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IPEC SUBREGIÃO AMÉRICA DO SUL Abril, 2002 realizada por Janicleide Lopes e Tânia Stoltz Relatório revisado e adaptado por Isa Ferreira Sistema de Información Regional sobre Trabajo Infantil – SIRTI- Tel: 511-2150327 / 511- 221-2565, Fax: 511- 4215292. Correo electrónico: sirti @oit.org.pe Las Flores 295 San Isidro, Lima 27. Casilla Postal 14-124, Lima 14. IPEC Sudamérica ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO Oficina Regional da América Latina e Caribe Programa Internacional De Erradicação Do Trabalho Infantil - IPEC

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IPEC SUBREGIÃO AMÉRICA DO SUL

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Abril, 2002

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����������� �������������� �������������� �������������� �������realizada por

Janicleide Lopes e Tânia Stoltz Relatório revisado e adaptado por

Isa Ferreira

Sistema de Información Regional sobre Trabajo Infantil – SIRTI-

Tel: 511-2150327 / 511- 221-2565, Fax: 511- 4215292. Correo electrónico: [email protected] Las Flores 295 San Isidro, Lima 27. Casilla Postal 14-124, Lima 14.

IPEC Sudamérica

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO Oficina Regional da América Latina e Caribe

Programa Internacional De Erradicação Do Trabalho Infantil - IPEC

II

Prefácio

Uma das prioridades da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no marco do trabalho

decente é a promoção e implementação da Convenção 182– proibição e ação imediata para a erradicação das piores formas de trabalho infantil (1999). A recomendação 190, que acompanha esta convenção, estabelece que "se deve compilar e armazenar informações específicas e dados estatísticos sobre a natureza e magnitude do trabalho infantil para que sirva de base no momento de definir as prioridades de ação nacional para sua abolição, bem como na definição de medidas urgentes para eliminar as piores formas" Entretanto, a despeito do enorme esforço já empreendido, constata-se enormes vazios, sobretudo nos setores onde o trabalho infantil é invisível e, consequentemente mais perigoso.

Levantar dados sobre a exploração sexual comercial de crianças e adolescentes não é tarefa

simples. Apesar da dedicação de muitas organizações a este tema, as informações ainda são escassas. Enfrenta-se muita resistência para estabelecer uma aproximação com as crianças e adolescentes que se encontram nesta situação: muitos procuram negar a existência do problema; fatores culturais também têm representado fortes impedimentos e, sobretudo, o acesso às crianças em locais de prostituição e o risco que a atividade envolve. A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes em muitas regiões tem apresentado estreita vinculação com o crime organizado e com redes de tráfico.

A investigação que ora apresentamos integra um conjunto de estudos realizados pelo

Programa Binacional para prevenir e eliminar a exploração sexual comercial infanto-juvenil na região de fronteira Brasil/Paraguai (Ciudad del Este/Foz de Iguaçu) que a OIT através do seu programa IPEC está desenvolvendo desde setembro 2001. Com financiamento do Departamento do Trabalho dos Estados Unidos o programa tem duração de três anos e um de seus objetivos é produzir e disseminar informações relevantes sobre as características e magnitude da exploração sexual comercial que atinge às crianças e adolescentes nessa região. Combinado-se aos estudos sobre vazios legislativos e políticas sociais, espera-se reunir evidências e um conjunto de recomendações que possibilitem a necessária mobilização de amplos setores da sociedade e do estado na definição de medidas urgentes e imediatas para prevenir e eliminar essa forma perversa de exploração das crianças e adolescentes.

As informações desse diagnóstico abordam diretamente as características da exploração

sexual comercial de crianças que trabalham nas ruas. No entanto, por sua característica qualitativa de abordagem a diferentes segmentos foi possível detectar diferentes nuances dessa forma de exploração infanto-juvenil: a exploração se expressa em vários níveis e abrange setores diversos da população. Atinge desde as crianças e adolescentes que trabalham e sobrevivem nas ruas, como também a segmentos das classes sociais mais favorecidas. Em todos os níveis detectou-se forte vinculação com redes de tráfico de drogas e crime organizado.

Esperamos que estes resultados, associados aos que foram coletados, no Paraguai representem uma significativa contribuição às intervenções para afastar as crianças dessa forma de exploração, oferecendo-lhes oportunidades de plena cidadania e para colocar em prática programas e políticas que previnam e inibam esse crime na região da tríplice fronteira: Argentina, Brasil e Paraguai.

Isa Ferreira Agustin Muñoz Diretora do Programa Binacional Diretor Regional para as Américas de Prevenção e Eliminação da ESCI Junho 2002

III

Agradecimentos

À Prefeitura de Foz do Iguaçu através da Secretaria da Criança por sua abertura e apoio à

implantação e implementação do Programa na cidade. A todos os integrantes do Comitê Local pelo compromisso, disponibilidade para assumir as ações propostas. Ao Conselho Tutelar pelo apoio à realização do diagnóstico. Aos diversos órgãos governamentais e não governamentais visitados que permitiram acesso às informações aqui apresentadas. Aos parlamentares, setores da polícia e do judiciário pelas contribuições prestadas. À equipe do programa ESCI em Foz de Iguaçu por todo o esforço para viabilizar o programa local. Agradecimentos especiais a todas as pessoas que dispuseram de seu tempo para as entrevistas. Aos pesquisadores de campo pelo trabalho realizado e, particularmente às famílias e às crianças e adolescentes pesquisadas. A elas dedicamos esse trabalho.

IV

INDICE PREFÁCIO ...................................................................................................................................................................... II

AGRADECIMENTOS .................................................................................................................................................. III

INDICE............................................................................................................................................................................IV

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS UTILIZADAS........................................................................................... X

RESUMO EXECUTIVO................................................................................................................................................XI

CAPÍTULO 1 - MARCO DE REFERÊNCIA................................................................................................................ 1

1.1 ANTECEDENTES ........................................................................................................................................................ 1

1.2 O CONTEXTO NACIONAL .......................................................................................................................................... 2

1.3 POLÍTICAS PARA A INFÂNCIA NO BRASIL............................................................................................................... 4

1.4 MARCO CONCEITUAL*.......................................................................................................................................... 8

1.5. MARCO LEGAL......................................................................................................................................................... 9

CAPÍTULO 2 - PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS..................................................................................... 12

2.1. JUSTIFICATIVA DO ESTUDO.................................................................................................................................. 12

2.2 OBJETIVOS .......................................................................................................................................................... 13

2.3 METODOLOGIA UTILIZADA ................................................................................................................................. 13

2.4 CRITÉRIOS DE RECONHECIMENTO DOS GRUPOS PESQUISADOS ............................................................................. 14

Famílias .................................................................................................................................................................. 15

2.5. CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO...................................................................................................... 15

2.6. MÉTODOS DE COLETA DE DADOS......................................................................................................................... 16

2.7. LIMITES DA INVESTIGAÇÃO................................................................................................................................. 16

2.8 A EQUIPE DE INVESTIGAÇÃO............................................................................................................................... 17

CAPÍTULO 3 - PRINCIPAIS ACHADOS................................................................................................................. 18

3.1. CONTEXTO LOCAL............................................................................................................................................... 18

3.1.1 Variáveis Demográficas............................................................................................................................ 19

3.1.2 Infra-estrutura Social de Foz do Iguaçu................................................................................................... 22

3.1.3 Economia Local ........................................................................................................................................ 28

3.1.4 Organização Social................................................................................................................................... 30

3.2 AS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL INFANTO-JUVENIL ................................ 31

3.2.1 Perfil das Crianças e Adolescentes pesquisadas........................................................................................... 34

3.2.1.1Condições de sobrevivência e de saúde fisíca e mental ............................................................................... 40

3.2.1.2 Situação Familiar ..................................................................................................................................... 42

3.2.1.3 Nível Educacional..................................................................................................................................... 46

3.2.1.4 Rendimentos.............................................................................................................................................. 47

3.2.1.5 Relação com os "clientes"......................................................................................................................... 51

V

3.2.1.6 Violências a que são submetidas .............................................................................................................. 52

3.2.1.7 Necessidades de apoio .............................................................................................................................. 53

CAPÍTULO 4 - O CONTEXTO FAMILIAR.............................................................................................................. 56

4.1 CARACTERIZAÇÃO DAS FAMÍLIAS ....................................................................................................................... 56

4.2 CONDIÇÕES DE MORADIA, SAÚDE, EDUCAÇÃO E RENDIMENTOS .......................................................................... 56

4.3. PERCEPÇÃO SOBRE O TRABALHO INFANTIL ......................................................................................................... 64

CAPÍTULO 5 - CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES.......................................................................................... 69

5.1 CAUSAS DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL DE MENINOS/AS E ADOLESCENTES. .............................................. 69

5.2 SOBRE OS EXPLORADORES ...................................................................................................................................... 73

5.3 CONCLUSÕES GERAIS ............................................................................................................................................. 76

5.3.1 AS DIFERENTES EXPRESSÕES DA ESCI NA ÁREA............................................................................................. 77

5.4 RECOMENDAÇÕES ................................................................................................................................................... 79

5.4.1 Nas Políticas ............................................................................................................................................. 79

5.4.2 Atenção direta às crianças e adolescentes................................................................................................ 81

REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS ............................................................................................................................ 83

ANEXO - ROTEIRO DAS ENTREVISTAS................................................................................................................ 85

FAMÍLIAS ...................................................................................................................................................................... 85

CRIANÇAS E ADOLESCENTES ................................................................................................................................ 86

VI

INDICE DE TABELAS

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ECA ..................................................................................... 10

TABELA 1 – EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE HABITANTES EM FOZ DO IGUAÇU DE 1889-2000 ........................................... 19

TABELA 2 – PERFIL DA POPULAÇÃO DE FOZ DO IGUAÇU 2000 EM FUNÇÃO DO SEXO, IDADE, INSTRUÇÃO E RENDA... 21

TABELA 3 – DEMONSTRATIVO DA EVOLUÇÃO DE NASCIMENTOS E ÓBITOS EM FOZ DO IGUAÇU ................................. 22

TABELA 4 – ESTABELECIMENTOS DE SAÚDE/LEITOS...................................................................................................... 22

TABELA 5 – HIV/AIDS .................................................................................................................................................... 25

TABELA 6 – CRECHES . .................................................................................................................................................... 25

TABELA 7 – ALUNOS MATRICULADOS – 2001.................................................................................................................. 27

TABELA 8 – ALUNOS MATRICULADOS NO ENSINO SUPERIOR – FEV. 2001 .................................................................... 27

TABELA 9 -PERFIL ECONÔMICO .............................................................................................................................. 28

TABELA 10– TOTAL DA RECEITA (ARRECADAÇÃO) TRIBUTÁRIA EM FOZ DO IGUAÇU (EM MILHÕES DE REAIS) 2000 28

TABELA 11 – IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO ATRAVÉS DO SISCOMEX DE FOZ DO IGUAÇU: 2000............................. 28

TABELA 12 – ESTABELECIMENTOS HOTELEIROS – DEZ/2000 ....................................................................................... 29

TABELA 13 – LOCAIS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM FOZ DO IGUAÇU . 32

TABELA 14 - TIPOS DE TRABALHO INFORMADOS ........................................................................................................... 37

TABELA 15 – POR QUE TRABALHA................................................................................................................................... 37

TABELA 16 – SUA FAMÍLIA SABE QUE TRABALHA AQUI.................................................................................................. 40

TABELA 17 – NÚMERO DE IRMÃOS .................................................................................................................................. 43

TABELA 18 – QUEM E ONDE TIROU FOTOS ...................................................................................................................... 52

TABELA 19 – O QUE GOSTARIA DE APRENDER ................................................................................................................ 53

TABELA 20 – SUGESTÕES DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES........................................................................................... 54

TABELA 21 - IDADE DOS REPRESENTANTES DAS FAMÍLIAS............................................................................................. 56

TABELA 22 - QUANTOS MEMBROS TRABALHAM.............................................................................................................. 58

TABELA 23 - ATIVIDADES DE GERAÇÃO DE RENDA DOS MEMBROS DAS FAMÍLIAS ........................................................ 58

TABELA 24 - PROBLEMAS DE SAÚDE ............................................................................................................................... 59

TABELA 25 - PRINCIPAIS CAUSA DE MORTES E PROBLEMAS DE SAÚDE.......................................................................... 60

TABELA 26 - TIPOS DE DROGAS INDICADAS PELA FAMÍLIA ............................................................................................ 61

TABELA 27 - VIOLÊNCIAS OCORRIDAS ............................................................................................................................ 61

TABELA 28 - TIPOS DE VIOLÊNCIA ................................................................................................................................... 61

TABELA 29- ESTÃO INSERIDAS EM ALGUM PROGRAMA DE APOIO ................................................................................. 61

TABELA 30 – DIFICULDADES ENFRENTADAS................................................................................................................... 63

TABELA 31 - PERCEPÇÃO ACERCA DO TRABALHO INFANTIL ......................................................................................... 64

TABELA 32 - HORAS DE TRABALHO DA CRIANÇA/ADOLESCENTE .................................................................................. 65

TABELA 33 - QUEM É O PATRÃO DO FILHO ..................................................................................................................... 65

TABELA 34 - CARACTERIZAÇÃO DO PATRÃO.................................................................................................................. 65

TABELA 35 – COMO INICIOU A ATIVIDADE ..................................................................................................................... 66

TABELA 36 – MOTIVOS PARA OS FILHOS TRABALHAREM .............................................................................................. 66

VII

TABELA 37 - O QUE PODERIA SER FEITO PARA EVITAR O TRABALHO DOS FILHOS ........................................................ 66

TABELA 38– O QUE PENSAM DOS EXPLORADORES ......................................................................................................... 73

TABELA 39 – QUEM PROTEGE OS EXPLORADORES ......................................................................................................... 74

VIII

INDICE DE FIGURAS Y MAPAS

MAPA 1 - FORMAS DE EXPRESSÃO DAS MODALIDADES DE EXPLORAÇÃO SEXUAL ................................ 2

MAPA 2 - REGIÕES DE FOZ DO IGUAÇU ............................................................................................................... 20

FIGURA 1 PROFISSIONAIS NA ÁREA DE SAÚDE........................................................................................................................... 23

FIGURA 2 DEMOSTRATIVO DO NÚMERO DE PROFISSIONAIS DA SAÚDE ............................................................................................ 23

FIGURA 3 ESTRUTURA DA SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE FEV / 2001 ...................................................................................... 24

FIGURA 5 NÚMERO DE SALAS DE AULA .................................................................................................................................. 26

FIGURA 6 NÚMERO DE PROFESSORES ..................................................................................................................................... 27

FIGURA 7 PROGRAMAS DE ATENCÃO A POPULAÇÕES EM RISCO ANO 2001 .................................................................................... 28

MAPA 4 VAZIOS URBANOS E AGLOMERADOS ........................................................................................................................ 33

FIGURA 8 IDADE DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES PESQUISADAS ............................................................................................... 35

FIGURA 9 SEXO DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES PESQUISADAS................................................................................................ 35

FIGURA 10 ORIGEM DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES PESQUISADAS ............................................................................................ 36

FIGURA 11 QUEM TRABALHA NA FAMÍLIA .............................................................................................................................. 36

FIGURA 12 ONDE TRABALHAM ............................................................................................................................................. 38

FIGURA 13 QUEM CONDUZIU AO TRABALHO NAS RUAS .............................................................................................................. 38

FIGURA 14 IDADE DE INÍCIO................................................................................................................................................ 38

FIGURA 15 ONDECCOMEÇOU A TRABALHAR .......................................................................................................................... 39

FIGURA 16 ATIVIDADES INICIAIS NA RUA ................................................................................................................................ 39

FIGURA 17 JA FICOU DOENTE............................................................................................................................................... 41

FIGURA 19 TIPO DE DROGA .................................................................................................................................................. 41

FIGURA 20 USA PRESERVATIVO ............................................................................................................................................ 42

FIGURA 21 FEZ TESTE HIV/AIDS........................................................................................................................................... 42

FIGURA 22 COM QUEM MORA ............................................................................................................................................. 42

FIGURA 23 TEM FILHOS..................................................................................................................................................... 43

FIGURA 24 TEM IRMÃOS .................................................................................................................................................... 43

FIGURA 25 TEM NAMORADO/A ............................................................................................................................................ 44

FIGURA 26 ONDE MORA..................................................................................................................................................... 45

FIGURA 27 FREQUÊNCIA À ESCOLA ....................................................................................................................................... 46

FIGURA 28 SÉRIE QUE CURSA .............................................................................................................................................. 46

FIGURA 29 ÚLTIMA SÉRIE QUE CURSOU ................................................................................................................................. 47

FIGURA 30 RENDA MENSAL ................................................................................................................................................. 48

FIGURA 31 JORNADA DE TRABALHO ..................................................................................................................................... 49

FIGURA 32 RENDA DIÁRIA DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES...................................................................................................... 49

FIGURA 33 O QUE FAZ COM ESSE DINHEIRO ......................................................................................................................... 50

FIGURA 34 PARA QUEM TRABALHA...................................................................................................................................... 50

FIGURA 35 COMO SE RELACIONA COM SEUS “CLIENTES” ........................................................................................................ 51

FIGURA 36 JÁ TIRARAM FOTOS OU FILMARAM VOCÊ NO TRABALHO .......................................................................................... 51

FIGURA 37 JÁ FOI VÍTIMA DE VIOLÊNCIA.............................................................................................................................. 52

FIGURA 38 AUTOR DA VIOLÊNCIA........................................................................................................................................ 53

IX

FIGURA 39 GOSTARIA DE DEIXAR ESSA ATIVIDADE ................................................................................................................. 54

FIGURA 40 ESCOLARIZAÇÃO DOS REPRESENTANTES DAS FAMÍLIAS ............................................................................................ 57

FIGURA 41 NÚMERO DE PESSOAS QUE RESIDEM NA CASA ......................................................................................................... 57

FIGURA 42 Nº DE CRIANÇAS SOB A CUSTÓDIA DAS FAMÍLIAS ..................................................................................................... 58

FIGURA 43 RENDA MENSAL ................................................................................................................................................ 59

FIGURA 44 SUGESTÕES DAS FAMÍLIAS SOBRE PROGRAMAS PARA EVITAR O TRABALHO INFANTIL .................................................... 60

FIGURA 45 ....................................................................................................................................................................... 63

FIGURA 46 SUGESTÕES DAS FAMÍLIAS SOBRE PROGRAMAS PARA EVITAR O TRABALHO INFANTIL ...................................................... 67

FIGURA 47 FATORES QUE FAVORECEM A ESCI ........................................................................................................................ 69

FIGURA 48 CAUSAS DA ESCI................................................................................................................................................. 70

FIGURA 49 ASPECTOS QUE DIFICULTAM A ESCI ....................................................................................................................... 72

FIGURA 50 QUEM SÃO OS EXPLORADORES............................................................................................................................. 75

FIGURA 51 ATIVIDADES VINCULADAS À EXPLORACAO SEXUAL DE CRIANCAS E ADOLESCENTES ...................................................... 76

ANEXO- ROTEIRO DAS ENTREVISTAS ............................................................................................................................. 85

X

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS UTILIZADAS

� ABRAPIA – Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência � BA - Bahia � BICE – Bureau Internacional Catholique de l’enfant � CECRIA – Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes � CEEBJA – Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos � COAS - Centro de Orientação e Apoio à AIDs � CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito � ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente � ECPAT – End Child Prostitution Child Pornography and Trafficking of Children for Sexual � Purposes � ESCI – Exploração Sexual Comercial Infantil � FEBEM – Fundação Estadual do Bem Estar do Menor � INN – Instituto Interamericano del Niño � IPEC – Programa Internacional de Erradicação do Trabalho Infantil � MERCOSUL – Mercado Comum do Sul das Américas � MS – Mato Grosso do Sul � NASA – Núcleo de Apoio e Solidariedade à AIDs � OIT – Organização Internacional do Trabalho � ONGs – Organizações Não-Governamentais � ONU – Organização das Nações Unidas � PAI – Programas de Ação Integrada � PE - Pernambuco � PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil � PIT – Programa de Incentivo ao Trabalho � RJ – Rio de Janeiro � SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial � SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial � SESI – Serviço Social da Indústria � SIPIA – Sistema de Informação para a Infância e Adolescência � UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância

XI

RESUMO EXECUTIVO

O “Diagnóstico Rápido da Exploração Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes em Foz do Iguaçu” objetivou caracterizar a exploração sexual comercial de crianças e adolescentes na região. Essa avaliação integra um conjunto de estudos realizados pela OIT/IPEC na implementação do Programa Binacional de Prevenção e Eliminação da Exploração Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes na zona de Fronteira Brasil/Paraguay (Ciudad del Este e Foz de Iguaçu).

Foz de Iguaçu tem uma população de 258.368 habitantes e está localizada na região Sul do Brasil na fronteira com o Paraguai e Argentina, área conhecida como tríplice fronteira.

A metodologia adotada foi a de rapid assessment, que utiliza várias estratégias para coletar dados com a finalidade de conhecer e compreender uma determinada realidade ou situação social específica em um contexto sócio-cultural particular. Foram entrevistados 27 informantes-chave vinculados a instituições e outros setores com maior aproximação ao tema da exploração comercial sexual infanto-juvenil, 21 famílias e 60 crianças e adolescentes encontradas na rua e exploradas sexualmente. A coleta de dados foi realizada entre fevereiro/março/abril de 2002. Além das entrevistas semi-estruturadas, foram realizadas observações do contexto envolvendo os sujeitos do estudo.

Como resultado da análise dos três grupos pesquisados: instituições, famílias e crianças constataram-se quatro níveis distintos de atividades de exploração sexual comercial em Foz do Iguaçu. Estes níveis estão interligados não só pela atividade de exploração sexual comercial, mas também pela atividade do tráfico de drogas e pela presença de aliciadores.

Primeiro nível: é o nível de maior pobreza e miséria. Constitui-se de crianças e adolescentes que vendem doces, passam “muamba”1 na ponte, esmolam, além de fazerem carícias a pedido de clientes e de oferecerem o próprio corpo por pouco dinheiro. Neste nível observa-se também muito claramente o uso de drogas e a participação das crianças no tráfico de drogas, sobretudo como "olheiros"2. Trabalham só nas ruas e se poderia afirmar que fazem qualquer coisa para sobreviver. “Apanham se não trazem dinheiro para casa”. São freqüentes os casos de iniciação e abuso sexual por parte de padrasto, vizinho ou conhecido da família. Muitas vezes o contexto familiar é de extrema promiscuidade. Algumas vezes a própria família é a aliciadora, seja na figura da mãe, padrasto, tio, tia e outros. Outras vezes, é um colega, adolescente mais velho ou um adulto, como se observaram casos de mendigos aliciadores de meninos e meninas. Mulheres que aliciam crianças e adolescentes para trabalharem em Foz do Iguaçu, outros Estados e outros países como Paraguai, Argentina e Chile. A promessa é de emprego de doméstica e dinheiro, mas na realidade envolve exploração sexual. Dentre os aliciadores podem se encontrar donas de casa, cabeleireiras, prostitutas, proprietários de prostíbulos que recebem em torno de US$ 100,00 por cada criança aliciada. Também são usados jovens para seduzir meninas na porta das escolas. Muitas vezes, o aliciamento ocorre via relação afetiva, namoro que acaba em rede de exploração sexual. Há relatos de aliciamento de meninos para serem explorados sexualmente por turistas argentinos. Este nível foi mais observado na área central: Jardim Jupira, próximo à Ponte da Amizade; Av. Juscelino Kubitschek; Av. Costa e Silva; Av. Brasil; Av. Paraná; República Argentina com Almirante Barroso; Rua Jorge Shimmelpfeng; Rua Engenheiro Rebouças; Av. Tancredo Neves.

Houve relatos de aliciamento de crianças na porta das escolas próximas à Cidade Nova, Morumbi, Jardim Jupira e Porto Meira e indicações de seqüestro de crianças em escola ou de crianças que desaparecem na Vila C.

Segundo nível: crianças e adolescentes que trabalham nas ruas fazendo programas e repassando drogas. As observações indicaram que a atividade de exploração sexual é o veículo para

1 Mercadoria contrabandeada. 2 Pessoas que trabalham para traficantes com a função de observar as possibilidades de risco para as atividades do tráfico.

XII

o tráfico de drogas. Vivem ou com amigos na favela ou em motéis, pensões ou na própria família, que geralmente desconhece sua atividade nas ruas. Muitos conseguem sustentar sua família com esta atividade, visto ser mais rentável que outras atividades sem qualificação profissional.

Este nível foi mais observado nas seguintes localidades: a Av. Costa e Silva; Av. Brasil; Av. Juscelino Kubitschek; Rua Jorge Shimmelpfeng; Av. República Argentina; Av. Paraná; Rua Engenheiro Rebouças e Av. Tancredo Neves.

Terceiro nível: crianças e adolescentes que trabalham sendo exploradas sexualmente em pequenas casas de prostituição, pousadas, pequenos hotéis e bares. Geralmente residem no próprio local de trabalho. Muitas trabalham também na rua. A droga pode ser obtida nestas casas e na rua.

O terceiro nível expressa-se com maior evidência na região da CODAPAR; região do CTG Charrua, na BR 277 e na Rua Jorge Shimmelpfeng. Além destes, podem ser citados bares, lanchonetes, pousadas e casas clandestinas de prostituição nos bairros: Porto Meira, Cidade Nova, Morumbi, São Francisco, Três Lagoas, Parque Presidente.

