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389 MANGÁ: UMA FERRAMENTA DIDÁTICA PARA MULTILETRAMENTOS Célia Tamara Coêlho 128 Elvira Lopes Nascimento (Orientadora) RESUMO O objetivo dessa pesquisa é o de apresentar dados de análise dos mecanismos verbais e não-verbais presentes no gênero Mangá que constituem aspectos de multimodalidade (KRESS & VAN LEEUWEN, 2001; DIONÍSIO, 2006) e que possibilitam a aproximação da linguagem desse tipo de HQ com a linguagem falada no nosso cotidiano. Para tanto, selecionamos trechos do seguinte Mangá que se constitui em nosso corpus de análise: “Chobits” nº2 da Editora Kodansha distribuída no Brasil pela Editora JBC. Dessa maneira, os simulacros edificados por esse gênero textual (NASCIMENTO, 2009) permitem que a linguagem da arte misture- se com a linguagem da vida por meio da fala, dos comportamentos e dos aspectos culturais representados simbolicamente em suas histórias. Dessa forma, partimos do pressuposto de que tal tipo de HQ é um texto visualmente mais informativo e que requer dos leitores um letramento multimodal para interpretar aspectos lingüísticos e visuais e assim, compreender os efeitos de sentido presentes no texto. Palavras-chaves: Mangá, multimodalidade; multiletramento. 128 Aluna bolsista do programa CAPES/CNPQ do mestrado em Estudos da Linguagem, da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Colaboradora do projeto de “Pesquisa Gêneros Textuais e Ferramentas didáticas para ensinoaprendizagem de Língua Portuguesa”, coordenado pela minha orientadora Profa Dra Elvira Lopes Nascimento.

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389

MANGÁ: UMA FERRAMENTA DIDÁTICA PARA MULTILETRAMENTOS

Célia Tamara Coêlho128 Elvira Lopes Nascimento (Orientadora)

RESUMO

O objetivo dessa pesquisa é o de apresentar dados de análise dos mecanismos verbais e não-verbais presentes no gênero Mangá que

constituem aspectos de multimodalidade (KRESS & VAN LEEUWEN, 2001; DIONÍSIO, 2006) e que possibilitam a aproximação da linguagem desse

tipo de HQ com a linguagem falada no nosso cotidiano. Para tanto, selecionamos trechos do seguinte Mangá que se constitui em nosso corpus

de análise: “Chobits” nº2 da Editora Kodansha distribuída no Brasil pela Editora JBC. Dessa maneira, os simulacros edificados por esse gênero

textual (NASCIMENTO, 2009) permitem que a linguagem da arte misture-se com a linguagem da vida por meio da fala, dos comportamentos e dos

aspectos culturais representados simbolicamente em suas histórias. Dessa forma, partimos do pressuposto de que tal tipo de HQ é um texto

visualmente mais informativo e que requer dos leitores um letramento multimodal para interpretar aspectos lingüísticos e visuais e assim,

compreender os efeitos de sentido presentes no texto.

Palavras-chaves: Mangá, multimodalidade; multiletramento.

128

Aluna bolsista do programa CAPES/CNPQ do mestrado em Estudos da Linguagem, da Universidade Estadual de Londrina (UEL).

Colaboradora do projeto de “Pesquisa Gêneros Textuais e Ferramentas didáticas para ensinoaprendizagem de Língua Portuguesa”,

coordenado pela minha orientadora Profa Dra Elvira Lopes Nascimento.

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Introdução

A linguagem em seus aspectos de representação da vida co-

evoluiu com a maneira de construção da sociedade contemporânea. Dessa

forma, cultura, história e linguagem interelacionam-se e modificam-se

constantemente, na medida em que representam o agir, o pensar, o ser e

o sentir de um ser humano, ao mesmo tempo, multifacetado e individual

que fabrica a realidade tanto cotidianamente quanto nas histórias das

HQs. Convém ressaltar que o gênero Mangá 129 constitui-se em uma das

formas de manifestação artística, em que o discurso da arte e da vida

fundem-se.

O advento da imagem como simulacro de edificação simbólica e

semiótica da realidade social evidencia as mudanças na forma de ler e

produzir dos textos, que passam a ser vistos como construtos multimoda,

nos quais a modalidade escrita é vista como um dos modos de

representação (MOZDZENSHI, 2008).

