microbiologia alimentar

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RMA Revista Microbiologia Alimentar Universidade do Minho Instituto de Educação

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Nesta revista cuja temática é a Microbiologia Alimentar serão abordados vários aspetos como o estudo de fatores que afetam o crescimento e a sobrevivência dos microrganismos nos alimentos, a análise e qualidade microbiológica dos alimentos, alguns exemplos de alimentos produzidos por ação de microrganismos, os diferentes métodos de conservação dos alimentos e intoxicações alimentares. No entanto, antes de iniciarmos esta descoberta sobre o tema da Microbiologia Alimentar, é imprescindível termos uma visão geral da evolução do estudo da microbiologia e entendermos o que são verdadeiramente os microrganismos.

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RMARevista

MicrobiologiaAlimentar

Universidade do Minho Instituto de Educação

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Cristina Daniela Melo Miranda

Joana Dantas Soares

Joana Eduarda Gomes de Araújo Braga

Joana Margarida Coelho Duarte

RMARevista

MicrobiologiaAlimentar

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TÍTULO: REVISTA DE MICROBIOLOGIA ALIMENTAR

AUTORES: CRISTINA MIRANDA

JOANA SOARES

JOANA BRAGA

JOANA DUARTE

DIREÇÃO DE: M. JUDITE ALMEIDA

EDIÇÕES TRÊS JD

FEVEREIRO DE 2013

TRÊS JD, S.A.

SEDEInstituto de Educação

Campos de Gualtar4710-057 Braga

Portugal

Internet: www.issuu.com/joana_soares_13/docs/a4_final

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INDÍCE

1. A MICROBIOLOGIA – O INÍCIO 1.1. Breve História da Microbiologia 1.2. Alguns Marcos da História da Microbiologia

2. MICRORGANISMOS – O QUE SÃO? 2.1.UmGrandeeDiversificadoGrupo 2.2. O Universo Microbiológico

3. CRESCIMENTO E SOBREVIVÊNCIA DE MICRORGANISMOS NOS ALIMENTOS 3.1. Crescimento Microbiano 3.2. Fatores Intrínsecos 3.3. Fatores Extrínsecos 3.4.FatoresImplícitos

4. ANÁLISE E QUALIDADE DOS ALIMENTOS 4.1. Flora Microbiana dos Alimentos Frescos 4.2. Exame Microbiológico 4.3. Controlo da Qualidade 4.3.1.Responsabilidades 4.4. Análise Microbiológica

5. ALIMENTOS PRODUZIDOS POR AÇÃO DE MICRORGANISMOS 5.1.Algunsexemplosdealimentosproduzidosporaçãodemicrorganismos

6. CONSERVAÇÃO DOS ALIMENTOS 6.1.Conservaçãopelocalor 6.2.Conservaçãopelofrio 6.3.Conservaçãoporaditivosalimentares 6.4.Conservaçãoporirradiação 6.5.Conservaçãopordesidrataçãoousecagem 6.6.Conservaçãopordefumação 6.7.Conservaçãoporatmosferamodificada 6.8.Conservaçãoporfermentação

7. INTOXICAÇÕES ALIMENTARES

8. GLOSSÁRIO

9. REFERÊNCIAS

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Nesta revista cuja temática é a Microbiologia Alimentar serão abordadosvários aspetos como o estudo de fatores que afetam o crescimento e asobrevivência dos microrganismos nos alimentos, a análise e qualidademicrobiológicadosalimentos,algunsexemplosdealimentosproduzidosporaçãodemicrorganismos,osdiferentesmétodosdeconservaçãodosalimentoseintoxicaçõesalimentares.No entanto, antes de iniciarmos esta descoberta sobre o tema da Microbiologia Alimentar,éimprescindíveltermosumavisãogeraldaevoluçãodoestudodamicrobiologiaeentendermosoquesãoverdadeiramenteosmicrorganismos.

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Batateira infetada com o fungo Phytophthora infestans

1. A MICROBIOLOGIA – O INÍCIO

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Ao longo da evolução do estudo das ciências surgiu uma nova área de investigação de seres vivos – a Mic-

robiologia – que se ocupa do estudo de or-ganismos que somente podem ser visuali-zados ao microscópio – os microrganismos. Desta forma, a microbiologia aborda um vasto e diverso grupo de organismos unice-lulares de dimensões reduzidas, que podem ser encontrados como células isoladas ou agrupados em diferentes arranjos. Assim, a microbiologia envolve o estudo de organis-mos procariotas (bactérias), eucariotas (al-gas, protozoários, fungos) e também seres acelulares (vírus).

Ao longo da história alguns marcos im-portantes ocorreram, de uma forma direta ou indireta, com o contributo

de microrganismos tais como: a fuga dos Is-raelitas do Egito (1500 a.C.), conduzida por Moisés, que foi facilitada pelo aparecimento da peste; a doença bacteriana (Yersinia pes-tis) que levou Atenas a perder a Guerra do Peloponeso em 404 aC; o aparecimento da malária e outras doenças infeciosas, devi-do ao corte do fornecimento de água pelo exército dos bárbaros, que contribuíram para a queda de Roma, em 565; o aparecimen-

to de sarampo e varíola que possibilitou a conquista da civilização Azteca (1500) pelos espanhóis; o caso do centeio in-fetado por um fungo patogénico ( C l a v i c e p s purpurea ) , em que o pão re-s u l t a n t e provocava alucinações que causou a famosa “Caça às Bruxas de Salem” em 1692; outro acontecimento provocado por um micror-ganismo que marcou a história da humani-dade foi a grande fome da Irlanda, em 1850, onde um fungo (Phytophthora infestans) de-vastou as batateiras matando à fome milha-res de pessoas e obrigou mais de um milhão a emigrar para a América.

1.1. Breve História da Microbiologia

Bactéria Yersinia pestis

Centeio infetado com o fungo patogénico Claviceps purpurea

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1664Descriçãodeestruturasdefrutificaçãode bolores – Robert Hooke

1677-1684Primeirasobservaçõesdemicrorganismos em detalhe – Antony van Leeuwenhoek

1798Vacinaçãocontraavaríola–EdwardJenner

1835-1844 Doençadebichos-da-sedacausadaporumfungo(sugerequeoutrasdoençassãoconsequênciadeinfeçõesmicrobianas)–AgostinoBassi

1.2. Alguns Marcos da História da Microbiologia

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1837Fermentaçãoalcoólicaconduzidaporleveduras – Theodore Schwann

1838-1839Célulascomounidadesestruturaisefuncionaisdetodososorganismos(teoriacelular)–SchleideneSchwann

1847-1850Transmissãodedoençaseintroduçãodeantissépticos–IgnazSemmelweis

1857-1850Fermentaçõesalcoólicaeláticaconduzidasporlevedurasebactérias,respetivamente–LouisPasteur

1861 Microrganismosquecrescemnaausênciadeoxigénio.Experiênciasquerefutaramateoriadageraçãoespontânea.Esterilização(pasteurização)–LouisPasteur

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1887-1890 Bactériasoxidantesdeenxofreenitrificantes(microbiologiadossolos)–Sergei Winogradsky

1866 Classificaçãodosmicrorganismoscomoconstituintesdenovoreino,oreinoprotista–ErnstHaeckel

1875-1877 Estudossobreformasderesistênciaaocalor(endósporos)esobretaxonomiadebactérias–FerdinandCohn

1880-1881 Métodosparaoestudodemicrorganismospatogénicos(obtençãodeculturaspuraseusodegelatina)–Robertkoch

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1892 Primeirademonstraçãodedoençaprovocadaporvírus(“mosaicodotabaco”)– Dimitri Ivanovski

1897 Parasitadopaludismooumalária(protozoárioPlasmodium sp.)transmitidopormosquito–R.Ross

1901 Introduçãodatécnicadeenriquecimentoedemeiosseletivosparaoisolamento de microrganismos – Beijerinck

1931-1932 Construçãodoprimeiromicroscópioeletrónico–MaxKnolleErnstRuska

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1977 Reconhecimentodasarqueobactériascomogrupodemicrorganismosdistintodas(eu)bactérias–C.Woeseecolaborares

1946 Descobertadaconjugaçãoembactérias(Escherichia coli) – J. Lederberg e E. M. Tatum

1953 DescobertadaestruturadeduplahélicedoDNA–JamesWatsoneFrancisCrick

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2. MICRORGANISMOS – O QUE SÃO?

