inteligência como instrumento de atuação do mp na proteção ao estado democrático de direito

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André Estêvão Ubaldino Pereira O EMPREGO DA INTELIGÊNCIA COMO INSTRUMENTO DE ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA PROTEÇÃO AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO Belo Horizonte Centro Universitário Newton Paiva Escola Superior do Ministério Público de Minas Gerais 2010

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Autor: André Estêvão Ubaldino Pereira. Fundação Escola Superior do Ministério Público do Minist[ério Público de Minas Gerais (FESMPMG). O presente trabalho se propõe, a partir do exame das transformações pelas quais passaram o Estado, o Ministério Público brasileiro, o processo penal e o direito penal, a responder à seguinte indagação: o câmbio sofrido, ao longo de sua história, pelo Ministério Público, autoriza-o ou lhe impõe, no estado democrático de direito, o emprego da inteligência para o desempenho de sua função de assegurar o respeito aos direitos fundamentais?

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Page 1: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

André Estêvão Ubaldino Pereira

O EMPREGO DA INTELIGÊNCIA COMO INSTRUMENTO DE ATUAÇÃO DO

MINISTÉRIO PÚBLICO NA PROTEÇÃO AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Belo HorizonteCentro Universitário Newton Paiva

Escola Superior do Ministério Público de Minas Gerais 2010

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André Estêvão Ubaldino Pereira

O EMPREGO DA INTELIGÊNCIA COMO INSTRUMENTO DE ATUAÇÃO DO

MINISTÉRIO PÚBLICO NA PROTEÇÃO AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Monografia apresentada ao Curso de Pós-Graduação Lato Sensu de Especialização em Inteligência de Estado e Inteligência de Segurança Pública, oferecido pela Escola Superior do Ministério Público de Minas Gerais em parceria com o Centro Universitário Newton Paiva, como requisito parcial à obtenção do título de Especialista em Inteligência de Estado e Inteligência de Segurança Pública.

Orientador: Prof. Dr. Denilson Feitoza Pacheco

Belo HorizonteCentro Universitário Newton Paiva

Escola Superior do Ministério Público de Minas Gerais2010

Page 3: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

Centro Universitário Newton PaivaEscola Superior do Ministério Público de Minas GeraisCurso de Pós-Graduação de Especialização em Inteligência de Estado e Inteligência de Segurança PúblicaMonografia intitulada “O emprego da inteligência como instrumento de atuação do Ministério Público na repressão às organizações criminosas e proteção ao estado democrático de direito”, de autoria de André Estêvão Ubaldino Pereira, considerado aprovado, com a nota 78 (setenta e oito), pela banca examinadora constituída pelos seguintes professores:

____________________________________________________________

Professor Dr. Denilson Feitoza Pacheco – Orientador

____________________________________________________________

Professor Mestre Sérgio Antônio Teixeira

____________________________________________________________

Professor Especialista Ronaldo Silveira Alcântara

Belo Horizonte/MG, 26 de maio de 2010

Escola Superior do Ministério Público de Minas GeraisRua Timbiras, 2928, 4º andar, Bairro Barro Preto

30140-062 - Belo Horizonte – MGTel: 31-3295-1023

www.fesmpmg.org.br

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A Deus pelo dom da existência e por

sua constante presença e proteção

em minha vida e de minha família.

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RESUMO

O presente trabalho se propõe, a partir do exame das transformações

pelas quais passaram o Estado, o Ministério Público brasileiro, o

processo penal e o direito penal, a responder à seguinte indagação: o

câmbio sofrido, ao longo de sua história, pelo Ministério Público, autoriza-

o ou lhe impõe, no estado democrático de direito, o emprego da

inteligência para o desempenho de sua função de assegurar o respeito

aos direitos fundamentais?

Palavras-chave: Inteligência – Ministério Público – direitos fundamentais

– Estado Democrático de Direito

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ABSTRACT

Taking into consideration the changes that the State, Brazilian Public Prosecutor´s Office, Criminal Law and Procedure have undergone, this papers aims to address the following question: do the modifications that the Public Prosecutor´s Office went through authorize it or impose to it the use of intelligence, in carrying out its duty of upholding the respect for fundamental rights in the Democratic State?

Key words: Intelligence - Public Prosecutor´s Office - Fundamental rights

- Democratic State

Page 7: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

LISTA DE SIGLAS

FESMP/MG Fundação Escola Superior do Ministério Público de

Minas Gerais

FGV Fundação Getúlio Vargas

SIBIN Sistema Brasileiro de Inteligência

SNI Serviço Nacional de Informação

Page 8: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO......................................................................................10

2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DO ESTADO.................................................14

2.1 Origens e estado absoluto.................................................................14

2.2 Estado constitucional.........................................................................15

3 ORIGEM E FORMAÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO.........................17

3.1 Brasil, de colônia a império................................................................17

3.2 Brasil república...................................................................................18

3.2.1 A primeira república e a constituição de 1891..........................................18

3.2.2 A revolução de 1930 e a constituição de 1934.........................................19

3.2.3 O Estado Novo e sua constituição............................................................20

3.2.4 O fim do Estado Novo e a constituição de 1946.......................................22

3.2.5 O golpe militar e a constituição de 1967...................................................24

3.2.6 A abertura e o retorno do poder aos civis.................................................26

4 ORIGEM E EVOLUÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.........................28

4.1 O Ministério Público no Brasil............................................................29

4.1.1 O Ministério Público no Brasil colônia.......................................................29

4.1.2 O Ministério Público sob o regime da Constituição de 1824.....................31

4.1.3 A primeira república e o Ministério Público...............................................40

4.1.4 A Constituição de 1934 e o Ministério Público..........................................47

4.1.5 A ditadura Vargas e o Ministério Público...................................................54

4.1.6 A Constituição Federal de 1946 e o Ministério Público.............................56

4.1.7 A Constituição de 1967 e o Ministério Público..........................................58

4.1.8 A Emenda Constitucional de 1969 e o Ministério Público.........................60

4.1.9 A Constituição de 1988 e o Ministério Público..........................................65

5 ORIGEM E EVOLUÇÃO DO DIREITO E PROCESSO PENAL...........73

6 INTELIGÊNCIA E INCREMENTO DA EFICIÊNCIA.............................76

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7 CONCLUSÃO.......................................................................................83

8 REFERÊNCIAS.....................................................................................84

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10

1 INTRODUÇÃO

Pode ou deve o Ministério Público, para o cumprimento de seu

dever constitucional de assegurar o respeito aos direitos fundamentais,

utilizar a inteligência?

Responder a essa indagação, exige considerar, inicialmente,

que profundas têm sido as transformações pelas quais vêm passando os

Estados modernos, cuja proximidade cresceu, nos últimos anos, tanto

em decorrência da evolução tecnológica, como em virtude do fim da

bipolarização que dividira, durante décadas, as nações que gravitavam

em torno da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, de um

lado, e dos Estados Unidos da América, de outro.

Tais transformações, ao tempo em que tornaram mais intensas

as relações mercantis entre os povos, também contribuíram para mais

veloz e fácil transferência de capitais, inclusive os provenientes de

atividades criminosas.

Nessas circunstâncias, nações em desenvolvimento, que já

experimentavam elevados índices de criminalidade, decorrentes

frequentemente de causas endógenas, passaram a conviver com

dificuldades adicionais, estas decorrentes da ocorrência de novas formas

de criminalidade, bem como da migração de ativos por elas produzidos,

além, evidentemente, da migração dos próprios delinquentes e seus

respectivos cartéis.

Submetido às novas condições, o Estado brasileiro, que já

acumulava grave passivo social, por não ter a tempo e modo atuado para

diminuir a exclusão e minimizar seu papel no incremento das práticas

criminosas, mantinha, por outro lado, no seu sistema de justiça criminal,

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modelo que se imaginara e construíra num tempo em que a

criminalidade, de caráter no mais das vezes provinciano, era, ademais,

frequentemente, individual.

Aos antigos e não vencidos desafios foram, portanto,

acrescentados novos, obrigando Estado e suas instituições à busca de

novas soluções.

Nesse quadro, o Ministério Público, a quem tradicionalmente já

vinha o ordenamento jurídico atribuindo a responsabilidade pela

promoção da ação penal pública, viu enormemente ampliadas suas

atribuições, entre elas se tendo inserido a própria defesa do neonato

regime democrático brasileiro.

Assim, ao mesmo tempo em que lhe era atribuída a

responsabilidade pela atuação na defesa do patrimônio público — cuja

secular apropriação indevida por particulares é certamente das mais

importantes causas da subsistência da miséria, desigualdade e violência

— ao Ministério Público se atribuía, ainda, em sede constitucional, a

legitimidade para promover, privativamente, a ação penal pública.

À ampla gama de atribuições cometidas ao Ministério Público,

entre as quais se inclui a obrigatória, a imperativa propositura da ação

penal em crimes em que ela é pública, não correspondeu, todavia, a

alteração ou ampliação proporcional de sua estrutura, que não

acompanhou a crescente complexidade da nova realidade.

Obrigado, portanto, agora pela própria Constituição da

República, a atuar sobre causas e consequências da criminalidade, viu-

se o Ministério Público compelido, para manter a eficiência administrativa

que por ela também lhe é imposta, a debater mais amplamente as

temáticas da racionalização de sua intervenção na área não penal e do

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emprego da inteligência, esta de modo mais acentuado no que concerne

à repressão às atividades de organizações criminosas.

Atuando nesse sentido, sustenta-se no Ministério Público, na

defesa da racionalização, que é necessário reconhecer a existência de

dois interesses públicos hoje tidos como distintos, como são o primário e

o secundário, entendendo-se que só lhe incumbe a intervenção

processual para defesa daquele.

De igual modo, no que respeita ao emprego da inteligência na

maximização da eficiência do Ministério Público na repressão às

organizações criminosas, ganha corpo o debate acerca da necessidade

de mudança postural e metodológica, apresentando-se nítida divisão

entre os que de um lado defendem a conservação da atitude tradicional,

traduzida pela tão só promoção da ação penal, e os que, de outro,

defendem a proatividade, representada pela busca do conhecimento e

ação que transcendam os limites do que contêm os autos de processos.

Para posicionar-se nesse debate, inclusive com a indicação de

quais seriam as medidas eventualmente necessárias, a proposta do

presente trabalho é examinar as transformações pelas quais passou o

Estado e, com ele, Ministério Público brasileiro, com a alteração de seu

primitivo papel de defensor dos interesses do soberano para defensor

daquele, dele para o de defensor da sociedade, e, ainda, para o de

defensor do próprio Estado Democrático de Direito.

Também se debruça o trabalho sobre as transformações

introduzidas no Direito e Processo Penal, com o escopo de revelar como,

com o passar do tempo, foram postos a serviço de um Estado que foi

progressivamente se transformando em instrumento de concretização de

direitos fundamentais.

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Nesse ponto, procura-se destacar como, apesar das tentativas

de aperfeiçoamento dos mencionados instrumentos intimidativo e

persecutório, não se conseguiu conter o avanço de práticas que,

marginais ao Estado Democrático de Direito, com ele conflitam e

concorrem, colocando até mesmo em risco a sua sobrevivência.

Em seguida, após demonstrar como se desenvolveu o conceito

de inteligência, procura-se destacar como se difundiu seu emprego, de

modo a generalizar a crença, hoje corrente, de que não há organização

ou instituição que possa dispensar seu emprego no aperfeiçoamento de

suas atividades.

É então que o trabalho — reconhecendo a ineficiência de um

modelo cujas origens remontam a séculos, caracterizado por

inadequação decorrente da crescente complexidade da sociedade a que

se destina — conclui pela necessidade indeclinável de que nele sejam

promovidas mudanças.

Finalmente, reconhecendo que o emprego da inteligência se

inclui entre as imprescindíveis mudanças impostas pela necessidade de

maximização de eficiência estatal na repressão às organizações

criminosas — que sustenta imprescindível à preservação do Estado

Democrático de Direito e mesmo da soberania nacional — aponta o

trabalho quais devem ser, na ótica de seu autor, as formas de sua

utilização pelo Ministério Público.

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2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DO ESTADO

2.1 Origens e estado absoluto

Acolhida a ideia de Weber, segundo a qual o seu surgimento

se dá com a expropriação, pelos capitais, dos meios de produção dos

artesãos, e pelo Poder Público, do serviço com as armas, com a criação

de organismos destinados à prestação de serviços públicos e com o

“monopólio legítimo do uso da força física dentro de um determinado

território”, pode-se afirmar que o Estado criação relativamente recente na

história da humanidade (WEBER, [1968?], p. 98).

Sob essa ótica, pode-se afirmar, com Miranda (2002), que foi

no continente europeu que nasceu o Estado, caracterizando-se ali sua

existência pela de uma autoridade central, monopolizadora da coerção.

De fato, se o poder, antes disso, estivera disperso entre várias

autoridades verticalmente dispostas, desde então ocorreu sua

concentração no rei, de quem passou a emanar toda autoridade pública,

que a partir daí foi dirigida a todos os pontos de um território com limites

precisamente determinados.

Se é certo que o Estado não se desenvolveu de modo

homogêneo em todos os quadrantes1, parece seguro, porém, com Poggi,

que para seu surgimento contribuiram decisivamente a ruína econômica

da nobreza, a ascensão burguesa e as aspirações desta a um Estado e

soberano que, superando as limitações de estruturas regionais

insuficientes, permitisse a expansão de suas atividades no plano

internacional.1 “O Estado não se desenvolveu, todavia, de modo homogêneo em todos os quadrantes, verificando-se seu surgimento ora de forma pacífica, ora violenta …”. “Além disso, se deu “através de processos variados, entre os quais figuraram a conquista, a migração, a aglutinação por laços de sangue ou econômicos, a secessão e o desmembramento” (DOEHRING, 2008; RUFFIA, 1973).

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15

Pode-se por isso dizer que o Estado nasceu com feição

autoritária, manifestada no fim de atender a certa classe, o que pouco

após se revelaria com a aparição, na história, do Estado Absoluto.

Com efeito, não tardaram a surgir pensadores que, como Bodin

(1530-1596), rompeu com a concepção de autoridade como exercício da

justiça tradicional e formulou a ideia do poder político como a capacidade

soberana de criar novas leis e impor-lhe incontrastável obediência, ou

seja, o de impor leis sem o consentimento dos súditos.

Representou o Estado absoluto a ideia de máxima

concentração do poder no rei, isoladamente ou com seus ministros, de

tal modo que o que imperava era a sua vontade, sendo as regras

jurídicas definidoras de sua ação vagas, raras e quase nunca escritas

(MIRANDA, 2002).

Em meados do Século XVIII, porém, daria o pensamento de

Bodin lugar às idéias contratualistas, a que se seguiria o surgimento do

Estado Constitucional.

2.2 Estado constitucional

Se de um lado assistiu o absolutismo ao surgimento de teorias

que o procuraram justificar, também ao seu tempo surgiram os vigorosos

e contundentes escritos de Montesquieu (1689-1755), Voltaire

(1694-1778) e Rousseau (1712-1778), que enorme influência tiveram nos

acontecimentos que se seguiram.

Assim, enquanto uns criticavam a Justiça francesa e seu

caráter hereditário, outros sustentavam que a soberania pertencia ao

legislativo, defendendo-se, ainda, a separação de funções.

Tais ideias, influenciando os dois lados do Oceano Atlântico,

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16

contribuiriam decisivamente para a eclosão das Revoluções Americana e

Francesa, ao cabo das quais nasceriam os Estados que afirmaram

princípios dos quais não mais se poderia prescindir.

Com efeito, ao cabo desses acontecimentos, uma nova

concepção era consagrada na Europa, a do Estado constitucional. Nele,

adotavam-se os princípios da legalidade, da separação dos poderes e da

representação política, bem como uma declaração de direitos. E, como

observa Miranda (2002), embora a máquina administrativa

permanecesse a mesma do anterior, se tinham introduzido

demasiadamente profundas modificações no plano ideológico e jurídico:

se antes o que vigorara era a tradição, cedia ela passo ao contrato

social, a que se passava a atribuir, então, a origem da sociedade; ao

invés da soberania do príncipe, em que se afirmava antes radicar todo o

poder, a soberania nacional; em lugar do poder unipessoal, a vontade

geral; sucedendo a razão do Estado, passava este à condição de

executor de normas jurídicas de que os destinatários não eram mais

súditos, mas cidadãos.

Em diferentes graus de intensidade, evidentemente,

projetaram-se esses princípios e ideias por todo o planeta. E o Brasil a

eles não estaria imune, como se veria.

