metodos basicos da analise de estruturas luiz fernando martha - livro completo

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MÉTODOS BÁSICOS DA ANÁLISE DE ESTRUTURAS Luiz Fernando Martha Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio Departamento de Engenharia Civil Rua Marquês de São Vicente, 225 - Gávea CEP 22453-900 – Rio de Janeiro, RJ Tel.: (21) 3114-1190 – Fax: (21) 3114-1195 E-mail: [email protected] URL: http://www.tecgraf.puc-rio.br/~lfm

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  1. 1. MTODOS BSICOS DA ANLISE DE ESTRUTURAS Luiz Fernando Martha Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro PUC-Rio Departamento de Engenharia Civil Rua Marqus de So Vicente, 225 - Gvea CEP 22453-900 Rio de Janeiro, RJ Tel.: (21) 3114-1190 Fax: (21) 3114-1195 E-mail: [email protected] URL: http://www.tecgraf.puc-rio.br/~lfm
  2. 2. Sumrio 1. INTRODUO................................................................................................................1 1.1. Breve histrico sobre a Engenharia Estrutural.....................................................2 1.2. Anlise estrutural .....................................................................................................3 1.2.1. Modelo estrutural..............................................................................................4 1.2.2. Modelo discreto .................................................................................................6 1.2.3. Modelo computacional...................................................................................10 1.3. Organizao dos captulos ....................................................................................11 2. CONCEITOS BSICOS DE ANLISE ESTRUTURAL............................................13 2.1. Classificao de estruturas reticuladas................................................................13 2.2. Condies bsicas da anlise estrutural..............................................................18 2.2.1. Condies de equilbrio..................................................................................19 2.2.2. Condies de compatibilidade entre deslocamentos e deformaes .......21 2.2.3. Leis constitutivas dos materiais.....................................................................22 2.3. Mtodos bsicos da anlise estrutural.................................................................24 2.3.1. Mtodo das Foras...........................................................................................25 2.3.2. Mtodo dos Deslocamentos ...........................................................................28 2.3.3. Comparao entre o Mtodo das Foras e o Mtodo dos Deslocamentos .................................................................................................31 2.4. Comportamento linear e superposio de efeitos..............................................32 2.5. Estruturas estaticamente determinadas e indeterminadas...............................39 2.6. Determinao do grau de hiperestaticidade.......................................................44 3. IDEALIZAO DO COMPORTAMENTO DE BARRAS.......................................49 3.1. Relaes entre deslocamentos e deformaes em barras..................................49 3.1.1. Deformaes axiais..........................................................................................51 3.1.2. Deformaes normais por flexo...................................................................52 3.1.3. Distores por efeito cortante ........................................................................53 3.1.4. Distores por toro ......................................................................................54 3.2. Relaes diferenciais de equilbrio em barras ....................................................55 3.3. Equilbrio entre tenses e esforos internos........................................................56 3.4. Deslocamentos relativos internos.........................................................................59 3.4.1. Deslocamento axial relativo interno provocado por esforo normal .......59 3.4.2. Rotao relativa interna provocada por momento fletor...........................60 3.4.3. Deslocamento transversal relativo interno provocado por esforo cortante .............................................................................................................61 3.4.4. Rotao relativa interna provocada por momento toror 61 3.5. Equao de Navier para o comportamento flexo..........................................62 3.6. Comparao entre vigas isostticas e hiperestticas .........................................63 3.7. A essncia da anlise de estruturas reticuladas .................................................65
  3. 3. Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha 4. SOLUES FUNDAMENTAIS ..................................................................................69 4.1. Traado do diagrama de momentos fletores ......................................................69 4.2. Energia de deformao e princpio da conservao de energia.......................73 4.3. Princpio dos trabalhos virtuais............................................................................78 4.3.1. Princpio das foras virtuais...........................................................................79 4.3.2. Princpio dos deslocamentos virtuais...........................................................95 4.3.3. Teoremas de reciprocidade..........................................................................102 4.4. Solues fundamentais para barras isoladas....................................................104 4.4.1. Funes de forma para configuraes deformadas elementares de barras de prticos planos..............................................................................105 4.4.2. Coeficientes de rigidez de barra de prtico plano ....................................108 4.4.3. Coeficientes de rigidez toro de barra...................................................118 4.4.4. Reaes de engastamento de barra para solicitaes externas................120 5. MTODO DAS FORAS ...........................................................................................129 5.1. Metodologia de anlise pelo Mtodo das Foras.............................................129 5.1.1. Hiperestticos e Sistema Principal ..............................................................130 5.1.2. Restabelecimento das condies de compatibilidade...............................132 5.1.3. Determinao dos esforos internos ...........................................................136 5.2. Matriz de flexibilidade e vetor dos termos de carga .......................................138 5.3. Escolha do Sistema Principal para uma viga contnua ...................................139 5.3.1. Sistema Principal obtido por eliminao de apoios..................................140 5.3.2. Sistema Principal obtido por introduo de rtulas internas.................150 5.4. Escolha do Sistema Principal para um quadro fechado..................................154 5.4.1. Sistema Principal obtido por corte de uma seo .....................................155 5.4.2. Sistema Principal obtido por introduo de rtulas.................................158 5.5. Exemplos de soluo pelo Mtodo das Foras.................................................161 6. MTODO DOS DESLOCAMENTOS .......................................................................193 6.1. Deslocabilidades e Sistema Hipergeomtrico ..................................................193 6.2. Metodologia de anlise pelo Mtodo dos Deslocamentos..............................196 6.3. Matriz de rigidez global e vetor dos termos de carga.....................................203 6.4. Convenes de sinais do Mtodo dos Deslocamentos....................................205 6.5. Exemplo de soluo de uma viga contnua ......................................................207 6.6. Exemplos de soluo de prticos simples.........................................................214 6.6.1. Prtico com trs deslocabilidades ...............................................................214 6.6.2. Prtico com articulao interna...................................................................219 6.6.3. Prtico com barra inclinada .........................................................................225 7. MTODO DOS DESLOCAMENTOS COM RESTRIES NAS DEFORMAES..........................................................................................................231 7.1. Classificao das simplificaes adotadas ........................................................232 7.2. Considerao de barras inextensveis................................................................233 7.2.1. Exemplo de soluo de prtico com barras inextensveis........................236
  4. 4. Luiz Fernando Martha Sumrio 7.2.2. Regras para determinao de deslocabilidades externas de prticos planos com barras inextensveis..................................................................244 7.3. Simplificao para articulaes completas........................................................251 7.3.1. Prtico com articulao no topo de uma coluna .......................................252 7.3.2. Prtico com articulao dupla na viga e coluna........................................256 7.3.3. Exemplo de soluo de prtico com duas articulaes............................260 7.4. Considerao de barras infinitamente rgidas..................................................262 7.4.1. Exemplo de soluo de prtico com dois pavimentos .............................266 7.4.2. Exemplo de barra rgida com giro ..............................................................268 8. PROCESSO DE CROSS...............................................................................................273 8.1. Interpretao fsica do Mtodo da Distribuio de Momentos......................274 8.2. Distribuio de momentos fletores em um n .................................................276 8.3. Soluo iterativa do sistema de equaes de equilbrio..................................280 8.4. Formalizao do Processo de Cross...................................................................283 8.4.1. Processo de Cross para um prtico com uma deslocabilidade...............283 8.4.2. Processo de Cross para uma viga com duas deslocabilidades................285 8.5. Aplicao do Processo de Cross a quadros planos..........................................289 9. MTODO DA RIGIDEZ DIRETA (no includo, ainda sendo escrito) 10. CARGAS ACIDENTAIS E MVEIS; LINHAS DE INFLUNCIA.....................294 10.1. Introduo ...........................................................................................................294 10.2. Linhas de influncia para uma viga biapoiada ..............................................295 10.3. Mtodo cinemtico para o traado de LI.........................................................296 10.4. Metodologia para clculo de LIs pelo mtodo cinemtico ..........................304 10.5. Linha de influncia de esforo cortante em viga biengastada .....................305 10.6. Linha de influncia de momento fletor em viga biengastada......................306 10.7. Exemplo de determinao de envoltrias de esforos internos...................307 APNDICE A CONVENO DE SINAIS PARA ESFOROS INTERNOS (no includo, ainda sendo escrito) APNDICE B ANALOGIA DA VIGA CONJUGADA ...........................................313 B.1. Converso de condies de apoio......................................................................314 B.2. Roteiro do processo de Mohr .............................................................................316 B.3. Clculo de deslocamentos em vigas isostticas...............................................316 B.4. Anlise de vigas hiperestticas ..........................................................................318 B.5. Determinao de reaes de engastamento de vigas......................................321 B.6. Deduo de coeficientes de rigidez de barras..................................................323 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS..............................................................................325
  5. 5. 1. INTRODUO O projeto e a construo de estruturas uma rea da Engenharia Civil na qual mui- tos engenheiros civis se especializam. Estes so os chamados engenheiros estrutu- rais. A Engenharia Estrutural trata do planejamento, projeto, construo e manu- teno de sistemas estruturais para transporte, moradia, trabalho e lazer. Uma estrutura pode ser concebida como um empreendimento por si prprio, como no caso de pontes e estdios de esporte, ou pode ser utilizada como o esqueleto de outro empreendimento, como no caso de edifcios e teatros. Uma estrutura pode ainda ser projetada e construda em ao, concreto, madeira, pedra, materiais no convencionais (materiais que utilizam fibras vegetais, por exemplo), ou novos ma- teriais sintticos (plsticos, por exemplo). Ela deve resistir a ventos fortes, a solici- taes que so impostas durante a sua vida til e, em muitas partes do mundo, a terremotos. O projeto estrutural tem como objetivo a concepo de uma estrutura que atenda a todas as necessidades para as quais ela ser construda, satisfazendo questes de segurana, condies de utilizao, condies econmicas, esttica, questes ambi- entais, condies construtivas e restries legais. O resultado final do projeto es- trutural a especificao de uma estrutura de forma completa, isto , abrangendo todos os seus aspectos gerais, tais como locao, e todos os detalhes necessrios para a sua construo. Portanto, o projeto estrutural parte de uma concepo geral da estrutura e termina com a documentao que possibilita a sua construo. So inmeras e muito com- plexas as etapas de um projeto estrutural. Entre elas est a previso do comporta- mento da estrutura de tal forma que ela possa atender satisfatoriamente s condi- es de segurana e de utilizao para as quais ela foi concebida. A anlise estrutural a fase do projeto estrutural em que feita a idealizao do comportamento da estrutura. Esse comportamento pode ser expresso por diversos parmetros, tais como pelos campos de tenses, deformaes e deslocamentos na estrutura. De uma maneira geral, a anlise estrutural tem como objetivo a deter- minao de esforos internos e externos (cargas e reaes de apoio), e das corres- pondentes tenses, bem como a determinao dos deslocamentos e corresponden- tes deformaes da estrutura que est sendo projetada. Essa anlise deve ser feita para os possveis estgios de carregamentos e solicitaes que devem ser previa- mente determinados. O desenvolvimento das teorias que descrevem o comportamento de estruturas se deu inicialmente para estruturas reticuladas, isto , para estruturas formadas por