E. coli

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2.1. Um Grande e Diversificado Grupo

Em termos gerais, são organismos com diâmetro igual ou inferior a 1mm, de dimensões microscópicas, considera-

dos microrganismos e vulgarmente deno-minados micróbios. Grande parte dos microrganismos tem uma estrutura física comum, estando or-ganizados em subunidades microscópicas - as células. Todas as células estão revesti-das por uma fina membrana - a membrana citoplasmática - que mantem dentro dos seus limites as moléculas necessárias ao fun-cionamento celular, e que regula as trocas entre o meio interno e externo. As células nunca surgem de novo, procedem sempre de células preexistentes, mediante o proces-so de divisão celular e crescimento.

No entanto, este grupo, sem valor taxonómico, pode ser dividido em dois gran-des grupos, que se distinguem pela presen-ça ou ausência de células: os seres celulares, onde se incluem a maioria das bactérias, dos protozoários, das algas e dos fungos; e os seres subcelulares, onde estão inseridos os vírus (e também os plasmídeos, os viróides e os priões). Os grupos das eubactérias, das arqueobactérias e dos protistas são constituídos em grande parte por microrga-nismos. Sendo assim, pode-se afirmar que existem importantes diferenças entre os vários gru-pos de microrganismos ao nível do taman-ho, da forma e da estrutura interna.

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2.2. O Universo Microbiológico

Os vírus são acelulares: diferenciam-se dos organismos celulares em estru-tura, composição química e modo

de crescimento; são parasitas capazes de se desenvolver unicamente dentro de células de outros organismos (eucariotas e proca-riotas) hospedeiros. Quando um vírus entra em contacto com uma célula, este “força” a entrada na célula e o escudo protetor que o envolver dissolve-se. Por sua vez, o centro do vírus toma conta do núcleo da célula hospe-deira e recombina os códigos da célula para que esta reproduza vírus. Posteriormente, a célula do hospedeiro é destruída e o vírus começa a espalhar-se.

As bactérias são organismos unicelu-lares que não possuem um núcleo celular organizado (procariontes);

podem apresentar-se isoladas ou agrega-das em pequenos grupos ou em estruturas pluricelulares. As células bacterianas podem apresentar quatro tipos principais de morfo-logia celular: esferas (cocos), cilindros (baci-los ou bastonetes), hélices rígidas (vibriões,

espirilos) e hélices flexíveis (espiroquetas). As células bacterianas podem dividir-se emdoisgrupos :deGram+edeGram-,confor-me reagem a coloração deGram, (de acor-docomacomposiçãodaparedecelular).Ascélulasbacterianasapesardeapresentaremumaestrutura celular bastante simples têmumasériedeestruturasconstituídaspordife-rentestiposdemacromoléculasequeocor-remexteriormenteàmembranaplasmática,que são a cápsula, aparede,osflagelos, asfímbriaseaspili.As bactérias foram e são essenciais paraa manutenção da vida no nosso plane-ta, a começar pelo próprio facto de teremsidoosprimeirosorganismosaaparecernasuperfície terrestre, há cerca de 4,6 biliõesdeanos,quedisponibilizaramoxigénioere-duziramasconcentraçõesdeCO2 na atmos-fera,permitiram,destaforma,acolonizaçãode novos organismos. Além disso, sem asbactérias não existiriam células eucariontese, muito menos, células vegetais, uma vezque, segundo a teoria endossimbiótica, asmitocôndriaseoscloroplastossãoderivadosdebactériasendossimbiontes.Aindahoje,asbactériasdecompositorasesaprófitas,junta-mentecomosfungos,sãoresponsáveispelareciclagem da matéria orgânica oriunda deorganismosmortoseresíduos(comofezese

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urina),transformando-aemmoléculasdecomposiçãomaissimplese,assim,garan-temacontinuaçãodosciclosdonitrogênioeoxigénio.No entanto, há muitas doenças causa-dasporbactérias.Quandoomeionãoéo adequado as bactérias desenvolvemesporos, formações que lhes conferemresistênciaatéencontraremomeioade-quado para a sua sobrevivência. Estaspodem multiplicar-se (dividir-se) muitorapidamente.Noentanto,osantibióticos,podemmatar estas bactérias, e assim sal-var vidas - muitas espécies de bactérias são utilizadas industrialmente,por exemplo na produção de insulina, io-gurte e vinagre. Noquedizrespeitoàsbactérias,nuncaserádemaisrealçaroseulugardedestaquenomundo vivo, sem dúvida ligado à grande diversidade metabólica e fisiológica queapresentam,quelhesconfereumaversa-tilidadeinigualável,comodizStephenJayGouldprofessordauniversidadedeHar-vardestamosna“eradasbactérias”.

Os fungos são seres vivos eucario-tas, com um só núcleo. Existem diferentes tipos de fungos, desde

organismos de dimensões consideráveis, como os cogumelos a organismos microscópicos, como os bolores e as leve-duras. Diversos tipos de fungos atuam no Homem causando várias doenças como, por exemplo as micoses, mas também existem fungos que servem de alimento. A maioria dos fungos não possuem flores e multiplicam-se por células muito pe-quenas - os esporos – e, como não têm capacidade de produzir o seu próprio alimento são parasitas. Por isso, estas células parasitam pães, frutas e vegeta-is, pois buscam alimentos em ambientes propícios para o seu desenvolvimento.

Por outro lado, os fungos também po-dem ser úteis no fabrico de determina-

dos alimentos, como é o caso dos queijos embolorados. Os fungos são organismos muito di-versificados, apresentando algumas características comuns aos vegetais e outras aos animais, por isso a sua posição entre os seres vivos foi polémica durante muito tempo. No sistema dos cinco rei-nos, proposta por Wittaker (1969) para a classificação dos seres vivos, o grupo adquiriu identidade própria: Reino Fungi (grego: sphongos = esponja; latin = fun-gus).

Os bolores e as leveduras perten-cem ao reino dos fungos e são formados por hifas (estruturas

básicas que podem ser septadas e dividi-das em células intercomunicadas através de poros ou células não septadas com os núcleos dispersos ao longo de toda hifa) que em conjunto formam uma estrutura denominada micélio. O micélio tem duas funções: fixar o bolor ao substrato e pro-mover a sua reprodução.

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Os bolores são fungos pluricelulares que obtêm a sua alimentação da matéria orgânica inanimada ou através de hospe-deiros que parasitam. Normalmente cres-cem em alimentos ricos em carbohidratos e ácidos, causando a decomposição destes, pois a assimilação de nutrientes é bastante acelerada. As hifas infiltram-se na matéria orgânica e as suas células eliminam as enzi-mas digerindo-as, desta digestão resultam substâncias mais simples que ficam no meio em solução e, assim podem ser absorvidas em toda a superfície das hifas. O micélio au-menta, crescendo sem orientação e em todas as direções e é este o responsável pelo aspe-to da colónia do bolor, seja aveludado, ge-latinoso, húmido, seco ou compacto, sendo que estes podem ter diferentes colorações. Quando bem desenvolvidas, algumas hifas formam pequenas esferas, geralmente escu-ras, visíveis a olho nu, cada uma com cente-nas de esporos. Quando se rompe a memb-rana dos esporos, estes ficam dispersos no ar, pelo que se torna difícil a sua eliminação em certos lugares. Onde houver alimento disponível e humidade, os esporos germi-nam e formam novos micélios. Os bolores, na sua maioria, são aeróbios e, por isso, cres-cem apenas na superfície dos alimentos em contato com o ar.As leveduras são fungos unicelulares, a sua forma pode variar entre esférica, ovoide, cilíndrica ou triangular. As condições ideias para crescerem são em meio ácido, pH entre 4,5 – 5,5 e a temperatura ótima está entre os 25ºC e os 30ºC. Reproduzem-se assexuada-mente por gemulação ou bipartição e sexu-adamente com conjugação de 2 ascósporos ou 2 células somáticas. Com exceção das leveduras fermentativas, as leveduras multiplicam-se melhor por aerobiosee tendo o açúcar como fonte de energia, mo-tivo pelo qual são encontrados na superfície

de órgãos dos vegetais, principalmente em flores e frutas, no trato intestinal dos animais em líquidos açucarados.As leveduras fermentativas são explo-radas pelo homem há milhões de anos na produção de cerveja e de vinho e na fermentação do pão, embora só no século XIX foi reconhecida a natureza biológica dos agentes responsáveis por este processo.Existem cerca de 350 espécies de leveduras separadas em 39 géneros.Em suma, os fungos são organismos eucarióticos, uni ou pluricelulares, que se nutrem por absorção, produtores de espo-ros, não possuem clorofila e reproduzem-se assexuada e sexuadamente. Sendo que os bolores crescem e reproduzem-se mais rapi-damente do que as bactérias.

