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ARY NORBERTO DA SILVA INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE UNIVERSIDADE DE CUIABÁ – UNIC CUIABÁ – MT 2006

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ARY NORBERTO DA SILVA

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

UNIVERSIDADE DE CUIABÁ – UNIC

CUIABÁ – MT

2006

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ARY NORBERTO DA SILVA

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE

Monografia apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de Cuiabá, como exigência parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, sob a orientação das professoras Marli Terezinha Deon Sette e Neuza Cavalieri Rocha Jevinski.

UNIVERSIDADE DE CUIABÁ – UNIC

CUIABÁ – MT

2006

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APRECIAÇÃO

____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________

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Dedico este trabalho:

Aos meus colegas de trabalho e

profissionais, porque juntos, na universidade ou

no trabalho, aprendemos a amar cada vez mais

esta maravilhosa arte que é ser operador do direito

realizando esta conquista por meio da troca de

experiências, sempre em busca da excelência.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela minha vida.

A minha família, em especial a minha

esposa Maria dos Anjos, meus filhos Juliana,

Izabela e José Victor pela compreensão e

colaboração no decorrer desta jornada.

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“Há homens que lutam um dia e são bons.

Há outros que lutam um ano e são melhores.

Há os que lutam muitos anos e são muitos bons.

Porém, há os que lutam toda a vida.

Esses são os imprescindíveis.”

Bertolt Brecht

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RESUMO

O direito à filiação é um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível,

sendo especialmente tutelado pelo ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 27). Está

relacionado ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, pois está ligado às

bases da espécie humana, configurando­se um direito fundamental. A Constituição Federal de

1988 (art. 226) também se refere à paternidade responsável não só como embasadora do

planejamento familiar, mas igualmente como empenho à satisfação dos direitos e interesses

das crianças e dos adolescentes e no cumprimento dos deveres advindos do pátrio­poder.

Assim, ter reconhecida a filiação é direito fundamental da criança e do adolescente. O meio

processual que garante a efetividade desse direito é a ação investigatória de paternidade,

prevista em nosso ordenamento jurídico desde o Código Civil de 1916. A ação de

investigação de paternidade é uma ação do Estado, por isso pode ser proposta pelo filho em

face do pai ou da mãe.

Palavras­chaves: paternidade, filho, investigação.

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ABSTRACT

The right to the filiation is an exclusive, unavailable and iniprescritation right,

being especially tutored person for the ECA ­ Statute of the Child and the Adolescent (art.

27). Human being is related at the outset constitution of the dignity of the person, therefore he

is on to the bases of the species human being, configuring itself a basic right. The Federal

Constitution of 1988 (art. 226) also if relate to the responsible paternity as not only bedding of

the family planning, but equally as persistence to the satisfaction of the rights and interests of

the children and the adolescents and in the fulfilment of the happened duties of the native­

power. Thus to have recognized the filiation is right basic of the child and the adolescent. The

procedural way that guarantees the effectiveness of this right is the i inquiry action of

paternity, foreseen in our legal system since the Civil Code of 1916. The action of inquiry of

paternity is an action of the State, therefore it can be proposal for the son in face of the father

or the mother.

Word­keys: paternity, son, inquiry.

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L ISTA DE SIGLAS

A.B.O. ­ Sangue tipo A, B ou Zero ou Universal

AIDS ­ Síndrome de Imunodeficiência Adquirida

CFM ­ Conselho Federal de Medicina

DNA ­ DesoxirriboNucleic Acid ou ácido desoxirribonucléico ECA ­ Estatuto da Criança e do Adolescente

EDNAP ­ European DNA Profiling Group

EUA ­ Estados Unidos da América

FIVETE ­ fertilização in vitro seguida de transferência de embriões GIFT ­ Transferência Intratubária de Gametas

IA ­ Inseminação Artificial

OMS ­ Organização Mundial de Saúde

PCR ­ Polymerese Chain Reaction PFL ­ Partido da Frente Liberal

PLC ­ Projeto de Lei da Câmara

TWGDAM ­Technical Work Group for DNA Analysis and Methods UERJ ­ Universidade do Estado do Rio de Janeiro

UFPR ­ Universidade do Estado do Paraná

ZIFT ­ Transferência Intratubária de Zigotos

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .............................................................................................. 11

CAPÍTULO I

“FAMÍLIA” A BASE DA SOCIEDADE ....................................................... 14

1.1 Do Novo Direito de Família .............................................................. 17

1.2 Das Alterações e o Novo Código Civil ............................................. 22

CAPÍTULO II

FILIAÇÃO E SEUS ASPECTOS ................................................................... 28

2.1 Do Princípio da Afetividade e suas Implicações .............................. 31

2.2 Da Filiação ........................................................................................ 36

2.3 Da Filiação Matrimonial ou Legítima .............................................. 37

2.3.1 Presunção legal da paternidade .................................................. 39

2.3.2 Prova de condição de filho ......................................................... 44

2.4 Da Filiação Não Matrimonial ou Ilegítima ....................................... 46

CAPÍTULO III

NOVAS TÉCNICAS DE REPRODUÇÃO HUMANA E SUAS IMPLICAÇÕES JURÍDICAS ......................................................................... 48

3.1 Das Técnicas de Reprodução Medicamente Assistida ...................... 50

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3.1.1 Inseminação artificial ................................................................. 52

3.1.2 Transferência intratubária de gametas ....................................... 53

3.1.3 Transferência intratubária de zigotos ......................................... 54

3.1.4 Fertilização in vitro seguida de transferência de embriões ........ 54

3.1.5 Mães de substituição .................................................................. 55

3.1.6 Problemas jurídicos decorrentes das novas técnicas de reprodução ...... 56

CAPÍTULO IV

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE E A QUESTÃO DO RECONHECIMENTO DOS FILHOS ............................................................ 61

4.1 Da Definição e Natureza do Reconhecimento de Filiação ................ 67

4.2 Da Possibilidade de Reconhecimento de Filho ................................. 68

4.3 Dos Modos de Reconhecimento de Filho ......................................... 69

4.3.1 Reconhecimento voluntário ........................................................ 69

4.3.2 Reconhecimento judicial ............................................................ 72

4.3.3 Ação de Investigação de paternidade ......................................... 73

4.3.4 Ação de Investigação de maternidade ........................................ 79

4.3.5 Conseqüência do reconhecimento do filho ................................. 80

CONCLUSÃO ............................................................................................... 82

BIBLIOGRAFIA ......................................................................................... 85

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INTRODUÇÃO

Este estudo tem como objetivo principal mostrar que o direito à

filiação é um direito personalíssimo, ligado às bases da espécie humana,

caracterizado como direito fundamental e resguardado na Constituição de 1988

em seu artigo 226.

Durante muitos anos os filhos havidos fora do casamento foram

descriminados e rejeitados pelo próprio direito. A partir da Constituição Federal

de 1988 procurou­se obter a igualdade na filiação, evitando­se o descaso e as

humilhações então sofridas. O avanço da biotecnologia surge demonstrando à

sociedade o tratamento ético que deve ser dado às relações de filiação.

As inovações tecnológicas criaram para o homem uma nova imagem

de como perceber a humanidade e a si mesmo enquanto espécie. As inovações

que há tempos atrás pareciam utópica ou simples ficção científica

hodiernamente são reais e problematizadas pelos seus aspectos éticos, sociais e

jurídicos. Enquadram­se dentro dos direitos de quarta geração. Resultam dos

novos conhecimentos e tecnologias resultantes das pesquisas biológicas

contemporâneas. São direitos para os quais o sistema jurídico não se encontrava

plenamente preparado e não acompanhou tal evolução que despontou na

sociedade.

A comunidade científica tem evoluído nas questões referentes

tecnologias reprodutivas, mas o ordenamento jurídico não se encontra preparado

para respaldar tais técnicas principalmente num sistema em que um único

exame, o DNA, define a filiação dos homens em sociedade determinando­lhes

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direitos e deveres recíprocos sem, no entanto, perquirir a situação afetiva dos

envolvidos.

A bioética rompe um liame na concepção de filiação em que bastam

os genes para se declarar a filiação, alerta para a necessidade de uma análise de

vida, a pesquisa de todo um histórico social para então declarar­se os direitos de

pai­filho, reconhecendo­se a posse de estado não apenas como meio probatório

mas como instrumento efetivo da determinação da filiação, resguardando­se

efetivamente os interesses das crianças e adolescentes uma vez de tal modo que

estaria se construindo um sistema definidor dos laços de família, vinculando

pessoas que desejam amar­se e cuidar­se reciprocamente. Assim, com o intuito

de demonstrar que a família é a base para uma sociedade melhor e mais

equilibrada, buscamos estudar por meio do tema em questão os assuntos

desenvolvidos em capítulos estruturados da seguinte maneira:

O Capítulo I, intitulado família a base da sociedade, demonstra o seio

familiar desde os primórdios, sua evolução e estruturação no mundo moderno. A

sua real importância na formação de indivíduos que serão com o passar do

tempo a própria sociedade em ação.

Desta forma, vários estudiosos se dedicam ao campo do Direito Civil

que trata especificadamente dos problemas gerados nos seios familiares. Este

campo recebeu a denominação de Direito de Família, e é tratado dentro do

Código Civil na Parte Especial. A atenção do capítulo está voltada à família, no

que diz respeito a questão da filiação. É somente incidindo as transformações

necessárias na sociedade é que poderão ocorrer as mudanças das legislações.

No Capítulo II, a filiação e seus aspectos, a Lei nº 8.560, de 29.12.92,

Lei de Investigação de Paternidade, que determina, no artigo 2º, que todo

registro de nascimento com apenas a maternidade estabelecida deverá ser levado

a conhecimento do Juiz pelo oficial, mediante remessa do inteiro teor da

certidão respectiva.

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Dentre outros instrumentos que a lei dispõe, a investigação de

paternidade passou a ser uma ação com resultado certo – positivo ou negativo ­,

mas de fato inquestionável. Com relação aos temas abordados, está o princípio

da afetividade, a definição e classificação da filiação, a filiação matrimonial e

não matrimonial, a presença legal da paternidade e a prova de condição de filho.

Traz o Capítulo III as novas técnicas de reprodução humana e suas

implicações jurídicas, dentre as técnicas estudadas e elencadas estão: a de

reprodução medicamente assistidas, a inseminação artificial, a transferência

intratubária de gametas e zigotos, a fertilização in vitro segundo a transferência

de embriões e uma prática concernente à reprodução artificial – as mães de

substituições. E, por último, os problemas jurídicos decorrentes das novas

técnicas de reprodução humana.

O Capítulo IV finaliza com a investigação de paternidade e a questão

de reconhecimento dos filhos, onde o conceito de paternidade está fragmentado

entre o liame biológico, jurídico e sócio­afetivo. Já o conceito de filiação

evoluiu no mundo jurídico da filiação biológica até a atual filiação sócio­afetiva,

que prepondera em nosso ordenamento jurídico. Define também a natureza do

reconhecimento da filiação, bem como a possibilidade de reconhecimento do

filho, elencando os diversos modos de reconhecimentos e suas conseqüências, e

conclui com a ação de investigação de paternidade onde é direito de todo

adotado ter o reconhecimento de sua identidade genética principalmente se

levarmos em consideração a Constituição que se norteia pelos princípios

constitucionais fundamentais, mormente o princípio da dignidade humana (art.

1º da Constituição), sendo ele fundamento da República Federativa do Brasil.

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CAP ÍTULO I

“FAMÍLIA” A BASE DA SOCIEDADE

Desde tempos imemoriais, é por meio da família que se estrutura e

forma os pilares da sociedade.

Na evolução do mundo moderno, a falta de estrutura familiar é origem

de quase todos, senão todos, os problemas sociais enfrentados na atualidade,

desde a marginalidade, até a perda da moral e da dignidade humana.

O tema “família” sempre teve atenção dos sociólogos e estudiosos do

Direito, tópico este que passou por inúmeras modificações ao longo dos últimos

anos, desde a revolucionária Lei do Divórcio (Lei nº 6.515/77), que foi fruto de

movimentos femininos de independência, até a recente Lei da União Estável

(Lei nº 9.278/96).

O Direito da Família contemporâneo tenta resgatar os laços familiares,

preocupando­se muito mais com os motivos e conseqüências da ruptura familiar,

tentando respeitar as inúmeras formas de vínculos afetivos. Evidenciou­se essa

evolução com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e também com a

entrada em vigência do Código Civil de 2002.

Em parceria com a sociedade, a legislação evoluiu em prol de

priorizar o Princípio da Afetividade em detrimento dos laços biológicos.

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A partir da nova Carta Magna, a distinção que havia entre homens e

mulheres dentro do casamento já não existe mais. Também não há falar­se em

filhos legítimos e ilegítimos. A Lei nº 6.015/73, ao contrário do que possa

parecer, não veio dissolver a estrutura familiar, senão dar­lhe maior

respeitabilidade, diante de inúmeras situações de inconformismos e preconceitos

em uma resistência inviável e ofensiva. A insistência em uma união falida viola

os preceitos da moralidade. Pais infelizes não possuem condições de criarem

seus filhos com respeito e dignidade. A Constituição Federal de 1988 trouxe

enorme colaboração ao tema, evoluiu a sociedade, dignificou a família, imputou

o dever de responsabilidade ao cidadão e ao Estado, tratou de assuntos

polêmicos ao estabelecer a igualdade formal entre homens e mulheres e ao

condenar todas as formas de discriminação (sexo, idade, cor etc.).

Numa tentativa de amparar o menor abandonado, conseqüência da

falência familiar, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90)

enfatizou o princípio da Afetividade e veio regular e promover os Institutos da

Guarda e da Adoção. Quebrando­se a monarquia biológica da filiação,

priorizou­se o respeito e consideração ao próximo, ao filho do próximo, como se

seu fosse, num vínculo maior de amor e convivência. Mudam­se as legislações,

modificam­se as instituições.

Com o advento da Lei nº 8.971/94 (Lei do Concubinato) e a Lei nº

9.278/96 (União Estável), a entidade familiar não se resume mais ao casamento

entre homem e mulher e sua prole. O vínculo matrimonial não é mais requisito

para formação da família. O homem solteiro ou a mulher solteira e sua prole

podem ser considerados “família”, agora regulamentado no art. 1.723 do Código

Civil.

Ainda, consciências estão se formando, mormente no Poder

Legislativo, a tendenciar a legalização da união entre homossexuais. Desta

forma, enorme evolução veio com a discussão do projeto de lei de autoria da ex­

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Prefeita de São Paulo Marta Suplicy, que tramita no Congresso Nacional para

regulamentar a união entre seres humanos do mesmo sexo.

Tal fato, se acontecer, ditará o curso das tímidas ações judiciais a

respeito. Tal como aconteceu com a Lei nº 5.478/68 (Lei de Alimentos) que, à

época, veio dirimir dúvida e controvérsia à sua incidência, facilitando o trabalho

dos aplicadores do Direito.

A “família” no mundo moderno contemporâneo teve seu significado

ampliado, não obstante, com limites definidos pelo amor e pelo respeito.

Ao se estabelecer direito e deveres, o Estado está limitando,

esclarecendo e resguardando as possibilidades e necessidades do ser humano.

Assim, conforme já determinou a Constituição Federal, em seu artigo

226, a “família” é a base da sociedade, portanto, recebe a proteção especial do

Estado porque é dela que se irradiam vida e experiência às pessoas

componentes, preparando­as para o cumprimento de suas funções junto à

sociedade. É certo que a “família” tem o papel de moldar o caráter e o

temperamento do indivíduo, aperfeiçoando sua personalidade, determinando os

conceitos de moralidade e honestidade. 1

O indivíduo demonstra em sociedade muito daquilo que aprendeu com

seus pais e familiares e é por esta razão que o Estado dispende atenção especial

aos laços familiares concretos e afetivos criados entre pais e filhos, desde o

nascimento. 2

O Estado deve voltar atenção especial à elaboração de dispositivos

legais que visem proteger a “família” como a célula mais importante da

sociedade, mediante a edição de legislação própria, instituição de órgãos e

entidades de amparo, assistência e proteção à “família”, criação de mecanismos

1 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=527. Acesso em 14 agosto de 2006. 2 Idem.

