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Revista Pensar Gestão e Administração, v. 3, n. 1, jul. 2014. IPI: O IMPOSTO DAS CONTROVÉRSIAS EM FAVOR DA ECONOMIA NACIONAL Leila Cordeiro da Cruz 1 João Salvador dos Reis Neto 2 RESUMO: O presente artigo visa a analisar a leitura constitucional acerca da anterioridade do Imposto sobre Produtos Industrializados, o qual, até a promulgação da Emenda Constitucional n. 42, encontrava-se em visão controversa acerca da sujeição ou não de algum tipo de anterioridade. Após a promulgação da referida Emenda, instituiu-se a regra da anterioridade nonagesimal para o IPI. O artigo 150, III, “c”, elenca anterioridade mista e a alínea “b” da anterioridade de exercício. O § 1º do artigo 150 diz que a vedação do inciso III, “b”, não se aplica ao IPI, portanto o princípio da anterioridade de exercício não se aplica ao IPI. Contudo, o referido parágrafo ao elencar que a vedação do artigo 150, III, “c” não se aplica a diversos impostos, é silente no que tange ao IPI. PALAVRAS-CHAVE: Imposto sobre Produtos Industrializados. Alíquota. Anterioridade nonagesimal. 1 INTRODUÇÃO O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) está previsto no rol de impostos de competência tributária da União, conforme se pode depreender do teor do art. 153, IV da Constituição da República de 1988 e do art. 46, do Código Tributário Nacional (CTN). Desta feita, percebe-se que a capacidade para instituir e cobrar tal tributo representa relevante parcela de poder político concentrado na esfera do Governo 1 Aluna do 10° período da graduação em Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas Professor Alberto Deodato. 2 Advogado. Mestre em Direito pela Universidade Fumec. MBA em Direito Tributário pela FGV. Professor da graduação da Faculdade de Ciências Jurídicas Professor Alberto Deodato

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Revista Pensar Gestão e Administração, v. 3, n. 1, jul. 2014.

IPI: O IMPOSTO DAS CONTROVÉRSIAS EM FAVOR DA ECONOMIANACIONAL

Leila Cordeiro da Cruz1

João Salvador dos Reis Neto2

RESUMO: O presente artigo visa a analisar a leitura constitucional acerca daanterioridade do Imposto sobre Produtos Industrializados, o qual, até a promulgação daEmenda Constitucional n. 42, encontrava-se em visão controversa acerca da sujeiçãoou não de algum tipo de anterioridade. Após a promulgação da referida Emenda,instituiu-se a regra da anterioridade nonagesimal para o IPI. O artigo 150, III, “c”, elencaanterioridade mista e a alínea “b” da anterioridade de exercício. O § 1º do artigo 150 dizque a vedação do inciso III, “b”, não se aplica ao IPI, portanto o princípio daanterioridade de exercício não se aplica ao IPI. Contudo, o referido parágrafo aoelencar que a vedação do artigo 150, III, “c” não se aplica a diversos impostos, é silenteno que tange ao IPI.

PALAVRAS-CHAVE: Imposto sobre Produtos Industrializados. Alíquota. Anterioridadenonagesimal.

1 INTRODUÇÃO

O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) está previsto no rol de

impostos de competência tributária da União, conforme se pode depreender do teor do

art. 153, IV da Constituição da República de 1988 e do art. 46, do Código Tributário

Nacional (CTN).

Desta feita, percebe-se que a capacidade para instituir e cobrar tal tributo

representa relevante parcela de poder político concentrado na esfera do Governo

1 Aluna do 10° período da graduação em Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas Professor AlbertoDeodato.2 Advogado. Mestre em Direito pela Universidade Fumec. MBA em Direito Tributário pela FGV. Professorda graduação da Faculdade de Ciências Jurídicas Professor Alberto Deodato

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Revista Pensar Gestão e Administração, v. 3, n. 1, jul. 2014.

Federal 3, não obstante boa parte dos recursos sendo objeto de repasse aos demaisentes da Federação, nos termos do art. 159, I e II da Constituição.

O Decreto Governamental 7567/2011, foi considerado o fruto de um

raciocínio ilógico do Estado, ao exigir que sua vigência fosse imediatamente à data de

sua publicação, sendo assim criou um problema de grandes proporções no cenário

nacional, no setor de automóveis importados.

Obedecendo ao referido Decreto, as importadoras de veículos teriam a

alíquota do Imposto de Produtos Industrializados majorada em 30 (trinta) pontos

percentuais.

Ressalta-se que, este regulamento entrando em vigor na data de sua

publicação, fere a Constituição Federal/88, no que diz respeito ao princípio da

anterioridade nonagesimal, princípio este que garante aos cidadãos segurança jurídica.

Tal regulamento, da forma como foi promulgado, desencadeou uma série de

ações no Supremo Tribunal Federal devido à majoração da alíquota do IPI, no entanto

tal decisão, segundo a Presidente da República Dilma Rousseff, tinha o objetivo de

preservar a economia nacional e garantir o emprego de vários cidadãos que pode ser

comprovada por trechos de uma entrevista dada pela mesma e se seguem

"nosso mercado interno não será objeto de pirataria" por nenhum outro país,nem ninguém. "Todas as empresas que estão se queixando não produziamaqui"

"Se aceitarmos que, na produção de veículos, alguém venha aqui, abra umaloja, produza o produto no seu país, crie empregos lá e venha vender aqui,estamos cedendo aqui uma coisa que conquistamos com o maior esforço, queé o mercado interno"

"Queremos que qualquer empresa estrangeira, para não pagar imposto maior,tenha de produzir aqui, gerar empregos aqui”

"Gostamos de respeito e damos o respeito. Agora o que queremos: queremosque invistam aqui sim, serão bem vindos, protegidos e amados. Mas venham eproduzam aqui, gerem tecnologia aqui. Não seremos mais objeto desse uso",

Tais argumentos foram reforçados pelo Ministro do Desenvolvimento,

Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, quando disse que as mudanças iriam

3 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário.São Paulo: Malheiros, 2004. 25 ed. p.317.

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permanecer como estavam, porque com a exigência imposta pelo Decreto, geraria a

obrigação de investimentos em solo nacional por parte das montadoras, sendo assim o

governo se mostra aberto às negociações para encontrar alternativas para tais

empresas, o entretanto para aquelas que estavam dispostas a continuar apenas a

importação, não haveria outra alternativa a não ser o aumento da alíquota em trinta

pontos percentuais.

Tanto a fala do referido Ministro como da Presidente seriam aceitáveis se

não ferisse o princípio constitucional da anterioridade nonagesimal tão questionada por

este trabalho e que garante segurança jurídica aos cidadãos, independe de ser um

artigo essencial ou de luxo, uma vez que a essencialidade nada tem haver com o luxo.

No entanto, agindo assim muitos questionamentos foram feitos por países

que têm acordos econômicos com o Brasil, tais como: Japão, Coreia do Sul, Austrália,

entre outros.

