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Informativo 547-STJ (08/10/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO DESAPROPRIAÇÃO Citação do proprietário dispensa a do cônjuge. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Princípio do in dubio pro societate. Indisponibilidade de bens. Dispensabilidade de prova do dano no caso do art. 11 da Lei de Improbidade. DIREITO CIVIL NASCITURO Grávida que sofre aborto por causa de acidente de trânsito tem direito de receber do DPVAT indenização pela morte do nascituro. LOCAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS Denúncia de contrato de locação de imóvel onde funciona hospital. DIREITO DO CONSUMIDOR PRÁTICA ABUSIVA ACP pleiteando nulidade de cláusula abusiva e condenação pelos danos causados. DIREITO EMPRESARIAL FALÊNCIA Pedido de falência. DIREITO PROCESSUAL CIVIL SENTENÇA Alteração da sentença para correção de erro material. AÇÃO RESCISÓRIA Início do prazo para a ação rescisória em caso de recursos parciais. Aplicabilidade da Súmula 343 do STF. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO Intervenção da Defensoria Pública como amicus curiae em recursos representativos de controvérsia. EXECUÇÃO Análise da impenhorabilidade prevista nos incisos IV e X do art. 649 do CPC.

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Informativo 547-STJ (08/10/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE DIREITO ADMINISTRATIVO

DESAPROPRIAÇÃO Citação do proprietário dispensa a do cônjuge. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Princípio do in dubio pro societate. Indisponibilidade de bens. Dispensabilidade de prova do dano no caso do art. 11 da Lei de Improbidade.

DIREITO CIVIL

NASCITURO Grávida que sofre aborto por causa de acidente de trânsito tem direito de receber do DPVAT indenização pela

morte do nascituro. LOCAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS Denúncia de contrato de locação de imóvel onde funciona hospital.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PRÁTICA ABUSIVA ACP pleiteando nulidade de cláusula abusiva e condenação pelos danos causados.

DIREITO EMPRESARIAL

FALÊNCIA Pedido de falência.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

SENTENÇA Alteração da sentença para correção de erro material. AÇÃO RESCISÓRIA Início do prazo para a ação rescisória em caso de recursos parciais. Aplicabilidade da Súmula 343 do STF. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO Intervenção da Defensoria Pública como amicus curiae em recursos representativos de controvérsia. EXECUÇÃO Análise da impenhorabilidade prevista nos incisos IV e X do art. 649 do CPC.

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EXECUÇÃO FISCAL Redirecionamento da execução fiscal de dívida ativa não-tributária.

DIREITO PENAL

LEI DE DROGAS Droga transportada em transporte público e causa de aumento do art. 40 da Lei 11.343/2006. Fundamentação na escolha do percentual de diminuição no caso de semi-imputabilidade.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

AÇÃO PENAL PRIVADA Queixa-crime deverá demonstrar o elemento subjetivo do agente. Consequências da proposta de composição civil feita apenas para parte dos querelados. PROVA TESTEMUNHAL Intimação da autoridade para prestar declarações. RECURSOS MS para atribuição de efeito suspensivo a RESE.

DIREITO ADMINISTRATIVO

DESAPROPRIAÇÃO Citação do proprietário dispensa a do cônjuge

Na ação de desapropriação por utilidade pública, a citação do proprietário do imóvel desapropriado dispensa a do respectivo cônjuge.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.404.085-CE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 5/8/2014 (Info 547).

Desapropriação por utilidade pública

A desapropriação por utilidade pública rege-se pelo Decreto-Lei n. 3.365/41. A ação de desapropriação é uma ação de natureza real uma vez que tem por objeto (pedido) a propriedade de um bem imóvel. O CPC determina que, nas ações que versem sobre direitos reais imobiliários, tanto o réu como o seu cônjuge devem ser citados (§ 1º do art. 10). Essa regra se aplica nas ações de desapropriação por utilidade pública? Se a Fazenda Pública ajuíza ação de desapropriação por utilidade pública contra o proprietário, o seu cônjuge também precisará ser citado? NÃO. Na ação de desapropriação por utilidade pública, a citação do proprietário do imóvel desapropriado dispensa a do respectivo cônjuge. Isso porque o art. 16 do DL 3.365/1941 (Lei das Desapropriações) dispõe que a “citação far-se-á por mandado na pessoa do proprietário dos bens; a do marido dispensa a da mulher”. Logo, não se aplica o § 1º do art. 10 do CPC considerando que esta é norma geral em relação ao art. 16 do DL 3.365/41, que é lei específica.

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IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Princípio do in dubio pro societate

Após o oferecimento de defesa prévia prevista no § 7º do art. 17 da Lei 8.429/1992 – que ocorre antes do recebimento da petição inicial –, somente é possível a pronta rejeição da pretensão deduzida na ação de improbidade administrativa se houver prova hábil a evidenciar, de plano, a inexistência de ato de improbidade, a improcedência da ação ou a inadequação da via eleita. Isso porque, nesse momento processual das ações de improbidade administrativa, prevalece o princípio in dubio pro societate.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.192.758-MG, Rel. originário Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min. Sérgio Kukina, julgado em 4/9/2014 (Info 547).

Regramento legal A improbidade administrativa é regida pela Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa – LIA). Propositura da ação A ação de improbidade deve ser proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada (art. 17). Petição inicial A petição inicial na ação por ato de improbidade administrativa, além dos requisitos do art. 282 do CPC, deve ser instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da existência do ato de improbidade. Assim, diz-se que a ação de improbidade administrativa, além das condições genéricas da ação, exige ainda a presença da justa causa (STJ. 1ª Turma. REsp 952.351-RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 4/10/2012). Defesa prévia (ou defesa preliminar) Estando a petição inicial em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do requerido, para oferecer manifestação por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações, dentro do prazo de 15 dias (§ 7º do art. 17). Essa manifestação por escrito é chamada por alguns de “defesa prévia” ou “defesa preliminar”. Juízo de delibação Recebida a manifestação por escrito (“defesa prévia” ou “defesa preliminar”), o juiz, no prazo de 30 dias, em decisão fundamentada, fará um juízo preliminar (juízo de delibação) sobre o que foi alegado na petição inicial e na defesa e poderá adotar uma das seguintes providências:

rejeitar a ação, se convencido da inexistência do ato de improbidade, da improcedência da ação ou da inadequação da via eleita;

receber a petição inicial, determinando a citação do réu para apresentar contestação. Repare que, somente após a defesa prévia e o recebimento da inicial, é que haverá a contestação. Princípio do in dubio pro societate De acordo com a orientação jurisprudencial do STJ, existindo meros indícios de cometimento de atos enquadrados como improbidade administrativa, a petição inicial da ação de improbidade deve ser recebida pelo juiz, pois, na fase inicial prevista no art. 17, §§ 7º, 8º e 9º da Lei nº 8.429/92, vale o princípio do in dubio pro societate, a fim de possibilitar o maior resguardo do interesse público (AgRg no REsp 1.317.127-ES). Assim, após o oferecimento de defesa prévia, somente é possível a pronta rejeição da pretensão deduzida na ação de improbidade administrativa se houver prova hábil a evidenciar, de plano:

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a inexistência de ato de improbidade;

a improcedência da ação; ou

a inadequação da via eleita. Após o oferecimento da defesa prévia, o magistrado poderá se deparar com três situações: 1) Existem provas ou indícios do ato de improbidade: o juiz deverá receber a ação. 2) Não existem provas ou indícios do ato de improbidade: o juiz mesmo assim deverá receber a ação

exatamente para se oportunizar a ampla produção de provas, necessárias ao pleno e efetivo convencimento do julgador (REsp 1.192.758-MG).

3) Existem provas cabais e irretorquíveis de que não houve ato ímprobo: só nessa hipótese a ação deverá ser rejeitada de plano.

Recurso contra a decisão do juiz que recebe a petição inicial: Agravo de instrumento (§ 10 do art. 17 da LIA). Recurso contra a decisão do juiz que rejeita a petição inicial: Apelação.

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Indisponibilidade de bens

É possível que o juiz decrete, cautelarmente, a indisponibilidade de bens do demandado quando presentes fortes indícios de responsabilidade pela prática de ato ímprobo que cause dano ao Erário.

A medida cautelar de indisponibilidade de bens, prevista no art. 7º da Lei de improbidade administrativa, pode ser decretada mesmo que o requerido não esteja dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, tendo em vista que o periculum in mora encontra-se implícito na lei.

Assim, para que a indisponibilidade seja decretada basta que estejam presentes fortes indícios da prática de atos de improbidade administrativa.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.366.721-BA, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min. Og Fernandes, julgado em 26/2/2014 (recurso repetitivo) (Info 547).

Indisponibilidade dos bens Se a pessoa praticar um ato de improbidade administrativa, estará sujeita às sanções previstas no § 4º do art. 37 da CF/88, quais sejam: suspensão dos direitos políticos; perda da função pública; indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário. A Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa) regulamenta as consequências no caso da prática de atos de improbidade administrativa. A LIA traz, em seus arts. 9º, 10 e 11, um rol exemplificativo de atos que caracterizam improbidade administrativa.

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Art. 9º: atos de improbidade que importam enriquecimento ilícito do agente público. Art. 10: atos de improbidade que causam prejuízo ao erário. Art. 11: atos de improbidade que atentam contra princípios da administração pública.

Para garantir que a pessoa que praticou ato de improbidade responda pelas sanções do § 4º do art. 37 da CF, o art. 7º da Lei nº 8.429/92 prevê a possibilidade de ser decretada a indisponibilidade dos seus bens. Veja o que preleciona a Lei:

Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá à autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado. Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.

Quem decreta essa indisponibilidade? O juiz, a requerimento do Ministério Público. A redação do art. 7º não é muito clara, mas o que a lei quer dizer é que a autoridade administrativa irá comunicar a suposta prática de improbidade ao MP e este irá analisar as informações recebidas e, com base em seu juízo, irá requerer (ou não) a indisponibilidade dos bens do suspeito ao juiz, antes ou durante o curso da ação principal (ação de improbidade). Em outras palavras, a indisponibilidade pode ser requerida como medida preparatória ou incidental. Quando o art. 7º fala em “inquérito”, está se referindo a inquérito administrativo, mas essa representação pode ocorrer também no bojo de um processo administrativo ou de um processo judicial. Além disso, o MP poderá requerer a indisponibilidade ainda que não tenha sido provocado por nenhuma autoridade administrativa, desde que, por algum outro modo, tenha tido notícia da suposta prática do ato de improbidade (ex: reportagem divulgada em jornal). De qualquer forma, muito cuidado com a redação dos arts. 7º e 16, porque muitas vezes é cobrada nas provas a sua mera transcrição, devendo este item ser assinalado, então, como correto.

Essa indisponibilidade dos bens pode ser decretada sem ouvir o réu? SIM. É admissível a concessão de liminar inaudita altera parte para a decretação de indisponibilidade e sequestro de bens, visando assegurar o resultado útil da tutela jurisdicional, qual seja, o ressarcimento ao Erário. Desse modo, o STJ entende que, ante sua natureza acautelatória, a medida de indisponibilidade de bens em ação de improbidade administrativa pode ser deferida nos autos da ação principal sem audiência da parte adversa e, portanto, antes da notificação para defesa prévia (art. 17, § 7º da LIA).

Para que seja decretada a indisponibilidade dos bens da pessoa suspeita de ter praticado ato de improbidade exige-se a demonstração de fumus boni iuris e periculum in mora? NÃO. Basta que se prove o fumus boni iuris, sendo o periculum in mora presumido (implícito). Assim, é desnecessária a prova do periculum in mora concreto, ou seja, de que os réus estejam dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, exigindo-se apenas a demonstração de fumus boni iuris, consistente em fundados indícios da prática de atos de improbidade. A medida cautelar de indisponibilidade de bens, prevista na LIA, consiste em uma tutela de evidência, de forma que basta a comprovação da verossimilhança das alegações, pois pela própria natureza do bem protegido, o legislador dispensou o requisito do perigo da demora.

Conforme explica o Ministro Mauro Campbell Marques, em trechos de seu brilhante voto: “as medidas cautelares, em regra, como tutelas emergenciais, exigem, para a sua concessão, o cumprimento de dois requisitos: o fumus boni juris (plausibilidade do direito alegado) e o periculum in mora (fundado receio de que a outra parte, antes do julgamento da lide, cause ao seu direito lesão grave ou de difícil reparação). (...)

