mod problemas atuais de teoria geral do estado wpos v3

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Brasília-DF, 2010.

Problemas Atuais de Teoria Geral do Estado

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Elaboração:

Gustavo Rabay

Produção:

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração

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Apresentação........................................................................................................................................... 04

Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa ................................................................................... 05

Organização da Disciplina ...................................................................................................................... 06

Introdução ............................................................................................................................................... 07

Unidade I – Problemas Atuais da Teoria do Estado e da Constituição ................................................ 09

Capítulo 1 – Neoconstitucionalismo e Pós-positivismo Jurídico: Força Normativa, Princípios e Jurisprudencialização .......................................................................... 09

Capítulo 2 – Metodologia e Hermenêutica Constitucional: Princípios de Interpretação Constitucional ........................................................................................................ 13

Unidade II – Direitos Fundamentais ...................................................................................................... 19

Capítulo 3 – Justiça Constitucional e Direitos Fundamentais: da Passividade à Judicialização Efetiva ............................................................................................ 19

Capítulo 4 – Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais nas Relações entre Particulares: Função de Proteção Perante Terceiros e Estado Democrático............. 24

Referências .............................................................................................................................................. 28

Bibliografia Recomendada ..................................................................................................................... 29

Sumário

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Apresentação

Caro aluno,

Bem-vindo ao estudo da disciplina Problemas Atuais de Teoria Geral do Estado.

Este é o nosso Caderno de Estudos e Pesquisa, material elaborado com o objetivo de contribuir para a realização e o desenvolvimento de seus estudos, assim como para a ampliação de seus conhecimentos.

Para que você se informe sobre o conteúdo a ser estudado nas próximas semanas, conheça os objetivos da disciplina, a organização dos temas e o número aproximado de horas de estudo que devem ser dedicadas a cada unidade.

A carga horária desta disciplina é de 40 (quarenta) horas, cabendo a você administrar o tempo conforme a sua disponibilidade. Mas, lembre-se, há uma data-limite para a conclusão do curso, incluindo a apresentação ao seu tutor das atividades avaliativas indicadas.

Os conteúdos foram organizados em unidades de estudo, subdivididas em capítulos de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, que farão parte das atividades avaliativas do curso; serão indicadas, também, fontes de consulta para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares.

Desejamos a você um trabalho proveitoso sobre os temas abordados nesta disciplina. Lembre-se de que, apesar de distantes, podemos estar muito próximos.

A Coordenação

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Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa

Apresentação: Mensagem da Coordenação.

Organização da Disciplina: Apresentação dos objetivos e da carga horária das unidades.

Introdução: Contextualização do estudo a ser desenvolvido por você na disciplina, indicando a importância desta para sua formação acadêmica.

Ícones utilizados no material didático

Provocação: Pensamentos inseridos no material didático para provocar a reflexão sobre sua prática e seus sentimentos ao desenvolver os estudos em cada disciplina.

Para refletir: Questões inseridas durante o estudo da disciplina para estimulá-lo a pensar a respeito do assunto proposto. Registre sua visão sem se preocupar com o conteúdo do texto. O importante é verificar seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. É fundamental que você reflita sobre as questões propostas. Elas são o ponto de partida de nosso trabalho.

Textos para leitura complementar: Novos textos, trechos de textos referenciais, conceitos de dicionários, exemplos e sugestões, para lhe apresentar novas visões sobre o tema abordado no texto básico.

Sintetizando e enriquecendo nossas informações: Espaço para você fazer uma síntese dos textos e enriquecê-los com sua contribuição pessoal.

Sugestão de leituras, filmes, sites e pesquisas: Aprofundamento das discussões.

Praticando: Atividades sugeridas, no decorrer das leituras, com o objetivo pedagógico de fortalecer o processo de aprendizagem.

Para (não) finalizar: Texto, ao final do Caderno, com a intenção de instigá-lo a prosseguir com a reflexão.

Referências: Bibliografia consultada na elaboração da disciplina.

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Ementa:Neoconstitucionalismo. Hermenêutica Constitucional. Jurisdição e Direitos Fundamentais. Eficácia horizontal dos direitos Fundamentais nas relações entre particulares.

Objetivos:

• Compreender os três planos ou dimensões dos direitos fundamentais, enfocando os princípios de interpretação constitucional.

• Desenvolve uma visão hermeneuticamente engajada, construtiva e possibilista dos preceitos inscritos na Constituição.

• Formular análises comparativas para entender o poder constituinte como ocorrência de força política, social e/ou econômica do país, associado ao contexto planetário.

• Buscar a autonomia entre a teoria e a práxis jurídica, compatibilizado com os novos marcos teóricos identificados e os fundamentos do Direito Constitucional.

Unidade I – Problemas Atuais da Teoria do Estado e da Constituição Carga horária: 20 horas

Conteúdo CapítuloNeoconstitucionalismo e Pós-positivismo Jurídico: Força Normativa, Princípios e Jurisprudencialização

1

Metodologia e Hermenêutica Constitucional: Princípios de Interpretação Constitucional

2

Unidade II – Direitos FundamentaisCarga horária: 20 horas

Conteúdo CapítuloJustiça Constitucional e Direitos Fundamentais: da Passividade à Judicialização Efetiva

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Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais nas Relações entre Particulares: Função de Proteção Perante Terceiros e Estado Democrático

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Organização da Disciplina

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Na perspectiva em que se busca dotar os direitos fundamentais de múltiplas garantias, reconhecendo-se a proeminência do princípio da dignidade da pessoa humana como fundamento norteador do Estado Democrático de Direito, o estudo do constitucionalismo assume uma posição privilegiada no conjunto de saberes que orientam o praticante da área jurídica. A leitura de que a Constituição nada mais é do que uma “carta de intenções”, calcada nas estruturas políticas do Estado, deve ceder espaço à pré-compreensão de que o Texto Constitucional possui força normativa e conteúdo irradiador das normas de decisão projetadas em cada caso concreto, no seio da vida social.

Desde a teoria kelseniana da norma hipotética fundamental, que coloca a constituição como fundamento de validade do próprio sistema jurídico, e da contribuição de Konrad Hesse, acerca da vontade constitucional e sua potencialidade jurídico-normativa, os estudiosos do Direito Público (e muito recentemente do Direito Privado) redescobrem os horizontes esquecidos da teoria do Estado, da carga de positividade que encerram os princípios de uma constituição e do feixe de possibilidades que as normas constitucionais podem representar no cotidiano dos direitos. Se antes se falava em Era dos Códigos, hoje se está presenciando a Era da Constituição (é a reflexão de Paulo Bonavides) e, conseqüentemente, dos Direitos Fundamentais (análoga à Era dos Direitos propalada por Norberto Bobbio). Afinal, as normas do Estatuto Político Fundamental do Estado comportam preceitos de conteúdo absoluto e que, em virtude de sua natureza principiológica e de sua dialética relação com a moral, devem constituir o ponto de partida para a realização do primado democrático que norteia os Estados ocidentais.

A evolução do constitucionalismo acompanha a evolução das gerações de direitos consagradas em um Estado. Dos albores da modernidade, com a decretação de um Estado absolutista, cuja resposta histórica foi o liberalismo político e econômico vindicado pela burguesia (constitucionalismo clássico), passando pelo ergir do Estado do bem-estar social (welfare state), e a instituição de prerrogativas jurídicas endereçadas à coletividade, vislumbrou-se, na segunda metade do século XX, a possibilidade de se retomar o projeto de paz perpétua aludida por Kant, com a construção do discurso de fraternalismo absoluto, a partir da pauta de garantias consignada nos textos constitucionais do Segundo Pós-Guerra. Direitos fundamentais foram alardeados como direitos inerentes à toda a humanidade, não mais associados a indivíduos ou a grupos de indivíduos. Assim, cogita-se a existência de três planos ou dimensões dos direitos fundamentais: a primeira, ligada aos direitos de liberdade (ou de defesa) dos indivíduos face ao Estado; a segunda, que invoca direitos de igualdade (ou sociais) e envolvem aspectos econômicos, culturais e de afirmação social; e a terceira, que caracteriza direitos de fraternidade (ou humanos propriamente ditos), calcados na solidariedade e na busca pela realização plena dos direitos de toda a humanidade.

No século XXI, o grande desafio é dar vida aos preceitos inscritos na Constituição, assegurando uma expansiva concretude dos direitos fundamentais e humanos, salvaguardados pelo Texto Maior. Não há espaço para sonhos dogmáticos. Mas também não é mais possível conceber a passividade daqueles que interpretam algumas normas constitucionais e lhes atestam a inoperância em virtude da suposta baixa densidade de seus conteúdos (identificadas como normas constitucionais de eficácia limitada, tais como as normas programáticas). Ao praticante do Direito, não se pode mais (so)negar uma visão hermeneuticamente engajada, construtiva e possibilista.

O estudo da Teoria da Constituição, do constitucionalismo, do Direito Constitucional Comparado e da própria dogmática constitucional (direito constitucional positivo) nunca esteve tão evidente no Brasil quanto no atual quadrante histórico. O constitucionalismo, com sua riqueza histórica e sofisticada evolução ao longo dos últimos dois séculos, jamais foi sondado com a profundidade que hoje dedicam estudiosos do mundo todo (Maurizio Fioravanti, Peter Häberle, Horst Dippel) e, em especial, do Brasil (Paulo Bonavides, José Afonso da Silva, Menelick de Carvalho Netto, entre outros). A contextual transição de paradigmas do Estado pós-moderno, em que avulta o signo do multiculturalismo, desencadeado pela integração de países e o surgimento de mercados comuns, fenômenos assinalados de forma reducionista pela expressão “globalização”, exige rupturas interpretativas do modelo de Estado moderno, posto que a soberania não mais se reveste de força absoluta no cenário internacional, nem se pode entender o poder constituinte como a ocorrência da força política, social e/ou econômica de uma nação, dissociado do próprio contexto planetário. Daí a emergência do estudo do Direito Constitucional sob a ótica do Direito Internacional e a necessária formulação de análises comparativas.

Ao lado de todas essas novas perspectivas que auxiliam na própria resignificação dos direitos postos a salvo pelo paradigma do constitucionalismo, exsurge a necessidade de se interpretar a Constituição como uma tarefa cotidiana do jurista, em especial no caso brasileiro, em que se reconhece a existência de uma Constituição expansiva e de alta densidade analítica.

