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O patOlÓGICO
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O PATOLÓGICOCentro Acadêmico Adolfo Lutz - Medicina Unicamp - ano mmx - setembro
ExtensãoUma tentativa de formação em educação e extensão popular por Daniel (Fanta Xl-VII).
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PATOCULTURALO filme a Onda por Sílvia Veríssimo (Xl-VIII).
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2 O patOlÓGICO SetembrO De 2010 3 O patOlÓGICOSetembrO De 2010
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sAIU NA MÍdIAUnicamp formali-
za adesão ao sinaes e alunos da área de saú-de vão ao Enade
[15/7/2010] (do site da UNICAMP)A participação da Unicamp ao Sina-
es/Enade foi formalizada no final da tar-de desta quinta-feira (15), em cerimônia com representantes da Universidade e do Ministério da Educação (MEC). Antes, secretários e coordenadores dos cursos de graduação da área da saúde (medi-cina, enfermagem, fonoaudiologia, far-mácia, nutrição e educação física), de-finida para o Enade deste ano, tiveram um dia intenso de trabalho. Eles ouvi-ram dos enviados do MEC explicações detalhadas sobre organização, estrutu-ra e procedimentos relativos ao Sistema Nacional de Avaliação da Educação Su-perior.
O Sinaes se propõe a avaliar a atua-ção da instituição de ensino superior (IES) em relação a ensino, pesquisa, ex-tensão, responsabilidade social, desem-penho dos alunos, gestão da institui-ção, corpo docente e instalações, entre outros aspectos. A adesão ao sistema foi aprovada na reunião da Comissão de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) da Unicamp de 1º de junho, com base nos subsídios apresentados por um grupo de trabalho composto por dez docentes e que promoveu reuniões por quase um ano para debater a questão.
Marcelo Knobel, pró-reitor de Gra-duação, sustenta que a Unicamp deve participar ativa e construtivamente do sistema, visando ao aprimoramento contínuo do ensino superior no Brasil. “A Universidade vem promovendo a avaliação em todas as instâncias, bus-cando sempre a excelência. Nada mais importante do que verificar como vão nossos cursos para poder aprimorá-los continuamente. Uma condição funda-mental, prontamente aceita pelo MEC, foi de participarmos de todo o sistema, atuando nas comissões e câmaras. Não se trata simplesmente de submeter nos-sos alunos ao Enade”.
Segundo Joaquim José Soares Neto, presidente do Instituto Nacional de Es-tudos e Pesquisas Educacionais (Inep), o exame envolve entre 800 mil e 1 milhão de estudantes, o que exige grande in-vestimento metodológico, tecnológico e em segurança. “A entrada da Unicamp, por sua dimensão em termos científicos e culturais, representa um enorme re-forço ao nosso sistema, pois podemos levar sua experiência para outras regi-ões. É um dia histórico para a educação superior de um país que dá fortes pas-sos para se tornar mais presente num mundo globalizado, sendo que a estru-turação da inteligência é fundamental neste processo”.
Nadja Maria Valverde Viana, que pre-side a Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), assegu-ra que a avaliação do ensino superior hoje é uma política de Estado (e não de governos) e lembra que a Unicamp se-diou o primeiro seminário para avaliar a pesquisa de pós-graduação no Brasil, em 1976. “Esta casa, idealizada pelo ge-nial Zeferino Vaz, representa a qualida-de da educação superior no país. Sua participação é um marco na implemen-tação e consolidação do Sinaes”.
Claudia Maffini Griboski, da Diretoria de Avaliação e Acesso ao Ensino Supe-rior, atenta que inúmeros docentes da Unicamp já atuam no Sinaes, dentro do banco de avaliadores e das comissões assessoras de áreas que definem as di-retrizes do Enade. “Com certeza, muitos deles estarão pensando as questões do próximo exame, que passa a ser elabo-rado no próprio Inep e não mais por empresa contratada. A entrada da Uni-versidade permite uma comparabilida-de com outras instituições de porte e a possibilidade de elevar os resultados no Enade”.
