformações sociais.

Assim, um processo de “empoderamento” eficaz precisa contemplar, pelo menos, quatro níveis:

CCooggnniittiivvoo –– a conscientização sobre a realidade e os processos; PPssiiccoollóóggiiccoo –– ligado ao desenvolvimento de sentimentos de auto-estima e autoconfiança, requisitos para atomada de decisões; EEccoonnôômmiiccoo –– que relaciona a importância da execução de atividades que possam gerar renda que assegure certograu de independência econômica; PPoollííttiiccoo –– que envolve a habilidade para analisar e mobilizar o meio social para nele produzir mudanças.

114

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Célia Maria Escanfella, Kátia Chagas

46

Page 47: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

115

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 10 - Empoderamento, um desafio a ser enfrentado

Para isso, é necessário que as pessoas e as instituições construam uma auto-imagem positiva, desenvolvamcapacidades para pensar criticamente e agir acertivamente, construam espaços e grupos colaborativos, promovama tomada de decisões de forma horizontal e democrática e implementem ações em conjunto.

O centro deste processo é o incremento do poder das comunidades –– a posse e o controle dos seus própriosesforços e destino. Uma comunidade que trabalha para atingir objetivos comuns adquire força e consciência desua capacidade e poder coletivo para enfrentar e resolver problemas.

Os conselheiros, no exercício de suas funções, devem ter claro em que tipo de democracia acreditam. Isso éimportante para que o trabalho desenvolvido pela conselheira ou conselheiro resulte em poder para si e para aspessoas por eles representadas.

Empoderar-se para assumir com autonomia o papel que têm a desempenhar e, de acordo com a legislação,exercer o poder de promover a participação e o “empoderamento” de outros, pode representar um dos maioresdesafios para a conselheira ou o conselheiro.

Para ajudar você nessa reflexão, algumas perguntas podem ser respondidas:

• As condutas que adoto espelham as causas que defendo?• Tenho informações suficientes e clareza de como enfrentar a situação de violação de direitos?• Quem são meus aliados e quais os recursos disponíveis para exercer a minha função?• Tenho contribuído para garantir a participação de todos?• Tenho buscado apoio e dado retorno às pessoas que represento em relação às decisões que eu tenho tomado?

O empoderamento dos conselheiros passa principalmente pela sua função educativa. Isto é, a sua capacidadede conhecer e adotar procedimentos democráticos, com critérios passíveis de serem definidos publicamente.

A função educativa da conselheira ou do conselheiro está relacionada à habilidade de articular e negociar nastomadas de decisões, na capacidade de sensibilizar e mobilizar seus representados para a partilha do poder pormeio de práticas participativas e solidárias.

Empoderar-se e empoderar os seus representados, passa, ainda, pelo exercício de pensar a realidade em que seestá inserido e de repensar e recriar essa realidade. Para que isso seja possível, os conselheiros devem desenvolver-se e capacitar-se continuadamente. Adquirir conhecimentos e informações e socializar esse conhecimento constituifator determinante para o sucesso na luta pela promoção, defesa, garantia e ampliação dos direitos humanos.

Notas36 Artigo: CCóóddiiggoo ddee ÉÉttiiccaa: Reafirmar a função pública de conselheiros e conselheiras, Rosangela Dias O.da Paz - CNAS-Conselho

Nacional de Assistência Social

47

Page 48: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

116

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os Capítulo 11

Ações básicas para uma atuação mais efetiva dos conselheiros

A eficácia dos conselhos na promoção e na defesa dos direitos depende de uma atuação consciente e planejada.Por esta razão é muito importante o conhecimento da realidade e a realização de um planejamento estratégico,como passo inicial de uma gestão do conselho para melhor cumprir suas atribuições de formular, de deliberar e deexercer o controle social, para superar as deficiências estruturais e o atendimento das demandas a curto, médio elongo prazo. Com este intuito, os conselhos devem buscar o apoio de órgãos públicos responsáveis peloplanejamento do ente federado ao qual se encontra vinculado, bem como o auxílio de outros profissionaisconvidados.

PPllaanneejjaammeennttoo EEssttrraattééggiiccoo ddaa GGeessttããoo ddoo CCoonnsseellhhoo

Planejar é sonhar e acreditar na nossa capacidade de transformar o sonho em realidade por meio do trabalhocoletivo. Indicar o que queremos alcançar, visualizando onde estamos, para onde vamos e os caminhos necessáriospara se chegar ao lugar desejado.

Ao planejar, amplia-se o foco da atuação dos conselhos, evitando a dispersão de esforços, o paralelismo deações, o desperdício de recursos financeiros, técnicos e materiais, criando instrumentos para o acompanhamentoe o controle conjunto de todo o processo de trabalho. Mas, sobretudo, planejar torna possível realizar o sonhocoletivo.

CCoonnhheecciimmeennttoo ddaa rreeaalliiddaaddee

A partir do conhecimento da realidade local, em especial sobre os segmentos de atuação prioritária dosconselhos, pode-se compreender quais são as reais necessidades relativas à política a ser formulada, priorizada edesenvolvida com vistas a garantia dos direitos dos segmentos populacionais beneficiados pela ação dos conselhos.

Nesse sentido, os conselhos de âmbito municipal têm papel peculiar à medida que é no município que aspessoas vivem, tem nome, estudam, trabalham, tem seus direitos garantidos ou violados. E é o lugar em quea política atinge mais diretamente os cidadãos e se pode verificar suas necessidades e os casos de violações dedireitos. Com base no conhecimento da realidade, pode-se planejar ações de combate a estas violações,priorizar medidas que interrompam o ciclo de violações e que atuem na direção de promover os direitos doscidadãos e cidadãs.

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Kátia Chagas, Maria Célia Orlato Selem, Mária de Nazaré Tavares Zenaide

48

Page 49: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

117

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

osO mapeamento da situação local pode ocorrer de diversas formas, como por exemplo:

• Busca de informações sobre os problemas que afligem a população e suas possíveis soluções eencaminhamentos.

• Levantamento das organizações sócias e entidades de atendimento existentes.• Criação de um sistema de informações em Rede, integrado tanto pelo poder público como pela comunidade.• Verificação da adequação dos programas de atendimento às necessidades locais.• Acompanhamento junto ao Poder Legislativo de projetos de lei relativos ao segmento populacional alvo dos

conselhos.• Incentivo à participação da sociedade por meio de audiências públicas, conferências, palestras, etc.

Contudo, a necessidade de conhecimento da realidade, com fins de deliberar políticas e colocar a realidade maispróxima a concretização dos direitos, é de todos os conselhos nos âmbitos nacional, distrital, estaduais emunicipais.

Um conselho que não conhece a situação dos segmentos que lhe é mais afeto, terá mais dificuldade em pensare planejar ações mais eficazes para assegurar os direitos.

Todas estas ações visam conhecer e ampliar a realidade local para que possa ser elaborado um planejamentoestratégico que visará solucionar os problemas existentes e formar de maneira articulada uma rede de proteçãoque espelhe as peculiaridades locais das crianças e adolescentes. Vale lembrar que tão importante quantoconhecer a realidade e planejar as ações que provoquem mudança, é garantir instrumentos de monitoramentoe avaliação das ações definidas. Por isso, é também fundamental o encontro dos conselheiros para o ajuste anualdo seu plano de ação.

Além do planejamento estratégico, apresentaremos, a seguir, alguns exemplos de ações básica para umaatuação mais efetiva dos conselhos de direitos.