Portanto,

Imagem e palavra mantêm uma relação cada

vez mais próxima, cada vez mais integrada.Com o advento das novas

tecnologias, com muita facilidade se criam novas imagens, novos layouts, bem como se

divulgam tais criações para uma ampla audiência. Todos os recursos utilizados na

construção dos gêneros textuais exercem uma função retórica na construção de sentidos dos

textos. Cada vez mais se observa a combinação de material visual com a escrita;

vivemos sem dúvida, numa sociedade cada vez mais visual.(DIONÍSIO, 2006, p.131-144)

129

A idéia que norteia esse trabalho a respeito da conceituação de gênero é a Bakhtiniana de que os gêneros textuais constituem-se em

entidades sócio discursivas que refletem e refratam os modos de agir, de pensar e de organizar da sociedade

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A linguagem é concebida como um mecanismo de interação

social que tanto reflete quanto refrata a vida cotidiana e que sempre é

dialógica (BAHKTIN, 2003). Dessa maneira, os gêneros textuais

perpassam as manifestações discursivas e sociocognitivas dos empates

político-ideológicos que moldam e constroem as relações entre os sujeitos,

bem como,determinam os papéis sociais a serem seguidos nas distintas

situações do viver em sociedade.

O discurso verbal e não-verbal, portanto, dentro de cada gênero

textual é resultado de uma ação comunicativa tanto coletiva quanto

individual que se atualiza, constantemente, pelo fato da interatividade

entre ficção e realidade que permite a verossimilhança. Essa

verossimilhança não significa uma “cópia” exclusiva do real, mas uma

possibilidade de aceitação do enredo da história, ou seja, o

reconhecimento das redes de significados plausíveis para a sua

compreensão.

O Mangá diante do contexto da disseminação da informação em

um “click”, da iconização da cultura e sua transposição para a tela do

cinema, bem como, a sua influencia na elaboração dos quadrinhos

nacionais e mundiais, torna-se um fenômeno global que legitima e

dissemina padrões de comportamento, formas ideológicas do pensar, do

agir e do dizer da cultura japonesa, ao mesmo tempo em que simboliza os

mecanismos ideológico-culturais de uma sociedade capitalista. Dessa

maneira, essa cultura pop 130 abarca uma diversidade de leitores

(crianças, jovens e adultos) que fascinados pela sua linguagem hibrida de

leitura fácil e prazerosa projetam seus sonhos, escondem seus medos e

frustrações em uma forma de entretenimento, na qual [...] as

personagens do mangá, que, ao contrario dos super-heróis produzidos no

130

“Cultura popular, cultura de massa ou cultura pop é a cultura vernacular - isto é, do povo - que existe uma sociedade moderna. O

conteúdo da cultura popular é determinado em grande parte pelas indústrias que disseminam o material cultural, como por exemplo as indústrias do cinema, televisão, música e editorais, bem como os veículos de divulgação de notícias. No entanto, a cultura popular não pode

ser descrita como o produto conjunto dessas indústrias; pelo contrário, é o resultado de uma interação contínua entre aquelas e as pessoas

pertencentes à sociedade que consome os seus produtos”. FONTE: http://pt.wikipedia.org/wiki/Cultura_popular acessado em 25/07/10

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ocidente, são heróis concebidos a partir do mundo real, os quais as

pessoas podem encontrar, além de uma espécie de miniatura. Essas

revistas servem para que os leitores vivenciem suas fantasias, que

preferem reprimir e interiorizar. São abundantes e oferecem uma válvula

de escape silenciosa afeita aos japoneses, que preferem reprimir seus

sentimentos. [...] (LUYTEM, 2001, p.40).

Essa leitura de escape presente no cotidiano, não somente, na

sociedade oriental, como também na ocidental atrai milhares de pessoas

que se reúnem em feiras como a Comic-Com (2010) 131, encontros de

animes 132, ou mesmo, em casa depois de um dia estressante para lerem

o Mangá, evidenciando que esse gênero se constitui em uma fonte da

memória compartilhada repleta de valores e regras aceitos, modificados e

reescritos pelas personagens e pelos leitores que são ao mesmo tempo

influenciados e influenciadores.

