interaÇÕes, brincadeiras e relaÇÕes...

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INTERAÇÕES, BRINCADEIRAS E RELAÇÕES INTERPESSOAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL Este texto faz parte de uma coletânea, organizada pelo Ministério da Educação, que constitui material para formação continuada de profissionais da Educação Infantil de todo o território nacional, tanto para aqueles que atuam diretamente no trabalho com as crianças nas instituições, quanto para os coordenadores pedagógicos, gestores e técnicos que têm como responsabilidade e compromisso implementar processos formativos junto aos professores. Trata-se de uma adaptação e atualização do material produzido originalmente pelo MEC para o Proinfântil - Programa de Formação Inicial de Professores em Exercício na Educação Infantil. Esse material, mesmo tendo sido estruturado para atender às exigências de um processo de formação inicial, já vinha sendo utilizado por universidades e por equipes técnicas de vários municípios para formação continuada de profissionais, em função de sua qualidade e pelo fato de promover uma fácil interlocução com os professores que atuam na Educação Infantil. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil DCNEI - , ao explicitarem as formas como deve se concretizar o currículo nessa etapa da Educação Básica, definem em seu Art. 9º que: As práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação Infantil devem ter como eixos norteadores as interações e a brincadeira, garantindo experiências que: I - promovam o conhecimento de si e do mundo por meio da ampliação de experiências sensoriais, expressivas, corporais que possibilitem movimentação ampla,expressão da individualidade e respeito pelos ritmos e desejos da criança; II - favoreçam a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o progressivo domínio por elas de vários gêneros e formas de expressão: gestual, verbal, plástica, dramática e musical; III - possibilitem às crianças experiências de narrativas, de apreciação e interação com a linguagem oral e escrita, e convívio com diferentes suportes e gêneros textuais orais e escritos; IV - recriem, em contextos significativos para as crianças, relações quantitativas, medidas, formas e orientações espaçotemporais; V - ampliem a confiança e a participação das crianças nas atividades individuais e coletivas; VI - possibilitem situações de aprendizagem mediadas para a elaboração da autonomia das crianças nas ações de cuidado pessoal, auto-organização, saúde e bem-estar; VII - possibilitem vivências éticas e estéticas com outras crianças e grupos culturais, que alarguem seus padrões de referência e de identidades no diálogo e reconhecimento da diversidade; VIII - incentivem a curiosidade, a exploração, o encantamento, o questionamento, a indagação e o conhecimento das crianças em relação ao mundo físico e social, ao tempo e à natureza; IX - promovam o relacionamento e a interação das crianças com diversificadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas, cinema, fotografia, dança, teatro, poesia e literatura; X - promovam a interação, o cuidado, a preservação e o conhecimento da biodiversidade e da sustentabilidade da vida na Terra, assim como o não desperdício dos recursos naturais; XI - propiciem a interação e o conhecimento pelas crianças das manifestações e tradições culturais brasileiras;

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INTERAÇÕES, BRINCADEIRAS E RELAÇÕES

INTERPESSOAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Este texto faz parte de uma coletânea, organizada pelo Ministério da Educação, que constitui material para formação continuada de profissionais da Educação Infantil de todo o território nacional, tanto para aqueles que atuam diretamente no trabalho com as crianças nas instituições, quanto para os coordenadores pedagógicos, gestores e técnicos que têm como responsabilidade e compromisso implementar processos formativos junto aos professores. Trata-se de uma adaptação e atualização do material produzido originalmente pelo MEC para o Proinfântil - Programa de Formação Inicial de Professores em Exercício na Educação Infantil. Esse material, mesmo tendo sido estruturado para atender às exigências de um processo de formação inicial, já vinha sendo utilizado por universidades e por equipes técnicas de vários municípios para formação continuada de profissionais, em função de sua qualidade e pelo fato de promover uma fácil interlocução com os professores que atuam na Educação Infantil. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil – DCNEI - , ao explicitarem as formas como deve se concretizar o currículo nessa etapa da Educação Básica, definem em seu Art. 9º que: As práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular da Educação Infantil devem ter como eixos norteadores as interações e a brincadeira, garantindo experiências que: I - promovam o conhecimento de si e do mundo por meio da ampliação de experiências sensoriais, expressivas, corporais que possibilitem movimentação ampla,expressão da individualidade e respeito pelos ritmos e desejos da criança; II - favoreçam a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o progressivo domínio por elas de vários gêneros e formas de expressão: gestual, verbal, plástica, dramática e musical; III - possibilitem às crianças experiências de narrativas, de apreciação e interação com a linguagem oral e escrita, e convívio com diferentes suportes e gêneros textuais orais e escritos; IV - recriem, em contextos significativos para as crianças, relações quantitativas, medidas, formas e orientações espaçotemporais; V - ampliem a confiança e a participação das crianças nas atividades individuais e coletivas; VI - possibilitem situações de aprendizagem mediadas para a elaboração da autonomia das crianças nas ações de cuidado pessoal, auto-organização, saúde e bem-estar; VII - possibilitem vivências éticas e estéticas com outras crianças e grupos culturais, que alarguem seus padrões de referência e de identidades no diálogo e reconhecimento da diversidade; VIII - incentivem a curiosidade, a exploração, o encantamento, o questionamento, a indagação e o conhecimento das crianças em relação ao mundo físico e social, ao tempo e à natureza; IX - promovam o relacionamento e a interação das crianças com diversificadas manifestações de música, artes plásticas e gráficas, cinema, fotografia, dança, teatro, poesia e literatura; X - promovam a interação, o cuidado, a preservação e o conhecimento da biodiversidade e da sustentabilidade da vida na Terra, assim como o não desperdício dos recursos naturais; XI - propiciem a interação e o conhecimento pelas crianças das manifestações e tradições culturais brasileiras;

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XII - possibilitem a utilização de gravadores, projetores, computadores, e outros recursos tecnológicos e midiáticos. (BRASIL,CEB/CNE,2009)(grifo nosso)

Ao definirem que as interações e a brincadeira devem se constituir como eixos norteadores da proposta curricular da Educação Infantil, garantindo toda essa gama de experiências, as DCNEI trazem a concepção de que essas são as formas privilegiadas de as crianças de até cinco anos aprenderem e se desenvolverem. Reafirmando essa concepção, discutiremos neste fascículo alguns fundamentos teóricos e práticas pedagógicas que contribuem para a compreensão do(a) professor(a) quanto à importância de considerar esses eixos no seu trabalho junto às crianças. Assim, partiremos da idéia de que as interações sociais são fundamentais ao desenvolvimento do ser humano: é nas relações com o “outro” – com adultos, jovens e com seus pares – que as crianças constroem conhecimento e vão se constituindo como sujeitos numa cultura. Portanto, para se desenvolver, a criança precisa, necessariamente, de parceiros sociais.

Discutiremos o brincar como uma forma muito intensa de interação entre as crianças, reconhecendo que esta é uma das atividades fundamentais para o desenvolvimento das crianças pequenas. Ao brincar, as crianças exploram e refletem sobre a realidade e a cultura na qual vivem, incorporando e, ao mesmo tempo, questionando regras e papéis sociais. Invenção, criatividade, conhecimento de mundo estão implicados no ato de brincar. Outro aspecto fundamental que destacaremos nesse texto diz respeito ao papel da creche e da pré-escola no incremento de relações afetivas e éticas entre as crianças. Acreditamos que essas relações vão se concretizar nas múltiplas interações e brincadeiras vivenciadas no cotidiano dessas instituições, as quais podem se tornar espaços bastante propícios tanto para o desenvolvimento dos laços de afetividade e de amizade, quanto para a formação de valores relativos à paz e à solidariedade. É necessário destacar, entretanto, que maiores ou menores possibilidades de aprendizagem e desenvolvimento das crianças numa instituição de Educação Infantil vão depender da qualidade e da intencionalidade das interações e brincadeiras ali vivenciadas e das relações que vão permear essas experiências. Nesse sentido, cabe-nos perguntar:

interações e brincadeiras vivenciadas no espaço da Educação Infantil contribuam de fato para que as crianças aprendam e se desenvolvam, formando-se como sujeitos afetivos e éticos, produtores de cultura? Essa é a grande questão sobre a qual buscaremos refletir nesse texto.

1- A interação como um dos eixos norteadores da proposta curricular da Educação Infantil 1-1- O papel das interações no desenvolvimento humano Existem várias teorias que discutem o desenvolvimento humano. Independentemente das ideias que norteiam essas diferentes teorias, cada uma delas aponta para uma maior ou menor importância das interações das crianças com os adultos e com outras crianças para esse desenvolvimento.

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Cada vez mais, no entanto, o desenvolvimento tem sido pensado a partir da noção de que o ser humano é biologicamente cultural, em que pessoa e ambiente são mutuamente determinados. Buscar uma prática que considere o ser humano nesse sentido requer uma reflexão constante e um planejamento que vise contribuir para promoção de interações com as crianças e entre as crianças; além da compreensão de que desde os primeiros meses de vida as crianças são participantes nos processos de construção das relações, do desenvolvimento e do meio, devendo-se valorizá-las e reconhecê-las como parceiros ativos. Se olharmos nossa história de vida, perceberemos que, desde o nascimento, estamos envolvidos em uma teia de relações, como evidencia esse trecho da música “Para Todos”, do compositor e cantor Chico Buarque: “O meu pai era paulista, meu avô pernambucano, meu bisavô mineiro, meu tataravô baiano, meu maestro soberano É Antônio brasileiro...” Cada um de nós possui uma história de vida que é marcada por experiências e relações que estabelecemos com as pessoas ao nosso redor, pois: Enquanto sujeito social e histórico que é, a criança não pode ser jamais confundida, identificada ou reduzida a uma etapa de desenvolvimento; ela não pode ser percebida apenas como um sujeito em crescimento, em processo, que irá se tornar alguém um dia (quando deixar de ser criança e virar adulto...). Ela é alguém hoje, em sua casa, na rua, no trabalho, no clube, na igreja, na creche, na pré-escola ou na escola, construindo-se a partir das relações que estabelece em cada uma dessas instâncias e em todas elas. (JOBIM, SOUZA e KRAMER, 1991) Nesse processo de desenvolvimento, a família ou os adultos que destinaram cuidados à criança nos primeiros meses de vida são responsáveis por aprendizagens fundamentais para a sua vida em sociedade. A criança como um ser social e histórico, ou seja, a criança como alguém que é hoje e se relaciona com diferentes instâncias sociais (em sua casa, na rua, na igreja, no clube, na creche, na pré-escola, na escola), vai se constituindo como sujeito a partir dessas relações. De um modo especial, as pessoas com as quais ela conviveu em seus primeiros anos de vida são muito importantes na sua constituição (que inclui tanto os familiares quanto outras pessoas, como é o caso de alguns bebês que passam a maior parte do tempo convivendo na creche com as professoras e demais profissionais que ali atuam). É por meio do contato com esse grupo de pessoas que as crianças desenvolvem as primeiras aprendizagens: os primeiros passos, as primeiras palavras, o comer com talheres ou não, o vestir-se desta ou daquela forma, lembrando-nos que essas aprendizagens estão interligadas à diversidade cultural na qual as crianças estão inseridas. Conforme crescemos, ampliamos as possibilidades de interação com outros grupos: a escola, as igrejas, as associações, o trabalho etc. Essas instâncias sociais são tão importantes em nossa vida quanto o(s) grupo(s) com o(s) qual(is) estabelecemos as primeiras interações. Ao estabelecer relações com diferentes grupos, temos a oportunidade de ampliar nossos conceitos sobre o mundo, além de praticarmos a vida

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em sociedade. É por meio das interações com os diferentes grupos que nos apropriamos dos diversos modos de pensar, de ser e de agir de uma cultura. Existem formas próprias para estarmos em cada um dos grupos que ocupamos socialmente. Nosso comportamento no trabalho normalmente é diferente daquele que temos em casa, como também, muitas vezes, o modo de falar muda em função do grupo em que estamos. Assim, nossa identidade é fruto das relações que estabelecemos com os outros. Em cada grupo assumimos um lugar, desempenhamos um papel, encontramos uma forma de estar que constitui nossa maneira de ser. Um grupo se reúne em função de objetivos e se constrói na constância, na permanência.

Os grupos sociais, dos quais fazemos parte ao longo de nossas vidas, são de grande importância para nossa formação. Dentre esses grupos, a escola tem um papel destacado, pois é um espaço de formação sistemática que contribui diretamente para a vida em sociedade. Devemos considerar que, para muitas crianças, a entrada na escola representa os primeiros passos fora dos cuidados e da atenção familiar. Desse modo, dentro do processo de aprendizagem sobre o mundo, podemos dizer que a escola (e para criança de 0 a 5 anos, em especial a creche e a pré-escola) tem um papel fundamental. Ela é um local privilegiado de trocas e aprendizagens. A forma de organização da escola, onde a criança permanecerá durante um tempo significativo da sua vida, favorece a convivência em grupo. Assim, podemos concluir que, em família ou em outros espaços, não estamos sozinhos! Há sempre alguém que eu vejo que é diferente de mim, mas que se volta para mim para me dizer quem eu sou. O outro, ou seja, os adultos e as crianças com quem convivemos têm um importante papel na nossa formação. Ao longo da nossa vida, nos acontecimentos cotidianos, realizamos várias aprendizagens ao nos relacionarmos com o outro (criança, jovem, adulto).

1-2 O papel das interações no ambiente escolar

Como já foi dito, a instituição de Educação Infantil e a escola têm um importante papel na socialização das crianças. Por ser um espaço institucional, possui uma organização que requer a freqüência das crianças. Nessas instituições, a criança terá que conviver com outras crianças e adultos por um período de tempo predeterminado, terá que exercitar a tolerância, a espera, o respeito, bem como deverá aprender a negociar seus desejos. A escola é um

espaço de socialização por excelência. Nela, a criança fará parte de um grupo. Para muitos, esse é o único local de encontro com outras crianças. Vejamos, a seguir, a situação vivenciada em uma creche: Brincando no pátio Dois meninos de dois anos brincavam no pátio da creche em um brinquedo grande de plástico em forma de castelo. No brinquedo havia uma escada que dava acesso a um platô onde havia um escorregador. Um dos meninos se encontrava no platô e o outro estava apoiado na escada, tentando subir. O menino que estava no alto chamou: – Vem, sobe. Ao que o outro respondeu: – Eu não sei. O menino insistiu: – Sobe. O menino que estava embaixo pediu ajuda para a professora. Ela se aproximou e estimulou a criança, através da fala, a superar o obstáculo da subida. Com a

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ajuda da professora e o estímulo do amigo, ele consegue subir. Após o encontro dentro do castelo, os dois meninos escorregam e voltam imediatamente para a escada para subir novamente. A cena se repete: – Vem, sobe. – Eu não sei. – Mas você já subiu, você sabe sim! O menino vai então refazendo o caminho anterior, pondo a mão, equilibrando e apoiando o corpo até chegar a um ponto onde alcança a outra criança, que lhe estende a mão e o ajuda. Para melhor compreendermos a situação acima e explicitarmos o valor das interações no cotidiano escolar, vamos recorrer às teorias de alguns autores considerados interacionistas nas suas formas de conceber o desenvolvimento humano. Um deles é Piaget que, em sua teoria, afirma que o processo de conhecimento tem início com o desequilíbrio entre o sujeito e a sua realidade. São apresentados problemas ou desafios para o sujeito, gerando um desequilíbrio. Este desequilíbrio leva o sujeito a agir com o propósito de restabelecer o equilíbrio. É na mudança de estruturas, que ocorre quando a criança busca esse equilíbrio, que reside a construção do conhecimento.O desequilíbrio pode ser gerado por um objeto ou pela interação com outras pessoas. Os(as) professores(as) fazem isso de forma mais intencional, quando propõem problemas para as crianças solucionarem, como, por exemplo, perguntar à turma que estratégias podem ser utilizadas para pegar um brinquedo que está fora do alcance do grupo. Ou como realizar divisões de modo que todos tenham a mesma quantidade de objetos. Mas as crianças em interação também proporcionam esse desequilíbrio, como vimos em “Brincando no pátio”. Na teoria do desenvolvimento humano proposta por Vygotsky, é muito importante o papel do outro, seja esse outro uma criança ou um adulto. De acordo com o autor, quando buscamos avaliar o desenvolvimento de uma criança pelo que ela já é capaz de resolver sozinha, acabamos por ter uma idéia distorcida de suas reais capacidades, pois, certamente, ela poderá fazer muito mais coisas se tiver o auxílio de um adulto ou de companheiros mais capazes. Assim, Vygotsky propõe que, ao buscarmos perceber o desenvolvimento de uma criança (em qualquer competência: lógica, de linguagem, corporal etc.), é preciso atentar não só para o que ela realiza sozinha, mas para o que faz com ajuda, com pistas, com o acompanhamento de alguém mais competente naquela tarefa. Portanto, além de ser importante discriminarmos o nível de desenvolvimento real (o que a criança realiza sozinha), é preciso identificar o nível de desenvolvimento potencial (o que ela faz com ajuda). Vygotsky ressalta que a distância entre o nível real e o potencial configura a zona de desenvolvimento proximal (onde ocorrem as aprendizagens). O que a criança hoje faz com ajuda, amanhã fará sozinha. Isso nos ajuda a compreender o processo de aprendizagem ocorrido na situação “Brincando no pátio”: subir a escada do brinquedo estava no nível de desenvolvimento potencial da criança, que, com a ajuda do colega e da professora, conseguiu avançar na sua aprendizagem. Para Vygotsky, a aprendizagem impulsiona o desenvolvimento. Isso quer dizer que quando aprende a escrever seu nome com o auxílio do crachá feito pela professora ou das dicas oferecidas por ela , a criança só está iniciando o processo de desenvolvimento que o saber escrever seu nome apropriadamente proporciona. A aprendizagem se dá no contexto dos relacionamentos entre as crianças e delas com os adultos, nas conversas, brincadeiras compartilhadas e imitações.

