livro - moçambique - 1974 - o fim do império e o nascimento da nação - fernando amado couto

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    A Frente interna

    Com a morte anunciada do sistema colonial, na chamada Frente

    interna, Jardim no o nico a movimentar-se. Existiram outrasforas que tentaram a sua oportunidade. Entre elas est a superactiva

    Dr.aJoana Simeo.

    A moambicana era visita frequente da misso diplomtica dos

    EUA em Moambique. A 24-10-1973, o cnsul norte-americano

    MacDougall recebe-a em sua casa328 para uma conversa que durou

    mais de duas horas.

    Joana deu-lhe conta da formao do GUMO, dos contactos de

    Mximo Dias em Lisboa, que assumia a presidncia do grupo.

    Critica alguns dos candidatos locais Assembleia Nacional329

    , ao

    mesmo tempo que elogia outros que forosamente tinham simpatias

    para com o GUMO330

    . E impiedosa no que se refere ao Dr. Miguel

    Artur Murupa, negando qualquer ligao ao advogado Domingos

    Arouca, porque no queria ser manchada de acusaes de ligao

    aos comunistas ou oposio portuguesa. Atravs de uma filha do

    industrial portugus Antnio Champalimaud tinha obtido o seu apoio,

    e afirma que nessa semana se iria encontrar com Jorge Jardim. Mas

    coloca srias dvidas acerca do apoio do engenheiro, pois ele estaria

    mais interessado numa soluo do tipo rodesiana e que Jardim

    precisava mais de ns do que ns dele.

    Telegrama referenciado R161335Z OCT 73.Felisberto Machatine, Assahel Mazula e Domingos dos Santos Xavier.Casos de Tito Jeque e Almeida Penicela.

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    218 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    O encarregado da misso diplomtica em Loureno Marques,

    Van Oss Hendrick, duvida da genuinidade da Dr.aSimeo. Entende

    que o GUMO deve ter cobertura portuguesa, talvez at mesmo

    mais do que Simeo pensa e recomenda a Washington que espere,

    no s para avaliar a capacidade de sobrevivncia do grupo, mas

    sobretudo pela prova do apoio portugus.

    Mais uma vez constatam que a poltica era algum a observar,

    porque se tratava da nica mulher universitria negra, educada,

    politicamente consciente. Alm de que era dinmica e agressiva, e

    disso ningum duvidava. Um dia, nos incios dos anos sessenta, na

    cidade de Argel, o Dr. Pascoal Mocumbi, ento representante da

    FRELIMO naquele pas, promoveu um encontro na sua residncia

    para tentar sanar as divergncias entre Joana e o seu marido. Para

    surpresa de todos, esta tinha aquecido azeite, atirando-o sobre o

    cnjuge, provocando-lhe srias queimaduras. Acto que lhe conferiu

    fama e inspirou terror. Se se comportava assim numa tentativa de

    apaziguamento, ainda por cima em casa de terceiros, qual seria o

    tratamento para com os seus inimigos?

    Numa carta muito secreta descreve o encontro havido com

    Jorge Jardim a 22 de Outubro de 1973 para uma reviso total do

    panorama de Moambique331

    . Jardim esconde-lhe as suas

    negociaes de Lusaka e recusa a sua participao no GUMO por serprejudicial, ficando a dvida se o prejuzo era para ele ou para o

    grupo. Fica, no entanto, acordado que poderiam ser estabelecidas

    reas futuras de colaborao.

    A PIDE332

    sabe do encontro havido entre Joana Simeo e Jardim e

    tambm do convite para este integrar o projecto do GUMO. O Eng.

    Jorge Jardim teria pedido 3 dias para reflectir e a 25 do mesmo ms

    partiu da Beira para Inhambane para conferenciar com o Dr.

    Domingos Arouca.

    331 Telegrama referenciado R161458Z OCT 73.332 Informao n. 5711/73/DI/2.3Seco/SC, de 7-11-1973.

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    A TERCEIRA FORA E O OVO DA SERPENTE 219

    A 3-7-1973, o Dr. Domingos Arouca, o primeiro advogado

    negro moambicano333, regressa ao seu pas, depois ter cumprido

    oito anos de cadeia nasprises da P1DE em Portugal. O seu cri-

    me? As suas relaes com a FRELIMO. Foi preso a 29 de Maio

    de 1965, um dia depois das cerimnias comemorativas do 28

    de Maio, data emblemtica do incio do Estado Novo. Arouca

    havia sido intimado a comparecer, como forma de rendio, a

    essas celebraes. Meses antes haviam sido presos o pintor

    Malangatana Valente, os escritores Jos Craveirinha, Rui

    Nogar e Lus Bernardo Honwana, Albino Magaia, entre outros,

    todos pertencentes ao grupo da FRELIMO na regio Sul,

    comandado por Matias Mboa.

    Domingos Arouca era um smbolo do nacionalismo moam-

    bicano oprimido e uma pedra no sapato no regime colonial. A sua

    libertao era permanentemente exigida em vrios fruns e por

    vrios movimentos de opinio cvica. A Amnistia Internacional,

    em 1972, considera-o o preso poltico do ano. Com o intuito

    manifesto de servir de exemplo foi obrigado a cumprir parte da

    sua pena de priso em Portugal, apesar dos seus protestos para

    permanecer em Moambique. Durante o seu tempo de priso no

    forte de Caxias eram muitos os moambicanos que o visitavam.

    Quase todos simpatizantes da FRELIMO.Consta que militantes do Partido Comunista Portugus, tam-

    bm detidos nessa cadeia, acusavam Arouca de comprometido

    ou colaboracionista. De facto, o advogado esteve sempre muito

    afastado do iderio marxista, alm de que era um preso em terri-

    trio estrangeiro. Essas acusaes sectrias so ouvidas e, face aos

    tempos que se viviam, no auguravam nada de bom.

    333Arouca um caso paradigmtico de como um cidado negro poderia concluir a formao

    universitria. Enfermeiro no Hospital de Mambone, sempre quis seguir os seus estudos. Fez

    diligncias vrias. Valeu-lhe a sorte de ter ganho a lotaria da Federao das Rodsias e o

    empenho do seu pai num negcio de destilarias. Com esse dinheiro seguiu para Portugal

    onde completa os estudos secundrios e posteriormente o curso de Direito em 1960.

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    220 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    O regresso de Arouca sua ptria no significou a sua liber-

    dade. O sistema legal da ditadura permitia que os presos polti-

    cos, mesmo depois de cumprida a pena, continuassem detidos,

    por critrios de mera subjectividade da segurana da nao, ou

    ento ficavam sujeitos a termo de identidade e residncia fixa.

    Foi isso que sucedeu ao advogado: mandaram-no para

    Inhambane, sujeito a uma vigilncia apertada. Domingos

    Arouca, era um cone na luta de libertao de Moambique,

    pois no s pagou anos da sua vida na priso, como era

    licenciado, intelectual com obra publicada.

    Nos planos independentistas de Jorge Jardim importava en-

    contrar um moambicano negro de renome para lhe dar credibi-

    lidade. A entrada em cena do Dr. Domingos Arouca era um dado

    novo, que importava investigar. Em Novembro de 1973, Jardim,

    acompanhado do Dr. Pinto Fernandes, comissrio nacional da

    Mocidade Portuguesa e por mera convenincia cunhado do

    Dr. Arouca, visita o advogado na sua casa em Inhambane, depois

    de muitos telefonemas. Queria sondar os planos polticos do

    advogado e tentar, atravs dele, uma aproximao FRELIMO,

    convencendo-o a participar nos seus planos. Nada de concreto

    foi estabelecido. Escreve o engenheiro: Parecia-me que Domin-

    gos Arouca poderia oferecer, no futuro prximo, um exemplo dereconciliao e personificar uma corrente de esperana.334

    Mas o Dr. Domingos Arouca estava saturado da priso a que

    esteve sujeito. A PIDE fazia-lhe uma apertada vigilncia, at

    porque no foi do seu agrado o regresso do advogado a

    Moambique. Era mais um problema, a juntar aos muitos com

    que ingloriamente se debatia. Num relatrio pode ler-se:335 na

    composio deste puzzle aparece agora a figura do Dr. Domin-

    gos Arouca, como possvel candidato a qualquer destaque no

    334 Moambique, Terra Queimada,p. 147.335 Informao n. 1174/DI (2) SC.

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    A TERCEIRA FORA E O OVO DA SERPENTE 221

    partido, provavelmente referindo-se ao GUMO. A PIDE escuta os

    seus telefonemas, regista as conversas com o Eng. Jardim336

    e anota,

    com estranheza, o convite para que visitasse o Malawi. Convite no

    concretizado devido s graves convulses sociais na Beira, resultantes

    do ataque dos colonos ao exrcito, em Janeiro de 1974, como iremos

    analisar.

    O Dr. Domingos Arouca sempre negou qualquer compromisso com

    Jorge Jardim, ou com o GUMO. Nem sequer conheceu, nesse perodo,

    a Dr.a Joana Simeo. Ele sentia-se como sendo da FRELIMO. No

    entanto, a Frente que ele havia conhecido em 1963, na Suazilndia,

    havia mudado muito em termos ideolgicos.

    O homem forte do Eng. Jardim sempre foi o Dr. Miguel Artur

    Murupa. Antigo adjunto do Departamento das Relaes Internacionais

    da FRELIMO ser, com Lzaro Kavandame, um dos elementos

    hierarquicamente mais importantes da Frente de Libertao que se

    entregaram s foras coloniais.

    O Dr. Murupa337

    estudou nos Estados Unidos, para onde fora

    enviado pelo primeiro presidente da FRELIMO338

    . Mantinha

    correspondncia regular com o Dr. Mondlane, e uma grande admirao

    por ele.

    Numa carta de 13-9-1965339

    , escreveu ao Dr. Mondlane: Mesmo

    admitindo os erros e as fraquezas inerentes a toda a obra humana, aFRELIMO fez, durante os poucos anos da sua existncia, uma obra

    gigantesca em prol da nossa Revoluo [...] Cada vida que se perde em

    campo de batalha, cada gota de sangue

    336 Informao n. 1024/74/DI(2) SC, de 15-2-1974.337 Miguel Murupa nasceu em Pebane a 8-1-1939. Fez os seus estudos primrios nessa

    localidade e continua os seus estudos na Misso catlica de Pilima. De 1952 a 1959

    frequentar o Seminrio do Zobu, a cargo dos Padres Brancos. Deixa os estudos e vai

    trabalhar at 1962 como revisor doDirio de Moambique e, em Fevereiro desse ano,

    ruma para o ento Tanganica, para se juntar FRELIMO.338 Iniciou os seus estudos na Lincoln University, na Pensilvnia, e depois na Howard Uni-

    versity, em Washington. Foi bolseiro do Special African Students Program.339 Carta depositada nos Arquivos da FRELIMO, do A.H.M.