Não restou outra alternativa aos que se sentiram prejudicados, procurar a

Justiça para resolver mais um descabido artifício do governo, sendo assim o Supremo

Tribunal Federal votou por unanimidade, a suspensão da vigência do Decreto

7567/2011, até que transcorresse o prazo previsto pela CF/88 de noventa dias, dando

origem a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4661/DF, conforme a ementa a seguir

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – DECRETO – ADEQUAÇÃO.Surgindo do decreto normatividade abstrata e autônoma, tem-se a adequaçãodo controle concentrado de constitucionalidade. TRIBUTO – IPI – ALÍQUOTA –MAJORAÇÃO – EXIGIBILIDADE. A majoração da alíquota do IPI, passível deocorrer mediante ato do Poder Executivo – artigo 153, § 1º –, submete-se aoprincípio da anterioridade nonagesimal previsto no artigo 150, inciso III, alínea“c”, da Constituição Federal. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE –IPI – MAJORAÇÃO DA ALÍQUOTA – PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADENONAGESIMAL – LIMINAR – RELEVÂNCIA E RISCO CONFIGURADOS.Mostra-se relevante pedido de concessão de medida acauteladora objetivandoafastar a exigibilidade da majoração do Imposto sobre ProdutosIndustrializados, promovida mediante decreto, antes de decorridos os noventadias previstos no artigo 150, inciso III, alínea “c”, da Carta da República.

Nota-se que, desde a origem do imposto, peça fundamental do Decreto

analisado, aconteceram muitas alterações, seja mudança de nomes, seja de

interpretação errônea por parte do governo ou ainda através da busca pelos direitos

contribuintes através de ações judiciais junto ao Judiciário.

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Para que o entendimento desse artigo alcance o objetivo pretendido, torna-

se latente que seja explanado em pormenores o imposto sobre produtos

industrializados, imposto este, que tem em sua estrutura características que o

diferenciam de outros pelo poder de fomentar ou preservar a economia nacional.

2 DISPOSIÇÕES LEGAIS

O Imposto sobre Produtos Industrializados é um imposto de competência da

União, e entende-se como produto industrializado qualquer operação que modifique a

natureza, funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou

o aperfeiçoe para consumo.

É necessário que se entenda a origem do IPI para que se possa analisar o

Decreto Governamental 7567/2011, objeto de análise desse trabalho.

O IPI é um dos impostos instituídos pela União. No entanto, só recebeu este

nome através da Emenda Constitucional n. 18 de 01 de Dezembro de 1965. Cabe

ressaltar que o mesmo, antes da referida EC, surgiu pela primeira vez na Constituição

Federal de 1934, tendo sua origem no Imposto de Consumo. Já em 1946, através da

Carta Magna, passou a ser chamado de Imposto sobre consumo de mercadorias.

Destaca-se ainda que, através da EC n. 18/65, o IPI tem caráter não-

cumulativo e seletivo em relação à essencialidade dos produtos, princípios que serão

explanados à frente.

Com o advento da Constituição da República de 1988, a competência de

instituir o IPI, entre outros impostos, é da União, como versa o seu artigo 153:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:IV - produtos industrializados;§ 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limitesestabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisosI, II, IV e V.§ 2º - (...)§ 3º - O imposto previsto no inciso IV:I - será seletivo, em função da essencialidade do produto;II - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operaçãocom o montante cobrado nas anteriores;.

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No entanto, o dispositivo que fomentou grande discussão foi o Decreto

Governamental 7567/2011, que implicou significativo aumento na alíquota do IPI

relativamente aos veículos importados, como forma de proteção às montadoras que

estavam instaladas em território nacional, as quais puderam usufruir de uma alíquota

reduzida a zero.

Nota-se que, a atuação estatal através desse Decreto, rompeu com um

importante princípio que evita a surpresa ao contribuinte final, que é o princípio da

anterioridade nonagesimal.

Cabe explanar sobre os princípios que regem o IPI, assim como outros

impostos instituídos no país.

3 DOS PRINCÍPIOS TRIBUTÁRIOS

Os impostos, de maneira geral, são regidos por princípios gerais e

específicos. Com o IPI não é diferente, o mesmo é regido por vários princípios gerais e

específicos. Entre os gerais destacam-se: legalidade, anterioridade e isonomia, já entre

os específicos, destacam-se: seletividade e não-cumulatividade.

Os princípios gerais encontram-se dispostos ao longo da Carta Magna,

trazendo ao cidadão segurança jurídica, são importantes como forma de proteção ao

contribuinte.

3.1 O princípio da legalidade

O IPI é regido, entre outros princípios, pelo princípio da legalidade, sendo

definido por José Eduardo Soares Melo

O princípio da legalidade constitui uma das garantias do Estado de Direito,desempenhando função de proteção do direitos dos cidadãos, insculpindo comoautêntico dogma jurídico pela circunstância especial de a Constituição haverestabelecido, como direito e garantia individual, “que ninguém será obrigado afazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (art. 5, II).-(MELO, 2009, p.144)

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O Código Tributário Nacional contempla o referido princípio de maneira

categórica no seu artigo

Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:I - a instituição de tributos, ou a sua extinção;II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos21, 26, 39, 57 e 65;

Observa-se que, quanto ao princípio da legalidade, não há nenhuma

transgressão por parte do Governo, uma vez que a majoração da alíquota do IPI, se

deu através do referido Decreto, respeitando o princípio da legalidade, no entanto ficou

provado sua inconstitucionalidade ao não respeitar o princípio da anterioridade.

Por ser extrafiscal, o IPI admite um comportamento mais ágil, é mais

permissivo com as iniciativas do Poder Executivo. Não exige lei formal, não exige

medida provisória, para alterar as suas alíquotas. Segundo o artigo 153, § 1º, da CF, é

possível um decreto do poder Executivo majorar ou diminuir as alíquotas do IPI.

3.2 O princípio da anterioridade

Quanto ao princípio da anterioridade, é aquele que garante ao contribuinte

a certeza do valor a ser recolhido para tal imposto. Tal princípio tem previsão no artigo a

seguirArt. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, évedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem emsituação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupaçãoprofissional ou função por eles exercida, independentemente da denominaçãojurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;III - cobrar tributos:a) ...b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que osinstituiu ou aumentou;

A base do princípio da anterioridade é muito bem definido por Manoela Floret

Silva Xavier:

nenhum tributo pode ser cobrado no mesmo exercício financeiro em que tenhasido publicada a lei que o instituiu ou aumentou. A intenção desse princípio é

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nitidamente evitar a surpresa do contribuinte, face à instituição de um novotributo, ou o aumento do mesmo, no meio do exercício financeiro. (XAVIER,2008, p. 7)

Sendo assim, o princípio da anterioridade só permite que a instituição ou

majoração de tributos só possa incidir sobre fatos que passam a existir após sua

vigência, entendida como anterioridade nonagesimal, cobrança que não poderia

acontecer antes de decorridos noventa dias da data que em que a lei foi instituída, em

conferência com o artigo especificado anteriormente.

No entanto, no caso do IPI, foi vedado o princípio da anterioridade devido ao

fato de o mesmo ser de natureza extrafiscal, exigindo assim uma política ágil, a fim de

compatibilizá-lo com a situação econômica do país da época.

O princípio da anterioridade foi, de todos os princípios que regem os

impostos, o mais desrespeitado pelo referido Decreto aqui analisado.

