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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Emerson Gomes Seraphim HISTÓRIA E REFLEXÕES DO DIREITO PENAL NO IMPÉRIO. CURITIBA 2016

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Emerson Gomes Seraphim

HISTÓRIA E REFLEXÕES DO DIREITO PENAL NO IMPÉRIO.

CURITIBA 2016

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HISTÓRIA E REFLEXÕES DO DIREITO PENAL NO IMPÉRIO.

Curitiba 2016

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

EMERSON GOMES SERAPHIM

História e reflexões do Direito Pena no Império.

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Curso de Direito – Faculdades de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharelado em Direito. Orientador: Professor André Peixoto de Souza.

CURITIBA 2016

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TERMO DE APROVAÇÃO

EMERSON GOMES SERAPHIM

HISTÓRIA E REFLEXÕES DO DIREITO PENAL NO IMPÉRIO

Curitiba, 2016

Prof. Dr. P.H.D. Eduardo de Oliveira Leite, Coordenador do Núcleo de Monografia da Universidade Tuiuti do Paraná

______________________________________________________________ Orientador: Prof. Doutor André Peixoto de Souza

UTP – FACET

Prof. Doutor Prof. Doutor

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RESUMO

O trabalho monográfico, faz uma reflexão histórica na relação entre o escravo e Direito Penal, no período do Brasil Império. O estudo surgiu com o intuito de apresentar novas perspectivas a respeito do escravo em relação ao Direito Penal e a efetivação da violência pelo Estado. De modo a analisar as relações sociais, políticas e culturais do período. O intuito é expor a posição do escravo como objeto e a afirmação do Poder do Estado, através da violência como exemplo pedagógico para a sociedade livre. Para a análise dos fatos que ocorreram no período imperial, foram usados as legislações vigentes e matérias de jornais que denunciavam os maus tratos contra os escravos. O escravo no Brasil, foi condicionado a servidão e sendo comparado com animais, objetos e não sendo reconhecidos como cidadão brasileiro, e também não tendo direitos como os homens livres. E lhe aplicando todos os tipos de torturas para forçar a trabalhar na lavoura e também nas minas. Portanto através dos maus tratos, havia o intuito de dominação coletiva, tanto pelo senhor de escravos como pelo Estado. Palavras chave: Escravidão, Direito e Estado.

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ABSTRACT

The monographic work, is a historical reflection on the relationship between the slave and Criminal Law in Brazil Empire period. The study came up with the intention of presenting new perspectives on the slave in relation to criminal law and the effectiveness of violence by the state. In order to analyze the social, political and cultural period. The purpose is to expose the position of the slave as object and the assertion of state power through violence as an educational example for the free society. For the analysis of the events that occurred in the imperial period, they were used existing laws and articles in newspapers denouncing the mistreatment of slaves. The slave in Brazil, has been conditioned to servitude and being compared to animals, objects and not being recognized as a Brazilian citizen, and also not having rights as free men. And applying all kinds of torture to force working in agriculture and also in mines. So through ill-treatment, had the purpose of collective dominance, both the slaveholder as the state. Keywords: Slavery, Law and State.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ......................................................................................08 1. ESTADO VIOLENTO ........................................................................11 1.1 ESTADO VIOLENTO NA EUROPA .................................................11

1.2. ESTADO VIOLENTO CONTRA O INDIGENA ................................14 1.3. ESTADO VIOLENTO CONTRA O AFRICANO LIVRE ...................17 2. ORDENAÇÕES PORTUGUESAS ....................................................19 2.1.INICIO DAS ORDENAÇÕES PORTUGUESA ................................19 2.2. ORDENAÇÕES MANUELINAS ..................................................... 20 2.3. ORDENAÇÕS FILIPINAS .............................................................. 23 3. PUNIBILIDADE DAS ORDENAÇÕES FILIPINAS .......................... 27 3. 1. DEGREDADOS ............................................................................ 30 3. 2. CASTIGOS E PENAS .................................................................. 39 4. CÓDIGO DE 1830 ............................................................................ 57 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................. 60 FONTES ............................................................................................... 61 REFERÊNCIAIS BIBLIOGRAFICAS ................................................... 61

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INTRODUÇÃO.

Este trabalho tem como objetivo abordar o tema da escravidão no Brasil,

considerando os “Aspectos Históricos e Jurídicos da Escravatura no Brasil: suas

transformações sociais e ideológicas no Brasil, desde descobrimento até o

período do primeiro Código Penal”.

Para analisar séculos de transformações sociais e suas implicações no

cenário brasileiro é necessário fazer um estudo histórico de sociedade e

jurisdição do Brasil, analisando os períodos colonial, imperial, pois os

acontecimentos dos referidos períodos históricos ecoam em nossa atual

sociedade.

De forma a consolidar as transformações políticas e jurídico – sociais no

estado brasileiro através da História da Justiça e a influência no contemporâneo.

Fundamentar a consolidação do Justiça através dos ideários de

manutenção jurídica e social e também com o intuito de fazer prevalecer o direito

natural, ou seja, a liberdade de ideias do indivíduo social perante o Estado,

buscando as relações Estado e sociedade.

Proporcionando novas teorias em território brasileiro, que no

prolongamento dos períodos transformou a sociedade e seus dogmas.

Neste trabalho os grupos sociais ativos pertencentes aos períodos

Históricos colonial, imperial serão analisados, dentre eles, os indígenas em

primeiro lugar e subsequente o africano aliciados para se transformar em mão

de obra escrava e deslocamento em direção ao Brasil, oriundo do continente

Africano.

Arrebatados através da relação de troca e compra e venda de almas, e

distanciando de sua terra natal, sob extrema violência para um futuro incerto.

Na chegada em território brasileiro, o cativo é direcionado para a

realização do cultivo da extração da cana-de-açúcar, pau brasil e minérios,

formalizando a posição de cada personagem histórico na sociedade, através das

relações jurídicas entre escravo, homem livre e o Estado.

Estes grupos sociais foram fundamentais para o processo social e

desenvolvimento da justiça no Brasil. Portanto a cada momento histórico do país,

à releitura do processo de transformação histórico - social e jurídico.

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Mas para a realização destas mudanças sociais, a ferramenta para a

consolidação da Justiça no Brasil-Nação, será as ordenações jurídicas

portuguesas, que irão salvaguardar os interesses nacionais.

A partir da valorização da legislação, passam a se efetivar as leis que

iram ser o ponto base para a nacionalização do Direito Penal, em solo brasileiro.

Neste sentido a problemática desta monografia refere-se a inserção das

primeiras Ordenações Portuguesas e o Direito Penal no Brasil, os motivos das

transformações que levaram as instituições jurídicas a ser moldadas para o

contemporâneo.

E também o processo de modificações de lei, que através da legislação

e movimentos organizados, políticos e populares fundamentaram propostas para

as transformações do Direito Penal no Brasil.

Para o auxílio do meu trabalho monográfico, usei fontes primárias e

secundárias, que me auxiliaram para o meu entendimento de leitura e escrita.

As fontes primárias são as leis no período colonial e do império e

processo penal, “Ordenações Portuguesas, Código Penal do Império de 1830).

E fontes secundárias, obras escritas por historiadores e juristas clássicos

José Alipio Goulart, “Da Palmatória ao Patíbulo”, Sidney Chalhoub, “Visões da

Liberdade”, Jayme de Altavila, “Origem dos Direitos dos Povos”, Moacyr Flores,

“Dicionário de História do Brasil”, Michel Foucault, “Vigiar e Punir”, Constituição

Imperial de 1824 e o Código Criminal do Império do Brazil de 1830.

A formação das leis, será o ponto fundamental para o desenvolvimento

de conceitos jurídicos para o Brasil. Como referencial teórico, embora utilizado

com parcimônia, focalizei o texto, “A História no Direito e a Verdade no Processo:

O Argumento de Michel Foucault”, de Ricardo Marcelo Fonseca. O autor explana

que:

“Da mesma maneira que não se pode falar levianamente de "direito", sem tornar preciso o que se quer dizer exatamente com isto, não se pode também falar de "história" sem que um esclarecimento conceitual sobre este termo seja requisitado. De fato, quando se fala em "direito", pode-se estar referindo a um conjunto de valores, a um conjunto de normas, a um sistema, a um campo de lutas, etc. A interpretação a ser dada vai depender de como o virtual interlocutor localiza o fenômeno jurídico no plano teórico (ele pode ser um jusnaturalista, um juspositivista, um sistêmico, um marxista, e assim por diante). Isto significa que antes de pretender definir o direito, devemos perguntar: que direito? Qualquer discussão teórica posterior depende deste

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esclarecimento prévio, que funciona desta forma como um pressuposto para que sejam colocados os termos de um debate sobre "direito".1

Focando esta perspectiva teórica surge a pergunta: Qual direito é privilegiado

na história da escravidão no Brasil?

O primeiro capítulo irá abordar o início das Ordenações Portuguesas no

Brasil. Ao analisarmos os instrumentos que efetivaram a gênese da instituição

jurídica em território brasileiro, partindo da oficialização do Rei de Portugal as

descobertas a partir das bulas papais, ou seja, normas jurídicas.

”Bula Dum Divesas: Bula do Papa Nicolau V. de 8.6.1452, autorizando o rei de Portugal a sujeitar ao regime de escravatura os povos que descobrisse”.2

Analisando a legislação brasileira no período escravista, o teor jurídico

das ordenações portuguesas para leitura dos delitos penais na sociedade de

época e a influência no coletivo e, em relação ao Estado.

No momento em que iniciam os projetos legislativos para a adequação

das regulamentações para o desenvolvimento da nova colônia portuguesa.

Movimentos populares e políticos, se organizam para transformações

em várias áreas da sociedade e estendendo para o judiciário, priorizando a

segurança dos homens livres, e firmando o pacto social que terá como base a

relação sociedade e Estado.

1 FONSECA, Ricardo Marcelo. Adaptado de: A HISTÓRIA NO DIREITO E A VERDADE NO PROCESSO: O ARGUMENTO DE MICHEL FOUCAULT. 2 VAÍNFAS, Ronaldo. Dicionário do Brasil Colonial 1500 a 1808. Editora Objetiva, 2000, p. 205.

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1. ESTADO VIOLENTO

1.1. O ESTADO VIOLENTO NA EUROPA

O Estado absolutista, neste período efetiva o seu poder sob a população,

através de representações do imaginário coletivo, ou seja, através de doutrinas

pedagógicas expostas em praça pública, de extrema violência, de tal modo a

fundamentar sua ideologia e impondo através de normas legislativas a sua

posição de instituição forte perante a sociedade e promovendo os dogmas

canônicas e reais, portanto constituindo a execução da violência pelo Estado.

Em meados do século XVI, a expansão territorial e econômica de Portugal

consolida a formação do Conselho Ultramarino, especializado na navegação e

colonização de territórios no novo mundo em nome da Coroa de Portugal.

Para a consolidação do desbravamento ultramarino, o rei de Portugal

intensifica os laços com a Igreja Católica, concretizando e fortalecendo a

capitalização para as duas forças políticas e econômicas do período.

Esta aliança tem como consequência a oficialização de leis papais, tendo

a preocupação de elaborar a “Bula do Papa Nicolau V, nominado de Dum

diversas de 8 de junho de 1452”, na qual efetiva em nome da Igreja Católica e

da Coroa portuguesa o descobrimento de novos continentes. A bula Dum

diversas, é a afirmação da aliança do rei de Portugal com a Igreja Católica e a

efetivação dos ideários de expansão econômica e dominação territorial em favor

da Coroa Portuguesa.

A bula oficializa os diretos da coroa Portuguesa de invadir, buscar,

capturar e subjugar, induzindo a escravidão perpétua, sequestro dos bens e a

imposição religiosa levando os não cristãos a serem inimigos religiosos, e assim,

facilitando a concretização da escravidão no novo mundo.

Contemporânea a Portugal, a Espanha inicia a sua labuta em direção a

novas descobertas, e pede para intervenção do Papa para participar do certame

marítimo.

“BULA INTER COETERA”. Do Papa Alexandre VI, em 3.5.1456, concedeu à Espanha as terras que estivessem ou viessem a ser descobertas para o ocidente de Cabo Verde, reconhecendo as costas africanas como de Portugal. No dia 4.5.1493, confirmou e corrigiu o breve da véspera, acrescentando que a terra seria dividida por um meridiano que passaria a 100 léguas a ocidente de Cabo Verde. As terras a oriente pertenceriam a Portugal e as do ocidente do meridiano,

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à Espanha. O breve provocou protestos de Portugal e o Papa teve que anuir com o Tratado de Tordesilhas, realizado em 1494.3

Neste período, há elaboração da segunda bula papal, denominada

Romanus pontifex, de 1455, que amplia para os territórios de Marrocos e as

Índias as mesmas sanções da bula anterior.

Baseado nas bulas papais, o Estado justifica sua ações primeiramente

contra o índio e mais tarde contra o escravo africano. Ações justificadas através

de Alvarás, que tinham o poder de Decreto real concedendo licença, para ações

em no do reis e igreja e consolidadas por tribunais.

“Inicialmente os portugueses utilizaram o índio como mão-de-obra escrava no Brasil, mas como era proibido escravizar índios cristãos, conforme a bula Veritas ipsa, do papa Paulo III, em 1537 foram realizadas as chamadas guerras justas para submeter os indígenas infiéis. Em 1539 o donatário de Pernambuco, Duarte Coelho, solicitou ao rei de Portugal licença para resgate de escravos negros da Guiné, repetindo a mesma solicitação em 1542 e 1543. Pedro Góis, donatário da Paraíba do Sul, encomendou negros ao Reino em 1545, pois a Europa já utilizava escravos africanos. Pelo Alvará de 29.3.1549, D João III autorizou os senhores de engenho a importar, cada um, 120 escravos de Guiné e da ilha de S.Tomé”.4

Na França como no resto da Europa, o poder do Estado representado pelo

Rei, é ilimitado no qual tem a faculdade de interceder em benefício do réu ou

desfavor ao acusado através de normativas expostas pelos tribunais de época,

que muitas vezes a pedido do rei, sentenciavam o réu a morte ou favoreciam

com o perdão. Este fato que constantemente era comum nos tribunais e

consolidado pelas autoridades coligadas a sua Majestade a representação de

Deus na terra.

Deforma a aplicação das penalidades, se tornarem espetáculos para a

população e ao mesmo tempo, exemplo de poder monárquico, manipulação e

dominação do imaginário coletivo, expondo o poder absoluto do Estado e a

função controladora e opressora da Igreja perante ao povo.

“Damiens fora condenado, a 2 março de 1757, a pedir perdão publicamente diante da porta principal da Igreja de Paris aonde devia ser levado e acompanhado numa carroça, nu, de camisola, carregando uma tocha de cera acesa de duas libras; em seguida, na dita carroça, na Praça de Greve, e sobre um patíbulo que ai será erguido, atenazado nos mamilos, braços, coxas e barrigas das pernas, sua mão direita segurando a faca com que comenteu o dito parricídio, queimada com fogo de enxofre, e às partes em que será atenazado se aplicarão

3 FLORES, Moacyr, Dicionário de história do Brasil, 4. Ed. ampl. atual. Porto Alegre: EDIPUCRS,2008,

pg. 108. 4 VAINFAS, Ronaldo, Dicionário do Brasil Colônia de 1500 a 1808. Editora Objetiva, 2000, pg.205.

