instrumentos necessários para oficinas literárias, fernando chiavassa

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  • 7/25/2019 Instrumentos Necessrios Para Oficinas Literrias, Fernando Chiavassa

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    INSTRUMENTOS NECESSRIOS PARA OFICINAS LITERRIAS

    Fernando Chiavassa

    Ensino e Aprendizado

    preciso apresentar o complexo processo de composio da escrita criativa paraalunos e professores, promovendo entre eles firmes relaes profissionais. Importante que osprofessores saibam escrever, conhecendo problemas retricos e processos recursivos, sabendoplanejar e acessar memrias, revisar, monitorar e avaliar. Neste processo de produo da escritae do saber, as dificuldades surgem como possibilidades de criao de novas ferramentas deensino. Todos tem que escrever e ler muito, conscientes da relao esttica entre escritor, leitore entre aqueles que, alm disso, tambm leem para leitores.

    Ensinar a escrever ensinar a ler criativamente: tanto durante a escrita como na leituraatenta como escritor, significados prprios so construdos, o suprfluo rejeitado e respostasso continuamente reelaboradas de modo a importar mais o processo que os resultados. Aleitura descortina o invisvel alm das relaes sonoras, semnticas e sintticas, privilegiando

    metalinguagens, mostrando a estrutura e os cdigos da lngua. imprecindvel desenvolvercapacidades para aprender e ensinar a ouvir o que est dentro de cada um, o felt sense. Essencialligar corpo e mente mergulhando em mitologias pessoais: investidos na postura de autor comintenes estticas, os aprendizes comeam a fisgar o leitor.

    imprecindvel saber ensinar isto: quando as intenes como autor no vingam preciso saber se a falha do escritor ou dos leitores. preciso dominar o que se quer dizer, oque se ouve e o que se entende (a perlocuo). O modo como o escritor se adapta s mudanas eas administra uma verdadeira gesto de processos. Para entender e agir precisamos refletir epara transformar a realidade importa saber teorizar a certa distancia com postura cientfica.Pouco adianta somente transmitir e receber conhecimentos: durante o processo de produo dosaber clara a igualdade entre as inteligncias de alunos e professores; muda a experincia.

    preciso evitar mtodos de ensino baseados em colchas de retalhos pedaggicas, cujosprofessores tomam decises sozinhos e no deixam espaos para erros e novidades. Bonsprofessores criam tcnicas derivadas de sua experincia enquanto leitores e escritores: aovivenciar dificuldades, se conectam afetivamente aos alunos e ensinam melhor. Quando osalunos verbalizam fracassos, abrem oportunidades de aprendizagem. Professores devemestimular a curiosidade e a ousadia sem pressionar na direo de respostas bvias, emboracorretas; devem entremear ganhos de aprendizagem com momentos de perplexidade e caos,estimulando a investigao, a explorao e a reflexo crtica.

    A eficiente anlise do discurso considera cada aluno em separado: interessam mais oserros que os acertos. Por isso a avaliao formativa acerta mais, forjando instrumentos prpriosao testar e observar os processos intelectuais do aluno. A avaliao normativa falha, porquanto

    o diagnstico intil se no levar a aes apropriadas. Ao contrrio, a avaliao formativa lutacontra fracassos e desigualdades. Contudo, poucos professores estudam avaliao e menosavaliaes formativas: e o problema que pedagogias especializadas pressupe qualificaocrescente de professores.

    Ferramentas Disposio

    Situaes Problema

    O modelo de ensino organizado atravs de situaes problema mobiliza o interesse dogrupo na resoluo de enigmas. Parte-se do princpio de que a explicao nada vale sem a

    necessidade que a requer, privilegiando a pedagogia da surpresa e da emancipao, na qual osujeito se v obrigado a utilizar a prpria inteligncia, inventando solues. Graas a umsistema de restries, o aluno no resolve o problema sem enfrentar os obstculos, somentevencidos graas um sistema de recursos didticos. preciso colocar o obstculo no centro dasituao problema, tornando possvel a sua transposio: se os alunos no tiverem meios paratranspor o obstculo, a situao-problema perde o interesse.

    So realizadas quatro operaes mentais na estruturao da situao-problema:deduo, induo, dialtica e divergncia. Ao invs de dar o que cada aluno precisa, o professoros torna capazes de conseguirem sozinhos. O ofcio de ensinar constitui trs desafios: tentarsuscitar o enigma que desperta o desejo de saber (funo ertica), permitir que haja aapropriao deste saber (funo didtica) e incentivar cada um para elaborar seus prprios

    procedimentos pedaggicos (funo emancipadora).

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    Sequncias Didticas

    Uma sequncia didtica um conjunto de atividades organizadas em torno de gnerostextuais: sua estrutura pressupe a apresentao da situao estudada, a produo inicial e aproduo final. Entre as duas ltimas sequncias h vrios mdulos. A segunda etapa permiteque o professor avalie em cada aluno as capacidades adquiridas alm das dificuldades da turma.

