1€¦  · web viewindÍce. prólogo...

21
INDÍCE Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico ..………………… 3 Epidemiologia .…..…………………………………………………….. 3 Critérios de Diagnóstico ………………..……………………………… 4 Etiologia………………………………….……………………………… 5 Tratamento ……………………………………………….……………. 9 Referências Bibliográficas …………………………………………….. 10 Outras Fontes …………………………………………………………... 13 PRÓLOGO Este documento foi criado com o objectivo de servir como fonte de informação complementar ao estudo de caso realizado no âmbito da unidade curricular de Ensino Clínico V sobre um doente que sofre de Jogo Patológico. Devido ao limite de páginas que me foi imposto, não pude fazer no próprio corpo do trabalho uma descrição mais alargada do fenómeno, tendo-me cingido aos dados essenciais para fundamentar o meu diagnóstico e planear as intervenções de enfermagem. No entanto, e uma vez que este fenómeno é ainda pouco conhecido da população em geral e muito pouco abordado no âmbito da enfermagem, considerei que seria importante apresentar em anexo uma breve súmula dos aspectos mais

Upload: vuthu

Post on 10-Oct-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

INDÍCE

Prólogo ………………………………………………………………….. 2

Conceitos de jogo: social, profissional e patológico ..………………… 3

Epidemiologia .…..…………………………………………………….. 3

Critérios de Diagnóstico ………………..……………………………… 4

Etiologia………………………………….……………………………… 5

Tratamento ……………………………………………….……………. 9

Referências Bibliográficas …………………………………………….. 10

Outras Fontes …………………………………………………………... 13

PRÓLOGO

Este documento foi criado com o objectivo de servir como fonte de informação complementar

ao estudo de caso realizado no âmbito da unidade curricular de Ensino Clínico V sobre um

doente que sofre de Jogo Patológico. Devido ao limite de páginas que me foi imposto, não pude

fazer no próprio corpo do trabalho uma descrição mais alargada do fenómeno, tendo-me cingido

aos dados essenciais para fundamentar o meu diagnóstico e planear as intervenções de

enfermagem. No entanto, e uma vez que este fenómeno é ainda pouco conhecido da população

em geral e muito pouco abordado no âmbito da enfermagem, considerei que seria importante

apresentar em anexo uma breve súmula dos aspectos mais centrais respeitantes a esta

problemática que retive durante a minha pesquisa bibliográfica.

Assim, falarei dos diversos conceitos de jogo que existem, epidemiologia, critérios de

diagnóstico, etiologia e tratamento do Jogo Patológico. Espero que esta explicação, juntamente

com o próprio estudo de caso apresentado permita uma maior compreensão do fenómeno e

fomente a quem os ler aprendizagens no sentido de melhor conseguir ajudar pessoas que tenham

este tipo de problema.

Page 2: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

CONCEITOS DE JOGO: SOCIAL, PROFISSIONAL E PATOLÓGICO

Considera-se o jogo como um “exercício ou passatempo recreativo sujeito a certas regras ou

combinações em que, por vezes, se arrisca dinheiro” (Grande Dicionário Universal da Língua

Portuguesa, 1997). Segundo a American Psychiatric Association (2002) e ainda autores como

Ibánez, Jiménez e Aymami (1999), Griffiths (1994) ou Keren e Wagennar (1988) este fenómeno

pode ser de índole social, profissional ou patológica:

O jogo social ocorre de uma forma típica com amigos ou colegas, durante um período de

tempo limitado, assumindo um carácter lúdico e pode envolver gastos que serão sempre

previsíveis e aceitáveis.

O jogo profissional é normalmente praticado durante longos períodos de tempo por uma

pessoa, podendo constituir a sua principal actividade e fonte de rendimentos. No entanto, a

disciplina que impõe a si própria é muito forte, não havendo perda de controle sobre o

comportamento e os riscos que toma são limitados.

O termo “jogo patológico” é usado no DSM-IV – TR (American Psychiatric Association,

2002) para descrever uma desordem mental caracterizada por uma dependência emocional

e preocupação com o jogo e com o comportamento de jogar que é excessiva, repetitiva e

recorrente, marcada por um impulso e perda de controlo relativa ao acto de jogar, que é

continuado apesar do aparecimento de consequências significativamente adversas e

negativas. Estas podem afectar “quer o jogador a nível individual quer a sua família,

podendo inclusivamente estender-se à comunidade” (Blaszczynski, 1999. p. 95).