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De acordo com Vygotsky, a imitação tem um papel crucial no desenvolvimento. A criança só consegue imitar aquilo que está na zona de desenvolvimento proximal. Isto quer dizer que o que ela imita hoje, amanhã irá tornar-se algo próprio dela. Por exemplo, quando imita a mãe numa brincadeira de faz-de-conta, a criança fala como se fosse a mãe, apresenta gestos e posturas mais desenvolvidos do que ela, criança, é na realidade. Quando volta ao seu lugar cotidiano de criança, ela volta diferente, pois incorpora algo do que imitou. Assim, também quando busca o modelo de um amigo mais velho para fazer um desenho, reproduz o traço do outro e, em seguida, coloca algo diferencial que marca sua produção própria. A imitação que funciona como impulso para o desenvolvimento particular é diferente da cópia mecânica que os adultos algumas vezes solicitam que as crianças façam. Neste caso, geralmente não se observa o que está na zona de desenvolvimento proximal da criança, o que ela mesma busca imitar e copiar como parte de seu processo de construção de significados. Mas há informações que os adultos julgam ser importantes e que são submetidas às crianças em forma de cópia mecânica, sem sentido para a criança

(cópia das letras, do modelo do desenho adulto etc.) A imitação faz parte do desenvolvimento cognitivo e cultural da criança. Para imitar alguém, a criança precisa atribuir um significado à ação do outro. É pela imitação que ela vai experimentar comportamentos e ações que talvez ainda não fizesse por conta própria. Nesse sentido, ela se coloca em situação de aprendizagem, de ampliação de seus recursos de ação. Impulsionada pelos modelos que a cercam, ela vai criando e incorporando novas formas de ação, como podemos perceber na situação descrita abaixo, com crianças entre 2 e 3 anos. João e Viviane estão sentados no chão, um ao lado do outro, mexendo em peças de encaixe. João coloca uma pecinha no ouvido e segura com a mão, olhando Viviane que está sentada ao lado dele. Ela faz o mesmo e coloca a mão no ouvido dizendo: “ Alô...”. João olha rapidamente para ela, que está mexendo nas pecinhas. Ela diz: “Ah, tá quebrado.” Ele a olha, fala algo e ela o olha e pega peças junto dele. Ele pega rapidamente a que restou, coloca no ouvido e sai. COELHO, M. T. F., PEDROSA. M. I., 1997.

Nesta situação, Viviane aprende com João um significado que ele atribui à peça de encaixe ao colocá-la no ouvido como se fosse um telefone. Portanto, as crianças estão compartilhando significados na ação de brincar, ao mesmo tempo em que atribuem novos significados aos objetos, nesse caso, as peças de encaixe. Desde muito pequenas, as crianças já possuem modos de aproximarem-se umas das outras, que variam de criança para criança, de grupo para grupo. Podemos ver nas crianças bem pequenas, que mesmo sem utilizar ainda a fala como possibilidade comunicativa, encontram formas de estabelecer parcerias pelo movimento, pelos gestos, pela imitação etc. A relação com o outro se dá de diversas formas. Uma criança, ao entrar na creche, pode passar alguns dias ou semanas mais observadora. Aparentemente, poderíamos dizer que ela não está se relacionando com o outro, pois não faz nenhum movimento em direção às outras crianças. No entanto, se observarmos o interesse com que ela acompanha o movimento do grupo e os movimentos e brincadeiras que passa a fazer a partir dessa observação, poderemos perceber claramente o quanto a presença do outro influencia suas ações. Mesmo bem pequenas, as crianças se influenciam mutuamente e criam formas próprias de brincarem juntas. Quando uma música que vem de fora da sala (onde crianças da creche almoçavam) é ouvida, Katarina (16 meses) sorri e bate as palmas das mãos ritmicamente na mesa, olhando para Fernanda (19 meses). Em seguida, Fernanda repete os gestos. Ela bate as palmas de suas mãos na mesa, observada por Katarina. Depois as duas meninas batem as palmas das mãos na mesa, rindo.

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Fernanda apóia o cotovelo na mesa e olha para a educadora que se aproxima, enquanto Rosa (17 meses) balança a cabeça de Katarina. Esta balança sua cabeça no ritmo da música, batendo as palmas das mãos na mesa. Fernanda bate de leve e rapidamente a mão direita nos próprios lábios, enquanto grita: “O, o, o, o!”. Katarina imita Fernanda por um instante e novamente bate as palmas das mãos na mesa. Uma educadora aproxima-se e dá às crianças seus pratos de comida. PAULA, E. M. A. T. de, OLIVEIRA, Z de M. R., 1997.

A situação descrita na cena acima mostra que as experiências compartilhadas entre as crianças vão constituindo a história, a cultura, as formas de expressão do grupo. Essas experiências permitem que as crianças estabeleçam relações de confiança, de intimidade, de pertença. O grupo se constitui a partir das muitas atividades partilhadas. Essas atividades podem ter início a partir da iniciativa de uma ou de várias crianças nas mais diversas situações, como a hora do almoço no exemplo relatado, ou num momento em que estão no pátio, como descrito na cena a seguir: No pátio de um espaço de Educação Infantil, algumas crianças com idade em torno de 2 anos estão juntas. Uma delas resolve correr de uma ponta a outra do pátio. Em seguida, todas as outras correm, em meio a gostosas gargalhadas. Podem também surgir a partir de desafios propostos pelo professor, conforme nos mostra a situação abaixo, observada em uma turma de crianças de 5 anos: Corda A atividade se iniciou com a professora propondo diferentes brincadeiras com cordas. Seu objetivo era que as crianças exercitassem o corpo, se relacionassem em grupo e desenvolvessem relações espaço-temporal. Inicialmente, foram realizadas as brincadeiras: cabo-de-guerra, cobrinha, aumenta-aumenta e zerinho. Depois, veio o desafio: pular corda no ritmo de ladainhas. A ladainha apresentada foi: “Um homem bateu em minha porta e eu abri. Senhoras e senhores, ponham a mão no chão. Senhoras e senhores, pulem num pé só. Senhoras e senhores, dêem uma rodadinha e vá para o olho da rua”. Algumas crianças conseguiram com mais facilidade e começaram a buscar alternativas para ajudar os amigos. A primeira estratégia utilizada foi tentarem pular acorda juntos. Não deu muito resultado. Então, uma das crianças, que já possuía a habilidade, se ofereceu para ficar fora do jogo, pulando, sem corda, ao lado de uma criança que não havia conseguido, até que essa conseguisse pegar o pulso e o ritmo da brincadeira. Com a continuidade desse exercício, todas as crianças superaram o obstáculo. Nesse sentido, é importante que os adultos criem espaços para que essas interações aconteçam, considerando que a imitação tem papel importante de integrar, criar identificações e significados compartilhados coletivamente. A teoria sócio-interacionista de Vygotsky parte do princípio de que o ser humano é social. Cadasujeito humano se torna o que é, constitui sua identidade e seu conhecimento,nos relacionamentos sociais. Somos sujeito a partir do outro, pela mediação do outro, ou seja, a partir da linguagem. Assim, os dois autores a que nos referimos nesse item dão um papel de destaque para as interações como forma de produção de conhecimento, construção da identidade e participação na cultura. Para Piaget, o outro pode ser o responsável por um desequilíbrio que transforma o sujeito. Segundo Vygotsky, ao realizar tarefas conjuntas, acionamos recursos para depois realizá-las sozinhos. Além deles, Wallon propõe que construímos nossa identidade no social, alertando para o valor da afetividade nesse processo.

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1-3 O papel mediador do professor na IEI: a qualidade e a intencionalidade das interações Mediação é a função de estabelecer a relação entre dois termos ou situações, ou seja, fazer uma ponte. A relação entre os seres humanos e o mundo é mediada por outros seres humanos com os quais convive e pela cultura onde estão inseridos. Mediar o olhar da criança sobre o mundo é criar condições para que a criança, a partir das interações que estabelece, perceba e signifique a realidade que a cerca. O olhar é algo que pode ser aprendido. Aprendemos a olhar, a perceber, a significar o mundo a partir das mediações. Por isso, olhar é algo que exige esforço. Olhar exige criatividade, imaginação. O papel de mediadores dos(as)professores(as) deve valorizar o olhar da criança, favorecendo a imaginação e a criatividade, ou seja, ajudar a criança a ver o mundo e a expressar-se por meio das suas múltiplas linguagens: o desenho, a dança, a música, a brincadeira, o gesto. As várias teorias abordam sobre o papel do outro nas aprendizagens individuais, mas um ponto que merece atenção é a qualidade das interações. As crianças não aprendem somente na escola. Em casa, na pracinha e nos diferentes grupos sociais, as crianças estão aprendendo, assim como os adultos. Qual é, então, a diferença entre as aprendizagens realizadas fora da escola e as que ocorrem em seu interior? Para responder a essa questão, vamos retomar a situação da corda, apresentada no item precedente. No caso descrito, as crianças foram as principais mediadoras da aprendizagem dos colegas, mas existia uma professora na cena. Essa professora, como relatado, tinha seus objetivos, tinha a intenção de proporcionar encontros e aprendizagens entre as crianças. Havia um planejamento, e os materiais e o espaço foram preparados para executá-lo. Embora as crianças estivessem no centro da cena, existia um adulto ao lado, favorecendo e mediando a situação. “A intencionalidade educativa na instituição de Educação Infantil deve assumir um caráter de premeditação – planejamento prévio, acompanhamento e avaliação – que vai muito além daqueles encontrados na família ou em outras instâncias educativas. O “sucesso” da interação é que vai medir a eficiência da instituição, visto ter sido criada com a finalidade de formalizar o processo educativo.” MACHADO, Maria Lucia. In: Oliveira, Zilma de. Educação Infantil: muitos olhares. São Paulo: Cortez, 2001. p. 39. Retomemos, agora, a cena “Brincando no pátio”, também apresentada no item precedente. Nesse caso, a atuação da professora parece ainda mais visível. A criança, inicialmente, se dirige a ela, pedindo ajuda. A professora a orienta com palavras e, em vez de levantá-la ou colocá-la em cima para escorregar, estimula a interação entre as crianças. “A intencionalidade educativa presente nas interações adulto/criança, parceiros mais/menos experientes, explica-se, sobretudo, quando o adulto responsável assume o compromisso de levar ao êxito os propósitos aos quais a interação se destina, especialmente quando se trata de interações pedagógicas, ou seja, daquelas que justificam a existência de espaços institucionais.” MACHADO, Maria Lucia. In: Oliveira, Zilma de. Educação infantil: muitos olhares. São Paulo: Cortez, 2001. p. 39.

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O(a) professor(a) é quem é capaz de avaliar os desafios para as crianças de seu grupo. Com esta avaliação ele(a) planeja situações diversas, relativas a todas as experiências que devem ser garantidas na proposta curricular de uma IEI, nas quais as crianças ainda não são capazes de realizar determinadas atividades com autonomia, ao mesmo tempo em que planeja e coloca em prática o auxílio de que elas necessitam. Com esta ação, ele(a) investe na aprendizagem das crianças e no seu desenvolvimento, além de contribuir para a auto-estima delas. Sempre que há possibilidade de troca e cooperação entre as crianças, conhecimentos são compartilhados. A valorização das trocas entre as crianças de um grupo e de grupos diferentes (de diferentes idades e momentos evolutivos) serve como incentivo no desenvolvimento de cada uma. Essa troca entre crianças de diferentes faixas etárias promove experiências educativas e sociais benéficas tanto para as crianças menores quanto para as maiores. Por isso a importância de organização pelo(a) professor(a) de diversas formas de agrupamentos entre as crianças. A organização do trabalho em subgrupos (duplas, trios ou mais crianças) é também interessante, principalmente quando o(a) professor(a) faz uma organização intencional, a partir do conhecimento que tem das crianças. Nessas situações, elas têm oportunidade de buscar a ajuda umas das outras, adequar suas falas e atitudes às necessidades dos(as) seus(suas) colegas, esforçar-se para serem compreendidas em suas questões, compartilhar experiências e contribuir com o processo de desenvolvimento do amigo. Na organização intencional de um trabalho que tem como um dos seus eixos as interações, é fundamental que sejam previstos tempos para que todos estes tipos de trocas entre as crianças e delas com o(a) professor(a) possam acontecer e que esses momentos sejam vividos com intensidade. A organização dos espaços pelo professor é outro fator fundamental para favorecer as

várias interações na Educação Infantil. A educadora italiana Lella Gandini afirma que o

espaço reflete a cultura das pessoas que nele vivem e que, acima de tudo, os espaços

devem favorecer a interação entre as crianças. (GANDINI, 1999) Isso é verdadeiro

desde o trabalho com os bebês. Assim, boas interações entre dois ou três bebês são

possíveis quando o(a) professor(a) os coloca livres em um espaço que é organizado

com objetos variados, que chamam sua atenção e lhes permite se movimentarem

conforme sua vontade, atendendo às solicitações individuais. Em contextos

organizados dessa forma, podemos encontrar os bem pequenos, mais protegidos,

observando atentamente os demais realizando interações por meio de trocas de

objetos e de breves períodos de imitação.

OUTRAS CONEXÕES: O espaço pode ser um aliado para o brincar. Veja no site http://www.lanskyarquitetura.com.br as propostas da Lansky Arquitetura que propõem formas arrojadas e inteligentes para provocar o brincar. Estudos vêm sendo feitos no sentido de demonstrar como os diferentes jeitos de organizar e decorar o ambiente utilizado por crianças pode favorecer ou dificultar a ocorrência de interações entre elas em ambientes coletivos, tais como creches e pré-escolas. Por exemplo, nos cantinhos ou nas zonas circunscritas, organizados

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pelos(as) professores(as), tanto na área interna quanto externa da instituição, tem-se observado que as crianças se organizam em subgrupos e brincam entre si, buscando menos a atenção dos adultos.

