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LOURIVAL ALVES FOLHA
ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E O
CUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA
PROPRIEDADE
UNIC/IUNI – UNIVERSIDADE DE CUIABÁ
FACULDADE DE DIREITO – CAMPUS PANTANAL
CUIABÁ – MT
2014
LOURIVAL ALVES FOLHA
ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E O
CUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA
PROPRIEDADE
Monografia apresentada pelo acadêmico à
Faculdade de Direito da Universidade de
Cuiabá / UNIC/IUNI- Campus Pantanal,
como critério para aceite no programa de
ensino de graduação no curso de Direito -
ano 2014, para desenvolvimento do
Trabalho de Conclusão de Curso II do 10º.
Semestre Noturno.
Professor orientador: MSc. Marli Teresinha Deon Sette
CUIABÁ - MT
2014
APRECIAÇÃO
________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à toda minha família,
em especial à minha mãe que está
sempre me apoiando e auxiliando na
edificação da minha educação do meu
futuro profissional.
AGRADECIMENTO
Agradeço a Deus primeiramente, minha família e meus amigos, que muito contribuíram para essa realização. À professora MSc. Marli Teresinha Deon Sette, pela paciência e incentivo na orientação desta monografia. À todos os professores do curso, que foram tão importantes na minha vida acadêmica.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................................9
CAPÍTULO I...................................................................................................................10
A TUTELA AMBIENTAL CONSTITUCIONAL ..........................................................10
1. A TUTELA DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. ........................................................................................................... 10 1.1. PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO AMBIENTAL..................................................... 11
1.1.1 Noções preliminares ....................................................................................11 1.1.2 Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado .......................12 1.1.3 Princípio da natureza publica da proteção ambiental .............................13 1.1.4 Princípio do protetor recebedor - PPR ......................................................13 1.2.5 Princípio da prevenção ..............................................................................14 1.2.6. Princípio do desenvolvimento sustentável ...............................................15 1.2.6.Princípio da proibição do retrocesso constitucional ambiental ecológico
.................................................................................................................................16 1.2.7. Princípio da função socioambiental da propriedade ...............................17
CAPÍTULO II .................................................................................................................19
A FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE ..................................... 19 2.1. Propriedade constitucional ............................................................................19 2.2. Os limites do direito de propriedade ............................................................20 2.3. Obrigação real ................................................................................................21 2.4. Desapropriação indireta ................................................................................23 2.5. Não aplicação do direito adquirido em matéria ambiental .........................24
CAPÍTULO III ................................................................................................................28
DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE.................................................28
3.1. CONCEITO E CONSIDERAÇÕES INICIAIS ........................................................... 28 3.2 DELIMITAÇÃO DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE .............................. 30
3.2.1 APP protetora de curso d’água ..................................................................30 3.2.2 APP protetora das montanhas ...................................................................32 3.2.3 Demais classes de APP previstas em Lei .................................................33 3.2.4 Particularidades em relação às APP previstas em Lei ............................35 3.2.5 Áreas de preservação permanente declaradas por ato do Poder
Executivo ................................................................................................................39 3.3. REGIME DE PROTEÇÃO DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E POSSÍVEIS
INTERVENÇÕES ................................................................................................... 40 3.4 ÁREAS CONSOLIDADAS EM ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE .................. 45 3.5 ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE EM ÁREA URBANA CONSOLIDADA ........ 52
CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................................57
REFERÊNCIAS .............................................................................................................59
9
INTRODUÇÃO
O presente trabalho foi elaborado com o objetivo de analisar as
normas de proteção das áreas de preservação permanente e suas relações com
a função socioambiental da propriedade.
Este tema foi escolhido em razão das recentes discussões sobre o
uso racional dos recursos ambientais e sua relevância no ordenamento jurídico
brasileiro, visto que em decorrência do avanço nas garantias advindas do Direito
Ambiental, passamos a perceber a ligação deste com a limitação no direito de
propriedade, sendo que uma destas limitações é observada quando falamos em
Área de Preservação Permanente – APP.
É importante ressaltar que depois de grande insatisfação de esferas
específicas, principalmente dos proprietários de imóveis rurais, o Congresso
Nacional iniciou uma revisão da legislação florestal brasileira, editando a lei Lei
12.651, em 25 de maio de 2012, a qual foi alterada em 17 de outubro de 2012
pela lei 12.727. A Lei 12651/2012, que dispõe sobre a proteção da vegetação
nativa, passou a ser chamada de Novo Código Florestal.
Pretende-se fazer uma abordagem sobre a tutela constitucional
ambiental, a função socioambiental da propriedade e as áreas de preservação
permanente.
Para isso, faremos uso método de abordagem dedutiva por meio de
pesquisas bibliográficas, doutrinárias, jurisprudenciais, textos e artigos,
abrangendo toda a legislação pertinente às áreas de preservação permanente e a
função socioambiental da propriedade, bem como alguns princípios relacionados
à proteção das áreas de preservação permanente.
O marco teórico é o direito fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à qualidade
de vida da população, sendo essencial, da mesma forma, para que se assegure a
dignidade da pessoa humana.
10
CAPÍTULO I
A TUTELA AMBIENTAL CONSTITUCIONAL
1. A tutela das Áreas de Preservação Permanente na Constituição Federal.
Com o advento da Carta Magna de 1988, o meio ambiente, com
proteção até então incipiente, passou a ter sua proteção constitucional, tanto em
disposições esparsas quanto em capítulo específico de regras de proteção
ambiental.
Vejamos o caput do art. 225 da Constituição Federal de 1988:
Art. 225, caput. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
1
Cabe ressaltar que, segundo Herman Benjamin, este artigo mostra
que o ambiente é um:
bem de uso comum e essencial à sadia qualidade de vida e ainda invoca o princípio da solidariedade para a sua proteção quando diz que cabe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo, reconhece por fim a questão intertemporal para garantir um mínimo essencial ecológico às futuras gerações.
2
Como o crescimento econômico das sociedades, bem como as
variadas atividades humanas cotidianas trazem pressões ao meio ambiente, o
legislador criou em nosso ordenamento jurídico, entre outros, uma área
especialmente protegida, denominada Áreas de Preservação Permanente –APP.
1 BRASIL, República Federativa do. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/html/legislacao. Acessado em: 24 de out. 2013. 2 BENJAMIN, Antônio Herman. Direito Constitucional Ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva,
2007, p. 65-66.
11
A Promotora de Justiça, Rochelle Jelinek, destaca que:
As áreas de preservação permanente estão tuteladas pelo texto constitucional no art. 225, §1°, que incumbiu ao Poder Público, para assegurar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, “preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e promover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas” (inc. I), “definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção” (inc. III) e “proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade” (inc. VII).
3
Segundo a referida autora:
A Constituição deu carta branca ao legislador para a definição de áreas e espaços territoriais a serem protegidos, do que decorre o entendimento de que o Código Florestal Federal foi recepcionado na sua integralidade pela Carta Magna, demonstrando que este já estava à frente daquela, quando elegia algumas áreas como de especial proteção: as áreas de preservação permanente.
4
1.1. Princípios gerais do direito ambiental
1.1.1 Noções preliminares
Enquanto as normas e as leis estabelecem o corpo de um
ordenamento, os princípios formam o espírito, a essência que banha internamente
o corpo deste ordenamento, dando-lhes vitalidade e sentido.
3 JELINEK, Rochelle. Áreas De Preservação Permanente Como Espaços Ecológicos Protegidos Pelo
Ordenamento Jurídico. Disponível em:
http://www.mpba.mp.br/atuacao/ceama/material/doutrinas/arborizacao/apps_como_espacos_ecologicos_prot
egidos_pelo_ordenamento_juridico.pdf. Acessado em: 29 de jun. 2014. 4 Idem, internet.
12
Nesta esteira:
Os princípios são proposições, diretrizes características às quais deve subordinar-se todo o desenvolvimento ulterior. Nesse sentido, os princípios despertam a idéia do que é primeiro em importância; e na ordem da aceitação, do que é fundamental.
5
Com base nos inúmeros princípios existentes no âmbito do direito
ambiental, aqui serão elencados os principais princípios voltados à proteção e
sustentabilidade das áreas de preservação permanente e à função social da
propriedade.
1.1.2 Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado
Quando discorrermos sobre direitos fundamentais da pessoa
humana, logo nos vem à mente o artigo 5° da Constituição Federal, pois de seu
Caput temos que:
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade...”.
6
No artigo citado e nos incisos que o seguem, se vê que o Estado
assume a responsabilidade primária de garantir a todos, um ambiente digno,
buscando satisfazer as suas necessidades básicas.
Por seu turno, o artigo 225 nos traz um complemento fundamental a
esses direitos, como podemos observar em seu caput, conforme retro citado.
Afere-se que o direito a um meio ambiente equilibrado busca garantir
a qualidade de vida, protegendo a todos contra os abusos ambientais de qualquer
5 RIBEIRO JÚNIOR, João. Teoria Geral do Direito Constitucional. São Paulo: Edipro, 1997, p. 11. 6 BRASIL, República Federativa do, op., cit., Internet.
13
natureza. Conforme Milaré destaca, temos este principio como sendo
transcendental das clausulas pétreas7.
1.1.3 Princípio da natureza publica da proteção ambiental
Este princípio deriva da prescrição constitucional de que o meio
ambiente deve ser assegurado e protegido para uso de todos, ou seja, de fruição
humana coletiva. O artigo 225 da CF, já citado, impõe ao Poder Público e à
coletividade como um todo, a responsabilidade por sua proteção.
