material para fazer resumo de vigiar a punir

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Resenha 1

Resenha do Livro 'Vigiar e Punir' de Michel Foucault O autor divide sua obra em 4 partes; suplcio, punio, disciplina e priso. Abordando diferentes aspectos punitivos e no mbito jurdico e disciplinar, usando de carter filosfico-histrico, Foucault apresenta na primeira parte (Suplcio), "O corpo dos condenados" exemplos de suplcio, que era usado na Europa medieval como forma punitiva, exemplo divino de salvao da alma, para exemplificar isso, no inicio do livro o autor relata o suplcio de Robert-Franois Damiens,um regicida que foi condenado ao suplcio em 1757, depois de horas de agonia num ritual de tortura horrendo (sendo seu corpo desmembrado e levado a fogueira ainda vivo). Foucault fala como o suplcio dos condenados era usado pelas instituies reais na Frana como forma de punio justa e com a garantia jurdica e divina de legalidade, o castigo-espetculo era apoiado pelo poder da justia, criando assim, um sistema punitivo entre a justia e o castigo, sobre o suplcio o prprio autor fala : "No raiva sem lei, mais uma lei que toma emprestada a raiva como modo de funcionamento". A necessidade dos castigadores de punir, corrigir e reeducar, impor uma conscincia moral de "curar" o condenado fazia parte do antigo regime, sendo o suplcio o meio mais eficaz de dar o exemplo aos demais, o corpo era o instrumento, o exemplo de manifestao da justia, o corpo sofria com o suplcio para que assim, o condenado, consiga exprimir o sinal de arrependimento sincero e tenha a salvao divina. No antigo regime, no perodo da formao dos estados absolutistas na Europa, o poder era mais identificvel, pois ele se concentrava nas mos de um soberano, ele retinha todo o poder de interferncia nas condenaes, a justia estava a merc de um s indivduo (sendo que, um suposto rei que tendo caractersticas piedosas de uma interferncia no julgamento, perdoando um condenado que "merecia" a punio e o suplcio), sendo um fator preponderante de economia do poder e "injustia".O suplcio era manifestao do poder do rei, a exemplificao do seu exerccio, o soberano era inquestionvel. Na segunda parte (Punio), as formas e modelos punitivos so tratados pelo autor, a modificao da concepo de punio, a reduo do sofrimento do espetculo do suplcio pena capital, colocando 'moral' no ato de punir, a economia dos interesses e a dinmica das paixes so deixados de lado. Antigamente, at o sculo XVIII, usava-se a poltica do medo,havia uma massa composta de corpos 'inteis' que eram coagidos pelo temor e pelo misticismo, todo esses aspectos atingiram o seu pice no absolutismo, chegando at a acreditar no carter divino dos reis. Aps a Revoluo francesa criou-se a falsa impresso dos valores e ideais revolucionrios (igualdade, fraternidade e liberdade), porm nunca se extinguiu a sede do poder e as disputas interna, as instituies socias que se formavam comearam a pensar que as antigas prticas penais, elas eram ineficientes,o nmero da grande massa de ignorantes, a inaptido ao trabalho, a ociosidade e criminalidade dominavam. Cria-se ento, segundo Foucault, uma economia do poder de punir (do antigo sistema, onde o direito de punir passa de uma vingana do rei para a defesa do corpo social vigente), nesse contexto, surgem os reformadores da lei, modelos jurdicos so estudados, dentre os quais, o modelo de Rasphuis de Amsterdam de 1596, "uma transformao pedaggica e individual por um execcio contnuo", as penas com o tempo comeam a ser exploradas como fonte de mo-de-obra barata, os objetivos de reabilitao foram desvirtuados para uma concepo de que o trabalho seria uma forma de dignificar e reparar os danos cometidos a sociedade, o "homos oeconomicas" dos indivduos, a punio se torna uma forma de coero. Foucault fala da reduo da punio do suplcio que buscava apresentar um conceito novo, as reformas adotadas nos finais do sculo XVII se relaciona com a coero punitiva. Os suplcios eram vistos pelos reformadores como "atos" desumanos e de crueldade e que em alguns casos, o condenado era elevado a condio de heri pela populao. Substitui-se ento, a desorganizao pela disciplina, o medo pela coao penal, o misticismo da divindade real pelas verdades prontas e inquestionveis, a fora da palavra pelas leis escritas, a massa ociosa pela formao de trabalhadores programados, o suplcio substitudo pelo crcere. Na terceira parte (Disciplina), a dominao dos corpos e as especificidades dos modelos disciplinares so abordados. J na parte anterior Foucault cita os modelos de Auburn e Filadlfia, so modelos de sistemas penitencirios adotados pela Europa e Estados Unidos, neles so apresentados aspectos que formariam o conceito levantado nessa parte do livro pelo autor de "indivduo disciplinar", a partir do isolamento e do controle da fora de trabalho se obteria uma forma punitiva que contemplaria uma implementao de um indivduo programado para o trabalho e para a dominao, uma "reduo materialista da alma". O corpo um objeto, um alvo do poder, o homem programado tratado no captulo 'Corpos dceis', a privao de liberdade e a teoria geral do adestramento, seriam processos conseguidos atravs da disciplina, so polticas coercitivas, so a "microfsica do poder"(o modo de investimento e distribuio dos indivduos no espao determinado). Percebe-se que h uma militarizao de instituies sociais (escolas tcnicas, liceus), criando aspectos peculiares a essas instituies, o principio da hierarquia do saber nos colgios jesutas, o enfileiramento dos alunos. As instituies de ensino moldam os pensamentos dos indivduos, transformando-os em agentes do poder do estado, a disciplina deve ser a arma que molda, os mestres devem ser instrudos para implementar uma hierarquia, sem questionamentos e abertura de espao para reflexo dos alunos. A individualizao dos corpos torna os presdios um local mais funcional, o "quadriculamento" de cada indivduo no seu devido lugar benfico, pode-se associar as celas dos conventos (no processo religioso), o isolamento, segundo Foucault, " bom para que o indivduo reflita sobre os seus atos e assim no os repita". Essas estratgias tendem a dividir os corpos, anular o descontrole social, aniquilar a aglomerao e evitar confrontos e contestaes ao mximo possvel. So a melhor forma para vigiar o comportamento do indivduo. A individualizao nos colgios tinha um papel classificatrio, de aprimoramento do saber e da implementao das formas de dominao, o olhar hierarquico calculado sobre o corpo seria a "economia calculada" a "dose correta" para adestrar. Para isso o tempo de suma importncia dentro desse processo disciplinar, h hora para tudo, as oficinas criadas dentro dos presdios funcionariam de acordo de uma organizao desse tempo, o condenado tinha a hora correta para descansar, para comer, para dormir, para trabalhar. Tudo calculado para se trabalhar corretamente com o tempo, o poder se articula diretamente sobre o tempo, para se obter a "correta disciplina" e bom adestramento deve-se calcular o tempo, trabalhar com ele. O livro cita as 4 principais caractersticas da individualidade dentro desse processo disciplinar, a caracterstica celular (pela repartio espacial,o domnio do indivduo se d em uma escala celular; a "microfsica do poder"), a orgnica (pela codificao das atividades, os indivduos e suas caractersticas de trabalho), a gentica (pela acumulao do tempo) e a combinatria ( pela composio das foras e a formao da hierarquia). Para se manter essa disciplina cria-se as "micropenalidades" que seriam as punies aos atrasos, as desatenes e as atitudes incorretas, se fabrica o "permitido" e o "proibido". Esses castigos tem a funo de reduzir os desvios, eles so a arte de punir no regime do poder disciplinar, so a capacidade de hierarquizar o valor das capacidades. A ordem seria, a disciplina agindo sobre o controle dos corpos passaria por um processo individualizante. Segundo Foucault os modelos de construo das penitencirias so de um papel extremamente importante, neles todos esses processos ganham vida, e dentro desses modelos, ele analisa o modelo criado pelo filsofo ingls, Jeremy Bentham, o panptico. O panptico seria um "laboratrio do poder", ele um modelo de priso onde suas estruturas e mecanismos esto de acordo com um controle da viso, das atitudes dos prisioneiros. Ele um modelo generalizvel de funcionamento onde a disciplina um tipo de poder. Desse modelo Foucault cria a sua concepo de "panoptismo", um controle total, um modelo de vigiar infalvel, um aparelho de controle sobre os prprios mecanismos disciplinares. Nesse modelo pode-se criar e recriar os comportamentos, modificar e controlar os presos, o panptico uma torre no centro de um modelo de priso, onde os que esto do lado de foram no vem os que esto dentro, sendo assim, os que esto dentro dessa "torre panptica" tem o controle visual total desses indivduos que esto fora. Esse modelo, onde a disciplina implantada, cria a multiplicidade cumulativa dos homens, o trabalho acelerado e produtivo, tudo vigiado, e dentro da concepo capitalista e aquilo que se exerce no "movimento de acumulao de capital". Na quarta parte (Priso), se trata da questo da reforma conceitual da priso, dentro de uma "tecnologia poltica", segundo o prprio Foucault,"mentes e corpos submetidos a aes e externas poderiam ser moldados por diversas instituies sociais", ele continua abordando questes pontuais dos mecanismos internos da priso. O castigo, a represso, o isolamento e a pena so os mecanismos internos dos modelos prisionais de Auburn e Filadlfia, eles so tecnologias corretivas do indivduo. A "teoria da priso" aquela onde a questes moralizantes e reparao de danos sociais so associadas ao trabalho, a criao das oficinas de trabalho traz a tona a questo da dvida a ser paga com a sociedade, o carter da priso entra em discusso, o trabalho assalariado do condenado estava sendo discutido de acordo com as reclamaes da populao de escassez de oportunidades de trabalho. Segundo os reformadores, a priso no uma oficina apenas, uma mquina capaz de transformar a moral dos indivduos, transformando a mentalidade do delinquente, implantando os valores do trabalho moralizante, dentro de uma tica industrial de produo em larga escala. A teoria de Charles Lucas, um reformador penal citada como o conceito de "classificao mvel das modalidades", quando os indivduos so postos a um gradual sistema disciplinar. As quatro fases desse sistema so, o perodo de intimidao do condenado (privao total de convvio social e de trabalho), perodo de trabalho (isolamento e trabalho), regime de moralizao (onde permitido o convvio social) e o perodo de trabalho comum. Dentro dessa reformas conceituais, a modulao da pena, Bonneville em 1846 apresenta o projeto de liberdade condicional. O sistema penitencirio, para Foucault, uma induo do estado social, que se utiliza de tcnicas de tipo disciplinar que alimenta a prpria sociedade que a produz. O delinquente um produto do corpo social, e o estado como uma representao desse corpo tende a impor coaes violentas, a violncia agora est institucionalizada. As coaes violentas esto representadas em vrios contextos, dentre os quais, na priso a representada pela vigilncia infalvel, a mquina de Bentham toma forma, o sistema panptico encontra a partir da metade do sculo XIX um mecanismo penitencirio em pleno funcionamento, o modelo de prises construdas em crculo e semi-crculo se difunde. Passa-se tambm a construir a personalidade do infrator, se foca agora na 'biografia do infrator', onde no ato do julgamento se pode avaliar as atitudes, a intencionalidade e a vida pregressa levada em conta no momento de se expedir a sentena. Em suma, as tecnologias jurdico-punitivas passaram de processo de suplcio para priso; " uma passagem da arte de punir para outra", a priso se apresenta como um mecanismo complexo, um aparelho de controle, que sobre a tica das experincias histricas, examina os mtodos sociais.

