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Page 1: Livro-texto EJA

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LIVRO TEXTO

Page 2: Livro-texto EJA

2

“Inteligência não é possuir todas as ferramentas.

Inteligência é possuir poucas (para andar leve) e saber

onde encontrar as que não se têm, na eventualidade de

se precisar delas. Sabedoria não é ter. É saber onde

encontrar.”

(Rubem Alves)

Page 3: Livro-texto EJA

3

Governador do Estado de Pernambuco

João Lyra

Secretário de Educação do Estado de Pernambuco

José Ricardo Wanderley Dantas de Oliveira

Secretária Executiva de Desenvolvimento da Educação

Ana Coêlho Vieira Selva

Secretária Executiva de Gestão de Rede

João Charamba

Secretário Executivo de Educação Profissional

EQUIPE TÉCNICO-PEDAGÓGICA UEJAI

Claudia Mendes de Abreu

Jandy Feitosa Carlos da Silva

Ana Lucia Gomes Cavalcante Neto

Ângela Cristina Pascaretta Gallo

Danielle da Mota Bastos

Danubia Charlene da Silva Nascimento

Diego Bruno Barbosa Felix

Emanuella de Jesus Ferreira da Silva

Helder Domingues Mendes da Silva

Jaciane Gomes Sousa de Lima Silva

Katarina Vasconcelos de Melo

Márcio Tiago dos Anjos

Mariana Silvia Bezerra

Raimundo Ferreira de Arruda

Rita de Kássia Pontes Silva

Page 4: Livro-texto EJA

4

Roberto de Carvalho Ventura

Roseane Pereira da Silva

Thiago de Oliveira Reis Marques Freire

Valdenice Leitão da Silva

Verônica Luzia Gomes de Sousa

Organização e Sistematização do Caderno

Danielle da Mota Bastos

Diego Bruno Barbosa Felix

Jaciane Gomes Sousa de Lima Silva

Rita de Kássia Pontes Silva

Roseane Pereira da Silva

Thiago de Oliveira Reis Marques Freire

Page 5: Livro-texto EJA

5

SUMÁRIO

Apresentação...................................................................................................................06

Unidade 1 – .Livros em sala de aula – modo de usar......................................................10

Unidade 2 – O lúdico na Educação de Jovens e Adultos................................................18

Texto complementar – Ludicidade como instrumento pedagógico.................................27

Unidade 3 – Deuses e monstros.......................................................................................35

Unidade 4 – Mídia e Educação: o uso das novas tecnologias no espaço escolar............48

Unidade 5 – Principais recursos didáticos analisados no ensino de geografia do

Brasil................................................................................................................................62

Page 6: Livro-texto EJA

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APRESENTAÇÃO

O tema desse caderno – como o próprio título sugere – trata de Recursos

Didáticos. Sua confecção surge da necessidade de tecer considerações e novas leituras

sobre as concepções e os usos desses importantes instrumentos pedagógicos nos

processos de ensino e aprendizagem de jovens e adultos, proposta, aliás, sugerida pelos

próprios formadores e professores dessa modalidade de ensino. É fruto também do

compromisso da Secretaria Executiva de Desenvolvimento da Educação/SEDE,

representada pela Gerência de Políticas Educacionais de Jovens, Adultos e

Idosos/GEJA, de fortalecer e renovar as práticas de formação continuada em serviço de

multiplicadores e professores atuantes na EJA em todo o Estado.

Nesse sentido, e na tentativa de contribuir para o trabalho do professor, visto

aqui como profissional autônomo e reflexivo, organizamos esta coletânea de textos com

o propósito de estabelecer diálogos com os profissionais da EJA e suscitar reflexões –

juntamente com o Livro Guia – sobre questões comuns e atuais do cotidiano da sala de

aula, utilizando-se de um aporte teórico e de encaminhamentos didáticos que

contribuam para uma prática docente mais crítica, reflexiva e em sintonia com as

especificidades da EJA. Em outras palavras, ousamos sugerir textos e atividades

didáticas que fossem relevantes para os saberes docentes, especialmente no momento de

escolher e propor estratégias com os mais diferentes recursos didáticos. Com isso, é

importante melhor definir recurso didático, bem como apresentar a estrutura desse livro.

Assim, iniciamos a discussão conceituando recurso didático, como sendo

qualquer meio, instrumento ou ferramenta que subsidie o professor em sua prática

pedagógica. É, portanto, um elemento pedagógico que está presente no ambiente de

aprendizagem, que ajuda a estimular o aprendiz a construir e consolidar saberes e

competências e que torna os processos de ensino e aprendizagem mais concretos, mais

eficazes e eficientes. Temos os livros, os jogos, as novas TICs (Tecnologias da

Informação e da Comunicação), e também outros materiais, como equipamentos de

laboratório, vídeos, áudio, recursos da natureza etc., que são necessários como suportes

para os processos de ensino e aprendizagem.

Os recursos didáticos são grandes instrumentos de apoio aos professores nesses

processos, se forem bem escolhidos e usados adequadamente, de acordo com as

condições estruturais da escola e as necessidades de seus alunos, e ainda relacionados ao

Page 7: Livro-texto EJA

7

planejamento do professor, uma vez que sua presença por si não é capaz de transformar

significativamente os processos de ensino e aprendizagem.

Segundo Cerqueira e Ferreira (2011)1,

Recursos didáticos são todos os recursos físicos, utilizados com maior

ou menor freqüência em todas as disciplinas, áreas de estudo ou

atividades, sejam quais forem as técnicas ou métodos empregados,

visando auxiliar o educando a realizar sua aprendizagem mais

eficientemente, constituindo-se num meio para facilitar, incentivar ou

possibilitar o processo ensino-aprendizagem.

Deste modo, considerando as definições de recursos didáticos dadas acima,

entendemos que muitos instrumentos em um ambiente no qual ocorrem os processos de

ensino e aprendizagem, que não foram especificamente criados para funcionarem como

recursos didáticos, podem ser tomados como tal, dependendo da forma como forem

utilizados.

Destacamos que os artigos disponibilizados nesta coletânea são explorados – por

meio de atividades didáticas – no Livro Guia que juntos compõem os materiais

didáticos produzidos para subsidiar o programa de formação continuada de professores

atuantes na EJA. Ao selecionarmos estes textos, procuramos ver a relevância dada ao

tema tratado e às especificidades da EJA, bem como a maneira como os autores o

apresentam, embora tenhamos percebido, em alguns textos, certas fragilidades de ordem

textual e normativa.

O livro foi dividido em 5 unidades, cada uma representando uma categoria

específica de recursos didáticos. Há um capítulo específico para mídias e TICs, pois

entendemos que, apesar de comportarem também os recursos audiovisuais, possuem um

largo espaço nas práticas didáticas em sala de aula e por isso merecem uma discussão

mais aprimorada. No mais, são 5 textos mais 1 complementar, de diferentes autores, que

abordam diferentes recursos didáticos. Além disso, é importante não perder de vista o

forte diálogo entre Livro Texto e Livro Guia, em que cada capítulo do Livro Texto

corresponde a uma unidade do Livro Guia.

1 CERQUEIRA, Jonir Bechara; FERREIRA, Elise de Melo Borba. Recursos didáticos na educação

especial. Revista Benjamin Constant. Edição 05. Vol. 6, nº 15. Rio de Janeiro- Dezembro de 1996.

Disponível em: <http// www.inep.gov.br>. Acesso em: 26.04.2011.

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No texto 1 “Livros em Sala de Aula- Modo de Usar”, a autora Roxane Rojo

historia de forma sucinta a escrita e o livro na escola, trazendo as principais categorias

do livro escolar, a partir de Chopin(1992), situando e delineando o perfil do livro

didático no Brasil e o relaciona com outros impressos e veículos de textos que fazem

parte da escola contemporânea. Logo após, a autora discute o livro didático como

suporte de textos ou como discurso de autor em gênero didático e aborda três modos

mais frequentes na escola de usar o livro: o livro como arquivo de textos e propostas; o

livro “de fio a pavio” e a escolha consciente e criteriosa do livro, de partes e textos de

livros e de outros impressos para a composição de um projeto de ensino situado. Rojo

conclui o texto chamando a atenção para algo fundamental na formação cidadã que é ser

capaz de discriminar e avaliar discursos hegemônicos na globalização, e fazer escolhas

éticas entre discursos presentes na sociedade.

No texto 2 “O Lúdico na Educação de Jovens e Adultos”, de Eliene de Oliveira,

Marcia do Socorro Rodrigues, Rejanete Silva e Souza e André Rodrigues Guimarães,

temos a abordagem de um trabalho de investigação sobre as práticas lúdicas

desenvolvidas na Escola Estadual Maria de Nazaré Pereira Vasconcelos. Os

pesquisadores pretendiam saber se essas práticas com os adultos estão respeitando a

realidade deles, pois a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de

ensino que tem especificidades que precisam ser levadas em conta no cotidiano escolar.

O texto está estruturado em duas partes. Na primeira parte, eles trazem uma abordagem

teórica sobre a temática ludicidade na EJA, e levantam questões que envolvem a

importância e a necessidade de aulas direcionadas com dinâmicas e jogos que

envolvam, divirtam, ensinem e formem novas aprendizagens. Na segunda parte, eles

enfocam o resultado da pesquisa de campo, em que verificaram pontos relevantes

quanto à utilização do lúdico na EJA. Por fim, fazem algumas considerações sobre a

importância da busca de novas metodologias que atendam e desperte o interesse a

motivação dos alunos da EJA.

No texto 3 “Deuses e monstros” fragmento da dissertação de Mestrado de

Roseli Pereira Silva, a autora aborda a introdução do cinema como uma das formas

culturais mais significativas e traz exemplos de experiências locais que incentivam a

utilização do cinema como recurso educativo. Mostra ainda a importância de se

reconhecer o trabalho com o audiovisual como uma ferramenta pedagógica, abordando,

inclusive, diferentes visões sobre o audiovisual: enquanto alguns o consideram a

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9

solução para todos os problemas, outros o encaram como um vilão, que subverte as

mentes mais pacíficas.

Já os autores do texto 4 “Mídia e Educação: o uso das novas tecnologias no

espaço escolar”, Gilza Maria Leite Dorigoni e João Carlos da Silva, trazem uma

reflexão sobre o uso das mídias na área educacional. Eles abordam os elementos

históricos sobre a mídia ao longo do século XX e falam também da influência do

avanço tecnológico na educação. O texto também traz questões sobre a efetivação e

aplicação da tecnologia na escola e, por fim, aborda o uso pedagógico da internet.

O último capítulo “Principais Recursos Didáticos Analisados no Ensino de

Geografia do Brasil”, de Inêz de Deus Neiva Brandão e Márcia Cristina de Oliveira

Mello, trata de uma investigação sobre as atuais tendências das metodologias de ensino

de Geografia difundidas pelos livros paradidáticos brasileiros, tendo os recursos

didáticos como ponto principal, considerando as técnicas tradicionais e as introduzidas

pelas novas tecnologias. Eles apresentam um panorama geral da estrutura metodológica

difundida por autores brasileiros que apontam novos caminhos e possibilidades de

materiais e suas aplicações, buscando facilitar a aprendizagem e o diálogo entre

professores e alunos. Os resultados preliminares apontam que, à luz da bibliografia

especializada, tais estudos concentram-se mais em explorar as técnicas de aplicação de

tal ou qual recurso, ou sua importância na relação ensino-aprendizado, nem sempre

apresentando um panorama da utilização real dos mesmos in loco, bem como eles se

concentram no tema cartográfico, havendo uma lacuna nos demais temas,

principalmente na Geografia Humana. Esta realidade será explicada através do breve

histórico do ensino de Geografia no Brasil, e o atual foco na cartografia escolar.

Após a leitura desses cinco capítulos, esperamos que o professor encontre

elementos que ampliem sua compreensão sobre recursos didáticos, bem como suas

implicações na prática de quem tem feito uso desses recursos, e que, participando de um

processo de formação continuada, reflita sobre sua prática e possa aprimorar seu

desempenho profissional, melhorando a qualidade de ensino nas escolas.

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CAPÍTULO 12

LIVROS EM SALA DE AULA – MODO DE USAR

Roxane Rojo1

Este texto historia brevemente a escrita e o livro na escola, distinguindo as principais

categorias de livro escolar, a partir de Choppin (1992). Com isso, situa e delineia

brevemente o perfil do livro didático hoje no Brasil em suas relações com os outros

impressos e veículos de textos que estão presentes na escola contemporânea. A partir

daí, discute-se o livro didático como suporte de textos ou como discurso de autor em

gênero didático, abordando três modos de usar o livro muito freqüentes em sala de aula:

o livro como arquivo de textos e propostas; o livro “de fio a pavio” e a escolha

consciente e criteriosa seja do livro, seja de partes e textos de livros e de outros

impressos, para compor, de maneira harmônica, um projeto de ensino situado. Sugerem-

se dois conjuntos de critérios de escolha e seleção para uso de textos impressos: o das

necessidades de ensino e o das possibilidades de aprendizagem. Conclui-se lembrando

uma meta central para a formação cidadã hoje, para a qual concorrem as adequadas

seleção e abordagem de textos e impressos, que é a da capacidade de discriminar e

avaliar discursos hegemônicos na globalização, de maneira a fazer escolhas éticas entre

discursos.

Escrita, livro e escola – uma relação muito antiga

Mesmo antes da revolução de Gutenberg – a invenção da escrita impressa – a

escrita sempre foi um dos principais instrumentos de comunicação da escola. A escola

sempre foi um espaço de circulação das “letras”, um espaço letrado.

Com a reprodutibilidade alcançada pela impressão de livro e de outros suportes, a escola

também passa a ser um dos principais espaços de circulação do livro. O livro escolar,

entretanto, ao longo da História, passou por diversas mudanças.

O pesquisador Alain Choppin (1992), dedicado ao estudo do livro escolar,

distingue quatro grandes tipos de livros escolares, organizados de acordo com sua

2 ROJO. Roxane. Livro em Sala de Aula: modo de usar. Materiais didáticos: escolha e uso. Programa

Salto para o Futuro. Boletim 14. Agosto de 2005. Disponível em

http://www.alemdasletras.org.br/biblioteca/material_formadoras/Salto_para_o_futuro_Praticas_de_leitura

_e_escrita.pdf.

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função no processo de ensino-aprendizado: - Os manuais ou livros didáticos, quer dizer,

“utilitários da sala de aula” (p. 16), obras produzidas com o objetivo de auxiliar no

ensino de uma determinada disciplina, por meio da apresentação de um conjunto

extenso de conteúdos do currículo, de acordo com uma progressão, sob a forma de

unidades ou lições, e por meio de uma organização que favorece tanto usos coletivos

(em sala de aula), quanto individuais (em casa ou em sala de aula);

- Os livros paradidáticos ou para-escolares, obras complementares “que têm por

função resumir,intensificar ou aprofundar” (p. 17) conteúdos específicos do currículo de

uma disciplina, seja por meio de uma utilização individual em casa, seja por meio de

uma utilização orientada pelo professor, na escola, como ocorre no Brasil2. Na tradição

brasileira, esse tipo de livro escolar abarca, prioritariamente, obras que aprofundam ou

enriquecem um conteúdo específico de uma disciplina (o tema da escravidão ou da vida

cotidiana no Brasil Colônia, por exemplo) ou que se voltam para a formação do leitor

(como os títulos de literatura infantil, em geral, apresentados nos catálogos de editoras

como obras “paradidáticas”);

- Os livros de referência, como dicionários, Atlas e gramáticas, destinados a

servir de apoio aos aprendizados, ao longo da escolarização;

- As edições escolares de clássicos, que reúnem, de modo integral ou sob a

forma de excertos, “as edições de obras clássicas (gregas, latinas, estrangeiras ou em

língua materna), abundantemente anotadas ou comentadas para o uso em sala de aula”

(p. 16) 3.

Nos meus tempos de estudante na Educação Básica, os impressos que havia em

sala de aula – não tão abundantes como hoje em dia – eram, principalmente, as obras de

referência (mapas, Atlas, dicionários e gramáticas – latinos, portugueses, franceses) e

uma edição escolar de autores clássicos da literatura brasileira e portuguesa – uma

coletânea ou antologia4. Na verdade, comprávamos as antologias, dicionários, e mesmo,

quando possível, enciclopédias e gramáticas. Atlas e mapas ficavam trancados em

grandes gaveteiros das estantes da biblioteca da escola e o professor os requeria quando

necessários para sua aula. A biblioteca escolar era grande e bem fornida de obras

clássicas e de divulgação, entretanto o acesso do aluno a ela não era livre, nem

tampouco freqüente. Os livros estavam nas casas dos alunos.

Por esta época, os livros ou manuais didáticos, tais como os conhecemos hoje, e

os livros paradidáticos sequer existiam. É somente com a reforma da grade curricular e

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da educação da década de 70 do século passado que o perfil e a circulação do livro

escolar começa a mudar. Segundo Clare (2002, s/p), a situação começa a se transformar

ainda na década de 60, quando se firma o processo de democratização de acesso da

população à escola, em conseqüência de um novo modelo econômico. Trata-se de novas

condições sociopolíticas. Com a ditadura militar, a partir de 1964, passa-se a buscar o

desenvolvimento do capitalismo, mediante expansão industrial. A proposta educacional,

agora, passa a ser condizente com a expectativa de se atribuir à escola o papel de

fornecer recursos humanos que permitam ao Governo realizar a pretendida expansão

industrial.

Com a ampliação do acesso da população à escola pública, muda o perfil não

somente econômico, mas também cultural, tanto do alunado como do professorado. Não

é mais uma escola pública destinada apenas aos filhos das elites, mas as camadas

populares passam a ter assento nas salas de aula. O novo perfil cultural do alunado

acarreta heterogeneidade nos letramentos, nos falares dos alunos. Os esforços das

escolas em adequarem-se à nova realidade têm impactos visíveis na qualidade do ensino

e no perfil do livro escolar. Também o perfil sociocultural, econômico e profissional dos

docentes sofre alteração, com a ampliação das redes. A profissão de professor começa a

desprestigiar-se, a perder autonomia, a deslocar-se nos espaços sociais: antes, uma

profissão que conferia status às moças de classe média e alta; agora, a ascensão social

para os que pertencem à classe mais pobre da sociedade (Clare, 2002, s/p).

É por esta época que começa a surgir o livro didático e, depois, os paradidáticos,

tais quais os conhecemos hoje. De certa maneira, esses manuais didáticos trazem para si

uma soma do que antes era a aula do professor e a consulta do aluno a obras de

referência e a antologias. Na disciplina de Língua Portuguesa, esse fenômeno é bastante

visível – as instruções do livro se combinam (ou entram em conflito) com as do

professor na aula e os antigos dicionários, a gramática e a antologia encontram-se hoje

espalhados pelas páginas dos volumes do livro didático.

Com a mudança de perfil do alunado, sobretudo no que diz respeito ao perfil

socioeconômico, o livro deixa de estar na casa do aluno e passa a se sediar na escola.

Por outro lado, os Programas nacionais de distribuição do livro incrementam seu

alcance, de maneira a poder prover, progressivamente, um número cada vez maior de

escolas e de estudantes com os acervos necessários.

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Hoje, podemos dizer, ao contrário, que os tipos de livro escolar mais presentes

em sala de aula são os manuais didáticos e os livros paradidáticos, além de, mais

recentemente, por meio da distribuição do PNLD, os dicionários5.

Atualmente, esses livros não são os únicos impressos que circulam nas escolas.

Revistas (de divulgação científica e outras) e grandes empresas jornalísticas colocam à

disposição das escolas doações de assinaturas permanentes de periódicos jornalísticos

(revistas, jornais de grande circulação).

Finalmente, a revolução eletrônica – com a multiplicação dos meios de

comunicação de massa, como a televisão e o vídeo – e a revolução digital, trazendo a

crescente importância dos computadores e da Rede Internet para a circulação e

distribuição da informação, também ampliaram os veículos de circulação da escrita para

muito além dos limites dos livros.Hoje, as escolas mais equipadas contam com TV,

vídeo e computadores – em algumas delas, conectados – que permitem novos acessos à

informação escrita ou oralizada, a partir de novos veículos. Todas essas mudanças

acarretam impactos importantes para a escolha e uso de materiais didáticos e

paradidáticos e veículos de informação na escola contemporânea.

Livros didáticos contemporâneos – um brevíssimo perfil

Como vimos em outros Programas desta série, a capacidade governamental de

avaliação, compra e distribuição do livro escolar no Brasil de hoje ampliou-se muito.

Além de avaliar e comprar e, ainda, distribuir livros didáticos das principais disciplinas

acadêmicas (infelizmente, exceto Língua Estrangeira) ao conjunto dos alunos da rede

pública de Ensino Fundamental brasileira, por meio do PNLD – o que, por si só, já

atinge números astronômicos6, dada a proporção continental do país e a universalização

recente das matrículas –, atualmente o Governo Federal ainda investe, no mesmo

PNLD, na compra e distribuição de dicionários; por meio do PNBE, na renovação e

ampliação de acervos das bibliotecas escolares e, ainda, inicia a extensão do direito ao

livro escolar, por meio do PNLEM, ao Ensino Médio, por enquanto nas disciplinas de

Língua Portuguesa e Matemática. Para 2006, o PNLEM atenderá a todo o país.

