modelo de folha de rosto do projeto – seleção mestrado

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO LINHA TRABALHO E EDUCAÇÃO LERIANE TITTON A GESTÃO DAS ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DO RS: LIMITES E POSSIBILIDADES PARA O ACIRRAMENTO DAS CONTRADIÇÕES DA ESCOLA CAPITALISTA Florianópolis 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

LINHA TRABALHO E EDUCAÇÃO

LERIANE TITTON

A GESTÃO DAS ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DO RS:

LIMITES E POSSIBILIDADES PARA O ACIRRAMENTO DAS

CONTRADIÇÕES DA ESCOLA CAPITALISTA

Florianópolis

2014

Leriane Titton

A GESTÃO DAS ESCOLAS PÚBLICAS ESTADUAIS DO RS:

LIMITES E POSSIBILIDADES PARA O ACIRRAMENTO DAS

CONTRADIÇÕES DA ESCOLA CAPITALISTA

Dissertação submetida ao Programa de

Pós-Graduação em Educação do

Centro de Ciências da Educação da

Universidade Federal de Santa

Catarina para a obtenção do Grau de

Mestre em Educação.

Orientadora: Prof. Dra. Adriana

D’Agostini

Florianópolis

2014

Aos trabalhadores em educação que

acreditam, educam e lutam pela

revolução, e aos meus alunos, de

outrora e aos que ainda virão, como

incentivo a buscarem o conhecimento,

ferramenta para transformar o mundo.

AGRADECIMENTOS

À Prof. Dra. Adriana D’Agostini, pela orientação, pelas

contribuições ao longo destes dois anos, pelos ensinamentos em aula,

por sua prática comprometida com a educação pública numa perspectiva

emancipatória e sua luta cotidiana para transformar o mundo em busca

da sociedade comunista. Pela confiança e por todo o apoio.

Aos Professores da UFSC, com os quais tive a oportunidade de

estudar e aprender, por suas aulas instigantes, Prof. Dra. Rosalba M.

Cardoso, Prof. Dra. Nise M. T. Jinkings, Prof. Dr. Paulo S. Tumolo e

Prof. Dr. Lucidio Bianchetti.

À Prof. Dra. Rosalba M. Cardoso e à Prof. Dra. Bernardete W.

Aued, por sua prontidão em fazer parte das bancas e avaliar este

trabalho, e pelas importantes e qualificadas contribuições na banca de

qualificação do projeto e na banca de defesa da dissertação.

À Prof. Dr. Celi N. Z. Taffarel, por sua prontidão em avaliar a

dissertação e fazer parte da banca de defesa, e por suas importantes e

qualificadas contribuições.

Ao Prof. Dr. Jéferson Silveira Dantas, pelo parecer e pelas

contribuições.

Ao Programa de pós-Graduação em Educação da UFSC.

Aos colegas de aula, pelas contribuições na discussão do projeto

de pesquisa, pelos debates e conversas fortalecedoras.

À diretora da escola investigada, aos estudantes, pais, professores

e funcionários participantes da pesquisa.

Aos colegas do Núcleo de Estudos sobre as Transformações do

Mundo do Trabalho-UFSC, pelas aprendizagens possibilitadas nos

encontros.

Ao Alex Hoffmann, meu companheiro, uma surpresa incrível em

minha vida, pelo amor, pelo carinho, pelo interesse, pelo incentivo, pela

confiança, pelos debates acalorados e por todo o apoio, que me permitiu

realizar esta dissertação em condições melhores.

Ao Mauro Titton, meu irmão, pelo incentivo, pela inspiração,

pelas grandes aulas que iniciam numa simples conversa, pela confiança

e por todo o apoio.

À Janice Titton, minha irmã, pelo incentivo, pelo exemplo de

batalha cotidiana como professora na escola pública, perseverante,

sempre na luta quase solitária em defesa do direito do estudante ao

conhecimento. Pela revisão da dissertação e pelo apoio que me permitiu

chegar ao que sou.

À Ana Rita Titton, minha irmã, a primeira professora da família,

e a primeira a conhecer as dificuldades de querer ensinar em uma escola

pública. Por seu compromisso, seu apoio sempre.

À Graciosa M. G. Titton, minha mãe, mulher forte, que de pé

enfrentou desde pequena as dificuldades da pobreza e a tristeza de não

poder estudar para além da segunda série. E que sempre se sacrificou

pelos filhos.

Ao Julio Titton, meu irmão, pelo apoio e confiança.

Aos meus sobrinhos e cunhados, pelo carinho, pela confiança e

por compreenderem minha ausência.

Aos professores militantes do CPERS-Sindicato, com os quais

muito aprendi, em especial aos militantes do grupo CEDS – Centro de

Estudos e Debates Socialistas.

Aos meus amigos, pela confiança e por compreenderem minha

ausência.

Assim como a humanidade que há em nós, o conhecimento não

se produz individualmente, é um produto social. Os conhecimentos que

se encontram organizados e expostos nesta dissertação devem-se ao

conjunto dos trabalhadores que possibilitaram seu desenvolvimento ao

longo da história.

Quem não se movimenta,

não sente as correntes que o prende.

(Rosa Luxemburgo)

RESUMO

O presente estudo apresenta uma análise acerca da gestão das escolas

públicas estaduais do Rio Grande do Sul (RS). Por meio de uma

pesquisa qualitativa, apoiada nos conceitos e categorias do materialismo

histórico-dialético e em seus pressupostos teóricos, utilizando os

instrumentos de análise documental, revisão bibliográfica, entrevista

semiestruturada, questionários e observação semidirigida, o estudo

objetiva compreender por que as relações que constituem a gestão das

escolas estaduais do RS ocorrem de forma autoritária, sem participação

coletiva e democrática da comunidade escolar, embora a legislação que

a regulamenta institui formalmente a democracia e a participação. A

partir das contradições presentes no fenômeno, busca conhecer as

possibilidades de construção de práticas de gestão que contribuam para

o acirramento das contradições da escola capitalista como estratégia de

luta pela emancipação humana. O estudo revela que as políticas

educacionais refletem os interesses do capital e seguem a lógica das

reformas neoliberais, subsumindo as proposições da classe trabalhadora

ou incorporando-as com outros significados como forma de construir o

consenso em torno das pautas da classe dominante. Fazendo uma análise

lógica e histórica da gestão escolar, e relacionando o cotidiano da escola

com a legislação que regulamenta a Gestão Democrática do Ensino

Público do RS, o estudo conclui que os principais limites para o

desenvolvimento de práticas democráticas são o distanciamento da

escola, de sua gestão e de seus objetivos em relação às lutas e

reivindicações da sociedade e das organizações da classe trabalhadora e

seu distanciamento de objetivos que representem os interesses de

emancipação da classe, bem como a divisão do trabalho e a hegemonia

do capital sobre a consciência da classe trabalhadora. Como principais

possibilidades, aponta a participação qualificada da comunidade escolar,

a conscientização do trabalhador por meio da sua ação possibilitada pela

legislação, a sua unidade e a sua luta, dentro de uma estratégia global de

transformação da sociedade, da educação e da escola, a criação e

funcionamento dos grêmios estudantis como ambiente de organização,

prática e conscientização dos estudantes. Somente a ação consequente

da classe trabalhadora, ou seja, a unidade na luta, construída sobre as

reivindicações comuns e com a unificação de suas direções, pode

transformar a escola em um ambiente democrático de modo a contribuir

com a emancipação humana.

Palavras-chave: Política educacional. Gestão escolar. Gestão

democrática.

ABSTRACT

This work presents an analysis about the management of the state public

schools in the Rio Grande do Sul (RS). Through a qualitative research

based on the concepts and the categories of the historical-dialectical

materialism and on its theoretical presuppositions and using instruments

of documentary research, literature review, semi-structured interview,

questionnaires and semi-directed observation, this work aims to

understand why the relations that compose the management of the state

public schools of the RS occur in an authoritarian manner without the

collective and democratic participation of the school community

although the legislation that regulates it formally establishes the

democracy and the participation. From the contradictions in the

phenomenon it seeks to know the possibilities of the construction of

management practices that contribute to the intensification of the

contradictions of the capitalist school as a struggling strategy for the

human emancipation. The study unveils that the educational policies

reflect the interests of the capital and follow the logic of the

neoliberalism reforms, subsuming the propositions of the working class

or embodying them with other meanings as a way of building consensus

around the agenda of the ruling class. By doing a logical and historical

analysis, and by relating the everyday life of the school with the

legislation that regulates the Democratic Management of the Public

Education of RS, the study concludes that the main limits for the

democratic practices development are the distancing of the school, its

management and its objectives, from the social struggles and its

distancing from the interests of the emancipation of the class, as well as

the division of labour and the hegemony of capital over the working-

class-consciousness. As the main possibilities, it indicates the qualified

participation of the school community; the development of the worker's

class-consciousness through his action made possible by the legislation,

his unit and struggle, within a global strategy for transforming the

society, the education and the school; the establishment and functioning

of the student unions, as an environment for the organization, practices

and consciousness of the students. Only the consequent action of the

working class — i.e., unity in struggle built on common claims and with

the unification of directions — can transform the school into a

democratic environment so that it can contribute to human

emancipation.

Keywords: Educational policy. School management. Democratic

management.

LISTA DE SIGLAS

ADIN – Ação Direta de Inconstitucionalidade.

AIT – Associação Internacional dos Trabalhadores.

ANDE – Associação Nacional de Educação.

ANPAE – Associação Nacional de Política e Administração da

Educação.

ANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em

Educação.

ARENA – Aliança Renovadora Nacional.

BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento.

BIRD – Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento.

BM – Banco Mundial.

CBE – Conferências Brasileiras de Educação.

CEDES – Centro de Estudos Educação e Sociedade.

CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe.

CNE – Conselho Nacional de Educação.

CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação.

CONAE – Conferência Nacional de Educação.

CPERS-Sindicato – Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do

Sul – Sindicato dos Trabalhadores em Educação.

CPM – Círculo de Pais e Mestres.

CPM – Critical Path Method.

CRE – Coordenadoria Regional de Educação.

EJA – Educação de Jovens e Adultos.

FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

FHC – Fernando Henrique Cardoso.

FMI – Fundo Monetário Internacional.

FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação

Básica e Valorização dos Profissionais da Educação.

FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério.

IPES – Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais.

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

MARE – Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado.

MDE – Manutenção e Desenvolvimento do Ensino.

MEC – Ministério da Educação.

MEC-USAID – Ministério da Educação e Cultura - United States

Agency for International Development.

OEA – Organização dos Estados Americanos.

OMEP – Organização Mundial de Educação Pré-Escolar.

PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais.

PDDE – Programa Dinheiro Direto na Escola.

PDE – Plano de Desenvolvimento da Educação.

PDS – Partido Democrático Social.

PDT – Partido Democrático Trabalhista.

PDV – Plano de Demissão Voluntária.

PERT – Program Evaluation and Review Technique.

PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro.

PNE – Plano Nacional de Educação.

PPBS – Planning, Programming, and Budgeting System.

PPP – Plano Político Pedagógico.

PRN – Partido de Reconstrução Nacional.

ProEMI – Programa Ensino Médio Inovador.

PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira.

PT – Partido dos Trabalhadores.

RS – Rio Grande do Sul.

SEC – Secretaria de Educação e Cultura do RS.

SEDUC – Secretaria de Educação e Cultura do RS.

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência

e a Cultura.

UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................ 21

1.1 PROBLEMA E OBJETIVOS ..................................................... 27

1.2 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO ...................... 30

2 AS MÚLTIPLAS DETERMINAÇÕES DO MOMENTO

HISTÓRICO ATUAL ......................................................................... 39

2.1 OS DIFERENTES CONCEITOS ACERCA DA

ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA PÚBLICA ....... 40

2.2 O TRABALHO COMO ELEMENTO FUNDANTE DO SER-

SOCIAL E O SURGIMENTO DA ESCOLA ................................... 52

2.3 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA RELAÇÃO TRABALHO-

EDUCAÇÃO- EMANCIPAÇÃO ..................................................... 54

2.4 RELAÇÕES DE TRABALHO NA AMÉRICA LATINA E NO

BRASIL ............................................................................................ 65

2.5 RELAÇÕES DE TRABALHO NA ESCOLA PÚBLICA –

INTENSIFICAÇÃO E PRECARIZAÇÃO ....................................... 77

3 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO SOCIAL DA GESTÃO DA

ESCOLA PÚBLICA NO ÂMBITO DA SOCIEDADE

CAPITALISTA ................................................................................... 87

3.1 PARTICIPAÇÃO, DEMOCRACIA, AUTONOMIA,

EMANCIPAÇÃO HUMANA .......................................................... 90

3.1.1 A Comuna de Paris como experiência histórica de

autogestão ................................................................................. 112 3.2 O CONCEITO DE GESTÃO DEMOCRÁTICA DA ESCOLA

PÚBLICA DO RS ........................................................................... 124

4 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA LEGISLAÇÃO

ACERCA DA GESTÃO ESCOLAR DESDE O BRASIL

COLÔNIA ATÉ A LEI DE GESTÃO DEMOCRÁTICA DO

ENSINO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO SUL NA

ATUALIDADE .................................................................................. 167

4.1 OS PERÍODOS COLONIAL, REPUBLICANO E DA

DITADURA CIVIL-MILITAR ...................................................... 171

4.2 O PERÍODO DE CONSTRUÇÃO DO CAMPO

DEMOCRÁTICO E A GESTÃO DA ESCOLA PÚBLICA NO

COMPASSO OU CONTRAPASSO DA LEGISLAÇÃO E DAS

REFORMAS ................................................................................... 192

5 RELAÇÕES ENTRE A PRÁTICA DE GESTÃO DA ESCOLA

PÚBLICA E A LEGISLAÇÃO ....................................................... 215

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS: AS POSSIBILIDADES DE

CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS DE GESTÃO QUE

CONTRIBUAM PARA O ACIRRAMENTO DAS

CONTRADIÇÕES DA ESCOLA CAPITALISTA COMO

ESTRATÉGIA DE LUTA PELA EMANCIPAÇÃO HUMANA . 261

REFERÊNCIAS ................................................................................ 269

APÊNDICE A - Roteiro de entrevista para direção ...................... 285

APÊNDICE B - Questionário para estudantes ............................... 287

APÊNDICE C - Questionário para funcionários ........................... 291

APÊNDICE D - Questionários para responsáveis, pais, mães ...... 295

APÊNDICE E - Questionário para professores ............................. 299

APÊNDICE F - Termo de consentimento livre e esclarecido ........ 303

APÊNDICE G - Quadro de dados da pesquisa estudantes ........... 305

APÊNDICE H - Quadro de dados da pesquisa – pais e responsáveis

............................................................................................................ 309

APÊNDICE I - Quadro de dados da pesquisa – funcionários ....... 313

APÊNDICE J - Quadro de dados da pesquisa – professores ........ 317

21

1 INTRODUÇÃO

A organização da escola passou a ganhar importância na política

nacional principalmente a partir de 1889, no período republicano, no

qual a escola era considerada uma importante ferramenta de formação

para a ordem e o progresso. Em diferentes momentos da história o

debate contou com maior ou menor participação popular e foi dominado

por diferentes tendências. A prática foi mudando paulatinamente e

moldando-se à realidade social, determinada pelo modelo

socioeconômico do capital, vigente no país. Diferentes experimentos

foram desenvolvidos, às vezes sob diferentes nomenclaturas,

fundamentados em diferentes bases teóricas, que demonstram a

vinculação a distintos projetos político-sociais e distintas estratégias

pensadas para inserir a escola nas disputas mais amplas no embate entre

as classes sociais. Percebemos que as nomenclaturas administração

escolar, gestão escolar, gestão democrática, organização do trabalho

pedagógico e organização do trabalho didático organizam concepções

diferentes que predominam no debate acerca da organização da vida

escolar, ou seja, a organização do trabalho no âmbito escolar e todo o

movimento que constrói, regulamenta, envolve e que é decorrente do

funcionamento da escola. Embora se diferenciem na concepção de

forma e de que elementos abrangem1, todas tratam do mesmo fenômeno:

a organização do trabalho escolar, o funcionamento e a estrutura da

escola considerando esta como um espaço prioritário onde acontece o

processo ensino/aprendizagem formal, ou seja, a educação formal.

Utilizamos em nosso estudo predominantemente o termo gestão escolar,

por ser o termo reconhecido nas escolas estaduais do Rio Grande do Sul,

e regulamentado em lei, pela Lei de Gestão Democrática do Ensino

Público. Utilizamos o termo administração quando da exposição de

análise documental, por ser o termo predominante até os anos 1980, e ao

utilizarmos como referência autores que usaram este termo em seus

estudos.

A defesa da gestão democrática da escola pública foi um dos

eixos educacionais principais da luta sindical e dos setores da esquerda

no Brasil a partir dos anos 80, ganhando força com o processo de

democratização na política nacional. Passou a ser pauta constante nas

proposições do CPERS-Sindicato (Sindicato dos Trabalhadores em

1 Apresentaremos algumas diferenças entre as concepções no capítulo 2, seção

2.1.

22

Educação do Estado Rio Grande do Sul), estando presente em todos os

congressos e encontros de educação como eixo de debate, a gestão

democrática ganhou espaço entre as principais reivindicações do

sindicato e ganhou força também como proposta educacional de

campanhas eleitorais de partidos de esquerda. O termo gestão

democrática foi se constituindo de significado e sendo identificado com

uma escola que defendesse os interesses dos trabalhadores e após,

identificada com as frentes populares2 e mais expressivamente com o

Partido dos Trabalhadores (PT). Atualmente representa uma concepção

de gestão que é defendida por parcela de teóricos e intelectuais ligados

às estruturas do poder do governo federal do PT, que secundarizaram a

luta por uma escola transformadora e revolucionária em prol do discurso

da governabilidade, do apoio aos projetos das frentes populares e da

escola possível. Além disso, o Estado, para buscar o consenso com a

classe trabalhadora para a implantação dos projetos do capital se

apossou do termo, incluindo-o na legislação e atribuindo-lhe novos

significados, valores e princípios. Isso criou para o termo gestão

democrática um estigma de que se refere apenas a uma concepção

reformista da educação e da sociedade, que não nega a estrutura da

escola capitalista. É evidente que a Gestão Democrática, se não se

contrapõe às políticas do Estado burguês, apresenta limites para além

dos que são intransponíveis na sociedade capitalista, mas defendemos

que, sendo uma pauta que surge na luta da classe trabalhadora, tem um

significado distinto a ser retomado junto com a luta por sua realização.

Compreendemos que uma educação emancipatória não é possível

na escola atual, com sua estrutura e organização determinadas pelo

modelo capitalista de escola e de sociedade, no entanto, não podemos

esperar a transformação da sociedade para então repensarmos a escola.

Pensamos que é necessário disputar os espaços com a forma capitalista

de organização e buscarmos ampliar as práticas que contribuam para a

revolução pretendida, buscando atuar para a transformação da escola e

da sociedade de forma integrada desde este tempo histórico.

Apesar do significado e vinculação político-ideológica que o

termo gestão democrática possa apresentar, compreendemos que a

2 Coligações de partidos de esquerda para disputar eleições, normalmente

encabeçadas pelo Partido dos Trabalhadores (PT). No caso do RS em 1998, os

partidos que compuseram a Frente Popular que elegeu o candidato do PT

Olívio Dutra para governar o estado foram PT, PCdoB, PCB, PSB e PDT.

23

bandeira da democracia3 na gestão escolar e na sociedade não pode ser

abandonada pelos que lutam por uma escola progressista que possa

contribuir com a luta pelo comunismo em busca da emancipação

humana4. Defendemos uma gestão democrática com a participação da

comunidade escolar5, pautada pelo respeito às diferenças e pela

cooperação, visando transformar a escola num ambiente de

aprendizagem e conscientização capaz de romper com sua função de

servir de instrumento de fortalecimento do sistema do capital,

colocando-a a serviço da emancipação da classe trabalhadora,

constituindo-se numa ferramenta de transformação humana e social por

seu caráter formador.

Neste sentido, é necessário conhecer a realidade da escola

pública, como está organizada sua gestão, que elementos a constituem e

como se relacionam, como ocorrem as relações interpessoais dos

envolvidos no processo educativo e a legislação que a embasa, suas

mediações com os projetos político-sociais mais amplos que se inserem

na luta de classes sociais e as determinações impostas pelo sistema de

produção do capital, para que, ao reconhecermos as contradições

intrínsecas à sua organização, sejamos capazes de atuar conscientemente

em sua gestão para a transformação da escola em uma instituição de

relações democráticas, e que estas contribuam na luta pela emancipação

humana.

No Rio Grande do Sul a luta sindical e popular logrou conquistar

a Lei de Gestão Democrática das escolas estaduais desde a década de

19806, a qual foi passando por mudanças, em determinados momentos

progressistas e, em outros, conservadoras. A Lei de Gestão Democrática

do Ensino Público para as escolas estaduais do Rio Grande do Sul traz

em si elementos progressistas para a construção de uma gestão

democrática da escola. Ainda que a legislação apresente algumas

3 Apresentamos uma discussão acerca da concepção de democracia que embasa

nosso trabalho no capítulo 3, item 3.1, onde justificamos nossa opção pela

defesa da democracia operária como princípio a ser defendido na gestão da

escola. Assim, quando falamos em democracia, é à democracia operária que

nos referimos. 4 Trataremos do conceito marxista de emancipação humana ao qual nos

referimos no capítulo 3, item 3.1. 5 A Lei de Gestão Democrática considera comunidade escolar “o conjunto de

alunos, pais ou responsáveis por alunos, membros do Magistério e demais

servidores públicos, em efetivo exercício no estabelecimento de ensino”.

Neste estudo utilizamos o termo com esta amplitude. 6 Expomos como ocorreu este processo no capítulo 4, seção 4.2.

24

possibilidades de avanços, um olhar mesmo que superficial lançado à

organização das escolas evidencia que a democracia não é algo

constante e presente nas relações cotidianas, nem sequer nas ações onde

a legislação institui e regula que haja democracia. Embora a democracia

na gestão seja uma demanda e necessidade na organização escolar, que

vem sendo discutida há décadas pela classe trabalhadora, ela não se

efetiva no cotidiano, e a realidade se mantém desafiadora. Percebe-se

que por mais que se fale que os espaços são democráticos, a democracia

não se efetiva na sociedade e nas organizações que a compõe a não ser

em sua forma burguesa, com a participação popular no momento do

voto apenas, e os discursos acerca da democracia proferidos pelos

dirigentes das organizações, normalmente, se referem a relações que não

existem na prática.

Desde 1997, início de minha atuação como professora em escolas

estaduais, a gestão escolar sempre foi foco de preocupação, debate e

tentativas de construção coletiva, instigada pela concepção teórica que

pauta minha prática, pelos problemas expressos na qualidade da

educação e pelos conflitos estabelecidos percebidos nas escolas em

decorrência dos problemas de gestão da escola e da educação. A

preocupação tornou-se mais latente com a militância e realizando o

trabalho de visita à parte das escolas estaduais de Porto Alegre pela

Direção do 39º Núcleo do CPERS – Sindicato dos Trabalhadores em

Educação do Estado do Rio Grande do Sul, no período de 2002 a 2008.

Neste trabalho ouviram-se incontáveis relatos de práticas de gestão

autoritárias, pautadas no assédio moral, em ameaças e medo, na “troca

de favores”, na corrupção, no descaso com o ensino e com a formação

dos estudantes, que contrariam não apenas as práticas numa perspectiva

emancipatória, mas mesmo o grau de democratização previsto na

legislação, que apresenta uma concepção formal de democracia. Foi

possível constatar que a possibilidade colocada pela Gestão Democrática

prevista na legislação não se concretizou e que a gestão da escola

atualmente trilha rumos distantes da democracia que defendemos. Os

relatos deixaram transparecer a inconformidade de grande parte das

pessoas ligadas à escola, como alunos, pais, professores e funcionários

(e frequentemente membros das próprias direções) com a ausência de

espaços democráticos e de construção coletiva na gestão da escola posta

em prática pela direção e pelos governos. Eram frequentes os desabafos

de professores e funcionários de escola que buscavam orientação sobre

como agir, reagir e atuar para a transformação dos ambientes, bem como

relatos do sentimento de impotência, isolamento, insegurança e medo,

que as paralisava.

25

Ao mesmo tempo, durante a visita às escolas e atendimento no

39º Núcleo do Sindicato, ouviram-se alguns poucos relatos de

experiências de práticas democráticas que, mesmo que limitadas,

demostravam que havia espaço para a luta em prol da democratização da

escola. As práticas democráticas que ocorriam em determinadas escolas

garantiam a participação da comunidade escolar nas discussões dos

projetos educacionais e de construção dos planos políticos pedagógicos

e nas decisões, fortalecendo o debate educacional e a formulação

coletiva de objetivos para a escola, que estivessem de acordo com as

necessidades da comunidade escolar. Este envolvimento com a vida

escolar levava a comunidade a participar organizadamente na luta pelas

pautas educacionais, como pela ampliação da autonomia e por maiores

investimentos nas escolas, atuando em conjunto no Orçamento

Participativo7, que resultava também na participação destas

comunidades nas lutas sociais, o que, pelo acirramento das contradições

entre as classes em luta, contribui com a luta pela transformação social

de superação da sociedade capitalista e construção da sociedade

comunista, a qual defendemos por compreendermos como única capaz

de concretizar a emancipação humana.

Desvelando esta realidade inquietante das escolas, suscitou a

necessidade de estudarmos por que apesar de a legislação apresentar

como possibilidade a democratização das relações na gestão da escola, o

que predomina são as relações autoritárias, em que a comunidade

escolar não participa e as direções de escola recebem projetos prontos e

ordens das secretarias de educação e as aplicam e repassam à

organização escolar e aos professores, funcionários de escola, alunos e

pais, considerando-os seus subordinados (não raro praticando assédio

moral ou repassando o assédio sofrido). Esse processo ocorre

predominantemente sem que haja questionamentos ou debates com a

comunidade escolar acerca da natureza dos projetos e medidas

implantadas, mantendo a comunidade escolar distante do conhecimento

7 Forma de gestão do estado em que parte do orçamento é destinada a realizar as

demandas consideradas prioritárias em discussões e votação pelos delegados

das comunidades, que se reúnem em assembleias marcadas pelo próprio

governo, onde “disputam” os votos para aprovarem as propostas que

apresentam. O Orçamento Participativo funcionou nestes moldes durante o

governo do PT no RS, de 1999 a 2002. Mais informações em: TOLFO,

Daniela O. A experiência do orçamento participativo no Rio Grande do

Sul (1999-2002). Disponível em: < http://www.ongcidade.org/site/arquivos/artigos/oprs467c0c89cabe4.pdf>.

Acesso em: 20 jan. 2014.

26

das mudanças propostas, alheios à realidade cotidiana da escola e sem

qualquer possibilidade de envolvimento nos debates e decisões sobre o

rumo da educação. As direções acabam atuando como extensão dos

governos dentro das escolas e dentro das comunidades em que estão

inseridas, defendendo e justificando os projetos destes (que mudam ao

final de cada governo), ao invés de problematizá-los e proporcionar o

debate, tornando possível à comunidade a compreensão de seus

conteúdos, intenções, a que servem e a que projeto de sociedade estão

vinculados, e questionando se contemplam o projeto da escola e/ou se

estão de acordo com as necessidades da comunidade escolar. Assim,

estariam viabilizando o posicionamento consciente dos integrantes da

comunidade, a possibilidade de formularem um projeto educacional

construído coletivamente e de organizarem a luta por sua realização.

Não nos colocamos ao lado dos que atribuem o fracasso da

educação pública à gestão da escola, como se um “gerenciamento” mais

adequado dentro da unidade escolar pudesse sozinho resolver os

problemas da educação. No entanto, pensamos que o problema do

autoritarismo e falta de participação da comunidade na gestão da escola,

implica significativamente na qualidade da educação pública uma vez

que renuncia sua função social de problematizar, discutir e definir rumos

para a escola junto com as comunidades e de formular propostas para a

educação, e contribui para a manutenção do projeto de sociedade e de

educação do sistema do capital formando para a aceitação e o

consentimento passivo com o modelo vigente. Neste sentido, nos

remetemos a Saviani (2008, p. 61) quando explica que

[...] o critério para se aferir o grau em que a

prática pedagógica contribui para a instauração de

relações democráticas não é interno, mas tem suas

raízes para além da prática pedagógica

propriamente dita. Se a educação é mediação, isto

significa que ela não se justifica por si mesma,

mas tem sua razão de ser nos efeitos que se

prolongam para além dela e que persistem mesmo

após a cessação da ação pedagógica.

Considerando-se, como já se explicitou, que, dado

o caráter da educação como mediação no seio da

prática social global, a relação pedagógica tem na

prática social o seu ponto de partida e seu ponto

de chegada, resulta inevitável concluir que o

critério para se aferir o grau de democratização

27

atingido no interior das escolas deve ser buscado

na prática social.

Se é razoável supor que não se ensina democracia

através de práticas pedagógicas antidemocráticas,

nem por isso se deve inferir que a democratização

das relações internas à escola é condição

suficiente de democratização da sociedade.

Buscamos compreender as causas do distanciamento da gestão da

escola em relação às lutas e reivindicações da comunidade escolar e das

organizações da classe trabalhadora, do autoritarismo praticado pelos

governos na organização educacional e pelas direções de escola e a

ausência de participação da comunidade na discussão e formulação de

propostas e objetivos para a educação pública, na construção cotidiana

da escola e na tomada de decisões.

1.1 PROBLEMA E OBJETIVOS

A gestão da escola pública tem sido um importante foco de

debates ao longo das últimas décadas, sendo objeto de muitos estudos,

de autores diversos, movidos por concepções de educação diversas, que

contribuem para a compreensão da temática em seus inúmeros recortes.

Apesar de atuarmos em instâncias de discussão, sentimos a necessidade

de um estudo mais aprofundado buscando respostas sobre os problemas

enfrentados no cotidiano da escola, especialmente os relacionados à sua

gestão. Percebemos que o problema que mais nos inquietava se referia

ao autoritarismo vigente nas escolas contrariando a Gestão Democrática

regulamentada em lei, e a passividade e ausência da comunidade escolar

na gestão das escolas. Queríamos compreender as causas que alimentam

tais práticas e onde se encontram as possibilidades de superação das

mesmas, para que pudéssemos desenvolver práticas cotidianas

consequentes com nosso objetivo de transformação desta realidade, uma

vez que na forma como se apresenta cumpre apenas o papel delegado à

escola pelas classes dominantes, em contradição com as necessidades da

classe trabalhadora.

Considerando que a democracia na gestão é uma demanda e

necessidade na organização escolar, que vem sendo discutida há

décadas, mas que não se realiza de fato, propusemo-nos ao estudo da

temática da Gestão Escolar e Democracia, tendo por objeto a gestão das escolas públicas estaduais do RS. Buscamos responder ao seguinte

28

problema de pesquisa: por que a gestão das escolas públicas estaduais

do Rio Grande do Sul se constitui predominantemente de relações

autoritárias, sem a participação efetiva da comunidade escolar, embora exista a proposição formal da legislação apontando para o

desenvolvimento da gestão democrática de forma a transformar a

escola em um espaço de construção coletiva? Para dar consequência ao

estudo, conforme a teoria que o embasa – que orienta que não basta

compreender a realidade, mas importa transformá-la –, buscamos

através das contradições do fenômeno responder a um segundo

problema: que possibilidades de superação do autoritarismo e de

acirramento das contradições da escola capitalista se apresentam na gestão existente nas escolas estaduais do RS?

Partimos dos pressupostos que a democracia não pode existir

isoladamente na gestão da escola uma vez que a escola está inserida na

sociedade capitalista, por essência, não democrática; a gestão da escola,

desenvolvida de forma democrática contribui para a formação e

conscientização da classe trabalhadora e no processo de mobilização

desta para as lutas sociais, sendo tarefa da classe a democratização da

sociedade e também da escola; a gestão da escola desenvolvida de uma

forma democrática, com a participação da comunidade escolar, tende a

contribuir com a luta pela emancipação humana, pelo acirramento das

contradições vividas.

Trabalhamos com as hipóteses de que o distanciamento da

escola, de sua gestão e de seus objetivos em relação às lutas e

reivindicações da sociedade e das organizações da classe trabalhadora se

constitui no principal entrave ao desenvolvimento de uma gestão

coletiva e democrática da escola; a tradição de autoritarismo de longo

período que envolve a sociedade e os indivíduos limita a possibilidade

de efetivação da Gestão Democrática do Ensino Público nas escolas

estaduais do Rio Grande do Sul, regulamentada pela legislação atual;

consequentemente, pensamos que embora a classe trabalhadora tenha

logrado incluir na legislação suas reivindicações, isso não encerra a luta

pela democratização da gestão da escola, que depende da

conscientização, do compromisso e da ação dos homens, cujo grau de

alienação é um entrave à possibilidade de participar e de tomar decisões.

A realização deste estudo teve como objetivo geral analisar o

processo de gestão das escolas públicas estaduais do Rio Grande do Sul,

buscando compreender por que as relações que a constituem ocorrem de

forma autoritária, sem participação coletiva e democrática da

comunidade escolar, embora a legislação que a regulamenta institui

formalmente a democracia e a participação, visando a conhecer as

29

possibilidades de construção de práticas de gestão que contribuam para

o acirramento das contradições da escola capitalista como estratégia de

luta pela emancipação humana.

Elegemos como objetivos específicos identificar as

determinações do momento histórico atual; compreender como se deu o

processo de construção social da gestão da escola pública bem como da

Lei de Gestão Democrática do Ensino Público do Rio Grande do Sul;

identificar as principais contradições do processo de gestão escolar das

escolas estaduais do Rio Grande do Sul através da relação entre as

práticas cotidianas de gestão e a legislação que a embasa; analisar os

limites e as possibilidades de construção de práticas de gestão que

contribuam para o acirramento das contradições da escola capitalista

como estratégia de luta pela emancipação humana.

Delimitamos como campo empírico escolas estaduais do Rio

Grande do Sul, onde identificamos um processo de debates e

consolidação de proposições, na legislação, que demonstram a

necessidade de articular os coletivos escolares com os coletivos

organizados na luta pelos interesses de classe mais amplos para avançar

na efetivação da democracia.

A rede estadual é composta por 2.570 escolas, sendo que 258 em

Porto Alegre. Do total de escolas, 6 abrangem creches, 412 têm pré-

escola, 2.364 escolas abrangem Ensino Fundamental, 1.080 contam com

Ensino Médio, 160 têm Educação Profissional, 90 têm Educação

Especial e 555 têm Educação de Jovens e Adultos (EJA), totalizando

25.413 salas de aula utilizadas, sendo que 3.055 salas em zona rural e

22.358 salas em zona urbana. Nestas escolas atuam 49.966 professores

em exercício de atividade docente (6.393 em Porto Alegre), e 99.105

trabalhadores em educação, compreendendo a totalidade de pessoas

atuando em atividades docentes, administrativas e técnicas na escola

(12.072 em Porto Alegre)8. Conforme dados da Secretaria da Fazenda

9

de agosto de 2013, havia 70.040 professores atuando nas escolas

estaduais nas diferentes funções, sendo que destes, 17.842 (25,47%)

eram contratados, sem vínculo estável. O número de associados no

CPERS-Sindicato em junho de 2014 era de 81.896, sendo que 32.539

8 Dados retirados do Censo Escolar 2013. Disponível em:

<http://www.educacao.rs.gov.br/pse/html/estatisticas.jsp?ACAO=acao1>.

Acesso em: 14 abr. 2014. 9 Disponível em:

<https://www.sefaz.rs.gov.br/Site/MontaMenu.aspx?MenuId=639>. Acesso

em: 13 ago. 2013.

30

aposentados e 49.357 trabalhadores atuantes. Destes, não aposentados,

37.745 são professores (33.959 estáveis e 3.786 contratados) e 11.612

são funcionários (11.427 estáveis e 185 contratados). O percentual de

sindicalização de professores estáveis se mantém em torno de 50%,

enquanto que de professores contratados, em torno de 21%. Se

considerarmos o total dos trabalhadores em educação trabalhando nas

escolas do estado, o percentual de sindicalização está em torno de 50%,

enquanto que nas escolas de Porto Alegre, o percentual está em torno de

34%. O total de alunos matriculados na rede estadual no início do ano

de 2013 foi de 1.050.692, sendo que 194 em creches, 8.942 em pré-

escolas, 587.633 no Ensino Fundamental, 336.435 no Ensino Médio,

25.700 na Educação Profissional, 2.024 na Educação Especial e 89.764

na Educação de Jovens e Adultos10

.

1.2 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO

A educação é uma mediação importante que tanto pode servir

para a manutenção da sociabilidade dada, como para sua apreensão

crítica com vistas à sua superação. Segundo Mészáros (2005), essa

mediação se realiza sob o capitalismo majoritariamente pela construção

do consenso social que escamoteia as reais relações sociais, e com isso

faz com que o mundo objetivo seja apreendido como construtor da

realidade humana, e não seu produto (que determina a própria existência

humana). Assim,

as soluções educacionais formais, mesmo algumas

das maiores, e mesmo quando são sacramentadas

pela lei, podem ser completamente invertidas,

desde que a lógica do capital permaneça intacta

como quadro de referências orientador da

sociedade (MÉSZÁROS, 2005, p. 45).

Segundo Antunes (2009), o sistema de metabolismo social do

capital possui um complexo sistema de mediações. Para o autor, o

sistema de mediações de primeira ordem caracteriza-se pelo intercâmbio

do homem com a natureza, a qual ele também pertence, para suprir suas

10

Dados do Censo Escolar do ano de 2013, disponíveis em <

http://www.educacao.rs.gov.br/pse/html/estatisticas.jsp?ACAO=acao1>.

Acesso em 28 fev. 2014.

31

necessidades elementares garantindo a sua existência; e o sistema de

mediações de segunda ordem, cujo advento corresponde a um período

específico da história humana. Na atualidade, com a subsunção real do

trabalho pelo capital, essas mediações de segunda ordem interferem

profundamente na realização e funcionalidade das mediações de

primeira ordem.

Por considerarmos que o “sistema de mediação de segunda

ordem tem um núcleo constitutivo formado pelo tripé capital, trabalho e

Estado” (ANTUNES, 2009, p. 24, grifos do autor) e que, segundo o

autor, “essas três dimensões fundamentais do sistema são materialmente

inter-relacionadas” é que nos propusemos ao estudo da gestão escolar

entendendo que a democracia na gestão da escola é importante numa

estratégia de superação destas mediações fetichizadas, próprias ao

sistema sócio-metabólico do capital.

Ao definirmos o percurso para o desenvolvimento de nosso

estudo, adotamos o materialismo histórico dialético como fundamento,

por concordar com Frigotto (2012) que o define como concepção de

mundo, como método que possibilita a apreensão da realidade de forma

radical e enquanto práxis, que permite a busca de transformações e de

sínteses no âmbito do conhecimento e da realidade histórica.

De acordo com a concepção materialista entende-se que são as

condições materiais que determinam o ser humano e suas condições

espirituais, e Marx e Engels (1977, 2003), com o materialismo histórico

e dialético, oferecem aporte à ação, explicando que os homens podem

alterar as circunstâncias e a si próprios através da práxis revolucionária.

Por isso, defendem que não basta interpretar a realidade, mas importa

modificá-la, concepção da qual comungamos.

Seguindo a indicação de Kosik (1976), durante o processo de

investigação buscamos identificar o desenvolvimento do processo de

construção social do nosso objeto de estudo – a gestão da escola pública

– em três graus:

1) minuciosa apropriação da matéria, pleno domínio do material,

nele incluídos todos os detalhes históricos aplicáveis, disponíveis;

2) análise de cada forma de desenvolvimento do próprio material;

3) investigação da coerência interna, isto é, determinação da

unidade das várias formas de desenvolvimento.

Realizamos uma pesquisa bibliográfica identificando o “estado da

arte” na produção do conhecimento acerca da temática e pesquisa

documental para conhecer o estado atual da legislação no âmbito

educacional. Analisamos documentos de ordenamento legal e

proposições dos segmentos organizados das classes sociais em seus

32

órgãos e fóruns organizativos, sobretudo no Sindicato dos Trabalhadores

em Educação do RS (CPERS-Sindicato), sendo estes a Constituição

Federal, a Constituição Estadual, a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (LDB), Lei de Gestão Democrática do Ensino

Público Gaúcho (e decretos, portarias e orientações relacionadas a esta),

pareceres dos Conselhos Estadual e Nacional de Educação, Plano

Nacional de Educação (PNE), Plano de Desenvolvimento da Educação

(PDE), documentos do Compromisso Todos pela Educação, as teses aos

congressos do CPERS-Sindicato, teses aos congressos da Confederação

Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), o Plano Político

Pedagógico (PPP) e o Regimento Escolar da escola pesquisada. Os

documentos foram analisados tendo como recorte o que se refere à

gestão escolar. Não foi possível o acesso ao Regimento do Conselho

Escolar da escola, às atas de reuniões do Conselho Escolar, das

Assembleias Escolares, de Assembleias de segmentos, atas de reuniões

pedagógicas e correspondências da Secretaria de Educação do Estado à

escola.

Para a análise dos materiais documentais procedemos segundo as

orientações da perspectiva dialética, conforme explicitado por Triviños

(1987). Inicialmente, realizamos uma leitura crítica dos textos, buscando

apreender seu sentido mais geral, ou nas palavras de Triviños,

procedemos “a ‘contemplação viva’ do fenômeno (sensações,

percepções, representações)” (TRIVIÑOS, 1987, p. 73), estabelecendo

nesta etapa a sua singularidade, ou sua diferença em relação aos demais

fenômenos. Posteriormente, realizamos uma sistematização dos

principais indicativos de cada material, procedendo à “análise do

fenômeno”, buscando suas relações sócio-históricas e elaborando

“juízos, raciocínios, conceitos sobre o objeto” (TRIVIÑOS, 1987, p.

74), organizando em quadros para sistematização. Reunimos

informações sobre o fenômeno utilizando-nos de entrevista e

questionários além de observação, buscando apreciar a situação do

fenômeno no tempo e no espaço, e estabelecer seus traços quantitativos

e qualitativos. Por fim, com os dados organizados, buscamos estabelecer

“a realidade concreta do fenômeno” (TRIVIÑOS, 1987, p. 74),

identificando seus aspectos essenciais, “seu fundamento, sua realidade e

possibilidades, seu conteúdo e sua forma, o que nele é singular e geral, o

necessário e o contingente etc.”, e as tendências de desenvolvimento

presentes no material, buscando elaborar uma síntese.

No desenvolvimento do trabalho com os materiais dos órgãos

representativos da classe, utilizamos procedimentos da técnica de

33

análise de discurso, conforme apresentado por Minayo (2004, p. 211-

218), que em traços gerais poderiam ser assim definidos:

1. Leitura crítica, com levantamento das temáticas centrais de

cada um dos textos, com destaque ao(s) problema(s) científico(s)

e aos conceitos e categorias chaves;

2. Verificação nos textos de amostra da pesquisa de quais são as

principais referências teóricas adotadas pelos autores;

3. Verificação de quais são os principais pressupostos teóricos em

que se assentam, especialmente no que diz respeito aos

encaminhamentos propostos.

Para verificar o que se expressa nos documentos e a relação com

a realidade da escola, realizamos uma pesquisa de campo diretamente na

escola. Para este momento, delimitamos uma escola de Porto Alegre que

pudesse representar uma regularidade entre as escolas. A escola deveria

ser considerada comum do ponto de vista da gestão e da condição

(econômica, cultural, familiar) de seus alunos. Pensamos em uma escola

que contemplasse todos os níveis de ensino, que fosse uma escola de

porte médio, que se caracterizasse por pertencer a uma comunidade da

qual emanariam majoritariamente seus estudantes o que permitiria que

se constituísse em um polo centralizador. Além disso, pensamos que,

como a maioria das escolas de Porto Alegre se caracterizam pela

permanência da mesma pessoa como diretor(a) por vários mandatos, a

escola selecionada deveria contemplar esta especificidade, além do que,

a direção poderia nos ajudar a compreender o desenvolvimento da

gestão ao longo do tempo. Lembramos ainda, que durante o período dos

governos Rigotto e Yeda (2003/2010) algumas escolas assinaram

contratos com fundações como Unibanco, Maurício Sirotsky, Ayrton

Senna, Gerdau, das quais receberiam verbas para aplicar os projetos

educacionais elaborados pela escola sob diretrizes das organizações para

atingir determinados resultados na aprendizagem dos estudantes.

Pensamos que isto, em que pese a questão das metas, poderia trazer

dados sobre a questão da gestão da escola quando há recursos

disponíveis para os objetivos estabelecidos, visto que o montante de

recursos disponibilizado pelas fundações ultrapassava

significativamente os valores repassados pelo governo do estado. A

escola de nossa pesquisa, em 2008 recebeu mais de 200 mil reais, sendo

que os repasses do estado para o ano seriam pouco acima de 80 mil11

.

Assim, a escola estudada localiza-se em uma comunidade constituída

11

Não citamos números exatos nem fontes, pois as mesmas identificariam a

escola.

34

majoritariamente por famílias de baixa renda, trabalhadores assalariados

e explorados, que pode ser considerada periferia, mas não favela. Conta

com Ensino Fundamental e Ensino Médio. Em abril de 2014 era

constituída por 1.398 estudantes matriculados nos turnos matutino e

vespertino, 3 funcionários responsáveis pela preparação da merenda

escolar (e atividades relacionadas), 3 funcionários para manutenção da

infraestrutura (limpeza), 3 funcionários atuando na secretaria, 3 para

interação com os educandos (monitores), 1 funcionário responsável pela

portaria, 1 assistente financeiro, 2 orientadoras educacionais, 2

supervisoras, 2 vice-diretores, 1 diretor, 1 professor para apoio

pedagógico dos primeiros, segundos e terceiros anos do Ensino

Fundamental, 2 pessoas para atendimento da biblioteca e 56 professores

em sala de aula. Do total de 80 trabalhadores em educação da escola,

apenas 5 são sindicalizados12

e têm seu cadastro atualizado junto ao

CPERS-Sindicato. Os alunos estão organizados em 46 turmas, sendo

que no Ensino Fundamental são 3 primeiros anos, 4 segundos anos, 4

terceiros anos, 5 quartos anos, 4 quintos anos, 4 sextos anos, 4 sétimos

anos, 3 oitavos anos e 4 oitavas séries, e no Ensino Médio, 5 primeiros

anos, 3 segundos anos e 3 terceiros anos.

Procuramos conhecer a realidade através de observação

semidirigida conforme nos orienta Triviños (2004), de estudo dos

documentos próprios produzidos na escola, pela aplicação de

questionários (por meio de amostragem, visando alcançar todos os

segmentos que fazem parte da instituição escola pública, pais,

estudantes, professores e especialistas, funcionários de escola e equipe

diretiva), e de entrevista semiestruturada ao diretor. Sorteamos uma

turma de cada ano a partir do sexto ano para aplicarmos o questionário

aos estudantes e seus pais ou responsáveis (a partir do 6º ano, pois a Lei

de Gestão Democrática regulamenta que os alunos a partir da 4ª série –

o que seria o 5º ano – podem votar na eleição para direção da escola e

podem votar e ser votados na eleição dos membros do conselho escolar

– considerando que no ano de 2013 houve eleição de diretores, os alunos

a partir do 6º ano já deveriam ter participado do processo de escolha da

direção e estarem participando da gestão da escola através do conselho

escolar). Foram entregues 203 questionários em 8 turmas e recolhidos

54, sendo que 3 destes não estavam respondidos. As questões

perguntavam sobre a participação nas atividades de gestão e organização

da escola, com respostas de múltipla escolha e, solicitando justificativa.

12

Conforme cadastro de associados por escola do 39º Núcleo do CPERS-

Sindicato em junho de 2014.

35

A justificativa deveria ser elaborada por escrito pelo participante, o que

na maioria das perguntas não foi feito. A estes estudantes foram

entregues questionários para que seus pais ou responsáveis

respondessem, sendo entregues 203 questionários. Foram recolhidos 18

questionários encaminhados pelos pais, sendo que dois não respondidos.

Foram entregues 30 questionários aos professores, dos quais 10

retornaram respondidos, e 9 questionários entregues aos funcionários,

dos quais 6 retornaram respondidos.

Optamos pela entrevista à direção por concordarmos com Minayo

(2004, p. 109-110) que explica que

O que torna a entrevista instrumento privilegiado

de coleta de informações para as ciências sociais é

a possibilidade de a fala ser reveladora de

condições estruturais, de sistemas e valores,

normas e símbolos (sendo ela mesma um deles) e

ao mesmo tempo ter a magia de transmitir, através

de um porta-voz, as representações de grupos

determinados, em condições históricas, sócio-

econômicas e culturais específicas.

Sabemos, no entanto, que como toda a técnica de coleta de

informações, a entrevista apresenta suas limitações, sendo a principal o

fato de que através dela “não é possível apreender fidedignamente as

práticas dos sujeitos, mas as narrativas de suas práticas, segundo a visão

deste narrador” (Minayo, 2012, p. 49). Neste sentido, tomamos o

cuidado em nossa análise para percebermos as incoerências e hesitações

nas falas dos entrevistados, buscando compreender seus significados,

conforme nos indica Minayo (2004):

A discussão do campo conceitual da entrevista

como técnica de coleta de informações é amplo e

contempla uma série de questões que vão desde a

fidedignidade do informante ao lugar social do

pesquisador. Para fins de nosso trabalho

centraremos o tema em dois aspectos que retiram

a entrevista do campo supostamente neutro da

"coleta de dados", para a arena dos conflitos e

contradições: (a) Em primeiro lugar, trataremos de

status da palavra, da fala individual como

reveladora dos códigos de sistemas e valores

contraditórios. O assunto nos remete à discussão

dos critérios de representatividade da fala,

36

particularmente da representatividade qualitativa

na pesquisa social; (b) Em segundo lugar,

abordaremos a discussão do caráter da interação

social que está em jogo na relação

pesquisador/pesquisado. Este ponto traz luz sobre

as implicações sócio-políticas, culturais e

ideológicas de uma prática social que pretende ter

critérios de objetividade. (Minayo, 2004, p. 109).

Ao longo do processo e ao final da coleta das informações,

procedemos a análise e interpretação das mesmas buscando verificar

quais as mediações presentes na relação entre a realidade e a legislação

acerca da gestão da escola que permitiriam confirmar ou refutar nossas

hipóteses, contribuindo para sistematizar proposições superadoras para a

busca da efetivação da gestão democrática da escola pública.

Percorremos este percurso conforme nos indica o método

dialético, através das categorias do materialismo dialético, buscando

conhecer a relação do fenômeno com a totalidade social, a dinâmica

interna de nosso fenômeno de estudo, quais aspectos que o constituem,

isolando-os para compreender as relações que estabelecem entre si e

entre estes e o todo, buscando identificar qual é o aspecto essencial, e

seu fundamento, que determina o movimento e o desenvolver do

fenômeno. Buscamos estabelecer as regularidades do fenômeno em

estudo, uma vez que, como Freitas (1994, p. 89) nos ensina,

“entendemos por regularidades a essência (o que há de constante e

substancial no concreto-empírico – o universal), as leis que regulam o

movimento contraditório do real – para além das aparências”.

Na exposição de nosso estudo, no capítulo 2, apresentamos os

principais conceitos e termos que organizam diferentes concepções

acerca da organização do trabalho na escola pública, e para compreender

a totalidade em que se insere nosso objeto de estudo apresentamos uma

análise das múltiplas determinações do momento histórico atual,

iniciando pelo conceito de trabalho como elemento fundante do ser-

social, a historicização do surgimento da escola, sua relação com o

mundo do trabalho e uma análise dos princípios que norteiam esta

relação. Apresentamos também a análise da sociedade capitalista no

presente momento histórico e das relações de trabalho que esta engendra

na sociedade e na escola como parte desta, bem como suas repercussões

para a conformação do homem enquanto ser-social.

No capítulo 3, apresentamos o processo de construção de nosso

fenômeno de estudo, a gestão da escola pública, os conceitos de

37

participação, democracia, autonomia e emancipação humana,

fundamentais para compreender a proposição de gestão democrática

para a escola pública. Apresentamos a experiência histórica da Comuna

de Paris como autogestão, como gestão do Estado pelos trabalhadores,

evidenciando a possibilidade que representa para as lutas da classe.

Apresentamos também o conceito de gestão democrática das escolas

estaduais do RS, o que é, que elementos a constituem conforme a

regulamentação da legislação e conforme a prática nas escolas, suas

dimensões de administração e de direção política, articulando realidade

com algumas possibilidades.

No capítulo 4, apresentamos uma análise do processo de

construção da legislação acerca da gestão escolar, desde o Brasil

Colônia até a construção da lei de Gestão Democrática do Ensino

Público do Rio Grande do Sul e seu desenvolvimento atual,

relacionando com as políticas gerais, as reformas do Estado e a luta dos

trabalhadores organizados nas entidades de classe.

No capítulo 5, apresentamos o estudo das relações entre a prática

de gestão existente nas escolas estaduais do RS e a legislação que a

embasa, essencialmente a Lei de Gestão Democrática do Ensino Público

do RS, apresentando os limites e algumas possibilidades.

Finalizando a exposição, no capítulo 6, apresentamos nossas

considerações finais a partir das relações entre os limites e

possibilidades pensando como a ação cotidiana dos trabalhadores pode

contribuir com sua organização e sua unidade, necessárias para a luta

pela transformação da sociedade e da escola.

38

39

2 AS MÚLTIPLAS DETERMINAÇÕES DO MOMENTO

HISTÓRICO ATUAL

A realidade e os fenômenos que a compõe, bem como as relações

entre si e entre os homens nos diferentes ambientes, são determinados

pelo momento histórico, ou seja, pelas condições materiais a que os

seres humanos estão submetidos e pelas condições espirituais que

desenvolvem a partir destas. Considerando o trabalho como a essência

dos seres humanos (elemento fundante, desencadeador do processo de

humanização), compreende-se que as relações de trabalho, que

determinam em que condições este processo se realiza, determinam as

condições materiais e de consciência dos homens. O elemento central a

ser considerado é de que, no modo de produção capitalista, o processo

de trabalho se desenvolve sob relações de exploração da força de

trabalho para o acúmulo de mais-valia, perdendo sua dimensão

humanizadora. Para além desta premissa, são muitas, diferentes e

complexas as aparências e as configurações que o processo e as relações

de trabalho assumiram historicamente e a forma como determinam o

homem, a sociedade e todos os fenômenos que a compõem. Todo o

fenômeno social é permeado pelas determinações que decorrem do

modo de produção capitalista, o que nos impõe a necessidade do estudo

destas mediações, conscientes de que são dialéticas.

Nosso objeto de estudo insere-se entre as principais polêmicas

que envolvem o debate educacional. A organização de todo o

movimento que envolve o cotidiano de uma escola não é tema pacífico

do ponto de vista conceitual e de nomenclatura. São inúmeros termos

representando diferentes concepções teóricas, diferentes concepções de

educação e sociedade, de trabalho, do trabalho que ocorre na escola,

com diferentes conceitos e abrangências, que mesmo sob a mesma

nomenclatura chegam a diferir em seu conteúdo e forma. De um modo

geral, podemos dividir estas concepções entre os que se pautam em uma

concepção neoliberal de educação, os que se pautam em concepções

progressistas e os que se pautam em uma concepção revolucionária. Em

nosso trabalho, buscamos compreender a origem e o estado de

desenvolvimento de nosso fenômeno, nos utilizando de teóricos que

fazem a análise sob os princípios das concepções progressistas e

revolucionárias. A concepção neoliberal de educação se realiza na

organização da escola por meio da transposição de práticas das empresas

privadas para a escola, pautando-se pelos princípios de competitividade,

produtividade, alcance de metas, racionalidade econômica, considerando

40

a escola um ambiente similar ao da fábrica capitalista e desconsiderando

o todo social. Já as concepções progressista e revolucionária

reconhecem a especificidade da escola pública em relação à organização

de um ambiente de produção privado e a analisam como parte de uma

totalidade histórica.

Compreendemos que a escola como espaço de formação social

dos sujeitos difere antagonicamente em seus fins das empresas privadas,

que buscam a extração e acumulação de mais-valia, exigindo assim uma

organização diferenciada. As diferenças expressas superficialmente nas

terminologias não contemplam a totalidade de sua concepção. O

conteúdo da organização das atividades da escola, as diferentes

concepções sobre esta, não se tornam claras na simples opção de

nomenclatura. Cabe então compreendermos através das diferentes

nomenclaturas e de seu desenvolvimento histórico, o que é o fenômeno

gestão da escola pública o qual consideramos peculiar e antagônico à

gestão empresarial.

2.1 OS DIFERENTES CONCEITOS ACERCA DA ORGANIZAÇÃO

DO TRABALHO NA ESCOLA PÚBLICA

Analisando os discursos no RS, relacionados ao nosso objeto de

estudo em falas e textos cotidianos, propostas e debates sindicais e

populares, em planos de governos e na legislação verificamos que o

termo mais utilizado atualmente em referência ao fenômeno de

organizar os processos de trabalho e o movimento que ocorre na escola é

“gestão”. Na documentação mais antiga analisada, desde o período do

Brasil colonial, o termo utilizado era “administração”. Na literatura

podemos encontrar os dois termos, inclusive utilizados pelos mesmos

autores. Aparentemente esses termos representam o mesmo fenômeno

material e são usados e compreendidos como sinônimos, no entanto,

predominaram em diferentes momentos da história da educação, e

apresentam (ou apresentaram) algumas diferenças, embora nem sempre

sejam utilizados com consciência disso.

De acordo com Riscal (2009, p. 13) “a ideia de administração

apresenta um sentido eminentemente político”. Desde a antiguidade

“administrar referia-se à coisa pública, incluindo-se aí a obtenção de

recursos para o Estado, sua conservação e distribuição” (RISCAL, 2009,

p. 13). A partir do século XVI, com o desenvolvimento dos

empreendimentos privados capitalistas, o significado político da

41

administração foi redimensionado para a realização do acúmulo de

capital privado, uma vez que o acúmulo de riquezas não se faz mais por

parte do Estado e seus representantes (reis, imperadores etc.), mas por

indivíduos privados. Na sociedade moderna capitalista Taylor foi o

primeiro a sistematizar os princípios da organização do trabalho.

Segundo Kuenzer (1984, p. 40)

Ele sistematizou as ideias de divisão do trabalho,

estabelecendo as funções de planejamento,

supervisão funcional e execução; as ideias de

hierarquia, realização do trabalho por tarefa,

identidade de objetivos entre capitalista e operário

(o lucro), motivações econômicas subjacentes ao

trabalho e o conceito de homem racional.

Segundo a autora, a obra de Taylor foi complementada com a

obra de Fayol13

cujo foco era a organização do trabalho do

administrador. Fayol elaborou e descreveu pela primeira vez o processo

administrativo e formulou inúmeros princípios de administração,

enunciando dentre outros “o da existência de um homem certo para cada

lugar, legitimando a ideia de que uns nascem para administrar, outros,

para executar” (KUENZER, 1984, p. 40). Segundo a autora

[...] a gênese da teoria de administração

educacional está vinculada ao próprio

desenvolvimento da teoria geral de administração,

cuja origem e evolução [...] repousa na

necessidade de controle trazida pelas novas

relações sociais inauguradas pelo advento do

capitalismo industrial e sua progressão para a fase

monopolista. (KUENZER, 1984, p. 41).

A partir daí cria-se a concepção de que quanto mais eficiente for

a administração dos recursos, maior será a eficiência da produção e

maior será o acúmulo de capital. Assim novos padrões de administração

voltados à eficiência e produtividade passam a ser implantados. De

acordo com Kuenzer,

13

No intuito de conhecer mais recomenda-se a leitura de: TAYLOR, Frederick

W. Princípios de Administração Científica. 7. ed. São Paulo: Editora Atlas

S.A., 1970. FAYOL, Henri. Administração Industrial e Geral: previsão,

organização, comando, coordenação, controle. 10. ed. São Paulo: Atlas, 1990.

42

A preocupação com uma teoria de administração

escolar surgiu com o desenvolvimento do

comportamentalismo, com sua preocupação de

observação sistemática do real para a derivação de

princípios gerais que se aplicassem à ação

administrativa em qualquer época e espaço.

Substitui, portanto, o enfoque normativo e

prescritivo pelo analítico e experimental.

(KUENZER, 1984, p. 41).

Segundo a autora, “As contribuições anteriores a esta fase que se

inicia, aproximadamente em 1950, não passam de mera transposição da

teoria geral de administração para o âmbito da escola” (KUENZER,

1984, p. 41).

A administração escolar teve sua origem na teoria geral da

administração, as formas de administração escolar se concretizaram

como gerenciamento de resultados, ou gestão de resultados, que Riscal

aponta como sendo “uma das origens da concepção de gestão

democrática e projeto político pedagógico, voltado para a elevação de

eficiência e da eficácia” (RISCAL, 2009, p. 17). A autora aponta

também outra raiz para a concepção de gestão democrática e projeto

político pedagógico, “derivada dos direitos humanos, que asseguram a

educação como um direito de todos e fundamental para a realização dos

demais direitos” (RISCAL, 2009, p. 17).

O termo gestão não foi sempre o predominante na área

educacional, houve uma mudança no desenvolver da história da

educação em que houve a substituição do termo administração pelo

termo gestão. Segundo Silva Júnior (2002) o termo gestão passou a ser

utilizado para forjar uma diferença entre a administração conforme a

teoria da administração geral voltada para as instituições privadas, e a

administração que seria implantada nas escolas públicas, o que permitiu

que fossem aplicados os mesmos princípios, porém dissimulados sob o

novo termo. Segundo o autor, além das citadas, não há como demarcar

as diferenças entre gestão e administração de uma forma clara, mesmo

fazendo um resgate na história da administração. Parro (2013, p. 3.284),

no entanto, expõe que:

Em seu estudo sobre a administração escolar, Paro

(1986) a define e reafirma em estudos posteriores

(Paro, 2008), “como a utilização racional de

recursos para a realização de fins determinados”.

43

Se a administração é a utilização de meios, então,

pode-se afirmar, com Russo (2005), que a gestão é

mediação entre os recursos (meios) e os resultados

(fins).

Parece-nos uma linha muito tênue, no entanto o termo gestão,

fora da educação, é um termo mais voltado à questão da gerência, do

controle de pessoal, na ênfase nos resultados, que representa mais uma

concepção neoliberal.

Com o termo gestão já consolidado e predominando no debate

educacional, nos anos 80, na luta pela democratização do país, foi

formulado o termo e a concepção de gestão democrática da educação.

Defendida por muitos intelectuais e militantes da esquerda política,

representava uma reivindicação popular progressista para a área da

educação, e passou a fazer parte das pautas sindicais e populares nos

movimentos grevistas e reivindicatórios. Mendonça (2000, p. 66)

explica que “a gestão democrática surge como um contraponto à ênfase

organizacional e tecnicista, bem como ao reducionismo normativista da

busca da eficiência pela racionalização de processos” e a luta por sua

implantação foi um combate contra a implantação da gerência científica,

advinda da divisão pormenorizada do trabalho.

Em 1988, a gestão democrática do ensino público foi incluída na

Constituição Federal como um princípio da educação. Posteriormente

passou a fazer parte das legislações estaduais e municipais; em 1996, foi

incluída no texto da LDB, e em 2001, no Plano Nacional de Educação.

Mendonça (2000) explica que é difícil definir a abrangência do

fenômeno gestão democrática uma vez que ela é resultado de um longo

processo de luta, do qual participaram com reivindicações desde as

“corporações profissionais vinculadas ao trabalho educativo, os usuários

diretos da ação pedagógica, seus familiares e até grupos sociais que [...]

reconhecem na educação uma importante bandeira a ser defendida”

(MENDONÇA, 2000, p. 68), ligados a diferentes ideologias e com

diferentes níveis de engajamento. Deste modo, por vezes, seu

significado é reduzido a aspectos ideológicos ou corporativos, outras

vezes a seu aspecto técnico e em outras é tão ampliado que parece

universal e por isso irrealizável. Na tentativa de compreendermos a

abrangência, Mendonça explica que a gestão democrática faz parte de

uma “cadeia mais ampla de processos, procedimentos, instrumentos e

mecanismos de ação que envolve também a política educacional e o

planejamento educacional” (MENDONÇA, 2000, p. 68) ou

44

é um conjunto de procedimentos que inclui todas

as fases do processo de administração, desde a

concepção de diretrizes de política educacional,

passando pelo planejamento e definição de

programas, projetos e metas educacionais, até as

suas respectivas implementações e procedimentos

avaliativos. (MENDONÇA, 2000, p. 69).

O autor alerta para o tratamento que a literatura especializada tem

dado a algumas vertentes, como por exemplo, a eleição de diretores, que

em certos momentos da luta chegou a ser confundida com a própria

gestão democrática. Outros aspectos que normalmente são destacados

são autonomia escolar, descentralização administrativa, financeira e

pedagógica, constituição e funcionamento de colegiados, participação

em processos consultivos e deliberativos entre outros. O autor

(MENDONÇA, 2000) explica que essas diferentes ênfases se devem

também às acepções que a gestão democrática assumiu nos diferentes

momentos e circunstâncias sócio-políticas que envolveram a educação e

influenciaram o pensamento hegemônico acerca da função social da

escola. Para Mendonça, nas décadas de 1970 e 1980 a gestão

democrática representou a luta contra o autoritarismo, enquanto que nos

anos 1990 o foco principal foi a luta do público contra o privado, uma

vez que a manutenção dos espaços públicos estava em risco.

A gestão democrática como pauta da luta dos trabalhadores está

vinculada a uma concepção de projeto histórico, no entanto, quando

apropriada pelas políticas neoliberais e materializada na legislação e no

cotidiano da escola assumem uma forma favorável e adaptável aos

interesses do capital e seus preceitos de descentralização, autonomia e

participação assumem caráter contraditório ao idealizado. Zanardini

argumenta que

Sob a aparente flexibilização do controle estatal

temos, via a descentralização, a autonomia e o

incentivo a participação, uma importante função

ideológica, uma vez que o que ocorre é a

acentuação desse controle, não apenas pela

distinção entre as tarefas de planejamento e

execução, mas porque as estratégias de

envolvimento das classes trabalhadoras, que se

fazem presente nas estratégias inspiradas na

acumulação flexível, têm em vista o controle da

45

capacidade de organização, canalizando-a para a

reprodução dos interesses do capital.

[...] via a materialização das políticas de

descentralização e autonomia proposta pelo

Estado burguês, a participação que se dá, através

desses mecanismos, não pode ser outra senão a

que reproduza os interesses e objetivos que ele

representa.

Como já apontamos, a perspectiva de

descentralização implementada via a reforma do

Estado tem em vista o alcance da eficiência

mercadológica. Como o expresso no próprio

Plano Diretor da Reforma do Estado, essa busca

exige a colaboração entre os indivíduos, entre o

Estado e o mercado, e exige também a competição

entre as diferentes organizações sociais; por isso,

descentraliza-se e propõe-se autonomia às

unidades escolares. (ZANARDINI, 2006, p. 120).

Em decorrência da forma como a proposição se materializa na

prática, o termo gestão democrática vai assumindo diferentes

significados, identificados com diferentes concepções de escola e de

educação e servindo a diferentes projetos. Esse trabalho se refere ao

significado construído na luta dos trabalhadores pela democratização da

educação.

Os termos gestão e administração são comumente empregados

por diversas correntes teóricas, sendo que muitas vezes são adjetivados.

Gestão colegiada, gestão democrática, gestão participativa, gestão

escolar, administração colegiada são alguns dos termos que demonstram

que gestão e administração são polissêmicos e/ou com caráter mais

técnico14

que não são suficientes para expressar e explicar exatamente

uma concepção teórica. Buscando conhecer as especificidades de nosso

fenômeno de estudo, passamos à análise de alguns conceitos e termos

que contribuem nesta construção de significado, e que eventualmente

poderiam trazer dúvidas da razão de nossa opção em defesa da gestão

democrática.

No contexto da consolidação do termo Gestão Democrática e de

sua inserção na legislação (Constituição Federal), se contrapondo a esta

14

A ênfase mais técnica na administração escolar é defendida por aqueles que

comungam da concepção da neutralidade da educação, que acreditam que por

ser neutra a educação deve cumprir fins técnicos podendo assim ser

administrada de forma técnica.

46

lógica, em 1994, encontramos a tese de Luiz Carlos de Freitas na qual

apresenta a concepção de “organização do trabalho pedagógico” como

uma área da Teoria Pedagógica15

, a seguir:

A teoria pedagógica, no entanto, não se limita à

“didática geral”, antes, esta última, é uma das

preocupações da teoria pedagógica. Preferimos,

deste ponto em diante, trabalhar com esta

significação mais ampla, situando o que hoje se

chama “didática” em horizontes maiores. Esta

ampliação conceitual passa por localizar, no

interior da Teoria Pedagógica, uma área que

denominaremos de Organização do Trabalho

Pedagógico.

Didática é um termo que deve ser subsumido ao

de Organização do Trabalho Pedagógico

entendendo-se, este último, em dois níveis: a)

como trabalho pedagógico que, no presente

momento histórico, costuma desenvolver-se

predominantemente em sala de aula; e b) como

organização global do trabalho pedagógico da

escola, enquanto projeto político-pedagógico da

escola. (FREITAS, 1994, p. 90).

Freitas (1994, p. 90) em seu trabalho se propõe a analisar

“algumas categorias (provisórias) da atual organização da escola

capitalista”, evidenciando-as para ajudar na compreensão dos “objetivos

sociais que medeiam e produzem limites para o desenvolvimento do

trabalho pedagógico na sala de aula”. Segundo o autor, sendo categorias,

elas são contraditórias encerrando determinações e possibilidades. As

categorias evidenciadas são:

[...] os objetivos gerais/avaliação da escola

(enquanto função social); e o conteúdo/forma

gerais do trabalho pedagógico da escola (onde

15

Segundo Freitas (1994, p. 89-90) “[...] é importante diferenciarmos teoria

educacional de teoria pedagógica. A teoria educacional formula uma

concepção de educação apoiada em um projeto histórico e discute as relações

entre educação e sociedade em seu desenvolvimento; que tipo de homem se

quer formar; os fins da educação, entre outros aspectos. Uma teoria

pedagógica, por oposição, trata do “trabalho pedagógico”, formulando

princípios norteadores. Dessa forma, inclui a própria didática”.

47

destacamos a artificialidade da vida escolar

separada da produção material, a fragmentação do

trato com o conhecimento e a gestão da escola na

sua forma autoritária e alienante). Estas categorias

modulam categorias mais específicas, no interior

da sala de aula, tais como: objetivos/avaliação do

ensino, conteúdo/método de ensino, etc.

(FREITAS, 1994, p. 91).

Freitas entende a gestão da escola como um dos elementos

constitutivos da organização do trabalho pedagógico, ideia reafirmada

pelo autor ao explicar as categorias conteúdo/método e a relação entre

ambas, em que enuncia “três aspectos cruciais: a ausência do trabalho

material socialmente útil, como princípio educativo; a fragmentação

do conhecimento na escola; e a gestão da escola” (FREITAS, 1994, p.

93, grifos do autor). Acompanhando o desenvolvimento do trabalho de

Freitas (1994, p. 110), o autor afirma que

A relevância destas três características da

organização do trabalho pedagógico na escola

capitalista (ausência de trabalho material,

fragmentação e alienação) nos leva a reconhecer

que somente a sua superação na prática da escola,

à luz de um projeto histórico alternativo, pode nos

conduzir para além dos limites desta organização

do trabalho pedagógico e permitir, na prática, o

aparecimento de novas formas de se lidar com a

questão da formulação dos objetivos de ensino,

dos conteúdos, métodos, planejamento de ensino,

avaliação, com a questão da relação entre

professor-aluno e a própria gestão escolar. Estes

tópicos clássicos da “didática” tem que ser

examinados, criticamente, dentro de uma

concepção maior da própria organização do

trabalho na escola.

O autor não esclarece o que é, e o que abrange, a gestão da escola

nesta sua concepção, em que a coloca lado a lado com os elementos (a

questão da formulação dos objetivos do ensino, dos conteúdos, métodos,

planejamento de ensino, avaliação, relação entre professor-aluno) que,

em nossa concepção e na concepção do ordenamento legal, são seus

elementos constitutivos.

48

Alves nos apresenta o termo organização do trabalho didático,

(utilizado posteriormente por Saviani, 2010) que segundo o autor

(ALVES, 2012), começou a tomar forma como categoria analítica no

final da década de 1990, e foi patenteada em sua obra de 2006, A

produção da escola pública contemporânea, que é fundada na ‘ciência

da história’ da obra A Ideologia Alemã de Marx e Engels, e na releitura

de Didáctica Magna de Coménio. Acerca dos elementos constitutivos

da organização do trabalho didático o autor expõe que:

No plano mais genérico e abstrato, qualquer forma

histórica de ‘organização do trabalho didático’

envolve, sistematicamente, três aspectos: a) ela é,

sempre, uma ‘relação educativa’ que coloca,

frente a frente, uma ‘forma histórica de educador’,

de um lado, e uma ‘forma histórica de

educando(s)’, de outro; b) realiza-se com a

‘mediação’ de recursos didáticos, envolvendo os

procedimentos técnico-pedagógicos do educador,

as tecnologias educacionais pertinentes e os

conteúdos programados para servir ao processo de

transmissão do conhecimento; c) e implica um

‘espaço físico’ com características peculiares,

onde ocorre. (ALVES, 2005, p. 10-11 apud

ALVES, 2012, p. 170).