Resenha 2A obra inicia narrando uma verdadeira cena de crueldade humana, temperada com requintes de pantomima penal. Trata-se da execuo da pena de Damiens, um parricida condenado. Em seguida, samos da horrenda paisagem da morte de Damiens12e lemos um regulamento de um internato3de jovens infratores. Temos, nesse momento, diferenas de pocas e da pedagogia da punio.Foucault faz o seguinte comentrio acerca desses dois momentos da histria de repreenso de humanos delinquentes:Apresentamos exemplo de suplcio e de utilizao do tempo. Eles no sancionam os mesmos crimes, no punem o mesmo gnero de delinquentes. Mas definem bem, cada um deles, um certo estilo penal. Menos de um sculo medeia entre ambos.E complementa:desapareceu o corpo supliciado, esquartejado, amputado, marcado simbolicamente no rosto ou no ombro, exposto vivo ou morto, dado como espetculo. Desapareceu o corpo como alvo principal da repreenso penal.5O que no passado era necessrio, pois o povo precisava se assustar com as formas hediondas de punio, no futuro no to distante foi modificado, porque na verdade o que o povo precisa no de cenas chocantes de violncia praticadas pelo Estado, que deveria ser a me e o pai de todos os cidados, mas sim de uma educao mais perene, mais justa, mais fraterna e mais frequente. O Estado precisa, ainda hoje, beber na fonte profcua de Paulo Freire: Educao no transforma o mundo. Educao muda pessoas. Pessoas transformam o mundo. Esse ser o grande efeito que teremos para prevenir delinquncias e outros desajustes sociais.O filsofo francs assevera que A execuo pblica vista como uma fornalha em que se acende a violncia.6Destarte, lembro-me de dois ensinamentos exortados por Lacassagne e Beccaria.Alexandre Lacassagne, no passado, j asseverava: A sociedade tem os criminosos que merece. Afinal de contas, ns que dosamos o poder e o dever-ser de cada um. Se somos rgidos demais, teremos celerados cruis, se formos muito complacentes, teremos criminosos contumazes. Qual a receita certa? O equilbrio! Como se alcana essa condio equnime? Educando!Beccaria, por sua vez, refletia:Os pases e os sculos em que se puseram em prtica os tormentos mais atrozes, so igualmente aqueles em que se praticaram os crimes mais horrendos.7Caro leitor, verdade! No apenas um mero aforismo ou uma tradio oral que escutamos e repassamos aos nossos colaterais e descendentes, violncia gera violncia. Com a medida em que apenamos o outro, esta ser a medida que nos admoestar. Se fracassamos na reeducao e ressocializao dos delinquentes, estes retornaro ao mundo real, mais cedo ou mais tarde, e cometero novas atrocidades, s vezes pior do que as cometidas no passado. O modelo penitencirio precisa ser revisto. Ainda tempo.Mais uma vez Foucault nos doa uma prola:a certeza de ser punido deve desviaro homem do crime e no mais o abominvel teatro; a mecnica exemplar da punio muda as engrenagens. Por essa razo, a justia no mais assume publicamente a parte da violncia que est ligada a seu exerccio.8O Estado-juiz comea a entender que o seu trabalho procurar corrigir, reeducar, curar9, e no mais promover espetculos sangrentos no meio da rua, pensando ainda estar nos tempos do Coliseu, na Roma antiga.Na grande evoluo que o Estado vem passando de milnio para milnio, de sculo para sculo, aprendeu uma nova lio que ensina:o sofrimento fsico, a dor do corpo no so mais os elementos constitutivos da pena. O castigo passou de uma arte das sensaes insuportveis a uma economia dos direitos suspensos.10Hoje devemos suspender o direito de liberdade ou os direitos polticos, mas nunca, jamais, o direito vida ou o direito incolumidade fsica. Entretanto, infelizmente, alguns Estados no cumprem os tratados internacionais de direitos humanos e ainda hoje, nos dias hodiernos, assistimos, em plena revoluo tecnolgica e intelectual do homem, a existncia de prises que so verdadeiras masmorras ou calabouos insalubres e degradantes. Como possvel recuperar um criminoso usando meios e ferramentas que os sculos anteriores j demonstraram o fracasso? fcil a equao matemtica que devemos aplicar hoje. No precisamos atacar o corpo material, muito menos o psicolgico moral, fcil, basta demonstrar aos delinquentes o caminho certo. Todos merecem chances. Ainda mais em um Pas onde a desigualdade extrema e as oportunidades so rarefeitas, para no dizer, monopolizadas por uma ou duas fraes de indivduos da sociedade. Como to bem demonstra Foucault:Quase sem tocar o corpo, a guilhotina suprime a vida, tal como a priso suprime a liberdade, ou a multa tira os bens11.Evoluo. A palavra de ordem essa: evoluo. Samos dos suplcios pblicos que escarneciam o corpo dos apenados para um engenho que num rpido manuseio retirava a vida do apenado, sem que para isso fosse necessrio viol-lo, vilipendi-lo e tortur-lo. Depois disso, a evoluo tirou a guilhotina e passou a suprimir a liberdade e o direito de propriedade ao invs da vida. Evolumos. E agora, paramos? Evoluo quer dizer movimento linear voltado para o crescimento e desenvolvimento. O grande Charles Chaplin nos ensinou a evoluir para a direo certa, se que tem direo certa. Numa ocasio, o velho Chaplin ia caminhado placidamente pela rua, quando sem menos esperar topou em uma pedra e se desequilibrou; a meninada que estava a brincar na rua olhou para o grande artista e insultou: vai para onde palhao? E Chaplin respondeu: para frente, sempre para frente.Voltando aos ricos ensinamentos da obra que estamos analisando, percebemos um retrato histrico doado por Foucault:Os parricidas e os regicidas, a eles assemelhados eram conduzidos ao cadafalso, cobertos por um vu negro, onde, at 1832, lhe cortavam a mo.12Por que o Estado passou a cobrir o rosto dos criminosos em vez de lhe expor como se fazia nos suplcios pblicos? Por um simples e importante motivo: evitar a publicidade desses fatos. Somos, ao lado de grandes gnios e pensadores, defensores que a mdia deveria evitar exibir de forma sensacionalista alguns desatinos sociais. No de hoje, a percepo de que quando um novo crime, ou modalidade de crime, exibida na mdia, dias ulteriores, h uma verdadeira epidemia do neocrime Pas afora.Parece que a televiso, a internet, o jornal, o rdio, ensina a pessoa a fazer algo que ela nem imaginava ou, como pensam alguns, acordam o gene sociopata e psicopata que est adormecido em determinados indivduos. Nos idos da dcada de 1980 e 1990, a Inglaterra passou por um momento difcil na rea esportiva, mais precisamente no futebol. As torcidas dos inmeros clubes de futebol da Inglaterra passaram a se uniformizar e se organizar para torcer pelo seu time nos estdios. At ai, nada de mais, pelo contrrio, atitude interessante de coeso e unio em prol da sua agremiao esportiva. O problema veio depois. A rivalidade esportiva ultrapassou o bom senso do esporte e passou a lesar a integridade fsica das pessoas, ceifando em alguns casos at a prpria vida. Nesse momento, a Inglaterra passou a conhecer grupos de torcedores intitulados deHooligans, que em traduo livre quer dizer: vndalos. Esses torcedores praticavam violncia contra outros torcedores, terceiros que nada tinham a ver com o revanchismo desportivo, propriedades, animais, espaos pblicos e tudo mais que se encontrava na direo deles. Era verdadeira horda de marginais a saquear, espancar, espoliar, depredar e destruir. Como a Inglaterra conseguiu educ-los? Simples. Parou de exibir em telejornais, jornais escritos e rdios, notcias que informassem a ao desses arruaceiros. Os psicanalistas e antroplogos so unnimes em concordar que todo ser humano exibicionista, uns so menos, outros so muitos, mas todos so. Muitos desseshooligansobjetivavam a mdia, a publicidade, a propaganda, a falcia de chegar para os amigos e dizer no sou um mero annimo, sou umhooligane ontem a ao do meu grupo foi televisionada, foi fotografa e etc.. Cessou a mdia, cessaram os ataques. Ainda hoje, quando em jogos de futebol que possuem grande disputa entre os dois times, um ou outro torcedor invade o campo para praticar ato desarrazoado, a primeira providncia que a televiso faz tirar o foco da imagem da cena, ou seja, coloca a cmera focalizando uma cena bonita que ocorre no estdio, uma criana tomando sorvete, um casal se abraando etc. No h mais propagao, s tem conhecimento do intruso aquele que foi ao estdio e este no tem conhecimento apenas do fato infracional, mas tambm da severa punio que o infrator, ali mesmo no juizado especial que tem no estdio, ir sofrer. A Inglaterra somou atitude inteligente com uma repreenso severa, aguda e eficaz.Resultado: oshooligansfazem parte do folclore local. Exemplo para a mdia do mundo, mormente, a nossa brasileira. No esqueamos: um criminoso alm de ter o direito constitucional de proteo a sua imagem, no merece ser visto como um heroi. Quantos brasileiros e brasileiras fazem atitudes altrustas todos os dias e a mdia no vai em busca dessas pessoas?Retornando a Foucault, encontramos algumas passagens que demonstram cabalmente o fracasso e a falncia da pena de morte. No com a morte do criminoso que vamos educar a sociedade, afinal no podemos olvidar de vista que o criminoso deve ter receio de praticar crimes por conta da sano que ir sofrer e no porque ser, desde o incio, apenado pela sociedade para ir forca ou merecer a pena capital.Certa ocasio, uma criminosa foi levada ao banco dos rus e aps a leitura do libelo acusatrio e das razes de defesa, teve por fim sua condenao confirmada nos termos da delatria. Em seguida a r conservava o sangue frio at o momento da leitura do julgamento, mas cuja cabea comeou a ficar perturbada, e completamente louca, ao ser enforcada.13Nem mesmo o pior criminoso, o mais selvagem, o mais celerado, mais perverso, consegue se manter inerte diante da possibilidade real de ter sua vida ceifada. Quantas crianas cresceram alimentando dentro de si vingana contra a morte sofrida por seus pais criminosos? Quando o Estado aceita a pena de morte em sua circunscrio, est assinando o atestado de incio dasvendetas, ou seja, as vinganas das vinganas. At onde isso foi parar? J no nos basta essavendetanos morros cariocas, nas periferias de So Paulo, Braslia, Fortaleza, ou qualquer outra grande cidade brasileira? O trfico de drogas constituiu sua lei e o artigo primeiro defende avendeta.Quantos menores assistiram seus pais morrendo nas mos de traficantes? Quantos desses no se vingaram contra os traficantes ou seus familiares? Se o Estado inicia esse regime, como pode o Estado querer o contrrio? O Estado o pai e a me da sociedade, portanto deve querer obstinadamente educar e educar tem como primeiro passo o exemplo.A morte penal permanece, hoje ainda, uma cena que, com inteira justia, preciso proibir.14Os pases e naes que adotam esse sistema de pena de morte, mesmo esses entes pblicos sabem que no se pode mais, em dias hodiernos, propagar a morte como meio de pacificao social. preciso proibir a pena de morte, caso ainda no se consiga, pelo menos, proba a sua propagao ou exposio gratuita.A pena moderna que o criminoso deve sentir aquela que fere mais a alma do que o corpo.15Entra no palco do espetculo penal a punio moral, aquela que atua na conscincia do indivduo, que sofre no apenas o repdio e o vituprio social, mas tambm o seu prprio asco, a sua prpria pena mental. Sem dvida, a pena que lesa a alma - em sentido figurado bem mais eficaz para a reeducao ou a reflexo da infrao cometida do que uma punio corporal, que muitas vezes, seno todas, cria mais raiva e dio no infrator.Foucault acha essa substituio uma efemride exemplar para o desenvolvimento carcerrio e proclama:O corpo e o sangue, velhos partidrios do fausto punitivo, so substitudos. Momento importante.16Momento para esquecer os suplcios judiciais histricos. Esquecer no significa deixar de falar, pois guardando na lembrana os erros do passado que, assim, poderemos nos corrigir no presente e zelar pelo futuro. Dito isso, farei uma breve explanao sobre suplcio. Usarei