Uma das iniciativas importantes nesses Programas governamentais foi a

instituição da avaliação dos livros que serão comprados, em todas as áreas do

conhecimento. As pesquisas das décadas de 70 e 80 do século passado, a respeito do

livro escolar, constantemente denunciavam a baixa qualidade e a condução ideológica

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destes materiais. Instituída a avaliação, a qualidade desses materiais melhorou

enormemente e o cuidado com os projetos gráfico-editoriais intensificou-se, tendo

impacto no tratamento dos textos e das imagens veiculadas nos livros.

São muitos os manuais didáticos, dicionários, obras de referência e livros

paradidáticos propostos hoje para a escolha dos professores e todos eles apresentam

níveis de qualidade necessários ao bom desenvolvimento dos projetos de ensino-

aprendizagem em que o professor está envolvido. Mas isso coloca uma questão

relevante para os professores:

Como escolher e utilizar em sala de aula livros e impressos que não entrem em

conflito ou contradigam os projetos de ensino-aprendizagem dos professores? Que

sejam adequados às necessidades e possibilidades do alunado e da comunidade escolar?

Livros e outros impressos em sala de aula – três modos de usar

Discute-se hoje, na análise do livro didático, se este é um suporte de textos ou

um gênero de discurso. Já explico: a visão do livro didático como um suporte ou veículo

de textos variados (Marcuschi, 2004; Soares, 1999), encara o LD como um livro

(suporte) – uma brochura de papel em certo formato, com certo tipo de cobertura, com

resmas costuradas e coladas na lombada – que reúne em si uma certa distribuição de

textos e imagens de diversos tipos – textos expositivos e instruções do autor do livro;

outros documentos (históricos, por exemplo); imagens, como reproduções de

fotografias, de pinturas, mapas, gráficos, infográficos; textos de campos variados, como

o literário, o publicitário, o jornalístico, o da divulgação científica etc. Quase algo como

uma coletânea variada ou um arquivo.

Quem vê o livro como um gênero discursivo (Bunzen, 2005; Bunzen & Rojo, no

prelo) admite a presença deste conjunto de textos “migrados”7 de outros campos da vida

social, mas encara o livro como um discurso do autor, a partir de um projeto didático

autoral, dirigido a certos professores e a certo alunado, a certo tipo de projeto de ensino-

aprendizagem e não a outro, e que implica uma posição do autor sobre o que ensinar,

como ensinar, a quem ensinar, para que e quando etc. Este projeto autoral é, inclusive,

responsável pela seleção deste ou daquele “conjunto de textos migrados” de outros

campos da vida social.

Esta questão, embora pareça coisa apenas de pesquisadores, tem impacto na

escolha e, sobretudo, no uso do livro em sala de aula. Se eu encaro o livro como um

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acervo de textos, ou um arquivo de textos, como faz crer a definição do livro como

suporte, posso retirar deste e de outro arquivo qualquer, como quiser e de acordo apenas

com meu projeto de ensino – se houver – os textos/imagens necessários para dar suporte

a meu projeto de ensino naquele momento. Não preciso me preocupar com a

compatibilidade destes arquivos com meu projeto de ensino. Preciso apenas ter

condições logísticas de reprodução destes textos/imagens – retroprojetor, xerox – ou

que o aluno tenha o livro em mãos, para poder dar minhas aulas. O uso do livro escolar

por parte do professor como arquivo é o que acontece com freqüência nas escolas,

quando os alunos não dispõem cada um do livro para uso próprio, como foi o caso do

Ensino Médio até agora. Uma das decorrências deste tipo de uso do livro é o alto índice

de cópia de questões ou instruções da lousa nessas aulas, tomando parte preciosa do

escasso tempo escolar.

Nada em contrário à autonomia e à supremacia do projeto de ensino situado no

contexto e na comunidade escolar de cada professor. Ao contrário8. Mas quando e se

este projeto de ensino existe. Muitas vezes o que se dá é uma prática didática

cristalizada na tradição e na vivência de um dado professor, descontextualizada da

realidade da comunidade escolar, que, ao tratar o livro como arquivo, ignora também o

projeto didático autoral.

Como bem definia Choppin (1992, p. 16), no início deste texto, os manuais ou

livros didáticos são “utilitários da sala de aula”, ou seja, obras produzidas com o

objetivo de auxiliar no ensino de uma determinada disciplina, que favorecem tanto usos

coletivos (em sala de aula), quanto individuais (em casa ou em sala de aula).

Este é um segundo problema: se o professor trata o livro didático como um

arquivo, retirando textos e partes que lhe interessam de obras variadas e ignorando o

projeto autoral, mas solicita dos alunos que estudem, em sala de aula, em casa, para

aulas ou provas, usando o livro adotado, podem ocorrer projetos de ensino em conflito

(por exemplo, diferentes visões de como se fazer História), que induzirão o aluno a erro,

do ponto de vista da proposta escolhida pelo professor.

Tratar o livro didático como um discurso do autor (num gênero didático) é, ao

contrário, tanto na escolha do livro como no uso, levar em conta o projeto do autor, no

que diz respeito à seleção dos conteúdos, assim como no que tange à metodologia de

ensino adotada. Em seguida, comparar seu próprio projeto de ensino situado com o

projeto do autor, para ver se são compatíveis. E aí, são necessários critérios, tanto para

Page 16: Livro-texto EJA

16

adotar um livro para os próximos 3 anos naquela comunidade escolar como para

selecionar textos e atividades no livro e em outros impressos e veículos variados

(paradidáticos, obras de referência, coletâneas, jornais, revistas, vídeos, Internet etc).

Quais seriam esses critérios?

Gostaria de propor aos professores duas ordens de critérios: as necessidades de

ensino e as possibilidades de aprendizagem. Na ordem das necessidades de ensino,

encontra-se, principalmente, o projeto de ensino situado do professor (ou,

preferencialmente, do grupo de professores) para aquela comunidade escolar: Para este

alunado, o que se deve ensinar, para atingir metas determinadas? Para esta comunidade

escolar – que incorpora, por exemplo, alunado de favelas em São Paulo ou Rio de

Janeiro ou que está situada em zona rural do Centro-Oeste –, quais metas de ensino

foram eleitas? E, a partir delas, quais conteúdos são importantes para atingir essas

metas? Que tipos e níveis de letramento são necessários para que esta comunidade

alcance para a vida cidadã nesta comunidade? Que textos devem, então, ser

selecionados e trazidos para os alunos? Esta obra contempla esses conteúdos e textos?

Como complementá-la, a partir de outros impressos?

Na ótica das possibilidades de aprendizagem do alunado, algumas questões já

mencionadas são também importantes: Que conhecimentos, valores, atitudes e tipos e

níveis de letramento estes alunos já trazem? Quais são importantes no projeto de ensino

do professor? O que será preciso ensinar e aprender nesta coletividade? Como se

organizam o tempo e o espaço escolar de que se dispõe (número e tempo de aulas,

número e tipo de alunos por sala, disposição da sala, existência de biblioteca,

laboratório, salas ambientes etc.)? Com que recursos tecnológicos é possível contar

(retroprojetor, xerox, vídeo, computador, Internet etc.)? É possível contar com

professores de outras disciplinas para atingir estas metas? Que obra/trechos de obras

interessantes podem ser selecionadas para atingir estas metas, em face destas restrições?

Como é possível complementar esta obra a partir de outros impressos e recursos9?

Para finalizar, provisoriamente, esta discussão, quero lembrar de uma meta geral

na formação cidadã do alunado no Brasil de hoje – que envolve, de maneira crucial, os

textos, impressos e livros que circulam em sala de aula e, correspondentemente, os tipos

e níveis de letramento que buscamos que nossos alunos construam –, que é o fato de

que, no mundo altamente semiotizado da globalização, saber situar os discursos a que

somos expostos e recuperar sua situacionalidade social (quem escreveu, com que

Page 17: Livro-texto EJA

17

propósito e ideologia, onde foi publicado, quando, quem era o interlocutor projetado

etc.) – é importantíssimo para fornecer artifícios para os alunos aprenderem, na prática

escolar, a fazer escolhas éticas entre os discursos que circulam à sua volta. Isso

possibilita aprender a problematizar o discurso hegemônico da globalização e os

significados antiéticos que, nele, desrespeitem a diferença, o pluralismo e a democracia.

Referências Bibliográficas

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Nacional do Livro Didático (PNLD). In: R. H. R. Rojo & A. A. G. Batista (orgs.) O

Livro Didático de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental: Letramento escolar e

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BUNZEN, C. S. (2005). Livro didático de Língua Portuguesa: um gênero do discurso.

Dissertação de Mestrado. Campinas, SP: Universidade Estadual de Campinas.

BUNZEN, C. S. & R. H. R. Rojo (no prelo). Livro didático de Língua Portuguesa como

gênero do discurso: autoria e estilo. In: E. Marcuschi & M. G. Costa Val (orgs.) O livro

didático de Língua Portuguesa – Letramento, inclusão e cidadania. A sair por: Belo

Horizonte: Autêntica/CEALE.

CHOPPIN, A. (1992). Les manuels scolaires: historie et actualité. Paris : Hachette

Éducation.

CLARE, N. A. V. (2002). 50 anos de ensino de Língua Portuguesa (1950-2000). Anais

do VI Congresso Nacional de Lingüística e Filologia, Cadernos do CNLF, Série VI:

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RAZZINI, M. P. G. (2000). O Espelho da Nação: A Antologia Nacional e o ensino de

Português e de Literatura (1838-1971). Tese de Doutorado. Campinas: IEL/UNICAMP.

RIBEIRO, V. M. (org.) (2003) Letramento no Brasil – Reflexões a partir do INAF

2001. São Paulo: Global.

SOARES, M. B. (1999). A escolarização da literatura infantil e juvenil. In: A.

Evangelista et al. (orgs.). A escolarização da leitura literária. Belo Horizonte: Autêntica.

Notas

1. Prof.ª Dr.ª do Departamento de Lingüística Aplicada do Instituto de Estudos de

Linguagem IEL/UNICAMP. Consultora dessa série.

2. O programa de aquisição e distribuição de livros para o Ensino Fundamental do

estado de São Paulo, por exemplo, como vimos, possibilita ao professor a escolha de

livros didáticos e de paradidáticos e obras de referência. Na maior parte das vezes,

porém, a utilização de paradidáticos é feita para complementar o trabalho pedagógico

apoiado pelo livro didático.

Page 18: Livro-texto EJA

18

3. Definições retiradas de Batista (2003).

4. “A permanência da Antologia Nacional no currículo de Português nas séries iniciais

do curso secundário, até a década de 1940, reforça a longevidade deste modelo clássico

e beletrista de ensino da língua nacional, em que autores e textos eram considerados

sobretudo ‘paladinos da linguagem’.[…] Desta maneira, nos primeiros cinqüenta anos

de sua existência, a Antologia Nacional não só influenciou o ‘bem falar’ e o ‘bem

escrever’ de muitas gerações de brasileiros, como também lhes forneceu a formação

literária nacional” (Razzini, 2000, p. 243).

5. Pesquisas recentes, como as do INAF - ver Ribeiro (org.), 2003 - mostram que os

livros distribuídos diretamente aos alunos e os consumíveis – livros de alfabetização ou

cartilhas e dicionários – são dos mais presentes nas casas dos brasileiros (juntamente

com livros religiosos), mesmo dos brasileiros analfabetos.

6. “Entre 1994 e 2004, o PNLD adquiriu, para utilização nos anos letivos de 1995 a

2005, um total de 1,026 bilhão de unidades de livros, distribuídos para uma média anual

de 30,8 milhões de alunos, matriculados em cerca de 172,8 mil escolas. Nesse período,

o PNLD investiu R$ 3,7 bilhões. Pelo PNLD 2006 Dicionários serão atendidas mais de

478 mil salas de aula de quase 139 mil escolas públicas de 1ª a 4ª séries do Ensino

Fundamental, beneficiando mais de 16,9 milhões de alunos. Para isso, o FNDE vai

adquirir cerca de 490 mil acervos, cada um com 10 dicionários, que serão utilizados

coletivamente pelos alunos em sala de aula.” (Retirado do site

do FNDE,

http://www.fnde.gov.br/home/index.jsp?arquivo=/livro_didatico/livro_didatico.html#d

dosesta, em 30/05/2005)

7. Marcuschi, 2004.

8. A pior forma de uso do livro é aquela em que o professor perde autonomia e

abandona seu próprio projeto de ensino em favor daquele livro, executando com seus

alunos as instruções do autor, de “fio a pavio”.

9. Neste ponto, uma das questões importantes hoje é a inclusão nas salas de alunos

portadores de necessidades especiais, particularmente os cegos, cujo atendimento com

obras e textos traduzidos em Braille é hoje, sabemos, ainda altamente insuficiente. Este

é um problema, a meu ver, insolúvel por meio da tradução de cada livro ou impresso em

Braille. Quero apostar, num futuro breve, nas soluções computacionais para a questão

das necessidades especiais: presença de computadores dotados de acesso universal nas

salas; ensino paralelo dos alunos para uso das máquinas; tradutores automáticos de texto

ao Braille por meio de softwares; livros e textos digitais.

CAPÍTULO 2

Page 19: Livro-texto EJA

19

O LUDICO NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS3

Eliene de Oliveira1

Marcia do Socorro Rodrigues2

Rejanete Silva e Souza3

André Rodrigues Guimarães4

Introdução

O objetivo deste trabalho é investigar se as práticas lúdicas desenvolvidas na

Escola Estadual Maria de Nazaré Pereira Vasconcelos com os adultos estão respeitando

a realidade desses alunos, visto que a Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma

modalidade de ensino com especificidades que precisam ser consideradas no cotidiano

escolar.

Um outro fator inquietante que motivou a pesquisa foi averiguar se o lúdico

auxilia na construção de representações e significados por parte dos discentes. Assim,

buscamos compreender como a realidade colocada através das brincadeiras e jogos é

percebida pelos jovens e adultos, fazendo a interação entre sua real situação e os

conhecimentos sistematizados que são trabalhados na escola.

Neste processo, almejando um ensino-aprendizagem emancipatório, superador

da educação tradicional, é que vislumbramos que as vivências lúdicas estejam

efetivamente presentes na sala de aula, contribuindo para a compreensão e

enriquecimento da realidade de vida dos alunos jovens e adultos.

Para desenvolver a temática, o trabalho está estruturado em duas partes. Inicialmente

fazemos uma breve abordagem teórica referente à temática ludicidade na EJA,

abordando principalmente questões que envolvem a importância e a necessidade de

aulas direcionadas com dinâmicas e jogos que possam envolver, divertir e, ao mesmo

tempo, ensinar e formar novas aprendizagens. Em seguida enfoca-se o resultado da

pesquisa de campo, na qual verificamos pontos relevantes quanto à utilização do lúdico

na EJA. A análise exposta nesta comunicação foi feita numa perspectiva qualitativa,

para melhor percebermos a realidade específica da escola pesquisada, sem intenção de

generalizar os resultados.

3 OLIVEIRA, Eliene; RODRIGUES, Marcia do Socorro; SOUZA, Rejanete Silva; GUIMARÃES, André

Rodrigues. O Lúdico na Educação de Jovens e Adultos. Disponível em:

http://alb.com.br/arquivomorto/edicoes_anteriores/anais16/sem01pdf/sm01ss04_08.pdf.

Page 20: Livro-texto EJA

20

Ao final fazemos nossas considerações enfatizando que é significativo aos

docentes o envolvimento em busca de novas metodologias que atendam e desperte o

interesse a motivação dos educandos.

A ludicidade e suas contribuições na formação do aluno da EJA

Ao longo da história da educação brasileira pouco se fez em prol de um ensino

de qualidade para os jovens e adultos. É somente a partir de 1940 que no Brasil começa-

se a pensar em uma educação voltada a estas camadas populares, as quais tomaram

maior evidencia a partir de 1960.

Neste cenário Freire propunha uma concepção de educação libertadora, a qual

almeja, a partir das experiências vividas cotidianamente pelo aluno, a constituição de

um processo emancipador na qual a leitura está intimamente vinculada à transformação

social com a superação da opressão. Neste sentido, ressalta-se a necessidade de respeitar

os saberes dos educandos, suas realidades, pois impor “a eles a nossa compreensão em

nome da sua libertação é aceitar soluções autoritárias como caminhos para liberdade”

(FREIRE, 2003, p. 27).

As propostas de Freire visam uma educação popular, conscientizadora, na qual a

leitura de mundo precede a leitura da palavra. Entretanto, contrariamente à esta

perspectiva, em 1967 foi lançado o MOBRAL (Movimento Brasileiro de

Alfabetização), que se expandiu para todo país. Este programa levava o educando a

apenas decifrar letras e, muito precariamente, a leitura e a escrita. De um modo geral,

mesmo após a extinção do Mobral e com os sucessivos programas governamentais para

atender a EJA, percebemos que ainda são fortes as influências de perspectivas limitadas

de educação nesta modalidade de ensino.

Deste modo, para reverter este quadro, seria preciso envolver os alunos em um

processo de ensino norteado por práticas que possibilite a inclusão educacional e social.

Para tal, os trabalhos educativos com jovens e adultos devem estar alicerçados com

práticas que desenvolvam a permanência do educando na escola, permitindo o seu

desenvolvimento em múltiplas dimensões e fazendo com o mesmo se prepare para

novos desafios que surgem.

Assim sendo, o lúdico passa a constituir-se em uma possibilidade de um novo

olhar para os jovens e adultos, na qual esses alunos que não tiveram oportunidades

educacionais na idade própria e retornaram à escola na tentativa de superar o tempo

Page 21: Livro-texto EJA

21

perdido, possam encontrar na escola um ambiente prazeroso, descontraído e de

satisfação pessoal. É neste contexto que a escola de jovens e adultos pode tornar-se para

os educandos um espaço privilegiado de formação com metodologias divertidas e

dinamizadas, desfrutando de momentos prazerosos ao mesmo tempo construindo um

conhecimento escolar agradável.

A ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e

não pode ser vista apenas como diversão. O desenvolvimento do

aspecto lúdico facilita a aprendizagem, o desenvolvimento pessoal,

social e cultural, colabora para uma boa saúde mental, prepara para

um estado interior fértil, facilita os processos de socialização

comunicação, expressão e construção do conhecimento (SANTOS,

1997, p 12).

Numa concepção lúdica, a linguagem oral e escrita deve ser considerada como

forma de interação para externar pensamentos ou para apropriação de conhecimentos.

Desse modo, poderemos através de jogos, brincadeiras, montagens e produções dos

alunos criar um ambiente alfabetizador significativo e concreto. Além disso, a descrição

de objetos práticos pode ajudar o aluno no desenvolvimento de variadas dimensões

(ética, estética, artística, afetiva etc.).

Neste processo é importante lembrar que a leitura crítica da realidade

proporciona um novo fazer pedagógico reconhecendo que a alfabetização está

associada, sobretudo as mudanças que queremos implementar na sociedade. Ou seja,

concebemos que a educação deve ser “vista como um dos meios capazes de

proporcionar à classe trabalhadora um saber que seja instrumento de luta, a fim de que

possa de forma consciente, renascer enquanto homens e com eles uma nova escola”.

(VALE, 2001, p. 46).

Ressalta-se, que é preciso respeitar os níveis de compreensão dos alunos da EJA

valorizando a sua realidade para que se efetive o processo de ensino aprendizagem. Isto

deve ser feito sem imposição, pois ninguém sabe tudo, cada um tem intrínseco o seu

conhecimento pautado em suas convicções e experiências vividas. Assim sendo, o

trabalho com a ludicidade, para além da recreação, deve envolver a sensibilidade e a

descoberta de um novo sentido para a leitura e a escrita, vislumbrando o

desenvolvimento pleno da capacidade do sujeito.

Se observarmos atentamente a dinâmica de alfabetização evidenciada por Freire

(BRANDÃO, 1981) perceberemos o trabalho com gravuras, desenhos, imagens que

Page 22: Livro-texto EJA

22

estão sempre em contato com as formas lúdicas. Através das fichas com gravuras, os

alunos irão tendo noção das palavras que fazem parte do seu vocabulário. Esta tomada

de consciência possibilita aos docentes e discentes a criação de novas estratégias de

ensino presentes na cotidianidade do fazer pedagógico.

Desta forma é importante redimensionar através das atividades lúdicas os

conteúdos a serem trabalhados na EJA, modificando atitudes e comportamentos

facilitando a aprendizagem, e tornando-a significativa. Paralelamente a essa utilização

existem duas questões preponderantes. Primeiramente a utilização de atividades lúdicas

com novas metodologias de ensino com perspectiva de um novo olhar para o currículo

da EJA. Isso será necessário para efetivar a construção do conhecimento junto à

vivência e a capacidade criadora dos alunos.