3.3 O princípio da isonomia tributária tributária

Evidencia-se: portanto, quanto ao princípio da isonomia, o fato de ser vedada

à União instituir tratamento diferenciado entre os contribuintes que se encontram em

situação equivalente. Assim diz Antônio Roberto Sampaio Doria

A exigência da igualdade fiscal deve, pois se harmonizar com as desigualdadeseconômicas, onde outra natureza, em função das quais, e somente delas, opoder tributário se há de exercitar com justiça. (DORIA, 1986, p.136)

Destarte, em relação ao produto industrializado não tem como o legislador

federal instituir o IPI mais elevado para um contribuinte em benefício de outro

fabricante.

3.4 O princípio da seletividade

Ainda sobre princípios que regem os produtos industrializados, são

primordiais os princípios específicos, tais como a seletividade e não-cumulatividade.

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abaixo

O princípio da seletividade tem seu embasamento legal no artigo versado

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:(...)IV - produtos industrializados(...)§ 3º O imposto previsto no inciso IV:I - será seletivo, em função da essencialidade do produto;

Faz-se necessário analisar o significado de essencial: “constitutivo de

essência; aquilo que é fundamental, substancial. Diz-se do que é indispensável a um

ato ou contrato para que tenha existência legal” (Deocleciano Torrieri Guimarães, 2010,

p. 300)

A seletividade é um mecanismo para preservar a capacidade econômica,

naqueles casos em que, presumível, quem arca com o peso do tributo, ou não tem

renda, capacidade econômica para pagar o próprio tributo. Fato é que se busca

baratear o custo de mercadorias essenciais, e de mercadorias relacionadas a setores

de primeira necessidade, com a correspondente incidência de IPI reduzido.

Diante do exposto, a essencialidade se refere à adequação do produto

industrializado na vida do maior número de habitantes; e seletividade significa o sistema

de alíquotas por espécies de mercadorias.

Portanto, no que se refere à essencialidade e a seletividade, fica claro que

quanto mais o produto for essencial na vida de grande parte da população, maior será o

desconto da alíquota do IPI.

3.5 O princípio da não-cumulatividade

O princípio da não-cumulatividade é outro princípio específico do IPI,

também de natureza constitucional, sendo um mecanismo de compensação que

possibilita ao contribuinte, em cada operação, uma dedução correspondente aos

montantes cobrados nas operações anteriores.

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4 ENFRENTANDO O PROBLEMA

Com a majoração da alíquota para os carros importados, o consumidor para

adquirir um exemplar que deseja, terá que pagar um preço mais elevado, fica a

pergunta: em que os carros importados se diferenciam dos carros nacionais?

Acredita-se que, tornar os veículos nacionais mais competitivos, seja a

melhor forma de preservar o mercado interno.

O Decreto Governamental n. 7.567/11 intensificou a discussão sobre o

princípio da anterioridade nonagesimal do IPI a partir do momento em que através do

Decreto supracitado, autorizou um significativo aumento na alíquota do IPI

relativamente aos veículos importados, como forma de proteger o mercado nacional.

De tal forma, surgiu assim um problema: tinha-se, de um lado, a linha

defendida pelo Governo no sentido de que a anterioridade nonagesimal não se aplicaria

ao caso porquanto o art. 150, III, 'c', da Carta Magna alude a 'lei', e, no caso, teve-se

mudança implementada a partir de Decreto; ademais, buscou-se sensibilizar o

Judiciário com o argumento relacionado ao caráter extrafiscal do IPI e à necessidade de

que essa alteração fosse de forma imediata, para defender o mercado nacional contra

a invasão de montadoras estrangeiras, cujos veículos ostentam preços bastante

atrativos, uma vez que, me muitos países se tributa renda e não produtos – contrário do

Brasil. Na outra ponta, sustentava-se que se o art. 150, III, 'c' alude a 'lei', com mais

razão, há de ser estendido o seu alcance à alteração de alíquota mediante decreto, o

que somente se opera nos limites legais; somando-se a isso, emerge a anterioridade

nonagesimal como direito fundamental do contribuinte, cuja conformação constitucional

não traz qualquer exceção no sentido propugnado pelo Governo.

Se se observar bem, a proteção às montadoras estrangeiras em solo

nacional e àquelas que não estão em solo nacional, mas fazem parte de um acordo

econômico como o Mercosul em detrimento às tidas como simplesmente importadoras,

acaba sendo um paradoxo, uma vez que não há montadora especificamente brasileira,

e sim, aquelas que usam as benesses que o governo oferece para que elas se instalem

em território nacional.

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Entende-se como montadora nacional, protegidas, aquelas que atendam aos

requisitos previstos no inciso III, § 1º, artigo 2º, capítulo I do referido Decreto, assim

expresso:

III - estará condicionada ao atendimento dos seguintes requisitos:a) fabricação de veículos referidos no Anexo I com, no mínimo, sessenta e

cinco por cento de conteúdo regional médio para cada empresa, de acordocom definição apresentada no Anexo II;

b) realização de investimentos em atividades de inovação, de pesquisa e dedesenvolvimento tecnológico de produto e processo no País,correspondentes a pelo menos meio por cento da receita bruta total devenda de bens e serviços, excluídos os impostos e contribuições incidentessobre a venda a serem comprovados até a data referida no caput; e (Alíneacom redação dada pelo Decreto nº 7.604, de 10/11/2011)

c) realização de pelo menos seis das seguintes atividades, no País, pelaempresa beneficiária, por empresa por ela contratada para esse objetivoespecífico ou, ainda, por fornecedora da empresa beneficiária, em pelomenos oitenta por cento de sua produção de veículos referidos no AnexoI: ("Caput" da alínea com redação dada pelo Decreto nº 7.604, de10/11/2011)

1. montagem, revisão final e ensaios compatíveis;2. estampagem;3. soldagem;4. tratamento anticorrosivo e pintura;5. injeção de plástico;6. fabricação de motores;7. fabricação de transmissões;8. montagem de sistemas de direção, de suspensão, elétrico e de freio, deeixos, de motor, de caixa de câmbio e de transmissão;9. montagem de chassis e de carrocerias;10. montagem final de cabines ou de carrocerias, com instalação de itens,inclusive acústicos e térmicos, de forração e de acabamento; e11. produção de carrocerias preponderantemente através de peças avulsasestampadas ou formatadas regionalmente.

Muitas críticas surgiram a partir da decretação desse regulamento jurídico,

negativa por parte das importadoras de carros e alguns especialistas da área jurídica;

positiva por parte de representantes do governo e de alguns representantes de

sindicatos de setor automobilístico.

Segundo a presidente da República Dilma Rousseff, tal regulamento visava

à proteção da economia brasileira, não deixando com que o Brasil tornasse um lugar

com galpões de revenda, sendo assim a majoração da alíquota para carros importados

foi a estratégia que o governo usou para intervenção na economia do país,

característica da extrafiscalidade do IPI. Extrafiscalidade, segundo Aliomar Baleeiro:

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É quando o tributo não tem como sua função principal prover ao estado meiosadequados para seu custeio, ma visa prioritariamente ordenar a propriedade deacordo com sua função social ou intervir em dados conjunturais ou estruturaisda economia. Para isso tem se reconhecido cada vez mais a competência aolegislador tributário para estimular ou desestimular comportamentos, de acordocom os interesses da coletividade, por meio da tributação regressiva ouprogressiva, ou da concessão de incentivos e benefícios fiscais.

