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EDIÇÃO JUN/2014 #3 PUBLICAÇÃO EXPERIMENTAL DO CURSO DE JORNALISMO DA UNISINOS PORTO ALEGRE facebook.com/lupajornal THALLES CAMPOS ESTE PORTO JÁ FOI MAIS ALEGRE Cais Mauá, hoje com acesso restrito, aguarda que o novo projeto de revitalização levante de vez suas âncoras para voltar a fazer parte do cotidiano da cidade. PÁGINA 3 BELEZA OCULTA NA MARGEM OPOSTA Sem ser notada por quem aprecia o famoso pôr do sol da capital, Guaíba busca desenvolver o turismo. PÁGINA 5 PONTE DO GUAÍBA CONTINUA DE PÉ Mesmo com a construção de nova estrutura, o cartão- postal de Porto Alegre será opção de travessia. PÁGINA 7 DE IPANEMA AO LAMI Balneários locais mostram que não é preciso ir tão longe para descansar ou se divertir na praia. PÁGINA 2 MAIS VERDE PARA O CENTRO DE POA Parque Corredor do Gasômetro levará mais lazer e cultura aos moradores da região central da cidade. PÁGINA 4

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Jornal experimental Lupa (edição 3). A publicação é produzida por alunos do Curso de Jornalismo da Unisinos (campus Porto Alegre/RS). Veicula notícias e reportagens sobre uma comunidade da capital gaúcha. Esta edição é dedicada à região da orla do Rio Guaíba. Com 8 páginas, é impresso em cor. A tiragem é de 1.000 exemplares, que são distribuídos na localidade escolhida.

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EDIÇÃOJUN/2014#3PUBLICAÇÃO

EXPERIMENTAL DO CURSO DE JORNALISMO DA

UNISINOS PORTO ALEGRE facebook.com/lupajornal

TH

ALLES C

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POS

ESTE PORTO JÁ FOI MAIS ALEGRE

Cais Mauá, hoje com acesso restrito, aguarda que o novo projeto de revitalização levante de vez suas âncoras para

voltar a fazer parte do cotidiano da cidade. PÁGINA 3

BELEZA OCULTA NA MARGEM OPOSTA Sem ser notada por quem aprecia o famoso pôr do sol da capital, Guaíba busca desenvolver o turismo. PÁGINA 5

PONTE DO GUAÍBACONTINUA DE PÉ Mesmo com a construção de nova estrutura, o cartão-postal de Porto Alegre será opção de travessia. PÁGINA 7

DE IPANEMA AO LAMI Balneários locais mostram que não é preciso ir tão longe para descansar ou se divertir na praia. PÁGINA 2

MAIS VERDE PARAO CENTRO DE POA Parque Corredor do Gasômetro levará mais lazer e cultura aos moradores da região central da cidade. PÁGINA 4

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2 | lupa | porto alegre/rs | junho 2014

Olhar demarinheiro

EDITORIAL

Um cartão-postal é, por natu-reza, convidativo ao olhar. Para o olhar jornalístico, torna-se um con-vite ainda mais interessante. Pede que se olhe atrás, em volta, para to-dos os lados, por todos os ângulos. Foi o que fizeram repórteres e fo-tógrafos nesta edição do Lupa, que tem como pauta central o Guaíba. Central, neste caso, pois o tema é apenas um ponto de partida.

Estudantes de três turmas do curso de Jornalismo da Unisinos Porto Alegre percorreram a orla do Guaíba, atracaram no porto, nave-garam até as ilhas, atravessaram pontes e pinguelas, conheceram a margem oposta e voltaram à cidade. Tudo para compreender e relatar as diversas facetas da relação entre a capital gaúcha e seu famoso lago.

Fica claro, então, que cidade al-guma cabe em um cartão-postal. É preciso enxergar além do pôr do sol, decifrar a paisagem, traçar outros horizontes. Para isso serve o olhar do jornalista, que se assemelha ao olhar do marinheiro: sempre aten-to ao curso e em busca do próximo porto, onde a viagem recomeça.

Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISI-NOS. Av. Luiz Manoel Gonzaga, 744, Bairro Três Figueiras - Porto Alegre/RS. Telefone: (51) 3591 1122. E-mail: [email protected]. Reitor: Marcelo Fernandes de Aquino. Vice-reitor: José Ivo Follmann. Pró-reitor Acadêmico: Pedro Gilberto Gomes. Pró-reitor de Administração: João Zani. Diretor da Unidade de Graduação: Gustavo Borba. Gerente de Bacharelados: Gustavo Fischer. Coordenadora do Curso de Jornalismo: Thaís Furtado

O Lupa é um jornal produzido por alunos do Curso de Jornalismo da Unisinos Porto Alegre.

TEXTOSProdução dos alunos das disciplinas

de Jornalismo Impresso I e IIOrientação: Felipe Boff e Everton Cardoso

IMAGENSProdução dos alunos da disciplina

de FotojornalismoOrientação: Flávio Dutra

ARTEProjeto gráfico

Produção dos alunos da disciplina de Planejamento Gráfico (Curso de Jornalismo -

campus São Leopoldo/RS)Orientação: Everton Cardoso

Criação: Caroline Veleda e Daniela VaccariDiagramação

Produção da Agência Experimental de Comunicação (Agexcom)Campus São Leopoldo/RS

Adaptação do projeto gráfico: Marcelo Garcia

Diagramação: Gabriele Menezes e Marcelo Garcia

Supervisão: Marcelo GarciaCriação do logotipo: Lucas Inhaia

Calor. Final de semana. Feria-dão. Para muitas pessoas, a primeira opção é partir para o litoral. Capão da Ca-

noa, Tramandaí, Torres e até Praia do Rosa, em Santa Catarina, são alguns dos destinos que os moradores de Porto Alegre seguem quando o sol castiga o nosso asfalto. Mas nem sempre as con-dições permitem. O tempo e o dinheiro muitas vezes são limitados. O risco de sofrer um acidente aumenta em datas comemorativas como Natal, Réveillon, Carnaval e Páscoa. Ou, simplesmente, enfrentar um congestionamento e che-gar atrasado ao trabalho no dia seguin-te pode ser motivo para ficar em casa assistindo televisão.

