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MATEMÁTICAII Cálculo Diferencial em R n Júlia Justino Departamento de Matemática/ESTSetúbal

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MATEMÁTICA II

Cálculo Diferencial em Rn

Júlia Justino

Departamento de Matemática/ESTSetúbal

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Conteúdo

1 Campos escalares e vetoriais 11.1 Noções básicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11.2 Representação gráfica em R

n . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3

2 Limites e Continuidade 52.1 Bola aberta e vizinhança em R

n . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52.2 Limites e continuidade em campos escalares . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72.3 Limites e continuidade em campos vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

3 Cálculo diferencial em campos escalares 133.1 Derivadas parciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133.2 Diferenciabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 173.3 Derivada dirigida e vetor gradiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 213.4 Plano tangente e reta normal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

4 Cálculo diferencial em campos vetoriais 264.1 Diferenciabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 264.2 Derivada dirigida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 274.3 Operadores divergência e rotacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

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A presente sebenta destina-se a servir de manual de estudo para os alunos da UC deMatemática II do 1o ano dos cursos ministrados na ESTSetúbal/IPS.Agradeço a colaboração do Miguel Moreira na disponibilização de materiais usados na

antiga disciplina de Matemática II (que serviram de base a este trabalho) e do José CaldeiraDuarte na revisão desta sebenta e nas sugestões de melhoramento que me fez chegar.

1 Campos escalares e vetoriais

1.1 Noções básicas

Definição 1 Seja n ∈ N. Chama-se campo escalar a qualquer aplicação da forma

f : D ⊆ Rn → R

�x=(x1, . . . , xn) → f (�x) = y.

O conjunto D, designado domínio de f, é o conjunto de elementos de Rn para os quais festá definida.

Observação 1 Aos domínios de campos escalares aplicam-se as mesmas restrições queexistem nas funções reais de variável real, objeto de estudo na UC de Matemática I e quecorrespondem a campos escalares para n = 1. Em particular,

f (�x) =(·)(··) ⇒ (··) �= 0;

f (�x) = log (·)⇒ (·) > 0;f (�x) = p

√(·)⇒ (·) � 0, se p é par.

Exemplo 1 A função f : D ⊆ R3 → R definida por

f (x, y, z) =√x+ y+

2z

x2 + y2 − 1

é um campo escalar onde

D ={(x, y, z) ∈ R3 : x+ y � 0∧ x2 + y2 − 1 �= 0

}.

Definição 2 Sejam n,m ∈ N. Chama-se campo vetorial a qualquer aplicação da forma

f : D ⊆ Rn → Rm

�x → f (�x) = (y1, . . . , ym).

Neste caso, definem-se as componentes escalares de f como sendo os campos escalaresy1 = f1 (�x) , . . . , ym = fm (�x) tais que f = (f1, . . . , fm). O conjunto D, domínio de f, é talque D = Df1 ∩ . . . ∩Dfm .

1 Mat2 - 9 maio 2014

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Exemplo 2 A função g : D ⊆ R3 → R2 definida por

g (x, y, z) =

(3√x+ y,

2z

x2 + y2 − 1

)

é um campo vetorial cujas componentes escalares são g1 (x, y, z) = 3√x+ y e

g2 (x, y, z) =2z

x2+y2−1. Assim,

D = Dg1 ∩Dg2 = R3 ∩{(x, y, z) ∈ R3 : x2 + y2 − 1 �= 0

}

={(x, y, z) ∈ R3 : x2 + y2 �= 1

}.

Definição 3 Dado um campo vetorial f : D ⊆ Rn → Rm, designa-se contradomínio de f

como sendo o conjunto f (D), conjunto dos elementos de Rm que são imagem por meio de fde algum elemento de D:

f (D) = {(y1, . . . , ym) ∈ Rm : f (�x) = (y1, . . . , ym) para algum �x ∈ D} .

Exemplo 3 Considere-se o campo escalar definido por f (x, y) = 7+ x2 + y2. Então,

D = R2 e f(D) = [7,+∞[ .

Exemplo 4 Considere-se o campo vetorial definido por h (x, y) =(√xy, x

2y, 1− xy

).

Então, h1 (x, y) =√xy, h2 (x, y) = x

2ye h3 (x, y) = 1− xy são as componentes escalares de

h. Assim,

D = Dh1 ∩Dh2 ∩Dh3 ={(x, y) ∈ R2 : xy � 0∧ y �= 0

}

={(x, y) ∈ R2 : (x � 0∧ y > 0)∨ (x � 0∧ y < 0)

}:

eh(D) = [0,+∞[× [0,+∞[× ]−∞, 1] ⊂ R3 :

.

2 Mat2 - 9 maio 2014

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1.2 Representação gráfica em Rn

Sabemos que uma função real de variável real, f : R→ R, tem uma representação gráfica noplano R2, ou seja, Graf(f) ⊆ R2 = R×R, onde num eixo se representa o domínio e no outroeixo se representa o contradomínio da função. Generalizando esta ideia, um campo vetorial,f : Rn → R

m , terá uma representação gráfica em Rn+m , ou seja, Graf(f) ⊆ Rn × Rm .

Dada a nossa dificuldade em conceber representações gráficas acima de 3 dimensões, naprática apenas se representam gráficos de campos escalares da forma f : D ⊆ R2 → R. Paraisso, começa-se por encontrar algumas linhas de interseção da superfície definida pelo campoescalar com planos horizontais z = c, onde c ∈ R, designadas conjuntos de nível.

Definição 4 Sejam c ∈ R e f : D ⊆ Rn → R um campo escalar. Chama-se conjunto denível ao conjunto

L (c) = {�x ∈ D : f(�x) = c} ,obtido pela projeção ortogonal em D da interseção da superfície y = f(�x) com o plano y = c,ou seja, é o conjunto dos pontos do domínio de f cujas imagens se encontram à mesma cota.

Observação 2 Se c /∈ f (D), L (c) = ∅, donde na prática só terá interesse calcular L (c)caso c pertença ao contradomínio de f.

Exemplo 5 Considere-se o campo escalar do Exemplo 3 definido por f (x, y) = 7+ x2 +y2.Já se viu que D = R2 e f(D) = [7,+∞[. Assim,

L (2) ={(x, y) ∈ R2 : 7+ x2 + y2 = 2

}

={(x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = −5

}= ∅;

L (7) ={(x, y) ∈ R2 : 7+ x2 + y2 = 7

}

={(x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = 0

}= {(0, 0)} ;

L (8) ={(x, y) ∈ R2 : 7+ x2 + y2 = 8

}

={(x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = 1

},

que corresponde à circunferência de centro (0, 0) e raio 1;

L (11) ={(x, y) ∈ R2 : 7+ x2 + y2 = 11

}

={(x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = 4

},

que corresponde à circunferência de centro (0, 0) e raio 2.A representação gráfica destes conjuntos de nível é dada por

.

3 Mat2 - 9 maio 2014

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Exemplo 6 Considere-se o campo escalar g : D ⊆ R3 → R definido por g (x, y, z) =

x2 + y2 + z2. Então, D = R3 e g(D) = [0,+∞[. Assim,

L (0) ={(x, y, z) ∈ R3 : x2 + y2 + z2 = 0

}

= {(0, 0, 0)} ;

L (1) ={(x, y, z) ∈ R3 : x2 + y2 + z2 = 1

};

que corresponde à esfera centro (0, 0, 0) e raio 1;

L (4) ={(x, y, z) ∈ R3 : x2 + y2 + z2 = 4

};

que corresponde à esfera de centro (0, 0) e raio 2.A representação gráfica destes conjuntos de nível é dada por

-2

-3

-2-3-3

-2

-1

-1

-10

0

x

z

y

0

1

2

1 122

3

3 3

.