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No entanto, no caso da medida cautelar de indisponibilidade, prevista no art. 7º da LIA, não se vislumbra uma típica tutela de urgência, como descrito acima, mas sim uma tutela de evidência, uma vez que o periculum in mora não é oriundo da intenção do agente dilapidar seu patrimônio e, sim, da gravidade dos fatos e do montante do prejuízo causado ao erário, o que atinge toda a coletividade. O próprio legislador dispensa a demonstração do perigo de dano, em vista da redação imperativa da Constituição Federal (art. 37, §4º) e da própria Lei de Improbidade (art. 7º). (...) O periculum in mora, em verdade, milita em favor da sociedade, representada pelo requerente da medida de bloqueio de bens, porquanto esta Corte Superior já apontou pelo entendimento segundo o qual, em casos de indisponibilidade patrimonial por imputação de conduta ímproba lesiva ao erário, esse requisito é implícito ao comando normativo do art. 7º da Lei n. 8.429/92. (...) A Lei de Improbidade Administrativa, diante dos velozes tráfegos, ocultamento ou dilapidação patrimoniais, possibilitados por instrumentos tecnológicos de comunicação de dados que tornaria irreversível o ressarcimento ao erário e devolução do produto do enriquecimento ilícito por prática de ato ímprobo, buscou dar efetividade à norma afastando o requisito da demonstração do periculum in mora (art. 823 do CPC), este, intrínseco a toda medida cautelar sumária (art.789 do CPC), admitindo que tal requisito seja presumido à preambular garantia de recuperação do patrimônio do público, da coletividade, bem assim do acréscimo patrimonial ilegalmente auferido (REsp 1319515/ES, Rel. p/ Acórdão Min. Mauro Campbell Marques, 1ª Seção, julgado em 22/08/2012). Então, pode ser decretada a indisponibilidade dos bens ainda que o acusado não esteja se desfazendo de seus bens? SIM. É desnecessária a prova de que que o réu esteja dilapidando efetivamente seu patrimônio ou de que eles estariam na iminência de fazê-lo (prova de periculum in mora concreto).

O requisito do periculum in mora está implícito no referido art. 7º, parágrafo único, da Lei n. 8.429/1992, que visa assegurar “o integral ressarcimento” de eventual prejuízo ao erário, o que, inclusive, atende à determinação contida no art. 37, § 4º, da CF/88. Como a indisponibilidade dos bens visa evitar que ocorra a dilapidação patrimonial, o STJ entende que não é razoável aguardar atos concretos direcionados à sua diminuição ou dissipação, na medida em que exigir a comprovação de que esse fato estaria ocorrendo ou prestes a ocorrer tornaria difícil a efetivação da medida cautelar em análise. Além do mais, o disposto no referido art. 7º em nenhum momento exige o requisito da urgência, reclamando apenas a demonstração, numa cognição sumária, de que o ato de improbidade causou lesão ao patrimônio público ou ensejou enriquecimento ilícito. Vale ressaltar, no entanto, que a decretação da indisponibilidade de bens, apesar da excepcionalidade legal expressa da desnecessidade da demonstração do risco de dilapidação do patrimônio, não é uma medida de adoção automática, devendo ser adequadamente fundamentada pelo magistrado, sob pena de nulidade (art. 93, IX, da Constituição Federal), sobretudo por se tratar de constrição patrimonial (REsp 1319515/ES).

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Dispensabilidade de prova do dano no caso do art. 11 da Lei de Improbidade

Para a configuração dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública (art. 11 da Lei 8.429/1992), é DISPENSÁVEL a comprovação de efetivo prejuízo aos cofres públicos.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.192.758-MG, Rel. originário Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min. Sérgio Kukina, julgado em 4/9/2014 (Info 547).

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Art. 11 da Lei de Improbidade

O art. 11 da Lei n. 8.492/92 elenca condutas que configuram atos de improbidade administrativa em razão de violarem os princípios da administração pública. Confira o que diz o caput:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência; II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício; III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo; IV - negar publicidade aos atos oficiais; V - frustrar a licitude de concurso público; VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo; VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço.

Requisitos

Para a configuração dos atos de improbidade tipificados no art. 11 da Lei n. 8.429/92, exige-se que a conduta seja praticada por agente público (ou a ele equiparado), atuando no exercício de seu munus público, havendo, ainda, a necessidade do preenchimento dos seguintes requisitos: a) conduta ilícita; b) improbidade do ato, configurada pela tipicidade do comportamento, ajustado em algum dos incisos do 11 da LIA; c) elemento volitivo, consubstanciado no DOLO de cometer a ilicitude e causar prejuízo ao Erário; d) ofensa aos princípios da Administração Pública. Nesse sentido: STJ. 1ª Turma. AgRg no REsp 1306817/AC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 06/05/2014 (não divulgado em Info). Elemento subjetivo A configuração do ato de improbidade por ofensa a princípio da administração depende da demonstração do chamado dolo genérico ou lato sensu (STJ. 2ª Turma. REsp 1383649/SE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 05/09/2013). Ressalte-se que não se exige dolo específico (elemento subjetivo específico) para sua tipificação (STJ. 2ª Turma. AgRg no AREsp 307.583/RN, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 18/06/2013). Dispensabilidade de prova do dano ou de enriquecimento ilícito do agente O STJ entende que é DISPENSÁVEL a prova de dano para a configuração do ato de improbidade previsto no

art. 11 da Lei n. 8.249/1992 (STJ. 2ª Turma. REsp 1286466/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 03/09/2013). Também não é necessário que se prove que o agente teve enriquecimento ilícito com o ato.

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DIREITO CIVIL

NASCITURO Grávida que sofre aborto por causa de acidente de trânsito tem direito de receber do DPVAT

indenização pela morte do nascituro

Importante!!!

O DPVAT é um seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas, transportadas ou não. Em outras palavras, qualquer pessoa que sofrer danos pessoais causados por um veículo automotor, ou por sua carga, em vias terrestres, tem direito a receber a indenização do DPVAT. Isso abrange os motoristas, os passageiros, os pedestres ou, em caso de morte, os seus respectivos herdeiros.

O art. 3º, I, da Lei 6.194/74 afirma que deverá ser paga indenização do DPVAT aos herdeiros do falecido no caso de morte no trânsito.

O STJ decidiu que, se uma gestante envolve-se em acidente de carro e, em virtude disso, sofre um aborto, ela terá direito de receber a indenização por morte do DPVAT, nos termos do art. 3º, I, da Lei 6.194/74.

O Ministro Relator afirmou expressamente que, em sua opinião, “o ordenamento jurídico como um todo – e não apenas o Código Civil de 2002 – alinhou-se mais à teoria concepcionista para a construção da situação jurídica do nascituro, conclusão enfaticamente sufragada pela majoritária doutrina contemporânea”.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.415.727-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 4/9/2014 (Info 547).

Em que consiste o DPVAT? O DPVAT é um seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas, transportadas ou não. Em outras palavras, qualquer pessoa que sofrer danos pessoais causados por um veículo automotor, ou por sua carga, em vias terrestres, tem direito a receber a indenização do DPVAT. Isso abrange os motoristas, os passageiros, os pedestres ou, em caso de morte, os seus respectivos herdeiros. Ex: dois carros batem e, em decorrência da batida, acertam também um pedestre que passava no local. No carro 1, havia apenas o motorista. No carro 2, havia o motorista e mais um passageiro. Os dois motoristas morreram. O passageiro do carro 2 e o pedestre ficaram inválidos. Os herdeiros dos motoristas receberão indenização de DPVAT no valor correspondente à morte. O passageiro do carro 2 e o pedestre receberão indenização de DPVAT por invalidez. Para receber indenização, não importa quem foi o culpado. Ainda que o carro 2 tenha sido o culpado, os herdeiros dos motoristas, o passageiro e o pedestre sobreviventes receberão a indenização normalmente. O DPVAT não paga indenização por prejuízos decorrentes de danos patrimoniais, somente danos pessoais.

Qual é o valor da indenização de DPVAT prevista na Lei? no caso de morte: R$ 13.500,00 (por vítima) no caso de invalidez permanente: até R$ 13.500,00 (por vítima) no caso de despesas de assistência médica e suplementares: até R$ 2.700,00 como reembolso à cada

vítima. Desse modo, a Lei nº 6.194/74 (Lei do DVAT) afirma que somente deverão ser pagas indenizações nas situações de morte, invalidez permanente e despesas de assistência médica e suplementares. Em se tratando de morte, quem receberá a indenização serão os herdeiros do falecido, na forma do art. 792 do Código Civil:

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Informativo 547-STJ (08/10/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 9

Art. 792. Na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária.

Morte de nascituro Imagine que Maria estava dirigindo seu carro quando se envolveu em um acidente que ocasionou o aborto do feto de 4 meses que estava esperando. Maria terá direito de receber a indenização do DPVAT pela morte do nascituro? SIM. O STJ decidiu que a beneficiária legal de seguro DPVAT que teve a sua gestação interrompida em razão de acidente de trânsito tem direito ao recebimento da indenização prevista no art. 3º, I, da Lei 6.194/1974, devida no caso de morte. A resposta a essa indagação passa pela discussão sobre a natureza jurídica do nascituro. O art. 2º do CC/2002 estabelece o seguinte:

Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Podemos destacar três teorias principais que tentam explicar esse dispositivo:

NATALISTA PERSONALIDADE CONDICIONAL CONCEPCIONISTA

A personalidade jurídica só se inicia com o nascimento. O nascituro não pode ser considerado pessoa. Só será pessoa quando nascer com vida.

A personalidade civil começa com o nascimento com vida, mas o nascituro titulariza direitos submetidos à condição suspensiva (ou direitos eventuais).

A personalidade jurídica se inicia com a concepção, muito embora alguns direitos só possam ser plenamente exercitáveis com o nascimento. O nascituro é pessoa desde o momento em que ele é concebido (o nascituro é um sujeito de direitos).

O nascituro tem apenas expectativa de direitos.

O nascituro possui direitos sob condição suspensiva.

O nascituro possui direitos.

Sílvio Rodrigues, Caio Mário, Sílvio Venosa.

Washington de Barros Monteiro, Arnaldo Rizzardo.

Silmara Chinellato e a grande maioria da doutrina.

Neste julgado, o Min. Relator Luis Felipe Salomão (sempre genial) afirmou expressamente que, em sua opinião, “o ordenamento jurídico como um todo – e não apenas o Código Civil de 2002 – alinhou-se mais à teoria concepcionista para a construção da situação jurídica do nascituro, conclusão enfaticamente sufragada pela majoritária doutrina contemporânea”. Para o Ministro, mesmo que se diga que a personalidade jurídica se inicia com o nascimento, ainda assim é forço concluir que o nascituro já deve ser considerado como pessoa. Caso contrário, não se vislumbraria nenhum sentido lógico na fórmula “a personalidade civil da pessoa começa” (art. 2º), se ambas – pessoa e personalidade civil – tivessem como começo o mesmo acontecimento. Portanto, o aborto causado pelo acidente de trânsito subsume-se ao comando normativo do art. 3º, I, da Lei 6.194/74, haja vista que outra coisa não ocorreu, senão a morte do nascituro, ou o perecimento de uma vida intrauterina.

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LOCAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS Denúncia de contrato de locação de imóvel onde funciona hospital

O art. 53 da Lei 8.245/91 estabelece que o locador de imóvel utilizado por hospitais somente poderá fazer a denúncia do contrato se houver uma dos motivos elencados na lei. É a chamada “denúncia cheia”.

O STJ confere interpretação restritiva ao art. 53 e afirma que ele não protege o local em que são desempenhadas as atividades administrativas de estabelecimentos de saúde.

Assim, pode haver denúncia vazia de contrato de locação de imóvel não residencial ocupado por instituição de saúde apenas para o desempenho de atividades administrativas, como marcação de consultas e captação de clientes, não se aplicando o benefício legal previsto no art. 53 da Lei de Locações.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.310.960-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 4/9/2014 (Info 547).

Contrato de locação de imóveis e sua abrangência

A locação de prédios urbanos rege-se pela Lei n. 8.245/91. A locação de prédios rústicos é regulada pelo Estatuto da Terra. Locação de imóvel para funcionar como hospital

A Lei n. 8.245/91 prevê que, se o imóvel for alugado para servir como hospital, o proprietário não poderá pedir a retomada do bem, salvo se houver uma justa causa para tanto (exigência de uma denúncia cheia). Obs: quando estamos tratando sobre contratos, a palavra “denúncia” significa comunicar ao outro contratante o fim do pacto. Denúncia vazia: é a comunicação do fim do contrato sem a indicação de um motivo. Denúncia cheia: ocorre quando é exposta uma justa causa para a extinção do ajuste. Veja o que diz a Lei do Inquilinato:

Art. 53. Nas locações de imóveis utilizados por hospitais, unidades sanitárias oficiais, asilos, estabelecimentos de saúde e de ensino autorizados e fiscalizados pelo Poder Público, bem como por entidades religiosas devidamente registradas, o contrato somente poderá ser rescindido. I - nas hipóteses do art. 9º; II - se o proprietário, promissário comprador ou promissário cessionário, em caráter irrevogável e imitido na posse, com título registrado, que haja quitado o preço da promessa ou que, não o tendo feito, seja autorizado pelo proprietário, pedir o imóvel para demolição, edificação, licenciada ou reforma que venha a resultar em aumento mínimo de cinqüenta por cento da área útil.

Assim, segundo o art. 53 da Lei n. 8.245/91, o locador de imóvel utilizado por hospitais somente poderá fazer a denúncia do contrato nas seguintes hipóteses: a) mútuo acordo; b) prática de infração legal ou contratual; c) falta de pagamento do aluguel e demais encargos; d) realização de reparações urgentes determinadas pelo Poder Público; e) pedido do proprietário para demolição do imóvel locado, edificação, ou reforma que venha a resultar em aumento mínimo de 50% da área útil. Imagine que a rede de Hospitais “XXX” tem um prédio alugado que é utilizado somente para marcação de consultas, autorização de exames e contratação de novos planos de saúde. Esse local também receberá a proteção do art. 53? Em ouras palavras, se o imóvel locado é utilizado pela rede de hospitais apenas para atividades administrativas ele também estará sujeito à regra do art. 53?