Introdução

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No paradigma do pós-positivismo e do que vem sendo denominado neoconstitucionalismo, a hermenêutica constitucional se torna uma ferramenta básica para o método de interpretação do direito, pois, como afirma Friedrich Müller, é a própria dinâmica do trabalho jurídico que enseja a necessária compreensão estruturante do Direito vigente a partir da própria Constituição, sem descurar da análise dos fatos da vida que vivificam o sentido do Texto Fundamental. Estudaremos os princípios e métodos da Interpretação Constitucional, ao lado do exame do conteúdo das normas constitucionais.

Nessa busca por uma melhor sintonia entre a teoria e a práxis jurídica, verdadeira e necessariamente compatibilizadas com os novos marcos teóricos identificados, a disciplina será desenvolvida em duas unidades temáticas. Na primeira, estudaremos as bases do constitucionalismo e os fundamentos do Direito Constitucional, compreendendo o estudo do Neoconstitucionalismo e do pós-positivismo jurídico, da força normativa da Constituição, dos princípios constitucionais e do fenômeno conhecido como jurisprudencialização do Direito. Ainda na primeira Unidade, será abordado o problema da metodologia e hermenêutica constitucionais, enfocando os princípios de interpretação constitucional. Na segunda unidade, dedicada aos direitos fundamentais, trataremos da Justiça constitucional e sua relação com os direitos fundamentais: da passividade à judicialização efetiva, assim como o problema da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações entre particulares.

Vamos ao que interessa!

O Estado, apropriado pelo estamento dominante, é o provedor de garantias múltiplas para os ricos e de promessas para os pobres. Em um País sem tradição de respeito aos direitos, a constituinte termina sendo uma caça aos privilégios. Criam-se diferentes castas dos que são mais iguais. Alguns conseguem um lugar sob o sol da proteção constitucional direta. Outros ficam no mormaço das normas que sinalizam o status, mas precisarão ser integradas pelo legislador infraconstitucional. A maioria fica sob o sereno das normas programáticas, as que prometem saúde, cultura e terceira idade tranqüila. Mas só quando for possível. (BARROSO, 2001, p.91)

Nunca se falou tanto em Constituição como nos últimos cinco ou seis anos. Congressos, seminários, dissertações, teses e ampla produção bibliográfica têm apontado para as “constitucionalizações” do direito civil, do direito penal, do processo civil, etc. Se um estrangeiro não versado no estado da arte da crise do direito no Brasil comparecesse, por estes dias, aos congressos e simpósios ou até mesmo fizesse parte de bancas na pós-graduação ou ainda passasse os olhos na produção bibliográfica, acharia, com toda a certeza, que o Brasil estaria passando por uma verdadeira Allgegenwart der Verfassung, isto é, a onipresença da Constituição em todo o sistema jurídico. Na prática, entretanto, a solidão constitucional continua – e se agrava. Há, efetivamente, um abismo separando o discurso sobre a Constituição da efetiva operacionalização/concretização do Direito Constitucional. Afinal, o que pensamos da Constituição? O que é isto, a Constituição? E qual o papel da jurisdição constitucional em um país periférico e de modernidade tardia? Uma coisa resta muito clara: quando aprofundamos o debate sobre a força normativa da Constituição e seu papel dirigente e compromissário, de imediato saltam pesadas acusações de ativismo judicial, de judicialização da política, invasão de subsistemas, para dizer o mínimo. (STRECK, Lenio Luiz, apud NUNES, Antonio José A.; COUTINHO, Jacinto Nelson M. 2004, p.301–371)

Introdução

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Problemas Atuais da Teoria do Estado e da Constituição Unidade I

Capítulo 1 – Neoconstitucionalismo e Pós-positivismo Jurídico: Força Normativa, Princípios e Jurisprudencialização

A evolução do pensamento jurídico no século XX acenou criticamente contra o modelo positivista inaugurado com Kelsen, apontando para a falibilidade da ideia de que a aplicação do direito resta circunscrita a operações lógico-dedutivas extraídas de um sistema dinâmico de normas feito pelo Estado, excluindo-se quaisquer elementos de natureza metafísico-valorativa (PERELMAN, 2000, p.448-480). Certamente, um momento de “crise do direito”.

A partir dessa orientação, fortalece-se o paradigma assente na discussão metodológica atual que sustenta ser a aplicação do direito uma atividade dialética e que tem como cerne a racionalidade no saber jurídico como permanente construção, repercutindo valores. Caracteriza-se, assim, a hoje comumente denominada etapa pós-positivista do direito.

O pós-positivismo tem como pano de fundo o reconhecimento de que o método juspositivista dos séculos anteriores “não correspondia mais às perplexidades e inseguranças criadas por um mundo de novos e variados valores”, tomando-se, como clássica amostra, as atrocidades do nazismo, perpetradas com respaldo normativo (Idem, p.142-143). Com isso, fez-se necessário adotar-se um novo modelo de legitimação para as decisões judiciais, “o que só se tornaria possível quando reconhecida a natureza dialética e argumentativa do direito”.(idem, p.143)

No sentir de Margarida Lacombe, o pós-positivismo investe contra o modelo neutral kelseniano e, assim, inspira duas vertentes: uma que visa recuperar a força normativa dos princípios jurídicos, com todo o seu potencial valorativo, a partir das formulações de Ronald Dworkin e Robert Alexy, e a outra que procura, “nos fundamentos que sustentam as decisões judiciais, sua força lógico-legitimante”, como fazem Perelman e Viehweg, por exemplo.1

O atual momento metodológico da teoria jurídica fundamental e, sobretudo, do direito constitucional acentua, sobremaneira, a importância dos princípios no ambiente dogmático. No dizer de Ávila, verifica-se, hoje, a euforia de um “Estado Principiológico”(2004, p.15).2

Em verdade, as grandes promessas de uma etapa posterior ao positivismo normativista e à hermenêutica jurídica tradicional impulsionaram corações e mentes para os rincões da principiologia jurídica, um estágio teórico em que a dogmática jurídica pudesse ter rediviva em suas entranhas a racionalidade argumentativa e valorativa que vinha sendo sistematicamente expungida da aplicação normativa por mecanismos reducionistas do direito à interpretação silogística e banal de textos legais.

1 “A tópico-retórica, como alguns chamam a contribuição de autores que seguem a linha de Perelman e Viehweg, visa, antes de mais nada, estudar ou dar mais ênfase aos mecanismos persuasivos que orientam e dão forma ao discurso jurídico, voltado para um consenso capaz de dar suporte e legitimidade à decisão da autoridade judiciária”. (Idem, p. 141 e 147).

2 Fábio Corrêa Souza de Oliveira assinala o emprego de outras designações congêneres, tais como “Estado principialista” (Paulo Bonavides), “Hermenêutica de Princípios” (Inocên-cio Mártires Coelho), “Compreensão principial da Constituição” (Gomes Canotilho), “principiologia jurídico-constitucional” (Willis Santiago Guerra Filho), “dogmática principialista” (Clèmerson Merlin Clève) e “jurisprudência de princípios” (García de Enterría). Oliveira, Fábio Corrêa Souza de. Por uma teoria dos princípios – o princípio constitucional da razoabilidade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 10.

Unidade I

Problemas Atuais da Teoria do Estado e da Constituição

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Problemas Atuais da Teoria do Estado e da Constituição Unidade I

Os sinais dessa nova etapa do pensamento, que alguns chamam simplesmente de pós-positivismo (BARROSO, 2001, v.1, 2006), investem contra o padrão estratificado da dogmática jurídica, em especial nos planos epistemológico e interpretativo, inspirando, assim, diversas vertentes de revigoramento da Filosofia e da Teoria Geral do Direito: As teses da argumentação jurídica, que revolvem à discussão da força lógico-legitimante dos fundamentos que sustentam as decisões jurídicas (CAMARGO, 2001, p.141, 147) e, via reflexa, da moralidade do direito, apresentando-se em inúmeras variações teoréticas, tais como a retórica de Perelman, a tópica de Viehweg e a teoria que se convencionou chamar de “padrão”, formulada por Robert Alexy1; a concretização jurídica ou metódica estruturante, de Friedrich Müller, que propõe, em síntese, uma configuração procedimental-interpretativa de produção da norma jurídica, que não preexiste antes de vir ao encontro de dados dogmáticos (seu correspondente texto normativo, por exemplo), e de dados reais, que são os elementos naturais e sociais constantes do caso concreto (MÜLLER, 1995, p.42ss); e a Teoria Crítica do Direito, que promove, como reflete Barroso, a contestação do saber jurídico tradicional (BARROSO, 1999. p.265), já denunciada por Warat, como o senso comum teórico dos juristas2, posta a sugerir, de forma estrutural, perspectivas emancipatórias à epistemologia, hermenêutica e ideologia do direito, em que despontam Luís Fernando Coelho e Lenio Streck.

De mais a mais, não se deve esquecer a íntima relação que conservam tais temas com a semiótica jurídica, cada vez mais implicada na compreensão e estruturação do direito, tal como a filosofia da linguagem no seu papel de construção das relações humanas.

Como recurso lógico comum a todas essas inflexões por que passam a filosofia e teoria jurídicas contemporâneas, exsurge o primado da normatividade e hermenêutica dos princípios.

No entanto, a ausência de um aporte filosófico-dogmático definitivo acerca da teoria dos princípios é presente. O estatuto epistemológico dos princípios jurídicos ainda está em gestão, como sugere o título dessa breve investigação (e assim evidenciam algumas trágicas linhas definitórias associadas ao assunto).

Com efeito, apesar dos recentes esforços da doutrina na depuração teórico-dogmática daquilo que se convencionou chamar de princípio jurídico, ainda há muito por se produzir e clarificar. Como ressalta Ávila (op cit, p.56), existem duas formas de se investigar a principiologia jurídica: a primeira forma trata de uma investigação apologética, isto é, que exalta a importância incomensurável dos princípios, privilegiando-se a “proclamação da importância dos princípios, qualificando-os como alicerces ou pilares do ordenamento”, sem, contudo, indicar quais os cometimentos imprescindíveis à sua concreção e qual o aparato de sua justificação e aplicação; já a segunda consiste na análise consecutiva e insistente de sua estrutura e o modo de aplicabilidade racional dos princípios, enquanto modelos normativos eminentemente argumentativos, como, aliás, o são todas as normas jurídicas.

Na expressão de Barcelos (2007), “os princípios constitucionais são o locus no qual a necessidade de convivência respeitosa entre os espaços do jurídico-constitucional e da deliberação majoritária e democrática talvez se mostre de forma mais visível”.

