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MEMÓRIAS DE RESISTÊNCIA Lugares de repressão e de luta contra a Ditadura Militar de 1964–1985, em Belo Horizonte.

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MEMÓRIAS DE RESISTÊNCIALugares de repressão e

de luta contra a Ditadura Militar de 1964–1985, em Belo Horizonte.

MINEIROS MORTOS E DESAPARECIDOS DURANTE A DITADURA CIVIL-MILITAR

(1964-1985)

Abelardo Rausch Alcântara • Adriano Fonseca Filho • Alberto Aleixo • Antônio Carlos Bicalho Lana • Antônio Joaquim de Souza Machado • Antônio dos Três Reis de Oliveira • Arnaldo Cardoso Rocha • Augusto Soares da Cunha • Áurea Elisa Pereira Valadão • Benedito Gonçalves • Carlos Alberto Soares de Freitas • Carlos Antunes da Silva • Carlos Schirmer • Ciro Flávio Salazar Oliveira • Daniel José de Carvalho • David de Souza Meira • Devanir José de Carvalho • Eduardo Antônio da Fonseca • Eduardo Collen Leite • Elson Costa • Feliciano Eugênio Neto • Geraldo Bernardo da Silva • Getúlio de Oliveira Cabral • Gildo Macedo Lacerda • Guido Leão • Hamilton Pereira Damasceno • Helber José Gomes Goulart • Hélcio Pereira Fortes • Idalísio Soares Aranha Filho • Itair José Veloso • Ivan Mota Dias • Jeová Assis Gomes • João Batista Franco Drummond • João Bosco Penido Burnier, Padre • Joel José de Carvalho • José Carlos Novaes da Mata Machado • José Júlio de Araújo • José Maximino de Andrade Netto • José Toledo de Oliveira • Juarez Guimarães de Brito • Lucimar Brandão Guimarães • Maria Auxiliadora Lara Barcelos • Nativo Natividade de Oliveira • Nelson José de Almeida • Oracílio Martins Gonçalves • Orlando da Silva Rosa Bomfim Júnior • Osvaldo Orlando da Costa • Otávio Soares Ferreira da Cunha • Paschoal Souza Lima • Paulo Costa Ribeiro Bastos • Paulo Roberto Pereira Marques • Pedro Alexandrino Oliveira Filho • Raimundo Eduardo da Silva • Raimundo Gonçalves de Figueiredo • Rodolfo de Carvalho Troiano • Walquíria Afonso Costa • Walter de Souza Ribeiro • Zuleika Angel Jones (Zuzu Angel)

Este Guia é dedicado aos estudantes e militantes mineiros que deram sua juventude e sua vida em defesa da democracia no Brasil.

Monumento lembra os militantes mineiros mortos e desaparecidos na Ditadura Militar (Av. Afonso Pena, em frente ao Dops)

LUGARES DE MEMÓRIA

Repressão e resistência à Ditadura Militar de 1964,

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As cidades têm “lugares de memória” determinados pela história dos que a construíram e nela vivem e que traçaram sua trajetória histórica. O turismo urbano contemporâneo inclui entre os roteiros de destinos e atrativos esses lugares, constituídos por locais, edifícios, monumentos onde ocorreram fatos significativos da história da cidade e que merecem ser revisitados ou desvendados por sua importância na memória de todos.

A interpretação histórica não se aplica somente ao patrimônio edificado portador de exemplaridade ou singularidade, mas também aos locais de memória, palco de fatos notáveis, também causadores de fruição cultural e de vivências sensoriais, estimuladores da memória que reconstitui percursos humanos, valores espirituais, conhecimento e formação de identidades essenciais à evolução das sociedades.

A resistência ao regime militar implantado no Brasil em março de 1964 durou duas décadas e teve, em Belo Horizonte, vários momentos, fatos e locais onde se desenrolaram atos de resistência e confronto à ditadura, movimentos de rua, passeatas e concentrações, prisões, torturas e mortes. Relembrar fatos e locais da repressão é importante não só para a memória e para a pesquisa histórica, mas também como registro indispensável à difusão da evolução política. E, ainda, como potenciais roteiros de interesse turístico.

Em Minas Gerais, algumas centenas de pessoas foram detidas para averiguações nos primeiros dias após o golpe de 31 de março de 1964, que depôs o presidente constitucional João Goulart e instaurou uma ditadura militar que durou 21 anos. Estudantes, trabalhadores, intelectuais, sindicalistas, parlamentares e lideranças políticas foram as primeiras vítimas do novo regime.