AAccoommppaannhhaammeennttoo ddoo OOrrççaammeennttoo PPúúbblliiccoo

O acompanhamento orçamentário é pressuposto para que a definição e execução das ações e programas queasseguram e promovem direitos se concretizem. Para a sua realização faz-se necessário que se proceda até junhode cada ano a elaboração do plano de ação anual e plurianual, que contenham as estratégias, ações de governoe programas de atendimento a serem implementados, mantidos e/ou suprimidos pelo ente federado ao qual oconselho estiver vinculado, que deverão ser devidamente publicados e encaminhados para inclusão, nomomento oportuno, nas propostas de Lei de Diretrizes Orçamentárias e de Plano Orçamentário Plurianual,elaborados pelo Executivo.

Capítulo 11 - Ações básicas para uma atuação mais efetiva dos conselheiros

49

Page 50: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

118

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os FFoorrmmaaççããoo ccoonnttiinnuuaaddaa ddooss ccoonnsseellhheeiirrooss

A formação de conselheiros e conselheiras é fundamental para uma atuação consciente. Para ser conselheiro, avivência política não é suficiente, é preciso conhecer como funciona o Conselho, a máquina pública, eprincipalmente, a causa social e os direitos pelos quais a ação do conselho deve se nortear, promover e assegurar.

De acordo com Jaqueline Silveira, “capacitar não é simplesmente dar cartilhas, é pensar a própria prática demodo a alterar antigos preconceitos e internalizar novas concepções”. É preciso promover consciência política a fimde possibilitar aos/as conselheiros (as) uma prática renovada, transformadora.

A formação deve compor o plano de ação estratégica definido pelo conselho em seu planejamento. Para isto, énecessário a previsão de recursos que possibilite a organização dos programas de formação e a participação efetivados conselheiros e conselheiras.

CCaammppaannhhaass ddee pprroommooççããoo ddooss ddiirreeiittooss ee ccoommbbaattee ààss vviioollaaççõõeess

A campanha de fortalecimento dos conselhos tutelares realizada pelo Conanda, em parceria com a SecretariaEspecial dos Direitos Humanos é um bom exemplo de campanha que enfoca situações de violação de direitos decrianças e adolescentes e informa sobre o direito à denúncia a ser realizada nos conselhos tutelares. Combate aviolação e fortalece o órgão de acolhimento das denúncias.

A realização de campanhas de combate à violência, ao preconceito, por exemplo, é outra forma de atuar quedenuncia as violações e incentiva a mudança de atitude da sociedade em relação ao tema. São meios para ampliare fortalecer ações individuais e coletivas de cidadania.

PPrroommooççããoo ddaa ppaarrttiicciippaaççããoo ddaa ssoocciieeddaaddee ee ddee ccoonnttrroollee ssoocciiaall

É fundamental que a comunidade local participe da formulação e da implementação das políticas públicasdesenvolvidas na localidade, avaliando o impacto sobre os direitos das pessoas da comunidade. Para isso, o conselhonecessita garantir uma esfera pública ampliada, com participação de representantes da comunidade local, que:

• elabore políticas públicas de promoção de direitos.• monitore o impacto dessas políticas na proteção e efetivação dos direitos.• investigue as violações de direitos em sua localidade de atuação.• atue no sentido de que as violações de direitos recebam as sanções previstas na lei e que não aconteçam mais. • fiscalize as ações governamentais, inclusive as execuções orçamentárias.• acompanhe as proposições de projetos de leis.

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

50

Page 51: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

119

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

osO acompanhamento por parte da sociedade consciente contribui para evitar que os conselhos sejam usados

para forjar legitimidade.

CCoommuunniiccaaççããoo ee iinnffoorrmmaaççããoo

A comunicação tem papel fundamental para a efetivação da participação democrática. É preciso informar asociedade civil sobre a existência da grande quantidade de conselhos que existem hoje no Brasil. Apenas se podecontrolar o que se tem conhecimento. A criação de mecanismos de divulgação sobre o conselho e suas açõesimplica em algumas estratégias:

aa.. Construir um plano de comunicação estratégica que dê visibilidade às suas pautas, ações e ajude a dartransparência aos seus atos por meio de:

• Informativos.• Site na internet.• Agenda pública.• Divulgação de suas deliberações, resoluções, entre outros.

bb.. Os conselheiros têm de levar as discussões e deliberações dos conselhos a um público mais amplo. Para isso, oconselho necessita garantir a comunicação, os espaços de discussão e escuta da comunidade, como porexemplo:

• Encontros e reuniões com a comunidade.• Assembléias ou audiências públicas.• Reuniões abertas com divulgação antecipada de pautas.• Seminários temáticos.• Debate sobre suas resoluções.• Mecanismos de prestação de contas.

BBuussccaa ddee iinnffoorrmmaaççõõeess ssoobbrree oo iinntteerreessssee ddaa ssoocciieeddaaddee ppeelloo ccoonnsseellhhoo

Investigar o grau de desconhecimento por parte da sociedade civil sobre os conselhos, seja em relação à própriaexistência desses mecanismos, seja em relação às funções que eles exercem, como eles estão organizados, comoseus membros são escolhidos, etc.

Capítulo 11 - Ações básicas para uma atuação mais efetiva dos conselheiros

51

Page 52: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

120

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os PPrroommoovveerr aarrttiiccuullaaççõõeess ee iinntteeggrraaççõõeess ddee ppoollííttiiccaass ee aaççõõeess

• Construção de parcerias intersetoriais e interinstitucionais.• Construção de pactos e agendas mínimas a partir do trabalho de articulação e integração dos conselhos junto

aos órgãos governamentais, legislativos, judiciários, entidades sociais, meio empresarial e sindical, etc.

PPrroommooççããoo ddaa aarrttiiccuullaaççããoo eennttrree CCoonnsseellhhooss,, EEssttaaddoo ee ssoocciieeddaaddee

Promover a articulação do debate sobre políticas públicas entre Estado e sociedade civil e no interior dessaúltima é uma importante via para buscar superar a verticalidade e a setorialidade que marcam o formato daspolíticas públicas brasileiras (SILVEIRA, JAQUELINE)

UUmm ppoouuccoo ddee vviivvêênncciiaa

A rotina de conselheiros que já atuam em seus setores é o melhor espelho do que poderá ser sua atuação comoconselheiro. E cumpre um aspecto que defendemos: a importância da troca de experiência entre os Conselhoscomo forma de fortalecer a atuação individual.

Ter uma idéia consistente sobre direitos fundamentais e abertura para aprender com os erros e acertos de nossaprática. Contribuir para dar curso a essa mudança de paradigmas em cada uma das políticas públicas, não apenasocupando esses espaços, muito menos privatizando esses espaços. Estes são desafios que devem fazer parte docotidiano da ação conselheira.

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

Referências

CONANDA. Resolução no 106. Brasília: Conanda, anexo Recomendações para elaboração de leis municipais,estaduais e nacional de criação e funcionamento de Conselhos dos Direitos .

NOGUEIRA NETO, Wanderlino. Direitos humanos da infância e da adolescência no SIPIA, Fortaleza: CEDCA, 2004.

SILVEIRA, Jaqueline. Arranjo institucional dos Conselhos.

52

Page 53: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

121

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 12 - Articulação entre conselhos e integração das ações

Capítulo 12Articulação entre conselhos e integração das ações

As políticas sociais no Brasil foram construídas de forma bastante fragmentada, no âmbito de um Estadotradicionalmente centralizador, autoritário, patrimonialista e excludente. Essa tradição foi rompida por pressão dosmovimentos sociais na década de 1980 com a promulgação da Constituição Federal de 1988.

Com o princípio da descentralização, da municipalização e da participação social, a articulação de ações ganhouum significado presente e necessário à vida pública de construção e execução de políticas e na defesa dos direitos.

