mastite ambiental efeitos no animal e no leite -...

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» 48 — outubro 2012 Efeitos no animal e no leite Causada por bactérias de origem ambiental, que se valem de falhas do sistema imune do animal para o estabelecimento da doença na glândula mamária, a mastite ambiental causa prejuízos estimados em R$ 200,00/caso clínico, sendo que 88% desse custo ocorre em razão da quebra de produção e descarte do leite A mastite ambiental é definida como uma infecção intramamária causada por bactéria de origem ambiental. Dife- rentemente da mastite contagiosa, cujos patógenos causadores são transmitidos entre as vacas, as bactérias causadoras da mastite ambiental são consideradas patógenos oportunistas, que se valem de falhas do sistema imune do animal para o estabelecimento da doença na glândula mamária. Em geral, essa doen- ça tem menor duração que a mastite de origem contagiosa. Os prejuízos causados pela mastite am- biental são estimados em aproximada- mente R$ 200,00/caso clínico, sendo que 88% desse custo ocorre em razão da quebra de produção e descarte do lei- te. O custo restante recai sobre o custo da mão-de-obra, tratamentos e serviço veterinário, além do descarte e secagem prematura de animais. Estima-se que as perdas em vacas adultas são duas vezes maiores que àquelas geradas por animais de primeira lactação. As bactérias consideradas de origem am- MASTITE AMBIENTAL QUALIDADE DO LEITE Marcos Veiga dos Santos Professor Associado Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP www.marcosveiga.net biental são as Gram negativas e os es- treptococos ambientais (todas as demais espécies com exceção do S. agalactiae). Entretanto, essas generalizações nem sempre são aplicáveis de uma forma estrita em todos os rebanhos ou em to- das as cepas bacterianas de uma mesma espécie. Mais recentemente, exceções a esta classificação estrita entre mastite contagiosa e ambiental vêm se tornan- do mais evidentes desde a introdução de modernas técnicas de identificação de patógenos causadores de mastite. AMBIENTE LIMPO, MANEJO NUTRICIONAL ADEQUADO E VACINAÇÃO (J5) PODEM CONTRIBUIR PARA O CONTROLE DA ESCHERICHIA COLI

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— outubro 2012

Efeitos no animal e no leiteCausada por bactérias de origem ambiental, que se valem de falhas do sistema imune do animal para o estabelecimento da doença na glândula mamária, a mastite ambiental causa prejuízos estimados em R$ 200,00/caso clínico, sendo que 88% desse custo ocorre em razão da quebra de produção e descarte do leite

A mastite ambiental é defi nida como uma infecção intramamária causada

por bactéria de origem ambiental. Dife-rentemente da mastite contagiosa, cujos patógenos causadores são transmitidos entre as vacas, as bactérias causadoras da mastite ambiental são consideradas patógenos oportunistas, que se valem de falhas do sistema imune do animal para o estabelecimento da doença na glândula mamária. Em geral, essa doen-ça tem menor duração que a mastite de origem contagiosa.

Os prejuízos causados pela mastite am-biental são estimados em aproximada-mente R$ 200,00/caso clínico, sendo que 88% desse custo ocorre em razão da quebra de produção e descarte do lei-te. O custo restante recai sobre o custo da mão-de-obra, tratamentos e serviço veterinário, além do descarte e secagem prematura de animais. Estima-se que as perdas em vacas adultas são duas vezes maiores que àquelas geradas por animais de primeira lactação.As bactérias consideradas de origem am-

MASTITE AMBIENTAL

QUALIDADE DO LEITE

marcos veiga dos santosProfessor Associado Faculdade de Medicina

Veterinária e Zootecnia da USPwww.marcosveiga.net

QUALIDADE DO LEITE

Professor Associado Faculdade de Medicina

biental são as Gram negativas e os es-treptococos ambientais (todas as demais espécies com exceção do S. agalactiae). Entretanto, essas generalizações nem sempre são aplicáveis de uma forma estrita em todos os rebanhos ou em to-das as cepas bacterianas de uma mesma espécie. Mais recentemente, exceções a esta classifi cação estrita entre mastite contagiosa e ambiental vêm se tornan-do mais evidentes desde a introdução de modernas técnicas de identifi cação de patógenos causadores de mastite.

ambiente limpO, maneJO nutriciOnal

adeQuadO e vacinaÇãO (J5) pOdem cOntribuir para O cOntrOle da

escHericHia cOli

— outubro 2012

Faça as contas e

comprove.

Trate as mastites com

Cobactan, e descarte

o prejuízo.

Na ponta do lápis, a melhor escolha para tratar a mastite.

