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IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS DA MONOCULTURA DO EUCALIPTO NA COMUNIDADE LADEIRINHAS “A” NO MUNICÍPIO DE JAPOATÃ/SE Jonas Emanuel da Rocha Antão/UFS [email protected] Núbia Dias dos Santos/ UFS [email protected] GT4: Campesinato e Agronegócio. RESUMO A comunidade Ladeirinhas “A” no município de Japoatã/SE se origina do processo de regularização fundiária que ocorreu em 1980. Inicialmente, os camponeses assentados se reproduziam a partir do policultivo alimentício, e pelo cultivo da cana-de-açúcar que passou a ser um elemento geográfico presente na paisagem. Por volta de 2008, as plantações de eucalipto tonaram-se presente na comunidade. Este trabalho tem como objetivo discutir os impactos socioambientais que a monocultura do eucalipto ocasiona nas áreas onde é plantado e/ou onde seus impactos ambientais se espraiam. Para a presente discursão nos embasamos na literatura especifica, assim como na coleta de dados primeiros em lócus e os secundários em órgãos e institutos oficiais. Constata-se que a monocultura do eucalipto impacta o meio ambiente, afeta o desenvolvimento humano das regiões onde é instalado, assim como favorece a reprodução ampliada do capital em um movimento contraditório, desigual e combinado ao conectar o lugar a esfera mundo global do capitalismo, ao tempo em que destrói a identidade camponesa e o seu principal meio de reprodução que é a terra. PALAVRAS-CHAVES: O Espaço do Homem Camponês, Impacto socioambiental; Terra; capital; Ladeirinha A. 1. Introdução: O espaço do homem camponês é a simbiose do trabalho, do espaço absoluto, relativo e relacional e do tempo. Em sua vida o sujeito camponês metaboliza através da labuta diária na terra a natureza em objetos sociais, que são utilizados como alimento, ora como mercadoria, ambas opções garantem a sobrevivência da unidade de produção camponesa (HARVEY, 2012; SANTOS, 2012). É na década de 1980 que Ladeirinhas é formalizada por meio de uma regularização fundiária, onde os camponeses oriundos do próprio litoral norte e do sertão de Sergipe iniciam

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IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS DA MONOCULTURA DO EUCALIPTO NA

COMUNIDADE LADEIRINHAS “A” NO MUNICÍPIO DE JAPOATÃ/SE

Jonas Emanuel da Rocha Antão/UFS

[email protected]

Núbia Dias dos Santos/ UFS

[email protected]

GT4: Campesinato e Agronegócio.

RESUMO

A comunidade Ladeirinhas “A” no município de Japoatã/SE se origina do processo de regularização

fundiária que ocorreu em 1980. Inicialmente, os camponeses assentados se reproduziam a partir do

policultivo alimentício, e pelo cultivo da cana-de-açúcar que passou a ser um elemento geográfico

presente na paisagem. Por volta de 2008, as plantações de eucalipto tonaram-se presente na

comunidade. Este trabalho tem como objetivo discutir os impactos socioambientais que a monocultura

do eucalipto ocasiona nas áreas onde é plantado e/ou onde seus impactos ambientais se espraiam. Para

a presente discursão nos embasamos na literatura especifica, assim como na coleta de dados primeiros

em lócus e os secundários em órgãos e institutos oficiais. Constata-se que a monocultura do eucalipto

impacta o meio ambiente, afeta o desenvolvimento humano das regiões onde é instalado, assim como

favorece a reprodução ampliada do capital em um movimento contraditório, desigual e combinado ao

conectar o lugar a esfera mundo global do capitalismo, ao tempo em que destrói a identidade

camponesa e o seu principal meio de reprodução que é a terra.

PALAVRAS-CHAVES: O Espaço do Homem Camponês, Impacto socioambiental; Terra;

capital; Ladeirinha A.

1. Introdução:

O espaço do homem camponês é a simbiose do trabalho, do espaço absoluto, relativo e

relacional e do tempo. Em sua vida o sujeito camponês metaboliza através da labuta diária na

terra a natureza em objetos sociais, que são utilizados como alimento, ora como mercadoria,

ambas opções garantem a sobrevivência da unidade de produção camponesa (HARVEY,

2012; SANTOS, 2012).