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    222 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    que se derrama, cada lgrima que se verte, cada sacrifcio do nosso

    povo como um impvido e soberano magistrado sentado ex--

    cathedra a julgar-nos: tu s traidor da Revoluo; tu s heri da

    Revoluo. Acaba com uma frase distinta para o seu percurso:

    para todo o homem o nico caminho digno definir uma posio e

    segui-la, venham que vierem as consequncias.

    Regressado Tanznia em 1968, integrado como professor no

    Instituto Moambicano. Estava consciente de que regressaria aos

    Estados Unidos para continuar os seus estudos. Nesse ano nomeado

    para integrar a equipa dos trabalhos preparatrios do 2. Congresso.

    E eleito membro do Comit Central. Nomeado secretrio-adjunto do

    Departamento das Relaes Exteriores e, nessa qualidade, visita os

    EUA, Canad, Inglaterra, Holanda, Noruega, Sua, Jugoslvia,Arglia, Egipto e Sudo. Uma agenda carregada de viagens.

    Com a crise da FRELIMO de 1969, demite-se em Maio de 1970.

    Ser detido pela polcia tanzaniana e depois entregue FRELIMO,

    onde permanece na base de Naschingwea. Numa histria de con-

    tornos cinzentos foi integrado numa coluna de guerrilheiros em

    marcha para o interior do pas. Desertou, na zona do Sagal, em Cabo

    Delgado, entregando-se ao exrcito portugus a 7-12-1970. O

    comunicado n. 21/70, do Comando-Chefe, relata: Em Cabo

    Delgado apresentou-se s nossas tropas Miguel Artur Murupa, ex-dirigente da FRELIMO. Lacnico e parco em palavras.

    As razes pblicas da desero de Miguel Murupa foram por si

    apresentadas ao pblico, numa concorrida conferncia de imprensa,

    em Nampula340, invocando que as independncias em frica se

    mostraram prematuras. No caso de uma vitria da FRELIMO, haveria

    a substituio do Governo portugus por uma fora imperialista, de

    natureza comunista. Invoca tambm

    A conferncia teve lugar no Prdio Morgados, a 7-12-1970.

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    ATERCEIRA FORA E O OVO DA SERPENTE 223

    motivos religiosos. Era catlico apostlico romano, no se inte-

    grando na atitude atesta da FRELIMO.

    Respondendo a uma pergunta de um jornalista, o Dr. Murupa foi

    visionrio. Afirmou: Pessoalmente creio que a guerra est no fim.

    Mas a guerra que vir depois bem pior do que esta. Acertou.

    Estvamos em Dezembro de 1971. De facto, a guerra iniciada por

    alguns camaradas de Murupa, com o apoio expresso do regime de

    Smith e da Africa do Sul do apartheid, poucos anos depois da

    independncia de Moambique, ser bem mais devastadora no que se

    refere a vtimas humanas e destruio de infra-estruturas do que

    toda a luta de libertao contra o colonialismo, deixando marcas

    profundas no pas.

    Murupa troca, num golpe de asa, Dar-es-Salam pela Beira, onde

    passou a viver, tendo casado em 1972 numa mediatizada cerimnia

    social, registada de modo pouco habitual pelos rgos de informao

    locais341

    .

    Passado o tempo de quarentena que os desertores da FRELIMO

    eram obrigados a passar, porque, como explicava Marcelo Caetano

    esses elementos [...] no podiam ser logo valorizados de modo a dar

    a aparncia de que o ter militado nas fileiras inimigas constitua razo

    de preferncia em relao aos constantemente fiis, o Dr. Murupa

    foi designado, em finais de 1972, director da Voz Africana, semanriodo grupo editorial doNotcias da Beira.

    A partir de 8-8-1972, semanalmente, o Dr. Miguel Artur Murupa

    comea a escrever artigos de opinio virulentos contra os seus antigos

    companheiros, exorcizando o comunismo e

    341A esposa era natural da Beira, residente na zona das Bananeiras no Bairro da Munhava. A

    madrinha de casamento foi Teresa Jardim, esposa do Eng. Jorge Jardim. No havia na

    poca publicaes que se dedicassem divulgao da socialite, hoje frequentes em Maputo.

    A mediatizao do casamento foi criticada por Baltazar Rebelo de Sousa: No me pareceu

    aceitvel o casamento do Dr. Murupa com a repercusso pblica e apadrinhamento ilustre,

    carta ao governo-geral, in Marcelo Rebelo de Sousa, Baltazar Rebelo de Sousa

    Fotobiografia, Bertrand Editora, p. 453.

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    224 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    o espectro da sua aplicao em Moambique. A fraca audincia da

    Voz Africana em nada ajudou a voz de protesto. E muito escreveu.

    Editou em portugus um livro, Revolta e Desiluso, distribudo

    gratuitamente, s centenas de exemplares, pelos servios de

    propaganda do regime colonial. Depois publica outra obra, desta vez

    editada em ingls342

    . E uma compilao de vrias entrevistas a

    jornalistas no identificados.

    Nas suas respostas o Dr. Murupa defende a concepo integra-

    cionista plena do Ultramar portugus. Ser portugus tem apenas e

    to-s a ver com a cidadania e nacionalidade, no com a cor da pele

    e recusa mesmo que exista colonialismo em Moambique. Ter ido

    longe demais. Perdeu a pouca credibilidade poltica que ainda

    congregava aps a sua desero da FRELIMO. As palavras escritas

    com sinceridade ao Dr, Mondlane pesavam contra si.

    142 Portuguese Africa in Perspective lhe Making of a Multiracial Nation, ed. do autor *

    Miguel Murupa.

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    O ovo da serpente

    Na delegao da PIDE em Moambique passam-se tempos di-

    fceis. Tem como grande prioridade a FRELIMO, mas tambm omovimento da oposio democrtica, cada vez mais activo, os es-

    tudantes que acordam para a luta nacionalista e as agendas de novos

    nacionalistas, alguns deles aliados na mesma causa, mas nunca

    desistiram e resistem at ao fim. Reconhea-se esse mrito.

    Moambique era para as autoridades coloniais como um barco a

    meter gua por todos os lados. A oposio democrtica, pela primeira

    vez no liderada pelo Dr. Almeida Santos, aproveita as eleies de

    Outubro de 1973, no para concorrer, mas para divulgar a sua

    posio: no havia solues militares e a nica sada possvel era

    reconhecer o direito independncia de Moambique e dialogar com

    a FRELIMO. Apesar das perseguies, nenhum dos seus

    divulgadores foi preso. Era um incmodo para a PIDE e para o

    regime prender opositores de raa branca. Alm das complicaes

    jurdicas, expunham-se publicamente as contradies do sistema.

    Neste cenrio de desmoronamento, o GUMO tenta a todo o custo

    levar a sua agenda por diante. Depara-se com um muro de

    dificuldades. O governador-geral no s no os recebe343

    , como

    recusa a autorizao de realizarem um congresso na Beira para

    tornarem pblico a sua existncia. O Eng. Pimentel dos Santos eraadverso a qualquer mudana, um integracionista puro e duro.

    343Telegrama referenciado R251254Z OCT 73.

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    A no constituio legal do GUMO como associao cvica obs-

    tava a que a Dr.aJoana Simeo partisse to depressa quanto possvel

    para Nova Iorque, com o intuito de tentar participar nas Naes

    Unidas, como observadora, enfrentando olhos nos olhos o represen-

    tante da FRELIMO que, entretanto, recebera esse estatuto da ONU.

    E no exclui vias golpistas, afirmando ter o apoio militar dos GE

    e dos GEP, a nossa reserva militar (as mesmas unidades

    reclamadas por Jardim) e que contava com a numerosa fora dos

    estivadores atravs do controlo do Sindicato dos Profissionais de

    Estiva, liderado por Cassamo Dade, a quem fora conferido o lugar

    de vice-presidente.

    Entretanto, o Dr. Mximo Dias tem o seu primeiro contacto com o

    consulado norte-americano em Moambique a 6-11-1973344.

    Registam que o jovem advogado era um homem inteligente,

    sincero, mas politicamente pouco sofisticado, sobretudo se

    comparado com a sua vice-presidente, a Dr.a Joana Simeo.

    Dissertando sobre o omnipresente Jardim, Mximo Dias desvaloriza o

    seu papel, pois havia perdido dois importantes aliados: o apoio

    financeiro de Antnio Champalimaud e o apoio da Igreja Catlica,

    devido sua violenta campanha na imprensa dirigida contra os

    padres do Macti. Acusa-o de obter ganhos importantes atravs da

    influncia junto dos desertores da FRELIMO.Simeo, entretanto, desdobra-se em contactos para conseguir

    novos apoiantes. Tenta inclusivamente a aproximao a alguns

    militantes da FRELIMO na clandestinidade, residentes na capital

    moambicana e profissionalmente bem colocados, que recusaram. E

    totalmente contra o estabelecimento de contactos com ex-membros

    daquela organizao.

    O relatrio da PIDE a esse respeito sintomtico, ao registar no

    s o seu esprito de irreverncia, inconformismo e revolta contra

    344Telegrama referenciado R061416Z NOV 73.

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    tudo e todos, como anota as suas crticas a todos os apresentados

    que se confessam arrependidos do seu passado, dizendo que ela

    prpria nunca o faria, pois o seu ideal era lutar pelo povo negro de

    Moambique [...] sem subservincias a quem quer que seja345

    .

    Em Dezembro de 1973, Baltazar Rebelo de Sousa, ministro do

    Ultramar, realiza a ltima visita de um ministro colonial a

    Moambique. De toda a nomenclatura que rodeava Marcelo Caetano,

    Rebelo de Sousa destacava-se pela sua lucidez. No surpreende a

    aproximao de Mximo Dias e de Joana Simeo ao Dr. Baltazar

    Rebelo de Sousa. Como um sinal de confiana so integrados na

    comitiva do ministro a Nampula. Uma bofetada de luva branca ao

    governador-geral.

    Em Maro de 1974 a Dr.a Simeo visita Lisboa, onde se encontra

    com proeminentes empresrios com interesses ligados a Moambique:

    Sulemane Vali Mohammed e Abool Vakil, conforme informao da

    PIDE346

    . A 15 de Abril tem um encontro com o ministro dos Negcios

    Estrangeiros, Rui Patrcio, com um objectivo: a apresentao do Grupo

    ao Comit dos 24 das Naes Unidas. Ao que tudo indica ter recebido

    a aprovao, incluindo os fundos necessrios para a viagem. Seria uma

    viragem na poltica externa portuguesa. Pretendia partir para Nova

    Iorque nos finais de Abril, inteno sobre a qual existiam srias dvidas

    da sua viabilidade. Ou at se no se ter tratado de uma inveno daprpria Dr.aSimeo para obter apoios.