Mauricio Etchebehere, coordenador do Internato Médico da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), afirma que a nova direção da unidade, assim como a anterior, é totalmente favorável à participação no Sinaes/Enade. “Acha-mos importante porque a avaliação é reconhecida pelo Conselho Estadual de Educação, o que traz consequên-cias práticas para o curso de medicina,
como a facilidade de recredenciamen-to. Quanto aos alunos, a maioria é fa-vorável, apesar de resistências isola-das que acreditamos vencer através de um trabalho de esclarecimento”.
Como funcionaA nota final do Sinaes é composta
por uma série de instrumentos, como autoavaliação, avaliação externa, Ena-de, avaliação dos cursos de graduação e instrumentos de informação (censo e cadastro). O Conceito Preliminar dos Cursos de Graduação (CPC) – criado em 2007 para agregar critérios objetivos de qualidade e excelência ao processo de avaliação – vai de 1 a 5 e é um indicador prévio da situação dos cursos, valor de-pois consolidado com uma visita in loco à instituição.
O Enade (Exame Nacional de Desem-penho de Estudades) tem peso de 40% no CPC e afere o rendimento dos alunos em relação a conteúdos programáticos previstos nas diretrizes curriculares, ha-bilidades e competências para sua atu-alização permanente, além de conhe-cimentos sobre a realidade brasileira e mundial. A prova traz 10 questões de conhecimentos gerais e 30 questões es-pecíficas da área de conhecimento do aluno, entre discursivas e de múltipla escolha.
Com peso de 30% no CPC, o Indica-dor de Diferença do Desempenho (IDD) pretende demonstrar quanto o curso contribuiu para o desenvolvimento das habilidades acadêmicas, das competên-cias profissionais e do conhecimento específico do aluno. O IDD é a diferença entre o desempenho médio do aluno e o desempenho médio esperado em seu curso. O indicador, portanto, deve re-presentar quanto cada curso se destaca da média.
Instalações e equipamentos para au-las práticas, recursos didático-pedagó-gicos e a qualidade do corpo docente, segundo a percepção do aluno, fazem parte dos insumos, que possuem peso de 30% no CPC. Os dados objetivos in-seridos neste conceito são os percentu-ais de professores com titulação maior ou igual ao doutorado e daqueles que cumprem regime de dedicação integral ou parcial.
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Por que ser contra o ENAdE?
O governo federal sempre tem in-vestido em tentativas de se avaliar o desenvolvimento do ensino superior no Brasil. A primeira forma de avalia-ção das universidades brasileiras foi o PAIUB (Programa de Avaliação Institu-cional das Universidades Brasileiras) instituído durante o governo Itamar Franco e construído com outras entida-des ligadas à comunidade acadêmica, tendo como premissa a avaliação inter-na e externa; era de adesão voluntária das universidades.
Com a posse do governo Fernando Henrique, surge o ENC (Exame Nacio-nal de Cursos), mais conhecido como Provão; essa prova era para egressos do curso, que eram avaliados de A a E, sen-do que os mal avaliados recebiam reta-liações e a prova era responsável pelo ranqueamento das universidades; os movimentos sociais (incluindo o movi-mento estudantil) se juntaram para de-nunciar o caráter punitivo e a estrutura-ção desse exame, que avaliava apenas o produto da formação acadêmica, não se importando com o processo pela qual essa formação acontecia. Foi or-ganizado Boicote ao Provão nacional-mente, que teve bastante adesão pela incoerência da proposta de prova.
A chegada do governo Lula ao poder cria o SINAES (Sistema Nacional de Ava-liação da Educação Superior), e junta-mente com este projeto vem o ENADE (Exame Nacional de Avaliação de De-sempenho de Estudantes, avaliação a qual os estudantes da UNICAMP serão submetidos a partir deste ano.
Esse pequeno histórico sobre o pro-
cesso de avaliação do ensino superior no Brasil foi traçado para que possa-mos entender que independente da le-genda do partido que está à frente no governo, toda avaliação tem uma con-cepção de educação superior e de Uni-versidade defendidas por quem está no poder; e se formos comparar esses 16 anos (no mínimo) de propostas de ava-liação, elas não diferem muito entre si. Todas fizeram a opção de um modelo neoliberal de educação superior. Mas o que é isso? Quais as repercussões disso para o nosso ensino?