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chumbo derretido, óleo fervente, piche em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a seguir seu corpo será puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus membros e corpo consumidos ao fogo, reduzidos a cinzas, e suas cinzas lançadas ao vento. (Foulcault ).5

Os ideários de atrocidades praticados, pelos Estados absolutistas e

canônicos, se espalharam pela Europa, propondo e moldando a dominação

sobre o indivíduo e sociedade. Por meio do imaginário coletivo, introduzido como

conceito cultural de extrema violência, e afirmado pelo Estado fora intensificado

através dos costumes do período, solidificado por leis reais e canônicas.

Em meados do século XVIII, surgiu na Europa o ideário iluminista,

através de Jhon Locke, filosofo e fundador do iluminismo na Inglaterra, que

instituía a defesa da liberdade dos cidadãos e condenava o absolutismo e

conjugando os conceitos da razão através da ciência, analise e critica para

fundamentar a liberdade de expressão, igualdade de direitos, luta contra a

opressão absolutista e também a econômica e reflexões políticas contra o antigo

regime. Suas ideias ultrapassaram as fronteiras inglesas, e foi difundido por toda

Europa, anos mais tarde.

Na França os conceitos de Locke, se desenvolvem e são consolidados

e acolhidos pelas classes intelectuais francesas, nomes como Montesquieu,

Rousseau, Hobbes, Voltaire proporcionaram a releitura das classes através das

próprias classes como um todo, ou seja, o indivíduo privado e o indivíduo coletivo

para analisar a relação entre povo e governo, e as relações de trabalho, política,

economia, direito e sociedade.

Na Itália, exatamente no Ducado de Milão, surge Cesare Beccaria, com

26 anos de idade autor da obra “Dos direitos e das penas”, elabora o discurso

sobre o sistema penal e judiciário, deste modo estabelece apreciação de releitura

das regras dos delitos e das penas aplicado no Direito Penal, que ainda se

encontrava nos moldes medievais.

Fortalecido pelo ideário iluminista, passa a refletir sobre a problemática

dos processos judiciais e percebe a existência de vários erros nos procedimentos

de execução das penas, de modo a intensificar a formação de movimento para

releitura e modernização de todos os processos criminais da época para a nova

5 FOUCAULT, Michel, Vigiar e Punir: nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. 38. ed.

Petrópolis, RJ: Vozes, 2010, p. 09.

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aplicação de conceitos referentes aos costumes jurídicos e direitos canônicos.

No qual a grande incidência de excessos por parte da justiça criminal era fatal

para o acusado e réu.

Os excessos, seriam os crime comuns que eram convertidos em crimes

religiosos, portanto relacionado como pecado e crime gravíssimos pelas

autoridades judiciárias e canônicas.

Aumentando o conhecimento e aperfeiçoando suas ideias, no passar

dos anos, elabora fundamentos para a modernização das Instituições do

Judiciário e do Estado. O intuito é extinguir o antigo sistema aplicado, e

estabelecer novo sistema jurídico em benefício do povo e criar ferramentas para

a socialização do indivíduo infrator.

Beccaria para o seu tempo, um visionário, debateu com seus pares a

legalidade da pena que deveria ser aplicada com base na lei e puramente pela

lei, de forma transparente e garantindo segurança jurídica dos processos

judiciais.

Como paradigma, Beccaria fundamenta a aplicação de princípios para

as punições e condena toda forma de pré-julgamento baseados em

preconceitos, ódio contra o outro e desacordos religiosos. Com estas

considerações promove o fim da aliança da Igreja e Estado, e a valoração do

homem social influenciado pela razão e consequentemente a independência das

leis em um sistema de governo laico e igualitário.

Na sua análise, as penas aplicadas, com consciência e igualdade

processual, manifestam o intuito de humanização do indivíduo no privado e

coletivo. Destarte, fundamenta que a Igreja não pode interferir na matéria dos

processos judiciais, e, na relação entre Estado, Sociedade e Igreja e ao mesmo

tempo o legislador solidifique a ampla soberania sobre as leis, estendendo para

todas as classes em plena igualdade jurídica.

1.2. ESTADO VIOLENTO NO BRASIL CONTRA O INDIGENA.

No período quinhentista no Brasil, não foi diferente do contexto europeu.

Deste modo houve o prolongamento dos paradigmas processuais e religiosos na

colônia portuguesa, portanto os mesmos conceitos de violência, inquisição e

perseguições políticas e religiosa se consolidaram.

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Na colônia foi reproduzida as ações do Estado absolutista, para o

desenvolvimento da colônia e a formação do imaginário coletivo de dominação

pelo Estado.

As ações dos ideários absolutistas que foram aplicados em território

europeu, também seria aplicados, em território brasileiro como forma de justiça

e promovendo a vontade do monarca em afirmar sua posição no poder soberano.

Esta vontade se disseminava, se fazendo presente em todo o Reino

Português e transferindo–se para suas colônias além mar, de forma a uniformizar

as estruturas hierárquicas de jurisdição e alçadas.

“Vivia o direito penal, no além-mar, ao tempo da descoberta do Brasil, a mais cruel das fases de sua história, mui adequadamente denominada de período intimidativo, abrangente da Idade Média e da Renascença, em que a pena não tinha outro fim que não o de fazer sofrer e aterrorizar pelo sofrimento.”6

Através das punições e o controle sobre os súditos e vassalos, seria a

junção de estabelecer uma ordem social, para a afirmação do poder do soberano

e a propagação do poder real dos benefícios para sua prole.

A violência se iniciou no período do descobrimento da nova colônia

portuguesa, assim sendo o território desconhecido de difícil acesso,

proporcionava ao desbravador português novas alianças forçadas.

Nos primeiros momentos da colônia as relações entre explorador e

ameríndio consistiam no escambo e a formação de uma aliança de cooperação

para o desenvolvimento da nova colônia.

Com ô passar do tempo o desbravador intensifica o domínio sob a nova

colônia portuguesa. E não precisando dos préstimos e alianças dos ameríndios,

inicia o processo de dominação, através da força belica e agindo com extrema

violência.

O primeiro grupo social, que foi atingido pela doutrina europeia foi a

população indígena, através da religião e costumes sociais europeizados com a

intensão de desconstruir a cultura e religiosidade ameríndia.

Através das ações portuguesas, os ameríndios ameaçados, iniciariam a

reação através de fugas em direção ao interior do território brasileiro, com o

6 TINÔCO, Antonio Luiz, Código Criminal do Império do Brazil, anotado, Ed. fac-sim.-Brasília: Senado

Federal, Conselho Editorial, 2003, (Coleção história do direito brasileiro. Direito Penal). p. 13.

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intuito de conservar sua cultura, liberdade e o prolongamento de sua prole, e

mante - los livres da escravidão proposta pelo desbravador português.

O ato amerindio tinha em vista o fortalecimento do indivíduo natural, ou

seja, o indivíduo acostumado a ser livre e valorar o seu habitat nativo.

Para combater a fuga indígena e priorizar a exploração do pau-brasil e

minério, o Rei de Portugal, juntamente com a iniciativa privada, oficializam a

organização de grupos de milicianos procedentes da própria colônia, para coibir

a evasão indígena.

Denominados de Entradas e oficializado por sua Majestade lusitana,

iniciam a captura dos indígena pelo sertão brasileiro, no qual o apoio se

intensificou através do arrematante português, que através das Bandeiras,

consolidou a participação dos ideário comerciais e econômicos portugueses.

O arrematante português e com o apoio da sociedade livre que tinham o

mesmo intuito de aprisionamento dos ameríndios, e denominaram os milicianos

de bandeirantes paulistas.

Organizado e documentado pela Câmara Municipal, constituindo os

participantes homens livres e preparados para serem soldados ou quotistas, e

também índios tupis e negros escravos para o angariamento dos fugitivos e

extração das riquezas naturais.

Esta ação lusitana foi para promover os costumes portugueses e da

Igreja Católica, por conseguinte se transformaria no extermínio de algumas tribos

indígenas e se transformando em vítimas do Estado Português e prolongando

se por toda história do Brasil.

Através de suas normativas que seriam introduzidas mais tarde para a

organização da nova colônia portuguesa.

A grande lavoura Colonial é escravocrata. O problema da mão-de-obra foi resolvido, de início, com a escravidão do índio. Já o corte do pau-brasil se organizara a base do aproveitamento da mão de obra indígena livre; esta retirava da floresta e transportava os troncos de madeira preciosa em troca de machados e quinquilharias europeias. Contudo somente o escravo podia garantir os trabalhos de exploração regular, metódica e contínua da grande lavoura. Desde os fins do século XVI começou a se organizar no sul da colônia, na Capitania de S. Vicente, um gênero de vida à base da captura e escravização do índio que era vendido para ser utilizado como força de trabalho na grande lavoura. Na primeira metade do século XVII, justamente quando a lavoura canavieira adquiriu sua maior importância, as densas reservas de mão-de-obra indígena que os jesuítas haviam organizado em suas reduções, na bacia do Rio Paraná, foram desmanteladas por sucessivas pilhagens levadas a efeito pelos bandeirantes paulistas. A

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mercadoria humana se encaminhava para os engenhos do Rio de Janeiro, da Bahia, de Pernambuco, permitindo ao paulista obter os produtos manufaturados que estes importavam de Portugal.7

1. 3 ESTADO VIOLENTO NO BRASIL CONTRA O ESCRAVO.

Com a consolidação do Estado Português, na nova colônia, inicia o

sequestro e transporte dos africanos livres em direção ao Brasil. No primeiro

momento em que desembarcam na colônia, o seu patrimônio mais valioso, o

livre-arbítrio, cultura e religião, que usufruíram durante sua vida, será

descontruído com a ação violenta do vendedor de escravos e o escravocrata.

Por consequência o direito natural a liberdade, e, estar no seio do seus

pares, se extinguirá no horizonte juntamente com o navio negreiro, que se

distancia do litoral e foge das vistas em alto mar, com o propósito de retornar em

direção ao continente africano para angariar mais homens livres para o modo de

produção escravista.

Em terra firme, o sentimento de liberdade, vai se esvaindo pelos pulsos

e pescoço, através dos grilhões que o seu dono impõem, para domina-lo, assim

inicia, a sua vida de cativo na sociedade.

A consequência dos fatos iria direcionar o cativo a submissão e, a

condição de propriedade, coisa e bem objetivo e assim prolongando para suas

gerações os trabalhos forçados impostos pelo sistema escravista.

Portanto consolidando as relações sociais de compra e venda ou

alienação para o senhor da casa grande com o intuito de fortalecer a labuta para

o plantio e extração de cana-de-açúcar, para os engenhos e também extração

de pau-brasil e minério.

Mercadoria ao mesmo título que as demais mercadorias, sujeito a idênticas relações de compra e venda, o escravo era livremente alienável. O escravo não constitui em bem pessoal vinculado, mas alienável ao arbítrio do proprietário. Em consequência, a família escrava não recebia reconhecimento civil e, mesmo como casamento sacramentado pela Igreja, como se dava no Brasil, marido e mulher, pais e filhos podiam ser legalmente separados e vendidos a senhores diferentes. Já na fase de decadência do Império Romano é que a lei veio a proibir a separação dos membros da família escrava.8

7 CANABRAVA, Alice, In: História Geral da Civilização Brasileira (Cap. 09. A grande propriedade

rural), dir. de Sergio Buarque de Holanda, Difusão Européia do Livro, São Paulo, 1963, tomo I, vol. 2, p.

198 – 206. 8 GORENDER, Jacob, “O Escravismo Colonial, 4ª edição revista e ampliada, Editora Ática, São Paulo,

1985, p. 67.

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18

O sistema político-econômico colonial iria impor ao escravo a posição

social de consolidação para movimentar a economia de importação e exportação

na colônia e será a ferramenta fundamental para o angariamento das riquezas

naturais para a exportação em direção a Portugal e outras localidades na

Europa.

Na labuta diária, o escravo indígena e o africano cativo, seriam tratados

como objeto, sendo comparado com a lavoura, animais e a terra cultivada, ou

seja, domínio total do escravista sobre o escravo na colônia.

E portanto efetivando o ideário de não haver qualquer hipótese de

cidadania ou nacionalidade, perante a sociedade escravocrata na colônia e não

tendo o benefício do código civil ou penal da ordenações Manuelinas e Filipinas,

através de suas ordenações no “O Quarto Livro das Ordem, Título XVI”,

uniformizaram os conceitos sobre o escravo em um único título.

Ou seja, o direito enjeitar os escravos, bestas por doenças ou

manqueiras pelo motivo de ser ou adquirir uma anomalias físicas que para o

escravista seria um defeito de produção, que acarretaria prejuízo no trabalho e

produção escravista.

E poderia motivar ao comprador o ingresso de uma ação de danos, troca

do produto ou indenização, derivado da deficiência do objeto.

Mas no momento em que praticava um crime contra seu dono ou alguém

da sociedade livre é penalizado a duras penas.

Os crimes praticados por escravos era julgado por um tribunal, e

sentenciado a castigos físicos e morais ou a morte. Muitas vezes sem chances

de adquirir um defensor ou formalizar sua própria defesa.

A consolidação do ideário de exploração agrária e mineral teve como

peça fundamental para o desenvolvimento econômico da colônia portuguesa, a

formação da mão-de-obra escrava em benefício do colonizador e para o êxito

mercantil da colônia portuguesa.

Com o poder absoluto sobre a terra e a legião de escravos o colonizador

escravista investe tempo e dinheiro para usufruir as riquezas naturais, e através

do trabalho do cativo adestrado, produz o seu sustento e também desenvolve a

econômico.

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19

Com o processo de transformações sociais, anos mais tarde a colônia

de Portugal, se tornará o Império do Brasil e consequentemente será

contemplada como nação independente.

2 ORDENAÇÕES PORTUGUESAS

2. 1 INICIO DAS ORDENAÇÕES PORTUGUESAS

Na Idade Média, o feudalismo era um sistema econômico, político e

social que estabelecia a estrutura para o direito de propriedade sobre a terra.

A formação dos feudos, tem como personagens sociais o rei, o senhor

feudal, suserano, vassalagem, cavalaria e o camponês.

Estes grupos sociais, seriam a base para o processo de transformações

sociais para estabelecer as relações entre si na Europa.

De modo a constituir novos ideários para o desenvolvimento do direito

de propriedade e o sistema jurídico medieval.

Com a formação de novas alianças e tratados entre famílias feudais,

para a consolidação da prole e domínio e manutenção das terras de modo a

fortalecer os grupos sociais dominantes e impor jurisdição para a administração

dos feudos.

No início do século XI, com as transformações sociais e o

desenvolvimento da percepção intelectual dos grupos sociais, inaugurava um

novo contesto da percepção intelectual através do indivíduo privado e coletivo.

Com a união matrimonial com o nobre francês Conde D. Henrique de

Borgonha com a D. Tereza, princesa de Leão, filha de Afonso VI de Leão e

Castela, formalizou a união como recompensa pelo auxilio a conquista do reino

de Galícia, e também uma forma de fortalecer e expandir os laços das famílias

nobres e conquistas territoriais e propagação do poder para sua prole.

A consequência dos fatos ira fundar um novo contesto jurídico que

iniciaria, no ano de 1097, para a sociedade que estava em processo de

desenvolvimento tanto social como político.

A consolidação da dinastia em terras portucalenses, iria fomentar os

ideários para o início do direito português.

