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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS 90ª Promotoria de Justiça de Goiânia EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA ____ VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE GOIÂNIA-GO. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS , por intermédio da Promotora de Justiça que a esta subscreve, titular da 90ª Promotoria de Justiça do Estado de Goiás, no uso de suas atribuições constitucionais, e com fulcro nos artigos 129, inciso III, artigo 37, § 4º, ambos da Constituição Federal, artigo 5º, inciso I, da Lei 7.347/85, na Lei Federal 8.429/92 e 8.625/93, no artigo 46, inciso VI, alínea “a”, da Lei Complementar Estadual n. 25/98, vem perante Vossa Excelência propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA observado o rito ordinário e disposições especiais previstas na Lei 8.429/92, contra JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, brasileiro, casado, médico, natural de Goiânia/GO, RG nº 1351702 SSP/GO, CPF nº 414.772.511-20, nascido MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de Justiça Rua 23, esq. com Av. B, qd. 06, lts. 15/24, Sala 342, Jardim Goiás, Goiânia–GO. CEP 74805-100 1

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de Goiânia

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA ____

VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE GOIÂNIA-GO.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por

intermédio da Promotora de Justiça que a esta subscreve, titular da 90ª Promotoria de Justiça

do Estado de Goiás, no uso de suas atribuições constitucionais, e com fulcro nos artigos 129,

inciso III, artigo 37, § 4º, ambos da Constituição Federal, artigo 5º, inciso I, da Lei 7.347/85,

na Lei Federal 8.429/92 e 8.625/93, no artigo 46, inciso VI, alínea “a”, da Lei Complementar

Estadual n. 25/98, vem perante Vossa Excelência propor

AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

observado o rito ordinário e disposições especiais previstas na Lei 8.429/92, contra

JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, brasileiro, casado,

médico, natural de Goiânia/GO, RG nº 1351702 SSP/GO, CPF nº 414.772.511-20, nascido

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de JustiçaRua 23, esq. com Av. B, qd. 06, lts. 15/24, Sala 342, Jardim Goiás, Goiânia–GO. CEP 74805-100

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de Goiânia

aos 08/06/1967, filho de Ubirajara Marques Guimarães e de Ivone Vieira Guimarães,

residente na Alameda dos Jacarandás, Qd. 14, Lt. 31/32, Jardins Florença, nesta cidade;

RAFAEL HADDAD, brasileiro, solteiro, médico, natural de

Pires do Rio/GO, RG nº 2244152 SSP/GO, CPF nº 534.085.781-68, nascido aos 04/11/1974,

filho de Hassib Ghafriel Haddad e de Linda Abdalla Haddad, residente na Rua Siriema, Qd.

147, Lt. 21, Setor Santa Genoveva, nesta cidade;

CENTRAL VIDA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

HOSPITALARES LTDA. nome de fantasia UTI CENTRAL VIDA, inscrita no CNPJ com

o nº 08.602.751-0001-90, instalada no Hospital Jacob Facuri, com sede na Rua 08, Qd. 24,

Lt. 48-E, nº 657, Setor Central, nesta cidade, representada por seu sócio administrador Júnio

Marques Guimarães;

INTENSIVIDA LTDA. inscrita no CNPJ com o nº

03.268.777/0001-20, instalada no Hospital de Acidentados, com sede na Avenida Paranaíba,

nº 652, sala da Unidade de Tratamento Intensivo, nesta cidade, representada por seus sócios

administradores Júnio Marques Guimarães, Erlon Marden Mendes e Fernanda Aparecida de

Oliveira Peixoto;

CENTRO VIDA LTDA. inscrita no CNPJ com o nº

05.307.779/0001-06, instalada no Hospital São Lucas, com sede na Rua 04, Qd. 74, LT. 7-E,

nº 1.335, Setor Central, nesta cidade, CEP 74.025-020, representada por seus sócios

administradores Wilson Cleiton da Silveira, Rafael Haddad e Erlon Marden Mendes;

LUCIANO MARQUES BARBOSA, brasileiro, solteiro,

auxiliar administrativo, natural de Goiandira/GO, RG nº 1723442 SSP/GO e RG nº 2341213

SSP/DF, CPF nº 255487433-68, nascido aos 06/01/1969, filho de Jadyr Barbosa da Silva e de

Iracema Marques Barbosa, residente na Rua T-36, nº 3.387, apto. 600, Setor Bueno, nesta

cidade;

MARIA NEUZA MENDES, brasileira, solteira, gerente

administrativa, natural de Rio Paranaíba/MG, RG nº 1377626 SSP/GO, CPF nº 285897261-

34, nascida aos 02/10/1962, filha de José da Rocha Mendes e de Diogina Maria Mendes,

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residente na Avenida T-4, nº 800, Qd. 142, Lt. 08/09, apto. 1.303, Edifício Gênova, Setor

Bueno, Goiânia/GO, CEP 74230-030;

CLEONICE FERNANDES FERREIRA LISBOA, brasileira,

casada, servidora pública estadual, natural de Goiânia/GO, RG nº 1468412-SPTC-ID/GO,

CPF nº 433.659.061-34, nascida aos 23/12/1961, filha de Nestor Ferreira Faria e de Diva

Fernandes Ferreira, residente na Rua 14, unidade 203, Qd. 203, Lote 01, Parque Ateneu, CEP

74.890-320, nesta cidade;

EVA MOTA CORREA SOUZA, brasileira, casada, servidora

pública estadual, natural de Goiânia/GO, RG nº 1853500-SSP/GO, CPF nº 533.502.431-34,

nascida aos 20/11/1968, filha de Constantino da Mota Correa e de Geralda Barbosa Correa,

residente na Rua Deputado Augusto Paranhos, Qd. 26, Lt. 07 (ou lote 17), casa 02, Setor

Criméia Leste, nesta cidade;

JULIANO GERVÁSIO DE SOUSA, brasileiro, solteiro,

servidor público estadual, natural de Goiânia, RG nº 4125684 SSP/GO, RG nº 125853-

COREN/GO, CPF nº 979836911-49, nascido aos 03/06/1983, filho de Vegilato Gervásio e de

Francisca de Sousa Gervásio, residente na Rua 11, Qd. Z, Lote 10, Bairro Água Branca, nesta

cidade;

KEILE CRISTINA BATISTA NUNES, brasileira, solteira,

servidora pública estadual, natural de Goiânia/GO, RG nº 1957932-DGPC/GO, CPF nº

624.300.331-00, nascida aos 20/10/1971, filha de João Batista Leite e de Nadir Nunes da

Cunha Leite, residente na Rua SC-10, Qd. 16, Lt. 24 (ou Lote 23), Parque Santa Cruz, CEP

74.860-380, nesta cidade, CEP 74.860-380;

LUCIMAR NASCIMENTO CRUZ, brasileira, solteira,

servidora pública estadual, natural de Goiânia/GO, RG nº 429298- SSP/GO, CPF nº

122.483.631-68, nascida aos 02/04/1955, filha de Almiro Olímpio da Cruz e de Rosaria

Nascimento Cruz, residente na Rua 1.000 (ou Senador Domingos Velasco) , Qd. 19, Lt. 16, nº

833, Setor Pedro Ludovico, CEP 74.820-110, nesta cidade;

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de JustiçaRua 23, esq. com Av. B, qd. 06, lts. 15/24, Sala 342, Jardim Goiás, Goiânia–GO. CEP 74805-100

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de GoiâniaLUCINEIDE SOUZA DOS PASSOS, brasileira, divorciada,

servidora pública estadual e municipal, natural de Cristópolis/BA, RG nº 1716406-

DGPC/GO, CPF nº 179358815-53, nascida aos 28/06/1960, filha de Otaciano Domingos dos

Passos e de Jardelina Souza dos Passos, residente na Rua VC 62, Qd. 125, Lt. 03, casa B,

Conjunto Vera Cruz (ou Vera Cruz II), CEP 74.495-390, nesta cidade;

MAGDA LOURENÇA CARNEIRO, brasileira, casada,

servidora pública estadual, natural de Goiânia/GO, RG nº 846176-SSP/GO, CPF nº

246.984.581-53, nascida aos 16/09/1955, filha de Joaquim Virgílio Carneiro e de Maria

Onofre Carneiro, residente na Rua Desembargador Emílio Francisco Ferreira Póvoa, nº

1.261, Qd. 02, Lt. 11, Setor Criméia Leste, CEP 74.660-320, nesta cidade;

MARINEIDE DOS SANTOS BORGES, brasileira, casada,

servidora pública estadual, natural de Goiânia/GO, RG nº 1582750 DGPC/GO, CPF nº

348974531-00, nascida aos 27/10/1964, filha de Ercílio Alves de Souza e de Enia Maria dos

Santos Souza, residente na Avenida Botafogo, Qd. 36, Lt. 32, nº 686, Setor Pedro Ludovico,

CEP 74.820-005, nesta cidade;

ROSANA LOPES DA SILVA VIEIRA, brasileira, casada,

servidora pública estadual, natural de Morrinhos/GO, RG nº 3247010-SPTC-ID/GO, CPF

nº774.889.891-04, nascida aos 14/01/1975, filha de Jamiro Lopes da Silva e de Maria da

Glória Silva, residente na Avenida Dom Bosco, Qd. 15, Lt. 06, Conjunto Fabiana, CEP

74.870-110, nesta cidade;

ROSSANA MEDEIROS DE OLIVEIRA, brasileira, solteira,

servidora pública estadual, natural de Goiânia/GO, RG nº 3792332 SSP/GO, CPF nº

548700891-49, nascida aos 09/03/1969, filha de José Medeiros de Oliveira e de Nízia de

Jesus Oliveira, residente na Avenida Rezende, Qd. 2-B, Lt. 07, Residencial Cidade Verde,

CEP 74.455-515, nesta cidade;

pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos.

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I. DA LEGITIMIDAÇÃO ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO:

A legitimação do Ministério Público para promover a defesa do

patrimônio público por meio da Ação Civil Pública advém tanto da Constituição Federal

quanto da legislação infraconstitucional.

Ao tratar das funções institucionais do Ministério Público, assim

estabeleceu a Constituição Federal:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

A Constituição do Estado de Goiás, de seu turno, determina:

Art. 117. São funções institucionais do Ministério Público:

[…]

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

[…].