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próprios de atendimentos, auxílio, orientação ou defesa dos integrantes do

circuito familiar, como instrumentos de preservação da “família”.

Esta atenção especial do Estado voltada para a proteção da “família”

visa a necessidade do fortalecimento das nações por meio do contato e

reprodução humanos dignos, permitindo­se às gerações vindouras um mínimo

de garantia quanto ao nascimento normal, à preservação da saúde, à defesa de

sua integridade, à educação enfim, a valores outros componentes da

personalidade humana. 3

É neste sentido que o artigo 1ª da Constituição Federal, em seu inciso

III estabelece como um dos princípios constitucionais basilares a dignidade da

pessoa humana.

Segundo Pontes de Miranda:

As “famílias” formam as pessoas para integrarem a sociedade. Neste sentido, melhor serão os indivíduos que formam a nação e convivem na sociedade quanto maior for a estruturação que possuírem suas “ famílias” . 4

É certo que não é conveniente ao Estado que as “famílias” sejam

desmanteladas e os filhos fiquem a mercê da proteção estatal, uma vez que isto,

além de gerar maiores despesas ao erário público, restará a incerteza sobre o

caráter deste indivíduo excluído do convívio de seus familiares.

1.1 Do Novo Dir eito de “Família”

Uma questão que costumeiramente ocorre é saber se existe algo de

novo no Direito de “Família”. Nesse sentido, se for tomado o Brasil como

3 LÔBO. Paulo Luiz Netto. Op. cit., disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=527. Acesso em 14 agosto de 2006. 4 MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito de família. V. 3, p. 23

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referência, levando em consideração as raízes latinas brasileiras e também o

atual estágio da sociedade nacional, pode­se dizer que a resposta é afirmativa. É

questão incontroversa é a notória modificação ocorrida nos últimos tempos nos

seios familiares e também na estrutura da sociedade brasileira.

Nos dias atuais, não se tem mais amparo para a figura prepotente do

pater familia; o casamento é dissolúvel via divórcio sem que isso implique em

um declínio social para a mulher; as uniões concubinatárias começam a receber

amparo legal; a proteção à infância e à adolescência agora é colocada como um

dever social, o que inclui não só a “família”, mas também o Estado, a

comunidade e a sociedade em geral; as relações entre pessoas do mesmo sexo

são alvo de discussão com fito regulamentador, em favor do fato e contra a

hipocrisia. 5

As “famílias”, apesar da incongruência entre a próxima afirmação e as

anteriores, não mudaram muito. As mudanças normativas, pela sua característica

erga omnes, a todos contemplam, mas nas relações domésticas a diferenciação

de gênero e os papéis sociais assumem outras conotações. A coabitação

mantém­se como o modo mais freqüente de formação de “famílias”, embora a

incompatibilidade de gênios, que se acentua pela convivência, seja um dos

motivos mais recorrentes das separações.

Na verdade, as “famílias”, por razões conjunturais, reproduzem os

modelos possíveis de socialidade, por vezes fechando os olhos ou simplesmente

não percebendo a sedução do desejo que freqüentemente mora na “contramão”.

Os que trabalham com populações carentes sabem que as “famílias”

matrifocais são, principalmente, fruto de uma contingência estrutural, e não uma

reviravolta econômico­social. Por outro lado, as pendências mais difíceis de

5 DIAS, Berenice. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de família e o novo Código Civil. 1ª ed. Belo Horizonte; Del Rey, 2002.

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transpor nos casos de separação, independente da classe social, ainda são de

natureza patrimonial.

Da mesma forma, apesar de ter crescido o número de filhos sob a

guarda paterna, isso ainda é uma questão polêmica entre os operadores do

Direito. Por um lado podemos notar um certo crescimento nas decisões judiciais

quanto à concessão de guarda ao cônjuge ou companheiro varão, mas nas peças

processuais e salas de audiência ainda é afinado o coro dos que defendem que a

prole ficará mais bem assistida sob a guarda da mãe.

Nesse sentido, pode­se afirmar que existe algo de novo no Direito de

“família” “sim”. Merecendo destaque a vontade de adaptar os institutos jurídicos

à realidade social e aos imperativos de uma ética que se deseja ­ sob os auspícios

da ONU ­ seja planetária. Mas as “famílias” não permaneceram imutáveis, pois

ainda guardam uma série de resquícios culturais vinculados a tradições que

antecedem aos atuais modelos legais. 6

Após a adoção do Divórcio no Brasil, virou­se uma página de

preconceito e injustiça social. Sob o ângulo moral a sociedade majoritariamente

absorveu o novo instituto como fruto dos novos tempos. Considera­se que o

Estado, via aparelho jurídico, institucionalizava uma nova ordem familiar sob a

pressão social e com isso mantinha­se o império da regulamentação do desejo. 7

É certo que ainda existem muitos problemas jurídicos familiaristas a

serem analisados e institucionalizados. Destaca­se, para esta discussão, três que

têm se mantido entre a polêmica e a efetividade:

• o concubinato;

• as uniões homossexuais; e

• o aborto.

6 MIRANDA, Pontes de. Op. cit., p.32. 7 Idem, p. 34.

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O peso da tradição no Direito de “família” não conseguiu manter por

mais tempo a situação ridícula do desreconhecimento do concubinato e seus

efeitos. A Constituição de 1988 ao absorver a união estável como geradora de

“famílias” e merecedora da proteção do Estado, deu um basta na hipocrisia

reinante na Emenda Constitucional nº 01, de 1969, que só reconhecia como

“família” a instituição gerada a partir do casamento.

A questão mais polêmica acerca dessas relações afetivas parece dizer

respeito ao aspecto patrimonial. A configuração da relação como sociedade de

fato ou união estável tem sido o ponto nodal, quer para os teóricos, quer para os

julgadores. Considera­se que o aperfeiçoamento do entendimento sobre os

efeitos da união estável passa pela reformulação das legislações que tratam do

assunto (Leis nº 8.971/94 e nº 9.278/96), posto que a manutenção destas têm

contribuído para a instalação de uma série de equívocos interpretativos; o que

compromete a eficácia do Direito.

O passo mais importante com relação a essa temática somente dar­se­á

com o desenvolvimento da consciência coletiva no rumo da absorção da união

estável como uma opção legal e digna de familiaridade.

A união entre pessoas do mesmo sexo esbarra num preconceito muito

mais acentuado do que com relação à união estável. Esta questão reside

referências das mais diversas ordens e, inclusive, problemas de ordem

psicossocial, tendo em vista que legislar sobre esta matéria tende a expor a

libido das pessoas.

O Brasil teve uma oportunidade recente de legalizar a situação de

muitos homossexuais que mantém compromissos afetivo­patrimoniais entre si,

por meio do Projeto de Lei, de autoria da então Deputada Marta Suplicy e ex­

Prefeita da cidade de São Paulo, que tratava do “Contrato de Parceria Civil entre

pessoas do mesmo sexo”. Contudo, a polêmica em torno da questão não

permitiu que o projeto fosse votado, mas, um dado interessante se coloca diante

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do problema: enquete feita pelo programa televisivo, Fantástico, da Rede Globo,

colheu uma pequena, mas simbolicamente significativa maioria de votos entre

os telespectadores de todo o Brasil, a favor desta regulamentação, o que já

significa grande avanço na sociedade brasileira. 8

A regulamentação das relações homossexuais encontrará guarida no

Brasil no momento em que a questão passar a ser tratada em um número mais

significativo de países, principalmente por parte daqueles que encabeçam a

pirâmide da economia mundial. Isso se deve ao fato de que a polêmica que

envolve a questão torna cômodo ao cidadão, anonimamente, manifestar­se

favorável à regulamentação, mas tem embaraçado políticos das mais diversas

cores partidárias. 9

Por outro lado, o aborto traz um elemento novo em relação às duas

outras questões, já que é uma conduta criminalizada.

Embora afeto à familiaridade o aborto inclui particularidades que vão,

por exemplo, da Sociologia à Filosofia, da Medicina à Psicanálise, da História

ao Direito. Sem falar que a questão também traz ingredientes que envolvem a

religião e a ética. Por outro lado, internacionalmente a questão esquenta embates

de posições antagônicas entre si, chegando a ser legal em alguns estados de um

país e ilegal noutros. 10

A maioria dos brasileiros é favorável à manutenção das hipóteses

previstas na legislação penal para a questão do aborto, socialmente extensivo aos

que não podem custear a intervenção, pelo Sistema Único de Saúde, pois essa é

uma forma de universalizar o acesso a serviços médicos legais, o que, em tese,

protege a vida da mãe e oferece meios para o Estado controlar o cumprimento da

Lei.

8 Rede Globo de Televisão: Programa Fantástico – Contrato de parceira civil entre pessoas do mesmo sexo. Exibido em __ de junho de 2005. 9 A origem da família. Disponível em http://www.moreira.pro.br/textose37.htm. Acesso em 02 de junho de 2006. 10 Idem.

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Diante dos avanços da medicina, há os que defendem que a

intervenção também pode acontecer nos casos em que é patente a

impossibilidade de sobrevida do feto, como no caso de diagnóstico de

anencefalia.

Como o objeto é extremamente rico, considera­se inoportuno

continuar a discorrer sobre ele sem a chance de poder aprofundar esta

manifestação, já que é lateral ao tema dessa discussão.

Assim, é possível se afirmar que houve sensível mudança tanto do

Direito de “família” Brasileiro, bem como na sociedade brasileira, aspectos

esses que os brasileiros ainda não puderam classificar como bons ou ruins.

1.2 Das Alterações e o Novo Código Civil

O Código Civil de 2002 foi encaminhado à Câmara dos Deputados em

1975, sob o número 634­B. É de autoria de uma comissão regida pelo Professor

Miguel Reale e integrada pelos juristas José Carlos Moreira Alves, Agostinho de

Arruda Alvim, Sylvio Marcondes, Ebert Chamoun, Clóvis de Couto e Silva e

Torquato Castro. Tornou­se Projeto de Lei da Câmara (PLC) sob o número

118/84 e tramitou no Senado Federal desde 1984, tendo como relator o então

Senador Josaphat Marinho (PFL­BA).

Tem 2.073 artigos em nove livros. Os três livros da Parte Geral são:

das pessoas, dos bens e dos fatos jurídicos. A Parte Especial tem cinco livros: do

direito das obrigações, do direito de empresa, do direito das coisas, do direito de

“família” e do direito das sucessões. Um último livro, chamado complementar,

trata das disposições finais e transitórias.

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O principal ponto positivo do novo Código é que ele consagra as

inovações trazidas pela Constituição Federal de 1988, as quais não

recepcionaram alguns dispositivos do Código de 1916.

Com o Código Civil de 2002, a atualização, frente ao texto

constitucional, só foi possível graças ao ilustre e saudoso Senador Nélson

Carneiro, responsável por diversas emendas em matéria de Direito de

“Família” 11 . O ilustre jurista Miguel Reale apresentou as principais inovações do

Projeto, tais como: consagração da igualdade absoluta dos cônjuges;

consagração da igualdade absoluta dos filhos fossem eles considerados pela Lei

antiga legítimos, naturais, adulterinos, incestuosos ou adotivos; reconhecimento

da união estável como entidade familiar, ficando assegurados direitos recíprocos

aos companheiros.

O artigo 1.511 do Código Civil, em atendimento aos artigos 5º, I, e

226, § 5º, da Carta Magna, assevera: “o casamento estabelece comunhão plena

de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges”.

No dispositivo acima, verificamos que a legislação avança ao igualar

os cônjuges e caracterizar o casamento como “comunhão plena de vida” , e

avançou ao igualar os direitos e deveres dos cônjuges.

Sobre casamento, em resposta ao artigo 226, § 2º, da Constituição, o

artigo 1.512 do Código Civil estabelece:

O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do civil, equipara­se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração.

O Código Civil diferencia casamento (é o ato civil) e matrimônio (ato

religioso).

11 REALE, Miguel. O Direito de Família no Projeto de Código Civil: à frente da Constituição de 1988. Disponível em http://www.jus2.uol.com.br/texto.asp?id=511. Acesso em 10 de abril de 2006.

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Em atendimento à igualdade absoluta entre os cônjuges é que decorre

uma outra alteração, consubstanciada no artigo 1.556: “o marido não poderá

anular o casamento alegando o fato de ter descoberto que a esposa não era

virgem”. Essa alteração estava mais do que na hora de ser aprovada, visto o

retrocesso jurídico que implicava, tendo em vista que o artigo 219, IV, do

Código Civil de 1916, (anulação do casamento por erro essencial, quando o

marido ignora o defloramento da mulher) não foi recepcionado pela Lei Maior.

Ainda em consonância com o princípio da igualdade, há a

possibilidade do homem adotar o sobrenome da mulher depois do casamento e

de casar­se com 16 anos (agora sem autorização prévia). Esta última alteração

decorre, também, da redução da maioridade para 18 anos.

O pátrio poder passa a ser chamado de poder familiar, tendo em vista

que o seu exercício é de igual atribuição do marido e da mulher em relação aos

filhos menores.

A isonomia no tratamento dos filhos também decorre de princípio

constitucional (artigo 226, § 6º).

Da mesma forma, consagra a união estável como entidade familiar

(artigos 226, § 3º, e 1.723 do Código Civil). Destarte, distingue concubinato de

união estável. Nesse contexto, como a convivência pública, contínua e

duradoura de um homem com uma mulher, vivendo ou não sob o mesmo teto,

sem vínculo matrimonial, estabelecida com o objetivo de constituir “família”

desde que tenha condições de ser convertida em casamento. Já o concubinato é

caracterizado como uma relação adulterina, sem efeitos para qualquer dos

conviventes, efeitos estes que só podem decorrer da união estável, como o

direito à herança. 12

12 REALE, Miguel. Op. cit., disponível em http://www.jus2.uol.com.br/texto.asp?id=511. Acesso em 10 de abril de 2006.

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Assim dispõe o artigo 1.727: “As relações não eventuais entre o

homem e a mulher, impedidos de casar, constituem o concubinato”.

Outras mudanças ainda podem ser apontadas, como, por exemplo, o

cônjuge adúltero não ser mais impedido legalmente de constituir novo

casamento por conta do adultério (foi suprimido o artigo 183, VII, do Código

Civil de 1916). O Código Civil poderia ir além, já que manteve a postura

conservadora ao definir como causa para perda da guarda dos filhos na

separação judicial o adultério.

Quanto à adoção, passou a ser para a pessoa maior de 18 anos, o

adotante há de ser pelo menos mais velho que o adotado. O desejo do eminente

Orlando Gomes em ver a irrevogabilidade do regime de bens derrogada foi

atendido no artigo 1.639, § 2º:

É admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.

Entretanto, o regime legal continua sendo o da comunhão parcial.

Nele, por força do artigo 1.662 do Código Civil, há uma presunção de que os

bens imóveis foram adquiridos na constância do casamento quando não se pode

provar que o foram em data anterior.

Apesar das boas novas, na sua maioria, o Código Civil não estabelece

grandes mudanças. Em verdade, conforme opinião do próprio Miguel Reale à

época da elaboração, a intenção do Projeto era manter as premissas do Código

de 1916. No máximo, o Código Civil de 2002 consolida várias legislações

adotadas ao longo dos anos e os princípios consagrados na Constituição de

1988.

Em verdade, talvez seja o projeto de lei que ficou mais tempo em

tramitação. O que traduz o pensamento social de quase trinta anos atrás, em

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muito distante e inadequado às velozes mudanças por que experimentamos.

Assim, persiste em manter vícios e defeitos detectados no Código o qual não

mais tendia às aspirações sociais contemporâneas.

O novo Código avançou em alguns pontos em relação ao Código de

1916, como reconhecimento da união estável como entidade familiar. Passou a

admitir o direito de “família” para aqueles que possuem um chefe atendendo aos

anseios do art. 226, § 4º, da Carta Magna.