Em segundo lugar deve-se verificar que a educação de hoje precisa acompanhar

as inovações e aproveitar a ludicidade em benefício de todos, garantindo a integração na

sociedade como agentes mais críticos e criativos, só assim o aluno terá mais facilidade

de expressar sua afetividade, emoções e até mesmo integrar-se ao grupo de forma

consciente e crítica.

Nesta perspectiva, é preciso romper com o ensino tradicional que discrimina,

exclui e trata com inferioridade e incapacidade os jovens e adultos, que também fazem

parte da nossa sociedade precisando apenas ser reconhecidos e valorizados como

indivíduos com cultura e personalidade própria. Entretanto, ao pensar sobre a utilização

do lúdico na EJA é preciso considerar que esta modalidade possui suas especificidades

as quais devem ser respeitadas. Não podemos mais ver a EJA como uma extensão do

ensino regular ou com atividades meramente recreativas que não são usadas para

implementar novas práticas e sobretudo criar um ambiente de integração entre

professores e aluno.

O lúdico não pode nem deve ser usado simplesmente para passar o tempo, como

se não tivesse nenhum valor pedagógico. Ao contrário essas atividades devem envolver

os alunos para o trabalho coletivo, é através das atividades lúdicas como jogo e

brincadeiras que o adulto poderá indagar transformar e expressar suas vontades

Neste sentido, Haidt (2003, p. 176) enfatiza que além dessas questões “o jogo

tem um valor formativo porque contribui para a formação de atitudes sociais: respeito

mutuo, solidariedade, cooperação, obediência à regras, senso de responsabilidade

iniciativa, pessoal e grupal”.

Page 23: Livro-texto EJA

23

Uma outra questão a considerar é a concepção de formação humana contínua, segundo a

qual todos, educadores e educandos, são eternos aprendizes, trocando e inovando suas

experiências e aumentando a perspectiva de permanência desses alunos na escola.

Assim a escola deve constituir se em um espaço de troca de experiências, onde a

ludicidade auxiliam o professor na sua prática.

A ludicidade na EJA: caminhos para formação da cidadania na escola

Para verificar como vem sendo utilizado o lúdico na Educação de Jovens e

Adultos (EJA) na Escola Maria de Nazaré Pereira Vasconcelos, realizamos no mês de

outubro de 2006, uma pesquisa com abordagem qualitativa. Para tanto, foram realizadas

entrevistas estruturadas com duas docentes e aplicados questionários fechados com vinte

discentes. Especificamente os questionários nos auxiliaram a perceber quais as

perspectivas que os educandos têm a respeito da utilização do lúdico na sua formação

escolar.

a) A necessidade do lúdico como apoio para as novas práticas pedagógicas

A utilização de jogos na educação de jovens e adultos estimula os alunos para

uma participação ativa na prática escolar, envolvendo-os em trabalhos bem elaborados e

tornando-os independentes para perceberem seus potenciais, enquanto agentes

participativos. Assim, quanto mais vivências lúdicas tiverem esses alunos maiores serão

as suas participações em sala de aula, favorecendo até mesmo ao professor para que

tenha um envolvimento maior com seus alunos com momentos prazerosos e

descontraídos.

Isto é significativo, pois a aprendizagem só ocorre quando o aluno participa

ativamente do processo de construção e reconstrução do conhecimento. Nesta

construção os procedimentos didáticos devem ajudar o aluno a incorporar novas formas

de aprender e desenvolver-se.

Tanto os professores quanto os alunos investigados, de um modo geral,

compreendem que o lúdico torna as atividades escolares mais atrativas e descontraídas.

Constatou-se também que as professoras reconhecem a possibilidade de estabelecer,

com utilização dos jogos, uma ligação entre o que o aluno já sabe e aquilo que ele ainda

precisa alcançar. Conforme demonstra Freire (1996) a tarefa do educador é desafiar o

educando a pensar criticamente a partir de seu mundo imediato e não lhe impor um

mundo alheio.

Page 24: Livro-texto EJA

24

Neste contexto, as professoras ao elaborarem atividades lúdicas se mostraram

comprometidos com a realidade dos alunos, estimulando e trabalhando esses com novos

procedimentos didáticos. Para elas, através do jogo a aprendizagem acontece de forma

natural, com envolvimento e a participação ativa dos alunos, tornando a sala de aula um

lugar onde se constrói conhecimento e não apenas se transfere informações.

Através do jogo há um maior interesse do aluno em brincar e

aprender mais rápido estimula a memória, eles acham interessantes. E

também você tem a oportunidade de conhecer melhor os alunos

interagir com eles, proporcionando a eles atitudes e valores ético

através dos jogos essas atitudes são desenvolvidas sem obrigação de

forma consciente, coletiva, com justiça e igualdade, sem

discriminação (Professora A).

Mesmo com todos os entraves e dificuldades encontradas para efetivação e

implementação de novas práticas, fica evidente que as professoras dentro das suas

limitações estão procurando implementar suas aulas com atividades prazerosas. Porém,

apesar de todos os benefícios que a ludicidade trás para sala de aula, percebemos que as

professoras ainda utilizam os jogos esporadicamente, em atividades eventuais,

trabalhando geralmente jogos matemáticos, de montagem de letras, algumas construções

e outros.

Além destas questões já expostas, outro aspecto significativo mencionado pelas

professoras refere-se à melhoria do relacionamento e da amizade que envolve a presença

do lúdico no contexto escolar. O valor da ludicidade é visível quando possibilita o

relacionamento entre aluno e professores, que acabam criando um elo de respeito e

companheirismo.

Por outro lado, os alunos reconhecem que a ludicidade torna-os mais receptivos

aos assuntos trabalhados. Isto demonstra que os jovens da EJA percebem o valor dos

jogos e brincadeiras na sala de aula como um recurso pedagógico que os favorece em

suas aprendizagens. Os alunos afirmam que os jogos fazem com que eles aprendam

coisas novas, ativam a sua mente e estimulam o aprendizado, porque os deixam mais

extrovertidos e relaxados.

Os educandos acrescentam que gostam de tudo que envolve a ludicidade, tanto

os jogos como as brincadeiras, dramatizações, músicas e as dinâmicas que ajudam a

resolver problemas e construírem novas concepções e também de jogos da memória,

quebra-cabeça, montagem, dominó, baralho e gincanas educativas. Isso é fundamental,

Page 25: Livro-texto EJA

25

pois demonstra que os educadores aos poucos estão internalizando e incorporando a

necessidade de novas concepções de educação voltadas para adequação de um ensino

significativo.

b) Contribuições da formação lúdica do professor para trabalhar na EJA

A formação continuada do educador da EJA também contribui para sua melhor

atuação em sala de aula, pois possibilita um repensar de suas ações, para que através da

troca de experiência com outros educadores ele seja capaz de melhorar a sua prática,

afastando-se um pouco da rotina massacrante das aulas tradicionais e incorporando por

meio da ludicidade a satisfação de compartilhar com o outro o saber.

Entendemos que o educador é um mediador, um organizador do

tempo, do espaço, das atividades [...] na construção do conhecimento.

È ele quem cria e recria sua proposta pedagógica e para que ela seja

concreta, critica dialética, este educador deve ter competência técnica

para fazê-la (SANTOS, 1997, p. 61).

Compreendendo esta questão, a formação continuada foi apontada pelas

docentes como uma das condições básicas para termos um ensino diferenciado em

nossas escolas. As práticas lúdicas ajudam os educadores na formação do educando,

valorizando o homem em sua condição de pessoa humana que necessita também do

lazer que muitas vezes é negado pela falta de tempo e de oportunidade.

Por outro lado sabemos que só a formação do educador não é o bastante para

termos um ensino público de qualidade, é preciso assimilação desta prática por todos

que fazem parte da escola. A formação do educador também depende do seu esforço

próprio, não podendo contentar-se apenas com a sua formação inicial. É preciso

reconhecer-se com ser inacabado, que sempre esta aprendendo.

Estas considerações evidenciam a necessidade de uma política permanente e

específica para a EJA, que entre outras questões considere a formação inicial e

continuada dos profissionais da educação.

Considerações Finais

A especificidade da EJA exige que busquemos analisar e propor práticas

educativas condizentes com a realidade socialmente excludente em que vivemos.

Repensar a educação de adultos apresenta-se como um desafio para aqueles que se

propõe na construção de uma educação emancipadora, que considere o ser humano em

Page 26: Livro-texto EJA

26

todas as suas dimensões. Neste processo, as atividades lúdicas representam um caminho

para implementarmos uma pedagogia mais humana, fraterna e libertadora.

Na pesquisa que realizamos pudemos constatar que os educadores investigados

dizem utilizar a ludicidade em sua prática pedagógica, reconhecendo a sua importância

no seu fazer pedagógico para implementação da aprendizagem dos alunos. Entretanto,

verificamos que essas atividades ainda acontecem de forma esporádica que muitas vezes

não chegam a motivar todos os educandos precisando ser mais bem planejada e

adequada à realidade de todos e com maior freqüência.

E neste processo, o professor precisa assumir a crença no poder de

transformação que o lúdico pode trazer para a educação e o brincar deve ser visto como

um potencializador do desempenho do educador que sabe e gosta de brincar, que eleva e

respeita o potencial de cada indivíduo. Para tanto é preciso repensar nossas práticas,

adequando as ações pedagógicas para promover o exercício da cidadania e também

perceber que a sala de aula constitui-se em um espaço com diferentes vivências que

podem ser aproveitadas para estimular os alunos facilitando e dinamizando as aulas.

O desafio então é usar esses recursos didáticos com responsabilidade e

maturidade saindo do discurso para efetivação do processo de mudança do ato de

aprender e ensinar voltados para as necessidades dos alunos da EJA. Isso pode dar-se a

partir da mudança de postura de alguns professores que ainda insistem nas aulas

conteudistas sem motivação, sendo isso um desafio que a escola precisa superar.

Outro aspecto a ser acrescentado é que com as atividades lúdicas o professor

promove a auto-estima e favorece o desenvolvimento da linguagem, pois alguns alunos

têm dificuldades de comunicar-se e através dos jogos e brincadeiras as idéias fluem com

naturalidade. Assim, é possível compreender o outro, amar e sentir-se aceito pelos

colegas respeitando e compartilhando seus anseios, suas dúvidas e desejos. Para Freire,

“a alegria necessária à atividade educativa é a esperança. A esperança de que professor e

alunos juntos podem aprender ensinar, inquietar-nos, produzir e juntos igualmente

resistir aos obstáculos” (1996, p. 80).

De um modo geral, os alunos têm boa receptividade às atividades lúdicas

utilizadas no processo de ensino aprendizagem, porém alguns apresentam críticas a

certas atividades que “são infantis”. Assim, o desafio não estar somente na introdução

do lúdico na EJA, mas acima de tudo, compreender as especificidades que esta

modalidade exige.

Page 27: Livro-texto EJA

27

Para concretização destas questões as docentes investigadas apontam um

elemento basilar para a realização de práticas lúdicas que respeitem a EJA: sua

formação permanente. Deste modo, é evidente a necessidade de construirmos uma

política educacional permanente para jovens e adultos. Somente assim, poderemos

efetivamente construir uma educação plena e que possibilite uma formação

emancipadora para todos.

Referências Bibliográficas

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é o método Paulo Freire. São Paulo:

Brasiliense, 1981.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, 6ª

ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

__________. A importância do ato de ler. 45ª ed. São Paulo: Cortez, 2003.

HAIDT, Regina Célia Cazaux. Curso de Didática Geral: O uso de jogos (cap.9). 7 ed.

São Paulo: Ática, 2003.

SANTOS, Santa Marli Pires dos. O lúdico na formação do Educador. 6ª ed.

Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

VALE, Ana Maria do. Educação popular na escola pública, 3ª ed. São Paulo: Cortez,

2001.

Notas

1.Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Amapá – UNIFAP.

2.Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Amapá – UNIFAP.

3.Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Amapá – UNIFAP.

4.Professor de Fundamentos da EJA/UNIFAP e Mestrando em Desenvolvimento

Regional pela UNIFAP.

TEXTO COMPLEMENTAR

LUDICIDADE COMO INSTRUMENTO PEDAGÓGICO4

4 ALMEIDA, Anne. Ludicidade como instrumento pedagógico. Disponível em:

http://www.cdof.com.br/recrea22.htm. Acesso em 30.05.2014.

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28

Profª. Esp. Anne Almeida1

O lúdico tem sua origem na palavra latina "ludus" que quer dizer "jogo". Se se

achasse confinado à sua origem, o termo lúdico estaria se referindo apenas ao jogar, ao

brincar, ao movimento espontâneo. A evolução semântica da palavra "lúdico",

entretanto, não parou apenas nas suas origens e acompanhou as pesquisas de

Psicomotricidade. O lúdico passou a ser reconhecido como traço essencial de

psicofisiologia do comportamento humano, de modo que a definição deixou de ser o

simples sinônimo de jogo.

As implicações da necessidade lúdica extrapolaram as demarcações do brincar

espontâneo, passando a necessidade básica da personalidade, do corpo e da mente. O

lúdico faz parte das atividades essenciais da dinâmica humana, caracterizando-se por ser

espontâneo funcional e satisfatório. Sendo funcional: ele não deve ser confundido com o

mero repetitivo, com a monotonia do comportamento cíclico, aparentemente sem alvo

ou objetivo. Nem desperdiça movimento: ele visa produzir o máximo, com o mínimo de

dispêndio de energia.

Segundo Luckesi, lúdicas são aquelas atividades que propiciam uma experiência

de plenitude, em que nos envolvemos por inteiro, estando flexíveis e saudáveis. Para

Santin, são ações vividas e sentidas, não definíveis por palavras, mas compreendidas

pela fruição, povoadas pela fantasia, pela imaginação e pelos sonhos que se articulam

como teias urdidas com materiais simbólicos. Assim, elas não são encontradas nos

prazeres estereotipados, no que é dado pronto, pois estes não possuem a marca da

singularidade do sujeito que as vivencia.

Na atividade lúdica, o que importa não é apenas o produto da atividade, o que dela

resulta, mas a própria ação, o momento vivido. Possibilita a quem a vivencia momentos

de encontro consigo e com o outro, momentos de fantasia e de realidade, de

ressignificação e percepção, momentos de autoconhecimento e conhecimento do outro,

de cuidar de si e olhar para o outro, momentos de vida.

Uma aula com características lúdicas não precisa ter jogos ou brinquedos. O que

traz ludicidade para a sala de aula é muito mais uma "atitude" lúdica do educador e dos

educandos. Assumir essa postura implica sensibilidade, envolvimento, uma mudança

Page 29: Livro-texto EJA

29

interna e não apenas externa, implica não somente uma mudança cognitiva, mas,

principalmente, uma mudança afetiva. A ludicidade exige uma predisposição interna, o

que não se adquire apenas com a aquisição de conceitos, de conhecimentos, embora

estes sejam muito importantes. Uma fundamentação teórica consistente dá o suporte

necessário ao professor para o entendimento dos porquês de seu trabalho. Trata-se de ir

um pouco mais longe ou, talvez melhor dizendo, um pouco mais fundo. Trata-se de

formar novas atitudes, daí a necessidade de que os professores estejam envolvidos com

o processo de formação de seus educandos. Isso não é tão fácil, pois, implica romper

com um modelo, com um padrão já instituído, já internalizado.

A escola tradicional, centrada na transmissão de conteúdos, não comporta um

modelo lúdico. Por isso é tão frequente ouvirmos falas que apóiam e enaltecem a

importância do lúdico estar presente na sala de aula, e queixas dos futuros educadores,

como também daqueles que já se encontram exercendo o magistério, de que se fala da

importância da ludicidade, se discutem conceitos de ludicidade, mas não se vivenciam

atividades lúdicas. Fala-se, mas não se faz. De fato não é tão simples uma

transformação mais radical pelas próprias experiências que o professor tem ao longo de

sua formação acadêmica.

Como bem observa Tânia Fortuna, em uma sala de aula ludicamente inspirada,

convive-se com a aleatoriedade, com o imponderável; o professor renuncia à

centralização, à onisciência e ao controle onipotente e reconhece a importância de que o

aluno tenha uma postura ativa nas situações de ensino, sendo sujeito de sua

aprendizagem; a espontaneidade e a criatividade são constantemente estimuladas.

Podemos observar que essas atitudes, de um modo geral, não são, de fato, estimuladas

na escola. Para Jucimara: "as atividades lúdicas permitem que o indivíduo vivencie sua

inteireza e sua autonomia em um tempo-espaço próprio, particular. Esse momento de

inteireza e encontro consigo gera possibilidades de autoconhecimento e de maior

consciência de si".

São lúdicas as atividades que propiciem a vivência plena do aqui-agora,

integrando a ação, o pensamento e o sentimento. Tais atividades podem ser uma

brincadeira, um jogo ou qualquer outra atividade que possibilite instaurar um estado de

inteireza: uma dinâmica de integração grupal ou de sensibilização, um trabalho de

recorte e colagem, uma das muitas expressões dos jogos dramáticos, exercícios de

relaxamento e respiração, uma ciranda, movimentos expressivos, atividades rítmicas,

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30

entre outras tantas possibilidades. Mais importante porém, do que o tipo de atividade é a

forma como é orientada e como é experienciada, e o porquê de estar sendo realizada.

Enquanto educadores, damos ênfase às metodologias que se alicerçam no

"brincar", no facilitar as coisas do aprender através do jogo, da brincadeira, da fantasia,

do encantamento. A arte-magia do ensinar-aprender (Rojas, 1998), permite que o outro

construa por meio da alegria e do prazer de querer fazer. O jogo e a brincadeira estão

presentes em todas as fases da vida dos seres humanos, tornando especial a sua

existência. De alguma forma, o lúdico se faz presente e acrescenta um ingrediente

indispensável no relacionamento entre as pessoas, possibilitando que a criatividade

aflore.

Por meio da brincadeira a criança envolve-se no jogo e sente a necessidade de

partilhar com o outro. Ainda que em postura de adversário, a parceria é um

estabelecimento de relação. Esta relação expõe as potencialidades dos participantes,

afeta as emoções e põe à prova as aptidões testando limites. Brincando e jogando, a

criança terá oportunidade de desenvolver capacidades indispensáveis a sua futura

atuação profissional, tais como atenção, afetividade, o hábito de permanecer

concentrado e outras habilidades perceptuais psicomotoras. Brincando a criança torna-se

operativa.

Observamos que quando existe representação de uma determinada situação

(especialmente se houver verbalizado) a imaginação é desafiada pela busca de solução

para problemas criados pela vivência dos papéis assumidos. As situações imaginárias

estimulam a inteligência e desenvolvem a criatividade. O ato de criar permite uma

Pedagogia do Afeto na escola, permite um ato de amor, de afetividade cujo território é o

dos sentimentos, das paixões, das emoções, por onde transitam medos, sofrimentos,

interesses e alegrias. Uma relação educativa que pressupõem o conhecimento de

sentimentos próprios e alheios que requerem do educador a disponibilidade corporal e o

envolvimento afetivo, como também, cognitivo de todo o processo de criatividade que

envolve o sujeito-ser-criança. A afetividade é estimulada por meio da vivência, a qual o

educador estabelece um vínculo de afeto com o educando. A criança necessita de

estabilidade emocional para se envolver com a aprendizagem. O afeto pode ser uma

maneira eficaz de se chegar perto do sujeito e a ludicidade, em parceria, um caminho

estimulador e enriquecedor para se atingir uma totalidade no processo do aprender.

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31

Percebemos em Machado (1966) o ressaltar do jogo como não sendo qualquer

tipo de interação, mas sim, uma atividade que tem como traço fundamental os papéis

sociais e as ações destes derivadas em estreita ligação funcional com as motivações e o

aspecto propriamente técnico-operativo da atividade. Dessa forma destaca o papel

fundamental das relações humanas que envolvem os jogos infantis.

Entender o papel do jogo nessa relação afetiva-emocional e também de aprendizagem

requer que percebamos estudos de caráter psicológico, como mecanismos mais

complexos, típicos do ser humano, como a memória, a linguagem, a atenção, a

percepção e aprendizagem. Elegendo a aprendizagem como processo principal do

desenvolvimento humano enfocamos Vygotsky (1984) que afirma: a zona de

desenvolvimento proximal é o encontro do individual com o social, sendo a concepção

de desenvolvimento abordada não como processo interno da criança, mas como

resultante da sua inserção em atividades socialmente compartilhadas com outros.

Atividades interdisciplinares que permitem a troca e a parceria. Ser parceiro é sê-lo por

inteiro. Nesse sentido, o conhecimento é construído pelas relações interpessoais e as

trocas recíprocas que se estabelecem durante toda a vida formativa do indivíduo.

Machado (1966) salienta, que a interação social implica transformação e contatos

com instrumentos físicos e/ou simbólicos mediadores do processo de ação. Esta

concepção reconhece o papel do jogo para formação do sujeito, atribuindo-lhe um

espaço importante no desenvolvimento das estruturas psicológicas. De acordo com

Vygtsky (1984) é no brinquedo que a criança aprende a agir numa esfera cognitiva.