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3 ORIGEM E FORMAÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO

3.1 Brasil, de colônia a império

A adoção, pela França revolucionaria, de uma política

anexionista, causou profunda intranquilidade na região, no curso da qual,

sob intensa pressão, tomou a família real portuguesa, para proteger-se, o

caminho de sua então colônia, o Brasil (CALMON, 1959), que assim

reeberia novo impulso no sentido de sua independência, que se

consumaria, simbolicamente2, com o grito do Ipiranga.

Assim, enquanto permaneciam em vigor no Brasil as

Ordenações Filipinas (ALMEIDA, 1870), instalou-se em 03 de maio de

1823 (CALMON, 1959), a Assembleia Geral Constituinte, que porém foi

dissolvida em 12 de novembro de 1823, seguindo-se a outorga do texto

jurado em 25 de março de 1824 (BONAVIDES, 1991).

Embora contendo uma declaração de direitos, sob a inspiração

liberal que triunfara décadas antes, tinha a Constituição caráter

nitidamente autoritário, expresso na inserção, em seu texto, de um

“Poder Moderador”, em que foi investido privativamente o Monarca. Foi

isso, aliás, que levou Bonavides a dizer, a propósito, tratar-se o instituto,

literalmente, da “constitucionalização do absolutismo” (1991, p. 96).

Sustentado o primeiro reinado à custa de intervenções

militares, não sobreviveria a monarquia à passagem do tempo, no Brasil,

aprofundando-se o desgaste pelas chamadas questões militar,

escravagista e religiosa, que, retiando-lhe o prestígio e sutentação,

2 “foi na verdade em 03 e 19 de junho de 1822 que deu o Brasil passos mais firmes em direção à sua independência...”. Isto porque “nessas ocasiões ocorreu a edição, respectivamente, do Decreto de convocação de uma “Assembleia Luso-Brasiliense”, ou “Assembleia Geral Constituinte e Legislativa” , composta de deputados das Províncias do Brasil, e das instruções referentes às condições para a qualificação dos candidatos” (BONAVIDES, 1991; VARNHAGEN, 1957).

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levariam à Proclamação da República, e ao novo Estado, agora

republicano e federal, que se seguiu.

3.2 Brasil república

3.2.1 A primeira república e a constituição de 1891

Proclamada a República em 15 de novembro de 1889,

promulgou-se em 1891 a Constituição que, em 91 artigos, mantendo

alguns dos princípios já enunciados na legislação editada pelo Governo

Provisório, consagrou a separação dos poderes, a eleição direta do

Presidente e Vice-Presidente, extinguiu privilégios de berço, foros de

nobreza e títulos nobiliárquicos, secularizou cemitérios, laicizou o ensino,

separou Estado e Igreja, garantiu o habeas corpus, aboliu a pena de

morte, assegurou o livre direito de propriedade, de reunião, e

acrescentou, aos já reconhecidos na Constituição Imperial, a isonomia, a

livre manifestação do pensamento, a liberdade de associação, a

inviolabilidade de domicílio e a instituição do júri, declarando seu art. 28,

ainda, que não se achavam excluídos “outras garantias e direitos não

enumerados, mas resultantes da forma de governo que ela estabelecia e

dos princípios que [consignava]” (BONAVIDES, 1991, p. 251).

Claramente inspirada na Constituição americana, que

congregou sob autoridade central treze colônias originalmente

independentes entre si, a brasileira, embora destinada a um Estado

historicamente unitário, transformou as anteriores províncias em Estados,

conferindo-lhes expressiva autonomia, inclusive no campo legislativo,

mas não foi capaz de reduzir as desigualdades regionais, nem tampouco

evitar que as oligarquias estaduais, mediante fraudes, obstassem a

alternância de poder.

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19

Foi esse o quadro em que, rompido o pacto de rodízio de poder

firmado entre oligarquias que o exerciam, deu-se a Revolução de 1930.

3.2.2 A revolução de 1930 e a constituição de 1934

Consumada a Revolução de 1930, ao que se seguiu grave

descontentamento com seus rumos, cujo auge se traduziu na Revolução

Constitucionalista de 1932 (SKIDMORE, 1982), viu-se o Governo

obrigado a remover os entraves ao retorno à normalidade, que se

traduziu na promulgação, em 16 de julho de 1934, da segunda

Constituição da República.

Nela, os três poderes, que no texto anterior eram definidos

como independentes e harmônicos, passavam a ser independentes e

coordenados, proibindo-se a delegação e o seu exercício cumulativo.

Nela também eram relacionadas as competências privativas da União e

Estados, passando-se a prever a possibilidade de intervenção dos

últimos nos Municípios. A legislatura, fixada em três (art. 16, §2°) ou nove

(art. 31), na Constituição anterior, era estabelecida em quatro anos, (art.

22, parágrafo único) para ambas as casas, atribuindo-se ao Senado, cuja

competência legislativa era mitigada, a condição de colaborador da

Câmara (BRASIL, 1934).

Representou a Constituição de 1934 a expressão do Estado

Social, inaugurada com a Constituição do México, em 1917, e continuada

com a Constituição do Weimar, de 1991, em que se inspirou (LEAL,

1962).

Manifestando a nova tendência, em que não eram ignorados

ou anulados direitos individuais, inseriram-se os direitos sociais, ou de

prestação, com títulos, desconhecidos na Constituição de 1891,

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20

referentes a ordem econômica e social e à família, educação e cultura.

Nela, deve-se destacar a inclusão do direito à subsistência, inserido no

caput do art. 113 e desconhecido do texto anterior, bem como a

supressão da plenitude do direito de propriedade, prevista no § 17 do art.

72 da Constituição de 1891 (BRASIL, 1891), agora insuscetível de

exercício contra o interesse social e coletivo (art. 113, § 17). Em igual

sentido se orientou o art. 115, ao impor que a ordem econômica se

organizasse de modo a possibilitar a todos existência digna, como

também o capítulo pertinente à legislação trabalhista, especialmente a

garantidora de salário mínimo, jornada de trabalho máxima, repouso

semanal e férias, dentre outros (BRASIL, 1934).

Por isso a lição de Bonavides, segundo quem: Converteu-se a Constituição nesse capítulo sobre a ordem econômica e social numa apaixonada plataforma das idéias que marcam a índole nova do Estado brasileiro, enriquecidas e completadas no título seguinte, respeitante à família, educação e cultura. Aí as conotações sociais avultam com a mesma expressão e energia. A família é posta “sob a proteção especial do Estado”, a educação é direito de todos, as artes, as letras e a cultura são objeto de favorecimento, amparo e estímulo de poderes que se movem em três órbitas: União, Estado e Município. [BONAVIDES, 1991, p. 324]

No entanto, revelando desde sempre tendências autoritárias,

Getúlio Vargas, que se opunha aos rumos tomados pelo País, estimulou

conflitos entre diferentes atores políticos, obteve assim poderes de

exceção e, por seu intermédio, arquitetou o Golpe do Estado Novo, que

produziria, no próprio dia de sua deflagração, novo Texto Constitucional.

3.2.3 O Estado Novo e sua constituição

Produzida por representante daquilo que se denominou

“geração dos intelectuais autoritários” (BONAVIDES, 1991, p.332), a

Constituição de 1937, atenta às suas origens e fins, outorgou ao

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Presidente da República (art. 74) a competência para expedir Decretos-

leis, declarar guerra (independentemente de autorização do Poder

Legislativo, em caso de invasão ou agressão estrangeiras), decretar

estado de emergência e para intervir nos Estados. Também eram suas

prerrogativas (art. 75) as de indicar um dos candidatos à Presidência da

República, dissolver a Câmara dos Deputados em caso de não

aprovação das medidas por ele tomadas durante o estado de

emergência ou de guerra e escolher 10 dos integrantes do Conselho

Federal, que era uma das casas do Parlamento, que podia ainda adiar,

prorrogar e convocar (BRASIL, 1937).

Além disso, no capítulo referente à defesa do Estado, permitia-

se (art. 171) que, no estado de guerra, deixasse de vigorar a Constituição

nas partes indicadas pelo Presidente da República. Era a ele também

(art. 166) que, tendo decretado estado de emergência (ou de guerra, se

fosse necessário o emprego das forças armadas), cabia (art. 168) deter

pessoas em edifício não destinado a réus de crimes comuns, desterrá-las

para outros locais do território nacional, forçá-las a residir em

determinados pontos, com privação da liberdade de ir e vir, censurar

correspondência e toda forma de comunicação oral ou escrita, suspender

a liberdade de reunião e executar busca e apreensão em domicílio. Já

por força do art. 169, era-lhe permitido, ainda que o Legislativo tivesse

negado a licença respectiva, deter qualquer de seus membros,

independentemente de comunicação à casa a que pertencesse, desde

que entendesse a medida urgente. Coroando as disposições, previa o

art. 170 que dos atos praticados durante o estado de emergência ou de

guerra não conheceriam os juízes e tribunais (BRASIL, 1937).

Não bastasse o que se expôs, estabeleceu a Constituição, em

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seu art. 175, que o mandato do então Presidente se renovava até a

realização do plebiscito previsto no art. 187, que dependeria de

regulação por decreto seu, que nunca se editou (BRASIL, 1937).

Dado seu caráter, tratou a Constituição de enfraquecer o Poder

Legislativo, ainda, através da possibilidade de prisão de seus membros,

reforçando esse efeito o art. 43, que não lhes garantia imunidade

material nas hipóteses de crime de difamação, calúnia, injúria, ultraje à

moral pública e provocação pública ao crime (BRASIL, 1937).

O enfraquecimento do Poder Judiciário, por sua vez, foi

promovido pela Constituição com a proibição do exame de certos

assuntos, como os políticos (art. 94), e dos atos praticados durante os

estados de emergência e de guerra (art. 170), além, é claro, da ressalva,

nela contida, de acordo com a qual se mantinham, sim, as tradicionais

garantias da magistratura, porém, com as restrições nela expressas

(BRASIL, 1937).

Governando por decreto, até o ano de 1945, com o auxílio dos

interventores que nomeou, não resistiu Getúlio Vargas, porém, ao

crescimento da oposição ao seu governo, nem tampouco ao clima

desfavoravel, na oinião pública, decorrente do fato de achar-se o Brasil

numa ditadura enquanto tropas basileiras contra elas lutavam na Europa.

Assim, em 30 de outubro de 1945, em meio a um clima político

insustentável, sitiado o Palácio do Catete, Vargas foi deposto pelo Alto

Comando do Exército.

3.2.4 O fim do Estado Novo e a constituição de 1946

Deposto Vargas, teve lugar o processo dstinado à eleição dos

mandatários a quem incumbiria a elaboração da nova Constituição e de

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23

um novo Presidente da República.

Assim, ao cabo dos trabalhos, em 18 de setembro de 1946, foi

promulgada a Constituição brasileira, acerca da qual, como lembrou

Baleeiro, a Composição social dos constituintes naturalmente se refletiria na Constituição de 1946 [...] literalmente tão bem redigida quanto a de 1891. [...] A estrutura e as linhas gerais [a ela se] assemelham [...] mas sem a rigidez presidencialista desta, pois foram conservados os dispositivos que permitiam a convocação ou o comparecimento espontâneo dos ministros ao Pleno; as Comissões de Inquérito Parlamentar por iniciativa de 1/5 dos membros de cada Câmara [e] o Senado voltou à posição de 1891 no Poder Legislativo. [BALEEIRO; LIMA SOBRINHO, 2001, p.16].

Partindo, segundo Baleeiro (2001), da ideia kantiana de que o

Estado é meio e o homem o fim, para o qual deveria aquele convergir

seus esforços, elevando-o material, física, moral e intelectualmente,

procurou a Constituição de 1946 repartir as rendas entre União, Estados

e Municípios de modo a obter tal desiderato.

Além disso, buscou-se assegurar autonomia a Estados e

Municípios, garantindo-se, também, a liberdade de pensamento e culto.

A decretação do estado de sítio, diversamente do que ocorrera no texto

anterior, ficava então reservada ao Congresso Nacional, cujos membros,

Senadores e Deputados, passaram a ter mandatos de oito e quatro anos,

respectivamente. Livre também passou a ser a organização partidária,

salvo em relação àquelas agremiações que contrariassem o regime

democrático. Também procurou a Constituição de 1946 conferir, ao

Legislativo e ao Judiciário, o prestígio que a de 1937 lhes tinha subtraído.

Nela também, numa tentativa de compatibilizar disposições de natureza

liberal com social, mantinha-se o direito de propriedade, salvo

desapropriação, que, todavia, no seu regime, deveria ser objeto de

indenização em dinheiro. Também se previa a intervenção no domínio

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24

econômico, inclusive para monopolizá-lo, sempre, porém, tomando por

base o interesse público e por limites os direitos fundamentais (art. 146).

Também se manifestava o Estado Social na previsão de repouso

semanal remunerado, no direito de greve, na participação nos lucros da

empresa, na aposentadoria e na inserção da Justiça do Trabalho no

âmbito do Poder Judiciário (BRASIL, 1946).

Foi sob o império da Constituição de 1946 que estiveram os

Governos Dutra (1946-1951), Getúlio Vargas (1951-1954), Café Filho

(1954-1955), Juscelino Kubitscheck (1956-1961), Janio Quadros (1961) e

João Goulart (1961-1964).

Todavia, na crise militar que se abriu, durante o governo de

João Goulart, deu-se o golpe de 1964, a que sucederam a Constituição

de 1967 e a Emenda Constitucional de 1969.

3.2.5 O golpe militar e a constituição de 1967

No poder que se atribuiu, editou o Governo Militar o Ato

Institucional n° 4, de 07 de dezembro de 1966, que convocou o

Congresso Nacional para reunir-se para a discussão e votação de uma

nova Constituição cujo projeto lhe foi enviado em 12 de dezembro de

1966 (BONAVIDES, 1991).

Assim, em 24 de janeiro de 1967, o Congresso Nacional, que

não fora legitimado pelas urnas para fazê-lo, a quem os rígidos prazos

previstos no Ato Institucional inibiam o fazê-lo corretamente e a quem as

então recentes cassações coarctavam, promulgou a Constituição de

1967 (BONAVIDES, 1991; LIRA NETO, 2004).

Instrumento do arbítrio, buscava a Constituição de 1967

colocar sob seu controle a sociedade.

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25

Daí ter, sobre ela, em 24 de janeiro de 1967, data de sua

promulgação, dito o jornal Correio da Manhã:Hoje, 24 de janeiro, será promulgada a Constituição, apelido da nova carta outorgada. Ela instaura um neo-Estado Novo e constitucionaliza uma ditadura que se implantou pela audácia de um grupo armado. É a ata de um conluio, não um texto digno do respeito nacional [LIRA NETO, 2004, p. 394].

A ela se seguiriam, ante as reações de setores da sociedade

ao regime militar, a edição do ato institucional numero 5 e da Emenda

Constitucional, número 1, de caráter mais acentuadamente autoritários.

Pelo primeiro, mantida a Constituição de 1967 (art. 1°),

conferia-se poder ao Presidente da República para decretar o recesso do

Legislativo Brasileiro (art. 2°), achando-se o Brasil em estado de sítio ou

não, circunstância em que se concentrava no Poder Executivo a

competência para legislar. Também se conferia ao Presidente a

competência para decretar intervenção nos Estados e Municípios (art.

3°), bem como para limitar, pelo prazo de 10 anos, os direitos políticos,

assim como para cassar mandatos (art. 4°). Também se previa (art. 5°)

que a cassação importaria em perda de privilégios de foro, suspensão de

direitos políticos, proibição do exercício de atividades, aplicação de

liberdade vigiada, frequência a certos lugares e obrigação de domicílio

em local determinado, sem prejuízo de outras que pudessem constar do

ato. Além disso, subtraída a apreciação das medidas ao Poder Judiciário

(art. 5°, §2°), ficavam suspensas as garantias constitucionais da

vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade (art. 6°), permitindo-se ao

Presidente da República a demissão, remoção, aposentadoria, colocação

em disponibilidade e decretação de confisco de bens (art. 8°) (BRASIL,

1968). Enfim, “Pela primeira vez desde 1937 e pela quinta vez na história

do Brasil, o Congresso era fechado por tempo indeterminado [...]

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26

[restando] atendida a reivindicação da máquina repressiva” (GASPARI,

2002a, p. 340).

Em seguida, em 17 de outubro, promulgou-se a Emenda

Constitucional n° 1, que consolidou a supremacia do Executivo sobre o

Legislativo, sob o argumento de que “seguia critérios universais

predominantes” (BONAVIDES, 1991, p. 443).

3.2.6 A abertura e o retorno do poder aos civis

A longa agonia do regime autoritário e dos amplos e em certo

instante majoritários setores que a ela se opunham se traduziu, ao fim de

ao cabo, no retorno do Brasil à ordem constitucional, obtida com o

promulgação, em 05 de outubro de 1988, da vidgente Constituição da

República.