o magistrio filosofal de Foucault:Uma pena, para ser um suplcio, deve obedecer trs critrios principais: em primeiro lugar, produzir uma certa quantidade de sofrimento que se possa, se no medir exatamente, ao menos apreciar, comparar e hierarquizar; a morte um suplcio na medida em que ela no simplesmente privao do direito de viver, mas ocasio e o termo final de uma graduao calculada de sofrimentos: desde a decapitao que reduz todos os sofrimentos a um s gesto e num s instante: o grau zero do suplcio at o esquartejamento que os leva quase ao infinito, por meio do enforcamento, da fogueira e da roda, na qual se agoniza muito tempo: a morte-suplcio a arte de reter a vida no sofrimento. O suplcio faz correlacionar o tipo de ferimento fsico, a qualidade, a intensidade, o tempo dos sofrimentos com a gravidade do crime, a pessoa do criminoso, o nvel social de suas vtimas. [...] H uma cdigo jurdico da dor. [] A justia persegue o corpo alm de qualquer sofrimento possvel.17Como pode uma nao criar um cdigo jurdico da dor? possvel ainda pensar desta maneira nos dias iluminados de nossa Era? Como podeThmisperseguir o corpo do apenado ao invs de cegamente lhe doar uma deciso impregnada de equidade no seu sentido mais aristotlico possvel? No h mais o menor espao para sequer pensarmos em suplcios nos dias atuais, mesmo sabedores que somos, de que em pases orientais a prtica ainda contumaz.Um suplcio bem-sucedido justifica a justia, na medida em que pblica a verdade do crime no prprio corpo do supliciado.18Caros leitores, sintam o peso dessa sentena e reflitam.Foucault utopicamente demonstrava que se fosse para ter um julgamento de suplcio, este deveria ser antevisto pelo conhecimento da infrao, conhecimento do responsvel, conhecimento da lei. [] trs condies que [permitem] estabelecer um julgamento como verdade bem fundada.19Foucault pregava isso porque sabia que no havia de forma lapidar o cuidado e zelo por essas trs investigaes bsicas, logo no deveria nunca haver suplcios. Quantos de nsj no ouviu falar de cidados que foram presos injustamente e que at hoje cumprem pena ilegal nas celas nubladas de nosso sistema carcerrio? Quantos relatos no temos conhecimento de que pessoas menos abastadas foram presas em lugar dos verdadeiros criminosos? Se, por acaso, no Brasil fosse permitida a pena de morte, quantos inocentes no seriam estupidamente mortos?Nossa orao deve mirar no ensinamento profcuo de Roberto Lyra, o maior Promotor de Justia de todos os tempos: Melhor inocentar um culpado, do que culpar um inocente.Para Ruy Barbosa, a grande guia de Haia: No h sofrimento mais confrangente do que a injustia.Falamos isso, porque no passado - o passado horrendo dos suplcios - a maioria dos processos, seno todos, tramitavam em segredo e na presidncia de um homem conveniente e parcial.Na Frana, como na maior parte dos pases europeus com a notvel exceo da Inglaterra -, todo o processo criminal, at sentena, permanecia secreto: ou seja, opaco no s para o pblico, mas para o prprio acusado. O processo se desenrolava sem ele, ou pelo menos sem que ele pudesse conhecer a acusao, as imputaes, os depoimentos, as provas. Na ordem da justia criminal, o saber era privilgio absoluto da acusao. o mais diligente e o mais secretamente que se puder fazer, dizia a respeito da instruo, o edito de 1498.20Isso nos remete a trs fatos infelizes. Um, ainda bem, reside apenas na redao romanceada de Franz Kafka, enquanto os outros dois, hediondamente, fazem parte da Histria do mundo. Falo dos processos de Josep K., na obra O Processo do theco Franz Kafka e dos julgamentos nefastos de Jesus Cristo21e Scrates22, os quais tive o precioso trabalho de analisar sob as lentes cristalinas do Direito.Hoje, os processos secretos ou imiscudos do direito pleno de defesa so chamados de processos kafkianos. Enquanto os processos de Jesus Cristo e Scrates deixaram estampados nas egrgias pginas da Histria, como no devemos proceder diante de processos criminais. So trs julgamentos que merecem nossa ateno e de todo cientista jurdico, qui de toda a sociedade avanada e desenvolvida do sculo XXI.Alm de serem secretos, alguns julgamentos no permitiam ao ru, nem mesmo no ato de execuo da pena, falar com o magistrado ou com a acusao. Os mais pobres observa um magistrado no tm possibilidade de serem ouvidos na justia.23 nesses momentos que a mxima de Ovdio se faz real: cura pauperibus clausa est (o tribunal est fechado para os pobres).Por isso, em 1777, emVues sur la Justice Criminelle, o jurista Le Trosne clama que a justia pblica diminua suas prerrogativas contrrias a defesa e que considerem inocentes os acusados at a eventual condenao. Gestando, assim, o embrio do princpio da presuno de inocncia que preconiza que todos so inocentes enquanto no se prove o contrrio. Outra mudana proposta por Le Trosne foi que o juiz se tornasse um rbitro justo para a sociedade e que as leis fossem fixas, constantes, determinadas, de modo que os tutelados saibam qual o magistrio das leis. Este ltimo pedido de Le Trosne era baseado na assertiva de que em cada processo, o magistrado aplicava a lei mais conveniente para ele ou para os poderosos da poca, deixando, desta maneira, toda a populao extremada. Aqui, gestava-se tambm a gnese do princpio da segurana jurdica.Nos suplcios o que mais inquietava Jaucourt24, o pai da enciclopdia, eram as maquinaes do homem em apenar os seus semelhantes: um fenmeno inexplicvel a extenso da imaginao dos homens para a barbrie e a crueldade.Nesses termos, lembro-me do grande homem e advogadoMahatma Gandhi, que espantado, assustado, costumava dizer: Foi sempre para mim um mistrio o fato de alguns homens se sentirem satisfeitos com a humilhao de seu semelhante.O passado enterrou, juntamente com o tempo - aquele que inexoravelmente no para algumas espcies de suplcios. Mas, ainda hoje, pases cometem atrocidades contra os direitos humanos vida e dignidade.Esses pases que ainda hoje imprimem suplcios judiciais aos seus custodiados deviam ler aCahiers de Dolancesda Chancelaria Real da Frana, publicada em 1789: Que as penas sejam moderadas e proporcionais aos delitos [] que sejam abolidos os suplcios que revoltem a humanidade.O suplcio no lesa apenas o condenado, mas a sociedade como um todo, como um grande bloco monoltico que precisa de regras e ensinamentos abalizados por uma bssola humana e humanstica. A justia aplicada pelo Estado, caros leitores, deve ter a certeza da nova aurora e a convico da natureza, a rigidez de um monarca e a humanidade de um asceta, a fortaleza do tronco juc e a flexibilidade do bambu, a velocidade do vento e a perseverana das abelhas operrias.Na seara das mudanas nas execues penais que vinha ocorrendo com a evoluo intelectual da sociedade e, principalmente, dos monarcas, magistrados, eclesisticos e outros poderosos, um filsofo erudito propunha uma nova frmula: O Estado tem que ter o formidvel direito de punir, pois o infrator se torna o inimigo comum. Portanto, o infrator que vive em sociedade , antes de tudo, um traidor das regras e tratos sociais, desferindo golpe desleal nas entranhas dohabitatonde vive e existe socialmente.Todo malfeitor, atacando o direito social, torna-se, por seus crimes, rebelde e traidor da ptria; a conservao do Estado ento incompatvel com a sua.25Baseado nesse pensamento, Rousseau exortava que o criminoso deve ser afastado do convvio em sociedade. Entretanto, esse afastamento no significa aplicar suplcios corporais ou cruis.No reflexo criado por grandes pensadores surge outro que vem agregar alm do seu clssico saber intelectual e humanstico, o saber jurdico voltado para a amortizao dos desatinos sociais. Estou falando do inolvidvel Cesare Beccaria.Beccaria era sucinto e ao mesmo tempo contundente: Podem os gritos de um infeliz entre tormentos retirar do seio do passado que no volta mais uma ao j cometida?26. Em outras palavras ele indaga: possvel castigar uma pessoa cruelmente partindo da premissa de que sua atitude ir ser apagada ou restaurada? A vida que o infeliz condenado ceifou ir retornar com o sofrimento dantesco aplicado nele? A resposta e sempre ser: no! O apenado deve reconhecer seu erro, se arrepender, se reeducar, se ressocializar e depois retornar novamente ao seio dos comunas. Essa deve ser a pedagogia da punio. Educao!Barnave discursava em plena Constituinte francesa:Calcular uma pena em funo no do crime, mas de sua possvel repetio. Viso no ofensa passada, mas desordem futura. Fazer de tal modo que o malfeitor no possa ter vontade de recomear, nem possibilidade de ter imitadores.Parafraseando Pitgoras: educando no ser necessrio punir.Como educar um detento? Um condenado? Um celerado contumaz?Existem diversas formas. Muitas no tentadas, outras bem sucedidas, poucas no restaurveis.Uma delas transferir ao condenado a possibilidade de reparao do delito cometido. Como?A Frana tem muitas estradas intransitveis que prejudicam o comrcio; os ladres que tambm criam obstculo livre circulao das mercadorias tero que reconstruir as estradas. Seria mais eloquente do que a morte 'o exemplo de um homem que conservamos sempre sob os olhos, cuja liberdade foi retirada e obrigado a reparar a perda que causou sociedade.27Nada mais justo. Se o bandido destruiu as estradas para obstruir e dificultar a passagem de carruagens com carregamentos de produtos comerciais, ele que deve, ao ser preso, ter no bojo da condenao a ordem mandamental de que ele seja levado sob escolta juntamente com outros infratores do mesmo delito para reformar e consertar as estradas que eles inutilizaram para fins criminosos. Perfeito. Usar mo de obra dos detentos seria uma equao matemtica valorosa para o Estado, seno vejamos: o preso que trabalha tem sua pena remida, isto , a cada dia trabalhado umquantumde sua pena diminuda; segundo, o Estado no precisa fazer concesses ou licitaes morosas para contratar empresas privadas para trabalhar para ele; terceiro, diminuiria consideravelmente o custo do Estado na contratao de terceiros; quarto, no existe medida mais restaurativa para a vida de uma pessoa do que o trabalho. O trabalho dignifica o homem, mostra para ele uma nova realidade, uma nova chance, uma luz no fim do tnel; quinto, profissionalizaria nossos detentos, situao em que beneficiaria muitos que no tem ofcio profissional para sobreviver no retorno da vida em sociedade; e, por ltimo, mas no menos importante, seria a pedagogia da pena posta em realidade. Isto seria educar, ressocializar, corrigir, alm de colaborar com o prprio juzo axiomtico do detento que olhar para si mesmo no mais como um animal enjaulado, mas como algum que errou e est sendo educado para no cometer novos erros.No antigo sistema, o corpo dos condenados se tornava coisa do rei, sobre a qual o soberano imprimia sua marca e deixava cair os efeitos de seu poder. Agora, ele ser antes um bem social, objeto de uma apropriao coletiva e til. Da o fato de que os reformadores tenham quase sempre proposto as obras pblicas como uma das melhores penas possveis. Que os condenados a alguma pena abaixo da morte sejam condenados s obras pblicas do pas, por um tempo proporcional a seu crime.28Vou alm disso. Penso que, em alguns casos, poderamos fazer com que o infrator devolva sociedade o mal que lhe fez. Exemplo: o homicida deveria ser apenado tambm, alm do regime prisional, a de dois em dois meses doar sangue para salvar vidas. Se o condenado puder e isso no ofender sua integridade corporal ou sua sade, que ele saiba o valor pedaggico dessa medida: tirei uma vida humana, mas agora estou devolvendo com minha ajuda a vida a muitas outras. Com isso, quem sabe no humanizamos um pouco os nossos detentos? Ser que a reflexo no ser interessante para ele? Ele poderia pensar assim: doei sangue, salvei duas vidas, como importante uma vida. E em seu retorno sociedade ele poderia alm de continuar ajudando a salvar mais vidas com sua doao nunca mais tentar contra