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20

O direito português na antiguidade era influenciados pelas leis dos

Códigos Visigótico, o Fuero Real, e a Ley del Estilo e o Fuero de León, mas com

o passar do tempo o código oficial lusitano seria o Código das Sete Partidas, que

foi estabelecido pelo EL REY Afonso X, e introduzindo no sistema jurídico

português, o Corpus Juris Civili, que será a origem da consonância das leis

lusitanas que tinham como base os normativas aplicadas pelo Imperador

Justiniano (483 – 565), que foram adaptados ao idioma de Castela.

“Dali por diante, a cultura jurídica tomava encorpadura, sendo seus famosos representantes o Doutor João Afonso de Aregras, mais conhecido por Mestre João das Regras, e o Doutor João Mendes, Corregedor da Corte”.9

No ano de 1446, na regência do infante D. Pedro, é formalizada à

publicação do Código Afonsino, conhecida como as “Ordenações Afonsinas”,

originárias de D. Afonso V, o décimo segundo Rei de Portugal.

O Código Afonsino, para o período tinha o cunho visionário, de forma a

labutar sobre quase todos as matérias do direito econômico e administrativo do

Estado, e sendo valorado por ser a primeira obra publicada neste assunto na

Europa, para o referido tema no período português.

2.2 Ordenações Manuelinas.

O Código Afonsino, por vários anos foi a base do direito português,

portanto a regular as relações jurídicas lusitanas. Mas a temporalidade e as

questões sociais exigem mutações político-sociais, que através dos fatos

ocorridos como doença ou morte do rei, proporcionavam as transferências de

poderes, no qual as mudanças seriam liquidas e certas para o novo rei.

Com a ascensão de D. Manuel I, o Rei Venturoso, e através dos seus

valiosos feitos para Portugal, se intensifica o desenvolvimento ultramarino e do

comércio com o oriente e as descobertas das novas colônias, além mar.

As ações portuguesas iriam resultar no descobrimento do Brasil, e

também a consolidação do Estado lusitano como potência ultramarina e

originando o desenvolvimento de um novo pensamento jurídico, de forma a fazer

uma releitura dos procedimentos de Estado e jurisdição.

9 ALTAVILA, Jayme de, Origem dos Direitos dos Povos, 10ª ed., São Paulo: Íncone, 2004, p. 226.

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21

No ano de 1505, reúne intelectuais do Direito Português, para organizar

e executar a revisão do código manuelino em pauta. Para o analisar em todos

os seus aspectos jurídicos foram chamados o Chanceler – Mor Doutor Ruy Botto,

o Licenciado Ruy da Grãa e o Bacharel e Corregedor dos feitos cíveis da Corte

João Contrim.

As ações do novo Rei de Portugal, iriam propor a releitura, ou seja, a

reforma das ordenações antecessoras ao seu governo.

“Ao monarca “Venturoso”, que em seu tempo assistiu a pontos altos da gesta dos descobrimentos, não seia indiferente ligar o nome a uma codificação de vulto. Trata-se de conjectura alicerçada em vários testemunhos, inclusive numa confessada importância atribuída pelo rei ao direito e à realização da justiça. As preocupações legislativas de D. Manuel I for patentes, traduzindo-se também na importante reforma dos forais, que se concretizou em 1520, após tentativas frustradas dos seus antecessores”.10

Em 1521, seria o ano do falecimento do Rei Manuel I, e ao mesmo tempo

a finalização e edição definitiva das Ordenações. O texto reelaborado, e com

credibilidade pela classe jurídica lusitana, é publicado como lei geral do País.

Com o intuito de evitar confusões e efetivar a aplicação das ordenações

manuelinas, inicia o processo de expansão e conhecimento da obra, e impõem

determinação por “Carta Régia de 15 de Março de 1521, que, dentro de três

meses, se destruíssem os exemplares de anterior impressão, sob pena de multa

e degredo”.11

As Ordenações Manuelinas, tem o intuito de promover conforme regra

estabelecida uma nova contextualização jurídica para a sociedade portuguesa.

“Do ponto de vista formal, mantém-se a divisão em cinco livros, repartidos em títulos e parágrafos. Conserva-se basicamente a distribuição das matérias. Todavia, marca a obra um assinalável progresso de técnica legislativa, sobretudo traduzido no facto de os preceitos se apresentarem sistematicamente redigidos em estilo decretório, ou seja, como se de novas normas sempre se tratasse. A esta vantagem corresponde a contrapartida de um menor interesse para a reconstituição do direito anterior”. 12

10 ORDENAÇÕES MANUELINAS, Livro I, Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. 1984.

p.06. 11ORDENAÇÕES MANUELINAS, Livro I, Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. 1984.

p.06.

12 ORDENAÇÕES MANUELINAS, Livro I, Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. 1984.

p.07.

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22

Com todos os debates e formalidades jurídicas, as Ordenações

Manuelinas, explanam pontos jurídicos que não conjugam com as formalidades

expostas pelos conceitos das Ordenações Afonsinas, como exemplo; a

supressão dos princípios aplicados ao povo Judeu, fato este que resultou em

sua expulsão do território lusitana e também nas regras independentes

estabelecidas nas Ordenações da Fazenda.

“A Legislação respectiva à tolerância dos Judeos do Liv. II, do mencionado Código do Senhor D. Afonso V. falta em ambos os do Senhor Rei D.Manoel, e comesfeito em nenhum deles podia ter lugar a dita Legislação, porque é bem sabido, que depois de ouvidos diversos pareceres prevalecera em seu Conselho o de fazer expulsar destes Reinos e Senhorios todos os Judeos, e Mouros forros, que não quisessem converter – se à fé Cristã, e que nesta conformidade no mês de Dezembro de 1496, estando EL REI em Muja, se lhes ordenara que ou saíssem do Reino, ou recebessem a agoa do Baptismo até o fim de Outubro do ano seguinte de 1497.13

No entanto as universidades de Lisboa e Coimbra, incorporaram os

estudos jurídicos que formalizariam as traduções originais das leis Manuelinas,

para todo o território lusitano e suas colônias.

Através das novas leis, se consolida o ato de promulgação pelo rei de

Portugal, de forma a concretizar as execuções das penas de degredo

incorporadas pelas colônias de Ceuta, São Tomé e outras na África.

Em uma análise geral, o direito romano continuava a sobrepor–se ao

direito canônico, com limitações no tema espiritual, no qual a igreja tinha pleno

conhecimento e administrava as almas.

No primeiro momento para o entendimento do cidadão leigo as novas

leis, colocavam em dúvidas à interpretação das leis portuguesas.

Através da consulta ao regedor, poderiam sanar suas dúvidas, no qual

era o cargo mais alto no poder judiciário, e aos desembargadores da Casa da

Suplicação (livro V, título LVIII), que no período era a última estância da Corte,

ou seja, o Superior Tribunal do Reino de Portugal, sendo presididas as

audiências pelo Rei de Portugal.

Os assentos da Casa da Suplicação passariam a serem utilizados como

base para o início de uma padronização judicial em Portugal.

13 ORDENAÇÕES MANUELINAS, Livro I, Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. 1984. p.

XXI.

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23

As Ordenações Manuelinas, não tiveram o intuito de mudanças radicais

no Direito Português, mas a continuidade dos conceitos e adequação aos

desejos da sociedade.

2.3 Ordenações Filipinas.

Ao prefaciar as Ordenações Filipinas, iniciaremos através do reinado de

D. Sebastião e conjugado com o jurisconsulto Duarte Nunes de Leão, que

formalizou a obra que originária os textos das leis extravagantes, que seriam leis

anteriores às Ordenações e também as dos assentos da Casa da Suplicação,

aprovada em 1569. Por consequência essa obra ficou conhecida como Código

Sebastiânico.

No início do reinado de Filipe I, no qual os anos eram 1583 e 1585, com

o desenvolvimento jurídico e comercial além mar, inicia os preparativos para o

novo ideário legislativo, que iriam vigorar uma década mais tarde no reinado do

Rei Filipe II. “Toda a legislação não incluída na nova compilação foi revogada,

com exceção das transcritas em um livro guardado pela Casa da Suplicação,

das Ordenações da Fazenda e dos Artigos das sisas”.14

No momento que as Ordenações anteriores são atualizadas a partir das

leis extravagantes, que se encontravam dispersas.

O jurisconsulto Duarte Nunes de Leão, reúne os escritos que iriam

ilustrar as inovações jurídicas e administrativas do reinado de Filipe II, de forma

consolidar a criação da Relação do Porto, Casa da Suplicação, da Chancelaria,

do Desembargo do Paço, além da importante Lei da Reformação da Justiça, de

1582, deste modo formalizando os regimentos vigentes.

“Publicada como pomposo título de Ordenações e leis do reino de Portugal, recopiladas por mandado do muito alto, católico e poderoso rei dom Filipe, o primeiro, a compilação constituiu o mais bem – feito e duradouro código legal português. Apesar de promulgado sob a égide do domínio de Castela, o texto das Ordenações filipinas segue a tradição legal portuguesa, tanto do ponto de vista formal como do normativo, com raras influências castelhanas. Conserva, assim, a mesma divisão em cinco livros das Ordenações anteriores, igualmente subdivididos em títulos e parágrafos.”15

14 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, Companhia das Letras, São Paulo, 1999, p. 33. 15 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, Companhia das Letras, São Paulo, 1999, p. 34.

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Com as transformações no meio jurídico português, à ação de regressar

ao fato jurídico do antigo regime que teve uma grande importância para a

monarquia lusitana.

Assimilados fragmentos dos textos das ordenações anteriores, o direito

canônico seria adaptado para o sistema jurídico do período, sendo sua base

religiosa. Na história das monarquias o direito canônico, fazia parte do contexto

político, social e jurídico e também efetivado pelo poder do Rei, e influenciando

nas questões sociais portuguesas.

Em relação ao novo contexto jurídico lusitano, que estaria em processo

de adaptação para os ideários das Ordenações Filipinas em relação ao direito

canônico, que tinha grande prestigio durante o reinado de D. Sebastião, que

influenciado pelo concílio de Trento (reunião do alto clero para a manutenção

dos dogmas religiosos), favoreceu um grupo social e prejudicou outro, de forma

a se basear no direito romano e tendo apoio de seus pares.

“O livro I delineia as atribuições, direitos e deveres dos magistrados e oficiais da Justiça, com exceção dos ligados ao Desembargo do Paço, cujo regimento, embora datado de 27 de julho de 1582, não foi incorporado às Ordenações. No segundo livro estão definidas as relações entre o Estado a Igreja, os privilégios desta última e os da nobreza, bem como os direitos fiscais de ambas. O terceiro trata das ações cíveis e criminais, isto é, do processo civil e do criminal, regulando o direito subsidiário. O livro IV determina o direito das coisas e pessoas, estabelecendo as regras para contratos, testamentos, tutelas, formas de distribuição e aforamento de terras etc. O último é dedicado ao direito penal, estipulado – se os crimes e suas respectivas penas.”16

Com o emprego das Ordenações Filipinas pelo monarca, se formaliza o

respeito pela antiga legislação manuelinos, desta forma se cristaliza a

demonstração de respeito e mantendo alguns preceitos que estavam revogados

ou em desuso e assim havendo a conjugação do novo com o velho.

A conjugação do novo com velho regime jurídico lusitano, em fins do

século XVIII, acarretou a ausência de originalidade e falta de clareza, para o

manuseio das labutas jurídicas frente a sociedade.

Mas as modificações mais expressivas no novo código, foi o critério de

preenchimento da lacunas da lei no âmbito das relações entre a Igreja e o Estado

para a alçada do direito processual.

16 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, Companhia das Letras, São Paulo, 1999, p. 34.

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As Ordenações Filipinas, ao passar dos tempos vai sobrevivendo as

transformações sociais e reformas políticas, a ponto de ser usado para

determinado proposito em determinação de D. João IV, que sancionou

genericamente toda a legislação promulgada sob domínio castelhano.

E para afirmação das leis, D. João IV, à revalida sem deixar dúvidas de

forma a reunir metodicamente escritos jurídicos colocados em vigor quarenta

anos antes, de forma as Ordenações Filipinas não sofrerem alterações

substancias.

O direito português, baseado no direito romano, que naquele momento

tinha a superioridade de influência nos ideários jurídicos, formalizou uma lei que

determinava que o direito consuetudinário local, desde que não fosse conflitante

com as tradições e leis lusitanas, poderia ser aplicado.

Portanto respeitando conforme a boa razão, conceito jurídico lusitano e

tendo o seu tempo de uso mais de cem anos, deveria ser privilegiado como

direito subsidiário.

Nos reinados de D. João IV e D. João V, à iniciativa de algumas

manifestações frustradas de organizar uma nova compilação legal para Portugal,

desencadeou novas ideias de mudança sob a Justiça.

Mas foi no início do reinado de Maria I, que o ideário de mudanças

começou a fomentar a respeito do tema direito.

Deste modo iniciando a reunião dos membros da magistratura

portuguesa, para fundamentar este conceitos jurídicos para futuras mudanças.

Com o intuito de promulgar decretos que teriam importância para a

monarquia e suspendendo a execução de algumas leis do período pombalino,

são neutralizados por vários acontecimentos como a doença da rainha, os

desdobramentos dos grandes eventos europeus e também os debates de teor

político e jurídico que influenciavam a Justiça, interferindo nos trabalhos e na

efetivação dos projetos que marcaram o direito no final das décadas de 80 e 90

do século XVIII em Portugal.

Neste período Pascoal José de Melo Freire dos Reis (1738 – 1798),

Desembargador de Agravo da Casa de Suplicação, um dos mais altos cargos da

magistratura portuguesa.

Pelo reconhecimento dos serviços prestados a monarquia, e com vasto

conhecimento jurídico, lhe fora encomendado pela rainha Maria I, o projeto do

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Código Penal e destacando a obra de título de “Ensaio do Código Criminal”,

sendo publicado postumamente por Miguel Setar em Lisboa, na Tipografia

Macrense, em 1823.

“As modificações normativas e institucionais introduzidas no período pombalino não chegam a alterar o arcabouço jurídico mais geral expresso pelas Ordenações filipinas. Do mesmo modo, e apesar de suas críticas ao livro V das Ordenações, as modificações apontadas pelos projetos de Pascoal José de Melo Freire dos Reis não chegaram a entrar em vigor”.17

Com a intensificação das navegações além mar, rumo ao desconhecido,

com o intuito as descobertas para a formação de novas colônias em nome do

Rei e o fortalecimento através do angariamento de riquezas para Portugal.

No momento que Portugal, desembarca na nova colônia, tem como

material obrigatório para ter como base jurídica e justificar a fundação do marco

histórico em nome do Rei, as Ordenações português, que iriam consolidar o

Império lusitano, e fortalecer as instituições jurídicas do Estado, como os

assentos da Casa de Suplicação e de outros tribunais superiores.

Com os reclamos do povo da colônia, contra a dominação portuguesa,

é declarada a Independência do Brasil, de modo a formalizar a reunião de

pessoas que representam as classe sociais brasileiras, no anseio de

modificações jurídicas, no qual as transformações iniciaram na Assembleia

Constituinte brasileira, que em debates acirrados resolveriam que as

ordenações, leis, regimentos, alvarás, decretos e outras ordens promulgadas

pelos reis de Portugal até 25 de abril de 1821 continuariam a vigorar no novo

Império.

Este fato, por força das manifestações tinha o intuito de mudanças nas

leis pelos legisladores que afirmavam que seriam medidas provisórias, até a

formação de um novo código para a nova nação que estava se constituindo.