O autor acrescenta que, aos elementos descritos, soma-se “o

aparato de apoio administrativo produzido pela escola moderna [que]

tornou-se indispensável à realização de sua forma histórica radicada em

Coménio” (ALVES, 2012, p. 170). O autor (ALVES, 2010) também

explica que estes elementos não estão justapostos, mas a depender da

forma histórica do trabalho didático a relação entre eles determina a

dinâmica e as articulações, fazendo com que passem a exercer funções

específicas, e alguns se revelam mais determinantes na definição dos

rumos do trabalho didático.

Alves (2012) atribui a utilização de termos como “organização do

trabalho pedagógico” por Freitas (2008), “organização do trabalho

escolar” por Souza (2008), e “trabalho docente” por Lancillotti (2008) e

Tardif e Lessard (2007) à discussão levantada acerca de que a expressão

“trabalho didático” possivelmente não seria “a mais apropriada para

revelar toda a complexidade das atividades realizadas pelos profissionais

da educação” já que didática seria uma fração do trabalho pedagógico

(ALVES, 2012, p. 171). O autor argumenta que o conceito de didática

49

em Coménio legitima o termo “organização do trabalho didático” uma

vez que “Na obra comeniana, foi corrente a utilização do termo

‘didática’ significando ‘proposta de educação para a sociedade’, acepção

muito distinta das comumente difundidas em nosso tempo” (ALVES,

2012, p.171). O autor explica que a partir do século XVIII com a

utilização do termo pedagogia por Kant, e início do século XIX com

estudiosos como Herbart, “à medida que avançava o processo de divisão

do trabalho no âmbito da educação escolar, a didática se firmava,

progressivamente, como área especializada e subalterna da pedagogia”

(ALVES, 2012, p. 172). Ainda segundo o autor, após a conquista do

Estado pela burguesia, a ciência passou a ser desenvolvida com a

especialização do saber, que pela atomização da investigação do real

pulverizou sua apreensão “gerando toda sorte de obstáculos para que o

homem o reconstituísse como concreto pensado, para que retornasse à

unidade original da totalidade concreta” (ALVES, 2012, p. 173).

Segundo o autor, a pedagogia nasceu como ciência especializada neste

processo, e por isso

Ela está marcada politicamente pelo estigma

burguês e, como as demais ciências

especializadas, põe obstáculos para que o homem

retorne, por meio do pensamento, à unidade do

real e capte concretamente a educação e a escola

referenciando-as à totalidade.

Portanto, o retorno à concepção de Coménio e sua

incorporação aos estudos de ‘organização do

trabalho didático’ não podem ser entendidos como

caprichos direcionados à preservação de

categorias teóricas ultrapassadas. Ao incorporá-la,

a preocupação norteadora incidiu sobre o uso de

expressões cujos significados não tivessem sido

mutilados pela especialização do saber. ‘Trabalho

didático’, por exemplo, quando absorve o

conteúdo conceitual que lhe conferiu a obra

comeniana, é expressão que envolve significado

político amplo, pois faz a discussão ficar em torno

da sociedade e do homem. ‘Trabalho pedagógico’,

ao contrário, resume-se ao campo da educação,

cerceamento imanente à acepção especializada

que nosso tempo lhe atribuiu. (ALVES, 2012, p.

173).

50

Segundo Alves (2012), a concepção de trabalho pedagógico

incorpora uma ambiguidade quando Freitas denomina a didática geral

de teoria pedagógica, não deixando claro se a teoria pedagógica inclui

a didática ou se é a própria didática. O autor conclui o debate afirmando

que

A acepção de ‘didática’, tal como a entende

Coménio, ajuda a tangenciar a ambiguidade

reinante no campo especializado da pedagogia,

pois, além de revelar precisão e consistência,

incorpora em um todo harmonioso todas as

instâncias teóricas delineadas por Freitas, tanto a

da ‘teoria educacional’ quanto a da ‘teoria

pedagógica’, e contempla as iniciativas práticas

que tendem à realização de finalidades e objetivos

da educação. (ALVES, 2012, p. 174).

O autor (ALVES, 2012) também faz a crítica à incorporação da

categoria interdisciplinaridade a qual considera estranha à abordagem

marxista por ser avessa à categoria de totalidade. E acrescenta que

[...] o estudioso que prefere a expressão ‘trabalho

pedagógico’ em lugar de ‘trabalho didático’, tem

por referência a divisão do trabalho que se impôs

no campo da educação escolar, em nosso tempo, e

as acepções produzidas a partir do século XIX,

tanto no que se refere à pedagogia, desde então

colocada na condição de continente, quanto à

didática, entendida como parte integrante do

campo pedagógico. Mas essa postura não deixa de

conter uma limitação, pois, suficientemente

considerada, evidencia que a concepção de

pedagogia, hoje, não esgota o sentido de didática

em Coménio. E o motivo é muito simples. A

divisão do trabalho conferiu uma acepção

especializada à pedagogia, colocando-a, em face

do conhecimento, como uma esfera parcial, o que

não ocorria com didática no século XVII. Discutir

didática, nessa época, implicava, também e

necessariamente, discutir a sociedade e, portanto,

o homem. Discutir a pedagogia, hoje, resume-se a

considerar a atividade especializada que os

educadores desenvolvem no interior da escola.

(ALVES, 2012, p. 172).

51

Furtando-nos ao debate entre a abrangência e conceito de didática

e pedagogia, pensamos que as concepções organização do trabalho didático e organização do trabalho pedagógico, conforme expostas por

seus autores, englobam o conjunto de elementos que constituem nosso

objeto de pesquisa, ao que nos referimos como gestão da escola.

Contemplam também a dimensão de gestão compreendida pela Lei de

Gestão Democrática do Ensino Público do RS, legislação que ordena

nosso objeto de estudo. No entanto, enquanto a concepção de

organização do trabalho didático e gestão democrática, como a

pensamos, referem-se a uma proposta de organização para a escola

atual, buscando sua transformação para uma nova escola em uma nova

sociedade, a ideia que fundamenta a concepção da organização do

trabalho pedagógico de Freitas trata da organização coletiva do trabalho

numa transição da escola atual até a eliminação da mesma, pelo

desenvolvimento de uma forma revolucionária de educação no/pelo

trabalho.

Sobre o termo organização do trabalho escolar, de Rosa F. de

Souza, concordamos com a crítica que o autor (ALVES, 2012) faz,

explicando que a autora considera currículo algo à parte, não incluído na

concepção de trabalho escolar, e que assim, organização do trabalho escolar se refere estritamente à dimensão administrativa interna às

escolas, além disso, neste conceito são omitidos os determinantes

materiais da escola moderna.

Sobre o conceito de trabalho docente utilizado em sentido amplo,

também concordamos com Alves (2012, p. 176), que explica que “a

gestão das unidades escolares dissociou operações administrativas e as

reuniu em serviços com funções especializadas, desde então geridos por

especialistas independentes” (ALVES, 2012) assim, “o trabalho docente

é parte constitutiva do trabalho didático e se coloca ao lado de todas as

demais formas de trabalho atreladas aos serviços e funções que ele

abrange” (ALVES, 2012, p. 177) como as de administrador escolar, o

bibliotecário, o supervisor escolar, o orientador educacional, o

coordenador de curso etc. (que realizam funções especializadas

associadas à atividade educacional), bem como as funções de apoio

administrativo (limpeza e manutenção dos prédios, controle de pessoal,

controle de material, controle financeiro etc.).

Utilizaremos em nosso trabalho o termo gestão enquanto uma

fase do desenvolvimento da administração, porém numa dimensão mais

ampla que o significado neoliberal do termo, ou mais que o simples

gerenciamento e relocação de recursos e fiscalização de pessoal com

52

vistas a garantir um melhor rendimento (produtividade e lucro) como

nos parece ser a finalidade da administração empresarial, aparentemente

mais técnica, pautada em resultados a serem atingidos, na maioria das

vezes, quantitativos, ou mensuráveis, através da aplicação de metas e

índices de desempenho, como produtividade. Neste sentido, buscamos

compreender como nosso objeto de estudo se constituiu historicamente,

a partir do significado de administração e de seu desenvolvimento até a

atualidade, com diversos termos e concepções, e as polêmicas que o

envolvem, o que não é possível sem a compreensão e a explicação do

contexto histórico mais geral.

2.2 O TRABALHO COMO ELEMENTO FUNDANTE DO SER-

SOCIAL E O SURGIMENTO DA ESCOLA

No início era a natureza, matéria apenas. Nela, o animal, que

através de seus instintos é guiado a buscar seu alimento para garantir sua

sobrevivência, a observa. O antropoide, num diferencial em relação aos

outros animais, conta com uma formação estranha em sua constituição

corporal já evoluída: o polegar opositor em suas patas dianteiras. Este o

auxilia em sua ação sobre a natureza para conseguir o alimento,

possibilitando prender firmemente um objeto e permitindo assim o uso

de ferramentas; o que ao longo de sua existência e seu desenvolvimento

cerebral passa a fazer, e faz e observa. Ao observar vai transformando

sua ação, obtendo maior eficácia.

No processo de evolução, há um aumento do volume da massa

cerebral, e, com isto, um aumento de suas faculdades, além da mutação

dos olhos, que ficam ambos totalmente voltados para frente, melhorando

a imagem enviada ao cérebro e a percepção do mundo. Posteriormente,

em decorrência de necessidades vinculadas às diferenças geográficas,

desenvolve a habilidade de se locomover sobre duas patas, deixando

assim as outras, já na forma de mãos, livres para atuarem com outros

fins. Com o uso de ferramentas, passa a mudar outros hábitos, como a

alimentação, à qual inclui a carne. Para isto é necessário caçar. E vai

desenvolvendo métodos e ferramentas, observando os resultados e a

natureza à sua volta. Começa a se organizar socialmente e desenvolve a

necessidade de se comunicar, e a partir dela, a linguagem. Faz novas

descobertas, como a do fogo, que o faz evoluir fisicamente, pois com os

alimentos mais moles, diminui o tamanho dos dentes e do maxilar,

deixando mais espaço no crânio, o qual é ocupado pelo crescimento do

53

cérebro. A busca por abrigo cria novas necessidades e novas

observações.

E assim vai se fazendo homem, o animal que desenvolve sua

consciência e o conhecimento a partir de sua ação intencional sobre a

natureza para transformá-la, visando garantir sua sobrevivência. Engels

nos explica que o trabalho “É a condição básica e fundamental de toda a

vida humana. E em tal grau que, até certo ponto, podemos afirmar que o

trabalho criou o próprio homem.” (ENGELS, 1999b, p. 4).

Nasce a necessidade de preservar o conhecimento desenvolvido e

de passá-lo de uma geração a outra, o que inicialmente se dava de uma

forma quase espontânea, na convivência, na prática do grupo. Surgem as

formas de registrar este conhecimento para a posteridade, como

desenhos, hieróglifos e a escrita.

Segundo Manacorda (2010a), na Idade Antiga, a educação é

tarefa dos pais, que atribuem aos preceptores a instrução dos filhos.

Com a evolução da sociedade patriarcal, educar é tarefa de escravos, no

interior da família, ou de escravos libertos, na escola. A seguir, há a

atuação dos escribas e dos sofistas, a quem os possa pagar. Surgem as

escolas e ginásios para os cidadãos (homens livres). Na Idade Média, a

instrução ocorre nos mosteiros e nas corporações de ofícios, sob a

responsabilidade dos mestres artesãos.

A evolução segue, e o conhecimento avança, na ciência e na

técnica, e surgem novas ferramentas e novas formas de produção.

Mudam a organização social, as formas de trabalho, as relações de

produção e as relações entre os seres humanos. Na Idade Moderna

segundo Manacorda (2010a), surgem novas formas de produzir e novas

organizações para agrupar os trabalhadores no mesmo processo de

produção: as fábricas e a indústria moderna, onde cada trabalhador

contribui com a realização de uma parte do processo de produção.

Surgem novas formas de comercializar os produtos e gerenciar o

mercado. E um novo objetivo para a produção: a troca, o mercado.

Nasce o capitalismo. O desenvolvimento e a complexificação do sistema

produtivo, incluindo o trabalho, possibilita a criação da maquinaria, da

indústria moderna e do processo de industrialização. Assim, pela

necessidade de uma nova formação do trabalhador, faz-se necessária

uma nova forma de preservar e repassar os conhecimentos.

Com a evolução do homem e de sua organização social, e o

desenvolvimento da ciência, que, cada vez mais, conta com novos

conhecimentos, através de séculos, há a necessidade de criar uma forma

nova de preservar e organizar estes conhecimentos e garantir sua

54

perpetuação, e assim nasce a escola moderna16

, com a fábrica, ligada ao

mundo do trabalho, em decorrência de suas necessidades e também fruto

da reivindicação dos trabalhadores. Nesta duplicidade de objetivos, de

responder à demanda dos trabalhadores pelo conhecimento e de formar

para a nova sociedade burguesa e para o mercado, preparando o

trabalhador parcial, esvaziado de sentido e conteúdo necessário ao

desenvolvimento e manutenção do sistema socioeconômico do capital,

se constitui o caráter contraditório da escola. Permeada pelas relações de

compra e venda da força de trabalho, pela qual o trabalhador aliena sua

força de trabalho e a si próprio, se desenvolve visando à massificação,

pautada num conhecimento limitado voltado à formação do trabalhador

no que é necessário para ele desempenhar determinada função no

processo de produção.

Assim sendo, há que se tomar como ponto de partida o fato de

que a escola atual e os fenômenos que a compõem são determinados

pelo modo pelo qual a humanidade produz sua existência e as relações

que ocorrem no mundo do trabalho, portanto, pelo capitalismo, que

determina o atual momento histórico, não numa relação de fatalidade,

mas dialética, tendo em vista que os homens é que produziram o modo

de produção, e ao produzirem sua existência deste modo, se produzem

determinados por esse processo.

2.3 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA RELAÇÃO TRABALHO-

EDUCAÇÃO- EMANCIPAÇÃO

Consideramos inicialmente que a sociedade é determinada pelo

modo de produção vigente, ou seja, as relações do processo de produção

da existência humana determinam as relações sociais e a própria

condição do ser humano. Segundo Engels (1999b), a condição humana

se desenvolveu pelo trabalho, tomado este como atividade criativa do

homem sobre a natureza. Assim, o grau de desenvolvimento das forças

produtivas e o modo como o homem se relaciona com a natureza no

processo de trabalho determinam o desenvolvimento de sua consciência.

16

Para maior entendimento e detalhamento da história da educação,

recomendamos a leitura de MANACORDA, Mario Alighiero. História da

Educação – da antiguidade aos nossos dias. 13. ed. São Paulo: Cortez, 2010;

RUGIU, Antônio Santoni. Nostalgia do Mestre Artesão. Campinas: Autores

Associados, 1998.

55

O modo de produção capitalista tem como essência a propriedade

privada dos meios de produção, em que o trabalhador é obrigado a

vender sua força de trabalho, em troca de salário, garantindo ao

capitalista o acúmulo de mais-valia17

. Sob a perspectiva capitalista, o

trabalho é transformado em mercadoria, perdendo sua dimensão

educativa, de atividade criativa e conscientizadora, passando a ter como

único objetivo a produção de valores de troca capazes de garantir a

realização da mais-valia e o lucro ao capitalista. O trabalhador vende sua

força de trabalho, se aliena ao capitalista neste processo. O trabalho é

esvaziado de conteúdo e torna-se apenas uma expressão mecânica da

ação humana, o trabalhador age como se fora uma extensão da máquina.

A este trabalhador, tido como parte da fábrica, não cabem as decisões

relacionadas ao seu processo de trabalho; ele se torna executor de um

plano projetado num ambiente distinto. De acordo com Marx (1984, p.

43), com o desenvolvimento da maquinaria o trabalhador passou à

“especialidade por toda a vida em servir a uma máquina parcial” em que

“Abusa-se da maquinaria para transformar o próprio trabalhador, desde

a infância, em parte de uma máquina parcial”.

Quanto à destituição do caráter criador do trabalho, o autor

acrescenta que “enquanto o trabalho em máquinas agride o sistema

nervoso ao máximo, ele reprime o jogo polivalente dos músculos e

confisca toda a livre atividade corpórea e espiritual” (MARX, 1984, p.

43). Assim, “[...] na grande indústria erguida sobre a base da

maquinaria” produz-se “a separação entre as potências espirituais do

processo de produção e o trabalho manual, bem como a transformação

das mesmas em poderes do capital sobre o trabalho” (MARX, 1984, p.

44). O trabalho deixa de ser uma atividade criadora, pois, com a divisão

do trabalho (os que são proprietários dos meios de produção e os que

não são proprietários e vendem sua força de trabalho aos primeiros),

passa a ser, para o proletariado, a soma de movimentos e atividades

repetitivas e parciais, que pouco requerem de atividade mental. A

formação necessária ao trabalhador é alterada em função do que a esfera

da produção necessita dele.

Conforme Marx (2010a), as relações de exploração do

trabalhador pelo capitalista (homem explorando homem) têm como

consequência uma realidade permeada por relações fetichizadas, na qual

os homens não reconhecem o fruto de seu trabalho e não reconhecem a

si próprios e seu papel no processo de produção. A realidade se

17

Nos utilizamos da teoria Marxista para compreender a realidade, assim o

conceito dos termos presentes no texto são considerados nesta acepção.

56

apresenta de forma distorcida pelo trabalho alienado18

, e o homem vai se

desumanizando na impossibilidade de realizar suas potencialidades,

anulando a possibilidade de emancipação humana.

Defendemos a emancipação como um fim a ser perseguido, uma

vez que, conforme Manacorda (2010b) explica, baseando-se no

pensamento de Marx, é a realização das potencialidades e da liberdade

do ser humano, ou seja, a participação nos prazeres e no consumo – dos

bens materiais e intelectuais. A liberdade está condicionada ao modo

pelo qual o ser produz sua existência, no capitalismo, portanto, é negada

pela alienação. Segundo Manacorda (2010b, p. 83)

A divisão do trabalho condiciona a divisão da

sociedade em classes, e, com ela, a divisão do

homem; e como esta se torna verdadeiramente tal

apenas quando se apresenta como divisão entre

trabalho manual e trabalho mental, assim as duas

dimensões do homem dividido, cada uma das

quais unilateral, são essencialmente as do

trabalhador manual, operário, e as do intelectual.

Ainda segundo o autor, “como a divisão do trabalho é, em sua

forma ampliada, divisão entre trabalho e não trabalho, assim também o

homem se apresenta como trabalhador e não trabalhador”. Além disso, a

divisão do trabalho produz homens unilaterais, trabalhadores parciais, e,

segundo o autor (MANACORDA, 2010b, p.84)

sob o signo da unilateralidade, justamente, se

reúnem todas as determinações negativas, assim

como o signo oposto, o da onilateralidade

(obviamente, muito menos frequente, dado que

essa ainda não é coisa deste mundo), reúnem-se

todas as perspectivas positivas da pessoa [grifo

nosso].

18

Marx, nos Manuscritos Econômico-Filosóficos utiliza dois termos diferentes:

alienação (Entäusserung) e estranhamento (Entfremdung). Alguns autores os

tomam como sinônimos, enquanto outros defendem que Marx os utilizou com

significados diferentes. Para maior compreensão do significado dos termos e

do conceito indicamos a leitura de: TUMOLO, Paulo Sergio. Trabalho,

alienação e estranhamento: visitando novamente os “manuscritos” de marx.

Disponível em: <http://27reuniao.anped.org.br/gt09/t0916.pdf>. Acesso em:

22 mar. 2013. MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. 4. reimpr.

São Paulo: Boitempo, 2010.

57

O autor afirma a impossibilidade de atingirmos a

omnilateralidade na sociedade capitalista, pelas determinações que esta

impõe. No capitalismo temos homens com capacidades limitadamente

desenvolvidas, com suas possibilidades não realizadas, homens tolhidos

dos meios de produção, impossibilitados de desenvolverem o processo

de trabalho de forma autônoma e independente, e de serem proprietários

do produto de seu trabalho. Segundo Marx (2010a, p. 80, grifos do

autor), “O trabalho [no modo de produção capitalista] não produz

somente mercadorias; ele produz a si mesmo e ao trabalhador como uma

mercadoria, e isto na medida em que produz, de fato, mercadorias em

geral”.

O maior segmento da população se compõe de trabalhadores

assalariados, que vendem sua força de trabalho, com possibilidades de

humanização reduzidas pelo modo como produzem sua vida. Enfrentam

condições precárias de existência, vivendo o reino das necessidades19

no

qual o indivíduo empenha seu tempo não apenas para satisfazer suas

necessidades naturais e vitais, mas para satisfazer finalidades externas,

19

Marx (1983b, p. 273) explica que: “A riqueza real da sociedade e a

possibilidade de constante expansão de seu processo de produção não

depende, portanto, da duração do mais trabalho, mas de sua produtividade e

das condições mais ou menos ricas de produção em que ela transcorre. O

reino da liberdade só começa, de fato, onde cessa o trabalho determinado pela

necessidade e pela adequação à finalidades externas; portanto, pela própria

natureza da questão, isso transcende a esfera da produção material

propriamente dita. Assim como o selvagem tem de lutar com a Natureza para

satisfazer suas necessidades, para manter e reproduzir sua vida, assim também

o civilizado tem de fazê-lo, e tem de fazê-lo em todas as formas de sociedade

e sob todos os modos de produção possíveis. Com seu desenvolvimento,

amplia-se esse reino da necessidade natural, pois se ampliam as necessidades;

mas, ao mesmo tempo, ampliam-se as forças produtivas que as satisfazem.

Nesse terreno, a liberdade só pode consistir em que o homem social, os

produtores associados, regulem racionalmente esse seu metabolismo com a

Natureza, trazendo-o para seu controle comunitário, em vez de serem

dominados por ele como se fora por uma força cega; que o façam com o

mínimo emprego de forças e sob as condições mais dignas e adequadas à sua

natureza humana. Mas este sempre continua a ser um reino da necessidade.

Além dele é que começa o desenvolvimento das forças humanas, considerado

como um fim em si mesmo, o verdadeiro reino da liberdade, mas que só pode

florescer sobre aquele reino da necessidade como sua base. A redução da

jornada de trabalho é a condição fundamental.”

58

de produção e acumulação de mais-valia para o capitalista, passando a

ser dominados por esse processo de trabalho.

A exploração humana e a precarização das formas de existência

se agravam nos momentos de crise do sistema do capital, em que este

precisa de um esforço para garantir sua sobrevivência. Nestes períodos,

a realização das potencialidades humanas encontra-se mais limitada e

inatingível devido ao rebaixamento das condições de vida da população.

No entanto, precisamos ver a crise também como um momento

impulsionador da ação da classe trabalhadora, pois como explica Harvey

(2011, p. 176), “As crises são momentos de paradoxo e possibilidades,

das quais todo o tipo de alternativas, incluindo socialistas e

anticapitalistas, podem surgir”. Essa contradição fundamental do

sistema sócio-metabólico nos períodos de crises estruturais profundas é

explicada por Mészáros como uma possibilidade, pois,

É nas circunstâncias de tais crises estruturais

profundas que o trabalho pode fazer valer com

sucesso sua reivindicação de ser a única

alternativa hegemônica (factível) à ordem

estabelecida em todas as suas dimensões, desde as

condições materiais básicas de vida até os mais

intrincados aspectos políticos e ideológicos do

intercâmbio social. (MÉSZÁROS, 2011, p. 1059).

De acordo com Mészáros (2007) estamos vivendo num período

da crise estrutural do capital, o que, apesar de limitar as condições de

ação da classe trabalhadora, também engendra algumas possibilidades

pelo acirramento das contradições entre capital e trabalho. Referindo-se

ao momento histórico atual, Tumolo defende que “nunca foi tão

necessário falar sobre e fazer a revolução” (TUMOLO, 2005, p. 19),

citando algumas razões, e entre elas a de que

nunca a contradição antagônica entre capital e

humanidade ficou tão evidente e constatável

empiricamente como no período contemporâneo,

ou seja, nunca a continuidade da existência

humana esteve tão ameaçada por um modo de

produção gestado pela própria humanidade.

(TUMOLO, 2005, p. 19).

Assim, a luta pela emancipação não pode obter êxito se

desvinculada da luta pela transformação social para um modelo de

59

produção da vida que possibilite relações de igualdade entre os

trabalhadores, uma sociedade sem classes sociais, com a superação da

propriedade privada que garanta ao trabalho o espaço de centralidade na

produção do humano, e a superação da subsunção do trabalho concreto

ao trabalho abstrato20

. Não há possibilidade de emancipação humana no

capitalismo onde uma classe domina a outra.

A escola, considerada como nos indica Pistrak (2003, p. 30),

como “a arma ideológica da revolução”, pode cumprir um papel

importante na construção de um projeto de sociedade sem classes, que é

a única possibilidade para a emancipação humana. Não se trata, no

entanto, de, como nos explica Saviani (2008, p. 51), cair “na armadilha

da ‘inversão idealista’ [...] que, de elemento determinado pela estrutura

social, a educação é convertida em elemento determinante” e crer que a

escola sozinha pode transformar a sociedade. Assumimos a concepção

de que a escola é determinada pela sociedade, assim como os seres

humanos, mas numa relação dialética e não fatalista, na qual os seres

humanos podem transformar as condições materiais e se transformarem

neste processo.

Para realizar a possibilidade de estar a serviço da revolução, a

escola precisa ser transformada. Esta tarefa está nas mãos da classe

trabalhadora. Segundo Leher (2012, p. 2),

[...] somente os socialistas podem lutar

plenamente para que a educação dos trabalhadores

possa abranger o conjunto da existência e das

potencialidades humanas: científica, artística,

tecnológica, histórico-cultural, filosófica,

assegurando a todos que tem um rosto humano a

condição de intelectual e dirigente.

É uma tarefa da classe trabalhadora com consciência de classe,

que tenha como objetivo de sua ação a sociedade comunista. Isso

demanda uma escola que priorize o conhecimento, aliando as

descobertas científicas ao trabalho e à educação como partes inter-

20

Podemos compreender os conceitos de trabalho concreto e trabalho abstrato

com a seguinte citação de Marx (1983a, p. 53): “Todo trabalho é, por um lado,

dispêndio de força de trabalho do homem no sentido fisiológico, e nessa

qualidade de trabalho humano igual ou trabalho humano abstrato gera o valor

da mercadoria. Todo trabalho é, por outro lado, dispêndio de força de trabalho

do homem sob forma especificamente adequada a um fim, e nessa qualidade

de trabalho concreto útil produz valores de uso”.

60

relacionadas do processo de humanização; e uma escola constituída em

espaço de participação efetiva da classe trabalhadora, a qual deve

realizar sua construção através de decisões coletivas, pautadas pelo

princípio de cooperação e de igualdade, organizando a escola de forma

democrática. Neste processo de organização o indivíduo necessita

conhecer a escola em seu desenvolvimento, assim toma consciência de

si como parte de um todo, complexo de relações, o qual só funciona

organizadamente com a responsabilidade de todos, e toma consciência

da importância de sua atuação, de suas ações e das consequências destas

para o todo. A práxis nesta perspectiva reflexiva traz elementos que

possibilitam avanços nas condições subjetivas necessárias para a

revolução socialista e para a emancipação humana, contribuindo para

desenvolver valores que Saviani (2008) aponta como centrais para uma

pedagogia revolucionária, que são a igualdade essencial real entre os

homens (e não apenas formal) e a criticidade. O processo contínuo de

conhecimento, conscientização, participação, reflexão, decisão

consciente e construção, levado às esferas mais amplas da sociedade,

junto com a conquista do tempo livre pelo alto grau de desenvolvimento

das forças produtivas, constitui a base da verdadeira liberdade, ou seja,

da emancipação humana, só possível de forma completa na sociedade

transformada em sociedade comunista.

Concordamos com Kuenzer (2013, p. 72), ao expor que

O nosso desejo, reconhecidamente ingênuo, tem

como objeto uma escola que, comprometida com

os trabalhadores e os excluídos, para além das

políticas educacionais restritivas, pudesse tomar

como referência as positividades presentes nas

mudanças que ocorrem no mundo do trabalho

para construir um novo projeto pedagógico, o

qual, rompendo com a lógica da racionalidade

financeira, formasse os cidadãos de novo tipo,

intelectual, técnica e eticamente desenvolvidos e

politicamente comprometidos com a construção

da nova sociedade.

Esta transformação necessária à escola só pode ocorrer vinculada

a um processo de transformação social, onde o conjunto da sociedade e

de suas estruturas e organizações se transformem simultânea e

organizadamente dentro de um processo revolucionário que supere o

capitalismo.

61

Acerca do tempo livre, Fiod (2005a, p. 254), apoiando-se em

Marx, expõe que

A possibilidade de a ciência produzir riquezas

incomensuráveis materializada no instrumental de

trabalho (na maquinaria) demonstra [...] que os

seres humanos haviam criado as condições

materiais para se libertarem dos grilhões do

mundo do trabalho.

Esta liberação que deveria ocorrer com o desenvolvimento da

ciência, nos marcos do domínio capitalista não pode ocorrer, a não ser

através do desemprego, que se coloca na contramão da emancipação

humana.

O trabalho é o elemento fundante do ser social e determinante da

consciência, mas só tem esta dimensão e só se concretiza em veículo de

realização humana se constituído de significado. No capitalismo, o

trabalho é destituído de sua dimensão humanizante por tornar o

trabalhador refém da exploração de sua força de trabalho. O processo de

trabalho não acontece como escolha livre e consciente do trabalhador,

mas como uma imposição do capital que determina que atividades

deverão ser desenvolvidas e, independente da forma que se apresentem,

quais destas atividades estarão disponíveis e/ou obrigatórias a quem.

Também é o sistema do capital que define as formas de desenvolver os

processos de trabalho e que ferramentas serão usadas, em que tempo e

de que modo. A sociedade capitalista impossibilita a participação

autônoma, independente, livre e consciente do ser humano no processo

de trabalho e, portanto, impossibilita o desenvolvimento pleno de suas

capacidades físicas e mentais. Ao trabalhador na sociedade capitalista

não restam escolhas ou alternativas, destituído dos meios de produção

precisa vender sua força de trabalho nas condições impostas pelo

sistema para garantir sua sobrevivência. Aliena assim seu trabalho, e a si

próprio, ao capitalista.

Lutar pela emancipação é assumir a luta pela superação dos

elementos constitutivos do sistema do capital, buscando compreender

como ele se reproduz. É necessário abalar as relações que ocorrem entre

os elementos que compõe seu tripé de sustentação, capital, trabalho

alienado e Estado, acirrando as contradições de modo a destruir o

metabolismo de reprodução de seu sistema em sua essência: a

propriedade privada. O trabalho, se despido de seu caráter capitalista de

meio de acumulação de capital, pode assumir sua centralidade no

62

processo de constituição do homem enquanto ser-social, e produzir a

riqueza, os valores de uso para o consumo conforme as necessidades

humanas em seu momento histórico. A produção de riquezas sob a

ordem do capital é um meio de concretizar a mais valia e o lucro, e não

um meio de reprodução da existência dos seres humanos para a

liberdade, como se almeja alcançar com o comunismo.

Marx e Engels (2003) apontam a ação unitária do proletariado

como uma das primeiras condições para sua emancipação, alegando que

esta requer sua união fraternal em âmbito mundial. E esclarece que “a

emancipação das classes trabalhadoras deverá ser conquistada pelas

próprias classes trabalhadoras” (MARX; ENGELS, 2003, p. 107), e que

somente o proletariado poderá realizar a emancipação, já que sua luta

não é por privilégios e monopólios de classe, buscando dominar as

demais classes, mas busca a igualdade, e a abolição de todo domínio de

classe. A única possibilidade para a emancipação humana é a revolução

proletária, construindo uma sociedade sem classes pela destruição da

forma de produção pautada na propriedade privada, que estabelece a

formação das classes fundamentais do sistema do capital, classe

capitalista e classe trabalhadora, pondo fim à exploração de uma classe

sobre a outra. Fiod (2008, p. 165) explica que

[...] a sociedade – que supõe o direito de um grupo

social à propriedade privada dos meios

necessários à produção da riqueza – significa a

não-propriedade do outro grupo social que, por

exclusão, fica impedido de desfrutar da riqueza

material que ele próprio cria. Assim, uma classe,

ao criar a propriedade da outra através de sua

capacidade de trabalhar, cria e recria as condições

da riqueza alheia e, simultaneamente, as

condições de sua própria pobreza.

Neste sentido, não há como conciliar um projeto de emancipação

humana com uma sociedade que mantenha a propriedade privada dos

meios de produção. Marx ensina que o capitalismo é “uma formação

social em que o processo de produção domina os homens” (MARX,

1983a, p. 76), não havendo nela a possibilidade de independência e

emancipação do trabalhador, por mais diversas que sejam as faces

aparentes das relações de trabalho.

O proletariado, por meio de sua organização e ação pode

transformar sua consciência, passando da consciência do senso comum

para a consciência de classe, e da consciência de “classe em si” (quando

63

percebe que deve cobrar a ampliação de seus direitos e que sua luta pode

ser consequente) para a consciência de “classe para si”21

(quando

percebe os limites das conquistas proletárias na sociedade capitalista e

toma consciência da necessidade da revolução). Tumolo nos ajuda a

compreender que este processo é dialético e os aspectos se transformam

ao mesmo tempo.

Tanto a estratégia revolucionária e, por

desdobramento, o conjunto das ações políticas

táticas — incluídas aqui as lutas sindicais —,

como a produção teórica na perspectiva de classe

do proletariado e a consequente transmissão-

apreensão do conhecimento, condições

propiciadoras da construção da consciência de

classe, só podem se desenvolver, de forma

umbilicalmente articulada, no bojo da luta de

classes, com vistas à emancipação da classe

revolucionária. Neste sentido, a consciência de

classe é fruto da própria luta revolucionária do

proletariado. (TUMOLO, 2003?, p. 12).

Uma estratégia para a luta pela emancipação é a reorganização

dos trabalhadores, que na coletividade avance sobre as estruturas de

domínio do capital buscando melhores condições de trabalho,

melhorando suas condições de vida, provocando o acirramento da

contradição capital-trabalho, para nesse processo dialético avançar na

consciência de classe, a um grau tal que permita o desembocar deste

movimento no processo de revolução pela superação do modelo de

produção capitalista, que significa superar a propriedade privada dos

meios de produção e a divisão do trabalho, rompendo com a alienação e

produzindo seres omnilaterais. Segundo Freitas (1994, p. 121), “o

capitalismo possui contradições insuperáveis que tendem a se agravarem

com a luta histórica dos trabalhadores”. O acirramento das contradições,

possível a partir da luta de classes, permite tornar clara a essência do

sistema do capital facilitando a tomada de consciência acerca da

necessidade de sua superação.

21

Estes conceitos não são tranquilos mesmo entre os marxistas. Tumolo (2003?)

traz uma exposição que pode nos ajudar a compreender. Sugerimos também:

DUARTE, Luiz Claudio. Reflexões sobre o conceito marxiano de

representação de classe. Revista Trabalho Necessário. Ano 10, n. 14, 2012.

64

O capitalismo dissemina o individualismo, e combate todas as

formas de unidade dos trabalhadores, com o auxílio da fragmentação do

trabalho e da produção. Pela importância que têm como ferramenta de

luta, as organizações de classe, como partidos e sindicatos, encontram-se

também fragmentadas, e têm sido duramente combatidas pelo sistema

do capital, não sendo capazes de uma ação consequente e aglutinadora

da classe. Os movimentos populares têm sofrido com uma nova ofensiva

da criminalização e desmantelamento com prisões e perseguições22

a

cada retomada da luta. Estas ações afastam os trabalhadores da

organização e da luta coletiva pela ameaça constante que representam a

suas vidas. Para além da necessidade da luta, Marx e Engels apontam

que a coletividade e a associação são requisitos para a liberdade humana

e a omnilateralidade; a convivência com o grupo é um meio para o

desenvolvimento das potencialidades sociais para a emancipação. Nas

palavras dos autores:

Apenas na coletividade (de uns e de outros) é que

cada indivíduo encontra os meios de desenvolver

suas capacidades em todos os sentidos; somente

na coletividade, portanto, torna-se possível a

liberdade pessoal. [...] Na coletividade real, os

indivíduos adquirem sua liberdade na e através de

sua associação. (MARX; ENGELS, 1977, p. 116-

117).

É preciso que os trabalhadores desenvolvam o princípio da

cooperação, da coletividade no processo de luta. A destruição da

sociedade fundada na centralidade do capital é necessária e urgente para

garantir a condição humana, evitando a barbarização do ser humano

pelo processo de desumanização sofrido nas relações de trabalho sob o

modo de produção capitalista. Cabe à própria classe trabalhadora

identificar onde estão postas as possibilidades de destruição da ordem

social vigente, a responsabilidade de forjar ferramentas capazes de

enfrentar a organização do capital e levar a classe trabalhadora à

superação da propriedade privada realizando a possibilidade da

emancipação humana.

22

A criminalização dos movimentos sociais, as prisões e perseguições a

sindicalistas não são um fenômeno novo. Fazem parte da estratégia capitalista

de defesa e de manutenção do domínio, acompanhando o capitalismo desde o

início de seu desenvolvimento.

65

2.4 RELAÇÕES DE TRABALHO NA AMÉRICA LATINA E NO

BRASIL

Fernandes (2009) contribui para a compreensão da realidade da

América Latina, com o conceito de países de economias coloniais e

neocoloniais, que os leva a desenvolverem um tipo de capitalismo

diferente do capitalismo clássico dos países desenvolvidos: o

capitalismo dependente. Para o autor, esta formação especial

[...] contém todos os elementos do capitalismo não

só em termos dos caracteres centrais do “modelo

clássico”, mas das condições estruturais,

institucionais e funcionais de sua forma atuante

no vir a ser histórico – porém os projeta em um

contexto psicológico, socioeconômico e político

próprio, que resulta da articulação dos dois tipos

de dinamismos indicados (e não como muitas

vezes se supõe, de uma imposição inflexível, pura

e simples, das sociedades nacionais hegemônicas).

Por isso, o capitalismo dependente está sempre se

transformando, seguindo as evoluções das

sociedades centrais hegemônicas, sem no entanto

conseguir mudar o padrão de transformação,

passando da articulação dependente para o

desenvolvimento relativamente autônomo.

(FERNANDES, 2009, p. 60, grifo do autor).

Esta submissão e dependência a qual o autor se refere, segundo

este (FERNANDES, 2009, p. 60), não é “mera ‘condição’ ou

‘acidente’”, mas, “requer uma permanente vantagem estratégica do polo

econômico hegemônico”, condição que é aceita pelo polo dependente

como útil, criadora e compensadora, considerada um atalho mais rápido

para o desenvolvimento ou realização das aspirações da burguesia local.

Esta relação de aceitação do domínio externo tem reflexos importantes

nas relações de produção e de trabalho, bem como na estruturação do

Estado. Dentre outras consequências, há a exclusão de qualquer

tendência que defenda a participação das massas dos processos

decisórios da política econômica e do funcionamento do Estado, e o

alijamento do trabalhador das instâncias de poder.

Segundo o Fernandes (2009), podemos reconhecer três momentos

distintos na evolução desta forma de capitalismo, que configuram sua

estrutura e sua dinâmica:

66

O momento em que ele se configura, na transição

neocolonial; o momento em que ele transborda o

mundo neocolonial, mas não o destrói, em que se

dá a passagem do primitivo capitalismo

mercantilista, herdado da colônia de exploração,

para um capitalismo comercial cheio de

vitalidade; e o terceiro momento, vivido

atualmente por poucos países, em que a revolução

industrial se intensifica e se acelera. O que é

constante, nos três momentos, consiste no impacto

externo: ele induz, condiciona e regula a mudança

estrutural. O que significa que acarreta

transferência de capitais, de agentes humanos, de

instituições e de tecnologia. (FERNANDES,

2009, p. 59).

O Brasil, como os demais países subdesenvolvidos, ou em

desenvolvimento, transfere aos países centrais a riqueza produzida por

seus trabalhadores. Os capitais financeiros e materiais acumulados na

forma da mais-valia vão ser apropriados para a manutenção da ordem

capitalista nos países centrais, – o que Fernandes (2009, p. 62) chama de

“sobreapropriação repartida do excedente econômico” – além de

garantirem o funcionamento do próprio Estado, exigindo uma maior

apropriação e produção de excedente, aprofundando a precarização do

trabalho e da vida do trabalhador nos países periféricos ou de

capitalismo dependente.

Segundo o autor (FERNANDES, 2009), esses países, ao se

submeterem à lógica dos acordos internacionais, o fazem conscientes de

que ocuparão necessariamente um lugar secundário nas relações

econômicas, sociais e políticas, e que as promessas de livre economia,

livre mercado e livre concorrência, não podem garantir-lhes igualdade

de negociações e desenvolvimento. As burguesias latino-americanas, ao

romperem com a colonização e implantarem o capitalismo, mantiveram

o domínio do mercado interno e da política através do poder militar.

Negando a democratização necessária à competitividade, destituíram o

capitalismo de sua potencialidade criadora, o que teve como

consequência mais grave o baixo ritmo de desenvolvimento da

industrialização, do mercado interno, da produção de riquezas e da

ciência. Segundo o autor, as classes sociais na América Latina agem no

sentido de preservar e intensificar os privilégios de poucos e de excluir

os demais. Para isso as burguesias nacionais controlam o Estado, suas

67

organizações de repressão e as superestruturas jurídicas como

instrumento de perpetuação do status quo. O Estado por sua vez se

constitui em ferramenta da burguesia como garantidor do mercado. A

dependência não é necessariamente imposta, mas depende de acordos e

da aceitação das burguesias nacionais que “desfrutam de autonomia,

para escolher soluções alternativas, e de poder para impor sua vontade”

(FERNANDES, 2009, p. 64).

Nos Estados dependentes, as relações de trabalho e o

desenvolvimento das forças produtivas seguem um padrão ditado pelos

interesses dos países hegemônicos, uma vez que cumprem o papel

determinado de arcar com a parte mais precária do processo de

produção, em que se emprega a força de trabalho subjugada a graus

elevados de exploração e de produção de excedente, que são

aprofundados nos momentos de crise.

É um destes momentos que enfrentamos hoje, como nos aponta

Mészáros (2007, p. 55): “Vivemos numa época de crise histórica sem

precedentes [...], a crise estrutural cada vez mais profunda do próprio

sistema do capital” (grifo do autor). Esta crise faz com que o sistema

sócio-metabólico do capital busque sua reestruturação, sobre novas

formas de exploração. Seus tentáculos se expandem sobre todas as áreas

sociais e econômicas, visando manter seu controle e reajustar os

processos de produção para garantir a expansão do capital.

As crises não são fatalidades ou contingências, são próprias e

necessárias à sobrevivência do sistema do capital, como Freitas (1994,

p. 113) nos explica, que para o capitalismo as crises são

[...] um recurso para postergar contradições,

cooptar setores e ganhar sobrevida mudando o

papel do estado, desenvolvendo novos padrões de

exploração da classe trabalhadora e alterando a

própria composição da classe trabalhadora – entre

outros.

Segundo o autor (FREITAS, 1994, p. 117), “a recessão não é

somente um instrumento econômico, mas principalmente um

instrumento político disciplinador da classe trabalhadora” que

desmobiliza a ação da classe e de suas representações sindicais,

“facilitando a introdução dos novos padrões de acumulação”. É nestes

períodos que o capitalismo muda “o papel do estado, o papel da

educação, a composição da classe trabalhadora, com impactos

significativos na luta política e ideológica” (FREITAS, 1994, p. 117).

68

Assim, as crises são inerentes ao sistema do capital, e mesmo que

possam abalar suas estruturas de dominação momentaneamente, lhe são

necessárias. Para Holloway (1987, p. 132 apud ANTUNES, 2009, p. 33)

A crise capitalista não é outra coisa senão a

ruptura de um padrão de dominação de classe

relativamente estável. Aparece como uma crise

econômica, que se expressa na queda da taxa de

lucro. Seu núcleo, entretanto, é marcado pelo

fracasso de um padrão de dominação estabelecido

[...]. Para o capital, a crise somente pode encontrar

sua resolução através da luta, mediante o

estabelecimento da autoridade e através de uma

difícil busca de novos padrões de dominação.

Nesta busca por novos padrões de dominação, se observa o

aprofundamento da exploração, expressa em diferentes medidas, entre

elas, as que Antunes (2009, p. 33) elenca ao falar da resposta do

capitalismo à crise do fordismo e do keynesianismo:

Como resposta à sua própria crise, iniciou-se um

processo de reorganização do capital e de seu

sistema ideológico e político de dominação, cujos

contornos mais evidentes foram o advento do

neoliberalismo, com a privatização do Estado, a

desregulamentação dos direitos do trabalho e a

desmontagem do setor produtivo estatal [...], um

intenso processo de reestruturação da produção e

do trabalho, com vistas a dotar o capital do

instrumental necessário para tentar repor os

patamares de expansão anteriores (grifos do

autor).

Além destes, cita ainda a autonomia do setor financeiro com a

liberação e a mundialização dos capitais e do processo produtivo. “Tudo

isso num cenário caracterizado pela desregulamentação e expansão dos

capitais, do comércio, da tecnologia, das condições de trabalho e

emprego” (ANTUNES, 2009, p. 34), a desregulamentação dos capitais

produtivos transnacionais, a expansão e liberação dos capitais

financeiros, a liberação comercial e as novas formas de domínio

tecnocientífico, que nos países do chamado Terceiro Mundo se

desenvolvem de forma totalmente subordinada e dependente. A

destruição da natureza, do meio ambiente e das forças produtivas, a ação

69

destrutiva contra a força humana de trabalho, a precarização, o aumento

do desemprego, da formação e do controle ideológicos e a crise do

movimento operário são algumas das consequências da reestruturação

do capital e de sua expansão latente.

Antunes (2009) ainda nos explica que o modelo de

produção/dominação taylorista e fordista implantado a partir dos anos

1920 apresentou o seu sistema de compromisso e regulação como

tentativa de controle sobre os trabalhadores, tentando convencer os

trabalhadores de que a conciliação entre capital e trabalho seria possível

se mediada pelo Estado. Em países centrais, isto levou à garantia

mínima de direitos, com a adesão dos partidos sociais democráticos,

assim, a ilusão foi criada no seio da classe operária, levando-a a perder

de vista o horizonte da luta de classes. Já, nos países periféricos do

capitalismo, como o caso do Brasil, os trabalhadores ficaram fora do

compromisso de conciliação, e mesmo com a mediação dos sindicatos e

partidos políticos como representantes dos trabalhadores, estes

garantiram pequenos avanços em relação aos avanços conquistados

pelos trabalhadores nos países hegemônicos do capital. O Estado atuou

como garantidor dos interesses do capital, e as organizações e partidos

de classe capitularam, atuando em prol da conciliação e combatendo as

iniciativas dos trabalhadores de ir além do acordado. Houve o

aprofundamento da burocracia sindical, afastamento da direção e da

base e o fortalecimento do corporativismo, em prejuízo da democracia

operária. O período conhecido como welfare state (o Estado como

garantidor do bem-estar pela criação de direitos como seguridade social,

regulação salarial, direito ao trabalho, à moradia, à saúde) criou o fetiche

de um Estado de providência e democrático, tendo como consequência o

abandono da luta pelo socialismo e pelas novas formas de organização

do trabalho pela classe trabalhadora. Este modelo entrou em crise ao

encerrar seu ciclo de expansão, insuficiente às reivindicações dos

trabalhadores, que buscavam o controle social da produção. Esta crise,

segundo Antunes,

[...] já era a expressão de uma crise estrutural do

capital que se estendeu até os dias atuais, e fez

com que, entre tantas outras consequências, o

capital implementasse um vastíssimo processo de

reestruturação, visando recuperar seu ciclo

reprodutivo e, ao mesmo tempo, repor seu projeto

de dominação societal, abalado pela confrontação

e conflitualidade do trabalho, que, como vimos,

70

questionaram alguns dos pilares da sociabilidade

do capital e de seus mecanismos de controle social

(ANTUNES, 2009, p. 49).

O toyotismo despontou como alternativa à crise, opondo-se ao

contrapoder das lutas sociais, procurando reorganizar o processo

produtivo e resgatar o controle hegemônico. No plano ideológico

disseminou o culto ao individualismo exacerbado contra a solidariedade

e organização coletiva e na produção, o sistema just in time,

intensificando o trabalho e a acumulação. Harvey (1996) considera este

período o emergir de um regime de acumulação flexível, que teria como

características “a divisão de mercados, o desemprego, a divisão global

do trabalho, o capital volátil, o fechamento de unidades, a reorganização

financeira e tecnológica” (HARVEY, 1996, p. 363-364).

Antunes (2009, p. 52) contribui com essa ideia discorrendo que

“as mutações em curso são expressão da reorganização do capital com

vistas à retomada do seu patamar de acumulação e ao seu projeto global

de dominação”. Estas afirmações nos permitem concluir e concordar

com a tese de que não houve mudanças substantivas ou essenciais no

processo de trabalho e nas relações de trabalho, mas cada período é uma

expressão do aprofundamento da exploração do trabalhador e

intensificação do acúmulo de mais-valia, características essenciais do

modo de produção capitalista. Druck (2011) esclarece que já está

implícita na denominação acumulação flexível a compreensão de que o

capitalismo sofreu transformações ao longo de seu desenvolvimento

histórico. Para a autora, essas mudanças “redefiniram sua configuração,

mesmo que mantivessem sua essência como um sistema cujas relações

sociais se assentam sobre o trabalho assalariado” (DRUCK, 2011, p.

41). A flexibilidade de contratos mascara a exploração e a verdadeira

essência desta relação. É evidente que, independente das formas de

contrato de trabalho aplicadas, o trabalhador vende sua força de trabalho

no mercado, da qual o capital irá se apropriar, e se apropriará do produto

do trabalho, completando a exploração e a mais-valia – numa fase de

aprofundamento da precarização social do trabalho. Ainda segundo a

autora, na era da acumulação flexível, as transformações geraram um

modo diferente de trabalho e de vida, pautados na flexibilização e na

precarização do trabalho, “como exigências do processo de

financeirização da economia, que viabilizaram a mundialização do

capital num grau nunca antes alcançado” (DRUCK, 2011, p. 42). A

esfera financeira passa a dominar todas as demais esferas do capital,

entre elas a produtiva. Isso tem como consequência formas de trabalho e

71

de gestão do trabalho que vão apoiar-se numa nova configuração do

Estado, “que passa a desempenhar cada vez mais o papel de ‘gestor dos

negócios da burguesia’” (DRUCK, 2011, p. 42), agindo pela

desregulamentação dos mercados, em especial o financeiro e o de

trabalho.

O modelo de acumulação flexível impõe consequências

importantes sobre o comportamento dos trabalhadores e em suas

relações cotidianas pelos valores ideológicos disseminados. Um dos

pontos levantados por Druck (2011) é de que a obsolescência e a

descartabilidade do trabalhador são políticas de (des)emprego do padrão

flexível, os trabalhadores se tornam empregáveis por um período

extremamente curto e com formas precárias de contrato:

O curto prazo – como elemento central dos

investimentos financeiros – impõe processos ágeis

de produção e de trabalho, e, para tal, é

indispensável contar com trabalhadores que se

submetam a quaisquer condições para atender ao

novo ritmo e às rápidas mudanças. (DRUCK,

2011, p. 42).

A obsolescência gera instabilidade e insegurança, e aprofunda a

vulnerabilidade social do trabalhador, uma vez que o próprio mercado

concorrencial é baseado na “especulação financeira pautado na

volatilidade, na efemeridade, no curtíssimo prazo, sem estabelecer laços

ou vínculos com lugar nenhum” (DRUCK, 2011, p. 43) e sem

compromissos de nenhum tipo a não ser com o próprio mercado

(financeiro em primeiro lugar) e suas necessidades, sob uma

concorrência internacional intensa, que não aceita nenhuma

regulamentação, e usa tanto a força quanto o consentimento para

garantir um elevado grau de acumulação, que a autora chama de “sem

limites materiais nem morais”. Druck (2011, p. 43) compreende que

“Afirmar que a precarização social do trabalho está no centro da

dinâmica do capitalismo flexível significa também entendê-la como uma

estratégia de dominação”.

As novas faces do mundo do trabalho, bem como o capitalismo

desde seu início, se apresentam com algumas particularidades

determinadas pelas condições sociais, econômicas, geográficas e

históricas e também conforme a posição ocupada pelo Estado na cadeia

global de produção. Neste sentido, podemos considerar o que Antunes

nos elucida:

72

É necessário ainda lembrar que a crise do

movimento operário é particularizada e

singularizada pelas condições específicas de cada

país, dadas pelas formas da dominação política,

pela situação econômica, social etc., sem as quais

os elementos mais gerais não ganham concretude.

(ANTUNES, 2009, p. 37-38, nota, grifos do

autor).

Tanto as formas de exploração, de acumulação quanto as crises e

a resposta dada pelo movimento operário dependem das condições

históricas a que estão submetidos. As crises não se expressam da mesma

forma em todos os lugares ou países, tanto as crises econômicas, a crise

do proletariado, bem como a crise estrutural atual apresentam elementos

que dependem dos fatores locais e externos, embora mantenham suas

características gerais que as identificam com o modo de produção

capitalista. Nos países imperialistas foi possível criar uma ilusão de

democracia e liberdade pelas melhores condições de vida atingidas,

principalmente durante o período do welfare state, e principalmente pela

superexploração a que submetem os países dependentes. Nos países

dependentes, por sua vez, a classe operária não atingiu o mesmo

patamar de conquistas e ao adotar a bandeira do anti-imperialismo

perdeu o foco na luta operária consequente – contra o sistema do capital

em sua totalidade – acreditando ser possível todos atingirem também um

patamar de vida superior dentro do capitalismo, o que fez com que

voltassem suas forças e argumentos contra os países considerados

imperialistas.

Para Fontes (2010), considerar isoladamente um país como

imperialista por sua posição político-econômica de superpotência ou

tradição de estar no comando, ou ainda pelo nível de desenvolvimento

de suas forças produtivas ou de sua tecnologia não contempla a

realidade atual. A luta contra um Estado (ou alguns Estados) imperialista

é insuficiente mediante a amplitude do sistema de exploração

organizado mundialmente. O sistema do capital transcende os patamares

do imperialismo, alia-se a este, fundando um sistema mais complexo,

estruturado e potente. Compreendendo o imperialismo como um

desdobramento do patamar de expansão capitalista, que incorporou a

dominação econômica numa dinâmica mais concentrada, abrangendo o

mundo e superpondo-se à forma concorrencial do capital mundialmente,

a autora nos explica que após a Segunda Guerra Mundial até a década de

73

1980 tivemos mais um desdobramento no ritmo, na extensão e na forma

de expansão do imperialismo – levando-o a constituir-se como capital-

imperialismo. Segundo a autora,

Falar, pois, de capital-imperialismo, é falar da

expansão de uma forma de capitalismo, já

impregnada de imperialismo, mas nascida sob o

fantasma atômico e a Guerra Fria. Ela exacerbou a

concentração concorrente de capitais, mas

tendencialmente consorciando-os. Derivada do

imperialismo, no capital-imperialismo a

dominação interna do capital necessita e se

complementa por sua expansão externa, não

apenas de forma mercantil, ou através de

exportações de bens ou de capitais, mas também

impulsionando expropriações de populações

inteiras das suas condições de produção (terra), de

direitos e de suas próprias condições de existência

ambiental e biológica. Por impor aceleradamente

relações sociais fundamentais para a expansão do

capital, favorece contraditoriamente o surgimento

de burguesias e de novos Estados, ao mesmo

tempo que reduz a diversidade de sua organização

interna e os enclausura em múltiplas teias

hierárquicas e desiguais. (FONTES, 2010, p. 149).

Essa associação do capital, organizado hierarquicamente no que

Fontes (2010) chama de “múltiplas teias hierárquicas e desiguais”, não

estabelece de forma definitiva a posição de cada Estado em relação aos

demais e em relação à cadeia produtiva constituída, no entanto associa-

os de modo a garantir um equilíbrio mínimo, principalmente diante das

flutuações do mercado financeiro. Assim, os países centrais que exercem

o controle hegemônico do capital internacional tentam garantir sua

permanência, o que, ao longo do tempo, se mantém ameaçada,

principalmente após cada crise cíclica do capital quando este faz um

movimento buscando se reestruturar.

Chesnais (2009) sustenta que a crise financeira mundial de 2007

teve como epicentro os Estados Unidos, cujo elemento crítico foi seu

sistema bancário e que a “brutalidade da propagação mundial da crise

em sua dupla dimensão financeira e de superprodução resulta

precisamente do fato que sua sede são os Estados Unidos” (CHESNAIS,

2009, p. 25). Os Estados Unidos, mesmo sendo uma superpotência com

poder hegemônico, perdem espaço com negociações em moeda asiática

74

como centro de um novo sistema monetário internacional, deixando

assim campo para o crescimento do poder dos países asiáticos, em

especial, da China. Quem comanda não mais é um ou outro país, mas o

capital, que dita suas regras e o seu ritmo de exploração e de sua

necessidade de expansão global. A globalização é a expressão palatável

e ilusória da mundialização do capital, forma de esconder o capitalismo

na ideia de liberdade de relações de mercado entre os Estados. Se o

fenômeno da mundialização do capital evidencia o fortalecimento do

capital por sua expansão global, também evidencia a contradição

presente em formar uma classe operária internacional, com potencial de

ação fortalecida, capaz de dar uma resposta global.

As crises, tanto políticas, sociais, econômicas e a crise estrutural

(que afeta todas as dimensões) trazem em seu desenvolver um espaço

privilegiado e contraditório para a luta da classe trabalhadora. Ao

mesmo tempo em que a o acirramento da contradição entre capital e

trabalho, evidenciando que são irreconciliáveis, faz com que a condição

de consciência do trabalhador seja rebaixada na unidade dialética com o

rebaixamento de suas condições de vida pela exacerbação da exploração

e pela desumanização decorrente da precarização e da intensificação do

trabalho. Fiod (2008, p. 163) lembra que

[...] as crises nem sempre têm o poder de

engendrar a negação da sociedade que as

produzem. A elas pode corresponder, e tem

correspondido, na história moderna, a sobrevida, a

rearticulação da degradação em formas sociais

aparentemente novas.

Segundo Peroni (2012, p. 20), “o neoliberalismo, a globalização,

a reestruturação produtiva e a Terceira Via são estratégias do capital para

superação de sua crise de diminuição na taxa de lucro, o que redefine o

papel do Estado”. Isso gera “a perda de direitos sociais, materializados

em políticas públicas”. O Estado é tomado como a causa da crise,

acusado de provocar o déficit fiscal com gastos excessivos em políticas

sociais e de atrapalhar o andamento livre do mercado com a regulação

da economia. Como solução a burguesia propõe o Estado mínimo “tanto

na execução quanto na coordenação da vida em sociedade, e quem passa

a ser parâmetro de eficiência e qualidade é o mercado” (PERONI, 2012,

p. 21) e, portanto, a gestão gerencial. Segundo a autora, o

individualismo é um princípio tanto do neoliberalismo quanto da

Terceira Via, que sustentam que “cada indivíduo é responsável por abrir

75

o seu caminho, e as transformações ocorrerão na esfera pessoal, e não

societária”, concepção também da teoria do capital humano que reforça

o individualismo e a meritocracia. Nessa concepção, a democracia e a

participação são compreendidas como repassar à sociedade a execução

de tarefas que seriam do Estado e não a participação nas decisões e no

controle social. De acordo com Peroni (2012, p. 22), nesse período

particular do capitalismo, ao mesmo tempo em que se avança na

democratização, “há um esvaziamento das políticas sociais,

principalmente das políticas sociais como um direito universal”

aumentando a separação entre o econômico e o político.

A nova aparência do capitalismo dependente no Brasil

caracteriza-se também pela prática comum do neoliberalismo em buscar

o desmantelamento das organizações de classe dos trabalhadores e dos

movimentos sociais visando garantir a manutenção e o avanço das

políticas de exploração. Esta prática se dá pela criminalização da luta de

classes e das ferramentas de enfrentamento como greves e piquetes, pela

alteração na legislação que rege as relações de trabalho, pela constante

judicialização das demandas dos trabalhadores, e pela ideologização da

classe trabalhadora pela mídia e pelas organizações do Estado, como

pela escola. Chaui (2008, p. 75) explica que

No caso do Brasil, o neoliberalismo significa:

levar ao extremo à polarização carência-

privilégio, a exclusão sócio-política das camadas

populares, a desorganização da sociedade como

massa dos desempregados; aumentar o espaço

privado ocupado não apenas pelas grandes

corporações econômicas e financeiras, mas

também pelo crime organizado, o qual, diante do

encolhimento do Estado, pode espraiar-se por toda

a sociedade como substituto do Estado (proteção,

segurança, emprego, privatização da guerra,

privatização do uso da força, etc.); significa

solidificar e encontrar novas justificativas para a

forma oligárquica da política, para o autoritarismo

social e para o bloqueio à democracia.

Estes elementos trazem profundas consequências à luta de

classes, uma vez que entravam a associação e a organização dos

trabalhadores e a práxis revolucionária, que desenvolve nestes a

76

consciência de classe. A luta de classes23

e a busca pela transformação

social de superação do capitalismo – e, por consequência, a luta pela

emancipação – ficam relegadas ao plano de projeto utópico sem

possibilidade de realização.

Com a intensificação da exploração e da precarização, e com a

flexibilidade ou ausência de direitos, com a prática do exército de

reserva ameaçando constantemente o trabalhador com o desemprego,

com o trabalho escravo (ainda existente no mundo todo)24

, e as demais

violências contra o trabalhador, este vai se tornando submisso, acrítico,

sem consciência de si e da classe, processo que se dá com maior

profundidade nos países dependentes.

23

Freitas defende a importância da luta de classes e parafraseando Bergquist,

expõe a análise do autor de que o período de expansão pós-guerra teve origem

nas conquistas das grandes lutas populares dos trabalhadores durante a crise

do capitalismo mundial no período anterior à guerra. “Em função da luta de

classes o capitalismo foi forçado a efetuar uma série de concessões e

compromissos com as forças populares, em geral, e com os trabalhadores em

particular, que conduziram ao término da crise.” Estes compromissos

começaram a ser quebrados após os anos 70 por um novo período de crises,

que levaram os capitalistas ao “desespero por reduzir custos” na produção

para garantir a competitividade internacional, e levando-os a atacar o

movimento trabalhista e as conquistas ligadas ao bem-estar social. Nesta

análise a luta de classes está no centro da dinâmica das contrações e

expansões do capitalismo, e “isso contribui para se combater a tendência de

reificar o capital e fazer apenas das iniciativas dos capitalistas o motor

principal da economia mundial capitalista”. (Freitas, 1994, p. 113-114). 24

Dados encontram-se disponíveis em:

<http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/oit/relatorio/america_latina_cari

be.pdf>. Acesso em: 24 fev. 2013. Em:

<http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/oit/relatorio/america_latina_cari

be.pdf>. Acesso em: 24 fev. 2013. Em:

<http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/oit/relatorio/paises_industrializa

dos.pdf>. Acesso em 15 jul. 2013. Em:

<http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/oit/relatorio/declaracao_somavi

a.pdf>. Acesso em: 15 jul. 2013. Em:

<http://thecnnfreedomproject.blogs.cnn.com/2012/06/01/rights-group-21-

million-now-in-forced-labor/>. Acesso em: 10 set. 2013.

77

2.5 RELAÇÕES DE TRABALHO NA ESCOLA PÚBLICA –

INTENSIFICAÇÃO E PRECARIZAÇÃO

As relações que ocorrem na escola estão determinadas por esse

sistema alienante e adestrador da sociedade centrada no capital. A

educação escolar, a gestão da escola e o trabalho na escola pública, se

desenvolvem nos marcos dos valores capitalistas, da exploração, da

precarização e intensificação do trabalho, da ausência de coletividade e

de espaços democráticos, da falta de diálogo e participação, de

competição e desumanidade, do mando e obediência, de subserviência.

No entanto é preciso considerar que o trabalho pedagógico da escola

pública apresenta uma especificidade que, segundo Saviani (2008) e

Paro (2000), não permite sua subsunção real ao capital. Segundo

Saviani, esta impossibilidade se deve ao fato de que a produção e o

consumo não podem ser separados, pois acontecem ao mesmo tempo.

Nesta concepção, a aula é tomada como produto do trabalho

pedagógico, que é consumida pelos alunos. Paro discorda desta

concepção de aula, e a compreende como o próprio trabalho pedagógico.

Desta forma, fazendo uma analogia à produção material, o aluno seria

além do consumidor, ao mesmo tempo produtor, ou coprodutor, e o

próprio objeto de trabalho, sobre o qual pretende-se fazer uma

modificação através da aula. O produto do trabalho pedagógico seria

essa diferença que se produziu no aluno. Assim, Paro (2000) atribui a

impossibilidade da subsunção real do trabalho pedagógico ao capital à

natureza do trabalho pedagógico enquanto relação social. Para o autor,

“a subsunção formal do trabalho ao capital” (PARO, 2000, p. 34)

possibilitou ao capitalista a expropriação do trabalhador do

conhecimento (enquanto saber fazer) e separou a concepção (para as

mãos do capitalista) da execução do trabalho (para o trabalhador). O

trabalhador que

formalmente (ou seja, de fato, mas por meio de

uma relação social que encobre o real) já se

encontrava sob o domínio do capital, passa agora

a estar ‘realmente’, concretamente, ou melhor,

tecnicamente, subordinado ao capital. (PARO,

2000, p. 34, grifos do autor).

O trabalhador no trabalho pedagógico também pode ser

expropriado do saber fazer enquanto métodos e técnicas, embora não

radicalmente como na produção material, pois a execução pode ser

78

separada da concepção. No entanto não pode ser expropriado totalmente

do conhecimento historicamente produzido, uma vez que a educação

enquanto relação social em que se dá a apropriação deste conhecimento

não pode ser esvaziada totalmente dele.

Sob o ponto de vista da regulamentação e organização legal, a

escola não se constrói na escola, ou seja, é resultado de discussões e

decisões que ocorrem longe de seu ambiente, formuladas à luz dos

interesses do capital, das quais sua comunidade não participa e,

normalmente, nem sequer toma ciência. A escola, a serviço do capital,

perde assim mais uma de suas dimensões educativas e transformadoras:

de possibilitar aos sujeitos a conscientização e transformação pela

prática da participação consciente e pela luta.

Embora haja uma aparente democratização da construção de

rumos para a escola pública no Brasil, a elaboração dos Planos

Nacionais de Educação (PNEs) praticamente não considera as

proposições da população e é feita sem o conhecimento da grande

maioria desta e mesmo dos educadores. Os debates que acontecem nas

CONAEs25

(Conferência Nacional de Educação), por uma representação

de delegados vinculados a instituições que os elegem normalmente sem

debates amplos, não garante de fato o direito de opinião às massas

populares, e as decisões mais significativas para a classe trabalhadora,

aprovadas como proposições nas conferências não são aceitas, ou são

descaracterizadas nas instâncias de governo. Além deste aspecto, o que

é posto em pauta na elaboração dos PNEs não permite propostas

transformadoras, pois buscam paliativos para resolver minimamente os

problemas mais graves da escola atual. Não são contempladas propostas

de conteúdo e forma que busquem uma escola superadora, para além da

que existe. Aceitando esta realidade, em que o Estado determina os

objetivos da educação para assegurar o domínio da classe burguesa,

estamos fadados a uma escola que não contribui na luta pela

emancipação e que mantém seu papel em conformidade com as funções

da educação capitalista apresentadas por Mészáros, como as duas

principais: “(1) a produção das qualificações necessárias ao

funcionamento da economia, e (2) a formação dos quadros e a

elaboração dos métodos de controle político” (MÉSZÁROS, 2006, p.

275, grifos do autor). A mudança da escola é necessária e urgente para

que se coloque a serviço da estratégia revolucionária.

25

Informações mais detalhadas disponíveis em:

<http://conae.mec.gov.br/index.php>. Acesso em: 17 jun. 2014.

79

A escola pública é um complexo de contradições, fenômenos e

relações, em constante movimento, uma estrutura que faz parte da

sociedade (também como um complexo de fenômenos e relações)

determinada pelo modo de produção capitalista, numa relação dialética.

Neste sentido, as relações de trabalho de exploração e precarização

analisadas ocorrem no funcionamento e nas relações de trabalho da

escola, apresentando alguns elementos próprios que passamos a analisar

brevemente.

Segundo Kuenzer (2013) as profundas mudanças do mundo do

trabalho trazem novos desafios para a educação. Segundo a autora, a

base técnica de produção fordista foi sendo “substituída por um

processo de trabalho resultante de um novo paradigma tecnológico

apoiado essencialmente na microeletrônica, cuja característica principal

é a flexibilidade” (KUENZER, 2013, p. 46), modelo assentado nas

transformações tecnológicas, na descoberta de novos materiais e nas

novas formas de organização e gestão do trabalho. A autora explica que

a sociedade passa a apresentar novos paradigmas econômicos e

socioculturais, e temas como “a pobreza, as questões ambientais e

raciais, a segurança coletiva” (KUENZER, 2013, p. 46) passam a fazer

parte da agenda internacional, embora a exclusão continue se

reproduzindo dada a lógica dominante da racionalidade econômica.

Segundo a autora,

Estabelecem-se novas relações entre trabalho,

ciência e cultura, a partir das quais se constitui

historicamente um novo princípio educativo, ou

seja, um novo projeto pedagógico por meio do

qual a sociedade pretende formar os

intelectuais/trabalhadores, os cidadãos/produtores

para atender às novas demandas postas pela

globalização da economia e pela reestruturação

produtiva. (KUENZER, 2013, p. 46-47).

Kuenzer (2013) evidencia algumas das características da fase

atual da reestruturação produtiva que vão exigir uma adaptação da

escola:

A descoberta de novos princípios científicos

permite a criação de novos materiais e

equipamentos; os processos de trabalho de base

rígida vão sendo substituídos pelos de base

flexível; a eletromecânica, com suas alternativas

80

de solução bem definidas, vai cedendo lugar à

microeletrônica que assegura amplo espectro de

soluções possíveis desde que a ciência e a

tecnologia, antes incorporadas aos equipamentos,

passem a ser domínio dos trabalhadores; os

sistemas de comunicação interligam o mundo da

produção. (KUENZER, 2013, p. 50).

A pedagogia baseada no taylorismo/fordismo, que dominava o

panorama educacional vai perdendo sua importância uma vez que com a

incorporação da ciência e da tecnologia nos processos de trabalho um

novo tipo de trabalhador, capaz de se adaptar à produção flexível, é

requerido. Entre as capacidades que perpassam o novo discurso acerca

da formação do trabalhador estão:

[...] a capacidade de comunicar-se

adequadamente, por intermédio do domínio dos

códigos e linguagens, incorporando, além da

língua portuguesa, a língua estrangeira e as novas

formas trazidas pela semiótica; a autonomia

intelectual, para resolver problemas práticos

utilizando os conhecimentos científicos, buscando

aperfeiçoar-se continuamente; a autonomia moral,

por meio da capacidade de enfrentar novas

situações que exigem posicionamento ético;

finalmente, a capacidade de comprometer-se com

o trabalho, entendido em sua forma mais ampla de

construção do homem e da sociedade, por meio da

responsabilidade, da crítica, da criatividade.

(KUENZER, 2013, p. 50-51).

Segundo a autora, estas necessidades mudariam radicalmente a

formação dos trabalhadores, desde que fosse pensada para todos. No

entanto, o que se aprofunda é estratificação social, em que a escola

continua cumprindo seu papel de seleção, oferecendo uma formação

científico-tecnológica sólida para um número cada vez menor de

trabalhadores, reformulando os métodos e conteúdos para estes, e

ampliando o contingente de trabalhadores formados precariamente num

processo educativo ainda mais esvaziado de conteúdos, que irão

alimentar as fileiras de desempregados ou de empregados com empregos

precários.

A autora entende que dadas as determinações do capitalismo na

atualidade, a democratização da educação possível, e só com muita luta,

81

é a democratização da educação básica de qualidade para todos, já que

“a efetiva democratização da educação só será possível com a efetiva

democratização da sociedade em outro modo de produção, onde todos

os bens materiais e culturais estejam disponíveis a todos os cidadãos”

(KUENZER, 2013, p. 51).