Os conselhos dos direitos e de defesa são formados a partir de áreas específicas de atuação do Estado e voltadosa grupos sociais também específicos. A articulação entre eles é imprescindível, sob pena de na lei termos umcenário, e, na prática e nos resultados da ação política por direitos termos outro – o cenário da divisão, dafragmentação, das “caixinhas” de direitos que não dialogam entre si. Em resumo, teríamos um “corpo humanocom direitos esquartejados”, na contra-mão do que se conquistou mundialmente com a Declaração Universal dosDireitos Humanos, tratados, protocolos e convenções, e incorporados na Constituição de 1988, que apontam paraa universalidade e indivisibilidade dos direitos humanos.

Um dos grandes desafios em um contexto de exclusão e de ampliação dos direitos de cidadania e ao mesmotempo de políticas setoriais, é reconhecer e ampliar o atendimento às demandas específicas necessárias e, aomesmo tempo, a ampliação das demandas universais, sem compartimentalizar a concepção de direitos humanose de políticas públicas. Além disso, uma conseqüência nefasta da fragmentação e desarticulação é o fato de queassim as políticas atingem apenas alguns grupos e não caminham na universalização dos direitos.

Teixeira e Carvalho, no artigo sobre como articular as ações dos conselhos,37 alertam para o fato de que “osconselhos vêm sendo formados, ligados a cada uma das áreas da ação do Estado e a cada um dos segmentosorganizados da sociedade. A divisão de muitos conselhos de direitos, apesar de ter avançado na visibilidade dasdenúncias e da necessidade de políticas de atenção a determinados grupos excluídos, não tem, no entanto,aumentado o nível e o número da participação social. Ao contrário, verificam-se superposições de representantesda sociedade civil e até do Estado em mais de um conselho.”

No cotidiano dos conselhos, é fundamental a percepção dos interesses e das necessidades de outros segmentossociais, é até uma ação pedagógica para os/as conselheiros/as, conhecer a realidade da questão social sob váriosângulos e demandas. O desafio para potencializar a atuação dos conselhos de direitos e de defesa é construir umdiálogo capaz de ampliar o reconhecimento das especificidades de cada um e, ao mesmo tempo, se apoiaremmutuamente nas lutas e ações. Nesse sentido, é relevante que cada área se articule para dentro da área (ex: os

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Mária de Nazaré Tavares Zenaide

53

Page 54: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

conselhos municipais, estaduais e nacional da mulher) e para fora (com os demais conselhos na localidade).Dependendo da pauta das lutas e ações, há necessidade de uma mobilização em diferentes instâncias e esferas,não só na área temática como nos demais campos dos direitos humanos. Conhecer a legislação e o regimento dosconselhos nacionais e estaduais é uma condição para viabilizar possíveis articulações.

Nesse sentido, crescem as iniciativas para se romper com as ações fragmentadas e promover a articulação entresujeitos, ações, órgãos e políticas. Estas iniciativas são potencializadas à medida que se aprofunda o entendimentoda necessidade do diálogo, da intersetorialidade, da transversalidade e da integração de políticas e ações paradefender e garantir direitos. Exemplo disso é a realização do Seminário Nacional para discutir políticas de saúdepara as mulheres, que possibilita o diálogo e a articulação entre os organismos de defesa dos direitos da mulher eos conselhos de saúde nas esferas federal, distrital, estaduais e municipais, tendo como base o Plano Nacional dePolíticas para as Mulheres (2004), aprovado a partir da I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres.

É fundamental a articulação das políticas dos conselhos e a integração das ações do Estado, por exemplo: paraformular política para crianças e adolescentes, considerando a especificidade de raça/etnia, é essencial a articulaçãoentre os conselhos dos direitos da criança com os conselhos de combate à discriminação e de promoção daigualdade racial e as ações da área de educação; para elaborar políticas de educação, é imprescindível considerar asnecessidades de crianças e de adolescentes com deficiência e dialogar junto aos conselhos e órgãos de defesa daspessoas com deficiência. A demanda de crianças e de adolescentes com deficiência física, por exemplo, é maior quea oferta de serviços e equipamentos adequados para sua inclusão e acesso ao direito à educação. A mesma dinâmicadeve ser considerada quando se trata de políticas que envolvem a discussão de gênero, como, por exemplo, aexploração sexual de crianças e de adolescentes ou o trabalho infantil doméstico, a necessidade de articular com osconselhos dos direitos da mulher, ou com os órgãos governamentais e da sociedade civil que tratam especialmentedesta temática, como a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, os Núcleos de Pesquisa sobre Gênero dasUniversidades, as organizações feministas, entre outros.

Os pactos intersetoriais e agendas-mínimas são também exemplos de ações típicas da função potencializadorae estratégica dos conselhos construídas a partir da articulação entre conselhos, junto aos órgãos governamentais,ao legislativo e judiciário, às entidades sociais, aos sindicais, às empresariais de comunicação, entre outros.Destacam-se os pactos pela erradicação do trabalho infantil; contra a exploração e o abuso sexual; contra aviolência, que ganharam destaque na mídia, engajamento dos órgãos governamentais e não-governamentais, e asensibilidade e apoio da população.

A busca de sinergias e integração entre conselhos pode potencializar e trazer melhores resultados na promoçãodos direitos e no combate à violação destes. As conferências podem ser momentos especiais para a busca daarticulação e integração dos segmentos e políticas articulados pelos conselhos. A constante interlocução entreConanda e Conselho Nacional da Assistência Social –(CNAS) tem impulsionado a articulação na construção de

122

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

54

Page 55: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

123

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 12 - Articulação entre conselhos e integração das ações

políticas e programas referenciais que melhorem a qualidade da vida e garantam a proteção integral de crianças ede adolescentes no País, debatendo e negociando pontos comuns na política nacional da assistência social, nosistema único da assistência e no sistema de garantia dos direitos humanos de crianças e adolescentes e seussubsistemas como o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo –(SINASE), incorporando as contribuiçõesdas políticas setoriais que os compõe, como saúde, educação, cultura, esporte, trabalho, entre outros. O resultadopode ser a promoção de ações mais integradas no local de realização destas políticas, os municípios.

No entanto, para que a articulação de ações entre conselhos aconteça de forma adequada e eficaz, é fundamentalo conhecimento das políticas dos diversos conselhos, dos programas, serviços e redes de apoio disponíveis.

Os programas e os conselhos que tratam de políticas públicas constituem importantes redes de suporte para apromoção dos direitos e o combate às violações. Por exemplo, um Centro de Referência de Combate à Homofobiaestá diretamente relacionado ao Conselho Nacional de Combate à Discriminação, mas pode ser um apoio importantenas ações dos Conselhos de Direitos Humanos, dos Direitos da Mulher, dos Direitos da Criança e do Adolescente, entreoutros. O Centro de Defesa do Consumidor pode ajudar, por exemplo, na situação de um deficiente cadeirante quetem seus direitos violados, pois não consegue entrar em um cinema por não ter rampa de acesso.

Os mecanismos para atender às vítimas de violação dos direitos nasceram da necessidade de proteção e de defesados cidadãos e cidadãs e devem ser do conhecimento de todos os conselheiros e conselheiras. Os programas deatendimento às políticas públicas vêm contribuindo com o processo de promoção da igualdade e garantia destesdireitos. Nessa direção, as políticas buscam reconhecer as especificidades, mas é necessário cuidado para não cair norisco da fragmentação. O desafio que está posto é discutir políticas públicas com o viés da transversalidade dos direitoshumanos, considerando a indivisibilidade destes direitos e, ao mesmo tempo, valorizando suas especificidades.

Apresentamos a seguir algumas situações da vida cotidiana dos conselhos com o objetivo de impulsionar a reflexão.

Considerando os programas e serviços descritos abaixo:

• Programa de proteção às vítimas e testemunhas ameaçada.• Programa de proteção aos adolescentes ameaçados de morte.• Programa de proteção aos defensores de direitos humanos.• Centros de apoio às vítimas de violência.• Centros de referência e combate à homofobia.• Centros de referencia de proteção a pessoa idosa.• Serviços de proteção ao depoente especial.• Delegacias especiais de Defesa dos Direitos da Mulher, da criança e do idoso.• Centros de defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente.