A Lei n.º 7.347 de 24 de julho de 1985, que disciplina a ação

civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a

bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, em seu artigo 5º,

inciso, I, com redação dada pela Lei n.º 11.448, de 15 de janeiro de 2007, estabelece:

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de Goiânia

Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: (Redação dada pela Lei n.º 11.448, de 2007)

I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei n.º 11.448, de 2007)

[...]

Já a Lei n.º 8.429 de 02 de junho de 1992, que dispõe sobre as

sanções aplicáveis aos agentes públicos pela prática de ato de improbidade administrativa

dispõe:

Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

[...]

§ 4º O Ministério Público, se não intervir no processo como parte, atuará obrigatoriamente, como fiscal da lei, sob pena de nulidade.

A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público – Lei 8.625 de

12 de fevereiro de 1993 – estabelece:

Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

[...]

IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:

a) proteção, prevenção e reparação de danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos;

[…].

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de Goiânia

Por fim, prevê a Lei Complementar nº 25/98 – Lei Orgânica do

Ministério Público do Estado de Goiás:

Art. 46. Além das funções previstas na constituição Federal, na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, na Constituição Estadual e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

[…]

VI – promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei, para:

a) proteção, prevenção e reparação de danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos;

[…].

Os atos normativos ora mencionados, especialmente a

Constituição Federal, evidenciam a atribuição do Ministério Público para o exercício da Ação

Civil Pública e assentam a adequação dessa via para a defesa do patrimônio público e o

combate de atos de improbidade administrativa.

II. DOS FATOS:

Conforme apurado no Inquérito Civil Público de n.º

2009000100042822, no período que se estendeu de meados de 2007 a dezembro de 2008, os

réus participaram de um esquema criminoso, que se encontrava sediado no Hospital de

Urgências de Goiânia – HUGO – hospital público de acentuada importância no cenário de

atendimento emergencial no Estado de Goiás.

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de Goiânia

Segundo se extrai dos autos, o “esquema” contava com a

participação direta de servidores públicos estaduais, lotados em locais estratégicos do

Hospital de Urgências de Goiânia, como o setor de emergências e o setor de serviço social.

Tais servidores, mediante recebimento de “propina”, nominada pelos envolvidos como

“incentivos”, realizavam a triagem de pacientes que, possuidores de planos de saúde, davam

entrada no setor de emergências do referido nosocômio, para encaminhá-los a UTIs

particulares.

Esses encaminhamentos, por vezes desnecessários,

possibilitavam aos proprietários das UTIs envolvidas no esquema alta lucratividade,

porquanto, além de manterem a “casa cheia”1, possibilitavam auferir lucros pela manutenção

de pacientes nos leitos de UTI sem que o quadro do paciente indicasse tal procedimento. É o

que se verifica pelos índices de áudio nº 4653757, 5110086, 4645192, 4639552, 4662281,

4643874, 4664107, decorrentes de interceptação telefônica autorizada judicialmente, cujas

transcrições acompanham a presente peça (documento 2).

Em troca do encaminhamento de pacientes para as UTIs, os

servidores públicos lotados no HUGO recebiam, dos proprietários das UTIs, quantias em

dinheiro que variavam de R$100,00 (cem reais) a R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) por

paciente encaminhado, a depender do número de pacientes encaminhados. Esses valores

chegavam a até 10% do total das despesas, na hipótese de paciente particular.

Do citado esquema participavam também prepostos dos

proprietários das UTIs, que, incumbidos de contatar diretamente os servidores públicos

envolvidos, deles obtinham o encaminhamento para a UTI a qual se encontravam vinculados,

mediante pagamento de quantias que variavam entre R$30,00 (trinta reais) e R$50,00

(cinquenta) reais.

1 Expressão utilizada pelos envolvidos no esquema para se referirem à completa ocupação dos leitos das UTIs.

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de GoiâniaDo citado esquema, participavam os réus e dele se beneficiavam

de forma direta.

O réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, proprietário da

UTI CENTRAL VIDA LTDA., localizada no Hospital Jacob Facuri e da UTI

INTENSIVIDA, localizada no Hospital de Acidentados, tinha como prepostos os réus

LUCIANO MARQUES BARBOSA e MARIA NEUZA MENDES. O réu LUCIANO

MARQUES BARBOSA, desde o mês de julho de 2008, era o responsável pelo controle de

pacientes encaminhados pelos réus servidores públicos para a UTI CENTRAL VIDA

LTDA., localizada no Hospital Jacob Facuri, bem como pelos respectivos pagamentos dos

“incentivos” aos servidores públicos envolvidos no esquema. A ré MARIA NEUZA

MENDES, além de sócia da UTI CENTRAL VIDA LTDA. e empregada da UTI

INTENSIVIDA era a responsável pelo controle dos pacientes encaminhados pelos réus

servidores públicos, tanto para a UTI CENTRAL VIDA LTDA, como para a UTI

INTENSIVIDA, bem como pelo pagamento dos “incentivos” aos servidores públicos.

Ambos agiam em conjunto com o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES.

A ré KEILE CRISTINA BATISTA NUNES, à época dos

fatos, além de servidora pública lotada no setor de emergências do HUGO, era funcionária da

UTI INTENSIVIDA. Nessas condições, valendo-se das facilidades que o cargo lhe

proporcionava, era a principal responsável pela cooptação dos pacientes no HUGO para

encaminhamento às UTIs de propriedade do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES,

mediante recebimento de “incentivos”.

Já o réu JULIANO GERVÁSIO DE SOUSA, além de servidor

público (técnico em enfermagem) lotado no setor de emergências no HUGO, prestava

serviços à UTI CENTRAL VIDA LTDA, localizada no Hospital Jacob Facuri. Também,

valendo-se das facilidades que o cargo lhe proporcionava, era encarregado da cooptação de

pacientes no HUGO para encaminhamento às UTIs de propriedade do réu JÚNIO

MARQUES GUIMARÃES, mediante recebimento de “incentivos”.

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de Goiânia

O réu RAFAEL HADDAD, além de médico plantonista

contratado pelo Estado de Goiás para a prestação de serviços no HUGO, era proprietário da

UTI CENTRO VIDA LTDA. e, aproveitando-se das facilidades que o cargo lhe

proporcionava, cooptava pacientes possuidores ou não de planos de saúde, para

encaminhamento para a UTI CENTRO VIDA LTDA., da qual era sócio. Tinha, ainda, como

preposta a ré EVA MOTA CORREA SOUZA que, além de servidora pública lotada no

HUGO, era funcionária da UTI CENTRO VIDA LTDA. a qual também valendo-se das

facilidades do cargo, era a principal responsável pela cooptação de pacientes no HUGO e

encaminhamento para a UTI CENTRO VIDA LTDA, mediante recebimento de

“incentivos”.

As demais rés, CLEONICE FERNANDES FERREIRA

LISBOA, LUCINEIDE SOUZA DOS PASSOS, LUCIMAR NASCIMENTO CRUZ,

MAGDA LOURENÇA CARNEIRO, MARINEIDE DOS SANTOS BORGES,

ROSANA LOPES DA SILVA VIEIRA e ROSSANA MEDEIROS DE OLIVEIRA,

servidoras públicas lotadas no HUGO, realizavam a triagem e encaminhamento dos pacientes

possuidores ou não de planos de saúde, para as UTIs de propriedade do réu JÚNIO

MARQUES GUIMARÃES e do réu RAFAEL HADDAD, todas mediante recebimento de

“incentivos”.

Os réus JÚNIO MARQUES GUIMARÃES e RAFAEL

HADDAD mantinham estreito relacionamento, embora fossem sócios proprietários de UTIs

aparentemente “concorrentes”. Entretanto, pela análise dos contratos sociais e alterações

contratuais da UTI CENTRAL VIDA LTDA., INTENSIVIDA LTDA, da qual o réu

JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, à época dos fatos, era sócio proprietário e da UTI

CENTRO VIDA LTDA., da qual o réu RAFAEL HADDAD, também à época dos fatos, era

sócio proprietário, constata-se uma coincidência de sócios entre tais UTIs ao longo de sua

existência como pessoas jurídicas, o que está a indicar uma convergência de interesses entre

tais pessoas físicas e jurídicas. Ressalta-se que a UTI CENTRO VIDA LTDA., de

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de Goiânia

propriedade do réu RAFAEL HADDAD foi inicialmente constituída como pessoa jurídica

por JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, sócio proprietário.

Há, inclusive, nos autos, elementos que demonstram uma

“parceria” entre ambos no encaminhamento de pacientes para as UTIs das quais eram sócios

como se verá adiante.

Eis alguns fatos que demonstram a forma de atuação e

participação dos réus no esquema.

Conforme se extrai das interceptações telefônicas autorizadas

judicialmente corroboradas pelos demais elementos de prova coligidos durante a investigação

policial, cujas peças integram o ICP nº 2009000100042822 e ora instruem a presente inicial,

no dia 28/05/2008, o réu RAFAEL HADDAD, médico e proprietário da UTI CENTRO

VIDA LTDA, conversou, por telefone, com a ré EVA MOTA CORREA SOUZA e

recomendou o encaminhamento de pacientes excedentes para a UTI CENTRAL VIDA

LTDA. de propriedade do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES. Nessa oportunidade, a ré

EVA MOTA CORREA SOUZA comentou que a ré KEILE CRISTINA BATISTA

NUNES havia encaminhado à UTI CENTRO VIDA LTDA, de propriedade do réu

RAFAEL HADDAD dois pacientes, momento em que este determinou à ré EVA MOTA

CORREA SOUZA que mandasse a ré KEILE CRISTINA BATISTA NUNES receber o

“incentivo” do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES (índice de áudio nº 4298011).

No dia 25/08/2008, o réu RAFAEL HADDAD, por telefone,

informou à ré KEILE CRISTINA BATISTA NUNES que deixara R$ 100,00 (cem reais)

com o seu “patrão” (referindo-se ao réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES), pelo

encaminhamento de pacientes à UTI CENTRO VIDA LTDA. de propriedade do réu

RAFAEL HADDAD (índice de áudio nº 4298028).