Sobre a educação, Freitas (1994) defendia a tese de que o

capitalismo, no final do século XX, prescindiria da formação de um

novo tipo de trabalhador, mais adequado ao novo tipo de exploração, e

que isto acirraria a contradição educar/explorar. Ao mesmo tempo em

que o capitalismo não pode instruir demais os trabalhadores, precisa de

trabalhadores com mais conhecimentos, capazes de operar sobre a nova

base tecnológica e atuar na gestão dos processos de trabalho. O autor

alerta que para que a defesa de uma educação progressista não caia na

dicotomia melhorar a escola e contribuir com o projeto de formação do

novo trabalhador para o capitalismo, ou não melhorar a “educação para

as classes populares para não sermos cúmplices do projeto da ‘nova

direita’” (FREITAS, 1994, p. 124), precisa compreender o caráter

contraditório da educação escolar e da luta pela qualidade da educação

para as classes populares, e, ao invés de trabalhar pela formação do novo

trabalhador, como é o projeto da burguesia e do capital, precisa

trabalhar pela formação do novo homem. Do ponto de vista do capital, o

autor questiona se o que restará será “exercer um controle mais direto do

projeto político pedagógico da escola, ou seja, da organização do

trabalho pedagógico” (FREITAS, 1994, p. 127). Esta tendência é

evidente na gestão gerencial implantada pelo Estado, através de

programas, com metas pré-estabelecidas a serem alcançadas, nas formas

de controle, como a avaliação externa, as regulamentações impostas, e

também pela precarização aprofundada pelos contratos emergenciais e

temporários, a desvalorização e a intensificação do trabalho.

Um aspecto importante é o da desvalorização salarial, que obriga

os professores a trabalharem em jornadas duplicadas ou mesmo em três

turnos para garantirem minimamente suas condições de sobrevivência.

Dados apresentados por Horn e Calazans (1992), demonstram que desde

1974, quando o Plano de Carreira e Salários do Magistério foi criado no

RS, até dezembro de 1991, o poder aquisitivo do salário dos professores

havia caído para 28,50% de seu poder aquisitivo inicial, ou seja, caiu

para menos de 1/3 de seu valor. Em 1985 o magistério havia

conquistado em acordo de greve um vencimento básico igual a dois

salários mínimos e meio, o que foi cassado logo após por vinculação

ilegal do índice de reajuste ao salário mínimo. Em julho de 2013 o

vencimento básico era igual a 72% do salário mínimo. Mesmo

82

considerando a valorização real do salário mínimo, estes números

expõem o alto grau de desvalorização do salário do professor ao longo

dos anos, que reconfigura a categoria do magistério, e obriga os

trabalhadores a assumirem jornadas duplas e/ou triplas de trabalho para

poderem garantir minimamente suas condições de existência.

Outro aspecto a ser considerado no estado do RS foi a política de

enturmação26

e multisseriação27

. Comuns nos anos 80, voltaram a fazer

parte do cotidiano das escolas a partir de 2007 com o governo do PSDB

no estado. A enturmação ocorreu em 43,5% das escolas e a

multisseriação, em mais de 36% das escolas em 2009, conforme dados

de pesquisa do CPERS-Sindicato (CPERS, 2010). Com essas medidas o

governo promoveu a intensificação do trabalho com o aumento do

número de alunos por sala, sobrecarregando o professor em sala de aula

bem como no trabalho extraclasse, de preparação de aulas e avaliação,

além de precarizar a qualidade do ensino.

A redução do número de pessoal de apoio em setores como

supervisão, coordenação e orientação pedagógica, e a ausência ou mau

funcionamento de laboratório de informática e o fechamento de setores

como laboratórios de ciências físicas, químicas e biológicas e

bibliotecas, e a falta de pessoal disponibilizado para o atendimento

destes setores implica tanto na qualidade do trabalho docente quanto na

intensificação do trabalho, uma vez que o professor passa a assumir

novas responsabilidades. A pesquisa do CPERS-Sindicato (CPERS,

2010, p. 9) apontou que 60% das escolas não tinham orientador

pedagógico, e 37,8% não tinham laboratório de informática28

.

26

Junção de turmas feita durante o andamento do ano escolar, elevando o

número de estudantes por turma para até 50. 27

Salas de aula em que um único professor atende duas ou mais séries ao

mesmo tempo. 28

Mais dados podem ser encontrados em: CPERS aponta problemas da rede

estadual de ensino através de pesquisa científica. Notícia publicada em

página on-line. Disponível em:

<http://www.cpers.org.br/index.php?menu=1&cd_noticia=3440>. Acesso em:

11 mar. 2013. Trabalho Docente na Educação Básica em Santa Catarina –

Relatórios de Pesquisa – Centro de Ciências da Educação da UFSC –

GEPETO/CED/UFSC – 2011 (material em CD). Trabalho Docente na

Educação Básica no Brasil. Disponível em:

<http://trabalhodocente.net.br/relatorio_sinopse.pdf>. Acesso em: 15 ago.

2013. Trabalho Docente na Educação Básica no Brasil. Disponível em:

<http://louderdesign.net/gepeto/projetos-de-pesquisa/concluidos/finish/11-

83

Outro aspecto que interfere diretamente nas condições de trabalho

é o da insuficiência de repasses para manutenção da escola. No RS, em

março de 2007, o montante de verbas devido às escolas em função de

repasses parciais e atrasados somava o valor correspondente às verbas

integrais de um ano29

. O sindicato recebeu inúmeros relatos de escolas

em que os professores não tinham recursos básicos como tinta e folhas

para fotocopiadoras ou mimeógrafos, e em muitos casos não contavam

nem mesmo com giz para escrever no quadro negro, tendo que eles

próprios individualmente custearem materiais de uso pedagógico.

Conforme aponta CPERS-Sindicato (CPERS, 2010), 81,6% dos

entrevistados, pais, alunos, professores, funcionários de escola, diretores

e vice-diretores, avaliavam que a verba era insuficiente para manter a

escola.

A impossibilidade de oferecer aulas de qualidade pela ausência de

recursos adequados (recursos materiais, humanos, setores de apoio e

instalações) se apresenta como uma forma de intensificação do trabalho,

uma vez que os professores passam a cobrar de si próprios soluções

eficazes para garantir a aprendizagem dos alunos, muitas vezes

adquirindo problemas emocionais e físicos, como a síndrome de

Burnout, por sentirem-se impotentes.

Aspectos ainda mais relevantes são os da contratação emergencial

e temporária, e da ausência de concursos públicos e a morosidade na

nomeação. O contingente de professores contratados no RS chega a

25%, e em Porto Alegre 33%, segundo dados da Secretaria da

Fazenda30

. Estes trabalhadores não contam com plano de carreira,

adicional por tempo de serviço, Fundo de Garantia por Tempo de

Serviço (FGTS) e tampouco seguro desemprego. Até 2010, recebiam

apenas pelas horas trabalhadas em sala de aula, não recebendo nenhuma

remuneração para o trabalho extraclasse. Estes profissionais, sem

vínculo estável com o estado, estão mais vulneráveis às ameaças das

direções e acabam assumindo cargas horárias para além das exigidas

pela Secretaria de Educação quando da falta de professores tanto pelo

não suprimento das vagas do quadro da escola quanto pelas ausências

eventuais. Normalmente são estes profissionais que atendem a duas, três

concluidos/156-trabalho-docente-na-educacao-basica-no-brasil.html>. Acesso

em: 13 ago. 2013. 29

Sineta – informativo do CPERS – março de 2007. 30

Disponível em:

<https://www.sefaz.rs.gov.br/Site/MontaMenu.aspx?MenuId=639>. Acesso

em 13 ago. 2013.

84

ou mais turmas ao mesmo tempo para não haver a dispensa de alunos e

garantir-lhes o dia letivo. A pesquisa do CPERS-Sindicato (CPERS,

2010) apontou falta de provimento de professores e funcionários de

escola em 58,5% das escolas do estado. Fiod (2005b, p. 16) contribui

com esta análise quando, acerca do trabalho temporário expõe:

Ele aparece como síntese de um processo que

impôs o assalariamento, porém em uma sociedade

em que não pode garantir emprego para todos,

nem mesmo na esfera estatal.

Como pressuposto da relação social nutrida pelo

emprego/desemprego dessa unidade de contrários,

percebe-se que o trabalhador temporário, alijado

do assalariamento, submete-se a qualquer

condição de trabalho para sobreviver, inclusive

ministrando aulas em condições precárias de

emprego.

Ainda sobre a intensificação do trabalho docente e a precarização

da educação, outro aspecto a ser considerado é o da inclusão de alunos

portadores de deficiências, que, na maioria dos casos, é feita sem os

recursos necessários e sem a formação dos educadores, que sem preparo

acabam tendo que buscar por si soluções.

Devemos considerar também o descumprimento dos direitos

constantes da legislação como plano de carreira, adicional de férias,

promoções, unidocência31

, reajustes salariais, que implicam na

existência de um grande número de processos judiciais contra o estado,

através dos quais os educadores buscam receber o que lhes é devido.

Estes processos arrastam-se por anos até serem julgados e os valores

devidos transformam-se em precatórios, que levariam décadas para

serem pagos. Como alternativa o servidor abdica de parte do valor (às

vezes um percentual bastante alto) para receber como Requisição de

Pequeno Valor, que deveria ser pago em 180 dias, mas que o governo

não cumpre, aprofundando o ataque aos direitos e agravando a sensação

de impotência. Este aspecto reflete negativamente na saúde emocional

dos trabalhadores em educação, que, desrespeitados em seus direitos

trabalhistas, vão percebendo o projeto de desmonte da educação pública

31

Valor pago mensalmente ao professor único de turma, de 1º ao 5º ano do

ensino fundamental, como compensação por não ter remuneração para horas

atividade e cumprir tempo integral em sala de aula.

85

dos governos e o descaso com os estudantes e educadores, o que

contribui para o desenvolvimento da síndrome de Burnout.

O assédio moral tornou-se uma constante no cotidiano escolar,

que levou o sindicato a desenvolver inúmeras campanhas para

conscientização, tentando organizar os coletivos escolares como forma

de evitá-lo e instrumentalizar os trabalhadores em educação para que

possam reagir e defenderem-se.

A intensificação e a precarização do trabalho limitam a

possibilidade de organização e de apreensão crítica da realidade bem

como de organização da resistência contra as políticas neoliberais em

curso. O contexto escolar atual limita as possibilidades de construir a

gestão da escola de forma coletiva e democrática, e de transformação da

escola, exigindo uma ação estrategicamente pensada para transformar a

escola e a sociedade conjuntamente, o que depende de um grande

esforço coletivo para enfrentar as condições expostas e romper os

condicionantes. As condições de organização da classe são tolhidas

pelas condições impostas pela classe dominante ao mundo do trabalho.

Sem organização não há como discutir propostas, construir

reivindicações comuns e unidade para a luta em sua defesa, não há como

traçar estratégias de transformação da realidade. Só a organização, a

unidade e a luta podem romper com os determinantes e iniciar a

transformação.

86

87

3 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO SOCIAL DA GESTÃO DA

ESCOLA PÚBLICA NO ÂMBITO DA SOCIEDADE

CAPITALISTA

A organização da escola foi se desenvolvendo ao longo da

história passando por formas diversas que corresponderam ao momento

histórico e seus determinantes, o modo de produção e a divisão do

trabalho. Passaram-se muitos anos na história da escola antes que se

desenvolvesse de forma organizada uma concepção de administração

escolar. A administração enquanto ação de organizar o trabalho e os

espaços, formular objetivos, executar o trabalho para atingir os

objetivos, avaliar se os resultados contemplam os objetivos, existe desde

o início da história do homem moderno, no entanto, conscientemente

começa a se desenvolver como administração a partir do aparecimento

das fábricas modernas durante o que se convencionou chamar de

Revolução Industrial.32

Marx (1983a, p. 257) explica que o processo de

produção capitalista inicia quando

[...] um mesmo capital individual ocupa

simultaneamente um número maior de

trabalhadores, onde o processo de trabalho,

portanto, amplia sua extensão e fornece produtos

numa escala quantitativa maior que antes. A

atividade de um número maior de trabalhadores,

ao mesmo tempo, no mesmo lugar (ou, se se

quiser, no mesmo campo de trabalho), para

produzir a mesma espécie de mercadoria, sob o

comando do mesmo capitalista, constitui histórica

e conceitualmente o ponto de partida da produção

capitalista.

Segundo Marx (1983a), no início a diferença é meramente

quantitativa, no entanto, neste processo de muitos trabalhadores lado a

lado dividindo o mesmo espaço e trabalhando simultânea e

combinadamente no mesmo processo de produção que se chama

cooperação, não significa meramente a soma das forças de trabalho

32

Podemos situar o início da Revolução Industrial no final do século XVIII com

a invenção da máquina a vapor. O período que provocou profundas mudanças

nas formas de vida e organização da população, fundamentalmente na

organização do trabalho, se estenderia pelo século XIX, até início do século

XX.

88

individuais, mas potencializa estas forças quando empenham seu esforço

numa mesma operação. Para isso, torna-se condição o comando do

capital, a ordem do capitalista.

Todo trabalho diretamente social ou coletivo

executado em maior escala requer em maior ou

menor medida uma direção, que estabelece a

harmonia entre as atividades individuais e executa

as funções gerais que decorrem do movimento do

corpo produtivo total, em contraste com o

movimento de seus órgãos autônomos. [...] Essa

função de dirigir, superintender e mediar torna-se

função do capital, tão logo o trabalho a ele

subordinado torna-se cooperativo. (MARX,

1983a, p. 263)33

.

Segundo Souza (2012) a administração moderna surgiu para

responder a duas necessidades decorrentes da Revolução Industrial:

a) Crescimento acelerado e desorganizado das

empresas que passaram a exigir uma

administração científica capaz de substituir o

empirismo e a improvisação;

b) necessidade de maior eficiência e produtividade

das empresas, para fazer face à intensa

concorrência e competição no mercado (SOUZA,

2012, não paginado).

A administração organizada como teoria teve início com

Frederick Winslow Taylor, que em 1911 publicou sua teorização no

livro Princípios de Administração Científica. Taylor defende que a

concepção e o planejamento do processo de trabalho devem ocorrer

33

Para aprofundamento da reflexão veja também o excerto de Marx (1983a, p.

263): “A direção do capitalista não é só uma função específica surgida da

natureza do processo social de trabalho e pertencente a ele, ela é ao mesmo

tempo uma função de exploração de um processo social de trabalho e,

portanto, condicionada pelo inevitável antagonismo entre o explorador e a

matéria-prima de sua exploração. [...] Se, portanto, a direção capitalista é, pelo

seu conteúdo, dúplice, em virtude da duplicidade do próprio processo de

produção que dirige, o qual por um lado é processo social de trabalho para a

elaboração de um produto, por outro, processo de valorização do capital, ela é

quanto à forma despótica”.

89

separados de sua execução, desta forma, não é necessário que o

trabalhador seja educado, a não ser para executar os movimentos

necessários para o trabalho parcelar que vai desenvolver. Taylor

aprofunda a divisão do trabalho de forma que o trabalhador pode ser

totalmente destituído do conhecimento, sendo-lhe necessárias apenas

habilidades físicas. Taylor dividiu a Administração Científica em cinco

fases essenciais: planejar, comandar, organizar, controlar e coordenar.

Em 1916, Henry Fayol publicou, em francês, suas teorias, na obra

Administração Industrial Geral, que foi traduzida para o inglês apenas

em 1947, quando passou a exercer maior influência na administração.

Esta teoria e a de Taylor influenciaram fortemente o desenvolvimento da

administração escolar ao longo dos anos, que foi sofrendo mudanças

conforme as fases de desenvolvimento da sociedade capitalista e de suas

formas de administração da produção, passando pela influência do

Fordismo, Keynesianismo, Toyotismo34

e do modelo de acumulação

flexível.

Foram várias as formas assumidas pela administração escolar,

muitas vezes sem uma definição clara, sendo um misto de várias

tendências, uma vez que a proposta encaminhada pelos governantes

depende da execução por parte dos trabalhadores da escola, os quais não

o fazem de uma forma coesa e sem resistências.

No final dos anos 1970 e início dos anos 1980, o termo gestão

entrou no debate educacional35

e passou a fazer parte das reivindicações

da classe trabalhadora para a escola, pensando numa forma mais

participativa e autônoma, sob a bandeira da gestão democrática. No

mundo da produção o termo passou a predominar buscando substituir a

concepção de administração predominante, centrada nos princípios de

previsão, organização, comando, coordenação e controle, dando mais

ênfase à autonomia e responsabilização. A partir dos anos 1990, o termo

gestão, mesmo na educação, passou a focar mais a concepção neoliberal

da administração, a gerência, a gestão de conflitos internos e a busca de

melhores resultados, principalmente no que se refere ao lucro. Com esta

ressignificação, o que seria seu contraditório, a gestão democrática, foi

sendo tomada pelos princípios neoliberais e utilizada pelos governos

como ferramenta de produção de consenso. Neste trabalho defendemos a

34

Apresentamos alguns dos elementos acerca destes conceitos no capítulo 2,

seção 2.4 e os retomamos no capítulo 4. 35

Não há fontes na literatura que apontem precisamente quando, em que

ambientes e com que significado o termo gestão passou a ser usado e passou a

prevalecer sobre o termo administração.

90

gestão democrática revestida de seu significado construído na luta da

classe trabalhadora pela democratização da educação do final dos anos

1970 e anos 1980, conforme apresentamos na seção 3.2.

3.1 PARTICIPAÇÃO, DEMOCRACIA, AUTONOMIA,

EMANCIPAÇÃO HUMANA

Ao pensarmos uma forma de gestão da escola pública que possa

configurar-se numa ferramenta de luta que contribua para o acirramento

das contradições da sociedade capitalista, e que possa fazer a escola

contribuir em direção à realização dos interesses da classe trabalhadora,

ou seja, realizar revolução social e a emancipação humana, pensamos na

gestão democrática, participativa, pautada no princípio da cooperação,

da igualdade e da liberdade, por envolver os indivíduos numa prática de

defesa e luta por seus interesses, na tomada de decisões pelos rumos da

sua escola, estabelecendo-lhe objetivos e contribuindo de forma

consciente para sua realização. A classe trabalhadora necessita uma

escola com esse caráter transformador, capaz de contribuir na sua

libertação da dominação burguesa, mesmo que a maioria não tenha

consciência desta necessidade e consciência de que a escola pública que

temos hoje cumpre um papel de conservação e defesa do sistema do

capital. Cabe então a explicação do conceito de democracia como o

pensamos para a gestão da escola.

Vale salientar que a busca pela democracia não se encerra como

um fim em si mesmo, mas como uma ferramenta capaz de desenvolver

nos sujeitos participativos a consciência de seu papel na sociedade, o

compromisso e a responsabilidade com sua classe, como meio de

impulsionar o acirramento das contradições da sociedade capitalista e a

luta pela superação desse modelo socioeconômico. Pensamos a

democracia como forma de relacionar-se com os demais nos ambientes

da sociedade e de suas organizações, como ferramenta que contribui no

desenvolvimento da consciência crítica, esta como meio de levar os

indivíduos à apreensão da realidade e à compreensão da necessidade da

transformação revolucionária da sociedade, e visando a seu engajamento

na luta por esta transformação, articulando-se com os coletivos em luta –

percebendo que a luta é de toda a classe trabalhadora, por sua

emancipação.

A democracia que contribui para este fim tem várias

conceituações. Inicialmente podemos pensar no significado do termo

91

com origem na Grécia antiga, demos (povo) + kratos (poder, autoridade

para decidir), democracia, significando o poder do povo. Ober (2008)

pergunta-nos sobre qual poder se está falando, pois a generalização é

que seja poder de tomar decisões através do voto, respeitando a vontade

da maioria. O autor nos explica que o sentido da palavra demokratia na

Grécia antiga, quando o termo foi criado, é o de poder enquanto

capacidade de fazer coisas, e demo como um coletivo formado por

indivíduos (cidadãos, portanto homens adultos residentes da polis)

capazes de pensar objetivos e escolher e praticar ações para realizá-los,

então, um coletivo com poder de fazer coisas, e não o poder da maioria.

Foi durante a revolta popular que provocou a revolução

democrática de 508/7 a.C., segundo o autor (OBER, 2008), que a

capacidade do coletivo se manifestou pela primeira vez. No entanto,

segundo o autor, momentos revolucionários são fugazes, e se era para

permanecer esta capacidade coletiva de fazer coisas, incluindo planejar e

atuar realizando os planos, em condições normais, a democracia como

uma forma de autogoverno popular necessitava de formas institucionais.

Ainda segundo o autor, as formas institucionais atenienses nunca foram

centradas nas eleições. Mas como o demos se constituía de indivíduos

capazes de escolher conforme seus desejos, e não foram unificados nos

desejos por uma ideologia, além de apresentarem condições diferentes

de participação as quais eram aproximadas através de subsídios, estes se

constituíam em dificuldades coletivas e problemas de coordenação, a

serem abordados e resolvidos para que o demos pudesse agir

politicamente e de uma maneira permanente e sustentável. Buscou-se

equacionar estes fatos por meio não apenas de adoção de regras de

votação, mas também de sorteios para cargos e pela constituição de um

coletivo deliberativo de elaboração de planos de ações, as quais foram as

primeiras formas institucionais democráticas. O autor aponta que estas

formas não conseguiram captar o verdadeiro significado de demokratia

como capacidade de fazer coisas, seu significado foi sendo distorcido e

não dando conta do que se propunha inicialmente. Ao ler a exposição do

autor podemos aproximar à ideia dos “coletivos com capacidade de

fazer as coisas” com a liberdade existente na autogestão, onde os

coletivos se administram conforme seus interesses e suas condições, no

entanto, segundo o autor, faz-se necessário traçar interesses comuns

mediados pela ideologia.

Pensando no significado que possa ter a palavra “poder” nas

diferentes concepções, podemos considerar Bobbio (2005, p. 7) ao

expressar que

92

[...] por democracia entende-se uma das várias

formas de governo, em particular aquelas em que

o poder não está nas mãos de um só ou de poucos,

mas de todos, ou melhor, da maior parte, como tal

se contrapondo as formas autocráticas.

Este apresenta a dimensão que a democracia tem em nossa

sociedade, onde se configura numa forma de governo, em que o poder

não está na mão do presidente, mas se divide entre os representantes do

povo, que são eleitos. O poder de decisão política neste caso é do

parlamento, enquanto que ao povo cabe o poder do voto na escolha de

“seus” representantes, ou o poder de protesto. Os representantes que

fazem parte das estruturas democráticas de decisão, como já analisado

anteriormente, são submissos aos interesses do capital, representam os

interesses das classes dominantes (que entre outras coisas, financiam

suas campanhas eleitorais) demonstrando que a democracia não pode se

efetivar no capitalismo.

Boron (1994) nos remete à alteração evidente de sentido que

tomou a democracia com as concepções liberais que a distanciaram de

forma quase intransponível de seu sentido presente nas formulações

mais antigas. As atuais teorias liberais abandonaram o conteúdo

essencial da democracia (a qual chama de medula igualitária, presente

nos escritos de Aristóteles e Rousseau) e o substituíram pelo formalismo

que privilegia os aspectos dos procedimentos dos processos eleitorais e

das estruturas de governo contra os atributos substantivos da cidadania.

E completa que “Chega-se assim a um ponto em que a medula

igualitária e revolucionária da democracia se dissolve em uma deslavada

proposta doutrinária” (BORON, 1994, p. 93) legitimadora da

supremacia estatal. O autor explica ainda que a coincidência entre

democracia e os interesses do capitalismo é uma “novidade deste

século”, possível pelo rebaixamento de conteúdo que a democracia

sofreu que permitia que coexistisse “sem excessivas fricções e sem

‘excessiva’ repressão” (pelo “domínio que a hegemonia burguesa havia

introduzido na consciência das classes subordinadas”) com um regime

econômico que proclamava a Igualdade, embora fundado na

expropriação e exploração da classe trabalhadora (BORON, 1994, p. 94-

95).

Historicamente a democracia foi sendo dotada de diferentes

significados em diferentes concepções teóricas. Medeiros e Luce

(2006?, p. 2) nos lembram que duas teorias têm embasado o confronto

de duas diferentes concepções de democracia a partir do século XX e ao

93

longo deste século, a democracia participativa, fundamentada no

marxismo ou socialismo e a democracia liberal, fundamentada no

liberalismo. As autoras explicam que a democracia liberal se tornou

hegemônica e caracteriza-se por “[...] ser um método ou arranjo para

chegar-se a decisões políticas e administrativas; um conjunto de regras

para formação do governo representativo, através do voto”. A

democracia liberal ou democracia burguesa é sinônimo da democracia

representativa que podemos observar em funcionamento na sociedade.

Neste tipo de democracia “[...] o eleitorado é homogeneizado e o centro

do debate são as normas do processo democrático, reduzido às eleições

de elites políticas” (MEDEIROS; LUCE, 2006?, p. 2) e a democracia

representativa é tida como a única forma possível. Segundo as autoras,

esta forma de democracia

[...] é o regime no qual uma elite é autorizada a

governar, em nome de um todo idealmente

homogêneo e de um suposto consenso. Assim

sendo, pode-se considerar que se trata de uma

democracia restrita ao campo político, sem

“alargamentos” e consequências para o campo

social e econômico. (MEDEIROS; LUCE, 2006?,

p. 2).

Segundo Medeiros e Luce, a democracia participativa e popular,

como uma concepção contra-hegemônica, é entendida

[...] como forma de aperfeiçoamento da

convivência humana, construída histórica e

culturalmente, que deve reconhecer e lidar com as

diferenças, ser inclusiva das minorias e das

múltiplas identidades, implicar na ruptura com as

tradições e buscar a instituição de novas

determinações. Enfim, é a concepção de que a

convivência humana deve ser mediada por uma

“gramática democrática”, provocadora de rupturas

positivas e indeterminações, através do exercício

coletivo e participativo do poder político, para que

se possa seguir avançando para novos desejados

estados de vida em sociedade. (MEDEIROS;

LUCE, 2006?, p. 2).

A democracia representativa é a forma hegemônica aceita pelo

sistema do capital, que a usa em busca do consenso entre as classes

94

sociais e como justificação. Wood (2003, p. 173) explica que enquanto

na democracia ateniense os pequenos produtores primários eram livres,

de fato, da exploração, “livres da necessidade de entrar no mercado para

garantir as condições de trabalho e de subsistência”, os trabalhadores no

capitalismo são obrigados a trocar sua força de trabalho por um salário

para garantir os meios de sua subsistência, ficando assim reféns da

exploração do capitalista. Segundo a autora, “Somente no capitalismo se

tornou possível deixar fundamentalmente intactas as relações de

propriedade entre capital e trabalho enquanto se permitia a

democratização dos direitos políticos e civis” (WOOD, 2003, p. 174).

De acordo com Wood (2003), enquanto a democracia ateniense era

contra as eleições por privilegiarem as classes proprietárias (a não ser

em alguns casos específicos em que fosse necessária uma opinião

técnica), a democracia estado-unidense foi quem criou o tipo de

cidadania passiva da democracia representativa, que dá ênfase à eleição,

exatamente com o intuito de afastar o povo das decisões políticas e

privilegiar as classes proprietárias.

É o capitalismo que torna possível uma forma de

democracia em que a igualdade formal de direitos

políticos tem efeito mínimo sobre as

desigualdades ou sobre as relações de dominação

ou de exploração em outras esferas. (WOOD,

2003, p. 193).

Segundo Wood, a democracia representativa foi se transfigurando

em democracia liberal, movimento que esteve ligado à “afirmação do

poder das classes dominantes contra o povo” (WOOD, 2003, p. 198,

grifos da autora), como um projeto contrarrevolucionário, ou um meio

de conter as revoluções em curso, e que se buscava o liberalismo para

substituir a democracia e não para mudá-la. O termo democracia foi

esvaziado de conteúdo e atualmente é utilizado referindo-se a

“liberdades civis, liberdade de expressão, de imprensa e de reunião,

tolerância, proteção de uma esfera de privacidade, defesa do indivíduo e

da ‘sociedade civil’ contra o estado, e coisas tais” (WOOD, 2003, p.

199, destaque da autora) ao invés de seu significado original de governo

popular.

No entanto, mesmo que essa seja a democracia característica

dessa conjuntura, não pensamos que se justifique abandonar a bandeira

da democracia, o que representaria um retrocesso nas conquistas da

classe trabalhadora. Outrossim, defendemos a luta pela ampliação dos

95

espaços democráticos visando implantar a democracia participativa,

creditando a esta um caráter revolucionário, no sentido de despertar os

trabalhadores para sua tarefa de buscar a emancipação da classe.

Viana (2003, p. 33) apresenta duas formas de se tratar a

democracia:

[...] como realidade existente ou como projeto

político. Se tomarmos a democracia como

conceito antecipador, como um projeto político,

temos que admitir que a democracia não existe, e

talvez nunca existiu, em nenhum lugar do mundo,

dependendo da forma que a definirmos. Se

tomarmos a democracia como conceito

expressivo, como realidade existente, então

teremos que analisar suas manifestações concretas

no interior de determinadas relações sociais e daí

retirarmos sua definição.

O autor opta por fazer uma análise da democracia existente, a

democracia burguesa, representativa, que como representativa dos

interesses da maioria, domina pela hegemonia os interesses da

população que aceita como seus os interesses da minoria formada pela

classe dominante. Concordamos com o autor acerca do que representa a

democracia existente, e defendemos a democracia como um projeto

político, mesmo considerando o que o autor explica: que então é

necessário buscar uma definição de algo que não existe concretamente e

que poderia se resolver tal dilema com “a retomada da raiz etimológica

da palavra: democracia = governo do povo, o que é equivalente a

autogoverno ou autogestão” (VIANA, 2003, p. 33). O autor julga então

desnecessário o uso do termo democracia se já se tem o termo

autogestão construído de significado, no entanto pensamos na

democracia operária como bandeira dos trabalhadores, da qual

defendemos não abdicar.

Mesmo que julguemos como remota a possibilidade de a

democracia ocorrer de forma revolucionária na transformação dos seres

humanos e da sociedade neste momento histórico, Titton (2010, p. 66-

67) apresenta a contradição que está no desenvolvimento de regimes

políticos democráticos, explicando que ao mesmo tempo em que

[...] se complexificou a estrutura do poder,

também permitiu a organização da classe

trabalhadora em um grau diferenciado, ampliando

96

sua participação nas esferas de disputa do poder

político e econômico, com a organização dos

partidos operários e dos sindicatos e, mais

recentemente, dos movimentos de luta social.

Neste andar contraditório, mesmo que se ampliem os espaços de

participação, o sistema do capital em crise limita cada vez mais as

possibilidades de realização dos interesses operários, de “interromper a

destruição das forças produtivas e realizar a distribuição da riqueza

produzida”, e cada vez mais a democracia se volta para a defesa da

igualdade no plano formal, do direito, o que “se torna um poderoso

instrumento de cooptação, sobretudo da direção da classe trabalhadora”

(TITTON, 2010, p. 67). O autor coloca também que assim como a

igualdade, a liberdade também está posta no plano formal, “já que a

inserção objetiva dos homens na produção da riqueza os coloca em

classes com interesses antagônicos, irreconciliáveis” (TITTON, 2010, p.

67). Impossível conquistar a igualdade e a liberdade enquanto uma

minoria detém a propriedade dos meios de produção e a maioria é

escrava da venda de sua força de trabalho para garantir sua

sobrevivência. Ainda assim, considerando estes aspectos, a democracia

não é uma pauta da qual a classe operária possa prescindir, como

Luxemburgo nos ensina: “a tarefa histórica do proletariado, quando

toma o poder, consiste em instaurar a democracia socialista no lugar da

democracia burguesa, e não em suprimir toda a democracia”

(LUXEMBURGO, 1991, p. 96). Não é a qualquer democracia que a

autora se refere, deixa claro que é a democracia socialista, a qual

conceitua como sendo a ditadura do proletariado, que como classe

majoritária, pretende destruir as classes sociais, e a si enquanto classe,

sendo assim a única que pode fazer uma revolução e defender os

interesses de todos, da espécie humana. Luxemburgo (1991) explica o

que é a ditadura do proletariado, ou a democracia socialista, necessária

num período de transição:

Esta ditadura consiste na maneira de aplicar a

democracia, não na sua supressão, ela se

manifesta nas intervenções enérgicas e resolutas

pondo em causa os direitos adquiridos e as

relações econômicas da sociedade burguesa; sem

isso a transformação socialista não pode ser

realizada. Mas esta ditadura precisa ser obra da

classe e não de uma pequena minoria que dirige

em nome da classe, quer dizer, ela deve, a cada

97

passo, resultar da participação ativa das massas,

ser imediatamente influenciada por elas, ser

submetida ao controle do público em seu

conjunto, emanar da formação política crescente

das massas populares. (LUXEMBURGO, 1991, p.

96).

Temos a participação ativa e a formação política como partes

necessárias e inter-relacionadas deste processo de gestão da sociedade,

onde um transforma o outro, o indivíduo que transforma a gestão e se

transforma pela nova forma de gerir sua vida, os espaços sociais e a

sociedade como um todo.

A participação consciente necessária à realização da democracia

implica na condição de compreender os processos nos quais se está

inserido, de avaliar as possibilidades, de formular objetivos de acordo

com os seus interesses, de formular propostas, de conhecer os limites e

as possibilidades e a capacidade de organizar a ação para dar conta de

transformar a realidade em direção ao que se pretende. A participação

que por falta de compreensão da realidade, se limita à aceitação da

mesma, sem questionamentos críticos, sem formulação de objetivos e

propostas e sem a ação para realizá-los não configura democracia. O

sistema que se utiliza do consenso conquistado pela falta de informação

e de capacidade de compreensão da população é um sistema autoritário.

Marx e Engels expõem que a democracia é um meio, um passo

necessário e importante na transição para uma sociedade sem classes,

defendendo que “o primeiro passo na revolução operária é a elevação do

proletariado à classe dominante, a conquista da democracia” (MARX e

ENGELS, 2003, p. 66). Esta assertiva não ocupa uma forma definitiva

na teoria dos autores, mas tem espaço como meio, transição, como um

“primeiro passo”. Lenin também reforça esta ideia afirmando que

A ditadura do proletariado, período de transição

para o comunismo, instituirá pela primeira vez

uma democracia para o povo, para a maioria,

esmagando ao mesmo tempo, impiedosamente, a

atividade da minoria, dos exploradores. Só o

comunismo está em condições de realizar uma

democracia totalmente perfeita, e, quanto mais

perfeita for, mais depressa se tornará supérflua e

por si mesma se eliminará. (LENIN, 2007, p. 107-

108).

98

Coutinho (1979) nos explica que a democracia não é uma etapa

no caminho do socialismo que após a conquista deva ser abandonada,

mas é a criação de uma base, de um patamar mínimo que deve ser

aprofundado e conservado ao longo de todo o processo. A democracia

de massas a ser implantada deve conservar e elevar a um nível superior

as conquistas da democracia liberal burguesa. O autor defende que

[...] para aqueles que, em nome dos interesses

histórico-universais dos trabalhadores, lutam pelo

socialismo, a democracia política não é um

simples princípio tático: é um valor estratégico

permanente, na medida em que é condição tanto

para a conquista quanto para a consolidação e

aprofundamento dessa nova sociedade.

(COUTINHO, 1979, p. 37).

O autor entende que a democracia que deve ser construída a partir

da articulação entre as formas de representação tradicionais e os

organismos de democracia direta é a democracia de massas, “que deve

servir de superestrutura à transição para, e à construção de, uma

sociedade socialista” e deve

[...] promover a síntese dos vários sujeitos

políticos empenhados na transformação social

uma síntese que - respeitada a autonomia e o

pluralismo dos movimentos de base - seja a

portadora da hegemonia dos trabalhadores sobre o

governo da sociedade como um todo. O que se

propõe, em outras palavras é a constituição do

“autogoverno dos produtores associados”, a que

se referiam Marx e Lênin. (COUTINHO, 1979, p.

39).

O autor explica como funciona na prática a democracia de massas

que deve perdurar no socialismo evitando que seja novamente o

domínio de alguns sobre os interesses de outros:

Nessa democracia de massas, a dialética do

pluralismo - a autonomia dos sujeitos políticos

coletivos - não anula, antes impõe, a busca

constante da unidade política, a ser construída de

baixo para cima, através da obtenção do consenso

majoritário; e essa unidade democraticamente

99

conquistada será o veículo de expressão da

hegemonia dos trabalhadores. (COUTINHO,

1979, p. 40).

De acordo com Titton (2010, p. 69), “o aprofundamento da

democracia é incompatível com a atual fase do capitalismo

mundializado” o que “repõe a necessidade revolucionária na ordem do

dia”. A luta pela democratização precisa estar aliada à estratégia

revolucionária como forma de ultrapassar os limites impostos pela

sociedade de classes.

Gramsci ao criticar as escolas profissionais e contrapor a estas a

escola única (“que conduza o jovem até os umbrais da escolha

profissional, formando-o entrementes como pessoa capaz de pensar, de

estudar, de dirigir ou de controlar quem dirige” (GRAMSCI, 1989, p.

136)) expõe uma das possíveis contribuições da escola se ela tiver

caráter democrático, a ideia de que a escola deve formar o indivíduo

para que ele efetivamente desenvolva a condição de se tornar um

governante, tornando possível a democracia:

[...] a tendência democrática, intrinsecamente, não

pode consistir apenas em que um operário manual

se torne qualificado, mas em que cada “cidadão”

possa se tornar “governante” e que a sociedade o

coloque, ainda que “abstratamente”, nas

condições gerais de poder fazê-lo: a democracia

política tende a fazer coincidir governantes e

governados (no sentido de governo com o

consentimento dos governados), assegurando a

cada governado a aprendizagem gratuita das

capacidades e da preparação técnica geral

necessárias ao fim de governar. (GRAMSCI,

1989, p. 137).

Pensamos que é inviável ensinar democracia na escola e

tampouco desenvolver nos educandos valores democráticos se o

ambiente é autoritário e se todas as decisões já foram tomadas. Não é

possível construir uma sociedade democrática pelo discurso, mas sim

pela experiência. No entanto não é forjando situações em que as pessoas

possam intervir de forma democrática em decisões fantasiosas, mas na

prática cotidiana que envolve o ambiente escolar e a sociedade, desde as

menores decisões que se pode ir construindo uma cultura de democracia.

Paro retoma a ideia gramsciana e explica que:

100

Por certo, ser governante numa sociedade que

leva o conceito de democracia à radicalidade não

implica necessariamente ter um cargo de

governante. Mais importante do que isso, ao

pensar nas grandes massas da população, é que

diuturnamente o cidadão comum sinta que sua

vida está integrada a um todo social para o qual

ele contribui com suas ações, com suas opiniões e

com sua participação em múltiplas instâncias do

tecido social, em que seus interesses e sua

vontade manifesta sejam levados em conta.

(PARO, 2007, p. 26, grifo nosso).

Assim, quando falamos em democracia e em gestão democrática

da escola, pensamos num sistema transitório (um meio, uma ferramenta

até a transformação social que possibilite a auto-gestão) onde todas as

pessoas estejam efetivamente envolvidas, acolhidas e sejam por ele

responsáveis (tendo ciência dos limites do capital). Concordamos com

Lück (2012, p. 58) que defende que

[...] a proposição de democratização da escola

aponta para o estabelecimento de um sistema de

relacionamento e de tomada de decisão em que

todos tenham possibilidade de participar e

contribuir a partir de seu potencial que, por essa

participação, se expande, criando um

empoderamento pessoal e de todos em conjunto e

da instituição.

Pensamos num sistema em que cada indivíduo possa contribuir

com suas ações e atitudes, com seu conhecimento e por vontade própria,

por ser um sistema o qual constrói, conhece, mantém e do qual formula

conscientemente os objetivos e os meios mais apropriados para atingi-

los conforme a vontade da maioria, compreendendo que este sistema lhe

devolve em possibilidades de realização humana (liberdade) todo o seu

empenho36

. Um sistema ao qual o indivíduo esteja integrado e se sinta

36

Ferreira (2011, p. 121) contribui com a compreensão ao expor que: “Os

princípios norteadores de qualquer Estado Democrático são a preservação da

liberdade, a igualdade de direitos e a supremacia da vontade popular, segundo

a qual o povo (conjunto de pessoas que falam a mesma língua, têm costumes,

histórias e interesses semelhantes) é a única fonte do poder”.

101

parte, consciente de que cada atitude individual ou coletiva afeta o

coletivo e os envolvidos individualmente. Neste sentido, defendemos a

gestão democrática e coletiva da escola pública como uma forma

intermediária – educativa e conscientizadora, de liberdade e autonomia

limitadas pela estrutura da escola capitalista – entre as formas

autoritárias que temos atualmente, e a que consideramos a forma ideal,

que é a autogestão, compreendendo que esta última só pode se efetivar

numa sociedade de iguais, onde a divisão do trabalho, e, portanto, a

divisão da sociedade em classes, tenha sido superada pela extinção da

propriedade privada, mas compreendendo também que isto não pode

servir de legitimação para a falta de ação, e que se deve iniciar em

algum ponto.

Pensamos que a gestão da escola pode ser um espaço de ação que

contribua para a construção da luta pela revolução socialista, ao

compreender que só a participação da classe trabalhadora no

planejamento educacional pode mudar os objetivos da escola. Neste

sentido, Paro defende que

[...] a maneira de a escola contribuir para a

transformação social é o alcance de seus fins

especificamente educacionais, [para isso]

precisamos dotá-la da racionalidade interna

necessária à efetiva realização desses fins. [...] A

Administração Escolar precisa saber buscar na

natureza própria da escola e dos objetivos que ela

persegue os princípios, métodos e técnicas

adequados ao incremento de sua racionalidade.

(PARO, 2012, p. 177).

O ponto de partida para a racionalização das atividades é o

conhecimento das especificidades do processo de trabalho que ocorre na

escola. A transformação passa pela negação da forma capitalista da

escola, de sua administração e, portanto, das relações de trabalho

capitalistas.

Defendemos que a escola precisa da participação da comunidade

escolar, refletindo coletivamente sobre sua organização, elaborando

objetivos, e buscando selecionar os melhores conteúdos, métodos,

técnicas e meios para atingi-los, pautados pelos princípios da igualdade

de condições, no respeito ao indivíduo e ao coletivo, construindo uma

administração pautada na práxis criadora. Neste sentido, a gestão

democrática cumpre um papel importante na tomada de consciência,

uma vez que proporciona pela prática a reflexão acerca da realidade da

102

escola, e o compromete com a apreensão desta realidade para que lhe

seja possível pensar na realização do objetivo da classe trabalhadora

como parte de um todo e de sua responsabilidade para a organização e

funcionamento deste todo. Marx e Engels nos ensinam que

A produção de ideias, de representações, da

consciência, está, de início, diretamente

entrelaçada com a atividade material e com o

intercâmbio material dos homens, como a

linguagem da vida real. O representar, o pensar, o

intercâmbio espiritual dos homens, aparecem aqui

como emanação direta de seu comportamento

material. O mesmo ocorre com a produção

espiritual, tal como aparece na linguagem da

política, das leis, da moral, da religião, da

metafísica etc. de um povo. Os homens são os

produtores de suas representações, de suas ideias

etc., mas os homens reais e ativos, tal como se

acham condicionados por um determinado

desenvolvimento de suas forças produtivas e pelo

intercâmbio que a ele corresponde até chegar às

suas formações mais amplas. A consciência

jamais pode ser outra coisa do que o ser

consciente, e o ser dos homens é o seu processo

de vida real. (MARX; ENGELS, 1977, p. 36).

Podemos concluir daí que toda prática da qual o sujeito toma

parte vai provocar mudanças em sua consciência, e não há outra forma

de alterar a consciência que não seja pela alteração da prática e da vida

material. Uma práxis reflexiva e criadora vai promover o

desenvolvimento da consciência crítica. “Não é a consciência que

determina a vida, mas a vida que determina a consciência” (MARX;

ENGELS, 1977, p. 37). A participação na gestão organizada de forma

democrática, orientada para a autogestão, onde se busque igualar as

condições de participação, considerando as diferenças dos indivíduos,

educa para a democracia, para a igualdade e para a própria participação.

A escola, organização à qual a classe trabalhadora ainda credita

grande importância na formação de seus filhos, apresenta grande

possibilidade de ser foco do interesse da participação destes pais, desde

que vejam nela objetivos semelhantes aos que sonham que a escola

concretize para seus filhos. Isto não significa, no entanto, que a escola

deva se ater aos sonhos possíveis de serem sonhados pelos pais, ela,

103

através dos indivíduos revolucionários, deve tensionar de forma

progressista e agir como elemento de formação da classe trabalhadora

em seu conjunto para que aspirem à sociedade sem classes.

A possibilidade de uma administração

democrática no sentido de sua articulação, na

forma e no conteúdo, com os interesses da

sociedade como um todo, tem a ver com os fins e

a natureza da coisa administrada. (PARO, 2012, p.

199).

Neste sentido, a autonomia é fundamental para a escola mesmo

que seja provida de recursos pelo Estado, para que possa se colocar ao

lado dos interesses da classe trabalhadora, que só a própria classe pode

realizar: o fim da sociedade de classes como possibilidade de

emancipação humana.

Quanto à autonomia, o uso do termo pelos diferentes grupos que

compõe a sociedade acabou por atribuir-lhe uma série de significados

que torna necessário um resgate de seu desenvolvimento e do sentido

defendido por este estudo.

De acordo com Gadotti (1995, p. 14) é a partir da segunda metade

do século XX “com as críticas à educação como fator de reprodução

social, que o tema da autonomia foi associado a uma concepção

emancipadora da educação”. Segundo o autor, no campo da educação,

em especial na Europa, na França, o tema da autonomia pedagógica foi

associado ao tema da autogestão social a partir dos anos 1960. O autor

explica que

Autonomia significava, acima de tudo, ruptura

com esquemas centralizadores. Opunha-se a

autonomia operária à burocracia estatal-partidária

conservadora. Era uma forma de repensar a

prática social, um movimento essencialmente

político, um movimento de rebeldia contra

doutrinas políticas mecanicistas, notadamente os

modelos socialistas que pregavam uma “linha

justa” contra outras linhas que consideravam

como “desvios”. (GADOTTI, 1995, p. 16).

Segundo o autor (GADOTTI, 1995, p. 12), no passado recente,

“O tema da autonomia teve um papel político mobilizador contra o

poder instituído verticalmente, burocraticamente. Ao centralismo

104

opunha-se uma prática social baseada na participação [...]” tanto na

escola como na sociedade. Com o predomínio das relações capitalistas,

o termo, que era pauta da luta do proletariado é apropriado por outros

setores que vão revestindo-o com novos significados.

Para tornar possível a compreensão do desdobramento de seu

significado, identificado com diferentes concepções teóricas, Martins

explica que é importante estudarmos a origem do termo.

A discussão sobre o desenvolvimento e o

exercício da autonomia no âmbito da política

implica um debate sobre a própria construção da

noção de democracia desde Rousseau, para quem

o princípio inspirador do pensamento democrático

sempre foi a liberdade entendida como autonomia,

isto é, como a capacidade de uma sociedade de

dar leis a si própria, promovendo a perfeita

identificação entre quem dá e quem recebe uma

regra de conduta, eliminando dessa forma, a

tradicional distinção entre governados e

governantes sobre a qual fundou-se todo o

pensamento moderno. (MARTINS, 2002, p. 12).

Democracia, autonomia e liberdade aparecem numa ligação

indissolúvel, dimensões do mesmo projeto. A autora (MARTINS, 2002)

apoia-se em Bobbio (2000) ao explicar que, para o bom funcionamento

da democracia, além da participação na tomada de decisões, é

indispensável que os que participam sejam colocados diante de

alternativas reais e com condições de poder escolher entre estas. Para

que isso seja possível devem existir garantias do direito à opinião, de

expressão, de associação, de reunião como direitos invioláveis. Neste

sentido, a realidade concreta acrescentou propriedades diferentes à

democracia uma vez que a sociedade não se faz de homens ideais, e a

democracia na sociedade de classes com interesses antagônicos concede

uma autonomia relativa aos grupos, mas quanto aos indivíduos, só lhes

possibilita idealmente. A realidade demonstra que a democracia como

um sistema que leve a sociedade à realização da autonomia e da

liberdade nunca existiu, senão como projeto ideal, o que aponta para a

necessidade do projeto revolucionário, cujo conteúdo, segundo Martins

(2002, p. 31) “é precisamente a reorganização e a reorientação da

sociedade pela ação autônoma dos homens”.

Segundo Martins o termo autonomia passou a conter uma

pluralidade de significados, sendo “utilizado por tecnocratas,

105

anarquistas, comunistas, proletários, humanistas e cientistas de forma a

designar descentralização, negação do Estado ou criação de conselhos”

(MARTINS, 2002, p. 47), e, na literatura acadêmica o conceito, em

alguns casos, está “vinculado à ideia de participação social, e, em

outros, relacionado à ideia de ampliação da participação política no que

tange a questões de descentralização e desconcentração de poder”

(MARTINS, 2011?, p. 5). A autora explica que a partir dos anos 1980, o

termo também foi sendo ressignificado pelas políticas educacionais

vigentes e

[...] passou a ser utilizado, de um lado, como

sinônimo de descentralização e desconcentração e,

de outro, como a etapa subsequente de processos

descentralizadores, a partir dos quais a unidade

escolar estaria finalmente livre para elaborar seu

próprio plano de voo. (MARTINS, 2002, p. 48).

No entanto, ao mesmo tempo em que a legislação foi

regulamentando propostas que seriam democráticas de gestão, foi

também limitando a autonomia das escolas, que ficaram obrigadas a

implantar o que regula a legislação e a seguir suas regras. Desta forma,

segundo a autora,

O termo autogestão, significativamente,

desapareceu nesse horizonte colocado pelas

diretrizes oficiais em vigor. Também desapareceu

o eixo central conferido, histórica e

filosoficamente, ao conceito de autonomia: a

defesa de conselhos gestores nas instituições de

ensino com mandato revogável e a instauração da

avaliação institucional. No debate da área

educacional, o conceito de autonomia vem

sofrendo um processo de sacralização e, ao que

tudo indica, encontra-se reduzido à redefinição de

procedimentos administrativos e financeiros da

rede de escolas, com significativa ampliação de

encargos e responsabilidades para elas

(MARTINS, 2002, p. 48).

O significado atribuído para a autonomia pelas políticas

educacionais para a gestão escolar é a de desresponsabilização do

Estado tanto com o financiamento quanto com os resultados, como Lück

deixa transparecer em sua análise que atribui a política da avaliação de

106

desempenho à concepção em que a autonomia da gestão escolar é

“entendida como processo de elevação da competência da escola a partir

do seu esforço no sentido de assumir responsabilidades

socioeducacionais e prestar contas delas à sociedade [...]” (LÜCK, 2009,

p. 89-90). Desta forma, apropriada pela classe dominante em busca do

consenso da classe trabalhadora, passa a constituir a legislação enquanto

termo, mas não com o significado que a classe trabalhadora lhe atribui.

Ao se realizar na prática, ela assume os valores e princípios de sua

roupagem nova, passando então a ser abandonada como pauta de luta

por uma parcela crítica da população que reconhece a impossibilidade

de realizá-la na sociedade capitalista.

Sobre as experiências de autogestão, Gadotti (1995, p. 25) explica

que a autogestão “[...] representa, sem dúvida, uma ‘mudança radical’,

mas, para pô-la em marcha, deve ser entendida, antes de mais nada,

como ‘democracia radical’ e como utopia concreta, sempre inacabada”,

que depende da ação responsável e ética e de um esforço contínuo. Ela

não pode ocorrer na sociedade capitalista como forma acabada, senão

como processo de construção e como resultado de uma quantidade de

pequenas mudanças no cotidiano, na mesma direção, as quais tornam

possível a grande mudança. A autogestão, segundo o autor, não é

participação, pois participar seria “engajar-se numa atividade já

existente com sua própria estrutura e finalidade. A autogestão visa à

transformação e não à participação.” (GADOTTI, 1995, p. 15).

O autor explica que o sentido que interessa para compreender

melhor a organização do trabalho na escola,

[...] pressupõe o fato de que hoje uma das formas

fundamentais da opressão é a divisão social do

trabalho entre dirigentes e executantes que se

reflete diretamente na administração do ensino:

uns poucos, fora da escola, detêm o poder de

decisão e o controle, enquanto todos os demais

simplesmente executam tarefas cujo sentido lhes

escapa. (GADOTTI, 1995, p. 35).

Este aspecto inviabiliza a autonomia ou autogestão, entendida

como a capacidade de governar-se a si mesmo, criando as próprias

normas, os próprios objetivos e definindo os meios para atingi-los, uma

vez que depende da ação consciente dos indivíduos. Para Castoríadis

(1982, p. 123 apud GADOTTI, 1995, p. 19) “a autonomia seria o

domínio do consciente sobre o inconsciente”, ou seja, também uma

107

forma de superação da alienação pela atividade coletiva dos indivíduos

que concebem, executam e coordenam seu próprio processo de trabalho.

Bruno (1990, p. 32 apud GADOTTI, 1995, p. 17) entende a autogestão

como uma importante ferramenta de luta contra a divisão do trabalho e

de superação da sociedade de classes, considerando-a uma forma

bastante avançada de luta, “onde os operários se reapropriam do espaço

e do tempo, redefinindo, destruindo as hierarquias, eliminando a

dualidade dirigentes-dirigidos, a divisão entre trabalho manual e

intelectual”.

A autonomia possível é relativa, porém, como defende Snyders

(1977, p. 109 apud GADOTTI, 1995, p. 44), não se trata de abandonar a

luta pela autonomia, mas compreender a importância que tem manter

essa autonomia e lutar para ampliá-la, compreendendo que ela “só pode

tornar-se realidade se participar no conjunto das lutas das classes

exploradas”. Gadotti (1995, p. 47) complementa afirmando que

A luta pela autonomia da escola insere-se numa

luta maior pela autonomia no seio da própria

sociedade, portanto é uma luta dentro do

instituído, contra o instituído, para instituir outra

coisa. [...] A autonomia se refere à criação de

novas relações sociais que se opõe às relações

autoritárias existentes.

[...] a escola autônoma não significa escola isolada

mas em constante intercâmbio com a sociedade.

Nesse momento, lutar por uma escola autônoma é

lutar por uma escola que projete, com ela, uma

nova sociedade. Pensar numa escola autônoma e

lutar por ela é dar um sentido novo à função social

da escola e do educador que não se considera um

cão de guarda de um sistema iníquo e imutável,

mas se sente responsável também por um futuro

possível com equidade.

Neste sentido, lutando pela autonomia, a escola pode servir

também de espaço para difundir a ideologia revolucionária,

disseminando a necessidade da transformação da sociedade em sua

essência. Uma vez que a ideologia dominante perpassa toda a sociedade,

é imprescindível utilizar todas as organizações para a divulgação e

construção da contra-hegemonia. Paro nos auxilia a pensar esta tarefa

afirmando que a divulgação da nova visão de mundo pela escola não

precisa restringir-se às atividades de ensino-aprendizagem, mas que

108

deve permear todas as atividades da escola, especialmente as

administrativas. De acordo com o autor,

Obviamente, uma gestão de escolas estruturada

em bases democráticas, fundada na participação

da comunidade, terá maiores facilidades de

conseguir a adesão de parcelas significativas dos

pais de alunos, para atividades culturais que visem

à reflexão mais profunda dos problemas

educacionais de seus filhos, e que lhes propiciem,

ao mesmo tempo, a apreensão de uma concepção

de mundo mais elaborada e crítica. Isso não pode

ser confundido, entretanto, com a prática do mero

proselitismo político ou da doutrinação e da

propaganda dogmática por meio da escola.

(PARO, 2012, p. 203-204).

Pensando no conceito amplo de administração, como “utilização

racional de recursos para a realização de fins determinados”, a escola

deve reorganizar as formas de administração para que seus recursos

estejam e sejam utilizados de acordo com os objetivos revolucionários e

a serviço dos interesses da classe trabalhadora, a qual está ligada

concretamente. Neste sentido, Paro explica que

[...] a natureza do processo pedagógico escolar,

por meio do qual se busca alcançar os objetivos

escolares, é que dá a medida das potencialidades e

limites aos quais está subordinado o alcance

desses mesmos objetivos.

A vinculação orgânica existente entre esses dois

aspectos – os objetivos educacionais e o processo

pedagógico escolar – é a mesma que deve existir

entre o técnico e o político na formulação de uma

nova teoria da Administração Escolar, articulada

com a transformação social. (PARO, 2012, p. 199,

grifo do autor).

O autor conclui que “a busca de uma especificidade para a

Administração Escolar coincide com a busca de uma nova

Administração Escolar” (PARO, 2012, p. 200), e que esta deve se pautar

pelos interesses da classe trabalhadora buscando realizar os objetivos

educacionais que sirvam a seu projeto de abolir a dominação, e deve ter

claro que o próprio processo educativo será determinado por estes

109

objetivos. Não pode haver democracia se não houver a construção

coletiva dos objetivos com autonomia e participação da comunidade

escolar.

Luxemburgo (2005) tece algumas considerações ainda sobre

democracia que nos interessa compreender:

[...] a [sorte] do desenvolvimento democrático [...]

está ligada ao movimento socialista. Que a

democracia não vai sendo viável na medida em

que a classe operária renuncia à sua luta

emancipadora, mas, ao contrário, na medida em

que o movimento socialista vai fortalecendo-se

bastante para lutar contra as consequências

reacionárias da política mundial e da deserção

burguesa. Que os que desejarem o reforçamento

da democracia devem desejar igualmente o

reforçamento, e não o enfraquecimento, do

movimento socialista, e que, renunciando aos

esforços socialistas, renuncia-se tanto ao

movimento operário quanto à própria democracia.

(LUXEMBURGO, 2005, p. 92-93).

Compreendemos que lutar pelo socialismo traz intrinsecamente a

luta pela democracia, embora a luta pela democracia muitas vezes se

encerra nela própria, perspectiva não defendida por nós. Só quem pode

conquistar ampliação na democracia nas estruturas e organizações onde

ainda há espaço para avanços é a classe trabalhadora revolucionária. A

burguesia não pode conceder mais democracia do que foi forçada para

garantir a farsa do poder compartilhado, justificada pelo voto e pelas

eleições. E nas organizações onde não há mais espaço para a democracia

ser aprofundada e fortalecida, cabe ao movimento socialista radicalizar a

luta acirrando as contradições do sistema, tornando-as mais evidentes.

A autora (LUXEMBURGO, 2005) enfatiza a luta pela

emancipação como uma das formas de democratizar a sociedade, e

evidencia a ligação entre ambas. A luta pela democracia e a luta pela

emancipação são dimensões interdependentes da mesma luta. Ambas

compõem e prescindem da luta pela transformação social para uma

sociedade comunista, que deve ocorrer com o fim da propriedade

privada dos meios de produção, que realiza a sociedade sem classes e a

superação da divisão do trabalho.

A emancipação humana é o fim último a ser alcançado. Um

conceito parcial do significado de emancipar-se é trazido por Marx e

110

Engels, ao explicarem que com a destruição da sociedade de classes e a

superação da propriedade privada pela revolução comunista, o poder do

mercado mundial será dissolvido

[...] e então a libertação de cada indivíduo singular

é alcançada na mesma medida em que a história

transforma-se completamente em história

mundial.[...] é claro que a verdadeira riqueza

espiritual do indivíduo depende da riqueza de suas

relações reais. É apenas desta forma que os

indivíduos singulares são libertados das diversas

limitações nacionais e locais, são postos em

contato prático com a produção (inclusive a

espiritual) do mundo inteiro e em condições de

adquirir a capacidade de desfrute desta multiforme

produção do mundo inteiro (as criações dos

homens). (MARX; ENGELS, 1977, p. 54).

Segundo os autores, não é possível combater a divisão do

trabalho no mundo das ideias, arrancando esta representação da mente,

da consciência, mas é preciso que os indivíduos superem a divisão do

trabalho no plano objetivo. Esta superação só é possível na coletividade.

“Apenas na coletividade [...] é que cada indivíduo encontra meios de

desenvolver suas capacidades em todos os sentidos; somente na

coletividade, portanto, é possível a liberdade pessoal” (MARX;

ENGELS, 1977, p. 116-117). A coletividade está posta como fator

imprescindível para a realização da liberdade pessoal, ou seja, para a

emancipação. Os autores explicam ainda que

[...] a dominação do proletariado fará com que

desapareçam [as separações e os antagonismos

entre as nações] ainda mais. A ação unitária, pelo

menos nos países civilizados, é uma das primeiras

condições de sua emancipação. (MARX;

ENGELS, 2003, p. 64).

Marx e Engels defendem que “a emancipação do proletariado

requer sua união fraternal” (MARX; ENGELS, 2003, p. 104). A

emancipação do trabalhador em relação ao trabalho alienado é um

elemento essencial para alcançar a emancipação humana. A

emancipação política, como outro elemento necessário à emancipação

humana, é lograda no processo de luta pela emancipação do trabalho e

111

pode ser alcançada em diferentes níveis de acordo com o avanço na luta

de classes. Há outras considerações que merecem ser compreendidas:

Que a emancipação das classes trabalhadoras

deverá ser conquistada pelas próprias classes

trabalhadoras; que a luta pela emancipação das

classes trabalhadoras não significa uma luta por

privilégios e monopólios de classe, e sim uma luta

por direitos e deveres iguais, bem como pela

abolição de todo domínio de classe; [...];

Que a emancipação econômica das classes

trabalhadoras é, portanto, o objetivo primordial a

que todo o movimento político deve subordinar-se

como meio;

Que todos os esforços visando a esse magno

objetivo fracassaram até agora em virtude da falta

de solidariedade entre os operários das diversas

categorias de trabalho em cada país, bem como

pela ausência de um vínculo fraternal de união

entre as classes trabalhadoras dos diferentes

países;

Que a emancipação do operariado não é um

problema local ou nacional, mas sim um problema

social, abrangendo todos os países onde existe a

sociedade moderna, e dependendo para sua

solução do apoio prático e teórico dos países mais

avançados. (MARX; ENGELS, 2003, p. 107).

A emancipação como a entende Marx (2010a) decorre da

eliminação da propriedade privada dos meios de produção, do fim da

divisão do trabalho, mas também do desenvolvimento das forças

produtivas, que deve se encontrar em nível avançado de modo a permitir

o tempo livre, pela redução da jornada de trabalho, e possa ser, em sua

totalidade, apropriado pelos próprios trabalhadores. Explica que

[...] a emancipação humana só estará plenamente

realizada quando o homem individual real tiver

recuperado para si o cidadão abstrato e se tornado

ente genérico na qualidade de homem individual

na sua vida empírica, no seu trabalho individual,

nas suas relações individuais, quando o homem

tiver reconhecido e organizado suas “forces

propres” [forças próprias] como forças sociais e,

em consequência, não mais separar de si mesmo a

112

força social na forma da força política. (MARX,

2010b, p. 54).

Marx coloca a emancipação como a passagem do reino da

necessidade ao reino da liberdade, sendo que este

[...] só começa, de fato, onde cessa o trabalho

determinado pela necessidade e pela adequação a

finalidades externas; portanto, pela própria

natureza da questão, isso transcende a esfera da

produção material propriamente dita. (MARX,

1983b, p. 273).

O autor (MARX, 2011a) entende o tempo de trabalho alienado

como tempo de desumanização, contrapondo com a necessidade de um

tempo livre para humanização do homem.

A realização da emancipação é uma possibilidade da luta do

proletariado, não é um produto da evolução da sociedade capitalista, só

pode se dar como resultado da revolução proletária.

3.1.1 A Comuna de Paris como experiência histórica de autogestão

Segundo Gadotti (1995), autonomia e autogoverno fazem parte

da própria natureza da educação. O autor entende que na autogestão o

trabalhador não se faz representar no poder, não participa do poder, mas

é ele que exerce diretamente o poder. Na educação, a autogestão é uma

necessidade, pois a educação inicia de fato com a liberdade de decisão, a

necessidade de pensar objetivos e a autoavaliação ou autocoerção.

A primeira experiência de sociedade baseada nos princípios da

autogestão e de uma sociedade de produtores livremente associados se

deu com a organização da Comuna de Paris em 1871. Esta ocorre após o

desenrolar de inúmeros movimentos revolucionários e insurreições,

como a Revolução Burguesa de 1789, o ascenso das massas de 1792, a

Revolução de Julho de 1830, a Revolução de Junho de 1832, a

Revolução de Fevereiro de 1848, a insurreição de junho de 1848 e a

tentativa de insurreição de 184937

.

37

Para um conhecimento mais aprofundado, indicamos a leitura também de:

MARX, Karl. The June revolution. Disponível em:

<https://www.marxists.org/archive/marx/works/1848/06/29a.htm>. Acesso

113

De acordo com Engels (1999a), a partir de 1789, considerando os

últimos 50 anos, com a revolução de 1830 e a revolução e a insurreição

de 1848, pelo desenvolvimento político e econômico da França

conquistado com o sangue da classe operária, não poderia ser outro o

caráter da revolução que viria a ocorrer em 1871, pois o proletariado

necessariamente defenderia suas reivindicações. Segundo ele, no

período que antecede a Comuna de Paris, dependendo do grau de

desenvolvimento da consciência dos operários parisienses, as

reivindicações eram mais ou menos obscuras e confusas, “mas o

objetivo final era sempre a supressão dos antagonismos de classe entre

capitalistas e operários” (ENGELS, 1999a, p. 8). Mesmo que não

soubessem como realizá-la, a reivindicação por si só era uma ameaça

para a ordem social estabelecida, o que provocou a busca constante do

enfraquecimento do operariado pela burguesia. Segundo Engels (1999a,

p. 8-9), “Assim se explica que depois de cada revolução ganha pelos

operários se travasse uma nova luta, cujo desfecho era a derrota dos

operários”. Isso pode ser verificado após as lutas de 1830, em que,

segundo o autor, os operários haviam conseguido atingir um nível de

independência política em relação à burguesia, que eventualmente os

impeliriam à luta, assim como ocorreu em 1848, ao perceberem o rumo

das decisões políticas em curso com a reforma eleitoral proposta pelos

burgueses liberais da oposição parlamentar, que usavam a luta popular

como força e legitimação. Dessa forma, ao verificarem “a crise entre o

governo e a oposição, os operários deram início à luta nas ruas” em

fevereiro de 1848, (ENGELS, 1999a, p. 9), não se limitando à pauta da

burguesia, mas implantando sua reivindicação: a república, a qual

em: 18 ago. 2013. ENGELS, Friederich. The 23rd of June. Disponível em:

<http://www.marxists.org/archive/marx/works/1848/06/28a.htm>. Acesso em:

25 jun. 2013. ______. Details about the 23rd of June. Disponível em:

<http://www.marxists.org/archive/marx/works/1848/06/26b.htm>. Acesso em:

24 abr. 2014. ______. The 24th of June. Disponível em:

<http://www.marxists.org/archive/marx/works/1848/06/28b.htm>. Acesso em:

27 abr. 2014. ______. The 25th of June. Disponível em:

<http://www.marxists.org/archive/marx/works/1848/06/29.htm>. Acesso em:

27 abr. 2014. ______. The June RevolutionThe Course of the Paris

Uprising. Disponível em:

<http://www.marxists.org/archive/marx/works/1848/07/01c.htm>. Acesso em:

27 abr. 2014. ______. The Kölnische Zeitung on the June Revolution.

Disponível em:

<http://www.marxists.org/archive/marx/works/1848/07/01b.htm>. Acesso em:

27 abr. 2014.

114

chamavam de República Social. Com o governo eleito, em que a

maioria dos representantes eram da burguesia, o antagonismo entre a

classe burguesa (ou capitalista) e a classe operária fica evidente e vai se

acirrando com a traição da burguesia às reivindicações dos operários,

acabando com a ilusão de unidade de reivindicações criada em 1789,

quando ambas as classes combateram o inimigo comum que era a

monarquia. A burguesia visa a enfraquecer e destruir sua classe

antagônica para garantir o poder em suas mãos, para isso precisa

desarmar os operários. Com a maioria na Assembleia Constituinte, a

burguesia passou a combater as ideias socialistas e lançar medidas para

controlar e reprimir os operários, forçando-os a se insurgirem

novamente em junho de 1848, quando precisaram então lutar pela

própria existência, desta vez sem a ilusão na fraseologia da bandeira

“Liberdade, Igualdade, Fraternidade”, que se mostrou vazia e incapaz de

resolver as contradições entre as classes. A insurreição foi combatida

impiedosa, brutal e cruelmente pela burguesia. Segundo Engels,

O governo havia tomado medidas para garantir

uma esmagadora superioridade de forças. Depois

de cinco dias de luta heroica os operários

sucumbiram. E se produziu um banho de sangue

de prisioneiros indefesos como jamais se vira

desde os dias das guerras civis com que se iniciou

a derrocada da República Romana. Era a primeira

vez que a burguesia mostrava a que extremo de

crueldade e vingança é capaz de chegar sempre

que o proletariado se atreva a confrontar-se com

ela como uma classe independente, que tem os

seus próprios interesses e reivindicações. E apesar

disso 1848 não foi mais que um brinquedo de

crianças comparado com a fúria selvagem de

1871. (ENGELS, 1999a, p. 10).

Segundo Marx (2011b), a resposta dada pelo proletariado

parisiense na Insurreição de Junho foi “o mais colossal acontecimento

na história das guerras civis europeias” (MARX, 2011b, p. 34), porém,

sua derrota com mais de 3 mil mortos e mais de 15 mil deportados

“relegou o proletariado ao segundo plano da cena revolucionária”

(MARX, 2011b, p. 35), exigindo um grande esforço para que

conseguisse se reerguer, o que foi se tornando mais difícil após cada

derrota. Segundo Marx (2011b), a derrota de junho havia preparado o

terreno para que a república burguesa pudesse ser implantada, mas

115

também foi ela que revelou que “a república burguesa representava o

despotismo irrestrito de uma classe sobre outras classes” (MARX,

2011b, p. 36, grifos do autor).

Engels (1999a) explica que a burguesia não era uma classe

homogênea, sua maioria de tendência monárquica estava organizada em

três partidos dinásticos e havia um quarto, republicano. A disputa de

interesses particulares e a discrepância interna da classe burguesa

permitiram a Luís Bonaparte, presidente da república eleito em

dezembro de 1848, a tomada do comando do exército, da polícia e do

aparelho administrativo e, após, em dezembro de 1851, a destruição da

Assembleia Nacional. Assim acabava a Segunda República e a França

retornava ao império. Marx (2011b) explica a responsabilidade dos

revolucionários socialistas. Segundo este, após as jornadas de junho de

1848, a pequena-burguesia não se sentiu recompensada e sentiu que seus

interesses materiais e as garantias democráticas estavam se perdendo, o

que a levou a aproximar-se dos trabalhadores. Por meio da luta contra

Bonaparte e contra os ministros monarquistas, sua representação

parlamentar retomou a popularidade e fez alianças com os líderes

socialistas, elaborando um programa em comum, instituindo comitês

eleitorais comuns e lançando candidatos comuns. De acordo com o

autor,

A ponta revolucionária das exigências sociais do

proletariado foi quebrada e foi-lhe dado um viés

democrático, as reivindicações democráticas da

pequena-burguesia foram despidas da sua forma

meramente política e a sua ponta socialista

voltada para fora. Assim surgiu a social-

democracia. (MARX, 2011b, p. 63).

Segundo Marx (2011b, p. 63), o caráter da social-democracia se

resumia a reivindicar instituições republicanas democráticas, “não como

meio de suprimir dois extremos, o capital e o trabalho assalariado, mas

como meio de atenuar a sua contradição e transformá-la em harmonia”,

ou seja, por mais que se use a revolução como ornamento, o que se

busca é transformar a sociedade apenas pelas vias democráticas, abrindo

mão da possibilidade da revolução. Segundo Marx (2011b, p. 64), “A

burguesia passou a sentir a necessidade de acabar com os pequeno-

burgueses democratas” e criou uma armadilha, desrespeitando a

constituição ao bombardear Roma, provocando uma violenta reação dos

representantes da social-democracia, que tentaram uma nova insurreição

116

em 13 de junho de 1849, esperada pela burguesia para lançar suas tropas

e destruir os pequeno-burgueses. Os representantes no parlamento não

foram apoiados pelas bases, que não estavam organizadas para a luta.

Segundo Marx (2011b), ao invés de os pequeno-burgueses conseguirem

um aporte de forças dos trabalhadores, os trabalhadores é que foram

contagiados com as debilidades do partido democrata, cujos

representantes haviam enganado as bases sobre a participação dos

Guardas Nacionais e das Forças Armadas, que não se mostraram na luta.

Totalmente débeis, parcela dos representantes social-democratas fugiu

para o exterior, outra parcela foi enviada para a Alta Corte, e os demais

foram vigiados pelo novo estado de sítio implantado em Paris e em

Lyon (em Lyon, em resposta ao levante armado dos trabalhadores,

esmagado numa luta sangrenta). Assim, conforme Marx (2011b, p. 66),

“os líderes tiveram a satisfação de culpar o seu ‘povo’ de deserção, e o

povo teve a satisfação de culpar os seus líderes de fraude”, no entanto,

além destes aspectos, o fundamental que faltava eram grandes interesses

comuns a serem defendidos, e não a Constituição. O total

enfraquecimento dos trabalhadores e de sua luta após estas jornadas e o

desenrolar das medidas tomadas pela Assembleia Nacional e pelo

executivo, em que a burguesia “foi obrigada a destruir com as próprias

mãos todos os seus meios de defesa contra o absolutismo no momento

em que ela mesma se tornou absoluta” (MARX, 2011b, p. 72),

possibilitaram o golpe de estado de Luís Bonaparte em dezembro de

1851 e, posteriormente, em novembro de 1852 o restabelecimento do

império pelo plebiscito que transformava Napoleão III em imperador.