Afastado da região central da capi-tal, o Lami é um dos locais que a Se-cretaria Municipal do Meio Ambiente (SMAM) sinaliza como próprio para ba-nho. Assessora de imprensa da Secreta-ria, Cibele Carneiro da Silva diz que o órgão solicita o monitoramento sema-nal das condições das águas do Lami e do Belém Novo ao Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE) apenas durante o verão. A análise iden-tifica a concentração de coliformes fe-cais e as condições de acidez e adstrin-gência da água. No momento, não há como saber se todos os pontos dessas duas praias estão balneáveis, pois no-vas coletas só voltarão a ser solicitadas no final de 2014.

O entorno da Praia do Lami conta com uma vasta área verde. Crianças brincam e famílias fazem piqueniques na grama. Churrasqueiras comunitá-rias fazem parte do ambiente. Não tem hora certa para o churrasco. No meio

da tarde do feriado de Tiradentes, ain-da havia uma família descarregando do carro carnes e bebidas ao som de “Dei-xa a vida me levar”, de Zeca Pagodinho.

Os comerciantes Luís Carlos de Bri-tos, 28 anos, e Sheila Santos, 34 anos, abriram um bar à beira da praia recen-temente. Sheila lembra que frequenta o local desde os sete anos e que passava todo o veraneio com apenas uma barra-ca e poucos utensílios. Hoje, o casal con-ta que em alguns finais de semana o lo-cal recebe diversas atividades culturais, promovidas pela prefeitura. “Essa praia parece tomada por uma tropa de bois”, diz Sheila, relatando o grande movimen-to de pessoas no Lami durante o verão.

Após sair da água com a namora-da no colo e acompanhado de outro casal de amigos, Gabriel Palma, 20 anos, conta que também curte o litoral gaúcho, mas o Lami proporciona mo-mentos de lazer quando o tempo está mais curto. Vai com a família e amigos, e lá podem passar o dia e preparar um churrasco no almoço. Garante que no verão, para a segurança dos banhistas, existem salva-vidas trabalhando nas guaritas ao longo da praia. Mas, en-tre as características apontadas pelos frequentadores, há uma, negativa, em comum: a falta de higiene do local. Do ponto onde estava Gabriel, não se avis-tava nenhuma lixeira na beira da orla, e o banheiro público mais próximo fi-cava a dez minutos de caminhada.

Além de um bom mergulho, o cli-ma de litoral pode estar apenas em reu-nir os amigos na beira do lago, tomar um chimarrão, aproveitar as águas de barco, jet ski ou até mesmo sobre uma prancha. Em Ipanema, nome dado em homenagem ao bairro do Rio de Janeiro, as condições de banho são consideradas impróprias. No entanto, as belezas natu-rais, a relativa proximidade com o centro

de Porto Alegre e a infraestrutura atra-em muitos frequentadores ao Guaíba.

Thiago Goulart, 32 anos, é um de-les. Praticante de stand up paddle, ele afirma que Ipanema é ótima para o esporte, pois não tem muito vento. Deixando a prancha no chão, Thiago aproveita o pôr do sol para tomar um mate com os pais. Sobre os problemas do local, também cita a falta de lixeiras e se preocupa que ainda lancem o esgo-to direto no lago.

O comércio de rua na região é bem forte aos finais de semana e feriados. Vendedores de algodão-doce e de ca-chorro-quente e outros ambulantes dis-putam a preferência dos frequentado-res. Antes das 17h daquele dia, a Kombi de churros teve de ir embora, pois o produto já havia acabado. Mas Ipanema conta ainda com empresários que bus-cam o desenvolvimento e colaboram com a manutenção da praia. Odacir Pa-laoro, 36 anos, é um dos proprietários do Radical Bar, que funciona há mais de 30 anos no bairro. Ali, trabalhou como garçom e adquiriu o estabeleci-mento em sociedade com um irmão, há nove anos. Percebeu o potencial do bar, que atende a diversos públicos, com um cardápio de pratos e valores bem variado. “Assim não tem como perder cliente. Atendemos do desembargador, servindo salmão a R$ 80, ao operário, com torrada a R$ 10.” O Radical é res-ponsável pela conservação da praça em frente ao bar e, em contrapartida, dis-põe de cadeiras para atender no local.

Nota-se que são praias diferentes, entre si – com públicos de poder aqui-sitivo distinto – e daquelas do litoral. Lami e Ipanema, as praias de Porto Ale-gre, ainda carecem de mais investimen-tos, mas podem ser boas opções para escapar das correrias do trânsito e do dia a dia da cidade.

YES, NÓS TEMOS PRAIAS!Moradores e turistas encontram lazer em Ipanema e no Lami

Pôr do sol do Guaíba: beleza natural que atrai inúmeros visitantes à Praia de Ipanema, em Porto Alegre

Texto: LUIS FELIPE MATOS e PEDRO HENRIQUE NUNESFoto: LUIS FELIPE MATOS

facebook.com/lupajornal

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Expostas na parede da biblioteca da Superin-tendência de Portos e Hidrovias (SPH), as

fotos da década de 50 mostram uma época em que o fluxo era intenso no porto da capital. Enquanto as explica, Jorge Fer-nandes fica nostálgico. Apesar de não ter trabalhado naquele tempo, a saudade é facilmente compreendida: o responsável técnico pela biblioteca traba-lha há 37 anos na SPH e é uma autoridade quando o assunto é a história do porto. Porém, sobre o presente, mais espe-cificamente do Cais Mauá, a situação muda: “Mas, afinal, o que acontece aqui hoje?”, per-gunta-se a ele. “Nada”, respon-de Fernandes.

Erguido a partir de 1911, o porto de Porto Alegre foi por muito tempo a principal via de contato da capital com outras cidades. Ele se divide em três cais: Mauá, Navegantes e Mar-cílio Dias, que, juntos, ocupa-ram até a década de 70 o quarto lugar em volume de cargas mo-vimentadas no país. “Madeira, sal, soja, vinho... tudo aportava aqui. Eram tantos navios que eles faziam fila para atracar”, conta Fernandes. Entretanto, a falta de políticas públicas fez com que esse panorama mu-dasse muito, a ponto de o porto perder 52,1% de sua movimen-tação entre 1990 e 2000.

Em 2005, todas as ativida-des portuárias no Cais Mauá foram encerradas. Segundo Andrei Fialho, assessor de co-municação da SPH, foi uma questão de saúde pública. “O porto recebe muitas cargas de fertilizantes, e o pó dos resí-duos que aportavam no Mauá estava indo para a cidade”, ex-plica. Agora, as cargas ficaram restritas ao Cais Navegantes.