    Toda esta novela que visava essencialmente a pessoa de Marcelo

    Caetano com vrios actores em cena, numa conspirao contra ele,

    aproxima-se das tragdias de Shakespeare, sobretudo quando criam um

    autntico ovo da serpente, semelhana do que acontece nessa obra-

    prima da literatura Jlio Csar.

    345 Relatrio imediato n. 1423, de 12-3-1974.346 Informao n. 1635/74, de 11-3-1974.

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    Presos polticos em Dar-es-Salam

    Costa Gomes, durante a sua breve visita a trs capitais provinciais,

    e nos contactos feitos com os militares conclui: como odemonstraram de imediato, no queriam continuar a combater e

    morrer numa guerra que iria acabar dentro de pouco tempo. Tenta

    encontrar tbuas de salvao. Nem democratas, nem dirigentes

    associativos, nem GUMOS eram de forma alguma a soluo. Recorre

    ao escol de ex-presos polticos e rene-se com Jos Craveirinha, Rui

    Nogar, Josefarte Machel, Matias Mboa, Malangatana Valente e

    Rogrio Djwana. Todos haviam estado detidos nas celas da cadeia da

    Machava sob a acusao de terem ligaes com a FRELIMO.

    De incio, procura convenc-los a formar um partido poltico que

    gozaria de todo o quadro de liberdades e garantias na sua actividade.

    Seria uma espcie de FRELIMO de dentro. Malangatana Valente

    pediu, em nome dos seus companheiros, tempo para reflectirem. Se

    aceitssemos essa ideia iramos apenas colocar entraves s

    negociaes e nunca essa atitude seria aceite pelos dirigentes da

    FRELIMO. A resposta ser dada, nessa mesma tarde, pelo poeta

    Jos Craveirinha. Rejeitam a hiptese de formar qualquer partido.

    Foi-lhes ento sugerido que se encontrassem com os dirigentes da

    FRELIMO na Tanznia, para transmitir um apelo paz e a um

    imediato cessar-fogo, ideia de fundo de Costa Gomes, acentuada pela

    disposio manifestada do seu exrcito em no

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    274 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    continuar a lutar. Precisava de parar a guerra a qualquer custo e obter

    um flego para acertar as diferentes agendas sobre a descolonizao.

    Misso que os ex-presos polticos aceitaram. Costa Gomes413 no

    escondeu a satisfao por esta sua iniciativa. Em conferncia de

    imprensa afirma eufrico: em Loureno Marques contactei

    elementos simpatizantes da FRELIMO, em misso no oficial [...]

    Solicitei-lhes que transmitissem aos seus dirigentes o nosso apelo

    paz e indicassem a forma como pretenderiam estabelecer negociaes

    oficiais para o estabelecimento de trguas414

    .

    Este grupo de ex-presos polticos partiu para Dar-es-Saiam415

    . A

    eles foi juntar-se, em avioneta fretada, o pintor Malangatana Valente,

    retido por razes burocrticas, sendo a viagem paga pelo empresrio

    Antnio S. Estava prevista tambm a ida do Dr. Domingos Arouca.

    Mas este optou por se deslocar ao Malawi, a convite do presidente

    Banda, para participar nas cerimnias das comemoraes de mais um

    aniversrio do presidente vitalcio do Malawi. Durante um comcio

    saudou Arouca publicamente como convidado pessoal vindo do

    povo irmo de Moambique. O rgido e formal protocolo malawiano

    colocou Arouca e a sua esposa na mesa de honra durante o banquete

    de Estado. Igualmente presente neste cerimonial estava Miguel

    Murupa, afastado das luzes da ribalta416

    .

    A partida desta delegao de ex-presos polticos para a Tanzniacriou inmeras expectativas. Integravam a delegao nomes

    conhecidos, nomes com histria. Era a primeira vez que se

    Conferncia de imprensa em Nampula, a 12 de Maio.Notcias n. 16137, de 14-5-1974.Todo este grupo estava ligado abertura da 4.aFrente da FRELIMO no Sul do Save,comandada por Matias Mboa. Denncias vindas da Suazilndia fizeram com que ogrupo tivesse sido detido, com as suas ramificaes internas, levando a que a direcoda FRELIMO decidisse seguir diferente estratgia militar relativamente s cidades.

    Notcias da Beira n. 8850, de 17-5-74.

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    A REVOLUO PORTUGUESA E O COLONIALISMO DEMOCRTICO 275

    anunciava previamente uma viagem para a Tanznia, sem regresso

    prvio e directo para a cadeia da Machava, com um objectivo

    definido: encontrarem-se com dirigentes da FRELIMO. Como dizia

    o poeta Jos Craveirinha, partida, havia a esperana de que a

    nossa deslocao seja um xito e que regressemos com a mensagem

    de paz que todo o Moambique ambiciona.

    A delegao foi recebida por Joaquim Chissano no aeroporto de

    Dar-es-Salam, sendo efusivamente abraados. J na sede da

    FRELIMO a recepo ser bem mais fria. Eram vistos como

    mensageiros do novo poder em Portugal, vindos da zona ocupada e

    portadores de mensagens e intenes pouco claras. Logo chegada,

    na capital tanzaniana, um representante da FRELIMO revelou

    imprensa que a sua organizao estava preparada para ouvir o que

    os antigos prisioneiros polticos tinham para dizer, mas que eles no

    se poderiam considerar como representantes da FRELIMO.

    Criaram-se, em torno desta visita, algumas especulaes e meias-

    verdades. Para um completo esclarecimento recorra-se aos

    documentos da FRELIMO, feitos no prprio perodo em questo.

    Desfeitos os objectivos iniciais da misso dos ex-presos polticos,

    no foi difcil FRELIMO, durante a sua estada na Tanznia,

    transform-los em novos emissrios, com diferente destinatrio. Ao

    fim e ao cabo tinham sofrido anos de cadeia por partilharam o ideriodaquela organizao. Contactaram com as realidades da luta armada,

    tiveram vrios e longos encontros com Samora Machel, e tambm

    com o presidente Julius Nyerere. Voltaram com ideias bem definidas

    do que era a FRELIMO e do que se pretendia.

    No seu regresso, a 4 de Junho, Jos Craveirinha417

    afirma: os

    membros da delegao partiram para Dar-es-Salam na nica qua-

    lidade em que podiam apresentar-se FRELIMO. Uma qualidade

    417 Entrevista conjunta aoNotcias da Beira e estao radiofnica sul-africana SABC. Citaes do

    Noticias n. 16 137, de 14-5-1974.

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    276 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    que fizeram questo em firmar junto das entidades portuguesas da

    Junta de Salvao Nacional. Pronunciando-se sobre a realizao de

    um referendo, o poeta responde: Referendos? Ser que a Junta de

    Salvao Nacional que derrubou o governo de Marcelo Caetano fez

    algum referendo? A FRELIMO no uma associao poltica, um

    movimento revolucionrio que no lutou com panfletos e abaixo-

    assinados. Lutou de armas na mo. Muitos caram em combate ou

    nas masmorras. Depois disso, um referendo para qu?

    Tornava-se claro que a FRELIMO s pretendia negociar com

    representantes legtimos do Governo portugus. No valia a pena

    mandar mais mensageiros.

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    Lutar ou negociar?

    No que se refere guerra, vamos encontrar posies diferenciadas

    nos beligerantes. Se a FRELIMO era irredutvel nos seus pontosprogramticos, de que a independncia no era negocivel e apenas

    se poderiam discutir os mecanismos e um calendrio para a mesma,

    j o novo poder de Lisboa vivia no encanto de ter encontrado a

    liberdade e a democracia, sem saber como resolver a questo

    africana. Por todos, cite-se o conceituado filsofo Eduardo Loureno,

    que escreve ainda a revoluo portuguesa estava no seu adro:

    notrio que uma parte da nossa classe poltica e a opinio com ela

    solidria, absorvidas j pelas delcias do partidarismo interno, age

    como se "pesadelo africano" tivesse terminado na manh do 25 de

    Abril418.

    As primeiras declaraes sobre esta matria do presidente da

    Junta, Antnio de Spnola, a 29-4-74419

    , durante uma conferncia de

    imprensa sobre a descolonizao, eram pouco ou nada claras. Spnola

    traava uma distino entre a autodeterminao, ou seja, o direito de

    cada povo escolher os seus destinos e a independncia que

    corresponderia a uma vontade de um povo. Eram, pois, duas vias

    distintas e para que fossem definidas haveria que realizar um

    plebiscito em que um povo deve estar de posse de um nvel cultural

    mnimo para saber escolher. Spnola tinha em mente, nas suasprprias palavras, acelerar o processo ultra-

    418 Escrito datado de 20-6-1974 publicado em O Fascismo nunca Existiu.419 Publicadas noDirio de Lisboa e transcritas noNotcias da Beira n. 8834, de 30-4-74.

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    278 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    marino que permita ao povo autodeterminar-se sob a bandeira

    portuguesa.

    Em face da confuso de mensagens contraditrias que chegavam

    de Lisboa e da evoluo poltica aps o golpe, Samora Machel

    convoca o Comit Executivo, a 3 de Maio de 1974, para nova anlise

    da situao poltica aberta com o golpe de Estado. A estratgia

    adoptada clara: a paz inseparvel da independncia nacional.

    No haveria lugar a nenhum cessar-fogo, sem que aquele direito

    fosse inequivocamente reconhecido.

    E diga-se que as mensagens vindas do novo poder em Lisboa

    apenas vinham a reforar a posio adoptada pela FRELIMO. A 4 de

    Maio, o novo comandante-em-chefe das Foras Armadas portuguesas

    e membro da Junta de Salvao Nacional, Costa Gomes, aterra em

    Luanda. As suas declaraes so bastante explcitas420

    : nossa

    inteno continuar a lutar contra os guerrilheiros e essa posio

    manter-se- at que os guerrilheiros aceitem a nossa oferta para depor

    as armas e se apresentarem como partido poltico. No dia seguinte,

    volta ao mesmo tema: se tais movimentos so realmente a expresso

    do povo, como se afirmam, deixem as clandestinidades, as suas sedes

    alm-fronteiras e venham lutar democraticamente com ideias.

    Acompanhado de outro membro da Junta, Diogo Neto421

    , Costa

    Gomes chega capital moambicana a 10 de Maio. Em confernciade imprensa, j com mais reservas, torna a afirmar

    422: teremos, no

    entanto que admitir que existem organizaes chamadas

    emancipalistas com chefes polticos e militantes com as suas ideias e

    as suas armas que dominam parcelas do territrio moambicano. A

    essas organizaes propomos negociaes imediatas, sem condies

    prvias, sem entregas simblicas de

    420Notcias da Beira n. 8838, de 8-5-1974.421 At data da sua nomeao era comandante da Fora Area em Moambique.422

    Noticias da Beira n. 8845, de 12-5-1974.