Em 1864 houve a primeira onda de greves, o que reacende o movimento

operário, que, impulsionado pela crise econômica de 1866-1867,

irrompe em inúmeras greves operárias nos anos de 1867 e 186938

. Em

1869, nas eleições para o legislativo, as oposições conseguem mais de

40% dos votos, o que é comemorado com manifestações em Paris. Em

abril de 1870, Napoleão III transforma o regime de governo em

monarquia parlamentar e manda prender todos os membros da

Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) na França, e submete

a reforma constitucional à eleição, na qual derrota a oposição. Em julho

38

Para mais detalhes indicamos: PONGE, Robert. A Comuna de Paris (1871).

Disponível em: <http://www.oolhodahistoria.ufba.br/04ponge.html>. Acesso

em: 03 ago. 2014. MORAES, João Q. Guerra, revolução e contra-revolução

na França (1870-1871). Disponível em:

<http://grabois.org.br/portal/revista.int.php?id_sessao=9&id_publicacao=426

&id_indice=2375>. Acesso em: 4 ago. 2014.

117

de 1870, sentindo-se fortalecido e vitorioso pela ampla diferença de

votos a seu favor na reforma constitucional, declara guerra à Prússia,

numa disputa territorial, e é amplamente apoiado pela opinião pública e

por setores operários. Os operários ligados à Internacional lançaram um

manifesto pela paz dirigido “aos operários de todas as nações” (MARX,

1999, p. 31). Napoleão foi derrotado pelo exército prussiano e capitulou

em 2 de setembro de 1870. Imediatamente após, em 4 de setembro, a

população de Paris ocupou a Câmara Legislativa e exigiu a proclamação

da república, o que logrou conquistar, constituindo-se o “Governo da

Defesa Nacional”, com representantes dos monarquistas e dos burgueses

republicanos. Segundo Marx (1999, p. 49), “Os orleanistas apoderaram-

se dos baluartes do exército e da polícia, deixando aos que se

proclamam republicanos os departamentos puramente retóricos”.

Segundo Ponge (1996?), nesta mesma noite reuniram-se a seção de Paris

da AIT e a Câmara Federal das Sociedades Operárias, que

conjuntamente definem

[...] como linha política, que "o governo

provisório não será atacado, devido à existência

da guerra e, também, devido ao pequeno grau de

preparo das forças populares, ainda

inorganizadas", mas que serão reivindicados,

"com urgência", a abolição imediata da polícia

imperial, a supressão da chefatura governamental

de polícia em Paris, a organização da polícia

municipal, a revogação de todas as leis contra a

imprensa e contra os direitos de reunião e de

associação, a eleição imediata da representação

municipal — vereadores e prefeito — de Paris (de

que a capital francesa está, até então, desprovida),

o armamento imediato de todos os franceses e o

alistamento em massa para fazer frente à ofensiva

das tropas do rei da Prússia, etc.,4 [sic] decidem,

ainda, impulsionar a constituição de um Comitê

Municipal formado por delegados de cada uma

das vinte regiões administrativas

(arrondissements) de Paris. (PONGE, 1996?, não

paginado).

De acordo com Ponge (1996?, não paginado), no dia seguinte,

numa reunião com cerca de quinhentas pessoas presentes, decidem

“lutar pela constituição de um Comitê Republicano por cada região

administrativa; cada Comitê delegará quatro de seus membros para a

118

formação de um Comitê Municipal”. Estas decisões, segundo o autor,

vão influenciar fortemente o rumo dos acontecimentos, principalmente a

partir do dia 11 de setembro, quando o Comitê Municipal passou a

existir, “sob o nome de Comitê Central Republicano de Defesa Nacional

das Vinte Regiões de Paris” (PONGE, 1996?, não paginado). O governo

não se opõe as reivindicações, no entanto, protela sob o pretexto de que

o primordial deve ser a resistência à invasão de Paris pelas tropas

prussianas, e nomeia os prefeitos das vinte regiões, prometendo eleições

posteriores.

Marx (1999) explica a contradição em que se encontra o governo,

que para impedir a invasão prussiana sobre Paris precisa armar a classe

operária e organizá-la como uma força efetiva, no entanto, armar a

classe operária significa entregar-lhe a revolução. Segundo o autor,

O triunfo de Paris sobre o opressor prussiano teria

sido o triunfo do operário francês sobre o

capitalista francês e seus parasitas dentro do

Estado. Nesse conflito entre o dever nacional e o

interesse de classe, o governo da defesa nacional

não vacilou um instante em converter-se num

governo de traição nacional. (MARX, 1999, p.

53).

Em 15 de setembro, enquanto o governo busca negociar sua

rendição para que não seja em termos humilhantes, a classe operária

organizada começa a dialogar com as bases através dos “cartazes

vermelhos” que seriam o veículo de informação das massas. No

primeiro cartaz, informam sobre a existência do Comitê Central

Republicano e do conteúdo da carta de propostas e reivindicações

entregue ao governo. Em 19 de setembro, Paris foi totalmente cercada

pelas tropas prussianas. Paris tinha provisões para sobreviver a 71 dias

de sítio, conforme calculavam os governantes, no entanto, mesmo com a

intenção de rendição, estes submeteram a população à fome e a

enganaram com promessas de não capitulação e vitória, e fingindo

defenderem-se dos soldados prussianos, como confessado mais tarde,

defendiam-se dos operários franceses. No dia 24 de setembro,

desmarcaram as eleições que estavam prometidas para 2 de outubro, o

que provocou inúmeras manifestações de vanguarda, bem como de

chefes da Guarda Nacional, reivindicando “defesa sem tréguas e

eleições municipais” (PONGE, 1996?, não paginado), sem resultados.

As manifestações continuaram, decorrentes do descontentamento com o

119

governo e com a capitulação de generais que entregaram seus exércitos,

armas e oficiais aos prussianos. Segundo Ponge (1996?), os

blanquistas39

tentaram derrubar o governo mas não tiveram sucesso. O

governo, então, marcou eleições municipais para 5 e 7 de novembro e

um plebiscito no dia 3, para o povo responder se confiava no governo.

No plebiscito houve uma esmagadora vantagem do governo, enquanto

que nas eleições municipais, houve um equilíbrio entre as forças pró-

governo e as forças oposicionistas. Assolados pela fome, frio,

bombardeios pelas tropas prussianas e pelas derrotas nas tentativas de

furar o bloqueio prussiano, a população de Paris resistia e protestava. No

dia 2 de janeiro, em Versalhes, o rei da Prússia foi proclamado o

imperador da Alemanha. No dia 5 de janeiro de 1871, os cartazes

vermelhos denunciavam: "A política, a estratégia, a administração de 4

de setembro, na continuidade do Império, estão julgadas. Lugar ao povo, lugar à Comuna!" (PONGE, 1996?, não paginado, grifos do

autor). No dia 28 de janeiro, foi assinado o armistício para rendição de

Paris, que, além de pagar uma indenização, deveria desarmar a

população. O governo marcou eleições para o dia 8 de fevereiro para

eleger uma Assembleia Nacional que iria aceitar ou não as condições da

rendição. As organizações operárias lançaram um manifesto “pelo

advento político dos trabalhadores, pela queda da oligarquia

governamental e do feudo industrial” (PONGE, 1996?, não paginado,

grifos do autor). Paris e as grandes cidades votaram maciçamente pela

república e contra o armistício. A Assembleia Nacional elegeu Thiers

como chefe do poder executivo da República Francesa. Este tomou

como primeiro objetivo desarmar Paris. Em 3 de março, a assembleia de

delegados da Guarda Nacional fundou a Federação Republicana da

Guarda Nacional, com estatuto próprio e um Comitê Central. Thiers

enviou uma tropa com 15 mil homens para recolher os canhões de Paris

na madrugada de 18 de março. A Guarda Nacional deu o alarme e a

população cercou a tropa, que acabou confraternizando amigavelmente,

embora dois generais, com ideais monarquistas e um passado de traição

ao povo, tivessem sido fuzilados. À tarde houve uma contra-ofensiva

popular: “a partir de ações inicialmente isoladas, depois com alguma

orientação do Comitê Central da Federação, batalhões da Guarda tomam

edifícios públicos, ministérios, a prefeitura, estações de trens, quartéis,

39

Militantes do blanquismo, conceito atribuído a Louis Auguste Blanchi, no

qual a revolução deve estar a cargo de um pequeno grupo de pessoas que

deveriam tomar o poder do estado e usá-lo para desenvolver as condições de

posteriormente implantar o socialismo.

120

etc.” (PONGE, 1996?, não paginado). Thiers decidiu fugir para

Versalhes, onde estava instalada a Assembleia Legislativa, e ordenou

que todos que constituíam seu governo o seguissem, o que a Guarda

Nacional permitiu que fizessem. À meia-noite, a Guarda Nacional

reuniu-se na prefeitura e, no dia 19, declarou-se o novo governo da

república, já marcando eleições para a composição do Conselho

Comunal de Paris (Comuna de Paris). Nas palavras de Marx:

A gloriosa revolução operária de 18 de março

apoderou-se indiscutivelmente de Paris. O Comitê

Central era seu governo provisório. E sua notável

atuação política e militar parecia levar a Europa à

dúvida sobre se o que se via era uma realidade ou

simplesmente os sonhos de um passado remoto.

(MARX, 1999, p. 74).

O manifesto do Comitê Central informava:

Os proletários de Paris, em meio aos fracassos e

às reações das classes dominantes,

compreenderam que chegou o momento de salvar

a situação tomando em suas mãos a direção dos

negócios públicos... Compreenderam que é seu

dever imperioso e seu direito incontestável tornar-

se donos de seus próprios destinos, tomando o

poder. (MARX, 1999, p. 84).

Segundo Marx (1999, p. 89), o primeiro decreto da Comuna foi

para suprimir o exército permanente e substituí-lo pelo povo armado.

Isso garantiria ao povo o controle das armas, e não a um governante. As

primeiras medidas do Comitê Central, conforme Ponge (1996?)

descreve, foram a abolição do estado de sítio, supressão dos tribunais

militares, anistia geral dos delitos políticos e imediata libertação dos

presos, restabelecimento da liberdade de imprensa, nomeação dos

responsáveis pelos ministérios e pelos serviços administrativos e

militares essenciais. De acordo com Marx (1999, p. 89-90),

A Comuna era composta de conselheiros

municipais eleitos por sufrágio universal nos

diversos distritos da cidade. Eram responsáveis e

substituíveis a qualquer momento. A Comuna

devia ser, não um órgão parlamentar, mas uma

corporação de trabalho, executiva e legislativa ao

121

mesmo tempo. Em vez de continuar sendo um

instrumento do governo central, a polícia foi

imediatamente despojada de suas atribuições

políticas e convertida num instrumento da

Comuna, responsável perante ela e demissível a

qualquer momento. O mesmo foi feito em relação

aos funcionários dos demais ramos da

administração. A partir dos membros da Comuna,

todos que desempenhavam cargos públicos

deviam receber salários de operários.

Estas medidas garantiam a igualdade de condições a todos os

trabalhadores, e entregavam o poder decisório em suas mãos. Segundo

Lenin (2007), a Comuna foi a realização da democracia operária, em

que há a liberdade de discussão e os próprios mandatários devem

trabalhar e fazer executar suas leis, verificar os resultados e responder

perante seus eleitores. As estruturas do Estado ainda estão presentes,

mas a caminho de serem abolidas por completo consumando a transição.

Após resolver as questões do poder do Estado e das forças militares, e

das polícias como poder de repressão, a Comuna precisava resolver a

questão da repressão espiritual exercida pela igreja, ou o poder dos

padres segundo Marx (1999, p. 90). Assim a Comuna decretou “a

separação da Igreja do Estado e a expropriação de todas as Igrejas como

corporações possuidoras”. Segundo Rougerie (1992, p. 67 apud

PONGE, 1996?, não paginado), os revolucionários tomam esta medida

considerando que “a liberdade de consciência é a primeira das

liberdades [...] [e] que o clero tem sido o cúmplice dos crimes da

monarquia contra a liberdade”. Além dessa medida, “Todas as

instituições de ensino foram abertas gratuitamente para o povo e ao

mesmo tempo emancipadas de toda a intromissão da Igreja e do Estado”

(MARX, 1999, p. 90), libertando a própria ciência dos entraves criados

pelos preconceitos de classe e do poder do governo. Todos os

funcionários públicos, inclusive os magistrados e juízes, deviam ser

funcionários eletivos, responsáveis e demissíveis a qualquer momento.

A Comuna não devia se restringir a Paris, mas a forma de

governo “dos produtores pelos produtores” (MARX, 1999, p. 91) devia

ser implantada em todos os lugares, desde os grandes centros até as

menores aldeias do país, se encontrando nas capitais de distrito e

enviando deputados à delegação nacional em Paris. Estes delegados

poderiam ser substituídos a qualquer momento e desempenhariam um

mandato seguindo instruções de seus eleitores.

122

A Comuna era a antítese direta do Império (MARX, 1999), e ela

veio para se contrapor ao Estado e se colocar em seu lugar. Esta forma

revolucionária e democrática de exercer o poder, onde o trabalhador tem

o poder decisório, não poderia ser aceita pela burguesia como classe

dominante. Ela seria a destruição da burguesia enquanto classe. A

burguesia se organizou para combatê-la, e de uma forma brutal.

No dia 22, houve uma tentativa, sem sucesso, de restabelecimento

da Assembleia Nacional por um grupo liderado por monarquistas.

Segundo Ponge (1996?), entre 22 e 26 de março houve a implantação de

Comunas em outras cidades como Lyon, Marselha, Narbonne,

Toulouse, Saint-Étienne e Le Creusot. Em 26 de março, ocorrem as

eleições e no dia 28, o Comitê Central apresenta o resultado

proclamando a Comuna o poder de governo. No dia 29, a Comuna

organiza-se em dez comissões conforme os ministérios anteriormente

existentes (Militar, Finanças, Justiça, Segurança, Trabalho, Subsistência,

Indústria e Trocas, Serviços Públicos, Ensino) e uma comissão

executiva para integrá-las. Enquanto isso, Thiers foi organizando a

represália com o intuito de restabelecer a ordem em Paris, e conseguiu

com os alemães a permissão para juntar 170 mil homens, dos quais

cerca de 100 mil seriam prisioneiros libertados pelos alemães. Marx

(1999) considerou um “erro decisivo” da Comuna o fato de ter evitado o

confronto armado com Versalhes e permitido a reorganização das forças

da burguesia monarquista sob o comando de Thiers. Segundo o autor, no

começo de abril Thiers iniciou sua segunda campanha contra Paris, com

humilhação e crueldade contra os prisioneiros levados a Versalhes.

Segundo Ponge (1996?), em 2 de abril acontece o primeiro

confronto entre o poder de Paris e o poder de Versalhes, com o revés de

Paris, que tem seus prisioneiros fuzilados. A Comuna envia tropas a

Versalhes, onde novamente sofre revés. Em decorrência, decreta que vai

executar três reféns para cada refém seu morto por Versalhes (o que não

faz a não ser nos últimos dias da Comuna). Iniciam os bombardeios à

distância. Em 19 de abril, a Comuna vota pela apresentação ao povo do

programa da Comuna e a proposta de Constituição Comunalista. Em 21

de abril houve uma reestruturação das comissões, visando fortalecer e

agilizar a ação da Comuna, e é criado o Comitê de Salvação Pública,

que não tem o acordo dos integrantes da AIT. A partir de 26 de abril, as

tropas de Paris começam a perder as posições, e Thiers vai fechando o

cerco. Em 10 de maio, Thiers assina o tratado de paz com a Alemanha.

No dia 30, 130 homens das tropas de Versalhes começam a entrar em

Paris, por uma passagem aberta por um traidor. No dia 22, a guerra toma

as ruas. No dia 25 acontece a última reunião da Comuna e no dia 28 é

123

tomada a última barricada. A Comuna sucumbe e termina a chamada

“Semana Sangrenta”. Seguiu-se mais uma semana de execuções, que

beiraram 25 mil (PONGE, 1996?).

Segundo Ponge,

Embora acuada pela premência das tarefas de

defesa, embora à cabeça de uma cidade sitiada,

isolada, em vias de estrangulamento, embora

tenha durado parcos 72 ou 73 dias, a Comuna

creditou-se, perante a História, com uma obra

política e social, certamente embrionária, mas,

mesmo assim ousada, radical, revolucionária. E,

cabe salientá-lo, o fez garantindo um extremo

grau de liberdade e de democracia. (PONGE,

1996?, não paginado, grifos do autor).

A Comuna foi massacrada pela burguesia. Nos 72 dias de sua

existência, conseguiu consolidar-se como uma experiência de autogestão

dos trabalhadores que embrionariamente prova a possibilidade de os

trabalhadores desenvolverem a consciência de classe na prática da luta

em defesa por seus interesses. Exemplo disso foi o avanço dos

Proudhonianos, que na Comuna aplicaram o princípio da associação que

até então criticavam na teoria marxista, e os blanquistas, que defendiam

o poder centralizado nas mãos de alguns representantes “preparados”

para tal, mas na Comuna defenderam a divisão do poder entre o

conjunto dos trabalhadores. Também provou a capacidade de luta dos

trabalhadores e de auto-organização e autogestão, onde assumiram as

tarefas que lhes foram necessárias, de acordo com o conhecimento que

as suas condições materiais e de consciência lhes permitiam, e

orientados pela certeza da direção que deviam dar às políticas. Entre

outros equívocos, como a decisão de não tomar o banco central e a não

destruição do aparelho do Estado, a Comuna equivocou-se na tática ao

deixar “escapar” Thiers e as lideranças da burguesia sanguinária. Este

erro decorre também em consequência do nível de desenvolvimento do

sentido do humano, em contradição com a crueldade da burguesia, que

faz com que optem por não submeter novamente a população ao terror

da guerra, da ira e da crueldade da burguesia, e nem devolver a esta o

mesmo ódio de classe e crueldade.

As medidas tomadas pela Comuna demonstraram o caráter

classista proletário do governo que se instalou. Segundo Marx (1999, p.

94),

124

O regime comunal teria devolvido ao organismo

social todas as forças que até então vinham sendo

absorvidas pelo Estado parasitário, que se nutre às

custas da sociedade e freia seu livre movimento.

[...] A simples existência da Comuna implicava,

como algo evidente, um regime de autonomia

local, porém já não como contrapeso a um poder

estatal, que agora era supérfluo.

Segundo o autor, a Comuna desenvolveu uma base de instituições

realmente democráticas. No entanto, sua meta não era nem a República

e nem o governo barato, mas a emancipação do trabalho. Marx explica

que

a Comuna era, essencialmente, um governo da

classe operária, fruto da luta da classe produtora

contra a classe apropriadora, a forma política

afinal descoberta para levar a cabo a emancipação

econômica do trabalho. (MARX, 1999, p. 95-96).

A Comuna devia servir de instrumento para acabar com os

fundamentos econômicos que permitem a existência das classes,

acabando com a dominação. Com a emancipação do trabalho “todo

homem se torna um trabalhador, e o trabalho produtivo deixa de ser um

atributo de classe” (MARX, 1999, p. 96). E, como o autor expõe, a

classe trabalhadora sabe que a conquista de sua emancipação e de uma

forma de vida superior não será fruto de um milagre ou de uma única

luta, mas que “terão que enfrentar longas lutas, toda uma série de

processos históricos que transformarão as circunstâncias e os homens”

(MARX, 1999, p. 98). E a Comuna não esperava por trabalhadores

ideais, mas praticou o governo dos trabalhadores com os trabalhadores

reais, nas suas condições reais. E não apenas para os trabalhadores da

França, mas pôs em prática o princípio do internacionalismo proletário,

defendendo a unidade dos trabalhadores do mundo.

3.2 O CONCEITO DE GESTÃO DEMOCRÁTICA DA ESCOLA

PÚBLICA DO RS

A opção pela defesa da gestão da escola de forma democrática

decorre da concepção teórica assumida por esta autora, na qual

compreende-se a educação “como um processo que se caracteriza por

125

uma atividade mediadora no seio da prática social global” (SAVIANI,

1996, p. 131), correspondendo portanto a uma sociedade concreta num

momento histórico específico, pela qual é determinada e sobre a qual

exerce uma ação. A educação é um ato político e, como tal, não é neutra.

Defendemos a educação vinculada a um projeto de transformação social

revolucionário que concretize a sociedade comunista, por

compreendermos que esta é a única que pode realizar a emancipação

humana. Neste sentido pensamos que a gestão democrática pode

contribuir com a tarefa de transformar a escola e a sociedade, como

também defende Hidalgo (2008, p.111) ao afirmar que

[...] as tentativas de democratização das relações

entre os diversos segmentos na organização dos

sistemas de ensino e nas instituições escolares –

desde que consideradas em suas relações

intrínsecas com os aspectos ideológicos, políticos,

culturais e científicos, mas também a partir de

uma perspectiva epistemológica – são essenciais

para a instauração das condições objetivas e

subjetivas para a superação das contradições do

modo de produção capitalista [...].

Nesta direção, defendendo, discutindo e/ou analisando a gestão

democrática, encontramos inúmeros pesquisadores40

, com diferentes

acepções, entre eles, Paro (2012, p. 34), que defende que a gestão deve

ser democrática visando à cooperação, uma vez que as relações de

dominação entre os homens fazem com que percam sua característica

humana de seres diferenciados do mundo meramente natural já que o ser

se determina humano pela característica de dominação sobre a natureza,

e o homem quando domina outro homem o submete à condição apenas

de ser natural.

Pensando na contribuição que a escola pública pode dar para a

luta pela revolução social, defendemos a gestão democrática como meio,

como uma possibilidade e não como objetivo final, que é a autogestão,

só possível em outro tipo de sociabilidade. A ação consequente na

gestão da escola exige a compreensão do que é a gestão, seus elementos

constitutivos, seu aspecto essencial, suas relações e sob que condições

este fenômeno se desenvolve. Compreendendo que a gestão da escola se

40

Alguns desses pesquisadores: Heloísa Lück, Vera V. Peroni, Vitor H. Paro,

Acácia Z. Kuenzer, Dinair L. da Hora, João B. Bastos, Angela M. Hidalgo,

Naura S. C. Ferreira, Luiz F. Dourado, Ângela M. Martins.

126

desenvolve “em condições históricas determinadas para atender a

necessidades e interesses de pessoas e grupos” como Paro (2012, p. 19)

nos explica, e que, segundo o autor, está [...] “organicamente ligada à

totalidade social, onde ela se realiza e exerce sua ação e onde, ao mesmo

tempo, encontra as fontes de seus condicionantes” (PARO, 2012, p. 19),

avançamos em nosso estudo analisando o conceito de gestão

democrática ao qual nos referenciamos ao longo do trabalho.

Paro41

, importante pesquisador da área, utiliza o termo gestão

como sinônimo de administração, assim, enquanto estivermos usando-o

como referência, utilizaremos ambos. O autor explica que “a

administração como é entendida e realizada hoje é produto de longa

evolução histórica e traz a marca das contradições sociais e dos

interesses políticos em jogo na sociedade” (PARO, 2012, p. 24). Assim,

a administração que podemos conhecer na atualidade é “historicamente

determinada pelas relações econômicas, políticas, sociais que se

verificam sob o modo de produção capitalista” (PARO, 2012, p. 24).

Uma vez que pretendemos desenvolver uma forma de administração que

sirva a outro modelo de sociabilidade, precisamos primeiramente

compreender o que é a administração em seus traços gerais, destituída

de suas características de subserviência ao capital. Dessa forma, Paro

expõe que “administração é a utilização racional de recursos para a

realização de fins determinados” (PARO, 2012, p. 25), e, por

consequência, uma atividade exclusivamente humana, uma vez que

somente os seres humanos são capazes de estabelecer objetivos, e é

atividade necessária para que utilizem racionalmente os meios de que

dispõem para realizar estes objetivos. Com este sentido, é “condição

necessária da vida humana” (PARO, 2012, p. 41) e sempre existiu,

embora em diferentes formas de expressão, acompanhando os diversos

momentos históricos. O autor destaca as duas dimensões inter-

relacionadas do termo racional: a dimensão do uso da razão, portanto

41

Utilizaremos conceitos expostos por Vitor H. Paro, a partir de 1986 (ano da

defesa de sua tese de doutorado que culminou no lançamento do livro

Administração Escolar: introdução crítica), especialmente os desenvolvidos

nas obras referenciadas por considerá-lo uma referência importante em âmbito

nacional acerca da administração escolar e gestão democrática da escola

pública, evidenciada em nossa revisão bibliográfica, onde o autor é citado em

um grande número dos trabalhos acadêmicos atuais que tratam do tema. Além

disso, comungamos do referencial teórico marxista adotado pelo autor nas

obras às quais referenciamos. Consideramos que o minucioso estudo das

especificidades da administração em geral e a da administração escolar

sistematizadas por ele são de grande relevância para nosso estudo.

127

ter a possibilidade de selecionar qual é o meio mais adequado para o fim

proposto, e a dimensão econômica, da possibilidade de atingir o objetivo

com o mínimo de tempo e de dispêndio de recursos (considerando aqui

as relações entre os homens e a natureza e as relações dos homens entre

si, coordenadas para a realização do objetivo, ou o esforço humano

coletivo). Para o autor, “a administração pode ser vista, assim, tanto na

teoria quanto na prática, como dois amplos campos que se

interpenetram: a ‘racionalização do trabalho’ e a ‘coordenação’”

(PARO, 2012, p. 32), em que, racionalização do trabalho compreende as

relações entre homem e natureza com utilização racional dos recursos

materiais e conceptuais que servem de mediação nesta relação, e a

coordenação é a utilização racional do esforço coletivo (as relações que

os homens são levados a estabelecer entre si para que o processo se

realize).

Segundo Paro (2010a, p. 765), de acordo com seu conceito

abrangente de administração, a mediação perpassa todo o processo de

busca de objetivos.

Isso significa que não apenas direção, serviços de

secretaria e demais atividades que dão subsídios e

sustentação à atividade pedagógica da escola são

de natureza administrativa, mas também a

atividade pedagógica em si – pois a busca de fins

não se restringe às atividades-meio, mas continua,

de forma ainda mais intensa, nas atividades-fim

(aquelas que envolvem diretamente o processo

ensino-aprendizado). (PARO, 2010a, p. 765).

No entanto, a gestão escolar na sociedade capitalista toma como

modelo a administração empresarial, considerando como elementos

constitutivos os que se referem aos aspectos financeiros e de

organização/fiscalização das estruturas e do pessoal. A expressão da

gestão escolar na escola capitalista assume formas vindas da condição

de domínio exercido pela classe hegemônica. Desse modo, Paro (2010a,

p. 765) expõe que

a noção de administração do senso comum,

deixando de captar o que há de administrativo no

processo pedagógico (ao limitar a administração

às normas e procedimentos relativos à

organização e funcionamento da escola), acaba

por valorizar aquele que é o responsável direto

128

pelo controle das pessoas que devem cumprir

essas normas e realizar esses procedimentos: o

diretor escolar.

Esta noção contribui para a visão fetichizada do diretor que o

coloca no centro do processo de gestão, com o poder de coordenar, de

supervisionar, de comandar conforme seu ideal de escola. Mantém a

mistificação do poder do diretor, um poder que de fato ele não tem.

Mendonça (2000) explica que a gestão está diretamente ligada ao

campo da administração, e que a gestão escolar que ocorre atualmente

foi construída historicamente. Segundo o autor, podemos identificar sob

quatro enfoques analíticos que se superpõe embora haja a

predominância de um ou outro em determinado momento. Seriam:

O enfoque jurídico, herdado da tradição europeia,

de caráter basicamente normativo e legalista,

exerceu sua influência até a década de 1930, no

Brasil, tendo a ele se somado valores e ideais do

cristianismo e do positivismo. O enfoque

organizacional, que se estendeu até a década de

1960, materializou-se, na administração pública,

particularmente na administração da educação, na

forma tecnicista. A teoria administrativa desta

fase fundamenta-se nos princípios da

administração clássica, com especial relevo para

as proposições da administração científica e

gerencial, de Taylor e Fayol, respectivamente. O

enfoque comportamental, surgido como uma

reação aos princípios e práticas da administração

clássica, tem sua base teórica nas ciências do

comportamento, particularmente na psicologia.

São dessa fase a particular importância dada aos

processos de dinâmica de grupo e treinamento de

lideranças, que muita influência exerceram na

administração escolar brasileira em função da

tradicional vinculação da psicologia à pedagogia.

O enfoque sociológico toma em consideração o

contexto social, político e econômico de onde é

exercida a atividade administrativa.

(MENDONÇA, 2000, p. 65).

Segundo Oliveira (2007) a atividade-meio da gestão escolar está

constituída pela direção e conselho escolar, com o suporte dos serviços

129

de secretaria compostos por secretários, auxiliar administrativo (nas

escolas em que há), os serviços de manutenção de infraestrutura e

limpeza, monitoria e serviço de alimentação. A atividade-fim (ensino-

aprendizagem) conta com o serviço de orientação escolar e de

supervisão escolar. A autora afirma que também podem ser

considerados órgãos auxiliares à gestão da escola o CPM (Círculo de

Pais e Mestres) e o grêmio estudantil (considerando obviamente nas

escolas em que existem).

A gestão democrática das escolas estaduais do RS se constitui por

inúmeros elementos, ou propriedades, das quais buscamos evidenciar a

essencial. Os principais elementos são os mecanismos reguladores – as

leis, os decretos e pareceres, os documentos legais da escola (Plano

Político Pedagógico – PPP; Regimento Escolar e Planos de Estudo

devendo ser considerados também os Planos de Ação da Equipe

Diretiva eleita); os órgãos (mecanismos) de gestão democrática como a

equipe diretiva (diretor, vice-diretores e coordenador pedagógico) e o

conselho escolar (constituído pelo diretor e representantes de pais,

alunos, funcionários42

e professores), e as instâncias de gestão

democrática, assembleias de segmentos, assembleias da escola, reunião

do conselho escolar, reunião da direção, recursos humanos, materiais e

financeiros, objetivos e avaliação. Paralelamente estão o Círculo de Pais

e Mestres (CPM), o Grêmio Estudantil e o Grêmio de Professores e

Funcionários como ferramentas de organização e intervenção dos

segmentos.

De acordo com a Lei de Gestão Democrática do Ensino Público

do RS (RIO GRANDE DO SUL, 2012, Art. 2º), a gestão democrática

ocorre através da autonomia na gestão administrativa, financeira e

pedagógica, abrangendo assim as três dimensões, que são tomadas como

distintas. A Lei considera assim a atividade administrativa como parte

da gestão, e regula que será exercida pela equipe diretiva atuando em

consonância com as deliberações do conselho escolar. A administração é

compreendida como a organização da execução do trabalho, obviamente

ligada à dimensão financeira e pedagógica, uma vez que irá utilizar

42

A legislação utiliza o termo servidores, no entanto optamos por manter

funcionários que é a nomenclatura consolidada nas escolas, reconhecida pelos

próprios funcionários, levando em consideração a etimologia do termo

servidor – de servir, mesma raiz que a palavra servo, que esteve durante

muitos anos ligado ao significado de escravo.

130

racionalmente43

os recursos para a realização dos fins escolares, que são

pedagógicos. As atribuições do diretor, que podem incorrer em seu

afastamento no caso de não cumprimento, são diversas, e parecem

predominantemente fazer parte da dimensão administrativa embora esta

integre as demais dimensões.

Assim a gestão da escola compreende as ações da direção, e do

conselho escolar prioritariamente. As atribuições do diretor conforme a

legislação são:

I - representar a escola, responsabilizando-se pelo

seu funcionamento;

II - coordenar, em consonância com o Conselho

Escolar, a elaboração, a execução e a avaliação do

projeto administrativo-financeiro-pedagógico,

através do Plano Integrado de Escola, observadas

as políticas públicas da Secretaria da Educação;

III - coordenar a implementação do Projeto

Pedagógico da Escola, assegurando sua unidade e

o cumprimento do currículo e do calendário

escolar;

IV - submeter ao Conselho Escolar, para

apreciação e aprovação, o Plano de Aplicação dos

recursos financeiros;

V - submeter à aprovação da Secretaria da

Educação o Plano Integrado da Escola;

VI - organizar o quadro de recursos humanos da

escola com as devidas especificações,

submetendo-o à apreciação do Conselho Escolar e

indicar à Secretaria da Educação os recursos

humanos disponíveis para fins da convocação de

que trata o art. 56, da Lei nº 6.672, de 22 de abril

de 1974, com a redação dada por esta lei,

mantendo o respectivo cadastro atualizado, assim

como os registros funcionais dos servidores

lotados na escola; registros funcionais dos

servidores lotados na escola;

VII - submeter ao Conselho Escolar para exame e

parecer, no prazo regulamentar, a prestação de

contas prevista no artigo 73;

43

Conforme Paro, sob duas dimensões: de forma racional a estarem os recursos

adequados aos fins, e racional no sentido da forma econômica tanto do esforço

coletivo (das relações como dos recursos materiais e conceptuais) de modo

que os objetivos estejam sempre norteando as ações.

131

VIII - divulgar à comunidade escolar a

movimentação financeira da escola;

IX – coordenar o processo de avaliação das ações

pedagógicas e técnico-administrativo-financeiras

desenvolvidas na escola;

X - realizar, anualmente, os procedimentos do

Sistema Estadual de Avaliação e apresentar seus

resultados, juntamente com aqueles decorrentes da

avaliação externa e interna, ao Conselho Escolar,

bem como as propostas que visem à melhoria da

qualidade do ensino e ao alcance das metas

estabelecidas;

XI - apresentar, anualmente, à Secretaria da

Educação e à comunidade escolar a avaliação do

cumprimento das metas estabelecidas no Plano

Integrado de Escola, a avaliação interna da escola

e as propostas que visem à melhoria da qualidade

do ensino e ao alcance das metas estabelecidas;

XII - manter atualizado o tombamento dos bens

públicos, zelando, em conjunto com todos os

segmentos da comunidade escolar, pela sua

conservação;

XIII - dar conhecimento à comunidade escolar das

diretrizes e normas emanadas dos órgãos do

Sistema de Ensino;

XIV - cumprir e fazer cumprir a legislação

vigente;

XV - coordenar os procedimentos referentes ao

recebimento, execução, prestação de contas e

aplicação dos recursos financeiros transferidos às

escolas por órgãos federais, estaduais, municipais

ou doações para a manutenção e o

desenvolvimento do ensino, nos temos do art. 41

desta Lei. (RIO GRANDE DO SUL, 2012, Art.

8º).

O diretor ainda deverá encaminhar à Coordenadoria Regional de

Educação (CRE), a prestação de contas quadrimestral, acompanhada de

parecer conclusivo do conselho escolar, para homologação, condição

para a liberação de novos recursos.

Os conselhos escolares são os principais mecanismos de gestão

democrática, e se constituem como

132

entes sem fins lucrativos e devidamente inscritos

no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica, [que]

constituirão as Unidades Executoras das escolas

da rede pública estadual do Rio Grande do Sul

responsáveis pelo recebimento, execução,

prestação de contas e aplicação dos recursos

financeiros transferidos às escolas por órgãos

federais, estaduais, municipais ou doações para a

manutenção e o desenvolvimento do ensino. (RIO

GRANDE DO SUL, 2012, Art. 41, Parágrafo

Único).

Estes, conforme a legislação, “terão funções consultiva,

deliberativa, executora e fiscalizadora nas questões pedagógico-

administrativo-financeiras” (RIO GRANDE DO SUL, 2012, Art. 41) e

têm como atribuições, que juntamente com as ações da direção da escola

são as ações que constituem a gestão escolar:

I - elaborar seu próprio regimento;

II - criar e garantir mecanismos de participação

efetiva e democrática da comunidade escolar na

definição do Plano Integrado da Escola;

III - adendar, sugerir modificações e aprovar o

Plano Integrado da Escola;

IV - aprovar o plano de aplicação financeira da

escola;

V - apreciar a prestação de contas do Diretor;

VI - divulgar, quadrimestralmente, informações

referentes à aplicação dos recursos financeiros,

resultados obtidos e qualidade dos serviços

prestados;

VII – coordenar, em conjunto com a direção da

escola, o processo de discussão, elaboração ou

alteração do regimento escolar;

VIII - convocar assembleias-gerais dos segmentos

da comunidade escolar;

IX – encaminhar, quando for o caso, à autoridade

competente, proposta de instauração de

sindicância para os fins de destituição de Diretor

da escola, em decisão tomada pela maioria

absoluta de seus membros e com razões

fundamentadas e registradas formalmente;

133

X - recorrer a instâncias superiores sobre questões

que não se julgar apto a decidir, e não previstas no

regimento escolar;

XI - analisar os resultados da avaliação interna e

externa da escola, propondo alternativas para

melhoria de seu desempenho;

XII - analisar e apreciar as questões de interesse

da escola a ele encaminhadas;

XIII - apoiar a criação e o fortalecimento de

entidades representativas dos segmentos da

comunidade escolar. (RIO GRANDE DO SUL,

2012, Art. 42).

É também atribuição do conselho eleger seu presidente (RIO

GRANDE DO SUL, 2012, Art. 58, § 2º). Quanto aos conselheiros,

conforme a legislação, devem “representar seu segmento discutindo,

formulando e avaliando internamente propostas para serem apresentadas

nas reuniões do Conselho” (RIO GRANDE DO SUL, 2012, Art. 43). O

conselho escolar deverá se reunir uma vez por mês ordinariamente e

extraordinariamente quando necessário, por meio da convocação do

presidente, do diretor da escola, ou da metade mais um de seus membros

(RIO GRANDE DO SUL, 2012, Art. 60). Quanto à forma, a lei

estabelece que o conselho escolar só funcionará com o quórum mínimo

de metade mais um de seus componentes (RIO GRANDE DO SUL,

2012, Art. 60) e só terão validade as deliberações aprovadas pela metade

mais um dos presentes à reunião (RIO GRANDE DO SUL, 2012, Art.

62), e que

As controvérsias existentes entre o Diretor e o

Conselho Escolar, que inviabilizem a

administração da escola, serão dirimidas, em

única e última instância, pela assembleia-geral da

comunidade escolar, a qual deverá ser convocada

por qualquer das partes para reunir-se e decidir,

no prazo máximo de quinze dias, contados do ato

que gerou impasse. (RIO GRANDE DO SUL,

2012, Art. 91).

Nos momentos em que haverá eleição da equipe diretiva, a

comissão eleitoral também toma parte no processo de gestão, e suas

atribuições, listadas a seguir, somam-se às ações que constituem a

gestão democrática:

134

I - organizar a apresentação em debate público

para a comunidade escolar dos planos de ação dos

candidatos inscritos;

II - constituir as mesas eleitorais/escrutinadoras

necessárias a cada segmento, com um Presidente e

um Secretário para cada mesa, escolhidos dentre

os integrantes da comunidade escolar;

III - providenciar todo o material necessário ao

processo de indicação;

IV - orientar previamente os mesários sobre o

processo de indicação;

V - definir e divulgar o horário de funcionamento

das urnas, com antecedência mínima de 72

(setenta e duas) horas, de forma a garantir a

participação do conjunto da comunidade escolar.

(RIO GRANDE DO SUL, 2012, Art. 33).

São também atribuições da comissão eleitoral lavrar a ata de

votação, assinando-a e encaminhando-a para arquivamento com os

demais materiais referentes à votação (RIO GRANDE DO SUL, 2012,

Art. 35), decidir e dar ciência aos candidatos sobre impugnação de

chapas (RIO GRANDE DO SUL, 2012, Art. 36) e comunicar o

resultado da votação ao presidente do conselho escolar e ao diretor (RIO

GRANDE DO SUL, 2012, Art. 37).

O mesmo ocorre com a comissão eleitoral que irá organizar a

eleição dos representantes da comunidade escolar no conselho escolar,

que será eleita em assembleias gerais dos respectivos segmentos,

convocadas pelo conselho escolar, cujas atribuições irão compor a

gestão escolar durante o período das eleições, através das seguintes

ações: convocar “assembleia-geral da comunidade escolar para definir a

forma de eleição, conforme artigo 47 desta lei [se por chapas ou

individual], e definir o regimento eleitoral” (RIO GRANDE DO SUL,

2012, Art. 51, § 2º); convocar a comunidade escolar para proceder-se à

eleição, através de edital que deve ser afixado em local visível da escola,

indicando:

a) pré-requisitos e prazos para inscrição,

homologação e divulgação das nominatas ou

chapas;

b) dia, hora e local de votação;

c) credenciamento de fiscais de votação e

apuração;

135

d) outras instruções necessárias ao

desenvolvimento do processo eleitoral. (RIO

GRANDE DO SUL, 2012, Art. 54).

Constam também como atribuições da comissão eleitoral

encaminhar aviso do lançamento do edital da eleição aos pais e

responsáveis por alunos com antecedência mínima de 30 dias (RIO

GRANDE DO SUL, 2012, Art. 54, § 2º), lavrar a ata da eleição (RIO

GRANDE DO SUL, 2012, Art. 56) e decidir imediatamente acerca de

pedidos de impugnação (RIO GRANDE DO SUL, 2012, Art. 57).

Quanto à autonomia da gestão pedagógica, segundo a legislação,

será assegurada pela definição de proposta pedagógica específica, que

deverá constar no Plano Integrado de Escola, a ser elaborado pela escola

e pelo aperfeiçoamento do profissional de educação (RIO GRANDE DO

SUL, 2012, Art. 75 e 76), vindo estas ações a complementar o conteúdo

da gestão democrática. Sobre o aperfeiçoamento, são objetos de gestão

instituídos pela legislação:

I - programas de formação em nível de habilitação

com vistas à titulação, à valorização profissional e

ao suprimento das necessidades;

II - programa de formação permanente para

servidores;

III - programas de formação continuada em

serviço, com objetivo de proporcionar a reflexão e

a reorientação qualificada das práticas

pedagógicas considerando as diferentes realidades

e especificidades, no sentido de uma educação de

qualidade social. (RIO GRANDE DO SUL, 2012,

Art. 77).

Além destes elementos, fazem parte a avaliação do Plano

Integrado, compreendendo a avaliação interna e a avaliação externa.

Expostos os elementos que de acordo com a legislação,

constituem o conteúdo de nosso fenômeno, passamos a analisar sua

forma, que é determinada pelo modo como estes elementos constitutivos

do conteúdo se relacionam na prática da gestão escolar.

O movimento da relação entre os elementos da gestão escolar está

determinado pelas mediações das condições materiais e de consciência

dos indivíduos que estão envolvidos e que atuam sobre a gestão. A

forma em que os homens produzem sua existência, como trabalhadores

explorados, alienados determina sua condição de compreensão, de

136

consciência e prática – da práxis. Esta determinação se dá por

mediações, e de uma forma dialética, onde os aspectos influenciam e são

influenciados ao mesmo tempo, e não de uma forma automática e

determinista. Sánchez Vázquez (2011, p. 267) explica que

Se a práxis é a ação do homem sobre a matéria e

criação – através dela – de uma nova realidade,

podemos falar em diferentes níveis da práxis, de

acordo com o grau de penetração da consciência

do sujeito ativo no processo prático e com o grau

de criação ou humanização da matéria

transformada destacado no produto de sua

atividade prática.

Com relação a esses dois critérios niveladores,

distinguimos, por um lado, a práxis criadora e a

reiterativa ou imitativa, e, por outro, a práxis

reflexiva e a espontânea.

De acordo com o autor, essas distinções não eliminam os

vínculos mútuos entre uma práxis e outra, nem entre um nível e outro;

uma práxis pode apresentar traços de outra. A práxis criadora é a que

permite ao homem enfrentar situações novas e criar soluções novas para

novos problemas, enquanto que a práxis reiterativa é a repetição, a

imitação de uma práxis já estabelecida. O autor explica também que de

acordo com o grau de consciência que se tem da prática que se está

realizando, a práxis pode ser reflexiva – quando a consciência é elevada

–, ou espontânea – quando a consciência é baixa ou quase nula. Paro

(2012), retomando a ideia de Sánchez Vázquez, explica que na escola

existe uma administração criadora, de caráter único e inédito e uma

administração reiterativa, que é a repetição/imitação de caminhos e

procedimentos para se atingir os objetivos já antes inventados. No

desenvolvimento da práxis da administração reiterativa há que ter o

cuidado de evitar que esta se estabeleça “como fim em si mesma, sob

pena de degenerar-se numa práxis burocratizada, que impede o

desenvolvimento da própria administração criadora” (PARO, 2012, p.

38). Segundo o autor,

[...] tanto pode existir uma prática administrativa

espontânea, na qual a utilização dos recursos,

embora realizada de maneira racional, seja feita

mais de modo a atender às necessidades imediatas

que vão surgindo no processo prático, sem que se

137

tenha uma visão clara e consciente de como isto

se dá, quanto uma administração reflexiva, na

qual, além da consciência prática, representada

pela utilização racional dos recursos, o sujeito

(individual ou coletivo) se ache consciente da

racionalidade do processo e da participação nele

de sua consciência. (PARO, 2012, p. 39 – grifos

do autor).

O autor compreende que já estão postas as condições para que

seja possível realizar uma administração reflexiva, estas condições dão

conta do aspecto objetivo e subjetivo. O primeiro incorpora a própria

necessidade de o processo ser reflexivo, somado à disponibilidade de

esforço humano coletivo e recursos materiais e conceptuais que

possibilitam a satisfação dessa necessidade, ou, engloba “todas as

condições objetivas (culturais, econômicas, sociais, políticas, etc.) que

precisam ser levadas em conta na concepção e realização da atividade”

(PARO, 2012, p. 41). O segundo, o aspecto subjetivo, diz respeito ao ato

intencional da práxis administrativa, que acontece quando há a

necessidade da atividade administrativa reflexiva utilizando as

condições (possibilidades e limitações) que a realidade prática oferece.

Paro ainda nos explica que a administração sempre apresenta uma

dimensão progressista, haja vista que

[...] agindo administrativamente [...], é que o

homem foi conseguindo superar seu primitivo

estado de necessidade natural, produzir sua

existência material de forma cada vez mais eficaz,

bem como produzir a si próprio como realidade

diferenciada da natureza. (PARO, 2012, p. 41).

Administração, então, é compreendida como a organização,

construção e decisão consciente, pensada, do processo de trabalho. A

atividade administrativa apresenta traços gerais, em seus elementos mais

simples e abstratos, que tem validade para todas as formas de

organizações sociais, ao mesmo tempo em que apresenta elementos

diferenciados determinados pelo momento histórico. Paro explica que “a

atividade administrativa participa também das contradições e forças

(sociais, econômicas, políticas, culturais, etc.) em conflito em cada

período histórico e em cada formação social determinada” (PARO,

2012, p. 41). E explica que ao mesmo tempo em que é determinada por

estas forças, sua realização concreta também as determina, numa relação

138

dialética de mútua determinação com as contradições vigentes. A

administração não é um processo que acontece à parte da sociedade, dos

processos de trabalho, das organizações sociais e das contradições que

as constituem, mas está intrinsecamente ligada ao desenvolvimento

destas estruturas. Para o autor, isto reafirma o caráter progressista da

atividade administrativa uma vez que “são estas contradições que

acabam determinando a superação do modo de produção até então

dominante e sua passagem para outro historicamente mais avançado”.

(PARO, 2012, p. 41).

Marx (2008) nos explica que a um determinado grau de

desenvolvimento das forças produtivas materiais correspondem relações

de produção determinadas, necessárias e independentes da vontade dos

homens, e correspondem determinadas formas de consciência social, e

que estas relações determinam a maneira como os homens se organizam

em sociedade. Estas relações não são eternas, são passíveis de mudanças

provocadas pela luta de suas contradições internas e externas. As

determinações da transformação social pela estrutura econômica não

ocorrem de forma mecânica e autônoma, nem mesmo fatalmente as

transformações vão ocorrer, mas estão sujeitas à ação revolucionária

intencional. Paro explica que

Tendo em vista que a atividade administrativa

participa das contradições no nível das relações de

produção e das forças produtivas, e uma vez que

estas, evoluindo, reclamam sucessivamente novos

modos de produção, essa evolução e essa

passagem trazem em seu bojo novas maneiras de

administrar, que são negadas e superadas num

momento subsequente. (PARO, 2012, p. 42).

Segundo o autor, não se pode pretender que a administração se

constitua, por si, numa força revolucionária autônoma, pois

[...] seu caráter contraditório, e em certo sentido

progressista, [...] que a coloca como

coparticipante da evolução histórica das forças

produtivas e das relações de produção, se dá de

maneira espontânea, necessária, ou [...]

independente da vontade dos homens. Por isso, é

compatível tanto com um projeto revolucionário,

de superação da estrutura social vigente, quanto

com as forças conservadoras interessadas em

139

manter tal estrutura. Na sociedade de classes, em

que o poder está confinado nas mãos de uma

minoria, a administração tem servido

historicamente como instrumento nas mãos da

classe dominante para manter o status quo e

perpetuar ou prolongar ao máximo seu domínio.

(PARO, 2012, p. 43).

Isto, no entanto, não pode ser tomado como definitivo. É possível

revestir a atividade administrativa com um caráter transformador em

prol dos interesses dos trabalhadores, segundo o autor “[...] desde que

suas potencialidades sejam aproveitadas na articulação com estes

interesses” (PARO, 2012, p. 43). Para que isto se torne possível “é

necessário que a atividade administrativa seja elevada de seu caráter

espontaneamente progressista para uma práxis reflexivamente

revolucionária” (PARO, 2012, p. 43-44). Para que pensemos um projeto

de atividade administrativa transformador precisamos conhecer as

condições concretas em que se realiza a administração na sociedade

capitalista e suas especificidades nesta sociedade.

A sociedade capitalista compõe-se de um modo de produzir a

vida em que o centro é a produção da mais-valia, através da produção de

excedente, ou, mercadorias que vão garantir a valorização do capital. A

propriedade privada dos meios de produção, como central nas relações

de produção, estabelece um sistema de dominação, em que o trabalhador

é obrigado a vender sua força de trabalho e submetê-la à exploração

capitalista. Neste sistema, a administração é perpassada pelas

determinações resultantes dessa relação de domínio e, segundo Paro,

[...] permeando a estrutura e a superestrutura,

tanto a ‘racionalização do trabalho’ quanto a

coordenação do esforço coletivo adquirem [...]

características específicas do modo de produção

capitalista. Tais características dizem respeito, no

que concerne à ‘racionalização do trabalho’, ao

problema da divisão pormenorizada do trabalho e

da forma que ela assume visando à geração de

maiores lucros ao capitalista; no que diz respeito à

coordenação do esforço humano coletivo, têm a

ver com o problema da gerência ou do controle do

trabalhador. (PARO, 2012, p. 60).

140

Para além da forma que toma a administração na sociedade

capitalista, o grande problema que se coloca é exatamente confrontando

sua forma atual ao conceito que tomamos de administração de utilização

racional dos recursos para a realização de determinados fins. Os fins a

que a administração vai buscar realizar de forma racional são os fins

determinados pelo próprio modo de produção, de valorização e

expansão do capital, de gerar mais-valia para garantir o lucro do

capitalista, são os objetivos e aspirações da classe dominante, da classe

que detém o poder econômico, da classe capitalista. Qualquer fim que

não esteja em consonância a este objetivo da sociedade de classes, está

submetido a não realização. A classe trabalhadora, que inclui a maioria

da população, está alijada do processo decisório de definição de

objetivos para as organizações. Assim, “ao tomar determinado fim como

eterno, universal e inquestionável”, transparece o caráter particularista

da administração, “que se coloca a serviço de uma classe em particular e

não do homem em geral” (PARO, 2012, p. 74-75). Para o autor, é

preciso “transcender o âmbito da mera racionalidade funcional,

colocando-se como questão fundamental a busca de objetivos que

atendam aos interesses de toda a sociedade e não de grupos

privilegiados dentro dela” (PARO, 2012, p. 76), o que se sabe que não é

possível dentro de uma sociedade de classes, em que uma exerce

domínio sobre a outra estabelecendo como objetivos para toda a

sociedade a satisfação de seus interesses.

Uma racionalidade no sentido social, em que os

meios sejam adequadamente utilizados visando ao

bem de todos, supõe a ausência da dominação de

grupos e o exercício coletivo do poder por todo o

corpo social. (PARO, 2012, p. 76).

Na escola atual, segundo Alves (2012) a divisão do trabalho

destituiu os trabalhadores em educação do conhecimento que o torna

capaz de pensar um projeto de educação para a sociedade, da capacidade

de elaborar objetivos, inviabilizando a resistência destes aos projetos

estabelecidos nas instâncias de governo. Os trabalhadores, destituídos da

capacidade e da possibilidade de decidirem, passam apenas a executar a

proposta educacional do capital, que já vem gestada, permitindo aos

governos utilizarem-se das políticas públicas de compartilhamento da

gestão da escola com os professores como justificação para o fracasso

do projeto de escola gestado por seus órgãos, tentando se isentar da

culpa.

141

No âmbito da forma, o processo de trabalho pertence ao

capitalista, que comprou os meios de produção e a força de trabalho. Por

isso, a racionalização do trabalho e a coordenação do esforço coletivo

(as duas dimensões da administração) estão sob seu comando. Surge

então a gerência, como a forma específica da administração capitalista,

tendo como conteúdo básico o controle do trabalho e do trabalhador,

buscando “a superação do desinteresse do trabalhador e a neutralização

de sua resistência às condições de trabalho impostas pelo capital”

(PARO, 2012, p. 79). A partir de então, criam-se algumas subfunções

para a administração capitalista, como a de dirigir as atividades do

pessoal para que realizem objetivos, estabelecer os objetivos próprios da

organização a ser dirigida, fazer o pessoal produzir os resultados da

melhor forma possível, garantir que as pessoas trabalhem em conjunto

com eficácia, entre outros, tolhendo assim as principais dimensões da

administração.

Assinalamos a administração científica criada por Taylor44

no

início do século XX, que teve grande influência nas relações de trabalho

nas fábricas, indústrias e empresas. Esta defende a divisão dos

trabalhadores entre trabalho manual e trabalho intelectual visando

melhor aproveitamento (entenda-se racionalização e barateamento) da

força de trabalho para uma maior produtividade (entenda-se

intensificação do trabalho, pela eliminação de movimentos considerados

desnecessários e pela cronometragem do tempo necessário a cada

atividade parcelar do processo de trabalho). A partir da teoria da

administração científica, cabe à direção reunir os conhecimentos que

antes pertenciam aos trabalhadores, e a partir destes conhecimentos,

definir os objetivos, o método e o ritmo a serem empregados no

processo de trabalho do qual o trabalhador passa a ser apenas o

executor, através de atividades parcelares e repetitivas. Paro ao referir-se

a esta concepção de administração explica que

O pensamento de Taylor, ao contrário do que

comumente se afirma, não ficou restrito aos

limites de sua “administração científica”. Embora

com matizes variados, que servem para encobrir

suas reais dimensões e visam a atender às

necessidades de justificação ideológica do

momento, a gerência como controle do trabalho

44

Para um conhecimento mais aprofundado indicamos a leitura de TAYLOR,

Frederick W. Princípios de Administração Científica. 7. ed. São Paulo:

Editora Atlas S.A., 1970.

142

alheio, por meio da apropriação do saber e do

cerceamento da vontade do trabalhador, encontra-

se permanentemente presente na teoria e na

prática da administração em nossa sociedade,

perpassando as diferentes “escolas” e “correntes”

da administração, neste século [século XX].

É razoável que isto aconteça, visto que tal

concepção reflete o próprio processo capitalista de

produção, em sua realidade e tendências,

inspirando-se nele e ao mesmo tempo reforçando-

o e buscando sua legitimação. (PARO, 2012, p.

86).

Segundo o autor, neste tipo de administração é exercido o

controle do capital sobre o trabalhador, para que tudo seja feito de modo

a melhorar o processo de exploração capitalista e ampliar o domínio do

capital sobre o trabalho. Busca-se melhor eficiência e produtividade,

mas dentro dos moldes de produção capitalista, visando a uma maior

extração de mais-valia e maior valorização do capital. Um dos grandes

problemas enfrentados com este tipo de administração é o fato de que as

direções encarregadas do trabalho intelectual acabam se fechando e se

afastando dos trabalhadores. Estes, deixando de participar

conscientemente das decisões e assumindo tarefas parciais, destituídas

de conteúdo, que pouco exigem de sua inteligência, acabam

desenvolvendo uma práxis burocratizada, reiterativa, conservadora, em

detrimento da práxis criadora, que “é a que dá ao homem sua verdadeira

dimensão humana” (PARO, 2012, p. 90). A preponderância da práxis

reiterativa “propicia a cristalização de princípios e procedimentos que

acabam por dificultar a busca de soluções novas para os problemas que

vão surgindo” (PARO, 2012, p. 92), o que compromete o próprio

desenvolvimento da atividade administrativa e o alcance de maior

eficiência e produtividade.

Houve um momento em que a direção da escola ficou

responsável por tomar decisões no âmbito da escola, no entanto, com o

aumento do controle e o aprofundamento da divisão do trabalho todo o

planejamento passa a se dar de forma centralizada, nas instâncias de

governo, e apenas pequenas decisões de forma são permitidas à escola.

Para além dos aspectos técnicos da administração científica, este

tipo de administração também cumpre uma função ideológica, como

“falseamento da realidade concreta – já que contribui para encobrir as

verdadeiras razões políticas e econômicas da burocratização e da

administração capitalista de modo geral” (PARO, 2012, p. 91) e procura

143

justificar as contradições entre capital e trabalho apelando apenas para

argumentos técnicos. De acordo com Kuenzer (1984, p.43),

A Teoria da Administração surge como um

conjunto de representações oriundas da

necessidade de justificar o novo modo de

produção que tira do trabalhador o seu próprio

trabalho, e portanto desumaniza-o, em nome da

máxima produtividade apresentada como objetivo

da organização e do homem. [...] As ideias passam

a explicar as relações sociais na organização em

lugar de permitir que se perceba que tais relações

só se explicam pela natureza do processo

produtivo que a gerou.

O taylorismo considera a origem da administração científica

como a necessidade de eficácia para atingir os objetivos universais,

como se fosse possível o objetivo de aumentar a produção através da

redução de gastos, inclusive em força de trabalho, significando

intensificação e aumento da exploração, servir de objetivo ao

trabalhador. A Teoria da administração mascara a realidade, e essa

ocultação de sua origem já denota sua natureza ideológica, uma vez

“que apresenta um conjunto coerente e sistemático de imagens ou

representações que são tomadas como capazes de explicar a realidade

concreta” (KUENZER, 1984, p. 43). Desse modo, segundo a autora, “o

imaginário, as imagens sobre o real são tomadas como o próprio real”.

A teoria da administração da forma capitalista é tomada como se fosse

universal e se aplicasse a todas as formas de administração em qualquer

momento histórico ou espaço. Segundo a autora, “ao mostrar o

particular como universal, a ideologia realiza a lógica do poder, de

modo a esconder as divisões, as diferenças, os conflitos [...]”

(KUENZER, 1984, p. 44).

A administração capitalista faz uso de mecanismos persuasivos

para dissimular as verdadeiras condições nas quais ocorrem os processos

de trabalho, fazendo o convencimento de que os objetivos estabelecidos

são os melhores para todos. Neste sentido, para mascarar as verdadeiras

relações, investe-se no tratamento de questões como “relações

interpessoais, motivação, interesse e satisfação pessoal dos

trabalhadores, conflito de interesses entre gerência e subordinados, etc.”

(PARO, 2012, p. 93), utilizando as contribuições da Psicologia, da

Sociologia e outras, criando a ideia de que tudo está bem, sem conflitos

e todos estão felizes.

144

O processo de domínio da gestão capitalista não é totalmente

pacífico. Existe a resistência dos trabalhadores, normalmente quando o

capital avança na degeneração das condições de trabalho, o que acarreta

uma ofensiva mais forte de persuasão pela administração para conter o

descontentamento e buscar a pacificação. Segundo Paro,

Ao procurar minimizar esse movimento de repulsa

do trabalhador às condições do trabalho

capitalista, ao mesmo tempo que promove a

organização, sistematização e rotinização das

atividades no interior da empresa, a administração

capitalista tem como fim o incremento da

produtividade do trabalho, com vistas à expansão

do capital. (PARO, 2012, p. 94).

A administração é desenvolvida então com a função de mediação

entre o capital e o processo de produção de mais-valia, se torna

mediadora da exploração do trabalho pelo capital, destituindo-se assim

da dimensão humana e criadora, uma vez que não visa à promoção e

crescimento dos seres humanos em geral, mas busca favorecer apenas a

classe dominante cujos interesses são contrários ao restante da

sociedade.

A administração, então, que, como utilização dos

recursos disponíveis ao homem, possui

potencialidades infinitas de promoção do bem-

estar e felicidade desse homem, apresenta-se,

numa sociedade dividida em classes antagônicas,

em que os meios administrativos se colocam nas

mãos da classe que detém o poder econômico e

político, como impedimento e negação dessa

promoção humana, colocando-se

contraditoriamente a promover o seu inverso, ou

seja, o desconforto e a infelicidade da grande

maioria da população. (PARO, 2012, p. 95).

Pautada nesta concepção, a administração passa a ser

desenvolvida não mais pelo capitalista, individualmente, mas se

constitui num novo setor na empresa. Trabalhadores especiais, com

cargos distintos de gerentes, subgerentes, supervisores, formam uma

organização que se sobrepõe ao restante da empresa e que funciona

como se fora um processo de trabalho análogo ao processo de produção,

145

embora produza apenas a organização, operação e coordenação da

empresa. É comum a administração tornar-se atividade de um corpo

gerencial que não conta com proprietários e acionistas do capital, mas

que esteja a serviço destes. À medida que a administração vai se

ampliando e tornando mais complexa, as empresas se ampliando, os

administradores vão conquistando certo grau de autonomia (sempre

relativa) em relação aos proprietários do capital, e com isto passam a

defender, dentro da administração, objetivos e interesses próprios, no

entanto, de modo a atender os objetivos do capital, não rompendo com a

essência da administração burguesa. Esta possibilidade de alcançar

regalias e privilégios aos administradores, desde que não comprometa os

objetivos de expansão do capital, existe exatamente como forma de

garantir que mantenham o controle sobre a empresa levando-a a altos

graus de produtividade e eficiência, realizando os objetivos do capital.

Segundo Paro (2012), a administração, sob a forma assumida na

sociedade do capital, se torna uma poderosíssima arma a serviço da

dominação de uma minoria da população sobre o restante, e dada a

complexidade e as dimensões dos aparelhos administrativos, o faz com

cada vez maior eficiência, poder este que conforme se pode observar na

realidade concreta, não pode ser separado da propriedade privada dos

meios de produção, de onde ele se origina. O poder está intrinsecamente

ligado à propriedade, e a administração é sua expressão. Não podemos

transformar profundamente a administração sem transformar seus

condicionantes históricos.

A administração desenvolveu ao longo da história conhecimentos

e qualidades técnicas que na atualidade se encontram a serviço do

capital, mas que, nas mãos da classe trabalhadora, se unidos a um

projeto de emancipação humana podem contribuir com a realização

deste objetivo. Segundo Paro (2012), aliados aos métodos e técnicas

desenvolvidos especificamente para realizar o objetivo de emancipação

da classe trabalhadora, devemos usar os métodos e técnicas de

administração que já existem e que representem uma contribuição

técnica útil para nosso fim, somando todas as forças neste sentido. O

autor defende que “A administração estará tanto mais comprometida

com a transformação social quanto mais os objetivos com ela

perseguidos estiverem articulados com essa transformação” (PARO,

2012, p. 106). Assim, para compreender as possibilidades da

administração escolar em relação à transformação social é necessário

avaliar as possibilidades da educação escolar como elemento de

transformação social (PARO, 2012).

146

Complexos desafios de natureza ideológica impõem-se para a

realização desta tarefa de reconstruir a gestão pautada em moldes

democráticos, buscando romper com a lógica do capital. Martins e

Neves (2010, p. 24) nos explicam que nas últimas décadas as relações

sociais capitalistas se intensificaram como expressão “da fase mais

intensa da dinâmica capitalista radicalizada pela financeirização da

economia”. A ofensiva do capital, para garantir a hegemonia, intensifica

a dominação político-ideológica e faz uso das bandeiras históricas da

luta da classe trabalhadora como ferramentas para criar o consenso,

ressignificando termos e políticas, despindo-os do caráter revolucionário

e impingindo-lhes os valores capitalistas, que vão se materializar em

práticas pautadas nos princípios neoliberais. Os autores nos ajudam

compreender parte desse processo ao explicarem que

A nova pedagogia da hegemonia materializou-se

com ações efetivas na aparelhagem estatal e na

sociedade civil nos anos finais do século XX e nos

anos iniciais do século XXI, configurando uma

nova dimensão educativa do Estado capitalista.

Sua principal característica é assegurar que o

exercício da dominação de classe seja viabilizado

por meio de processos educativos positivos. Sua

efetividade justifica-se em parte pela força de sua

fundamentação teórica, que legitima iniciativas

políticas de organizações e pessoas baseadas na

compreensão de que o aparelho de Estado não

pode estar presente em todo tempo e espaço e que

é necessário que a sociedade civil e que cada

cidadão se tornem responsáveis pela mudança da

política e pela definição de formas alternativas de

ação social. Trata-se de um intenso processo de

mudança de concepções e práticas ordenadas pela

“repolitização da política”, envolvendo todo o

tecido social. Por “repolitização da política”

entende-se a redefinição da participação política

no contexto democrático das décadas finais do

século XX e iniciais do século XXI, voltadas ao

fortalecimento da coesão social nos moldes do

projeto neoliberal da Terceira Via. (MARTINS;

NEVES, 2010, p. 24).

O poder da ideologia inculcada na consciência dos trabalhadores

faz com que estes assumam como seu o projeto de educação do capital e

147

apliquem suas estratégias de expansão contribuindo para a formação e

manutenção da hegemonia. É importante compreendermos o

funcionamento da superestrutura política, jurídica e ideológica para

conhecermos como os homens formam sua consciência e tomam

consciência das relações sociais e de produção. Gramsci (1989, p. 11),

explica que

[...] pode-se fixar dois grandes “planos”

superestruturais: o que pode ser chamado de

“sociedade civil” (isto é, o conjunto de

organismos chamados comumente de “privados”)

e o da “sociedade política ou Estado”, que

correspondem à função de “hegemonia” que o

grupo dominante exerce em toda a sociedade e

àquela de “domínio direto” ou de comando, que se

expressa no Estado e no governo “jurídico”.

Paro explica que a sociedade política “congrega o conjunto de

atividades que dizem respeito à função de coerção ou domínio direto”

enquanto que da sociedade civil a “função primordial é a de persuasão”

(PARO, 2012, p. 108 – grifos do autor). O Estado usa da coerção pelos

aparatos das forças armadas, tribunais, legislação, polícia, etc.,

principalmente nos momentos em que o consenso, buscado pelo uso dos

aparelhos de persuasão como meios de comunicação de massa, escola,

igreja, associações científicas e culturais, associações profissionais e

sindicatos, partidos políticos, etc., falha. Através destes instrumentos se

tem a hegemonia, que se estabelece quando a classe dominante

consegue estabelecer alianças com a maioria da população na defesa de

seus interesses próprios, que os toma como se fossem interesses comuns

a toda população. A concretização da hegemonia requer a difusão da

ideologia da classe dominante, onde todas as manifestações de vida

individuais e coletivas são impregnadas pela concepção de mundo dessa

classe.

A escola capitalista tem duplo caráter: de instrumento de

persuasão a serviço do capital e de transformação social, este segundo,

por permitir à classe trabalhadora que se aproprie do conhecimento

historicamente acumulado, que serve à classe revolucionária como

“elemento de sua afirmação e emancipação cultural na luta pela

desarticulação do poder capitalista e pela organização de uma nova

ordem social” (PARO, 2012, p. 135) e por apresentar a possibilidade de

ter seu caráter ideológico transformado por uma tomada da classe

148

trabalhadora num movimento revolucionário. Nessa escola, a divisão

social do trabalho é praticada nos mesmos moldes que na sociedade que

a contém, embora não seja aplicada radicalmente. Para o autor, “com

relação à estrutura econômica, o papel da escola é o de dotar as pessoas

de determinados requisitos intelectuais indispensáveis ao exercício de

uma função no campo da produção” (PARO, 2012, p. 138) e em termos

superestruturais, “funciona como mecanismo de disseminação da

ideologia da classe dominante” (PARO, 2012, p. 139). Este percurso, no

entanto, se apresenta de forma contraditória, pois ao preencher a

atividade educacional com conteúdos intelectuais, os quais seriam

utilizados de veículos de ideologização, a classe burguesa, dominante,

possibilita à classe trabalhadora a apreensão de ferramentas que lhe

permite apreender a realidade contraditória da sociedade em que está

inserida, formular objetivos de acordo com os interesses da classe e

desenvolver instrumentos de luta para realizá-los. Saviani nos aponta

uma das dimensões da importância do conhecimento para a classe

trabalhadora ao expor que

[...] o acesso das camadas trabalhadoras à escola

implica a pressão no sentido de que a igualdade

formal (“todos são iguais perante a lei”), própria

da sociedade contratual instaurada com a

revolução burguesa, se transforme em igualdade

real. Nesse sentido, a importância da transmissão

de conhecimentos, de conteúdos culturais, marca

distintiva da pedagogia da essência, não perde seu

caráter revolucionário. A pressão em relação à

igualdade real implica a igualdade de acesso ao

saber, portanto, a distribuição igualitária dos

conhecimentos disponíveis. (SAVIANI, 2008, p.

51, grifos do autor).

Dado o caráter revolucionário do conhecimento, a escola

dominada pelos valores capitalistas passa então a selecionar e dosar o

conhecimento a ser proporcionado, tentando equilibrar os polos

contrários, daí a negação do conhecimento às classes subalternas. A

escola então é diferenciada levando em consideração a quem vai

atender: uma escola com conteúdos intelectuais e científicos o mais

desenvolvidos disponível para as classes dominantes que podem arcar

com suas despesas, e uma escola pública e gratuita esvaziada de

conteúdo para a classe trabalhadora. Revela-se mais uma função da

escola, a de garantir e perpetuar as desigualdades. Saviani (2008)

149

converge com esta tese ao expor sobre a Escola Nova “que tornou

possível, ao mesmo tempo, o aprimoramento do ensino destinado às

elites e o rebaixamento do nível de ensino destinado às camadas

populares” e conclui que “É neste sentido que a hegemonia pode ser

recomposta” (SAVIANI, 2008, p. 43). Saviani destaca a importância do

conteúdo como “instrumento indispensável para a participação política

das massas” (SAVIANI, 2008, p. 45), destaca seu caráter

revolucionário, e defende que para romper com a dominação, é preciso

“dominar o que os dominantes dominam” (SAVIANI, 2008, p. 45).

A escola preenche ainda, segundo o autor, o papel de “álibi no

processo de justificação ideológica das desigualdades sociais geradas no

nível da estrutura econômica e impossíveis de serem solucionadas pelo

capitalismo” (PARO, 2012, p. 143). Difunde-se a ideia de que o

indivíduo não atinge condições de vida melhores por não ter aproveitado

a oportunidade que a escola lhe deu de ascender de classe, como se a

escola tivesse realmente este poder de acabar com a desigualdade gerada

pelo modo de produção capitalista. Segundo Saviani (2008), a

pedagogia da Escola Nova, predominante nas escolas, como a pedagogia

das diferenças, contribuiu no sentido de justificar as desigualdades e

usou o discurso da democracia e sua prática para legitimar os

privilégios.

Uma vez que é a escola que deve formar preparando para o

trabalho ela precisou se adaptar historicamente à estruturação do

trabalho determinado pela forma capitalista de produção, em cada

momento de seu desenvolvimento. Segundo Fiod (2005a, p. 240),

[...] cabe à escola [...] desenvolver uma espécie de

cultura geral, de princípios éticos, de ritmo, de

disciplina, algum tipo de treinamento profissional,

enfim, habilidades e conhecimentos intelectuais,

condição imposta pelo trabalho comum (social)

que exige dos que trabalham flexibilidade,

versatilidade e disponibilidade para desempenhar

diferentes funções no mesmo processo de

trabalho, ou em diferentes fábricas, escritórios e

serviços.

Com o esgotamento do modelo taylorista/fordista de produção,

em que o trabalhador exercia uma única atividade, o modelo baseado na

chamada acumulação flexível, o mercado necessita um novo tipo de

trabalhador, capaz de se adaptar a novas funções, porém também

parciais.

150

Além disso, a escola, que nasceu com o intuito de formar o

homem para o trabalho, atualmente vive um dilema segundo a autora,

pois prepara “cidadãos para o trabalho em uma sociedade onde o

desemprego aumenta sem cessar” (FIOD, 2005a, p. 237). Essa

contradição, ainda segundo a autora, soma-se à outra: “as máquinas cada

vez mais velozes e modernizadas dispensam trabalhadores manuais e

intelectuais em toda a parte, sem que eles possam ser outra coisa”

(FIOD, 2005a, p. 242). Para Fiod (2005a), saber o que fazer com as

pessoas que estão sendo expulsas do mundo do trabalho se configura em

uma das questões mais complexas a que a humanidade precisa

responder. Nessa conjuntura, a escola perde a importância a ela atribuída

de “passaporte” ao emprego, a uma vida melhor e ascensão de classe.

