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    As relaes de poder na Universidade

    De quem e para quem?

    Livro/Texto para estudantes

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    Editorial: Bem vindos Calouros!!!

    Parabns a todos os calouros. O vestibular dentre uma infinidade de outras coisas uma prova difcil e todos aqueles que conseguem super-lo merecem ser parabenizados. Emboratodo ano a universidade se renove, sempre com muita expectativa que os veteranos aguardam o

    ingresso dos calouros. So eles que mudam a cara das coisas e continuam o que j havia sidocomeado. E quanta coisa h de se continuar este ano...Para recepcionar os Calouros, uma Comisso de estudantes, professores e servidores

    organizaram, este ano, toda uma semana completa de atividades de integrao entre ingressantes eveteranos, que englobam desde atividades ldicas at discusses polticas que buscam situ-los nauniversidade: a Calourada 2010.

    Este livro/texto faz parte do esforo para integrar os calouros na universidade. Nele constammuitos escritos que apresentam a universidade tal como ela . Ocorre que a primeira coisa a sequestionar a propaganda institucional da UNESP, que a coloca como a melhor das melhores.Embora esta seja uma boa universidade pblica, isto no significa que no haja problemas nela. Elesexistem e so muitos. E, por causa destes, os estudantes, os servidores e os professores seorganizam para buscar solucion-los e melhor-la. Alm disso, esses trs grupos necessitam, pormuitas vezes, at mesmo defender a precria qualidade atual da universidade contra as medidasdos diferentes governos que querem, por um ou outro motivo, precariz-la. Por vezes, os trs

    grupos conseguem vitrias. Mas, como quase nada so flores, no raro, ao buscar estes objetivos,estudantes, professores e funcionrios so derrotados.Neste livro/texto buscaremos apresentar a universidade sob uma srie de pontos de vistas

    distintos. Trataremos da forma como a UNESP se organiza, como os estudantes tambm seorganizam para defender seus interesses, e a histria desta organizao chamada MovimentoEstudantil, desde 2003 at 2009. Falaremos sobre a reforma do governo federal para educao emtodo o pas, ou seja, seu projeto de sucateamento desta. Apresentamos um tema que muito nosimporta: a democracia na universidade e como democratiz-la (porque a universidade no democrtica). Falaremos sobre as polticas para manter os estudantes pobres na universidade oua ausncia delas , chamadas de polticas de permanncia estudantil. E, um dos temas maisinteressantes para os Calouros: o trote.

    *Embora a Direo da FFC tenha financiado praticamente todas as atividades da Calourada 2010,

    ela se negou a bancar outras no menos importantes, como a vinda de trs debatedores que os

    estudantes consideravam de extrema relevncia: Alonso Moreira, da Comisso de Moradia daUNESP-Franca; Claudionor Brando, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da USP; e Jos BahiaJnior, do DCE da UFOP (No sabe o que um DCE? Olhe no Glossrio deste livro/texto). A Direose recusou, ainda, a custear este livro/texto, cujo objetivo discutir com os estudantes a realidadeda universidade, no seu projeto sonhado.

    Apesar do forte cerceamento poltico empreendido pela Direo, no tnhamos, contudo, condiespolticas na faculdade para romper com ela. ramos pouqussimos estudantes e entidades (CAs deTerapia Ocupacional, Relaes Internacionais, Filosofia e Pedagogia, alm de membros da Comissode Moradia; no sabe o que um C.A.? J sabe onde procurar) interessados em construir umaCalourada. Tnhamos, pois, a escolha de ou fazer a Calourada com a Direo e aproveitarmos asbrechas para denunci-la ou rachar com ela e perigar no haver Calourada alguma.

    O Centro Acadmico de Cincias Sociais, at ento praticamente ausente da organizao daCalourada 2010, preferiu rachar com as demais entidades do campus e construir, sozinho, poucasatividades que esto a chamar de Calourada Paralela. Os motivos que os levaram a rachar so,

    contudo e em fato, outros que discutiremos em Assemblia Geral, o local mais adequado para tal.Entretanto, a Direo merece o mais veemente repdio por parte dos estudantes pela atitudearbitrria que tomou: o veto da vinda dos palestrantes acima mencionados, e o no financiamentodeste livro/texto elaborado e concebido exclusivamente por alunos, com a justificativa de este tercunho poltico. O modo como ela agiu somente demonstra, na prtica, um daqueles problemas dosquais dizamos h pouco: a falta de democracia na universidade. E, por causa deste problema,dentre outras coisas, que necessitamos nos organizar, enquanto estudantes de uma universidadepblica, para defender nossos interesses, dentre outras coisas.

    *

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    Agradecemos a todos os estudantes e professores que contriburam para a Calourada 2010 epara a execuo deste livro/texto, cujas atividades e escritos foram feitos pensando em integrar ecolocar elementos de reflexo aos calouros. Que voc, ento, aproveitem.

    Aline Monge, Mestranda em Educao na UNESP-MarliaCamila Mendes Pinheiro, 3o Pedagogia na UNESP-MarliaFelipe Luiz Guma, 4 Filosofia na UNESP-Marlia

    Karina Perin Ferraro, Mestranda em Educao na UNESP-Marlia

    Sumrio

    A organizao do movimento estudantil hoje

    Estrutura burocrtica da UNESP ou a antidemocracia universitria

    A democratizao da Universidade

    A luta pela permanncia e a permanncia da luta

    Os ataques do Governo Federal

    O movimento estudantil na ltima dcada e o projeto de universidade pblicado Governo estadual

    2009: ano de luta

    4 motivos para desmistificar o Ensino a Distncia (EaD)

    A universidade que reprime

    A luta pela permanncia e a permanncia da luta

    Ano novo velhos hbitos

    Glossrio

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    A organizao do movimento estudantil hoje.

    A universidade hoje composta por trs segmentos definidos de acordo com a funo que nelaexercem: aos professores compete ensinar o conhecimento por eles acumulado; aos funcionrioscumpre, literalmente, fazer a universidade funcionar, e com isto deve-se entender desde atividadesburocrticas, at limpar os prdios e vigiar a estrutura; aos estudantes cumpre, como o nomeindica, estudar. Esses trs segmentos devem articular-se para dar realidade ao objetivo da

    universidade, qual seja: produzir e reproduzir conhecimento. Para este fim, as trs categorias sofundamentais.

    O que marca a universidade de nossos dias inclusive a UNESP uma falta, ou, antes, umasrie de faltas. E a falta qual todas as outras podem ser subsumidas a falta de democracia.

    Faltam vagas para todos que querem cursar a universidade. Faltam polticas de permannciaestudantil. Falta democracia na gesto da universidade. Falta abertura da universidade pblica sociedade que a mantm como tal: a utilizao e a finalidade pblica do conhecimento que auniversidade produz. Faltam salrios dignos aos professores e funcionrios a estes especialmente.Faltam, pois, muitas coisas, e este o primeiro motivo que leva os trs segmentos a organizar-se;quer dizer, lutar por condies que permitam que suas respectivas funes articulem-se para que auniversidade cumpra suas finalidades: produzir, reproduzir e extender o conhecimento sociedade.

    Mas no trata-se de um mesmo plano, onde os trs segmentos ocupam a mesma posio. No: nointerior da universidade os segmentos ocupam posies diferentes. Quem gere a universidade, porexemplo, uma parcela de professores e funcionrios: a burocracia acadmica; a enorme maior

    parte dos estudantes, funcionrios e mesmo dos professores no participam em nenhum nvel dessagesto portanto, as diferenas no se do somente entre segmentos, mas interiormente a cadasegmento h diferenas.

    Porque se ocupam diferentes posies, mas no s por isso, h diferenas: que auniversidade no uma idia pronta desde sempre; ela est situada, e muito bem situada, nosconfrontos de interesses na sociedade. H projetos distintos para as universidades. Ou seja,baseado nas foras polticas de seus envolvidos ser vitorioso um projeto de universidade.Neste desnvel de posies, desenvolve-se toda uma srie de lutas na universidade. Para defenderseus interesses e seus projetos polticos distintos, os grupos organizam-se. Grupos dentro de cadasegmento, grupos do segmento, grupos que perpassam e do a volta nos segmentos.

    Chama-se Movimento Estudantil (M.E.), o meio atravs do qual os estudantes organizam-se paraconseguir as condies mnimas de estudo e para por em prtica seu projeto poltico deuniversidade. Portanto, meio para a defesa dos interesses dos estudantes. Estes interesses so, porsua vez, definidos atravs de dois mecanismos de democracia. Aqueles de democracia direta e

    outros, de democracia representativa.Dentre os mais notveis mecanismos de democracia direta, podemos citar as assemblias

    estudantis. Nelas vale o principio de cada cabea um voto. So os organismos supremos dedeliberao estudantil, onde qualquer estudante pode tomar a palavra e votar. Nenhum outroorganismo superior a uma assemblia em suas respectivas instncias, porque existem diversosnveis de assemblias: assemblia de curso, de faculdade ou instituto, de universidade, etc.

    H, alm disso, os comits ou comandos: mecanismos instaurados por uma assemblia com umfim especfico; assim, submetem-se assemblia. Por exemplo, um comando de greve ou umcomit de luta contra a represso. Seu objetivo , portanto, organizar uma mobilizao contradeterminada coisa. Existem dois tipos de comits/comandos: abertos (onde todos os presentes tmdireito voz e voto). E fechados (onde somente alguns representantes, chamados de delegados,tem direito ao voto, ao restante cabendo somente o direito voz).

