a monocultura do camarão- danos socioambientais à base
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A MONOCULTURA DO CAMARO: DANOS SOCIOAMBIENTAIS BASE DA VIDA COMUNITRIA TRADICIONAL NO LITORAL
DO NORDESTE BRASILEIRO.
Antonio Jeovah de Andrade MEIRELESProf. Dr. do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Cear - UFCPrograma de Ps-graduao em Geografia/UFC ([email protected])
Luciana de Souza QUEIROZMSc. em Desenvolvimento e Meio Ambiente/UFCInstituto Terramar ([email protected])
1. Introduo
A atividade de cultivo de camaro em cativeiro - carcinicultura - possui destaque no
contexto do rpido crescimento da aqicultura mundial, impulsionada em grande medida pelo
declnio dos estoques pesqueiros dos oceanos (NAYLOR et al., 1998, 2000), sendo o produto mais
proeminente da aqicultura no mercado internacional (FAO, 2002). O crescimento do cultivo de
camaro implicou uma elevao na produo mundial deste produto de 30.000t em 1981 para 1,63
milho em 2003. Em 1970, o camaro cultivado correspondia a apenas 2,5% da produo
camaroneira global e, em 2003, atingiu o patamar de 35,2% (PAIVA ROCHA et al., 2004). A
China, lder mundial do setor, produziu 370.000 toneladas em 2003, 22,6% do total (Paiva Rocha et
al. op cit.), levantando-se a ressalva de que a veracidade dos dados chineses muito questionada,
em geral considerados superestimados (FAO, 2002).
Nos pases do hemisfrio sul, a carcinicultura tem provocado alteraes profundas nas
funes e servios socioambientais prestados pelo ecossistema manguezal. Os recursos marinho-
costeiros de relevante importncia para a sociedade e, em primeiro lugar, para a vida comunitria,
foram amplamente afetados por esta atividade industrial. Comunidades de pescadores, marisqueiras,
ndios, ribeirinhos, quilombolas e camponeses que ancestralmente desenvolviam suas relaes de
subsistncia vinculadas diversidade de paisagens e sistemas ambientais de usufruto tradicional
foram desproporcionalmente afetadas pelos impactos desencadeados. Extensas reas foram
degradadas, guas das bacias hidrogrficas e reas midas litorneas foram contaminadas e a
biodiversidade alterada.
O Brasil pode ser considerado como uma frente recente de expanso da carcinicultura
comercial. Ainda que a atividade tenha dado seus primeiros passos no Pas no incio da dcada de
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1970, no Rio Grande do Norte, somente aps o desenvolvimento do pacote tecnolgico do camaro
do Pacfico (Litopenaeus vannamei), entre 1996/1997, que ocorre um crescimento mais intenso,
principalmente no final da dcada passada e incio desta. Este crescimento foi vigoroso at o ano de
2004 e se deu, em muitos aspectos, nos moldes do que j havia ocorrido nos pases do sudeste
asitico: sem ordenamento adequado, sem regulamentao1, com forte incentivo governamental e
gerao de impactos ambientais e sociais graves.
A partir de 1997, a produo em cativeiro salta de 3.600 toneladas para mais de 90.000
toneladas, em 2003 (ABCC, 2005). Os impactos cumulativos relacionados com a devastao do
manguezal, qualidade da gua e diminuio da biodiversidade ao longo das bacias hidrogrficas e
zona costeira, principalmente no Nordeste brasileiro, atingem nveis de elevada degradao
ambiental. Inicia-se um cenrio de perda de produtividade primria e insegurana alimentar com a
extino e fragmentao de setores do manguezal, privatizao de extensas reas de preservao
permanente e de usufruto das comunidades tradicionais e expulso de pescadores, ndios e
ribeirinhos de seus lugares e ecossistemas de subsistncia.
Esta nova atividade industrial, implantada em ecossistemas de preservao permanente
segundo a legislao ambiental brasileira, ameaa a existncia das comunidades usurias ancestrais,
contribuindo diretamente para a desorganizao das atividades tradicionais, criando outras relaes
de trabalho e mercantilizao de seus territrios. A carcinicultura impulsionou um perverso
processo de expropriao das terras, da degradao do modo de vida das comunidades e, em vrios
casos, promoveu uma das maiores violaes dos direitos humanos: o direito vida. O documento
elaborado na III Assemblia da Redmanglar Internacional2 (Declaratria de Cuyutln, Mxico)
rendeu homenagem a pescadores e pescadoras, ambientalistas e tcnicos que morreram e sofreram
atentados na luta pela preservao dos territrios
1 O primeiro instrumento normativo de mbito nacional surgiu somente em 2002, com a Resoluo 312 do Conselho Nacional de Meio Ambiente CONAMA. Pouco antes disso, algumas resolues de conselhos estaduais de meio ambiente j haviam sido editadas, em grande parte decorrente das discusses j iniciadas no CONAMA.
2 Rendimos homenaje en esta Tercera Asamblea, a travs de nuestro trabajo a los compaeros y compaeras cados para que su prematura partida no haya sido en vano. Incluimos sus nombres a continuacin. Brasil: Ailson Souza da Silva, Francisco Cordeiro da Rocha, Irm Dorothy Stang, Paulo Marinho de Almeida, Sebastian Marquez de Souza, Joao Dantas Brito; Ecuador, Hay Hao Daniel Nanoto, Sebastin Cruz, Vernica Estupin; Mexico: han asesinado a ocho lideres que resistieron proyectos y actividades impactantes en sus comunidades; Honduras: Amilcar Martnez, Gabriel Martnez, Gertrudiz Funez Guevara, Manuel Gmez, Jos Aguilera, Pastor de Jess Carranza, Silvano Meja, Moiss Bentez, Israel Ortiz, Marin Peralta, Cristbal Almendrez, Rolando Castro, Daniel Salinas; Guatemala: Fernando Chicoy, Maytin Castellano. Condenamos el atentado casi mortal contra Carlos Albacete y Piedad Espinoza. http://www.redmanglar.org/redmanglar.php?c=685 (Acesso em 18/03/2008)
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Assistimos, a partir de 2004, a uma queda da produo de camaro, revelando-se uma
nova realidade do desenvolvimento da indstria do camaro no Brasil. A carcinicultura entra numa
crise econmica em grande parte atribuda aos nveis elevados de produtividade e acumulao dos
impactos, incrementando os nveis de contaminao e degradao dos mananciais, de fragmentao
do ecossistema manguezal e reas midas associadas e de doenas virais (alcanando ndices
superiores a 70% no litoral cearense). Em razo desses fatores, os industriais da carcinicultura, cuja
atividade estava entre as mais lucrativas da economia brasileira, entraram em colapso, agravado
pela reduo recente das exportaes.
Diante desta realidade, nos ltimos anos, os empresrios da carcinicultura e o Governo
brasileiro (Secretaria Especial de Aqicultura e Pesca - SEAP), mesmo com a possibilidade de
ampliao das fazendas associadas degradao do manguezal, vm investindo em novas
estratgias. Esto direcionadas para a recuperao da indstria em plena decadncia, com aes
institucionais de governo, grupos empresariais e de agncias de financiamento (bancos pblicos e
privados), de modo a atingir altos nveis de produtividades e novos territrios e mercados.