Gustavo Tepedino enfatiza que:

O Código Civil manteve os quatro personagens básicos que marcaram presença na legislação de 1916 (o marido, o proprietário, o contratante e o testador), apenas acrescentando­ lhes o empresário. 13

Conforme entendimento de Cristiano Chaves de Farias:

O novo Código Civil, portanto, não atende a princípios constitucionais, precipuamente o da dignidade humana, mantendo uma visão formada a partir de elementos sócio­ culturais prevalecentes há 30 anos, sem atualizar o texto codificado às necessidades do presente momento histórico, marcado pela diversidade e pluralismo, corolários da globalização. 14

É um Código que já nasceu velho, defasado, sem criar o novo que

tanto se pretende. Omite­se ao não contemplar técnicas de reprodução, como a

fertilização in vitro, a inseminação artificial e até mesmo a clonagem.

Não regulamenta, em nenhum momento, a união civil entre

homossexuais, o que já é matéria do Projeto de Lei nº 1.151/95.

13 TEPEDINO, Gustavo. Premissas Metodológicas para Constitucionalização do Direito Civil, p. 438. 14 FARIAS, Cristiano Chaves de. Achegas para (além da) reforma do Código Civil. Disponível em http://www.jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2019. Acesso em 03 de abril de 2006.

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Miguel Reale apregoa que “é a própria Constituição que restringe a

união estável entre o homem e a mulher. Assim sendo, sem reforma da

Constituição não poderá ser atendida a pretensão dos homossexuais (...)”. 15

Ocorre que a Constituição, em nenhum momento, proíbe a união civil

entre pessoas do mesmo sexo, apenas rechaça a união estável disciplinada pelas

leis extravagantes. Por conseqüência, era possível (e necessário) que o “novo”

Código trouxesse um capítulo destinado a tal matéria.

15 REALE, Miguel Op. cit., disponível em http://www.jus2.uol.com.br/texto.asp?id=511. Acesso em 10 de abril de 2006.

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CAP ÍTULO I I

FILIAÇÃO E SEUS ASPECTOS

Não é raro presenciar situações onde o constrangimento toma conta de

muitas pessoas quando são questionadas “pelo nome do pai” e só podem

responder: “não tenho!”.

Além de ser absolutamente impossível, é inadmissível. Toda pessoa

tem como resultado de sua vida a conjunção carnal entre o homem, seu pai, e a

mulher, sua mãe. Nesse sentido, em que pese desconhecido, todas as pessoas

têm um pai, e esse direito lhe é “assistido” e “assegurado”.

Em 29/12/92 foi promulgada a Lei nº 8.560, reconhecida como a

“Nova Lei de Investigação de Paternidade”. Numa tentativa de prevenir lacuna,

ao menos em parte, ou fazer, quem sabe, com que toda pessoa “tenha pai”. Ela

determina pelo artigo segundo que:

Todo registro de nascimento com apenas a maternidade estabelecida, deverá ser levado ao conhecimento do Juiz, pelo Oficial, mediante remessa do inteiro teor da certidão respectiva. Com esta, a qualificação completa e o endereço do que é denominado ‘suposto pai’, mesmo que seja casado.

Sucede em grande parte dos casos, entretanto, que no espaço

destinado a tal informação, vem um seco: IGNORADO.

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Segundo relatos de Marlusse Pestana Daher 16 , na oitiva da mãe em

juízo, acaba­se, quase invariavelmente, obtendo o nome do “suposto pai” que ela

não quis ou não pode inicialmente declinar, por qualquer motivo. Às vezes até,

por não querer um tal pai para seu filho, ou por preferir que ele seja só seu.

Conhecido o nome, notifica­se o citado senhor para que se manifeste.

Ele comparece e ocorre: desde a impossibilidade absoluta de negar, em face das

evidências e consequentemente o reconhecimento de plano, do filho, à negativa

formal, com insegurança muitas vezes, até à recusa só por temor de ter um

casamento desfeito. Enfim, são as mais diversas as reações ou os resultados.

No caso de ser superada sem êxito esta fase, denominada de

“averiguação oficiosa” e “havendo elementos suficientes”, os autos são

remetidos ao Ministério Público que na condição de autor, propõe a

Investigatória de Paternidade.

Procede­se então, desta feita, à citação do “suposto pai”, que contesta

logicamente, continuando a negar que o filho é seu. Vem em seguida, a fase da

instrução que consistirá na prova pericial representada pelo chamado “exame do

sangue” quando o problema se agiganta e pela oitiva das testemunhas.

O exame que está ao alcance dos economicamente desprovidos é o

“A.B.O.” (sangue tipo A, B, ou Zero ou Universal). O resultado dele, entretanto,

é apenas de que, em face do tipo sangüíneo, F. pode ser filho(a) de N.. Pela sua

singeleza, este exame vem sendo contestadíssimo, de forma que, se com o

depoimento pessoal do requerido, ele não acabar se contradizendo, e com a

prova testemunhal, não se obtiverem informações tais, quase inquestionáveis,

estar­se­á perdendo tempo.

16 DAHER, Marlusse Pestana. Investigação de Paternidade. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=535. Acesso em 10 de maio de 2006.

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Todos os caminhos, no entanto, podem ser considerados percorridos

com a semelhança fisionômica que se pode encarregar de fazer toda a prova

sozinha.

Nos últimos anos, com a descoberta dos cientistas das técnicas que

utilizam o DNA como marcador da individualidade biológica, têm tornado

possível excluir ou admitir a paternidade ou a maternidade, em 100% dos casos.

Surgiu assim a rainha das provas e o terror dos que temem o confronto com a

verdade. Com elas, a Investigação de Paternidade passou a ser uma ação com

resultado certo, positivo ou negativo, mas de fato, inquestionável.

Os laboratórios especializados nesse processo, no Brasil, se têm

revelado ociosos da grandeza de sua tarefa e mantêm como ponto de honra,

assegurar às partes que não haverá interferência externa, como a possibilidade

de extravio ou troca de material, bem como, o sigilo e proteção das identidades

das partes e entre outras mais, até a possibilidade de os advogados das mesmas

acompanharem o processamento das análises.

Tendo em vista o alto custo deste exame, deixando uma grande

parcela da população, que necessita desse instrumento para solucionar

problemas quanto à identificação de paternidade, desejosos e impossibilitados de

realiza­lo, cabe ao Congresso Nacional, que votou uma lei para investigar a

paternidade, começar a pensar em outra solução que crie possibilidade e permita

a todos que precisarem, terem acesso a este grande meio.

Nas Comarcas, os Promotores enfrentam inúmeras dificuldades.

Somam­se a estas, o temor ­ ou poderia dizer má vontade ­ que as pessoas têm,

de testemunhar o relacionamento dos pais.

Não é simples desconhecer o próprio pai, ignorar quem ele seja.

Afinal de contas, pela sua natureza, a pessoa humana carece crescer e se

desenvolver na comunidade familiar da qual os pais são os componentes

essenciais, constituindo­se os filhos, em integrantes dela em todos os sentidos.

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Pela sua natureza ainda, a falta do pai gera e faz manter na criança, um

vazio enorme com reflexos inominados para o seu desenvolvimento. Este vazio

produzirá as conseqüências que dele decorrem. Por isto, é perigosa a forma com

que condenamos pura e simplesmente uma pessoa, em virtude do seu agir ou

reagir no dia­a­dia, no convívio social.

Considerada a importância do DNA, deseja­se que esteja bem

próximo o dia em que as Universidades serão dotadas dos meios indispensáveis

a realização dessas análises para que não faltem recursos e todos tenham acesso

a ele, mormente porque o DNA é um bem para todos, basta observar o número

excessivo de pessoas que conseguiram comprovar sua paternidade por meio

deste método.

Por este motivo, o exame do DNA, precisa estar ao alcance de todos

ou então o Brasil não será um país cuja Constituição estabelece que “todos são

iguais perante a lei, independente de sexo, credo, cor ou raça”

2.1 Do Pr incípio da Afetividade e suas Implicações

Este princípio da afetividade tem fundamento constitucional; não é

petição de princípio, nem fato exclusivamente sociológico ou psicológico. No

que respeita aos filhos, a evolução dos valores da civilização ocidental levou à

progressiva superação dos fatores de discriminação entre eles. Conforme ensina

Paulo Luiz Netto Lôbo: “projetou­se, no campo jurídico­constitucional, a

afirmação da natureza da ‘família’ como grupo social fundado essencialmente

nos laços de afetividade.” 17

17 LÔBO. Paulo Luiz Netto. Op. cit., disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=527. Acesso em 14 agosto de 2006.

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Encontra­se na Constituição Federal brasileira três fundamentos

essenciais do princípio da afetividade, constitutivos dessa aguda evolução social

da “família”, máxime durante as últimas décadas do Século XX:

a) todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem (artigo

227, § 6º);

b) a adoção, como escolha afetiva, alçou­se integralmente ao plano da

igualdade de direitos (artigo 227, §§ 5º e 6º);

c) a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes,

incluindo­se os adotivos, tem a mesma dignidade de “família”

constitucionalmente protegida (artigo 226, § 4º).

A Constituição não tutela apenas a “família” matrimonializada e não

estabelece mais distinção entre filhos biológicos e adotivos. As pessoas que se

unem em comunhão de afeto, não podendo ou não querendo ter filhos, é

“família” protegida pela Constituição.

A filiação biológica era nitidamente recortada entre filhos legítimos e

ilegítimos, a demonstrar que a origem genética nunca foi, rigorosamente, a

essência das relações familiares.

A igualdade entre filhos biológicos e adotivos implodiu o fundamento

da filiação na origem genética. A concepção de “família”, a partir de um único

pai ou mãe e seus filhos, elevam­os à mesma dignidade da “família”

matrimonializada 18 . O que há de comum nessa concepção plural de “família” e

filiação é a relação entre eles fundada no afeto.

O princípio da afetividade, assentado nesse tripé normativo,

especializa, no campo das relações familiares, o macroprincípio da dignidade da

18 É impressionante o número de famílias chefiadas por mulheres, no Brasil: 10 milhões, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE, de 1999.

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pessoa humana (artigo 1º, III, da Constituição Federal), que preside todas as

relações jurídicas e submete o ordenamento jurídico nacional.

A dignidade humana é aquilo que é essencialmente comum a todas as

pessoas, impondo­se um dever de respeito e intocabilidade, inclusive em face do

Poder Público.

Como princípio, ostenta densidade semântica reduzida, de modo a ser

preenchida com a mediação concretizadora de quem o deva aplicar. A mediação

não se compadece com juízos subjetivos de valor. O princípio é espécie do

gênero norma jurídica constitucional, que não fica a mercê da norma jurídica

infraconstitucional regulamentadora. Dele brotam efeitos imediatos e

determinantes, sendo ao menos de três espécies:

a) imposição permanente ao legislador, para que o densifique com os conteúdos prevalecentes em cada época, mediante normas infraconstitucionais (eficácia positiva); b) conformação fundamental das normas infraconstitucionais, que devem ser aplicadas e interpretadas a partir e segundo o princípio constitucional (eficácia positiva); c) compatibilização limitante das normas infraconstitucionais, que não podem com o princípio colidirem, sob pena de inconstitucionalidade ou de revogação (eficácia negativa). 19

Os juristas costumam dizer que os princípios constitucionais são

expressos ou tácitos. São tácitos quando emergem do sistema de normas e

valores constitucionais. O princípio da afetividade é fato jurídico­constitucional,

pois é espécie do princípio da dignidade humana emerge das normas acima

referidas, que o sistematizam. 20

19 CANOTILHO,Gomes. Direito Constitucional, Coimbra, ed. Almedina, 1993, 6ª edição, p. 183, refere­se a três tipos de eficácia mínima dos princípios constitucionais: a) vinculação do legislador; b) como diretivas materiais permanentes ao legislador, à Administração e à jurisdição; c) inconstitucionalidade das normas que os contrariarem. 20 Idem.

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Na “família” patriarcal, a cidadania plena concentrava­as na pessoa do

chefe, dotado de direitos que eram negados aos demais membros, a mulher e os

filhos, cuja dignidade humana não podia ser a mesma 21 .

O espaço privado familiar estava vedado à intervenção pública,

tolerando­se a subjugação e os abusos contra os mais fracos. No estágio atual, o

equilíbrio do privado e do público é matrizado exatamente na garantia do pleno

desenvolvimento da dignidade das pessoas humanas que integram a comunidade

familiar, ainda tão duramente violada na realidade social, máxime com relação

aos filhos.

Concretizar esse princípio é um desafio imenso, ante a cultura secular

e resistente. No que respeita à dignidade da pessoa da criança, o artigo 227 da

Constituição expressa essa viragem, configurando seu específico bill of rigths,

ao estabelecer que é dever da “família” assegurar­lhe “com absoluta prioridade,

o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à

profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à

convivência familiar e comunitária” , além de colocá­la “à salvo de toda forma

de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Não é apenas um direito oponível ao Estado, à sociedade ou a

estranhos, mas principalmente a cada membro da própria “família”. É uma

espetacular mudança de paradigmas.

Assim, impõe­se a distinção entre origem biológica e

paternidade/maternidade. Em outros termos, a filiação não é um determinismo

biológico, ainda que seja da natureza humana o impulso à procriação. Na

maioria dos casos, a filiação deriva­se da relação biológica; todavia, ela emerge

da construção cultural e afetiva permanente, que se faz na convivência e na

responsabilidade.

21 Constitucionalização do Direito Civil, Revista de Informação Legislativa, Brasília, nº 138: 99 109, abr./jun. 2002.

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É necessário se distinguir o direito de personalidade ao conhecimento

da origem genética, com esta dimensão, e o direito à filiação e à

paternidade/maternidade, nem sempre genético.

O afeto não é fruto da biologia. Os laços de afeto e de solidariedade

derivam da convivência e não do sangue. A história do direito à filiação

confunde­se com o destino do patrimônio familiar, visceralmente ligado à

consangüinidade legítima. Assim, é a história da lenta emancipação dos filhos,

da redução progressiva das desigualdades e da redução do quantum despótico,

na medida da redução da patrimonialização dessas relações.

Cabe aos juristas, principalmente aos que lidam com o direito de

“família”, o desafio de descobrir a capacidade de ver as pessoas em toda sua

dimensão ontológica, a ela subordinando as considerações de caráter biológico

ou patrimonial. Impõe­se a materialização dos sujeitos de direitos, que são mais

que apenas titulares de bens. A restauração da primazia da pessoa humana, nas

relações civis, é a condição primeira de adequação do direito à realidade e aos

fundamentos constitucionais.

A “família” recuperou a função que, por certo, esteve nas suas origens

mais remotas: “a de grupo unido por desejos e laços afetivos, em comunhão de

vida”. O princípio jurídico da afetividade faz despontar a igualdade entre irmãos

biológicos e adotivos e o respeito a seus direitos fundamentais, além do forte

sentimento de solidariedade recíproca, que não pode ser perturbada pelo

prevalecimento de interesses patrimoniais. É o salto, à frente, da pessoa humana

nas relações familiares. Estas relações e o desenvolvimento científico tende­se a

encontrar a harmonização entre o direito de personalidade ao conhecimento da

origem genética, até como necessidade de concretização do direito à saúde e

prevenção de doenças, e o direito à relação de parentesco, fundado no princípio

jurídico da afetividade.

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2.2 Da Filiação

Maria Helena Diniz conceitua filiação da seguinte forma:

Filiação é o vínculo existente entre pais e filhos; vem a ser a relação de parentesco consangüíneo em linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e aqueles que lhe deram a vida 22 .

É certo que a vida de uma criança não pode ser gerada apenas por

meio de uma relação sexual, pode também advir de uma inseminação artificial

homóloga ou heteróloga (Código Civil, artigo 1.597, inciso III), esta última

desde que com a autorização do marido (Código Civil, artigo 1.597, inciso IV);

ou mesmo com a fertilização in vitro ou na proveta (Código Civil, artigo 1.597).

Hoje ainda fala­se muito em clonagem humana. Contudo, o novo

Código Civil, dentre ainda das inúmeras falhas que possui, não tratou do

assunto. No caso da fertilização in vitro, dúvidas surgiram com relação ao

momento em que a vida legal do ser gerado começa. Para o Código Civil, artigo

2º, 2ª parte, o início legal da personalidade jurídica é o da penetração do

espermatozóide no óvulo, muito embora este processo possa ocorrer fora do

corpo da mulher, já que se põem a salvo, desde a concepção, os direito do

nascituro. Mas sobre os aspectos jurídicos da filiação na inseminação artificial

serão melhores discutidos abaixo. O parentesco, dada à proximidade de grau,

gera vários efeitos no campo do Direito, daí as legislações darem tamanha

importância ao tema.

Antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, artigo 227, §

6º, e da vigência das Leis nº 8.069/90 e 8.560/92 havia distinção entre filiação

legítima e ilegítima, o que será aqui discutido apenas por questões didáticas.

22 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 372.

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2.3 Da Filiação Matr imonial ou Legítima

A filiação matrimonial ou legítima é aquela gerada na constância do

casamento, ainda que o casamento seja nulo ou mesmo anulado, se contraído de

boa­fé (Código Civil/2002, artigos 1.561 a 1.617). Nesse sentido, observa­se que

o casamento dos genitores deve ser anterior não só ao nascimento, mas também

preceder a própria concepção.

Eram chamados de legítimos os filhos apenas os concebidos na

vigência do casamento válido, anulável ou nulo. O artigo 217 do Código Civil

de 1916 previa que a anulação do casamento não obsta ao reconhecimento da

legitimidade dos filhos concebidos e havidos na sua constância. Ademais, os

casamentos putativos geram seus efeitos até a sentença definitiva que os

declaram nulos, devendo então os filhos havidos neste ínterim serem

considerados legítimos. Não obstante, pode ocorrer de o filho ter sido concebido

antes do casamento e nascido durante a sua vigência. Nestes casos a filiação não

deixa de ser legítima.

Assim, presumem­se concebidos na constância do matrimônio os

filhos nascidos até 180 dias após o estabelecimento da convivência conjugal ou

dentro de 300 dias após a dissolução da sociedade conjugal (Código Civil/2002,

artigo 1.597, incisos I e II).

O nosso Código Civil/2002 estabelece em seu artigo 1.597 e com base

em conhecimentos científicos que os filhos nascidos 180 dias, pelo menos,

depois de estabelecida à convivência conjugal e não no dia da celebração do ato

nupcial, porque há casos de casamento por procuração 23 . Desta forma, se a

criança nascer até 06 meses após o casamento presume­se ser filha do casal, mas

23 MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito de família. v. 3 id. Tratado de direito privado. v. 6. § 123.

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se veio ao mundo antes mesmo deste prazo, não se opera esta presunção.

Contudo, se a criança nascer antes deste prazo, somente o pai tem o direito de

elidir a paternidade, e somente ele, não sendo dada a legitimidade a mais

ninguém (Código Civil/2002, artigo 1.601).

Pelo regime adotado pelo Código anterior, esse direito de contestar a

filiação nascida antes do prazo de 180 dias anteriores à convivência, não era

imprescritível, pois se o filho nascesse antes deste prazo, ao marido não era dada

a possibilidade de contestar a filiação se:

a) antes de se casar, tinha ciência da gravidez da mulher, caso em que

há presunção de que, implicitamente, admitia que o filho era seu ou que

desejava assumir a sua paternidade por altruísmo, mesmo que não fosse

responsável por ela, para poupar sua consorte, salvando­lhe a honra.

b) assistiu pessoalmente, ou por procurador, à lavratura do termo de

nascimento do filho, sem contestar a paternidade. Nesse sentido, se deixasse que

o recém­nascido fosse levado a registro com indicação de seu nome, não poderia

alegar, mais tarde, sua ilegitimidade. Se quisesse contestar a paternidade deveria

comparecer em cartório, ordenando a abertura de termo de nascimento do filho,

acrescentando que se reservava o direito de propor, oportunamente, a ação

denegatória de paternidade.

Os filhos nascidos dentro de 300 dias subseqüentes à dissolução da

sociedade conjugal por morte, separação ou anulação do casamento, também são

presumidamente legítimos filhos do marido, uma vez que a gestação humana

não ultrapassa este prazo. Nesse sentido, o filho que nascer até 10 meses após a

dissolução do casal também é considerado matrimonial uma vez que a criança

pode ter sido gerada no último dia de convivência do casal. Mas se nasceu após

este prazo, não poderá ser considerado como legítimo.

Verifica­se então, que a lei determina quando começa e termina a

presunção de paternidade, levando­se em consideração a presunção de:

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coabitação e fidelidade da mulher e a de reconhecimento implícito e antecipado

da filiação feito pelo marido ao se casar. Assim, o filho será considerado

legítimo se concebido na constância do casamento e nascido já em seu término.

(Código Civil/2002, artigo 1.609, inciso I).

A filiação matrimonial é estabelecida apenas por presunção, pelo fato

de que é impossível se provar diretamente a paternidade sem a realização de

exames específicos. Desta forma é que estabelecem legítimos os filhos havidos

na constância do matrimônio. Contudo, esta presunção é relativa ou juris

tantum, admitindo prova em contrário limitadamente, mas com relação a terceiro

é absoluta, pois não é dado a ninguém contestar a filiação de alguém, uma vez

que a ação para este fim somente é possibilitada ao pai (Código Civil/2002,

artigo 1.601).

Esta presunção se estabeleceu pelo fato que era o que comumente

ocorria: quando duas pessoas são casadas, os filhos havidos normalmente eram

descentes dos nubentes. A razão marcante desta presunção era a de caráter

social, pois militava a favor da estabilidade e segurança da “família”, evitando

que se atribuísse prole adulterina à mulher casada e que se introduzisse,

desnecessariamente, na vida familiar, o receio da imputação da bastardia.

É certo que a Lei nº 8.560, de 29 de dezembro de 1992, admitindo que

a investigação de paternidade, mesmo adulterina, seja proposta contra o homem

casado, ou pelo filho da mulher casada contra o seu verdadeiro pai, de certo

limitou a presunção pater is.

2.3.1 Presunção legal da paternidade

A filiação matrimonial foi instituída pelos legisladores para os casos

em que resta impossível se aferir a paternidade por outros meios, portanto, para

estes casos, a legislação civil instituiu a presunção de paternidade.

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É o que estabelece o artigo 1.597 do Código Civil de 2002:

Presumem­se concebidos na constância do casamento os filhos: I – nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal; II – nascidos nos trezentos dias subseqüentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento; III – havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; IV – havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários; V – havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

Esta presunção é relativa ou juris tantum, admitindo prova em

contrário. Ademais, quando se trata de terceiros, esta presunção é absoluta.

Nesse sentido, a única pessoa que pode se opor a presunção é o pai, não cabendo

esta prerrogativa a mais ninguém. Isto é o que estabelece o artigo 1.601 do

Código Civil/2002: “Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade dos

filhos nascidos de sua mulher, sendo tal ação imprescritível.’’

Desta forma, a lei presume que os filhos havidos na constância do

casamento são do marido, até prova em contrário, que somente poderá ser

produzida por ele. Segundo estabelece o artigo 1.597 do Código Civil/2002

existe cinco (05) formas de se presumir a partenidade:

a) I ­ nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida

a convivência conjugal.

Neste caso, se a criança nasceu até seis meses após o casamento,

presumidamente a paternidade será aferida ao marido, caso contrário esta

presunção não se operará. Como já afirmado, caso a criança nasça antes do

prazo estipulado pela lei, somente o pai (marido) poderá contestar a filiação,

sendo este direito imprescritível.

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Pelo antigo Código Civil, este direito de questionar a paternidade de

filho nascido a até 180 dias após o casamento era prescritível (artigo 339 do

antigo Código Civil), vistos anteriormente, em que se o marido deixasse que a

criança fosse registrada com a indicação de seu nome, sem nada contestar, não

poderia, mais tarde, alegar que ela não é seu filho. Pelo Código de 1916, caso

deseje contestar a paternidade é necessário comparecer em cartório, ordenando a

abertura do termo de nascimento do filho de sua mulher, ressalvando que, como

o nascimento se dera antes de 06 meses da convivência conjugal, o bebê não era

seu filho, acrescentando que se reserva o direito de propor, oportunamente, a

negatória de paternidade.

Nesse sentido, com a entrada em vigência do novo Código Civil, estas

considerações restam inócuas, visto que este direito de contestar a paternidade é

imprescritível.

b) II – nascidos nos trezentos dias subseqüentes à dissolução da

sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do

casamento.

Entende­se que o filho nascido até 10 meses após a ruptura da vida em

comum, é presumidamente considerado filho do marido, uma vez que pode ter

sido concebido no último dia da vida em comum. No entanto, se nasceu após

este prazo, após a morte do consorte, ou após a anulação do casamento ou

separação judicial, não se opera a presunção.

Ademais, esta presunção é aplicada mesmo se a mulher contrair novas

núpcias depois da dissolução da sociedade conjugal ou mesmo após a morte do

cônjuge.

c) III – havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que

falecido o marido.

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Cada pessoa tem a propriedade do material destacado de seu corpo.

Nesse sentido, para que haja a utilização de sêmen de um doador para a

realização da inseminação artificial, é necessário que exista o seu

consentimento. Além do mais, o doador deverá estar ciente do processo a que

será submetido. 24

Nos casos de inseminação artificial, a matéria ainda é escassa,

deixando muitas dúvidas.

d) IV – havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões

excedentários.

Os embriões excedentários são conseguidos pela junção do material

genético do marido e da mulher. Nesse procedimento, também se exige a

expressa anuência do casal e o total esclarecimento do procedimento a que se

submeterão, técnica de reprodução assistida in vitro.

e) V – havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha

prévia autorização do marido.

No registro civil não se pode falar em falsa inscrição, ante essa prévia

presunção legal de que a criança é filha do marido de sua mãe, mesmo que ele

tenha autorização àquela fertilização.

Existem casos em que a mulher se submete a uma inseminação

heteróloga não consentida, podendo haver causa justa para ensejo de separação

judicial por injúria grave, pois a paternidade forçada agride a integridade moral

e a honra do indivíduo.

A determinação estabelecida pelo artigo 1.597, inciso V, do Código

Civil/2002, visa a instaurar a vontade de procriar do pai, como meio de impedi­

lo a desconhecer a paternidade do filho voluntariamente assumido ao autorizar a

inseminação heteróloga de sua mulher. Nesses casos, a paternidade não terá

24 Resolução CFM nº II. 2.

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ligação genética, mas moral e afetiva. Seria imoral que o marido aceitasse a

inseminação artificial heteróloga de sua esposa e, após o nascimento da criança,

renegasse o filho. A legislação sempre tende a preservar os interesses do menor

envolvido, até mesmo em caso de desentendimento entre os pais. Caso contrário,

o filho nascido, por questões éticas do médico, terá uma paternidade incerta pelo

restante de sua vida, visto que não se poderá revelar o nome do suposto pai,

mesmo também porque ele jamais quis o filho, apenas doou seu sêmen para que

os casais com problemas de reprodução pudessem ter seus filhos.

Existem situações onde se caracteriza a vontade viciada do marido.

Nesses casos, mesmo viciada a vontade do pai, a criança nascida da inseminação

artificial heteróloga será seu filho, salvo se ficar comprovado que a criança

nasceu da infidelidade de sua mulher, conforme prescreve os artigos 1.600 e

1.602 do Código Civil/2002. No entanto, o adultério assim descoberto, é causa

de separação judicial litigiosa.

Nota­se que, se o marido, após o nascimento da criança e o seu

consentimento para que o procedimento se realizar, negar a paternidade, estará

agindo com deslealdade. Nesse sentido, a presunção estabelecida pelo artigo

1.597, inciso V, do Código Civil/2002, procurou dar segurança as relações

jurídicas advindas deste procedimento, em detrimento do compromisso

vinculante entre os cônjuges de assumir a paternidade e a maternidade, mesmo

com componente genético estranho, dando­se prevalência ao elemento

institucional e não ao biológico.

A lei civil pecou ao não considerar com requisito essencial do

consentimento do marido a forma escrita. Nesse sentido, facilmente a

autorização poderá ser negada. Como se nota, várias questões envolvendo as

novas formas de reprodução fogem do âmbito do direito civil, caindo no

chamado biodireito, bem como na esfera a ética e da moral, somente a postura a

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ser adotada pela sociedade desse novo milênio poderá melhor delimitar os

caminhos a serem seguidos pelo Judiciário na resolução dessas celeumas.

2.3.2 Prova de condição de filho

A filiação pode ser provada pelos seguintes modos:

a) pela certidão do termo do nascimento, inscrito no Registro Civil, de

acordo com o artigo 1.603 do Código Civil/2002 e artigos 50 e seguintes da Lei

nº 6.015/73.

É certo que a ninguém é facultado contrariar o que resulta desse

registro, salvo em caso de erro ou falsidade comprovada do instrumento (Código

Civil/2002, artigo 1.604).

Pode ocorrer, algumas vezes, que alguém declare o nascimento de

uma criança, filha do declarante e de sua esposa, quando não houve esse evento.

Barros Monteiro alerta para a seguinte situação:

Ante a falsidade, com alteração da verdade material das declarações, o próprio registrado, como qualquer pessoa interessada, pode anular referido registro, mediante processo contencioso previsto na Lei nº 6.015/73, artigo 113. 25

b) por qualquer modo admissível em direito, se o registro faltar,

porque os pais não o fizeram ou porque se perdeu o livro ou se o termo de

nascimento for defeituoso, como quando o filho é dado com nome diverso ou se

lhe atribui paternidade incógnita. 26

O Código Civil/2002 no artigo 1.605, incisos I e II, demonstra desde

que:

25 BARROS MONTEIRO, Washington de. Curso de direito civil – direito de família. 19ª ed. São Paulo, Saraiva, 1980, v. 2. 26 CHAVES, Antônio. Filiação legítima in Enciclopédia Saraiva de Direito. v. 37. p. 329.

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I) haja começo de prova escrita, proveniente dos pais, conjunta ou

separadamente, como cartas familiares, declaração formal, diários onde

registram que, em certa época, lhes nasceu um filho.

II) existam veementes presunções resultantes de fatos já certos. Para

bem esclarecer a questão, cumpre citar um exemplo de Orlando Gomes:

(...) se, em companhia de um casal, vive há muito tempo pessoa tida como filha, sabendo­se que houve casamento e que a mulher teve um filho, estribada na posse do estado de filho, a pessoa educada e criada pelo casal poderá vindicar em juízo o reconhecimento da legitimidade da filiação, se não se fez, oportunamente, no termo de nascimento, menção a este fato. 27

Nos Tribunais nacionais esta prova de filiação está sendo admitida,

com reserva, desde que façam presentes três elementos:

• o nomem, ou seja, que a pessoa traga o nome paterno;

• o tractatus, isto é, que a pessoa seja tratada na “família” como filha

legítima; e

• a fama, ou seja, que tenha sido constantemente reconhecida pelos

presumidos pais, pela “família” e pela sociedade como filha.

Nesses casos, havendo esses elementos, ter­se­á, presumidamente, a

filiação. Esta presunção é juris tantum. 28

A ação de prova da filiação é pessoal, pois compete ao filho, enquanto

viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz (Código

Civil/2002, artigo 1.606).

Será imprescritível se proposta pelo filho, e se, porventura, o filho

morrer, seus herdeiros poderão movê­la por terem interesse moral e material 29 .

Se a ação tiver sido iniciada pelo filho, poderão continuá­la os herdeiros, salvo

27 GOMES, Orlando. Direito de família. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 345. 28 BARROS MONTEIRO, Washington de. Op. cit., p. 243. 29 Idem

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se julgado extinto o processo (Código Civil/2002, artigo 1.606, parágrafo único).

E a sentença que declarar a paternidade deverá ser averbada no registro de

nascimento (Lei nº 6.015/73, artigo 29, § 1º, d).

A prova da condição de filho dá à pessoa a condição jurídica de obter

não só direito ao nome, à educação e à criação compatíveis com o nível social de

seus pais, à companhia dos genitores, à sucessão, na qualidade de descendente a

que o Código de 2002 (artigos 1.829, inciso I, e 1.845) outorga, em primeiro

lugar, a sucessão legítima, e aos alimentos (Código Civil/2002, artigo 1.696),

mas também aos direitos que decorrem do poder familiar (Código Civil/2002,

artigo 1.630) e da tutela. Por outro lado, incumbe­lhe o dever de prestar

obediência e respeito aos pais e os serviços próprios de sua idade e condição

(Código Civil/2002, artigo 1.634, inciso VII).