    Ao contrrio das assemblias e comits, os mecanismos de democracia representativa sopermanentes, isto , ocorre uma disputa eleitoral entre uma srie de chapas/candidatos, e a/o

    chapa/candidato eleito tem um mandato fixo, ao fim do qual procede-se uma nova eleio. Dentreestes mecanismos cumpre ressaltar os Centros Acadmicos (CAs), que representam os estudantesde determinados cursos; os Diretrios Acadmicos (DAs), representantes dos estudantes de umafaculdade ou instituto, sendo estas/estes uma congregao de cursos; e os Diretrios Centrais dosestudantes (DCEs), cuja funo representar a totalidade dos estudantes de uma universidade,que uma congregao de faculdades e institutos. CAs, DAs e DCEs so organizaes autnomasdos estudantes, cujos fins so defender perenemente os interesses dos estudantes.

    Essas entidades estudantis podem possuir uma srie de diferenas internas. Constitudas por umasrie de membros, elas podem ser verticais (caso haja uma hierarquia interna, por exemplo:presidente, vice-presidente, etc..) ou horizontais (portanto, com todos os membros equivalendo-se

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    entre si nas decises internas). A forma de sua eleies pode ser majoritria (a chapa que tivermaioria absoluta de votos ocupa todas as cadeiras na entidade) ou proporcional (as chapasocuparo as cadeiras proporcionalmente ao nmero de votos que obtiveram).*

    Atravs de suas formas organizacionais democrticas, portanto, os estudantes defendem seusinteresses. Por meio delas, colocam em prtica seu projeto poltico para a universidade. E tantomais os estudantes sero influentes quanto mais fortes forem estas organizaes nas lutas internas

    universidade.

    Felipe Luiz Guma, 4 Filosofia na UNESP-MarliaAline Monge, Mestranda em Educao na UNESP-Marlia

    Estrutura burocrtica da UNESP ou a antidemocracia universitria1

    A UNESP composta burocraticamente por uma srie de rgos que, em se relacionando,administram a universidade. Basicamente dividem-se em dois tipos; rgos de administrao geralda UNESP; e rgos das unidades, que administram cada campus. H, alm disso, dois tipos dergos de gesto: os rgos colegiados e os rgos executivos.

    Em todos os rgos colegiados e comisses da Universidade, os professores devem,obrigatoriamente, ocupar 70% das vagas, quer dizer, os professores que mandam na universidadeem fato. Os funcionrios e estudantes possuem somente 15%, cada categoria, dos assentos nestesorgos colegiados. Trata-se do famoso 70-15-15, absolutamente antidemocrtico, pois osestudantes e funcionrios, embora sejam a maioria absoluta da universidade em nmeros absolutos,no o so com o mesmo peso na gesto, com um segmento valendo mais que os outros: que nauniversidade todos so iguais, mas uns so muito mais iguais que os demais.

    O rgo mximo de deliberao da universidade o Conselho Universitrio (C.O.), composto pelosdiretores das unidades, pelo reitor e vice-reitor, pelos pr-reitores, representantes de professores,funcionrios e estudantes e representantes das entidades patronais e de entidades dostrabalhadores. O C.O. possui dois rgos auxiliares principais, o CADE (Conselho de Administrao eDesenvolvimento) e o CEPE (Conselho de Ensino, Pesquisa e Extenso de Servios Comunidade),cujas composies obedecem ao mesmo esquema do C.O., quer dizer, os professores possuemmaioria mais que absoluta, podendo deliberar e aprovar sozinhos sobre e qualquer tema.

    estes rgos colegiados subordina-se a Reitoria. O reitor o administrador mximo dauniversidade; o vice-reitor seu substituto imediato; e os pr-reitores cuidam de partes especficasda administrao da universidade, como a graduao ou a administrao. Embora se diga que oreitor eleito, em fato, o processo de escolha do reitor a marca a mais saliente da estruturameritocrtica e autoritria da universidade. Primeiro, somente professores (com o grau mximo detitulao possvel chamados professores titulares) podem se candidatar a reitoria; portanto, nemestudantes nem funcionrios e sequer a maior parte dos professores podem participar da gesto dauniversidade enquanto reitores. Segundo, a forma como as eleies se do: h uma diferenagritante entre o peso de cada uma das categorias na escolha do reitor: o voto de cada professorequivale ao de voto de 3.097 estudantes e de 458 funcionrios2; isto porque embora a UNESP contecom 46.566 estudantes e 6880 funcionrios, estes no exercem nem a sombra de poder que osprofessores, que somam 3.425. Isto leva a distores no processo de eleio, como a que ocorreuaqui nesta UNESP-Marlia em 2008: o candidato que obteve a maioria absoluta de votos, Prof. Dr.Z Carlos, no tornou-se Diretor; que a outra concorrente e atual Diretora Profa. Dra. Fujita,teve um nmero maior de votos dos professores, em contraste com Z Carlos, cuja base erapredominantemente formada por estudantes e funcionrios. Assim, Z Carlos ganhou, mas perdeu eFujita perdeu, mas ganhou. Terceiro: quem d a ltima palavra sobre a escolha do reitor ogovernador do estado. O C.O. elabora uma lista trplice, com os trs candidatos mais bem votados.A partir desta, o Governador do Estado indica quem ser o reitor da UNESP. Nem sempre aqueleque recebeu a maior votao ser o reitor; o que acaba de ocorrer na USP: embora G. Oliva tenha

    1 Os dados constantes neste texto esto disponveis no site da UNESPe no Anurio Estatstico 2009, cujodownload tambm possvel na pgina da universidade: www.unesp.br2 Coeficiente obtido por meio da diviso do nmero total de estudantes, professores e funcionrios da UNESPpela percentagem de vagas de cada segmento nos orgos colegiados.

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    recebido a maioria dos votos, foi J. G. Rodas o escolhido como novo reitor da USP pelo governadorSerra.

    O reitor comanda toda a maquinaria burocrtica da universidade: pr-reitorias, assessorias, etc..Ele responsvel direto por colocar em prtica a poltica do governo do estado para a universidade.Atualmente, por exemplo, o Governador Serra busca aumentar o nmero de vagas na universidadepor meio do ensino distncia e submeter, ainda mais, s universidades e a educao de maneirageral aos interesses dos grandes capitalistas. A Reitoria da UNESP (RUNESP) segue atentamente

    estes planos, seja por meio da abertura de toda uma srie de cursos distncia, como Pedagogia,seja atravs do PDI (Plano de Desenvolvimento Institucional), que torna a UNESP um anexo dasgrandes empresas e dos latifundirios do estado, submetendo-a completamente a estes.*

    Portanto, RUNESP o nome da administrao geral da universidade, responsvel por gerir e darunidade ao conjunto da universidade. que a UNESP uma universidade multicampi, quer dizer,descentralizada. H mais de 30 unidades da UNESP espalhadas por 23 cidades do estado. Porunidade deve-se compreender uma faculdade ou instituto, cada um composto, por seu lado, poruma srie de cursos.

    A clula burocrtica primordial de cada campus o departamento; ele congrega osprofessores de determinada rea em um todo mais ou menos coerente. Cada departamento possuium chefe e, o conjunto dos chefes de departamento de uma unidade compe a Congregao local,

    juntamente com os representantes dos estudantes e dos funcionrios. Este rgo colegiado umpequeno C.O., rgo mximo de deliberao de cada unidade; e, tambm como no CO, a

    Congregao possui toda uma sorte de Comisses assessoras, como Conselho de Oramento, ou oConselho de Ensino, Pesquisa e Extenso. O presidente da Congregao sempre o Diretor daunidade, um pequeno reitor que administra o campus. Tambm o Diretor deve se submeter Congregao, tal qual o reitor ao C.O.*

    A universidade, esta fbrica de conhecimento, cuja origem remonta aos mais obscuros tempos daIdade Mdia, mantm-se, quando soa bem de pertinho o primeiro milnio de sua criao, mantm-se, ainda, medieval. Controlada por uma casta de professores altamente especializados, que secolocam como os iluminados, os nicos capazes de gerir a universidade; a universidade como queum feudo: exclui a maior parte da populao, deixando-se entrevar nas mos de uns poucos. Auniversidade, inteira fechada, que somente corta fora todo aquele que no lhe dcil. A UNESP:uma universidade de nossos dias.

    Felipe Luiz Guma, 4 Filosofia na UNESP-Marlia

    Aline Monge, Mestranda em Educao na UNESP-Marlia

    A democratizao da Universidade

    Como tudo o que h no mundo, tambm a universidade pode-se dizer composta de trspartes: inicio, meio e fim. Como quase tudo que h em nossa sociedade, tambm universidade

    falta uma srie de coisas que a distanciam da perfeio.Democratizao significa o processo de tornar algo democrtico. Se a universidade deve setornar, ela no . Trata-se, pois, de uma falta e de uma destas faltas que este pequeno textopretende tratar: a falta de democracia na universidade, seja em seu incio, em seu meio ou em seufim.

    O ingresso na universidade no livre. No so todos que podero, um dia, ter um diplomaem mos. Na verdade, so muitos poucos no Brasil atualmente: a universidade, e a universidadepblica especificamente, so extremamente restritas; no caso das universidades privadas, isto se dem decorrncia das altas mensalidades, que poucos em uma sociedade marcada pelas diferenas

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    mais abissais entre ricos e pobres podem arcar. No caso das universidades pblicas, como aUNESP, a questo torna-se um pouquinho mais complicada.

    H o vestibular que existe para medir um conhecimento hegemnico que negado a maioriada populao e que seleciona quem far e quem no far a universidade. Ora, se a universidadepblica de qualidade estivesse ao alcance de todos quem pagaria as mensalidades de uma privada?Portanto, faz parte da poltica neoliberal vigente, que separa os cursos de excelncia dos queformam para o mercado de trabalho. O vestibular serve, portanto, para impedir que a maior parte

    da populao, que pobre e cujo ensino bsico deu-se em escolas pblicas extremamenteprecarizadas, entrem nesses centros de excelncia, como a USP, UNESP e Unicamp.

    Uma universidade democrtica em seu incio aberta para que todos os que querem cursaro faam; uma universidade que, sendo pblica, permita e busque integrar a maior parte dapopulao s suas fileiras.