Tratando-se a Constituição do ambiente natural dos princípios jurídicos (GUERRA FILHO, 2001, p.54), esses constituem a síntese dos valores principais da ordem jurídica (BARROSO, 1993, p.171). Assim, os princípios constitucionais, além de refletirem a própria essência do regime político adotado e os exatos valores supremos da ordem jurídica, enquanto normas superiores e axiologicamente orientadas (função fundamentadora), exprimem, também, a função de disposição efetiva, subsumível ao caso concreto, ainda que, prefacialmente, não possuam endereçamento definitivo.

1 Para uma visão introdutória do tema, cf. Guerra, Gustavo Rabay. O direito racional e o retorno ao argumento: as teses do direito argumentativo (Tópica, Retórica e Discurso Racional Procedimental) como canais para um pós-positivismo jurídico factível. Revista da Faculdade de Direito de Caruaru. Caruaru, n. 34, p. 165-190, 2003.

2 Esta expressão designa, no intento de uma Crítica Jurídica, o conjunto de pressupostos conceituais (princípios, dogmas, verdades, crenças, valores) sobre o qual se assenta a cultura e a epistemologia jurídica predominantes/tradicionais, sendo tal conjunto desprovido de legitimidade ideológico-social Cf. Warat, Luis Alberto. Introdução geral ao Direito: o direito não estudado pela teoria jurídica moderna. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1997.

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Problemas Atuais da Teoria do Estado e da Constituição Unidade I

Para além dessa função normativa, que se extrai automaticamente da sua própria natureza jurídica, o caráter de fecundidade dos princípios lhes confere a função interpretativa e a função integrativa (BARROSO, 1999, p. 148; CORREIA, 1998 p.8), como assinalada à clássica noção de “princípios gerais do direito”. De tal modo, os princípios informam as normas jurídicas concretas, concebidas a partir da interpretação ou hermenêutica inventivas ou, ainda, da argumentação, de tal forma que a literalidade da norma pode ser desatendida pelo juiz quando viola um princípio que nesse caso específico se considera importante, como pretende Dworkin, ao citar o arquetípico exemplo de prevalência principiológica contida no caso “Riggs vs Palmer”, decidido pela Corte de Nova Iorque, em 1889, no qual um neto foi condenado pelo assassinato de seu avô, com a intenção de receber sua herança, ficando dele privado, posto que aquela Corte justificou o seu entendimento no princípio de que “ninguém pode se beneficiar de seus próprios delitos”, a despeito da lei sobre sucessões dispor a contrario sensu (CALSAMIGLIA, 1984).

Apesar da transição paradigmática por que passa o saber jurídico contemporâneo, centrada na ideia de resgate dos princípios jurídicos e de toda a sua força normativa, ainda existe certa resistência da doutrina e da jurisprudência, em reconhecer a importância dos princípios não escritos de um dado ordenamento (CORREIA, 1998, p.8). No entanto, é inegável a presença e importância dos princípios implícitos, ou seja, aqueles que não foram frontalmente enunciados em normas escritas, devem portar aplicabilidade normativa plena, prevalecendo, inclusive, sobre algumas regras expressas1.

Outro ponto de exclamação que promove uma verdadeira reviravolta na forma como lemos e entendemos a Constituição se dá com a lição de Konrad Hesse. Décadas após a consagração do modelo constitucional na teoria pura de Hans Kelsen, o professor alemão Konrad Hesse passou a ser a principal referência no que toca à concepção jurídico-positiva da constituição, com seu célebre A força normativa da constituição (Die normative Kraft der Verfassung).

Opondo-se claramente a Ferdinand Lassale e sua célebre doutrina sociológica da Constituição, Hesse (1991) considera que se a realidade social influi sobre o direito, por outro lado o direito também influencia e condiciona a realidade social, operando comandos normativos com força de concretização plena em situações específicas. Segundo ele, ao reconhecer a vontade constitucional (Wille zur Verfassung) de uma nação, é exigível ao Estado dotar a ordem jurídica de mecanismos que assegurem concreta aplicação dos preceitos constitucionais.

Esse contraponto de Hesse não contraria, no entanto, o pensamento de Lassale. No diálogo entre os dois constitucionalistas, podemos extrair que a constituição não configura apenas a expressão do modo de ser do Estado, mas também um dever dirigido à sociedade como um todo. Ao lado da força condicionante da realidade, encontramos a normatividade da constituição. A “Constituição real” e a “Constituição jurídica” condicionam-se mutuamente, mas não guardam relação de dependência uma com relação a outra (COELHO; HESSE; HABERLE, 1998).

Muito embora, de início, não se reconhecesse uma força normativa nos princípios, modernamente, em decorrência da evolução do positivismo jurídico, chegando-se ao pós-positivismo, “as novas Constituições Promulgadas acentuam a hegemonia axiológica dos princípios, convertidos em pedestal normativo sobre o qual assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas constitucionais.” (BONAVIDES, 2002, p.237)

Seguindo a teoria de Konrad Hesse (1991), a partir do momento em que a Constituição tem uma pretensão de eficácia normativa que não se confunde com as condições de sua realização, não pode representar somente a expressão de um “ser”, mas também de um “dever-ser”. A “força normativa” da Constituição mencionada por Hesse, todavia, não seria somente a adequação do texto constitucional à realidade concreta. Mais do que um simples retrato da realidade, ela impõe tarefas que devem ser efetivamente realizadas no tempo. No entanto, isso se dará, somente, se existir a chamada “vontade de constituição”. Essa “vontade” possui três vertentes: a compreensão da necessidade de uma ordem normativa contra o arbítrio, a constatação de que essa ordem não é eficaz sem o concurso da vontade humana e a de que a ordem normativa adquire e mantém sua vigência sempre mediante atos de vontade. Em síntese, Hesse afirma que a força normativa da Constituição não depende apenas de seu conteúdo, mas também de sua prática.

1 Idem, p. 8-9; Outrossim, faz-se obrigatório recobrar o disposto no § 2º do art. 5º, da Constituição de 1988, que assim dispõe, in litteris: “§ 2º – Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

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Problemas Atuais da Teoria do Estado e da Constituição Unidade I

A síntese dessa nova forma de se enxergar a Constituição como estrutura normativa de princípios, dotada de força normativa, constitui a base do que chamamos de neoconstitucionalismo.

Enquanto corrente jusfilosófica, o neoconstitucionalismo se identifica com três grandes transformações: (a) reconhecimento da força normativa da Constituição; (b) expansão da jurisdição constitucional; (c) desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional (BARROSO, 2005).

O desenho téorico da força normativa da Constituição existia antes do marco histórico do neoconstitucionalismo. Contudo, era inócua, em razão da ausência da vontade constitucional. Com a jurisdição constitucional, a parcela de poder responsável pela resolução de controvérsias no âmbito institucional foi transferida para um órgão próprio, como, por exemplo, o Tribunal Constitucional Federal alemão (1951) ou a Corte Constitucional italiana (1956). No início, esse modelo enfrentou duras resistências, que foram combatidas com a formulação de técnicas específicas para o processo de tomada de decisão nos assuntos de natureza constitucional (dogmática constitucional), que se aperfeiçoam ao longo do tempo e dos casos difíceis.

Conseqüência natural dessas novas ondas transformadoras são a perspectiva de jurisprudencialização do direito, algo que se acentua no ordenamento jurídico brasileiro com a Reforma do Judiciário, trazida pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004, e que consagrou o instituto das Súmulas Vinculantes.

André Gontijo, em resumo analítico da obra do Prof. Luís Roberto Barroso, evoca alguns pontos controvertidos sobre o tema.

A constitucionalização e a judicialização das relações sociais se refere ao aumento da demanda por justiça e, ao mesmo tempo, no embrião da Cidadania e da conscientização dos direitos das pesssoas. Reflete, de certa forma, a ascensão do Poder Judiciário no Brasil, envolvendo a judicialização das questões políticas e sociais, como a discussão das políticas públicas no campo da reforma da previdência, as relações entre os poderes, com as CPIs e o poder de investigação do Ministério Público, não devendo se esquecer da colisão e ponderação de direitos fundamentais, como no caso dos anencéfalos, além de questões do dia a dia das pessoas (Idem, p.8).

Nesse contexto, os órgãos judiciais se apresentam com uma argumentação jurídica, mas exercem uma função política, o que enseja a discussão entre a legitimidade democrática da função judicial, no que toca a suas possibilidades e limites. Assim, questões fundamentais, como a soberania popular e separação dos poderes são colocadas frente a necessidade de se preservar as condições essenciais para o funcionamento do Estado Constitucional Democrático. Esse deve ser o papel do Juiz: assegurar valores substantivos e procedimentos adequados de participação e deliberação no contexto plural das discussões políticas entre os legitimados. (Idem, p.19)

Com efeito, essa situação remonta a discussão entre progressistas versus conservadores na Suprema Corte dos Estados Unidos, em que se enxerga a divergência entre processo político, como jogo de interesses, em disputa com os reais valores da democracia. Percebe-se, nesse contexto, o deficit de legitimidade do legislador em relação ao jurista, o qual deve primar pelos valores fundamentais, resguardando-os, a fim de assegurar o procedimento democrático e a estabilidade institucional. (Idem, p.20)

Assim, deve-se preservar o ponto de equilíbrio, alcançando-se a Supremacia da Constituição, com a interpretação constitucional pelo judiciário e preservando-se o processo político majoritário. Esse, atualmente, é o papel do STF, em razão da falta de legitimidade dos demais poderes: tentar contornar a disfunção institucional “crônica” presenciada nos dias atuais. (Idem, p.20-21)

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Capítulo 2 – Metodologia e Hermenêutica Constitucional: Princípios de Interpretação Constitucional

A palavra hermenêutica na sua origem etimológica, vem de Hermes, o Deus Mensageiro na Mitologia Grega que transportava as mensagens dos deuses para os humanos.

Então, quando pensamos em hermenêutica estamos sempre cogitando a transmissão de mensagens. No caso da hermenêutica jurídica, qual é a mensagem? É a norma que tem, de alguma maneira, de ser aplicada a um caso concreto.

A Constituição é norma jurídica e, enquanto tal, guarda uma série de peculiaridades, em especial por ser regramento do fenômeno político. Então, é inevitável que a interpretação constitucional, de alguma maneira, acabe estando permeada pela política.