Diante da definição sobre a extrafiscalidade, cabe ressaltar que o objetivo do

governo era frear a importação de veículos, como fica evidenciado no parecer pedido

pelo executivo, para comprovar que há um crescente déficit na balança comercial entre

importação e exportação no setor automotivo,

PARECERPGFN/CASTF Nº 991/2012

Argüição de Descumprimento de Preceito Industrializados - IPI. Alíquotas.Decreto nº 7.567/11.Constitucionalidade Fundamental n. 245. Imposto sobre Produtos. Ausência de violação a princípios constitucionais.

Subsídios. Encaminhamento à Consultoria-Geral da União.

I

Cuida-se o presente do Memorando Nº 207/2012/CGU/AGU encaminhado pelosenhor Consultor-Geral da União Substituto solicitando o encaminhamento demanifestação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, com o objetivo desubsidiar a elaboração das informações que deverão ser prestadas pelaExcelentíssima Senhora Presidenta da República, em face da propositura, peloDemocratas - DEM, de Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental,tombada sob o número 245, sob a relatoria do Ministro Marco Aurélio, quepostula a declaração de inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º, III, "a" e art. 3º, §4º, do Decreto n. 7.567, de 15 de setembro de 2011

2. A demanda postula fixação de entendimento por parte do Supremo TribunalFederal no sentido de que tais dispositivos teriam violado os preceitosfundamentais da livre iniciativa, da livre concorrência, da igualdade e da defesado consumidor.

3. Inicialmente faz-se necessário registrar que o expediente em voga deuentrada na Coordenação de Atuação Judicial do Supremo Tribunal Federal -CASTF/PGFN no dia 30/05/2012, sendo o termo assinalado para a entrega dopresente trabalho o dia 31/05/2012. Dessa forma, a análise aqui tecida nãopode estar imune aosefeitos da limitação temporal que a exigüidade do prazo apontado impõe. Feitoesse registro, passemos à análise do caso.

II

ADMISSIBILIDADE

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4. A despeito da superação desse ponto na apreciação da liminar na ADI4.661/DF, a Fazenda Nacional entende conveniente e tecnicamente adequadoo levantamento do óbice da não-admissibilidade da presente Argüição deDescumprimento de Preceito Fundamental (ADPF).

5. Com efeito, no que pertine ao cabimento da arguição, colhe-se posiçãopacificada do Supremo Tribunal Federal de que os regulamentos ou decretosregulamentadores expedidos pelo Poder Executivo (art. 84, IV, da CF) e demaisatos normativos secundários não podem, em regra, ser objeto de controle diretode constitucionalidade. Tais atos não atenderiam ao requisito de estaremrevestidos de autonomia jurídica a fim de possam ser qualificados como atosnormativos suscetíveis desse tipo de controle.

6. Por certo, cuida-se o Decreto n. 7.567, de 15 de setembro de 2011, deveicular normas que não se revestem de autonomia jurídica, na exata medidaem que cumpre a função de regulamentar os arts. 5º e 6º da Medida Provisórianº 540, de 2 de agosto de 2011, os quais dispõem sobre a redução do Impostosobre Produtos Industrializados - IPI em favor da indústria automotiva, bemcomo alterar a Tabela de Incidência do IPI - TIPI, aprovada pelo Decreto n.6.006, de 28 de dezembro de 2006.

7. Inicialmente, extrai-se do Decreto em questão:

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art.84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto nos incisos I e II docaput do art. 4o do Decreto-Lei no 1.199, de 27 de dezembro de 1971, e osarts. 5º e 6º da Medida Provisória no 540, de 2 de agosto de 2011, decreta: (...)

8. Já o referenciado Decreto-lei nº 1.199, de 27 de dezembro de 1971, no pontoque interessa à presente discussão, assim dispõe:

Art 4º O Poder Executivo, em relação ao Impôsto sobre ProdutosIndustrializados, quando se torne necessário atingir os objetivos da políticaeconômica governamental, mantida a seletividade em função da essencialidadedo produto, ou, ainda, para corrigir distorções, fica autorizado:

I - a reduzir alíquotas até 0 (zero);

II - a majorar alíquotas, acrescentando até 30 (trinta) unidades ao percentual deincidência fixado na lei;

9. Atento ao conteúdo normativo do Decreto-Lei nº 1.199, facilmente se colheque é dado ao Poder Executivo, no que toca ao Imposto sobre ProdutosIndustrializados - IPI, reduzir alíquotas até 0 (zero), ou ainda majorá-las em até30 (trinta) unidades ao percentual de incidência fixado na lei.

10. Cotejando essa regra com o que trazido nos dispositivos veiculados a partirdo indigitado Decreto n. 7.567 -supostamente eivado de inconstitucional -, semdificuldades percebe-se que tal Decreto nada mais fez do que atuar no plano doregramento das alíquotas, consoante os ditames previamente estabelecidos noDecreto-Lei nº 1.199.

11. Destarte, é, por sua vez, desnecessária a defesa da natureza normativaprimária da espécie legal de Decreto-Lei, por ser matéria absolutamenteincontroversa e completamente despida de maiores dúvidas.

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12. Portanto, do quadro normativo posto não se pode ter outra conclusão quenão a de que o Decreto n. 7.567, de 15 de setembro de 2011, como normativoinfralegal que é, vem à tona com o fito de estabelecer regulamentação comespeque em norma legal representada pelo Decreto-lei nº 1.199, de 27 dedezembro de 1971.

13. Nessa perspectiva, mostra-se forçoso reconhecer que o Decreto oraatacado não pode ser considerado como exemplar de verdadeira expressão dafunção normativa, pelo que não se traveste de ato normativo autônomo, nãosendo, pois, portador de qualquer norma originária no mundo jurídico.

14. É que quando a lei (decreto-lei) determina que decreto presidencial irádefinir a alíquota do imposto dentro de um patamar mínimo e máximo, ocontribuinte já sabe exatamente quais as possibilidades de ingerência estatalsobre o tributo.

15. Por isso, não há que se consentir com a natureza de norma legal autônomaapta a abrir a via do controle concentrado, posto inexistir qualquer novidadenormativa nos seus dispositivos.

16. Por certo, na medida em que já existente prévio diploma legal veiculador denorma estabelecedora de margens de alíquota aplicáveis ao IPI, não se podeter como autônomo regramento que disponha acerca de determinadopercentual dentro daqueles limites antes previstos. É dizer: não se pode extrairdo Decreto n. 7.567 autonomia jurídica que o permita tratá-lo como atonormativo suscetível de controle direto.

17. E como é cediço, o que se busca com o manejo da via concentrada decontrole é o controle de constitucionalidade de lei ou ato normativo que semostrarem incompatíveis com o arcabouço constitucional.