Segundo o autor a criança comporta-se de forma mais avançada do que nas atividades

da vida real, tanto pela vivência de uma situação imaginária, quanto pela capacidade de

subordinação às regras.

A ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não pode ser

vista apenas como diversão. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a

aprendizagem; o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa

saúde mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de

socialização, comunicação, expressão e construção do conhecimento.

A formação do sujeito não é um quebra-cabeça com recortes definidos, depende da

concepção que cada profissional tem sobre a criança, homem, sociedade, educação,

escola, conteúdo, currículo. Neste contexto as peças do quebra-cabeça se diferenciam,

possibilitando diversos encaixes.

Page 32: Livro-texto EJA

32

Negrine (1994) sugere três pilares que sustentariam uma boa formação

profissional, com a qual concordamos: a formação teórica, a prática e a pessoal, que no

nosso entendimento, a esta última preferimos chamá-la de formação lúdica

interdisciplinar. Este tipo de formação é inexistente nos currículos oficiais dos cursos de

formação do educador, entretanto, algumas experiências têm-nos mostrado sua validade

e não são poucos os educadores que têm afirmado ser a ludicidade a alavanca da

educação para o terceiro milênio.

A formação lúdica interdisciplinar se assenta em propostas que valorizam a

criatividade, o cultivo da sensibilidade, a busca da afetividade, a nutrição da alma,

proporcionando aos futuros educadores vivências lúdicas, experiências corporais que se

utilizam da ação do pensamento e da linguagem, tendo no jogo sua fonte dinamizadora.

Quanto mais o adulto vivenciar sua ludicidade, maior será a chance deste profissional

trabalhar com a criança de forma prazerosa, enquanto atitude de abertura às práticas

inovadoras. Tal formação permite ao educador saber de suas possibilidades e limitações,

desbloquear resistências e ter uma visão clara sobre a importância do jogo e do

brinquedo para a vida da criança. Percebemos com isso que se o professor tiver

conhecimento e prazer, mais probabilidade existirá de que os professores/aprendizes se

utilizem desse "modelo" na sua sala de aula. Nóvoa (1991) afirma que o sucesso ou

insucesso de certas experiências marcam a nossa postura pedagógica, fazendo-nos sentir

bem ou mal com esta ou aquela maneira de trabalhar na sala de aula.

Ao sentir que as vivências lúdicas podem resgatar a sensibilidade, até então

adormecida, ao perceber-se vivo e pulsante, o professor/aprendiz faz brotar o

inesperado, o novo e deixa cair por terra que a lógica da racionalidade extingue o calor

das paixões, que a matemática substitui a arte e que o humano dá lugar ao técnico

(Santin, 1990), permitindo o construir alicerçado no afeto, no poder fazer, sentir e viver.

Poder vivenciar o processo do aprender colocando-se no lugar da criança, permitindo

que a criatividade e a imaginação aflorem através da interdisciplinaridade enquanto

atitude. A intersubjetividade se mostre por meio do afeto e da alegria de poder liberar o

que cada sujeito (professor) traz consigo mesmo e quanto pode contribuir com o outro.

Segundo Snyders (1988) o despertar para o valor dos conteúdos das temáticas

trabalhadas é que fazem com que o sujeito aprendiz tenha prazer em aprender.

Conteúdos estes despertados pelo prazer de querer saber e conhecer. Devemos despertá-

los para, com sabedoria, podermos exteriorizá-los na nossa vida diária. A alegria, a fé, a

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33

paz, a beleza e o prazer das coisas estão dentro de nós.

Por entender e concordar com o autor percebemos que se o professor não aprende com

prazer não poderá ensinar com prazer.

É isso que procuramos fazer em nossa prática pedagógica, dando ênfase à

formação lúdica: ensinar e sensibilizar o professor-aprendiz para que, através de

atividades dinâmicas e desafiadoras, despertem no sujeito-aprendiz o gosto e a

curiosidade pelo conhecimento. Curiosidade que segundo Freire (1997) é natural e cabe

ao educador torná-la epistemológica.

Tudo se decide no processo de reflexão que o professor leva a cabo sobre sua

própria ação (Nóvoa, 1995). O homem da ciência e da técnica perdeu a felicidade e a

alegria de viver, perdeu a capacidade de brincar, perdeu a fertilidade da fantasia e da

imaginação guiadas pelo impulso lúdico (Santin, 1994). Que a sala de aula seja um

ambiente em que o autoritarismo seja trocado pela livre expressão da atitude

interdisciplinar (Fazenda, 1994). Que as aulas sejam vivas e num ambiente de inter-

relação e convivência (Masseto, 1992).

A formação lúdica possibilita ao educador conhecer-se como pessoa, saber de

suas possibilidades, desbloquear resistências e ter uma visão clara sobre a importância

do jogo e do brinquedo para a vida da criança, do jovem e do adulto (Santos, 1997;

Kishimoto, 1999). A afetividade como sustentáculo significativo e fundamental de uma

pedagogia que se alicerça na arte-magia interdisciplinar do ensinar-aprender (Rojas,

1998).

Sala de aula é um lugar de brincar se o professor consegue conciliar os objetivos

pedagógicos com os desejos do aluno. Para isso é necessário encontrar equilíbrio

sempre móvel entre o cumprimento de suas funções pedagógicas e contribuir para o

desenvolvimento da subjetividade, para a construção do ser humano autônomo e

criativo. Credita ao aluno, isto é, 'a sua ação, à parte de responsabilidade no

desenvolvimento. Mesmo procurando fazer sua parte, o professor e a escola

dão/respeitam a possibilidade de que outra coisa aconteça. Como tão bem afirma Tânia

Fortuna: brincar na sala de aula é uma aposta.

Referências Bibliográficas

VYGOTSKY, L.S. (1993) Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes.

Page 34: Livro-texto EJA

34

FORTUNA, Tânia Ramos. Formando professores na Universidade para brincar. In:

SANTOS, Santa Marli P.dos (org.). A ludicidade como ciência. Petrópolis: Vozes,

2001, p.116.

FAZENDA, I. C. (1995) A Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa.

Campinas/SP, Papirus.

MORIN, E. (1999). Amor, Poesia e Sabedoria. Lisboa: Instituto Piaget.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Educação, ludicidade e prevenção das neuroses futuras:

uma proposta pedagógica a partir da Biossíntese. In: LUCKESI, Cipriano Carlos (org.)

Ludopedagogia - Ensaios 1: Educação e Ludicidade. Salvador: Gepel, 2000.

Notas 1 A profª. Esp. Anne Almeida é licenciada em Educação Física Pelas Faculdades

Montenegro - Ibicaraí, Bahia. Especialista em Educação Física Escolar pela

Universidade Salgado de Oliveira – RJ. Professora da Rede Estadual em Itabuna Bahia,

Colégios: Eraldo Tinoco Melo e Colégio Modelo - Luis Eduardo Magalhães. Docente

das Faculdades Montenegro nos cursos de Educação Física e Pedagogia. A Almeida -

Disponível: http://www. cdof. com. br/recrea22. htm. …, 2006 - cdof.com.br

CAPÍTULO 3

Page 35: Livro-texto EJA

35

DEUSES E MONSTROS5

Educar é substantivamente formar. Divinizar ou

diabolizar a tecnologia é uma forma altamente

negativa e perigosa de pensar errado. (PAULO

FREIRE, 2002, p.37).

De acordo com Ferreira e Junior (1986), o inventor Thomas Edison, após suas

primeiras experiências com máquinas de projeção, já anunciava a possibilidade de que

os filmes chegariam a substituir os livros didáticos. Os primeiros cineastas já

produziram muitos filmes educativos com caráter instrucional.6 Com a invenção do

projetor portátil, concomitante à praticidade dos filmes não-inflamáveis inventados por

Eastman Kodak, foi possível uma maior penetração do cinema nas escolas. De acordo

com Belloni e Subtil (2002) essa questão começa a ganhar maior visibilidade a partir da

Segunda Guerra Mundial quando, nos Estados Unidos da América, começa-se a utilizar

recursos audiovisuais na educação tendo em vista a grande eficiência do uso desses

recursos, principalmente retroprojetores, projetores e filmes educativos para

treinamentos de homens para a guerra. No período pós Segunda Guerra Mundial,

algumas empresas se firmaram no ramo de produções educativas como a Encyclopaedia

Britannica Films, Coronet e Walt Disney, que se dedicou a produções de vídeos sobre

animais e fenômenos da natureza.

Louro (2000) afirma que no século XX o cinema passou a ser uma das formas

culturais mais significativas. Ao que foi inicialmente surgido como mais uma

modalidade de lazer, em pouco tempo passou a ser encarado como uma importante

instância formativa com representações de gênero, etnias, classes, dentre outras sendo

legitimadas ou marginalizadas.

A educação sempre foi alvo de inúmeros debates, experiências e reformas no

intuito de transformá-la. Acompanhada de um pensamento que percebe a educação

como o principal veículo de transformação social, algumas destas tentativas visavam,

dentre outras coisas, a expansão, qualificação e a modernização do ensino. No Brasil,

5Esse capítulo é parte da dissertação de Mestrado intitulada Cinema e educação: uma reflexão sobre a

formação dos educadores na/para a linguagem audiovisual de Adriana Marques Ferreira (Capítulo 02).

Juiz de Fora, 2009.

Filme norte-americano (1998) dirigido por Bill Condon. Título original: Gods and Monsters. 6 De acordo com Ferreira e Júnior (1986), o primeiro filme de caráter realmente educativo foi produzido

por Oskar Messter para a Marinha Alemã, em 1897.

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36

essas iniciativas vieram no bojo da tentativa de construção de um país também moderno

e progressista.

A década de 1920 representou um marco das lutas por uma grande reforma da

educação. Em 1930, subseqüente às idéias consolidadas nas Conferências Nacionais de

Educação foi criado o então denominado Ministério da Educação e Saúde Pública.

Neste momento, com o anseio de modernização e progresso do país, afirmava-se a

ideologia do grupo da Escola Nova que ensejava principalmente pelo ensino público,

obrigatório e laico.

A proposta de utilização do cinema como aliado educativo veio a partir das

idéias renovadoras de utilizá-lo como recurso e aliado da educação moderna, seja como

propaganda do país ou como auxiliar da educação na formação dos cidadãos. Dentre os

primeiros defensores da utilização do cinema na educação podemos citar Fernando de

Azevedo que, já na década de 1920, será mentor de reformas educacionais que, entre

outras medidas, incluirão o cinema como proposta de ensino.

Como possível portador de uma ideologia nacionalista, a contribuição do cinema

se daria principalmente no que se refere à “formação” da nação. Os filmes trariam

grandes benefícios para o cidadão e cumpririam o papel de apresentar aos brasileiros o

seu próprio país. Assim, apresentariam a geografia do Brasil, os monumentos históricos,

os heróis nacionais e até mesmo a origem das raças.

Este projeto de consolidação de uma nação, de acordo com Catelli (2004) se

caracterizava por uma modernização conservadora já que o cinema era concebido como

uma obra da elite. Portanto, como a arte e a cultura eram direitos reservados

exclusivamente a esta elite os novos meios de comunicação tinham como função

irradiar uma cultura elaborada “de cima”, ou, no caso da cultura popular, ao menos

selecionada por profissionais especializados.

Até então se conhecem algumas experiências locais que incentivam a utilização

do cinema como recurso didático. Em 1927, no Rio de Janeiro, foi criada uma

“Commissão de Cinema Educativo”. Esse pensamento também fez parte da reforma

educacional do Distrito Federal realizada em 1928 por Fernando de Azevedo. Durante o

Estado Novo, este projeto de transformar o cinema em um grande veículo educativo e

de integração nacional será levado à frente pelo poder político.

Foi em 1935 que, Edgard Roquette-Pinto encaminhou ao então Ministro da

Educação, Gustavo Capanema, um projeto de criação de um Instituto de Cinematografia

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Educativa. Funcionou, assim, de 1936 a 1966, o Instituto Nacional do Cinema

Educativo (INCE). Criado no governo Getúlio Vargas e influenciado pelo movimento

da Escola Nova, a função do INCE era documentar as atividades científicas e culturais

realizadas no país para difundi-las, principalmente, na rede escolar. Seu objetivo era

editar filmes educativos populares e escolares. O cinema, visto como uma tecnologia

ligada ao progresso científico das sociedades modernas, insere-se na concepção que

define os meios de comunicação de massa como capazes de difundir a cultura para a

população, percebida como ainda em formação e deficiente culturalmente. O

pensamento de Getúlio Vargas era de que as distâncias regionais, políticas, territoriais e

econômicas eram um obstáculo ao crescimento nacional e o cinema, na sua visão, era

capaz de aproximar os diferentes núcleos de pessoas dispersas no território da

República. Sendo assim, o cinema poderia representar um instrumento de mudança

social e de modernização da sociedade, tanto pelas vias da técnica como da ciência. O

cinema ainda seria um facilitador na educação do povo, já que não era preciso

necessariamente estar alfabetizado para compreender as mensagens veiculadas.

Deste Instituto fez parte, como diretor, o cineasta Humberto Mauro. As idéias de

Humberto Mauro compartilhavam com os princípios que orientaram a criação do INCE,

concordando com as teses defendidas por Roquette-Pinto sobre a eficiência dos meios

de comunicação como ferramentas na educação do povo.

Neste período, a produção cinematográfica no Brasil era muito escassa. De

acordo com Franco (2004), em 1929, dos 1477 filmes liberados pela censura, 1268 eram

norte-americanos e apenas 38 eram brasileiros. Esta situação marcava um modelo de

importação de cultura e demonstrava que a indústria cinematográfica brasileira não

estava se beneficiando com o processo de industrialização do país. A influencia da

cultura norte-americana era visível e muito desta cultura era passada aos brasileiros

através do cinema. Portanto, era necessário o incentivo estatal ao cinema educativo e,

principalmente, nacionalista. O INCE, então, foi responsável por um processo de

aumento da produção nacional, pois contabilizava a produção de cerca de 30 filmes por

ano, o que era um número muito expressivo para a realidade da época.

No entanto, o INCE foi passível de muitas críticas no que se refere à qualidade

dos filmes exibidos, sobre as intenções políticas a que eles estavam vinculados e

também ao seu uso meramente instrucional ou ilustrativo. Apesar do reconhecimento do

cinema como importante recurso educacional, era necessário mantê-lo sob controle,

Page 38: Livro-texto EJA

38

sempre cabendo às elites letradas conduzir o que seria veiculado pelo cinema, com o

intuito de espalhar a cultura nacional para as massas “incultas”. O cinema era, então,

considerado um poderoso aliado do ensino curricular e uma eficiente ferramenta para

inculcar noções como moralidade, higiene e trabalho, condizentes com uma moral

social e católica. O sujeito nacional seria aquele que, através do seu trabalho, auxiliaria

o crescimento da nação, e, assim, exerceria o seu patriotismo. Desta forma, os jovens

espectadores, dos filmes do INCE, aprendiam lições positivas sobre o trabalho manual.

Meninos apareciam trabalhando com a madeira, tendo treinamentos físicos enquanto as

meninas executavam tarefas domésticas, como costura e culinária. (ROSA, 2006). E,

sempre felizes, sorrindo, por estarem contribuindo com a pátria.

Os filmes produzidos pelos INCE também foram muito criticados no que diz

respeito à falta de uma orientação pedagógica em sua produção. Na pesquisa realizada

por Marília Franco sobre esses filmes ela pôde ao observar a falta dessa linha

pedagógica que desse ênfase a algum tipo de ensino ou que valorizasse alguma

abordagem. Sobre isso, Franco (2004) diz o seguinte:

Encontrei de tudo: geografia, música, medicina, educação rural,

documentação cientifica e industrial, história, literatura, registros

documentais. A análise do material preservado levou-me a constatação

de que não havia uniformidade didática. Sequer era clara a articulação

com os programas de ensino então vigentes. Neste caso fez falta o

educador para orientar a “linha editorial” (p.31)

Na verdade, o interesse pela dimensão educativa do cinema sempre foi alvo de

estudos e discussões. Favaretto (2002) coloca que as décadas de 1950 e 1960 foram um

período marcado por vários estudos, principalmente, psicopedagógicos. Isto se deve ao

fato de haver, naquele momento, uma ampla penetração do cinema norte-americano no

Brasil. Portanto, percebiam-no como um influenciador, ou até mesmo indutor dos

comportamentos das crianças e adolescentes com vistas ao chamado american way of

life, ou seja, o jeito americano de ser. Ao autor chama atenção para o fato de, nesta

época haver um grande número de estudos publicados sobre o tema. Diz ele:

Ao lado de um documento da Unesco com recomendações sobre os

cuidados que deveriam cercar a aproximação das crianças e

adolescentes do cinema, saíram no Brasil vários textos em revistas

especializadas. Por exemplo: ‘A criança e o cinema’, de Samuel

Pfromm Neto, ‘Cinema e saúde mental’, de J. Carvalho Ribas, ‘

Aspectos pedagógicos da influência do cinema sobre a criança e o

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39

adolescente’, de Enzo Azzi. Inclui-se aí um interessante artigo de

Paulo Emílio Salles Gomes, ‘Inocência do cinema’[...]. Descartando o

que era considerada a influência maléfica do cinema, Paulo Emílio

destaca a sua relação com os problemas sociais nele configurados

através de uma singular experiência cultural. (FAVARETO, 2002,

p.10)

O INCE existiu até 1966 quando foi integrado ao Inc – Instituto Nacional de

Cinema transformando-se no DFC – Departamento do filme cultural. Pode-se afirmar

que o INCE foi a experiência mais sólida de cinema educativo no Brasil. E, mesmo com

todas as críticas – demasiadas pertinentes – não há como negar que o material

produzido pelo INCE possui um grande registro da história e da cultura brasileira.

Nas décadas seguintes, principalmente devido ao aumento dos meios de

comunicação de massa, o interesse da compreensão das relações entre cinema e

educação permanecia, mas, de acordo com Favaretto (2002), houve um

redirecionamento do interesse dedicado ao cinema educativo devido a dois fatores: ao

destaque dado aos problemas colocados pelas novas tecnologias, no âmbito da pesquisa,

do ensino e do saber, e a necessidade de transformação do processo educativo tanto nos

níveis institucionais quanto no nível pedagógico, levando em consideração as demandas

sociais e a produção industrial.

Belloni e Subtil (2002) afirmam que, no Brasil, o fortalecimento da inclusão dos

audiovisuais como recursos didáticos correspondem às reformas de ensino

implementadas na década de 1970. Neste momento, prevalecia o modelo tecnicista que

considerava que o ensino se tornava eficiente a partir do momento em que se aplicavam

métodos e técnicas instrucionais. Os processos educacionais estavam próximos ao

modelo de organização do trabalho típicas do modelo fordista de produção industrial.

Tal visão tecnicista considera tais materiais como “muletas pedagógicas”, ou seja, um

instrumento sobre o qual se apóia o professor para dar conta de transmitir o conteúdo da

forma mais eficaz possível. A partir dos anos 80 surgiram inúmeras críticas a tais

modelos tecnicistas e, com estas críticas, o modelo vigente também foi posto em

discussão. Dizem as autoras:

Na visão tecnicista, que considera esses materiais “muletas

pedagógicas”, escamoteia-se o fato de que eles são carregados de

historicidade, são fontes de emoção, de idéias e de conhecimentos e

que estão colocados na trama comunicacional – desencadeada no ato

pedagógico – como mediadores no processo de produção dessa

comunicação que envolve professores e alunos. Portanto, para além da

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40

simples transferência de informação, a relação estabelecida é a de

elaboração e transformação de idéias, sentimentos, atitudes e sentidos

entre esses sujeitos com o uso dos objetos midiáticos. (p.69)

No entanto, ao se rejeitar o modelo tecnicista de educação, também foram

descartados os meios técnicos. Tal fato foi determinante para que a escola deixasse de

utilizar os avanços tecnológicos que ocorreram no campo da comunicação e da

informação, processos que Belloni e Subtil consideram como “matérias-primas da

educação” (2002, p.60). Hoje, o crescimento das Tecnologias da Informação e

Comunicação (TIC) aliado a programas como, por exemplo, o Programa TV Escola7,

criado em 1996, ou o mais recente DVD Escola8 de 2006, têm acentuado o interesse

pelos meios de comunicação e seus usos, aliados à tecnologia, na educação. Tal

crescimento possibilita uma ampliação no que diz respeito ao uso de variados

instrumentos tecnológicos, trazendo a televisão, o vídeo, e, mais recentemente o DVD e

os computadores para dentro da prática pedagógica.