Tropa da Polícia Militar cerca a Faculdade de Medicina em 1977: prisões e “Corredor Polonês” para impedir o Encontro da UNE em Belo Horizonte F

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Símbolo da repressão política em Minas, o Dops foi um dos principais locais de violação dos direitos civis em Belo Horizonte no período militar. Palco de torturas e prisões, era o braço de atuação da Polícia Civil contra a oposição ao regime. Criada em 1927 como Delegacia de Segurança Pessoal e Ordem Política e Social, foi transformada em polícia política em 1956, já como Departamento de Ordem Política e Social de Minas Gerais (Dops/MG). Foi usada na repressão desde os primeiros dias do golpe de 1964, em articulação com os DOI-Codis do Rio e São Paulo. Ao Dops, viriam juntar-se novos quadros dos serviços de inteligência das Forças Armadas, das polícias militares e da Polícia Civil de todo o País. Por suas celas, passaram lideranças políticas, professores, estudantes e sindicalistas que entravam na lista de procura da nova ordem que se instalou com o golpe. Os organismos de defesa das liberdades civis reivindicam sua transformação em centro de memória das lutas de resistência contra a ditadura no Brasil. Um monumento às vítimas da repressão foi inaugurado em 2013 em frente ao prédio, na avenida Afonso Pena. Hoje, ele abriga a delegacia de repressão ao tráfico de drogas.

DOPS Endereço: Av. Afonso Pena, 2.351 • Funcionários.

Foto Acervo da Polícia Civil

LOCAIS DE REPRESSÃO E RESISTÊNCIA

Endereço: Ruas Juiz de Fora e Tenente Brito Melo • Barro Preto

QUARTEL DO 12º REGIMENTO DE INFANTARIA

Levantamentos, pesquisas e depoimentos relativos ao período ditatorial apontam, entre outros, como locais de prisão ilegal e torturas os quartéis do então 12º Regimento de Infantaria e do Centro de Preparação de Oficiais da Reserva (CPOR), no Barro Preto, e uma unidade do Exército sediada nas instalações do Colégio Militar, no Bairro São Francisco. Foram unidades militares utilizadas como aparatos para prisões ilegais e depoimentos sob tortura de presos políticos, em operações policiais integradas com outros órgãos repressores do Estado, do Rio e São Paulo. Passaram por suas prisões vários militantes da resistência ao regime militar.

EDIFÍCIO ACAIACAEndereço: Av. Afonso Pena, 867, confluência das ruas Espírito Santo e Tamoios • Centro

Com sede no 11º andar do Edifício Acaiaca, no Centro de Belo Horizonte, sob o nome de Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais, o Ipes foi o grande foco de irradiação da oposição ao governo de João Goulart em Minas Gerais. Mantido com recursos de empresários conservadores, lideranças patronais, executivos de empresas norte-americanas e dinheiro e técnicas de propaganda de comunicação de massa da CIA, a agência de inteligência dos Estados Unidos, o Ipes foi criado em 1961 e teve como principal executivo o general Golbery do Couto e Silva, fundador e ministro-chefe do Serviço Nacional de Informação (SNI) e uma das principais lideranças do governo militar. O Ipes produzia material para jornais e revistas, patrocinava edições de livros, mantinha grupos paramilitares e montava cenários para manifestações públicas e marchas de donas de casa e de católicos fundamentalistas. Foi o principal mentor do golpe. Em janeiro de 1964, em reunião na sede de Belo Horizonte, a alta cúpula do Ipes entregou ao general Carlos Luís Guedes, comandante da ID/4 (Quarta Infantaria Divisionária), líder do golpe que seria consumado dois meses depois, a coordenação do núcleo militar da conspiração em Minas. O chamado ‘Grupo Acaiaca’ funcionava no andar-sede do Sindicato da Indústria de Fiação e Tecelagem de Minas Gerais.

Foto Breno Pataro - Acervo PBHFoto Bebel Baldoni - Acervo PBH

A Escola Estadual Pandiá Calógeras, localizada na praça em frente à Assembleia Legislativa de Minas Gerais, serviu de local para o recrutamento de voluntários a favor do golpe militar e de centro de distribuição de material anticomunista. Sediou também uma milícia civil chefiada pelo general José Lopes Bragança, responsável por prisões e várias ações repressivas nos dias que se seguiram ao golpe e que realizou várias ações repressivas. Foi transformada em QG dos grupos reacionários católicos e de movimentos de donas de casa, alvos da campanha ideológica de desestabilização do Governo Goulart.

