gravidez na adolescência, questionário

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Departamento de Sociologia A Gravidez na Adolescência: Percursos Interrompidos Denise Alexandra de Castro Mirrado Tomaz Dissertação submetida como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Família e Sociedade Orientadora: Doutora Maria das Dores Guerreiro, Professora Auxiliar, ISCTE-IUL Outubro, 2010

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Gravidez na Adolescência

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  • Departamento de Sociologia

    A Gravidez na Adolescncia: Percursos Interrompidos

    Denise Alexandra de Castro Mirrado Tomaz

    Dissertao submetida como requisito parcial para obteno do grau de

    Mestre em Famlia e Sociedade

    Orientadora:

    Doutora Maria das Dores Guerreiro, Professora Auxiliar,

    ISCTE-IUL

    Outubro, 2010

  • Agradecimentos

    Agradeo, em primeiro lugar, Professora Maria das Dores Guerreiro, por ter aceite

    orientar este trabalho, bem como pelo sentido crtico apresentado e interesse

    manifestado em todos os momentos.

    Um agradecimento sentido Empresa Municipal de Habitao Social de Cascais

    Emgha, na pessoa da Presidente do Conselho de Administrao, Dra. Conceio Carp,

    por prontamente ter aceite a realizao do presente estudo.

    s jovens que participaram no estudo, muito obrigada! Sem o vosso testemunho este

    trabalho no existiria.

    Um obrigada especial minha colega e amiga Zelinda Santos, por todos os momentos

    em teve uma palavra de incentivo a horas tardias, enquanto caminhvamos nesta

    odisseia. Obrigada pelo apoio e pela amizade!

    Aos meus pais agradeo o apoio incondicional de sempre Este passo na minha

    formao acadmica fruto do vosso constante investimento em mim! Obrigada!

    Ao meu marido, agradeo o apoio incondicional manifestado desde o primeiro

    momento! Jamais teria conseguido sem a tua ajuda e incentivo Filhote, a mam j no

    tem de ir para a escola! Agora o tempo todo para a nossa famlia!

    Por ltimo, um agradecimento ao ISCTE e especialmente ao Departamento de

    Sociologia, pela oportunidade de cimentar e aumentar conhecimentos na rea da

    Sociologia da Famlia.

  • ndice Geral

    ndice

    ndice de Quadros ------------------------------------------------------------------------------- 2

    I Introduo ------------------------------------------------------------------------------------ 3

    II Enquadramento Terico ------------------------------------------------------------------ 6

    III Metodologia ------------------------------------------------------------------------------- 19

    1. Objecto de estudo

    2. Hipteses de Estudo

    3. Dimenses de Anlise

    4. Mtodo e Tcnicas

    IV Anlise Emprica ------------------------------------------------------------------------- 22

    V Consideraes Finais --------------------------------------------------------------------- 36

    VI Referncias Bibliogrficas ------------------------------------------------------------- 38

    VII - Anexos ------------------------------------------------------------------------------------ 49

  • ndice de Quadros

    Quadro 1 Interrupes voluntrias da gravidez entre os anos 2007 e 2009

    Quadro 2 N de nascimentos de crianas de mes com idade inferior a 20 anos

    em pases da Unio Europeia

    Quadro 3 Evoluo do n de interrupes voluntrias da gravidez em pases

    da Unio Europeia

    Quadro 4 Caracterizao social das entrevistas

  • I. Introduo

    O fenmeno da gravidez na adolescncia tem assumido nos tempos que correm maior

    visibilidade, embora seja do conhecimento geral que tal no se trata de um problema da

    actualidade. visto na nossa sociedade como um problema de ndole social, atendendo

    a que muitas vezes a ele esto associadas situaes como o abandono escolar precoce, a

    baixa escolaridade, a pobreza, o desemprego ou at mesmo actividades laborais pouco

    qualificadas, entre muitas outras caractersticas que, por sua vez, so tpicas da grvida

    adolescente, bem como dos seus progenitores e, at mesmo, dos seus companheiros.

