inclusão digital na medida

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Livro com o resultado da sistematização da consultoria em Inclusão Digital no Programa Pró-menino.

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MediDana

digitalInclusão

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Inclusão digital na medida / Comitê para Democratização da Informática. São Paulo : Fundação Telefônica, 2007.

120p.

1. Inclusão digital 2, Crianças e adolescentes I. Título

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MediDana

digitalInclusão

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Iniciativa Fundação Telefônica

Antonio Carlos ValentePresidente do Grupo Telefônica no BrasilPresidente do Conselho CuradorSérgio MindlinDiretor PresidenteMaria Gabriella BighettiGerente de ProjetosMaria Cristina Bôa NovaCoordenadora de Projetos e Coordenadora daPublicação

Consultoria em Inclusão Digital no Pró-Menino

Rodrigo AlvarezCoordenação GeralFátima Oliveira Coordenação PedagógicaPaula TakadaGestão do Projeto e Coordenação da PublicaçãoRaquel QuintinoCoordenação de Projetos SociaisKalu Newton ScrivanoAssistência PedagógicaGisele Santos, Laura Fuser, Luis Melo, Suelen Faria Gestão de Escolas de Informática e CidadaniaNoely Souza Assistente administrativo-financeiroConselho EditorialCristiane Fornazier Coordenadora Pedagógica da Rede CDIMayara Regina Romualdo Eduardo Jovem-monitora do Núcleo de Inclusão Digital daAJAES Leonel Castro Cabral Educador da Escola de Informática e Cidadania, doComec, Campinas.Gabriela Pluciennik Coordenadora de parcerias do portal Pró-Menino(Ceats)Mílada Tonarelli Gonçalves Coordenadora editorial da coleção “EducaRede:Internet na escola” (Cenpec)Roberto Giansanti Coordenador do programa Educação de Jovens eAdultos e autor de livros didáticos, da Ação Educativa

Estúdio GirassolBeth Kok Esperanza Martin SobralProjeto Gráfico e Produção EditorialEliana AtihéRevisão de Texto e Editorial

Risco StudioIlustrações

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8 Inclusão Digital na Medida

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Inclusão Digital na Medida 9

Apresentação

Promover o desenvolvimento social por meio da educação e da defesa dos direi-tos de crianças e adolescentes, privilegiando o uso das tecnologias de informação e comu-nicação, é o objetivo da Fundação Telefônica. Seus dois principais programas, o Pró-Menino e o EducaRede, alinhados às iniciativas do Grupo Telefônica nos países emque opera, trabalham para que cada criança seja entendida e beneficiada como um ser integral.

O Programa EducaRede (www.educarede.org.br) contribui para a qualificação doensino público, oferecendo conteúdos, ferramentas e espaços de troca de experiênciaspara alunos e professores de todo o Brasil. As ações do Programa Pró-Menino estão essen-cialmente voltadas à promoção e defesa dos direitos de crianças e adolescentes, tendocomo temas o combate ao trabalho infantil, o jovem em conflito com a lei em cumpri-mento de medidas sócio-educativas em meio aberto, a formação de redes de atenção àcriança e ao adolescente e o desenvolvimento de um portal, o www.promenino.org.br.

Na linha Jovens em Conflito com a Lei, do Pró-Menino, mais de dois mil adolescen-tes já foram beneficiados pelos 21 projetos apoiados pela Fundação Telefônica. A partir de2004, a orientação para o uso das tecnologias da informação e comunicação foi potencia-lizada com a bem sucedida parceria realizada com o Comitê para Democratização daInformática – CDI. De forma coerente com a vocação de ambas as instituições, impôs-se odesafio de estimular e descobrir, junto com os educadores dos núcleos de informática eseus sócio-educandos, alguns caminhos criativos para a superação do uso elementar,estereotipado ou desordenado do computador. Durante mais de dois anos, o CDI desen-volveu um processo de conhecimento sobre o uso do computador e tecnologias agrega-das como ferramentas pedagógicas inclusivas e emancipadoras. “Inclusão digital namedida” é o resultado dessa experiência.

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10 Inclusão Digital na Medida

As práticas desenvolvidas e descritas neste caderno podem ser reproduzidas emqualquer instituição comprometida com a promoção dos direitos de crianças e adolescen-tes que desejem fazer do computador um estímulo para criar novas leituras de mundo enovas formas de intervenção nele. Já sabemos que o acesso à tecnologia é fundamental,mas não basta. É preciso colocar as tecnologias da comunicação e informação a serviçodos seres humanos, da qualidade de vida e do empoderamento cidadão. Esta publicaçãooferece uma proposta prática e bem refletida para isso.

Desejamos que a inspiração aqui contida contribua para a descoberta de novosconhecimentos e novas potencialidades para a intervenção na realidade.

Sérgio MindlinDiretor-Presidente da Fundação Telefônica

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Inclusão Digital na Medida 11

Jovens em conflito com a lei são jovens. E, como jovens, adoram tecnologia. Geraçãodigital, eles quase não conhecem discos de vinil, TV em preto e branco e aqueles gigantes-cos computadores com letra verde. Vieram ao mundo escutando MP3, enviando torpedospelo celular, jogando games em lan houses e participando de comunidades virtuais.

Mas quem é que os ensina a usar as ferramentas da sociedade da informação? Quemos orienta a utilizá-las de forma saudável e produtiva, para que transformem suas vidas eajudem o mundo a mudar? Grande parte das escolas públicas ainda não possui laboratóriode informática ou faz uso inadequado dele, sem aproveitar toda a riqueza de possibilidadesoferecidas. Como dizia Paulo Freire, mestre em educação popular, não são as técnicas queconstroem uma nova realidade, são os homens, orientados à reflexão e estimulados a agir,que reescrevem a História.

Amparadas numa proposta pedagógica, as modernas tecnologias reinventam o dia-a-dia e até o processo de aprendizagem. Em geral, são os educandos que fazem proezas dianteda tela de um computador, e não seus professores. De onde vem tanta intimidade com o uni-verso virtual? Como explicar tamanha integração? Tanto fôlego? Essa lógica às avessas, à luzdos ensinamentos de Paulo Freire, faz uma leitura absolutamente inovadora das relações emsala de aula: todos têm tanto a ensinar quanto a aprender. A educação é uma via de mão dupla.

A parceria do CDI com a Fundação Telefônica nasceu para levar essas idéias aos pro-jetos de informática dirigidos a jovens em conflito com a lei. Até então, esses projetostinham um viés tradicional, com base no conhecido sistema operacional Windows e nopacote Office. Quando muito, o conteúdo abrangia Internet, mas, por vezes, limitava-seapenas a cursos de digitação. Com a mediação do CDI, educandos e educadores do projetopassaram a ter peso decisivo no desenho das aulas e a estabelecer seus próprios vínculoscom a tecnologia.

O clique da tecnologia

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12 Inclusão Digital na Medida

O resultado de tudo isso poderá ser apreciado neste trabalho, dedicado especial-mente aos educadores que nos ajudam a promover revoluções moleculares através dainformática. À Fundação Telefônica, nossas homenagens por ter apostado numa iniciati-va que abre as portas para a criatividade, para a interação das mídias e, sobretudo, parafantásticas experiências a partir de um clique.

Rodrigo Baggio – Coordenador do CDIRodrigo Alvarez – Coordenador do CDI São Paulo

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Sumário

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Prefácio 17

1. Consultoria do CDI no Pró-Menino 22

2. A metodologia na prática 30Passo-a-passo da metodologia 33

1º passo: Leitura de mundo 40 2º passo: Problematização 44

3º passo: Plano de ação 50 4º passo: Execução da ação 56

5º passo: Avaliação 60 Nova leitura de mundo 62

3. Estratégias e caixa de ferramentas 64

4. Reflexões sobre a prática 88

Para saber mais 103

Bibliografia 117

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16 Inclusão Digital na Medida

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Inclusão Digital na Medida 17

A inclusão digital é freqüentemente encarada como uma prática da esfera tecnoló-gica, capaz de equipar o ser humano para aceitar os imensos desafios da era digital. Ogrande diferencial do CDI é transformar esse cenário, dando um salto qualitativo no sen-tido de articular toda essa modernidade tecnológica com a modernidade pedagógica, ouseja, com uma visão transformadora e crítica da realidade cultural, social, política e eco-nômica dos usuários da tecnologia a quem ela é destinada. O nome disso – todos sabe-mos muito bem – é cidadania.

Paulo Freire, ao longo de toda a sua obra extraordinária e seminal, refletiu ampla e profundamente sobre os fins e os meios da ação educativa. Não nos deixou, contudo,em seu legado, um ferramental mais básico de métodos e técnicas que permitissem a transposição de toda essa riqueza para o cotidiano dos educadores na ação social de base.

O CDI abraçou essa causa e decidiu articular tecnologia e pedagogia em favor daeducação para a cidadania. Assim, inclusão digital e social tornaram-se duas faces damesma moeda: a moeda da transformação pedagógica a serviço da eqüidade social, dalibertação cultural, da promoção e emancipação econômica e social.

A inclusão digital, quando ligada à aplicação das medidas sócio-educativas emmeio aberto, dá-nos a dimensão do esforço que vem sendo realizado pelo CDI. No atualcontexto brasileiro, trabalhar com jovens em conflito com a lei é um desafio para poucose fazê-lo de forma emancipadora, sensibilizadora e conscientizadora vem acrescentarmais valor a essa linha de atuação. Sempre costumo dizer que estamos diante de adoles-centes que cometeram ato infracional, e não de infratores que, por acaso, são adolescen-tes. Portanto, tudo de bom que serve para trabalhar com adolescentes serve para traba-lhar com adolescentes que cometeram infração.

Prefácio

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A consultoria do CDI no PRÓ-MENINO, da Fundação Telefônica, é o exemplo de umaaliança social estratégica, que amplia os limites do possível, quando se trata de incluir, nosentido mais amplo do termo, nossos adolescentes e jovens em estado de maior vulnera-bilidade pessoal e social.

A etapa mais importante deste livro é o Capítulo 2, onde os educadores sociais debase encontrarão, com fundamento numa visão paulofreiriana do homem, do mundo e doconhecimento, uma série de métodos, estratégias e ferramentas que lhes permitirãointerferir, de forma articulada e conseqüente, na realidade em que atuam.

O zelo com que este material foi construído e a forma como se pretende disponibi-lizá-lo, em aliança estratégica com o CDI, atesta a seriedade e a profundidade do compro-misso da Fundação Telefônica. Muitas organizações têm trabalhado alguns aspectos,digamos, menos complexos do ECA. A Fundação tem colocado o dedo nos pontos maisdoloridos e problemáticos da implementação do novo direito.

Este trabalho permite ao educador e ao educando, reunidos numa relação dialógi-ca, aprender, compreender, significar, projetar, criticar e atuar transformadoramente sobrea realidade em que vivem, tendo na inclusão digital um suporte tecnológico da imagi-nação, do pensamento crítico e da ação transformadora.

A cidadania não é uma enteléquia. A cidadania é, antes de tudo, um exercício dodia-a-dia do trabalho social e educativo. A idéia de cidadania está vinculada ao protago-nismo consciente, praticado desde as bases de nossa sociedade. Lá, onde o CDI e seus par-ceiros realizam sua verdadeira ação transformadora.

Belo Horizonte, setembro 2007.Antonio Carlos Gomes da Costa

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Kika tem 18 anos e há dois anos cumpriu a medida sócio-educativa de Liberdade Assistida na entidade onde hoje é educadora de Inclusão digital.

Ivan tem 23 anos e toda a sua história está contada no livro “As histórias de Ana e Ivan – boas experiências em Liberdade Assistida”, de Maria de LourdesTrassi. Aliás, esta é uma das melhores indicações para quem quer saber mais sobre o trabalho de orientação de Liberdade Assistida.

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Inclusão Digital na Medida 21

Nossa, Ivan, achoque encontrei o livro

que a gente estavaprocurando!

Será, Kika?Só lendo prasaber…

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1capítulo

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consuLToriaCDido

Pró-MeninoNo

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Inclusão digital de adolescentes em medidas sócio-educativas em meio aberto

m dezembro de 2004, o CDI foiselecionado pela Fundação Telefô-nica para assessorar o trabalho de

Inclusão Digital das entidades apoiadas peloPrograma Pró-Menino, na linha Jovens emConflito com a Lei. Na época, o programa cha-mava-se Medida Legal e o grupo foi formadopor cinco entidades que realizam atendimentode adolescentes em medidas sócio-educativasem meio aberto:

• Associação Jandirense de Apoio às Enti-dades Sociais (AJAES), com o projeto “Umnovo olhar para o adolescente”, de Jandira;• Centro de Orientação ao Adolescente de Campinas (COMEC), com o projeto“Desafios”;• Associação Brasileira de Defesa da Mulher,da Infância e da Juventude (ASBRAD), com o“Projeto Gaia”, de Guarulhos;

• Secretaria de Ação Social e Cidadania daPrefeitura Municipal do Guarujá, com o pro-jeto “Medida Legal – inclusão digital” e • Associação Cubatense de Capacitaçãopara o Exercício da Cidadania (ACCEC), com oprojeto “Jovem cidadão” de Cubatão.

O objetivo do CDI era apoiar as cincoentidades em seus projetos, orientando a ins-talação dos Núcleos de Inclusão Digital ecapacitando educadores e adolescentes a tra-balharem com as tecnologias de informação ecomunicação. O desafio proposto era desen-volver, de forma participativa, um modelo degestão desses núcleos e uma metodologia detrabalho de inclusão digital, ambos voltadospara o uso da tecnologia como ferramentapara o desenvolvimento da cidadania, priori-zando o protagonismo social.

Começamos apresentando as propos-tas às cinco organizações. Em seguida, inicia-

E

Inclusão Digital na Medida 25

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26 Inclusão Digital na Medida

mos o trabalho de formação dos educadorese adolescentes na leitura de mundo, com atividades presenciais em cada um dosmunicípios. Nesse momento, pudemosconhecer melhor as pessoas envolvidas naparceria, ao mesmo tempo em que elas tam-bém se conheciam. Posteriormente, utilizan-do jogos, identificamos junto com os adoles-centes seus temas geradores. Com a partici-pação de 123 jovens, os temas que aparece-ram com mais força estavam relacionados àfalta de oportunidade para a juventude.

Na fase seguinte, educadores e adoles-centes foram capacitados em pesquisa efotografia durante um encontro de trêsdias, em Cajamar, que reuniu representan-tes das cinco entidades. A idéia era que elesse apropriassem desses instrumentos parainvestigar a questão levantada: a falta deoportunidade para os jovens em cada umadas cidades. Os adolescentes e educadoresconstruíram o questionário de pesquisa,realizaram a pesquisa de campo e tabula-ram os resultados. Em todas as fases, a tecnologia foi naturalmente inserida noprocesso, com o uso de câmeras fotográfi-cas digitais, banco de dados on line, plani-lhas eletrônicas, a construção de blogs e defotoblogs para divulgação do processo depesquisa.

Com o resultado em mãos, passamos àetapa seguinte: a discussão e a análise dosdados. Num segundo encontro de três dias,optamos pela experimentação de outraslinguagens: o rádio e o vídeo. Assim educa-dores e adolescentes criaram um programade rádio e outro de TV, para transmitir osresultados de suas pesquisas. Com os dadosem mãos, a etapa posterior foi planejar ouso dos núcleos de inclusão digital. Reuni-dos por cidades, os grupos esboçaram seusplanos de ação, que foram aprofundadosem cada localidade, juntamente com aassessoria da equipe do CDI.

Os planos de ação priorizaram o traba-lho de comunicação, dando voz aos adoles-centes. Nesse contexto, surgiram as deman-das por capacitação técnica em áudio, vídeoe webdesign, que aconteceram nos mesesseguintes e marcaram a conclusão dos tra-balhos do primeiro ano da parceria, emfevereiro de 2006.

Em agosto de 2006 – após um períodode acertos e renovação da parceria entre aFundação Telefônica, o CDI e as entidades –reiniciamos o trabalho da consultoria, foca-da em dois eixos:

1. Fortalecimento da atuação dos educa-dores dos núcleos de inclusão digital, sem

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Inclusão Digital na Medida 27

perder de vista a vertente do protagonismodos adolescentes, construída no primeiroano da consultoria.2. Sistematização das experiências, jun-tamente com os envolvidos no processo(educadores, educandos e coordenadoresdas entidades), de forma a gerar um mate-rial de apoio para educadores de espaçosde inclusão digital.

Nesse segundo momento da assessoria,o grupo sofreu algumas mudanças. A ObraSocial São João Bosco, de Campinas, e aEscola de Informática e Cidadania (EIC) PadreMoreira, de São Paulo, passaram a integrar oprojeto. Além disso, alguns adolescentes queparticiparam da formação anterior foramcontratados pelas organizações para atuarcomo monitores de Inclusão Digital.

Assim, a partir do segundo semestrede 2006, realizamos três Encontros de Trocae Sistematização, quadrimestrais, mesclan-do momentos de planejamento, capacita-ção técnica e metodológica, e sistematiza-ção. Entre esses momentos, realizávamosum acompanhamento presencial, com visi-tas mensais a cada entidade, para apoiá-laem suas demandas específicas.