18. Assim vem decidindo o Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. Ataque a dispositivo de Decretoque aprova Regulamento de ICMS e que se limita a reproduzir texto de Lei quenão é atacado. - Esta Corte já firmou o entendimento de que não cabe açãodireta de inconstitucionalidade contra Decreto que regulamenta Lei, ou porque,havendo divergência entre aquele e esta, a questão se situa primariamente noterreno da legalidade, ou porque, sendo a norma daquele mera reprodução dadesta, a inconstitucionalidade a ser atacada é da norma legal e só por via deconseqüência se reflete na norma do Decreto que a reproduz. - No caso,configura-se a segunda hipótese, não tendo, portanto, sido atacada a normalegal que foi reproduzida no regulamento e cujo texto é o único impugnado.Ação direta de inconstitucionalidade não conhecida.(ADI 2121 / SC - SANTA CATARINA, AÇÃO DIRETA DEINCONSTITUCIONALIDADE, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Julgamento:09/11/2000, Órgão Julgador: Tribunal Pleno)

EMENTA: ADIN - ATOS NORMATIVOS 24 E 25/89, DA SECRETARIA DARECEITA FEDERAL - JUÍZO PREVIO DE LEGALIDADE - OBJETO INIDONEOPARA O CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE - AÇÃONÃO-CONHECIDA - AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. - A ação direta deinconstitucionalidade não e instrumento habil ao controle da validade de atosnormativos infralegais em face da lei sob cuja egide foram editados, ainda que,num desdobramento, se estabeleca, mediante previa aferição da inobservanciadessa mesma lei, o confronto consequente com a Constituição Federal. Crises

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de legalidade, caracterizadas pela inobservancia, por parte da autoridadeadministrativa, do seu dever jurídico de subordinação normativa a lei, revelam-se estranhas ao controle normativo abstrato, cuja finalidade restringe-se,exclusivamente, a aferição de eventual descumprimento, desde que direto efrontal, das normas inscritas na Carta Politica. A ação direta deinconstitucionalidade - quando utilizada como instrumento de controle abstratoda mera legalidade dos atos editados pelo Poder Público - descaracteriza-seem sua precipua função político-jurídica, na medida em que, reduzindo-se emsua dimensão institucional, converte-se em meio processual desvinculado dafinalidade para a qual foi concebido.(ADI 264 AgR / DF - DISTRITO FEDERAL, AG.REG.NA AÇÃO DIRETA DEINCONSTITUCIONALIDADE, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Julgamento:07/05/1992, Órgão Julgador: Tribunal Pleno)

EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. Artigo 68 do Regulamento dosBenefícios da Previdência Social aprovado pelo Decreto 2.172, de 05 de marçode 1997. Pedido de liminar. - Já se firmou o entendimento desta Corte nosentido de que não cabe ação direta de inconstitucionalidade contra normareguladora de lei que é atacada por ir além do disposto na lei regulamentada oucontra ela, porquanto nesse caso se está diante de questão de ilegalidade enão de inconstitucionalidade. Ação de inconstitucionalidade não conhecida,ficando prejudicado o pedido de liminar.(ADI 1866 / DF - DISTRITO FEDERAL, AÇÃO DIRETA DEINCONSTITUCIONALIDADE, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Julgamento:29/10/1998, Órgão Julgador: Tribunal Pleno)

Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Alteração nº 150 introduzida pelo art. 1ºdo Decreto nº 2665, de 29.10.1993, do Estado do Paraná, que modificoudispositivos do regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1966, de22.12.1992, do referido Estado. 3. Não se trata de decreto autônomo o Decretoparanaense nº 2665/1993, pois nada mais fez do que incluir no Regulamento doICMS (Decreto nº 1966/1992) o novo tratamento dispensado (Convênio 63/89),no que se refere a créditos do tributo incidentes na aquisição de matériasprimas e material secundário na fabricação de papel de imprensa. 4. Não setratando de decreto autônomo, o Decreto nº 2665/1993 não pode ser atacadoem ação direta de inconstitucionalidade, que não é via adequada à meradeclaração de ilegalidade de norma regulamentar. 5. Ação direta deinconstitucionalidade não conhecida, julgando-se prejudicado o pedido decautelar.(ADI 1258 / PR - PARANÁ, AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE,Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA, Julgamento: 26/05/1995, Órgão Julgador:Tribunal Pleno)

19. Por outro lado, veja que somente seria adequado o controle concentrado deconstitucionalidade se o decreto houvesse incorrido em desrespeito aos limiteslegais, o que não se colhe na espécie, como já demonstrado:

DECRETO REGULAMENTADOR - EXTRAVASAMENTO - ATUAÇÃOLEGISLATIVA. De início exsurge o sinal do bom direito quando o decretolegislativo de sustação de ato regulamentador de lei extravasa os limitespróprios à preservação da competência da casa legislativa. Isso ocorre emrelação ao Decreto Legislativo nº 111/96 da Câmara Distrital de Brasília, no quesuspendeu, sem distinguir preceitos, o decreto do Governador de nº 17.128, de31 de janeiro de 1996, editadoem parte, à luz da Lei nº 237, de 20 de janeiro de 1992. Suspensão parcialdeferida pelo Presidente da Corte e referendada pelo Plenário.

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(ADI 1553 MC / DF - DISTRITO FEDERAL, MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃODIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADERelator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Julgamento: 06/03/1997 Órgão Julgador:Tribunal Pleno)

20. É, pois, numa parcial síntese conclusiva que se pode asseverar odescabimento da presente ADPF, à vista da franca impossibilidade de oDecreto n. 7.567, de 15 de setembro de 2011, ser objeto de controleconcentrado de constitucionalidade, em face de seu caráter eminentementeregulamentador do Decreto-lei nº 1.199, de 27 de dezembro de 1971.

MÉRITO

21. No que toca ao mérito da argüição, é certo que a correta apreensão docontexto macroeconômico em que se inserem as alterações na tributação doIPI, levadas a cabo pelo Decreto n. 7567/11 e pela Medida Provisória n. 540/11,permite que se compreenda as razões da sua edição e, consequentemente,que se extraia os elementos jurídicos comprovadores de sua conformidadeconstitucional.

22. Nesse passo, constata-se que, há alguns anos, a indústria automotivabrasileira vem se destacando no cenário mundial e obtendo importantescolocações no ranking dos países produtores, exportadores e importadores deveículos; nos últimos anos, o setor experimentou um forte crescimento nonúmero de unidades produzidas, que saltou de 1,7 milhões em 2000 para 3,6milhões, em 2010. Tal crescimento se reflete em recordes sucessivos, desde2002, de unidades produzidas anualmente, o que - dada a solidez da economiabrasileira - não foi abalado sequer pela crise financeira que acometeu o mundoem 2008/2009. E o crescimento da produção de veículos automotivos foiacompanhado de expansão similar na magnitude das vendas: nos últimos dezanos ocorreu acréscimo de 136% nos licenciamentos referentes às vendasinternas de autoveículos.

23. Entretanto, esse crescimento na produção e venda de autoveículos já háalgum tempo não tem sido acompanhado por um aumento, na mesmaproporção, do desempenho da indústria nacional no setor, especialmente sob aótica da sua balança comercial. Com efeito, desde 2009, o setor automotivo temapresentado constantes déficits (importações superando as exportações), o quetem contribuído, em muito, para o preocupante déficit comercial de 86 bilhõesde dólares de produtos manufaturados no país. Assim, segundo dados daFUNCEX, veículos automotores, reboques e carrocerias registraram um saldocomercial líquido de US$ 7,3 bilhões em 2006, ao passo que, nos anos 2009 e2010, o setor passou a registrar déficit comercial líquido de US$ 3,0 bilhões eUS$ 4,9 bilhões, respectivamente.