    H o meio das coisas. Por ele, as coisas articulam-se para atingir seu fim. Pois bem, so trsos fins da universidade: o ensino, a pesquisa e a extenso (o trip indissocivel). O meio denominado administrao, ou seja, planejamento e organizao para atingir um fim. Essaadministrao no neutra, o modo como ela se organiza embasada em uma concepo do seufim, ou seja, no caso da universidade, em uma concepo de educao.

    Na administrao tambm falta democracia. que a administrao da universidadeconcentra-se em rgos, chamados colegiados, onde os professores dominam. Eles tm legalmente,com exceo dos Conselhos de Curso, direito 70% das vagas, enquanto que os funcionrios eestudantes tm direito somente a 15% cada setor. Como a diviso em peso decisrio na

    universidade segue o famoso 70-15-15, sendo que os estudantes e os funcionrios somam, naUNESP, 53.446 enquanto que os professores so, no total, 3.325? H 16 vezes mais funcionrios eestudantes que professores. No entanto, seu peso em decises irrisrio. H uma casta deprofessores incrustada na universidade que a controla, de modo que os colegiados da universidadeso antidemocrticos, absolutamente autoritrios. Mesmo nas eleies para reitor e diretor osprofessores valem mais que o restante; na universidade, cada cabea no vale um voto, como se osprofessores fossem iluminados, destinados pelas foras do universo a comandar o restante dauniversidade.

    Uma universidade democrtica em seus meios reconhece, em um primeiro momento, quetodos aqueles que a compem so iguais independentemente da funo que exercem em seuinterior. Fazem parte de uma mesmo projeto de universidade e, portanto, devem decidir por ele.No h justificativa razovel para que os professores, por terem estudado, por exemplo, filosofiaantiga, saibam melhor que os demais segmentos da universidade planejar seu projeto poltico-pedaggico.

    H duas propostas imediatas no sentido de democratizar a universidade: a paridade e aproporcionalidade. Paridade quer dizer que cada um dos trs setores ter um tero do voto nosrgos colegiados e um tero do peso nas eleies: 33%-33%-33%. Proporcionalidade significa queos setores tero o peso equivalente ao seu nmero absoluto na universidade; assim, a universidadedeixaria de dar-se sob a forma de castas para ser como todo resto da sociedade, onde cada um valeum voto.

    Por ltimo, o conhecimento gerado na universidade. Em tese, o conhecimento produzidopela universidade pblica deve ser voltado para a sociedade. O que acontece hoje que as verbaspara as pesquisas so financiadas por agncias que possuem uma poltica de priorizao daquelasque levem a um retorno imediato e que sirvam para gerar lucro s grandes empresas. Trata-se deuma privatizao velada da universidade: se esta pblica, como pode sua finalidade dar-se paralucroprivado de uns poucos empresrios?

    Uma universidade pblica em seus fins ser aquela na qual o dinheiro pblico que arrecadoda sociedade retorne a ela. O conhecimento que a universidade produz ser pblico quando

    destinar-se a suprir e resolver necessidades sociais, como os problemas crnicos de nosso pas: afome, enchentes, doenas, etc. No pesquisar Botox, como faz o Dep de Biologia da USP; oumelhoramento gentico de frangos, tal qual o ex-reitor da UNESP, Marcos Macari, o fez a servio daPerdigo.

    Democratizar a universidade um imperativo ao movimento estudantil. Como a burocraciaacadmica jamais abrir mo do controle da universidade, somente forte mobilizao estudantil,poder mostrar aos excludos, queles que no tm acesso universidade pblica, como estapermanece elitista e submissa aos grandes interesses; somente uma mobilizao que alieestudantes e sociedade poder, em fato, democratiz-la. Eis uma necessidade atual do movimentoestudantil e de trabalhadores da universidade.

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    Karina Perin Ferraro, Mestranda em Educao na UNESP-MarliaFelipe Luiz Guma, 4 Filosofia na UNESP-Marlia

    A luta pela permanncia e a permanncia da luta.

    Um novo ciclo da universidade est comeando nesse ano. Ciclo este que se repete acada novo ano letivo: estudantes que se iniciam no universo acadmico e estudantes queo deixam. Isso revela que o modo de funcionamento da universidade apresenta umacontinuidade; essa continuidade depende da existncia de elementos: esses elementosdo permanncia estrutura de funcionamento do ensino, da pesquisa e da extenso - ofamoso trip sobre o qual apiam-se as universidades. Mas no inteno deste textodeter-se ao referido trip, pois isto ser feito pela burocracia acadmica. No obstante,constitui o propsito destas poucas linhas abordar um pouco sobre um catalisador dauniversidade, o qual ser referido com o nome de luta. Ainda que para muitos ela no sejaclara, todos conhecem a luta, e ela deve ser inserida no contexto geral da universidade. Aluta que aqui trataremos aquela que defende a permanncia dos estudantes nauniversidade moradia, restaurante universitrio (RU) e bolsas de apoio. Cabe ressaltar

    que estes no so os nicos problemas e contratempos que os estudantes enfrentam.No s na Unesp em Marlia que a minoria dos ingressantes pertence classe mais

    oprimida da sociedade. Fazer parte desta minoria, os pobres, acarreta uma srie deconseqncias de mbito estudantil e acadmico, tais como: necessidade de moradia ebolsas estudantis, RU, quantidade de livros disponveis na biblioteca e acesso internet. Apermanncia dos pobres na universidade j dificultada pela prpria condio social, e setorna comprometida caso no haja polticas de permanncia estudantil. Convm ressaltarque as polticas de permanncias existentes nas universidades no so garantidas todosos anos todos os estudantes e no so frutos da boa vontade da burocracia acadmica,mas da luta dos prprios estudantes. Infelizmente todos os anos a histria se repete naluta pelos meios que permitam a insero e continuidade dos estudantes.

    A moradia, por exemplo, o espao de vivncia dos estudantes oriundos da classetrabalhadora, resultado de uma luta levada a cabo por aqueles que no possuam meiosde se manter na universidade. A luta foi travada contra a burocracia acadmica que,mesmo conhecendo as necessidades dos estudantes da construo de uma moradia,tornou o processo demasiado lento. Essa histria teve momentos de intensidade aguda,como o perodo em que muitos, como protesto, dormiram no cemitrio da cidade porvrias noites. A inteno do movimento era clara: conquistar meios que permitissem apermanncia dos estudantes em Marlia e, nesse momento de conquista, com aconstruo da moradia, a organizao dos estudantes foi necessria.

    Faz-se presente dentro da Moradia Estudantil uma organizao autnoma dosestudantes denominada Comisso de Moradia, cujos objetivos compreendem tanto aorganizao do espao que constitui lar de mais de cem pessoas, quanto para levaradiante as lutas histricas dos estudantes pobres, que visam conquistas fundamentais; aComisso de Moradia busca, enfim, dar fora queles que pretendem no s uma

    Universidade, mas uma sociedade verdadeiramente justa. Dentre outras questes, aorganizao estudantil busca formas de solucionar as demandas dos estudantes (inclusiveaquelas de permanncia) seja atravs de protestos, greves, e outras formas de luta.

    Todavia, nem s de casa para morar que vive o estudante. H vrias outrasnecessidades tais como livros, alimento, vestimenta, atendimento mdico, internet - queso historicamente constitudas pelos seres humanos e que recebem um carter denormalidade na sociedade. Segundo as circunstncias da sociedade atual, as necessidadess podem ser satisfeitas quando o indivduo tem a posse e faz uso do dinheiro ele umagente intermedirio entre a necessidade e a sua realizao. Esse meio existe na esfera

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    estudantil, mesmo que em nmero insuficiente: as bolsas de auxlio estudantil. Essamodalidade de bolsa d uma pequena ajuda aos que precisam, mas h que se destacaraspectos sobre sua quantidade e qualidade: o seu nmero pequeno frente demanda eo valor no cobre as despesas reais. No isto bastando, a forma de seleo decontemplados pela bolsa um processo extremamente burocrtico, constrangedor,negligente e de descaso, realizado pela burocracia acadmica: nele o pobre tem que

    provar sua misria. De fato, o valor da bolsa no permite sequer a aquisio dos textosque so utilizados no curso. No obstante, mesmo sendo escasso o nmero de bolsas,elas so os resultados de luta dos estudantes. Luta que se radicaliza quando os detentoresdo dinheiro pblico so colocados contra suas paredes de cristal e espelho, que refletemas diferenas de classes.

    A radicalizao da luta deixou resultados que at hoje do frutos importantes aosestudantes. Mas preciso explicitar que radicalizao no sinnimo de loucura,barbrie; essa concepo falaciosa. certo tambm que a luta no incorporada portodas as pessoas aqui presentes. Para muitos as condies de existncia atuais estomuito favorveis; assim, devemos nos perguntar, quem que luta e quem no luta?Como se divide a sociedade hoje e como essa diviso, marcada por drsticas contradies,se reflete na universidade? Quem nunca viu a distoro feita pela mdia das lutas dosestudantes por condies mnimas de permanncia e a represso policial a mando dos

    dirigentes burocratas?Em geral, o espao de atuao dos filhos da classe trabalhadora na universidade

    reduzido, limitado por aqueles que anseiam a dominao cada vez maior. Mas nem s ospobres enfrentam os problemas aqui existentes. H coisas comuns, que ferem a todos:falta de professores em todos os cursos, falta de livros e recursos, quadro de funcionriosincompleto (o que gera um gravssimo problema: os que ainda conseguem trabalhardevem fazer o servio de muitos, sendo explorados ao extremo), falta de recursos para oR.U., sujeira feita por muitos dos prprios estudantes e professores, que so limpas pelasfuncionrias terceirizadas, a prpria terceirizao nas universidades, etc.