Como características gerais comuns a estes três níveis observa-se: a idade varia predominantemente de 08 a 18 anos, estando na faixa etária dos 10 aos 17 anos de idade a de maior freqüência. Envolve meninos e meninas. Geralmente possuem algum grau de instrução acima da 2ª série do ensino fundamental e muitos freqüentam a escola. Esta também pode ser a razão de uma das formas de aliciamento ser na porta da escola. Combinam diferentes formas de outros trabalhos com a prostituição. Trabalham todos os dias e quando solicitados. Não há um horário preciso de término da atividade. O trabalho segue enquanto houver demanda e pode chegar a 19 horas diárias, conforme indicaram alguns. Freqüentemente as crianças iniciam em torno de 8 anos a serem exploradas sexualmente. Há muitos casos de iniciação sexual na própria família. Essas crianças advêm normalmente de regiões periféricas de Foz do Iguaçu, onde residem com a família, amigos ou no próprio local de trabalho.

Quarto nível: crianças e adolescentes de classe média que são exploradas sexualmente em boates, grandes casas de prostituição, hotéis de médio e grande porte. São aliciadas a partir de agências de modelo e de fotografia.

São solicitadas por meio de books fotográficos ou a partir de desfile para clientes. Nem chegam a saber quem realmente fez o contato com o cliente. Não há o indício de um local de agenciamento. Apenas o “book” concentra todas as adolescentes. Há indicação de que traficam drogas para a Europa. Seus documentos são alterados para atingirem a maioridade.

Deste quarto nível observa-se o menor número de informações. Este nível tem como regiões de maior incidência: a região da AKLP; do Beverly Falls Park; Av. das Cataratas e Vila A.

Observa-se que se trata de um fenômeno complexo, de causas sócio-econômicas e histórico-culturais. Dentre as principais causas sócio-econômicas está a desigual distribuição de renda, a pobreza, a migração, o rápido avanço do processo de urbanização, a debilidade das políticas sociais.

Em relação às causas histórico-culturais identifica-se a visão de criança como objeto da dominação ou mercadoria, a nova estrutura familiar e suas conseqüências, o consumismo, a ideologia pós-moderna do subjetivismo e do prazer, a cultura da impunidade.

Como principais fatores de risco sócio-econômico tem-se a situação de pobreza que se expressa nas condições de moradia: favelas onde as casas são muito pequenas para o grande número de habitantes e que não permitem o mínimo de privacidade; na falta de emprego ou no trabalho informal; na escassez de alimento, vestuário e de satisfação das necessidades mais básicas. Dentre os fatores de risco mental e social constatam-se a negligência a que são submetidas, caracterizada por falta de diálogo, falta de limites, falta de cuidado, afeto, dependência de drogas e baixa auto-estima. Outro aspecto é o reduzido acesso aos bens culturais e a exposição à violência física e psicológica. A ausência prolongada de um cuidador responsável pela educação e proteção das crianças, é também fator de predisposição à exploração. Da mesma forma, quando a escola não corresponde às necessidades dessas crianças, quando o conteúdo trabalhado não apresenta significado para o universo infantil, e quando o aliciamento ocorre na porta das escolas, tem-se nestas não um fator de proteção, mas de risco à exploração. Observou-se igualmente que famílias

XIII

numerosas, com grande número de crianças; famílias cujos membros não contam com qualificação profissional e que apresentam renda mensal insuficiente à satisfação de suas necessidades; famílias que se caracterizam pela ausência do pai, a presença de alcoólatras e dependentes químicos como cuidadores estão entre os fatores que predispõem à exploração de crianças e adolescentes. Também como fator de risco familiar foi apontado o abuso sexual ou a iniciação sexual por membros da própria família ou da sua confiança.

As informações coletadas levam a acreditar que há redes de tráfico de crianças, adolescentes e mulheres em Foz do Iguaçu. Estas redes estão ligadas ao tráfico de drogas, de armas e a grupos vinculados ao crime organizado. Há indicativos de que esta região de fronteira é uma rota importante do tráfico internacional de drogas.

Na formulação e implementação de políticas para eliminar e prevenir a exploração sexual comercial de crianças consideram-se como fatores importantes:

1. A sensibilização da sociedade: escola, igrejas, movimentos sociais, sindicatos, polícia, opinião pública e órgãos do governo para a criação de parcerias no desenvolvimento de uma rede de articulação contra a exploração de crianças e adolescentes. O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente necessita ser mais divulgado e compreendido pela sociedade.

2. Desenvolvimento de campanhas, divulgando os diferentes tipos de penalidades que podem ser aplicadas aos exploradores. Criação de um serviço de disque-denúncia onde não haja risco para quem quiser denunciar essa forma de exploração. Simultaneamente deve-se desenvolver um sistema multidisciplinar e multisetorial de fiscalização com blitz regulares nos lugares onde ocorrer a exploração sexual de crianças, adolescentes e jovens.

3. Realizar trabalho específico junto às escolas, assegurando policiamento ostensivo e preventivo para inibir a atuação de traficantes e aliciadores. As escolas devem ter campanhas específicas para prevenção da ESCI e prevenção do uso de drogas.

4. É imperioso articular as ações governamentais com as não-governamentais na formulação de uma diretriz pautada por pressupostos claros, definidos e uma prática comum consistente. Somente uma rede articulada de combate pode fazer frente à rede de aliciamento e exploração de crianças.

5. Considera-se fundamental o fortalecimento do Conselho de Direitos das Crianças como formulador de políticas e do Conselho Tutelar, como órgão de garantia de direitos das crianças e adolescentes. Bem como dos Centros de Defesa, que têm um importante papel na construção da cidadania. Outro aspecto de especial relevância é a promoção do protagonismo juvenil nas ações voltadas ao combate à exploração sexual.

6. Todo e qualquer programa deve se valer do levantamento detalhado de dados da realidade e características da exploração sexual na área onde irá atuar.

Deverá também contar com integrantes da própria comunidade em seu planejamento e execução, assim como especialistas nas grandes frentes de combate. A discussão com diversos segmentos da comunidade sobre aspectos gerais de exploração sexual de crianças e específicos da área em que se vai atuar, possibilitarão maior comprometimento de todos no levantamento de recursos e estratégias para a sua solução.

7. Um aspecto bastante relevante diz respeito à impunidade e às denúncias de envolvimento de autoridades, policiais, políticos, e outros, além de redes internacionais na exploração sexual de crianças e adolescentes. Os depoimentos coletados asseguram que essas pessoas garantem proteção a esta atividade e não têm interesse no combate e punição dos responsáveis. O desvelamento das intrincadas redes que envolvem autoridades e exploradores é imprescindível para a implementação de políticas que objetivem a eliminação e prevenção da exploração sexual infanto-juvenil.

8. Trabalhar com as famílias articulando-as à comunidade e à escola para reverter a “cultura de exploração” de crianças e adolescentes. A instalação de uma rede de apoio

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social às famílias deve partir de agentes da própria comunidade. Requer-se, portanto, o estímulo à capacidade de organização comunitária, cursos de capacitação para o trabalho integrado com a escola e famílias.

9. Centros de atendimento à criança e ao adolescente devem voltar-se às necessidades de crianças e adolescentes explorados sexualmente. O trabalho deve centrar-se em atividades de desenvolvimento da auto-estima e de iniciação à profissionalização. Atividades esportivas, de lazer, recreativas e culturais que, além das profissionalizantes, deverão desenvolver nesta criança uma nova expectativa de vida e de futuro.

10. Investimento na capacidade de produção de Foz do Iguaçu. Fomentar políticas que objetivem a geração de empregos e de renda.Estimular e atrair iniciativas de produção de pequenos, médios e grandes produtores da região. Desenvolver o potencial de produção das áreas mais carentes mediante a exploração de seus recursos físicos e humanos. Promover a criação de cooperativas a partir da discussão da vocação dessas comunidades.

11. Investimento em cursos profissionalizantes para adultos e adolescentes, adequados às necessidades da região. Requisito para incidir sobre uma das causas da exploração de crianças e adolescentes: a falta de capacitação para o emprego de adultos e jovens.

As prioridades centram-se em uma política de geração de renda e emprego, educação relevante e de qualidade, ensino profissionalizante e na articulação escola-família-comunidade para a prevenção e reabilitação de crianças e adolescentes vitimadas pela ESCI.

A atuação do IPEC pode estar vinculada à construção de uma rede de articulação entre entidades governamentais e não-governamentais que trabalham com crianças e adolescentes. O IPEC deve atuar na formulação de programas de reabilitação e prevenção e na capacitação de profissionais para o trabalho na comunidade, escola e famílias.

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Capítulo 1 - Marco de Referência

1.1 ANTECEDENTES

A Convenção Universal dos Direitos das Crianças, aprovada pelas Nações Unidas em

1989, em seu Artigo 32, preconiza que as crianças e adolescentes têm direito a serem “protegidas contra a exploração econômica ou de realizar qualquer trabalho que seja perigoso ou interfira em sua educação, ou que seja nocivo para a saúde ou o desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral ou social”.

Foi a partir do 1º Congresso Internacional contra a Exploração Sexual Comercial de Meninas (os) e Adolescentes, realizado em Estocolmo, 1996, que esta forma de exploração passou a integrar a agenda pública no âmbito internacional e nacional. Passou-se a considerá-la como crime que abrange grande número de crianças e adolescentes e gera lucros extraordinários às redes de aliciadores e exploradores em todo o mundo.

Em 1999, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) aprovou a Convenção 182 sobre as piores formas de trabalho infantil, incluindo entre elas a “utilização, procura e oferta de crianças para fins de prostituição, de produção de material ou espetáculos pornográficos” (Artigo 3). Nesta convenção o termo criança se aplica a todos menores de 18 anos. Sua aprovação ocorreu em tempo record em cerca de 120 países do mundo, incluindo Argentina, Brasil e Paraguai.

A Convenção 182, complementar à 138 (1973), que estabelece a idade mínima de admissão ao emprego, define que todos os Estados membros iniciem urgentemente todas as medidas necessárias para a execução de programas de ação para a erradicação das piores formas de trabalho infantil e determinem sanções efetivas que conduzam à aplicação da Convenção. Como outras formas de exploração de crianças e adolescentes definidas pela Convenção 182 citam-se: todos os tipos de escravidão ou práticas similares como venda e tráfico de crianças, sujeição por dívida e servidão, trabalho forçado ou compulsório, produção e tráfico de drogas ou qualquer outro trabalho que prejudique a saúde, a segurança e a moral da criança.

Novos atores passaram a integrar as ações de combate à exploração sexual de crianças a partir da Convenção 182: empregadores, governo e trabalhadores. A década de 1990 assinala o aumento da preocupação com o enfrentamento do problema do abuso sexual de crianças e adolescentes no mercado do sexo. Como características deste novo olhar verifica-se a “conscientização da gravidade e do avanço do problema em todo o mundo e de uma mobilização nacional e internacional, tanto de organismos internacionais (OIT, INN, UNICEF) como de ONGs (ECPAT, BICE)”. (FALEIROS, 2000).

No 2º Congresso Internacional contra a Exploração Sexual Comercial de Crianças, realizado em Yokohama em 2001, realizou-se uma avaliação sobre a evolução da exploração sexual infanto-juvenil desde o 1º Congresso, com sede em Estocolmo em 1996.

Segundo o resumo do texto preparatório do encontro, disponível no site do UNICEF, uma série de medidas vêm sendo realizadas para combater a exploração sexual comercial de crianças e adolescentes: mobilização da opinião pública, elaboração de programas de reintegração social de crianças exploradas e projetos de proteção a crianças especialmente vulneráveis a esse tipo de exploração. No entanto, constata-se que a cada ano milhões de crianças se tornam vítimas da exploração sexual devido à cumplicidade de uma rede intrincada de pessoas que inclui desde grupos do crime organizado a taxistas e vizinhos omissos em relação à denúncia. Neste cenário, a Convenção 182, que estabelece medidas urgentes para a eliminação das piores formas de exploração do trabalho infantil, é apontada como um mecanismo fundamental no combate à exploração sexual comercial infanto-juvenil.

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1.2 O CONTEXTO NACIONAL

A problemática da exploração sexual de crianças e adolescentes tem sua origem na

estrutura sócio-econômica-política do Brasil. São questões como empregabilidade, concentração de renda, deficiências na escolarização e falta de redes de apoio à família, às crianças e jovens, sobretudo aos grupos especialmente vulneráveis. No reverso dessa situação sabe-se hoje de sua complexidade e das políticas necessárias ao seu enfrentamento (LEITE, 1990).

Sabe-se hoje que os inchaços populacionais dos grandes centros urbanos são decorrentes, em sua maioria, dos processos migratórios. A partir deste processo, o círculo vicioso da pobreza empurra cada vez mais as crianças para o universo do trabalho (informal e ilegal). Alguns autores apontam que esta situação é mais grave nas famílias chefiadas por mulheres, considerando sua remuneração mais baixa em relação à dos homens (DREXEL, 1991). É neste contexto de extrema pobreza que se verifica com mais freqüência o “abuso sexual” (UNICEF, 1998) e por que não dizer uma estreita relação entre abuso sexual e exploração sexual comercial infantil (ESCI). Desta forma, a exploração sexual comercial infantil se caracteriza como uma das formas de violência mais perversas, onde ocorre “... a violação de direitos, por expropriar à infância, a liberdade, o prazer, a dignidade, a possibilidade de constituir um nível propício ao seu desenvolvimento em condições humanamente saudáveis”. (UNICEF, 1998).

Outro aspecto fundamental destacado por LEAL (1999) e FALEIROS (2000) é a articulação do fenômeno da exploração sexual com as atividades econômicas dos territórios onde ocorre. As formas de exploração variam segundo o desenvolvimento econômico das localidades e regiões nas quais existem. Veja-se o mapa extraído de LEAL (1999, p. 20) que estabelece as modalidades da exploração sexual de crianças e adolescentes na realidade brasileira.

MAPA 1

FORMAS DE EXPRESSÃO DAS MODALIDADES DE EXPLORAÇÃO SEXUAL

Norte Exploração sexual (garimpos, prostíbulos, portuária, cárcere privado – fazendas e garimpos); prostituição em estradas e nas ruas, leilões de virgens.

Sudeste Pornoturismo Exploração sexual comercial em prostíbulos/ cárcere privado Exploração sexual comercial de meninos e meninas de rua Prostituição nas estradas

Centro-Oeste Exploração sexual comercial em prostíbulos Exploração sexual comercial nas fronteiras/ redes de narcotráfico (Bolívia, Brasília, Cuiabá e municípios do Mato Grosso) Prostituição de meninas e meninos de rua Rede de prostituição (hotéis, etc.) Prostituição através de anúncios de jornais Turismo sexual, ecológico e náutico Prostituição nas estradas

Nordeste Turismo sexual Exploração sexual comercial em prostíbulos Pornoturismo Prostituição de meninas e meninos de rua Prostituição nas estradas

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No Brasil, evidenciam-se diferentes formas de manifestação do fenômeno da exploração

sexual comercial de crianças e adolescentes (LEAL, 1999). A primeira forma de expressão apontada por LEAL é através de prostíbulos fechados,

sobretudo onde há um mercado regionalizado com atividades extrativistas em garimpos e que se apresenta sob a forma de cárcere privado, venda, tráfico, leilões de virgens, mutilações e desaparecimento. A exploração sexual é também realizada nas estradas (postos de gasolina) e portos marítimos.

A segunda caracteriza-se por crianças e adolescentes em situação de rua. Geralmente saem de casa, onde muitas vezes foram vítimas de violência física e/ou sexual ou submetidas a situações de extrema miséria ou negligência e passam a sobreviver nas ruas usando o corpo como mercadoria para obter afeto e sustento. Abrange principalmente adolescentes do sexo feminino, mas também apresenta jovens do sexo masculino. Esta situação é observada nos grandes centros urbanos e em cidades de porte médio.

A terceira forma de expressão da exploração sexual de crianças e adolescentes relaciona-se ao turismo sexual e à pornografia, sobretudo nas regiões litorâneas de intenso turismo, como nas capitais da região Nordeste e outros destinos turísticos do país. É comercial, organizada numa rede de aliciamento que inclui agências de turismo nacionais e estrangeiras, hotéis, comércio de pornografia, taxistas e outros. Trata-se de exploração sexual, principalmente de adolescentes do sexo feminino, (na maioria dos casos pobres, negras ou mulatas). Abrange também o tráfico para países estrangeiros.

A quarta está ligada ao turismo portuário e de fronteiras e é encontrada em regiões banhadas por rios navegáveis da Região Norte, fronteiras nacionais e internacionais da região Centro-Oeste e Sul e zonas portuárias. Está direcionada à comercialização do corpo infanto-juvenil e atende também a turistas estrangeiros. No entanto, é a própria população local a principal usuária da prostituição de crianças e adolescentes nas regiões ribeirinhas. Nos portos está direcionada principalmente à tripulação de navios cargueiros.

Dentre as atividades econômicas que facilitam a inserção de meninas(os) na exploração sexual comercial, são apontadas por LEAL (1999): prostíbulos, casas de massagem, turismo, postos de gasolina, comércio, boates, hotéis, rodoviária, locais de tráfico de drogas, restaurantes, salão de beleza, centros de lazer, bares, áreas de garimpo, anúncio nos jornais. Além dos acima mencionados, a ABRAPIA aponta como locais de exploração no contexto da realidade brasileira: locadora de carros, mineradora, escritório, INTERNET, agência de aluguel de bugres, casa de eventos, quiosque, agência de turismo, restaurante, mercearia, loja de autopeças, oficina mecânica, posto de gasolina, fazenda, disque-sexo, abrigo evangélico, delegacia, agência matrimonial, clube, academia, agência de modelos, apart-hotel, padaria, fliperama, igreja, hospital, locadora de vídeo, colégio, cassino, banca de jornal, asilo, abrigo de menores, teatro, fliperama, açougue, consultório médico, cinema, sauna, seminário abandonado, clínica médica, parque de exposições, fábrica de brinquedos, boliche, produtora de cinema, salão de cabeleireiros, agência de publicidade, cais do porto e teatros.

Alguns pesquisadores da área, como SOUSA (2001) e Marcel Hazeu, chamam a atenção para as relações do fenômeno da exploração sexual com as demandas atuais à juventude em relação à sexualidade e ao consumo, como processo de inclusão.

Embora o Estatuto da Criança e do Adolescente, fundamentado em uma política de cidadania, tenha representado um grande avanço em relação aos pressupostos da política do bem-estar expressos no antigo Código de Menores, há muitas dificuldades a serem enfrentadas e que se evidenciam nesta pesquisa. SANTOS (2001, p. 91-93) as expõe com propriedade.

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1.3 POLÍTICAS PARA A INFÂNCIA NO BRASIL3

A gestão das políticas sociais de proteção à infância no Brasil baseada no Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA) está ancorada na descentralização político-administrativa (restringindo o papel dos estados e ampliando as competências e reponsabilidades dos municípios e da comunidade) e na participação da sociedade por meio de suas organizações representativas (Consellhos Municipais, estaduais e nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente e Conselhos Tutelares) O ECA trouxe um novo paradigma em relação à infância e à juventude, reconhecendo-os como sujeito de direitos, pessoas em condição peculiar de desenvolvimento e prioridade absoluta.

Tolerado e até estimulado no Brasil até meados da década de 80, o trabalho infantil só passou a ser questionado no bojo das grandes discussões que caracterizaram a Assembléia Nacional Constituinte4 e a aprovação do ECA. A OIT teve papel importante neste processo, por meio de seu Programa Internacional de Erradicação do Trabalho Infantil (IPEC), assim como o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), agências internacionais que a partir do início da década de 90 estimularam a inclusão do tema na agenda dos problemas nacionais.

Em novembro de 1994, estas mesmas agências apoiaram a criação do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, formado por 325 entidades e com representação do governo, trabalhadores, empresários, ONGs, Procuradoria Geral da República e Ministério Público do Trabalho. uma das principais atividades do Fórum foi o estímulo à implementação de Programas de Ação Integrada-PAI, cujo objetivo é a retirada de crianças de trabalhos que as colocam em situação de risco, tendo sido selecionados a produção de carvão vegetal (MS), a cultura e beneficiamento de sisal (BA) e a cultura de cana-de-açúcar em campos (RJ) e na zona da mata (PE). Em julho de 1996, o governo federal passou a disponibilizar recursos para o programa, por meio da institucionalização do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil-PETI, ligado à Secretaria de Assistência Social do Ministério da Previdência e Assistência Social (SEAS/MPAS), tendo como principal instrumento a concessão de auxílio financeiro às famílias, buscando possibilitar o acesso e a permanência na escola das crianças e adolescentes trabalhadoras6.

Note-se que o Fórum Nacional, assim como o PETI, não incluem a prostituição entre suas áreas prioritárias de ação. Da mesma forma, a prostituição não aparece na publicação Trabalho Infantil no Brasil, de Simon Schwartzman, que tem como base a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) de 1999, a qual mostra que em 1998 cerca de 7,7 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos trabalhavam no país. No entanto, após ratificar a Convenção 182 da OIT7 sobre as piores formas de trabalho infantil, o Brasil inclui a prostituição entre as mesmas. Por trás desta aparente contradição está o posicionamento do Brasil em relação à prostituição infantil, a qual, em consonância com o ECA, é compreendida como “exploração sexual”. Ou seja, as crianças e adolescentes, por estarem submetidos às condições de vulnerabilidade e de risco social, são considerados prostituídas e não prostitutas. Além disso, os programas de governo criados para erradicar o trabalho infantil, seja na forma de renda-mínima, bolsa-escola ou cesta básica, em termos de orçamento familiar podem

3 Texto elaborado para o IPEC por Márcia Sprandel - 2002. 4 A Emenda Constitucional no. 20, de 15 de dezembro de 1988, proíbe o trabalho para menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. 5 Atualmente, participam do Fórum 46 entidades. 6 Em 2001, conforme a SEAS, o PETI retirou do trabalho insalubre e aviltante e encaminhou aos bancos escolares 717 mil crianças, entre 7 a 14 anos, em todo o País, fechando o ano com o atendimento de 749,4 mil crianças e adolescentes. Conforme dados da PNAD de 1999, cerca de 7,7 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos de idade trabalhavam no país em 1998. 7 Convenção Internacional de Trabalho no. 182: Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e a Ação Imediata para sua Eliminação.

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significar menor ingresso do que pode receber uma criança ou adolescente prostituída. No caso destes últimos, os programas sociais precisam ser de outra ordem, com ênfase muito grande na atração, no apoio psicológico e na ressocialização. De qualquer maneira, pode-se dizer que é um debate em aberto. Conceitualmente e para fins de programas oficiais a prostituição de crianças e adolescentes é enfocada de forma diversa do tratamento dado à questão do trabalho infantil, embora na realidade seja de fato fonte de renda para um número grande, ainda desconhecido de crianças, adolescentes e suas famílias.

No Relatório da República Federativa do Brasil sobre o cumprimento das metas emanadas da Cúpula Mundial pelas Crianças, datado de setembro de 2001, especificamente em relação à violência intrafamiliar e sexual, o governo brasileiro declara que vem sendo implantado um Sistema de Informação para a Infância e Adolescência (SIPIA), coordenado no âmbito do Ministério da Justiça para sanar o problema da imprecisão dos dados. Em relação à violência sexual contra crianças e adolescentes, afirma que a partir de 1996 intensificaram-se as campanhas, frentes e redes de atendimento, tendo sido criados novos órgãos e serviços no sistema de justiça e segurança, quais sejam: Delegacias Especiais de Proteção à Criança e ao Adolescente e Varas de Justiça privativas para apuração de crimes contra crianças e adolescentes, Defensorias Públicas de Crianças e Centros de Defesa, em alguns Estados.

O documento ressalta também a implantação do Sistema Nacional de Recepção, Tratamento, Acompanhamento, Monitoramento e Avaliação de Denúncias de Abuso e Exploração Sexual Praticada contra Crianças e Adolescentes, coordenado pelo Ministério da Justiça em parceria com a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência (Abrapia), com a participação de Conselhos Tutelares, Promotorias Públicas especializadas, Defensorias Públicas especializadas, Varas de Justiça privativas, especializadas em crimes contra crianças e adolescentes, e as Delegacias especializadas de proteção. Em apoio a esse sistema, esclarece o documento, foi desenvolvida a “Campanha Nacional de Prevenção e Combate à Violência Sexual Praticada Contra Crianças e Adolescentes”, de caráter permanente. Os dados cumulativos gerados por esse sistema de disque-denúncia podem ser visualizados na Internet no endereço www.mj.gov.br/recria e os seus registros se referem a 10.938 ligações, com 1700 denúncias efetivas de exploração sexual, de fevereiro 1997 a abril 2001.