A escola é um campo de contradições e em disputa, e, segundo

Paro (2012), porquanto o Estado estabeleça as normas para o ensino,

determinando os currículos e programas, a organização administrativa

da escola e do ensino em geral, precisa garantir-lhe um certo grau de

autonomia, enquanto aparelho privado de hegemonia, o que se constitui

em possibilidade para a classe trabalhadora (mesmo que em real

desvantagem em relação ao Estado) de aproveitar as contradições e fazer

da escola mais um espaço de expressão dos seus interesses.

Segundo o autor (PARO, 2012), a dimensão revolucionária do

trabalho pedagógico se realiza quando o educador toma consciência

histórica de que o conhecimento acumulado se deve ao dominador que o

elaborou e sistematizou ao longo do tempo, mas muito mais ao

dominado, que produziu as condições materiais para que fosse possível

o tempo livre ao dominador para a elaboração do conhecimento, e,

aliado a isto, quando toma consciência da importância que tem o acesso

ao conhecimento pelas classes trabalhadoras e passa a trabalhar na

perspectiva de que possam se apropriar dele como ferramentas a serviço

de sua emancipação. O saber elaborado e a consciência crítica se

desenvolvem ao mesmo tempo, a apropriação do saber constitui uma

contribuição para o desenvolvimento da consciência crítica, e não é

possível ser crítico sem conhecimento da realidade. Então, é

fundamental buscar nos conhecimentos disponibilizados pela escola

capitalista, os que são conhecimentos objetivos sobre a realidade,

buscando despi-los da mistificação e fetiche próprios do sistema

capitalista. O autor (2012) defende que

A concepção de mundo que tem por premissa a

necessidade de superação da atual ordem

econômica e social, em direção a uma organização

151

social que, garantindo ao homem o domínio mais

adequado possível das forças naturais, as coloque

em benefício da liberdade e desenvolvimento

coletivos, só pode ter na apropriação crítica desse

real um dos mais importantes instrumentos na

busca de seus objetivos. (PARO, 2012, p. 155).

Uma vez que os trabalhadores não participam da elaboração dos

objetivos da educação e a deixam a cargo do Estado, a escola vai tendo

seus conteúdos gradualmente rebaixados, procurando não

instrumentalizar a classe trabalhadora para a resistência e reação frente à

exploração capitalista.

Pensando as escolas estaduais do RS neste contexto, a tendência

predominante tem sido a de aplicar à escola a administração geral, como

explicado por Paro (2012), na qual os condicionantes específicos da

administração de uma organização são elevados à categoria da

universalidade e considerados aplicáveis a todos os fenômenos. A

tendência mais comum é a de empregar na escola os princípios e

métodos da administração empresarial, completamente comprometida

com os objetivos capitalistas e encarada como uma questão meramente

técnica, desvinculada de seus determinantes econômicos e sociais,

desconsiderando a dimensão educativa da escola. Paro (2012, p. 165)

nos explica que nesse contexto se atribui a todo e qualquer problema

“uma dimensão estritamente administrativa, desvinculando-o do todo

social onde têm lugar suas causas profundas”. Em decorrência desta

atomização o surgimento do problema acaba sendo atribuído a causas

ilusórias, aparentes, como o uso inadequado dos recursos, a

incompetência das pessoas e decisões equivocadas, causas estas que

poderiam ser resolvidas a partir de uma ação administrativa mais

apropriada. Desse modo os sistemas de educação acabam orientando sua

ação para a dimensão aparente do problema e não para suas reais causas

o que torna a ação ineficiente.

Alguns elementos fundamentais diferenciam a gestão das escolas

da gestão das empresas capitalistas, apresentando uma constituição e

uma dinâmica própria. Podemos apontar como primeira especificidade o

que Paro (2012, p. 165) nos indica: o fato de que enquanto as “empresas

em geral visam à produção de um bem material tangível ou de um

serviço determinado, imediatamente identificáveis e facilmente

avaliáveis”, os fins da escola são de difícil identificação e não são

mensuráveis por seu caráter não material que acaba por envolver em sua

avaliação juízos de valor.

152

Outra é o fato de a escola ser “prestadora de serviços, que lida

diretamente com o elemento humano”, onde o “aluno não é apenas o

beneficiário do serviço que ela presta, mas também participante de sua

elaboração” (PARO, 2012, p. 166). A matéria-prima do trabalho da

escola é bem distinta da matéria-prima da empresa. Outro fator é o da

força de trabalho: a empresa conta com uma grande participação relativa

das máquinas, com tendência à sua intensificação cada vez maior, já, na

escola, é a força de trabalho que tem a participação relativa mais

elevada. Isso se deve à peculiaridade da matéria prima, e à natureza do

trabalho desenvolvido, “que consiste na transmissão e crítica do saber,

envolvendo, portanto, o comportamento humano, que não se contém nos

estreitos limites da previsibilidade inerente à máquina” (PARO, 2012, p.

166).

Ao se desconsiderar estas especificidades e implantar na escola a

administração aos moldes da gestão empresarial, a maior consequência é

não ter condições de elencar novos objetivos para a atividade

educacional, que serve, segundo o autor, de “fator de homogeneização

do comando exercido pela classe burguesa, em nossa sociedade”

(PARO, 2012, p. 168). O autor nos auxilia a compreendermos um pouco

mais como se dá esse processo:

Em termos políticos, o controle do capital,

exercido primeiro no âmbito das relações sociais

de produção, precisa disseminar-se por todo o

corpo social para que, assim, se efetive o domínio

e a hegemonia da classe que o detém sobre o

restante da sociedade. Uma das maneiras mais

efetivas pelas quais essa disseminação se

concretiza é pela introdução, nas diversas

instituições da sociedade, e em especial na escola,

da administração especificamente capitalista,

gerada no interior da empresa, e que, assim, se

procura generalizar, sob a denominação

“administração geral”, que, encobrindo sua

verdadeira origem histórica, lhe empresta maior

legitimidade, a dar-lhe foros de universalidade.

(PARO, 2012, p.168-169).

Assim a administração escolar embasada nesta teoria

conservadora, gera uma prática também conservadora, elemento de

manutenção do status quo. Embora na empresa capitalista a teoria da

administração geral embase uma prática que tem elementos

153

progressistas, já que ao buscar a maior racionalização e produtividade

faz com que se desenvolvam os métodos e as técnicas para mais

economicamente atingir os objetivos, na escola, por mais que se espere

que ela desenvolva o aspecto progressista de introduzir os benefícios

técnicos que fariam atingir os objetivos da educação de distribuir o saber

historicamente acumulado, com mais racionalidade e eficiência, isto não

se concretiza na práxis da administração escolar, até mesmo pela

destituição do saber aplicada sobre os administradores da escola e os

trabalhadores em educação. Segundo o autor (Paro, 2012), os aspectos

presentes na escola, que se destacam em sua administração, são os

mecanismos gerenciais, de controle do trabalhador, ou seja, os aspectos

negativos, pois os aspectos positivos da administração geral, que são os

de sua dimensão técnica, ficam obscurecidos, não produzindo os

resultados esperados. E explica que é evidente que o conteúdo técnico

da teoria da administração capitalista poderia contribuir com a melhoria

da escola, desde que direcionado à racionalização das atividades e à

sistematização dos procedimentos, voltados a um ensino melhor. No

entanto o que se verifica como prática comum no cotidiano da escola é

“a hipertrofia dos meios representada pelo número excessivo de normas

e regulamentos com atributos meramente burocratizantes, desvinculados

da realidade e inadequados à solução dos problemas” (PARO, 2012, p.

170-171), agravando-os e emperrando o funcionamento da instituição

escolar.

A divisão do trabalho na escola, que buscando uma maior

racionalidade, propunha a reorganização dos currículos e dos programas

em bases mais funcionais e objetivas, pelo planejamento meticuloso e a

divisão das atividades didáticas, com o acompanhamento do trabalho

docente e discente por supervisores e orientadores resultou em “mera

rotinização e burocratização das atividades no interior da escola”

promovendo “a autonomização das tarefas e o esvaziamento de seus

conteúdos, comprometendo cada vez mais a qualidade do ensino e a

satisfação do professor em sua função” (PARO, 2012, p. 171). Este

esvaziamento vai exigindo cada vez menos da consciência e inteligência

do professor que vai deixando de compreender sua realidade, deixando-

se dominar cada vez mais pela fetichização. A desqualificação do

ensino, como produto do ato de ensinar acarreta a desqualificação do

professor, uma vez que para fazer um produto de qualidade inferior

utiliza-se força de trabalho de qualidade inferior, unida a meios de

produção também inferiores, normalmente disponíveis em maior

quantidade e a preços mais baixos.

154

A administração, em sua dimensão de gerência como controle do

trabalho, como o autor (PARO, 2012) explica, é a forma que assume a

coordenação do esforço humano coletivo sob o capitalismo, e está

presente na escola perpassando todas suas atividades, despida, no

entanto, dos procedimentos de liderança e relações humanas como

ocorre na empresa, mas ainda assim desenvolvendo um sistema

hierárquico análogo aos da empresa capitalista onde a última palavra

deve ser dada pelo diretor, que está no topo dessa hierarquia. Este

sistema desenvolve normas que devem garantir a hierarquia e o controle

das ações dentro da escola. Para isto todo o pessoal deve desempenhar

funções precisas o bastante para serem controladas e cobradas na

realização das tarefas.

Um aspecto importante é o da contradição existente na ação de

ser diretor de escola. Este fica colocado entre as reivindicações da

comunidade escolar por melhores condições de ensino e trabalho, e a

omissão do Estado em prover a demanda e atribuir ao diretor o papel de

satisfazer as necessidades da escola e as demandas da comunidade e

conter estas demandas de modo a não ameaçar o sistema e os interesses

das classes dominantes. Saviani expõe que o diretor de escola fica entre

dois polos de pressão:

[...] do "sistema" que privilegia a forma sobre o

conteúdo impondo um conjunto de exigências

burocrático-administrativas; de outro lado (de

baixo e de dentro), a pressão do conteúdo

educativo que necessita ser desenvolvido no

interior da escola sem o que ela se descaracteriza,

se rotiniza e perde a razão de ser. Em termos

ideais caberia ao diretor efetuar a mediação entre

os dois focos de pressão, saturando de conteúdo as

formas que decorrem das exigências da chamada

"instância superior" (o sistema); sua ação se

dirigiria, então, no sentido de subordinar e

adequar as prescrições administrativas a

finalidade educativa colimada no interior da

escola. Na prática, poderíamos mesmo dizer que

um diretor será tanto mais educador quanto maior

o grau de autonomia que mantém em relação às

exigências do "sistema", subordinando suas

formas aos conteúdos educativos; e será tanto

mais administrador quanto menor o grau de

autonomia referido, o que o levará, em

consequência, a se ater à rigidez das "normas

155

superiores" mantendo-as esvaziadas do conteúdo

que lhes daria sentido. (SAVIANI 1996, p. 208-

209).

Paro (2012) considera estes dois aspectos inconciliáveis: de como

educador ter de cuidar da busca pelos objetivos educacionais, e como

gerente ter de cumprir as determinações dos órgãos superiores

dedicando a maior parte de seu tempo para o atendimento de

formalidades burocráticas que sobrecarregam a escola (grande número

de leis, pareceres, resoluções, portarias, regulamentos, etc.) e na busca

de soluções para o problema da escassez de recursos, o que lhe tolhe a

função de educador. Da maneira como ele consegue lidar com esse

conflito é que constrói sua imagem perante a comunidade escolar. A

dimensão gerencial transforma o diretor num agente de controle do

Estado, defensor de seus direitos, deixando de lado o papel

transformador para assumir o papel de conservador da sociedade do

capital. O diretor é visto em geral como alguém que tem poder e

autonomia, muito além do que realmente tem, e o autor explica que,

[...] quando as circunstâncias e o esforço pessoal

permitem ao diretor resolver problemas no interior

da escola, não é incomum associar-se sua imagem

a de uma pessoa democrática e identificada com

os interesses dominados; de modo análogo,

quando os recursos disponíveis e seu poder de

decisão são insuficientes para atender as justas

reivindicações, de melhoria do ensino e das

condições de trabalho na escola, a tendência é

considerá-lo autoritário e articulado com os

interesses dominantes. (PARO, 2012, p. 175).

O autor explica que esta avaliação não contempla a realidade e

tende a desaparecer ou diminuir quando as contradições no âmbito

educacional (em decorrência das contradições na sociedade) se tornam

mais agudas. O acirramento das contradições desvela a realidade, as

causas ficam mais aparentes e de mais fácil apreensão, e torna-se mais

claro o papel desempenhado por cada agente envolvido no processo

educacional, e tende a desvelar a ilusão criada pela ideologia que faz

com que os interesses da classe dominante pareçam os de toda a

população.

Paro (2012) diferencia as relações que ocorrem na escola

particular das da escola pública, pelo fato de que na escola particular, o

156

trabalho se constitui de fato em trabalho produtivo, que gera mais-valia.

Na escola particular, a preocupação primordial da administração, como

na empresa capitalista, não é a qualidade do ensino oferecido, como

produto final da “empresa”, mas é a valorização do capital investido, e

mesmo que o trabalho na escola pública utilize processos de trabalho

com conteúdo concreto semelhante ao da particular, sua natureza, de

trabalho não produtivo, a diferencia. Outra especificidade da escola a ser

considerada é a natureza não material de sua produção, que faz com que

o produto seja, em geral, inseparável do ato de sua produção. A

produção e o consumo se dão ao mesmo tempo (embora a aula

permaneça produzindo mudanças e sendo consumida ao longo da vida

do indivíduo, a produção que envolve diretamente o professor e a escola

se dá imediatamente). Esta especificidade limita a possibilidade da

mercadoria “ensino”, e da generalização da forma capitalista de

produção na escola. Esta última (a limitação de generalização da forma

capitalista de produção na escola) decorre essencialmente de três

fatores: pelo papel atuante da “matéria-prima” a ser transformada na

escola, o estudante, que é necessário para que o processo de trabalho

ocorra, é consumidor e participante de sua produção, é sujeito e objeto

(de trabalho) da educação ao mesmo tempo; se deve ainda à amplitude

do conceito do produto da educação escolar (que não pode ser

meramente a aula, o ensino, mas envolve a mudança provocada no aluno

a partir da aula); e à natureza revolucionária do saber envolvido no

processo (que por mais que seja ensinado de modo a garantir a

conservação da sociedade capitalista, por si só sempre tem uma

dimensão revolucionária).

Esse aspecto do estudante ser ao mesmo tempo objeto de trabalho

e agente no processo educativo, como alguém que realiza um trabalho

no sentido de atividade orientada a um fim, traz importantes implicações

para a administração escolar, no sentido da racionalização do processo,

uma vez que o estudante como matéria-prima chega até a escola “como

ele é” e não é possível à escola (pública principalmente) selecionar a

qualidade da matéria-prima que seria mais econômica e eficiente para o

alcance de seus objetivos. Com a universalização da educação, ainda

mais a qualidade dessa matéria-prima está sujeita aos condicionantes

sociais, culturais e econômicos, e se apresenta sem os requisitos

desejados e com

[...] todo o tipo de problemas relacionados à

desnutrição, fome, carência cultural e afetiva, falta

de condições materiais e psicológicas para o

157

estudo em casa, necessidade de trabalhar para

ajudar no orçamento doméstico, bem como uma

série de outros problemas, advindos todos eles do

estado de injustiça social vigente que

comprometem o desenvolvimento do aluno na

aprendizagem. (PARO, 2012, p. 187).

O produto da educação escolar está condicionado pela condição

apresentada pela matéria-prima, como em todo o processo de produção,

no entanto neste processo com maior ênfase já que a matéria-prima

apresenta duplicidade de “funções” como agente e objeto de trabalho e

não é possível para a administração escolar escolher uma matéria prima

mais adequada ao seu fim, limitando uma das dimensões da

administração, que é a escolha dos meios que melhor condizem para

atingir os objetivos.

Outra especificidade que influencia diretamente na

administração, dificultando a generalização da forma capitalista de

produção na escola, é o fato de que não podemos considerar apenas a

aula como produto do processo educacional. Por mais que a aula seja,

do ponto de vista da mercadoria, o produto que representa a mais-valia

na escola particular, pois a aula é o que é vendido, não é a aula apenas

que se espera do processo educacional quando esta é comprada. O

consumo da aula, não esgota o produto, pois o produto do processo

educacional, tanto na escola particular quanto na escola pública, envolve

uma série de transformações no educando que são buscadas a partir do

consumo da aula, a partir da apropriação do saber, que englobam

“conhecimentos, atitudes, valores, habilidades, técnicas, etc.” (PARO,

2012, p. 189). O que move na maioria dos casos o consumidor a

procurar a educação escolar é a necessidade de formação para o

trabalho. Neste caso, a possibilidade de avaliação do produto da escola é

muito limitada. Enquanto o produto material da empresa capitalista é

avaliado quase que imediatamente por sua aceitação no mercado (uma

vez que se o produto não é de boa qualidade procura-se outro

concorrente), o produto da escola pública precisa de um longo tempo

para que seja verificado se seu efeito foi de qualidade ou não, sua

avaliação não pode ser feita logo após o consumo, e vai ocorrer através

de julgamentos subjetivos, impedindo conclusões mais seguras e

definitivas. Se há a dificuldade em avaliar do ponto de vista do

indivíduo, ainda maior é a dificuldade de se fazer uma avaliação no

sentido social, e concluir se aquela educação escolar, como produto,

conseguiu levar os sujeitos à apreensão crítica da realidade, que lhes

158

permita organizarem suas ações para a transformação social utilizando

como ferramentas o saber desenvolvido. Além disso, em caso de má

qualidade do produto da educação escolar (e com maior distinção na

escola pública), os consumidores não têm à sua disposição os mesmos

mecanismos eficazes de sanção. A possibilidade de apresentar algum

efeito está na organização coletiva para encaminhar suas reivindicações,

já que dependem da aprovação de órgãos distantes e de maior “poder”

perante a sociedade, para além da direção da escola, prefeito, governo

estadual ou federal. Neste sentido, há um empenho em voltar as políticas

educacionais para a produção de índices de desempenho, facilitando

assim a avaliação do produto para tornar possível a classificação das

escolas e a auferição de resultados pela mensuração da produtividade.

Quanto ao aspecto da natureza do saber envolvido no processo de

trabalho da educação escolar, o autor explica que, com a divisão

pormenorizada do trabalho, pode-se separar concepção e execução em

momentos distintos. No caso do processo de trabalho da educação

escolar, é diferente.

Eis aí um dos elementos que fazem a

especificidade do processo pedagógico: o saber

não se apresenta neste processo apenas como algo

que possa ser separado dele, como concepção; ele

se apresenta também como objeto de trabalho e,

como tal, é inalienável do ato de produção. Assim

sendo, esse saber não pode ser expropriado do

trabalhador sob pena de descaracterizar-se o

próprio processo pedagógico. (PARO, 2012, p.

194).

Esta especificidade implica em não separação dos aspectos

manual e intelectual do processo educativo, senão, o professor não

contaria com parte da matéria-prima para efetivar o processo de

trabalho, o saber a ser utilizado como meio de trabalho. O saber tem um

caráter essencialmente revolucionário, pois sua apropriação se configura

em ferramenta para o desenvolvimento da consciência crítica, através da

qual o indivíduo consegue chegar à apreensão da realidade concreta que

o cerca, e pensar formas de transformá-la. No entanto, a escola, à

medida que vai incorporando os objetivos capitalistas de manutenção da

ordem vigente, esvazia-se de saberes e passa a utilizar-se de

conhecimentos e conteúdos que sejam comprometidos com os interesses

dominantes. Ainda que se busque a anulação desta contradição, o saber

159

sempre apresentará uma dimensão revolucionária, e, por isso, haverá a

tentativa de sonegação do saber para a classe trabalhadora.

Segundo Paro (2012, p. 194) estes aspectos “evidenciam também

o caráter essencialmente superestrutural da escola enquanto entidade que

provê a educação”, que se fundamenta “em relações que decorrem das

representações que os homens elaboram a partir das relações que se dão

no nível da produção social de sua existência”, ou, em outras palavras,

“se pauta por relações que dizem respeito à forma pela qual os homens

tomam consciência da própria realidade concreta” (PARO, 2012, p.

196). Se houvesse a generalização do processo de produção capitalista,

fundamentado nas relações de produção que se dão no nível da

infraestrutura econômica, da expropriação do trabalhador de todos os

meios de produção, descaracterizaria a escola desta “condição específica

de entidade pertencente à superestrutura da sociedade” (PARO, 2012, p.

195).

Frigotto (2010) contribui neste debate quando explica que a

escola se articula aos interesses capitalistas por estar inserida numa

sociedade capitalista, mas, se explorar as contradições inerentes à

sociedade capitalista, pode ser articulada aos interesses da classe

trabalhadora, em favor da negação destas relações sociais de produção,

e,

Mais que isso, pode ser um instrumento eficaz na

formulação das condições concretas da superação

destas relações sociais que determinam uma

separação entre capital e trabalho, trabalho

manual e intelectual, mundo da escola e mundo do

trabalho. Isto nos indica, então, que a escola que

não é por natureza capitalista no interior deste

modo de produção tende a ser articulada com os

interesses do capital, mas exatamente por não ser

inerente ou orgânica deste modo de produção,

pode articular-se com outros interesses

antagônicos ao capital. (FRIGOTTO, 2010, p.34-

35).

À medida que a escola vai reduzindo o volume de

conhecimentos, sonegando o saber, vai se aproximando do objetivo da

empresa capitalista, de manter a exploração de uma minoria sobre a

maioria da população, e recusando o papel revolucionário que poderia

desempenhar. Enquanto a empresa “serve ao capital diretamente,

mediando a apropriação da mais-valia no nível das relações de

160

produção”, a escola “assume o papel político de enfraquecer os

antagônicos do capital, isto é, a classe trabalhadora, despotencializando

sua ação política” (PARO, 2012, p. 197). Busca-se assim na

administração da empresa capitalista, cujo fim é a exploração da mais-

valia, modelos de mecanismos de dominação a serem aplicados na

escola, agindo antagonicamente aos interesses de uma escola

revolucionária, que visa servir de instrumento de superação da

dominação e da exploração do trabalhador. Se ambas são antagônicas

em seus objetivos, não é possível tomar a administração capitalista e

tentar revesti-la de princípios revolucionários buscando adequá-la aos

fins da classe trabalhadora, mas é necessária uma práxis administrativa

que se oponha a ela (no aspecto político, pois como se viu, não se pode

desprezar o avanço tecnológico dos procedimentos, práticos e teóricos,

sob os aspectos que são gerais e que contribuem com a elaboração da

práxis revolucionária). Se a escola for capaz de cumprir seu objetivo

educacional de transmitir o saber acumulado historicamente, levando os

educandos a desenvolverem a consciência crítica e a serem capazes de

desenvolver os conhecimentos e criar novos, ela cumpre seu papel

revolucionário. Para Saviani (2008, p. 45),

Se os membros das camadas populares não

dominam os conteúdos culturais, eles não podem

fazer valer seus interesses, porque ficam

desarmados contra os dominadores, que se servem

exatamente desses conteúdos culturais para

legitimar e consolidar a sua dominação.

Aí está contemplada a dimensão revolucionária, embora

contraditória pela ideologia, da escola. Segundo Saviani (2008), para

que os conteúdos sejam assimilados pelos educandos é imprescindível a

disciplina na e da escola, sendo mais um foco necessário de atenção e

ação administrativa nas escolas. Para isto há que se avançar na forma de

administração, que ainda se concretiza numa prática conservadora, que

[...] se mostra, na teoria, pela adoção de

determinado tipo de administração, a

administração capitalista; e, na prática, pela

negligência com os aspectos mais nitidamente

técnicos dessa mesma administração, em favor do

privilegiamento dos aspectos políticos

comprometidos com a conservação social e com a

dominação. (PARO, 2012, p. 205).

161

A direção política é a dimensão que pode diferenciar

radicalmente a administração da escola pública da administração

capitalista. É primordial a tarefa de definir coletivamente os objetivos da

escola pautados nos interesses da classe trabalhadora, estabelecendo

também as atividades administrativas que devem ser desenvolvidas para

se chegar aos objetivos traçados. Levando em consideração a dimensão

política da administração, Paro explica que o termo direção é utilizado

contemplando mais este aspecto. Para o autor, uma análise rigorosa das

especificidades mostra que a direção difere da administração, embora,

genericamente ambas se confundam. Esta diferença reside em que,

Quando se trata da direção da escola e do

responsável por ela, pretende-se uma maior

abrangência de ação e um ingrediente político

bastante nítido, que a administração, muito mais

técnica, parece não conter: o diretor é aquele que

ocupa a mais alta hierarquia de poder na

instituição. (PARO, 2010a, p. 769).

Dirigir é mais amplo do que administrar, que faz parte de dirigir.

Dirigir significa também liderar, para a escolha de uma filosofia e de

uma política de ação (RIBEIRO, 1968 apud PARO, 2010a, p. 769), ou

seja, “podemos dizer que a direção é a administração revestida do poder

necessário para se fazer a responsável última pela instituição” (PARO,

2010a, p. 769). Na sociedade do capital, a direção está nas mãos de uns

poucos, que definem os objetivos a serem perseguidos pela instituição e

estabelecem os métodos e técnicas que serão utilizados, enquanto que a

maioria executa as ações necessárias para se atingir os fins. Isto não

impede que se inicie a construção de um formato de administração que

dê conta de toda a amplitude das atividades educativas, que seja

desenvolvida pelo coletivo, pautada pela participação. Marx e Engels

afirmam que

Tendo em vista que os senhores da terra e do

capital sempre utilizam seus privilégios políticos

para defender e perpetuar seu monopólio

econômico e para escravizar o trabalho, a

conquista do poder político torna-se a tarefa

primordial do proletariado. (MARX; ENGELS,

2003, p. 110).

162

As escolas, e outras estruturas da sociedade do capital, que

funcionam como legitimadoras e disseminadoras da ideologia da classe

dominante, a partir de suas contradições apresentam-se como uma

possibilidade inicial, que pela tomada de sua direção e de seu poder

político pela classe trabalhadora, pode tornar-se um espaço de

aprendizagem e de acúmulo de forças para a transformação da

sociabilidade vigente.

Paro defende que para que a “Administração Escolar possa

contribuir verdadeiramente para a transformação social, não basta o

caráter transformador dos objetivos. É preciso que eles sejam

perseguidos de maneira efetiva” (PARO, 2012, p. 204), não podem ficar

apenas no campo ideal como aspiração formal, desprendida da realidade

e da prática, senão servem apenas ao projeto dominante, mascarando o

que verdadeiramente ocorre na escola. “É no nível da práxis, na busca

efetiva dos fins propostos e na concretização dessas intenções que seu

caráter transformador se completa” (PARO, 2012, p. 205). Quanto mais

a administração da escola tiver objetivos comprometidos com a

revolução social, e quanto mais sua forma se deixar impregnar pela

natureza e propósitos transformadores de seus objetivos, mais ela pode

contribuir para a transformação.

O que determina o caráter conservador ou

transformador da administração é a natureza dos

objetivos que ela busca concretizar, os quais – em

conjunto e como resultante das forças sociais

predominantes em um determinado momento

histórico, de uma dada formação econômico-

social – acabam por determinar a própria forma

em que se dá a atividade administrativa. [...] Ao

reconhecermos na escola seu papel na

transformação social, então o tema de sua

racionalidade interna e, portanto, de sua

administração, se coloca como uma questão

fundamental; e o desenvolvimento de uma nova

Administração Escolar, efetivamente adequada a

sua natureza e a seus objetivos transformadores,

se impõe como uma tarefa que precisa ser

permanentemente realizada. (PARO, 2012, p.

206-207).

A administração, para ser revolucionária, depende da criação de

uma nova forma, mas que, como práxis criadora, considere todo o

163

avanço já alcançado historicamente, na teoria, nos instrumentos e nas

técnicas. Deve superar a prática espontânea e realizar-se como práxis

reflexiva, em que a consciência do sujeito esteja presente tanto como

consciência prática orientando para o uso racional dos meios, mas

também como consciência da práxis, ou a consciência que o sujeito tem

da racionalidade do processo e da participação de sua consciência neste

processo.

Esta passagem de uma prática administrativa

espontânea para uma prática administrativa

reflexiva e intencional é que pode configurar a

Administração Escolar como processo criador

capaz de atender aos objetivos identificados com a

transformação social. (PARO, 2012, p. 207).

Além de buscar oferecer um melhor ensino, democratizar a

administração prescinde da luta pela dotação de recursos da escola, pois

a administração precisa dispor de recursos para operar. Sabemos que a

autonomia depende de inúmeros elementos, sendo um deles, e

fundamental, os recursos financeiros que possibilitem elaborar objetivos

e cumpri-los. Barroso (2013, p. 32) explica que é necessária a

adequação dos recursos disponibilizados às

escolas quer pelo orçamento do Estado, quer por

outros meios, às suas condições específicas e dos

projetos que pretendem desenvolver, no quadro da

sua autonomia, com especial atenção (e

mecanismos de compensação) para as que se

encontram situadas em zonas social e

economicamente degradadas.

Para que se torne possível oferecer um ensino de melhor

qualidade é necessário que os trabalhadores em educação apresentem

um conjunto de conhecimentos, técnicas e habilidades que torne o

objetivo possível. Do mesmo modo, as pessoas envolvidas na

administração da escola precisam de uma competência técnica referente

ao conhecimento do que se vai administrar, “ou seja, aos aspectos mais

propriamente pedagógicos, quanto aos processos, métodos e técnicas

relacionados à atividade administrativa” (PARO, 2012, p. 208), o que se

configura num desafio maior quanto maior o nível de participação, o

número e variedade de pessoas envolvidas. Assim, requer a permanente

formação, voltada a aperfeiçoar as práticas e a participação.

164

Paro (2012) explica que tendo em vista a unidade entre os

objetivos que se pretende alcançar e a forma como se vai proceder para

isto (que é a administração), a atividade administrativa que tem como

objetivo uma formação econômico-social que elimine a exploração e

vise à cooperação, deve necessariamente pautar-se por este princípio e

ter sua forma impregnada por essa cooperação. E completa que fica

claro que a forma atual da administração da escola, “pautada no

autoritarismo em suas relações e pela ausência de participação dos

diversos setores da escola e da comunidade em sua realização” (PARO,

2012, p. 209) não serve ao projeto de chegarmos a uma sociedade

democrática pela revolução social.

Por isso, uma teoria e prática de Administração

Escolar que se preocupe com a superação da atual

ordem autoritária na sociedade precisa propor

como horizonte a organização da escola em bases

democráticas. E para a Administração Escolar ser

verdadeiramente democrática é preciso que todos

os que estão direta ou indiretamente envolvidos

no processo escolar possam participar das

decisões que dizem respeito à organização e

funcionamento da escola. (PARO, 2012, p. 209).

Segundo o autor (PARO, 2012), isto implica em extinguir a

forma de administrar em que a concentração da autoridade fica na mão

de uma só pessoa, o diretor, e adotar formas coletivas de administração

distribuindo o poder. A gestão cooperativa deve visar à constituição, na

escola, de um trabalhador coletivo como resultado do trabalho

cooperativo de todos os envolvidos no processo escolar, que

desenvolvam uma vontade coletiva em direção ao objetivo educacional.

Não é possível estabelecer a priori qual a forma mais adequada de

gestão em cada situação e momento histórico, esta só pode ser

construída na práxis da atividade administrativa escolar, “enquanto ação

humana transformadora adequada a objetivos educativos de interesse

das classes trabalhadoras” (PARO, 2012, p. 210). Porém o que é

evidente, é que deve pautar-se na participação efetiva de todos que

constituem a escola, direta ou indiretamente, e que seja uma atividade

do coletivo e não de alguns indivíduos que venham a exercer autoridade

e poder irrestrito sobre os demais. Não há como prevalecer os interesses

de alguns sobre os outros quando os interesses são comuns, e se os

objetivos a serem alcançados são decididos conscientemente no coletivo

e pautados por estes interesses comuns, a busca pela concretização

165

destes objetivos será também um processo coletivo onde serão

atribuídas tarefas conforme a natureza destas e a capacidade de cada um.

Ao mesmo tempo em que não é possível desenvolver

efetivamente esta proposta na sociedade capitalista por não termos todas

as condições necessárias, é necessário implantá-la na medida do

possível, buscando desenvolver “práticas democráticas de coordenação

do esforço humano coletivo que estejam articuladas com uma nova

postura administrativa, identificada com a concepção de mundo da

classe trabalhadora” (PARO, 2012, p. 211), forçando o acirramento das

contradições como meio de despertar a consciência crítica dos

indivíduos acerca da realidade, o que contribui para a disseminação da

concepção de mundo da classe trabalhadora e a possibilidade de

realização da revolução social. Precisamos ter convergência de

interesses e consciência de quais são eles, bem como ter consciência de

quais meios nos servem e como devem ser usados para garantir a

realização de nossos interesses.

O autor nos explica que a coordenação do esforço coletivo de

todos os indivíduos que compõem os segmentos da comunidade escolar

é de extrema importância para a realização da gestão democrática, pois é

por meio desta que são garantidas as melhores condições de participação

na tomada de decisões, que serão feitas por grupos representativos, que

funcionem como expressão das ideias dos coletivos e de intercâmbio de

informações. Nesta nova administração, identificada com os interesses

da classe trabalhadora, é preciso que todos conheçam seus princípios e

métodos para poderem atuar conscientemente. Para que a classe

trabalhadora possa participar, também é necessário superar os

condicionantes da não participação dos pais45

, que vão desde a falta de

tempo até a falta de compreensão política da importância da

participação.

Paro (2012) também nos explica que com a democratização da

escola e a divisão do poder e autoridade não é apenas a organização

interna que se fortalece, mas também a unidade escolar em suas relações

externas. Quando a escola é dirigida por um único diretor ou uma equipe

diretiva, a tendência a sucumbir à pressão dos governos e das classes

dominantes é mais forte, enquanto que com uma gestão democrática,

cooperativa, coletiva e operária, o objetivo da classe trabalhadora como

referência para a ação fica mais presente, e a cooptação se torna mais

difícil. Também torna mais difícil administrar a escola conforme

interesses individuais.

45

Os condicionantes são apresentados detalhadamente no capítulo 5.

166

Segundo Paro,

se queremos uma escola transformadora,

precisamos transformar a escola que temos,

excludente, gestada autoritariamente, com

objetivos estabelecidos fora dela visando

interesses das classes dominantes, antagônicos às

necessidades da classe trabalhadora. A

transformação dessa escola passa necessariamente

por sua apropriação por parte das camadas

trabalhadoras. (PARO, 2000, p. 10).

Pensamos que não é possível tomar algo sem ter o poder de

decidir sobre seus rumos e objetivos, bem como os meios a serem

utilizados para atingi-los, portanto, a escola só será da classe

trabalhadora quando houver participação desta na sua gestão, não apenas

formalmente, mas plenamente, com condições objetivas (materiais) e

subjetivas (consciência) de participação.

A possibilidade de transformar a realidade se dá pela intervenção

em algum aspecto material que a compõe, para que a ação provoque

novas alterações, no sentido de chegar a um patamar que nos permita

revolucionar a realidade. Não podemos esperar que estejam dadas todas

as condições da revolução, pois assim nossa atuação não mais seria

necessária. Precisamos “cavar” mudanças na materialidade que nos foi

dada a conhecer, pois como Marx ensina, “na realidade, para o

materialista prático, isto é, para o comunista, trata-se de revolucionar o

mundo existente, de atacar e transformar, praticamente, o estado de

coisas que ele encontrou” (MARX e ENGELS, 1977, p. 66). E a forma

eficaz de fazer a revolução é alterando a essência do fenômeno que se

pretende revolucionar.

167

4 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA LEGISLAÇÃO

ACERCA DA GESTÃO ESCOLAR DESDE O BRASIL

COLÔNIA ATÉ A LEI DE GESTÃO DEMOCRÁTICA DO

ENSINO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO SUL NA

ATUALIDADE

O desenvolvimento da legislação que prevê a gestão democrática

da escola pública foi um processo longo e lento, que iniciou com a

democratização da sociedade a partir do final dos anos 80. Para

compreender como era a organização e a administração da escola, que

ao longo do tempo foi sendo modificada, e que serviu de base para o

desenvolvimento da legislação atual, estudamos o passado, desde o

início da formação do sistema escolar brasileiro.

Considerando que as relações de poder da sociedade se

expressam na legislação decorrente de sua organização, buscamos

compreender como o poder estava constituído e sob que condições as

relações sociais se desenvolviam em cada momento da história do

desenvolvimento da legislação acerca da gestão escolar, apontando

alguns aspectos principais. Também considerando que a escola na

sociedade capitalista cumpre um papel de fomentar o mercado de

trabalho, formando o ser humano a serviço do capital, ficou evidente a

necessidade de compreender as principais influências da implantação do

capitalismo e da industrialização e as exigências que estas impõem em

nossa sociedade a cada diferente fase de sua expansão.

A regulamentação atual da gestão escolar das escolas estaduais

do Rio Grande do Sul se dá pela Lei 10.576/1995 - Lei de Gestão

Democrática com as modificações da Lei 11.695/2001 - de Gestão

Democrática do Ensino Público do Rio Grande do Sul e da Lei

13.990/2012, em consonância com a Lei 9394/1996 - de Diretrizes e

Bases da Educação, a Lei 10.172/2001 - PNE - Plano Nacional de

Educação e as normas dos Conselhos de Educação. A legislação, como

uma forma de expressão da organização social, foi sofrendo inúmeras

alterações, fruto das demandas e mobilizações populares, seguindo o

rumo das mudanças sociais, expressando em seu conteúdo e forma as

relações que ocorriam na sociedade. Considerando os momentos

históricos diversos pelos quais passou a sociedade brasileira, precisamos

considerar que a práxis da legislação está intimamente ligada às lutas

sociais e ao domínio de classe característico do capitalismo, com

diferentes expressões em cada fase de organização do poder político-

econômico. A legislação expressa a correlação de forças entre as

168

diferentes concepções e grupos em luta na disputa pela construção do

projeto social num determinado momento.

Pachukanis (1988) nos explica que a regulamentação jurídica é o

resultado de uma forma concreta de sociedade, é um fenômeno objetivo

que evolui histórica e dialeticamente com a humanidade, portanto, “[...]

a forma jurídica, expressa por abstrações lógicas, é um produto da forma

jurídica real ou concreta [...], um produto da mediação real das relações

de produção” (PACHUKANIS, 1988, p. 12). Como viemos discorrendo

acerca da humanidade e da escola, ao analisarmos a legislação não

podemos deixar de considerar as determinações impostas pelo modo de

produção vigente, com o domínio da classe capitalista sobre a classe

trabalhadora, que terá um efeito determinante sobre a formulação do

sistema jurídico, que é um dos elementos chave da superestrutura de

domínio do capital. Pachukanis (1988, p. 52) afirma que “a

superestrutura jurídica é uma consequência da superestrutura política”,

ou seja, de uma organização política existente na sociedade.

O mesmo autor nos ajuda a compreender que

[...] o princípio da subjetividade jurídica (como tal

entendemos o princípio formal da liberdade e da

igualdade; da autonomia da personalidade etc.),

não é somente um meio dissimulatório e um

produto da hipocrisia burguesa, na medida em que

é oposto à luta proletária pela abolição das

classes, contudo não deixando também de ser um

princípio realmente atuante, que se acha

incorporado na sociedade burguesa desde que essa

nasceu da propriedade feudal patriarcal e a

destruiu. [...] a vitória deste princípio não é apenas

e tão somente um processo ideológico (isto é, um

processo da ordem das ideias, das representações

etc.) mas antes um real processo de transformação

jurídica das relações humanas, que acompanha o

desenvolvimento da economia mercantil e

monetária (da economia capitalista, falando da

Europa) e que engendra profundas e múltiplas

modificações de natureza objetiva.

(PACHUKANIS, 1988, p. 10).

Desta forma, não existe um direito desinteressado, justo, neutro

ou garantidor dos direitos de todos, mas o direito burguês. O direito

expressa uma luta de interesses

169

[...] a filosofia do direito, cujo fundamento é a

categoria do sujeito com sua capacidade de

autodeterminação [...] nada mais é, com certeza,

do que a filosofia da economia mercantil, que

estabelece as condições mais gerais, mais

abstratas, sob as quais se pode efetuar a troca de

acordo com a lei do valor e ter lugar a exploração

sob a forma de “contrato livre”. Este pensamento

serve de base à crítica que o comunismo fez, e

ainda faz, à ideologia burguesa da liberdade, da

igualdade e da democracia burguesa formal, dessa

democracia na qual a “república do mercado”

procura mascarar o “despotismo da fábrica”. Este

pensamento dá-nos a convicção de que a defesa

dos chamados fundamentos abstratos da ordem

jurídica é a forma mais geral da defesa dos

interesses da classe burguesa etc.

(PACHUKANIS, 1988, p. 8-9, prefácio).

Ao analisarmos a legislação acerca da gestão escolar, o fizemos

como nos apresenta Pachukanis, pensando “[...] essencialmente no

conteúdo concreto da regulamentação jurídica adaptada a uma

determinada época, ou seja, naquilo que os homens consideram como

sendo o direito nesse dado estágio de evolução” (PACHUKANIS, 1988,

p. 20-21), ou seja, pensando a “[...] regulamentação jurídica como forma

histórica determinada” (PACHUKANIS, 1988, p. 21), e considerando

que o direito se divide em duas naturezas, em norma e em faculdade

jurídica. Consideramos também que “Apenas a sociedade burguesa

capitalista cria todas as condições necessárias para que o momento

jurídico esteja plenamente determinado nas relações sociais”

(PACHUKANIS, 1988, p. 24). Segundo o autor,

[...] o direito como forma não existe somente na

mente e nas teorias dos juristas especializados. Ele

tem uma história real, paralela, que não se

desenvolve como um sistema de pensamento mas

antes como um sistema particular de relações que

os homens realizam em consequência não de uma

escolha consciente, mas sob pressão das relações

de produção. O homem torna-se inevitavelmente

sujeito jurídico como inevitavelmente transforma

o produto natural numa mercadoria dotada das

170

propriedades enigmáticas do valor.

(PACHUKANIS, 1988, p. 33).

Antes de ser criado na legislação, o direito já existe nas relações

sociais, já foi aceito pelo consenso, conseguido através da hegemonia.

Dessa forma, o direito precisa ser entendido “não como um atributo da

sociedade humana abstrata, mas como uma categoria histórica que

corresponde a um regime social determinado, edificado sobre a oposição

de interesses privados” (PACHUKANIS, 1988, p. 36) e como tal, reflete

a luta de classes e a coerção do Estado. Essa natureza do direito faz com

que o próprio direito se apresente de forma contraditória, como

“sinônimo da existência oficial do Estado e o direito como porta-voz da

luta revolucionária: esta dualidade determina um campo de infinitas

controvérsias e incríveis confusões” (PACHUKANIS, 1988, p. 57). Esse

dualismo também é fruto de disputas, onde um campo do direito está em

constante contradição com o outro, tentando sobrepor-se.

Segundo o autor (PACHUKANIS, 1988), a forma jurídica é

constituída pelos pares opostos como: direito privado – direito público;

direito objetivo – direito subjetivo; direito como norma objetiva –

direito como justificação entre outras oposições fundamentais. Além

destas oposições, na sociedade capitalista burguesa surge a oposição

entre o indivíduo como pessoa privada e o indivíduo como membro da

sociedade política, modificando consigo a forma e o conteúdo do

direito. Pachukanis concebe isto como consequência da organização

capitalista da sociedade e expõe que “[...] o que caracteriza a sociedade

burguesa é justamente o fato de os interesses gerais se destacarem dos

interesses privados e de se oporem a eles” (PACHUKANIS, 1988, p.

64). Neste sentido Lenin (2007, P. 116) esclarece que direito burguês

pressupõe “um Estado burguês, pois o direito não é nada sem um

aparelho capaz de impor a observação de suas normas”. Apresenta-se

outro elemento determinante do sistema do capital, que é o Estado como

mediador do conflito de classes, representando o papel de regulador e

mantenedor da ordem burguesa. Pachukanis considera o Estado “como

uma organização real de dominação de classe” (PACHUKANIS, 1988,

p. 40).

O autor (PACHUKANIS, 1988) nos ajuda a compreender a

relação direito, legislação e sociedade explicando que as normas

jurídicas garantem e preservam uma relação social existente, mas de

forma alguma a criam, podendo sim demonstrar um interesse, uma

intenção que isso ocorra, por mais escusas sejam as intenções por trás da

intenção. E explica, ou a norma (conteúdo lógico do direito) é deduzida

171

das relações já existentes, ou representa “apenas um sintoma que

permite prever com certa probabilidade o futuro nascimento das relações

correspondentes” (PACHUKANIS, 1988, p. 48-49). Deste modo, como

probabilidade, pode ser que se criem as relações descritas, ou podem

continuar como mera possibilidade. Pachukanis nos alerta que desse

modo, o estudo do direito não pode levar em consideração apenas a

forma normativa expressa na lei, deve se prender aos fatos, pois

Se certas relações foram efetivamente

constituídas, isso significa que nasceu um direito

correspondente; porém, se uma lei ou um decreto

foram apenas promulgados sem que na prática

tivesse surgido qualquer relação correspondente,

então isso significa que foi feita uma tentativa

fracassada para criar um direito. (PACHUKANIS,

1988, p. 49).

Parece-nos que este é o caso da Lei de Gestão democrática do

Ensino Público do RS, que se desenvolve enquanto uma intenção

popular de inserir na sociedade, no caso na escola, uma relação ainda

não existente, que não se efetivou, e como tal, se mantém como

possibilidade.

4.1 OS PERÍODOS COLONIAL, REPUBLICANO E DA DITADURA

CIVIL-MILITAR

A formação do sistema escolar no Brasil iniciou logo após a

chegada dos portugueses. A partir de 1549, os jesuítas, buscando a

expansão da Igreja aliada à expansão do império, iniciaram a

implantação de escolas como meio de arrebanhar fiéis, catequizando,

evangelizando e instruindo as pessoas, formando-as para servirem a seus

objetivos. A gestão da escola, tomada com amplo sentido, de

organização e administração, esteve a cargo dos jesuítas no período

colonial até sua expulsão em 1759 (sob o reinado de D. José I), com a

exceção dos poucos colégios dos franciscanos e beneditinos por eles

administrados. Romanelli (2012) explica que, com a expulsão dos

jesuítas, ainda no período colonial, houve o desmantelamento de uma

estrutura administrativa do ensino que já estava formada e um vazio de

treze anos até o Estado (a Coroa) assumir os encargos da educação e sua

administração, com a oferta das Aulas Régias. De acordo com Saviani

172

(2011), o Alvará de 175946

, que determinou o fechamento dos colégios

jesuítas, introduziu as Aulas Régias em seu lugar, com subsistência

garantida pela Coroa. No entanto foi um processo muito lento. Segundo

Fonseca e Menardi (2012, p. 45), esta seria “uma primeira forma de

sistema de ensino público no Brasil”.

Diretamente tratando da administração, ou gestão da escola,

praticamente não há menções. A Carta de Lei de 7 de março de 176147

diz que “Haverá um Reitor que tenha a seu cargo o governo do

Colégio[...]” e que este reitor “deve cuidar muito seriamente na paz,

sossego, boa ordem dos Porcionistas, e direção de todo o Colégio;

fazendo observar exatamente os Estatutos [...]” acrescentando na

regulamentação que

Não poderá o mesmo Reitor fazer sem especial

ordem Minha algum novo Estatuto, ou Regulação,

ou Reforma, nem também interpretar os estatutos

por Mim estabelecidos. Mostrando porém a

experiência que neles faltam algumas coisas

necessárias, ou se fazem duvidosas outras que já

sejam expressas; deve informar o Diretor Geral

para que este Me consulte; e Eu determine o que

Me parecer conveniente.

Percebe-se nesta legislação a função de fiscalização exercida pelo

reitor, vice-reitor e pelo prefeito de estudos (este sim com função de

vigilância apenas) sobre as ações dos envolvidos no colégio a fim de o

rei manter o controle absoluto no que prescrevia. Os pais deviam pagar

pela instrução dos filhos. Em 1771, o rei entregou a administração e

direção das Escolas Menores à Real Mesa Censória (uma corporação já

ativa, criada pelo próprio rei), justificando a impossibilidade de uma

única pessoa garantir o bom funcionamento da educação.

Saviani (2011, p. 113-114) aponta como sendo uma das

características básicas das reformas pombalinas a estatização e

secularização da administração do ensino “concentrando a gerência de

todos os assuntos ligados à instrução na figura do diretor geral de

46

Disponível em: <http://www.sg.min-edu.pt/pt/patrimonio-educativo/museu-

virtual/exposicoes/exposicao-documental-e-bibliografica/>. Acesso em: 20

mar. 2013. 47

Disponível em: <http://www.sg.min-

edu.pt/fotos/editor2/RDE/L/S18/1761_1770/1761_03_07_cartadelei.pdf>

Acesso em: 20 mar. 2013.

173

Estudos [...] cuja ação se estendia a todo o reino por meio de diretores

locais e comissários”, (o cargo fora criado em 1759). Conforme o

Alvará, todos os professores eram subordinados ao diretor de estudos.

Em 1824, Dom Pedro I outorgou a primeira Constituição do

Império do Brasil e nesta, entre duas menções sobre educação, uma é

sobre o direito à instrução primária e gratuita a todos os cidadãos. A Lei

Geral de 15 de outubro de 1827 trata da criação de “Escolas das

Primeiras Letras” e apesar de trazer algum detalhamento de como

seriam as escolas, não faz menção à sua administração. Segundo

Ananias (2012), esta é considerada a primeira lei da educação nacional

brasileira.

Ananias (2012, p. 57) apresenta que o Ato Adicional de 1834,

que introduzia alterações na Constituição de 1824, “descentralizou a

administração pública do país e, no campo da educação, tornou a

garantia da instrução primária gratuita um dever das províncias” fazendo

com que as províncias promovessem uma transição entre a estrutura

deixada pelo Governo Geral, com seu aproveitamento, e a que ocuparia

seu lugar.

Em 1846, São Paulo decretou a Lei Geral nº 34, que de acordo

com Ananias (2012, p. 58), “foi a primeira a propor a ordenação e a

fiscalização de toda a instrução pública” e regulamentou as matérias que

deviam ser ensinadas. Segundo a autora, a lei também previa a criação

de comissões inspetoras que deviam fiscalizar toda a rotina das escolas

(públicas ou particulares), dos alunos e dos professores, já que os

responsáveis pela escola eram os próprios professores, pela inexistência

do cargo de diretor.

O passo seguinte na legislação não demonstrou evolução no

sentido da gestão da escola; a Reforma Couto Ferraz48

de 1854 (sob o

governo do imperador D. Pedro II), segundo Saviani (2011), apresenta

uma concepção centralizadora no tocante ao aspecto administrativo,

atestada ao atribuir amplo papel ao inspetor geral, “ao qual se encontram

hierarquicamente subordinados os delegados de distrito” (BRASIL,

1854).

48

Decreto n. 1331-A de 17 de fevereiro de 1854 para a reforma do ensino

primário e secundário, elaborado pelo então ministro do Império Luiz Pedreira

de Couto Ferraz, o que a tornou conhecida como a Reforma Couto Ferraz. O

texto da reforma encontra-se disponível em:

<http://www.scribd.com/doc/35921498/Decreto-n-1331-A-1854-Reforma-

Couto-Ferraz>. Acesso em: 20 mar. 2013.

174

Na província de São Paulo, em 1847, segundo Ananias (2012), a

Lei nº 29 criou, para os dois liceus criados em 1846, o cargo de diretor,

que seria nomeado pelo governador, e que deveria

[...] tomar conta do liceu, inspecionar a conduta

dos professores, remeter ao presidente da

província os problemas e sugerir alterações para

mudanças, tanto na rotina do colégio como na

vida profissional de seus professores. Além disso,

deveria encaminhar anualmente um relatório

contendo: o estado moral e intelectual do liceu;

um mapa dos alunos frequentes, que declarasse os

aprovados, os reprovados e os que não fizeram os

exames, e especificasse os considerados

incorrigíveis; atestar a frequência dos

empregados; discutir em conselho, com os

professores, os problemas do liceu; repreender os

alunos; designar as horas das aulas; despachar os

requerimentos a ele destinados; marcar e presidir

a banca de exames dos alunos, escolhendo os

examinadores; conceder, quando necessário,

licença aos professores e aos porteiros; e por fim,

intermediar a correspondência entre os

professores e o presidente da província.

(ANANIAS, 2012, p. 59).

Percebe-se que a concepção de diretor era de um cargo

fundamentalmente fiscalizador, com algumas tarefas organizativas e

sem caráter formulador e propositor.

No Decreto Nacional n. 7.247 de 187949

, apareceu na legislação

nacional a figura do diretor, e o Artigo 9, §9, determinou que “Em cada

Escola Normal haverá um Diretor, que será nomeado d'entre as pessoas

que com distinção houverem exercido o magistério público ou

particular”. O diretor de escola ficaria abaixo do “Conselho diretor da

instrução primária e secundária do município da Corte”, dos inspetores

de distrito e do inspetor geral de ensino, numa hierarquia totalmente

centralizada e fiscalizadora. O Artigo 20, § 12, determinou que os

Diretores dos estabelecimentos de ensino superior teriam exercício por

dois anos e seriam nomeados pelo governo “d'entre as pessoas distintas

49

Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-

1899/decreto-7247-19-abril-1879-547933-publicacaooriginal-62862-

pe.html>. Acesso em 20 mar. 2013.

175

por merecimento literário que possuam o grau de doutor ou bacharel

pela respectiva Escola ou Faculdade ou outra da mesma natureza”

(BRASIL, 1879).

Ainda segundo Saviani (2011, p. 164), “a ideia de sistema

nacional de ensino se fez presente em todos os projetos de reforma

apresentados desde o final da década de 1860”, no entanto, só teve um

tratamento em âmbito nacional após a Revolução de 1930. Até aí, a

direção e a inspeção do ensino estavam sob a responsabilidade de um

inspetor geral, em todo o estado, auxiliado por dez inspetores escolares e

a fiscalização nos municípios era exercida pelos delegados ou

representantes das municipalidades. Nesse período, a ascensão da

importância do café na economia, o início da imigração, a abolição da

escravatura, o início do processo de industrialização, o crescimento da

urbanização, a necessidade de garantir a unidade nacional (contra as

revoltas regionais em curso) e a tentativa de configurar um mercado

interno e externo conformando a sociedade brasileira ao capitalismo

internacional foram elementos que mudaram a configuração da

sociedade e da política nacional, pautando objetivos para a educação e,

por consequência, maior rigidez na aplicação da regulamentação

nacional e maior fiscalização.

Segundo Ananias (2012, p. 70), “a constituição de uma economia

capitalista através de um lento processo de acumulação de capitais, de

diversificação da economia, de formação de um mercado de terras, de

produção e de consumo”, norteou os rumos da instrução pública, não

alterando-a do ponto de vista da administração, contribuindo para a

constituição da escola pública como a conhecemos atualmente. Segundo

a autora, deve-se ao período republicano a instituição oficial do “‘lugar’

das escolas, e a sua administração interna, por meio da criação dos

grupos escolares” (ANANIAS, 2012, p. 70).

Os republicanos atribuíam à escola uma importância central na

constituição da nova república, como instrumento de formação da ordem

e do progresso, e assim desenvolveram a preocupação com o método,

com o como ensinar para obter êxito na realização do objetivo de criar a

nova sociedade promissora. As primeiras reformas educacionais foram

voltadas às escolas normais, visando adequar a formação de professores

ao novo momento e às novas necessidades. Segundo Penteado e Neto

(2012), a constituição de 1891 era inspirada pelos ideais liberais norte-

americanos e tinha um caráter federalista, garantindo autonomia aos

estados, inclusive para a organização de seus sistemas de educação para

o ensino primário e normal, visto que o secundário e o superior eram de

competência da união.

176

No Rio Grande do Sul, como na política nacional, o governo

atuou criando condições para a expansão capitalista legitimado como

administrador do sistema público como se estivesse garantindo os

interesses coletivos da população. Segundo Corsetti (2002), os governos

positivistas que governaram o Rio Grande do Sul no período

republicano investiram parcela significativa do orçamento em educação

pública, embora o estado não utilizasse todos os recursos arrecadados,

sobrando até mais de 50% em determinados anos. Ocorria uma

manipulação das verbas, subestimando a receita, fazia-se

propositadamente que sobrassem recursos, pois, desvinculados do

orçamento, eram utilizados livremente para outros fins não previstos. A

partir de 1923, foram elencadas outras prioridades para o orçamento

público, que em termos relativos à arrecadação fez com que houvesse

uma redução das verbas destinadas à educação, destacando que eram

direcionadas também a escolas privadas. Segundo a autora, a política

orçamentária adotada no período demonstra o uso do orçamento público

“como um dos instrumentos legais manipulados pelo estado gaúcho, no

sentido da implementação de seu projeto de modernização capitalista do

Rio Grande” (CORSETTI, 2002, p. 209). Segundo Heinz (2009, p. 265),

no RS

[...] militantes republicanos e jovens militares,

notadamente aqueles de inclinação positivista,

partilhavam certa desconfiança em relação ao

liberalismo clássico das elites regionais

brasileiras, bem como a simpatia por um modelo

de ação pública que combinasse graus variados de

autoritarismo, intervenção estatal e dirigismo

econômico, como terminaria por ocorrer no Rio

Grande do Sul.

O autor relata que em 1897 foi inaugurada a Escola de

Engenharia de Porto Alegre, criada por um grupo de engenheiros,

conforme o projeto positivista comteano de universidade técnica, e nos

seus primeiros anos começou um forte movimento de expansão do qual

o governo do estado era parceiro, alocando recursos públicos em

abundância para financiar a construção de instalações da escola que se

esperava que desse a formação profissional para o desenvolvimento

econômico e tecnológico do estado, em consonância com os projetos e

as necessidades dos homens de estado. A Escola de Engenharia, por seu

caráter ideológico acabou por formar uma elite de políticos que

177

dirigiram o estado e suas políticas por vários anos, e ainda influenciam

fortemente com seus valores na atualidade. Conforme Werle (2005), em

1898 existiam 491 escolas públicas em funcionamento no estado do RS.

Heinz (2009, p. 274) faz uma análise de que

A Constituição estadual republicana de [...] 1891,

reconhecida como de ‘inspiração positivista’,

pode ser definida como de caráter ‘fundacional’

para os militantes republicanos do Rio Grande do

Sul. Ela definiu uma estrutura de poder fortemente

centralizada, autoritária, em que o parlamento

estadual tinha funções de análise e aprovação do

orçamento, e esteve por quatro décadas em claro

desacordo com a Constituição Federal Brasileira

em inúmeros pontos.

Na esfera nacional, o Decreto n. 3.890, de 190150

, em seu artigo

2º, determinou que “Cada estabelecimento será administrado por um

diretor, de livre escolha do Governo” e fez o detalhamento das funções

do diretor, que envolvem mais o aspecto administrativo, não havendo

uma função de direção política e de decisão da escola aliada à

administração (BRASIL, 1901).

Há um detalhamento das funções do diretor também no Decreto

n. 3.914 de 190151

, (que criou o Ginásio Nacional), colocando-o mais

como um fiscal, embora no Artigo 69, inciso IV aponte que cabe ao

diretor “Organizar o regimento interno do estabelecimento, o qual será

posto em execução depois de aprovado pelo Ministro” (BRASIL, 1901).

Em 1911, o Decreto n. 8.65952

, conhecido como Reforma

Rivadávia Côrrea, instituiu em seu artigo 2º: “Os institutos, até agora

subordinados ao Ministério do Interior, serão, de ora em diante,

considerados corporações autônomas, tanto do ponto de vista didático,

50

Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-

1909/decreto-3890-1-janeiro-1901-521287-publicacaooriginal-1-pe.html>.

acesso em: 20 mar. 2013. 51

Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-

1909/decreto-3914-23-janeiro-1901-503356-publicacaooriginal-1-pe.html>.

Acesso em: 20 mar. 2013. 52

Disponível em:

<http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/4_1a_Republ

ica/decreto%208 659%20-

%201911%20lei%20org%E2nica%20rivad%E1via%20correia.htm>. Acesso

em: 11 jan. 2014.

178

como do administrativo”; no artigo 5º previa a criação de um Conselho

Superior de Ensino que iria substituir a função fiscalizadora do Estado

pela função de estabelecer “as ligações necessárias e imprescindíveis no

regime de transição que vai da oficialização completa do ensino, ora

vigente, a sua total independência futura, entre a União e os

estabelecimentos de ensino”; e no artigo 6º, estabelece que

Pela completa autonomia didática que lhes é

conferida, cabe aos institutos à organização dos

programas de seus cursos, devendo os do Colégio

Pedro II revestir-se de caráter prático e libertar-se

da condição subalterna de meio preparatório para

as academias.

O artigo 21 previa que o diretor seria eleito pela congregação

para um mandato de dois anos, este não poderia ser reconduzido ao

cargo imediatamente após ao de seu mandato. A autonomia dos

estabelecimentos nas decisões administrativas e pedagógicas ficaria a

cargo do diretor. No entanto, a implantação não ultrapassou a

experiência do período que deveria ser de transição. Segundo Penteado e

Neto (2012), o Decreto n. 11.530 de 191553

, conhecido como Reforma

Carlos Maximiliano, veio para reverter a situação instaurada pela

reforma anterior. Este criou o Conselho Superior do Ensino, como “o

órgão consultivo do Governo e o seu auxiliar imediato para a

fiscalização dos institutos oficiais e dos equiparados a estes” (BRASIL,

1915); restabeleceu a função do diretor como fiscalizador, cassando as

competências e a autonomia estabelecidas anteriormente, decretando

que os diretores seriam escolhidos e demitidos pelo Presidente da

República.

O Decreto n. 16.782-a, de 192554

, conhecido como Reforma

Rocha Vaz, criou o Departamento Nacional do Ensino, porém

“Diretamente subordinado ao Ministério da Justiça e Negócios

Interiores” e reafirmou os diretores como administradores do patrimônio

dos estabelecimentos de ensino e reitera que serão demitidos e

nomeados pelo Presidente da República. Segundo Penteado e Neto

(2012, p. 83) “essa reforma, que retirou completamente a autonomia

53

Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1910-

1919/decreto-11530-18-marco-1915-522019-republicacao-97760-pe.html>.

Acesso em: 20 mar. 2013. 54

Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1910-

1929/d16782a.htm>. Acesso em 20 mar. 2013.

179

didática e administrativa que fora concedida em 1911, permitiu ao

governo controlar ideologicamente o sistema de ensino”.

Em 1931 (após o golpe de Estado que levou Getúlio Vargas ao

poder), pelo Decreto n. 19.40255

, foi criada “uma Secretaria de Estado

com a denominação de Ministério dos Negócios da Educação e Saúde

Pública” que fez a Reforma Francisco Campos. Segundo Andreotti

(2012), esta reforma centralizou o ensino superior na administração

federal, organizou o ensino secundário organizando-o em dois ciclos,

um fundamental de 5 anos e outro complementar, de 2 anos, este

voltado a algumas carreiras e ambos obrigatórios para o ingresso no

ensino superior e estruturou o ensino comercial nos níveis médio e

superior. Neste período, segundo Romanelli (2012, p. 199), o país viveu

a ruptura com o sistema oligárquico rural e cafeeiro e o prenúncio da

“implantação gradual da ordem social burguesa e da ordem econômica

industrial capitalista”, neste cenário, a educação era considerada

elemento central para o progresso e a reconstrução e desenvolvimento

nacional, bem como meio de ascensão social sendo assim cada vez mais

regulada e definida pelo Estado.

Em 1932 foi lançado o “Manifesto dos Pioneiros da Escola

Nova”56

, que entre outros princípios, defendia

[...] uma ampla autonomia técnica, administrativa e

econômica, com que os técnicos e educadores, que

têm a responsabilidade e devem ter, por isto, a

direção e administração da função educacional,

tenham assegurados os meios materiais para

poderem realizá-la.

Defendia também a descentralização. Saviani (2011, p. 294)

explica que no os dispositivos relativos à educação da Constituição de

1934 que foram reiterados na Constituição de 1946 e que

“desembocaram no projeto de diretrizes e bases da educação nacional

derivam do programa formulado no ‘Manifesto de 1932’”. Conforme

Saviani (2008), nas três primeiras décadas do século XX havia um

entusiasmo pela educação, a escola era pensada com uma função

55

Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-

1939/decreto-19402-14-novembro-1930-515729-publicacaooriginal-1-

pe.html>. Acesso em: 20 mar. 2013. 56

Disponível em:

<http://www.histedbr.fae.unicamp.br/revista/edicoes/22e/doc1_22e.pdf>.

Acesso em: 20 mar. 2013.

180

explicitamente política, o período foi rico em movimentos populares

reivindicando maior participação na sociedade e fazendo também

reivindicações do ponto de vista escolar, houve grandes agitações e a

crise de hegemonia das oligarquias dominantes, com várias greves

operárias e vários movimentos organizacionais, que entraram em refluxo

na década de 30, na qual, “de uma preocupação em articular a escola

como um instrumento de participação política, de participação

democrática, passou-se para o plano técnico-pedagógico” (SAVIANI,

2008, p. 42) acreditando-se que as coisas resolviam-se no plano interno

das técnicas pedagógicas. Saviani desmascara o caráter não democrático

e reacionário da Escola Nova, como a pedagogia das diferenças que

justificava os privilégios, e onde inclusive “o abandono da busca de

igualdade é justificado em nome da democracia” (SAVIANI, 2008, p.

39). Esta pedagogia, predominante no período, melhorou a qualidade do

ensino oferecido às elites e rebaixou o nível de ensino para a população,

se constituindo no instrumento pelo qual foi possível reestabelecer a

hegemonia da burguesia. Segundo o autor, neste período muitos

movimentos sociais abandonaram sua luta marxista, anarquista,

socialista de conclamar o povo para se organizar e reivindicar escolas

para os trabalhadores, e “todos os progressistas em educação tenderam a

endossar o credo escolanovista” (SAVIANI, 2008, p. 43) pelo

significado progressista que este tinha recebido socialmente.

A Constituição de 193457

determinou ser o Conselho Nacional de

Educação (criado pelo Decreto n. 19.850 de 193158

) responsável pela

elaboração do Plano Nacional de Educação, que não se realizou, uma

vez que seu projeto foi enviado para a Presidência da República em

1937, e em consequência da implantação do Estado Novo nem sequer

foi discutido. A Constituição também criou os Conselhos Estaduais e

departamentos autônomos de administração do ensino. Estabeleceu

como mínimo a ser investido em educação dez por cento para a União e

os municípios e vinte por cento para os estados; tornou o concurso

público obrigatório como meio de ingresso no magistério público, e

deixou a cargo dos estados a fiscalização e a regulamentação das

instituições de ensino. Trouxe avanços do ponto de vista organizativo,

57

Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao34.ht

m>. Acesso em: 20 mar. 2013. 58

Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-

1939/decreto-19850-11-abril-1931-515692-publicacaooriginal-1-pe.html>.

Acesso em 20 mar. 2013.

181

mas não regulamentou a gestão dos estabelecimentos de ensino – neste

momento já os grupos escolares – e manteve a centralização da

administração.

Segundo Romanelli (2012), dois grupos ideológicos se

enfrentavam nas Conferências Nacionais de Educação, cujas ideias se

expressaram nas constituições e reformas de 1930 a 1937: de um lado os

que promoviam e lideravam as reformas e o movimento inovador,

defendendo a laicidade, a obrigatoriedade do Estado de assumir a função

educadora e a coeducação, e por outro, os que, na maioria católicos,

combatiam os princípios citados. No Estado Novo (1937-1945),

segundo Andreotti (2012, p. 110)

[...] a formação escolar teve como eixo ideológico

o nacionalismo, o patriotismo e a difusão dos

princípios do projeto político-ideológico do

governo. [...] os livros escolares apregoavam o

trabalho e o patriotismo como valores absolutos.

Pautado por esta ideologia, o Decreto-Lei n. 4.244 de 194259

traz

um capítulo dedicado à administração escolar, centrada na figura do

diretor, prescrevendo eficiência nos serviços administrativos e

entendimento da direção com a família dos alunos no interesse da

educação destes. De acordo com Andreotti (2012) é deste período que

datam os primeiros estudos acerca da administração da escola60

. Estes

eram pautados nas teorias da Administração Geral, da administração de

empresas, buscando aproveitar princípios do fayolismo e taylorismo.

Segundo Gallindo e Andreotti (2012, p. 126), em decorrência da

Segunda Guerra Mundial há o declínio das potências europeias que dá

“lugar à ascensão dos Estados Unidos e da União Soviética e à divisão

do mundo em dois blocos distintos: o capitalista e o socialista”. É neste

período que são criadas a Organização das Nações Unidas para a

Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em 1945; o Fundo das

Nações Unidas para a Infância (UNICEF) em 1946; a Organização

Mundial de Educação Pré-Escolar (OMEP) em 1948; o Fundo

59

Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-

1949/decreto-lei-4244-9-abril-1942-414155-publicacaooriginal-1-pe.html>.

Acesso em 20 mar. 2013. 60

José Q. Ribeiro com o livro Fayolismo na Administração Escolar das

Escolas Públicas, de 1938; após, A. Carneiro Leão, com o livro Introdução à

Administração Escolar, de 1939; e mais tarde, novamente José Q. Ribeiro,

com o livro Ensaio de uma teoria de administração escolar, de 1952.

182

Monetário Internacional (FMI) e o Banco Internacional de Reconstrução

e Desenvolvimento (BIRD). No Brasil vivemos o período conhecido

como Nacional Desenvolvimentismo, de 1946 a 1964, no qual o país

adotou um modelo econômico de abertura ao capital estrangeiro e

utilizava a educação de forma política, visando a formação da força de

trabalho para contribuir com o processo de desenvolvimento em curso.

Sob a pressão popular,

[...] avançou-se no processo de popularização do

ensino, com o crescimento da escolarização básica

e a instalação de cursos [...] que permitiam que

maiores de 17 anos pudessem cursar o ginásio ou

concluir os estudos secundários ou o colegial”

(GALLINDO; ANDREOTTI, 2012, p. 131).

Data do ano de 1945 a fundação do Centro dos Professores

Primários Estaduais do RS, por iniciativa de um grupo de professoras,

este que se tornou a base do CPERS-Sindicato.

Em 194661

, O Decreto Nacional n. 8.589, em seu Artigo 36

determinou que:

Os diretores de escolas públicas primárias serão

sempre escolhidos mediante concurso de provas

entre professores diplomados, com exercício

anterior de três anos, pelo menos, e, de

preferência, entre os que hajam recebido curso de

administração escolar.

Ainda em 1946 foi promulgada uma nova Constituição, que,

segundo Gallindo e Andreotti (2012, p. 128), foi “elaborada por um

Congresso Nacional, no qual 80% dos membros eram representantes das

elites econômicas e do poder elitista autoritário”. Deste modo, também

não apresentou avanços em relação à democratização da gestão da

escola. Segundo as autoras, a Constituição estabeleceu que caberia à

União legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional. Foi

instaurada uma comissão de educadores de todo o país para a elaboração

de um anteprojeto de lei, o qual foi encaminhado à Câmara Federal em

outubro de 1948 como Projeto da primeira LDB. Devido ao embate de

61

Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-

1949/decreto-lei-8529-2-janeiro-1946-458442-publicacaooriginal-1-pe.html>.

Acesso em: 20 mar. 2013.

183

opiniões, o projeto foi sendo alterado e só foi votado em dezembro de

1961.

Segundo Sander (2008), nas décadas de 1950 e 1960 houve a

consolidação das ações das agências internacionais (OEA, UNESCO,

BID e BM) na América Latina,

[...] no bojo da corrente desenvolvimentista da

administração do Estado e do poderoso

movimento internacional da economia do bem-

estar social e, no campo do ensino, da economia

da educação e suas áreas correlatas, alimentadas

pela ideologia que inspirou os programas do Plano

Marshall e da Aliança para o Progresso [...]. É à

luz da lógica econômica que caracterizou esses

movimentos que surgiu o planejamento da

educação, impulsionado pelos organismos

internacionais de cooperação técnica. (SANDER,

2008, p. 161).

O autor explica o caráter que a educação toma a partir de 1962,

com a reunião dos ministros de educação dos países da América Latina,

em que, com o patrocínio da OEA (Organização dos Estados

Americanos), UNESCO (Organização das Nações Unidas para a

educação, a ciência e a cultura) e CEPAL (Comissão Econômica para a

América Latina e o Caribe), “consagraram o papel da educação como

fator de desenvolvimento econômico, instrumento de progresso técnico

e meio de seleção e ascensão social” (SANDER, 2008, p. 161).