    O problema da ocorrncia excessiva de professores substitutos reside no fato delessempre pegarem o bonde andando, sem falar do baixo salrio, na impossibilidade deorientao em estgios, o que leva ao sobrecarregamento dos professores efetivos. No

    h dvidas da capacidade intelectual dos professores substitutos; contudo, assim como nocaso da contratao de funcionrios terceirizados, eles no tm vrios direitos que umfuncionrio pblico contratado possui.

    A UNESP-Marlia conta, ainda, com um restaurante universitrio. Fruto de mais devinte anos de luta dos estudantes, o R.U. vai longe da perfeio: h poucos funcionrios,refeies e espao, alm do que o restaurante funciona somente no horrio do almoo. Aluta realizada em 2009 pelos estudantes conquistou a garantia do funcionamento noturnodo R.U.; mas, por enquanto, ficou somente como promessa no cumprida da Direo e daReitoria.

    Tudo isso compe uma breve descrio do que ocorre, e por isso tem suas limitaes. preciso que cada um tome para si o problema e, de forma organizada com osestudantes e trabalhadores que querem realmente uma transformao da realidade, dcontinuidade luta, no deixando perecer de vez esse espao que pode(ria) ser de

    crescimento social e pessoal.

    Rodrigo Maia, graduando em Cincias Sociais na UNESP-Marlia.Juliana Galhardi. Mestranda em Geologia na UNESP-Rio Claro

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    Os ataques do Governo Federal

    Apesar de sermos considerados um povo pacfico, a histria brasileira contem inmeras revoltas emanifestaes ao longo desses quinhentos anos, e com a educao no foi diferente.

    Recorrendo a um perodo mais recente, em 1932, intelectuais brasileiros [da nossa nao]

    (*nao passa-me a noo ou de um nacional-desenvolvimentismo frouxo ou de um chauvinismo)lanaram o Manifesto dos Pioneiros da Educao Nova, [ou seja,] uma carta que continhareformas educacionais partindo da necessidade da elaborao de um plano nacional para aeducao. A partir da grande repercusso desse manifesto, outros setores da sociedade,entendendo a sua importncia e necessidade, participam mais abertamente das discusses e naConstituio Federal de 1934, a educao incorporada como artigo e dever do Estado.

    Ao longo dos anos que se sucederam, e ainda na atualidade, as preocupaes com a educaoentraram e saram da Constituio. Houve momentos de grandes lutas, com perodos democrticos onde vrios setores da populao realmente participaram das discusses. Mas, sem dvidaalguma, o que prevaleceu foram sempre os acordos dos altos escales governamentais, ou seja,acordos no democrticos de cpula que em sua maioria venderam, de uma forma ou outra, osistema educacional brasileiro grupos estrangeiros (atrelando a educao brasileira s imposiesdo FMI Fundo Monetrio Internacional, a organizao mundial do imperialismo etc.) e gruposnacionais ligados ao ensino privado.

    A esse sentido antidemocrtico no qual a histria de nossa educao vem caminhando, juntam-seos mais recentes ataques. O PNE (Plano Nacional de Educao) e as reformas universitrias que aele esto atreladas como o REUNI (Programa de Apoio a Planos de Reestruturao e Expanso dasUniversidades Federais), o ProUni (Programa Universidade Para Todos) e o projeto de expanso dasuniversidades estaduais so os mais recentes passos contra toda populao brasileira no que dizrespeito educao e a democracia.

    No mbito federal, as linhas argumentativas do Governo Lula na defesa de seus programaspara a educao so afirmar estes como : 1. os programas so de incluso social, pois a grandebeneficiria dessa mudana a populao brasileira; 2. que os crticos a eles so antidemocrticos eelitistas,]. Analisemos, contudo, mais de perto cada um desses programas.A) ProUni

    O Programa de Universidade Para Todos (ProUni), tem o intuito de oferecer vagas nasuniversidades privadas para estudantes que no possuem condies financeiras, o que possibilitaque pessoas at ento impedidas de seguir um curso superior o faam.

    O discurso que justifica o ProUni lindo: o problema que o discurso no condiz com a prtica,pois, na verdade, o programa est alicerado em um grande processo de iseno de impostos paraas Instituies privadas que dele fazem parte. Expliquemos melhor:

    Tudo comeou aps a Lei da Reforma Educacional feita em 1968, em plena represso aosmovimentos populares levada adiante pela Ditadura Militar. Resultado de uma srie de acordosentre o ento Ministrio da Educao e Cultura e o United States Agency for InternationalDevelopment, conhecidos como acordos MEC-USAID, entre Brasil e Estados Unidos, por meio dosquais o imperialismo ianque ditava-nos, visando seus interesses particulares, com organizar oensino em geral e, particularmente, o ensino superior; a Lei da Reforma Educacional, reestruturavatoda a educao no pas. Por meio deste ltimo acordo fruto do golpe de 1964, alm disso, oGoverno militar concedia uma srie de incentivos iniciativa privada no mbito da educao,salientando-se as isenes de impostos. Seja por meio de renncia fiscal ou por imunidadetributria, as isenes nada mais so que a transferncia indireta de recursos pblicos iniciativaprivada: dinheiro pblico que passa s mos de particulares. Este processo de privatizao velada

    somente avanou at nossos dias, ao ponto das universidades privadas que ofereciam cerca de45% das vagas no ensino superior quando da Reforma em 1968, ofertarem em 2008, quarenta anosdepois, cerca de 70% dessas vagas (dados extrados do INEP) . Assim, recursos pblicos quedeveriam ir ao atendimento da populao brasileira de maneira tambm pblica, so passados paraa iniciativa privada as posses de pessoas e grupos empresariais, que exploram a populao.

    Nesse contexto democrtico braseiro populao a instituio estudantil representativa nvel nacional a Unio Nacional dos Estudantes organiza caravanas como Caravana UNE peloBrasil, com o discurso de levar reivindicaes para o Governo. Porm, o que acontece so acordosunilaterais entre a diretoria da UNE, o Governo pelego de Lula, as reitorias e os empresrios, quesomente levam desmobilizao estudantil. A UNE, no nos esqueamos, recebe financiamento do

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    Governo. Quer dizer, uma das principais instituies estudantil, que deveria fomentar o debate,acaba por apoiar o Governo Federal em troca de financiamento descarado e desmobilizar osestudantes de modo mascarado para que os ataques de Lulla passem por vantagens.

    Ficam algumas perguntas: Por que o dinheiro pblico que passado para mos de particulares,no usado para realmente beneficiar a populao como um todo ao invs de servir como meio delucro para um punhado de grandes empresrios, os tubares do ensino superior? Porque a UNErealmente no critica essas polticas pblicas que h muito tempo vem sendo implementadas? Por

    que se privilegiam os acordos paralelos? Por que o debate velado totalidade da populao, aoinvs de aberto como deveria ser em uma democracia ? Os maiores beneficiados dessas polticasso realmente o conjunto da populao, ou so polticas [de carter no democrticos] nopopulares com roupagens democrticas?B) REUNI

    O Programa de Apoio a Restruturao das Universidades Federais (REUNI), um pouco diferente doProUni, um projeto de ampliao e reestruturao das universidades pblicas, o que j umavano em relao ao [projeto do] ProUni. Por meio dele, o governo oferece um maior repasse deverbas em troca de uma srie de ajustes que as universidades que aderirem ao programa devemrealizar.

    O maior problema do REUNI no est nos poucos, mas enfim dispensados, recursos educao pblica, e, sim, na precarizao das universidades e do ensino em geral que os dados, porserem simples nmeros, escamoteiam.

    Por detrs deste projeto se escondem dados importantes. Nas escolas pblicas de educao bsica

    h um professor para cada dezoito estudantes; ora, o REUNI pretende fazer o mesmo com asuniversidades pblicas federais, o que implica que se dobre o nmero de estudantes sem a mesmacontratao de um s professor. Ser preciso que lembremos o estado calamitoso do ensino pblicona educao bsica? Ser isto que queremos em relao as universidades pblicas?

    Esse aumento do percentual professor/estudantes no tudo. O REUNI levanta ainda o ensino distncia como forma de ampliar as vagas nas universidades, o que bastante discutvel seja emtermos propriamente pedaggicos, seja em termos polticos e financeiros. O REUNI ainda postulaque as universidades que aderirem ao programa devem por como meta que 95% de seusestudantes concluam os cursos, ndice que hoje gira em torno de 54%.

    Em troca desta srie de ajustes o governo prope, no mximo, 20% a mais de repasse deverbas. Para sermos bastante claros: o Governo quer que as instituies DOBREM o nmero deestudantes e tenham como contrapartida financeira APENAS 20% a mais de recursos.

    O problema desse projeto a precarizao total do ensino em um tempo recorde! Hoje, asinstituies pblicas de ensino superior do Brasil, com 30% do total de estudantes matriculados [de

    alunos nelas matriculados], empreendem 80% de toda a pesquisa, alm do [e] desenvolvimento denovas tecnologias[,]: ser que isso vai continuar com ataques do calibre do REUNI? Ou ser queesto tentando destruir as universidades pblicas [esses instituies de ensino] como fizeram com aeducao bsica?

    H de se contar o processo democrtico no qual se deu estas discusses nenhum: restrito aosreitores e a alguns poucos doutores. Quando os estudantes dessas instituies buscaram posicionar-se em relao ao REUNI, seja para opor-se a adeso de suas respectivas universidades a ele, sejapara aperfeioar esta adeso, ou foram ignorados ou receberam o sempre presente dilogo docassetete com mui amveis policiais da Tropa de Choque. esse tipo de democracia que queremos?Por que a populao no tem voz, e quando tenta falar recebida pela polcia?