a vida de um humano. Interessante no? possvel, basta querermos!Tenho outros exemplos: o que cometeu peculato cumprir sua pena aprendendo o ofcio laborioso para construir mveis e utenslios para o poder pblico. Assim, o poder pblico gastaria menos com compras de fornecedores privados e ainda estaria conscientizando um infrator. A pessoa infanticida e a que cometeu o aborto ou ajudou na empreitada criminosa, poderia, sob escolta, durante um dia na semana, cuidar de filhos de detentas, assim ela passaria a dar valor e refletiria sobre sua ao delituosa anterior. Com certeza, esses infratores passariam a dar mais valor gestao. O infrator falsificador iria trabalhar colaborando com a polcia na investigao de outros infratores do gnero, tal como assistimos no final do famigerado filme Prenda-me se puder com o astroHollywoodianoLeonardo Dicprio. simples: a regra demonstrar para o infrator o erro e fazer com que ele conviva com o erro, mas agora olhando na direo correta. Se restaurando.Como to bem adverte Foucault: O suporte do exemplo, agora, a lio.29O condenado alm de se sentir til, fato raro nos dias atuais, ainda dar orgulho aos seus familiares que o aguardam do lado de fora das muralhas. Isso seria perfeito. Podemos deixar de sonhar e transformar em realidade? Podamos, basta querer!Como to bem lecionava Danjou:O salrio [trabalho] faz com que se adquira amor e hbito ao trabalho; d a esses malfeitores que ignoram a diferena entre o meu e o teu o sentido da propriedade daquela que ganhou com o suor do rosto.30O presono um peso. O preso deveria ser encarado como uma pessoa que errou e que pode se corrigir e ser exemplo. No vamos mais confundir preso com peso, existe um r importante na primeira palavra que por linha do destino a consoante inicial da palavra: REEDUCAO e RESTAURAO.Voltemos ao manancial vivo de lies de Foucault:A ideia de uma recluso penal explicitamente criticada por muitos reformadores. Porque incapaz de responder especificidade dos crimes. Porque desprovida de efeito sobre o pblico. Porque intil sociedade, at nociva: cara, mantm os condenados na ociosidade, multiplica-lhes o vcio.31Cabea vazia, oficina do diabo, j diz o provrbio popular. Ao invs de cio, os detentos devem respirar o hlito do trabalho, da produo, da serventia. Devem se refrescar com o vento que sopra em sua face dizendo-os: vs sois teis. O prprio detento com o trabalho que oferta ao poder pblico pagaria a sua manuteno, que cara, no presdio. O homem s d valor quilo que conquista. Pedagogia da pena. Atentem!Depois disso, o nosso sistema penitencirio a melhor ps-graduao que existe no Pas. Os presos entram por delitos como o furto, por exemplo, e saem ps-doutores em quadrilha, trfico de drogas, homicdios em massa. Algo est errado.A priso por priso um lugar de trevas onde o olho do cidado no pode contar as vtimas. Alis, a escurido das prises se torna assunto de desconfiana para os cidados: supem facilmente que l se cometem grandes injustias.32A priso do jeito que hoje, incua porque se eu tra meu Pas, sou preso; se matei meu pai, sou preso; todos os delitos imaginveis so punidos de maneira mais uniforme. Tenho a impresso de ver um mdico que, para todas as doenas, tem o mesmo remdio33. E um remdio que no cura!J diziam os romanos: Ad Continendos homines, non ad puniendos, isto , a priso assegura que temos algum, no o pune.Como dizia Desjardin emLes Cahiers de Dolance et la Justice Criminelle:As prises, na inteno da lei, sendo destinadas no a punir mas a garantir a presena das pessoas... Privar um cidado do mais precioso dos bens, mergulh-lo ignominiosamente no mundo do crime, arranc-lo a tudo o que lhe caro, precipit-lo talvez na runa e retirar-lhe, no s a ele mas sua infeliz famlia, todos os meios de subsistncia34.Isso sem lhe dar nada em troca. Tem que reeducar, ressocializar, faz-lo entender o dano e repar-lo.Tambm no pode ser apenas reparao do dano, tem que mostrar aos apenados a obrigao do trabalho que retribui e permite ao detento melhorar o seu destino durante e depois da deteno35.O prazo da pena indiferente correo dos hbitos; deixando os condenados deriva da ocupao de se evadir e se revoltar.36Na antiga cidade norte-americana de Filadlfia, em 1796, Liancourt Rochefoucauld sugeria que os condenados fossem empregados em trabalhos produtivos para faz-los suportar os gastos da priso, para no deix-los na inao e para lhes preparar alguns recursos para o momento em que dever cessar seu cativeiro.No somos contrrios pena de priso, pelo oposto, concordamos que a priso a pena das sociedades civilizadas.37Como preconizava Foucault: Conhecem-se todos os inconvenientes da priso, e sabe-se que perigosa, quando no intil. E, entretanto, no vemos o que pr em seu lugar. Ela a detestvel soluo, de que no se pode abrir mo.38Em outras palavras, o mal necessrio. Melhor a punio da liberdade, do que a punio corporal ou capital. um avano, mas ainda assim, possui mculas corrigveis.Um exemplo de mcula corrigvel se d na catalogao dos presos em virtude de seus delitos. inconcebvel se colocar na mesma cela ou pavilho, um traficante e homicida com um simples furtador contumaz. no se pode permitir que o indivduo condenado a penas leves se encontre preso no mesmo local que o criminoso condenado a penas mais graves.39O condenado deve se emendar, se corrigir, jamais aprender novas prticas criminosas ou execues de crimes bem mais nocivos sociedade.Alis, essa separao constitucional, seno vejamos o que reza aCarta Magnade nosso Pas:Art.5XLVIII - apena ser cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado. (grifo nosso)Em 1839, os diretores de penitencirias, baseados na ausculta de seus reclusos, elaboraram as sete mximas universais da boa condio penitenciria.I A pena privativa de liberdade tem como objetivo principal a recuperao e a reclassificao social do condenado; (Princpio da correo)II - Os detentos devem ser isolados ou pelo menos repartidos de acordo com a gravidade penal de seu ato, mas principalmente segundo sua idade, suas disposies, as tcnicas de correo que se pretende utilizar com eles, as fases de sua transformao; (Princpio da classificao)III adequado aplicar um regime progressivo com vistas a adaptar o tratamento do prisioneiro sua atitude e ao seu grau de regenerao. Este regime vai da colocao em cela semiliberdade. O benefcio da liberdade condicional estendido a todas as penas temporrias; (Princpio da modulao das penas)IV O trabalho penal no deve ser considerado uma agravao da pena. Deve permitir aprender ou praticar um ofcio, e dar recursos ao detento e a sua famlia; (Princpio do trabalho como obrigao e como direito)V O tratamento ao prisioneiro, fora de qualquer promiscuidade, deve tender principalmente sua instruo geral e profissional e sua melhora; (Princpio da educao penitenciria)VI O mdico da priso deve conhecer melhor o temperamento dos presos. Exercer ao mais eficaz sobre os sentimentos dos presos, aliviando-lhes dos males fsicos e aproveitando para faz-los ouvir palavras severas ou encorajamentos teis. Em todo estabelecimento penitencirio deve funcionar um servio social e mdico-psicolgico; (Princpio do controle tcnico da deteno)VII O encarceramento deve ser acompanhado de medidas de controle e de assistncia at a readaptao definitiva do antigo detento. dada assistncia aos prisioneiros durante e depois da pena com a finalidade de facilitar a sua reinsero social. (Princpio das instituies anexas).Se nosso sistema prisional cumprisse 50% (cinquenta por cento) dessas sete mximas universais, com certeza vislumbraramos uma mudana radical em nossos crceres e no retorno social dos antigos infratores. Seriam egressos de uma penitenciria que os educou, os ressocializou, os fez enxergar os caminhos ticos e morais e devolveu-os o sentimento de valorizao da vida, da propriedade, da famlia, da sociedade, do amor ao Estado, e tantos outros ensinamentos melhores para a sua vida em diante.Insisto novamente no hasteamento dessa bandeira: EDUCAO.A educao de forma insofismvel a melhor prtica para diminuirmos os delitos e os crimes cometidos em nossa comunidade. Esta educao deve comear no incio da vida humana, ainda na fase infante, tomar crianas, faz-las adotar pela ptria, prepar-las em escolas, ensinar sucessivamente a postura.40Recordo-me de pensamento do incrvel jurista Pontes de Miranda sobre o assunto: Preparemos todas as crianas em idade escolar, alinhemo-las todas, no mesmo ponto de partida! S assim daremos a todas as mesmas possibilidades; s assim faremos obra de justia social, de cooperao leal e de fraternidade. Esse o caminho. Educao de qualidade demonstrar na prtica a existncia da luz solar sobre a sociedade. Basta-nos abrir a janela pela manh na aurora que veremos o sol brilhar para todos. Investir em educao o mesmo que dizer que todos tero as mesmas oportunidades da mesma forma que o sol brilha para o rico e para o pobre.Se cada um de ns leitores colocarmos em prtica essas ideias, estaremos, assim como o beija-flor, pingando a nossa gotinha no grande incndio em que vive a sociedade. Com certeza, se as autoridades repensarem o modelo prisional no vamos nunca mais precisar assinar e ler atestados de fracasso.A obraVigiar e Punirde Michel Foucault traz essas e muitas outras noes e lies. Trata-se, portanto, de um estudo profcuo do seu incio ao fim.Referncias Bibliogrficas1Finalmente foi esquartejado. Essa ltima operao foi muito longa, porque os cavalos utilizados no estavam afeitos trao; foi necessrio, para desmembrar as coxas do infeliz, cortar-lhe os nervos e retalhar-lhe as juntas.... FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 92Um dos carrascos chegou mesmo a dizer pouco depois que, assim que eles levantaram o tronco para o lanar na fogueira, ele ainda estava vivo. FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 113Regulamento redigido por Lon Faucher para a Casa dos jovens detentos em Paris.4FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 135Ibid, 2012, p. 136Ibid, 2012, p. 147BECARRIA, Cesare,Dos Delitos e das Penas.So Paulo: Martin Claret, p. 508FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 149Ibid, 2012, p. 1510Ibid, 2012, p. 1611Ibid, 2012, p. 1812FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 1413FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 4714Ibid. 2012, p. 2015MABLY. G.De La Lgislation.Ouevres Completes.1789, p. 32616FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 2117Ibid, 2012, p. 35-3618Ibid, 2012, p. 4519FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 2320Ibid, 2012, p. 3721RIBEIRO, Roberto Victor Pereira.O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito.So Paulo: Pillares, 2010.22___________________________.O Julgamento de Scrates sob a luz do Direito.So Paulo: Pillares, 2012.23FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 6024Louis Jaucourt foi um erudito francs e um dos mais prolificos contribuidores para aEncyclopdie. Ele escreveu por volta de 18.000 artigos sobre assuntos envolvendo fisiologia, qumica, botnica, patologia e histria poltica, ou cerca de 25% de toda a enciclopdia, tudo feito voluntariamente.25ROUSSEAU. J. J.O Contrato Social.So Paulo: Martin Claret, 2010.26BECCARIA, Cesare.Dos Delitos e das Penas.So Paulo: Martin Claret, 2009, p. 8727FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 10528FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 10529FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 10630DANJOU.Des Prisons. 1821, p. 21031Ibid. 2012, p. 11032Ibid. 2012, p. 11033CHABROUD, Ch.Archives Parlementaires.TXXXVI, p. 61834Langres,Trois Ordres.p. 483apudFOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 11535FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 11836Ibid, 2012, p. 11837ROSSI.Trait de Droit Pnal.Vol. III, 1829, p. 16938FOUCAULT, Michel.Vigiar e Punir.40 ed. Petrpolis: Vozes, 2012, p. 21839Motifs du Code d'instruction Criminelle, p. 24440Ibid, 2012, p. 152