EPIDEMIOLOGIA

Apesar de não existirem estudos realizados em Portugal acerca da epidemiologia e prevalência

deste fenómeno é de acreditar, segundo dados fornecidos pela Associação Portuguesa das

Medicinas de Adições que a taxa de jogadores patológicos possa ser superior a 0,5% da

população, não pecando esta estimativa por excesso – de facto as estatísticas de países como os

Estados Unidos revelam que entre 1,4% a 2,8% da população adulta é jogadora patológica,

subindo esta percentagem no que diz respeito aos jovens e adolescentes para 4 - 6% (Becoña,

1999). No Canadá, Austrália e Nova Zelândia a prevalência deste problema é de cerca de 1,2%

Page 3: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

entre a população adulta, podendo esta percentagem aumentar ou triplicar nos adolescentes

(Bujold, Ladoucer e Vitaro, 1996; Ladoucer e Sylvain, 1999). No que diz respeito à nossa vizinha

Espanha, um dos países em que se tem estudado mais este fenómeno e que se sabe ser um dos

países europeus em que há maior gasto per capita no jogo, acredita-se que existam entre 1,7% a

2,5% de jogadores patológicos adultos e 4% a 8% de adolescentes em risco de ficarem adictos a

este comportamento.(Becoña, 1999)

É de referir, no entanto, que estes países promovem e facultam à população em geral o acesso a

inúmeras máquinas de jogos a dinheiro – na Espanha, por exemplo, existem as chamadas

«máquinas tragaperas», presentes em quase todos os bares e restaurantes do país e que só por si

representam 40% do lucros que o Estado recebe com a actividade do jogo (Aymami, Ibánez e

Jiménez, 1999). Acredita-se que a grande disponibilidade de jogos, o baixo custo do jogo e a

promoção e publicidade dos jogos de azar são factores que se encontram directamente

correlacionados com o aumento de jogadores patológicos (Dickerson, England e Hinchy, 1992).

O facto de em Portugal não existir uma disponibilidade e promoção tão acentuada do jogo,

permite conjecturar que a taxa de jogadores patológicos não será tão elevada coimo nos países

anteriormente referidos.

Estudos diversos (American Psychology Association, 2001; Aymami, Ibánez e Jiménez, 1999,

Becoña, 1999, Bujold, Ladoucer e Vitaro (1996) e Crespo e Turón (1999) definem o perfil típico

do jogador patológico (quando recorre às instituições médicas pela primeira vez para pedir

auxílio) como um homem, casado, com uma idade média de 40 anos, com uma educação melhor

que a média, activo a nível laboral e com emprego qualificado. O inicio da conduta de jogo

patológico ocorre normalmente na adolescência, sendo a sua evolução muitas vezes insidiosa.

Anos de jogo social podem ser seguidos pelo início abrupto de jogo patológico, o qual é

susceptível de ser desencadeado por uma maior exposição a estas actividades ou por factores de

stress. A evolução do comportamento assume um padrão crónico e progressivo em relação à

frequência do jogo, da quantia apostada e das preocupações relacionadas com o jogo (Gelder et

al, 1996).

Por outro lado, sabe-se que a compulsão para jogar aumenta durante períodos de ansiedade e

depressão, podendo ser igualmente a principal causa destas (Kaplan, 1997) e que a prevalência

deste fenómeno acentua-se em sujeitos que possuem problemas relacionados com o abuso de

substâncias como o álcool e os estupefacientes (Jacobson, 1997).

Page 4: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO

O Jogo Patológico é classificado no DSM-IV – TR (American Psychiatric Association, 2002)

como um Distúrbio do Controlo de Impulso, podendo um indivíduo ser diagnosticado com esta

patologia caso a sua sintomatologia corresponda a cinco ou mais dos seguintes critérios:

Preocupação com o jogo (revivênvia de experiências prévias com o jogo, planificação para

os próximos jogos, preocupação com a obtenção do suporte financeiro para jogar);

Necessidade de aumentar as quantias apostadas no sentido de obter a desejada excitação;

Tentativas falhadas de controlar, reduzir ou parar o comportamento face ao jogo;

Inquietude ou irritabilidade quando tenta reduzir ou parar de jogar;

O jogo pode funcionar como forma de escape a problemas ou como forma de aliviar um

humor disfórico (sentimento de desamparo, culpa, ansiedade e depressão);

Perdas repetidas ao jogo e comportamento de “resgate” no sentido de as recuperar;

Mentir à família, terapeuta ou outros quanto à extensão e envolvimento no jogo;

Envolvimento em actividades ilegais como falsificação, fraude, roubo ou desfalque para

financiar o jogo;

Pôr em risco ou perder relações significativas, emprego ou oportunidades de carreira ou

académicas por causa do jogo;

Contar com os outros para obter dinheiro com o fim de regularizar uma situação financeira

desesperada devido ao jogo.