É na década de 1980 que Ladeirinhas é formalizada por meio de uma regularização

fundiária, onde os camponeses oriundos do próprio litoral norte e do sertão de Sergipe iniciam

um processo de recuperação do solo através das práticas da própria cultura camponesa, o uso

de esterco e da policultura, como também o plantio de árvores frutíferas que devolvem os

nutrientes ao solo, possibilitando a sobrevivência no novo local de morada.

Da década de 1980 até os anos 2000 ocorreu a redução das roças comunitárias, das

lavouras onde imperava a heterogeneidade, em contraposição ocorre o aumento das lavouras

de cana-de-açúcar e recentemente o cultivo de eucalipto que passa a ser um elemento

geográfico presente na paisagem.

O cultivo do eucalipto é um elemento que indica a aliança capital-Estado, ambos

buscam reduzir e/ou enfraquecer a lógica camponesa que organizou o espaço de ladeirinhas,

reorganizando-o para atender a lógica do modelo de produção capitalista objetivando lucros

maiores que se concentram nas mãos de poucos, ao camponês restam a terra desgastada

devido ao cultivo do eucalipto.

Assim sendo este artigo está composto em cinco seções. A primeira é a presente

introdução. A segunda intitulada: O Espaço da pesquisa: O Município de Japoatã e a

comunidade camponesa de Ladeirinhas onde se expõe o perfil demográfico e as contradições

ocasionadas pelo modelo de gestão que otimiza os ganhos dos agentes do capital em

detrimento do desenvolvimento do ser humano. A terceira: O eucalipto como elemento

geográfico da relação estado-capital, se discute a presença da aliança capital-Estado na

consolidação do eucalipto como cultivo alternativo para a reprodução social camponesa e suas

contradições. A quarta: O impacto socioambiental provocado pelo eucalipto reflete sobre os

impactos socioambientais que essa monocultura ocasiona. Na quinta seção apresentamos as

considerações finais e, na sequencia as referências.

2. Espaço da pesquisa: O Município de Japoatã e a comunidade camponesa de

Ladeirinhas.

O município de Japoatã localizado no litoral norte do estado de Sergipe, está distante a

94,0 quilômetros da capital do estado, Aracaju. A Igreja com o intuito de catequizar os índios

da tribo do cacique Pacatuba, invadiram, posteriormente, os padres foram expulsos pelas

invasões holandesas na região (IBGE, 2016). Assim sendo, na busca de catequizar os índios a

Igreja permitiu a aproximação dos portugueses, os quais ocasionavam a fome, a escravidão e

a morte para aqueles que resistiam e lutavam contra os invasores.

O município de Japoatã apresenta um clima seco e sub-úmido, com precipitação média

anual de 881,0mm, chegando a registrar em média uma temperatura anual de 25,5º C, tendo

seu período chuvoso nos meses de março a julho, (BONFIM, 2002). O clima propicia o

desenvolvimento da agricultura, pois apresenta chuvas regulares, ou seja, a precipitação e as

temperaturas indicam o potencial agrícola de Ladeirinhas “A”.

O meio natural permite o desenvolvimento de atividades econômicas, pois, através do

trabalho, o homem desenvolve o espaço geográfico, metabolizando a natureza em objeto

social (HARVEY, 2006; SANTOS 2012; SANTOS, 2014), as quais permitem a geração de

receitas orçamentárias que deveria favorecer o desenvolvimento para a população.

A população residente no município de Japoatã/SE apresentou um crescimento pouco

expressivo entre os anos de 2000 e 2007, havendo no ano de 2010 uma ligeira redução

populacional. Tal projeção pode advir de uma organização sócioespacial desintegrada à

relação do homem com o seu lugar de vivência e de existência. Tem-se um espaço segregado

o qual dificulta e/ou impossibilita a reprodução social dos camponeses, obrigando-os a se

reproduzirem em outras localidades. Essa realidade do município é peculiar visto que, diverge

do cenário estadual e nacional os quais apresentam crescimento moderado, como exposto no

quadro 01.

Quadro 01: Evolução populacional nas escalas nacional, estadual e municipal, Japoatã, 2010.

