jornal arrocha - edição 05 - vícios e hábitos

12
Arrocha JUNHO DE 2011. ANO II. NúMERO 5 DISTRIBUIçãO GRATUITA - VENDA PROIBIDA Jornal JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE COMUNICAçãO SOCIAL/JORNALISMO DA UFMA, CAMPUS DE IMPERATRIZ Hábitos, rotina. Vícios, descontrole Acompanhando a tendência nacional, o crack vem liderando as estatísticas de apreensão da Delegacia de Entorpecentes de Imperatriz. Entre fevereiro de 2010, quando começou a funcio- nar, até o final do ano passado, foram apreendidos 15,3 quilos da droga que estavam em poder de traficantes da cidade. Como já se tornou a tendên- cia do Arrocha, além dos núme- ros, os futuros repórteres foram atrás dos seres humanos que so- frem com o flagelo de uma droga que vicia rápido e causa um grau de dependência mais intenso do que outras substâncias químicas. Na reportagem “Nas garras sedutoras do crack”, os perso- nagens descrevem a dor do ví- cio, que se confunde com o pra- zer imediatista que ele costuma proporcionar. Na mesma página, conheça o trabalho da delegacia e também do Programa Educa- cional de Resistência às Drogas (Proerd), este último estimulando a relação entre policiais capacita- dos, educadores, estudantes, pais e comunidade. Página 5 e 7 O que é vício? O que é hábi- to? Qual a fronteira que sepa- ra esses dois tipos de condutas humanas? Na entrevista desta edição do Arrocha, a psicólo- ga Gizele da Costa Cerqueira explica, entre outras questões, que a principal diferença entre ambos é o descontrole. Assim, entender a frequên- cia, intensidade, como, por que e para quê é essencial para o diagnóstico. Aliás, esse é o tema de to- das as matérias desta edição do jornal Arrocha. As reporta- gens tratam tanto do reflexo regional do crack, pasta base, maconha e álcool, quanto das compulsões por beleza, lim- peza, tecnologia, internet, en- tre outras. E também hábitos, como comer panelada e sentar na porta nas casas no final da tarde. Página 9 Comportamentos ligados à vaidade são comuns desde a ori- gem da humanidade. Mas hoje, com todos os tratamentos e ci- rurgias existentes, a tendência a se embelezar pode virar uma compulsão que, segundo a opi- nião dos especialistas, atrapa- lha as relações sociais. Conheça histórias curiosas e personagens diversos sobre o assunto nessa edição. Página 12 Tecnologia também gera compulsão À medida que os preços dos produtos tecnológicos se tornam mais baratos, muitos passam a li- dar com nova compulsão: a troca constante de celulares, computa- dores e outros brinquedinhos. To- dos prometem uma novidade que outro supostamente não tinha. A relação com a internet, principal- mente entre os jovens, também precisa de certo controle, segundo os especialistas. Página 10 Transtorno Obsessivo (TOC), limpeza, hipocondria...Tem mania para tudo Transtorno Obsessivo Com- pulsivo (TOC) é o nome cientí- fico para quando hábitos que parecem comuns e rotineiros se transformam em compulsão. É uma ideia que invade o pensa- mento e deixa o indivíduo sem o domínio das próprias ações. Mesmo quando não chegam a ser tão graves, certas manias atrapalham o cotidiano das pes- soas. A compulsão por limpeza é uma das mais comuns e pou- co contestadas. Os classificados como hipocondríacos, preocu- pados tanto com a medicina tra- dicional quanto com a baseada nas plantas e até mesmo os co- lecionadores também são perso- nagens que os nossos repórteres foram procurar para ouvir nesta edição. Páginas 3, 6 e 11 - TRÁFICO - Sejam as rodas de conversa em família ou mesmo entre amigos e vizinhos, todas são sempre muito animadas e cercadas pelos risos e por olhares curiosos THAÍSIA ROCHA Vaidade demais pode atrapalhar ROSANA BARROS

Upload: imperatriz-noticias

Post on 06-Mar-2016

243 views

Category:

Documents


9 download

DESCRIPTION

Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos. Produzido pelos acadêmicos de Jornalismo da UFMA de Imperatriz.

TRANSCRIPT

Page 1: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

ArrochaJUNHO de 2011. ANO ii. NúmerO 5 distribUiçãO GrAtUitA - VeNdA PrOibidA

Jorn

al

JOrNAl lAbOrAtÓriO dO cUrsO de cOmUNicAçãO sOciAl/JOrNAlismO dA UfmA, cAmPUs de imPerAtriz

Hábitos, rotina. Vícios, descontrole

Acompanhando a tendência nacional, o crack vem liderando as estatísticas de apreensão da Delegacia de Entorpecentes de Imperatriz. Entre fevereiro de 2010, quando começou a funcio-nar, até o final do ano passado, foram apreendidos 15,3 quilos da droga que estavam em poder de traficantes da cidade.

Como já se tornou a tendên-cia do Arrocha, além dos núme-ros, os futuros repórteres foram atrás dos seres humanos que so-frem com o flagelo de uma droga que vicia rápido e causa um grau de dependência mais intenso do que outras substâncias químicas.

Na reportagem “Nas garras sedutoras do crack”, os perso-nagens descrevem a dor do ví-cio, que se confunde com o pra-zer imediatista que ele costuma proporcionar. Na mesma página, conheça o trabalho da delegacia e também do Programa Educa-cional de Resistência às Drogas (Proerd), este último estimulando a relação entre policiais capacita-dos, educadores, estudantes, pais e comunidade. Página 5 e 7

O que é vício? O que é hábi-to? Qual a fronteira que sepa-ra esses dois tipos de condutas humanas? Na entrevista desta edição do Arrocha, a psicólo-

ga Gizele da Costa Cerqueira explica, entre outras questões, que a principal diferença entre ambos é o descontrole.

Assim, entender a frequên-

cia, intensidade, como, por que e para quê é essencial para o diagnóstico.

Aliás, esse é o tema de to-das as matérias desta edição

do jornal Arrocha. As reporta-gens tratam tanto do reflexo regional do crack, pasta base, maconha e álcool, quanto das compulsões por beleza, lim-

peza, tecnologia, internet, en-tre outras. E também hábitos, como comer panelada e sentar na porta nas casas no final da tarde. Página 9

Comportamentos ligados à vaidade são comuns desde a ori-gem da humanidade. Mas hoje, com todos os tratamentos e ci-rurgias existentes, a tendência a se embelezar pode virar uma compulsão que, segundo a opi-nião dos especialistas, atrapa-lha as relações sociais. Conheça histórias curiosas e personagens diversos sobre o assunto nessa edição. Página 12

Tecnologia tambémgera compulsão

À medida que os preços dos produtos tecnológicos se tornam mais baratos, muitos passam a li-dar com nova compulsão: a troca constante de celulares, computa-dores e outros brinquedinhos. To-dos prometem uma novidade que outro supostamente não tinha. A relação com a internet, principal-mente entre os jovens, também precisa de certo controle, segundo os especialistas. Página 10

Transtorno Obsessivo (TOC), limpeza, hipocondria...Tem mania para tudo

Transtorno Obsessivo Com-pulsivo (TOC) é o nome cientí-fico para quando hábitos que parecem comuns e rotineiros se transformam em compulsão. É uma ideia que invade o pensa-mento e deixa o indivíduo sem o domínio das próprias ações.

Mesmo quando não chegam a ser tão graves, certas manias atrapalham o cotidiano das pes-

soas. A compulsão por limpeza é uma das mais comuns e pou-co contestadas. Os classificados como hipocondríacos, preocu-pados tanto com a medicina tra-dicional quanto com a baseada nas plantas e até mesmo os co-lecionadores também são perso-nagens que os nossos repórteres foram procurar para ouvir nesta edição. Páginas 3, 6 e 11

- TRÁFICO -

Sejam as rodas de conversa em família ou mesmo entre amigos e vizinhos, todas são sempre muito animadas e cercadas pelos risos e por olhares curiosos

THAÍSIA ROCHA

Vaidade demais pode atrapalhar

ROSAnA bARROS

Page 2: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

Quando é que aquele hábito que parece comum e inofensivo torna-se uma compulsão que traz prejuízos fí-sicos e psicológicos? Tendo como pon-to inicial esta pergunta, os acadêmicos do curso de Jornalismo da UFMA re-solveram partir mais uma vez a campo para elaborar esta edição especial do Arrocha sobre vícios e hábitos.

Para amenizar um assunto tão complexo, como a questão do vício em drogas, foi decidido, em sala de aula, que este jornal também traria reportagens sobre hábitos que identi-ficam Imperatriz. Assim, os acadêmi-cos e futuros jornalistas conversaram com aqueles que gostam de sentar na porta e com os consumidores de pa-nelada. Nem sempre encaradas como problemas aparecem aqui também as compulsões por vaidade, limpeza, trabalho, sexo, consumo, baladas e

internet. Algumas vezes, o tom de hu-mor ajuda a relaxar, mas o problema é sério quando foge do controle. Não poderiam faltar também reportagens sobre o flagelo das drogas pesadas, como o crack e as formas de combate ao tráfico, bem como o tratamento dos dependentes. Os futuros repórteres se preocupam em procurar histórias para ilustrar todas as situações. Onde há ser humano, temos sempre um pro-cesso de identificação. Mais uma vez a principal intenção é desdobrar um assunto em seus vários ângulos. Boa leitura.

Arrocha: É uma expressão tí-pica da região tocantina e também é um ritmo musical do Nordeste. Signi-fica algo próximo ao popular desem-bucha. Mas lembra também “a rocha”, algo inabalável como o propósito éti-co desta publicação.

EDITORIAL - Entre o hábito e o vício

Ensaio Fotográfico

CHARGE

2 ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

ExpEDIEnTE Fotografia: Alan milhomem, Alessandra ferreira, carla Kassis, diego leonardo, dyego Wilson, Gleicy ferraz, Jairo moraes, marisvaldo lima, mauricio sousa, Narcisio ferreira, Nilzeth Alves, Paulo edson, Pollyana Galvão, renata costa, rosana barros, thaisia rocha, Wallikson barros, Welbert Queiroz, e Karla carvalho (tratamento de imagens).

Reportagem: Ângela barros, Alan milhomem, Alessandra ferreira, Allana cristina, carla Kassis, douglas Aguiar, Gleicy ferraz, Joaquim rodrigues, marisvaldo lima, maurício sousa, max dimes, Narcisio ferreira, Nilzeth Alves, Nonato Pereira, Paulo edson, Pollyana Galvão, renata costa, rosana barros, stepheson silva, thaisia rocha, thalyta dias, Wallikson barros, Welbert Queiroz.

Professores: diagramação: Allanna chrystyne rocha menezes sanches, Ana Alice mendes dos santos, Anderson silva de Araújo, Antonio Wagner silva Aurélio, cleber carlos simoes Júnior, diana cardoso costa, edigeny soares barros, elen cristina silva santos, evando raizio silva maciel, flávia brito silva, flávia luciana magalhães Novais, Genyedi soares barros, Gleziane sobrinho de Oliveira, isabela crema tavares, Jéssica roseane fernandes Gomes, José Augusto dias da silva, Karla mendes santos, Karlanny costa farias, Kellen Nilceya dos santos Almeida, layane do Nascimento ribeiro, luan rogerio Pereira lima, maiely cabral dos santos, marcela

Publicação laboratorial interdisciplinar do Curso de Comunicação Social/Jornalismo da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). As informações aqui contidas não representam a opinião da Universidade.