Resenha 3

Foucault: Vigiar e punir Resenha para preguiososPublicado em 30/06/2012 por Vinicius

preciso retomar, aqui, um pouco das razes de Foucault em seu livro mais pop, Vigiar e punir. Como este espao no se presta a elaboraes extensas, atenho-me, como de costume, a uma parte do livro apenas. Optei pelo incio, isto , pelo primeiro captulo. Para os amigos, reservo o dilogo acerca dos outros captulos, um dia.

Antes de adentrar a resenha propriamente dita, declaro que no me contentei muito com a traduo brasileira (em determinados pargrafos, h trechos ininteligveis). Tentei buscar on line, ento, o original em francs, mas no o achei. Ainda bem. Porm, h trechos da traduo inglesa disponveis na rede, os quais me ajudaram bastante quando houve dvidas. Isso, de alguma maneira, comprova que o problema mesmo da traduo brasileira, e no do original francs apesar de sabermos de toda a afetao de Foucault, inclusive no que diz respeito ao tratamento do texto. Como j traduzi um livro sobre o filsofo, creio haver algo de verdadeiro no que afirmo.

O livro comea pela narrativa da tortura, suplcio e esquartejamento de um parricida, em 1757. Pois bem, isso o bastante para que eu faa minhas primeirssimas derivaes, as quais serviro de intrito resenha. Falemos da tortura de Damiens, o assassino: o modo como ela foi feita, a agressividade nela contida, o esprito de sua poca, a animalidade, o mundo dicotmico em que se inseria tudo isso servir de substrato para a tese a ser apresentada ao longo do livro, qual seja, a de que essa tortura, com o tempo (isto , ao longo dos sculos XIX e XX), transmuta-se em outra coisa, transfere-se para outro lugar. No s passa do corpo para a alma (as aspas so minhas, e no de Foucault, mas acredito que estejam bem colocadas ver a citao 23 do livro, mais abaixo): a tortura deixa tambm de ser prerrogativa de quem detm um poder poltico que se sustenta fortemente na moral religiosa, no crivo religioso, para passar a ser prerrogativa do poder legal, do poder educacional, do poder psiquitrico, do poder presente no trabalho etc. Em outras palavras, passa a ser tortura disseminada, difusa.

Esse aspecto difuso da tortura, sua disseminao pelos mais diversos setores de nossa vida diria, j est, hoje, to introjetado no que somos que sequer a percebemos. Ao contrrio, h, na sociedade ocidental contempornea, esquisita e esquizofrenicamente, um certo prazer em ser torturado, uma vontade de no ser livre, de delegar poderes aos carrascos, que so muitos, e tambm difusos, mas ainda to sem luzes quanto aqueles carrascos caricatos, seja do Antigo Regime, seja da Revoluo meros cumpridores de ordens. Estamos diante deles no condomnio, no trabalho, no transporte pblico, nas ruas, na beira da praia at o campo, com sua atmosfera de amplido libertria, tem o seu carrasquinho. O Ocidente julga-se livre, mas est preso, muito preso

Se o aprisionamento torturante, hoje, no o do corpo, mas o da alma, h-de se buscar, na prtica, o lugar de onde emanam os eflvios de poder que agrilhoam essa tal alma. No difcil perceber que boa parte deles, talvez a mais forte e resistente em termos miasmtico-prisionais (o qu?!), venha ainda do cerne e da carne da Igreja (assim como de seus derivados: os embutidos pentecostais, evanglicos, macedianos). Cordeiros torturados em nmero crescente bradam seus cnticos torturantes por todo o lugar, at mesmo em Copacabana (eis a cor local do texto), enquanto prostitutas passam ao largo dos templos, desfilando pernas, umbigos e bocas. A necessidade de sentir-se subjugado encontra facilmente, assim, apesar da lascvia circundante, lugar de congregao. Sob o olhar piedoso do padre/pastor e dos irmos em Cristo, todos esto protegidos e devidamente anulados. O esprito aprisionado entre as quatro paredes do Senhor esprito satisfeito. Afinal, fora dessas quatro paredes, no h mesmo nada, a no ser o mundo, no ? Moldada a mente, ou esprito, ou alma, pela moral que emana da Igreja, resta pouco a moldar. Contudo, a educao escolar, o mundo do trabalho e o mundo paralelo da cultura/entretenimento/informao seriam, entre outras frentes, trs replicadores dessa moral, pondo-se, ainda que em outros termos, contra o indivduo, com a finalidade precpua, apesar de tcita, de torn-lo ainda mais dcil, ou, por fim, de moldar os que no do ouvidos ao discurso religioso. Afinal quem no religioso tambm precisa ser controlado. Fecham-se as brechas.

A escola, j pelo simples fato de dispor de um currculo, prega tambm verdades. Sua crena a de que, por meio de restries e encaminhamentos, o indivduo ser devidamente moldado. Uma vez moldado, ser, ento, entregue sociedade pronto para o trabalho. Neste, cumprir docilmente sua jornada de oito horas, contribuindo no s para sua dignificao prpria, mas tambm para o enobrecimento da humanidade, dizem. Findas as oito horas, paralelamente ao trabalho, de maneira consecutiva, haver algum tempo e espao para o prazer/lazer, o conhecimento e a percepo da realidade, todos eles regidos, hoje, pela lgica da Publicidade, a qual aproxima sem escrpulos e sob um fundo eminentemente quantitativo (leia-se quantificvel) e quase nada qualitativo prazer/lazer de entretenimento, conhecimento de cultura em sentido restrito e percepo da realidade de informao jornalstica. Desse caldeiro escola-trabalho-diverso, surgem os belos indivduos que nos cercam, como se fossem carcereiros do bem (a expresso minha). No aspecto diverso (deixarei a escola e o trabalho de fora, porque o texto j se anuncia longo), esses carcereiros do bem atuam como moedeiros falsos contumazes, mas julgam produzir somente dobres de ouro. Tudo, para eles, deve imediatamente ser convertido em algo quantificvel da os processos infantis em que incorrem, mesmo quando adultos maduros: viajei mais do que voc durante as frias (entretenimento quantificado); sei mais sobre Erasmo de Rotterdam do que voc (cultura em sentido restrito quantificada); estou mais bem informado do que voc sobre a crise na Europa (informao quantificada). Devidamente quantificada, a vida ganha ares de competio, e os moedeiros falsos sentem-se, sempre, na liderana. De fato, so prceres da humanidade de cuja companhia devemos muito nos orgulhar.