Fonte: IBGE, 2010

O IBGE (2016) estimou que em 2013 a população de Japoatã fosse de 13.253

habitantes e que até 2016 a população reduziria para 13.242 habitantes. O Município

apresenta uma instabilidade no que corresponde a permanência de seus habitantes,

principalmente da população economicamente ativa, pois a falta de oportunidades de trabalho,

ocupação, emprego e renda coloca o campesinato em migração constante, deslocamento

historicamente desenvolvido no Brasil, iniciado com a invasão portuguesa e que ocorre até na

atualidade (MARQUES, 2014; OLIVEIRA, 2001).

O município de Japoatã apresentava no censo de 2010 uma população rural superior à

população urbana, isto ocorre devido aos assentamentos criados, onde a população masculina

é maior na zona rural e a feminina é relativamente maior na zona urbana, pois as mulheres

ocupam atividades de serviço (funcionalismo público, comércio), enquanto que os homens

trabalham nas lavouras e nos canaviais (Quadro 02).

Quadro 02: Quantidade de população por situação domiciliar, Japoatã, 2010.

Evolução Populacional

Ano Japoatã Sergipe Brasil

2000 13.020 1.784.475 169.799.170

2007 13.539 1.939.426 183.987.291

2010 12.938 2.068.017 190.755.799

Fonte: IBGE – Censo Demográfico, 2010.

Dos 12.938 habitantes de Japoatã, 60% estão concentrados na faixa etária de 15 a 59

anos, o que corresponde a 60% do número de habitantes, 30% dos Japoatãnense estão no

grupo de 0 a 14 anos, que são os futuros trabalhadores que irão ocupar os pontos de trabalho

oferecidos pelos três setores econômicos além administrar as unidades campesinas (Quadro

03).

Os 10% são os que iniciaram o processo de produção e reprodução do espaço em

Japoatã e em Ladeirinhas “A”, atualmente são os que sustentam os mais jovens, pois em

virtude da seca, da falta de emprego é constante que as famílias necessitem de uma ajuda

momentânea do aposentado.

Quadro 03: Grupo de faixa etária, Japoatã, 2010.

Grupo de Idade Quantidade de indivíduos Porcentagem

0 a 14 anos 3.917 30%

15 a 59 anos 7.800 60%

60 anos ou mais 1.221 10%

Total 12.938 100% Fonte: IBGE – Censo Demográfico, 2010.

É o setor terciário que movimenta a economia nacional e a estadual, porém isto não se

aplica em Japoatã, pois no município é a agropecuária, garantindo o maior valor do PIB. É a

agricultura que absorve a maior parte da População Economicamente Ativa (PEA) municipal

(Quadro 04).

Quadro 04: Distribuição do PIB por setor econômico, Município de Japoatã, 2014. Fonte

:

IBG

E,

2014

C

onstata-se que a População Economicamente Ativa (PEA), do município de Japoatã está

Sexo Situação do domicílio População Porcentagem

Homens Urbana 2145 16.6%

Rural 4337 33.6%

Mulheres Urbana 2167 16.7%

Rural 4289 33.1%

Total 12.938 100%

Produto Interno Bruto (Valor Adicionado) real

Variável Japoatã Sergipe Brasil

Agropecuária 33.490 532.973 105.163.000

Indústria 6.461 3.993.425 539.315.998

Serviços 25.331 7.463.286 1.197.774.001

Total 65.282 11.989.684 1.842.252.999

distribuída entre os três setores da economia. No entanto, apresenta característica peculiar em

relação aos demais municípios, pois além de ser o setor que movimenta a economia local, até

o ano de 2012 era a agropecuária que absorvia mais trabalhadores, confirmando a

consolidação do latifúndio no município (Quadro 05).

Quadro 05: Pessoas ocupadas por setor de Atividade Econômica. Município de Japoatã, 2007

– 2013.

Variáveis 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Agricultura 1040 1049 659 711 820 682 551

Comércio 29 35 25 55 71 80 93

Indústria 171 169 136 153 143 60 17

Serviços 626 635 648 642 575 623 640

Soma 1866 1888 1468 1561 1609 1445 1301 Fonte: IBGE, Cadastro Central de Empresas 2014.