Os protozoários são microrganismos eucariotas, unicelulares, a gran-de maioria são heterotróficos, mas

também existem alguns autotróficos. No reino protista encontram-se também as algas inferiores: euglenófitas, pirrófitas e crisófitas. A locomoção dos protozoários no meio aquático é feita através do batimento de cílios ou do batimento dos flagelos que são estruturas adaptadas para a natação; existem também protozoários que rastejam com movimento ameboide e outros que não possuem organelos locomotores. Os micror-ganismos parasitas disseminam-se pelo am-biente através da produção de muitos es-poros que são levados pela água, pelo ar ou são levados através de vetores como mos-cas, mosquitos, carrapatos etc. para outros animais. Os microrganismos passam a maior parte da vida parasitando diversas espécies de seres vivos e dessa forma causando mui-tas doenças. A reprodução dos protozoários geralmente é assexual acontecendo por divisão múltipla onde o microrganismo ape-

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nas se divide em cópias dele mesmo, alguns produzem esporos para se disseminarem

pelo ambiente, às vezes alguns também apresentam reprodução sexual, havendo nítida troca de material genético entre um microrganismo e outro.

Aos microrganismos é ainda reservado o papel de “maus da fita” causado-res de doenças no homem (pestes)

deterioração de alimentos, pragas na agri-cultura e pecuária – os agentes patogénicos. Embora sendo uma ideia incorreta é compreensível, pois enquanto é fácil levar qualquer pessoa a apreciar a complexidade do comportamento animal não é na mesma medida fácil levar alguém a dizer “que belo bolor!” ou “que linda bactéria” mas mais tar-de ou mais cedo, vai ter mesmo de se ou-vir dizer “que bons bolinhos de Chlorella” (alga unicelular) ou ”que belo hamburger de Methylomonas (bactéria que obtém energia a partir do carbono e do metano).

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3. CRESCIMENTO E SOBREVIVÊNCIA DE MICRORGANISMOS NOS ALIMENTOS

Abóbora contaminada por microrganismos

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3.1. Crescimento Microbiano

O crescimento microbiano é um pro-cesso autocatalítico, ou seja, não irá ocorrer crescimento sem a presen-

ça de uma célula viável e a taxa de crescimento irá aumentar com a quantidade de bi-omassa presente.No decorrer do crescimento, da colheita, processa-mento, armazena-mento, os alimen-tos estão sujeitos a contaminação de uma variedade de fontes. Alguns dos microrganismos presentes não serão capazes de crescer sob as condições prevalentes, enquanto outros crescem jun-

tos, naquilo que é designado por associação, assim a composição microbiana irá mudar com o decorrer do tempo.

Os fatores que afetam o crescimen-to microbi-ano nos ali-mentos, e consequen-temente as associações que são de-senvolvidas, também de-

terminam a natureza da contaminação e os riscos para a saúde daí recorrentes. Estes fa-tores podem ser divididos em 4 grupos:

Quadro 1: Fatores envolvidos no crescimento microbiano nos alimentos

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3.2. Fatores intrínsecos

Conteúdo em NutrientesComo nós, os microrganismos podem usar alimentos como fonte de nutrientes e ener-gia. Deles, estes derivam os elementos químicos que constituem a biomassa mic-robiana, essas moléculas essenciais para o crescimento que os organismos não conse-guem sintetizar e um substrato que pode ser usado como fonte de energia.

A incapacidade de determinado organismo para utilizar o componente principal de um material alimentar, irá limitar o seu cresci-mento e coloca-lo em desvantagem compe-titiva relativamente àqueles que o consegu-em fazer. A concentração de nutrientes essenciais pode, em certa medida, determi-nar a taxa de crescimento microbiano.

pH A acidez ou alcalinidade de determinado ambiente tem um efeito profundo na ati-vidade e estabilidade de macromoléculas como as enzimas, logo não é surpreendente que o crescimento e metabolismo de mic-rorganismos sejam influenciados pelo pH. De um modo geral, as bactérias crescem mais rapidamente em pH 6.0-8.0, levedu-

ras 4.5-6 e fungos filamentosos 3.5-4. A aci-dez de um produto pode ter importantes implicações na sua ecologia microbiana e na taxa e caráter da sua contaminação.

Potencial RedoxO oxigénio, presente no ar, é geralmente o fator mais influente nos sistemas alimenta-res, sendo um poderoso agente oxidante, contribuindo para o aumento do potenci-al redox em determinado alimento quan-do uma quantidade suficiente de ar, está presente. Uma vez que o fator intrínseco

de potencial redox, está intimamente rela-cionado com o fator extrínseco da atmos-fera envolvente, aumentando o acesso de ar a um alimento, cortando-o, moendo-o, triturando-o, irá aumentar o seu potencial redox. O crescimento microbiano, num ali-mento, leva a uma redução do seu potencial redox. Tal facto normalmente é atribuído a uma combinação da depleção de oxigénio e produção de componentes redutores, tais como o hidrogénio, pelos microrganismos. Os microrganismos variam no grau de sen-sibilidade ao potencial redox do meio de multiplicação, podendo dividir-se em:

Morangos contaminados por microrganismos devido à sua acidez

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Estruturas e Constituintes Antimicro-bianosBarreiras físicas – estruturas biológicas - tais como a pele, concha, casca, servem como proteção a infeções microbianas. Estas, normalmente são constituídas por macromoléculas relativamente resistentes à degradação (baixa atividade de água, ba-ixa disponibilidade de nutrientes), e frequ-entemente por componentes antimicrobia-nos como ácidos gordos de cadeia curta (na pele animal) e óleos essenciais (nas plantas), o que proporciona um ambiente inóspito para os microrganismos. Estas, quando da-nificadas, permitem a invasão microbiana dos tecidos inferiores, ricos em nutrientes. Verificando-se uma deterioração mais rápida dos alimentos, quando tal acontece. Como segunda linha de defesa, os tecidos podem conter componentes antimicrobia-nos, cuja concentração aumenta resultado de dano físico. Nas plantas, tal dano pode causar a rutura de células que armazenam

óleos essenciais. Uma classe de agentes an-timicrobianos conhecida como fitoalexinas, são produzidas por algumas plantas em res-posta a invasões microbianas. Muitos cons-tituintes naturais das plantas como resinas, pigmentos, alcaloides, têm propriedades

antimicrobianas, embora o seu uso prático seja limitado. Ácido benzoico e sórbico são exceções, que são usadas nas suas formas puras, para preservar alimentos. Algumas ervas e especiarias têm uma atividade anti-microbiana significativa, consequentemen-te, estas, podem contribuir para a estabilida-

Deterioração de uma maça

Quadro 2: Relação entre os diferentes microrganismos e o potencial redox

Logo, este é um fator de importância a ser considerado na preservação de alimentos, sendo determinante para os tipos de microrganismos que se irão desenvolver em determinados alimentos. A exclusão de ar irá reduzir o seu potencial redox, controlando assim os micror-ganismos aeróbios, para tal usam-se embalagem a vácuo, usados para queijos, vegetais, carne e outros, evitando os bolores superficiais. Nos enlatados, o ambiente anaeróbio favo-rece a multiplicação de microrganismos, anaeróbios ou facultativos.

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de microbiológica dos alimentos onde são usadas. Contudo, usualmente o seu papel na preservação é menor e em alguns casos, es-tas podem ser fonte de contaminação micro-biana, levando a deterioração ou problemas de saúde pública, mesmo em concentrações relativamente elevadas, agentes antimicro-bianos vegetais, não são completa garantia de segurança. Componentes antimicrobi-anos diferem no seu espectro de atividade e potência, estando presentes em variadas concentrações no produto natural e estão presentes frequentemente a níveis muito baixos para terem qualquer efeito.

Atividade da ÁguaA água é um componente importante. A vida como nós a conhecemos, é totalmen-te dependente da presença de água no seu estado líquido. As reações que têm lugar no citoplasma das células, fazem-no em am-biente aquoso e o citoplasma está rodea-do por uma membrana, que geralmente é permeável a moléculas de água, que passam livremente do citoplasma para o ambiente e do ambiente para o citoplasma. O ponto de fusão e ebulição da água é expectável ser limitante para a ocorrência de crescimen-to, contudo o ponto de fusão desta pode ser diminuído pela presença de solutos, ha-vendo microrganismos capazes de crescer a temperaturas inferiores a zero, pois o seu citoplasma contém compostos que atuam como anticongelantes. Contudo, o citoplasma deve estar na fase líquida para haver crescimento (não confun-dir crescimento com sobrevivência, muitos microrganismos podem sobreviver, mas não crescer quando o seu citoplasma está con-gelado), a água no ambiente de organismos vivos deverá estar presente não só na fase li-quida como água pura ou uma solução, mas também na atmosfera na fase gasosa, ou associada com uma fase sólida. O citoplas-ma é uma solução aquosa, como tal, deverá ter uma baixa atividade de água quando comparada a água pura (um microrganismo num ambiente de água pura, deverá experi-enciar um fluxo de moléculas de água para o citoplasma).Consoante a atividade de água diminui, ou a pressão osmótica aumenta no ambiente, é essencial que a atividade da água do citoplasma seja ainda menor, ou a sua pressão osmótica ainda maior. Com a redução da atividade da água no ambiente, o número de grupos de microrganismos ca-pazes de crescer diminui.O valor absoluto, da atividade de água, dá uma indicação segura, do conteúdo de água

Os produtos animais também têm uma série de constituintes antimicrobia-nos não-específicos, como é o caso do albúmen (parte branco) do ovo e no leite. Ambos contêm a enzima lisozi-ma, os quais catalisam a hidrólise das ligações glicosídicas do peptidoglicano, o polímero estrutural responsável pela estrutura e rigidez da parede das células bacterianas. Uma vez que a destruição ou enfraquecimento desta camada leva à ru-tura celular. Sendo que esta é mais ativa contra as células Gram-positivas do que Gram-negativas, uma vez que, nas prime-iras, o peptidoglicano está mais acessível. Existem outros componentes que limi-tam o crescimento microbiano, restrin-gindo a disponibilidade de nutrientes.