A certificao (selos orgnicos) das fazendas produtoras de camaro a principal
estratgia. Tem como meta normalizar as etapas de produo, embalagem, armazenagem e
comercializao, com uma engenharia produtivista e mercantil que certamente alcanar os nveis
de insustentabilidade que promoveram sua decadncia. Trata-se de uma nova estratgia que
delimita um ntido cenrio de degradao ambiental e que demarcou a falncia do modelo
produtivo; modelo este que agora se configura para o estabelecimento de instruo normativa e
tcnicas especficas para regulamentar prticas na produo industrial de camaro.
Diante do quadro apresentado, ser realizada a continuao uma sntese dos danos
socioambientais promovidos pela mercantilizao de espaos e ecossistemas vitais para as
comunidades tradicionais litorneas. Ser tambm evidenciada a estratgia dos industriais para a
retomada da produtividade, com a instalao de programas de certificao. Outro objetivo desta
sntese foi o de estruturar aes em redes, especficas e estratgicas, para a proteo, conservao e
recuperao dos sistemas ambientais degradados.
2. Metodologia
Para a composio dos impactos ambientais definidos ao logo dos manguezais e suas
conseqncias na perda de biodiversidade e danos qualidade de vida das comunidades
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tradicionais litorneas, foram realizados trabalhos de campo durante o ano de 2004 em cinco
estados do Nordeste brasileiro Piau, Cear, Rio Grande do Norte, Paraba e Bahia. A partir de
2005, foram sistematizados dados relacionados com dissertaes de mestrado, relatrios tcnicos
de instituies estaduais e federais do meio ambiente e, mais recentemente, resultados de
diagnstico socioambiental das fazendas certificadas nos Estados do Cear e Rio Grande do Norte
(MEIRELES e QUEIROZ, 2007).
Foram utilizados trabalhos anteriores relacionados com mapas geolgico, geomorfolgico e
de cobertura vegetal e proposio de modelos de fluxos (hidrodinmica estuarina e ao das ondas
e mars) realizados por Schaeffer-Novelli, 1986; Meireles, 2004; Tupinamb 2002, Aquasis, 2003.
Dados referentes fauna e flora do manguezal foram obtidos em trabalhos de pesquisa realizados
por Schaeffer-Novelli, 1989; Fernandes, 1989; Coelho Jr. e Schaeffer-Novelli, 2000; Vicente da
Silva, 1998; Bezerra, 2003 e Meireles et al., 2007.
A dinmica ambiental associada ao sistema estuarino e vinculada evoluo do ecossistema
manguezal foi definida de acordo com pesquisas realizadas por Dalrymple, et al. 1992; Farnsworth
e Ellison, 1997; Pannier e Pannier, 1980; Roman e Nordstrom, 1996; Fairbridge, 1980; Pritchard
1967; Perillo 1995; Paez-Osuna, 2001a; Meireles 2001; Bioma/Nema, 2001; Meireles e Vicente
da Silva, 2003; Alongi, 2002; Alonso-Perez et al., 2003.
3. Diagnstico integrado dos impactos ambientais
O ecossistema manguezal3 representa um dos ambientes tropicais mais ameaados do
mundo, que perdeu, nas ltimas duas dcadas, pelo menos 35% da sua rea, perdas superiores a de
outros ambientes ameaados como as florestas tropicais e os recifes de corais (VALIELA et al.,
2001). Segundo Juma (1997), o deficit de nutrientes no ecossistema marinho promovido pela
degradao do manguezal representou perdas anuais de aproximadamente 4,7 milhes de toneladas
de peixe e 1,5 milho de toneladas de camaro marinho para a indstria pesqueira, sem contar com
os demais recursos e servios ainda no calculados (ostras, caranguejos, aves, proteo da costa,
perda de habitats, etc.). Impactos relacionados com alteraes econmicas locais e regionais com as
3 Diante de sua importncia, o ecossistema manguezal considerado como rea de preservao permanente em todo Territrio Nacional, por fora da Lei do Cdigo Florestal Brasileiro (BRASIL, 1965) e da Resoluo 303/2002 do Conselho Nacional de Meio Ambiente CONAMA (BRASIL, 2002), sendo sua ocupao permitida apenas por fins de utilidade pblica.
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interferncias na produtividade ecolgica do ecossistema manguezal tambm foram definidos por
Barbier and Strand, 1998; Rnnback , 1999 e Souza-Filho, et al. 2003.
A caracterizao do ecossistema manguezal levou em conta a importncia do apicum4
(marisma, intertidal marsh) e das salinas abandonadas em regenerao, para a continuidade das
relaes de troca de energia com suas demais unidades da paisagem. Evidenciaram-se tambm as
interferncias das fazendas de camaro nas atividades tradicionais das comunidades litorneas.
O apicum apresenta uma fisionomia plana, associado s oscilaes das mars de sizgia e
inundado pela gua doce durante os eventos de cheias fluviais. Durante a estufa da mar (momento
de retomada do fluxo de vazante), depositam-se sedimentos e so incorporados nutrientes para os
sistemas estuarino e costeiro marinho. Como reserva perodos sem uma cobertura vegetal
expressiva, comporta-se como rea de baixa turbidez, proporcionando uma camada de gua ftica
essencial para uma expressiva faixa de organismos da cadeia alimentar. Em decorrncia dos
elevados ndices de insolao, os sedimentos areno-argilosos, ricos em restos vegetais de mangue,
apresentam comumente altos ndices de salinidade em superfcie e intersticial, minimizados durante
os perodos de maior precipitao pluviomtrica, aportao de gua doce do lenol fretico e com
os eventos de inundao fluvial (regulam as taxas de salinidade quando incorporada
hidrodinmica fluviomarinha). Durante os intervalos em que exposto insolao e ao vento, na
mar baixa, sobre sua superfcie repousa um tapete de microorganismos, resguardando a base da
cadeia alimentar. A fauna encontra no apicum locais de pouso, alimentao e de reproduo. As
comunidades tradicionais utilizam-no para a mariscagem, a pesca e como vias de acesso para os
demais setores do manguezal associados com o extrativismo. Ao ser revegetado pelo manguezal,
assume outras funes e servios ambientais, associados expanso do bosque de manguezal
(SCHAEFFER-NOVELLI e CINTRN, 1986; NASCIMENTO, 1993; MEIRELES, 2001;
MEIRELES e VICENTE DA SILVA, 2003).
Com o incremento da atividade industrial, a partir de 2001, utilizando claramente reas de
preservao permanente, inicia-se uma nova fase, caracterizada por mudanas na legislao
estadual de preservao e conservao de reas midas. Tratou-se de aes orientadas para a
descriminalizao do licenciamento de fazendas dentro de setores caracterizados como apicum
(plancies hipersalinas).
4 O termo apicum em tupi-guarani significa mangue, brejo de gua salgada - apicu - picum apecu (MAURO e SILVA, 2004).
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Os dados de campo e o acompanhamento evolutivo de setores de apicum, que foram
completamente revegetados (esturios do Jaguaribe, Pacoti, Coc, Cear, Acara e Corea)
contradizem a definio apresentada pela Resoluo COEMA/CE 02/2002, Art. 1 inciso XI
(CEAR, 2002): apicum: ecossistema de estgio sucessional tanto do manguezal como do
salgado, onde predomina solo arenoso e relevo elevado que impede a cobertura dos solos pelas
mars, sendo colonizado por espcies vegetais de caatinga e/ou mata de tabuleiro e, portanto,
tratando-se de um conceito tcnica e cientificamente equivocado.