Conforme os dados do observatório de Sergipe, a população economicamente ativa de

Japoatã no ano de 2010 era de 5.046 pessoas, no mesmo ano os setores da economia

absorveram 1.561 (31%) dos trabalhadores, ou seja, 3.485 (69%) dos japoatãnense estavam

desempregados no município, necessitando se deslocar para outros municípios para trabalhar.

A baixa industrialização e a alta dependência ao setor primário que é o segundo maior

empregador e promovedor de receitas, mesmo com essa realidade, o município de Japoatã tem

dinheiro suficiente para os gastos públicos, pois, conforme o IBGE, (2014), a receita

municipal é superior a suas despesas (imagem 01).

Imag

em

01:

Desp

esas

e

Rece

itas

orça

ment

arias

em

relaç

ão

ao

Bras

il e a Sergipe, Japoatã, 2015.

Fonte: IBGE, 2016

O modo de vida rural segregacionista e dependente da Cana-de-açúcar e do eucalipto,

somado as receitas superior as despesas, não permitem que o município de Japoatã tenha um

Índice de Desenvolvimento Humano-M (IDH-M) maior (Quadro 06). O IDH-M do município

é inferior à realidade estadual e nacional, o que demonstra que o índice não depende da

situação puramente econômica, mas a maneira com que a distribuição de renda é gerida no

município.

Quadro 06: Índice de Desenvolvimento Humano Municipal – IDHM, Sergipe, 2010.

Cidade IDHM

Aracaju 0,77

Campo do Brito 0,621

Japaratuba 0,621

Japoatã 0,560

Lagarto 0,625

Santa Luzia do Itanhy 0,545

São Domingos 0,588 Fonte: Atlas Brasil 2013 Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos municípios é resultado do acesso

desigual a natureza, pois o camponês necessita de terra e autonomia para se reproduzir, pois é

o trabalho planejado e livre do ser humano que cultiva e colhe os frutos do solo. Assim,

homem e natureza são as fontes de todas as riquezas da sociedade capitalista (ENGELS,

1999).

O município de Japoatã apresenta uma malha fundiária com 1.559 estabelecimento,

onde os camponeses detêm 14,04% da área com 1.160. Os outros 399 estabelecimentos

ocupam 79.54%, que corresponde às médias e grandes propriedades, onde são pertencentes a

empresários, demonstrando a forte concentração fundiária (Quadro 07).

Quadro 07: Malha fundiária do município de Japoatã, 2006.

Variável Número de estabelecimentos Área dos estabelecimentos

(Unidades) (Percentual) (Hectares) (Percentual)

Mais de 0 a menos de 1 ha 268 16,43 142 0,6

De 1 a menos de 2 ha 377 23,11 552 2,34

De 2 a menos de 5 ha 305 18,71 972 4,11

De 5 a menos de 10 ha 210 12,88 1.650 6,99

De 10 a menos de 100 ha 362 22,2 9.350 39,62

De 100 a menos de 200 ha 19 1,16 2.691 11,4

De 200 a menos de 500 ha 13 0,8 4.223 17,9

De 500 a menos de 1000 ha 4 0,25 2.508 10,62

De 1000 a menos de 2500 ha 1 0,06 X X

Produtor sem área 72 4,41 - -

Total 1559 100 22088 93,58

Fonte: IBGE, Censo Agropecuário, 2006.

As grandes propriedades com mais de 10 a menos de 2500 hectares correspondem a

398 estabelecimentos, ocupando 79.54% da área total do município evidenciando a

concentração fundiária. Mas, existe uma unidade que não apresentar a área ocupada.

Os dados revelam o tamanho da propriedade que ocupa o extrato de área entorno de

1000 a menos de 2500 hectares, mas levando em consideração que as demais propriedades

detêm juntas 93,58% das propriedades, esta, em específica, corresponde a 6,42 % da área dos

estabelecimentos rurais.

Esse grande estabelecimento ocupa uma área de 210 unidades camponesas (5 a menos

de 10 hectares), que correspondem a 6,99 % das propriedades rurais, estes dados demonstram

a elevada concentração de terras que o município apresenta, mesmo depois da implantação de

assentamentos camponeses.