No dia 28/06/2008, por telefone, a ré KEILE CRISTINA

BATISTA NUNES combinou com a ré MARIA NEUZA MENDES, esta agindo como

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS - 90ª Promotoria de JustiçaRua 23, esq. com Av. B, qd. 06, lts. 15/24, Sala 342, Jardim Goiás, Goiânia–GO. CEP 74805-100

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preposta do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, o encaminhamento do paciente Valter

Marçura, que estava acobertado por plano de saúde, a uma das UTIs pertencentes ao réu

JÚNIO MARQUES GUIMARÃES (índice de áudio nº 4563165). Pouco depois, a ré

KEILE CRISTINA BATISTA NUNES, por telefone, confirmou com o réu JÚNIO

MARQUES GUIMARÃES o encaminhamento de tal paciente para uma de suas UTIs

(índice de áudio nº 4563186).

No dia 01/07/2008, a ré CLEONICE FERNANDES

FERREIRA LISBOA combinou com o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES o

encaminhamento do paciente Aníbal, militar, acobertado por plano de saúde, a uma de suas

UTIs (índice de áudio nº 4584763)

No dia 01/07/2008, por telefone, a ré KEILE CRISTINA

BATISTA NUNES conversou com a ré MAGDA LOURENÇA CARNEIRO e MARIA

NEUZA MENDES, sucessivamente, sobre uma eventual pendência de pagamentos relativa a

dois pacientes encaminhados para as UTIs do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES. Na

conversa travada, a ré KEILE CRISTINA BATISTA NUNES afirmou à ré MARIA

NEUZA MENDES que somente o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES dispunha de tais

dados e somente ele poderia sanar as dúvidas levantadas (índice de áudio nº 4582703). No dia

03/07/2008, utilizando-se do telefone da ré CLEONICE FERNANDES FERREIRA

LISBOA, a ré MAGDA LOURENÇA CARNEIRO esclareceu á ré MARIA NEUZA

MENDES que havia localizado o nome dos pacientes e que conversara com o réu JÚNIO

MARQUES GUIMARÃES, oportunidade em que este afirmara que deixaria o valor dos

“incentivos” com MARIA NEUZA MENDES, para que esta efetivasse o pagamento à ré

MAGDA LOURENÇA CARNEIRO (índice de áudio nº 4601033).

No dia 02/07/2008, os réus JÚNIO MARQUES

GUIMARÃES e RAFAEL HADDAD conversaram sobre a falta de pacientes nas UTIs. Na

oportunidade, o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES informou que suas UTIs estavam

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“cheias” e, portanto, encaminharia para a UTI do réu RAFAEL HADDAD os pacientes que

porventura fossem encaminhados para as suas UTIs (índice de áudio nº 4590028).

No dia 03/07/2008, por telefone, a ré EVA MOTA CORREA

SOUZA combinou com médica que trabalhava na UTI CENTRO VIDA LTDA., de

propriedade do réu RAFAEL HADDAD, localizada no Hospital São Lucas, o

encaminhamento da paciente Jussara de Oliveira, que estava acobertada por plano de saúde –

IPASGO – para o mencionada UTI. Na oportunidade a ré EVA MOTA CORREA SOUZA,

embora tenha afirmado que não era caso de UTI, asseverou que iria encaminhar a paciente

para lá para que pudesse ficar mais “vigiadinha” (índice de áudio nº 4597195).

No dia 03/07/2008, por telefone, o réu RAFAEL HADDAD

conversou com uma pessoa somente identificada por Lúcia sobre encaminhamento para a sua

UTI de uma paciente acobertada por plano de saúde – IPASGO. Sucessivamente, o réu

conversou com outra pessoa, não identificada, que também se encontrava no HUGO,

solicitando o encaminhamento de outros dois pacientes (índice de áudio nº 4603801).

No dia 05/07/2008, por telefone, o réu JÚNIO MARQUES

GUIMARÃES conversou com a ré ROSSANA MEDEIROS DE OLIVEIRA sobre ter

“perdido” um encaminhamento para uma de suas UTIs, por equívoco de informação relativa à

existência ou não de vagas (índice de áudio nº 4621049).

No dia 06/07/2008, por telefone, o réu JULIANO GERVÁSIO

DE SOUSA, agindo como preposto do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, conversou

com a ré KEILE CRISTINA BATISTA NUNES sobre a existência de vaga para o

encaminhamento de paciente oriundo do HUGO para a UTI INTENSIVIDA, localizada no

Hospital dos Acidentados (índice de áudio nº 4628570). No mesmo dia, o réu JÚNIO

MARQUES GUIMARÃES, por telefone, informou a ré KEILE CRISTINA BATISTA

NUNES que não havia mais vagas na UTI INTENSIVIDA, localizada no Hospital de

Acidentados, razão pela qual era para ligar para o réu RAFAEL HADDAD, a fim de

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encaminhar o referido paciente para a UTI CENTRO VIDA LTDA., localizada no Hospital

São Lucas. Na oportunidade, o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES esclareceu à ré

KEILE CRISTINA BATISTA NUNES que esse procedimento deveria ser adotado somente

até “abrir” a UTI CENTRAL VIDA LTDA., localizada no Hospital Jacob Facuri. (índice de

áudio nº 4628582).

No dia 11/07/2008, a ré EVA MOTA CORREA SOUZA,

utilizando-se do telefone do réu RAFAEL HADDAD, noticiou à ré KEILE CRISTINA

BATISTA NUNES o encaminhamento da paciente Divina e do paciente Argeu a uma das

UTIs do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES (índice de áudio nº 4664735).

No dia 24/07/2008, por telefone, a ré EVA MOTA CORREA

SOUZA combinou com o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES o encaminhamento do

paciente Luiz Carlos R. Júnior, para a UTI INTENSIVIDA, localizada no Hospital dos

Acidentados (índice de áudio nº 4810996).

No dia 25/07/2008, a ré CLEONICE FERNANDES

FERREIRA LISBOA combinou com a ré KEILE CRISTINA BATISTA NUNES o

encaminhamento do paciente Telmo e do paciente Wilmar Dias Soares Júnior a uma das UTIs

do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES (índices de áudio nº 4820122 e 4823593).

No dia 26/07/2008, por telefone, a ré EVA MOTA CORREA

SOUZA confirmou com o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES o encaminhamento do

paciente Wilian, anteriormente ocorrido, a uma das UTIs deste último (índice de áudio nº

4834231).

No dia 29/07/2008, por telefone, a ré CLEONICE

FERNANDES FERREIRA LISBOA confirmou com o réu JÚNIO MARQUES

GUIMARÃES o encaminhamento do paciente Vanderli Cassiano Teodoro, anteriormente

ocorrido a uma de suas UTIs (índice de áudio nº 4863533).

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No dia 29/07/2008, por telefone, a ré LUCINEIDE SOUZA

DOS PASSOS combinou com a ré KEILE CRISTINA BATISTA NUNES o

encaminhamento de paciente para uma das UTIs do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES

(índice de áudio nº 4867583).

No dia 02/08/2008, por telefone, a ré ROSANA LOPES DA

SILVA VIEIRA combinou com o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES o

encaminhamento do paciente Ênio Francisco da Silva para a UTI INTENSIVIDA, instalada

no Hospital de Acidentados (índice de áudio nº 4913232).

No dia 03/08/2008, por telefone, a ré KEILE CRISTINA

BATISTA NUNES combinou com o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES o

encaminhamento do paciente Bruno Cristiano Ferreira de Souza, acobertado por plano de

saúde, para a UTI INTENSIVIDA, instalada no Hospital de Acidentados (índices de áudio

nº 4923745 e 4923769).

No dia 03/08/2008, por telefone, a ré KEILE CRISTINA

BATISTA NUNES combinou com o réu JULIANO GERVÁSIO DE SOUSA o

encaminhamento da paciente Otacília, que estava acobertada por plano de saúde, para a UTI

CENTRAL VIDA LTDA. , instalada no Hospital Jacob Facuri (índices de áudio nº 4922651

e 4923848).

No dia 05/08/2008, a ré CLEONICE FERNANDES

FERREIRA LISBOA conversou com a ré MARINEIDE DOS SANTOS BORGES sobre

valores a serem recebidos do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES pelo encaminhamento

de pacientes, inclusive de um que apontam como Vanderlei Cassimiro Teodoro. Ainda, as

referidas rés falaram sobre o pagamento relativo a dois pacientes encaminhados pela ré

LUCIMAR NASCIMENTO CRUZ (índice de áudio nº 4948427).

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de GoiâniaNo dia 11/08/2008, por telefone, a ré KEILE CRISTINA

BATISTA NUNES conversou com o réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES sobre

pacientes encaminhados, cujo pagamento dos “incentivos” ainda estava pendente. Na

oportunidade, ficou ajustado que o pagamento dos “incentivos” relativos aos pacientes

destinados à UTI CENTRAL VIDA LTDA. seria efetivado pelo réu LUCIANO

MARQUES BARBOSA (índice de áudio nº 5012034).

O réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES registrava os nomes

dos pacientes encaminhados para as suas UTIs, em uma agenda que foi apreendida por

ocasião das investigações policiais, onde mencionava a data do encaminhamento, o servidor

responsável pela indicação, valor pago e a sigla de pagamento, conforme documento 03.

No documento 03 há afirmação expressa do seguinte teor: “eu

paguei a Cleo pegar com UTI 500,00 5 pacts, 10/01/08”. A ré CLEONICE FERNANDES

FERREIRA LISBOA atendia pelo apelido Cleo.

Registros de pagamentos de “incentivos” às rés CLEONICE

FERNANDES FERREIRA LISBOA, EVA MOTA CORRÊA SOUZA, JULIANO

GERVÁSIO DE SOUSA, KEILE CRISTINA BATISTA NUNES, LUCINEIDE SOUZA

DOS PASSOS, LUCIMAR NASCIMENTO CRUZ, MAGDA LOURENÇA

CARNEIRO, MARINEIDE DOS SANTOS BORGES, ROSANA LOPES DA SILVA

VIEIRA e ROSSANA MEDEIROS DE OLIVEIRA constam das anotações feitas em

agendas apreendidas na UTI CENTRAL VIDA LTDA, bem como na agenda apreendida em

poder do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, de sua propriedade. (documento 03).

Pelo que consta do documento 03, JÚNIO MARQUES

GUIMARÃES anotou em sua agenda a seguinte afirmativa: “2 paciente encaminhado para o

São Lucas pegar 250 1 Dr. Junio 1 da Lucimar”.