2- A brincadeira: o outro eixo norteador das propostas curriculares da Educação Infantil 2-1 O brincar, o brinquedo e a brincadeira Ao olhar para os brinquedos e para as brincadeiras das crianças, podemos perceber a sua compreensão do mundo. Ou seja, (...) a brincadeira sempre revela a cultura de uma época, os valores que a sustentam e os costumes que a caracterizam e as manifestações artístico-religiosas de que se revestem (Vitória, 2003). Podemos avançar nessa compreensão, a partir de Walter Benjamin, filósofo alemão, que escreveu sobre a história cultural do brinquedo. Segundo Benjamin (1984), para compreendermos o brinquedo, e por que não dizer também a brincadeira, precisamos olhar para a cultura, para a classe na qual a criança está inserida, pois os brinquedos estabelecem um diálogo simbólico entre a criança e a sua realidade. O brinquedo e a brincadeira são, então, construções culturais que assumem características que representam transformações sócio-culturais. Estão interligados nessa relação com a cultura.

Vários artistas retrataram a brincadeira das crianças e seus brinquedos, em diferentes épocas

e em diferentes culturas.

Ainda no século XVIII, antes de aparecerem as indústrias que passaram a fabricar objetos em série, tudo era feito de forma artesanal. A partir do século XIX, com a revolução industrial, o brinquedo deixa de ser o resultado de um processo doméstico de produção, em que adultos e crianças se envolviam com a criação de brinquedos artesanais, e passa a ser comercializado. Hoje, não só podemos encontrar milhares de brinquedos iguais, como também em muitos países do mundo meninas e meninos brincam de Barbie e têm o mesmo tipo de jogos de video games. Dessa forma, os brinquedos trazem sempre a imagem do seu tempo. Com certeza, há cem anos atrás não encontraríamos foguetes, robôs, video games ou Barbies em lojas de brinquedos para crianças. Olhando os brinquedos das crianças, podemos compreender muitas coisas da sociedade em que vivem e também as relações que as próprias crianças estabelecem com o seu meio. O brinquedo, em especial, é concebido como suporte da brincadeira. Gilles Brougère (1994), pesquisador francês, ao escrever sobre a relação do brinquedo com a cultura, entende que o objeto torna-se brinquedo quando assume uma função lúdica, ou seja, quando a criança reveste esse objeto de um significado que é sempre social. Diante disso, compreendemos que o brinquedo não é só aquilo que está culturalmente investido desse estatuto, mas aquilo que a própria criança produz ou investe de sentido lúdico. O adulto pode criar, produzir um brinquedo para a criança, mas esse objeto (brinquedo), quando relacionado com a brincadeira da criança, não parece definido por uma função precisa. De acordo com Brougère, “trata-se, antes de tudo, de um objeto que a criança manipula livremente, sem estar condicionado às regras ou a princípios de utilização de outra natureza” (1984, p. 13).

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OUTRAS CONEXÕES Para saber mais sobre Brougère pesquise no site da Revitsa Nova Escola no link www.revistaescola.abril.com.br/crianca-e-adolescente/desenvolvimento-e-aprendizagem/entrevista-gilles-brougere-sobre-aprendizado-brincar-jogo-educacao-infantil-ludico-brincadeira-crianca-539230.shtml. Assim, do ponto de vista de quem brinca, o brinquedo pode ser qualquer objeto

utilizado como suporte para a brincadeira. Às vezes, as crianças se envolvem por um

longo tempo com um cabo de vassoura ao qual conferiram um significado de espada

ou cavalo de pau.

Não podemos esperar que a criança veja um determinado brinquedo com o nosso ponto de vista adulto. Por isso, no trabalho que realizamos com a criança é fundamental observarmos do que ela brinca e com o que ela brinca e disponibilizar diferentes objetos – sejam eles considerados brinquedos ou não – que possam servir de suporte para as suas brincadeiras. OUTRAS CONEXÕES: 1. No site da Fundação Abrinq - www.fundabrinq.org.br - você tem acesso a vários projetos e atividades, entre elas, o Programa Empresa Amiga da Criança, o Programa Crer para Ver, Prefeito Criança, o Projeto Nossas Crianças. Essas propostas discutem o atendimento com qualidade à criança.

2. Para saber mais sobre brinquedos indicados para as crianças, acesse o site www.abrinquedoteca.com.br. No site você encontra o “Guia de Brinquedos e Jogos” com os destaques de ano a ano, além de propostas de trabalho na educação infantil. Na situação que se segue, observada numa creche, entre crianças de 1 ano e meio a 2 anos, o mesmo objeto assume diferentes significados numa proposta mediada pela professora e pelas próprias crianças: Num pátio bem amplo, uma professora apresentou para as crianças uma caixa com cordas de diferentes tamanhos e espessuras. As crianças iam retirando as cordas da caixa, olhando e tentando fazer algo com as cordas. Uns saiam puxando, outros penduravam no pescoço, outros jogavam no chão. A professora tentou prestar atenção ao movimento de cada criança, incentivando o que estavam fazendo. No meio da atividade, uma menina deitou-se no chão e uma outra veio fazê-la dormir. Outras crianças, ao verem a cena, imitaram a colega. Ao perceber o movimento das crianças, a professora sentou-se no chão e começou a cantar uma cantiga de ninar. A princípio, parecia que a corda ficara esquecida. No entanto, assim que viu a professora cantando, uma menina pegou uma das cordas e trouxe para que a professora cantasse ao “microfone”. A professora aceitou a proposta da criança e logo fez o convite para que todos cantassem ao “microfone”. Duas outras crianças correram para pegar cordas também, interessadas em cantar, e uma nova brincadeira se iniciou no pátio. Assim, podemos entender que cada brinquedo pode ter diferentes significados a partir das condições históricas e sociais que se estabelecem em cada contexto. A brincadeira pode ser compreendida como o lugar em que a criança traduz e recria as imagens daquilo que ela vive a partir das suas interações com o mundo. A brincadeira vai se organizando a partir dos objetos disponíveis que a criança tem para eleger como brinquedos e também das experiências que ela estabelece com o seu meio. Assim, a criança brinca com o que ela tem à mão (que ela transforma em brinquedo) e com o que tem na cabeça (a sua imaginação). De acordo com o pesquisador Gilles

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Brougère, a criança não nasce sabendo brincar: ela aprende a entrar no universo da brincadeira a partir das relações que estabelece com o seu meio. A brincadeira pressupõe, então, uma aprendizagem social. OUTRAS CONEXÕES: Assista ao filme "Parangolé", dirigido por Waltuir Alves. O filme conta a história de Brás, uma criança de oito anos que descobre, em meio à realidade difícil, um universo habitado por sua imaginação. Brás tem amigos imaginários, brincantes, que trazem a música e a poesia para sua vida. No site www.emcantar.org você tem acesso a informações sobre o filme e outros materiais.

A produção de uma cultura lúdica pelas crianças Ao brincar, a criança estabelece regras e comportamentos que são compartilhados. Cria-se um conjunto de procedimentos que permitem tornar a brincadeira possível. A isso chamamos cultura lúdica, entendendo por cultura os significados que os seres humanos dão às suas produções e por produção lúdica a capacidade que a criança tem de reordenar os elementos retirados da realidade, organizando novas combinações e produzindo novos significados, ou seja, a própria brincadeira. O relato abaixo, que traz o registro da observação de algumas crianças de 4 e 5 anos, nos ajuda a compreender esse conceito: “Numa escola de Educação Infantil algumas crianças estão à espera do sinal da entrada. Cris está correndo na parte de cimento que fica junto à entrada. Vai e volta. Bel observa a amiga e diz para uma outra menina que a amiga está correndo. Cris, então, pára e diz que está brincando e explica: “tem que ir até o portão verde e voltar”. Ela criou a brincadeira e explica as suas regras. Faz isso mais três vezes. Outras quatro crianças estão sentadas, observando. Um menino decide ir brincar de correr também. Cris explica que tem que ir até o final da quadra e voltar. Logo são três crianças indo e vindo (...). Uma menina maior segura a mão da irmã menor. Cris, que começou a brincadeira, logo impõe: “não, não pode segurar a mão, assim não vale”. As meninas obedecem e logo soltam as mãos.” (BARBOSA, 2004) Se, por um lado, é importante a presença do adulto para colocar a criança em contato com a cultura, por outro lado, é fundamental que também possamos perceber a criança como um ser que produz cultura. E é principalmente por meio da brincadeira, na interação com o outro, que a criança se apropria e recria o mundo à sua volta. As crianças podem dar outros significados àquilo que os adultos só vêem com seus olhos, limitados pelos sentidos que eles já elaboraram para os diferentes acontecimentos do seu cotidiano. As crianças, no entanto, estão sempre criando novos significados. As crianças são produtoras de cultura!

Na produção de uma cultura lúdica, as crianças vão se socializando e compartilhando suas brincadeiras. Nos grupos, elas vão se apropriando das brincadeiras, reelaborando-as e enriquecendo essa cultura.

Essas brincadeiras retratadas por Cândido Portinari nos seus quadros e outras como “Ciranda, cirandinha”, “Pique-ajuda”, “Bento que bento é o frade”, “Batatinha frita um, dois, três” e uma infinidade de outras brincadeiras vão sendo aprendidas e ressignificadas pelo grupo de crianças na produção da cultura lúdica, que podemos

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também denominar de cultura infantil. Valorizam a socialização e a produção coletiva, pois fora do grupo não há piques ou brincadeiras de roda.

Hoje, as brincadeiras coletivas, na rua, costumam ser substituídas pela televisão. A possibilidade de aprender coletivamente acaba sendo substituída por brincadeiras individuais, como o video game. Provavelmente não podemos impedir que as crianças estejam diante da televisão ou diante de um video game, mas podemos criar, na Educação Infantil, espaços de coletividade e resgate dessa cultura infantil. Podemos observar as crianças e valorizar sua cultura lúdica. OUTRAS CONEXÕES: Leia o Brincar(es), de Alysson Carvalho, Fátima Salles e Marília Guimarães, da Editora da UFMG. O livro trata da relação entre a criança e o brincar, abordando o brincar como ação terapêutica, a articulação entre o brincar e o mundo da escola e o brincar em diferentes contextos de trabalho.

As nossas discussões nesse texto vêm evidenciando que, ao mesmo tempo em que é fundamental compreender a criança como um sujeito que está se apropriando da cultura na qual está inserida, precisamos considerá-la como um ser humano de pouca idade, com capacidade de produzir cultura, de construir significados. Para Walter Benjamin, a criança não é ingênua, nem inocente, mas tem ainda uma certa falta de habilidade para lidar com o mundo em oposição à segurança dos adultos. Mas exatamente por não dominar as coisas ao seu redor (em oposição a um adulto que pensa que domina), por não ter todas as respostas, a criança reinventa o mundo. De uma folha de árvore faz um assobio, de um cuspe ou um relâmpago, faz um jogo... Para Walter Benjamin, a incompletude da criança é que torna possível a invenção. Ele escreveu: “a criança é aquela que pode fazer saltar de um simples pedacinho de madeira, uma pinha ou uma pedrinha as mais diferentes figuras”. Ou seja, a criança é aquela que de um cabo de vassoura faz espada, cavalo, muleta, tudo o que a sua imaginação mandar. De modo semelhante às ideias de Benjamin, para Vygotsky, a brincadeira atende sempre a uma necessidade da criança, motivando a sua ação sobre o mundo, embora deixe claro que nem toda necessidade gera uma brincadeira. Essa necessidade surge a partir de algo que não pode ser realizado a não ser no mundo da imaginação, por serem necessidades que não podem ser atendidas de modo imediato. Assim, ao brincar, a criança cria uma situação imaginária, de modo a atender, pelo menos nesse universo imaginário, essa necessidade. No entanto, ao imaginar esse universo, onde pode encontrar as respostas para suas necessidades, a criança o faz a partir do próprio conhecimento que ela tem do mundo. Dessa forma, toda a imaginação que dá início à brincadeira vem atravessada pela própria cultura, gerando regras para a brincadeira. A descrição de uma observação da brincadeira de cinco meninas em uma praça da cidade do Rio de Janeiro nos ajuda a compreender essas ideias. É um espaço cercado, aberto ao público, arrumado pelo McDonalds. Crianças que aparentemente não se conhecem, brincam juntas nos brinquedos. Penso assim porque os adultos que

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estão com elas, cada um em um canto diferente da praça, não se comunicam entre si. Num brinquedo que parece uma nave espacial, estão brincando cinco meninas de idades bem diferentes: 2 anos, 5 anos, 8 anos, 9 anos, 10 anos (idades aproximadas). A que parece mais velha é a mãe. As de 5 e 9 anos, são irmãs. A de 8 anos é empregada e a de 2 anos é filha. A menina que está no papel da empregada recebe ordens das duas irmãs: mandam que ela acabe de varrer e limpar tudo porque, quando elas voltarem, querem tudo limpinho. Quando as meninas saem, a menina que está vivendo o papel da empregada fala: ‘’Eu não vou limpar porcaria nenhuma, eu vou é dormir”. E entra na casa. Quando as irmãs voltam do passeio a menina que é a empregada diz: “Olha só, eu estava dormindo, então vocês chegavam e brigavam comigo”. Ela volta a dormir e as duas meninas brigam com ela: “Acorda! Anda! Vai trabalhar! Limpe tudo agora”. A mãe, que está dentro da casa, concorda e a manda trabalhar. Chega mais uma menina, que diz: “Eu quero brincar”, e uma das irmãs pergunta para a menina mais velha que está no papel da mãe: “ela pode entrar?”. De repente, a brincadeira se desfaz e elas vão para o outro brinquedo, assim, não mais que de repente. (BARBOSA, 2003. p. 3). Na descrição anterior, durante todo o tempo, a imaginação, a fantasia e a realidade se cruzam. As meninas interrompem a brincadeira para inserir um novo elemento, ou organizar a fala seguinte e logo continuam a brincadeira. Transitam com muita propriedade entre a fantasia e a realidade. Elas usam o brinquedo e elas dizem o enredo. Não há um tempo pré-determinado para a brincadeira. As crianças determinam quando começar e quando parar, ou quando simplesmente interromper para recomeçar daqui a pouco. A criança se encanta com o mundo e, por meio da imaginação, cria e recria a realidade, subvertendo a ordem das coisas. Segundo Vygotsky, a ação na esfera imaginativa, numa situação imaginária, a criação das intenções voluntárias e a formação dos planos da vida real e motivações que envolvem os desejos – tudo aparece no brinquedo. Ele entende que a brincadeira cria uma zona de desenvolvimento proximal na criança, pois ela tem a oportunidade de ser aquilo que ainda não é, pode agir como se fosse maior do que é na realidade e pode saber e usar coisas que lhe são proibidas. No faz-de-conta, a criança ultrapassa os limites reais do seu desenvolvimento, agindo na zona de desenvolvimento proximal. Dessa forma, diferentes situações dão à criança essa oportunidade de ser mais do que ela realmente é, tornando-se motivações para as brincadeiras. O brincar é uma ação que nasce da necessidade da criança de criar, imaginar, compreender o mundo à sua volta. O brincar é uma atividade gratuita, não-instrumental, surge liberada, livre. Ou seja, é exercida pelo simples prazer que as crianças encontram em fazê-lo. O jogo de faz-de-conta se desenvolve a partir das atitudes e desejos dos “jogadores” e por uma disposição particular de certos objetos que dão apoio para a definição de uma situação, como casa de bonecas, supermercado, hospital etc., onde há determinadas regras. O brincar tende sempre a aperfeiçoar-se, tornando-se cada vez mais complexo. Ao brincarem de casinha, médico ou escola, as crianças retomam com bastante fidelidade as características básicas de situações anteriormente vividas. Entretanto, a comunicação interpessoal que a brincadeira envolve não pode ser considerada “ao pé da letra”: ela requer uma constante negociação de regras e a transformação dos

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papéis assumidos pelos participantes, fazendo com que seu desenrolar seja sempre imprevisível. Com isso, a brincadeira cria espaço para a novidade.

O fato de ser livre não significa que ela não atenda às necessidades de desenvolvimento, pois como discutiremos mais à frente nesse texto, ela tem enorme importância neste aspecto.