Cobactan VL e Cobactan 2,5% para MASTITES

Mastite por bactérias Gram negativasEscherichia coliA E. coli é considerada um dos prin-cipais patógenos ambientais, pois é largamente distribuída no ambiente da produção leiteira e por ser uma das mais oportunista dentre todos os outros patógenos causadores de mastite, uma vez que a sua incidên-cia é maior nos animais com balanço energético negativo no início da lac-tação. A incidência e gravidade de um caso de mastite aguda causada por E. coli pode ser reduzida pela menor exposição da vaca ao patógeno ou pelo aumento da resistência imune do animal. Um ambiente limpo asso-ciado ao manejo nutricional adequa-do (energia, vitamina E e selênio) e vacinação (J5) podem contribuir para o controle desse patógeno.Contudo, recentemente alguns estu-dos científi cos indicaram a ocorrência de casos de infecções intramamárias crônicas causadas por E. coli. O uso de técnicas de identifi cação por DNA permitiu comprovar a reincidência de casos de mastite clínica em um mesmo quarto mamário de um mes-mo animal, pois é pouco provável que o isolamento repetido de uma mesma cepa em um mesmo quarto mamário seja decorrente de novas infecções que se repetem durante um período determinado de tempo. Esses resultados indicaram que E. coli está se adaptando ao ambiente da glândula mamária. Por causa dis-so, pode-se esperar que as infecções intramamárias crônicas causadas por E. coli sejam observadas mais frequentemente nos próximos anos.

Klebsiella sppAs mastites causadas por Klebsiella respondem de forma insatisfatória ao tratamento, e a maioria dos ani-mais acometidos por esse patógeno é secada prematuramente por causa das altas contagens de células somá-ticas e sinais de mastite clínica. Essa bactéria geralmente está no ambien-te, particularmente na serragem úmi-da ou verde utilizada como material de cama para as vacas.Recentemente, mesmo em rebanhos bem manejados que não utilizam serragem como cama de sistemas

de confi namento, este agente tem sido uma causa importante de sur-tos de mastite. Este microrganismo também se encontra no sistema gastrintestinal de humanos, além de estar disperso no ambiente. A reuti-lização de areia como cama para ani-mais, contaminada com Klebsiella, de origem fecal ou ambiental, pode estar associada com a ocorrência desses casos de mastite em reba-nhos que usam materiais inorgânicos como cama. Além disso, há relatos de transmissão do patógeno entre animais, caracterizando uma forma contagiosa da infecção. Estudos recentes sobre o comportamento deste microrganismo no ambiente e sua interação com o hospedeiro in-dicam que o controle da mastite por Klebsiella também pode necessitar a segregação das vacas infectadas para reduzir a transmissão do tipo contagiosa.

Mastite por bactérias Gram positivasStreptococcus sppO Streptococcus uberis é o microrga-nismo que está entre as causas mais comuns de mastite clínica e subclí-nica de vacas em lactação e a prin-cipal causa de mastite entre vacas secas. Como não existe mecanismo de transmissão contagiosa dessas infecções durante o período seco, acredita-se que esses casos de masti-te sejam de origem ambiental. Feno, palha e outros materiais orgânicos, assim como outros alimentos, água e pasto albergam altas contagens de S. uberis. Até o momento, mais de 5 cepas diferentes de S. uberis foram identifi cadas dispersas no ambiente.Portanto, devido a sua grande disse-minação no ambiente, o S. uberis, de

FIQUE ATENTO

A E. coli está se adaptando ao ambiente da glândula mamá-ria. Por causa disso, pode-se esperar que as infecções intra-mamárias crônicas causadas por E. coli sejam observadas mais frequentemente nos próximos anos

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forma semelhante à E. coli, pode ter a transmissão por via contagiosa e a par-tir do ambiente, pois é pouco provável que uma grande proporção de vacas de um mesmo rebanho seja infectada com a mesma cepa. Alguns estudos indicaram que a cura dos casos de mastite causados por cepas de S. uberis que são transmiti-das entre vacas (comportamento conta-gioso) é mais demorada que a daqueles causados por outras cepas de S. uberis. Estes resultados indicam que estas cepas são mais agressivas e, pelo maior tempo de contato com os animais do rebanho, pode ter levado a uma maior adaptação.