2.4 Da Filiação Não Matr imonial ou Ilegítima

A filiação não matrimonial, também conhecida como ilegítima é

aquela decorrente de união extramatrimoniais. Os filhos havidos dessas uniões

são classificados segundo Maria Cristina de Almeida da seguinte forma:

a) Naturais: se descenderem de pais entre os quais não havia

impedimento algum matrimonial no momento do nascimento;

b) Espúrios: se oriundos de união entre homem e mulher entre os

quais havia, por ocasião da concepção, impedimento matrimonial. Desta forma,

são considerados filhos espúrios:

I) os adulterinos: que nascem de casal impedido de se casar por

ocasião de casamento anterior, resultando de um adultério. O filho adulterino

pode resultar de duplo adultério, ou seja, quando o pai e a mãe forem casados;

ou ainda adulteridade unilateral, quando ou somente a mãe ou somente o pai for

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casado. Os filhos gerados de pais separados ou divorciados são considerados

filhos naturais.

II) os incestuosos: nascidos de homens ou mulheres que, ante o

parentesco natural, civil ou afim, não podiam convalidar núpcias à época da

concepção. 30

Hoje não há mais que se distinguir entre qualquer filho, diante da nova

Constituição, sendo vedada qualquer discriminação e assegurados direitos

iguais.

30 ALMEIDA, Maria Cristina de. Investigação do Direito Civil. V. I. 19ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 166.

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CAP ÍTULO I I I

NOVAS TÉCNICAS DE REPRODUÇÃO HUMANA E SUAS

IMPLICAÇÕES JURÍDICAS

Ao final do segundo milênio, está­se assistindo a uma série de

transformações políticas, econômicas, sociais e tecnológicas. Fatos até então

inconcebíveis, se analisado pelo prisma da mentalidade de dez, vinte ou trinta

anos atrás, hoje se descortinam cotidianamente com a maior naturalidade, como

se o impossível, o inimaginável se tornassem real como que num passe de

mágica.

Sem dúvida, os avanços tecnológicos foram os que mais

impressionaram neste final de milênio. Senão, vejamos:

Houve a descoberta de uma nova doença de proporções terríveis para

a humanidade, a AIDS, ao mesmo tempo em que há muitos avanços na busca da

cura desse mal. Por outro lado, a engenharia genética avançou a passos largos:

na década de 70, nasceu o primeiro bebê de proveta; logo depois,

desenvolveram­se as técnicas de inseminação animal, vegetal e humana, com a

possibilidade de melhoramento dos animais para o abate, de uma produtividade

maior na agricultura, resolvendo, em tese, o problema da fome mundial, e, o que

é considerado, para muitos, um avanço incalculável na área médica, devolveram

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aos casais estéreis ou com problemas reprodutivos a possibilidade de gerar

filhos. 31

Para culminar, o maior avanço na engenharia genética se deu na

Escócia, quando o cientista Ian Wilmut conseguiu clonar uma ovelha, ou seja,

de forma assexuada, reproduziu uma ovelha idêntica a uma outra usada como

modelo. 32

Realmente, é um admirável mundo novo que se abre para as novas e

futuras gerações. Quantas possibilidades não se descortinam para a humanidade?

Ao mesmo tempo, que mundo perigoso esse que se pode criar, se utilizadas

todas as técnicas à disposição, sem um mínimo de debate sobre a eticidade dos

resultados obtidos?

Certa vez, advertiu o Ministro da Justiça da Alemanha, Hans

Engelhard, em 1978, que “nem tudo que é cientificamente possível pode ser

autorizado”.

Inserido em todo este contexto já delineado, está o problema candente

das novas técnicas de inseminação artificial. Será possível, jurídica e eticamente,

correto se utilizar de todas as técnicas possíveis de inseminação artificial de que

a humanidade dispõe? Em caso de resposta negativa, quando elas deverão ser

autorizadas pelo Direito?

São perguntas difíceis de serem respondidas, mormente pelo fato de o

Brasil não possuir uma legislação específica sobre o tema, o que atesta o atraso

do nosso ordenamento jurídico em relação aos países mais desenvolvidos do

mundo, basta dizer que Espanha e Suécia, só para se ficar com dois exemplos, já

31 FERRAZ, Sérgio. Manipulações Biológicas e Princípios Constitucionais: Uma Introdução. Sérgio Antônio Fabris Editor, Porto Alegre, 1991, p. 17. 32 Idem.

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possuem leis específicas sobre a utilização das técnicas de reprodução

medicamente assistida. 33

Necessário, assim, focar os estudos nos princípios constitucionais

vigentes, pois são eles os únicos com possibilidade de dar respostas satisfatórias

às perplexidades que se apresentam quanto ao tema em exame.

Ao tratar da relação entre as manipulações biológicas e os princípios

constitucionais, Sérgio Ferraz afirma:

Em outras palavras, seja agora, enquanto não editada a pertinente normatividade, seja a partir de sua elaboração, e subseqüente vigência, o tema da manipulação genética tem de ser, a todo instante, calibrado à vista dos princípios constitucionais ­ única fórmula de assegurar a abertura das sendas do progresso, dentro dos marcos fundamentais livremente estabelecidos pela sociedade. 34

Para melhor estudo e compreensão do tema analisado, bem como para

situar a questão da filiação frente às novas tendências médicas, necessário tecer

breve análise sobre as novas formas de reprodução medicamente assistida e suas

implicações jurídicas.

3.1 Das Técnicas de Reprodução Medicamente Assistida

As tecnologias de reprodução medicamente assistida inserem­se no

contexto mais amplo dos cuidados relativos à infertilidade. Segundo a

Organização Mundial de Saúde (OMS), infertilidade é a ausência de concepção

depois de pelo menos dois anos de relações sexuais não protegidas.

33 Idem. 34 FERRAZ, Sérgio. Op. cit., p. 10.

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Segundo Léo Pessini:

Os fatores de infertilidade podem ser absolutos ou relativos, dando origem, respectivamente, à esterilidade ou à hipofertilidade. A primeira deriva de situações irreversíveis em que a concepção só será possível por meio de técnicas de reprodução medicamente assistida. Nas situações de hipofertilidade, como infertilidades de causa inexplicada, a concepção poderá ser conseguida, em alguns casos, por terapêuticas tradicionais. 35

As técnicas de reprodução medicamente assistida, também

denominadas de técnicas de inseminação artificial, classificam­se em dois

grandes gêneros: inseminação artificial homóloga ou simplesmente inseminação

homóloga e inseminação heteróloga. Diz­se que uma inseminação é homóloga

quando realizada com o sêmen do próprio marido, e heteróloga, quando feita em

mulher casada com sêmen originário de terceira pessoa ou, ainda, quando a

mulher não é casada. A inseminação artificial heteróloga somente é possível

com o consentimento do marido, se casada for a mulher. 36

Recorre­se à inseminação heteróloga quando a esterilidade é

indiscutível. Diversas são as causas de esterilidade masculina, mas as razões

mais freqüentes continuam sendo a ausência completa de espermatozóides

(azoospermia), ou quando a produção de espermatozóides é alterada

(azoospermia secretória). Como técnicas principais atualmente disponíveis

podemos destacar: inseminação artificial (IA), transferência intratubária de

gametas (GIFT), transferência intratubária de zigotos (ZIFT), fertilização in

vitro seguida de transferência de embriões (FIVETE). Pode­se, ainda, recorrer a

pessoas que carreguem o embrião, caso de impossibilidade física da mulher,

situação que ficou vulgarmente conhecida como “mães de aluguel”, mas que

preferimos denominar “mães de substituição”. 37

35 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas Atuais de Bioética. São Paulo: Edições Loyola, 1996, p. 215. 36 Idem. 37 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito: Aspectos Médicos, religiosos,

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Importante ressaltar que qualquer dessas técnicas pode ser utilizada

ora de forma homóloga, ora de forma heteróloga. O que vai definir como

homólogo ou heterólogo será a proveniência do material biológico utilizado.

3.1.1 Inseminação artificial

A inseminação artificial é o processo pelo qual se dá a transferência

mecânica de espermatozóides, previamente recolhidos e tratados, para o interior

do aparelho genital feminino.

A técnica de inseminação artificial é muito simples, consistindo

basicamente em obtenção dos espermatozóides, seja do marido, seja de terceira

pessoa, por meio da masturbação ou de massagens nas vesículas seminais.

Depois de vários processos de seleção dos espermatozóides, estes estão prontos

para ser implantados no corpo da mulher, por meio da simples colocação no

fundo do canal vaginal, podendo­se utilizar pílulas de espermatozóides,

inventadas pelo professor Milton Nakamura, da Universidade de São Paulo. A

mecânica mais simples, sem dúvida, supondo­se a sanidade dos gametas, seria a

coleta do sêmen com a imediata introdução no corpo da mulher, donde se falar

em auto­inseminação, possibilidade exitosa se a mulher estiver na época da

ovulação e não sofrer de nenhuma deficiência funcional ou orgânica. Essa

introdução pode ser feita usando­se cânulas ou seringas. Isso permite a

simplicidade da técnica e a ausência quase que total de riscos para a receptora 38 .

É possível, ainda, o congelamento do sêmen recolhido, quando este

não é automaticamente implantado no corpo da mulher. Pelas técnicas de

crioconservação (congelamento de gametas) existentes na atualidade, pode­se

manter o sêmen com suas características inalteradas por um período de até 20

psicológicos, éticos e jurídicos. Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1995, p. 32. 38 LAMADRID, Miguel Ángel Soto. Biogenética, filiación y delito: La fecundación artificial y la experimentación genética ante el derecho. Buenos Aires: Editorial Astrea, 1990, pp. 28 a 30.

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anos. Assim é que foi notícia em revista de grande circulação aqui no Brasil a

façanha de um hospital do estado americano da Califórnia, que conseguiu a

concepção de um gêmeo de um menino de sete anos de idade. Essa proeza que,

ao mesmo tempo, assusta, só foi possível graças ao congelamento de

espermatozóides 39 .

E, o congelamento de óvulos, técnica que parecia impossível, foi

noticiada em outubro de 1997, como o mais novo avanço na área de reprodução

artificial 40 .

O alongamento na discussão de técnica tão simples justifica­se, como

se verá adiante, pelo fato de que todos os outros métodos são derivados da

inseminação artificial.

3.1.2 Transferência intratubária de gametas

Ricardo Ash, médico argentino, idealizou a transferência intratubária

de gametas (GIFT, sua sigla em inglês), a qual consiste em captar os óvulos da

mulher por meio de laparoscopia, exame endoscópico da cavidade abdominal

por meio de uma pequena incisão na parede do abdome 41 , ao mesmo tempo que

se capta o esperma do marido. Na mesma operação, colocam­se ambos os

gametas em uma cânula especial, devidamente preparados, introduzindo­os em

cada uma das trompas de Falópio, lugar onde se produz naturalmente a

fertilização. Se tudo transcorrer normalmente, os espermatozóides penetram em

um ou mais óvulos, formando­se o embrião. Este descerá dentro das trompas até

o útero, de forma tal que a concepção se produzirá integralmente no corpo da

39 PASTORE, Karina. A Vida no Freezer. In Revista Veja, editora Abril, edição 1.535, ano 31, nº 8, 25 de fevereiro de 1998, p. 40. 40 PASTORE, Karina; FRANÇA, Valéria. Nova proveta: Técnica experimental permite gravidez depois da menopausa. In Revista Veja, editora Abril, edição 1.519, ano 30, nº 43, 29 de outubro de 1997, p. 68. 41 Laparoscopia. In KOOGAN/HOUAISS ­ Enciclopédia e Dicionário Ilustrado. Edições Delta, p. 948.

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mulher. O grande problema é a baixa porcentagem de êxito desta técnica,

figurando entre 35 a 40% 42 .

Outro problema, comum às técnicas que não se utilizam apenas de

métodos físicos, é a grande possibilidade de concepção de gêmeos. Isso se

explica pelo fato de, ao se utilizar esse método de reprodução artificial,

recolherem­se vários óvulos, para se garantir alguma margem de sucesso.

3.1.3 Transferência intratubária de zigotos

Por meio da transferência intratubária de zigotos (ZIFT, em inglês),

ambos os tipos de gametas são postos em contato, in vitro, em condições

apropriadas para a sua fusão. O zigoto ou zigotos resultantes são transferidos

para o interior das trompas uterinas. A grande diferença da ZIFT em relação à

GIFT é que, na primeira, a fecundação se realiza fora do corpo da mulher,

enquanto na segunda, o encontro do óvulo com o espermatozóide, formando o

embrião, ocorre nas trompas 43 .

Possui a ZIFT as mesmas restrições apresentadas pela GIFT, ou seja,

baixa porcentagem de êxito e sobra de vários zigotos não colocados no corpo da

mulher. Esses zigotos são conservados congelados até que o casal decida o que

fazer com ele, surgindo problema ético­jurídico de monta, que será analisado

mais a frente.

3.1.4 Fertilização in vitro seguida da transferência de embriões

A fertilização in vitro seguida da transferência de embriões, ou

simplesmente FIVETE (sigla em inglês), consiste na técnica segundo a qual o

42 LAMADRID, Miguel Ángel Soto. Op. cit., p.30. 43 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Op.cit., p. 218.

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zigoto ou zigotos continuam a ser incubados in vitro no mesmo meio em que

surgiram, até que se dê a sua segmentação. O embrião ou embriões resultantes

(estágio de 2 a 8 células) são, então, transferidos para o útero ou para as

trompas. É a fertilização em laboratório, conhecida como bebê de proveta.

Difere da ZIFT pelo fato da transferência ocorrer após a segmentação do zigoto,

quando este já é denominado de embrião. 44

3.1.5 Mães de substituição

Nesse breve esforço de caracterização de algumas práticas

concernentes à reprodução artificial, temos o que vulgarmente se chamou de

“mães de aluguel”, mas que se prefere, por razões a serem explicitadas mais a

frente, denominar de “mães de substituição”.

Convém ressaltar que não se trata de uma técnica biológica, mas sim

da utilização de mulheres férteis que se dispõem a carregar o embrião, durante o

período de gestação, pela impossibilidade física da mulher que recorreu aos

Centros de Reprodução de suportar o período gestacional. Essa prática tem tido

repercussões bastante negativas, muitas vezes, a mãe substituta se afeiçoa ao ser

que vai gerar, descumprindo a obrigação contratual de devolver o recém­nascido

à mulher que a contratou.

Nos países desenvolvidos, esse fato tem causado grandes discussões,

sendo na maior parte deles vedado o uso das mães de substituição. Tudo isso

será examinado quando forem tratadas as questões jurídico­constitucionais que

envolvem os métodos de reprodução artificial.

44 Idem.

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3.1.6 Problemas jurídicos decorrentes das novas técnicas de reprodução humana

Cumpre examinar algumas questões palpitantes sobre as novas

técnicas de reprodução humana.

É bem de ver que não se tem a pretensão de esgotar o tema tão vasto e

complexo, mesmo por que este trabalho não se presta a esse fim. A tarefa será

colocar alguns problemas, sempre balizados pelos princípios constitucionais,

mormente tendo em vista que a discussão é acerca das questões envolvendo a

investigação de paternidade.

Anteriormente, foi discorrido sobre os aspectos biológicos das

técnicas de reprodução humana. Este procedimento foi realizado com o objetivo

de aclarar algumas noções, para que não se repetissem posteriormente.

As grandes discussões que surgem na área das técnicas de reprodução

humana dizem respeito a uma questão básica e central: o congelamento do

material genético, para posterior implante no corpo da mulher. Questões

secundárias também surgem, como o problema das mães de substituição. Na

primeira parte, será tratada a questão do congelamento de embriões e

espermatozóides. E, no final, das mães de substituição.

Já foi dito anteriormente que as técnicas denominadas de GIFT, ZIFT

e FIVETE, se utilizam da técnica de congelamento, seja de embriões, seja de

material genético, seja de zigotos, para o posterior implante no corpo da mulher.

Por isso, surgem questões a saber: por quanto tempo se deve deixar esse material

congelado? O que fazer com o material congelado que não foi utilizado?