Há uma intensa desresponsabili-zação do Estado/governo em manter uma universidade pública e de quali-dade, sendo que o mesmo tem tomado posições de caráter privatista, tornan-do o público uma moeda de troca com o privado (mercantilização) e sempre buscando as parcerias com as empre-sas privadas, que privam aquilo que é garantido na constituição, mas que não vemos acontecer de verdade: o acesso de toda a população aos direitos bási-cos, entre eles, a educação.
Na área da saúde, essa desrespon-sabilização se contextualiza na priva-tização dos leitos públicos, abrindo a dupla-porta nos hospitais, favorecendo o atendimento de convênios nos mes-mos, criando fundações privadas para gerenciar aquilo que é público, ven-dendo estágios no hospital para estu-dantes de universidades pagas; exem-plos que vêm ocorrendo no Brasil todo e que já começaram a acontecer aqui na UNICAMP também
É importante entender, a partir des-
sa análise global e contextualizada, que nossas críticas ao ENADE não são de forma pontual, mas que essa avaliação faz parte de um sistema muito maior de desmonte da Educação Superior e que precisamos travar uma luta tanto contra o ENADE quanto contra esse desmonte do sistema público em nosso país.
Mas como funciona o ENADE?O ENADE é uma prova de fase única,
nacional, que busca avaliar a formação geral, competências profissionais e ha-bilidades acadêmicas dos estudantes. A prova é composta por 10 questões (8 múltipla escolha e 2 discursivas) de for-mação geral e 30 (27 múltipla escolha e 3 discursivas) específicas do curso ava-liada, no nosso caso, medicina! Após o processamento de dados e resultados da prova, é atribuído um conceito para a universidade, que varia de 1 a 5; sen-do que as universidades que variam entre 1 e 2 no conceito, são submetidas à readequamento de seus cursos, caso não queira ter seu vestibular suspenso.
Para entender nossas críticas a essa avaliação, devemos entender como já explicitamos acima, que nenhuma ava-liação é neutra; ou seja, toda forma de avaliação reproduz aquilo que quem a propôs defende. Assim, entendemos que o ENADE (e o SINAES) funciona como o “Inmetro” da Educação Supe-rior, ou seja, avalia se a universidade está adequada a reproduzir aquilo que o sistema precisa, tornando o estudan-te como um consumidor do produto, que se orientaria a partir da relação custo/beneficio do que a universidade oferece.
7 razões para ser contra:1. Avaliação RANQUEADORA, que transforma o ensino em mero produto de mercado;2. Avaliação PUNITIVA, que promove retaliações nas instituições com nota baixa;3. Avaliação OBRIGATÓRIA;4. Avaliação RESTRITA ao estudante, desconsiderando outros fatores necessários a serem avaliados;5. Avaliação IMPOSTA, pois não houve construção pelos diversos segmentos da sociedade;6. Avaliação que desrespeita as diversidades regionais;7. Avaliação que permite a desresponsabilização do Estado perante a melhoria da educação.
Dessa maneira, o ENADE promove o ranqueamento das universidades do Brasil (o qual somos estritamente con-trários), feito a partir dos resultados das provas, que servem apenas como propaganda para o mercado (principal-mente de instituições privadas) e não refletem as condições reais pelas quais as instituições passam, demonstrando apenas um caráter produtivista do en-sino.
Além disso, as universidades que es-tão mais bem colocadas no ranking do ENADE, recebem incentivos financeiros do governo federal, enquanto aquelas que tiram uma nota ruim, não recebem apoio nenhum, apenas retaliações; isso é uma contradição tremenda, afinal, pela lógica da avaliação que seria mini-mamente coerente, aquela instituição que vai mal é quem deveria receber apoio do governo para que possa me-lhorar seu ensino; é como se um médi-co receitasse o medicamento apenas para as pessoas saudáveis, deixando as doentes à própria sorte...
Exemplos disso podem ser vistos em casos como aquele que ocorreu na UFBA (Universidade Federal da Bahia), uma instituição extremamente respei-tada no meio acadêmico, que obteve uma nota baixa nessa prova e correu o risco de fechar as portas, caso não cumprisse os requisitos que o governo
propôs à mesma. Para se ter idéia do absurdo que aconteceu, dentre esses requisitos, ficava à cargo da UFBA re-formular todo o sistema de atenção pri-mária em saúde de Salvador sem ajuda financeira governamental, para que seus estudantes pudessem ter campo de estágio nos mesmos; tal aquisição é dever estritamente do Estado, não da universidade. Após intensas manifesta-ções estudantis (entre elas, o BOICOTE) e da comunidade acadêmica, o gover-no retrocedeu.