Mesmo contrariando estudos que definiram que este setor do manguezal interfere
diretamente na regulao, processamento e distribuio de nutrientes e, quando inundados durante
eventos de mar de sizgia, depositam-se sedimentos e so incorporados nutrientes para o sistema
estuarino, a Resoluo COEMA/CE N 02/2002 (CEAR, op. cit.) aprova sua utilizao para a
carcinicultura. No foi levada em conta a utilizao deste sistema ambiental pelas comunidades
tradicionais, fundamental para as atividades de pesca e mariscagem.
Ao ser utilizada a faixa do entremars para implantao de fazendas de camaro, foram
suprimidas vrias funes, habitats e servios ambientais diretamente associados ao ecossistema
manguezal. Os impactos ambientais (Tabela I) refletiram diretamente sobre a qualidade da gua,
em danos produtividade dos recursos pesqueiros e na supresso de grandes reas destinadas
evoluo do prprio ecossistema. Os setores de apicum foram amplamente ocupados e utilizados
para iniciar o processo de expanso das fazendas na direo do bosque de manguezal e dos canais
estuarinos. Verificou-se que extensas reas utilizadas para a pesca artesanal e mariscagem foram
suprimidas, caminhos de acesso aos locais de pesca, agricultura e moradia foram bloqueados.
Foram comprometidos os vnculos das comunidades com a biodiversidade que emana desses
ecossistemas, com os quais tm relaes ancestrais de sobrevivncia.
TABELA I Impactos ambientais, anlise das causas e conseqncias e principais indicadores.
Tipo de impacto Causas Conseqncias IndicadoresDesmatamento do manguezal Implantao e ampliao dos viveiros, dos canais de aduo e
de lanamento de efluentes. Durante a fase de implantao do canteiro de obras e demais equipamentos de infra-estrutura.
Danos ambientais em rea de preservao permanente (ecossistema manguezal), mudanas estruturais, fsico-qumicas e pedolgicas do solo, supresso das condies ambientais e ecodinmicas para a sobrevivncia da fauna e diminuio da biodiversidade.
Evoluo espaciotemporal atravs de fotografias areas e imagens de satlite. Durante trabalhos de pesquisadores do Departamento de Geografia da UFC. Constatao durante as
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Destruio e fragmentao de habitats. Extino de reas destinadas mariscagem, pesca e coleta de caranguejos. Foram registradas ameaas aos pescadores que denunciaram a degradao ambiental.
vistorias tcnicas, denncias por parte dos pescadores, marisqueiras, lideranas comunitrias e OGNs.
Desmatamento da mata ciliar o do carnaubal
Instalao das vias de acesso e demais equipamentos de infra-estrutura. Implantao e ampliao dos viveiros, dos canais de aduo e de lanamento de efluentes.
Supresso e extino de ecossistema com diversificadas fauna e flora, constituindo significativa ameaa biodiversidade. Eroso do solo e assoreamento do bosque de manguezal, do apicum e do salgado. Supresso de unidades produtoras e exportadoras de nutrientes para o ecossistema manguezal. Eliminao de vastas reas de carnaubal utilizadas pelas comunidades tradicionais para o extrativismo vegetal.
Constatao durante as vistorias de campo e sobreposio de imagens de satlite. Marcas de eroso do solo e de assoreamento no contato com o manguezal. Denncias de agricultores e ndios que trabalhavam na coleta de palha de carnaba.
Extino de setores de apicum
Implantao dos equipamentos de infra-estrutura e piscinas para a produo de camaro.
Extino de setores pertencentes ao ecossistema manguezal. Destruio de reas antes destinadas ao refgio e alimentao da ictiofauna e da avifauna (inclusive de aves migratrias). Impermeabilizao do solo e salinizao do lenol fretico. Supresso de setores do ecossistema manguezal utilizados para a pesca e mariscagem. Eliminao dos canais de mar que atuavam como indutores da revegetao do apicum.
Aspectos geolgicos, geomorfolgicos e ecolgicos em resqucios de apicum em contato com os viveiros de camaro. Associao com bosques de manguezal. Bloqueio das trocas laterais identificado atravs da supresso dos canais de mar. Depoimento de pescadores e agricultores que antes utilizavam o apicum para o desenvolvimento de suas atividades de subsistncia.
Soterramento de gamboas e canais de mar
Implantao e ampliao dos viveiros de camaro, desvio do fluxo das mars e dragagens para implantao de canais de aduo.
Bloqueio das trocas laterais e da conectividade com os demais setores do manguezal; morte da vegetao de mangue; perda de habitats; salinizao do aqfero e diminuio da biodiversidade. Alteraes na produo e distribuio de nutrientes atravs dos canais de mara e gamboas. Supresso da dinmica disseminadora de sementes do manguezal.
Setores da plancie fluviomarinha com gua estagnada, descontinuidade dos canais de mar, acmulo de rejeito de material de dragagem sobre o manguezal e o apicum, introduo de material sedimentar alctone ao ecossistema e atividades de terraplenagem.
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Utilizao de fotografias areas e imagens de satlite anteriores ao dano ambiental.
Bloqueio do fluxo das mars Obras de engenharia para a construo dos diques,
comportas, viveiros e canais de aduo e desge. Construo das bacias de sedimentao.
Morte da vegetao de mangue e da fauna associada, alteraes na dinmica de produo, distribuio e exportao de nutrientes. Interferncia na produtividade primria do ecossistema. Morte de organismos que foram desassociados das oscilaes dirias da mar (caranguejos e moluscos) refletindo na perda de habitat.
Constatao durante as inspees de campo. Entrevistas com pescadores, ndios e marisqueiras. Utilizao de imagens de satlite e fotografias areas para averiguar o rompimento do fluxo das mars.
Contaminao da gua por efluentes dos viveiros e das fazendas de larva e ps-larva
Mortandade de peixes e caranguejos. Riscos de contaminao do lenol fretico e alteraes na qualidade da gua para o consumo humano. Lanamento direto dos efluentes no solo, nas gamboas e no canal principal dos esturios.
Alteraes na demanda bioqumica de oxignio, contaminao da gua por metabissulfito, mudanas na alcalinidade, pH e oxignio dissolvido. Infiltrao dos efluentes alcanando o aqfero em razo da permeabilidade e porosidade dos sedimentos.
Denncias de mortandade de peixes e caranguejos realizadas durante as entrevistas. Constatao de fazendas de camaro sem bacias de sedimentao e recirculao da gua. Lanamento de efluentes em ambientes lacustres e em terrenos arenosos.
Efluentes de metabissulfito
Doenas respiratrias, de pele e registros de bitos.
Dificuldade de respirar e manchas avermelhadas na pele. Tosse, expectorao, rouquido, dispnia, dor torcica, febre,calafrios, anorexia, nuseas, vmitos, tonturas, emagrecimento, hipotenso arterial e leses cutneas pruriginosas
Documento de auditores do MTE / DRT/CE; audincias pblicas e trabalhos de campo realizados pelos membros do GT.