Para iniciar as mudanças da lei, se iniciou pelo livro V das Ordenações

Filipinas, portanto sendo o primeiro a ser substituído, em 16 de dezembro de

1830, e se estendendo para os anos seguintes e vindo a consolidar o Código do

Processo Criminal.

17 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, Companhia das Letras, São Paulo, 1999, p. 38.

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Com a abertura dos portos às nações amigas e a transações de

importação e exportação, a nova nação denominada Brasil precisava de leis

efetivas para o livre comercio.

O Império colaborando com o comercio internacional, e firmando

contratos com diversos países, principalmente a Inglaterra, estes fatos seriam

motivos para longas discussões a respeito de regulamentos, leis para organizar

o comercio no Império, pelo Parlamento e idealizando o processo comercial.

Neste momento as Ordenações Filipinas, na matéria de direito civil, era

soberana e se adaptava aos anseio da sociedade, no qual a Monarquia nunca

conseguiu produzir um Código Civil que estive a altura das Ordenações.

“A Consolidação das leis civis, concluída em 1857 pelo jurista Auguto

Teixeira de Freitas, constiutiu apenas um ponto de partida para um caminho cheio de obstáculos, tensões e disputas.”. 18

Os debates e tentativas foram muitos, para modificação do Código

Penal, que no período da monarquia não teve sucesso, porém as medidas mais

efetivas foram tomadas no momento que o regime Republicano assume o poder.

Como comparação da solidez entre os Códigos Civil e Penal, tem como

clareza este parágrafo;

“Na primeira década da República um decreto estabeleceu que o regulamento monárquico sobre o processo comercial seria observado também no processo das causas civis em geral. O Código Civil, no entanto, foi sancionado apenas em 1916, para vigorar a partir de 1º de janeiro de 1917. Foi somente nessa data que as últimas determinações das Ordenações filipinas deixaram finalmente de vigorar.”19

As Ordenações Filipinas, com o seu conteúdo jurídico, bem

fundamentado e coeso, de modo a sobreviver ao regime monárquico, no qual

administrou a maior parte da vida colonial, e sua vigência prolongou – se para

além da Independência e República do Brasil.

3. PUNIBILIDADES DAS ORDENAÇÕES FILIPINAS

As Ordenações Filipinas, para a sua época foi um marco jurídico, mas

sendo de menor duração em vista das outras matérias do direito. A elaboração

dos seus conceitos jurídicos, adaptado a cada ciclo do direito português os livros

18 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, Companhia das Letras, São Paulo, 1999, p. 39. 19 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, Companhia das Letras, São Paulo, 1999, p. 39.

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jurídicos acompanha a organização dos grupos sociais e as relações de poder

sob os súditos.

As Ordenações, chamados por muitos de “monstruoso” ou “bárbaro”, de

forma a expor nos mínimos detalhes a conjugação entre a lei, poder régio e

submissão do povo, tanto livre como escravo.

O Rei representante de Deus na terra e coroado por seus pares,

determinava através da justiça dos homens, o desenvolvimento de mecanismos

para a efetivação da justiça, e de costume do Rei, sendo a última palavra,

sempre do monarca. Mas com conveniência de não causar atritos com seus

súditos, seriam respeitadas as hierarquias sociais.

Para a aplicação de sanções e execuções das penas com requintes de

violência excessiva e expor o seu arsenal punitivo, de modo a resgatar os

padrões do Antigo Regime.

“Melhor caracterização não se ofereceu do direito penal das Ordenações Filipinas do que a levada a cabo pelo Conselheiro Batista Pereira, que as definiu como “espelho, onde se refletia, com inteira fidelidade, a dureza da codificações contemporâneas, era um misto de despotismo e de beatice, uma legislação híbrida e feroz, inspirada em falsas idéias religiosas e políticas, que, invadindo as fronteiras da jurisdição divina, confundia o crime com o pecado, e absorvia o indivíduo no Estado fazendo dele um instrumento. Na previsão de conter os maus pelo terror, a lei não media a pena pela gravidade da culpa; na graduação do castigo obedecia, só, ao critério da utilidade. Assim, a pena capital era aplicada com mão larga; abundavam as penas infamantes, como o açoite, a marca de fogo, as galés, e com a mesma severidade com que se punia a heresia, a blasfêmia, a apostaria e a feitiçaria, eram castigos os que, sem licença de EL-Rei e dos Prelados, benziam cães e bichos, e os que penetravam no mosteiros para tirar freiras e pernoitar com elas.”20

Baseado na hierarquia social, ou seja, o rei no ápice da pirâmide e

sequencialmente as classes subalternas, as penas eram distribuídas

desigualmente, conforme a gravidade do crime e sobretudo, os privilégios sociais

do réu ou da vítima, de forma ao degredo, açoites e outras marcas corporais,

penas pecuniárias ou qualquer das “mil mortes”, serem aplicadas com cuidado

devido ao grau de hierarquia do indivíduo que seria punido pelo Estado.

Com a nova monarquia em formação em terras brasileiras, estabelecer

novos conceitos de pena para o réu, mas não para o escravo de modo as

20 TINÔCO, Antonio Luiz, Código Criminal do Império do Brazil, anotado, Ed. fac-sim.-Brasília: Senado

Federal, Conselho Editorial, 2003, (Coleção história do direito brasileiro. Direito Penal). p. 15.

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Ordenações Filipinas, sofrerem pontuais substituições nos seus textos, mas sua

essência ainda continuava a vigorar para as penas.

Através dos acontecimentos, a monarquia inicia o processo de

elaboração do primeiro Código Penal.

Em 1830, de forma a revogar parte das práticas dos procedimentos da

ação e conservando as penas mais brutais para dominação pedagógica para

submissão como a pena de morte para cabeças de insurreições escravas e seus

simpatizantes, homicídios, roubos com agravantes e as galés perpétuas ou

temporárias.

Para os homens livres a monarquia constitucional, optou pela pena mais

branda e propondo aos apenados, penas em multas pecuniárias e prisão.

“Outros tempos, outras maneiras de punir. Mas não para todos: o açoite, pena aviltante, foi mantido para os escravos. Já em 1756 um alvará que determinava o castigo para os escravos que trouxessem facas excluiu os negros e mulatos livres da pena de cem açoites dados no pelourinho durante dez dias alternados. Em 1775 outro alvará deixou claro que o açoite, por ser odioso, aviltante e infamante, não podia ser aplicado aos libertos mas somente aos escravos.”21

As penalidades normatizadas pelo livro V das Ordenações Filipinas,

continuou até à data de 15 de outubro de 1886, quando foi revogado à matéria

da legislação penal.

Para os cativos africanos angariados e enviados em direção ao Império

do Brasil e seus descendentes nascidos e instalados nas fazendas de café, para

o plantio e extração de minério, tinha a proposta de escravizar e prolongar a

legislação que estava em vigor no sistema de leis do livro V, das Ordenações

Filipinas.

No Império, com a monarquia constitucional em desenvolvimento político

e social, as leis regias eram impostas para a sociedade, e ainda persistindo a

aplicação dos castigos físicos com o intuito pedagógico de exemplo e disciplina

a serem seguidos.

Estes acontecimentos foram determinante para os senhores

escravocratas, que através das leis efetivavam as execuções das penas, com

extrema violência.

21LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, Companhia das Letras, São Paulo, 1999, p. 41.

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Com o aval e sancionados, pelo Estado absolutista que através da

escravidão manifestavam a opinião de que a economia do Império desenvolveria

e seria fortalecida, pelo escravo. Incentivava o escravista a fazer uso dos cativos

e concretizando através da força e violência o domínio de seus escravos.

“No interior das fazendas, imperava ainda a máxima de Jorge Benci, de 1705: “Haja açoites, haja correntes e grilhões, tudo a seu tempo e com regra e moderação devida, e vereis como em breve tempo fica domada a rebeldia dos servos; porque as prisões e açoites, mais que qualquer outro gênero de castigos, lhes abatem o orgulho e quebram os brios”.22

Um livro que explana os dias de cativeiro vivenciado pelo escravo é a

obra do republicano e socialista Vicente de Souza, “O Império e a escravidão; o

Parlamento e a pena de morte”, este livro prefacia a violência da escravidão e a

monarquia de modo a serem equiparadas como regimes de máxima opressão.

A relação entre o escravo e a pena capital, derivado do crime de

homicídio, sendo as vítimas seu senhores tinha a conotação de repudio com

veemência pela sociedade escravista e pelo judiciário, no qual a punição era a

pena de morte.

O Novo Regime, faz uso das penas físicas e prolonga a pena de morte

para seus cativos. Esta prática iria no futuro fomentar manifestações e

movimentos abolicionistas para o fim dos castigos e penas de morte.

3. 1. DEGREDADOS

Durante os séculos XVI e XVII, a legislação portuguesa previa em suas

Ordenações Portuguesas, o crime de degredo que tinha como pena a expulsão

de criminosos, chamados de malfeitores. O cidadão que pratica-se determinado

crime e sentenciado ao degredo, se tornaria uma pessoa indesejada e afastada

do seu meio social.

A pena era consolidada no momento que o apenado era enviado as

longínquas possessões no além mar e forçado a trabalhar nas temíveis galés.

O Brasil foi uma das possessões utilizadas para o execução das penas,

que tinha uma prática pedagógica de submissão para o homem livre e também

22 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, Companhia das Letras, São Paulo, 1999, p. 42.

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31

para punir os criminosos e heterodoxos que não obedeciam as normas sociais

lusitanas.

No Direito português havia diversos crimes a serem julgados pelos

tribunais civil, penal ou inquisitorial, mas o crime de degredo era definido pela

Justiça, como a saída forçada do local aonde vive e do meio familiar e social,

sendo efetivado pela corte judiciária.

A maioria dos crimes de degredo era baseado nos crimes de lesa

Majestade, furtar uma mão de trigo, cortar arvores de frutos, prostituição,

adultério, bigamia e homicídio.

Para a sociedade lusitana, as práticas criminosas eram vistas como

ofensas as normas sociais de modo a influenciar o entendimento do judiciário a

respeito da qualificação das penas, sendo o único remédio jurídico para

determinados crimes o degredo, no qual o interesse de acompanhar era todos e

informados em praça pública e feita a leitura dos procedimentos aplicados e

sentenciados pelo Tribunal.

Os atos praticados pelos acusados, eram taxados como ações violentas,

que agrediam os ideários de sociedade costumes morais e religiosos.

O conceito jurídico português, tinha como base a filosofia Grega, que

impunha aos seus cidadãos que não respeitavam as normas sociais, e portanto

sendo identificado como perigo para a sociedade e assim formalizavam o seu

afastamento do seus pares e não se aproximando ou participando de outros

grupos sociais Gregos.

Na Grécia antiga, o código draconiano previa dois tipos de expatriação: o ostracismo e o exilio. O primeiro restringia-se a cidadãos que, por alguma razão, ofereciam perigo político. Só indivíduos que se destacavam politicamente, a ponto de chamar para si a atenção dos poderes, é que poderiam ser penalizados com o ostracismo. Pode-se dizer que se tratava de uma pena elitista, dada as características da democracia grega, e porque o ostracismo não se revestia de caráter infamante. O afastamento tinha duração prevista na lei por um período de 10 anos e era decidido fora das instâncias do poder judicial, na Assembleia do Povo. Em face dessas peculiaridades, a literatura jurídica entende o ostracismo como um meio termo entre punição e medida de segurança. Já o exilio propriamente dito, apresentava duas modalidades bem distintas: admitia-se o exilio como pena imposta pela lei; e o exilio como uma concessão amparada legalmente. No primeiro caso, trata-se de uma pena perpétua, aplicada a criminosos comuns e que acarretava infâmia e confisco de bens. Já no segundo caso, trata-se de uma iniciativa que se reserva ao acusado de, antes do julgamento, se auto-exilar. Esse expediente tinha amparo legal desde que o acusado mantivesse a promessa de jamais retornar ao território grego. Os acusados que normalmente recorriam ao auto-exilio costumavam ser os que temiam que pudesse recair sobre si a pena

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capital e encontravam, desse modo, um meio de salvaguardar a vida; por outro lado, a sociedade, com base nesse recurso, podia respirar aliviada, sentindo-se a salvo de sua presença.”23

A previsão do exilio, estava condicionada nas legislações romanas e

gregas, de modo ao acusado ter o direito ou a vontade de recorrer durante o

tramite do processo acusatório.

Paralelo ao crime de exilio, os romanos elaboraram formas de coerção

de expatriação penal, sendo a mais antiga a interdictio aquae et iginis (interdição

de água e de fogo), a pena tinha como base executória a expulsão do acusado

a perda de todos os direitos de cidadão e a humilhação perante seus pares, este

fato o classificaria como morte civil para a justiça e sociedade romana.

Augusto fundador do Império Romano e seu primeiro imperador (27 a.C.

a 14 d.C.), nos seus decretos estabeleceu, o fim da interdição de água e de fogo,

penalidade que era usada na antiguidade romana, e formalizou uma nova

matéria jurídica de expatriação penal.

A nova expatriação chamada de “deportatio” e “relegatio” (deportação e

relegação), era uma forma de punição no período romano e tinha o intuito e

penalizar o cidadão que não obedecia as leis impostas pelo Estado.

A deportação tinha a força de execução perpétua, de modo a consolidar

as mesmas qualidades da antiga interdição de água e de fogo, portanto as suas

penalidades tinham a capacidade de produzir real efeito sob o condenado.

A consequência dos atos seriam o banimento para as ilhas do Mar Egeu,

conforme o grau do crime os condenados eram transferidos para as extensões

do império romano na África e na Ásia.

A relegação tinha como penalidade a execução temporária, no qual a

punição era mais branda de forma as agressões físicas não levarem a

decapitação ou patíbulo, e não provocando a morte civil ou confisco de bens.

Mas o condenado acataria sua pena e se afastaria do seus pares para o

local de sua sentença, e muitas vezes a pena de relegação tinha o ideário político

e eram usadas para a exclusão de opositores do rei e para fins políticos.

23 www.humanas.ufpr.br/A-pena-de-degredo-e-a-construção-do-império-colonial-Maristela-Toma.pdf,

p.438.

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Os estudiosos no Direito como na História, analisam a pena de degredo

a partir das antigas formas de expatriação penal, e conceituam que o degredo

moderno resultou da mutação de uma dessas penas antigas.

As Ordenações Filipinas, com o intuito de adequar as leis portuguesas,

de acordo com os anseios da sociedade e baseado nas antigas legislações

greco-romanas, reformulou a pena de degredo e atualizou para o seu período.

Deste modo consolidou o afastamento dos perturbadores das normas sociais,

previstas em lei sob a jurisdição e uso do Estado.

“O degredo, como bem apontou Coates, inscreve-se dentro de uma política de transplante populacional extremamente dinâmica, que se pautou em um conceito racional de aproveitamento de condenados como mão de obra móvel colocada a serviço do Estado, sob as mais variadas formas. 24

No artigo 126, § 7, do Código Filipino, ao prefaciar em seu conteúdo a

expressão da punição de “banido”, tinha o intuito de alertar o condenado de que

a prática do crime e o fato de estar foragido acarretaria danos a sua liberdade e

ao processo.

A conjugação dos crimes de Banido e Degredo, no contexto de seus

procedimentos eram similares, mas cada termo tinha suas particularidades,

deste modo a fortalecer o entendimento sob cada termo e aplicar a pena

adequada para a sentença e fortalecendo a posição dos juízes lusitanos sob a

execução da pena pelo judiciário.