No entanto, a informação fornecida pelos conjuntos de nível não é suficiente para sededuzir corretamente o gráfico da superfície definida por um campo escalar. Veja-se o casodo Exemplo 5 onde, a partir dos conjuntos de nível obtidos, se conclui que a superfíciecomeça no ponto (0, 0, 7) e se propaga ao longo do eixo zz através de circunferências cadavez maiores. Não se sabe se a superfície terá a forma de um cone, de um parabolóide oude um funil. Para completarmos a informação àcerca da superfície é necessário intersetá-lacom outros planos não horizontais, planos verticais de tipo x = c1 e y = c2. No caso doExemplo 5, intersetando a superfície com os planos x = 0 e y = 0, obtêm-se parábolasverticais voltadas para cima, centradas no eixo zz. De facto,

{z = 7+ x2 + y2

x = 0⇒{z = 7+ y2

x = 0e

{z = 7+ x2 + y2

y = 0⇒{z = 7+ x2

y = 0.

Assim, o gráfico de f é um parabolóide:

-2 -20

xy

0 0

2

2 2

4

6z

8

10

12

.

4 Mat2 - 9 maio 2014

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2 Limites e Continuidade

Na definição de limite de uma função real de variável real, estudada na UC de MatemáticaI, é fundamental a noção de "proximidade" ou "vizinhança". Para se generalizar esta noçãoem campos escalares e vetoriais, começamos por dar um conceito que generaliza ao espaçoRn a noção de intervalo aberto de R.

2.1 Bola aberta e vizinhança em Rn

Definição 5 Sejam �a ∈ Rn e r > 0. Chama-se bola aberta de centro em �a e raio r aoconjunto dos elementos de Rn cuja distância ao ponto �a é menor do que r, definido por:

Br (�a) = {�x ∈ Rn : ‖�x− �a‖ < r} ,

onde ‖�x‖ =√x21 + · · ·+ x2n,∀�x = (x1, . . . , xn) ∈ Rn.

Exemplo 7 Seja r = 1.

1. Se �a = 2 ∈ R,

B1 (2) = {x ∈ R : ‖x− 2‖ < 1} ={x ∈ R :

√(x− 2)

2< 1

}

= {x ∈ R : |x− 2| < 1} = {x ∈ R : x− 2 < 1∧ x− 2 > −1}= {x ∈ R : x < 3∧ x > 1} = ]1, 3[ .

2. Se �a = (−1, 2) ∈ R2,

B1 (−1, 2) ={(x, y) ∈ R2 : ‖(x, y) − (−1, 2)‖ < 1

}

=

{(x, y) ∈ R2 :

√(x+ 1)

2+ (y− 2)

2< 1

}

={(x, y) ∈ R2 : (x+ 1)2 + (y− 2)2 < 1

},

que corresponde ao interior da circunferência de centro (−1, 2) e raio 1.

3. Se �a = (0,−1, 2) ∈ R3,

B1 (0,−1, 2) ={(x, y, z) ∈ R3 : ‖(x, y, z) − (0,−1, 2)‖ < 1

}

=

{(x, y, z) ∈ R3 :

√x2 + (y+ 1)

2+ (z− 2)

2< 1

}

={(x, y, z) ∈ R3 : x2 + (y+ 1)2 + (z− 2)2 < 1

},

que corresponde ao interior da esfera de centro (0,−1, 2) e raio 1.

5 Mat2 - 9 maio 2014

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Definição 6 Sejam �a ∈ Rn e V ⊆ Rn. Diz-se que o conjunto V é uma vizinhança do

ponto �a se:∃r > 0 : Br (�a) ⊆ V.

Exemplo 8 Em R2, considere-se �a = (1, 1), V1 =

{(x, y) ∈ R2 : x � 0∧ y � 1

2

}e

V2 ={(x, y) ∈ R2 : x � 1∧ y � 1

}. Então, V1 é vizinhança de �a (pois, por exemplo,

B 13(1, 1) ⊆ V1) mas V2 não o é.

Definição 7 Sejam �a ∈ Rn e S ⊆ Rn.

1. Diz-se que �a é um ponto interior de S se ∃r > 0 : Br (�a) ⊆ S. Ao conjunto de todosos pontos interiores de S dá-se o nome de interior de S, denotando-se por intS.

2. Diz-se que �a é um ponto de acumulação de S se em toda a vizinhança de �a existireminfinitos pontos de S. Ao conjunto de todos os pontos de acumulação de S dá-se o nomede derivado de S, denotando-se por S′.

Observação 3 Seja S ⊆ Rn. Então, intS ⊂ S′.

Exemplo 9 Considere-se o conjunto A = ]−1, 3] ∪ {π} ⊂ R.

Observando a figura, conclui-se que

intA = ]−1, 3[ e A′ = [−1, 3] .

Exemplo 10 Considere-se o conjunto B ={(x, y) ∈ R2 : 1 < x2 + y2 � 4

}.

Observando a figura, conclui-se que

intB ={(x, y) ∈ R2 : 1 < x2 + y2 < 4

}e B′ =

{(x, y) ∈ R2 : 1 � x2 + y2 � 4

}.

6 Mat2 - 9 maio 2014

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2.2 Limites e continuidade em campos escalares

Recordemos a definição de limite aplicada a uma função real de variável real, onde a, b ∈ R:limx→af(x) = b⇔ (∀δ > 0∃ε > 0 : x ∈ D\ {a} ∧ |x− a| < ε⇒ |f (x) − b| < δ) .

Intuitivamente, o facto de b ser o limite de f (x) quando x tende para a, significa que asimagens dos pontos do domínio, diferentes de a, estão tão próximas quanto quizermos de b,desde que nos aproximemos suficientemente perto de a.Repare-se que faz sentido falar de limite de f num ponto que não pertence ao domínio,

desde que seja ponto de acumulação deste. Por exemplo, sendo f : R\ {0} → R a funçãodefinida por f (x) = sin x

x, embora o zero não pertença ao domínio da função é ponto de

acumulação e sabemos que limx→0

sin xx= 1.

Por outro lado, em pontos do domínio que não sejam pontos de acumulação não fazsentido falar de limite da função nesse ponto. Por exemplo, numa função definida no conjunto[0, 1] ∪ {2} , não faz sentido falar de limite no ponto 2, pois não nos podemos aproximarsuficientemente perto de 2 por pontos do domínio.

Definição 8 Sejam f : D ⊆ Rn → R um campo escalar e �a ∈ D′. Diz-se que b ∈ R é o

limite de f (�x) quando �x tende para �a se

∀δ > 0∃ε > 0 : �x ∈ D\ {�a} ∩ Bε (�a)⇒ f (�x) ∈ Bδ (b) ,e escreve-se lim

�x→�af(�x) = b. Ou seja,

lim�x→�a

f(�x) = b⇔ (∀δ > 0∃ε > 0 : �x ∈ D\ {�a} ∧ ‖�x− �a‖ < ε⇒ |f (�x) − b| < δ) .

Exemplo 11 Consideremos a função definida em R2\ {(0, 0)} por

f(x, y) =xy2

2 (x2 + y2).

Note-se que (0, 0) é ponto de acumulação de R2\ {(0, 0)}. Provemos, por definição, quelim

(x,y)→(0,0)f(x, y) = 0, ou seja, que

∀δ > 0∃ε > 0 : (x, y) ∈ R2\ {(0, 0)} ∧√x2 + y2 < ε⇒ |f(x, y)| < δ.

Ora ∀ (x, y) �= {(0, 0)} ,x2 � x2 + y2 e y2 � x2 + y2,

donde|x| �

√x2 + y2 e |y| �

√x2 + y2.

Assim,

|f(x, y)| =

∣∣∣∣xy2

2 (x2 + y2)

∣∣∣∣ =|x|y2

2 (x2 + y2)�

√x2 + y2

(x2 + y2

)

2 (x2 + y2)

=

√x2 + y2

2<ε

2.

Escolhendo ε > 0 tal que ε2� δ⇔ ε � 2δ, tem-se então que |f (x, y)| < δ.