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    A REVOLUO PORTUGUESA E O COLONIALISMO DEMOCRTICO 279

    armamento. Colocado perante a eventualidade de a FRELIMO no

    aceitar essa via, responde: lutaremos com uma misso mais bela e

    enobrecida. Pouco tempo depois, tentando justificar a intensificao

    dos combates, o general declara que o presente esforo guerreiro da

    FRELIMO, pode resultar da necessidade interna de conseguir uma

    coeso atravs do exerccio da luta423

    .

    O professor Palma Carlos, primeiro-ministro do 1. Governo

    Provisrio, em Lisboa, em entrevista ao Dirio Popular, afirmava:

    o problema do Ultramar dramtico e altamente preocupante. Est

    apontado o caminho para a autodeterminao. Mas porque forma

    que se vai fazer a autodeterminao? A que resultados ela levar?

    A luta armada recrudesce. Ultimam-se os preparativos para a

    abertura da Frente da Zambzia. Se, de um lado, h a certeza da

    vitria e so recebidos, nos campos de treino, cada vez mais jovens

    empenhados em derrubar o colonialismo, do outro lado, existe a

    vontade de acabar a guerra o mais rapidamente possvel.

    Em face destas mensagens contraditrias que vm sendo recebidas

    de Lisboa, e depois de goradas as primeiras conversaes de Junho,

    Samora Machel decide enviar a Lisboa um velho companheiro de

    Argel, o jornalista Aquino de Bragana, com uma misso: identificar

    quem na realidade detinha o poder em Portugal.

    Aquino, que iniciou as suas actividades polticas na CONCP comorepresentante das colnias portuguesas na ndia, era um jornalista com

    nome feito, sendo conhecidos os seus artigos na revista Afrique-Asie

    publicada em Paris. Parte para Lisboa e dirige-se redaco do

    Expresso, onde se apresenta a Augusto de Carvalho, ento chefe de

    redaco deste semanrio. Diz-lhe ao que vem e este, sem hesitaes,

    decide apresent-lo ao ncleo do movimento das Foras Armadas:

    Victor Alves e Ernesto Melo

    Notcias n. 16 181, de 29-6-74.

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    280 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    Antunes. Era este ncleo que na realidade detinha o poder em

    Portugal. Estava encontrada a ponte para que as conversaes

    tivessem efeito til.

    curioso que igual movimento feito pelos servios norte--

    americanos em Moambique. Sentem que o novo governador--geral

    do Governo Provisrio no representa qualquer poder, e partem para

    Nampula para falar com representantes do movimento militar.

    Encontram-se a 28 de Junho com o major Mrio Baptista Tom,

    reputado lder do Movimento das Foras Armadas em Moambique.

    Alto, loiro, cerca de trinta anos, de Estremoz, Portugal, que

    confidencia que a FRELIMO o nico partido que pode dizer-se

    representativo de quem quer que seja. Declara-lhes a oposio dos

    militares realizao de um referendo e defende imediatoreconhecimento do GOP (Governo portugus) da independncia de

    Moambique424.

    As linhas de fora estavam encontradas. As nicas negociaes

    seriam entre os militares portugueses, autores do golpe de Estado, e a

    FRELIMO. E passaram a ser secretas, no por vontade dos

    moambicanos, mas por desejo expresso da parte portuguesa, em face

    da luta de poderes instalada no seu pas, a comear na prpria

    governao.

    Telegrama confidential do Consulado de LM para o secretrio de Estado, R01130zJUL74.

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    Democratas da FRELIMO

    Aliados de peso para a FRELIMO, durante os meses que se

    seguiram ao golpe de Estado, foram os Democratas deMoambique. Congregavam um grupo muito heterogneo. O seu

    ncleo duro era composto pelos advogados Carlos Adrio Rodrigues,

    Camilo Pereira Leite, Rui Baltazar, Victor Serraventoso, Carlos

    Raposo Pereira, agrupando outras figuras como Mrio da Graa

    Machungo, Malangatana Valente, Amaral de Matos, Filipe Ferreira,

    Eugnio de Lemos, Ana Margarida Oliveira. Havia nesse ncleo no

    s longas amizade, mas tambm o compartilhar de um caminho

    poltico coerente contra o sistema, destacando-se alguns dos

    advogados pela coragem na defesa de presos polticos.

    Constituram conscientemente um grupo de aco poltica que

    actuou sempre em consonncia com a FRELIMO nas zonas urbanas,

    especialmente na capital e na Beira. Funcionaram como um porta-voz

    no oficial e recuado da FRELIMO, fazendo frente aos diversos

    partidos polticos que se constituam, no permitindo a aco do

    Governo Provisrio, ou de qualquer outro governo que no tivesse o

    reconhecimento prvio dos dirigentes da FRELIMO.

    Os Democratas de Moambique estavam, inicialmente,

    organizados em associaes regionais. Havia assim os democratas de

    Loureno Marques, da Beira, de Quelimane, de Tete, etc. Depois, .a26 de Maio, decidem unificar-se nos Democratas

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    MUDAM-SE OS TEMPOS MAS NO AS VONTADES 293

    de Moambique435

    . E o local escolhido no podia deixar de ser a

    Beira.

    O objectivo dessa unificao era dar um maior entrosamento

    aco poltica urbana. E, novamente nesta deciso, no ter sido

    estranha a aco dos idelogos da FRELIMO, que sempre pugnaram

    pela unidade da aco das foras polticas anticoloniais, sobretudo

    quando actuassem no interior do pas. Em comunicado divulgado no

    final desse encontro, os Democratas tornam pblico que no seu

    objectivo constiturem-se como um grupo poltico em Moambique.

    Afirmam-se como um contrapoder, manifestando-se contrrios

    tentativa de se criarem terceiras foras, porque desnecessrias, na

    medida em que o nico objectivo era assegurar as conversaes entre

    a FRELIMO e o Governo portugus sobre os mecanismos da

    transferncia de poderes436

    .

    Entre os membros dos democratas, grupo de tendncias polticas

    muito amplas, estavam militantes da FRELIMO na clandestinidade.

    Os dirigentes da FRELIMO convidam-nos para rumar para

    Naschingwea. Atraem velhos e novos aliados. Do-lhe o apoio

    necessrio para a sua aco no interior de Moambique. Alguns deles

    percebem que na conjuntura vitoriosa poderiam ser fortes candidatos

    a lugares de direco na futura governao e na administrao da

    coisa pblica, como veio a acontecer. O futuro apresentava-sepromissor. Da que ao ncleo duro se juntem democratas de ltima

    hora, que no esto preparados nem para as dificuldades que no

    previram nem muito menos para o estilo da FRELIMO.

    Os seus esforos so publicamente reconhecidos pelo presidente

    Samora Machel, que lhes enviou uma mensagem amplamente

    divulgada: A FRELIMO tem seguido com ateno a aco

    Conforme comunicado publicado noNotcias n. 16150, de 27-5-1974. A reunio congregou

    os ncleos de democratas de Loureno Marques, Beira, Vila Pery, Quelimane e Nampula.

    Comunicado publicado na edio doNotcias referenciada na nota anterior.

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    294 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    desenvolvida pelos Democratas de Moambique aps o 25 de Abril.

    A FRELIMO deseja saudar a actividade desenvolvida por vs, que se

    integra plenamente na justa luta do povo moambicano pela

    conquista dos direitos fundamentais liberdade e independncia

    total e completa de Moambique.

    No mesmo sentido, a 4 de Julho, Jorge Rebelo, membro do

    Comit Executivo da FRELIMO, em entrevista Rdio Tanznia, ao

    responder pergunta qual a posio da FRELIMO sobre os

    Democratas de Moambique?, declara: Ns consideramos que as

    actividades do grupo dos Democratas de Moambique so correctas.

    Este grupo recusou constituir-se como um Partido, limitando-se

    apenas conscincia do Povo, no sentido da independncia de

    Moambique, sob a bandeira da FRELIMO. Eles tm o nosso apoio.

    Os Democratas congregaram um dio mortal dos ps negros.

    Tinham sede num prdio na Avenida 24 de Julho, eram localizveis e

    identificveis. Nas primeiras horas que se seguiram revolta dos

    colonos aps a assinatura dos Acordos de Lusaka, a 7 de Setembro,

    foi assaltada e incendiada a sede dos Democratas e inicia-se a caa

    ao homem. A sorte para muitos estarem em Lusaka. Outros,

    prudentemente, tomam refgios seguros at ao fim da revolta.

    Conforme se esperava, no final das negociaes entre a Frente de

    Libertao e o Governo portugus, os Democratas, enquanto tal,desapareceram da cena poltica. Alguns dos seus destacados membros

    passaram a exercer funes pblicas no Governo de Transio.

    Outros no resistem ao trauma dos tumultos do 7 de Setembro, e

    saram envergonhadamente de Moambique, iniciando uma marcha

    que os levou, quase todos, a rumarem para Portugal. Mas cumpriram

    com eficincia a sua misso durante o perodo que se seguiu ao golpe

    de Estado at assinatura dos Acordos de Lusaka.

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    GUMO, FICO ou CAVO?

    No perodo de Junho a Agosto de 1974, em Moambique, foram

    constitudos mais de vinte partidos polticos. Na sua maioria duraram

    o tempo respeitante ao seu acto de divulgao nos meios da

    comunicao social. Alguns congregam pequenos grupos de pessoas

    com uma tremenda ingenuidade poltica, tendo como agenda a

    procura de protagonismo.

    H partidos para todos os gostos e tendncias. Desde a Liga

    Internacionalista Socialista, ao MIMO446

    ao MONA447

    , ao monr-

    quico MUR, dirigido por Pedro Mondlane, que alm de ter sido vogal

    na Junta Provincial, reivindica relaes de parentesco com a casa real

    suazilandeza, defendendo a desnecessidade de partidos, porque

    divididos como podemos construir Moambique?448

    , aoMovimento Moderado Moambicano

    449, ao nampulense e mais que

    efmero Partido Democrtico Afro-Lusitano450

    , ao

    Liderado pelo mdico David Ferreira, cujo programa preconizava um cessar-fogo e con-

    versaes entre moambicanos, sem diferenas tnicas, sob a gide do secretrio-geral

    das Naes Unidas.O MONA, cuja presidncia (e talvez nico membro activo) pertencia a um ilustre

    desconhecido na cena poltica moambicana, de nome Domingos Cardoso, foi constitudo a

    19-5-1974. Pouco depois, transforma-se em MONAUMO Movimento Nacional

    Unificado de Moambique, preconizando um modelo de estado federativo, dentro das

    tradies da civilizao lusada e na preferncia da cultura ocidental. Conforme afirma

    aoNotcias, na sua edio n. 16205, de 23-7-74. Liderado por Hermnio Subtil Serra, que

    rejeita solues tomadas unilateralmente na metrpole, pretende dar voz maioria

    silenciosa, os moderados que em geral no se manifestam, propondo relativamente ao

    futuro da colnia uma forma federativa. Criado em Nampula, pelo professor Miguel

    Dantas, prope a unificao de todos os parfidos emergentes, no seu partido, para defesa do

    bem de todos.