A sistematização de nossas experiên-cias exigia uma metodologia que dialogas-se com o trabalho de educação popular. Foi

partindo desse princípio que buscamosuma referência que nos auxiliasse nessaempreitada. Preparamo-nos para isso comuma das maiores autoridades em sistemati-zação, Oscar Jara, sociólogo peruano queatua com educação popular desde 1968 ecoordena o Programa Latino-Americano deApoio à Sistematização de Experiências doCEAAL – Conselho de Educação de Adultosda América Latina.

O contato com Jara resultou numacapacitação que não apenas nos preparou,mas também nos ofereceu a oportunidadepara executar o trabalho na dimensão queimaginávamos, ou seja, no contato comuma ferramenta para aperfeiçoar, enrique-cer e transformar a prática dos projetos.

Depois do trabalho interno com nossaequipe, planejamos e desenvolvemos o I En-contro de Troca e Sistematização, em outubrode 2006, com educadores e adolescentes dasentidades. Iniciamos a sistematização, defi-nindo, com o grupo, as questões iniciais.

O que queremos sistematizar?

O trabalho do Núcleo de InclusãoDigital. Não apenas as atividades técnicas,com as ferramentas, mas também os conteú-dos e, sobretudo, a metodologia de trabalho.

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Para que sistematizar?Para aprender e aprimorar o que faze-

mos; para construir e compartilhar umametodologia com outras pessoas; para terum material pedagógico que não será umaapostila técnica, padronizadora.

No II Encontro de Troca e Sistematiza-ção, em janeiro de 2007, fizemos um exercí-cio de reconstituição histórica dos momen-tos metodológicos vivenciados desde o iní-cio da parceria. Esse exercício foi fundamen-tal para partilhar, com os novos integrantes,o repertório de conhecimento já acumuladopelo grupo. Começávamos então a aprendercom nossas próprias experiências.

Em abril de 2007, no III Encontro, o focovoltou-se para a análise crítica dos nossostrabalhos. Sempre partindo das experiên-cias práticas e tendo como referencial oconceito de Inclusão Digital construídocoletivamente, elaboramos uma lista deaprendizagens, recomendações e novosquestionamentos.

Os registros das atividades realizadasnos encontros, juntamente com os registros

do acompanhamento que o CDI fez durantetoda a consultoria, formaram o grande mate-rial bruto dessa sistematização. Chegamosassim à última etapa do processo: a comuni-cação dessa experiência sistematizada, isto é,a produção desta publicação.

Nas próximas páginas, você vai encon-trar Inclusão Digital na Medida, um guiaconstruído a partir da reflexão coletivasobre uma experiência: a aplicação dametodologia do CDI à prática das entidadesque trabalham com medidas sócio-educati-vas em meio aberto.

É uma história da nossa experiência,contada a partir dos conceitos de nossametodologia, mostrando como a práticaacontece, ou seja, o que fazemos, por quefazemos e como fazemos. Mostraremostambém uma seção com sugestões deestratégias e ferramentas para desenvolveros momentos paulofreireanos deste traba-lho de inclusão digital. Esperamos que estaexperiência contribua para inspirar e forta-lecer outras iniciativas tão importantesquanto a que nosso grupo viveu.

28 Inclusão Digital na Medida

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Inclusão Digital na Medida 29

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capítulo2

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MeToDo-

naprática

A

lOgia

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Inclusão Digital na Medida 33

uito mais do que disponibilizar oacesso a computadores conecta-dos à Internet, a inclusão digital

também pressupõe sensibilizar para a reali-dade, estimular a reflexão sobre essa reali-dade e a visão das oportunidades que elaoferece e encaminhar para a conquista da cidadania. As tecnologias de informa-ção e comunicação podem mudar um con-texto de exclusão. Por meio delas, as pes-soas se apropriam da informática, dosrecursos multimídia (texto, imagem, áudio evídeo) e da Internet, e se transformam emprotagonistas de ações transformadorasem suas vidas e na vida de suas comunida-des. Fazer inclusão digital é utilizar a tecno-logia como instrumento de inclusão cultu-ral e social, contribuindo para diminuir asinjustiças e as desigualdades, promovendo a cidadania crítica e o desenvolvimento local.

Parece até simples. Mas... como fazer aInclusão Digital? De que jeito realizar umtrabalho ousado como este?

Quando nos preocupamos com as res-postas para essas perguntas, estamos bus-cando uma metodologia para esse trabalho.Isso é extremamente importante, pois não éfazendo qualquer uso da tecnologia queconseguimos transformar a realidade, jáque queremos que as pessoas que a utili-zam tornem-se sujeitos da própria história.

Então que jeito é esse?É um jeito da educação popular, jeito que

Paulo Freire – um dos maiores pensadoresmodernos da educação – e seus seguidoresvêm desenvolvendo desde o século passado. Éum jeito de educar que se compromete com aconstrução de conhecimentos a partir da açãopolítica dos cidadãos, uma educação que dese-

Passo-a-passo da metodologia de Inclusão Digital

M

cidadaniaPara muitos, o cidadãoseria aquele que vota. Mas o voto, apesar de serum direito do cidadão, nãoé o que o define como tal.Cidadão é a pessoa capazde criar e de transformar,com os outros, a ordemsocial, sujeito esse a quem cabe cumprir e proteger as leis que elemesmo ajudou a criar. (José Bernardo Toro)

protagonistaA palavra protagonismo éformada por duas raízesgregas: proto, que signifi-ca "o primeiro, o princi-pal"; agon, que significa"luta". Agonistes, por suavez, significa "lutador".Protagonista quer dizer,então, lutador principal,personagem principal, atorprincipal. (Antonio CarlosGomes da Costa)

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Inclusão Digital na Medida

ja criar condições para que as pessoas com-preendam e superem situações de exclusão eopressão, transformando também – paramelhor – a realidade de sua comunidade.

A novidade é que, para alcançar esseresultado, a metodologia de Inclusão Digitalexplorada nesta experiência vai inserir oaprendizado e o uso crítico do potencial deinformação e de comunicação que têm astecnologias.

Desse modo, a visão transformadorade Paulo Freire auxilia o encontro da educa-

ção com as tecnologias da informação ecomunicação, orientando nossa proposta deinclusão digital em seus momentos-chave.

Em todos esses momentos, o gruporegistra, avalia e sistematiza os passosdados, produzindo um material de comuni-cação que pode ser aproveitado nos desdo-bramentos dessa ação ou na orientação denovas ações. Promove, assim, uma interven-ção na realidade, empregando as tecnolo-gias de informação e comunicação em cadauma das etapas realizadas.

Leitura de mundo

Educadores e educandos

atiçam a sensibilidade e

usam as tecnologias

disponíveis para

conhecer melhor a

realidade e a comunida-

de em que vivem.

1ºpassoProblematização

Conhecendo melhor essa

realidade, eles passam a

identificar e analisar os

problemas, suas causas e as

oportunidades de atuação.

2ºpasso

Page 35: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 35

Plano de AçãoEducadores e educandos

elaboram um plano para

resolver um ou mais

problemas (ou parte deles).

3ºpassoExecução da Ação

Com tudo planejado, todos

partem para a ação.

4ºpassoAvaliação

É o momento de refletir

sobre a intervenção

realizada e sobre a

apropriação das tecnologias,

ao longo do processo

de Inclusão Digital.

5ºpasso

Nova Leitura de Mundo

...

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36 Inclusão Digital na Medida

RealVídeo-ação “Liberdade Assistida e Escola:uma relação possível”

Na Escola de Informáticae Cidadania (EIC) Padre

Moreira, na zona leste deSão Paulo, um grupo

de oito jovens realizouuma intervenção cultural

e social, utilizando diferentes tecnologias

com ênfase no vídeo.Mediado por um

educador, o trabalho dogrupo passou pelos

momentos da metodologia de Inclusão

Digital.

Leitura de mundo: O educador organizouuma roda de conversa para que os jovens seconhecessem melhor e identificassem proble-mas comuns. O grupo, composto por adoles-centes em medida sócio-educativa de liberda-de assistida, descobriu que todos tinham pro-blemas relacionados à escola. Uns não conse-guiam nem se matricular. Já os matriculadoslidavam diariamente com manifestações depreconceito, tanto por parte de colegas comopor parte de alguns professores.Problematização: Para entender melhoresse cenário, o grupo resolveu fazer umapesquisa com todos os jovens que freqüen-tavam a entidade. No editor de texto, elabo-raram um pequeno questionário com per-guntas como:• Você está estudando?• Se não está, por que não está? Pretendevoltar a estudar?

• Se está, como é seu dia-a-dia na escola?Você sofre algum tipo de discriminação porestar em liberdade assistida?

O grupo conseguiu entrevistar aproxi-madamente 40 adolescentes. Os resultadosforam organizados e socializados por meiode uma apresentação de slides, que foiimpressa e afixada nos murais da entidadeonde fica a EIC Padre Moreira.

Alguns dados chamaram mais a aten-ção do grupo, como por exemplo, o fato demais de 60% dos entrevistados não estaremna escola. A maioria não havia conseguidouma vaga. Outros, mesmo matriculados,desistiram de freqüentar as aulas por nãoacompanharem o que o professor estavaensinando ou por se sentirem discriminados.Plano de ação: Como reverter essa situa-ção? Para começar a transformar a realidaderevelada, o grupo percebeu que precisava

nA

Page 37: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 37

criar um canal de diálogo com a escola.Planejaram, então, um debate, com a parti-cipação de gestores e professores das esco-las da região, familiares, adolescentes eorientadores de medidas sócio-educativas.

Outro objetivo era produzir um vídeo pa-ra registrar o debate. Para isso, identificou-se,no plano de ação, a necessidade de o grupoparticipar de capacitações técnicas específi-cas sobre a linguagem audiovisual.Execução da ação: Para mobilizar as pes-soas para o debate, o grupo usou o e-mail,convites personalizados e cartazes. No dia,local e horários marcados, o debate aconte-ceu. Compareceram gestores e professores detrês escolas, quatro familiares, dezoito adoles-centes e quatro orientadores de medidasócio-educativa. Diante dos resultados dapesquisa, um dos gestores apontou quepreservava a identidade dos adolescentes emmedida sócio-educativa de liberdade assisti-da. Justificou, assim, que o preconceito come-çava com esses adolescentes, que faziamquestão de utilizar a situação para se impornas salas de aula. Um dos professores levan-tou a questão da falta de preparo profissional

para lidar com a inclusão de um modo geral,seja de alunos cumprindo medidas sócio-edu-cativas, seja de pessoas com deficiência etc.Um jovem do grupo da EIC mediou o debate.Outros se encarregaram de filmar e fotogra-far as discussões.Avaliação: Na opinião do grupo, o fato deestarem mediando e filmando as discussõesatrapalhou a participação dos jovens nacondição de debatedores. A diversidade dosequipamentos utilizados (filmadoras analó-gica e digital) e a falta de familiaridade comos diferentes editores de vídeo prolongarama finalização do trabalho. Em contrapartida,a superação dessas dificuldades gerouaprendizados para todos os envolvidos naprodução. Os resultados foram satisfatórios,pois os gestores mostraram-se disponíveispara continuar dialogando sobre a questão.Um dos professores e outros jovens interes-saram-se em colaborar com novas ações. Ogrupo pretende exibir o vídeo em outrasescolas da região e para representantes dopoder público. (O vídeo “Liberdade Assisti-da e Escola: uma relação possível” está no CD-Rom que acompanha esta publicação).

Vídeo-ação Proposta de gênero audiovisual, lançada peloCDI São Paulo, que tem como objetivo registrarações de grupos que buscamsolucionar problemas.

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38 Inclusão Digital na Medida

O que cê tá fazendo com nossoplanejamento???

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Inclusão Digital na Medida 39

Tá bom!Tá tudo errado,Ivan... Vamo

começar tudo denovo!

Calma aê! Vamo vero que vem pelafrente e depois agente refaz nosso

planejamento.

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40 Inclusão Digital na Medida

O ponto de partida para mudarmosuma dada situação é conhecê-la em seusdetalhes. Precisamos fazer um diagnósticoda realidade. Isso implica ler o mundo que aíestá. As tecnologias podem ajudar-nos, emuito, a enxergar situações do cotidianoque estão bem debaixo do nosso nariz.Porém, como estamos acostumados, elasparecem não nos incomodar mais, o quenão é verdade. Através de uma lente, pode-mos revelar muita coisa sobre o mundo emque vivemos e sobre quem segura a câmerafotográfica ou a filmadora. Olhar o mundo e

vê-lo, perceber as questões à nossa volta eque nos dizem respeito são os primeirospassos para a identificação de problemas epara a possibilidade de encontrar soluçõespara eles.

Algumas perguntas podem nos orien-tar nessa tarefa:

Como eu vejo o mundo? Como nósvemos o mundo?

Como eu me vejo no mundo? Comonós nos vemos no mundo?

Como este mundo me vê? Como estemundo nos vê?

Leitura de mundo

1ºpasso

Page 41: Inclusão digital na medida

Podemos começar a leitura de mundoaos poucos, conhecendo primeiramente anossa realidade e a das pessoas que estãotrabalhando com a gente. Quem somos?Como somos? Onde moramos? Quais são osnossos sonhos? E os nossos problemas?

Também é importante que o grupoentenda por que está fazendo essa leitura demundo. Nosso objetivo nesse momento éconhecer a realidade vivida pelos educandospara encontrar, junto com eles, uma oportu-nidade de intervir nessa realidade, a fim demelhorá-la. Ou seja: estamos buscando co-nhecer a situação concreta em que estamosmergulhados para compreendermos tam-bém nosso papel de agentes de mudança.

Para aprofundar a leitura de mundo,sugerimos duas estratégias:

Mergulho na comunidade Quando o trabalho de inclusão digital

está acontecendo em um determinadoespaço geográfico, como uma favela ou umpresídio, por exemplo, o grupo poderá iden-tificar os problemas locais para desenvolveruma ação comunitária.

Mergulho na realidade do grupo Quando a “comum unidade” – uma rea-

lidade que iguala a todos – não é o lugar

onde as pessoas moram, mas a situação emque elas se encontram ou a causa na qualestão engajadas. Exemplos: um grupo deadolescentes em liberdade assistida nãoconsegue se matricular na escola; pessoasreivindicam direitos que não estão sendorespeitados; estudantes se unem para lutarcontra algum tipo de discriminação etc.Aqui a intervenção será definida pelassituações e o espaço onde ela acontecerápoderá ou não ser uma comunidade.

Esses “mergulhos” e o uso de algumastecnologias estão descritos no capítulo 3“Estratégias e caixa de ferramentas”.

Inclusão Digital na Medida 41

Page 42: Inclusão digital na medida

42 Inclusão Digital na Medida

Com um participante por computador,pedimos que cada um escrevesse, no editorde textos, sobre seus sonhos, seus medos oupreocupações, as possibilidades de mudan-ça e seu lugar no mundo.

Cada um salvou seu texto em um dis-quete, sem se identificar. Embaralhamos eredistribuímos os disquetes aos participan-tes. Em seguida, cada um tinha que encenaro texto que havia recebido para o grupo. Odesafio era justamente o de se colocar e seperceber no lugar do outro, enquanto asdemais pessoas tentavam adivinhar quemera o autor original daquele texto.

Essa dinâmica foi realizada nas entida-des que já estavam com os equipamentosmontados. Nas que ainda não tinham com-putadores, a atividade foi adaptada, utili-zando colagem de imagens e palavras recor-

tadas de revistas. Nas cinco cidades, desta-camos as respostas mais recorrentes dosjovens:

sonhos: trabalhar, estudar, ter umacasa, ter um carro, ser jogador de futebol,ter paz...

medos e preocupações: morte, perda defamiliares, violência, desemprego e tráfico...

possibilidades de mudança: ter fé,estudar, ajudar os outros, ter dinheiro...

lugar no mundo: com a família, commelhores condições de vida, trabalhando eestudando...

RealDinâmica do disquete para aquecer a Leitura de Mundo

nA

Em cada uma das entidades apoiadas em

2005 pelo Pró-Menino, otrabalho de inclusão digital começou pela

leitura de mundo.Em grupos formados

por adolescentes,educadores, orientadores

de medida sócio-educativa e coordenadores

pedagógicos, realizamos a dinâmica do disquete

para iniciar este exercício de conhecer

criticamente a realidade.

Page 43: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 43

Com osolhos!

É sério!Desculpa. Não sei como

vejo o mundo. Nunca

parei pra pensar nisso.

Preciso ir lá fora olharpara ele...

Kika, comovocê vê omundo?

Page 44: Inclusão digital na medida

44 Inclusão Digital na Medida

Depois da leitura de mundo, algumassituações-problema foram identificadas narealidade do grupo ou na comunidade ondeos educandos vivem. Precisamos agora com-preender um pouco melhor essas situações,para escolher aquela em que o grupo desejaintervir.