Não há como negar a necessidade de se trabalhar com o audiovisual como uma

importante ferramenta pedagógica. Cabe ressaltar que o trabalho com o cinema

educativo não deve se restringir ao uso de filmes produzidos para este fim, mas sim se

deve aproveitar o potencial educativo de toda e qualquer produção sem que, no entanto,

isso signifique sua mera didatização ou uma escolarização das mídias, e nem mesmo

que o cinema vire instrumento de alienação e propaganda de idéias e regimes. Até

mesmo Roquete-Pinto já afirmava que o verdadeiro cinema educativo era o cinema

espetáculo, o cinema da vida integral (FRANCO, 2004). A tomada de consciência das

infinitas possibilidades educativas deste tipo de linguagem não deve pender para um

lado meramente instrumental de sua utilização, o que seria reduzir em muito seu

potencial, estético, artístico e político.

Apesar do reconhecimento por parte de educadores, governo e sociedade, da

necessidade de utilização dos recursos audiovisuais nas escolas, o que se percebe é que

eles ainda dividem opiniões: ou são considerados Deuses – soluções para todos os

7 O Programa TV Escola equipou as escolas públicas com um kit tecnológico composto por antena

parabólica, televisão em cores, receptor de satélite, videocassete, estabilizador de voltagem e fitas

cassetes. Os equipamentos que compõem o kit tecnológico foram adquiridos pela escola por intermédio

da Secretaria de Educação do Estado ou pelo Município, com recursos do BIRD e do salário-educação

administrados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) do MEC. 8 Foram enviados a 50 mil escolas públicas de ensino básico (pré-selecionadas usando alguns critérios

com base no censo INEP/2004) um aparelho de reprodução de DVD e uma caixa com 50 mídias DVD,

contendo, aproximadamente, 150 horas de programação produzida pela TV Escola.

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problemas, sendo a maior ferramenta contra o marasmo em que a escola se encontra –,

ou são considerados Monstros – grandes vilões capazes de subverter as mentes mais

pacíficas, estimulando o consumo desenfreado e a violência.

As concepções que se referem aos meios de comunicação – cinema,

computador, televisão etc. – como responsáveis por destruir consciências ou por trazer-

lhes esclarecimentos, já são muito apresentadas e discutidas por educadores e teóricos,

sejam da área da comunicação ou da educação.

As opiniões são divergentes e, por isso, trazer imagens para a sala de aula e/ou

criticar e analisar as imagens recebidas seria uma boa forma de se garantir o direito de

escolha e de pensamento diante delas. Umberto Eco em seu livro Apocalípticos e

Integrados (1979), reúne argumentos a favor e contra a chamada comunicação de massa

e vai além de questioná-la como sendo algo estritamente bom ou mau. De modo geral,

os argumentos contra dizem respeito à críticas a um certo caráter conformista que

teriam esses meios, que seguiriam a lógica de uma economia baseada no consumo e

ainda se sujeitariam a influência persuasiva da publicidade.Os argumentos em prol da

comunicação se apegam a possibilidade da democracia de acesso aos bens culturais, já

que difundem uma grande quantidade de obras a baixo preço e ainda proporcionam

entretenimento.

Martín-Barbero (2001) coloca que a escola encarna e prolonga um regime de

saber que a comunicação do texto impresso instituiu, tanto que seu principal meio de

informação ainda é o livro didático. O avanço intelectual, no seu entendimento,

caminha paralelo ao progresso da leitura e exclui quem desvia desse padrão. E é assim

que a escola reproduz a relação do fiel com a sagrada escritura que a Igreja instaurou há

tempos atrás. Daí a antiga desconfiança da escola com a imagem, pois ela é polissêmica

e não pode ser controlada como o texto escrito.

Dizem Belloni e Subtil (2002):

Computadores, videogames, telefones celulares, TV a cabo e toda a

parafernália técnica que nos cerca e nos constitui vão transformando

rapidamente as estruturas simbólicas e os sistemas de significação.

Nesse meio ambiente novíssimo (ecologia cognitiva? ciberespaço?

cibercultura? sociedade da informação? da imagem? o saber?, a escola

aparece como um lugar estranho com sua fixação na oralidade e nos

meios impressos.(p.69-70).

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42

A origem dessa posição se deve ainda a uma grande reação contra a idéia de

uma passagem da cultura do livro para a cultura audiovisual. No entanto, uma coisa não

elimina a outra. Para Babin e Kouloumdjian (1989), deve haver uma mixagem entre as

duas culturas, uma interpenetração entre as duas linguagens afirmando que não estamos

em um período de exclusão, mas sim de mistura. Um nascimento significa também uma

promessa de uma outra coisa que a educação deveria compreender e desenvolver.

Assim, questionam: “como guardar o essencial da aquisição de Gutemberg e, ao

mesmo tempo, assumir os novos modos e valores da linguagem audiovisual? É este o

desafio que a sociedade precisa aceitar”. (p.75)

A escola, muitas vezes, coloca como culpadas pela crise da leitura as

tecnologias, que são postas como sedutoras e malignas, poupando-a de questionamentos

sobre a reorganização do mundo das linguagens e escritas. Para Martín-Barbero

(2001), o modo como circula o saber é uma das mais profundas mutações na sociedade.

Assim, reivindicar a presença da cultura audiovisual não é desmerecer a cultura letrada,

mas sim desmontar sua pretensão de ser a única a ser considerada como tal em nossa

sociedade. É necessário compreender as tecnologias como cultura e não como meros

artefatos tecnológicos.

A expansão das grandes mídias nos anos 50 transformou nossos modos de

aprender e comunicar. O que é importante hoje é saber que tipo de cultura está

nascendo entre crianças e jovens, após um longo período de expansão e adensamento da

televisão, do cinema, do computador e de uso de diferentes aparelhos eletrônicos.

Segundo Babin e Kouloumdjian (1989) seria possível definir linguagem audiovisual

“como um modo particular de comunicação, regido por regras originais, resultando da

utilização simultânea e combinada de variados documentos visuais e sonoros”.(p.40).

No mundo atual a nova geração de indivíduos já nasce imersa em um meio

impregnado por toda essa tecnologia. Ela não conhece um mundo onde não exista

internet, filmes, animações de última geração, videogames etc. Por isso, o homem da

geração audiovisual raciocina, age, fala e possui uma atitude diferenciada perante a

sociedade, com relação à hábitos e comportamentos, de maneira diferente da geração

que teve que se adaptar gradativamente conforme foram ocorrendo as mudanças na

sociedade.

De acordo com Martín-Barbero (2001), realizando uma comparação com o

flâneur de Walter Benjamin, que vagava pelas ruas de Paris experenciando os novos

Page 43: Livro-texto EJA

43

hábitos e costumes urbanos, estamos vivendo uma geração de flaneurs virtuais que não

consideram as mídias como apenas um meio de informação e conhecimento, mas como

uma grande rua movimentada onde podem transitar livremente. E, assim, anuncia:

Ao sensorium moderno que W. Benjamin viu emergir passeando pelas

avenidas das grandes cidades, os jovens articulam hoje as

sensibilidades pósmodernas das tribos efêmeras que se movem pela

cidade fendida ou das comunidades virtuais, cibernéticas. (p.50)

Portanto, ao lidar com esse meio é necessário reconfigurar nossos sentidos de

tempo, distância e espaço, já que a composição audiovisual não é linear, não é didática;

ela mistura som, palavra e imagem e sua interpretação é altamente subjetiva. Portanto, é

impossível compreender os esboços da nova cultura se não tentarmos compreender os

traços característicos dessa linguagem que está se instaurando.

Louro (2000) afirma que: “distintas relações do sujeito com a imagem fílmica

pode ocorrer: acolhida, ruptura, conformidade, resistência, critica ou imprevisíveis

combinações dessas e de outras respostas. Nesse processo de interação com a imagem

há sempre um investimento de emoções” (p.424). Para Babin e Kouloumdjian (1989),

diferentemente da linguagem escrita, que seria capaz de desenvolver maior capacidade

de análise, de rigor e de abstração, a linguagem audiovisual utiliza múltiplas atitudes

perceptivas, solicitando constantemente a presença da imaginação e dando à afetividade

um caráter primordial de mediação entre o produto audiovisual e o espectador. Para os

autores, o audiovisual efetua uma elaboração intelectual que possui diferentes fases no

mecanismo presente no ato de compreendê-lo. A primeira fase denominada estímulo-

sensação age sobre a personalidade do indivíduo e se refere ao choque inicial provocado

pela mistura de som, palavra e imagem. A segunda fase, da emoção fundamental, seria a

responsável pelos sentimentos iniciais, como uma pré-orientação da percepção ou do

conhecimento. A terceira fase se refere à elaboração do sentido, ou seja, o ato de

compreender, de fazer comparações tirando o foco apenas da emoção e do sentimento.

E, finalmente, a última fase, a da distância e reflexiva e crítica, seria aquela em o

indivíduo faria uma análise do vivido, estabelecendo conceitos e fazendo reflexões

críticas sobre o conteúdo visualizado. Podemos constatar, a partir destas informações

que este processo é extremamente subjetivo, portanto, ligação entre o conteúdo

intelectual e a afetividade é essencial à linguagem audiovisual eletrônica.

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44

Mas, como definir esse conceito de tonalidade afetiva? É um elemento

sutil e fundamental que pertence particularmente à todas as

palavras,ações, imagens e músicas da linguagem audiovisual. Não há

palavras precisas para definir essa alma das coisas, essa base comum

de uma obra que faz com que se diga ser ela unificada, mesmo que

alguns elementos sejam disparatados.(1989, p.110).

A escola hoje tem a tarefa de educar essa nova geração da tecnologia. A grande

questão que se faz presente diz respeito a como introduzir essas tecnologias no currículo

escolar e na formação humana em um contexto social dominado por imagens. Assim,

uma reflexão que nos permita ampliar nossa compreensão dos processos educativos

evidenciando sua relação com a comunicação, com a arte, e com a política é

indispensável.

A linguagem cinematográfica também possui suas próprias características. É

necessário considerar as particularidades do cinema quanto a sua natureza e recursos

expressivos. O cinema, ao apresentar visualmente as imagens já as interpreta e participa

ativamente de seu conteúdo, portanto, é uma estrutura que por si só já apresenta uma

forma lógica e política.

Almeida (2004) diz que:

Quando se usa a expressão “linguagem cinematográfica” está se

procurando aproximar o entendimento do cinema ao que já se presume

entender de algo já conhecido: a língua. [...] O filme, como um texto

falado/escrito, é visto/lido.[...] O significado de um texto/filme é o

todo, amálgama desse conjunto de pequenas partes, em que cada uma

não é suficiente para explicá-lo, porém todas são necessárias e cada

uma só tem significação plena em relação a todas as outras. (p.28-29)

Assim, o cinema levado para a escola pelo educador, com finalidades

pedagógicas, deve ser compreendido como texto, já que este comunica conteúdos

através de posicionamentos e intenções. Assim, como tal, precisa ser lido ou

decodificado por seu espectador. O suporte do texto no cinema é a imagem em

movimento que utiliza meios expressivos particulares que caracterizam a arte

cinematográfica. Nesse sentido, Almeida (2005) coloca que apesar das imagens no

cinema não serem símbolos exatamente da mesma forma que damos às palavras e à

língua, estas imagens também participam da mesma relação social e simbólica. Desta

forma, os espectadores são ligados às imagens que conferem reconhecimento e sentido

ao filme. “Daí ser possível falar de uma linguagem visual e de uma educação visual”.

Page 45: Livro-texto EJA

45

(ALMEIDA, 2005, p.65). Da mesma forma estranha quando reflete que os programas e

teorias de alfabetização não se apercebam da necessidade de uma “alfabetização” de

imagens e sons (ALMEIDA, 2004).

O problema que se coloca ao homem ‘audiovisual’ não é

essencialmente diverso ao problema que enfrentava o homem da

cultura escrita, ou da tradição oral: no plano das relações com seu meio

físico, social, ele precisa reagir, adaptar-se com a maior eficiência

possível para atingir, através de processos clássicos ou novos, a melhor

acomodação entre as exigências desse meio e as suas próprias

enquanto organismo social, psicológico, sociológico.(BABIN E

KOULOUMDJIAN, 1989, p.76).

Tanto a escola quanto a família mantêm com a mídia uma estreita relação e essa

se torna hoje uma espécie de disseminadora e (re) produtora de cultura. Assim, contribui

para que se construa, na sociedade atual, a identidade dos indivíduos que se tornam

consumidores dessas tecnologias. Por isso, tanto a família quanto a escola possuem

responsabilidade na formação dos indivíduos no intuito de diminuir os efeitos da

influência de modelos sociais e econômicos padronizados para que estes não sejam

consumidos sem se tornarem passíveis de questionamentos.

Para Belloni (2002), os objetivos da educação para as mídias dizem respeito à

formação do usuário ativo, crítico e criativo diante de todas as tecnologias de

informação que, por sua vez, possuem dupla função: a de ferramenta pedagógica e

objeto de estudo. Para a autora, a educação para as mídias é educação para a cidadania,

um instrumento indispensável à democratização de oportunidades educacionais e do

acesso ao saber e, conseqüentemente, da redução das desigualdades sociais.

Pode-se dizer que um dos problemas centrais da escola é um certo arcaísmo.

Mesmo com as novas linguagens colocadas em prática, hoje em dia a escola ainda

insiste nos códigos disciplinares e nas matrizes de pensamento dominantes. A escola

quer preparar o aluno para um mundo que não existe mais. A clássica sala de aula com o

professor a frente do quadronegro é anacrônica. Hoje a situação é diferente. Além dos

livros e papéis, temos recursos inimagináveis em outras épocas. Assim, a incorporação

das tecnologias audiovisuais no processo educacional pode prenunciar o

reconhecimento de novas formas de conhecimento e organização da escola. Porém, não

se trata de apenas substituir um por outro modo de lidar com o conhecimento, já que

mesmo com a utilização de tecnologias podem-se reproduzir práticas educacionais

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46

tradicionais. O que se torna indispensável em uma pedagogia que considere esses novos

modos de compreender é o reconhecimento da necessidade de se abarcar de forma

eficiente todos os tipos de linguagens, sejam elas escrita, oral ou audiovisual.

Sendo, então, o cinema um sistema de linguagem, devemos nos questionar sobre

as possibilidades de abordagem para que seja construído um diálogo produtivo entre o

filme e o espectador. O filme é composto por uma série de elementos próprios que

abrem ao emissor um enorme potencial de possibilidades comunicativas que não estão

sujeitas a apenas um tipo de linguagem. Assim, ele chega até ao espectador que é

atingido por essas várias possibilidades comunicativas passadas pelas mensagens

filmadas.

Referências bibliográficas

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Page 47: Livro-texto EJA

47

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Data de publicação: 26 de Janeiro de 2006. Disponível em:<<

http://www.mnemocine.com.br/cinema/anpuh2005/anpuh2005i.htm>> Acesso em: 14

de outubro de 2007.

CAPÍTULO 4

Page 48: Livro-texto EJA

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MÍDIA E EDUCAÇÃO: O USO DAS NOVAS TECNOLOGIAS NO ESPAÇO

ESCOLAR9

Gilza Maria Leite Dorigoni10

João Carlos da Silva11

Introdução

As reflexões em torno do assunto mídia e educação vem sendo aprofundadas há

várias décadas dado a constatação de sua influência na formação do sujeito

contemporâneo e da necessidade em explorar o assunto diante do rápido

desenvolvimento das novas tecnologias de informação e comunicação.

Ao falarmos propriamente sobre mídia, faz-se necessário reportarse à sua

complexidade, ao situá-la como produto que se desenvolveu a partir dos anos de 1940,

no contexto da ordem industrial. Nesta época, a concentração econômica e

administrativa aliada ao desenvolvimento tecnológico estabelecia semelhança estrutural

ao cinema, rádio e revistas.

Tradicionalmente a sociedade atribuiu a instituições escolares à

responsabilidade na formação da personalidade do indivíduo tendo em vista a

transmissão cultural e do conhecimento acumulado historicamente. A educação para as

mídias como perspectivas de um novo campo de saber e de intervenção vem se

desenvolvendo desde os anos de 1970 no mundo inteiro com o objetivo de formar

usuários ativos, criativos, críticos de todas as tecnologias de informação e

comunicação.

No que se refere à área educacional, a mídia esteve sempre presente na

educação formal, porém, não raras vezes, sofreu certa resistência, em relação a sua

aplicação na escola. Porém, o impacto social causado pela penetração da tecnologia de

informação e comunicação (TIC) nos últimos anos, ocasionou intensas transformações

nas principais instituições sociais. A família foi invadida pela programação televisiva

em seu cotidiano, a Igreja se rendeu ao caráter de espetáculo da TV, a escola que

9 DORIGONI, Gilza Mª Leite & SILVA, João Carlos da Silva. Mídia e Educação: o uso das novas

tecnologias no espaço escolar. Cascavel – PR. Disponível em: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/1170-2.pdf. 10

Licenciada em pedagogia pela UNIOESTE-PR. Pós-graduada em administração e planejamento de

sistemas educacionais e de instituições educacionais/UNIPAR. Professora do programa do

desenvolvimento educ. PDE/SEED–Pr. E-mail: [email protected] 11

Doutor em História, filosofia da educação/UNICAMP. Professor UNIOESTE, Campus Cascavel. Doutorando em Educação pela Faculdade de Educação UNICAMP. Membro do Grupo de Pesquisa HISTEDBR – História, Sociedade e Educação – GT – Cascavel – PR E-mail: [email protected]

Page 49: Livro-texto EJA

49

pressionada pelo mercado utiliza a informática com um fim em si, e a essas influências

se associa à Internet, com intensa possibilidade de uso.

Mediante esse quadro caberia uma indagação: a escola pública deveria

incorporar as tecnologias de informação e comunicação em suas práticas pedagógicas?

Porém, torna-se relevante acrescentar que a abordagem aqui discorrida, não trata da

negação dos suportes midiáticos, ao contrário, enfoca entre outros contrapontos suas

influências e necessidades de inserção no processo pedagógico. Desta forma, a partir do

objeto em estudo, pretende-se suscitar discussões sobre o processo

ensino/aprendizagem, também no sentido de esclarecer se a falta de direcionamento

para a utilização dos meios de comunicação pode influenciar negativamente na

aprendizagem da criança e do adolescente. Assim, o que prende é compreender a

influência dos meios de comunicação sobre o trabalho escolar a partir das relações entre

mídia e educação.

Elementos históricos sobre a mídia

Ao longo do século XX, especialmente entre os anos de 1940 e 1970, o telefone,

o cinema, o rádio, as revistas e a televisão constituíam-se em um sistema, que o

desenvolver-se, transformou-se em aparato de última geração ao integrar outros

avanços tecnológicos mais recentes como telefones celulares, TV interativa e a Internet.

Tais aparatos foram sendo produzidos e vinculados com a totalidade, estabelecendo

uma intima relação com os objetivos da industrialização.

O avanço tecnológico se colocou presentes em todos os setores da vida social, e

na educação não poderia ser diferente, pois o impacto desse avanço se efetiva como

processo social atingindo todas as instituições, invadindo a vida do homem no interior

de sua casa, na rua onde mora, nas salas de aulas com os alunos, etc. Desta forma, os

aparelhos tecnológicos dirigem suas atividades e condicionam seu pensar, seu agir, seu

sentir, seu raciocínio e sua relação com as pessoas.

Diante dessa realidade, delineiam os desafios da escola sobre esse tema na

tentativa de responder como ela poderá contribuir para que crianças e jovens se tornem

usuários criativos e críticos dessas ferramentas, evitando que se tornem meros

consumidores compulsivos de representações novas de velhos clichês (BELLONI,

2005, p.8). Contanto que essa atuação ocorresse no sentido de amenizar ou até mesmo

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50

eliminar as desigualdades sociais que o acesso desigual a essas máquinas estão

gerando, tal fato poderia se tornar um dos principais objetivos da educação.

No tocante ao ensino, uma das formas a se contemplar, dentre muitas sugeridas

para a educação para as mídias, seria estudar, aprender e ensinar a história, a criação, a

utilização e a avaliação das mídias como artes plásticas e técnicas, analisando como

estão situados na sociedade, seu impacto social, suas implicações, a participação e a

modificação do modo de percepção que elas condicionam o papel do trabalho criador e

o acesso às mídias.

Para aplicação dessa forma de ensino/aprendizagem abordando a mídia, é

necessário evitar o deslumbramento, assumir a criticidade, abandonar práticas

meramente instrumentais, excluir a visão apocalíptica que favorece o conformismo e

não a reflexão.

Desde a década de 1950, teóricos chamam a atenção para a caracterização da

sociedade pela tecnificação crescente nos mais variados setores sociais. Já havia

preocupações no sentido de que os meios de comunicação constituíam uma escola

paralela onde as crianças e os adultos estariam encantados e atraídos em conhecer

conteúdos diferentes da escola convencional. Desta forma foram sendo analisados os

efeitos do impacto da tecnologia na sociedade e na educação. A partir desses impactos,

alguns autores como Friedmann e Pocher (1977) apontam que as tecnologias são mais

do que meras ferramentas a serviço do ser humano, elas modificam o próprio ser,

interferindo no modo de perceber o mundo, de se expressar sobre ele e de transformá-

lo, podendo também levá-lo em direções não exploradas encaminhando a humanidade

para rumos perigosos.