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NÃO. O art. 53 da Lei de Locações não alcança o local em que são desempenhadas as atividades administrativas de estabelecimentos de saúde. Assim, pode haver denúncia vazia de contrato de locação de imóvel não residencial ocupado por instituição de saúde apenas para o desempenho de atividades administrativas, como marcação de consultas e captação de clientes, não se aplicando o benefício legal previsto no art. 53 da Lei de Locações. Segundo o Min. Sanseverino, o objetivo do legislador ao editar o referido artigo fora retirar do âmbito de discricionariedade do locador o despejo do locatário que preste efetivos serviços de saúde no local objeto do contrato de locação, estabelecendo determinadas situações especiais em que o contrato poderia vir a ser denunciado motivadamente. Buscou-se privilegiar o interesse social patente no desempenho das atividades fins ligadas à saúde, visto que não podem sofrer dissolução de continuidade ao mero alvedrio do locador. Justamente por isso, o STJ confere interpretação restritiva ao dispositivo, não estendendo as suas normas à locação de espaço voltado aos serviços administrativos do hospital.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PRÁTICA ABUSIVA ACP pleiteando nulidade de cláusula abusiva e condenação pelos danos causados

I – Em uma mesma ação coletiva, o autor pode formular pedidos relacionados com direitos individuais homogêneo, direitos coletivos em sentido estrito e direitos difusos. As tutelas pleiteadas em ações civis públicas não são necessariamente puras e estanques. Não é preciso que se peça, de cada vez, uma tutela referente a direito individual homogêneo, em outra ação uma de direitos coletivos em sentido estrito e, em outra, uma de direitos difusos, especialmente em se tratando de ação manejada pelo Ministério Público, que detém legitimidade ampla no processo coletivo.

II – Havendo violação a direitos transindividuais, é cabível, em tese, a condenação por dano moral coletivo que se caracteriza como uma categoria autônoma de dano e que não está relacionado necessariamente com os tradicionais atributos da pessoa humana (dor, sofrimento ou abalo psíquico).

III – No caso concreto julgado, o STJ entendeu que não cabia condenação por dano moral coletivo. Os usuários do Plano de Saúde “ZZZ” que precisassem de próteses para cirurgias de angioplastia precisavam pagar um valor extra considerando que determinada cláusula excluía da cobertura o implante de próteses cardíacas. Essa cláusula é abusiva e ilegal, no entanto, ela não gerou danos difusos ou coletivos, mas apenas individuais homogêneos.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.293.606-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/9/2014 (Info 547).

Imagine a seguinte situação adaptada: Os usuários do Plano de Saúde “ZZZ” que precisassem de próteses para cirurgias de angioplastia precisavam pagar o valor extra de R$ 2.500,00 considerando que a cláusula 3.6 das do contrato padrão excluía da cobertura do plano o implante de próteses cardíacas. O Ministério Público estadual ajuizou ação civil pública contra o plano de saúde alegando que a cobrança configurava prática abusiva e requereu: 1. o pagamento de indenização aos consumidores pelos danos resultantes da negativa de cobertura da

prótese cardíaca, cujo montante deveria ser liquidado em procedimento próprio; 2. a condenação do réu em obrigação de fazer consistente na retirada da citada cláusula excludente; 3. a condenação do réu ao pagamento de R$ 100.000,00 como dano moral coletivo, valor que deveria ser

revertido ao Fundo Municipal de Direitos do Consumidor.

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Repare que o primeiro requerimento diz respeito a direitos individuais homogêneos, o segundo poderia ser classificado como integrante dos direitos coletivos em sentido estrito e o terceiro abrange direitos difusos. É possível que esses três pedidos sejam formulados em uma mesma ação coletiva? SIM. O STJ decidiu que, em uma mesma ação coletiva, podem ser discutidos os interesses dos consumidores que possam ter tido tratamento de saúde embaraçado com base em determinada cláusula de contrato de plano de saúde, a ilegalidade em abstrato dessa cláusula e a necessidade de sua alteração em consideração a futuros consumidores do plano de saúde. As tutelas pleiteadas em ações civis públicas não são necessariamente puras e estanques. Não é preciso que se peça, de cada vez, uma tutela referente a direito individual homogêneo, em outra ação uma de direitos coletivos em sentido estrito e, em outra, uma de direitos difusos, notadamente em se tratando de ação manejada pelo Ministério Público, que detém legitimidade ampla no processo coletivo. Isso porque embora determinado direito não possa pertencer, a um só tempo, a mais de uma categoria, isso não implica dizer que, no mesmo cenário fático ou jurídico conflituoso, violações simultâneas de direitos de mais de uma espécie não possam ocorrer. No caso concreto, trata-se de ação civil pública de tutela híbrida. Percebe-se que há: a) direitos individuais homogêneos referentes aos eventuais danos experimentados por aqueles contratantes que tiveram tratamento de saúde embaraçado por força da cláusula restritiva tida por ilegal; b) direitos coletivos resultantes da ilegalidade em abstrato da cláusula contratual em foco, a qual atinge igualmente e de forma indivisível o grupo de contratantes atuais do plano de saúde; c) direitos difusos, relacionados aos consumidores futuros do plano de saúde, coletividade essa formada por pessoas indeterminadas e indetermináveis. Havendo múltiplos fatos ou múltiplos danos, nada impede que se reconheça, ao lado do dano individual, também aquele de natureza coletiva. Em tese, é possível a condenação por danos morais coletivos? SIM. Havendo violação a direitos transindividuais, é cabível, em tese, a condenação por dano moral coletivo que se caracteriza como uma categoria autônoma de dano e que não está relacionado necessariamente com os tradicionais atributos da pessoa humana (dor, sofrimento ou abalo psíquico). Ressalte-se que a condenação em danos morais coletivos é, em tese, possível não apenas no campo do Direito do Consumidor, mas também no Direito Ambiental (STJ. 2ª Turma. REsp 1.328.753-MG, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 28/5/2013. Info 526). No caso concreto, era cabível a condenação do plano de saúde por danos morais coletivos? NÃO. O STJ entendeu que não cabia condenação por dano moral coletivo porque a cláusula do contrato que excluía da cobertura as próteses cardíacas não gerou outros prejuízos além daqueles experimentados por quem, concretamente, teve o tratamento embaraçado ou teve de desembolsar os valores ilicitamente sonegados pelo plano. Em outras palavras, a referida cláusula abusiva somente causou danos individuais homogêneos. Na verdade, a cláusula contratual restritiva permanece inoperante até que algum contratante venha a pleitear o serviço por ela excluído. Antes disso, é mera previsão contratual abstrata, incapaz de gerar qualquer efeito fora da idealização normativa avençada. A responsabilidade civil requer, em regra, ilegalidade da conduta (salvo exceções de responsabilização por ato lícito), dano e nexo causal. A cláusula contratual em apreço é ilegal, no entanto, não gerou danos difusos ou coletivos, mas apenas individuais.

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DIREITO EMPRESARIAL

FALÊNCIA Pedido de falência

A falência do devedor poderá ser decretada quando ele, sem relevante razão de direito, não pagar, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 salários-mínimos na data do pedido de falência (art. 94, I, da Lei 11.101/2005).

Para pedir a falência com base neste inciso não é necessário que o requerente tenha tentado executar o título. Não se revela como exigência para a decretação da quebra a execução prévia. Assim, é desnecessário o prévio ajuizamento de execução forçada para se requerer falência com fundamento na impontualidade do devedor.

A duplicata virtual protestada por indicação é título executivo apto a instruir pedido de falência com base na impontualidade do devedor. Logo, se o devedor não pagar uma duplicata virtual em valor superior a 40 salários-mínimos é possível que seja decretada a sua falência

STJ. 3ª Turma. REsp 1.354.776-MG, Min. Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/8/2014 (Info 547).

Conceito Falência é o processo coletivo de execução forçada de um empresário ou sociedade empresária cuja recuperação mostra-se inviável. Finalidade A falência tem como objetivo reunir os credores e arrecadar os bens, ativos e recursos do falido a fim de que, com os recursos obtidos pela alienação de tais bens, possam os credores ser pagos, obedecendo a uma ordem de prioridade estabelecida na lei. Legislação aplicável

Atualmente, a falência do empresário e da sociedade empresária é regida pela Lei n. 11.101/05. Procedimento:

I – PROCEDIMENTO PRÉ-FALIMENTAR II – PROCESSO FALIMENTAR

O procedimento pré-falimentar vai do pedido de falência até a sentença do juiz. Engloba, resumidamente, três atos principais: 1) pedido de falência; 2) resposta do devedor; 3) sentença. Ao final desta fase, a sentença pode ser: • Denegatória: o processo se extingue sem a instauração da falência. • Declaratória: hipótese em que se iniciará o processo falimentar propriamente dito.

O processo falimentar vai da sentença declaratória de falência até a sentença de encerramento. É no processo falimentar propriamente dito que ocorre a verificação e habilitação dos créditos e o pagamento dos credores.

Quem pode requerer a falência do empresário ou da sociedade empresária? A pessoa que requer a falência é chamada de “sujeito ativo” da falência (deve-se lembrar que a falência acarreta um processo judicial).

Segundo o art. 97 da Lei n. 11.101/2005, podem requerer a falência do devedor:

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I – o próprio devedor. Obs: é a chamada autofalência. II – o cônjuge sobrevivente, qualquer herdeiro do devedor ou o inventariante. Obs: isso ocorre no caso de empresário individual que morre e os seus herdeiros percebem que o falecido estava em situação de insolvência, razão pela qual optam por requerer a falência. III – o cotista ou o acionista do devedor. Obs: isso ocorre quando o sócio da sociedade empresária (seja ele cotista ou acionista) entende que a empresa está insolvente e que o único caminho é a falência. IV – qualquer credor. Obs: é a hipótese que ocorre em 99% dos casos. Hipóteses nas quais pode ser requerida a falência: O art. 94 prevê que a falência poderá ser requerida em três hipóteses:

I – Impontualidade injustificada: Quando o devedor, sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 salários-mínimos na data do pedido de falência. Adotou-se neste inciso o critério da impontualidade injustificada. Obs1: para pedir a falência com base neste inciso não é necessário que o requerente tenha tentado executar o título. Não se revela como exigência para a decretação da quebra a execução prévia. Assim, é desnecessário o prévio ajuizamento de execução forçada para se requerer falência com fundamento na impontualidade do devedor (STJ. 3ª Turma. REsp 1.354.776-MG, Min. Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/8/2014). Obs2: a duplicata virtual protestada por indicação é título executivo apto a instruir pedido de falência com base na impontualidade do devedor. Logo, se o devedor não pagar uma duplicata virtual em valor superior a 40 salários-mínimos é possível que seja decretada a sua falência (STJ. 3ª Turma. REsp 1.354.776-MG, Min. Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/8/2014). II – Execução frustrada: Quando o devedor é executado por qualquer quantia líquida, mas não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal. A lei presume que o devedor, ao adotar esse comportamento na execução contra si proposta, é porque está insolvente. Para o legislador, o devedor praticou um “ato de falência”, ou seja, um ato de quem está em falência. Adotou-se neste inciso o chamado critério da enumeração legal. III – Atos de falência:

Quando o devedor pratica uma série de atos listados nas alíneas do inciso III do art. 94 da Lei n. 11.101/2005. Aqui a lei também presumiu que o devedor está falido pelo fato de ter praticado algum dos comportamentos descritos na lei. Assim, também se adotou neste inciso o chamado critério da enumeração legal.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

SENTENÇA Alteração da sentença para correção de erro material

O magistrado pode corrigir de ofício, mesmo após o trânsito em julgado, erro material consistente no desacordo entre o dispositivo da sentença que julga procedente o pedido e a fundamentação no sentido da improcedência da ação.

STJ. 2ª Turma. RMS 43.956-MG, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 9/9/2014 (Info 547).

O Código de Processo Civil prevê, em seu art. 463:

Art. 463. Publicada a sentença, o juiz só poderá alterá-la: I - para lhe corrigir, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais, ou lhe retificar erros de cálculo; II - por meio de embargos de declaração.

Mas, o que se entende por “inexatidão material”? Trata-se do “erro evidente, reconhecido primu ictu oculi, consistente em equívocos materiais, sem conteúdo decisório propriamente dito. Como exemplo, mencionem-se os erros de grafia, de nome, valor, etc.” (STJ. 3ª Turma. REsp 1.151.982-ES, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/10/2012). Primu ictu oculi é uma expressão em latim e que significa “num primeiro golpe de vista” ou, de maneira simplificada, “à primeira vista”. Desacordo entre o dispositivo e a fundamentação Segundo decidiu o STJ, se o dispositivo da sentença julga procedente o pedido, mas a fundamentação foi toda no sentido da improcedência da ação, temos aí um desacordo que pode ser classificado como erro material, podendo ser corrigido de ofício pelo magistrado mesmo após o trânsito em jugado.