Depois desse longo intrito, passemos a trechos relevantes do livro, enfim. Estou usando a edio da Vozes, traduo de Raquel Ramalhete. Todos os trechos abaixo so do primeiro captulo apenas. Aps uma caminhada pela praia (sim, um inverno quente este), pretendo analis-los. Imaginem vocs que meu scanner quebrou e tive de digitar todos os trechos. Santa tortura a que me submeto em nome do sagrado contedo deste site

Trechos de Vigiar e punir (traduo de Raquel Ramalhete) compilados por Vinicius Figueira, sem inteno comercial, para mera anlise pessoal e intransfervel.

1. Dentre tantas modificaes, atenho-me a uma: o desaparecimento dos suplcios. [] Punies menos diretamente fsicas, uma certa discrio na arte de fazer sofrer, um arranjo de sofrimentos mais sutis, mais velados e despojados de ostentao. [p. 13]

2. A punio [] deixa o campo da percepo quase diria e entra no da conscincia abstrata [] a certeza de ser punido que deve desviar o homem do crime []. [p.14]

3. a prpria condenao que marcar o delinqente com sinal negativo e unvoco: publicidade, portanto, dos debates e da sentena; quanto execuo, ela como uma vergonha suplementar que a justia tem vergonha de impor ao condenado. [p. 15]

4. A execuo da pena vai-se tornando um setor autnomo, em que um mecanismo administrativo desonera a justia. [p. 15]

5. E acima dessa distribuio dos papis se realiza a negao terica: o essencial da pena que ns, juzes, infligimos, no creiais que consista em punir; o essencial procurar corrigir, reeducar, curar. [p. 15]

6. Existe na justia moderna e entre aqueles que a distribuem uma vergonha de punir, que nem sempre exclui o zelo: ela aumenta constantemente: sobre esta chaga pululam os psiclogos e o pequeno funcionrio da ortopedia moral. [p. 15]

7. De modo geral, as prticas punitivas se tornaram pblicas. No tocar mais no corpo ou o mnimo possvel, e para atingir nele algo que no o corpo propriamente. [] O sofrimento fsico, a dor do corpo no so mais os elementos constitutivos da pena. O castigo passou de uma arte das sensaes insuportveis a uma economia dos direitos suspensos. [] Um exrcito inteiro de tcnicos veio substituir o carrasco, anatomista imediato do sofrimento: os guardas, os mdicos, os capeles, os psiquiatras, os psiclogos os educadores. [p. 16]

8. O emprego da psicofarmacologia e de diversos desligadores fisiolgicos, ainda que provisrio, corresponde perfeitamente ao sentido dessa penalidade incorprea. [p. 16]

9. Desaparece, destarte, em princpios do sculo XIX, o grande espetculo da punio fsica: o corpo supliciado escamoteado; exclui-se do castigo a encenao da dor. Penetramos na poca da sobriedade punitiva. [p. 19]

10. A reduo do suplcio uma tendncia com razes na grande transformao de 1760-1840. [] Castigos como trabalhos forados ou priso privao pura e simples da liberdade nunca funcionaram sem certos complementos punitivos referentes ao corpo: reduo alimentar, privao sexual, expiao fsica, masmorra.

11. O afrouxamento da severidade penal no decorrer dos ltimos sculos um fenmeno bem conhecido dos historiadores do direito. Entretanto, foi visto, durante muito tempo, de forma geral, como se fosse fenmeno quantitativo: menos sofrimento, mais suavidade, mais respeito e humanidade. Na verdade, tais modificaes se fazem concomitantes ao deslocamento do objeto da ao punitiva. [] Se no mais ao corpo que se dirige a punio, em suas formas mais duras, sobre o que ento se exerce? A resposta dos tericos [] simples, quase evidente. Dir-se-ia inscrita na prpria indagao. Pois no mais o corpo, a alma. Marbly formulou o princpio fundamental: que o castigo, se assim possa exprimir, fira mais a alma do que o corpo. [p. 21]

12. Momento importante. O corpo e o sangue, velhos partidrios do fausto punitivo, so substitudos. Novo personagem entra em cena, mascarado. Terminada uma tragdia, comea a comdia, com sombrias silhuetas, vozes sem rosto, entidades impalpveis. O aparato da justia tem que se ater, agora, a esta nova realidade, realidade incorprea. [p. 21]

13. Muitos crimes perderam tal conotao [de crime], uma vez que estavam objetivamente ligados a um exerccio de autoridade religiosa ou a um tipo de vida econmica; a blasfmia deixou de se constituir em crime; o contrabando e o furto domstico perderam parte de sua gravidade. [p. 21]

14. Sob o nome de crimes e delitos, so sempre julgados corretamente os objetos jurdicos definidos pelo cdigo. Porm, julgam-se tambm as paixes, os instintos, as anomalias, as enfermidades, as inadaptaes, os efeitos de meio ambiente e de hereditariedade. [] so as sombras que se escondem por trs dos elementos da causa que so, na realidade, julgadas e punidas. [] o conhecimento do criminoso, a apreciao que dele se faz, o que pode saber sobre suas relaes entre ele, seu passado e o crime, e o que se pode esperar dele no futuro. [p. 22]

15. A alma do criminoso no invocada no tribunal somente para explicar o crime e introduzi-la como um elemento na atribuio jurdica das responsabilidades; se ela invocada com tanta nfase, com tanto cuidado de compreenso e to grande aplicao cientfica, para julg-la, ao mesmo tempo que o crime, e faz-la participar da punio. [p. 22]

16. O laudo psiquitrico, [] a antropologia criminal e o discurso da [] criminologia, introduzindo solenemente as infraes no campo dos objetos suscetveis de um conhecimento cientfico, [do] aos mecanismos da punio legal um poder justificvel no mais simplesmente sobre as infraes, mas sobre os indivduos; no mais sobre o que eles fizeram, mas sobre aquilo que eles so, sero ou possam ser. No mais simplesmente: Quem o autor [ do crime]? Mas Como citar o processo causal que o produziu? Onde estar, no prprio autor, a origem do crime?. [p. 23]

17. Admitiram que era possvel algum ser culpado e louco; quanto mais louco, tanto menos culpado; culpado, sem dvida, mas que deveria ser enclausurado e tratado e no punido; culpado, perigoso, pois manifestamente doente etc. E a sentena que condena ou absolve no simplesmente um julgamento de culpa uma deciso legal que sanciona: ela implica uma apreciao de normalidade e uma prescrio tcnica para uma normalizao possvel. O juiz de nossos dias magistrado ou jurado faz outra coisa bem diferente de julgar. [p. 23]

18. Ao longo do processo penal, e da execuo da pena, prolifera toda uma srie de instancias anexas: [] peritos psiquitricos ou psicolgicos, magistrados da aplicao das penas, educadores, funcionrios da administrao penitenciria fracionam o poder legal de punir[]. A partir do momento em que se deixa a pessoas que no so os juzes da infrao o cuidado de decidir se o condenado merece ser posto em semiliberdade ou em liberdade condicional, se eles podem pr um termo sua tutela penal, so sem duvida mecanismos de punio legal que lhes so colocados entre as mos e deixados sua apreciao; juzes anexos, mas juzes de todo modo. [p. 24 e 25]

19. Resumindo: desde que funciona o novo sistema penal o definido pelos grandes cdigos dos sculos XVIII e XIX um processo global levou os juzes a julgar coisa bem diversa do que crimes: foram levados em suas sentenas a fazer coisa diferente de julgar; e o poder de julgar foi, em parte, transferido a instncias que no so as dos juzes da infrao. A operao penal inteira se carregou de elementos e personagens extrajurdicos. Pode-se dizer que no h nisso nada de extraordinrio, que do destino do direito absorver pouco a pouco elementos que lhe so estranhos. Mas uma coisa singular na justia criminal moderna: se ela se carrega de tantos elementos extrajurdicos, no para poder qualific-los juridicamente e integr-los pouco a pouco no estrito poder de punir; , ao contrrio, para poder faz-los funcionar no interior da operao penal como elementos no jurdicos; para evitar que essa operao seja pura e simplesmente uma punio legal; para escusar o juiz de ser pura e simplesmente aquele que castiga. [p. 25]

20. Objetivo deste livro: uma histria correlativa da alma moderna e de um novo poder de julgar; uma genealogia do atual complexo cientfico-judicirio onde o poder de punir se apia, recebe suas justificaes e suas regras, estende seus efeitos e mascara sua exorbitante singularidade. [nota minha: conceito de genealogia da punio] [p. 26]

21. A relao entre os vrios regimes punitivos e os sistemas de produo em que se efetuam: assim, numa economia servil, os mecanismos punitivos teriam como papel trazer mo de obra suplementar e constituir uma escravido civil ao lado da que fornecida pelas guerras ou pelo comrcio. [p. 28]

22. Mas o corpo tambm est diretamente mergulhado num campo poltico; as relaes de poder tm alcance imediato sobre ele; elas o investem [atacam], o marcam, o dirigem o supliciam, sujeitam-no a trabalhos, obrigam-no a cerimnias, exigem-lhe sinais. Este investimento poltico do corpo est ligado, segundo relaes complexas e recprocas sua utilizao econmica [] [A constituio do corpo] como fora de trabalho s possvel se ele est preso num sistema de sujeio; o corpo s se torna til se ao mesmo tempo corpo produtivo e corpo submisso. Essa sujeio no obtida s pelos instrumentos da violncia e da ideologia; [] pode ser calculada, organizada, tecnicamente pensada, pode ser sutil, no fazer uso de armas nem do terror, e no entanto continuar a ser de ordem fsica. [p. 28 e 29]

23 . No se deveria dizer que a alma uma iluso, ou um efeito ideolgico, mas afirmar que ela existe, que tem uma realidade, que produzida permanentemente, em torno, na superfcie [e] no interior do corpo, pelo funcionamento de um poder que se exerce sobre os que so punidos de uma maneira mais geral sobre os que so vigiados, treinados e corrigidos, sobre os loucos, as crianas, os escolares, os colonizados, sobre os que so fixados a um aparelho de produo e controlados durante toda a existncia. Realidade histrica dessa alma que, diferentemente da alma representada pela teologia crist, no nasce faltosa e merecedora de castigo, mas nasce antes de procedimentos de punio, de vigilncia, de castigo e de coao. [p. 31 e 32]

Resenha 4Resenha do Livro " Vigiar e PUnir"