Jornal Arrocha. Ano II. número 5. Junho de 2011

Reitor - Prof. dr. Natalino salgado filho | diretor do Campus de Imperatriz - Prof. dr. Jefferson moreno | Coordenadora do Curso de Jornalismo - Prof. msc. roseane Arcanjo Pinheiro.

msc. Alexandre maciel (Jornalismo impresso), msc. marco Antônio Gehlen (Programação Visual), msc. marcus túlio lavarda (fotojornalismo). revisão: Acadêmica Nilzeth Alves.

www.imperatriznoticias.com.br | Fone: (99) 3221-7625 Email: [email protected]

Contatos:

de souza silva, maria félix Pereira calixto, mariana ferreira campos, marilan reis dos santos, marta Nunes de Oliveira, mikaelle Katússia martins carvalho, Pamella bandeira santana, raísa farias Araújo salles, ramisa farias Araújo salles, rayane silva de carvalho, raynan ferreira Pinheiro, rômulo santos fernandes, safira Vieira Pinho, samoel Pereira de freitas, sara cristina costa batalha, sararuth Andrade chagas, saron Paulo fell Alencar de Albuquerque, silas Waldemir souza chaves, taya santana da silva, thayse de sousa barros, Valdiane costa de santana, Walison silva reis, Wenia Hyana reis silva, Yanny dorea moscovits.

WALLIKSOn bARROS

DIEGO LEOnARDO

THAÍSIA ROCHA

JAIRO MORAES

Page 3: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

TRADIçãOPara muitos, a panelada é apenas uma refeição pós-noitada regada a álcool. Para outros, é o café da manhã que enche de força para mais um dia de trabalho

PAUlO EDSON

Ao sentarem no banco velho, pintado de tinta azul descascada pelo tempo largo de uso, os clien-tes das barracas de panelada sentem a verdade do provérbio: “De costas para a rua, todo mundo é igual”. A iguaria, essencialmente imperatri-zense, não escolhe as pessoas que a consomem.

Vindos de todas as partes da ci-dade, os clientes chegam trazendo suas experiências também diversas. De barões a peões, todos se reúnem em torno de pratos cheios e ardi-dos de pimenta malagueta curtida na gordura dentro de garrafas pet. limões azedos cortados e a fari-nha de puba dura como o dia que se levanta em plena madrugada de segunda-feira são a síntese da vida diária de quem tem em um prato en-gordurado a sustância primeira do dia, como diriam nossos avós.

Para muitos, a panelada é ape-nas uma refeição pós-noitada rega-da a álcool. Para outros, é o café da manhã que enche de força os braços dos trabalhadores que movimentam a cidade comercial.

As conversas fluem como a água gelada nos copos de alumínio

e terminam com pratos vazios de ossos roídos. Das Quatro Bocas à Rodoviária, os clientes procuram e acham o sabor sem se importarem com o lugar ou com o que se encon-tra em volta.

De acordo com o funcionário

de uma empresa de transportes, Dantas Amorim, os que consomem o prato não olham para a higiene do local. “O povo que come não liga muito se tem bueiro aberto por per-to, o preparo, esse tipo de coisa. Se ligassem ninguém comia”.

Horários - Dantas confirma tam-bém que é um assíduo consumi-dor da panelada, principalmente à noite, no intervalo do serviço. A opinião dele sobre esse costume é que por vezes, torna-se um vício. “Um colega de trabalho, até nas

folgas e mesmo tendo comida em casa, acordava meia-noite e vinha comer panelada aqui”.

O hábito de alimentar-se com a panelada em horários distintos deve-se à necessidade de quem consome administrar o próprio tempo, tanto de trabalho como de lazer. A vendedora do prato, Kei-tiane Rodrigues, conhece todos os tipos de clientes que frequentam sua barraca na avenida Bernardo Sayão, setor das Quatro Bocas: “Na parte da madrugada é mais o povo que vem da balada. Também vem muito mototáxi e garis. Pela ma-nhã é mais o povo que trabalha no Mercadinho, que come a panelada para aguentar o rojão diário”.

A verdade é que o consumo massivo e sem barreiras sociais se dá pelo fato de a panelada ser um prato saboroso e barato. Uma porção generosa custa em torno de seis reais.

Consumir a panelada é um exercício de manutenção da iden-tidade imperatrizense. Ela sinteti-za o sabor da cidade, temperada com o calor do sol ardente, a pi-menta bem curtida e o suor dos corpos molhados dos peões ma-drugadores.

De todas as partes da cidade, os clientes chegam trazendo suas experiências diversas. De barões a peões, todos se reúnem em torno dos pratos cheios

3ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

PAULO EDSOn

Aquela maniazinha podeser algo muito mais grave

panelada celebra democracia da alimentação

AllANA CRISTINA

Hoje com 13 anos, V.S.O. so-fre desde os dez com o Transtor-no Obsessivo Compulsivo (TOC). Quando está distraído rói com-pulsivamente as unhas e toda vez que passa por um “quebra-mola”, tem de voltar para tocá-lo. “Se não faço isso tenho pensamen-tos ruins, como minha mãe vai morrer”, conta, com tristeza, o menino.

Ele descobriu que era com-pulsivo quando suas atividades normais passaram a ser afetadas por ações pelas quais não tinha controle. V.S.O., por conta do transtorno, tem dificuldade no relacionamento com os colegas de classe e atrasa-se muito para chegar aos lugares por causa da sua mania.

A psicóloga Dayse Cavalcan-te define TOC como uma ideia que invade o pensamento e dei-xa o indivíduo sem domínio das ações. Ela afirma que a cura está próxima com o tratamento por meio de psicoterapia e medica-mentos. “A psicoterapia trabalha no combate dos pensamentos ne-gativos e o remédio ajuda o pa-ciente a ficar tranquilo”.

Maria Silva, mãe de V.S.O., diz que quando o via cometendo essas atitudes anormais não dava atenção, pois pensava que era de-vido à fase conturbada da adoles-cência. Os professores do garoto alertaram Maria sobre a queda do rendimento escolar dele e su-geriram a ela que procurasse o

Centro de Atenção Psicossocial Infanto Juvenil (CAPS IJ). “Foi no Caps que entendi que o meu pro-blema tinha cura. Os remédios e as conversas com as psicólogas me ajudam muito”, conta o me-nino.

O Centro Psicossocial In-fanto Juvenil está localizado no Complexo de Saúde Pública, no Parque Anhanguera. O número de pacientes com características de TOC é frequente. De cada dez que são atendidos, pelo menos três sofrem com a doença.

Outro problema enfrentado por quem tem TOC está na difi-culdade de encontrar remédios disponíveis na rede pública. A farmacêutica Vera lívia é respon-sável pelo processo de licitação de todos os medicamentos distri-buídos pela Secretaria Municipal de Saúde. Ela informa que a pre-feitura não tem remédios dispo-níveis para crianças que sofrem de TOC. “Temos para doentes mentais, não para aqueles que sofrem de ansiedade, que é um dos sintomas do TOC”. Afirma, ainda, que os únicos antidepres-sivos são receitados e destinados para adultos.

A identificação do TOC na criança e no adolescente não é fácil. Segundo a psicóloga Day-se Cavalcante, as doenças men-tais não recebem o mesmo valor que as demais pelo fato de serem pouco perceptíveis. No entanto, como causam sofrimento, têm de ser tratadas com a mesma inten-sidade.

Tudo no lugar, mas será que é saudável?NIlzETH AlVES

“Todo dia ela faz tudo sempre igual”. A letra da canção “Cotidia-no”, de Chico Buarque, parece ins-pirada na rotina da dona de casa Joãolisboense Antônia Cecília Al-meida Falcão, 49 anos. Ela acorda às 6 horas para preparar o café e, em seguida, inicia as tarefas do-mésticas. Descanso só à tarde, en-quanto assiste alguma novela.

A casa de Antônia tem sete cômodos, além de um alpendre, garagem e uma extensa área de quintal. Os espaços são varridos todos os dias e ainda tem de so-brar tempo para aguar as dezenas de plantas e dedicar-se à costura.

Quando encontra algo fora do lugar não reclama, mas se ir-rita com a bagunça e “a desorga-nização do marido e dos filhos, roupas, calçados espalhados pelo chão”.

Assim como Antônia, mais de 53 milhões de brasileiras donas de casa se esforçam para manter o ambiente doméstico limpo e organizado. Esse tipo de compor-tamento é considerado saudável, de acordo com a psicóloga Patrí-cia Maciel Trindade, pois a falta de medidas higiênicas adequadas afeta a autoestima, gera isola-mento social e preconceito.

A cabeleireira Maria Diva Te-les Caminha, 58 anos, também não para. Mantém jornada dupla desde 1987. Todos os dias, após chegar do salão, Diva encontra sempre um jeitinho de arrumar alguma coisa em casa. Por causa de seu apego com a limpeza ga-nhou até um apelido: “Maria en-joada”. Mas ela parece não se im-portar com as críticas.

Mesmo nos fins de semana não descansa. Pelo contrário, é nesses dias que trabalha mais. “Já deixei de sair várias vezes para me divertir, porque tinha que aproveitar o tempo para faxinar a casa”.

Exagero - O cuidado excessivo com a limpeza pode se tornar uma patologia e trazer prejuízos emocionais quando começa a in-terferir na vida social. Patrícia ex-plica que a pessoa fica com medo de frequentar certos lugares e evita situações sociais por temor de contaminação.

É o caso da universitária la-

rissa Fernanda Santana Rolim, 20 anos, que desde os nove convive com o hábito de lavar as mãos compulsivamente, devido ao re-ceio de contrair doenças.

Para larissa, não existe sen-sação pior do que sentir que suas mãos estão sujas. “Fico impacien-te, não consigo fazer outra coisa, fico só pensando nas mãos”. A jovem buscou ajuda de um pro-fissional e, após quatro anos de tratamento psicológico, o núme-ro de lavagens “diminuiu” para um pouco mais de 30 vezes por dia. Hoje, ela já consegue pegar nas mãos das pessoas tranquila-mente.

Antônia Falcão lida com as tarefas domésticas o dia inteiro e só descansa enquanto assiste novela

nILZETH ALVES

Page 4: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

4 ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

CERCOiniciativas como a lei Antifumo são tentativas de impedir disseminação do vício do tabagismo, mas as influências familiares e culturais são determinantes

Mesmo com alerta, fumar ainda é comum

WElBERT QUEIROz

Ricardo tem 20 anos e lembra que o primeiro contato com o ál-cool foi aos 12, em uma reunião de coroinhas após uma missa. Depois desse dia passou a beber socialmente, mas nunca exagerou na dose. Como muitos, ele garante que sabe a hora de parar.

O grupo Reviver de Alcoóli-cos Anônimos (AA) em Imperatriz tem uma postura diferenciada, pois trabalha com a recuperação do indivíduo que procura a insti-tuição por vontade própria. Nas reuniões, cada membro tem o seu sobrenome substituído pela sigla AA. “Aqui trabalhamos com o au-tojulgamento, é uma sugestão e não obrigação. Encaramos o alco-olismo como doença e não como espíritos ou encosto”, declara Francisco AA.