  6. 6. 2 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha barras (elementos estruturais que tm um eixo claramente definido). Estes so os tipos mais comuns de estruturas, tais como a estrutura de uma cobertura ou o es- queleto de um edifcio metlico. Mesmo em casos de estruturas nas quais nem to- dos os elementos estruturais podem ser considerados como barras (como o caso de edifcios de concreto armado), comum analisar o comportamento global ou parcial da estrutura utilizando-se um modelo de barras. Este livro est direcionado para a anlise de estruturas reticuladas estaticamente indeterminadas, isto , para a anlise de estruturas hiperestticas. Isso inclui as treli- as (estrutura com todas as barras articuladas em suas extremidades), os prticos ou quadros (planos e espaciais) e as grelhas (estruturas planas com cargas fora do plano). Nele so tratados principalmente os mtodos clssicos da anlise de estru- turas hiperestticas: o Mtodo das Foras e o Mtodo dos Deslocamentos. Nesse con- texto, a anlise considera apenas cargas estticas e admite-se um comportamento linear para a estrutura (anlise para pequenos deslocamentos e materiais elstico- lineares). Considera-se como pr-requisito para a leitura deste livro conhecimentos de Mec- nica Geral (Esttica), Anlise de Estruturas Isostticas (estruturas estaticamente determinadas) e Resistncia dos Materiais. Parte-se do princpio de que o leitor entende os conceitos bsicos de equilbrio esttico, esforos internos, tenses e de- formaes. Diversos livros-texto abordam esses assuntos. Como sugesto para leitura, recomenda-se na rea de Esttica os livros de Hibbeler (1999) ou Meriam e Kraige (1999), na rea de Anlise de Estruturas Isostticas os livros de Campanari (1985) ou Sssekind (1977-1), e na rea de Resistncia dos Materiais os livros de Beer e Johnston (1996), Fodosiev (1977), Hibbeler (2000) ou Timoshenko e Gere (1994). 1.1. Breve histrico sobre a Engenharia Estrutural Timoshenko (1878-1972), um dos pais da Engenharia Estrutural moderna, descreve em seu livro Histria da Resistncia dos Materiais (Timoshenko 1983) um histrico do desenvolvimento terico sobre o comportamento de estruturas. A Engenharia Es- trutural vai encontrar razes, se bem que de uma forma emprica, nos grandes mo- numentos e pirmides do antigo Egito e nos templos, estradas, pontes e fortifica- es da Grcia e da Roma antigas. O incio da formalizao terica da Engenharia Estrutural atribudo publicao do livro Duas Cincias, de Galileu, em 1638, que deu origem a todo o desenvolvimento da cincia desde o sculo 17 at os dias de hoje. Antes disso, Leonardo da Vinci (1452-1519) j havia escrito algumas notas sobre Esttica e Resistncia dos Materiais. Durante esses sculos, vrios matemti- cos e cientistas ilustres deram suas contribuies para formalizar a Engenharia Es- trutural tal como se entende hoje. At o incio do sculo 20 pode-se citar, dentre outros, Jacob Bernoulli (1654-1705), Euler (1707-1783), Lagrange (1736-1813), Cou- lomb (1736-1806), Navier (1785-1836), Thomas Young (1773-1829), Saint-Venant
  7. 7. Luiz Fernando Martha Introduo 3 (1797-1886), Kirchhoff (1824-1887), Kelvin (1824-1907), Maxwell (1831-1879) e Mohr (1835-1918). A formalizao da Engenharia Estrutural atravs de teorias cientficas permite que os engenheiros estabeleam as foras e solicitaes que podem atuar com seguran- a nas estruturas ou em seus componentes. Tambm permite que os engenheiros determinem os materiais adequados e as dimenses necessrias da estrutura e seus componentes, sem que estes sofram efeitos prejudicais para o seu bom funciona- mento. A Engenharia Estrutural sofreu um grande avano no final do sculo 19, com a Re- voluo Industrial. Novos materiais passaram a ser empregados nas construes, tais como concreto armado, ferro fundido e ao. Tambm nessa poca que a En- genharia Estrutural teve um grande desenvolvimento no Brasil. Em seu livro His- tria da Engenharia no Brasil (Telles 1994-1, Telles 1984-2), Pedro Carlos da Silva Tel- les descreve, com uma impressionante quantidade de informaes histricas, esse desenvolvimento. Durante o sculo 20, os principais desenvolvimentos se deram nos processos construtivos e nos procedimentos de clculo. A Engenharia Civil brasileira detentora de vrios recordes mundiais, notadamente na construo de pontes. 1.2. Anlise estrutural Como dito, a anlise estrutural a etapa do projeto estrutural na qual feita uma previso do comportamento da estrutura. Todas as teorias fsicas e matemticas resultantes da formalizao da Engenharia Estrutural como cincia so utilizadas na anlise estrutural. A anlise estrutural moderna trabalha com quatro nveis de abstrao1 para a es- trutura que est sendo analisada, tal como indicado na Figura 1.1. O primeiro n- vel de abstrao o do mundo fsico, isto , esse nvel representa a estrutura real tal como construda. Essa viso de carter mais geral sobre a anlise de estrutu- ras tem por objetivo definir claramente o escopo deste livro. Modelo Discreto Estrutura Real Modelo Estrutural Modelo Computacional Figura 1.1 Quatro nveis de abstrao para uma estrutura na anlise estrutural. 1 Baseado na concepo do paradigma dos quatro universos da modelagem em Computa- o Grfica idealizado por Gomes e Velho (1998) e no conceito de anlise estrutural de Felippa (2001).
  8. 8. 4 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha 1.2.1. Modelo estrutural O segundo nvel de abstrao da anlise estrutural o modelo analtico que utili- zado para representar matematicamente a estrutura que est sendo analisada. Esse modelo chamado de modelo estrutural ou modelo matemtico e incorpora todas as teorias e hipteses feitas para descrever o comportamento da estrutura para as di- versas solicitaes. Essas hipteses so baseadas em leis fsicas, tais como o equil- brio entre foras e entre tenses, as relaes de compatibilidade entre deslocamen- tos e deformaes, e as leis constitutivas dos materiais que compem a estrutura. A criao do modelo estrutural de uma estrutura real uma das tarefas mais im- portantes da anlise estrutural. Essa tarefa pode ser bastante complexa, depen- dendo do tipo de estrutura e da sua importncia. Por exemplo, o modelo estrutu- ral de um prdio residencial de pequeno porte concebido de uma forma corri- queira. Em geral, o modelo deste tipo de estrutura formado por um conjunto de linhas que representam as vigas e colunas do prdio e pelas superfcies que repre- sentam as lajes de seus pavimentos. Por outro lado, a concepo do modelo estru- tural de um prdio que abriga o reator de uma usina atmica muito mais com- plexa e pode envolver diversos tipos de elementos estruturais, das mais variadas formas (por exemplo, superfcies para representar paredes estruturais com furos ou a superfcie para representar a casca de concreto armado que cobre o prdio). Na concepo do modelo estrutural feita uma idealizao do comportamento da estrutura real em que se adota uma srie de hipteses simplificadoras. Estas esto baseadas em teorias fsicas e em resultados experimentais e estatsticos, e podem ser divididas nos seguintes tipos: hipteses sobre a geometria do modelo; hipteses sobre as condies de suporte (ligao com o meio externo, por e- xemplo, com o solo); hipteses sobre o comportamento dos materiais; hipteses sobre as solicitaes que agem sobre a estrutura (cargas de ocupa- o ou presso de vento, por exemplo). No caso de estruturas reticuladas, o modelo estrutural tem caractersticas que so bastante especficas. O modelo matemtico deste tipo de estrutura usa o fato de os elementos estruturais terem um eixo bem definido e est embasado na Teoria de Vigas de Navier, que rege o comportamento de membros estruturais que traba- lham flexo, acrescida de efeitos axiais e de toro. A Figura 1.2 mostra um e- xemplo de um modelo estrutural bidimensional para o prtico de um galpo in- dustrial.
  9. 9. Luiz Fernando Martha Introduo 5 Estrutura Real Modelo Estrutural Figura 1.2 Estrutura real e o seu modelo estrutural. Observa-se na Figura 1.2 que os elementos estruturais do galpo (vigas e colunas) aparecem representados por linhas. A informao tridimensional das barras fica representada por propriedades globais de suas sees transversais, tais como rea e momento de inrcia. Portanto, no caso de estruturas reticuladas, a considerao da geometria do modelo uma tarefa simples: os eixos das barras definem os ele- mentos do modelo estrutural. Entretanto, a considerao das outras hipteses simplificadoras que entram na ide- alizao do comportamento da estrutura real pode ser bastante complexa. Por e- xemplo, a representao das solicitaes (cargas permanentes, cargas acidentais, etc.) pode envolver um alto grau de simplificao ou pode ser muito prxima da realidade. O mesmo pode ser dito com respeito considerao do comportamento dos materiais ou do comportamento das fundaes (condies de apoio). No e- xemplo da Figura 1.2, a ligao da estrutura com o solo foi modelada por apoios que impedem os deslocamentos horizontal e vertical, mas que permitem o giro da base das colunas. Outro tipo de hiptese poderia ter sido feito para os apoios: por que no consider-los como engastes perfeitos (que impedem tambm o giro da base)? Nesse mesmo modelo, as cargas verticais representam o peso prprio da estrutura e as cargas horizontais representam o efeito do vento. De quantas manei- ras se pode considerar os efeitos do vento ou de outras solicitaes? Questes como essas mostram que existem diversas possibilidades para a concep- o do modelo estrutural de uma estrutura. Nessa concepo diversos fatores en- tram em cena, tais como a experincia do analista estrutural e a complexidade da estrutura e de suas solicitaes. Apesar da importncia da concepo do modelo estrutural dentro da anlise estru- tural, no o objetivo deste livro abordar esse assunto. Os modelos matemticos adotados para a idealizao do comportamento de estruturas usuais j esto de certa forma consagrados, principalmente no caso de estruturas reticuladas. Esses modelos so descritos em livros de Resistncia dos Materiais (Fodosiev 1977; Ti- moshen-ko & Gere 1994; Beer & Johnston 1996) e Teoria da Elasticidade (Timo-
  10. 10. 6 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha shenko & Goodier 1980, Malvern 1969, Little 1973, Boresi & Chong 1987, Villaa & Taborda 1998), entre outros. Tambm no so tratadas aqui questes que se referem representao das solici- taes reais no modelo estrutural, bem como questes relativas s leis constitutivas dos materiais que compem a estrutura. Esses assuntos, em geral, so abordados em disciplinas que tratam das etapas de dimensionamento e detalhamento dentro do projeto estrutural, tais como Estruturas de Ao, Estruturas de Concreto ou Es- truturas de Madeira. O foco principal deste livro so as metodologias de anlise de estruturas hiperest- ticas. No corpo deste volume, o modelo estrutural completo (com materiais, solici- taes e apoios definidos) vai ser sempre fornecido como ponto de partida para a anlise. Entretanto, para entender os mtodos de anlise estrutural, necessrio conhecer os modelos matemticos adotados para estruturas reticuladas. Portanto, os Captulos 2, 3 e 4 deste livro resumem todas as teorias fsicas e matemticas que so necessrias para descrever os mtodos de anlise estrutural que so tratados neste volume. 1.2.2. Modelo discreto O terceiro nvel de abstrao utilizado na anlise estrutural o do modelo discreto (veja a Figura 1.1). Esse modelo concebido dentro das metodologias de clculo dos mtodos de anlise. Portanto, a concepo do modelo discreto de estruturas reticuladas um dos principais assuntos tratados neste livro. De uma forma geral, os mtodos de anlise utilizam um conjunto de variveis ou parmetros para representar o comportamento de uma estrutura. Nesse nvel de abstrao, o comportamento analtico do modelo estrutural substitudo por um comportamento discreto, em que solues analticas contnuas so representadas pelos valores discretos dos parmetros adotados. A passagem do modelo matem- tico para o modelo discreto denominada discretizao. Os tipos de parmetros adotados no modelo discreto dependem do mtodo utili- zado. No Mtodo das Foras os parmetros adotados so foras ou momentos e no Mtodo dos Deslocamentos os parmetros so deslocamentos ou rotaes. Por exemplo, a Figura 1.3 mostra a discretizao utilizada na soluo de um prtico plano pelo Mtodo das Foras. Nesse mtodo, os parmetros adotados para discre- tizar a soluo so foras ou momentos redundantes para garantir o equilbrio est- tico da estrutura. Isto , so foras e momentos associados a vnculos excedentes de uma estrutura hiperesttica. Esses parmetros so denominados hiperestticos.
