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INFLUÊNCIA DA ESCARIFICAÇÃO E PREDAÇÃO DE SEMENTES NA GERMINAÇÃO DE BAUHINIA CHEILANTHA (BONG.) STEUD. (FABACEAE- CAESALPINOIDEAE) Lílian de Lima Braga 1 , Priscyla Maria Silva Rodrigues 1 , Yule Roberta Ferreira Nunes 1 , Maria das Dores Magalhães Veloso 1 ( 1 Laboratório de Ecologia e Propagação Vegetal, Campus Universitário Prof. Darcy Ribeiro - Vila Mauricéia - Montes Claros /MG - CP 126 - CEP 39401. e-mail: [email protected]) Termos para indexação: predação, escarificação de sementes, Bauhinia cheilanta Introdução O cerrado cobre, originalmente, uma área de 2 milhões de km 2 no Brasil central, representando cerca de 23% da área total do país (Ratter et al., 2005). Além do que, é considerado um dos maiores centros de biodiversidade do mundo, sendo, portanto de grande importância para a conservação (Myers et al., 2000). Desta forma, para que se assegure a sobrevivência das espécies nativas deste bioma é necessário estudos sobre a forma de propagação, para que assim sejam estabelecidas novas técnicas de manejo e cultivo. O processo de germinação pode ser considerado como a retomada do crescimento do embrião, com o conseqüente rompimento do tegumento pela radícula (Labouriau, 1983). Portanto, uma semente viável, em estado de dormência ou quiescência, quando são satisfeitas uma série de condições externas (do ambiente) e internas (intrínsecas do órgão), germinará (Borges e Rena, 1993). A dormência é um mecanismo de sobrevivência da espécie para determinadas condições (Popinigis, 1977). Assim, muitas sementes não são capazes de germinar quando submetidas a condições favoráveis devido ao impedimento da embebição (Labouriau, 1983), que ocorre em decorrência da impermeabilidade encontrada no tegumento da semente. Esta impermeabilidade tegumentar permite que se forme um banco de sementes no solo até que sejam encontradas condições naturais para o estabelecimento das plântulas (Alves et al., 2006), entretanto tal ocorrência impede uma germinação rápida e uniforme (Barbosa, et a.l., 2004). Segundo Carvalho e Nakagava (2000), a impermeabilidade do tegumento à água é uma das causas mais comuns da dormência em Fabaceaes. Dessa forma, foram criados métodos

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INFLUÊNCIA DA ESCARIFICAÇÃO E PREDAÇÃO DE SEMENTES NA

GERMINAÇÃO DE BAUHINIA CHEILANTHA (BONG.) STEUD. (FABACEAE-

CAESALPINOIDEAE)

Lílian de Lima Braga1, Priscyla Maria Silva Rodrigues1, Yule Roberta Ferreira Nunes1, Maria das Dores Magalhães Veloso1 (1Laboratório de Ecologia e Propagação Vegetal, Campus Universitário Prof. Darcy Ribeiro - Vila Mauricéia - Montes Claros /MG - CP 126 - CEP 39401. e-mail: [email protected]) Termos para indexação: predação, escarificação de sementes, Bauhinia cheilanta

Introdução

O cerrado cobre, originalmente, uma área de 2 milhões de km2 no Brasil central,

representando cerca de 23% da área total do país (Ratter et al., 2005). Além do que, é

considerado um dos maiores centros de biodiversidade do mundo, sendo, portanto de grande

importância para a conservação (Myers et al., 2000). Desta forma, para que se assegure a

sobrevivência das espécies nativas deste bioma é necessário estudos sobre a forma de

propagação, para que assim sejam estabelecidas novas técnicas de manejo e cultivo.

O processo de germinação pode ser considerado como a retomada do crescimento do

embrião, com o conseqüente rompimento do tegumento pela radícula (Labouriau, 1983).

Portanto, uma semente viável, em estado de dormência ou quiescência, quando são satisfeitas

uma série de condições externas (do ambiente) e internas (intrínsecas do órgão), germinará

(Borges e Rena, 1993).

A dormência é um mecanismo de sobrevivência da espécie para determinadas

condições (Popinigis, 1977). Assim, muitas sementes não são capazes de germinar quando

submetidas a condições favoráveis devido ao impedimento da embebição (Labouriau, 1983),

que ocorre em decorrência da impermeabilidade encontrada no tegumento da semente. Esta

impermeabilidade tegumentar permite que se forme um banco de sementes no solo até que

sejam encontradas condições naturais para o estabelecimento das plântulas (Alves et al.,

2006), entretanto tal ocorrência impede uma germinação rápida e uniforme (Barbosa, et a.l.,

2004). Segundo Carvalho e Nakagava (2000), a impermeabilidade do tegumento à água é uma

das causas mais comuns da dormência em Fabaceaes. Dessa forma, foram criados métodos

para superação da dormência (Popinigis, 1977). A eficiência desses métodos depende do tipo

e do grau de dormência, que é variável entre as espécies (Alves et al., 2006).

Outro fator que também pode afetar o processo de germinação é a predação de

sementes, causadas diretamente por danos às flores, frutos e sementes (Kageyama e Piña-

Rodrigues, 1993). Entretanto, a predação de sementes pode ser distinta em plantas da mesma

espécie, indivíduos de mesmo porte, e que se encontram no mesmo ambiente (Sari e Ribeiro-

Costa, 2005). Em parte, isso provavelmente se deve às diferenças no início da fase fenológica

de frutificação (Sari e Ribeiro-Costa, 2005). Deste modo, a predação de sementes é bastante

evidente em espécies da família Fabaceae (Jermy e Szentesi, 2003).