ETIOLOGIA

Actualmente não existe um modelo explicativo conceptual adequado ao jogo patológico, que

tenha em conta a complexa interacção dos factores ambientais, psicológicos e biológicos no

desenrolo deste transtorno (Blaszczynski, 1999). Existem, no entanto, diversas teorias acerca das

causas e mecanismos de acção envolvidos nesta patologia, sendo as mais conhecidas e aceites a

nível cientifico, a teoria afectiva, a teoria cognitiva, a teoria de arousal e a teoria da adição.

A premissa básica da teoria afectiva é a de que “os jogadores patológicos jogam com maior

frequência quando a realidade é mais dolorosa” (Lamberton e Oei, 1997 cit. Custer, 1977, p.88).

Page 5: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

Existe uma lista extensa de estudos evidenciando a associação do problema do jogo com a

deterioração social e ocupacional, bem como com problemas do foro conjugal, legal, financeiro,

médicos e criminais (Lamberton e Oei, 1997). Bergler (1975) sugere que estes problemas podem

ser os stressores que fazem com que os jogadores patológicos procurem um escape emocional e o

conforto fisiológico do jogo. Blaszczynski (1999) encara o jogo patológico como o resultado de

ansiedade e/ou estados de humor disfóricos que surgem como consequência de estratégias de

coping inadequadas. O atenuar destes estados de humor durante o acto do jogo é apenas

temporário, uma vez que as perdas financeiras e o sentimento de culpa e medo de detecção

exacerbam os estados prévios de ansiedade e/ou depressão e mantém assim o impulso de jogar.

Por outro lado, Lamberton e Oei (1997) referem os trabalhos de Taber et al (1987) que

concluíram que o jogo é uma resposta à intolerância de afectos, constituindo-se episódios

traumáticos vivenciados na infância e adolescência como factores predisponentes ao

desenvolvimento deste problema. A crítica a esta teoria é a de que se concentra muito nas

variáveis psicossociais que podem afectar o início e a manutenção do comportamento do jogo

patológico, ignorando o fenómeno do jogo em si e a forma como este pode influenciar a pessoa.

Segundo a teoria cognitiva, defendida por autores como Griffiths (1994), Keren e Wagenaar

(1988) e Dickerson, England e Hinchy (1992), a recompensa financeira é a motivação primária

para o jogo. A diferença principal entre os jogadores patológicos e os não patológicos é a de que

os primeiros constróem um conjunto de ideias e crenças falsas acerca do jogo. Actualmente, “o

jogo legalizado está construído de tal maneira que aqueles que jogam devem esperar perder”

(Lamberton e Oei, 1997 cit. Walker, 1992, p.90). A lei das probabilidades é sempre desfavorável

para o jogador e cada vitória (ou derrota) é independente da próxima. Os jogadores patológicos

não levam este facto em linha de conta. Por um lado, eles sobrestimam as suas capacidades no

que diz respeito a jogos que envolvem uma componente de perícia, acreditando que possuem uma

habilidade especial para ganhar. As derrotas são desvalorizadas como causadas por factores

externos e fora do seu controlo, enquanto que as vitórias funcionam como uma prova de que a

sua habilidade funciona. Por outro, eles experimentam em jogos que implicam somente o factor

sorte aquilo que Bergler (1975) define como «ilusão de controlo», assumindo crenças irracionais

de que podem “bater o sistema” através de um insight ou lógica especial. O acto de jogar é

igualmente estimulado por um mecanismo lógico, mas irreal das probabilidades de ganhar. Os

Page 6: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

jogadores patológicos não têm a percepção exacta da independência probabilística de cada jogada

em relação às anteriores, pensando que por terem acumulado diversas derrotas aumentam as suas

possibilidades de ganhar algo (Keren e Wagenaar, 1988). Além disso, face a derrotas sucessivas

afigura-se-lhes racional a continuação do acto de jogo, uma vez que parar significa uma

probabilidade nula de recuperar o dinheiro investido, ao passo que continuar pode não só

devolver-lhes a perda, como inclusivamente conferir-lhes lucro. A “pecha” desta teoria é

considerar o aspecto financeiro como despoletador do jogo patológico, o que nem sempre

acontece de acordo com os relatos dos doentes: estes referem diversos motivos para terem

começado a jogar, que nem sempre se prendem com questões monetárias.