Salinizao do aqfero
Extensas reas de viveiros de camaro sobre reas de recarga do aqfero, impermeabilizao do solo, lanamento de efluentes em lagoas e terrenos arenosos (porosos e permeveis). Fazendas de camaro nas proximidades das vilas de pescadores e de suas reas de agricultura de subsistncia.
Contaminao do aqfero por intruso da gua salgada associada s extensas reas ocupadas pelos viveiros. reas antes destinadas recarga do aqfero foram utilizadas para a implantao dos criatrios; lanamento de efluentes diretamente ao solo; inexistncia de lagoas de sedimentao; rompimento dos diques das piscinas; abertura de canais de aduo e desge em reas antes associadas recarga
Denuncias apresentada nas audincias pblicas. Extensas reas de mata ciliar e carnaubal desmatados para a implantao de criatrios. Precariedade estrutural dos diques, terraplenagem em setores de recarga, abertura de canais de aduo para o fluxo de gua salina em terrenos tipicamente associados
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do aqfero. A salinizao de poos, cacimbas e terras agricultveis est associada proximidade das fazendas de camaro.
a ambientes de gua doce.
Impermeabilizao do solo associado ao ecossistema manguezal, ao carnaubal e a mata ciliar
Extensas reas utilizadas para a implantao dos viveiros de camaro e das obras de infra-estrutura.
Supresso de reas destinadas recarga do aqfero; extino de fontes de gua doce; soterramento de riachos associados mata ciliar e ao carnaubal; eliminao de vrios habitats (mata ciliar, carnaubal, apicum, salgado, canais de mar, lagoas de gua doce, lagunas, manguezal, bancos e flechas de areia) antes com uma diversificada fauna e flora. Completa artificializao da paisagem associada ao ecossistema manguezal, mata ciliar, caatinga e carnaubal. Fragmentao e bloqueio de zonas de transio (corredores ecolgicos).
Evoluo das unidades ambientais a partir de recobrimentos aerofotogramtricos e imagens multitemporais de satlite; anlises de impactos ambientais realizadas por pesquisadores do Departamento de Geografia da UFC; em vistorias durante as atividades de campo e denuncias nas audincias pblicas foi possvel constatar extensas reas submetidas a intensa movimentao de terra para a implantao e ampliao dos viveiros.
Eroso dos taludes, dos diques e dos canais de abastecimento e desge.
Precariedade das obras de engenharia, complexidade estrutural dos terrenos utilizados para edificao dos viveiros e as caractersticas tcnicas inadequadas dos materiais de construo.
Eroso provocada pela dinmica das mars em contato com os diques e pelo escoamento superficial no perodo chuvoso (principalmente no perodo de inundaes provocadas pelos eventos de cheias). O material remobilizado promove o assoreamento do manguezal, soterrando as razes respiratrias, o apicum e o salgado. Artificializao do solo de mangue e de reas destinadas regenerao da vegetao. Induo de mudanas morfolgicas e pedogenticas de habitats de espcies adaptadas a terrenos antes lamosos e ricos em matria orgnica. O fluxo das mars associado remobilizao dos sedimentos promove recalques e deslizamentos das vertentes dos canais de aduo e desge.
Acmulo de areia proveniente dos taludes em setores exclusivamente associados ao solo lamoso de mangue. Fissuras, ravinas e voorocas nos diques, taludes e canais. Deslizamento de materiais utilizados para a construo dos diques sobre terrenos de mangue. A mar alta atinge o sop dos taludes. Ao das marolas provocada pelo vento no espelho dgua dos viveiros. Acmulo de sedimentos dentro dos canais de aduo.
Empreendimentos sem bacias de
Lanamento dos efluentes potencialmente danosos
Contaminao dos recursos hdricos superficiais e
Vistorias durante os trabalhos de campo
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sedimentao diretamente nos sistemas estuarino, fluvial e lacustre.
subterrneos. Incremento dos slidos em suspenso, mudanas fsico-qumicas e ecolgicas das guas. O restante do material (rao) no consumido e liberado para o corpo receptor, durante os ciclos de despesca, poder ocasionar srios problemas para os organismos do ecossistema, principalmente aos associados produtividade primria. Os slidos em suspenso podem ainda induzir processos de eutrofizao. Lanamento de efluentes em desacordo com a Resoluo n 020/86 do CONAMA.
identificaram empreendimentos sem bacias de sedimentao. Denncias durante as audincias pblicas.
Fuga de camaro extico para ambientes fluviais e fluviomarinhos
Rompimento dos diques, inundaes fluviais durante as enchentes.
A espcie Litopenaeus vannamei, natural da costa oriental do Oceano Pacfico, poder ocasionar competies em diversos habitats ao longo da bacia hidrogrfica e faixa litornea.
Denncias registrada durante entrevistas e no decorrer das audincias pblicas. Vistorias realizadas pelos tcnicos do IBAMA. Impactos observados em praticamente todos os esturios.
Reduo e extino de habitats de numerosas espcies
Utilizao do manguezal, apicum e salgado para a implantao dos viveiros de camaro. Vastas reas de mata ciliar e carnaubal extintas para a implantao dos equipamentos industriais. Lagoas, canais de mar e gamboas foram utilizadas como reas de lanamento de efluentes. A laguna Passagem Rasa (utilizada pelos ndios Trememb de Almofala, Itarema/CE) e os manguezais e gua doce subterrnea da comunidade do Cumbe (Aracat) encontram-se em avanado estado de degradao pela implantao dos viveiros.
Diminuio da biodiversidade ao longo das bacia hidrogrficas. Interferncia direta na produo e distribuio de nutrientes para o esturio, lagunas, praias e plataforma continental. Extino de setores de reproduo e alimento de moluscos, aves (inclusive de aves migratrias) e peixes. Danos s atividades de subsistncia de pescadores, ndios, marisqueiras e quilombolas.
Inicialmente foram utilizadas fotografias areas e imagens de satlite para caracterizar os habitats danificados pela construo de viveiros e demais obras de infra-estrutura. Durante os trabalhos de campo, foram amplamente registrados os danos ambientais e constatadas alteraes radicais (morfologia, substrato, fauna e flora) de vrios habitats.
Biodiversidade ameaada Alteraes nos processos geoambientais e ecodinmicos
relacionados com a produtividade primria. Artificializao da paisagem associada aos mdio e baixo cursos fluviais. Extino de setores de apicum,
Interferncias na produo e distribuio de nutrientes no ecossistema manguezal e exportao de nutrientes para os demais ecossistemas da zona costeira. Atividades cumulativas ao longo do sistema fluviomarinho sem o
Pareceres tcnicos do IBAMA e de pesquisadores do Departamento de Geografia da UFC. Constatao em campo dos danos ambientais ao longo do
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desmatamento do manguezal, contaminao da gua e salinizao do aqfero. Elevada densidade de fazendas de camaro concentradas nos baixos cursos fluviais
devido conhecimento das conseqncias ambientais. Extino de reas de alimentao e refgio para a fauna marinha (inclusive de aves migratrias). Conseqncias socioeconmicas e culturais diretamente vinculadas s atividades de subsistncia das comunidades tradicionais.
ecossistema manguezal, mata ciliar e carnaubal.