Denota-se que o “...caráter jurídico do meio ambiente
ecologicamente equilibrado é de um bem de uso comum do povo. Assim, a
realização individual deste direito fundamental está intrinsecamente ligada a sua
realização social”.8
1.1.4 Princípio do protetor recebedor - PPR
Conforme ensinamento de DEON SETTE:
Tem ganhado destaque na seara ambiental a ideia de implementar instrumentos econômicos que funcionem como forma de agregar retorno econômico aos “protetores” do meio ambiente, com a adoção de incentivos positivos – fiscais, tributários e creditícios, a fim de normatizar a conduta humana e moldá-la a um agir pró ambiente. neste contexto se insere o princípio do protetor recebedor, que, em síntese, prega que aquele agente público ou privado que protege um bem natural em benefício da comunidade deve receber uma compensação financeira como incentivo pelo serviço de proteção ambiental prestado
9
Com fundamento neste princípio a Agência Nacional de Águas
(ANA) em 2007, no município de Extrema, em Minas Gerais, iniciou o programa
Produtor de Água, no qual os produtores promovem manejo sustentável das suas
áreas, preservando florestas e evitando contaminação com resíduos das
7 MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente : doutrina, pratica, jurisprudência, 2 ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2001, p. 123. 8 Idem, p. 159. 9 DEON SETTE, Marli Teresinha. Manual de Direito Ambiental. 2 ed. Curitiba: Juruá, 2013, p. 66.
14
atividades agropecuárias. O pagamento é realizado mediante recuperação e
proteção das áreas de preservação permanentes das nascentes e dos cursos
d’água, de acordo com a extensão da área preservada, e com valores pré-fixados
para recuperação do solo, cobertura vegetal e saneamento ambiental.10
Outros argumentos sobre a aplicação do princípio do protetor
recebedor são apresentados por DEON SETTE, e constam das:
Disposições contidas na Lei 12.305/2010, que arrola em seu art. 6º,inc II, o princípio do protetor recebedor como princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos; e a Lei 12.651/2012, que institui o pagamento ou incentivo a serviços ambientais, como retribuição, monetária ou não, às atividades de conservação e melhoria dos ecossistemas e que gerem serviços ambientais (art. 41,inc.I e suas alíneas).
11
E ainda podemos verificar a aplicação da lógica do PPR nos casos
em que se utiliza o IPTU e o ITR na conservação e preservação do patrimônio
cultural e da paisagem urbana e rural do país, e, ainda, por meio da concessão de
isenções e incentivos aos proprietários que mantém as áreas de preservação
permanente e Reservas Particulares do Patrimônio Natural.12
1.2.5 Princípio da prevenção
O princípio da prevenção é o princípio no qual se busca evitar os
riscos de ocorrência de danos ambientais, devendo ser tomadas medidas de
mitigação e de controle de possíveis danos.
De acordo com MACHADO:
10 OLIVEIRA, Marco Olívio Morato, Políticas Ambientais Modernas. Disponível em: http://www.agroanalysis.com.br/materia_detalhe.php?idMateria=1105. Acessado em: 20 de jan. 2014. 11
DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 67. 12 ARAÚJO, C. C. de, FERREIRA, M. I. R., RODRIGUES, P. C. e SANTOS, S. M. dos. Meio Ambiente e
Sistema Tributário. São Paulo: Senac, 2003, p. 173.
15
O princípio da prevenção se baseia no entendimento de que os conhecimentos técnicos existentes podem contribuir para a melhoria da qualidade ambiental e devem ser empregados na execução de atividades que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental.
13
Como exemplo da aplicação deste princípio temos os corredores
ecológicos, que representa uma das estratégias mais promissoras para o
planejamento regional eficaz de conservação e preservação de flora e fauna, nos
quais ocorre a ligação de remanescentes florestais isolados por corredores de
vegetação natural para mitigar os efeitos da ação antrópica e garantir a
biodiversidade nos mesmos.
DEON SETTE nos ensina que este princípio se relaciona com o art.
225, § 1º, IV, da Carta Magna, pois:
Dispõe que toda atividade que causa significativo impacto ambiental deve ser precedida de estudo de impacto ambiental, o qual sistematiza informações e alternativas para que sejam minimizados os possíveis impactos de
atividades econômicas.14
1.2.6. Princípio do desenvolvimento sustentável
Neste princípio, a palavra de ordem é a sustentabilidade. “O termo
desenvolvimento sustentável brotou na Conferência Mundial do Meio Ambiente,
realizado em 1972, em Estocolmo, e tornou-se muito conhecido no Brasil na Eco-
92”.15
O conceito de desenvolvimento sustentável explicita que o
desenvolvimento econômico pode ocorrer desde que não ameace a
sustentabilidade ambiental. “Em outras palavras, para que o desenvolvimento seja
13
MACHADO, P. A. L. Direito Ambiental Brasileiro. 12 ed.. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 1064. 14 DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 68. 15 Idem, p. 60.
16
sustentável, não basta que seja ecologicamente sustentável; deve visar
igualmente às dimensões sociais, econômicas, políticas e culturais do
desenvolvimento”.16
1.2.6.Princípio da proibição do retrocesso constitucional ambiental ecológico
O meio ambiente possui as características de irrenunciabilidade,
inalienabilidade e imprescritibilidade, pois é reconhecido como um direito
fundamental, e deve ser mantido ecologicamente equilibrado para a manutenção
da dignidade humana.
Luís Roberto Barroso entende que o princípio da vedação ao
retrocesso
não é expresso, mas decorrente do sistema jurídico constitucional, entende-se que se uma lei, ao regulamentar um mandamento constitucional, instituir determinado direito, ele se incorpora ao patrimônio jurídico da cidadania e não pode ser absolutamente suprimido.
17
Neste sentido:
Por força do art. 5.º, §1º da nossa Lei fundamental, é imposta a proteção efetiva dos direitos fundamentais não apenas contra a atuação do poder de reforma constitucional (em combinação com o art. 60, que dispõe a respeito dos limites formais e materiais às emendas constitucionais), mas também contra o legislador ordinário e os demais órgãos estatais (em vista de que medidas administrativas e decisões jurisdicionais também podem atentar contra a segurança jurídica e a proteção da confiança), os quais são incumbidos de um dever permanente de desenvolvimento e concretização dos direitos fundamentais, o que não permite, em qualquer hipótese, a supressão ou restrição desses de modo a invadir o seu núcleo essencial, bem como, atentar, de outro modo, às exigências do princípio da proporcionalidade.
18
16 SILVA, Geraldo Eulálio do N. C. Direito ambiental internacional. Rio de Janeiro: Thex, 1995, p. 49. 17 BARROSO, Luis Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 5 ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2001, p. 158. 18 SARLET, I. W.; FENSTERSEIFER, T. Direito constitucional ambiental: constituição, direitos
fundamentais e proteção do ambiente. 2 ed. São Paulo: Revistados Tribunais, 2012, p. 202.
17
Com isso constatamos que a tutela constitucional do meio ambiente
é direito fundamental, e que, além de ser imune a alterações restritivas por
emenda constitucional, não pode sofrer regressão na legislação
infraconstitucional.
1.2.7. Princípio da função socioambiental da propriedade
Quando tratamos da função socioambiental da propriedade,
podemos considerar que:
A Constituição Federal Brasileira de 1988 consagra expressamente o direito de propriedade (art.5º, XXII), mas ao mesmo tempo dispõe que "a propriedade atenderá a sua função social" (art.5º, XXIII). Tal condição (para a configuração do direito de propriedade) foi inserida tanto no capítulo que trata dos Princípios Gerais da Atividade Econômica (através do artigo 170, III), concomitante ao princípio da defesa do meio ambiente na atividade econômica (inc.VI do art.170); como no capítulo referente à Política Urbana , ao vincular a função social da propriedade a exigências fundamentais de ordenação da cidade (§2° do artigo 182).
19
Através destes dispositivos observamos que a propriedade não mais
toma aquela concepção individualista do Código Civil, sobressaindo o seu sentido
social, tornando-se, assim, aliada ao desenvolvimento e ao bem-estar comum.
Por meio do princípio da função socioambiental da propriedade
temos como consequência o dever de que:
a propriedade seja efetivamente exercida para beneficiar a coletividade e o meio ambiente, configurando um aspecto positivo, não bastando tão somente que não seja exercida em prejuízo de terceiros ou da qualidade ambiental, aspecto negativo. Em outros termos, é possível realçar, com cores quentes, que a função socioambiental não constitui um mero limite ao exercício do direito de propriedade, tal como aquela restrição tradicional, por meio da qual se
19 DUARTE JÚNIOR, Ricardo César Ferreira; DUARTE, Marise Costa de Souza. A questão da
indenização por restrições de natureza ambiental ao exercício do direito de propriedade diante do
regramento constitucional e da efetivação do princípio da função socioambiental: algumas considerações preliminares. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/17767/a-questao-da-indenizacao-por-
restricoes-de-natureza-ambiental-ao-exercicio-do-direito-de-propriedade-diante-do-regramento-
constitucional-e-da-efetivacao-do-principio-da-funcao-socioambiental-algumas-consideracoes-preliminares.
Acessado em: 17 de jan. 2014.
18
concede ao proprietário, no exercício de seu direito, fazer tudo o que não acarrete prejuízos à coletividade e ao meio ambiente. Distintamente, a função socioambiental se estende e autoriza até que se estabeleça em relação ao proprietário comportamentos positivos no exercício de seu direito, com o escopo de promover a adequação da propriedade à preservação do meio ambiente.
20
Feitas estas breves considerações sobre o princípio da função
socioambiental da propriedade, passaremos ao capítulo seguinte que trata este
tema de maneira mais pormenorizada.
20 RANGEL, Tauã Lima Verdan. Anotações ao princípio da função socioambiental da propriedade: a
consolidação dos aspectos difusos dos direitos de terceira dimensão no ordenamento brasileiro.
Disponível em:
http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13143&revista_
caderno=5. Acessado em: 20 de mar. de 2014.
19
CAPÍTULO II
A FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE
2.1. Propriedade constitucional
A propriedade reconhecida como direito fundamental é aquela que
atende à sua função social. A Constituição Federal de 1988, pela primeira vez no
constitucionalismo brasileiro, em meio ao rol de direitos e garantias individuais,
prevê além do direto de propriedade, no inciso XXIII, art. 5º, que a propriedade
atenda sua função social.
Conforme observações das palavras de Cortiano Junior:
Como a função social é um elemento essencial definidor do próprio direito de propriedade, e não uma técnica jurídica limitativa do exercício dos poderes proprietários, pode-se afirmar que não há propriedade sem função social. Equivale dizer: o proprietário que não faz cumprir a função social da propriedade não merece a tutela que é atribuída ao proprietário que utiliza sua propriedade de forma adequada ao interesse social.