    A UNE nesse processo cumpriu, mais uma vez, o papel de desmobilizadora do movimentoestudantil em troca de alguns milhes do paizinho Lula. Enquanto isto, a universidade pblica, ou oque resta de sua qualidade esto a ir ralo abaixo.Matheus Bortoleto, 2 Cincias Sociais na UNESP-Marlia

    Natlia Bellucci, 2 Pedagogia na UNESP-Marlia

    O movimento estudantil na ltima dcada e o projeto de universidade pblica do Governoestadual

    No Estado de So Paulo, inclusive na UNESP, o projeto de educao neoliberal oneoliberalismo uma forma de gerir o Estado na sociedade capitalista - transforma tudo emmercadoria, inclusive a educao em todas as modalidades e nveis e a coloca a servio do mercado.

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    O projeto do governo estadual do PSDB possui algumas frentes: no caso especfico do ensinosuperior o principal objetivo o sucateamento da universidade pblica, para que esta procure edependa de recursos da iniciativa privada, isto , dos empresrios que apenas visam ao lucroimediato. Para que a educao gere lucro, preciso sacrificar sua qualidade, j que se trata de umprocesso de formao humana, de difcil mensurao, onde os resultados se do a longo prazo.

    Em segundo plano, o projeto do governo estadual busca atacar a autonomia dasuniversidades pblicas (constitucionalmente garantida). O motivo claro: h setores dentro das trs

    pblicas paulistas dispostos a resistir implementao do projeto neoliberal de educao dogoverno. Em terceiro plano: o Ensino Distncia (EaD), forma mais lucrativa para o governo incluirno ensino superior maior parte da populao; lucro econmico, pois o EaD mais barato; mastambm lucro poltico, dado sua rapidez e claro apelo eleitoreiro. Assim, sero citados algunsataques e as respectivas respostas da comunidade acadmica professores, estudantes efuncionrios - na ltima dcada.

    Entre 2000 e 2004 a UNESP abriu oito novos campie mais cursos nas unidades existentessem repasse de verba necessrio. S no campus de Marlia dos cinco cursos ento existentes, foramabertos mais quatro, Relaes Internacionais, Fisioterapia, Terapia Ocupacional e Arquivologia. Emsuma: dobrou-se o nmero de cursos sem que houvesse proporcional incremento na infraestruturada universidade como construo de salas, bibliotecas, etc. Tambm no contrataram-se maisprofessores, tampouco funcionrios.

    A comunidade acadmica promoveu discusses e lutas para barrar esses ataques por meiode greves, passeatas, atos, porm sem muito sucesso. Aps 2004, o movimento convertido pela

    abertura de concursos, reajuste salarial e por mais verbas para a educao. Vale ressaltar que em2005, na discusso oramentria da Assemblia Legislativa do Estado de So Paulo, foi conquistadopela comunidade acadmica e movimentos sociais organizados um aumento do repasse de ICMS(Imposto sobre circulao de mercadorias e servios) para a educao que no chegava ao que acomunidade estava lutando, mas j se configurava como um avano. O percentual inicial do ICMSdestinado s universidades pblicas paulistas era de 8,4% em 1989, quando da conquista de suaautonomia financeira e, desde 1995, era de 9,57%. Entretanto, o ento governador Geraldo Alckmin(PSDB), vetou o aumento do repasse. Mesmo com forte mobilizao da comunidade acadmica,principalmente dos estudantes, no foi possvel barrar o veto.

    O sucateamento das estaduais paulistas continuava em curso, mas o movimento continuoulutando e, especificamente a UNESP-Marlia foi tendo algumas conquistas, como o RestauranteUniversitrio, um novo prdio de aulas, um novo laboratrio de informtica, alguns concursos.

    Logo nos primeiros dias de seu mandato, o atual governador Serra, do PSDB, atacou pormeio de uma srie de decretos as instituies pblicas estaduais: alterou-se a estrutura de poder do

    CRUESP (Conselho de Reitores das Universidades do Estado de So Paulo) com uma reformulaoque concentrava os processos decisrios nas mos de secretrios de estado; suspendeu-se asadmisses e contrataes de pessoal; advieram presses para que as universidades engessassem oseu oramento no Sistema Integrado de Administrao Financeira para Estados e Municpios doEstado de So Paulo (SIAFEM); no transferiu-se em janeiro/2007 parte dos recursos previstos emlei; priorizou-se o financiamento de pesquisas operacionais, ou seja, pesquisas que possuam umresultado quantificvel e aplicvel, que sirvam preferencialmente para que os grandes empresriosaumentem seu capital financeiro. Assim, o governo estadual ataca, principalmente, a administraodas universidades, ferindo a autonomia conquistada a duras penas pela comunidade acadmica nadcada de 1980 e as deixam dependentes do seu governo.

    Como resposta aos fortes ataques promovidos pelos Decretos, iniciou-se uma greve dosestudantes nas universidades estaduais paulistas, seguida por funcionrios e professores, que seaprofundou com manifestaes, passeatas e ocupaes em vrios campi. Pela fora da ocupaoestudantil, de 51 dias, da Reitoria da USP, o movimento cresceu com a ocupao da Diretoria docampus de Marlia da UNESP, expandindo-se aos demais campidesta universidade. Exigia-se, entreoutros, a retirada dos decretos. O movimento foi o mais forte das ltimas dcadas, tanto que ogoverno estadual divulgou um decreto declaratrio, dia 31 de maio de 2007, abrindo mo dapresidncia do CRUESP e de outros pontos, como a mudana de redao do decreto referente pesquisa operacional, mas no de todo o conjunto dos decretos institudos.

    Com o decreto declaratrio, muitos professores que estavam apoiando a greve se retiraram,principalmente os reitores. As ocupaes foram sendo encerradas, assim como as greves. Apesardisso, o movimento de 2007 reavivou a discusso pela gesto e a autonomia universitrias edemonstrou que os estudantes discutem e se organizam em torno da questo da educao e dasociedade brasileira e ainda demonstrou sua independncia perante o movimento docente. Durante

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    todo esse tempo o movimento estudantil colocou suas pautas e levou o movimento a frente, masno teve fora suficiente para continuar at que todas suas pautas fossem atendidas. A falta de umaorganizao estadual e o desgaste sofrido depois de muito tempo de luta foram fatores doencerramento das greves e ocupaes.

    No tendo passado ainda tempo suficiente para que o movimento conjunto dos trs setoresse recuperasse do desgaste sofrido aps a luta de 2007, o governo de So Paulo retoma seusataques pela frente do Ensino a Distncia (EaD) com a criao da Universidade Virtual do Estado de

    So Paulo (UNIVESP) e, em consonncia com o governo, a reitoria da UNESP, impe um Plano deDesenvolvimento Institucional (PDI), ambos em 2008.

    A criao de cinco mil vagas EaD para o curso de Pedagogia, como parte do projetoUNIVESP, foi o primeiro golpe que a UNESP sofreu. O projeto, alm de propor EaD, era muito malformulado propondo uma precria estrutura pedaggica e fsica. Mesmo com grande parte dacomunidade acadmica se opondo, foi aprovado por cada rgo colegiado central da UNESP, rgosformados em sua maioria por representantes das reas exatas e biolgicas, at se chegar amatrcula dos novos estudantes na penltima semana de fevereiro deste ano de 2010.

    De incio, a proposta era de que o curso comeasse no segundo semestre de 2008,entretanto, a comunidade acadmica, principalmente os estudantes, respondeu com paralisaes,abaixo-assinados, impedimentos legais em algumas instncias, fazendo com que o curso fosseadiado por algum momento. No entanto, a perspectiva do governo ampliar os cursos nestamodalidade, incorporando as demais licenciaturas. Por isso a luta do movimento deve ser maisampla, pois assim como a pesquisa operacional, o EaD vem projetando o discurso do progresso

    tecnolgico como salvador da educao e esta como salvadora de todos problemas da sociedade, oque uma falcia. Se a educao fosse realmente prioridade para o atual governo, a verbadestinada a essa rea deveria ser muito maior e utilizada para um ensino de qualidade.

    Ento, qual o interesse dos governos neoliberais no EaD? Para quem serve um ensino dessetipo? Serve para a insero dos jovens pobres no mercado de trabalho, alienando-os de seu papelde explorados, no sendo oferecida formao de qualidade para que possam criticar essa forma desociedade e reivindicar uma sociedade melhor. Serve para controlar a formao, ou semi-formao,da maior parte da populao brasileira, transmitindo o discurso de que a educao, mesmo EaD, essencial para uma futura ascenso social.

    Ainda nesse mesmo ano, a reitoria da UNESP impe seu novo projeto de universidade para aprxima dcada: o PDI (Plano de Desenvolvimento Institucional), que prope os trs eixos j citados- a iniciativa privada, a mudana da gesto da universidade e o EaD. O PDI, baseado na idia deque a universidade deve ser planificada, termina por transformar a universidade em uma empresa,pensando-a em termos de metas que levam em conta somente uma produo quantitativa,

    submetendo os fins da universidade ao interesse do capital.O movimento respondeu a estes ataques com muitas discusses e lutas, que obriga a

    reitoria a passar a discusso s unidades e fazer o caminho inverso, ou seja, discusso pelos rgoscolegiados. Vale ressaltar que os rgos colegiados possuem uma estrutura no mnimo questionvel,pois em sua maioria formado por setenta por cento do total de membros docentes, quinze porcento de funcionrios e quinze por cento de estudantes. No entanto, apesar de algumas mudanas,seu resultado foi o mesmo.

    Assim segue o projeto de educao neoliberal, onde os grandes empresrios do capitaldominam a sociedade e o restante da populao trabalha, passa fome e morre. Cabe aos estudantesdas estaduais paulistas, refletir sobre esses ataques e se organizar em torno de um movimentoforte, com objetivos muito bem definidos e prticas muito bem pensadas. Sozinhos os estudantespouco faro, mas se conseguirem articular com os demais segmentos e atingir a conscincia dapopulao brasileira muito poder ser feito contra este projeto, tendo em vista a construo de umprojeto melhor.