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de GoiâniaNo documento 03 consta a seguinte afirmação: “Lucimar 3 pg”,

indicativa de que a ré LUCIMAR NASCIMENTO CRUZ recebeu pelo encaminhamento

de 3 pacientes. Consta, ainda, “1 pcte Lucimar Unimed São Lucas” e, logo em seguida, há

registro do nome do paciente “Cláudio Alves da Silva 05/01/07”.

No documento 03 há referência expressa do seguinte teor:

“200,00 pcte Lucineide”, a indicar o pagamento à ré LUCINEIDE SOUZA DOS PASSOS

de R$ 200,00 (duzentos reais) pelo encaminhamento de pacientes.

Pelo documento 03, apreendido na administração da UTI

CENTRAL VIDA, no dia 01/09/08 o réu JULIANO GERVÁSIO DE SOUSA indicou para

ser internado naquela UTI o paciente José Alvino e recebeu a importância de R$ 150,00

(cento e cinquenta reais) pelo encaminhamento.

Na administração da UTI CENTRAL VIDA LTDA.,

localizada no Hospital Jacob Facuri, foi apreendida uma agenda onde o réu LUCIANO

MARQUES BARBOSA, preposto do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, fazia

anotações sobre pagamentos aos servidores do HUGO, com menção da data do

encaminhamento, nome do paciente, quem fez a indicação, o valor e a sigla de pagamento,

conforme documento 03.

III - FUNDAMENTOS JURÍDICOS DO PEDIDO

A Constituição Federal de 1998 consagrou, de forma explícita,

os princípios que regem a Administração Pública, assim enunciados:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito

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Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 19, de 1998) […]

Da conjugação de tais princípios emerge o regime jurídico

administrativo brasileiro. Tais princípios devem orientar toda e qualquer ação que se realize

no âmbito da Administração Pública, porquanto consubstanciam proposições básicas

norteadoras não só da aplicação da norma jurídica, como ainda de toda ação administrativa.

Enquanto o princípio da legalidade afasta condutas arbitrárias

por parte dos administradores, que devem agir nos estritos limites da lei, o princípio da

impessoalidade e da moralidade vedam qualquer ação discriminatória e impõem que o agente

público paute sua conduta pelos mais estritos preceitos éticos e dispense tratamento

isonômico aos administrados.

De acordo com o princípio da legalidade, a vontade da

Administração Pública é a que advém da lei. Em clássica lição, assentou Meirelles:

[…] A legalidade como princípio da administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. […] Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo o que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa 'pode fazer assim'; para o administrador público significa 'deve fazer assim' (MEIRELLES, Helly Lopes. Direito administrativo brasileiro. 37 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2011)

Sobre o princípio da impessoalidade, escreveu Mello:

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[…] Nele se traduz a ideia de que a Administração tem que tratar a todos os administrados sem discriminações, benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo nem perseguições são toleráveis. Simpatias ou animosidades pessoais, políticas ou ideológicas não podem interferir na atuação administrativa e muito menos interesses sectários de facções ou grupos de qualquer espécie. O princípio em causa não é senão o próprio princípio da igualdade ou isonomia […]. (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, 22 ed., rev. e atual. até a Emenda Constitucional 53, de 19.12.2006, Malheiros Editores, 2007)

Por outro lado, haverá ofensa ao princípio da moralidade, conforme ensina Di Pietro,

[…] sempre que em matéria administrativa se verificar que o comportamento da Administração ou do administrado que com ela se relaciona juridicamente, embora em consonância com a lei, ofende a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de equidade, a ideia comum de honestidade, estará havendo ofensa ao princípio da moralidade administrativa. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, 24 ed., São Paulo: Atlas, 2011)

A violação, consciente e voluntária, aos princípios regentes da

Administração Pública configura ato de improbidade administrativa, nos termos da Lei n.º

8.429/92:

Dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

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[…].

Por outro lado, a violação a princípios da Administração Pública

que importe em enriquecimento ilícito do agente constitui ato de improbidade administrativa

previsto no artigo 9º da Lei 8.429/92:

Dos atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito

Art. 9º. Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei e notadamente:

I – receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;

[…].

A Constituição Federal delineou o tratamento a ser dispensado

aos atos de improbidade, nos seguintes termos:

§ 4º. Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

A Lei n.º 8.429/92, regulamentando a matéria, por sua vez,

estabelece:

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Art. 5°. Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano.

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações:

I - na hipótese do art. 9º, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos;

[...]

III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

A conduta dos servidores públicos lotadas no Hospital de

Urgências de Goiânia – HUGO - de, consciente e voluntariamente, no exercício do cargo,

valendo-se das facilidades que este lhes proporcionava, receber “incentivos” para encaminhar

pacientes para UTIs particulares, dentre elas, a UTI CENTRAL VIDA LTDA., localizada

no Hospital Jacob Facuri, a UTI INTENSIVIDA, localizada no Hospital de Acidentados,

ambas de propriedade do réu JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, e a UTI CENTRO

VIDA LTDA., localizada no Hospital São Lucas, de propriedade do réu RAFAEL

HADDAD, além de ferir de morte princípios caros à Administração Pública – como a

legalidade, a moralidade e a impessoalidade – ensejaram um enriquecimento ilícito, bem

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como causaram grave prejuízo ao patrimônio moral do Estado de Goiás, diante da violação a

sua honra objetiva, em razão do descrédito social que as condutas dos referidos servidores

públicos geraram ao ente público.

A gravidade das consequências dos atos imorais e lesivos à

saúde pública e, em especial, daqueles que se viram “utilizados” como instrumentos de lucro

e auferimento de vantagens ilícitas, geraram sérios e irreversíveis prejuízos à coletividade.

Da mesma forma, as pessoas físicas e jurídicas que, aderindo à

vontade dos servidores públicos envolvidas no esquema, auferiram vantagens econômicas em

razão do ato ímprobo, devem responder pelos atos praticados, na forma prevista no artigo 9º e

11 c/c artigo 12, I e III, todos da Lei 8.429/92, inclusive no que pertine ao dano moral difuso

e coletivo causado, como se verá adiante, conforme estabelece o artigo 3º da referida lei:

Art. 3º. As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

IV – DO DANO MORAL DIFUSO E COLETIVO

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso X,

garantiu a indenizabilidade do dano moral, ao dispor:

Art. 5º. […]

X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material e moral decorrente de sua violação;

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[…].

Na mesma esteira, o Código Civil Brasileiro, assim estabelece:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

A partir da Constituição de 1988, a indenizabilidade do dano

moral foi garantida de forma ampla e sem condicionamentos sempre que houver lesão, dentre

outros, à honra e à imagem das pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas.

A propósito, o Superior Tribunal de Justiça sumulou a questão

relativa à possibilidade de dano moral à pessoa jurídica, nos seguintes termos:

Súmula 227. A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.

No âmbito dos direitos difusos, a indenizabilidade do dano

moral, além de encontrar amparo na própria Constituição Federal de 1988, é expressamente

admitida pelo artigo 1º da Lei 7.347/85, ao assim dispor:

Art. 1º. Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

[…]

IV – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;

[…].

Especificamente no que tange à defesa do patrimônio público,

também a Lei 8.429/92 prevê a reparabilidade do dano, de forma ampla, sem limitações

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quanto à modalidade de dano – material ou moral -, conforme se extrai do artigo 5º e do

artigo 12 da citada lei.

Vale mencionar, por oportuno, que o conceito de patrimônio

público não se confunde com o de erário. A este respeito, valiosa é a observação de Martins:

[…] De considerar, ainda, a ideia de que o patrimônio público não pode ser compreendido apenas do ponto de vista material, econômico ou palpável. O patrimônio público espelha todo tipo de situação em que Administração Pública estiver envolvida, desde a mais módica prestação de serviço típica té os bens que fazem parte de seu acervo dominial. Com efeito, e como veremos adiante, a própria moral da Administração Pública constitui patrimônio a ser resguardado por todos os membros da sociedade, sob pena de completa submissão dos valores rígidos de honestidade e probidade às práticas vezeiras de corrupção, enriquecimento ilícito, concussão e prevaricação. Tudo isso a agerar desconfiança dos administrados em face dos administradores e, se não, o pior – difundir a ilicitude como meio usual nas multifárias relações entre os particulares, já que o mau exemplo dos administradores autorizaria, em tese, o desmantelamento dos critérios de lisura. (MARTINS, Fernando Rodrigues. Controle do patrimônio público. São Paulo: Saraiva, 2000)

Dessa forma, mesmo que o ato de improbidade administrativa

não cause lesão material ao patrimônio público, poderá ensejar a indenização pelo dano moral

causado ao ente público ou à coletividade, na hipótese de violação à honra objetiva ou

subjetiva, respectivamente.

A conduta violadora dos princípios regentes da Administração

Pública que, pela sua gravidade, conforme asserem Garcia e Alves (GARCIA, Emerson.

ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa, 26 ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris,

2010) contribui para o descrédito das instituições públicas e do Estado perante a sociedade,

esmaece o vínculo de confiança entre esta e os exercentes do poder político, com degeneração

da própria segurança das relações sociais e disseminação entre os indivíduos, do nefasto

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sentimento de impunidade e injustiça social, afeta inexoravelmente a honra objetiva do ente

público, com graves danos ao patrimônio público moral e enseja a indenização pelo dano

moral difuso provocado.

O reconhecimento jurisprudencial do dano moral em relação às

pessoas jurídicas, segundo Ramos, “é o primeiro passo para que se aceite a reparabilidade do

dano moral em face de uma coletividade”. E ainda acresce: “o ponto chave para a aceitação

do chamado dano moral coletivo está na ampliação de seu conceito, deixando de ser o dano

moral um equivalente da dor psíquica, que seria exclusividade de pessoas físicas” (RAMOS,

André de Carvalho. A ação civil pública e o dano moral coletivo. In: Revista de Direito do

Consumidor, n. 25/98, p. 82).

Seguindo nessa linha de entendimento e partindo do enfoque da

coletividade, a análise do dano moral se desloca para a violação de valores imateriais de um

grupo social. Nessa perspectiva, o dano decorre dos estados de comoção deflagrados no seio

social pelo atuar ímprobo (dano moral coletivo), da natureza do bem lesado e sua importância

no meio social e da dimensão do prejuízo suportado pela coletividade (GARCIA, Emerson.

ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa, 26 ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris,

2010)

Como ensina Bittar Filho:

[...] O dano moral coletivo é a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial.(BITAR FILHO, Carlos Alberto. Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro in Direito do

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Consumidor, São Paulo: Revista dos Tribunais, vol. 12 )2

No caso ora em debate, indubitável que a conduta dos réus

maculou a honra objetiva do Estado de Goiás, a sua credibilidade, a confiança da sociedade

nas instituições públicas estaduais, principalmente tendo em vista as consequências negativas

que tais condutas ímprobas causaram à saúde pública. Vale lembrar que, movidos pelo intuito

de lucro e obtenção de vantagens indevidas, vidas de seres humanos foram colocadas em

risco, numa total demonstração de desprezo pelo bem mais caro ao ser humano e garantido

com proeminência pela Constituição Federal de 1988 – a vida.

Do ponto de vista da coletividade, irrefragável também, que a

conduta ímproba dos réus causou, além de intensa comoção social, pela sua gravidade e

perversão, incomensuráveis prejuízos para a saúde pública bem como para aqueles que, de

forma vil, se viram utilizados como meio para a obtenção de vantagens econômicas.

Os Tribunais Superiores vêm reconhecendo a indenizabilidade

do dano moral difuso e coletivo.

É o que se extrai da decisão prolatada no REsp nº 1.057.274 -

RS (2008/0104498-1) em que foi relatora a Ministra Eliana Calmon, cuja ementa tem o

seguinte teor:

ADMINISTRATIVO - TRANSPORTE - PASSE LIVRE - IDOSOS – DANO MORAL COLETIVO - DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA DOR E DE SOFRIMENTO - APLICAÇÃO

2 Vale destacar, ainda, a manifestação de Ramos que, ao analisar o dano moral coletivo, assim dissertou: “[...] é preciso sempre enfatizar o imenso dano moral coletivo causado pelas agressões aos interesses transindividuais. Afeta-se a boa imagem da proteção legal a estes direitos e afeta-se a tranquilidade do cidadão, que se vê em verdadeira selva, onde a lei do mais forte impera. (RAMOS, André de Carvalho. A ação civil pública e o dano moral coletivo, Revista de Direito do Consumidor, vol. 25- Ed. RT, p. 83). Continua o citado autor, dizendo: “Tal intranquilidade e sentimento de desapreço gerado pelos danos coletivos, justamente por serem indivisíveis, acarretam lesão moral que também deve ser reparada coletivamente. Ou será que alguém duvida que o cidadão brasileiro, a cada notícia de lesão a seus direitos não se vê desprestigiado e ofendido no seu sentimento de pertencer a uma comunidade séria, onde as leis são cumpridas? A expressão popular ‘o Brasil é assim mesmo’ deveria sensibilizar todos os operadores do Direito sobre a urgência na reparação do dano moral coletivo” (idem, ibidem).

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EXCLUSIVA AO DANO MORAL INDIVIDUAL - CADASTRAMENTO DE IDOSOS PARA USUFRUTO DE DIREITO – ILEGALIDADE DA EXIGÊNCIA PELA EMPRESA DE TRANSPORTE - ART. 39, § 1º DO ESTATUTO DO IDOSO - LEI 10741/2003 VIAÇÃO NÃO PREQUESTIONADO.1. O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação jurídica-base. 2. O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos. 3. Na espécie, o dano coletivo apontado foi a submissão dos idosos a procedimento de cadastramento para o gozo do benefício do passe livre, cujo deslocamento foi custeado pelos interessados, quando o Estatuto do Idoso, art. 39, § 1º exige apenas a apresentação de documento de identidade. 4. Conduta da empresa de viação injurídica se considerado o sistema normativo. 5. Afastada a sanção pecuniária pelo Tribunal que considerou as circunstancias fáticas e probatória e restando sem prequestionamento o Estatuto do Idoso, mantém-se a decisão. Recurso especial parcialmente provido.

Ao exarar seu voto a Relatora Ministra Eliana Calmon,

reconhecendo a indenizabilidade do dano moral difuso e coletivo, ponderou:

[…] E não poderia ser diferente porque as relações jurídicas caminham para uma massificação e a lesão aos interesses de massa não podem ficar sem reparação, sob pena de criar-se litigiosidade contida que levará ao fracasso do Direito como forma de prevenir e reparar os conflitos sociais. A reparação civil segue em seu processo de evolução iniciado com a negação do direito à reparação do dano moral puro para a previsão de reparação do dano a interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, ao lado do já consagrado direito à reparação pelo dano moral sofrido pelo indivíduo e pela pessoa jurídica (cf. Súmula 227/STJ).

Com efeito, os direitos de personalidade manifestam-se como uma categoria histórica, por serem mutáveis no tempo e no espaço. O direito de personalidade é uma categoria que foi idealizada para satisfazer exigências da tutela da pessoa, que são determinadas pelas

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contínuas mutações das relações sociais, o que implica a sua conceituação como categoria apta a receber novas instâncias sociais. (cf. LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental. do individual ao coletivo extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 287).

Como constata Xisto Tiago de Medeiros Neto:

Dessa maneira, o alargamento da proteção jurídica à esfera moral ou extrapatrimonial dos indivíduos e também aos interesses de dimensão coletiva veio a significar destacado e necessário passo no processo de valorização e tutela dos direitos fundamentais. Tal evolução, sem dúvida, apresentou-se como resposta às modernas e imperativas demandas da cidadania. Ora, desde o último século que a compreensão da dignidade humana tem sido referida a novas e relevantíssimas projeções, concebendo-se o indivíduo em sua integralidade e plenitude, de modo a ensejar um sensível incremento no que tange às perspectivas de sua proteção jurídica no plano individual, e, também, na órbita coletiva. É inegável, pois, o reconhecimento e a expansão de novas esferas de proteção à pessoa humana, diante das realidades e interesses emergentes na sociedade, que são acompanhadas de novas violações de direitos. (Dano moral coletivo. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 121).

O mesmo autor sintetiza os requisitos para configuração do dano moral coletivo:

Em suma, pode-se elencar como pressupostos necessários à configuração do dano moral coletivo, de maneira a ensejar a sua respectiva reparação, (1) a conduta antijurídica (ação ou omissão) do agente, pessoa física ou jurídica; (2) a ofensa a interesses jurídicos fundamentais, de natureza extrapatrimonial, titularizados por uma determinada coletividade (comunidade, grupo, categoria ou classe de pessoas); (3) a intolerabilidade da ilicitude, diante da realidade apreendida e da sua repercussão social; (4) o nexo causal observado entre a conduta e o dano correspondente à violação do interesse coletivo (lato sensu). (idem, p. 136)

O dano moral extrapatrimonial deve ser averiguado de acordo com as características próprias aos interesses difusos e coletivos, distanciando-se quanto aos caracteres próprios das pessoas físicas que compõem determinada coletividade ou grupo determinado ou indeterminado de pessoas, sem olvidar que é a

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confluência dos valores individuais que dão singularidade ao valor coletivo.

Oportuna, também, a lição do Ministro Luiz Fux, vazada no

REsp Nº 598.281 – MG:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AO MEIO AMBIENTE. DANO MATERIAL E MORAL. ART. 1º DA LEI 7347⁄85.1. O art. 1º da Lei 7347⁄85 dispõe: "Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:I - ao meio ambiente;II - ao consumidor;III - a bens e direitos de valor artístico. estético. histórico. turístico e paisagístico;IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo;V - por infração da ordem econômica."2. O meio ambiente ostenta na modernidade valor inestimável para a humanidade, tendo por isso alcançado a eminência de garantia constitucional.3. O advento do novel ordenamento constitucional - no que concerne à proteção ao dano moral - possibilitou ultrapassar a barreira do indivíduo para abranger o dano extrapatrimonial à pessoa jurídica e à coletividade.4. No que pertine a possibilidade de reparação por dano moral a interesses difusos como sói ser o meio ambiente amparam-na o art. 1º da Lei da Ação Civil Pública e o art. 6º, VI, do CDC.5. Com efeito, o meio ambiente integra inegavelmente a categoria de interesse difuso, posto inapropriável uti singuli. Consectariamente, a sua lesão, caracterizada pela diminuição da qualidade de vida da população, pelo desequilíbrio ecológico, pela lesão a um determinado espaço protegido, acarreta incômodos físicos ou lesões à saúde da coletividade, revelando atuar ilícito contra o patrimônio ambiental, constitucionalmente protegido.6. Deveras, os fenômenos, analisados sob o aspecto da repercussão física ao ser humano e aos demais elementos do meio ambiente constituem dano patrimonial ambiental.7. O dano moral ambiental caracterizar-se quando, além dessa repercussão física no patrimônio ambiental, sucede ofensa ao sentimento difuso ou coletivo - v.g.: o dano causado a uma paisagem causa impacto no sentimento da comunidade de determinada região, quer como v.g; a supressão de certas árvores na zona urbana ou localizadas na mata próxima ao perímetro urbano.

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8. Consectariamente, o reconhecimento do dano moral ambiental não está umbilicalmente ligado à repercussão física no meio ambiente, mas, ao revés, relacionado à transgressão do sentimento coletivo, consubstanciado no sofrimento da comunidade, ou do grupo social, diante de determinada lesão ambiental.9. Destarte, não se pode olvidar que o meio ambiente pertence a todos, porquanto a Carta Magna de 1988 universalizou este direito, erigindo-o como um bem de uso comum do povo. Desta sorte, em se tratando de proteção ao meio ambiente, podem co-existir o dano patrimonial e o dano moral, interpretação que prestigia a real exegese da Constituição em favor de um ambiente sadio e equilibrado.10. Sob o enfoque infraconstitucional a Lei n. 8.884⁄94 introduziu alteração na LACP, segundo a qual passou restou expresso que a ação civil pública objetiva a responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados a quaisquer dos valores transindividuais de que cuida a lei.11. Outrossim, a partir da Constituição de 1988, há duas esferas de reparação: a patrimonial e a moral, gerando a possibilidade de o cidadão responder pelo dano patrimonial causado e também, cumulativamente, pelo dano moral, um independente do outro.12. Recurso especial provido para condenar os recorridos ao pagamento de dano moral, decorrente da ilicitude perpetrada contra o meio ambiente, nos termos em que fixado na sentença (fls. 381⁄382).