Os Mangás, essas narrativas icônico-verbais, ao serem lidos

precisam acionar uma rede de significações sociocognitivas o que requer

que o leitor seja multiletrado para poder perceber que esse tipo de texto

não é tão inocente quanto parece ser. Para tanto, propomos seu uso nas

escolas apoiado em uma prática pedagógica que permita ao aluno ser um

sujeito crítico e reflexivo sobre os textos que lê e produz, para poder

compreender, interpretar e resignificar os efeitos de sentido e os

significados tanto explicito quanto implícito nos textos que utilizam tanto

linguagem verbal quanto não verbal.

É inegável a importância desse gênero quadrinizado, tanto que

seu uso passa a ser didatizado na forma de cartilhas jurídicas e de saúde,

a fim de esclarecer a população sobre seus direito e deveres, no primeiro

caso, e no segundo, como forma de profilaxia. Dessa maneira, a

131

Uma das maiores convenções de quadrinhos do mundo, a Comic-Con acontece de 21 a 25 de julho em San Diego, nos Estados Unidos.

http://noticias.bol.uol.com.br/entretenimento acessado em 25/07/10 132

Termo que define desenhos japoneses (animações) os quais derivam do mangá.

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linguagem fluida e oralizada ancorada pelas imagens é um mecanismo

que seduz ao mesmo tempo que manipula discretamente seus leitores por

meio dos estereótipos sociais disseminados pelas personagens dessas

histórias. Nesse sentido, entendemos que esse gênero se presta a

atividades de letramento escolar por se tratar de uma prática discursiva

emergente que está ligada à aparição de novas motivações sociais que

são resultantes de novas circunstâncias de comunicação associadas à

produção tecnológica, constituindo assim um novo ambiente de interação

social que precisa ser estudado e didatizado.

1. Breve histórico do gênero Mangá e suas característica: a

edificação de um fenômeno mundial

A imagem permeia a vida humana desde os primórdios, uma vez

que surge antes da palavra escrita para representar os costumes, os

valores, os hábitos e mesmo a religiosidade e o misticismo como forma de

registro de uma cultura oralizada. Dessa maneira, os desenhos retratam o

viver da sociedade desde as pinturas rupestres 133, ao surgimento do

alfabeto ideográfico 134, até a utilização dos textos imagéticos na

sociedade contemporânea e sua fusão com o texto verbal, quadrinizado,

televisivo e virtual (internet).

133 As pinturas rupestres são desenhos feitos nas paredes das cavernas que retratam o cotidiano das sociedades préhistóricas, bem como, seus costumes e valores sociais. Elas são consideradas patrimônio da humanidade desde 1993 pela UNESCO. (ENCICLOPÉDIA BARSA

DIGITAL, 2001 – CD ROOM)Uma das maiores convenções de quadrinhos do mundo, a Comic-Con acontece de 21 a 25 de julho em San

Diego, nos Estados Unidos. http://noticias.bol.uol.com.br/entretenimento acessado em 25/07/10 134

O alfabeto ideográfico surge há aproximadamente 3.000 a.C, sendo utilizado pelas seguintes civilizações fenícia, egípcia. Os fenícios

foram os primeiros a inventarem esse tipo de escrita pictográfica em tabuas de barro e de maneira, representado de uma maneira cuneiforme

(em forma de cunha) com a finalidade de registro e preservação de sua cultura. Outras sociedades também possuem esse tipo de alfabeto

chinesa e japonesa. (ENCICLOPÉDIA BARSA DIGITAL, 2001 – CD ROOM)

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Pinturas Rupestres

Fonte: http://pt.wikipedia.org

Desenho Mangá (animes)

Fonte: http://ultradownloads.uol.com.br

O Mangá, história em quadrinhos japonesa, constitui-se em uma

narrativa icônico-verbal, sendo utilizada pela primeira vez pelo ilustrador

Katsushika Hokusai 135 em 1814 durante o período Edo 136 (LUYTEN,

2001), em formato de livro, para poder retratar de uma maneira lúdica as

características dessa sociedade. Convém ressaltar que esse gênero textual

deriva do emakimono, pintura japonesa em rolos de papel com textos que

contavam histórias do cotidiano, dos valores e hábitos, à medida em que

iam sendo desenrolados (MOLINÉ ,2004).