AÇÃO RESCISÓRIA Início do prazo para a ação rescisória em caso de recursos parciais

Importante!!!

Impugnada parcialmente a sentença, os capítulos não impugnados transitam em julgado desde logo ou deve-se aguardar o julgamento do recurso quanto ao restante da sentença?

Em outras palavras, o prazo para a ação rescisória se iniciará para cada capítulo ou deve-se aguardar que não haja mais a possibilidade de se interpor qualquer recurso?

STJ: deve-se aguardar o julgamento do recurso quanto ao restante da sentença. Somente quando não for cabível qualquer recurso, terá início o prazo para a ação rescisória.

STF e doutrina: os capítulos não impugnados transitam em julgado desde logo. O prazo da ação rescisória se iniciará para cada capítulo, à medida que ele transitar em julgado. Assim, o prazo decadencial da ação rescisória, nos casos de existência de capítulos autônomos, deve ser contado do trânsito em julgado de cada decisão (cada capítulo).

STJ. Corte Especial. REsp 736.650-MT, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 20/8/2014 (Info 546).

STF. 1ª Turma. RE 666589/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 25/3/2014 (Info 740).

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CAPÍTULOS DE SENTENÇA Elementos da sentença A sentença é dividida em três elementos, que o CPC chama de “requisitos”: relatório, fundamentação e dispositivo.

Art. 458. São requisitos essenciais da sentença: I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo; II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito; III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões, que as partes lhe submeterem.

No dispositivo existem os capítulos da sentença No dispositivo da sentença, o julgador irá decidir as questões que a ele foram apresentadas para serem examinadas. Em outras palavras, no dispositivo o magistrado apresentará as conclusões sobre os pedidos que foram feitos. Em regra, no dispositivo o julgador irá decidir mais de uma questão, tendo em vista que as partes fazem variados pedidos, havendo ainda os temas que o magistrado tem que decidir de ofício, como a condenação em custas processuais etc. Essas várias questões decididas pelo julgador no dispositivo da decisão judicial são chamadas pela doutrina de “capítulos de sentença”. Conceito de capítulos de sentença Quem melhor teorizou sobre isso, sendo repetido por todos, foi Cândido Rangel Dinamarco. Para o autor, capítulos de sentença são “as partes em que ideologicamente se decompõe o decisório de uma sentença ou acórdão, cada uma delas contendo o julgamento a uma pretensão distinta” (Instituições de direito processual civil. Vol. III. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 200). Obs: apesar de o nome ser capítulos de “sentença”, esse mesmo raciocínio vale também para acórdãos, conforme se pode constatar pelo conceito fornecido por Dinamarco. Exemplo: Em uma ação de indenização, o autor pede a condenação do réu por danos materiais, morais e estéticos. Quanto aos danos patrimoniais, requereu a condenação por danos emergentes e lucros cessantes. Na contestação, o requerido invoca a ilegitimidade de parte e refuta os pedidos formulados. Repare que, no dispositivo, o juiz terá que resolver inúmeras questões que lhe foram submetidas. Para cada uma delas, podemos dizer que haverá um diferente capítulo de sentença. No caso, teremos, no mínimo, sete capítulos de sentença: 1) ilegitimidade de parte; 2) danos emergentes; 3) lucros cessantes; 4) danos morais; 5) danos estéticos; 6) honorários advocatícios; 7) custas processuais. AÇÃO RESCISÓRIA Conceito Ação rescisória é uma ação que tem por objetivo desconstituir uma decisão judicial transitada em julgado. Natureza jurídica A ação rescisória é uma espécie de ação autônoma de impugnação (sucedâneo recursal externo). Atenção: a ação rescisória NÃO é um recurso. O recurso é uma forma de impugnar a decisão na pendência do processo, enquanto a ação rescisória somente pode ser proposta quando há trânsito em julgado, ou seja, quando o processo já se encerrou.

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Competência A ação rescisória é sempre julgada por um tribunal (nunca por um juiz singular). Quem julga a rescisória é sempre o próprio tribunal que proferiu a decisão rescindenda. Prazo A ação rescisória possui prazo de dois anos, contados do trânsito em julgado da decisão.

CPC/Art. 495. O direito de propor ação rescisória se extingue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão.

Imagine agora a seguinte situação adaptada: A empresa “ABC” ajuizou uma ação de indenização contra a empresa “XYZ” cobrando danos emergentes e lucros cessantes. O juiz julgou procedente o pedido quanto aos danos emergentes e improcedente no que tange aos lucros cessantes. Ambas as partes apelaram. A autora recorreu contra o capítulo sobre os “lucros cessantes” e a ré impugnou o capítulo dos “danos emergentes”. O Tribunal manteve integralmente a sentença. A empresa/ré não recorreu contra o acórdão do TJ. Já a empresa/autora apresentou recurso especial impugnando novamente o capítulo sobre “lucros cessantes”. Desse modo, houve trânsito em julgado para a ré em 02/02/2010. Depois de três anos de tramitação, o STJ julgou improvido o recurso especial interposto pela autora, mantendo o acórdão. A autora conformou-se, não apresentou mais nenhum recurso e, em 03/03/2013, houve o trânsito em julgado para ela. Ação rescisória proposta pela empresa/ré No dia 04/03/2013, a empresa “XYZ” ajuizou ação rescisória afirmando que a sua condenação em “danos emergentes” violou literal disposição de lei (art. 485, V, do CPC). A empresa “XYZ” ajuizou a ação rescisória dentro do prazo? Depende:

Para o STJ: SIM. Para o STJ a contagem do prazo decadencial para a propositura de ação rescisória se inicia com o trânsito em julgado da última decisão proferida no processo, ainda que algum dos capítulos da sentença ou do acórdão tenha se tornado irrecorrível em momento anterior. Existe até um enunciado que espelha esse entendimento: Súmula 401-STJ: O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial.

Para o STF: NÃO. Para o STF teria havido decadência. Segundo decidiu a 1ª Turma do STF, o prazo decadencial da ação rescisória, nos casos de existência de capítulos autônomos, deve ser contado do trânsito em julgado de cada decisão (cada capítulo). O capítulo sobre “danos emergentes” transitou em julgado em 02/02/2010, momento em que as partes não mais discutiram essa decisão. No STJ, o que ficou sendo debatido foi o capítulo sobre “lucros cessantes”. Ao ocorrer, em datas diversas, o trânsito em julgado de capítulos autônomos da sentença ou do acórdão, surge a viabilidade de ações rescisórias distintas, com fundamentos próprios. As partes do julgado que resolvem questões autônomas formam sentenças independentes entre si, passíveis de serem mantidas ou reformadas sem prejuízo para as demais. Em outras palavras, cada

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capítulo de sentença é como se fosse uma sentença independente, apesar de estar em um mesmo documento. Tanto isso é verdade, que existem os recursos parciais, ou seja, que impugnam apenas uma parte (um capítulo) do dispositivo. O Min. Marco Aurélio destacou que o entendimento acima está contido no Enunciado 514 do STF:

Súmula 514-STF: Admite-se ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenham esgotado todos os recursos.

Mencionou, ainda, como reforço de argumentação, que o TST possui igualmente essa posição, conforme

se observa pelo inciso II da sua Súmula n. 100:

AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA II - Havendo recurso parcial no processo principal, o trânsito em julgado dá-se em momentos e em tribunais diferentes, contando-se o prazo decadencial para a ação rescisória do trânsito em julgado de cada decisão, salvo se o recurso tratar de preliminar ou prejudicial que possa tornar insubsistente a decisão recorrida, hipótese em que flui a decadência, a partir do trânsito em julgado da decisão que julgar o recurso parcial.

Vale ressaltar que o entendimento do STF é aplaudido por boa parte da doutrina, sendo a posição acolhida pelo projeto do novo Código de Processo Civil que tramita no Senado Federal e adota a coisa julgada progressiva. Capítulos de sentença no acordão do Mensalão Recentemente, o STF já havia reconhecido a autonomia substancial dos capítulos de sentença no processo do Mensalão. O Plenário decidiu que as penas impostas aos réus da AP 470 que não foram objeto de embargos infringentes deveriam ser executadas imediatamente (AP 470 Décima Primeira-QO/MG, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgado em 13/11/2013 – Info 728). Por exemplo: segundo o STF, a parte que condenou determinado réu ao art. 317 do CP era um capítulo de sentença autônomo em relação à condenação do art. 288 do CP. Assim, foi decretado o trânsito em julgado e determinou-se a executoriedade imediata dos capítulos autônomos do acórdão condenatório que não foram impugnados por embargos infringentes. Como a condenação do art. 317 do CP já é definitiva (não tem possibilidade de ser alterada pelos embargos infringentes), não havia fundamento legítimo que justificasse o retardamento da execução. Coisa julgada progressiva Assim, o STF admite a coisa julgada progressiva, ou seja, aquela que vai ocorrendo em momentos distintos porque a sentença foi fragmentada em partes (capítulos) autônomas. A coisa julgada progressiva é aquela que vai se formando ao longo do processo, em razão de existência de recursos parciais. É como se a coisa julgada fosse sendo paulatinamente formada a medida que os capítulos da sentença não são impugnados. Resumindo: Impugnada parcialmente a sentença, os capítulos não impugnados transitam em julgado desde logo ou deve-se aguardar o julgamento do recurso quanto ao restante da sentença? O prazo para a ação rescisória se iniciará para cada capítulo ou deve-se aguardar que não haja mais a possibilidade de se interpor qualquer recurso?

STJ: deve-se aguardar o julgamento do recurso quanto ao restante da sentença. Somente quando não for cabível qualquer recurso, terá início o prazo para a ação rescisória.

STF e doutrina: os capítulos não impugnados transitam em julgado desde logo. O prazo da ação rescisória se iniciará para cada capítulo à medida que ele transitar em julgado.

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Essa divisão de entendimentos pode refletir em problemas tanto na prática forense como também na hora das provas. Veja essa questão recentemente cobrada no concurso da PGM/SP: (PGM/SP VUNESP 2014) O termo inicial do prazo para propositura de ação rescisória corresponde à data em que (A) decorrer o prazo para recurso do capítulo da sentença ou do acórdão de mérito que será objeto de impugnação, não importando a existência de recurso parcial referente a outros capítulos. (B) não for mais cabível recurso do pronunciamento judicial rescindendo, mesmo que se trate de decisão interlocutória. (C) não for mais cabível recurso do último pronunciamento judicial ocorrido no processo. (D) ocorrido o último pronunciamento judicial de mérito no processo, desde que não interposto recurso ou que este não tenha sido conhecido. (E) não for mais cabível, perante as instâncias ordinárias, nenhum recurso do pronunciamento judicial rescindendo. O gabarito apontou como correta a alternativa “C”. Realmente ela está correta de acordo com o entendimento do STJ (Súmula 401). Ocorre que a letra “A” também está certa, se levarmos em consideração a posição da 1ª Turma do STF acima explicada.

AÇÃO RESCISÓRIA Aplicabilidade da Súmula 343 do STF

Importante!!!

O inciso V do art. 485 do CPC prevê que é cabível a ação rescisória quando a sentença de mérito transitada em julgado “violar literal disposição de lei”.

A jurisprudência entende que, se na época em que a sentença rescindenda transitou em julgado havia divergência jurisprudencial a respeito da interpretação da lei, não se pode dizer que a decisão proferida tenha tido um vício. Logo, não caberá ação rescisória. Isso está em um enunciado do STF:

Súmula 343-STF: Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.

Imagine o seguinte exemplo: havia divergência na jurisprudência se o índice de correção índice de correção monetária a ser aplicado em determinada situação deveria ser o BNTf ou o INPC. Em 2003, o STJ pacificou que o índice seria o INPC.

Se o acórdão do TJ transitou em julgado em 2002 aplicando o BNTf, não caberá ação rescisória porque na época havia divergência. Aplica-se a Súmula 343-STJ.

Se o acórdão do TJ transitou em julgado em 2004 aplicando o BNTf, caberá ação rescisória porque na época não mais havia divergência. Não se aplica a Súmula 343-STJ.

STJ. Corte Especial. REsp 736.650-MT, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 20/8/2014 (Info 547).

Conceito Ação rescisória é uma ação que tem por objetivo desconstituir uma decisão judicial transitada em julgado. Natureza jurídica A ação rescisória é uma espécie de ação autônoma de impugnação (sucedâneo recursal externo).

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Atenção: a ação rescisória NÃO é um recurso. O recurso é uma forma de impugnar a decisão na pendência do processo (este ainda não acabou). A ação rescisória, por sua vez, somente pode ser proposta quando há trânsito em julgado, ou seja, quando o processo já se encerrou.

Competência A ação rescisória é sempre julgada por um tribunal (nunca por um juiz singular). Quem julga a rescisória é sempre o próprio tribunal que proferiu a decisão rescindenda.

Prazo A ação rescisória possui prazo de dois anos, contados do trânsito em julgado da decisão.

CPC/Art. 495. O direito de propor ação rescisória se extingue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão.

Hipóteses O CPC prevê as hipóteses em que a ação rescisória é cabível:

Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: I - se verificar que foi dada por prevaricação, concussão ou corrupção do juiz; II - proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente; III - resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei; IV - ofender a coisa julgada; V - violar literal disposição de lei; VI - se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou seja provada na própria ação rescisória; VII - depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável; VIII - houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença; IX - fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa; § 1º Há erro, quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido. § 2º É indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato.