O livro descreve inicialmente a punio de um parricida e todo o tipo de suplcio aplicado a um criminoso da poca. O detalhamento de cada etapa do ritual descrito com riqueza de detalhes, vislumbrando ao leitor a percepo de todo o castigo imposto ao condenado.Diante das descries, os castigos eram verdadeiros suplcios, onde os acusados tinham seu corpo exposto a uma execrao pblica, verificando-se, ento, uma violncia no s fsica, mas, tambm psicolgica, em todos os partcipes do ato de penalizao, um verdadeiro espetculo de horror. Alm da multido, os carrascos, o comissrio de polcia, o escrivo, os confessores, e os oficiais. Tudo meticulosamente articulado, desde o trajeto em direo ao local do suplcio a cada operao de punio, cujo tempo de durao poderia ir at a morte, dependendo da resistncia do criminoso.Trs dcadas depois, foi elaborado um novo regulamento em Paris, os suplcios eram aplicados conforme o delito, bem como o tempo de sua durao Enfim, este um livro que aborda, ao longo de sculos, os mtodos e mecanismos punitivos, efeitos repressivos, disciplina e castigo impostos aos criminosos, desde a Europa Medieval at os dias de hoje.Vale destacar que a primeira parte do livro tenta resumir em tese todo o texto que ser tratado, suas diversidades de mtodos, a evoluo dos pensamentos, do sistema de poder e de como conter as massas, passando para a humanizao e o estudo da alma humana, na tentativa de assim estudar cientificamente toda as relaes de poder e os seus objetos. Neste perodo passou a existir hierarquia, descrita pelo autor como um cerimonial, o processo de punir. Neste texto so relatadas, detalhadamente, todas as etapas do espetculo, que privava o condenado de todo e qualquer recurso de minimizao do sofrimento, fosse ele em qualquer esfera.Toda a comunidade assistia quela cena de castigo, que era um dos objetivos do soberano, mostrar a sua fora e o rigor para com aqueles que infringiam suas normas, ou ousassem desafi-lo.Os suplcios, assim chamados, os tratamentos de punio aos julgados culpados, obedeciam aos rituais mais pormenorizados e cerimoniosos que se possa imaginar. Os criminosos eram torturados, executavam trabalhos forados, enclausurados, alm da privao da plena liberdade, sofriam a reduo alimentar, privao sexual, expiao fsica e a masmorra. Percorriam ruas, praas pblicas, descalos, com a cabea coberta, eram colocados nus ou ainda vestidos em camisolas, cujas cores indicavam o tipo do delito cometido. Eram, ainda, levados a pelourinhos, cadafalsos, portando a arma do crime (facas, armas...); sobre os seus corpos eram derramados chumbo, piche, leo quente, tinham seus corpos puxados por quatro cavalos, tendo seus membros reduzidos e consumidos pelo fogo. Um verdadeiro espetculo de horror, que levava pior das mortes, tudo isso como pena de um crime, que, muitas vezes no sofria o seu real julgamento. O certo que, para o erro, somente o suplcio, a morte.Neste momento o pensamento era achar uma nova maneira de punir; pensadores e filsofos, juristas, legisladores do sculo XVIII entraram em confronto, o suplcio passou a ficar intolervel. O suplcio era mais uma coroao do poder do soberano, uma revanche da sua fora, quando assim contrariado. Puramente interesse poltico, descartando todo e qualquer possibilidade de se fazer de fato justia. Mas para outros a ideia era punir sem se vingar.Os suplcios, assim chamados, os tratamentos de punio aos julgados culpados, obedeciam aos rituais mais detalhados e cerimoniosos que se possa imaginar. Os criminosos eram torturados, executavam trabalhos forados, enclausurados, alm da privao da plena liberdade, sofriam a reduo alimentar, privao sexual, expiao fsica e a masmorra. Percorriam ruas, praas pblicas, descalos, com a cabea coberta, eram colocados nus ou ainda vestidos em camisolas, que s vezes em cores indicavam o tipo do delito cometido. Eram ainda, levados a pelourinhos, cadafalsos, portando a arma do crime (facas, armas...), sobre os seus corpos era derramado chumbo, pinche, leo quente, eram amarrados e seus corpos puxados por quatro cavalos, tendo seus membros reduzidos e consumidos pelo fogo. Um verdadeiro teatro de horror, que levava a pior das mortes, tudo isso como pena de um crime, que muitas vezes no sofria o seu real julgamento. O certo que para o erro, somente o suplcio, a morte.Neste momento, o pensamento era achar uma nova maneira de punir; pensadores e filsofos, juristas, legisladores do sculo XVIII entraram em confronto, o suplcio passou a ficar intolervel.Ele, o suplcio era mais uma coroao do poder do soberano, uma revanche em razo da sua fora, quando assim contrariado.No entanto o pensamento era de que os juzes no faziam mais o seu papel de julgar, o poder de julgar foi transferido a outras instncias, cheio de personagens extrajurdicos. E o fato que esta ao tinha como finalidade retirar da pessoa do juiz o fardo social, de ser aquele o que castiga.Dessa forma, o livro tem como abordagem principal analisar uma nova forma de julgar do poder, em que ele se apoia se justifica e esconde sua singularidade. Ele estuda como usar os mecanismos punitivos e repressivos, avaliando seus ps e contras, fazendo com que a punio exera seu papel social.H uma reflexo no texto que leva a uma anlise profunda: se o estudo da alma humana deve ser levado em considerao como uma ferramenta de tecnologia para a humanizao da pena, um estudo de fenmenos sociais. Ser que a excluso do cio do apenado se daria por meio de trabalhos na manufatura, proporcionando a economia, tratando simplesmente o corpo, com punies, trancando , vigiando, ou seja, uma escravido civil?Podemos tambm citar a alma que, por sua vez, aprisiona o corpo e tambm o liberta. As prises tm como sentido a priso do corpo, levando a revoltas, que vo da misria fsica (frio, fome, solido, falta de educao, cuidados mdicos), indo alm, contra os guardas e o poder.Para satisfao do poder, o soberano levava em considerao a natureza dos crimes e, de acordo com o delito, as condenaes poderiam ser de multa, o banimento, o aoite, a roda, a fogueira, o esquartejamento, a exposio, a marcao com ferrete, tornando-se, assim, um verdadeiro suplcio, o ato mais cruel e brbaro que um ser humano possa imaginar. Para ele, o soberano, a pena obedecia a critrios: produzir sofrimento, a execuo do prprio cerimonial da justia, manifestando a sua fora, perseguindo o corpo, investido de luz e verdade do crime.Pasmemos: nesse tempo, aproximadamente 1670, o acusado nem sequer tinha a chance de ter conhecimento dos autos do processo, no sabia quem o denunciava, ao menos o que era dito ao seu respeito nos depoimentos, mais impossvel ainda ter um advogado. Os juzes recebiam a relatrios prontos. Quanto aos testemunhos, dependiam de quem os fazia: se nobres, teriam validade, mas, se fossem de vagabundos, eram em vo.Ainda no sculo XVI, para o rei, punir no pertencia multido, diante da justia todos deviam se calar.Houve, nessa poca, muitos acusados que se declararam culpados sem ter cometido crimes. Os interrogatrios eram cruis e desumanos, baseados em tortura, tanta barbrie que remetia ao tempo da inquisio.No final do sculo XVIII, a punio terrestre era como se fosse minimizao da pena futura (prestao de contas com Deus).O soberano daquele tempo entendia que o criminoso havia cometido uma quebra de regra imposta por ele, o rei, opondo-se ao seu poder, como se isso o enfraquecesse, da, o suplcio se tornar um cerimonial/ritual poltico. Pois, quem tinha a fora e o poder era o rei. Com o suplcio, o soberano ataca quem o ofendeu. Era a reafirmao do poder, o triunfo do soberano sobre o criminoso.Ento, o suplcio descrito pelo autor, resume todas as aes do judicirio, sejam elas na oralidade, na escrita, na exposio do secreto, ou a confisso.Vale lembrar, como conta o autor, que a cerimnia do suplcio era para o povo, com a inteno de provocar horror e medo.Contudo, os reformadores dos sculos XVIII e XIX fizeram apelos para suspender as cerimnias de suplcio, pois no mais incitava o medo no povo, mas sim uma tremenda revolta contra o carrasco. Nasceu, ento, a literatura do crime, passando do suplcio para o inqurito, que nada mais era seno o confronto intelectual. O afrouxamento da penalidade, custa de muitas lutas, trouxe em consequncia, a mudana e diminuio dos crimes; aparecem em maior quantidade os crimes de propriedade, o criminoso desse tempo tambm apresenta outro perfil, so os malfeitores, mal alimentados, levados pelo impulso da pobreza, os famosos marginais. Surgem, ento, os crimes de massa.Aconteceu nesse perodo ilegalidade de castas sociais, comuns a cada grupo, caracterizados por rivalidade e conflitos de interesses, partindo, desde ento, para uma crise mais genrica de ilegalidade popular, surge grande quantidade de trabalhadores, comrcio ilcito, ocorrendo uma familiaridade de delitos que eles mesmos no sentem.Para Le Trosne, o sistema penal deveria servir para gerir de forma diferenciada as ilegalidades, no para extinguir todas.Aconteceu um fato paradoxal, que cria novos princpios nessa nova estratgia jurdica: o cidado aceita as leis que devero puni-lo, contudo, ele rompe o pacto, rompe com a sociedade e participa da punio que recai sobre ele, passando, assim, a inimigo comum, tido pela sociedade como um monstro. O direito de punir saiu da esfera do soberano e passou para a defesa da sociedade.Em se tratando da humanidade das penas, passa o autor a descrever a natureza, o controle e os efeitos do ajuste. No pensamento de Foucault, a punio dever ter a medida dos seus efeitos, conforme a gravidade da sua falta, em outras palavras, no meu entendimento, se o crime no for relevante, no deve ser tratado como tal. A punio deve olhar seus efeitos futuros, tendo em mente a preveno, a punio deve, apenas, impedir outros eventos em longo prazo.Paradoxalmente, Beccaria citou o castigo que substitui a pena de morte, podendo ser a escravido perptua, sendo considerada por ele pior que a morte, se equipara ao suplcio, pois parece no ter fim. Por outro lado, o crime no pode ser encoberto, no pode fugir ao olhar da justia, a polcia e a justia devem andar juntas, trazendo luz do dia o crime, seus culpados e os castigos/punies para eles previstos. Nesse caso, tudo deve ser explcito, nada deve estar oculto; o magistrado tem o dever de abrir para os cidados o destino dos condenados, enfim, dar a devida publicidade ao julgamento.Por outro lado, no pode haver o descrdito da impunidade, e de que o mesmo castigo seja remdio para todos os criminosos, cita o autor, a multa no castigo para os ricos, nem a infmia para quem est exposto. Para haver justia, o castigo deve atuar como um preventivo ao retorno ao crime? Prevendo a profundidade da sua maldade e a motivao?A partir do fim do sculo XVIII, apesar de ainda muito distante, comea um pensamento de classificao dos delitos, fracionando-os, de maneira que leis gerais possam atingi-los, mas era como um sonho, a utopia de leis amplas para as pessoas de forma isolada.Afinal, qual a punio ideal? Punir seria uma arte? Para o autor a punio deve ser suficiente para provocar o temor, fazer o indivduo refletir, talvez pensando, aprimorando a sua conscincia. Talvez com uma nova proposta de legislao criminal, razoabilidade das penas, quem sabe? Poderia ser tambm um desencorajamento do delito, a anlise das perdas e danos quando se comete um erro.Havia proposio de penas de intensidade progressiva, interessante, uma retribuio do culpado, assim ele passaria a ter uma atividade rentvel para a sociedade, trabalho, podendo ser visto como o reparo da leso aos cidados de bem. Le Peletier apresenta uma nova legislao criminal. Para ele, a natureza da punio tem que ter relao direta com o delito, se o criminoso for preguioso dever ter uma pena de trabalho penoso, etc. Diz ainda que os mendigos no tero sucesso sendo trancado, o trabalho a melhor maneira de puni-los. Assim, o mau hbito ser substitudo.Trazendo baila a filosofia de Le Peletier, essa teoria seria muito relevante nos dias de hoje. Rentvel, por que no dizer, onde o Estado sufocado, e a sociedade pesada de impostos se veem obrigados a pagar pelo oprbrio do cidado incorreto.A reforma da lei, compensada pela separao do culpado da sociedade, ele, desta vez, no segue os ritos cerimoniosos do passado, o criminoso passa a elemento de instruo, o tempo em que as penas devem ensinar. A deteno torna-se parte do castigo.Na chegada do sculo XIX, as prises, enormes edifcios, que se estendiam por toda a Frana e, consequentemente, por toda a Europa, eram finalmente o castigo reduzindo as masmorras, os trabalhos forados, as punies. Finalmente, a pena uniforme e melanclica, como diz o autor, por sua vez, jamais pensada em 1670.Para alguns juristas, a deteno no uma pena, apenas a garantia sobre o corpo da pessoa, simplesmente o prende, mas no o pune.Seria benfico retribuir seu erro com a mo-de-obra em construes de praas, estradas, ofertando melhorias coletivas. Crime e penas, agora intimamente ligados, o criminoso separado da sociedade, um verdadeiro luto pela separao, ento isolado.Para Le Peletier, esse poderia ser um dos princpios do novo Cdigo Penal da poca. Pouco tempo depois, a deteno passou forma normal de castigo, foram programados grandes edifcios para os crceres, todo o suplcio do cadafalso fora substitudo pelos projetos arquitetnicos, muros altos, instransponveis, era a garantia do poder sobre o corpo das pessoas, naquele instante encarcerados.Contudo, os reformadores inconformados com o tipo de pena, pois, encarcerar no era o tipo de pena ideal para eles, ento, decretaram que fossem colocados todos em liberdade. O castigo, para os reformadores, no poderia ter formas gerais.Essa heterogeneidade e incompatibilidade, ambas antagnicas formularam princpios: durao das penas, reduo das penas, trabalho obrigatrio, celas individuais somente usadas em casos especficos, e ainda o salrio, tudo que fizesse o bem, imaginando que assim estivessem evitando o mal. Para os pensadores poca, o cio provocava o pensamento mau, gerava o crime.A cela, uma forma de castigo cristo, era a o instrumento religioso e econmico: a separao dos mundos, tida como pedaggico.A disciplina era extrema, tudo milimetricamente planejado e executado, um regime espartano, obrigaes e proibies regiam o sistema. Tudo dependia de um bom comportamento que levava a progresso da pena e, dependendo de alguns casos at mesmo o perdo.