Em Japoatã a criação de assentamentos possibilita o desenvolvimento e o

fortalecimento das relações não capitalistas, no entanto, pelo processo de subordinação do

trabalho familiar campesino, o mesmo, contraditoriamente, contribui para a acumulação

ampliada do capital, como salienta Oliveira (apud KOLMING; CONCEIÇÃO, 2012), assim,

na dinâmica capitalista o camponês perpassa um jogo dialético entre autonomia e dependência

como salienta Santos (2012).

Em pleno século XXI ocorre a necessidade de investimento (capital), sem que haja,

necessariamente, a necessidade de deter a posse da terra. Essa nova configuração se dá devido

ao agricultor não ter capital e, assim, o burguês pode aprisionar o seu trabalho através dos

preços baixos da mercadoria produzida nas lavouras. Assim sendo, mesmo com a posse da

terra ocorre sujeição camponesa perante o capital, que é evidente devido a área plantada de

Cana-de-açúcar e eucalipto.

3. O eucalipto como elemento geográfico da relação estado-capital

O eucalipto é uma planta exótica, pois conforme o dicionário online1 exótico é o

“estrangeiro; que não nasceu no país, ou região, em que habita: vegetação exótica”, ou seja, é

um ser vivo que ocorre fora dos seus limites geográficos originais. O Ministério do Meio

1 https://www.dicio.com.br/exotico/

Ambiente classifica as espécies exóticas como “organismos que, introduzidos fora da sua área

de distribuição natural, ameaçam ecossistemas, habitats ou outras espécies”, (BRASIL, 2006).

O eucalipto não é natural/originário do Brasil sendo oriunda da Austrália, trazida ao

país em meados do final do século XIX, sendo cultivado no Sudeste como planta ornamental

nós casarões do Rio de Janeiro. No século XX seu potencial econômico é descoberto

passando a incentivar o seu plantio em larga escala para atender as necessidades da

Companhia Paulista de Estradas de Ferro, sendo então São Paulo o maior produtor deste

período. No século XXI o eucalipto tornou-se marca presente em muitos estados do Brasil e

em todas as regiões (CARDOSO; PIRES, 2014).

No início do século XXI o Brasil possuía cinco milhões de hectares de eucaliptos,

onde Minas Gerais passou a ser o maior produtor nacional com cerca de 1,5 milhões de

hectares, (VIANA, 2004), o que o torna uma cultura inviável para o camponês, pois o mesmo

não tem capital suficiente para esperar sete anos para colher a madeira, além de que o plantio

dessa monocultura não é característico da identidade camponesa.

O Brasil devido aos altos incentivos estatais é o maior produtor de eucalipto do mundo

(SILVA; SAMBAIO, 2014). No Nordeste, especificamente no litoral norte de Sergipe no

platô de Neópolis ocorre a presença desta monocultura. No município de Japoatã essa

subordinação do trabalho campesino pode ser evidenciada através da produção agrícola

municipal que apresenta grandes plantações de Cana-de-açúcar e de eucalipto para abastecer

as usinas e as cerâmicas no estado de Sergipe (Gráfico 01).

Gráf

ico

01:

Perc

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al da

prod

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lipto

,

Baix

o

São

Fran

cisc

o de Sergipe, 2015. Fonte: IBGE - Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura, 2015

As empresas de celulose necessitam cada vez mais de terra para a produção de

eucalipto, contudo, não conseguindo adquirir glebas de terra, as empresas buscam arrendar ou

formar parceria com os proprietários das terras, sendo eles grandes, médio e pequenos

buscando atender a demanda do mercado que é cada vez maior, sendo vital aumentar o

tamanho da área plantada de eucalipto (CERQUEIRA NETO, 2011), o que é visível a

territorialização do capital na região próxima Ladeirinhas “A”.

Os países do Norte são dependentes dos países do Sul, pois são estes que produzem os

eucaliptos (celulose) para abastece-los. Os desserviços que as nações do Norte realizam não

restringem só na produção de celulose, pois os países desse hemisfério são os maiores

emissores de CO², não realizando nenhuma redução drástica nestas emissões buscam

amenizar os estragos incentivando o plantio de florestas (Desertos Verdes) no hemisfério sul

principalmente no Brasil (VIANA, 2004).