A teoria de arousal ou busca de sensações centra todo comportamento do jogo no estímulo

(arousal) agradável que o jogo produz nas pessoas. Segundo Brown (1999), Coventry e Norman

(1998) e Bergler (1975) o jogador não tem tanto o objectivo de ganhar uma fortuna – procura sim

alcançar e manter um estado subjectivo de excitação. Uma prova desta excitação é a alteração

fisiológica que ocorre nos jogadores patológicos enquanto jogam – dá-se um aumento da

frequência cardíaca e da sudação corporal. Brown (1999) afirma que cada indivíduo possui um

nível óptimo de arousal que lhe é único e que quando é atingido lhe permite obter uma sensação

de bem-estar. Os jogadores patológicos têm um baixo nível de arousal natural, que se traduz em

estados disfóricos mais ou menos persistentes, em que a apatia, o desinteresse e o aborrecimento

são uma constante. O jogo funciona como uma solução para este problema, elevando o arousal

até aos níveis óptimos para a pessoa. Bergler (1975) sugere que o arousal é experiênciado como

uma sensação de prazer-dor. Ocorre uma tensão entre o acto de apostar e o fim do jogo que é

desejada tanto pelo jogador que acaba por sobrepor-se ao resultado final do jogo. Neste sentido, o

comportamento de jogar traz recompensas mesmo quando se perde, mas que, infelizmente, são

apenas imediatas. As consequências práticas da perda económica acabam por ser devastadoras

para os jogadores, o que lhes baixa ainda mais o nível de arousal, incentivando ao jogo. Esta

teoria acaba por ser criticável da mesma maneira que a teoria anterior, embora com argumentos

“opostos”. De facto, ao passo que a teoria anterior só dava atenção à questão monetária, esta

teoria foca-se somente sobre a excitação que o jogo pode trazer, “esquecendo” outros factores

que podem contribuir para a manutenção pouco salutar e perda de controlo sobre o

comportamento.

Page 7: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

O jogador patológico pode também considerar-se como uma pessoa adicta ao

comportamento de jogo, como defendem autores como Jacobson (1997), Lamberton e Oei (1997)

e Gettings e McCuster (1997). Esta é, aliás, a categoria mais aceite actualmente pela comunidade

cientifica, inclusivamente pela American Psychiatric Association que admite a possibilidade de

ter cometido um erro ao classificar o Jogo Patológico como um Distúrbio do Controlo de

Impulso. Os próprios critérios de diagnóstico expressos no DSM-IV – TR (American Psychiatric

Association, 2001) assemelha-se bastante aos respeitantes às adições. A adição é caracterizada

por quatro factores essenciais: a perda de controle, a obsessividade, o aumento da tolerância e um

síndrome de abstinência em relação ao consumo de uma substância ou manutenção de um

comportamento. Em relação aos três primeiros factores, não há dúvida que a sintomatologia

descrita no DMS-IV – TR (APA, 2001) é equivalente. Apenas no que diz respeito ao síndrome de

abstinência poderiam existir dúvidas. No entanto, já foi documentado em vários estudos

realizados com jogadores patológicos quando tentam reduzir ou parar de jogar, sintomas de

abstinência física similares aos sintomas de abstinência aos depressores do sistema nervoso

central e opióides – por exemplo, irritabilidade, dores de cabeça, insónias e problemas

gastrointestinais (Gettings e McCuster, 1997). A elevada co-morbilidade que existe entre o jogo

patológico e outras adições apoia também esta hipótese. Sáiz e Ibáñez (1999) referem que

diversos autores (Ramírez et al, 1983; Lesieur et al, 1986; Cusack et al, 1993) encontraram um

abuso de álcool ou de outras substâncias psico-activas em 40-45% dos jogadores patológicos

estudados, assim como um elevado índice de tabagismo. Por outro lado, Jiménez, Ibánez e

Aymami (1999) constatam que vários jogadores patológicos em processo de reabilitação acabam

por “trocar de vício”, ingerindo álcool ou consumindo drogas para substituir o hábito do jogo.