Endereço: Praça Carlos Chagas • Santo Agostinho

PANDIÁ CALÓGERAS

DAN MITRIONE/CIA

Endereço: Rua José Carlos da Mata Machado • Bairro das Indústrias

A CIA enviou a Belo Horizonte, nos anos anteriores ao golpe de 64, um especialista em interrogatório e ações repressivas, o agente norte-americano Dan Mitrione, cuja missão era ensinar aos policiais mineiros, por meio de acordo com a Usaid, as técnicas de pressão psicológica contra presos sistematizadas nos manuais Kubark da organização. Ficou dois anos na capital mineira (1961–1962), ligado à base da CIA, o chamado Ponto4, que funcionava na sede do Instituto Cultural Brasil-Estados Unidos (ICBEU), na rua da Bahia, Funcionários. Transferido para o Uruguai, Mitrione foi capturado e executado pela guerrilha dos tupamaros em 10 de agosto de 1970. Deixou em Minas uma teoria da tortura: “A dor exata, no momento exato, na quantidade exata, para o efeito desejado”. Homenageado pela então Câmara dos Vereadores, virou nome de rua em Belo Horizonte. Com a redemocratização, a homenagem foi revogada e à rua foi dado o nome do militante belo-horizontino JOSÉ CARLOS DA MATA MACHADO, filho do professor Edgar de Godoy da Matta-Machado e assassinado pela polícia política, em Recife, em outubro de 1973.

Foto Breno Pataro - Acervo PBH

DELEGACIA DE FURTOS E ROUBOS

Prisão com práticas medievais de tortura e prisões ilegais, a Delegacia de Furtos e Roubos da Polícia Civil de Minas, na rua Pouso Alegre, bairro Floresta, era uma das mais temidas unidades policiais do País. Com a repressão política transformada em método de obtenção de informações de militantes, presos políticos envolvidos em assaltos a bancos se juntaram aos presos comuns nas salas de tortura. Em 28 de janeiro de 1969, após uma ação da Polícia Civil em um aparelho da organização COLINA na rua ATACARAMBU, 120, no bairro São Geraldo, que resultou na morte de dois policiais civis e na prisão de um grupo de militantes, foi lançada uma caçada a integrantes da organização em Belo Horizonte e no Estado. Em busca de informações que levassem a outros integrantes, foi transferido para a unidade o ex-sargento da Aeronáutica João Lucas Alves, preso em novembro de 1968 pelo Dops/RJ e levado em seguida para a Polícia do Exército. Integrante do COLINA, o ex-militar, expulso das Forças Armadas por envolvimento no movimento de suboficiais em 1963 e 1964, foi trazido para interrogatório na Furtos e Roubos, onde morreu sob tortura. A polícia alegou suicídio. A DFR, instituída como unidade autônoma em 1964, foi desativada em 1985, após ação do Ministério Público Estadual, e transferida para a rua Uberaba, no Barro Preto.

Endereço: Rua Pouso Alegre, 417 • Floresta

CENTROS CLANDESTINOS DE TRIAGEM

Sítios clandestinos no entorno de Belo Horizonte e as penitenciárias de Neves e Dutra Ladeira foram transformados em centros de detenção clandestina nos anos de repressão. Os locais foram definidos a partir de relatos de presos políticos, que apontam, entre eles, uma casa no bairro Renascença, nunca identificada. Em muitos casos, a localização é imprecisa porque os detidos eram encapuzados. Um desses centros de triagem pertencia à Polícia Militar e funcionava em uma casa anexa ao Palacete Dantas, a 30 metros do Palácio da Liberdade.

Endereço: Esquina das ruas Sergipe e Santa Rita Durão • Funcionários

Foto Breno Pataro - Acervo PBHFoto Acervo da Polícia Civil

O Teatro Marília foi construído pela Cruz Vermelha brasileira, ficando sob responsabilidade da instituição durante 15 anos. Concebido como auditório da sua Escola de Enfermagem, foi inaugurado em 1964, dando início à história de um espaço privado que, tornado público, passou a ter grande importância cultural para a cidade e se transformou em um núcleo de resistência intelectual e artística. Nas décadas de 1960 e 1970, apresentações do Grupo de Teatro Oficina e de autores de contestação, como Bertolt Brecht, Gianfrancesco Guarnieri, Augusto Boal e Millôr Fernandes, colocaram o Marília como referência no circuito nacional. No local, funcionaram também a Galeria Guignard e o bar Stage Door, pontos de encontro de artistas, boêmios e intelectuais.