Outro fato que propiciou a sua disseminação consiste em que a

maioria da população japonesa era analfabeta em relação ao alfabeto

Kanji 137 e o Mangá, dessa forma, precisou utilizar os desenhos de traços

simples e estilizados de influencia chinesa para substituir aos ideogramas

135

Katsushika Hokusai (葛飾北斎?, outubro ou novembro de 1760 – 10 de maio de 1849) foi um artista japonês, pintor de

estilo ukiyo-e e gravurista do período Edo. Em sua época, era um dos principais especialistas em pintura chinesa do Japão.[1]

Nascido em Edo (atual Tóquio), Hokusai é melhor conhecido como autor da série de xilogravuras Trinta e seis vistas do

monte Fuji (富嶽三十六景, Fugaku Sanjūroku-kei?, c. 1831) que inclui sua pintura icônica e internacionalmente conhecida,

A Grande Onda de Kanagawa, criada durante a década de 1820”. FONTE: http://pt.wikipedia.org/wiki/Katsushika_Hokusai

acessado em 27/07/10 136

Período Edo marca o início do período moderno no Japão por Xogun Tokugawa Ieyasu (1603 a 1868). Nessa dinastia o

Japão isola-se do resto do mundo por meio de uma política anti-estrangeirismo chamada de shogun e desenvolve quanto

aprimora técnicas de gravação, bem como de suporte gráfico. 137

O Kenji é um dos três tipos de alfabetos oficiais japoneses, composto de ideogramas (desenhos) para representar palavras

e até mesmo frases. Convém ressaltar que além do som, explora também, a idéia contidas nos signos. Os outros são: o

Hiragana e o Katagana, cada um com 48 caracteres.

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desse alfabeto (FARIA, 2007). Tal procedimento visou facilitar a

transmissão e interação dos leitores com as personagens pelo

reconhecimento dos arquétipos emocionais vinculados por esse tipo de

HQ.

Contudo, foi na Era Meiji (1868 a 1912) que o Mangá passa a se

configurar mais próximo do seu formato atual pela abertura cultural,

política e econômica aos estrangeiros, principalmente, aos norte-

americanos (LUYTEN, 1976). Para tanto, houve o início de uma indústria

do entretenimento, na qual o Mangá passa a possuir linearidade em suas

histórias e personagens fixos que se baseiam na infra-estrutura da

perspectiva de apresentação das HQs americanas (fusão entre a

linguagem verbal e não-verbal com a utilização de quadros e balões para

transmissão das histórias e com enfoque nos desenhos). Segundo Moliné

(2004) a primeira HQ japonesa com esses procedimentos foi criada por

Rakuten Kitazawa em 1901 (Tagosaku to Morukubei no Tokyo Kenbutsu -

A Viagem a Tokyo de Tagosaku e Morukubei).

Com o advento do cinema, na década de 20, os japoneses

puderam utilizá-lo para desenvolver animações sonoras baseadas nas

histórias dos Mangás (SATO, 2005). Mas, somente da década de 50 é que

o termo anime desponta-se, sendo uma derivação da palavra inglesa

animation, designando os desenhos animados japoneses (LUYTEM, 2001).

A partir desse momento, os Mangás e animes com Osamu Tesuka sofrem

duas profundas transformações, de acordo com Moliné (2004): 1) o

desenho acentuado dos olhos para melhor representar simbolicamente os

sentimentos e emoções psicológicas de uma forma mais profunda que

sensibiliza eficazmente o leitor; 2) técnicas de enquadramento

cinematográfico e animação para induzir movimento e passagem do

tempo nessas histórias. Portanto, esse gênero textual alcança proporções

globais, contituindo-se em um produto de exportação que abarca

mercados como os dos EUA, Mexico, Brasil, etc. Em solo brasileiro há,

primeiramente, uma explosão mercadológica dos animes (Dragon Ball Z,

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Samurai X, Pokémon, Naruto, dentre outras) para sua posterior

disseminação em formato de HQ. Hoje, os Mangás são inegavelmente, um

fenômeno em vendas e atraem milhares de leitores que sucumbem a

leitura prazerosa e emocionante de suas histórias que retratam varias

temáticas tais como: sátira a sociedade atual, crise existencial, humor e

sexualidade, etc.