Por outro lado, os Jogadores Anónimos, um grupo de auto-ajuda que foi originalmente

constituído nos EUA e que se baseou no programa de doze passos instituido para os Alcoólicos

Anónimos provou ser útil para muitos jogadores patológicos e pode ser a intervenção mais

efectiva actualmente disponível. Contra esta teoria existem os argumentos de que um número

excessivo de problemas já se encontram erroneamente classificados como adicções, tendo a

palavra e o conceito sido trivializada por uma utilização deste tipo. A adição deve ser um termo

normalmente reservado às actividades nas quais uma substância química estranha é introduzida

no corpo, não para qualquer comportamento repetitivo especifico. É com base nesta justificação

Page 8: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

que a APA (2002) mantém a sua classificação actual do fenómeno do jogo patológico, embora

aconselhe o recurso aos Jogadores Anónimos para tratar este problema.

Existem também algumas reflexões de teor psicanalítico em relação a este fenómeno.

Freud (1961) atribui ao jogo uma conotação sexual e “compara o jogo patológico com uma

compulsão masturbatória em resposta a um sentimento de culpa edipal” (Freud, 1961 cit. Lamberton

e Oei, 1997, p.93). O facto do seu pai estar muitas vezes ausente (não em casa, mas ausente para ele)

e de o castigar frequentemente contribuiu para um ambiente interno instável, em que a tensão se ia

acumulando lentamente, constituindo o jogo uma maneira de a libertar. Esta ideia é confirmada por

Jacobs (1989) que identificou uma tendência para os jogadores patológicos responderem a uma

reportada frustração e infelicidade na sua infância e adolescência através da combinação de fantasias

de negação e de satisfação de desejos e sugere que estes tenham procurado experiências de jogo onde

se sentissem aceites, admirados e amados (Townsend, 1993).

Começam-se igualmente a estudar os factores genéticos como influentes no jogo patológico.

Saiz e Ibanés (1999) referem-se a vários estudos que apontam para uma possível herança hereditária

do fenómeno, relacionando a presença de antepassados com sintomatologia de gastos excessivos e

perdas ao jogo com a prevalência actual da patologia. Assim, pessoas com familiares de 1º ou 2º grau

com problemas deste género apresentariam um maior risco de se vir a tornar jogadores compulsivos.

Os (escassos) estudos neurobiológicos que se realizaram em relação ao fenómeno do jogo

patológico não foram conclusivos quer em relação a uma “hipótese serotoninérgica” que apoiaria

a teoria do jogo patológico como um distúrbio no controlo dos impulsos, quer relativamente a

uma “hipotese dopaminérgica”, que apoiaria a hipótese do jogo patológico ser uma adição. De

facto, não se observaram alterações muito significativas nas concentrações e mecanismos

associados a quaisquer neurotransmissores que pudessem conotar de uma forma decisiva o jogo

patológico com qualquer uma das teorias descritas anteriormente ou induzir á formulação de uma

nova teoria.

Apesar da hipótese aditiva estar em voga actualmente, não podemos deixar de levar em linha de

conta a existência das outras teorias. Aliás, uma das vantagens da teoria da adição é que esta pode

incorporar dentro de si muitos modelos conceptuais. Assim, quer a teoria afectiva, quer a

Page 9: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

cognitiva e de arousal encontram repercursões no mecanismo aditivo e ajudam a explicar um

pouco melhor o fenómeno complexo e multi-causal que é o jogo patológico.

TRATAMENTO

O tratamento do jogo patológico consiste normalmente em três modalidades, que devem ser

utilizadas (se possível) em conjunto de modo a potencializar a sua eficácia (O´Brien, 1999).

A psicoterapia individual assume-se como um tratamento de primeira linha e pretende

ajudar o jogador a compreender as razões porque joga e a lidar com os seus sentimentos de

impotência, depressão e culpa. É importante que o utente identifique os factores estressores

que despoletam os comportamentos de jogo e evitar que ocorram ou, em alternativa, que

aprenda a lidar com eles de uma forma mais conveniente. Estas sessões, que são

normalmente semanais e podem durar de seis meses a dois anos, devem igualmente focar

aspectos cognitivos. Deve-se procurar clarificar as concepções que a pessoa tenha acerca de

aspectos relacionados com as probabilidades e ajudá-la a percepcionar a verdadeira

realidade do(s) jogo(s) de que ficou dependente e as «ilusões de controlo» que pode

eventualmente criar durante o acto de jogo (Jiménez, Ibánez e Aymami, 1999).