Bauhinia cheilantha (Bong.) Steud. (Fabaceae-Caesalpinoideae) é uma espécie muito

rara (Oliveira-Filho, 2006), e apresenta amplo padrão de distribuição no corredor seco

diagonal formado pela Caatinga e Cerrado (Vaz e Tozzi 2003). Sendo assim, este trabalho

teve como objetivo avaliar o potencial germinativo da B. cheilantha sob diferentes

tratamentos de escarificação, como também avaliar a falha na predação de suas sementes

como um mecanismo de escarificação.

Material e Métodos

Para este trabalho, frutos foram coletados, aleatoriamente, de 31 plantas matrizes, no

mês de maio de 2007, na área de Preservação da Companhia de Mineração Construtora Rocha

& Souza (CROS), Norte de Minas Gerais (16°38’53,8’’S 43°53’30,4’’W). Estes frutos foram

transportados para o Laboratório de Ecologia e Propagação Vegetal, da Universidade Estadual

de Montes Claros (UNIMONTES), onde permaneceram armazenados em bandejas e mantidos

à temperatura ambiente. Em seguida, foi realizada a triagem dos frutos, sendo descartadas as

sementes abortadas (tamanho reduzido e mal-formadas).

Para o teste de germinação foi utilizado um delineamento experimental casualizado de

dez repetições com dez sementes cada. Os tratamentos utilizados foram: controle (C), que

constavam sementes intactas sem prévio tratamento, escarificação térmica (A), representada

por sementes intactas imersas em água aquecida a 70°C por cinco minutos, escarificação

mecânica (L), utilizando lixa de acabamento (n°80), danificando o tegumento até o

aparecimento do endosperma no lado oposto ao hilo, semente danificada sem o predador

(DS), em que se utilizou àquelas sementes que apresentavam vestígios de predação, e semente

danificada com o predador (DP), no qual os insetos (predadores) encontravam-se presentes.

As sementes foram alocadas em placas de Petri previamente esterilizadas e forradas com

papel-filtro, sendo este embebido com água destilada. O experimento foi conduzido em

câmara de germinação com temperatura e luz alternadas (30ºC luz/12 horas e 20ºC escuro/12

horas). A avaliação da germinação ocorreu diariamente, no mesmo horário, durante 30 dias.

Foi considerada como caráter germinativo a emissão da radícula (Labouriau, 1983; Borges e

Rena, 1993).

Para detectar diferenças entre as porcentagens de germinação das sementes nos

diferentes tratamentos foi feita a Análise de Variância (ANOVA) e também utilizou-se um

pós-teste, o teste de Tukey. Além disto, anterior ao teste, os dados foram transformados

através do arcoseno da raiz quadrada da porcentagem, para melhor linearização dos dados

(Santana e Ranal, 2004).

Resultados e Discussão

Houve diferença significativa entre os tratamentos (gl = 4; F = 86,766; P < 0,001; n =

50). Entretanto, quando realizado o teste de Tukey, essa diferença só foi constatada quando

comparado os tratamentos de predação com os demais tratamentos. A maior taxa germinativa

foi encontrada para o tratamento de imersão em água a 70°C, com média de 98,0% (± 63%

DP) (Figura 1). O uso de água quente, em ebulição, normalmente, amolece e expande o

tegumento, promovendo assim, a permeabilidade da semente (Perez, 2004). Entretanto, para

algumas espécies desse gênero, como por exemplo, B. monandra e B. ungulata, o tratamento

de água quente à 85ºC é ineficaz, uma vez que impede a germinação (Alves et al., 2000).

Alves et al. (2004) também encontraram resultados ineficazes com imersão de sementes de B.

divaricata em água quente. Além disso, sementes de Leucaena diversifolia, também

pertencente à família Fabaceae, quando submetidas à água em ebulição apresenta baixa

porcentagem germinativa (Souza et al., 2007).

Os tratamentos de lixa (X = 94,0 ± 8,4%) e controle (X = 93,0 ± 15,7%) não diferiram

estatisticamente do tratamento em imersão em água quente. Assim conforme observado neste

trabalho, a escarificação mecânica proporciona altas taxas de germinação para outras espécies

desse gênero, como B. monandra e B. ungulata, e para B. divaricata (Alves et al., 2000;

Alves et al., 2004). Além disso, a escarificação mecânica é um método eficiente para

superação de dormência de outras espécies de fabaceaes, tais como Caesalpinia leiostachya,

Cassia javanica e Peltophorum dubium (Grus et al., 1984; Oliveira et al., 2003).

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

A L C DS DP

Tratamentos

Taxa

Ger

min

ativ

a (%

)

Figura 1. Porcentagem média de germinação de sementes (± Desvio Padrão) de Bauhinia cheilantha submetidas a diferentes tratamentos de escarificação. C: controle, A: Água a 70ºC, L: lixa, DS: sementes danificas sem o predados, DP: sementes danificadas com o predador.

Por outro lado, observou-se uma baixa porcentagem germinativa para os tratamentos

de predação, tanto para o tratamento com sementes danificadas sem o predador (X = 14 ±

13%) quanto para sementes danificadas com a presença do predador (X = 9 ± 12%).Dessa

forma, os dois tratamentos de predação mostraram-se inadequados para essa espécie, uma vez

que as sementes foram danificadas pelo predador, e assim comprometeram a viabilidade de

germinação dessa espécie.

Conclusão

As sementes de B. cheilantha não necessitam de tratamentos para superação de

dormência. Além disso, a injúria causada às sementes pela ação do inseto predador

influenciou negativamente a germinação dessa espécie.

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