São questões de difícil resolução, examinadas agora no âmbito dos

princípios constitucionais, com o escopo de delinear as principais perplexidades

referentes ao tema. Sim, porque não se tem a pretensão de apresentar soluções

prontas e acabadas, até porque elas não existem. E não existem, pelo simples

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fato de que essa área da pesquisa humana está extremamente relacionada com as

visões de mundo, conceitos e preconceitos do sujeito que produz o

conhecimento.

Assim, é possível, para uma mesma questão sobre um tema da

preocupação bioética (manipulação genética, reprodução artificial, clonagem,

etc), serem apresentadas várias respostas, em decorrência da influência do

sujeito que escreve.

As técnicas retro referidas são utilizadas para se tentar sanar problema

de fertilidade. Até aí, nada mais humano do que tentar dar filhos a quem a

natureza não permitiu. O problema surge em decorrência das técnicas utilizadas.

Todas essas técnicas se utilizam de uma super­estimulação hormonal,

com o objetivo de coletar vários óvulos numa mesma menstruação. Isso se deve

pelo fato de que as técnicas de reprodução possuem um índice baixo de êxito,

índice que é aumentado se forem implantados vários embriões no corpo da

mulher. Por razões de segurança médica, implantam­se cerca de quatro

embriões, tendo­se, dessa forma, uma grande probabilidade de ocorrência de

gêmeos. O problema é que não são apenas quatro óvulos que são retirados do

corpo da mulher, quando da super­estimulação hormonal; e, pior, todos os

óvulos retirados são fecundados, significando que, além dos quatro embriões

implantados no corpo feminino, temos ainda outros congelados no laboratório,

pelo que há se perquirir: esses embriões são seres humanos? A partir de que

momento se pode referir a uma vida humana?

Na França, tem­se assentado que só se considera vida humana depois

de 14 dias da fecundação, por ser esse tempo a época aproximada do surgimento

do tecido nervoso. No entanto esse critério não parece o mais aceitável, pois

logicamente um ser não­humano, não se pode tornar ser humano, da noite para o

dia. Crê­se que assim que as duas células sexuais se unem, formando uma só

célula, existiria então um ser humano, pelo menos em potencial. Por

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conseqüência, os embriões sobrantes não podem de forma alguma ser

destruídos, em respeito aos princípios assegurados no artigo 5º de nossa

Constituição.

O grande problema é que a Constituição brasileira também garante

como direito fundamental a intimidade, a vida privada, honra e imagem das

pessoas (artigo 5º, X), gerando um conflito de princípios: o direito à vida do

embrião versus o direito à intimidade da mulher. Pergunta­se, então: pode a

mulher pedir a destruição dos embriões sobrantes? Parece que a resposta aqui é

negativa.

Quando há choque de princípios, como no caso em tela, esse choque é

resolvido não com a eliminação de um princípio, mas com a valoração, no caso

concreto, dos princípios. Assim, nesse caso, assente que o princípio da vida

humana, e mais, da dignidade da vida humana é mais importante do que

intimidade, vida privada, ou qualquer outro princípio que se queira invocar no

caso concreto. 45

A própria Constituição, no entender de Cármen Lúcia Antunes Rocha,

em brilhante artigo editado na Revista da Ordem dos Advogados do Brasil, foi

toda estruturada para defender a vida e a dignidade da pessoa humana 46 .

Além da proteção constitucional da vida humana, estabelecida no

artigo 5º, o ordenamento pátrio ainda cuida, no plano infraconstitucional, da

proteção do nascituro, ou seja, o ser humano que ainda não chegou a nascer. É o

que estabelece, de forma clara, sucinta e objetiva, o Código Civil/2002, no seu

artigo 4º, onde dispõe: “Art 4º. A personalidade civil do homem começa do

45 FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1996. p. 168. 46 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Cidadania e Constituição (As Cores da Revolução Constitucional do Cidadão). In Revista da Ordem dos Advogados do Brasil, nº 65, ano XXVII, julho/dezembro 1997, pp. 29 a 54.

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nascimento com vida; mas a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do

nascituro.”

Assentada, então, a impossibilidade de destruição dos embriões

sobrantes, o que fazer com eles? Esse é o grande problema a ser resolvido. Têm­

se algumas possibilidades. Pode­se doar os embriões, mas a possibilidade de

rejeição em decorrência de ser um corpo estranho é muito grande. Pode­se

deixar congelado para uma nova implantação no corpo da mulher, caso ela

queira ter mais filhos. Mas, pergunta­se, e se ela não quiser?

Realmente, é um problema de grande complexidade, e qualquer

solução pensada trará com ela milhões de outros problemas. Como dito no

início, não temos pretensão de dar uma solução única, até porque ela não existe.

Não existe no plano legal (inexiste lei no Brasil sobre o assunto), não existe no

plano teórico (poucos autores brasileiros têm se dado conta do problema e

apresentado soluções satisfatórias). O ponto positivo de se levantar um problema

é que se pode, a partir de agora, começar a pensar soluções éticas, jurídicas e

morais adequadas.

Assim, nesse momento, deve­se abordar a questão dos direitos do

casal que recorre às técnicas de reprodução. Deve o casal ter toda a informação,

por parte do médico responsável bem como do Centro de Reprodução. Deve o

médico dar todas as informações necessárias sobre a porcentagem de êxito, o

número de vezes que o casal deverá ir ao Centro, os perigos da técnica, qual a

melhor técnica a ser utilizada no caso concreto, bem como todo o procedimento

que possibilitará ao casal ter o filho tão desejado. Caso o médico não dê todas as

informações, poderá ser responsabilizado solidariamente com o Centro em que

trabalha.

Sempre que um casal recorrer a um Centro de Reprodução Humana,

deve este apresentar um documento, que deverá ser assinado pelos beneficiários

da técnica de reprodução, declarando que receberam todas as informações sobre

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o procedimento a ser utilizado, isentando de responsabilidade o Centro e o

médico, caso não haja sucesso.

É importante ressaltar que a obrigação do Centro e do médico é de

meio, e não de resultado, só sendo eles responsabilizados por dolo ou culpa, no

caso de falta de diligência no uso do procedimento 47 .

Quanto ao problema das mães de substituição, contrata­se uma mulher

para carregar o embrião, pelo fato da mãe não poder fazê­lo, em decorrência de

problemas biológicos. No Brasil, essa prática deve ser terminantemente vedada,

em decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana. Ora, a mulher que

se dispõe a carregar o embrião por nove meses se apega ao ser que cresce dentro

de suas entranhas. Como fica o sentimento dessa mulher, quando da entrega

desse filho, que ela ajudou a nascer? Ela raciocina e, com toda razão, que esse

filho é muito mais dela do que do casal que com ela contratou. Foi ela que

suportou todas as dificuldades durante nove meses e, muitas vezes, aprendeu a

amar o bebê, que, de estranho, passou a ser o seu bebê.

É por esse motivo, que, não raras vezes, a mulher que carrega o bebê

se recusa a devolvê­lo ao casal contratante após o parto. Nos EUA, isso tem

ocorrido de forma recorrente, gerando grandes disputas nos tribunais 48 .

Nota­se que o tema abordado não foi esgotado, mas é apenas uma

pequena contribuição para que os estudiosos do direito se atentem aos temas

recentes ligados à filiação, pois o Direito deve sempre acompanhar a evolução

da sociedade, sob pena da sociedade forçar o Direito a se propor logo nas

soluções jurídicas advindas de certo eventos.

47 GOMES, Orlando. Obrigações. 11ª edição, revista e atualizada por Humberto Theodoro Júnior, Rio de Janeiro: Forense, 1996, pp. 16 a 17. 48 LEITE, Eduardo de Oliveira. Op. cit., p. 480 .

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CAP ÍTULO IV

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE E A QUESTÃO DO

RECONHECIMENTO DOS FILHOS

Atualmente, o conceito de paternidade acha­se fragmentado entre o

liame biológico, o jurídico e o sócio­afetivo.

O conceito de filiação e sua definição no mundo jurídico evoluiu da

filiação biológica até a atual filiação sócio­afetiva que prepondera em nosso

ordenamento.

Ser pai ou mãe, atualmente, não é apenas ser a pessoa que gera ou a

que tem vínculo genético com a criança. É, antes disso, a pessoa que cria, que

ampara, que dá amor, carinho, educação, dignidade, ou seja, a pessoa que

realmente exerce as funções de pai ou de mãe em atendimento ao melhor

interesse da criança.

Conforme leciona a douta Professora Juliane Fernandes Queiroz:

Assim, o novo comportamento cultural, no tocante à paternidade, insere o mundo moderno em outro contexto social, em que a função de pai deve ser exercida no maior interesse da criança, sem que se atenha à própria pessoa em exercício da referida função. Diz ainda: Por isso, atribui­se que o verdadeiro vínculo que se trava com os pais é o afetivo e, portanto, pais podem perfeitamente não ser os biológicos, e completa da seguinte forma: Assim, em questões que envolvam conflitos de

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paternidade biológica e social, o interesse melhor e maior da criança deverá nortear a decisão. 49

Questões como as relativas à adoção, inseminação heteróloga, adoção

à brasileira estabelecem, entres os pais e seus filhos, verdadeiras filiações

socioafetivas tendo em vista que, em tais casos, não há liame biológico entre os

envolvidos.

A filiação, portanto, estabelece­se não apenas em face do vínculo

biológico, mas principalmente em face do vínculo sócio­afetivo que atende mais

ao princípio do melhor interesse da criança, da dignidade da pessoa humana e

também da paternidade responsável.

Estabelecido o vínculo da filiação, o mesmo poderá, contudo, ser

contestado ou repelido, desde que não mais se observe o interesse da criança,

pela perda do pátrio poder 50 , ou desde que não haja consentimento livre em face

da inseminação heteróloga feita, ou se o mesmo for externado sob fraude, erro

ou coação 51 .

Mas, atendendo­se ao melhor interesse da criança e externando de

forma livre e esclarecida o consentimento à técnica heteróloga de inseminação

artificial ou à adoção, forma­se liame de filiação, com base na filiação sócio­

afetiva, que não mais poderá ser contestado ou repudiado e que prevalecerá

sobre as demais formas de filiação, mesmo a biológica.

Portanto, o vínculo de filiação, uma vez formado, não mais será objeto

de contestação ou de impugnação e imporá, aos que externarem de forma livre e

esclarecida o seu consentimento, os direitos e obrigações relativos à filiação.

Por outro lado, a escolha do casal pelas técnicas de inseminação

heteróloga ou pela adoção não tem o condão de impedir que o filho gerado possa

49 QUEIROZ, Juliane Fernandes. Paternidade: aspectos jurídicos e técnicas de inseminação artificial. Doutrina e Jurisprudência. pp. 52, 55, 59, Belo Horizonte: Del Rey, 2001. 50 Artigo 1.638, inciso III, do Código Civil. 51 Artigo 171, inciso II, do Código Civil.

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investigar e ter acesso à sua origem genética, tendo em vista ser este um direito

personalíssimo, indisponível e intransferível. Tycho Brahe Fernandes, citando

Álvaro Villaça de Azevedo e Walter Ceneviva, diz:

(...) posiciona­se Álvaro Villaça de Azevedo, para quem o filho concebido por meio de uma das técnicas de reprodução assistida poderá, a qualquer tempo, investigar sua paternidade, esclarecendo, ainda, que os responsáveis pela guarda dos dados do doador de sêmen deverão fornecê­los em segredo de justiça. No mesmo sentido é a posição de Walter Ceneviva, quando assegura que o direito da mãe não vincula o filho, e este, ao atingir a maioridade, poderá ingressar com a competente ação investigatória para tentar a identificação do homem que, mesmo involuntariamente e apesar das circunstâncias, é seu verdadeiro pai. 52

O direito ao reconhecimento da origem genética é direito

personalíssimo da criança, não sendo passível de obstaculização, renúncia ou

disponibilidade por parte da mãe ou do pai.

O artigo 5º da Constituição Federal preconiza que “Todos são iguais

perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...)”. Além do mais, o artigo

227, § 6º, da Constituição Federal, pontifica a igualdade entre os filhos.

Leciona Tycho Brahe Fernandes que:

Ao se negar a possibilidade do aforamento de ação investigatória por criança concebida por meio de uma das técnicas de reprodução assistida, em inaceitável discriminação se estará negando a ela o direito que é reconhecido a outra criança, nascida de relações sexuais. 53

Além do mais, estar­se­ia se impedindo o seu direito à ação.

Por sua vez, J. Franklin Alves Felipe defende que:

Diante do novo texto constitucional, não há mais que se restringir os casos em que a investigatória de paternidade é

52 FERNANDES, Tycho Brahe. A reprodução assistida em face da bioética e do biodireito : aspectos do direito de família e do direito das sucessões. Florianópolis: Ed. Diploma Legal, 2000, p. 85. 53 Idem, p. 86

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admissível. Simplesmente cabe ação para o filho pleitear o reconhecimento de sua paternidade. 54

O artigo 27 da Lei 8.069/90 (ECA) estabelece o seguinte:

O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça.

Portanto, mesmo que os pais tenham firmado documento de

consentimento informado no qual se comprometiam a não demandar a

paternidade, o termo não vincula o filho nascido, pois o direito do

reconhecimento do estado de filiação e, por conseqüência, do reconhecimento da

origem genética, é indisponível e personalíssimo e pode ser exercido sem

qualquer restrição, não podendo constituir objeto de renúncia por parte de quem

não os possui.

Segundo Tycho Brahe Fernandes:

Ter direito ao reconhecimento da origem genética não significa subjugação, discriminação ou preponderância da filiação biológica em face da filiação sócio­afetiva, pois tal entendimento só seria relevante quando se trata da discussão travada em um conflito positivo de paternidade mas, ao tratar de uma criança que não terá pai algum e desejando conhecer seus verdadeiros pais, nada mais lógico que se reconheça esse direito 55 .

O direito ao reconhecimento da origem genética não importa,

igualmente, em desconstituição da filiação jurídica ou sócio­afetiva e apenas

assegura a certeza da origem genética, a qual poderá ter preponderância ímpar

para a pessoa que a busca e não poderá nunca ser renunciada por quem não seja

o seu titular.

54 FELIPE, J. Franklin Alves. Adoção, guarda, investigação de paternidade e concubinato, p. 66. 55 FERNANDES, Tycho Brahe, Op. cit., p. 89

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Ressalta a doutrinadora Silmara Juny de Abreu Chinelato e Almeida,

quanto ao direito à identidade genética:

O direito de os filhos gerados por doação de gametas (óvulos e espermatozóides) conhecerem os pais biológicos, sem que o exercício deste direito importe em desconstituição de paternidade, nem menosprezo à paternidade sócio­afetiva. 56

Respondendo ao questionamento acerca do temor que sofreriam os

pais sócios­afetivos ante a possibilidade de o filho buscar a sua origem genética,

leciona a mesma autora:

O ‘direito à identidade Genética’ não significa a desconstituição de paternidade dos pais sócio­afetivos. Hoje, enfatiza­se a importância da paternidade sócio­afetiva e a denominada ‘desbiologização’ da paternidade. E o filho só conheceria os pais biológicos se quisesse. O que não se pode é negar o Direito de Personalidade à identidade e fazê­lo crescer sob uma mentira, como alertam os psicólogos. Um simples exame de tipo sanguíneo pode destruir toda a fantasia de que a criança é filha biológica de um casal. 57

Em palestra proferida no III Congresso Brasileiro de Direito de

“família”, as Dras. Heloísa Helena Barboza, da Universidade do Estado Rio de

Janeiro – UERJ, e Jussara Maria Leal de Meirelles, da Universidade Federal do

Paraná – UFPR, foram enfáticas em afirmar que o ser nascido de técnicas

heterólogas de inseminação artificial tem total direito ao reconhecimento de sua

origem genética e que tal direito é personalíssimo, irrenunciável e imprescritível.

O Direito alemão, O Tribunal Constituição, em decisão em 1994,

reconheceu nitidamente o direito de personalidade ao conhecimento da origem

genética, mas sem efeitos sobre a relação de parentesco; é o chamado “Direito

ao conhecimento das Origens”.

56 CHINELATO, Silmara de Abreu Juny, entrevista citada. Disponível em http://projeto33.no.com.br. Acesso em 15 de junho de 2006. 57 FERNANDES, Tycho Brahe, Op. cit., p. 33.