Paulo Freire também chama as situa-ções-problema de temas geradores. Sãogeradores porque provocam, no grupo, ainquietação que o levará a agir. São temasque geram ações e não simplesmenteassuntos que estão na moda, na mídia…

Algumas perguntas podem nos orien-tar nesta tarefa:

• Quais são os problemas presentes na rea-lidade deste grupo?• Quais são os fantasmas desta comunidade?

Aqui a sensibilidade e a habilidade doeducador serão fundamentais para estimu-lar o grupo a sair da superficialidade dosproblemas muito amplos, como desempre-go, violência, sexualidade. O desafio serádescobrir o que está por trás desses proble-mas. Eles afetam diretamente o grupo? Deque forma?

Ao responder a essas perguntas, alémde começar a definir o problema mais grave,o grupo também já estará aprofundando otema gerador. Do mesmo modo como fize-

Problematização

2ºpasso

Page 45: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 45

mos a leitura de mundo para identificar osproblemas, agora precisamos conhecer bemessas situações, para poder agir sobre elas.Ou seja, precisamos problematizar o temagerador para, posteriormente, planejar aação que vamos executar.

Ao mediar a problematização de umasituação, o educador precisa ser criativo,sensível e dinâmico. As tecnologias facili-tam muito a busca, a organização e o regis-tro das informações. No entanto, é precisoficar atento para não cair na armadilha dese dispersar em infinitas pesquisas naInternet. Também não podemos nos iludircom a perspectiva de que os educandosestão super-empolgados para discutir osproblemas que afetam sua vida. É aí que atecnologia pode ser uma grande aliada parainstigar o grupo a analisar criticamenteuma situação-problema. Estas sugestõesestão detalhadas no capítulo 3, “Estratégiase caixa de ferramentas” (pág. 78).

De que maneira a discussão sobre deter-minado problema pode ficar interessante?

E se fizéssemos uma pesquisa no bairro?Ou um programa de rádio, em formato

de debate?Que tal fazermos uma dramatização

sobre a situação? Uma fotonovela? Ou umvídeo?

O mais importante da problematiza-ção é que o grupo tome consciência e seposicione criticamente diante da situaçãoque deseja reverter.

Agora que já olhamos para a nossa rea-lidade e compreendemos melhor o que estápor trás do fantasma que nos atormenta,podemos planejar a ação com a qual pre-tendemos eliminá-lo.

Page 46: Inclusão digital na medida

Dentro da consultoria em InclusãoDigital no Pró-Menino, começamos a forma-ção dos educadores e adolescentes pela lei-tura de mundo. Depois, com o Jogo doFantasma (ver “Estratégias e caixa de ferra-

mentas”, pág. 79) definimos o tema geradorem cada grupo. De uma maneira geral, os“fantasmas” que apareceram nas cinco ci-dades estavam relacionados à falta de opor-tunidades para o adolescente. Em um de-bate sobre o tema, o grupo concluiu queuma das causas da falta de oportunidadesestava vinculada à imagem dos adolescen-tes. Cada cidade resolveu, então, investigaressa problemática.

Em um encontro presencial, o grupopassou por uma capacitação em pesquisa efotografia. Conheceu diferentes estratégiasde como abordar as pessoas para entrevistá-las e também de como utilizar a fotografiapara registrar o processo da pesquisa e suasdescobertas. Neste mesmo encontro, o grupoformulou um questionário comum, para seraplicado nas cinco cidades (Campinas, Cuba-tão, Guarujá, Guarulhos e Jandira).

RealA pesquisa como estratégia de problematização

46 Inclusão Digital na Medida

nA

Page 47: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 47

Os adolescentes se encarregaram deentrevistar as pessoas nas escolas, na enti-dade e em locais públicos. Durante essa fa-se, as equipes trocaram informações sobre oandamento das pesquisas por meio deblogs e fotoblogs. Com todos os questioná-rios preenchidos, os jovens das cinco cida-des lançaram os resultados em um bancode dados virtual, organizado em parceriacom a ONG ImageMágica. A partir dessebanco de dados, foram gerados gráficospara ilustrar as respostas obtidas em cadaquestão.

Os gráficos com os resultados da pes-quisa foram apresentados em slides, numsegundo encontro presencial. Com a análisedos dados – e do processo da pesquisa –, ogrupo concluiu que precisava intervir nasquestões relacionadas aos adolescentes,porém com estes à frente desse trabalho.

Educadores e educandos descobriram queprecisavam deixar de discutir sobre os ado-lescentes para discutir com eles os seus pro-blemas. A problematização da falta de opor-tunidades apontou, portanto, que era neces-sário dar voz a esses jovens.

Conseqüentemente cada cidade plane-jou ações voltadas à comunicação. Assimsurgiram projetos de sites, de programas derádio, de jornais e de vídeos feitos por ado-lescentes. O objetivo desses veículos de co-municação era possibilitar que os adoles-centes tratassem de assuntos relativos àadolescência, tendo como público-alvo pes-soas de todas as idades, começando pelosfreqüentadores das entidades.

BlogÉ uma página da internetatualizada regularmente poruma pessoa ou um grupo.Temático ou não, ele podetrazer textos, imagens,áudios, vídeos, gráficos e quaisquer arquivos multimídia. Blogs nasceramcomo diários pessoais eextrapolaram essa dimensão(“Blogs”, Coleção Conquistea Rede).

FotologOu fotoblog ou simplesmenteflog é uma página na internet otimizada para apublicação de arquivos deimagem. Permite a inserçãode legendas e a interaçãodos visitantes por meio decomentários.

Page 48: Inclusão digital na medida

48 Inclusão Digital na Medida

Este é o título do vídeo produzido pelosjovens do COMEC (Centro de Orientação aoAdolescente de Campinas). O curta-metra-gem problematiza a violência contra amulher, por meio de uma encenação produ-zida e filmada pelos próprios adolescentes,com apoio dos educadores de inclusão digi-tal. Uma mulher escreve uma carta parauma amiga, contando o sufoco que andapassando com o marido, que chega em casasempre alcoolizado e a agride. Um dia, omarido a surpreende... com um buquê deflores. O filme termina com os adolescentesdando sua opinião real sobre a violênciacontra a mulher e sobre o alcoolismo.Apresenta ainda contatos do centro deapoio a mulheres da cidade.

Ao mesclar realidade com ficção, ogrupo acabou produzindo um curta-metra-gem do gênero conhecido como doc-fic.

Essa foi a maneira que educandos e educa-dores encontraram para aprofundar osconhecimentos que tinham sobre a situa-ção-problema que incomodava a maioria dogrupo. Assista “A Carta” no CD-Rom queacompanha esta publicação.

RealA carta

nA

Doc-ficGênero audiovisual que

mistura realidade e ficção.Há diversas maneiras de fazer essa combinação. A dramatização de um

conflito, tendo como atores as pessoas que o vivenciam

na vida real, é um exemplo.Trata-se de um trabalho

que funde característicasdo vídeo-documentário

e do vídeo-ficção, por isso doc-fic.

Page 49: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 49

Só.

Nossa!!! Queviagem! Dá pra

juntar teatro comInclusão Digital!!!

E será que rolafazer uma parada

de hip hop e informática?

Claro que rola!Mas vai depender

do que a galeracurte, né?

Page 50: Inclusão digital na medida

50 Inclusão Digital na Medida

Desenvolver um plano de ação signifi-ca pensar e organizar cada passo que preci-sa ser dado para nos levar à resoluçãodaquilo que identificamos como um proble-ma. Um bom plano é essencial para garantiros melhores resultados possíveis para a ação.

Pode ser, porém, que um bom planonão seja suficiente para conseguirmos tudo.Por outro lado, existem alguns elementosque nos trazem vantagens, que minimizama gravidade de algumas situações. Se o

plano for elaborado de forma coletiva, pode-mos ganhar em alguns aspectos, como porexemplo:• Os objetivos ficam mais claros para todosaqueles que vão participar. Assim as pes-soas trabalham conscientemente para amesma finalidade.• A construção participativa do plano ge-ra maior comprometimento das pessoascom a ação. Afinal são elas que, voluntaria-mente, se responsabilizam pelas tarefasnecessárias.

Plano de Ação

3ºpasso

Page 51: Inclusão digital na medida

• O grupo prepara-se para encarar as maisdiferentes situações que podem atrapalhara ação. Dessa forma, fica mais fácil contor-nar os imprevistos.• As pessoas passam a visualizar a ação commais nitidez. Isso é fundamental para saberse a intervenção é mesmo viável. Caso nãoseja, é preciso pensar em um plano alterna-tivo, redimensionando as metas, para que asfrustrações sejam minimizadas.

Para elaborar um plano de ação com ogrupo, sugerimos que todos juntos respon-dam às seguintes questões:1. Qual é o problema que o grupo decidiusolucionar no momento anterior, da problematização?2. Quais são as causas desse problema?3. Então o que vamos fazer?4. Por que vamos fazer isso?5. Como vamos fazer isso?6. Quando essa ação vai acontecer?Quanto tempo ela vai durar?7. Onde a ação vai acontecer?8. Quem vai fazer o quê? 9. Quem são as outras pessoas que precisamos envolver na ação? Como vamos envolvê-las?10. Quais recursos serão necessários? Como vamos obtê-los?

11. Que tecnologias vamos utilizar? O grupo domina essas tecnologias? Quaisserão os momentos de capacitação técnica?

Dicas para facilitar a elaboração de um plano de ação• Procure ouvir, com o grupo, a opinião e assugestões de quem já trabalha com o tipo deproblema que se pretende solucionar.• Pesquise outros grupos que já realizaramintervenções parecidas. Como eles fizeram?• Discuta com os participantes o maiornúmero de detalhes que podem interferirna ação.• Os responsáveis precisam estar claramen-te definidos e concordar com as tarefas quelhes cabem.

Inclusão Digital na Medida 51

Page 52: Inclusão digital na medida

52 Inclusão Digital na Medida

Com base nos dados encontrados, oseducandos concluíram que era necessáriodar voz aos adolescentes, para que eles pró-prios pudessem desconstruir os estereóti-pos com que eram confundidos.

No Guarujá, o grupo resolveu criaruma rádio no espaço de Inclusão Digitalpara difundir informações com, sobre e paraos adolescentes. Assim as perguntas queorientam o Plano de Ação foram respondi-das da seguinte forma:

1. Qual é o problema que o grupo decidiusolucionar no momento anterior, da proble-matização? A falta de oportunidades paraos adolescentes (relacionadas ao trabalho,aos estudos, ao lazer etc.)2. Quais são as causas desse problema? Sãovárias. Em um debate, o grupo destacou aimagem dos adolescentes.

3. Então o que vamos fazer? Criar uma rádio,por meio da qual os próprios adolescentes pos-sam divulgar informações de seu interesse.4. Por que vamos fazer isso? Porque perce-bemos que as pessoas estão mal informa-das sobre as questões da adolescência, oque gera estereótipos e preconceitos comrelação aos jovens.5. Como vamos realizar essa ação? Vamosmontar uma rádio no Núcleo de InclusãoDigital da Ação Social do Guarujá. As tur-mas que estiverem fazendo informática noespaço serão responsáveis pela programa-ção da rádio. Os adolescentes farão pesqui-sas constantes para divulgar informaçõesatualizadas. Os programas serão transmiti-dos internamente, por caixas de som, eexternamente, pela Internet.6. Quando ela vai acontecer? Quanto tempovai durar? A rádio começará a funcionar a

RealPlano de ação do grupo do Guarujá

nA

Para contextualizar o Planode Ação elaborado pelo

grupo das entidadesapoiadas pelo Pró-menino

na cidade do Guarujá,vamos relembrar o que já

foi descrito nos momentosanteriores. Na leitura de

mundo, o grupo encontrou,como problema comum,a falta de oportunidades

para os adolescentes.Num debate, educandos

e educadores perceberamque a falta de

oportunidades estava ligada à imagem dos

adolescentes. Resolveramentão pesquisar mais a

fundo a situação.

Page 53: Inclusão digital na medida

partir do segundo semestre de 2005. Os pro-gramas terão 10 minutos de duração.7. Onde a ação vai acontecer? No Núcleo deInclusão Digital do Guarujá.8. Quem vai fazer o quê? Educandos e educadores:• iniciar uma nova pesquisa, voltada para osprogramas da rádio;• convidar outros adolescentes para partici-par do projeto;• pesquisar escolas e ONGs que oferecemcapacitação em web-rádio, utilizando umametodologia que incentive o protagonismodos adolescentes.Coordenadores pedagógicos:• viabilizar a compra e instalação dos equi-pamentos;• viabilizar as capacitações técnicas doseducadores e dos educandos.9. Quem são as outras pessoas que precisa-

mos envolver na ação? Como envolvê-las?Adolescentes de todas as turmas de InclusãoDigital; orientadores de medida sócio-educa-tiva; adolescentes que não participam das ati-vidades da entidade. Vamos convidar todasessas pessoas para ouvirem a rádio ou paraserem entrevistadas em alguma ocasião.10. Quais recursos serão necessários? Comoobtê-los? Computadores com kit multimídia(caixas de som, fone de ouvido e microfone) egravador de CD; gravador de voz digital; pro-grama de edição de áudio. Vamos compraresses equipamentos com os recursos do Pró-Menino, doados pela Fundação Telefônica.11. Que tecnologias vamos utilizar? O grupodomina essas tecnologias? Quais serão osmomentos de capacitação técnica? Preci-samos buscar oficinas de programaçãomusical, edição de áudio, web-rádio e locu-ção (para falar bem e perder a timidez).

Inclusão Digital na Medida 53

Page 54: Inclusão digital na medida

54 Inclusão Digital na Medida

Exemplo do plano de ação do Guarujá

Isso mesmo! COM os

adolescentes.Então, pelo que

eu entendi, vamos

planejar a açãojunto com a molecada?

AçõesRealizar nova pesquisa para alimentar a programação darádio com informações sobre os adolescentes

Convidar outros adolescentespara participar do projeto

Pesquisar escolas e ONGs queoferecem capacitação em rádio

Viabilizar a compra e a instalação dos equipamentos

Viabilizar as capacitações técnicas dos adolescentes e educadores

Festa de lançamento da rádio

PrazosAté setembro de 2005

Agosto de 2005

Agosto de 2005

Setembro de 2005

Setembro de 2005

Outubro de 2005

ResponsáveisAdolescentes com apoio do educadorde Inclusão Digital

Adolescentes, educador de InclusãoDigital e orientadores de medidasócio-educativa

Adolescentes, educador de InclusãoDigital e orientadores de medidasócio-educativa

Coordenador pedagógico, com apoiodo educador de Inclusão Digital e dos orientadores de medida sócio-educativa

Coordenador pedagógico

Adolescentes e educador de InclusãoDigital, com apoio dos orientadores de medida sócio-educativa e do coordenador pedagógico.

Page 55: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 55

Como romper com o fatalismo e a desesperança

As maiores barreiras para que uma pessoa ou grupo se disponha a agir sãoo fatalismo e a desesperança. O fatalis-mo acaba gerando e justificando umcerto tipo de cinismo, uma vez que, porcausa dele, aceitamos conviver comsituações que condenamos. Por isso, oseu antídoto é o apelo ao compromisso,ao comportamento e aos valores éticosdas pessoas. Isso significa mostrar econseguir que as pessoas vejam queexistem situações com as quais nãopodemos conviver, em relação às quaisnão devemos ser tolerantes.Quanto à desesperança, o remédio é trabalhar o conceito de cidadania.É ele que vai aumentar a segurança,despertar a capacidade empreendedoracoletiva e fazer com que as pessoas se sintam poderosas para produzirmudanças. E aí é só começar, porque os primeiros resultados vão reforçar eampliar esse sentimento.

Como romper com o “costume com a ruindade”

“Talvez o mais trágico na sociedade brasileira atual não seja a existência dadesigualdade, da miséria e da violência.O mais trágico é a naturalidade com que todos nós convivemos com esta realidade”, escreveu Margarida Vieira em

artigo intitulado A banalização do mal(Jornal Estado de Minas, 25/09/95).Caetano Veloso também já cantou:“Enquanto os homens exercem seuspodres poderes,/ morrer e matar deraiva, de fome e de sede,/ são tantasvezes/ gestos naturais”.Esta é uma das maiores barreiras ao processo de mobilização: o “costumecom a ruindade”, o sentimento de que sempre foi assim, que outros já tentaram (“Eu já vi este filme...”).Romper com esse sentimento exigeassumir o destino e a construção daordem social. Aceitar que somos nós quea criamos, com nossas ações, nossasomissões e nossas permissões e delegações para que outros ajam por nós. Por isso, podemos modificar essaordem. A atitude de conformismo e denão indignação só é rompida quando assumimos nosso lugar como construtoresda ordem social: cidadãos. Por isso, asinformações e os argumentos de convencimento, de compartilhamentodo imaginário, têm que ser dirigidos às pessoas cidadãs, pessoas físicas,solidárias na construção da realidade.Os sentimentos a serem despertadossão de natureza ética e cidadã.

Jose Bernardo Toro & Nísia Maria DuarteWerneck. Mobilização Social: um modo de construir a democracia e a participação.