A desativação do Cais Mauá logo traz à lembrança a sua revitalização, uma ideia an-tiga, que já era pensada antes da interrupção das atividades. Diversos projetos foram pro-postos ao longo dos anos. O primeiro, de 1991, foi o “Cami-nho do Porto”, em que cinco ar-mazéns seriam transformados; outro foi o “Porto dos Casais”, de 1998, que previa até uma casa noturna.

Nenhum projeto saiu do pa-pel. Porém, isso nunca impediu que a população utilizasse o es-paço para passeio e turismo – até agora. Após a aprovação do

novo projeto de revitalização, o acesso, antes tão simples, ficou restrito. Por licitação, o poder público concedeu a área, em 2010, ao Consórcio Cais Mauá do Brasil S/A, formado pelas empresas NSG Capital, GSS Holding e Contern. O con-trato prevê a administração do local pelo grupo privado por 25 anos, com possibilida-de de renovação.

As restrições se deram, se-gundo a empresa, por questões de segurança, devido ao início das obras. Atualmente, os gal-pões permanecem fechados. No pórtico principal, os guar-das são enfáticos: por ali só en-tram funcionários. A entrada só ocorre pela escadaria subter-rânea, que leva aos terminais fluviais. O que funciona de fato são o barco de passeio turístico Cisne Branco, as travessias do Catamarã, o Grupamento de Busca e Salvamento dos Bom-beiros (GBS) e o prédio da SPH,

o antigo Deprec, empresa pú-blica que administra os portos do Estado. Esse acesso limitado e as poucas atividades não fo-ram bem aceitos por todos os cidadãos. Diante do desconfor-to, surgiram reações.

Prestes a iniciar uma reu-nião, os integrantes do Defesa Pública da Alegria conversam tranquilamente. Apesar do clima descontraído, as pautas do coletivo são tratadas com seriedade. O Defesa surgiu em 2012 para se manifestar contra a privatização dos espaços pú-blicos da cidade. Em dezembro de 2013, promoveu o ato “De-fesa Pública do Porto Alegre”, que ocorreu no Cais Mauá e reuniu centenas de pessoas em uma série de shows e ativida-des culturais.

Eles defendem a restaura-ção sem privatizações e pedem que eventos como a Bienal e a Feira do Livro voltem a ser realizados no cais. Para o De-

fesa Pública, o projeto da Cais Mauá do Brasil se baseia em um conceito elitista, que não beneficiará a população de classes baixas. “Tem gente que acha que é bom, mas bom pra quem?”, indaga uma das ativis-tas do coletivo.

Por outro lado, o Movi-mento Quero Cais defende a revitalização. Liderado por Jorge Piqué, o grupo vem acompanhando as obras des-de o início. Segundo ele, o projeto não é elitista. “Seria ótimo se os críticos vissem as ideias do Fermín Vázquez. Suas concepções são corretas e ele tem uma visão huma-nista.” Vázquez é o arquiteto responsável pelo projeto do Cais Mauá e fundador da b720 Fermín Vázquez Arquitectos. Piqué alega que o cais será um grande catalisador para a capital. Ele acredita que a re-forma promoverá a interação entre a cidade, o porto e o rio,

e, assim, Porto Alegre voltará a ser como era antigamente.

Mesmo divergentes em vá-rios pontos, os movimentos têm algo em comum: ambos nunca analisaram a planta e as informações técnicas do pro-jeto. Nem eles, nem ninguém. A biblioteca da SPH, que tem todas as plantas relativas aos portos do Estado, não possui a que se refere ao projeto. No site da b720, é possível encontrar uma espécie de pré-projeto, as-sinado por Vázquez em colabo-ração com a Jaime Lerner Ar-quitetos Associados. O mesmo ocorre no site oficial, o “Viva Cais Mauá”, que apresenta uma versão interativa, mas sem de-talhes técnicos.

A dificuldade para ver as plantas se dá porque o proje-to ainda está na primeira fase, que consiste em um estudo de caso. Exigido para concorrer à licitação, o estudo não inclui a apresentação de um proje-to técnico, que deverá ser fei-to após a prefeitura autorizar as construções. Por sua vez, o Município aguarda liberações de 16 secretarias para conceder a licença de instalação definiti-va. O parecer mais aguardado é o Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (Rima), estabeleci-do pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama).

A sede do Consórcio Cais Mauá do Brasil não recebe a imprensa no local. Entretanto, Luiz Eduardo Franco Abreu, representante do consórcio e diretor-presidente da NSG Capital, palestrou em maio na Federasul. No evento, Abreu esclareceu que o objetivo é ofe-recer tanto locais de alimenta-ção e consumo popular como espaços mais refinados. Ele garantiu ainda que haveria um espaço aberto ao público, com telão para assistir aos jogos da Copa do Mundo de 2014.

As obras parecem dis-cretas e o prazo de entrega, estendido para 2015, não foi garantido pelo diretor-pre-sidente. Construções ainda não são vistas e se sabe que algumas demolições ocorre-ram. A incerteza ainda paira no ar quando o assunto é o futuro do Cais Mauá. Por ser um patrimônio histórico im-portantíssimo para o Estado e até mesmo para o país, toda a extensão do cais é tombada. Revitalizar o local é realmen-te necessário para preservar os 90 anos de história do Por-to de Porto Alegre. A popula-ção espera há anos para ver o que acontecerá com o cais – e, pelo jeito, precisará ter mais um pouco de paciência.

UM PORTO ANCORADO NO TEMPOEm 90 anos, Cais Mauá foi do auge ao abandono. Hoje, ainda aguarda a revitalização

Texto: LAÍS ALBUQUERQUE, ÉRIKA FERRAZ e MARINA LEHMANNFoto: BRUNA FERNANDES

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TRATAMENTO DE ESGOTO TRIPLICA

CENTRO DA CAPITAL GANHA NOVO PARQUE

EXPOSIÇÃO MOSTRA TRAJETÓRIA DE IBERÊ

ARTESÃS DE ILHA CRIAM COOPERATIVA

Mudar de 27% para 80% a capaci-dade de tratar o esgoto de Porto Ale-gre é um dos principais meios para ga-rantir que as águas do Guaíba sejam despoluídas. O responsável pela ação

é o Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE) por meio do Progra-ma Integrado Socioambiental (Pisa).