Outro aspecto que, de alguma maneira, torna peculiar a interpretação constitucional, é o fato de que as constituições, pela sua própria natureza, são compostas de normas que são expressas numa linguagem muito aberta, muito abstrata, muito vaga, e que, por isso mesmo, franqueiam um amplo espaço para valorações subjetivas de parte daquele que as aplica. Por exemplo, uma Constituição como a brasileira, que contém normas que empregam conceitos como “moralidade administrativa”, “dignidade da pessoa humana”, “cidadania”, “devido processo legal”, entre inúmeras outras, permite uma grande abertura interpretativa para a aplicação dos casos concretos. (MÜLLER, 2005; MÜLLER, 1995, p.42; GALINDO, 2003; ADEODATO, 2001, p.221-259; BISOL, 2003, p.189-200)

Uma outra característica importante das constituições, que, também, se reflete na sua hermenêutica, é o fato de que ela é a norma suprema. Ela, como norma jurídica, é superior a todas as demais. Ora, quando interpretamos um decreto, podemos colher subsídios da lei, da qual aquele decreto decorre; quando interpretamos uma lei, temos a Constituição para apontar certos parâmetros. Agora, quando interpretamos a Constituição, do ponto de vista jurídico-formal, não podemos recorrer a nada mais. Isso amplia, indubitavelmente, essa margem de subjetivismo que caracteriza a posição e a obra do intérprete.

Nesse sentido, importante a lição de Barroso (apud cit. 1999):

O ponto de partida do intérprete há que ser sempre os princípios constitucionais, que são o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui. A atividade de interpretação da Constituição deve começar pela identificação do princípio maior que rege o tema a ser apreciado, descendo do mais genérico ao mais específico, até chegar à formulação da regra concreta que vai reger a espécie. É importante assinalar, logo de início, que já se encontra superada a distinção que outrora se fazia entre norma e princípio. A dogmática moderna avaliza o entendimento de que as normas jurídicas, em geral, e as normas constitucionais, em particular, podem ser enquadradas em duas categorias diversas: as normas-princípio e as normas-disposição. As normas-disposição, também referidas como regras, têm eficácia restrita às situações específicas às quais se dirigem. Já as normas-princípio, ou simplesmente princípios, têm, normalmente, maior teor de abstração e uma finalidade mais destacada dentro do sistema.

É preciso se ter em mente que, na verdade, a Constituição não é pura norma. É texto normativo. E como tal, precisa ser concretizado, transformando-se em norma sustentável para um determinado problema concreto.

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Nesse sentido, veja-se o caso da metódica hermenêutica de Friedrich Müller: o professor de Heidelberg defende o emprego combinado dos velhos cânones de Savigny, os seus meios clássicos de interpretação (o gramatical, o histórico, o genético e o sistemático) com as modernas técnicas e procedimentos interpretativos da Nova Hermenêutica Constitucional.

Em síntese, a proposta de Müller propõe uma configuração procedimental interpretativa de produção da norma jurídica, que não preexiste antes de vir ao encontro de dados dogmáticos (seu correspondente texto normativo, por exemplo), e de dados reais, que são os elementos naturais e sociais constantes do caso concreto.

Infelizmente, ainda persiste na tradição brasileira a ideia praxiológica de direito positivo calcado no primado da lei. A dificuldade de dissociação entre norma x lei, ou mesmo norma x texto, é injustificável na “era cibernética”.

Mas quando mencionamos um determinado artigo da Constituição, não estamos diante de uma norma constitucional, mas de um dispositivo textual da Constituição, que só se tomará a acepção de norma após a interpretação de sua manifestação literal ou factual diante de um certo contexto, determinado pelo caso concreto. O dispositivo constitucional invocado seria, na linguagem de Müller, uma “norma-texto” (preferimos “texto da norma”) e a melhor solução para o caso, de acordo com o sistema jurídico e a finalidade que ele guarda ao caso, seria a “norma-decisão”.

Vejamos a seguir quais os princípios da interpretação especificamente constitucional. Deixaremos de abordar os métodos clássicos de interpretação constitucional em razão da extensão diminuta que esse espaço comporta.

Princípios da interpretação constitucional

A doutrina atual, partindo sempre do português Gomes Canotilho, enumera como principais os seguintes princípios de interpretação constitucional:

• princípio da unidade da constituição: a interpretação constitucional dever ser realizada de maneira a evitar contradições entre suas normas;

• princípio do efeito integrador: na resolução dos problemas jurídico-constitucionais, deverá ser dada maior primazia aos critérios favorecedores da integração política e social, bem como ao reforço da unidade política;

• princípio da máxima efetividade ou da eficiência: a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe conceda;

• princípio da justeza ou da conformidade funcional: os órgãos encarregados da interpretação da norma constitucional não poderão chegar a uma posição que subverta, altere ou perturbe o esquema constitucionalmente estabelecido pelo legislador constituinte;

• princípio da concordância prática ou da harmonização: exige-se a coordenação e combinação dos bens jurídicos em conflito de forma a evitar o sacrifício total de uns em relação aos outros;

• princípio da força normativa da constituição: entre as interpretações possíveis, deve ser adotada aquela que garanta maior eficácia, aplicabilidade e permanência das normas constitucionais.

Acerca do princípio da unidade, explicam Mendes, Coelho e Branco (2008, p.107):

Segundo essa regra de interpretação, as normas constitucionais devem ser vistas não como normas isoladas, mas como preceitos integrados num sistema unitário de regras e princípios, que é instituído na e pela própria constituição. Em consequência, a constituição só pode ser compreendida e interpretada corretamente se nós a entendermos como unidade, do que resulta, por outro lado, que em nenhuma hipótese devemos separar uma norma do conjunto em que ela se integra, até porque − relembre-se o círculo hermenêutico − o sentido da parte e o sentido do todo são interdependentes.

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Por força desse princípio,

inexiste hierarquia entre normas da Constituição, cabendo ao intérprete a busca da harmonização possível, in concreto, entre comandos que tutelam valores ou interesses que se contraponham. Conceitos como os de ponderação e concordância prática são instrumentos de preservação do princípio da unidade, também conhecido como princípio da unidade hierárquico-normativa da Constituição.

Quanto ao princípio da concordância prática, aduz que Mendes, at al. (2008, p.107-108):

Intimamente ligado ao princípio da unidade da constituição, que nele se concretiza, o princípio da harmonização ou da concordância prática consiste, essencialmente, numa recomendação para que o aplicador das normas constitucionais, em se deparando com situações de concorrência entre bens constitucionalmente protegidos, adote a solução que otimize a realização de todos eles, mas ao mesmo tempo não acarrete a negação de nenhum.

Derivado, igualmente, do cânone hermenêutico da unidade da constituição – como apontam Mendes et al. (2008, p.108)

o princípio da correção funcional tem por finalidade orientar os intérpretes da constituição no sentido de que, instituindo a norma fundamental um sistema coerente e previamente ponderado de repartição de competências, não podem os seus aplicadores chegar a resultados que perturbem o esquema organizatório-funcional nela estabelecido, como é o caso da separação dos poderes, cuja observância é consubstancial à própria ideia de Estado de Direito.

O princípio do efeito integrador, por seu turno,

orienta o aplicador da constituição no sentido de que, ao construir soluções para os problemas jurídico-constitucionais, procure dar preferência àqueles critérios ou pontos de vista que favoreçam a integração social e a unidade política, porque além de criar uma certa ordem jurídica, toda constituição necessita produzir e manter a coesão sócio-política, enquanto pré-requisito ou condição de possibilidade de qualquer sistema jurídico. Em que pese a indispensabilidade dessa integração para a normalidade constitucional, nem por isso é dado aos aplicadores da constituição subverter-lhe a letra e o espírito para alcançar esse objetivo a qualquer custo, até porque, à partida, ela se mostra submissa a outros valores, desde logo reputados fundamentais − como a dignidade humana, a democracia e o pluralismo, por exemplo − que precedem a sua elaboração, nela se incorporam e, afinal, seguem dirigindo a sua interpretação. (opus. cit, p.10)

A noção principiológica de força normativa da constituição, de que tanto nos fala Konrad Hesse, transmuta-se em princípio de interpretação, “para que os aplicadores da constituição, na solução dos problemas jurídico-constitucionais, procurem dar preferência àqueles pontos de vista que, ajustando historicamente o sentido das suas normas, lhes confiram maior eficácia”. (opus. cit, p.111)

Associado à ideia de força normativa, o princípio da máxima efetividade

orienta os aplicadores da lei maior para que interpretem as suas normas em ordem a otimizar-lhes a eficácia, mas sem alterar o seu conteúdo. De igual modo, veicula um apelo aos realizadores da constituição para que em toda situação hermenêutica, sobretudo em sede de direitos fundamentais, procurem densificar tais direitos, cujas normas, naturalmente abertas, são predispostas a interpretações expansivas. Tendo em vista, por outro lado, que em situações concretas a otimização de qualquer dos direitos fundamentais, em favor de determinado titular, poderá implicar a simultânea compressão, ou mesmo o sacrifício, de iguais direitos de outrem, direitos que constitucionalmente também exigem otimização (...) em face disso impõe-se harmonizar a máxima efetividade com essas e outras regras de interpretação, assim como se devem conciliar, quando em estado de conflito, quaisquer bens ou valores protegidos pela constituição. (Opus. cit, p.111)

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Apontam, igualmente, com Canotilho (1991, p.136ss), a necessidade de delimitação do âmbito normativo de cada norma constitucional, vislumbrando-se sua razão de existência, finalidade e extensão. Os dois autores citados dão o seguinte exemplo: “não há conflito entre a liberdade de expressão e o direito ao bom nome em caso de difamação, dado que não está coberto pelo âmbito normativo-constitucional da liberdade de expressão o direito à difamação, calúnia ou injúria”.

Sobre esse importante princípio metodológico, assim como faremos com o princípio da interpretação, conforme a constituição, empreenderemos análise separada.

Princípios da proporcionalidade

A adoção desses princípios de interpretação é complementar ao emprego do princípio da proporcionalidade, que, além de constitucional, também, se verifica como interpretativo, possibilitando que eventual colisão de direitos, decorrente de contradição entre eles possa ser superada, ou por meio da redução proporcional do âmbito de alcance de cada um deles, ou, em alguns casos, mediante a prevalência de um sobre outro.

Segundo Barroso (1994, p.209), o princípio da razoabilidade também tem sua origem e desenvolvimento ligados à garantia do devido processo legal, em especial, de cunho substantivo. Sobremaneira, a doutrina mais autorizada credita ao art. 5º, LIV, da Constituição de 1988, a sedes materiae do princípio da proporcionalidade no direito positivo vigente, constituindo-se, portanto, previsão implícita, decorrente do próprio due process of law. (BUECHELE, 1999, p.146)

Contemporaneamente, é franca sua difusão, enquanto base principiológica, no âmbito do exame de constitucionalidade das leis, pois, como ressalta Barroso (op cit, p. 109), é por seu intermédio que se procede ao exame de razoabilidade (reasonableness) e de racionalidade (rationality) das normas jurídicas e dos atos do Poder Público em geral.