    Os problemas surgidos na primeira produo so corrigidos nos mdulos. Neles, inicialmente aatividade de produo do texto decomposta, abordando um a um e separadamente os maisdiversos elementos. No momento da produo final, o aluno coloca em prtica osconhecimentos adquiridos e junto com o professor, mede os progressos alcanados. A produofinal serve tambm para uma avaliao somativa. Esta forma de avaliao permite ao professor,pelo menos parcialmente, desfazer-se de julgamentos subjetivos e comentrios imprecisos,utilizando vocabulrio conhecido por todos.

    Estruturaes da Lngua

    O domnio da lngua ser centrado nas marcas de organizao dos gneros literrios,nas designaes de uma mesma realidade ao longo de um texto, nos elementos deresponsabilidade enunciativa e de modalizao dos enunciados, no emprego dos tempos verbaise na maneira como so utilizados e inseridos os discursos indiretos. Importante anlisar odiscurso (AD e componentes: texto, contexto, universo terico, bases retricas, gramaticais,semnticas, semiticas, sociais e histricas), como atividade comunicativa, por meio de cdigosde um jogo ldico de sinais e imagens. O tratamento de gramtica e sintaxe deve ser integrados atividades propostas, para corrigir problemas relativos sintaxe da frase, morfologia verbalou ortografia; para eliminar frases incompletas, a falta de variedade na construo de frases ediminuir as incidncias de perodos coordenados em detrimento de subordinados, afora apontuao insuficiente. necessrio reservar um tempo para ensino especfico de gramtica esintaxe (e mesmo de ortografia), onde o objetivo ser conhecer o funcionamento da lngua.

    Gneros

    A escolha de gneros deve ser flexvel para atingir o domnio das principaismodalidades textuais e suas funes, dependendo dos projetos estticos desejados. Assim asvocaes lingusticas permitem com relativa eficincia, narrar, relatar, argumentar, expor edescrever aes veiculadas por inmeros gneros. O ato de narrar considera a mimese das aesatravs da gerao de intrigas. Relatar configura representar pelo discurso experincias vividasno tempo. Quando argumentamos, sustentamos ou refutamos ao negociarmos tomadas deposio. Ao expor, apresentamos diferentes formas do saber e finalmente ao descrever aespromovemos regulaes mtuas de comportamentos. Assim a poesia abre a experincia deaprendizagem, seguida da prosa, com crnicas, contos, novelas e romances, trabalhando poticae prosa com relatos, narrativas curtas e longas, descrio de aes, argumentaes e exposies.

    Progresses textuais

    possivel estabelecer progresses lineares em torno da aprendizagem dos gneros: ummesmo gnero trabalhado de formas diferentes com objetivos cada vez mais complexos, oudiferentes gneros podem ser estudados em funo de suas possibilidades de transferncia.Pode-se tambm pensar em progresses em espiral para melhorar o domnio do mesmo gneroem diferentes nveis. desejvel prover aprendizagens precoces para assegurar domnio aolongo do tempo: prope-se uma iniciao antecipada de algumas atividades. Importante definirdiferentes nveis de complexidade sem repeties: o conto, por exemplo, pode ser abordado em

    diferentes etapas, porm, com objetivos graduados tanto do ponto de vista da organizao e daconstruo de personagens tpicas, quanto das unidades lingusticas que os caracterizam.

    Orientaes Metodolgicas

    Nas escolas tradicionais estudamos disciplinas isoladas que intuitivamente gostaramosde associar sincronicamente: primeiro semitica, depois retrica, teorias do texto e do discurso;em seguida, teorias literrias e literaturas comparadas. Desde ento, desejamos unir tudo semsaber como, porque no fomos preparados como autodidatas. No entanto, rarssimos professorestm capacidade de estudar um texto destacando tudo o que o compe, percebido em sua forma,funo e estrutura. E isso o que importa: o entendimento holstico para que possamos ver o

    que est inscrito bem como o que no est escrito, mas que funciona porque age como seestivesse. Devemos juntar tudo o que a escola tradicional separou em currculos, disciplinas e

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    compartimentos, resgatando o papel do aluno como coadjuvante na aventura pela busca doconhecimento. Na prtica, apoiado em metodologia flexvel, o professor deve propor tarefastanto simples quanto complexas. Exerccios extensos implicam em maiores riscos, masdesenvolvem novas competncias, o que no ocorre com a rescrita de pequenos trechos,(comeos, dilogos ou finais), onde a recriao feita fora de contexto, sobre fragmentos.Importante dar prazos suficientes; encorajar a escolha do narrador como deliberao e no comocoao e optando por utilizar as prprias experincias, leituras e conhecimentos na trama dafico. Alm de ensinar normas tradicionais, preciso enaltecer as escolhas de diversos autoresna literatura, ressaltando os efeitos pretendidos e obtidos atravs do gnero e da tcnica adotada,analisando tamanhos, totalidades e fragmentos propostos; narradores e vozes; tempos e espaosnarrados; linguagem e estilo adotado, prosa ou poesia; estudando as narrativas avante ou r,cenas, aes, dilogos, nomes e personagens; as escolhas para desenvolvimento ou supressodas aes; a destilao de detalhes; pistas e objetos que iluminam a fico, comeos e finais etc.