7 Mat2 - 9 maio 2014

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Teorema 1 O limite de uma função num ponto, quando existe, é único.

Dem. Omite-se a demonstração deste resultado.

No caso das funções reais de variável real, quando se pretende estudar o limite da funçãonum ponto, estudam-se frequentemente os limites laterais, à esquerda e à direita, da funçãonesse ponto. A função terá limite nesse ponto se e só se os dois limites laterais tiveremo mesmo valor, sendo esse o limite da função. No caso dos campos escalares a situação ébem mais complexa. De facto, ao contrário do que acontece no caso anterior, em que sónos podemos aproximar do ponto por valores à esquerda ou à direita, neste caso podemosaproximarmo-nos do ponto por muitas maneiras - segundo retas, parábolas ou qualquer outrosubconjunto do domínio, do qual esse ponto seja ponto de acumulação.

Definição 9 Sejam f : D ⊆ Rn → R um campo escalar, C ⊂ D e �a ∈ C′. Diz-se que b ∈ Ré o limite de f (�x) relativo a C quando �x tende para �a se

∀δ > 0∃ε > 0 : �x ∈ C\ {�a} ∧ ‖�x− �a‖ < ε⇒ |f (�x) − b| < δ,

e escreve-se lim�x→�a�x∈C

f(�x) = b.

Aos limites relativos a retas que passem pelo ponto �a dá-se o nome de limites direcionais.

Observação 4 Pela unicidade de limite de uma função, quando existe o limite de umafunção num ponto, todos os limites relativos que passem por esse ponto terão o mesmovalor. Consequentemente, caso existam limites relativos com valores diferentes, prova-se anão existência de limite nesse ponto. No entanto, o facto dos limites direcionais serem todosiguais não garante a existência de limite no ponto.

Exemplo 12 Considere-se a função f (x, y) =(x+1)2−(y−3)2

(x+1)2+(y−3)2, definida no conjunto

D = R2\ {(−1, 3)}. Ora (−1, 3) /∈ D mas é ponto de acumulação de D. Calculemos algunslimites direcionais de f que passem pelo ponto (−1, 3). Começemos por calcular o limite def relativo à reta x = −1:

lim(x,y)→(−1,3)

x=−1

f(x, y) = limy→3f(−1, y) = lim

y→3

0− (y− 3)2

0+ (y− 3)2= −1.

Calculando agora o limite de f relativo à reta y = 3, obtem-se:

lim(x,y)→(−1,3)

y=3

f(x, y) = limx→−1

f(x, 3) = limx→−1

(x+ 1)2

(x+ 1)2= 1.

Como existem dois limites direcionais com valores diferentes, conclui-se que não existe olimite de f no ponto (−1, 3).

8 Mat2 - 9 maio 2014

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Exemplo 13 Vejamos que a função f (x, y) = xy3

x2+y6, definida no conjunto R2\ {(0, 0)} , não

tem limite no ponto (0, 0), embora os limites direcionais sejam todos iguais neste ponto.Calculemos o limite de f relativo à reta vertical x = 0:

lim(x,y)→(0,0)

x=0

f(x, y) = limy→0f(0, y) = lim

x→0

0

0+ y6= 0.

Calculando o limite de f relativo a qualquer reta não vertical y =mx, obtem-se:

lim(x,y)→(0,0)y=mx

f(x, y) = limx→0f(x,mx) = lim

x→0

x (mx)3

x2 + (mx)6= limx→0

mx2

1+m6x4= 0.

Tem-se então que todos os limites direcionais no ponto (0, 0) são nulos. No entanto, a funçãonão tem limite no ponto (0, 0) pois, por exemplo, o limite de f relativo à curva de equaçãox = y3 é:

lim(x,y)→(0,0)x=y3

f(x, y) = limy→0f(y3, y) = lim

y→0

y3y3

y6 + y6=1

2�= 0.

Propriedade 2 Sejam f e g campos escalares de D ⊂ Rn → R, �a ∈ D′ e b, c ∈ R.Se lim

�x→�af(�x) = b e lim

�x→�ag(�x) = c, então:

1. lim�x→�a

λ = λ, ∀λ ∈ R;

2. lim�x→�a

[f(�x) + g(�x)] = b+ c;

3. lim�x→�a

[λf(�x)] = λb, ∀λ ∈ R;

4. lim�x→�a

[f(�x) · g(�x)] = bc;

5. lim�x→�a

[f(�x)

g(�x)

]= b

c, se c �= 0 e g(�x) �= 0 numa vizinhança de �a;

6. lim�x→�a

|f(�x)| = |b| .

Propriedade 3 (Lei do enquadramento) Sejam f, g e h campos escalares deD ⊂ R

n → R, �a ∈ D′ e b ∈ R tais que lim�x→�a

g(�x) = lim�x→�a

h(�x) = b. Se existe uma

vizinhança V de �a tal que ∀�x ∈ V ∩D, g(�x) � f(�x) � h(�x) então,

lim�x→�a

f(�x) = b.

9 Mat2 - 9 maio 2014

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Definição 10 Seja f : D ⊆ Rn → R um campo escalar e �a ∈ D ∩ D′. Diz-se que f é

contínua em �a selim�x→�a

f (�x) = f (�a) ,

ou seja,∀δ > 0∃ε > 0 : �x ∈ D\ {�a} ∧ ‖�x− �a‖ < ε⇒ |f (�x) − f (�a)| < δ.

Uma função diz-se contínua se for contínua em todos os pontos do seu domínio.

Das propriedades dos limites, resulta que:

• qualquer campo escalar constante é contínuo;

• a soma de campos escalares contínuos é um campo escalar contínuo;

• o produto de um escalar por um campo escalar contínuo é um campo escalar contínuo;

• o produto de campos escalares contínuos é um campo escalar contínuo;

• o quociente de campos escalares contínuos é um campo escalar contínuo, nos pontosonde o denominador não se anula;

• o módulo de um campo escalar contínuo é um campo escalar contínuo;

• a composição, desde que bem definida, de dois campos escalares contínuos é um campoescalar contínuo.

Exemplo 14 Seja f : R2 → R definida por

f (x, y) =

{xy2

2(x2+y2 ), (x, y) �= (0, 0)

1 , (x, y) = (0, 0).

∀ (x, y) �= (0, 0), f (x, y) = xy2

2(x2+y2 )é soma, produto e quociente de funções contínuas onde o

denominador não se anula. Assim, f é contínua em R2\ {(0, 0)}.

Por outro lado, já vimos no Exemplo 11 que lim(x,y)→(0,0)

f (x, y) = 0. Como f (0, 0) = 1 �= 0,conclui-se que f não é contínua no ponto (0, 0).

Definição 11 Seja f : D ⊆ Rn → R um campo escalar e �a ∈ D′\D. Diz-se que f é

prolongável por continuidade ao ponto �a se existe lim�x→�a

f (�x) ∈ R.À função F : D ∪ {�a} ⊆ Rn → R definida por

F (�x) =

{f (�x) ,�x ∈ Dlim�x→�a

f (�x) ,�x = �a

dá-se o nome de prolongamento por continuidade de f ao ponto �a.

Exemplo 15 No caso da função referida no Exemplo 12 não é possível fazer o prolonga-mento por continuidade ao ponto (−1, 3) pois a função não tem limite neste ponto.

10 Mat2 - 9 maio 2014

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2.3 Limites e continuidade em campos vetoriais

Definição 12 Sejam f : D ⊂ Rn → R

m um campo vetorial e �a ∈ D′. Diz-se que�b ∈ Rm é o limite de f(�x) quando �x tende para �a se

∀δ > 0∃ε > 0 : �x ∈ D\ {�a} ∧ ‖�x− �a‖ < ε⇒∥∥∥f (�x) − �b

∥∥∥ < δ,

e escreve-selim�x→�af (�x) = �b.

Embora aparentemente mais complexo, na prática podemos reduzir o estudo dos limitesde campos vetoriais ao estudo dos limites das suas componentes escalares, aplicando aproposição que se segue.