A Estação de Tratamento de Esgo-tos Serraria é a obra central. Inaugura-da em abril, é composta por tecnologia capaz de remover os poluentes com baixo consumo de energia. Segundo a assessoria de imprensa do DMAE, a

implantação mais significativa é a do emissário subaquático (tubulações no solo do rio). Ele conduz o esgoto até a Estação Serraria, onde é tratado para retornar ao Guaíba. Com 11km de ex-tensão a obra foi a primeira do gênero a ocorrer no país.

Em relação a possíveis danos à natureza, o secretário municipal de

meio ambiente, Claudio Dil-da, entende que o projeto da obra é totalmente acoplado ao conceito da sustentabili-dade. “Vai ao encontro das ações de cidades que pen-sam e planejam a gestão socioambiental. Esta é uma área que foi esquecida por muitos anos e que agora, com o Pisa, passa a integrar um processo para qualificar o ambiente e a saúde da po-pulação”, avalia.

O processo de tratamen-to da água passa ainda pela Estação de Bombeamento do Cristal (foto), que capta resíduos das bacias dos arroios Dilúvio e Cavalhada. O Pisa conta com investimentos oriundos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), financiamento do Banco Interamerica-no de Desenvolvimento (BID) e Caixa Econômica Federal.

Porto Alegre está prestes a ga-nhar um novo espaço verde: em março deste ano, a Câma-ra de Vereadores aprovou o

projeto que institui a criação do Cor-redor Parque Gasômetro. A coordena-dora do Movimento Viva Gasômetro, Jaqueline Sanchetone, avalia que a região finalmente está sendo valoriza-da pelo poder público, visto que a luta por melhorias no parque vem desde 2007. Segundo ela, o espaço perdeu áreas verdes ao longo dos anos, e a população deixou de ver o Gasôme-tro como um lugar de lazer. A criação do parque, prevista desde 2009, só foi sancionada recentemente pelo prefei-to José Fortunati.

Qualidade de vidaSegundo o estudante de Adminis-

tração Thiago Cáceres, morador do bairro Centro Histórico há 20 anos, a criação do parque trará benefícios à região. “Mesmo que as obras dificul-tem o trânsito, que já é complicado por aqui, o Centro precisa de mais parques e áreas de lazer, e é isso que o Parque Gasômetro irá nos proporcio-nar”, enfatiza. Também Jaqueline res-

salta que o principal objetivo é melho-rar a qualidade de vida dos moradores e frequentadores da região, além de valorizar a cultura e a ecologia.

O Corredor Parque Gasômetro, inicialmente, ficará dividido em duas áreas. A primeira compreende o Mu-seu do Trabalho e seu entorno, che-gando até a Avenida Presidente João Goulart. Na outra, na região da Pra-ça Júlio Mesquita, o alcance chega à Avenida Loureiro da Silva e Usina do Gasômetro. O prefeito José Fortunati formalizou a criação de um grupo de trabalho, composto por representan-tes dos governos estadual e federal e sociedade civil, que deverá sugerir a melhor forma de uso e de atividades a serem desenvolvidas no local.

A Fundação Iberê Camargo pre-para exposições inéditas do artista que dá nome ao lugar. Está em cartaz a mostra Iberê Camargo: as horas [o tempo como motivo], com curadoria do crítico de arte Lorenzo Mammì. São 22 pinturas e 26 desenhos produ-zidos entre as décadas de 1970 e 1980. As obras, colocadas em sentido cro-nológico, introduzem a exposição e funcionam como uma passagem para compreender a pintura de Iberê.

A exposição concentra um momen-to importante na arte do pintor: a vol-ta da inserção de figuras humanas nas pinturas, tema que o artista fez uso no começo da carreira, em 1940. Há tam-bém a exibição do filme Iberê Camargo: Pintura pintura (1981), de Mário Carnei-ro, e a reprodução do conto O relógio, assinado pelo pintor. A mostra segue até o dia 9 de novembro.

Para a professora do instituto de Artes da UFRGS Mônica Zielinski, a essência expressionista de Iberê Camargo foi importante para a arte contemporânea brasileira. “Iberê ti-nha a preocupação com o uso dos pig-mentos das tintas”, conta a crítica de

arte. E acrescenta: “Existia uma busca constante pela qualidade”.

A comemoração do centenário do pintor se inicia no dia 18 de novem-bro. O Comitê Curatorial organizará as obras, que estarão distribuídas por todos os andares do espaço expositi-vo. Sobre a expectativa para o grande dia, o gestor cultural Pedro Mendes revela: “Esperamos que a abertura da exposição resulte em um grande pú-blico e em uma excelente visibilidade para a produção e pensamento de Ibe-rê Camargo”.

Um grupo de quarenta morado-ras da Ilha das Flores está se reunin-do para formar uma cooperativa de trabalho artesanal, onde atuarão na confecção de uniformes, toalhas de mesa e bolsas. Elas pretendem, com isso, prover o seu sustento sem precisar usar programas assistenciais. E, por esse motivo, já estão desenvol-vendo alguns desses pro-dutos em suas próprias casas, porém, por falta de maquinário e de um lugar fixo, a cooperativa ainda não está funcionando.

A artesã e moradora do local Josinete Machado diz: “Não foi fácil sair da situação de pobreza a que estávamos acostumadas. Só recebíamos doa-ções ou dependíamos de programas de assistência e não queremos mais viver desse jeito!” A artesã salienta que só precisam de condições de tra-balho para ter uma situação de vida melhor. Aqui todas são trabalhado-ras!”, frisa Josinete.

Na Ilha das Flores, tudo anda

muito devagar: a comunidade tem muitos projetos, mas tudo está em-perrado, segundo a presidente da Associação de Moradores da Ilha das Flores, Laci Hirscher (foto). “Tínhamos espaço para que as mu-lheres trabalhassem, porém isso nos foi tirado. Máquinas para o trabalho

da cooperativa estavam prometidas, mas até agora não chegou nada. Não precisamos de promessas, mas de ações!” afirma.

E, por precisar de ações concre-tas, o grupo, agora, está em busca de investimentos de empresas pri-vadas que queiram ligar seus no-mes a esse projeto da cooperativa da comunidade.