Sobre os termos “proporcionalidade” e “razoabilidade”, geralmente aplicados para identificar a mesma realidade objetiva, cumpre esclarecer a fungibilidade das duas palavras. Como nos diz Barros (2000, p.72), a doutrina alemã utiliza, indiscriminadamente o primeiro vocábulo, ou, em seu lugar, “proibição de excessos” (Übermassverbot), para designar o princípio que os americanos tratam por razoabilidade.

De outra parte, Guerra Filho (2001, p.66) lembra a sinonímia e origem comum, na matemática, dos termos “razão” e “proporção”, radicados nas formas latinas ratio e proportio, respectivamente. E reforça, na mesma linha, de forma magistral, Barroso: “(...) a jurisprudência, assim na Europa continental como no Brasil, costumam fazer referência, igualmente, ao princípio da proporcionalidade, conceito que em linhas gerais mantém uma relação de fungibilidade com o princípio da razoabilidade”. (op cit. p.215)

Canotilho destaca sua aplicabilidade dogmática em dois sentidos: (i) princípio da proporcionalidade em sentido amplo, equivalente ao princípio da proibição de excessos (Übermassverbot”), consagrada na Constituição Portuguesa de 1976; e (ii) princípio da proporcionalidade em sentido restrito (Verhältnismässigkeit), que seria um dos subprincípios do princípio da proibição de excessos ou princípio da proporcionalidade em sentido amplo. (s.d., p. 265-269)

Acentua Buechele, com relação ao princípio em sentido estrito: “(...) o aspecto chave é a ponderação, a relação “custo-benefício”, ou seja a verificação das vantagens e desvantagens resultantes para o cidadão, a partir dos meios utilizados pelo legislador com vistas à obtenção dos fins perseguidos pela norma constitucional”. (op cit. p. 132)

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Nesse subprincípio, meios e fins são colocados em equação mediante um juízo de ponderação, com o objetivo de avaliar se o meio empregado é ou não proporcional à finalidade última da medida em questão ou, em um só esforço, trata-se do princípio da “justa medida”(CANOTILHO, p.264). Nesse diapasão, proporcionalidade em sentido estrito é um parâmetro de valoração dos atos do Poder Público, aplicável para aferir se eles estão informados pelo critério de justiça, que deveria ser o valor superior a todo o ordenamento jurídico. (BARROSO, p.215)

Guerra Filho (2001, p.70), baseado no direito alemão, alude que essa perspectiva de proporcionalidade em sentido estrito, também denomina-se “máxima de sopesamento” (Abwägungsgebot), e integra, ao lado de outros dois subprincípios, quais sejam, o “princípio da adequação” e o “princípio da exigibilidade” ou da “máxima do meio mais suave” (Gebot des mildesten Mittels), o conteúdo do próprio princípio da proporcionalidade em sentido lato (“proibição de excessos”).

O segundo subprincípio, o da “adequação”, radica na verificação de que o meio eleito para a consecução do objetivo almejado tenha condições para materializar-se, “isto é, que seja apto, capaz de lograr o desiderato pretendido”. É o que Canotilho (opus cit, p.268) refere como “princípio da conformidade ou adequação” (Geeignetheit), que consiste na imposição de que a medida tomada para a realização do interesse público deve ser apropriada à finalidade suscitada. “Trata-se, pois, de controlar a relação de adequação medida-fim”, como decifra o autor lusitano.

Por sua vez, o subprincípio da “exigibilidade”, também designado por “máxima do meio mais suave”, e ainda, princípio da “necessidade”, parte do exame de ser o meio eleito para a consecução do fim proposto o mais aconselhável e não se, per si, era exigível, não esquecendo-se, pois, que o princípio da proporcionalidade em sentido lato, “contempla o exame da norma legal no plano intrínseco, ou seja, sob a ótica da sua conexão material entre meios e fins,” como salientado por Barros. (2000, p.79)

Em síntese, pode ser focalizado como o princípio que avalia se a medida adotada seria mesmo exigível ou necessária, face à sua repercussão real. É como se houvesse a necessidade se ministrar uma vacina e se constatasse que os efeitos colaterais seriam nocivos e até mesmo perigosos, em certas circunstâncias. Aqui, a colateralidade reside no perigo de desrespeito aos direitos fundamentais dos cidadãos.

Complementando essa ideia, enfatiza Canotilho (op cit. p.268) que o referido subprincípio “coloca a tônica na ideia de que o cidadão tem direito à menor desvantagem possível”, na qual se conclui que se deve exigir, sempre, a comprovação de que não era possível a adoção de outros meios menos onerosos para ele, senão aquele escolhido.

Enfim, a junção desses três subprincípios compõem o conteúdo do princípio da proporcionalidade lato sensu que, assim como seu correspondente norte americano (rule of reasonableness), é o entorno da valoração de diversas medidas e finalidades postas no jogo da decidibilidade democrática do direito, que encerra potencializado viés interpretativo, ínsito ao sopesamento de eventuais conflitos de princípios jurídicos e, portanto, ao controle de constitucionalidade das leis.

Em caso que se contrapuseram a Igreja Universal do Reino de Deus e a Prefeitura de Diadema, decidiu a 1ª Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo: “A liberdade de exercício de culto religioso assegurada pelo art. 5º, VI, da Constituição Federal, não autoriza o abuso na utilização de instrumentos sonoros a desrespeitar o repouso da coletividade e normas municipais. (...) Os vizinhos têm também o direito à intimidade (art. 5º, X, da CF) e, também, à liberdade de consciência e de crença (art. 5º, VI, da CF), prejudicados estes direitos fundamentais pelo som da apelante”.

O surgimento do pós-positivismo evidenciou a insuficiência do método subsuntivo para a decisão jurídica. Segundo Barroso e Barcellos (2003, v5, p.51-80), a

ponderação consiste, portanto, em uma técnica de decisão jurídica aplicável a casos difíceis, em relação aos quais a subsunção se mostrou insuficiente, especialmente quando uma situação concreta dá ensejo à aplicação de normas de mesma hierarquia que indicam soluções diferenciadas. A estrutura interna do raciocínio ponderativo ainda não é bem conhecida, embora esteja sempre associada às noções difusas de balanceamento e sopesamento de interesses, bens, valores ou normas (...) É interessante observar que alguns dos principais temas da atualidade constitucional no Brasil tem seu equacionamento posto em termos de ponderação de valores, podendo-se destacar: (i) o debate acerca da relativização da

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coisa julgada, onde se contrapõem o princípio da segurança jurídica e outros valores socialmente relevantes, como a justiça, a proteção dos direitos da personalidade e outros; (ii) o debate acerca da denominada “eficácia horizontal dos direitos fundamentais”, envolvendo a aplicação das normas constitucionais às relações privadas, onde se contrapõem a autonomia da vontade e a efetivação dos direitos fundamentais; (iii) o debate acerca do papel da imprensa, liberdade de expressão e direito à informação em contraste com o direito à honra, à imagem e à vida privada.

A Interpretação conforme a Constituição

A interpretação conforme a Constituição, assim como o princípio da proporcionalidade, se traduz em verdadeiro método de interpretação eminentemente constitucional. Esse princípio “consubstancia essencialmente uma diretriz de prudência política ou, se quisermos, de política constitucional, além de reforçar outros cânones interpretativos, como o princípio da unidade da constituição e o da correção funcional”.

Segundo Mendes (1008, p.112), sua importância consiste na recomendação para

que os aplicadores da constituição, em face de normas infraconstitucionais de múltiplos significados, escolham o sentido que as torne constitucionais e não aquele que resulte na sua declaração de inconstitucionalidade, esse cânone interpretativo ao mesmo tempo em que valoriza o trabalho legislativo, aproveitando ou conservando as leis, previne o surgimento de conflitos, que se tornariam crescentemente perigosos caso os juízes, sem o devido cuidado, se pusessem a invalidar os atos legislativos.

Como bem advertem Barroso e Barcellos (2003, p.51-80), o princípio têm aspecto dúplice:

• Princípio instrumental de interpretação constitucional: Como princípio de interpretação, decorre ele da confluência dos dois princípios anteriores: o da supremacia da Constituição e o da presunção de constitucionalidade. Com base na interpretação conforme a Constituição, o aplicador da norma infraconstitucional, dentre mais de uma interpretação possível, deverá buscar aquela que a compatibilize com a Constituição, ainda que não seja a que mais obviamente decorra do seu texto.

• Método de jurisdição constitucional: -Como técnica de controle de constitucionalidade, a interpretação conforme a Constituição consiste na expressa exclusão de uma determinada interpretação da norma, uma ação “corretiva” que importa em declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto. Em qualquer de suas aplicações, o princípio tem por limite as possibilidades semânticas do texto, para que o intérprete não se converta indevidamente em um legislador positivo.

Sobre esse último aspecto, remarque-se:

Não por acaso, os clássicos do controle de constitucionalidade sempre apontaram, entre as regras de bom aviso ou preceitos sábios, que devem presidir, no particular, as relações entre os juízes e a legislatura, o princípio da presunção de constitucionalidade das leis, a significar que toda lei, à partida, é compatível com a constituição e assim deve ser considerada, até judiciosa conclusão em contrário; ou, mais precisamente, que a inconstitucionalidade não pode ser presumida, antes deve ser provada, de modo cabal, irrecusável e incontroverso.

Realize um mapeamento de pelo menos 3 decisões emblemáticas do STF e identifique nelas a aplicação dos princípios/métodos de hermenêutica constitucional estudados.

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Direitos Fundamentais Unidade II

Capítulo 3 – Justiça Constitucional e Direitos Fundamentais: da Passividade à Judicialização Efetiva

Ativismo judicial, democracia e direitos fundamentais

O Poder Judiciário Nacional e a cidadania brasileira vivem uma fase de intensas transformações e conquistas na passagem dos 200 anos desde a instalação da Casa da Suplicação do Brasil, aos 10 de maio de 1808. Essa data assinala, também, a consagração da independência judicial no País, tendo o citado órgão operado até a primeira Constituição Brasileira (1824), que o transformou em Supremo Tribunal de Justiça do Império do Brasil, e que, posteriormente, com a Constituição Republicana de 1891, se transmutou em Supremo Tribunal Federal (STF).

Ultimamente, temas instigantes povoam as sessões do STF. O papel político e a consequente necessidade de legitimação democrática discursiva do Judiciário ficaram patentes no julgamento de questões complexas, tais como a fidelidade partidária e a autorização de experiências científicas com células-tronco embrionárias. Tivemos, também, a imposição do uso das algemas, o caso da greve dos servidores públicos e o fim do nepotismo nas três funções do Estado. Em seguida, teremos, ainda, julgamentos marcantes, tais como a possibilidade de descriminalização de aborto de fetos anencefálicos, a demarcação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, a constitucionalidade do casamento homossexual e, por fim, a questão das ações afirmativas e das cotas nas universidades públicas.