Em 1959, segundo Saviani (2011, p. 342-343), foi fundado o

Instituto Brasileiro de Ação Democrática, “a primeira organização

empresarial especificamente voltada para a ação política” cuja

“finalidade explícita era combater o comunismo” e “financiada por

grandes empresas nacionais e internacionais, especialmente norte-

americanas” num movimento de contenção da mobilização popular das

Ligas de Camponeses, dos sindicatos de operários, das organizações de

estudantes e dos movimentos de cultura e educação popular. Ainda

segundo o autor, em 1961 foi fundado o Instituto de Pesquisas e Estudos

Sociais (IPES), também resultado de uma articulação de empresários

nacionais e multinacionais com a Escola Superior de Guerra, que

Em suas ações ideológica, social e político-

militar, o IPES desenvolvia doutrinação por meio

de guerra psicológica fazendo uso dos meios de

184

comunicação de massa como o rádio, a televisão,

cartuns e filmes em articulação com órgãos da

imprensa, entidades sindicais dos industriais e

entidades de representação feminina, agindo no

meio estudantil, entre os trabalhadores da

indústria, junto aos camponeses, nos partidos e no

Congresso, visando a desagregar, em todos esses

domínios, as organizações que assumiam a defesa

dos interesses populares. (SAVIANI, 2011, p.

342).

Neste ambiente hostil à democracia, em 1961 foi publicada a

primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional62

. Esta, no que

concerne à administração, manteve a administração centralizada, nesse

momento no Conselho Federal de Educação, com normas fiscalizadas

pelos conselhos estaduais. Porém, representou um avanço na

participação da população no debate educacional de sua elaboração,

manifesto nos movimentos populares pela educação dos anos 60.

De acordo com Gallindo e Andreotti (2012, p. 138),

Em relação à administração escolar no país, até os

anos de 1960, ainda não havia sido produzido um

corpo teórico que desse suporte às suas

necessidades ou que permitisse avançar nas áreas

de organização do sistema ou da estrutura da rede

escolar. Para adequar-se às condições sociais do

momento e às demandas da sociedade, como

também ao que a legislação impunha como

formação especializada em administração escolar,

entre outros aspectos, assumiu os princípios da

teoria geral da administração.

Segundo as autoras, a divisão entre execução e planejamento do

trabalho passou a ser aplicada como nas empresas capitalistas. O

planejamento educacional era feito por instâncias dos governos federal,

estaduais e municipais e os professores deveriam executar o trabalho. A

administração de escola tinha o papel de mediar este processo através do

diretor, uma figura com autoridade, porém sem autonomia e afastado da

ação pedagógica pelo formato burocrático da administração, em que

62

Disponível em:

<http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=75529&no

rma=102346>. Acesso em: 20 mar. 2013.

185

passa a assumir as funções de gerenciamento e supervisão. Em São

Paulo a escolha do diretor já se dava através de concurso desde 1941, de

títulos e provas sobre conteúdos da administração, forçando que os

candidatos fossem formados na área.

Em 1961 foi criada a Associação Nacional de Professores de

Administração Escolar (ANPAE), que em 1971 mudou para Associação

Nacional de Profissionais de Administração Escolar, e após outras

alterações, em 1996, passou a denominar-se Associação Nacional de

Política e Administração da Educação sob a mesma sigla ANPAE,

entidade que continua atuante e que se define como

[...] uma associação civil de utilidade pública e

natureza acadêmica no campo da política e da

gestão da educação, que congrega pesquisadores,

docentes e estudantes de educação superior;

dirigentes e técnicos dos sistemas de ensino; e

professores e diretores de escolas e outros espaços

sociais de educação e formação cidadã (ANPAE,

2014)63

.

Em 1962, o Conselho Federal de Educação regulamentou a LDB,

que determinava que o diretor de escola devia ter idoneidade moral e ser

educador qualificado, reconhecendo como diretor qualificado

[...] aquele que reunir qualidades pessoais e

qualidades profissionais, compondo uma força

capaz de infundir à escola a eficácia do

instrumento educativo por excelência e de

transmitir a professores, a alunos e à comunidade

sentimentos, ideias e aspirações de vigoroso teor

cristão, cívico, democrático e cultural.

(TABACCHI, 1979, p. 48 apud GALLINDO;

ANDREOTTI, 2012, p. 142).

Em decorrência do parecer, os cursos de Pedagogia começaram a

ter maior número de matrículas. Segundo Gallindo e Andreotti (2012),

em 1963, Lourenço Filho publicou o livro Organização e Administração

Escolar, planejado para ser um curso básico de administração foi

63

Disponível em: <http://www.anpae.org.br/website/sobre-a-anpae/identidade>.

Acesso em: 15 maio 2014.

186

amplamente adotado nos cursos de formação de administradores

escolares.

Ainda em 1962, foi elaborado o primeiro Plano Nacional de

Educação, não como lei, mas como uma iniciativa do MEC, aprovada

pelo Conselho Federal de Educação, “Era basicamente um conjunto de

metas quantitativas e qualitativas a serem alcançadas num prazo de oito

anos” (BRASIL, 2001).

Em 1964, o Brasil passou a viver sob o golpe civil-militar e a

implantação da ditadura como resposta às chamadas ameaças

comunistas. Os direitos civis foram cassados, e a repressão tentava

esmagar qualquer reação ao sistema, incluindo as manifestações

estudantis e de professores, especialmente as voltadas à democratização

da educação. A educação passou a ser objeto de vigilância permanente e

de censura e, como mais uma forma de conter as reações contrárias a

hegemonia do capital, no momento sob o comando do imperialismo

estadunidense, entraram em cena os acordos MEC-USAID (Ministério

da Educação e Cultura - United States Agency for International

Development), em decorrência da Doutrina Truman64

, implementada

pelos Estados Unidos a partir de 1947. Podemos resumir estes acordos

numa tentativa de eliminar qualquer traço de autonomia da educação,

aplicando, entre outras medidas, a formação de docentes para o

distanciamento da atividade política, a desmobilização dos estudantes

com campanhas moralistas, a privatização das universidades e inserção

da lógica mercantil visando à preparação dos estudantes para o trabalho

numa visão tecnicista e esvaziada de conteúdos científicos.

Em 1965 houve uma revisão no Plano Nacional de Educação, ao

qual “foram introduzidas normas descentralizadoras e estimuladoras da

elaboração de planos estaduais” (BRASIL, 2001), e em 1966 uma nova

revisão introduziu “alterações na distribuição dos recursos federais,

beneficiando a implantação de ginásios orientados para o trabalho e o

atendimento de analfabetos com mais de dez anos” (BRASIL, 2001).

64

Segundo Clark; Nascimento e Silva (2012, p. 150, nota) “A doutrina Truman

sintetiza a política externa dos Estados Unidos implementada em 1947 com o

principal objetivo de conter o expansionismo soviético. Em 1949, foi

anunciado o Ponto IV, que trata da assistência e cooperação com as ‘áreas

subdesenvolvidas’, como parte de um programa em favor da paz e liberdade”.

187

Sob a ditadura civil militar, após o golpe de 1964, foi promulgada

a Constituição Federal de 196765

, que ao tratar das competências da

União, citou a de estabelecer planos nacionais de educação e de saúde, e

de legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional.

No Rio Grande do Sul, em 1966, segundo CPERS (199-), o

Decreto 17.76166

determinou eleição de diretores nas escolas estaduais

que contavam com um mínimo de trinta professores em seu quadro, por

indicação de lista tríplice a ser encaminhada para o governo fazer a

escolha final, decreto este cassado em 1968 com a vigência do Ato

Institucional n. 567

. Em 1969, a Lei Estadual 5.75168

determinou a

criação de um órgão colegiado, constituído pela maioria de professores,

para atuar com o diretor da escola na administração de recursos e

técnico-pedagógica, demonstrando que a legislação quanto à gestão da

escola pública estadual gaúcha vinha em certa medida se desenvolvendo

na contramão do movimento da política nacional.

Segundo Kuenzer (1984, p. 41), a partir de 1968, teve profunda

influência na administração educacional a teoria dos sistemas, gerando

inúmeros estudos “baseados em avaliação das necessidades de mão-de-

obra na linha da economia da educação, nas análises de custo benefício,

e sugestões para a utilização PPBS, PERT e CPM”69

.

65

Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao67.ht

m>. Acesso em: 26 mar. 2013. 66

Não consta nas referências uma vez que a informação foi obtida num

documento reprográfico de um memorial do CPERS-Sindicato, [199-]. 67

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-05-68.htm>.

Acesso em 20 mar. 2013. 68

Disponível em: <http://www.edulaica.net.br/artigo/163/legislacao/legislacao-

estadual/rio-grande-do-sul/lei-575169/>. Acesso em: 20 set. 2013. 69

PPBS – Planning, Programming, and Budgeting System – é uma forma de

gerenciamento do orçamento baseada na integração de várias técnicas de

planejamento, programação e definição de custos e vinculação dos recursos às

prioridades e estratégias estabelecidas, e prever custos, gastos e a realização

dos objetivos. Disponível em: <

http://en.wikipedia.org/wiki/Output_budgeting>. Acesso em: 23 maio 2014.

Mais informações: CULAU, Ariosto Antunes. Planejamento e orçamento

como instrumentos de gestão. Disponível em:<

http://novo.fundap.sp.gov.br/egap/PAvGestaoPublica/material/PLAN_ORC_

AAC.doc>. Acesso em: 23 maio 2014. PERT – Program Evaluation and

Review Technique – modelo de rede que permite aleatoriedade nos tempos de

conclusão das atividades para reduzir tempo e custo na conclusão de um

projeto. CPM – Critical Path Method – desenvolvido em 1957 como um

188

Em 1971, ainda sob a ditadura civil-militar, foi publicada a Lei

5.692, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)70

. Saviani

(2008) critica esta LDB pelo seu princípio de flexibilidade, que,

segundo ele, faz com que ela nem precise ser implantada, aponta ainda

que esta flexibilização avaliza o ensino público desqualificado e

aligeirado para as camadas populares, podendo “ser aligeirado até o

nada, até se desfazer em mera formalidade” (SAVIANI, 2008, p. 44). A

LDB, que vigorou até 1996, trazia em seu Capítulo I, Do Ensino de 1º e

2º Graus, Artigo 2º, parágrafo único, que

A organização administrativa, didática e

disciplinar de cada estabelecimento do ensino será

regulada no respectivo regimento, a ser aprovado

pelo órgão próprio do sistema, com observância

de normas fixadas pelo respectivo Conselho de

Educação. (BRASIL, 1971).

Nesta legislação, não havia a previsão de quem elaboraria o

regimento da instituição educacional, deixando assim abertura para

participação democrática, mas também espaço para elaborações

autoritárias pelos próprios órgãos governamentais e suas representações

na administração da escola. Quanto ao conteúdo, há alguma liberdade,

porém muito limitada, em relação às decisões centralizadas do Conselho

Federal de Educação.

O Artigo 5º, § 2º, b, e no Artigo 6º (BRASIL, 1971), traziam o

atrelamento do ensino ao mercado de trabalho local ou regional,

limitando as possibilidades de decisão e escolha na formação. Os

critérios de aproveitamento também eram definidos de forma

verticalizada, sem nenhuma participação da comunidade. A elaboração e

execução de planos nacionais de educação continuavam centralizadas no

governo, visando atender às diretrizes e normas do Plano Geral do

Governo, e não buscando sanar as necessidades e realizar os projetos da

população a qual deveria participar de sua elaboração.

A comunidade foi citada pela primeira vez quando se buscava

colaboração para serviços de assistência, no artigo 62. A administração

modelo de rede para gestão de projetos. Fixava um tempo específico para cada

atividade. Disponível em: <

http://www.netmba.com/operations/project/pert/>. Acesso em: 26 maio 2014. 70

Disponível em: <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5692.htm>. Acesso em:

20 mar. 2013.

189

da educação e das escolas também continuou distante da população,

assim regulamentada: Art. 70. As administrações dos sistemas de ensino

e as pessoas jurídicas de direito privado poderão

instituir para alguns ou todos os estabelecimentos

de 1º e 2º graus por elas mantidos, um regimento

comum que, assegurando a unidade básica

estrutural e funcional da rede, preserve a

necessária flexibilidade didática de cada escola

(BRASIL, 1971).

Houve uma aparente descentralização do poder, em nome dos

Conselhos Municipais, mas não à população através de sua participação

direta, expressa no Artigo 71: “Os Conselhos Estaduais de Educação

poderão delegar parte de suas atribuições a Conselhos de Educação que

se organizem nos Municípios onde haja condições para tanto”

(BRASIL, 1971).

Sobre a direção dos estabelecimentos de ensino, quase não havia

menções, apenas estabelecia, no Artigo 79, que na falta de “profissionais

legalmente habilitados para o exercício das funções de direção dos

estabelecimentos de um sistema, ou parte deste” (BRASIL, 1971) seria

permitido que professores com habilitação para o mesmo grau escolar e

com experiência de magistério assumissem a direção; o que denota a

exigência de uma formação específica para diretor de escola. A LDB

fazia também a exigência de os estabelecimentos adaptarem seu

regimento e o submeterem à aprovação dos conselhos de educação.

A legislação educacional brasileira sofria as influências das

decisões e políticas externas de educação. Sander (2008) apresenta

algumas das políticas internacionais para a educação no Brasil e relata

que uma das áreas de maior interesse para a OEA era a administração da

educação e as áreas de supervisão e orientação escolar, relacionadas a

ela. A partir dos anos 1970, a OEA, em conjunto com universidades da

Argentina, Brasil, Colômbia, Chile, México, Panamá, Peru e Venezuela,

patrocinou um extenso programa de formação de administradores e

planejadores educacionais, ao mesmo tempo em que apoiou o

estabelecimento de unidades específicas de planejamento nos

Ministérios e Secretarias de Educação. A adoção da sistemática de

planos anuais, trienais, quinquenais e decenais de desenvolvimento

pelos Ministérios de Economia e Planejamento também remontam a este

período. Segundo o autor,

190

[...] uma das primeiras e reiteradas propostas de

reforma educacional auspiciadas pela UNESCO

enfocava a descentralização na gestão da

educação, de inspiração liberal, mas combinada

com um sistema de planejamento baseado na

planificação central dos países socialistas.

(SANDER, 2008, p. 161).

Segundo Medeiros e Luce (2006?, p. 1) é na década de 70 que

inicia o principal debate sobre a gestão escolar,

[...] quando a luta da classe trabalhadora pelo

direito de seus filhos à escola pública impõe a

reflexão sobre os motivos da falta de vagas, das

altas taxas de reprovação e do consequente

abandono escolar, assim como das condições

precárias nas instalações escolares e da

profissionalização do magistério.

Segundo as autoras, em consequência dessas lutas, nos anos 80,

os professores das redes de ensino estaduais começaram a se organizar

em sindicatos e a conquistar planos de carreira e valorização da

formação e passaram a questionar a organização da administração da

escola feita de forma hierárquica e burocrática, e a denunciar o uso das

escolas para apadrinhamentos políticos.

Nesse período de ditadura, de ausência de direitos democráticos,

de repressão e de exclusão, a escola, como reflexo da sociedade e do

mundo do trabalho, era refém de relações hierarquizadas, de obediência

e submissão, com o poder centralizado e pautado na fiscalização e

controle. Os sindicatos de professores, recém criados, envolveram-se na

luta pela democratização atuando nos movimentos contrários à ditadura

que efervesciam na sociedade. Neste rumo posicionou-se a primeira

greve do CPERS (na época Centro dos Professores do Estado do Rio

Grande do Sul, hoje Sindicato dos Trabalhadores em Educação) em

1979. Sendo a primeira categoria no RS e a segunda no país a entrar em

greve após o golpe de 1964, conseguiu pautar o governo de Amaral de

Souza (ARENA) na criação de uma comissão para elaboração de um

projeto de lei de gestão democrática do ensino e o direito à participação

do sindicato no Conselho Estadual de Educação representando os

professores, além de 70% de aumento salarial e a nomeação de 20 mil

professores concursados. Segundo Medeiros e Luce (2006?, p. 1), é

nesse período (década de 1980), “[...] no bojo da ampla luta pela

191

democracia que se formula, entre nós, a noção de gestão democrática da

educação, compreendendo a gestão democrática na educação” (grifo das

autoras).

A Lei 8.025 e o Decreto 32.002, ambos de 1985, conforme

CPERS (199-), durante o governo de Jair Soares (PDS), foram frutos

das negociações da greve, e trouxeram a eleição de diretores para as

escolas (através de lista tríplice), com voto de professores, servidores,

pais e alunos (estes acima de 14 anos), representando mais uma

possibilidade de avanço na democratização da gestão escolar.

Esta conquista também foi reflexo das novas políticas

internacionais que estavam se delineando. Em 1984, segundo Sander

(2008, p. 162), os ministros de educação da América Latina e Caribe,

organizados no âmbito da UNESCO, OEA e outros organismos

internacionais, “passam a focalizar a necessidade de implantar novas

estratégias de gestão dos sistemas educacionais, baseadas na

modernização institucional e na eficiência econômica”. Assim os

sistemas educacionais vão criando formas de buscar consenso em torno

de suas propostas através de pequenas concessões.

Em 1987 teve início o Fórum Nacional em Defesa da Escola

Pública, composto por entidades científicas, acadêmicas, profissionais,

sindicais, estudantis e movimentos populares de âmbito nacional, com o

objetivo de atuar na constituinte defendendo a universalização da

educação pública, gratuita, laica, com qualidade social, em todos os

níveis. O Fórum elaborou e apresentou ao Congresso Nacional em 1988

um projeto de Plano Nacional de Educação representando a proposta da

sociedade brasileira (que não se concretizou como Plano) com

princípios e propostas que continuam sendo defendidos na atualidade.

Segundo o autor (SANDER, 2008), em 1987 com o final das

ditaduras civil-militares, a UNESCO adotou os conceitos de democracia

e participação para a gestão da educação latino-americana. Neste mesmo

ano, o magistério novamente entrou em greve, e contou com o apoio dos

diretores de escola eleitos em 1985, que inviabilizaram o controle e a

punição aos professores grevistas por parte da Secretaria Estadual de

Educação (SEC). Em medida retaliatória, a SEC destituiu os diretores e

instaurou processos administrativos contra estes. Por força do

movimento grevista, em acordo de final de greve, os diretores foram

reconduzidos aos cargos e os processos anulados71

. Mais uma conquista

71

Informações de registros de memória do CPERS-Sindicato, em documento

mimeografado e sem data.

192

imediata do movimento do coletivo dos trabalhadores organizados no

sindicato, significativa para o avanço da consciência política.

No final da década, a UNESCO mudou a direção de suas

políticas, e

prepara o caminho para a adoção de uma agenda

educacional de cunho predominantemente liberal,

utilizando, pela primeira vez, o conceito de

accountability ou responsabilidade social e

recomendando uma revisão em profundidade dos

estilos de organização e gestão educacional na

América Latina e no Caribe. (SANDER, 2008, p.

162).

Esta reformulação da política educacional vai trazer

consequências para os movimentos de democratização da escola pública

no Brasil, cujo desenvolvimento expomos a seguir.

4.2 O PERÍODO DE CONSTRUÇÃO DO CAMPO DEMOCRÁTICO

E A GESTÃO DA ESCOLA PÚBLICA NO COMPASSO OU

CONTRAPASSO DA LEGISLAÇÃO E DAS REFORMAS

Nas décadas de 1980 e 1990 foi o período em que organizações

de educadores como CEDES (Centro de Estudos Educação e Sociedade

– fundado em 1978), ANDE (Associação Nacional de Educação –

fundada em 1979) e ANPED (Associação Nacional de Pós-Graduação e

Pesquisa em Educação – fundada em 1977), entre outras, exerciam

enorme pressão social por suas críticas ao modelo educacional tecnicista

que vinha sendo implantado, e, por via das Conferências Brasileiras de

Educação (CBE) foram conseguindo alargar os horizontes democráticos.

Em 1986, na IV Conferência Nacional de Educação, com mais de 5 mil

educadores participantes, foi elaborada a Carta de Goiânia72

cujos

princípios eram:

[...] educação escolar como direito de todos,

gratuita e laica, em estabelecimentos públicos;

ensino fundamental obrigatório, com duração de

oito anos; o Estado garantindo à sociedade civil o

72

O texto completo da Carta de Goiânia está disponível em:

<http://www.cedes.unicamp.br/carta_goiania.pdf>. Acesso em: 23 maio 2014.

193

controle da execução da política educacional (em

todos os níveis de governo, por meio de

organismos colegiados, constituídos

democraticamente); o Estado assegurando formas

democráticas de participação e mecanismos que

garantam o cumprimento e o controle social

efetivo de suas obrigações referentes à educação

pública, gratuita e de boa qualidade, em todos os

níveis de ensino. (OLIVEIRA, 2007, p. 29-30).

Em 1988, com o início da abertura democrática conquistada com

os grandes movimentos estudantis, sindicais e populares, foi

promulgada a Constituição Federal, que foi forçada a expressar um

pouco do sentimento e desejo da população brasileira daquele momento.

Segundo Vieira (1992), não foram todas as reivindicações populares que

foram atendidas, mas as que o grupo dirigente daquele momento

histórico considerou aceitáveis, e que o fato de os dirigentes adotarem

bandeiras originárias da classe trabalhadora demonstrava a necessidade

de manter a dominação política e não necessariamente o desejo de

garantir melhorias nas condições humanas. O Artigo 206, em seu inciso

VI, contemplou como princípio da educação a “gestão democrática do

ensino público” (BRASIL, 1988). A partir de então, com a

obrigatoriedade de reformulação das constituições estaduais, este

preceito foi se repetindo e tomando corpo na legislação, mesmo que na

prática já fosse em parte aplicado em alguns estados. Estabeleceu ainda

em seu artigo 214 que o Plano Nacional de Educação deveria ser

regulamentado por lei, que deveria ter uma duração plurianual,

visando à articulação e ao desenvolvimento do

ensino em seus diversos níveis e à integração das

ações do poder Público que conduzam à:

I - erradicação do analfabetismo;

II - universalização do atendimento escolar;

III - melhoria da qualidade do ensino;

IV - formação para o trabalho;

V - promoção humanística, científica e

tecnológica do País. (BRASIL, 2001).

Zanardini (2006, p. 105) nos dá a ideia de que esta possibilidade

foi incluída na legislação com o intuito de responsabilizar a comunidade

pelo fracasso da educação, já que “numa perspectiva centralizada de

194

gestão, a comunidade não poderia ser cobrada/responsabilizada por

objetivos que ela não ajudara a formular”.

Em 1989, a Constituição Estadual (RIO GRANDE DO SUL,

1989, Art. 197, VI) estabeleceu como princípio do ensino “a gestão

democrática do ensino público”, e que “As escolas públicas estaduais

contarão com conselhos escolares, constituídos pela direção da escola e

representantes dos segmentos da comunidade escolar, na forma da lei”

(RIO GRANDE DO SUL, 1989, Art. 213). Estabeleceu também que “os

diretores das escolas públicas estaduais serão escolhidos mediante

eleição direta e uninominal, pela comunidade escolar” (RIO GRANDE

DO SUL, 1989, Art. 213, § 1º)73

e que “Os estabelecimento públicos de

ensino estarão à disposição da comunidade, através de programações

organizadas em comum” (RIO GRANDE DO SUL, 1989, Art. 213, §

2º). Além disso, regulamentou que

É assegurado aos pais, professores, alunos e

funcionários organizarem-se, em todos os

estabelecimentos de ensino, através de

associações, grêmios ou outras formas.

Parágrafo único - Será responsabilizada a

autoridade educacional que embaraçar ou impedir

a organização ou o funcionamento das entidades

referidas neste artigo. (RIO GRANDE DO SUL,

1989, Art. 212).

De acordo com Amaral (2006, p. 67), nessa constituição “a

gestão democrática da educação é constituída por um tripé: participação

da comunidade escolar, autonomia escolar com o repasse de verbas para

a manutenção e a conservação da escola e eleição para diretor”.

Representa uma grande possibilidade de organização para a classe

trabalhadora, que poderia utilizar o ambiente escolar para sua

organização na construção de proposições e organização da luta pela

educação pública de qualidade, bem como na organização da própria

escola. No entanto, a lei que expressa o desejo das camadas populares

esbarra nos limites dos determinantes impostos pela sociedade do

capital.

Em 1990, assumiu o poder o primeiro presidente eleito por voto

direto da população após o período da ditadura civil-militar de 1964:

Fernando Collor (PRN). Governos como de Thatcher na Inglaterra,

73

Foi declarada a inconstitucionalidade do dispositivo na ADI n.º 578, DJU, 18

maio 2001.

195

Reagan nos Estados Unidos, haviam aberto a ofensiva neoliberal na

política mundial. Collor espelhou-se nestes ao defender a privatização,

reformas do Estado, abertura da economia para a concorrência

internacional, redução dos órgãos públicos e demissão de funcionários,

medidas que provocaram profunda recessão e desemprego. Assumiu a

pauta do Consenso de Washington74

, aplicando as reformas prescritas

pelo ideário neoliberal, como a reforma educacional, a reforma da

previdência, a reforma trabalhista e a reforma administrativa ou reforma

do Estado. Segundo Sander (2008), após a queda do muro de Berlim, os

Estados Unidos ganharam força na formulação de políticas

internacionais e na condução da economia e das políticas sociais. A

globalização é orientada a todos os setores da atividade humana. O

projeto neoliberal de educação orienta a Conferência Mundial de

Educação para Todos de 199075

, redefinindo as prioridades de projeto da

UNESCO e da OEA, que na gestão da educação na América Latina

passam a priorizar, “de um lado, a descentralização e a autonomia local

e os critérios clássicos de eficiência e eficácia administrativa, e de outro,

a articulação entre educação e política social para apoiar as populações

mais carentes” (SANDER, 2008, p. 162). Estas reformas, segundo

Riscal (2009), embora com aparência democratizante, fazem parte de

um conjunto mais amplo de políticas educacionais pautadas pela

racionalidade econômica, nas exigências de produtividade,

competitividade e empregabilidade.

Sander (2008) considera o lançamento do livro Educação e conhecimento: transformação produtiva com equidade, em 1992, pela

74

Consenso de Washington é um conjunto de medidas - que se compõe de dez

regras básicas - formulado em novembro de 1989 por economistas de

instituições financeiras situadas em Washington D.C., como o FMI, o Banco

Mundial e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, fundamentadas

num texto do economista John Williamson, do International Institute for

Economy, e que se tornou a política oficial do Fundo Monetário Internacional

em 1990, quando passou a ser "receitado" para promover o "ajustamento

macroeconômico" dos países em desenvolvimento que passavam por

dificuldades. Disponível em:

<http://pt.wikipedia.org/wiki/Consenso_de_Washington>. Acesso em 22 mar.

2013. 75

O documento resultante da Conferência Mundial, Declaração Mundial sobre

Educação para Todos: satisfação das necessidades básicas de aprendizagem,

encontra-se disponível em:

<http://unesdoc.unesco.org/images/0008/000862/086291por.pdf>. Acesso em:

23 maio 2014.

196

CEPAL e UNESCO, um divisor de águas que redefine a agenda política

e ideológica na educação na América Latina, onde UNESCO, OEA e

CEPAL abandonam a teoria da dependência e adotam o paradigma da globalização, procurando equacionar os princípios de competitividade e

equidade. Segundo o autor, esta redefinição exige “reformas

institucionais dos sistemas de ensino, visando fomentar a modernização,

a descentralização administrativa e a competitividade no contexto do

mundo globalizado” (SANDER, 2008, p. 162). O autor afirma que “esse

foi o momento da ruptura com o passado e a adoção definitiva da

agenda liberal no âmbito das organizações internacionais e que se

mantém até hoje” (SANDER, 2008, p. 162).

Leher, referindo-se ao período pós-ditadura civil-militar,

contribui de forma esclarecedora sobre como se dá a hegemonia do

pensamento neoliberal sobre a educação, explicando que

[...] a partir do final das duas últimas décadas do

século XX, o braço da balança voltou a pender

para o lado particularista do capital e do Estado,

impondo transformações muito profundas na

educação da classe trabalhadora. A perspectiva

universalista, de que a escola pública deveria

assegurar uma formação geral a todos os

estudantes por meio da garantia, pelo Estado, da

educação pública, gratuita e estruturada em

sistemas nacionais, foi combatida em prol de

políticas focalizadas, referenciadas na pedagogia

das competências, atributos utilitaristas que

objetivam a adaptação das crianças e jovens ao

ethos capitalista e, mais precisamente, ao

chamado novo espírito do capitalismo flexível,

referenciado no trabalho super explorado e

precário. (LEHER, 2012, p. 3).

O autor (LEHER, 2012), analisando retrospectivamente o

período, explica que nos países dependentes a expansão da oferta de

escola pública é acompanhada pelo esvaziamento dos conteúdos

científico, histórico-cultural, tecnológico e artístico, transformando a

escola para adaptá-la ao padrão de acumulação em curso.

Nesse período, valores e princípios da empresa capitalista foram

inseridos na pedagogia e na organização dos conteúdos escolares, bem

como na forma de educar e na gestão da escola, que devem preparar o

197

trabalhador para as novas formas de exploração. Segundo Neves (2008,

p. 52),

A educação escolar brasileira, na primeira metade

dos anos 1990, por sua vez, foi redefinindo, pouco

a pouco, seus objetivos, transformando-se em

veículo de uma certa “qualidade total”, ou seja,

em instrumento de disseminação de um conjunto

de elementos cognitivos e comportamentais

destinados a aumentar a competitividade e a

produtividade empresariais nessa nova fase do

capitalismo monopolista.

Aparentemente na contramão do movimento (pois a essência

confirma que era um movimento de concessão necessário para a busca

de consenso e implantação do programa do capital), o governo gaúcho

Sinval Guazzelli (PMDB) publicou em 1991 as leis 9.232 e 9.233,

dando poder consultivo, deliberativo e fiscalizador como órgão máximo

de discussão dentro da escola aos conselhos escolares (que seriam

constituídos por eleição direta), e determinando a eleição de diretor

uninominal e por chapas, elegendo também os vice-diretores (RIO

GRANDE DO SUL, 1991a, 1991b). Cabe apontar que o projeto de lei

havia sido elaborado por uma comissão de entidades representativas da

comunidade gaúcha, da qual o CPERS-Sindicato fez parte, participação

conquistada através de luta pela pauta de sua campanha salarial, aceita

pelo governo como tentativa de buscar acordo e consenso com o

sindicato de professores, fortemente organizado e mobilizado. Ainda no

mesmo ano, mas com Alceu Collares (PDT) no governo, as leis

anteriores foram alteradas pelas leis 9.262 e 9.263 (RIO GRANDE DO

SUL, 1991c, 1991d). Os diretores seriam eleitos individualmente e não

mais em chapas e escolheriam os vice-diretores após a eleição; o

conselho escolar passaria a ter função consultiva. As novas leis foram

motivo de protestos nas escolas e, em consequência, objetos de uma

Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) pelo próprio governo que

questionava a eleição, uma vez que considerava o diretor como seu

cargo de confiança.

Itamar Franco, em 1992, assumiu como presidente após o

impeachment e renúncia de Collor. Manteve a mesma direção política,

de desobrigação do Estado com a educação, e com os discursos de

desburocratização iniciou o processo de descentralização. Este período

foi de um governo de introdução das políticas neoliberais, que facilitou

198

a realização das reformas pelo governo de Fernando Henrique Cardoso e

subsequentes.

No RS, segundo Amaral (2010, p. 77), nesse período é que

surgem as parcerias público-privadas, divulgando a filosofia e os

princípios da qualidade dos processos e dos produtos para as empresas,

o que resultou na estruturação do Programa Gaúcho de Qualidade e

Produtividade, a partir de 1992, com a meta inicial de que no ano 2000

“a metade das pessoas em atividade no estado estivessem usando as

ferramentas e os conceitos da Qualidade Total”, acirrando a

competitividade.

Em 1995, assumiu como presidente Fernando Henrique Cardoso

(FHC) (PSDB), que manteve o rumo do governo e das políticas

educacionais. FHC aprofundou as políticas neoliberais no contexto geral

e educacional, e com isto, pôs em prática políticas e ações de

aprofundamento das privatizações (que no setor educacional se

realizaram através de terceirizações e parcerias), de precarização da

escola pública incentivando o investimento da iniciativa privada, de

redução dos serviços públicos, de ampliação das terceirizações, de

reforma do Estado e de implantação do Estado mínimo para a

população. Utilizando-se do discurso da crise do Estado e da

necessidade de modernização para inserção num mercado globalizado, o

governo criou condições para a consolidação do capitalismo e a

expansão de seus mercados, garantindo a exploração do trabalho e do

trabalhador em condições favoráveis ao sistema do capital. Através do

Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE)

liderado por Bresser Pereira, propunha uma reforma

[...] apoiada na proposta de administração pública

gerencial, como uma resposta à grande crise do

Estado dos anos 80 e à globalização da economia

– dois fenômenos que estão impondo, em todo o

mundo, a redefinição das funções do Estado e da

sua burocracia. (PEREIRA, 1996, p. 1).

A ideia era implantar um modelo mais eficiente de administração

que resultasse em racionalização de recursos financeiros, ou seja, de

natureza neoliberal. Zanardini; Blum e Michellon (2013) explicam que é

possível afirmar que, no campo da gestão escolar, a partir das

orientações do governo do Presidente FHC, implantou-se uma proposta

de gestão baseada nos valores do mercado e sua propalada democracia.

A partir de 1995, no governo de FHC a reorganização da política

199

educacional é focalizada na gestão por programas e projetos76

“em

direção à descentralização federativa e desconcentração do poder

decisório das suas estruturas organizacionais” (ZANARDINI, 2006, p.

110). A natureza desta política de programas e projetos é a mesma que

embasa as reformas de Estado – racionalização de recursos e formação

para garantir bases à expansão do capital. Segundo Zanardini, Blum e

Michellon (2013, paginação irregular) na década de 1990 ainda estão em

evidência as categorias que na década de 1980 significavam a

democratização da educação sob um viés popular, no entanto, estas

categorias foram destituídas de seu caráter popular e revestidas pelo

caráter da administração pública gerencial “capaz de superar a rigidez e

a centralização da administração pública burocrática e

‘democratizar/descentralizar’ para construir o consenso necessário à

sobrevivência do capital”. De acordo com Zanardini (2006), o objetivo

da busca por uma gestão escolar eficiente presente nos documentos do

MEC a partir de 1995 era a implantação da administração pública

gerencial, substituindo a administração burocrática, conforme

explicitado por Bresser Pereira (1996), argumentando que a gestão em

curso “apresentava uma rigidez de procedimentos e um excesso de

normas e regulamentos, concentrando e centralizando funções no

aparelho do Estado” (ZANARDINI, 2006, p. 107).

76

Alguns programas e projetos, apresentados pelo governo FHC como políticas

de descentralização e participação do MEC, foram elencados por Zanardini,

Blum e Michellon (2013, paginação irregular): “o Fundo de Manutenção e

Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério

(FUNDEF), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), o

Programa de Dinheiro Direto na Escola (PDDE), o Programa Nacional do

Livro Didático (PNLD), o Programa Bolsa Escola, os Parâmetros Curriculares

em Ação e o Programa de Expansão e Reforma da Educação Profissional

(PROEP)”. Os autores relatam que “Em outro Relatório intitulado Política e

resultados (1995-2002) Gestão nas Escolas indica-se como instrumentos

criados ou reformados também na gestão do Presidente Fernando Henrique

Cardoso, que se propuseram a partir da sua lógica, e fortalecer a autonomia

escolar: o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), o Fundo de

Fortalecimento da Escola (FUNDESCOLA), o estímulo à criação das

Associações de Pais, Mestres e Funcionários (APMF), o Projeto de

Adequação do Prédio Escolar (FUNDESCOLA), o Programa Nacional do

Livro Didático (PNLD), o Fundo Nacional de Alimentação Escolar (FNAE), o

Censo Escolar realizado pelo INEP e o Sistema de Administração Escolar

(SAE)”.

200

Ainda em 1995, no governo de caráter neoliberal desenvolvido

por Antônio Britto (PMDB) no RS, a Assembleia Legislativa gaúcha

aprovou a Lei de Gestão Democrática do Ensino Público do Rio Grande

do Sul, Lei 10.576, que representou um avanço importante em direção à

democracia na escola e em sua gestão, embora no embate de posições

tenha prevalecido o projeto construído pelo governo, em detrimento do

projeto construído e apresentado pelo fórum de entidades representativas

(que contou com ampla participação da população). Embora ela

represente algumas possibilidades na participação da comunidade na

gestão da escola, é preciso ter claro que a intenção que move as políticas

de governo para a administração do estado é a implantação dos

conceitos e ferramentas da Qualidade Total, pautada na produtividade e

competitividade. Conforme Amaral (2010) a Secretaria de Educação

aderiu ao Programa de Qualidade na Administração Pública implantado

por Britto para superar o que considerava a causa da crise do estado: a

má administração estatal.

Neste cenário de avanço das políticas neoliberais sobre o país e

de uma democracia formal e não real, em que as reivindicações da

classe trabalhadora não eram ouvidas e suas mobilizações esmagadas

pelo aparato coercitivo e repressivo do Estado, em 1996 foi publicada a

nova LDB (Lei 9.394), não sem debate e polêmica entre as diferentes

concepções de educação e de sociedade. Esta ordenava no Artigo 3º,

inciso VIII, “gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e

da legislação dos sistemas de ensino” e nos Artigos 14 e 15,

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as

normas da gestão democrática do ensino público

na educação básica, de acordo com as suas

peculiaridades e conforme os seguintes princípios:

I - participação dos profissionais da educação na

elaboração do projeto pedagógico da escola;

II - participação das comunidades escolar e local

em conselhos escolares ou equivalentes.

Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às

unidades escolares públicas de educação básica

que os integram progressivos graus de autonomia

pedagógica e administrativa e de gestão

financeira, observadas as normas gerais de direito

financeiro público. (BRASIL, 1996).

Novamente a aparência é de que de fato se conquistou a gestão

democrática, no entanto um olhar global na LDB demonstra que sua

201

medula é de cunho neoliberal, e os poucos preceitos democráticos

incluídos são fadados a não realização uma vez que estão limitados pelo

conjunto legal e são ressignificados desta forma visando a contribuir

com o projeto neoliberal. Tanto a Constituição Federal quanto a LDB se

caracterizam pelo caráter neoliberal.

Saviani (2011) explica que com a redefinição do papel do Estado,

redefiniu-se o papel das escolas e o processo foi flexibilizado, como

prescreve o toyotismo, e o controle deslocou-se do processo para o

resultado. Assim, a LDB traz a questão da avaliação como principal

papel do Estado, como forma de garantir a eficiência e a produtividade e

usando estas como critérios para a alocação de recursos implantando a

competição. O conceito de qualidade total foi levado para as escolas,

implantando o modelo empresarial de gestão e organização,

minimizando o espaço para a democracia e a construção coletiva. Para

Martins (2011?), ao mesmo tempo em que a LDB instituiu princípios

democráticos como a participação da comunidade escolar na gestão da

escola, engessou as possibilidades de ampliação da autonomia escolar.

A LDB determinou a elaboração dos Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCNs), que foram publicados logo após, em 1997. Sobre este

documento, Zanardini critica o enfoque sistêmico adotado:

Há nesse, e em outros documentos referentes à

reforma da educação básica, a ideia de que os

alunos irão aprender a viver juntos, a respeitar a

diversidade, a reconhecer o outro e assumirão um

compromisso social, na medida em que as

relações estabelecidas na gestão e organização do

ambiente escolar estiverem pautadas nessa espécie

de relações. (ZANARDINI, 2006, 117).

Lück (2000, p. 8) sintetiza a visão que vem sendo disseminada

nos documentos que defendem a gestão democrática atualmente, de que

O aluno não aprende apenas na sala de aula, mas

na escola como um todo: pela maneira como é

organizada e funciona; pelas ações globais que

promove; pelo modo como as pessoas nela se

relacionam e como a escola se relaciona com a

comunidade, pela atitude expressa em relação às

pessoas, aos problemas educacionais e sociais,

pelo modo como nela se trabalha, dentre outros

aspectos.

202

Segundo Zanardini (2006), essa concepção segue uma tendência

mundial, defendendo que a escola deve ser autônoma no sentido de

desenvolver uma gestão em nível local, visando à desresponsabilização

dos governos com a manutenção das mesmas e a redução de custos, e

jogando a responsabilidade dos resultados sobre a própria escola, como

se ela pudesse sozinha transformar-se de modo a responder às

exigências sociais.

Essa postura dissemina que a sala de aula e a escola podem se

organizar isoladamente da sociedade, sem sofrer suas determinações,

como se os problemas decorrentes da organização capitalista da

sociedade e os valores por ela engendrados pudessem ser resolvidos no

âmbito escolar.

As políticas do governo gaúcho seguiram a rigor as políticas

neoliberais de expansão do capitalismo aplicadas pelo governo federal.

O governo Britto privatizou e fechou estatais, demitiu servidores com o

Plano de Demissão Voluntária (PDV), enxugou o funcionalismo,

sempre com os discursos de modernização e eficiência, atacando a

imagem dos servidores públicos e enfrentando os movimentos sociais

com truculência e repressão, numa tentativa clara de desestruturar as

organizações sindicais e sociais.

Shiroma (2007, p. 73) expõe que “a reforma dos anos 1990

também envolveu e comprometeu intelectuais em comissões de

especialistas, análises de parâmetros curriculares, elaboração de

referenciais e pareceres” e que a prioridade do governo foi garantir o

acesso e permanência na escola através de programas de governo e do

MEC, e avaliações da educação, e no campo da gestão promoveu a

municipalização do ensino.

Em 1998 passou a vigorar o Fundo de Manutenção e

Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do

Magistério (FUNDEF), que segundo Davies (2004) era inspirado “na

orientação dos organismos internacionais, em especial o Banco

Mundial, de priorização do ensino fundamental” e não cumpriu o

objetivo de desenvolver o ensino fundamental e valorizar o magistério já

que não previa recursos novos. Ao invés disto, apenas redistribuiu, em

âmbito estadual, entre o governo estadual e os municípios, “uma parte

dos impostos que, antes de sua criação, já eram vinculados à

MDE com base no número de matrículas no ensino fundamental regular

das redes de ensino estadual e municipais” (DAVIES, 2004, não

paginado). Embora o fundo tenha contribuído para a redução da

desigualdade entre os municípios num mesmo estado, não teve o mesmo

203

resultado entre os estados, mantendo a desigualdade, e principalmente a

insuficiência de recursos para as escolas. Além disso, outro problema

dos fundos é que ao priorizar determinado nível (ensino fundamental)

trata a educação de forma fragmentada, desconsiderando que os

principais problemas da educação só podem ser resolvidos com uma

visão da totalidade (desde a creche até a pós-graduação), além de não

considerar a qualidade da educação, mas apenas os valores fixos

estipulados (DAVIES, 2006). Os princípios orientadores da gestão da

educação e do FUNDEF são os mesmos baseados no paradigma

neoliberal que orientam a gestão escolar. Conforme indica Militão

(2011, p. 7), o FUNDEF era “alinhado às orientações de reforma e

racionalização do Estado, hegemônicas a partir da década de 1990 em

escala planetária” e foi o responsável por inaugurar no Brasil “a política

de fundos para o financiamento da educação pública”.

Segundo Oliveira, “a década de noventa foi uma década de

implantação de um modelo neoliberal de gestão pública, sendo que esse

germe neoliberal já estava em desenvolvimento há algumas décadas”

(OLIVEIRA, 2007, p. 24). Os embates de posições travados pelas

diferentes concepções de gestão estão refletidos nas contradições entre a

legislação (acerca da gestão) construída neste período e a prática

cotidiana de gestão escolar. As bandeiras de luta da classe trabalhadora

são tomadas pelo capital, ressignificadas com os valores e princípios

neoliberais e utilizadas como ferramentas em busca do consenso da

classe trabalhadora para a aplicação das propostas do capital. Noronha

(2002, p. 90 apud ZANARDINI, 2006, p. 117) explica que:

[...] a mudança do enfoque, do social para o

individual, é traduzida no campo da política

educacional pela autonomia e descentralização. A

justificativa ideológica que se manifesta nesta

retórica é a do respeito às singularidades e

particularidades locais junto a do

desenvolvimento de atitudes de auto-sustentação.

A justificativa econômica é a da otimização e

redistribuição de recursos escassos, sugerindo que

seja gerido de modo mais eficiente aquilo de que

se dispõe (...) os sistemas de educação baseados

na descentralização significam, de um lado, a

adoção de formas mais flexíveis de gestão e de

distribuição das responsabilidades pelo fracasso

ou sucesso dos empreendimentos (a avaliação é

realizada pelos resultados e pela eficiência de

204

cada um) e, de outro, o estímulo ao caráter

competitivo e fragmentado que se instaura entre

os diferentes níveis de ensino.

Em 1999, assumiu o governo do estado Olívio Dutra do Partido

dos Trabalhadores (PT), com um projeto mais voltado para os interesses

dos trabalhadores e de caráter democrático. Aliado ao Orçamento

Participativo implantou o debate da Constituinte Escolar77

, por meio do

qual as comunidades escolares deveriam definir os rumos da educação

gaúcha, construindo os regimentos e planos político-pedagógicos de

suas escolas e as diretrizes para a educação estadual como resultado de

um amplo debate democrático e popular. O CPERS-Sindicato, num

embate contra o governo que não contemplou as reivindicações salariais

da categoria, chamou sua base de trabalhadores em educação a não

participarem na Constituinte Escolar, representando um prejuízo para a

força das propostas da categoria.

Sendo oposição ao governo federal, e com minoria de

representação na Assembleia Legislativa, o governo do PT teve

dificuldades em aprovar seus projetos, como o de aperfeiçoamento da

gestão democrática do ensino (Lei n. 11.695/2001) construído pelo

fórum de entidades representativas da sociedade, o qual apoiava, que foi

substituído na Sessão Plenária por um projeto apresentado por

deputados de oposição, sendo este último o projeto aprovado. Com o

envolvimento no processo da Constituinte Escolar e com o incentivo da

Secretaria Estadual de Educação bem como a formação oferecida, as

escolas viveram um período diferenciado na democratização de suas

práticas de gestão, concretizadas na constituição dos conselhos

escolares, na autonomia ampliada de elaboração dos objetivos da escola,

na elaboração dos Planos Políticos-Pedagógicos e Regimentos Escolares

através do amplo debate com a comunidade escolar com tempo previsto

dentro do calendário escolar para reuniões pedagógicas e assembleias de

segmentos viabilizando a participação, que apesar de apresentar limites,

se destacou nos últimos anos. Amaral cita como alguns limites

77

Para informações mais detalhadas acerca do Orçamento Participativo e da

Constituinte Escolar, bem como alguns limites e avanços na gestão escolar

democrática durante o governo de Olívio Dutra, indicamos a leitura de:

CAMINI, Lucia. O processo de construção da política educacional no Rio

Grande do Sul de 1999 a 2002: relações, limites, contradições e avanços.

Dissertação de Mestrado. UFRGS, Programa de Pós-Graduação em Educação

da Faculdade de Educação. Porto Alegre, 2005.

205

[...] continuidade do Círculo de Pais e Mestres

(CPM) como Unidade Executora [...]; instituição

do voto universal na eleição para diretor; [...]

continuação dos cargos de vice-diretor, assim

como toda a equipe diretiva serem escolhidas

como cargo de confiança, não como uma chapa;

[...] ininterrupção da avaliação externa com base

no Padrão Referencial de Currículo; [...] não

retirada do termo “relativo” no que diz respeito à

autonomia administrativa, financeira das escolas

[...] dificuldade por parte do poder legislativo

estadual em aceitar as diretrizes convencionadas

por meio da democracia participativa, devido à

desconsideração das discussões realizadas nas

Comissões Paritárias. (AMARAL, 2010, p. 113).

Além destes, a alteração na legislação e a política de governo não

resultaram em valorização do magistério de forma satisfatória, em uma

reavaliação do financiamento da educação e na consolidação de uma

nova cultura escolar de compromisso, participação mantendo a

submissão. A experiência desse começo de democratização da gestão da

escola findou com a intervenção do governo subsequente.

Em 2001 foi aprovado o Plano Nacional de Educação (PNE),

através da Lei Nº 10.172, que sobre a gestão das escolas propunha:

[...] democratização da gestão do ensino público,

nos estabelecimentos oficiais, obedecendo aos

princípios da participação dos profissionais da

educação na elaboração do projeto pedagógico da

escola e a participação das comunidades escolar e

local em conselhos escolares ou equivalentes

(BRASIL, 2001, cap. 2, item 2).

De acordo com Zanardini (2006) é evidente como gestão

adjetivada como democrática é usada pelo MEC para traduzir os

elementos ideológicos e mercadológicos que apoia como meios de

superar a crise de eficiência das escolas através da descentralização e da

autonomia, e de formar parcerias. Acentua-se a busca pela organização

do coletivo escolar para executar as políticas do MEC de forma efetiva e

responsável, buscando superar na escola os problemas da educação

nacional. Uma política clara de desresponsabilização oculta sob as

bandeiras de luta da classe trabalhadora.

O PNE também propunha:

206

Deve-se promover a efetiva desburocratização e

descentralização da gestão nas dimensões

pedagógica, administrativa e de gestão financeira,

devendo as unidades escolares contar com repasse

direto de recursos para desenvolver o essencial de

sua proposta pedagógica e para despesas de seu

cotidiano.

Finalmente, no exercício de sua autonomia, cada

sistema de ensino há de implantar gestão

democrática. Em nível de gestão de sistema na

forma de Conselhos de Educação que reúnam

competência técnica e representatividade dos

diversos setores educacionais; em nível das

unidades escolares, por meio da formação de

conselhos escolares de que participe a

comunidade educacional e formas de escolha da

direção escolar que associem a garantia da

competência ao compromisso com a proposta

pedagógica emanada dos conselhos escolares e a

representatividade e liderança dos gestores

escolares. (BRASIL, 2000, cap. V, item 11.2,

grifos no original).

A desburocratização, que é colocada como algo positivo no

sentido de garantir a eficiência no repasse das verbas para que a escola

possa realizar a sua proposta pedagógica, mascara ao mesmo tempo em

que revela a essência neoliberal do projeto. O PNE propunha ainda

como um objetivo e meta “Promover a autonomia financeira das escolas

mediante repasses de recursos, diretamente aos estabelecimentos

públicos de ensino, a partir de critérios objetivos” (BRASIL, 2001, cap.

V, item 11.3.1).

Em oito anos de mandato, o governo de FHC fez a reforma

administrativa, a reforma previdenciária, a reforma trabalhista e a

reforma universitária, além das demais emendas constitucionais e

reformas, aplicando a fundo o receituário dos órgãos multilaterais como

o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial para garantir a

reestruturação do capital. Zanardini (2006, p. 113) afirma que:

Descentralização e autonomia seriam, por razões

financeiras, políticas e ideológicas, ao lado da

avaliação de resultados, os elementos centrais da

reforma da gestão escolar e do conjunto de

207

reformas relacionadas à reforma do Estado e às

demais que a sociedade globalizada requer.

A autora ainda alerta para os embustes que esta política

apresenta, uma vez que joga com as mesmas categorias defendidas pelos

trabalhadores na década de 1980, deixando margem para ilusões acerca

do projeto:

Ao introduzir a descentralização e a autonomia

como corolários do modelo de racionalidade que

emerge na gestão dos sistemas e unidades

escolares, recupera-se, de certo modo, o

movimento da década de 1980, porém com um

caráter ideológico e financeiro bem delineado e

canalizado para a perspectiva de solidariedade,

cooperação e compromisso coletivo, que permeia

o ideário neoliberal e pós-moderno, e que requer,

além de recursos financeiros, a aprendizagem

pelas diferentes instituições e organizações

sociais, dos valores que as levariam à eficiência e

à democracia. (ZANARDINI, 2006, p. 113).

Em 2003 assumiu a presidência Luiz Inácio Lula da Silva (Lula),

eleito pelo Partido dos Trabalhadores em aliança com partidos

conservadores, manteve o mesmo rumo para as políticas de governo. No

estado, Germano Rigotto (PMDB), num governo mais fechado e

conservador, porém moderado, apoiado pela burguesia iniciou seu

governo com políticas de defasagem salarial, suprindo a falta de pessoal

através de contratações precárias, sem direitos trabalhistas, dando

margem ao clientelismo e subserviência. Seu governo, na Educação

aliado ao PDT com o secretário José Fortunatti, implantou o Contrato de

Gestão como projeto piloto em parte das escolas do RS, que pautado na

meritocracia visa aumentar a produtividade e melhorar a qualidade da

gestão. O Contrato de Gestão firmado entre diretores de escola e

Secretaria da Educação apresentava metas a serem cumpridas e previa

punições no caso destas não serem atingidas, além de premiação para os

melhores resultados, pautados em critérios como evasão, repetência,

classificação nas avaliações externas, promovendo a competição pelos

parcos recursos disponibilizados. No início do governo Rigotto, em

2003, o RS tinha 3.041 escolas estaduais em funcionamento. Sofreu o

208

fechamento ou municipalização de 185 escolas, findando o período

dessa gestão, em dezembro de 2006, com 2.856 escolas estaduais78

.

Em 2007, no governo Lula (PT), que foi reeleito, foi aprovado o

FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação

Básica e Valorização dos Profissionais da Educação), para vigorar até

2020, com objetivo de corrigir falhas do anterior FUNDEF, como a

incorporação da educação infantil, da educação de jovens e adultos

(EJA), do ensino médio e da educação especial e um gradual aumento

no valor de financiamento. No entanto, com a inclusão desses alunos, o

acréscimo no valor do financiamento mesmo que sendo alto, quando

distribuído por aluno acabou sendo irrisório, ou mantendo o mesmo

valor (DAVIES, 2006).

Yeda Crusius (PSDB) assumiu o governo do RS em 2007, eleita

surpreendentemente, numa manobra das campanhas eleitorais dos

partidos conservadores, apoiados na grande mídia, que pretendiam tirar

do segundo turno o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT), o que

acabou deixando fora do segundo turno o candidato favorito nas

pesquisas de opinião, Rigotto (PMDB). Os partidos conservadores

apoiaram Yeda, que vencendo pelo voto contra o PT, sem apoio popular

ao seu programa, assumiu enfraquecida politicamente e construiu um

governo pautado na distribuição de cargos para acomodação dos apoios

partidários obtidos. Exerceu um governo voltado aos interesses do

grande capital e da burguesia bem como da bancada ruralista

latifundiária da qual recebeu apoio. Fez o fechamento de 255 escolas

estaduais no primeiro ano de mandato79

e efetuou inúmeras tentativas de

acabar com a lei de gestão democrática, apoiada na culpabilização das

escolas por sua condição de precariedade, pelos resultados negativos nas

avalições externas, pela evasão e repetência. Instituiu uma política de

centralização e burocratização apoiada nos diretores de escola, levando-

as a uma situação de autoritarismo exacerbado, violento assédio moral,

perseguições políticas, ameaças e corrupção. Atacou sistematicamente o

sindicato com o aparato da imprensa, e nos movimentos grevistas e

manifestações com a violência do aparato policial e pela via da

78

Fonte: MEC/INEP - Censo Escolar da Educação Básica 2003 e 2006.

Disponíveis em:

<http://www.educacao.rs.gov.br/pse/html/estatisticas.jsp?ACAO=acao1>.

Acesso em: 17 jun. 2014. 79

Conforme números de levantamentos do CPERS-Sindicato, e constatáveis

pelo número de escolas apresentado pela Secretaria de Educação do Estado

anualmente.

209

judicialização. Usou da corrupção para conseguir apoio a seus projetos e

teve o governo investigado pelo Ministério Público pelos crimes de

corrupção, desvio de verbas públicas, e esteve envolvido num caso de

assassinato como “queima de arquivo”80

. Neste ambiente, a democracia

se tornou insustentável, mesmo que estivesse prevista na legislação.

Sua política de privatização da educação e sucateamento da

educação pública ficou evidente com o fechamento de 302 escolas81

realizado até o final de seu governo, em dezembro de 2010, quando o

RS encerrou o ano com 2.554 escolas estaduais, sendo que no início do

mandato de Yeda Crusius em 2007 havia 2.856 escolas em

funcionamento.

Em 2012, assumiu como presidente Dilma Roussef, para um

terceiro mandato do mesmo partido, não rompendo com a lógica de

aprofundamento das políticas neoliberais a serviço do capital. No estado

do Rio Grande do Sul assumiu Tarso Genro, pelo mesmo partido da

presidente da República, com uma pauta educacional próxima às

aspirações da comunidade gaúcha, porém segue as prescrições externas

do Banco Mundial, FMI, OCDE e a pauta do movimento Todos pela

Educação. Implantou o projeto Ensino Médio Politécnico82

, usando

referenciais marxistas para embasar um projeto de caráter mercantilista

80

Conforme reportado pela mídia, pelos materiais sindicais de diversos

sindicatos de servidores públicos e documentos de denúncias protocolados

junto à Assembleia Legislativa. Acerca do envolvimento de queima de

arquivo ver notícias relacionadas à morte de Marcelo Cavalcante (ex-assessor

de Yeada Crusius), em fevereiro de 2009: <

http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/misterios-na-morte-de-ex-

assessor-de-yeda-crusius/>; < http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticia/2009/02/ex-

chefe-da-representacao-do-governo-do-estado-em-brasilia-esta-desaparecido-

2407974.html>; <http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticia/2009/02/corpo-de-ex-

representante-do-governo-do-rs-e-encontrado-em-brasilia-2408046.html>;

<http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/gravacoes-comprometem-governo-

yeda-crusius>. Acesso 13 jan. 2014.

<http://lucianagenro.com.br/2013/11/nota-oficial-da-direcao-e-da-bancada-

do-psol-sobre-a-reportagem-do-zero-hora/>. Acesso em: 26 maio 2014. 81

Fonte: MEC/INEP - Censo Escolar da Educação Básica 2006 e 2010.

Disponíveis em:

<http://www.educacao.rs.gov.br/pse/html/estatisticas.jsp?ACAO=acao1>.

Acesso em: 17 jun. 2014. 82

Para consulta de detalhes do projeto indicamos a leitura dos documentos

oficiais, disponível em:

<http://www.educacao.rs.gov.br/pse/html/ens_medio.jsp?ACAO=acao1>.

Acesso em: 20 jul. 2013.

210

e neoliberal, que visa à produção de trabalhadores formados

especialmente para atender as demandas do mercado. Oferece ao aluno

um conjunto de técnicas esvaziadas do conteúdo científico num

processo de adestramento para o trabalho alienado. O projeto tem sido

alvo de protestos da comunidade escolar, especialmente de estudantes.

Como forma de construir consenso com a comunidade escolar e

trabalhadores em educação, o governador alterou a Lei de Gestão

Democrática pela Lei n. 13.990 e pelo Decreto 49.502, ambos de 2012.

A alteração contemplou as elaborações constantes do anteprojeto de lei

de Gestão Democrática enviado à Assembleia Legislativa em 2001,

construído democraticamente pelo fórum de entidades representativas da

sociedade gaúcha, que havia sido substituído na sessão plenária, que

são: eleição da equipe diretiva por chapas, dando à comunidade escolar

o direito de escolher também os vice-diretores, fortalecendo a escolha de

um programa e não o indivíduo “diretor”; responsabilização da equipe

diretiva (e não apenas o diretor como constava) com a administração da

escola que deverá ser feita de forma integrada e em consonância com as

deliberações do Conselho escolar; garantia de indicação da equipe

diretiva mediante votação direta e por chapas (a legislação anterior

trazia uma redação de possibilidade “Os Diretores das escolas públicas

estaduais poderão ser indicados” (RIO GRANDE DO SUL, 1995)

enquanto esta legislação estabelece a indicação pela comunidade como

definitiva); imposição do limite de uma recondução sucessiva para o

cargo de diretor e vice-diretor; implantação do voto proporcional (com

peso de 50% para o segmento pais-alunos e 50% para o segmento

magistério-servidores). Além destas constantes da reivindicação da

comunidade escolar, outras mudanças foram: inclusão do coordenador

pedagógico como membro da equipe diretiva (mas como cargo de

confiança do diretor e vice-diretor e por eles escolhido); para a

candidatura e de uma chapa, exigência de “apoio expresso de, no

mínimo, dez membros da comunidade escolar, sendo cinco do segmento

magistério-servidores e cinco do segmento pais-alunos, vedado o apoio

a mais de uma chapa” (RIO GRANDE DO SUL, 2012) nas escolas com

trinta ou mais integrantes no segmento magistério-servidores;

acrescentou como atribuição do diretor “coordenar os procedimentos

referentes ao recebimento, execução, prestação de contas e aplicação

dos recursos financeiros” (RIO GRANDE DO SUL, 2012);

impedimento de concorrer à equipe diretiva no caso de estar sob sanção

penal condenatória ou processo disciplinar administrativo em órgão da

Administração Pública Direta ou Indireta nos últimos cinco anos;

atribuiu ao Conselho Escolar a função executora além das já constantes

211

(consultiva, deliberativa e fiscalizadora); torna o Conselho Escolar

responsável pelo recebimento, execução, prestação de contas e aplicação

dos recursos financeiros transferidos às escolas (antes atribuição do

diretor apenas); ampliação de dois para três anos do mandato de cada

membro do Conselho Escolar e limite de uma recondução sucessiva;

inclusão de material didático-pedagógico e administrativo nas despesas

possíveis da escola; ampliação do horário de funcionamento das urnas

na indicação da equipe diretiva para até as 21 horas visando garantir a

participação de toda a comunidade escolar.

A mudança abrange inúmeras reivindicações da comunidade

escolar, que podem contribuir na democratização da gestão, no entanto,

vêm aliadas à tentativa de intervenção direta nas escolas com a

exigência de reformulação dos regimentos escolares e dos planos

político-pedagógicos à luz das prescrições do governo, através de

regimento padrão (embora este apresente elementos progressistas),

cassando completamente a autonomia que ainda restava à escola e à

comunidade na construção de seu projeto de educação.

Na greve deflagrada no dia 23 de agosto e encerrada no dia 13 de

setembro de 2013, como nos demais movimentos grevistas, a gestão

escolar, foi ponto da Pauta de Reivindicações83

da categoria de

trabalhadores em educação organizados no sindicato, exigindo

“Autonomia para a gestão das escolas públicas. Fim do autoritarismo da

SEDUC e CREs84

.” Recebeu do governo uma resposta85

justificativa

alegando que a relação não se pauta pelo autoritarismo, relatando

algumas ações que serviriam para aperfeiçoar a gestão democrática,

como o aumento da verba de manutenção das escolas, conforme decreto

de agosto de 2013; descentralização financeira aumentando os valores

que a escola pode utilizar em compra de equipamentos e reformas; e a

ampliação das atribuições do conselho escolar. Em nossa concepção,

medidas paliativas, que terão pouca repercussão nos resultados.

83

Disponível em:

<http://www.cpers.org.br/includes/thumbs.php?src_rw=imagens/sinetas/sineta

_julho.pdf>. Acesso em: 20 set. 2013. 84

SEDUC – Secretaria do Estado de Educação e Cultura; CRE – Coordenadoria

Regional de Educação. 85

Disponível em:

<http://www.educacao.rs.gov.br/pse/binary/down_sem/DownloadServlet?arqu

ivo=arquivos/0409_Anexo_DocCPERS_1378333107319.pdf>. Acesso em:

12 set. 2013.

212

Assim como nesse movimento grevista, os debates e

proposições acerca da gestão escolar no sindicato nos últimos anos têm

sido a defesa da Gestão Democrática. A partir da conquista da Gestão

Democrática na legislação, o CPERS-Sindicato limitou-se a defendê-la,

como ponto final no projeto de gestão da escola, não mais atuando de

forma propositiva tentando pautar os governos por avanços, e levando a

comunidade escolar a perceber as contradições entre capital e trabalho

as quais não permitem a efetivação da democracia, mas atuando

timidamente pela democratização das relações que ocorrem no interior

da escola, tendo como exemplo campanhas contra o assédio moral.

Alguns encontros educacionais têm aprofundado o debate apresentando

algumas propostas de práticas que democratizem a gestão, o que

também ocorre em algumas teses aos congressos do CPERS-Sindicato, e

teses aos congressos da CNTE, mas que não chegam a ser construídas

com a comunidade escolar como eixo de luta. A situação atual

vivenciada na gestão das escolas também é reflexo dessa lacuna deixada

pela política sindical, que abriu mão da proposta de transformar a escola

e de mobilizar a comunidade como forma de acirrar as contradições da

escola capitalista.

De 2010 a 2014, vem sendo feito o debate na Câmara Federal e

no Senado acerca no Projeto de Lei 8035/201086

, do PNE 2011-2020.

Neste, a Meta 19, que diz respeito especificamente à gestão escolar,

demonstra o projeto do capital para a educação, e evidencia que novos

desafios e limites estão sendo colocados para a luta pela democratização

da gestão da escola. A Meta 19 visa à

Garantir, mediante lei específica aprovada no

âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, a nomeação comissionada de

diretores de escola vinculada a critérios técnicos

de mérito e desempenho e à participação da

comunidade escolar. (CONGRESSO

NACIONAL, 2010).

Tal meta implanta definitivamente a gestão aos moldes

neoliberais, pautada na gerência e controle, no mérito mensurado pelo

86

Disponível em:

<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=

63A2953767624F2B3C26F9E93160CFF7.proposicoesWeb2?codteor=83142

1&filename=PL+8035/2010>. Acesso em: 14 jun. 2014.

213

desempenho, na qual o diretor é nomeado pelo governo à revelia da

opinião da comunidade escolar, devendo atuar como representante dos

interesses do capital. Para garantir o consenso, o texto apresenta que a

gestão deve ser vinculada à participação da comunidade escolar, no que

a própria meta se contradiz e inviabiliza quando nomeia um diretor para

a escola e coloca a participação como um acessório, um adorno,

regulada para não interferir nos rumos da educação. Embora ainda esteja

sujeito a alterações, o projeto aponta que a legislação que decorrer dele

representará um retrocesso em relação à legislação estadual que

regulamenta a gestão da escola pública no RS, exigindo dos

trabalhadores a organização e a luta ainda mais contundente na defesa

da educação pública de qualidade socialmente referenciada.

O percurso de desenvolvimento da legislação educacional,

como resultado das contradições das forças em luta na sociedade, reflete

a correlação de forças nos momentos determinados de sua promulgação.

As alterações que ocorreram, em momentos progressistas e, em outros,

conservadoras, foram utilizadas pelas classes dominantes como forma

de construir o consenso com sua classe antagônica: a classe

trabalhadora. Algumas reivindicações desta, como participação,

democracia, autonomia, foram incluídas, porém foram carregadas de

significados atribuídos pela classe dominante que os afastam de sua

origem e permitem que a legislação se torne mais uma ferramenta de

domínio e de disputa da consciência da classe trabalhadora. Esta, por

sua vez, acaba por não perceber as intenções postas nas políticas

educacionais, como o controle do Estado sobre a formação do

trabalhador para garantir as condições de expansão do capital. Sob a

ilusão de que a inclusão do direito na legislação garantirá de fato o

direito, o trabalhador entende como encerrada sua luta, permitindo que,

ao invés de avanços, ocorram retrocessos. A análise da gestão escolar,

fazendo uma relação com a legislação, demonstra como estas mediações

ocorrem no ambiente escolar e como determinam as ações e a

consciência dos trabalhadores. É o que expomos no capítulo 5.

214

215

5 RELAÇÕES ENTRE A PRÁTICA DE GESTÃO DA ESCOLA

PÚBLICA E A LEGISLAÇÃO

Nosso objeto de estudo é um fenômeno material social, contendo,

portanto, como todos os fenômenos materiais, todas as categorias do

materialismo dialético. Estas se apresentam em pares dialéticos

indissociáveis: espaço-tempo; matéria-consciência; singular-particular-

geral; qualidade-quantidade; causa-efeito; necessário-contingente;

conteúdo-forma; essência-fenômeno; realidade-possibilidade e as

categorias fundamentais da contradição, negação, movimento e relação,

que procuramos dar conta de analisar (mesmo que não nomeadamente).

Procurando responder ao nosso problema de pesquisa optamos

por agrupar as informações obtidas em nossa pesquisa em algumas

categorias de estudo que são: participação-ausência-exclusão; espaço-

tempo; consciência-ideologia-hegemonia; recursos-financiamento;

divisão do trabalho intelectual e manual-estratificação-hierarquização;

intensificação do trabalho-precarização. Estas nos ajudaram a

compreender as relações que se estabelecem entre os elementos que

constituem nosso objeto de estudo.

Compreendemos que a gestão da escola pública sofre as

determinações do momento histórico, da sociedade de classes e da

divisão do trabalho, formas próprias da sociedade capitalista. Saviani

expõe que

[...] compreende-se que o trabalho didático seja

determinado pela forma de organização da própria

sociedade. No entanto, é preciso ter presente que

essa determinação não é direta e imediata,

caracterizando-se, ao contrário, por mediações

mais ou menos complexas. (SAVIANI, 2010, p.

13).

Estas determinações não ocorrem de uma forma fatalista, sem

sofrer resistências. Como em todo o fenômeno material, na gestão

existem aspectos contrários em luta que desenvolvem o fenômeno

mantendo-o em movimento. Suas contradições essenciais o definem, e

se definem, pelas determinações da forma capitalista de sociedade. Estas

determinações e contradições nem sempre se expressam de forma clara

na aparência do fenômeno, exigindo que para poder conhecê-las, se faça

um “mergulho” em suas entranhas, buscando a sua verdadeira essência

nas mediações e relações mais ocultas.

216

Inicialmente consideramos que o Plano Político Pedagógico da

Escola, complementado pelo Regimento Escolar, pudesse ser a

propriedade essencial de nosso fenômeno, uma vez que se constitui no

documento organizativo da escola, que contém descritos os conteúdos a

serem trabalhados, os métodos a serem empregados, a forma de

avaliação e os objetivos. Segundo Freitas (1994), o que pauta a ação do

professor é a avaliação, uma vez que os alunos precisam apresentar nos

instrumentos de avaliação determinados conhecimentos, estes precisam

ser ensinados pelos professores, tornando-se assim seu objetivo. Assim,

no cotidiano da escola o que move os professores é a busca por vencer

os conteúdos programados. Isso somado à intensificação do trabalho,

não lhes permite tempo – e por consequência aos alunos – para

envolverem-se com atividades que não sejam as letivas programadas, o

que inviabiliza a organização dos segmentos, a realização de reuniões,

assembleias e discussões, a participação efetiva na gestão da escola,

determinando-a a ser o que é. Desse modo, o fator determinante da

gestão atual poderia ser o tempo, ou a ausência dele, pois o PPP, através

de seu programa de conteúdos, estaria inviabilizando o tempo, que

reflete na não participação. O tempo, no entanto, não pode ser

considerado o elemento fundamental da gestão democrática, pois se o

tempo for alterado em quantidade, não necessariamente o será em

qualidade, e não necessariamente resultará em participação.

Pensamos que, uma vez que quem elabora o PPP e define os

conteúdos são as pessoas que compõem a escola (a menos que esteja

determinado definitivamente pelos órgãos educacionais), ele poderia ser

modificado. Além disso, o programa de conteúdos não é algo que venha

definitivamente pronto, então trata-se de chegar ao seu determinante.

Com a avaliação externa, mesmo que não haja uma determinação formal

por uma lista de conteúdos a ser contemplada no PPP, o currículo acaba

tendo que contemplar todos os conteúdos necessários para garantir uma

boa classificação. A propriedade essencial poderia então ser a avaliação.

Freitas (1994) a considera um elemento central para compreender a

escola e para compreender os objetivos da escola, não apenas os formais

descritos no PPP, mas os reais objetivos que pautam a prática cotidiana.

Segundo o autor,

[...] o conteúdo da avaliação guia a ação do

professor e, neste sentido, a avaliação encarna

objetivos. Da mesma forma que o aluno estuda

para a avaliação, o professor também ensina para

217

a avaliação. Neste sentido, o que irá ser avaliado

constitui o seu objetivo. (FREITAS, 1994, p. 208).

Assim, a categoria avaliação forma um par dialético indissociável

com objetivos – tanto dos objetivos ligados ao conteúdo, quanto aos

ligados aos valores e atitudes. Pensamos então, considerando que o que

move os professores e os envolve completamente é o programa de

conteúdos, poderia ser a avaliação a propriedade essencial da gestão.

Não a avaliação interna, uma vez que, em tese, depende de decisões da

escola, mas a avaliação externa. Esta vem estabelecida, baseada num

conjunto de objetivos e conteúdos os quais o professor deve dar conta de

ensinar, alterando os conteúdos e os objetivos da escola, os quais

determinam a avaliação interna. Mudando o conteúdo da avaliação,

mudariam os objetivos e conteúdos a serem ensinados, alterando as

outras propriedades.