O documento brasileiro destaca a importância do papel de organizações não-governamentais no tratamento da questão. É citado o Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (CECRIA), pela implantação da Rede Nacional de Informação Sobre o Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil (RECRIA), estratégia de articulação de bancos de dados surgida da sociedade civil e acolhida pelo Ministério da Justiça e UNICEF. O CECRIA, no período de 1993 a 2002, identificou 128 organizações que dão uma direção política às ações e ao movimento de enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes, por meio de quatro eixos de intervenção: articulação política (4 Seminários Nacionais;1 Seminário das Américas;1 Encontro Internacional;3 Encontros ECPAT/Brasil;1 Comissão regional no centro-oeste;1 Encontro Nacional do Protagonismo Juvenil; Elaboração do Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes em Seminário Nacional em junho de 2000; Criação do Fórum Nacional pelo Fim da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes em junho de 2000); sensibilização (3 Campanhas Nacionais; 23 Campanhas Estaduais; Criação de um selo “Jornalista amigo da Criança”, consignado pela ANDI; Criação de um Disque Denúncia Nacional); conhecimento (25 Pesquisas sobre Abuso e Exploração Sexual e Criação de Banco de Dados CECRIA/RECRIA/ABRAPIA) e legislação (8 CPIs – sendo 1 Nacional, 6 Estaduais, 1 Distrital e 1 Municipal; 1 Frente Parlamentar pelo Fim da Violência Sexual; aprovação de Lei

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que institui o “Dia Nacional de combate à violência sexual de crianças e adolescentes”; aprovação de Lei que altera o ECA, melhorando os mecanismos de defesa e responsabilização nos crimes de violência sexual contra crianças e adolescentes). O RECRIA identificou igualmente 37 programas/projetos de prevenção e atendimento nas diferentes regiões brasileiras. Conforme o documento, as ações de atendimento estão se agregando nas redes de serviços sociais, envolvendo ONGs e Governo. Os mesmos atores somaram esforços para formulação e implantação do “Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil”. Em relação a este, o relatório brasileiro afirma que, embora algumas de suas ações já venham sendo implementadas pontualmente, quer nas três esferas de governo, quer por parte da iniciativa privada, aguardam-se, ainda, novas fontes de financiamento para a sua consecução integral8.

O documento destaca as ações desenvolvidas pela Secretaria de Estado de Assistência Social: (1) Projeto Cunhantã & Curumim, de 1997, em parceria com o Governo do Estado do Amazonas, destinado ao combate da exploração sexual comercial de crianças e adolescentes de 7 a 14 anos9 ; o (2) Programa de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, também destinado à faixa de 7 a 14 anos10 e o (3) Programa Sentinela (2001), desdobramento do anterior, que tem como objetivos atender crianças e adolescentes abusados e/ou explorados sexualmente em Centros de Referência e Famílias Acolhedoras11. Vale lembrar que a Empresa Brasileira de Turismo (EMBRATUR) lançou em fevereiro de 1997 a campanha “Exploração do Turismo Sexual Infantil – Cuidado o Brasil está de Olho”, que contou com o apoio da Associação Brasileira de Agentes de Viagem e a Associação Brasileira da Indústria Hoteleira. As mesmas entidades participaram da Conferência Regional do Combate a Exploração do Turismo Sexual Infanto-Juvenil, promovido pela EMBRATUR/OMT, em dezembro de 2001, com representação da UFTAA, Interpol e IH & RA.

Embora não citados no documento oficial brasileiro, vale lembrar que também são parceiros governamentais no combate à exploração sexual de crianças e adolescentes o Ministério do Trabalho, cujo “Programa Nacional de Formação Profissional para Jovens em Situação de Risco Total”, de 1996, vinculado à Secretaria de Formação e Desenvolvimento Profissional – SEFOR, que visa dar oportunidade de inserção econômica e social para adolescentes e jovens, entre 14 e 21 anos, e que vivem em situação de risco (pobreza crítica, carência de vínculos familiares, sem escolaridade de 1º e/ou 2º graus concluídos, sem acesso aos serviços de saúde e sem formação para o trabalho), oferecendo educação profissional e acesso ao mundo de trabalho; o Ministério da Saúde, com o “Programa de Saúde do Adolescente - PROSAD”, vinculado à Secretaria de Assistência à Saúde/Departamento de Assistência e Promoção/Coordenação Materno-Infantil que visa oferecer um atendimento 8 Idem 9 Cerca de 10.000 crianças e adolescentes, conforme o governo brasileiro, teriam sido beneficiados pelo Projeto em 33 municípios do Estado. A partir de 2001, previa-se que as crianças e adolescentes até então atendidos no Projeto Cunhantã & Curumim seriam inseridas no Programa PETI e no Programa Agente Jovem, tendo em vista a similaridade de métodos, de procedimentos, bem como de requisitos. 10 O Programa foi estruturado com base em dois eixos: prevenção e atendimento. O primeiro previa a participação da SEAS em campanhas de esclarecimento e capacitação de profissionais, e o segundo, a intervenção direta, mediante programas e projetos de assistência social e da articulação da rede de serviços governamentais e não-governamentais. Segundo o governo brasileiro, foram atendidas 29.647 crianças e adolescentes na maior parte dos Estados brasileiros. Um dos requisitos para a implantação do Programa é o funcionamento adequado, no Estado ou Município, dos Conselhos Tutelares e dos Direitos da Criança e do Adolescente. O objetivo é atender prioritariamente às demandas desses Conselhos, além de estimular a implantação dos mesmos onde ainda não existam. 11 O Centro de Referência é uma base física que o Município implanta para o desenvolvimento de serviços que executam ações especializadas de atendimento e proteção imediata às crianças, aos adolescentes e famílias vitimadas pela exploração sexual. A Família Acolhedora é um serviço que OO MUUNNIICCÍÍPPIIOO implanta e/ou implementa, após a implantação do Centro de Referência, constituindo uma Rede de Famílias, voltada à proteção integral das crianças e adolescentes vitimados pelo abuso sexual, garantindo-lhes, através do acolhimento familiar, direito à convivência familiar e comunitária. A previsão do Programa Sentinela para o triênio 2001/2003, aponta para a implantação de Centros de Referência em todas as Capitais brasileiras, todos os municípios com população superior a 750 mil habitantes, municípios de zonas portuárias, municípios onde existem garimpos, municípios com grande incidência do fenômeno abuso/exploração sexual, Capitais e regiões metropolitanas que compõem as prioridade do Plano Nacional de Segurança Pública.

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especializado ao adolescente, abrangendo a população entre 10 e 19 anos, em especial: acompanhamento do crescimento e desenvolvimento; desenvolvimento psicológico do adolescente; saúde mental; sexualidade na adolescência; planejamento familiar12; e o Ministério da Educação, que entre os “Parâmetros Curriculares Nacionais-Convívio Social e Ética-Saúde de 1995”, propõe a inclusão do tema “Educação para a Saúde” no currículo escolar, e que tem por objetivo desenvolver nos alunos a consciência do direito à saúde e o conhecimento de seus determinantes e capacitá-los para a utilização de medidas práticas de promoção, proteção e recuperação da saúde ao seu alcance. Considerando-se a questão da integridade e da dignidade do corpo em função dos direitos humanos.

Também não faz parte do relatório, por sua atualidade, o fato do governo brasileiro ter instalado, em abril de 2002, a Unidade Gestora do Programa Global de Combate ao Tráfico de Seres Humanos, em parceria com o Escritório das Nações Unidas para Controle de Drogas e Prevenção ao Crime (UNODCCP), no âmbito da Secretaria Nacional da Justiça do Ministério da Justiça.

O relatório brasileiro traz um quadro sobre os graus de cumprimento do Brasil em relação as metas para 2000 emanadas pela Cúpula Mundial da Criança. No caso da melhoria na proteção às crianças que vivem em circunstâncias especialmente difíceis e empenho na procura de solução para as causas fundamentais dessa situação, o governo afirma ter cumprido a meta, uma vez que a proteção às crianças e adolescentes em situação de risco tem sido ampliada por meio de programas que visam à melhoria das condições de crianças e adolescentes portadores de deficiência, que trabalham, que sofrem violência sexual, que não têm registro civil, e dos adolescentes infratores que cumprem medidas socioeducativas, entre outros13.

Não obstante a excelência do ECA em termos de legislação, o posicionamento do Brasil em relação aos principais acordos internacionais e os programas criados para o enfrentamento da exploração sexual de crianças e adolescentes, as verbas orçamentárias para os mesmos, assim como para instalação dos conselhos, varas e delegacias especializadas, são insuficientes. A execução orçamentária também tem sido motivo de preocupação por parte das entidades da sociedade civil. Para monitorá-la, o Instituto de Estudos Sócio-econômicos (INESC) reuniu os principais programas num “orçamento criança”, lembrando que o artigo 4º do ECA estabelece que a garantia de prioridade absoluta ao atendimento dos direitos da população infanto-juvenil compreende, entre outras afirmações, preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas e destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. Em avaliação recente, o INESC afirma que a área da infância e adolescência (...) não tem sido privilegiada no recebimento dos recursos públicos, mesmo daqueles previstos em orçamento. (...) além de não haver recursos suficientes para o combate às formas de violação e efetiva proteção à infância e adolescência, a sua execução é feita de maneira a comprometer a continuidade dos programas nesta área.. e, para agravar, há uma concentração nos últimos meses do ano, como se fosse possível imaginar que é só neste período que as crianças são exploradas sexualmente e escravizadas(..)14 Os orçamentos dos últimos anos foram influenciados diretamente pelos

12 Esse programa tem como objetivos divulgar e assegurar o cumprimento das normas propostas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Brasil, 1990). No que tange a violência doméstica, os artigos 13º, 47º e o 245º, estabelecem a obrigatoriedade do médico em comunicar casos suspeitos ou confirmados às autoridades competentes, e em especial ao Conselho Tutelar, cabendo ao setor saúde a prevenção e o atendimento médico e psicossocial. Tem com objetivo ainda, propor linhas de ação, nas áreas de ensino, pesquisa, assistência e extensão de serviços à comunidade que propiciem a prevenção e a atuação na área da violência doméstica contra a criança e o adolescente. 13 Conforme Relatório da República Federativa do Brasil sobre o cumprimento das metas emanadas da Cúpula Mundial pelas Crianças, disponibilizado no site do Ministério da Justiça (www.mj.gob.br). 14 Cf. Boletim da Criança e do Adolescente, ano III, no. 9, Brasília, agosto de 2001.

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acordos firmados pelo Brasil com o Fundo Monetário Internacional, no qual o governo assumiu o compromisso de ter superávits primários no orçamento público.

1.4 MARCO CONCEITUAL*

A adoção do termo “exploração e violência sexual comercial contra crianças e adolescentes” e não o termo “prostituição infantil” considera que crianças e adolescentes menores de 18 anos não optam por se prostituírem, mas são introduzidos pela prática criminosa do adulto.

O conceito de exploração sexual abrange o abuso sexual, as diversas formas de prostituição, o tráfico e venda de pessoas, as intermediações e o lucro com base na oferta e demanda de serviços sexuais das pessoas, o turismo sexual e a pornografia infantil. (LEAL, 1999).

Um avanço na concepção desta temática estabeleceu-se a partir da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da prostituição infanto-juvenil no Brasil, em 1993. A prostituição infantil passa a ser compreendida como exploração sexual infanto-juvenil, baseada nas diretrizes do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei Federal nº 8.089/96), cujo artigo 5º observa:

Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade ou opressão, punindo na forma de lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

A exploração sexual de crianças e adolescentes é praticada por pessoas de distintos níveis sócio-econômicos. Na maioria das vezes caracteriza-se por pessoas do sexo masculino, sendo que esta prática encontra grande respaldo cultural (UNICEF, 1998) uma vez que se inspira na discriminação étnica, na dominação de gênero, na impunidade e nas condições sócio-econômicas. Desta maneira, as crianças e adolescentes nestas condições se encontram mais vulneráveis à dominação e exploração. É importante reconhecer que com o aumento da atividade de exploração sexual comercial infanto-juvenil ocorre a articulação da rede delituosa que a sustenta e que envolve uma multiplicidade de relações onde estão incluídas: taxistas, donos de bares, agências de turismo, policiais, entre outros. Esta complexidade dificulta a identificação das crianças e adolescentes e a eliminação da rede de exploração.

Como breve diagnóstico da realidade, o documento introdutório ao 2º Congresso evidencia a realidade do tráfico de crianças. Crianças e adolescentes são afastados de suas famílias e comunidades a partir de promessas de um futuro melhor e muitos acabam sendo vítimas de exploração sexual. O tráfico de crianças ocorre em escala cada vez maior e de forma cada vez mais organizada. O tráfico entre países é normalmente realizado por terra pela falta de fiscalização dos postos de fronteira. O Congresso de Yokohama aponta a importância da cooperação entre governos e do combate ao crime organizado internacional, que inclui o tráfico de seres humanos.

Na abertura do Colóquio Internacional de Direito Penal, promovido pela Associação Internacional de Direito Penal (AIDP), no Rio de Janeiro são apresentados dados que relacionam o comércio de crianças no Brasil à adoção internacional. O relatório nacional reúne informações que apontam para a existência de quadrilhas organizadas que contam com a participação de advogados e autoridades do país e do exterior. Trata-se da terceira fonte de renda proveniente de atividade ilícita no país, conforme o relatório.

Outro aspecto evidenciado no 2º Congresso Mundial de Yokohama é a implicação de familiares, amigos, grandes empresas, políticas sociais e econômicas dos governos, além dos meios de comunicação de massa no aumento da exploração sexual de crianças.

Há também indícios da estreita relação entre exploração sexual comercial de crianças e adolescentes e o tráfico de drogas. Muitas vezes o comércio ilegal de drogas e sexo é feito

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pelas mesmas redes e rotas. A alta vulnerabilidade dessas crianças exploradas sexualmente à contaminação por HIV/Aids é outro fator considerado no documento introdutório do 2º Congresso.

Segundo o CECRIA , no documento referente às Oficinas de Políticas Públicas, no Brasil há poucas pesquisas sobre a exploração sexual comercial. Constata-se hoje a formação de equipes e resultados importantes, ainda que parciais e limitados, dada a extensão do país e da problemática. Organismos internacionais e governamentais vêm financiando pesquisas, muitas realizadas por ONGs e no meio acadêmico. Há no Brasil a implantação de diversos bancos de dados funcionando ainda sem a articulação necessária.

Segundo FALEIROS (2000), as pesquisas realizadas sobre esta realidade e a compreensão do caráter econômico do trabalho e da exploração no mercado do sexo apontam a “pobreza” e a “exclusão” (e a procura de “inclusão” via renda e consumo) como importantes determinantes da inserção neste mercado de trabalho.

FALEIROS (2000, p. 20) também ressalta que a exploração sexual de crianças e adolescentes tem entre seus principais determinantes “a pobreza e a exclusão sócio-econômica (da escola, do consumo, mercado de trabalho, da saúde, da cultura), o enfrentamento desse problema passa, obrigatoriamente, pela ‘inclusão’, através do acesso a políticas sociais públicas, responsabilidade exclusiva do Estado. Neste sentido cabe às ONGs um papel complementar e subsidiário de parceria com Estado”.

*Neste documento o termo criança se aplica ao grupo etário de 0 a 12 anos e

adolescentes ao grupo de 13 a 18 anos. De ambos os sexos.

1.5. MARCO LEGAL

Este item está amparado no estudo realizado por SPRANDEL (2002), o qual dedicou-

se às questões legislativas pertinentes à exploração sexual comercial de crianças e adolescentes.

No Brasil, a base jurídica que trata da questão da exploração sexual comercial de crianças e adolescentes é a Constituição Federal (1988), o Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei nº 2.848, alterado em sua Parte Especial pela Lei nº 7.209 de 1984) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, de 1990).

1. Constituição Federal (art. 227, caput, § 1º, 3º, IV, V e § 4º; art. 228); 2. Código Penal (além dos arts. 227 a 229, já citados: arts. 213 a 226, 233 e 234); 3. Estatuto da Criança e do Adolescente (arts. 5º; 82 a 85; 149, 238 a 243; 250 e 255); 4. Lei dos Crimes Hediondos (lei nº 8.072, de 1990); 5. Lei da Tortura (Lei nº 9.455, de 1997). O ECA retoma a preocupação prevista na Convenção sobre o Direito da Criança de

Dec. 99.710/90, art. 34. Volta-se à proteção da moral sexual da criança e do adolescente, buscando protegê-lo da exploração sexual e financeira decorrente de incentivação à exibição pública. As penas são aplicadas a quem, de qualquer modo, contribuir para a realização do crime ou pratica a omissão na realização de atos que podem evitá-lo. O adolescente menor de 18 anos explorado sexualmente deverá ser recolhido em casas de abrigo e, se verificada a participação ou omissão dos pais na educação de crianças e adolescentes, pode ocorrer a perda do pátrio poder. Também são consideradas a culpa e a penalidade das autoridades que se omitem, como ocorre em alguns casos com membros do Ministério Público, juízes, defensores públicos, assistentes judiciários, advogados, pais e responsáveis pelas crianças e adolescentes, delegados, agentes de polícia, donos de casa de prostituição, que assumem

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boates, casas de massagem, restaurantes e outros estabelecimentos que facilitam esta atividade. Pelo cumprimento da lei que protege crianças e adolescentes estão responsabilizados os delegados de Polícia civil e federal; os juízes estaduais e federais, os Ministros de Tribunais Superiores, os Desembargadores, Promotores, Procuradores da República e os Conselhos Tutelares.

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ECA

Conquistas Dificuldades O movimento social em favor das

crianças e adolescentes continua ativo, e a competência técnica e maturidade política de seus quadros parecem ter aumentado ao longo da década.

Com o deslocamento da esfera de ação e do âmbito nacional para os municípios, o movimento pelos direitos das crianças enfraquece o espaço nacional de elaboração de estratégias e de consensos sobre a implementação do ECA, causando dificuldade na orientação de seus membros para a atuação em nível local.

O terceiro setor, ligado ao empresariado, aumentou de forma significativa sua presença no campo da solidariedade social em favor da população infanto-juvenil.

Uma parcela significativa do empresariado nacional resiste e mesmo se opõe ao ECA, atuando pela flexibilização de direitos nos aspectos do trabalho, maioridade penal, entre outros.

A estrutura de participação requerida pelo estatuto já se encontra em grande parte implantada nos níveis da União, de todos os estados e num número bastante significativo de municípios – os conselhos de direitos e tutelares.

Parte considerável dos conselhos de direitos e tutelares ainda não consegue funcionar dentro do que dispõe a legislação.

Falta em muitos conselhos capacidade técnica e cultura de participação. Esse quadro, em muitas situações, é agravado pela incompetência dos Executivos em fortalecer os mecanismos de democracia participativa.

O antigo sistema da Política Nacional de Bem-Estar do Menor tem sido gradativamente desmontado. O seu órgão nacional (Funabem) foi desativado.

Velhas instituições (Febems), ainda não foram desmanteladas, mantendo vivas culturas organizacionais do passado e fazendo com que os modelos assistencialistas e correcionais repressivos de atendimento sigam vigindo, principalmente, nas áreas das crianças em situação de risco e dos adolescentes em conflito com a lei.

Avanços na formulação de uma política cidadã para crianças e adolescentes.

A educação, base do desenvolvimento pessoal e social da população infanto-juvenil, substitui os grupos de risco como eixo central do debate dos direitos das crianças e adolescentes no país. Os indicadores de saúde e educação, apesar das dificuldades, econômicas, não deixaram de conhecer o processo de melhoria.

Os programas e ações desenvolvidos nas áreas de educação e saúde para a população infanto-juvenil, além da cobertura insuficiente, ainda não levam em conta e de maneira devida a contribuição que a adoção da perspectiva do ECA poderia agregar à sua atuação.

Ao lado da escola, a família começa a A produção de metodologia de trabalho

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emergir (com um certo destaque) no campo das políticas sociais. Programas de saúde da família, valorização da participação dos pais na vida das escolas e renda familiar mínima são exemplos que ilustram essa tendência.

Desenvolvimento de redes de serviços para crianças, adolescentes e suas famílias já é uma realidade em vários municípios brasileiros.

com famílias e a operacionalização de redes de serviços ainda representam um grande desafio para a universalização de políticas que adotam a família como unidade de intervenção.

Também em decorrência das dificuldades econômicas, programas e ações interessantes ficam restritos a uma pequena escala em razão da dificuldade de promover sua expansão.

Os municípios assumiram, como em nenhuma época anterior de nossa história, uma linha de programas para a população infanto-juvenil, incluindo um variado conjunto de ações em favor dos grupos em situação de maior vulnerabilidade social.

Um novo pacto federativo continua a ser necessário. A divisão do trabalho social e de recursos para realizá-los entre a União, os estados e os municípios continua a requerer ajustes.

Inexiste uma adequada estrutura de apoio técnico aos municípios, principalmente os pequenos, que começam a estruturar políticas para a infância e juventude.

Questões antigas, como o trabalho infantil, foram objeto de um intenso processo de mobilização social, gerando ações, tanto por parte do Estado como da sociedade.

Um conjunto de políticas e estratégias de eliminação do trabalho infantil começa a ser implementado.

Esse conjunto de ações atinge ainda uma parcela muito pequena dessa modalidade de trabalho. Resta muito a fazer para que as duas intervenções centrais na eliminação do trabalho infantil, melhoria da renda das famílias e melhoria da qualidade do ensino possam mesmo atingir as consideradas formas mais intoleráveis.

O Plano Nacional de Direitos Humanos propõe ações relevantes no campo dos direitos da criança e do adolescente.

A quebra do ciclo da impunidade com relação aos crimes cometidos contra a infância ainda é o principal desafio do enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes.

Defensorias Públicas e serviços de advocacia da criança e do adolescente começam a emergir em várias capitais brasileiras.

No sistema de administração da justiça juvenil, a Defensoria Pública continua sendo o elmo mais fraco, o que prejudica o exercício das garantias processuais pelos adolescentes. Principais problemas: pouca quantidade de profissionais e dificuldade na compreensão de seu papel na elaboração do contraditório.

Poucos, mas significativos juízes, aderiram à nova doutrina da proteção integral inscrita no ECA.

Uma grande parcela dos juízes da infância e juventude ainda se encontra afiliada à doutrina da situação irregular e defensora do Código de Menores, resistindo de variadas formas à implementação do ECA.

As ameaças de retrocesso na legislação relativa à criança e ao adolescente, embora persistam, ainda não foram capazes de gerar resultado prático.

O ECA já influenciou a elaboração de legislações semelhantes em mais de 15 países da região, constituindo-se numa

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verdadeira ponte de integração do Brasil com os países-irmãos da América Latina.

Nunca se escreveu, publicou, se discutiu e se capacitou tanta gente para atuar no campo do atendimento, da promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente.

Capítulo 2 - Procedimentos Metodológicos

2.1. JUSTIFICATIVA DO ESTUDO

Com financiamento do Departamento de Trabalho dos Estados Unidos, o IPEC iniciou

em setembro/2001 o Programa de Prevenção e Eliminação da Exploração Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes na fronteira Brasil/Paraguai (Ciudad del Este e Foz de Iguaçu). Por se tratar de um programa de cooperação técnica binacional a estratégia geral prevê que todas as atividades ocorram simultaneamente em cada país.

Até o final do programa (agosto/2004) espera-se os seguintes resultados: � Serão identificadas lacunas nos sistemas legais existentes, serão incorporadas

recomendações para uma legislação mais apropriada à proteção de crianças e adolescentes sexualmente explorados no nível nacional; haverá uma harmonização

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lesgislativa e serão tomadas ações urgentes e relevantes pelas autoridades competentes em cada país.

� Informações confiáveis e com credibilidade relacionadas à exploração sexual comercial de crianças e adolescentes, incluindo possíveis redes de tráfico de crianças, serão disponibilizadas e estarão em uso no planejamento, na elaboração e na implementação de intervenções públicas nesta área.

� Instituições públicas, privadas, governamentais e não-governamentais serão fortalecidas na sua capacidade de formular e implementar esforços para eliminar a exploração sexual comercial de crianças e adolescentes. Elas terão adotado políticas nacionais, locais e binacionais para a total eliminação da exploração sexual comercial nas áreas de intervenção.

� 1000 crianças atualmente sendo sexualmente exploradas para fins comerciais serão resgatadas desta ocupação perigosa e receberão assistência jurídica, à saúde, psico-social e educacional e 400 famílias receberão crédito e atividades correlatas.

Para atingir esses objetivos, o componente inicial do programa propõe a realização de diferentes diagnósticos que permitam uma maior aproximação às principais características do problema da exploração sexual comercial infanto-juvenil nas áreas de intervenção. Como também a formulação de um bloco de recomendações para que as ações inicialmente planejadas tenham o impacto necessário e se traduzam em possibilidades concretas de geração de políticas de proteção à infância e à adolescência.

2.2 OBJETIVOS

O “Diagnóstico Rápido da exploração sexual comercial de crianças e adolescentes em

Foz do Iguaçu” teve por finalidade reunir um conjunto de dados sobre as características da exploração sexual comercial de crianças e adolescentes, a possível existência e caracterização de redes de tráfico para a exploração sexual infantil na região da tríplice fronteira e a apresentação de proposições que possam contribuir para a prevenção e reabilitação de crianças e adolescentes em situação de exploração sexual. Seus objetivos específicos foram:

� Fornecer informações atualizadas sobre a magnitude e características da exploração sexual comercial de crianças e adolescentes na cidade;

� Identificar causas e conseqüências da ESCI, definindo um perfil da população explorada e de seu entorno familiar e comunitário;

� Identificar os principais fatores de risco do ponto de vista socio-econômico, mental, educacional, familiar;

� Identificar como se estabelecem as relações entre as vítimas e exploradores; � Identificar a possível existência de redes de tráfico para exploração sexual infantil na

região da tríplice fronteira; � Apresentar proposições baseadas nas opiniões das vítimas sobre as medidas que

possam ajudá-las a se reabilitar; � Apresentar proposições sobre políticas de prevenção a ESCI; � Validar a metodologia de avaliação rápida desenvolvida por OIT/UNICEF.