TEATRO MARÍLIA/GALERIA GUIGNARD/STAGE DOOREndereço: Avenida Alfredo Balena, 588 • Santa Efigênia Cidade com forte tradição cultural e população

jovem, Belo Horizonte teve no circuito de teatros um importante formador de consciência crítica e de ligação com a produção cultural nacional e internacional de vanguarda e de contracultura. No Teatro da Associação Mineira de Imprensa – AMI, em Lourdes, seminários de leituras dramáticas de peças proibidas pela censura reuniam artistas, jornalistas, intelectuais e estudantes nos anos 1970, desafiando as forças policiais que tentavam impedir apresentações de produções de desafio à ordem política. No mesmo período, o TEATRO DA IMPRENSA OFICIAL promovia com frequência festivais de cinema do realismo socialista soviético, theco, polonês e cubano.

TEATRO DA AMI

Endereço: Rua da Bahia, 1.450, Lourdes (AMI) eRua Rio de Janeiro, 1.063, Centro (IO)

Foto Breno Pataro/Acervo PBHFoto Acervo da FMC

IGREJA SÃO FRANCISCO DAS CHAGAS

A Igreja São Francisco das Chagas, no bairro Carlos Prates, abrigou os estudantes que, após a invasão da União Estadual dos Estudantes em Belo Horizonte, três dias antes, quando a polícia efetuou dezenas de prisões, realizaram clandestinamente, em 28 julho de 1966, o 28º Congresso da UNE, colocada na ilegalidade após o golpe de 1964. O congresso, realizado na cripta da igreja, reforçou a linha de resistência e decidiu pela ampliação das manifestações de rua em todo o País. A igreja foi atingida por atentado a bomba em 28 de março de 1978.

Endereço: Praça São Francisco • Carlos Prates

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Endereço: Campus da Avenida Antônio Carlos • Pampulha

A Universidade Federal de Minas Gerais sofreu intervenção militar em julho de 1964 por ordem de uma das principais lideranças militares no Estado, o general Carlos Luis Guedes, que, à revelia do Ministério da Educação, destituiu o reitor Aloísio Pimenta, em quem via posição de esquerda, e nomeou como interventor o tenente-coronel Expedito Orsi Pimenta. A intervenção durou dois dias e, por ordem do Marechal Castello Branco, então na Presidência, o ato foi anulado e o cargo reassumido por Pimenta. A UFMG tornou-se, por várias de suas escolas, a principal instituição de resistência ao regime militar.

Foto Acervo NIFoto Acervo NI

FAFICHEndereço: Rua Carangola, 288 • Santo Antônio

A repressão atuou fortemente contra um dos principais redutos da resistência em Belo Horizonte, a Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG, a Fafich, cujo prédio, na rua Carangola, abrigava as Faculdades de Psicologia, História, Geografia, Ciências Sociais, Letras, Comunicação Social, Filosofia, Matemática, Física, Química e Biologia. O prédio foi invadido e ocupado pela Polícia Militar em 1968. Os militares levaram uma lista de 12 alunos para serem presos. Havia no prédio, no momento, 600 alunos, 90 professores e funcionários. A direção se recusou a entregar os alunos e o diretor, professor Pedro Parafita de Bessa, recebeu ordem de prisão. O impasse só seria resolvido horas depois, quando os militares deixaram o prédio. Nenhum aluno foi preso. Na Fafich, organizaram-se, em assembleias de alunos, vários movimentos públicos de resistência ao regime que prendeu, cassou e processou vários professores e estudantes. Marco de resistência à ditadura, a Fafich vai abrigar o Memorial da Anistia Política cuja montagem está sob coordenação da UFMG.

FACULDADE DE MEDICINA/UFMGEndereço: Avenida Alfredo Balena, 190 • Santa Efigêna

Em 4 de junho de 1977, a realização do III Encontro Nacional dos Estudantes, promovido pela União Nacional dos Estudantes (UNE), colocada na ilegalidade, foi violentamente reprimida em Belo Horizonte. O objetivo do encontro, que mobilizou estudantes de todo o País, era reorganizar a UNE e discutir novas formas de resistência. O Exército impediu a saída de caravanas dos estados e barrou o acesso de estudantes à capital. Um grande aparato policial-militar foi montado. Cerca de 400 universitários mineiros guardaram vigília na noite do dia 3 na Faculdade de Medicina da UFMG, onde aconteceria o encontro. A repressão culminou com o cerco da Faculdade e a condução dos confinados para o Parque da Gameleira, transformado em prisão temporária. O Diretório Acadêmico da Faculdade de Medicina já tinha sido invadido, pichado e vasculhado, em 11 de maio, por grupos anticomunistas. No ano seguinte, uma bomba explodiu no DA, provocando danos ao prédio. O Show Medicina, contestador do regime militar, sofreu restrições e acabou impedido.