Importante mencionar que a comprovação do dano moral não

depende da demonstração efetiva do abalo à credibilidade das instituições públicas ou da dor

física ou moral causada à coletividade. Depende única e exclusivamente da comprovação da

situação fática danosa imbuída da gravidade necessária ao abalo das instituições públicas e

aos valores imateriais do grupo social. Uma vez comprovada esta, devidamente comprovado

estará o dano moral.

A questão foi debatida no REsp nº 1.057.274 - RS

(2008/0104498-1), cuja ementa, pela importância ao debate ora encetado, transcreve-se

novamente:

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ADMINISTRATIVO - TRANSPORTE - PASSE LIVRE - IDOSOS – DANO MORAL COLETIVO - DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA DOR E DE SOFRIMENTO - APLICAÇÃO EXCLUSIVA AO DANO MORAL INDIVIDUAL - CADASTRAMENTO DE IDOSOS PARA USUFRUTO DE DIREITO – ILEGALIDADE DA EXIGÊNCIA PELA EMPRESA DE TRANSPORTE - ART. 39, § 1º DO ESTATUTO DO IDOSO - LEI 10741/2003 VIAÇÃO NÃO PREQUESTIONADO.1. O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação jurídica-base. 2. O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos. 3. Na espécie, o dano coletivo apontado foi a submissão dos idosos a procedimento de cadastramento para o gozo do benefício do passe livre, cujo deslocamento foi custeado pelos interessados, quando o Estatuto do Idoso, art. 39, § 1º exige apenas a apresentação de documento de identidade. 4. Conduta da empresa de viação injurídica se considerado o sistema normativo. 5. Afastada a sanção pecuniária pelo Tribunal que considerou as circunstancias fáticas e probatória e restando sem prequestionamento o Estatuto do Idoso, mantém-se a decisão. Recurso especial parcialmente provido.

No mesmo sentido:

Indenização de direito comum. Dano moral. Prova. Juros moratórios. Súmula n.º 54 desta Corte. 1 – Não há que falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam. Provado assim o fato, impõe-se a condenação, sob pena de violação ao art. 334 do Código de Processo Civil. 2 – Na forma da Súmula n.º 54 da Corte, os juros moratórios nestes casos contam-se da data do evento. 3 - Recurso especial conhecido e provido, em parte.(STJ - RESP n.º 86.271 – SP – 3ª Turma - Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito – DJ 09/12/97)

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de GoiâniaQuanto ao valor devido a título de indenização pelos danos

morais difusos e coletivos, observa Bittar:

[...] deve traduzir-se em montante que represente advertência ao lesante e à sociedade de que se não se aceita o comportamento assumido, ou o evento lesivo advindo. Consubstancia-se, portanto, em importância compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se de modo expressivo, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. deve, pois, ser quantia economicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante. Coaduna-se essa postura, ademais, com a própria índole da teoria em debate, possibilitando que se realize com maior ênfase, a sua função inibidora de comportamentos. Com efeito, o peso do ônus financeiro é, em um mundo em que cintilam interesses econômicos, a resposta pecuniária mais adequada a lesionamentos de ordem moral.(BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais” in RT, 1993, pp. 220-222)

A indenização por dano moral deve atender a uma relação de

proporcionalidade, não podendo ser insignificante a ponto de não cumprir com sua função

apenadora, nem ser excessiva a ponto de desbordar de sua ratio essendi compensatória, e,

assim, causar um enriquecimento indevido à parte.

Entretanto, não se pode também desconsiderar o caráter

repressivo-preventivo que informa a responsabilização pelo dano moral coletivo, já que sua

previsão não apenas objetiva compensar a coletividade, revertendo o valor pecuniário em

favor de fundo que a todos aproveita, como tem por fim punir aquele que, previamente

avisado pela lei, violou interesse transindividual.

Tendo em vista a gravidade da conduta praticada pelos réus,

bem como o abalo provocado à confiança e crédito do Estado e das instituições públicas, a

comoção social provocada, em razão do elevado grau de torpeza da conduta dos réus, e, ainda

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o lucro obtido, principalmente por parte da UTI CENTRAL VIDA LTDA., UTI

INTENSIVID,. UTI CENTRO VIDA LTDA. e pelos réus JÚNIO MARQUES

GUIMARÃES e RAFAEL HADDAD, em razão do esquema noticiado, e mais,

considerando que deve a indenização pelo dano moral difuso e coletivo ser fixada em

montante que represente uma significativa perda patrimonial aos réus, a fim de cumprir seu

papel indenizatório e inibitório de comportamentos lesivos, postula seja ela fixada em

montante não inferior a R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais)

Alfim, vale mencionar, ainda, que no âmbito da jurisdição

coletiva não mais incide a limitação contida no artigo 3º da Lei 7.347/85, suprimida que foi

pelo artigo 83 do Código de Defesa do Consumidor, aplicável na defesa dos direitos e

interesses difusos e coletivos de modo geral, inclusive o patrimônio público, por força do

artigo 21 da Lei 7.347/85. Eis o que diz o artigo 83 do CDC:

Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este Código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.

Diante do plexo legislativo constitucional apresentado, pode-se

afirmar a possibilidade de utilização da ação civil pública por ato de improbidade

administrativa para a obtenção da tutela ampla do patrimônio público, inclusive para a

indenização pelo dano moral causado ao ente público e à coletividade.

V– DA INDISPONIBILIDADE DOS BENS

O artigo 5º da Lei de Improbidade dispõe que “ocorrendo lesão

ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente ou de

terceiros, dar-se-á integral ressarcimento do dano”. Essa norma é complementada pelo

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artigo 7º, que estabelece a possibilidade de decretar a indisponibilidade de bens do autor do

ato ímprobo, com o fito de assegurar o integral ressarcimento pela prática do ato de

improbidade administrativa.

Como medida cautelar, para a concessão da indisponibilidade

dos bens basta a presença do fumus boni juris e do periculum in mora. Ambos requisitos

estão fartamente consubstanciados nos autos da presente demanda.

O fumus boni juris está presente em razão da verossimilhança

dos fatos imputados aos agentes públicos. Não se faz necessário, por óbvio, que o ato

ímprobo esteja cabalmente provado, o que só ocorrerá por ocasião da sentença. Como é

pacífico, este mesmo parâmetro também é utilizado para fim de recebimento da exordial.

Vejamos o escólio de Bedaque:

[…] No caso específico dos processos versando improbidade administrativa, tendo em vista a natureza da relação jurídica material e o bem da vida tutelado, o legislador previu tutela provisória da evidência, mediante providência cautelar conservativa consistente na indisponibilidade de bens do réu. Para obtê-la basta a demonstração da verossimilhança do direito […] (BEDAQUE, José Roberto dos Santos et al., Improbidade Administrativa, questões polêmicas e atuais. Ed. Malheiros, p. 260, 263/264)

A narração dos fatos contida na exordial, amparada pelas

interceptações telefônicas autorizadas judicialmente, bem como pelos documentos

apreendidos durante as investigações policiais, são mais do que suficientes para demonstrar a

verossimilhança das alegações apresentadas.

Quanto ao periculum in mora, a mais abalizada doutrina

especializada sobre o tema entende que é requisito implícito, isto é, está subentendido no

artigo 37, § 4º, da Constituição da República, que estabelece:

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§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Nesse sentido:

Com efeito, a lei presume esses requisitos ao autorizar a indisponibilidade, porquanto a medida acautelatória tende à garantia da execução da sentença, tendo como requisitos específicos evidências de enriquecimento ilícito ou lesão ao erário, sendo indiferente que haja fundado receio de fraude ou insolvência, porque o perigo é ínsito aos próprios efeitos do ato hostilizado. Exsurge, assim, a indisponibilidade como medida de segurança obrigatória nessas hipóteses. Precioso acórdão estampa que a indisponibilidade de bens exige os pressupostos gerais das medidas de cautela (fumus boni juris e periculum in mora), considerando que o periculum in mora é presumido por que o “§ 4º do artigo 37 da Constituição Federal, ao determinar de modo expresso que 'os atos de improbidade administrativa importarão ... a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário...' (sublinhou-se), e sendo a primeira figura nitidamente acautelatória – diversamente da segunda -, evidentemente manda presumir, em relação a ela, o requisito do 'periculum in mora'. O dispositivo constitucional demonstra claramente a imprescindibilidade da providência quando o ato de improbidade administrativa causar lesão ao patrimônio público. Daí a razão do artigo 7º da Lei 8.429/92 não esclarecer quais os requisitos exigíveis para a sua concessão, diferentemente de outras medidas acautelatórias.” (MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa. 4ª ed., São Paulo: Saraiva, 2009, p. 454-455)

Quanto ao periculum in mora, parte da doutrina se inclina no sentido de sua implicitude, de sua presunção pelo art. 7º da Lei de Improbidade, o que dispensaria o autor de demonstrar a intenção de o agente dilapidar ou desviar o seu patrimônio com vistas a afastar a reparação do dano. [...] De fato, exigir a prova, mesmo que indiciária, da intenção do agente de furtar-se à efetividade da condenação representaria, do ponto de vista prático, o irremediável esvaziamento da

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indisponibilidade perseguida em nível constitucional e legal. Como muito bem percebido por José Roberto dos Santos Bedaque, a indisponibilidade prevista na Lei de Improbidade é uma daquelas hipóteses nas quais o próprio legislador dispensa a demonstração do perigo de dano. Deste modo, em vista da redação imperativa adotada pela Constituição Federal (art. 37, § 4º) e pela própria Lei de Improbidade (art. 7º), cremos acertada tal orientação, que se vê confirmada pela melhor jurisprudência. (GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. 3ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 764)

[…] não se mostra crível aguardar que o agente público comece a dilapidar seu patrimônio para, só então, promover o ajuizamento de medida cautelar autônoma de sequestro dos bens. Tal exigência traduziria concreta perspectiva de impunidade e de esvaziamento do sentido rigoroso da legislação. O periculum in mora emerge, via de regra, dos próprios termos da inicial, da gravidade dos fatos, do montante, em tese, dos prejuízos causados ao erário. A indisponibilidade patrimonial é medida obrigatória, pois traduz consequência jurídica do processamento da ação, forte no art. 37, parágrafo 4º, da Constituição Federal. Esperar a dilapidação patrimonial, quando se trata de improbidade administrativa, com todo respeito às posições contrárias, é equivalente a autorizar tal ato, na medida em que o ajuizamento de ação de sequestro assumiria dimensão de 'justiça tardia', o que poderia se equiparar a denegação de justiça.[...]Prepondera, aqui, a análise do requisito da fumaça do bom direito. Se a pretensão do autor da actio se mostra plausível, calcada em elementos sólidos, com perspectiva concreta de procedência e imposição das sanções do art. 37, parágrafo 4º, da Carta Constitucional, a consequência jurídica adequada, desde logo, é a indisponibilidade patrimonial e posterior sequestro dos bens. (OSÓRIO, Fábio Medina. Improbidade administrativa, 2a. ed., Porto Alegre: Síntese, 1998, p. 239 e ss.)