OUTRAS CONEXÕES: 1. Assista ao vídeo “Movimento e Cultura Corporal: os brinquedos voadores”, produzido pelo Grupo de Pesquisa Contextos Integrados em Educação Infantil da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. O vídeo mostra atividade com brinquedos tais como, pipas, bolinhas de sabão, aviõezinhos de papel, balões e outros. 2. Para saber mais sobre brincar, brincadeiras e brinquedos acesse o site www.labrimp.fe.usp.br do LABRIMP, Laboratório de Brinquedos e Materiais Pedagógicos, coordenado pela profa. Dra. Tizuko M. Kishimoto.

2-2 Os processos de aprendizagem e desenvolvimento do brincar Podemos dizer que a brincadeira não existe apenas para a espécie humana. Vários mamíferos se ocupam de simular perseguições e fazer explorações do meio, desligadas de objetivos de sobrevivência. Estas atividades são chamadas “brincadeiras” e estão voltadas para o aprendizado de determinados comportamentos. Gatinhos, por exemplo, passam muito tempo brincando de perseguir novelos de lã, como vemos com freqüência. Esse tipo de “brincadeiras” também surge no recém-nascido, quando ele exercita suas possibilidades sensoriais nascentes. Brinca de olhar, de fazer sons, de movimentar os seus membros. Aos poucos, à medida que cresce, o bebê descobre novas brincadeiras dessa mesma natureza. A princípio, provoca alguns acontecimentos por acaso, como, por exemplo, quando está deitado em seu berço e acidentalmente esbarra no móbile que fica pendurado próximo a ele. O prazer que o movimento do móbile traz ao bebê faz com que ele vá, aos poucos e pela repetição do gesto, associando o efeito de sua ação (o balanço do móbile) ao que causou este efeito (sua mão esbarrando no móbile). Essa associação favorece o fato de o bebê começar a buscar repetir este efeito intencionalmente, ou seja, ele agora não esbarra mais por acaso no móbile, mas pratica essa ação intencionalmente em busca da repetição da situação que lhe causou prazer. Nessa situação, ele está desenvolvendo intensamente suas habilidades motoras e suas emoções diante das tentativas bem ou mal-sucedidas. Esse mesmo padrão lúdico, ou seja, a mudança de uma ação gratuita para outra intencional, se repete mais tarde em outros patamares do desenvolvimento infantil. O grafismo é um bom exemplo. Crianças pequenas começam a fazer rabiscos pelo simples prazer exploratório da atividade, dando um significado diferente a seu desenho sempre que perguntarmos o que desenharam. Este significado só irá se estabilizar mais tarde, a partir de seu desenvolvimento e das experiências no campo da produção plástica que forem vivenciando. As crianças também estão atravessando um período marcadamente sensorial/motor, o que significa que têm desejo por experiências ligadas ao movimento e às sensações. Estão construindo o conhecimento sobre seu próprio corpo e sobre o mundo à sua volta e, portanto,

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brincadeiras que envolvam subir, descer, pular, cair, levantar, pôr, tirar, fazer, desfazer, criar e destruir fazem sucesso.

Mas, para além dessa simples exploração de sensações e movimentos, o que vai diferir, de modo significativo, a brincadeira humana da “brincadeira” animal, é que ela vai requerer da criança a capacidade de comunicar-se simbolicamente por meio de diferentes linguagens, para tomar certas decisões, criando o novo. A grande diferença é que os animais realizam essas ações por instinto, enquanto que, para os seres humanos, o papel da sociedade e da cultura é fundamental.

A brincadeira não é uma atividade que a criança já nasce sabendo. Brincar implica troca com o outro, pois trata-se de uma aprendizagem social. Com relação aos bebês, vemos que este brincar vai surgir nos primeiros momentos de vida. Os pais, familiares e educadores responsáveis pelos cuidados com os bebês ensinam-lhes a brincar desce cedo. Por meio da interação e dos vínculos afetivos, vão criando diferentes situações e as crianças encontram rapidamente as ações adequadas para participarem de um jogo ou brincadeira. Isto ocorre, por exemplo, quando os pais ou educadores introduzem o bebê em certas ações não voltadas ao atendimento de uma necessidade imediata, como brincar com ele de “Cadê? Achou! ”ou “Esconde-esconde”, quando utilizam lençóis ou panos para “sumir” ou fazer as crianças “sumirem”. Pode também ser observado quando as crianças iniciam repentinamente essa brincadeira sem combinarem isso previamente. Nesses momentos, a criança vai construindo, na relação com suas primeiras figuras de referência, um “jogo”, isto é, aprende a brincar a partir da repetição, da percepção da expressão dos pais ou educadores, do entendimento que vai construindo quanto ao significado daquela brincadeira. No caso dessa brincadeira de esconde-esconde, por exemplo, podemos identificar múltiplos aprendizados que estão em jogo: a possibilidade de representar mentalmente o objeto “sumido” apesar de sua ausência (o que Piaget denomina de “permanência do objeto”), o entendimento da linguagem, a alternância de participação dos envolvidos como estrutura da brincadeira etc. Além disto, a brincadeira é um especial momento de prazer, troca afetiva e alegria, elementos fundamentais na vida de qualquer pessoa para a sua constituição. OUTRAS CONEXÕES: Solicite no site da Aliança pela Infância o documento “Brinquedos e Brincadeiras na creche”. O documento tem por objetivo orientar professoras, educadoras e gestores na seleção, organização e uso de brinquedos, materiais e brincadeiras para crianças de 0 a 3 anos, apontando formas de organizar espaço, tipos de atividades, conteúdos, diversidade de materiais. Disponível em www.aliancapelainfancia.org.br. Uma brincadeira especialmente valiosa para o desenvolvimento infantil no período entre aproximadamente 1 e 5 anos é o jogo simbólico ou brincadeira de faz-de-conta. Particularmente, ele é ferramenta para a criação da fantasia, para construir visões criativas da realidade. Lili inventa o mundo, Mário Quintana

Lili vive no mundo do faz-de-conta. Faz de conta que isto é um avião, zum... Depois aterrizou em pique e virou trem

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Tuc, tuc, tuc, tuc...

Entrou pelo túnel chispando. Mas debaixo da mesa havia bandidos. Pum! pum! pum! pum! O trem descarrilhou. E o mocinho? Meu Deus! No auge da confusão, levaram Lili para a cama à força. E o trem ficou tristemente derribado no chão, Fazendo de conta que era mesmo uma lata de sardinha.

A poesia acima “Lili inventa o mundo”, escrita por Mário Quintana, revela o papel que a imaginação desempenha na vida da criança e as múltiplas possibilidades que se abrem a partir da brincadeira de faz-de-conta. Vejamos, a seguir, como isso se dá: Segundo Vygotsky, entrar nesse mundo do faz-de-conta depende da capacidade de simbolizar. Ou seja, tornar presentes objetos ou situações ausentes por meio da imaginação. A princípio os objetos têm uma força determinante sobre a criança: uma escada é para subir, objetos são para tirar e colocar, uma porta é para abrir e fechar, determinando, assim, o que ela pode ou não fazer. Se o objeto não está presente, se a criança não pode vê-lo, a ação também vai estar ausente: ela não pode imaginar-se subindo numa escada se não há escada para subir. A partir de um determinado momento do seu desenvolvimento, a criança passa a criar ações na imaginação, não dependendo mais do objeto. Assim, a criança adquire a capacidade de se comportar não só a partir daquilo que vê concretamente, mas também tendo como suporte para a sua ação os significados que ela atribui aos objetos. Os objetos manipulados no faz-de-conta são usados de modo simbólico, como substitutos para outros, através de gestos imitativos que reproduzem as posturas, expressões e verbalizações conhecidas pela criança. Por exemplo, uma vassoura deixa de ser percebida em suas características – objeto utilizado para varrer o chão – e passa a ser usada pela criança como se fosse um cavalo, conforme ela, em pé, coloca a vassoura entre suas pernas, segura seu cabo perto da ponta superior e saltita pelo ambiente como se trotasse. Na situação de faz-de-conta, a criança age cada vez mais guiada por imagens criadas a partir de sua experiência com outras vivências reais – as suas experiências na escola, por exemplo – adotando comportamentos diferentes dos que assume em outras situações de sua vida diária.

Mais tarde, ela pode apenas fazer um gesto sem usar qualquer objeto para imitar o comportamento de pentear-se ou, ainda, pode dizer “já me penteei!”, sem executar um ato observável, e esta declaração ser usada como parte do enredo que está sendo criado na brincadeira. Com o desenvolvimento da criança, o

jogo simbólico deixa de depender dos objetos e passa a apoiar-se mais nas idéias, imagens e regras construídas por ela para sua realização.

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Ao mesmo tempo, ao representar o papel do outro no que se costuma chamar de “jogo dos papéis”, a criança começa a perceber as diferentes perspectivas envolvidas na situação. Por exemplo, ela pode ser a professora, reproduzindo seus comportamentos, experimentando como acha que ela vê os alunos etc. “As crianças precisam desenvolver ações comuns, que exigem envolvimento mútuo, com um entendimento mínimo entre elas, partilhado e acordado verbalmente ou tacitamente. Isto significa que, para brincarem, têm que imaginar, negociar e renegociar continuamente papéis, cenários e a trama; cada participante tem que assumir o seu papel de acordo com a função que o outro assume e desenvolver as ações previstas para o papel, em resposta às ações do outro.” (SALLES & FARIA, 2012) Existem, portanto, regras sociais, maneiras adequadas de se comportar nesses jogos. Conforme têm maior experiência de criação de situações imaginárias, as crianças passam a ter maior controle sobre a história que está sendo criada, podendo planejá-la e distribuir os papéis que a compõem, com maior facilidade. Ela evolui com o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criança, porque envolve sua personalidade e sua forma de entender o mundo à sua volta. O modo como as crianças vão se apropriar dos objetos que são colocados à sua disposição para brincar e dos enredos que vão criar a partir deles depende da cultura na qual estão inseridas. A criança aprende a brincar com os outros membros de sua cultura. Primeiramente com os mais próximos e, à medida que cresce e se desenvolve, vai ampliando seu rol de relações. Suas brincadeiras são repletas de hábitos, valores e conhecimentos do grupo social ao qual pertence. Por isso dizemos que a brincadeira é histórica e socialmente construída. Ou seja, a criança utilizará as experiências que vive em sua comunidade – os valores que circulam, as tradições, os personagens do folclore típico da localidade. Conforme a criança vai crescendo, os jogos regrados, em que o mais importante é seguir a regra (esportes, como o futebol ou o vôlei; jogos de cartas ou de tabuleiro), vão tomando o lugar dos jogos de faz-de-conta. OUTRAS CONEXÕES: Pesquise brincadeiras para fazer com as crianças no site Mapa do Brincar da Folhinha de São Paulo. São mais de 500 brincadeiras de diversas regiões do Brasil. Disponível em www.mapadobrincar.folha.com.br. Além das brincadeiras, você encontra comentários de vários mestres sobre o brincar, a infância e as brincadeiras.

2-3 As contribuições das brincadeiras para a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças Brincar de fazer de conta cria condições para uma transformação marcante da forma de a criança ter consciência do mundo e de si mesma, por lhe exigir formas mais complexas de ação e novas formas de organizar os elementos do ambiente. Além disso, favorece imensamente o desenvolvimento da linguagem oral pelas crianças, como se evidencia nos exemplos a seguir, quando as crianças brincam com a participação da mãe ( exemplo1) e da avó (exemplo 2), construindo diálogos e narrativas: Exemplo1 (criança – C - com a mãe - M) C.: Vamu naná? (Olhando para a boneca. Põe a boneca no berço.) M.: Agora canta uma musiquinha pra ela naná, num quer? C.: Tá nananu caminha.

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M.: Tá nanando na caminha? C.: (Pega a mamadeira.) Minha mamadela du nenê. Cadê áua? (…) Sem mamadela du nenê. (Dá mamadeira à boneca no berço.) Ó! Que linda! (Continua). Eli num qué mamadela. Eli num qué mamadela. (Tira a mamadeira e dirige-se à boneca.) Num qué? Não? Pricisa tomá mamadela! M.: Precisa? Ela tá falando que num qué mamadeira? C.: Não. Num qué mamadela. M.: Tá danu mamá? C.: (Para de dar mamadeira e dirige-se à boneca.) Num qué mamadela? Piliza tomá mamadela. (Pega outra boneca no chão e joga longe.) Sai nenê! Sai! (Bate na outra boneca.) (Criança aos 2 anos e 2 meses)

Exemplo 2 (criança –C - com a avó – A.) C.: (Brinca com os ursos.) Filhinha, filhinha, mamãe volta já já. Filho é dose. A.: Vai trabaiá, mamãe? Colocar figuras da C.: (Silêncio) A.: Mãezinha... Troca a fralda do nenê, fez xixi. C.: (Dobra a fralda). (…) Tô trocanu ele. (…) Vô fazê janta. A.: Já? Vai faze janta já? C.: Já. Tó, filha, come tudo. A.: Ta, mamãezinha. Vou comer tudo. C.: Mamãe qui dá, mamãe qui dá. Qué qui põe no pratinho? Tó. Come tudo. Tó, come com cué tudu. A.: Nossa... Que colherão. C.: Pronto, já comeu tudo. A.: Ô mamãezinha. C.: A mamãe vai fazê miojo. A: Miojo... Ah, mamãe, quero miojo, mãezinha. (Criança aos 2 anos e 11 meses A imaginação e a criatividade são dois elementos básicos associados ao jogo infantil. Imaginação é um atributo de todo ser humano e se desenvolve durante toda a vida. Ela é livre, embora ainda limitada na criança, enquanto que o adulto, por ter uma experiência mais diversificada, pode experimentar uma função imaginativa extremamente rica e madura. OUTRAS CONEXÕES: Assista ao curta” Aquarela”, disponível no site www.laboratoriodedesenhos.com.br/aquarela.htm. O vídeo retrata a riqueza da imaginação infantil, utilizando a música de Toquinho. Por outro lado, inventar algo não é tarefa de uma só pessoa. Mesmo as grandes

descobertas resultam do acúmulo de experiência de uma ou várias gerações de pessoas. Não se fala, assim, de um criador isolado, mas de um ambiente onde a criatividade é estimulada. A ação criativa necessita da imaginação, que, na criança, se desenvolve especialmente através do jogo simbólico, que a envolve

como um todo, mas também por meio do desenho, da narrativa de histórias, entre outras atividades.

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Ao brincar, a criança não apenas desenvolve sua imaginação e criatividade, como

também se desenvolve em vários outros aspectos, à medida que se comporta de

modo diferente daquele próprio à sua idade. Quando observamos crianças brincando

de casinha, por exemplo, as atitudes que a “mãe” ou o “pai” adotam com o bebê – de

cuidado, proteção – reproduzem comportamentos diferentes daqueles adotados pelas

crianças pequenas, e se aproximam do comportamento dos adultos.