  11. 11. Luiz Fernando Martha Introduo 7 HA MA VA HB VB (0) (1) (2)MA HB Figura 1.3 Superposio de solues bsicas no Mtodo das Foras. No exemplo da Figura 1.3, os hiperestticos adotados so as reaes de apoio MA (reao momento no apoio da esquerda) e HB (reao horizontal no apoio da direi- ta). A configurao deformada do prtico, denominada elstica (indicada pela li- nha tracejada na figura e mostrada em escala ampliada), obtida pela superposi- o de solues bsicas dos casos (0), (1) e (2) mostrados na figura. A estrutura utilizada nas solues bsicas uma estrutura isosttica obtida da estrutura origi- nal pela eliminao dos vnculos excedentes associados aos hiperestticos. Cada soluo bsica isola um determinado efeito ou parmetro: o efeito da solicitao externa (carregamento) isolado no caso (0), o efeito do hiperesttico MA isolado no caso (1) e o efeito do hiperesttico HB isolado no caso (2). A metodologia de clculo do Mtodo das Foras determina os valores que os hiperestticos devem ter para recompor os vnculos eliminados (restrio rotao no apoio da esquerda e restrio ao deslocamento horizontal do apoio da direita). Dessa forma, a soluo do problema fica parametrizada (discretizada) pelos hiperestticos MA e HB. Essa metodologia ser apresentada em detalhes no Captulo 5 deste livro. Na soluo pelo Mtodo dos Deslocamentos para estruturas reticuladas, a soluo discreta representada por valores de deslocamentos e rotaes nos ns (pontos de encontro das barras), tal como indicado na Figura 1.4. Esses parmetros so de- nominados deslocabilidades. No exemplo dessa figura, as deslocabilidades so os deslocamentos horizontais dos ns superiores, x C e x D , os deslocamentos verti- cais desses ns, y C e y D , e as rotaes dos ns livres ao giro, B, C e D.
  12. 12. 8 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha C D B C D B x C x D y C y D x C x D y C y D X Y Figura 1.4 Parmetros nodais utilizados na discretizao pelo Mtodo dos Deslocamentos. Na Figura 1.4, a configurao deformada da estrutura (elstica mostrada em escala ampliada) representa a soluo contnua do modelo matemtico. Os valores das deslocabilidades nodais representam a soluo discreta do problema. Nesse tipo de metodologia baseada em deslocamentos, a soluo contnua pode ser obtida por interpolao dos valores discretos dos deslocamentos e rotaes nodais, conside- rando tambm o efeito da carga distribuda na barra horizontal. Em geral, para estruturas reticuladas com barras prismticas, a soluo obtida por interpolao igual soluo analtica do modelo estrutural. Isto ocorre porque as funes de interpolao que definem a configurao deformada contnua so compatveis com a idealizao matemtica do comportamento das barras feita pela Resistncia dos Materiais. A metodologia de clculo do Mtodo dos Deslocamentos vai ser deta- lhada no Captulo 6. No caso de estruturas contnuas (que no so compostas por barras), o mtodo comumente utilizado na anlise estrutural uma formulao em deslocamentos do Mtodo dos Elementos Finitos2 (Zienkiewicz & Taylor 2000, Felippa 2001). Nesse m- todo, o modelo discreto obtido pela subdiviso do domnio da estrutura em sub- domnios, chamados de elementos finitos, de formas simples (em modelos planos, usualmente tringulos ou quadrilteros), tal como exemplificado na Figura 1.5 pa- ra o modelo bidimensional de uma estrutura contnua com um furo. Essa subdivi- so denominada malha de elementos finitos e os parmetros que representam a so- luo discreta so valores de deslocamentos nos ns (vrtices) da malha. Pode-se observar por esse exemplo que a obteno do modelo discreto para estru- turas contnuas muito mais complexa do que no caso de modelos de estruturas reticuladas (prticos, trelias ou grelhas). Para estruturas formadas por barras, os ns (pontos onde valores discretos so definidos) so identificados naturalmente no encontro das barras, enquanto que para modelos contnuos os ns so obtidos pela discretizao do domnio da estrutura em uma malha. 2 Muitos outros mtodos so utilizados, tais como o Mtodo dos Elementos de Contor- no. As notas de aula de Felippa (2001) apresentam uma excelente introduo aos m- todos de anlise de estruturas contnuas.
  13. 13. Luiz Fernando Martha Introduo 9 Figura 1.5 Discretizao pelo Mtodo dos Elementos Finitos para uma estrutura contnua. Uma importante diferena entre os modelos discretos de estruturas reticuladas e de estruturas contnuas que a discretizao de uma malha de elementos finitos introduz simplificaes em relao idealizao matemtica feita para o compor- tamento da estrutura. Isto ocorre porque as funes de interpolao que definem a configurao deformada de uma malha de elementos finitos no so, em geral, compatveis com a idealizao matemtica do comportamento do meio contnuo feita pela Teoria da Elasticidade. Dessa forma, a soluo do modelo discreto de elementos finitos uma aproximao para a soluo analtica da Teoria da Elasti-
  14. 14. 10 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha cidade, ao passo que a soluo do modelo discreto de uma estrutura com barras prismticas igual soluo analtica da Resistncia dos Materiais. Conforme comentado, este livro trata apenas de modelos de estruturas reticuladas. Existem diversas referncias para o tratamento de estruturas contnuas atravs do Mtodo dos Elementos Finitos. Pode-se citar os livros de Cook et al. (1989), Felippa (2001), Zienkiewicz e Taylor (2000), Assan (1999), e Soriano (2003). Este ltimo se constitui em uma referncia em portugus recente e completa (dentro do contexto da anlise de estruturas) sobre o Mtodo dos Elementos Finitos. 1.2.3. Modelo computacional Desde a dcada de 1960 o computador tem sido utilizado na anlise estrutural, embora inicialmente somente nos institutos de pesquisa e universidades. Nos anos setenta essa utilizao passou a ser corriqueira, e nos anos oitenta e noventa, com a criao de programas grficos interativos, a anlise estrutural passou a ser feita com uso de computador em praticamente todos os escritrios de clculo estrutural e empresas de consultoria. A anlise de estruturas pode ser vista atualmente como uma simulao computa- cional do comportamento de estruturas. Embora este livro no esteja direcionado diretamente ao desenvolvimento de programas para prever o comportamento de estruturas, importante ter em mente que no se concebe atualmente executar as tarefas de anlise estrutural, mesmo para o caso de estruturas reticuladas, sem o uso de computador e de Computao Grfica. Portanto, este livro pode ser considerado como introdutrio para a anlise de es- truturas. As solues apresentadas para os modelos discretos das formulaes do Mtodo das Foras e do Mtodo dos Deslocamentos so obtidas atravs de resolu- o manual. O enfoque dado aqui para o entendimento do comportamento de estruturas reticuladas hiperestticas e dos fundamentos dos mtodos bsicos da anlise estrutural. Livros-texto sobre o Mtodo dos Elementos Finitos, como os que so citados acima, abordam de uma certa maneira a implementao computacional do Mtodo da Rigidez Direta (que uma formalizao do Mtodo dos Deslocamentos direciona- da para uma implementao computacional) e do Mtodo dos Elementos Finitos. O Mtodo das Foras tem uma metodologia que no conveniente para ser im- plementada computacionalmente e, por isso, pouco utilizado em programas de computador. Entretanto, diversos outros aspectos esto envolvidos no desenvolvimento de um programa de computador para executar uma anlise estrutural. Questes como estruturas de dados e procedimentos de criao do modelo geomtrico, gerao do modelo discretizado, aplicao de atributos de anlise (propriedades de materiais,
  15. 15. Luiz Fernando Martha Introduo 11 carregamentos, condies de suporte, etc.) e visualizao dos resultados so fun- damentais nesse contexto. Essas questes no so tratadas nos livros de elementos finitos, mas so da rea de Modelagem Geomtrica e Computao Grfica. 1.3. Organizao dos captulos Este captulo procurou posicionar o leitor dentro da atividade de anlise estrutural e direciona para os principais tpicos que so abordados neste livro. No Captulo 2 so introduzidos conceitos bsicos sobre a anlise de estruturas. O captulo trata principalmente das condies bsicas que tm que ser atendidas pelo modelo estrutural, tais como relaes de equilbrio entre foras e entre tenses, as relaes de compatibilidade entre deslocamentos e deformaes, e as leis constitu- tivas dos materiais que compem a estrutura. feita uma introduo aos mtodos clssicos da anlise estrutural: Mtodo das Foras e Mtodo dos Deslocamentos. O comportamento linear de estruturas, condio para aplicar superposio de efeitos, tambm discutido. Tambm feita uma abordagem conceitual entre as diferen- as de comportamento de estruturas isostticas e estruturas hiperestticas. Final- mente, apresentado um procedimento geral para determinao do grau de hipe- restaticidade de prticos planos e grelhas. O Captulo 3 resume a formalizao matemtica feita na idealizao do comporta- mento de barras. A Teoria de Vigas de Navier para o comportamento flexo de barras apresentada com todas as suas hipteses e simplificaes. As principais relaes diferenciais da Resistncia dos Materiais que regem o comportamento de barras para efeitos axiais, cisalhantes, de flexo e de toro so apresentadas com vistas sua utilizao no desenvolvimento dos mtodos de anlise apresentados nos captulos subseqentes. O Captulo 4 apresenta solues fundamentais que so utilizadas nas metodologias dos Mtodos das Foras e dos Deslocamentos. Tais solues so obtidas com base no Princpio dos Trabalhos Virtuais. Esse princpio, atravs de suas duas formula- es Princpio das Foras Virtuais e Princpio dos Deslocamentos Virtuais , necessrio para deduzir as expresses utilizadas no clculo de coeficientes dos sis- temas de equaes resultantes da discretizao do problema pelos Mtodos das Foras e dos Deslocamentos. O Mtodo das Foras apresentado em detalhes no Captulo 5. O captulo trata principalmente de aplicaes do mtodo para prticos planos, mas tambm so considerados exemplos de trelias planas e grelhas. Embora, atualmente, na prti- ca esse mtodo seja pouco utilizado (tem difcil implementao computacional), o mtodo tem o mrito de ser intuitivo e, por isso, em geral o primeiro mtodo a ser apresentado em livros-texto.