Convém evidenciar que apesar de influenciado pelas HQs

americanas, o Mangá apresenta peculiaridades tais como: 1) personagens

próximas da realidade social, já que desempenham papéis sociais do

passado, do presente e da perspectiva do futuro da cultura japonesa,

podendo ser: samurais, dona de casas, vendedores, estudantes, robôs,

etc. Portanto, não há o misticismos dos heróis americanos, ou seja, essas

personagens são reais, sem super-poderes e com traços humanos como o

dualismo (convivem em seu ser e existir traços de bondade e maldade) e

não são imortais; 2) o público leitor influencia na sua escrita, podendo

alongar as histórias ou reduzí-las, chegando, até mesmo, a terminá-las;

3) há uma linearidade temporal e cronológica, na qual o produtor do

Mangá, chamado de Mangaka, elabora as histórias a partir do nascimento

das personagens, passando pela sua adolescência, maturidade, velhice e

até, evidenciando, a morte das mesmas. Tal procedimento, propicia uma

visão geral da história, aproximando-a da vida cotidiana real, uma vez que

o viver das personagens é verossímil, ou seja, é reconhecido como

realidade possível; 4) a leitura das histórias é realizada da direita para

esquerda, diferente da leitura da sociedade ocidental (esquerda para a

direita); 5) sua impressão acontece em papel jornal e, geralmente, é feita

de forma monocromática (em preto e branco) para baratear os custos de

impressão; 6) os formatos dos balões são diferenciados, mas próximos

dos convencionais americanos; 7) ênfase na expressão caricatural das

personagens, com olhos acentuados e traços, ao mesmo tempo angélicas

quanto sexis, e personagens masculinas com rostos afeminados; 8)

sobreposição dos quadros e o formato dos mesmos, possibilitam a idéia de

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movimento cinematográfico durante a sua leitura; 9) divisão em faixa

etárias: shounen (garoto jovem) ,shoujo (garota jovem),o gekigá, que é

uma corrente mais realista voltada ao público adulto, seinen para homens

jovens e josei para mulheres. Os desenhos abaixo possuem a finalidade

de exemplificar os tópicos comentados anteriormente.

2

1

6

Forma de leitura dos Mangás

Revista de Mangá: Chobits nº2 pg. 34

5

4

3

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Os Mangás conquistam

cada vez mais espaço nos

momentos de lazer de um

público, tanto oriental

quanto ocidental, que

busca uma válvula de

escape de uma realidade

permeada por regras de

conduta e moral de uma

sociedade capitalista que

enaltece, a cada dia, o

parecer e não o ser.

HQ americana: Marvel 2000 nº3

Dessa maneira, os leitores são transportados ao mundo

imaginário em que podem realizar as suas fantasias, explorar os seus

medos, salvar lindas donzelas, liberar pudores, etc. Tudo, sem sair de

casa, e ainda gastando muito pouco, em uma viagem pelo universo

acessível do Mangá, que não é nada ingênuo ou neutro.

2 Multimodalidade e multiletramento: a construção dos múltiplos significados dos textos

A fim de disseminar a utilização e a didatização na esfera escolar

do gênero Mangá, aproveitamos para evidenciar que como todo tipo de

texto, esse possui um discurso dialógico e manipulador, no sentido que

seduz os leitores de forma consciente ou não a utilizar e aceitar os

produtos, objetos de consumo, que são veiculados em suas histórias, bem

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como, as idéias, os valores e as crenças que influenciam a forma de agir e

de ser dos indivíduos no mundo real cotidiano. Para tanto, é necessário

uma escola voltada para a formação de um sujeito histórico e social que

não pode desvincular do seu conteúdo programático textos da cultura

popular (PCNs, 1998), além de, possibilitar aos alunos desenvolver e

aprimorar as suas capacidades lingüísticas, cognitivas e discursivas

(BRONCKART, 2003) para que possam se tornar multiletrados, ou seja,

interpretar e analisar textos multimodais (NASCIMENTO, 2009).

Segundo Kress e Van Leeuwen, 2001, gêneros multimodais

referem-se àqueles que utilizam além da linguagem verbal uma linguagem

não-verbal que ao se articularem geram possibilidades de sentido. Dessa

maneira, devido a revolução nas formas de impressão e visualização dos

textos no ciber espaço, e mesmo, a existência da possibilidade de

articulação entre texto e imagem na mídia televisiva e cinematográfica, o

papel do leitor sofre profundas transformações, uma vez que se torna

primordial para uma leitura eficaz e crítica que o indivíduo seja capaz de

rearranjar suas estruturas sociodiscursivas para conseguir interpretar e

entender esses tipos de textos. Para Tanto, o multiletramento na visão de

Oliveira (2009), advêm do conceito de “letramento ideológico” que

perpassa a acessibilidade de diversos textos a serem trabalhados no

ambiente escolar, para que os alunos sejam capazes de perceber e

analisar criticamente as formas ideológicas e os mecanismos de

manipulação e dominação utilizados, bem como compreender,

interpretara e resignificar os significados que são veiculados nesses

discursos 138.