No brinquedo, a criança sempre se comporta além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário; no brinquedo, é como se ela fosse maior do que é na realidade. Lev Vygotsky Esta afirmação de Lev Vygotsky, aponta para a estreita relação entre a atividade de brincar e o desenvolvimento de novas formas de comportamento pela criança que permitem a ela maior autonomia. Assim, as brincadeiras contribuem no desenvolvimento de algumas capacidades

importantes, tais como: a atenção, a imitação e a memória. Contribuem também na

construção da independência e capacidade de decisão. Isso porque, ao brincar, as

crianças exploram e refletem sobre a realidade e a cultura na qual vivem, incorporando

e, ao mesmo tempo, questionando regras e papéis sociais. Nos jogos de faz-de-conta,

por exemplo, a criança recria situações que fazem parte de seu cotidiano, trazendo

personagens e ações que fazem parte de suas observações. Assim, ela pode vestir

uma saia rodada e se tornar bailarina, colocar uma bolsa a tiracolo e dizer que “vai

trabalhar”. Podemos dizer que, na brincadeira, as crianças podem ultrapassar a

realidade, modificando-a através da imaginação. Por meio da brincadeira, elas vão

prestando atenção no mundo social em que estão inseridas, ao mesmo tempo em que

buscam organizá-lo. No quadro a seguir, trazemos uma observação feita em Belo

Horizonte das brincadeiras de crianças de 5 anos:

Numa brincadeira de um grupo de crianças de 5 anos, que habitavam uma região extremamente Colocar aqui desenho da pobre de Belo Horizonte, os papéis de pai e mãe eram bastante representativos da vivência daquelas crianças. Na brincadeira, as crianças representavam as mulheres fazendo seus afazeres domésticos, cuidando dos filhos, enquanto na representação dos homens sempre havia a ida aos bares depois do trabalho. Uma cena que se repetia constantemente era a das meninas se juntarem para buscar seus “maridos” que, a essa hora, já estavam “embriagados” nos bares. Esta cena se repetia a cada brincadeira das crianças. Mas essa era uma repetição ativa, ou seja, a cada nova cena construída, as crianças recriavam aspectos do que estava sendo vivenciado. Ora experimentavam soluções diferentes para convencer seus “maridos” a voltarem para casa, ora exprimiam seus desejos. Através da composiçãodesse cenário, as crianças tentavam entender os papéis sociais de pai e mãe dentro da comunidade, ao mesmo tempo em que experimentavam algo novo quando esses papéis eram recriados conforme seus desejos. Naquela comunidade, o grau de alcoolismo entre os homens era bastante elevado. Analisando esse exemplo, podemos dizer que as crianças repetem a cena, no sentido de compreender as relações sociais e afetivas que ela representa e a recriam, utilizando os recursos disponíveis para modificar sua forma de estar no mundo. A brincadeira é, portanto, um espaço de aprendizagem, de imaginação e reinvenção da realidade.

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Além de possibilitar uma maior compreensão da realidade social, muitas aprendizagens também acontecem quando a criança brinca com os elementos e fenômenos do mundo físico: quando ela brinca com a água, com o ar, com a luz, com as sombras, com o equilíbrio, com misturas diversas, com a exploração de objetos, com o funcionamento desses objetos etc. As brincadeiras que envolvem o corpo das crianças são fonte inesgotável de conhecimento de suas próprias possibilidades e de seus limites corporais, das noções espaciais e temporais, das várias relações matemáticas, dentre outros. As crianças também brincam com as várias linguagens, apropriando-se, dessa forma, dos vários elementos que a constituem. A brincadeira de faz-de-conta tem um outro papel importante para a criança. Ela permite reviver situações que lhe causaram enorme excitação e alegria ou alguma ansiedade, medo ou raiva, podendo, na situação mágica e descontraída da brincadeira, expressar e trabalhar essas emoções muito fortes ou difíceis de suportar. Na brincadeira, estão envolvidos aspectos cognitivos, emocionais e físicos, e o que está em jogo para os adultos que convivem com a criança é conhecer melhor os sentimentos e emoções que ela vive, bem como o modo como ela os elabora por meio do brincar. José tem 2 anos e está na creche há um ano. Conhece bem os adultos e as crianças e demonstra muito prazer em freqüentar a instituição de Educação Infantil. Recentemente, sua mãe foi convidada para assumir um novo trabalho distante de sua casa, o que exigiu que ela passasse de segunda a sexta-feira fora da cidade onde moravam, só vindo para a casa nos fins de semana. José ficava com o pai. Para José, o afastamento da mãe de segunda à sexta era um grande desafio. Na sexta-feira, ele e o pai iam buscar a mãe na rodoviária. Sua família deu a ele um ônibus de madeira e ele passou a andar agarrado a esse brinquedo. Sempre que algum adulto chegava perto, ele explicava toda a história: – Esse é o ônibus que a mamãe pegou, ela vai voltar sexta-feira. O ônibus vai lá na estrada... Um outro aspecto importante das brincadeiras, como discutiremos mais à frente nesse texto, é que por meio delas as crianças aprendem a fazer amigos, constroem relações afetivas, sociais e éticas e se constituem como sujeitos na sua cultura. OUTRAS CONEXÕES: . Leitura do texto “Brinquedos e Brincadeiras na Educação Infantil” de Tizuko Morchida Kishimoto. Disponível no Portal do MEC. Texto elaborado por solicitação da Coordenação de Educação Infantil (COEDI / SEF / MEC) para subsidiar a discussão das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (Resolução 5/2009).

2.4 Organizando as experiências do brincar nas instituições de Educação Infantil A brincadeira é uma aprendizagem social, fruto das relações entre os sujeitos de um grupo social. Nesse sentido, a Educação Infantil – apoiada nesta perspectiva histórica-cultural do desenvolvimento – tem um papel muito importante na organização e no planejamento de condições propícias para o desenvolvimento e a aprendizagem do processo de brincar. Nesse sentido, a presença do(a) professor(a) é fundamental, pois será ele quem vai mediar as relações, favorecer as trocas e parcerias, promover a integração, planejar e organizar ambientes instigantes para que o brincar possa se desenvolver.

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O papel do(a) professor(a) na valorização das brincadeiras Considerando a importância da brincadeira para o desenvolvimento das crianças até 5 anos, ela se torna um elemento pedagógico fundamental na Educação Infantil. Por conseguinte, o(a) professor(a) tem um papel relevante a cumprir no sentido de valorizá-la e de criar condições para que ela ocorra no cotidiano de seu trabalho, garantindo múltiplas experiências e aprendizagens. Assim, para poder contribuir com o pensamento e a ação das crianças, além de conhecer os jogos e brincadeiras infantis (seus temas, materiais, personagens etc.), o(a) professor(a) necessita ser criativo(a) e sensível para apoiar o desenvolvimento da criatividade das crianças no brincar. Ele(a) deve ter em mente que, para a criança envolver-se em brincadeiras, ela necessita sentir-se emocionalmente bem em relação aos adultos e às outras crianças presentes e precisa querer brincar. Nesse sentido, ele pode organizar oportunidades para a realização de brincadeiras, deixando que as crianças circulem pelos ambientes e que se envolvam em diferentes tipos de jogos. Uma das atitudes fundamentais ao(a) professor(a) que atua na Educação Infantil é a de ser um(a) observador(a) atento(a), voltado(a) para acompanhar a riqueza das interações infantis que aí ocorrem. Observando os jogos simbólicos ou brincadeiras de faz-de-conta que as crianças estabelecem com os companheiros de idade, o apoio do(a) professor(a) pode auxiliar o grupo de crianças a entrar nos personagens e a agir a partir daí. A intervenção do(a) professor(a) deve basear-se em uma análise das situações criadas pelas crianças, tanto em relação a seu conteúdo (temas, personagens, clima emocional etc.) como a sua forma de acontecer (regras, materiais utilizados, organização do espaço, formas de cada criança desempenhar certos papéis). A participação do(a) professor(a) no jogo simbólico ou brincadeira de faz-de-conta pode ocorrer de forma indireta, quando ele(ela) organiza os espaços e objetos que estruturam enredos e papéis adotados, cuidando para que as regras propostas pelo grupo sejam mantidas. Pode, excepcionalmente, ter uma participação direta, quando assume o papel de juiz em um jogo de regra ou em um jogo esportivo, ou mesmo fazendo o papel do(a) aluno(a) em uma brincadeira de escolinha. Em outras ocasiões, as crianças mostram que querem brincar sozinhas. Neste caso, o(a) professor(a) terá uma excelente oportunidade para perceber a maneira como elas se organizam, suas competências na brincadeira, ou mesmo para observar uma criança que esteja lhe chamando a atenção. Para alimentar o jogo simbólico, o(a) professor(a) pode brincar com as palavras fazendo rimas, lendo poemas, cantando canções. A utilização de gestos e movimentos pode fazer parte desses momentos. Música, pintura, escultura, dança, poesia, narrativa e teatro são formas de brincar e fazer fruir as manifestações infantis. Além disso, a mediação deve favorecer que o brincar seja partilhado e que o grupo se integre, reconhecendo uns aos outros como parceiros com os quais é possível trocar, brincar, amar e cuidar. Neste sentido, é importante que também nós, adultos, “entremos na roda”, nos dispondo a brincar com as crianças, vivenciando com elas as aventuras e invenções maravilhosas que são capazes de criar. Precisamos aprender com as crianças. Aprender a alegria de ver, em cada pedaço do nosso cotidiano, oportunidades, não para fazer sempre o mesmo, mas para ver o novo, para fazer sempre de novo, aquilo que para nós, adultos, já está revestido de significados endurecidos e enraizados na falta de imaginação, fantasia, criação.

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OUTRAS CONEXÕES: Para ter acesso a materiais sobre o brincar tais como textos, entrevistas, palestras e links diversos entre no site Quem quer Brincar? O site foi desenvolvido na Universidade Federal do Rio Grande do Sul pelo Programa de Extensão Universitária. Disponível em www.ufrgs.br/faced/extensao/brincar.

Organizando espaços, materiais e tempos para o brincar Nas instituições de Educação Infantil, a organização do tempo e do espaço pode favorecer ou não a criação de brincadeiras diversas pela criança. A seguir, são apresentadas algumas sugestões de como proceder para favorecer a brincadeira na rotina das instituições de Educação Infantil: Uma forma de incentivar o faz-de-conta das crianças é arrumar uma ou mais caixas grandes de papelão. Em cada uma delas podem-se colocar roupas, adereços, enfeites, objetos que reforcem um determinado tema da vida cotidiana das crianças: cabeleireiro, barbeiro, time de futebol, venda, lanchonete ou restaurante, castelo mágico, ilha encantada, fábrica de automóvel, barco de pesca etc. Como podemos ver, a variação é grande e o(a) professor(a) pode, melhor que ninguém, reconhecer quais temas são interessantes para as crianças. Ele(a) deve procurar acompanhar como elas utilizam os objetos da caixa e modificar alguns itens, se necessário, aumentando ou trocando alguns deles. É interessante, também, que faça um registro de cada um dos primeiros dias de uso do “baú da fantasia”. O(a) professor(a)pode, por exemplo, na sala de atividades de crianças entre 1 e 2 anos, amarrar uma corda de uma ponta a outra da sala e pendurar nela diferentes tripas de papel ou tipos diferentes de barbantes, tecidos e/ou fitas. Certamente este toque no ambiente promoverá explorações divertidas. As crianças dessa faixa etária adoram provocar efeitos de movimento nos objetos e se encantam em balançá-los e puxá-los, dentre outras ações. Assim, vão conhecendo mais sobre os efeitos de sua ação sobre o mundo material e sobre as próprias características dos objetos em questão. O(a) professor(a), ao organizar o espaço e disponibilizar alguns materiais para exploração pelas crianças, já cria um ambiente propício para surgirem brincadeiras. Depois é só entrar com elas na farra! Fantasias, tecidos, caixas e bolas, objetos de baixo custo e materiais não estruturados são excelentes para brincar. Entrar e sair de caixas, fazer com elas casas e carros, vestir fantasias e brincar de faz-de-conta, manipular bolas de tamanhos e texturas diferentes, enfim, são muitas as possibilidades de exploração. Espelhos para brincar de fazer caretas, para se observar depois de colocar fantasias e fazendo movimentos inusitados com o corpo são também excelentes recursos para ampliar o brincar. Para favorecer brincadeiras ligadas ao movimento e às sensações, o(a) professor(a) pode preparar o espaço de modo a favorecer essas explorações, convidando ao movimento. Caixas de vários tamanhos, almofadas, tecidos, pequenos obstáculos nos quais a criança possa subir e descer com segurança, objetos que ela possa colocar e tirar de dentro das caixas, tais como bolas de encher cheias, coleções diversas etc. As crianças gostam também de entrar com o corpo inteiro em diferentes lugares e objetos. Podemos fazer túneis de tecido para elas passarem, caixas que virem carros etc.

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Ampliando o acervo de brincadeiras Entendendo a importância da brincadeira e da cultura, as oportunidades de trazer elementos da cultura para o cotidiano da Educação Infantil por meio do brinquedo e da brincadeira deve ser uma preocupação constante do profissional que trabalha com a criança de 0 a 5 anos. Esse lugar de mediador deixa espaço para que a criança se aproprie do brinquedo e da brincadeira a partir do seu próprio ponto de vista. Assim, os significados e apropriação dos brinquedos variam de região para região. A seguir, apresentaremos algumas brincadeiras que as crianças brincam e que podem aparecer em diferentes versões. O(a) professor(a) pode ampliar esse repertório com brincadeiras que constituíram sua própria história, bem como com aquelas trazidas pelas crianças e por suas famílias. Brincadeiras de roda As cantigas de roda são, em regra, folguedos folclóricos. A forma mais comum é a roda simples, em que as crianças se movimentam e cantam simultaneamente. As brincadeiras de roda assumem formas diferentes nas diversas regiões do Brasil. Um exemplo disso é a cantiga, mais conhecida como “A canoa virou”. É uma cantigade roda, onde uma das crianças fica no centro da roda. Adriana Friedmann (2004, p. 127) apresenta pelo menos quatro versões conhecidas. Veja uma delas: A canoa virou Por deixar ela virar Foi por causa da Fulana (nome da criança) Que não soube remar Tirilim pra cá Tirilim pra lá A Fulana é velha E não quer se casar OUTRAS CONEXÕES Leia os livros de Adriana Friedmann. Abaixo a sugestão de 2 títulos: 1. Brincar no Cotidiano da Criança, da Editora Moderna. O livro aborda a forma como a criança brinca, por que e como observá-la no processo das suas brincadeiras e como trazer para o cotidiano da escola as brincadeiras tradicionais. 2. A Arte de Brincar: Brincadeiras e Jogos Tradicionais, da Editora Vozes. Nesse livro Adriana reúne mais de 200 brincadeiras tradicionais.

Jogos de perseguir, procurar e pegar ” Os jogos de correr, pegar, procurar, são muito apreciados pelas crianças. São jogos onde o objetivo é perseguir os adversários. Nesses jogos, as crianças aprendem a lidar com regras e a brincar em grupo. No quadro acima, do artista francês André Henri-Dargelas (1828-1906), vemos um exemplo desse tipo de brincadeira, chamada “cabra-cega”. Esse quadro foi pintado no final do século XIX. Outra brincadeira, também no mesmo estilo é a brincadeira chamada “chicotinho queimado”. A mesma autora citada anteriormente, Adriana Friedmann (2004), apresenta outros nomes para uma mesma brincadeira: “corre cotia”, “lencinho”, “lencinho branco”, “lenço na mão”, “lenço atrás”. Poderíamos ainda acrescentar: “batata quente” e “galinha choca”. E pode ser que você ainda conheça um outro nome para a mesma brincadeira! Veja, a seguir, a descrição dessa brincadeira, adaptada do livro “A arte de brincar”, dessa autora:

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Lenço atrás Dispõem-se os jogadores em círculo, voltados para o centro e ligeiramente afastados uns dos outros. Escolhida por sorte, uma criança permanecerá fora do círculo e segurará um lenço (ou um objeto como uma bola, um graveto). Dado o sinal de início, o jogador de posse do lenço (ou do objeto escolhido) corre ao redor do círculo com o fim de deixá-lo cair atrás de uma das crianças. Enquanto a criança corre, as crianças do círculo, de olhos fechados vão cantando: Corre cotia na casa da tia corre cipó na casa da vó lencinho na mão caiu no chão moça bonita do meu coração posso jogar? Pode! Agora, todos de olhos abertos, assim que a criança, atrás de quem foi deixado o lenço, perceber que o lenço está ali, deverá apanhá-lo e sair correndo atrás do jogador que deixou cair, procurando prendê-lo antes de ocupar o lugar vago. Se a criança que deixou o lenço cair for presa, ficará “choca”, indo para o meio do círculo onde permanecerá sentada. O jogador que ficar de posse do lenço continuará correndo em torno do círculo e repetirá a ação, colocando o lenço atrás de uma das crianças e procurando ocupar o seu lugar. Se for pego, ficará no lugar da criança que está no “choco”, e esta voltará para a roda. A brincadeira pode continuar até que todos tenham oportunidade de jogar o lenço ou enquanto permanecer o interesse das crianças pela brincadeira. (Adaptado do livro “A arte de brincar”, de Adriana Friedmann, 2004. p. 55.)