  16. 16. 12 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha O Captulo 6 apresenta uma introduo ao Mtodo dos Deslocamentos. O objetivo descrever os fundamentos do mtodo aplicado a prticos planos. Nesse captulo s so tratados prticos com barras horizontais e verticais, pois a resoluo de pr- ticos com barras inclinadas pela formulao geral do Mtodo dos Deslocamentos muito trabalhosa para ser feita manualmente. No Captulo 7 so introduzidas restries que so comumente adotadas para as deformaes de barras com o objetivo de reduzir o nmero de parmetros discre- tos e, assim, facilitar a resoluo manual pelo Mtodo dos Deslocamentos. A apre- sentao do mtodo com essas restries pode ser considerada como a forma cls- sica de apresentao em livros-texto, como por exemplo no de Sssekind (1977-3), que estavam voltados para uma resoluo manual. Na verdade, o principal objeti- vo ao considerar essas restries a deformaes de barras caracterizar o compor- tamento de prticos com respeito aos efeitos de deformaes axiais e de deforma- es transversais por flexo. Por exemplo, a considerao de barras sem deforma- o axial (chamadas de barras inextensveis.) uma aproximao razovel para o comportamento de um prtico. A hiptese de barras inextensveis possibilita o entendimento do conceito de contra-ventamento de prticos com barras inclinadas, que muito importante no projeto de estruturas. O Captulo 8 descreve um processo de soluo iterativa de prticos pelo Mtodo dos Deslocamentos. Esse processo denominado Mtodo da Distribuio de Mo- mentos (White et al. 1976) ou Processo de Cross (Sssekind 1977-3). Apesar deste processo ter cado em desuso nos ltimos anos, ele tem a vantagem de propiciar um entendimento intuitivo do comportamento de vigas e quadros que trabalham fundamentalmente flexo, alm de permitir uma rpida resoluo manual. O Mtodo da Rigidez Direta, que uma formalizao do Mtodo dos Deslocamen- tos voltada para sua implementao computacional, apresentado no Captulo 9. Essa formulao geral do Mtodo dos Deslocamentos feita para prticos planos, com barras com qualquer inclinao, com ou sem articulao, e para grelhas. Finalmente, o Captulo 10 descreve o procedimento de anlise estrutural para car- gas acidentais e mveis, isto , para cargas que no tm atuao constante ou posi- o fixa sobre a estrutura. Os conceitos de Linhas de Influncia e Envoltrias de Esforos so introduzidos. deduzido o mtodo cinemtico para o traado de li- nhas de influncia, tambm chamado de Princpio de Mller-Breslau (White et al. 1976, Sssekind 1977-1). As solues de engastamento perfeito deste princpio pa- ra barras isoladas so apresentadas. Essas solues facilitam a determinao de linhas de influncia por programas de computador que implementam o Mtodo da Rigidez Direta. Dois apndices complementam os captulos descritos. O primeiro mostra a con- veno de sinais adotada para esforos internos em estruturas reticuladas. O se- gundo apresenta a Analogia da Viga Conjugada como forma alternativa para de- duzir as solues fundamentais de barras introduzidas no Captulo 4.
  17. 17. 2. CONCEITOS BSICOS DE ANLISE ESTRUTURAL Este captulo resume alguns conceitos bsicos de anlise estrutural para estruturas que so compostas por barras. Esses conceitos foram selecionados de forma a permitir a compreenso dos demais captulos deste livro, e essa seleo foi baseada em consultas a trabalhos de diversos autores que certamente descrevem esses con- ceitos em maior profundidade. Os principais livros que serviram como referncia para este captulo foram os de White, Gergely e Sexsmith (1976), Rubinstein (1970), Candreva (1981), Timoshenko e Gere (1994), Tauchert (1974) e West (1989). So considerados como pr-requisitos para os assuntos tratados neste captulo a definio de tenses, deformaes e esforos internos (esforos normais e cortantes e momentos fletores e torores) em barras e a anlise de estruturas estaticamente determinadas (estruturas isostticas). Como referncias para esses assuntos pode- se citar, alm das referncias anteriores, os livros dos seguintes autores: Beaufait (1977), Beer e Johnston (1996), Campanari (1985), Felton e Nelson (1997), Fleming (1997), Sssekind (1977-1), Gorfin e Oliveira (1975), Hibbeler (1998) e Meriam (1994). 2.1. Classificao de modelos de estruturas reticuladas Conforme mencionado no Captulo 1, este livro est direcionado para a anlise de estruturas reticuladas, isto , de estruturas formadas por barras. Esta seo faz uma classificao dos tipos de modelos de estruturas reticuladas de acordo com o seu arranjo espacial e de suas cargas. Tambm so definidos sistemas de eixos globais da estrutura e de eixos locais das barras. Para cada tipo de estrutura so caracterizados os tipos de esforos internos e as direes dos seus deslocamentos e rotaes. A Figura 2.1 mostra um exemplo de um quadro ou prtico plano. Um quadro plano um modelo estrutural plano de uma estrutura tridimensional. Este modelo pode corresponder a uma fatia da estrutura, ou pode representar uma simplificao para o comportamento tridimensional. Estruturas deste tipo esto contidas em um plano (neste livro adotado o plano formado pelos eixos X e Y, como mostra a Fi- gura 2.1) e as cargas tambm esto contidas no mesmo plano. Isso inclui foras com componentes nas direes dos eixos X e Y e momentos em torno do eixo Z (que sai do plano).
  18. 18. 14 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha O quadro plano da Figura 2.1 tem um solicitao externa (carregamento) composta por uma fora horizontal P (na direo de X) e uma carga uniformemente distribu- da vertical q (na direo de Y). Tambm esto indicados na figura as reaes de apoio, que so compostas de foras horizontais e verticais, e por um momento em torno do eixo Z. X Y HA MA VA HB VB P q x C x D y C y D X Y z C z D z B Figura 2.1 Eixos globais, cargas, reaes, deslocamentos e rotaes de um quadro plano. A Figura 2.1 tambm indica a configurao deformada da estrutura (amplificada de forma exagerada) com as componentes de deslocamentos e rotaes do ns (pontos extremos das barras). A simplificao adotada para modelos estruturais de quadros planos que no existem deslocamentos na direo transversal ao pla- no (direo Z) e rotaes em torno de eixos do plano da estrutura. Portanto, um quadro plano apresenta somente as seguintes componentes de deslocamentos e rotao: x deslocamento na direo do eixo global X; y deslocamento na direo do eixo global Y; z rotao em torno do eixo global Z. As ligaes entre as barras de um prtico plano so consideradas perfeitas (ligaes rgidas), a menos que algum tipo de liberao, tal como uma articulao, seja indi- cado. Isto significa que duas barras que se ligam em um n tem deslocamentos e rotao compatveis na ligao. Ligaes rgidas caracterizam o comportamento de prticos e provocam a deformao por flexo de suas barras. Os esforos internos de um quadro plano tambm esto associados ao comporta- mento plano da estrutura. Neste tipo de estrutura, existem apenas trs esforos internos em um barra de um prtico plano, definidos nas direes dos eixos locais da barra, tal como indicado na Figura 2.2: N esforo normal (esforo interno axial) na direo do eixo local x;
  19. 19. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 15 = y QQ esforo cortante (esforo interno transversal) na direo do eixo local y; = z MM momento fletor (esforo interno de flexo) em torno do eixo local z. Q Q N N M M x y Figura 2.2 Eixos locais e esforos internos de uma barra de quadro plano. Esforos internos em uma estrutura caracterizam as ligaes internas de tenses, isto , esforos internos so integrais de tenses ao longo de uma seo transversal de uma barra. Esforos internos representam o efeito de foras e momentos entre duas pores de uma estrutura reticulada resultantes de um corte em uma seo transversal. Os esforos internos correspondentes de cada lado da seo secciona- da so iguais e contrrios, pois correspondem uma ao e a reao correspondente. A relao entre tenses e esforos internos vai ser discutida no Captulo 3. Uma trelia uma estrutura reticulada que tem todas as ligaes entre barras arti- culadas (as barras podem girar independentemente nas ligaes). A Figura 2.3 mostra uma trelia plana com suas cargas e reaes. Na anlise de uma trelia as cargas atuantes so transferidas para os seus ns. A conseqncia disso, em con- junto com a hiptese de ligaes articuladas, que uma trelia apresenta apenas esforos internos axiais (esforos normais de trao ou compresso). X Y N N Figura 2.3 Eixos globais, cargas, reaes e esforo interno normal de uma trelia plana. Muitas vezes, a hiptese de ligaes articuladas uma simplificao para o compor- tamento de uma trelia, pois muitas vezes no existem articulaes nos ns. Esta
  20. 20. 16 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha simplificao se justifica, principalmente, quando os eixos das barras concorrem praticamente em um nico ponto em cada ligao. Nesse caso, o comportamento da estrutura de d fundamentalmente a esforos internos axiais (esforos cortantes e momentos fletores so pequenos na presena de esforos normais). Um outro tipo de estrutura reticulada a grelha. Grelhas so estruturas planas com cargas na direo perpendicular ao plano, incluindo momentos em torno de eixos do plano. A Figura 2.4 mostra uma grelha com uma carga uniformemente distri- buda transversal ao seu plano. Neste livro adotado que o plano da grelha for- mado pelos eixos X e Y. Os apoios de uma grelha apresentam apenas uma compo- nente de fora, que na direo vertical Z, e duas componentes de momento. VA VB q z XY Z x AM y AM x y Figura 2.4 Eixos globais, cargas, reaes, deslocamentos e rotaes de uma grelha. Por hiptese, uma grelha no apresenta deslocamentos dentro do seu plano. A Figura 2.4 indica a configurao deformada da grelha (de forma exagerada), que apresenta as seguintes componentes de deslocamento e rotaes: z deslocamento na direo do eixo global Z; x rotao em torno do eixo global X; y rotao em torno do eixo global Y. Em geral, as ligaes entre as barras de uma grelha so rgidas, mas possvel que ocorram articulaes. Uma ligao articulada de barras de grelha pode liberar a- penas uma componente de rotao, ou pode liberar as duas componentes. Os esforos internos de uma barra de grelha esto mostrados na Figura 2.5, junta- mente com a conveno adotada para os eixos locais de uma barra de grelha. So trs os esforos internos: = z QQ esforo cortante (esforo interno transversal) na direo do eixo local z; = y MM momento fletor (esforo interno de flexo) em torno do eixo local y; = x TT momento toror (esforo interno de toro) em torno do eixo local x.