21
Cabe salientar que a Constituição da República de 1988, mesmo
mantendo a função social da propriedade como base da ordem econômica, prevê
que uma propriedade, seja ela rural ou urbana, só cumpre com a sua função
social, se esta função for socioambiental, ou seja, que preserve a flora, a fauna,
as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico, artístico e
cultural.
Neste sentido, destacam Elcio Nacur Rezende e Romeu Thomé:
Ademais, dentre os princípios que regem as atividades econômicas, art. 170 da Constituição, encontra-se prevista, em seu inciso III, a função social da propriedade. O exercício do direito de propriedade está condicionado à preservação do meio ambiente em prol da coletividade que, de
21 CORTIANO JUNIOR, Eroulths. O Discurso Jurídico da Propriedade e suas Rupturas (uma análise do
ensino do Direito de Propriedade). Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 296.
20
acordo com o seu art. 225, tem direito a um meio
ambiente ecologicamente equilibrado.22
Portanto, além de configurar a função social como uma estrutura do
direito de propriedade, não apenas limitando seu exercício, a Constituição Federal
de 1988 determina que o direito de propriedade está condicionado à preservação
do meio ambiente, possuindo caráter socioambiental em prol
da proteção ambiental, estando seu uso cercado pela legislação que já não
garante a propriedade somente a sua utilização particular, mas prioriza o uso
sustentável e ecologicamente correto.
2.2. Os limites do direito de propriedade
Ao falarmos sobre os limites do direito de propriedade, devemos nos
atentar para o que nos ensina ANTUNES:
O debate sobre o meio ambiente ecologicamente equilibrado, como posto pela constituição de 1988, não pode deixar de ter como um de seus pilares o questionamento sobre o direito de propriedade e seus limites, haja vista que a atividade econômica se faz, necessariamente, sobre a apropriação dos bens naturais, sejam eles públicos ou privados.
23
Observa-se que o direito ambiental vem disciplinado na Constituição
Federal, nos artigos 225 e seguintes, mas é também um assunto abordado em
todo o texto constitucional, inclusive na normatização do direito de propriedade.
Isso se deve ao fato de que “o uso da propriedade está condicionado ao bem
estar social (art. 5º, XXII e XXIII; 182; e 186, todos da CF/88”.24
Neste contexto, nos dizeres de DINIZ:
22 REZENDE, Elcio Nacur; THOMÉ, Romeu. Temas de Direito Ambiental e Desenvolvimento
Sustentável. Belo Horizonte: Editora O Lutador, 2010, p. 45. 23
ANTUNES, Paulo de Bessa. Áreas Protegidas e Propriedade Constitucional. São Paulo: Atlas, 2011,
p.3. 24 DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 59.
21
O direito de propriedade deve, ao ser exercido, conjugar os interesses do proprietário, da sociedade e do Estado, afastando o individualismo e o uso nocivo do domínio. Dever-se-á então, preservar, observando-se normas especiais, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico, o patrimônio histórico e artístico e evitar quaisquer tipos de poluição.
25
Uma destas normas que podemos citar como exemplo é a Lei
12.651/2012, que impõe limitações ao exercício do direito de propriedade,
exigindo a preservação de áreas com vistas ao bem-estar social, sendo um
exemplo a área de preservação permanente.
A área de preservação permanente é definida na Lei 12.651/2012,
como:
Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por:
[...]
II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
26
2.3. Obrigação real
De acordo com DEON SETTE, “ As obrigações impostas pela Lei
12.651/2012 são obrigações propter rem, sendo portanto transmitidas ao
sucessor de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do
imóvel rural”.27
25 DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p.733-734. 26
BRASIL, República Federativa do. Lei 12.651/2012. Disponível em: www.planalto.gov.br/legislação.
acessado em 10 de mar. 2014. 27 DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 333.
22
Portanto, no caso de aquisição do domínio e posse do imóvel rural,
estando este imóvel com passivo ambiental, ou seja, que tenha dano a ser
reaparado, por exemplo, déficit de cobertura vegetal na propriedade em relação
aos limites legais, a responsabilidade se impõe ao adquirente.
Observamos aqui a distinção entre obrigação de não fazer e
obrigação negativa. Não podem ser vistas como sinônimas e muito menos serem
tratadas uma como gênero da outra. A primeira constitui relação de direito
pessoal; a segunda configura direito real.
As obrigações reais se vinculam à coisa e não a pessoa, daí seu
caráter real e não pessoal. Isso por tratar-se de norma geral, a todos imposta, não
assumida unilateralmente pelo devedor, mas sim por força de lei.
Sob a ótica ambiental, no art. 2º, caput, e § 2º, da Lei 12.651/2012,
temos que:
As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação nativa, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.
[...]
§ 2o As obrigações previstas
nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural.
28
Fica, portanto, evidente o caráter propter rem das obrigações
relativas à propriedade, incluindo as Áreas de Preservação Permanente, que
serão discutidas no capítulo seguinte.
28 BRASIL, República Federativa do. Lei 12.651/2012. Disponível em: www.planalto.gov.br/legislação.
Acessado em: 23 de fev. 2014.
23
2.4. Desapropriação indireta
A desapropriação, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, " vem
a ser o procedimento administrativo diante do qual o Poder Público,
compulsoriamente, despeja alguém de uma propriedade e a adquire para si,
mediante indenização, fundada em um interesse público".29
Cabe destacar, que esta intromissão no direito de propriedade só
pode ocorrer “mediante justa e prévia indenização” da área desapropriada pelo
Estado, e conforme procedimento adequado, nos termos do art. 5º, XXIV, da
Constituição Federal de 1988.30
Em razão do direito de propriedade não ser um direito absoluto, a
Constituição Federal não permite que o proprietário se beneficie de todos os usos
possíveis e imagináveis de sua propriedade, pois nenhum imóvel, principalmente
os rurais, tem, como única forma de utilização, a exploração econômica dos
recursos naturais.
Conforme Antônio Herman V. Benjamin, a limitação imposta pela
instituição das áreas de preservação permanentes deverá ser indenizada quando:
a) faltar-lhes o traço da generalidade (afetar um ou poucos proprietários);
b) não beneficiarem, direta ou indiretamente, o proprietário; e
c) sua efetivação inviabilizar, por inteiro, a totalidade do único (hipótese raríssima) ou de todos os possíveis usos da propriedade, respeitado, evidentemente, o lapso prescricional, que corre da promulgação do ato administrativo de regência.
31
29 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos do direito administrativo. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1980, p. 342. 30 BRASIL, República Federativa do, op., cit., Internet. 31 BENJAMIN, Antônio Herman V, op., cit., internet.
24
Assim sendo, se verifica que, via de regra, não cabe indenização
pela instituição das áreas de preservação permanente, quando imposta para
todos os proprietários, ou seja, decorrentes de Lei, restringindo-se, em regra, para
os casos de instituição decorrente de ato administrativo.
2.5. Não aplicação do direito adquirido em matéria ambiental
Prevê o art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal que a lei não
prejudicará o direito adquirido. No mesmo artigo, no inciso XXII, é previsto que é
garantido o direito de propriedade, e ainda, no inciso XXIII do mesmo artigo,
também há a previsão de que a propriedade atenderá a sua função social.
Por outro lado a Constituição Federal, no art. 225 e seus parágrafos,
demonstra a preocupação com a proteção ambiental. Diz o caput do 225 que:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comumdo povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
32
Diante destas normas, é necessário que se proceda a devida
harmonização de seus usos, pois uma não pode prevalecer indiscriminadamente
sobre outra.
Deste modo, nos cabe primeiramente entender o conceito de direito
adquirido.
Este conceito é encontrado no § 2.º do art.6.º da Lei de Introdução
as normas Direito Brasileiro: “Consideram-se adquiridos assim os direitos que o
seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do
exercício tenha termo pré-fixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio
de outrem”.33
32
BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. 33 BRASIL, República Federativa do. Lei 12.376/2012. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm. Acessado em: 12 de mar. de 2014.
25
Segundo José Afonso da Silva:
Para compreendermos um pouco melhor o que seja o direito adquirido, cumpre relembrar o que se disse acima sobre o direito subjetivo: é um direito exercitável segundo a vontade do titular e exigível na via jurisdicional quando seu exercício é obstado pelo sujeito obrigado à prestação correspondente. Se tal direito é exercido, foi devidamente prestado, tornou-se situação jurídica consumada (direito consumado, direito satisfeito, extinguiu-se a relação jurídica que o fundamentava). ...
Se o direito subjetivo não foi exercido, vindo a lei nova, transforma-se em direito adquirido, porque era direito exercitável e exigível à vontade de seu titular. Incorporou-se no seu patrimônio, par aser exercido quando convier. A lei nova não pode prejudicá-ló, só pelo fato de o titular não ter exercido antes.
34
Em outras palavras, é um direito subjetivo que pode já ter sido
exercitado e, portanto, é direito consumado; ou ainda que não exercitado, não
pode ser prejudicado pela legislação posterior, pois já foi adquirido.
De acordo com artigo de autoria de LOUBET e ALMEIDA:
Para haver o direito adquirido há que ocorrer um direito subjetivo de seu titular, é importante registrar-se o conceito de Direito Subjetivo, que Miguel Reale trata ao dizer que “é a possibilidade de ser exercido, de maneira garantida, aquilo que as normas de direito atribuem a alguém como próprio.
35
Cabe ressaltar que direito subjetivo pode ser tanto de ordem
privada, quanto de ordem pública. Em razão disso, atualmente é pacificado na
doutrina, jurisprudência e na legislação, a divisão dos direitos subjetivos em
individuais; individuais homogêneos; coletivos e difusos.
34 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 5 ed. São Paulo: RT, p. 374. 35
LOUBET, Luciano Furtado; ALMEIDA, Luiz Antônio Freitas de. Inconstitucionalidades dos retrocessos
empreendidos pelo novo Código Florestal. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3358, 10 set. 2012.
Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/22582>. Acesso em: 17 abr. 2014.
26
Esses conceitos se encontram no Código de Defesa do Consumidor,
em seu artigo 81, parágrafo único, que assim dispõe:
Art. 81 (...).
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I – interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II – interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
III – interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem coumum.