Adorno e Hokheimer teorizam sobre os meios de comunicação ao considerarem

que esses passam a ser apenas negócios com fins comerciais programados para a

exploração de bens considerados culturais, denominando-os “Indústria Cultural”.

O termo “indústria cultural” foi explicado como mais propício que o termo “cultura de

massa”, disseminado pelos donos dos veículos de comunicação, ao justificarem que a

cultura surge de forma espontânea, brota das massas, do povo.

Segundo Adorno (1999, p.8), a indústria cultural ao aspirar à integração vertical

de seus consumidores, não apenas adapta seus produtos ao consumo das massas, mas,

em larga medida, determina o próprio consumo. Sendo assim, o interesse da indústria

cultural nos homens é mantê-los como consumidores ou empregados reduzindo sua

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humanidade, confirmando desta forma seu papel de portadora da ideologia dominante.

Desta maneira, sendo aliada da ideologia capitalista, falsifica as relações entre os

homens e do homem com a natureza, contribuindo para o que Adorno trata como

antiiluminismo, contrário ao Iluminismo que objetivava a liberdade, o abandono do

medo e a exclusão do mundo da magia e dos mitos.

Com o iluminismo esperava-se a instauração da soberania do homem sobre a

técnica e a ciência, mas o progresso da dominação técnica tornou-se o novo engano,

vitimando o homem mesmo depois de ter sido liberto do medo mágico que o

acompanhava.

Sabemos que o poder da técnica pelo homem não o levou a libertação do medo,

somente transferiu sua ansiedade e apreensão do mágico, do mítico, para o medo do

novo, do avanço desenfreado da ciência e dos efeitos em sua vida, perpetuando sua

insatisfação no sentido humanitário.

Bacon (1979) difundia idéias que divergiam das diretrizes do Iluminismo, ele

desprezava os adeptos da tradição, da credulidade, a omissão da dúvida, o receio de

contradizer e a tendência de se satisfazer com conhecimentos parciais. Para Bacon,

poder e conhecimento são sinônimos. O que importa não é aquela satisfação que os

homens chamam de verdade, mas sim, o proceder eficaz, no desempenho e no trabalho,

nas descobertas dos fatos particulares anteriormente desconhecidos que possam equipar

melhor a vida.

No mundo do iluminismo, a mitologia foi sucumbida, mas a dominação se

apresenta sob forma de alienação do homem com respeito aos objetos dominados e com

o enfeitiçamento dos homens em seus relacionamentos sociais e do homem consigo

mesmo. Antes, os fetiches estavam sob a lei da igualdade. Agora, a própria igualdade se

converte em fetiche (ADORNO, 1999, p.33).

Assim, o homem é condicionado ao sentido econômico que dá as mercadorias

valores que interferem e decidem a sua existência, estabelecendo o caráter de fetiche

sobre a vida em sociedade. Desta forma são inculcados no indivíduo normas e

comportamentos considerados únicos, decentes e racionais pela cultura de massa ou

indústria cultural.

Portanto, é o princípio do si mesmo que evidencia o trabalho social do indivíduo

na sociedade burguesa que restitui a uns o capital acrescido, a outros a força para o

mais trabalho. Assim, o indivíduo vai se moldando cada vez mais ao processo de

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autoconservação decorrente da divisão burguesa do trabalho, concomitante com o

envolvimento ao aparato técnico. Sobre essa questão, vale reportar às reflexões de

Paolo Nosella (2006), embasado nos métodos de Marx que salienta que o trabalho

burguês é historicamente determinado sendo interação dos homens entre si e com a

natureza, assim, o trabalho que deveria ser a manifestação de si tornou-se perdição de

si. Assim, faz-se necessário que se inverta esse processo recuperando o trabalho com o

sentido de libertação plena do homem.

O processo de dominação imbicado na historia em seu aspecto cíclico, perpassa

por um retrocesso antropológico em suas etapas primitivas, condicionando os instintos

por uma opressão maior. A força que perfaz a dominação sobre os sentidos proporciona

a uniformização da função intelectual, a resignação do pensar à produção da

humanidade, desencadeia um processo de empobrecimento do pensar e da experiência.

Desta forma, quanto mais o aparato social econômico e científico for refinado e

complexo a serviço do qual o corpo fora destinado pelo sistema de produção, ocorre o

empobrecimento das vivências que esse corpo é capaz.

Portanto, esse regredir das massas hoje pode ser traduzido sob o olhar do novo,

é a ciência elaborada em alta tecnologia ou tecnologia de ponta, que incapacita o

homem de ouvir o que nunca foi ouvido, de palpar com as próprias mãos o que nunca

foi tocado; uma nova forma de opressão, que supera a opressão mítica já vencida. No

transcorrer do caminho que vai da mitologia à logística, o pensar perdeu o elemento da

reflexão sobre si e hoje a maquinaria estropia os homens mesmo quando os alimenta

(Adorno & Horkheimer, 1999, p.56).

A rapidez da disseminação da Internet pelo mundo, em relação a outras mídias.

Enquanto o rádio levou 38 anos para atingir um público de 50 milhões nos Estados

Unidos, o computador levou 16 anos, a televisão, 13 anos e a Internet levou apenas

quatro anos para alcançar a marca de 50 milhões de Internautas.

Mediante o que foi exposto, reflexões a cerca do assunto devem ser

implementadas, contudo, o potencial educacional que as TIC oferecem não pode ser

negado, mas precisa ser integrado efetivamente na escola, principalmente na rede

pública de escolarização, já que pode servir como mais uma possibilidade para a

construção da cidadania plena. Para tanto, faz-se necessário estabelecer como propósito

a utilização da produção multimídia de forma a desenvolver o potencial crítico sem

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53

negar o papel de consumidores que somos, mas sob forma consciente, salientar a nossa

função de emissores e receptores do saber e da informação.

Mídia e escola

Para efetivar a aplicação das tecnologias de informação e comunicação na

escola, após a constatação de sua importância e necessidade, é preciso criar

conhecimentos e mecanismos que possibilitem sua integração à educação evitando o

deslumbramento ou o uso indiscriminado da tecnologia por si e em si. Portanto, é

imprescindível enfatizar o cunho pedagógico em detrimento das virtualidades técnicas,

fugindo do discurso ideológico procedente da indústria cultural.

Entretanto, a perspectiva que se abre no campo educacional, indo do livro e do

quadro de giz à sala de aula informatizada ou on-line, leva o professor a uma

perplexidade, despertando insegurança frente aos desafios que representa a

incorporação dos TIC ao cotidiano escolar. Talvez sejamos ainda os mesmos

educadores, mas certamente, nossos alunos já não são os mesmos, “estão em outra”

(BABIN, 1989).

Neste cenário de constante e acelerado processo tecnológico que desde os anos

80 tomou novas proporções com equipamentos projetados para armazenar, processar e

transmitir informações de forma mais rápida e cada vez mais acessível em termo de

custos, vislumbrando uma maior possibilidade de utilização para todos, presencia-se

questões sobre a informatização e o acesso à Internet permeando ainda as discussões

dos que acreditam em uma sociedade mais justa e igualitária, necessitando abordar

aspectos sobre as condições sociais, políticas e econômicas da vida e do trabalho,

entrelaçados com as condições culturais.

Contudo, escolas públicas vêm sendo equipadas com computadores conectados

à Internet através de Programas do governo federal e estadual. Porém, somente esse

fato garantiria a melhoria de qualidade no processo de ensino/aprendizagem? Pedroso

(2002) afirma que enquanto não forem criadas possibilidades através de substancial

mudança na estrutura do ensino continuaremos na situação de dependência e servidão.

No entanto, o computador e sua capacidade técnica podem sob forma contraditória, ser

usado no sentido da democratização, humanização, transformando as desigualdades

existentes na sociedade.

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54

Mas a utilização da informática é vista como reacionária e conservadora tendo

em vista o desemprego tecnológico e o descomprometimento dos educadores com a

democracia. Em razão da péssima remuneração dos professores, duvidosas formações,

da baixa qualidade de ensino no ensino fundamental e médio e a semialfabetizaçao dos

alunos, incluindo em países considerados 1º do mundo, levam a crer que esse fenômeno

de descomprometimento coma educação seja um fenômeno mundial.

Enfatizando a importância dos meios de comunicação e das tecnologias de

informação que se concretiza fortemente em todos os âmbitos da vida social, trazendo

conseqüências para os processos culturais, comunicacionais e educacionais, vale

lembrar que uma das instituições que demonstra grande dificuldade em absorver as

transformações nos modos de aprender em decorrência do avanço tecnológico atual é a

escola, que devido à rapidez desses avanços e ter intrínseco em seu bojo dependências

com instituições maiores, não assimilou outras formas tecnológicas comunicacionais e

já se depara com a informatização, suas linguagens multimídias e suas potencialidades

interativas.

A sociedade contemporânea sob a forma de produção industrial tem sua base na

racionalidade instrumental regida por regras técnicas operacionais em que tudo é

planejado, medido, racionalizado. Assim organizada essa sociedade tomou proporção

tal que atingiu todos os setores da vida do indivíduo, se adentrando no espaço e no

tempo livre do trabalhador, atingindo-o até mesmo em sua consciência sujeita às regras

provenientes das exigências técnicas da produção industrial.

Com suas regras clássicas e científicas, o Capitalismo estabelece em seu

discurso tecnocrático uma ideologia que insistentemente tenta legitimar uma falsa

consciência do mundo. Essa ideologia dominante influencia comportamentos humanos,

acabando por legitimá-la.

Assim, já no século XIX, pensadores como Durkheim e Marx convergiam suas

constatações de que o homem e sua consciência são produtos da sociedade. Por ser o

homem um ser social é fruto de sua sociedade, é o resultado desta sociedade. Desta

forma, o homem é considerado criador e criatura, pois ao longo de sua evolução, foi

criando e adaptando instrumentos para facilitar suas relações com os homens e com a

natureza, desenvolvendo seus sentidos, sua ação e aquilo que é específico do homem, a

capacidade de criar.

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55

Impregnados pela ideologia do poder, tanto a família quanto a escola e outras

instituições sociais, influenciam para a conformação e adaptação às normas

dominantes, ao mesmo tempo em que transmitem aos homens os conhecimentos

técnicos acumulados pelas gerações antecessoras, desenvolvendo habilidades para

adaptação ao sistema social econômico. Dessa maneira, essas características vão

modelando o processo de socialização, a formação de novas gerações e a transmissão

cultural. Neste contexto, a formação da personalidade do indivíduo passa a ser tarefa de

instituições e de especialistas como: psicólogos, orientadores educacionais, médicos,

assistentes sociais. E a escola divide com a mídia a responsabilidade na socialização

dos jovens e crianças.

Portanto, o controle social é exercido sob múltiplas formas e através de

instituições entre as quais a escola e a mídia. A escola perpetua assim sua função como

Aparelho Ideológico do Estado, dividindo agora esse intento com a mídia que assume a

liderança sobre essa função. Nesse cenário atual, escola é vista apenas como mais uma

entre as muitas agências especializadas na produção e disseminação da cultura. No

processo geral de transmissão da cultura e no processo de socialização das novas

gerações, a escola vem perdendo terreno e prestígio em concorrência com as diferentes

mídias.

Enquanto o mundo se apresenta cada vez mais aberto e com máquinas que

lidam com o saber e com o imaginário, a escola ainda se estrutura em tempos e espaços

pré-determinados, fechada ignorando as inovações. Em decorrência da velocidade dos

avanços tecnológicos e sua interferência no trabalho e na vida de todos, a escola se

encontra em crise. A escola que tem como ideal preparar as pessoas para vida, para

cidadania e para o trabalho, deve-se então questionar, sobre qual contexto social se

reportar já que este está em permanente modificação.

Desta forma a escola e todo sistema educacional tende a funcionar com outros

tempos e em múltiplos espaços diferenciados, com a presença de todos os novos

elementos tecnológicos da informação e comunicação. Assim, sobre a resistência e a

não completude em relação às tecnologias na educação, Pretto e Pinto (2006),

consideram como sendo uma das características peculiares do momento

contemporâneo. Segundo os autores, é a busca pela a estabilidade e do equilíbrio, tendo

a instabilidade como elemento fundante.

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56

Diferentemente de tempos não muito distantes, hoje os educandos dispõem de

muitos meios de informação. O aluno hoje tem acesso muito mais rápido e fácil às

informações do que nós e nossos pais. Para estabelecer um parâmetro de analise, basta

lembrar que a televisão brasileira começou no ano de 1950, mais precisamente em 18

de setembro. Foi nesse dia histórico que a TV Tupi fez sua primeira transmissão. Os

computadores são mais recentes. Foi em julho de 1980 que a IBM lançou o primeiro

PC (abreviação em inglês de computador pessoal). A Internet já existia desde a década

de 1970 para fins militares, migrando a seguir para grandes universidades. No entanto,

foi entre 1989 e 1991 que o inglês Tim Berners-Lee inventou a World Wide Web

(WWW) e popularizou a rede. (BUSSACARINI, 2005).

Torna-se evidente e compreensivo através desse paralelo o sentido de resistência

gerado pela instabilidade que acelerado processo tecnológico ocasiona no meio

educacional.

Desta maneira, os meios de comunicação de massa, e em especial a

televisão, que penetra nos mais recônditos cantos da geografia,

oferecem de modo atrativo e ao alcance da maioria dos cidadãos uma

abundante bagagem de informações nos mais variados âmbitos da

realidade. Os fragmentos aparentemente sem conexão e assépticos de

informação variada, que a criança recebe por meio dos poderosos e

atrativos meios de comunicação, vão criando, de modo sutil e

imperceptível para ela, incipientes, mas arraigadas concepções

ideológicas, que utiliza para explicar e interpretar a realidade

cotidiana e para tomar decisões quanto a seu modo de intervir e reagir

(SACRISTÁN; GÓMEZ, 1996, p.25).

Nesse sentido, é que se torna imprescindível a utilização destes meios na escola,

para oportunizar uma reflexão das ideologias que servem a cultura dominante, sendo

que as relações sociais, bem como os meios de comunicação que transmitem

informações, estão a serviço desta cultura . Segundo Kalinke:

Os avanços tecnológicos estão sendo utilizados praticamente por

todos os ramos do conhecimento. As descobertas são extremamente

rápidas e estão a nossa disposição com uma velocidade nunca antes

imaginada. A Internet, os canais de televisão a cabo e aberta, os

recursos de multimídia estão presentes e disponíveis na sociedade.

Estamos sempre a um passo de qualquer novidade. Em contrapartida,

a realidade mundial faz com que nossos alunos estejam cada vez mais

informados, atualizados, e participantes deste mundo globalizado

(1999, p.15).

Page 57: Livro-texto EJA

57

Entretanto, no limiar deste século, as grandes maiorias dos profissionais da

educação ainda não se vêem preparados para o enfrentamento de metodologias que

utilizem esses recursos tecnológicos. Desta forma, muitas explicações têm sido dadas

para justificar esta resistência, no entanto, tornam-se premente que o professor propicie

aos alunos elementos de emancipação com a utilização destes aparatos como

ferramentas pedagógicas.

A dificuldade escolar está hoje entre os problemas mais estudados e discutidos

do sistema educacional. Porém, às vezes, a busca pelo culpado do fracasso se torna

mais relevante do que a causa do mesmo. Sob a ótica da Psicopedagogia o ser humano

é cognitivo, afetivo e social e sua autonomia é estabelecida à medida que se

compromete com o seu social em redes relacionais. Segundo Bossa (1994), a

Psicopedagogia, inicialmente teve como pressuposto, que as pessoas que não

aprendiam tinham um distúrbio qualquer.

Hoje, o que se propõe é investigar e entender a aprendizagem com base no

diálogo entre várias disciplinas. Os profissionais que atendiam essas pessoas eram os

médicos, em primeira instância, e em segunda instância, psicólogos e pedagogos que

pudessem diagnosticar os déficits. Os fatores orgânicos eram responsabilizados pelas

dificuldades de aprendizagem, na chamada época “patologizante”. A criança ficava

rotulada, e a escola e o sistema a que ela pertencia se eximiam de suas

responsabilidades, jogando o foco do problema na criança. Concebendo esse rótulo à

criança, passa-se a não perceber em quais circunstâncias ela apresenta tais dificuldades.

A sociedade do êxito educa e domestica. Seus valores e mitos relativos à

aprendizagem muitas vezes levam muitos ao fracasso. Segundo Fernandes (2001), em

nosso sistema educacional, o conhecimento é considerado conteúdo, uma informação a

ser transmitida. As atividades visam à assimilação da realidade, e não possibilitam o

processo de autoria do pensamento.

Alicia Fernándes define como “autoria”, o processo e o ato de produção de

sentidos e de reconhecimento de si mesmo como protagonista ou participante de tal

produção. O caráter informativo da educação também se apresenta na utilização do

livro didático, quando o aluno é levado a memorizar conteúdos e não a pensá-los.

Assim afirma Fernándes: “É preciso distinguir aquilo que é próprio da criança, em

termos de dificuldades, daquilo que ela reflete em termos do sistema em que se insere”

(FERNANDES, 2001, p.91).

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58

Assim, considerando as variedades de fatores que interferem no processo

ensino-aprendizagem, e que esta ocorre num vínculo entre subjetividades, propõe-se

compreender tais fatores na tentativa de amenizar os problemas enfatizando a utilização

dos meios tecnológicos como mais uma possibilidade de suporte metodológico.

O uso pedagógico da Internet

A origem da Internet se deu a partir de 1969 com a Guerra Fria quando os

Estados Unidos solicitou a Advanced Research Projects Agency (ARPA) uma rede de

computadores que pudessem ter seu funcionamento mesmo com a quebra de conexão.

Surgiu então a rede das redes.

Desde 1980, os computadores pessoais e o desenvolvimento de técnicas

computacionais como os jogos simulados fazem surgir o computador como extensão

das capacidades cognitivas humanas que ativam o pensar, o criar e o memorizar.

Segundo Pretto e Costa Pinto, essas máquinas não estão mais apenas a serviço do

homem, mas interagindo com ele, formando um conjunto pleno de significado. A partir

de 1995, a Internet se expandiu com um grandioso poder de expressão a nível

individual e coletivo ampliando em larga escala o número de usuários.

A Internet é um meio que poderá conduzir-nos a uma crescente

homogeneização da cultura de forma geral e é, ainda, um canal de construção do

conhecimento a partir da transformação das informações pelos alunos e professores. As

redes eletrônicas estão estabelecendo novas formas de comunicação e de interação onde

a troca de idéias grupais, essencialmente interativas, não leva em consideração as

distâncias físicas e temporais. A vantagem é que as redes trabalham com grande

volume de armazenamento de dados e transportam grandes quantidades de informação

em qualquer tempo e espaço e em diferentes formatos.

Os professores estão sendo convocados para entrar neste novo processo de

ensino e aprendizagem, nesta nova cultura educacional, onde os meios eletrônicos de

comunicação são a base para o compartilhamento de idéias e ideais em projetos

colaborativos. A utilização pedagógica da Internet é um desafio que os professores e as

escolas estarão enfrentando neste século, que pode apresentar uma concepção

socializadora da informação.

A Internet tem cada vez mais atingido o sistema educacional e as escolas. As

redes são utilizadas no processo pedagógico para romper as paredes da escola, bem

Page 59: Livro-texto EJA

59

como para que aluno e professor possam conhecer o mundo, novas realidades, culturas

diferentes, desenvolvendo a aprendizagem através do intercâmbio e aprendizado

colaborativo.

Com o rápido crescimento do processo de globalização, vários problemas estão

afetando muitos países ao mesmo tempo. Questões como inflação, meio-ambiente, têm

preocupado diferentes autoridades em todo o mundo. E também, com o assustador

crescimento do conhecimento, torna-se impossível para o aluno e o professor

dominarem tudo. Assim, o trabalho em equipe e a Internet oferecem uma das mais

excitantes e efetivas formas para capacitar os estudantes ao processo colaborativo e

cooperativo e, ainda, desenvolver a habilidade de comunicação.

Aprendizagem colaborativa é muito mais significativa quando os estudantes

podem trabalhar com alunos de outras culturas, podendo entender e perceber novas e

diferentes visões de mundo, ampliando, assim, seu conhecimento. Os estudantes

trabalhando como colaboradores em projetos dentro ou fora das escolas podem medir

coletar, avaliar, escrever, ler, publicar, simular, comparar, debater, examinar, investigar,

organizar, dividir ou relatar os dados de forma cooperativa com outros estudantes.

Porém, é importante lembrar que os professores devem trabalhar com metas comuns e

que a colaboração em sala de aula é o primeiro passo em direção à cooperação global.

Considerações finais

Diante das reflexões que permeiam o assunto caracterizado, evidencia-se a

urgência em se efetivar a implementação das novas tecnologias no bojo da escola

pública incorporando-as aos recursos metodológicos que propiciam a aprendizagem.