Análise do inciso V O inciso V do art. 485 prevê que é cabível a ação rescisória quando a sentença de mérito transitada em julgado “violar literal disposição de lei”. Importante ressaltar que, para incidir essa hipótese, a violação deve se mostrar aberrante, cristalina, observada primo ictu oculi (STJ. 1ª Turma. REsp 1458607/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 23/10/2014). Quando o inciso fala em “lei”, abrange também as normas constitucionais? SIM. A palavra “lei”, nesse caso, deverá ser interpretada em sentido amplo, abrangendo lei ordinária, lei complementar, medida provisória, norma constitucional, decreto, resolução e qualquer outro ato normativo. Assim, se a sentença violar literal disposição de lei, de norma constitucional ou de qualquer outra norma jurídica, caberá, em tese, ação rescisória. Se a sentença violar um princípio, caberá ação rescisória? SIM. A jurisprudência do STJ possui precedentes reconhecendo o cabimento de ação rescisória por conta de violação a princípios. Vale lembrar que a doutrina atual considera que o princípio é uma espécie de norma jurídica. Nesse sentido: STJ. 1ª Turma. REsp 1458607/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 23/10/2014.

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Se a sentença violar literal disposição de súmula (comum ou vinculante), caberá ação rescisória? NÃO. Não cabe ação rescisória contra violação de súmula. O inciso V não abrange a contrariedade à súmula porque não se trata de ato normativo. Conforme prevê o art. 485, V, do CPC, a sentença pode ser rescindida quando violar literal disposição de lei, hipótese que não abrange a contrariedade à súmula. Logo, não há previsão legislativa para o ajuizamento de ação rescisória sob o argumento de violação de súmula (STJ. 3ª Seção. AR 4.112-SC, Min. Rel. Marco Aurélio Bellizze, julgada em 28/11/2012). Súmula 343 do STF Não é raro que uma mesma lei gere interpretações completamente diferentes, inclusive dentro de um único Tribunal.

Imaginemos, por exemplo, que a 1ª Turma do STJ afirme que o art. XX da Lei n. 8.112/90 confere determinado direito ao servidor. A 2ª Turma do STJ, por sua vez, interpreta o dispositivo de forma oposta e entende que a Lei não confere esse direito. O juiz “A” decidiu com base na intepretação dada pela 1ª Turma do STJ e esta sentença transitou em julgado. Ocorre que, um ano depois, a 1ª Turma modificou seu entendimento, curvando-se à posição da 2ª Turma. Nesse caso, seria possível ajuizar ação rescisória contra a sentença proferida pelo juiz “A” alegando que ela

violou literal disposição do art. XX Lei n. 8.112/90? NÃO. A jurisprudência entende que, se na época em que a sentença rescindenda transitou em julgado havia divergência jurisprudencial a respeito da interpretação da lei, não se pode dizer que a decisão proferida tenha tido um vício. Logo, não caberá ação rescisória. Isso está expresso na súmula 343 do STF:

Súmula 343-STF: Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.

O raciocínio que inspirou essa súmula é o seguinte: se há nos tribunais divergência sobre um mesmo preceito normativo, é porque ele comporta mais de uma interpretação, significando que não se pode qualificar qualquer dessas interpretações, mesmo a que não seja a melhor, como ofensiva ao teor literal da norma interpretada. Trata-se da chamada “doutrina da tolerância da razoável interpretação da norma” (Voto do Ministro Teoria Zavascki no RE 590809/RS). Explicando melhor com outro exemplo: O acórdão do TJMT reconheceu que o índice de correção monetária a ser aplicado em determinada situação deveria ser o BNTf. Esse acórdão transitou em julgado em 2002. Na época havia divergência nos Tribunais se o indexador a ser aplicado seria o BNTf ou o INPC. Tal divergência somente veio a ser pacificada pelo STJ em abril de 2003 quando o STJ afirmou que seria o INPC. Logo, não cabe ação rescisória contra esse julgado do TJMT, com base no art. 485, V, do CPC, considerando que o acórdão foi prolatado ANTES da pacificação da jurisprudência em sentido contrário. Aplica-se, portanto, o raciocínio da Súmula 343 do STF. Agora vejamos o contrário: se o acórdão do TJMT tivesse sido prolatado em 2004, ou seja, APÓS a pacificação, nesse caso seria cabível a ação rescisória. Não se aplicaria a Súmula 343 do STF.

Tema era controvertido e foi pacificado. CABE AÇÃO RESCISÓRIA?

Se o acórdão contrário à jurisprudência do STJ foi prolatado ANTES da pacificação: NÃO cabe ação rescisória. Aplica-se a Súmula 343 do STF.

Se o acórdão contrário à jurisprudência do STJ foi prolatado APÓS a pacificação: CABE a ação rescisória. NÃO se aplica a Súmula 343 do STF.

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RECURSO ESPECIAL REPETITIVO Intervenção da Defensoria Pública como amicus curiae

em recursos representativos de controvérsia

Atenção! DPU

A DPU e as Defensorias Públicas estaduais podem atuar como amicus curiae em recursos especiais repetitivos e recursos extraordinários submetidos à repercussão geral, assim como em processos de controle concentrado de constitucionalidade. Para isso, deverão demonstrar que possuem legítimo interesse e representatividade para essa atuação como amigo da Corte.

A mera afirmação de que a Defensoria Pública atua em vários processos que tratam do mesmo tema versado no recurso representativo da controvérsia a ser julgado não é suficiente para caracterizar-lhe a condição de amicus curiae.

Dois exemplos em que o STJ não admitiu a intervenção da instituição como amicus curiae:

Recurso especial repetitivo em que se discutia encargos de crédito rural; Recurso especial repetitivo em que se debatia a possibilidade de redirecionamento de

execução fiscal em caso de dívidas não-tributárias.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.371.128-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10/9/2014 (Info 547).

STJ. 2ª Seção. REsp 1.333.977-MT, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 26/2/2014 (Info 537).

Multiplicidade de recursos extraordinários tratando sobre o mesmo tema O legislador percebeu que havia no STF e no STJ milhares de recursos que tratavam sobre os mesmos temas jurídicos. Diante disso, a fim de otimizar a análise desses recursos, a Lei nº 11.672/2008 acrescentou os arts. 543-B e 543-C ao CPC, prevendo uma espécie de “julgamento por amostragem” dos recursos extraordinários e recursos especiais que tiverem sido interpostos com fundamento em idêntica controvérsia ou questão de direito. Julgamento por amostragem O art. 543-B estabelece o procedimento a ser adotado pelo STF no caso de múltiplos recursos

extraordinários tratando sobre o mesmo tema. O art. 543-C, por sua vez, prevê o rito no caso de múltiplos recursos especiais em tramitação no STJ. Julgamento por amostragem e recursos especiais repetitivos O julgamento por amostragem no caso dos recursos especiais repetitivos é previsto no art. 543-C do CPC:

Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.

Previsão da intervenção de amicus curiae na repercussão geral e no recurso especial repetitivo O CPC prevê que, antes de julgar o recurso extraordinário submetido à repercussão geral e o recurso especial sob a sistemática dos recursos repetitivos, o STF e o STJ poderão colher a manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia, que se pronunciarão sobre a causa na qualidade de amicus curiae. Veja:

Art. 543-A (...) § 6º O Relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

Art. 543-C (...) § 4º O relator, conforme dispuser o regimento interno do Superior Tribunal de Justiça e considerando a relevância da matéria, poderá admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia.

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A DPU pode atuar como amicus curiae em recursos especiais repetitivos, recursos extraordinários submetidos à repercussão geral e em ADIs? SIM. A DPU e as Defensorias Públicas estaduais já foram admitidas como amici curiae em muitos processos no STF e no STJ. Veja alguns exemplos no STF:

ADI 4.636: o Min. Gilmar Mendes admitiu a participação da Defensoria Pública de São Paulo como amicus curiae na ADI 4.636 na qual o Conselho Federal da OAB impugna dispositivos da Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública (LC 80/94).

RE 580.963: o Min. Gilmar Mendes deferiu o pedido da DPU para atuar como amicus curiae no julgamento do RE 580.963 (sob a sistemática da repercussão geral). Esse recurso tratava sobre o caso de uma pessoa de baixa renda que teve o pedido de benefício assistencial negado pelo INSS pelo fato de, supostamente, ter renda incompatível. O pedido de intervenção da DPU fundamentou-se no fato de que uma das atribuições da Instituição é justamente a defesa dos hipossuficientes em causas previdenciárias.

ADPF 186: nesta ação, o Partido DEM questionava o sistema de cotas raciais da UnB. O Min. Relator Ricardo Lewandowski aceitou a participação da DPU como amicus curiae.

Admissões ocorridas em processos no STJ:

REsp 1.111.566: discutia-se, em recurso repetitivo, se, no processo criminal contra o motorista acusado de embriaguez ao volante, poderiam ser admitidos outros meios de prova além do bafômetro e do exame de sangue. A DPU foi admitida como amicus curiae.

REsp 1.133.869: recurso repetitivo envolvendo tratando sobre demanda envolvendo mutuário do SFH e a empresa seguradora, por ter esta negado a cobertura securitária pretendida. Foi aceito o ingresso da DPU no feito sob o argumento de que ela tem atuação preponderante na defesa dos consumidores e hipossuficientes.

REsp 1.339.313: o recurso versava sobre o prazo prescricional para o ajuizamento das ações de repetição de indébitos de tarifas de água e esgoto. DPU foi igualmente admitida como amiga da corte.

Para que a DPU possa intervir como amicus curiae basta que ela demonstre que a instituição atua em muitas ações envolvendo aquele tema? Isso é motivo suficiente para a intervenção? NÃO. O simples argumento de que DPU atua em vários processos que tratam do mesmo tema versado no recurso representativo da controvérsia a ser julgado não é suficiente para caracterizar a sua condição de amicus curiae. DPU não pode atuar como amicus em REsp em que se discutia encargos de crédito rural A cédula de crédito rural é uma espécie de “título rural”, ou seja, um título de crédito criado para facilitar as negociações na atividade rural. Em um caso concreto, o STJ estava discutindo, sob a sistemática de recurso repetitivo (art. 543-C), se a cédula de crédito rural admitia ou não a capitalização de juros. Havia vários recursos especiais envolvendo esse tema e que estavam aguardando o pronunciamento definitivo do STJ. Dessa forma, a decisão tomada iria influenciar todos esses processos. Diante da relevância da matéria, o STJ admitiu, como amici curiae (plural de amicus curiae) as seguintes entidades:

Banco Central do Brasil;

Federação Brasileira dos Bancos. Assim, o BACEN e a FEBRABAN apresentaram manifestação defendendo seus pontos de vista sobre a controvérsia.

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Foi, então, que a Defensoria Pública da União requereu à Ministra Relatora que também fosse admitida nos autos como amicus curiae justificando que atua em defesa de hipossuficientes em milhares de ações envolvendo capitalização de juros em cédulas de crédito rural. O STJ admitiu a participação da DPU como amicus curiae? NÃO. Segundo decidiu o STJ, NÃO se admite a intervenção da Defensoria Pública como amicus curiae no processo para o julgamento de recurso repetitivo em que se discutem encargos de crédito rural, destinado ao fomento de atividade comercial (STJ. 2ª Seção. REsp 1.333.977-MT, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 26/2/2014. Info 537). A Ministra Relatora utilizou três argumentos para negar a intervenção: 1º) Para que a pessoa, órgão ou entidade possa ser admitida como amicus curiae, nos termos do § 4º do art. 543-C, é necessário que ela tenha uma representatividade relacionada com sua “identidade funcional, natureza ou finalidade estatutária” que a qualifique para contribuir para o aprimoramento do julgamento da causa. Dessa forma, para atuar como amicus curiae, não basta que a pessoa, órgão ou entidade tenha o interesse em defender a solução da lide em favor de uma das partes, como no caso da DPU. Isso, segundo o STJ, seria defender um interesse meramente econômico. 2º) A intervenção formal no processo repetitivo deve dar-se por meio da entidade de âmbito nacional cujas atribuições sejam pertinentes ao tema em debate, sob pena de prejuízo ao regular e célere andamento deste importante instrumento processual. No caso em que se discutem encargos de crédito rural, destinado ao fomento de atividade comercial, a matéria, em regra, não se subsume às hipóteses de atuação típica da Defensoria Pública. Apenas a situação de eventual devedor necessitado justificaria, em casos concretos, a defesa dessa tese jurídica pela Defensoria Pública, argumento este igualmente sustentado por empresas de grande porte econômico. 3º) A inteireza do ordenamento jurídico já é defendida pelo Ministério Público Federal, que se manifesta no processo de recurso repetitivo.