Por outro lado, a adesão a um grupo de auto-ajuda como os jogadores anónimos e ao seu

programa de doze passos vai fornecer ao indíviduo pessoas de referência que compreendem

a sua situação e que são exemplos vivos de que é possível superar as adversidades

especificas da doença. Isto pode ajudar o jogador patológico a estabelecer uma nova vida

sem que o comportamento aditivo do jogo esteja em controlo.

Também a terapia familiar é particularmente importante porque as mentiras, os enganos, a

falta de confiança e os problemas financeiros criados pelos comportamentos dos jogadores

patológicos podem ter criado sentimentos de alienação nos familiares. Para que a

recuperação real tome lugar é necessário que as pessoas significativas confiem no utente

novamente, que curem as feridas emocionais e aprendam a usar competências de

comunicação mais eficaz um em relação aos outros e igualmente mecanismos de coping

mais apropriados.

Page 10: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

Em relação ao tratamento farmacológico, ainda não está provado que este seja eficaz no

controlo desta patologia, “não se podendo recomendar um fármaco específico para o problema do

jogo patológico, mas apenas indicar diferentes possibilidades de acordo com as características do

utente” (Crespo e Turón, 1999, p.144). É de referir, no entanto, que algumas experiências

empíricas demonstram resultados positivos com o uso de estabilizadores de humor e anti-

depressivos. No entanto, argumenta-se que a melhoria dos utentes está associada ao alívio dos

sintomas de depressão e ansiedade que esta terapêutica induz, problemas muitas vezes

concomitantes em relação ao jogo patológico.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

American Psychiatric Association. Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações

mentais 4ª Edição – Texto Revisto (DSM-IV – TR). 1ª Edição. Lisboa: Climepsi Editores.

2002. ISBN: 972-796-020-0

Aymami, Maria; Ibánez, Àngels; Jiménez, Susana. Epidemiología del juego patológico en un

programa de tratamiento profesional. In Anuário de Psicología. Vol. 3, Nº 4. Barcelona:

Ediciones Paidós. Diciembre, 1999. ISSN: 0066-5126. Págs. 21-31

Becoña, Elisardo. Epidemiología del juego patológico en España. In Anuário de Psicología.

Vol. 3, Nº 4. Barcelona: Ediciones Paidós. Diciembre, 1999. ISSN: 0066-5126. Págs. 7-19

Bergler, Edmund. Psychology of Gambling – do people gamble because they want to win or

because they have an unconscious wish to lose? New York: Internacional Universities Press.

1975.

Blaszczynski, Alex. Pathological gambling: An impulse control, addictive or obsessive-

compulsive disorder? In Anuário de Psicología. Vol. 3, Nº 4. Barcelona: Ediciones Paidós.

Diciembre, 1999. ISSN: 0066-5126. Págs. 93-109

Page 11: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

Brown, Ian. Arousal, disociación y cognición en el juego normal y problemático. In Anuário de

Psicología. Vol. 3, Nº 4. Barcelona: Ediciones Paidós. Diciembre, 1999. ISSN: 0066-5126.

Págs. 79-92

Bujold, Annie; Ladoucer, Robert; Vitaro, Frank. Predictive and Concurrent Correlates of

Gambling in Early Adolescent Boys. In Journal of Early Adolescence. Vol. 16, Nr. 2. Thousand

Oaks: Sage Periodicals Press. May, 1996. ISSN: 0272-4316. Págs. 211- 228

Coventry, Kenny; Norman, Anna. Arousal, erroneous verbalizations and the illusion of

control during a computer-generated gambling task. In British Journal of Psychology. Vol. 89,

Part 4. London: The British Psychological Society. November, 1998. ISSN: 0007-1284. Págs.

629-645

Crespo, José; Turón, Vicente. Tratamiento farmacológico del juego patológico. In Anuário de

Psicología. Vol. 3, Nº 4. Barcelona: Ediciones Paidós. Diciembre, 1999. ISSN: 0066-5126.