    Em Portugal, at Abril de 2007, qualquer adolescente que engravidasse, em

    termos legais, no teria outra opo que no levar a gravidez a termo e s

    posteriormente se afeririam as medidas a tomar relativamente ao beb, uma vez que a

    figura do aborto no estava previsto no corpo da lei, a no ser em casos especiais,

    conforme ilustrado na Lei n 6/84 de 11 de Maio, em especfico na alterao ao artigo

    140 do Cdigo Penal que contempla o seguinte:

    1.No punvel o aborto efectuado por mdico, ou sob a sua direco, em

    estabelecimento de sade oficial ou oficialmente reconhecido, e com o consentimento

    da mulher grvida quando, segundo o estado dos conhecimentos e da experincia da

    medicina:

    a) Constitua o nico meio de remover o perigo de morte ou de grave e irreversvel leso

    para o corpo ou para a sade fsica ou psquica da mulher;

    b) Se mostre indicado para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura leso para o

    corpo ou para a sade fsica ou psquica da mulher grvida, e seja realizado nas

    primeiras 12 semanas de gravidez;

    c) Haja seguros motivos para prever que o nascituro venha a sofrer, de forma incurvel,

    de grave doena ou malformao, e seja realizado nas primeiras 16 semanas de gravidez;

    d) Haja srios indcios de que a gravidez resultou de violao da mulher, e que seja

    realizado nas primeiras 12 semanas de gravidez;

    2. A verificao das circunstncias que excluem a ilicitude do aborto deve ser

    certificada em atestado mdico, escrito e assinado antes da interveno por mdico

    diferente daquele por quem, ou sob cuja direco, o aborto realizado.

    3. A verificao da circunstncia referida na alnea d) do n 1 depende ainda da

    existncia de participao criminal da violao.

  • A Lei n16/2007, de 17 de Abril Excluso de ilicitude nos casos de

    interrupo voluntria da gravidez veio introduzir alteraes bastante significativas

    em relao possibilidade de se prosseguir ou no com uma gravidez no planeada e

    no desejada.

    O presente estudo tem como objectivo perceber de que modo a introduo da Lei

    n 16/2007 de 17 de Abril, relativa legalizao da Interrupo Voluntria da Gravidez

    (IVG) at s 10 semanas por opo consciente da mulher, produziu ou no efeitos no

    nascimento de nados vivos de mes adolescentes entendidas estas como todas as

    jovens entre os 12 e os 19 anos pretendendo-se tambm conhecer as implicaes que

    as opes tomadas representam nos seus percursos de vida.

    De uma forma sucinta, podemos considerar os seguintes objectivos do estudo:

    Aferir a representatividade da problemtica da gravidez na adolescncia em

    Portugal;

    Contextualizar a problemtica em anlise no concelho de Cascais, em especfico

    nos bairros de habitao social geridos pela EMGHA Empresa de Gesto e

    habitao Social de Cascais EM, SA;

    Perceber que motivaes compulsam as adolescentes em prosseguir com a

    gravidez e consequentes implicaes nos seus percursos de vida.

    Metodologicamente procedeu-se ao recurso anlise quantitativa, passando

    sobretudo pela pesquisa bibliogrfica, anlise de dados documentais, aplicao de

    entrevistas semi-estruturadas a 17 adolescentes (grvidas ou com filhos nascidos a partir

    de Novembro de 2007) e ainda recolha e anlise de dados.

    Atendendo abrangncia nacional da temtica, no descurando uma anlise aos

    dados relativos situao do pas, delimitou-se o raio de aco do estudo aos inquilinos

    residentes em fogos municipais sitos no concelho de Cascais e geridos pela EMGHA.

    De acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatstica (INE), a taxa de nados

    vivos de filhos de adolescentes tem vindo a diminuir ao longo dos ltimos 5 anos, no

    entanto, Portugal continua a ser um dos pases da Unio Europeia com taxas superiores

    relativamente a este problema social.

    Se considerarmos as implicaes pessoais, familiares e sociais das gravidezes

    em jovens adolescentes, facilmente entendemos que se trata de uma temtica que

    continua a ter bastante relevncia na sociedade contempornea e para a qual todos os

    contributos so vlidos.

  • Ao pensar nesta questo, rapidamente assumimos que estas jovens tm como

    que percursos de vida interrompidos. Interessa perceber se quem vivncia essas

    situaes tambm tem a mesma viso ou se, por outro lado, considera que o nascimento

    de um filho, quando muitas delas ainda so umas crianas, a forma que tm de

    atriburem um sentido s suas vidas e em que medida se vm confrontadas a ter de

    alterar objectivos h muito traados ou em algumas (muitas situaes) definir e

    construir um projecto de vida, mais ainda quando actualmente existe outra opo

    legalmente instituda.

  • II. Enquadramento terico

    incontornvel recorrer a estudos sobre famlia no mbito deste projecto de pesquisa,

    uma vez que a adolescente que passou pela experincia da gravidez no pode ser

    dissociada da famlia que contribuiu para o seu processo de socializao. Importa, no

    entanto, frisar que no se pretende minimizar a importncia da escola, dos pares e do

    meio envolvente no processo de socializao de qualquer indivduo.