DPU não pode atuar como amicus em REsp no qual se discutia redirecionamento de execução fiscal No REsp repetitivo 1.371.128-RS, o STJ discutia se a dissolução irregular da empresa seria motivo suficiente para o redirecionamento da execução fiscal de dívida ativa não-tributária contra o sócio-gerente. O Relator não admitiu a participação da DPU como amicus curiae no processo. Segundo o Ministro, o único argumento utilizado pela DPU para pedir a intervenção foi a afirmação de que atuava em vários processos que tratam sobre o mesmo tema versado no recurso representativo da controvérsia. Isso, contudo, segundo a jurisprudência do STJ, não é suficiente para caracterizar-lhe a condição de amicus curiae. STJ. 1ª Seção. REsp 1.371.128-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10/9/2014 (Info 547).

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EXECUÇÃO Análise da impenhorabilidade prevista nos incisos IV e X do art. 649 do CPC

Importante!!!

Mudança de entendimento!

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O art. 649 do CPC estabelece um rol de bens que não podem ser objeto de penhora.

O inciso IV do art. 649 prevê que as verbas salariais são absolutamente impenhoráveis. O STJ, no entanto, confere interpretação restritiva a esse inciso e afirma que a remuneração a que se refere o dispositivo é a última percebida, perdendo esta natureza a sobra respectiva, após o recebimento do salário ou vencimento seguinte. Assim, se a pessoa recebe seu salário na conta bancária, mas não o utiliza no mês e o deixa lá depositado, tal quantia perderá o caráter de impenhorabilidade.

O inciso X do art. 649 estabelece que é impenhorável a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários mínimos. O STJ decidiu que é possível aplicar a proteção desse inciso, por intepretação extensiva, para outras formas de investimento. Desse modo, é impenhorável a quantia de até 40 salários mínimos depositada em fundo de investimento, desde que seja a única aplicação financeira do devedor e não haja indícios de má-fé, abuso, fraude, ocultação de valores ou sinais exteriores de riqueza.

As verbas rescisórias trabalhistas são consideradas impenhoráveis, nos termos do inciso IV, por terem a natureza de verba salarial (alimentar). No entanto, se a pessoa recebe a verba trabalhista e deposita esse dinheiro em um fundo de investimento, por longo período, a quantia perderá o caráter de impenhorabilidade do IV já que não foi utilizada para suprimento de necessidades básicas do devedor e sua família. Por outro lado, essa verba poderá ser considerada impenhorável com base no inciso X, até o limite de 40 salários mínimos, desde que seja a única aplicação financeira do devedor e não haja indícios de má-fé, abuso, fraude, ocultação de valores ou sinais exteriores de riqueza.

STJ. 2ª Seção. REsp 1.230.060-PR, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 13/8/2014 (Info 547).

INCISO IV DO ART. 649 DO CPC Todo e qualquer bem pode ser penhorado? NÃO. O art. 649 do CPC estabelece um rol de bens que não podem ser objeto de penhora. Dentre eles, veja o que diz o inciso IV:

Art. 649. São absolutamente impenhoráveis: IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3º deste artigo;

Se a pessoa recebe seu salário na conta bancária, mas não o utiliza no mês e o deixa lá depositado, tal quantia continuará sendo impenhorável? NÃO. Os valores somente podem ser considerados como verbas alimentares, e protegidos pelo art. 649, IV do CPC, enquanto estiverem destinados ao sustento do devedor e sua família, ou seja, enquanto se prestarem ao atendimento das necessidades básicas do devedor e seus dependentes. Para o STJ, na hipótese de qualquer quantia salarial se mostrar, ao final do período (isto é, até o recebimento de novo provento de igual natureza), superior ao custo necessário ao sustento do titular e de seus familiares, essa sobra perde o caráter alimentício e passa a ser uma reserva ou economia, tornando-

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se, em princípio, penhorável. Explicando melhor com um exemplo: a pessoa recebe 10 mil reais de salário por mês; gasta 7 mil e mantém os 3 mil restantes na conta corrente; se, no mês seguinte, receber o novo salário (mais 10 mil), totalizando 13 mil na conta, estes 3 mil “excedentes” poderão, em tese, ser penhorados. Em suma, o STJ confere interpretação restritiva ao inciso IV do art. 649 e afirma que a remuneração a que se refere o dispositivo é a última percebida, perdendo esta natureza a sobra respectiva, após o recebimento do salário ou vencimento seguinte. Não é razoável, como regra, admitir que verbas alimentares não utilizadas no período para a própria subsistência sejam transformadas em aplicações ou investimentos financeiros e continuem a gozar do benefício da impenhorabilidade (Min. Nancy Andrighi, REsp 1.330.567-RS). Essa posição adotada pelo STJ é defendida há muito tempo pela doutrina majoritária. Por todos, confira o genial Leonardo Greco: “Até a percepção da remuneração do mês seguinte, toda a remuneração mensal é impenhorável e pode ser consumida pelo devedor, para manter padrão de vida compatível com o produto do seu trabalho. Mas a parte da remuneração que não for utilizada em cada mês, por exceder as necessidades de sustento suas e de sua família, será penhorável como qualquer outro bem do seu patrimônio.” (O Processo de Execução. Vol. II, Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 21). INCISO X DO ART. 649 DO CPC Outra importante previsão de impenhorabilidade é trazida pelo inciso X do art. 649 do CPC:

Art. 649. São absolutamente impenhoráveis: X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança.

É possível aplicar a proteção desse inciso X, por intepretação extensiva, para outras formas de investimento? SIM. O STJ decidiu que é possível estender a proteção do inciso X do art. 649 do CPC para a quantia de até 40 salários mínimos depositada em fundo de investimento, desde que:

seja a única aplicação financeira do devedor;

não haja indícios de má-fé, abuso, fraude, ocultação de valores ou sinais exteriores de riqueza. Segundo defendeu a Min. Maria Isabel Gallotti, a regra de impenhorabilidade estatuída no inciso X do art. 649 do CPC merece interpretação extensiva para alcançar pequenas reservas de capital poupadas em outros investimentos, e não apenas os depósitos em caderneta de poupança. Não há sentido em restringir o alcance da regra apenas às cadernetas de poupança assim rotuladas, sobretudo no contexto atual em que diversas outras opções de aplicação financeira se abrem ao pequeno investidor, eventualmente mais lucrativas, e contando com facilidades como o resgate automático. O escopo do inciso X do art. 649 não é estimular a aquisição de reservas em caderneta de poupança em detrimento do pagamento de dívidas, mas sim o de proteger devedores de execuções que comprometam o mínimo necessário para a sua subsistência e de sua família, finalidade para qual não tem influência alguma que a reserva esteja acumulada em papel moeda, conta-corrente, caderneta de poupança propriamente dita ou outro tipo de aplicação financeira, com ou sem garantia do Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Ressalte-se que essa parte da decisão é inovadora e representa mudança na posição até então prevalecente.

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CASO CONCRETO Imagine a seguinte situação adaptada: João foi demitido sem justa causa e recebeu, na Justiça do Trabalho, suas verbas rescisórias. As verbas rescisórias trabalhistas são consideradas impenhoráveis, nos termos do inciso IV do art. 649? SIM. As quantias referentes à rescisão trabalhista são consideradas verbas alimentares e podem ser equiparadas a “salário”. Logo, em princípio, as verbas rescisórias trabalhistas são absolutamente impenhoráveis. Verba rescisória foi depositada em fundo de investimento Suponhamos que João tenha depositado o valor recebido em um fundo de investimento, tendo essa quantia ficado lá aplicada por 2 anos. Ocorre que João teve uma experiência empresarial mal sucedida e tornou-se réu em um processo de execução. O juiz determinou a penhora on line da quantia depositada por João no fundo de investimento. João poderá invocar que essa quantia é impenhorável com base no inciso IV do art. 649? NÃO. De acordo com a interpretação restritiva adotada pelo STJ, a regra de impenhorabilidade prevista no inciso IV do art. 649 do CPC não protege a quantia recebida como indenização trabalhista, mas que foi aplicada por longo período em fundo de investimento, considerando que esse dinheiro não foi nem está sendo utilizado para suprimento das necessidades básicas do devedor e sua família. A princípio, as verbas rescisórias recebidas por meio de reclamação trabalhista são impenhoráveis com base no inciso IV do art. 649 do CPC. Isso porque possuem natureza salarial e, mesmo sendo superiores ao valor do salário mensal, elas não podem ser consideradas como “sobras” ou “excedentes” de salário tendo em vista que o trabalhador não estava guardando esse dinheiro por vontade própria. Era uma verdadeira “poupança” forçada uma vez que o empregador já deveria ter pago essa quantia, mas por ato ilícito não o fez, somente realizando após ser acionado na Justiça. Por conta do não pagamento desses valores, pode ser que o trabalhador tenha adiado despesas que ele precisaria fazer, como, por exemplo, um tratamento de saúde. Assim, quando o trabalhador recebe a rescisão, tal verba, em sua integralidade, é impenhorável. Todavia, a partir do momento em que a quantia foi posta à sua disposição e ele pagou suas despesas e necessidades imediatas, investindo o restante do dinheiro, esse valor perde a natureza salarial e passa a ser considerado como aplicação financeira. Isso faz com que ele não possa ser mais enquadrado no inciso IV do art. 649 do CPC. João poderá, então, invocar que essa quantia aplicada no fundo de investimento é impenhorável com base no inciso X do art. 649? SIM. Como visto, o STJ confere interpretação extensiva ao inciso X do art. 649 do CPC, permitindo que essa impenhorabilidade abranja outras aplicações financeiras, além da poupança, como é o caso do fundo de investimento. Assim, João poderá invocar a impenhorabilidade do inciso X desde que:

seja a sua única aplicação financeira; e

não haja indícios de má-fé, abuso, fraude, ocultação de valores ou sinais exteriores de riqueza Ressalte-se que somente será impenhorável a quantia depositada no fundo de investimento que corresponda até o limite de 40 salários mínimos. Os valores que excederem a esse patamar poderão ser penhorados.

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EXECUÇÃO FISCAL Redirecionamento da execução fiscal de dívida ativa não-tributária

Importante!!!

Mudança de entendimento!

Atualize seu livro de 2013

Quando a sociedade empresária for dissolvida irregularmente, é possível o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente da pessoa jurídica executada mesmo que se trate de dívida ativa NÃO-TRIBUTÁRIA. Vale ressaltar que, para que seja autorizado esse redirecionamento, não é preciso provar a existência de dolo por parte do sócio.

Assim, por exemplo, a Súmula 435 do STJ pode ser aplicada tanto para execução fiscal de dívida ativa tributária como também na cobrança de dívida ativa NÃO-TRIBUTÁRIA.

No caso concreto, a ANATEL estava executando créditos não-tributários que eram devidos por uma rádio comunitária. Quando o Oficial de Justiça chegou até o endereço da empresa constatou que ela não mais estava funcionando ali, estando presumidamente extinta. Logo, caberá o redirecionamento da execução para o sócio-gerente.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.371.128-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10/9/2014 (recurso repetitivo) (Info 547).

Execução fiscal Execução fiscal é... - a ação judicial proposta pela Fazenda Pública (União, Estados, DF, Municípios e suas respectivas autarquias e fundações) - para cobrar do devedor - créditos (tributários ou não tributários) - que estão inscritos em dívida ativa. Redirecionamento Quando a Fazenda Pública ajuíza uma execução fiscal contra a “empresa” (rectius: empresário ou sociedade empresária) e não consegue localizar bens penhoráveis, o CTN prevê a possibilidade de o Fisco redirecionar a execução para algumas pessoas físicas que tenham relação com a “empresa” e hajam atuado com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, nos termos do art. 135 do CTN:

Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Os sócios, como regra geral, não respondem pessoalmente (com seu patrimônio pessoal) pelas dívidas da sociedade empresária. Isso porque vigora o princípio da autonomia jurídica da pessoa jurídica em relação aos seus sócios. A pessoa jurídica possui personalidade e patrimônio autônomos, que não se confundem com a personalidade e patrimônio de seus sócios. No entanto, se o sócio praticou atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos (art. 135, III), ele utilizou o instituto da personalidade jurídica de forma fraudulenta ou abusiva, podendo, portanto, ser responsabilizado pessoalmente pelos débitos. Vale ressaltar, no entanto, que o simples fato de a pessoa jurídica estar em débito com o Fisco não autoriza que o sócio pague pela dívida com seu patrimônio pessoal. É necessário que tenha praticado atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos (art. 135, III). Nesse sentido:

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Súmula 430-STJ: O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.

A dissolução irregular da empresa caracteriza infração à lei Uma das situações mais comuns em que ocorre o redirecionamento da execução fiscal é quando a empresa é dissolvida irregularmente. Se isso ocorre, a jurisprudência entende que houve infração à lei (art. 135 do CTN) já que o procedimento para a extinção de sociedades empresárias é disciplinado na lei, devendo ser cumpridas uma série de formalidades, de sorte que se essa dissolução ocorre de forma irregular, a legislação está sendo desrespeitada. Empresa que deixa de funcionar no seu domicílio fiscal e não comunica aos órgãos competentes, presume-se que foi dissolvida irregularmente Domicílio tributário (ou fiscal) é o lugar, cadastrado na repartição tributária, onde o sujeito passivo poderá ser encontrado pelo Fisco. Dessa feita, se a Administração Tributária tiver que enviar uma notificação fiscal para aquele contribuinte, deverá encaminhar para o endereço constante como sendo seu domicílio fiscal. As regras para a definição do domicílio tributário estão previstas no art. 127 do CTN. Se a empresa deixa de funcionar no seu domicílio fiscal, presume-se que ela deixou de existir (foi dissolvida). E o pior: foi dissolvida de forma irregular, o que caracteriza infração à lei e permite o redirecionamento da execução. Assim, por exemplo, em uma execução fiscal, caso não se consiga fazer a citação da empresa porque ela não mais está funcionando no endereço indicado como seu domicílio fiscal, será possível concluir que ela foi dissolvida irregularmente, ensejando o redirecionamento da execução, conforme entendimento sumulado do STJ:

Súmula 435-STJ: Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.