55

Page 56: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

aa.. QQuuee rreellaaççããoo eesstteess pprrooggrraammaass ee sseerrvviiççooss ttêêmm hhoojjee ccoomm oo ccoonnsseellhhoo ddoo qquuaall ffaaççoo ppaarrttee??bb.. OO ccoonnsseellhhoo ddoo qquuaall ffaaççoo ppaarrttee ppooddee uuttiilliizzáá--llooss ddee ffoorrmmaa aarrttiiccuullaaddaa ccoomm oouuttrrooss ccoonnsseellhhooss??cc.. CCiittee aallgguummaass ppoossssíívveeiiss aaççõõeess ddee aarrttiiccuullaaççããoo ccoomm oouuttrrooss ccoonnsseellhhooss..

Leia os textos a seguir, extraídos de matérias divulgadas no site da Secretaria Especial dos Direitos Humanos.

TTeexxttoo 11::

“Casos de violência e assassinatos contra travestis, tortura de índios, extermínio da juventude negra, intolerância religiosaquanto às religiões de matriz africana e preconceito institucional racial e homofóbico no Brasil foram os temas tratados naprimeira reunião do ano do Conselho Nacional de Combate à Discriminação (CNCD). Estes são os temas que irão orientaro trabalho do Conselho neste ano. O ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidênciada República (SEDH/ PR), presidente do CNCD, esteve na reunião para dar início às atividades do colegiado em 2006”.

•• NNaa ssuuaa ooppiinniiããoo,, qquuaaiiss ooss ccoonnsseellhhooss ee rreeddeess ddee aappooiioo qquuee ppooddeerriiaamm sseerr aarrttiiccuullaaddooss ppaarraa eennffrreennttaarr ooss tteemmaassddeeffiinniiddooss ccoommoo pprriioorriiddaaddeess ppeelloo CCoonnsseellhhoo NNaacciioonnaall ddee CCoommbbaattee àà DDiissccrriimmiinnaaççããoo??

TTeexxttoo 22::

DDeemmoolliiççããoo ddee bbaarrrraaccooss ddee sseemm--tteettoo eemm SSããoo JJoosséé ddooss CCaammppooss ((SSPP))..O Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) definiu em reunião a ida de uma comissão especialpara São José dos Campos, com objetivo de acompanhar a decisão da justiça de São Paulo, que concedeu liminar àPrefeitura de São José dos Campos autorizando a demolição de 1.800 barracos construídos no assentamento doPinheirinho. A preocupação do conselho é evitar conflitos que resultem em morte ou prejuízo às pessoas que reivindicammoradia. Cerca de sete mil pessoas, sendo 2,5 mil crianças, vivem no local e pretendem resistir à reintegração. A comissãoexplicou que fez e continuará fazendo a mediação do conflito, no sentido de intervir para que a prefeitura e a Justiça localdialoguem com os assentados.”

•• NNaa ssuuaa ooppiinniiããoo,, qquuaaiiss ooss ccoonnsseellhhooss ee rreeddeess ddee aappooiioo qquuee ppooddeerriiaamm sseerr aarrttiiccuullaaddooss ppaarraa eennffrreennttaarr aa ssiittuuaaççããooddeessccrriittaa aacciimmaa??

EExxeemmppllooss ddee aarrttiiccuullaaççããoo eennttrree ccoonnsseellhhooss

11.. AArrttiiccuullaaççããoo ddee eessppaaççoo ffííssiiccoo

AA CCAASSAA DDOOSS DDIIRREEIITTOOSS

Em Cajamar-SP, criou-se recentemente a “Casa dos Direitos”, um conjunto de salas disponibilizadas pela Prefeiturapara o funcionamento de todos os conselhos de co-gestão de políticas públicas que há no município. Diante da

124

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

56

Page 57: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

125

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 12 - Articulação entre conselhos e integração das ações

necessidade de equipar uma sede para a instalação do Conselho Tutelar, buscou-se viabilizar a instalação de todosos conselhos em um mesmo espaço físico. A inauguração da Casa dos Direitos representou o coroamento de umprocesso de articulação de todos os integrantes do Fórum dos Conselhos. Atualmente, o Fórum dos conselhos deCajamar é integrado pelos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, da Assistência Social,da Educação, da Alimentação Escolar e do Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundef. Ainstalação dos Conselhos no mesmo espaço físico propicia comunicação entre eles. Mais que isso, a criação doFórum em torno do qual se reúnem os diversos conselhos permite superar a visão setorizada e corporativa de cadaum deles, e identificar os problemas comuns. Dessa forma, é possível, para os Conselhos voltarem-se para questõesmais amplas e contribuírem para a superação dos desafios estratégicos para o desenvolvimento do Município.

22.. AArrttiiccuullaaççããoo tteemmááttiiccaa ee ttrrooccaa ddee eexxppeerriiêênncciiaass

II SSEEMMIINNÁÁRRIIOO IINNTTEEGGRRAADDOO DDEE CCOONNSSEELLHHOOSS EESSTTAADDUUAAIISS DDEE DDEESSEENNVVOOLLVVIIMMEENNTTOO SSOOCCIIAALL DDEE MMIINNAASS GGEERRAAIISS(Belo Horizonte, 1º e 2 de dezembro de 2004)

A Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Esportes, em ação pioneira, realizou o primeiro encontrodos Conselhos de Desenvolvimento Social do Estado de Minas Gerais, em 2004. Como subsídio às discussões,foi oferecido aos conselheiros uma coletânea de dados com informações (caracterização, semelhanças ediferenças, atuação, funcionamento, estrutura)sobre os Conselhos Estaduais administrativamente vinculados àSecretaria. Segundo informativo distribuído, a intenção da SEDESE foi pensar juntamente com representantesde todos os Conselhos uma estrutura capaz de proporcionar uma capacitação constante para otimizar seudesempenho na formulação, fiscalização e avaliação das políticas públicas de desenvolvimento social do Estadode Minas Gerais. Relação de conselhos participantes:

• CEAS – Conselho Estadual de Assistência Social• CEI – Conselho Estadual do Idoso• CCN – Conselho Estadual de Participação e Integração da Comunidade Negra• CONEDH – Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos• CONPED - Conselho Estadual de Defesa dos Portadores de Deficiência• CEM – Conselho Estadual da Mulher• CONEAD – Conselho Estadual Antidrogas• CEDCA – Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente• CETER – Conselho Estadual do Trabalho, Emprego e Geração de Renda no Estado de Minas Gerais• CEJ – Conselho Estadual da Juventude• SubDH – Subsecretaria de Direitos Humanos• SDH – Superintendência de Direitos Humanos• STR – Superintendência de Trabalho e Renda• SAS – Superintendência de Assistência Social

57

Page 58: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

• SJ – Superintendência da Juventude• CERNAM – Centro Risoleta Neves de Atendimento à Mulher• CAADE – Coordenadoria de Apoio e Assistência à Pessoa Deficiente• CEIVT – Comissão Estadual de Indenização às Vítimas de Tortura• SEDESE – Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Esportes de Minas Gerais

33.. AArrttiiccuullaaççããoo ddee aaççõõeess

SSUUGGEESSTTÕÕEESS(extraídas do artigo Como Articular as Ações dos Conselhos - Instituto Pólis)

• Marque reunião com todos os conselhos conhecidos.• Discuta temas de interesse para todos, que ajudem a perceber as semelhanças entre os conselhos e a pensar

como enfrentar as dificuldades juntos.• SSuuggeessttõõeess ddee tteemmaass: quais os principais desafios do município, qual a representatividade dos conselheiros,

como se aproximar dos representados, como são as relações entre governo e sociedade, como os conselhostêm funcionado, quais resultados têm sido alcançados em cada conselho.