Oliveira (2007), ao analisar os conselhos escolares, elegeu como

propriedade essencial a legislação que os institui e regula. No caso da

gestão democrática, pensamos essa possibilidade. No entanto, após

analisar a prática da escola, ficou evidente que a legislação funciona

mais como Pachukanis (1988) explica87

, que a lei reflete uma prática, e

se ela se antecipa à prática e não gerou a ação esperada, ela representa e

se mantém como intenção. É o que ocorre com a Lei de Gestão

Democrática, em que o descrito como norma foi incluído a partir da

proposição das organizações de classe e das organizações populares que

lutavam pela transformação da escola, e buscavam no respaldo legal

uma possibilidade a mais para implantar nas escolas as mudanças na

gestão. Atualmente, a regulamentação legal apresenta uma forma de

organização da gestão escolar que é mais avançada em direção à

democratização do que a forma realizada no cotidiano da escola. O

direito à participação, incluído na lei, aceito pelas classes dominantes

como forma de criar o consenso, permanece como uma intenção das

classes populares, frustrando a expectativa de que, por ser uma

reivindicação da população que constitui a escola pública estadual, a lei

teria força para impulsionar a ação desses mesmos trabalhadores que a

reivindicaram a realizarem a mudança. Sabe-se que a transformação da

escola depende do contexto histórico como um todo e não pode dar-se

por completo sem que a sociedade mude. Porém o que se percebe é que,

com a conquista da lei, as mesmas pessoas que lutavam cotidianamente

na escola pela democratização das relações acabaram por dar a tarefa

87

Apresentamos as ideias do autor no capítulo 4.

218

como encerrada, provocando um retrocesso no que já havia sido

conquistado. Fica evidente o limite da concessão das classes

dominantes: promulgam as leis de forma a criar consenso e recriar as

formas de domínio já existentes, sob a nomenclatura aceita pela classe

trabalhadora, fazendo apologia à democracia, regulamentam as formas

de domínio de classe e a participação das classes populares, que passa a

ser aceita em momentos e instâncias restritas. Isso comprova que, no

caso da gestão, a legislação não pode ser considerada sua propriedade

essencial, pois alterando-a não necessariamente se altera a prática, além

do que compreendendo a gestão escolar como a organização de todos os

elementos que compõem a escola, ela é intrínseca ao processo de

formação da escola. É organizada de alguma forma, mesmo que seja de

forma espontânea, não planejada, então a própria existência da escola

gera sua gestão. Quanto à gestão democrática, é uma forma de gestão

que depende de elementos diversos, a se estabelecer qual é o prioritário.

Considerando que nosso fenômeno não é um fenômeno natural,

mas social, que depende das relações e mediações entre os seres

humanos, percebemos que nossa propriedade essencial não

necessariamente seria um elemento material dos que compõem o

conteúdo da gestão, mas que poderia ser um dos elementos não-

materiais. Assim, a participação (que se efetiva através de uma ação)

poderia ser essa propriedade essencial que buscamos conhecer, uma vez

que para que a gestão seja democrática é necessária fundamentalmente a

participação, e alterando a quantidade e/ou a qualidade da participação,

teremos outra forma de gestão. Aqui está envolvida a qualidade da

participação (no par dialético com a quantidade), pois qualquer

participação não é suficiente, a participação passiva não alteraria o

fenômeno. Alterando-se a propriedade essencial pela quantidade gera-

se, numa relação dialética, uma alteração na qualidade, resultando em

outra forma de gestão, podendo ser autoritária, ditatorial, representativa

etc. Contribui com nossa ideia a afirmação de Mendonça (2000, p. 93)

[...] as questões ligadas à participação podem ser

consideradas o pano de fundo de todos os

mecanismos que, de alguma maneira,

materializam os processos de funcionamento da

gestão democrática do ensino público. [...] a

participação e os mecanismos de gestão

democrática apresentam-se imbricados.

219

Buscamos então compreender qual seria o fundamento de nossa

propriedade essencial. Retornamos então para a questão do tempo

disponível para a participação, mas recaímos novamente na questão da

definição do que seria tempo disponível, na questão do tempo permitido

para reuniões pedagógicas e não utilizado pelas escolas, na ausência de

participação dos estudantes, professores e funcionários que seriam,

formalmente (pois existem implicações práticas não previstas na lei)

liberados para participarem, e pensamos que alterando simplesmente o

tempo, ainda assim a participação poderia não ocorrer, demonstrando

ser um equívoco tomar o tempo como fundamento da participação.

Apoiados nas informações obtidas em nossa pesquisa, em nossa

experiência cotidiana, nos relatórios de pesquisas da bibliografia

estudada, bem como na revisão de literatura e estudos bibliográficos,

entendemos que a hegemonia, decorrente do mundo da produção

material da existência e da ideologia dominante, é o que fundamenta a

exclusão ou a não participação nas instâncias decisórias.

Na análise da relação entre prática e legislação da gestão

democrática transparecem os elementos que nos permitem identificar o

poder da hegemonia sobre a ação e o comportamento das pessoas. São

um conjunto de elementos que tornam possível identificar a hegemonia

analisando a sociedade, e seu desenvolvimento, ou analisando um

fenômeno social, como o em questão, ou mesmo analisando o

comportamento individual de alguém.

Neste sentido, compreende-se que apenas uma estratégia global,

que dê conta de alterar a ideologia dominante pela luta e pela

transformação da sociedade, por consequência transformando a

hegemonia, é capaz de ir transformando a essência da gestão tornando-a

de fato democrática. Sem alterar as relações sociais de produção não há

como conquistar a democracia plena.

A concepção de democracia predominante na legislação e nas

reivindicações do sindicato e fóruns ao longo da história da construção

da Lei de Gestão Democrática do RS vincula-se mais às questões da

constituição do corpo diretivo da escola e do Conselho Escolar do que à

construção de novos mecanismos de funcionamento destes e de

organização do cotidiano no interior da escola que venham a

desenvolver e/ou fortalecer a democracia e a participação efetiva das

pessoas na gestão e na construção de novos rumos para a escola. Por

isso, identificamos que a democratização da escola, de sua gestão e da

sociedade é um processo que depende de todos os envolvidos e a

democracia não ocorre de forma espontânea, ou por concessão da

legislação ou dos governos. A gestão democrática da escola pública

220

esbarra em limites sociais, culturais, econômicos, políticos e jurídicos,

de acordo com Paro (2000).

Segundo a legislação, a democracia na gestão da escola acontece

baseada em alguns pilares fundamentais para sua realização: autonomia,

liberdade e participação. No caso do Rio Grande do Sul, estes princípios

encontram-se regulamentados na Lei n. 10.576/95, com as alterações da

Lei n. 13.990/12 e regulamentada pelo Decreto n. 49.502/12,

legislação em vigor atualmente. Analisando seu Artigo 1º, que

regulamenta:

A gestão democrática do ensino público [...] será

exercida na forma desta lei, com vista à

observância dos seguintes preceitos:

I – autonomia dos estabelecimentos de ensino na

gestão administrativa, financeira e pedagógica;

II – livre organização dos segmentos da

comunidade escolar;

III – participação dos segmentos da comunidade

escolar nos processos decisórios e em órgãos

colegiados;

IV – transparência dos mecanismos

administrativos, financeiros e pedagógicos;

V – garantia de descentralização do processo

educacional; [...]

VII – eficiência no uso dos recursos. (RIO

GRANDE DO SUL, 2012b).

Tem-se a ideia de que a gestão da escola se desenvolve baseada

em práticas democráticas conforme a legislação estabelece. A

autonomia citada no Inciso primeiro como um preceito absoluto é

relativizada no artigo 2º:

Os estabelecimentos de ensino serão instituídos

como órgãos relativamente autônomos, dotados de

autonomia na gestão administrativa, financeira e

pedagógica, em consonância com a legislação

específica de cada setor. (RIO GRANDE DO

SUL, 2012b).

A priori, parece necessária a relativização, uma vez que do ponto

de vista financeiro a escola depende do Estado. No entanto, a autonomia

entendida como a faculdade de se governar por suas próprias leis,

dirigir-se por sua própria vontade, não se refere à busca de recursos

221

disponíveis à sua sobrevivência, mas sim à liberdade e capacidade de

direcionar a ação conforme interesses próprios. Também parece

necessária a relativização do ponto de vista legal, pois a autonomia não

será absoluta uma vez que a rotina escolar e a própria gestão escolar

estão submetidas à legislação e às rotinas dos órgãos superiores, como a

Secretaria de Educação. No entanto, a relativização apresentada no

artigo 2º denota o que de fato ocorre – a autonomia é relativa dado que

as diretrizes para a educação pública, se considerado o conjunto de

políticas públicas, deixa margem muito pequena para decisões da escola.

O financiamento tem sido por meio de programas de governo, os quais

disponibilizam recursos já direcionados aos objetivos previamente

gestados em gabinetes de instâncias governamentais. As escolas

trabalham sob a pressão de cumprir metas de produtividade, baseada em

índices que não dependem da escola apenas para mudá-los, como o caso

da evasão e repetência. As escolas estaduais têm que seguir o Regimento

Padrão estabelecido pela SEC, além de ter seus conteúdos determinados

pela avaliação externa, que desconsidera as especificidades locais de

cada escola e determina um conteúdo padrão. A autonomia é atualmente

utilizada pela legislação educacional como a intenção do Estado de

repassar a responsabilidade pela manutenção da escola e pelo

gerenciamento dos problemas cotidianos à comunidade escolar. A

autonomia, significando a liberdade de ação, de fato só pode ocorrer de

forma relativa e limitada na gestão da escola na atualidade dentro da

formação social de domínio do capital.

A autonomia assegurada no Artigo 5º, aliado ao Artigo 1º, inciso

IV, o controle do poder e ação da autoridade, parece plena já que prevê a

escolha do diretor pela comunidade, a participação da comunidade na

divisão do poder, nas decisões:

A autonomia da gestão administrativa, financeira

e pedagógica dos estabelecimentos de ensino será

assegurada:

I – pela indicação do Diretor e do(s) Vice-

Diretor(es), mediante votação direta da

comunidade escolar;

II – pela escolha dos representantes de segmentos

da comunidade no Conselho Escolar;

III – pela garantia de participação dos segmentos

da comunidade nas deliberações do Conselho

Escolar;

222

IV – pela atribuição de mandato ao Diretor

indicado, mediante votação direta da comunidade

escolar;

V – pela destituição do Diretor, na forma regulada

nesta lei. (RIO GRANDE DO SUL, 2012b, Art.

5º).

No entanto, segundo Martins (2011?), a autonomia prevista é a

autonomia tutelada, vigiada, fiscalizada pelo estado, entendida como a

escolha de como aplicar na escola as políticas do estado. A autonomia

não existe se a escola, sua comunidade, direção e conselho, não tiverem

a liberdade de definir os objetivos, definir os recursos necessários à sua

realização e tê-los disponíveis, e se não puder decidir os instrumentos e

métodos de que vai se utilizar para isso. Também não existe através da

escolha de representantes e da direção se estes atuarem em consonância

com o governo na defesa do projeto do capital, em oposição aos

interesses da classe trabalhadora que compõe a comunidade escolar, e se

não houver a escolha consciente entre distintos projetos a serem

votados. A diretora entrevistada evidenciou o limite da autonomia da

escola em sua fala88

:

A democracia tem que ser bem entendida. Porque

nós não temos autonomia de gestão. Eu tenho

autonomia em algumas coisas. Eu tenho

autonomia de quais os sábados que vamos

trabalhar. Mas eu tenho um limite de sábados que

eu posso trabalhar. [...] Sobre os recursos que a

escola recebe, eu tenho um valor para a

manutenção. Eu tenho um valor para o

permanente. Eu não posso misturar. Eu não posso

tirar o dinheiro da merenda para consertar um

telhado que caiu. Eu não posso contratar quem eu

quero para fazer um trabalho. Eu tenho que

88

A entrevista foi concedida à pesquisadora no dia 01 abr. 2014. Na transcrição

da entrevista foram eliminadas repetições, hesitações e feitas correções

verbais conforme linguagem padrão, tirando vícios próprios da linguagem

oral. Adotaremos a seguinte identificação dos participantes D – Diretora, E –

Estudante, PR – Pai/mãe ou Responsável e F – Funcionário, P – Professor,

acompanhado pelo número atribuído exclusivamente a cada um destes. Não

divulgaremos mais informações como idade, sexo e outras, para garantir o

anonimato dos participantes da pesquisa. Apresentamos os quadros de

tabulação dos dados da pesquisa nos apêndices G, H, I e J.

223

contratar quem tem a documentação e o menor

preço. Então o democrático, no sentido de

autonomia nós não temos. Nenhuma escola tem.

Nós temos, dentro de limites, a democracia, mas

nós somos engessados por questões legais. [...]

Ela [a autonomia] é muito comprometida, muito.

Tem que existir normas, claro que essas normas às

vezes me aprisionam. (D).

Outro limite para a gestão democrática é a divisão do trabalho

própria da sociedade capitalista. De acordo com Amaral Sobrinho (1987

apud MENDONÇA, 2000, p. 69), parte do problema do planejamento

educacional pode ser explicado pela divisão do trabalho, pela separação

entre política e administração, entre planejamento e implementação, o

que faz com que:

O planejamento, pelo aspecto técnico e científico

que envolve, e por sua proximidade com o poder

político, formula políticas, define estratégias,

define programas e projetos, na maioria das vezes

nos gabinetes situados nas capitais, para que

sejam implementadas pelas estruturas da educação

nas regiões, estados ou municípios. Assim, os que

se encarregam da implementação dos programas e

projetos não são os mesmos que os formularam.

Os que formularam as políticas definem os

padrões de referência e mensuração com o fim de

constatar o grau em que o sistema real afasta-se

do estado desejável. Todo desvio, carência ou

obstáculo, toda anormalidade ocorrida no

processo de implementação aparece, a partir desta

ótica, como um sinal de patologia que conspira

contra a materialização do modelo especificado

conceitualmente. Os que executam são assim os

responsáveis pelo fracasso. (AMARAL

SOBRINHO, 1987 apud MENDONÇA, 2000, p.

69).

A divisão do trabalho se expressa na gestão da escola, na medida

em que a direção é que desempenha o papel de elaboração e

planejamento, dentro das limitadas possibilidades deixadas pelo sistema

educacional, seguido pelos professores que vão assessorar ou

complementar e os pais que irão concordar ou não, e ajudar na execução

224

se for o caso. Cabe ao diretor também o papel de gerência, que comanda

a execução de todo o trabalho na escola conforme sua visão de escola

que “funciona” e cumpre também o papel de supervisão, vigiando os

ambientes escolares, investigando possíveis desacordos com seu

comando. Segundo Freitas (1994), o maior controle exercido pelo

capital na escola é desenvolvido pela direção. Esse papel de controle da

direção sobre a execução dos programas de governo, bem como do

funcionamento da estrutura, em muitos casos, não é baseado no que a

legislação ou governo exige, mas no que é necessário ao diretor para

garantir sua condição privilegiada de direção. Leher nos explica alguns

dos motivos da gerência do capital sobre a escola:

Para impedir que os trabalhadores façam da

educação pública um espaço em que quem educa

não é o Estado, mas os educadores auto-

organizados em conselhos, os setores dominantes

operaram, historicamente, a redução do espaço de

autonomia real do aparato escolar através de um

enorme aparato de avaliação (da alfabetização à

pós-graduação) e de materiais pedagógicos tidos

como obrigatórios objetivando converter a

educação em uma ferramenta de produção do

consenso sem consentimento. A meta dos setores

dominantes é educar a massa de crianças e jovens

para um conformismo (que nada tem de estático)

com a situação social vigente que pode e deve

mudar para que tudo fique como está. (LEHER,

2012, p. 4).

Outro aspecto a ser analisado é a questão dos objetivos da

educação e do financiamento, que se encontram intrinsecamente ligados.

Não há como planejar a gestão ou administração sem recursos

suficientes para alcançar os objetivos determinados. Nesta concepção

está implícita a necessidade de que os recursos sejam suficientes e

adequados aos fins. Para que a Lei de Gestão Democrática seja

realmente capaz de assegurar autonomia, deveria estar aliada a uma

legislação que garantisse o financiamento conforme a necessidade e o

projeto de cada estabelecimento, diferente do que acontece, onde os

gestores precisam dispender grande parte de seu tempo buscando

alternativas para conseguir recursos, pois os destinados pelo governo do

estado são insuficientes. Paro (2000, p. 13) nos esclarece que “O

autoritarismo se dá também, e em especial, quando o Estado deixa de

225

prover a escola com os recursos necessários à realização de seus

objetivos”. A carência de recursos por si só inviabiliza a autonomia na

formulação de objetivos, que serão estabelecidos conforme os recursos

permitirem.

O Plano Nacional de Educação, Lei n. 10.172 de 2001, também

trata o financiamento como parte essencial à autonomia, quando em seu

capítulo V, item 11.2, Diretrizes, define que

Deve-se promover a efetiva desburocratização e

descentralização da gestão nas dimensões

pedagógica, administrativa e de gestão financeira,

devendo as unidades escolares contar com repasse

direto de recursos para desenvolver o essencial de

sua proposta pedagógica e para despesas de seu

cotidiano. (BRASIL, 2001, grifos no original).

E “Promover a autonomia financeira das escolas mediante

repasses de recursos, diretamente aos estabelecimentos públicos de

ensino, a partir de critérios objetivos” é lembrado como objetivo e meta

no item 11.3.1 (BRASIL, 2001). O cotidiano da escola mostra que isto

não se efetiva. No RS, em março de 2007, o montante de valor em

verbas devido às escolas em consequência de repasses parciais e

atrasados somava o valor correspondente às verbas de um ano inteiro.

Atualmente os repasses sofreram um reajuste, no entanto continuam

insuficientes para a manutenção da escola como um ambiente que

ofereça um espaço adequado à atividade pedagógica, agradável, limpo e

seguro para a permanência diária dos estudantes bem como para a

aquisição de materiais pedagógicos. As escolas encontram-se com suas

estruturas deterioradas pelo uso e falta de investimento em manutenção

ao longo do tempo, como demonstra o relato do estudante: “Falta

estrutura, teto caindo, professor faltando, carga horária desequilibrada,

mas do resto tá valendo.” (E1). A avaliação dos estudantes, pais e

responsáveis, diretores, professores e funcionários, divulgada nos meios

de comunicação, ouvida nas visitas às escolas, nas conversas informais e

descrita nos questionários, é de que há em curso uma política de

desmonte da educação pública que fica evidente na estrutura física das

escolas. Sobre a carência de recursos são reveladoras algumas falas da

diretora da escola pesquisada:

Sempre as necessidades são maiores do que a

verba disponível. Então... assim, é um pouco

chato de dizer, mas onde mais se gera a discussão

226

dentro do conselho, é em cima de necessidades.

[...] A maioria das reivindicações ficam na

questão de melhorias físicas, na questão da

infraestrutura, e aí a gente tem que colocar as

restrições que a gente tem, porque os valores que

a gente dispõe, não alcançam... para reformar uma

escola, construir nada, nós não temos essa

capacidade. (D).

A melhoria da estrutura física da escola e a qualidade da merenda

escolar foram reivindicações recorrentes nos questionários respondidos

por pais/responsáveis e estudantes no espaço destinado a comentários.

Além da falta de recursos financeiros, a liberdade e a participação

implicam substancialmente na autonomia, uma vez que as três são

interdependentes. O Inciso II do Artigo 1º da Lei de Gestão Democrática

(RIO GRANDE DO SUL, 2012) trata da liberdade de organização, no

entanto não prevê em que tempo e espaço isto será possibilitado dentro

do cumprimento do calendário letivo e do cotidiano da escola. Se o

tempo despendido com a organização dos segmentos e de agrupamentos

ou entidades representativas nos momentos que se reúnem para discutir

a escola não é considerado “letivo”, a organização deixa de ser livre. E a

participação dos professores, servidores e alunos no processo de gestão

da escola requer tempo, discussão, pesquisa, estudo das condições da

escola para conhecer a realidade e poder construir soluções para os

problemas identificados. E ainda, o tempo dos pais ou responsáveis

pelos alunos, para que participem da escola, deve estar regulamentado

de forma a permitir a participação real e não figurativa, ou apenas

restringir a participação aos momentos de eleições ou busca de

resultados na avaliação dos estudantes. A legislação trabalhista prevê

liberação do trabalho aos trabalhadores que tiverem filhos na escola

quando for solicitada sua presença na escola, quando houver reuniões e

entrega de avaliações. Os mecanismos de efetivação desta liberação não

funcionam, uma vez que a lógica capitalista não permite o pagamento de

um trabalhador que não esteja produzindo mais-valia. Neste sentido, as

empresas dão preferência para a contratação aos trabalhadores que não

têm filhos em idade escolar, e acabam por demitir os pais (ou

responsáveis) que costumam se afastar do ambiente de produção para

responder ao chamado da escola. É comum os trabalhadores, no

momento da contratação, assumirem o compromisso de não solicitarem

liberação para irem à escola e chegam a assinar termos garantindo não

serem eles os responsáveis por seus filhos na escola, passando a

227

responsabilidade ao outro (pai responsabiliza a mãe e vice-versa perante

o empregador). Como o comum é os dois serem assalariados, acaba

nenhum podendo participar da vida escolar, nem mesmo nos momentos

regulados em lei. Participar da escola significa a dura escolha entre o

emprego e a escola do filho, como evidencia a fala da diretora sobre a

participação dos pais no Conselho Escolar:

Como você tem muita dificuldade de conseguir

que as pessoas se candidatem, você tem que

praticamente implorar. Dá para entender, porque

as pessoas trabalham. As reuniões do conselho

eventualmente são dentro do horário de trabalho

[...]. (D).

A organização dos segmentos da escola em associações e grêmios

também não é comum nas escolas estaduais. As direções, apoiadas pelos

órgãos de governo, combatem qualquer forma de organização que possa

significar alguma ameaça ao seu poder. Na maioria das escolas não

existe grêmio estudantil, e o CPM funciona apenas como veículo de

captação de recursos e de apoio à direção, não servindo como espaço de

organização dos trabalhadores da escola, como constatado na escola

pesquisada. Quanto ao grêmio estudantil, esta não é uma questão menor,

visto que é através de sua organização enquanto segmento e da práxis,

ao elaborarem suas pautas de reivindicações e ao se unirem e lutarem

pela realização destas pautas e na defesa de seus direitos que os

estudantes têm a possibilidade de desenvolverem a consciência de

classe. Não há grêmio estudantil na escola pesquisada, e foi

reivindicação recorrente de estudantes e pais no questionário aplicado,

no espaço destinado a comentários. Quanto ao CPERS-Sindicato,

sindicato dos trabalhadores em educação do RS, o número de associados

têm diminuído nas escolas, compondo-se, em Porto Alegre,

majoritariamente por aposentados. Quase não existem mais

representantes de escola (representantes de base que organizam um

núcleo do sindicato na escola e levam as propostas da escola para o

sindicato mensalmente no Conselho do Núcleo Regional) e os poucos

que existem não conseguem atuar de forma a garantir espaços de

discussão e organização para os associados. O sindicato vem sendo

combatido pelas direções de escola, que usam o fato de terem poucos

associados na escola e de estes não aderirem às greves e paralizações

como moeda de troca com o governo, por pequenos favores e benesses.

A ausência da organização sindical dentro das escolas através dos

228

representantes de base que deveriam ser atuantes na organização dos

trabalhadores da escola num corpo, num coletivo capaz de discutir e

formular proposições para a educação e se perceberem como classe e se

unirem na luta por interesses comuns, facilita o domínio da

fragmentação e do individualismo no ambiente escolar. Hoje não se

permite mais esse espaço de organização no ambiente de trabalho,

mesmo estando previsto na legislação. Os educadores, agindo

isoladamente, acabam perdendo a capacidade de compreender que têm

reivindicações comuns entre si e entre os segmentos da escola e que

apenas unificados por estas reivindicações comuns é possível traçar

táticas de luta capazes de alcançar os objetivos estratégicos e

transformar de fato a realidade. A fala da diretora sobre a participação

em movimentos reivindicatórios e greves revela o individualismo e

fragmentação disseminados pelo sistema do capital para o qual as

direções agem como representantes na escola:

Já participei de movimentos grevistas, hoje como

diretora é minha obrigação manter a escola

funcionando, [...] claro, as pessoas me conhecem,

elas sabem que ninguém está feliz com o que

ganha, todos nós gostaríamos de ganhar mais,

sabemos que o governo do estado tem dificuldade

em pagar isso também. Recebemos um professor

agora há poucos dias que disse ‘tudo que o núcleo

[do sindicato] determinar eu vou fazer. Se o

Núcleo determinar paralisação eu vou fazer, se o

núcleo determinar greve eu vou fazer’. É seu

direito, a única coisa que eu peço para ele não

fazer, é tentar convencer o outro a fazer o que não

quer. Eu falo [...] que cada um tem o livre arbítrio,

se o grupo decidir que vai entrar em greve, ou dez

professores, ou nenhum, me comunica, pois eu

preciso dar uma posição pra comunidade. (D).

O pensamento hegemônico domina o ambiente escolar, o

individualismo se sobrepõe ao coletivo, inviabilizando a organização

dos trabalhadores e enfraquecendo-os enquanto classe.

Além do tempo, merece destaque o espaço de organização da

gestão escolar. Obviamente, como a gestão perpassa todas as instâncias

e dimensões do trabalho na escola, ela perpassa todos os espaços da

escola. O ambiente físico das escolas estaduais é estarrecedor a quem

entra pela primeira vez, e desconcertante, mesmo aos que a frequentam

229

diariamente. É visível ao primeiro olhar porque se constitui em foco de

reclamação constante. É um ambiente envelhecido, degradado pelo uso,

pela falta de manutenção, por ser foco também de expressão cultural e

dos sentimentos dos estudantes (seja de revolta contra os colegas, contra

os professores, contra a direção, contra a escola, seja de amor, de

orgulho ou outros motivos). Paredes descascadas, pichadas, sujas,

quebradas, tetos com partes caídas, cadeiras e mesas quebradas, vidros

quebrados, chão com buracos, lâmpadas queimadas, armários com

portas caídas, quebradas, cortinas rasgadas, bebedouros estragados,

ausência ou insuficiência de bebedouros, insuficiência de banheiros,

insuficiência de cadeiras e mesas para os alunos, ausência ou

insuficiência de armários para os materiais pedagógicos dos professores,

salas pequenas, ausência ou insuficiência de ambientes para recreação,

de ambientes para aulas de educação física, laboratórios de informáticas

inoperantes, por falta de internet e/ou computadores estragados,

ausência de bibliotecas, falta de material didático, de folhas, de giz, de

fotocópias, presença de grades e portões chaveados separando direção e

secretaria dos corredores e ambientes onde os professores e alunos têm

acesso, separando ambientes de professores e direção de alunos e

funcionários, entre cozinha e refeitórios, ambientes sujos, com lixo

espalhado pelo chão, entre outros, são os problemas que envolvem a

estrutura física e o espaço escolar, às vezes isolados, às vezes presentes

em alguma escola, às vezes, todos presentes na mesma escola, e muitos

deles presentes em todas as escolas. Não é um espaço físico acolhedor,

onde se queira estar. Além disso, a legislação que institui o conselho

escolar prevê assembleias de segmentos e assembleias gerais da escola,

não prevê, no entanto, o espaço para que ocorram. A maioria das escolas

não tem auditório ou salão, nem sala disponível para a reunião do

conselho escolar, que acaba ocorrendo na sala dos professores, ao

mesmo tempo em que outras atividades se desenvolvem no mesmo

ambiente, até mesmo a visita de parentes dos membros da direção ou

professores. Este é um dos elementos utilizados pelas direções como

justificativa para não fazerem reuniões e assembleias.

A participação da comunidade escolar na administração se

encontra como garantia nos Artigos 1º, 4º e 5º da Lei de Gestão

Democrática: o Art. 1º, Inciso III regula: “participação dos segmentos da

comunidade escolar nos processos decisórios em órgãos colegiados;”

(RIO GRANDE DO SUL, 2012b); “Art. 4º - A administração dos

estabelecimentos de ensino será exercida pelos seguintes órgãos: [...] II

– Conselho Escolar” (RIO GRANDE DO SUL, 2012b), constituído pela

direção da escola e representantes eleitos dos segmentos da comunidade

230

escolar; aliado ao Artigo 5º que estabelece que a autonomia da gestão

será assegurada, entre outros, “III – pela garantia de participação dos

segmentos da comunidade nas deliberações do Conselho Escolar” (RIO

GRANDE DO SUL, 2012b). Subentende-se que os membros que

compõem os segmentos da comunidade escolar devem ser consultados

por seus representantes no conselho sobre cada deliberação a ser feita,

caso contrário, não estão participando. O que ocorre normalmente nas

escolas, é que os membros do conselho escolar nem sequer são

reconhecidos como tal por seus pares. A participação restringe-se ao

momento da eleição dos conselheiros, que é feita sem debate, sem

informação, onde muitos relatam que o fazem por ser obrigatório, outros

relatam que não sabem para o que é a votação, e em muitos casos,

tiveram a orientação de um professor ou da direção para votar em

determinado candidato. Os que foram candidatos por sua vez, não raro,

dizem tê-lo sido por terem sido convidados pela direção, enquanto

outros nunca se candidataram por não terem sido convidados, e outros

por não saberem que haveria eleição e como ela ocorre. Estes fatos

evidenciam a falta de informação e de conhecimento da legislação e do

funcionamento da escola. Além da predominância do poder do diretor

sobre o conselho escolar e sua composição.

A leitura do Artigo 42 permite criar uma imagem da escola como

um ambiente democrático e do coletivo, no qual o conselho escolar

exerce o papel central na organização da escola, no entanto,

considerando as contradições presentes na sociedade e na gestão da

escola, pode-se compreender que a aparência não reflete a realidade:

Art. 42 - São atribuições do Conselho Escolar,

dentre outras:

I - elaborar seu próprio regimento;

II - criar e garantir mecanismos de participação

efetiva e democrática da comunidade escolar na

definição do Plano Integrado da Escola;

III - adendar, sugerir modificações e aprovar o

Plano Integrado da Escola;

IV - aprovar o plano de aplicação financeira da

escola;

V - apreciar a prestação de contas do Diretor;

VI - divulgar, quadrimestralmente, informações

referentes à aplicação dos recursos financeiros,

resultados obtidos e qualidade dos serviços

prestados;

231

VII – coordenar, em conjunto com a direção da

escola, o processo de discussão, elaboração ou

alteração do regimento escolar;

VIII - convocar assembleias gerais dos segmentos

da comunidade escolar;

IX – encaminhar, quando for o caso, à autoridade

competente, proposta de instauração de

sindicância para os fins de destituição de Diretor

da escola, em decisão tomada pela maioria

absoluta de seus membros e com razões

fundamentadas e registradas formalmente;

X - recorrer a instâncias superiores sobre questões

que não se julgar apto a decidir, e não previstas no

regimento escolar;

XI - analisar os resultados da avaliação interna e

externa da escola, propondo alternativas para

melhoria de seu desempenho;

XII - analisar e apreciar as questões de interesse

da escola a ele encaminhadas;

XIII - apoiar a criação e o fortalecimento de

entidades representativas dos segmentos da

comunidade escolar. (RIO GRANDE DO SUL,

2012b, grifos nossos).

A realidade da gestão em vigor nas escolas não é a de um

ambiente com conselho escolar como uma instância democrática de

gestão. Os estudos e a pesquisa demonstram que o conselho escolar se

configura mais num órgão formal do que propriamente um colegiado

para organizar o trabalho na escola. As atividades descritas como

atribuições do conselho escolar ou são desenvolvidas pelas direções ou

nem sequer são praticadas, como é o caso principalmente dos incisos II,

VI, VII, VIII e XIII.

Freitas (1994, p. 108), explica que a tensão entre gestão

autoritária da escola e a participação do coletivo escolar configuram

outro aspecto contraditório no interior da escola. Na escola capitalista

atual, a própria organização configura uma contradição uma vez que “a

organização coletiva dos alunos em classes aparece em contradição com

o exercício do poder individual do professor e do diretor” (FREITAS,

1994, p. 108). Segundo o autor:

Gestão/participação estão [...] em permanente

tensão e disputa pelo aparato escolar. Tanto a

relação professor/aluno como a relação

232

diretor/coletivo estão perpassadas por outras, de

poder, que pretendem controlar a objetivação dos

propósitos gerais fixados (formal ou

informalmente) para a escola. (FREITAS, 1994, p.

108).

Estas contradições se configuram também em possibilidade, uma

vez que podem gerar o desequilíbrio entre as forças em luta e, acirrando

as contradições, direcionar o desenvolvimento do fenômeno para uma

alteração ou transformação. É preciso ter claro que o equilíbrio é apenas

aparente, pois neste sistema do capital há o domínio da classe capitalista

sobre os trabalhadores. Este aparente equilíbrio significa que o

fenômeno se move em direção à realização dos interesses da classe

burguesa, movimento que só pode ser alterado pelo contrapoder da

classe trabalhadora em luta.

Segundo Paro (2010b, p. 73-74),

Estudar a prática escolar da perspectiva do poder

implica levar em conta tanto o contrapoder, que se

manifesta em suas múltiplas formas de dominação

e de violação da subjetividade, quanto o poder-

fazer, que engrandece personalidades e

incrementa o vigor da ação humano-social. Trata-

se de considerar e ter como foco de análise os

micropoderes que se exercem no interior da

instituição escolar, estando alerta para as

interdições, a vigilância, as coerções, os controles

e as proibições, mas não deixar de atentar também

para as relações de libertação, de fortalecimento

mútuo de subjetividades, de companheirismo, de

lealdade e de incremento do poder-fazer uns dos

outros.

As relações de cooperação que persistem em pequenos grupos

representam uma possibilidade para a associação dos trabalhadores em

educação em torno de pautas comuns, uma possibilidade de ação

coletiva, desde que unidos por um eixo comum.

Outro limite a ser superado, de acordo com Freitas (1994), é a

organização atual da escola, que inibe a participação dos alunos e

professores no processo de gestão, não da participação consensual ou de

adesão aos projetos apresentados, mas a participação na formulação do

projeto político-pedagógico e da gestão da escola de forma crítica. Esta

233

é que nos parece ser a principal tarefa da gestão, estabelecer objetivos

para a escola, articulando-os com os recursos a serem empregados para

atingi-los. Do ponto de vista dos objetivos que as escolas apresentam em

seus PPPs, parecem artificiais, sem vida, uma vez que são

desconhecidos pela maioria dos envolvidos no processo educacional e

que não são considerados na preparação das aulas e na gestão

propriamente. No PPP da escola pesquisada, encontramos inúmeras

referências à participação da comunidade, à formação dos estudantes

com consciência crítica, à criação de espaços democráticos, que não se

realizam nas práticas cotidianas e nem mesmo há um esforço ou um

compromisso tentando realizá-las. O PPP apresenta na introdução que a

escola “pretende direcionar suas atividades em sintonia com as

aspirações da comunidade escolar” e “estabelecer ações que visam

atender os anseios de sua comunidade” o que é inviabilizado pela

ausência da comunidade para expor seus anseios e aspirações. Na seção

“Marco Filosófico” descreve

- Queremos uma sociedade mais justa, acesso

igual a bens e serviços sem esquecer valores

humanísticos – liberdade, honestidade, respeito e

amor.

- Queremos uma sociedade de pessoas atuantes,

críticas, que não aceitem tudo que lhe é imposto,

mas que saibam lutar pela justiça e seus ideais

sem deixar se corromper. [...]

- A escola deve ser mediadora entre realidade e

conhecimento, refletindo o pensamento e a

identidade dos membros da comunidade.

- A escola deve ser um local em que toda a

comunidade escolar possa expor suas dúvidas,

possa conhecer os problemas de sua sociedade e

encontrar meios para resolvê-los.

Não há espaços de debate com a comunidade escolar, conforme a

pesquisa demonstrou, e as práticas não referendam os objetivos

colocados no PPP como reais objetivos, haja vista que a efetivação da

participação da comunidade não é perseguida no cotidiano da escola. Na

seção “Marco Operativo” novamente está descrita a participação como

central para a realização dos objetivos:

Propomos uma educação voltada para a realidade,

que atenda às necessidades socioeconômicas,

234

políticas e culturais de sua população [...]. Este

tipo de educação caracteriza-se pela inserção da

escola na comunidade.

Este tipo de inserção pressupõe a abertura à

participação comunitária valendo-se de uma

pedagogia crítico-social [...]. Será fundamental

que a comunidade escolar, nesse processo,

repense a sua política pedagógica com vistas a

uma ação transformadora.

Pretendemos uma educação onde não haja

dominantes e dominados. Que o aluno possa

expor seu ponto de vista sem temer as

consequências [...].

Essa educação poderá se efetivar a medida que a

escola se torne aberta e participativa, permitindo

que os segmentos que compõe a comunidade

possam discutir o processo ensino-aprendizagem

[...]. As regras e normas criadas pela própria

comunidade atendem melhor suas necessidades.

Pretendemos uma escola voltada para a realidade

e interesses da coletividade [...].

Os elementos descritos como fundamentais para a escola não se

concretizam. A possibilidade colocada como intenção não é a realidade

que fica evidente através dos relatos e respostas da comunidade escolar

à pesquisa, que aponta a falta de tolerância e aceitação da opinião, o

domínio da direção e dos professores sobre a organização da escola,

tratamento diferenciado para os indivíduos conforme os diferentes

segmentos a que pertencem e a ausência de atividades participativas e

ambientes de discussão nos coletivos. Duas frases dos participantes da

pesquisa ilustram essa realidade: “Tudo é imposto, não há democracia.”

(PR8); “Falta um espaço em que o aluno se sinta acolhido pela escola.

[...] não possui grêmio estudantil [...]. É muito ‘fechada’ para a opinião

dos alunos, e que deveria ser diferente, pois a escola é para nós.” (E2).

Oliveira (2007) apresenta outro limite ao relatar que o conselho

escolar também não se concretiza como um espaço de democratização e

que a eleição para o conselho escolar não ocorre de forma democrática,

conforme prevista na legislação, na maioria das escolas. Relata, ainda,

que há uma grande dificuldade em ter pessoas que se disponibilizem a

participar, fazendo com que a direção busque candidatos para compor

uma chapa, que normalmente será chapa única. Assim, “Os pais, alunos

e professores que acabam por aceitar participar do CE normalmente são

os que possuem uma certa ligação com a diretora da Escola, pois essa é

235

uma das cláusulas do convite” (OLIVEIRA, 2007, p. 68). A autora

afirma que o mesmo processo ocorre com o CPM. Segundo a autora, o

objetivo da escola, ao invés de buscar a participação efetiva da

comunidade, é cumprir os procedimentos formais exigidos pela

legislação. Percebe-se que as direções de escola vêm atuando ainda no

modelo que Lück descreve:

Até bem pouco tempo, o modelo de direção da

escola, que se observava como hegemônico, era o

de diretor tutelado dos órgãos centrais, sem voz

própria, em seu estabelecimento do ensino, para

determinar os seus destinos e, em consequência,

desresponsabilizado dos resultados de suas ações

e respectivos resultados. Seu papel, nesse

contexto, era o de guardião e gerente de operações

estabelecidas em órgãos centrais. Seu trabalho

constituía-se, sobretudo, repassar informações,

controlar, supervisionar, “dirigir” o fazer escolar,

de acordo com as normas propostas pelo sistema

de ensino ou pela mantenedora. Era considerado

bom diretor quem cumprisse essas obrigações

plenamente de modo a garantir que a escola não

fugisse ao estabelecido em âmbito central ou em

hierarquia superior. (LÜCK, 2000, p. 13).

Embora a autora o tome como modelo em superação, percebe-se

que este papel ainda é o desempenhado e defendido como adequado por

grande parte das direções de escola, incentivadas pelos órgãos de

governo.

Oliveira (2007) expõe também que sua pesquisa revelou um

medo entranhado na sociedade como fator de exclusão das instâncias de

poder, mesmo da escola. As pessoas deixariam de participar em função

do medo de contrariar ou fazer oposição aos governantes e exporem

suas opiniões. Pensamos que isso pode ser reflexo das formas de

governo ditatoriais pelas quais passamos ao longo da história recente do

país, ainda presente na memória de muitos. Chaui explica que “as

classes populares carregam os estigmas da suspeita, da culpa e da

incriminação permanentes”. (CHAUI, 2008, p. 72).

Oliveira acrescenta como fator de passividade e não participação

a lógica do livre mercado, que é percebido como uma esfera de

236

liberdade, implantando a lógica do laissez-faire89

(deixai fazer) como

senso comum. Em nossa análise, o “deixai fazer” acaba sendo

fundamental para a manutenção do status quo, acaba se tornando o

“deixai como está”. Avaliamos que esse é reforçado por conceitos como

cultura da paz e justiça restaurativa, que buscam impedir os

questionamentos, a discordância, criando um apassivamento em busca

do consenso para suas pautas.

Sobre o aspecto da presença dos conselheiros para cumprir as

formalidades relacionadas à gestão democrática, Oliveira (2007) revela

em seu estudo que uma forma de cumprir esta formalidade é falseando o

número de presentes nas reuniões do conselho. Como a participação é

algo difícil de conseguir, faz-se a reunião com o número de conselheiros

presentes, mesmo que de forma a contrariar a legislação, depois de

realizada a reunião colhe-se as assinaturas na ata dos membros que

estiveram ausentes até no mínimo preencher o requisito legal. Assim o

registro arquivado na escola falseia a realidade. E descoberto este

mecanismo, não há mais empenho em buscar a participação, e nem

sequer em divulgar a informação de que vai haver reunião (alguns

conselheiros não tomam ciência da realização de algumas reuniões). A

autora revela que as reuniões do conselho escolar normalmente são

conduzidas pela direção, que apresenta a prestação de contas sem que

haja nenhuma verificação ou questionamento, apenas concordância, e o

mesmo ocorre com as propostas apresentadas, que já são apresentadas

com caráter de deliberação, o que acaba se confirmando. A gestão da

escola está de fato nas mãos do diretor. Este aspecto foi evidenciado

também na pesquisa de campo, em formulações que se repetiram, como

“Porque a diretora tem o poder! She gets the power!”90

(E1); “Porque é

tudo como a diretora quer, não temos participação ativa.” (E2); “Nada

relacionado à verba, merenda, compras de livros, decisão de provas e

trabalhos, nada disso é consultado para ver se os alunos estão de acordo.

Decidem sozinhos. Acredito que nem todos os professores participam!”

(E3); “Isso os adultos decidem.” (E6); “A diretora impõe.” (E22); sobre

a decisão do que fazer com as verbas da escola afirmam “É feita só pela

diretora.” (P1); “Somente a direção decide. Centralização de poder.”

(P2); “Fica a cargo da direção.” (P3); “Apenas a direção [decide].” (E1);

89

Expressão em francês que significa deixai fazer, retirada da expressão laissez

faire, laissez aller, laissez passer: deixai fazer, deixai ir, deixai passar, no

sentido de deixar livre, sem regulação. Tornou-se a expressão símbolo do

liberalismo econômico e político. 90

Ela tem o poder! - foi escrito em inglês no questionário.

237

“Não é decidido pelos alunos.” (E19). O diretor, por sua vez, se

configura num gerente/gestor do capital na escola, buscando alcançar as

metas impostas pela Secretaria de Educação, mesmo que estas estejam

em total desacordo com os objetivos da escola ou com a opinião da

comunidade escolar. Agem dessa forma por ignorância, desconhecendo

o projeto do capital para a escola e seus objetivos, por ingenuidade, por

não perceberem a que se presta o projeto, ou por convicção de que este é

o programa que defendem para a escola ou de que necessitam dele para

manterem-se no cargo.

Martins (2011?, p. 4) citando dados do Programa Nacional de

Fortalecimento dos Conselhos Escolares aponta que, dos cento e um

sistemas de ensino analisados pelo programa, poucos têm o conselho

constituído como “colegiado deliberativo, consultivo, fiscal e

mobilizador, inserido na estrutura de gestão da escola e regulamentado

em seu regimento”. Grande parte deles está organizado apenas como

“entidade jurídica (com independência executora) para driblar a

necessidade de administrar verbas como as que são vinculadas ao

Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE)”, configurando-se em

mais um elemento de autoritarismo.

Além desses aspectos do autoritarismo, há o aspecto dos

objetivos da gestão, os objetivos que se revelam além dos escritos nos

documentos, que pautam a prática cotidiana. Oliveira (2007), referindo-

se à escola pesquisada, afirma que, embora a atividade-fim da escola

seja o processo ensino-aprendizagem, o qual a gestão escolar deve

organizar para que atinja seus objetivos educacionais,

[...] estes objetivos ficam distantes de serem

alcançados, devido à própria prática dos gestores

dessa escola, que priorizam as solicitações

emanadas dos diversos órgãos que controlam a

educação no RS, os quais acabam por

monopolizar suas atividades cotidianas, em

detrimento das ações pedagógicas, ou seja, há a

inversão de prioridades. (OLIVEIRA, 2007, p.

58).

O objetivo da escola acaba sendo responder às demandas da

Secretaria de Educação por procedimentos burocráticos, informativos e

descritivos juntamente com a busca por solução dos problemas

cotidianos.

238

Além das condições jurídicas e materiais, Paro (2000) aborda

outros diferentes tipos de condicionantes da participação da comunidade

na vida escolar, alguns internos à escola, outros presentes na

comunidade. São quatro os tipos de condicionantes presentes na

instituição escolar citados por Paro: “materiais, institucionais, político-

sociais e ideológicos” (PARO, 2000, p. 43) e os determinantes da

participação presentes na comunidade podem ser divididos em três

tipos:

1) condicionantes econômico-sociais, ou as reais

condições de vida da população e a medida em

que tais condições proporcionam tempo,

condições materiais e disposição pessoal para

participar; 2) condicionantes culturais, ou a visão

das pessoas sobre a viabilidade e a possibilidade

de participação, movidas por uma visão de mundo

e de educação escolar que lhes favoreça a vontade

de participar; 3) condicionantes institucionais, ou

os mecanismos coletivos, institucionalizados ou

não, presente em seu ambiente social mais

próximo, dos quais a população pode dispor para

encaminhar sua ação participativa. (PARO, 2000,

p. 54).

Em nossa compreensão, estas dimensões dos condicionantes

estão ligadas, se interpenetram, ocorrem simultaneamente. Sobre os

condicionantes institucionais, Paro (2000) faz a crítica ao caráter

hierárquico da distribuição da autoridade, que, segundo ele, “visa

estabelecer relações verticais, de mando e submissão, em prejuízo de

relações horizontais, favoráveis ao envolvimento democrático e

participativo” (PARO, 2000, p. 45). Embora o autor se refira ao sistema

de designação de diretor via concurso, a realidade nas escolas gaúchas

onde o diretor é eleito tem se mostrado equivalente, pela participação

apenas formal dos membros do Conselho Escolar, e a ausência de

discussões, debates e assembleias de segmentos para tomada de

decisões. A participação e democracia restringem-se ao momento

específico da votação. Segundo Oliveira (2007), muitas das

características do conselho escolar derivam dos conselhos de empresa,

que têm por objetivo a participação formal em que se reúnem apenas

para formalizar decisões assinando documentos ou apenas estarem

presentes por exigência estatutária.

239

Os condicionantes político-sociais podem resumir-se nas

“múltiplas expressões de interesses contraditórios, nas relações

interpessoais” (PARO, 2000, p. 46) que se devem à falta de consciência

dos interesses de classe, mais amplos, o que permite que no dia-a-dia as

pessoas se orientem por seus interesses imediatos91

. Em momentos em

que há uma luta por um objetivo coletivo, de interesse de todos os

segmentos, a tendência é que os conflitos sejam relegados a um segundo

plano. Na ausência de objetivos amplos comuns a todos, os conflitos

pela garantia dos interesses distintos aos grupos e indivíduos se

acentuam. Se considerarmos a realidade atual de nosso objeto de

pesquisa, fica evidente a ênfase nas discordâncias, nas diferenças de

opinião como obstáculo à organização do coletivo. Nos períodos em que

ocorre a eleição de direção de escola e de conselho escolar (este último

nas poucas escolas em que a comunidade é informada e participa), as

disputas ganham um caráter pessoal, o debate ocorre em torno da

divulgação de elementos da vida pessoal dos candidatos, sem atenção ao

programa e propostas defendidas. É comum ocorrerem transferências e

afastamentos como forma de perseguição aos componentes de chapas

vencidas, o que reflete na ausência de candidaturas de oposição à

direção que está no cargo. Nas escolas onde há mais de uma candidatura

para direção da escola, as disputas pessoais, e não de projetos, envolvem

as comunidades em conflitos que, não relacionados a diferentes projetos

de educação e de escola, esvaziam de sentido a participação e o

envolvimento dos pais e estudantes. Os próprios professores e

funcionários dessas escolas relatam ser um período desafiador, difícil,

conflituoso e que é melhor não demonstrar afinidades para não sofrer

punições. O direito à opinião e à divergência, como pressuposto da

democracia, é negado nessa forma de gestão.

Isso nos remete à Chauí (2008), que, ao explicar o caráter

autoritário da sociedade brasileira, nos expõem que uma das formas de

autoritarismo se dá pelo bloqueio que se faz à esfera pública da opinião

que representa interesses de grupos e classes antagônicas, onde a

informação é monopolizada, “e o consenso é confundido com a

unanimidade, de sorte que a discordância é posta como ignorância ou

atraso” (CHAUÍ, 2008, p. 72). São comuns relatos de tentativas de

ridicularização da opinião de quem discorda, caracterizando o assédio

moral, cujos casos se repetem cotidianamente e apenas uma parcela é

91

Como expressão disso, ao serem perguntados sobre o porquê da participação,

temos respostas como: “É legal.” (E4), “Deu vontade.” (E5) ou sobre ser líder

de turma “Mostra imponência.” (E1).

240

levada ao conhecimento das entidades de classe e à Secretaria de

Educação para providências na defesa dos assediados. Podemos

considerar como a dimensão ideológica destes condicionantes, o fato de

que o autoritarismo é aceito pelas pessoas, que não se insurgem, ou nem

questionam. A aceitação às vezes ocorre de forma espontânea pela

cultura social e política autoritária construída ao longo da história, e é

perceptível através de frases como “Manda quem pode, obedece quem

precisa” (F1); “Questão de hierarquia” (F2);

A escola está sob o “braço forte” de um comando

há anos no poder, contudo, tem exercido esse

comando com primor e dedicação, o que torna a

escola menos democrática, mas muito funcional.

(P4).

A escola e a educação desenvolvidas autoritariamente têm

contribuído para a construção e o reforço desta cultura, e, como Paro nos

explica ao falar da imposição arbitrária de conteúdos feita pela escola

tradicional, a escola

[...]deixa de contribuir para a formação de

personalidades democráticas [...], em vez de

formar cidadãos predispostos a agir

democraticamente, acaba por contribuir para a

formação de personalidades autoritárias, cujas

principais características são, “de uma parte, a

disposição à obediência preocupada com os

superiores, incluindo por vezes o obséquio e a

adulação para com todos aqueles que detêm a

força e o poder; de outra parte, a disposição de

tratar com arrogância e desprezo os inferiores

hierárquicos e em geral todos aqueles que não têm

poder e autoridade”. (PARO, 2010b, p. 61-62 -

grifos do autor).

Embora a aceitação possa ser espontânea, na maioria das escolas

é construída através da coerção, pelo medo, por ameaças, e/ou através da

manipulação, onde parte das informações é sonegada, convencendo as

pessoas com informações equivocadas, confusas ou verdades parciais.

Kuenzer (1984, p. 44) nos ajuda a compreender outra dimensão

desta busca por consenso na administração da escola, vinda da

administração científica, na qual “ocultar a divisão, a diferença, a

241

contradição através de um imaginário, é condição ‘sine qua non’ para a

manutenção do poder, que é a dominação do particular em nome do

universal [...]”. Para isso, as contradições e conflitos são tratados como

comportamentos patológicos, desvios que não contemplam a dimensão

social e perturbam a harmonia do todo, devendo ser evitados e tratados.

Segundo a autora, a teoria da administração, como corpo coerente de

representações, “‘explica’ a realidade da organização, as variáveis que a

compõem e fornece um corpo de normas coerentes para orientar a

prática, de modo a reproduzir a dominação” (KUENZER, 1984, p. 44),

motivo pelo qual a teoria da administração não questiona o fato da não

distribuição efetiva do poder.

Segundo Oliveira (2007, p. 57-58), a forma que se concretiza na

maioria das escolas públicas é a mesma que revela o atual organograma

da escola estudada, que:

[...] coloca em destaque a divisão do trabalho

intelectual e manual, sendo que no trabalho

intelectual encontra-se estratificado o(a)

diretor(a), no topo e em seguida, a vice-direção e,

abaixo dessa, o corpo docente. No trabalho

manual, que é a base dessa pirâmide, encontramos

o pessoal administrativo, limpeza, portaria e

merenda.

A autora explica que as relações de trabalho na escola se dão de

forma contraditória uma vez que, por um lado, a legislação aponta para

uma gestão coletiva da escola, e por outro, coloca a direção como núcleo

que organiza, coordena, controla e superintende todas as atividades

administrativas, financeiras e pedagógicas da escola. Avaliamos que a

Lei também se contradiz quando afirma a importância da equipe

diretiva, composta pelo diretor, vice-diretores e coordenador

pedagógico, mas ao estabelecer as atribuições, o faz apenas

responsabilizando o diretor e não a equipe diretiva como consta no

início da lei – e após a distinção do diretor, também não regulamenta de

forma separada as atribuições dos vice-diretores e do coordenador,

deixando uma lacuna na abrangência da gestão democrática uma vez

que esta envolve a equipe diretiva toda e, por conseguinte, as atividades

dos vice-diretores e do coordenador.

Paro explica que por condicionantes ideológicos entendemos

“todas as concepções e crenças sedimentadas historicamente na

personalidade de cada pessoa e que movem suas práticas e

242

comportamentos no relacionamento com os outros.” (PARO, 2000, p.

47). Aqui importa a visão que o coletivo escolar tem da comunidade e a

visão que a comunidade tem da escola, além da concepção de

participação que as pessoas têm. O mais comum é as pessoas se

sentirem participando quando podem votar e escolher o dirigente, e não

consideram necessária a participação na organização da escola, e a

direção da escola aceitar a participação no momento da execução de

tarefas, mas questionar e não aceitar a participação na tomada de

decisões. A ampla maioria dos participantes da pesquisa relata que não

lhes é permitida a participação nas decisões que fazem parte da gestão

da escola, a não ser a eleição de direção, que muitos dizem participar

por ser obrigatória, enquanto outros afirmam que isso é importante. Já

por sua vez, a direção critica a ausência, inclusive pelo fato de não

desejarem responsabilidades. Constitui-se mais uma contradição, sem

perceberem que os dois polos desta contradição são determinados, em

suas ações, pela sociedade capitalista, abre-se mais um campo de

disputa: de quem é a responsabilidade pela não efetivação da

participação e democracia. Foram expressões recorrentes da comunidade

escolar quando perguntados sobre os motivos da não participação nas

decisões que a gestão da escola envolve: “Não podemos participar e não

temos oportunidade de dar nossa opinião.” (E7); “Acho que a diretora

devia aceitar as sugestões dos alunos para melhorar a escola.” (E8);

“Porque não nos perguntam nada.” (E3); “Não nos dão essa

possibilidade.” (E10); “Não deixam os alunos darem opinião de [sic]

merenda.” (E16); “Não podemos decidir isso.” (E9); “A escola não

aceita a opinião [...].” (E16); “Não permitem a gente decidir isso.” (E9);

“Não pedem a opinião dos pais e nem dos alunos.” (PR2). A diretora

percebe de outra forma a causa da ausência de participação:

Eu acho que o que está por trás de tudo que existe:

a ideia de que você possa chamar as pessoas para

fazer um trabalho, não é bem-vinda, das pessoas

assumirem um compromisso, não é bem-vinda.

[...] É difícil. As pessoas não disponibilizam

tempo para a escola. (D).

Outra contradição presente na visão da escola sobre os pais é o

fato de se excluir os pais da participação nas decisões por conta de seu

baixo nível de escolaridade e por não conhecerem as discussões

pedagógicas, ao mesmo tempo em “que se exige que os mesmos pais

participem (em casa, no auxílio e assessoramento a seus filhos) da

243

execução do pedagógico” (PARO, 2000, p. 52, grifo do autor). A partir

dos estudos bibliográficos e das informações da pesquisa, ficou evidente

que os próprios pais e responsáveis, e mesmo os estudantes, assimilam

esta visão de inferioridade e se sentem incapazes de poder opinar, e

atribuem a tarefa de decidir sobre as questões de organização da escola

aos professores e à direção. Quando perguntados sobre decisões como

carga horária semanal por disciplina, instrumentos de avaliação,

cardápio da merenda escolar, aplicação da verba entre outras, foram

recorrentes respostas como “Isso é com os diretores.” (E16); “Apenas

nutricionistas e cozinheiras.” (E1); “São coisas dos professores.” (E5);

“Isso quem sabe são os professores.” (PR3); “Coisa deles.” (PR3);

“Cabe à direção da escola.” (E2); “Só a diretora sabe o que fazer.”

(E22); “São assuntos internos.” (PR4); “Coisa da SEC.” (E5); “É outro

setor.” (F3). Maria Malta Campos (1991, p. 58-59 apud MENDONÇA,

2000, p. 97) afirma que as mães percebem como autoritarismo e

humilhação terem que participar de reuniões nos horários que se

adequam à vida dos professores e sobre assuntos que não se sentem

competentes. Sobre os pais participarem das discussões e decisões

pedagógicas, a diretora nos explica que “Essa é até uma dificuldade que

a gente tem, porque os pais dizem pra gente assim: ‘olha eu não entendo

esse assunto, eu conheço pouco disso, eu não devia opinar sobre isso’.”

(D).

Segundo Paro (2000), se a escola julga que os pais são

incapacitados para opinarem e decidirem sobre os rumos pedagógicos e

administrativos da escola, também não poderia responsabilizar estes

mesmos pais pelo fracasso escolar de seus filhos, pois

contraditoriamente julgam que deveriam ter a competência formal e

profissional da docência sem sequer aceitar que têm conhecimento

suficiente para poderem opinar nas questões cotidianas do processo

educativo e de organização da escola. Esta contradição revela a falta de

consciência, de reflexão e de conhecimento sobre quem são os pais,

quem é a comunidade, o que pensam e como desenvolvem seu

conhecimento.

Este sentimento de incapacidade também se constrói como

reflexo da falta de informação sobre o funcionamento da escola e sobre

as possibilidades de participação que a própria lei apresenta. Enquanto

algumas teorias afirmam que vivemos a sociedade do conhecimento e da

informação, o que ficou evidente é a falta de conhecimento e de

informação, que nos leva a uma sociedade de seres humanos paralisados

politicamente, empobrecidos espiritualmente e, não raro, satisfeitos com

sua condição material de existência mesmo em condições precárias de

244

sobrevivência. Quando perguntados sobre alguns instrumentos e

instâncias de gestão, repetiram-se inúmeras vezes respostas como “Nem

sei se tem na minha escola.” (E6). “Nem sei o que é isto.” (E11);

“Nunca ouvi falar que tivesse tido alguma.” (F1); “Talvez não

tenham...” (E1); “Estamos sempre sem saber nada.” (E5); “Não sei se

existe.” (P1); “Desconheço a realização desta atividade.” (P5); “Nunca

sabemos o que fazem.” (PR3); “Não tenho conhecimento deste tipo de

evento.” (PR4).

A informação se constitui assim em outro limite para a

participação e a democracia. Falta informação de como se organiza a

escola, da existência do Conselho Escolar, de sua composição, da

existência (ou não) de CPM (Círculo de Pais e Mestres), de Grêmio

Estudantil, da Lei de Gestão Democrática, do PPP e sua construção, do

Regimento Escolar e sua construção, de reuniões etc. As pessoas não

conhecem a escola e na maioria das vezes a tratam como um ente

abstrato, distante, do qual não faz parte, expresso em falas como “É a

escola que decide.” (E13); “A escola não permite.” (E21); “Isto a escola

é que sabe.” (PR6); “A escola é que tem que fazer isso.” (PR7); “Não

temos decisão nenhuma, tudo escolhido pela escola.” (E20); “Eu não

decido nada quem decide é a escola.” (E25); “A escola devia escutar

mais a opinião dos alunos.” (E18); “Cabe à escola a decisão.” (PR1); “A

escola deveria ser mais compreensiva com os alunos para melhorar a sua

situação que não está das melhores.” (PR2); “A escola não nos permite

opinar sobre esta questão.” (PR4). Percebeu-se nos questionários que a

maioria das pessoas não busca conhecer e participar. Aceitam

passivamente o que lhes é informado como sendo suficiente, esperam

serem avisados, convidados, procurados para então intervirem, dando a

impressão de que não se importam em estarem distantes, sem

conhecimento da escola e que não desejam comprometer-se. Os aspectos

da falta de informação, que aliados à passividade inviabilizam a

participação na gestão da escola ficaram evidentes na recorrência de

falas como “Não somos convidados.” (E2); “Só se me chamarem.”

(PR2); “Não convidam.” (E18); “Nunca fui consultado.” (P1); “Não sei

se tem.” (E5); “Nem sabia que tinha isso.” (E6); “Não pedem nossa

opinião.” (E9); “Não perguntam isso aos alunos.” (E16); “Não faço nem

ideia se tem verba.” (PR3); “Nunca tive conhecimento do que ‘fazem’

com a verba.” (PR4); “Não falam sobre isso com os alunos.” (E3); “Não

consultam os alunos.” (E26); “Não sabemos o que fazem com o

dinheiro.” (E13); “Nem sabemos como é feita [a avaliação].” (E17);

“Não nos perguntam nada.” (E3); “Nunca tive interesse.” (E12); “Não

245

quis me responsabilizar pela turma.” (E14); “Não gosto de ser

responsável pelos erros dos outros.” (E17).

Lück, ao analisar a descentralização do poder na educação, nos

apresenta elementos para compreendermos um pouco mais esta relação:

Destaca-se, no entanto, o fato de que, muitas

vezes, intenções claras de descentralização, em

sua origem, na sua aplicação não passam de

esforços de desconcentração, tendo em vista o

hábito arraigado de obediência como forma de

transferência de responsabilidade pessoal.

(LÜCK, 2012, p. 55, grifo nosso).

Ao mesmo tempo em que não buscam abrir possibilidades para

participarem, e aguardarem serem chamados, fica evidente a

possibilidade: um espaço para construção da participação já que

respondem ao convite ou convocação, conforme o relato de muitos, de

terem participado de atividades de gestão por terem sido convidados.

Oliveira (2007) explica que as escolas estratificam seus alunos

conforme o exposto por Wood (2003, p. 73) tratando classe como “uma

camada numa estrutura hierárquica diferenciada por critérios

‘econômicos’ como renda, ‘oportunidades de mercado’ ou ocupação”.

Deste modo, contribui para o mascaramento da realidade da sociedade

dividida em duas classes antagônicas como ensinado por Marx, e faz

com que os alunos, pais e trabalhadores em educação não se vejam na

mesma classe social. Isso obstaculiza a organização destes trabalhadores

em busca de objetivos comuns e a ação coletiva para a transformação da

realidade, mesmo que a percebam da mesma forma e constatem os

mesmos problemas necessários de soluções. Esta estratificação ocorre

também nos órgãos de gestão: no conselho escolar, segundo Oliveira

(2007, p. 76), pela sua formação e estratificação conforme a economia

burguesa, os professores são elevados “a uma classe superior a dos pais,

que se encontram em situações de extrema pobreza”. Por esta

estratificação exercem influência ainda maior, e suas propostas tendem a

ser mais consequentes. Podemos compreender esta assertiva a partir da

análise do que ocorre na sociedade capitalista:

A classe detentora dos meios de produção atribui

para si as decisões fundamentais da sociedade,

enquanto o proletariado fica excluído desse nível

de decisão. Em alguns momentos, para diminuir a

pressão do proletariado, os donos dos meios de

246

produção acabam cedendo, mas o proletariado

participará das decisões secundárias ou

superficiais que não afetarão o sistema.

(OLIVEIRA, 2007, p. 85).

No sentido de incluir os pais, segundo Rodrigues (1983, p. 48

apud MENDONÇA, 2000, p. 98) é preciso reconhecer que a

comunidade escolar vai participar não para formular programas de ação

completos para a escola, “mas para determinar quais são as necessidades

e os tipos de educação necessários; que tipos de expectativas a

comunidade tem em relação à escola”. A partir das considerações dos

pais, todos em conjunto vão elaborar os planos, e os professores vão

contribuir com as questões pedagógicas para que os pais possam

acompanhar os debates, num intercâmbio de saberes.

Mendonça (2000, p. 98) explica que Oliveira e Catani (1993)

consideram como fatores que inviabilizam ou dificultam a participação

da comunidade, a resistência dos professores e especialistas a qualquer

prática que possa significar perda de poder; a falta de sentido para os

pais de participarem quando a influência que podem exercer não é clara;

as inúmeras formas de participação com resultados pouco visíveis e um

consequente desencanto. Nossa pesquisa na escola converge com a

conclusão desses autores. Quanto à consequência de sua participação, a

comunidade ou se mostra insegura, ou demonstra certeza de que nada

vai mudar. O descaso da direção com sua opinião é percebido pelos pais

e estudantes, que quando perguntados sobre por que não opinam nas

decisões da escola, fazem comentários como: “Porque não muda em

nada.” (E23); “ Eu não falo, porque eu não vou me cansar sabendo que

tem muito pouca possibilidade de me ouvirem.” (E24); “Eles não ouvem

ninguém. O que nossa palavra vai adiantar para eles?” (E5); “É a mesma

coisa que nada, perda de tempo.” (E15); “Porque se damos opinião não

sai da teoria.” (E2); “Quando se dá opiniões, não são aceitas.” (E16);

“Não ouvem os pais e nem os alunos.” (PR2); “Quando opinamos não

somos ouvidos.” (PR4). Entre os estudantes, 76,5% responderam que

suas opiniões e sugestões não são consideradas para a organização da

escola, e apenas 13,7% responderam que são consideradas. Além deste

aspecto, a autonomia da escola é tão limitada que apenas decisões

“cosméticas” podem ser tomadas. As escolhas possíveis tornam-se

insignificantes em relação ao esforço exigido para vencer os

condicionantes e garantir a participação da comunidade escolar na

decisão. Não há razão em priorizar em suas vidas discussões infrutíferas

que não vão mudar de fato a escola.

247

Referenciado em Carvalho (1989), Mendonça (2000) acrescenta

que a comunidade percebe que sua participação é oportuna em tarefas

materiais como limpeza e manutenção da escola, ajuda financeira etc.

enquanto que sua opinião e esforço para interferir nas decisões da escola

é vista como intromissão, abuso, invasão. O corporativismo dos

professores também se constitui num fator que acabou por excluir a

comunidade da escola. Segundo Oliveira (2007, p. 77), existe o “receio

da possibilidade de atrito entre pais e professores, na medida em que os

pais possam passar a se intrometer na sala de aula”, sendo assim, melhor

não dar muita abertura à participação.

Mendonça (2000, p. 103) constata a pressão que o segmento dos

professores exerce sobre a organização da escola para garantir a sua

hegemonia, e explica que à medida que a escola vai se abrindo para a

participação dos demais segmentos e a participação vai sendo ampliada,

os conflitos de interesses aumentam e “estabelecendo-se por vezes, uma

verdadeira guerra de segmentos”, fato que pode ser observado de forma

empírica na pesquisa.

Outro aspecto é descrito por Pereira (1967 apud MENDONÇA,

2000, p. 99) cujo estudo apontou que, embora a escola seja pública, a

comunidade não sente este pertencimento. Em suas entrevistas com

diretor, auxiliar de direção, pais, alunos, professores, serventes e

moradores, todos definem a escola como sendo dos professores, do

diretor e do auxiliar. Embora a pesquisa tenha sido realizada em 1960,

ainda reflete o que se passa na escola pública hoje (mesmo que não de

maneira absoluta quanto na época) demonstrando as determinações que

se impõe à escola pela sociabilidade do capital. Em nossa pesquisa ficou

demonstrado que ao se referirem à escola, parcela dos indivíduos dos

diversos segmentos se refere a “eles” e quando questionados sobre as

atividades de gestão dizem ser atribuição “deles” (referindo-se

normalmente aos professores ou à direção). Mendonça explica que a

concepção patrimonialista da escola,

[...] que permite ao professor apoderar-se da

instituição e dos alunos como coisas que lhe

pertencem, afasta a comunidade e impede, até

mesmo o diretor, de interferir nas atividades e

relações internas da sala de aula, já que o

professor é o ‘dono’ de sua classe.

(MENDONÇA, 2000, p. 101, grifos do autor).

248

Nesta concepção, o diretor, além de amortecer os conflitos, acaba

sendo um guardião do poder do professor perante a comunidade, em

alguns casos impedindo o contato entre os segmentos, como expresso

por uma mãe de estudante: “Mal temos contato com os professores.”

(PR4). Esta função da direção é muito evidente nas escolas. Assim,

principalmente os pais, não se sentem legítimos em decidir, em

participar da gestão, da organização, uma vez que sentem que a escola

não lhe pertence.

O autor aponta ainda a questão da posse, do poder doméstico dos

professores sobre os alunos, principalmente nos anos iniciais, onde se

desenvolve uma relação afetiva de parentesco, baseada em relações de

posse, de ingratidão, nela há espaço o castigo, a punição. O estudante

não se configura num sujeito, nem sujeito de direitos, pois o professor

exerce o domínio e quem tem a posse dos bens materiais é quem tem o

poder, o professor, mesmo que a escola pertença aos estudantes também.

A análise feita por Freitas (1994) revelou essas relações que se

desenvolvem nas salas de aula, que vão condicionando o

comportamento dos estudantes e formando-os para a inserção social. Ao

acompanhar as aulas de uma professora por mais de um semestre letivo,

o pesquisador concluiu que 52% dos episódios eram de ocorrências de

situações aversivas aos alunos, como punições, ameaças e comparação

negativa. O autor relata que:

Chega-se a temer pela saúde da professora tal é o

grau de desgaste emocional a que é submetida.

Por outro lado, pode-se imaginar as repercussões

deste “stress” para a formação dos alunos. O

professor – nos limites de sua atuação – recorre à

punição como forma de motivar os alunos a

realizar as tarefas escolares. A forma de

organização do trabalho pedagógico acaba

impondo estas condições. (FREITAS, 1994, p.

198).

Esta forma de interação entre professor e aluno é muito presente

nas escolas atualmente, conforme relatos de alunos, pais e professores, e

também é comum nas ações de gestão da escola, nos momentos de

decisões “coletivas”, bem ilustrada pela resposta dada por um

participante da pesquisa, quando perguntado se a escola é democrática,

ao que responde negativamente justificando que: “Não temos voz. Se

temos é suspensão.” (E1). Outra estudante faz algumas considerações no

espaço destinado a comentários que apresenta inúmeros dos aspectos

249

que analisamos e nos apresenta uma imagem da realidade da escola

pública contra a qual lutamos:

Nosso colégio vive numa burocracia, onde nem

um aluno tem o direito de expor sua opinião, tudo

para eles não tem valor tipo uma opinião de uma

pessoa que não passa de um estudante.

Tudo que eles não [nos] propõem nos [sic] temos

que fazer pois se não coremos [sic] o risco de

rodar. As salas de aula são um nojo tudo caindo e

vamos pedir para ajudar e não adianta de nada...

(E5).

A exclusão na gestão da escola também é percebida no segmento

que convive dentro da escola, que são os estudantes, os professores e os

servidores. Embora seja incontestável a primazia dos professores e

funcionários, estes sofrem os mesmos condicionantes que os pais, e

embora na aparência o acesso às discussões e decisões é mais fácil a

eles, as pessoas ignoram quase que totalmente o direito de participação

que a legislação traz, desconhecem quais as pessoas (seus pares) fazem

parte do conselho escolar e são condicionados pelos mesmos elementos

já analisados. Os relatos dos professores a seguir demonstram algumas

especificidades que se estabelecem nas relações de gestão da escola que

entravam a participação: sobre a participação na elaboração do PPP:

“Nunca fui consultado.” (P1); “Nunca houve esta [dos professores]

participação.” (P2); sobre a participação na elaboração do Regimento

Escolar: “O atual foi imposto pela Secretaria de Educação.” (P1);

“Desde que estou aqui não foi alterado o Regimento Escolar.” (P3);

“Politécnico [Regimento para o Ensino Médio Politécnico] já veio

estruturado.” (P6); sobre reunião de professores: “São obrigatórias, mas

pouco produtivas.” (P1); “As decisões já vêm prontas da diretora.” (P1);

“Só para dar recados. Não há nenhum tipo de estudo ou algo ‘útil’. Total

perda de tempo. O que é necessário e preciso não é abordado.” (P2);

sobre a participação em outros espaços ou atividades na escola: “A

direção dificulta ao máximo a realização de qualquer atividade na

escola.” (P1); “Na escola nenhum. Não há ‘abertura’.” (P2). Embora

44,5% dos professores que responderam à pesquisa consideram a escola

autoritária e 22,2% um pouco autoritária, e, 77,8% avaliam que a escola

devia ser mais aberta à participação, 88,9% consideram que têm

autonomia de decisão sobre suas aulas e conteúdos, o que pode

configurar-se em possibilidade de transformação da escola. Sobre o

250

caráter autoritário e não democrático da escola alguns professores assim

justificam: “As decisões já vêm prontas. [...] Não há espaço para as

ideias serem aceitas.” (P1); “Decisões centralizadas.” (P2); “A direção

tem o poder de tudo – consegue administrar a organização da escola.”