Como a nossa pesquisa foca-se na multimodalidade presente no

gênero Mangá, aproveitamos, assim, o quadro abaixo para evidenciar os

processos icônico-verbais de fabricação da realidade nesse discurso do

narrar.

138

O sentido de discurso utilizado no artigo refere-se tanto a textos verbais quanto não-verbais

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Linguagem verbal Linguagem não-verbal

· Estruturas lexicais, fraseológicas e

discursivas que se combinam para

propiciar sentido e transmissão de

informação;

· Polifonia, intertextualidade e

dialogismo, conceitos da teoria

bakhtiniana, sendo que o primeiro

e o segundo referem-se a

possibilidade da existência de

distintas vozes sociais que

auxiliam a compor os discursos. O terceiro

termo constitui-se em

qualquer produção que perpassa as

relações sociais.

· Figuras de linguagem, tais como

onomatopéia, metáfora, hipérbole,

etc

· Balões, quadrados;

· Enfoque e distribuição da

perspectiva de enquadro das

personagens;

· Formas de impressão e

visualização;

· Desenhos e marcas gráficas;

· Tipos de cores e texturas utilizados

e seus contrastes;

· Sobreposição de cenas e quadros;

· Espaços em branco;

Quadro: recorte dos aspectos da multimodalidade no gênero Mangá

A questão da simbolização semiótica do mundo real retratada por

esse tipo de gênero aliada aos recursos verbais e não-verbais explorados

no quadro acima circundam a idéia de discurso de Fairclough (2001), que

se pauta na observação dos efeitos de sentido que essa simbolização

produz em seus leitores: 1) contribui para a construção de identidades

sociais e posicionamento do sujeito; 2) permeia e edifica as relações

sociais entre os indivíduos; 3) serve de base para a construção de um

sistema de crenças e conhecimentos. Dessa maneira, o “fazer sentido”

dos textos multimodais como o Mangá, situa-se na qualidade da narrativa

icônico-verbal em acionar em seus leitores cadeias intertextuais de

sentido, termo usado por Fairclough (2001), na qual a textualidade se

manifesta como representação tanto explicita quanto implícita do real.

As práticas discursivas que permeiam esse texto perpassam os

sistemas de cognição sociais fundamentais e organizadores das atitudes e

das representações sociais, que se estabelecem por meio dos estereótipos

veiculados pela personagens desse tipo de HQ. Portanto, o imaginário

tanto coletivo quanto individual dos seres humanos é resultado de

experiências cotidianas reais ou ficcionais, na qual arte e vida fundem-se

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em um espetáculo, que nada mais é do que o possível e o identificável de

uma superposição do eu, do outro e do nós, em uma narrativa icônico-

verbal que conta o próprio viver do homem sócio-histórico.

3.Análise de uma cena do Mangá: “Chobits” nº2

Convém ressaltar que essa pesquisa constitui-se em um recorte,

ou seja, uma analise de uma cena da Revista de Mangá: Chobits nº 2

criada pela CLAMP 139 e distribuída no Brasil pela editora JBC, em 2003.

Primeiramente, gostaríamos de apresentar uma sucinta contextualização

do seu contexto de produção e do seu enredo, aspectos relevantes para o

compreensão do artigo.

A Revista Chobits destina-se ao público masculino de 20 a 40

anos, ou seja, é do gênero seinen mangá. Sua história acontece no século

XXI e seu personagem principal é Hideki Motosuwa, um jovem estudante

que se muda para a capital Tókio, a fim de ingressar na universidade.