Curiosidade

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livre no alimento, sendo esta a única forma de água utilizada por parte dos microrganis-mos. Sendo que, normalmente, as bactérias são mais exigentes quanto à disponibilidade de água livre.Baixasatividadesdeáguaestãoassociadascom3tiposdistintosdealimentos,tendomicror-ganismosassociadoscomestesalimentos:

Algunsmicrorganismoscrescemmelhoremreduzidaatividadedeágua,podendoserdescritoscomohalofílicos,osmofílicosouxerofílicos.Ovalorlimitedeatividadedeáguaparaocresci-mentodequalquermicrorganismoécercade6.0, abaixo deste valor, a contaminação dosalimentos não é microbiológica, mas podedever-se a insetos, reações químicas comooxidação.Arelaçãoentreatividadedaáguaeconteúdodeáguaémuitosensívelàtempe-raturaepareceserdependentedaáguaestara ser adicionada ou removida de um substra-to.Seaamostratemmaisbaixovalordeati-vidadedeáguadoqueaatmosfera,entãoiráganharpeso,setiverummaiorvalordeativi-

dadedeágua,eleiráperderpeso.

3.3. Fatores Extrínsecos

Humidade RelativaA humidade relativa e a atividade de água estão inter-relacionadas. A humidade relativa é essencialmente uma medida da atividade da água na fase gasosa. Esta interfere diretamen-te na atividade de água de um alimento, pois quando alimentos com uma baixa atividade de água são armazenados numa atmosfera de elevada humidade relativa, a água vai-se trans-

Quadro3:Diferentesmicrorganismoscontaminamdiferentesalimentos

Pão contaminado com microrganismo devido à atividade da água que contém

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ferir da fase gasosa para os alimentos. Tal facto pode levar muito tempo para aumen-tar a atividade da água, do alimento, mas a condensação pode ocorrer em superfícies dando origem a regiões localizadas de elevada atividade de água, sendo nestas regiões que propágulos que se mantiveram viáveis, mas incapacitados de crescer, pos-sam agora germinar e crescer. Uma vez que estes iniciam o crescimento e se tornam fisi-ologicamente ativos, produzem água como produto final da respiração, aumentando a atividade de água no seu ambiente. Assim, microrganismos requerendo uma elevada atividade de água, têm condições para cres-cer e contaminar o alimento, considerado inicialmente microbiologicamente estável.

TemperaturaDe entre os fatores relacionados ao ambi-ente que podem atuar positiva ou negativa-mente, no crescimento dos microrganismos, a temperatura é um dos que mais afetam a viabilidade e a multiplicação microbiana. O crescimento microbiano pode ocorrer num intervalo de temperatura de cerca -8ºC até acima de 100ºC a pressão atmosférica. O

requisito mais importante é a presença de água no estado líquido e disponível para suportar o crescimento. Não há um organis-mo capaz de crescer ao longo de todo este intervalo. Cada organismo apresenta uma

temperatura mínima, ótima e máxima na qual o crescimento pode ocorrer – tempera-turas cardinais - sendo características de um microrganismo, no entanto, estas são influ-enciadas por fatores ambientais como dis-ponibilidade de nutrientes, pH e atividade de água [1].A temperatura, afeta a duração do período de latência de um microrganismo, a velo-cidade de multiplicação, exigências nut-ricionais da célula. O congelamento e refrigeração podem ou não ser letais para determinado organismo, dependendo do próprio organismo, da temperatura e tempo de armazenamento. Sendo que alguns mic-rorganismos, designados extremófilos, per-manecem viáveis durante longos períodos de tempo em alimentos congelados.Na microbiologia alimentar, organismos mesofílicos e psicotróficos são normal-mente de maior importância. Mesofílicos têm uma temperatura ótima de crescimen-to à volta de 37ºC e crescem mais rapida-mente à sua temperatura ótima do que os psicotróficos. Entre os organismos capazes

de crescer a temperaturas baixas, podem-se distinguir dois grupos, os psicotróficos est-ritos que têm temperatura ótima de cresci-mento 12-15ºC, os psicotróficos facultativos

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que crescem igualmente sob temperatu-ras baixas, mas têm temperaturas ótimas e máximas de crescimento mais elevadas. Esta tolerância a um intervalo maior de tempe-raturas significa que os últimos são de ma-ior importância nos alimentos refrigerados, sendo os termófilos de menor importância na microbiologia alimentar.

Atmosfera gasosaOxigénio é o gás mais importante em con-tacto com os alimentos, em circunstâncias normais. A sua presença e a sua influencia no potencial redox são importantes deter-minantes das associações microbianas, que se desenvolvem e da sua taxa de crescimen-to.O efeito inibitório do Dióxido de Carbono, no crescimento microbiano é aplicado na embalagem de alimentos em atmosfera

modificada. O Dióxido de Carbono não é uniforme no seu efei-to nos mic-rorganismos, sendo que, as bactérias g r a m -n e g a t i v a s são mais

sensíveis, as bactérias gram-positivas ten-dem a ser mais resistentes. O efeito inibitório aumenta com a diminuição da temperatura, presumivelmente devido ao aumento da solubilidade do CO2 a baixas temperatu-ras. Alguns microrganismos são mortos por exposição prolongada a CO2, mas usualmen-te o seu efeito é bacteriostático.O mecanismo de inibição pelo CO2 é uma combinação de vários processos, um iden-

tificado é o seu efeito no pH. O dióxido de Carbono dissolve-se na água, produzindo um ácido fraco, o ácido carbónico, o qual, numa solução não tamponada, produz uma apreciável diminuição do pH. Provavelmen-te de maior importância, é a capacidade do CO2 para penetrar a membrana plasmática e acidificar o interior celular. Pensa-se que outras capacidades que o CO2 tem são a mu-dança nas propriedades físicas da membra-na plasmática, afetando o transporte de so-lutos, a inibição de enzimas.

3.4. Fatores Implícitos

São importantes na determinação da natu-reza das associações microbiológicas nos alimentos, e são descritos como fatores implícitos – propriedades dos próprios or-ganismos, como respondem ao ambiente e interagem uns com os outros.O microrganismo com maior taxa de cres-cimento vai dominar com o passar do tem-po, tal facto vai depender, obviamente, das condições prevalentes, alguns fungos podem crescer perfeitamente em alimen-tos frescos, mas crescem mais lentamente do que as bactérias. Em alimentos onde as bactérias de crescimento mais rápido são inibidas por fatores como redução de pH ou atividade da água, os fungos assumem um

papel impor-tante na contaminação [1].

[1]AdamsMR,Moss,M.O.FoodMicobiology:UnivesityofSurrey,U.K.

Queijo contaminada devido à atmosfe-ra gasosa onde se encontrava

Tomate contaminado

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4. ANÁLISE E QUALIDADE DOS ALIMENTOS

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4.1. Flora microbiana dos alimentos frescos

Todos os dias, por todo o mundo, são realizadas em muitos laboratórios, milhares de análises microbiológicas aos alimentos. Os laboratórios de unidades de produção controlam a qu-alidade microbiológica das matérias-primas, a efetividade dos processos de tratamento, pontos de controlo crítico durante a produção assim como a qualidade dos produtos finais.Os alimentos, durante a sua preparação, podem ser contaminados com microrganismos, a menos que o crescimento e o metabolismo desses microrganismos sejam controlados, uma vez que são capazes de alterar as condições dos alimentos, resultando em deterioração. De-vido à diversidade da composição dos alimentos tornam-se possíveis substratos nutritivos para uma variedade de microrganismos. Este conjun-to de substratos, juntamente com a diversidade de atividades metabólicas, sugere grande varie-dade de tipos de deterioração alimentar. Posto isto, é percetível a necessidade de uma análise e controlo de todos os alimentos que a população possa ingerir, pois é do conhecimento geral que a contaminação dos alimentos pode comprometer a saúde pública. Por outro lado, é de salientar, a necessidade de ter em atenção que alguns microrganismos são úteis na preparação de alimentos como é o exemplo de produtos fermentados tais como pic-les e azeitonas. Assim como, há microrganismos que servem como excelentes fontes de proteínas e são suplementados na alimentação de animais.