Brincadeiras ritmadas As brincadeiras ritmadas estão presentes principalmente no folclore. As crianças se encantam em repetir, inventar e reinventar quadras que implicam habilidades da memória, das mãos e da voz. Assim como as brincadeiras apresentadas anteriormente, as brincadeiras que se baseiam na verbalização ou no canto assumem diferentes versões também. Friedmann (2004, p. 138-140) apresenta sete versões da mesma parlenda. Veja três dessas versões: Parlendas Hoje é domingo, Pé de cachimbo; Cachimbo é de barro, Bate no jarro; O jarro é de outro, Bate no touro; O touro é valente, Bate na gente; A gente é fraco, Cai no buraco; O buraco é fundo, Acabou-se o mundo. (Bom Retiro)

Amanhã é domingo, Pé de cachimbo; Galo Monteiros; Pisou na areia; Que dá no sino; O sino é de ouro, Que dá no besouro; O besouro é de prata, Que dá na mata; A mata é valente, Que dá no tenente; O tenente é mofino, Que dá no menino; O menino é valente, Que dá em toda gente. (Rio de Janeiro/Sergipe)

Amanhã é domingo, Pé de cachimbo; O cachimbo é de ouro, Bate no touro; O touro é valente, Chifra a gente; A gente é fraca, Cai no buraco; O buraco é fundo, Acabou-se o mundo. (Bela Vista/Belém)

Ao estar atento a todas essas possibilidades de brinquedos e brincadeiras, o(a) professor(a) atua como mediador(a) entre a criança e o mundo que a cerca, trazendo a cultura, ampliando as possibilidades de a criança significar o mundo à sua volta.

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OUTRAS CONEXÕES:

Acesse no Portal do MEC, no link Publicações, o material “Brincar para todos”. O material é destinado aos educadores e pais com orientação para a utilização de brinquedos e atividades lúdicas, principalmente para crianças com deficiência visual, alertando para a importância de cada brinquedo na promoção do

desenvolvimento infantil. São apresentados 105 brinquedos de fácil confecção.

3 - Interações e brincadeiras possibilitando a construção de relações afetivas e éticas na Educação Infantil 3-1 O papel mediador do professor na construção da subjetividade, de relações afetivas e éticas Por meio das várias interações estabelecidas com as crianças e entre as crianças nas instituições de Educação Infantil, elas aprendem a conviver com seus sentimentos, a conviver com adultos e crianças e a descobrir formas variadas de lidar com as adversidades. O fato de o(a) professor(a) valorizar as manifestações das crianças, propor e participar das suas brincadeiras e garantir às crianças essa possibilidade é fundamental para que elas se sintam à vontade para expressarem suas ideias e sentimentos. Além disso, a referência que o(a) professor(a) representa para elas as ajuda a se conhecerem melhor. Ao retornar para si o olhar e as palavras impregnadas de sentidos que o outro lhe transmite, a criança acaba por construir sua subjetividade a partir dos conteúdos sociais e afetivos que este olhar e estas palavras lhe revelam. (JOBIM e SOUZA. 2000.p.27) Na Educação Infantil, o(a) professor(a) é o adulto que convive mais de perto com as crianças. Por isso, torna-se fundamental observar o que as crianças fazem ou dizem, de modo a captar uma idéia e devolvê-la ao grupo em forma de desafio, provocação. Tanto as idéias de uma criança em particular como as idéias do grupo podem ser transformadas em propostas para a sua turma. À medida que a criança sente que o adulto valoriza suas idéias, seus interesses, suas brincadeiras, suas hipóteses, ela vai fortalecendo o seu vínculo, ou seja, a sua ligação com os adultos e com o espaço. A criança passa a olhar para si mesma como alguém que é capaz, que pode fazer a diferença no seu meio. Especialmente nos primeiros anos de vida, período em que muitas crianças freqüentam as creches e pré-escolas, a dependência dos pequenos em relação ao outro constitui uma peculiaridade especial do desenvolvimento. Essa dependência vai se transformando gradualmente, à medida que a criança vai conquistando novas formas de ação. Desde bebês, nós, humanos, possuímos uma certa organização do comportamento e algumas condições para perceber e reagir às situações exteriores, principalmente aos parceiros diversos que formam nosso meio social. É na relação com os outros que vamos compreendendo o mundo, dando significado para as ações, dominando formas de agir, pensar e sentir presentes em nossa cultura, desenvolvendo a capacidade de expressão e de linguagem. Tomemos como exemplo o comportamento do bebê em seus primeiros meses de vida. Inicialmente, ele chora em reação a diferentes incômodos e ajustes orgânicos: cólicas, sono, fome, necessidades de higiene etc. Os adultos responsáveis pelos cuidados com o bebê – normalmente a mãe ou o pai – reagem ao seu choro e tomam atitudes

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para ampará-lo, oferecendo- lhe alimento, colo, trocando suas fraldas etc. Sendo assim, de certa forma, o bebê vai ensinando aos adultos como estes devem se comportar para atender às necessidades que ele manifesta. Pouco a pouco, o bebê percebe que sempre que chora obtém a atenção de seus objetos de afeição e, então, começa a chorar não mais como ação reflexa. Agora seu choro se torna intencional, isto é, ele chora para obter a atenção desejada e a resolução de seus desconfortos. Depois de algum tempo, podemos até diferenciar quando o choro indica fome, ou sono, ou apenas necessidade de proximidade física. Não apenas o bebê vai controlando seu choro (mais intenso, mais alto), como também os adultos que se relacionam com ele vão aprendendo, na interação, a diferenciar suas formas de expressão. É necessário destacar que a forma como o adulto vai compreender esse choro será fundamental para que a criança vá também dando um sentido às suas sensações. Para o bebê, embora reconheça o desconforto físico, a discriminação entre o que exatamente “está lhe incomodando” não é clara. Se, por acaso, o adulto reage ao choro do bebê, achando que sempre que ele chora é porque está com fome e o alimenta, é provável que o bebê comece a associar suas sensações de desprazer àquela forma de conforto apresentada pelo adulto (nesse caso, ao alimento). É importante investigarmos as expressões infantis, tentando compreender os diferentes significados que se expressam em seus comportamentos. Será por meio da ajuda do adulto que desde muito cedo o bebê irá compreender e dar sentido ao que sente e vive. A comunicação entre a criança e seus parceiros – sejam eles adultos ou crianças – se dá muito precocemente. O papel do adulto, em especial, é compreender a criança para ajudá-la a compreender a si mesma e ao mundo. Vemos também que, nesse contexto, a imitação tem lugar privilegiado como forma de a criança aprender sobre o outro, sobre si e sobre tudo o que está ao seu redor. Com isso, ela também amplia suas possibilidades de expressão. É observando os adultos de referência – suas expressões, seus gestos, suas falas – que o bebê vai conhecendo o mundo, o outro e a si mesmo. Os conflitos entre as crianças são bons exemplos de como o adulto pode ser um mediador dos relacionamentos entre elas na prática cotidiana, pois, para que o (a) professor(a) possa intervir adequadamente, precisa observar o que motivou o conflito, quais as crianças envolvidas nele e de que forma aquelas crianças têm conseguido expressar seus desagrados e resolver seus impasses. Vejamos como isso acontece na situação descrita a seguir. Um grupo de crianças de 3 anos brinca no pátio de areia, sob a supervisão da professora. Pedro e Lucas iniciam uma disputa por um baldinho de areia. Antes que a professora pudesse intervir, Pedro bate com uma pazinha de plástico na testa de Lucas, arranhando-o. Lucas começa a chorar. A professora abaixa-se e conversa com os dois meninos. Dirige-se a Pedro e mostra a ele que Lucas está chorando, sugerindo que façam algo para cuidar do colega machucado. Leva os dois pela mão até o banheiro e pede que Pedro ajude a limpar o arranhão na testa do colega. Vai, então, orientando-o a lavar as próprias mãos e passá-las, ainda molhadas, na testa do colega. O gesto é repetido, posteriormente, agora com um algodão embebido em soro. Aos poucos, Lucas e Pedro vão se acalmando; o gesto inicial de agressão vai se tornando um gesto de carinho, de cuidado com o outro.

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Muitas vezes, é com a mediação do adulto que a criança vai experimentando novas condutas que, sozinha, ainda não seria capaz de vislumbrar. Vale destacar que, especialmente nos primeiros anos de vida, atitudes como a descrita acima não podem ser consideradas simplesmente agressões. A criança pequena, de um modo geral, não tem ainda plenamente desenvolvida sua capacidade de expressão pela fala e está construindo um entendimento sobre os efeitos que suas ações causam nos outros. Portanto, bater, puxar um brinquedo da mão de outra criança ou mesmo morder podem significar uma inabilidade da criança para lidar com a situação. Para as crianças, é ainda um desafio perceber que não é apenas seu próprio desejo que deve ser considerado, bem como compreender que suas ações provocam reações. O papel do(a) professor(a) é ir ajudando a criança a construir este entendimento de si mesma e do outro, bem como desenvolver formas de resolução de conflitos baseadas no cuidado com o amigo, no respeito e no afeto. O afeto irá facilitar o estabelecimento de vínculos entre a criança, o(a) professor(a) e seus(suas) colegas e os objetos do conhecimento, pois é ele quem suscita motivos para a ação. Promover a capacidade da criança para relacionar-se desde cedo com parceiros diversos, particularmente com outras crianças, é uma ação fundamental por parte do(a) professor(a) de Educação Infantil. Atualmente vivemos uma crise dos laços de solidariedade entre os adultos, especialmente no mundo do trabalho, que tem se expandido para outras esferas da sociedade. “Cada um por si” é o lema no qual o que vale é o próprio interesse. Para que possamos nos contrapor a essa cultura do individualismo, é preciso promover momentos de troca e de partilha entre as crianças, tendo em vista que nascemos disponíveis para o contato com o outro e dependemos dele para nosso desenvolvimento. Como isso pode ser feito na prática? Atitudes simples podem ser tomadas. Promover brincadeiras em que as crianças se relacionem e percebam umas às outras é um bom caminho. No caso das crianças bem pequenas podemos, por exemplo: 1. Promover um jogo de bola em círculo em que o(a) professor(a) vai nomeando cada criança para quem passa a bola e incentivando-a a jogar a bola para outra criança. 2. Quando houver disputas por brinquedos, o(a) professor(a) pode intervir propondo uma brincadeira coletiva com o objeto da disputa, de modo que esse objeto possa ser compartilhado. 3. O(a) professor(a) pode fazer um mural com fotos e/ou desenhos das crianças em diferentes situações de brincadeira, relembrando os momentos vividos e fortalecendo o reconhecimento do sentido de grupo. 4. Promover situações de brincadeiras que envolvam o toque, a aproximação, o carinho, as manifestações de afeto. Assim, o aprendizado da convivência pode ser potencializado nos espaços de Educação Infantil. São nesses locais que, privilegiadamente, as crianças poderão aprender a negociar com o outro, reconhecer diferentes pontos de vista, lidar com conflitos de interesse, promover situações cooperativas, internalizar regras, trocar afeto etc. No ambiente das creches, pré-escolas e salas de Educação Infantil, as crianças poderão ter múltiplas oportunidades de se relacionarem, desenvolvendo formas de comunicação variadas e vivenciando diferentes desafios que a convivência põe em cena.

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Se, como vimos em item precedente, a imitação é uma forma de conhecer o outro, de compreender formas de se relacionar e expressar a partir da vivência com os parceiros – crianças e adultos, será, então, a partir da interação que as crianças descobrirão formas socialmente construídas de estarem juntas, se comunicarem, construírem regras coletivas. É o encontro com o outro que favorece nosso desenvolvimento. OUTRAS CONEXÕES: Leia o texto ““Relações entre crianças e adultos na Educação Infantil” de Iza Rodrigues Luz. . Disponível no Portal do MEC. Texto elaborado por solicitação da Coordenação de Educação Infantil (COEDI / SEF / MEC) para subsidiar a discussão das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil ( Resolução 5/2009).

3-2 Construindo laços de afetividade e de amizade Quando o(a) professor(a) está atento(a) ao que acontece com as crianças, pode favorecer o desenvolvimento de relações de troca, afeto e confiança, condição fundamental para ajudar a criança a lidar com seus conflitos e para propiciar o brincar junto. Canção da América “Amigo é coisa para se guardar debaixo de sete chaves, dentro do coração. Assim falava a canção que na América ouvi (...) Currupio, “Cenas infantis”. Amigo é coisa para se guardar Sandra Guinle no lado esquerdo do peito, mesmo que o tempo e a distância digam não...” Milton Nascimento

Brincar é coisa de amigos! Quanto mais estreitos os laços de afeto, mais os espaços e as situações de brincar se expandem. O brincar possibilita a aprendizagem da sociabilidade e a construção de uma ordem social própria pelas crianças. De acordo com os teóricos que vêm estudando a Sociologia da Infância, esse é um espaço para se fazer amigos. Experiências de infância são infinitas. Considera, nesses estudos, não só as adaptações e internalizações dos processos de socialização, mas também os processos de apropriação, reinvenção e reprodução realizados pelas crianças. Essa noção de socialização, na sociologia da infância, busca compreender as crianças como atores capazes de criar e modificar culturas, embora inseridas no mundo adulto. Os principais pesquisadores são: Willian Corsaro, Manuel Sarmento, Manuela Ferreira, Cristina Gouvea, Manuel Pinto, entre outros. Num contexto mais estável, como, por exemplo, o propiciado por uma Instituição de Educação Infantil, onde as mesmas crianças costumam estar sempre juntas, as brincadeiras tendem a se repetir: repetem-se os temas, os papéis assumidos, as regras definidas, as tramas. Essa repetição das interações, criando padrões de ação conhecidos para os atores envolvidos, reforça as relações sociais entre as crianças e possibilita sua transferência para outros espaços e atividades (FERREIRA, cit. p. 92). Assim, no brincar, as crianças aprendem como interagir, a construir e a reconstruir as relações sociais como sujeitos competentes, membros participantes e integrados no grupo de crianças. A criação de regras, às quais todos devem se submeter, além de permitir ao grupo se auto-estruturar, possibilita a cooperação entre as crianças. Como

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afirma Corsaro (1997), o brincar cria oportunidades para as crianças se sentirem parte integrante de um grupo, para fazerem e encontrarem amigos, conseguindo, assim, participar de uma cultura de crianças. (SALLES & FARIA, 2012) OUTRAS CONEXÕES: Na internet você encontra vários projetos sobre o brincar. Pesquise sobre essas iniciativas. Algumas indicações: a. “Projeto Território do Brincar”, coordenado pela educadora Renata Meirelles e pelo documentarista David Reeks. O Projeto é um trabalho de escuta, intercâmbio de saberes, registro e difusão da cultura infantil. No site você encontra fotos, vídeos e textos que trazem a voz das crianças do Brasil. Disponível em www.territoriodobrincar.com.br.

b. “Projeto Brincar” do CENPEC, Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária, disponível no site www. cenpec.org.br/brincar. O projeto propõe formação para profissionais que atuam com crianças, visando o aprimoramento de práticas no desenvolvimento de atividades lúdicas, expressivas e recreativas.

c. “Projeto Bira” - Brincadeiras Infantis da Região da Amazônica, disponível no site www.projetobira.com. O Projeto Bira, coordenado Renata Meirelles e David Reeks, apresenta pesquisas na área da cultura lúdica infantil.

d. “ Projeto Memórias do Futuro” – Olhares da Infância brasileira - pesquisa sobre a cultura da infância do Brasil. Disponível em www.memoriasdofuturo.com.br. São muitas as situações diárias que envolvem interações criança-criança e criança-adulto: as rodas de conversa, onde está em jogo o aprendizado da escuta do outro e da própria expressão; as refeições, quando todos compartilham o alimento, conversam sobre suas experiências; nas brincadeiras, quando precisam encontrar formas de incluir as diferentes idéias, vontades, movimentos uns dos outros; as histórias, quando se acomodam de forma que todos possam ver o livro que o(a) professor(a) mostra etc. Enfim, todos os momentos partilhados no cotidiano da Educação Infantil podem convidar as crianças a estabelecerem relações umas com as outras em trocas intensas e constantes. Conflitos, como já dissemos, são inevitáveis nesse contexto, seja em função do desejo por um mesmo brinquedo ou dificuldades em estabelecimento de combinados coletivos. O(a) professor(a) será o(a) principal mediador(a) nesses momentos, não resolvendo os impasses pelas crianças, mas ajudando-as a olharem para as situações de conflito conjuntamente, buscando com elas formas de resolução, esclarecendo as diversas formas de compreensão que se colocam em cena. Em alguns momentos, aflitos(as) com os desentendimentos infantis, os(as) professores(as) acabam tomando atitudes mais drásticas, separando algumas crianças para manter a “disciplina”. Ao contrário disso, o importante é estimularmos o desenvolvimento da autonomia na criança, entendendo por autonomia a possibilidade de ela fazer escolhas por si própria sem que seja necessário um rígido controle externo. O(a) professor(a) será sim o(a) mediador(a) nos momentos de conflito, mas sem impedir que a criança possa buscar formas de se comunicar com seus parceiros, de fazer com eles combinados. Será no confronto e na vivência tranqüila destes momentos de embate – com o apoio do(a) professor(a) – que a criança vai construir com autonomia uma disciplina que norteará seu comportamento social.