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    MUDAM-SE OS TEMPOS MAS NO AS VONTADES 305

    beirense PRUMO451

    , ao Congresso Nacional Africano de Mo-

    ambique452

    , ao renascido Lzaro Kavandame que constitui o

    UNIPOMO e realiza um comcio em Pemba, com uma muita

    reduzida assistncia, na sua maioria de raa branca.

    De todo este vasto leque, o nico partido que se diferencia de

    todos os outros ser o GUMO. Tem uma agenda definida j antes do

    golpe de Estado e integra personagens marcantes.

    J vimos que Mximo Dias e Joana Simeo procuravam nos

    incios de 1974 constituir uma associao cvica, o GUMO, que

    actuaria como um grupo de presso, reclamando o estatuto de uma

    FRELIMO de dentro. O GUMO, nas palavras do seu presidente,

    era fruto das injustias sociais, incidentes particularmente na

    populao negro-mestia moambicana.

    Em finais de Fevereiro de 1974, o ncleo fundador havia com-

    pletado os estatutos. Reuniu-se a 27 desse ms, no pouco discreto

    Hotel Polana, para discusso da estratgia a adoptar: enviar os

    estatutos para aprovao directa do governador-geral, ou fazer a sua

    entrega prvia ao professor Marcelo Caetano. Um informador da

    PIDE, bem localizado nos sales do hotel, regista para a posteridade

    esse debate, bem como a opinio expressa sobre o governador-geral,

    que deveria ser substitudo por um homem mais clarividente e

    realista capaz de interpretar, nas suas verdadeiras dimenses, aproblemtica deste vastssimo territrio.

    O governador-geral, pouco entusiasmado com eventuais mo-

    vimentos que colocassem em causa o estado das coisas, solicitou

    parecer PIDE. Esta prev a pouca adeso que o GUMO teria entre a

    populao.

    Como organizao poltica, estava preparado e, por isso, depois do

    golpe de Estado em Portugal, foi o primeiro grupo a vir

    Constitudo por Nunes de Carvalho e Armindo Brito, dirigentes da AssociaoComercial da Beira.Dirigido por Antnio Baslio Calisto Makubule, que reclama a independncia nacional.

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    306 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    tona de gua. Na Beira, em conferncia de imprensa, a 29 de Abril,

    atravs de Mximo Dias e de Joana Simeo, apresenta-se

    publicamente. Divulgou um manifesto em que historiava a sua

    origem e propunha um programa poltico.

    Entre os objectivos propostos conta-se a obteno de uma

    autonomia poltica progressiva, dentro das instituies polticas

    vigentes no espao portugus. Essa autonomia seria realizada

    atravs de meios legais e do dilogo permanente com os res-

    ponsveis, defendendo a realizao de eleies. O GUMO pugna

    por uma comunidade luso-moambicana e a participao activa

    da comunidade negro-mestia na estrutura econmica

    moambicana.

    Decide passar das palavras prtica e realiza dois comcios que

    acabam violentamente. O primeiro em Loureno Marques, no

    Xipamanine, frente Igreja Joo Albasini, no dia 4 de Maio.

    Estariam presentes vinte mil pessoas. Tratava-se de um acon-

    tecimento. Joana Simeo, oradora principal, precisou com mais

    pormenor o seu programa: membros do GUMO tm que entrar na

    Assembleia Nacional em Lisboa como deputados e na Assembleia

    Legislativa em Moambique. A aparelhagem sonora em nada

    ajudava a entender os oradores. Havia, entre os presentes curiosos,

    aderentes, mas sobretudo oponentes. As vozes que mais se faziamouvir eram rua e fora, GUMO. A experincia termina com

    desacatos, sendo mesmo necessria a interveno das foras policiais

    para restabelecer a lei e a ordem.

    Era uma mensagem clara de que os tempos no estavam para

    partidos emergentes que transmitissem uma mensagem diferente da

    FRELIMO.

    Cientes da falta de adeso na capital e aproveitando a visita do

    general Costa Gonles, membro da Junta de Salvao Nacional,

    Beira, os dirigentes do GUMO rumam para aquela cidade

    promoyendo um outro comcio no lendrio bairro da Munhava,

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    MUDAM-SE OS TEMPOS MAS NAO AS VONTADES

    a 12 de Maio. Se a confuso gerada em Loureno Marques foi

    grande, na Beira ultrapassou as marcas, obrigando actuao da

    polcia civil e militar que tiveram srias dificuldades em dominar a

    situao453

    . O contexto da confuso era outro. Era um conflito

    racial, sendo a agitao promovida pelo habitual ncleo de beirenses

    brancos opostos a qualquer mudana. A confuso termina no palcio

    do governador, onde estava hospedado o general Costa Gomes,

    enfurecido com a situao. Queria calma e no acicatar nimos

    raciais.

    Joana Simeo comentou imprensa: os acontecimentos tu-

    multuosos na Munhava entristecem todos aqueles que acreditam na

    viabilidade de uma convivncia racial em Moambique. A hora no

    para excitados, nem para provocadores454. S que os nimos

    estavam exaltados.

    A ltima reunio pblica promovida pelo GUMO decorreu a 22 de

    Maio, em Quelimane, num ambiente mais calmo e ordeiro,

    provavelmente porque menos concorrido e talvez porque a Dr.aJoana

    Simeo estava ausente, procurando apoios na Europa, tendo tido um

    encontro com o general Costa Gomes.

    O programa do GUMO, tal como a sua praxis, estavam desa-

    justados das perspectivas criadas com a ruptura provocada pela queda

    do regime. Poderia ter alguma validade no perodo anterior, no maisao nvel do novo contexto poltico. No agradava nem a gregos nem a

    troianos.

    Acresce que os meios de informao ser-lhe-o completamente

    hostis, e a FRELIMO, atravs das suas emisses j sem interferncias

    e com cada vez maiores audincias, no lhe d descanso nas crticas,

    sobretudo relativamente a Joana Simeo.

    Trs dias depois do comcio da Beira, o Dr. Mximo Dias publica

    uma carta afirmando que o GUMO a FRELIMO implantada

    453Notcias n. 16 136, de 13-5-1974.454Notcias da Beira n. 8846, de 13-5-1974.

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    308 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    em Moambique e consideramos a existncia do GUMO como uma

    vitria da FRELIMO. Entende que uma vez concretizada a

    independncia, atravs de negociaes entre o governo portugus e a

    FRELIMO, o GUMO dar por concludo o seu trabalho, porque

    nessa altura a paz ser uma realidade e o objectivo do GUMO est

    alcanado.

    Era um claro piscar de olhos do Dr. Mximo Dias FRELIMO. A

    sua correlegionria Joana Simeo no ficou satisfeita com esta

    posio. Reclamava uma postura mais activa e dirigiu-se a Paris para

    se encontrar com o dirigente da FRELIMO Armando Panguene.

    Tinha um objectivo, estabelecer uma aliana entre o GUMO e a

    FRELIMO. Bateu porta do hotel da capital francesa onde Panguene

    se alojava, participando numa conferncia internacional. Mas desta

    vez a porta no se abriu. Numa jogada de antecipao, atravs da

    agncia noticiosa francesa France-Press, Joana Simeo afirma ter tido

    resultados positivos.

    Jorge Rebelo, secretrio do Departamento de Informao e

    Propaganda da FRELIMO, envia a 1 de Junho uma mensagem rdio

    destinada a Rafael Maguni, para ser difundida nas emisses da Voz

    da FRELIMO, desmentindo contactos entre Joana Simeo e aquela

    organizao. Sublinha ser tctica do GUMO mostrar-se ligado

    FRELIMO para tentar assim uma qualquer credibilidade. E que aFRELIMO nunca teve nem nunca ter qualquer relao com grupos

    ou indivduos ao servio do colonialismo como o GUMO.

    Face s discrepncias de programas e s acusaes cada vez mais

    persistentes de que a Dr.aSimeo era agente da PIDE, instituio que

    despertava dios imediatos, a 9 de Junho o Dr. Dias, na qualidade de

    presidente do GUMO, suspende a vice-presidente Joana Simeo at

    completa averiguao sobre o seu passado poltico. Esta no

    espera pelas investigaes e demite Mximo Dias do GUMO. Com

    bom senso, em tempos conturbados,

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    MUDAM-SE OS TEMPOS MAS NO AS VONTADES 309

    o Dr. Mximo Dias, em conferncia de imprensa de 16 de Junho,

    informou que a deciso de Joana Simeo era nula pois s a As-

    sembleia Geral o poderia fazer.

    Ainda durante este perodo de dissidncia, a Dr.a Joana Simeo

    apercebe-se de que tem de reunir foras e regressou sua terra natal,

    Nampula, onde anuncia, em conferncia de imprensa realizada a 23-

    6-1974455

    , a realizao de um Congresso do Povo Moambicano,

    agregando chefes tradicionais, religiosos da etnia macua. Nessa

    conferncia declara guerra aos Democratas que, segundo ela, s

    tm espalhado dio e a desunio entre os moambicanos e apela

    congregao das foras polticas pacficas dentro de Moambique

    [...] para obter a independncia atravs de um dilogo franco e aberto

    com Spnola, usando o processo democrtico do referendo.

    Ciente de que o tempo escasseia, Joana Simeo, sfrega, no

    espera por batalhas jurdicas sobre as competncias de rgos

    internos do GUMO e decide formar uma nova organizao a

    FRECOMO. O seu velho companheiro, estivador de profisso,

    Cassamo Dade, acompanha-a como responsvel pela classe

    operria.

    A 3 de Julho de 1974, na sequncia de uma assembleia-geral

    realizada na Beira, o GUMO declara a sua dissoluo, pois a exis-

    tncia de uma terceira fora em Moambique visa impor o neo-colonialismo. Da sua nascena morte poltica passaram exacta-

    mente 65 dias. Autoliquidou-se por mrito ou demrito prprio. Ao

    extinguir-se terminavam, em definitivo, as possibilidades tericas de

    efectuar qualquer referendo relativo independncia, e da realizao

    de eleies a que a FRELIMO sempre se ops e que a realidade dos

    acontecimentos de forma alguma possibilitava, apesar da legitimidade

    poltica da prpria Frente de Libertao.

    Notcias n. 16 176, de 24-6-1974.

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    310 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    Em sentido oposto, e como nota histrica, ter-se- de fazer

    referncia ao FICO. Foi um movimento poltico nascido por acaso,

    durante uma manifestao realizada na cidade de Loureno Marques,

    no dia 5 de Maio, na praa Mouzinho de Albuquerque. Um grupo de

    colonos gritou bem alto a sua determinao de permanecer em

    Moambique, em oposio queles, cada vez mais numerosos, que

    decidiram no esperar e rumaram para outras paragens, denominados

    a partir de ento como CAVO. Mas a diminuio da populao

    portuguesa em Moambique era anterior queda do regime.