Os tecidos internos das plantas e dos animais sadios são isentos de microrganismos (este-rilizados), porém as suas superfícies são contaminadas com muitos tipos de micróbios. A proporção da contaminação é o reflexo das seguintes condições: a condição do produto em bruto; a população microbiana do ambiente do qual é retirado o alimento; o método de manipulação e armazenamento.

CarneA carcaça de um animal abatido, para alimentação, mantida em refrigeração, e posteriormente cortada, tem a sua superfície contaminada com microrganis-mos específicos do ambiente e dos instru-mentos (serras e facas) utilizados no corte da carne. A quantidade de microrganismos

aumenta no tecido exposto a cada nova superfície resultante de novos cortes. Na contaminação da carne podemos encontrar: pseudomonas, os estafilococos, os microco-cos, os enterecocos e os coliformes.

Aves As aves, recentemente mortas e depenadas, têm uma flora bacteriana superficial (pele) que se origina dos microrganismos presen-tes, habitualmente, nas aves vivas e dos pro-

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cessos do manuseamento durante o abate destas. A contagem bacteriana, em boas condições sanitárias, ronda os 100 a 1000 microrganismos por centímetro quad-rado, contudo em condições precárias estes valores são 100 vezes mais elevados. Os principais contami-nantes das aves são as pseudomonas.

OvosDe um modo geral o interior do ovo, recentemente posto, é isento de microrganismos. Todavia, posteriormente, o seu conteúdo microbiano é determinado pelas condições sob as quais os ovos serão manuseados e armazenados (temperatura e humidade). Os microrganismos, especificamente as bactérias e bolores entram nos ovos através de fraturas que possam existir na casca.

Frutas e vegetais As frutas e os vegetais são, por norma, muito passíveis de infeções bacterianas, fúngicas e virais. Os fatores que contribuem para a contaminação das frutas e dos vegetais são: as diversas fases do desenvolvimento destas, isto é, quanto mais extenso o tecido invadido maior a possibilidade de deterioração e a manipulação durante e após colheita (a colheita mecânica revela a uma maior invasão dos microrganismos). Devido ao facto de o pH da fruta ser relativamente ácido restringe o crescimento bacteriano, mas não retarda o

desenvolvimento de fungos. Por outro lado, a variação do pH dos vegetais é maior, o que reflete uma maior suscetibilidade ao ataque bacteriano.

Peixes e moluscos A qualidade microbiana da água irá refle-tir, de um modo geral, a flora microbiana do marisco e pei-xes recentemen-te capturados. É de salientar a importância que há em saber se a água é poluída por esgotos uma vez que estes são capazes de transmitir diversos agentes patogénicos.

Os tecidos inter-nos das plantas e dos animais sadios são isentos de mic-rorganismos (este-rilizados), porém as suas superfícies são contaminadas

com muitos tipos de micróbios. A proporção da contaminação é o reflexo das seguintes condições: a condição do produto em bru-to; a população microbiana do ambiente da qual é retirado o alimento; o método de manipulação e armazenamento.

4.2. Exame microbiológico O exame microbiológico dos alimentos pode fornecer informações relativas à qualidade da matéria-prima e às condições sanitárias sob as quais houve o processamento do ali-

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mento, assim como à eficácia do método de preservação. No caso de alimentos deteriorados, é possível identificar o agente responsável

pelo fenómeno; tendo descoberto o agen-te, pode ser possível traçar a fonte de contaminação e as condições que permi-tiram a ocorrência da deterioração. Como consequência, podem ser instituídas medi-das capazes de prevenir outras degradações. O tipo de exame realizado é determinado

pelo tipo de produto alimentar a ser analisa-do, assim como pelo objetivo do exame. Por exemplo, uma alimento que está a ser ana-lisado, por uma possível contaminação pelo Clostridium botulinum deve ser submetido a testes laboratoriais diferentes daqueles a que está a ser sujeito um alimento no qual se suspeita a presença de coliformes.

O aumento significativo de doenças causa-das através da contaminação de alimentos, tornou imprescindível o desenvolvimento de métodos, mais rápidos e confiáveis, para a determinação da qualidade alimentar.

4.3. Controlo da qualidade

Nos dias de hoje, o volume considerável de produtos tratados pelas empresas de alimentos, as múltiplas manipulações e transformações a que são submetidos, bem como os prazos prolongados antes do seu consumo, exigem um bom controlo da qualidade microbiológica dos alimentos. Apresenta-se dois aspetos: - a qualidade sanitária, que reflete a hi-giene que circunda o preparo dos alimentos e as condições de armazenamento; uma boa qualidade sanitária permite reduzir os riscos de potenciais intoxicações alimentares. - a qualidade comercial, que visa prin-cipalmente o controlo da flora de alteração para uma conservação prolongada do pro-duto. As autoridades governamentais, responsáveis pela proteção da saúde pública, preocupam-se mais com a qualida-de sanitária dos produtos colocados no mer-cado, enquanto a indústria alimentar está mais atenta aos dois aspetos da qualidade microbiológica. Para atingir este obje-tivo, as grandes empresas do ramo alimentar tiveram que adotar e mel-horar progressiva-mente as técnicas de controlo de qu-alidade, em parale-lo com os progressos realizados nas técnicas de transformação.

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4.3.1. Responsabilidades

Responsabilidades GovernamentaisAs autoridades governamentais de cada país estabeleceram um determinado número de leis e de regulamentos aos quais estão submetidos todos os estabelecimentos onde são manipulados alimentos. Estes estabelecimentos estão submetidos, regularmente, a visitas de inspeção que controlam a conformidade bem como a salubridade dos locais e dos utensílios de trabalho, verificando também, as temperaturas de armazenamento e as práticas de manuseamento dos alimentos. Durante estas inspeções há a recolha de amost-ras de determinados produtos para a sua análise assim como a condução de inquéritos devido a queixas públicas ou em resposta à ocorrência de infeções alimentares. Os serviços governamentais têm autoridade legal para fechar estabelecimentos alimentares julgados insalubres.

Responsabilidades das EmpresasPara controlar a qualidade microbiológica dos produtos alimentares, uma empresa deve essencialmente: - reduzir ao máximo o nível de contaminação do produto acabado assegurando- se da boa qualidade das matérias-primas e vigiando de perto as fontes de contaminação ao longo da cadeia de fabricação; - dar ao produto uma proteção intrínseca contra a proliferação dos germes presentes inicialmente. A instalação de um plano de controlo de qualidade de uma produção começa pela construção do diagrama de fabricação do produto para determinar os pontos críticos de controlo que devem ser objeto de verificação especial, de ordem físico-química (tempera-

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4.4. Análise microbiológica

A análise microbiológica dos alimentos res-ponde a dois objetivos: - Controlar a qualidade microbiológica geral dos géneros alimentares. Efetuar tes-tes para verificar o alcance da contaminação dos alimentos, higiene que envolve a sua manipulação, as condições de armazena-mento e salubridade. - Detetar a presença de microrganis-mos patogénicos ou de toxinas suscetíveis de causarem intoxicações alimentares. A análise microbiológica tornou-se um ins-trumento indispensável no domínio e no controlo da salubridade dos alimentos no nosso mundo moderno. Contudo, não obs-tante o interesse considerável em conhecer a composição e a evolução da flora microbi-ana nos alimentos, é necessário estar cons-ciente das dificuldades que restringem a utilização destas análises ou que limitam a interpretação dos resultados: - Os microrganismos estão raramente distribuídos de forma homogénea num ali-mento; - Os produtos alimentares compor-tam, geralmente, uma flora microbiana mui-to diversificada; - Os resultados das análises são tributários dos modos de amostragem e dos métodos de análise. A avaliação quantitati-va da flora de superfície de uma carcaça de

carne, por exemplo, fornecerá resultados di-ferentes se a colheita das amostras tiver sido realizado por raspagem; - Nenhuma análise permite verificar, na sua totalidade, a flora presente, o que li-mita o alcance da informação obtida; - O custo significativo das análises e os prazos de vários dias para a obtenção dos resultados limitam consideravelmente o emprego destes métodos. Mesmo com todas estas limitações, as análises microbiológicas dos alimentos for-necem dados valiosos e trata-se, de qualqu-

er modo, da única abordagem eficaz que se possui atualmente. Para reduzir a imprecisão dos resultados do ponto de vista quantita-

tura, pH,…) ou microbiológica. Deve ser dada uma atenção especial à verificação da quali-dade microbiológica das matérias-primas, porque a presença de ingredientes muito conta-minados exerce uma forte pressão microbiana em toda a cadeia de fabricação. A título de exemplo, uma empresa que fabrica pizas congeladas prontas a serem cozinhadas. A partir do diagrama desta fabricação estabelece-se um plano de controlo nos pontos críticos. Gra-ças a estes diferentes pontos de controlo, se os limites microbiológicos do produto aca-bado forem ultrapassados, poderá ser feita uma correção rapidamente. A longo prazo, é do interesse das próprias empresas de alimentação terem um bom controlo da qualidade microbiológica dos seus produtos porque a perda de confiança dos consumidores significa mais cedo ou mais tarde um fracasso comercial.