Ele relata que para se livrar do vício procurou “de religiões a macumbeiros”, mas não obteve sucesso. “Eu encontrei a resposta no Alcoólicos Anônimos. Aos 33 anos, Jesus salvou o mundo e aos 33 eu salvei minha vida”, reconhe-ce, emocionado.

Outro membro, Antônio AA, dentre outros problemas, perdeu a

mulher por causa do vício, motivo que o levou a procurar o grupo. “O AA não é apenas para deixar de

beber. É para aprender, respeitar e mudar o comportamento. É uma programação de vida”, garante or-

gulhosamente.Para a maioria das pessoas,

o consumo de álcool gera pouco

ou nenhum risco de se tornar um vício. Outros fatores geralmente contribuem para que o seu uso se transforme em alcoolismo: o am-biente social em que a pessoa vive, a saúde emocional e psíquica, além da predisposição genética.

O álcool possui grande acei-tação social. Essa é uma droga que atua no sistema nervoso cen-tral, podendo causar dependência e mudança no comportamento. Quando consumido em excesso é visto como um problema de saú-de, pois está diretamente ligado a acidentes de trânsito e violência.

O alcoolismo é definido como o consumo exagerado de álcool ou preocupação com bebidas alcoóli-cas ao ponto de esse comporta-mento interferir na vida pessoal, familiar, social ou na profissional da pessoa.

Trata-se de um dos problemas mundiais de uso de drogas que mais traz custos. Com exceção do tabagismo, sai mais caro para os sistemas de saúde dos países do que a combinação dos proble-mas relacionados ao consumo de outros drogas, segundo dados do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Ce-brid).

AlESSANDRA FERREIRA

Fatores como a interferência da família e da escola “abrem as portas” para que a juventude im-peratrizense seja cada vez mais cedo dependente do cigarro.

Geane, ou “Preta” é uma jovem divorciada, com largo sorriso, que

fuma desde os 17 anos. “Dizem que outras pessoas influenciam”. Ela alega que suas amigas tinham apenas 15 anos quando iniciaram o consumo do cigarro. Ou seja, ainda estavam em idade escolar.

Tanto em espaços universi-tários como em instituições de ensino fundamental encontra-

mos jovens que consomem pro-dutos derivados do tabaco. R., 14 anos, estudante e esportista, é um exemplo desse contexto. “Já faz um ano que fumo”. Ele ainda res-salta que o cigarro ajudou-o a ser aceito no grupo de amigos.

Mas existem casos em que a família também exerce uma for-

te influência. Segundo “Preta”, apesar das suas colegas da escola sempre fumarem perto dela, so-mente depois do seu casamento sentiu vontade de usar o cigarro. “Aprendi a fumar com meu espo-so”.

Para tentar diminuir os índi-ces e riscos que envolvem as duas

bases sociais da formação do in-divíduo, o estado do Maranhão adotou a proposta nacional de lei Antifumo.

Aprovado pela Assembleia legislativa do Maranhão em 10 de agosto de 2009, o documento proíbe o consumo de cigarros, ou “quaisquer produtos fumígenos” derivados ou não do tabaco, nos ambientes de uso coletivo, públi-cos e privados.

O texto deixa claro que “am-bientes de uso coletivo” muito mais do que bares e restaurantes, são espaços “de trabalho, de estu-do, de cultura, de culto religioso, de lazer, de esporte ou de entre-tenimento, áreas comuns de con-domínios, casas de espetáculos, teatros, cinemas, lanchonetes, boates, hotéis, pousadas, veículos públicos ou privados de transpor-te coletivo, viaturas oficiais de qualquer espécie e táxis”.

A estimativa da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), sobre o con-sumo individual do cigarro no país também mostra a importân-cia de aplicar a lei Antifumo. O consumo nacional varia de 20 ou mais unidades por dia de acordo com os dados.

No caso de São luís o valor atingiu 2,5%. Em Imperatriz a re-alidade também não é diferente. Apesar dos amigos aconselharem Preta a largar o cigarro, ela decla-ra que costuma fumar por volta de três carteiras por dia, especial-mente quando consome bebidas alcoólicas. Para a jovem, é difícil largar o vício porque “tem muitas vezes que o cigarro tira depres-são, apetite, a raiva que a gente desconta nele”.

Uso dos produtos derivados do tabaco está mais limitado em ambientes públicos, mas novas pessoas, principalmente jovens, continuam aderindo ao vício por motivos como a influência de amigos que fumam

ALESSAnDRA FERREIRA

Para a maioria das pessoas, o consumo de álcool gera pouco ou nenhum risco de se tornar um vício, mas outros fatores conjugados podem levar ao alcoolismo

Incentivo ao consumo de bebida alcoólica ajuda a não perceber compulsãoWELbERT QUEIROZ

Page 5: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

5ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

“BOCAS”dados da delegacia de entorpecentes de imperatriz apontam a liderança do crack entre as drogas mais apreendidas nas mãos dos traficantes da cidade

Crack e maconha são as drogas mais apreendidasJOAQUIM RODRIGUES

Dados da Delegacia de Entorpe-centes de Imperatriz, que começou as suas atividades em fevereiro de 2010, indicam que daquele mês no ano passado até dezembro o crack foi a droga mais apreendida, tota-lizando 15,3 quilos. Entre janeiro e abril de 2011 o entorpecente con-tinua na liderança, com 6,7 quilos apreendidos. Entre fevereiro e de-zembro de 2010 o total de maconha apreendido foi de 2,9 quilos contra 21g de cocaína. Nos primeiros meses de 2011, a polícia conseguiu retirar do poder dos traficantes 344,37g de maconha.

Por outro lado, quando se leva em conta os dados da Polícia Rodo-viária Federal, é significativo o nú-mero de apreensões de outra droga nas estradas do Maranhão: a pasta base de cocaína. Foram mais de 100 quilos no ano passado e só em mar-ço de 2011, em uma única operação em Porto Franco, a polícia apreen-deu 16 quilos desta droga.

A pasta da cocaína é o substrato da folha da coca mais barato e com alto teor de impurezas. De acordo com um usuário que preferiu não se

identificar, a pasta tem vantagem no mercado por ser mais lucrativa para os traficantes. Um quilo no formato de pedra pode multiplicar até 11 qui-los de pasta e seu lucro não rende menos do que 20 mil reais. Pode ser comprada, na fonte, por menos de 10 dólares. Já um quilo de maconha plantada não passa dos 200 reais.

Em uma operação realizada no mês de agosto de 2010 em apenas uma “boca de fumo” no bairro Bacu-ri foram apreendidos oito quilos da pasta de cocaína. A quantia superou a maconha e o cloridato. Essa dro-ga pode ser beneficiada e misturada a outras substâncias químicas, no formato de pasta base, petrificada, quando é conhecida como pedra de óxi, já pronta para o consumo, ou “embolada” em pequenas “petecas” vendidas entre 5 e 15 reais.

Esse entorpecente resulta dos restos da folha da coca. Após ser prensada é misturada a solventes químicos. Em um processo artesa-nal, de suas sobras ainda são pro-duzidas duas drogas ainda mais ba-ratas.

“A coca desgraçou toda, mas toda a minha família mesmo. Pri-meiro o pai, depois minha irmã e eu.

Hoje não uso mais, mas o pai conti-nua. É terrível ver o seu pai nesta situação. Só não perdeu o emprego dele porque tem estabilidade”, rela-ta uma usuária identificada com as iniciais S.M.

O consumo de drogas é mais amplo, o que significa dizer que ou-tros produtos são utilizados para satisfazer a vontade do usuário. Entre os adolescentes há registro de alguns inalantes, que tem utilidades domésticas, mas acabam sendo usa-

dos para entorpecer. Na sua grande maioria são produtos químicos que evaporam muito rápido. Entretan-to, seus prejuízos são longos, pois, entre os danos causados estão: ta-quicardia, hepatite, epilepsia e per-da do olfato.

De acordo com o policial mili-tar Pedro Marinho, que atua no Pro-grama Educacional de Resistência às Drogas e Violência (Proerd), a PM vem trabalhando principalmente na prevenção por meio de atividades

desenvolvidas em salas de aula e isso tem gerado bons resultados. O Grupo Especial de Apoio às Escolas (Geape) também atua no combate ao tráfico e ao consumo nas insti-tuições de ensino.

Outro usuário conta que co-meçou a usar inalantes já adulto. “Durante algum tempo usava con-trolado, depois observei que esta-va secando, morrendo aos poucos. Hoje estou tentando me curar desse câncer chamado droga”.

GlEICy FERRAz

O vício é algo que prejudica, e é difícil superá-lo sozinho, por isso, existem os locais especializados. Na ci-

dade há centros de reabilitação, onde eram encontrados até o ano passado aparatos específicos para a ressociali-zação. Mas, no momento, a realidade é outra. A estrutura para recuperação

de dependentes químicos e, mais ain-da, para cuidar da saúde mental em Imperatriz, atualmente passa por uma crise.

Existe na cidade o Centro de

Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD), o Caps Infanto Juvenil (IJ), o Caps Adulto (Renascer) e o Núcleo de Assistência Integrada à Saúde de Impe-ratriz (Naisi) com serviço de urgência e emergência. Todos sofrem com a falta de investimentos, o que vem prejudi-cando o atendimento.

O Caps Renascer fechou as por-tas parcialmente, enquanto os outros centros também vêm sofrendo cortes de verbas. De acordo com carta aberta à sociedade redigida e divulgada por acadêmicos e professores do curso de enfermagem da UFMA, “no momento, o funcionamento se dá de forma pre-cária, por exemplo: não são ofertadas todas as refeições necessárias; não são desenvolvidas terapêuticas comple-mentares ao cuidado dos pacientes em razão da escassez de recursos”.

Um dos motivos é que nos meses de abril e maio de 2011 foram efetua-dos cortes no sistema de saúde, o que gerou a demissão de funcionários con-tratados, deixando efetivamente no cargo apenas os concursados. Assim, o atendimento de todo o sistema acabou prejudicado. Em 2001 o então prefeito Jomar Fernandes havia firmado con-vênio com o Ministério da Saúde para manter as casas de reabilitação.

Os estudantes de enfermagem, juntamente com usuários e traba-lhadores de serviços da área de saú-de mental promoveram no dia 18 de maio, Dia da luta Antimanicomial, uma caminhada pedindo o fim dos manicômios e melhor estrutura para a ressocialização dos usuários do sis-tema.

Os centros de reabilitação na cidade surgiram por meio de vários projetos. O primeiro nascido neste sentido foi o ambulatório especializa-do em saúde mental chamado “Casa” que, tendo sido fundado em 2001, tornou-se o Caps adulto com inaugu-ração no dia 21 de dezembro de 2004. O objetivo foi tratar e dar assistência psicológica e psicoterapêutica com uma equipe multiprofissional com-posta por psicólogos, enfermeiros, médicos, assistentes sociais, musico-terapeutas e professores de educação física.