Quando Hideki chega a grande cidade, descobre um mundo, no qual os

avanços tecnológico são uma realidade comum ao cotidiano. Dessa

maneira, possuir um computador portátil, ou mesmo, ser o dono de um

robô com aparência humana, os chamados persocons, é absolutamente

normal. Nesse mundo os persocons permeiam o viver dos indivíduos que

os ensinam a realizar tarefas que vão desde a lavar os pratos, até acessar

a internet, e inúmeras outras coisas mais. Hideki, também queria ter um

persocon, mas devido a sua condição de estudante, não tinha muito

dinheiro. Contudo, uma bela noite quando voltava para casa encontra

uma persocon jogada no lixo. Como ela parecia estar em perfeitas

condições, Hideki a leva para casa e a liga. Ao ligá-la o estudante percebe

que a memória da persocon foi apagada e que ela parece ser da lendária

serie dos Chobits (lenda urbana que se conta sobre persocons com a

capacidade de desenvolver uma personalidade e ter sentimentos). Como a

139

CLAMP constitui-se em um grupo de mangakas do Japão, formado por quatro escritoras mulheres: Ageha Ohkawa, Mokona, Tsubaki

Nekoi e Satsuki Igarashi. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/CLAMP acessado em 02/08/10

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robô fala constantemente a palavra Chii, Hideki a passa chamar dessa

forma. Assim, a história desse mangá perpassa as confusões, descobertas

e incertezas que constroem os caminhos de Hideki e Chii que os levam a

busca de informações para desvendar a origem da robô.

A cena abaixo constitui-se no momento em que Chii faz Hideki

sentir vergonha diante da sehorio, a dona do apartamento no qual as

personagens moram. Portanto, analisaremos a seguir os mecanismos

multimodais apresentados nesse excerto que as autores utilizam para

construir os efeitos de sentidos disseminados por esse texto.

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403

Mangá Chobits nº2

A cena desenvolve-se por meio de oito quadros que se super-

posicionam e se fundem como uma moldura, a fim de facilitar a percepção

1

2

3

4

5

6

7

8

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do tempo e do espaço na história. Além dessa finalidade os quadros

permitem também, estabelecer a posição do leitor em relação a cena,

bem como indicam a duração de cada evento, ao mesmo tempo que dão a

idéia de movimento cinematográfico ao mangá. Portanto, o olhar do leitor

é direcionado a pairar em cada cena em uma seqüência para desvendar

seu significado. Segundo Rama (2004) os quadros servem para preencher

as lacunas, ou mesmo as falhas que possam haver entre os quadrinhos,

uma vez que possibilitam ao leitor realizar inferências, presumir e

recuperar tanto do explicito quanto do implícito os efeitos de sentido.

Convém ressaltar que todos os quadros menos o três, utilizam uma

associação entre linguagem verbal e não verbal para fabricar a ilusão da

realidade. Dessa maneira, podemos constatar que o quadro três serve de

suporte para determinar a passagem de tempo entre os quadros um e

dois, na qual a personagem Hideki encontra-se aborrecido pelo

comportamento de Chii diante da senhorio, até seu restabelecimento

(elemento pressuposto) que culmina com um passeio com a persocon no

quadros quatro e cinco pela cidade.

Para ancorar o estado psicológico de vergonha e raiva pelo

comportamento de Chii, as autoras, no quadro um, encurtam a cena

(tamanho do quadro) e desenham Hideki de cabeça baixa, ao mesmo

tempo, que evidenciam uma nuvem de raiva que paira sobre sua cabeça.

Há, ainda nessa cena o contraste de claro e escuro para demonstrar a

turbulência do pensamento da personagem que se suporta pela sua

linguagem verbal entrecortada (Bo...). No quadro dois essa raiva é

externalizada pela caricatura acentuada do rosto de Hideki que se

contrapõe a figura entrecortada de Chii, objeto de sua fúria, acentuado

pelo balão de grito (com traçado firme e formato de estrela), no qual a

personagem grita uma pergunta monológica em negrito e em caixa alta,

para si mesmo, já que a senhorio já foi embora (BOA SORTE COM O

QUÊ???). As onomatopéias nos quadros um e dois aparecem em forma

de ideogramas do alfabeto kenshi e servem para reforçar os estados

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psicológicos das cenas por meio da utilização do recurso da sonoridade.

No primeiro quadro, permeia a idéia de (ranger de dentes) e na segundo

do grito (AHHHHH).