• Você também pode convocar uma reunião entre os conselhos das cidades da mesma região. No Grande ABCpaulista, que é formado por Santo André, São Bernardo, São Caetano, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e RioGrande da Serra, os conselhos começaram a se unir para pensar em temas que interessam a todos e criaramo “Movimento Criança Prioridade 1”.

126

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

Notas37 TEIXEIRA, Ana Claudia C; CARVALHO, Maria do Carmo. CCoommoo AArrttiiccuullaarr aass AAççõõeess ddooss CCoonnsseellhhooss - Instituto Pólis.

Referências

TEIXEIRA, Ana Claudia C; CARVALHO, Maria do Carmo. CCoommoo aarrttiiccuullaarr aass aaççõõeess ddooss ccoonnsseellhhooss. São Paulo: Instituto Pólis.

58

Page 59: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

127

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

osCapítulo 13

Promoção da igualdade e valorização da diversidade: combate ao preconceito e a discriminação

Para falar de igualdade é importante pensar sobre a instituição das categorias para criação das diferenças e ouso político destas para o exercício do poder.

A diferença compreendida como constituidora da diversidade humana é bela, enriquece a vida humana e afirmacada ser na sua singularidade.

No entanto, a conversão das diferenças de gênero, raça/etnia, deficiência e orientação sexual, entre outras, emdesigualdades são construções históricas geradas pela humanidade ao longo de sua história de uso do poder.

As ciências, voltando um pouco no tempo, nos últimos séculos, vão pensar e falar em torno de um sujeitoabstrato e universal, como representação de toda a humanidade. Um sujeito nos moldes das propostas dasverdades ocidentais - homem, adulto, branco, heterossexual e cristão.

Esse modelo passa a ser o centro de todos os discursos, filosóficos, religiosos, médicos, jurídicos, científicos, etc.,reafirmando-o. Nossa forma de pensar e de falar, ou seja, nossa linguagem e nosso imaginário foram aos poucosconstruídos em torno desse centro, desse modelo universal de humano. Assim, o que não corresponde a ele,rapidamente foi conduzido à condição de "outro", ou seja, desqualificado.

Nesse contexto, construíram-se categorias de sujeitos que, por estarem na condição de diferentes, encontram-se em situação de maior vulnerabilidade, como crianças e adolescentes mulheres, negras(os), pessoas comdeficiência, de orientação sexual e religiosa distintas, dentre outras.

Os movimentos sociais, como já mencionado anteriormente, foram importantíssimos para a mudança dessasrelações, propondo reivindicação de espaços, reformulação de leis, igualdade de direitos. Exemplo desse tipo deação são os movimentos feministas, movimento negro, o movimento pelos direitos das pessoas com deficiência,o movimento de gays, lésbicas, travestis, transexuais e bissexuais, o movimento pelos direitos das crianças, dosadolescentes, dos idosos e o movimento por um Estado laico. Esses tiveram importante papel para atransformação das concepções sobre o sujeito universal e trazendo esses 'novos sujeitos' para a luz doreconhecimento social.

Capítulo 13 - Promoção da igualdade e valorização da diversidade: combate ao preconceito e a discriminação

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Célia Maria Escanfella, Maria Célia Orlato Selem, Maria de Nazaré Tavares Zenaide

59

Page 60: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

128

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os A luta por direitos humanos trouxe, por um lado, uma série de conquistas destes direitos afirmados em nossa

legislação. Entretanto, a conquista destes direitos na Lei não foi suficiente para alterar a realidade de discriminaçãoe de preconceito, construída historicamente e que se encontra inserida na cultura e na mentalidade de nossasociedade e presente no cotidiano de violações destes direitos.

Para efeito didático, diferenciamos aqui preconceito e discriminação. Podemos compreender discriminação nocampo da desigualdade e, portanto, seu contraponto é a luta pela igualdade de direitos. Já o preconceito está nocampo da intolerância, da dificuldade de conviver com o diferente e seu contraponto seria a afirmação dadiversidade, o direito à diferença, com igualdade de direitos.

Preconceito é, tanto para as diversas linhas da sociologia e da psicologia, categoria cognitiva, é atitude, implicaem emoções, sentimentos negativos ou de desconforto diante daquilo ou daqueles que são consideradosdiferentes.

É relacionado aos valores, à tradição cultural e à construção de mentalidades. E, portanto, o seu combate exigeoutros tipos de iniciativas distintas, exige a construção de estratégias e ações que visem interferir nestes valores,implica em esferas diferentes de ação. Preconceito não, necessariamente, se manifesta em ação concreta, pode"estar guardado", como questiona a campanha "onde você guarda o seu preconceito?."

A discriminação é ação concreta que implica em tratamento que desconsidera as necessidades e especificidadesdos sujeitos concretos. Para ações de discriminação a Lei prevê sanções, punições, obrigatoriedades. Eu não possodiscriminar negros, mulheres, crianças, homossexuais ou deficientes porque são diferentes do sujeito construídohistoricamente "homem, branco, adulto, heterossexual, sem deficiência". A lei proíbe qualquer tipo dediscriminação e prevê mecanismos para coibi-las. Portanto, planejar o combate às discriminações exige açõesconcretas com amparo legal.

No entanto, o preconceito é abstrato, invisível, composto de valores e culturas. São valores que necessitam deações específicas e coletivas para que se rompa com a visão de mundo baseada no preconceito e se construa umacultura da convivência e respeito às diferenças.

Uma pessoa pode ter preconceito com relação a idosos e assim mesmo ceder seu lugar no ônibus, em funçãoda pressão social ou de um imperativo legal. Bem como uma instituição pode não ter preconceito com relação apessoas com necessidades especiais e simplesmente construir uma escola sem condições de acessibilidade paracadeirantes aos banheiros, como acontece em inúmeras escolas em que há rampas de acesso para as salas, masnão é possível acesso aos banheiros. É necessário agir legalmente diante de ações discriminatórias e de açõescoletivas que interfiram nas concepções e valores das pessoas.

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

60

Page 61: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

129

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

osIsto é, para alcançar eficiência na luta por igualdade de direitos e valorização da diversidade humana, os

conselhos devem considerar a necessidade de ações distintas e estratégias diferenciadas. O combate àdiscriminação exige medida legal, enquanto o combate ao preconceito exige ações no campo da educação, dacultura, da mudança de mentalidades e valores.

O mesmo é similar para as instituições. Nesse sentido, mesmo que a organização política e burocrática dasinstituições não seja preconceituosa (pois não têm capacidade cognitiva), pode possuir mecanismos internos dediscriminação. Basta citar diversos exemplos em que isso ocorre. Como a manutenção de crianças negras durantemais tempo nas primeiras séries do ensino fundamental. Condições sanitárias mais precárias, onde vivem criançasnegras e pobres, se comparada com crianças brancas com as mesmas condições financeiras. São ainda maisdistintas se comparadas com crianças brancas e ricas.

As últimas décadas do século XX foram marcadas por grandes mobilizações de todos os segmentos maisatingidos pelo preconceito e discriminação.

A bandeira da igualdade e o reconhecimento da diversidade como direito foi a principal pauta introduzida peloconjunto destes movimentos que conquistaram, já na Constituição de 1988, a inclusão de alguns artigos para agarantia desses direitos e criação de mecanismos de exigibilidade e de deliberação e controle de políticas depromoção de direitos.

A criação dos conselhos temáticos de direitos e de políticas sociais, como por exemplo, o Conselho Nacional deCombate à Discriminação - (CNDC), o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial - (CNPIR), o ConselhoNacional dos Direitos da Mulher - (CNDM), é resultado também da pressão dos movimentos por igualdade dedireitos e combate à discriminação.