Evidentemente, à Constituição de 1988 não faltaram títulos

consagrados à organização do Estado (III) e dos poderes (IV), à sua

defesa e à das instituições democráticas (VI), nem tampouco os

referentes à ordem econômica, financeira (VII) e à social (VIIII) (BRASIL,

1988).

Constituiu inovação, porém, em relação aos textos anteriores, a

introdução de título, referente aos princípios fundamentais, em que se

afirmou ser o Brasil um Estado Democrático fundado na soberania, na

cidadania, na dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do

trabalho e iniciativa privada, assim como no pluralismo político.

Nesse particular, seguiu a Constituição brasileira a tendência

inaugurada na Península Ibérica com as Constituições da Republica de

Portugal, de 02 de abril de 1976, que sucedeu a Revolução dos Cravos,

e da Espanha, de 27 de dezembro de 1978, promulgada após a fim da

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27

longa ditadura iniciada por Francisco Franco.

É que, de fato, ali se estabelecido, sob o título “princípios

fundamentais”, em seu artigo 1°, ser “Portugal [...] uma República

soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade

popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e

solidária”, asseverando seu artigo 2° ser ainda “um Estado de direito

democrático [baseado] na garantia da efetivação dos direitos e

liberdades fundamentais [com] interdependência de poderes e o

aprofundamento da democracia participativa” (SENADO, 1987, p.

759-760, v. II). A segunda, por sua vez, afirmando ser a Espanha “um

Estado social e Democrático de Direito”, pronunciara como valores

superiores de seu ordenamento jurídico a liberdade, a justiça, a

igualdade e o pluralismo político (SENADO, 1987, p. 359, v. I).

Inovadoras foram, ainda, no constitucionalismo brasileiro, a

afirmação dos fins ou objetivos fundamentais da República e a posição

destacada em que se inseriu o título (II) referente aos direitos e garantias

fundamentais, fossem individuais ou coletivos (art. 5°), fossem sociais (6°

a 11), e a extensão inaudita dos então consagrados.

Com eles, o constitucionalismo brasileiro, que introduzira nas

constituições de 1824 e 1891 alguns dos direitos fundamentais de

primeira geração, e nas de 1934, 1937, 1946 e 1967 alguns dos de

segunda, incorporou à de 1988 alguns de terceira.

Foi nessa Constituição, sob vários aspectos inédita, que o

Ministério Público, que se constituíra no país desde a época colonial,

veio a ocupar, após longa trajetória, seção de capítulo referente às

funções essenciais à atuação da jurisdição.

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28

4 ORIGEM E EVOLUÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Embora alguns estudiosos apontem suas origens nos Magiaí,

do Egito antigo, e outros na na Grécia, na Roma Clássica, Suécia ou

mesmo nas cidades alemãs, a visão predominante da doutrina é que o

Ministério Público nasceu3 com os antigos Procuradores do Rei, na

França, aos quais fazia referência a Ordenança que editou em 25 de

março de 1302 Felipe IV, o Belo, que reuniu então numa só instituição os

servidores encarregados da administração de seus bens pessoais, de

promover a ação penal e de defender os interesses da Coroa junto aos

tribunais (MAZZILLI, 2005).

Díspares as funções atribuídas à instituição — pois lhe

competia a defesa de interesses públicos e privados — acabou a

circunstância, com o correr do tempo, por causar-lhe grave desgaste, o

que fez com que, atribuindo-lhe seus críticos, durante a Revolução

Francesa, certa tendência em confundir uns e outros, se chegasse a

propor até mesmo a sua extinção (SAUWEN FILHO, 1991).

Acolhida porém a ponderação de que algumas vezes haviam

seus membros se recusado — embora devendo estrita obediência e

subordinação ao rei — a cumprir ordens que lhes tinham parecido

contrárias ao bem comum, optou a Assembleia Nacional Constituinte por

mantê-lo.

Assim, conformando-o aos ideais que então triunfavam,

promoveu a Assembleia Nacional Constituinte francesa profundas

transformações no Ministério Público, dando-lhe as feições com as quais,

através das invasões napoleônicas, difundiu-se pela Europa continental

3 Se a Instituição, aparentemente, surgiu nessa época, teria a denominação que ostenta, por sua vez, surgido da prática, dos que a ela pertenciam, de referir-se, em suas correspondências, ao seu ministério .(MAZZILLI, 2007; AXL, 2001).

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(TORNAGHI, 1959) e, depois, pelas pelas colônias.

4.1 O Ministério Público no Brasil

4.1.1 O Ministério Público no Brasil colônia

Colônia portuguesa, submeteu-se o Brasil durante séculos à

legislação da metrópole, onde, desde 14 de janeiro de 12894, se criara a

função de Procurador do Rei, com a atribuição de “chamar à casa do rei”

os que com ele “tivessem questões”.

Foi mais tarde, quando se percebeu a necessidade de

constituição de uma instituição que reclamasse a aplicação da lei, que

surgiu a figura do “Procurador de Justiça”, regulada pelo Título VII, do

Livro I, das Ordenações Afonsinas de 1446.

Assim, quando foram editadas as Ordenações Manuelinas, já

existia, na Casa de Suplicação de Lisboa, um Procurador de Feitos da

Coroa e um Procurador de Feitos da Fazenda, segundo o antigo modelo

francês, a eles cabendo a defesa dos interesses do monarca e do

Estado.

A eles, somaram as Ordenações Filipinas as figuras de um

Promotor de Justiça e um solicitador de justiça, funcionando, ainda, junto

à Casa do Cível da Relação do Porto, um promotor de justiça e um

solicitador de justiça. Coincidiu, pois, em Portugal, o surgimento do

Ministério Público com a criação dos tribunais perante os quais

funcionava (SAUWEN FILHO, 1999, p. 103-106).

Tal em linhas gerais a estrutura do Ministério Público

português, por decisão da metrópole se estabeleceu, em 07 de março de

1609, o Tribunal de Relação na Bahia, nele sendo instituído o cargo de 4 Perceba-se, portanto, que, embora possa ter a legislação portuguesa sofrido influência da de seus vizinhos, a instituição do Ministério Público, ali, é possivelmente anterior à que ocorreu na França.

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30

Procurador dos Feitos da Coroa, Fazenda e Fisco e o de Promotor de

Justiça5, a este sendo atribuído o encargo de preservar a integridade da

jurisdição civil contra as invasões da eclesiástica.

No entanto, como a confusa estrutura judicial da colônia

estimulava o surgimento de conflitos entre autoridades civis e

eclesiásticas, os que se opunham à Relação de Salvador acabaram

obtendo o seu fechamento, em 05 de abril de 1626, sendo por isso

atribuído ao promotor da casa de suplicação de Portugal, por carta de 27

de julho de 1627, o encargo de denunciar os criminosos no Brasil.

Perdurando tal situação até 1653, quando se deu a recriação

(AXL, 2001) da Relação da Bahia, nada, porém, na organização do

Ministério Público, foi alterado, nesse período, tampouco vindo isso a

ocorrer quando, em 1751, deu-se a instalação da Relação do Rio de

Janeiro.

Com efeito, foi apenas com a chegada da família real ao Brasil

que transformações foram realizadas na estrutura judiciária do Brasil6,

sendo elevada a Relação do Rio de Janeiro à categoria de Casa de

Suplicação, pelo alvará de 10 de maio de 1808, assim como criadas, em

18127 e 18218, respectivamente, as relações do Maranhão e

Pernambuco9.

Era então o Ministério Público, a quem se atribuíam várias e

distintas funções, a exemplo do que sucedia em Portugal, simples

auxiliar do ofendido na ação penal, somente depois vindo a tornar-se

5 E, seguindo os costumes da época, era ele obrigado, antes de despachar, a usar opa e a ouvir missa celebrada por capelão especial (LYRA, 1937; SAUWEN FILHO, 1999; CÂMARA, 1965, II).6 E, por consequência, no Ministério Público.

7 7 alvará com força de lei de 13 de maio de 1812 (CÂMARA,1965, p. 147-150, tomo II).8 alvará de 06 de fevereiro de 1821(CÂMARA, II, 1965).9 Nesses tribunais, o segundo desembargador em antiguidade exercia o cargo de procurador da Coroa e fazenda; o terceiro, de procurador da justiça (CÂMARA, II, 1965).

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31

principal e tomar-lhe o lugar10 (ALMEIDA JUNIOR, 1959).

Aliás, como leciona Almeida Júnior (1959, p. 167, v. 2), em

Portugal, de onde veio para o Brasil, embora coubesse ao Ministério

Público, desde o século XIV, promover a ação penal pública, “nunca a

[sua] iniciativa [...], assim como o procedimento oficial dos juízes se

manifestaram, sem que ficasse provada a falta de acusação do ofendido

ou de sua família”.

Era porém confusa a atuação do Ministério Público no Brasil,

como confusa era, no dizer de Leal (1978), a própria organização das

atividades do poder público à época colonial. E tal era a situação quando,

na terceira década do século XIX, deu-se o nascimento do Brasil como

Estado nacional, disso decorrendo inevitáveis reflexos também no

Ministério Público.

4.1.2 O Ministério Público sob o regime da Constituição de 1824

Tornando-se independente de Portugal, ocorreu no Brasil, em

1824, a outorga de Carta Constitucional, nela se tendo tratado do Poder

Judiciário, que ali se afirmou (art. 151) independente e composto por

juízes11 e jurados, atribuindo a estes o artigo 152 o exame da matéria

fática e àqueles o do direito.

Despia a Constituição o Poder Judiciário, todavia (art. 153), das

garantias imprescindíveis ao exercício de seu mister, ao mesmo tempo

em que, no tocante ao Ministério Público, quase nada disse12.

10 Porém, em Portugal, como no Brasil, não chegaria o Ministério Público a experimentar, na época, a importância que na França se viu (ALMEIDA JUNIOR, 1959).11 Também cuidou a Constituição de conferir aos magistrados a garantia da “perpetuidade” (art. 153), que, porém, era gravemente mitigada na exceção que acompanhava a regra (BRASIL, 1824).

12 Limitava-se ela, de fato, apenas a estabelecer, no artigo 48, relativo às competências do Senado, que, nos crimes em que tal não coubesse à Câmara dos Deputados, seria a acusação promovida pelo Procurador da Coroa e Soberania Nacional, este, evidentemente, da livre escolha do Imperador (BRASIL, 1824).

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32

Assim, enquanto na França, em 1791, já afirmara

categoricamente a Assembleia Constituinte a tese de que o direito de

acusação é atributo da soberania nacional (ALMEIDA JÚNIOR, 1979, v.

2), que deveria por isso ser delegado ao Ministério Público, para, agindo

em nome do Estado, promover a aplicação da lei penal, ignorava

inteiramente a questão a Constituição Imperial brasileira, que, além de

nada a respeito dispor, absteve-se de organizar uma instituição que

pudesse fazê-lo (LYRA, 1937).

Atribuída a responsabilidade pelo trato da matéria, portanto, a

norma infraconstitucional, em 18 de setembro de 1828 se editou a Lei

que, criando o Supremo Tribunal de Justiça, previu em seu artigo 30 a

obrigatoriedade da intervenção do promotor de justiça na acusação de

todos os crimes, ainda quando houvesse parte acusadora.

Naquela oportunidade, porém, não se cuidou de organizar a

instituição, de definir os limites de suas atribuições, nem tampouco de

estabelecer os requisitos e critérios para o ingresso no cargo e

desempenho das funções. Daí que, sendo recrutados os promotores de

modo rudimentar, por razões exclusivamente políticas, fossem as

funções exercidas frequentemente por pessoas despidas de maturidade,

e mesmo de qualquer preparação, causa a que se pode atribuir, ao

menos em parte, a sua ineficiência (SAUWEN FILHO, 1999).

Era, portanto, precário o funcionamento do Ministério Público,

no regime da Lei de 18 de setembro de 1828, quando sobreveio o

Código de Processo Criminal de 1832, que dedicou aos “Promotores

Públicos” os artigos 36 a 38, por intermédio dos quais passou o Código a

dispor sobre as funções que por seus membros seriam exercidas, bem

como sobre um mínimo de requisitos a que deveriam atender os que

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33

pretendessem fazê-lo.

Assim, a) poderiam ser promotores os que pudessem ser

jurados, preferindo-se os que fossem instruídos em leis; b) seriam

nomeados pelo governo, na Corte, e pelo Presidente, nas Províncias,

pelo prazo de três anos, sendo escolhidos em listra tríplice proposta

pelas Câmaras Municipais; c) sua era a atribuição de denunciar crimes

graves, solicitar a prisão e punição dos criminosos e representar contra

negligência de empregados da Justiça; e d) nos seus impedimentos ou

faltas, poderiam ser substituídos por interinos nomeados pelos juízes

municipais (PESSOA, 1899; VIANNA, 1876).

Não obstante ter trazido o Código de Processo Criminal de

1832, inegavelmente, algum avanço no confuso e ineficiente quadro da

Justiça Criminal daquele período, foi por ele mantida, nas Províncias do

Império, para administração da justiça criminal, a precedente

organização judiciária, com a divisão em comarcas, termos e distritos. E

ocorreu, que, nestes, previu-se a existência de um escrivão, inspetores

de quarteirão, oficiais de justiça e um juiz de paz, este com funções

judiciárias, e, tal qual o eram os promotores e juízes municipais,

selecionado através de processo eletivo.

Ademais, impunham as regras adotadas, aos promotores,

dupla subordinação, já que, a par da exigência de que figurassem seus

nomes em lista tríplice composta segundo os anseios do poder político

local, poderiam ser substituídos em seus impedimentos ou faltas por

quem os juízes municipais indicassem13.

A deficiente estrutura, associada à eletividade dos

responsáveis pela função jurisdicional e sua provocação, era tal que, em 13 E o ponto nevrálgico residia exatamente em que, nada dispondo a lei a respeito de impedimentos, subordinava-se o exercício das funções, em última análise, à vontade do juiz municipal, que era o único critério a que se submetia a afirmação ou negação do impedimento.

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sessão de 03 de novembro de 1841, o Ministro da Justiça, Paulino de

Sousa, examinando-a, asseverou que as influências das localidades habituaram-se assim a ditar condições ao governo, impondo-lhe os homens que querem para juízes. Os juízes de paz, que a Constituição parece haver querido reduzir às conciliações, são de eleição popular: nas suas mãos a nossa legislação atual depositou toda a autoridade criminal e exclusivamente a arma das pronúncias, de todas a mais forte e a mais terrível. Os juízes municipais, de órfãos e promotores são propostos em lista tríplice, pelas Câmaras Municipais, que também organizam a lista de jurados. Assim, quase toda a justiça nasce e se forma nos municípios por uma maneira quase independente, porque, ainda que aos Presidentes de província pertença nomear juízes municipais, de órfãos e promotores, é essa nomeação dependente e limitada a três indivíduos propostos pelas Câmaras. Que justiça poderia se esperar de tais autoridades? Que garantia têm elas oferecido? Uma luta continuada, uma serie não interrompida de reações, todo o favor, toda a proteção para os que as elegeram, toda a perseguição para os que não quiseram contribuir para a sua eleição. [NEQUETE, 1973, p. 66].

Natural, pois, que, nos turbulentos e violentos anos que se

seguiram à edição do Código de Processo, em larga medida estimulados

pela ineficiência de uma Justiça Criminal eletiva, fossem esboçadas

iniciativas de sua reforma, quer no tocante às funções dos juízes de paz,

quer em relação ao Ministério Público.

Daí ter sobrevindo, em 1841, a Lei 261, de 03 de dezembro,

que previa a existência, no município da Corte e em cada uma das

províncias, um chefe de polícia, a que se subordinariam delegados e

subdelegados, todos de livre nomeação e demissão pelo governo,

naquela, ou pelos presidentes, nestas. Nela, também foram extintas as

juntas de paz e ampliadas as competências dos juízes de direito,

suprimida a exigência de lista tríplice para o provimento dos municipais,

assim como extinto o júri de acusação e outorgadas, a delegados e

subdelegados, funções tipicamente judiciárias (LEAL, 1978).

No tocante ao Ministério Público, a seu turno, previa a lei que,

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35

sendo nomeados livremente pelo Imperador, na Corte, e pelos

Presidentes, nas Províncias, serviriam os promotores por tempo

indeterminado e enquanto conviesse (art. 22), podendo, por conseguinte,

ser demitidos a qualquer tempo. A mesma lei (art. 23) estabeleceu que

haveria pelo menos um promotor em cada comarca (ou mais de um,

havendo necessidade), de preferência escolhido entre bacharéis

formados (artigo 22), em cuja falta ou impedimento seriam substituídos

por interinos nomeados pelo juiz de direito (art. 22, “in fine”). Ademais,

para a percepção de seus ordenados, passou a exigir-se apresentação

de atestado de frequência subscrito pelos juízes a quem

acompanhassem (PESSOA, 1899).