    Karina Perin Ferraro, Mestranda em Educao na UNESP-Marlia

    2009: ano de luta

    O ano de 2009 principiou-se tenso nas trs universidades pblicas paulistas. O governo doestado retomara a ofensiva contra a USP, a UNESP e a UNICAMP por trs meios, sobretudo: aUNIVESP, a perseguio queles que fizeram as lutas em 2007 e, no caso especifico da UNESP, oPlano de Decenal de Desenvolvimento Institucional (PDI).

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    Diante dos fatos, logo no principio de maio, dia 03, os trabalhadores da USP, capitaneados por seusindicato (SINTUSP), entraram em greve contra os ataques do governo.

    Aqui, na UNESP-Marlia, os estudantes vinham em um processo de mobilizao crescente. A lutaem Marlia iniciou-se cedo. J na segunda semana de aula, quando de uma aula magnacomemorativa dos 50 anos da faculdade, o primeiro ato estudantil do ano perguntava-se o quehavia para comemorar, em fato, quando, aps cinqenta anos, a universidade no mudara nada,permanecendo elitista, racista, autoritria e antidemocrtica, cerrada sobre si mesma, dando as

    costas maior parte da populao?O correr do ano somente viu as coisas esquentarem. Inmeros atos e manifestaes foram

    impulsionados pelos estudantes da UNESP-Marlia: atos na cidade contra a crise econmica, sob omote a crise dos ricos: que os patres paguem pela crise; atos na universidade como aocupao por um dia do R.U. por uma poltica efetiva de permanncia estudantil; paralisaes ecadeirao contra o PDI, a UNIVESP, pela democratizao da universidade e contra a represso aomovimento das Trs Pblicas Paulistas, particularmente, pela reintegrao do Brando.

    Toda agitao culminou com a entrada em greve, no dia 26 de maio, por parte dos estudantes ecom a ocupao do prdio de aulas da FFC-Marlia. Ponta-de-lana da mobilizao estadual, osestudantes da UNESP-Marlia foraram os professores e os trabalhadores a aderirem tambm agreve sendo que Marlia foi o primeiro local do estado onde os trs setores entraram em greveconjuntamente e tambm o ltimo local onde eles saram.

    A resposta das reitorias foi a polcia. No dia 09 de junho, diante da mobilizao dada, a

    ento reitora da USP, Suely Viela, chama a polcia a invadir a USP em So Paulo contra os piquetesorganizados pelos trabalhadores; trabalhadores funcionrios e estudantes resistiram a violnciapolicial naquilo que ficou conhecido como a Batalha da USP. Apelando fora bruta, o CRUESP (verglossrio) mostrou qual sua forma preferencial de dilogo: o cassetete, os ces, as bombas de efeitomoral. Como resposta, o movimento cresceu, mas no o suficiente. Na UNESP somente Assis e osestudantes de Geografia de Rio Claro entraram em greve; os trabalhadores de diversos campidaUNESP e UNICAMP aderiram tambm ao movimento, mas no de maneira massiva tal qual a fortegreve de 2007. Mas o fato escandaloso da polcia colocou o movimento na mdia. A falta dedemocracia na Universidade era patente. E talvez este estar na mdia tenha sido a maior vitria domovimento unificado estadual.

    No entanto, com pouca fora, no fomos capazes de barrar os ataques. O governo recuouem relao a UNIVESP, mas o projeto continuou vivo e este ano j teremos a primeira turma depedagogia semi-presencial na UNESP. Brando no foi readmitido na USP. O PDI no terminou.Podemos dizer, pois, que fomos derrotados politicamente.

    Embora na UNESP-Marlia os estudantes tenham obtido conquistas pontuais, como o Centrode Lnguas, a reforma do campus II da UNESP e a promessa da abertura noturna do R.U.,estadualmente fomos derrotados. Afinal, que universidade teremos se a UNIVESP, o PDI e arepresso instalarem-se de vez, comprometendo no s a qualidade como o carter pblico dauniversidade?

    E 2010?

    Conforme dissemos, como os ataques no cessaram, tambm a luta no pode cessar. Nas trspblicas paulistas, lutar contra a represso est na ordem do dia, como trataremos em outro textoneste manual. Tambm as polticas neoliberais, como PDI e UNIVESP, no retrocederam.

    No caso especifco de Marlia, tivemos conquistas pontuais que no se concretizaram. O R.U.ainda no tem o funcionamento noturno assegurado e, mesmo o nmero de refeies atuais, estcomprometido. O dinheiro para a reforma do CEES(ver glossrio) ainda no foi liberado. Portanto

    cumpre que os estudantes se organizem para lutar pela concretizao das conquistas da forte greve.

    Felipe Luiz Guma, 4 Filosofia na UNESP-Marlia

    4 motivos para desmistificar o Ensino a Distncia (EaD)

    1. Enquanto na universidade pblica com cursos presenciais existe uma relao de ensino eaprendizagem - porque s h ensino quando h aprendizagem - e isso acontece no momento queos estudantes expem suas idias e dvidas e as debatem com seus professores e colegas, isto ,

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    estabelecem uma relao de participao mtua onde todos aprendem; os de EAD pressupem ummesmo modo de ensinar e de se aprender, desconexos, na qual recebem informaes norelacionadas com seu cotidiano, que apenas servem para decorar e utilizar de maneira prtica.2. Enquanto nas universidades pblicas com cursos presenciais, os estudantes tm acesso apesquisa, ao conhecimento produzido, e podem participar dele, os estudantes de EAD no tm.3. As tecnologias no substituem o conhecimento de um professor, pois um conhecimento queest sempre em transformao. O conhecimento do professor, assim como o conhecimento

    historicamente acumulado um conhecimento transformado a partir das relaes humanas e danatureza, portanto, o processo educacional sistematizado uma atividade essencialmente humana.As tecnologias ainda no conseguiram substituir os seres humanos na tarefa do ensinar apesar dosdiscursos contrrios.4. Os estudantes de EaD no possuem espaos de participao fora da sala de aula, muitossequer possuem salas de aulas pelo processo ser virtual, onde possam discutir suas idias e seorganizarem para suas reivindicaes, inclusive em relao ao contedo e forma de ensino, como nauniversidade pblica em cursos presenciais.

    Karina Perin Ferraro, Mestranda em Educao na UNESP-Marlia

    A universidade que reprime

    Embora muitos assim quisessem, a universidade no homognea, indiferenciada; de modo alguma Universidade comporta todas as idias e pessoas, pesquisa todas as coisas, pensa tudo que seriapossvel pensar. Muito ao contrrio, a Universidade um espao de tenso, de luta e confronto,cheia de fissuras, enfrentamentos e interesses, tal como a sociedade, que a espelha espelhando-se.Em cada menor ponto h o suficiente para iniciar uma luta magistral; em cada vrgula, em cadaletra, em cada palavra proferida e em cada ato que se realiza, todas as razes e todos os motivos.

    A Universidade traz em si as marcas das lutas que a engendraram, a mantm tal como ela, a modificam ou modificaram, que buscaram modific-la ou radicalmente transformar. Luta-se portudo: o que e como pesquisar e no pesquisar, como agir, como fazer, como proceder, comoorganizar. Tantas possibilidades existentes, tantas formas que a Universidade poderia ter tomado;se hoje ela assim, porque algum grupo venceu, e a enquadrou na forma desejada; no se tratade um jogo binrio, que exclui absolutamente os adversrios; uma vitria pode ser parcial, umaderrota pode conduzir posteriormente a uma vitria. Assim, a luta leva a progresso de alguns

    pontos, a regresso de outros, ao avano que no cessa ou a derrota que permanece enquanto aresistncia no se bem organiza. O melhor meio de conceber a Universidade , portanto, como umcampo de batalha na guerra social que externa e interna Universidade.

    Assim como @s vencedores/as de uma guerra sentem-se no direito de prender, abusar eseviciar os derrotados, na Universidade no poderia ser diferente. Aqueles que vencem o pequenoou grande confronto, no podem querer poupar @ adversri@, para evitar que ele se recupere daderrota e reorganize suas foras. Aps as greves, as ocupaes, as paralisaes, enfim, a todas aslutas que @s estudantes, funcionri@s e professores/as levam a cabo pela melhoria,aperfeioamento e democratizao da Universidade, a burocracia universitria velha vassala dosinteresses do grande capital e dos polticos corruptos empreende sempre uma onda derepresses, que busca criminalizar e torturar psiquicamente e fisicamente @s brav@s lutadores/asque se opem s suas polticas.

    Na UNESP, na USP e na UNICAMP a represso usada tanto para buscar dissuadir as novaslutas, quanto para punir os que j lutaram. Sobre todos aqueles que no se curvam aos mandos e

    desmandos da burocracia universitria, dos reitor@s, e daqueles professores/as autoritri@s, pairaa eterna sombra da punio. Criam-se comisses de averiguao, comisses de sindicncia,desenvolve-se um processo, termina-se por punir. que perseguir e punir so meios de disciplinaruma populao ou individuo; assim como se bate em um cachorro para que ele no entre em casa,tambm punem-se lutadores/as para que eles no reajam, para que sejam, ao mesmo tempo,dceis e produtivos nas posies que a burocracia universitria a eles determina. Por isso lutarcontra a represso aos estudantes, professores/as e funcionri@s engajad@s to importantequanto empreender a luta; pois, se aps uma luta no se garante as condies mnimas para aorganizao das prximas, se aqueles que lutaram no podem desenvolver suas experincias naslutas a devir, ento h a derrota, ainda que no imediatamente visvel, do movimento.