Com esse fim, busca-se assegurar que a escola se remeta a sua necessária função

no mundo do capitalismo que é garantir a apreensão da totalidade de pensamento

através do domínio teórico, utilizando-se dos aparatos tecnológicos como ferramentas

de emancipação, proposta pelo surgimento da mídia no século XVIII, mas que no

século XX tornou-se um meio de dominação e controle social.

Considerando a importância do fenômeno comunicacional na sociedade mundial

e o acelerado processo tecnológico que abrange os mais variados setores da

convivência humana, o que se propõe é uma escola contextualizada, que se situe na

dinâmica dos novos processos de ensino e aprendizagem colaborativa, com o uso da

Page 60: Livro-texto EJA

60

Internet como mecanismo de desenvolvimento, de criticidade, de colaboração mútua

que transforma as informações em conhecimentos sistematizados.

Para que esse intento se concretize, os educadores precisam coordenar este

processo, incorporando as mídias aos encaminhamentos pedagógicos deixando de

defender-se da inovação.

Com o intuito de colocar o homem no centro da historia, analisando o impacto

que as novas tecnologias vêm causando na sociedade, e a evidência que a mídia é

imprescindível aos rumos educacionais oferecendo valiosas perspectivas para atingir o

conhecimento satisfatório, insere esse estudo como pretensa contribuição ao

desenvolvimento da educação.

Para refletir:

1. O que entendemos por mídia e educação e indústria cultural?

2. Qual é a importância que nós professores atribuímos ao uso do computador na

escola?

3. Qual a relação que podemos estabelecer entre indústria cultural e escola?

4. Que influencia que a mídia exerce no meio educacional?

5. Qual a sua opinião sobre o acesso indiscriminado a Internet por crianças e

adolescentes sem encaminhamento ou acompanhamento de pais e (ou)

professores?

6. Qual o seu ponto de vista sobre a inserção da Internet nos encaminhamentos

pedagógicos?

7. Quais fatores você considera importante para a incorporação da mídia e suas

tecnologias na realização do trabalho didático?

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Page 62: Livro-texto EJA

62

CAPÍTULO 5

PRINCIPAIS RECURSOS DIDÁTICOS ANALISADOS NO ENSINO DE

GEOGRAFIA DO BRASIL12

Inêz de Deus Neiva Brandão13

; Márcia Cristina de Oliveira Mello

Universidade Estadual Paulista – Campus Experimental de Ourinhos

FAPESP

Eixo temático: Situación y perspectivas de la enseñanza-aprendizaje de la Geografía en

América Latina

Os recursos didáticos são elementos auxiliares para os professores no processo de

ensino e aprendizagem. Para que o professor utilize tais recursos, é necessário

considerar uma estrutura teórico-metodológica, sendo esta planejada e executada de

acordo com a realidade escolar e do aluno. Neste contexto, os professores podem ser

surpreendidos por questões como: em que momento da aula aplicar-se-á o recurso

didático? Por que utilizar tal recurso em detrimento de outro? Como utilizar

determinado recurso didático? Como planejar? Qual(is) recurso (s) pode (m) ser

utilizado (s) como auxílio no conteúdo? Enfim, questões que devem ser respondidas no

planejamento das aulas para uma execução contingente com os objetivos propostos. Por

esta razão, o professor de Geografia reconhecendo seu papel de mediador no processo

de ensino e aprendizagem, deve procurar meios que promovam tal processo de modo

eficiente, sendo os recursos didáticos um caminho a ser considerado. O objetivo deste

trabalho consistiu em investigar as atuais tendências em relação às metodologias de

ensino de Geografia difundidas pelos livros paradidádigos brasileiros, tendo como viés

principal os recursos didáticos, considerando as técnicas tradicionais e as introduzidas

pelas novas tecnologias. Partindo desta perspectiva, os resultados forneceram um

panorama geral da estrutura metodológica difundida por autores brasileiros e apontaram

novas alternativas e possibilidades de materiais e suas aplicações, de modo a facilitar a

aprendizagem e o diálogo entre professores e alunos. A metodologia fundamentou-se

em pesquisa bibliográfica, sendo consultados livros remissivos e publicações periódicas

de acordo com o tema e a lógica dos conteúdos propostos pelo currículo do ensino de

Geografia no Brasil. Os resultados preliminares apontam que à luz da bibliografia

especializada tais estudos concentram-se mais em explorar as técnicas de aplicação de

tal ou qual recurso, ou sua importância na relação ensino-aprendizado, nem sempre

apresentando um panorama da utilização real dos mesmos in loco, bem como eles se

concentram no tema cartográfico, havendo uma lacuna nos demais temas,

12

BRANDÃO, Inêz de Deus Neiva; MELLO, Márcia Cristina de Oliveira. Principais recursos didáticos

analisados no ensino de geografia do Brasil. 14º EGAL- Encuentro de Geógrafos da America Latina.

Peru, 2013. Disponível em: http://www.egal2013.pe/wp-content/uploads/2013/07/Tra_In%C3%AAz-de-

Deus-Neiva-Brand%C3%A3o-M%C3%A1rcia-Cristina-de-Oliveira-Mello.pdf 13 Bolsista de Iniciação Científica – FAPESP – Processo número??

Page 63: Livro-texto EJA

63

principalmente na Geografia Humana. Esta realidade será explicada através do breve

histórico do ensino de Geografia no Brasil, e o atual foco na cartografia escolar.

Palavras-chave: Recursos didáticos; livros paradidáticos; Geografia; Ensino

aprendizagem; práticas de ensino de Geografia.

1. BREVE HISTÓRICO DO ENSINO DE GEOGRAFIA NO BRASIL E A

ATUAL ÊNFASE EM ESTUDOS CARTOGRÁFICOS

O ensino de Geografia no Brasil recebeu influências de duas correntes

europeias. A alemã estabeleceu a Geografia descritiva e sistemática, tendo seus

principais precursores Alexander von Humboldt, focando seus estudos através de

comparações e relações entre diversas escalas da paisagem, com o método empírico e

indutivo; Karl Ritter define a Geografia como o estudo de sistemas naturais, o qual

analisa arranjos individuais, sendo estes últimos os lugares específicos, sua análise

compara tais lugares em escala regional; e Ratzel com a antropogeografia, que

considera as influencias14

do meio natural sobre o homem, formando sociedades

distintas culturalmente e economicamente a partir dos recursos disponíveis para suprir

as necessidades humanas15

.

Já a corrente francesa, baseada em estudos de Vital de La Blache, que a

princípio criticou os estudos de Ratzel e estabeleceu uma relação entre homem e

paisagem, diferente do autor alemão. La Blache define o objeto da Geografia como a

relação entre homem e meio, sendo que o primeiro além de ser influenciado pelo

segundo, também transforma a paisagem de acordo com suas necessidades, através do

método empíricoindutivo, este autor explica os fenômenos somente através da

observação direta destes, classificando-os de forma tipológicas16

. Além de La Blache,

14

Segundo Moraes (1983), os estudos de Ratzel não foram essencialmente deterministas, e sim, os seus

discípulos radicalizaram seus pensamentos e criaram a escola determinista. Também deve-se destacar a

escola ambientalista baseada na Antropogeografia de Ratzel. 15

Nesta perspectiva, Ratzel conceitua “espaço vital” como a expansão do território, tendo por finalidade

satisfazer tais necessidades humanas, assim, para manter o domínio e sua expansão territorial, o conceito

de Geopolítica está intimamente relacionado sobre sua proposta de ação do Estado sobre o espaço.

(MORAES, 1983). 16

A partir de seus estudos Vidal de La Blache estabeleceu a doutrina que fundou a escola francesa: o

Possibilismo. Nele a região torna-se papel essencial de análise geográfica, diferentemente de Ratzel, que

estabelece relações causais, La Blache concebe os fenômenos naturais e humanos de forma mútua, uma

vez que eles estão interpostos. Desta forma, La Blache estabelece um método de estudo científico

dividido em três partes, que é seguido até nos dias atuais: análise física, formas de ocupação humana e

por último, a integração entre ambas. (FERREIRA; SIMÕES, 1986).

Page 64: Livro-texto EJA

64

podemos citar outros autores franceses que se desdobraram a partir da proposta

lablaciana, tais como C. Vallaux, Comte e Sorre (MORAES, 1983).

Tais correntes consideradas na perspectiva da Geografia Moderna, foram

fundamentais para responderem “o que existe em tal lugar”, tendo como perspectiva a

diferenciação do espaço e a relação entre homem e meio (FERREIRA; SIMÃO, 1986).

Em 1837, a disciplina de Geografia escolar foi incluída no currículo escolar de forma

explícita no Brasil, no Colégio Pedro II, situado no Rio de Janeiro. A princípio, tal

disciplina pautava-se somente na metodologia Positivista, de cunho tradicional, isto é,

centralizada na descrição e memorização de conteúdos, tais como a cosmografia e a

astronomia, os quais não condiziam com a realidade dos alunos. Ainda não havia, nesta

época, estudos sistemáticos sobre didática em Geografia. Somente no início do século

XX, destacou-se o professor Carlos Miguel Delgado de Carvalho, de influência

francesa, como um dos principais introdutores da didática em Geografia no âmbito

escolar.

No ensino superior, a Geografia somente foi estabelecida no currículo na década

de 1930, nas principais capitais brasileiras, tais como São Paulo, Rio de Janeiro e

Salvador. A partir deste momento, a metodologia Moderna se expandiu, pois os

primeiros professores universitários eram estrangeiros que seguiam a corrente alemã

ou francesa e, posteriormente brasileiros começaram a realizar a pós graduação nestes

países supracitados. Podemos citar entre os primeiros precursores do ensino superior de

Geografia no Brasil Jean Tricart, Pierre Deffontaines e Pierre Monbeing.

A princípio, havia uma forte dicotomia entre o que era ensinado na escola e na

academia, permanecendo inalterada entre as décadas de 1940-50. É importante salientar

que no período pós II Guerra Mundial, a Cartografia recebeu contribuições

tecnológicas, tais como a aerofotogrametria e o sensoriamento remoto. Este marco foi

importante para ressaltar a Geografia como ciência prática (exercida pelos bacharelados

em Geografia), pois contribuiu no aperfeiçoamento de métodos de aquisição de dados

para a elaboração de mapas.

O período da ditadura militar que perpassa as décadas de 1960-80, foi marcada,

a princípio, pela exaltação do patriotismo, o qual deveria ser difundido pela mídia e,

principalmente, nas disciplinas de História e Geografia na escola. A Geografia deveria

Page 65: Livro-texto EJA

65

dilacionar estudos acríticos, meramente descritivos, exaltando o Estado-nação, o

formato do território brasileiro e suas potencialidades.17

Em meados da década de 1970 há o início da tentativa de ruptura com a

Geografia Tradicional ensinada nas salas de aula. Esta ocorre quando a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei nº 5692/71) promoveu a junção curricular

de Geografia e História substituindo-as pela disciplina de Estudos Sociais, sem

questionar as teorias e os fundamentos epistemológicos particulares de cada disciplina.

Na década de 1980, a Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB) e a

Associação Nacional de Professores Universitários de História (ANPUH), analisaram e

questionaram os Estudos Sociais como disciplina, e conseguiram sua remoção da grade

curricular nos ensinos de primeiro e segundo graus da época. Os objetivos dos membros

dessas associações eram inserir as disciplinas de Geografia e História no ensino de

forma a qualificar a aprendizagem, através de metodologias condizentes com suas

particularidades. Entre as décadas de 1980 e 1990, foram produzidas propostas

curriculares em parceria com as universidades, esta realidade, conhecida como

"movimento de renovação curricular", possibilitou um estudo sobre o conteúdo

curricular na disciplina de Geografia de acordo com sua finalidade educacional

(PONTUSCHKA et al 2007).

Segundo estudos de Cavalcanti (2008, p. 21-22), o movimento buscava

denunciar a neutralidade do pensamento geográfico, principalmente as ideologias

difundidas pelo Estado através do ensino. Tal rompimento procurava uma reformulação

teórica no ensino partindo da Geografia crítica, porém, a referida autora ressalta que

nem todos os discursos deste período tiveram base filosófica, política e ideológica

marxista, e sim, havia também antimarxistas e uma pluraridade no discurso geográfico

que se convergiam quanto ao descontentamento nas práticas de ensino.

É importante destacar a transição que o ensino de Geografia perpassa neste

momento de sua história, como destaca Cavalcanti (2008, p. 23):

Mais do que localizar e descrever elementos da natureza, da população

e da economia, de forma separada e dicotomizada, propunha-se uma

nova estrutura para esse conteúdo escolar, que tivesse como

pressupostos o espaço e as contradições sociais, orientando-se pela explicação das causas e decorrências das localizações de certas

estruturas espaciais.

17 Sobre o assunto vide OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. (Org.). Para onde vai o ensino de geografia?

5ª ed. São Paulo: Contexto, 1994.

Page 66: Livro-texto EJA

66

A partir da década de 1980, apesar da crise deste movimento sociopolítico, o

marxismo contribuiu no reforço da fundamentação pedagógica-didática, na busca de

métodos de ensino que auxiliaram o aluno a pensar criticamente no contexto do início

da globalização.

Assim, ampliam-se os estudos sobre ensino de Geografia que se intensificam nas

duas últimas décadas do século XX e, no início do século XXI, há encontros,

congressos e simpósios tanto sobre teoria da Geografia acadêmica quanto em didática

em Geografia.

É a partir desses estudos com levantamento de informações (entrevistas,

aplicação de recursos didáticos, análise de processo de ensino e aprendizagem, entre

outros), que foi possível indicar as principais teorias a serem abordadas na prática do

ensino de Geografia, entre elas se destacam: o lugar como escala de referência do

cotidiano do aluno, que auxiliará na compreensão do mundo, articulando, assim, o local

com o global; discutir temas socioespaciais, tais como questões etnicas e exclusão

social; desenvolver a linguagem cartográfica nos alunos; promover a educação

ambiental dando a atual importância da preservação da natureza no contexto da

globalização; incorporar diferentes linguagens, tais como música, vídeos, fotografias,

websites, entre outros, com a finalidade de auxiliar o aluno na compreensão dos

conteúdos, neste caso encontram-se os recursos didáticos (CAVALCANTI, 2008).

É também a partir dos estudos sobre as práticas docentes e suas principais

dificuldades que foi possível diagnosticar que a cartografia é o principal conteúdo em

que os professores possuem dificuldade em mediar no processo de ensino-

aprendizagem dos alunos. Neste quesito, Archela (2000) destaca que o índice na

publicação científica no campo da cartografia e ensino teve uma elevação gradativa,

principalmente após o primeiro Colóquio de Cartografia para Crianças, que ocorreu em

1995. Tal colóquio objetiva a troca de experiências e a busca de novos desafios à

ciência cartográfica escolar. Através de tais encontros e suas posteriores publicações,

possibilitaram a difusão e atual valorização da cartografia no ensino de Geografia no

Brasil.

Neste ínterim a cartografia escolar está se aperfeiçoando, principalmente devido

às novas tecnologias que subsidiam a produção de materiais didáticos e possibilitam

diferentes meios de aplicação. Atualmente, a cartografia escolar busca englobar

Page 67: Livro-texto EJA

67

aspectos tanto das ciências humanas quanto das ciências da linguagem, uma vez que a

junção de ambas são elementares para a compreensão e alfabetização cartográfica.

Assim, a cartografia, torna-se importante em discussões sobre os conteúdos de

ensino da Geografia, pois dela pode-se localizar elementos através de representações,

sejam elas através de mapas analógicos, digitais ou mentais. Esta pluralidade de meios

de representar o espaço possibilita a comunicação com os demais temas geográficos

(escala, meio ambiente, e questões sociais), valorizando e incentivando ainda mais a

pesquisa na área do ensino, e consequentemente, nas práticas pedagógicas em sala de

aula.

2. RECURSOS DIDÁTICOS NO ENSINO DE GEOGRAFIA

Para familiarizarmos com o elemento principal deste estudo, conceituaremos

recursos didáticos como o conjunto de materiais que, ao serem utilizados para fins

pedagógicos, buscam uma melhor mediação de conhecimento de conteúdos com os

alunos, podendo ser todo tipo de objeto material (giz, livro didático, maquete, globo

terrestre, entre outros) ou imaterial (tonalidade da voz e expressões corporais); os

recursos didáticos modernos são formados por componentes eletrônicos e

computacionais (FISCARELLI, 2008).

Assim, para compreendermos as principais tendências ideológicas, Fiscarelli

(2008) sustenta que há discurso e saberes perante a utilização de recursos didáticos que

não condizem com a realidade praticada em sala de aula. Ela analisa o discurso dos

órgãos políticos (Proposta Curricular do Estado de São Paulo e Proposta Curricular

Nacional), dos livros didáticos dos principais autores de manuais de didática,

consagrados nos cursos de licenciatura desde a metade do século XX, tais como os de

Nérici (1959), Mattos (1971) e Turra et al. (1975). Em tal estudo, a autora conclui que

há uma ideologia empregada pela política educacional paulista que incentiva o

professor a utilizar os recursos didáticos, principalmente os relacionados às novas

tecnologias. Para efetivar esta ideologia, são realizados cursos de capacitação com a

finalidade do professor realizar atividades lúdicas em sala de aula, pois o principal

problema na utilização dos recursos didáticos é adaptá-los aos temas propostos pela

disciplina.

Quanto à expectativa de utilização de recursos didáticos pelo professor, a autora

infere que há receio destes na questão da viabilidade, adaptação ao conteúdo e à

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68

realidade escolar. Para a prática em sala de aula, o professor necessita de maior preparo

e eficiência, pois assim como o recurso pode ajudar, ele também pode atrapalhar o

docente se ele não souber utilizá-lo corretamente.

Por fim, os estudos sobre os recursos didáticos ganham maior destaque nas

décadas de 1980-1990, sendo este um elemento enfatizado por grande parte dos autores

deste referencial teórico em estudo. Devemos assim, buscar esta qualidade, seja através

de práticas pedagógicas renovadoras ou na busca de outros meios de estímulo à

motivação de aprendizagem dos alunos, como a utilização de recursos didáticos.

A seguir abordaremos os estudos sobre recursos didáticos no ensino de

Geografia no Brasil, consagrados pelos principais pesquisadores sobre cada recurso. É

importante salientar que foram desconsiderados os livros didáticos, paradidáticos e

literários, por serem temas muito abrangentes e demasiadamente estudados, e também

por não abrangerem a proposta neste estudo, isto é, que considere somente recursos

didáticos que possibilite uma abordagem através do método intuitivo, o qual haja a

participação ativa entre o sujeito e o objeto de estudo.

2.1 Globo Terrestre

Segundo estudos de Schäffer et al (2005), o globo terrestre tem sido um recurso

didático relegado, esquecido e pouco compreendido pelos professores, sendo muitas

vezes um elemento meramente decorativo, principalmente nas salas ambientes. Este

recurso tem suma importância nos temas que englobam orientação, leitura de mapas,

origem das situações de tempo, variação do horário na superfície terrestre, fluxo

espaciais (comércio, transporte e informações) e também em análise de questões

geopolíticas.

As principais vantagens em apresentar este recurso em sala de aula é que com

ele há a aproximação da real forma do planeta Terra; possibilita mostrar de forma total

os elementos físico-geográficos; mostram de forma total as divisões políticas dos

países; traz a rede de coordenadas geográficas sem distorções; possibilita a simulação

dos movimentos da Terra (dia-noite, estações do ano, fuso horário e eclipses); além de

suscitar indagações e despertar curiosidade àqueles que a manuseia (SCHÄFFER et al,

2005).

Uma das principais dificuldades em utilizar este recurso é a escola, por muitas

vezes ser muito pequena, dificultando a apresentação de informações e detalhamento.

Page 69: Livro-texto EJA

69

Também está na impossibilidade de aproximação, visualização e manuseio deste com o

aluno, pois este material, muitas vezes, não há em abundância na escola. Por esta razão,

é importante que tenha na escola um exemplar com vários globos, mesmo que seja em

tamanho reduzido, para que todos os alunos possam manuseá-lo.

É importante também verificar os elementos encontrados nos globos terrestres,

para que possam ser explorados todos os componentes que este recurso possui como

destacado em Schäffer et al. (p. 34, 2005):

[…] (a) rede de coordenadas, com identificação do Meridiano de

Greenwich e da linha do Equador; (b) a escala, geralmente impressa

junto à legenda; (c) legenda, destacando símbolos não-convencionais

e, via de regra, colocada sobre áreas oceânicas; (d) arco de meridiano

em que aparecem os valores da latitude ; e (e) um círculo ou calota,

em geral de plástico, sobre o Pólo Norte e onde há marcação para

leitura das horas.

Agora, apresentamos algumas atividades organizadas por Schäffer et al (2005) e que

podem ser realizadas em sala de aula, de acordo com a realidade escolar.

• Procurar no globo, lugares citado no texto (trabalhado em sala de aula); discutir a

localidade e tempo de deslocamento, continente pertencente, etc.