Não foram pequenas as transformações. Ao contrário, foram de

tal modo profundas que, sobre elas, afirmou José Murilo de Carvalho

que:Juntamente com a interpretação do Ato Adicional, a reforma do Código de Processo foi um dos esteios da centralização política do Segundo Reinado. Pelo efeito conjugado das duas leis, as províncias perderam jurisdição sobre funcionários da justiça e da polícia, que passaram a depender do ministro da justiça. Os juízes de paz perderam grande parte de seu poder para os delegados de polícia. Direta ou indiretamente, o ministro da justiça nomeava e demitia desde o desembargador até o guarda da prisão. [CARVALHO, 1999, p. 31].

Aliás, a centralização foi tal e “a indignação causada nos meios

liberais [...] tamanha que a reforma de 1841 se inclui entre os motivos da

Revolução de 1842” (LEAL, 1978, p. 194).

Relativamente ao Ministério Público, em particular, entre outros

efeitos, produziram as modificações operadas o aprofundamento da

subordinação dos promotores, pois, além de recrutados com maior

liberdade que antes, nenhuma garantia da continuidade do seu exercício

funcional tinham que não a permanente obediência aos interesses

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governamentais central ou provinciais, conforme o caso. Na verdade,

portanto, nesse aspecto, apenas se mudava o eixo da subordinação: se

antes a dupla obediência era devida ao poder político local e ao juiz

municipal, agora o era ao poder central ou provincial, conforme o caso, e

ao juiz de Direito, de quem dependia para a percepção de seus

vencimentos, a quem deveria acompanhar e por quem poderia ser

afastado da atividade por simples e arbitrária afirmação de impedimento.

De fato, subordinar a Justiça, de um modo geral, e o Ministério

Público, em particular, aos interesses do Governo central, era, à época, o

que pretendiam as reformas introduzidas no ordenamento jurídico

brasileiro. A tal necessidade, aliás, já se referia Pimenta Bueno, em

1857, ao asseverar que pelo que toca a nomeação e demissão de tais empregados, não pode haver dúvida alguma séria de que isso dependa inteiramente do juízo do governo. Ele é o representante da sociedade, o encarregado e responsável pelos direitos, ordem e segurança da sociedade. Os membros do Ministério Público não são senão agentes seus, de sua escolha e confiança, são molas de sua autoridade que devem ser conservadas ou destituídas como ele entender conveniente ao serviço público. [BUENO, 1958, p. 373].

Datam de meados do século XIX as observações, quando

lembrava Bueno (1958) incumbir ao Ministério Público, entre outros, a

defesa das propriedades ou direitos da coroa e da fazenda pública, a

proteção social de menores, interditos e ausentes, além, evidentemente,

da promoção da ação penal.

No entanto, lembrando ser vital a ação do Ministério Público na

administração da Justiça Criminal e lamentado o fato de se achar

representado na mais alta corte e nas comarcas, mas não perante os

juízes municipais (BUENO, 1958), observava que o Ministério Público, assim como quase todas as nossas instituições, [era] incompleto, sem centro, sem ligação, sem unidade, inspeção e

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harmonia. [sofria] de mais a mais lacunas graves nas atribuições conferidas aos seus agentes, lacunas que muito [prejudicavam] a administração da justice. [BUENO, 1857, p. 51].

Viria porém o ano de 1871 e, com ele, a introdução de

importantes modificações na estrutura e funcionamento do Poder

Judiciário

De fato, se a Lei de 3 de dezembro de 1841, procurando

centralizar o poder, criara a figura dos chefes de polícia, delegados e

subdelegados, outorgando-lhes funções tipicamente jurisdicionais,

procederia a Lei 2033/71 de modo inverso, de modo a devolvê-las a

órgãos judiciários e separar, assim, de modo mais nítido, funções

policiais e administrativas das tipicamente judiciais.

Assim, dispôs o artigo 1° que nas capitais que fossem sedes de

Relações e nas comarcas de um só termo a elas ligadas, de modo que

em dia se pudesse ir e voltar, a jurisdição seria exercida exclusivamente

por juízes de direito, que seriam substituídos por outros, também

doutores ou bacharéis. Seu § 4°, por sua vez, dizia incompatíveis os

cargos de juiz municipal e de autoridade policial, além do que o §5°

impunha que, nomeados Chefes de Polícia, perdessem os magistrados

os respectivos predicamentos.

Cuidou a lei, ainda, de definir as competências dos juízes de

paz (art. 2º), que não voltariam, porém, a ser pronunciadas como antes

da Lei 261/1941, eis que em sua maior parte eram atribuídas aos juízes

municipais (art. 3º) e aos de direito (art. 4º e 5º). Também se extinguia

(art. 9º) a jurisdição dos chefes de policia, delegados e subdelegados, no

que respeitava ao julgamento dos crimes de que tratava o art. 12, § 7º do

Código do Processo Criminal, assim como as relativas ao julgamento das

infrações dos termos de bem viver e segurança, infrações de posturas

Page 38: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

38

municipais e para o processo e pronuncia nos crimes comuns. Nestes

últimos, a propósito, impunha-se que as autoridades policiais,

procedendo às diligencias necessárias ao descobrimento dos fatos

criminosos e suas circunstâncias, transmitissem aos Promotores os

autos de corpo de delito e indicassem as testemunhas mais idôneas,

com todos os esclarecimentos coligidos, disso dando ciência à

autoridade competente para a formação da culpa.

Foi abolido (art. 15), ainda, o procedimento ex-oficio dos juízes

formadores da culpa, exceto nos casos de flagrante delito; nos crimes

policiais e nas hipóteses de omissão por parte do Ministério Público, a

quem (Lei 2033/71, art. 15, § 7º) as autoridades judiciárias deveriam

remeter as provas necessárias ao ofertamento da denuncia.

Suprimidas, como dito, as funções jurisdicionais das

autoridades policiais, especialmente no tocante à formação da culpa nos

crimes comuns, constituiu-se, em substituição à fase preliminar da

persecução penal, o inquérito policial, de que tratava a seção III do

Decreto 4.824/1871. Nela se dispunha inicialmente (art. 38) que, logo

que por qualquer meio lhes chegasse a notícia de se ter praticado algum

crime comum, procederiam as autoridades policiais às diligencias

necessárias para verificação de sua ocorrência, descoberta de suas

circunstâncias e identificação dos autores. Também eram relacionadas

as diligências que deveriam ser executadas, a saber (art. 39), a

realização do corpo de delito direto, de exames e buscas para apreensão

de instrumentos e documentos, inquirição de testemunhas, do autor e

ofendido, e tudo quanto fosse útil ao esclarecimento do fato e suas

circunstâncias. Também trazia o decreto disposições referentes à

hipótese de configuração de flagrância (art. 41), impondo-lhe o artigo 41

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39

que procedesse a inquérito, nos crimes de ação penal pública, se não

comparecesse a autoridade judiciária ou não se instaurasse

imediatamente o processo da formação da culpa. Indicadas ainda outras

diligências que deveriam ser realizadas (art. 42), no prazo máximo de

cinco dias, após o que seriam os autos remetidos ao juiz municipal,

previa o Decreto a possibilidade de impugnação do depoimento das

testemunhas pelo indiciado (BRASIL, 1871).

No tocante ao Ministério Público, previa-se (§ 7º) a existência,

em cada termo, de um adjunto do Promotor Público, proposto pelo Juiz

de Direito da respectiva comarca e aprovado pelo Presidente da

Província. E, na falta de adjunto (§ 8º), previa-se que as suas funções

seriam exercidas por qualquer pessoa idônea nomeada pelo Juiz da

culpa para o caso especial de que se tratasse.

Aos Promotores Públicos incumbia o artigo 16 de assistir, como

parte integrante do Tribunal do Júri, a todos os julgamentos, inclusive

aqueles em que houvesse acusador particular, assim como de promover

os termos da acusação e interpor qualquer recurso, nos crimes de ação

pública, ainda que tivesse sido esta promovida por acusação particular.

O artigo 20, § 2º, do Decreto 4824, por sua vez, incumbia-os de

promover todos os termos da causa nos processos em que coubesse

ação penal publica, mesmo que houvesse acusador particular, de aditar

a queixa, a denúncia e o libelo, de fornecer outras provas além das

indicadas pela parte e de interpor os recursos, quer na formação da

culpa, quer no julgamento. Eram fixados, pelo art. 22, os prazos de trinta

ou cinco dias para ofertamento de denúncia, de conformidade com que

tivesse o réu prestado fiança ou estivesse preso, respectivamente,

enquanto em outros casos seria de cinco dias o prazo, contado do

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40

recebimento de esclarecimentos ou provas do crime ou de quando este

tivesse se tornado notório. A eles se permitia, ainda (art. 23) o

aditamento da queixa ou denuncia, que o adjunto ou a pessoa nomeada

no caso do § 8º, do art. 1º, da Lei 2.033, houvesse apresentado, e o

prosseguimento nos termos da formação da culpa, para o que o adjunto,

ou quem suas vezes fizesse, deveria comunicar-lhe a que tivesse

formulado (BRASIL, 1871).

Tais eram as normas a que se achava sujeito no Brasil, nas

últimas décadas do século XIX, o Ministério Público, quando sobrevieram

os importantes acontecimentos que redundaram na Proclamação da

República.

4.1.3 A primeira república e o Ministério Público

Instalando-se no Brasil com a proclamação da República, o

Governo Provisório, sendo Ministro da Justiça Campos Sales, editou, em

11 de outubro de 1890, o Decreto 848, que tinha a finalidade de

organizar a Justiça Federal (BRASIL, 1890b).

Assim foi que, em seu art. 5°, instituiu o Decreto um Supremo

Tribunal Federal, composto de quinze ministros, de livre nomeação pelo

Presidente da República, com a aquiescência do Senado Federal,

escolhidos entre Juízes Seccionais ou cidadãos de notável saber e

reputação, cuja competência era definida pelo art. 9°. Em primeiro grau,

por sua vez, seria a jurisdição federal exercida (arts. 1° e 2°) por juízes

intitulados Juízes de Seção, de livre nomeação do Presidente da

República, que eram inamovíveis e vitalícios, e tinham a competência

estabelecida pelo art. 15 (BRASIL, 1890b).

No que se refere ao Ministério Público, dizia o Decreto (art. 6°)

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41

que as funções de Procurador-Geral da República seriam exercidas por

Ministro do Supremo Tribunal Federal, escolhido pelo Presidente da

República, figurando entre as suas atribuições, segundo o art. 22, a

promoção da ação penal pública, a representação da União, o velamento

pela execução das leis, decretos e regulamentos, a defesa da jurisdição

federal e o fornecimento de instruções aos Procuradores Secionais. Em

primeiro grau seriam as funções do Ministério Público exercidas pelos

Procuradores Secionais, escolhidos pelo Presidente da República para

exercício da função pelo período de 4 anos, dentro dos quais eram

inamovíveis (art. 23). Suas atribuições se achavam previstas no art. 24,

figurando entre elas a promoção da ação penal pública, a solicitação de

instruções ao Procurador-Geral da República e o cumprimento das

ordens do Governo da República relativas ao exercício das suas funções.

Além disso, nas faltas e impedimentos dos Procuradores Secionais,

dispunha o art. 26, que seriam suas funções exercidas por quem o

Procurador-Geral nomeasse (BRASIL, 1890b).

Já no mês que se seguiu, editou-se, em 14 de novembro de

1890, o Decreto 1030, que organizou a Justiça no Distrito Federal e que,

ao tratar do Ministério Público, disse-o o “advogado da Lei, o fiscal de

sua execução, o procurador dos interesses gerais, o promotor da ação

pública contra todas as violações do direito, o assistente dos

sentenciados, dos alienados, dos asilados e dos mendigos”, incumbindo-

o de requerer o que fosse necessário para o bem da Justiça e dos

deveres de humanidade (BRASIL, 1890c).

Não obstante tivesse a exposição de motivos do Decreto

848/1890 asseverado ser “O Ministério Público... uma instituição

necessária em toda organização democrática e imposta pelas boas

Page 42: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

42

normas da Justiça, a qual [competia] velar pela execução das leis,

decretos e regulamentos que [devessem] ser aplicados pela Justiça

Federal e promover a ação pública onde ela [conviesse]”, a ela não

dedicou a Constituição de 1891, contudo, grande atenção (LYRA, 1937,

p. 16).

De fato, pouco se referia a Constituição ao Ministério Público.

Dele somente cuidavam os artigos 58, §2°, inserido na seção referente

ao Poder Judiciário, para dizer que o Presidente da República designaria,

dentre os membros do Supremo Tribunal Federal o Procurador-Geral da

República, cujas atribuições seriam definidas em lei, e o 81, §1°, que o

dizia legitimado a promover a revisão criminal (BRASIL, 1891).

Ainda no âmbito federal, a Lei 221, de 30 de novembro de

1894, ao dispor sobre o Ministério Público, explicitou-lhe as atribuições,

de tal sorte que, agora expressamente, competia-lhe, entre outras, a

representação dos direitos e interesses da União, a alegação e defesa

dos direitos da Fazenda Nacional em todas as causas cíveis, a promoção

dos processos executivos de cobrança da dívida ativa, a promoção dos

processos de desapropriação por necessidade ou utilidade Nacional, os

de incorporação de bens aos cofres da União, a arrematação de objetos

depositados nos cofres nacionais, o requerimento de providências legais

assecuratórias de direitos da União, as medidas avocatórias garantidoras

da jurisdição do juízo, o ofício nas habilitações e justificações que

devessem ser perante o Juiz Federal processadas, a interposição de

recursos das decisões proferidas nos processos civis, criminais ou

administrativos em que lhe competisse funcionar e a promoção da

execução das sentenças em favor dos interesses da União (BRASIL,

1894).

Page 43: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

43

Sendo mantidas em tudo mais as disposições do Decreto 848,

sobreveio, porém, com o advento da Lei 280, de 29 de julho de 1895, em

desfavor da instituição, que pouco antes se afirmara ser imprescindível a

toda organização democrática, a supressão de importante garantia. É

que seus membros, que já eram escolhidos segundo a exclusiva

conveniência política do Executivo, passaram a ser susceptíveis de

desligamentos de seus cargos pela mesma razão, sendo a inovação

aplaudida por parte substancial da doutrina (BRASIL, 1895).

Certo que a disciplina do Ministério Público, no regime da

Constituição de 1891, figurava na organização federal, aos Estados

ficara reservada a faculdade de legislar a seu respeito, até mesmo em

virtude de que, consoante as disposições daquele texto, era-lhes

assegurada toda a competência legislativa não inserida nos poderes da

União (BRASIL, 1891).

Bem por isso, legislaram os Estados-membros a respeito como

lhes pareceu conveniente, tendo em vista o caráter sintético da

Constituição de 1891, que, como mencionado, quase nada disse a

respeito do Ministério Público.

Assim, o Estado de Minas Gerais, por exemplo, na vigência da

primeira Constituição republicana, editou a sua, de 15 de junho de 1891,

seguindo o modelo daquela, em que pouco tratava do Ministério Público,

dedicando-lhe apenas parte dos artigos 66 e 67, referentes ao Poder

Judiciário. Desse modo, enquanto o primeiro afirmava que haveria no

Tribunal de Relação, escolhido pelo governo em meio aos seus

membros, um Procurador-Geral, determinava o segundo que lei especial

(Constituição, art. 67, caput) regulasse a constituição e acesso à

magistratura e ao Ministério Público. Porém, antecipando-se ao que

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44

pudesse estabelecer a lei especial, previa a Constituição a exigência do

grau de bacharel em Direito para o acesso ao cargo de juiz, o que era

apenas preferível, para o acesso ao de promotor de justiça (Constituição,

art. 67, IV). Além disso, conferida a vitaliciedade aos juízes (Constituição,

art. 64), o mesmo não se aplicava a promotores de Justiça (MINAS

GERAIS, 1891).

Também em Minas Gerais, no ano de 1903, através da Lei

adicional n° 05, de 13 de agosto, embora tenham sido introduzidas

modificações no capítulo referente ao Poder Judiciário, nada se fez em

relação ao Ministério Público, senão determinar-se que lei ordinária o

organizasse. Por isso, foi somente no ano de 1920 que estabeleceu a Lei

a condição indeclinável de doutor ou bacharel em Direito para o acesso

ao cargo de promotor de Justiça. E, no que respeita à vitaliciedade,

determinou que se inserisse na Constituição disposição geral expressa

que a negava aos que não fossem desembargadores, juízes de direito,

membros de tribunais superiores ou serventuários a quem a lei tivesse

outorgado tal garantia (MINAS GERAIS, 1903).