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    A histria recente das Universidades no deixa dvida de como essa ttica espria semantm muitssimo viva. Em 2005 a UNESP chegou ao cmulo de cogitar a expulso de 24estudantes, 7 do campus de Franca, 15 do campus de Marlia e 2 do campus de Araraquara. Os seteestudantes da UNESP-Franca tiveram a oportunidade de ser os primeiros expulsos da histria daUNESP, em decorrncia de um polmico ato de terrorismo esttico contra o reitor e a burocracia daUniversidade; estes estudantes, descontentes com a situao da Universidade, e bem sabendo quea reitoria e a burocracia universitria de modo algum defendem os interesses d@s estudantes e

    funcionri@s, organizaram, no dia 02 de agosto de 2005, um ato esttico contra o reitor: em umareunio da Congregao da Universidade, interromperam-na, um estudante defecou em um jornaldo dia e ofereceu ao reitor, como modo de indicar o que ele estava a fazer com a Universidade e oque ele mesmo, enquanto cargo burocrtico, era e representava, ao passo que outro estudanteentrou bruscamente na sala da Congregao, e passou a vomitar em um balde, devido ao ascoadvindo aps olhar como a Universidade se organiza; outros cinco (ou sero seis?) estudantesentregaram, ento, coquetis molotovs (bombas caseiras) ao reitor, atribuindo-lhe a vontade dedestruir a Universidade; enquanto disso, proferiam palavras contra a organizao e estado daUniversidade. Foi o suficiente para toda a populao esconjurar os estudantes que protestaram,movida, sobretudo, por um moralismo decrpito e por um desconhecimento das condies daUniversidade. Contando com escasso apoio poltico, os estudantes foram expulsos h poucos dias doano findar, o que abre um precedente bastante sinistro para a Universidade.

    Na UNESP-Marlia a expulso dos estudantes foi cogitada enquanto represlia a umaOcupao Estudantil da direo da Universidade; o motivo da ocupao foi a mudana no critrio de

    oferecimento das bolsas de assistncia estudantil (que deveria ter carter scio-econmico), o quecriou uma distoro tal que pessoas com renda per capita acima de R$ 2000 fossem agraciadas combolsas de R$ 175,00. Ento, aps a luta findar vitoriosa, instaurou-se uma Comisso de Sindicncia,que contava com o nome de todos os membros do Diretrio Acadmico que, no por acaso, contam-se entre os estudantes mais ativos do movimento estudantil da UNESP. Felizmente, aps muitapresso poltica estudantil, a burocracia recuou e a expulso no ocorreu. Isto ocorreu em 2005.

    J na UNESP-Araraquara o caso foi bastante grave. Duas militantes do PCO (Partido daCausa Operria) foram ameaadas de expulso por fazerem distribuio de materiais poltico-partidrios no interior da Universidade, somado ao fato de complicaes para eleies de entidadesestudantis. A direo da unidade buscou intervir na organizao do ME, o que gerou fortesprotestos; o clima ficou pesado na FCL, tendo inclusive ocorrido o espancamento de professores,com a presena de skin heads araraquarenses. Uma vigorosa oposio por parte d@s estudantesno foi suficiente para impedir as punies s militantes, ainda que abrandada (!) em umasuspenso de um semestre no ano de 2006.

    So alguns casos que, no entanto, no so suficientes para ilustrar. Falamos da repressocontra estudantes, mas no so s eles que empreendem as lutas no interior da Universidade, poisas lutas mais fortes so aquelas nas quais os trs setores (estudantes, funcionri@s eprofessores/as) unem-se. Falemos ento da represso que desaba sobre professores/as efuncionri@s.

    Ainda que sejam tambm @s professores/as que giram a Universidade, no podemosesquecer que eles tambm no esto unidos em tudo, mas que possuem idias, concepes e aesque se diferenciam como a areia da gua. Assim, existem professores/as que pertencem a grupospolticos que dominam a Universidade que querem calar queles que se-lhes opem. Demitir um/aprofessor/a concursad@ um mais difcil que expulsar um estudante rebelde ou exonerar um/afuncionrio@ insubmiss@ e combativ@. Mas h outras formas de retaliao: perseguiesacadmicas, no liberao de verbas, ou bolsas, perseguies a orientando, etc. H casos aindamais graves, como o do gegrafo franco-polons Jan Leszek Dulemba, professor da UNESP-Franca,que se matou em dezembro de 1975, em decorrncia do clima de perseguio, delao e boatos que

    os demais professores/as, contrrios as suas posies polticas o precipitaram. H casos maisrecentes; ainda ano passado quatro professores do campus experimental da UNESP-Registro foram(e ainda esto sendo) ameaados de morte, tanto pelo fato de sua militncia sindical ativa, quantoem decorrncia das investigaes que esto a promover sobre as contas da Universidade; asameaas de morte passam todas pela exigncia do fim das investigaes, como, por exemplo, naameaa relatada pela Seo Sindical da ADUNESP de Registro, recebida por telefone: secontinuarem com essas denncias vo MORRER, TODOS VOCS, SAFADOS () vocs no precisamsaber sobre a PRESTAO DE CONTAS DO CAMPUS REGISTRO. A Reitoria no se posiciona,mantendo um mui prudente silncio sobre os casos. Os professores ameaados esto a exigir que secumpra uma portaria da prpria reitoria da UNESP que, entre outras coisas, estabelece a

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    contratao de professores/as concursad@s, a constituio de rgos colegiados locais (pois ocampus administrado por uma comisso indicada pela reitoria) e a j dita elaborao de umaprestao de contas do campus experimental.

    No caso d@s funcionri@s, a questo ainda mais grave; demitir um professor/a doutor/aou expulsar um@ estudante de classe mdia gera indignao e repercusso em toda sociedade; j@s funcionri@s so entendid@s como trabalhadores/as no qualificad@s, quer dizer, dispensveis.Quando a mo pesada da burocracia busca ceifar-lhes o emprego, os motivos no variam: corte de

    verbas e represso atuao poltica. Nesse sentido, temos um exemplo ainda recente e muitssimovivo de represso aos trabalhadores e organizao sindical: a demisso de um dos dirigentes doSINTUSP (Sindicato dos Trabalhadores da USP), Claudionor Brando, em dezembro de 2008.

    O SINTUSP reconhecidamente o sindicato mais combativo do pas, marcando presena eorganizando todas as grandes lutas das Universidades Estaduais Paulistas, dos funcionrios pblicose dos explorados em geral. Brando conhecido pela sua militncia aguerrida e anticapitalista, oque desperta a fria da burocracia universitria uspiana e dos polticos reacionrios. Assim, aOcupao da USP, na qual o SINTUSP e Brando estavam na linha de frente do movimento, foi agota dgua para a burocracia: inventaram um motivo e despediram-no por justa causa. A reao demisso de Brando no tardou, pois desde as entidades estudantis, sindicais e docentes,passando por meios de comunicao de massa (como a Caros Amigos), at deputados e ministrosse colocaram contra a demisso de Brando, denunciando-na como ataque organizao sindical e democracia. Tambm ns, estudantes, no podemos ficar de braos cruzados diante doautoritarismo bismarckiano da Reitoria da USP; a luta contra a demisso de Brando , desde j,

    uma das pautas para a forte luta universitria que deve se desenvolver este ano, contra os efeitosda crise econmica criada pelos banqueiros, contra as medidas precarizadoras da educao(especialmente o PDI e o EaD) e contra a represso aos funcionrios, estudantes e professores queempreendem as lutas na Universidade.

    H mais, no entanto. A represso, por vezes, desencadeia-se como forma de acabar com aslutas enquanto elas ainda esto a ocorrer. Assim, a UNESP-Araraquara foi invadida pela polciaquando de uma ocupao estudantil em 2007, no contexto da luta contra os famigerados DecretosSerra. A bicentenria Faculdade de Direito da USP, tambm foi invadida pela tropa de choque doGovernador Serra, enquanto l ocorria uma ocupao temporria, tambm em 2007, em defesa daUniversidade Pblica. Mas as Universidades privadas tambm conhecem a represso: a ocupao daFundao Santo Andr, Universidade municipal da cidade de mesmo nome, tambm foi atacadaquando os estudantes exigiam menores mensalidades, a investigao do reitor da Universidade(sobre o qual pairava suspeita, posteriormente comprovada, de corrupo) e a reabertura de cursosarbitrariamente fechados pela reitoria, que, no por acaso, eram cursos de cincias humanas, em

    muitas ocasies, mais combativos que os demais.Se a Batalha da USP, no dia 09 de junho de 2009, surpreendeu uns e outros, os motivos no

    so claros. A polcia invadir e surrar estudantes, funcionrios e professores no interior dauniversidade o fio lgico de continuidade das polticas e aes que esto a ser aplicadas vo l 15anos. Chegamos em um momento em que a tenso tanto se acirrou que somente os msculosesculpidos e as bombas com cuidado fabricadas poderiam resolver o impasse. No tenhamos dvidaque este somente um novo perodo, h anos dado, da ofensiva neoliberal rumo a privatizaocompleta dos servios pblicos.

    No a primeira vez a polcia usada contra lutadores. Desde 2004 a reitoria da UNESPmostra sua disposio em ir at o fim em suas polticas, neste mesmo ano, por exemplo, a Tropa deChoque invadiu a reitoria ocupada da UNESP e chegou mesmo a garantir uma reunio da burocraciaacadmica em Araatuba, diante de uma multido de estudantes que se colocavam contra aprecarizao. Aqueles estudantes expulsos que eu j disse, e dos quais sou um dos representantes,pagaram no s com a expulso, mas com processos criminais por sua ousadia contra os neoliberais

    da reitoria e da diretoria. Em 2007, o Choque invadiu a UNESP-Araraquara, ao mesmo tempo emque, na UNESP-Marlia, a Congregao deliberava se a polcia teria ou no uma base permanente nocampus. J ano passado vimos o giroflex brilhar na UNESP de Rio Preto. Dois reitores depois, apolcia invade a ocupao dos estudantes da UNESP-Prudente este ano, mostrando que Herman, oatual magnfico da UNESP, no abre mo dos coturnos para se impor.