Foto Acervo Projeto República/UFMGFoto Acervo Projeto República/UFMG

FACULDADE DE DIREITO/UFMGEndereço: Praça Afonso Arinos • Centro

A Faculdade de Direito da UFMG promoveu dezenas de atos políticos contra o regime militar e a favor da anistia e da redemocratização. Processos contra alunos com base na Lei de Segurança Nacional, perseguições contra professores, cercos policiais e ameaças de bombas não foram suficientes para impedir a reação dos estudantes. A Faculdade foi cercada algumas vezes por forças policiais para impedir manifestações.

DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES

O DCE/UFMG, na avenida Afonso Pena, a União Estadual dos Estudantes (UEE), na rua Guajajaras, 694, a União Municipal dos Estudantes Secundaristas (Umes), atuantes e organizados, com grande liderança entre os estudantes, lideraram os movimentos de resistência ao regime militar, com diversas e variadas manifestações, passeatas, paralisações e denúncias. Atuaram em sintonia com a UNE e seus dirigentes e líderes foram os que mais sofreram com a repressão policial, com prisões, torturas, mortes, exílios e desaparecimentos, alguns até hoje não esclarecidos. Após o Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, editado pela Junta Militar que governava o país, retirando todos os direitos e garantias individuais, muitos militantes passaram à clandestinidade, integrando organizações de resistência armada ao regime militar.

Endereço: DCE/UFMG – Avenida Afonso Pena • Centro UEE – Rua Guajajaras, 694 • Centro

Foto Acervo Projeto República/UFMG Foto Acervo Projeto República/UFMG

Uma das mais atuantes miltantes pela anistia e pela defesa dos Direitos Humanos no País, Helena Greco presidiu o Movimento Feminino pela Anistia, o MFPA/MG, e sofreu atentados e ameaças durante todo o período da ditadura e nos anos subsequentes à decretação da Lei da Anistia. Sua casa, na Rua Juiz de Fora, no Barro Preto, foi transformada em local de resistência à ditadura militar e à violação dos direitos civis. Helena Greco e sua residência tornaram-se símbolo e referência nas lutas de resistência democrática. Em março de 2014, por decisão da Câmara dos Vereadores, o Elevado Castelo Branco, batizado com o nome do primeiro presidente do ciclo militar, teve seu nome trocado para Elevado Helena Greco, ligando a região central de Belo Horizonte a importantes bairros da região Noroeste e Pampulha.

HELENA GRECO E A ANISTIAEndereço: Rua Juiz de Fora, 849 • Barro Preto

Credito: Foto Acervo IHG

Endereço: Praça Rio Branco, confluência com Avenida Afonso Pena e Rua Caetés • Centro Praça da Estação, Praça Rui Barbosa • Centro

PRAÇA DA RODOVIÁRIA

Em 24 de fevereiro de 1984, 400 mil pessoas se reuniram na Praça Rio Branco, a Praça da Rodoviária, no início da avenida Afonso Pena, em Belo Horizonte, em apoio à Emenda Dante de Oliveira, que pedia Eleições Diretas-Já, na maior concentração até então ocorrida na Capital. Minas diz “Não” à ditadura militar e pede eleições diretas para a Presidência da República. Em Belo Horizonte, a Praça Rio Branco, a Praça Sete e a Praça da Estação foram os locais históricos de manifestações, comícios, reuniões e protestos em todos os tempos da cidade.

Foto Marcelo Prates/Acervo Pessoal

CASA DO JORNALISTA/SINDICATO DOS JORNALISTAS

Entidade com vínculos históricos com a defesa da liberdade de expressão e das instituições democráticas, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais teve atuação importante na proteção dos profissionais de imprensa, na denúncia das arbitrariedades policiais e na abertura do espaço da Casa do Jornalista, na avenida Álvares Cabral, para debates que davam voz à oposição e a outras entidades sindicais ameaçadas pelo regime militar. Alinhou-se a correntes progressistas e a organismos de defesa dos Direitos Humanos. Cedeu espaço para reuniões de outras categorias profissionais e teve participação ativa na defesa da Anistia e na campanha por eleições diretas. Atuou na organização de vários sindicatos em Minas. Foi alvo de atentados a bomba, ameaças, invasões, violação de correspondência e pichações. Em 27 de junho de 1980, véspera da visita do Papa João Paulo II a Belo Horizonte, novo atentado atingiu o sindicato, que meses antes já tinha sido invadido. A explosão de uma bomba veio em meio a uma escalada de terror contra bancas de jornais, gráficas, editoras, universidades e entidades religiosas. Bombas ainda explodiram na Casa do Jornalista após a redemocratização.