Enquanto isso, no Estado de São Paulo, atribuía o art. 49 da

Constituição, de 15 de dezembro de 1890, aos membros do Poder

Judiciário vitaliciedade e inamovibilidade. No entanto, omitia-se acerca

das funções e do acesso aos cargos no Ministério Público. Limitava-se a

Constituição, aliás, no tocante à instituição, a estabelecer, em seu art. 51,

que caberia ao Tribunal de Relação eleger anualmente, dentre os seus

membros, o Procurador-Geral do Estado (SÃO PAULO, 1890).

A Constituição paulista de 1891, em seu artigo 46, assegurava

o provimento dos cargos de juiz mediante concurso, atribuindo o artigo

47 aos seus membros completa e segura independência, vitaliciedade e

Page 45: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

45

inamovibilidade. No que se referia ao Ministério Público, porém, mais

uma vez se silenciava, como a anterior, no tocante às atribuições e forma

do provimento dos cargos respectivos (SÃO PAULO, 1891).

Posteriormente, no ano de 1921, a Constituição do Estado de

São Paulo, sendo reformada, passou a estabelecer, em seu art. 54, que

o Presidente do Estado é quem designaria, dentre os membros do

Tribunal de Justiça, o Procurador-Geral do Estado, mantendo-se tal

prerrogativa na reforma de 1929 (SÃO PAULO, 1891).

Na Bahia, tratava a Constituição de 02 de julho de 1891, no

Título IV, do Poder Judiciário, cuja independência era afirmada (art. 63).

Era ele constituído sob a forma de tribunais, cujos membros eram

vitalícios e inamovíveis (art. 65, n° 4°) e Juízes de Direito (art. 65, 3°),

vitalícios, prevendo-se (art. 67, §1°) o ingresso na carreira por concurso,

para o que se exigia (art. 65, §1°) a condição de doutor ou bacharel em

Direito atribuída por faculdade oficial ou equiparada (BAHIA, 1891).

No que respeita ao Ministério Público, instituído naquela

ocasião (art. 88), estabelecia a Constituição, todavia, que se organizaria

em órgãos hierárquicos, nomeados e demitidos livremente pelo Chefe do

Poder Executivo, prevendo-se um em cada comarca, com atribuições e

condições de nomeação e vencimentos previstos em lei, preferindo-se os

bacharéis ou doutores em Direito. O certo é que, emendada em 24 de

maio de 1915, em nada alterou a Constituição baiana, substancialmente,

o Poder Judiciário e o Ministério Público. Continuou, portanto, em relação

a este, o provimento dos cargos na dependência da vontade do Chefe do

Executivo, e as atribuições na dependência de norma infraconstitucional.

Enfim, pertencendo aos Estados a competência residual, num

tempo em que a Constituição Federal a respeito do Ministério Público

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46

quase nada dizia, seria absolutamente natural, como foi, que a sua

instituição nos Estados se desse consoante a tradição imperial não

alterada nos primeiros anos da República. Daí que neles se silenciassem

as constituições estaduais acerca de critérios de recrutamento e

desligamento, de modo a tornar possível sua realização segundo a

conveniência e a oportunidade do Executivo, tal qual aliás sucedia

quanto às demais funções públicas.

Impossível ignorar, todavia, as influências da legislação federal

na formação do direito estadual, deve-se registrar que, em 28 de

dezembro de 1911, por intermédio do Decreto 9.263, sofreu a Justiça do

Distrito Federal importante reorganização, quando seu 158 afirmou ser o

Ministério Público, perante as autoridades constituídas, o advogado da lei

e o fiscal de sua execução, bem como o promotor da ação penal pública

contra todas as violações de direitos. De igual, modo, sofrendo a Justiça

do Distrito Federal, em 20 de dezembro de 1923, por meio do Decreto

16.273 nova reorganização, fez-se mais uma vez idêntica afirmação,

enfatizando-se a recíproca independência entre os órgãos do Ministério

Público e os membros da magistratura (BRASIL, 1912; BRASIL, 1923).

Não se achando a instituição do Ministério Público, todavia,

imune às transformações sociais, foi natural que, eclodindo a Revolução

de 1930 e sobrevindo Constituição depois dela produzida, recebesse a

instituição tratamento diferente daquele adotado no âmbito da União e

que dela se difundira para os Estados.

Page 47: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

47

4.1.4 A Constituição de 1934 e o Ministério Público

Imposta pelo movimento revolucionário de 1930 nova ordem,

seguiu-se a necessidade de produção de nova Lei Fundamental, que

viria a incorporar, como se antes ocorrera, tendências que se difundiram

também em outros Estados-nacionais.

Embora o respectivo anteprojeto tivesse, no que respeita ao

Poder Judiciário, se inclinado no sentido da sua unidade, a solução não

foi acolhida pela Constituição de 1934, que optou pela dualidade,

mantendo, assim, as justiças federal e estadual. Além disso, foram

criadas as justiças eleitoral e militar (art. 63) e acrescida, às garantias da

vitaliciedade e irredutibilidade de vencimentos dos magistrados, já

consagradas na Constituição de 1891, a da inamovibilidade (art. 64)

(BRASIL, 1934).

No tocante à sua organização, manteve a Constituição, como

órgão de cúpula do Poder Judiciário, aquela a que denominou Corte

Suprema, estabelecendo-se em onze o número de seus ministros, que

poderiam ser elevados até dezesseis (art. 73). Deles se exigia, para o

acesso ao cargo, notável saber jurídico e reputação ilibada, sendo

mantida a exigência de idade mínima, salvo sendo magistrados os

indicados, e estabelecida a máxima (art. 74). Os juízes federais, a seu

turno, deveriam ser nomeados entre brasileiros natos dotados de

reconhecido saber científico e reputação ilibada, com idade não inferior a

trinta nem superior a sessenta anos, escolhidos pelo Presidente da

República em lista quíntupla formada, em escrutínio secreto, pela

Suprema Corte (art. 80) (BRASIL, 1934).

Acerca da justiça estadual, a Constituição (art. 104),

Page 48: Inteligência como instrumento de atuação do MP na proteção ao estado democrático de direito

48

determinando aos Estados que a respeito legislassem, impôs, porém,

que fossem observados os princípios da investidura mediante concurso,

do acesso aos graus superiores por antiguidade e merecimento, da

inalterabilidade do número de juízes da corte, da fixação de vencimentos

não inferiores aos de secretários de Estado e da competência para

julgamentos de juízes inferiores. Ademais, determinando fossem

respeitados os preceitos dos seus artigos 64 a 72, compeliu a

Constituição Federal os Estados à adoção das garantias da vitaliciedade,

inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos, de há muito já

reclamadas (BRASIL, 1934).

No tocante ao Ministério Público, revelam os registros dos

trabalhos constituintes que se pretendeu inicialmente colocá-lo, como de

fato o fez o anteprojeto, no capítulo referente ao Poder Judiciário, de que

constava, originalmente, no art. 63. Todavia, acabou sua disciplina sendo

abrigada no capítulo referente aos órgãos de cooperação nas atividades

governamentais. Assim (art. 95), dispôs a Constituição que o Ministério

Público seria organizado na União, no Distrito Federal e nos Territórios

por lei federal, e, nos Estados, por leis locais, competindo a estas, nos

termos do art. 7°, I, “e”, respeitar, na sua atividade legiferante, as

garantias do Ministério Público. Acerca da chefia do Ministério Público

Federal, estabeleceu-se que, embora com aprovação do Senado

Federal, seria o cargo de livre nomeação do Presidente da República,

que escolheria o ocupante dentre cidadãos que atendessem aos

requisitos para ministro da Corte Suprema, porém demissíveis ad nutum.

Também no tocante aos chefes do Ministério Público do Distrito Federal

e dos Territórios foram estabelecidos requisitos, que eram a condição de

jurista de notável saber e reputação ilibada, de eleitor alistado e de idade

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49

superior a trinta anos. Outra importante inovação foi a exigência de

concurso para acesso ao cargo, cuja perda só ocorreria por sentença

judicial ou processo administrativo em que fosse assegurada ampla

defesa. No tocante aos Ministérios Públicos Estaduais, limitou-se a

Constituição Federal a dizer incompatível o exercício da função com

outra pública, salvo o magistério, e em outros casos nela indicados. Por

fim, remeteu a leis especiais a organização do Ministério Público das

Justiças Militar e Eleitoral (art. 98) (BRASIL, 1934).

Absteve-se a Constituição, todavia, de indicar as atribuições do

Ministério Público, que restaram, assim, entregues às normas

infraconstitucionais. Por outro lado, como a Constituição recriava o

Estado, viram-se os Estados-membros obrigados a produzir novas

Constituições que se amoldassem à da República.

Assim, na Constituição Estadual Mineira, de 30 de julho de

1935, por exemplo, ao lado do Título V, consagrado ao Poder Judiciário,

tratou o Título IX do Ministério Público, ali (art. 83) se tendo disposto que

seria exercido: a) pelo Procurador-Geral do Estado, com as funções de

chefe do Ministério Público, nomeado pelo Governador dentre brasileiros

natos, bacharéis em Direito de notório saber jurídico e idoneidade moral

e que tivessem mais de oito anos de prática forense, com os mesmos

vencimentos dos Desembargadores, mas demissível ad nutum; b) pelos

Promotores de Justiça, nomeados pelo Governador dentre bacharéis em

Direito; e c) pelos órgãos e funcionários instituídos em lei (MINAS

GERAIS, 1935).

Todavia, enquanto o art. 50, alusivo ao Poder Judiciário,

impunha que o ingresso se fizesse por concurso de provas e títulos,

exigindo-se o bacharelado em Direito, idade superior a 25 anos e quatro

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50

anos de prática forense, nada dizia a respeito o Título IX, no tocante aos

promotores de Justiça, limitando-se a estabelecer que seriam nomeados

pelo Governador do Estado dentre bacharéis em Direito. Ademais,

enquanto o art. 51 assegurava a juízes e desembargadores a

vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de vencimentos, nos

termos da Constituição da República, estabelecia o art. 84, alusivo aos

promotores de Justiça, que serviriam eles durante quatro anos, permitida

a recondução, admitindo-se, ainda, remoção ou exoneração mediante

processo ou por exigência do serviço público, em virtude de

representação formulada pelo Procurador-Geral do Estado (MINAS

GERAIS, 1935).

A esse tempo, a Constituição do Estado de São Paulo, de 09

de julho de 1935, ao tratar do Poder Judiciário, conferiu a

desembargadores e juízes, em seu art. 45, as garantias da vitaliciedade,

inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos. Ao Ministério Público,

a seu turno, dispensava tratamento o art. 57, que previa a nomeação de

promotores pelo Governador, após concurso de títulos e provas, só se

admitindo perda do cargo, nos termos da lei, por sentença judiciária ou

processo administrativo, em que fosse assegurada ampla defesa.

Também se dispunha, no art. 61, que seria seu chefe o Procurador-Geral

do Estado, nomeado pelo Governador entre doutores ou bacharéis em

Direito, de notório merecimento e reputação ilibada, com mais de trinta e

cinco anos de idade e dez de prática forense, o qual perceberia os

mesmos vencimentos dos desembargadores, sendo, todavia, demissível

ad nutum. A ele, cujas atribuições não eram expressamente conferidas

pela Constituição, permitia o §1°, do art. 61, fosse em lei ordinária

atribuída a função de promover a defesa judicial dos direitos e interesses

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51

do Estado. Finalmente, o art. 85 estabelecia que a organização do

Ministério Público seria a determinada em lei que atenderia às garantias

prescritas aos Estados pela Constituição da República (SÃO PAULO,

1935).

Àquela mesma época, a Constituição da Bahia, de 20 de

agosto de 1935, assegurava a desembargadores e juízes, em seu art.

39, a vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos.

Ademais, dando-se o acesso à corte de apelação por promoção de

juízes, previa-se que o ingresso na carreira dar-se-ia (art. 45) mediante

concurso com exigência de bacharelado ou doutorado em Direito,

reconhecido saber, boa reputação e mais de quatro anos de efetivo

exercício, nomeado pelo Governador, após aprovação da Assembleia

Legislativa, entre candidatos indicados pela Corte em lista tríplice (art.

46) (BAHIA, 1935).

No tocante ao Ministério Público, disse-o o art. 53 chefiado pelo

Procurador-Geral do Estado, com os encargos de zelar pela execução da

lei, representar a Fazenda Estadual em juízo e defender os interesses

gerais do Estado, sendo o cargo provido por livre nomeação do

Governador do Estado entre membros do Ministério Público ou da Ordem

dos Advogados, Seção da Bahia, dotados de notório saber e reputação

ilibada, que seriam, porém, demissíveis ad nutum. No tocante aos

promotores de justiça, exigível a condição de bacharel ou doutor em

Direito (art. 54), eram asseguradas a inamovibilidade, irredutibilidade de

vencimentos e vitaliciedade (art. 55), prevendo-se (art. 54) que suas

atribuições seriam definidas em lei (BAHIA, 1935).

Consagrando a Constituição Federal de 1934, como visto, no

§3°, do art. 95, embora referindo-se ao Ministério Público Federal, o

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52

acesso mediante concurso e a estabilidade, dava a instituição importante

passo na direção da sua independência do Poder Executivo, que,

todavia, continuava a deter importante parcela do poder, porquanto lhe

cabia nomear, livremente (art. 95) o seu chefe (BRASIL, 1934).

Certo que o art. 7° da constituição, conferindo aos Estados-

membros competência legislativa, impunha-lhes, porém, respeito (alínea

“e”) às garantias do Poder Judiciário e do Ministério Público, natural e

desejável seria que fossem observados os princípios da investidura

mediante concurso e da estabilidade. No entanto, como se vê, entre os

exemplos citados, de Minas Gerais, São Paulo e Bahia, apenas o

segundo previa o acesso mediante concurso, chegando o primeiro ao

extremo de fazer temporário o exercício das funções, das quais poderia

ser afastado o titular sob a alegação de interesse público (BRASIL,

1934).

Promovida em alguns Estados, como visto, o retorno à

disciplina existente cem anos antes, quando as funções do Ministério

Público eram atribuídas a funcionários escolhidos e demitidos ao sabor

da vontade do governante, era o fato explicado, ao menos em parte, pela

visão então dominante, traduzida no pensamento de Getúlio Vargas,

exposto por ocasião do veto oposto, parcialmente, ao Decreto n° 05, de

24 de janeiro de 1935.

De fato, nas razões do veto oposto ao projeto, que dispunha

sobre o provimento dos corpos do Ministério Público Eleitoral, insurgia-se

o Chefe do Executivo contra a exigência, estabelecida em seus artigos 1°

e 2°, de listas tríplices. É que, dizendo então achar-se o Ministério

Público subordinado ao Poder Executivo, afirmava inconstitucional a

interferência na competência de seu chefe para a designação dos cargos

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53

federais (BRASIL, 1935). E ia além, como lembra Lyra (1937, p. 26), pois

a par de reviver a tese já fortemente combatida da dependência,

afirmava que deveriam ser os representantes do Ministério Público “a

expressão da confiança direta do Governo”.

Trouxe a Constituição de 1934, no tocante ao Ministério

Público, algumas importantes e aplaudidas inovações (SAUWEN FILHO,

1999), além da nítida separação do poder Judiciário - cujas garantias

foram, no entanto, estendidas aos seus membros - e que contribuiriam

de modo decisivo para a formação de seu perfil.

Com efeito, conferindo a Constituição à Corte Suprema a

condição de guardiã da Constituição, era ao Ministério Público que cabia

(art. 96), para assegurar-lhe a supremacia, comunicar a decisão de

inconstitucionalidade de lei ou ato governamental, por ela tomada, à

autoridade legislativa ou executiva de que tivesse emanado, inclusive ao

Senado Federal, para o cumprimento do disposto no art. 91, IV (BRASIL,

1934).

Ademais, acentuando a tendência, já manifestada em normas

infraconstitucionais, de compelir o Ministério Público à defesa dos

vitimados indevidamente pela ação repressiva estatal, atribuía a

Constituição a legitimidade do Ministério Público para a promoção da

revisão criminal (art. 76, n° 3) (BRASIL, 1934).

Tendia o Ministério Público, como visto, por força das

disposições mencionadas, a converter-se um tanto mais em defensor da

sociedade que do Estado, quando, porém, sobreveio o refluxo autoritário

do Estado Novo, que se repercutiria sobre a instituição, como, de resto,

sobre toda a sociedade.