Propriedade 4 Sejam f : D ⊂ Rn → R

m um campo vetorial tal que f = (f1, . . . , fm),�a ∈ D′ e �b = (b1, ..., bm) ∈ Rm. Então,

lim�x→�af (�x) = �b se e só se lim

�x→�af1 (�x) = b1, . . . , lim

�x→�afm (�x) = bm .

Quanto às propriedades dos limites para campos vetoriais, embora algumas das que severificam para campos escalares se mantenham, outras nem sequer fazem sentido tendo queser adaptadas para este contexto (por exemplo, não faz sentido falar de produto de camposvetoriais, sendo esta noção substituída pela de produto interno).

Propriedade 5 Sejam f e g campos vetoriais de D ⊂ Rn → Rm , �a ∈ D′ e �b,�c ∈ Rm.

Se lim�x→�a

f (�x) = �b e lim�x→�a

g (�x) = �c tem-se que:

1. lim�x→�a

[f(�x) + g(�x)] = �b+ �c;

2. lim�x→�a

[λf(�x)] = λ�b, ∀λ ∈ R;

3. lim�x→�a

[f(�x) | g(�x)] = �b | �c;

4. lim�x→�a

‖f(�x)‖ =∥∥∥�b∥∥∥ .

Definição 13 Seja f : D ⊆ Rn → R

m um campo vetorial e �a ∈ D ∩ D′. Diz-se que f écontínua em �a se

lim�x→�af (�x) = f (�a) .

11 Mat2 - 9 maio 2014

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Tal como acontece no caso dos limites, o estudo da continuidade de um campo vetorialpode reduzir-se ao estudo das suas componentes escalares.

Propriedade 6 Sejam f : D ⊂ Rn → R

m um campo vetorial tal que f = (f1, . . . , fm) e�a ∈ D′. Então,

f é contínua em �a ⇔ ∀1 � i �m, fi é contínua em �a.

Definição 14 Seja f : D ⊆ Rn → R

m um campo vetorial e �a ∈ D′\D. Diz-se que f éprolongável por continuidade ao ponto �a se existe lim

�x→�af (�x) ∈ Rm .

À função F : D ∪ {�a} ⊆ Rn → Rm definida por

F (�x) =

{f (�x) ,�x ∈ Dlim�x→�af (�x) ,�x = �a

dá-se o nome de prolongamento por continuidade de f ao ponto �a.

Exemplo 16 Consideremos o campo vetorial h : R2\ {(0, 0)}→ R3 definido por

h (x, y) =

(xy2

2 (x2 + y2), cosx,−2ex+y

).

As suas componentes escalares são

h1 (x, y) =xy2

2 (x2 + y2), h2 (x, y) = cosx, h3 (x, y) = −2e

x+y.

∀ (x, y) �= (0, 0), h1 (x, y) é soma, produto e quociente de funções contínuas onde o denomi-nador não se anula; h2 (x, y) é uma função trigonométrica contínua em R

2; h3 (x, y) é soma,composição e produto de funções contínuas em R

2. Assim, h1, h2 e h3 são funções contínuasem R

2\ {(0, 0)}, donde se conclui que h = (h1, h2, h3) é contínua em R2\ {(0, 0)}.

Vejamos agora se h é prolongável por continuidade ao ponto (0, 0). No Exemplo 11, já seviu que lim

(x,y)→(0,0)xy2

2(x2+y2 )= 0. Assim,

lim(x,y)→(0,0)

h1 (x, y) = 0;

lim(x,y)→(0,0)

h2 (x, y) = cos 0 = 1;

lim(x,y)→(0,0)

h3 (x, y) = −2e0 = −2,

donde, pela Propriedade 4, se conclui que h tem limite no ponto (0, 0) . Logo, h é prolongávelpor continuidade ao ponto (0, 0) e o seu prolongamento é dado por:

H (x, y) =

{h (x, y) , (x, y) �= (0, 0)(0, 1,−2) , (x, y) = (0, 0)

.

12 Mat2 - 9 maio 2014

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3 Cálculo diferencial em campos escalares

Numa função real de variável real o conceito de derivada num ponto corresponde ao decliveda reta tangente ao gráfico dessa função que passa por esse ponto. Iremos ver que numafunção definida em Rn o conceito de derivada está associado à garantia de existência de umplano tangente nesse ponto.

3.1 Derivadas parciais

Comecemos por recordar a aplicação da definição de derivada num ponto de uma função realde variável real.

Seja f : R→ R tal que f (x) = x2. Então,

f′ (2) = limx→2

f (x) − f (2)

x− 2=

[h=x−2]limh→0

f (2+ h) − f (2)

h=m,

onde y = mx + b é a equação da reta tangente ao gráfico de f no ponto a = 2. Usando asregras de derivação, tem-se que

∀x ∈ R, f′ (x) = 2x⇒ f′ (2) = 4.

Geometricamente,

Figura 1

.

Generalizando este conceito a uma função definida em Rn, definem-se as derivadas

parciais dessa função.

Considere-se o campo escalar f : R2 → R definido por f (x, y) = x2+y2 cuja representaçãográfica é

-4

-2-4-2 0

00

2

2

4

2 4

6

4

8

.

13 Mat2 - 9 maio 2014

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Consideremos a restrição da função f aos pontos do domínio com y = 2. Esta restrição,f (x, 2), é uma função real de variável real cujo gráfico é obtido pela interseção da superfíciez = f (x, y) com o plano y = 2, obtendo-se uma parábola como na Figura 1 cujo vértice sesitua no ponto (0, 2, f (0, 2)) = (0, 2, 4).

-4-2-4 -2 0

00

2

2

4

42

6

8

4

,

Seja g(x) = f (x, 2). Caso g seja diferenciável em x = 0,

g′ (0) = limh→0

g (0+ h) − g (0)

h= lim

h→0

f (0+ h, 2) − f (0, 2)

h.

Assim, g′ (0) é o declive da reta tangente à parábola do gráfico desta restrição de f no ponto(0, 2).

Consideremos agora restrição da função f aos pontos do domínio com x = 0. Estarestrição, f (0, y), é uma função real de variável real cujo gráfico é obtido pela interseção dasuperfície z = f (x, y) com o plano x = 0, obtendo-se uma parábola como na Figura 1 cujoponto (0, 2, f (0, 2)) = (0, 2, 4) se situa no lado direito.

-4

-2-4-2 0

00

2

22 4

4

6

4

8

,

Seja u(y) = f (0, y). Caso u seja diferenciável em y = 2,

u′ (2) = limh→0

u (2+ h) − u (2)

h= lim

h→0

f (0, 2+ h) − f (0, 2)

h,

donde u′ (2) é o declive da reta tangente à parábola do gráfico desta restrição de f no ponto(0, 2).

14 Mat2 - 9 maio 2014

Page 17: MATEMÁTICAII CálculoDiferencialem Rltodi.est.ips.pt/mat2/documentos/SEBENTA/Mat2_CalcDifRn.pdf1.2 RepresentaçãográficaemRn Sabemosqueumafunçãorealdevariávelreal,f:R→R,temumarepresentaçãográficano

Assim, as derivadas parciais, caso existam, obedecem às já conhecidas regras de derivaçãopara as funções reais de variável real. Isto significa que para derivar em ordem a x uma funçãocom n variáveis, as restantes variáveis devem ser encaradas como constantes; para obter aderivada em ordem a y, as restantes variáveis devem ser tratadas como constantes e assimsucessivamente. No caso do campo escalar definido por f (x, y) = x2 + y2,

f′x (0, 2) =(x2 + y2

)′x(0, 2) = (2x+ 0) |(x,y)=(0,2) = 0

ef′y (0, 2) =

(x2 + y2

)′y(0, 2) = (0+ 2y) |(x,y)=(0,2) = 4.

Definição 15 Sejam f : D ⊆ Rn −→ R um campo escalar e �a = (a1, .., an) ∈ intD.