“BANIDOS”( artigo 126, § 7, Ordenações Filipinas)

“Sendo condenados os ausentes pelos juízes de maior alçada, eles os

pronunciarão por banidos e sendo por tais pronunciados, mandamos a todos os

juízes e Justiças que apelidem sobre eles toda a terra para os prenderem; e

como forem presos, se a condenação for de morte natural, sejam logo

enforcados ou degolados, segundo a sentença for conteúdo.

E se forem condenados em outras menores penas que de morte, assim lhes

sejam logo dadas e em todos as sentenças contra eles executadas, sem mais

apelação nem agravo.

24www.humanas.ufpr.br/A-pena-de-degredo-e-a-construção-do-império-colonial-Maristela-Toma.pdf,

p.439.

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Porém, se depois de condenados, antes que sejam presos, eles por sua livre

vontade dentro de um ano se vierem meter na cadeia e quiserem alegar tal

defesa ou contrariedade que provada relevaria de todo a pena e foram absolutos,

se a princípio se vieram livrar e a alegaram seja-lhes recebida e dilate-se a

execução, até se dar sobre isso sentença final, na qual serão relevados em todo

ou em parte, segundo prova de sua defesa ou contrariedade.

E vindo depois do dito ano, não serão mais ouvidos com defesa alguma.

Porém, se na sentença, além da pena corporal, lhes for dada outra pena de

dinheiro e já for executada em seus bens, posto que venham meter na cadeia

dentro do ano e provem tanto por que sejam absolutos, não desfará a dita

execução que já em sua fazenda for feita, somente serão ouvidos quando à pena

corporal.25

Este artigo fortalece a perseguição aos condenados ao banimento,

através de recompensas estipuladas pelo Estado, que oficializava que qualquer

cidadão poderia matar em nome da Justiça, de modo a não ser acusado ou preso

por homicídio.

Em contra partida, comprovado que o cidadão em sua moradia ou

terras, ocultava da presença da lei o fugitivo, automaticamente já estaria em

crime para a justiça.

Comprovando a presença do fugitivo na residência, e baseado no artigo

104, das Ordenações Filipinas, seria aplicada a pena pecuniária, o degredo para

as colônias e a perda de seus bens.

“Artigo 104, Ordenações Filipinas”

“QUE OS PRELADOS E FIDALGOS NÃO ACOUTEM MALFEITORIES EM SEUS COUTOS, HONRAS, BAIRROS OU CASAS, E DOS DEVEDORES QUE SE ACOLHEM A ELAS”. “Defendendo que nenhum senhor de terras, prelado, fidalgo, nem outra pessoa

de qualquer estado e condição que seja, não faça novamente coutos nem bairros

coutados nem acolha nem coute neles, nem outros antigos e honras, posto que

25 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, Companhia das Letras, São Paulo, 1999, p. 449.

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aprovadas pelos os reis nossos antecessores, nenhuns malfeitores, nem

degredados.

E fazendo os ditos coutos ou amparando neles malfeitores para não serem

presos, perderão a jurisdição, serão degredados dois anos para África, e pagará

cada um duzentos cruzados.

E os alcaides-mores que trouxerem consigo ou acolherem em suas fortalezas ou

casas malfeitores ou degredados serão suspensos das ditas alcaidarias-mores,

rendas e direitos delas até nossa mercê e mais pagarão duzentos cruzados”. 26

Se o foragido se apresentasse à justiça no prazo de 1 ano, a sentença

poderia ser interrompida temporariamente, por se apresentar em tempo hábil

para a formalização de uma nova defesa, e assim retrocedendo os

procedimentos de acusação e solicitando uma nova audiência perante a

autoridade judiciária, com o intuito de apurar os verdadeiros fatos ação imposta

ao sentenciado, de modo a modificar a sentença proferida, tendo como base a

condenação original.

Com o passar dos tempos houve a mutação da linguística, no qual a

linguística jurídica acompanhou estas mudanças e também as relações entre

povos e transformações sociais no decorrer dos períodos, auxiliando a

uniformização da linguística jurídica em alguns países europeus de modo a

serem aplicados em determinados documentos portugueses.

Um dos termos é o “desterro”, termo também utilizado para a aplicação

de penas propunha a saída forçada do acusado de seu habitat, e muitas vezes

confundido com o “degredo” que oficializava a função pedagógica de

punibilidade para o cidadão, de modo ao termo degredo ser tratado como

sinônimos para determinadas situações ou fatos legais.

Para um melhor entendimento dos dois termos em uso pelas

Ordenações portuguesas, portanto adequaram-se a realidade das colônias, de

modo a serem reformadas e aplicadas na legislação do Império do Brasil.

Estas reformas no conteúdo legislativo lusitano, ainda não seriam

consolidadas, portanto as altercações pontuais nas leis vigentes, acarretariam

26 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, artigo 104, Companhia das Letras, São Paulo,

1999, p. 314.

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por muitas vezes a obscuridade legislativa para o entendimento penal e

originando transtornos na aplicação das penas.

No Código Criminal do Império do Brasil de 16 de dezembro de 1830, no

Título II, Das Penas, Capitulo I, menciona as penas para a execução de

condenados, ao degredo, desterro e banidos de modo a uniformizar e adequar

cada termo para sua aplicação punitiva para o cidadão livre, que provocado o

crime teria a consequência dos fatos ocorridos assim sendo teria o prejuízo em

suas funções sociais perante a sociedade e o Estado.

“Art. 52. A pena de desterro, quando outra declaração não houver, obrigará os

réos a sahir dos termos do lugares do delicto, da sua principal residência, e da

principal residência do ofendido, e a não entrar em algum deles, durante o tempo

marcado na sentença”.

“Art. 53. Os condemnados á galés, á prisão com trabalho, ou á prisão simples, a

degredo ou a desterro, ficam privados do exercício dos direitos políticos de

cidadão brasileiro, emquanto durarem os efeitos da condenação.

“Art. 54. Os condemandos á galés, á prisão com trabalho, ou á prisão simples,

que fugirem das prisões; os degradados, que sahirem do lugar do degredo, e os

desterrados que entrarem no lugar, de que tiverem sido desterrados, antes de

satisfeita a pena, serão condemnados na terça parte do tempo da primeira

condenação. 27

Através de estudos para a reforma e separação dos termos legislativos,

o Código de 1852, ratifica o “desterro” como à “obrigação de o condenado sair

dum lugar sendo sua moradia, fazenda ou vila e “degredo” determina o envio do

condenado para terras na administração do Estado, ou seja, colônias além mar

nos domínios da Coroa Portuguesa”.

Analisando os termos, é explícito à diferenciação entre o degredo que

faz o envio do condenado para cumprir a pena em território e tempo

determinados pela justiça, conforme é estudado os termos fica explicito a

distinção entre desterro ou banimento para a legislação vigente.

27http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM-16-12-1830.htm

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Portanto as punições seriam aplicadas para determinadas classes

sociais na pirâmide portuguesa de modo a serem executados em ambos os

sexos, ou seja, em homens e mulheres livres e excluindo os escravos, que eram

tratados de diferentes formas de punições, empregadas nas colônias lusitanas.

Para consolidar a relação de pena para homens e mulheres livres, é

citado o artigo 140, § 8º, das Ordenações Filipinas;

“E os degredados que forem cavaleiros ou escudeiros e a quem nas Relações

se guardarem os privilégios serão levados aos navios quando forem cumprir

seus degredos com cadeia no pé e não com colares ao pescoço, como outros

que não têm a dita qualidade”.28

E segue no mesmo artigo 140, § 2º, das Ordenações Filipinas, a citação;

“2. E na sentenças em que se condenarem algumas pessoas para África, se não

declarará lugar certo mas digam nelas que os condenam para um dos lugares

de África, porque se declarar lugar certo se retarda a levada dos degredados por

falta de embarcação; e o degredo será pelo tempo que parecer ao julgador,

segundo o caso for. E as mulheres não serão condenadas em degredo para

África, por caso algum que seja, mas serão degredadas para outras partes,

conforme as suas culpas e nossas Ordenações”.29

Os degredados eram homens cultos, e poderiam ser aplicados em nome

do rei, para serviços de espionagem, diplomacia e relações de comercio com os

ameríndios, formalizando assim os anseios lusitanos na nova colônia.

Os degredados faziam parte do escalão mais baixo e desprotegido dos

funcionários públicos reais, com a expulsão da Metrópole os condenados

passam a ser enviados a nova colônia que seriam Brasil, África, Castro Marim

28 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, artigo 140, § 8, Companhia das Letras, São

Paulo, 1999, p. 498.

29 LARA, Silvia Hunold, Ordenações Filipinas: Livro V, artigo 140, § 2º, Companhia das Letras, São

Paulo, 1999, p. 496.

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ou para outras parte da Índia que estavam em processo de colonização. Esta

prática lusitana durou por mais de 300 anos, em territórios brasileiro.

O Rei de Portugal, com a experiência em conflitos bélicos, e priorizando

a vida de seus comandados. Determina que suas tropas não entre em choque

com os ameríndios, que aguardam em terra firme, deste modo a indicar os

préstimos dos degredados para os primeiros contatos e desbravamento do

território hostil e desconhecido.

A consolidação dos ideários além mar lusitano, seriam no primeiro

momento em que o descobridor português Pedro Alvares Cabral, no momento

que desembarca no litoral baiano, ou seja, em território da nova colônia, teria o

ato de oficializar o marco inicial para a relação cognitiva entre europeu e

ameríndio.

A primeira ação portuguesa, na nova colônia seria abandonar dois

apenados de nomes Coelho e Dias, para o comprimento da pena de degredo,

de modo a serem os primeiros europeus a terem contato com os ameríndios.

Ao cumprir sua pena na colônia o degredado, era obrigado a prestar

serviços ao Reino de Portugal, portanto eram impostas funções em nome do rei,

nas colônias como a exploração do território, o aprendizado da língua nativa e

costumes do povo ameríndio, tendo como missão.

Na aplicação da pena de degredo, desterro e banimento a intenção é de

envio do condenado para as regiões limítrofes, longínquas ou inóspitas com o

intuito de povoamento e representação em nome do rei para a consolidação das

novas colônias portuguesas, e assim garantido a defesa territorial, de tal maneira

a combater os ameríndios e exércitos inimigos.

Com o intuito de salvaguardar os milicianos, dos primeiros contatos com

os nativos, por não ter conhecimento de seus costumes e culturas, de modo a

indicar o uso do degredado para esta prática populacional.

Devido a sua posição de apenado, portanto não tendo condições de

recusa e analisando uma chance de vida nova em território desconhecido, mas

com o desejo de voltar a ser um cidadão português e voltar a Metrópole, assume

a função de representante de Vossa Majestade.

O degredado ao ter contato com o ameríndio, inicia ciclo de expansão

territorial e angariamento através do conhecimento do território e costumes dos

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nativos. Este contato poderia reverter sua posição para Portugal em terras

estranha, e também o recomeço na nova colônia.

3. 2. CASTIGOS E PENAS

No capítulo anterior o crime de degredo era uma pena e castigo, para os

cidadãos livres portugueses, que eram enviados para as colônias além mar em

domínio lusitano.

A consequência do crime praticado pelo cidadão português, seria a

expulsão do seu habitat, convívio com seu pares e a morte civil. De acordo com

a legislação, o apenado iria cumprir sua pena de degredo em um dos domínios

lusitanos que poderiam ser no Brasil, África ou nas Índias.

O degredado, desembarcando na colônia, traz consigo o conhecimento

adquirido na Metrópole, e consegue adaptar -se as diferenças que a terra lhe

proporciona através do seu aprendizado em Portugal.

Para o africano, que era aliciado na África continental, e transferido para

colônia portuguesa, e portanto era efetivada através do escambo, no qual o

desbravador e comerciante português iniciavam a compra de escravos de guerra

com os reis de tribos africanas vencedoras dos conflitos étnicos.

Os conflitos tinham o intuito de conquistas e domínio de territórios no

continente africano, as tribos derrotadas pagavam o ônus de guerra através da

escravidão ou pena de morte.

A pena de escravidão no continente africano, tinha determinado tempo

para sua execução ou pela eternidade de sua vida, para o determinado fim de

pagamento dos gastos com a manutenção e reconstruções das cidades

destruídas pelos vencidos.

Outro motivo seria a religião, ou seja, a expansão do islamismo pelo

norte e centro da África e o combate pelos cristãos.

No momento, que o africano desembarca na colônia, consolida a origem

de um novo sistema de trabalho para sua vida, o modo de produção escravista.

Efetivada a venda de almas, o escravo trabalharia a duras penas em

favor do escravista e estendendo para o resto de sua vida e descendente a

posição servil que acompanhará por séculos.

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“Reduzido à condição de cousa, sujeito ao poder e domínio ou propriedade de um outro, é havido por morto, privado de todos os direitos, e não tem representação alguma.”30

A insanidade humana do proprietário de negros, impunha diversos atos

de punibilidade e castigo ao cativo, com o intuito de impor o pena pedagógica, o

medo e a obediência.

O domínio pelo terror, tinha um leque de sentimentos incontidos na

aplicação do castigo. O medo de revoltas pela população cativa era um dos

motivos de alerta pelos escravocratas que já haviam recebido relatos de outros

acontecimentos de insurgências escravas em outras localidades ou colônias.

Mas não haveria só as insurgências, no entanto outros motivos

formalizariam a insanidade do escravista sob seu escravo.

As questões trabalhadas como a justiça, homens livres e escravos, a

relação de poder sob o outro, a econômica escravagista, a política de servidão

implantada para beneficiar os dono de escravos e o mais desumana a crueldade

da mulher contra a mulher, por vezes mais satânica que os homens, tinha a

disposição de crueldades extremas a ponto de perder sua humanidade,

sanidade e religiosidade.

Como era comum o escravo “homem”, era tratado como objeto e força

de trabalho, ou seja, ferramenta fundamental de modo de produção, e pouco se

falava da “mulher escrava”, que participava das labutas diárias e recebia as

mesmas condições violentas ou até pior que seu pares sendo muitas vezes mais

efetiva que os homens.

“Enraivecidas com as negras, enciumadas com as mulatas, negras e mulatas de boas coxas, bons dentes, bons peitos, e admirável flexibilidade, escolhidas a dedo para as obrigações de cama; desesperadas por se verem preteridas por aquelas verdadeiras beldades de ébano, ou cor de mel, as sinhás, esbranquiçadas, obesas, de barriga quebrada, dentes podres e peitos flácidos, expandiam seus recalques e suas frustações através de requintadas perversidades de que eram vítimas suas indefesas e, a rigor, inocentes rivais.”31

As sinhazinhas, filhas dos donos de escravos e futuras sinhás, eram

tratadas como rainhas e sua alimentação era para a engorda e deformidade do

seu corpo.

30 CHALHOUB, Sidney, Visões da liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na Corte,

ed. Companhia das Letras, São Paulo, 2011. 31 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 47.

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Portanto a sua alimentação rica em gordura e açúcar, proporcionava

uma criança, adolescente e mulher obesa e com baixo desenvolvimento físico.

Se antes a criança era anêmica, com o passar do tempo se transforma

em uma adolescente balofas matronas, de epiderme macerada e olhar baço e

com distúrbios glandulares com verdadeiros bigodes e indisfarçáveis

cavanhaques.