36
Assim, o direito subjetivo também é um direito aplicado à
coletividade, por meio do direito difuso.
Resumidamente, constatamos que a Constituição Federal veda que
a lei venha a retroagir para violar o direito adquirido, seja direito individual, seja
direito difuso, dentre estes o direito ao meio ambiente equilibrado. Portanto,
qualquer violação pela lei a um direito subjetivo ambiental ferirá um direito
adquirido da coletividade.
Neste sentido, DEON SETTE leciona que:
as normas de direito ambiental são normas de direito público, que tutelam interesses transindividuais, em que os interesses difusos devem prevalecer sobre os interesses individuais. Desta forma, apanham as situações em curso, já que os conceitos de “irretroatividade” e de “direito adquirido” não se harmonizam com as
36 BRASIL, República Federativa do. Lei 8.078/90. Disponível em: www.planalto.gov.br/legislação.
acessado em: 17 de abr. de 2014.
27
questões de interesse público, o qual prevalece sobre o interesse privado.
37
Nota-se então que não podemos falar em direito adquirido individual
em matéria ambiental em detrimento do direito difuso ambiental.
37 DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 109-110.
28
CAPÍTULO III
DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE
3.1. Conceito e considerações iniciais
As áreas de preservação permanente – APP’s, são definidas no
artigo 3°, II, da Lei n° 12.651, de 25 de maio de 2012, como sendo uma área
protegida, coberta ou não por vegetação nativa, e que tem como funções
ambientais a preservação dos recursos hídricos, da paisagem, da estabilidade
geológica e da biodiversidade, bem como a facilitação do fluxo gênico de fauna e
flora, a proteção do solo e, por fim, assegurar o bem-estar das populações
humanas.
Conforme GOUVÊA:
O código florestal de 1934 (Decreto n° 23.793) não definia o que era área de preservação permanente, tampouco o código florestal de 1965, em sua redação originária, o que veio a ocorrer por meio da medida provisória nº 2.166-67, de 2001 (art. 1°, § 2°, II), tornando claro o entendimento de que aquelas áreas que já haviam sido desmatadas não deixavam de se caracterizar como sendo de preservação permanente, pois parte da doutrina ainda afirmava que tendo ocorrido a supressão da vegetação, não mais poderíamos falar em área de preservação permanente.
38
Portanto, a caracterização da área de preservação permanente não
depende da ocorrência de vegetação, pois esta caracterização se dá pela
localização, em decorrência de suas funções ambientais definidas acima.
Segundo DEON SETTE:
as referidas áreas tem função primordial relativamente à qualidade ambiental, mormente porque se bem preservadas possibilitam a qualidade e quantidade hídrica
38
GOUVÊA, Yara Maria Gomide. Novo código florestal: comentários à Lei 12.651, de 25 de maio de
2012, à Lei 12.727, de 17 de outubro de 2012 e do Decreto 7.830, de 17 de outubro de 2012 / coordenação
Édis Milaré, Paulo Affonso Leme Machado. 2 ed. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 69.
29
necessária, bem como a formação de corredores ecológicos perfeitos, na medida em que todos os corpos d´agua são ladeados por áreas de preservação permanente. Como a maioria dos córregos e rios são afluentes ou efluentes de outros rios, não é difícil concluir que sendo preservadas as áreas de preservação permanente, haveria uma continuidade de vegetação em que seria facilitado o fluxo gênico, a estabilidade geológica, sem falar no plus em favor da manutenção da biodiversidade. Além disso, qualquer paisagem que imaginemos com corredores ecológicos perfeitos, nos dá a maravilhosa sensação de bem-estar, de nostalgia, o que se constitui num benefício ambiental impagável.
39
Cabe ainda o questionamento quanto ao conceito legal das APP´s,
se na ausência das funções ambientais que lhe são inerentes, estas áreas
perderiam a caracterização de áreas protegidas.
ANTUNES afirma:
para ser consideradas áreas de preservação permanente, os requisitos caracterizadores das funções ambientais das áreas de preservação permanente precisam estar presentes, caracterizando-se como pressupostos de legalidade, e portanto uma presunção legal não absoluta a ser provada pelo interessado.
40
Já DEON SETTE, ao refletir sobre tratamento a ser dado para os
casos de ocupação em APP nos centros urbanos, para as situações
consolidadas, entende que tanto nestes casos como em inúmeros outros
possíveis, o norteador das decisões futuras deva ser a possibilidade de “um
mínimo restabelecimento das funções da área de preservação permanente no
local em conflito”.41 Ou seja, naquelas situações em que a APP, em sendo
restaurada, possa devolver ao ambiente o mínimo das funções mencionadas no
inc. II do art. 3º da Lei 12651/2012, que se exija a sua restauração, nas demais,
que se aplique a lógica dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para
avaliar a questão.
39
DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 334. 40 ANTUNES, Paulo de Bessa. Comentários ao novo código florestal. São Paulo: Atlas, 2013, p. 66. 41 Idem, p. 338.
30
No mesmo sentido:
Diante da grande importância ambiental das APP´’s e das várias funções elencadas na lei, podemos considerar muito difícil encontrar alguma área que não tenha vocação para cumprir o mínimo dessas funções. Sendo, portanto, claro que, quando alguma área não cumprir efetivamente o mínimo de suas funções, por certo o será em consequência de degradação ambiental, ou seja, por fator externo, e não por que a área não possua vocação para tanto. É este
o entendimento.42
Cabe ainda ressaltar que a supressão de vegetação situada em APP
gera a obrigação de restauração ao proprietário ou possuidor, pessoa física ou
jurídica de direito público ou privado, pois se trata de obrigação real, prevista no
art 7º, caput, e §§ 1º e 2º, da lei 12.651/2012, observadas as exceções legais.
3.2 Delimitação das Áreas de Preservação Permanente
3.2.1 APP protetora de curso d’água
De acordo com o art. 4º da Lei 12651/2012, considera-se Área de
Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas:
I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de: a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura; b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura; c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;e) 500 (quinhentos) metros,
42
DUNDA, Bruno faro Eloy. O conceito e as funções das áreas de preservação permanente. Disponível
em: http://blog.ebeji.com.br/o-conceito-e-as-funcoes-das-areas-de-preservacao-permanente. Acessado em: 20
de abr. 2014.
31
para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros.
43
Conforme DEON SETTE nos ensina:
A grande mudança desta disposição legal em relação ao Código Florestal anterior é o ponto a partir de onde se mede a área de preservação permanente relativamente aos cursos d’água. Com efeito, na lei anterior media-se desde o seu nível mais alto do curso d’água, em faixa marginal (aquele local em que a água do rio alcança em épocas de cheia), agora, mede-se a partir da borda da calha do leito regular (aquele local em que a água do rio alcança quando não está nem do período de seca, nem de cheia).
44
Com a utilização deste novo conceito, na prática nota-se a
considerável redução da extensão da área protegida, ocasionando a ocupação
antrópica da área banhada pelo leito maior nos períodos de cheias, podendo
inclusive ocasionar desastres envolvendo a população ribeirinha que venha a se
instalar nestes locais, além de tornar vulneráveis grandes áreas úmidas, “a
exemplo do Pantanal Mato grossense em que, em vários cursos d’água, há
enorme diferença entre a borda da calha do leito regular e o nível mais alto do
curso d’água em faixa marginal em período de cheia”.45
No mesmo art. 4º, os incs. II, III e IV trazem a seguinte previsão:
as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de: a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros; b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas; III - as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento; IV - as áreas no entorno das
43
BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. 44 DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 336. 45 Idem, p. 336.
32
nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros.
46
Nestes casos, os corpos d’água com até vinte hectares de superfície
deverão ter uma faixa de APP de 50 metros. O lagos ou lagoas naturais situados
em zonas urbanas deverão ter uma faixa de APP de 50 metros. Nos demais
casos as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais deverão obedecer uma
faixa com largura mínima de 100 metros.
Conforme o § 1o do art. 4º, não será exigida Área de Preservação
Permanente no entorno de reservatórios artificiais de água que não decorram de
barramento ou represamento de cursos d’água naturais. Já no § 4o, do mesmo
artigo, temos a disposição que nas acumulações naturais ou artificiais de água
com superfície inferior a 1 (um) hectare, fica dispensada a reserva da faixa de
proteção prevista nos incisos II e III do caput, vedada nova supressão de áreas de
vegetação nativa, salvo autorização do órgão ambiental competente do Sistema
Nacional do Meio Ambiente - Sisnama.
3.2.2 APP protetora das montanhas
A lei 12651/2012, define no art. 4º, inciso V, VIII, IX e X, que deve
ser mantida a APP nas:
a) encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive; b) as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais; c) no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação; e d) as
46 BRASIL, República Federativa do, op., cit., Internet.
33
áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação.
47
No que diz respeito à estas previsões legais, DEON SETTE, destaca
que a “ausência de áreas de preservação permanente protetoras das encostas
deixa a área mais sensível em relação a possibilidade de ocorrerem
deslizamentos, sendo necessária a proteção de sua vegetação nativa para
garantir a segurança e o bem estar social”.48
É importante lembrar que muitos fatos catastróficos ocorrem em
locais onde as áreas protegidas não são utilizadas adequadamente. Um exemplo
é a ocupação urbana de encostas e de áreas inundáveis.
3.2.3 Demais classes de APP previstas em Lei
No art. 4º, inc. VI, VII e XI, da Lei 12.651/2012,verificamos que são
APP’s:
a) as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues; b) os manguezais, em toda a sua extensão; e c) em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de 50 (cinquenta) metros, a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado.
49
O art. 3º, inc. XVI, da Lei 12.651/2012, define que restinga:
o depósito arenoso paralelo à linha da costa, de forma geralmente alongada, produzido por processos de sedimentação, onde se encontram diferentes comunidades que recebem influência marinha, com cobertura vegetal em mosaico, encontrada em praias,
47
BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. 48 DEON SETTE, Marli Terezinha, op., cit., p. 340. 49 Idem, Internet.
34
cordões arenosos, dunas e depressões, apresentando, de acordo com o estágio sucessional, estrato herbáceo, arbustivo e arbóreo, este último mais interiorizado.