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Toda essa discussão nos aponta para a importância de criarmos ambientes propícios ao brincar e ao estreitamento das relações entre as crianças, compreendendo que as experiências compartilhadas são condições importantes para que isto ocorra efetivamente. OUTRAS CONEXÃO: Para saber mais sobre a Sociologia da Infância e, mais especificamente, sobre a análise do brincar de acordo com estudiosos dessa ciência, leia: 1. Texto: “Sociologia da infância: pesquisa com crianças” de Ana Cristina Coll Delgado e Fernanda Müller. Disponível em: www.scielo.br/pdf/es/v26n91/a02v2691.pdf

2. Texto:“As culturas da infância nos espaços-tempos do brincar: estratégias de participação e construção da ordem social em um grupo de crianças de 4-6 anos” , de Angela Meyer Borba. Disponível em www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT07-2229--Int.pdf.

3. Livro: Estudos da Infância, Maria Cristina Gouvea e Manuel Sarmento, da Editora Vozes.

3-3 Relações Interpessoais: educar para a paz e a solidariedade “Importa hoje conceder cidadania à nossa capacidade de sentir o outro, de ter compaixão com todos os que sofrem, humanos e não humanos, de obedecer mais à lógica do coração, da cordialidade e da gentileza, do que à lógica da conquista e do uso utilitário das coisas.”( BOFF, 1999). Paz e a solidariedade são pensamentos, sentimentos e atitudes que são formados no relacionamento social. Em outras palavras: É nas relações com as outras pessoas que nós nos educamos para sermos pessoas de paz e para vivermos solidariamente. Assim, para se conquistar a paz, é necessário pensar em educar para a paz e, consequentemente, considerar a formação das pessoas para os valores humanos, tais como o respeito, a cooperação, a solidariedade, a tolerância, dentre outros. A Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou, em outubro de 1999, a Declaração sobre uma cultura de paz e um programa para colocar em ação seus objetivos e diretrizes. A ONU define cultura de paz como um conjunto de valores, atitudes, tradições, comportamentos e estilos de vida baseados no respeito e na promoção dos direitos fundamentais da pessoa humana e das sociedades. Cultura de paz e direitos humanos, portanto, estão profundamente relacionados. A seguir, vamos trazer alguns desses valores para a realidade da Educação Infantil, para que os(as) professores(as) possam refletir sobre seu papel na promoção de um ambiente de paz e solidariedade no seu trabalho junto às crianças, que contribua para sua formação como sujeitos éticos. É importante ressaltar que, nessa etapa da Educação Básica, esses valores se concretizam nas diversas interações e nas brincadeiras vivenciadas pelas crianças nas creches e pré-escolas, mediadas pelo(a) professor(a).

Esse valor se refere ao respeito à vida humana, em geral, à vida de cada criança, em particular, à vida dos animais, das plantas, à vida do Planeta Terra, os quais são bastante desrespeitados na sociedade contemporânea. No Brasil, a cada ano, mais de 100 mil crianças não completam o seu primeiro ano de vida. Entre 2 mil e 3,5 mil mães morrem das conseqüências da falta de atendimento de qualidade durante a gravidez, o parto e após o parto. Os riscos para a mãe e seu filho aumentam por insuficiência de micronutrientes, como vitamina A e iodo, por alta incidência de desmame precoce

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antes dos 6 meses de vida, por falta de informações adequadas sobre os cuidados necessários ou por falta de acesso a serviços básicos de saneamento. Os cuidados têm de começar antes mesmo de a criança nascer. A mulher grávida precisa fazer pelo menos seis consultas pré-natais e de orientações sobre como garantir o melhor começo de vida a seu bebê. (dados colhidos no site da UNICEF – www.unicef.org.br) No trabalho da Educação Infantil, o respeito à vida implica a consciência das condições de vida das crianças e suas famílias e a mobilização em relação a ações que possam modificar quadros como esses. No que diz respeito à vida do planeta esta questão está hoje na ordem do dia, quer dizer, há uma grande preocupação com a sobrevivência da Terra. A civilização humana pode ser destruída pelas bombas atômicas armazenadas, pelas armas químicas, mas também a Terra pode se tornar um deserto sem vida por causa do processo de degradação de seus recursos naturais (água, ar, florestas etc.). O respeito à vida de nosso planeta passou ser um novo tema da ética. Nesse sentido é fundamental que no trabalho cotidiano com a criança essa questão esteja presente, permeando as atitudes do professor e as ações desenvolvidas com as crianças.

Fim da violência Felizmente, nosso sistema de ensino não admite mais os castigos e o Estatuto da Criança e do Adolescente não permite agressão e violência contra a criança. Mas ainda há muitas formas de violência encoberta, por exemplo, recusar-se a falar com a criança porque ela fez alguma coisa que desagradou à professora; proibi-la de ir ao parque com as outras por causa de uma atitude desaprovada; impor a própria vontade sobre a dela, em vez de dialogar e negociar; não ouvir os argumentos que apresenta para justificar porque fez isso ou aquilo; magoá-la com uma palavra; acusá-la em público; exigir que delate um coleguinha; impor uma sanção a toda a turma porque uma ou outra criança fez alguma coisa “errada”; ter preferências manifestas por algumas crianças etc. Para viver a paz, não basta não bater, não ofender, não magoar, não discriminar. Muito mais do que “não”, ela é “sim”: isto é, um sentimento e uma ação afirmativa de respeito ao outro, de convivência respeitosa. É a escolha do diálogo como meio de resolver desentendimentos, é dar mais atenção àquilo que aproxima e une, do que ao que diferencia e separa. Temos vivido tempos difíceis. Somos expostos a imagens da guerra, tanto no contexto internacional como nos confrontos urbanos que tiram a vida de cidadãos inocentes. O tempo que vivemos, por um lado, com adolescentes (e até crianças) se envolvendo com o crime organizado e, por outro, a situação de miséria e pobreza e a omissão do Estado são um cenário pouco favorável para se trabalhar com e a partir da utopia. (BAZÍLIO e KRAMER, 2003. p.108) De acordo com os autores citados, se temos consciência de que a guerra não é apenas ausência de paz, não podemos negar que a guerra destrói tanto vidas quanto a possibilidade de diálogo, cria um clima de insegurança, põe em dúvida as certezas e, principalmente, tira a possibilidade do entendimento. Não podemos ver a guerra e o conflito como solução, pois o que trazem consigo é a destruição do outro. Ao contrário, precisamos reafirmar nossas possibilidades de lutar contra as injustiças e opressões. Precisamos nos importar, colocar em dúvida o que a mídia coloca como certeza, buscar o diálogo e viver a esperança, como nos diz a canção:

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Dias melhores Rogério Flausino – Jota Quest Vivemos esperando Dias melhores Dias de paz, dias a mais Dias que não deixaremos pra trás Vivemos esperando O dia em que seremos melhores Melhores no amor, melhores na dor Melhores em tudo Vivemos esperando O dia em que seremos para sempre Vivemos esperando Dias melhores pra sempre O espaço da Educação Infantil deve possibilitar às crianças viver, hoje, relações mais amorosas e mais pacíficas, que podem anunciar o fim da violência e a esperança em dias melhores.

Respeito à liberdade de expressão No Brasil, felizmente, em nossos dias conquistamos a liberdade de expressão. Essa foi uma luta de toda uma geração para a garantia desse direito do qual, em momento algum, podemos abrir mão. Nesse sentido é necessário criar espaços e momentos nas instituições de Educação Infantil para a manifestação das diversas formas de expressão, garantindo o direito de todas as crianças expressarem seus sentimentos, seus desejos, necessidades e possibilidades, tanto por meio da fala, quanto do gesto, da música, da dança, do teatro, das várias formas de expressão plástica, da escrita etc. É fundamental, ainda, que suas produções sejam valorizadas.

Respeito à liberdade de informação A curiosidade é um impulso para conhecer. Reprimi-la é uma forma de violência contra a inteligência, o desejo de descobrir, a necessidade de saber. Educar para a paz, nesse item, implica atender à curiosidade das crianças, alimentar seu desejo de saber, responder às suas perguntas, oferecer-lhe os meios de acesso ao conhecimento.

Respeito à liberdade de opinião A riqueza de um grupo está na diversidade de visões, de opiniões e de disposição para conhecer e fazer alguma coisa e na capacidade de chegar ao consenso ou a uma decisão democrática. Impedir que os discordantes se manifestem ou participem do planejamento nega o direito à opinião, discrimina, exclui e gera reação oposta. Se queremos promover uma cultura de paz, em vez de suprimir as individualidades das crianças, de uniformizar a pluralidade do grupo, devemos conciliar opiniões divergentes, encontrar formas de atender a todos ou, no caso de serem inconciliáveis, podemos decidir democraticamente: fazemos votação e a maioria vence.

Na maior parte do tempo, o ambiente da Educação Infantil é tranquilo, as crianças brincam, se entendem, se ajudam, participam animada e alegremente das mesmas

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atividades. Mas nas múltiplas relações estabelecidas no cotidiano, principalmente entre as crianças, há situações de conflito, diante das quais o(a) professor(a) precisa ter habilidade para mediar a solução.

Na creche, pré-escola ou escola onde funcionam turmas de Educação Infantil e, particularmente, na sala de atividades, a gestão democrática pode ser vivida em vários momentos, como, por exemplo, nas brincadeiras, na elaboração com as crianças, dos projetos de trabalho ou do plano diário das atividades, na avaliação, dentre outros. Assim, a escolha das brincadeiras, a definição dos participantes, a divisão de brinquedos disponíveis na IEI são momentos privilegiados para exercitar o espírito democrático junto às crianças. Se o(a) professor(a) lhes pede para sugerirem os temas de trabalho, se planeja com elas o que o grupo vai fazer, se a distribuição das tarefas é feita com a participação de todos, ele(a) está exercendo a democracia com sua turma de crianças. No trabalho com bebês, também é possível agir democraticamente. Temos a tendência de trazer tudo pronto para eles. Embora ainda não falem, eles têm suas próprias formas de se expressarem: choro, balbucio, gritinhos, expressão de alegria, retraimento, agressividade, movimentos do olhar, da mão ou do corpo inteiro em direção a alguma coisa são formas capazes de transmitir ao(à) professor(a) suas necessidades, seus desejos, seus problemas, seus gostos e suas vontades. Prestar atenção a tais formas e procurar atender ao que os bebês estão dizendo é agir democraticamente. Por meio dessas expressões, os bebês estão participando e exercendo influência no planejamento e no desenvolvimento das atividades propostas pelo(a) professor(a). A avaliação, junto às crianças, das tarefas propostas também pode se constituir em momento em que a gestão democrática pode se tornar realidade. Isso é feito quando se discute com as crianças: o que pode ser registrado do progresso que vai sendo obtido pela turma e por cada uma delas em particular; do que falta fazer; do que não deu certo; das causas ou motivos por que algo não foi realizado.

A rigidez torna as pessoas pusilânimes, isto é, pequenas, fechadas, mesquinhas. A magnanimidade, isto é, aquele jeito de ser generoso, de ter espírito aberto, compreensivo, desperta as crianças a terem alma grande. O intolerante se julga melhor que os outros, o perfeito, a referência para o comportamento dos demais. O tolerante, ao contrário, é o que releva, perdoa, compreende os motivos por que o outroagiu daquele modo, embora não se omita, não deixe passar tudo o que é errado, e não aceite humilhação. O tolerante “não faz tempestade em copo d’água”. Quem escolhe como profissão educar crianças está diante da oportunidade de ajudá-las a terem uma visão aberta, ampla, compreensiva do mundo e das pessoas. Isso pode ser concretizado nas várias interações estabelecidas entre adultos e crianças, e entre as próprias crianças. As brincadeiras oferecem oportunidade ímpar de praticar a tolerância.

Solidariedade Precisamos ser também solidários. Não olhar apenas os nossos próprios interesses, mas estarmos comprometidos com as necessidades dos outros.

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Segundo o dicionário Aurélio, solidariedade significa: Relação de responsabilidade entre pessoas unidas por interesses comuns, de maneira que cada elemento do grupo se sinta na obrigação moral de apoiar o(s) outro(s). Nessa perspectiva, promover a solidariedade no trabalho da Educação Infantil, quer seja nas brincadeiras ou nas diversas interações vivenciadas no cotidiano, é criar condições para que as crianças tenham interesses comuns e sintam-se, por isso, impulsionadas a apoiar, ajudar e estar junto às outras crianças.

As brincadeiras e outras atividades em grupo exercitam a cooperação, põem em prática a participação de vários indivíduos num mesmo projeto ou ação, ensinam a integração das capacidades de cada um, levam à descoberta do outro, à valorização de suas qualidades. .

O respeito às culturas diferentes da nossa significa admiração pela sua beleza. Por meio desse respeito, podemos chegar ao conhecimento da profundidade de uma determinada cultura enquanto criação histórica de um povo. Esse respeito rejeita a dominação cultural pretendida pela cultura dominante.

Diálogo Todos os documentos internacionais que têm por objetivo promover a paz falam em diálogo. Isso porque o diálogo é a abertura do ser humano para o outro: implica ouvir e falar, entender o ponto de vista do outro e expor o seu próprio com a clareza possível. O diálogo procura chegar a um ponto comum. Há situações em que as pessoas falam sem ouvir, querem impor seus pontos de vista sem considerar o do outro. Quem aposta no diálogo tem muito mais chance de conseguir a paz, o entendimento, a solução dos problemas. Tão importante quanto escutar as crianças, é o(a) professor(a) ter um estilo de comunicação com as crianças que provoque interação, respostas, novas afirmações. Nesse sentido, em sua prática, o(a) professor(a) deve observar sua comunicação com as crianças: a maior parte das suas falas na sala dá chance a respostas, a opiniões, a uma conversa? Ou, ao contrário, é uma comunicação vertical, em que predominam a narração, a orientação às atividades, as ordens, proibições, chamadas de atenção, pedidos, elogios?

As crianças têm uma sensibilidade muito grande com relação às plantas, aos animais, à natureza toda. A infância é um período muito importante para a formação de valores permanentes de amor e proteção à natureza, ao Planeta Terra, que se encontra

ameaçado pelo comportamento depredatório do ser humano. Aprender a reciclar, a usar materiais de sucata, dando novo sentido a coisas que já cumpriram sua primeira finalidade ajuda as crianças a enxergarem além da visão utilitarista e consumista. Passeios a sítios naturais são muito proveitosos tanto para as crianças conhecerem ecossistemas quanto para aprofundarem o sentimento de proteção do meio ambiente. E isso é importante para as crianças da cidade assim como para as do campo. Hoje, há um consenso mundial quanto à importância do resgate desses valores para se possibilitar relações mais humanizadas entre os sujeitos que convivem nos vários espaços de vida coletiva desse planeta. A Educação Infantil, como primeira etapa da

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Educação Básica, tem o compromisso social de cultivar esses valores, promovendo a formação ética de suas crianças, de modo a contribuir para uma cultura de paz e solidariedade. E essa educação só se concretiza por meio das relações que são estabelecidas com as crianças e entre as crianças nos espaços educativos.