A madeira do eucalipto é utilizada nas indústrias de celulose, para a construção civil e

para o seu uso como lenha nas cerâmicas do país. Para atender essa necessidade é necessário a

produção em larga escala, para isto são necessárias grandes extensões de terra e de capital,

favorecendo as empresas de celulose (SILVA; SAMBAIO, 2014).

A citação do documento da câmera legislativa produzida por Viana (2004), demonstra

como a aliança Capital-Estado atua na organização territorial do Brasil. Além disto, a

perpetuação do país como agroexportador de commoditeis é pauta de agenda do governo

brasileiro, agravando a fragilidade da soberania alimentar, pois os agrotóxicos contaminam os

alimentos. A padronização reduz a diversidade alimentar e a redução de área para a produção

de alimentos reduz a quantidade de alimentos, além de não gerar emprego para as

comunidades locais.

Estudos demonstram que a quantidade de empregos gerados é o menor das

monoculturas analisadas, pois “a cada 15 hectares são empregadas trinta pessoas na cultura de

café, sete pessoas na fruticultura, mas para o cultivo do eucalipto só é empregada uma pessoa.

Na agricultura familiar pode gerar até 30 postos [...] por hectare” (TEDINE, apud SILVA;

SAMBAIO, 2014). O desastre ocasionando pela monocultura não se restringem ao campo

social, mas é um problema sócioespacial.

4. O impacto socioambiental provocado pelo eucalipto

Os impactos ambientais ocasionado pelo eucalipto se materializa nas áreas onde esse

cultivo é realizado. Tem-se relatos na África do Sul e Chile sobre a escassez hídrica devido ao

seu alto consumo de água e a redução da área destinada ao plantio de alimento. Tais

elementos estimulam o êxodo devido à falta de trabalho, além de destruir as florestas

originarias pela monocultura. No Chile, foi o regime militar que incentivou a produção de

eucalipto, permitiu que o país ampliasse as suas exportações, no entanto, a grande riqueza

gerada ficou nas mãos de grupos chilenos e depois das multinacionais, já os custos ambientais

foram entregues aos camponeses (VIANA, 2004).

No sudeste do Brasil o eucalipto está afetando o ambiente onde são inseridos. Já se

fala para a área onde se situa o Vale do Jequitinhonha em ocasional desertificação. Os

eucaliptais adentraram o vale através dos incentivos fiscais promovidos pelos governos dos

militares, incentivando o reflorestamento ocasionando a substituição de outras lavouras, que

no início aumentou a geração de postos de trabalho (no período do plantio), mas declinou

provocando um acelerado êxodo rural (CHAVES apud VIANA, 2004; CARDOSO; PIRES,

2014).

É evidente que a implantação de eucaliptais no nordeste brasileiro é um risco, pois,

essas culturas necessitam de enormes quantidades de água para sobreviver, isto pode agravar

a escassez hídrica da região. Na região sudeste, onde a média pluviométrica da região é mais

alta do que a do Nordeste, ocorre “segundo MEIRELLES e CALAZANS (2006), [...], só no

norte do Espírito Santo já secaram mais de 130 córregos depois que o eucalipto foi

introduzido na região” (CARDOSO; PIRES, 2014).

Há na produção de eucalipto uma relação contraditória, pois ao ser cultivado o

eucalipto integra o lugar ao circuito global do capital, em contraposição, provoca desastre

ambientais, lançando-o na dependência de um único produto ocasionando assim uma

paisagem homogênea, (CERQUEIRA NETO, 2011), em substituição a heterogeneidade dos

ambienteis naturais ou das áreas camponesas policulturas.

Para além do impacto ambiental, o eucalipto tem ocasionado no extremo sul da Bahia

uma degradação social ampliando o mercado “da prostituição, crescimento da criminalidade,

desterritorialização de parte da sociedade rural, aumento dos imóveis e perturbação no meio

ecológico” (CEQUEIRA NETO, 2011).

Os impactos ambientais são diversos, porém estudos demonstram que as

especificidades dos lugares devem ser respeitadas para entender até que ponto o eucalipto

pode afetar a dinâmica ambiental local e regional, e também como ocorre o manejo dessa

lavoura (VIANA, 2004).