Os homens fazendo comparações entre as sinhás e as escravas,

escolhiam as cativas para se deitar. O libido acrescentado com as curvas e

flexibilidade corporal eram atrativos para os homens livres.

No qual o senhor e seus filhos poderia usufruir e violentar o corpo da

escrava, usando como objeto sexual e ao mesmo tempo não seriam acusados

de estupro ou outro crime qualquer, pelo motivo de o homem livre ter prioridade

sob seu escravo.

A escrava por trabalhar no pesado, mantinha a forma física que era o

ponto base para uma violência sexual e ao mesmo tempo não tinha culpa de ter

o corpo como atrativo e admirado pelo homem livre.

O regime escravista facilita a violência contra a mulher escrava, e nas

entre linhas aumenta a procura da satisfação do instinto, deste modo também

aumenta a violência das sinhás contra as escravas.

No período oitocentista, vários jornais de época denunciam a violência e

maus tratos contra as mulheres escravas e as denúncias e são intituladas de

mulheres perversas e ocupam o lugar de destaque nas colunas populares dos

jornais das cidades com os seus feitos de extrema violência contra seus cativos:

“E no Mensageiro de 6 de fevereiro de 1857, também catarinense, lê-se notícia

de uma senhora, de nome Leopoldina da Silva, que respondeu a júri por ter

espancado duas escravas suas até matá-las. Como de regra, foi absolvida.” 32

“No jornal “O Popular”, editado em Recife, número de 19 de abril de 1883, lê-se

o seguinte: “Despotismo da Escravidão – Chegou ao nosso conhecimento, por

informação de fonte exata, que em um dos dias passados a promotoria pública

procedeu a corpo de delito em uma vítima da escravidão.” “O nosso informante

32 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 50.

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testemunhou o estado mísero em que se achava uma pobre mulher de nome

Delfina, de propriedade de um tal José Machado de Souza Pimentel, residente

à rua dos Aflitos.” “Inundada de sangue e coberta de feridas pelo rosto, a inditosa

escrava mostrava um aspecto de horrorizar e condoer.” “Deste fato, de hedionda

arbitrariedade, disse a empregada escrava que foi autora a senhora do tal Souza

Pimentel! Horrível!” “Espanta que uma senhora mãe de família, alimente a

perversidade de maltratar uma sua semelhante, talvez criminosa por não lhe

haver preparado alguma papa!” “As autoridades devem exercer a justiça sobre

os verdugos da infeliz Delfina.”33

“Constando ao Dr. 2.º delegado de polícia que em 2 de julho, Gregório Fernandes

Cardoso e sua mulher, Brasilina Augusta Fontoura Cardoso, moradores à rua do

Regente n.º 1, assassinaram em sua própria residência a crioula Margarida,

escrava de Francisco da Silva Cruz Lisboa, por meio de castigos bárbaros,

fazendo-a sepultar no cemitério de S. Francisco Xavier, com o nome de Florindo,

criado livre, e com atestado do Dr. Claudino José Viegas, abriu o respectivo

inquérito; procedendo a tôdas as diligências, inclusive à exumação do cadáver

de Margarida.” Os delinquentes foram presos, em virtude de mandado expedido

pelo Dr. Juiz de Direito do 7.º Distrito criminal, à vista da representação do

mesmo delegado, sendo a prisão do primeiro efetuada em Niterói, em 2 de

setembro, a requisição desta repartição, e a de D. Brasilina em 22 do mesmo

mês, nesta Côrte.” Foram pronunciados; mas, a 21 de dezembro o júri os

absolveu. O médico foi processado pelo crime da falsa atestação, consoante

informa, ainda, o trecho constante do relatório do chefe de polícia da Côrte,

anexado ao ministro da justiça Manoel Duarte de Azevedo, de 1º de maio de

1875.34

Neste período os jornais que denunciam os maus tratos contra os

escravos, seguiam os mesmos métodos dos jornais franceses no período do

antigo regime francês.

Este método de expor as críticas e denunciar os malefícios aplicados no

Brasil, pelos escravistas, já era praticado pelos “subliteratos” na França, antes

33 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 50. 34 Ibi id. 51.

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da Revolução Francesa, no qual criticavam os maus tratos contra o povo francês

e a indignação contra o antigo regime absolutista.

Este movimento literário não tinha o aval do Rei, portanto os subliteratos

não eram financiados pelos cofres do Estado francês. Assim faziam – se ouvir,

através de explanações, com o intuito de criticar e denunciar as ações do Rei da

França.

No Brasil, os jornais que não eram financiados pelo governo faziam

duras críticas contra os maus tratos, enforcamentos e decapitações dos cativos,

praticados por senhores de escravos e tendo aprovação da Justiça.

Como eram altos os índices de mortes de escravos, através do castigos

com um aparato de inúmeras formas de provocar o suplício do mesmo.

Inicia – se a introdução de grupos abolicionista compostos por juristas,

escritores e autoridades do legislativo que seriam a linha de frente para o

combate o fim dos castigos que levariam a morte dos escravos.

A Justiça para impor o poder e o domínio sob a sociedade, tinha como

ferramentas o aparato de castigos físicos, para várias aplicações cruéis com o

propósito de coação tanto do escravo como do cidadão livre.

Estes castigos tinham relação diretas com o serviço nas plantações e

minas, na convivência com o senhor dono de escravos e também na sociedade.

Os instrumentos do castigo poderiam ser: palmatoadas, tronco, marca

de ferro, mascaras de flandres e açoites.

A “Palmatoadas”, também cognominada de bolos, tinha o intuito de punir

fisicamente o escravo através das mãos, e, era lhe aplicados com o instrumento

de palmatória, no qual eram executados vários golpes de palmatoadas que

provocavam lesões nas mãos e deformidades.

“Arrebentar as mãos de bôlo, como de hábito se dizia, significava provocar violentas equimoses e ferimentos n epitélio delicado das palmas das mãos. Quando elevado número de palmatoadas, os membros afetados não só ficavam deformados por fortes edemas, como se abriam em rachaduras deixando escorrer copiosa sangria. Era o castigo preferido para disciplinar negras e moleques, sendo de corriqueira aplicação pelas sinhás.35

As sentenças eram lavradas pela Justiça e indicavam o número de bolos

que seriam aplicados no réu, como forma pedagógica de aprendizado.

35 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 58.

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“No Paraná, por exemplo, o castigo das palmatoadas, julgado como eficiente método de conduzir à boa aprendizagem, chegou a ser oficializado por uns brutos que governaram aquela Província. Tal método deveria ser aplicado nas escolas de primeiras letras, “para os casos em que os castigos morais não forem suficientes”, consoante dispunha o ignóbil instrumento legal que o instituiu.”36

Como é exemplificado, a prática das palmatoadas eram comuns e

efetivas para relação entre dominante e dominado.

O “Tronco”, um velho instrumento de castigo da antiguidade e conhecido

pelos cristãos. A aplicação pelos escravocratas em território brasileiro, era

consolidado com frequência nas regiões urbanas e rurais.

Esta prática comum em território brasileiro era aplicado sob os escravos,

e se prolongando após a abolição. Esta prática e expandiu para a execução

como pena para criminosos civis e militares.

A finalidade era conter o cativo para não efetivar a fuga do local aonde

se encontrava e também para aguardar a sua pena capital ou de castigo.

O tronco tinha várias finalidades, mas se destacava na produção de

suplícios, lamentos de dor do escravo e aumentava o castigo aplicado pela

Justiça.

O escravo ou criminoso era colocado em uma posição incomoda, a vista

de todos e com as lesões expostas ao tempo, e rodeado de insetos que

pousavam e pioravam seus ferimentos, e assim provocando a piora das lesões

derivadas do açoite.

E para dificultar a sua situação do cativo, o alimento era colocado em

uma posição de difícil acesso e custoso para se alimentar e saciar sua forme e

por consequência destes fatos ficavam desnutridos.

“Era o Tronco, que Rodrigues Carvalho dizia ser “um aparelho constante de forte vigia enfincada, com uma tábua de sucupira em forma de meia lua, tendo uma abertura em que o prisioneiro colocava uma perna, suspensa, firmando-se na outra na altura que o feitor quisesse.” E acrescentava: “Depois de alí suspenso durante horas, ficava a desgraçada vítima em frangalhos, sem forças e muitas vezes desfalecida.”37

36 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 59. 37 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 64.

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A Marca a Ferro, na antiguidade era praticada comum e oficializadas

pelas leis romanas. No Brasil, marca a fogo, tinha a prioridade de marcar os

escravos fujões e para fazer o reconhecimento era expostas as iniciais dos

donos de escravos ou lotes para a venda como peças.

O Código Filipino, no Livro V, Tit. XLI, efetivava o castigo de mutilações

e mortes. Na mesma legislação o escravo que provoca-se a morte do seu senhor

ou parente direto, teria a pena da Marcar a Ferro, pra a identificação e como

pena.

“A prática de sinalizar os negros com ferro em braza antecedeu, no Brasil, aos demais castigos a que foram eles submetidos; isso porque, tão logo negociados os lotes de pau de ébano, nos mercados africanos, os negreiros apunham em cada “peça”38, por aquele terrível sistema, ou o carimbo do consignatário, ou, desde logo, a marca do novo dono. Com essa providência objetivava – se facilitar a entrega da mercadoria, chegados que fossem os tumbeiros a portos brasílicos.”39

No litoral do continente africano, havia o embarque dos africanos em

direção ao Brasil.

No local de embarque os negros já seriam obrigados a usar correntes de

ferro e acomodados como bezerros novos, a intenção era de já no início da

viajem se adaptar com o novo sistema de vida e trabalho e seriam tratados como

se fossem gado no campo.

E na sequencia eram marcados com ferro em brasa em várias partes do

corpo dependendo da vontade do comprador e do trabalho que seria aplicado

em terras brasileiras.

O Príncipe Regente D. João, fundamentando o Alvará de 24, de

novembro de 1813, e observando as práticas de marcação de ferro em brasa

sob os escravos, e proíbe o sistema de carne tostada.

E manda substituir o processo de marcação a ferro a brasa, pela de

gravação do distintivo no ferro que vai em seu pescoço, ou seja, que o escravo

seja identificado por manilha ou coleira. A partir do pedido do Príncipe Regente

D. João o transporte do escravo passaria a ter no ferro no seu pescoço, as iniciais

do seu senhor, como se fosse um cachorros.

38 “A denominação “Peça”, era usado para identificar os escravos que vinham do continente africano,

para serem vendidos, nos estabelecimentos que praticavam o comercio de escravos. 39 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 67.

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“O ferro em braza não respeitava sexo nem idade. Indivíduos ainda impúberes eram selados, tal como os adultos, e disso são exemplos os anúncios que se seguem: “um moleque fugido a 2 de maio de 1826, por nome Luís, entre 10 e 12 anos apenas, no peito esquerdo tem a marca F.M.P. junta, e pouco se percebe, que é o carimbo com que ele foi marcado . . .” (grifos nossos). Outro moleque, esse de nação Quilimane, de idade 11 a 12 anos, fugido da casa de seu senhor, “tem no peito a marca N & B”.40

A marca de ferro em brasa, tinha duas finalidades a primeira,

organização do tráfico negreiro e também a identificação do produto que estava

sendo comercializado e o castigo como prática comum nas fazendas.

Os Açoites, eram comuns na romana antiga, e tinham o intuito de pena

e castigo para o escravo. No Brasil a prática era efetivada pela Justiça, sendo

uma ferramenta de aceitação tanto para fazendeiros como para autoridades

públicas.

O açoite era tão comum na sociedade que sua aplicação era aplicada

como pena ou por pura diversão para os responsáveis pelos escravos.

Os estrangeiros que viajavam no interior do país faziam a descrição das

atrocidades cometidas pelos fazendeiros.

“O autor de um artigo publicado na Inglaterra, sob o título “Relação de uma Viagem à Serra dos Órgãos”, ao que se presume por volta de 1841, depôs o seguinte com relação ao Brasil: “O único inconveniente que prejudica realmente a felicidade dos escravos consiste na sujeição aos excessos de cólera da parte de seus senhores.” E vem a denúncia: “Pelo menor suspeita, e sem que se admita justificação, a pena corporal mais grave é aplicada. Amarra-se o negro a uma árvore, e recebe quatrocentos a quinhentos açoites, dados muitas vezes pela própria mão de seu senhor. As mulheres não estão livres de tal pena.” Em que pêse o exagero quanto à generalidade e à severidade do castigo, a denúncia é válida no que refere à sua espécie.41

A Constituição Política do Império, de 1824, no § 19 do art. 179, fez

cessar a pena de açoites, pelas gravidades físicas que eram impostas ao cativo,

mas com a elaboração do Código Criminal do Império, no seu art. 60, que

explana; “Se o réo fór escravo, e incorrer ém pena que não seja a capital ou de

galés, será condemnado na de açpites, e, depois de os soffrer, será entregue a

seu senhor, que se obrigará a trazê-lo com um ferro, pelo tempo e maneira quite

o juiz designar.”42

40 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 68. 41 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 78. 42 Artigo 60 do Código Criminal do Império do Brasil, Artigo 60 pg. 95

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A sentença expedida pelo juiz, seria executada em frações e devolvido

para o seu senhor com o intuito de efetivar a pena e também para não sofrer

maiores prejuízos físicos, sendo a sua ausência prolongada iria proporcionar

prejuízo para o seu senhor no lucro de produção da fazenda.

Os Tribunais do Império, fazendo uma releitura dos fatos e

determinariam pela reformar os procedimentos em alguns casos de sentenças

de Juízes inferiores, e recomendado a moderação das penas para não levar o

cativo a morte.

Através da Circular n.º 365, de 10 de junho de 1861, que expõem a

preocupação do Imperador com as aplicações das penas sob o escravo e decide

recomendar aos Juízes de Direito, para ter cautela nas execuções das penas.

E priorizar a idade e robustez do réu, e portanto, ouvir os conselhos dos

médicos titulares na execução da pena, sendo que para a aplicação de 200

açoites, poderia levar o apenado a óbito. E, propondo a suspensão dos castigos

logo que o cativo demostre-se não mais aguentar os açoites.

No momento em que à o conflito de entendimentos jurídicos, a respeito

da Circular n.º 365. É elaborado o Aviso de n.º 276, de 20 de agosto de 1874, da

Secretária de Justiça do Conselho de Estado; que a pena seria temporariamente

suspensa, mas não de modo definitivo. Portanto o médico era a autoridade capaz

para liberar a continuidade da pena ou não, e assim analisando o estado de

saúde do réu para continuidade da pena.

“Mesmo após a promulgação da Constituição do Império, que aboliu a pena de açoites, houve quem continuasse, talvez por hábito, a fazer uso do relho nos galés turbulentos e rixosos. Mas, pelo Aviso n.º 283, de 26 de junho de 1865, do Ministro da Justiça, tal prática foi condenada em nome do Imperador, isso porque “se a própria autoridade não o pode decretar em suas sentenças, muito menos é lícito ordená-lo sem forma de juízo e por mero arbítrio.” No caso, aliás, seria sobrepor nova pena à de galés anteriormente decretada.”43

Como podemos analisar, os métodos de tortura eram eficazes para o

propósito de domesticar o escravo.

Os instrumentos de ferro, tem a tradição na história dos povos, no qual

eram utilizados para as guerras e aprisionamento de inimigos ou escravos.

43 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 81.