  21. 21. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 17 Q Q T T M M x y z Figura 2.5 Eixos locais e esforos internos de uma barra de grelha. interessante fazer uma comparao entre as componentes de deslocamentos e rotaes de quadros planos e grelhas, bem como entre os tipos de esforos internos. A Tabela 2.1 indica as componentes de deslocamentos e rotaes que so nulas pa- ra quadros planos e grelhas. Observe que quando uma componente nula para um quadro plano ela no nula para uma grelha, e vice-versa. A tabela tambm mostra as diferenas entre os esforos internos de quadros planos e grelhas. V-se que os esforos normais so nulos para grelhas. Por outro lado, os quadros planos no apresentam momentos torores. As barras de um quadro plano e de uma gre- lha apresentam esforos cortantes, mas eles tm direes distintas em relao aos eixos locais. O mesmo ocorre para momentos fletores. Tabela 2.1 Comparao entre quadro plano e grelha. Quadro Plano Grelha Deslocamento em X x 0=x Deslocamento em Y y 0=y Deslocamento em Z 0=z z Rotao em torno de X 0=x x Rotao em torno de Y 0=y y Rotao em torno de Z z 0=z Esforo normal x NN = (x local) 0=N Esforo cortante y QQ = (y local) z QQ = (z local) Momento fletor z MM = (z local) y MM = (y local) Momento toror 0=T x TT = (x local)
  22. 22. 18 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha Finalmente, o caso mais geral de estruturas reticuladas o de quadros ou prticos espaciais. Um exemplo mostrado na Figura 2.6. Cada ponto de um quadro espa- cial pode ter trs componentes de deslocamento )e,,( zyx e trs componentes de rotao )e,,( zyx . Existem seis esforos internos em uma barra de prtico espacial: esforo normal x NN = (x local), esforo cortante y Q (y local), esforo cor- tante z Q (z local), momento fletor y M (y local), momento fletor z M (z local), e momento toror x TT = (x local). XY Z zP xP yP zq Figura 2.6 Eixos globais e cargas de um quadro espacial. 2.2. Condies bsicas da anlise estrutural No contexto da anlise estrutural, o clculo corresponde determinao dos esfor- os internos na estrutura, das reaes de apoios, dos deslocamentos e rotaes, e das tenses e deformaes. As metodologias de clculo so procedimentos mate- mticos que resultam das hipteses adotadas na concepo do modelo estrutural. Dessa forma, uma vez concebido o modelo de anlise para uma estrutura, as me- todologias de clculo podem ser expressas por um conjunto de equaes matem- ticas que garantem a satisfao s hipteses adotadas. Dito de outra maneira, uma vez feitas consideraes sobre a geometria da estrutura, sobre as cargas e solicita- es, sobre as condies de suporte ou ligao com outros sistemas e sobre as leis constitutivas dos materiais, a anlise estrutural passa a ser um procedimento ma- temtico de clculo que s se altera se as hipteses e simplificaes adotadas forem revistas ou reformuladas. As condies matemticas que o modelo estrutural tem que satisfazer para repre- sentar adequadamente o comportamento da estrutura real podem ser dividas nos seguintes grupos: condies de equilbrio; condies de compatibilidade entre deslocamentos e deformaes;
  23. 23. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 19 condies sobre o comportamento dos materiais que compem a estrutura (leis constitutivas dos materiais). A imposio destas condies a base dos mtodos da anlise estrutural, isto , as formas como essas condies so impostas definem as metodologias dos chamados Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas, foco principal deste livro. Esta seo exemplifica as condies bsicas que o modelo estrutural tem que aten- der atravs de um exemplo simples de trs barras articuladas (Timoshenko & Gere 1994), mostrado na Figura 2.7. Existe uma fora externa P aplicada no n da estru- tura que conecta as trs barras. As barras so feitas com um material com mdulo de elasticidade E e tm sees transversais com rea A. l P N1N2 N2 X Y Figura 2.7 Estrutura com trs barras articuladas. 2.2.1. Condies de equilbrio No contexto deste livro, no qual no so considerados problemas de vibraes ou de dinmica de estruturas, condies de equilbrio so condies que garantem o e- quilbrio esttico de qualquer poro isolada da estrutura ou da estrutura como um todo. No exemplo da Figura 2.7, o equilbrio tem que ser garantido globalmente, isto , para a estrutura como um todo, em cada barra isolada e em cada n isolado. Nesse exemplo simples, em que s existem esforos internos axiais nas barras (for- as normais), as trs reaes de apoio nos ns superiores convergem em um ponto: o n inferior. Na verdade, essas reaes so os prprios esforos normais nas bar- ras, tal como indicado na Figura 2.7. Alm disso, a simetria da estrutura impe que os esforos normais nas barras inclinadas sejam iguais (isto , na verdade, uma
  24. 24. 20 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha imposio de equilbrio de foras na direo horizontal X). Dessa forma, o equil- brio do n inferior na direo vertical Y garante o equilbrio global da estrutura: =+= PNNFY cos20 21 . (2.1) Nessa equao, tem-se: 1N esforo normal na barra vertical; 2N esforo normal nas barras inclinadas. Na Equao (2.1), a condio de equilbrio na direo vertical do n inferior da es- trutura foi escrita considerando a geometria original (indeformada) da estrutura. Isto s vlido quando os deslocamentos que a estrutura vai sofrer so muito pe- quenos em relao s dimenses da estrutura. Essa hiptese, denominada de hip- tese de pequenos deslocamentos (White et al. 1976, West 1989), ser adotada neste livro. A anlise de estruturas com essa considerao denomina-se anlise de primeira or- dem. Nem sempre possvel adotar a hiptese de pequenos deslocamentos. Por exemplo, no projeto moderno de estruturas metlicas exige-se que se faa uma an- lise de segunda ordem (deslocamentos no desprezveis na imposio das condi- es de equilbrio), pelo menos de uma maneira aproximada. Apesar disso, neste livro s sero consideradas anlises com pequenos desloca- mentos, e as condies de equilbrio sempre sero escritas para a configurao (ge- ometria) indeformada da estrutura. Esse ponto ser justificado na Seo 2.4 deste captulo, onde a hiptese de pequenos deslocamentos abordada em maior pro- fundidade. Observa-se pela Equao (2.1) que no possvel determinar os valores dos esfor- os normais N1 e N2. Isto , existem duas incgnitas em termos de esforos e ape- nas uma equao de equilbrio (considerando que a equao de equilbrio na dire- o horizontal j foi utilizada). As estruturas que no podem ter seus esforos de- terminados apenas pelas equaes de equilbrio so chamadas de estruturas hiperes- tticas, como a estrutura do exemplo da Figura 2.7. Existe um caso especial de es- truturas que podem ter seus esforos internos e externos (reaes de apoio) deter- minados apenas pelas condies de equilbrio so as chamadas estruturas isostti- cas. Em geral, as equaes de equilbrio fornecem condies necessrias, mas no sufi- cientes, para a determinao dos esforos no modelo estrutural. Para a determina- o dos esforos em estruturas hiperestticas, necessrio fazer uso das outras condies, que so tratadas nas sees a seguir.
  25. 25. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 21 2.2.2. Condies de compatibilidade entre deslocamentos e deformaes As condies de compatibilidade entre deslocamentos e deformaes so condies geo- mtricas que devem ser satisfeitas para garantir que a estrutura, ao se deformar, permanea contnua (sem vazios ou sobreposio de pontos) e compatvel com seus vnculos externos. Deve-se ressaltar que as condies de compatibilidade no tm relao alguma com as propriedades de resistncia dos materiais da estrutura (consideradas nas leis constitutivas dos materiais, tratadas na seo a seguir). As condies de com- patibilidade so expressas por relaes geomtricas impostas no modelo estrutural para garantir a continuidade no domnio da estrutura real. Essas relaes conside- ram as hipteses geomtricas adotadas na concepo do modelo. As condies de compatibilidade podem ser divididas em dois grupos: Condies de compatibilidade externa: referem-se aos vnculos externos da es- trutura e garantem que os deslocamentos e deformaes sejam compatveis com as hipteses adotadas com respeito aos suportes ou ligaes com outras estruturas. Condies de compatibilidade interna: garantem que a estrutura permanea, ao se deformar, contnua no interior dos elementos estruturais (barras) e nas fronteiras entres os elementos estruturais, isto , que as barras permaneam ligadas pelos ns que as conectam (incluindo ligao por rotao no caso de no haver articulao entre barras). No exemplo da Figura 2.7, as condies de compatibilidade externa so garantidas automaticamente quando s se admite uma configurao deformada para a estru- tura que tenha deslocamentos nulos nos ns superiores, tal como mostra a Figura 2.8. A configurao deformada est indicada, com deslocamentos ampliados de forma exagerada, pelas linhas tracejadas mostradas nessa figura. As condies de compatibilidade interna devem garantir que as trs barras perma- neam ligadas pelo n inferior na configurao deformada. Mantendo-se a hipte- se de pequenos deslocamentos, pode-se considerar que o ngulo entre as barras aps a deformao da estrutura no se altera, tal como indicado na Figura 2.8.