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tivo, temos que respeitar escrupulosamen-te a planificação da amostragem, realizar as análises o mais rápido possível e aplicar métodos apropriados ao tipo de produto.

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5. ALIMENTOS PRODUZIDOS POR AÇÃO DE MICRORGANISMOS

Alimentos produzidos por S. cerevisiae

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Existe uma enorme diversidade de alimentos, onde a atividade microbiana é uma característica essencial na sua produção. Os alimentos fermentados, foram descobertos quase sem exceção, antes da humanidade ter algum conhecimento sobre microrganis-mos. Apenas se aperceberam que o armazenamento de alguns alimentos efetuava mudan-ças desejáveis nas suas características. Originalmente, a mais importante destas mudan-ças deverá ter sido um aumento no tempo de vida e segurança dos alimentos. Este facto tornou-se menos importante no mundo industrializado, com o aparecimento de métodos alternativos de preservação, tais como enlatar, congelar e refrigerar. Na fermentação de alimentos, as condições de tratamento e armazenamento, produzem um ambiente no qual certos tipos de organismos podem crescer e terem um efeito benig-no nos alimentos, ao invés de os estragarem. A maioria dos alimentos fermentados é pro-duzida pela atividade de bactérias acido-láticas e fungos, principalmente leveduras, mas também por bolores, embora em menor escala. Ambos os grupos de organismos partilham um nicho ecológico, estando aptos a crescerem sob condições de baixo pH e atividade de água; contudo, apenas bactérias acido-láticas e leveduras facultativas irão prosperar em condições anaeróbias. Como consequência, estas ocorrem frequentemente juntas, em ali-mentos fermentados, sendo que em alguns casos, membros de ambos os grupos agem em conjunto para produzir um produto e, noutros casos, um grupo tem o papel de organismo deteriorador [1].

5.1. Alguns exemplos de alimentos produzidos por ação de microrganismos

A cerveja é uma bebida produzida pela fermentação de cereais, levada a cabo por levedu-ras, em que os açúcares são transformados em álcool [2]. O processo de produção de cerve-ja inicia-se com a maltagem, onde os grãos de cereal são sujeitos à molha, germinação e se-cagem, sendo a duração desta última que confere a cor à cerveja [1]. Numa etapa seguinte faz-se a moagem, onde o malte é moído, de seguida a mosturação, onde é adicionada água ao malte e se eleva a temperatura, formando-se assim, uma solução açucarada, designada mosto. Adiciona-se o lúpulo que confere diversos aromas e sabor amargo à cerveja, e possui compostos que apresentam um efeito antibiótico moderado, favorecendo a atividade da leve-dura de cerveja em relação a organismos menos dese-jados durante a fermentação. De seguida, dá-se a fervu-ra, pasteurizando o mosto, e o arrefecimento até uma temperatura favorável à fermentação. Na fermentação alcoólica as leveduras Saccharomyces sp. convertem o açúcar do mosto, em etanol e dióxido de carbono [3].

Para preparar o vinho necessitamos de colher e esmagar as uvas. A partir do esmagamento da uva, num processo

[1]AdamsMR,Moss,M.O.FoodMicobiology:UnivesityofSurrey,U.K.[2]http://www.members.tripod.com/emersonam/cerveja.html[3]JayJ.M.,LoessnerM.J.,GoldenD.A.,2001,ModernFoodMicrobiology,Springer,7ªEdição,pp.182-183

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Etapasdaproduçãodevinho

natural, as leveduras que existem naturalmente na superfície dos bagos desta, misturam-se com o sumo, iniciando a fermentação. A fermentação alcoólica do vinho é um processo anaeróbio, que consiste na oxidação de açúcares (geralmente glucose) com a produção de álcool etílico e dióxido de carbono. Este último liberta-se na forma gasosa, produzindo a efervescência do vinho em fermentação. No vinho, a levedura Saccharomyces cerevisiae, entre outras, realiza a fermentação. A temperatura e o teor de açúcar do mosto influenciam muito a duração da fermentação. Após esta fermentação, o vinho deve ser submetido a uma fermentação malolática destinada a reduzir a sua a acidez. Bactérias láticas realizam esta fermentação, durante a qual o ácido málico (responsável pela acidez do vinho) é con-vertido em ácido lático. Uma vez que o ácido málico é duas vezes mais ácido do que o ácido lático, esta transformação suaviza o vinho [1]. Seguidamente o vinho é colocado em barris com um ambiente anaeróbio, não propício aos microrganismos aeróbios deterioradores deste.

[1]AdamsMR,Moss,M.O.FoodMicobiology:UnivesityofSurrey,U.K.

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O iogurte é um produto da fermentação lática, sendo que esta é normalmente utilizada para aumentar o período de validade do leite, devido à formação durante este pro-cesso de substâncias que inibem bactérias responsáveis pela deterioração do produto. Na produção de iogurte, normalmente utiliza-se uma cultura mista de Lactobacil-lus bulgaricus e Streptococcus thermophilus [4]. O Lacto-bacillus bulgaricus é uma bactéria que decompõe a lac-tose, fermentando o leite e produzindo acetaldeído, que

confere odor ao iogurte. Por sua vez, a outra bactéria (Streptococcus thermophilus) trabalha simbioticamente com o Lactobacillus bulgaricus, ambas produzindo ácido lático, dióxido de carbono e álcool. Estas duas espécies usam a lactose para os seus processos metabólicos e fornecem ácido lático ao meio, diminuindo o seu pH, desnaturando as proteínas. Nestas condições, o leite coagula, ou seja, o leite assume uma estrutura mais sólida, o coalhado, resultando o iogurte [1].

O queijo é um produto resultante da coagulação das proteínas do leite. Inicialmente faz-se um tratamento do leite pelo calor. Seguidamente inocula-se com microrganismos, como bactérias láticas, que fermentam o açúcar do leite, a lactose, a ácido lático e adição de renina (proteína extraída do abdómen de bovinos) que permite a produção de uma massa mais compacta. Faz-se o cozimento, por forma a haver uma maior libertação de soro e segue-se a separação des-te da restante massa. Salga-se o queijo, para lhe dar o sabor desejado e controlar a flora microbiana do mesmo; poste-riormente efetua-se a prensagem, que completa o desso-ramento por eliminação forçada do soro. Depois realiza-se o processo de cura, etapa onde há uma elevada atividade enzimática, por ação de diferentes enzimas dos microrganis-mos. Estes microrganismos compreendem bactérias láticas e outras, assim como fungos e leveduras que crescem no interior ou exterior queijo e que provocam alterações no aroma, sabor, e características dos mesmos [1].

Na produção do pão é preparada uma mistura constituída por farinha, levedura, água e cloreto de sódio. Seguidamente inicia-se a fermentação; a levedura comummente utilizada neste processo é Saccharomyces cerevisiae e a sua função consiste em aumentar o volume da massa (devido à libertação de CO2 resultante da fermentação de hidratos de carbono), além de também exercer influência sobre as propriedades reológicas da massa, contribu-indo para o aroma e paladar da mesma [5]. Segue-se um processo de repouso, no qual o CO2 produzido, se vai acumulando dentro da massa, e se o glúten tiver a “força” necessária para o reter, este acumula-se na massa que se vai expandindo, dada a sua elasticidade. Pos-

[1]AdamsMR,Moss,M.O.FoodMicobiology:UnivesityofSurrey,U.K.[4]Lacasse,D,IntroduçãoàMicrobiologiaAlimentar,InstitutoPiaget,1995[5]http://www.revista-fi.com/materias/114.pdf

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teriormente divide-se a massa em porções, libertando-se algum do CO2, aquando deste processo, molda-se a massa e procede-se à sua cozedura. Durante o processo de cozedura, as elevadas temperaturas levam à mor-te das leveduras, evaporação do álcool; à formação de alvéolos no miolo do pão e à formação da crosta [6] sa-bor, e características dos mesmos [1].