Texto: DÉBORA VASZELEWSKIFoto: AMANDA BICCA

Texto: GUILHERME ENGELKEFoto: GABRIELA GONÇALVES

Texto: CINTIA FERNANDESFoto: RAFAEL MARTINS

Texto: FABÍOLA MOLINAFoto: KALLEB FRANÇA

4 | lupa | porto alegre/rs | junho 2014

Prevista desde 2009, a obra demorou três anos para iniciar

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Equilibrando-se em seu novo par de patins rosa, a menina abre es-paço entre a multidão.

Logo atrás, mãe e tia seguem a passos lentos e descompromis-sados enquanto tomam chimar-rão jogando conversa fora. Um olho na cuia, o outro na Júlia. Atravessar o lago para visitar a tia já é um hábito para a garo-ta e sua mãe, que aproveitam para fazer atividades ao ar li-vre. “Moramos no Bom Fim, mas eu prefiro trazer ela aqui, é bem mais tranquilo”, afirma Cristiane Moreira, vendedo-ra. O “aqui” a que a mãe da menina de 8 anos e sorriso fácil se refere é a chamada “Beira”, um conjunto de cal-çadas, bancos, grama e árvo-res que contornam a outra margem do Lago Guaíba, no município de... Guaíba.

Uma viagem de 20 minutos, de barco, é o que separa Guaíba da capital gaúcha. A sensação ao desembarcar se assemelha ao que Cabral deve ter sentido há mais de 1.500 anos quan-do caiu, sem querer querendo, em terras tupiniquins. A mar-gem guaibense do Lago Guaíba (desconsiderem a redundância) lembra qualquer cidade praia-na em época de veraneio: uma avenida movimentada divide bares, restaurantes e comércio do calçadão propriamente dito. Bicicletas, patins, patinetes e skates disputam espaço na

calçada com barraquinhas de pipoca, cachorro-quente, cre-pe, churros e outras atividades empreendedoras. Na metade do passeio o visitante se depa-ra com um imenso píer, todo de madeira, por onde se pode experimentar a sensação de en-trar no lago e permanecer seco.

À medida que o espaço de terra entre a água e a avenida aumenta, vão surgindo pistas de skate, bancos de praça, gen-te, mais gente, e uma quadra de vôlei de praia, que sedia cam-peonatos na área verde, o que justifica os olhares atentos de quem passa. Com um sorriso de satisfação, Tatiana Souza, presidente da Associação de Voleibol Guaíba (AVG), conta que a entidade foi criada em 2006 e, desde então, viu na Bei-ra o lugar ideal para realizar seus campeonatos. No inverno, as competições ocorrem dentro de ginásios. Segundo Tatiana, a prefeitura cedeu uma pequena sala embaixo da pista de skate para que os atletas pudessem guardar seus materiais. Naque-le ponto, a prática de atividade física parece ser tão unânime quanto o chimarrão.

Embaixo de uma árvore, um pouco mais à frente, um belo comercial de margarina pode-ria estar sendo gravado. Gilson Machado, 30 anos, tocava vio-lão para a esposa, enquanto o filho Felipe, 16 anos, praticava slackline, esporte em que a pes-soa se equilibra sobre uma fita. Gilson conta sobre as dificulda-des que a orla enfrenta. “Des-de que vocês desembarcaram aqui, viram algum policial em

ronda? Uma viatura sequer? Sofremos com a insegurança, que aumenta à noite com a falta de iluminação”, desabafa. Nenhum agente de seguran-ça havia sido avistado naque-la tarde. Questionada sobre o tema, a Secretaria de Turismo de Guaíba se limitou a dizer que “contam com o apoio da Brigada Militar, que faz rondas em vários horários”.

Se quando chega a Guaíba o visitante se sente Cabral, nes-se momento também se coloca no lugar de um extraterrestre observando a vida frenética de uma Porto Alegre que não pode enxergá-lo. O Beira-Rio, com sua imponência pós-re-forma, pode ser avistado a olho nu pelo pipoqueiro guaibense, que do outro lado da margem ouve em seu radinho de pilha os lances da partida de rei-nauguração. Assim como ele, muitas pessoas acompanham o jogo pelas emissoras de tele-visão, das quais se avistam as antenas no Morro Santa Tere-za. Que criança nunca sonhou em descer as curvas do Centro Administrativo Fernando Fer-rari de skate ou carrinho de rolimã? O mesmo prédio que habita o lúdico da gurizada dá seu olá silencioso a Guaíba. No lado oposto ao maior shopping da região Sul, temos a silhueta marcante da Usina do Gasôme-tro. Quantas pessoas estariam visitando a Usina naquela tar-de, olhando para o horizonte sem nem imaginar que existe vida na outra extremidade?

Apesar dos problemas, pou-co a pouco Guaíba parece con-

quistar seu espaço. A Secretaria de Turismo do município afir-ma que a cidade se tornou um atrativo turístico, tanto para os visitantes quanto para os pró-prios moradores. A pasta esti-ma que mais de 3 mil pessoas circulam pela orla nos finais de semana, número que chega a 5 mil nos grandes feriados. Des-de 2010 os visitantes podem contar com a linha Catama-rã, que faz a travessia Porto Alegre-Guaíba, e com várias outras linhas turísticas que garantem um belo passeio de ônibus pelos principais pon-tos de Guaíba para apresentar mais a fundo a história da Re-

volução Farroupilha, que aca-ba se confundindo com a do próprio município.

Guaíba, com sua margem visivelmente mais limpa do que a de Porto Alegre, ficou por muito tempo escondida atrás da sombra da capital. Re-centes revitalizações abriram as portas do município na ex-pectativa da chegada de mais e mais pessoas para conhecer o outro lado da margem, aquele que não se pode ver de longe. Talvez um dia os moradores de Guaíba se reúnam para acenar e gritar a Porto Alegre: “Ei, olhem pra gente! Nós também existimos!”.

Texto: VINICIUS FERRARI e STÉPHANY FRANCOFotos: ARTHUR MARQUES e FERNANDA GARRIDO

lupa | porto alegre/rs | junho 2014 | 5

A OUTRA MARGEM

O município de Guaíba vem se destacando na exploração turística

de uma orla que antes passava despercebida

Na Beira, a paisagem convida ao lazer

Porto Alegre brilha vista de Guaíba

ARTHUR MARQUES

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DA

GA

RR

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6 | lupa | porto alegre/rs | junho 2014

Quarenta e cinco anos depois, após três cam-peonatos brasileiros, uma Copa do Brasil, um Mundial e duas

Libertadores da América come-morados no estádio, o Beira-Rio passou por uma remodelação. Passado, presente e futuro sim-bolizam esse mar de concreto e ferro, onde já desfilaram Falcão, Carpegianni, Figueroa, Dadá, Jajá, Fabiano, Dunga, D’Alessan-dro e Fernandão.