50
Manguezal é definido, de acordo art. 3º, inc. XIII, como:
Ecossistema litorâneo que ocorre em terrenos baixos, sujeitos à ação das marés, formado por vasas lodosas recentes ou arenosas, às quais se associa, predominantemente, a vegetação natural conhecida como mangue, com influência fluviomarinha, típica de solos limosos de regiões estuarinas e com dispersão descontínua ao longo da costa brasileira, entre os Estados do Amapá e de Santa Catarina.
51
A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de
Preservação Permanente de manguezais só será permitida mediante
comprovação prévia de que a função ecológica do manguezal esteja
comprometida.
De acordo com o relatório do Grupo de Atuação Especial de Defesa
do Meio Ambiente – GAEMA:
O manguezal cumpre, dentre outras, as seguintes funções ecológicas: estabilização de sedimentos entre raízes e troncos; retenção de poluentes, evitando contaminação das águas estuarinas e costeiras; filtro biológico; atenuação dos efeitos de tempestades nas áreas costeiras (efeito “cortina-de-vento”); abrandamento da energia das ondas e marés, evitando a suspensão dos sedimentos das áreas costeiras mais rasas; proteção da linha de costa; melhora da qualidade das águas estuarinas e costeiras; produção primária de ambiente marinho, transformando nutrientes minerais em matéria orgânica vegetal, quealém de prover sustento para a base de teias alimentares costeiras, gera bens e serviços ecossistêmcios sem custos para os usuários ribeirinhos e caiçaras; provisão de alimentos para crustáceos e peixes jovens; produção de micro-organismos constituintes da base da teia alimentar marinha; beleza cênica explorada pelo turismo;
50
BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. Idem, internet. 51 Idem, internet.
35
base de sustentação de atividades extrativistas artesanais; garantia de aporte de nutrientes de terra e sua mobilização no ambiente costeiro.
52
O relatório alerta que em face de sua importância ecológica e
vulnerabilidade, o manguezal é considerado área de preservação permanente, em
toda sua extensão, abrangendo todas as suas feições. Integra a Zona Costeira, e,
por isso, deve ser considerado patrimônio nacional (art. 225, § 4º). Por essa
razão, só pode ser utilizado em condições que assegurem sua preservação,
inclusive no que diz respeito ao uso dos recursos naturais que o integram. Nos
manguezais, as atividades antrópicas devem restringir-se ao extrativismo
sustentável de subsistência das comunidades tradicionais de ribeirinhos, caiçaras,
indígenas e quilombolas, tais como a captura do caranguejo e do marisco sururu.
A vereda é a “fitofisionomia de savana, encontrada em solos
hidromórficos, usualmente com a palmeira arbórea Mauritia flexuosa - buriti
emergente, sem formar dossel, em meio a agrupamentos de espécies arbustivo-
herbáceas”.53 É o que dispõe o art. 3º, inc. XII, da lei 12.651/2012.
3.2.4 Particularidades em relação às APP previstas em Lei
Para a pequena propriedade ou posse rural familiar, é permitido o
plantio de culturas temporárias e sazonais de vazante de ciclo curto na faixa de
terra que fica exposta no período de vazante dos rios ou lagos, desde que não
implique supressão de novas áreas de vegetação nativa, seja conservada a
qualidade da água e do solo e seja protegida a fauna silvestre.
A Pequena propriedade ou posse rural familiar é aquela explorada
mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural e
que atenda ao disposto no art. 3º da Lei no 11.326, de 24 de julho de 2006.54
52 GRUPO DE ATUAÇÃO ESPECIAL DE DEFESA DO MEIO AMBIENTE. Relatório de Análise sobre a Lei 12.651/2012. Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/cao_criminal/Boas_praticas/Relacao_Projetos/projetoflorestar1/RELATORIO_LEI%2012.651-2012_GAEMA.pdf. Acessado em: 20 de abr. 2014. 53 BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. 54 Idem, internet.
36
O tamanho da pequena propriedade ou posse rural familiar é
variável conforme a região do país onde ela se localiza.
Nos imóveis rurais com até 15 (quinze) módulos fiscais, é admitida,
nas faixas marginais dos cursos d’água e nas áreas no entorno de lagos e lagoas
naturais, a prática da aquicultura e a infraestrutura física diretamente a ela
associada, desde que (§ 6º, art. 4º da Lei 12.651/2012):
I - sejam adotadas práticas sustentáveis de manejo de solo e água e de recursos hídricos, garantindo sua qualidade e quantidade, de acordo com norma dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente; II - esteja de acordo com os respectivos planos de bacia ou planos de gestão de recursos hídricos; III - seja realizado o licenciamento pelo órgão ambiental competente; IV - o imóvel esteja inscrito no Cadastro Ambiental Rural - CAR. V - não implique novas supressões de vegetação nativa.
55
Em se tratando de módulos fiscais, Mauro da Fonseca Ellovitch e
Carlos Alberto Valera:
Apontam que a Lei n° 12.651/12 dá diversos tratamentos diferenciados conforme o tamanho da propriedade rural em módulos fiscais, sem qualquer preocupação com a condição social do proprietário ou com a possibilidade de desmembramento dos imóveis. O parágrafo único do art. 3° equipara qualquer propriedade com até 04 (quatro) módulos fiscais que desenvolva atividades agrossilvipastoris à pequena posse ou propriedade rural familiar.
56
Os autores citados destacam que:
a utilização do módulo fiscal como parâmetro para tratamento diferenciado para recuperação de áreas de preservação permanente e de reservas legais causará uma enorme
55 BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. 56 VALERA, Carlos Alberto; ELLOVICHT, Mauro da Fonseca; Apontamentos sobre a Lei Federal
12.651/12 - Novo Código (anti) Florestal. Disponível em:
http://www.gnmp.com.br/publicacao/233/apontamentos-sobre-a-lei-federal-12-651-12-novo-codigo-anti-
florestal. Acessado em: 17 de abr. 2014.
37
insegurança jurídica, pois além de não haver disposições claras sobre casos de alteração superveniente do tamanho dos módulos fiscais a política ambiental brasileira ficará condicionada a um ato normativo infralegal do Presidente do INCRA.
57
Por fim, observamos, no caso do art. 4º, seus parágrafos e incisos,
que a área de preservação permanente vem devidamente caracterizada na
própria Lei, ou seja, não depende de qualquer ato do poder executivo, quer seja
Federal, Estadual ou Municipal. É, pois, uma limitação de ordem pública, logo não
passível de indenização.
De acordo com SIRVINSKAS:
A instituição de uma APP Legal não enseja qualquer tipo de indenização ao proprietário, pois se trata de uma limitação legal, por conseguinte, de limitação de ordem pública, possuindo caráter de generalidade, gratuidade e unilateralidade.
58
A Lei 12.651/2012, no art. 5º e seus §§, assinala, ainda, que para a
implantação de reservatório d’água artificial destinado a geração de energia ou
abastecimento público::
É obrigatória a aquisição, desapropriação ou instituição de servidão administrativa pelo empreendedor das Áreas de Preservação Permanente criadas em seu entorno, conforme estabelecido no licenciamento ambiental, observando-se a faixa mínima de 30 (trinta) metros e máxima de 100 (cem) metros em área rural, e a faixa mínima de 15 (quinze) metros e máxima de 30 (trinta) metros em área urbana. Na implantação de reservatórios d’água artificiais o empreendedor, no âmbito do licenciamento ambiental, elaborará Plano Ambiental de Conservação e Uso do Entorno do Reservatório, em conformidade com termo de referência expedido pelo órgão competente do Sistema Nacional do Meio Ambiente - Sisnama, não podendo o uso exceder a 10% (dez por cento) do
57 VALERA, Carlos Alberto; ELLOVICHT, Mauro da Fonseca, op., cit., Internet. 58 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 232.
38
total da Área de Preservação Permanente. O Plano Ambiental de Conservação e Uso do Entorno de Reservatório Artificial deverá ser apresentado ao órgão ambiental concomitantemente com o Plano Básico Ambiental e aprovado até o início da operação do empreendimento, não constituindo a sua ausência impedimento para a expedição da licença de instalação.
59
Da leitura o art. 5º e seus §§, notamos que a implantação da área de
preservação permanente deve se dar por meio de aquisição, desapropriação ou
instituição de servidão administrativa.
Nestes casos, o órgão ambiental competente para o licenciamento
ambiental fixará a faixa da área de preservação permanente tanto em área rural
quanto em área urbana, respeitando os limites previstos no caput do art. 5º, da Lei
12.651/2012.
Importante frisar, que a instituição de servidão administrativa, em
regra, também não gera direito a indenização pela perda da propriedade da área
relativa a servidão. Neste sentido, José dos Santos Carvalho Filho assevera que:
Regra reside em que a servidão administrativa não rende ensejo à indenização se o uso pelo Poder Público não provoca prejuízo ao proprietário. Segue-se daí que, se o direito real de uso provocar prejuízo ao domininus, deverá este ser indenizado em montante equivalente ao mesmo prejuízo. É bom relembrar que o ônus da prova cabe ao proprietário. A ele cabe provar o prejuízo; não o fazendo, presume-se que a servidão não produz qualquer prejuízo.
60
59
BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. 60 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 14 ed. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2005, p. 620.
39
3.2.5 Áreas de preservação permanente declaradas por ato do Poder
Executivo
Até aqui estudamos as áreas de preservação permanente instituídas
por lei. O art. 6º e seus incisos trazem as áreas que podem ser instituídas por ato
do chefe do poder executivo, tendo o seguinte teor:
Art. 6o Consideram-se, ainda, de
preservação permanente, quando declaradas de interesse social por ato do Chefe do Poder Executivo, as áreas cobertas com florestas ou outras formas de vegetação destinadas a uma ou mais das seguintes finalidades:
I - conter a erosão do solo e mitigar riscos de enchentes e deslizamentos de terra e de rocha;
II - proteger as restingas ou veredas;
III - proteger várzeas;
IV - abrigar exemplares da fauna ou da flora ameaçados de extinção;
V - proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico, cultural ou histórico;
VI - formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;
VII - assegurar condições de bem-estar público;
VIII - auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades militares.
IX - proteger áreas úmidas, especialmente as de importância internacional.