A produção de vegetais fermentados, como é o caso do Chucrute (Sauerkraut), é conduzida por bactérias láticas. Uma vez que o ácido lático atua como agente de preservação, este processo é utilizado como forma de preservação. Para a produção deste alimento, são utilizadas folhas de couves cortadas em tiras muito finas, aumentando-se assim a área superficial de contacto com as bactérias [1; 2]. Estas são colocadas em recipientes, em condições de anaerobiose, onde é adicionado sal até à concentração final de 2-2,5 % (p/v). O processo fermentativo é levado a cabo pelas bactérias pre-

sentes na flora das folhas das couves, formando ácido lático (fermentação lática). A bactéria Le-uconostoc mesenteroides está predominante-mente envolvida no início desta fermentação, formando-se acido lático, etanol e CO2, levando à diminuição do pH, que por sua vez inibe o crescimento desta bactéria; outras bactérias continuam o processo fermentativo como Lactobacil-lus plantarum, Lactobacillus brevis e Pediococcus cerevisiae, até ser atin-gida uma acidez de 2-2,5. Este processo fermentativo requer cerca de 20 dias à temperatura de 20°C até estar completo e haver produção de chucrute [3].

[6]http://www.cienciaviva.pt/projectos/pollen/sessao6pao.pdf[1]AdamsMR,Moss,M.O.FoodMicobiology:UnivesityofSurrey,U.K.[2]http://www.fao.org/docrep/x0560e/x0560e10.htm[3]http://www.splammo.net/foodapplmicro/applkraut.html-ArtigoHoffmann,2001,Fatoreslimitantesàproliferaçãodemicror-ganismosemalimentos,Brasilalimentos,n.º9,pp23-3

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6. CONSERVAÇÃO DE ALIMENTOS

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6.1. Conservação pelo calor

Louis Pasteur

Uma das principais preocupações da humanidade, no passado, foi prolongar a conservação dos produtos alimentares após a sua colheita de forma a assegurar uma maior durabilida-de deste. Até ao início do séc. XIX, os meios aplicados eram muito limitados o mais usual, daquele tempo, era a ação protetora do sal, porém, existiam outros como secar e defumar determinados produtos como peixe e a carne. Estes precoces métodos estavam sempre de-pendentes da qualidade das colheitas, e estas dependentes das estações e das condições dos locais.Nos dias de hoje esta situação alterou-se por completo. Os vários métodos de conservação e os meios de transporte modernos possibilitam a circulação dos produtos alimentares numa vasta rede de distribuição não só a nível nacional mas também internacional. Os métodos de conservação utilizados propõem-se retardar ou impedir a deterioração dos alimentos, assim como preservar ao máximo as qualidades nutricionais. Posto isto, pode-mos então dizer que os métodos de conservação têm como objetivo evitar as alterações nos alimentos com qualidades nutritivas e principalmente isentos de microrganismos patogénicos. Isto é, de um modo mais específico, minimizar as alterações dos alimentos; aumentar “a vida de prateleira” do produto; propiciar a preservação das qualidades dos ali-mentos e oferecer produtos de elevado valor nutricional para o consumo humano.

Este tipo de conservação é, hoje em dia, de elevada importância pois permite uma conservação de longa duração. Consiste em tratar os alimentos a elevadas temperaturas o que provoca a destruição da maioria, ou da totalidade, dos microrganismos suscetíveis de alterarem os produtos.

Pasteurização É o nome dado ao tratamento térmico moderado, normal-mente com temperaturas inferiores a 100°C. Isto permite a destruição da maioria dos microrganismos, dentre os quais os patogénicos. A contribuição da pasteurização para a durabili-dade pode ser pequena, particularmente, se o alimento paste-urizado não possui outros fatores de conservação. Os organismos termorresistentes podem sobreviver às tempe-raturas de pasteurização, crescendo e deteriorando o produto rapidamente a temperaturas ambientais, sendo a refrigeração um requerimento adicional para uma durabilidade aceitável. Outro aspeto menos aceitável deste tratamento é o facto de que nem todos os alimentos podem ser conservados sem perdas a nível do sabor e da qualidade nutritiva.

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Nicolas Appert

Esterilização Tratamento térmico igual ou superior a 100°C de forma a ga-rantir a destruição total dos microrganismos de alteração. Esta exposição dos alimentos a altas temperaturas pode ser feita du-rante um longo período de tempo, como no caso de comida en-latada, ou muito curto alimentos líquidos em embalagens longa-vida, por exemplo. Foi desenvolvida inicialmente pelo confeiteiro francês Nicolas Appert (por isso o processo de esterilização de alimentos levar o nome de “apertização”).

A apertização deve o seu nome ao inventor do procedimento original de esterilização dos alimentos, Nicolas Appert. Este francês desenvolveu a sua técnica de conservação por volta de 1809, aquando de um concurso lançado pelo imperador Napoleão depois da sua desastrosa campanha da Rússia. O método de Appert consiste em dispor os alimentos em re-cipientes de vidro com fecho hermético e mergulhá-los em seguida em água levada à ebulição. A duração do aquecimento varia segundo o tipo de alimento que se pretende esterilizar. Appert publica em 1810 O livro de todos os lares, ou a Arte de conservar durante vários anos todas as substâncias animais ou vegetais. Nele descreve minuciosamente todas as etapas a serem seguidas para pôr em conserva diferentes categorias de alimentos. O seu método marca o começo da indústria das conservas. Em 1819, um inglês, Peter Durand, concebe um tipo de recipiente menos dispendioso: uma lata de conserva metálica formada por uma folha de aço dobrada e soldada. A invenção é melhorada em 1839 pela colocação de uma fina camada de estanho sobre a folha de aço para reduzir os riscos de corrosão. A lata de conserva assume o seu aspecto moderno em 1908 quando um engenhoso sistema de fecho permite eliminar a necessidade de soldadura. O método de Appert foi utilizado com bastante fidelidade até 1872, ano em que um americano, A.K. Shiver, desenvolve um aparelho que permite aquecer as latas de conserva sob uma pressão de vapor. Sendo a tempe-ratura obtida superior a 100ºC, a duração do tratamento térmico pode ser reduzida. A autoclave moderna utilizada nas indústrias de conservas é inspirada neste aparelho. Embora Louis Pasteur tenha demonstrado em 1860 que os microrganis-mos eram responsáveis pelas fermentações, a indústria de conserva só fez a ligação entre as bactérias e a alteração dos alimentos em 1895, ou seja, quase um século depois da invenção de Nicolas Appert.

Curiosidade

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6.2. Conservação pelo frio

Hoje em dia, a conservação pelo frio é uma das mais utilizadas pelos consumidores. Como já foi mencionado, a temperatura é um dos fatores ambientais que mais afeta a atividade e o crescimento dos microrganis-mos. Enquanto na conservação pelo calor é referenciada a morte de microrganismos e inativação de enzimas, na conservação pelo frio os fatores que controlamos são a proliferação microbiana e reações químicas, como as reações enzimáticas. Como é do conhecimento geral, existem microrganis-mos que podem estar presentes nos ali-mentos em contagens toleráveis, isto é, de-pendendo do tipo de alimento e do tipo de microrganismo, podemos consumi-lo com certa carga microbiológica sem perdas a nível da qualidade do alimento e da saúde pública. Posto isto, podemos mencionar, como obje-tivos da conservação em frio: - inibir ou retardar a atividade enzimática; - retardar o crescimento dos micror-ganismos.

Refrigeração Para que haja refrigeração é necessário colo-car os alimentos a temperaturas situadas li-geiramente acima do ponto de congelação, ou seja, aproximadamente entre os 0ºC e 7ºC. Neste tipo de conservação os impactos sobre as propriedades nutricionais são mais ligeiras, mas o tempo de conservação é me-nor.

Congelamento A congelação é um procedimento de conservação de alimentos pelo frio que visa a interromper por completo o cresci-mento e a atividade de todos os microrga-

nismos. Através deste método o tempo de conservação é maior, porém para o congela-mento ser eficaz é necessário temperaturas inferiores a -18°C. Existem microrganismos que ainda podem crescer a temperaturas de -10°C o que conduz um perigo para o con-gelamento mal monitorizado.