  26. 26. 22 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha D1 d1 = D1 d2 Figura 2.8 Configurao deformada da estrutura com trs barras articuladas. Com base na Figura 2.8 e considerando a simetria da estrutura, pode-se ento esta- belecer relaes de compatibilidade entre os alongamentos das barras da estrutura e o deslocamento vertical do n inferior: 11 Dd = ; cos12 = Dd . Sendo: 1D deslocamento vertical do n inferior; 1d alongamento da barra vertical; 2d alongamento das barras inclinadas. Isto resulta na seguinte equao de compatibilidade entre os alongamentos das barras: cos12 = dd . (2.2) A introduo da equao de compatibilidade acrescentou duas novas incgnitas ao problema, d1 e d2, sem relacion-las s incgnitas anteriores, N1 e N2. Entretanto, essas quatro incgnitas vo ficar relacionadas atravs da considerao do compor- tamento do material que compe a estrutura, sem que isso introduza novas incg- nitas. 2.2.3. Leis constitutivas dos materiais O modelo matemtico do comportamento dos materiais, em um nvel macroscpi- co, expresso por um conjunto de relaes matemticas entre tenses e deforma-
  27. 27. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 23 es, chamadas de leis constitutivas (Fodosiev 1977). Essas relaes contm par- metros que definem o comportamento dos materiais. A Teoria da Elasticidade (Timoshenko & Goodier 1980) estabelece que as relaes da lei constitutiva so e- quaes lineares com parmetros constantes. Nesse caso, dito que o material tra- balha em regime elstico-linear, em que tenses e deformaes so proporcionais. Entretanto, nem sempre possvel adotar um comportamento to simplificado pa- ra os materiais. Por exemplo, procedimentos modernos de projeto de estruturas metlicas ou de concreto armado so baseados no estado de limite ltimo, quando o material no tem mais um comportamento elstico-linear. Apesar disso, no contexto deste livro s sero considerados materiais idealizados com comportamento elstico-linear e sem limite de resistncia. Isto justificado pelos seguintes motivos: De uma maneira geral, as estruturas civis trabalham em regime elstico- linear. Por isso, a maioria das estruturas analisada adotando-se essa apro- ximao. Mesmo para projetos baseados em regime ltimo, a determinao da distri- buio de esforos internos , em geral, feita a partir de uma anlise linear. Isto , faz-se o dimensionamento local no estado ltimo de resistncia, com o uso de coeficientes de majorao de carga e de minorao de resistncia, mas com esforos calculados atravs de uma anlise global linear. Esta uma aproximao razovel na maioria dos casos, mas o correto seria fazer uma anlise global considerando o material em regime no linear (que relati- vamente complexa quando comparada com uma anlise linear). Na prtica, uma anlise no linear executada computacionalmente de for- ma incremental, sendo que em cada passo do processo incremental feita uma anlise linear. Como este livro introdutrio para a anlise de estrutu- ras, a considerao de um comportamento linear se justifica. O foco principal deste livro so os mtodos bsicos da anlise estrutural. A considerao em si de leis constitutivas no lineares um tema bastante am- plo que foge do escopo deste livro. Portanto, no exemplo da Figura 2.7, o material considerado tem um comportamen- to elstico-linear. As barras desta estrutura esto submetidas apenas a esforos axiais de trao. As tenses x e deformaes x que aparecem nesse caso so nor- mais s sees transversais das barras (na direo do eixo local x, na direo axial da barra). A lei constitutiva que relaciona tenses normais e deformaes normais a conhecida Lei de Hooke (Beer & Johnston 1996, Fodosiev 1977) e dada por xx E = , (2.3) sendo: E mdulo de elasticidade (propriedade do material);
  28. 28. 24 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha x tenses normais na direo axial da barra; x deformaes normais na direo axial da barra. No contexto de uma anlise com pequenos deslocamentos, a tenso normal devida a um esforo axial dada pela razo entre o valor do esforo e a rea da seo transversal, e a deformao normal a razo entre o alongamento da barra e o seu comprimento original. Assim, para a barra vertical da Figura 2.7 tem-se: l d E A N 11 = , (2.4) e para as barras inclinadas tem-se: cos 22 l d E A N = . (2.5) Observa-se que as Equaes (2.4) e (2.5) introduziram novas relaes entre as in- cgnitas do problema sem que aparecessem novas variveis. Dessa maneira, as Equaes (2.1), (2.2), (2.4) e (2.5) formam um sistema de quatro equaes a quatro incgnitas, N1, N2, d1 e d2, resultando na soluo nica do problema. V-se que s foi possvel resolver a estrutura hiperesttica desse exemplo utilizan- do todos os trs tipos de condies: equilbrio, compatibilidade e leis constitutivas. A prxima seo discute esse ponto em mais detalhe. H casos em que o material tambm solicitado ao efeito de cisalhamento. Para materiais trabalhando em regime elstico-linear, a lei constitutiva que relaciona tenses cisalhantes com distores de cisalhamento dada por: G= , (2.6) sendo: G mdulo de cisalhamento (propriedade do material); tenso de cisalhamento; distoro de cisalhamento. 2.3. Mtodos bsicos da anlise estrutural O exemplo simples mostrado na seo anterior ilustra bem a problemtica para a anlise de uma estrutura hiperesttica. Para se resolver (calcular esforos, deslo- camentos, etc.) uma estrutura hiperesttica sempre necessrio considerar os trs grupos de condies bsicas da anlise estrutural: condies de equilbrio, condi- es de compatibilidade entre deslocamentos e deformaes e condies sobre o comportamento dos materiais (White et al. 1976).
  29. 29. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 25 No exemplo, existem infinitos valores de N1 e N2 que satisfazem a equao de equi- lbrio (2.1). Tambm existem infinitos valores de d1 e d2 que satisfazem a equao de compatibilidade (2.2). Entretanto, existe uma nica soluo para essas entida- des: aquela que satisfaz simultaneamente equilbrio, compatibilidade e leis cons- titutivas. Observa-se que para esse exemplo a soluo da estrutura hiperesttica requer a resoluo de um sistema de quatro equaes a quatro incgnitas. Para estruturas usuais (bem maiores), a formulao do problema dessa maneira acarreta uma complexidade de tal ordem que a soluo pode ficar comprometida. Assim, ne- cessrio definir metodologias para a soluo de estruturas hiperestticas. Isto vai resultar nos dois mtodos bsicos da anlise estrutural, que so introduzidos a se- guir. 2.3.1. Mtodo das Foras O primeiro mtodo bsico da anlise de estruturas o chamado Mtodo das Foras. Nesse mtodo as incgnitas principais do problema so foras e momentos, que podem ser reaes de apoio ou esforos internos. Todas as outras incgnitas so expressas em termos das incgnitas principais escolhidas e substitudas em equa- es de compatibilidade, que so ento resolvidas. O Mtodo das Foras tem como idia bsica determinar, dentro do conjunto de solues em foras que satisfazem as condies de equilbrio, qual a soluo que faz com que as condies de compatibilidade tambm sejam satisfeitas. Na formalizao do Mtodo das Foras existe uma seqncia de introduo das condies bsicas do problema: primeiro so utilizadas as condies de equilbrio, em seguida so consideradas as leis constitutivas dos materiais, e finalmente so utilizadas as condies de compatibilidade. O exemplo da Figura 2.7 vai ser usado para ilustrar essa seqncia. Considere que o esforo normal N1 na barra central foi adotado como a incgnita principal. O nmero de incgnitas principais igual ao nmero de incgnitas ex- cedentes nas equaes de equilbrio. A escolha de N1 como principal foi arbitrria (teria sido indiferente escolher N2). Pela equao de equilbrio (2.1) pode-se escre- ver N2 em funo de N1: cos2 1 2 = NP N . (2.7) Pelas Equaes (2.4) e (2.5) pode-se expressar d1 e d2 em funo de N1 e N2, respec- tivamente. Utilizando a Equao (2.7) e substituindo na Equao (2.2), tem-se a equao de compatibilidade expressa em termos da incgnita N1:
  30. 30. 26 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha 313 )(cos2)(cos2 = + EA lP N EA l EA l . (2.8) Finalmente, a soluo desta equao resulta no valor de N1, e substituindo esse re- sultado na Equao (2.7) tem-se N2: 31 )(cos21 + = P N ; 3 2 2 )(cos21 )(cos + = P N . Deve-se salientar que os valores de N1 e N2 independem da rea da seo transver- sal das barras e do mdulo de elasticidade porque esses parmetros so, nesse e- xemplo, iguais para as trs barras, tendo sido cancelados na soluo da Equao (2.8). Na verdade, a soluo mostrada acima no corresponde metodologia utilizada na prtica para analisar uma estrutura hiperesttica pelo Mtodo das Foras. A meto- dologia adotada na prtica faz uma parametrizao (discretizao) do problema em termos de variveis independentes, tal como j sugerido na Seo 1.2.2 do Ca- ptulo 1. No caso do Mtodo das Foras, essas variveis so as foras (e momentos) associadas aos vnculos excedentes determinao esttica da estrutura. Essas for- as e momentos so chamados de hiperestticos. Para o exemplo das trs barras s existe um hiperesttico. Uma possvel soluo parametrizada pelo Mtodo das Foras obtida pela superposio de solues b- sicas dos casos (0) e (1) mostrados na Figura 2.9. O hiperesttico escolhido nessa soluo a reao de apoio vertical X1 (= N1) e o vnculo associado a restrio ao deslocamento vertical do apoio central. X1 = 1 x X1 10 P (0) (1) P 11 X1 = N1 Figura 2.9 Superposio de solues bsicas do Mtodo das Foras.
  31. 31. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 27 Na soluo indicada na Figura 2.9, a estrutura utilizada nas solues bsicas uma estrutura estaticamente determinada (isosttica) obtida da estrutura original pela eliminao do vnculo excedente associado ao hiperesttico. Essa estrutura isost- tica auxiliar chamada de Sistema Principal (SP). Cada soluo bsica isola um de- terminado efeito ou parmetro no SP: o efeito da solicitao externa (carregamento) isolado no caso (0) e o efeito do hiperesttico X1 isolado no caso (1). As solues bsicas mostradas na Figura 2.9 violam uma condio de compatibili- dade da estrutura original pois o vnculo eliminado libera o deslocamento vertical do apoio central. Por outro lado, as solues bsicas do Mtodo das Foras satisfa- zem as equaes de equilbrio da estrutura original. A metodologia de clculo do Mtodo das Foras determina o valor que o hiperest- tico deve ter para recompor o vnculo eliminado no SP. Essa condio pode ser expressa matematicamente por uma equao de compatibilidade que superpe os deslocamentos no vnculo eliminado de cada caso bsico: 011110 =+ X . (2.9) Nessa equao: 10 termo de carga: deslocamento vertical no ponto do vnculo eliminado no caso (0); 11 coeficiente de flexibilidade: deslocamento vertical no ponto do vnculo elimina- do devido a um valor unitrio do hiperesttico aplicado isoladamente. A Equao (2.9) determina o valor do hiperesttico X1 que faz com que o desloca- mento do ponto do vnculo eliminado seja nulo. Dessa forma, o valor correto do esforo normal N1 (= X1) determinado pois a compatibilidade da estrutura origi- nal, violada na criao da estrutura auxiliar (SP) utilizada na superposio de casos bsicos, recomposta. Considerando que deslocamentos verticais so positivos no sentido da fora unit- ria arbitrada para X1 (para cima), tem-se que os valores do termo de carga e do coe- ficiente de flexibilidade para esse problema so: 310 )(cos2 = EA lP e 311 )(cos2 += EA l EA l . Substituindo esses valores na Equao (2.9), pode-se observar que essa equao exatamente igual equao de compatibilidade (2.8) encontrada anteriormente. No Captulo 5 essa metodologia prtica do Mtodo das Foras ser formalizada detalhadamente. Essa metodologia est baseada na validade do Princpio da Su- perposio de Efeitos (veja a Seo 2.4) e serve para resolver qualquer estrutura hiperesttica reticulada com comportamento linear.