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Em relação à relevância que representa o conhecimento da filiação

biológica para o filho adotado, ou para o filho fruto de inseminação artificial,

podemos perceber a discussão que se travou na mídia com a publicidade dada

pelo sociólogo Kiko Goifman na procura de sua mãe biológica e que foi até

mesmo divulgada pela Internet, por meio do site http://projeto33.no.com.br,

onde conta que desenvolveu um projeto para, em 33 dias, procurar o paradeiro

de sua mãe biológica com aquiescência e ajuda de sua esposa e de sua mãe

adotiva. 58

Ao legar ao filho o seu direito de conhecer a sua verdadeira identidade

genética, estamos reconhecendo­lhe o exercício pleno de seu direito de

personalidade e a possibilidade de buscar nos pais biológicos as explicações

para as mais variadas dúvidas e questionamentos que surgem em sua vida,

como, por exemplo, as explicações acerca da característica fenotípica, da índole

e do comportamento social, das propensões ou resistências a certas doenças, etc.

O reconhecimento da origem genética também tem importância em

casos de doenças somente solucionáveis por meio de compatibilidade

consangüínea, tal é o caso de certos transplantes de órgãos e certas doenças,

como a leucemia.

A própria resolução 1358/92 do CFM, que regula a reprodução

humana assistida, prevê a possibilidade do fornecimento de informações acerca

do pai biológico, em situações especiais e sempre preservada a identidade civil

do doador, para o médico que a requisitar.

Portanto, se for vontade do filho, seja por ato próprio, assistido ou

representado, ele poderá a qualquer tempo, em face da imprescritibilidade de seu

direito, investigar a sua origem genética sem que isto constitua diminuição,

58 GOIFMAN, Kiko. Disponível em http://projeto33.no.com.br. Acesso em 15 junho de 2006.

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discriminação ou desconsideração da filiação socioafetiva, porventura formada,

e sem que implique quaisquer outros direitos inerentes à filiação que não o do

reconhecimento genético.

4.1 Da Definição e Natur eza do Reconhecimento de Filiação

O reconhecimento é o ato declaratório que estabelece o vínculo

jurídico entre os pais e os filhos. Não é ato constitutivo, uma vez que somente

visa a declarar uma situação de fato, sendo, portanto, meramente declaratório.

Este ato é de importância extrema uma vez que visa estabelecer as questões

jurídicas relativas à filiação e, consequentemente, quanto às pessoas envolvidas.

Necessário ressaltar que o reconhecimento é único, estabelecendo a

paternidade de determinada pessoa, por isso, juridicamente, não há que se falar

em duplo reconhecimento, uma vez que o indivíduo somente poderá ter uma

paternidade, tendo que recusar a primeira, por erro ou falsidade, para ganhar a

segunda.

O reconhecimento poderá ser ato voluntário e conjunto dos pais ou

isolado de apenas um deles, que reivindica judicialmente o seu estado de pai ou

mãe. Por outro lado, também poderá ser ato de iniciativa do próprio filho, por

meio da ação de investigação de paternidade ou maternidade. Qualquer dessas

formas de reconhecimento produzem efeitos jurídicos idênticos.

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4.2 Da Possibilidade de Reconhecimento de Filho

O Código Civil de 1916 somente permitia o reconhecimento dos filhos

naturais. Para os adulterinos e incestuosos, o artigo 358 desse diploma legal

vedava expressamente.

Não obstante, mais tardiamente, o Decreto­lei n º 4.737/42 mitigou o

rigor dessa proibição quando concedeu a possibilidade de reconhecimento de

filiação, qualquer que fosse, prescrevendo em seu artigo 1º que o filho havido

pelo cônjuge fora do matrimônio podia, após o desquite, ser reconhecido ou

demandar que se declarasse sua filiação.

No entanto, por não prever o reconhecimento dos filhos em outras

causas de dissolução da sociedade conjugal, tais como a morte do consorte, foi

publicada a Lei nº 883/49, que estabeleceu a possibilidade de reconhecimento

voluntário ou judicial de filho adulterino ou de ação para que se lhe declarasse a

filiação, quando fosse dissolvida a sociedade conjugal, sem especificar a causa.

Depois dessa lei, em qualquer dos casos da dissolução da sociedade conjugal era

possível haver o reconhecimento do filho extra­matrimonial.

A par disso, inovação maior foi trazida pela Lei n º 6.515/77, que

acrescentou o parágrafo único no artigo 1º da Lei nº 883/49,3 que assim passou

a ser redigido:

Ainda na vigência do casamento, qualquer dos cônjuges poderá reconhecer o filho havido fora do matrimônio, em testamento cerrado, aprovado antes ou depois do nascimento do filho, e, nessa parte, irrevogável.

Para muitos doutrinadores, o referido diploma legal abriu a

possibilidade para o reconhecimento dos filhos incestuosos, uma vez que, se o

parentesco lhe negava a possibilidade de legitimação, pelo subseqüente

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casamento dos pais, a lei do divórcio lhes proporcionou a oportunidade de

reconhecimento para todos os efeitos legais e não apenas para pleitear alimentos,

é o que se nota do reformado artigo 2º da Lei nº 883/49, no qual fica

determinado que “qualquer que seja a natureza da filiação, o direito à herança

será reconhecido em igualdade de condições.”

Ademais, frente a nova Constituição Federal, em seu artigo 227, § 6º,

o reconhecimento dos filhos incestuosos não está mais proibido pelo nosso

ordenamento jurídico. Assim, a Carta Magna encerrou a discussão sobre a

possibilidade de reconhecimento dos filhos incestuosos, que culpa alguma

possuem se ter sido concebido por pais com laços de parentesco, tendo sim,

direito ao reconhecimento e todas as implicações que este fato possa ocasionar.

O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo,

indisponível e imprescritível, podendo ser exercido contra os pais ou seus

herdeiros, sem quaisquer limitações, observado o segredo de justiça (Lei nº

8.069/90, artigo 27 e Lei nº 8.560/92.

4.3 Dos Modos de Reconhecimento de Filho

Os modos de reconhecimento de filhos pode se dar nos modos:

4.3.1 Reconhecimento voluntário

O reconhecimento de filho voluntário é o modo pelo qual, o pai e a

mãe revelam espontaneamente a sua qualidade de pais, outorgando ao filho,

todos os direito e deveres daí decorrentes.

É um ato unilateral, visto que gera efeitos apenas pela manifestação da

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vontade de uma das partes, no caso, a vontade dos pais, quem reconhece. Nota­

se que um ato unilateral dos genitores, não podendo ser feito por terceira pessoa

como os avós, tios, padrinhos ou outros. No entanto, será válido se feito por

meio de procurador legalmente constituído, munido de poderes especiais e

expressos; nesse caso, a outorga da vontade de reconhecer o filho já está

embutido no ato de outorgar poderes ao procurador, sendo que o mandatário

somente se limita a formalizar o ato do reconhecimento juridicamente.

A quem aponte a este ato caráter sinalagmático, em razão do artigo

1.614 do Código Civil/2002 e também artigo 4º da Lei nº 8.560/92

condicionarem a sua eficácia ao consentimento do filho maior e dar ao filho

menor a prerrogativa de impugná­lo dentro de 04 anos que se seguirem à

maioridade ou emancipação, mediante ação de contestação de reconhecimento,

fundada na sua falta de sinceridade na atribuição de falsa filiação ao perfilhado.

Não obstante, o fato da vontade do reconhecido interferir no

reconhecimento, não retira o caráter unilateral do ato, uma vez que a anuência

do filho maior ou a permissão dada pela lei ao filho menor para impugná­la,

tempestivamente, o ato que o reconheceu são medidas protetoras ante o fato de o

reconhecimento envolver efeitos relevantes, de ordem moral e patrimonial, que

não podem ser provocados, arbitrariamente, por uma só pessoa.

Somente há a possibilidade de reconhecimento de filho já falecido se

ele deixou descendentes, cabendo então a eles o direito de consentir com o

reconhecimento tardio. Isso é o que prescreve o artigo 1.609, parágrafo único do

Código Civil/2002 e o artigo 26, parágrafo único da Lei nº 8.069/90: “O

reconhecimento pode preceder o nascimento do filho, ou suceder­lhe ao

falecimento, se deixar descendentes.”

Após exteriorizada a vontade de reconhecer o filho, o ato externado se

torna irretratável ou irrevogável, inclusive se feito em testamento (artigo 1.610

do Código Civil/2002) por se tratar de confissão de paternidade de maternidade.

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Não obstante, o ato poderá ser anulado caso viciado por erro ou coação, até

mesmo se não observadas as formalidades legais. Nesse sentido, o caráter

irrevogável do reconhecimento não impede que ele seja anulado por vícios

sociais ou de consentimento.

Como se trata de questões relativas à personalidade, o reconhecimento

não pode ser subordinado a termo ou condição (artigo 1.613 do Código

Civil/2002), ou mesmo qualquer cláusula que vise a limitar ou alterar os efeitos

admitidos por lei.

Os filhos havidos fora do casamento (naturais, incestuosos ou

adulterinos) poderão ser reconhecidos tardiamente pelos pais, conjunta ou

separadamente (artigo 1.607 do Código Civil/2002), sendo que o último não

mais requer, para isso, dissolução da sociedade conjugal ou testamento cerrado

se o ato se der na vigência do casamento.

É necessário verificar que o reconhecimento é ato solene e obedece à

forma prescrita em lei, pois o artigo 1.609, inciso I a IV do Código Civil/2002, a

Lei nº 8.069/90, no artigo 26 e a Lei nº 8.560/92, artigo 1º, inciso I a IV, impõe

que se o faça:

I) No próprio termo do nascimento: caso em que os pais comparecem perante o oficial do Registro Público e prestam declarações sobre a descendência do registrado, assinando o termo, na presença de testemunhas. Esse reconhecimento poderá ser feito conjunta ou separadamente pelos pais, segundo o que determina o artigo 1.607 do Código Civil. No caso do pai ser o declarante, se a maternidade constar do termo de nascimento, ela somente poderá contestar o registro e também o reconhecimento em caso de falsidade do termo das declarações nele contidas (artigo 1.608 do Código Civil). Se apenas a mãe comparecesse em cartório para declarar a paternidade do filho e o pai contestasse, o termo deixaria de prevalecer. Hoje em dia, se apenas a mãe comparece para reconhecer o filho e não declara o nome do suposto pai, o oficial do cartório remeterá ao juiz corregedor permanente do cartório certidão de registro e o nome do indigitado pai, devidamente qualificado, para que oficiosamente se verifique a procedência da imputação da paternidade. Com isso, o Judiciário, que não presta tutela

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jurisdicional sem o consentimento do interessado (artigo 262 do Código de Processo Civil), passará a ter a função de sindicante da filiação alegada pela declarante (mãe, parteira etc.). II) Por escritura pública: não precisará ter especificadamente esse fim, pois o reconhecimento pode dar­se numa escritura pública de compra e venda, bastando que a paternidade seja declarada de modo incidente ou acessório em qualquer ato notarial, assinado pelo declarante e pelas testemunhas; não se exigindo nenhum ato público especial. No entanto, vale também o reconhecimento feito por instrumento particular arquivada em cartório (artigo 1.609, inciso II) e autenticada; isto porque a Lei nº 8.560/92, não só a escritura pública é forma exigida ad substantiam, para que o ato valha como título de Estado, mas também o instrumento particular, com firma do signatário reconhecida, a ser arquivado em cartório. Igualmente, a declaração que constar de termo judicial produzirá o mesmo efeito, por se tratar de confissão perante pessoa que tem fé pública. III) Por testamento: O testamento poderá ser cerrado, público ou particular, ainda que incidentalmente manifestado e mesmo sendo nulo ou revogado, o reconhecimento nele exarado vale de per si, inclusive se tratar de simples alusão à filiação, a menos que decorra de fato que acarrete sua nulidade, como por exemplo, a demência do testador. IV) Por manifestação direta e expressa perante o juiz ou por termo nos autos: essa forma equivale à escritura pública, mesmo que o reconhecimento seja o objeto único e principal do ato que o contém.

4.3.2 Reconhecimento judicial

O reconhecimento judicial resulta de sentença proferida em ação

intentada para o devido fim pelo filho, tendo, portanto, caráter pessoal, embora

os herdeiros do filho possam continuá­la. A ação de investigação poderá ser

intentada contra o pai, contra a mãe ou contra os dois em conjunto, desde que

observados os pressupostos legais para a admissibilidade da ação, considerados

como presunções de fato. Poderá esta ação ser contestada por qualquer pessoa

que tenha na ação interesse moral ou econômico (artigo 1.615 do Código

Civil/2002), como, por exemplo, a mulher do réu, seu filhos matrimoniais ou os

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reconhecidos anteriormente, os parentes sucessíveis ou qualquer entidade

obrigada ao pagamento de pensão aos herdeiros do suposto pai.

A sentença que será proferida nesta ação terá eficácia absoluta,

valendo erga ominis, ao declarar o vínculo de filiação equiparável ao da

descendência matrimonial, nos seus efeitos pessoais e patrimoniais. Segundo o

que determina o artigo 7º da Lei nº 8.560/92, a sentença que reconhecer a

paternidade deverá fixar os alimentos provisionais ou definitivos do reconhecido

que deles necessite e poderá ordenar que o filho se crie e eduque fora da

companhia dos pais ou daquele que lhe contestou essa qualidade. A sentença

que julgar procedente a ação de investigação produz os mesmos efeitos do

reconhecimento e deverá, para tanto, ser averbada no registro competente.

4.3.3 Ação de investigação de paternidade

A ação de investigação de paternidade é possibilitada ao filho natural

mesmo que se dissolva a sociedade conjugal de seus pais. Com a mudança

recente da lei, ao filho incestuoso também é possibilitada a impetração da ação

de investigação de paternidade.

A ação de investigação de paternidade processa­se mediante ação

ordinária promovida por filho, ou mesmo por seu representante legal se incapaz,

contra o seu genitor ou seus herdeiros, podendo ser cumulada com a de petição

de herança com a de alimentos e com a de anulação de registro civil. No caso do

falecimento do investigado no decorrer da ação, seus herdeiros, se houverem,

poderão continuar a ação, salvo se o processo for extinto. Para muitos

doutrinadores, se morto o filho antes mesmo de intentada a ação de investigação

de paternidade, faltaria a seus herdeiros legitimidade ad causam para a

impetração da medida. Mas com a entrada em vigor do novo Código Civil,

desde que faleça, menor ou incapaz, seu representante terá legitimação para

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intentar ação de investigação de paternidade. 59

É necessário ressaltar que, como a ação de investigação de paternidade

é uma ação de estado de pessoa, ela é imprescritível, logo, o filho interessado

poderá, a qualquer momento, propô­la, uma vez que não se pode negar ao filho

o direito do reconhecimento de sua paternidade e o alcance do status jurídico

que esse fato implica. No entanto, ao contrário do direito ao reconhecimento que

é imprescritível, os direitos patrimoniais do reconhecido prescrevem, mas não

impedem a ação investigatória.

Na vigência do Código Civil de 1916, o artigo 363 permitia a

investigação de paternidade nos casos:

a) concubinato: pessoas que se unem com o intuito de constituírem

uma vida em comum sem laços matrimoniais. O filho poderia demandar contra

os pais se provasse que, ao tempo de sua concepção, sua mãe estava

concubinada com o pretendido pai, pois, para ser pressuposto de admissibilidade

da ação, da concepção. Assim, o réu poderia defender­se:

I) negando a existência de concubinato;

II) demonstrando que o autor não fora gerado durante a sua vigência;

III) invocando a exceptio plurium concubentium, ou seja, alegando

que, por ocasião da concepção, a mãe do investigante mantinha relações sexuais

com outros homens sendo, por esse motivo, incerta a paternidade; e por último

IV) provando a impossibilidade física de ser ele o pai do investigante,

devido ao seu internamento em hospital, viagem ou impotência, no momento da

concepção.

b) rapto da mãe pelo suposto pai ou relação sexual coincidente com a

data da concepção: deve o autor provar que houve rapto ou relação sexual entre

sua mãe e o suposto pai por ocasião de sua concepção e que sua mãe não

59 FELIPE, J. Franklin Alves. Op. cit., p. 102.

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mantinha, nessa época, relação com outro homem, sendo desnecessária a

condenação criminal do raptor, mas imprescritível a honestidade da mulher.

c) existência por escrito daquele a quem se atribuirá a paternidade,

reconhecendo­o expressamente: isso, desde que não fosse vago, equívoco ou

ambíguo, podendo ser público ou particular, feito pelo suposto pai ou assinado

por ele, apesar de escrito por outrem. O interessado poderia contestar a ação

demonstrando a falsidade ideológica ou material do documento ou evidenciado

defeito ou vício da declaração de vontade.