Até o ano passado havia ativida-des de oficinas de arte e as telas eram pintadas pelos próprios pacientes. Havia, ainda, banhos de piscina, lan-ches e uma integração social que pro-porcionava entretenimento durante todo dia. Hoje, as atividades estão sob ameaça de continuar em sua ple-nitude.

A equipe que realizava o trata-mento recebia orientação da Univer-sidade de São Paulo (USP) sobre como fornecer informações terapêuticas aos pacientes e acompanhar as famí-lias, em projeto chamado “Terapêutico Individual”, hoje com o atendimento prejudicado. O mesmo acontece com o Núcleo de Atenção Integrada em Saúde de Imperatriz (Naisi), centro de reabilitação ligado aos Caps, porém com ênfase maior, pois atua na inter-nação. Com todos os problemas que vem ocorrendo, os pacientes estão desassistidos. Os serviços estariam funcionando em precárias condições, tanto físicas quanto assistenciais.

DIEGO LEOnARDO

Resultado comum de uma busca e apreensão policial: armas, cocaína, maconha, pasta base, lança-perfume e dinheiro provenientes do tráfico lucrativo

Atividades artísticas faziam parte do processo de recuperação de dependentes químicos a partir de um trabalho que envolvia profissionais de várias áreas

Centros de reabilitação de Imperatriz lutam para manter funcionamentoGLEICY FERRAZ

Page 6: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

6 ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

pOLÊMICAUsuários da cannabis mantêm o discurso de que o seu consumo é um hábito milenar que ajuda a “gerar comunhão” e acham absurdo proibir uma planta

nARCISIO FERREIRA

NARCISIO FERREIRA

Beira-Rio. O pôr do sol lança sobre as águas os últimos raios de luz. lugar propício para chegar ao fim do dia. Ali se encontra um grupo de amigos usuários de ma-conha. Segundo eles, esse horário é o ideal para utilizar a droga.

Sentados em um lençol sobre a grama, de uma maneira harmô-nica, quase como um ritual, eles fazem o uso da erva. O “baseado”, passa de mão em mão, aos poucos vai diminuindo e em instantes os usuários parecem ser tomados por um arrebatamento de sensações.

Mi, uma das integrantes do grupo, explica por que faz uso da “diamba”. “A maconha é uma droga que socializa, ela traz comunhão entre as pessoas. Deveria ser libe-rado até o plantio, pois o cultivo seria mais saudável”. Ela ainda ressalta que o álcool é que deveria ser proibido, pois tira a percepção da realidade. “A ‘cannabis’ é uma planta e foi Deus quem fez”, co-menta a moça, com o rosto sério.

José (nome fictício para pre-servar a identidade da fonte) é um cidadão de 40 anos e já avô, tra-balha duro em sua bicicleta para sustentar a família. Sempre que

pode vai ao encontro dos amigos para curtir o cair da noite e fumar o “cachimbo da paz”. Empolgado, talvez com o som de uma flauta que tocava a música “Carinhoso”, de Pixinguinha, José põe um sorri-so no rosto e relembra: “A primeira vez que fumei tinha 15 anos e sal-vei a mulher da minha vida”. Com o pensamento elevado continua a conversar com os amigos, falando de coisas místicas e da importân-cia da natureza na vida do ser hu-mano. Quanto ao final da história José se esquece de contar.

Fumar maconha é uma prá-tica antiga. Segundo estudiosos, na região onde hoje é a Romênia foram encontradas sementes que comprovam o uso da droga no Ter-ceiro Milênio a.C. Chamada cien-tificamente de cannabis sativa, tem como principal composto químico o tetraidrocanabinol.

Debate - No Brasil o consumo des-sa substância é proibido. Nos anos 1990, iniciou-se uma ampla dis-cussão sobre o consumo e a legali-zação da erva. Em parte, o debate deu-se tanto com a presença de Fernando Gabeira no Congresso Nacional quanto pelas canções da banda “Planet Hemp” que faziam

apologia ao uso da erva. E hoje, o que as pessoas acham?

O policial militar Antônio (pseudônimo usado para preser-var a identidade do entrevistado) é contra o consumo e a legaliza-ção da planta. De acordo com ele, o uso da erva não traz benefício algum, o usuário fica dependen-te e perde o controle. Alterando, assim, a ordem social. E comple-ta: “O pai que usa deixa de lado a família e dá prioridade à droga”. Já C.D.7, jovem de 24 anos, é a fa-vor da liberação. Assim, o usuário poderia ter sua própria plantação. “Como é que os caras vão proibir uma planta?”

À margem de toda essa discus-são encontra-se Mister M., que, tendo o céu como abrigo, peregri-na pelas ruas de Imperatriz. Ele possui uma mala, na qual coloca suas ferramentas de confeccionar pulseiras. Conheceu a “marijuana” aos 14 anos e hoje, com 39, conti-nua consumindo.

“Ela abre minha mente, me deixa pensativo. Às vezes não que-ro, mas a carne pede”. Ao lado de alguns amigos, também na Beira-Rio, totalmente “maluco beleza”, fuma seu “baseado” e fica a excla-mar: “Vida louca!”

MARISVAlDO lIMA

Hipocondria, do grego hypo, “abaixo,” e kondrós, “cartilagem do tórax”. Segundo o Dicionário Mi-chaelis é o receio mórbido pela saú-de, muitas vezes associado com uma doença imaginária.

Maria de Jesus, 62 anos, é uma mulher negra e magra que aparen-ta ter metade de sua idade, não tem um fio de cabelo branco na cabeça e esbanja disposição para dar e ven-der. No quintal grande de sua casa ela planta quase tudo que usa para fazer os remédios que toma.

Posicionada na lavanderia com uma pilha de roupas para lavar, ela começa a me dar as receitas: “Está com dor de cabeça? Chá das folhas de terramicina. Com dor de barriga? A hortelã está logo ali. Inflamações de toda sorte? Casca de aroeira, inharé ou casca de caju. Problemas renais: casca de jatobá ou chá de quebra-pedra”. Eu pergunto: “E fun-ciona?” Maria solta um convicto: “mas é claro!”.

As receitas são tantas... pode escolher à vontade. Mastruz com folhas de algodão serve para cicatri-zar ferimentos. Cravo-da-Índia com álcool e pinhão curam enxaqueca. Calmante bom é chá de capim santo ou erva cidreira.

Apesar de tantos remédios ca-seiros ela vai ao médico com muita frequência. Em uma dessas consul-tas descobriu que tem um mioma no útero. Dessa vez ela terá de fazer cirurgia.

Ao me despedir ganhei até um

remédio que, segundo ela, pode curar minha artrite: duas gotas de leite do Pau-Brasil para uma garrafa de vinho branco seco.

Automedicação - Encontro Fran-cisca Silva Gomes de 56 anos senta-da na calçada de casa. Mãe de nove filhos e casada, ela é dona de uma voz conhecida na vizinhança. Não que ela cante bem ou algo do tipo, mas pelos sonoros “ê Mateus, vem almoçar” que ecoam diariamente da porta para fora.

Em uma caixa de sapatos, estra-tegicamente guardada na primeira gaveta da cômoda, ela guarda car-telas e mais cartelas, frascos e mais frascos de remédios. Neosaldina, Tandene, Anador, Doril, Cataflan, AAS, Amoxilina, Diclofenaco de Só-dio, Dipirona, Tylenol. Todos sem receita.

Ela diz que sente muita dor de dente, mas tem medo de arrancar, por isso toma tanta Neosaldina. “Mas e o resto, é pra quê?”. Ela res-ponde sem hesitar: “Aqui tem muito menino. Se algum deles adoecer de noite já tem remédio aí”. Mas não deixa de confessar: “Tenho muito medo de adoecer, por isso que te-nho todos esses remédios aqui em casa”.

Segundo Eliseu Veraciano, pro-prietário de uma drogaria na perife-ria da cidade, é grande o número de pessoas que procuram a farmácia para comprar remédios sem pres-crição médica. “Na maior parte das vezes são sempre as mesmas pes-soas que, semanalmente, compram

remédios pra dor de cabeça, dor de dente e às vezes até remédios con-trolados”.

Cresce também o número de pessoas que aderem aos remédios caseiros. Exageros que podem tor-

nar-se vícios, que, por sua vez, po-dem complicar em vez de curar do-enças.

Consumo de maconha ganha jeito de ritual

Preparar o “baseado” é a primeira etapa do ritual que depois seguirá com o seu compartilhamento

Do uso de plantas caseiras a automedicação: qual o limite dos remédios?

Maria planta no quintal de sua casa quase tudo que usa para fazer os remédios que costuma consumir. Funciona? “Mas é claro!”, responde convicta

MARISVALDO LIMA

Page 7: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

7ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

DEpEnDÊnCIAO crack é uma das drogas mais baratas, porém demonstra um poder viciante superior e surgiu como alternativa à conhecida cocaína

ROSANA BARROS

Irajá e l., como pediram para ser identificados, entraram para o ranking de usuários do crack por curiosidade de saber qual é o efeito dessa droga. Irajá, um hi-ppie de fala mansa e sempre com um sorriso no rosto, disse ter usado a substância após o fim do seu casamento enquanto l. expe-rimentou por influência dos ami-gos.

O crack é a droga mais ba-rata que existe, porém uma das mais viciantes. Surgiu como uma alternativa para a cocaína, mas aumentou o teor de impureza. Geralmente é composto por coca-ína, bicarbonato de sódio, éter e acetona. Alguns traficantes acres-centam talco, cimento branco e cal. Pode haver também solução de bateria e, às vezes, até cacos de vidro moído.

Irajá relatou o que para ele foi mais significativo durante o uso: “Após uma semana e meia usando só crack dia e noite, sen-ti minha alma se separar do cor-po. Foi uma viagem totalmente diferente, a parada mais marcan-te que eu carrego até hoje”. l. contou que nunca sentiu prazer ao usar, pois ficava sempre muito nervoso e no outro dia sentia-se arrependido.

As sensações mais comuns de quem usa são a euforia, exci-tação, tremores, suor intenso, di-latação das pupilas, aumento da pressão arterial e dos batimentos cardíacos. Normalmente quem consome a pedra já passou por outros tipos de drogas. Irajá usou cocaína, maconha, ecstasy, anfe-taminas e também as injetáveis. Já l. era usuário apenas do álcool e de maconha quando provou o crack pela primeira vez.

Após o consumo, o efeito é instantâneo. São poucos segun-dos para sentir o prazer, que logo

acaba e o corpo pede mais. Dessa forma, o usuário procura todos os meios para conseguir nova-mente a droga. Muitos roubam até a própria família e vendem tudo o que têm dentro de casa. O crack é consumido em cachimbos nos quais se colocam cinzas de cigarro e a pedra. Ou então como “pitilho”, que é a sua forma mis-turada com a maconha.

Em Imperatriz, a Delegacia

de Entorpecentes é a responsável pelas apreensões do crack, uma das substâncias mais combatidas na cidade. Irajá lembra que já fi-cou preso 24 horas, mas o pior foi ficar sem a droga durante esse período.

Mensagem - Muitos usuários buscam ajuda no Centro de Aten-ção Psicossocial de Álcool e Dro-ga de Imperatriz (CAPS AD Giras-

sol), quando não conseguem mais dominar seu corpo e o grau de agressividade está em alto nível. Os pacientes são indicados pelo Núcleo de Atenção Integrada em Saúde de Imperatriz (Naisi) e pelo Hospital Municipal (Socorrão), pois necessitam de ajuda para en-frentar as crises de abstinência.