Endereço: Avenida Álvares Cabral, 400 • Centro

O BINÔMIO

Fundado em fevereiro de 1952 em Belo Horizonte e um dos precursores da imprensa alternativa brasileira, tanto no formato tablóide como no conteúdo crítico, O BINÔMIO se transformaria em 1964 em trincheira contra o movimento conspiratório que levaria ao governo militar, antecedendo a atuação da chamada imprensa nanica. Jornal satírico, na linha que anos depois levou ao surgimento de “O PASQUIM”, O BINÔMIO fez humor e crítica contra todos os governos anteriores ao golpe. Após a publicação de uma matéria que apontava o então comandante militar em Minas, João Punaro Bley, como simpatizante do Nazifascismo, o jornal foi invadido por cerca de 200 militares, depredado e empastelado. Durou poucos meses em 1964, sendo fechado por apoiar as reformas de base de João Goulart. Seu editor, José Maria Rabêllo, foi obrigado a se asilar no Chile e, depois, na França. Muitos jornais que surgiram no período pós-golpe, com linha crítica e de resistência, como MOVIMENTO, EM TEMPO e DE FATO sofreram ameaças e atentados a bomba em Belo Horizonte. Os jornais comerciais de grande circulação nacional colaboraram, em sua maioria, na desestabilização do governo e apoiaram o golpe de 64.

Endereços: O Binômio – Rua Curitiba, 676 • Centro Em Tempo – Rua Bernardo Guimarães, 1.884 • Sto. Agostinho De Fato – Avenida do Contorno, 2.399 • Floresta Jornal Movimento – Rua Rio de Janeiro, 300 • Centro

Foto Breno Pataro - Acervo PBH Foto Binomio - Acervo José Maria Rabelo

EDIFÍCIO MALETTAEndereço: Esquina de Avenida Augusto de Lima e Rua da Bahia

Principal local de encontro de escritores, boêmios, atores, teatrólogos, jornalistas e intelectuais de todos os matizes ideológicos de Belo Horizonte, o Edifício Maletta era ponto obrigatório de debates sobre os rumos da política e da conjuntura nacional e de assimilação e crítica das novas ideias que surgiram com a explosão libertária dos movimentos culturais e políticos que marcaram a década de 1960. Nos bares e livrarias do Maletta, a efervescência cultural do período propiciou a formação de importantes escolas mineiras de arte, literatura e teatro. A proximidade com as redações de jornais, com a Faculdade de Direito da UFMG, na avenida Álvares Cabral, com a redação do SUPLEMENTO LITERÁRIO, onde surgiu toda uma geração de escritores, e com redutos frequentados por militantes de esquerda, como os bares BUCHECO, na rua Guajajaras, e SALOON, na rua Rio de Janeiro, fez com que, nas mesas da CANTINA DO LUCAS, do LUA NOVA e do JANGADEIRO se consolidasse um importante reduto de resistência à ditadura militar.

COLÉGIO ESTADUAL CENTRAL

O Colégio Estadual Milton Campos, o Estadual Central, foi um dos maiores formadores de líderes estudantis mineiras que se opuseram à ditadura militar. Foco de resistência ao regime autoritário, foi palco da estruturação do movimento estudantil secundarista de Belo Horizonte e um dos mais ativos formuladores das ações de protesto que ganharam as ruas da capital. Várias das lideranças surgidas no agitado clima de engajamento do colégio, um conjunto projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer e frequentado por jovens de classe média, tiveram papel importante em organizações clandestinas, como o Partido Comunista Brasileiro, a Polop (Política Operária) e a AP (Ação Popular), e vínculo com o movimento estudantil universitário. Na fase aguda da guerrilha, com o acirramento da repressão após a instituição do AI-5, várias dessas lideranças participaram de ações armadas. Presas, foram torturadas e condenadas com base na Lei de Segurança Nacional.