  32. 32. 28 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha O Mtodo das Foras assim denominado pois os hiperestticos so foras (ou momentos). O mtodo tambm denominado Mtodo da Compatibilidade (West 1989) pois as equaes finais, como no exemplo a Equao (2.9), so equaes de compatibilidade escritas em termos dos hiperestticos. 2.3.2. Mtodo dos Deslocamentos O segundo mtodo bsico da anlise de estruturas o chamado Mtodo dos Deslo- camentos. Nesse mtodo as incgnitas principais do problema so deslocamentos e rotaes. Todas as outras incgnitas so expressas em termos das incgnitas prin- cipais escolhidas e substitudas em equaes de equilbrio, que so ento resolvi- das. O Mtodo dos Deslocamentos tem como idia bsica determinar, dentro do con- junto de solues em deslocamentos que satisfazem as condies de compatibili- dade, qual a soluo que faz com que as condies de equilbrio tambm sejam sa- tisfeitas. Observa-se que o Mtodo dos Deslocamentos ataca a soluo de estruturas de ma- neira inversa ao que feito pelo Mtodo das Foras. Por isso esses mtodos so ditos duais. Na formalizao do Mtodo dos Deslocamentos a seqncia de intro- duo das condies bsicas tambm inversa: primeiro so utilizadas as condi- es de compatibilidade, em seguida so consideradas as leis constitutivas dos ma- teriais, e finalmente so utilizadas as condies de equilbrio. O exemplo da Figura 2.7 tambm vai ser utilizado para mostrar isso. A incgnita principal escolhida o alongamento d1 da barra vertical, que corres- ponde ao deslocamento vertical D1 do n inferior da estrutura (veja a Figura 2.8). O nmero de incgnitas no Mtodo dos Deslocamentos igual ao nmero de in- cgnitas excedentes nas equaes de compatibilidade. No exemplo, existe uma equao de compatibilidade Equao (2.2) com duas incgnitas: d1 e d2. A esco- lha de d1 como principal foi arbitrria. Utilizando a equao de compatibilidade e as Equaes (2.4) e (2.5) da lei constitu- tiva, pode-se expressar a equao de equilbrio (2.1) em funo da incgnita prin- cipal: Pd l EA l EA = + 1 3 )(cos2 . (2.10) A soluo desta equao fornece o valor de d1, e substituindo esse resultado na E- quao (2.2) tem-se d2: EA lP d + = 31 )(cos21 ;
  33. 33. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 29 EA lP d + = 32 )(cos21 cos . Para encontrar os valores de N1 e N2 mostrados anteriormente basta utilizar as E- quaes (2.4) e (2.5). Assim como na seo anterior para o Mtodo das Foras, a soluo pelo Mtodo dos Deslocamentos apresentada inicialmente nesta seo tem um carter apenas didtico. Na prtica necessrio formalizar o mtodo para resolver qualquer tipo de estrutura reticulada. A metodologia adotada na prtica faz uma parametrizao (discretizao) do problema em termos de variveis independentes, tal como indi- cado na Seo 1.2.2 do Captulo 1. No caso do Mtodo dos Deslocamentos, essas variveis so os parmetros que definem completamente a configurao deforma- da da estrutura, que so chamados de deslocabilidades. Para o exemplo das trs barras, devido simetria da estrutura, est sendo conside- rado que o n inferior no se desloca lateralmente. Portanto, s existe uma deslo- cabilidade, que o deslocamento vertical D1 do n inferior. A soluo parametri- zada pelo Mtodo do Deslocamentos obtida pela superposio de solues bsi- cas dos casos (0) e (1) mostrados na Figura 2.10. D1 D1 = 1 K11 x D1 10 P P (0) (1) Figura 2.10 Superposio de solues bsicas do Mtodo dos Deslocamentos. Na soluo indicada na Figura 2.10, a estrutura utilizada nas solues bsicas uma estrutura cinematicamente determinada (estrutura com configurao deformada conhecida) obtida da estrutura original pela adio do vnculo necessrio para impedir a deslocabilidade D1. Essa estrutura cinematicamente determinada auxiliar chamada de Sistema Hipergeomtrico (SH). Cada soluo bsica isola um determinado efeito ou parmetro no SH: o efeito da solicitao externa (carregamento) isolado no caso (0) e o efeito da deslocabilidade D1 isolado no caso (1). As solues bsicas mostradas na Figura 2.10 satisfazem as condies de equilbrio do Sistema Hipergeomtrico, mas violam o equilbrio da estrutura original, que no contm o vnculo adicional que impede a deslocabilidade D1. Dito de outra maneira, o apoio fictcio adicionado no SH introduz uma reao de apoio espria
  34. 34. 30 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha que fere o equilbrio da estrutura original. Deve-se observar que as solues bsi- cas do Mtodo dos Deslocamentos jamais violam as condies de compatibilidade da estrutura original, isto , existe continuidade interna (ligao entre as barras) e compatibilidade com os vnculos externos. A metodologia de clculo do Mtodo dos Deslocamentos determina o valor que a deslocabilidade D1 deve ter para recompor o equilbrio da estrutura original sem o apoio fictcio do SH. Essa condio pode ser expressa matematicamente por uma equao de equilbrio que superpe as reaes no apoio fictcio do SH de cada caso bsico: 011110 =+ DK . (2.11) Nessa equao: 10 termo de carga: fora (reao) vertical no apoio fictcio do caso (0); 11K coeficiente de rigidez: fora vertical no apoio fictcio do SH necessria para impor uma configurao deformada tal que a deslocabilidade D1 tenha um valor unitrio. A Equao (2.11) determina o valor da deslocabilidade D1 que faz com que a reao final (na superposio) no apoio fictcio do SH seja nula. Dessa forma, o valor cor- reto de D1 determinado pois o equilbrio da estrutura original, violado na criao da estrutura auxiliar (SH) utilizada na superposio de casos bsicos, restabeleci- do. Considerando que foras verticais so positivas no sentido do deslocamento unit- rio arbitrado para D1 (para baixo), tem-se que os valores do termo de carga e do coeficiente de rigidez para esse problema so: P=10 e l EA l EA K 3 11 )(cos2 += . Substituindo esses valores na Equao (2.11), pode-se observar que essa equao exatamente igual Equao de equilbrio (2.10) encontrada anteriormente. No Captulo 6 essa metodologia prtica do Mtodo dos Deslocamentos ser forma- lizada detalhadamente. Assim como para o Mtodo das Foras, essa metodologia est baseada na validade do Princpio da Superposio de Efeitos (veja a Seo 2.4) e serve para resolver qualquer estrutura reticulada com comportamento linear. O Mtodo dos Deslocamentos assim denominado pois as incgnitas (deslocabili- dades) so deslocamentos (ou rotaes). O mtodo tambm chamado de Mtodo do Equilbrio (West 1989) pois as equaes finais, como no exemplo a Equao (2.11), so equaes de equilbrio tendo como variveis principais as deslocabilida- des.
  35. 35. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 31 2.3.3. Comparao entre o Mtodo das Foras e o Mtodo dos Deslocamentos Nas duas sees anteriores os dois mtodos bsicos da anlise de estruturas reticu- ladas foram introduzidos com base em um exemplo simples com trs barras articu- ladas. Como comentado, esses mtodos sero apresentados em detalhes em cap- tulos subseqentes deste livro. Entretanto, as principais idias dos dois mtodos j foram abordadas e importante salientar os pontos principais. Nesta seo feita uma comparao entre os Mtodos das Foras e dos Desloca- mentos, mostrando um resumo da metodologia de cada mtodo atravs da tabela mostrada a seguir, salientando a dualidade entre os dois mtodos. Mtodo das Foras Mtodo dos Deslocamentos Idia bsica: Determinar, dentro do conjunto de so- lues em foras que satisfazem as condies de equilbrio, qual a soluo que faz com que as condies de com- patibilidade tambm sejam satisfeitas. Metodologia: Superpor uma srie de solues estati- camente determinadas (isostticas) que satisfazem as condies de equilbrio da estrutura para obter uma soluo final que tambm satisfaz as condies de compatibilidade. Incgnitas: Hiperestticos: foras e momentos asso- ciados a vnculos excedentes determi- nao esttica da estrutura. Nmero de incgnitas: o nmero de incgnitas excedentes das equaes de equilbrio, denominado grau de hiperestaticidade. Idia bsica: Determinar, dentro do conjunto de so- lues em deslocamentos que satisfa- zem as condies de compatibilidade, qual a soluo que faz com que as con- dies de equilbrio tambm sejam satis- feitas. Metodologia: Superpor uma srie de solues cinema- ticamente determinadas (configuraes deformadas conhecidas) que satisfazem as condies de compatibilidade da es- trutura para obter uma soluo final que tambm satisfaz as condies de equilbrio. Incgnitas: Deslocabilidades: componentes de des- locamentos e rotaes nodais que defi- nem a configurao deformada da es- trutura. Nmero de incgnitas: o nmero de incgnitas excedentes das equaes de compatibilidade, de- nominado grau de hipergeometria.