Após quase dois anos fora de seu estádio, o Internacional e o seu torcedor podem retornar à sua casa. Onde foi construída toda a trajetória de um clube centenário. Onde a torcida vi-brou, chorou, comemorou, re-clamou, e elogiou. Onde taças foram erguidas. Onde derrotas decretaram o fim de uma era vencedora ou iniciaram um novo caminho de glória.

O Gigante, inaugurado na tarde de 6 de abril de 1969, ago-ra passa a ser mais imponente. Claudiomiro, autor do primeiro gol do estádio, lembra cada deta-lhe daquele dia: “Foi um cruza-mento da direita do Valdomiro, mas a bola foi muito forte e pas-sou por toda a extensão da área. O Dorinho deu um toque para o meio e eu, com a cabeça, escorei no canto esquerdo do goleiro”.

As melhorias são percebidas logo de cara com a cobertura. Ela é uma das partes mais charmo-sas do processo de moderniza-ção. É formada por 65 estruturas metálicas em conjunto com uma membrana autolimpante e resis-tente a incêndios. Iluminação, gramado, telões, todas as modifi-cações foram realizadas visando total conforto ao torcedor colo-

rado, que passará do concreto para a cadeira estofada.

Menos de 20 metros sepa-ram o torcedor do gramado, o que encanta o ex-jogador do clube Jajá: “Dentro de campo dá para sentir a energia da torcida! O bafo na nuca do adversário será grande”. Na área do escan-teio a distância é ainda menor, apenas 12 metros. Essa aproxi-mação com o gramado se deu pela retirada da antiga “Coreia”, espaço que ficava no nível do campo e onde eram vendidos ingressos populares.

No início das obras, porém, não se via esse mar de rosas. O engenheiro Lucio Matteucci, ge-

rente da Andrade Gutierrez, res-ponsável pela reforma, fala so-bre a modernização do estádio: “Quando encontramos o Beira--Rio, ele estava sem manuten-ção preventiva. A parte elétrica estava danificada, a hidráulica carecia de cuidados e descobri-mos muitos espaços que não eram aproveitados corretamen-te”, afirma o engenheiro.

Passada a obra, chegou o dia de o torcedor voltar para casa. O retorno ao estádio aconteceu no dia 15 de fevereiro, uma rei-nauguração não oficial contra o Caxias pelo Gauchão. E naquele dia Fabrício escreveu seu nome na história do Inter. O jogador

marcou o primeiro gol oficial na reabertura, e fala com orgulho: “O primeiro gol já foi meu, né? Isso ninguém vai tirar”. O atleta ainda comemorou a oportuni-dade de jogar no primeiro ano do estádio remodelado: “É mui-to gratificante poder participar dessa parte da história de um grande clube como o Inter”.

É só conversar com qualquer colorado: é perceptível o senti-mento de intenso orgulho. Mas a saudade do antigo Gigante er-guido sobre as águas ainda fica. Querendo ou não, é um estádio praticamente novo, e para Antô-nio Freitas, 71 anos de idade e 40 de Beira-Rio, que doou cerca de

1 mil tijolos para a construção, a saudade será imensurável: “Eu cresci nos Eucaliptos, ajudei a construir o Gigante, e agora vejo essa reinauguração, não preciso de mais nada na vida. Já posso morrer feliz”.

Passado, presente e futuro. Esse é o Beira-Rio. O estádio do torcedor colorado, da Copa do Mundo de 2014, o palco em que a Seleção Gaúcha desfilou dian-te da Seleção Brasileira e que viu os maiores títulos da história do Internacional. Esse estádio não poderia ser esquecido. Come-more, torcedor, vibre e se orgu-lhe. Pois haverá Copa e ela será na sua casa.

O GIGANTE AGORA É PARA SEMPRE

CATAMARÃ É ALTERNATIVA PARA IR A GUAÍBA

Um passado de boas lembranças, um futuro de encantamento: o novo Beira-Rio

Texto: DOUGLAS DEMOLINER e MATHEUS MARTINSFoto: LUANA CHINAZZO

Texto: JOÃO DANIEL AITAFoto: SARAH NIEDERAUER

Com acesso pelo armazém B3 do Cais Mauá em Porto Alegre e pelo terminal ro-doviário de Guaíba, o Catamarã é uma al-ternativa rápida e segura para moradores e trabalhadores das cidades. Operando desde o início de 2011, a embarcação faz todos os dias o trajeto entre os dois municípios.

O vendedor Antônio Carlos mora em Guaíba e trabalha na capital. Ele vai e vol-ta da cidade há 30 anos e se diz feliz com a embarcação. “O passeio pelo rio é muito mais rápido que pela rodovia. O conforto das poltronas é um diferencial, além de ser um trajeto seguro”, diz o vendedor.

Ramón Destro é mecânico, mora em Porto Alegre e trabalha numa oficina na cidade vizinha. Ele disse que a possibilida-de de transportar sua bicicleta fez com ele mudasse seu trajeto até o trabalho. “O barco tem espaço para bicicleta, agora não preciso pegar ônibus para chegar em casa ou no tra-balho.”, diz o trabalhador.

Com o transporte terrestre ainda como alternativa, o Catamarã tem a passagem um pouco mais cara que a de ônibus. O trajeto tem duração de vinte minutos e o valor da passagem é R$ 7,35. A mesma viagem pela estrada leva uma hora e custa R$ 4,85. A CatSul lançará ainda este ano, trajetos entre os dois terminais até a zona sul da capital, onde já existe o píer pronto.

Após a reforma, estádio tem capacidade para 56 mil torcedores

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PONTE LEVADIÇA SEGUE EM USO

MORADORES DE ILHA SOFREM COM CHEIAS

MURO PERMANECENA AVENIDA MAUÁ

Depois de construção da nova estrutura, antiga continuará sendo opção

O conhecido cartão-pos-tal de Porto Alegre deve seguir como op-ção para o trânsito de-

pois da construção da nova estru-tura sobre o Guaíba. Pelo menos é o que diz o gerente de engenharia da Triunfo Concepa Fabio Hirsch. Ele é o encarregado, pela empresa que administra a via, de supervi-sionar manutenções e melhora-mentos no local.