Endereço: Rua Fernandes Tourinho, 1.020 • Lourdes

Foto Ricardo Laf - Acervo PBH Foto Acervo NI

Endereço: Rua dos Dominicanos, 26 • Serra

CONVENTO DOS FRADES DOMINICANOS

A Igreja Progressista foi uma das mais atingidas pela repressão: de 1964 a 1979, segundo a Arquidiocese de São Paulo, 395 integrantes da Igreja foram presos, sete assassinados, 34 torturados, templos foram invadidos e depredados e nove religiosos estrangeiros foram expulsos do Brasil. De acordo com a historiadora e pesquisadora Heloísa Starling, logo após o golpe, a repressão em Minas teve como um dos alvos principais a Ação Popular (AP). Esta se inicia com a invasão do Convento dos Frades Dominicanos, localizado no bairro da Serra, e atingiu tanto líderes leigos quanto religiosos. Outra entidade católica que sofreu repressão no pós-golpe foi a Ação Católica. Em 1º de abril de 1964, a sede da Juventude Operária Católica (JOC) foi invadida pelo organismo paramilitar dos “Novos Inconfidentes”, o núcleo mineiro do Ipes, e o seu fundador e assistente eclesiástico, padre William Silva, foi indiciado em um Inquérito Policial Militar. Lideranças como os freis Betto e Tito se formaram no pequeno convento da Serra.

Endereço: Edifício Maletta • Centro

ALDEIA GLOBAL

A Editora e Livraria Aldeia Global, situada no segundo piso do Edifício Maletta, foi, por três vezes, invadida pela polícia. Ponto de encontro de estudantes e intelectuais, pertencia ao proscrito Partido Comunista e editava clandestinamente obras de história e teoria marxista. Criada por Antônio Bertelli, era um aparelho do partido em Belo Horizonte. Livros apreendidos na editora durante as invasões eram recolhidos ao Dops e incinerados.

Foto Breno Pataro - Acervo PBH

Endereço: Avenida Augusto de Lima,em frente ao Mercado Municipal

SECRETARIA DE SAÚDE

Com a radicalização política impedindo a realização das reformas de base, o ex-governador do Rio Grande do Sul e então deputado federal Leonel Brizola, líder da Frente de Mobilização Popular, apostou na pregação das reformas por meio de comícios, passeatas, entrevistas e visitas aos Estados. Em 25 de fevereiro de 1964, pouco mais de um mês antes do golpe, tentou reunir os mineiros para uma palestra no auditório da Secretaria de Estado da Saúde, hoje Minascentro, na avenida Augusto de Lima. Convocada a resistir à passagem de Brizola por Belo Horizonte por grupos anticomunistas, que na noite anterior promoveram uma palestra do almirante Silvio Heck, ex-ministro de Janio Quadros, que condenou o “imperialismo de esquerda” e a “comunização russa e cubana” do Brasil, Brizola chegou, em um primeiro momento, a ser impedido de entrar no auditório. Grupos que apoiavam o líder trabalhista se atracaram com a claque anticomunista da Frente de Mobilização Democrática. O auditório da Secretaria da Saúde foi invadido por mulheres que, com o terço nas mãos, gritavam slogans contra “o belzebu vermelho” e oravam para “exorcizar o anticristo”. O episódio ficou conhecido como a “Noite das Cadeiradas”. Agredidos com socos-ingleses e pauladas, os organizadores do encontro foram expulsos do auditório. Brizola deixou o local às pressas. Policiais participaram do conflito. Cinquenta pessoas saíram feridas.

PRAÇA SETE/IGREJA SÃO JOSÉ

Endereço: Praça Sete de Setembro • Centro Igreja São José • Avenida Afonso Pena com ruas Espírito Santo e Tamoios

Espaço simbólico da cidadania em Belo Horizonte e palco de manifestações populares que celebram conquistas e unem movimentos sociais na reivindicação de direitos, a Praça Sete, no hipercentro da capital, foi local de manifestações de estudantes e trabalhadores nos protestos contra a ditadura militar e na campanha das Diretas-Já. A 100 metros, a Igreja São José abria as portas e dava abrigo aos manifestantes perseguidos pela polícia mineira.

Foto Acervo NI Foto: Acervo Jornal Estado de Minas

CRONOLOGIA DE UM GOLPE

O presidente Getúlio Vargas, após uma intensa campanha de desestabilização liderada pela direita militar e parlamentar representada pela União Democrática Nacional, a UDN, comete suicídio em 24 de agosto nos aposentos presidenciais do palácio do Catete, no Rio de Janeiro. Assumiu o Vice-Presidente, Café Filho, em meio a uma grave crise política e militar. Pressionado pelos militares, que ameaçavam um golpe, Café Filho se licencia e passa o governo para o presidente da Câmara e sucessor natural, Carlos Luz.