Irajá deixa uma mensagem para os usuários de crack: “Para galera que usa, a única coisa que

eu digo é que conhece o tamanho do problema que está entrando. E, se quiser persistir no erro, sabe qual o ponto que vai chegar. Pois desde o início a história já está escrita que você vai chegar no fim do nada, não vai ter nada, nem apoio da família”. Tanto Ira-já quanto l. disseram ter deixado de usar pedra, pois como alega-ram, “usar crack é fim de carrei-ra”.

STEPHESON SIlVA

No dia 15 de fevereiro de 2010 foi implantada a Delegacia de En-torpecentes em Imperatriz, devi-do ao elevado índice de procedimentos policiais relacionados às drogas. Desde então, ela se tor-nou o centro das investi-gações e dos demais atos de polícia judiciária, ponto de atendimento e proteção à população.

O delegado de Po-lícia Civil, Arthur José Benazzi, informa que a delegacia tem priorizado atividades de inteligência no combate às drogas. Investigações de pontos de vendas, perfis e comportamen-tos são necessários para se anteci-par as ações dos principais grupos que atuam na cidade.

Procedimentos - Segundo Bena-zzi, as investigações podem durar

meses. Primeiro são levantadas provas suficientes para a solicita-ção de mandatos de busca e apre-ensão. Quando a Justiça determina, os policiais aguardam o momento

certa para dar o flagrante.Ocorrendo a prisão, a autori-

dade de polícia judiciária comuni-cará, imediatamente, ao juiz com-petente, que dará vista ao órgão do Ministério Público no prazo de 24 horas. No laudo constam o

tipo e a quantidade de droga apre-endida, confirmado por um perito oficial.

“O que diferencia o consumi-dor do traficante de drogas não é

a quantidade apreendida, mas sim, a circunstância em que a droga era utili-zada”, explica o delegado Arthur Benazzi. A pessoa que transportar ou trou-xer consigo para consumo pessoal será submetida às seguintes penalidades: advertência sobre os efei-tos das drogas, prestação de serviços a comunidade e comparecimento a pro-gramas ou cursos educa-tivos.

Para aquele que porta drogas com a finalidade de expor à venda, a pena é de três a 10 anos de prisão e pagamento de 700 a 1.220 reais de multa. A lei brasi-leira para o combate ao tráfico de drogas é a 11.343/2006, denomi-nada de “lei Antidrogas”.

perdidos nas garras sedutoras do crack

Quem usa o crack, que é fumado em cachimbos muitas vezes improvisados, sente a sensação de euforia, excitação, tremores, suor intenso, dilatação das pupilas, aumento da pressão e das batidas cardíacas

STEPHESON SIlVA

O Programa Educacional de Resistência às Drogas (Proerd) é a versão brasileira do norte-ameri-cano Drug Abuse Resistence Edu-cation (D.A.R.E.), surgido em 1983. No Brasil, foi implantado em 1992 pela Polícia Militar do Rio de Ja-neiro e chegou ao Maranhão em 2001.

Em Imperatriz, atua desde 2005 e hoje conta com mais de cinco mil crianças entre 9 e 12 anos formadas e com diploma. O programa consiste em uma ação conjunta entre o policial militar devidamente capacitado, chamado policial Proerd, educadores, estu-dantes, pais e comunidade. São oferecidas estratégias preventivas visando reforçar a proteção e o desenvolvimento da resistência da criança e do adolescente, que pode correr o risco de envolver-se com drogas e problemas de comporta-

mento violento.Para o sargento Hosano, que

atua no 3º Batalhão da Polícia Mi-litar e é auxiliar do coordenador do Proerd, somente a repressão é insuficiente para combater as dro-gas. “É importante a participação da população no combate e nas campanhas de prevenção para que a comunidade como um todo pos-sa manter-se longe das drogas”.

Especialistas afirmam que não é possível lutar contra o tráfico so-mente como um crime e esquecer-se de combater as causas que levam as pessoas ao consumo e à sua de-pendência. “O consumo de drogas é uma preocupação que tem de mo-bilizar a todos. Quanto mais ações de campanhas, palestras e progra-mas de combate às drogas existi-rem maior será a mobilização e a iniciativa da sociedade”. A opinião é da psicóloga do Centro de Aten-ção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD), Nara Siqueira.

programa educacional atua na prevenção às drogas

Investigações de pontos de venda, perfis e comportamentos são

necessárias para se antecipar às ações dos principais grupos que atuam no

tráfico de drogas em Imperatriz.

Delegacia utiliza inteligência estratégica

ROSAnA bARROS

Page 8: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

8 ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

DESCOnTROLENão é difícil encontrar histórias de pessoas que fazem do jogo, mesmo legalizado, uma compulsão diária: o problema mesmo é diferenciar o lazer dos prejuízos

“É mais fácil perder do que ganhar”AlAN MIlHOMEM

“Ninguém sai sorrindo quando perde”, é o que relata o cambista do jogo do bicho de iniciais A. l. D. A atividade é proibida no Brasil, por se enquadrar em jogos de azar. Mas as bancas funcionam em todo país e em Imperatriz não é diferente.

Na cidade funcionam duas ban-cas centrais e há aproximadamente 15 corretores e 100 cambistas, segundo informações de A. l. D. Por se tratar de uma atividade ilegal, as pessoas que jogam não gostam de falar sobre o as-sunto e os compulsivos não se consi-deram doentes.

Segundo A. l. D., que há 25 anos trabalha como cambista e faz suas apostas no jogo do bicho, há clientes que “jogam três vezes por dia, todos os dias sem falhar”. Segundo a psicóloga e especialista em relações humanas, Aline Santos da Silva, é a intensidade e a frequência do hábito que vão de-terminar se o comportamento é com-

pulsivo. “Quando a pessoa não tem mais controle sobre ele e passa a per-der contato social o comportamento é considerado compulsivo e, portanto, uma doença”.

O jogo patológico é uma depen-dência comparada a outras como a da droga, por exemplo, inclusive pelos próprios compulsivos. A dificuldade no diagnóstico deve-se ao fato de o ato de jogar ser considerado normal, ou apenas uma diversão aceita pela socie-dade. Em consequencia disso, o trata-mento da doença fica comprometido.

B., uma apostadora fiel do jogo do bicho, joga todos os dias. Prefere sem-pre os números do telefone, da casa e dos documentos. Ela diz que não é jo-gadora “profissional”, isto é, cambista, e que já chegou a ganhar até 700 reais. Sua irmã, F., joga também diariamente e já chegou a ganhar 6 mil reais.

Em Imperatriz, assim como no Brasil, há muitas pessoas dependentes dos jogos, mas que não buscam trata-mento para se livrarem dessa doença,

por acharem normal, um simples hábi-to, uma diversão. B.C., apostador assí-duo de jogo de baralho há 20 anos, diz que “é mais fácil perder do que ganhar, nesse jogo”. Ele já perdeu vários bens e muito dinheiro nas partidas, além de ter deixado de pagar dívidas para jogar. “Quando começo a jogar enquanto ti-ver dinheiro estou jogando, e se o di-nheiro acaba pego no banco, penhora-

mos bicicletas, jóias ou pego dinheiro com agiotas”.

Segundo a psicóloga Aline, o tra-tamento é feito por meio de terapia, psicoterapia e medicamentos. Porém, os viciados em jogos têm muitas di-ficuldades em parar com essa com-pulsão, pois encaram esse comporta-mento como um simples lazer e não conseguem ver as perdas e os proble-

mas que o jogo traz. Aline alerta que a dependência de jogos acarreta mui-tos problemas como perdas no traba-lho, na família e nos relacionamentos. Além de “perda da visão de futuro, de ter uma família, uma profissão”. B. C. confirma: “Ah, já pensei em parar mui-tas vezes, mas a vontade é maior que o desempenho. A de continuar é maior que a de deixar”.

THAlyTA DIAS

“Somos influenciados pela mí-dia a consumir cada vez mais”. O comentário é da psicóloga Nádia Borges de Araújo. Muitas pessoas compram por necessidade, status, modismo, mas também pelo simples prazer que esse ato proporciona.

A estudante de pedagogia, Edi-leusa Batista, 17 anos, afirma ser consumista, em especial de esmal-tes. Para ela, a compra exagerada do produto proporciona a sensação de bem-estar, mesmo reconhecendo que depois vem o arrependimento.

“Sou consumista demais, não pos-so ver dinheiro, que gasto. Quan-do compro esmaltes me sinto bem, mas depois me arrependo”. A partir do momento em que o consumo deixa de suprir as necessidades bá-sicas do indivíduo, torna-se consu-mismo. Acontece quando a pessoa passa a obter produtos, serviços ou bens sem a obrigação de possuí-los.

leonardo Barbosa, 26 anos, vendedor de roupas no shopping Timbira, assume ser consumista. “Compro tudo! Roupas, sapatos e até produtos bestas, surpérfluos”. leonardo reconhece que às vezes o

hábito compromete suas finanças e admite que ao adquirir um produto o sentimento é de prazer. “A sensa-ção é boa. Mas tem coisas que eu não tenho necessidade de comprar e compro”. leonardo conta que de-positou um dinheiro na sua conta no mês passado, mas, quando uma amiga mostrou-lhe umas camisetas não resistiu e mexeu na poupança. “Comprei 11 peças de roupas. Ou seja, comprometi 50% do dinheiro depositado”.

Causas - Segundo a psicóloga Ná-dia Borges, a mania do consumis-

mo é provocada por uma falha no sistema emocional, quando o ato de consumir remete a uma falsa sensação de bem-estar. “Fazendo uma analogia, é como se fosse uma dependência química. A pessoa re-conhece que não devia fazer, mas isso não impede de fazer de novo. É uma ilusão acreditar que aquilo vai trazer uma satisfação”, comenta Nádia.

Possuir um determinado pro-duto pode gerar uma agradável sensação de prazer. Porém, pode ser acompanhada de uma série de transtornos e doenças, como a one-

omania, caracterizada pela compra exagerada de produtos. Neste caso, o indivíduo que age dessa forma é considerado um consumista com-pulsivo. Os medicamentosos ou psicoterápicos estão entre os trata-mentos indicados para os compul-sivos. Ambos precisam ser acom-panhados por profissionais. Não há tempo de tratamento estipulado, tendo em vista que cada caso é di-ferente. “O tratamento não costuma ser de curto prazo, pois a compul-são de comprar é apenas o sintoma de um problema mais sério”, ressal-ta Nádia.

WAllIKSON BARROS

Hoje, viver e trabalhar com saúde e disposição é uma dádiva para poucos. Cumprir expediente além do horário é, para muitos, uma forma de ganhar um extra no fim do mês. Outros dizem que de tão comum vira hábito prolongar o expediente diariamente.