    Nmeros de 1973 indicam a sada de cerca de 10% do total da

    populao branca, avaliada no seu mximo, na colnia, em 250 mil

    pessoas.

    Da manifestao espontnea h quem tire dividendos imediatos.

    No dia seguinte, esses convocam uma outra reunio pblica para

    apresentarem a constituio do FICO, atravs da distribuio de um

    manifesto. FICO passa a significar Frente Independente de

    Convergncia Nacional. Os seus dirigentes so Pires Moreira, Gomes

    dos Santos, Arlindo Malosso e Artur Ferraz de Freitas.

    Era um movimento do tipo dos ps negros da Arglia, sem a

    fora que estes tiveram. O seu manifesto prova da confuso de

    ideias que paira nos seus mentores e da sua fragilidade poltica.

    Excepto no abaixo a guerra e morra a FRELIMO. Com umaressalva de que se esta se constituir Frente livre, de dilogo aberto,

    sem armas na mo, teria o reconhecimento do FICO. No esto

    preparados para nenhuma mudana, antes esto preparados para a luta

    e dizem-no publicamente. O jornal sul-africano Star, na sua edio de

    1 de Junho, d conta do encontro que manteve com Gomes dos

    Santos, que alm de ser campeo de tiro ao alvo tinha uma empresa

    de compra e venda de carros usados. O jornalista escreve: na

    agitao poltica que se seguiu ao movimento militar, os europeus em

    Moambique esto a formar

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    MUDAM-SE OS TEMPOS MAS NO AS VONTADES 31 |

    grupos ricos e enrgicos que possam servir de bias de salvao para

    a sua sobrevivncia. Concluso demasiado genrica.

    Alm de produzirem vrios boletins intitulados Ficar-Convivendo,

    namoram o general Spnola para que fosse efectuado um referendo

    com vista a uma autodeterminao e que o general os considerasse

    como uma fora a ter em conta na tomada de decises sobre

    Moambique.

    Manuel Gomes dos Santos por duas vezes se encontrou com o

    consulado norte-americano em Loureno Marques. Deu a conhecer o

    programa do FICO e solicitou um emprstimo para assistncia

    financeira ao FICO. Para espanto do adido de defesa norte-

    americano, impe condies ao seu pedido, porque Moambique

    no estava venda e no aceitava condies que comprometessem

    a liberdade de deciso. O nico comentrio do consulado norte-

    americano a constatao de que embora o FICO se proclame

    multirracial, na sua direco s existem brancos.

    O FICO inimigo confesso dos Democratas, dos estudantes

    contestatrios e de todos os que estivessem prximos da FRELIMO.

    Partilhavam ideias comuns com o Movimento Federalista Portugus,

    dirigido em Moambique por Vasco Teixeira Alves Cardiga.

    Enquanto estes movimentos polticos se digladiavam entre si, a

    Dr.a

    Joana Simeo, como lder da FRECOMO, parte, nos finais deJunho, com Baslio Calisto Mokubule, dirigente do Congresso

    Nacional Africano de Moambique, para Blantyre para se avistar com

    o outrora seu aliado, o presidente da COREMO, Paulo Gumane. Num

    encontro promovido pelo presidente Banda, em comunicado de 1 de

    Julho de 1974, Joana Simeo d conta da aliana que a FRECOMO

    havia estabelecido com a COREMO e da chegada para breve do

    reverendo Uria Simango a Moambique.

    Por outro lado, Artur Vilankulos, dirigente da COREMO, que

    depois de 13 anos regressa a Moambique, ao ser questionado

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    3 12 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    sobre a aliana com a FRECOMO afirma: O passado passado [...]

    temos ouvido falar muito da actividade da camarada Joana e

    chegamos concluso de que devamos colaborar, apelando ao

    Governo portugus para no cometer o erro de negociar a paz ou a

    independncia de Moambique s com uma das partes.

    Em meados de Agosto forma-se o Partido da Coligao Nacional.

    Em conferncia de imprensa realizada num hotel da Beira, a 24 de

    Agosto, Uria Simango divulga os quatro pontos do novo partido: um

    processo democrtico sobre o destino de Moambique;

    negociaes com todas as partes; afirmao do multirracialismo e um

    cessar-fogo, feito atravs de um convite paz.

    O processo de independncia j se encontrava concludo entre o

    Governo portugus e a FRELIMO. A tentativa do PCN no peca s

    por ser demasiado tardia, mas tambm porque no encontra adeso.

    As razes so simples: a FRELIMO tinha, ao longo de doze anos,

    estabelecido uma credibilidade externa e conseguido ganhar a

    simpatia do povo moambicano na causa pela independncia. Soube

    manter a sua estrutura.

    No momento da rendio do professor Marcelo Caetano aos

    militares, no quartel do Carmo, em Lisboa, o poder, em Moambique,

    estava merc da FRELIMO.

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    As mudanas inacreditveis

    Para a comunidade internacional, o fim do regime de Caetano e os

    propsitos dos militares que assumiram o poder afirmando que asoluo do Ultramar era poltica e no militar foi um alvio.

    Sobretudo para os aliados tradicionais de Portugal. A queda da

    ditadura punha termo inconvenincia cada vez maior de tratar nos

    diversos fruns com o ltimo reduto dos imprios coloniais. Por isso

    no tardou o reconhecimento do novo regime de Lisboa, pelos

    estados europeus, pelos EUA e o restabelecimento das relaes

    diplomticas com a URSS456.

    A frica reage de forma mais cautelosa, com excepo da frica

    do Sul que sem demoras reconhece o novo poder457. A soluo do

    golpe militar na vida poltica portuguesa, como forma de terminar as

    guerras africanas, era um dado adquirido por parte da polcia secreta

    do apartheid. O primeiro-ministro sul--africano B. J. Vorster458, no

    dia imediato ao golpe, afirmou que as mudanas em Portugal

    afectariam a frica do Sul e que haveria que as enfrentar. Tanta

    celeridade do apartheid, em face das

    A 29 de Abril, o Departamento de Estado envia um questionrio ao embaixador de Portugalem Washington. Entre as vrias questes estavam as implicaes na mudana em relao

    poltica africana. O diplomata respondeu que o novo regime era favorvel ao princpio daautodeterminao dos povos africanos. Telegrama do Departamento de Estado, de 29-4-1974, referenciado como P292131Z APR 74.A 28 de Abril de 1974, atravs de declarao pblica do ministro dos Negcios Estrangeirosda frica do Sul, Dr. Hilgard Muller.Afirmaes proferidas no discurso de vitria eleitoral das eleies realizadas a 24 de Abril.

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    316 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    intenes dos novos governantes portugueses, suscitou dvidas sobre

    os reais intentos anticoloniais de Lisboa. Apesar dessas suspeies, o

    posicionamento de Pretria mostrou-se benfico para o processo de

    descolonizao em Moambique. Foi uma das agendas mais

    complexas do processo negocial e imps um comportamento a

    Pretria, afastando-a de solues belicistas, to ao gosto dos falces

    do Ministrio da Defesa sul-africano, que se vm a demonstrar pouco

    depois com a invaso de Angola.

    As primeiras reaces dos pases da OUA partem da Zmbia. Na

    noite de 25 de Abril, Mark Chona janta na residncia do nncio

    apostlico em Lusaka. E tem uma longa conversa com a embaixadora

    norte-americana, Jean Wilkowski, sobre o tema da noite: o golpe em

    Lisboa e os cenrios que se poderiam desenhar para uma novapoltica africana459. Chona acreditava que o golpe seria uma sada

    poltica para as colnias portuguesas, terminando a escalada militar.

    Havia mesmo, durante a tarde, discutido acaloradamente o tema com

    o presidente Kaunda, traando objectivos e os termos que seriam

    minimamente aceitveis para que o novo Governo portugus pudesse

    iniciar negociaes com vista independncia dos territrios

    africanos sob sua administrao.

    No dia seguinte o Daily News460, influente jornal que expressava

    habitualmente as opinies do Governo de Lusaka, defendia que ogolpe de Estado em Portugal no era importante s na histria de

    Portugal, mas tambm na histria africana, pois representava um

    ponto de viragem na luta de libertao dos povos das colnias

    portuguesas. O seu autor era Mark Chona. Inteligentemente antev o

    efeito em cadeia que se ir repercutir, a mdio prazo, no fim do poder

    branco na frica Subsariana. Haveria que imprimir uma dinmica ao

    processo, porque o factor mais crtico

    459 Telegrama da Embaixada dos EUA na Zmbia, referenciado PR261510Z APR 74, comdata de 26-4-1974.

    460 Edio de 26-4-1974.

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    AS NEGOCIAES: MOAMBIQUE E O SEU FUTURO 3 17

    para frica no era o golpe em si, mas sim a urgente iniciativa que

    os pases africanos independentes teriam que fazer [...] para que os

    ventos da mudana soprassem na direco certa nas colnias

    portuguesas africanas. O dilogo com Lisboa deveria ser

    estabelecido de imediato461. A Zmbia, mais uma vez e com toda a

    fora, oferece-se para ser a mediadora nas negociaes vista.

    Nesse sentido, Mark Chona, fazendo jus alcunha do Kissinger

    africano, chama ao seu gabinete, a 3 de Maio, a embaixadora norte-

    americana para lhe transmitir, em nome do presidente Kaunda, a

    necessidade urgente de se iniciar o dilogo entre Spnola e os

    movimentos de libertao, de forma a no se perder a oportunidade

    de uma soluo poltica e para prevenir a criao de um vcuo no

    qual os soviticos e os sul-africanos se pudessem mover emdetrimento de futuros interesses, incluindo os dos portugueses. Com

    a ajuda do seu pas, da Tanznia e outros pases africanos, seria

    possvel obter um acordo com vista autodeterminao. Chona

    adianta que j tinha contactado Samora Machel e que este estava

    pronto a encontrar-se com o Governo de Spnola. Solicita a

    Washington que persuadissem Spnola a negociar e que

    desencorajassem uma interveno sul-africana.

    Na mesma data, em Dar-es-Salam, durante uma conveno

    selectiva dos Lions, o vice-presidente tanzaniano, Eelude Jumbe,afirma que nada faria parar as guerras nas colnias portuguesas seno

    a independncia. Rejeita as teses de Spnola expostas no livro

    Portugal e o Futuro. As palavras ostensivas de Jumbe vm a ser

    buriladas pelo director de frica e Mdio Oriente do MNE, Paul

    Rupia, que faz questo de afirmar ao embaixador norte-americano na

    Tanznia que o presidente Nyerere estava disposto a usar a sua

    influncia para que a FRELIMO negociasse com o novo Governo de

    Lisboa, no esprito do Manifesto de

    461O editorialista defende que deveria ser o presidente em exerccio da OUA, o chefe de Estado daNigria, general Gowana, a tomar a iniciativa, para futuras negociaes.