Segundo o engenheiro, a Concepa já realizou estudos de viabilização para reformu-lação da estrutura e os enca-minhou para a Agência Nacio-nal de Transportes Terrestres (ANTT). “Com a construção da nova ponte, o tráfego rodoviá-rio poderia ser desviado e o vão móvel içado para uma reforma, liberando o tráfego hidroviário. Fica viável uma modernização de todo o sistema”, explica.

Um grande empecilho para a modernização à qual o engenheiro Fabio se refere é justamente a fal-ta de opções para a ligação entre a capital e a região Sul do esta-do – além do acesso às pequenas ilhas anexas a Porto Alegre. Com

a construção da nova ponte, o tre-cho atual poderia ser fechado en-quanto é melhorado, e ainda assim haveria outra opção.

O maior complicador na reestruturação é justamente o que um dia foi motivo de or-gulho nacional, o vão móvel. Desenvolvido na Alemanha, foi um projeto inovador e moder-no à época de sua construção. Erguido por quatro torres a 40 metros do nível da água e 26 metros da rodovia, as 460 tone-ladas do trecho de 58m x18m se elevam graças a um sistema de contrapesos que necessita de manutenção diária.

Problema constanteConstruída na década de

50 e inaugurada no dia 28 de dezembro de 1958, a ponte re-cebia um fluxo médio de 600 veículos por dia nos primei-ros anos de seu funcionamen-to. Os responsáveis pela obra previram que em 35 anos a travessia não daria mais va-zão ao tráfego de automóveis. Hoje, quase 56 anos depois, passam por ela diariamente 50 mil veículos.

O professor de trânsito e transporte do curso de Enge-nharia Civil da Unisinos João

Hermes Nogueira Junqueira defende: “Uma obra como essa não se descarta. Conservá-la e utilizá-la é o melhor caminho”. E adverte: “Nas chegadas a Por-to Alegre, caso os acessos não sejam bem dimensionados, te-remos problema com grandes congestionamentos”. Mesmo

assim, ele acha que, no lado oposto, na cidade de Guaíba, a chegada será tranquila.

O auxiliar de atendimento Thiago Gonçalves, de 24 anos, que reside em Eldorado do Sul e utiliza a ponte para chegar ao trabalho no centro da capital , ad-verte: “Acho que vai ser um de-

safogo, mas quando der acidente, o trânsito vai parar”. Ele conta que normalmente leva 40 minu-tos para realizar o trajeto de ôni-bus, mas que, quando acontece um acidente, o tempo aumenta para uma hora e meia. “Na mé-dia, acontece um acidente a cada dez dias”, calcula.

Na Ilha Grande dos Marinheiros, as casas são cons-truídas quase dentro da água. A moradora Jussara da Silva conta que, quando era criança, ela e seus 11 irmãos acordavam com a casa alagada. O perigo maior são os animais e as doenças que as enchentes trazem: Jeferson, filho de Jussara, contraiu leptospirose. “Ele quase morreu no hospital”, ressalta.

“Antigamente, os moradores aterravam o terreno com lixo e jogavam terra por cima, para tentar evitar que água chegasse até eles”, relata Jussara. Todos que chegam para construir uma nova casa são instruídos a fazerem construções altas. A presidente da Associação das Mães da ilha Nazareth da Silveira conta que as famílias são retiradas pela Defesa Civil somente quando a água entra em suas casas. “Antes disso, elas não querem sair por causa dos móveis”, diz.

O Centro Administrativo Regional das Ilhas, a Defesa Civil e a Fundação de Assistência Social (FASC) trabalham juntos nos períodos de elevação dos níveis dos rios. A intenção é garantir assistência

aos atingidos pe-las cheias, conta a gestora do CAR, Patrícia Salcedo. A Defesa Civil, junto com o CAR, vem mapeando as áreas de risco para fazer um monito-ramento prévio.

Ao contrário do que muitos pensam, a estação portuária de Porto Alegre está em utilização. Na hidrovia que vai de Rio Grande até capital, são movimentados mais de cinco milhões de tonela-das de granéis por ano. Só em 2013, foi mais de um milhão.

Atualmente, o porto pertence à Superintendên-cia de Portos e Hidrovias (SPH), que é do governo do estado. Segundo o administrador da empresa, Bruno Almeida, os produtos que chegam pela capi-tal vão além da região metropolitana e alcançam a região responsável por 55% do PIB do estado.

No último ano, o porto teve um aumento de 20% na economia e mais de 190 navios atracados. A maioria das embarcações vem do exterior e traz cargas de grãos e fertilizantes. Por essa via, tam-bém chega o sal que é distribuído para 90% do Rio Grande do Sul. E, em questão de exportação, são enviados transformadores para o exterior, em sua maioria para os Estados Unidos.

O Muro da Mauá será mantido e deve fazer parte das próximas etapas da reforma do Cais do Porto, localizado na região central de Porto Alegre. Segundo a assessoria de imprensa do consórcio Cais Mauá Brasil, empresa responsável pelas obras, a parede será revitalizada devido à sua importância estrutural, pois une os diques de contenção das águas do Guaíba. O projeto de revitalização conta com investimento exclusivamente privado e prevê nova pintura e reforço da estrutura.

O paredão foi construído pela Prefeitura em 1974, após a maior enchente já registrada na capital. O desastre natural, ocorrido entre os meses de abril e maio de 1941, desalojou cerca de 70 mil famílias, prejudicou mais de 600 empre-sas e causou um dano de 30 milhões de dólares aos cofres públicos. “Ninguém tem coragem de demolir o Muro da Mauá, devido a seu contexto histórico e, principalmente, por se tratar de uma construção elaborada após muito estudo técni-co”, afirma a his-toriadora Célia Ferraz de Sou-za. Em razão da possibilidade de nova enchente, a permanência do muro torna-se uma forma de precaução.