O diferencial é trabalhar levan-do saúde para todos. Maria Juracy vende produtos da linha Herbalife há pouco mais de seis meses e conta que hoje trabalha proporcionando qualidade de vida para as pessoas. “A cada dia que passa eu fico mais entusiasmada com meu empreen-dimento. levo vida nova com pro-dutos que vão de nutrição interna a beleza externa. Eu passo horas e horas visitando meus clientes. Chego a perder a noção do tempo,

mas é para uma boa causa”. Mas sua atividade pode virar

um vício ou é um hábito? “Eu faço isso por amor, porque eu quero uma vida melhor para mim e para as pessoas. Se isso é vício, que to-dos tenham esse maravilhoso ví-cio”.

Incansável no seu ramo, Ma-ria Juracy revela que o seu fascínio vem do uso dos produtos. “Eu vejo os resultados em mim, por isso que eu recomendo. Porque eu e as pessoas notamos nitidamente os grandes resultados. Perdi quatro quilos em um mês, além de ganhar qualidade de vida. Recebo reconhe-cimento da minha companhia”.

Rita Silva é gerente da Provider, empresa que presta serviço de call center para a Companhia Energética do Maranhão (Cemar). Ela trabalha sem parar, com o objetivo de atin-

gir a excelência no atendimento aos clientes. “Quando cheguei, vi que realmente tinha muito traba-lho”. Ela ainda conta que não é fá-cil gerenciar um serviço de atendi-mento como esse, as dificuldades são muitas, o trabalho é árduo. “Quando eu fico aqui na central de oito da manhã até as cinco horas do outro dia, é porque realmente eu gosto”. Rita veio de Igarassu, Pernambuco, com a oportunidade de crescer dentro da empresa.

Para a psicologia comporta-mental o hábito é resultado de uma construção orgânica, desenca-deada pelo reforço de uma relação entre estímulo e prazer químico. A base teórica deste ramo de atu-ação dos psicólogos é o behavio-rismo. Edward l.Thorndike e John Watson foram um dos precursores dessa teoria.

ALAn MILHOMEM

Jogar no bicho envolve um ritual particular em que vale tudo, como números de telefone, dos documentos, ou a crença: sonhou com animal dá na cabeça!

no ambiente de trabalho, eficiência pode esconder sintomas de exageroWALLIKSOn bARROS

Gerente de call center, Rita trabalha com o objetivo de atingir a excelência no atendimento aos clientes

Consumistas são atraídos pelo “mundo maravilhoso” das vitrines

Page 9: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

9ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

EnTREVISTAPsicóloga Gizele da costa cerqueira

“Hábitos são rotina. Vícios, descontrole” MAx DIMESRENATA COSTA

O que é vício? O que é hábito? Os hábitos, de uma forma geral,

são as coisas que fazemos rotineira-mente e que não geram para a gente um problema de comportamento. Tem gente que tem hábito de acordar de manhã cedo, de dormir de tarde e isso não traz nenhum prejuízo. O ví-cio pressupõe que alguma coisa está descontrolada. É um nome pejorati-vo, usado em relação às pessoas que têm compulsões.

As pessoas demoram muito para perceber que têm um problema como o Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) e procurar ajuda médica? Por quê?

Por preconceito. A psicologia e a psiquiatria tratam da mente e an-tigamente quem precisava de aten-dimento por parte desses profissio-nais era quem? O chamado “maluco”. Ainda hoje as pessoas associam que quem lida com a mente: psicólogos e psiquiatras são meio “malucos” também. Ao longo da história da psi-quiatria, isso foi sendo construído. Quando [o filósofo Michel] Foucault escreveu sobre a história da loucura, fez todo um apanhado e uma análi-se para mostrar como o conceito da “loucura” e do “louco” foram constru-ídos socialmente. Problemas sempre existiram, a “loucura” sempre existiu. O que acontece é que em um deter-minado momento isso passou a ser objeto da ciência com a psiquiatria. Não que o sofrimento psíquico não existisse antes disso, mas o “louco” precisando de tratamento, isso foi construído socialmente. Depende muito do que as pessoas enxergam. Eu, particularmente, acho que tudo é construído socialmente, até o amor.

Os especialistas, hoje, fa-lam em dependência em vez de vício. Quando a palavra “vício” era mais aceita, o tratamento era diferente? O que muda?

Muda o olhar. Porque, veja, a dependência quími-ca tem um histórico de jul-gamento moral. As pessoas achavam, e muitas hoje em dia ainda acham, que o de-pendente químico é uma pessoa sem-vergonha, mau-caráter, vagabundo.

O dependente passou de uma condição de culpado para a de vítima de uma doença?

Depende. Porque essas ques-tões são muito complexas. Você sai de uma posição de culpado para a de uma pessoa doente. Mas não ne-cessariamente vítima. A vitimização vai depender da forma como a gen-te trata e vê. A dependência química é difícil de trabalhar, porque atinge vários aspectos da vida do ser huma-no. Então, você tem o aspecto social, familiar, a própria saúde clínica, o fato de ela ser bastante democráti-ca: atinge gordinho, baixinho, negro, pobres, ricos. É muito importante termos essa clareza. Se tivermos um julgamento moralista, em cima disso, não conseguimos atender e ajudar o dependente químico.

Os vícios em geral são caracterizados e diagnosticados pela frequência dos atos e do consumo de determinada substância?

Depende. Nunca só a frequência.

Precisamos ver frequência, intensida-de, como, por quê, para quê, tudo na saúde mental é diagnosticado dessa maneira. Se você chegar para mim e disser que tem uma pessoa que bebe todos os dias e perguntar se ela é al-coólatra, vou te dizer que eu não sei. Eu preciso saber o que ela bebe, para que ela bebe, qual o prejuízo que ela tem na vida dela por conta disso.

A senhora acha que no momento em que vivemos, as pessoas estão mais propícias ao vício do que em outras épocas?

O mundo sempre teve droga e sempre terá. Essa ilusão que as pes-soas colocam “o mundo sem drogas”, “um mundo antidrogas”, não existe. O que acontece hoje é que temos um

tráfico, que causa outros problemas. Ainda não temos clareza de algumas coisas sobre as drogas. Temos muito ainda para estudar ao invés de sair-mos por aí afirmando isso. O que eu

digo é que o mundo de hoje está muito desrespeitoso nas relações. As pessoas passam fome, necessidade, não tem trabalho. Então, são condições de saúde bá-sicas que faltam. Precisa-mos dar condições para que as pessoas se relacionem bem e possam viver bem. Para que tenham uma vida social, com saúde, com educação.

Existe relação entre depressão e a busca pelas drogas?

Não só pela busca, mas quando acaba a “maromba” do sujeito. A dependência química pode vir acompa-nhada de outros transtor-nos mentais, é um transtor-no mental. A depressão e a ansiedade são transtornos mentais. Estou falando de patologias, não falo da “de-prê” de quem brigou com o namo-rado e ficou triste. Há uma relação, mas não necessariamente de causa e efeito.

Tem se falado na “epidemia do crack” em todo o país. Imperatriz já faz parte dessa realidade?

Imperatriz já tem crack. Muitas

pessoas usam crack na cidade, mui-tas.

O Caps Girassol tem atendido muitos usuários de crack?

Sim. Em primeiro lugar o álcool, em segundo o crack.

O Brasil adotou em 2001 a Reforma Psi-quiátrica. A nova estrutura implantou os Caps e Centros de Atendimento no Trata-mento das Doenças Psíquicas, evitando que o paciente saia do convívio social e familiar. Essa estrutura funciona bem em Imperatriz?

Ainda temos muitas coisas para

alcançar. Com a Reforma Psiquiátri-ca construímos os Caps e foi o que conseguimos fazer ao longo desses 10 anos de reforma psiquiátrica na cidade.

O poeta maranhense Ferreira Gullar es-creveu um artigo para o Folha de São Paulo no qual ele se posicionava total-

mente contra a Reforma Psiquiátrica, chamando-a de “lei errada”. O poeta falou como pai de dois esquizofrênicos. A senhora leu esse artigo, tem conhecimen-to dessa polêmica?

li na internet. Precisamos se-parar o que é manicomial e o que é internação. Os manicômios eram um caos. Se eu estivesse com uma pneumonia e procurasse um hos-pital que não me desse condição nenhuma de um bom tratamento, essa não seria uma boa internação. Ao contrário disso, um hospital que me desse condições de diag-nóstico, tratamento, eu teria uma

boa internação. O que o Ferreira Gullar estava di-zendo é que é muito difí-cil tratar em casa pessoas com transtornos mentais graves, ainda mais sendo duas. Não vou julgá-lo por isso. Mas acho que falar que a Reforma Psiquiátrica não funciona não é verda-de. Precisamos de vontade política.

Os transtornos mentais têm cura?

Controle, cura não. Trabalhar em saúde mental é acom-panhar o sujeito e não é possível dizer que o paciente nunca mais vai ter um surto, uma recaída. A doen-ça nunca está fora de um contexto que é social, familiar, pessoal, po-lítico, cultural, histórico. Agentes que são impossíveis de se regular, apenas de acompanhá-los.

Coordenadora e psicóloga do Centro de Assistência Psicossocial Álcool e Drogas em Imperatriz (Caps AD – Girassol) desde a sua inauguração há dois anos, Gizele da

Costa Cerqueira abriu as portas de sua casa no bairro Parque das Palmeiras para uma conversa com o Jornal Arrocha.

Especialista em saúde mental pelo Ins-

tituto de Psiquiatria da Universidade Fe-deral do Rio de Janeiro (IPUB) e em depen-dência química pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Gizele esclareceu

uma série de questões relacionadas a vícios (dependências), comportamentos compul-sivos e ao trabalho dos Centros de Apoio Psicossocial (Caps) em Imperatriz. A psi-

cóloga Gizele da Costa afirma que nenhuma doença está fora de contexto social e que o preconceito nunca ajuda, pelo contrário, só atrapalha.

REnATA COSTA

“A doença nunca está fora de um contexto que é social, familiar, pessoal,

político, cultural e histórico”

“Para caracterizar um vício temos de ver frequência, intensidade, como, por quê e

para quê. Tudo na saúde mental é diagnosticado dessa maneira”

Page 10: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

10 ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

nA TOMADAenquanto logistas confirmam que a venda de aparelhos eletrônicos representa quase metade dos lucros, consumidores contam sua relação com as máquinas

preços incentivam compulsão tecnológicaDOUGlAS AGUIAR

O uso da tecnologia se tor-nou indispensável para a maioria das pessoas. Nos afazeres diários, para se comunicar, se divertir ou trabalhar, os aparelhos tecnoló-gicos assumem diversas funções e contribuem para satisfação de necessidades.

Os preços baixos e as facili-dades na compra geram o aumen-to da procura por esses aparelhos nas lojas de Imperatriz e de todo o Brasil. O gerente de loja Gonzaga Pacheco confirma essa demanda. “As pessoas têm procurado cada vez mais nossos aparelhos, prin-cipalmente os notebooks e compu-tadores que representam 40% do lucro da empresa”.

Os cybers da cidade são bas-tante movimentados. O uso do computador torna-se uma prática entre os jovens e muitas vezes até mesmo um vício. Jhon Warlyson Nascimento tem 17 anos. Todos os dias, sem falta, frequenta o cy-ber próximo à sua casa no bairro Santa Rita. Ele relata a sua roti-na: “Venho pra cá de manhã. Saio meio dia pra almoçar. Volto umas duas horas e só vou pra casa umas seis da tarde”. À noite ele vai à es-cola, mas diz que algumas vezes já “matou aula” para ir ao cyber.