Os quadros quatro e cinco demonstram o passeio de Hideki e Chii

e pressupõem a volta do equilíbrio pelo passar do tempo proposto pelo

quadro três. No quadro quatro as autoras lançam mão do recurso de

aproximação da cena para fundir o olhar do leitor com o olhar de Hideki,

que se encontra em um estado de espírito pensativo sobre os

acontecimentos anteriores. Dessa forma, a cena transmite a idéia de que

Hideki olha para cima para refletir sobre o ocorrido e visualiza um canto

de uma fachada qualquer durante o passeio. Essa inferência é sustentada

pela linguagem não verbal desse quadro é confirmada pela superposição

dos balões e do quadro da cena cinco que indica o que Hideki pensa sobre

o comportamento de Chii (N-N-Não pensei que ... / Ela fosse dar uma

gafe na frente da senhoria). Também, outro mecanismo que reforça o

estado de espírito reflexivo e de preocupação de Hideki proposto pelo

quadro quatro é que na cena cinco acontece o afastamento do enfoque,

permitindo que o leitor veja o desenho da personagem levando as mãos a

cabeça, bem como, há ainda, a onomatopéia ideográfica (sentido de Uf -

marca simbólica de que Hideki assopra para dizer que se encontra tenso)

acima de sua cabeça.

Os quadros seis e sete as autores possibilitam ao leitor por meio

da linguagem verbal exposta pelo balão do pensamento, perceber o que

Hideki pensa a respeito da persocon (quadro seis / A Chii não tem a

menor noção do que é certo ou errado); e no quadro sete uma conclusão

sobre essa valoração (Ensiná-la... pode ser muito mais difícil do que eu

imaginava...). As reticências no final do pensamento de Hideki, também,

podem indicar uma antecipação de problemas futuros referente ao fato de

ensinar noções morais a Chii. A linguagem não verbal do quadro seis foca

o desenho lateral de Chii que poderia se passar por uma humana se não

fosse o detalhe das suas orelhas que se sobressaem em relação a sua

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cabeça. Essa imagem também reforça a questão de que a persocon não

diferencia o certo do errado, já que a sua caricatura passa uma

tranqüilidade inabalável diante dos acontecimentos. Na cena sete aparece

somente a silueta de Chii em um segundo plano e no primeiro há a

acentuação da expressão facial de Hideki (linguagem não verbal) para

ancorar a idéia proposta pela linguagem verbal nesse quadro (antecipação

de um problema).

No último quadro as preocupação de Hideki sobre as dificuldades

de ensinar noções de moralidade a Chii, evidenciada pelas cenas

anteriores, são quebradas, uma vez que o desenho do rosto da persocon

volta-se para a figura implícita de Hideki que se funde a do leitor. Esse

momento em que o sorriso Chii é direcionado a Hideki e ao leitor enfatiza

a quebra e se reforça pela adversativa (Mas...) presente no balão do

pensamento. Convém ressaltar que a reticência do pensamento da

personagem Hideki permite prender a atenção do leitor, criando uma

atmosfera de curiosidade para desvendar os acontecimentos posteriores.

Considerações Finais

O Mangá constitui-se em uma narrativa icônico-verbal,

multimodal que utiliza uma linguagem verbal e não-verbal para que o

leitor possa tecer interpretações e compreender os significados das suas

histórias. Dessa forma, não pode ser vista apenas como um emaranhado

de quadros, balões e personagens que encenam em um mundo ficcional,

com uma linguagem simples e fácil.

Como percebemos pela analise acima, as histórias perpassam o

mundo real dos leitores que são influenciados e influenciadores das

ideologias expostas pelos estereótipos das personagens, que nada mais

são, que reflexos do agir, do pensar, do ser e do existir do mundo real.

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Será que a escola como instituição do saber letrado não percebe isso?

Será que você, leitor, reflete sobre o que lê?

Essas questões circundam a elaboração desta pesquisa e, porque

acreditamos que somente seremos multiletrados quando tivermos uma

escola que possibilite transposições didáticas (CHEVALLARD, apud

NASCIMENTO, 2009) das práticas discursivas, o que implica abrir as

janelas da sala de aula para a vida, utilizando, sem preconceitos e

estereótipos, os textos da chamada literatura popular. Ao nosso ver, os

mangás podem ser utilizados como ferramentas didáticas que propiciam a

reflexão sobre temas transversais (como os benefícios e malefícios da

tecnologia) e sobre a cultura da paz e da convivência social harmoniosa,

tal qual é materializada pela linguagem multimodal da revista de mangá

Chobits.

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