    E no s de polcia que vive a represso. Afinal, quando a Direo nega-se a trazer umpalestrante deliberado pelos estudantes, como ocorreu na organizao da Calourada 2010, no setrata tambm de uma forma de represso, mas de outro modo, silenciosa, velada?

    Polcia, sindicncias, expulses, suspenses e demisses de cunho poltico, so coisas queno combinam com a Universidade. Ao menos, o que pensam @s estudantes, funcionri@s e a

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    maioria dos professores/as; mas para defender seus interesses vis, sua posio de gestora daUniversidade, seu controle sobre as verbas pblicas no raro desviadas tanto para caixa dois departidos, enriquecimento ilcito ou ostentao de lixeiras folheadas a ouro a burocraciauniversitria, os governos subservientes e os exploradores capitalistas no pestanejam em utilizar afora bruta dos policiais, da cavalaria, dos ces, dos cassetetes e das bombas de gs. Eis a sina e ahistria de nossos dias; eis contra o que cumpre organizar-se para combater e derrotar.

    Felipe Luiz Guma, 4 Filosofia na UNESP-Marlia

    Ano Novo, Velhos hbitos: Integrao, Violncia e Tradio.

    Ano aps ano assistimos, sem maiores questionamentos, a repetio de uma srie deatividades que muitas vezes constrangem e humilham os calouros, mas que pelo seu cartertradicional so consideradas normais e at naturais ao processo de iniciao dos primeiro-anistas aoensino superior. Sobretudo nesse incio de ano letivo em que o trote torna-se parte da realidade,principalmente, dos alunos ingressantes, importante refletirmos de forma mais ampla essaquesto para evitarmos constrangimentos, distores e abusos.

    De forma mais geral, o trote pode ser entendido como uma tradio acadmica que consiste

    num conjunto de atividades organizadas pelos alunos veteranos para a recepo dos calouros,ocorrendo de forma mais efetiva, normalmente, nos dias de matricula e nos primeiros dias de aula,valendo ressaltar que as atividades podem continuar ocorrendo durante todo o semestre ou anoletivo, ou ento at o aluno ser desconsiderado da condio de bixo. Sendo o trote uma TradioAcadmica sua principal pretenso tornar-se natural aos indivduos, pois tudo o que naturalapenas e dispensa o pensamento, o questionamento e as possibilidades. O corte de cabelo e apintura dos calouros na FFC de Marilia um bom exemplo disso. Muitas vezes tratam-se taisatividades como se fossem etapas necessrias e naturais ao ingresso dos primeiro-anistas, quandona verdade de genuno e natural s existe a imposio e a tentativa de ajustamento dosingressantes a essa ordem. Assim bom ficar claro ningum obrigado a participar de nenhumaprtica ou ritual que no queira, devendo ser respeitado, sem sofrer nenhum tipo de coao.

    Na tentativa de legitimar-se e tornar-se a regra, a tradio tambm utiliza-se de outrosmecanismos como a falsa idia de que as coisas sempre foram assim para justificar suas aes.Assim, que quando entramos na universidade temos a impresso de que todas as pessoas que

    esto ali passaram por esse ritos de iniciao, logo tornando nossos questionamentos e at a nsmesmos muito pequenos diante da imensido desse sempre imemorvel da tradio do trote. Porisso devemos ter claro para ns que o trote, seja l da forma como se apresentar, no necessrio e menos ainda natural ao processo de ingresso vida acadmica, apesar de se pretenderassim. Logo observarmos que a tradio funciona como um eficientssimo meio de controle e deobteno de poder, uma vez que dispensa a reflexo e as dvidas dos indivduos, enquanto rege eimpe suas regras sobre eles. Assim nossa problemtica aparece justamente quando esta tradiopassa a se impor sobre vrios indivduos e nessa tentativa de ajust-los sua ordem, utiliza-se dasmais diversas formas de violncias, constrangimentos e outros mecanismos de coero.

    Outro ponto importante nessa discusso, principalmente aqui na FFC de Marlia, a questodo trote leve, j que aqui as atividades realizadas so classificadas dessa forma, por no termosum histrico de violncias durante a realizao do trote. Aqui cabe pensarmos a concepo deviolncia comumente utilizada quando tratamos da questo. Mas apesar do adjetivo leve, comum por aqui muitos calouros serem obrigados a cortar o cabelo, a pintar o rosto e corpo, a

    pagar taxas em dinheiro sob ameaas de ovos, entre outras atividades que ocorrem dentro daprpria universidade nos dias de matricula e na primeira semana de aula. Classificar o trote dessaforma, de acordo com uma suposta intensidade, significa reduzir um amplo conceito de violnciaapenas violncia fsica, desconsiderando as vrias outras formas de violncias, que podem causardanos iguais e at piores s vitimas que as recebem. O terror causado pela intimidao, asubmisso do calouro implcita no ar, as brincadeiras constrangedoras, a ridicularizao, as ordensrecebidas e as diversas formas de coero e ajustamento so formas de violncia muito graves eque podem causar prejuzos irreparveis, mas que, no entanto, nesse ambiente confuso do trote,muitas vezes so consideradas legitimas, por no serem agresses fsicas. Quem pode dizer que aridicularizao e o constrangimento que pode causar um apelido, por exemplo, menos prejudicial

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    que um soco? Ambas as formas de violncia so terrveis, mas o que vemos uma preocupantenaturalizao dessas outras formas de violncias, as no fsicas, que se tornam legitimas sob asmximas de trote leve e mdio. Torna-se muito difcil, dessa forma, classificar com elementosexteriores aos indivduos as atividades do trote de acordo com uma suposta intensidade, uma vezque as pessoas possuem estruturas psicolgicas com limites diferentes, sendo que, por exemplo, oque representa uma simples brincadeira para uma, pode causar um surto psictico em outra. Issonos mostra que o trote no passa a ser aceitvel por ser convencionado como leve, mdio ou

    grave, pois como vimos a intensidade e o grau de violncia das atividades so medidos de formamuito particular.

    Nesse sentido, podemos inverter a lgica e pensarmos que talvez o trote que temos vistoem nossa faculdade nos ltimos anos, seja muito pior que o observado em outras universidadescom histricos de casos considerados graves ou ironicamente violentos, pois aqui essasinmeras formas de violncias esto naturalizadas e normalizadas, e no dificilmente, nemidentificadas como violncia so. Preferimos, e aqui se inclui a comunidade acadmica como umtodo, nos esconder diante da confortvel idia de trote leve e acreditar que o nosso problema estresolvido ou que nem problemas temos, enquanto casos de constrangimento, ridicularizaes emuitas outras formas de violncia ocorrem dentro da nossa prpria instituio sob os nossos olhos.

    Enfim, penso ser importante ficar claro que de forma alguma a Integrao entre os alunosprecisa necessariamente passar pelas atividades do trote. Alis, aps essa mnima reflexo, pensoparecer um tanto contraditrio e at insustentvel a defesa de que pessoas possam realmente seintegrar num ambiente de mo nica, no qual mistura-se ordens e imposies com momentos de

    simpatia, risadas com momentos de tenso, brincadeiras com ridicularizaes, entre outras coisas. nesse sentido, que a comisso da calourada de 2010 elaborou uma programao com diversasatividades, como oficinas de variados temas, uma mostra de msica e poesia, palestras e debates,entre uma srie de outras atividades, buscando proporcionar alternativas e abrir outraspossibilidades de integrao, para que este momento de contato entre os estudantes no fiquereduzido apenas ao trote.

    Diego Damaceno Lima 4 ano C.Sociais

    Glossrio

    Burocracia: sistema de organizao hierrquica no qual divide-se responsabilidade que seroexecutada por meio de regras e procedimentos rgidos. No raro (quase sempre!) dificulta as coisassimples e esconde enormes processos de corrupo.C.A.: Centro Acadmico; entidade representativa dos estudantes de um curso.CRUESP: Conselho de Reitores das Universidades Estaduais de So Paulo; entidade que rene osreitores das trs universidades estaduais e vrios secretrios de estado. A presidncia sempre deum dos reitores.CEES: Centro de Estudos do Ensino e da Sade; ou campus II da UNESP-Marlia; local onde vrioscursos da FFC elaboram seus estgios. Tem graves problemas estruturais, com o teto perigando caire o cho afundar.D.A.: Diretrio Acadmico; entidade representativa dos estudantes de uma faculdade ou instituto.DCE: Diretrio Central dos Estudantes; entidade representativa dos estudantes de umauniversidade.Entidades patronais: assim como os trabalhadores e os estudantes possuem meios derepresentao, tambm os patres e os ricos possuem seus rgos para defesa de seus interessescomuns enquanto classe.Meritocracia: meio de organizao que privilegia, em tese, o mrito. Costuma, entretanto,privilegiar formas viciadas de escolha: quem define o passvel de mrito? No so todos nauniversidade, tenhamos certeza. Alm disso,a meritocracia refora a burocracia e garante apredominncia de um grupo poltico de professores na universidade.Poltica de permanncia estudantil: polticas que buscam garantir que os estudantes pobrespermaneam na universidade. Dentre elas podemos salientar: moradia, R.U., bibliotecas, laboratriode informtica, bolsas de carter scio-econmico, etc.rgos colegiados: meio de organizao pautado na deliberao de membros iguais entre si.Contudo na universidade como a composio destes rgos no segue a composio em nmerosabsolutos, esta forma torna-se antidemocrtica e autoritria. Exemplos de rgos colegiadosuniversitrios: Conselho universitrio, Congregao e rgos anexos a estes (Comisses, etc.)

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    rgos executivos: so aqueles rgos que existem para colocar em prtica as decises dosrgos colegiados. Exemplos, Reitoria e Diretoria.RDs: representantes discentes.