Staphylococcus sppEstafilococos coagulase-negativa (ECN) são comumente classificados como pató-genos secundários da mastite, por terem baixa patogenicidade (ou seja, causam poucos danos na glândula mamária); to-davia estão associados à forma subclínica da doença. Os ECN são tradicionalmente considerados como parte da microbiota natural da pele dos bovinos, mas podem causar mastite subclínica como um agen-te oportunista, o que resulta em eleva-ções moderadas na CCS. Já foram identifi-cadas dezesseis espécies de ECN isoladas de vacas com mastite, com variações en-tre rebanhos e países. Espécies como S. simulans, S. chromogenes, S. hyicus e S. epidermidis, são as mais frequentemente isoladas de vacas e novilhas com infec-ções intramamárias (IIM).Os estafilococos coagulase negativa (ECN) são os microrganismos mais isola-dos de amostra de leite, tanto de vacas em lactação quanto, principalmente, de novilhas. Durante a mastite causada por ECN poucos são os efeitos sobre a CCS de tanque, no entanto, em nível de quarto mamário os valores da CCS são altos.Atualmente, existem muitas controver-sas relacionadas à infecção intramamária causada por ECN, uma vez que, inicial-mente, acreditava-se que estes agentes pudessem prevenir as infecções causadas por outros agentes mais patogênicos, os chamados patógenos maiores. Contudo, nos estudos mais recentes o efeito pre-ventivo deste agente contra os outros patógenos principais não é significativo.Apesar das consequências negativas na

QUALIDADE DO LEITE

CCS, pelo aumento moderado nos ní-veis de CCS das amostras do tanque, e na diminuição da qualidade do leite, uma vantagem deste grupo, para o produtor, é que estes microrganismos apresen-tam boa sensibilidade aos antibióticos, aumentando a taxa de cura após o tra-tamento intramamário com antibióticos.

Contaminação microbiológica do leiteÉ notório que a contaminação ambiental do leite reduz a qualidade da matéria--prima e dos derivados após o processa-mento, além de diminuir a sua vida de prateleira. Dessa forma, quando os pro-cedimentos de ordenha são conduzidos sem higiene e com instalações e animais mal manejados, o leite produzido apre-senta CBT elevada. Além disso, a CBT do leite de tanque elevada pode estar associada com altas contagens de bacté-rias causadoras de mastite nos animais. Apesar das principais causas de alta CBT no leite serem conhecidas, como limpeza deficiente dos equipamentos de ordenha e resfriamento inadequado do leite, um estudo recente mostrou que vacas com mastite também podem ser causa de alta CBT no tanque. Essa situação é particu-larmente importante no caso específico da mastite causada pelos estreptoco-cos. Um estudo recente indicou que uma cepa predominante de S. uberis no leite do tanque estava presente nos animais do rebanho acometidos pela mastite por aquele microrganismo. Resultados similares foram observados em relação a rebanhos com altas contagens de co-liformes. Portanto, o controle tanto da mastite causada por esses agentes am-bientais, além de outras medidas de higie-ne já mencionadas são necessárias para a melhoria da qualidade microbiológica do leite.A redução dos riscos associados às do-enças veiculadas por alimentos no ho-

mem está ligada ao controle completo dos processos e procedimentos para a produção do alimento, desde a matéria--prima até o produto acabado, na mesa do consumidor. No caso da produção lei-teira, a ordenha é provavelmente a etapa de maior importância para a redução do risco de contaminação do leite.Anteriormente, os riscos aos quais as vacas estavam expostas para adquirir a mastite ambiental era o argumento para justificar os procedimentos para o controle do ambiente na propriedade leiteira. Realmente, a vaca está exposta à contaminação por bactérias de origem ambiental, as quais são oportunistas e causam infecções agudas na glândula mamária. Entretanto, em algumas situ-ações estes microrganismos podem se tornar melhor adaptados ao ambiente da glândula mamária, resultando numa infecção de quadro crônico, aumentan-do a possibilidade de transmissão desta cepa para outros animais.Portanto, o controle dos fatores ambien-tais envolvidos com a aparição de casos de mastite ambiental num rebanho é importante não só para a redução dos casos desta infecção intramamária, mas também na prevenção da emergência de novas cepas que migrem do ambiente ex-terno e se adaptem ao ambiente da glân-dula mamária, e aí permaneçam promo-vendo infecções de caráter mais crônico.Existem inúmeras razões para a manu-tenção de um ambiente limpo na proprie-dade leiteira. Os estudos demonstram a importância de adotar procedimentos que controlem os fatores ambientais para melhorar a qualidade do leite, e ain-da controlar os riscos de contaminação do leite por bactérias que causem doen-ças no homem. Apesar de ser impossível a erradicação desses microrganismos na propriedade rural, a única maneira de prevenir a contaminação e manter a boa qualidade microbiológica do leite é controlando os fatores ambientais aos quais as vacas estão expostas. Além dos benefícios imediatos do produtor, com a redução dos casos de mastite ambiental e um leite de melhor qualidade, pode-se buscar também um aumento da credibi-lidade dos consumidores em relação aos alimentos de origem animal.

Os estafilOcOcOs cOagulase negativa sãO tradiciOnalmente cOnsideradOs cOmO parte da micrObiOta natural da pele dOs bOvinOs, mas pOdem causar mastite subclínica cOmO um agente OpOrtunista