1954

SINDICATO DOS MÉDICOS

A atuação sindical dos médicos de Belo Horizonte se transformou numa militância política de contestação do regime, principalmente a partir de 1980 quando, em eleição histórica, elegeu-se para o Sindicato dos Médicos a Chapa Renovação Médica, encabeçada pelo médico e ex-prefeito de Belo Horizonte Célio de Castro, que também presidiu o Cebrade (Centro Brasil Democrático). A atuação política do Sindicato levou grupos anticomunistas a praticar dois atentados contra o presidente da entidade, um deles, em abril de 1987, com a explosão de uma bomba na casa de Célio de Castro, na rua Catete, na Barroca. A repressão prendeu e processou vários médicos militantes da resistência.

Endereço: Avenida do Contorno, 4.999 • Floresta

Assume a Presidência Jânio Quadros, que tem como Vice João Goulart. Conservador, com apoio da UDN e políticas ambíguas, renuncia em agosto do mesmo ano, com apenas sete meses de governo, provocando uma nova mobilização dos militares, que não aceitam a posse de João Goulart, o que provoca uma intensa mobilização popular liderada pelo governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola. Um acordo destinado a evitar uma guerra civil permite a posse de Goulart com a implantação do regime parlamentarista. Em 1963, um plebiscito restaura o presidencialismo.

Em 31 de março, um levante militar iniciado em Juiz de Fora recebe apoio das guarnições de Rio de Janeiro e São Paulo e resulta no golpe que, com apoio de empresários representantes de empresas estrangeiras, da imprensa e de fundamentalistas católicos, derruba o governo constitucional e instaura uma ditadura que dura 21 anos. Em 12 de abril, o marechal Humberto de Alencar Castello Branco, então chefe do Estado-Maior do Exército, toma posse como presidente de fato da República pelo Congresso Nacional. Foi o primeiro dos cinco presidentes do ciclo militar, seguido dos generais Costa e Silva, Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Baptista Figueiredo. Nesse período, parlamentares foram cassados, o Congresso Nacional fechado, a imprensa foi colocada sob censura, estudantes e professores expulsos das universidades e os direitos civis suspensos, instaurando um regime de terror.

Em 15 de janeiro, o Colégio Eleitoral elege Tancredo Neves. É o fim do regime militar.

1961

1964

1985

Sob forte oposição dos militares e da UDN, que o acusavam de ter apoio dos comunistas, Juscelino Kubistchek de Oliveira foi eleito Presidente da República em 3 de outubro de 1955. A posse de Juscelino e do Vice-Presidente eleito João Goulart só foi garantida com um levante militar liderado pelo ministro da Guerra, general Henrique Teixeira Lott, que, em 11 de novembro de 1955, depôs o então presidente interino da República Carlos Luz. Suspeitava-se que Carlos Luz, da UDN, não daria posse ao presidente eleito. Assumiu a Presidência, após o golpe de 11 de novembro, o presidente do Senado Federal, Nereu Ramos. O Brasil permaneceu em estado de sítio até a posse de JK em 31 de janeiro de 1956.

1955

Dados da Arquidiocese de São Paulo apontam que

cerca de 50 mil pessoas foram presas somente

nos primeiros meses de ditadura; milhares de pessoas

passaram pelos cárceres por motivos políticos; em

torno de 10 mil exilados; 4.862 cassados;

245 estudantes expulsos das universidades

por força do decreto 477; foram 707 processos judiciais por crimes contra a segurança nacional

de 1964 a 1979; desses processos, constam 7.367

OS NÚMEROS DA DITADURA

denunciados, 6.385 indiciados e 2.183 testemunhas, perfazendo um total de 17.420 pessoas atingidas; foram quatro condenações

à pena de morte – não consumadas; 130 pessoas foram banidas do território nacional; 6.592 militares punidos. Além disso, cerca de 20 mil presos foram submetidos a torturas físicas e há um número desconhecido de mortos.

ALVES, Maria Helena Moreira. Estado e oposição no Brasil (1964-1984). Petrópolis, Vozes, 1984

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Material de pesquisaCentro de Documentação da UFMG/Projeto República

Estado de Minas/Hoje em Dia/Movimento/O Binômio/IstoÉ

Polícia Civil de Minas Gerais

Texto e pesquisa elaborados pela Empresa Municipal de Turismo de Belo Horizonte – Belotur31 de março de 2014.

BIBLIOGRAFIA

belohorizonte.mg.gov.br