2.3 METODOLOGIA UTILIZADA

A avaliação rápida é uma metodologia que usa várias estratégias de coleta de dados com

a finalidade conhecer e compreender uma determinada realidade ou situação social específica num contexto sócio-cultural particular. Usa-se com o objetivo de formular um projeto ou

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algum outro tipo de intervenção e deve ser realizada num período não superior a 3 meses, investigando populações mediante a observação e entrevista de pequenos grupos de indivíduos sem utilizar métodos de amostra científicas ou grupos de controle.

Esta metodologia, produto da experiência de OIT/UNICEF, serviu de marco metodológico e guia para a equipe de investigação. Por ser uma metodologia flexível, os investigadores podem selecionar e adaptar a cada situação as técnicas e instrumentos mais oportunos, desde que não se desvirtue o caráter e objetivo da investigação.

Partindo de uma perspectiva nacional e mediante a combinação de técnicas quantitativas e qualitativas, a presente investigação analisou o contexto da cidade de Foz do Iguaçu para determinar as características da exploração sexual comercial de crianças e adolescentes. O diagnóstico ocorreu no período de fevereiro a abril de 2002. Além da necessária pesquisa documental, foram entrevistados 27 informantes-chave vinculados a organizações públicas, ONGs, Conselhos de Direitos, área de turismo, setor hoteleiro, funcionários de bares e restaurantes, taxistas e representantes do poder legislativo. Observações de contexto e entrevistas foram realizadas com 21 famílias de crianças exploradas sexualmente. O diagnóstico enfocou diretamente 60 crianças e adolescentes de ambos sexos, que combinam trabalho na rua com a prostituição. Além das entrevistas semi-estruturadas, foram realizadas observações do contexto que envolveu os sujeitos do estudo. Todos os sujeitos pesquisados foram identificados através da busca ativa.

2.4 CRITÉRIOS DE RECONHECIMENTO DOS GRUPOS PESQUISADOS

Crianças e adolescentes vítimas de exploração sexual e comercial são todas as pessoas

de ambos os sexos menores de 18 anos. Diferentemente do abuso sexual que geralmente ocorre em lugares e com pessoas do

universo de relacionamento da vítima, a exploração sexual comercial geralmente ocorre fora do contexto familiar ou comunitário. Embora haja casos onde o/a aliciador/a possa ser uma pessoa do universo familiar ou comunitário, ou, até mesmo, onde o lugar de exploração seja a própria moradia da vítima.

Mesmo nos casos em que a vítima pareça “gostar” ou se comportar como se a situação de prostituição lhe pareça favorável, é fundamental considerar que:

- Ela foi levada a esta situação por falta de opções, na grande maioria dos casos, pela pobreza, violência doméstica, abusos, enfim por sua situação de vulnerabilidade;

- Em qualquer circunstância, devem ser tratadas como vítimas e não como infratores; - Em muitos casos foi enganada, induzida por alguém com ascensão sobre ela. Mesmo que pareçam bastante conhecidas, as causas da exploração sexual infanto-

juvenil são multifacetadas e podem ser bastante complexas. Por isso, é importante fazer uma abordagem de diferentes ângulos: social, econômico, cultural, educacional, psico-emocional, familiar, comunitário etc;

A invisibilidade da exploração sexual de crianças e adolescentes é o que mais dificulta as intervenções. Neste sentido, é importante não se ater as suas formas visíveis (ruas, bares, mercados, terminais de ônibus, aeroportos, etc), mas buscar os locais onde as vítimas possam estar confinadas, ou escondidas sob diferentes formas de trabalho, adoção, etc. Aí provavelmente estarão as de menor idade e as mais vulneráveis.

É fundamental conhecer a sua trajetória, estrutura familiar e social, de onde vêem, de que forma chegaram ao lugar onde vivem atualmente, sua relação com a escola (Estudaram? Estudam? Onde? Por quanto tempo? São alfabetizados/os? Estado de saúde, habilidades ou interesses vocacionais, com que idade começaram a ser explorados/as, por quê, como, onde?

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Exposição ou envolvimento com outros fatores de risco (drogas, sida). Perspectivas de futuro: como pensam ser possível ajudá-las/os?

Famílias

As famílias de origem podem dar muitas pistas para explicar as causas, como também

os fatores que devem ser considerados nas políticas de prevenção e proteção: por quê, como e quando seus/suas filhos/os começaram a ser explorados/as. Quais as características dessas famílias, quais são os principais fatores de risco social, econômico, familiar?

Exploradores/as Apesar de não ser possível, no contexto dessa investigação, pesquisar os/as

exploradores/as é possível através de outros informantes, conseguir caracterizá-los e tipificá-los: como atuam, onde atuam, desde quando, estão organizados em grupos? Como se engendra a cadeia de exploração? Articula-se entre os três países da fronteira? Quais são os fatores que facilitam o negócio da exploração sexual de crianças e adolescentes, o que pode dificultar, reduzir e eliminar esse tipo de negócio?

Não apenas as próprias vítimas são as melhores informantes. Em muitos casos elas ocultarão sua situação em virtude das ameaças que devem sofrer. Daí é importante, investigar os serviços de saúde, escolas, bairros marginais, motoristas de táxi, polícia de fronteira, delegacias de polícia, serviços de proteção à criança e adolescente, adultos que se prostituem, caminhoneiros, agências de viagens, representações consulares, pastorais da igreja, ONGs, religiosas/os, empregados de bares, restaurantes e clubes noturnos; serviços de imigração etc.

Autoridades Locais Importante também saber qual o nível de compreensão das autoridades locais sobre a

questão: o que pensam o Prefeito, o comandante da polícia, fiscais da receita, os responsáveis pelas áreas da criança, educação, ação social, saúde, mulher, planejamento, trabalho, inspetores ou delegados do trabalho, juízes, etc. Como encaram o problema? Negam? Admitem? Que soluções propõem? Sentem-se responsáveis? Como encaram sua participação na solução do problema?

2.5. CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

Para efeitos de pesquisa foram consideradas as seguintes amostras: Informantes-chave: foram entrevistados 27 informantes-chave (de instituições e

setores) com conhecimento da questão. O critério realizado em sua seleção foi o de terem sido indicados pelo Conselho Tutelar e demais entrevistados.

Famílias: foram entrevistadas 21 famílias de crianças e ou adolescentes explorados sexualmente. A seleção das famílias foi estabelecida em função da indicação de ex-educadores de rua e funcionários e representantes de ONGs sobre famílias que têm crianças nesta situação. Buscou-se famílias de diferentes regiões de Foz do Iguaçu.

Crianças e Adolescentes: foram entrevistadas 60 crianças e adolescentes de ambos os sexos e encontradas em regiões apontadas pelos informantes-chave como locais de maior exploração sexual de crianças. Foi considerado o critério disponibilidade e o fato de estar em situação de exploração sexual. A amostra não foi aleatória. Seguiram-se as indicações dos ex-educadores de rua que conheciam crianças e adolescentes explorados sexualmente.

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2.6. MÉTODOS DE COLETA DE DADOS

Contatos e visitas à organizações públicas e privadas e com pessoas, que por seu nível

de participação ou atividade possuiam informações qualificadas sobre o tema. Estas visitas e contatos incluíram:Conselho Tutelar, Conselho de Direitos da Criança, SOS Criança, empregados de hotéis e restaurantes, Secretaria de Turismo, Delegacia da Mulher, ONGs, taxistas, Secretaria de Saúde, Secretaria da Criança, Câmara de Vereadores, escolas e serviços especializados de atenção às crianças e adolescentes no município. Esses contatos permitiram a seleção da equipe para realizar as entrevistas com as crianças; a seleção e realização das entrevistas com os 27 informantes-chaves (adultos); a indicação dos principais pontos onde se poderiam encontrar crianças em situação de prostituição e as localidades de maior risco social onde poderiam ser encontradas as famílias das crianças exploradas sexualmente.

Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas (respostas abertas) com 27 informantes-chaves. Cada entrevista teve duração de 1 a 3 horas e se realizaram nos locais de trabalho dessas pessoas ou em suas residências. A partir desses informantes-chave realizou-se o mapeamento dos locais de maior exploração sexual de crianças e adolescentes em Foz do Iguaçu. Este grupo foi formado por 13 homens e 14 mulheres, em sua maioria ocupando cargos em instituições públicas ou ONGS que trabalham com crianças e adolescentes. Os demais informantes-chave foram profissionais que igualmente possibilitaram conhecer o universo mais amplo da exploração sexual de crianças e adolescentes em Foz.

As entrevistas com as crianças e adolescentes foram realizadas na rua por uma equipe especializada de ex-educadores de rua. A duração dessas entrevistas teve duração variada dependendo das condições de realização e do nível de confiança que pôde ser estabelecido. Geralmente, as crianças foram bastante receptivas à abordagem. No entanto, em muitos casos, os pesquisadores e as próprias crianças sentiram-se intimidadas pela presença de adultos que pareciam controlá-las. Neste sentido, elas tenderam a omitir dados sobre aliciadores e pessoas ou grupos que as exploravam, pois se sentiam vigiadas. As entrevistas com as crianças ocorreram nos seguintes locais: Av. Costa e Silva, Ponte da Amizade, Av. JK, Região do CODAPAR, Vila Portes (Terminal), Região do BIG, Centro, Região do SUS, BR (Parque Presidente), Vila Portes, Jd. Polo Centro, Jardim América.

Com as 21 famílias selecionadas a partir das indicações dos educadores de rua e informantes- chaves, as entrevistas foram realizadas em suas residências. Neste caso, foi entrevistado o adulto indicado como responsável pela família. Em sua grande maioria foram mulheres, representadas pela figura da mãe (15). Houve ainda um respondente pai, um padrasto, uma mãe adotiva, um irmão, um tio e uma tia. A faixa etária mais representativa desse grupo está em torno de 36 e 45 anos.Essas entrevistas foram realizadas nas seguintes localidades: Cidade Nova, Vila C, Jupira, São Francisco, Morumbi, BR, Favela da Av. Paraná, Favela Jardim Petrópolis, Adriana I, Adriana II.

Pesquisa documental que permitiu a coleta de dados estatísticos para definir o conexto local.

2.7. LIMITES DA INVESTIGAÇÃO

Observa-se ligeiro predomínio de meninos do que meninas. A entrevista com meninas

mostrou-se mais difícil de ser realizada. Havia sempre mais pessoas vigiando as meninas na rua e a presença de traficantes. As meninas são muito utilizadas para traficar, os meninos geralmente são mais "olheiros".

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Não foi possível entrevistar crianças e adolescentes em boates, casas de prostituição, pousadas, hotéis, saunas, casas de massagem e outros locais fechados pelo risco envolvido em uma abordagem deste tipo na área pesquisada. A própria entrevista na rua envolveu ameaças de diferentes tipos, mesmo para os ex-educadores de rua conhecidos e bem aceitos pelas crianças e adolescentes. O problema centra-se na permanente vigilância a que são submetidas as crianças na rua, principalmente por traficantes. Além do mais, observa-se o risco quando as próprias crianças e adolescentes omitem dados sobre as pessoas que as exploram e “clientes”. Morre-se muito facilmente em Foz de Iguaçu. Sabe-se exatamente o que se pode e o que não se pode falar. Segundo um dos informantes-chave, as crianças e adolescentes que depuseram e fizeram denúncias na CPI da Prostituição Infantil em 1995, todas morreram, geralmente com ferimentos na boca e garganta. Uma característica destas mortes é que dão a impressão de ser acidente ou suicídio. Um dos informante-chave declarou: “Sem a total garantia de proteção às testemunhas, não há quem fale”.

Outro informante-chave ressaltou que a única forma de ter acesso às crianças e adolescentes em boates, pousadas e outros locais fechados, é a "blitz" policial.

Reconhece-se que dados sobre as crianças exploradas em locais fechados só podem ser coletados quando o trabalho de prevenção e sensibilização seja iniciado. A própria intervenção direta com a instalação de um serviço de telefone para recepção de denúncias e a instalação de blitz em articulação com a polícia e outros setores especializados, serão a forma mais apropriada de se ter acesso a estes locais, bem como de resgatar as crianças.

Dado os limites da metodologia e características do problema, a atuação de redes de tráfico em toda a região de fronteira, requer um tipo de investigação especial com participação dos serviços de inteligência de uma polícia internacional.

2.8 A EQUIPE DE INVESTIGAÇÃO

A equipe de investigação de campo constituiu-se de uma mestranda em Educação, na

linha de pesquisa: cognição e aprendizagem da Universidade Federal do Paraná e também membro do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Criança e o Adolescente (NEICA); uma Professora Doutora em Educação, Psicologia da Educação do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná e membro do NEICA; dois ex-educadores de rua que já haviam realizado outros levantamentos diagnósticos sobre crianças e adolescentes para a Secretaria da Criança.

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Capítulo 3 - Principais Achados

3.1. CONTEXTO LOCAL

Informações da Secretaria Municipal de Governo, Departamento de Informações

Institucionais, indicam que a história do desenvolvimento ordenado de Foz do Iguaçu inicia-se no fim do século XIX pelo Exército Brasileiro, numa região explorada por empresas madeireiras e ervateiras argentinas. A mão-de-obra utilizada por estas empresas era paraguaia e se valia de “mensus” (trabalhadores de descendência indígena), em regime de semi-escravidão.

A história da cidade pode ser compreendida a partir da caracterização de quatro ciclos econômicos (Anuário Estatístico Perfil 2001).

O 1º ciclo (1870-1970) envolve a extração de madeira e o cultivo de erva-mate. Neste período surgem os primeiros desbravadores, principalmente paraguaios, argentinos e indígenas. Com a fundação da Colônia Militar do Iguassu, há uma maior presença de brasileiros, e a instituição de um pequeno comércio. Próximo à desativação do ciclo madeireiro e da erva mate verifica-se o desenvolvimento de uma agricultura familiar e da pequena propriedade rural a partir de colonos vindos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina.

No século XX, a explosão demográfica de Foz do Iguaçu foi gradativa e ordenada apesar dos incentivos para ocupação e exploração da terra que levou à divisão à distribuição de lotes aos colonos. Chegou-se à década de 70 com uma população de 33.966 habitantes (IBGE).

O 2º ciclo (1970-1980) caracteriza-se pela construção da hidrelétrica de Itaipu. A construção da hidrelétrica de Itaipu trouxe consigo 30 mil trabalhadores e suas famílias. Atraiu grandes contingentes de “mão-de-obra” operativa e especializada. Durante o período de sua construção, o Paraguai consolida em sua fronteira com o Brasil a instalação de uma Zona de Livre Comércio, localizada em Ciudad del Este. O acréscimo a partir deste ciclo foi de 102 mil novos habitantes na cidade. Ocorre aqui o rompimento do crescimento demográfico ordenado.

O 3º ciclo (1980-1995) é marcado pela exportação e turismo de compras. O término das obras e o início do funcionamento da hidrelétrica de Itaipu contribuíram

para a intensificação do comércio de exportação e do turismo de compras com o Paraguai. O traço característico deste período é o intenso movimento migratório para Foz do Iguaçu, originando grandes invasões em áreas públicas e privadas por parte de famílias de baixa renda e desempregados, aqui atraídos pela localização limítrofe da cidade com o grande comércio aberto de Ciudad del Este. Este ciclo trouxe consigo o acréscimo de 74 mil habitantes.

O 4º ciclo (1995 a 2001) pode ser assinalado como de abertura de mercados a partir da globalização.

A consolidação do Mercosul (Mercado Comum do Sul das Américas) marca o processo de abertura do mercado econômico no Brasil.

O rompimento com o ciclo anterior, agrava as situações econômicas e sociais do Município, visto que ocorre o desaparecimento de grande parte do setor exportador e há a redução significativa do turismo de compras e a ocupação de estabelecimentos hoteleiros não classificados. Este ciclo, que ainda não está inteiramente concluído, conta com o acréscimo de 48 mil habitantes até o ano de 2000.

Dentre os emigrantes deste ciclo estão os brasileiros que retornam do trabalho na agricultura no Paraguai. Esta população, conhecida como brasiguaios, por diversas

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circunstâncias foi obrigada a sair do Paraguai e em seu retorno ao Brasil passa a residir em favelas ou na periferia de Foz do Iguaçu, não encontrando aqui alternativas de renda.

O aumento do desemprego e dificuldades de ordem social aliado ao crescimento da economia informal, resultou na elevação do favelamento urbano e dificuldades específicas nas áreas de educação, saúde e segurança pública.

O mercado de trabalho não acompanha o ritmo de crescimento populacional. Além desse fator, a brusca diminuição do turismo de compras leva à dispensa de trabalhadores informais tanto na cidade, como em Ciudad del Este, o que vem a estabelecer um dos principais problemas urbanos de Foz do Iguaçu: o desemprego.

Finalmente, observa-se que em meio a este quadro de dificuldades sócio-econômicas, Foz do Iguaçu vem se destacando cada vez mais por seu potencial turístico baseado no ecoturismo, pela infra-estrutura de recepção para grandes eventos, com acomodação de padrão internacional. A principal fonte de divisa de Foz do Iguaçu advém do turismo.

3.1.1 Variáveis Demográficas

A tabela, na seqüência, sintetiza a evolução do número de habitantes em Foz do Iguaçu.

TABELA 1 – EVOLUÇÃO DO NÚMERO DE HABITANTES EM FOZ DO IGUAÇU DE 1889-2000

ANO 1889 1920 1940 1950 1960 1970 1980 1990 2000 Hab 324 6.430 7.645 16.412 28.212 33.966 136.321 190.115 258.368

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 20 Foz do Iguaçu destaca-se perante as demais cidades da Região Oeste do Paraná por sua

pequena população rural (3.078 habitantes), constituída pela região 12 que abrange a parte Sul, Norte e Bananal, representando somente 1,19% da sua população total (258.368).

A população é basicamente urbana, distribuída em mais de 200 bairros, que integram as regiões urbanas (R-01 a R-11), representando 98,81% da população total do município concentrada na área urbana.

20

MAPA 2 - REGIÕES DE FOZ DO IGUAÇU

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 64.

21

Na seqüência apresenta-se o perfil da população de Foz do Iguaçu no ano 2000 em função do sexo, idade, instrução e renda.

TABELA 2 – PERFIL DA POPULAÇÃO DE FOZ DO IGUAÇU 2000 EM FUNÇÃO DO SEXO, IDADE, INSTRUÇÃO E

RENDA

SEXO HABITANTES (%) Masculino Feminino Total

127.706 130.662 258.368

49,5 50,5 100

IDADE HAB. (%) 0-4 anos 5-10 anos 11-15 anos 16-24 anos 25-39 anos 40-59 anos mais de 60 anos Total

33.587 41.338 28.420 49.089 67.175 31.008 7.751

258.368

13 16 11 19 26 12 3

100 INSTRUÇÃO ALUNOS (%)

Educ. Infantil Até o 1º grau Até o 2º grau Técn. Prof. Superior Total de alunos

4.689 54.583 15.864 1.000 4.207

80.343

6 68 20 1 5

100 POP. OCUPADA HABITANTES (%)

Até 3 s.m. De 4/10 s.m. Mais de 10 s.m. Total

89.493 31.128 9.079

129.700

69 24 7

100 Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001. Observa-se um ligeiro predomínio do sexo feminino em número de habitantes. A idade

predominante da população está entre 25 e 39 anos (26%), sendo seguida da de 16 a 24 anos (19%). Na seqüência, uma significativa parcela de uma população infantil entre 5 e 10 anos (16%) da população total.

Quanto ao grau de instrução observa-se que a maioria 68% possui instrução até o 1º grau completo ou incompleto. Conseqüentemente verifica-se a baixa remuneração da maior parte dos habitantes, 69% recebem até 3 salários mínimos.

Ao analisar os índices de nascimentos e óbitos do município verifica-se em 2000 que embora o número de nascimentos tenha diminuído em relação a 1998 e 1999, o número de óbitos registrados aumentou, o que fala a favor do aumento do índice de violência na cidade.

22

TABELA 3 – DEMONSTRATIVO DA EVOLUÇÃO DE NASCIMENTOS E ÓBITOS EM FOZ DO IGUAÇU

ANO Nascimentos Óbitos 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000

6.034 6.919 6.394 6.366 6.826 8.506 7.001 8.977 9.276 7.821

169 804 846 844 905 901 863 985 1.107 1.477

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 21.

3.1.2 Infra-estrutura Social de Foz do Iguaçu Foz do Iguaçu conta com 8 estabelecimentos de saúde que oferecem ao todo 369 leitos

para internamento. Observe-se a estrutura da Secretaria Municipal de Saúde em 2001 o número de profissionais que trabalham na área da saúde municipal, e o de profissionais que trabalham na área de saúde privada podem ser observado abaixo:

TABELA 4 – ESTABELECIMENTOS DE SAÚDE/LEITOS

LEITOS TOTAL LEITOS SUS

Convênios e Particulares

Santa Casa Monsenhor Guilherme 125 79 46 Hospital Internacional 86 - 86 Hospital São Tiago 12 - 12 Hospital Costa Cavalcanti 104 55 49 Unimed 06 06 06 Hospital e Maternidade Santa Ana 11 - 11 Hospital e Maternidade Cataratas 19 - 19 Hospital Dia Psiquiát. Ranascer 06 06 - TOTAL 369 140 229

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 50

23

FIGURA 1

Profissionais na área da saúde.N: 953 Médicos

26%

Dentistas 20%Enfermeiros

5%Técnico de

Enfermagem7%

Auxiliares de Enfermagem

42%

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001

FIGURA 2

Demonstrativo do número de profissionais da saúde municipal/fev.2001

2

2

5

7

11

11

16

24

36

43

50

65

118

164

264

320

0 50 100 150 200 250 300 350

Fonoaudió logo

Nutricionista

Fisioterapeuta

Assistente Social

Farmacêutico-Bioquímico

Técnico H. Dentário

Psicólogo

Técnico de Enfermagem

Atendente Dentário

Enfermeiros

Agente de Endemias

Cirurgião Dentista

M édicos

Auxiliares de Enfermagem

Outros

Agente Comunitário Saúde

Quantidade

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 50.

24

FIGURA 3

Estrutura da Secretaria Municipal de Saúde – fev/2001

21

5

1

1

1

1

0 5 10 15 20 25

Postos de Saúde

Núcleos

Centro de Especialidades Médicas

Centro de Epidemiologia

Clínica do Bêbe

Centro de Controle de ZoonosesE

QU

IPA

ME

NTO

S

QUANTIDADES

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 51 Algumas entidades trabalham com a dependência química em Foz do Iguaçu, mas não

chegam a atender a grande demanda em relação a esse serviço. Como entidades governamentais tem-se um programa de atendimento a usuários de

drogas vinculado à Divisão de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde. Este Programa atende a adolescentes individualmente por meio de desintoxicação e terapia. Há também o Centro de Atendimento Renascer, o qual está sendo desativado.

Como ONGs que trabalham as questões relativas à dependência química existem quatro: o Ancoradouro, chácara que atende adolescentes a partir de 13 anos para desintoxicação e tratamento; o Projeto Vida, do vereador Marcelinho Moura, o qual atende adultos para desintoxicação e tratamento; o Recanto Betânia e a Casa de Recuperação Maranata, que realizam o atendimento a adultos. O Projeto Vida, o Recanto Betânia e a Casa de Recuperação Maranata são entidades ligadas a Igreja Evangélica.

Quanto aos programas que atendem portadores de HIV/AIDS, tem-se o atendimento do COAS (Centro de Orientação e Apoio à AIDs) ligado à Secretaria de Saúde. Este programa prevê a testagem para verificação do vírus HIV e oferece tratamento para os infectados por meio de coquetel de medicamentos, além de distribuir preservativos.

A ONG/NASA (Núcleo de Apoio e Solidariedade à Aids) oferece diversas ações preventivas e de atendimento aos portadores de HIV, tanto para mulheres, homens e adolescentes. Sua atuação envolve orientação, acompanhamento, palestras nas escolas, programa de redução de danos para usuários de drogas; informações na comunidade sobre prevenção às DSTs; reinserção de soropositivos no mercado de trabalho; cursos profissionalizantes, artesanato e outros.

25

TABELA 5 – HIV/AIDS

Grupos afetados 88/97 1998 1999 2000 2001 TOTAL Aids Adulto 171 43 59 62 50 385 Aids Criança 13 5 4 1 0 23 Aids ÓbitoS 113 15 20 18 10 176 Soropositivos HIV 140 39 35 55 72 341

Fonte: CEFI – Centro Epidemiológico de Foz do Iguaçu / SAE Na área de educação, são referidos pela Secretaria Municipal 76% da população com o

1º grau completo ou incompleto. Observe-se os dados a seguir sobre os diferentes níveis de ensino.

TABELA 6 – CRECHES .

TIPO DE CRECHE QUANTIDADE N’ DE CRIANÇAS ATENDIDAS

Municipais 18 1934 Comunitárias 09 953 Subvencionadas 08 1129 Total 35 4016

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 47 Para uma população de 258.368 habitantes e com mais de 33.587 de crianças entre 0 e 4

anos, sem contar as com 5 e 6 anos de idade, dado que não está desagregado no Anuário 2001, (41.338 crianças), o número indicado de creches parece não ser suficiente para a demanda.

FIGURA 4

Número de Escolas fev 2001, N: 115

Municipal50%

Estadual20%

Particular26%

Outros4%

SESI, SENAI, SENAC, CEEBJA e ESCOLA MUNICIPAL AMBIENTAL Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 48. Abaixo encontra-se a relação de estabelecimentos de ensino, de salas e aula e de

professores em 2001. No total de alunos matriculados observamos o atendimento em Foz do Iguaçu de 76.234 crianças e adolescentes incluindo a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio.