(P3); “Há a concentração de poderes decisórios nas mãos de uma

pessoa, mas isso acaba sendo bom, pois há muita experiência e as

decisões são bem tomadas!” (P4).

A relação dos professores e direção com os funcionários de

escola também não é pautada em relações de igualdade, numa visão de

que são colegas, ainda predomina a subalternidade dos funcionários e o

mando pelos professores e direção. Apontada na pesquisa de Pereira

(1967) aplicada em 1960, a realidade vem mudando lentamente. No RS

houve um grande empenho da luta sindical pela aprovação do Plano de

Carreira dos funcionários de escola, já que se acreditava que seria um

fator decisivo para democratizar a relação com os demais trabalhadores

da escola, uma vez que teriam suas atribuições especificadas em lei, não

mais estando sujeitos às definições da escola e aos mandos das direções

e professores. Mas, do mesmo modo que na Lei de Gestão Democrática,

novamente a realidade desafia e demonstra que é preciso a ação

consciente dos indivíduos para transformá-la. Não há como os

funcionários participarem das instâncias de gestão da escola numa

relação democrática se no cotidiano estão submissos aos que devem

tratar como iguais nos momentos de discussão, elaboração e decisão.

Segundo Pereira (1967), a posição inferior dos funcionários não deriva

apenas de sua posição culturalmente vista como abaixo dos professores

hierarquicamente, mas também da condição socioeconômica. Estes

recebem salários mais baixos e vêm de estratos mais pobres da

população. Esta caracterização da inferioridade é feita pelos próprios

funcionários, como nossa pesquisa também demonstrou, onde parcela

acha legítimo ser subordinado à direção e aos professores, e que estes

são considerados bons apenas por não os humilharem ou explorarem em

tarefas de exigências pessoais.

Percebe-se também a ausência de assembleias de segmentos para

subsidiar os representantes para participarem das reuniões e deliberações

formais do Conselho Escolar, e a ausência de pautas para as reuniões, as

quais deveriam ser divulgadas previamente possibilitando a busca de

mais informações sobre o assunto, o debate na comunidade escolar, o

encaminhamento das decisões tomadas e a defesa de posições. Um

aspecto trazido por Oliveira (2007), lembrado por uma mãe membro do

conselho escolar da escola alvo de sua pesquisa, é o da dificuldade de

organização ainda maior para o segmento pais. A mãe lembra que os

251

professores, funcionários, estudantes e direção, se encontram

cotidianamente e se conhecem, sendo que muitos têm intimidade entre

si, enquanto que os pais permanecem em um total isolamento. Apenas se

enxergam no momento em que deixam ou buscam seus filhos na escola,

o que inviabiliza sua organização e a representação deste segmento no

conselho, pelo mesmo motivo, acaba não sendo consequente.

Além disso, a estrutura física das escolas estaduais, justificada na

necessidade de proteção contra a violência, apresenta uma barreira quase

intransponível para se chegar a entrar na escola ou conseguir falar com

alguém interno à escola92

. O comum são portões trancados, sem

trabalhadores para atender na portaria, sem campainhas onde para entrar

é preciso dispor de tempo e convicção do que se quer. Nas visitas às

escolas era comum depararmo-nos com pessoas desistindo e afirmações

como “Aqui é assim, ninguém consegue entrar.”; “Nunca abrem o portão.”; “A gente nunca consegue entrar.”

93 E uma vez dentro da

escola, a exclusão se repete, não são atendidos, não podem falar com os

professores, as direções não os recebem, não há pessoal disponibilizado

para fazer um atendimento. Esses são fatores que desestimulam a

participação dos pais, que em algum momento tentaram esse contato

com a escola.

Outro aspecto a ser considerado é o fato de que a prática da

gestão na escola não se apoia numa teoria do conhecimento, orientada

por princípios coesos e coerentes, de modo a orientar ao alcance do que

está descrito em seu PPP como seu objetivo. A gestão da escola é

desenvolvida mesclando diferentes conceitos e princípios de gestão,

tendo como principais influências os modelos de gerência e

administração do taylorismo, do fayolismo, do fordismo, do toyotismo e

pautada em princípios autoritários, hierarquizados e excludentes. Esta

mistura não é algo planejado pelos gestores da escola, pois estes seguem

as recomendações dos governos, e por falta de clareza teórica e

entendimento das propostas, acabam por desenvolver uma prática

baseada no espontaneísmo, sem um planejamento prévio, em que a

direção dá conta de manter os alunos e professores em sala de aula,

independente do que estejam fazendo, desde que não perturbem a

“organização” da escola. Acaba sendo uma gestão do cotidiano, e dos

92

Isso foi constatado ao longo de alguns anos de visitação às escolas enquanto

direção do sindicato, e no próprio momento da coleta de informações desta

pesquisa. 93

Anotações em relatórios pessoais de visitas às escolas como Diretora de

Núcleo do Sindicato no período 2005-2008.

252

problemas imediatos, que afloram incessantemente, como a ausência do

professor, desobediência e desacato pelos alunos (considerados

indisciplina), atos de violência, alunos gazeando aula, falta de recursos

etc. Fica evidente na resposta da diretora quando perguntada sobre quem

administra a escola:

Não, não dá para dizer que é direção e conselho.

Porque, a direção da escola, pelas carências que

existem... digamos assim, faltam dois ou três

professores num dia, dá uma emergência, alguma

sala alaga, estoura um cano, não dá tempo para

chamar o conselho e discutir se vai fazer. [...] o

ideal seria isso, mas você vive numa situação de

muitas necessidades, e a escola é de muita

diversidade [...] Mas isso é basicamente assim, em

cima de necessidades. Planejamento a longo

prazo, isso a gente não tem. [...] Então as coisas

basicamente são quando surgem as demandas, por

parte da Secretaria de Educação, por parte da

escola, por parte da estrutura. É basicamente em

cima disso. É a direção, supervisão, tá todo

mundo envolvido, mas enfim, não há um

planejamento a longo prazo. (D).

A falta de planejamento também se torna um limite para a ação

coletiva. Não há como organizar momentos de discussão, debates, de

levantamento de problemas, de construção de propostas e objetivos sem

planejar um tempo para esta atividade. Para viabilizar a participação é

necessário um planejamento prévio, uma agenda organizada, pautas

definidas para as reuniões e encontros e muita disciplina para que as

reuniões não acabem em instâncias de encontro para conversa, ou

queixas sem propostas de soluções e longas discussões vazias. Definir

objetivos requer planejamento de tempo, de recursos, de levantamento

de necessidades e priorização de pontos aos quais devem ser

direcionadas as ações. No entanto não é possível planejar quando as

demandas cotidianas sufocam o tempo e os recursos (humanos e

materiais) disponíveis.

Outro elemento da gestão, a avaliação, é citada por Freitas (1994)

como sendo uma categoria central para a compreensão da organização

do trabalho pedagógico, considerando que a avaliação em certa medida

determina os objetivos da escola. Consideramos que a avaliação também

é essencial para a gestão e sua manutenção ou transformação, já que é a

253

partir dela que se pode verificar se há a efetivação ou não dos objetivos

aos quais ela própria conduz.

A avaliação interna proposta pela Lei de Gestão Democrática se

pauta em objetivos neoliberais para a educação, pois tem como base o

princípio da produtividade, baseado nos índices de permanência-evasão

e progressão-repetência, conforme segue:

A avaliação do Plano Integrado de Escola, que se

constitui na avaliação interna, será efetivada

através da aferição do cumprimento das metas do

Plano Integrado e da produtividade do processo

escolar, com base na avaliação de desempenho

dos alunos, considerando, entre outros, os índices

de permanência e promoção na vida escolar. (RIO

GRANDE DO SUL, 2012, Art. 76, § 2º).

Como produtividade é algo medido quantitativamente, e a

avaliação da educação é por essência qualitativa, criam-se formas de

quantificar, através da produção de índices de desempenho no que pode

ser medido: evasão, repetência, competências entre outros.

Também como forma de controle e mensuração, a gestão por

parte do Estado é feita através de programas (como PDDE, PDE, Mais

Educação, ProEMI, Programa Brasil Alfabetizado etc.)94

ligados a

verbas específicas a serem investidas nas escolas, com orçamento pré-

definido (verba já direcionada), nos quais a escola tem que optar entre

aderir e ficar obrigada a cumprir metas, ou não receber recursos.

Villas Boas (1993, p. 360) nos apresenta outra dimensão

importante da avaliação ao afirmar que

A avaliação formal e informal molda atitudes e

valores que afetam a todos os alunos, mesmo os

que são aprovados. Também estes incorporam os

modelos impostos. Para permanecerem na escola

e obterem sucesso é preciso que os alunos se

conformem às suas normas. [...] A avaliação

direciona o trabalho pedagógico e contribui para a

formação do aluno para a ordem capitalista.

94

Mais informações disponíveis em:< http://pdeinterativo.mec.gov.br/>; <

http://portal.mec.gov.br/>. Acesso em: 23 jan. 2014.

254

A avaliação classificatória contribui para a lógica da

competitividade, da exclusão, da hierarquização. No entanto ela se

converte numa ferramenta de fácil justificação uma vez que os

estudantes já chegam na escola com estes valores bastante enraizados

por sua convivência na sociedade capitalista e desejam esta competição

e classificação. No entanto, os efeitos são barreiras quase incapacitantes

principalmente aos que não atingem o conjunto de atitudes, valores e

conhecimentos estipulados pelo professor como ideais. Estes tendem a

sentir-se inúteis à sociedade, visão incentivada pelo sistema.

A avaliação aplicada nas escolas atualmente não tem servido para

construir alternativas aos principais problemas da educação, uma vez

que estes não derivam da escola, mas tem suas raízes na formação

socioeconômica. Não há uma avaliação permanente interna, e a

avaliação dos alunos é insuficiente para forjar possíveis caminhos e

soluções para os problemas que poderiam ser solucionados no âmbito da

escola, e em alguns casos, é insipiente mesmo para apontar os

problemas, pairando uma aparência de que, desde que cumpridos os 200

dias letivos e as 800 horas-aula, tudo está bem.

Outro limite a ser superado é a questão dos princípios da

racionalidade técnica, aplicada tanto na gestão da educação e da escola

como na formação de professores, em que se investe no aspecto técnico-

prático, separado do aspecto crítico e teórico, onde se buscam pessoas

capazes apenas de executar uma série de procedimentos sem refletir

acerca da prática e de seus objetivos. A criticidade é vista como um

elemento negativo, capaz de desestabilizar os ambientes e provocar

polêmicas e discussões. O bom profissional é o que é capaz de adaptar-

se às novas situações sem questionar, e realizar as tarefas práticas com

eficiência.

Em 2012, foram alterados alguns elementos que faziam parte da

legislação e que eram considerados entraves à democratização da gestão

por contribuírem para a formação de uma cultura de relações autoritárias

dentro da escola nos últimos anos. A alteração pode contribuir com a

democratização de algumas práticas da gestão. O Art. 9º regulamentava:

“O período de administração do Diretor corresponde a mandato de três

anos, permitidas reconduções” (RIO GRANDE DO SUL, 2001). Não

havendo limite de reconduções a lei possibilitava a perpetuação do

Diretor no cargo, o que contraria o princípio da divisão do poder e da

alternância das pessoas no poder. Um dos elementos que constituem a

democracia é a condição dos indivíduos de serem governantes. O

contexto de não alternância no poder, reduz o interesse das pessoas em

prepararem-se para governar, construírem alternativas de direção, de

255

programa para a escola, de pensarem rumos, de se sentirem

responsáveis. Além disso, a perpetuação no cargo foi criando vícios

burocráticos e autoritários que foram sendo reforçados a cada novo

mandato. Não é raro encontrar diretores de escola em seu décimo

quinto, ou décimo sexto ano, como diretores da mesma escola, a

exemplo da escola pesquisada em que é o décimo quarto ano da diretora

no cargo. Na pesquisa isso apareceu como reclamação da comunidade

escolar, a repetição da diretora no cargo e o fato de nas duas últimas

eleições terem apenas uma candidata à direção, não tendo escolha nem

sequer no momento da votação.

Outro elemento que foi alterado na Lei de Gestão Democrática

em 2012 é a escolha dos vice-diretores, que era feita pelo diretor, depois

de eleito. Votava-se apenas no diretor, e este ganhava poderes para

decidir quem seria o restante da equipe diretiva, tão importante quanto o

diretor, e quando do impedimento deste, assumiria como diretor o vice-

diretor, que não havia sido escolhido pela comunidade. O diretor era

dotado de um poder todo especial, de inclusive destituir seus vice-

diretores se dele discordassem, prática comum conforme relatos ao

sindicato. Atualmente a eleição ocorre por chapas, donde há a

possibilidade de tirar a ênfase do debate personificado em quem se

candidata para o cargo de diretor, dando maior ênfase ao programa e

fortalecendo o debate acerca de uma alternativa de educação e escola. E

o conselho escolar é que tem o poder de destituir alguém da direção.

Pode-se apontar também a questão do voto universal, que com

peso igual para cada voto, independente do segmento, até a alteração da

lei em 2012, a decisão recaía sobre o segmento pais e alunos. Embora os

professores e funcionários tenham um poder de persuasão maior sobre a

comunidade do que o contrário, ainda assim em última análise quem

decidia quem seria o diretor era o segmento pais e alunos, por ser

absolutamente mais numeroso. Atualmente o peso dos votos é

considerado por segmento, sendo que 50% a pais e alunos e 50% a

professores e funcionários, dividindo por segmento a responsabilidade

de selecionar o melhor programa para a escola e as pessoas que vão

conduzir sua aplicação.

Embora essas alterações possam contribuir para o

desenvolvimento da democracia, sabemos que apenas a ação da

população pode de fato realizar essa possiblidade, e não isoladamente na

escola, mas numa relação dialética com a sociedade. Oliveira (2007, p.

78) anuncia uma possibilidade sobre os conselhos escolares com a qual

compartilhamos:

256

[...] as possibilidades de relações de trabalho

realmente democráticas só serão possíveis quando

homens e mulheres se reunirem, não para cumprir

dispositivos legais, mas em espaços simples,

pobres e, assim, lentamente, ganharem força para

que se transformem através da luta [...].

Só pela ação prática e pensada, planejada, o trabalhador pode

transformar a realidade e desenvolver sua consciência, transformando-se

no processo de transformação da realidade externa.

Concordamos com Titton (2006, p. 9), quando elenca entre as

tarefas revolucionárias combater as práticas, comportamentos e valores

próprios do sistema do capital, entre estas, que devemos “Combater

práticas pedagógicas reacionárias, autoritárias, alienantes, alienadas e

alienadoras”, das quais pensamos que a gestão da escola como se

desenvolve atualmente faz parte, por isso a necessidade de nossa

atuação consciente para a sua transformação.

Freitas (1994, p. 278) ensina que “As ‘possibilidades’ não são um

produto ‘natural’. São concretizadas no bojo das lutas político-

ideológicas e só se convertem em realidade com clareza política e

ideológica”. A clareza política e ideológica também só pode ocorrer em

decorrência da ação, da atuação na luta, o que exige uma integração da

luta, da participação ativa e da formação contra-hegemônica, com uma

escola que articule os conhecimentos científicos que possibilitam às

classes populares a apropriação do real.

Idealizamos que através da participação popular na gestão da

escola consigamos chegar ao que Saviani (2008) chama de o ponto

correto da pedagogia, que recai na

[...] valorização dos conteúdos que apontam para

uma pedagogia revolucionária. Esta identifica as

propostas burguesas como elementos de

recomposição de mecanismos hegemônicos e

dispõe-se a lutar concretamente contra a

recomposição desses mecanismos de hegemonia,

no sentido de abrir espaço para as forças

emergentes da sociedade, para as forças

populares, para que a escola se insira no processo

mais amplo de construção de uma nova sociedade.

(SAVIANI, 2008, p. 46).

257

Só a participação pode criar os novos valores necessários à nova

sociedade, sem classes, e as ações pautadas nestes novos valores. Como

nos ensina Chaui (2008, p. 76),

Se compreendermos a democracia como

instituição de uma sociedade democrática e o

socialismo como instituição de uma política

democrática, compreenderemos que somente

numa política socialista os direitos, que definem

essencialmente a sociedade democrática, podem

concretizar-se e que somente numa sociedade

democrática a prática política socialista pode

efetivar-se. Assim, uma nova política cultural

precisa começar como cultura política nova, cuja

viga mestra é a ideia e a prática da participação.

No entanto, para que a participação ocorra de fato, são muitos os

desafios a serem enfrentados. As formas de exclusão se reproduzem na

sociedade capitalista como uma necessidade do sistema para garantir sua

manutenção. São ferramentas de fortalecimento do sistema de poder do

capital e perpassam todas as estruturas sociais, em todas suas

organizações. Lenin (2007, p. 105) nos apresenta alguns exemplos de

limites que estão postos, mesmo que a sociedade se diga democrática,

que devem ser considerados em nossas reflexões:

Se observarmos mais de perto o seu mecanismo

[da democracia da sociedade capitalista], só

veremos, sempre e por toda parte, restrições ao

princípio democrático, nos ‘menores’ [...] detalhes

da legislação eleitoral [...], assim como no

funcionamento das assembleias representativas,

nos obstáculos de fato ao direito de reunião (os

edifícios públicos não são para os ‘maltrapilhos’),

na estrutura puramente capitalista da imprensa

diária etc., etc. Essas limitações, exceções,

exclusões e obstáculos para os pobres, parecem

insignificantes, [...] mas, totalizadas, essas

restrições eliminam os pobres da política e da

participação ativa na democracia.

São muitos os limites impostos pela sociabilidade do capital à

conformação de espaços democráticos, desde os mais evidentes aos mais

258

velados, cujo reconhecimento pela classe trabalhadora já representa uma

possibilidade de sua superação.

São muitas as concepções e termos que se referem à gestão da

escola, entre eles o de gestão democrática – que também é polissêmico –

o que torna o tema ainda mais complexo e polêmico, configurando-se

em mais um limite para a efetivação de uma gestão identificada com os

interesses da classe trabalhadora e para a unidade dos trabalhadores na

defesa de um projeto de educação que possa contribuir para a

emancipação humana. No entanto, na perspectiva do capital, essa

diversidade de termos e de significados que gera a fragmentação na luta

por uma educação de classe, é o que possibilita a construção do

consenso em torno da sua proposta e a realização do seu projeto

educacional, que vai enfrentar pouca resistência por parte da classe

trabalhadora.

Os trabalhadores, por todas as razões expostas, não estão

conseguindo construir a unidade para a ação. Um ponto inicial para que

a unidade se torne possível é a necessidade de os trabalhadores

identificarem quais são suas reivindicações comuns. Tanto na escola

quanto na sociedade não há espaços abertos para este tipo de discussão e

elaboração, fazendo com que os indivíduos criem um falseamento da

realidade e compreendam suas reivindicações de forma isolada do todo

social, como se estas fossem demandas individuais para as quais não

têm capacidade de exigir e propor soluções.

Várias reivindicações foram descritas livremente pelos

participantes da pesquisa no espaço do questionário reservado para

comentários. Estas reivindicações não parecem ter o caráter de uma

pauta de luta dos coletivos da escola, faltando para isso apenas um

impulso da discussão coletiva, na qual, compartilhando desejos e

propostas para a escola, todos pudessem tomar ciência das

reivindicações dos demais e organizar os coletivos para defenderem suas

pautas. Algumas reivindicações descritas pelos estudantes foram: direito

a todos opinarem nas decisões; maior abertura da escola para os alunos

opinarem; maior abertura da escola para os alunos participarem e

exporem suas ideias de como melhorar a escola; maior consideração

com as opiniões dos alunos; grêmio estudantil; merenda melhor; festas;

escola limpa; uma escola mais democrática; uso melhor das verbas para

conforto dos alunos; mais investimento em livros novos; melhoria das

condições de estrutura, salas de aulas, banheiros, prédio, limpeza,

pintura etc.; realização de festas e passeios com a participação dos pais;

cerimônia de formatura (reivindicação dos 3º anos do EM); mais

passeios culturais para melhorar a aprendizagem; abertura para novas

259

atividades como gincanas, campeonatos; cantina; merenda antes do

recreio, que é muito curto; atividades em que os alunos tenham voz e

maior contato social.

As reivindicações descritas pelos pais foram: uma escola mais

compreensiva com os alunos; limpeza no banheiro, nas salas; mudança

do cardápio da merenda para os alunos; grêmio estudantil para decidir o

que fazer com as verbas, passeios, direção da escola etc.; melhores

condições de estrutura; abertura da escola aos finais de semana com

atividades, por exemplo, esportivas para a comunidade, visando

melhorar o desempenho físico e mental das crianças; brinquedos e

atividades para as crianças das séries iniciais desenvolverem suas

habilidades e preservarem a infância; atividades com pais e alunos para

se aproximarem da direção, professores e outros pais.

Apenas uma reivindicação foi descrita pelos professores: gestão

compartilhada, com setores mais autônomos no que diz respeito às suas

funções. E pelos funcionários: a escola como um ambiente educacional

devia ser um exemplo a ser seguido em todos os sentidos e não é o que

se vê no dia-a-dia; valorização dos professores e funcionários e maiores

investimentos nas escolas.

Estas reivindicações demonstram a possibilidade de unificar a

luta no cotidiano da escola e de aumentar a participação da comunidade

organizada nos seus segmentos, defendendo suas propostas e elevando

sua prática ao nível da práxis reflexiva e criadora, desenvolvendo sua

consciência cada vez mais e criando condições para transformar a escola

e a sociedade.

260

261

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS: AS POSSIBILIDADES DE

CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS DE GESTÃO QUE

CONTRIBUAM PARA O ACIRRAMENTO DAS

CONTRADIÇÕES DA ESCOLA CAPITALISTA COMO

ESTRATÉGIA DE LUTA PELA EMANCIPAÇÃO HUMANA

Buscamos em nosso estudo compreender onde se encontram os

limites impostos à gestão democrática da escola pelo modo de produção

capitalista, e em suas contradições identificar que mediações entre a

prática e a legislação acerca da gestão da escola pública indicam

possibilidades de ação superadora que direcionem para práticas

democráticas, emancipatórias, de modo a contribuir para o acirramento

das contradições da escola e da sociedade capitalista e levar o coletivo

da comunidade escolar a articular-se às lutas sociais pela superação da

sociedade de classes rumando à emancipação humana.

O trabalho alienado decorrente da propriedade privada dos meios

de produção tem como consequência seres humanos parcialmente

desenvolvidos, destituídos do conhecimento em decorrência da divisão

do trabalho e desumanizados pela exploração, precarização e

intensificação do trabalho. Estas determinações perpassam todas as

organizações e formações materiais na forma de mediações, incluindo as

escolas públicas estaduais e a sua gestão, em todo seu processo de

construção e desenvolvimento.

A comunidade escolar não pode ser culpabilizada pelo

autoritarismo que envolve sua gestão e a gestão da educação como um

todo. As determinações do sistema do capital perpassam toda a estrutura

social, e a hegemonia exercida pela classe dominante controla e domina

a consciência dos homens. Estes, guiados pelos valores da sociedade

capitalista, têm poucas possibilidades de romper com o individualismo,

com o isolamento e tomarem consciência de si enquanto classe, assim,

repetem nas estruturas das quais fazem parte, os vícios da sociedade

burguesa. O autoritarismo mascarado de democracia, ou a democracia

burguesa, cria a ilusão do poder compartilhado, enquanto que a decisão

que permite aos membros da classe trabalhadora participar com poder de

interferir é a da escolha de seus representantes, o que fazem sem

condições subjetivas de discernir acerca de um programa que de fato

contemple seus interesses. Assim como na organização do poder estatal,

nas esferas de governo federal, estadual e municipal, na escola pública

também a participação da população se restringe ao momento do voto;

sem uma transformação do conjunto das estruturas, os trabalhadores

262

também não têm possibilidades de construírem a gestão da escola de

forma democrática. Por mais que a legislação aponte no sentido da

democratização e da participação de todos na construção do Projeto

Político Pedagógico da escola, na elaboração do Regimento Escolar e na

parte administrativa através do conselho escolar, fica clara que a

autonomia garantida é extremamente restrita, impedindo a elaboração de

um projeto distinto de educação. A legislação prevê a elaboração de

objetivos para a escola, no entanto, as diretrizes nacionais definem os

limites impedindo possibilidades de superação do modelo de educação

capitalista, que reproduz as desigualdades e a exclusão do trabalhador

do conteúdo científico.

As possibilidades de romper com a lógica dominante se

encontram colocadas na conscientização do trabalhador, na sua unidade

e na sua luta, dentro de uma estratégia global de transformação da

sociedade, da educação e da escola, com clareza da ligação entre elas e

das determinações decorrentes do modo pelo qual os homens produzem

sua existência, e que buscando romper com a tradição capitalista de

organização social, através do conhecimento seja capaz de utilizar as

possibilidades legais para superar os condicionantes históricos e realizar

um novo projeto social para a humanidade.

Os esforços cotidianos dos trabalhadores que agem com

consciência de classe dentro das estruturas sociais, como a escola,

buscando criar espaços de atuação coletiva e ações democráticas e

democratizantes, mesmo que se restrinja a um número extremamente

limitado, provam a possibilidade de romper com a ideologia dominante

e de passar a atuar de forma crítica contribuindo para a transformação da

realidade concreta e para a conscientização dos que estão próximos.

Nos momentos de mobilização das classes populares a tendência

é de se desenvolver mais o senso crítico, e com a participação popular os

espaços irem se abrindo para o coletivo. A experiência positiva vivida

no período da Constituinte Escolar no RS, quando houve uma maior

mobilização das comunidades escolares para a construção do projeto de

educação para o estado, e a participação das comunidades na construção

dos PPPs e Regimentos das escolas, demonstrou em alguma medida a

possibilidade de democratização da gestão da escola. No entanto, isso

demanda que cada indivíduo assuma sua responsabilidade no processo

de transformação, que demanda tempo, conhecimento, compromisso,

formação, unidade e muita luta.

Apesar da precarização e intensificação do trabalho, que dificulta

a organização dos trabalhadores e desumaniza-os, a escola apresenta

uma especificidade em relação ao processo de trabalho que ocorre nas

263

empresas capitalistas que também se constitui em possibilidade. A

escola, como uma organização que faz parte da superestrutura da

sociedade, funciona como aparelho de persuasão, difundindo a ideologia

da classe dominante. Mas como todo o fenômeno, se constitui sobre

aspectos contraditórios, deixando aberta uma possibilidade para a classe

trabalhadora. Neste caso, a contradição reside no fato de que a escola

existe como ferramenta de preservação e transmissão do saber, e, como

tal, tem um caráter revolucionário, mesmo que o saber seja utilizado

ideologicamente. O capital não pode destituir por completo o

trabalhador da escola do saber, já que o saber se configura em meio de

trabalho no processo do trabalho educativo. Também não pode negá-lo

por completo aos educandos, pois não cumpriria com o objetivo

existencial da escola para o capitalismo, de formar o trabalhador com

um conjunto de conhecimentos e técnicas necessárias aos processos de

trabalho. Deste modo, cabe à classe trabalhadora (tanto aos

trabalhadores da escola como os que frequentam a escola ou necessitam

dela para seus filhos) identificar o espaço deixado pelas contradições,

como possibilidade de luta e transformação, e reforçar o polo

direcionado a seus objetivos revolucionários, de eliminar a dominação,

abolir a propriedade privada, superar a divisão do trabalho e implantar o

comunismo como forma única de realizar a emancipação humana. Para

tal, é pré-requisito a unidade dos trabalhadores, pois só a classe

trabalhadora que se coloque como classe dominante poderá implantar a

democracia operária e levar a humanidade à revolução do modo de

produção.

A legislação acerca da gestão das escolas estaduais do RS é

progressista no sentido de apresentar uma possibilidade de participação

da comunidade escolar na gestão, na tomada de decisões. Esta

possibilidade não se realiza sem que se superem os condicionantes da

participação, demonstrando que só se concretizará pelo esforço coletivo

e também individual de todas as pessoas que compõem a comunidade

escolar comprometidas com a transformação da realidade em sua

totalidade.

Uma legislação que seja consequente precisa dar conta de todas

as dimensões dos condicionantes, então é preciso garantir formação,

tempo, informação, práticas que fortaleçam o diálogo, que construam a

consciência de coletivo, a solidariedade, a cooperação. Neste sentido, a

Lei de Gestão Democrática do Ensino Público do RS evidenciou seu

caráter de ferramenta de criação de consenso, onde reivindicações dos

trabalhadores para a gestão da escola e da educação foram incorporadas

à legislação e ressignificadas para controlar e dosar a participação da

264

comunidade. A “gestão democrática” está colocada na legislação como

uma forma de democracia representativa (burguesa) uma vez que os

segmentos elegem seus representantes no conselho escolar e não mais

tem controle sobre os mesmos. Assumindo as determinações da

sociabilidade do capital, os representantes agem de forma descolada de

sua base, com decisões advindas de suas opiniões e interesses pessoais,

confluindo para o projeto das direções e dos governos, entenda-se do

capital. As pautas são conhecidas na hora da reunião, não há

instrumentalização para construir uma diversidade de opções a serem

analisadas e escolhidas, além disso, a falta de informação sobre os

assuntos faz com que se ouça a posição da direção e se legitime esta

como a posição do conselho, uma vez que a maioria dos participantes

não possuem as informações necessárias para uma elaboração própria ou

diferente a partir do diálogo com o segmento representado.

A aparência apresentada pela legislação quando da leitura de seus

artigos é a de que a gestão escolar por ela regulamentada é democrática,

com autonomia, participação, liberdade e igualdade de condições dos

envolvidos de interferir nos rumos da escola. As práticas e relações

cotidianas da gestão das escolas contradizem a aparência, e apresentam

evidências claras de que a gestão da escola se desenvolve de forma

autoritária, dentro de determinados limites, nos quais a contradição

engendra algumas possibilidades.

Os limites são de natureza teórica, legal, prática e estrutural,

determinados pelas relações sociais de produção da sociedade

capitalista. Os principais limites de ordem legal a serem superados são a

questão da imposição do Regimento Padrão; a avaliação externa que

determina conteúdos e condiciona os objetivos da escola; o tempo e o

espaço para a organização e desenvolvimento da gestão democrática; a

questão da insuficiência de recursos e a sua setorização (pré-definição

externa de onde devem ser aplicados); a gestão educacional por

programas, vinculada à questão das metas; a produção de índices para

medição dos resultados; a avaliação classificatória.

Os principais limites de ordem prática e estruturais são a

insuficiência de recursos financeiros e materiais; a insuficiência de

pessoal; a divisão social do trabalho aplicada no interior da escola e na

sociedade e a divisão entre trabalho manual e trabalho intelectual, entre

concepção e execução que expropriam o conhecimento do trabalhador; o

esvaziamento dos conteúdos a serem trabalhados na escola; a

estratificação social; a hierarquização; o controle do capital sobre o

trabalho, transformando as direções em gerências/gestores da aplicação

do projeto hegemônico; a intensificação e precarização do trabalho; o

265

assédio moral; o excesso de exigências de natureza formal, como

relatórios, documentações e processos que envolvem a direção da escola

e o conselho escolar; a falta de transparência; a centralização do poder

nos órgãos de governo; o descaso com a opinião dos que participam e a

ausência de consequências de sua participação; a insignificância das

decisões que a escola pode tomar frente ao conjunto do que é, e o que

representa a escola; o corporativismo e o patrimonialismo dos

professores; o currículo oculto; a inexistência de grêmio estudantil, da

organização sindical dentro da escola e da organização dos segmentos;

ausência de assembleias e reuniões de segmentos e gerais.

Os principais limites de ordem teórica são a ausência de uma

clara concepção teórica que embase o projeto de gestão da escola,

predominando práticas pautadas no espontaneísmo e na gestão do

cotidiano e seus problemas imediatos; a ausência de planejamento;

ausência de objetivos claros para a escola, formulados à luz de uma

visão de escola para a classe trabalhadora, que contribua com a luta pela

transformação social e pela sua emancipação; o domínio ideológico dos

valores e princípios capitalistas sobre a consciência da classe

trabalhadora, como a fragmentação e o individualismo absorvidos da

esfera da produção material da vida; a impossibilidade de estabelecer

objetivos diferenciados para a escola e selecionar os conteúdos e

métodos adequados para atingi-los; o senso-comum baseado nos valores

neoliberais e capitalistas como o laissez-faire e os conceitos atuais como

cultura de paz, justiça restauradora que impedem a discordância, a

polemização e os questionamentos; a falta de informações e de

conhecimento da organização da escola; equívocos a respeito do que é

democracia e participação; o hábito da obediência e do medo como

herança construída pela ditadura militar, pela violência do aparato

repressor do Estado.

As possibilidades estão postas nas contradições que a gestão

escolar engendra; no reconhecimento dos limites da realidade atual; na

luta pela ampliação dos espaços democráticos, demonstrada pelas lutas e

conquistas ao longo da história da educação e da gestão da escola, bem

como no desenvolvimento da Lei de Gestão Democrática do Ensino

Público do RS; no desenvolvimento da consciência de classe pela

prática da luta, demonstrada nas pessoas e grupos que se mantêm

atuantes e críticos, buscando a transformação da escola e da sociedade

apesar das ofensivas do capital de ideologização e despolitização da

classe trabalhadora; na organização coletiva da comunidade escolar

demonstrada na existência de pequenos grupos organizados com

lealdade e companheirismo; na participação dos que alegam como

266

motivo o convite recebido, e o grande número de pessoas que alegam

como motivo de não terem participado o fato de não terem sido

convidadas, que pode representar uma possibilidade a ser realizada pelo

convite à participação; nas reivindicações dos estudantes, pais,

professores e funcionários, como a criação do grêmio estudantil, a

abertura de espaços para atividades conjuntas, e o desejo de espaços

democráticos para intervirem nas decisões da escola.

Pensamos que nosso estudo apresentou elementos que nos

permitem confirmar nossas hipóteses, de que o distanciamento da

escola, de sua gestão e de seus objetivos em relação às lutas e

reivindicações da sociedade e das organizações da classe trabalhadora se

constitui no principal entrave ao desenvolvimento de uma gestão

coletiva e democrática da escola uma vez que só pela prática é possível

superar os condicionantes materiais e transformar as condições de

consciência dos homens tornando possível a superação dos

condicionantes ideológicos e o desenvolvimento da consciência de

classe. Só pela luta da classe trabalhadora será possível transformar a

sociedade para superar a sociabilidade do capital e suas determinações

históricas. Também avaliamos ter se confirmado a hipótese de que a

tradição de autoritarismo de longo período que envolve a sociedade e os

indivíduos limita a possibilidade de efetivação da Gestão Democrática

do Ensino Público nas escolas estaduais do Rio Grande do Sul, em que,

pela construção do senso-comum, aceita-se a hierarquização, a distorção

dos valores e das práticas democráticas e a centralização do poder de

forma passiva e como natural e necessária. E de fato, ficou demonstrado

que, mesmo que a classe trabalhadora tenha logrado incluir na legislação

suas reivindicações, isso não encerra a luta pela democratização da

gestão da escola, que depende da conscientização, do compromisso e da

ação dos homens, cujo grau de alienação é um entrave à possibilidade de

participar e de tomar decisões para a transformação, o que só pode

ocorrer de forma efetiva se concomitantemente com a transformação das

relações sociais e da sociedade. A participação popular é um fator

decisivo para a realização da gestão democrática, que não se efetiva

apenas pela conquista do direito na legislação. Não qualquer

participação, mas a participação consciente pautada pelos interesses de

classe, o que requer a formação da classe trabalhadora, pois a

participação figurativa, sem consciência e sem formação, legitima o

projeto do capital e contribui para o falseamento da realidade e a

efetivação da democracia burguesa, afastando ainda mais a possibilidade

da luta pela implantação da democracia operária. A luta é cotidiana e no

chão da escola, aliada à estratégia de revolução social, e não pode se

267

restringir à luta pelo desenvolvimento da legislação, mas compreender a

legislação que apresenta elementos progressistas como nova

possibilidade de reafirmar e fortalecer a luta e avançar nas mudanças.

Pensamos que quando cada ser humano tomar parte na tarefa de

transformar a realidade, esta por si só estará transformada, no entanto, a

ação irá definir qual a possibilidade será concretizada.

Considerando que são muitos os limites que se apresentam para a

transformação da escola, vislumbramos a necessidade de potencializar

ao máximo o que se apresenta como possibilidades de essência, ou seja,

a participação da comunidade na gestão da escola, de modo a construir a

possibilidade de intervir na elaboração dos objetivos da educação e na

elaboração da avaliação.

Mesmo que essa participação inicialmente seja pequena, por

convite, convencimento ou convicção, representa a superação dos

condicionantes por essa minoria que participa, e se apresenta como

resistência à escola capitalista atual. A participação organizada dos

coletivos da escola representa uma possibilidade de fortalecimento da

classe trabalhadora e de desenvolvimento da consciência de classe, que

contribuem para o acirramento das contradições da escola capitalista

como parte na estratégia de luta pela emancipação humana.

268

269

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285

APÊNDICE A - Roteiro de entrevista para direção

1. Há quanto tempo você trabalha na escola pública e há quanto tempo

faz parte da direção da escola?

2. Quando foi elaborado o Plano Político Pedagógico da escola?

3. Quem construiu este Plano Político Pedagógico e com que

metodologia?

4. Quando foi elaborado o Regimento da escola? Por quem e com que

metodologia?

5. O Plano e o Regimento são observados e cumpridos por todos na

escola? Como isso pode ser observado?

6. O Conselho Escolar da escola é ativo?

7. A cada quanto tempo se reúne?

8. Como se organiza? Quem marca as reuniões?

9. Quem faz a pauta das reuniões?

10. Quem dirige as reuniões do Conselho Escolar?

11. Quem e como apresenta as propostas?

12. Todos conselheiros tem espaço para apresentar solicitar

esclarecimentos, propostas, fazer avaliações ou encaminhamentos?

13. O tempo de fala dos conselheiros é livre ou existe algum controle?

14. Todos os conselheiros são ouvidos igualmente e tem suas opiniões

respeitadas?

15. Todos os conselheiros costumam opinar?

16. As datas e as pautas das reuniões são divulgadas previamente aos

conselheiros? Se sim, com quanta antecedência e como (aviso verbal,

mural, bilhete etc.)?

17. Como são tomadas as decisões? Por voto (aberto ou secreto), por

consenso ou outra forma.

18. As decisões do Conselho Escolar são divulgadas para a comunidade

escolar? Como?

19. Os conselheiros fazem assembleias de segmentos para saber das

demandas e como se posicionarem nas reuniões do Conselho

Escolar? Ou usam outra forma de consulta – qual?

20. A escola faz assembleias gerais?

21. Como é escolhido o presidente do Conselho Escolar?

22. Quem administra a escola?

23. Quem decide o que fazer com as verbas da escola (de merenda, de

materiais permanentes e rotativos)?

24. Quem decide que conteúdos são ensinados na escola?

25. Quem decide quantas horas de aula terá cada disciplina na escola?

286

26. Quem decide como a escola é organizada (se por séries ou ciclos,

bimestres, trimestres ou semestres, nota, conceito ou parecer

descritivo, o horário das aulas etc.)?

27. Como é a metodologia empregada nas reuniões de professores?

28. Como se organizam os conselhos de classe?

29. Como ocorre o processo de eleição para direção? Há várias

candidaturas?

30. Como é a participação da comunidade na eleição de direção?

31. Por que você optou por estar na direção?

32. Qual é o objetivo desta escola? Para que ela prepara os alunos?

33. O que se espera é alcançado?

34. Você acha a participação da comunidade importante? Por quê?

35. Como você acha que deveria ser a participação? Em que espaços?

36. Quais os espaços ou atividades desenvolvidas na escola que você

identifica como participativas?

37. Você é sócio de algum sindicato ou participa de associação de

moradores, de bairro ou alguma outra? Por quê?

38. Você já participou de algum movimento reivindicatório como greve,

protesto, ato público ou algum outro? Qual? Por quê?

39. Você considera a gestão/ direção da escola democrática? Por quê?

40. Você acha que a escola tem autonomia para se organizar?

41. Como você considera a relação da SEC com a escola e a direção?

42. Quais as barreiras/limites que você encontra no desempenho da

função de direção da escola?

43. Você considera os programas de governo como o PDE, PDDE e

outros importantes?

44. Você já participou da direção de outra(s) escola? Se sim, quando?

Mudou a forma ou a autonomia? Quais as diferenças entre os

períodos?

45. Você considera que a comunidade escolar participa de fato da

escola?

46. Se não, quais você considera ser os maiores entraves para a

participação?

47. Em sua avaliação, você avalia que a participação vem aumentando

ou diminuindo?

48. Você acredita/sente que há possibilidades de melhorar o índice de

participação?

287

APÊNDICE B - Questionário para estudantes

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA: A Escola foi selecionada para contribuir com dados para a pesquisa “A

gestão das escolas públicas estaduais do RS: limites e

possibilidades”. Esta pesquisa deseja conhecer como acontece a

gestão/administração da escola. Com esta pesquisa buscamos identificar

que mediações demonstram possibilidades de avanços na

democratização da escola pública.

Não existem respostas certas ou erradas, buscamos apenas seu relato, de

forma simples, da forma que você conhece, com respostas simples, e

podem ser curtas ou longas, como quiser. Se quiser use o verso da folha.

De forma alguma este material será divulgado ou entregue a outras

pessoas. Somente eu, como pesquisadora, terei acesso às respostas.

Fragmentos das respostas poderão ser transcritos, mas de nenhuma

forma quem escreveu será identificado. Sua identidade e participação

serão mantidos em sigilo. Para isso, pedimos que NÃO coloque seu

nome, apenas escreva as informações pedidas e as respostas.

Desejamos melhorar a qualidade da educação construída nas escolas

públicas, e você está sendo convidado a participar. Deixamos claro que

você não sofrerá nenhum tipo de prejuízo, ou punição ou recompensas

pelo tipo de respostas ou se não responder a todas as perguntas, ou seja,

você foi convidado a participar e fará se concordar, e do jeito que você

quiser. A pesquisa se compõe de perguntas sobre a organização, a

gestão/administração da escola e de sua participação na escola.

Pesquisadora: LERIANE TITTON

E-mail: [email protected]

Telefone:

Estudante do Programa de Pós-Graduação em Educação da

Universidade Federal de Santa Catarina – Campus Universitário Reitor

João David Ferreira Lima – Bairro Trindade - Florianópolis - Santa

Catarina – Brasil - CEP: 88040-900

Secretaria de Pós-Graduação em Educação – fone (48) 3721 2251 / Fax:

(48) 3721 8638 / [email protected]

Linha Trabalho e Educação – sob a orientação da Prof. Dra. Adriana

D’Agostini.

SÉRIE:________________________ IDADE:_____

288

Quais os espaços ou atividades desenvolvidas na escola que você

participa?

1. Festas: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

2. Conselho de classe: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

3. Reuniões do Conselho Escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

4. Assembleia/reunião de pais: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

5. Assembleia de estudantes: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

6. Assembleia da escola toda: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

7. Grêmio Estudantil: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

8. Decisão de cardápio da merenda escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

9. Decisão do que fazer com as verbas (dinheiro) da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

10. Decisão de que livros comprar para a biblioteca: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

11. Decisão de que visitas ou passeios os estudantes farão fora da

escola: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

12. Decisão se as aulas serão organizadas em trimestres, bimestres ou

semestres: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

13. Decisão se as aulas e a progressão serão organizadas em anos ou

ciclos: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

14. Decisão de quantas horas de aula terá em cada disciplina:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

15. Decisão de quais conteúdos vão ser ensinados em cada disciplina:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

16. Decisão de que instrumentos serão usados para avaliação como

observação das aulas, provas, trabalhos etc. : ( ) Sim. ( )

Não.

289

Por quê?___________________________________________________

17. Decisão de como a avaliação será expressa, se por notas ou

pareceres descritivos: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

18. Elaboração do Plano Político e Pedagógico da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

19. Elaboração do Regimento Escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

20. Se você participa de reuniões, você dá sua opinião (fala)?

( )Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

21. Se você dá sua opinião ou sugestões, você acha que são ouvidas

para a organização da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

22. Já participou do Conselho Escolar como conselheiro?

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

23. Se você já foi membro do Conselho Escolar, consultava seus

colegas representados por você para saber suas demandas, o que

defender e como votar? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

24. E já participou como candidato a conselheiro do Conselho escolar?

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

25. Já foi candidato a presidente do Grêmio Estudantil?

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

26. Já foi candidato a líder de turma? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

27. Já votou nas eleições de direção da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

28. Já votou nas eleições para o Conselho Escolar? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

29. Outros espaços e atividades que você participa:

__________________________________________________________

30. Você acha que a escola é democrática?

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

Por quê?___________________________________________________

31. Você acha que a escola é autoritária?

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

Por quê?___________________________________________________

290

32. Você acha que a escola deveria ser mais aberta para a participação?

( ) Sim. ( ) Não.

Comentários caso queira: _____________________________________

______________________________________________________

______________________________________________________

_____________________________________________________

291

APÊNDICE C - Questionário para funcionários

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA: A Escola foi selecionada para contribuir com dados para a

pesquisa “A gestão das escolas públicas estaduais do RS: limites e

possibilidades”. Esta pesquisa deseja conhecer como acontece a

gestão/administração da escola. Com esta pesquisa buscamos identificar

que mediações demonstram possibilidades de avanços na

democratização da escola pública.

Não existem respostas certas ou erradas, buscamos apenas seu

relato, de forma simples, da forma que você conhece, com respostas

simples, e podem ser curtas ou longas, como quiser. Se quiser use o

verso da folha. De forma alguma este material será divulgado ou

entregue a outras pessoas. Somente eu, como pesquisadora, terei acesso

às respostas. Fragmentos das respostas poderão ser transcritos, mas de

nenhuma forma quem escreveu será identificado. Sua identidade e

participação serão mantidos em sigilo. Para isso, pedimos que NÃO

coloque seu nome, apenas escreva as informações pedidas e as

respostas.

Desejamos melhorar a qualidade da educação construída nas escolas

públicas, e você está sendo convidado a participar. Deixamos claro que

você não sofrerá nenhum tipo de prejuízo, ou punição ou recompensas

pelo tipo de respostas ou se não responder a todas as perguntas, ou seja,

você foi convidado a participar e fará se concordar, e do jeito que você

quiser. A pesquisa se compõe de perguntas sobre a organização, a

gestão/administração da escola e de sua participação na escola.

Pesquisadora: LERIANE TITTON

E-mail: [email protected]

Telefone:

Estudante do Programa de Pós-Graduação em Educação da

Universidade Federal de Santa Catarina – Campus Universitário Reitor

João David Ferreira Lima – Bairro Trindade - Florianópolis - Santa

Catarina – Brasil - CEP: 88040-900

Secretaria de Pós-Graduação em Educação – fone (48) 3721 2251 / Fax:

(48) 3721 8638 / [email protected]

Linha Trabalho e Educação – sob a orientação da Prof. Dra. Adriana

D’Agostini.

FUNÇÃO:________________________ IDADE:_____

292

Quais os espaços ou atividades desenvolvidas na escola que você

participa?

1. Festas: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

2. Conselho de classe: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

3. Reuniões do Conselho Escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

4. Assembleia/reunião de pais: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

5. Assembleia de estudantes: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

6. Assembleia de professores: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

7. Reunião de professores: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

8. Assembleia de Funcionários: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

9. Assembleia da escola toda: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

10. Decisão de cardápio da merenda escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

11. Decisão do que fazer com as verbas (dinheiro) da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

12. Decisão de que livros comprar para a biblioteca: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

13. Decisão de que visitas ou passeios os alunos farão fora da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

14. Decisão se as aulas serão organizadas em trimestres, bimestres ou

semestres: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

15. Decisão se as aulas e a progressão serão organizadas em anos ou

ciclos: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

16. Decisão de quantas horas de aula terá em cada disciplina:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

17. Decisão de quais conteúdos vão ser ensinados em cada disciplina:

( ) Sim. ( ) Não.

293

Por quê?___________________________________________________

18. Decisão de que instrumentos serão usados para avaliação como

observação das aulas, provas, trabalhos etc. : ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

19. Decisão de como a avaliação será expressa, se por notas ou

pareceres descritivos: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

20. Elaboração do Plano Político e Pedagógico da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

21. Elaboração do Regimento Escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

22. Se você participa de reuniões, você dá sua opinião (fala)?

( )Sim. ( )Não.

Por quê?___________________________________________________

23. Se você dá sua opinião ou sugestões, você acha que são ouvidas

para a organização da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

24. Já participou do Conselho Escolar como conselheiro?

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

25. Se você já foi membro do Conselho Escolar, consultava seus

colegas representados por você para saber suas demandas, o que

defender e como votar? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

26. E já participou como candidato a conselheiro do Conselho escolar?

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

27. Como candidato à direção da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

28. Você já foi da direção da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

29. Já votou nas eleições de direção da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

30. Já votou nas eleições para o Conselho Escolar? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

31. Outros espaços e atividades que você participa:

__________________________________________________________

32. Você acha que a escola é democrática?

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

Por quê?___________________________________________________

33. Você acha que a escola é autoritária?

294

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

Por quê?____________________________________________

34. Você acha que a escola deveria ser mais aberta para a participação?

( ) Sim. ( ) Não.

Comentários caso queira: ____________________________________

__________________________________________________________

__________________________________________________________

_________________________________________________________

295

APÊNDICE D - Questionários para responsáveis, pais, mães

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA: A Escola foi selecionada para contribuir com dados para a

pesquisa “A gestão das escolas públicas estaduais do RS: limites e

possibilidades”. Esta pesquisa deseja conhecer como acontece a

gestão/administração da escola. Com esta pesquisa buscamos identificar

que mediações demonstram possibilidades de avanços na

democratização da escola pública.

Não existem respostas certas ou erradas, buscamos apenas seu

relato, de forma simples, da forma que você conhece, com respostas

simples, e podem ser curtas ou longas, como quiser. Se quiser, use o

verso da folha. De forma alguma este material será divulgado ou

entregue a outras pessoas. Somente eu, como pesquisadora, terei acesso

às respostas. Fragmentos das respostas poderão ser transcritos, mas de

nenhuma forma quem escreveu será identificado. Sua identidade e

participação serão mantidos em sigilo. Para isso, pedimos que NÃO

coloque seu nome, apenas escreva as informações pedidas e as

respostas.

Desejamos melhorar a qualidade da educação construída nas escolas

públicas, e você está sendo convidado a participar. Deixamos claro que

você não sofrerá nenhum tipo de prejuízo, ou punição ou recompensas

pelo tipo de respostas ou se não responder a todas as perguntas, ou seja,

você foi convidado a participar e fará se concordar, e do jeito que você

quiser. A pesquisa se compõe de perguntas sobre a organização, a

gestão/administração da escola e de sua participação na escola.

Pesquisadora: LERIANE TITTON

E-mail: [email protected]

Telefone:

Estudante do Programa de Pós-Graduação em Educação da

Universidade Federal de Santa Catarina – Campus Universitário Reitor

João David Ferreira Lima – Bairro Trindade - Florianópolis - Santa

Catarina – Brasil - CEP: 88040-900

Secretaria de Pós-Graduação em Educação – fone (48) 3721 2251 / Fax:

(48) 3721 8638 / [email protected]

Linha Trabalho e Educação – sob a orientação da Prof. Dra. Adriana

D’Agostini.

296

RESPONSÁVEL POR ALUNO(S) DE QUE ANO/SÉRIE(S):

___________________ SUA IDADE:_____

Responda abaixo sobre os espaços ou atividades da escola que você

participa:

1. Festas: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

2. Conselho de classe: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

3. Reuniões do Conselho Escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

4. Assembleia/reunião de pais: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

5. Assembleia da escola toda: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

6. Participa do CPM: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

7. Decisão de cardápio da merenda escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

8. Decisão do que fazer com as verbas (dinheiro) da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

9. Decisão de que livros comprar para a biblioteca: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

10. Decisão de que visitas ou passeios os alunos farão fora da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

11. Decisão se as aulas serão organizadas em trimestres, bimestres ou

semestres: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

12. Decisão se as aulas e a progressão serão organizadas em anos ou

ciclos: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

13. Decisão de quantas horas de aula terá em cada disciplina:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

14. Decisão de quais conteúdos vão ser ensinados em cada disciplina:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

15. Decisão de que instrumentos serão usados para avaliação como

observação das aulas, provas, trabalhos etc. : ( ) Sim. ( ) Não.

297

Por quê?___________________________________________________

16. Decisão de como a avaliação será expressa, se por notas ou pareceres

descritivos: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

17. Elaboração do Plano Político e Pedagógico da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

18. Elaboração do Regimento Escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

19. Se você participa de reuniões, você dá sua opinião (fala)?

( )Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

20. Se você dá sua opinião ou sugestões, você acha que são ouvidas

para a organização da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

21. Já participou do Conselho Escolar como conselheiro?

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

22. Se você já foi membro do Conselho Escolar, consultava seus

colegas representados por você para saber suas demandas, o que

defender e como votar? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

23. E já participou como candidato a conselheiro do Conselho escolar?

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

24. Já votou nas eleições de direção da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

25. Já votou nas eleições para o Conselho Escolar? ( ) Sim. ( )

Não.

Por quê?___________________________________________________

26. Outros espaços e atividades que você participa:

__________________________________________________________

27. Você acha que a escola é democrática?

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

Por quê?___________________________________________________

28. Você acha que a escola é autoritária?

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

Por quê?____________________________________________

29. Você acha que a escola deveria ser mais aberta para a participação?

( ) Sim. ( ) Não.

298

Comentários caso queira: ____________________________________

__________________________________________________________

__________________________________________________________

_________________________________________________________

299

APÊNDICE E - Questionário para professores

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA: A Escola foi selecionada para contribuir com dados para a pesquisa “A

gestão das escolas públicas estaduais do RS: limites e

possibilidades”. Esta pesquisa deseja conhecer como acontece a

gestão/administração da escola. Com esta pesquisa buscamos identificar

que mediações demonstram possibilidades de avanços na

democratização da escola pública.

Não existem respostas certas ou erradas, buscamos apenas seu relato, de

forma simples, da forma que você conhece, com respostas simples, e

podem ser curtas ou longas, como quiser. Se quiser use o verso da folha.

De forma alguma este material será divulgado ou entregue a outras

pessoas. Somente eu, como pesquisadora, terei acesso às respostas.

Fragmentos das respostas poderão ser transcritos, mas de nenhuma

forma quem escreveu será identificado. Sua identidade e participação

serão mantidos em sigilo. Para isso, pedimos que NÃO coloque seu

nome, apenas escreva as informações pedidas e as respostas.

Desejamos melhorar a qualidade da educação construída nas escolas

públicas, e você está sendo convidado a participar. Deixamos claro que

você não sofrerá nenhum tipo de prejuízo, punição ou recompensas pelo

tipo de respostas, ou se não responder a todas as perguntas, ou seja, você

foi convidado a participar e fará se concordar, e do jeito que você quiser.

A pesquisa se compõe de perguntas sobre a organização, a

gestão/administração da escola e de sua participação na escola.

Pesquisadora: LERIANE TITTON

E-mail: [email protected]

Telefone:

Estudante do Programa de Pós-Graduação em Educação da

Universidade Federal de Santa Catarina – Campus Universitário Reitor

João David Ferreira Lima – Bairro Trindade - Florianópolis - Santa

Catarina – Brasil - CEP: 88040-900

Secretaria de Pós-Graduação em Educação – fone (48) 3721 2251 / Fax:

(48) 3721 8638 / [email protected]

Linha Trabalho e Educação – sob a orientação da Prof. Dra. Adriana

D’Agostini.

LECIONA EM QUE SÉRIES:____________ IDADE:_____

TEMPO NO MAGISTÉRIO PÚBLICO:_____________

300

Responda sobre os espaços ou atividades desenvolvidas na escola que

você participa:

1. Festas: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

2. Conselho de classe: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

3. Reuniões do Conselho Escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

4. Assembleia/reunião de pais: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

5. Assembleia de estudantes: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

6. Assembleia de professores: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

7. Reunião de professores: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

8. Assembleia de Funcionários: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

9. Assembleia da escola toda: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

10. CPM: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

11. Decisão de cardápio da merenda escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

12. Decisão do que fazer com as verbas (dinheiro) da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

13. Decisão de que livros comprar para a biblioteca:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

14. Decisão de que visitas ou passeios os alunos farão fora da

escola: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

15. Decisão se as aulas serão organizadas em trimestres, bimestres

ou semestres: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

16. Decisão se as aulas e a progressão serão organizadas em anos

ou ciclos: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

17. Decisão de quantas horas de aula terá em cada disciplina:

( ) Sim. ( ) Não.

301

Por quê?___________________________________________________

18. Decisão de quais conteúdos vão ser ensinados em cada

disciplina: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

19. Decisão de que instrumentos serão usados para avaliação como

observação das aulas, provas, trabalhos etc. : ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

20. Decisão de como a avaliação será expressa, se por notas ou

pareceres descritivos: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

21. Elaboração do Plano Político e Pedagógico da escola:

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

22. Elaboração do Regimento Escolar: ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

23. Se você participa de reuniões, você dá sua opinião (fala)?

( )Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

24. Se você dá sua opinião ou sugestões, você acha que são ouvidas

para a organização da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

25. Já participou do Conselho Escolar como conselheiro?

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

26. Se você já foi membro do Conselho Escolar, consultava seus

colegas representados por você para saber suas demandas, o que

defender e como votar? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

27. E já participou como candidato a conselheiro do Conselho

escolar? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

28. Como candidato à direção da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

29. Você já foi da direção da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

30. Já votou nas eleições de direção da escola? ( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

31. Já votou nas eleições para o Conselho Escolar?

( ) Sim. ( ) Não.

Por quê?___________________________________________________

32. Outros espaços e atividades que você participa:

__________________________________________________________

302

33. Você acha que a escola é democrática?

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

Por quê?__________________________________________________

34. Você acha que a escola é autoritária?

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

Por quê?__________________________________________________

35. Você acha que a escola deveria ser mais aberta para a participação?

( ) Sim. ( ) Não.

36. Você acha que a escola tem autonomia?

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

37. Você tem autonomia de decisão sobre suas aulas e conteúdos?

( ) Sim. ( ) Não. ( ) Um pouco.

Por quê?___________________________________________________

Comentários caso queira:_____________________________________

__________________________________________________________

__________________________________________________________

__________________________________________________________

303

APÊNDICE F - Termo de consentimento livre e esclarecido

Você está sendo convidado a participar da pesquisa “A gestão das

escolas públicas estaduais do RS: limites e possibilidades”. A pesquisa é

requisito do estudo e elaboração de dissertação no curso de Mestrado em

Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade

Federal de Santa Catarina.

Você foi convidado por fazer parte do corpo diretivo desta escola e

não é obrigado a participar da pesquisa. A qualquer momento você pode

desistir da pesquisa, retirar seu consentimento e solicitar que os dados

fornecidos por você não sejam utilizados, sem qualquer prejuízo ou

penalidade.

Os motivos que nos levaram ao presente estudo é a busca pela

compreensão de como está se realizando a Gestão Democrática do Ensino

Público regulamentada na lei estadual. Você participará desta pesquisa

respondendo a entrevista da pesquisadora, que com seu consentimento será

gravada.

As informações e respostas dadas por você serão confidenciais e a

sua participação será mantida em sigilo. Para contribuir com o anonimato, a

entrevista poderá ser realizada em local de sua escolha.

Sua identidade não será divulgada e os dados serão mantidos em

sigilo, sendo utilizados apenas para a análise deste estudo. Os dados

coletados só serão divulgados livres de elementos que possam permitir a

sua identificação, e ficarão sob a guarda da pesquisadora. Apenas a

pesquisadora e orientadora terão acesso aos documentos das entrevistas.

Você não será identificado em nenhuma publicação que possa resultar deste

estudo.

Com sua participação você ajudará a conhecermos melhor como é

a gestão da escola pública e onde se encontram as possibilidades de práticas

mais democráticas para que possamos propor mudanças no sentido de

melhorar a qualidade da educação construída nas escolas públicas.

Este termo é constituído de duas vias, que serão assinadas por você

e pela pesquisadora, sendo que uma delas ficará com você e a outra com a

pesquisadora.

No termo constará endereço de e-mail, telefone e endereço

institucional da pesquisadora por meio dos quais você poderá obter

esclarecimentos e tirar suas dúvidas sobre a pesquisa ou sobre sua

participação a qualquer momento do andamento do estudo.

304

Pesquisadora: LERIANE TITTON

E-mail: [email protected]

Telefone:

Estudante do Programa de Pós-Graduação em Educação da

Universidade Federal de Santa Catarina – Campus Universitário Reitor

João David Ferreira Lima – Bairro Trindade - Florianópolis - Santa

Catarina – Brasil - CEP: 88040-900

Secretaria de Pós-Graduação em Educação – fone (48) 3721 2251 / Fax:

(48) 3721 8638 / [email protected]

Linha Trabalho e Educação – sob a orientação da Prof. Dra. Adriana

D’Agostini.

Assinatura da pesquisadora:__________________________________

Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha

participação na pesquisa “A gestão democrática da escola pública:

limites e possibilidades”, que fui esclarecido de minha participação e

que posso desistir a qualquer momento e retirar meu consentimento, e

que me foi garantida a confidencialidade e o sigilo sobre minha

participação, e concordo em participar.

Por meio de entrevista gravada:

Nome:________________________________________________

Assinatura:_____________________________________________

Local Data: _____________________________, ____/____/2014.

305

APÊNDICE G - Quadro de dados da pesquisa estudantes

TOTAL 51 PARTICIPANTES

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Festas Não há.

Conselho de classe Apenas líderes de

turma e professores

participam.

Reuniões do conselho

escolar

Acontecem 3 ou 4

por ano segundo a

diretora – só

representantes

participam.

Assembleia/reunião de

pais e responsáveis

11 39 1 A maioria relata

que é só para pais.

Assembleia de estudantes Não há.

Assembleia da escola toda Não há.

Grêmio Estudantil Não tem na escola.

Decisão de cardápio da

merenda escolar

2 49 Muitos colocam

como decisão da

SEC, nutricionistas

e cozinheiras.

Decisão do que fazer com

as verbas (dinheiro) da

escola

2 49

Decisão de que livros

comprar para a biblioteca:

1 50

Decisão de que visitas ou

passeios os estudantes

farão fora da escola

12 38

Decisão se as aulas serão

organizadas em

trimestres, bimestres ou

semestres

5 46

Decisão se as aulas e a

progressão serão

organizadas em anos ou

ciclos

4 47

Decisão de quantas horas

de aula terá em cada

disciplina

1 50

306

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Decisão de quais

conteúdos vão ser

ensinados em cada

disciplina

4 47

Decisão de que

instrumentos serão usados

para avaliação como

observação das aulas,

provas, trabalhos etc.

4 43 4 responderam que

em alguma

disciplina,

dependendo do

professor.

Decisão de como a

avaliação será expressa, se

por notas ou pareceres

descritivos

6 44 1 respondeu que

em alguma

disciplina

dependendo do

professor.

Elaboração do Plano

Político e Pedagógico da

escola

2 48 1

Elaboração do Regimento

Escolar

1 50

Se você participa de

reuniões, você dá sua

opinião (fala)?

15 28 2 6 responderam que

não participam.

Se você dá sua opinião ou

sugestões, você acha que

são ouvidas para a

organização da escola?

7 39 3 1 respondeu

marcando “Sim.” e

“Não.” e 1

respondeu

“Raramente.”

Já participou do Conselho

Escolar como

conselheiro?

4 46 1

Se você já foi membro do

Conselho Escolar,

consultava seus colegas

representados por você

para saber suas demandas,

o que defender e como

votar?

1 3

E já participou como

candidato a conselheiro

do Conselho escolar?

10 40 1

307

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Já foi candidato a líder de

turma?

21 28 2

Já votou nas eleições de

direção da escola?

36 14 1

Já votou nas eleições para

o Conselho Escolar?

24 25 2

Outros espaços e

atividades que você

participa

1 respondeu

“Passeios e festas.”

e 1 respondeu “Só

a biblioteca.” Os

demais não

participam de nada

mais.

Você acha que a escola é

democrática?

5 24 4 18 responderam

“Um pouco.”

Você acha que a escola é

autoritária?

29 11 1 10 responderam

“Um pouco.”

Você acha que a escola

deveria ser mais aberta

para a participação?

45 5 1

308

309

APÊNDICE H - Quadro de dados da pesquisa – pais e responsáveis

TOTAL 18 PARTICIPANTES

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Festas Não há.

Conselho de classe Apenas líderes de

turma e professores

participam.

Reuniões do conselho

escolar

5 13 Acontecem 3 ou 4

por ano segundo a

diretora – só

representantes

participam.

Assembleia/reunião de

pais e responsáveis

12 6

Assembleia da escola toda Não há.

Círculo de Pais e Mestres

- CPM

3 15

Decisão de cardápio da

merenda escolar

18

Decisão do que fazer com

as verbas (dinheiro) da

escola

1 16 1

Decisão de que livros

comprar para a biblioteca

16 2

Decisão de que visitas ou

passeios os estudantes

farão fora da escola

17 1

Decisão se as aulas serão

organizadas em

trimestres, bimestres ou

semestres

1 16 1

Decisão se as aulas e a

progressão serão

organizadas em anos ou

ciclos

1 16 1

Decisão de quantas horas

de aula terá em cada

disciplina

17 1

310

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Decisão de quais

conteúdos vão ser

ensinados em cada

disciplina

17 1

Decisão de que

instrumentos serão usados

para avaliação como

observação das aulas,

provas, trabalhos etc.

16 2

Decisão de como a

avaliação será expressa, se

por notas ou pareceres

descritivos

16 2

Elaboração do Plano

Político e Pedagógico da

escola

1 15 2

Elaboração do Regimento

Escolar

1 15 2

Se você participa de

reuniões, você dá sua

opinião (fala)?

10 6 1 1 respondeu que

não participa.

Se você dá sua opinião ou

sugestões, você acha que

são ouvidas para a

organização da escola?

7 9 2

Já participou do Conselho

Escolar como

conselheiro?

18

Se você já foi membro do

Conselho Escolar,

consultava seus colegas

representados por você

para saber suas demandas,

o que defender e como

votar?

Nenhum foi

conselheiro.

E já participou como

candidato a conselheiro

do Conselho escolar?

18

Já votou nas eleições de

direção da escola?

13 5

311

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Já votou nas eleições para

o Conselho Escolar?

2 13 2 1 assinalou “Sim.”

e “Não.”

Outros espaços e

atividades que você

participa

A resposta era

descritiva. 5

escreveram

“Nenhum.”, 1

escreveu “Não há

outros.” e 12 não

escreveram nada.

Você acha que a escola é

democrática?

4 6 1 7 responderam

“Um pouco.”

Você acha que a escola é

autoritária?

6 9 1 2 responderam

“Um pouco.”

Você acha que a escola

deveria ser mais aberta

para a participação?

16 2

312

313

APÊNDICE I - Quadro de dados da pesquisa – funcionários

TOTAL 6 PARTICIPANTES

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Festas Não há.

Conselho de classe Apenas líderes de

turma e professores

participam.

Reuniões do conselho

escolar

6 Acontecem 3 ou 4

por ano segundo a

diretora – só

representantes

participam.

Assembleia/reunião de

pais e responsáveis

6

Assembleia de estudantes Não há.

Assembleia de professores 6

Reunião de professores 6

Assembleia de

funcionários

Não há.

Assembleia da escola toda Não há.

Decisão de cardápio da

merenda escolar

2 4 As duas

merendeiras

responderam que

sim.

Decisão do que fazer com

as verbas (dinheiro) da

escola

6

Decisão de que livros

comprar para a biblioteca

6

Decisão de que visitas ou

passeios os estudantes

farão fora da escola

6

Decisão se as aulas serão

organizadas em

trimestres, bimestres ou

semestres

6

Decisão se as aulas e a

progressão serão

organizadas em anos ou

ciclos

6

314

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Decisão de quantas horas

de aula terá em cada

disciplina

6

Decisão de quais

conteúdos vão ser

ensinados em cada

disciplina

6

Decisão de que

instrumentos serão usados

para avaliação como

observação das aulas,

provas, trabalhos etc.

6

Decisão de como a

avaliação será expressa, se

por notas ou pareceres

descritivos

6

Elaboração do Plano

Político e Pedagógico da

escola

6

Elaboração do Regimento

Escolar

6

Se você participa de

reuniões, você dá sua

opinião (fala)?

3 2 1 respondeu que

não participa.

Se você dá sua opinião ou

sugestões, você acha que

são ouvidas para a

organização da escola?

3 3

Já participou do Conselho

Escolar como

conselheiro?

6

Se você já foi membro do

Conselho Escolar,

consultava seus colegas

representados por você

para saber suas demandas,

o que defender e como

votar?

Nenhum foi

conselheiro.

E já participou como

candidato a conselheiro

do Conselho escolar?

3 3

315

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

E como candidato à

direção da escola?

6

Já foi da direção da

escola?

6

Já votou nas eleições de

direção da escola?

6

Já votou nas eleições para

o Conselho Escolar?

5 1

Outros espaços e

atividades que você

participa

A resposta era

descritiva. 1

respondeu

“Capacitação para

merendeiras.”; 1,

“Comemorações

que a escola

realiza.”; 1,

“Organização e

limpeza da

escola.”; 1,

“Prefiro ficar

reservada a meu

ambiente de

trabalho.”, 2 não

escreveram nada.

Você acha que a escola é

democrática?

1 2 3 responderam

“Um pouco.”

Você acha que a escola é

autoritária?

6

Você acha que a escola

deveria ser mais aberta

para a participação?

5 1

316

317

APÊNDICE J - Quadro de dados da pesquisa – professores

TOTAL 10 PARTICIPANTES

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Festas Não há.

Conselho de classe 9 1 Apenas líderes de

turma e professores

participam.

Reuniões do conselho

escolar

4 6 Acontecem 3 ou 4

por ano segundo a

diretora – só

representantes

participam.

Assembleia/reunião de

pais e responsáveis

9 1

Assembleia de estudantes Não há.

Assembleia de professores 8 2 1 relata que só

ocorreu uma vez;

2, que não

ocorrem.

Reunião de professores 10

Assembleia de

funcionários

3 7 Não há.

Assembleia da escola toda Não há.

Círculo de Pais e Mestres

- CPM

1 9

Decisão de cardápio da

merenda escolar

1 9

Decisão do que fazer com

as verbas (dinheiro) da

escola

2 8

Decisão de que livros

comprar para a biblioteca

3 7

Decisão de que visitas ou

passeios os estudantes

farão fora da escola

5 5

Decisão se as aulas serão

organizadas em bimestres,

trimestres ou semestres

3 7 2 disseram que é

decidido pela SEC,

1, pela direção.

318

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Decisão se as aulas e a

progressão serão

organizadas em anos ou

ciclos

1 9 1 disse que é

definido pela SEC;

1, pela direção e 1,

que é conforme o

regimento escolar.

Decisão de quantas horas

de aula terá em cada

disciplina

3 7 1 disse que é

definido pela SEC;

1, pela direção e 1,

que é conforme o

regimento escolar.

Decisão de quais

conteúdos vão ser

ensinados em cada

disciplina

9 1

Decisão de que

instrumentos serão usados

para avaliação como

observação das aulas,

provas, trabalhos etc.

9 1

Decisão de como a

avaliação será expressa, se

por notas ou pareceres

descritivos

3 7 No EM a decisão

partiu da SEC e é

por menção. 2

responderam que é

conforme

regimento, e 1,

decidido pela

direção.

Elaboração do Plano

Político e Pedagógico da

escola

5 5

Elaboração do Regimento

Escolar

3 7 2 relataram que o

atual foi imposto

pela SEC; 1, que é

elaborado pela

direção e 1, que

desde que está na

escola não houve

alteração do

regimento.

319

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Se você participa de

reuniões, você dá sua

opinião (fala)?

9 1

Se você dá sua opinião ou

sugestões, você acha que

são ouvidas para a

organização da escola?

7 3

Já participou do Conselho

Escolar como

conselheiro?

4 6

Se você já foi membro do

Conselho Escolar,

consultava seus colegas

representados por você

para saber suas demandas,

o que defender e como

votar?

4

E já participou como

candidato a conselheiro

do Conselho escolar?

5 5

E como candidato à

direção da escola?

10

Já foi da direção da

escola?

10

Já votou nas eleições de

direção da escola?

7 3

Já votou nas eleições para

o Conselho Escolar?

9 1

320

VOCÊ PARTICIPA DE: SIM NÃO NÃO

RESPON-

DEU

OBSERVAÇÕES

Outros espaços e

atividades que você

participa

A resposta era

descritiva. 1

respondeu “A

direção dificulta ao

máximo a

realização de

qualquer

atividade”; 1,

“Passeios extra-

classe, jogos e

campeonatos com

os alunos.”; 1,

“Nenhuma. Não há

‘abertura’.”; 7 não

escreveram nada.

Você acha que a escola é

democrática?

3 2 1 4 responderam

“Um pouco.”

Você acha que a escola é

autoritária?

4 3 1 2 responderam

“Um pouco.”

Você acha que a escola

deveria ser mais aberta

para a participação?

7 3