24. Confira-se, por oportuno, os dados relativos à balança comercial do setorautomotivo, fornecidos pela Secretaria de Política Econômica (SPE) doMinistério da Fazenda (MF):

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Balança Comercial – Automotivo

ANO IMPORTAÇÕES EXPORTAÇÕESSALDOCOMERCIAL

2005200620072008200920102011

2.5793.8365.7079.0278.42712.9838.653

8.0668.6789.3759.9106.0649.1015.555

5.4874.8423.668883-2.363-3.882-3.098

25. E esse preocupante cenário tem se mantido no decorrer de 2011, não tendoapresentado sinais de recuperação, eis que:

(i) segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), de janeiro aagosto do presente ano, as exportações nacionais de componentesautomotivos somaram US$ 7,36 bilhões e as importações, por sua vez, US$10,57 bilhões;

(ii) somente em agosto de 2011, os embarques da indústria alcançaram US$1,14 bilhão; já as compras externas ficaram em US$ 1,68 bilhão, o que significaque o saldo negativo comercial no mês foi de US$ 548,1 milhões, o equivalentea avanço de 76,4% na comparação anual;

(iii) e, entre a terceira e a quarta semana de setembro, houve déficit de US$ 584milhões na balança comercial, o que se explica, em grande parte, pelo aumentoem 22,5% nas importações, em especial de veículos automotivos, registradoentre os dias 19 e 25 do referido mês, conforme divulgado pelo Ministério doDesenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

26. Esse panorama indica, claramente, que a pujante demanda do mercadointerno brasileiro, explicada, dentre outros fatores, por uma conjunturamacroeconômica doméstica favorável e pelos elevados níveis de emprego, temsido atendida pelas importações de automóveis, em evidente detrimento daindústria e produção nacionais. Segundo dados fornecidos pela Secretaria dePolítica Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda (MF), tendo como fonte aANFAVEA, enquanto em janeiro de 2005 a participação dos autoveículosimportados no mercado interno brasileiro era de 4,72%, em janeiro de 2011essa participação já alcançava 23, 52%; e esse percentual cresce mês a mês,conforme será demonstrado mais adiante.

Nesse ponto, e para ilustrar o avanço predatório dos autoveículosimportados no mercado nacional, vale citar o caso das importações oriundasdos países asiáticos: desde 2005, o crescimento das importações da Coréia doSul e China, foi, respectivamente, de4.100% e 1.250% (!) - dados da SPE doMF. A montadora chinesa JAC Motors, por exemplo, em pouco mais de um anono Brasil, já tem superado o número de vendas de outras empresas bem maisantigas no setor, que investem e têm fábrica no país há muito mais tempo. É oque se extrai de informações constantes do site na internet da empresa:

"JACMOTORS CRESCE 45,1% NAS VENDAS EM MAIO

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Em maio, de acordo com dados de emplacamentos divulgados pelo Renavam,a JAC Motors superou em 45,1% as vendas do mês anterior. O sucesso dosdois modelos, J3 e J3 Turin, é inquestionável no mercado nacional, à medidaque mais de 3 mil unidades foram emplacadas, cerca de mil acima do mêsanterior. (...)Em São Paulo, a JAC Motors obteve 2,28% de participação nas vendas emmaio, à frente da Mitsubishi, por exemplo. No Rio de Janeiro, com 2,62%, a JACMotors vendeu mais também que Mitsubishi e Toyota. Já em Brasília, com umafatia de 2,79% das vendas, a marca superou Mitsubishi, Toyota e Nissan.Nessas três cidades, o market share médio ultrapassa 2,5%".

28. Percebe-se, ainda, uma nítida tendência de desnacionalização da produçãolocal, por meio da crescente utilização de partes e peças importadas. Essaprática acarreta menor investimento no setor de autopeças nacional e naspróprias fábricas, havendo transferência de atividades de maior complexidade eagregação de valor ao exterior, enquanto que as atividades produzidas no paíspassam a limitar-se à mera montagem de veículos. Com isso, os efeitosmultiplicadores no setor são diminuídos, com menor agregação de valor e,conseqüentemente, menor geração de emprego e renda no país. De formamais clara: o emprego e renda gerados pela alta demanda interna por veículossão transferidos para o exterior, não permanecendo no país.

29. Foi justamente diante desse cenário - de preocupante e crescente déficit nabalança comercial, de avanço predatório do conteúdo importado do setorautomotivo e, conseqüentemente, de degradação da indústria nacional ecomprometimento do emprego e renda no país - que veio à lume o Decreto nº7.567, de 15 de setembro de 2011, que regulamenta os artigos 5º e 6º daMedida Provisória n. 540, de 2 de agosto de 2011. Esses dois atos normativosintegram o Plano "Brasil Maior", cujo objetivo é conferir maior estímulo aodesenvolvimento inovador e competitivo do País, frente à conjuntura de maioragressividade competitiva no comércio internacional e apreciação da moedanacional. Insta registrar, por oportuno, que medidas como a plasmada noDecreto n. 7.567/2011, não são exclusividade da política comercial brasileira:em realidade, têm sido contemporaneamente adotadas por vários outros paísesdo mundo, como, apenas para citar alguns exemplos, pela Argentina (queimpõe ao importador a obrigação de exportar outros produtos em montantecorrespondente, principalmente quando não há conteúdo nacional), pelaAustrália e por vários países asiáticos (cujo exemplo mais emblemático é o daChina).

30. Em suma, conforme se extrai do teor do Decreto n. 7.567/11, altera-se, paramaior, em 30 pontos percentuais, as alíquotas para automóveis e caminhõesimportados. Entretanto, a alíquota de IPI não sofrerá tal alteração em relaçãoaos produtos produzidos no país, bem como para os importados do Mercosul eMéxico, mas, ainda assim, apenas para aquelas empresas instaladas no paísque cumprirem alguns requisitos (todos relacionados a um certo grau deagregação de valor à industria nacional), tais como, exemplificadamente:fabricação de veículos com, no mínimo, sessenta e cinco por cento de conteúdoregional; realização de investimentos em atividades de inovação, de pesquisa ede desenvolvimento tecnológico de produtos no país correspondentes a pelomenos 0,5% da receita bruta total de venda de bens e serviços;desenvolvimento, no país, de atividades tais como estampagem, soldagem,fabricação de motores, dentre outras de alta agregação de valor. Cumpresalientar que tais alterações, para maior, nas alíquotas de IPI permanecerão emvigor até dezembro de 2012.

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31. Assim, as medidas tributárias implementadas pelo Decreto 7.567/11, bemcomo pela MP n. 540/11, são peças essenciais de um estratégico eemergencial plano de ação do governo brasileiro, gestado com a nítidafinalidade de fortalecer a industria nacional e tentar conter o nível crescente deimportações que tem comprometido gravemente a competitividade brasileira nosetor automotivo. Ao fim e ao cabo, tais medidas - de natureza nitidamenteextrafiscal e que têm duração temporária - visam evitar o fechamento defábricas, a redução na produção industrial e a perda de postos de trabalho,possivelmente geradas a partir do cenário de degradação da indústria nacionalacima referido.

32. É preciso, portanto, compreender as recentes alterações nas alíquotas doIPI como um meio para alcançar as finalidades acima mencionadas. E, o que émais importante ao deslinde da presente demanda: isso apenas se faz possívelem razão da roupagem conferida ao IPI pela Constituição Federal que, aoimprimir-lhe caráter extrafiscal, permite seu manejo, pelo Governo Federal,como importante instrumento de implementação de políticas públicas.