Chama-se derivada parcial de f em ordem à variável xj no ponto �a, ∀1 � j � n, ao limite:

f′

xj(�a) ≡ ∂f

∂xj(�a) = lim

h→0

f (a1, .., aj + h, .., an) − f (�a)

h.

Observação 5 Em funções definidas por ramos, as derivadas parciais de pontos interioresao domínio mas não interiores a um dos ramos terão de ser sempre calculadas utilizando adefinição, não se podendo recorrer às regras de derivação.

Exemplo 17 Considere-se a função f : D ⊆ R2 −→ R definida por

f (x, y) =

{x3y2 − 3xy , x �= 0∧ y �= 0

0 , x = 0∨ y = 0.

Tem-se que D ={(x, y) ∈ R2 : x �= 0∧ y �= 0

}∪{(x, y) ∈ R2 : x = 0∨ y = 0

}= R2.

1. Calculemos as derivadas parciais de f no ponto (1, 1). Como (1, 1) é ponto interior doprimeiro ramo da função, podem utilizar-se as regras de derivação:

f′x =(x3y2 − 3xy

)′x= 3x2y2 − 3y⇒ f′x (1, 1) = 3− 3 = 0

ef′y =

(x3y2 − 3xy

)′y= 2x3y− 3x⇒ f′y (1, 1) = 2− 3 = −1.

15 Mat2 - 9 maio 2014

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2. Calculemos as derivadas parciais de f no ponto (0,−1). Como (0,−1) pertence aosegundo ramo da função mas não é seu ponto interior, as derivadas parciais terão deser calculadas utilizando a definição:

f′x (0,−1) = limh→0

f(h,−1) − f(0,−1)

h= lim

h→0

h3 + 3h − 0

h

= limh→0

(h2 + 3

)= 3

e

f′y (0,−1) = limh→0

f(0, h− 1) − f(0,−1)

h= lim

h→0

0− 0

h= 0.

Definição 16 Sejam f : D ⊆ R2 −→ R um campo escalar e (a, b) ∈ intD. Chamam-se

derivadas parciais de 2a ordem de f às derivadas f ”x2, f ”xy , f

”yxe f

”y2

, onde

f ”xy (a, b) ≡∂

∂y

(f

x (a, b))≡ ∂2f

∂y∂x(a, b) .

A partir destas derivadas podem ser definidas as derivadas de 3a ordem e assim sucessi-vamente.

f

ւ ցf ′x f ′

y (1a ordem)ւ ց ւ ց

f ”x2

f ”xy f ”yx f ”y2

(2a ordem)ւ ց ւ ց ւ ց ւ ց(..) (..) (..) (..) (..) (..) (..) (..) (3a ordem)

Exemplo 18 Considere-se a função do Exemplo 17 para pontos do conjunto{(x, y) ∈ R2 : x �= 0∧ y �= 0

}. Já se viu que

f′x = 3x2y2 − 3y e f′y = 2x

3y− 3x.

As derivadas de 2a ordem de f são

f′′x2 =(3x2y2 − 3y

)′x= 6xy2, f′′xy =

(3x2y2 − 3y

)′y= 6x2y− 3,

f′′yx =(2x3y− 3x

)′x= 6x2y− 3, f′′y2 =

(2x3y− 3x

)′y= 2x3.

As derivadas de 3a ordem de f são

f′′′x3 =(6xy2

)′x= 6y2, f′′′x2y =

(6xy2

)′y= 12xy,

f′′′xyx = f′′′yx2 =(6x2y− 3

)′x= 12xy, f′′′xy2 = f

′′′yxy =

(6x2y− 3

)′y= 6x2,

f′′′y2x =(2x3)′x= 6x2, f′′′y3 =

(2x3)′y= 0.

16 Mat2 - 9 maio 2014

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Definição 17 Sejam S ⊆ Rn e p ∈ N. Diz-se que a função f : D ⊆ Rn −→ R é de classeCp (S) se todas as suas derivadas parciais até à ordem p são funções contínuas em todos ospontos do conjunto S, escrevendo-se

f ∈ Cp (S) .

Diz-se que f é de classe C∞ (S) se f admite derivadas parciais contínuas de qualquer ordemem todos os pontos do conjunto S e de classe C0 (S) se f é contínua em S.

Terminamos esta secção com um resultado que garante a igualdade das derivadas mistas.

Teorema de Schwarz: Seja f : D ⊆ R2 −→ R um campo escalar tal que D = intD ef ∈ C2 (D) . Então, ∀ (a, b) ∈ D,

f′′xy (a, b) = f′′yx (a, b) .

Dem. Omite-se a demonstração deste resultado.

3.2 Diferenciabilidade

Da mesma forma que a diferenciabilidade de uma função real de variável real, num certoponto a do seu domínio, está associada à existência de uma reta tangente ao gráfico dafunção no ponto (a, f (a)), a diferenciabilidade de um campo escalar de R2 em R, num ponto(a, b) do seu domínio, está associada à existência do plano tangente ao gráfico desse campoescalar no ponto (a, b, f (a, b)).

-4

-2-4-2 0

00

2

22 4

4

6

4

8

No entanto, a existência do plano tangente não depende apenas da existência das derivadasparciais como facilmente se pode concluir pelo exemplo seguinte.

Exemplo 19 A função f (x, y) =√|xy|, cujo gráfico pode ser visto na figura abaixo, admite

derivadas parciais finitas na origem:

f′

x(0, 0) = f′

y(0, 0) = 0.

17 Mat2 - 9 maio 2014

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No entanto, percebe-se intuitivamente que não tem sentido falar da existência de plano tan-gente ao gráfico da função no ponto (0, 0, 0), donde esta função não é diferenciável na origem.

-4

-2-4 -2 0

00

1

2

2

3

4

4

2

5

6

4

A condição que garante a existência do plano tangente no ponto (a, b, f (a, b)) é:

lim(h,k)→(0,0)

f (a+ h, b+ k) − f(a, b) − h · f ′

x (a, b) − k · f′

y (a, b)√h2 + k2

= 0. (1)

Esta condição generalizada a um campo escalar definido em Rn, para �h = (h1, . . . , hn),

é:

lim�h→�0

f(�a+ �h

)− f(�a) − h1 · f ′

x1(�a) − . . .− hn · f ′

xn(�a)

∥∥∥�h∥∥∥

= 0.

Definição 18 Sejam f : D ⊆ Rn −→ R um campo escalar e �a ∈ intD.Diz-se que f é diferenciável em �a se:

∃f ′

x1(�a) , . . . , f

xn(�a) ∈ R e lim

�h→�0

f(�a+ �h

)− f(�a) − h1 · f ′

x1(�a) − . . .− hn · f ′

xn(�a)

∥∥∥�h∥∥∥

= 0.

Exemplo 20 Vejamos que a função f (x, y) = x2 + y2 é diferenciável em (0, 2). No iníciodesta secção já se viu que

f′x (0, 2) = 0 e f′y (0, 2) = 4.

Resta ver que

lim(h,k)→(0,0)

f (0+ h, 2+ k) − f (0, 2) − h · f′x (0, 2) − k · f′y (0, 2)√h2 + k2

= 0.

Ora

lim(h,k)→(0,0)

f (0+ h, 2+ k) − f (0, 2) − h · f′x (0, 2) − k · f′y (0, 2)√h2 + k2

= lim(h,k)→(0,0)

h2 + (2+ k)2− 4− 0− 4k√

h2 + k2= lim

(h,k)→(0,0)

h2 + 4+ 4k+ k2 − 4− 4k√h2 + k2

= lim(h,k)→(0,0)

h2 + k2√h2 + k2

= lim(h,k)→(0,0)

(√h2 + k2

)2

√h2 + k2

= lim(h,k)→(0,0)

√h2 + k2 = 0.