Leitura complementarLidando com algumasdificuldades

Page 56: Inclusão digital na medida

Um mutirão de limpeza, a reformapara ampliação da creche, um abaixo-assi-nado por mais médicos no posto de saúde,uma manifestação pela moradia, uma cam-panha pela erradicação do trabalho infantil,um fórum permanente para discutir a rela-ção da escola com os alunos em liberdadeassistida. Cada situação-problema vai de-mandar um tipo de ação, com estratégias edinâmicas específicas – já definidas noplano de ação.

Toda ação, seja pontual ou abrangente,para ser transformadora vai envolver pes-soas externas ao grupo que está organizan-do a iniciativa. Isso quer dizer que precisa-mos mobilizar diferentes atores sociais paragarantir a eficácia da ação. O melhor jeito defazer isso é a comunicação.

Além de mobilizar as pessoas, a comu-nicação é um instrumento fundamental para repercutir os resultados e os processosda primeira ação.

56 Inclusão Digital na Medida

Execução da ação

4ºpasso

Page 57: Inclusão digital na medida

A divulgação será útil para os desdo-bramentos dessa iniciativa e poderá servirde exemplo para outros grupos que tambémqueiram realizar intervenções. Por isso, é pre-ciso registrar a ação no momento em que elaestiver acontecendo. Posteriormente seránecessário organizar esses registros para,então, disseminá-los.

Assim, antes, durante e depois da açãovamos nos comunicar, seja para mobilizar aspessoas, seja para repercutir os resultados. Ovídeo, o editor de texto, o e-mail, a rádio, omegafone, a Internet, enfim, as tecnologiasde informação e comunicação deixam de serexercícios e experimentações e se transfor-mam em comunicação social. Essas suges-tões estão detalhadas no capítulo 3, “Estra-tégias e caixa de ferramentas” (pág 84).

Seja na instituição, na comunidade ouno âmbito das políticas públicas, o impor-tante é que as ações não morram no papelou numa bem feita apresentação de slides.Também é preciso saber lidar com a frus-tração, quando os resultados obtidos foremmenos impactantes do que se esperava.Ações desse tipo precisam ser consideradasetapas de um processo. Independente desua amplitude, elas são passos de uma ca-minhada em busca da solução de proble-mas. São, sobretudo, experiências indispen-sáveis para a formação de sujeitos críticos,participativos, sensíveis, autônomos, solidá-rios, cidadãos, ou seja, protagonistas.

Inclusão Digital na Medida 57

Page 58: Inclusão digital na medida

58 Inclusão Digital na Medida

RealApresentação pública “Adolescente em questão”

nA

Em Guarulhos, os adolescentes e educadores

do Projeto Gaia tambémelaboraram um plano de

ação voltado para a comunicação.

O grupo pretendia divulgar os resulta-dos da pesquisa em revistas, jornais, sites efóruns, também organizados pelos própriosadolescentes. Em novembro de 2005, umadessas ações saiu do papel. Com um ver-

dadeiro trabalho em equipe, envolvendoadolescentes, educadores e coordenadores,o Projeto Gaia realizou uma apresentaçãopública dos dados da pesquisa para aCâmara Municipal de Guarulhos. O eventofoi chamado “Adolescente em questão” econtou com a presença de adolescentes,profissionais que trabalham com medidassócio-educativas e representantes do poderpúblico.

O objetivo do evento era chamar aatenção das autoridades municipais e dasociedade em geral para as dificuldadesencontradas pelos adolescentes em medidasócio-educativa de liberdade assistida. A difí-cil relação com a escola e com o mundo dotrabalho, além da precária oferta de serviçosem cultura e lazer, foram pontuadas.

Ivan, mas quando a

ação estiver rolando, o

que nós, educadores,

precisamos fazer?

Ai, Kika, você é muito

acelerada! Dá umaolhada na próxima

página…

Page 59: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 59

O papel do educador junto aos jovensenvolvidos na realização de ações deprotagonismo pode ser desempenhadode várias maneiras, tais como:

• ajudar o grupo a identificar a situação-problema e posicionar-se diante dela;• empenhar-se para que o grupo nãodesanime nem se desvie dos objetivospropostos;• favorecer o fortalecimento dos vínculos dos membros do grupo;• animar o grupo, para que não se deixeabater pelas dificuldades;• motivar o grupo a avaliar permanente-mente sua atuação e, quando necessá-rio, replanejá-la;• zelar permanentemente para que aação dos jovens seja compreendida eaceita por todos os que com eles se relacionam no curso do processo;• estar atento para a manutenção de um clima de empenho e mobilização porparte de todos os membros do grupo;• colaborar – sempre que necessário –na avaliação das ações desenvolvidas ena incorporação de suas conclusões àsetapas seguintes do trabalho.

É importante que o educador que se dispõe a atuar como animador de grupos de jovens em ações de protago-nismo desenvolva os seguintes atributose habilidades:• ter convicção do significado que a par-ticipação na solução de problemas reaisda sua comunidade tem para o desenvol-vimento pessoal e social de um jovem;

• conhecer os fundamentos, a dinâmica e a evolução do trabalhocom grupos;• apreender a situação ou problemaque se pretende enfrentar;• ter boa compreensão do projeto e sercapaz de explicá-lo, quando necessário;• participar de ações grupais, mesmonão sendo na condição de animador;• estar convencido da importância da ação a ser realizada e disposto a transmitir a outras pessoas esse conhecimento;• administrar oscilações de comporta-mento comuns entre os jovens, comoconflitos, passividade, indiferença,agressividade e destrutividade;• ser capaz de se conter, para proporcio-nar aos educandos a oportunidade depensar e agir livremente;• acolher e compreender as manifestaçõesverbais e não-verbais emitidas pelosmembros do grupo;• respeitar a identidade, o dinamismo ea dignidade de cada um dos membrosdo grupo.

Essa maneira de trabalhar com os adolescentes poderá contribuir para quemuito daquilo que hoje é consideradoproblema se transforme, amanhã, emsolução. Para isso, o fundamental é acreditar sempre no potencial criador ena força transformadora dos jovens.

Antonio Carlos Gomes da Costa,Protagonismo Juvenil: adolescência,educação e participação democrática.

Leitura complementarO papel do educador

durante a realização das ações

Page 60: Inclusão digital na medida

60 Inclusão Digital na Medida

Utilizamos uma metodologia de Inclu-são Digital que tem suas raízes na educaçãopopular. A apropriação das tecnologiasacontece primeiramente para compreen-dermos o mundo em que vivemos. Para queessa compreensão não seja apenas superfi-cial, usamos o computador, a Internet e osrecursos multimídia, a fim de problemati-zar as situações encontradas. Em seguida,elaboramos um plano e mobilizamos dife-rentes pessoas para realizarem conosco

uma ação, com o objetivo de transformaraquela situação problemática, diagnostica-da na leitura de mundo.

Com essa metodologia, pretendemosformar cidadãos, sujeitos, protagonistas dahistória. Para isso, o tempo todo exercitamosa sensibilidade, a reflexão e a crítica. Só faze-mos a problematização quando analisamoscriticamente a leitura de mundo. Só conse-guimos planejar e executar uma ação serefletirmos sobre a situação problematizada.

Avaliação

5ºpasso

Page 61: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 61

Portanto, todo o processo de inclusão digitalfoi permeado por momentos de avaliação.

Agora que executamos uma primeiraação, podemos dizer que concluímos umciclo. Precisamos avaliar como se deu a açãoe como foi o processo de inclusão digital atéaqui. Só assim conseguiremos definir o queacontecerá daqui para a frente.

Sugerimos que o grupo recupere osregistros do processo, da leitura de mundo àexecução da ação. Olhando para essesmateriais, todos, incluindo o educador, po-dem responder questões como:

• Que recursos tecnológicos cada integranteaprendeu a utilizar?• Como era o domínio dessas tecnologias noinício do processo e como é agora?• Que ferramentas cada um deseja aprendermelhor? Que outras ferramentas o grupodeseja conhecer?• Olhando para o Plano de Ação, alcançamosnossos objetivos?• O que acertamos? O que erramos?• E agora? Paramos por aqui? Podemos irmais além? De que forma?

Sacou, Kika, qualque é a dessametodologia?

Saquei. Agora,

precisamos estudar um

pouco essas novidades,

tipo vídeo na internet,podcast e tal…

Tranqüilo! Na própria net, você

encontra as instruções.Eu te ajudo.

Page 62: Inclusão digital na medida

62 Inclusão Digital na Medida

Nova Leitura de Mundo

...

Page 63: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 63

E assim um novo ciclo do mesmo

processo pode ser iniciado. Algumas

pessoas talvez não queiram ou não

possam continuar com o grupo. Por

outro lado, novas pessoas poderão entrar.

O grupo não é mais o mesmo e a realidade também

foi modificada. Por isso, é necessário realizar uma

nova leitura de mundo, levantar e aprofundar outras

situações-problema, planejar e executar diferentes

ações, aproveitando melhor o potencial humano que

se apropria criativamente das tecnologias de informa-

ção e comunicação.

Page 64: Inclusão digital na medida

3capítulo

Page 65: Inclusão digital na medida

dE ferra-MenTas

E caixaestratégias

Page 66: Inclusão digital na medida

66

Vimos até aqui o passo-a-passo da metodologia

de Inclusão Digital. Agora apresentaremos uma

série de estratégias e ferramentas que podem

ser utilizadas em cada um dos momentos.

Há sugestões de trabalho com imagem,

fotografia, texto, apresentação de slides,

áudio, vídeo etc.

Page 67: Inclusão digital na medida

67

Estratégias e ferramentas parafazer a

Problematização

Estratégias e ferramentas parafazer

Leitura de Mundo

Estratégias e ferramentas para elaborar o

Plano de Ação

Estratégias e ferramentas para a

Ação

Page 68: Inclusão digital na medida

68 Inclusão Digital na Medida

Estratégias e ferramentas para fazer

Leitura de Mundo

Page 69: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 69

ObjetivoIniciamos a leitura de mundo a partir das histórias de vida dos educandos. Para isso, vamos estimulá-losa refletirem sobre si e a compartilharem,com o grupo, suas trajetórias.

Possibilidades de trabalho com imagens

• Produzir auto-retratos no editor de dese-nhos, com características físicas e da perso-nalidade de cada um.• Fotografar cada integrante do grupo (ati-vidade que pode ser feita em duplas, emque um fotografa o outro). A pessoa queserá fotografada pode fazer uma pose, des-tacando suas principais qualidades (alegre,tímida, séria, brava etc.) Utilizando um edi-

tor de imagens, fazer o auto-retrato, mani-pulando a fotografia para acrescentarcaracterísticas da personalidade.• Digitalizar (utilizando um scanner) foto-grafias da infância dos educandos e pedirque cada um deles monte a linha do tempode sua vida no editor de desenhos, usando adata de nascimento como ponto de partida.Localizar, nessa linha do tempo, a situaçãoregistrada na fotografia da infância (Quemomento era aquele?). Os educandos mar-cam, com desenhos, símbolos ou palavras,os acontecimentos importantes, até chegaraos dias de hoje, à fotografia atual.• Procurar em revistas ou na Internet diver-sas imagens que representem as principaisqualidades, defeitos, sonhos, problemas dosparticipantes. Digitalizar e montar, no edi-tor de desenhos ou de imagens, uma grandecolagem que construa o auto-retrato.

Quem sou eu?

Dicas de sites• Google Imagenshttp://www.google.com.brSite de busca de imagens.

• Foto Favelahttp://www.fotofavela.com.brAcervo fotográfico do portalViva Favela. Contém ensaiosfotográficos de profissionaise moradores das favelas doRio de Janeiro. Na seção“Galeria Aberta”, sugerimos o ensaio “Rocinha”, de André Cypriano.

• Sebastião Salgadowww.sebastiaosalgado.com.brSite com diversos trabalhosdo fotógrafo brasileiro.Sugerimos os ensaios “Êxodos” e “Crianças”.

Page 70: Inclusão digital na medida

70 Inclusão Digital na Medida

Possibilidades de trabalho com textos

• Com o grupo já se conhecendo minima-mente, peça para cada um escrever seunome em um arquivo em branco no editorde texto. Diga a todos que troquem de lugare, no computador em que estão agora,escrevam algumas qualidades e defeitosdaquela pessoa. Troque todos de lugar maisalgumas vezes. No final, quando os educan-dos voltarem ao computador onde estavamno início, peça que cada um deles leia emvoz alta como o grupo o vê. A pessoa concor-da com o que os colegas escreveram sobreela? Por quê?• A dinâmica dos disquetes é parecida coma brincadeira descrita acima, só que, ao

invés de trocarem de máquina, os educan-dos salvam seu arquivo em um disquete. Oeducador mistura e redistribui os disquetespara que outros vão completando o arquivocom as características daquela pessoa. Nofinal, cada um recebe o seu disquete devolta, com um texto sobre si mesmo, escritopor todos os integrantes do grupo.• Produzir cartas, poesias, relatos, letras demúsica com o editor de texto, contando umpouco de sua história de vida e algumascaracterísticas. Como se chama? Onde nas-ceu? Onde passou a infância? Onde moraagora? Quais foram os fatos que mais mar-caram sua vida? Como você é hoje? O quevocê espera ser no futuro? Qual é o seu pro-jeto de vida? Quais são seus sonhos?

Dica de siteMuseu da Pessoa

http://www.museudapessoa.net

Museu virtual de histórias

de vida, com arquivos de

texto, imagem, áudio e vídeo.

Também é possível deixar

registrada sua própria

história. Sugerimos um

passeio pelos depoimentos

do projeto “Um milhão de

histórias de jovens”.

Page 71: Inclusão digital na medida

Possibilidade de trabalhocom apresentação de slides

• Montar uma apresentação individual comnome, fotos, desenhos, características físi-cas e psicológicas, o que gosta, o que nãogosta, projetos e sonhos.

Possibilidades de trabalho na Internet

• Criar uma conta de e-mail e trocar mensa-gens, apresentando-se aos colegas. Os tra-balhos já realizados também podem ser tro-cados, anexados às mensagens.• Criar uma conta em um sistema de redessociais como:Orkut (http://www.orkut.com)Gazzag (http://www.gazzag.com)Myspace (http://www.myspace.com).Todos precisam encontrar a página dosdemais participantes e do educador e adi-cioná-los como amigos. Chame a atençãopara que cada um preencha seu perfil com omáximo de detalhes e também leia o perfildos colegas.

Inclusão Digital na Medida 71

O ideal é que cada educando apresente e explique seus trabalhos para o grupo.Aqueles que não quiserem se expor devem ser respeitados. Caso haja uma impressoradisponível, imprima essas produções e monte uma exposição com os educandos pelasparedes do espaço de inclusão digital e/ou em espaços públicos da comunidade.

Page 72: Inclusão digital na medida

72 Inclusão Digital na Medida

ObjetivoPromover o auto-conhecimento do grupo e iniciar a construção de uma identidade coletiva, explorando afinidades e diferenças.Quem somos nós? Nossas histórias de vida se parecem? Elas se cruzam? De que forma? O que temos em comum? Do que gostamos? Do que não gostamos? Quais são nossos problemas? Quais são nossos sonhos?

Possibilidades de trabalho com imagens

• Educandos e educador serão fotografa-dos. Todos irão produzir uma montagem dogrupo no editor de imagens.• O grupo se fotografa e faz intervençõesnas fotos com o editor de imagens, usandorecursos como filtros, rotações, contraste-brilho etc.

Possibilidades de trabalho com textos

• Perfil do grupo escrito pelo grupo. Prepareconjuntos de perguntas como:1. Qual seu nome, idade, sexo?2. Onde você mora?3. Quais são suas melhores qualidades?4. Quais são seus piores defeitos?5. O que mais gosta de fazer?6. O que não gosta de fazer?7. Que estilo de música você gosta de ouvir?8. Quais são suas habilidades?9. Quais são seus maiores problemas?10. Quais são seus sonhos?

Cada educando será responsável poruma pergunta que deverá ser respondidapor todos os demais integrantes do grupo.Com todas as respostas registradas, cadaum vai organizar um parágrafo sobre as

Mergulho na realidade do grupo

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Inclusão Digital na Medida 73

respostas no editor de texto. Para montarum único texto com o perfil do grupo, abra,em um dos computadores, um arquivo detexto novo e peça para que cada um colenele o seu parágrafo (transportando os ar-quivos pela rede ou com disquetes). Defi-nam coletivamente a formatação do texto(tamanho, cor e tipo da fonte, alinhamentoetc.). Ao final, peça para criarem um títulopara o texto, que também pode ser o nomedo grupo.

Possibilidades de trabalhocom apresentação de slides

• Montar uma apresentação com as imagense as informações sobre o perfil do grupo.• Construir uma linha do tempo com osprincipais acontecimentos que marcaram avida de cada integrante do grupo. Primeiropeça que cada um faça sua própria linha dotempo, iniciando pela data de nascimento epontuando fatos importantes da sua vida.Os educandos podem apresentar um fatopor slide, não se esquecendo de indicar adata ou, pelo menos, o ano em que aconte-ceu. Para facilitar a organização do trabalho,sugerimos fazer um esboço dessa linha dotempo coletiva numa lousa ou papel gran-de. Um educando se encarrega de registraros fatos. Seguindo uma ordem cronológica,comece a socialização das informaçõespelas datas de nascimento e depois peçaaos educandos que falem dos acontecimen-tos que vêm na seqüência das datas. Depoisque todos os momentos estiverem marca-dos, divida a linha do tempo em períodos epeça para que cada um faça um slide corres-pondente a um dos períodos. No final, jun-tando todos os slides, temos a apresentaçãoda linha do tempo da vida dos integrantesdo grupo.