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54

4.1.5 A ditadura Vargas e o Ministério Público

Se no regime da Constituição Federal de 1934 recebera

capítulo à parte, o Ministério Público, no Estado Novo e sua Carta,

todavia, seria objeto de referências esparsas, apenas, como foram as

constantes no art. 99, 101, “b”, 105 e 109, parágrafo único (BRASIL,

1937).

Assim, suprimidas quaisquer referências às garantias que aos

seus membros tinham sido atribuídas, o que fez a constituição de 1937,

foi, de conformidade com a tendência autoritária que em tudo a

orientava, aprofundar o controle do Executivo sobre as instituições,

pertencessem elas ao ente a que pertencessem.

Com efeito, ao tempo em que dissolvia, com base no art. 178,

a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, as Assembleias

Legislativas e as Câmaras Municipais e outorgava-se ao Chefe do

Executivo (art. 176) a competência para afastar governadores de Estado,

nomeando interventores a quem conferiu (art. 181) competência para

ditar Constituições Estaduais e legislar. E também se atribuía ao

Presidente (art. 180) a competência para fazê-lo, enquanto não se

reunisse parlamento em substituição ao que dissolvera, por meio de

decretos-lei (BRASIL, 1937)

Nessas circunstâncias, não surpreende que, suprimidas a

Justiça Federal e Eleitoral (art. 90), tenha-se atribuído o Presidente o

poder de nomear, sem consulta a quem quer que fosse, sequer ao

Conselho Federal, o Procurador-Geral da República, bem como o de

demiti-lo ad nutum (BRASIL, 1937).

Quanto ao mais, limitava-se a Constituição, no tocante ao

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55

Ministério Público, a prever que estaria o Procurador-Geral da República

sujeito a processo criminal perante o Supremo (101, “b”), que um quinto

dos tribunais seria composto por advogados ou membro do Ministério

Público (art. 105) e que a lei poderia cometer ao Ministério Público (art.

109, parágrafo único) a função de representar em juízo a Fazenda

Federal.

Sob a ditadura que então se implantou no país, com a

dissolução dos legislativos, concentrada em mãos de Getúlio Vargas a

competência para legislar, foram editados o Código Penal (Decreto-lei

2.848, de 07 de dezembro de 1940) e o Código de Processo Penal

(Decreto-lei 3.689, de 03 de outubro de 1941), este de cunho

marcadamente autoritário, como aliás o denuncia a sua exposição de

motivos.

Embora sem conter capítulo destinado ao Ministério Público, a

ele se referia o Código inúmeras vezes, como para obrigá-lo à

propositura da ação penal pública (art. 24), para permitir-lhe a requisição

de instauração de inquérito policial (art. 5°, II), a requisição de diligências

à autoridade policial (art. 13, II), para impedir-lhe o requerimento de

retorno desnecessário dos autos à delegacia (art. 16), para fazê-lo o

destinatário da provocação de qualquer do povo (art. 27) e da

representação (art. 39), para permitir-lhe o requerimento de nomeação

de curador (art. 33), para permitir-lhe a dispensa do inquérito, em certos

casos (art. 39, §5°), para impedi-lo de desistir da ação (art. 42), para

permitir-lhe o aditamento da queixa (art. 45), para fixar prazos para

ofertamento da denúncia em caso de atuação sem inquérito policial (art.

46, §1°), para permitir-lhe a requisição de informações diretamente a

qualquer autoridade (art. 47), para impor-lhe o velamento pela

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56

indivisibilidade da ação penal privada (art. 48), para impor-lhe a

promoção da ação indenizatória em caso de pobreza da vítima (art. 68),

para legitimá-lo à promoção de medidas assecuratórias (art. 142), para

permitir-lhe a promoção da instauração de incidente de insanidade

mental (art. 149), para permitir condenação mesmo em face do seu

pedido de absolvição (art. 385) e para permitir-lhe a impetração de

habeas corpus (art. 654), entre outras referências (BRASIL, 1941).

Numerosas como visto, as referências, no Código de Processo

Penal, ao Ministério Público, decorreu o fato da inexistência de outras

leis que pudessem reger o tema, eis que a atividade legislativa no país

se desenvolveu, como, aliás, se deu com o próprio Código de Processo

Penal, através de decretos-lei.

Entrando em vigor o Código de Processo Penal em janeiro de

1942, regeu ele, portanto, as iniciativas no âmbito criminal de um

Ministério Público cujos membros, como salientado, não dispunham de

garantia alguma.

4.1.6 A Constituição Federal de 1946 e o Ministério Público

A Constituição de 1946, dedicando ao Poder Judiciário o

Capítulo IV, nele (art. 25) reconheceu as garantias da vitaliciedade,

inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos, tornando os Ministros

do Supremo Tribunal Federal (nome que a Constituição de 1937 lhe

atribuíra) a depender, na sua nomeação, da aprovação do Senado (art.

99). Também ali se recriou a Justiça Eleitoral, criando-se a do Trabalho

(BRASIL, 1946).

Ao Ministério Público, dispensou o Título III tratamento,

prevendo-se que o da União funcionaria junto à Justiça Comum, Militar,

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57

Eleitoral e do Trabalho (art. 125). Conservou-se, porém, a possibilidade

de escolha do Procurador-Geral da República (art. 126) por livre escolha

do Presidente da República, dependente todavia de aprovação pelo

Senado Federal, entre cidadãos que atendessem às condições para

Ministro do Supremo Tribunal Federal, porém, demissíveis ad nutum.

Além disso, previsto que os membros do Ministério Público da União, do

Distrito Federal e dos Territórios ingressariam na carreira mediante

concurso, eram-lhes garantidas a estabilidade e inamovibilidade,

ressalvada, quanto a esta, a conveniência do serviço. Por outro lado,

como determinava a Constituição que os Estados organizassem seus

Ministérios Públicos (art. 128) em carreira, observados os princípios da

promoção de entrância a entrância e os previstos no artigo precedente, a

eles também se aplicariam os princípios da inamovibilidade e

estabilidade. Por fim, deve-se acrescentar que, sendo representada em

juízo a União pelos Procuradores da República, previa-se pudesse a lei

cometer tal encargo, nas comarcas do interior, ao Ministério Público local

(BRASIL, 1946).

Evidente, pois, que, produzindo as suas Constituições, viram-

se os Estados-membros obrigados a respeitar os princípios reitores

consagrados na Constituição Federal.

Assim, das normas constitucionais não podendo se afastar, a

Constituição do Estado de Minas Gerais, de 14 de julho de 1947, em seu

art. 60, reconheceu aos Magistrados as garantias da vitaliciedade,

irredutibilidade de vencimentos e inamovibilidade, assim como a

promoção de entrância a entrância. Ao Ministério Público, por sua vez,

que ocupava o título constitucional subsequente, dedicavam-se os arts.

74 a 77, prevendo o primeiro deles que seria a instituição chefiada por

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58

brasileiro, bacharel em Direito, de notório saber jurídico e idoneidade

moral, com idade mínima de trinta e cinco anos e dez de prática forense,

nomeado pelo Governador com a aprovação da Assembleia, com os

mesmos vencimentos dos desembargadores. Dos promotores e

curadores, por sua vez, tratava o art. 75, que impunha o ingresso em

concurso de provas, com estabilidade após dois anos, com remoção

fundada apenas em conveniência do serviço, e promoção de entrância a

entrância. Equiparados os cargos de curadores e promotores para todos

os efeitos, remetia-se à norma infraconstitucional a responsabilidade pela

organização da instituição (MINAS GERAIS, 1947).

4.1.7 A Constituição de 1967 e o Ministério Público

Apesar da implantação, no Brasil, em 1964, de uma ditadura

militar, com a consequente edição de nova Constituição, não destoou

esta significativamente da anterior, democraticamente elaborada, no

tocante ao Ministério Público.

Na verdade, o art. 138, da Constituição de 1967, apenas

reproduziu o art. 126 da Constituição de 1946, pelo que o chefe do

Ministério Público continuaria a ser o Procurador-Geral da República,

nomeado pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha

pelo Senado Federal, dentre cidadãos que reunissem as condições para

ser ministro do Supremo Tribunal Federal, isto é, brasileiros natos,

maiores de trinta e cinco anos, dotados de notável saber jurídico e

reputação ilibada. Aliás, nesse particular, até certo avanço aparente

houve, já que se suprimiu a referência à demissibilidade imotivada.

Tampouco houve alteração substancial no tocante à estabilidade, que foi

objeto de disciplina no §1°, do art. 138, de modo idêntico ao previsto no

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59

art. 127 da Constituição anterior. O art. 139, por sua vez, apenas tratou,

nos mesmos termos em que antes o era o assunto, da organização do

Ministério Público Estadual, pelo art. 128 da Constituição de 1946. Até

mesmo a possibilidade de representação judicial da União, antes tratada

no art. 201, §2°, era objeto de previsão, nos mesmos termos, porém, no

art. 119, §3° (BRASIL, 1967; BRASIL, 1946).

Amoldando-se à Constituição de 1967, em 13 de maio daquele

ano editou o Estado de São Paulo a sua, em que, no art. 58 e seguintes,

tratava do Ministério Público. Ali, prevendo-se a sua organização em

carreira, exigiu-se a aprovação em concurso público de provas e títulos

para o ingresso. Também eram previstas as garantias da estabilidade e

inamovibilidade, bem como a promoção de entrância a entrância.

Também se estabelecia (art. 59) que a chefia do Ministério Público seria

exercida pelo Procurador-Geral de Justiça, que seria nomeado pelo

Governador entre os Procuradores indicados em lista tríplice pelo colégio

respectivo. Além disso, cometendo o art. 47 à Procuradoria-Geral do

Estado a responsabilidade pela representação judicial e extrajudicial do

ente, previa-se fosse ele, no interior do Estado, em processos fiscais (art.

48), representado pelo Ministério Público. Finalmente, também se previa

(art. 59/60), a organização da carreira de Procurador de Estado,

mediante concurso de provas e títulos (SÃO PAULO, 1967).

À mesma época, em 13 de maio de 1967, no Estado de Minas

Gerais, promulgava-se Constituição que, em seu art. 127, mencionavam-

se as garantias da inamovibilidade, vitaliciedade e irredutibilidade de

vencimentos da magistratura. Nela também, tratando do Ministério

Público, previu o art. 152, fosse chefiado pelo Procurador-Geral do

Estado, escolhido entre os Procuradores, com prévia aprovação da

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60

Assembleia Legislativa. No art. 153, por sua vez, previam-se o ingresso

na carreira mediante concurso de títulos e provas, a estabilidade e a

inamovibilidade, estabelecendo o art. 154 a obediência às normas

referentes à disciplina e garantias da magistratura, no que aplicáveis,

assim como a promoção de entrância a entrância. Também se previa, no

art. 181, pudessem os membros do Ministério Público Estadual exercer

as atribuições do da União, quando delegadas em lei ou convênio

(MINAS GERAIS, 1967).

Já amoldadas as Constituições Estaduais à Federal, sobreviria,

porém, em reação às já examinadas resistências à ditadura militar, a

Emenda Constitucional n° 01, que produziria maior concentração de

poderes no Executivo, com importantes reflexos também sobre o

Ministério Público.

4.1.8 A Emenda Constitucional de 1969 e o Ministério Público

Sentindo-se à época pressionados pelas circunstâncias a fazê-

lo, os que detinham então o poder promulgaram a Emenda

Constitucional n° 01, que, em relação ao Ministério Público, em especial,

promoveu alterações limitadas, mas profundas.

De fato, dando nova redação ao 138, o art. 95, referente ao

provimento do cargo de Procurador-Geral da República, passou a

dispensar a aprovação do Senado Federal ao nome indicado pelo

Presidente da República, de modo que, sendo demasiadamente

subjetivos os requisitos do notável saber jurídico e da reputação ilibada,

poderia a escolha recair sobre qualquer indivíduo escolhido pelo chefe do

Executivo, desde que contasse mais de trinta e cinco anos.

A ampla liberdade que o dispositivo dava ao Presidente da

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61

República para escolha do chefe do Ministério Público se explica, pelo

menos em parte, pelo fato de que a este é que cabia, de conformidade

com o disposto no art. 154 da Emenda, representar ao Supremo Tribunal

Federal para a suspensão dos direitos políticos daqueles que,

supostamente abusando de direito individual ou político, o fizessem com

o propósito de subversão do regime democrático ou corrupção.

A superveniência da Emenda Constitucional n° 01, de 1969,

como não poderia deixar de ser, repercutiu de modo importante nos

Estados-membros, compelindo-os a novas modificações em suas

normas de regência.

Assim, o Estado de São Paulo, por exemplo, viu-se compelido

a alterar sua Constituição, o que fez, em 30 de outubro de 1969. Assim,

manteve-se a organização em carreira, com exigência de concurso

público de provas e títulos (art. 46) para o ingresso, assim como as

garantias da estabilidade e inamovibilidade e a promoção de entrância a

entrância. Ali também se previu (art. 47) que a chefia do Ministério

Público seria exercida pelo Procurador-Geral de Justiça, nomeado pelo

Governador entre os Procuradores indicados em lista tríplice formada

pelo colégio respectivo. Além disso, cometendo o art. 48 à Procuradoria-

Geral do Estado a responsabilidade pela representação judicial e

extrajudicial do ente, previa-se fosse ele, no interior do Estado, em

processos fiscais (art. 49), representado pelo Ministério Público. Previu-

se, finalmente (art. 50/51), se fizesse a organização da carreira de

Procurador de Estado, mediante concurso de provas e títulos (SÃO

PAULO, 1969).

Também o Estado de Minas Gerais, alterando sua

Constituição, reafirmou na Emenda promulgada em 1970 (art. 117) as

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62

garantias da magistratura. Já no tocante ao Ministério Público, previu

fosse chefiado pelo nomeado, em comissão, pelo Governador, entre

Procuradores de Justiça da categoria mais elevada. Todavia, na esteira

do que previa a Emenda Constitucional n° 01, não mais dependia a

escolha da aprovação do Legislativo. Também se manteve o acesso ao

cargo mediante concurso, assegurando-se a estabilidade e a

inamovibilidade (art. 90) (MINAS GERAIS, 1970).

Importante é destacar que, embora especificamente em

relação ao Ministério Público tenham sido limitadas as alterações,

achavam-se seus membros, como de resto os de quaisquer outras

instituições ou poderes, submetidos às disposições do Ato Institucional n°

05, de 13 de dezembro de 1968, que foi mantido em vigor pelo art. 182,

da Emenda Constitucional n° 01 (BRASIL, 1968).

Assim, embora aparentemente se achassem também os

membros do Ministério Público garantidos contra o arbítrio, poderia ter

qualquer deles, com base no art. 4°, do Ato Institucional n° 05,

suspensos seus direitos políticos, bem como, por força do disposto no

art. 6°, ser removido, demitido, aposentado ou colocado em

disponibilidade, mediante decreto do Presidente da República (BRASIL,

1968).

Com o passar dos anos, com base no Ato Institucional n° 05,

outorgou o Governo militar a Emenda Constitucional n° 07, de 13 de abril

de 1977, em meio ao que ficou conhecido como “pacote de abril”, através

do que se inseriu na Constituição, no art. 96, parágrafo único, disposição

segundo a qual lei complementar, de iniciativa do Presidente da

República, estabeleceria normas gerais a serem adotadas na

organização do Ministério Público Estadual. Assim, após a Emenda

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63

Constitucional n° 11, que dava ao Procurador-Geral da República a

legitimidade para requerer a suspensão do exercício do mandato do

parlamentar que se achasse respondendo a processo por crime contra a

segurança nacional, foi que se editou a Lei Complementar n° 40, de 14

de dezembro de 1981 (BRASIL, 1977; BRASIL, 1978; BRASIL, 1981b).

A Lei Complementar n° 40, estabelecendo as normas gerais a

serem adotadas na organização do Ministério Público, pelos Estados,

afirmou-o instituição permanente e essencial a função jurisdicional do

Estado. E, por isso, o fez responsável pela defesa da ordem jurídica, dos

interesses indisponíveis da sociedade, pela fiel observância da

Constituição e das leis (art. 1°), tendo por princípios institucionais, a

unidade, a indivisibilidade e a autonomia funcional (art. 2°). Como suas

funções institucionais, foram relacionadas o velamento pela observância

da Constituição e das leis, a promoção de sua execução, a promoção da

ação penal pública e da ação civil pública, nos termos da lei (art. 3°).