18 Mat2 - 9 maio 2014

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Da condição (1), deduz-se que

lim(h,k)→(0,0)

f (a+ h, b+ k) − f(a, b) − h · f ′

x (a, b) − k · f′

y (a, b) = 0,

ou seja,

f (a+ h, b+ k) = f(a, b) + h · f ′

x (a, b) + k · f′

y (a, b) + R (h, k) (2)

⇔ f ((a, b) + (h, k)) = f(a, b) +[(f

x (a, b) , f′

y (a, b))| (h, k)

]+ R (h, k) ,

onde lim(h,k)→(0,0)

R (h, k) = 0.

A equação (2) corresponde então à fórmula de Taylor de f no ponto (a, b) com resto deordem 1 dada na UC de Matemática I, o que sugere a definição seguinte.

Definição 19 Seja f : D ⊆ R2 −→ R um campo escalar diferenciável em �a ∈ intD.Define-se diferencial ou derivada (total) de f em �a como sendo o campo escalarDf�a ≡ f′ (�a) : R2 −→ R tal que

f (�a+ �u) = f (�a) +Df�a (�u) + R (�u) , (3)

∀�u ∈ R2 próximo da origem que verifica lim‖�u‖→0

R(�u)

‖�u‖ = 0.

A esta fórmula dá-se o nome de fórmula de Taylor de 1a ordem para f (�a+ �u).

Observação 6 Desprezando R (�u) na fórmula (3), tem-se que

f (�a+ �u) − f (�a) ≈ Df�a (�u) ,

donde Df�a (�u) é uma aproximação linear de f (�a+ �u) − f (�a) = △f, sendo R (�u) o errocometido. É claro que quanto mais próximo �u estiver de �a menor será o erro cometido nestaaproximação.

• Caso f : R→ R e a ∈ R,

f (x) = f(a) + f′ (a) (x− a) + R1(x),

ou seja,∆f ≡ f (x) − f(a) ≈ f′ (a) (x− a) = f′ (a)∆x,

donde ∀x ∈ Bε (a), com ε > 0,

Dfa (x) = f′ (a) (x− a) .

19 Mat2 - 9 maio 2014

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• Caso f : R2→ R e (a, b) ∈ R2,

△f ≡ f(x, y) − f (a, b) ,

donde ∀(x, y) ∈ Bε (a, b) , com ε > 0,

Df(a,b)(x, y) = f′

x (a, b) (x− a) + f′

y (a, b) (y− b)

=∂f

∂x(a, b)∆x+

∂f

∂y(a, b)∆y.

Exemplo 21 Vejamos que a função f (x) = ex, numa vizinhança do ponto 0, tem comoaproximação linear a função y = x+ 1. Para qualquer x próximo do ponto 0,

∆f ≈ f′ (0)∆x.

Assim ∀x ∈ ]−ε, ε[, com ε � 0,

ex − e0 ≈ e0 (x− 0) ,

dondeex ≈ x+ 1.

-4 -3 -2 -1 1 2 3 4

-2

-1

1

2

3

4

5

6

Note-se que Df0 (x) = f′ (0)∆x = x.

Propriedade 7 Sejam f : D ⊆ Rn −→ R um campo escalar, �a ∈ intD e ε > 0. Então,

1. f é diferenciável em �a⇒ f é contínua em �a.

2. f ∈ C1 (Bε (�a))⇒ f é diferenciável em �a.

Observação 7 O resultado recíproco da Parte 1 da propriedade anterior não é verdadeiro,ou seja, uma função pode ser contínua num ponto e não ser diferenciável nesse ponto (veja-sea função do Exemplo 19).

A Parte 2 da propriedade anterior dá-nos uma forma simples de garantir a diferenciabi-lidade de uma função sem recorrer à definição, o que nem sempre é tarefa fácil.

20 Mat2 - 9 maio 2014

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Exemplo 22 A função f (x, y) = x2 + 2xy + y2 é diferenciável em qualquer ponto de R2,pois f′x = 2x+ 2y e f′y = 2x+ 2y são funções contínuas em qualquer ponto de R2.

Observação 8 Sejam f : D ⊆ Rn → R um campo escalar e ε > 0. Tem-se a seguinte

hierarquia de propriedades:

3.3 Derivada dirigida e vetor gradiente

Nesta secção apresenta-se o conceito de derivada de uma função segundo a direção de umvetor, conceito esse que não depende da diferenciabilidade da função. Sabendo que a derivadade uma função pode ser encarada como a taxa de variação instantânea da função, o que sepretende estudar é qual a variação do campo escalar quando passa de um ponto �a paraum ponto �x de uma vizinhança de �a. Por exemplo, se f (a, b) representar a temperaturade um ponto (a, b) numa sala com um aquecedor e uma janela aberta, é evidente que senos movermos do ponto (a, b) em direção à janela a temperatura irá diminuir, mas se nosmovermos em direção ao aquecedor a temperatura aumentará.

Definição 20 Sejam f : D ⊆ Rn −→ R um campo escalar, �a ∈ intD e �v ∈ Rn. Define-sederivada dirigida de f no ponto �a segundo o vetor ~v como sendo

f′

�v (�a) = limt→0

f (�a+ t�v) − f (�a)

t,

que corresponde à taxa de variação instantânea de f em �a, segundo o vetor �v.A derivada dirigida de f no ponto �a segundo a direção do vetor �v é f

e�v(�a), onde e�v = �v

‖�v‖é um vetor unitário.

Exemplo 23 Calculemos a derivada da função f (x, y) = 3x2 + 2y no ponto (1, 1) segundoa direção do vetor �v = (−3, 2).

21 Mat2 - 9 maio 2014

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O vetor �v não é um vetor unitário, pois ‖�v‖ =√(−3)

2+ 22 =

√13 �= 1. Define-se então

um vetor que tenha a mesma direção e o mesmo sentido de �v mas com norma igual a 1:

e�v =�v

‖�v‖ =(−3√13,2√13

).

Assim,

f′

e�v(1, 1) = lim

t→0

f[(1, 1) + t

(−3√13, 2√

13

)]− f (1, 1)

t

= limt→0

f(1− 3√

13t, 1+ 2√

13t)− 5

t

= limt→0

3(1− 3√

13t)2+ 2

(1+ 2√

13t)− 5

t

= limt→0

3(1− 6√

13t+ 9

13t2)+ 2+ 4√

13t− 5

t

= limt→0

− 18√13t+ 27

13t2 + 4√

13t

t

= limt→0

(2713t− 14√

13

)t

t= −

14√13.

Definição 21 Seja f : D ⊆ Rn −→ R diferenciável em �a ∈ intD. Define-se vetor

gradiente de f no ponto �a como sendo

∇f (�a) ≡ grad f (�a) =(∂f

∂x1(�a) , . . . ,

∂f

∂xn(�a)

).

Exemplo 24 Considere-se a função f (x, y) = 3x2 + 2y. Ora,

f′x = 6x e f′y = 2

são funções contínuas em R2. Logo, f ∈ C1

(R2), donde f é diferenciável em (1, 1). Assim,

∇f (1, 1) =(f′x (1, 1) , f

′y (1, 1)

)= (6, 2) .

Teorema 8 Seja f : D ⊆ Rn −→ R diferenciável em �a ∈ intD. Então, ∇f (�a) é um vetorcom direção perpendicular à da superfície de nível de f que passa pelo ponto �a.

22 Mat2 - 9 maio 2014

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Dem. Omite-se a demonstração deste resultado.

Propriedade 9 Sejam f : D ⊆ Rn −→ R diferenciável em �a ∈ intD e �v ∈ Rn. Então,

1. f′

�v (�a) = ∇f (�a) |�v = ‖∇f (�a)‖ · ‖�v‖ · cosθ, onde θ = ∢ (∇f (�a) ,�v) .

2.∣∣f ′

e (�a)∣∣ = ‖∇f (�a)‖, onde e = ∇f(�a)

‖∇f(�a)‖ .