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    318 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    Lusaka462, mas que iria impor que os movimentos de libertao

    participassem nas negociaes.

    Coincidncia ou no, tambm a 3 de Maio o presidente Banda

    entra na lia para se pronunciar sobre o novo poder em Portugal.

    Numa rara conferncia de imprensa, afirma que esperava do novo

    Governo portugus surpreendentes mudanas. Mudanas

    inacreditveis. Questionado sobre o calendrio dessas mudanas no

    especifica datas, mas astutamente afirma que a rapidez das mesmas

    poderiam ser influenciadas pelo seu pas. Nesta fase, Banda

    recomenda que era necessrio pacincia e conteno. E, para que

    no se duvidasse dos seus sentimentos anticoloniais, afirma que

    havia dito no passado aos portugueses, cara na cara, que a sua

    poltica era um contra-senso463. Acresce que para o primeiropresidente do Malawi, as relaes com Portugal no seriam afectadas

    pelo golpe tal como nos tempos dos governos de Salazar e

    Caetano. Um tremendo erro de anlise.

    No cmputo geral h uma profunda desconfiana dos dirigentes

    africanos sobre os propsitos da Junta militar que assumiu o poder

    em Portugal, acerca da nica matria que lhes interessa: o futuro das

    colnias portuguesas em frica.

    Este ambiente de desconfiana est patente numa conversa havida

    entre o embaixador norte-americano em Dar-es-Salam e o secretrioexecutivo da OUA, brigadeiro Hashim Mbita, nos jardins da

    Embaixada da Holanda na capital tanzaniana464.0 militar manifestava

    srias apreenses quanto agenda africana do general

    O Manifesto de Lusaka foi um documento aprovado na V Cimeira de Alto Nvel dosEstados da frica Central e Oriental, a 15 de Abril de 1969. Foi confirmado pela ONUe pela ONU. Aceitava princpios de negociao para a resoluo das questes coloniaisno continente.Daily News, de 4-5-1974.Comemorava-se o dia nacional da Holanda. Na conversa juntaram-se o alto comissrio

    britnico e o encarregado de negcios da ndia que alinharam na mesma atitude deconfiana de um novo cenrio que se iria definir, de acordo com o embaixador norte--americano

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    AS NEGOCIAES: MOAMBIQUE E O SEU FUTURO 319

    Spnola em relao poltica africana. Receava que os colabo-

    radores africanos nas colnias negociassem com os portugueses

    afastando os movimentos de libertao. Mbita afirma que no se

    deveria esperar muito tempo para que Portugal apresentasse uma

    soluo credvel, pelo que a OUA continuaria a pressionar.

    No esprito de manter a liderana do processo negocial e sabendo

    das boas relaes entre Portugal e o Malawi e do plano arquitectado

    com o Eng. Jardim, Kaunda faz, a 7 de Maio, uma curta visita ao

    Malawi para trocar impresses com Banda. Este faz do encontro uma

    visita de Estado. Era uma rara oportunidade para o reconhecimento

    africano da sua poltica. As ruas da cidade de Blantyre foram

    engalanadas a preceito. Uma multido previamente organizada,

    alinhada nas ruas, dava as boas-vindas a Kaunda. No final,

    comentando a visita, Banda465

    afirma que a iniciativa da visita tinha

    partido do presidente Kaunda. Afasta sem convico a possibilidade

    de que o seu propsito tenha sido abordar a mudana do Governo

    em Lisboa, at porque esse era principalmente um assunto dos

    portugueses e, como tal, um assunto da sua exclusiva competncia.

    No entanto, afirma que ns, no Malawi, no podemos estar

    indiferentes aos acontecimentos em Portugal, at porque estamos

    cercados por Moambique. Alm do mais as linhas de fronteiras eram

    artificiais, pois foram criadas pelo colonialismo. Aluso clara apretenses territoriais, caso a soluo poltica para Moambique fosse

    retalhar o pas.

    O activo Mark Chona, a 27 de Maio, avista-se novamente com a

    embaixadora norte-americana em Lusaka para lhe apresentar um

    programa de dez pontos, que resultava da reunio conjunta dos chefes

    de Estado da Tanznia, da Zmbia e do Zaire sobre o processo de

    negociaes com os movimentos de libertao. No caso de

    Moambique, no aceitam a realizao

    Daily News, de Blantyre, na sua edio de 8-5-1974.

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    320 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    de um referendo e desvalorizam a COREMO e o GUMO, como

    eventuais alternativas FRELIMO. No entanto, Mark Chona frisa

    que o FICO era um movimento perigoso. E no se enganou.

    Chona apela aos EUA para que apreciem as qualidades de

    Samora Machel como lder. Descreve-o como um homem modesto,

    humilde, simples, forte em fibra moral e em princpios, caso

    contrrio os presidentes Nyerere e Kaunda no lhe dariam apoio. E

    defende que a FRELIMO no era s uma organizao militar e

    respeitvel oponente ao exrcito portugus, mas tambm um partido

    poltico com real sentido de misso e de organizao capaz de

    governar Moambique numa base democrtica. Enfatiza o

    humanismo de Machel que recusou executar agentes infiltrados na

    organizao, contrariamente COREMO que havia morto seis civis a

    sangue-frio, em territrio zambiano.

    Machel descrito como no-comunista e insusceptvel de sofrer

    influncias, russas ou chinesas. Que os chineses eram mais espertos

    porque jogavam no sistema e os soviticos nas pessoas.

    A uma pergunta do embaixador sobre se os brancos eram tidos

    como potenciais inimigos, Chona respondeu que vrias vezes Kaunda

    tinha colocado a Machel a necessidade de integrar brancos no

    Governo, tal como a Zmbia tinha feito aps a independncia.

    Samora era um apologista de uma sociedade multirracial.Quanto COREMO e ao GUMO tinham mais interesse em

    publicidade do que em aco. Mark Chona pede ao embaixador que

    transmita a necessidade de os EUA, atravs da Embaixada de Dar-es-

    Salam, iniciarem contactos com os lderes da FRELIMO.

  • 7/25/2019 Livro - Moambique - 1974 - O Fim Do Imprio e o Nascimento Da Nao - Fernando Amado Couto

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    As outras foras e Lusaka, umasituao irreal

    Hoje, passados mais de trinta anos sobre as conversaes deLusaka, surgem muitas interrogaes. Porque razo as Naes Unidas

    no tiveram um papel activo no processo negocial? Como explicar,

    no contexto da Guerra Fria, que os EUA estivessem ausentes do

    processo negocial, sabendo que o resultado seria o reforo da URSS

    na Africa Austral? Quais as razes que levaram a que a frica do Sul

    do apartheid fizesse orelhas moucas s propostas de Ian Smith para

    invadir Moambique e parti-lo a sul do Zambeze? Como que um

    aliado natural de Portugal, o Malawi, se tornou um pas quase

    inimigo, quebrando-se as relaes diplomticas, numa atitude rara

    na histria da diplomacia portuguesa? Como se justifica que as ne-

    gociaes tivessem apenas envolvido o Governo portugus e a

    FRELIMO, excluindo todas as outras foras polticas do xadrez

    moambicano? Estas e muitas outras questes devem, em abono da

    histria, ser suscitadas. O tempo permite dar algumas respostas para a

    sua compreenso.

    Desde logo, afaste-se a teoria, que estranhamente tem ganho

    adeptos, de que o golpe militar do 25 de Abril se tratou de uma

    conspirao preparada pela URSS com o objectivo de se apoderar de

    Portugal e das suas colnias. Para alm de no corresponder aosfactos, no se adaptava agenda sovitica africana do ento

    presidente Brejnev. A importncia de frica era,

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    328 MOAMBIQUE 1974:0 FIM DO IMPRIO E O NASCIMENTO DA NAO

    para Moscovo, de natureza limitada. Mesmo no que se refere a

    Angola, a partir de 1975, sabe-se hoje que foi precipitada com a

    interveno cubana a pedido do MPLA, sem que os dirigentes do

    Kremlin a tivessem aprovado.

    A razo por que as negociaes para a independncia de Mo-

    ambique tiveram lugar entre o governo portugus a FRELIMO,

    excluindo outras foras polticas moambicanas, parece-nos su-

    ficientemente explicada nos captulos anteriores. Havia muitas

    agendas, mas no plano prtico nenhuma aco. Num pas em guerra,

    a paz discute-se entre os beligerantes e no com outras foras. Para

    alm de que a FRELIMO estava, no plano internacional, reconhecida

    quer pela OUA quer pelas Naes Unidas.

    Foi neste pressuposto que chegada a Lusaka para dirigir as

    primeiras conversaes o Dr. Mrio Soares afirma: O nico partido

    com o qual h que negociar o partido que toma parte na luta. Isso

    apenas realismo. Para acabar com uma guerra preciso chegar a

    acordo com aqueles que fazem a guerra.478

    A COREMO e as negociaes

    Analise-se a forma como a COREMO, a mais antiga e mais bem

    estruturada organizao, reagiu a esta nova conjuntura. Aquando dogolpe em Portugal, Faustino Kambeu, secretrio da Informao da

    COREMO479

    afirmou que era muito cedo para entender

    convenientemente o que aconteceu em Portugal, mas esperava que o

    golpe fosse um primeiro passo para a democracia. Aguardo que o

    novo Governo torne pblicos os seus pontos de vista sobre a poltica

    colonial para fazer juzos. Sobre a participao em conversaes,

    Kambeu afirma que a COREMO no participaria em nenhuma

    negociao, a no ser que significasse

    478Dirio de Noticias, de 6/6/1974.479 Telegrama'da Embaixada dos EUA, referenciado R271200ZAPR74, de 27-4-1974.

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    AS NEGOCIAES: MOAMBIQUE E O SEU FUTURO 329

    a independncia. Na mesma linha, a 8 de Maio, a COREMO, emite

    um comunicado relativo ao apelo de cessar-fogo lanado pelo general

    Costa Gomes. A sua aceitao significava a rendio dos

    guerrilheiros. O cessar-fogo no deve ser resultado de contactos

    cordiais e no pode ser uma condio para negociar. O problema o

    desfasamento entre as palavras e a realidade, na medida em que esta

    organizao deixou praticamente de realizar qualquer actividade

    militar em Moambique. Nem conseguiu nunca implantao no

    terreno. Os comunicados emitidos passam a ter o mesmo impacto que

    os proferidos por outras dezenas de partidos que quase diariamente se

    constituem.