Esses são exemplos de como o Judiciário vem se tornando o último reduto político-moral da sociedade, nos temas que naturalmente suscitam os chamados desacordos morais razoáveis (reasonable disagreements). Vivenciamos, assim, o que Ingeborg Maus chamou de “superego da sociedade órfã” e o que Viana Lopes identifica como a “Invasão do Direito”, no contexto da expansão do papel dos atores judiciais e da própria normatividade no quotidiano das práticas sociais. No “Estado Judicante” é mais fácil conclamar o debate público na corte do que no parlamento. É o fenômeno da acessibilidade dos espaços judiciais, em substituição à representação política tradicional, em que os eleitores demandam de seus governantes as providências necessárias para o bom funcionamento da sociedade. Diante das frustrações da ausência de representação política, o julgador torna-se, ele próprio, porta-voz de uma ideologia refratária dos desmandos do poder, descendo ao “inferno de uma democracia desnorteada” (Paul Ricouer) e impondo severos comprometimentos ao espaço público e a sua própria instituição. A nova “cidadania judicial” tem que enfrentar velhos fantasmas.

Barroso nos acena sobre a expansão do poder dos magistrados a partir da assunção do papel normativo da Constituição e como isso acarretou uma mudança comportamental da função judiciária, que da emudecida passividade e da falta de efetividade passou à judicialização excessiva. Como exemplos de tal mudança da paisagem atitudinal, sopesam-se decisões que vão do racismo e sexismo explícitos – como aquela proferida por um juiz mineiro que considerou inconstitucional a Lei Maria da Penha e diabólicas as mulheres –, passando pela marca patrimonialista do nosso Judiciário – encarnado na magistrada paraibana que atestou ser o julgador “incomparavelmente superior a qualquer outro ser material” –, até as recentes construções jurisprudenciais que, (re)habilitando instrumentos constitucionais legítimos e democráticos, como o mandado de injunção para efetivar o direito de greve no serviço público, resignificam a gramática dos direitos fundamentais.

Unidade II

Direitos Fundamentais

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Direitos Fundamentais Unidade II

Será possível, enfim, modular a reflexividade político-moral do ativismo judicial? Se há limites éticos ao ativismo político dos juízes, tais só poderão ser ponderados a partir do recorte histórico e do estudo de casos, implicados em uma linguagem que reconheça a integridade e a idiossincrasia do debate brasileiro.

O Pragmatismo Judiciário e suas Armadilhas

O tensionamento entre os Poderes, suscitado pela atuação proeminente do Judiciário, revela em seu âmago o problema da legitimidade das decisões que põem em discussão direitos de cunho social/prestacional (GUERRA, 2006), tal como é o caso de sentenças emanadas pelos juízes brasileiros que determinam a inclusão/criação de vagas no sistema público de educação, a extensão de benefícios a categorias de trabalhadores não contempladas em dado ato normativo, e, ainda, à guisa de exemplo, o fornecimento de medicamentos, com base no preceito do art. 196 da Constituição, consoante pondera Streck (2004, p.329), convicto num pleno acordo entre constitucionalismo e democracia e conforme, ainda, com a perspectiva defendida por Peter Schneider (1991, p.35-52), para quem a “Constituição é direito político: do, sobre e para o político”.

Com efeito, no transcurso da segunda década de atividade constitucionalmente renovada, o Supremo Tribunal Federal (STF) consolida-se como engrenagem vital do projeto republicano, na busca pela legitimação da jurisdição qualificada que lhe é inerente.

A experiência pós-1988 revela uma aspiração às condições de possibilidade da democracia deflagrada, mas ao mesmo tempo, grande ceticismo ou, até mesmo, certo tom de “lamentação” em torno das propostas de realização do projeto constitucional pró-cidadania que, por sua própria dimensão prospectiva complexa, é repetidamente conspurcada.

Em verdade, a debilidade de concretização dos direitos sociais, por fatores múltiplos, não foi capaz de arrefecer a luta, cada vez mais sensível, pelo reconhecimento jurídico de interesses setoriais da sociedade contemporânea. Exsurge, assim, uma concepção midiática/massificadora do Direito, reduzindo-o a objeto de apropriação das expectativas dos diversos segmentos sociais que dele se valem para fins diversos: da resolução de conflitos que constitui seu escopo essencial à contemporização das oportunidades estamentais desencadeadas com a reconfiguração administrativa do Estado, em que o bacharelismo jurídico ocupa centralidade.

O processo sugerido resulta em uma espécie de “juridificação” ou “judicialização” societal fragmentária e paradoxal. Dois são os motivos para essa constatação: de um lado, verifica-se a ampliação da função judicial no Estado de Direito, em que avulta o papel da jurisdição constitucional e todo o debate de sua legitimação no controle e na revisão dos atos dos demais poderes. Bem assim, recrudesce a possibilidade de uma mediação pró-ativa entre a Constituição – compreendida como uma ordem estrutural de valores – e a realidade social, uma vez reconhecida a normatividade/operatividade dos princípios constitucionais e toda sua carga hermenêutico-argumentativa (CITTADINO, 2002, p.17-42).

Por outro lado, é importante notar imensas lacunas metodológicas e dogmático-aplicativas do direito contemporâneo, resultando no paradoxo aqui indiciado: muita produção jurídica e apelos crescentes para incrementos reflexivamente inexauríveis de juridicidade e, simultaneamente, maiores incertezas e uma complexidade progressiva de responsividade a esses dilemas.

Aqui, caberia ao primeiro sentido o alerta de entronização do Judiciário feita por Maus (2002, p.186,187), em que a sociedade transfere todo o ônus moral-convivencial dos mais significativos dilemas ao tribunal constitucional, que passa a ser o “superego” dessa sociedade, que, por sua vez, resta infantilizada, pois se “a justiça ascende ela própria à condição de mais alta instância moral da sociedade, passa a escapar de qualquer mecanismo de controle social”.

De outra sorte, a leitura de que o exercício da jurisdição em matéria constitucional 1 pode ser desempenhado de maneira legítima e ampliativa do espaço público a ela circular, fornece substrato denso para clarificar a senda de respostas não efetivas que o modelo democrático brasileiro está a trilhar.1 A expressão “jurisdição em matéria constitucional” é preferível, pois, no Brasil, toda jurisdição é jurisdição constitucional. Cf. Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira. Devido pro-

cesso legislativo. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000, passim; Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira. Direito processual constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000.

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Com efeito, é preciso notar que a tutela da Constituição por parte do STF mobiliza sentimentos imbrincados na consciência e identidade dos sujeitos constitucionais, contemplando notável inserção na esfera pública. O que se vê, no entanto, é uma total descrença no papel lógico-legitimante dos membros do Judiciário, por parte dos atores sociais. A recorrente estigmatização de um Judiciário “político” é demasiado estranha e tautológica: não será toda e qualquer manifestação do Estado demonstração de sua força e de seu monopólio regular do espaço convivencial sob uma dimensão político-orgânica?

As implicações de uma decisão judicial na vida coletiva combinadas com as recorrentes ferramentas de inserção comunicacional (além do aparato midiático convencional, há o canal de televisão do Judiciário, a “Rádio Justiça” e transmissão das sessões e notícias em “tempo real” na Internet, entre outras formas) expande, cada vez mais, o grau de participação dos atores sociais na formação da consciência sobre o Judiciário.

Isso posto, aponta-se para uma crescente confusão – cognitivamente vulgar, acerca da forma como decidem os membros da Corte Constitucional pátria, sendo divulgado pela mídia e pela opinião pública em geral que os magistrados do Supremo ora decidem de acordo com suas convicções pessoais, ora o fazem por motivações político-partidárias ou, até mesmo, comprometimentos idiossincráticos decorrente das pressões exercidas por grupos setoriais ou pela própria conjuntura econômica.

A leitura que se faz da atuação da Corte presume-se equivocada por total desconhecimento de causa ou tem conotações ideológicas mais profundas, pois eventualmente representaria um estratagema de diversos entes, sejam eles públicos ou privados, com interesses de diferentes graduações na desmobilização do Poder que julga todos.

O reducionismo das análises difusamente produzidas chega a proclamar um neorealismo jurídico: os magistrados do STF julgam de acordo com os resultados que serão ventilados pela decisão que lhes cabe tomar; se há lógica no processo decisional, ela está radicada no alcance dos resultados práticos. Com isso, reduzem-se os Ministros do STF a reféns do consequencialismo de seus atos. Parece haver, aí, dissonantes acordes de um pragmatismo jurídico crônico1.

É a própria tensão permanente visualizada em como a função judicial se transformou em uma necessidade de amparo da democracia e, ao mesmo tempo, como a presença de órgãos judiciais fortes pode ser uma ameaça ao pluralismo e ao modelo das maiorias.

Aqui assume inegável relevância o debate deflagrado por Habermas (1997) e seguido por uma maciça corrente teórica que revista os fundamentos do judicial review, a partir de uma sondagem sobre a estrutura reflexiva do Direito e sua inserção no contexto do Estado democrático de Direito, em que os limites do controle judicial de constitucionalidade das normas pressupõe uma resignificação do papel do Judiciário na defesa de uma democracia contra-majoritária.

Na perspectiva em que ativismo das cortes é exigência do constitucionalismo contemporâneo, os instrumentos de controle político se tornam frágeis a ponto de serem substituídos pela vontade de fazer democracia dos julgadores. Diante desse paradoxo, Tushnet (2005, p.59-63) provocou intensamente a literatura jurídica norte-americana sobre o tema, ao publicar um artigo em que sugere a promulgação de uma emenda à Constituição dos Estados Unidos para extinguir o controle de constitucionalidade concentrado, por ele denominado “End Judicial Review Amendment” (EJRA). 2

Tushnet acusa a U.S. Supreme Court de violar a democracia quando busca exercer, sem limites, aquilo que se convencionou chamar “a melhor interpretação da Constituição”, entre aquelas objeto de “desacordos razoáveis”.