Com o novo Código Civil não faz mais essas exigências e diferenças

entre o reconhecimento da paternidade como se fazia no regime anterior.

Havendo dúvidas quanto à filiação, o interessado pode buscar sua paternidade

biológica, por ter o direito de saber sua identidade genética. Nesta ação, bastante

difícil é a questão das provas da filiação, porque as relações sexuais são, na

maior parte dos casos, impossível de ser comprovadas, devendo­se, então, contar

com indícios e presunções mais ou menos certos e seguros e, principalmente,

com o exame de DNA.

Nesse sentido, existindo a certeza pela realização dos exames de

DNA, não há porque se considerar a presunção pater est quem justae nuptiae

demonstrat, substitui­se então a verdade ficta pela real. Sempre há que

prevalecer o interesse do filho em descobrir a sua identidade genética, ou

melhor, a verdade real biológica. Nesse sentido, pelos avanços médicos

verificados na atualidade, não há que se subsistir o fetichismo injustificável de

dispositivos legais retrógrados, nem se poderia deixar de admitir a produção das

provas que fossem necessárias à realização da justiça e à descoberta da verdade

real.

Podem ser citadas como provas:

a) a posse do estado de filho: a posse do estado de filho é estabelecida

entre o pretenso pai e o investigante, capaz de revelar tal parentesco desde que o

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filho use o nome do investigado, receba tratamento como filho e goze na

sociedade do conceito de filho do suposto pai. Nesse sentido, são observados

que para haver a posse do estado de filho, são necessários três pressupostos,

como já esclarecido: nomem, tractatus e fama. Embora seja mera aparência, esta

prova por si só não basta para comprovar a filiação, no entanto, possibilita a

investigação, de maneira que se o autor apenas provar que desfrutava da posse

do estado de filho, sem acrescentar outra evidência, decairá o pedido, sendo,

portanto, prova subsidiária.

b) testemunhal: recebida com reserva, mas que deve ser analisada pelo

magistrado.

c) exame prosopográfico: esse exame consiste na ampliação de

fotografias do investigante e do investigado, justapondo­se uma a outra, por

cortes longitudinais e transversais, inserindo algumas partes de uma na outra

(nariz, olhos, orelha, raiz do cabelo e outras), porém, ainda que prove

semelhança entre os dois, não autoriza afirmar o vínculo jurídico, por

semelhança não induz relação de parentesco.

d) exame de sangue: mais adequado para excluir a paternidade se o

filho e o pretenso pai pertencerem a diversos grupos sanguíneos. No entanto, se

forem do mesmo grupo, ainda assim não se pode proclamar a filiação com

absoluta certeza, há somente mera possibilidade da relação biológica da

paternidade, isto porque à circunstância de que os tipos sanguíneos e o fator RH,

embora transmissíveis hereditariamente, são encontrados idênticos em milhões

de pessoas. Nesse sentido, se o tipo do sangue do investigante e do investigado,

não há afirmação inconteste de que eles sejam pais e filho, podendo ser apenas

mera coincidência. É certo que o exame de sangue é prova negativa e serve

apenas para excluir a paternidade.

e) exame odontológico: serve apenas para auxiliar o magistrado no

deslinde da questão, não sendo prova contundente de paternidade.

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f) exame de DNA: os estudos preliminares da genética molecular no

campo da investigação da identidade tiveram início em 1953, quando os

cientistas James Watson e Francis Crick descobriram a estrutura em dupla hélice

do DNA (ácido desoxirribonucléico), componente responsável pelo patrimônio

genético dos seres vivos.

Somente em 1980, porém, começaram a surgir técnicas capazes de

caracterizar no DNA as particularidades de cada pessoa. Em 1985, Alec Jeffreys

criou sondas moleculares radioativas com a propriedade de reconhecer regiões

altamente sensíveis do DNA, e assim levantar os padrões específicos de cada

indivíduo, que ele chamou de “impressão digital” genética do DNA.

As aplicações médico­legais da “impressão digital” genética do DNA

(DNA Fingerprints) podem contribuir para a investigação da paternidade e da

maternidade, mesmo após a morte dos envolvidos, desde que essa “impressão”

venha ser reconstituída por meio de amostras de sangue dos parentes próximos.

A amostra de sangue dos avós, de tios ou de irmãos legítimos pode possibilitar

uma vinculação genética com a mesma precisão do que aquela obtida se os pais

fossem vivos. Além do que, também, se pode determinar se existe relação de

parentesco entre duas pessoas.

Outrossim, dentro de uma criteriosa análise, levando em conta a

avaliação do risco­benefício, pode­se utilizar estas técnicas de vinculação

genética da paternidade intra­útero, por meio do estudo de tecidos fetais obtidos

pela aminiocentese e pela amostra de vilo corial. Nesta última, a mais usada,

utiliza­se o componente fetal da placenta, a partir da 9ª semana de gestação. Este

método só deve ser usado em situações muito especiais da determinação de

paternidade de interesse judicial, pois, do contrário, deve ser feito com todas as

vantagens após o nascimento da criança. 60

60 FERRAZ, Sérgio. Op. cit., p. 42.

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Outra maneira de utilização da “impressão genética” do DNA é na

identificação de suspeitos, numa investigação criminal, por meio de amostras de

material biológico encontradas em locais examinados, contribuindo assim para

apontar autores ou excluir falsas imputações.

Finalmente, esse método por ser usado com certa utilidade nos casos

de identificação de vítimas onde os outros métodos mostraram­se ineficazes,

como nas grandes mutilações ou nos carbonizados parcial ou quase totalmente,

ou ainda nas exumações adotando­se o uso de microssatélites pela técnica de

PCR (Polymerase Chain Reaction), que permite o estudo do DNA degradado, a

partir de pequenas quantidades de material obtido dos dentes, dos ossos, do

bulbo dos cabelos e de outros tecidos remanescentes.

A investigação da paternidade e da maternidade, antes do advento

desta técnica do perfil de DNA, tinha como ajuda os marcadores sangüíneos

simples. Não se pode negar que hoje, com esses novos recursos, tenha­se

respostas a situações, antes impossíveis como nos casos de pais falecidos, a

partir de familiares diretos. Mas isso não quer dizer que a análise do

polimorfismo do DNA tenha respostas para todas as indagações no campo da

identificação do vínculo genético de paternidade, nem que todos os resultados

dessa prova sejam imperiosamente verdadeiros.

Os equívocos do caso Castro nos Estados Unidos é um exemplo de

que há muita coisa ainda para se aprender. Entre elas a de que não se pode

acreditar demasiadamente rápido numa técnica que ainda se consolida e já se

rotula com a falsa expectativa de infalibilidade. Não foi por outra razão que

naquele país criou­se o TWGDAM (Technical work group for DNA analysis

and methods) e na Europa o EDNAP (European DNA profiling group), com a

finalidade de examinar cuidadosamente os diversos problemas na aplicação

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forense da tipagem do DNA, inclusive criando­se mecanismos seguros para um

controle de qualidade. 61

Sempre é bom repetir que na prova em DNA há uma esperança muito

grande de contribuição à homogenética médico­legal, a partir do momento que

esta esteja firmada cientificamente, tenha respostas para um número razoável de

dúvidas que ainda restam, disponha de uma rotina de previsão de erros e venha

livrar­se das pressões das empresas comerciais e dos meios de comunicação que

forçam, de um certo modo, o uso precipitado de um determinado critério,

difundindo uma idéia de infalibilidade da prova. E mais: que os laboratórios

sejam submetidos a controle de qualidade, que contem com banco de dados de

freqüência populacionais, que em casos de exclusão confira com outros dois

tipos de exames genéticos diferentes e que em casos de inclusão conste no

relatório o índice de paternidade individual para cada sistema, o índice de

paternidade combinado de todos os marcadores, a probabilidade de paternidade

em porcentagem e a maneira utilizada para calcular a probabilidade de

paternidade. 62

4.3.4 Ação de investigação de maternidade

A ação de investigação de maternidade é instituto raro nos meios

jurídicos, devendo ser proposta pelo filho, ou se incapaz, por seu representante

legal, contra a suposta mãe, ou se já tiver sido falecida, contra seus herdeiros. É

rara pelo fato da parêmia mater semper certa est, sendo vedada quando tinha por

fim:

a) atribuir prole legítima a mulher casada;

b) conferir prole incestuosa a mulher solteira uma vez que não se

61 Idem. 62 Ibidem, p. 47.

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permitia reconhecimento de filhos oriundos de incesto.

Atualmente, não há mais qualquer restrição a ação de investigação de

maternidade. Se o suposto filho, menor ou incapaz, falecer antes de movê­la,

seus herdeiros têm legitimação para fazê­lo, e se morrer após intentá­la, seus

herdeiros terão direito assegurado de continuá­la.

4.3.5 Conseqüência do reconhecimento de filho

O reconhecimento de filho, seja ele voluntário ou judicial, produz

efeitos ex tunc, retroagindo até o dia do nascimento da pessoa ou mesmo desde a

sua concepção se esse for o interesse. Os interesses em obter o reconhecimento

desde a data da concepção são os seguintes: 63

a) estabelecer o liame de parentesco entre o filho e seus pais,

atribuindo­lhe um status familiar, fazendo constar o fato no Registro Civil, sem

qualquer referência à filiação ilegítima (Lei nº 883/49, artigo 7º, e Decreto­lei nº

3.200/41, artigo 14), com a menção dos nomes paterno e materno, bem como os

dos avós;

b) impedir que o filho ilegítimo, reconhecido por um dos cônjuges,

resida no lar conjugal sem a anuência do outro, conforme estabelece o artigo

1.611 do Código Civil/2002;

c) dar ao reconhecido o direito à assistência e aos alimentos que

corresponda a condição sócio­econômica de seus pais, igualmente ao que o

genitor presta a seus outros filhos matrimoniais, mesmo que com ele não

residam;

63 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 1997, p. 35.

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d) sujeitar o filho reconhecido ao poder “família” de seus genitores

enquanto menor, se não houver acordo quanto à posse do poder “família”,

sempre deverá se decidir por aquele genitor que atender melhor aos interesses do

menor (Código Civil/2002, artigo 1.612). Caso o magistrado entenda que o

poder “família” sobre o menor não possa ser conferido nem ao pai nem a mãe,

deverá então concedê­lo, preferencialmente a pessoa idônea da “família” de

qualquer dos genitores. A ação de investigação de paternidade, em que pese

conceder o reconhecimento, poderá determinar que o filho seja criado fora da

companhia do pai e também da mãe, verificando o que melhor atende aos

interesses do menor;

e) conceder direito a alimentos tanto aos genitores quanto ao menor,

uma vez que o direito a alimentos é recíproco entre os parentes, devendo eles

alimentos uns aos outros;

f) equiparar os filhos para efeitos sucessórios, estabelecendo direito

recíprocos à herança entre pais e filhos;

g) autorizar o reconhecido a intentar ação de petição de herança e

nulidade de partilha, devido a sua condição de herdeiro;

h) equiparar a prole reconhecida tanto para efeito de clausulação de

legítima como para o de indignidade ou deserção ao descendente reconhecido.

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CONCLUSÃO

Toda pessoa tem o direito de saber qual a sua origem, onde deitam

suas raízes. Negar isso a alguém, como fez, num certo momento nosso

legislador civil, inspirado no conservadorismo patriarcal, no casamento como

fonte de família legítima, é uma forma de discriminação, de impedir que uma

pessoa exerça o direito personalíssimo de buscar a sua identidade.

Todo ser humano tem pai e mãe. Mesmo a inseminação artificial ou as

modalidades de fertilização assistida não dispensam o progenitor, o doador,

ainda que essa forma de paternidade não seja imediata. Dessa modo, o direito

não pode se afastar da verdade científica. A procriação é, portanto, um fato

natural. Sob o aspecto do direito, a filiação é um fato jurídico do qual decorrem

inúmeros efeitos. Sob perspectiva ampla, a filiação compreende todas as

relações, e respectivamente sua constituição, modificação e extinção, que têm

como sujeitos os pais com relação aos filhos. Portanto, sob esse prisma, o direito

de filiação abrange também o pátrio poder, atualmente denominado poder

familiar, que os pais exercem em relação aos filhos menores, bem como os

direitos protetivos e assistenciais em geral.

Tradicionalmente, afirmava­se com insistência, no passado não muito

remoto, que a maternidade era sempre certa (mater semper certa est); a

paternidade era sempre incerta (pater semper incertus est). No direito tradicional

essa foi uma verdade dogmática: enquanto a maternidade era sempre suscetível

de ser provada, a paternidade era de difícil comprovação. O avanço da ciência e

da tecnologia genética nas últimas décadas coloca na berlinda e desmente a

afirmação tradicional. Hoje pode­se afirmar com quase certeza a paternidade. A

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ciência já aponta e possibilita, a técnica mais uma vez suplanta o sistema

jurídico e obriga sua reestruturação. Já é possível apontar o pai de um indivíduo

sem qualquer dúvida ponderável. Torna­se possível programar nascimentos e

características dos novos seres humanos. O amedrontador admirável mundo

novo 64 , imaginado e imortalizado por Aldous Huxley, há tantas décadas, pode

tornar­se realidade não muito agradável ou aceitável, se o direito e o

ordenamento não tomarem os rumos corretos.

De qualquer modo, no campo do direito, por maior que seja a

possibilidade da verdade técnica, nem sempre o fato natural da procriação

corresponde à filiação como fato jurídico. O legislador procura o possível no

sentido de fazer coincidir a verdade jurídica com a verdade biológica, levando

em conta as implicações de ordem sociológica e afetiva que envolvem essa

problemática.

A sociedade brasileira tem evoluído não apenas tecnologicamente,

mas também socialmente. A estrutura familiar tem tido inúmeras alterações nas

últimas décadas, deixou­se de lado o patriarcalismo ressaltando­se outras

funções sociais do ente humano que não apenas o comando cego e onipotente do

pai de família que então tudo podia e tudo determinava.

As noções de filiação apegadas a cada época histórico­social

evoluíram e deixando­se de lado os pré­conceitos para aceitarem­se moralmente

e de forma responsável as condutas humanas, o filho extra matrimonial deixa de

ser filho extra matrimonial para tornar­se filho. O filho provindo de reprodução

assistida deixa de ser filho de terceiro desconhecido para tornar­se simplesmente

filho de uma união, digno de direitos e de reconhecimento social.

As razões para a igualdade e equiparação entre os filhos, decorreram

do próprio declínio a família, da redução do patrimônio familiar e da troca de

atitude perante o filho. Razões que favorecem a autonomia do indivíduo

64 HUXLEY, Aldous. Admirável Mundo Novo.2ª ed. São Paulo: Globo, 2000.

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preservada pela bioética que ofereceu ao mundo jurídico novas posições

doutrinárias, novas problemáticas a serem percebidas e solucionadas

desacomodando os pensamentos e posições retrógradas no tocante a filiação.

A interação da bioética com o sistema jurídico surge da necessidade

dos juristas identificarem soluções aos novos questionamentos emergentes das

novas tecnologias biológicas.

O operador do direito e a sociedade vislumbram nas situações em que

as codificações não oferecem o respaldo necessário a consciência de que o

passado serve para demonstrar os atos e suas práticas, mas não de paradigma

para a atualidade contrapor­se a esse antigo modelo, alterando­o para promover

a valorização da dignidade da pessoa humana, em respeito à Constituição

Federal, é a tarefa do jurista neste final do milênio, sendo a bioética um

fundamental instrumento para atingimento deste objetivo.

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BIBL IOGRAF IA

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