Disseminao de doenas (crustceos)
Elevada produtividade de camaro por hectare. Ausncia de monitoramento e manejo integrado nas diversas fases de produo.
Disseminao de doenas virais (mancha branca) e sndrome da necrose idioptica muscular (NIM)
Relatos durante as entrevistas e audincias pblicas. Foi registrado pelos pesquisadores do Depto. de Geografia da UFC o fato de aproximadamente 300 kg de camaro em elevado estagio de putrefao em uma fazenda clandestina.
Extino de reas de mariscagem, pesca e captura de caranguejos
Implantao de viveiros em reas de manguezal, de apicum, salgado e bancos de areia, antes utilizadas de forma sustentvel pelas comunidades tradicionais litorneas e indgenas.
Interferncias na capacidade de produo de alimento associada ao ecossistema manguezal. Danos aos habitats relacionados diretamente com a segurana alimentar das comunidades tradicionais. Diminuio da biodiversidade e conseqentemente na capacidade produtiva do sistema estuarino e demais unidades de paisagem afetadas. Ocorreram relatos de migrao de populaes de pescadores devido problemas associado supresso e privatizao de reas de subsistncia.
Durante os trabalhos de campo e observaes realizadas em fotografias areas e imagens de satlite, foi possvel caracterizar setores do ecossistema manguezal, da mata ciliar, da caatinga e do carnaubal, completamente artificializados pela atividade de carcinicultura. Denncias por parte de pescadores, ndios e agricultores.
Excluso das comunidades tradicionais no planejamento participativo
Desinteresse dos produtores em discutir os impactos ambientais, econmicos e culturais com a implantao das fazendas de camaro em reas tradicionalmente utilizadas pelas comunidades litorneas.
No cumprimento da legislao ambiental e conflito de interesses.
Denncias durante as audincias pblicas e de acordo com entrevistas realizadas nas atividades de campo. Foram inclusive visitadas reas em operao clandestina (sem licena dos rgos ambientais).
Presso para compra de terras
Coao e ameaas realizadas pelos produtores de camaro aos pescadores, pequenos agricultores e lideranas
Conflitos de terra. Denncias apresentadas aos tcnicos do IBAMA e relator do GT durante audincia pblica.
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comunitrias. Entrevistas realizadas nas comunidades de Curral Velho (Acara/CE) e Cumbe (Aracat/CE).
Desconhecimento do nmero exato de fazendas de camaro
Fazendas de camaro clandestinas em reas de preservao permanente.
Danos paisagem e ecossistemas ao longo das bacias hidrogrficas. Conflitos com as comunidades litorneas.
Inspees de campo, onde foi possvel constatar fazendas de camaro sem placas informativas sobre a licena de operao.
Inexistncia de manejo
Conjunto de impactos ambientais detectados ao longo do ecossistema manguezal, sem nenhuma ao de recuperao das reas degradadas.
Incremento dos impactos ambientais, culturais e socioeconmicos ao longo das bacias hidrogrficas.
Relatrios apresentados pelos tcnicos do IBAMA e pareceres tcnicos realizados por pesquisadores do Departamento de Geografia da UFC.
No-definio dos impactos cumulativos
Elevada densidade de fazendas de camaro em bacias hidrogrficas, com a fragmentao dos ecossistemas manguezal, mata ciliar e carnaubal. Aumento dos conflitos com as comunidades tradicionais.
Damos ambientais de elevada magnitude ao longo das bacias hidrogrficas.
Relatrios tcnicos apresentados pelos Analistas do IBAMA, audincias pblicas, anlise de imagens de satlite e trabalhos de campo realizados pelo GT-Carcinicultura..
Fonte: Modificada de MEIRELES e TUPIMAMB (2005).
Mesmo apresentando toda uma problemtica ambiental, a atividade de carcinicultura teve
disposio considervel incentivo por parte dos Governos Estadual e Federal e de instituies
financeiras pblicas e privadas. O Departamento de Pesca e Aqicultura do Ministrio da
Agricultura e do Abastecimento elaborou, em julho de 1998, a poltica de desenvolvimento da
carcinicultura, voltada para as exportaes, buscou financiamentos pblicos para o projeto junto ao
BNDES, Banco do Nordeste do Brasil e a SUDENE, sob a justificativa de o Brasil poder [...]
reverter o dficit da balana comercial nacional de pescado (Departamento de Pesca e
Aqicultura, in: BATISTA e TUPINAMB, 2004).
Analisando o processo de crescimento da atividade industrial da monocultura do camaro
nos manguezais do Nordeste brasileiro, e j apontando para as conseqncias desastrosas desta
nova forma de mercantilizao dos ecossistemas de fundamental importncia para a diversidade de
fauna e flora nas zonas costeira e marinha e de usufruto das comunidades tradicionais, Batista e
Tupinamb (op. cit.), afirmaram que o crescimento exponencial espantoso do cultivo de camaro
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marinho em cativeiro no Brasil no constitui fenmeno espontneo. Os responsveis pelo
crescimento vertiginoso da atividade foram as polticas de desenvolvimento e de incentivo,
pautadas na lgica do agronegcio e implementadas pelo Estado brasileiro.
As conseqncias do massivo processo de ocupao dos manguezais, contaminao dos
recursos hdricos superficiais e subterrneos, privatizao da gua e danos sociais, foram
amplamente alertadas por pesquisadores universitrios, tcnicos de ONG`s nacionais e
internacionais, representantes do Congresso Nacional e lideranas comunitrias e indgenas. O
Relatrio do GT Carcinicultura publicado em 2005 e aprovado por unanimidade pela Comisso de
Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Cmara dos Deputados, denunciou os graves
problemas ambientais, sociais e econmicos da carcinicultura.
Os danos socioambientais relacionados com a expulso de comunidades tradicionais de suas
reas de moradia e de subsistncia foram tambm associados com a promoo de baixos ndices de
empregos e srios problemas de sade do trabalhador. Segundo a Associao Brasileira dos
Criadores de Camaro (ABCC, 2004), a atividade de produo de camaro em cativeiro gera 1,8
emprego diretos por hectare. Ao analisar-se os empregos gerados por 245 fazendas de camaro
(IBAMA, 2005), constataram-se ndices de at 6,3 vezes menos empregos por hectare,
demonstrando que os dados apresentados ABCC foram supervalorados.
Segundo informaes de pescadores, ex-trabalhadores e constatao durante as atividades
de campo, as fazendas que ainda persistem nos esturios dos rios Jaguaribe e Corea utilizam o
metabissulfito de sdio (Na2S2O5) durante a etapa de despesca. Trata-se de um composto oxidante
que, ao ser lanado no ambiente, diminui a concentrao de oxignio dissolvido, podendo provocar
a morte de organismos aquticos. Aps ser lanado na gua, libera o gs dixido de enxofre (SO2).
Trata-se de um gs irritante e a intoxicao aguda resulta da inalao de concentraes elevadas de
SO2 (ARAJO e ARAJO, 2004). A morte pode resultar do espasmo reflexo da laringe, edema de
glote, com a conseqente privao do fluxo de ar para os pulmes, congesto da pequena
circulao (pulmes), surgindo edema pulmonar e choque.