Segundo explica o Min. Mauro Campbell Marques ao comentar a origem da súmula, “o sócio-gerente tem o dever de manter atualizados os registros empresariais e comerciais, em especial quanto à localização da empresa e a sua dissolução. Ocorre aí uma presunção da ocorrência de ilícito. Este ilícito é justamente a não obediência ao rito próprio para a dissolução empresarial (...)” (REsp 1.371.128-RS). Até aqui tudo bem. Agora vamos enfrentar uma grande polêmica que existia sobre o tema: o redirecionamento é permitido apenas nas execuções fiscais que cobrem débitos TRIBUTÁRIOS ou também pode ser aplicado a dívidas NÃO-TRIBUTÁRIAS? O STJ decidiu que, quando a sociedade empresária for dissolvida irregularmente, é possível o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente da pessoa jurídica executada mesmo que se trate de dívida ativa NÃO-TRIBUTÁRIA. Vale ressaltar que, para que seja autorizado esse redirecionamento, não é preciso provar a existência de dolo por parte do sócio. Assim, por exemplo, a Súmula 435 do STJ pode ser aplicada tanto para execução fiscal de dívida ativa tributária como também na cobrança de dívida ativa NÃO-TRIBUTÁRIA. No caso concreto, a ANATEL estava executando créditos não-tributários que eram devidos por uma rádio comunitária. Quando o Oficial de Justiça chegou até o endereço da empresa constatou que ela não mais estava funcionando ali, estando presumidamente extinta. Logo, caberá o redirecionamento da execução para o sócio-gerente. Um dos argumentos utilizados pelos advogados para evitar o redirecionamento era o de que o art. 135 do Código Tributário Nacional não pode ser aplicado para dívidas não-tributárias. Como superar essa alegação?

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A legislação civil e empresarial preveem a possibilidade de que o sócio-gerente da sociedade seja responsabilizado caso tenha havido infração à lei, independentemente da existência de dolo. Segundo apontou o STJ, o suporte dado pelo art. 135, III, do CTN, na esfera tributária é dado pelo art. 10,

do Decreto n. 3.078⁄19 e art. 158, da Lei n. 6.404⁄78 - LSA no âmbito não-tributário, não havendo, em nenhum dos casos, a exigência de dolo. Confira:

Decreto n. 3.078⁄19 Art. 10. Os sócios gerentes ou que derem o nome à firma não respondem pessoalmente pelas obrigações contraídas em nome da sociedade, mas respondem para com esta e para com terceiros solidária e ilimitadamente pelo excesso de mandato e pelos atos praticados com violação do contrato ou da lei.

Lei n. 6.404/78 Art. 158. O administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém, civilmente, pelos prejuízos que causar, quando proceder: I - dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo; II - com violação da lei ou do estatuto.

Como bem pontua o Min. Mauro Campbell, não há como compreender que o mesmo fato jurídico "dissolução irregular" seja considerado ilícito suficiente ao redirecionamento da execução fiscal de débito tributário e não o seja para a execução fiscal de débito não-tributário.

DIREITO PENAL

ESTATUTO DO IDOSO Crime do art. 102

Se o funcionário do banco recebe o cartão e a senha da idosa para auxiliá-la a sacar um dinheiro do caixa eletrônico e, ele, aproveitando a oportunidade, transfere quantias para a sua conta pessoal, tal conduta configura o crime previsto no art. 102 do Estatuto do Idoso.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.358.865-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 4/9/2014 (Info 547).

Imagine a seguinte situação adaptada: João, estagiário de um banco, era o responsável por auxiliar os clientes que tivessem dúvidas sobre como usar os caixas eletrônicos localizados na entrada da agência. Determinado dia uma senhora de 81 anos solicitou a sua ajuda para sacar dinheiro do caixa eletrônico. Como não conseguia realizar a operação sozinha, ela entregou o cartão magnético e forneceu a sua senha pedindo que o estagiário sacasse o valor. João fez o saque e entregou à senhora. No entanto, valendo-se da oportunidade, ele também transferiu 300 reais para a sua conta pessoal. Qual foi o crime praticado por João? O agente cometeu o delito tipificado no art. 102 do Estatuto do Idoso:

Art. 102. Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade: Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa.

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O autor do delito desviou bens da vítima (2ª figura do art. 102). Para a prática dessa conduta, não há necessidade que o agente tenha tido prévia posse dos bens. A prévia posse somente é exigida na 1ª figura do tipo penal (apropriar-se). Quando o agente transferiu os valores da conta bancária da vítima para a sua conta pessoal ele desviou os bens da idosa, dando-lhes aplicação diversa da sua finalidade. Pouco importa qual seria a finalidade que a idosa daria aquele dinheiro. Com certeza essa finalidade não era doar o dinheiro para o agente. Logo, independente de qual fosse o fim a ser empregado, o certo é que o dinheiro foi desviado dessa finalidade, ao ser, por meio de fraude, transferido para a conta do autor. Se a vítima não fosse idosa, qual crime teria sido praticado? Se a vítima não fosse idosa, João teria praticado o crime de furto mediante fraude (art. 155, § 4º, II, do CP). Como você pode ter ficado em dúvida entre furto e estelionato, vejamos as diferenças entre os dois, valendo-se, para a elaboração do quadro abaixo, dos excelentes ensinamentos de Cleber Masson (Direito Penal Esquematizado. Parte Especial. Vol. 2. São Paulo: Método, 2014, p. 369-371):

FURTO MEDIANTE FRAUDE (art. 155, 4º, II) ESTELIONATO (art. 171)

A fraude é utilizada para diminuir a vigilância da vítima (ou de terceiro) sobre o bem, permitindo ou facilitando que o agente faça a subtração.

A fraude é utilizada para colocar a vítima (ou terceiro) em erro, mediante uma falsa percepção da realidade, o que faz com ela entregue espontaneamente o bem ao agente.

O bem é retirado da vítima sem que ela perceba. A fraude é para realizar a subtração.

O bem é entregue ao agente espontaneamente pela própria vítima. Não há subtração.

Essa distinção acima é adotada pelo STJ: (...) No furto qualificado, a fraude tem o escopo de reduzir/burlar a vigilância da vítima para que, em razão dela, não perceba que a coisa lhe está sendo subtraída, enquanto no crime de estelionato a fraude visa induzir a vítima a erro e, assim, entregar o bem, espontaneamente, ao agente. (...) (STJ. 6ª Turma. RHC 21.412/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 06/05/2014). No caso de João, ele se valeu de uma fraude (“vou lhe ajudar”) para diminuir a vigilância da vítima sobre sua conta e assim ele pudesse transferir valores para a sua conta. A idosa não entregou o dinheiro para ele. Logo, não houve estelionato. Atenção: o fato de a senhora ter entregado o cartão para João não faz com que seja estelionato. Isso porque não foi o cartão que ela perdeu. A vantagem patrimonial obtida pelo agente não foi o cartão, mas sim o dinheiro. E o dinheiro não foi entregue espontaneamente, tendo sido subtraído. O mais absurdo disso é que, o Estatuto do Idoso, nesse ponto, acabou deixando os idosos menos protegidos. Isso porque se a pessoa praticar o crime contra alguém maior de 60 anos receberá uma pena menor (art. 102 do EI) do que se tivesse cometido contra uma vítima não idosa (art. 155, § 4º, II, do CP). Vejamos outros exemplos de FURTO MEDIANTE FRAUDE já reconhecidos pela jurisprudência:

Agente “clonou” cartões de crédito e, com isso, conseguiu retirar indevidamente valores pertencentes aos titulares das contas bancárias (STJ. 6ª Turma. RHC 21.412/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 06/05/2014).

Agente usou equipamento coletor de dados (“chupa-cabra”), para copiar os dados bancários relativos aos cartões que fossem inseridos no caixa eletrônico bancário. De posse dos dados obtidos, foi emitido cartão falsificado, posteriormente utilizado para a realização de saques fraudulentos: no caso, o agente se valeu de fraude - clonagem do cartão - para retirar indevidamente valores pertencentes ao

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titular da conta bancária, o que ocorreu, por certo, sem o consentimento da vítima, o Banco. A fraude, de fato, foi usada para burlar o sistema de proteção e de vigilância do Banco sobre os valores mantidos sob sua guarda, configurando o delito de furto mediante fraude (STJ. 5ª Turma. REsp 1412971/PE, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 07/11/2013).

Subtração de valores de conta corrente, mediante transferência ou saque bancários sem o consentimento do correntista (STJ. 3ª Seção. CAt 222/MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 11/05/2011).

Vítima entregou as chaves de seu carro para que o agente, na qualidade de segurança da rua, o estacionasse, não percebendo que o seu veículo estava sendo furtado: a vítima não tinha a intenção de se despojar definitivamente de seu bem, não queria que o veículo saísse da esfera de seu patrimônio, restando, portanto, configurado o furto mediante fraude (STJ. 5ª Turma. HC 217.545/RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 03/12/2013).

“Test drive” falso: trata-se de furto mediante fraude porque a concessionária (vítima) deu a posse do veículo vigiada (precária) (STJ. REsp 672.987-MT, Rel. Min. Jorge Scartezzini, julgado em 26/9/2006).

Por outro lado, vejamos um exemplo de estelionato: (Juiz Federal TRF1 2013 CESPE) Ao sair de uma festa, Celestino entregou o ticket de estacionamento ao manobrista e aguardou a chegada do automóvel. O manobrista, por engano, entregou-lhe outro veículo, muito mais novo e, portanto, mais valioso. Mesmo sabendo que aquele não era o seu automóvel, Celestino o recebeu e o levou consigo. Nessa situação, Celestino não provocou o engano, mas também não o desfez, incorrendo no crime de estelionato. (CERTO)

LEI DE DROGAS Droga transportada em transporte público e causa de aumento do art. 40 da Lei 11.343/2006

O art. 40, III, da Lei de Drogas prevê como causa de aumento de pena o fato de a infração ser cometida em transportes públicos.

Se o agente leva a droga em transporte público, mas não a comercializa dentro do meio de transporte, incidirá essa majorante?

NÃO. A majorante do art. 40, II, da Lei n. 11.343/2006 somente deve ser aplicada nos casos em que ficar demonstrada a comercialização efetiva da droga em seu interior. É a posição majoritária no STF e STJ.

STF. 1ª Turma. HC 122258-MS, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 19/08/2014.

STF. 2ª Turma. HC 120624/MS, Red. p/ o acórdão, Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 3/6/2014 (Info 749).

STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1.295.786-MS, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 18/6/2014 (Info 543).

STJ. 6ª Turma. REsp 1.443.214-MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 22/09/2014.

Se o agente leva a droga em transporte público, mas não a comercializa dentro desse meio de transporte, incidirá a causa de aumento do art. 40, III, da LD?

A Lei de Drogas (Lei n. 11.343/2006), em seu art. 40, traz sete causas de aumento de pena. Veja a hipótese do inciso III, com destaque para a parte grifada:

Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se: III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de

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qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos;

Se o agente leva a droga no transporte público, mas não a oferece nem comercializa para as pessoas que estão dentro desse meio de transporte, incidirá, mesmo assim, a majorante? Ex: João pegou um ônibus carregando uma mochila repleta de droga. Durante o trajeto, não ofereceu droga para ninguém. Quando chegou a seu destino, foi preso em uma blitz de rotina da PM, que descobriu o entorpecente. Responderá pela causa de aumento do inciso III? NÃO. É a posição atual do STF e STJ. A mera utilização de transporte público para o carregamento da droga não leva à aplicação da causa de

aumento do inciso III do art. 40 da Lei n. 11.343/2006. Com base em uma interpretação teleológica, o disposto no art. 40, III, somente pode ser aplicado se houver a comercialização da droga em transporte público, não alcançando a situação de o agente ter sido surpreendido quando trazia consigo droga em ônibus intermunicipal, sem que nele a tivesse vendido. Em outro precedente, o Min. Teori Zawascki afirma que o entendimento do STF é no sentido de que a causa de aumento de pena para o delito de tráfico de droga cometido em transporte público (art. 40, III,

da Lei n. 11.343/2006) somente incidirá quando demonstrada a intenção de o agente praticar a mercancia do entorpecente em seu interior.

LEI DE DROGAS Fundamentação na escolha do percentual de diminuição no caso de semi-imputabilidade

O art. 46 da Lei de Drogas prevê hipótese de semi-imputabilidade do réu. Assim, a pena aplicada pode ser reduzida de 1/3 a 2/3 se o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Se o juiz for aplicar a causa de diminuição em seu grau mínimo (1/3), ele deverá fundamentar a decisão, expondo algum dado, em concreto, que justifique a adoção dessa fração.