26

Verifica-se insuficiência no atendimento, sobretudo na educação infantil e nos cursos profissionalizantes que contam com 1000 adolescentes atendidos.

FIGURA 5

Número de salas de aula fev 2001, N: 1.160

Rede Municipal40%

Rede Estadual29%

Rede Particular31%

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 48

27

FIGURA 6

Número de Professores Ano 2001, N: 3457

Rede Municipal44%

Rede Estadual38%

Rede Particular18%

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 48

TABELA 7 – ALUNOS MATRICULADOS – 2001

Colégios / Escolas

Educação Infantil

Ensino Fundamental

1ª a 4ª

Ensino Fundamental

5ª a 8ª

Médio Cursos profissionalizantes

TOTAL

Particulares 2.324 2.875 2.840 2.638 - 10.677 Estaduais - 33 21.426 12.319 - 33.778

Municipais 2.365 26.645 - - - 29.010 Sesi/Senai - - - - 115 115

Senac - - - - 885 885 CEEBJA - 98 764 907 - 1.769

Total 4.689 29.651 25.030 15.864 1.000 76.234 Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 48. Atualmente 29,51% da população total encontra-se estudando no ensino médio e

fundamental. Também se observa um aumento de vagas para o ensino superior desde o início da década de 90 (1000 vagas para 4 cursos) até 2001 onde há referência de 4.207 vagas distribuídas em 25 cursos. Veja-se as Faculdades e Universidades de Foz do Iguaçu.

TABELA 8 – ALUNOS MATRICULADOS NO ENSINO SUPERIOR – FEV. 2001

FACULDADES E UNIVERSIDADES TOTAL DE ALUNOS UNIFOZ – Faculdades Unificadas de Foz do Iguaçu 1.037 CESUFOZ – Faculdade de Economia, Processamento de Dados, Administração, Ciência da Computação e Educação Física de Foz do Iguaçu

967

UNIOESTE – Universidade Estadual do Oeste do Paraná 1.468 UDC – União Dinâmica das Faculdades Cataratas 735 Total 4.207

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001

28

Há programas em Foz do Iguaçu que atendem a crianças, adolescentes e a famílias em situação de pobreza. Nestes programas são atendidas somente 1423 crianças, número muito inferior à demanda.

FIGURA 7

Programas de atenção à populações em risco. Ano 2001N: 1423

102

108

111

157

463

482

0 100 200 300 400 500 600

Programa SOS

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil

Programa de Prestação de Serviços àComunidade’

Programa de Iniciação ao Trabalho

Programa da Rua para a Escola

Programa de Apoio Sócio Familiar

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001 Espaços de Lazer Áreas de Lazer - 05 locais: Calçadão (centro) Av. Pôr-do-sol (Conj. Libra) Rua do Recreio (Profilurb I) Campos do Iguaçu Av. Mário Filho Praças – 19 praças. Quadras Poliesportivas: 23 particulares 25 municipais Ginásio de Esportes: 15 particulares 08 municipais Quadras/ Ginásios em Escolas e Colégios: 01 municipal 06 particulares

Campos de Futebol: 15 municipais 03 particulares Esportes Aquáticos: 16 particulares 01 municipal Passeio Público: 2 locais Av. Paraná – municipal Trilha Ecológica do 34º BIMTz – federal Pontos de Encontro: 04 locais Izidoro Pastorelo (Boicy) Raul de Matos (centro) Av. JK (próximo ao viaduto) Av. Mario Filho (São Francisco)

Fonte: SMMA

28

3.1.3 Economia Local

TABELA 9 -PERFIL ECONÔMICO

Pop em Idade Ativa Pop. Econ. Ativa Pop. Ocupada Renda per capta PIB

193.776 hab 136.935 hab 129.700 hab R$ 3.219,00

R$ 831.644.760,00

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 23

TABELA 10– TOTAL DA RECEITA (ARRECADAÇÃO) TRIBUTÁRIA EM FOZ DO IGUAÇU (EM MILHÕES DE REAIS)

2000

MUNICIPAL 22,37 FEDERAL 67,36 ESTADUAL 28,37

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 61. Foz do Iguaçu conta com 9.768 empresas e movimenta capital significativo com suas

importações e exportações.

TABELA 11 – IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO ATRAVÉS DO SISCOMEX DE FOZ DO IGUAÇU: 2000

Importação US$ 699.929 Exportação US$ 851.691

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 61. Um dado importante a ser considerado no diagnóstico da exploração sexual comercial é

o número de estabelecimentos hoteleiros e o número de agências de viagem e turismo em Foz do Iguaçu. A cidade recebe anualmente 1 milhão de turistas, 34% estrangeiros. 60% da receita advém desse setor. A EMBRATUR classifica Foz de Iguaçu como o quinto destino turístico do Brasil.

29

TABELA 12 – ESTABELECIMENTOS HOTELEIROS – DEZ/2000

Categoria Estabelecimentos Leitos Hotéis com classificação 38 10.677 Hotéis sem classificação 103 11.015 Pousadas 18 355 Hospedaria 02 100 Motéis 16 670 Albergue de Turismo 02 135 Camping 03 - Flat’s 02 337 Total 184 23.289

Fonte: Anuário Estatístico Perfil 2001, p. 51. Outro aspecto relevante refere-se à grande estrutura da mídia da cidade. Foz do Iguaçu

conta com 06 canais de televisão e 04 estações de rádio, além de 13 jornais e 03 revistas da própria localidade.

Como uma característica brasileira, o perfil econômico da região também aponta um

desnível significativo entre a população em idade ativa e a população economicamente ativa: aproximadamente 56.841 habitantes estão em situação de desemprego. É preciso considerar que segundo o Anuário Estatístico Perfil 2001, 55% das atividades econômicas do município ainda estão concentradas no setor informal.

Não foi possível obter dados sobre o índice de pobreza da cidade de Foz do Iguaçu, mas pode-se inferir que este é elevado a partir de alguns indicativos. O mapa a seguir representa o grande número de favelas a apenas 5 km do centro e as áreas não urbanizadas de Foz do Iguaçu. As favelas envolvem áreas de invasão. Observe-se o mapa a seguir.

30

Fonte: Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu Favelas a 5 km do centro (26) Áreas não urbanizadas

3.1.4 Organização Social Foz do Iguaçu conta com muitas ONGs registradas (74), distribuídas em diferentes

bairros da região. Há ainda outras ONGs ainda não registradas na Prefeitura e que desenvolvem trabalhos importantes. O conjunto de ONGs não está integrado em uma rede de articulação.

31

Relação das ONGs de Foz do Iguaçu

Albergue Noturno de Foz do Iguaçu Associação Comunitária Evangélica de Foz do Iguaçu – ACEFI Associação Cultural dos Moradores da Cidade Nova II Associação de Doentes e Deficientes Físicos – ACDD Associação de Moradores do bairro Campos do Iguaçu e Jd. Amazonas Associação de Moradores do bairro Jardim Nova Califórnia Associação de Moradores do bairro Sol de Maio Associação de Moradores do bairro, Vila “C” Nova Associação de Moradores dos bairros, Jardim Lindóia, Bela Vista e Dona Leila Associação de Moradores dos Jd. Karla, Laranjeiras e Petrópolis – AKLP Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE Associação de Pais e Amigos dos Surdos de F.I. – APASFI Associação de Promoção ao Menor – APROM Associação de Proteção à Maternidade e a Infância – APMI Associação de Proteção à Vida Associação Filantrópica Projeto Vida Associação Fraternidade Aliança Associação Internacional de Caridade Associação Poço do Jacó RCC Associação Rainha da Paz Associação São Carlos do Brasil Câmara Júnior de Foz do Iguaçu Cáritas Paroquial São José Operário Casa de Recuperação Plena Paz – Paulo Roque & Ltda. Casa de Recuperação e Apoio à Criança e ao Adolescente Mão Amiga Casa de Recuperação Maranata Casa Família Agrícola e Industrial San Romano Casa Família Maria Porta do Céu – Casa Lar Madre Assunta Casa Família Maria Porta do Céu – Casa Lar Scalabrini Casa Família Maria Porta do Céu – LaborArte São Carlos Casa Família Maria Porta do Céu Casa Lar – Diva Rodrigues Bücker Casa Lares no Caminho Centro de Nutrição Infantil

Centro Presbiteriano do Bem Estar do Menor – CEPRESBEM Centro Profissionalizante Raiane da Silva Soares – APAE Comunidade dos Pequenos Trabalhadores – CDPT Comunidade Terapêutica Ancoradouro – CTA Congregação dos Filhos da Imaculada Conceição Creche Comunitária Cláudio Lourenço Creche Comunitária da AKLP Creche Comunitária da Vila “C” Nova Creche Comunitária do Bairro Campos do Iguaçu Creche Comunitária do Bairro Ouro Verde Creche Comunitária do Bairro Três Bandeiras Creche Comunitária do Jardim Califórnia Creche Comunitária do Jardim Lindóia Creche Comunitária Tia Sandra Creche Deputado Aníbal Khury Creche Mamãe Carolina Creche Nossa Senhora da Conceição Escola de Educação Especial Melvim Tones – APAE Fundação Nosso Lar – Casa Lar IV Fundação Nosso Lar – Casa Lar I Fundação Nosso Lar – Casa Lar II Fundação Nosso Lar – Casa Lar III Fundação Nosso Lar Grupo Escoteiro Guairacá Guarda Mirim de Foz do Iguaçu Igreja Batista Parque Morumbi Instituto Adventista Sul Brasileiro de Educação e Assistência Social Instituto das Irmãs de Maria Consoladora Instituto Popular de Assistência Social – IPAS Lar de Apoio a Criança e ao Adolescente – LACA Legião da Boa Vontade – Foz do Iguaçu Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua – Foz do Iguaçu Nosso Canto – Centro de Adaptação Neurológica Total Núcleo Sagrada Família – Paróquia São João Batista Pastoral da Criança – Mitra Diocesana Pastoral do Menor da Paróquia São Paulo Apóstolo Serviço de Ação Social da Igreja do Evangelho Quadrangular Sociedade Civil Nossa Senhora Aparecida Sociedade Espírita Aprendizes do Evangelho – SEAE Sociedade Espírita Os Mensageiros

O número de ONGs na cidade é considerável. No entanto, ao lado destas iniciativas

não-governamentais há o aumento desemprego, violência, exploração de crianças e adolescentes, abuso sexual e maltrato infantil, dependência e tráfico de drogas, AIDS/SIDA, impunidade.

31

O aumento do número de ONGs não vem a abalar a base do problema. Dado o crescimento de algumas problemáticas sociais, a atuação de muitas dessas organizações tem se caracterizado mais como assistencialistas e não voltadas à capacidade de mobilização e organização comunitária. Não se chega a atingir as causas da problemática econômica, social e cultural, característica de grande parte das cidades brasileiras.

As atitudes da população frente aos temas sociais envolvem sua luta pela sobrevivência. Homens e mulheres, meninos e meninas de grande parte da população buscam seu sustento nas ruas ou em outras atividades informais. Há muitas evidências do abuso sexual intrafamiliar, muitas vezes com a conivência da mãe. O que parece representar como que uma iniciação da criança à exploração sexual, a qual gera renda para a família. Muitas crianças exploradas sexualmente têm em sua história o abuso sexual familiar ou praticado por um conhecido da família.

A violência familiar é aceita como prática corretiva das crianças e adolescentes. O maior número de casos de denúncia ao Conselho Tutelar advém do uso de violência e maus tratos na família. O segundo maior índice mensal refere-se ao abuso sexual.

Há muita omissão por parte da população quanto á exploração sexual de crianças. Como na maioria das cidades, parece ocorrer uma espécie de “cultura da exploração" que cedo se instala a partir da ausência de um cuidador responsável pela criança e pela influência dos amigos que logo indicam o caminho para a obtenção de algum dinheiro. Para tornar mais visível a “cultura da exploração”, obtivemos relatos sobre crianças de 9 anos que “brincavam” de “atacar os carros”, brincavam de levantar a saia quando os carros passavam nas ruas só para ver quantos paravam e quanto ofereciam.

A desinformação da população em relação à AIDS é acentuada. Há muita falta de informação adequada, além de grande exposição à contaminação pelo vírus HIV e DSTs visto que a maioria não usa preservativo (ver tabela nº 36). Em relação Às drogas e álcool observa-se, semelhante à AIDS, um desconhecimento do perigo da dependência. O consumo de drogas e álcool é alto nos ambientes de maior pobreza, tanto da parte de adultos, quanto de crianças e adolescentes. A droga está muito presente nestes contextos, principalmente a maconha, o crack e a cocaína.

3.2 AS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA EXPLORAÇÃO SEXUAL

COMERCIAL INFANTO-JUVENIL

A cidade de Foz do Iguaçu, contexto dessa investigação, não foge muito do apontado

por diversos autores acerca da exploração sexual nas diferentes regiões do Brasil. No entanto, apresenta certas peculiaridades que lhe são inerentes: muitas crianças sem registro de nascimento; a ausência de controle quanto à passagem das crianças para o Paraguai e a Argentina; aliado ao fato de ser uma região de fronteira com intensa presença de atividades comerciais informais. Outro aspecto a ser salientado é a presença de um grande contingente de pessoas de outras nacionalidades vivendo na cidade. A Secretaria de Turismo informa que das 192 nacionalidades existentes no mundo, há 57 em Foz de Iguaçu, fato que contribui para uma importante diversidade cultural. A vocação turística da cidade, tanto por sua beleza natural, sobretudo pelo Parque Nacional e pela represa de Itaipu, como pela área de livre comércio, estabelecida em Ciudad del Este - diariamente cerca de 10.000 pessoas cruzam a ponte da Amizade que liga o Brasil com o Paraguai (Foz de Iguaçu/Ciudad del Este) - atrai um grande contingente de visitantes. Associado a isto verifica-se o mesmo padrao de muitas outras cidades: problemas de escolaridade, empregabilidade e de formação profissional, geram um grande número de excluídos dos benefícios sociais, econômicos e culturais. Como

32

pano de fundo, verifica-se que as políticas sociais de atendimento à infância e, particularmente, à problemática da exploração sexual, ainda são bastante débeis.

TABELA 13 – LOCAIS DE EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM FOZ DO

IGUAÇU

LOCAL Nº de Indicações (mais de uma indicação)

(%)

Av. Juscelino Kubistschek 11 10,47 BR 277 (CTG Charrua, Codapar) 11 10,47 Av. Costa e Silva 9 8,57 Av República Argentina com Almirante Barroso 9 9,57 Av. Brasil 8 7,61 Casas Noturnas (de Prostituição, Boates, Casas de Massagem)

8 7,61

Porto Meira 5 4,76 Aduanas 4 3,80 Próximo à Rodoviária 3 2,85 Av. Paraná 3 2,85 Vila Portes 3 2,85 Todos os Bairros 4 3,80 3 Lagoas 3 2,85 Marechal Floriano 3 2,85 Lanchonetes, Bares 2 1,90 Colégios 2 1,90 Rua Engenheiro Rebouças 2 1,90 Morumbi 2 1,90 Hotéis 2 1,90 Há redes (não determina local específico) 2 1,90 São Francisco 1 0,94 Parque Presidente 1 0,94 Bairro Jardim Petrópolis 1 0,94 Bairro Beverly Falls Park 1 0,94 Cidade Nova 1 0,94 Vila A 1 0,94 Av. Tancredo Neves 1 0,94 Rua Jorge Schimmelpfeng “Rua dos Prazeres” 1 0,94 Favelas 1 0,94 Total 105 100

Quando se dispõe os dados referentes aos principais locais de exploração sexual de

crianças e adolescente junto aos dados de algumas favelas em Foz do Iguaçu,15 já se pode perceber a extensão do problema e sua intrínseca relação com a pobreza.

15 Só há a delimitação das favelas mais próximas do centro de Foz do Iguaçu, a qual conta no total com 58 favelas, segundo o anuário do município de 2001.

33

MAPA 4

Legenda: Favelas MAIOR RISCO: 1,2,3 MÉDIO RISCO: 4, 5 MENOR RISCO: 6, 7, 8 ÁREA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL NÃO EXPLÍCITA: 9, 10 Observa-se, a partir do mapa, como principais regiões de risco à exploração sexual de

crianças: MAIOR RISCO EXPLÍCITO DE EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇAS: área em

torno da região central, compreendendo o Jardim Jupira, próximo à Ponte da Amizade; Av. Juscelino Kubitschek; Av. Costa e Silva; Av. Brasil; Av. Paraná; Rua Engenheiro Rebouças; Av. Tancredo Neves; Rua Jorge Schimmelpfeng; favelas.

34

MÉDIO RISCO: áreas próximas à Cidade Nova e à Região do Porto Meira. MENOR RISCO: compreendendo as áreas do Jardim São Paulo; Morumbi e Três

Lagoas. A área do Jardim Jupira destaca-se, segundo a pesquisa, como uma das áreas de maior

risco à exploração sexual comercial de crianças e adolescentes devido à iniciação precoce da criança no mundo do trabalho, sobretudo próximo à Ponte da Amizade, que acaba culminando nas piores formas de manifestação do trabalho infantil.Nesta área, principalmente área de invasão do Jardim Jupira, há muitos adolescentes envolvidos diretamente na exploração sexual e no tráfico de drogas, sendo alguns atendidos pelo Conselho Tutelar.Crianças de 07 e 08 anos são utilizadas como olheiros do tráfico de drogas. Houve dificuldade em realizar entrevistas nesta localidade em virtude da intensa vigilância dos traficantes e do medo das pessoas em falar. O nível de pobreza desta região é alto, falta infraestrutura básica como saneamento, creches, escolas, áreas de lazer e de prática de esportes. Há muitos hotéis no entorno.

A Rua Jorge Schimmelpfeng, também conhecida por Rua dos Prazeres, concentra uma série de bares, casas noturnas e pousadas clandestinas que servem de locais para exploração sexual de crianças e adolescentes. Por esta rua transitam muitos turistas, jovens e adolescentes. O tráfico de drogas também é acentuado nesta localidade.

Ainda incluem-se como áreas de grande exploração sexual de crianças e adolescentes as regiões da A.K.L.P, a região próxima ao Beverly Falls Park e a Av. das Cataratas, onde se concentram os maiores hotéis de Foz do Iguaçu. Nestas regiões a exploração não está tão explícita como a que ocorre nas ruas, e se dá por intermédio de redes de agenciamento que utilizam books para a oferta das meninas aos clientes.

De 27 informantes, 17 indicam o período posterior a 1995 como caracterizando um aumento da atividade de exploração de crianças e adolescentes. Curiosamente, é em 1995 que se estabeleceu uma CPI sobre a Prostituição Infantil no Estado do Paraná a partir de “uma série de denúncias e por um dossiê elaborado pelo Centro de Direitos Humanos de Foz do Iguaçu, Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua e Casa da Família Maria Porta do Céu” (Parecer da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a Prostituição Infantil no Paraná, p. 2). Essa CPI conduziu a um Fórum para averiguar a prostituição infantil em Foz do Iguaçu, e nada foi coibido. Este dado pode apontar para o poder dos principais grupos de exploração sexual de crianças e adolescentes, que parecem contar com uma rede de proteção que muitos denunciam ter a participação de autoridades locais. Outro aspecto que se deve considerar são as evidências testimoniais de sua ligação com outras atividades também altamente lucrativas, como o tráfico de drogas, apontado por muitos informantes como ligado à exploração sexual de crianças e adolescentes.

3.2.1 Perfil das Crianças e Adolescentes pesquisadas

Foram entrevistadas 60 crianças e adolescentes de rua exploradas sexualmente. Sua

idade variou entre 8 e 18 anos, sendo a faixa etária encontrada com maior freqüência dos 10 aos 17 anos. Esta informação, em relação a dos informantes-chave, mostra um número grande de crianças em idade mais precoce do que a suposta (14 – 17 anos). Já a idade das mais novas encontradas coincide com a apontada pelos informantes-chave (8 anos).

35

FIGURA 8

FIGURA 9

Sexo das crianças e adolescentes pesquisadas. N: 60

M63%

F37%

O sexo das crianças e adolescentes entrevistados apresentou uma predominância do

sexo masculino, que também pode ser justificado por ter sido menos complicado, além de envolvendo menor risco, entrevistar meninos16.

Ao todo contou-se com 38 entrevistas de meninos e 22 entrevistas com meninas. A predominância de meninos também permite conhecer o universo dos meninos explorados sexualmente, o qual é pouco explorado na literatura especializada.

É interessante observar que em relação às entrevistas com as famílias de crianças, percebe-se que a maioria das crianças/adolescentes é oriunda de Foz do Iguaçu, o que indica

16 Ver critérios de seleção da amostra.

Idade das crianças e adolescentes pesquisadas. N=60

46

1112

1314

02468

10121416

18 8 – 9 10 – 11 14 – 15 12 – 13 16 – 17

Idade

Qua

ntid

ade

36

uma primeira ou segunda geração de crianças a partir do processo migratório evidenciado em torno de 20 anos atrás e referido pelas famílias. Veja-se a figura abaixo:

FIGURA 10

Origem das crianças e adolescentes pesquisadasN: 60

70%

11%6.60% 5% 6.60%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

Foz do Iguaçu Outras cidades doParaná

Outros Estados doBrasil

Paraguai Não responderam

local de origem

Quando perguntados sobre quem contribui na geração de renda na família verifica-se o que se observou nas entrevistas com os informantes-chave e com as famílias. As crianças são elemento fundamental na constituição da renda mensal familiar. A ênfase maior recai na configuração familiar crianças/adolescentes e pai ou padrasto como responsáveis pelo orçamento doméstico. Também encontrou-se grande expressão da participação só de crianças e adolescentes na geração de renda ou destes e da mãe.

FIGURA 11

Quem trabalha na famíliaN: 60

33.30%

21.60% 21.60%

16.60%

6.60%

0.00%

5.00%

10.00%

15.00%

20.00%

25.00%

30.00%

35.00%

Criança,adolescente e o

pai/padrasto

Criança,adolescente,

irmãos, amigas

Criança,adolescente e a

mãe

Criança,adolescente, mãe,

pai ou padrasto

Criança,adolescente e tios

37

O trabalho dessas crianças envolve sempre mais de uma atividade. Embora se tenha o dado por outras fontes, nem sempre o fato de “fazer programa17” ou de “fazer carícias por dinheiro” é mencionado pelas crianças e adolescentes com trabalho. Permanece a observação das entrevistas realizadas com os informantes-chave: faz-se qualquer coisa para sobreviver e as crianças muitas vezes apanham se não trazem dinheiro para casa. As atividades de geração de renda são semelhantes às descritas pelas famílias. Destacam-se aqui as atividades de vendedor ambulante, engraxate, “fazer programa”, esmolar, catar latinha, papel, garrafa e cuidar de carro.

TABELA 14 - TIPOS DE TRABALHO INFORMADOS

ATIVIDADE DE GERAÇÃO DE RENDA FREQÜÊNCIA (mais de uma resposta)

(%)

Engraxate 16 23,18 Vendedor 13 18,84 Faz programa 10 14,49 Mendiga 8 11,59 Cuida de carro 5 7,24 Catador de latinhas, papelão, garrafas 6 8,69 Rouba 3 4,34 Outros (laranja18, pega frutas, cuida da casa) 4 5,79 Não respondeu 4 5,79 Total 69 100,00

Os motivos que geralmente conduzem a criança e o adolescente a exercer uma atividade

de geração de renda são os mesmos apontados pelas famílias. O fator predominante é a necessidade de sua participação no orçamento familiar para a garantia de satisfação de suas necessidades básicas de alimento, vestuário, água, luz e outras. Apenas 4 crianças informaram que o motivo para trabalhar é sua satisfaçao pessoal. Mas alguns expressam que é melhor ficar na rua do que cuidar da casa. TABELA 15 – POR QUE TRABALHA

FATOR FREQÜÊNCIA (mais de uma resposta)

(%)

Para comprar comida, por necessidade 18 25,00 Para ajudar a família 17 23,61 Para comprar roupa, material escolar 11 15,27 Para ter dinheiro 7 9,72 Para pagar dívida 4 5,55 Gosta 4 5,55 Outros: porque quer; para não fazer nada; para estudar; para comprar drogas; porque não tem outra opção.

5

6,94

Não responderam 6 8,33 Total 72 100,00

17 Prostituir-se

18 Nome que designa a pessoa que transporta a mercadoria contrabandeada do Paraguai para o Brasil.

38

A maior parte das crianças e adolescentes entrevistados trabalham na Ponte da Amizade (35), outras trabalham na região compreendendo o centro da cidade de Foz do Iguaçu (16), e outras 14 indicaram como local de trabalho a Av. Brasil, Av. JK, Av. Costa e Silva e BR 277. Todos os entrevistados trabalham também na rua. Os locais coincidem com os apontados pelos informantes-chave.