  36. 36. 32 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha Estrutura auxiliar utilizada nas solu- es bsicas: Sistema Principal (SP): estrutura estati- camente determinada (isosttica) obtida da estrutura original pela eliminao dos vnculos excedentes associados aos hiperestticos. Essa estrutura auxiliar viola condies de compatibilidade da estrutura original. Equaes finais: So equaes de compatibilidade ex- pressas em termos dos hiperestticos. Essas equaes recompem as condi- es de compatibilidade violadas nas solues bsicas. Termos de carga das equaes finais: Deslocamentos e rotaes nos pontos dos vnculos liberados no SP devidos solicitao externa (carregamento). Coeficientes das equaes finais: Coeficientes de flexibilidade: desloca- mentos e rotaes nos pontos dos vncu- los liberados no SP devidos a hiperest- ticos com valores unitrios atuando iso- ladamente. Estrutura auxiliar utilizada nas solu- es bsicas: Sistema Hipergeomtrico (SH): estrutu- ra cinematicamente determinada (estru- tura com configurao deformada co- nhecida) obtida da estrutura original pela adio dos vnculos necessrios para impedir as deslocabilidades. Essa estrutura auxiliar viola condies de equilbrio da estrutura original. Equaes finais: So equaes de equilbrio expressas em termos das deslocabilidades. Essas e- quaes recompem as condies de equilbrio violadas nas solues bsicas. Termos de carga das equaes finais: Foras e momentos (reaes) nos vncu- los adicionados no SH devidos solici- tao externa (carregamento) Coeficientes das equaes finais: Coeficientes de rigidez: foras e mo- mentos nos vnculos adicionados no SH para impor configuraes deformadas com deslocabilidades isoladas com va- lores unitrios. 2.4. Comportamento linear e superposio de efeitos Como visto nas sees anteriores, na formalizao dos mtodos bsicos da anlise estrutural o Princpio da Superposio de Efeitos (White et al. 1976, West 1989, Felton & Nelson 1996) adotado. Esse princpio prescreve que a superposio dos cam- pos de deslocamentos provocados por vrios sistemas de foras atuando isolada- mente igual ao campo de deslocamentos provocado pelos mesmos sistemas de foras atuando concomitantemente. A Figura 2.11 exemplifica esse princpio mos- trando que a combinao linear de duas foras resulta nos mesmos deslocamentos
  37. 37. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 33 da combinao linear dos deslocamentos provocados pelas foras atuando isola- damente. P1 P2 ( )2 1 1 1 + P2 ( )2 2 1 2 + 1 1 1 2 P1 2 1 2 2 Figura 2.11 Combinao linear de duas foras e os correspondentes deslocamentos. Para que se possa utilizar esse princpio necessrio que a estrutura tenha um comportamento linear. O comportamento linear de uma estrutura est baseado em duas condies. A primeira que o material trabalhe no regime elstico-linear. A segunda condio que seja vlida a hiptese de pequenos deslocamentos. Conforme abordado na Seo 2.2.1, os deslocamentos podem ser considerados pe- quenos quando as equaes de equilbrio escritas para a geometria indeformada da estrutura fornecem resultados praticamente iguais aos obtidos pelas mesmas equa- es de equilbrio escritas para a geometria deformada da estrutura (White et al. 1976). Exceto em casos particulares, as estruturas civis tm deslocamentos pequenos em comparao aos tamanhos caractersticos dos seus membros (comprimento da bar- ra ou altura da seo transversal, por exemplo). Um contra-exemplo, para o qual no possvel adotar a hiptese de pequenos deslocamentos, mostrado na Figura 2.12 (White et al. 1976). Essa estrutura tem duas barras e trs rtulas alinhadas, e o estado de equilbrio estvel s pode ser alcanado para a estrutura na configurao deformada. Cabos, que so estruturas muito flexveis, so um outro exemplo de estruturas cujo equilbrio alcanado na geometria final, considerando os seus des- locamentos sobrepostos geometria inicial indeformada. Essas estruturas no se- ro tratadas neste livro, e sero classificadas como instveis.
  38. 38. 34 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha P Figura 2.12 Exemplo de uma estrutura para a qual no se pode adotar pequenos deslocamentos. Existem exemplos clssicos de estruturas instveis, tais como as mostradas na Fi- gura 2.13 (White et al. 1976). O prtico da Figura 2.13-a apresenta trs componen- tes de reao de apoio que so verticais, no existindo nenhum vnculo que impea o movimento horizontal do prtico. A estrutura da Figura 2.13-b tem trs reaes concorrentes em um ponto. Portanto, na configurao indeformada, no possvel equilibrar o momento de foras atuantes, tal como a carga P, em relao ao ponto de convergncia das reaes de apoio. Nesse caso, talvez o equilbrio pudesse ser alcanado na configurao deformada da estrutura, quando as reaes deixariam de concorrer em um ponto. Mesmo assim, essa estrutura sempre apresentaria um estado de instabilidade eminente. P (a) (b) Figura 2.13 Exemplos de estruturas instveis pela configurao dos apoios externos. A dependncia do comportamento linear com a hiptese de pequenos deslocamen- tos pode ser entendida a partir do exemplo da Figura 2.14. Nessa estrutura, o des- locamento vertical da extremidade inferior do balano, a, depende das caracters- ticas geomtricas das barras, assim como dos valores das foras V e H e das propri- edades do material da estrutura.
  39. 39. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 35 V H b a a Figura 2.14 Configurao deformada de um prtico em forma de L. Considerando que a estrutura da Figura 2.14 tem um material elstico-linear e se- es transversais pr-definidas, e que as foras esto sempre atuando nos mesmos pontos, o comportamento da estrutura, no que diz respeito aos seus deslocamen- tos, depende apenas das caractersticas geomtricas da estrutura (a e b) e dos valo- res das cargas (V e H), que podem variar. Duas situaes podem ser consideradas: Deslocamento a com um valor que no pode ser desprezado em relao s dimenses a e b, de tal maneira que as condies de equilbrio devem ser es- critas para a geometria deformada. Nesse caso, ),,,( baaHVaa += , ou se- ja, a determinao de a depende do conhecimento do seu prprio valor. Is- to caracteriza o que se define como no-linearidade geomtrica (White et al. 1976). Deslocamento a com um valor muito menor do que as dimenses a e b, de tal maneira que as condies de equilbrio podem ser escritas para a geome- tria original indeformada. Nesse caso pode-se dizer que ),,,( baHVaa = , ou seja, no existe dependncia de a em relao a si prprio. Como todas as outras propriedades so lineares, o comportamento da estrutura linear. Is- to , a varia linearmente em funo dos valores das cargas. No caso em que os deslocamentos no so pequenos, a determinao de a em ge- ral no tem soluo analtica simples. Nesse caso, o valor de a pode ser determi- nado atravs de algum processo iterativo. Por exemplo, partindo-se de um valor inicial que poderia ser nulo, determina-se o valor seguinte considerando um com- portamento linear. Com os valores de deslocamentos calculados no passo anterior, atualiza-se a geometria da estrutura e determina-se o valor seguinte de a. Esse processo se repete at que o valor determinado em um passo no difira significati- vamente do valor do passo anterior. Esse processo pode no convergir, e nesse caso a estrutura instvel. Um exemplo isosttico simples (White et al. 1976) mostrado na Figura 2.15 para ilustrar o efeito da no-linearidade geomtrica. A configurao deformada da es- trutura est indicada pelas linhas tracejadas da figura. Na configurao indefor- mada o ngulo entre as barras e o eixo vertical , e na configurao deformada o
  40. 40. 36 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha ngulo . Nesse exemplo os deslocamentos no so considerados pequenos e a equao de equilbrio que relaciona a fora aplicada P com o esforo normal N nas barras escrita na configurao final (deformada) da estrutura, tal como expresso na Equao (2.12). comprimento final: ( ) ( )22 tancos/ Dlll ++= l P N N D tanltanl comprimento original: cos/l Figura 2.15 Estrutura isosttica com grandes deslocamentos. ( ) ( )22 tan 2cos2 Dll Dl NNP ++ + == . (2.12) Com base na Figura 2.15, pode-se relacionar o alongamento d das barras com o deslocamento vertical D do n central. O alongamento das barras a diferena entre o comprimento final (deformado) das barras e o comprimento original (inde- formado), resultando na seguinte relao de compatibilidade: ( ) ( ) cos/tan 22 lDlld ++= . (2.13) Para obter a resposta do problema em termos de deslocamentos, necessrio con- siderar a relao tenso-deformao do material. Considerando a deformao nas barras como a razo entre o alongamento e o comprimento original da barra, ela resulta em uma expresso que relaciona o esforo normal das barras com o seu a- longamento: ( ) d l EA N = cos/ (2.14)
  41. 41. Luiz Fernando Martha Conceitos Bsicos de Anlise Estrutural 37 Substituindo o alongamento d dado pela Equao (2.13) na Equao (2.14), e depois substituindo o esforo normal N na Equao (2.12), isso resulta em uma expresso que relaciona a fora aplicada P com o deslocamento vertical D: ( ) ( ) ( ) ( )22 22 tan costan cos 2 Dll DllDll l EA P ++ + ++ = . Simplificando essa expresso, tem-se: ( ) ( ) ( ) ++ += 22 tan 1cos 2 Dlll DlEAP (2.15) A relao entre a fora P e o deslocamento D da Equao (2.15) mostrada na Fi- gura 2.16 para alguns valores do ngulo da configurao indeformada da estru- tura. Os valores da fora aplicada foram normalizados pela razo P/EA e os valo- res dos deslocamentos foram normalizados pela razo D/l. 0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 1 2 3 4 EA P l D15=30=45=60=75= pequenos deslocamentos EA P l D efeitos de segunda ordem Figura 2.16 Curvas carga-deslocamento para estrutura isosttica com grandes deslocamentos. Com base na Figura 2.16 pode-se observar a natureza no linear da resposta da estrutura para grandes deslocamentos. A curva carga-deslocamento para o caso da estrutura achatada (ngulo grande) a que apresenta maior grau de no- linearidade, enquanto a curva para o caso da estrutura alongada (ngulo peque-
  42. 42. 38 Mtodos Bsicos da Anlise de Estruturas Luiz Fernando Martha no) praticamente linear. Nota-se tambm que a estrutura mais alongada a mais rgida (valor de carga mais alto para um dado valor de deslocamento). interessante comparar a resposta no linear dada pela Equao (2.15) com a res- posta linear da estrutura da Figura 2.15 para pequenos deslocamentos. A resposta linear obtida igualando os ngulos e , e considerando d = Dcos, tal como na Equao (2.2). Isto resulta na seguinte relao carga-deslocamento: D l EA Plinear = 3 )(cos2 . (2.16) Pode-se comparar a Equao (2.16) com a derivada da resposta no linear avaliada para D = 0: l EA dD dP 3 )(cos2)0( = . (2.17) V-se que o coeficiente angular da resposta linear igual derivada da curva car- ga-deslocamento no linear para D = 0, tal com indica o detalhe da Figura 2.16. Isso mostra que a resposta linear uma aproximao da resposta no linear para pequenos deslocamentos. Esse estudo do comportamento no linear de uma estrutura indica que a soluo para grandes deslocamentos pode ser relativamente complexa, mesmo para o caso de uma estrutura bastante simples como a da Figura 2.15. De uma certa maneira, o comportamento de todas as estruturas no linear para o caso de uma anlise exa- ta que envolveria a considerao dos deslocamentos da estrutura nas equaes de equilbrio (equilbrio imposto na configurao deformada). Entretanto (e felizmen- te), para os casos mais freqentes de estruturas civis, os deslocamentos so to pe- quenos (para cargas usuais) que podem ser desconsiderados quando se formulam as condies de equilbrio. Neste livro s sero consideradas estruturas para as quais pode-se adotar a hipte- se de pequenos deslocamentos (equaes de equilbrio sempre escritas para a for- ma indeformada da estrutura). Essa hiptese bsica, juntamente com o compor- tamento linear dos materiais, para a utilizao do princpio da superposio de efeitos (White et al. 1976). Como dito anteriormente, esse princpio aplicado nos mtodos bsicos da anlise de estruturas, que so mtodos lineares. Deve-se observar que mtodos lineares de anlise tambm so adotados