61
Verifica-se que para a instituição dessas APP’s é necessária a
declaração de interesse social pelo chefe do poder executivo.
DEON SETTE chama a atenção para o fato que:
61 BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet.
40
Para a instituição de área de preservação permanente por ato do chefe do poder executivo é necessário que a área seja coberta por florestas ou outras formas de vegetação, enquanto que a definição das APP decorrentes diretamente da Lei é de área protegida, cobertas ou não, por vegetação nativa.
62
Como, neste caso, estamos tratando de limitação administrativa não
aplicável erga omnes, quando os bens a serem protegidos estiverem localizados
em áreas privadas, a declaração de interesse social efetivará a desapropriação.
“Nesses casos, como a área, em tese, deveria ser destinada para
aproveitamento econômico, o proprietário/posseiro, ao vê-la declarada com área
de preservação permanente, deve exigir indenização compatível com a atividade
econômica que poderia desenvolver”.63
3.3. Regime de Proteção das Áreas de Preservação Permanente e Possíveis
Intervenções
A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá
ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título,
pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado. Assim determina o art. 7º,
da Lei 12.651/2012.
Art. 7o A vegetação situada em
Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado.
§ 1
o Tendo ocorrido supressão de
vegetação situada em Área de Preservação Permanente, o proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a recomposição da vegetação, ressalvados os usos autorizados previstos nesta Lei.
§ 2
o A obrigação prevista no §
1o tem natureza real e é transmitida ao sucessor
62 DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 343. 63 BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet.
41
no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural.
64
Como vimos anteriormente, a obrigação de promover a
recomposição é uma obrigação de natureza real.
Ressaltamos ainda que, de acordo com o STJ:
Descabe falar em culpa ou nexo causal, como fatores determinantes do dever de recuperar a vegetação nativa e averbar a Reserva Legal por parte do proprietário ou possuidor, antigo ou novo, mesmo se o imóvel já estava desmatado quando de sua aquisição. Sendo a hipótese de obrigação propter rem, desarrazoado perquirir quem causou o dano ambiental in casu, se o atual proprietário ou os anteriores, ou a
culpabilidade de quem o fez ou deixou de fazer.65
A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de
Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de
interesse social ou de baixo impacto ambiental (art. 8º, caput, da Lei 12651/2012).
As hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto
ambiental, estão previstas no art. 3º, VIII, IX e X, da Lei 12651/2012.
Buscando listar as hipóteses de utilidade pública, no art. 3º, VIII
define que são:
a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitária; b) as obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços públicos de transporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos parcelamentos de solo urbano aprovados pelos Municípios, saneamento, gestão de resíduos, energia, telecomunicações, radiodifusão, instalações necessárias à realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais, bem como mineração, exceto, neste último caso, a extração de areia, argila, saibro e cascalho; c) atividades e obras de defesa civil; d) atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na
64
BRASIL, República Federativa do, op. Cit., Internet. 65 BRASIL, República Federativa do. Recurso Especial 948.921. Relator: Ministro Herman Benjamin, dje:
11-11-2009. Disponível em: www.stj.jus.br/jurisprudencia. Acessado em: 10 de abr. 2014.
42
proteção das funções ambientais referidas no inciso II deste artigo; e) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal.
66
As atividades de interesse social são:
a) as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, tais como prevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies nativas; b) a exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena propriedade ou posse rural familiar ou por povos e comunidades tradicionais, desde que não descaracterize a cobertura vegetal existente e não prejudique a função ambiental da área; c) a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais consolidadas, observadas as condições estabelecidas nesta Lei; d) a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados predominantemente por população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas, observadas as condições estabelecidas na Lei n
o 11.977, de 7 de
julho de 2009; e) implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e de efluentes tratados para projetos cujos recursos hídricos são partes integrantes e essenciais da atividade; f) as atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho, outorgadas pela autoridade competente; g) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional à atividade proposta, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal.
67
As atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental são:
a) abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhões, quando necessárias à travessia de um curso d’água, ao acesso de pessoas e animais para a obtenção de água ou à retirada de produtos oriundos das
66 BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. 67 Idem, internet.
43
atividades de manejo agroflorestal sustentável; b) implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da água, quando couber; c) implantação de trilhas para o desenvolvimento do ecoturismo; d) construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro; e) construção de moradia de agricultores familiares, remanescentes de comunidades quilombolas e outras populações extrativistas e tradicionais em áreas rurais, onde o abastecimento de água se dê pelo esforço próprio dos moradores; f) construção e manutenção de cercas na propriedade; g) pesquisa científica relativa a recursos ambientais, respeitados outros requisitos previstos na legislação aplicável; h) coleta de produtos não madeireiros para fins de subsistência e produção de mudas, como sementes, castanhas e frutos, respeitada a legislação específica de acesso a recursos genéticos; i) plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e outros produtos vegetais, desde que não implique supressão da vegetação existente nem prejudique a função ambiental da área; j) exploração agroflorestal e manejo florestal sustentável, comunitário e familiar, incluindo a extração de produtos florestais não madeireiros, desde que não descaracterizem a cobertura vegetal nativa existente nem prejudiquem a função ambiental da área; k) outras ações ou atividades similares, reconhecidas como eventuais e de baixo impacto ambiental em ato do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA ou dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente.
68
Observa-se que nas hipóteses de utilidade pública e de interesse
social temos a possibilidade de definição, por ato do Chefe do Poder Executivo
Federal, de outras atividades similares, devidamente caracterizadas e motivadas
em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e
locacional à atividade proposta.
Em Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI, a Procuradora-Geral
da República, em relação à estas hipóteses de intervenção em casos de utilidade
pública ou interesse social, assevera que:
É imprescindível, portanto, que seja conferida interpretação conforme a Constituição aos incisos VIII e IX do art. 3º da Lei
68 BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet.
44
12.651/12, no sentido de que, todas as hipóteses de intervenção excepcional em APP, por interesse social ou utilidade pública, previstas exemplificativamente nos incisos VIII e IX do art. 3º, sejam condicionadas à inexistência de alternativa técnica e/ou locacional, comprovada mediante processo administrativo próprio, conforme alínea “e” do inciso VIII e alínea “g” do inciso IX..
69
Com efeito, se mantida a omissão da lei, esta acaba por autorizar
interpretações segundo as quais a intervenção em áreas de preservação
permanente é regra e não exceção, permitindo, na prática, o comprometimento
das funções ecológicas de tais áreas e, portanto, dos atributos que justificam sua
proteção.
É previsto ainda, no art. 8º:
§ 1o A supressão de vegetação
nativa protetora de nascentes, dunas e restingas somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública.
§ 2o A intervenção ou a supressão
de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente em restingas fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues poderá ser autorizada, excepcionalmente, em locais onde a função ecológica do manguezal esteja comprometida, para execução de obras habitacionais e de urbanização, inseridas em projetos de regularização fundiária de interesse social, em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda.
§ 3o É dispensada a autorização
do órgão ambiental competente para a execução, em caráter de urgência, de atividades de segurança nacional e obras de interesse da defesa civil destinadas à prevenção e mitigação de acidentes em áreas urbanas.
70
69 BRASIL, República Federativa do. Relatório da ADIN 4903. Relator: Ministro Luiz Fux. Disponível em:
http://www.florestafazadiferenca.org.br/wp-content/uploads/2013/01/adi_codigoflorestal.pdf. Acessado em:
30 de abr. 2014. 70 BRASIL, República Federativa do, op., cit., Internet.
45
Já o art. 9o permite “o acesso de pessoas e animais às Áreas de
Preservação Permanente para obtenção de água e para realização de atividades
de baixo impacto ambiental”.71
Sobre o art. 9o, o entendimento de Ana Cláudia La Plata de Mello
Franco e Gabriela Silveira Giacomolli, é o seguinte:
Por fim, o art. 9º da Seção em análise repete a regra já prevista na Lei 4.771/1965, de permissão de acesso de pessoas e animais às Áreas de Preservação Permanente para obtenção de água e para a realização de atividades de baixo impacto ambiental. De se observar, por oportuno, que não há mais a previsão, nessa hipótese, da impossibilidade de supressão e de não comprometimento da regeneração e manutenção, a longo prazo, da vegetação nativa. Essa omissão nos permite concluir, sem embargo das opiniões em contrário, que o acesso nessas hipóteses, nos termos da lei florestal vigente, poderá se dar inclusive mediante supressão da vegetação situada na Área de Preservação Permanente.
72
3.4 Áreas Consolidadas em Áreas de Preservação Permanente
Além de serem permitidos, nas áreas de preservação permanente,
obras, atividades ou empreendimentos nas hipóteses de utilidade pública, de
interesse social ou de baixo impacto ambiental, existe ainda a previsão do art. 61
- A, que diz: “Nas Áreas de Preservação Permanente, é autorizada,
exclusivamente, a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e
de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008”.73
Essas permissões, diferentes das estudadas no item anterior,
ocorrem em razão dessas áreas serem consideradas áreas rurais consolidadas,
que, de acordo com art. 3º , IV, da Lei 12651/2012, é a “área de imóvel rural com
ocupação antrópica preexistente a 22 de julho de 2008, com edificações,
71 BRASIL, República Federativa do, op., cit., Internet. 72
FRANCO, Ana Cláudia La Plata de Mello; GIACOMOLLI, Gabriela Silveira. In: MILARÉ, Edis;
MACHADO, Paulo Affonso Leme, op., cit., p. 185. 73 Idem, Internet.
46
benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris, admitida, neste último caso, a
adoção do regime de pousio”.74
José Guilherme Purvin de Figueiredo, citado por Haroldo Celso de
Assunção, faz duras críticas aos artigos acima citados, principalmente por, no seu
entender, comprometer a segurança jurídica e não observar o princípio da
igualdade, conforme segue:
A introdução do conceito de “área consolidada” no Direito Ambiental premia o infrator e sanciona quem sempre cumpriu a legislação, gerando insegurança jurídica e fraturando a espinha dorsal da democracia, que é o princípio da igualdade de todos perante a lei: os proprietários que sempre cumpriram as exigências do Código Florestal ou os que foram punidos e recuperaram o ambiente degradado estarão impedidos de explorar estas áreas preservadas; e, de outro, infratores que por décadas afrontam a legislação serão beneficiados com a extinção dos padrões de proteção nas áreas degradadas.