O eucalipto possui uma estrutura foliar que permite a penetração de mais luz e a

infiltração da água no solo o que proporciona o controle do escoamento superficial, reduzindo

a erosão, ampliando a ciclagem dos nutrientes. O consumo reduzido de nutrientes dos solos

em comparação as outras culturas agrícolas como o feijão e o milho não é algo que ameniza

os impactos do eucalipto, visto que, esses cultivos compõem a alimentação humana, ou seja,

todos os nutrientes absolvidos são ingeridos pelos brasileiros por meio das refeições.

Estudos criticam as afirmações de que o eucalipto prejudica os solos, entendendo que

as raízes absorvem os nutrientes das camadas inferiores, devolvendo-os as camadas

superficiais do solo, através da queda das folhas, (LIMA apud VIANA, 2004). Todavia, Viana

(2004) apresenta dados que contribuem para questionar tais afirmações (Quadro 08).

Quadro 08: Distribuição da biomassa do Eucalipto por compartimentos da planta, 2004.

COMPARTIMENTO DISTRIBUIÇÃO (Tonelada Seca/ha) %

Casca 8-12

Copas 6-10

Madeira de Tronco 60-74

Raízes 12-18 Fonte: Foelkel apud VIANA, 2004.

Adaptação: Jonas Emanuel da Rocha Antão, 2017

A afirmação de que, após a colheita é necessário para a recuperação/manutenção do

solo a criação de serapilheiras com as folhas, galhos, como também as raízes que ficam

abaixo do solo os quais permitem devolver os nutrientes absorvidos pela planta, é

questionável devido a parte considerável da biomassa ficar no troco, que é extraído e

transportados para lugares distantes e leva consigo os nutrientes extraídos dos solos.

Enquanto, 26 – 40 % da biomassa é deixada no local através da serapilheira, ou outros

60 – 70 % são transportados para serem transformados em papel, em moveis ou lenha, menos

da metade da biomassa é deixada no local onde foi cultivado, ocasionando um balanço

negativo na reposição de nutrientes no solo.

A produção de eucalipto necessita para o seu desenvolvimento de uma quantidade de

água de 800 – 1220 mm/ano (Quadro 09), se o cultivo desta monocultura ocorre em lugares

onde o regime pluviométrico é menor que 800 mm/ano, ocorrerá o ressecamento do solo, o

que fará o eucalipto drenar as águas subterrâneas (VITAL, 2007).

Quadro 09: Consumo de água por diferentes culturas, 2004.

CULTURA CONSUMO DE ÁGUA/ANO (mm)

Cana-de-Açúcar 100-2.000

Citrus 600-1.200

Milho 400-800

Feijão 300-600

Eucalipto 800-1.200 Fonte: Ipef. Apud VIDAL, 2004

Adaptação: Jonas Emanuel da Rocha Antão, 2017

Em Japoatã/SE a precipitação média anual é de 881,0 mm/ano e pode chegar a

1.109,20 mm/ano (BONFIM, 2002; EMDAGRO, 2008), ou seja, se a plantação de eucalipto

absorver 800 mm/ano, deixa saldo médio positivo 81-309.2 mm/ano, se não considerar a

evapotranspiração do eucalipto (Imagem 02).

Imagem 02: Plantação de Eucalipto, Ladeirinhas “A” em Japoatã/SE, 2017. Fonte: Trabalho de Campo, 2017

O processo de evapotranspiração lança na atmosfera 638 mm, o saldo hídrico varia de

719-947 mm/ano, além de repor o lençol freático, tem que ser o suficiente para atender as

necessidades hídricas das demais lavouras que são cultivadas de maneira consociadas, como

por exemplo a Cana-de-Açúcar, presente no município, que necessita em média 100 – 2000

mm/Ano, ou seja, a necessidade de água no povoado Ladeirinhas “A” é alto, além do

eucalipto e a Cana-de-Açúcar existe as lavouras e as pastagem como também o consumo

humano. Todavia, alguns corpos hídricos são contaminados pelos lixões e o uso dos

agrotóxicos, fertilizantes, além dos riscos de contaminação devido ao descarte inadequado dos

rejeitos da mandioca, como a manipueira.