Estabeleceu, ainda, a lei, a organização do Ministério Público em

carreira, dispondo sobre a sua representação em primeiro e segundo

graus, afirmando-o chefiado pelo Procurador-Geral de Justiça, que seria

nomeado pelo Governador nos termos da lei estadual (art. 6°). Também

foram definidas as atribuições do Procurador-Geral de Justiça (art. 7°) e

do Conselho Superior do Ministério Público (art. 12), cuja estruturação

era determinada (art. 11). Definidas as atribuições da Corregedoria-Geral

(art. 13), referia-se a Lei às atribuições dos membros do Ministério

Público em segundo grau (art. 14) e em primeiro (art. 15). Eram ainda

definidas as garantias e prerrogativas (arts. 16, 17, 19, 20 e 21) e os

deveres (art. 22, 23 e 24). Relacionadas as faltas e penalidades (arts. 25

a 31), era definida a responsabilidade (art. 32), disciplinado o processo

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64

administrativo (arts. 33 a 36) e regulamentados os vencimentos,

vantagens e direitos (arts. 37 a 44) e a carreira (arts. 45 a 51) (BRASIL,

1981b).

Contribuindo a Lei Complementar de modo significativo para

dar ao Ministério Público, nacionalmente, uniformidade, sobreveio, em 24

de julho de 1985, a Lei 7.347, disciplinando a ação civil pública.

Buscando determinar a responsabilidade por danos causados

ao meio ambiente, ao consumidor e a bens e direitos de valor artístico,

estético, histórico, turístico e paisagístico, conferiu a Lei 7.347/1985

legitimidade ao Ministério Público para a propositura de ações cautelares

e principais destinadas a responsabilizar os autores das lesões (art. 5°, I)

aos interesses tutelados, conferindo-lhe, igualmente, a atribuição de

instaurar (art. 8°, §1°), para tanto, o inquérito civil público (BRASIL,

1985).

À época, já caminhava o Brasil em direção à plena

democratização, inclusive com a instituição de Comissão destinada a

produzir anteprojeto de Constituição. E, no texto que produziu, conferiu a

Comissão, no Título II, Capítulo XI, ao Ministério Público, a condição de

instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,

incumbindo-a da defesa do regime democrático, da ordem jurídica e dos

interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 308). Ali também eram

apregoados os princípios institucionais da unidade, indivisibilidade e

independência funcional, prevendo-se a sua autonomia administrativa e

financeira. Também se propunha compreender-se no Ministério Público o

federal, o eleitoral, o militar e o do trabalho (art. 309), sendo

estabelecidos os critérios (art. 310) para nomeação e destituição do

Procurador-Geral da República, dependente de aprovação do Senado,

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65

com término coincidente com o mandato presidencial daquele que o

tivesse nomeado. Era ainda incumbido o Ministério Público Federal da

supervisão da defesa judicial das autarquias. Entre as funções

institucionais do Ministério Público, figurava, ainda, (art. 312) a promoção

da ação penal pública, da ação civil pública, a supervisão da investigação

criminal, a intervenção em qualquer processo em que se discutisse

interesse público ou social relevante. Também se propunha pudesse o

Ministério Público requisitar da autoridade competente a instauração de

inquéritos necessários às ações públicas que devesse promover,

avocando-os para suprir omissão, para apuração de abuso de autoridade

ou em outros casos que viessem a ser especificados em lei. Também ao

Ministério Público da União se incumbia de representar esta, cabendo tal

responsabilidade no interior aos Procuradores dos Estados e Municípios.

Previa-se (art. 303), ainda, a elaboração de lei complementar contendo

normas gerais para organização do Ministério Público dos Estados,

Distrito Federal e Territórios, observadas as garantias da vitaliciedade,

inamovibilidade, irredutibilidade de vencimentos e promoções voluntárias

(BRASIL, 1986).

Referia-se o capítulo mencionado ao Ministério Público da

União, é verdade, mas determinava o art. 96 fosse o dos Estados

organizado por lei complementar, observadas tais disposições (BRASIL,

1986).

4.1.9 A Constituição de 1988 e o Ministério Público

Se é certo que o anteprojeto da Comissão, como antes se viu,

não foi dirigido à Assembleia Constituinte, também o é que influenciou o

texto da Constituição de 1988, a não ser que se credite a semelhança de

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66

tratamento dispensado aos temas, num e noutro texto, a obra de simples

e improvável acaso.

Assim, no que se refere à sua posição constitucional, vê-se

que, se na primeira Constituição republicana constara como breve

referência, na segunda em seção de capítulo autônomo, na terceira

como ligeira menção, na quarta em título autônomo, na quinta em seção

de capítulo referente ao Poder Judiciário e na Emenda Constitucional de

1969 no Poder Executivo, viria o Ministério Público a integrar, na

Constituição de 1988, seção de capítulo pertinente às funções essenciais

à Justiça. Nele, declarou-se o caráter permanente do Ministério Público,

impeditivo, portanto, de sua supressão pelo Poder Constituinte derivado,

afirmando-se, ainda, a essencialidade de sua atuação à função

jurisdicional estatal. Também ali se afirmou, como suas incumbências

fundamentais, a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos

interesses sociais e individuais indisponíveis (BRASIL, 1891; BRASIL,

1934; BRASIL, 1946; BRASIL, 1967; BRASIL 1969). Daí o fato de, sendo

asseguradas aos seus membros garantias (art. 128, §5°, I) e impostas

vedações (art. 138, §5°, II) serem explicitadas suas funções

institucionais, quais sejamArt. 129. São funções institucionais do Ministério Público:I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;IV - promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição;V - defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas;VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva;

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VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior;VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas. [BRASIL, 1988].

Examinadas as disposições que o regem, vê-se que, referindo-

se à defesa do regime democrático, reproduziu a Constituição de 1988 o

que dispôs o art. 224, I, da Constituição Portuguesa de 1976, que

também, após anos de autoritarismo, incumbiu o seu respectivo

Ministério Público da defesa da legalidade democrática (SENADO, 1987,

v. II).

Também lhe atribuiu a Constituição Federal, como já o fizera

norma infraconstitucional cuja vigência remonta ao ano de 1942, a

responsabilidade pela promoção da ação penal pública, agregando a

este direito bifronte o dever de promover as medidas necessárias a que

respeitem poderes públicos e serviços de relevância pública os direitos

assegurados na Constituição, a promoção do inquérito civil e ação civil

pública para proteção de interesses difusos e coletivos, a promoção da

ação de inconstitucionalidade, a defesa dos direitos e interesses de

indígenas, a instauração e instrução de procedimentos de sua

competência, o exercício do controle externo da atividade policial a

requisição de outras diligências e o exercício de outras funções, desde

que compatíveis com sua finalidade.

Bem se vê que a ampla gama de funções institucionais

atribuídas ao Ministério Público não corresponde senão a instrumentos

voltados à realização dos únicos fins que explicam e legitimam a sua

existência — a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos

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68

interesses sociais e individuais indisponíveis — ao mesmo tempo em que

explicam, por sua complexidade e importância, a dificuldade em situá-lo

constitucionalmente .

Não são, porém, apenas as amplas funções que foram

atribuídas pela Constituição de 1988 que explicam em que se

transformou, desde a sua origem, o Ministério Público, mas também as

que lhe foram subtraídas.

De fato, foi o antigo Procurador do Rei, criado em Portugal em

1289, com a função, aparentemente precípua, de defender os interesses

patrimoniais do soberano, que inspirou, séculos depois, a solução que foi

adotada na Constituição de 1824, no Brasil, que em seu artigo 48 se

referia ao Procurador da Coroa e Soberania Nacional, que era

encarregado de defender também os interesses patrimoniais do

Imperador.

Por isso que, com a advento da República, em 1889, resultou

natural que, tal qual vinha ao longo dos séculos ocorrendo, tocasse a

responsabilidade pela promoção da ação penal e pela defesa dos

interesses patrimoniais do soberano –com os quais, antes, se

confundiam os do Estado- ao mesmo órgão. A inspiração resta mais

clara ainda se se perceber que, tal qual antes sucedia com o Procurador

dos Feitos da Coroa, Fazenda e Fisco, que pertencia à Relação, era

também o Procurador-Geral da República, no regime do Decreto 848,

escolhido entre os magistrados (então, do Supremo Tribunal Federal).

Por isso que, no regime da Constituição Federal de 1891

incumbia ao Ministério Público, além da promoção das ações penais, a

representação dos direitos e interesses da União, a alegação e defesa

dos direitos da Fazenda Nacional em todas as causas cíveis, a promoção

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69

dos processos executivos de cobrança da dívida ativa e a promoção dos

processos de desapropriação por necessidade ou utilidade Nacional,

entre numerosas outras atribuições, várias delas voltadas à defesa dos

interesses da Fazenda.

Daí que, encarregado o Ministério Público, no âmbito da União,

de defender tais interesses, tenha sido o modelo aplicado também nos

Estados.

Foi o que sucedeu em São Paulo, por exemplo, cuja

Constituição, em 1935 (art. 61, § 1°), permitia fosse em lei ordinária

atribuída aos promotores a função de defender judicialmente os direitos e

interesses do Estado. O mesmo, aliás, ocorria também na Bahia, cuja

Constituição, também de 1935, atribuía ao Procurador-Geral do Estado a

representação da Fazenda Estadual em juízo e a defesa dos interesses

gerais daquele.

Tal solução foi a adotada também na Constituição de 1946,

que cometia as Procuradores de República a representação judicial dos

interesses da União.

Tal a razão pela qual, em todo o País, durante quase toda a

vida republicana, terem reunido os Ministérios Públicos respectivos, em

maior ou menor extensão, as funções de defender os interesses fiscais e

patrimoniais da União e Estados e de promover as ações penais contra

os que delinquissem.

Todavia, é inegável que, após a Constituição de 1946, que

devolveu ao Brasil a normalidade constitucional após os longos anos da

ditadura do Estado Novo, deu-se uma irrefreável tendência, embora a

princípio tímida, ao estabelecimento de nítida e progressiva separação

de deveres, passando os interesses fiscais à responsabilidade de outros

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70

organismos estatais.

Assim, em 1947, já passava a Constituição da Bahia, por

exemplo, ao transferir ao Procurador de Fazenda (art. 71, § 2°, da

Constituição), na Capital, a representação, que antes pertencera ao

Procurador do Estado, dos interesses do fisco.

O mesmo sucederia também em São Paulo, cuja Constituição,

em 1967, no artigo 47, cometeu à Procuradoria-Geral do Estado a sua

representação judicial em processos fiscais, embora permitindo o

fizessem os promotores de justiça no interior (art. 48).

Mais uma vez na Bahia, já em 1967, passava a Constituição,

no artigo 79, a cometer irrestritamente (e não mais na Capital, apenas) a

defesa e representação dos interesses do fisco ao Procurador-Geral da

Fazenda.

Esse contínuo processo de cisão, que se manifestaria também

nesse período nos demais Estados da Federação, encontraria seu ápice

na Constituição Federal de 1988, que constituiu a advocacia pública,

cometendo aos advogados-gerais da União e aos Procuradores dos

Estados funções de representação que, no passado, haviam pertencido

ao Ministério Público (CF, art. 131/132) (BRASIL, 1988).

E nada teve de casual tal divisão. Ao contrário, ao afastá-lo das

funções de defesa e representação dos interesses patrimoniais e

financeiros do ente público a que se achava vinculado o Ministério

Público, proibindo expressamente seus membros de exercer a

representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas (CF,

art. 129, IX), quis a Constituição, aprofundando a tendência antes

manifestada, vinculá-lo, de modo radical, aos interesses, de outra ordem,

que no passado também haviam justificado sua criação, que foram os

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71

interesses públicos primários (BRASIL, 1988).

Por isso que, tendo sido imposta ao Ministério Publico a missão

de zelar por tais interesses, dizer Paes que:O Ministério Público deverá exercer seu papel institucional até mesmo em oposição aos agentes do próprio Estado, se for o caso, pois no sistema de pesos e contra pesos concebido pelo constituinte, foram conferidas à instituição funções que a colocam agora no papel de verdadeiro ombusdman. [PAES, 2003, p. 178-179]

Com efeito, ainda que em conflito com os responsáveis pela

gestão do secundário, que é o da administração, ou como os órgãos

governamentais o interpretam, cuja defesa não mais lhe compete, é a

defesa do interesse público de caráter geral que compete ao Ministério

Público e o deve orientar.

E é desse novo eixo que decorrem essas duas tendências,

aparentemente antagônicas, do novo Ministério Público nascido da

Constituição de 1988, quais sejam as abster-se de funcionar em feitos

em que não se discutam interesses primários e atuar onde o sejam, quer

intervindo em processos em curso, quer promovendo os necessários à

sua prevalência, sejam penais ou não.

Por isso que, classificadas as funções do Ministério Público em

típicas –porque vinculadas à defesa dos denominados interesses

públicos primários- e atípicas, historicamente se tem percebido a

expansão daquelas e contração destas.

Daí a necessidade de racionalização de sua intervenção, que

deve fazer-se cada vez mais frequente, profunda e eficaz na realização

dos interesses primários e cada vez mais rara naquilo que não

corresponda, a rigor, à defesa da ordem jurídica, do regime democrático

e interesses sociais e individuais indisponíveis.

Tal foi, aliás, a razão pela qual o introduziu o constituinte em

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72

capítulo autônomo, em solução oposta à adotada pela Emenda

Constitucional de 1969, certamente movido pela expectativa de que a

instituição se coloque a serviço dos interesses indisponíveis da

sociedade mesmo contra os interesses do poder público, ou de seus

agentes, que não raro os tem violado, ao longo dos anos, por ação ou

omissão (PAES, 2003).

Essa também a razão pela qual, adotando posição diversa das

Constituições anteriores, teve a vigente a preocupação de relacionar

expressamente suas funções, figurando entre elas, não por acaso à

frente das demais, a promoção, privativamente, na forma da lei, da ação

penal pública.

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73

5 ORIGEM E EVOLUÇÃO DO DIREITO E PROCESSO PENAL

Se Estado e Ministério Público, como antes visto, caminharam

em direção à democratização, diferente não foi, bem examinada, a

trajetoria do Direito e do Processo Penal.

De fato, se é verdade que, ao longo da história, incontáveis

vezes foi posto o Direito Penal a serviço dos interesses de Estados

despóticos, que ignoraram solemente quaisquer restrições

principiólogicas que pudessem limitá-lo, desde há muito se pecebe,

porém, que diferente é a realidade presente.

Com efeito, modernamente se reconhece que a intervenção da

norma penal punitiva, porque conflitante com o estado de liberdade em

que se acha e deve achar-se o homem, impõe, no Estado democrático,

como lembra Ferrajoli (2002), a estrita obediência aos princípios do nulla

pena sine crimine, nullum crimen sine lege, nulla lex (poenalis) sine

necessitate, nulla necessitas sine injuria, nulla injuria sine actione, nulla

actio sine culpa, nulla culpa sine judicio, nullum judicium sine

accusatione, nulla acusatio sine probatione e nulla probatio sine

defensione.

Há mais, porém: acha-se o Direito Penal, modernamente, na

busca permanente do equilíbrio entre a liberdade e segurança,

profundamente inspirado pelo princípio da intervenção mínima. Assim,

não somente é diferente, hoje, o critério para escolha dos bens jurídicos

tutelados, como tal tutela se faz mínima, limitada às estritas

necessidades de preservação de direitos.

Nessa ótica, é forçoso reconhecer, que dispensando o Direito

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Penal, sob a força dos princípios constitucionais, proteção apenas a bens

que a sociedade democrática, num dado tempo e espaço, entendeu

imprescindíveis à subsistência sua e dos que a compõem, é inaceitável

que as normas do processo — ou pior, interpretação sua contemporânea

aos tempos em que a democracia era mero e improvável sonho —

pretendam retirar-lhe as chances de objetivar-se.

Também já não mais se vive, no processo penal, o tempo da

prisão preventiva compulsória, nem tampouco o da manutenção na

prisão do absolvido, ou da inserção do nome do somente pronuciado no

rol dos culpados. Já também descabem a prisão administrativa e a

decretação da incomunicabilidade do preso.

De fato, o elevado número de novos direitos e garantias

consagrados expressamente na Constituição, a sua natureza, e a

cláusula de não exclusão de outros, compatíveis com o regime e

princípios adotados pela Constituição ou em tratados internacionais

subscritos pelo Brasil, impuseram, naturalmente, um novo modo de

interpretar o Estado e, em especial, as próprias normas penais e

processuais penais, a persecução e mesmo os órgãos delas

encarregados.

Assim, à democratização do Estado correspondeu, como seu

efeito necessário, a democratização do Direito e do Processo Penal, que

não mais podem constituir, como tantas vezes no passado, instrumentos

de dominação de uma categoria de cidadãos sobre outros, mas de

proteção dos direitos de todos e de cada um.