O Conanda, em 2005, colocou pela primeira vez na pauta da conferência nacional o tema específico daigualdade e diversidade. Isto significou que todo o País foi convidado a discutir os direitos de crianças eadolescentes, considerando o direito à diferença.

Assim, a ação dos conselheiros deve ser nos dois sentidos. Diante de um preconceito praticado pelos indivíduos,ou na prática discriminatória das instituições,tem que agir legalmente.

A violência contra os fóruns e/ou focos de diversidades leva a necessidade de atenção especial face às práticasde violência como a violência doméstica, a homofobia, pois estas situações demandam ações de promoção, deproteção e de defesa que promovam/valorizem a igualdade e, ao mesmo tempo, mantenham e reconheçam asdiversidades. As violações contra os direitos humanos geram necessidades de programas de defesa de direitos, e

Capítulo 13 - Promoção da igualdade e valorização da diversidade: combate ao preconceito e a discriminação

61

Page 62: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

130

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os serviços como delegacias especializadas, programas que respeitem as diferenças diante das violações, como Brasil

sem Homofobia, as Casa Abrigo, os Centro de Referência, entre outros.

Uma sociedade democrática, justa e humanitária pressupõe o respeito a todas as pessoas e a garantia dedireitos, independente de sexo, cor, idade, condições físicas, mentais e orientação sexual. Esta é uma disposiçãode nossa Lei maior, desde 1988. Cabe aos conselhos promoverem a discussão na sociedade, estimulando atransformação da mentalidade antiga para estes novos conceitos e visão de homens e mulheres, combatendo asdesigualdades e valorizando a diversidade humana, em que todas as diferenças são fundamentais.

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

62

Page 63: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

131

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

osCapítulo 14

Instrumentos de apoio à promoção de direitos

O trabalho desenvolvido pelo conselheiro, como todo trabalho, requer instrumentos que possibilitem egarantam suas ações como defensor e guardião dos direitos. Alguns instrumentos são essenciais para apoiar estetrabalho. O apoio ao trabalho dos conselhos ocorre, principalmente, com a utilização da legislação em vigor emdefesa dos direitos dos cidadãos e cidadãs, em especial dos segmentos mais vulneráveis e discriminados como ascrianças e adolescentes, mulheres, homens, deficientes, idosos(as), negros(as), índios(as), gays, lésbicas, travestis,transexuais e bissexuais.

Nesse sentido, o Brasil, que sempre contou com atuação intensiva de organizações de defesa de direitos, podecontar com um arcabouço legal nacional e internacional valioso para a defesa dos direitos humanos. Vale destacara importância dos(as) conselheiros(as) conhecerem e utilizarem como instrumentos de apoio à sua ação as leis,programa e políticas, dentre as quais destacamos as seguintes:

11.. DDiirreeiittooss hhuummaannooss –– DDiirreeiittoo ddee ttooddooss

• Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos,Sociais e Culturais.

• Constituição Federal de 1988 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm)• Lei nº 9.140 de 4 de dezembro de 1995 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/L9140.htm)

Reconhece como mortas pessoas desaparecidas em razão de participação, ou acusação de participação, ematividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979 e dá outras providências.

• Lei nº 9.455 de 7 de abril de 1997 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/L9455.htm)Define os crimes de tortura e dá outras providências.

• Lei federal nº 7.716/1989, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor.• Lei nº 9.474 de 7 de julho de 1997 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/L9474.htm)

Define mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951 e determina outras providências.• Lei nº 10.536 de 14 de agosto de 2002 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10536.htm)

Altera dispositivos da Lei nº 9.140, de 4 de dezembro de 1995, que reconhece como mortas pessoasdesaparecidas em razão de participação, ou de acusação de participação, em atividades políticas, no períodode 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, e dá outras providências.

• Programa Nacional dos Direitos HumanosDecreto nº 4.229 de 13 de maio de 2002 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4229.htm).

Capítulo 14 - Instrumentos de apoio à promoção de direitos

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues

63

Page 64: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

132

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os • Portaria nº 98/2003 (http://www.mj.gov.br/sedh/ct/consulta/portaria98.htm)

Institui o Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos• Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos• Programa Brasil sem Homofobia• Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial• Política de Políticas para Mulheres• Plano de Ação para o Enfrentamento da Violência contra o Idoso• Plano de Ações Integradas para Prevenção e Controle da Tortura• Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo

A Constituição de 1988 fixou os direitos humanos como um dos princípios que devem reger as relaçõesinternacionais do Brasil (artigo 4º, inciso II).

Além da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Brasil é signatário dos mais importantes tratadosinternacionais de direitos humanos tanto na esfera da Organização das Nações Unidas (ONU) como da Organizaçãodos Estados Americanos (OEA), entre os quais:

• Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos.• Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.• Convenção Contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes. • Convenção Americana sobre os Direitos Humanos.

A criação do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) em 2006 e a sua revisão em 2000 foi o resultado deuma política nacional que abriu espaço para o desenvolvimento de mais instâncias e instituições atuantes na defesados direitos no Brasil. Essas instâncias, fortemente ligadas à sociedade civil, orientam suas ações para contextosespecíficos, o que confere densidade, qualidade e objetividade ao projeto brasileiro global de defesa dos direitos.

22.. DDiirreeiittooss ddaass mmuullhheerreess

• Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher• Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher • Lei nº 10.778 , de 24.11.2003

(www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.778.htm) Estabelece a notificação compulsória, no território nacional, do caso de violência contra a mulher que foratendida em serviços de saúde públicos ou privados

• Lei nº 10.683 de 28 de maio de 2003(https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.683.htm)Cria a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, com status de Ministério, vinculado à Presidência daRepública, e reorganiza o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

64

Page 65: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

133

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os• Lei nº 10714 de 13 de agosto de 2003

(http://www.mpdft.gov.br/Orgaos/PromoJ/promulher/legislacao/Lei_010714.htm)Autoriza o Poder Executivo a disponibilizar, em âmbito nacional, número telefônico destinado a atenderdenúncias de violência contra a mulher.

• Diretrizes para uma Política Nacional para as Mulheres(http://200.130.7.5/spmu/docs/diretrizes_cnpm.pdf)Contribuições para a I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres

• Deliberações da I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres. (http://200.130.7.5/spmu/docs/anais.pdf)2004 – Anais e Resoluções da I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres

• Decreto nº 5390 de 8 de março de 2005 (http://200.130.7.5/spmu/docs/PNPM.pdf) Institui Comitê de Monitoramento do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres

• Aprova o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres.

33.. DDiirreeiittooss ddaa ccrriiaannççaa ee ddoo aaddoolleesscceennttee

• Declaração Internacional dos Direitos da Criança• Convenção Internacional dos Direitos da Criança• Estatuto da Criança e do Adolescente – (ECA)• Aprovado em 13 de julho de 1990, o ECA instituiu-se como Lei Federal nº 8.069 detalhando o artigo 227 da

Constituição Federal, adotando a chamada Doutrina da Proteção Integral, cujo pressuposto básico afirma quecrianças e adolescentes são pessoas em desenvolvimento, sujeitos de direitos e destinatários de proteçãointegral, com prioridade absoluta.

• O Estatuto, em seus 267 artigos, garante os direitos e deveres de cidadania a crianças e adolescentes,determinando ainda a responsabilidade dessa garantia aos setores que compõem a sociedade, sejam estes afamília, o Estado ou a sociedade. Ao longo de seus capítulos e artigos, o Estatuto discorre sobre as políticasreferentes à saúde, educação, adoção, tutela e questões relacionadas aos adolescentes autores de atos infracionais.

44.. DDiirreeiittooss ddoo((aa)) iiddoossoo((aa))

• Lei nº 8.842 de 4 de janeiro de 1994 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/L8842.htm) - Dispõe sobre a política nacional do idoso, cria o Conselho Nacional do Idoso e dá outras providências.