Sem uma perspectiva avançada de deliberação pública, em meio às disputas interpretativas a respeito da aplicabilidade dos direitos fundamentais, o STF passou a empregar marcos teóricos sofisticados, mas pouco reflexivos, para permitir-lhe o emprego desmedido do princípio da proporcionalidade, de modo que os casos difíceis passam a ser solucionados

1 A discussão parte de Richard Posner. Law, Pragmatism and Democracy. Cambridge-London: Harvard University, 2003. No Brasil, os trabalhos mais significativos são os seguintes: José Eisenberg. Pragmatismo, direito reflexivo e judicialização da política. In: Luiz Werneck Vianna (org). A Democracia e os três poderes no Brasil. Belo Horizonte-Rio de Janeiro: UFMG-IUPERJ, FAPERJ, 2002, p. 43-62; e José Eisenberg; e Thamy Pogrebinschi. Pragmatismo, direito e política. Novos Estudos Cebrap. São Paulo, n. 62, p. 107-121, 2002; Luiz Prado. Filosofia do Direito e pragmatismo. Revista de Direito e Política, v.1, n.1, p.11-13, jan.-abr. 2004.

2 Caso aprovada a EJRA determinaria o seguinte: “Salvo autorização do Congresso, nenhuma Corte dos Estados Unidos ou de qualquer um dos Estados terá o poder de revisar a constitucionalidade das leis editadas pelo Congresso ou por qualquer das legislaturas estaduais”.

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na base de um juízo de ponderação, em que Tribunal é quem vai estabelecer quais os valores preponderantes para cada situação concreta. A textura aberta é que balanceamento de princípios pode corresponder às concepções autoritárias de Estado. (CHAVES, JUNIOR, s.d.)

O Judiciário como Medium Democrático: Os Limites Decisionais Contra-Majoritários

Em virtude da necessária costura epistemológica do tema, oferecemos uma aproximação da questão pelo prisma da teoria democrática, na perspectiva defendida por Souza Neto (2002, p.51), de uma compreensão e legitimação da jurisdição constitucional a partir da tomada de visão de uma democracia que se caracteriza não apenas por regras tais quais a do voto majoritário, mas do respeito das minorias contra as decisões arbitrárias da maioria.

No rastro desse pensamento, consente que a revisão judicial dos atos dos outros poderes, que foram eleitos pelos governados, se dará por um outro órgão, não eleito pela maioria: “Mas isso – ressalta, torna-se coerente se atentarmos que se trata justamente de um mecanismo adequado à proteção das minorias, cujos direitos fundamentais são considerados como condições de associação”. Embora o voto majoritário garanta uma situação de autonomia para a maioria das pessoas, e, portanto, “do ponto de vista utilitarista, possibilite o maior grau de felicidade para o maior número, não tem necessariamente compromisso com o respeito aos direitos individuais, embora possa eventualmente servir para protegê-los”. (idem, p.52)

Castro (1997, p.149), ao analisar o impacto político do comportamento do Supremo Tribunal Federal, ressalta que, do ponto de vista do processo político, o fenômeno promove uma interação entre os Poderes que não é, necessariamente, prejudicial à democracia, eis que ela sucede quando “os tribunais são chamados a se pronunciar onde o funcionamento do Legislativo e do Executivo se mostram falhos, insuficientes ou insatisfatórios. Sob tais condições, ocorre uma certa aproximação entre Direito e Política e, em vários casos, torna-se difícil distinguir entre um ´direito´ e um ´interesse político´”.

No Brasil, ressalta Carvalho, essa interação se dá a partir dos tribunais judiciais (especialmente o STF), do governo e dos partidos políticos, das associações profissionais relevantes e da opinião pública.

Embora o Judiciário venha causando algum impacto sobre o Legislativo e o governo, frequentemente por meio da concessão de liminares, “uma parcela diminuta dessas ações resultaram em decisões substantivas do mérito”, o que indica que o processo de judicialização da política ainda se encontra num estágio embrionário no país e, além disso, em sua maioria favorece as políticas governamentais. (CASTRO, 1997, p.151-154)1

O que Habermas (1997, v.1, p.48) denomina juridificação da política ou positivação do direito natural constitui uma espécie de adensamento do direito nas esferas da vida social (fato típico do Estado de Bem-Estar Social). Tem lugar, então, a judicialização da política como resultado da interpretação das cortes judiciais sobre as políticas legislativas ou executivas do Estado, interpretações essas que só têm lugar porque o sistema democrático permite tais provocações interpretativas sobre as leis erigidas.

Ely (1995, p.5) propõe uma concepção procedimental de democracia, segundo a qual o Judiciário está legitimado para defender a representação dos cidadãos por meio de uma interpretação da Constituição que assegure as condições de desenvolvimento do jogo democrático. Assim, a questão central consiste no fato de que “um corpo que não é eleito ou de outra forma, politicamente responsável ou em qualquer outra forma estará dizendo aos representantes eleitos pela população que eles não podem governar como gostariam”. Com relação às políticas públicas, Ely não considera legitimado o Judiciário para deliberar com autonomia face às maiorias.

Para Ackerman (1990), os juízes podem adotar posições contra-majoritárias sempre que os membros dos demais poderes atentarem contra os princípios basilares da Constituição, uma vez que a maior parte dos cidadãos da geração atual não está vinculada à discussão pública sobre política e moralidade.

1 Marcus Faro de Castro. Op. cit., p. 151-154. Através da análise de 1.240 acórdãos, o autor conclui que “com exceção da política tributária, o STF preponderantemente não tem desenvolvido jurisprudência em proteção a direitos individuais e em contraposição às políticas governamentais”.

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Sua concepção dualista conduz a um debate, segundo Appio, entre os “princípios constitucionais que decorrem da vontade de uma geração passada, formada por cidadãos efetivamente interessados nas questões políticas, e a geração presente, que se faz representar no Congresso Norte-Americano, mas que raramente se envolve com o debate sobre os destinos da comunidade”.

A percepção juridificante das decisões políticas, em especial as pertinentes a direitos sociais, transcende os mais elementares contornos de uma democracia calcada apenas na regra majoritária, instaurando um novo ciclo dialógico no qual o Judiciário representa, em si, um retorno às bases ideológicas de legitimação da Constituição.

O vertente preparo teórico tem a pretensão de apenas discorrer sobre essas implicações prefaciais do enfoque. Em outra oportunidade, tentaremos estabelecer uma análise mais circunstanciada acerca de grandes dilemas enfrentados pela democracia brasileira em que a centralidade das controvérsias é assumida pelo Poder Judiciário, sendo esse frequentemente acusado de se imiscuir em matérias eminentemente “políticas”.

Precisa-se ter em mente, entretanto, que os limites da tarefa jurisdicional não se confundem, a rigor, com a interpretação “técnica” dos atos legais e demais fontes normativas que se apresentam dogmaticamente organizadas, em sentido positivo-normativista estrito, mas refere-se a fatos da vida, questões concretas e, não raro, trágicas.

A acessibilidade dos espaços judiciais, em substituição à representação política tradicional, em que os eleitores demandam de seus governantes as providências necessárias para o bom funcionamento da sociedade, é a cidadania e a participação política por meio do direito; a cidadania pela via judiciária.

Se há limites éticos ao ativismo político dos juízes, tais só poderão ser ponderados a partir do recorte histórico e do estudo de casos, implicados em uma linguagem que reconheça a integridade e a idiossincrasia do debate brasileiro.

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Capítulo 4 – Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais nas Relações entre Particulares: Função de Proteção Perante Terceiros e Estado Democrático

Tradicionalmente, os direitos fundamentais foram concebidos no limite do Estado. Hodiernamente, no entanto, torna-se frequente a percepção de que a opressão à dignidade do homem parte, também, de atores privados, não apenas do Estado. Mesmo aqueles direitos que, pelo seu perfil, estariam mais associados à relação indivíduo x Estado, também penetram e se irradiam no âmbito das relações privadas.

Como exemplo, no Brasil, a Constituição consagra o devido processo legal, contraditório e ampla defesa. Será que um clube “fechado” pode expulsar alguém sem franquear-lhe o direito de defesa? Pelo próprio valor que o princípio do devido processo legal ostenta, esse deveria ser estendido para as entidades privadas. Será que é válido o que os porteiros de boates e clubes fazem, deixando os “ricos” entrarem e os suburbanos não? Será que a isonomia também não penetra no âmbito das relações privadas?

O Supremo Tribunal Federal tem um caso emblemático: a Air France pagava um determinado salário para os brasileiros e outro para os franceses. O STF determinou mandou que a empresa francesa pagasse igual para os brasileiros. Foi aplicado o princípio da isonomia no âmbito das relações privadas. 1

Será que os direitos fundamentais apresentam-se com o mesmo impacto nas relações privadas do que nas relações estatais, nas relações do cidadão com o Estado?

De um lado há a relação cidadão-Estado, ou seja, entre um titular de direitos fundamentais e um ente que não é titular de direitos fundamentais; e, de outro, nas relações privadas, existem dois titulares de direitos fundamentais, lembrando que a autonomia privada também é um direito fundamental, decorrente da dignidade da pessoa humana e do princípio da autodeterminação. Necessário, em cada situação concreta, ponderar como um direito fundamental, que supostamente estaria sendo violado, pode ser compatibilizado sem o perecimento de outros valores constitucionalmente assegurados.

Ou seja, dizer que os direitos fundamentais penetram no âmbito das relações privadas não significa dizer que não é possível dar um tratamento homogêneo a todos os direitos fundamentais, afirmando que Estado e entidades privadas estão equiparados. Os alemães discutem, assim, a teoria de “Eficácia horizontal dos direitos fundamentais” (Drittwirkung der Grandrecht).2

Na Alemanha há duas teorias sobre a eficácia irradiante dos direitos fundamentais nas relações entre particulares:

1) eficácia direta: os direitos fundamentais valem imediatamente no âmbito das relações privadas;

2) eficácia indireta: os direitos fundamentais penetram nas relações privadas quando o legislador os leva em consideração e regulamenta essas relações, partindo dos direitos fundamentais, como, à guisa de exemplo, a proteção do consumidor (não precisa elevar a direito fundamental da Constituição, pois o Código de Defesa do Consumidor positivou a proteção almejada), ou no preenchimento dos conceitos jurídicos indeterminados de que se vale a legislação privada.

1 Acolhendo a alegação de ofensa ao princípio da isonomia, a Segunda Turma do STF conheceu e deu provimento a recurso extraordinário interposto por empregado brasileiro da companhia aérea Air France, ao qual foram negadas vantagens trabalhistas previstas no regulamento da empresa, sob o argumento de que somente os empregados franceses teriam direito a tais vantagens. Com o provimento do RE, determinou-se a aplicação do estatuto da empresa ao recorrente. RE 161.243-DF, rel. Min. Carlos Velloso, 29.10.96.