Page 74: Inclusão digital na medida

74 Inclusão Digital na Medida

Possibilidades de trabalho com áudio

• Tendo o texto do perfil do grupo comobase, vamos elaborar uma curta apresenta-ção radiofônica. Para isso, os educandospodem criar uma vinheta de abertura, usan-do o nome do grupo. Com uma base musicalao fundo, cada locutor lê uma parte do per-fil e a apresentação pode ser encerrada coma mesma vinheta.• Entrevista: O grupo é dividido em duplas.Cada educando prepara algumas perguntaspara fazer ao seu colega de dupla, gravandoa entrevista (com um gravador analógico,digital ou com um microfone conectado aocomputador). No editor de áudio, juntartodas as entrevistas para o grupo ouvir ediscutir: Quem somos nós? O que temos emcomum? Quais são nossos sonhos? Quaissão nossos problemas?

Possibilidades de trabalhocom a Internet

• Criar um grupo de e-mails para facilitar atroca de mensagens coletivas.• Criar uma comunidade com o nome dogrupo em um sistema de redes sociais comoOrkut (http://www.orkut.com)Gazzag (http://www.gazzag.com) Myspace (http://www.myspace.com)• Montar um blog, no qual os integrantespublicarão seu perfil, o perfil do grupo, suasexpectativas, aprendizagens, suas dúvidasetc. Esse espaço pode ser usado como diáriode bordo, para registrar os avanços do grupocom relação às percepções, às tecnologias eà futura intervenção.• Montar um Podcast, publicando os arqui-vos de áudio com a vinheta, a apresentaçãodo grupo e as entrevistas.

Dicas de Blogs e Podcasts• Blog Tic@ção http://www.ticacao.blogspot.com• Podcast do Cala-Boca já Morreuhttp://canal.podcast1.com.br/educomunicacao• Web-rádio Galera Onlinehttp://canal.podcast1.com.br/galera_online• Radio Digital do Guarujá http://radiodigital.podomatic.com

VinhetaAbertura de um programa

(de rádio ou de televisão)que contém o nome do programa

e normalmente é acompanhadade uma base musical e,

na TV, de imagens.

PodcastÉ um meio veloz de distribuir

sons pela internet, um neologismo que funde duas

palavras: iPod, o tocador dearquivos digitais de áudio da Apple, e broadcast, que

significa transmissão eminglês. O podcast tem váriosprogramas ou episódios, como

se fosse um seriado. Os arquivos ficam hospedados

em um endereço na internet e,por download, chegam ao

computador pessoal outocador. Você pode baixar o

arquivo no computador, no MP3Player, no celular ou em um

PDA (computador de mão), para ouvir quando quiser.

(“Podcast”, Coleção Conquiste a Rede)

Page 75: Inclusão digital na medida

ObjetivoConhecer com detalhes a comunidade onde os educandos vivem, enfocando os problemas e as oportunidades de ação.

Preparação do MergulhoComo é a nossa comunidade? Utilizan-

do o editor de desenhos, cada educando vaidesenhar um mapa da comunidade ou – sea comunidade for muito grande – da regiãoonde ele mora. Peça para localizarem, nodesenho, sua casa, as principais ruas, ospontos mais freqüentados como igrejas,mercearias, botecos, centros comunitários,creches, escolas, e os problemas da comuni-dade. Encerre este primeiro momento comos educandos observando e comentando osdesenhos dos demais colegas. As pessoasreconhecem os lugares marcados no mapa?

Agora é hora do grupo todo construir

apenas um mapa da comunidade, em umacartolina ou outro papel grande.

Com o mapa pronto, podemos planejarcomo será o Mergulho, sempre lembrandoque o objetivo deste momento é conhecermelhor a comunidade, para encontrar osprincipais problemas e as oportunidades deintervenção que o grupo pode realizar.Usando o mapa como referência, o grupoterá condições de organizar o plano do mer-gulho, discutindo e respondendo as seguin-tes perguntas:• Para onde vamos? • O que vamos buscar? • Quem vamos entrevistar? Que perguntasvamos fazer para estas pessoas? Precisamosmarcar um horário para fazer essas entre-vistas? • Que tecnologias vamos utilizar para regis-trar nossas descobertas?

Mergulho na comunidade

Inclusão Digital na Medida 75

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76 Inclusão Digital na Medida

• De quanto tempo precisaremos para fazereste mergulho?• Quando vamos?

Mergulhando: algumasrecomendações • Antes de entrevistar as pessoas ou visitaras instituições, é importante que o grupo seapresente, explique o que está fazendo ecom qual finalidade.• É muito importante pedir autorização àspessoas, antes de começar a gravar, filmarou fotografar.• Estar atentos para perceber situaçõesinesperadas e entrevistar pessoas que ogrupo não havia previsto.• Dependendo do tamanho do grupo, éinteressante todos ficarem juntos, para nãocausar dispersão.

Avaliação e sistematizaçãodo Mergulho• Cada educando pode escrever um textosobre sua experiência no mergulho, contan-do suas descobertas e impressões.• Roda de conversa: Como foi? O que jásabíamos? O que descobrimos? Que proble-mas encontramos? Que possíveis açõespodemos começar a pensar? Conseguimosfazer o que havíamos planejado? Atingimos

nossos objetivos? Quais foram os imprevis-tos? Como o grupo improvisou?• Desafiar o grupo a montar coletivamenteuma apresentação de slides, usando foto-grafias, textos, trechos dos depoimentosgravados em áudio e vídeos. Para organizaro trabalho, sugerimos construir um roteirocoletivo para a apresentação, com o grupodiscutindo e decidindo como vão começar,em que ordem vão inserir as informações,quais fotografias serão usadas etc. Depoiscada um pode responsabilizar-se por editarum conjunto de slides que vai compor otodo da apresentação.

Possibilidades de trabalho com áudio• Editem as entrevistas e montem um pe-queno programa de rádio, relatando comofoi o mergulho e o que o grupo descobriusobre a comunidade.

Dica de livro“ZOOM” Istvan Banyai

Composto apenas por imagens,este livro propõe ao leitor

um movimento que se assemelhaao da lente de uma câmera

fazendo zoom. A cada página,o campo de visão se amplia,

revelando o verdadeiro significado das imagens.

Na primeira página, o leitorse depara com uma mancha vermelha e descobre, na

página seguinte, que a manchana verdade é a crista de umgalo. Na seqüência, percebe

que o galo está inserido numcenário e assim por diante.Uma leitura coletiva desselivro pode sensibilizar o

grupo para a importância demergulhar na comunidade.

Page 77: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 77

Possibilidades de trabalho com a Internet• Divulguem por e-mail o texto final sobre asconclusões do grupo a partir do mergulho.• Publiquem o planejamento do mergulho eo texto final sobre as conclusões no blog.• Criem um fotolog para publicar as fotos.• Adicionem as gravações em áudio dasentrevistas no podcast.• Criem uma conta em um site de publica-ção de vídeos, como o Youtube, e publiquemas filmagens feitas na comunidade.• Criem uma comunidade virtual para dis-cutir os problemas da comunidade real emum sistema de redes sociais como Orkut.Iniciem juntos um fórum, publicando asconclusões do grupo a partir do mergulho.

Outros linksDesenvolvimento Comunitário Baseadoem Talentos e Recursos Locais – ABCD.Lycia Tramujas Vasconcellos Neumann eRogerio Arns Neuman.

Coleção Conquiste a Rede, Ana CarmemFochini e Roberto Romano Taddei.Composta por quatro volumes, a coleçãoaborda o recente fenômeno do “façavocê mesmo” na Internet, explicando oque é e como fazer blogs, fotologs,vídeologs, podcasts e JornalismoCidadão. Disponível emhttp://www.overmundo.com.br

ImageMágica – Organização não-governamental que trabalha para despertar o senso de responsabilidadepara a edificação de um mundo melhor,utilizando como principal ferramenta o poder da imagem.http://www.imagemagica.org

Cala-boca Já Morreu – Organização não-governamental que desenvolve um projeto de educação pelos meios decomunicação, dirigido a crianças,adolescentes e jovens.http://www.cala-bocajamorreu.org

http://www.fotosite.com.br – Portal detrabalhos fotográficos com portifólio de profissionais e ensaios com temasvariados. Na seção Links há indicaçõesde diversos fotologs interessantes.

http://estudiolivre.org – Site que reúneinformações sobre diversos programaslivres, como o editor de imagem GIMP, oeditor de áudio AUDACITY e os editoresde vídeo KINO e CINELERRA.

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78 Inclusão Digital na Medida

Estratégias e ferramentas para fazer

Problematização

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Inclusão Digital na Medida 79

O Jogo do Fantasma é uma estratégialúdica que encaminha a problematização darealidade. Seguindo os passos sugeridospelo jogo, o grupo consegue identificar otema gerador (fantasma) mais grave.Analisa suas causas, elabora um plano deação, executa a ação (a caçada ao fantasma)e avalia o processo.

Como jogar1º passo – Com o grupo em roda, proponha abrincadeira do fantasma.2º passo – O educador pode ser o coordena-dor, mas o grupo também poderá escolherum dos educandos para coordenar o jogo.Outra pessoa deve ser a relatora da equipe.3º passo – Com o editor de desenhos ou papele lápis, cada pessoa vai desenhar um fantas-ma que ataca a qualidade de vida daquelegrupo ou daquela comunidade, e dar um

nome a esse fantasma – não pode ser o nomede uma pessoa. Após desenhar e escrever onome do fantasma, proponha que:• Cada um apresente o seu fantasma aogrupo, dizendo quem ele é e os danos queele causa.• O relator anota os fantasmas que vãosendo apresentados, de preferência em umalousa ou papel grande, para que todos pos-sam visualizar.4º passo – Os participantes vão agrupar osfantasmas semelhantes, como se eles fos-sem da mesma família fantasmagórica:• Os fantasmas semelhantes serão reuni-dos em pequenos grupos. Por exemplo, faltade trabalho, desemprego e falta de oportu-nidades são fantasmas que podem seragrupados na mesma família.• Os grupos vão descobrir por que cada fan-tasma existe e o que os criou.

Jogo do fantasma

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80 Inclusão Digital na Medida

• Os grupos vão escrever cinco causas ou aorigem dessa família de fantasmas.5º passo – No grande grupo:• Cada grupo apresenta o que descobriusobre a família de fantasmas que investigou(o relator de cada grupo).• O relator geral anota as descobertas dosgrupos.6º passo – Um fantasma é eleito pelo grupopara ser caçado em primeiro lugar. Anotemo plano de ação.7º passo – O coordenador pergunta quais ascaracterísticas necessárias à equipe que vaicaçar o fantasma:• Que qualidades pessoais e coletivas oscaçadores devem ter?• Quais são os conhecimentos gerais e es-pecíficos necessários à caçada?8º passo – O Grupo identifica os recursos deque a equipe vai precisar e descobre comopode obtê-los.9º passo – O Grupo deve definir as três pri-meiras ações.• Quem serão as pessoas responsáveis porcada ação (os nomes deverão constar noplano de ação)?• Qual será o prazo para as primeiras ações?• O coordenador deverá marcar uma datade retorno do grupo, para avaliar as ações

Roteiro para registro e avaliação da caçada:1. Quem era o fantasma? (apresente-o emforma de desenho ou escreva sobre ele)2. O que criou o fantasma?3. O que ele provocou?4. Como foi descoberto?5. Quem era a equipe Caça-Fantasmas?6. Como a equipe pensou as ações de combate?7. Qual foi o envolvimento de cada um noprocesso?8. Existiu algum tipo de parceria para essaação? Qual ou quais?9. Qual foi a abrangência da ação? (localonde foi desenvolvida)10. Quais foram os resultados da caçada?11. Quais tecnologias a equipe utilizou,desde o planejamento até a caçada?12. Novas ações foram planejadas pela equi-pe, caçando o mesmo fantasma? Conteresumidamente.

Áudio-fórumA idéia é realizar um debate sobre o

tema gerador. Pode ser um debate internoao grupo ou com a participação de pessoasconvidadas (especialistas no assunto, repre-sentantes do poder público etc). A diferençaentre o áudio-fórum e um debate normal é

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Inclusão Digital na Medida 81

que ele estará sendo gravado em áudio (fitacassete ou gravador digital). As pessoaspodem ser divididas em pequenos grupos e cada um vai debater o tema gerador. Numoutro momento, todos ouvem os deba-tes, o que permite ampliar a discussão, apartir das diversas visões acerca do mesmoproblema.

Assim os educandos fazem uma duplareflexão sobre o assunto: a primeira, na horados debates e a segunda, na audição dosmesmos. O material bruto pode ser editadoe veiculado pela rádio comunitária do bair-ro, pela rádio interna da entidade e, ainda,ser divulgado pela Internet, no podcast.

FotonovelaA fotonovela é um gênero de literatura

popular que fez muito sucesso nas décadasde 50 e 60, quando pouca gente tinha tele-visão. Os capítulos das histórias eram conta-dos por meio de seqüências fotográficas epublicados em revistas. Enquanto a teleno-vela apresenta as cenas e os personagensem movimento, a fotonovela mostra osacontecimentos congelados em fotografias,acompanhadas de pequenos textos e ba-lões de diálogo, como nos gibis.

Para montar uma fotonovela com ogrupo, sugerimos os seguintes passos:

• Defina com clareza o tema gerador com ogrupo (você pode usar o início do jogo dofantasma para isso).• Organize um pré-roteiro para a fotonovela:Qual é o tema gerador ou o conflito danovela?Quem serão os personagens?Onde a história vai se passar?Quando ela acontece?Como vai começar?Quais fatos acontecerão?Quais serão as falas dos personagens?O problema será resolvido? Como?Como termina essa história?• Com essas perguntas respondidas (elaspodem ser organizadas no editor de textos),vamos planejar o roteiro da fotonovela,cena-a-cena. Qual será a cena-fotografia 1?Cena-fotografia 2? E assim por diante.• Luz, câmera, pose e... clik! Enquanto partedo grupo encena a novela, outra parte cuidada produção das fotografias.• No apresentador de slides, peça para ogrupo organizar uma fotografia por slide,acrescentando as falas dos personagens.Não se esqueça da abertura, com o nome dafotonovela e do final, com os créditos dequem fez o quê.• Incentive o grupo a mobilizar as pessoasda entidade (outros educandos e colabora-

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82 Inclusão Digital na Medida

dores) e da comunidade (moradores, lide-ranças e representantes do poder público)para assistirem à fotonovela e encaminha-rem propostas concretas de ação para solu-cionar o problema apresentado.• Se possível, imprima os slides e deixe afotonovela exposta por um tempo em umlocal bem visível.

Teatro-fórumO teatro-fórum é uma das técnicas do

Teatro do Oprimido, criado pelo teatrólogobrasileiro Augusto Boal. A linguagem teatralé utilizada como instrumento dramático,lúdico e imaginativo, para favorecer a com-preensão e a busca de diferentes caminhos

para solucionar problemas. No teatro-fórum, especificamente, uma situação-pro-blema é apresentada na forma de espetácu-lo teatral. À medida que a história vai sedesvelando, os espectadores são convida-dos por um mediador (chamado “coringa”) a substituir o personagem principal e aimprovisar alternativas para o problemaapresentado.

O teatro-fórum pode ser realizado den-tro do grupo que está fazendo o trabalho deinclusão digital ou, estrategicamente, comum público maior. Neste caso, já estamossensibilizando e envolvendo outras pessoas(da entidade e da comunidade), que pode-rão contribuir muito para a eficácia da ação.

Outros links Nossa escola pesquisa sua opinião:manual do professor. Instituto PauloMontenegro. Disponível também emhttp://www.ipm.org.br

Teatro do Oprimido e Outras Poéticaspolíticas. Augusto Boal

Associação Cultural Kinoforum promoveatividades na linguagem cinematográfi-

ca, como festivais e oficinas. Possui um grande acervo de vídeos produzidospor participantes das oficinas, com temas variados.http://www.kinoforum.org

Ensinar com Internet: como enfrentar o desafio. Coleção EducaRede: Internetna escola. CENPEC. Disponível emhttp://www.educarede.org.br

Dica de siteCentro de Teatro do Oprimido

http://www.ctorio.org.br

Informações sobre o históricoe as outras técnicas do

teatro do oprimido. Há tambémregistros de experiênciasrealizadas, sobretudo em

penitenciárias.Estratégias eferramentas para elaborar o

PLANO DE AÇÃO

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Organização do Plano de Ação

Depois de responder às perguntas quesugerimos na página 51, o grupo pode orga-nizar o Plano de Ação em uma tabela no edi-tor de texto de planilhas. Uma apresentaçãode slides com as ações planejadas tambémpode facilitar a mobilização das pessoasque vão colaborar com a ação.