75
Neste sentido, na ADI 4903, a Procuradora-Geral da República, em
relação a área rural consolidada, mostra que a criação desta área visa a isentar
os causadores de danos ambientais da obrigação de reparar o dano, sem exigir
qualquer circunstância razoável para a dispensa desta reparação.
A iniciativa contraria de forma explícita o § 3º do art. 225 da Constituição Federal segundo o qual “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas e jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Se a própria Constituição estatui de forma explícita a responsabilização penal e administrativa, além da obrigação de reparar os danos, não se pode admitir que o legislador infraconstitucional exclua tal princípio, sob pena de grave ofensa à Lei Maior. Ademais, como será evidenciado na análise específica de cada dispositivo impugnado, a Lei 12.651/12, em relação às áreas de preservação permanente,
74 BRASIL, República Federativa do, op., cit., Internet. 75
ASSUNÇÃO, Haroldo Celso de. As áreas rurais consolidadas no código florestal de 2012: uma análise
sob a perspectiva da função socioambiental da propriedade Belo Horizonte. Disponível em:
http://www.domhelder.edu.br/uploads/dissertaoharoldocelsodeassuno.pdf. Acessado em: 23 de abr. 2014.
47
consagra patente inconstitucionalidade decorrente da proteção insuficiente do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
76
Para a realização destas atividades, o art. 61-A, § 11 estabelece que:
a realização das atividades previstas no caput observará critérios técnicos de conservação do solo e da água indicados no PRA previsto nesta Lei, sendo vedada a conversão de novas áreas para uso alternativo do solo nesses locais.
77
Na Lei 12651/2012, além de ser criada área rural consolidada, nas
situações previstas ficou definido que as APP´s terão dimensões proporcionais ao
tamanho do imóvel rural e não ao bem ambiental protegido. Estas situações estão
previstas no art 61- A, precisamente, nos seus §§ 1º a 7º, conforme segue:
Art. 61 – A (...)
§ 1o Para os imóveis rurais com
área de até 1 (um) módulo fiscal que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em 5 (cinco) metros, contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso d´água.
§ 2o Para os imóveis rurais com
área superior a 1 (um) módulo fiscal e de até 2 (dois) módulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em 8 (oito) metros, contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso d´água.
§ 3o Para os imóveis rurais com
área superior a 2 (dois) módulos fiscais e de até 4 (quatro) módulos fiscais que possuam áreas
76
BRASIL, República Federativa do. Supremo Tribunal Federal. Notícias STF. Disponível em:
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=228842. Acessado em: 10 jun. 2014. 77 BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet.
48
consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em 15 (quinze) metros, contados da borda da calha do leito regular, independentemente da largura do curso d’água.
§ 4o Para os imóveis rurais com
área superior a 4 (quatro) módulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais:
I - (VETADO); e
II - nos demais casos, conforme determinação do PRA, observado o mínimo de 20 (vinte) e o máximo de 100 (cem) metros, contados da borda da calha do leito regular.
§ 5o Nos casos de áreas rurais
consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no entorno de nascentes e olhos d’água perenes, será admitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição do raio mínimo de 15 (quinze) metros.
§ 6o Para os imóveis rurais que
possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente no entorno de lagos e lagoas naturais, será admitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, sendo obrigatória a recomposição de faixa marginal com largura mínima de:
I - 5 (cinco) metros, para imóveis rurais com área de até 1 (um) módulo fiscal;
II - 8 (oito) metros, para imóveis rurais com área superior a 1 (um) módulo fiscal e de até 2 (dois) módulos fiscais;
III - 15 (quinze) metros, para imóveis rurais com área superior a 2 (dois) módulos fiscais e de até 4 (quatro) módulos fiscais; e
IV - 30 (trinta) metros, para imóveis rurais com área superior a 4 (quatro) módulos fiscais.
§ 7o Nos casos de áreas rurais
consolidadas em veredas, será obrigatória a recomposição das faixas marginais, em projeção
49
horizontal, delimitadas a partir do espaço brejoso e encharcado, de largura mínima de:
I - 30 (trinta) metros, para imóveis rurais com área de até 4 (quatro) módulos fiscais; e II - 50 (cinquenta) metros, para imóveis rurais com área superior a 4 (quatro) módulos fiscais.
78
Diante das situações supra descritas, Paulo de Bessa Antunes, faz a
seguinte observação:
o artigo 61-A e seus 17 parágrafos pretendem regulamentar as atividades que já estão sendo praticadas nas Áreas de Preservação Permanente, ou seja, busca legitimar e legalizar aquilo que vinha sendo realizado em contravenção às normas existentes.
79
Com relação a redação dos art. 61-B e 61-C da Lei 12651/2012,
verificamos que:
Art. 61-B. Aos proprietários e possuidores dos imóveis rurais que, em 22 de julho de 2008, detinham até 10 (dez) módulos fiscais e desenvolviam atividades agrossilvipastoris nas áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente é garantido que a exigência de recomposição, nos termos desta Lei, somadas todas as Áreas de Preservação Permanente do imóvel, não ultrapassará:
I - 10% (dez por cento) da área total do imóvel, para imóveis rurais com área de até 2 (dois) módulos fiscais.
II - 20% (vinte por cento) da área total do imóvel, para imóveis rurais com área superior a 2 (dois) e de até 4 (quatro) módulos fiscais
Art. 61-C. Para os assentamentos do Programa de Reforma Agrária, a recomposição de áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo ou no entorno de cursos d'água, lagos e lagoas naturais observará as exigências estabelecidas no art. 61-A, observados os limites de cada área demarcada
78 BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. 79 ANTUNES, Paulo de Bessa, op., cit., p. 124.
50
individualmente, objeto de contrato de concessão de uso, até a titulação por parte do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra.
80
Observa-se que a recomposição exigida no artigo 61-B, para os
imóveis com até 4 módulos fiscais, não poderá ultrapassar 10% ou 20% do total
do imóvel. Com isso, na prática, estes imóveis nas áreas consolidadas poderão
ter medidas inferiores àquelas estabelecidas no art. 61 – A.
Ao analisar os artigos 61-A c/c 61-C, DEON SETTE observa que:
Além de considerar como atividades consolidadas aquelas, desempenhadas até 22.07.2008, nesses artigos a definição das medidas das APPS é escalonada, não a partir do objeto que as motiva – curso d’água, lago, lagoa, nascente, vereda etc., mas, sim, pelo tamanho do imóvel. Ou seja, a lei adotou um sistema de escalonamento, incidente sobre parte dos objetos que motivam a existência das APPs relacionados no art. 4º, só que, ao invés de tomar como medida, por exemplo, a largura dos cursos d‟água, tomou como parâmetro do escalonamento o tamanho dos imóveis.
81
DEON SETTE, ainda destaca que:
Da forma como está a Lei, aquele de agiu em desacordo com a norma legal existente a época pode ter o benefício de ficar com uma área econômica (uso alternativo) maior do que aquele proprietário que sempre observou os comandos legais, já que está vedada a conversão de novas áreas para uso alternativo do solo, enquanto aquele não precisa repor o total de APPs conforme consta na regra geral (art. 4º da Lei 12.651/2012, c..c. art. 61-A e seu § 1º a 11 e seus incisos.
82
Outra questão controvertida diz respeito a relevância das medidas
das APPs estabelecidas nestes artigos, tomadas com base no tamanho dos
imóveis, o que não parece ter qualquer relação com a efetividade de suas
80
BRASIL, República Federativa do, op., cit., Internet. 81 DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 348. 82 DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 350-351.
51
funções, pois “esse tipo de lógica não tem nenhuma relação com as exigências da
Lei em relação às funções que deve desempenhar as APPs”.83
Já quando a Lei trata da recomposição das Áreas de Preservação
Permanente, o artigo 61-A, no § 13, diz que poderão se dar, de forma isolada ou
conjuntamente, pelos método de:
a) condução de regeneração natural de espécies nativas; b) plantio de espécies nativas; c) plantio de espécies nativas conjugado com a condução da regeneração natural de espécies nativas; d) plantio intercalado de espécies lenhosas, perenes ou de ciclo longo, exóticas com nativas de ocorrência regional, em até 50% (cinquenta por cento) da área total a ser recomposta, no caso das pequena propriedade ou posse rural familiar.
84
Segundo a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e
Ambiental – ABES-SP:
A lei 12.651/202 mantém a possibilidade de plantio intercalado de espécies nativas e exóticas, em sistema agroflorestal, sendo que a área recomposta com espécies exóticas não poderá exceder a 50% da área total a ser recuperada. Contudo, dá o entendimento de caráter permanente da exploração da espécie exótica nas áreas de Reserva Legal, diferentemente do Código anterior que determinava a recomposição poderia ser realizada mediante o plantio temporário de espécies exóticas como pioneiras, com o intuito de restaurar o ecossistema original.
85
Admite-se nas Áreas de Preservação Permanente das bordas dos
tabuleiros ou chapadas, dos imóveis rurais de até 4 (quatro) módulos fiscais, a
partir de boas práticas agronômicas e de conservação do solo e da água,
mediante deliberação dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente ou órgãos
83 Idem, p. 351. 84 BRASIL, República Federativa do, op., cit., internet. 85
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL. Código Florestal
Apreciação Atulizada. Disponível em: http://www.abes-sp.org.br/arquivos/atualizacao_codigo_florestal.pdf.
Acessado em: 22 de abr. 2014.
52
colegiados estaduais equivalentes, a consolidação de outras atividades
agrossilvipastoris, ressalvadas as situações de risco de vida.
Destacamos que essas áreas garantem a estabilidade do solo contra
deslizamentos, e com isso, Walter José Senise e Marina Montes Bastos revelam
que: “a análise deverá ser feita com bastante cuidado, a fim de não colocar em
risco a população e o meio ambiente local, e deverá ser seguida de uma
fiscalização ativa para verificar se as práticas conservacionistas estão realmente
sendo implantadas”. 86
3.5 Áreas de Preservação Permanente em Área Urbana Consolidada
A lei 12.651/2012, ainda trata sobre regularização fundiária, de
interesse social e de interesse específico, em áreas urbanas consolidadas,
conforme art. 64 e 65 da Lei 12.651/2012.