Texto: JOAQUIM ORESKOFoto: RAFAEL ACOSTA

Texto: REBECCA ROSAFoto: BRUNA FERNANDES

Texto: LEONARDO STÜRMERFoto: AMANDA BICCA

Texto: LUCIANO DEL SENTFoto: THALLES CAMPOS

Em funcionamento desde 1958, travessia deve seguir como alternativa para o trânsito na região

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PORTO RECEBE GRÃOS,FERTILIZANTES E SAL

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Quem leva os visitan-tes até a Ilha das Pe-dras Brancas, ou Ilha do Presídio, é Marlene

Machado, estudante de Gestão Ambiental e mem-bro do Conselho Municipal do Meio Ambiente de Guaíba (Comea). Antes de embarcar, é preciso passar pela residência de Marlene, na beira do Lago Guaí-ba. A casa é singela e apresenta a estética da vida de pescador – Marlene e o marido, Rogério Ma-chado, também vivem da pesca. Nos fundos, já se enxerga o lago e a pinguela que leva até o bar-co Corsário Beira-mar II. Como precaução para que nada acon-teça com os recém-chegados, ela orienta: “Pisem somente na tábua do meio. É mais firme”.

O percurso até a ilha leva cerca de 15 minutos. Ao som de “Descobridor dos Sete Mares” no rádio, Rogério guia o barco enquanto faz leves movimentos dançantes com o corpo. O ca-chorro Dark também participa do passeio e é atencioso com os visitantes, pedindo carinho e até posando para as fotos.

Ao chegar à Ilha do Presídio, há um deck bem mais seguro do que o da casa de Marlene. “A construção do deck foi a primeira benfeitoria que realizamos junto à prefeitura de Guaíba. A segun-da será colocar cartazes para que não sujem a ilha e não ponham fogo”, afirma Marlene. Ela conta que muitas pessoas vão até o lo-cal com lanchas ou barcos pró-prios, já que a ilha é pública. Lá, passam o dia, fazem churrasco, piquenique, e acabam deixando muito lixo acumulado. O churras-co é um problema. Como no local venta muito, seja verão ou inver-no, qualquer réstia de fogo pode ocasionar um grande incêndio na vegetação. Marlene aponta para uma pedra que tem uma chur-rasqueira de tijolos ao lado e diz “Olha, a rachadura da pedra está cada vez maior”, referindo-se ao dano causado pelo fogo feito pró-ximo à rocha.

O presídio, ou o que sobrou dele, está muito depredado. O te-lhado e as grades das celas foram furtados. Com pichações e pare-des quebradas, é difícil reconhe-cer quais eram os lugares de con-vívio da guarda e dos presos. Um dos únicos locais reconhecíveis é o compartimento das celas. To-das do mesmo tamanho e com um pequeno buraco para ilumi-nação no teto, elas são pequenas, frias e muito úmidas.

A Ilha do Presídio não é tom-bada, mas segundo a Secretaria

Municipal do Turismo e da Cul-tura de Guaíba, o pedido de tom-bamento foi encaminhado e está em andamento. Há também um projeto de restauração que ainda não saiu do papel por precisar de muita verba, podendo variar de R$ 2 milhões a R$ 8 milhões.

A história da ilha lembra tempos sombrios da história do Brasil. Da casa de Carlos Franklin Paixão de Araújo, advogado e ex-deputado esta-dual pelo PDT, é possível lem-brar o passado todos os dias, pois mesmo de longe dá para identificar a Ilha do Presídio. Localizada na Zona Sul de Porto Alegre, a residência de Araújo possui um quintal cujo terreno termina na margem do Lago Guaíba.

Perseguido durante a dita-dura, ele foi preso em 1970, fi-cando nos estados de São Paulo

e do Rio de Janeiro. Em 1972, foi conduzido à Ilha das Pedras Brancas, onde um presídio de presos comuns fora transfor-mado em presídio político após o golpe militar de 1964. O advo-gado de 76 anos tem uma longa história na militância política. Com Dilma Rousseff, atual pre-sidente do Brasil, que foi sua esposa por mais de 30 anos, pregava a luta armada contra o regime militar. Relembrando os tempos de militância e, como consequência, de prisão, Araú-jo se defende: “Fui preso por-que lutava contra a ditadura, e todo aquele que lutava contra ela era tido como subversivo e até terrorista. Mas terroristas eram aqueles que derrubaram João Goulart, eleito pelo povo, aqueles que matavam e tortura-vam”. Ao voltar à ilha, em 2013, Carlos Araújo se surpreendeu: “Percebi que estava tudo des-truído. A sensação foi de pro-funda tristeza e indignação pelo abandono a que foi rele-gada essa ilha tão simbólica”.

Raul Jorge Anglada Pont, ex--prefeito de Porto Alegre e atual deputado estadual pelo Partido dos Trabalhadores (PT), foi pre-so por militância estudantil con-trária à ditadura militar. Pont foi “sequestrado”, como costuma fa-lar, pela Operação Bandeirantes (Oban) e levado para o Departa-mento de Ordem Social (Dops) de São Paulo. Ficou detido no presídio Tiradentes, também em São Paulo, e, por fim, na Ilha do Presídio, onde permaneceu da metade de 1971 até o fim de 1972. “Éramos sequestrados por pessoas que não tinham identi-ficação, eram apenas bandos ar-mados”, lembra Pont.

Antes de ser usada como ilha penitenciária, a Ilha das Pedras Brancas foi utilizada como local estratégico pelos revolucionários farroupilhas, em meados de 1835. Depois disso, ficou conhecida como Ilha da Pólvora, em 1857, quando foi construído um gran-de paiol. Esse passado deixou de herança a insalubridade para os que ficariam presos ali mais de um século depois. Sobre o presí-dio, Raul Pont comenta: “As con-dições eram desumanas. Como são grandes pedras e o paiol foi construído em cima delas, aqui-lo se transformou em algo in-salubre, sem ventilação. Havia aberturas para ter um mínimo de iluminação externa. Dificilmente alguém passava um inverno lá sem pegar uma pneumonia”.

Abandonada há 31 anos, a Ilha do Presídio clama por socorro. Não deixar que a his-tória caia no esquecimento de-pende, também, que o presente seja preservado.

LOGO ALI, UMA ILHA CONTA HISTÓRIASPara ser lembrado, o passado da Ilha do Presídio depende da preservação do presente

Texto: CAROLINE GARSKE ROSAFotos: LUANA CHINAZZO

Pequenas e úmidas, as celas tinham péssimas condições para

os detentos; a Ilha do Presídio pode ser reconhecida por suas

enormes pedras brancas