Págs. 137-146

Dickerson, Mark; England, Stephanie; Hinchy, Jonh. On the determinants of persistent

Gambling Behaviour I – High-frequency poker machine players. In British Juvenil Psychology.

Vol. 83, Part 2. London: The British Psychological Society. May, 1992. ISSN: 0007-1245.

Págs. 237-248

Ferraz, Nina; Pedro, Fernanda. Um dia de cada vez. Artigo publicado no âmbito do

suplemento Revista Expresso. Lisboa: Jornal Expresso. Novembro, 2001. Págs. 144-150

Gelder, Michael et al. Oxford Textbook of Psychiatric. Third Edition. Oxford: Oxford

University Press. 1996. ISBN: 0-19-262501-2. Págs. 759-760

Gettings, Briege; McCuster, Christopher G. Automaticity of cognitive biases in addictve

behaviours: Further evidence with gamblers. In British Journal of Clinical Psychology. Vol. 36,

Page 12: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

Part 4. London: The British Psychological Society. November, 1997. ISSN: 0007-1328. Págs.

543-554

Griffiths, Mark D. The role of cognitive bias and skil in fruit machine gambling. In British

Journal of Psychology. Vol. 85, Part 3. London: The British Psychological Society. August,

1994. ISSN: 0007-1269. Págs. 351-369

Ibánez, Àngels; Jiménez, Susana; Aymami, Maria. Evaluación y tratamiento cognitivo-

conductual de jugadores patológicos de máquinas recreativas com premio. In Anuário de

Psicología. Vol. 3, Nº 4. Barcelona: Ediciones Paidós. Diciembre, 1999. ISSN: 0066-5126.

Págs. 111-125

Jacobson, Alan; Jacobson, James. Segredos em Psiquiatria. Porto Alegre: Artes Médicas

Editora. 1997. ISBN: 85-7307-225-3. Págs. 198-204

Jiménez, Susana; Ibánez, Àngels; Aymami, Maria. Variables psicológicas y psicopatológicas

en el juego patológico. In Anuário de Psicología. Vol. 3, Nº 4. Barcelona: Ediciones Paidós.

Diciembre, 1999. ISSN: 0066-5126. Págs. 67-78

Kaplan, Harold et al. Compêndio de Psiquiatria. 7ª Edição. Porto Alegre: Artes Médicas

Editora. 1997. ISBN: 85-7307-211-3. Págs. 673, 677-679

Keren, Gideon; Wagenaar, Willem A. Chance and Skill in Gambling: A Search for

Distinctive Features. In Social Behaviour – An Internacional Journal of Applied Social

Psychology. Vol. 3, Nr. 3. New York: Wiley. September, 1988. ISSN: 0885-6249. Págs. 199-

217

Ladoucer, Robert; Sylvain, Caroline. Tratamiento del juego patológico: un estudio controlado.

In Anuário de Psicología. Vol. 3, Nº 4. Barcelona: Ediciones Paidós. Diciembre, 1999. ISSN:

0066-5126. Págs. 127-135

Page 13: 1€¦  · Web viewINDÍCE. Prólogo ………………………………………………………………….. 2 Conceitos de jogo: social, profissional e patológico

Lamberton, Anna; Oei, Tian P. S. Problem Gambling in Adults: An Overview. In Clinical

Psychology and Psychotherapy – An Internacional Journal of Theory & Practice. Vol. 3, Nr 2.

New York: Wiley. June, 1997. ISSN: 1063-3995. Págs. 84-99

O’ Brien, Patricia et al. Psychiatric Nursing – An Integration of Theory and Practice. New

York: Mackgraw-Hill. 1999. ISBN: 0-07-105479-0. Págs. 387-393

Sáiz, Jerónimo; Ibánes, Ángela. Las bases neurobiológicas del juego patológico. In Anuário de

Psicología. Vol. 3, Nº 4. Barcelona: Ediciones Paidós. Diciembre, 1999. ISSN: 0066-5126.

Págs. 47-65

Townsend, Mary. Psychiatric/Mental Health Nursing: Concepts of Care. Philadelphia: F. A.

Davis Company. 1993. ISBN: 0-8036-8586-6

OUTRAS FONTES

Grande Dicionário Universal da Língua Portuguesa – Versão 3.0. Cacém: Texto Editora. 1997.

ISBN: 972-47-1022-X.