2 Na verdade, a expressão refere-se à eficácia irradiante. Para “eficácia horizontal”, há o termo próprio, qual seja Horizontalwirkung. Cf. MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva-IDP, 2007, p. 265 et seq.

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A interpretação da boa-fé tem que se concretizar à luz dos sistemas de valores afeitos à Constituição. Nesse sentido, é preciso interpretar certos conceitos de que se vale a legislação a partir dessas premissas axiológicas ligadas a tutela dos direitos fundamentais.

Um caso que aconteceu na Alemanha é considerado pioneiro nesse debate. Trata-se do caso Lüth, conforme noticia Barroso (2005):

Erich Lüth, presidente do Clube de Imprensa de Hamburgo, incitava ao boicote de um filme dirigido por Veit Harlan, cineasta que havia sido ligado ao regime nazista no passado. A produtora e a distribuidora do filme obtiveram, na jurisdição ordinária, decisão determinando a cessação de tal conduta, por considerá-la em violação do § 826 do Código Civil (BGB) (“Quem, de forma atentatória aos bons costumes, infligir dano a outrem, está obrigado a reparar os danos causados”). O Tribunal Constitucional Federal reformou a decisão, em nome do direito fundamental à liberdade de expressão, que deveria pautar a intepretação do Código Civil.

A Corte Constitucional Alemã reconheceu que, mesmo em questão de responsabilidade civil, os direitos fundamentais se penetram e se irradiam. Por causa da liberdade de expressão, Eric Lüth não teve de indenizar nada. Deve-se fazer uma análise casuística dos direitos humanos nas relações privadas.

Outro exemplo interessante é o relativo à Lei de Separação e Divórcio brasileira (Lei nº 6.515, de 1977), no que toca à existência de prazos para as pessoas se separarem: não há nada mais fundamental ligado à privacidade, a dignidade humana de se escolher com quem o indivíduo deve permanecer (ou não). Será que alguma lei pode dizer que você tem que ficar casado porque você não alcançou o prazo que o legislador estipulou? Isso é esquecer que o direito fundamental penetra nas relações privadas1.

A doutrina, no entanto, não debate esse problema. Tampouco há construções jurisprudenciais nesse sentido, prevalecendo tais prazos para a regulamentação do vínculo afetivo.

É preciso, portanto, racionalizar até que ponto o Estado deve ou não intervir em situações jurídicas supostamente “fechadas”. Como fica a questão do controle judicial de questões ditas “interna corporis”?2

Alguns “standards” devem ser levados em consideração para a solução dos casos difíceis (hard cases):

1º) menor ou maior nível de desigualdade entre as partes, pois quanto mais desiguais forem as partes, maior a incidência dos direitos humanos; quanto menor for a desigualdade, mais você confiará na autodeterminação;

2º) o grau de fundamentalidade e complexidade do direito controvertido. É diferente, por exemplo, “Ilê-Ayê”, grupo folclórico que não aceitou brancos em sua manifestação carnavalesca, dizer que não aceita negros.

1 A esse respeito, vejam os seguintes dispositivos: “Art. 4º. Dar-se-á a separação judicial por mútuo consentimento dos cônjuges, se forem casados há mais de 2 (dois) anos, manifestado perante o juiz e devidamente homologado.

(...)

Art. 25. A conversão em divórcio da separação judicial dos cônjuges existente há mais de 1 (um) ano, contada da data da decisão ou da que concedeu a medida cautelar cor-respondente (art. 8º), será decretada por sentença, da qual não constará referência à causa que a determinou.

(...)

Art. 40. No caso de separação de fato, e desde que completados 2 (dois) anos consecutivos, poderá ser promovida ação de divórcio, na qual deverá ser comprovado decurso do tempo da separação”.

2 São vários os exemplos citados por Barroso: “a) pode um clube de futebol impedir o ingresso em seu estádio de jornalistas de um determinado veículo de comunicação que tenha feito críticas ao time (liberdade de trabalho e de imprensa)?; b) pode uma escola judaica impedir o ingresso de crianças não judias (discriminação em razão da religião)?; c) pode o empregador prever no contrato de trabalho da empregada a demissão por justa causa em caso de gravidez (proteção da mulher e da procriação)?; d) pode o locador recusar-se a firmar o contrato de locação porque o pretendente locatário é muçulmano (de novo, liberdade de religião)?; e) pode um jornalista ser demitido por ter emitido opinião contrária à do dono do jornal (liberdade de opinião)?” (BARROSO, op. cit.).

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No caso do Ilê-Ayê, a diferença existe porque se está lidando com um bem jurídico cujo grau de fundamentalidade, à luz da ordem de valores escrita na Constituição, é diverso. Mister se fará sempre ter que ponderar, de um lado, o direito fundamental supostamente violado e, do outro, a autonomia da vontade que, sendo também um interesse constitucionalmente protegido, não pode ser esquecido na resolução do caso concreto. O princípio-método da proporcionalidade deverá ser empregado como fórmula de ponderação.

Nos Estados Unidos, perfila-se a Teoria do “State Action Doctrine”, que afirma, em princípio, só valerem os direitos fundamentais para o Estado. Essa posição foi atenuada a partir da adoção da “Public Function Doctrine”, cuja premissa básica apóia-se na hipótese de entidade não estatal agir no exercício de uma atividade de natureza estatal, situação em que deve respeitar os direitos fundamentais1.

Cita-se, costumeiramente, o caso do Marsh x Alabama, julgado pela Suprema Corte em 19462. Marsh, testemunha de Jeová, foi presa em Chickasaw, subúrbio da cidade de Mobile, Alabama – cidade privada (company-owned town) gerenciada pela Gulf Shipbuilding Co. –, por insistir na distribuição de literatura religiosa, mesmo tendo sido expressamente proibida pelos administradores da companhia.

Havia sido afixado em vários locais da “mini-cidade” privada um aviso com os dizeres: “This Is Private Property, and Without Written Permission, No Street, or House Vendor, Agent or Solicitation of Any Kind Will Be Permitted”.

Mesmo assim, Marsh recusou-se a calar, e acabou encarcerada pelo Xerife local. Levada a julgamento, em sua defesa invocou a proteção das Emendas Primeira e Décima-Quarta – em vão. O Tribunal estadual a condenou, ao fundamento de que cometera crime por permanecer em terras de outro depois de advertida expressamente para se retirar (trespass).

A Corte Recursal do Alabama reafirmou a condenação. O encarceramento amparava-se no instituto do trespass (invasão desautorizada de propriedade alheia). A empresa era dona de uma área enorme, e nela fizeram essa “mini-cidade”.

A Suprema Corte decidiu, no entanto, que nesse tipo de atividade, ao manter o equivalente a uma cidade, está se equiparando ao Estado e tem que respeitar os direitos fundamentais. O juiz Black, prolator do voto vencedor, entendeu violadas no caso as liberdades de expressão e pensamento, afirmando expressamente que tais garantias constitucionais deveriam prevalecer quando confrontadas ao direito de propriedade.

Em suas palavras:

When we balance the Constitutional rights of owners of property against those of the people to enjoy freedom of press and religion, as we must here, we remain mindful of the fact that the latter occupy a preferred position. As we have stated before, the right to exercise the liberties safeguarded by the First Amendment ‘lies at the foundation of free government by free men’ and we must in all cases ‘weigh the circumstances and appraise ... the reasons ... in support of the regulation of (those) rights.’ In our view the circumstance that the property rights to the premises where the deprivation of liberty, here involved, took place, were held by others than the public, is not sufficient to justify the State’s permitting a corporation to govern a community of citizens so as to restrict their fundamental liberties and the enforcement of such restraint by the application of a State statute. Insofar as the State has attempted to impose criminal punishment on appellant for undertaking to distribute religious literature in a company town, its action cannot stand 3.

1 Como lembra Luiz Fernando Martins: “não obstante a clara ‘eficácia horizontal’ da proibição da escravatura contida na Civil Right Act de 1875, se alicerçou a state action doctrine, segundo a qual os direitos fundamentais são primariamente direitos de defesa contra o Estado, não vinculando entidades privadas. Todavia, através da public function doctrine a jurisprudência americana (especialmente, da Supreme Court) procura atenuar alguns dos aspectos mais radicais da state action doctrine”. Cf. SILVA, Luiz Fernando Martins da. A incidência e eficácia dos direitos fundamentais nas relações com particulares . Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3460>. Acesso em: 10 jun. 2008.

2 Findlaw: Supreme Court. Disponível em: <http://caselaw.lp.findlaw.com/scripts/getcase.pl?navby=CASE& court=US&vol=326&page=501>. Acesso em: 11 jun. 2008).

3 Idem.

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Assim, sintetizando o problema do impacto dos direitos fundamentais no âmbito das relações privadas, é preciso deixar claro os seguintes aspectos:

• Aquela visão de que os direitos fundamentais são normas que valem para o cidadão, face ao Estado, não prepondera hoje. É admissível a sujeição de particulares face à proteção jusfundamental de direitos de outros particulares.

• Por outro lado, os direitos fundamentais não valem nas relações privadas, do mesmo modo que eles valem nas relações com o Estado, pois existem particularidades nessa aplicação. Por exemplo: o Estado não poderia dar um benefício para um cidadão, por uma razão caprichosa e não dar para outro. O pai pode dar um presente para um filho e não dar para outro.

Não é demasiado lembrar que a compreensão de um âmbito de proteção dos direitos fundamentais nas relações entre particulares resulta na identificação de uma função relevante da proteção jusfundamental. Trata-se da função de proteção perante terceiros.

São portadores dessa função os direitos que impõem ao Estado o dever de proteger os titulares de direitos fundamentais da ação de terceiros, como bem lembra Prado e Silva (2006), firme na lição de Gomes Canotilho.

O Estado teria, então, o dever de adotar medidas positivas a fim de proteger o exercício dos direitos fundamentais de ações lesivas praticadas por terceiros; a relação jurídica aqui não se dá diretamente entre o titular do direito fundamental e o Estado, mas entre o indivíduo e outros indivíduos, atuando o Estado apenas indiretamente.

O dever de proteção possibilita, enfim, uma determinada eficácia horizontal, a incidir, também, nas relações entre particulares.

• Daniel Sarmento. Direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.

• Wilson Steinmetz. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004.

• Ingo Wolfgang Sarlet (org.). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

• Rodrigo Kaufmann. Dimensões e perspectivas da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, 2003 (dissertação de mestrado apresentada à Universidade de Brasília)

• Luís Virgílio Afonso da Silva. A constitucionalização do direito: Os direitos fundamentais nas relações entre particulares, 2004, mimeografado (tese de livre-docência apresentada na Universidade de São Paulo – USP).

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