    Perguntas e Respostas

    Nada melhor que avaliar o processo de escrita do aluno periodicamente, expondo suas

    falhas, no sem antes ter lido cuidadosamente seus rascunhos, provendo abundantescomentrios. Importante apresentar as trs principais fontes das narrativas: as individualidades,os estilos e as vises pessoais da histria. A individualidade leva criao de histrias centradasno ego: o aluno deve se distanciar de seu egocentrismo com a aplicao de recursos literrios. Oestilo do aluno deve considerar palavras e sintaxe, a lgica dos pargrafos, as estratgiasretricas e as metforas; a construo de cenas. A histria adota fatos, lembranas ou mesmoeventos desde que acrscidos de mudanas estruturais e temticas: a fico deve leva o mundoprivado do escritor para o mundo pblico e no ao contrrio. A melhor narrativa aquela ondeh o mximo de intriga e presso e onde os trs elementos se misturam em propores exatas.Esta narrativa perfeita cativa por personagens atraentes, entretm pelo enredo original e encantapelas variaes lingusticas inesperadas. essencial aos alunos a percepo de que na base de

    uma histria envolvente h intrigas e novidades: um personagem incomum atrai mais que atrama familiar. interessante conhecer como as histrias so compostas enfatizando asupremacia do mtodo de composio sobre a inspirao, das tcnicas de composio, sobre aexplorao psicanaltica e do vocabulrio pesquisado e escolhido sobre a livre imaginao.

    Ajustando Uma Oficina de Escrita Criativa

    Embora no se possa dar talento aos alunos, possvel encorajar as capacidades que jpossuem, oferecendo apoio de tempo, suporte e material. Entrar numa comunidade literria importante para que o aluno aprenda e amadurea. Impossvel identificar o momento decisivoem que isso acontece, mas com extremo cuidado e distanciamento, o professor especializado

    descobre que tipo de escritor est nascendo. Livre de preconceitos e com tempo, o professor capaz de reconhecer a formao de selfs, quando alunos livres de padres antigos assumemnovos comportamentos. preciso abrir possibilidades de criao de identidades autorais queno sejam as mesmas do cotidiano. Assim, os alunos se libertam de escritas alheias, tornando-seos escritores que desejam.

    Uma Oficina literria deve reunir cerca de dez escritores, no qual seus textos so lidose criticados uma vez por semana. A entrega preliminar de textos deve ser intercalada parapremiar surpresas: so criticados de trs a quatro textos por vez, garantindo que cada alunotenha seu texto criticado e reanalisado todo ms. No dia da leitura o aluno permanece emsilncio, toma notas, e ao final faz uma pequena manifestao. O professor deve promover aulasexpositivas com anlises de textos e debates com escritores profissionais. Em contato com a

    tradio e herana literria, os alunos aprendem a ler como escritores, conhecendo estilos, temase objetivos estticos. Aos poucos, criticamente, escrevem de maneiras diferentes as mesmashistrias, explorando o inconfortvel e excitante territrio da literaura.

    Ao professor (como tentativa frrea) ainda cabe: impedir focos exclusivos e repetitivos,descobrir dificuldades e competncias em todos os alunos; avaliar textos dos alunoscontinuamente atravs de critrios estticos definidos; amenizar espritos de competio queinibem a ousadia e o experimento; evitar aumentar a quantidade de alunos; no propagar acultura do narcisismo; tratar a todos como possveis escritores e no como escritores jpublicados e importante: no se contaminar pelo xtase da associao indstria editorial paraequivocadamente baixar seus padres, fazendo concesses.

    Bibliografia:

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    Fortunato, Mrcia - O Processo de Escrita

    Perl , Sondra - Compreendendo a Composio Escrita

    LeMay, Eric - Borges Como Um Self: Ensinando Escritores Criativos.

    Tauveron, Catherine - A Escrita Literria na Narrativa da Escola: Condies e Obstculos

    Reid, Shelley - Ensinar Professores de Escrita a Escrever - Dificuldade, Explorao...

    Meireu, Philippe - Guia Metodolgico Para a Elaborao de Uma Situao Problema

    Dolz, Joaquim - Sequncias Didticas Para o Oral e a Escrita: Apresentao...

    Secreast, Donald - Do Subjetivo Ao Objetivo: Ajudando os Alunos a Visualizar Respostas...

    Moxley, Joseph M. - Oficina de Escrita Criativa (Modelo Iowa)

    Instituto Vera Cruz - Curso de Ps Graduao em Formao de Professores de Escrita Criativa

    Disciplina - Ensinar a Escrever - Prof. Mrcia FortunatoTrabalho Final - Dezembro 2015 / Janeiro 2016