O jogo do fantasma (pág. 79) tambémpode ser utilizado no Plano de Ação.

Inclusão Digital na Medida 83

Estratégias e ferramentas paraelaborar o

Plano de Ação

Outros linksElaboração participativa de projetos:um guia para jovens. Maria CarlaCarrochano e Dílson Wrasse.

Utilizando o planejamento como ferramenta de aprendizagem.Antonio Luiz de Paula e Silva.

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84 Inclusão Digital na Medida

Estratégias e ferramentas para a

Ação

Page 85: Inclusão digital na medida

Inclusão Digital na Medida 85

Preparando a ação:mobilização social

Independentemente do tipo de açãoque pretendemos realizar (um mutirão delimpeza, um debate, uma manifestação pú-blica etc.), é necessário convocar as pessoaspara colaborar. Quanto mais envolvidas elasestiverem, maior será o sentimento de co-responsabilidade pelos resultados. O impor-tante é definir quem são as pessoas que ogrupo considera estratégico convocar. Dife-rentes meios podem ser usados, como car-tas-convite, e-mails, cartazes, folhetos,divulgação em veículos de comunicaçãocomunitária ou na imprensa ( jornais, revis-tas, telejornais, rádios, sites etc.)

Em todos esses meios de comunica-ção, as informações precisam ser claras ecompletas. As seguintes perguntas podem

ajudar na produção desses materiais:• O que queremos fazer?• Por que queremos realizar esta ação?• Como a ação vai acontecer?• Quando?• Onde?• Quem é este grupo que está organizandoa ação?

Ter um material que, ao mesmo tempo,convida e explica qual será a ação e por queela é necessária é extremamente impor-tante, mas não garante a participação daspessoas. É preciso ser persistente, telefonar,visitar as pessoas em seu local de trabalhoou em suas casas. Mais do que convidá-las,é necessário sensibilizá-las para a impor-tância da sua participação.

Observação: Alguns registros produzi-dos na leitura de mundo podem ser reapro-veitados nesses materiais de convocação.

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86 Inclusão Digital na Medida

Registrando a ação

Enquanto a ação acontece, é importan-te registrá-la. Para isso, é importante definirpreviamente quem ficará responsável poresse registro e verificar as condições dosequipamentos que serão utilizados.

As pilhas da câmera fotográfica estãocarregadas? Há memória suficiente? Se acâmera não for digital, quantos filmes serãonecessários?

Se o grupo pretende gravar entrevistasno momento da ação, é preciso verificar ascondições do gravador de áudio (pilhas,fitas, memória).

Para filmar o desenrolar da ação, aquantidade de fitas ou de memória é sufi-ciente? A bateria está carregada? A câmeraestá funcionando bem?

Repercutindo a ação

A ação já foi realizada. E agora? Aindatemos o que fazer? Sim! Precisamos organi-zar e editar todo o material de registro edifundi-lo para:a) pessoas que convidamos e que colabora-ram com a ação. Assim elas ficam sabendoos resultados e podem avaliar a importânciade sua colaboração;

b) pessoas que não participaram direta-mente dessa ação, mas podem colaborarcom os desdobramentos da mesma;c) pessoas que participaram ou não, masque estão interessadas em realizar açõesfuturas.

Com o editor de texto, o grupo podepreparar uma carta, um relatório ou umareportagem, contando como foi o processo.Esse texto pode ser publicado no blog,enviado por e-mail, publicado em sites, fan-zines, jornais ou revistas.

Com o editor de apresentações, é pos-sível ordenar dados, fotografias, vídeos edepoimentos. Com o material pronto, cabeao grupo organizar um encontro para apre-sentar o material ao público interessado. Osslides podem ser impressos e afixados nainstituição ou na comunidade.

O material bruto das filmagens precisaser editado para se tornar um vídeo quemobilize as pessoas. Além de garantir a edi-ção do material, o grupo precisa se preocu-par com a exibição desse vídeo. Afinal, praque fazer um vídeo que ninguém vai assis-tir? Reuniões, festas, encontros, todas essasocasiões podem ser aproveitadas para apre-sentar o filme sobre a ação realizada. Alémdisso, o material audiovisual pode ser publi-cado na Internet.

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Inclusão Digital na Medida 87

Outros linksMobilização Social: um modo de construir a democracia e a participação.José Bernardo Toro e Nisia Maria Duarte Werneck.

Protagonismo Juvenil: adolescência, educação e participação democrática.Antonio Carlos Gomes da Costa.

Aracati (http://www.aracati.org.br) é uma entidade que desenvolve projetos na áreade mobilização social. Destaque para o livro “Mobilização Social Juvenil”, disponívelno site, com o relato de oito iniciativas envolvendo jovens protagonistas.

Vídeo-ação, um jeito de fazer inclusão digital. Material impresso, resultado da sistematização do processo do vídeo-ação no CDI São Paulo. Disponível no CD-Rom que acompanha esta publicação.

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4capítulo

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a Prática

reflexõessobre

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90 Inclusão Digital na Medida

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Inclusão Digital na Medida 91

Protagonismo e cidadania: umaexperiência prática de inclusãorumo a uma cultura digital

Resgatamos aqui a experiência vividaao longo do processo de sistematização,resultado dos encontros com os atoresenvolvidos na parceria entre CDI, AJAES,COMEC, Prefeitura do Guarujá, Obra SocialSão João Bosco, Projeto Gaia e FundaçãoTelefônica, em busca de pistas que possibili-tem compreender as orientações e os cami-nhos seguidos, bem como visualizar paraonde apontam os rumos dessa inclusãodigital-social-cultural, resultantes dessaintervenção.

Como afirma Oscar Jara, “é necessáriovoltar novamente à prática, agora sim, comuma compreensão integral e mais profundados processos e suas contradições, a fim dedar um sentido consciente à prática e orien-tá-la numa perspectiva transformadora”(2006, 49).

Uma experiência piloto

A consultoria às entidades apoiadaspelo Programa Pró-Menino, da FundaçãoTelefônica iniciada em 2005, inscreve-secomo marco para o CDI Regional São Paulo,pois nasce num momento-chave da reestru-turação da Rede CDI: a criação de umConselho Consultivo eleito pelos ComitêsRegionais e a reconstrução da Proposta Polí-tico-Pedagógica, bem como das diretrizespara o funcionamento das EICs – documen-tos imprescindíveis para a realização damissão da Organização, elaborados porinterlocutores também eleitos, inauguran-do um jeito mais democrático e participati-vo de tomada de decisões na Rede.

Isto é relevante para o CDI São Paulo, jáque o regional tem uma atuação importan-te na Rede neste momento, com o envolvi-

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mento de sua coordenadora pedagógica naprodução de conteúdos para a construçãoda Proposta Político-Pedagógica, com a par-ticipação do regional no Conselho Consul-tivo do CDI e com a eleição da coordenado-ra de projetos sociais para interlocutora daRede. No regional, isto se reflete na constru-ção coletiva de projetos para captação derecursos, que culmina com a aprovaçãodesta consultoria.

Estando o CDI no momento de alçaroutros vôos e tentar novas experiências,tanto no aspecto da gestão como no peda-gógico, o desafio de trabalhar com outrasinstituições que não faziam parte de suaRede apresentava-se duplamente impac-tante. Primeiro porque ainda não havia, emsua atuação, uma prática consolidada emnenhuma das vertentes exigidas pelo proje-to proposto – consultoria e uso de novastecnologias. Segundo porque essa experiên-cia poderia ajudar na construção de estra-tégias pedagógicas que consolidassem aProposta Político-Pedagógica em processode validação na Rede.

Além disso, o momento era propício àsnovas aprendizagens, pois todos os envolvi-dos viviam fases bem parecidas. O CDI, porestar revendo suas práticas pedagógicas,lançando-se em direção ao novo e comparti-

lhando suas descobertas com outras orga-nizações; a Fundação Telefônica por inaugu-rar, junto aos projetos do programa “MedidaLegal”, uma experiência de inclusão digital.E as instituições selecionadas pela parceria,umas porque estavam iniciando o trabalhocom inclusão digital, e outras porque se dis-ponibilizavam a rever a sua prática, dando-lhe continuidade, a partir do que agregariaesta consultoria.

Sendo uma experiência piloto, em quetodos testavam processos e relações, omarco inicial da consultoria se deu quandoo CDI, em reunião com a Fundação Telefôni-ca e, mais tarde, com as instituições selecio-nadas, apresentou as estratégias propostasno projeto, deixando claro que apenas dis-punha de orientações metodológicas geraise estratégias iniciais que ajudariam a des-lanchar o processo, sendo os encontros nascidades e as trocas coletivas práticas deter-minantes para a composição dos passosseguintes.

Dado o passo inicial e acordados ospressupostos, a consultoria seguiu, tendopor base:• Uma intervenção direta, em que todas asetapas eram compostas por uma fase depreparação local, com reuniões entre todosos envolvidos: adolescentes em atendimen-

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Inclusão Digital na Medida 93

to, educadores, coordenadores pedagógicose gerais das respectivas instituições.• Um processo de formação em grupo e emimersão, em que o principal foco era a vivên-cia do uso de novas tecnologias (áudio, foto-grafia, vídeo e web), a troca de experiênciasentre os atores envolvidos e a multiplicaçãolocal.• Um olhar voltado para o protagonismodos adolescentes em cumprimento de medi-da sócio-educativa em meio aberto, estimu-lando a participação de educandos, propor-cional ao número dos representantes dasinstituições, formando um grupo de 50% deadolescentes e 50% de adultos. Todos saíamcom a responsabilidade de apoiar a multipli-cação da metodologia nos núcleos de inclu-são digital de cada instituição.• Uma gestão coletiva, na qual o planeja-mento das ações era realizado pelas áreasdo pedagógico, de projetos sociais e da coor-denação regional do CDI São Paulo, tambémproponentes da consultoria.• A sistematização de processos como prin-cipal característica do segundo momentoda consultoria, a produção e publicação dematerial pedagógico.

Para prosseguirmos, destacaremosalguns momentos que, no decorrer do pro-cesso, revelaram-se importantes à constru-

ção, e que serão analisados a partir do ca-ráter pedagógico da intervenção e seus desdobramentos.

O movimento da prática

O primeiro contato com os adolescen-tes aconteceu com a formação da equipe"Caça-Fantasmas", estimulada pelo CDI aodesenvolver uma oficina de preparação parao primeiro Encontro Geral do grupo, e quetinha como objetivo pensar sobre os sonhos,o lugar no mundo e as dificuldades – fantas-mas – que estavam presentes.

Esse contato foi um marco para odesenvolvimento da consultoria, pois traziajá de início, a base de toda a intencionalida-de pedagógica da metodologia proposta noprojeto: o protagonismo dos adolescentes.

Metodologicamente, o CDI, ao sentar-se lado a lado com esses e essas adolescen-tes, pretendia desconstruir uma forma ban-cária de pensar educação, trazendo o jovempara a condição de ator, para pensar com elesuas questões, juntando-se a quem tam-bém tinha interesse em contribuir, como oseducadores e educadoras dos núcleos deinclusão digital.

É certo que chegar perto e viver, direta-mente com o grupo, as experiências peda-

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gógicas que este propunha, parecia ir alémde sua condição de consultor, mas, mesmosendo estreante nesse tipo de trabalho, oCDI sabia que esse momento era importan-te para conhecer a realidade daqueles comquem iria atuar. Isso porque acredita, assimcomo Paulo Freire, a quem toma por refe-rência metodológica, que não se muda avida de outra pessoa a não ser com ela, apartir das necessidades que ela sente e doque ela enxerga de possibilidades de supe-ração e mudança.

Com essa opção metodológica, osEncontros locais e gerais tiveram interven-ção direta da equipe do CDI, mesmo quandofoi necessário contratar ou firmar algumaparceria externa, como aconteceu no primei-ro Encontro, no qual foi realizado um traba-lho conjunto com a ONG ImageMágica ecom o consultor em pesquisa AntônioNápole e, mais tarde, na última fase do pri-meiro ano, com a ONG “Cala-boca já morreu”e o coletivo “Web Social”. Essa característicaaparece mais fortemente no primeiro ano,quando o CDI tinha pouca ou nenhumaexperiência com as tecnologias de rádio,vídeo, fotografia etc. e, por isso mesmo, pro-curava ajuda.

Retomando a experiência do primeiroencontro do grupo, que ocorreu na cidade

de Cajamar, eram duas as vertentes das ofi-cinas: fotografia e pesquisa. O objetivo dasatividades era dar continuidade à reflexãode questões provocadas pelo exercício ini-ciado localmente com a formação da equipe"Caça-Fantasmas":

“O que dizem de mim? O que dizempara mim?", eram perguntas que iniciavama formação em fotografia dada pela Image-Mágica, em parceria com o CDI nesseEncontro. “Precisamos ir além e falar por nósmesmos” dizia a Raquel, facilitadora da ins-tituição parceira. “Mudar a imagem queconstruíram de nós para outra que quere-mos ser”, diziam Alex, Bruno, Cleber, adoles-centes que participavam da formação. (Rela-tório do Encontro, 2005)

No mesmo encontro com a oficina depesquisa, o grupo tomou por base essedebate, compreendendo que, para mudaressa imagem, era preciso investigar as opor-tunidades que eles tinham em seu entorno,para daí elaborar um plano de ação que pro-pusesse a utilização dos recursos do núcleode inclusão digital, como instrumentos paratransformar essa realidade.

Se a oficina de fotografia serviu comoetapa de sensibilização dos jovens para aproposta, encantando-os com efeitos eluzes, a pesquisa foi determinante para seu

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envolvimento no núcleo, pois eram muitosos desafios: pensar o que queriam saber, oque era necessário conhecer para mudaruma situação; sair do seu mundo particulare abordar pessoas para saber o que elaspensavam sobre o que eles estavam trazen-do; tabular dados e classificá-los por temas,tornando-os mais claros com a construçãode gráficos; destacar o que seria mais rele-vante para o plano de ação etc.

Os adolescentes capacitados no pri-meiro Encontro participaram de todos osmomentos, além de ajudarem na multipli-cação das oficinas em seus núcleos, com aresponsabilidade de sensibilizar e agregaroutros ao trabalho.

Ao chegar para o segundo Encontro, mo-mento de pensar sobre o que os dados estavamdizendo, os adolescentes, mais amadurecidospelo processo, já distinguiam coisas como:

"O total dos dados não dá os resulta-dos verdadeiros porque cada uma das cida-des aplicou os questionários em lugaresdiferentes, tipo, se um grupo estava no cen-tro da cidade e foi a uma escola particular, oresultado é diferente de uma escola públicaporque os moleques são diferentes." (Cleber,adolescente do Guarujá).

De posse dos dados, ao mesmo tempoem que se planejava produzir rádio, vídeo,

jornais, revistas e sites nos Núcleos, tendo apesquisa como apoio e um projeto de açãocomo referência, pensava-se sobre o quefazer com aqueles dados nas cidades. Gua-rulhos organizou os resultados locais e pre-parou uma reunião na Câmara Municipal. AFundação Telefonica e o CDI, com a ajuda dasinstituições envolvidas, reuniram algumasautoridades que trabalhavam com criançase adolescentes das cinco cidades, dirigentespúblicos e de organizações civis da cidade deSão Paulo, em um evento que significou umaprimeira iniciativa desse grupo, de sensibili-zação para a realidade desses adolescentes,trazendo a público um retrato do que estavaacontecendo no trabalho.

Ao mesmo tempo em que tudo issoocorria, os adolescentes envolvidos tinhamos seus primeiros contatos com as tecnolo-gias: câmeras fotográficas, gravadores, fil-madoras, tabulação de dados on line, uso deplanilhas para montar gráficos e apresenta-ção em slides.

Além de muitos outros resultados,como a aprendizagem dos participantes dasoficinas com a aplicação de questionários narua e o uso de tecnologias que não lhes eramacessíveis, como o email, sites de relaciona-mento, blogs, flogs etc, os adolescentes seapropriaram da estratégia de abordagem, de

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tal forma que todos os planos para uso dosnúcleos apontavam uma nova pesquisa.

Em síntese, o primeiro ano da consulto-ria significou a vivência, o aprender fazendo.Parecia tudo meio confuso, desorganizado,como relataram alguns integrantes do grupo.Foi no segundo momento, "com a sistemati-zação do processo, que tudo começou a fazermais sentido". De acordo com Leonel, educa-dor do COMEC – Campinas, "parecia necessá-rio viver tudo daquele jeito, porque se nãofosse assim, seria só teoria, mas pensar porque fizemos e como isso foi se desenvolven-do na instituição, após ter vivido, e agora como amadurecimento, está sendo muito impor-tante para entendermos como fazer na EIC".

Nos encontros do segundo ano, o resgatefoi a base de todo o processo, mas os exercíciosem grupo, para compartilhar e pensar osaprendizados velhos e novos, as novas pergun-tas que surgiam com as reflexões e, a partirdaí, as recomendações que o grupo fazia parasi e para outros com o mesmo desafio, tudoisso possibilitou a construção de um desenhode uma prática pedagógica, não só vivida, mascom projeções que apontavam para novaspossibilidades antes não pensadas.