• Estatuto do Idoso - Lei nº 10.741, de 01.10.2003 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.741.htm)Após sete anos tramitando no Congresso, o Estatuto do Idoso foi aprovado em setembro de 2003 e sancionadopelo presidente da República no mês seguinte, ampliando os direitos dos cidadãos com idade acima de 60 anos.Mais abrangente que a Política Nacional do Idoso, lei de 1994 que dava garantias à terceira idade, o estatutoinstitui penas severas para quem desrespeitar ou abandonar cidadãos da terceira idade.

Capítulo 14 - Instrumentos de apoio à promoção de direitos

65

Page 66: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

134

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os 55.. DDiirreeiittooss ddaass ppeessssooaass ccoomm ddeeffiicciiêênncciiaa

• Declaração de SalamancaVárias declarações das Nações Unidas culminaram no documento “Regras Padrões sobre Equalização deOportunidades para Pessoas com Deficiências”, o qual demanda que os Estados assegurem que a educação depessoas com deficiências seja parte integrante do sistema educacional. Nota-se um incremento no envolvimentode governos, grupos de advocacia, comunidades e países, e em particular de organizações de pessoas comdeficiências, na busca pela melhoria do acesso à educação para a maioria daqueles cujas necessidades especiaisainda se encontram desprovidas; e reconhecendo como evidência para tal envolvimento a participação ativa doalto nível de representantes e de vários governos, agências especializadas, e organizações inter-governamentaisna Conferência Mundial de Educação Especial, representando 88 governos e 25 organizações internacionais emSalamanca, Espanha, entre 7 e 10 de junho de 1994.

• Lei nº 7.853 de 24 de outubro de 1989 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/L7853.htm Dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacionalpara Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - CORDE, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos oudifusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes e dá outras providências.

• Estatuto da Pessoa Portadora de DeficiênciaO Estatuto da Pessoa Portadora de Deficiência, Lei nº 10.098 aprovada em 19 de dezembro de 2000, édestinado a assegurar a integração e a inclusão social e o pleno exercício dos direitos individuais e coletivos daspessoas que apresentam limitação em suas atividades devido à alguma deficiência.

66.. DDiirreeiittooss ddooss nneeggrrooss((aass))

• Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial.http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/discrimina/lex81.htm

• Lei nº 9.459/1997 Tipificação dos crimes de discriminação com base em etnia, religião e procedência nacional.

• Lei nº 10.639 , de 09.01.2003 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.639.htm)Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, paraincluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”.

• Lei nº 10.678 , de 23.05.2003 (http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.678.htm)Cria como órgão de assessoramento imediato ao Presidente da República, a Secretaria Especial de Políticas dePromoção da Igualdade Racial e lhe compete formular, coordenar e articular políticas e diretrizes para apromoção da igualdade racial nas políticas públicas de promoção da igualdade e da proteção dos direitos deindivíduos e grupos raciais e étnicos, com ênfase na população negra.

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

66

Page 67: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

135

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os77.. DDiirreeiittooss ddooss ppoovvooss iinnddííggeennaass

• Estatuto do Índio - Lei nº 6.001 - de 19 de dezembro de 1973(http://www.funai.gov.br/quem/legislacao/estatuto_indio.html)Aos índios e comunidades indígenas se estende a proteção das leis do país, nos mesmos termos em que seaplicam aos demais brasileiros, resguardados os usos, costumes e tradições indígenas.

• Educação Indígena (http://www.funai.gov.br/quem/legislacao/educacao_indigena.htm)Decreto nº 26, De 4 de Fevereiro de 1991 - Prestação de Assistência aos Povos Indígenas - Decreto Nº 3.156, de27 de Agosto de 1999.

88.. DDiirreeiittooss ddaass LLééssbbiiccaass,, GGaayyss,, BBiisssseexxuuaaiiss,, TTrraavveessttiiss,, TTrraannssggêênneerrooss ee TTrraannsssseexxuuaaiiss

• Decreto nº 3.952, de 4 de outubro de 2001http://www.mj.gov.br/sedh/ct/cncd/decreto3952.htmDispõe sobre o Conselho Nacional de Combate à Discriminação – CNCD.

• Programa Nacional de Ações Afirmativas – Decreto nº 4228 de 13 demaio de 2002. http://www.presidencia.gov.br/CCIVIL/decreto/2002/D4228.htm

• Programa Brasil sem Homofobiahttp://www.aids.gov.br/data/Pages/LUMISE047F607PTBRIE.htm

No decorrer do curso, dependendo de sua área de atuação e de interesse, você irá conhecer em profundidadeessas e outras ferramentas legais. Esta abordagem inicial teve o objetivo de ilustrar o processo evolutivo dalegislação de proteção de direitos no Brasil e apresentá-las como instrumentos valiosos de apoio à ação dos/asconselheiros/as.

LLeeiittuurraa ccoommpplleemmeennttaarr::

MMaarrccoo LLeeggaall ddee pprrootteeççããoo ddooss DDiirreeiittooss HHuummaannooss

O Brasil ratificou a maioria dos principais instrumentos globais e regionais de proteção dos Direitos Humanos.Participou da proclamação pela Assembléia Geral das Nações Unidas da Declaração Universal dos DireitosHumanos, em 10 de dezembro de 1948. Depois disso, foram ratificados pelo Estado brasileiro as seguintesnormativas internacionais:

• Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. • Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.• Convenção de Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio.

Capítulo 14 - Instrumentos de apoio à promoção de direitos

67

Page 68: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

136

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os • Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial.

• Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher. • Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher. • Convenção das Nações Unidas contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou

Degradantes. • Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança. • Protocolos Adicionais à Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura. • Convenção Americana sobre Direitos Humanos. • Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos,

Sociais e Culturais. • Abolição da Pena de Morte; entre outros.

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

68

Page 69: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

137

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 15 - Construção de Redes de Proteção dos Direitos

Capítulo 15Construção de Redes de Proteção dos Direitos

CCoonncceeiittoo ddee RReeddee

A palavra Rede é antiga e vem do latim retis que significa teia, entrelaçamento de fios que formam umaespécie de tecido de malha aberto. O termo vem ganhando novos significados, especialmente nas últimasdécadas do século XX, com as novas tecnologias, o incremento da informática e da internet.38 O significadoadotado neste texto refere-se ao conjunto de pessoas ou organizações que mantêm contato entre si com umfim comum. Descrito no manual de Redes Sociais do Centro de Direitos Humanos, “redes são sistemasorganizacionais capazes de reunir indivíduos e instituições, de forma democrática e participativa, em torno decausas afins”.39

Tão importante como definir é entender as Redes “como uma proposta democrática de realização do trabalhocoletivo e de circulação do fluxo de informações, elementos essenciais para o processo cotidiano de trans-formação social.”40

São espaços coletivos por excelência. Não é possível uma rede estabelecer-se com propósitos individuais. Não sefaz uma rede sozinho. Mas a vontade e participação de cada integrante individualmente garante a vitalidade edinâmica das Redes. Seu alimento é a circulação de informações, o compartilhamento de saberes, experiências eobjetivos comuns. Sua forma de existir pode ser virtual (redes eletrônicas) ou presencial (redes físicas), sendo queum funcionamento mais eficaz pressupõe a articulação entre estas duas possibilidades.

O pressuposto do trabalho em Rede é a participação, a cooperação, a horizontalidade, a circulação deinformações e a articulação, sejam elas sistemáticas, estratégicas ou pontuais. São eficazes quanto maior for acapacidade de cooperação e compartilhamento de informações.41

A estrutura horizontal de uma Rede contribui para “romper o modelo de organização tradicional, piramidal,centralizador, competitiva,42 de poder hierárquico e de representação, possibilitando vivenciar nas relações sociaise políticas, e as idéias e princípios emancipatórios, de empoderamento de pessoas e organizações”.43 As redespossibilitam uma nova experiência de convívio político, próprio da horizontalidade, da descentralização e dadesconcentração do poder. “Participar verdadeiramente de uma rede implica em aceitar o desafio de rever asformas autoritárias de comportamento as quais estamos acostumados e que reproduzimos (como dominadores ecomo subordinados) apesar dos discursos e intenções democratizantes”.