O constante medo de se ter uma nota baixa nessa avaliação faz com que as universidades e faculdades se prestem a papéis extremamente autoritários, ameaçando alunos, fazendo reuniões a portas fechadas para convencê-los e obrigá-los a fazer a prova, prometendo recompensas, dando presentes, crian-do cursinhos preparatórios, etc; o que demonstra que essa avaliação, na ver-dade, não avalia nada!
Há, também, uma desconsideração entre as particularidades regionais so-ciais, políticas, econômicas e culturais entre as diversas regiões brasileiras, já que a prova é única e nacional, descon-siderando a pluralidade e a diversida-de do ensino nas diferentes regiões do país.
Para aqueles que dizem que não so-mos propositivos, viemos para mostrar
que somos sim!Entendemos que a avaliação faz par-
te do processo de formação; ela deve se pautar no projeto político pedagógico do curso, por condições estruturais de ensino, pesquisa e extensão (laborató-rios, campos de estágio, preceptoria, salas de aula, equipamentos necessá-rios para a realização das atividades), pelos docente, desenvolvimento de atividades, e por avaliar se os estudan-tes têm a possibilidade de construir um projeto de sociedade diferente do que temos atualmente.
Entendemos que o SINAES / ENADE não é essa avaliação e nossa proposta é que haja o BOICOTE ao ENADE.
A partir do boicote, poderemos mos-trar nosso grito de indignação perante esse tipo de avaliação ineficaz para a sociedade e, como já aconteceu ante-riormente com o Provão, deslegitimar essa política de privatização e precari-zação do ensino superior.
BOICOTE!Pois, ao contrário do que dizem por
aí, UM BOICOTE INCOMODA MUITO MAIS!
marcelo Gustavo lopes- XlVICoordenador regional Sul-2(Sp e
pr) da Direção executiva Nacional dos estudantes de medicina
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manter ou mudar?
Eu vi a sigla FCM no cartaz, mas es-perava um ou outro aluno de medici-na nesse evento. Não imaginava que tantos de vocês estariam interessados nesse tipo de coisa”. Esse foi o comen-tário de um estudante de outro curso de nossa universidade, no primeiro dia de formação em educação e extensão popular organizado pelos participantes do projeto Egbé (quilombolas) e Anhu-mas. Nos últimos anos um grupo de estudantes de nossa faculdade vem se preocupando em fazer mais pela socie-dade do que apenas atendê-la clinica-mente, sem reflexão e criticidade.
Discussões como as dessa formação servem para entendermos as contradi-ções do sistema vigente, percebermos como somos incluídos nelas, e que a mantemos, mesmo quando achamos que estamos sendo imparciais. Mas va-mos além. Temos propostas de fortale-cimento de uma educação transforma-dora. Uma educação que não vem para manter, mas para mudar. Uma educação interessada na emancipação dos opri-midos. Uma educação popular. Acredi-tamos ser a universida-de um meio pelo qual podemos construir e difundir essa educa-ção. Aí entra a exten-são popular. A partir do diálogo, e não da coerção, pretendemos a produção de algo novo. Algo que quebra a nossa ingenuidade e indiferença frente às desigualdades sociais, e nos leva de Barão Geraldo a uma favela, simplesmente porque precisamos fazer algo, e porque temos um plano.
Nossos projetos são instrumentos de tra-balho para o que acre-ditamos. Há um ano, o projeto Egbé (quilom-bolas) está em ativida-de no Vale do Ribeira. E como os participantes cresceram desde en-tão. Foram necessários
dois anos para começarmos a sentir na prática o que teoricamente sempre discutimos. Como uma população tão próxima a todo o desenvolvimento téc-nico-científico pode permanecer tão marginalizada? Como pode o desen-volvimento econômico de nossa nação não incluí-los, quando pelas nossas leis, deveriam os mais necessitados rece-ber prioridade? Como podemos mudar isso? Pensamos que não seremos nós os agentes diretos das transformações que almejamos, mas sim a própria po-pulação, que tomando consciência da opressão, e aprendendo os meios de luta – e é aqui que nós entramos – po-dem se unir para deixar para trás o lu-gar de exclusão que nunca deveriam ter ocupado.