5. Considerações finais

O povoado Ladeirinhas “A” é o espaço vivido dos camponeses, encontro de

dificuldades e de superação. As superações tornaram-se possíveis devido as estratégias de

reprodução do campesinato, onde a partir da posse da terra o cultivo da mandioca e as

plantações alimentares possibilitam a reprodução da vida dos campesinos de maneira

autônoma, fortalecendo a unidade familiar.

Os resultados obtidos na coleta de dados secundários demostram que o município de

Japoatã atendeu as necessidades impostas pelo setor sucroalcooleiro, visto que, a maior

quantidade de produto agropecuário vem das lavouras é a cana de açúcar, em virtude disto

supõe-se que no município ocorra o conflito entre dependência deste setor e a autonomia que

as lavouras de mandioca oferecem aos camponeses.

O potencial natural do Baixo São Francisco Sergipano inicialmente, com a

implantação do projeto, não permitiu uma reprodução social satisfatória, pois o solo de

Ladeirinhas “A” não era ideal para o cultivo, tendo em vista que a área era anteriormente

utilizada para pastagens que se tornaram degradas.

O modo de vida camponês através do policultivo pode iniciar o processo de

recondução da realidade de Ladeirinhas “A” para um ambiente menos degradado, pois no

passado o policultivo devolveu ao solo a sua capacidade de nutrientes, o mesmo mecanismo

de cultivo pode reequilibrar o balanço hídrico, fortalecer o solo e restringir o avanço do

capital silvicultor e a redução da área da cana, ao tempo em que fortaleça a identidade

camponesa e contribua para a revitalização das suas estratégias de reprodução social

adequadas e condizentes com a sua realidade.

O eucalipto não é em si o grande causador dos prejuízos ambientais, mas sim, a lógica

de reprodução que os capitalistas nacionais e internacionais, apoiados pelo Estado brasileiro

desenvolve no território. Há uma reorganização do espaço rural brasileiro para atender as

necessidades do modelo de reprodução capitalista, que necessita das grandes produções de

monoculturas para atender a demanda industrial da produção de celulose.

Em virtude do empobrecimento rural devido à reduzida quantidade monetária de

incentivos do Estado brasileiro direcionadas ao pequeno agricultor, como também as

comodidades que o cultivo de eucalipto proporciona, o camponês é influenciado a se

submeter as vontades do capital, pois a quantidade de trabalho desprendida é menor, mas o

desastre ambiental ocasionado no espaço não compensa ao camponês, na medida em que após

alguns anos irá lhe restar uma terra improdutiva como resultado da sua inserção dessa cultura

agrícola.

Na área da pesquisa tonou-se uma preocupação a escassez hídrica motivada pela

irregularidade das chuvas e a baixa precipitação, pois as culturas da Cana e do Eucalipto

ocasionou a degradação da vegetação nativa, o que reduziu a evapotranspiração, ocasionando

menos chuvas e acelerando o processo hidrológico, o que provoca a escassez hídrica que

levou a morte as plantações de mandioca, bananeiras e coqueiros.

A análise do impacto do eucalipto não era objetivo do trabalho, mas devido a elevada

quantidade da produção, e a propriedade alopática exalada pela planta que afasta espécies

importantes no processo de polinização, além de que as folhas também apresentam esta

propriedade que ao cair das copas e ao se decompor no solo ocasiona o impedimento de que

outras plantas se desenvolveram na sua sombra. Isto impede que o camponês continue a

prática do policultivo.

O eucalipto apresenta dois efeitos nocivos as estratégias de reprodução social

camponesa. O primeiro ocorre ao se realizar esse plantio nas propriedades rurais circundantes

as propriedades camponesas. Os efeitos alolopátícos do eucalipto atinge as plantações dos

camponeses e tendem a prejudicar a manutenção dos seus cultivos quer pelo impacto na

fertilidade do solo, quer pela escassez hídrica.

A ausência do conhecimento mais acurado do efeito alolopátíco do eucalipto tem

contribuído para que os camponeses sejam seduzidos para implantarem esses cultivos nossas

propriedades. Se tal fato se consolidar a tendência é que pela exiguidade da terra o eucalipto

provoque a perda da fertilidade do solo o que irá significa no futuro a materialização do

denominado “deserto verde”.

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