6.3. Conservação por aditivos alimenta-res

Um aditivo alimentar é uma substância química “estranha” incorporada num alimen-to, normalmente em pequena quantidade, com a finalidade de melhor a textura, cor, sabor ou prevenir a sua deterioração. Os aditivos utilizados com o objetivo de pro-longar a conservação dos alimentos são cha-mados de agentes químicos de conservação ou conservantes químicos. O uso destes con-servantes tem como finalidade a inibição do crescimento e da atividade microbiana. Os agentes de conservação podem prejudicar as trocas celulares dos microrganismos, a atividade das suas enzimas, os mecanismos de reprodução e modificar as condições físico-químicas do meio, tornando-o menos favorável ao desenvolvimento microbiano. Um bom agente químico de conservação deve, teoricamente: - agir sobre um grande número de microrganismos; -não ser toxico para o consumidor; -estar uniformemente distribuído no alimento; -ser eficaz em pequenas doses; -não modificar as qualidades dos ali-mentos -não mascarar a má qualidade se o produto a tiver. Os conservantes químicos são geralmen-te utilizados como complemento a outros métodos de conservação. Esta associação

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6.4. Conservação por irradiação

Quadro4:Principaisutilizaçõesdasradiaçõesionizantes

A conservação por irradiação é ainda pouco utilizada, o principal obstáculo provém dosconsumidores serem muito reticentes ao aceitar esta técnica. Contudo, quando bemcontroladaecombinadacomoutrosmétodosdeconservação,airradiaçãopodeserbastanteútilnoquesereferea:-destruirosmicrorganismos;-retardaragerminaçãodecertoslegumes;-destruirinsetoseparasitas;-retardaramaturaçãodecertosfrutoselegumes.Naverdade,quandoirradiamososalimentos,estamosasubmetê-losadosesminuciosamentecontroladasdeumaradiaçãoparticular,aradiaçãoionizante.

permite reduzir ao mesmo tempo as per-das alimentares e os riscos sanitários liga-dos ao consumo excessivo de conservan-tes. Existem conservantes químicos, como o sal, açúcar, vinagre e o álcool, que eram

utilizados desde os primórdios da conservação alimentar.

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6.5. Conservação por desidratação ou se-cagem

No processo de desidratação e secagem procura-se remover ou diminuir a quantida-de de água, por evaporação ou sublimação, nos alimentos. Como esta é essencial para que haja vida, os microrganismos tornam-se inativos evitando assim que sejam cria-das as condições propícias para o desenvol-vimento destes. É ainda de salientar que o baixo teor de água desacelera a maioria das reações químicas e enzimáticas de alteração. Posto isto, um alimento suficientemente seco pode conservar-se com mais facilidade, mesmo que este esteja à temperatura ambi-ente. A dinâmica básica deste processo consiste em colocar o produto num local onde haja a passagem de um volume de ar seco e quen-te. Assim, o produto é aquecido o que pro-

move a transferência de humidade para o ar. 6.6. Conservação por defumação

A defumação dos alimentos, já desde os tempos imemoriais, era praticada principal-mente no que se refere à carne e ao peixe. Hoje em dia, a defumação é utilizada, prin-cipalmente, pelo sabor especial que confere aos alimentos. A fumaça resultante da queima da madei-ra contém compostos químicos formados durante o processo que destroem e ini-bem o crescimento dos microrganismos. A exposição do alimento a altas temperaturas tem um papel crucial uma vez que diminui o teor de água. Ocorre ainda a formação de uma “casca” externa que tem uma proteção isoladora, dificultando a entrada de conta-minantes.

6.7. Conservação por atmosfera modificada Oambienteemqueosalimentosseencontramtemmuitainfluêncianacomposiçãoede-senvolvimentodafloramicrobianaenarapidezcomquepodemsurgirosfenómenoscomoamaturaçãodefrutaselegumes.Aalteraçãodacomposiçãodomeioambientepodeprolon-garotempodeconservaçãodosalimentos,semquehajaperdadequalidade,reduzindoasconcentraçõesdeconservantesouaintensidadedostratamentostérmicos.

Armazenamento em atmosfera controlada Consiste na alteração da atmosfera seguida de um controlo continuado durante todo operíododearmazenamento.Asconcentraçõesgasosasótimasdeconservaçãovariamcomotipodeprodutos.Paraafrutaelegumesfrescospodemosterumaatmosfera:

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Armazenamento sob atmosfera modificadaEsta técnica consisteemexpulsaro ardo interiordasembalagense substituí-loporumacomposiçãogasosafavorávelaoalimentoaconservar.Namaiorpartedoscasosestanovacomposiçãoéricaemdióxidodecarbono. Armazenamento em vácuoConsiste na extração do ar das embalagens. Logo, este processo torna-se bastantecomplicado,umavezqueéimpossívelcriarumvácuototaldevidoàatividaderespiratóriadafloramicrobianaqueabsorveooxigéniosubstituindo-opordióxidodecarbono.Geralmentesão utilizadas embalagens retráteis que garantem umamaior impermeabilidade. Carnes,salsichas,queijoseprodutosdepastelariasãoexemplosdealimentosmantidosemvácuo.

6.8. Conservação por fermentação

Aconservaçãoporfermentaçãobaseia-senaincompatibilidadeentreasespéciesmicrobia-nas,emqueumaoumaisespéciesinibemasoutras,pormeiodecompetiçãopornutrientesenaproduçãodemetabólitosantimicrobianos.Estesmetabólitoscomoosácidosorgânicos,álcooiseCO2inibemodesenvolvimentodeoutrosmicrorganismosquepodemdeteriorarosalimentos. A fermentação necessita, em alguns casos, demétodos complementares de conservaçãocomoapasteurização,nocasodacerveja,enocasodelaticínioshánecessidadedearmaze-namentoemrefrigeração.

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7. INTOXICAÇÕES ALIMENTARES

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Curiosidades Exemplos de intoxicações alimentares:

Botulismo (Clostridium botulinum)

Enterite associada à Campylobacter

Intoxicação alimentar, ou gastrintestinal, é um problema de saúde causado pela ingestão de água ou alimentos contaminados por bactérias (Salmonella, Shigella, E.coli, Staphi-lococus, Clostridium), vírus (Rotavírus) ou pelas suas respetivas toxinas, ou ainda por fun-gos ou por componentes tóxicos encontrados em certos vegetais e produtos químicos. A contaminação pode ocorrer durante a manipulação, preparação, conservação e/ou ar-mazenamento dos alimentos. É mais frequente após o indivíduo comer em piqueniques, refeitórios, grandes eventos sociais ou restaurantes e, nestes casos, pode afetar um número significativo de pessoas.As intoxicações alimentares nas crianças, nos idosos e em mulheres que estejam a ama-mentar podem traduzir-se numa doença grave, assim como em pessoas que apresentam alguma patologia séria (doença renal ou diabetes), pessoas com o sistema imunológico de-bilitado ou até pessoas que viajam por regiões onde haja mais exposição a micróbios que poderão provocar intoxicações alimentares. A intoxicação alimentar geralmente ocorre devido à ingestão de alimentos preparados sem técnicas adequadas de higiene das mãos, ou com recursos a utensílios, tábuas de cortar ou outros itens sujos, ou ainda laticínios ou alimentos que contêm maionese que foram man-tidos fora da frigorífico durante muito tempo, alimentos congelados ou refrigerados que não foram armazenados na temperatura adequada ou não foram reaquecidos de forma apropriada, peixe cru ou ostra, frutas ou vegetais crus que não foram bem lavados, vegetais crus ou sucos de fruta e laticínios, carne ou ovos mal cozidos, água de poço, rio ou de uma região sem tratamento.

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Cólera Intoxicaçãoporpeixecontaminado

Listeria Staphylococcus aureus

Salmonella Shigella

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8. GLOSSÁRIO

dá uma indicação segura do conteúdo de água livre do alimento, sendo esta a única forma de água utilizada por parte dos microrga-nismos.

só realizam a fermentação se não tiverem O2. Na presença deste, realizam a respiração.

mede a concentração do ião Hidrogénio numa solução, numa escala de 0 a 14, que mede a acidez (<7), a neutralidade (=7) ou a alcalinidade (>7) dessa solução.

ocorre como resultado de uma transferência de eletrões entre átomos ou moléculas. A tendência de um meio para aceitar ou doar eletrões, para oxidar ou reduzir, é determinada pelo seu potencial redox. Se o balanço dos vários pares redox presentes favorecer o es-tado oxidado, então irá haver uma tendência para aceitar eletrões, criando um ambiente oxidante. Se o balanço é reverso, vai haver uma tendência para doar eletrões, criando um ambiente redutor.

Atividade da água

Leveduras facultativas

pH

Reação de oxidação-redução (redox)

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9. REFERÊNCIASAdams,M.R.-Foodmicrobiology.Cambridge:TheRoyalSocietyofChemistry,imp.1999.

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http://www.minhavida.com.br/saude/temas/intoxicacao-alimentar

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