GLOSSÁRIO Mediação: é a função de estabelecer a relação entre dois termos ou situações. Para a Psicologia Sócio-histórica, da qual Vygotsky é um dos autores mais conhecidos, a relação entre os seres humanos e o mundo é mediada pelos outros seres humanos com os quais convivemos e pela cultura onde estamos inseridos. A linguagem exerce um papel fundamental neste processo de mediação. Assembléia Geral das Nações Unidas: é o principal órgão deliberativo da Organização das Nações Unidas (ver ONU), que reúne todos os países membros. Todo o trabalho da ONU durante o ano é orientado pelas decisões da Assembléia Geral, expressas em Resoluções. Biodiversidade: variedade de vida no planeta Terra. Inclui a variedade genética das populações e espécies, da flora, da fauna e dos microorganismos. A biodiversidade é responsável pelo equilíbrio e pela estabilidade dos ecossistemas. Ecossistema: reunião, num mesmo espaço geográfico, de vários elementos em equilíbrio e auto-reprodução: os fatores físicos/ambientais (solo, água, atmosfera), a flora, a fauna e os microorganismos. Todos estão articulados em um ciclo vital, a chamada cadeia alimentar, responsável pelo equilíbrio e pela reprodução do sistema. Quando se provoca a extinção de uma espécie, por exemplo, pode-se ocasionar o desequilíbrio nesse sistema e causar sua morte. O estudo das interações entre os seres vivos e o meio ambiente e as condições necessárias para a reprodução das diferentes formas de vida é feito pela ecologia. Ética: como conhecimento, a ética é a parte da filosofia que estuda o comportamento humano sob o ponto de vista do bem e do mal. Ela propõe um modo de existir em vista da finalidade da vida humana. Aristóteles, na Ética a Nicômaco, diz que o objetivo da ética é uma vida pessoal boa, numa sociedade justa, solidária e pacífica. O cristianismo acrescentou: regida pela verdade, a justiça, o amor e a paz. A ONU, na Declaração dos Direitos Humanos, fundamenta a ética na dignidade da pessoa como valor fundamental.

Como ação, a ética é a arte de viver, que implica a livre escolha de princípios e valores que orientem para o bem comum. Comportamento ético é aquele que segue os princípios e valores da justiça, da verdade, da liberdade, da honestidade, da prudência, do respeito, do amor ao próximo etc. ONU: significa Organização das Nações Unidas. Foi criada em outubro de 1945, logo após o término da Segunda Guerra Mundial, por 51 países decididos a manter a paz mediante a cooperação internacional. Hoje, mais de 190 países são membros da ONU. Seus principais objetivos são: promover a paz, a solidariedade, a cooperação internacional, evitar a guerra, garantir os direitos humanos, assegurar a justiça internacional. Seus órgãos são: Assembléia Geral, Conselho de Segurança, Conselho Econômico e Social, Corte Internacional de Justiça, Conselho de Administração Fiduciária e Secretaria Geral. Tem vários programas, dois fundos (PNUD e UNICEF) e diversos organismos especializados. Esses organismos funcionam como entidades independentes, vinculados à ONU, e se encarregam de áreas específicas como educação, ciência e cultura (UNESCO), alimentação e agricultura (FAO), saúde (OMS), trabalho (OIT), comércio (OMC).

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Visão utilitarista: o jeito de olhar para as coisas pelo seu lado de serventia, de valor para satisfação imediata de algum desejo. A que dá valor às coisas só pela sua utilidade, sacrificando seu significado mais profundo em troca do prazer egoísta que ela pode oferecer. Interacionistas : Corrente de estudiosos que levam em conta tanto os aspectos inatos quanto influências do ambiente no desenvolvimento humano Para eles, por meio da interação com outras pessoas mais experientes é que a criança vai construindo suas características (sua maneira de pensar, sentir e agir) e sua visão de mundo (seu conhecimento). Piaget, Vygotsky e Wallon podem ser considerados como interacionistas, pois defendem que o conhecimento da criança é constituído nas interações dela com o meio. Piaget focaliza a construção do conhecimento científico que acontece através da relação do sujeito humano com o meio físico (objetos como brinquedos, pedaços de corda, madeira etc.). Vygotsky e Wallon consideram o meio social e cultural da criança como impulso para o desenvolvimento de cada uma. Zona de desenvolvimento proximal: distância entre nível real e proximal – o que hoje o sujeito realiza com ajuda e logo realizará sozinho. Materiais não estruturados: são os objetos comuns do cotidiano utilizados pelo(a) professor(a) no cotidiano da sala para o desenvolvimento de atividades com as crianças. Exemplos: sementes diversas, grãos de feijão, palitos de picolé, caixas, folha de papel, lápis, barbante, cordão, bolas de gudes, dados, baralho entre outros.

SUGESTÕES PARA LEITURA 1. ALMEIDA, A. M.; RUBIANO, M. R. B. Vínculo e compartilhamento na brincadeira de crianças. In: ROSSETTI, F. M. C. et al. Rede de significações e o estudo do desenvolvimento humano. Porto Alegre: Artmed, p. 171-188, 2003.

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3. BENJAMIN, Walter. Reflexões: a criança, o brinquedo, a educação. São Paulo: Summus Editorial, 1984.

4. BOFF, Leonardo. Saber Cuidar: ética do humano, compaixão pela Terra. Petrópolis: Vozes, 1999.

5. BROUGÈRE, Gilles. Brinquedo e cultura. Coleção Questões da Nossa Época, v. 43. São Paulo: Cortez Editora, 2001.

6. FRIEDMANN, Adriana. A arte de brincar: brincadeiras e jogos tradicionais. Petrópolis: Vozes, 2004. 7. JARES, Xesús R. Educação para a paz: sua teoria e sua prática. 2ª.ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.

8. KISHIMOTO, T. M. (org.). O brincar e suas teorias. São Paulo: Pioneira, 1998.

9. KISHIMOTO, Tizuco Morchida. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez Editora, 2001.

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11. MACHADO, Maria Lucia. Educação infantil e sócio-interacionismo In: OLIVEIRA, Zilma de. Educação infantil: muitos olhares. São Paulo: Cortez, 2001.

12. MAGALHÃES, Cláudio M., BENDER, Ivo. A criança e a produção cultural: do brinquedo à literatura. Porto alegre: Mercado Aberto, 2003.

13. MARQUES, Francisco. Galeio: uma antologia poética para adultos e crianças. São Paulo: Peirópolis, 2004.

14. NICOLAU, M. L. M., DIAS, M. C. M. (org.) Oficinas do sonho e realidade na formação do educador da infância. São Paulo: Papirus, 1999.

15. OLIVEIRA, Zilma de. A criança e seu desenvolvimento. São Paulo: Cortez, 2000.

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16. RICE, Chris & Melanie. As Crianças na História: Modos de vida em diferentes épocas e lugares. São Paulo: Ática, 1999.

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5. BARBOSA, Silvia Néli F. Nas tramas do cotidiano: adultos e crianças construindo a educação infantil. Dissertação Mestrado em Educação. Departamento de Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2004.

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8. BRASIL. Ministério da Educação. Resolução n. 5/2009, de 17 de dezembro de 2009. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: Conselho Nacional de Educação, Câmara de Educação Básica – CEB. Dez. 2009.

9. BAZÍLIO, Luiz Cavalieri, KRAMER, Sônia. Infância, educação e direitos humanos. São Paulo: Cortez, 2003.

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11. BENJAMIN, Walter. Rua de mão única. Obras escolhidas. vol. II. São Paulo: Brasiliense, 2000. 12. BOFF, Leonardo. Saber Cuidar: ética do humano, compaixão pela Terra. Petrópolis: Vozes, Petrópolis, 1999.

13. BROUÈRE, Gilles. Brinquedo e cultura. Coleção Questões da Nossa Época, v. 43. São Paulo: Cortez Editora, 2001.

14. CADMARTORI, Ligia. Crianças e quadrinho. In: MAGALHÃES, Cláudio M., BENDER, Ivo. A criança e a produção cultural: do brinquedo à literatura. Porto Alegre: Mercado Aberto, 2003. p. 45-62.

15. CARVALHO, Adriana Cintra de, OLIVEIRA, Marcelo Pires de. Leitura de histórias em quadrinhos: uma prática discursiva entre crianças não-alfabetizadas. In: http://www.csonlineunitau.com.br/comu/artigo2.html (acesso em 21.06.05).

16. COELHO, M. T. F., PEDROSA. M. I. Faz de conta: construção compartilhada de significados. In: OLIVEIRA, Z. M. R. A criança e seu desenvolvimento – perspectivas para se discutir a educação infantil. São Paulo: Cortez, 1997.

17. FERNANDES, Florestan. As “trocinhas” do Bom Retiro. In: FERNANDES, Florestan. Folclore e mudança social na cidade de São Paulo. Petrópolis: Vozes, 1979.

18. FRANCO, Camila, PIRES, Marcelo. Liga-Desliga. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 1992.

19. FREIRE, Madalena. A paixão de conhecer o mundo. São Paulo: Paz e Terra, 1983.

20. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

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21. FRIEDMANN, Adriana. A arte de brincar: brincadeiras e jogos tradicionais. Petrópolis: Vozes, 2004.

22. LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. São Paulo: Brasiliense, 1993. p. 13.

23. MACHADO, Maria Lucia. Educação infantil e sócio-interacionismo. In: OLIVEIRA, Zilma de. Educação infantil: muitos olhares. São Paulo: Cortez, 2001.

24. MAGALHÃES, Cláudio M. Criança e televisão: uma relação superpoderosa. In: MAGALHÃES, Cláudio M., BENDER, Ivo. A criança e a produção cultural: do brinquedo à literatura. Porto alegre: Mercado Aberto, 2003. p. 113-136.

25. MALAGUZZI, Loris. In: EDWARDS, Carolyn. GANDINI, Lella. FORMAN, George. As cem linguagens da criança: a abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira infância. Porto Alegre: Artmed, 1999.

26. MARQUES, Francisco. Galeio: uma antologia poética para adultos e crianças. São Paulo: Peirópolis, 2004.

27. MARQUES, Francisco. Muitos dedos: enredos. Um rio de palavras deságua num mar de brinquedos. São Paulo: Peirópolis, 2005.

28. MEIRELES, Cecília. Uma palmada bem dada. In: MEIRELES, Cecília. Ou isso ou aquilo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.

29. PEREIRA, Vera Wannmacher. Figurinha difícil. In: MAGALHÃES, Cláudio M., BENDER, Ivo. A criança e a produção cultural: do brinquedo à literatura. Porto Alegre: Mercado Aberto, 2003. p. 63-82.

30. POUGY, E. Criança e Arte: descobrindo as artes visuais. São Paulo: Editora Ática, 2001.vol. 4.

31. QUINTANA, Mario. Lili inventa o mundo. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1983.

32. Revista Nova Escola. Ano XV, nº 130. São Paulo: Abril Cultural, março de 2000.

33. ROCHA, Ruth. Teresinha e Gabriela. In: ROCHA, Ruth. Marcelo, marmelo, martelo e outras histórias. São Paulo: Salamandra, 1999.

34. SALGADO, Raquel Gonçalves. “Eu tenho a força!”: os super-heróis mirins nos desenhos animados e na vida. In: JOBIM, SOUZA, Solange (org.) Educação@Pós-Modernidade. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2003. p.75-87.

35. SALLES, Fátima & FARIA Vitória. Currículo na Educação Infantil: Diálogo com os demais elementos da Proposta Pedagógica. São Paulo: Ática, 2012.

36. VERÍSSIMO, L. F. Comédias para se ler na escola. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

37. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

38. VYGOTSKY, L. S. Imaginación y el arte en la infancia. México: Hispanica, 1987.

Sugestões de atividades para serem propostas ao professor em processos de formação continuada INTERAÇÕES, BRINCADEIRAS E RELAÇÕES INTERPESSOAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

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3- A interação como um dos eixos norteadores da proposta curricular da Educação Infantil 3-1- O papel das interações no desenvolvimento humano

1ª Atividade Quando olhamos o passado, ressignificamos a nossa história. Assim, sugerimos que você registre o nome de pessoas e fatos significativos que falem da sua origem e de outros momentos de sua história:

-escola? Entrou numa turma de Educação Infantil (ou num antigo jardim-de-infância)? Começou na classe de alfabetização, no Ensino Fundamental ou no antigo primário? Que sentimentos marcaram esse primeiro contato com a escola?

ndar de bicicleta, a costurar ou a fazer uma outra atividade do cotidiano? Você estava sozinho(a) nesse momento? Como foi? Quem lhe ensinou?

1-2 O papel das interações no ambiente escolar

2ª Atividade Vamos pensar na sua turma de Educação Infantil. Você seria capaz de identificar alguma situação onde as crianças estejam compartilhando conhecimentos? Sem dúvida deve haver várias propostas onde as crianças troquem conhecimentos e aprendam umas com as outras. Sugerimos que você observe as interações delas e registre uma dessas situações onde elas estejam aprendendo umas com as outras.

4- A brincadeira: o outro eixo norteador da proposta curricular da Educação Infantil 2-1 O brincar, o brinquedo e a brincadeira

3ª Atividade a) Você se recorda dos brinquedos da sua infância? Talvez seja um tempo bem

distante, talvez não tão distante assim. Pode ser que sejam tantos brinquedos e tantas brincadeiras... mas pode ser que um brinquedo tenha sido especial. Você pode descrever esse brinquedo? b) Por que você escolheu esse brinquedo? c) Esse brinquedo foi feito por alguém ou foi comprado?

4ª Atividade Faça uma lista de brincadeiras que você conhece. Depois assinale as que você costumava brincar em sua infância.

2-2 Os processos de aprendizagem e desenvolvimento do brincar

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5ª Atividade Observe, por alguns minutos, brincadeiras e jogos de crianças em pequenos grupos, procurando acompanhar como são construídos os enredos do faz-de-conta. A partir disto, faça um relato detalhado do que foi observado, descrevendo os participantes, objetos, falas e gestos criados pelas crianças.

6ª Atividade Procure observar como o jogo de faz-de-conta das crianças é vivido na creche, pré-escola ou turma de Educação Infantil da escola em que você trabalha. Para isto, faça um relato de situações de faz-de-conta observadas em alguns dias e Registre-as

3-1 O papel mediador do professor na construção da subjetividade, de relações afetivas e éticas 7ª atividade A roda de conversa, no início das atividades do dia, o planejamento e a avaliação com a turma são bons momentos para a expressão das opiniões e o respeito do grupo pelas crianças. Você recorda de uma situação em que deu um bom encaminhamento para a divergência de opiniões?

8ª Atividade Procure se lembrar de uma situação bem expressiva em que você modificou seu plano para atender às necessidades que as crianças, até mesmo os bebês, expressaram por meio de gestos, olhares, movimentos ou mesmo falando de seus desejos e expectativas.

9ª Atividade a)Em que momentos ou atividades você tem percebido que as crianças são mais cooperativas? b) Você já notou o que um gesto de cooperação produz no sentimento da criança que recebe o apoio, a ajuda? Pode-se dizer que a cooperação contribui para a “cultura da paz” em sua sala?

10ª Atividade a) Faça um levantamento da diversidade cultural das famílias das crianças de sua sala: de que regiões do país elas ou seus familiares provêm? Que manifestações culturais existem naquelas regiões? Que espaço você já abriu em sua sala de Educação Infantil a essas culturas? As crianças têm oportunidade de conhecer a diversidade cultural da humanidade? b) Como essa atividade pode contribuir para a cultura de paz?