Felizmente, o projeto Egbé deu fruto a muitas novas ideias, inclusive um novo projeto que já vem se estruturando desde maio. Trata-se do projeto Anhu-mas, com os moradores da rua Mos-cou. Diferentemente dos quilombolas, eles estão a apenas quinze minutos da Unicamp. Esperamos que a facilidade de acesso nos ajude a criar um vínculo bem forte, além de ações mais contínu-
as. Ao visitar a Vila Parque Anhumas, e ouvir relatos de pessoas que se sentem favelados mesmo depois de abandonar os barracos, nos sentimos impelidos a levar uma reflexão e discussão que faça a diferença. Para eles, e para nós tam-bém.
Animadoras também são as partici-pações de pessoas de diferentes cursos em nossa formação, como relações in-ternacionais, pedagogia, arquitetura, letras, economia, linguística, ciências sociais, história e fonoaudiologia. Mui-tas pessoas que em diferentes contex-tos vêm se incomodando e procurando formas de trabalhar por uma sociedade mais justa. Juntos, não iremos somen-te reproduzir as contradições sociais que nos circundam. Iremos procurar entendê-las e propor mudanças, levan-do esse debate à população mais inte-ressada, que são os próprios oprimidos. Sejamos formados para isso. Não atra-vés de uma educação hegemônica que mantém a ordem, mas através do am-plo diálogo de todas as esferas interes-sadas. Estamos interessados
Daniel (Fanta) Montanini XLVII
fORMAçãO: EXTENsãO POPULAR E EdUCAçãO POPULAREXAME dO CREMEsPA avaliação da qualidade do ensino médico
nas faculdades de medicina do Brasil é de extrema importância para a busca da melhoria desse ensino e da possibilidade de formação de profissionais capazes de se apropriar de todo o conhecimento produzido na área. Buscam-se, dessa maneira, maneiras de se avaliar essas escolas e os estudantes, objetivando a descoberta de falhas durante o curso e possível correção destas.
A entidade pioneira na realização e na defesa da instituição de um Exame de Ordem para a Medicina é o CREMESP (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo). Desde o ano de 2005, essa entidade vem realizando exames terminais não obrigatórios para os estudantes de medicina do estado de São Paulo que estão no último ano do curso. A justificativa daqueles que defendem esse modelo de avaliação e que se propõe a organizá-lo é de que é necessário proteger a população brasileira dos erros médicos e de que é necessário colocar um entrave para a abertura indiscriminada de novas escolas médicas de baixa qualidade. Ambas as justificativas são bastante discutíveis.
É inegável que o número de erros médicos tenha aumentado nos últimos. Devemos, entretanto, questionar-nos se esse aumento de erros médicos é causado apenas pelos médicos recém-formados. E aqueles que se formaram há alguns/muitos anos? Como avaliaremos a conduta desses profissionais mais velhos? Será que eles não cometem erros no exercício de sua profissão? A culpa das condições de saúde em que se encontra a sociedade seria decorrente apenas dos médicos recém-formados?
É inegável, também, que houve um aumento substancial do número de escolas médicas no Brasil. Mas afirmar que o exame de ordem seria um entrave para a abertura indiscriminada de novas escolas é negar a história, já que há provas de que isso é amplamente discutível. Estudos mostram que após a implantação do exame da OAB, o número de escolas de direito quintuplicou no Brasil em um período de menos de dez anos.
O Exame de Ordem é um modelo de avaliação limitado, constituindo-se por um prova terminal (no final do curso), aplicado em apenas um momento da formação. Apenas por isso, já fica claro que essa prova não permite o diagnóstico das falhas durante o ensino (que são seis anos de curso) e, muito menos, permite a correção dessas falhas. É uma avaliação que não avalia a progressão do estudante ao longo do curso, não avalia suas habilidades e, por fim, não permite um diagnóstico das deficiências ao longo do currículo médico.