Dem. Suponhamos f diferenciável em �a ∈ intD. Então,

f (�a+ t�v) = f (�a) +Df�a (t�v) + R (t�v) ,

onde limt→0

R(t�v)

‖t�v‖ = 0, pois ‖t�v‖ −→t→0 0. Logo,

f′

�v (�a) = limt→0

f (�a+ t�v) − f (�a)

t= lim

t→0

Df�a (t�v) + R (t�v)

t(4)

= limt→0

Df�a (t�v)

t+ lim

t→0

R (t�v)

t= lim

t→0

∇f (�a) | (t�v)t

+ 0

= limt→0

t (∇f (�a) |�v)t

= ∇f (�a) |�v = ‖∇f (�a)‖ · ‖�v‖ · cosθ,

onde θ = ∢ (∇f (�a) ,�v), pela definição de ângulo entre dois vetores.Seja e = ∇f(�a)

‖∇f(�a)‖ . Então, θ = ∢ (∇f (�a) , e) = 0◦ donde, por (4),∣∣f ′

e (�a)∣∣ = |‖∇f (�a)‖ · ‖e‖ · cosθ| = ‖∇f (�a)‖ · |cosθ| = ‖∇f (�a)‖ · 1 = ‖∇f (�a)‖ .

Observação 9 Como consequência da Parte 2 da propriedade anterior, se ∇f (�a) �= �0, ataxa de variação máxima de f verifica-se na direção do vetor gradiente.

23 Mat2 - 9 maio 2014

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Exemplo 25 Consideremos a função f (x, y) = 3x2 + 2y e o vetor �v = (−3, 2) do Exemplo23. Já se viu que f é diferenciável em (1, 1). Assim, pela Parte 1 da propriedade anterior,

f′

e�v(1, 1) = ∇f (1, 1) |e�v = (6, 2) |

(−3√13,2√13

)

=1√13(6, 2) | (−3, 2) =

1√13(−18+ 4) = −

14√13.

Além disso, a direção de maior crescimento de f no ponto (1, 1) será a direção do vetor∇f (1, 1) = (6, 2).

3.4 Plano tangente e reta normal

Consideremos uma superfície caracterizada pela equação F (x, y, z) = C e P = (a, b, c) umponto dessa superfície tal que F é diferenciável em P. Como ∇F (P) é um vetor com direçãoperpendicular à superfície, para qualquer ponto �x da superfície, tem-se:

∇F (P) | (�x− P) = 0⇔ F′

x (P) (x− a) + F′

y (P) (y− b) + F′

z (P) (z− c) = 0 ,

sendo esta a equação do plano tangente à superfície F (x, y, z) = C no ponto P.

Além disso, como ∇F (P) é um vetor normal à superfície no ponto P, as equaçõescartesianas da reta normal à superfície F (x, y, z) = C no ponto P são:

x−a

F′

x (P)= y−b

F′

y (P)= z−c

F′

z (P),

pois

x = a+ t · F ′

x (P)

y = b+ t · F ′

y (P)

z = c+ t · F ′

z (P)

t = x−a

F′

x (P)

t = y−b

F′

y (P)

t = z−c

F′

z (P)

, com t ∈ R.

Observação 10 Caso alguma das coordenadas do vetor gradiente seja nula, as equações dareta normal assumem a forma

x− a

F′

x (P)=z− c

F′

z (P)∧ y = b, se F

y (P) = 0 (por exemplo)

ou a formay = b∧ z = c, se F

y (P) = F′

z (P) = 0 (por exemplo).

24 Mat2 - 9 maio 2014

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Observação 11 No caso de se tratar do gráfico de um campo escalar f(x, y) = z ⇔f(x, y) − z = 0, onde F (x, y, z) = f(x, y) − z e f é diferenciável no ponto (a, b), as equaçõesdo plano tangente e da reta normal serão, respetivamente:

f′

x (a, b) (x− a) + f′

y (a, b) (y− b) = z− f(a, b)

ex− a

f′

x (a, b)=

y− b

f′

y (a, b)=z−f(a, b)

−1.

Exemplo 26 Considere-se a superfície definida pela equação 3y+ xy+ 3z2 − y2z = 2.

-4 -4-2

-2

-200 0

2

4

2 2

6

4

8

4

Sejam F (x, y, z) = 3y + xy + 3z2 − y2z e P = (−1, 1, 0). Como F (P) = 2, P é ponto dasuperfície dada. Além disso,

F′x = y, F′y = 3+ x− 2yz e F′z = 6z− y2

são funções contínuas em R3, donde F ∈ C1

(R3). Logo, F é diferenciável em P. Assim,

∇F (P) =(F′x (P) , F

′y (P) , F

′z (P)

)= (1, 2,−1) .

Portanto, a equação do plano tangente é

1 · (x+ 1) + 2 · (y− 1) + (−1) (z− 0) = 0⇔ x+ 1+ 2y− 2− z = 0⇔ x+ 2y− z = 1

e as equações da reta normal são

x+ 1

1=y− 1

2=z− 0

−1⇔ x+ 1 = y−1

2= −z .

25 Mat2 - 9 maio 2014

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4 Cálculo diferencial em campos vetoriais

O cálculo diferencial em campos vetoriais não será mais do que uma extensão docálculo diferencial em campos escalares, tal como se verificou com as noções de limite ede continuidade.

4.1 Diferenciabilidade

Definição 22 Sejam f : D ⊆ Rn −→ R

m um campo vetorial tal que f = (f1, . . . , fm) e�a ∈ intD. Diz-se que f é diferenciável em �a se

∀1 � i �m, fi é diferenciável em �a.

Exemplo 27 Consideremos o campo vetorial f : R3 → R2 definido por

f (x, y, z) =(yz− x3, zey

).

As suas componentes escalares são

f1 (x, y, z) = yz− x3 e f2 (x, y, z) = ze

y.

Ora,

∂f1

∂x= −3x2,

∂f1

∂y= z,

∂f1

∂z= y,

∂f2

∂x= 0,

∂f2

∂y= zey e

∂f2

∂z= ey

são funções contínuas em R3. Assim, f1, f2 ∈ C1

(R3), donde f1 e f2 são diferenciáveis em

R3. Logo, f =(f1, f2) é diferenciável em R

3.

Propriedade 10 Sejam f : D ⊂ Rn → Rm um campo vetorial e �a ∈ intD. Então,

f é diferenciável em �a ⇒ f é contínua em �a.

Propriedade 11 Seja f : D ⊆ Rn −→ R

m um campo vetorial diferenciável em �a ∈ intDtal que f = (f1, f2, f3). Então,

f ′ (�a) ≡ Df�a =

∂f1∂x1(�a) · · · ∂f1

∂xn(�a)

.... . .

...∂fm∂x1

(�a) · · · ∂fm∂xn

(�a)

≡ Jf (�a) ∈Mm×n (R) ,

designa-se por matriz Jacobiana de f em �a.

26 Mat2 - 9 maio 2014

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Exemplo 28 Consideremos o campo vetorial f : R3 → R2 do Exemplo 27 e �a = (−1, 0, 2).

Já se viu que f =(f1, f2) é diferenciável em R3. Em particular, f é diferenciável em �a.

Assim,

Jf (�a) =

[∂f1∂x(�a) ∂f1

∂y(�a) ∂f1

∂z(�a)

∂f2∂x(�a) ∂f2

∂y(�a) ∂f2

∂z(�a)

]

=

[−3x2 z y

0 zey ey

]

(−1,0,2)

=

[−3 2 0

0 2 1

].

4.2 Derivada dirigida

Definição 23 Sejam f : D ⊆ Rn −→ Rm um campo vetorial, �a ∈ intD e �v ∈ Rn. Define-se

derivada dirigida de f no ponto �a segundo o vetor �v como sendo

f′

�v (�a) = limt→0

f (�a+ t�v) − f (�a)

t∈ Rm .

A derivada dirigida de f no ponto �a segundo a direção do vetor �v é f′

e�v(�a), onde e�v = �v

‖�v‖ .