O entendimento doutrinário é corroborado pela jurisprudência:

Ação Civil Pública – Cautelar – Indisponibilidade de bens do servidor a quem se imputa prática de ato de improbidade – Perigo – Tratando-se de ação civil pública cautelar cujo escopo é garantir a indenização por danos oriundos de imputado ato de improbidade a

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administrador público, não é necessária a existência ou demonstração de perigo na demora a ensejar a concessão da medida judicial de indisponibilidade dos bens – Constatada a plausibilidade da imputação da prática de ato de improbidade, os bens do agente público, que respondem pelos atos por ele praticados não mais podem ser alienados, desnecessária a demonstração de existência de perigo ou intenção de alienação – Recurso provido para decretar-se a indisponibilidade dos bens dos agravados, que permanecerão com a administração dos mesmos até final julgamento da ação – Recurso provido para tal fim. (Agravo de instrumento n.º 052.503-5 – São Paulo – 2ª Câmara de Direito Público. - Relator: Lineu Peinado – 12.05.98)

No Agravo de Instrumento n.º 24069014520, o Desembargador

Maurílio Almeida de Abreu, da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, em

decisão publicada aos 15 de agosto de 2007, afirmou:

[…] Quanto ao “periculum in mora”, boa parte da doutrina se inclina no sentido de sua implicitude, de sua presunção pelo artigo 7º da Lei nº 8.429⁄92, o que dispensaria o autor de demonstrar a intenção do agente dilapidar ou desviar o seu patrimônio com vistas a afastar a reparação do dano. Nesse sentido, argumenta Fábio Osório Medina que “o periculum in mora emerge, via de regra, dos próprios termos da inicial, da gravidade dos fatos, do montante, em tese, dos prejuízos causados ao erário”, sustentado, outrossim, que “a indisponibilidade patrimonial é medida obrigatória, pois traduz consequência jurídica do processamento da ação, forte no art. 37, §4º, da Constituição Federal”. Nas palavras de Wallace Paiva Martins Júnior, “a providência não exige prova cabal, mas razoáveis elementos configuradores da lesão, como acentua Marcelo Figueiredo, sob o argumento de que “exige, s.m.j., não uma prova definitiva da lesão (já que estamos no terreno preparatório), mas, ao contrário, razoáveis provas para que o pedido de indisponibilidade tenha trânsito e seja deferido”. Razoável o argumento que exonera a presença do fumus boni juris e periculum in mora para a concessão da indisponibilidade de bens, apesar de opiniões contrárias. Com efeito, a lei presume esses requisitos ao autorizar a indisponibilidade, porquanto a medida acautelatória tende à garantia da execução da sentença, tendo como requisitos

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específicos evidências de enriquecimento ilícito ou lesão ao erário, sendo indiferente que haja fundado receio de fraude ou insolvência, porque o perigo é insito aos próprios efeitos do ato hostilizado. (MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. 2002. p.395⁄396). Ao meu sentir, evocando as palavras de Rogério Pacheco Alves, “de fato, exigir a prova, mesmo que indiciária, da intenção do agente furtar-se à efetividade da condenação representaria, do ponto de vista prático, o irremediável esvaziamento da indisponibilidade perseguida em nível constitucional e legal”. (PACHECO ALVES, Rogério. Improbidade Administrativa. 2006. p 764). Como muito bem percebido pelo Eminente Desembargador José Roberto dos Santos Bedaque, a indisponibilidade prevista na Lei de Improbidade Administrativa é uma daquelas hipóteses nas quais o próprio legislador dispensa a demonstração do perigo de dano. (Tutela Jurisdicional Cautelar e Atos de Improbidade Administrativa¿. p. 266⁄270). Assim sendo, em vista da dicção imperativa adotada pela Constituição da República de 1988 (art. 37, §4º) e pela própria Lei de Improbidade Administrativa (art. 7º), cremos acertada tal orientação, que se vê confirmada pela melhor jurisprudência. Nesse sentido o Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso decidiu que, “exsurgindo dos autos da ação civil pública provas convincentes da improbidade administrativa, pode o juiz determinar, a requerimento do autor, a indisponibilidade dos bens dos envolvidos, à vista do periculum in mora ínsito no artigo 7º da Lei 8.529⁄92...”. (1ª Cam. AgI 8.234, Paratinga, Rel. Des. Orlando de Almeida Perri, 20.04.1998). Sobre o tema, confira-se precedente emanado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, in verbis: “Ação Civil Pública - Cautelar - Indisponibilidade de bens do servidor a quem se imputa prática de ato de improbidade - Perigo - Tratando-se de ação civil pública cautelar cujo escopo é garantir a indenização por danos oriundos de imputado ato de improbidade a administrador público, não é necessária a existência ou demonstração do perigo na demora a ensejar a concessão da medida judicial de indisponibilidade de bens. (...) (Agravo de Instrumento nº 052.503-5 - São Paulo - 2ª Câmara de Direito Público - Relator Des. Lineu Peinado - 12.05.1998)”.

O mesmo entendimento foi exarado em agosto de 2009 pelo

Superior Tribunal de Justiça que, ao julgar o REspl 1.098.824/SC, por sua Segunda Turma, à

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unanimidade, consagrou que “o requisito cautelar do periculum in mora está implícito no

próprio comando legal, que prevê a medida de bloqueio de bens, uma vez que visa a

assegurar o integral ressarcimento do dano”. Confira-se o teor da ementa:

ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – INDISPONIBILIDADE DE BENS – ART. 7º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 8.429/1992 – REQUISITOS PARA CONCESSÃO – LIMITES – SÚMULA 7/STJ. 1. O provimento cautelar para indisponibilidade de bens, de que trata o art. 7º, parágrafo único da Lei 8.429/1992, exige fortes indícios de responsabilidade do agente na consecução do ato ímprobo, em especial nas condutas que causem dano material ao Erário. 2. O requisito cautelar do periculum in mora está implícito no próprio comando legal, que prevê a medida de bloqueio de bens, uma vez que visa a 'assegurar o integral ressarcimento do dano'. 3. A demonstração, em tese, do dano ao Erário e/ou do enriquecimento ilícito do agente, caracteriza o fumus boni iuris. 4. Hipótese em que a instância ordinária concluiu ser possível quantificar as vantagens econômicas percebidas pelo réu, ora recorrente, para fins de limitação da indisponibilidade dos seus bens. Rever esse entendimento demandaria a análise das provas. Incidência da Súmula 7/STJ. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido. (REsp 1098824/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/06/2009, DJe 04/08/2009)

Nessa esteira, seguiu o Superior Tribunal de Justiça ao reiterar,

recentemente, o posicionamento esposado no REsp 1.098.824/SC acerca do bloqueio de bens

em ações de improbidade administrativa, quando asseverou que “tal medida não está

condicionada à comprovação de que os réus estejam dilapidando seu patrimônio, ou na

iminência de fazê-lo, tendo em vista que o periculum in mora está implícito no comando

legal”. Confiram-se os seguintes arestos:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DOS BENS. DECRETAÇÃO. REQUISITOS. ART. 7º

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DA LEI 8.429/1992. 1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Federal no Estado do Maranhão contra a ora recorrida e outros, em virtude de suposta improbidade administrativa em operações envolvendo recursos do Fundef e do Pnae. 2. A indisponibilidade dos bens é medida de cautela que visa a assegurar a indenização aos cofres públicos, sendo necessária, para respaldá-la, a existência de fortes indícios de responsabilidade na prática de ato de improbidade que cause dano ao Erário (fumus boni iuris). 3. Tal medida não está condicionada à comprovação de que os réus estejam dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, tendo em vista que o periculum in mora está implícito no comando legal. Precedente do STJ. 4. Recurso Especial provido. (STJ, REsp 1115452/MA, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, 2ª Turma, julgado em 06/04/2010, DJe 20/04/2010).

RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DOS BENS. DECRETAÇÃO. REQUISITOS. ART. 7º DA LEI 8.429/1992. REVISÃO. FATOS. NÃO-CABIMENTO. SÚMULA 07/STJ. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem-se alinhado no sentido da desnecessidade de prova de periculum in mora concreto,ou seja, de que o réu estaria dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, exigindo-se apenas a demonstração de fumus boni iuris, consistente em fundados indícios da prática de atos de improbidade. Precedentes: REsp 1.203.133/MT, Rel. Ministro Castro Meira, REsp 967.841/PA, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Dje 08.10.2010, REsp 1.135.548/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, DJE 22.06.2010; REsp 1.115.452/MA, Rel. Ministro Herman Benjamin, Dje 20.04.2010. [...] (STJ, 2ª Turma, Recurso Especial nº 2010/0075404-6, Ministro Castro Meira, DJe 10/02/2011)

Por fim, imperioso frisar que a indisponibilidade de bens não se

apresenta como antecipação de aplicação de sanção aos réus, mas tão-somente meio de

assegurar o resultado útil do processo, instaurado em defesa do patrimônio público.

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de GoiâniaBem por isso, afigura-se imprescindível a concessão de medida

liminar inaudita altera pars, com a decretação do bloqueio de bens dos réus para o integral

ressarcimento ao erário.

A indisponibilidade, frise-se, deverá recair sobre bens

suficientes para garantir o integral ressarcimento do dano moral difuso e coletivo, estimado

em valor não inferior a R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).

VI – DAS PENAS - A PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA

Dentre as sanções previstas no artigo 12, inciso III, da Lei

8.429, está a perda da função pública.

A previsão da perda do cargo ou função pública exercidos pelo

agente público que pratica ato de improbidade administrativa deflui como consequência

lógica da constatação da incompatibilidade da personalidade do agente com a gestão pública.