4. Recomendaes para a sustentabilidade e garantia dos territrios tradicionais
A carcinicultura representa um modelo de desenvolvimento falido que se apropria de
territrios coletivos e ancestrais, ocasiona rpidas transformaes das formas de vida, da paisagem e
ecossistemas de usufruto, fundamentais meios de sobrevivncia de comunidades ao longo do litoral
nordestino. Verificou-se que a instalao das fazendas de camaro ao longo de reas de preservao
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permanente e os atuais critrios de certificao no ajudam a enfrentar os mltiplos e graves
impactos ambientais e sociais decorrentes da impulso da indstria do camaro nos pases do sul e
no Brasil.
Esta atividade se desenvolveu em detrimento da qualidade ambiental dos ecossistemas
marinhos e costeiros e vem promovendo, ampliando e legitimando injustias ambientais e violaes
dos direitos humanos, bem como comprometendo a segurana alimentar das populaes locais.
As recomendaes de utilizao adequada do ecossistema manguezal foram agrupadas com
suporte da anlise integrada dos impactos ambientais, das atividades socioeconmicas vinculadas
biodiversidade, das propostas de uso sustentvel apresentadas pelos usurios ancestrais e lideranas
comunitrias. Foram associadas melhoria da qualidade de vida das comunidades tradicionais,
manuteno da biodiversidade e preservao do ecossistema manguezal, da mata ciliar e do
carnaubal.
As recomendaes tcnicas foram tambm vinculadas s deliberaes das Conferncias
Nacional e Estaduais do Meio Ambiente (CNMA, 2003), relatrios do GT-Carcinicultura
(MEIRELES e TUPINAMB, 2005) e do IBAMA (2005) e foram agrupadas em trs grandes eixos
(MEIRELES e TUPIMAMB, 2005; MELO, 2005):
A. Aes integradas e participativas;
B. Aes diretamente associadas aos impactos ambientais definidos durante os trabalhos do
GT-Carcinicultura, e
C. Aspectos a serem considerados na reviso das Resolues do CONAMA.
A. Aes integradas e participativas
i) Atuao conjunta durante as etapas de licenciamento (Unio, estados e municpios), de
monitoramento e de fiscalizao, envolvendo os rgos ambientais, o Ministrio Pblico, as
universidades, as ONGs e, principalmente, representantes das comunidades tradicionais direta
e indiretamente atingidos pelos empreendimentos de carcinicultura.
ii) Informar, discutir e deliberar com as comunidades tradicionais, em seminrios, oficinas,
fruns e audincias pblicas, sobre as tcnicas de instalao, de produo e de industrializao
do camaro em cativeiro, as reas destinadas para a atividade, os geossistemas e ecossistemas
envolvidos e os habitats a serem utilizados para a implantao das fazendas de camaro.
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iii)Fortalecer as polticas de fiscalizao e de Educao Ambiental para o combate e a preveno
dos crimes contra a biodiversidade, de extino de ecossistemas da zona costeira e de habitats
e territrios vinculados diretamente s atividades de subsistncia das comunidades tradicionais.
iv)Articular e integrar a gesto das atividades de carcinicultura com a gesto das bacias
hidrogrficas, das florestas, da biodiversidade, do solo e de assentamentos humanos, levando
em conta os impactos cumulativos ao longo das bacias hidrogrficas e da zona costeira.
v)Vincular a outorga da gua a critrios socioambientais, com a renovao da licena
dependente de efetiva operao dos equipamentos de controle da qualidade de efluentes.
vi)Implementar medidas (programas e projetos) para a efetiva preservao e recuperao do
ecossistema manguezal, da vegetao ciliar e do carnaubal, vinculadas ao Programa Nacional
de Gerenciamento Costeiro (PNGC).
vii)Determinar que os estudos de impactos ambientais (EIA/RIMA) apresentem programas e
projetos efetivos (vinculados a dotaes oramentrias) de previso e de recomposio da
paisagem (complexo socioambiental associado) aps o abandono da atividade de produo de
camaro.
viii)Fomentar programas e projetos de recuperao ambiental, de previso e de recomposio da
paisagem apontados em estudos de impactos ambientais
ix)Revisar o Zoneamento Ecolgico-Econmico (ZEE), em escala de detalhe (no superior a
1:10.000), com a definio prioritria dos territrios tradicionalmente ocupados pelas
comunidades tradicionais e indgenas, prevendo a no-fragmentao do ecossistema
manguezal e demais ecossistemas associados e a preservao de corredores ecolgicos entre as
bacias hidrogrficas.
x)Demarcar as faixas marginais de preservao permanente (ecossistema manguezal, mata ciliar,
carnaubal e demais sistemas ambientais vinculados) associada com projetos de revitalizao de
bacia e proteo integral do solo, da vegetao, da fauna e da flora.
xi)Demarcar as Terras da Unio com sua vinculao a uma ao integrada com os rgos
federais, estaduais e municipais de meio ambiente.
xii)Assegurar no processo de demarcao das Terras da Unio a permanncia das atividades
tradicionais sustentveis e de usufruto ao longo das bacias hidrogrficas e da zona costeira.
xiii)Ampliar a participao das entidades representativas das comunidades tradicionais nas
instncias deliberativas e de formulao de polticas pblicas.
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xiv)Criar mecanismos para assegurar recursos das agncias pblicas para financiamento das
atividades de carcinicultura que no envolvam a utilizao de reas de preservao
permanente, priorizando a produo consorciada a aplicao de tecnologias limpas e o
policultivo.
xv)Determinar que os fundos estaduais e municipais de meio ambiente e as agncias pblicas de
financiamento deliberem sobre o financiamento, amparadas em pareceres tcnicos elaborados
pela prpria agencia de financiamento, enfatizando os custos ambientais, ecolgicos, sociais,
culturais, simblicos e econmicos.
xvi)Suspender financiamento de empresas que no cumpram a legislao ambiental e trabalhista.
xvii)Criar linhas especficas de financiamento para grupos comunitrios e vinculadas produo
comunitria e cooperativa.
xviii)Vincular os recursos oriundos de multas e compensaes diretamente s
reas/ecossistemas/comunidades tradicionais, atingidas pelos crimes ambientais, enfatizando a
aplicao na fiscalizao, na recuperao de reas degradadas e em polticas de Educao
Ambiental.
xix)Estimular a criao e institucionalizao de fruns de natureza integracional e
interinstitucional para incentivar e aprimorar as polticas ambientais, a educao ambiental, a
pesquisa e o desenvolvimento de tcnicas sustentveis; estabelecer parmetros e normas,
propor projetos inovadores e de redes de informao e comunicao. Devero atuar como
catalizadores e disseminadores das propostas de preservao do ecossistema manguezal e da
melhoria da qualidade de vida das comunidades tradicionais e indgenas.