FIGURA 12

Onde trabalhamN: 77

45.40%

20.70%18.10%

5.10%2.20% 1.20% 1.20% 1.20%

3.30%

0.00%

5.00%

10.00%

15.00%

20.00%

25.00%

30.00%

35.00%

40.00%

45.00%

50.00%

Ponte Centro Av. JK, Brasil,Costa e Silva,

BR 277, ParquePresidente

Paraguai Vila Portes Boate ExplodeCoração

Jardim América Ceasa Nãoresponderam

FIGURA 13

Quem conduziu ao trabalho nas ruasN: 60

40%

20%

8.30% 8.30% 6.66%5%

1.66% 1.66% 1.66% 1.66%5%

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

40%

45%

Amigos Sozinho Irmão Mãe Primo Pai Padrasto Cunhada Sobrinho Expulso decasa

Nãoresponderam

Em relação à idade de início observa-se a maioria se iniciando na rua entre 6 e 11 anos

(38 respondentes):

FIGURA 14

39

Idade de inícioN: 60

6 à 11 anos63%

NR10%

12 à 17 anos27%

O início do trabalho geralmente se deu na Aduana ou no centro, locais apontados pelos

informantes-chave como de grande concentração de crianças e adolescentes explorados sexualmente.

FIGURA 15

Onde começou a trabalhar

36.60%

11.60%

6.60%

3.30% 3.30%1.66% 1.66% 1.66% 1.66% 1.66% 1.66%

28.30%

0.00%

5.00%

10.00%

15.00%

20.00%

25.00%

30.00%

35.00%

40.00%

Ponte

Centro

Av. B

rasil

Costa e S

ilva

Ceasa

VR

277

CTG

Charrua

Jardim A

mérica

Cascavel

FranciscoB

eltrão

Paraguai

Não

responderam

O início da atividade nas ruas deu-se geralmente como engraxate ou vendedor

ambulante.

FIGURA 16

40

Atividades iniciais na ruaN: 60

18

13

45 5

15

02468

101214161820

Engraxate Vendedor (a)ambulante

Catador de papel Guardador decarro

Esmolando Nãoresponderam

ATIVIDADE

QU

AN

TID

AD

E

A maioria considera positivamente o trabalho nas ruas, retomando o discurso do

trabalho como valor moral apontado pelas famílias e expressa que estas conhecem a atividade que exercem nas ruas. Provavelmente as famílias não parecem perceber o grau de risco que envolve o trabalho nas ruas.

TABELA 16 – SUA FAMÍLIA SABE QUE TRABALHA AQUI

SUJEITO FREQÜÊNCIA (%) Sim 50 83,33 Não 8* 13,33 Não responderam 2 3,33 Total 60 100,00

3.2.1.1Condições de sobrevivência e de saúde fisíca e mental Este dado foi apurado a partir da observação dos contextos visitados e de informações

referentes a sua saúde. As crianças e adolescentes geralmente são magros; os meninos, com aspecto de falta de higiene. Principalmente os meninos apresentam marcas de escoriações e cicatrizes pelo corpo. Alguns estão drogados. Há forte cheiro de maconha no ar. Encontram-se adolescentes no oitavo mês de gravidez fazendo programa na rua.

As meninas que fazem programas apresentam-se bem vestidas e limpas. Geralmente são magras e arrumadas.

Quanto às questões relacionadas à saúde, das crianças e adolescentes que respondem ao dado, 36 nunca ficaram gravemente doentes, contra 21 que já tiveram problemas graves de saúde. Somente 15 de 60 mencionam que usam drogas. Destas, observa-se o predomínio da maconha e do crack, seguida da cocaína e cola. O cigarro e o álcool normalmente não são considerados drogas. Quando perguntados diretamente, 29 relatam de uso freqüente de álcool.

* Os oito adolescentes são os que têm como atividade de geração de renda principal fazer

programa.

41

FIGURA 17

Já ficou doenteN: 60

Sim35%

NR5%

Não60%

Figura 18

Usa drogasN: 60

Sim25%

NR3%

Não72%

FIGURA 19

Tipo de drogaN: 60

20%

10% 8.30%5% 5% 3.30%

48.30%

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Maconha Crack Cocaína Cola Mesclado Cigarros Álcool

Significativo é o quadro de exposição ao HIV/AIDs e outras doenças sexualmente transmissíveis. A maioria não usa preservativo e nunca fez exame para detectar DSTs. É realmente preocupante a situação de risco pessoal e social a que estão expostas estas crianças.

42

FIGURA 20

Usa preservativoN: 60

Sim28%

Não 72%

FIGURA 21

Fez teste HIV/AIDsN: 60

Sim18%

Não 82%

Durante as entrevistas observou-se que a maioria das crianças e adolescentes têm uma

ecelente capacidade cognitiva. Podem ser caracterizadas como na média ou até acima da média. Fazem rápidas relações a partir das perguntas realizadas, mostram-se bastante receptivas, com capacidade de interação social. Sabem exatamente o que podem e o que não podem falar. Observa-se o desejo de que alguém as escute, se interesse por sua vida. Algumas demonstraram interesse em rever a equipe de pesquisadores.

3.2.1.2 Situação Familiar

De 60 entrevistados, 25 residem com os pais, 12 com a mãe e 10 com a mãe e o

padrasto. Este dado concorda com o que aponta a própria família como exploradora da criança, em alguns casos. Também mostra, em alguns casos, o conhecimento da família sobre o que as crianças estão fazendo. As respostas fornecidas pelas famílias indicam que estas estimulam a atividade das crianças. Dos 60 entrevistados, 6 já têm filhos pequenos.

FIGURA 22

43

Com quem moraN: 60

41.60%

20%16.60%

6.60% 5% 5% 3.33% 1.66%

0.00%5.00%

10.00%15.00%20.00%25.00%30.00%35.00%40.00%45.00%

Pais Mãe Mãe/Padrasto Só ou na rua Pai Tia Amigos (a) Filho

FIGURA 23

Tem filhosN: 60 Sim

10%

Não90%

A maioria destes entrevistados tem irmãos, geralmente entre 1 e 4. A maior parte não

tem namorado, mas é explorado sexualmente já há alguns anos.

FIGURA 24

Tem irmãosN: 60

Não40%

Sim60%

TABELA 17 – NÚMERO DE IRMÃOS

44

IRMÃOS FREQÜÊNCIA (%) 1 a 2 9 25,00 3 a 4 13 36,11 5 a 6 4 11,11 7 a 8 6 16,66 9 1 2,77 Não responderam 3 8,33 Total 36 100,00

FIGURA 25

Tem namorado/aN: 60

Sim15%

Não85%

Ao serem indagados onde moram em Foz verificamos que há uma saída da periferia

para os locais mais centrais onde usufruem dos serviços e constituem seu local de trabalho. Observando o mapa com a delimitação das favelas (item 3.1) verifica-se que estas desembocam na região do centro, principal local de exploração visível de crianças e adolescentes. Veja-se o gráfico:

45

FIGURA 26

Onde moraN: 60

9

7

5

5

4

4

4

2

2

2

2

2

2

1

1

1

1

1

1

1

1

2

0 2 4 6 8 10

Cidade Nova

Porto Meira

Jardim Califórnia

Jardim Jupira

Morumbi II e III

Vila Resistência

Gleba Guarani

Vila C

Jardim América

Centro

Jardim Itálica

Albergue masculino

Paraguai

Porto Belo

São Francisco

Portal

Vila Portes

Três Lagoas

Favela Monsenhor

Próximo à Rodovia

Rua

Não responderam

46

3.2.1.3 Nível Educacional

FIGURA 27

Freqüência à escolaN: 60

SIM65%

NÃO35%

A maioria diz freqüentar a escola (39). Destes, a incidência recai mais da 2ª à 6ª série. Já

os que não freqüentam a escola, pararam entre a 4ª e 8ª série. Observe-se nas tabelas.

FIGURA 28

Série que cursaN: 60

27.50%

22.50% 22.50%

12.50%

7.50%5%

2.50%

0.00%

5.00%

10.00%

15.00%

20.00%

25.00%

30.00%

5ª 2ª 4ª 6ª 8ª 7ª 3ª

47

FIGURA 29

Última série que cursouN: 60

3 3 3 3

2 2

1 1 1 1

0

0.5

1

1.5

2

2.5

3

3.5

4ª 5ª 7ª 8ª 1ª 3ª 2ª 6ª

1º ano do 2º grau

Não inform

ou série

SERIE

Chama atenção o importante número de crianças que não freqüentam a escola e o fato

de ter significativo número de crianças trabalhando nas ruas com nível de escolaridade igual ou superior à 4ª série. Não foi possível investigar as razões do abandono escolar e o que nela valorizam e reprovam. O número dos que frequentam a escola aponta a necessidade de um esforço concentrado de campanhas e sensibilização desse setor.

3.2.1.4 Rendimentos

A renda mensal destas crianças está muito próxima à declarada pelas famílias. Na

maioria das vezes gira em torno de R$ 100,00 e R$ 200,0019 por mês. Em alguns casos consta-se uma elevação considerável deste valor chegando até R$ 1.000,0020 por adolescente. Esta renda se justifica pela realização de diferentes atividades, incluindo o fato de ser explorada sexualmente e de estar envolvida no tráfico de drogas. O que conseguem ganhar com essas atividades, pode representar um importante obstáculo para encontrar alternativas de apoio e substituição desse tipo de rendimento. No Brasil, os programas de subsídios às famílias para substituir o rendimento das crianças pela frequência escolar não tem ultrapassado R$50,00 mensais (aproximadamente U$21,).

19 Aproximadamente U$43 a U$86 20 Aproximadamente U$434,

48

FIGURA 30

Renda mensalN: 60

30%

20%

10%

8.30%

5%

5%

5%

16.60%

0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35%

R$ 110,00 a R$ 200,00

Até R$ 100,00

R$ 210 a R$ 300

R$ 310 a R$ 400

R$ 410 a R$ 500

R$ 510 a R$ 600

R$ 1.000

Não responderam

O período de trabalho indicado concentra-se na maioria das vezes entre 4 e 8 horas

diárias (32 crianças). No entanto, 18 informam uma longa jornada de trabalho: 9 a 16 horas por dia, o que indica uma excessiva responsabilidade para a pouca idade e também um alto nível de comprometimento de suas oportunidades de desenvolvimento integral.

49

FIGURA 31

Jornada de TrabalhoN: 60

2

14

10

11

10

5

2

6

0 2 4 6 8 10 12 14 16

1 hs à 2 hs

3 hs à 4 hs

5 hs à 6 hs

7hs à 8 hs

9 hs à 10 hs

11 hs à 12 hs

Mais de 12 hs

Não responderam

FIGURA 32

Renda diáriaN: 60

7%

12%

10%

8%

63%

R$ 1,00 – R$ 10,00 R$ 15,00 – R$ 20,00 R$ 30,00 – R$ 40,00R$ 50,00 – R$ 60,00 Não responderam

50

Quando perguntados sobre o que fazem com este dinheiro a maioria novamente aponta sua contribuição no orçamento doméstico e para a garantia de sua sobrevivência. Poucos apontam o uso deste dinheiro para outras atividades, como comprar drogas e material escolar.

FIGURA 33

O que faz com o dinheiroN: 60

5% 6%

26%

6%

57%

Ajuda a família Compra comida Compra drogasMaterial escolar Não responderam

Confirmando que a atividade de trabalho na rua é vinculada ao setor informal, 43,33%

informa trabalhar por conta própria. Neste caso, observa-se que a tendência é não informa quem as explora sexualmente. O alto índice dos que não repondem a essa questão também corrobora esta hipótese.

FIGURA 34

Para quem trabalha N: 60

26

9

2

2

2

1

1

17

0 5 10 15 20 25 30

Próprio adolescente/criança

Mãe

Pai/mãe

Patrão

Pai

Mãe/padrasto

Cunhado

Não responderam

51

De 6 entrevistados, os únicos que apontam um "patrão" além da família são dois. Este

patrão apresenta a atividade de vendedor e o relacionamento com ele é caracterizado como bom.

3.2.1.5 Relação com os "clientes" A maioria indica não ter problemas com seus clientes (36). Só 5 relatam problemas com

dinheiro relacionado ao pagamento do serviço prestado. Da mesma forma, ao serem indagados sobre se já tiveram problemas com clientes, dos que responderam, a maioria relata que não (24). Só 7 mencionam que sim. Dos que respondem que sim, nenhum indica forma de intermediação e onde são realizados os encontros.

FIGURA 35

Como se relaciona com seus "clientes"N: 60

36

5

19

0 5 10 15 20 25 30 35 40

Se dá bem

Não se dá bem

Não responderam

Ao serem indagados sobre já terem sido fotografados ou filmados em serviço, dos que responderam, 20 disseram que sim e 32 indicaram que não. Este dado pode estar relacionado à

integração de fotos em books e à filmagens e fotos para redes de aliciadores, exploradores, pedófilos e eventuais turistas.

FIGURA 36

Já tiraram fotos ou filmaram você no trabalhoN: 60

Sim33%

NR13%

Não54%

52

TABELA 18 – QUEM E ONDE TIROU FOTOS

ALTERNATIVA FREQÜÊNCIA (%) Homem na Av. Brasil 4 20,00 Turistas 2 10,00 Casa das Máquinas 1 5,00 Árabes 1 5,00 Cadeião 1 5,00 Centro 1 5,00 Ponte 1 5,00 No Mufato 1 5,00 Argentina e Chile 1 5,00 Não responderam 7 35,00 Total 20 100,00

3.2.1.6 Violências a que são submetidas

Durante a análise do contexto percebeu-se que as crianças e adolescentes são na maioria

das vezes vigiadas por traficantes. São estes que lhes perguntam sobre pessoas suspeitas (entrevistadores, por exemplo) e a quem podem recorrer quando necessitam de proteção e apoio.

Quase a metade da população examinada foi vítima de violência. O autor desta violência é geralmente algum amigo ou a própria polícia. A família (padrasto, mãe, pai, irmão) também é citada como agente de violência. A grande indicação da alternativa “amigo” pode indicar sua relação sua vinculação com algum tipo de explorador direto, que muitas vezes aparece como "protetor" mas que tem um forte poder sobre as vítimas. A polícia que, supostamente, deveria protegê-los aparece como o segundo maior autor da violência. Segundo diferentes informantes, a polícia também estaria envolvida em redes de aliciamento e exploração. Há relatos de maus tratos e mortes de crianças e adolescentes pela polícia.

FIGURA 37

Já foi vítima de violênciaN: 60

Sim40%

Não 60%

53

FIGURA 38

Autor da violenciaN: 60

34.40%

31%

13.70%

6.80%

6.80%

3.40%

3.40%

0.00% 5.00% 10.00% 15.00% 20.00% 25.00% 30.00% 35.00% 40.00%

Amigo

Polícia

Padrasto

Mãe

Pai

Irmão

Cliente

3.2.1.7 Necessidades de apoio As crianças e adolescentes entrevistados indicaram claro desejo de dar continuidade à

sua formação, seja em cursos profissionalizantes, seja em uma formação mais abrangente até a faculdade. Somente 15 das 60 crianças e adolescentes entrevistados não gostariam de mudar de trabalho. Os demais mudariam, se pudessem sobreviver sem ele.

TABELA 19 – O QUE GOSTARIA DE APRENDER

ATIVIDADE FREQÜÊNCIA (mais de uma resposta)

(%)

Fazer Faculdade, estudar 19 25,67 Fazer cursos: informática (13); línguas (9); artes; manicure/ cabeleireiro; corte/costura; modelo

32

43,24

Policial 8 10,81 Professora 5 6,75 Esportes 4 5,40 Motorista 3 4,05 Bancário 1 1,35 Catequese 1 1,35 Não sabe 1 1,35 Total 74 100,00

54

FIGURA 39

Gostaria de deixar essa atividadeN: 60

Não25%

Sim75%

As sugestões das crianças e adolescentes quanto ao que poderia ser feito estão próximas às indicadas pelos informantes-chave e as famílias.

TABELA 20 – SUGESTÕES DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES

SUGESTÃO FREQÜÊNCIA (mais de uma resposta) (%) Trabalho para a criança e o adolescente

26 30,95

Centro de esporte/lazer 24 28,57 Trabalho para os pais 12 14,28 Cursos profissionalizantes 9 10,71 Creche 4 4,76 Asfalto 4 4,76 Escola 2 2,38 Cesta básica 1 1,19 Bolsa escola 1 1,19 Posto de Saúde 1 1,19 Total 84 100,00

É visível a carga que a criança e o adolescente se atribuem na obtenção da renda

familiar, o que vem a representar uma adultização da infância e uma inversão de papéis. Para esta criança e adolescente cabe mais a ele próprio do que aos adultos responsáveis prover o seu sustento. Tanto os cursos profissionalizantes como a creche falam a favor deste desejo de poder dar conta de sua sobrevivência e da de seu filho. Este também é o discurso de muitas famílias. Muito cedo esta criança assume as atribuições do mundo adulto, como se pode verificar na idade de início do trabalho nas ruas; muito cedo se expõe aos perigos deste mundo adulto, com poucos recursos para não ser explorada em sua miséria. O importante número de indicações para Centros de esporte e lazer podem representar que as alternativas de programas de apoio devem considerar atividades que permitam o desenvolvimento de

55

potencialidades ainda não exploradas por essas crianças. Também pode significar a necessidade de dispor de tempo livre e dedicá-lo a atividades mais prazerosas.

56

Capítulo 4 - O Contexto Familiar21

4.1 CARACTERIZAÇÃO DAS FAMÍLIAS

Foram entrevistadas 21 famílias de crianças e adolescentes exploradas sexualmente,

representadas em sua maioria pela figura da mãe (15). Houve ainda um respondente pai, um padrasto, uma mãe adotiva, um irmão, um tio e uma tia. A faixa etária mais representativa dos respondentes das famílias está em torno de 36 e 45 anos, conforme a tabela que segue.

TABELA 21 - IDADE DOS REPRESENTANTES DAS FAMÍLIAS

IDADE SUJEITOS (%) 21 – 25 1 4,76 26 – 30 0 - 31 – 35 2 9,52 36 – 40 9 42,85 41 – 45 6 28,57 46 – 50 3 14,28 Total 21 100,00

4.2 CONDIÇÕES DE MORADIA, SAÚDE, EDUCAÇÃO E RENDIMENTOS

Como a maioria dos grupos migratórios que se estabelecem nas áreas periféricas das cidades. Este grupo apresenta características similares a dos habitantes dos principais centros urbanos do país. As condições de moradia são extremamente precárias e a estrutura de serviços é alguns caso, é quase inexistente.

Quanto à origem dos respondentes representantes das famílias das crianças a maior

parte (15) não nasceram em Foz do Iguaçu, são imigrantes sobretudo de outras cidades do Paraná e do Rio Grande do Sul. Somente 6 sujeitos são naturais de Foz do Iguaçu. Dos que não nasceram nesta cidade, 4 sujeitos passaram por outras cidades, dentre estas uma residiu em uma cidade no Paraguai antes de firmar residência em Foz.

Embora a amostragem de sujeitos seja reduzida, pela marcante presença do dado há

indicativos do que foi apontado pelos informantes-chave como “falta de raízes” de grande parte da população, a qual se integrou à cidade em busca de melhores condições de vida, emprego, saúde. A maioria está a pouco tempo em Foz do iguaçu (entre 10 e 20 anos) e seu nível de escolaridade é baixo, como observado no gráfico que segue, com 6 sujeitos entrevistados sem nenhuma escolarização.

21 Observe-se que este capítulo enfoca basicamente o termo trabalho infantil, vez que as famílias, nem tampouco as crianças, admitem seu envolvimento com a prostituição de forma explícita. Decidiu-se explorar com maior profundidade suas percepções sobre o tema do trabalho infantil para averiguar o nível de percepção dos riscos a que as crianças se expõem ao trabalhar nas ruas.

57

FIGURA 40

Escolarização dos representantes das famíliasN: 21

6

5 5

1 1

3

0

1

2

3

4

5

6

7

Semescolarização

1ª a 2ª série 3ª a 4ª série 5ª a 6ª série 7ª a 8ª série Nãoresponderam

As famílias entrevistadas contam com elevado número de membros que residem sob o

mesmo teto e têm aos seus cuidados geralmente de 4 a 5 crianças, como podemos perceber nas tabelas abaixo:

FIGURA 41

Número de pessoas que residem na casaN: 21

4

7

54

1

012345678

3 a 4 5 a 6 7 a 8 9 a 10 11 a 12

58

FIGURA 42

nº de crianças sob a custódia das famíliasN: 21

2 2

3

4

5

3

2

0

1

2

3

4

5

6

1 2 3 4 5 6 7

Quando as famílias são indagadas sobre quantos trabalham, observa-se o trabalho sendo

desenvolvido, sobretudo pelas crianças, seguido da mãe, pai e padrasto. Dentre as atividades mais citadas estão as de vendedor ambulante, catador de papel e latinha e “laranja”22, sendo também estas as atividades mais praticadas pelas crianças e as que as colocam em contato com o submundo da exploração sexual e o tráfico de drogas. Veja-se as tabelas:

TABELA 22 - QUANTOS MEMBROS TRABALHAM

MEMBROS DAS FAMÍLIAS FREQÜÊNCIA (mais de uma indicação) (%) Filhos 12 36,36 Pai 7 21,21 Mãe e Pai 5 15,15 Padrasto 2 6,06 Mãe 5 15,15 Tio (a) 1 3,03 Cunhada (o) 1 3,03 Total 33 100,00

As palavras de um entrevistado sintetizam bem a situação: “todos se viram um pouco,

mas fichado23 ninguém”.

TABELA 23 - ATIVIDADES DE GERAÇÃO DE RENDA DOS MEMBROS DAS FAMÍLIAS

ATIVIDADES FREQÜÊNCIA (mais de uma indicação) (%) Vendedor ambulante 6 24,00 Doméstica/Diarista 4 16,00 Catador de papel e latinha 3 12,00

22 Pessoa contratada por grupos de crime organizado para realizar atividades ilícitas. 23 Gíria utilizada para indicar que a pessoa não tem contrato formal de trabalho

59

“Laranja”, puxa muamba 3 12,00 Engraxate 2 8,00 Cortador de grama 2 8,00 Sapateiro 1 4,00 Trabalha na Guarda Municipal 1 4,00 Servente de pedreiro 1 4,00 Babá 1 4,00 Técnico em eletrônica 1 4,00 Total 25 100,00

A renda mensal das famílias, considerando adultos e crianças/adolescentes

trabalhadores é geralmente baixa para dar conta do sustento de seus muitos membros.

FIGURA 43

Renda mensalN: 21

5

5

4

2

1

1

1

1

1

0 1 2 3 4 5 6

R$ 81,00 – R$ 130,00

R$ 131,00 – R$ 180,00

R$ 30,00 – R$ 80,00

R$ 360,00

R$ 181,00 – R$ 230,00

R$ 231,00 – R$ 280,00

R$ 480,00

R$ 700,00

R$ 1.000,00

TABELA 24 - PROBLEMAS DE SAÚDE

ALTERNATIVA FREQÜÊNCIA (%) Sim 17 80,95 Não 3 14,28 Não responderam 1 4,76 Total 21 100

60

TABELA 25 - PRINCIPAIS CAUSA DE MORTES E PROBLEMAS DE SAÚDE

Indicações FREQÜÊNCIA (%) Acidente com morte 1 5,88 Sequelas por acidentes 2 11,76 Assassinato 1 5,88 Doença mental 1 5,88 Lupus 1 5,88 Câncer 1 5,88 Hérnia 1 5,88 Dependência química 2 11,76 Gripe 1 5,88 Desmaio 1 5,88 Epilepsia 1 5,88 Problemas renais 1 5,88 Problemas nos olhos 1 5,88 Sem indicação 2 11,76 Total 17 100,00

Observe-se nas duas tabelas anteriores que a descrição dos tipos de causa mortis e de

problemas relacionados à saúde indicam que não fogem ao padrão da maioria das populações que habitam as periferias de grande parte das cidades brasileiras, nas quais se registram grandes índices de mortes violentas. Neste caso, ressalte-se que geralmente é essa população que tem menos acesso aos serviços de saúde e residem em áreas com maior nível de insalubridade. A presença de de dependentes químicos parece ser um indicativo da vulnerabilidade dessa população ao tráfico de drogas. Observe-se que esses aspectos precisariam ser analisados com maior profundidade em outros estudos.

A incidência de uso de drogas e álcool, relatado pela família, é elevada. Somente seis

disseram não fazer uso freqüente de uma ou outra substância.

FIGURA 44

Uso de drogas e álcool na famíliaN: 21

Não29%

NR5%

Sim66%

61

TABELA 26 - TIPOS DE DROGAS INDICADAS PELA FAMÍLIA

DROGA FREQÜÊNCIA (mais de uma indicação) (%) Álcool 9 52,94 Cigarros 4 23,52 Crack 1 5,88 Todo tipo de droga 3 17,64 Total 17 100,00

Em relação à educação, o que se observa quanto à presença ou não de crianças e

adolescentes na escola é que a maioria está matriculada. Segundo os respondentes, necessitam deste comprovante para receber o auxílio financeiro bolsa escola, a que muitos tâm acesso, conforme a tabela relativa aos auxílios destinados às famílias. O que não foi averiguado é a freqüência da criança à escola. Apurou-se que 16 crianças entre 07 e 16 anos estão na escola regular; só um menor de 6 anos foi mencionado como freqüentando a creche e 2 estão realizando supletivo. Na tabela relativa às sugestões das famílias para a prevenção desse tipo de exploração às crianças ressalta-se a freqüente solicitação por creches. Também os informantes-chave mencionam a falta de creches. Em muitos casos, há defasagem entre a idade da criança e a série que cursa, a qual gira em torno de 2 a 3 anos de defasagem entre os que indicaram a série em que a criança está matriculada. Pelo tempo de permanência nas ruas pode-se deduzir a sua escassa freqüência à escola.