Com relação ao CDI, percebemos doisníveis de intervenção: como capacitador,quando sua equipe desenvolvia as ativida-

des diretamente com o Grupo; como parcei-ro, quando planejava e realizava com outraorganização as oficinas pedagógicas. A pri-meira era muito tranqüila, mas não davaconta de todas as demandas do projeto. Asegunda não era tão simples de adminis-trar, pois as organizações convidadas, ape-sar de terem uma proposta muito afinadacom o CDI, tinham sua própria metodologia.

No geral, o processo foi muito enrique-cedor, pois favoreceu ao CDI São Paulo osprimeiros contatos com as chamadas novastecnologias e provocou uma necessidadeinterna de deixar mais claro o jeito CDI defazer inclusão digital, além de possibilitar oexercício de novas práticas com as EICs. Emsuma, ao olhar para fora e compartilhar suaproposta político-pedagógica com outrosparceiros, a demanda por retomar a práticade inclusão digital à luz da identidade CDItomava corpo, provocando-lhe a necessida-de de sistematizar a experiência para obteros elementos práticos que caracterizam asua metodologia de inclusão digital.

Inclusão digital e cidadania

Segundo Bernado Toro, a cidadania nãoé legítima se não somos criadores ativos denossa própria história. Pois "toda ordem

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social é criada por nós. O agir e o não agircontribui para a formação e consolidação daordem em que vivemos" (1996: 7). Ora, se aordem social que aí está foi aceita por nós,então temos como mudá-la. E mudar é exer-cer a cidadania. Para isso, é imprescindível aparticipação em processos coletivos queobjetivam mudar uma realidade não satis-fatória, pois é no exercício da participação,construído nos espaços democráticos, queisso se realiza.

Sendo esse um espaço de troca é tam-bém de aprendizagens, de construção derelações e de conquistas coletivas. Toro afir-ma que "aprendemos a conversar, a decidir eagir coletivamente, ganhamos confiança nanossa capacidade de gerar e viabilizar solu-ções para nossos problemas, fundamentospara construção de uma sociedade comidentidade e autonomia" (op.cit., 7-16).

No livro "A educação como prática daliberdade", Paulo Freire fala-nos disso, quan-do trata da cultura do silêncio, instauradapela cultura da maioria, que é o contra-senso da democracia. A cidadania é, tam-bém, para ele, um exercício da prática daliberdade, em que o diálogo é o principalinstrumento. Assim, nos espaços educativosque deverão ser, acima de tudo, comunicati-vos, o diálogo entre as pessoas para enfren-

tar as suas questões é condição imprescin-dível a uma prática pedagógica voltada àliberdade e a transformação social.

Mas como transformar os núcleos deinclusão digital em espaços educativos, vol-tados para a construção dessa cidadania?

Um dos problemas a enfrentar era o deachar que tudo isso poderia ser chato paraos adolescentes. Além disso, a angústia doseducadores e coordenadores das institui-ções era de que os adolescentes, sendo mui-to instáveis e difíceis de serem conquista-dos, não dessem continuidade aos traba-lhos iniciados; que as cargas horárias dife-rentes de cumprimento da medida sócio-educativa e o fato de os adolescentes viremde vários lugares da cidade dificultavam aorganização dos grupos.

Nem todas as angústias do grupo fo-ram resolvidas nos Encontros, nem era esseo objetivo, mas o debate trouxe um olharmais crítico às experiências, revelando algu-mas pistas à prática. Com relação à partedesse bloco, por exemplo, os adolescentestrouxeram falas que contribuíram muitocom a reflexão do grupo:

"Existem duas maneiras de dar aulaaos adolescentes, uma chata e outra legal; achata é aquela que não escuta, só fala emanda fazer exercícios chatos no computa-

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dor; a legal é quando os adolescentes deci-dem junto o que fazer, e onde mexer"(Jéssica, da AJAES de Jandira, no I Encontrode Sistematização, outubro de 2006).

Como fazer isso funcionar, sem correr orisco de deixar o trabalho solto demais? Comotrabalhar sem saber o que vai acontecer?

O próprio grupo percebeu que era pre-ciso enxergar os adolescentes como inter-locutores e não apenas como receptores. Oeducador Leonel, do COMEC, mais uma veznos diz em seu depoimento:

“Tínhamos medo de dar uma câmerapara eles, porque não acreditávamos aindaque pudessem ser responsáveis. Tínhamosreceio de deixar que falassem em públicopara explicar algo que o grupo estava fazen-do, porque sabíamos que ia ser difícil paraeles, e sei lá... podiam dizer coisas, compro-meter a instituição, o trabalho, mas aí des-cobrimos que não havia outro jeito e tenta-mos. Desde então, foi muito diferente.”

Outro grande desafio apresentava-se:fazer uma educação mais democrática e par-ticipativa, e saber quando e como intervir, pre-servando a liberdade e o respeito ao coletivo.

No ritmo de várias outras reflexões, ogrupo percebeu que é muito importanteplanejar, que o educador tem uma intencio-nalidade, um objetivo ao se encontrar com

aquele grupo, e que se não pode jogá-lofora, mas negociar o jeito de realizá-lo, tor-nando todos os que ali estão em potenciaisparceiros que, juntos, decidirão comoenfrentar os problemas. Outra descobertado grupo é que existem dois momentos pa-ra esse planejamento: um com a equipe, emque se definem objetivos e estratégias paraenvolver os educandos nas oficinas, e outro,com os educandos, ao decidir a ação que o grupo realiza com o apoio das oficinas.Essa prática é o grande diferencial de umprocesso educativo democrático, pois pro-voca os educandos a se enxergarem comoagentes de mudança, por isso protagonistasde suas histórias, cidadãos.

Mas onde entra a inclusão digital?

Segundo Jesús Martin-Barbero, "essaempatia dos jovens com as novas tecnolo-gias é um empatia cognitiva, modos de rela-ção com o saber que passam por essas tec-nologias, mas empatia expressiva também.Novos modos de dizer, novos modo de nar-rar, que passam por essas novas sensibilida-des" (1999, 74).

“Eu nunca imaginei que podia pegaruma filmadora e fazer eu mesmo um filme!

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Assim, parecido com os da televisão!", diziaDione, adolescente da EIC Padre Moreira,entusiasmado com a produção de um vídeoem que registrou as suas dificuldades derelacionamento, e a de seus pares em Liber-dade Assistida, com as escolas da região emque mora, em São Paulo.

Também Mayara, adolescente da cida-de de Jandira, ao fazer uma provocação parao grupo, revela uma pista para esse jeito deeducar.

“Com o olhar sobre a objetiva da filma-dora, ela registrava a avaliação do grupo,mas naquele momento chegara a sua vezde falar. Assim, colocou a filmadora do ladi-nho e disse: "que tal se a gente dissesse aosadolescentes do mundo inteiro o que nósadolescentes estamos fazendo aqui?"(depoimento retirado do filme, "Que bom!Que pena... Que tal?", como registro do pri-meiro Encontro do grupo – 2005)”

Nesses depoimentos, percebemos oquanto é possível a prática da liberdade e dodiálogo proposta por Freire como métodopara gerar autonomia e protagonismo, pres-supostos da cidadania que queremos. Seunirmos essa vontade de mudar que osjovens já possuem às facilidades de uso dasferramentas atuais de informação e comu-nicação, além da aptidão da juventude para

se expressar e da natural empatia comessas tecnologias à qual Barbero se refere,concluiremos que a prática da inclusão digi-tal é determinante e estratégica na forma-ção cidadã e na inclusão social e culturaldesses adolescentes.

Agregado a isso, temos ainda a popula-rização das Tecnologias de Informática e Co-municação, o que muda o conceito decomunicação. De volta a Barbero, "até agora,vimos a comunicação como a que veicula,que faz circular, que reproduz. Pois bem, apartir do computador já não é mais isso. Daío computador começa a ligar-se com a TV,com o vídeo, etc., e esses são os novos mo-dos de produção de conhecimento. Não ape-nas novos modos de armazenar e sim deproduzir" (op.cit., 77).

Com a simplicidade do uso de eletrôni-cos e a produção de áudios, vídeos, fotogra-fias, e também o barateamento das tecnolo-gias, como câmeras fotográficas, filmadorasetc, o tempo e a urgência do dia-a-dia saemdo universo doméstico e privado e se tor-nam públicos. O músico faz seu disco no“fundo de quintal”, com um computadorpessoal, e o vende diretamente para seusfãs, criando um novo canal de relaciona-mento e colaboração; os jovens fazem fil-mes sobre suas realidades e os publicam na

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internet; surgem os concursos de filmes debolso, de minuto etc, que estimulam, cadavez mais, essa produção doméstica.

É impossível dar as costas a essasmudanças, se somos responsáveis por in-cluir pessoas nessa cultura digital, pensa oCDI. Fazer por nós mesmos é lema da orga-nização. Mudar a realidade que nos cerca écidadania. No que concerne a fazer dessemovimento digital um instrumento parainclusão social e cultural, é provável que ocaminho "mais legal", como diriam osjovens, seja o de colocar uma filmadora namão de um adolescente, muitas vezes autorde alguma infração, e torná-lo responsávelpelo que diz e faz, estimulando-o a, ele pró-prio, mudar sua realidade. Foi essa a opçãopedagógica do CDI, frente ao desafio quelhe foi colocado.

Questões como essas são levantadastodo o tempo, nesse ambiente de provoca-ção metodológica. O CDI, como um protago-nista da história da inclusão digital, toma-as como matéria de reflexão, trazendo odebate às instituições parceiras e a outras,com as quais também dialoga. No contextodo ritmo acelerado de desenvolvimento dastecnologias e de acesso a elas, essa organi-zação começou preocupada em dar acesso acomputadores nos morros cariocas e tenta

agora, a partir desse diálogo e de suas expe-rimentações, ressignificar seu modo defazer inclusão digital, deixando claro que asconexões proporcionadas por esse movi-mento devem ser canalizadas para a mobili-zação social. O acesso, assim como a cidada-nia a que nos referimos, não mais é passivo,receptivo, mas provocativo, crítico, produtor,ativo.

Assim sendo, é importante enfatizaralgumas das necessidades que emergemdessa prática, tais como:• a manutenção de um ambiente coletivoonde o diálogo é utilizado e as experiências devida de todos, independentemente da idade edo papel que assumem, são respeitadas;• a preocupação contínua em fazer da trocade experiências a melhor forma de aprender,dando condições a todos de produzir emgrupo e aproveitando as habilidades pes-soais que se apresentam com a convivência;• a construção de um espaço de criação,onde todos são autônomos e usam as tec-nologias da informação e da comunicaçãopara mudar a sua vida e a de seus pares.

Difícil? Talvez, ideal. Mas o fundamen-tal é que a objetividade do dia-a-dia lembra-nos sempre do grande fosso da desigualda-de que a falta de oportunidade provoca, e aíse inclui o acesso digital, que não nos deixa

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espaço para acomodação. Como colocamalguns dos pensadores que citamos aqui, éno exercício de encontrar, de dialogar, demudar a nós mesmos e ao mundo, quevamos prosseguindo e aprendendo, com

tudo o que nos faz ser apenas um grupo,mas também muitos, com nossas diferen-ças, possuídos que somos por uma únicacausa: construir uma sociedade mais justa edigna para todos.

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Sobre o CDIPaulo Freire

O método dialético Novas tecnologias

maissAberpara

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Um método para inclusão digital:tecnologia para transformação social

Cristiane Fornazier*, coordenadora pedagógica do CDI – MatrizFátima Oliveira**, coordenadora peadgógica do CDI – São Paulo

Em 1995, quando o mundo da Internet ainda estava quase restrito à produção de co-nhecimento acadêmico e a áreas militares estratégicas, e o computador era uma ferramen-ta para poucos, nascia o Comitê para Democratização da Informática (CDI). Esse evento deu-se em meio a um intenso movimento pela democratização do país e à criação dos comi-tês contra a miséria e pela vida, ligados ao grande mobilizador social Betinho de Souza.

Pioneiro em ações de inclusão digital, o CDI iniciou sua atuação lançando uma campa-nha de arrecadação de computadores para populações de baixa renda. Cinco anos depois decriado, e em franco crescimento, já funcionava em várias cidades brasileiras e tinha algunscomitês regionais constituídos. Mas, apesar da expansão e de ter objetivos claramente defi-nidos, a organização necessitava de um método para fazer sua missão acontecer. Querialevar um diferencial às suas Escolas de Informática e Cidadania (EICs). E, para isso, desde oinício, a pedagogia de Paulo Freire foi o grande referencial. Mas, como não existiam orienta-ções práticas, cada um fazia do seu jeito.

A primeira elaboração desse padrão chegou ao CDI como contribuição do Núcleo deInformática Aplicada à Educação (NIED) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).Após várias experimentações e debates em torno dessa proposta, porém, a Rede CDI perce-beu que sua prática estava se distanciando do referencial inicial.

Um movimento interno de estudo do método de Paulo Freire deu início a um processode reconstrução da Proposta Político-Pedagógica, que avançou com a criação de um grupode interlocutores formado por representantes de regiões eleitos pela Rede.

CDI

* Cristiane é mestra emEducação pela Universidade

Estácio de Sá.** Fátima é doutoranda

em Ciências Políticas pelaPUC-São Paulo.

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Em 2005, esse mesmo grupo sintetizou sua pesquisa num texto que continha os pres-supostos teóricos baseados em Paulo Freire, e também uma série de orientações metodoló-gicas para apoiar o trabalho dos regionais com as EICs. Nascia então a primeira versão daProposta Político-Pedagógica (PPP) do CDI, construída e validada por sua Rede.

Autor de um método de alfabetização de adultos que o tornaria conhecido internacio-nalmente, Paulo Freire parte do princípio de que a educação é um processo de aprendizagemem que todos somos sujeitos em busca de expressão no mundo. Nesse sentido, partilhamosa mesma condição: a de aprendizes que querem transformar-se em agentes de suas pró-prias vidas, passando da dependência à autonomia. Nesse sentido, a educação é um ato,uma ação transformadora que gera conhecimento, enquanto cria alternativas para mudar,para melhor, a realidade posta. Daí a importância de uma ação cultural. Pensando nisso,Paulo Freire criou os Círculos de Cultura que, na contramão das escolas de educação formal,possibilitavam que todos os envolvidos no processo se sentissem irmanados pela mesmabusca.

Para Freire, ao utilizar os conhecimentos de que nos apropriamos para viver melhor,atuamos como autores de nossas histórias pessoais e da história coletiva. Quem não conse-gue participar ativamente desse processo, pronunciando-se como co-criador de si mesmo eda realidade, precisa ser despertado, provocado a se pronunciar. Disso depende o exercíciopleno de nossa condição humana. Entretanto, se alguma coisa na estrutura cultural, políti-ca e social em que estamos inseridos impede-nos de exercer nossa humanidade integral-mente, se algo nos exclui de alguma dimensão dessa condição fundamental, o ato educati-vo deve ajudar-nos a refletir sobre como é possível transformar essa situação, juntamentecom os demais sujeitos envolvidos.

Ao ver as coisas ao nosso redor, ao constatá-las e ao nos tornarmos conscientes, pode-mos despertar para nossa condição no mundo, para nossas relações e para a percepção deque a vida pode ser transformada, por meio de nossa ação. Refletir e agir, agir e refletir sãopráticas que abrem espaço para o diálogo entre sujeitos que partilham uma mesma realida-de. Pronunciar-se no mundo sobre si e sobre o mundo promove a consciência de si e da rea-

Paulo Freire

maissAberpara

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lidade. É esse o ato educativo que Paulo Freire defende. Sua pedagogia é dirigida a todosaqueles que estão sob alguma condição de dependência, de opressão e de exclusão, aos quesofrem à margem da sociedade e não conseguem expressar-se, já que não encontram espa-ço para protagonizar suas histórias. Nesse sentido, o ato educativo visa a construção de pes-soas autônomas, sensíveis, conscientes de sua condição e capazes de transformá-la.

Para Paulo Freire, o mundo da palavra existe para que todos, de posse de seus códi-gos e significados históricos, despertem e se tornem autores e protagonistas de suas histórias, transformando assim a realidade excludente e opressiva. O CDI foi criado para que todos possam ter acesso ao mundo das tecnologias digitais, fazendo delas instru-mentos de expressão e comunicação que convocam sujeitos a agir e a transformar reali-dades pessoais e coletivas. Para o CDI, esse é um modo objetivo de construir as bases de uma sociedade mais justa, onde todos tenham iguais oportunidades. Por isso a opção porPaulo Freire.

Assim, retomamos aqui alguns dos pressupostos metodológicos da pedagogia dePaulo Freire, para reelaborá-los como fundamentos da prática político-pedagógica do CDI.