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Instrumentos preparados de várias formas e tamanhos, conquistou seu

espaço na lista de aplicação de torturadores, autoridades públicas e senhores

de escravos.

No regime escravista brasileiro, se consolida o Código Criminal do

Império, que através do artigo 126, que fazia por entender pelo emprego de

instrumentos de ferro e prisão solitária, no momento em que os presos

planejassem empreender fuga das fazendas ou das cadeias públicas da Corte.

“Art. 126. Se a fugida fôr tentada, ou effectuada pelos mesmos presos, não serão

por isso punidos; mas serão mettidos em prisões solitárias, ou lhes serão postos

ferros, como parecer necessário para segurança ao Juiz, debaixo de cuja direção

estiver a prisão.”

“Fugindo porém os presos por efeito de violência contra o carcereiro, ou guarda.”

“Pena – de prisão por três mezes a um anno, além das que merecerem pela

qualidade da violência.”44

E para reforçar o emprego dos instrumentos de ferro sob o escravo,

seriam empregados os regulamentos da Casa de Correção da Corte, instituição

que sancionava a expedição do decreto 678, de 6 de julho de 1850, que efetivava

a execução dos instrumentos de ferro, sob os cativos, sendo em extrema

necessidade e por ordem da Comissão Inspetora.

“A Casa de Correção do Rio de Janeiro, também chamada de Correção da Corte, foi criada em 6 de julho de 1850 pelo decreto n. 678, que também aprovou o seu primeiro regulamento, com o objetivo de ser uma prisão modelo do Império, onde se executada a pena de prisão com trabalho, sendo considerada uma das “obras mais úteis e necessárias ao País pela influência do sistema penitenciário sobre os hábitos e a moral dos pesos.”45

Para a contenção do cativo os instrumentos tinham uma variação de

nome e aplicações que levavam o escravo aos suplícios e determinando se,

seriam obediente ou tentaria a fuga pelo resto de suas vidas.

A primeira é a Corrente – Libambo, que era utilizada na captura do

escravo pelo capitão do mato e enviado e utilizado nas cadeias, como nas

propriedades particulares.

44 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM-16-12-1830.htm 45 http://linux.an.gov.br/mapa/?p=6333

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A Gargalheira, Golhilha ou Gorilha, era um colar de ferro que era fixado

ao pescoço do cativo, e carregando por vários dias, de modo a ser por motivo de

obediência ou sentenciados pela Justiça, ou por mera decisão de seu senhor, o

que acontecia com frequente.

A Calcêta e Grilhões eram conhecidos pela argola de ferro, estar

localizado no tornozelo da vítima, e assim dificultando os passos durante sua

locomoção entre regiões e também quando se distanciavam da prisão para

serviços externos e eram identificado pela sentença de Galés.

O Anjinho ou chamado de vis-à-pression, era aplicado nas possessões

francesas e inglesas. No Brasil, foi muito usado para colher informações de

escravos fugitivos e também para a localização de quilombos, assim

consolidando formas de arrancar confissões que não eram verídicas e colocando

a vítima em posição de declarar e assumir crimes que não provocou.

Este aparelho consistia em prender a cabeça dos dedos polegares da

vítima em dois anéis, e comprimi – lás gradualmente, através de uma pequena

chave de parafusos até esmigalhar as pontas dos polegares.

Algemas, Peias e Machos, era instrumento de importância para os

trabalhos de condução do cativo, e tinha a finalidade de restringir os movimentos

das mãos e dos pés do aprisionado. A Peias, eram submetidas aos tornozelos e

limitando os passos do cativo, no qual poderia ser de ferro ou de couro. Os

Machos, eram argolas de ferro presas a pesadas bolas de metal e fechadas ao

tornozelo do escravo, também limitando o seu deslocamento e fuga.

Placa de Ferro, era uma golhilha pendurada ao peito do escravo, de

modo a ser uma placa de ferro pesada e estigmatizando o seu portador, como

ladrão ou fujão, determinado pelas inscrições desonrosas relatadas contra o

portados do objeto.

Vira Mundo, objeto de ferro, menor do que o tronco usado para os

castigos nos escravos, mas com o mesmo objetivo de castigar os escravos pelos

pés ou pelas mãos.

Para a limitação de castigos e penas de crueldade contra a pessoa D.

João VI, explana:

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“Com data de 23 de março de 1821, D. João VI assinou decreto versando sobre as liberdades individuais, no qual se lê: “Ordeno em quarto lugar que em caso nenhum possa alguém ser lançado, em segredo, em masmorra estreita, escura ou infecta, pois que a prisão deve só servir para guardar as pessoas, e nunca para as adoecer e flagelar; ficando implicitamente abolido para sempre o uso de correntes, algemas, grilhões, e outros quaisquer ferros inventados para martirizar homens ainda não julgados a sofrer qualquer pena aflitiva por sentença final; entendendo-se todavia que os Juízes, e Magistrados Criminais, poderão conservar por algum tempo, em casos gravíssimos delinquentes, contanto que seja em casas arejadas e cômodas, e nunca manietados, ou sofrendo qualquer espécie de tormento.”46

O direito Português tinha em suas ordenações a pena capital, que

determinava a execução do enforcamento ou decapitação do escravo ou

delinquente como resposta ao crime praticado.

Eram duas as execuções de morte natural: a cruel, quando o réu era

sentenciado, e o comprimento era através de tortura que iniciava com agressões

físicas com instrumentos de barras de ferro e bastões de madeira.

A intenção do agressor era produzir no réu, fraturas nos ossos das

pernas e braços; o atroz, quando após o enforcamento ou a degola, o corpo era

preparado para o ritual de esquartejamento ou queima do cadáver, e se

transformando em cinzas no final deste procedimento, seriam espalhadas ao

vento.

O Governo se encarregava da cerimonia de execução do réu e divulgava

ao povo a sentença, do crime e os motivos da execução. E ao mesmo tempo

fomentar o medo coletivo e poder do Estado.

Com estes procedimentos de execução pelo Estado, o mesmo colocava

a mostra o sistema de pura violência contra qualquer um que fosse contra o Rei

ou suas ordenações, de modo ao apenado ser esquartejado e seus membros

serem expostos nos locais dos crimes praticados.

“A 3 de setembro de 1776 foram executados, na Bahia, ao negos Marcelo e Manoel de Afonseca. Em carta dirigida ao Mestre de Campo da Praça do Rio de Janeiro, de onde se originaram os réus, o Marques de Angeja transmitia o relato macabro: “Foi o Marcelo condenado à morte e depois de se lhe cortar a cabeça esquartejado, e Manoel de Afonseca também à morte e cortada a cabeça e assim uma e outra se fossem pôr no lugar do delito para que nessa terra se faça público ter-se castigado os delitos daqueles bárbaros e os moradores dela saibam se teve atenção com todo cuidado a sua representação.”47

46 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 140. 47 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 143.

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Com a extrema violência dos senhores de escravos iniciariam as

revoltas, que a força bélica do Estado, teria que neutralizar e sendo apoiada

pelos senhores de escravos, que neste momento eram os mais afetados pelas

revoltas dos escravos.

A pena capital era consolidada tanto pelas ordenações portuguesas,

como também no Brasil, que punha em total atividade a aplicação das

ordenações que penalizavam o escravo que fosse mentor ou mentores de

rebeliões e homicídios de senhores donos de escravos, feitores e suas famílias.

Nas Ordenações Filipinas, V, Tit. XLI, já dispunha desta aplicação no

qual explanava “morra morte natural para sempre” o significado destas palavras

fundamentariam a sentença de morte para os escravos que afrontasse,

agredisse ou matasse seu senhor.

“Abeberava-se o legislador brasileiro no dispositivo filipino sem mais efeito num Brasil já independente. Esse instrumento teve longa vida, pois vamos ver que o Aviso n.º 264, de 27 de novembro de 1852, ainda fortificava as disposições da Lei n.º 4, referida, disposições que deveriam ser executadas sem recurso algum, nos casos de sentença condenatória contra escravos, não só nos crimes mencionados no art. 1.º daquele instrumento legal, do mesmo passo, pelo de insurreição ou qualquer outro em que coubesse a pena de morte, consoante os demais artigos da mesma Lei. O Decreto n.º 1310, de 2 de janeiro de 1854, confirmou as determinações do Aviso que se vemde de citar: Nos casos previstos pela Lei 10 de junho de 1835, para aplicação da pena de morte, a simples confissão do réu não se configurava prova bastante para a decretação da “morte natural”, como, aliás, já ficou visto. Necessário era que houvesse “o complexo de todas aquelas circunstâncias que a Lei requer para que a pena de morte seja aplicável”, sendo de cabal importância “a declaração da existência de outra prova além da confissão do réu.”48

Mas para a pena de morte se consolidar em território brasileiro, o Rei

transfere, poderes para os governos da capitanias para aplicação da pena de

morte em suas administrações, sendo através de reuniões com seus ouvidores

e juízes, para o processamento e decisão das ações.

“No primeiro quartel do século XVIII, época de grande concurso de escravos na sub-região das minas, não menos avultado era o número de calhambolas, cada vez mais audaciosos nas suas tropelias, fruto das miseráveis condições de trabalho e de trato ali implantadas. A 21 de novembro de 1719, o Conde de Assumar, então governante daquelas partes, viu-se na contingência de expedir Bando determinando a execução de “morte natural” a todo negro fugido, considerando necessário, à guisa de processo, apenas os depoimentos de quatro testemunhas e o julgamento dos Ouvidores. A medida extrema visava, por igual passo, a diminuir os prejuízos decorrentes das constantes e numerosas evasões de escravos, cujos

48 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 146.

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reflexos se faziam sentir, et pour cause, nos trabalhos de exploração das jazidas, a que a Coroa dedicava especial atenção e inusitado carinho.”49

Com a publicação da primeira Constituição do Brasil, chamada de

Constituição Política do Império do Brasil, em 25 de março de 1824, inicia a

consolidação do Brasil como Nação e reconhecido por países estrangeiros.

Consolidada a Carta Magna, inicia o processo de execução das novas

legislações do novo Império.

O Poder Moderador, seria exercido pelo Imperador, como Chefe

Supremo da Nação, e sua posição inviolável, e sagrada, sendo sua

representação divina, e consolidando a posição de não estar sujeito a

responsabilidades de qualquer natureza.

Através da Carta Magna, efetiva os seus títulos de “Imperador

Constitucional, Defensor Perpetuo do Brasil, a Dom Pedro I e sendo tratado

como Majestade Imperial com as funções de organizar a política através dos

fundamentos do art. 101, sendo exposto o artigo:

“Art. 101. O Imperador exerce o Poder Moderador

I. Nomeando os Senadores, na forma do Art. 43.

II. Convocando a Assembléa Geral extraordinariamente nos intervalos

das Sessões, quando assim o pede o bem do Impeio.

III. Sanccionando os Decretos, e Resoluções da Assembléa Geral, para

que tenham força de Lei: Art. 62.

VI. Approvando, e suspendendo interinamente as Resoluções dos

Conselhos Provinciares: Arts. 86 e 87.

V. Prorogando, ou adiando a Assembléa Geral, e dissolvendo a Camara

dos Deputados, nos casos, em que o exigir a salvação do Estado;

convocando imediatamente outra, que a substitua.

VI. Nomeando, e demitindo livremente os Ministros de Estado.

VII. Suspendendo os Magistrados no casos do Art. 154.

VIII. Perdoando, e moderando as penas impostas ao Réos

condemnados por Sentença.

49 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 151.

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53

IX. Concedendo Amnistia em caso urgente, e que assim aconselhem a

humanidade, e bem do Estado.”50

Com a consolidação da constituição brasileira, e baseado no art. 101,

parágrafo 8º, seria gerado a Lei de 11 de setembro de 1826;

Lei de 11 de Setembro de 1826

Manda que as sentenças de pena de morte não se executem, sem que

primeiramente sejam presentes ao poder Moderador.

Dom Pedro por Graça de Deus e unanime aclamação dos povos,

Imperador Constitucional, e Defensor Perpetuo do Brazil: Fazemos saber a todos

os nossos súbditos, que a Assembléa Geral decretou, e nós queremos a lei

seguinte:

Art. 1.º A sentença proferida em qualquer parte do Imperio que impozer

pena de morte, não será executada, sem que primeiramente suba á presença do

Imperador para poder perdoar, ou moderar a pena, conforme o art. 101, § 8.º da

Constituição do Imperio.

Art. 2.º As excepções sobre o artigo precedente, em circumstancias

urgentes, são da privativa competência do Poder Moderador.

Art. 3.º Extinctos os recursos perante os Juizes, e intimada a sentença

ao réo, para que no prazo de oito dias, querendo, apresente a sua petição de

graça, o relator do processo remetterá á Secretaria de Estado competente as

sentenças, por cópia, por eles escriptas, e a petição de graça, ou certidão de não

ter sido apresentada pelo réo no prazo marcado; e pela mesma Secretaria de

Estado será comunicada a imperial resolução.

Mandamos portanto a todas as autoridades, a quem o conhecimento e

execução da referida lei pertencer, quem a cumpram, e façam cumprir, e guardar

tão inteiramente, como nella se contém. O Secretario de Estado dos Negocios

da Justiça a faça imprimir, publicar, e correr.

Dada no Palacio do Rio de Janeiro aos 11 dias do me de Setembro de 1826, 5.º

da Independecia e do Imperio.

IMPERADOR com rubrica e guarda.

50 NOGUEIRA, Otaciano, 1824, 3. Ed., Brasília, Senado Federal, Subsecretária de Edições, 2012.

(Coleção Constituições brasileiras; v. 1), www2.senado.leg.br

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54

Visconde de Caravellas.

Carta de lei, pela qual Vossa Magestade Imperial manda executar o

decreto da Assembléa Geral, que Houve por bem senccionar, par proporcionar

a todos os réos condemnados á pena de morte o meio de poderem gozar do

beneficio concedido pela Constituição do Imperio, no art. 101, § 8.º, tudo na

fórma acima declarada.

Para Vossa Magestade Imperial ver.

Domingos Lopes da Silva Araujo a fez.

Registrada a fl. 2 do livro 1.º de leis, que serve nesta Secretaria de

Estado dos Negocios da Justiça. Rio de Janeiro em 14 de Setembro de 1826. –

Vicente Ferrera de Castro Silva

Pedro Machado de Miranda Malheiro.

LEGISLATIVO.

Foi publicada esta Carta de Lei nesta Chancellaria-mór do Imperio do

Brazil.- Rio de Janeiro, 16 de Setembro de 1826. – Francisco Xavier Rapoo de

Alburquerque.

Registrada na Chancellaria-mór do Imperio do Brazil a fl.57 do livro 1.º

das leis. – Rio de Janeiro, 16 de Setembro de 1826. – Demetrio José da Cruz.51

Afirmados o poder real e político, o respeito ao Imperador era

incondicional. De modo a ser elaborada a Lei de 13 de outubro de 1827, no seu

art. 4.º, que explana; “Art. 4.º Regular-se-hão as Juntas de Justiça, no

conhecimento e decisão dos processos, pelo regimento no Conselho Supremo

Militar; e a sua sentença será dada á execução, sem mais recurso algum,

excepto o da revista.”52

A revista, era feita pelo Imperador, que analisava quem teria o benefício

de escapar da pena capital, mas ao mesmo tempo a Assembleia Legislativa se

posicionava a resolver está problemática de forma a não excluir o recurso de

graça dirigido ao Imperador, quando a sentença impusesse a pena de morte.