Quando indagados sobre a ocorrência de violência na família, 8 sujeitos relatam violência contra suas próprias crianças entre morte, violência sexual, agressão física e atropelamento. Dois sujeitos referem-se à violência contra outros membros da família, que não as crianças.

São as crianças as primeiras a serem agredidas nas famílias, sobretudo pelo risco que correm quando permanecem por longos períodos sem cuidados adequados, como é o caso do trabalho nas ruas, o qual as expõe ao tráfico e à exploração sexual.

Veja-se as tabelas referentes à violência na família.

TABELA 27 - VIOLÊNCIAS OCORRIDAS

VIOLÊNCIA FREQÜÊNCIA (%) Não 11 52,38 Sim 9 42,85 Não responderam 1 4,76 Total 21 100,00

TABELA 28 - TIPOS DE VIOLÊNCIA

TIPO DE VIOLÊNCIA FREQÜÊNCIA (%) Violência física com instrumento cortante e mão 4 44,44 Atropelamento / assassinato 3 33,33 Violência sexual 1 11,11 Desaparecimento 1 11,11 Total 9 100,00

Em relação aos auxílios prestados às famílias são citados:

TABELA 29- ESTÃO INSERIDAS EM ALGUM PROGRAMA DE APOIO

62

SUJEITO FREQÜÊNCIA (%) Sim 15 71,42 Não 5 23,80 Não responderam 1 4,76 Total 21 100,00

63

FIGURA 45

Tipos de apoio recebidoN: 60

41.60%

16.60%

16.60%

12.50%

8.30%

4%

0.00% 5.00% 10.00%

15.00%

20.00%

25.00%

30.00%

35.00%

40.00%

45.00%

Bolsa escola

PIT (Programa de Incentivo ao Trabalho)

Cesta básica

Pastoral da Igreja Católica

Clube de Mães

Visita Assistente Social

Um total de 24 indica que uma mesma família está inserida em diferentes programas.

Estas respostas revelam o nível de necessidade dessa população e que um dado positivo é que mesmo em condições ainda precárias, a cidade já tem uma estrutura para desenvolver alguns programs compensatórios de alívio à pobreza. No entanto, a maior necessidade se concentra no melhoria das condições de emprego e renda e para isso não as oportunidades são escassas. Observa-se que além do auxílio dado a quem matriculou sua criança na escola (bolsa escola), as Igrejas, o Programa de Incentivo ao Trabalho e o Clube de Mães vêm a constituir fontes de garantia da sobrevivência, seja em subsídios financeiros, material escolar ou mesmo alimento. Ressalte-se aqui que muitas solicitações das famílias não são atendidas pelos programas de auxílio pela excessiva demanda e falta de recursos para atendê-las. Uma família menciona a visita da assistente social como auxilio que recebe.

As dificuldades mais freqüentes experimentadas pelas famílias são as relacionadas à falta de dinheiro e de alimento, ao lado de problemas de saúde, os quais se apresentam com grande incidência.

TABELA 30 – DIFICULDADES ENFRENTADAS

DIFICULDADES FREQÜÊNCIA (mais de uma indicação)

(%)

Problemas de saúde (também envolvendo drogas e álcool) 8 36,36 Falta de dinheiro, de comida 7 31,81 Desemprego 3 13,63 Violência familiar 2 9,09 Falta de moradia 1 4,54 Não relata 1 4,54 Total 22 100,00

64

4.3. PERCEPÇÃO SOBRE O TRABALHO INFANTIL

Quando perguntados acerca de sua percepção quanto ao trabalho da criança, alguns

respondentes informam no que não gostariam e no que apreciariam que seus filhos trabalhassem. Fica claro que as famílias conhecem os perigos a que as suas crianças estão sujeitas nas ruas. É a rua que é apontada pela maioria como lugar inadequado para o trabalho. Já o trabalho em locais fechados, como firmas, lojas, na função de empacotador, ou ligada ao processamento de informações com o uso de computador, é desejado pelos reponsáveis. Outro trabalho valorizado é o que vem se realizando em um dos projetos da Prefeitura: o Colégio Agrícola.

Como exemplos da visão negativa dos reponsáveis sobre os riscos do trabalho nas ruas tem-se: “vender coisas na rua é perigoso” (citado por 2 famílias).

“Não é bom, porque está na rua”. Outros aspectos não desejados pelas famílias para seus filhos são: trabalho “em coisa perigosa”; “não sem ficha (contrato formal)”; “em serviço pesado”; “se não tem perigo é bom”.

Contraditoriamente, quando falam sobre o trabalho de seus filhos (9), a maioria expressa visão positiva acerca do trabalho de suas crianças (7). O trabalho é visto positivamente pelo valor moral que encerra promovendo dignidade e única alternativa de ascensão social.

Uma família relata o que levou suas crianças ao trabalho precoce: “se tivesse emprego não precisava trabalhar”; outra família menciona ainda que a criança: “catava papel para comprar drogas”. É irônico perceber que dentre os aspectos positivos quanto ao trabalho de seus filhos está a indicação do trabalho como fator de proteção às drogas e da influência negativa do grupo, quando é justamente este trabalho nas ruas que o predispõe a este perigo. Os exemplos abaixo o demonstram:

“Eu acho que tem que estudar, mas também tem que trabalhar”. “Eu acho bom trabalhar do que ficar perdido no meio da turma”. “Não acho nada, aconselho para que se cuide. Antes pedir do que pegar o que é dos

outros”. “Melhor a criança engraxando, trabalhando, do que fumando (maconha)”. “É bom porque assim ele não se envolve com droga, com assalto”. As dificuldades cotidianas afastam essas famílias de uma prática de proteção à infância.

Como o Estado não consegue empreender medidas que promovam essas famílias, a única forma de promoção que elas encontram é a de inserir seus filhos no mercado de trabalho informal, sujeito a todos os riscos apontados anteriormente.

Quando indagados sobre o que poderia ser feito para evitar o trabalho infantil constata-

se que a maioria apóia a necessidade de estudo e trabalho. “Melhor criar trabalhando que pensando bobagem”; deve-se “obrigar a trabalhar”. São 12 as famílias que se pronunciam neste sentido.

TABELA 31 - PERCEPÇÃO ACERCA DO TRABALHO INFANTIL

ALTERNATIVA FREQÜÊNCIA (%) Bom 12 57,14 Ruim 5 23,80 Não acha nada 1 4,76 Não responderam 3 14,28 Total 21 100,00

65

Dos poucos respondentes que indicaram o período de trabalho dos filhos, este

concentra-se entre 6 e 9 horas ao dia.

TABELA 32 - HORAS DE TRABALHO DA CRIANÇA/ADOLESCENTE

HORAS FREQÜÊNCIA (%) Até 6 horas diárias 5 23,80 Mais de 9 horas diárias 4 19,04 Não responderam 11 52,38 Não sabe 1 4,76 Total 21 100,00

Outro silêncio verificado é na menção ao "empregador". Apenas 6 responderam a esta

pergunta:

TABELA 33 - QUEM É O PATRÃO DO FILHO

Patrão FREQÜÊNCIA (%) Pais 2 9,52 Não tem 2 9,52 Não sabe 1 4,76 Senhora do hotel 1 4,76 Não responderam 15 71,42 Total 21 100,00

O desconhecimento ou silêncio é ainda mais marcante quando se busca saber

características deste empregador. Só 3 de 21 responderam a esta pergunta, confirmando a informalidade das relações de trabalho.

TABELA 34 - CARACTERIZAÇÃO DO PATRÃO

TIPO FREQÜÊNCIA (%) Empresário 2 9,52 Policial 1 4,76 Não responderam 18 85,71 Total 21 100,00

Das poucas respostas obtidas para a pergunta sobre o início das atividades, indicam que

o fato de outras crianças trabalharem nessas circunstâncias parece ser uma alternativa quase que natural. Desta forma, parecem "aprender" uma com as outras. O número de não respondentes a essa questão pode indicar, de um lado, a "naturalidade" com que as famílias encaram a situação e, por outro, a possibilidade de querer ocultar o envolvimento de suas crianças com atividades ilícitas. Veja-se a tabela:

66

TABELA 35 – COMO INICIOU A ATIVIDADE

SUJEITO FREQÜÊNCIA (%) Saía com outros e foi aprendendo (vender, “puxar a muamba”...) 4 19,04 Alguém buscou na favela 1 4,76 Por conta da própria criança 1 4,76 Indicação 1 4,76 Não responderam 14 66,66 Total 21 100,00

Quando perguntou-se às famílias quanto ao motivo de seus filhos estarem trabalhando,

obteve-se somente 10 respostas, em sua maioria apontando a condição de carência econômica e o uso das crianças para auxiliá-las.

TABELA 36 – MOTIVOS PARA OS FILHOS TRABALHAREM

MOTIVOS FREQÜÊNCIA (%) Necessidades da família 7 33,33 Desejo da criança 1 4,76 Ficava na rua, roubava 1 4,76 Tinha que cuidar da criança do vizinho 1 4,76 Não responderam 11 52,38 Total 21 100,00

Algumas expressões que buscam justificar a necessidade da família em aceitar, ou

melhor, solicitar que seus filhos contribuam no orçamento doméstico: “Eu estava sozinha e o pai tinha abandonado a casa”. “Porque não tem pai que mora na casa e a renda familiar não dá”. São os amigos os mais citados como relacionados à escolha do trabalho, sobretudo

para as meninas que claramente indicam que fazem programa.

TABELA 37 - O QUE PODERIA SER FEITO PARA EVITAR O TRABALHO DOS FILHOS

O QUE PODE SER FEITO FREQÜÊNCIA Emprego para os pais 7 33,33 Emprego registrado para os adolescentes de 14/15 anos 5 23,80 Projeto de apoio à família 3 14,28 Trabalhar junto com os pais 2 9,52 Colocar no Projeto Renascer 1 4,76 Interná-lo 1 4,76 Bolsa escola de maior valor 1 4,76 Criar cursos 1 4,76 Total 21 100

As famílias têm a clareza de que só seria possível evitar o trabalho infantil se

passassem a ter melhores condições de vida para sustentar suas crianças. Como exemplo da percepção dominante das famílias, observe-se os depoimentos

abaixo:

67

É preciso “pais com bom emprego para poder sobreviver melhor, sem os filhos ficarem na rua com drogas, pedindo dinheiro”.

“Os filhos deveriam trabalhar com os pais” (sugere que estudem e trabalhem). “Dar apoio para a família, colocar as crianças em algum projeto para ajudar a passar a

fome”. “Internar para não ficar na rua e sair só quando tivesse 18 anos ... se ficar na rua ...” “Fornecer alimentos, criar programas, projetos, cursos”. “Arrumasse emprego na fábrica, indústria”. “Precisava de uma bolsa escola um pouco maior”. “Trabalho para o pai, mãe. Ajuda do governo”. Nas sugestões das famílias do que pode ser feito em termos de programas, há

novamente a ênfase no emprego para os adultos, auxílio financeiro, estudo aliado ao ensino profissionalizante e projetos voltados a atividades para crianças e adolescentes. Observe-se o gráfico seguinte:

FIGURA 46

Sugestões das famílias sobre programas para evitar o trabalho infantil

N: 37

9

8

5

5

3

3

1

1

1

1

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Trabalho para os pais

Escola integral

Creche

Apoio do Clube de Mães

Curso de Computação e Artesanato

Escola prof issionalizante para pais e jovens

Associação PROVOPAR

Participação em Grupo de Jovens

Clínica de recuperação para dependentes químicos

Lazer

As observações de contexto onde foram entrevistadas as famílias, geralmente favelas, revelaram moradias muito pobres e sujas, com normalmente uma ou duas peças repartidas por móveis servindo de divisória dos cômodos. A maioria tem banheiros. Chamou a atenção o

68

medo de falar de algumas famílias e as pessoas estranhas que rodeavam a família, como que vigiando suas respostas à entrevista. Numa das casas, havia "tijolos" de maconha no chão e a suspeita de serem traficantes, os que rodeavam a casa.

Evidencia-se nessas entrevistas que o percurso mais freqüente para a exploração sexual se dá via trabalho infantil nas ruas. Inicia-se com o trabalho de vendedor ambulante e de passagem de contrabando (“laranja”) para depois passar à venda do próprio corpo para obter algum dinheiro. É freqüente também o abuso sexual em casa pelo padrasto ou pelo pai, muitas vezes com a conivência da mãe. É também freqüente o perambular pelas ruas com amigos “atacando” os carros de brincadeira, erguendo a saia, no caso das meninas. O que no início mais parece uma brincadeira, acaba sendo um modo de sobreviver. A menina de 14 anos que relata este fato com entusiasmo observa que chegaram a oferecer R$ 300,00 para a amiga de 9 anos. Uma de suas colegas, de 12 anos, e que faz programas na rua, brinca de “tomar chá” com a amiga, enquanto se realizava a entrevista com sua mãe. Esta mesma menina fora atendida pela assistente social e apresenta histórico de abuso sexual pelo pai.

As Assistentes Sociais relatam que as amizades levam as crianças a se prostituir.

Senhoras, muitas vezes prostitutas, aliciam crianças da vizinhança, e residem ou na própria favela ou em outras localidades. Meninos mais velhos, adultos e até mendigos aliciam outros meninos nas ruas para fazer programas.

A contribuição das crianças no orçamento familiar é bem caracterizada por uma das famílias que diz “Se meus filhos não trabalham, morremos de fome” e, mais adiante, “ Pobre criar filhos sem trabalhar, é difícil”.

Fato também coerente com o que foi analisado com os informantes-chave, é a presença de drogas seja no uso, seja no tráfico, seja em ambos, o que é mais evidente. Na luta pela sobrevivência vale qualquer coisa para obter dinheiro. Desde vender o corpo a traficar drogas. “Muitos querem estudar, mas não podem, têm de trabalhar para ajudar os pais, têm que pedir”.

Permanece a observação inicial quanto ao silêncio dessa população em relação à prostituição infantil, assim como ao tráfico de drogas. Como estas famílias foram ou vêm sendo assistidas pelo Conselho Tutelar ou Assistentes Sociais, sabe-se que algumas de suas crianças fazem "programas". Todas as famílias entrevistadas têm crianças exploradas sexualmente e usam ou traficam drogas, mas nenhuma menciona essa atividade como um dos trabalhos realizados pela criança. Resta saber, se é por desconhecer essa forma de obter dinheiro pelas crianças, se é por “fingir que não vê”, pois essa atividade garante um retorno financeiro certo para a família; se é por saber que não é permitido por lei, se é por vergonha ou tabu em relação a esta atividade; ou se é por medo de represália dos exploradores.

69

Capítulo 5 - Conclusões e Recomendações

5.1 CAUSAS DA EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL DE MENINOS/AS E

ADOLESCENTES.

As referências feitas ao que facilita o negócio da exploração sexual de crianças e

adolescentes em Foz do Iguaçu apontam com maior freqüência a falta de responsabilidade e controle da família, a pobreza, a impunidade seguido da baixa escolaridade e do desemprego. Observe-se as alternativas apresentadas pelos informantes-chaves.

FIGURA 47

Fatores que favorecem a exploração sexual comercialN:59

18.60%

16.90%

11.80%

8.40%

6.70%

5%

5%

5%

5%

3.30%

3.30%

3.30%

3.30%

3.30%

0.00% 2.00% 4.00% 6.00% 8.00% 10.00%

12.00%

14.00%

16.00%

18.00%

20.00%

Falta de responsabilidade, orientação e controle da família.

Pobreza

Impunidade

Baixa escolaridade

Desemprego

Cultura, acha “normal” a exploração

Envolvimento com drogas

Influência da mídia

Falta de raízes na cidade

Violência na família

Turismo sexual

O desnível social e cultural

Falta de religião

Falta de projetos e programas de prevenção

É a pobreza que aparece em primeiro plano quando se indaga as sobre as causas da

exploração sexual comercial infanto-juvenil em Foz do Iguaçu. Na seqüência tem-se a falta de orientação e controle dos pais sobre seus filhos.

70

FIGURA 48

Causas da exploração sexual comercialN:42

26%

21.40%

9.50%

9.50%

4%

4.70%

7%

7%

7%

0% 5% 10% 15% 20% 25% 30%

Pobreza, dificuldades econômicas,favelas.

Falta de responsabilidade, orientação,diálogo dos pais.

Falta de emprego.

Localização geográfica de Foz

Falta de perspectiva profissional, deexpectativas em relação ao futuro.

Falta de escolaridade

“Cultura” de Foz

Impunidade

Meio fácil de ganhar dinheiro.

Observa-se que se trata de um fenômeno complexo, de causas sócio-econômicas e

histórico-culturais. Dentre as principais causas sócio-econômicas está a desigual distribuição de renda, a pobreza, a migração, o rápido avanço do processo de urbanização, a debilidade das políticas sociais.

Em relação às causas histórico-culturais identifica-se a visão de criança como objeto da dominação ou mercadoria, a nova estrutura familiar e suas conseqüências, o consumismo, a ideologia pós-moderna do subjetivismo e do prazer, a cultura da impunidade.

A exploração sexual de crianças insere-se em um contexto de pobreza. Identificou-se que seus locais de moradia são muito precários. Algumas casas têm apenas um cômodo e aí vivem todos. A ida às ruas é geralmente requerida pela própria família à criança para auxiliar no sustento da casa. A busca precoce da rua como local de geração de renda leva esta criança a realizar diferentes atividades para conseguir sobreviver: engraxate; vendedor; catador de papel, lata, garrafa; passador de muamba (contrabando); guardador de carro etc. É esta atividade na rua que normalmente a coloca em contato com a exploração sexual e com o tráfico de drogas. O que se passa a partir daí diz respeito à violação total de seus direitos. Há relatos de que crianças são seqüestradas na rua e na escola e desaparecem; são crianças que se tornam dependentes de drogas, que estão totalmente expostas a doenças sexualmente transmissíveis e ao HIV/AIDs; são crianças usadas para repasse de drogas e contrabando por pouco dinheiro; são crianças que são mortas com a maior facilidade; que trabalham desprotegidas em contextos extremamente violentos. A exploração sexual se dá por muito

71

pouco, às vezes por comida, vale-transporte, drogas. São crianças exploradas por outras mais velhas e por adultos, inclusive mendigos. Há relatos de caminhoneiros que estupram e matam meninos.

Muitas vezes as crianças e adolescentes são seduzidos na porta da escola por pessoas bem apresentadas e aparentando bom nível sócio-econômico, inclusive carros importados. Jovens são usados para seduzir as meninas. Primeiro, ocorre o namoro. O aliciamento se dá via relação afetiva. Depois este rapaz diz que necessita se ausentar da cidade, por exemplo, viajar a São Paulo e convida a adolescente para acompanhá-lo. Chegando na nova cidade, a adolescente percebe que está envolvida numa rede de prostituição. É dificultado então o acesso desta adolescente ou criança à família. A família recebe ameaças quando tenta resgatála.

Os aliciadores não têm um perfil defindo. Há relatos de mulheres, donas de casa, cabeleireiras, prostitutas, que aliciam crianças e adolescentes para trabalhar no Paraguai e na Argentina. Paga-se US$ 100,00 por menina. Os documentos são falsificados. Foz do Iguaçu tem grande incidência de roubo e extravio de carteiras de identidade femininas, as quais são usadas para traficar adolescentes. O que de início se refere a um trabalho de doméstica acaba se evidenciando como de exploração sexual.

Nas favelas, indica-se que há mulheres que aliciam e exploram sexualmente crianças da vizinhança e até seus próprios filhos. A iniciação das crianças na atividade começa bem cedo. Há muita promiscuidade: houve relatos de que há famílias, onde todos dormem no mesmo cômodo e as crianças, desde pequenas, presenciam cenas de sexo.Nesses casos, as crianças fatalmente começam a ser exploradas muito cedo (entre 7 e 8 anos de idade). Há relatos sobre mulheres que não residem na favela, mas que de lá retiram crianças sob a promessa de uma vida melhor. Algumas crianças simplesmente desaparecem. Crianças são forçadas a manter relações sexuais na rua e em casa.

Quanto aos meninos, houve relatos de que os mais velhos aliciam os menores nas ruas e os conduzem para serem explorados sexualmente por turistas argentinos.

Outro relato presente é o de adolescentes que optam por trabalhar cerca de 4 ou 5 anos na Argentina e no Chile em casas de prostituição ou Karaokês24. Depois retornam com algum dinheiro ou lá permanecem. Em relação ao Paraguai, as indicações são de que lá se prefere crianças mais novas, razão pela qual seja possível que muitas das crianças que desaparecem vão para o Paraguai.

Quando questionados sobre o que dificultaria o negócio de exploração sexual de crianças e adolescentes, é apontado o atendimento às necessidades evidenciadas na tabela referente ao que facilita esta exploração. Observe-se os aspectos citados com maior freqüência:

24 Estabelecimento comercial onde se pode fazer refeições e cantar músicas da própria

escolha.

72

FIGURA 49

Aspectos que dificultam a exploração sexual comercial infanto-juvenil

N: 54

12

11

9

8

5

2

1

1

1

1

1

1

1

0 2 4 6 8 10 12 14

Atividades de geração de renda

Atuação junto às famílias

Escola de período integral

Implementação de políticas sociais

Punição dos exploradores

Apoio às famílias e adolescentes

Implementação do ECA*

Combate à pobreza

Formação profissional

Fiscalização

Conscientização da sociedade

Programa de Combate as Drogas

Trabalho integrado entre escola, igreja e comunidade

Segundo um dos informantes, 70% da renda familiar é obtida pelas crianças e

adolescentes. É o quadro de pobreza que engendra a exploração das crianças: desemprego, baixa escolaridade, impunidade. As alternativas de reversão deste quadro apontam também para a necessidade primordial de atendimento às famílias dessas crianças, as quais têm pouca ou nenhuma escolaridade, muito menos formação profissional, e consideram correta ou “única alternativa” a utilização de seus filhos para o sustento familiar.

Há programas públicos de atendimento à famílias carentes e à crianças e adolescentes em situação de risco e exploradas em Foz do Iguaçu: o Programa de Apoio Sócio Familiar; o Programa da Rua para a Escola; o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil; o Programa S.O.S.; o Programa de Iniciação ao Trabalho e o Programa de Prestação de Serviços à Comunidade. O problema está na baixa cobertura à demanda existente. O atendimento não cobre as necessidades da população.

Na atuação da prevenção à exploração sexual de crianças e adolescentes é necessário considerar a sensibilização da comunidade, a sensibilização e capacitação de professores e funcionários de instituições, em especial a escolar, e a capacitação de adolescentes, cuja família já se tornou permeável à sensibilização da comunidade, incentivando assim o protagonismo juvenil.

73

As escolas podem desempenhar importante papel na orientação sexual, na prevenção de uso de drogas e de comportamentos violentos, além de poderem desenvolver nos meninos, um senso de estabilidade que perderam (KOLLER & HUTZ, 1996).

ROSEMBERG (1990) lembra a necessidade da escola considerar o modelo de família que é trazido pela criança e as instituições adequarem-se ao padrão das populações ditas especiais, oferecendo atendimento apropriado.

Tanto nos programas de apoio às crianças, como na prevenção, há necessidade imprescindível de estabelecer fortes vínculo com a comunidade. Esta é fundamental na formação de redes de apoio social às famílias e aos meninos(as). Cada comunidade deverá ser conscientizada de que tem capacidade e pode utilizar seus próprios recursos para desenvolver uma rede de proteção.

É preciso investir em educação, profissionalização e programas específicos de atendimento e promoção de desenvolvimento positivo no menino e em suas famílias. KOLLER & HUTZ (1996) apontam o empobrecimento econômico e afetivo das famílias dos meninos como causa de sua ida às ruas.

A reversão deste quadro requer um trabalho de conquista e de afeto, que permitirá a participação e a permanência dos meninos(as) em programas preventivos e de atendimento pelo desejo de serem considerados, ouvidos e de poderem expressar seus anseios e angústias. O grupo com o qual se trabalha deve caminhar na construção coletiva de regras que foram originadas das discussões e reflexões com os próprios participantes e que assim são assumidas conscientemente por todos.

5.2 SOBRE OS EXPLORADORES

Muitos dos pesquisados denunciam o envolvimento de autoridades, políticos, policiais

e estrangeiros na exploração sexual de crianças e na sua vinculação como o tráfico de drogas. Acreditam que não há como avançar sem ações efetivas de combate e sanção aos responsáveis. Não resolve se apenas se atua sobre a "oferta", protegendo as crianças. A maioria dos entrevistados concorda que é imperativo conter a "demanda". Combatendo e punindo severamente todos que estejam envolvidos na rede da exploração sexual comercial infanto-juvenil.

TABELA 38– O QUE PENSAM DOS EXPLORADORES

INIDICAÇÕES FREQÜÊNCIA (%) É uma atividade de sobrevivência na rua, porta de escola e que tem vinculação com drogas.

7 21,21

O aliciador é da própria família 5 15,15 A exploração está ligada a organizações internacionais de pedofilia e mafiosos.

3 9,09

As crianças e adolescentes moram juntos em favelas com amigos.

2 6,06

O aliciamento e exploração se realizam em boates, bares e pousadas.

2 6,06

É lucrativo para alguns grupos. 2 6,06 Os aliciadores são pessoas importantes e poderosas. 1 3,03 Uma criança mais velha explora a menor. 1 3,03 Não sabem 10 30,30 Total 33 100,00

74

. Indagados sobre quem dá proteção aos exploradores, os respondentes, apesar do temor

indicam o envolvimento da polícia e de autoridades que ocupam cargos públicos, políticos, empresários, juízes e donos de motéis e hotéis, além de traficantes.