Essa avaliação terminal acaba por provocar uma desresponsabilização da Escola Médica na formação do médico, culpabilizando apenas o estudante pelo seu desempenho final na prova, já que não possibilita a avaliação de itens imprescindíveis para uma adequada avaliação de como anda o curso: a infra-estrutura do curso (rede de laboratórios, salas de aula, equipamentos adequados, etc), os campos de prática (hospitais, ambulatórios, enfermarias, unidades básicas de saúde), o corpo docente, o currículo médico. A responsabilidade de se passar na prova, dessa maneira, fica por conta apenas do estudante, não sendo uma maneira de se diagnosticar falhas no
ensino e muito menos de propor correções a estasOutra questão importante a ser abordada
sobre esse assunto é: o que o estudante egresso que não passar no Exame de Ordem poderá fazer? A resposta para essa pergunta é simples! Tornar-se-á um bacharel em medicina! Então, surge outra questão: o que o bacharel em medicina faz? Resposta: Nada! Ou melhor, não poderá exercer sua profissão. Esse fato se torna bastante complicado se analisarmos a questão de que existe a possibilidade daqueles que não passarem no exame, entrar no mercado ilegalmente, criando uma subcategoria de trabalho e intensificando as relações de exploração e precarização do trabalho médico.
A reserva de mercado é caracterizada como a regulação de vagas para a entrada no mercado de trabalho de profissionais, visando à manutenção salarial daqueles que já estão trabalhando e a estabilidade dos mesmos. É uma medida totalmente corporativista (já que os defensores dessa avaliação são médicos já inseridos no mercado de trabalho) que pretendem regular a entrada daqueles que podem e que não podem exercer sua profissão. Além de ser uma medida absurdamente corporativa, demonstra um verdadeiro descaso com a sociedade, já que a reserva de mercado visa somente atender aos interesses do médico já empregado e não ao déficit de profissionais de saúde da população.
Questionamos a intencionalidade daqueles que se propõem a organizar essa avaliação, como o CREMESP, sobre o que será feito com os dados estatísticos obtidos a partir da realização da prova pelos egressos. A experiência nos mostra que esses dados são utilizados apenas para se fazer um rankeamento das escolas médicas, propagandeando aquelas aos quais os estudantes vão bem, e ridicularizando aquelas aos quais os estudantes não passam. A instituição de um Exame de Ordem apenas agravaria o que já vem acontecendo com os resultados desse exame proposto pelo CREMESP e ainda tornaria o quadro muito mais obscuro, já que ocorreria uma proliferação dos cursinhos preparatórios para o exame de ordem (algo que já ocorre com relação às provas de residência). Essa proliferação de cursinhos faria com que o estudante focasse sua graduação no aprendizado da prova, deixando de lado a imprescindível formação teórica e prática para uma adequada prática clínica, o que é um agravante para a piora do estado em que se encontra o ensino médico no Brasil.
Surpreende-nos a abordagem feita sobre a necessidade de se implantar um Exame de Ordem urgentemente para a proteção da população, que estaria sujeita a riscos de maior adoecimento devido a erros médicos. Mas, se estão tão preocupados com a proteção da sociedade, porque não lutam pela melhoria da organização do sistema de saúde? Pela transformação social? Questões como essas vêm a nossa cabeça no momento em que se utiliza de argumentação tão falsa como essa. Precisam entender que há diversos problemas no nosso sistema de saúde que impedem o acesso da população ao mesmo, sendo este fato verdadeiramente preocupante.
Outro ponto a ser analisado é que se formos mais a fundo veremos que o fator determinante sobre a atuação profissional do médico são suas
condições de trabalho e não sua formação. O que queremos dizer com isso é que o estudante de medicina pode aprender a importância de um exame físico completo, uma anamnese detalhada, a importância dos novos métodos diagnósticos e das mais modernas e efetivas formas de tratamento, porém o que vai determinar a utilização desse conhecimento são suas condições de trabalho: a pressão para o cumprimento de metas ou um pagamento por produtividade (como é o dos planos de saúde) irá diminuir o tempo da consulta, o financiamento da saúde por parte do Estado vai determinar se o paciente terá acesso aos aparelhos diagnósticos mais modernos e eficientes e às drogas mais efetivas.