Observação 12 Note-se que, para f = (f1, ..., fm), se tem:

f′

�v (�a) =((f1)

�v (�a) , . . . , (fm)′

�v (�a)).

Exemplo 29 Consideremos o campo vetorial f (x, y, z) =(yz− x3, zey

)do Exemplo 27,

�a = (−1, 0, 2) e �v = (1, 1.− 1). As componentes escalares de f são

f1 (x, y, z) = yz− x3 e f2 (x, y, z) = ze

y.

Então, a derivada de f em �a segundo o vetor �v é

f′

�v (�a) =((f1)

�v (�a) , (f2)′

�v (�a))

=

(limt→0

f1 (−1+ t, t, 2− t) − f1 (−1, 0, 2)

t, limt→0

f2 (−1+ t, t, 2− t) − f2 (−1, 0, 2)

t

)

=

(

limt→0

t (2− t) − (t− 1)3− 1

t, limt→0

(2− t) et − 2

t

)

27 Mat2 - 9 maio 2014

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=

(

limt→0

2t− t2 − (t− 1)(t2 − 2t+ 1

)− 1

t, limt→0

2et − tet − 2

t

)

=

(

limt→0

2t− t2 −(t3 − 2t2 + t− t2 + 2t− 1

)− 1

t, limt→0

2 (et − 1) − tet

t

)

=

(limt→0

−t3 + 2t2 − t

t, 2lim

t→0

et − 1

t− lim

t→0et)=(limt→0

(−t2 + 2t− 1

), 2− e0

)

= (−1, 1) .

Propriedade 12 Seja f : D ⊆ Rn −→ Rm diferenciável em �a ∈ intD. Então,

f′

�v (�a) = Jf (�a)×�v,∀�v ∈ Rn.

Exemplo 30 Consideremos o campo vetorial f (x, y, z) =(yz− x3, zey

)do Exemplo 27,

�a = (−1, 0, 2) e �v = (1, 1.− 1). Como f é diferenciável em �a,

f′

�v (�a) = Jf (�a)×�v =[−3 2 0

0 2 1

]

1

1

−1

=[−1

1

]= (−1, 1) .

4.3 Operadores divergência e rotacional

Definição 24 Seja f : D ⊆ Rn −→ Rn um campo vetorial tal que f = (f1, ..., fn). Caso f

seja diferenciável em �a ∈ intD, define-se divergência de f em �a com sendo o escalar

div f (�a) =∂f1

∂x1(�a) +

∂f2

∂x2(�a) + · · ·+ ∂fn

∂xn(�a) ,

que corresponde à soma dos elementos principais da matriz Jacobiana de f em �a.

Exemplo 31 Considere o campo vetorial definido por

g (x, y, z) =(ex sen (πx) , 2x2y+ z, z ln

(x2 + y2

)).

As suas componentes escalares são

g1 (x, y, z) = ex sen (πx) , g2 (x, y, z) = 2x

2y+ z e g3 (x, y, z) = z ln(x2 + y2

).

28 Mat2 - 9 maio 2014

Page 31: MATEMÁTICAII CálculoDiferencialem Rltodi.est.ips.pt/mat2/documentos/SEBENTA/Mat2_CalcDifRn.pdf1.2 RepresentaçãográficaemRn Sabemosqueumafunçãorealdevariávelreal,f:R→R,temumarepresentaçãográficano

Tem-se que �a = (0, 1, 1) ∈ intD ={(x, y, z) ∈ R3 : x �= 0∨ y �= 0

}. Além disso,

∂g1

∂x= ex sen (πx) + πex cos (πx) ,

∂g1

∂y= 0,

∂g1

∂z= 0,

∂g2

∂x= 4xy,

∂g2

∂y= 2x2,

∂g2

∂z= 1

∂g3

∂x=

2xz

x2 + y2,∂g3

∂y=

2xz

x2 + y2e

∂g3

∂z= ln

(x2 + y2

)

são funções contínuas emD. Assim, g1, g2, g3 ∈ C1 (D) , donde g1, g2 e g3 são diferenciáveisem �a. Logo, g =(g1, g2, g3) é diferenciável em �a. Assim,

divg (�a) =∂g1

∂x(�a) +

∂g2

∂y(�a) +

∂g3

∂z(�a)

= π cos 0+ 0+ ln1 = π.

Observação 13 Os campos vetoriais com divergência nula são particularmente importantesna física e engenharia já que podem traduzir um princípio de conservação de uma grandeza(massa, carga eléctrica, etc).

Definição 25 Sejam f : D ⊆ R3 −→ R3 um campo vetorial diferenciável em �a ∈ intD tal

que f = (f1, f2, f3), �e1= (1, 0, 0), �e

2= (0, 1, 0) e �e3 = (0, 0, 1). Define-se rotacional

de f em �a com sendo o vetor

rot f (�a) =

∣∣∣∣∣∣

�e1�e2�e3

∂∂x

∂∂y

∂∂z

f1 f2 f3

∣∣∣∣∣∣(�a)

=T. Laplace

1a linha

(∂f3

∂y(�a) −

∂f2

∂z(�a) ,

∂f1

∂z(�a) −

∂f3

∂x(�a) ,

∂f2

∂x(�a) −

∂f1

∂y(�a)

),

obtido à custa dos elementos não principais da matriz Jacobiana de f em �a.

Exemplo 32 Consideremos o campo vetorial do Exemplo 31 e �a = (0, 1, 1). Como g édiferenciável em �a,

Jg (�a) =

∂g1∂x(�a) ∂g1

∂y(�a) ∂g1

∂z(�a)

∂g2∂x(�a) ∂g2

∂y(�a) ∂g2

∂z(�a)

∂g3∂x(�a) ∂g3

∂y(�a) ∂g3

∂z(�a)

=

π 0 0

0 0 1

0 0 0

.

Assim,

rotg (�a) =

(∂g3

∂y(�a) −

∂g2

∂z(�a) ,

∂g1

∂z(�a) −

∂g3

∂x(�a) ,

∂g2

∂x(�a) −

∂g1

∂y(�a)

)

= (0− 1, 0− 0, 0− 0) = (−1, 0, 0) .

29 Mat2 - 9 maio 2014

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Observação 14 Os campos vetoriais de rotacional nulo dizem-se irrotacionais. A irrota-cionalidade de um campo vetorial está associada à satisfação de certos princípios de conser-vação.

Propriedade 13 Sejam f : R3 −→ R um campo escalar e g : R3 −→ R3 um campo vetorial,

ambos de classe C2(R3). Então,

1. rot (∇f) = �0;

2. div (rotg) = 0.

Dem. 1. Pelo Teorema de Schwarz, as derivadas mistas de f são iguais. Logo,

rot (∇f) = rot(∂f

∂x,∂f

∂y,∂f

∂z

)=

∣∣∣∣∣∣

�e1�e2�e3

∂∂x

∂∂y

∂∂z

∂f∂x

∂f∂y

∂f∂z

∣∣∣∣∣∣

=

(∂2f

∂y∂z−∂2f

∂z∂y,∂2f

∂z∂x−∂2f

∂x∂y,∂2f

∂x∂y−∂2f

∂y∂x

)

= (0, 0, 0) = �0.

2. Seja g = (g1, g2, g3). Então,

div (rotg) = div(∂g3

∂y−∂g2

∂z,∂g1

∂z−∂g3

∂x,∂g2

∂x−∂g1

∂y

)

=∂

∂x

(∂g3

∂y−∂g2

∂z

)+∂

∂y

(∂g1

∂z−∂g3

∂x

)+∂

∂z

(∂g2

∂x−∂g1

∂y

)

=∂2g3

∂x∂y−∂2g2

∂x∂z+∂2g1

∂y∂z−∂2g3

∂y∂x+∂2g2

∂z∂x−∂2g1

∂z∂y= 0,

pelo Teorema de Schwarz.

30 Mat2 - 9 maio 2014