STJ. 5ª Turma. HC 167.376-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 23/9/2014 (Info 547).

Semi-imputabilidade

O art. 46 da Lei de Drogas (Lei n. 11.343/2006) estabelece o seguinte:

Art. 46. As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Esse dispositivo prevê uma causa especial de diminuição de pena aplicada quando o juiz entender que o réu não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Trata-se de hipótese da semi-imputabilidade.

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Repare que o artigo afirma que o magistrado poderá reduzir a pena aplicada de 1/3 a 2/3. Segundo decidiu o STJ, se o juiz for aplicar a causa de diminuição em seu grau mínimo (1/3), ele deverá fundamentar a decisão, expondo algum dado, em concreto, que justifique a adoção dessa fração. A diminuição da pena, nessa situação, deve ser avaliada de acordo com o grau de deficiência intelectiva do réu, vale dizer, de sua capacidade de autodeterminação. Quanto mais o juiz entender que o réu não tinha condições de autodeterminar, maior será a redução da pena.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

AÇÃO PENAL PRIVADA Queixa-crime deverá demonstrar o elemento subjetivo do agente

Deve ser rejeitada a queixa-crime que que impute ao querelado a prática de crime contra a honra, mas que se limita a transcrever algumas frases, escritas pelo querelado em sua rede social, segundo as quais o querelante seria um litigante habitual do Poder Judiciário (fato notório, publicado em inúmeros órgãos de imprensa), sem esclarecimentos que possibilitem uma análise do elemento subjetivo da conduta do querelado consistente no intento positivo e deliberado de lesar a honra do ofendido.

STJ. Corte Especial. AP 724-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 20/8/2014 (Info 547).

Pedro ofereceu queixa-crime contra João narrando o seguinte: “No dia, 03/09/2013, o Querelado (João), por meio de sua página no Facebook®, publicou fato ofensivo à honra objetiva do Querelante (Pedro), consistente na seguinte afirmação: ‘existem mais de 90 processos instaurados, 94 títulos protestados e 12 inquéritos criminais abertos por empresários, ex-sócios e outros prejudicados por suas atitudes. Esse Pedro é um dos um dos maiores golpista da internet no país’. Com essa conduta, o Querelado praticou os delitos de calúnia (art. 138 do CP), difamação (art. 139) e injúria (art. 140), devendo por eles ser condenado.” Essa queixa-crime descreveu adequadamente os crimes imputados? Poderá ser recebida? NÃO. Deve ser rejeitada a queixa-crime que se limita a transcrever algumas frases, escritas pelo querelado em sua rede social, segundo as quais o querelante seria um litigante habitual do Poder Judiciário (fato notório, publicado em inúmeros órgãos de imprensa), sem esclarecimentos que possibilitem uma análise do elemento subjetivo da conduta do querelado consistente no intento positivo e deliberado de lesar a honra do ofendido. Segundo decidiu o STJ, nos crimes contra honra, exige-se demonstração do intento positivo e deliberado de lesar a honra alheia. Trata-se do animus injuriandi vel diffamandi. Para se poder inferir que houve realmente a prática de fato criminoso contra a honra, seria indispensável que o querelante tivesse esclarecido qual era a sua relação com o autor, para saber quais os motivos que o levaram a querer (volição) denegrir a sua honra.

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AÇÃO PENAL PRIVADA Consequências da proposta de composição civil feita apenas para parte dos querelados

Se o querelante oferece queixa-crime contra três querelados e propõe a composição civil dos danos apenas para dois deles, isso significa que ele renunciou tacitamente ao direito de ação (art. 104 do CP), devendo essa renúncia ser estendida ao terceiro querelado para quem a proposta não foi feita.

Na ação penal privada, vigora o princípio da indivisibilidade segundo o qual se, houver dois ou mais querelados e o querelante manifestar a sua intenção de não processar uma parte dos envolvidos, essa manifestação se estenderá aos demais. Assim, a renúncia em relação ao direito de processar um dos querelados beneficia todos os envolvidos.

STJ. Corte Especial. AP 724-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 20/8/2014 (Info 547).

Imagine a seguinte situação adaptada: João ofereceu queixa-crime (ação penal privada) contra Pedro, Luís e André. Segundo a peça acusatória, Luís e André, por ordem de Pedro, teriam publicado, na internet, textos ofensivos à reputação de João. No final da queixa-crime, o querelante formulou proposta de composição de danos a dois dos querelados (Luís e André), sob o argumento de que “(...) não gostaria de estar processando os 2º e 3º Querelados, que são meros capatazes do 1º Querelado (...)” e, portanto, “propõe aos 2º e 3º Réus que, como composição dos danos, paguem, cada um, dez computadores novos e completos ao Querelante, que se compromete a doá-los para escolas públicas”.

A composição dos danos está prevista no art. 74 da Lei n. 9.099/95 e, sendo aceita e homologada judicialmente, implica a renúncia ao direito de queixa:

Art. 74. A composição dos danos civis será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado no juízo civil competente. Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação.

Qual é a consequência processual de o querelante ter oferecido a proposta de composição dos danos somente a dois querelados? Para o STJ, isso é motivo para a queixa-crime ser rejeitada em sua integralidade, isto é, em relação a todos os querelados. Segundo decidiu a Corte, o querelante ao oferecer a composição civil dos danos renunciou tacitamente ao direito de ação, nos termos do art. 104 do CP:

Art. 104. O direito de queixa não pode ser exercido quando renunciado expressa ou tacitamente. Parágrafo único. Importa renúncia tácita ao direito de queixa a prática de ato incompatível com a vontade de exercê-lo; não a implica, todavia, o fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime.

A renúncia, expressa ou tácita, é causa de extinção da punibilidade, sendo irretratável (art. 107, V, CP).

Na ação penal privada, vigora o princípio da indivisibilidade segundo o qual se, houver dois ou mais querelados e o querelante manifestar a sua intenção de não processar uma parte dos envolvidos, essa manifestação se estenderá aos demais. Assim, a renúncia em relação ao direito de processar um dos querelados beneficia todos os envolvidos. Isso está previsto no CPP:

Art. 48. A queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua indivisibilidade. Art. 49. A renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a todos se estenderá.

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Informativo 547-STJ (08/10/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 36

PROVA TESTEMUNHAL Intimação da autoridade para prestar declarações

Importante!!!

O art. 221 do CPP prevê que determinadas autoridades, quando forem chamadas para servirem como testemunhas, serão ouvidas em local, dia e hora previamente ajustados entre eles e o juiz.

Essa garantia do art. 221 NÃO é aplicada quando a autoridade é convocada para ser ouvida na condição de investigado ou de acusado.

STJ. 5ª Turma. HC 250.970-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 23/9/2014 (Info 547).

Autoridades ouvidas como testemunhas O CPP prevê uma prerrogativa para autoridades que são convocadas para servirem como testemunhas. Elas têm direito de escolher o dia e hora em que irão depor. Confira o dispositivo legal:

Art. 221. O Presidente e o Vice-Presidente da República, os senadores e deputados federais, os ministros de Estado, os governadores de Estados e Territórios, os secretários de Estado, os prefeitos do Distrito Federal e dos Municípios, os deputados às Assembléias Legislativas Estaduais, os membros do Poder Judiciário, os ministros e juízes dos Tribunais de Contas da União, dos Estados, do Distrito Federal, bem como os do Tribunal Marítimo serão inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados entre eles e o juiz.

Essa garantia do art. 221 também é aplicada quando a autoridade é convocada para ser ouvida na condição de investigado ou de acusado? NÃO. As autoridades com prerrogativa de foro previstas no art. 221 do CPP, quando figurarem na condição de investigados no inquérito policial ou de acusados na ação penal, não têm o direito de serem inquiridas em local, dia e hora previamente ajustados com a autoridade policial ou com o juiz. Isso porque não há previsão legal que assegure essa prerrogativa processual, tendo em vista que o art. 221 do CPP se restringe às hipóteses em que as autoridades nele elencadas participem do processo na qualidade de testemunhas, e não como investigados ou acusados.

Veja que esse tema já havia sido cobrado em prova: (Juiz TJ/ES 2012 CESPE) A prerrogativa de os parlamentares federais poderem ser inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados entre eles e o juiz criminal prevalece, ainda que eles figurem, no processo penal, como indiciados ou réus. (ERRADO)

RECURSOS MS para atribuição de efeito suspensivo a RESE

Se o juiz rejeita a denúncia, o MP poderá interpor RESE que é um recurso que não tem, em regra, efeito suspensivo.

Não é possível que o MP interponha MS pedindo que seja concedida liminar no writ para se atribuir efeito suspensivo ativo a RESE, sobretudo sem a prévia oitiva do réu.

A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, em regra, não cabe mandado de segurança para conferir efeito suspensivo a determinado recurso que não o possui.

Em situações teratológicas, abusivas e que possam gerar dano irreparável à parte, até se admite, excepcionalmente, a impetração de mandado de segurança contra ato judicial para atribuir-lhe efeito suspensivo. No entanto, tratando-se de não recebimento de denúncia, nem sequer em hipóteses de teratologia seria permitida a realização do ato em outra relação processual.

STJ. 6ª Turma. HC 296.848-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 16/9/2014 (Info 547).

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Informativo 547-STJ (08/10/2014) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 37

Imagine a seguinte situação adaptada: O Ministério Público ajuizou ação penal contra João, tendo a denúncia sido rejeitada pelo juiz. Contra a rejeição da inicial acusatória, o Promotor interpôs recurso em sentido estrito (art. 581, I, do CPP). Em seguida, impetrou um mandado de segurança no Tribunal de Justiça, requerendo, liminarmente, o imediato recebimento da denúncia. O Desembargador Relator concedeu a liminar no MS e determinou ao magistrado que recebesse a denúncia e desse prosseguimento ao feito. O réu impetrou habeas corpus no STJ contra a decisão liminar do Desembargador alegando que não caberia MS no presente caso.

O STJ concordou com o réu? SIM. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, em regra, não cabe mandado de segurança para conferir efeito suspensivo a determinado recurso que não o possui. Em situações teratológicas, abusivas e que possam gerar dano irreparável à parte, até se admite, excepcionalmente, a impetração de mandado de segurança contra ato judicial para atribuir-lhe efeito suspensivo. No entanto, tratando-se de não recebimento de denúncia, nem sequer em hipóteses de teratologia seria permitida a realização do ato em outra relação processual. Em homenagem ao princípio do devido processo legal, o recebimento da denúncia deve ocorrer, necessariamente, nos autos da ação penal instaurada para apurar a prática do suposto ato criminoso. Ressalte-se, ainda, que o recebimento da denúncia, nessas circunstâncias, ou seja, por meio de liminar em MS, causaria um enorme tumulto processual, porque, ao mesmo tempo em que nos autos da ação principal há uma decisão de rejeição da denúncia (pendente de julgamento do recurso cabível), em razão de liminar concedida em outra relação processual, qual seja, um mandado de segurança, há o recebimento da inicial acusatória. O tumulto processual é tão grande que a parte ré, beneficiada pela rejeição da denúncia (em decisão ainda não modificada dentro da própria ação penal), por meio de uma liminar proferida em mandado de segurança, se vê obrigada a, nos autos da ação principal, apresentar resposta à acusação, em primeira instância, e contrarrazões ao recurso em sentido estrito, em segunda instância, além de ter de se manifestar no mandado de segurança, que é uma relação processual autônoma. Em suma, não cabe, na análise de pedido liminar de mandado de segurança, atribuir efeito suspensivo ativo a recurso em sentido estrito interposto contra a rejeição de denúncia, sobretudo sem a prévia oitiva do réu.

EXERCÍCIOS

Julgue os itens a seguir: 1) (Cartório TJPE 2013 FCC) Na execução fiscal, o inadimplemento de obrigação tributária pela sociedade gera, por si

só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente. ( ) 2) (Juiz TJPA 2012 CESPE) O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade gera, por si só, a

responsabilidade solidária do sócio-gerente. ( ) 3) (Juiz TJSP 2014 VUNESP) É de se presumir que determinada empresa foi dissolvida irregularmente quando deixa

de funcionar naquele que é o seu domicílio fiscal conhecido, omitindo-se no dever de efetuar a comunicação da mudança aos órgãos competentes, o que pode ocasionar o redirecionamento da ação de execução fiscal. ( )

4) (DP/DF 2013 CESPE) De acordo com o STJ, a não localização de determinada sociedade no domicílio fiscal fornecido gera presunção iuris tantum de dissolução irregular, sendo possível, nesse caso, o redirecionamento da execução fiscal ao sócio-gerente da sociedade. ( )

5) (Juiz Federal TRF1 2013 CESPE) Ao sair de uma festa, Celestino entregou o ticket de estacionamento ao manobrista e aguardou a chegada do automóvel. O manobrista, por engano, entregou-lhe outro veículo, muito mais novo e, portanto, mais valioso. Mesmo sabendo que aquele não era o seu automóvel, Celestino o recebeu e o levou consigo. Nessa situação, Celestino não provocou o engano, mas também não o desfez, incorrendo no crime de estelionato. ( )

Gabarito

1. E 2. E 3. C 4. C 5. C