33. Nessa perspectiva, a disciplina constitucional dada ao IPI é complementadapela regra prevista no art. 153, §1º da CF/88, que permite ao Poder Executivoalterar as alíquotas de tal exação, atendidas as condições e limites dispostosem lei. Essa previsão consiste, segundo entendimento doutrinário ejurisprudencial pacíficos, em uma exceção ao princípio constitucional dalegalidade tributária estrita, na medida em que possibilita a alteração dasalíquotas do IPI por meio de Decreto editado pelo Presidente da República,estando a legitimidade dessa alteração, contudo, condicionada à sua completaadstrição às "limitações previstas em lei" (em sentido estrito).

34. E essas "limitações legais" - especificamente quanto aos limites máximos emínimos - estão previstas, atualmente, no Decreto-lei n. 1.199/1971, que, emseu artigo 4º, autoriza o Poder Executivo a (i) reduzir as alíquotas do IPI atézero (inc. I) ou (ii) majorar alíquotas, acrescentando até 30 unidades aopercentual de incidência fixado na lei (inc. II). Essa lei, que fixa o percentualbásico de incidência, por sua vez, é a de n. 10.451/2002, que, em seu art. 7º,determina que "para efeito do disposto no art. 4º, incisos I e II do Decreto-Lei1.199, de 27 de dezembro de 1971, o percentual de incidência é o constante daTIPI, aprovada pelo Decreto n. 4070, de 28 de dezembro de 2001".

35. Assim, na prática, da conjugação dessas normas infraconstitucionais resultaque, para fins de fixação do quantum devido a título de IPI: há a chamada"alíquota legal básica" do IPI, que é prevista, atualmente, na TIPI/2001 (Decreton. 4070/2001), por força dos arts. 6º e 7º da Lei n. 10.451/2002; ao lado dessaalíquota legal básica, há, ainda, a alíquota concretamente aplicável do IPI, queé imposta/regulada via Decreto executivo.

36. Assim, pelo contorno atualmente dado à matéria pelo Decreto-lei n.1.199/71, permite-se ao Poder Executivo, validamente, por meio de Decreto,acrescentar à alíquota legal básica do IPI - prevista na TIPI/2001 - até 30pontos percentuais, o que significa dizer que, se, por exemplo, a alíquota legalbásica do IPI de determinado produto é de 5%, o Poder Executivo poderá, pormeio de Decreto, fixar a alíquota concretamente aplicável do IPI em até 35%(alíquota legal básica [5%] + 30% [limite máximo de alteração via Decreto] =alíquota concretamente aplicável [35%]). E, caso se pretenda que tal alíquotaconcretamente aplicável seja de 40%, terá que alterar - por intermédio de lei emsentido estrito - a respectiva alíquota legal básica, que, no exemplo dado,passará a ser de 10%.

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37. E essa sistemática de definição do quantum devido a título de IPI - que fazuso dos conceitos, acima referidos, de alíquota legal básica e alíquotaconcretamente aplicável, cuja roupagem essencial está em vigor há mais detrinta anos no sistema jurídico nacional-, realça a nota da extrafiscalidade quemarca o IPI . É que é justamente mediante o manejo, dentro dos limites legais(zero a trinta pontos percentuais), das alíquotas concretamente aplicáveis ao IPIdevido por determinados setores do mercado que o Estado, intervindo naeconomia, tem podido alcançar fins diversos da pura e simples arrecadaçãotributária, tais como a proteção de um setor produtivo contra práticaspredatórias de exportadores estrangeiros, o desenvolvimento de um setorespecífico da economia, a proteção da indústria nacional contra a invasão demercadorias importadas subsidiadas, o desestímulo do consumo de bensprejudiciais à saúde pública (como bebidas alcoólicas e cigarros), dentre outrosfins de igual relevância pública.

38. Além disso, tal interpretação sistemática deverá ter como "fio condutor" acompreensão do papel que, hodiernamente, os tributos extrafiscais, de que éexemplo o IPI, no caso do Brasil, desempenham para a economia dos países,inseridos que estão num mercado de escala global. É somente a partir dessacompreensão que será possível se obter uma interpretação atual do textoconstitucional, sintonizada com as exigências, modernamente impostas aosEstados, de intervenção indutora na economia, apta a promover-lhe importantesalterações conjunturais ou, mesmo, estruturais.

39. Nessa toada, uma vez extraída a matriz interpretativa constitucionalmenteconsagrada no art. 153, §1º da CF/88, especialmente se realizada à luz do atualconteúdo da função regulatória e indutora do IPI, incontornável a conclusão deque a variação das alíquotas do IPI, realizada por Decreto presidencial e dentrodos limites legais, atende aos preceitos constitucionais tido comopretensamente violados. É que esse Decreto presidencial foi editado em estritaobservância aos limites legais (previstos, como visto, no art. 4º do Decreto-lei1.199/71), e fixa a alíquota concretamente aplicável do IPI, manejada peloGoverno como forma de exercer uma ágil regulação e indução na economia.

40. Registre-se, aqui, que o exemplo consubstanciado no Decreto n.7.567/2011 elucida bem como o manejo, por Decreto, das alíquotas do IPI podeassumir o relevante papel de regulador da economia, mediante a correção dedesvios capazes de lhe comprometer a estabilidade, veiculando uma respostaágil a graves situações de crise. No caso do Decreto n. 7.567/2011, a situaçãode crise enfrentada exsurge, como visto anteriormente, num quadro depreocupante e crescente déficit na balança comercial, de avanço predatório doconteúdo importado do setor automotivo e, conseqüentemente, de degradaçãoda indústria nacional e comprometimento do emprego e renda no país.

41. Com efeito, o avanço predatório das importações de autoveículos nomercado brasileiro se reflete numa participação cada vez maior dos importadosno percentual de vendas internas. E essa participação cresce mês a mês:apenas de agosto a setembro deste ano, a parcela de vendas internas deautoveículos importados saltou de 22,49% para 25,36%, ou seja, um aumentode quase 3% em um mês. Para que se tenha uma exata noção da magnitudedo crescimento que as importações têm assumido nos últimos meses, bastaque se observe que, no período de 1 ano (de janeiro de 2010 a janeiro de2011), o crescimento total da participação dos importados no mercado internofoi de 3%. Ou seja: em apenas um mês de 2011, constatou-se um incrementonas importações de autoveículos equivalente ao incremento ocorrido em todo o

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ano de 2010 (!).