TABELA 39 – QUEM PROTEGE OS EXPLORADORES

QUEM DÁ PROTEÇÃO FREQÜÊNCIA (%) Polícia 13 30,23 Não sabem 12 27,90 Autoridades locais 6 13,95 Setor Hoteleiro 3 6,97 Traficantes de drogas 3 6,97 Empresários 2 4,65 Donos de motéis 1 2,32 Motoristas de táxi 1 2,32 Prostitutas 1 2,32 Outros países 1 2,32 Total 43 100,00

Durante a coleta destes e outros dados relacionados aos exploradores foram freqüentes

as expressões designativas de medo e de conhecimento do poder de grandes grupos envolvidos na exploração de crianças e adolescentes. Observe-se alguns depoimentos:

“Não existe nada de concreto, há muito cuidado no falar”. “Alguém sempre avisa antes”. “Um protege o outro... Não sei como os chefes se protegem, na realidade a

comunidade não se envolve”. Quanto aos países envolvidos na exploração de crianças e adolescentes observa-se além

dos pertencentes à tríplice fronteira: Brasil, Argentina e Paraguai (citados por 21 informantes, sendo mais citados o Paraguai e o Brasil), também a menção a outros países da Europa e América do Norte (citados por 6 informantes). Segundo um dos informantes: “existem redes que aliciam para diferentes países do mundo”.

Ao serem indagados sobre quem são os exploradores, verificamos que há correspondência com a tabela referente aos que estariam ligados à proteção destes grupos.

75

FIGURA 50

Quem são os exploradoresN:57

21%

10.50%

8.70%

12.20%

7.00%

7.00%

5.26%

3.50%

3.50%

3.50%

7.01%

1.75%

1.00%

1.75%

1.75%

1.75%

1.75%

0% 5% 10% 15% 20% 25%

Traficantes de drogas

Policiais

Pais

Empresários

Prostitutas

Estrangeiros

Donos de boate

Adolescentes

Chineses

Árabes

Políticos

Donos de casa de massagem

Donos de hotéis

Cabeleireira

Autoridades

Caminhoneiros

Contrabandistas

As maiores indicações apontam para os traficantes de drogas. Os próprios pais também

têm indicação importante. E novamente os depoentes, também confirmam o envolvimento de empresários, policiais, autoridades e políticos na exploração sexual comercial de crianças e adolescentes. As repostas indicam que esta participação tanto ocorre na proteção a outros exploradores como, no envolvimento direto com a exploração.

Ao analisar as atividades apontadas pelos informantes como diretamente ligadas à exploração sexual de crianças há o evidente envolvimento com a atividade de tráfico de drogas, o que também justifica a poderosa rede de proteção.

76

FIGURA 51

Atividades vinculadas à ESCIN:27

33.30%

33.30%

18.51%

7.40%

3.70%

3.70%

0.00% 5.00% 10.00% 15.00% 20.00% 25.00% 30.00% 35.00%

Tráfico de drogas

Não responderam

Prostituição

Contrabando de armas

Trabalho escravo

Turismo sexual

5.3 CONCLUSÕES GERAIS

Como principais fatores de risco sócio-econômico tem-se a condição de pobreza

expressa: i) nas condições de moradia, populações que vivem em favelas onde as casas são muito precárias e muito pequenas para o número de habitantes, o que não permite o mínimo de privacidade; ii)na falta de emprego ou no emprego informal e iii) na escassez de alimento, vestuário e de satisfação das necessidades mais básicas.

Dentre os fatores de risco mental estão a situação de negligência a que as crianças são submetidas, caracterizada por falta de diálogo, falta de limites, falta de cuidado e de afeto. Outro aspecto é o reduzido acesso aos bens culturais e a exposição à violência física e psicológica. A ausência prolongada de um cuidador responsável pelo desenvolvimento e proteção das crianças, é fator de predisposição à exploração. Da mesma forma, quando a escola não corresponde às necessidades dessas crianças, quando o conteúdo trabalhado pela escola não apresenta significado para o universo infantil, tem-se nesta não um fator de proteção, mas de risco à exploração. Observa-se igualmente que famílias numerosas, com muitas crianças; famílias cujos membros não contam com qualificação profissional e que apresentam renda mensal insuficiente à satisfação de suas necessidades; famílias que se caracterizam pela ausência do pai, a presença de alcoólicos e dependentes químicos como

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cuidadores estão entre os fatores que também predispõem à exploração de crianças e adolescentes. Também como fator de risco familiar foi apontado o abuso sexual ou a iniciação sexual por membros da própria família ou da sua confiança.

As informações coletadas apontam para a existência de redes de tráfico de crianças, adolescentes e mulheres nessa região. Evidências testemoniais indicam que estas redes se vinculam ao tráfico de drogas, de armas e a grupos vinculados ao crime organizado. Há indicativos de que Foz do Iguaçu faça parte da rota do tráfico internacional de drogas. Nas áreas onde as entrevistas foram realizadas, a maconha é algo corriqueiro. Frequentemente os jornais locais divulgam notícias sobre a apreensão de grandes quantidades de drogas.

O temor de falar e o medo foram aspectos comuns aos três grupos pesquisados. Uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) e um Fórum foram realizados e nada se modificou. A população sabe exatamente o que pode e o que não pode falar. Chegar a essas redes, desativá-las, ou inibir sua participação na exploração sexual de crianças e adolescentes exige uma ação articulada e com participação dos grupos de inteligência de uma polícia internacional. Além disso, é preciso considerar que as pessoas só falam se houver um forte esquema para proteger as testemunhas. Foram relatados muitos casos de ameaças e morte de crianças, adolescentes e adultos que fizeram denúncias anteriormente. Fato que também corrobora este aspecto é a inexistência de outros estudos sobre o tema na área ora investigada. Alguns afirmaram que as tentativas de pesquisas na área foram sempre desestimuladas. Há uma grande preocupação em negar até mesmo a existência de prostituição adulta. Percebe-se que o tema é praticamente um tabu. O que parece indicar a necessidade de preservar uma imagem que não afete o setor turístico. Nesse aspecto, apesar de se ter encontrado referências ao turismo sexual, as maiores evidências apontam para a vinculação com o crime organizado, especialmente o tráfico de drogas.

5.3.1 AS DIFERENTES EXPRESSÕES DA ESCI NA ÁREA

Como resultado da análise da visão dos informantes-chaves, das famílias e das crianças

classificou-se em quatro níveis distintos as atividades de exploração sexual comercial infanto-juvenil em Foz do Iguaçu. Estes níveis estão interligados não só pela atividade de exploração sexual comercial, mas também pela atividade do tráfico de drogas e pela presença de aliciadores:

Primeiro nível: é o de maior pobreza e miséria. Constitui-se de crianças e adolescentes

que vendem doces, passam “muamba”25 na ponte, esmolam, além de fazerem carícias a pedido de clientes e de oferecerem o próprio corpo por pouco dinheiro. Neste nível observa-se também muito claramente o uso de drogas e a participação dos meninos no tráfico de drogas, sobretudo como olheiros26. Trabalham só nas ruas e pode-se afirmar que fazem qualquer coisa para sobreviver. “Apanham se não trazem dinheiro para casa”. São freqüentes os casos de iniciação e abuso sexual por parte de padrasto, vizinho ou conhecido da família. Algumas vezes a própria família é a aliciadora, seja na figura da mãe, padrasto, tio, tia e outros. Outras vezes é um colega, adolescente mais velho ou mesmo um adulto, como observaram-se casos de mendigos aliciadores de meninos e meninas, mulheres que aliciam crianças e adolescentes para trabalharem em Foz do Iguaçu, outros Estados ou outros países como Paraguai, Argentina e Chile. A promessa é de emprego de doméstica e dinheiro, mas na realidade envolve exploração sexual. Aqui estão reunidas donas de casa, cabeleireiras, prostitutas e

25 Mercadoria contrabandeada. 26 Ver nota 2

78

proprietários de prostíbulos que recebem em torno de US$ 100,00 por cada criança aliciada. Também são usados jovens para seduzir meninas na porta da escola. O aliciamento se dá via relação afetiva, namoro que acaba em rede de exploração sexual. Há relatos de aliciamento de meninos para serem explorados sexualmente por turistas argentinos. Pode-se citar como regiões que abrangem o primeiro nível a região em torno da área central: Jardim Jupira, próximo à Ponte da Amizade; Av. Juscelino Kubitschek; Av. Costa e Silva; Av. Brasil; Av. Paraná; República Argentina com Almirante Barroso; Rua Jorge Shimmelpfeng; Rua Engenheiro Rebouças; Av. Tancredo Neves.

Houve relatos denunciando o aliciamento de crianças na porta de escolas próximas a Cidade Nova, Morumbi, Jardim Jupira e Porto Meira. E indicações de seqüestro de crianças em escola ou de crianças que desaparecem na Vila C.

Segundo nível: crianças e adolescentes que trabalham nas ruas fazendo programas27 e repassando drogas. As observações indicam aqui que a atividade de exploração sexual é o veículo para o tráfico de drogas. Vivem ou com amigos na favela ou em motéis, pensões ou na própria família, que geralmente desconhece sua atividade nas ruas. Muitos conseguem sustentar a família com esta atividade, visto ser mais rentável que outras atividades sem qualificação profissional.

Este nível é se expressa mais nas seguintes áreas: a Av. Costa e Silva; Av. Brasil; Av. Juscelino Kubitschek; Rua Jorge Shimmelpfeng; Av. República Argentina; Av. Paraná; Rua Engenheiro Rebouças e Av. Tancredo Neves.

Terceiro nível: crianças e adolescentes que trabalham sendo exploradas sexualmente em pequenas casas de prostituição, pousadas, pequenos hotéis e bares. Geralmente residem no próprio local de trabalho. Muitas trabalham também na rua. A droga pode ser obtida nestas casas e na rua.

O terceiro nível expressa-se com maior evidência nas áreas da CODAPAR; região do CTG Charrua, na BR 277 e na Rua Jorge Shimmelpfeng. Além destes, podem ser citados bares, lanchonetes, pousadas e casas de prostituição clandestina nos bairros: Porto Meira, Cidade Nova, Morumbi, São Francisco, Três Lagoas, Parque Presidente.

Como características gerais comuns a estes três níveis observa-se: a idade varia predominantemente de 08 a 18 anos, estando na faixa etária dos 10 aos 17 a idade de maior freqüência. Envolve meninos e meninas. Geralmente possuem algum grau de instrução acima da 2ª série do ensino fundamental e muitos freqüentam a escola. Esta também pode ser a razão de uma das formas de aliciamento ser na porta da escola. Trabalham todos os dias e quando solicitados. Não há um horário preciso de término da atividade. O trabalho segue enquanto houver demanda e alguns informam que alcançam 19 horas diárias. Freqüentemente as crianças iniciam em torno de 8 anos a serem exploradas sexualmente. Há muitos casos de iniciação sexual na própria família. Essas crianças advêm normalmente de regiões periféricas de Foz do Iguaçu, onde residem com a família, amigos ou no próprio local de trabalho.

Quarto nível: crianças e adolescentes de classe média que trabalham exploradas sexualmente em boates, grandes casas de prostituição, hotéis de médio e grande porte. São aliciadas a partir de agências de modelo e de fotografia.

São solicitadas por meio de books fotográficos ou a partir de desfile para clientes. Nem chegam a saber quem realmente fez o contato com o cliente. Não há indício de um local de agenciamento. Apenas o “book” concentra todas as meninas e adolescentes. Há indicação de que estas meninas trafiquem drogas para a Europa. Seus documentos são alterados para atingirem a maioridade.

27 Ver nota 18

79

Deste quarto nível obteve-se o menor número de informações. Este nível é mais observado nas seguintes áreas: a região da AKLP; a do Beverly Falls Park; a da Av. das Cataratas e a da Vila A.

5.4 RECOMENDAÇÕES

5.4.1 Nas Políticas

Na formulação e implementação de políticas para eliminar e prevenir a exploração

sexual comercial de crianças considera-se como fatores importantes: � A sensibilização da sociedade: escola, igrejas, movimentos sociais, sindicatos,

polícia, meios de comunicação, órgãos do governo, empresários, na formação de uma rede articulada contra a exploração sexual de crianças e adolescentes. O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente precisa ser melhor divulgado e compreendido pela sociedade.

Neste programa de sensibilização é preciso dar especial atenção às pesquisas realizadas que apontam para a abrangência e complexidade do fenômeno, o qual apresenta semelhanças e especificidades em cada região. Dentro da própria realidade de Foz do Iguaçu observa-se a exploração sexual com características diversas dependendo da área focalizada.

� Realização de campanhas específicas denunciando esse crime e divulgando os diferentes tipos de penalidades que podem ser aplicadas aos exploradores.

� É imperioso articular as ações governamentais com as não- governamentais formulando diretrizes para a prevenção e eliminação da ESCI, definindo uma prática comum consistente. Somente uma rede articulada de combate pode fazer frente à rede de aliciamento e exploração de crianças.

� Criação de um serviço de disque-denúncia onde não haja risco para quem quiser denunciar essa forma de exploração. Simultaneamente deve-se desenvolver um sistema multidisciplinar e multisetorial de fiscalização com `blitz´ regulares nos lugares suspeitos.

� Considera-se fundamental o fortalecimento do Conselho de Direitos das Crianças, como formulador de políticas e do Conselho Tutelar, como órgão de garantia de direitos das crianças e adolescentes. Bem como, dos Centros de Defesa que têm um importante papel na construção da cidadania. Outro aspecto de especial relevância é a promoção do protagonismo juvenil nas ações voltadas ao combate à exploração sexual.

� Todo e qualquer programa deve se valer do levantamento detalhado de dados da realidade e características da exploração sexual na área onde irá atuar. Deverá também contar com integrantes da própria comunidade em seu planejamento e execução, assim como especialistas nas grandes frentes de combate. A discussão com diversos segmentos da comunidade sobre aspectos gerais de exploração sexual de crianças e específicos da área em que se vai atuar, deverá possibilitar maior comprometimento dos integrantes da região com os problemas que lhe são próprios e no levantamento de recursos e estratégias para a sua solução.

� Um aspecto bastante evidente em Foz do Iguaçu refere-se à impunidade e ao envolvimento de pessoas que ocupam cargos públicos, policiais, políticos e outros, além de redes internacionais na exploração sexual de crianças e adolescentes. Depoimentos indicam que tais pessoas garantem proteção a esta

80

atividade e não têm interesse no combate e punição dos responsáveis. O desvelamento das intrincadas redes que envolvem autoridades é imprescindível para a implementação de políticas que objetivem a eliminação e prevenção da exploração sexual.

� Realizar um trabalho específico junto às escolas, assegurando policiamento ostensivo e preventivo para inibir a atuação de traficantes e aliciadores. As escolas devem ter campanhas específicas sobre prevenção da ESCI e prevenção de drogas.

� Trabalhar com as famílias articulando-as à comunidade e à escola no sentido de reversão da “cultura de exploração” de crianças e adolescentes. A instalação de uma rede de apoio social às famílias deve partir de agentes da própria comunidade. Requer-se, portanto, o estímulo à capacidade de organização da comunidade, cursos de capacitação para o trabalho integrado com a escola e famílias.

� Os centros de atendimento à criança e ao adolescente devem voltar-se às necessidades de crianças e adolescentes explorados sexualmente. O trabalho deve centrar-se em atividades de desenvolvimento da auto-estima e de iniciação à profissionalização. Atividades esportivas, de lazer, recreação e culturais, além de profissionalizantes, deverão desenvolver nesta criança uma nova expectativa de vida e de futuro.

� Investimento na capacidade de produção de Foz do Iguaçu. Fomentar políticas que objetivem a geração de empregos e de renda.

� Estimular e atrair iniciativas de produção de pequenos, médios e grandes produtores da região. Desenvolver o potencial de produção de determinadas regiões mediante a exploração de seus recursos físicos e humanos. Promover a criação de cooperativas a partir da discussão da vocação das comunidades.

� Investimento em cursos profissionalizantes para adultos e adolescentes, adequados às necessidades da região. Objetiva-se incidir sobre uma das causas da exploração de crianças e adolescentes: a falta de capacitação para o emprego de adultos e adolescentes.

Como atitudes sociais que podem dificultar a operacionalização de políticas de proteção pode-se citar a desarticulação entre as ações de diversos setores que visam o combate à exploração sexual; a denunciada vinculação de autoridades com a rede de aliciamento e exploração; a exacerbação da subjetividade, do consumo e do prazer pelos meios de comunicação. O descomprometimento, a omissão e a falta de conhecimento da sociedade civil em relação à exploração sexual; o desconhecimento da região onde se pretende atuar; a falta de um juizado atuante no encaminhamento dos processos envolvendo exploradores de crianças e adolescentes.

Também pode-se citar o legislativo como dificultando a proteção quando há excessiva demora na aprovação dos projetos voltados à proteção de crianças e adolescentes vitimados sexualmente.

As possibilidades concretas de resgatar essas crianças e adolescentes da exploração sexual, bem como de prevenir que outras se envolvam nesta rede, depende da observância dos aspectos discutidos durante todo este trabalho.

Os recursos humanos e financeiros de Foz do Iguaçu não são poucos e deveriam ser mais destinados à área social. A rede de exploração sexual comercial é poderosíssima e caracteriza-se pela mudança de estratégia de atuação. Nas denúncias, quando a polícia chega ao local de exploração, não há mais evidências desta atividade. Não se conseguem provas, principalmente sobre a exploração em boates, hotéis, pousadas, etc. Já foram feitas

81

intervenções (CPI, Fórum) e não foi evidenciado nenhum princípio de desmobilização. Ao lado do trabalho articulado, envolvendo toda a sociedade, há a necessidade de investigação, garantia de vida às testemunhas e rigorosa punição de exploradores.

5.4.2 Atenção direta às crianças e adolescentes

Como medidas que possibilitariam a reabilitação de crianças e adolescentes explorados

sexualmente ressalta-se a necessidade de políticas públicas de geração de renda; atividades de profissionalização de adultos e adolescentes; atendimento especializado a crianças e adolescentes explorados sexualmente; trabalhos envolvendo a comunidade e as famílias; a opção de escola em tempo integral com alternativas de atividades para crianças e adolescentes envolvendo esporte, lazer, trabalhos com música, artes plásticas, estimulação do protagonismo juvenil. É preciso atuar com os recursos que a comunidade dispõe para enfrentamento da realidade. É preciso desenvolver a capacidade de iniciativa e de organização de grupos da sociedade civil. Além destas medidas, o combate severo à exploração e aliciamento de crianças, bem como ao tráfico de drogas é fundamental, pela íntima ligação deste com a exploração.

Como proposições sobre políticas de prevenção sugere-se o trabalho envolvendo a integração escola, família e comunidade, ao lado de políticas públicas que enfoquem a geração de empregos e renda, a promoção da infância e adolescência, a ampliação das áreas de esporte e lazer, qualificação das escolas através conteúdos relevantes e significativos; centros especializados de desenvolvimento de atividades para crianças e adolescentes, voltados à saúde, desenvolvimento da auto-estima, promoção da vida e prevenção à exploração sexual comercial e uso de drogas. Reitera-se a necessidade de combate e punição ao tráfico de drogas e às redes de aliciamento e exploração de crianças e adolescentes como forma de prevenção. Há também a necessidade de criação do Conselho Municipal Anti-Drogas para implementação de política local na área de repressão, prevenção e tratamento.

Além destas, seria interessante resgatar as propostas apontadas na I Conferência Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente realizada em 2001 em Foz do Iguaçu.

Quanto às estratégias necessárias para retirar crianças e adolescentes desta exploração recomenda-se:

� Renda mensal para a família que mantiver seus filhos na escola e comprovar sua assiduidade.

� Educação em tempo integral. � Investimento em atividades de lazer e esportivas. � Centro de atendimento a crianças e adolescentes voltados às suas necessidades, à

construção de um projeto de vida, expectativas de futuro. Atividades que promovam desenvolvimento da auto-estima e a capacidade de organização de grupos a partir de necessidades comuns.

� Combate e punição de grupos envolvidos com o tráfico de drogas e com a exploração sexual de crianças.

� Ensino profissionalizante. � Atividades de geração de renda para os responsáveis por estas crianças. � Trabalho com as famílias de crianças exploradas sexualmente, articulado à

comunidade e à escola e contando com a participação de agentes da própria comunidade.

� Apresentação e aprovação de Projeto de Lei que permita o fechamento de estabelecimentos que facilitem ou promovam a exploração sexual comercial de crianças e adolescentes.

82

Divulgação constante na mídia de dados sobre a exploração sexual comercial de crianças no Brasil e da necessidade de comprometimento dos diferentes setores da sociedade na sua coibição, visto ser crime. Divulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente pela mídia como política de direitos.

As prioridades centram-se em uma política de geração de renda e emprego, educação integral, ensino profissionalizante, punição aos exploradores e na articulação escola-família-comunidade para a prevenção e reabilitação de crianças e adolescentes vitimadas pela ESCI.

A atuação do IPEC pode estar vinculada à construção de uma rede de articulação entre entidades governamentais e não-governamentais que trabalham com crianças e adolescentes. Também vemos a atuação do IPEC na formulação de programas de reabilitação e prevenção e na capacitação de profissionais para o trabalho na comunidade, escola e famílias.

83

Referências biliográficas

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84

SPRANDEL, M.A. A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes na legislação brasileira – lacunas e recomendações. Manuscrito inédito, OIT – IPEC, 2002.

85

Anexo - Roteiro das entrevistas

INFORMANTES-CHAVES

Nome:

Idade:

Sexo:

Local de trabalho:

Função:

1) Quais os locais que você considera como de maior índice de exploração sexual de crianças?

2) Desde de quando começaram a aparecer estes lugares? 3) Como você acha que funcionam estes locais que exploram crianças? 4) Como você acha que se organizam esses grupos de exploradores? 5) Como você acha que estes grupos se protegem? 6) Quais países estariam envolvidos na exploração de crianças? 7) Quem são esses exploradores? Que outras atividades estariam ligadas à exploração de

crianças? 8) Qual a média de idade que a criança se inicia nesse negócio? Qual a idade média das

crianças que estão trabalhando? 9) O que você acha que facilita o negócio da exploração sexual de crianças e

adolescente? 10) O que você acha que pode dificultar, reduzir e até eliminar a exploração de crianças e

adolescente? 11) Por que você acha que tem tanta criança e adolescente sendo explorada sexualmente? 12) O que Foz do Iguaçu oferece como alternativa de atividade para essas crianças e

adolescentes que são explorados sexualmente? 13) O que você acha que a política local na área da infância e da adolescência está fazendo

para proteção dessas crianças e adolescentes? O que você acha que pode ser feito?

Famílias Nome:

Idade:

Sexo:

Posição na família:

Local de origem:

86

1) Vocês são de Foz do Iguaçu? Se não são, vieram de onde? E por que? 2) Quantas pessoas moram aqui? Quantas crianças? 3) Quem trabalha na família? 4) Por que seu filho (a) começou a trabalhar? 5) Quantas horas trabalham e em que? 6) Quem é o patrão de seu filho(a)? 7) Como é este patrão e o que ele faz? 8) Como ele conseguiu este emprego e desde quando ele trabalha neste emprego? 9) Qual a renda média da família? 10) Já teve algum problema sério de saúde na família? 11) Alguém faz uso de drogas ou álcool na sua família? 12) Seus filhos estudam? Por que não estudam? 13) Algum membro da família já sofreu algum tipo de violência? 14) Participa de algum programa de auxilio da sua comunidade? Recebe auxilio de alguma

instituição? Freqüenta algum grupo de igreja , de apoio? 15) Qual a maior dificuldade que a família já enfrentou? Obteve ajuda? De quem? 16) Como você vê o trabalho de seu filho ? 17) O que poderia ser feito para que as crianças não precisassem trabalhar? 18) Que tipo de programas poderia ser criado neste sentido

Crianças e Adolescentes

Iniciais:

Idade:

Sexo:

Origem:

1) Com quem você mora? Quem cuida de você/ Tem filhos? Tem namorado? 2) Alguém da sua família trabalha? Quanto ganha em média? 3) Como é o seu trabalho? Por que você trabalha nesta atividade? 4) Onde você trabalha? Quantas horas? Desde quando? 5) Quanto você recebe? O que você faz com este dinheiro? 6) Já tiraram fotos ou filmaram você enquanto trabalhava? 7) Quem é o responsável por você no trabalho? O que faz seu patrão? 8) Como você se dá com seu patrão? 9) Como você se dá com seus clientes? Já teve problemas? 10) Aonde você mora ? E por que? 11) Você está freqüentando a escola? Em que série? (se parou de estudar, por que parou?

É alfabetizado?) 12) Como você chegou a este trabalho/ com que idade começou? Aonde? Como? 13) O que você acha deste trabalho? 14) Sua família sabe que você trabalha aqui? Por que? 15) Você já ficou doente? De que ficou doente e que lugares e pessoas procurou? Como

foi atendido? 16) Você usa ou já usou drogas? Quando? Ainda usa? 17) Que tipo de droga? Quando foi a última vez que usou?

87

18) Você consome álcool com freqüência? 19) Você já fez teste de AIDS? 20) Você usa camisinha sempre, às vezes ou nunca? 21) Você já foi vítima de violência? Se foi, por quem? Quando? 22) O que você gostaria de aprender, de estudar? 23) Você gostaria de mudar de trabalho? Por quê? 24) O que você acha que poderia ser feito para que você venha a ter outra atividade em sua

vida?

88