• Discussão sobre globos em propagandas (ideologia).

• Foto tradicional da escola (formatura) do aluno ou responsável deste, que tenha o globo

simbolizando o ingresso no mundo culto e letrado. Discutir o tema.

• Confecção de bandeiras. Observar o significado de cores e símbolos.

• Aluno analisar uma bandeira de um país por ele escolhido.

• Questionar cores e símbolos da legenda do globo.

• Diferenciar, com os alunos, o globo antigo (século XVI) com o globo atual.

• Confecção do globo antigo com itinerário de navegações; explicar as dificuldades

(tempo, tecnologia, investimento).

• Leitura prévia sobre grandes navegações. Cada grupo seleciona um filme e elabora

textos que relacione o início das navegações com conhecimentos do cotidiano dos

alunos: drogas, DSTs, preconceito, amizade, criatividade, doenças

por falta de vitamina, etc. E dizer a importância do globo no contexto histórico do

filme.

• Construção de um globo com folhas de jornal; desenhar linha do Equador, meridiano e

trópicos; consultar bibliografia de bases militares dos EUA no mundo; discutir

geopolítica com os alunos.

• Desenho de proporção e redução de um objeto.

Page 70: Livro-texto EJA

70

• Escolher dois países, cada aluno, e diferenciar as áreas no globo e no mapa.

• Venda de um produto: escolher três rotas aéreas mais rápidas de um continente para

outro; descrição da rota utilizando pontos cardeais; medir em um barbante as três rotas

em um globo terrestre.

• Alunos entrevistarem duas pessoas com visões diferentes sobre o surgimento do planeta

Terra; questionar com os alunos as limitações da ciência e da religião.

• Em dupla, elaborar roteiro de viagem para cidades sagradas, escolhendo e justificando o

itinerário dos atrativos turísticos através do globo terrestre.

• Maquete sobre o sistema solar (trabalhar proporção, estudo prévio sobre o tema com os

alunos, e elaboração de um glossário); os alunos utilizarão a maquete para explicar

cada tema escolhido por eles.

Segundo Almeida e Passini (2004), os conhecimentos e habilidades de localização,

orientação e representação contribuem para a compreensão da totalidade do espaço,

sendo o princípio para que o aluno construa a noção de espaço, codificando e depois

decodificando as representações gráficas presentes nos mapas.

2.2 Bússolas

As bússolas, apesar de muitas escolas não possuírem, é um recurso de fácil

acesso, podendo ser confeccionado pelos alunos e professores, ou comprados por preços

acessíveis à comunidade escolar.

As bússolas podem ser utilizadas no processo de ensino-aprendizagem de

conceitos, como norte magnético, orientação, rosa dos ventos, paralelos e meridianos,

além de exemplificar e relacionar com fatos históricos que perpassam as grandes

navegações e a importância da orientação daquela época e atualmente.

Neste contexto, concordamos com Castellar (2011, p. 126), ao constatar que,

O trabalho com orientação, como a localização do norte geográfico e a

identificação dos lugares a partir da rosa dos ventos, auxilia-os

[alunos] a compreender pontos fixos e não fixos da ordenação de um

território, e também no entendimento da variação de critérios de

regionalização.

Fica claro nesta ideia que, além dos conteúdos de orientação, o professor pode

abordar aspectos político-territorial, sendo elemento constituinte da localização do

indivíduo no espaço, já que utilizamos de pontos de referências que são social e

historicamente identificáveis, para que possamos nos localizar em determinados

espaços.

Page 71: Livro-texto EJA

71

Uma avaliação que pode ser feita, utilizando este recurso, é pedir para os alunos

realizarem a trajetória de um ponto a outro dentro da escola, anotando em uma folha os

pontos cardeais e a quantidade de passos, estipulando duas a três chegadas, e numa

outra folha os lugares onde se espera que o usuário chegue. Com isto, trocam-se as

folhas entre os alunos e observa se os alunos souberam utilizar este instrumento para se

localizarem. É uma atividade de envolve aprendizagem mútua, uma vez que os alunos

possam auxiliar uns aos outros no percurso.

Com as atividades desenvolvidas tendo a bússola como viés de aprendizagem,

estima-se que os alunos a entenderão fenômenos complexos com maior facilidade,

principalmente os relacionados à dinâmica interna da Terra, o qual possui muitos

elementos abstratos, pois se há interesse, os alunos aguçam a vontade de compreender,

além de ser uma atividade lúdica que os alunos não esquecerão tão facilmente.

2.3 Jogos

Os jogos em sala de aula destacam o aluno como principal precursor do

conhecimento, e esta transmissão se faz de modo interativo entre o objeto de ensino e o

sujeito, permitindo a troca de ideias, hipóteses e constatações através de resoluções de

problemas (SILVA, 2006).

Considerando os jogos como instrumentos do “brincar-aprendendo”, Vygotsky

(1998) afirma que eles são situações imaginárias, que conduzem a certos

comportamentos da criança, eliminando a possibilidade de ações, devido ao

cumprimento das regras, assim, esta ação está unida ao prazer, uma vez que a satisfação

das regras é realizada, tornando-se uma ação imaginativa. Tornar prazeroso este aspecto

é importante para o desenvolvimento da criança, nos aspectos morais e de convívio em

sociedade.

Em escala local, Breda (2011) realizou estudos sobre recursos didáticos,

descrevendo e analisando sua confecção e aplicação em algumas escolas estaduais e

municipais do município de Ourinhos/SP. A autora aborda quatro jogos principais: jogo

da memória, dominó, quebra-cabeça e o jogo de tabuleiro.

2.4 Maquetes

A respeito do uso da maquete em sala de aula, estudos de Simielli (1990) e

Almeida; Passini (2004), reforçam que a maquete possibilita ao aluno a construção de

noções espaciais através da visualização, em modelo reduzido, de representações

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72

bidimensional (mapas) para um tridimensional (maquetes), simplificando noções

abstratas que os alunos ainda estão desenvolvendo cognitivamente de acordo com suas

faixas etárias.

Para Almeida e Passini (2004), nos anos iniciais do ensino fundamental II, o

qual há a introdução da linguagem cartográfica para os escolares, deve-se ater maior

atenção quanto aos procedimentos metodológicos, enfocando o espaço vivido por este,

como por exemplo, a sala de aula, a quadra da escola, a escola em si, o bairro, enfim,

partindo de uma escala menor para uma maior.

Há atividades no intuito de estimular a percepção de um referencial topológico

entre os alunos nas séries iniciais (ALMEIDA; PASSINI, 2004) e, a posição, direção,

concentração, quantidade e demais informações que extrapolem a visualização da

maquete, que podem ser trabalhados pelo professor, principalmente entre os 9° anos e

ensino médio, tais como a dinâmica hidrográfica, clima, vegetação, as atividades

agrícolas e as demais relações econômico-sociais que a elas abarcam (SIMIELLI,

1990).

Uma metodologia de ensino com o intuito de aprendizagem que envolva a

construção de relações espaciais projetivas e euclidianas pelos alunos, abordando

aspectos de lateralidade (esquerda e direita), referência e orientação é abordada por

Almeida (2001), sendo um estudo desenvolvido para as séries iniciais (1° ao 6° ano do

ensino fundamental). Através da confecção de maquetes por grupos de alunos, eles

representam a sala de aula, de acordo com a proporção de carteiras, cadeiras e demais

elementos que esta pode conter. A sala de aula foi escolhida por representar um lugar

de convívio conhecido pelos alunos e professor, podendo este último determinar os

avanços e limitações dos alunos. Com a confecção das maquetes da sala de aula, foi

possível trabalhar com eles a visão vertical, escala proporção, legenda, e a posição dos

alunos na sala de aula, a princípio sem a utilização da maquete e, posteriormente,

utilizando a maquete, sendo um elemento essencial na preparação para a leitura das

coordenadas geográficas. Assim, o uso da maquete da sala de aula, “[…] projeta o

observador fora do contexto espacial no qual ele se insere, permitindo-lhe estabelecer,

inicialmente, relações espaciais topológicas entre a sua posição e a dos elementos da

maquete” (ALMEIDA, 2001, p. 78).

Neste ínterim, espera-se que a abordagem seja analisada de acordo com as

necessidades da prática docente, em vista dos objetivos traçados pelos conteúdos em

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73

sala de aula, os anos escolares e faixas etárias dos alunos, e as disponibilidades de

recursos e maquetes já disponíveis no âmbito escolar que poderão incorporar a fase de

execução desta pesquisa.

2.5 Fantoches

Segundo Silva (2011), a utilização de fantoches pelas crianças é um meio de

introduzir nas séries iniciais do ensino fundamental II (5º e 6º ano), temas da Geografia

relacionadas à realidade dos alunos, através de oficinas da narração de histórias ou a

representação de teatro de fantoches exercidos pelos próprios alunos. A referida autora

analisa a construção do conhecimento por meio da contribuição da epistemologia

genética, desenvolvido por Piaget, destacando que o fantoche pode ser um instrumento

facilitador no processo cognitivo, na passagem do egocentrismo para o operatório

concreto, em crianças entre 11 e 13 anos de idade. Com a confecção e manipulação dos

fantoches, a autora concluiu que foi possível trabalhar o conceito de espaço, lugar e

orientação, a fim de descentralizar do aluno de sua visão egocêntrica.

Em estudos que abordam a utilização de peça de teatro com fantoches para o

ensino de Geografia, são desenvolvidos pelo projeto “Colóide”, desenvolvido junto ao

Curso de Geografia da UNESP – Ourinhos/SP, que realiza atividades com os alunos de

forma lúdica, entre tais atividades está o teatro de fantoches como viés no

ensinoaprendizagem de conceitos que englobam o solo, tais como conservação do solo,

erosão e voçoroca (PEREIRA, 2011). Outra consideração a ser salientada é a

possibilidade de interação com o público espectador, a fim de juntos criarem

mecanismos para resolverem situações de degradação do solo, como no caso da

voçoroca.

Assim, no aspecto de utilização de fantoches como recurso didático, deve ter

claro qual a abordagem e método a ser utilizado. Este recurso tem maior utilização nas

séries iniciais do ciclo II do fundamental, devido à faixa etária e ao desenvolvimento

cognitivo desta faixa etária, porém, isto não impossibilita sua utilização nas séries

posteriores, desde que siga objetivos de acordo com o desenvolvimento cognitivo dos

alunos.

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74

2.6 Softwares educativos

No final do século XX e início do XXI, a tecnologia digital tornou-se acessível

aos usuários. Na Geografia, tal recurso tem sido pesquisado principalmente pela

cartografia escolar, no manuseio de mapas interativos e/ou dinâmicos. Também há a

confecção com os alunos de blogs e o manuseio de jogos online, que oferecem

diferentes temáticas possíveis a serem trabalhadas, além da cartografia, tais como

planejamento urbano, formas de relevo, dinâmica espacial, educação ambiental, entre

outros.

Há diferentes softwares distribuídos gratuitamente, confeccionados por

diferentes universidades, como a “Geoideia” desenvolvido pela Universidade Federal

Fluminense, além de sites como o IBGE teen voltado para o público juvenil. Assim, é

necessário que o professor busque o conhecimento sobre estas tecnologias e planeje

atividades e avaliações diferenciadas com este recurso.

Para o professor menos familiarizado com esta tecnologia, os slides oferecem

uma dinâmica de apresentação, podendo ser utilizado como recurso educativo. Ele

estabelece uma sequencia linear com efeitos e animações que são incorporados através

de sons, vídeos e animações (RAMOS, 2005). Com esta tecnologia informacional, os

alunos podem entender dinâmicas da Terra que necessita de maior interatividade e

abstração, que podem ser facilitadas através deste recurso.

Acreditamos que, a inserção da informática no meio escolar é um elemento que

deve ser explorado pelo professor, pois os alunos estão familiarizados com este recurso,

e no ensino de cartografia, poderá facilitar na aprendizagem da linguagem cartográfica.

2.7 Cinema

Segundo Napolitano (2009), o cinema em sala de aula, principalmente de ficção

e documentário, estando vinculado à indústria cultural, pode ser utilizado em sala de

aula pelo professor na abordagem de temas antes e/ou depois do filme. Para tanto, o

professor deve planejar suas atividades, de adequando ao currículo e à faixa etária dos

alunos.

Sobre o planejamento das atividades, o autor supracitado enfatiza três aspectos:

a organização na exibição do filme, verificando se ele ainda é acessível, se a sala de

vídeo é adequada (iluminação, barulho externo, vídeo e TV em perfeito estado de

utilização); adequação com o currículo e/ou conteúdo, afim de que o aluno elabore

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textos, faça leituras complementares e desperte criticidade e; adequação com a faixa

etária do aluno, podendo o professor retirar partes que necessitem de censura, também

neste último aspecto deve-se atentar à etapa de aprendizagem escolar.

As faixas etárias são divididas de acordo com os ciclos de ensino. Assim,

esperasse que os alunos do fundamental II desenvolvam uma observação linear dos

fatos. Os alunos nesta faixa etária são agitados e questionadores, por esta razão, os

filmes que mais despertam curiosidade e gera interesse são aventura (podendo o

professor, neste caso, trabalhar com filmes históricos), e os filmes de ficção científica

(sendo trabalhadas as diversas superações de técnicas e tecnologias, de forma

cronológica e linear). Nas atividades planejadas, o professor pode estruturar um roteiro

prévio, com questões objetivas e relatório simplificado.

Nos alunos do ensino médio, é interessante destacar na íntegra a análise de

Napolitano (idem, p. 27): “[…] aumento da interdependência grupal, maior interesse

pelo sexo oposto, redefinições identitárias, questionamento do sentido existencial da

vida e do mundo, primeiras exigências de vida civil”.

Pela razão de que alguns alunos podem estar em conflito existencialista, é

importante que o professor trabalhe este aspecto em sala de aula. O aluno nesta faixa

etária possui capacidade de abstração, permitindo uma abordagem mais profunda, com

roteiro de análise mais elaborado, afim de que o aluno reflita sobre étnicos, sociais e

psicológicos, que serão fundamentais no processo de formação da personalidade. Sobre

documentários, o autor enfatiza que o professor deve ter olhar crítico e questionável

sobre o conteúdo destes, analisando a fonte produtora, os financiadores e os produtores

(diretor e escritor) a fim de abordar o cunho ideológico, podendo utilizar outro

documentário que contraste com a mesma abordagem.

Por fim, autor elenca atividades categorizadas a partir de um referencial de

filmes, que não cabe aqui desmembrá-los, mas sim, destacá-los como uma fonte de

pesquisa a ser considerado pelo professor ao utilizar tal recurso como auxílio do

conteúdo geográfico.

2.8 Estudo do meio

O estudo do meio é uma atividade realizada fora do ambiente da sala de aula,

podendo ser a observação no bairro, num parque próximo ou distante da escola, em

museus, etc. O estudo do meio favorece o recorte, a análise e a conceituação da

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76

paisagem, observada de acordo com objetivos que podem englobar uma escala que

perpassa do local para o global, inter-relacionando os aspectos físicos e sociais que

resultam na paisagem historicamente (re) construída, além de singularizar as

particularidades da totalidade (SERPA, 2006).

O estudo a campo possibilita a interdisciplinaridade e propiciar abordar temas

transversais como prática da cidadania. Outro aspecto que pode ser estudado são as

categorias geográficas (espaço, território, paisagem e lugar), por serem conceitos

complexos, poderão ser observados a campo em diferentes olhares e pontos de vista

sobre cada categoria.

É importante que haja um estudo prévio sobre a área de estudo, para que os

alunos observem as peculiaridades e a constatação dos dados observados levantados. E,

após o campo haja a discussão e a sistematização dos dados antes e após o campo, para

que não ocorra, como salientado por Claval (2004) citado por Serpa, (2006, p. 16):

A descrição de paisagens urbanas tais como as descobrimos

percorrendo a cidade dá ideia das etapas de sua evolução, mas não

explica seu papel, não mostra do que a cidade vive, não permite

compreender seus problemas. Passemos do olhar do visitante à

perspectiva vertical daquele que dispõe de mapas, fotografias aéreas e

pesquisas sobre os hábitos de deslocamentos dos citadinos. A cidade

deixa de aparecer como um caleidoscópio. Tudo se torna claro.

Nesta perspectiva, as atividades devem ser realizadas de acordo com os

conhecimentos prévios dos alunos e, posteriormente, uma análise sobre as atividade

realizadas no campo, tendo como intuito ampliar os conhecimentos dos alunos a partir

da experinência vivenciada, correlacionando a teoria com a prática.

.

2.9 Fotografias

As fotografias são instrumentos que podem auxiliar o aluno na compreensão das

mudanças na paisagem, que ocorre, sobretudo, com a expansão da ocupação humana, e

as diferentes técnicas que o homem utiliza sobre o espaço. A análise fotográfica aguça a

percepção da paisagem de forma cronológica, seja através da assimilação entre fotos ou

entre estas com a realidade imediata.

Neste sentido, pode-se trabalhar também o conceito de lugar com os alunos, uma

vez que há a possibilidade de utilização de fotografias da escola, do bairro, ou do

município, em diferentes épocas. Esta atividade motiva os alunos, principalmente por

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77

reconhecerem referenciais do espaço observados nas fotografias. Além disso, o estudo

do município é importante, porque nele estão delimitados todos os aspectos do espaço

próximos dos alunos, sendo elementos expressos pelas condições sociais, econômicas e

políticas, formando uma totalidade na particularidade desta escala, podendo ser

expandida para as demais escalas geográficas (CALLAI, 2003).

Outra atividade de fácil acesso aos alunos, e com devido planejamento do

professor, é resgatar a história de parentes dos alunos, amigos ou vizinhos, que saliente

a mudança da paisagem no bairro e/ou município dos alunos. Assim, com o conteúdo e

conceitos prévios adquiridos em sala de aula, o professor pode juntamente com os

alunos, estabelecer perguntas prévias, e estes realizarem a campo (dentro de casa com

os pais, ou na casa de parentes, vizinhos e amigos) as entrevistas. É importante também

que eles busquem fotografias que retratem esta mudança na paisagem do local em

estudo. Em sala de aula, os alunos apresentam os dados obtidos e os expõe para os

demais alunos, a fim de que haja o diálogo entre eles, e o professor resgate os conceitos

já trabalhados em sala de aula anteriormente.

A fotografia é um recurso de fácil acesso, e muito pouco utilizada pelos

professores. Se ela for bem direcionada, o professor facilitará a compreensão da

dinâmica espacial pelo aluno e/ou despertar nele a identidade com o espaço ao qual ele

se sociabiliza.

2.10 Mostruário de rochas, minerais e solos

Sobre este recurso didático há pouca bibliografia no quesito de ensino em

Geografia, apesar de ser um material de fácil acesso e com ampla exploração em sala de

aula.

Um estudo peculiar sobre a utilização de rochas, minerais e solos no conteúdo de

geologia, que engloba os estudos geográficos, está no artigo de Moreno (2007), nesta

pesquisa, as rochas, minerais e solos se destacam pela possibilidade do contato direto do

aluno com o conteúdo estudado, despertando maior interesse destes pela Geografia

Física e sua inter-relação com os aspectos sociais. Para complementar o conteúdo, foi

agregado conhecimentos sobre impactos ao meio ambiente e socioeconômicos, tais

como contaminação da água pelo mercúrio, a importância do Aquífero Guarani, e os

tipos de solos e suas relações com a agricultura.

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Devemos destacar que a autora conclui afirmando a importância da motivação

dos alunos devido uma abordagem dos conteúdos de modo diferenciado, que foi

sistematizado considerando a pesquisa sobre o lugar vivenciado por eles, em escala

local e regional.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se concluir que os estudos no campo do ensino em Geografia relacionam-

se diretamente com a crescente pesquisa no campo de recursos didáticos, especialmente

os que facilitem a mediação entre professor e aluno na busca do conhecimento. Esta

constatação reforça a necessidade de questionarmos as práticas escolares atuais,

principalmente porque o ensino Tradicional ainda predomina, reforçando uma

Geografia desconexa em seus conteúdos.

Nos levantamentos bibliográficos sobre os recursos didáticos no campo de

ensino da disciplina de Geografia, os autores abordaram, com maior ênfase, a temática

cartográfica, por considerarem a dificuldade da transposição didática dos professores e

por esta ser importante para os estudos do campo geográfico. Assim, observamos que há

uma lacuna perante os demais temas, além da questão da interdisciplinaridade com as

demais disciplinas escolar.

Também devemos considerar os novos meios tecnológicos na difusão da

informação digital, facilitando o acesso à pesquisa produzida em colaboração entre

universidades e escolas, que facilitam o acesso aos artigos publicados nos encontros,

congressos e colóquios no ensino de Geografia. Tal meio de informação pode auxiliar

os docentes escolares na busca de metodologias diferenciadas.

Espera-se que este estudo seja base para a averiguação de tais lacunas

supracitadas, com a finalidade de explorar e difundir conhecimentos sobre práticas

escolares e técnicas que auxiliem no processo de ensino-aprendizagem dos alunos.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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