42. Confira-se, abaixo, tabela, fornecida pela SPE/MF (fonte: ANFAVEA), queilustra o vertiginoso aumento da participação dos autoveiculos importados nomercado brasileiro, dados que vão de janeiro de 2010 a setembro de 2011:

Unidadespor Mês

LicenciamentoautoveículosImportados

Licenciamentoautoveículos

Nacionais

Total deLicenciamentoautoveículos

Participaçãodos

Importados

jan/10 42.981 170.331 213.312 20,15fev/10 40.466 180.491 220.957 18,31mar/10 58.142 295.596 353.738 16,44abr/10 49.752 228.091 277.843 17,91mai/10 44.967 206.120 251.087 17,91jun/10 46.285 216.473 262.758 17,62jul/10 54.287 248.045 302.332 17,96ago/10 57.256 255.527 312.783 18,31set/10 57.548 249.509 307.057 18,74out/10 59.220 243.952 303.172 19,53nov/10 66.436 262.037 328.473 20,23dez/10 82.801 298.751 381.552 21,70jan/11 57.597 187.276 244.873 23,52fev/11 61.981 212.172 274.153 22,61mar/11 62.309 243.826 306.135 20,35abr/11 64.060 225.129 289.189 22,15mai/11 74.748 243.786 318.534 23,47jun/11 69.307 235.026 304.333 22,77jul/11 67.385 238.846 306.231 22,00ago/11 73.672 253.938 327.610 22,49set/11 79.038 232.610 311.648 25,36

43. Outro dado que impressiona é a taxa de crescimento do licenciamento deveículos importados e nacionais: entre janeiro de 2010 e setembro de 2011,observa-se um movimento crescente de licenciamento de veículos importados eum movimento decrescente de licenciamento de veículos nacionais. Observe-seos dados fornecidos pela SPE/MF (fonte: ANFAVEA):

Unidadespor Mês

LicenciamentoautoveículosImportados

Licenciamentoautoveículos

Nacionaisjan/10 28,5% 10,1%fev/10 28,4% 11,0%mar/10 31,8% 12,0%

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abr/10 36,7% 14,3%mai/10 38,4% 13,9%jun/10 37,4% 10,4%jul/10 37,6% 11,1%ago/10 41,3% 12,1%set/10 41,1% 10,1%out/10 38,2% 8,4%nov/10 36,9% 8,2%dez/10 35,0% 7,6%jan/11 36,8% 7,8%fev/11 38,4% 8,5%mar/11 33,2% 4,3%abr/11 31,3% 3,2%mai/11 33,9% 4,9%jun/11 36,5% 7,2%jul/11 36,2% 6,7%ago/11 34,4% 5,3%set/11 35,5% 5,1%

44. Diante da constatação de que o avanço expressivo das importações deautoveículos, especialmente dos asiáticos, em prejuízo à indústria nacional, dá-se a curtos intervalos de tempo, de modo que, em apenas um mês, as taxas decrescimento têm chegado a quase 3%, alçando o patamar de 3,36% em trêsmeses, desponta como evidente que medidas estratégicas, tal qual a veiculadapelo Decreto n. 7.567/11, apresentem caráter emergencial e imperativo, a bemda indústria nacional.

45. De fato, é necessário ter em mente as finalidades que se pretende alcançarmediante a edição do referido Decreto, a saber, fortalecer a industria nacionalde autoveículos e tentar conter o nível crescente de importações no setor. Valelembrar, ainda,que a majoração das alíquotas do IPI, decorrente do Decreto n. 7.567/11, temprazo certo para terminar (31/12/2012)46. E esse caráter imperativo da medida plasmada no Decreto n. 7.567/11,resta reforçado ante ao fato de estar em jogo o fechamento de fábricas, aredução na produção industrial e a perda de postos de trabalho, possivelmentegeradas a partir do cenário de degradação da indústria nacional acima referido.

47. Assim, por todas as razões antes expostas, resta claro que as alteraçõespromovidas nas alíquotas de IPI aplicáveis a autoveículos importados,promovidas pelo Decreto n. 7.567, de 15 de setembro de 2011, não têm ocondão de arranhar os preceitos constitucionais da livre iniciativa, da livreconcorrência, da igualdade ou da defesa do consumidor.

III

48. Apresentadas as razões, é dever consignarmos que a elaboração daspresentes informações fundou-se nos seguintes trabalhos: PARECERPGFN/CAT/Nº 690/2006, NOTA COSIT Nº 84, DEFESA MÍNIMA elaborada pelaDivisão Nacional de Acompanhamento Especial e Estratégia de Defesa -

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DIAEJ/PGFN, bem como NOTA Nº 1160/PGFN/CASTF.

49. São essas, pois, as considerações que a Fazenda Nacional entendepertinentes ao caso. Esse é o nosso parecer.

50. Se aprovado, sugerimos que seja encaminhado à Consultoria-Geral daUnião, a título de subsídios.À consideração superior.

PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 31 de maio de 2012.

GETÚLIO EUSTÁQUIO DE AQUINO JÚNIORProcurador da Fazenda Nacional

De acordo. Encaminhe-se à Procuradoria-Geral Adjunta da Consultoria eContencioso Tributário.

PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 31 de maio de 2012.

CRISTINA LUISA HEDLERCoordenadora da Atuação Judicial no STFSubstituta

Aprovo. Encaminhe-se, como sugerido, à Consultoria-Geral da União.PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 31 de maio de 2012.

RONALDO AFFONSO NUNES LOPES BAPTISTAProcurador-Geral Adjunto da Consultoria e Contencioso Tributário

Substituto

É notável que, a intenção do governo é proteger o mercado nacional, com o

promulgação do referido decreto, uma vez que quando se tem a implantação de uma

montadora em território nacional, significa geração de empregos e mais tributos para os

cofres públicos.

Portanto, o maior equívoco para a implementação desse regulamento, foi o

fato de exigir a vigência a partir da data de sua publicação, não respeitando a

anterioridade nonagesimal e não o fato de exigir a nacionalização de carros ou peças

automobilísticas.

5 CONCLUSÃO

O § 1º do artigo 150 diz que a vedação do inciso III, “b”, não se aplica ao IPI,

portanto o princípio da anterioridade de exercício não se aplica ao IPI. Consoante

referido alhures, a vedação do artigo 150, III, “c” não se aplicaria a diversos impostos,

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contudo, não se inclui a esta vedação o IPI pois remissão ao mesmo não é feita. Por

exercício hermenêutico, inclusive verificado na doutrina e jurisprudências suscitadas

neste trabalho, sobre o IPI recai a anterioridade nonagesimal.

O maior problema detectado por tal Decreto foi não respeitar a anterioridade

nonagesimal, despertando insegurança jurídica em vários importadores e

consumidores, sendo assim, várias ações de inconstitucionalidade foram impetradas

junto ao STF contra esse Decreto Governamental, por mais que o Governo alegasse

que esta medida era para proteger as montadoras que estavam em Território Nacional,

feria o princípio da igualdade, não havendo outra alternativa a não ser aplicar para os

carros importados o princípio da anterioridade nonagesimal, para tanto o regulamento

jurídico em questão foi revogado pelo Decreto nº 7.819, de 2012, decreto que dispões

sobre o Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia

Produtiva de Veículos Automotores - INOVAR-AUTO.

Diante de tantas controvérsias até aqui analisadas, fica evidente que a

função do IPI no cenário nacional, serve tanto para incentivar a economia ou para

desestimular a mesma, a mudança ocorre através da diminuição ou da majoração da

alíquota.

Destarte, o princípio da essencialidade, em se tratando de um país com tanta

diversidade social e econômica como o Brasil, torna-se cada vez mais complexo.

Se se levar em conta as diversas classes sociais que formam este país, é

notório observar que as pessoas têm necessidades diferentes umas das outras, que o

que é essencial para uma parte da sociedade não o é para outra.

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Nº 84, DEFESA MÍNIMA elaborada pela Divisão Nacional de Acompanhamento

Especial e Estratégia de Defesa - DIAEJ/PGFN, bem como NOTA Nº

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