B. Aes diretamente associadas aos impactos ambientais
i) Desmatamento do manguezal, da mata ciliar e do carnaubal: mapeamento integrado
(fauna, flora, uso do solo e recursos ambientais associados sobrevivncia das
comunidades tradicionais) com inventrio dos recursos ambientais, baseado em sries
histricas (com base nos levantamentos cartogrficos do Exrcito Brasileiro, Programa
RADAM Brasil, IBGE e outros institutos e fundaes estaduais) e produtos de
sensoriamento remoto (imagens de satlite) e em escala de detalhe (no inferior a
1:10.000). Prover tcnica e financeiramente os rgos ambientais, universidades, ONGs
e comunidades tradicionais para o desenvolvimento dos trabalhos de forma integrada e
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participativa. Aplicar parte dos recursos oriundos das multas na recuperao do habitat e
em medidas mitigadoras dos impactos socioambientais.
ii) Extino do apicum: delimitao dos remanescentes de apicum e dos que foram
extintos para a implantao das fazendas de camaro. Cassar as licenas prvias e
redefinir os projetos com licena de implantao. Os que se encontram em operao
devero fornecer programas executivos de compensao socioambiental e rigorosamente
fiscalizados para no ampliarem suas reas de produo sobre o apicum.
iii) Soterramento de gamboas e canais de mar: restabelecer as trocas laterais com a
hidrodinmica estuarina, com o lenol fretico e com o fluxo fluvial mediante aes
integradas com os rgos ambientais, universidades, ONGs e comunidades tradicionais.
Aplicar as compensaes ambientais e multas na recuperao de reas degradadas. No
aprovar licenas ambientais e o financiamento de empreendimentos que ocupem setores
vinculados diretamente com a produo e disseminao de nutrientes para o ecossistema
manguezal e para a zona costeira marinha associada.
iv) Contaminao da gua por efluentes dos viveiros e das fazendas de larva e ps-
larva: interditar os empreendimentos que no contam com um sistema integrado (lagoas
de sedimentao, monitoramento e gesto) de tratamento de efluentes. Constituir e
incentivar comits locais de fiscalizao e acompanhamento das atividades de
implantao, monitoramento e gesto do sistema de tratamento de efluentes; dar
publicidade aos dados de monitoramento.
v) Salinizao do aqfero: evitar a impermeabilizao do solo e de reas de recarga em
extensas reas e de forma contnua. No-implantao de canais de aduo de gua
marinha sobre ambiente tipicamente de gua doce. Monitoramento do regime de fluxo,
da qualidade e volume de gua armazenada no aqfero direta e indiretamente associado
s fazendas de camaro.
vi) Eroso dos taludes, dos diques e dos canais de abastecimento e de desge: nos
empreendimentos em operao implantar medidas de conteno das encostas e
recuperao das reas assoreadas por materiais alctones aos ecossistemas atingidos.
vii) Reduo de habitats de numerosas espcies e diminuio da biodiversidade:
quantificar de forma integrada os impactos que levaram fragmentao de habitats e
conseqente diminuio da biodiversidade. Efetivar a preservao do ecossistema
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manguezal, da mata ciliar e do carnaubal e implantar programas para a caracterizao,
monitoramento e gesto de corredores ecolgicos.
viii) Utilizao de metabissulfito: normas e procedimentos tcnicos de modo a no expor os
trabalhadores, os ecossistemas, o solo e os recursos hdricos s descargas de solues de
metabissulfito utilizado na produo de camaro em cativeiro. Vincular as fases de
licenciamento a um programa de sade do trabalhador, de modo a evitar doenas
respiratrias, de pele e bitos j registrados.
ix) Extino de reas tradicionalmente utilizadas para a mariscagem, pesca e captura
de caranguejos: diagnstico ambiental por comunidade para a definio de medidas de
retomada da biodiversidade; restabelecer os caminhos de acesso para as reas de
mariscagem, coleta de caranguejos e porto dos barcos e jangadas ; alm da compensao
socioeconmica para as comunidades direta e indiretamente atingidas pela extino dos
setores de apicum e manguezal.
x) Expulso de marisqueiras, pescadores e catadores de caranguejo de suas reas de
trabalho e sobrevivncia: estimular e financiar projetos para o fortalecimento dos
movimentos sociais vinculados s associaes comunitrias, aos sindicatos e fruns de
pescadores, pescadoras e marisqueiras, aos fruns em defesa da zona costeira, de
ambientalistas e s redes de Educao Ambiental, para uma ao conjunta, articulada e
ampliada. Fiscalizao e gesto dos conflitos desencadeados pelas fazendas de camaro
em reas tradicionalmente utilizadas para a subsistncia das comunidades tradicionais;
delimitao e demarcao dos territrios de usufruto e das terras indgenas.
xi) Excluso das comunidades tradicionais no planejamento participativo: mobilizar as
comunidades, sensibilizando os rgos pblicos de polticas ambientais e de educao
ambiental, para o envolvimento nas aes e programas de preservao do ecossistema
manguezal, de segurana alimentar e de manuteno da biodiversidade. Efetivar a
participao de entidades representativas nas instncias de deliberao. Que os
EIA/RIMAs promovam ampla discusso, nas diversas fases do empreendimento, com a
participao efetiva das comunidades tradicionais.
xii) Disseminao de doenas (crustceos): promover rigoroso programa de fiscalizao da
produtividade aliado ao monitoramento e gesto nas diversas fases de produo;
programa de barreiras fitossanitrias vinculado aos ecossistemas e bacias hidrogrficas.
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xiii) Presso para compra de terras: regularizao fundiria das posses dos moradores das
comunidades (pescadores, marisqueiras, ndios, agricultores, quilombolas, ribeirinhos),
por meio da demarcao das terras de marinha, das aes discriminatrias das terras
devolutas e da demarcao das Terras Indgenas; aes que devero ser implantadas de
forma integrada com polticas de fortalecimento dos movimentos sociais, articulao dos
rgos ambientais e associaes comunitrias.
xiv) Desconhecimento do nmero exato de fazendas de camaro: ao conjunta e
integrada de mobilizao dos rgos ambientais, Ministrio Pblico, universidades e
sociedade civil, no sentido de impor moratria das licenas ambientais at que se tenha
amplamente definido o atual estado ambiental do ecossistema manguezal e das
comunidades que dependem de seus recursos e servios ambientais para a sobrevivncia.
Realizar diagnstico por bacias hidrogrficas envolvendo a delimitao das fazendas de
camaro por ecossistemas utilizados.
xv) Inexistncia de manejo: exigncia, para a liberao por parte dos rgos ambientais e
conselhos vinculados ao SISNAMA, de um programa executivo de manejo e mitigao
dos impactos ambientais (com destinao oramentria por parte do empreendedor), que
dever estar vinculado s associaes comunitrias, fruns de pescadores, secretarias
estadual e municipais de sade, de meio ambiente e de educao.
xvi) No-definio dos impactos cumulativos: diagnstico ambiental da carcinicultura ao
longo das bacias hidrogrficas, da zona costeira e da plataforma continental, de modo a
compor um quadro geral do conjunto de impactos; associar a licena prvia para os
novos empreendimentos definio do incremento dos impactos e aes mitigadoras
vinculados aos empreendimentos em operao. A definio dos impactos cumulativos,
por bacias hidrogrficas e ecossistemas impactados, dever fundamentar a liberao de
licenas de implantao e operao.