Nesse quadro, viu-se o Ministério Público transformado de

defensor dos interesses do soberano em defensor dos interesses do

cidadão, e da própria subsistência do Estado Democrático de Direito que

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75

os afirma e deve atuar no sentido de sua concretização.

Por outro lado, tais transformações coincidem com a crescente

complexidade de uma realidade que torna ainda mais difícil a repressão

às ações de organizações que, em alguns momentos, buscam substituir

o próprio Estado, inclusive com violação ao monopólio deste no uso da

força.

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76

6 INTELIGÊNCIA E INCREMENTO DA EFICIÊNCIA

É inegável que a constituição de organizações criminosas e

ampliação de sua área de atuação foram estimuladas pelo fim da guerra

fria (GLENNY, 2008), projetando-se os efeitos de suas ações por locais

os mais variados. E isso expõe de modo mais visível a incapacidade dos

ordenamentos jurídicos nacionais de contê-las, ao menos através do

emprego do método tradicional no direito brasileiro, de limitar a ação dos

órgãos persecutórios à pura e simples apuração de infrações penais e

promoção de ações penais contra seus autores.

Forçados, portanto, pelas circunstâncias, ao emprego de

instrumentos diversos dos tradicionais, viram-se as instituições diante de

um, a inteligência, que, por ter sido empregado na história recente do

país e de outros da América do Sul para o planejamento e execução de

ações atentatórias aos direitos fundamentais, continua a enfrentar

resistências quando sugerida sua utilização para sua proteção14.

Essa circunstância, destacada por Antunes (2002) e Almeida

Neto (2008), tem sido, evidentemente, uma das razões pelas quais,

demonizadas a expressão e a prática que designa, olvidem-se os

benefícios que sua utilização pode trazer à preservação do regime

democrático e concretização dos direitos fundamentais por instituições

disso encarregadas.

Um debate lúcido sobre o tema deve partir da formulação de

um conceito sobre inteligência, o que nos leva, com Almeida Neto, a

distinguir a atividade metódica de assessoramento informacional do

decisor, cujas origens se perdem nas brumas do tempo, com o sistema

14 Sobre o envolvimento de agentes dos órgãos de inteligência, em tais práticas, assevera Figueiredo (p. 159) que uma associação entre seus membros produziu um dos mais ativos grupos terroristas do país.

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77

que a isso se presta, cujas origens repousam na modernidade (p. 28,

2008).

Com efeito, como observa o autor, com base nos

ensinamentos de Cepik, a criação de tais estruturas se acha intimamente

ligada ao desenvolvimento dos Estados soberanos, que impôs aos seus

governantes a necessidade de informações que lhes permitissem

incrementar seu poder perante outros governantes e os próprios súditos.

No Brasil, como salienta Cardoso (p. 14, ), a criação do

sistema, como suporte ao Poder Executivo, teve origem em 1927, com a

criação do Conselho de Segurança Nacional, através do Decreto 17.999,

no Governo Washington Luís, com o fim de produzir informações

financeiras, econômicas, bélicas e morais necessárias à defesa do

país15.

Posteriormente, em 6 de setembro de 1946 (FIGUEIREDO, p.

50, 2005), deu-se a criação, sob o governo de Dutra, sob a estrutura do

Conselho de Segurança Nacional, do Serviço Federal de Informações e

Contra-informações, cujas atividades se concentraram, dado o contexto

da “guerra fria”, na segurança nacional16.

Já com o movimento militar de 1964, foram criados o Serviço

Nacional de Informações, SNI, através da Lei 4.341/1964, a Escola

Nacional de Informações e o Sistema Nacional de Informações, aquele

com a missão de constituir o órgão central deste, aquela com a finalidade

de criar e difundir, nacionalmente, a doutrina de segurança.

Esgotado, porém, o regime autoritário inaugurado em 1964,

com o restabelecimento da democracia, o então presidente, Fernando

15 Tinha o serviço, segundo Figueiredo, o direito de investigar a vida pessoal dos adversários do presidente (p. 37)

16 No entanto, passados sete anos desde sua criação, ostentaria o serviço, segundo Figueiredo, pouco mais que o nome pomposo (p. 57).

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78

Collor de Mello, através da Medida Provisória 150, de 15 de março de

1990, extinguiu (art. 27, II) o Serviço Nacional de Informações.

De fato, transformado em Departamento de Inteligência, ficava

a antiga estrutura, agora consideravelmente reduzida, subordinada à

Secretaria de Assuntos Estratégicos (FIGUEIREDO, p. 452, 2005).

No entanto, subsistindo a necessidade de assessoramento

informacional do Presidente da República, em 19 de novembro de 1992,

já sob o governo de Itamar Franco, ascendia o Departamento à condição

de subsecretaria (FIGUEIREDO, p. 473, 2005), e dela, já no governo

Fernando Henrique Cardoso, à condição, que hoje e desde 1999 ostenta,

de Agência, acompanhada do SIBIN — Sistema Brasileiro de

Inteligência.

Bem por isso, sob nova denominação e submetido a mais

severos instrumentos de controle, o órgão central da comunidade de

inteligência, Agência Brasileira de Inteligência, criado através da Lei

9.883/1999, passou a ter a incumbência de obter, analisar e disseminar

informações sobre fatos com influência potencial sobre a segurança da

sociedade (art. 1º, § 2º).

É que se percebera, evidentemente, a indeclinável

necessidade de que a estrutura de inteligência viesse a assessorar a

tomada de decisões no campo, entre outros, da segurança pública, em

especial em vista dos permanentes câmbios de cenários que a afetam.

De fato, percebendo a necessidade de alteração de estruturas,

organismos responsáveis pela preservação da ordem, em que no

passado já se encontravam constituídas unidades de inteligência

vocacionadas para a proteção do Estado, voltaram-nas mais

intensamente para a segurança da sociedade, em especial contra as

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79

ações de organizações criminosas.

Assim, no âmbito da Polícia Militar de Minas Gerais, por

exemplo, que continua, como as demais, por força do disposto no artigo

144, § 6°, da Constituição Federal, como força auxiliar e reserva do

Exército, passou a vigorar a Resolução 3.654, de 23 de março de 2002,

alterada pela 3.678/2002, que lhe impõe (art. 12, XVIII) “identificar e

acompanhar as ações e conexões do crime organizado no Estado de

Minas Gerais”.

Observa Cardoso (2008), por outro lado, com propriedade, que

a “investigação da criminalidade ou investigação policial-preventiva

move-se na direção de buscar e coletar dados e analisá-los, para

antecipar a eclosão do delito e permitir à Instituição planejar o emprego e

lançamento de seu efetivo e meios”, que se destinam, evidentemente, à

prevenção de ações praticadas também por organizações criminosas.

Enquanto isso, no âmbito do Ministério Público brasileiro,

todavia, nenhuma providência havia sido adotada para introduzir a

inteligência como instrumento orientador da sua intervenção, que

continuou a guiar-se pela metodologia tradicional, consistente na simples

atuação no processo, com inteiro desprezo a quaisquer informacões que

não contribuissem para a solucão do caso concreto, muito embora

pudessem ter eventualmente alguma valia para indicação de tendências.

Tal modo de agir, que privilegiava apenas a busca da verdade

no processo, sem nenhuma atencão à conjuntura e às tendências da

criminalidade, de individual a coletiva, também contribuiu, certamente,

para inibir acões de caráter preventivo e, por isso, mais próximas do ideal

de concretização dos direitos fundamentais.

Centrada de fato a ação ministerial, tradicionalmente, em

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80

faceta puramente repressiva, para isso contribuiu, inegavelmente, o

principio, constitucionalmente estabelecido, da independência funcional,

frequentemente manejado como argumento para a não transposição de

uma ação meramente individual para outra, institucional, concertada

entre seus membros e órgãos.

Todavia, como adverte Almeida Neto, se aos membros do

Ministério Público se confere independência funcional, dele exige a

Constituicao, como órdão do Estado que é, eficiência administrativa, o

que impede se sobreponha aquela a este.

Por outro lado, embora ainda subsista, em setores do

Ministério Público, pelas razões já explicitadas, resistência à constituicão

de sistema de inteligência, reduziu-se ela significativamente após

homicídio que, perpetrado contra promotor de Justiça, em Belo

Horizonte, por líder de organização criminosa até então pouco

conhecida, revelou a necessidade de produção de conhecimento para

eficaz e segura execução da missão institucional.

Com efeito, redundando o fato na aglutinação dos esforços dos

vários segmentos em que se desdobra a Instituição, sob a forma de

grupo nacional, nele se percebeu a necessidade de emprego da

inteligência como ferramenta de ação, pena de descumprimento, pela

Instituição, de seus deveres constitucionais.

Por outro lado, se o emprego da inteligência, através da

constituição de órgãos internos, tal qual se deu no âmbito do Ministério

Público do Estado de Minas Gerais, com a criação da Coordenadoria de

Planejamento Institucional — COPLI17, é medida que se impõe, não é

ela, todavia, bastante.

17 Regida, atualmente, pla Resolução PGJ 30, de 24 de maio de 2006

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De fato, certo que o Ministério Público é o depositário, como

observa Pacheco18, de enorme massa de informações de que depende a

adequada execução de sua atividade-fim, a exigir científico e metódico

tratamento, também o é que se faz necessária mudança postural e

cultural dos membros da Instituição, de quem também se deve exigir

migração do tadicional modelo individualista para o coletivo.

Nesse sentido, é forçoso reconhecer que a complexidade do

desafio, que supera em muito as possibilidades de solução por meio da

intervenção isolada do membro do Ministério Público, ou mesmo de um

só dos vários segmentos em que a Constituição da República o

construiu, impõe ruptura com o modelo tradicional, do promotor ou

procurador senhor de si mesmo.

Sob essa ótica, importante como a criação de organismo

destinado a coletar, examinar e difundir as informações de que depende

o eficiente desempenho da missão institucional é a capacitação do

membro, ainda no seu estágio de ingresso, que lhe permita compreender

o papel que deve desenvolver na estrutra orgânica.

Impõe-se, por isso, para o adequado treinamento do membro

do Ministério Público para o adequado desenvolvimento de seu papel,

que seja ampliada a duração dos cursos de formação ministrados por

ocasião do ingresso na carreira, exigindo-se, igualmente, que o conteúdo

programático prestigie o conhecimento da ferramenta sem cujo emrego

todo esforço individual tende à inutilidade.

Enfim, se a conjuntura revela a imperiosa necessidade de

mudança do perfil tradicional do membro do Ministério Público, com a

ruptura do modelo tradicional, individualista, a transformação deve ter

18 Pacheco, Denilson Feitoza. Atividades de inteligência e processo penal. In: JORNADA JURÍDICA DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO- AUDITORIA da 4a CJM.

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seu início na ocasião do próprio ingresso, pena de perpetuação de um

modelo que — consoante a realidade bem demonstra — revela-se

incapaz de contibuir para a concretização dos direitos fundamentais e

inibição de ações, ofensivas ao Estado Democrático de Direito,

perpetradas com crescente ousadia por organizações criminosas.

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7 CONCLUSÃO

Conforme se procurou demonstrar, as transformações

operadas ao longo dos séculos no Estado e seus fins, no Direito e

Processo Penal e seus fins, assim como no Ministério Público, foram

extremamente profundas, a ponto tal que, talvez sem exagero, possa-se

afirmar que pouco conservam essas obras da cultura humana, desde a

remota época de sua criação, além de suas denominações.

Também se buscou demonstrar que já não serve o Estado,

hoje Democrático de Direito, à perseguição de propósitos de um diminuto

grupo, mas à concretização dos direitos que, sendo fundamentais, têm

todos por titulares; igualmente, procurou-se demonstrar que Direito e

Processo Penal já não mais consistem em instrumentos de intimação de

grupo de poderosos sobre enorme massa de excluídos, mas em

instrumentos de proteção de direitos fundamentais.

Também se procurou demonstar que, seguindo tal tendência, o

Ministério Público também já não é, nem tampouco pode insistir em ser,

o que foi. Ao revés, reconstruído com o fim de atuar para a concretização

de direitos, é essa a função que legitima sua existência, impondo-se a

ruptura com qualquer traço, ainda que herdado de seu passado mais

remoto, que lhe tolha a sua realização.

Daí a conclusão, segundo a qual a mudança deve ser também

cultural, apropriando-se também o Ministério Público de importante

ferramenta de que depende a eficiência de suas ações, fazendo-o ainda

desde o curso de ingresso na carreira, de modo a posicionar a

Instituição, com reais chances de êxito, como corresponsável pelo

Estado Democrático de Direito.

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8 REFERÊNCIAS

1.ALMEIDA, Cândido Mendes de. Código Philippino ou Ordenações e Leis do Reino de Portugal. 14. ed. Rio de Janeiro: Typographia do Instituto Philomáthico, 1870.

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3.ALMEIDA NETO, Wilson Rocha de. A Atividade de Inteligência como instrumento de eficiência no cumprimento da missão Constitucional do Ministério Público. 152 p. Monografia apresentada no curso de Especialização em Inteligência do Estado e Inteligência de Segurança Pública). Belo Horizonte, 2008

4.ANTUNES, Priscila Carlos Brandão. SNI & ABIN: uma leitura da atuação dos serviços secretos brasileiros ao longo do século XX. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2002.

5.BAHIA. Constituição (1891). Constituição do Estado da Bahia de 02 de julho de 1891. Diário Oficial da Bahia, 02 jul. 1891. Disponível em: <http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates HYPERLINK "http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates&fn=default.htm" & HYPERLINK "http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates&fn=default.htm" fn=default.htm >. Acesso em: 20 jul. 2009.

6.BAHIA. Constituição (1935). Constituição do Estado da Bahia. Diário Oficial do Estado da Bahia, Salvador, 20 ago. 1935. Disponível em : <http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates HYPERLINK "http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates&fn=default.htm" & HYPERLINK "http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates&fn=default.htm" fn=default.htm >. Acesso em: 20 jul. 2009

7.BAHIA. Constituição (1947). Constituição do Estado da Bahia de 1947. Diário Oficial do Estado, Salvador, 02 ago. 1947. Disponível em:<http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?

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8.BAHIA. Constituição (1967). Constituição do Estado da Bahia de 1967. Diário Oficial do Estado, Salvador, 14 mai. 1967. Disponível em:<http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates HYPERLINK "http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates&fn=default.htm" & HYPERLINK "http://www2.casacivil.ba.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates&fn=default.htm" fn=default.htm >. Acesso em: 20 jul. 2009.

9.BALEEIRO, Aliomar; LIMA SOBRINHO, Barbosa. Constituições Brasileiras: 1946. 2. ed. Brasília: Senado Federal, Ministério da Ciência e Tecnologia, Centro de Estudos Estratégicos, 2001. v. V.

10.BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes. História constitucional do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.

11.BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 1999.

12.BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

13.BRASIL. Código de Processo Criminal da Primeira Instância. Lei de 29 de novembro de 1832. Promulga o Código do Processo Criminal de primeira instancia com disposição provisória acerca da administração da Justiça Civil. CLIB, 1832.

14.BRASIL. Código de Processo Penal. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de Outubro de 1941. Diário Oficial da União, Seção 1, Rio de Janeiro, 13 out. 1941. p. 19.699.

15.BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de Dezembro de 1940. Diário Oficial da União - Seção 1, Rio de Janeiro, 31 dez. 1940. p. 23.911.

16.BRASIL. Constituição (1824). Constituição Brasileira de 1824. Constituição Política do Império do Brasil, elaborada por um

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86

Conselho de Estado e outorgada pelo Imperador D. Pedro I, em 25.03.1824. Rio de Janeiro, 25 mar. 1824. Coleção de Leis do Império do Brasil – 1824. p. 7.

17.BRASIL. Constituição (1891). Constituição Brasileira de 1891.Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, decretada e promulgada pelo Congresso Nacional Constituinte, em 24 de fev. de 1891. Diário do Congresso Nacional, Rio de Janeiro, 24 fev. 1891. p. 523.

18.BRASIL. Constituição (1934). Constituição Brasileira de 1934. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934. Diário Oficial da União, Seção 1, Suplemento, Rio de Janeiro, 16 jul. 1934. p. 01.

19.BRASIL. Constituição (1946). Constituição Brasileira de 1946. Constituição dos Estados Unidos do Brasil, decretada pela Assembléia Constituinte. Diário Oficial da União, Seção 1, Rio de Janeiro, 19 set. 1946. p. 09

20.BRASIL. Constituição (1967). Constituição Brasileira de 1967. Constituição do Brasil decretada e promulgada pelo Congresso Nacional. Diário Oficial da União, Seção 1, Brasília – 24 jan. 1967. p. 953.

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