51 www2.camara.leg.br/legin/fed/lei_sn/1824-1899/lei-38603-11-setembro-1826-567177-

publicacaooriginal-90579-pl.jtml 52 www2.camara.leg.br/legin/fed/lei_sn/1824-1899/lei-38387-13-outubro-1827-566670-

publicaçaooriginal-90210-pl.html

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55

As leis de 1826 e 1827, tiveram influência nos assassinatos de senhores

escravos, pelos próprios escravos que se rebelavam contra sua situação de

cativo. No momento que os homicídios passam a ter significado aumento, o

Imperador passa a determinar que todas as sentenças relacionadas entre

escravos e seus senhores que resulte em morte do senhor, a partir do

pronunciamento do Imperador, “sejam logo executadas independente de

subirem à Minha Real Presença”, por ditos réus não “fazerem-se dignos da

Minha Imperial Clemência”, aduzia Sua Majestade.53

Com o pronunciamento do Imperador, e formalizado o decreto de 9 de

março de 1837, no qual seriam estabelecidas modificações a respeito das ações

do poder moderador nos casos de sentença de pena de morte.

Decreto de 9 de março de 1837

Declarando o artigo 4.º da Lei de 10 de Junho de 1835, e o Decreto de 11 de

Setembro de 1826, sobre a execução das sentenças de pena capital.

O Regente em Nome do Imperador o Senhor Dom Pedro II, querendo

remediar abusos que se tem introduzido, e que para o futuro se possão introduzir

em matéria tão poderosa, qual he a da execução das sentenças de pena capital,

usando da faculdade que lhe concede o artigo cento e dous, paragrapho doze

da Constituição do Imperio: há por bem Decretar o seguinte:

Art. 1.º Aos condemnados, em virtude do artigo quarto da Carta de Lei

de dez de Junho de mil oitocentos trinta e cinco, não he vedado o direito de

petição de Graça ao Poder Moderador, nos termos do artigo cento e hum,

paragrapho oitavo da Constituição, o Decreto de onze de Setembro de mil

oitocentos e vinte e seis.

Art. 2.º A disposição do artigo antecedente não compreende os escravos

que perpetrarem homicídios em seus próprios senhores, como he expresso no

Decreto de onze de Abril de mil oitocentos e vinte e nove, o qual continua no seu

rigor.

Art. 3.º Quer o réo tenha apresentado petição de Graça dentro dos oito

dias prescriptos pela Lei, quer o não tenha feito, o Juiz fará extrair copia da

sentença, que deve ser remetida no Poder Moderador, a qual virá acompanhada

53 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 153.

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ao Governo Geral pelo Presidente da respectiva Provincia, com as observações

que este achar convenientes.

Art. 4.º Ainda naqueles casos em qua não há lugar o exercício do Poder

Moderador, não se dará execução á sentença de morte, sem prévia participação

ao Governo Geral no Municipio da Côrte, e aos Presidentes nas Provincias, os

quaes, examinando e achando que foi a Lei observada, ordenarão que se faça

a mesma execução, podendo comtudo os Presidentes das Provincias, quando

julguem conveniente, dirigir ao Poder Moderador as observações que

entenderem ser de justiça, para que este resolva o que lhe parecer; suspenso

até então todo o procedimento.

Gustavo Adolfo de Aguilar Pantoja, Ministro e Secretario de Estado dos

Negocios da Justiça, assim o tenha entendido, e faça executar. Palacio do Rio

de Janeiro em nove de Março de mil oitocentos trinta e sete, decimo sexto da

Independencia e do Imperio.

Diogo Antonio Feijó

Gustavo Adolfo de Aguilar Pantoja.54

Com as modificações das legislações, o direito ao recurso de Graça,

benefício concedido pelo Imperador a todos os sentenciados a pena capital por

motivos que não fossem o crime de homicídio sob seu senhor, e classificado no

art. 4.º da Carta de Lei de 10 de junho de 1835, ou seja, desmembrado os crimes

comuns dos crimes graves, e assim mantendo o que já havia exposto no decreto

de 11 de abril de 1829.

E, fixava que qualquer execução de pena capital, não teria efetivação

sem prévio conhecimento do Governo Central, e encaminhando a autoridade

competente para analisar atentamente os pequenos pormenores dos casos e

verificar se os dispositivos legais que deveriam ser cumpridos, estão em

concordância com as leis e autorizar as execuções das sentenças.

“No primeiro decênio da segunda metade do século XIX, havendo o Juiz de Direito da Comarca do Rio das Velhas condenado à morte duas escravas – Rosa e Peregrina – por haverem assassinado sua senhora, consoante decisão do júri do Termo de Sabará, o presidente da Província de Minas Gerais, ao mesmo tempo em que determinou a suspensão da execução da sentença, devolveu o processo respectivo àquele Juiz a fim de serem juntados o seu traslado integral e o recurso

54 www2.camara.leg.br/legin/fed/decret_sn/1824-1899/decreto-36920-9-marco-1837-562208-

publicacaoorifinal-86065-pe.html

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de Graça a ser remetido a Sua Majestade. Como a referida autoridade judicial fôsse de opinião que a execução deveria ser imediata, por julgar em vigor o Decreto de 11 de abril de 1829, anteriormente citado, aplicado pelo de 9 de março de 1837, “que nega o recurso de Graça aos escravos condenados por terem morto seus senhores”, o presidente submeteu o assunto à decisão do Govêrno Imperial, por achar “que os Decretos citados pelo Juiz de Direito se acham revogados pelas claras disposições do de 2 de janeiro de 1854...” Com efeito, ouvido o Conselho Procurador da Coroa, opinou este, com o que concordou Sua Alteza, no sentido de “Aprovar o procedimento dessa Presidência (de Minas Gerais) quando exigiu do Juiz de Direito da Comarca do Rio das Velhas a apresentação do recurso de graça, e mais peças essenciais, para que o negócio tivesse o andamento designado no Decreto n.º 1310, de 2 de janeiro de 1854.” É o que consta do Aviso ao Ministro da Justiça, datado de 27 de outubro de 1857 e dirigido ao Vice-Presidente da Província de Minas Gerais em exercício da presidência.”55

Analisando as questões que envolvem os procedimento da pena de

morte no Brasil, é clara a diferença entre o homem livre e o escravo. No momento

que inicia o processo de acusação o tratamento que lhe é aplicado não ô, é

uniforme, e podemos ver que neste período até ao nosso contemporâneo as

diferenças de aprisionamento e execução das penas, tem o diferencial de

classes.

Os procedimentos jurídicos e sociais, tanto no norte como no sul do

Brasil, tinham a proposta de coisificar o escravo e posiciona-lo como se é tratado

um animal e sujeito a se efetivar como propriedade de outrem, e juridicamente

na condição social de morte sem expressão de cidadania e privado de todos os

direitos de um homem livre, ou seja, sem representação alguma de direitos.

Ou seja, a sua condição jurídica de coisa, fundamentaria para o senhor

de escravos e sociedade, a posição de servidão e as condições sociais para a

estagnação, separação de famílias e aceitação da violência como um benefício,

necessário para a penalização que lhe eram decretadas de modo a coibir o seu

desenvolvimento na sociedade.

4. CÓDIGO DE 1830

O Código Criminal do Império do Brasil de 1830, foi aprovado pela

Câmara dos Deputado e no Senado e enviado ao Imperador, em 16 de dezembro

de 1830, sendo sancionado por D. Pedro I.

55 GOULART, José Alipio, DA PALMATÓRIA AO PATIBULO, Ed. Conquista, 1971, RJ. p. 154.

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58

No seu conteúdo formalizavam 313 artigos e dividindo-se em quatro

partes: I. Dos Crimes e das Penas; II. Dos Crimes Públicos; III. Dos Crimes

Particulares; IV. Dos Crimes Policiais.

Mas para prefaciarmos sobre o Código Criminal do Império do Brasil,

teremos que anteceder aos fatos que levaram a efetivação do primeiro código

penal brasileiro.

Como já falamos em capítulos anteriores sobre os ideários iluministas

que valoravam o humanismo e o fim da carnificina nos tribunais, e fomentando

os conceitos que seriam influenciados em toda Europa, partimos para o

históricos do Código Criminal do Império do Brasil.

No Brasil, consolidada a proclamação da independência de Portugal,

inicia um novo processo político e social. Com os acontecimentos consolidados

na Europa, que resultou na renovação dos conceitos de legislação e também a

releitura do sistema jurídico, político e as relações de Estado e sociedade, ou

seja, a relação do micro e macro nos grupos sociais.

No momento que a nova elite assume sua posição no Brasil, inicia o

envio de seus filhos para a Europa, para concluírem seus estudos e aplicarem

no Império brasileiro.

Transitando pelos corredores das universidades europeias, os patrícios

brasileiro tem contato com os conceitos revolucionários iluministas, que vão

influenciar na renovação dos ideários jurídicos e políticos no Brasil.

Através da revolução francesa, iniciam os movimento de reforma do

Direito Penal, e a extinção do antigo regime.

A revolução francesa, com o ideário de um novo regime político-social,

e o fim do sistema absolutista, elabora conceitos para a ruptura do Estado

violento e a elaboração da separação dos poderes e portanto a valoração do

direitos do homem e do cidadão.

O Brasil, acompanhando as mudanças na Europa, tem como influência

os ideários franceses. Motivados pelas classes políticas, o I Império inicia

mudanças significativas na estrutura social e política, que necessitava de

profundas reforma no Direito Penal.

Em 4 de maio de 1827, o Deputado Bernardo Pereira de Vasconcellos,

apresentava o primeiro projeto para o código penal, em contra partida no dia 16

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do mesmo mês o Deputado José Clemente Pereira, também apresentava outro

projeto, no qual apenas formalizava a primeira parte do seu trabalho.

Os projetos analisados pelos deputados, seriam enviados para Câmara,

com o intuito de estudar os artigos proposto nos projetos. Estes projetos

passariam por uma comissão composta por cinco deputados revisores, e sendo

despachado para o parecer do Imperador, em 14 de agosto de 1827, para a

correções de questões de efeitos aos princípios ou causas jurídicas dos projetos

em curso no parlamento, no qual seria a partir do projeto Vasconcellos.

Com a urgência de elaborar, o novo código penal para o Império,

intensifica as pressões para a finalização do projeto. Com rapidez é formada

nova comissão de seis representantes das duas casas legislativas.

Baseado no projeto de Bernardo Pereira de Vasconcelos, e novamente

redigido, os deputados expressavam suas opiniões e se manifestavam pela

demora em efetivar a legislação, e não se preocupando com as imperfeições e

desfavores do projeto em pauta, não se preocuparam em formalizar leis que

abolissem os castigos em relação aos escravos e as classes baixas do Império.

Chegado o dia da votação, o projeto é aprovado na Câmara dos

Deputados e no Senado e enviado ao Imperador, em 16 de dezembro de 1830,

e sancionado pro D. Pedro I.

Sancionado e denominado de Código Criminal do Império do Brasil, seu

conteúdo era composto por 313 artigos e dívidas em quatro partes: I. Dos Crimes

e das Penas; II. Dos Crimes Públicos; III. Dos Crimes Particulares; IV. Dos

Crimes Policiais.

No período da consolidação do código penal, as palavras “Crime e

Delito”, eram palavras sinônimas sendo redigidas no artigo 1º do código penal.

O Código Penal, no artigo 10, § 1º, expõem a imputabilidade penal a

partir dos 14 anos completos e obrigando o menor a trabalhar em casas de

correção no máximo até os 17 anos, e baseado no artigo 13. A imputabilidade

por insanidade mental era isenta de pena, mas o assistido podendo ser entregue

a sua família ou aos cuidados das instituições públicas apropriadas artigo 12.

A Legislação também indica o ressarcimento do dano, as vítimas pelo

réu e transferindo a dívida para seus descendentes regulado pelos artigos 21 a

32. Dos artigos 33 ao 60, “Da Qualidade das Penas, e da Maneira como se Hão

de Impor, e Cumprir”, são os procedimentos aplicados para os crimes comuns e

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graves, sendo entre os artigos a morte pela forca, de forma a ser a mais grave

entre as penas publicadas na legislação. E também as penas de liberdade, que

seriam a de galés, que consistia em trabalhos forçados, o desterro e degredo.

As penas de castigo não eram aplicadas nos homens livre, e, eram

apenas para escravos, sendo a ação efetivada por lei, para alguns casos, e

somente contra escravos.

O artigo 65, trata da pena por sentença, expedida por Juiz de Direito, no

qual não haverá prescrição em tempo algum e o comprimento da pena seria

imediato.

O Código de 1830, tinha como base os conceitos franceses, romanos,

germânicos e canônicos. Para sua época era um código visionário, de forma a

tratar o tema de indenização do dano decretada pelo próprio Juiz Criminal e à

antecipação da teoria positivista da cumplicidade.

O código também teve uma acentuada orientação político-criminal, que

favoreceu a sua elaboração para a consolidação do primeiro código nacional e

formalizado por brasileiros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Império sendo uma nação independente, precisava de Leis nacionais

para a consolidação dos ideários de povo e Justiça e também reformas no Direito

Penal do Império.

Na formação de novas Leis para a execução das penas, o intuito era a

mudanças em pró da sociedade livre. Com a elaboração de leis, que eram

consideradas a frente de seu tempo, consolidavam as ordenações que iriam

influenciar seus conceitos nos códigos de alguns países da América Latina e

também na Europa.

A legislação para a sociedade livre, foi de extrema importância, para a

organização das províncias, na segurança pública e também nos procedimentos

penais e a formação de estabelecimentos para a execução da pena.

Mas quem eram os homens livres? Eram os fazendeiros, políticos,

funcionários públicos e comerciantes de escravos que para a Justiça eram

importantes para o Estado, e deixando de fora da legislação os colonos,

empregados da fazenda e escravos.

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Mas para o escravo, a legislação não foi favorável, sem perspectiva de

mudanças para o cativo e ainda prolongaria o tratamento violento que era

aplicado sob o escravo e ao mesmo tempo sendo comparado com objeto de

trabalho e levando a diante as aplicações dos castigos e torturas sob o cativo.

E também o incentivo ao analfabetismo, a falta de informação foram

fundamentais para a servidão por tanto tempo no Brasil. Este fato foi fundamental

para a servidão por tantos anos no Império, que se transferia por gerações os

trabalhos da fazenda e seus castigos. Estes conceitos seriam fundamentais para

o desenvolvimento da violência no Brasil.

O Direito Penal, para o seu período foi visionário, mas com as

transformações sociais houveram novos discursos de reformas das leis.

Que simplesmente seria adaptadas para cada momento histórico-social

do Brasil, de modo a formalizar a cultura jurídica do “círculo vicioso” das leis

penais, portanto não havendo mudanças ou transformações de reformas efetivas

para uniformização social.

A Legislação, sempre foi direcionada para benefício daqueles que

exercem, administram e fazem a manutenção do poder, de forma a adequar leis

para determinados grupos sociais e não para a sociedade como um todo.

E as consequências derivadas do escravismo são a violência a falta de

estrutura jurídico-social, e efetivando a falta de conhecimento do indivíduo para

o preparo da convivência em sociedade.

FONTES

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As Constituição do Império de 1824 e o Código Criminal do Império de 1830. E, também notícias de jornais do período. REFERÊNCIAIS BIBLIOGRAFICAS _ ALTAVILA, Jayme de, Origem dos Direitos dos Povos, 10ª ed., São Paulo:

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