Nesse mesmo lugar, “muitos outros jovens passam o dia intei-ro na frente da tela em busca de

jogos e relacionamentos”, afirma lucas Silva, que trabalha no local.

O soldado Jadson Santos lembra que na infância se reunia para

brincar de peteca, pipa ou pião. “Hoje, a criança se tranca no quar-to pra se divertir e fazer amiza-des”. Ele adverte que o hábito de usar a tecnologia para tudo tem modificado a cultura das crian-ças.

A dona de casa Maria dos San-tos lucena mora na Beira-Rio, tem 57 anos, mas não abre mão do uso da tecnologia em sua vida. Por ne-cessidade, acessa a Internet todos os dias, pois tem de falar com a filha que se casou e está morando no Rio de Janeiro. “Com o celular e o computador é como se ela es-tivesse em casa”, acredita. Quan-do questionada sobre o que faria sem esses aparelhos, desabafa: “Não deixaria minha filha sair de Imperatriz”.

Adriano Sousa de Oliveira, ta-xista, vai ao shopping Timbira em média três vezes por semana. Sua atração: o parquinho de brinque-dos eletrônicos. Em meio a risa-das, ele brinca: “Ganho dinheiro levando passageiros e gasto todo me divertindo aqui”.

Assim como na vida de Adria-no, esse tipo de entretenimento tem se tornado um hábito para os imperatrizenses. “Esse local se tornou ponto de encontro na ci-dade. Fim de semana aqui é lota-do”, informa o gerente do parque José Francisco da Conceição.

MAURÍCIO SOUSA

A internet tornou-se um re-curso necessário na sociedade contemporânea. A questão é sa-ber quando navegar na rede deixa de ser um hábito normal para se tornar uma compulsão. No Brasil, a internet começou a se populari-zar em 1995 e, em 2011, mais de 80 milhões de pessoas já têm acesso à tecnologia.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em dados de 2009, o Maranhão possui 20,2% de usuários. Em Imperatriz, o número de in-ternautas cres-ce rapidamente e com ele, os cy-berviciados. “O hábito é algo da ordem da repe-tição, da rotina. Mas uma repe-tição que não traz prejuízos para a vida do sujei-to. Quando o hábito se torna uma compulsão, podemos dizer que se tornou um vício”, explica a psicó-loga Nadja Duarte.

É nessa situação de dependên-cia que se encontra Tamiris Neiva, 19 anos. “A internet tem vários atra-tivos: orkut, MSN, sites diversos...Quando entro, não tenho vontade de sair”. Mayza Oliveira, 23, vive situação semelhante. “Se eu pudes-se, passaria o dia inteiro na net”. De acordo com a mesma pesquisa divulgada pelo IBGE, 71,1% dos jo-vens de 15 a 17 anos tiveram acesso

à rede de computadores. Caracte-rizada pela possibilidade de ex-pressão sem precisar estar no meio de muitas pessoas, alguns jovens veem na internet uma opção per-feita de interação. Muitos passam tanto tempo na rede que se tornam celebridades virtuais: “Eu passo cerca de 12 horas por dia na net”, comenta Roniskley Britto, 20 anos. Ele confirma que mantém quatro orkuts (três lotados) e mais de qua-tro mil pessoas no MeAdd, um site de relacionamentos. “Há pessoas

que possuem fo-tos minhas no celular delas e, no entanto, nun-ca as vi pessoal-mente”.

Facilidade de relacionamento com outras pes-soas, popularida-de e diversão são oportunidades proporcionadas pela internet que contrastam com

sérios prejuízos à pessoa compul-siva, como explica Nadja Duarte: “Consequentemente há um em-pobrecimento dos laços, da vida, Eros, civilização. A sua vida social fica comprometida. O amor, o tra-balho, as amizades, o lazer podem ficar subordinados à droga”.

Mayza conta que esse hábito é difícil de controlar. “Isso, a gente não controla, por mais que você prometa pra si mesmo que vai dar um tempo, quanto menos espera já tá lá”. Tamiris afirma que quando não pode acessar a rede mundial fica “irritada e ansiosa”.

Além dos sintomas manifes-tados por essa jovem, segundo a psicóloga, o afastamento do “obje-to droga” pode causar nervosismo,

agressividade, distúrbios de sono e até mesmo perda de noção tempo-ral, já que o indivíduo passa muito tempo no computador e nem se dá

conta disso. “Uma psicoterapia ou uma análise podem ajudar o sujei-to a lidar com tais questões”, suge-re a psicóloga.

Antigas brincadeiras, como jogar peteca e peão e soltar pipa estão sendo substituídas atualmente pela experiência virtual gerada pelos jogos eletrônicos

DYEGO WILSOn

Com mais acesso à internet, muitos podem perder a cabeça na rede

“A internet tem vários atrativos: orkut, MSN, sites diversos...Quando

entro, não tenho vontade de sair”

MAURICIO SOUSA

Especialista diz que o afastamento do objeto do desejo, como a internet, pode gerar nervosismo, agressividade, distúrbios de sono e perda da noção de tempo

Page 11: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

11ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

OBjETOStodo bom colecionador, seja de música, filmes ou mesmo caixas de chocolate, como os desta reportagem, tem sempre histórias curiosas sobre suas conquistas

Cuidados são essenciais na arte de colecionarCARlA KASSIS

Apaixonados pelos seus obje-tos. Esse é o sentimento comum a todos os colecionadores. Da caixinha pequena decorada na estante do quarto ao vinil mais raro, aquele visto por poucos, to-dos são guardados com o máximo de carinho e dedicação possível. Temperado, muitas vezes, por pouco ou muito ciúme.

No barzinho pequeno, po-rém aconchegante, lourival Alves (loro), cresceu ouvindo o melhor da música nacional e internacio-nal nos vinis comprados pelo pai. O gosto pelas canções virou um hobby. Depois de mais de 15 anos, hoje é colecionador de vinis e gos-ta especificamente dos que foram produzidos nos anos 1980.

Em seu quarto, uma estante bem repartida que ocupa toda a parede foi feita exclusivamente para guardar a sua coleção, que não deixa de crescer. São mais de 3,5 mil vinis, além de DVD’s e um acervo em seu computador próxi-mo a 15 mil músicas.

Contando a própria histó-ria, loro apresenta alguns clássi-cos da sua coleção: Beatles, Elvis

Presley, lamartine Babo, Roberto Carlos, Orlando Dias, Marco An-tônio, este um dos mais antigos e o mais raro. “Tenho um DVD do Elvis, de 1972, que não existe mais no Brasil. Foram quase 15 anos de busca e encontrei em um site in-ternacional”.

loro ganha muitos presentes. Os amigos já conhecem sua pai-xão e estão sempre trazendo al-guma novidade. Ele também tem uma mini coleção de discos repe-tidos e, como todo bom colecio-nador, esses servem para aquele velho “toma lá, dá cá”: as trocas com outros colecionadores.

Francisco Hélio também está na lista dos apaixonados por mú-sica. É um amante dos anos 1970 e 1980. Em casa tem uma coleção audiovisual que já chega a 400 tí-tulos, entre discos e filmes. “Mes-mo tendo a internet pra baixar, eu gosto mesmo é de comprar. Todo mês eu sempre compro algo”. Francisco não foge à regra do cui-dado com sua coleção e dispara: “Eu não gosto que fiquem pegan-do nos meus DVD’s e CD’s, só eu pego e ninguém mais”.

No universo dos colecionado-res, qualquer objeto pode desper-

tar a atração e virar um símbolo precioso. Para Geiziane Santos, guardar caixas virou um hábito desde a sua infância. Caixas e mais caixas de chocolate, com todas as suas embalagens, era algo quase que intocável em seu quarto.

Durante quase dois anos elas ocupavam um bom espaço, até se-rem jogadas fora por uma amiga. “Eu fiquei muito chateada quan-

do isso aconteceu. Tenho ciúme de tudo, mas tenho mais ainda das minhas caixas”.

Apesar de tudo, nada a impe-diu de continuar. Agora são cai-xas decoradas que antes eram em-balagens de perfumes, sabonetes, tudo tem um cantinho especial. A amiga que divide o quarto com Geiziane denuncia: “Ela tem um monte de caixas, eu não sei para

quê isso. Se fosse eu já tinha jo-gado fora!”.

Ao final da conversa observo uma curiosidade. Uma caixa gran-de, toda decorada sob a mesa do seu trabalho. Ao olhar para ela nem precisei fazer a pergunta, pois o seu sorriso já foi a melhor resposta. “É, essa caixa aqui é minha fui eu que trouxe para cá”, disse Geiziane, não contendo o riso.

Na estante do quarto, clássicos dos anos 80, uma paixão do colecionador de vinil, Loro. Como bom colecionador, ele mantém alguns discos que são repetidos

CARLA KASSIS

THAISIA ROCHA

Eles chegam devagarzinho, sempre no fim da tarde ou ao cair da noite. Motivados pelo desejo de compartilhar histórias ou mesmo para tentar fugir do calor, as calça-das se enchem de gente, formando pequenas assembléias populares. Jogar conversa fora e observar o movimento da cidade são as prin-cipais respostas que recebo quando pergunto o porquê dessas reuniões diárias. Sejam elas em família, ou mesmo entre amigos e vizinhos, to-das são sempre muito animadas e cercadas por risos e olhares curio-sos.

Segundo Joeliândia da Concei-ção, 24 anos, moradora do bairro Maranhão Novo, sentar na porta é como participar de um reality show. “As pessoas negam, mas tudo que elas querem é ver e serem vistas”. Para ela, aquele é o momento de inteirar-se sobre tudo que acontece. “Todo mun-do tem um babado pra contar. Uma briga, um fuxico”.

Pelas calçadas de Imperatriz, en-contramos de tudo. Engana-se quem crê que na porta só senta-se para “prosear”. A jogatina, presente em 60% das casas visitadas, lidera o topo da tabela como prática mais exercita-da na porta dos lares da cidade.

Raimundo Costa, 65 anos, e An-tônio lima, 69 anos, ambos morado-res do bairro Beira-Rio, são vizinhos há mais de 30. Todas as tardes eles

trazem os tamboretes para baixo da sombra do “Jorge Tadeu” e ali armam o seu tabuleiro de damas. “Não tem coisa melhor que sentar debaixo de uma sombra, num fim de tarde, jo-gando uma ‘daminha’ e tomando um café”, conta Raimundo.

Excentricidade - Fugir do calor é uma tentativa diária dos moradores

de Imperatriz. Por isso, Edgar Pereira da Silva, 65 anos, morador do bairro Santa Rita, adquiriu um hábito um tanto estranho, para não dizer mór-bido.

Edgar senta-se todas as tardes na porta do camitério Campo da Sau-dade do qual é vizinho. O motivo? O cemitério fica do lado da sombra, é coberto por árvores e há um grande

fluxo de pessoas. “Toda tardezinha eu venho

pra cá, trago um banquinho e sen-to aqui com uns amigos. A gente fica falando dos tempos antigos e olhando o movimento”. Quando pergunto se ele não se incomoda com o movimento das pessoas que vêm ao cemitério ele diz que já acostumou. “Isso é da vida e

morando aqui em frente há tanto tempo, isso aí pra mim não é mais nem novidade”.