Concluímos, a partir dessas análises, que a questão da proteção da população e da garantia de uma assistência de saúde de qualidade a mesma, perpassa por muito mais problemas e questões sociais do que a capacidade de um egresso passar em uma prova ou reprovar na mesma. Precisamos nos atentar para esse debate sobre a organização da assistência em saúde no Brasil ao invés de nos preocuparmos apenas em regular o mercado de trabalho. Questionamo-nos sobre o porquê de os grandes idealizadores dessa proposta de exame de ordem não se preocuparem com o fato de o sistema de saúde do nosso país estar aos frangalhos e se utilizarem de uma falsa proteção à sociedade para justificar a existência de uma avaliação como a proposta.
Agora todos devem estar se perguntando: “Mas e aí, já sabemos que o exame é ruim, mas o que podemos e devemos fazer?”
Bom, para todos aqueles que acham que o movimento estudantil não tem proposta, é só reler o texto até aqui e perceber que nossas críticas já estão todas embasadas de propostas que temos a fazer!
Entendemos que o problema da educação médica no Brasil é grave e não será resolvido com uma solução simples e pontual como o Exame de Ordem. Nós queremos ser avaliados; mas queremos uma avaliação que contribua para a melhoria da Escola Médica, que possibilite a avaliação da infra-estrutura, do corpo docente. Uma avaliação que avalie o estudante ao longo da formação e, queremos que essa avaliação não seja meramente rankeadora e punitiva, queremos que ela seja um instrumento de diagnostico de deficiências a serem reparadas, permitindo ao estudante e à escola, através de reforço nos investimentos em educação, reparar as deficiências no ensino.
Exigimos melhores condições de trabalho, cargos e salários dos profissionais médicos. Lutamos por uma saúde 100% pública, estatal, gratuita e de qualidade para toda a população. Exigimos a abertura de novas escolas e a democratização do acesso à universidade, porém achamos imprescindível que essa expansão seja feita mantendo (ou ampliando) a qualidade do ensino. Por isso, nesse ano, junte-se a nós à campanha “Não ao Exame de Ordem para Medicina”. Vamos mostrar nossa voz e sermos ouvidos contra a realização do Exame do CREMESP.BOICOTE!!!“Se você não apóia, não faça a prova!”
Adaptado da Cartilha sobre Exame do Cremesp disponível em http://www.denem.org.br/textos/124
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PATOCULTURALO provérbio “a união faz a força” é exem-
plificado rotineiramente em nossas vidas. Entretanto, filmes como “A onda”, de Den-nis Gansel, e “Invictus”, de Clint Eastwood, enfatizam esse lema de maneiras distintas e surpreendentes.
O primeiro, baseado em uma história real ocorrida na Califórnia em 1967, trata de um jogo sobre autocracia levado tão a sério que passa a confundir-se com a re-alidade. O contexto de competitividade entre os professores de uma escola de en-sino médio incentiva Rainer Wegner a criar uma aula que estimule os alunos a enten-der como uma ditadura semelhante à de Hitler poderia ser abraçada pela popula-
ção globalizada. Dessa maneira, os alunos concordam em vestir um uniforme e criar um símbolo para a turma. Entretanto, al-guns extrapolam os limites da sala de aula, levando as regras de conduta ali estabele-cidas para suas vidas, excluindo os que não se subordinaram à massa e aterrorizando a cidade. Quando o professor Wegner per-cebe a gravidade da situação criada, mui-tos alunos já não conseguem viver sem o grupo e encontram-se desequilibrados e suscetíveis a cometerem tragédias caso o movimento “A onda” desaparecesse.
De modo antagônico, “Invictus” conta a trajetória de Nelson Mandela em unir a população após o fim do apartheid. A es-
tratégia: um bom time de rugby. O recém--eleito presidente da África do Sul preocu-pa-se em aliar o time à população, o que resultou no fortalecimento de ambos.
Nesse sentido, os dois filmes represen-tam o poder que um grupo unido pode ter. Entretanto, o primeiro utiliza essa força de maneira autoritária e egoísta; enquanto o segundo canaliza essa energia para bons propósitos, gerando conseqüências posi-tivas para toda a nação. Indubitavelmente, a música “Waka waka” representou o hino de união de torcedores por suas pátrias nesse ano de Copa do Mundo, evocando um sentimento de patriotismo.
Sílvia Veríssimo (XLVIII)
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