Por essa razão, deve a sanção alcançar todos os vínculos que o

agente tenha com a Administração Pública por ocasião da sentença condenatória.

Sobre o tema, assim lecionam Garcia e Alves:

Em razão da mencionada incompatibilidade entre a personalidade do agente e a gestão da coisa pública, o que se tornou claro com a prática do ato de improbidade, deve a sanção de perda da função, quando aplicada, extinguir todos os vínculos laborais existentes junto ao Poder Público. O art. 12, em seus três incisos, fala genericamente em perda da função, que não pode ser restringida àquela exercida por ocasião da prática do ato de improbidade. Isso sob pena de se permitir a prática de tantos atos ilícitos quantos sejam os vínculos

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existentes, em flagrante detrimento da coletividade e dos fins da lei. Ainda que o agente exerça duas ou mais atribuições, de origem eletiva ou contratual, ou uma função distinta daquela que exercia por ocasião do ilícito, o provimento jurisdicional haverá de alcançar todas, determinando a completa extinção das relações existentes entre o agente e o Poder Público.

Assim, é irrelevante que o ilícito, verbi gratia, tenha sido praticado em detrimento de um ente municipal e o agente, por ocasião da aplicação da sanção, mantenha uma relação funcional com a administração estadual, pois a dissolução haverá de abranger todos os vínculos mantidos com o Poder Público, designativo que abrange os sujeitos passivos do ato de improbidade.

[…]

Ademais, prevalecendo entendimento diverso e sendo aplicada a sanção de suspensão dos direitos políticos ao agente, ter-se-ia a inusitada situação de o mesmo, embora privado de sua cidadania, continuar a exercer outra atividade de interesse coletivo que exige aptidões e virtudes que já demonstrara não possuir. (GARCIA, Emerson. ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 26 ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010)

Na mesma esteira, Pazzaglini Filho pontifica:

Registre-se que essa sanção fulmina a função pública exercida pelo agente público condenado à época em que praticou o ato de improbidade administrativa reconhecido na sentença judicial. E incide sobre a função pública diversa que ele esteja exercendo ao tempo da condenação irrecorrível, quando for privado de seus direitos políticos. Nessa hipótese, somente poderá voltar a exercer outra função pública após o decurso do prazo da suspensão de seus direitos políticos. (PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de improbidade administrativa comentada. Aspectos constitucionais, administrativos, civis, criminais, processuais e de responsabilidade fiscal. 4. ed. São paulo: Atlas, 2009)

Outro não é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça

que, no REsp 924.439 - RJ (2007/0020069-2), assim se pronunciou:

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ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADEADMINITRATIVA – ART. 12 DA LEI 8.429/1992 – PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA – ABRANGÊNCIA DA SANÇÃO – PARÂMETROS: EXTENSÃO DOS DANOS CAUSADOS E PROVEITO OBTIDO – SÚMULA 7/STJ – RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM.1. Hipótese em que o Tribunal de origem deixou de condenar o agente na perda da função pública, sob o fundamento de que o mesmo não mais se encontrava no exercício do cargo, no qual cometeu os atos de improbidade administrativa.2. A Lei 8.429/1992 objetiva coibir, punir e afastar da atividade pública todos os agentes que demonstraram pouco apreço pelo princípio da juridicidade, denotando uma degeneração de caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida.3. A sanção de perda da função pública visa a extirpar da Administração Pública aquele que exibiu inidoneidade (ou inabilitação) moral e desvio ético para o exercício da função pública, abrangendo qualquer atividade que o agente esteja exercendo ao tempo da condenação irrecorrível.4. A simples configuração do ato de improbidade administrativa não implica condenação automática da perda da função pública, pois a fixação das penas previstas no art. 12 da Lei 8.429/1992 deve considerar a extensão do dano e o proveito obtido pelo agente, conforme os parâmetros disciplinados no parágrafo único desse dispositivo legal. Precedente do STJ.5. É indispensável que se faça uma valoração da extensão dos danos causados, bem como do proveito obtido pelo agente, ao aplicar a sanção de perda da função pública. Análise obstaculizada, em recurso especial, em razão da Súmula 7/STJ.6. Recurso especial provido, para determinar o retorno dos autos à origem, para que se verifique a possibilidade de condenação do recorrido na perda da função pública. (STJ, REsp nº 924.439 - RJ (2007/0020069-2), Rel Min. Eliana Calmon)

Dessa forma, a sanção de perda da função pública deverá ser

aplicada a todos os réus que, na data da sentença, exerçam cargo ou função pública em

qualquer nível da Administração Pública (municipal federal e municipal) e deverá alcançar

todos os vínculos existentes com o Poder Público.

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VII - PEDIDOS:

Devidamente comprovada a prática, pelos réus, de atos de

improbidade administrativa definidos no artigo 9º, inciso I e 11, inciso I da Lei 8.429/92,

requer o Ministério Público:

1) a notificação dos réus para oferecer, caso queiram,

manifestação preliminar, no prazo de 15 (quinze) dias, conforme estabelece o artigo 17, § 7º,

da Lei n.º 8.429/92;

2) apresentada ou não a defesa, o recebimento da petição inicial;

3) a decretação liminar da indisponibilidade dos bens dos réus,

conforme autorizado pelo art. 7º da Lei 8.429/92, a fim de garantir a futura indenização pelo

dano moral difuso e coletivo. Para o cumprimento da medida, deverá ser determinada:

3.1) a indisponibilidade dos bens dos réus aos Cartórios de

Registro de Imóveis de Goiânia/GO;

3.2) a indisponibilidade dos bens dos réus por meio do sistema

RENAJUD;

3.3) a indisponibilidade dos bens dos réus por meio do sistema

BACENJUD;

4) a citação dos réus para contestar o pedido, sob pena de

confissão e revelia;

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de Goiânia5) a citação do Estado de Goiás, na pessoa do Procurador-Geral

do Estado para, nos termos do artigo 17, § 3º da Lei 8.429/92 e artigo 6º, § 3º, da Lei

4.717/65, aplicável analogicamente ao presente caso, para contestar o pedido, abster-se de

contestá-lo ou atuar ao lado do autor se isso se apresentar útil ao interesse público;

5) a produção de toda a prova em direito admitida e, em

especial, a documental, pericial e testemunhal, cujo rol será ofertado oportunamente;

6) a procedência do pedido, a fim de que sejam condenados:

6.1) todos os réus, solidariamente, à indenização dos danos

morais difusos e coletivos causados, nos termos do artigo 12, inciso I e III da Lei 8.429/92,

que deverá ser fixada em valor não inferior a R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), sobre o

qual deverá incidir a correção monetária e juros moratórios, a partir da data dos fatos. Do

valor fixado, 50% deverá ser revertido ao Estado de Goiás, na forma do artigo 18 da Lei

8.429/92 e 50% ao fundo de que trata a o artigo 13 da Lei 7.347/85;

6.2) os réus CLEONICE FERNANDES FERREIRA

LISBOA, EVA MOTA CORREA SOUZA, JULIANO GERVÁSIO DE SOUSA, KEILE

CRISTINA BATISTA NUNES, LUCINEIDE SOUZA DOS PASSOS, LUCIMAR

NASCIMENTO CRUZ, MAGDA LOURENÇA CARNEIRO, MARINEIDE DOS

SANTOS BORGES, ROSANA LOPES DA SILVA VIEIRA e ROSSANA MEDEIROS

DE OLIVEIRA à perda de todos os cargos ou função pública que ainda ocupem por ocasião

da sentença, nos termos do artigo 12, inciso I e III da Lei 8.429/92;

6.3) os réus JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, RAFAEL

HADDAD, LUCIANO MARQUES BARBOSA e MARIA NEUZA MENDES à perda do

cargo ou função pública porventura ocupado por ocasião da sentença, nos termos do artigo

12, inciso I e III da Lei 8.429/92;

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS90ª Promotoria de Justiça de Goiânia6.4) todos os réus (com exceção da ré UTI CENTRAL VIDA

LTDA. UTI INTENSIVIDA E UTI CENTRO VIDA LTDA.) à suspensão dos direitos

políticos pelo prazo de 10 (dez) anos, tendo em vista a gravidade das condutas, nos termos do

artigo 12, inciso I e III da Lei 8.429/92;

6.5) os réus CLEONICE FERNANDES FERREIRA

LISBOA, EVA MOTA CORREA SOUZA, JULIANO GERVÁSIO DE SOUSA, KEILE

CRISTINA BATISTA NUNES, LUCINEIDE SOUZA DOS PASSOS, LUCIMAR

NASCIMENTO CRUZ, MAGDA LOURENÇA CARNEIRO, MARINEIDE DOS

SANTOS BORGES, ROSANA LOPES DA SILVA VIEIRA, ROSSANA MEDEIROS

DE OLIVEIRA e RAFAEL HADDAD ao pagamento de multa civil, no valor

correspondente a 100 (cem) vezes o valor da remuneração percebida, nos termos do artigo 12,

inciso III da Lei 8.429/92;

6.6) os réus JÚNIO MARQUES GUIMARÃES, LUCIANO

MARQUES BARBOSA e MARIA NEUZA MENDES e UTI CENTRAL VIDA LTDA.,

UTI INTENSIVIDA e UTI CENTRO VIDA LTDA. ao pagamento de multa civil no valor

correspondente a 100 (cem) cem vezes o valor da maior remuneração percebida pelos corréus

servidores públicos, nos termos do artigo 12, inciso III da Lei 8.429/92;

6.7) todos os réus à proibição de contratar com o Poder Público

ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que

por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio, pelo prazo de 10 (dez) anos, nos termos

do artigo 12, inciso I e III da Lei 8.429/92.

Requer a isenção do pagamento de taxas e emolumentos,

adiantamentos de honorários periciais e quaisquer outras despesas processuais.

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Requer, por fim, tramitem os autos em segredo de justiça, tendo

em vista que parte dos elementos que instruem a presente inicial constituem-se em prova

acobertada pelo sigilo legal.

Dá à causa o valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).

Instruem a inicial os documentos anexos, numerados por grupo

de 01 a 11, os quais são cópias fiéis extraídas dos autos de ICP nº 2009000100042822 que

tramitou nesta Promotoria de Justiça.

Nestes termos,

Pede deferimento.

Goiânia, 31 de maio de 2012.

FABIANA LEMES ZAMALLOA DO PRADO PROMOTORA DE JUSTIÇA

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