    Valentim Sithole, dirigente da COREMO, baseada em Lu-saka,

    foi inquirido por elementos dos servios de informao norte-

    americanos durante a curta estada do Dr. Mrio Soares. D conta de

    que no havia qualquer plano para se encontrarem com Mrio

    Soares, durante a sua permanncia em Lusaka.480

    Entrevistado por

    vrios jornalistas, afirma que a sua organizao defendia um

    referendo para deciso do futuro de Moambique e estava pronta para

    negociaes em qualquer lugar, mesmo at em Lisboa, mas que

    no havia recebido qualquer contacto de Portugal. Das declaraes

    iniciais de continuar a guerra, em menos de trinta dias, passa a

    admitir a realizao de um referendo.Em benefcio da verdade se diga que bem tentaram alguns

    dirigentes da COREMO, junto de algumas chancelarias, mudar esta

    percepo. A 23 de Maio, o Dr. Artur Vilankulos, representante da

    COREMO nos Estados Unidos, tem um encontro, a seu pedido, com

    funcionrios do Departamento de Estado em Washington481

    . Para

    evitar dvidas leva consigo uma credencial. Transmite-lhes que j

    havia estabelecido contactos com Portugal

    Telegrama da Embaixada dos EUA na Zmbia, referenciado PR051544Z JUN 74, de5-6-1974.Telegrama do Departamento de Estado, referenciado PR242029ZMAY74, de 24-5-1974.

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    e que a COREMO se mostrava disposta a aceitar o mecanismo do

    referendo, ou outro processo democrtico de transferncia de

    poderes. Questionado sobre a real implantao no terreno deste

    grupo, Vilankulos d a resposta que se esperava: que eram muitos

    populares.

    A sempre pequena seco africana do Departamento de Estado,

    por muita desatenta que pudesse estar situao em Moambique,

    decide tirar dvidas e, para isso, solicita s suas misses diplomticas

    informaes sobre a COREMO. E as respostas no tardaram.

    Primeiro do embaixador norte-americano na Tanznia482

    para quem a

    COREMO era considerada como uma organizao ineficaz, com o

    mnimo de apoio em Moambique. Depois, o consulado de

    Loureno Marques483, informa que os servios de informao nunca

    tinham considerado a COREMO como sria, e no encontramos

    evidncias da sua actividade em Moambique, excepto em ataques

    espordicos. E cita a Dr.aJoana Simeo, nas suas diversas visitas e

    chamadas telefnicas: Paulo Guma-ne, presidente da COREMO,

    poderia ser um bom presidente do GUMO, em vez de Mximo Dias.

    Mais tarde abandona a ideia ao lembrar-se da fraqueza de Gumane

    por bebidas fortes.

    Tambm o embaixador norte-americano em Lusaka responde. A

    capital da Zmbia, Lusaka, era a Casablanca dos anos setenta. Nela seencontravam representados quase todos os movimentos de libertao

    africanos. Acumulam-se os agentes secretos de vrios pases com

    interesses regionais. Frequentam os mesmos locais de encontro,

    sobretudo os bares dos hotis, procura de informaes. Esse nmero

    aumenta medida que Lusaka, devido aco do seu presidente, se

    transforma em local

    Telegrama da Embaixada dos EUA na Tanznia, referenciado R 270935ZMAY74, de27-5-1974.Telegrarna do Consulado de Loureno Marques dos EUA, referenciado R301230ZMAY74, de 30-5-1974.

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    AS NEGOCIAES: MOAMBIQUE E O SEU FUTURO 33 I

    de negociaes. O diplomata norte-americano, revela que tem

    mantido contactos discretos com todos os movimentos de libertao,

    incluindo a FRELIMO e a COREMO e destaca o papel do

    representante da FRELIMO, Mariano Matsinhe, e o respeito que os

    outros movimentos de libertao tinham por ele. Sobre a COREMO

    comenta que o seu apoio na Zmbia seria de 30 a 40 elementos e

    que do seu ponto de vista a COREMO uma organizao

    virtualmente moribunda que continua a existir somente devido

    personalidade vibrante de Gumane e do apoio financeiro de Mobutu

    do Zaire484

    .

    Para o Departamento de Estado em Washington, a COREMO era

    um dado fora das negociaes. A sua nica preocupao passa a ser

    ocultar os diversos contactos que foram mantendo com Paulo

    Gumane.

    A corrida vertiginosa de Joana Simeo

    Enquanto decorriam as conversaes entre a FRELIMO e o

    Governo portugus, o presidente da COREMO, acompanhado de

    Faustino Kambeu, encontrava-se no Malawi havia mais de duas

    semanas. Aparentemente esperavam ter um encontro com o

    embaixador portugus naquele pas. Mas a principal razo no eraessa. Deriva dos propsitos do Dr. Banda ao ver-se afastado do

    processo negocial. Ele que sempre foi to amigo do Governo de

    Lisboa v-se preterido em favor de Kaunda.

    Banda entendeu que o Eng. Jorge Jardim, ao adquirir o estatuto

    depersona non gratapara o novo poder de Lisboa, tinha de mudar. A

    27 de Maio485

    chama ao seu palcio, em Blantyre, construdo no estilo

    de uma mini-Versalhes e decorado em grande

    Telegrama da Embaixada dos EUA na Zmbia, referenciado R182127Z JUN74, de18-6-1974.Ofcio n. 5139, de 30-5-1974, muito secreto do Ministrio dos Negcios Estrangeiros.

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    parte custa do errio portugus, o encarregado de negcios de

    Portugal. Para alm de o informar que o Malawi iria conceder o

    direito de asilo ao Eng. Jardim e manifesta-lhe as suas apreenses

    com a falta de segurana da sua Embaixada em Lisboa, como

    habitual, deixa a matria principal para o fim da conversa. Informa

    que uma delegao da COREMO se encontrava no Malawi, pedindo

    os bons ofcios do Governo do Malawi para regressar a

    Moambique e reafirma a sua disponibilidade ao Governo portugus

    para quaisquer contactos julgados teis no ou atravs do Malawi.

    No dia seguinte, o encarregado de negcios caminha novamente

    para o palcio presidencial, em cumprimento das instrues que havia

    recebido de Lisboa. Depois de transmitir que por parte do seu

    Governo s h razes para se considerar que se abrem novas

    perspectivas de boas relaes, mensagem que deixou Banda

    exuberante, a sua vez de apresentar a m notcia: a estranheza pelo

    facto de o Eng. Jardim no ter sido advertido pelo Governo do

    Malawi no sentido de se abster de atitudes que podem comprometer

    as relaes entre os dois pases. O Dr. Banda no faz qualquer

    comentrio e solicita que, atravs dos seus ministros Mwalo e Ngwiri,

    o mantivessem informado sobre a situao poltica em Portugal. A

    pretenso do regresso de elementos da COREMO a Moambique no

    comentada. Este ter sido o ltimo encontro amistoso entre arepresentao diplomtica portuguesa e o Governo do Dr. Banda, que

    se sente cada vez mais isolado.

    Quem no fica pelos ajustes, para aguardar eventuais actividades

    da COREMO, a polcia zambiana. Nos incios de Junho prende

    vrios dirigentes, apreende as poucas armas e encerra as pequenas

    bases localizadas prximo da fronteira moambicana. Fanuel

    Malhuza, secretrio da Informao deste movimento, relata esta

    situao durante um encontro na Embaixada dos EUA,

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    AS NEGOCIAES: MOAMBIQUE E O SEU FUTURO 333

    em Lusaka, a 12 de Julho486

    . O prprio Mahluza havia sido detido

    pelos servios de informao da Zmbia, a 12 de Junho. Escapa,

    atravessando a fronteira para o Malawi, para se avistar com Gumane.

    De regresso a Lusaka, ser novamente detido a 2 de Julho, mas

    sempre lesto consegue escapar da esquadra nesse mesmo dia. E

    aproveita para realizar mais um encontro com a diplomacia norte-

    americana. Informa-as da nova estratgia adoptada pela COREMO: a

    formao de uma frente poltica com aliados internos. Esta estratgia

    desenhada depois de visitas de Paulo Gumane Suazilndia e ao

    Malawi, onde se avistou no s com alguns chefes tradicionais, mas

    tambm com a sua antiga companheira, a Dr.aJoana Simeo. Aliana

    apadrinhada pelo Dr. Banda. Joana Simeo em 28 e 29 de Junho

    encontra-se em Blantyre. Havia deixado o GUMO, em srias

    desavenas com o Dr. Mximo Dias, formando a FRECOMO. Tem

    encontros com o presidente Banda e com Paulo Gumane. A Dr.a

    Simeo exige que Gumane regresse rapidamente a Moambique.

    Ambos tm a exacta noo de que necessrio encontrar um lder

    negro para liderar a oposio FRELIMO. Com algum passado.

    Manifesta a sua inteno de realizar um congresso em Nampula, em

    que seria constituda a frente comum contra a FRELIMO. Tal intuito

    ser diversas vezes anunciado pela prpria Joana Simeo, apostando

    numa base de apoio tnica a que ela pertencia. Nunca ser realizado.No encontro acima referenciado foi decidido enviar Artur Vilankulos,

    ex--locutor da Voz da FRELIMO a Moambique. A inesperada recep-

    o pblica em Loureno Marques, com a imprensa previamente

    avisada, revela-se suficiente para que o Dr. Vilankulos entenda a falta

    de maturidade e a incapacidade da Dr.aSimeo guardar um segredo.

    A forada aliana passa a ser minada por desconfianas.

    Telegrama da Embaixada dos EUA na Zmbia, referenciado R151500Z JUL74, de15-7-74.

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    Entre a chegada de Vilkankulos Beira e meados de Julho

    seguiro para aquela cidade 23 elementos da nova COREMO.

    Seriam integrados na MUNIREMO, Movimento para a Unificao e

    Conciliao de Moambique, cujo lder era Pedro Mondlane. Uma

    cpia, de cor e sentido inverso dos Democratas de Moambique,

    relativamente FRELIMO. Procuram cativar alguns dos partidos

    dos brancos, nomeadamente a Convergncia Democrtica, para

    integrarem essa frente.

    Comea-se a desenhar um contorno internacional de apoios a esta

    frente no declarados mas assumidos. Envolvem o Malawi, a

    Suazilndia e o Qunia. Com o patrocnio distncia do Zaire,

    porque Mobutu reserva energias para a questo angolana.

    Comentando o apoio malawiano, Paulo Gumane desabafa: O

    Malawi est a encorajar uma maior cooperao entre os grupos

    moambicanos, mas a sua posio est longe de ser clara.487

    Modo

    astucioso de Kamuzu fazer poltica.

    No meio deste cenrio, j to cheio de actores, chegada a vez do

    rei Sobhuza II, da Suazilndia, entrar em cena: monarca j de

    avanada idade e com um squito de dezenas de legtimas esposas.

    Envia, a 20 de Maio, uma delegao a Dar-es-Salam para se encontrar

    com a direco da FRELIMO. O peq