AAuuttoorraa:: Maria Lourdes Alves Rodrigues CCoollaabboorraaddoorraa:: Kátia Chagas

69

Page 70: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

Para que sejam eficazes, as Redes devem contar com pessoas que garantam sua sustentabilidade no método.Pessoas que sejam preparadas, formadas para manter o fluxo contínuo de informações, comunicações, de debatese decisões sobre as ações estratégicas coletivas com vistas a alcançar os objetivos declarados pelos integrantes daRede. Esta pessoa é o(a) facilitador(a) da Rede. Segundo Bernardo Toro esse(a) facilitador(a) tem a função de “porseu papel social, ocupação ou trabalho, a capacidade de re-adequar as mensagens, segundo circunstâncias epropósitos, com credibilidade e legitimidade, é uma pessoa que tem público próprio, que é reconhecidosocialmente, que tem a capacidade de negar, transformar, introduzir e criar sentidos frente a seu público,contribuindo para modificar suas formas de pensar, sentir e atuar.”44

Considerando que Redes são processos horizontais, com foco numa determinada causa ou objetivo, osConselhos de Direitos podem usar este método de trabalho articulado em rede para potencializar o resultado dasações na perspectiva da garantia dos direitos dos segmentos atendidos pelo conselho.

Existem diversas modalidades de organização em Rede, com diferentes objetivos. Por exemplo: redes deproteção, redes de organizações da sociedade civil, redes governamentais, redes de serviços, redes de defesa dosdireitos, redes de violações de direitos (é preciso conhece-las para melhor enfrentar o problema).

Exemplos concretos de ações em Rede com foco na garantia dos direitos

11 A Rede de combate à exploração sexual de crianças e adolescentes que articula Governo Federal, governosestaduais e municipais, conselhos dos direitos e tutelares, Ministério Público, Judiciário, Legislativo, organizaçõesda sociedade civil, entre outros.O combate à exploração sexual de crianças e adolescentes requer um grande esforço coletivo de trabalho em rede,visando à eficiência das ações, o cessar da violência, a investigação dos acusados e a proteção das vítimas. Naoutra ponta, dos agressores, também identifica-se a constituição de redes de exploração, as redes de violaçõesdos direitos, opostas à proteção. A Rede de combate à exploração sexual, ou redes de proteção de crianças eadolescentes vítimas da exploração e abuso sexual, surgem como resposta ao enfrentamento do problema,considerando sua complexidade e o necessário envolvimento de diversos atores sociais, do executivo, judiciário,legislativo e da sociedade civil organizada, como os/as juízes/as, promotores/as, delegados/as, defensores dedireitos, conselheiros dos direitos, conselheiros tutelares, as universidades, centros de pesquisa, as organizaçõesgovernamentais e não-governamentais de atendimento, servidores públicos, os fóruns e centros de defesa dedireitos, entre outros.

22 Rede de prevenção e combate ao trabalho infantil

33 Redes contras à violência praticada contra as mulheres

44 Redes de defesa dos direitos humanos

138

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

70

Page 71: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

139

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Capítulo 15 - Construção de Redes de Proteção dos Direitos

Para que a Rede funcione e alcance resultados são necessários: conhecer o tema referente a causa focalizada;elaborar um plano estratégico, definir e priorizar as ações de advocacy, desenvolver e utilizar ferramentas decomunicação, definir uma agenda de encontros e eventos para seus integrantes, organização de grupos detrabalho focado nos assuntos de interesse de seus participantes, na causa e nos objetivos que se quer alcançar.Enfim, aproveitar todas as oportunidades de colaboração que significam sinergias, troca de banco de dados, deinformações e articulação de ações.

Em se tratando de espaços de promoção, proteção, defesa e controle social para que direitos sejam assegurados,as redes neste caso não podem ter como estratégia a competição, mas a cooperação, a solidariedade, acomplementação, a parceria.

DDiiccaass ppaarraa aa AArrttiiccuullaaççããoo ddee RReeddeess

A articulação de uma rede pode dar ênfase a:

• Incentivos a articulações regionais: estas articulações podem render bons frutos, pois organizações de umamesma região tendem a ter problemas similares e por estarem geograficamente próximas têm maiorespossibilidades de realizarem reuniões presenciais.

• Encontros presenciais: estes encontros reforçam os elos de confiança da rede e a torna mais propícia àcomunicação e trabalho conjunto. Embora nem sempre todos os integrantes de uma rede possam comparecera reuniões presenciais, as comunicações aumentam significantemente após os encontros. Se houver tecnologiadisponível, é interessante transmitir estes encontros via internet para toda a rede e ainda estimular a participaçãoon-line, como por exemplo, utilizando o programa skype consorciado com banda larga.

• Construção de um informativo: o objetivo é manter os participantes atentos às ações da rede. A tônica destetipo de comunicação pode ser bastante informal e algumas notícias podem ser de caráter corriqueiro e por vezesjocoso, para fortalecer outros tipos de vínculos entre os participantes.45

Notas38 Na área da informática, Rede significa um conjunto de pontos que se comunicam entre si, sistema constituído pela interligação

de dois ou mais computadores e seus periféricos, com o objetivo de comunicação, compartilhamento e intercâmbio de dados.39 Laura Olivieri - AA iimmppoorrttâânncciiaa hhiissttóórriiccoo--ssoocciiaall ddaass RReeddeess - artigo da publicação impressa Manual de Redes Sociais e Internet do

Centro de Direitos Humanos (www.cdh.org.br)

71

Page 72: Módulo II – Conselhos dos Direitos no Brasil · 71 Módulo II - Conselhos dos Direitos Capítulo 1 - Participação e controle social na garantia dos direitos humanos pressuposto

140

du

lo I

I -

Co

nse

lho

s d

os

Dir

eit

os

Formação de Conselheiros em Direitos Humanos

40 Maria Cristina de Lourdes Guarnieri - Redes: novo paradigma 41 Informação aqui é compreendida como o que é capaz de transformar estruturas.42 Com um controle central de onde emanam as ordens, com poder de representação externa. As disputas internas são freqüentes

e a forma de resolução dos conflitos na disputa pelo poder central é de exclusão dos diferentes.43 Desafios do trabalho em rede - Vivianne Amaral - Rede Brasileira de Educação Ambiental (REBEA)44 TORO, Jose Bernardo e Duarte, Nísia Maria. Mobilização Social: um modo de construir a democracia e a participação.45 Esta dica é de Cássio Martinho, Coordenador de Redes da Rits (Rede de Informações para o Terceiro Setor).

Referências

CAPRA, Fritjof. AA tteeiiaa ddaa vviiddaa. Ed. Cultrix: São Paulo-SP, 1996.

CASTELLS, Manuel. AA SSoocciieeddaaddee eemm RReeddee.. AA eerraa ddaa iinnffoorrmmaaççããoo: economia, sociedade e cultura. Vol. 1. SãoPaulo: Paz e Terra, 1999.

FACHINELLI ,Ana Cristina; MARCON Christian ; MOINET, Nicolas. AA pprrááttiiccaa ddaa ggeessttããoo ddee rreeddeess: uma necessidadeestratégica da Sociedade da Informação.

STAMPS, Jeffrey. Redes de Informações, São Paulo: Makron Books, 1994.

TORO, Jose Bernardo ; Duarte, Nísia Maria. MMoobbiilliizzaaççããoo ssoocciiaall: um modo de construir a democracia e aparticipação.

72