Mas, a questo era: ser que esta cidade que punia (as prises) era percebida como uma soluo para a sociedade? Voltamos a pensar, ser que o monarca est preparado para abrir mo do cerimonial da punio? O efeito de horror que causava nas pessoas?Contudo, os juristas, intitulados reformadores, acreditavam que a punio requalificava, era uma coero aos indivduos .Era chegado o tempo dos soldados, figura ereta, postura precisa, ousada, regulamentos militares, os que controlam e corrigem. O objetivo dessa arte era, antes de tudo, tornar o corpo mais obediente. A base, os princpios necessrios para se erguer um novo fundamento, mincias.Segundo La Salle, a disciplina distribui os indivduos nos espaos. Para ele, cada indivduo no seu lugar e um lugar para cada indivduo, a separao era necessria, provocava a solido para o corpo e a alma. Celas, fileiras, separao, organizao, ordem, ordenamento espacial, tudo era regulado. Todas essas teorias compartilhadas em hospitais, colgios, fbricas, tudo com a mxima exatido, uma sistematizao do comportamento.Com todo esse mtodo meticuloso e detalhado, era fcil prever o comportamento humano, pelo simples observar dos seus gestos, com fundamento na desarticulao, a teoria dizia ser mais eficaz e producente.Para a teoria napolenica, as tcnicas militares tornaram-se exemplos da real disciplina, promoviam a coero social, contudo, os juristas buscavam o modelo primitivo, a hierarquia que seguidamente obedecia as normas e sanes. As tcnicas militares de vigia, controle, que favorecidos pela arquitetura, davam o devido resultado do controle em diversas esferas: do trabalho, da produo, do enquadramento comportamental, contudo, sem deixar de lado a necessidade de um aparelho humano especializado. Tudo era resumido ao contexto pedaggico, a melhor tcnica j vista no sculo XVIII, esta buscava a discrio mecnica.A sano vira norma, castigar, punir, passa a ter funo disciplinar, sua inteno era reduzir os desvios, faz o indivduo progredir dizia La Salle. Gratificao e sano, ambos andavam juntos.Seguindo o modelo hospitalar, vigiar, visitar, a obedincia hierarquia interna, o papel de cada um, as tcnicas, foi tornando um mecanismo de aperfeioamento, criando assim um ritual, o exame, uma constante troca de saberes, o exerccio do saber e do poder. Neste contexto o exame ganha a caracterstica de ferramenta eficaz para a avaliao do indivduo, treinado para ser qualificado ou excludo.O surgimento do panoptismo, a estrutura de anel, perifrica e vigiada, janelas para dentro e para fora, ngulos abstratos de vigia, ver sem ser visto, o poder constante incutido no crcere. A ideia to perfeita que traz ao preso ideia de vigilncia constante, sem saber de onde est sendo controlado, era o efeito mais perfeito de poder.Tudo to utpico que parecia no serem mais necessrias, grades, correntes, fechaduras, parecia eficcia do poder, uma mquina de fazer experincias.Esse modelo to inovador, cheio de funes mltiplas, tais como: cuidar de doentes, orientar alunos, abrigar loucos, fiscalizar os operrios, controlar os ociosos e os mendigos. Era a descoberta genial, servia para tudo!Poderemos ver a sucinta explanao dos diversos tipos de prises em que o homem vive. Separados socialmente, na fora de trabalho, no espao de tempo, vigiados, examinados, monitorados, reprimidos de diversas formas, independente da priso formal, posta para o criminoso.Mas, a priso citada vista como um acesso humanizao, o surgimento das penas da civilidade, apesar de perigosa quando mal utilizada, e, contudo tida como um castigo genrico, igual a todos.Afinal, o seu papel no reeducar a todos? E como reeducados podero ser conduzidos ao convvio social, sem danos futuros? Como? Nesse reformatrio individualizante, com o fim de evitar compls, no a isso que assistimos!Para o autor, a solido traz a reflexo, causando remorso, ser isso mesmo, ou incita ira? O poder que exercido sobre ele, que o leva ao profundo da solido, regrado com trabalho, ocupaes, sendo vigiado, cultivando bons hbitos, seria utpico demais acreditar nisso. Mas, para o autor o trabalho junto com o isolamento frutfero, agente de transformao. fato que trabalho penal uma ferramenta inteligente, capaz de produzir efeitos extraordinrios se bem elaborado e desenvolvido, alavanca econmica, de profunda capacidade de reinsero social, qualifica e dignifica, acompanhado de subsdios oportuniza a valorizao da honradez e ajustamento para a vida moral e tica.Contudo, existe uma longa e perceptvel distncia entre a realidade carcerria e o judicirio, uma vez que o juiz no acompanha, de fato, os processos cotidianos, o conhecimento de cada detento, suas melhoras ou pioras, necessrio um acompanhamento clnico, no sentido jurdico da coisa.A profundidade do conhecer, saber da doena do delito, ou do delinquente, importantssima para a correo durante a execuo da pena de deteno; sem esse estudo, o homem apenas um crcere, sem a condio de vislumbramento de reintegrao social, pois, os fatos que levaram a criminalidade no foram de fato tratados.Ento o criminoso, as prises, a justia, tornam-se um perigo explosivo, cego e deseducador, sendo a considerado o expurgo da justia. Comparando a penitenciria, a priso, aos tempos dos suplcios, ela surge apenas como a privao de liberdade. Relembrando os atos e as fases dos ritos cerimoniosos do tempo passado, onde os espetculos ora se confundiam com o circo, com a distrao das cidades, dos seus soberanos, remontando a poca dos gladiadores. Hoje, a cadeia se compara ao grande espetculo medieval, que de forma simblica, resumindo as aes daquele tempo.Ento qual a serventia da priso? Que provoca reincidncia? Aumento de violncia? Desejo de fuga e ira? Tudo reduzido a perversidades e enormes revoltas, a priso uma fbrica de delinquentes!O contexto prisional viciado e corrupto, onde agentes de segurana, intendentes, toda a hierarquia carcerria se delinquiu juntamente com o crime, ou seja, uma fbrica agente do crime.Onde est sua funo social de reestabelecer o indivduo? Conduzido por agentes despreparados, mal remunerados, sem tcnica, assistncia social e psicolgica ... Seria uma priso ou um fracasso, como diz o autor?Enfim, a figura do carcerrio, preparado especificamente para controlar, educar, punir, fiscalizar, o indivduo que de diversas formas foi treinado para igualmente tratar o seu crcere, com objetivo final, o adestramento.Quando na verdade, a inteno do sistema era a modificao do comportamento, atravs de aquisio de habilidades, tornando-os criaturas resilientes.De forma cientfica, a medicina e a psiquiatria, adentraram nesse contexto como medida tcnica para o controle. Foi to fortemente aceito que outras instituies rapidamente aderiram, tais como: escolas, hospitais, empresas privadas, reparties pblicas. Certamente, Mettray fez escola em sua poca. Era ento a era da arte de punir.Essa instituio carcerria havia sido criada apenas para os jovens infratores, os delinquentes, com o a fim de corrigi-los, puni-los. A partir da, generalizado como mecanismo jurdico legal.Desviada de seu objetivo principal, o sistema penitencirio conduz o indivduo ao poo. Contido em uma circunstncia propicia a ficar a margem da sociedade, uma vez que colocados num sistema sem a menor perspectiva de correo e readaptao a uma nova chance de vida social. O pensamento disciplinar contido em um cenrio de total falta educao e mtodos, faltou estrutura de base.Validado pelo poder pblico o carcereiro, e consequentemente o abuso do seu poder, arbitrrio e intil... No h resposta, o que h so muitas perguntas.Por sua vez, os juzes cada vez mais encontram dificuldade em julgar, punir, medir, e reconhecer o certo e o errado, preciso encontrar o remdio para a cura dos erros humanos. Ento a priso vista como a nica forma ainda de se ter domnio de vigiar e punir os indivduos.