Em Imperatriz, namorar na porta é questão de honra. Alguns pais admitem que para “preservar” a filha, exigem que a moça namore na porta de casa. Terezinha Gomes, 59 anos, moradora do Bacuri, é a favor dessa ideia e diz que sua fi-lha só namora se for assim. “Moça de família namora é na porta de casa, se não os vizinhos ficam fa-lando e moça falada não casa”.

Maria Madalena Sena, 39 anos, também do Bacuri, diz não acreditar na eficácia dessa norma exigida por Terezinha. Por isso, dá liberdade à filha Glasyene, 15 anos, e para o namorado dela, Ma-xsandro, 24 anos, de escolherem o lugar que melhor agrade para na-morar.

“Não tem como impedir que ela namore, então é melhor esta-belecer um laço de confiança. Eu confio neles e vice-versa”. O casal agradece, mas ainda assim dizem gostar de namorar na porta. “O tempo tá muito quente, por isso sempre sentamos na porta pra ‘pe-gar um vento’, ver o movimento e namorar, lógico ”, diz Maxsandro.

Na busca pelo vento no rosto com esse calorão, ou para encon-trar os amigos, risos e desabafos, definitivamente sentar na porta é a melhor opção. Neste caso, a por-ta da rua é serventia da casa.

Bate-papo, namoro vigiado ou fuga do calor: vamos sentar na porta?

Na busca pelo vento no rosto com esse calorão, ou para encontrar amigos, risos e desabafos, definitivamente sentar na porta é a melhor opção em Imperatriz

THAÍSIA ROCHA

Page 12: Jornal Arrocha - Edição 05 - Vícios e Hábitos

12 ArrochaJorn

al

AnO II. númERO 5 ImPERATRIZ, JUnHO dE 2011

pADRõESem busca de um corpo perfeito e de uma aparência invejável, homens e mulheres utilizam os mais diversos artifícios, como as já populares cirurgias plásticas

POllyANA GAlVãO

Homens e mulheres estão cada dia mais em busca do corpo prefeito. Por causa da vaidade, malham, usam cosméticos, fazem dietas absurdas e muitas cirurgias plásticas.

Comportamentos vaidosos são comuns desde a mitologia grega, como o famoso “mito de Narciso”, um belo e jovem rapaz que se apaixonou pela sua pró-pria imagem refletida em um lago. Após Narciso descobrir o quanto era belo, passou a admirar seu re-flexo na água pelo resto da vida. Com o passar do tempo, esqueceu de beber e de alimentar-se, então o seu corpo definhou.

Ricardo Moreira, 24 anos, estudante de administração, diz que não se considera vaidoso, as pessoas é que falam isso dele.

Apenas gosta de ser do jeito que é, usar cremes e roupas boas. “Eu uso maquiagem, apesar do pre-conceito das pessoas. É claro que eu não me pinto, mas eu faço cor-reção. Até agora eu só me deparei com elogios em relação à minha vaidade”.

Algumas pessoas vão além dos tratamentos de beleza e pre-ferem fazer cirurgias plásticas. Sandra da Paz, 30 anos, dona de uma loja de roupas, fez essa esco-lha ao colocar silicone.

Sandra colocou 300 milili-tros de silicone nos seios porque os achava pequenos. “Era o meu sonho desde adolescente, estou muito feliz. Não me arrependi, mesmo após a dor”.

De acordo com o psicólogo Tácio Montes, a busca constan-te por um padrão pode afetar a individualidade das pessoas e a

aceitação de que muito da bele-za vem de dentro. “É saudável ter vaidade. Temos desejo de nos sen-tirmos bem, de ser admirado. Isso demonstra que cuidamos do nos-so corpo e que nos preocupamos com ele”.

Rosenir Alves, 50 anos, dona de casa, perdeu 47 quilos em 11 meses, após ter feito uma cirurgia de redução de estômago. Ela pre-tende ainda fazer uma operação plástica reparadora.

Ao contrário do que muitos pensam, Rosenir não fez a cirurgia por vaidade, mas por necessidade. Ela estava acima do peso e tinha muitos problemas de pressão alta. Rosenir ressalta os benefícios do procedimento médico: “Hoje me sinto cem por cento saudável, es-tou muito feliz. Antes eu sorria, mas era uma pessoa triste porque não tinha muita saúde”.

NONATO PEREIRA

Especialistas dizem que quando as relações sexuais começam a atra-palhar outros campos da vida, como relacionamento, família, trabalho e estudos, isso pode ser um quadro de compulsão sexual.

O médico ginecologista e fisiote-rapeuta sexual, Pedro Mário, afirma que qualquer atitude que extrapole ou cause descontrole na pessoa pode ser considerada compulsão ou vício, não considerado hereditário. Mas pode ser uma questão circunstancial, ou socio-cultural. Ele acrescenta que a maior parte das situações de compulsão são oriundas de traumas de infância e pas-sam a se manifestar de forma ostensi-va e perturbadora na adolescência. O que determina a compulsão ou vício é a falta de controle.

“Quando o assunto de uma pes-soa é só sobre sexo ou ela vai para a internet e só consegue ver assunto re-lacionado a isso, são sinais de que a frequência está muito alta”, alerta a psicóloga zaira Carandimelo. Ela res-salta a dificuldade que as pessoas têm

de procurar ajuda e lembra que pelo fato de a cultura incentivar muito o sexo fica difícil admitir a compulsão.

Em visita a uma loja de acessórios sexuais a vendedora diz que a maioria de seus clientes são pessoas a partir dos 23 anos. As mulheres casadas são as que mais procuram esses comple-mentos, geralmente por causa da mo-notonia no casamento. Já as solteiras porque querem fazer algo diferente, criando fantasias para o parceiro.

Experiente - Suely Costa da Silva Mazafera, 28 anos, simpática e com voz meio rouca, foi casada durante sete anos e tem dois filhos que não moram com ela. Faz programas em al-guns bares de Imperatriz durante o dia e também à noite e finais de semana. “Faço programa toda hora sem parar, só paro quando não tem mesmo. Eu gosto muito de fazer sexo anal, para mim não tem frescura não, na cama eu faço de tudo. E se não puder pagar a chave, o motel; aqui tem um lugar-zim especial, um matim ali”.

Em uma de suas experiências co-nheceu um rapaz “doidão”, saiu com

ele e passaram a noite transando. “Ele veio era sete horas da noite. E aí eu fui jantar, quando foi oito e meia a gente começou e só foi parar cinco e meia da manhã. O homem é viciado em sexo!” Suely já fez sexo até de cabeça para baixo. “A gente vai fazer uma caram-bela. A gente joga as mãos, é assim... Aí o cara apara, aí pronto, tá de cabeça para baixo”.

Sua mãe às vezes vem do Pará tentar tirá-la dessa vida. Mas ela nun-ca quis ir. “Tá certo, às vezes a gente não sente orgasmo, mas só que é uma curtição, entendeu? Já tentei, já saí uns dias, mas termino sempre voltando”. Nem sempre é por causa do dinhei-ro, mas pelo prazer de fazer sexo. “É um prazer grande, satisfação imensa. Eu acho gostoso, me acostumei. Tô viciada em sexo, eu sou viciada, sou, eu sou!”.

A compulsão sexual tem trata-mento, mas é preciso que a pessoa ou alguém próximo dela perceba o qua-dro de necessidade e procure ajuda. O problema pode ser solucionado por meio de fisioterapia sexual e com o auxílio de medicamentos.

ÂNGElA BARROS

Boates, shows, bares, festas tra-dicionais. Sair para se divertir e en-contrar com os amigos, sem dúvida, é uma das frases repetidas pelos ba-ladeiros de plantão em Imperatriz. Edson S., estudante de 25 anos, con-ta que nas noitadas que frequenta acontece de tudo. “Já fiz coisas que acho superinteressantes”.

Uma que marcou muito Edson foi quando estava com dois amigos em um bar de Imperatriz e chegaram quatro mulheres. “Começamos a conversar, nos apresentamos e aca-bamos em um motel”. Com ou sem esse final, Edson diz que suas noites sempre acabam mesmo depois de fazer um bom lanche “nas peixarias ou lanchonetes da cidade”.

Ele ainda ressalta o cuidado com as drogas: “Em nenhum mo-mento eu usei drogas em minha vida. Óbvio que já me ofereceram, mas a única droga que consumo é bebida alcoólica. Quando saio para beber é beber de verdade, sem fazer cerimônias. É como dizem: se eles vendessem só o ‘tontin’, seria muito bom. Mas não, por isso eu bebo!”

Edson espera que os produ-tores de eventos invistam mais em atrações musicais, pois para ir a um show diferenciado como de música popular brasileira (MPB) é preciso locomover-se para as capitais mais próximas.

Inquieta - A estudante Diulia Sou-sa conta que gosta de todos os rit-mos. Ela sai toda semana e prefere visitar diversas baladas na mesma noite. “Se o lugar está ruim, eu e meus amigos vamos para outro, porque o que queremos é nos di-vertir. Mas na maioria das vezes fi-camos na teoria de que, quem faz a festa somos nós”.

Mesmo os dois dias de agito

do Maranhão Forró Fest 2010 não foram suficientes para Diulia satis-fazer a vontade de foliar. Sua pre-ferência é por festas com o ritmo do momento: o sertanejo universi-tário. Ela afirma que não fica ape-nas em baladas no roteiro da cida-de. Embarca, também, para outros municípios vizinhos, pois gosta de conhecer gente nova. “Aqui está fi-cando escasso. Saio para vários lu-gares em uma mesma noite e vejo as mesmas pessoas”.

Diulia não consegue mesmo ficar em casa. “Basta me ligar, não resisto. Às vezes falo que não vou sair, mas se me ligam a demora é me arrumar. Meu dinheiro é prati-camente para baladas”.

Preferências - Para Fábio Guerra, gerente da principal boate da cida-de, as festas produzidas no local estão entre as maiores da região. Hoje a casa noturna proporciona shows de vários ritmos musicais e toca muita música eletrônica. Tem diversão para todos os gostos. Fá-bio revela as principais causas que fazem com que a casa noturna se torne a principal de Imperatriz: os investimentos em atrações musi-cais, estrutura e segurança. Ele quer que seus clientes se sintam seguros no ambiente que escolheram para se divertir.

Fábio lembra de situações inte-ressantes que já aconteceram e que atraíram público, como a presença do Ceará, artista do programa Pâni-co na TV. “Ele chegou e de repente a casa estava lotada. Todos os que estavam na boate ligaram para amigos, vizinhos, conhecidos. Foi engraçado. Depois, começou a dar autógrafos e fazer fotos com fãs”. A boate vai passar por algumas refor-mas, conforme afirma o gerente. Já existe um projeto para a criação de um boteco, que será um anexo.

Vaidade é saudável, mas beleza vem do interior

Ricardo Moreira, 24 anos, não se acha vaidoso e afirma que as pessoas é que o consideram assim

POLLYAnA GALVãO

Compulsão sexual envolve fatores culturais

Cenário de uma sex shop da cidade com alguns artigos: como a cultura incentiva muito o sexo, fica difícil, segundo os especialistas, detectar situações de vício

JAIRO MORAES

Fanáticos por baladas param pouco em casa