Pronunciar o mundo e se pronuciar no mundoDialetizar o mundo significa vê-lo em movimento, mudando a todo instante, mundo

que envelhece e se renova, em decorrência de nossas intervenções ou omissões. Assim, numcircuito infinito, transformamos o mundo e o outro e somos igualmente transformados poreles. Por isso, o ser humano é um ser inconcluso, em constante quefazer e o conhecimento,um ato que necessariamente envolve a convocação ao outro, em nome da ação humanasobre a realidade. Conhecer, então, não é um ato puramente individual, muito menos restri-to ao contexto escolar, mas que se realiza no mundo.

Para o CDI, mergulhar na própria realidade e conhecê-la é o primeiro passo para que osujeito pronuncie-se no mundo. É preciso, portanto, dizer a palavra, expressar-se em meio aesse mergulho. Homens, mulheres, jovens, crianças, seja na condição de educadores ou deeducandos, mas sempre como cidadãos, perguntam-se: “Qual o meu lugar no mundo? O quefaço aqui? Por que a palavra é privilégio de poucos? Posso me pronunciar no mundo? Posso

O métododialético

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mudar a minha história? Meu mundo se relaciona com o do outro? De que maneira? Comofaço para mudar essa maneira de interagir?”

Ao buscar respostas sobre si e sobre a sua realidade, as pessoas primeiro descobrem-seinseridas em uma situação histórica, em uma condição de vida, para só então decidir acercado quefazer.

A esse exercício, Paulo Freire chama leitura de mundo. Ler o mundo é contemplá-lo,investigá-lo, provocá-lo a responder, pronunciá-lo, intervir nele. Por meio desse ato de inter-venção na realidade, dá-se um processo de conhecimento capaz de transformar as pessoase o mundo. Trata-se, pois, de um movimento contínuo de leitura da realidade e de busca deseus sentidos para a transformação dessa realidade (do mundo e do sujeito). A reflexão e ainternalização desse dinâmico processo gerador de conhecimento constituem o que chama-mos de método dialético.

Como afirma Paulo Freire, o conhecimento “exige uma presença curiosa do sujeito emface ao mundo. Requer sua ação transformadora sobre a realidade. Demanda uma buscaconstante. Implica invenção e reinvenção. [...] Conhecer é tarefa de sujeitos, não de objetos.E é como sujeito e somente enquanto sujeito, que o homem pode realmente conhecer.” 1

Para Freire, a realidade não é; ela está sendo. Por essa razão, deve ser constantemente pro-blematizada, questionada em todos os seus porquês, analisada, interpretada e re-interpretadade diferentes pontos de vista, de modo a nos preparar para tomarmos as decisões que envolvemsua transformação. Aqui emerge um segundo pressuposto do pensamento paulofreireano.

A educação como ação problematizadora e emancipadora A problematização é um exercício de conhecimento de si e dos outros, da realidade em

nós e ao nosso redor. Trata-se de um questionamento constante, que se dá no decorrer daeducação do sujeito e que se realiza sempre com vistas a uma ação para mudar uma reali-dade identificada e analisada pelo grupo de educandos e educadores. Por isso, a problema-tização tem um caráter emancipador, visto que emancipar é conceder autonomia. Assim,seres humanos provocados pela reflexão sobre sua realidade, deixam sua condição de opres-são, emancipam-se e se sentem aptos a transformar-se/transformar o mundo, desse modoconstituindo-se como agentes de mudanças.

maissAberpara

1 Extensão e Comunicação, RJ:Paz e Terra, 1977.

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Esse modelo de educação concretiza-se quando o grupo investiga a realidade (a inte-rior e a exterior) para conhecê-la melhor, planeja e executa uma ação, refletindo continua-mente durante o processo.

A educação problematizadora tem na criatividade o motor de ações e reflexões autên-ticas, porque estimuladas pela realidade. Responde, assim, à vocação humana de legitimar opensamento que se compromete com a efetiva transformação da realidade. Nesse sentido,“...a educação para a libertação se constitui como um ato de saber, um ato de conhecer e ummétodo de transformar a realidade que se procura conhecer” 2.

Se, para a educação libertadora, transformar significa pronunciar-se, o caminho paraque isso aconteça abre-se na direção de um terceiro pressuposto paulofreireano.

O caráter dialógico e horizontal da educaçãoEsse caráter manifesta-se no contexto de um grupo que dialoga e decide quefazer para

mudar uma realidade. Trata-se de um conceito importante na pedagogia de Freire, pois,como já foi posto, esse educador entende que o ser humano é inconcluso e precisa do outropara construir sua identidade, conhecer-se, conhecer o mundo, criar e recriar a realidade.Assim a busca do quefazer é um processo de conhecimento que se realiza por meio da par-tilha de saberes entre sujeitos postos numa relação dialógica e horizontal, em que não exis-te “o-que-sabe-mais”, mas pessoas diferentes, com leituras diferentes do mundo, resultantesde suas histórias de vida. No grupo, essas pessoas constituem-se como atores que intera-gem para construir conhecimento.

Tal processo, contudo, nunca está dissociado da prática, isto é, não está restrito ao dis-curso, às discussões estéreis e às análises exaustivas da realidade, como se esses atores nãofizessem parte do mundo ou como se o mundo se restringisse à experiência interna dogrupo. Quando investigamos e buscamos as causas do que acontece a nós e aos outros, inse-ridos em uma realidade comum, estamos dialogando com o mundo e conseqüentementeaprendendo com ele e com os outros.

O diálogo é o ato de criticamente perguntar, ouvir, pronunciar a palavra mobilizadora e,por isso mesmo, exige reflexão e gera ação.

Para Freire, dizer a palavra é pronunciar o mundo e existir com ele.

2 Acción cultural y alfabetización de adultos.

Seminário do prof. Paulo Freireno Colégio Latino, em Roma,

novembro de 1972.

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Dialogar, então, é dizer a palavra e convidar o outro a assumir sua história conosco.Assim é preciso estabelecer um processo educativo de aprendizagem em conjunto, que

gere um compromisso com a realidade na qual cada um e todos estamos inseridos, lem-brando que a educação não é neutra, tem sempre caráter político, em função da intenciona-lidade de quem a pratica, intencionalidade essa que se faz presente em cada uma das pala-vras, atos e gestos do educador.

Foi por meio de sua visão política de educação que Freire vislumbrou a possibilidade deuma educação libertadora, dimensão que não pode ser ignorada, pois, se o for, ocultará umaparte significativa da realidade que se quer modificar.

Nesta leitura da obra de Freire, feita no contexto do CDI, encontramos ainda um quar-to pressuposto que nos ajuda a compreender...

A não neutralidade da educação e seu caráter político Por trás de todo discurso e de toda ação existe um sujeito, uma escolha, um objetivo,

uma intenção.Freire entende que todos somos sujeitos que pensamos e agimos de acordo com nossa

realidade e modo de viver. Por isso somos seres políticos. Mesmo quando, diante de umadada situação, cruzamos os braços e nos omitimos, ainda assim estaremos fazendo umaopção política.

Quando escolhemos um modo para que o trabalho aconteça nas EICs, quando optamospor um parceiro entre vários na comunidade, estamos fazendo uma opção política. Para pro-ceder a essa e a outras escolhas, refletimos sobre o quefazer, gerando assim um posiciona-mento diante daquela realidade e, portanto, atuando politicamente.

Para o CDI, assim como para Freire, o processo educativo é um modo de estimular aconstrução de um mundo onde todos sejam sujeitos da história. Essa ação educativa impli-ca possibilitar o acesso às tecnologias digitais para os excluídos delas, e assim estimulá-losa recriar suas histórias, inscrevendo-se no mundo como cidadãos.

Fazer isto leva-nos a analisar um quinto pressuposto.

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A não neutralidade das tecnologias A tecnologia não é novidade. Sua origem é a condição humana. Ela resulta da relação

entre os seres humanos e o mundo natural; é meio e fruto da ação humana sobre a realida-de. Na história, a cada desafio que lhe é proposto pelo meio, o homem cria novas possibili-dades técnicas que poderão melhorar ou piorar sua vida. Exemplo disso, na educação, é acriação da imprensa, que resultou numa revolução sem precedentes e possibilitou o acessode milhões de pessoas ao conhecimento sistematizado e veiculado por livros, jornais, revis-tas, folhetos etc. Porém, como tudo o que existe, a tecnologia também tem várias facetas, oque fica patente quando constatamos que a pesquisa atômica levou, por um lado, à fabrica-ção da bomba e, por outro, ao tratamento do câncer.

Paulo Freire, como homem do seu tempo, foi um entusiasta do uso das tecnologias dis-poníveis na época. Em seu trabalho com os Círculos de Cultura, ele já se utilizava de proje-tor de slides, material impresso, mimeografado etc. Isso também acontecia em outras inicia-tivas de educação popular, em que se produziam de boletins a programas de rádio paramobilizar as comunidades envolvidas, com o objetivo de levá-las a pensar sobre seus proble-mas, procurando resolvê-los, e a valorizar e divulgar a cultura local.

Até aqui, percebemos que, assim como ocorre na educação, por trás de toda tecnologia,há sempre alguém pensando em como, por quê e para quê usá-la. A natureza da ferramen-ta tecnológica permite que a humanidade a utilize tanto para dominar e destruir a nature-za, para oprimir e violar direitos quanto para educar, restaurar, libertar. A vocação históricado ser humano é ser sujeito de seu tempo, para o melhor ou para o pior. Isso quer dizer quea humanidade, de posse de suas potencialidades, do conhecimento de sua realidade e dosrecursos técnicos de que dispõe, pode transformar o mundo, se de fato desejar fazê-lo.

Se é assim, então por trás de toda tecnologia também existe uma escolha política. O que fazer? Por que usar a tecnologia? Para que usá-la? Como usá-la?

O grande desafio de educadores e educandos que compõem a Rede CDI e daqueles quese propõem a fazer Inclusão Digital é promover ações educativas que incentivem o usosocial crítico e criativo das tecnologias da informação e comunicação. Diante disso, temos a

Novas tecnologias

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responsabilidade de fazer do acesso a essas tecnologias um canal que mobilize redes e pro-duza possibilidades concretas de mudança, que gere ações que levem à transformaçãosocial e contribuam para a formação de cidadãos agentes dessa mudança.

Desafios políticos: onde queremos chegar? Como chegar?Com o objetivo de tornar mais clara sua metodologia, o CDI identificou quatro eixos

estratégicos que, ao mesmo tempo em que auxiliam o desenvolvimento da prática pedagógi-ca, ajudam a observar o movimento de sua missão nas comunidades em que a instituição atua.

Mergulhando na comunidade ou na realidadeTrata-se da aplicação de uma estratégia inicial, voltada à construção de conhecimento,

visto que a comunidade é tida como o lugar onde o sujeito pode exercitar um olhar maisagudo sobre a realidade e compreender os mecanismos que a determinam. A comunidadegera o conteúdo do processo de aprendizagem da educação cidadã.

Educandos e educandas agindoPara o CDI, ser cidadão e cidadã é ler o mundo, sentir, pensar, interagir e agir sobre o

meio, passando da passividade e dependência ao protagonismo. A utilização das ferramen-tas tecnológicas próprias de seu tempo permitem ao sujeito pronunciar o mundo e se pro-nunciar no mundo. No processo de pensar em como agir e por que agir, os educandos e aseducandas do CDI descobrem-se parte de um coletivo no qual podem e devem intervir, aomesmo tempo em que se desenvolvem como indivíduos, como produtores de conhecimen-to e como usuários da tecnologia em busca de autonomia.

EIC fazendo RedeAo pensar em maneiras de mudar uma dada realidade e nos recursos locais disponíveis

para isso, as EICs iniciam um processo de articulação local. À medida que uma ação localamadurece e consegue agregar mais pessoas, outras organizações, o poder público e atéoutras EICs, ela se torna mais forte, ampliando assim seu poder de mobilização na comuni-dade e, por vezes, atingindo toda uma região ou mesmo toda uma cidade.

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EIC como referência na comunidadeA EIC torna-se referência na comunidade, quando se utiliza do potencial das tecnolo-

gias da informação e comunicação para estimular o protagonismo dessa mesma comunida-de, captando recursos financeiros, humanos e tecnológicos e identificando seu potencialpara gerar respostas aos problemas locais. Ao mesmo tempo, disponibiliza suas instalaçõesde forma receptiva e criativa para mobilizar as pessoas que ali vivem e as organizações queali se instalam.

Nossa prática: como o trabalho pedagógico acontece na EIC?O conhecimento é, para nós como para Paulo Freire, algo que surge da intervenção

do ser humano na realidade, o que, por sua vez, exige um diálogo entre as pessoas envolvi-das e o mundo onde vivem e interagem, diálogo esse mediado pelas linguagens e pelosrecursos tecnológicos próprios de seu tempo. Pensando assim, o método de inclusão digitalque adotamos prevê uma prática interventiva baseada em três momentos: (1) o mergulho narealidade e na comunidade, que possibilita a identificação de uma situação-problema oulimite, (2) gerando um plano de ação, no qual se levantam as informações (o quê, onde,como, quem e quando) e (3) desencadeando uma ação que pretende encaminhar, total ouparcialmente, aquela situação. Todas essas etapas são mediadas pelas tecnologias da infor-mação e comunicação.

Como isso acontece?

Lendo o MundoLer o mundo é mergulhar na realidade e procurar percebê-la, senti-la, desvendá-la. O

momento da leitura do mundo é o momento das descobertas, de se perguntar que mundoé esse, de se inscrever nele e de constatar como as tecnologias podem ajudar a mudar assituações presentes. É também o primeiro momento, no qual educandos e educadores saemda EIC para conhecer melhor o lugar onde se encontram, caminhando por suas ruas, ouvin-do e vendo pessoas, observando e participando de situações a que nossos sentidos já seacostumaram e que, por isso mesmo, já não nos sensibilizam.

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Problematizando o mundo, conhecendo o próprio chãoÉ chegada a hora de refletir sobre o porquê das situações descobertas. De pensar sobre

o jeito como as diferentes pessoas respondem a esses acontecimentos, de identificar qual asituação que mais aflige os que vivem naquela comunidade (situação-limite ou situação-problema), de relacionar os recursos humanos e tecnológicos passíveis de mudá-la, de pla-nejar uma ação coletiva para superá-la. É o momento de pensar em como pronunciar omundo.

Agindo sobre o mundo e pronunciando-oApós identificar a situação-problema e definir o que fazer (a ação), é hora de planejar

como fazer (plano de ação), e de executar a ação planejada. É hora de convocar, de mobilizara comunidade e de se organizar com ela para enfrentar o problema.

Avaliando e refletindo sobre o processoA avaliação perpassa todo o processo, ora como apoio à continuidade das fases plane-

jadas com o grupo, ora como leitura das aprendizagens individuais e coletivas adquiridaspor todos os envolvidos: educandos, educadores, coordenadores etc. Para o CDI, mais do quemedir aprendizagem, a avaliação é um instrumento de conhecimento, porque possibilitaacessar a prática, refletir e retornar a ela de modo mais qualificado.

Para que isso realmente aconteça, porém, é preciso registrar, produzir uma memóriaconcreta de todo o processo vivido, parando em alguns momentos para resgatá-la. O regis-tro permite recuperar o que foi realizado até ali e planejar novas intervenções futuras. Ogrupo vai então adquirindo significado, vínculos e segurança no manejo das ferramentastecnológicas. Com a mediação comunitária, saímos de um processo de consciência ingênua,em que nos víamos isolados do mundo, para o processo de conscientização, quando pronun-ciamos o mundo e passamos a fazer parte ativa dele.

Ao nosso ver, comungar com o pensamento paulofreireano é construir uma práti-ca educativa que contribua efetivamente para a formação de seres humanos sensíveis,solidários, críticos e conscientes de si e sujeitos da realidade. Este é um desafio que não sepode encerrar no discurso teórico, como já observamos aqui, mas que precisa instalar-se

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na realidade, o que exige investimento na capacidade do grupo de costurar a teoria e a prática pois, para Freire, “libertação autêntica (...) é práxis, que implica a ação e a reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo. (...) O que fazer é teoria e prática. É reflexãoe ação.”

Referências bibliográficas

Livros e artigos:

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Outros documentos:

Proposta Político-Pedagógica do CDI: reconstruindo nossas práticas, Rede CDI, 2005.

Case Study – CDI São Paulo: Consultoria em inclusão digital – uma estratégia para explorar novos caminhos de inter-venção social e para gerar alternativas de sustentabilidade.

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Inclusão Digital na Medida 115

Portal Pró-Menino –http://www.promenino.org.br

Revista A Rede – revista mensal especializada em projetos de InclusãoDigital. http://www.arede.inf.br

Proposta Político-Pedagógica do CDI, disponível emhttp://www.cdi.org.br

Instituto Paulo Freire,http://www.paulofreire.org

Portal EducaRede http://www.educarede.org.br

Portal da Fundação Telefônicahttp://www.fundacaotelefonica.org.br

Site do CDI São Paulo,http://www.cdisaopaulo.org.br

Outros links

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Bibliografia

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Este livro foi composto em The Sans Light e impresso em papel Reciclato da Suzano pela Gráfica e Editora Makrokolor

para a Fundação Telefônica em outubro de 2007.

Tiragem: 2.000 exemplares.

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