A definição legal da regularização fundiária está prevista no art. 46
da Lei 11.977/2009.
Art. 46. A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
87
Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida e Vicente de Abreu Amadei,
orientam que na regularização fundiária de interesse social em APP é
imprescindível, nos termos do art. 54 da Lei 11.977/2009, a satisfação dos
pressupostos indicados neste artigo, entre eles, “a previsão de que a ocupação
deve estar inserida em área urbana consolidada até 31 de dezembro de 2007 e 86 SENISE, Walter José, et al. Novo código florestal: comentários à Lei 12.651, de 25 de maio de 2012, à
Lei 12.727, de 17 de outubro de 2012 e do Decreto 7.830, de 7 de outubro de 2012. 2 ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 455. 87 BRASIL, República Federativa do. Lei 11.977. disponível em: www.planalto.gov.br/legislação. Acessado
em: 20 de jun. 2014.
53
que a intervenção importe melhoria das condições ambientais em relação a
situação de ocupação irregular anterior”. Os autores ainda alertam que o requisito
temporal deve ser respeitado, visando a evitar o permanente incentivo a
ocupação irregular dessas áreas sensíveis.88
Os demais requisitos estão previstos no art. 64, § 2º da Lei
12651/2012, conforme segue:
Art. 64, § 2º O estudo técnico mencionado no § 1
o deverá conter, no mínimo, os
seguintes elementos:
I - caracterização da situação ambiental da área a ser regularizada;
II - especificação dos sistemas de saneamento básico;
III - proposição de intervenções para a prevenção e o controle de riscos geotécnicos e de inundações;
IV - recuperação de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização;
V - comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental, considerados o uso adequado dos recursos hídricos, a não ocupação das áreas de risco e a proteção das unidades de conservação, quando for o caso;
VI - comprovação da melhoria da habitabilidade dos moradores propiciada pela regularização proposta; e
VII - garantia de acesso público às praias e aos corpos d'água.
89
ANTUNES relembra que esta exceção legal também objetiva o
reconhecimento das situações de fato.
O artigo é, de certa forma, a confissão da falência da administração do
88 YOSHIDA, Consuelo Yatsuda Moromizato; AMADEI, Vicente de Abreu, op., cit., p. 467. 89 BRASIL, República Federativa do, op., cit., Internet.
54
território, ao mesmo tempo em que serve de cobertura para milhares de prefeitos e vereadores que, seguidamente, incentivaram promoveram a ocupação de áreas de preservação permanente, por populações vulneráveis e sem recursos para a aquisição de moradias dignas e seguras, sem prejuízo para o meio ambiente.
90
ANTUNES, ainda observa que “mesmo que se reconheça a
relevância do direito a moradia, elevado a status constitucional, não há que se
fazê-lo eficaz em detrimento de outros direitos, igualmente, tutelados pela
Constituição Federal, no caso, o direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado”.91
Na regularização fundiária de interesse específico dos
assentamentos inseridos em área urbana consolidada e que ocupam áreas de
preservação permanente não identificadas como áreas de risco, a regularização
ambiental será admitida por meio da aprovação do projeto de regularização
fundiária, na forma da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009.
Segundo o § 1o da Lei 12.651/2012, o processo de regularização
ambiental, para fins de prévia autorização pelo órgão ambiental competente,
deverá ser instruído com os seguintes elementos:
I - a caracterização físico-ambiental, social, cultural e econômica da área;
II - a identificação dos recursos ambientais, dos passivos e fragilidades ambientais e das restrições e potencialidades da área;
III - a especificação e a avaliação dos sistemas de infraestrutura urbana e de saneamento básico implantados, outros serviços e equipamentos públicos;
IV - a identificação das unidades de conservação e das áreas de proteção de mananciais na área de influência direta da ocupação, sejam elas águas superficiais ou subterrâneas;
90 ANTUNES, Paulo de Bessa, op., cit., p. 274-275. 91 Idem, p. 275.
55
V - a especificação da ocupação consolidada existente na área;
VI - a identificação das áreas consideradas de risco de inundações e de movimentos de massa rochosa, tais como deslizamento, queda e rolamento de blocos, corrida de lama e outras definidas como de risco geotécnico;
VII - a indicação das faixas ou áreas em que devem ser resguardadas as características típicas da Área de Preservação Permanente com a devida proposta de recuperação de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização;
VIII - a avaliação dos riscos ambientais;
IX - a comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental e de habitabilidade dos moradores a partir da regularização; e
X - a demonstração de garantia de acesso livre e gratuito pela população às praias e aos corpos d’água, quando couber.
§ 2o Para fins da regularização ambiental prevista
no caput, ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água, será mantida faixa não edificável com largura mínima de 15 (quinze) metros de cada lado.
§ 3o Em áreas urbanas tombadas como
patrimônio histórico e cultural, a faixa não edificável de que trata o § 2
o poderá ser redefinida
de maneira a atender aos parâmetros do ato do tombamento.
92
Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida e Vicente de Abreu Amadei,
consideram que é preciso ter em conta que a regra é a imutabilidade do perfil
ambiental natural protegido das APP, quer estejam situadas em Zona Rural ou em
Zona Urbana, e acrescenta que:
Essa diretiva – que se há de respeitar, em prol da cidade sustentável – comporta exceção legal controlada, mediante autorização específica, como se vislumbra em hipótese a regularização fundiária de
92 BRASIL, República Federativa do, op., cit., Internet.
56
assentamentos localizados em área urbana consolidada, na razão maior do desenvolvimento humano dos cidadãos. Refletindo a necessidade de resposta a triste realidade sociológica urbana brasileira, forjada nos assentamentos clandestinos ou irregulares em APP; e a perspectiva holística do meio ambiente e da transversalidade de dimensão ambiental, que no confronto entre as questões sociais e questões ambientais, reclama (a) ponderação de valores, (b) diagnóstico prudente da concretude das ocupações (em ordem a sua qualificação como consolidadas e de difícil reversibilidade e (c) solução realística, evitando tanto a permissividade abusiva como a intransigência utópica.
93
Por fim, recordando a reflexão de DEON SETTE, item 3.1 retro, que
pode complementar a avaliação das autorizações previstas nos artigos 64 e 65
acima citados, impõe-se lembrar que nos casos de ocupação em APP nos centros
urbanos, para as situações consolidadas, se deva buscar “um mínimo
restabelecimento das funções da área de preservação permanente no local em
conflito”.94 Ou seja, naquelas situações em que a APP, em sendo restaurada,
possa devolver ao ambiente o mínimo das funções mencionadas no inc. II do art.
3º da Lei 12651/2012, que se exija a sua restauração, nas demais, que se aplique
a lógica dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para avaliar a
questão.
93 YOSHIDA, Consuelo Yatsuda Moromizato; AMADEI, Vicente de Abreu, op., cit., p. 461. 94DEON SETTE, Marli Teresinha, op., cit., p. 338.
57
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tema aqui tratado, principalmente no que se refere à atual
normatização sobre a proteção das áreas de preservação permanente, se
apresenta com demasiada especificidade em sua regulamentação, tornando o
seu entendimento confuso e polêmico, além de suscitar em muitos a ideia de que
a atual normatização se voltou apenas ao atendimento de alguns setores da
sociedade.
Observamos que é imprescindível que seja conferida interpretação
conforme a Constituição aos incisos VIII e IX do art. 3º da Lei 12.651/12, no
sentido de que todas as hipóteses de intervenção excepcional em APP, por
interesse social ou utilidade pública, previstas exemplificativamente nos incisos
VIII e IX do art. 3º, sejam condicionadas à inexistência de alternativa técnica e/ou
locacional, comprovada mediante processo administrativo próprio, conforme
alínea “e” do inciso VIII e alínea “g” do inciso IX. Caso contrário, a omissão da lei
acaba por autorizar interpretações segundo as quais a intervenção em áreas de
preservação permanente é regra e não exceção, permitindo, na prática, o
comprometimento das funções ecológicas de tais áreas e, portanto, dos atributos
que justificam sua proteção.
Em relação ao conceito de “área consolidada”, nota-se que aquele
que agiu em desacordo com a norma legal anterior a 22/07/2008, recebeu o
prêmio de ficar com uma área econômica (uso alternativo) maior do que aquele
proprietário que sempre observou os comandos legais, já que está vedada a
conversão de novas áreas para uso alternativo do solo, enquanto aquele não
precisa repor o total de APPs, conforme consta na regra geral (art. 4º da Lei
12.651/2012, c..c. art. 61-A e seu § 1º a 11 e seus incisos).
A definição de área rural consolidada acaba por isentar os
causadores de danos ambientais da obrigação de reparar o dano, contrariando de
forma explícita o § 3º do art. 225 da Constituição Federal, segundo o qual as
condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
58
infratores, pessoas físicas e jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Outro questionamento observado é a definição das medidas das
APPs de maneira escalonada, tomadas com base no tamanho dos imóveis, não
parece ter qualquer relação com a efetividade de suas funções, pois esse tipo de
lógica não tem nenhuma relação com as exigências da Lei em relação às funções
que deve desempenhar as APPs.
Já no que diz respeito a utilização do novo conceito de leito regular,
na prática nota-se a considerável redução da extensão da área protegida,
ocasionando a ocupação antrópica da área banhada pelo leito maior nos períodos
de cheias, podendo, inclusive, ocasionar desastres envolvendo a população
ribeirinha que venha a se instalar nestes locais, além de tornar vulneráveis
grandes áreas úmidas, a exemplo do Pantanal Mato grossense, no qual, em
vários cursos d’água, há enorme diferença entre a borda da calha do leito regular
e o nível mais alto do curso d’água em faixa marginal em período de cheia.
Por fim, entendemos que a maneira como a legislação
infraconstitucional vem tratando das áreas de preservação permanente, nas
situações acima citadas, afronta os comandos constitucionais de garantia ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, fazendo com que a propriedade deixe de
atender a sua função social, prevista no art. 5º, XXIII da Constituição Federal.
59
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