C. Aspectos a serem considerados na reviso das Resolues do CONAMA
i) Explicitar o apicum e o salgado como unidades geoambientais e ecodinmicas
pertencentes ao ecossistema manguezal e, portanto, de preservao permanente.
ii) Exigir, para a implantao das atividades de produo de camaro em cativeiro, a
delimitao das Terras da Unio, dos terrenos de marinha e seus acrescidos, a
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demarcao das terras indgenas e o reconhecimento das posses legtimas mansas e
pacficas das comunidades tradicionais.
iii) Regulamentar a implantao de fazendas de camaro em unidades de conservao e em
terra indgenas.
iv) Definir uma zona de distanciamento mnimo das fazendas de camaro dos
assentamentos humanos, resguardando as reas de atividades tradicionais, de drenagem
superficial vinculada ao uso tradicional e s demais atividades de subsistncia (pesca,
mariscagem, agricultura e usufruto dos recursos naturais);
v) Delimitar os sistemas de produo (intensivo e extensivo) com suporte no potencial
sustentvel dos ecossistemas envolvidos e da efetiva disponibilidade de gua,
assegurando a continuidade das atividades tradicionais de pescadores, marisqueiras,
ndios, ribeirinhos e quilombolas vinculadas pesca, mariscagem, agricultura e ao
usufruto dos recursos naturais.
vi) Fixar ndices mximos (biolgicos, qumicos e fsicos) para o lanamento dos efluentes
das atividades de produo e beneficiamento do camaro em cativeiro.
vii) Determinar emisso de licenas somente com arrimo de efetivas aes de uso e manejo
adequados de implementos e substncias qumicas potencialmente danosas sade
humana e da qualidade dos sistemas ambientais envolvidos, na produo e
industrializao do camaro.
viii) Determinar que licenciamentos e financiamentos sejam realizados de acordo com a
definio dos impactos cumulativos, do estado de fragmentao dos ecossistemas
envolvidos e a disponibilidade de gua a partir de projees de uso a curto, mdio e
longo prazos.
ix) Licenciar e financiar com base em planos e programas (com dotao oramentria) de
recuperao de reas degradadas com o abandono da atividade de produo de camaro
em cativeiro.
x) Determinar que licenciamentos e financiamentos ocorram associados efetiva
instalao de barreiras fitossanitrias, controle e manejo na introduo/invaso de
espcies exticas para a produo, importao e exportao dos produtos associados
carcinicultura.
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5. Consideraes finais
A indstria da carcinicultura foi implantada, em grande parte, no apicum, caracterizado
como componente fundamental do ecossistema manguezal, de elevada biodiversidade, essencial
para a diversificao de nichos, constituindo reas de expanso do bosque de mangue, detentora de
processos geoambientais e ecodinmicos especficos, sendo habitat para peixes, aves migratrias,
crustceos e outros vertebrados. O apicum integra o ecossistema manguezal e produz recursos
ambientais essenciais para as comunidades tradicionais e indgenas, fornecendo suprimentos
alimentar e econmico para a subsistncia dos pescadores, marisqueiras, ndios, ribeirinhos,
quilombolas e camponeses.
O fluxograma continuao representa a integrao dos fluxos de matria e energia
envolvidos na dinmica evolutiva do ecossistema manguezal, evidenciando a origem do apicum e
sua evoluo para um bosque de manguezal. Evidencia a degradao do ecossistema manguezal
com a interferncia nestes fluxos a partir da introduo das fazendas de camaro. A ocupao do
apicum por essas fazendas5 fortaleceu institucionalmente a degradao do manguezal, mesmo com
resultados de pesquisas definindo este setor de plancie de mar como de fundamental importncia
ecolgica e social (territrio das relaes de trabalho, manifestaes culturais e de subsistncia das
comunidades costeiras e indgenas). Com a retomada dos fluxos litorneos em fazendas
abandonadas verificou-se o aumento da biodiversidade, com a entrada dos propgulos e da ciclagem
de nutrientes. A qualidade ambiental e comunitria est diretamente relacionada com a abertura dos
diques para a ciclagem de nutriente, o rompimento das barreiras promovidas por obras de
terraplenagem e o no lanamento de efluentes, aliados aplicao da legislao ambiental e
demarcao das reas comunitrias de subsistncia.
5 Amparada pela resoluo COEMA/CE N 02/2002
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Evoluo do ecossistema manguezal a partir da dinmica imposta pelos fluxos de matria e energia. Com a chegada da
carcinicultura, estes fluxos foram interceptados, o apicum ocupado pelas fazendas de engorda. A recuperao das reas degradadas
pelas fazendas abandonadas passa por um processo de gesto integrada e participativa, aplicao da legislao e tcnicas de
restabelecimento das trocas laterais com a retomada da dinmica das mars, para a ciclagem de nutrientes e incremento da
biodiversidade.
Foi possvel definir que o processo de certificao das fazendas produtoras de camaro est
se processando, por exemplo, como no Equador. Foram adotadas as regulamentaes
socioambientais e as boas prticas, buscando a melhoria da qualidade e sade do produto
(camaro para a exportao), para retomada das grandes exportaes e obteno de novos
mercados, aes essas definidas pelos industriais e setores institucionais de governo, em detrimento
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da conservao da biodiversidade, aplicao do marco legal vigente e proteo do modo de vida e
segurana alimentar dos povos tradicionais.
Esta nova fase da indstria do camaro no Brasil, associada aos diversos instrumentos
privados e seus variados critrios de certificao, surge como mais uma estratgia de sustentao de
um modelo de produo de monocultura e dedicada exportao de produtos aos consumidores de
pases desenvolvidos. Representa o cultivo industrial em reas de preservao permanente,
apropriao de terras tradicionais e a exportao de um produto vinculado degradao da
biodiversidade, privatizao dos recursos hdricos e ecossistemas costeiros de pleno usufruto
tradicional.
As fazendas abandonadas e o processo de certificao no podem ser utilizados para
legitimar um passivo ambiental decorrente de um ciclo produtivo de desenvolvimento da
carcinicultura caracterizado pela insustentabilidade. Creditamos, portanto, certificao um
potencial de se constituir elemento adicional na busca da sustentabilidade, desde que aberto a rever
as caractersticas, atividades produtivas e processos industriais em reas de preservao permanente
e em terras tradicionais, que conduziram instalao de conflitos com a privatizao e degradao
das reas midas litorneas.
No mbito da pesquisa cientfica, denotou-se parte considervel orientada para satisfazer os
interesses de grupos empresariais descomprometidos com o destino dos grupos sociais extrativistas
e a biodiversidade. Pesquisadores que demonstraram evidncias cientficas do carter inconcilivel
da carcinicultura com a preservao e conservao dos manguezais vm sendo perseguidos, numa
tentativa intil de impedir a continuidade e aprimoramento dos estudos que denunciam os danos
socioambientais desta monocultura no litoral nordestino.
Portanto, os conflitos ambientais foram desencadeados pela deficincia de polticas
orientadas para a manuteno da qualidade socioambiental de ecossistemas de preservao
permanente; prticas discriminatrias dos carcinicultores na apropriao/privatizao de territrios
de usufruto tradicional; impactos negativos direcionados para grupos socialmente vulnerveis,
inviabilizando, inclusive, acesso e utilizao dos sistemas ambientais de forma justa e eqitativa.
Aes francamente relacionadas com violao dos direitos humanos dos povos tradicionais e
indgenas e injustia ambiental.
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