    Famlia, no sentido restrito de agregado familiar, poder, assim, ser definida

    como um grupo de duas ou mais pessoas relacionadas por laos de sangue, por aliana

    ou por outro tipo de afinidades, que residam em conjunto, partilhem um oramento

    comum, se apoiem mutuamente e possam prestar cuidados a crianas ou outros

    coabitantes dependentes (Guerreiro, 2001).

    De acordo com Murdock, a famlia define-se como um grupo social que se

    caracteriza pela residncia em comum, pela cooperao econmica e pela reproduo

    (cit. in Barata, 1998).

    Robert Burguess, terico da corrente da Escola de Chicago, consensualmente

    considerado o pai da Sociologia da Famlia americana, apresenta a famlia como uma

    unidade de personalidades em interaco, que existe para a gratificao mtua dos seus

    membros que esto unidos por uma coeso interna, mais do que por presses externas.

    Importa referir que, reportando ao contexto histrico que se vivia, a crise de 1929,

    Burguess conseguiu aferir que existiam famlias em inter ajuda e que conseguiam

    ultrapassar as adversidades. Se considerarmos que a famlia transversal a qualquer

    cultura ou religio, h indubitavelmente necessidade de se assumir que ao longo dos

    tempos tm sido variadas as formas de abordagem e de anlise da mesma.

    Contudo no ser necessrio recuar-se muito na histria da Humanidade para se

    perceber que realidades como a famlia e as relaes que se estabelecem no seio do

    mesmo, estiveram, esto e estaro sempre em constante mutao, at porque essencial

    no esquecer que a vida faz-se de mudana

    As transformaes sociais tm sido regulares ao longo dos ltimos 30/40 anos.

    Noutros tempos, a famlia era o pilar da sociedade, o centro de todas as aces e no seio

    da qual eram discutidas todas as decises, sempre com maior destaque atribudo ao

    papel do homem, a quem cabia as grandes decises. Tratava-se de uma estrutura assente

    num regime patriarcal exercido com grande controlo social. Contudo esta realidade

    sofreu alteraes e no seio da sociologia da famlia, o grupo domstico deixa de ser

    considerado como um todo cujos comportamentos so julgados em funo apenas do

  • emprego do chefe de famlia, e os cnjuges reencontram, ao nvel da anlise sociolgica,

    uma autonomia de comportamento (Segalen, 1999).

    A relao dos indivduos com a sociedade teve inevitavelmente de se alterar,

    uma vez que a relevncia outrora conferida ao todo, ao grupo, famlia alargada, passa

    agora a centralizar-se no indivduo, com consequncias imediatas para o processo de

    modernizao das famlias. Se por um lado, existem os que atribuem a estas alteraes,

    responsabilidades acrescidas, nomeadamente ao nvel do comportamento de risco nos

    jovens, por outro lado so inmeros os aspectos positivos destas transformaes.

    De acordo com a teoria do controle social de Travis Hirschi, a famlia crucial

    em todo o processo de socializao e de estabelecimento de relaes afectuosas, uma

    vez que a ausncia das mesmas poder constituir-se como causa do desvio. Esta

    situao verifica-se, uma vez que tendo em conta que no existem laos afectivos entre

    os pares, no existe qualquer motivo que leve os indivduos a terem de agradar quem

    lhes mais prximo. Logo de acordo com esta teoria, as ligaes sociais dbeis, podem

    culminar em prticas desviantes. precisamente esta falta de apego, a quebra de laos

    que fazem com que as relaes entre os elementos que compem os agregados

    familiares se tornem cada vez mais frgeis e distantes. Importa ressalvar que esta

    fragilidade transversal a todos os estratos sociais, embora os efeitos mais imediatos

    sejam, obviamente mais visveis nos agregados familiares mais desprotegidos.

    Embora no possamos incorrer em generalizaes tendenciosas, de facto,

    verifica-se que uma parcela significativa das adolescentes que engravidam proveniente

    de agregados familiares mais frgeis e socialmente desfavorecidos. No entanto, importa

    tambm reter que as adolescentes grvidas das classes mdia/alta recorrem a outro tipo

    de servios e nem to pouco so confrontadas com situaes de to grande

    vulnerabilidade social.

    Muitos estudos tm sido feitos sobre as famlias destas adolescentes. Grande

    parte chega-nos dos Estados Unidos da Amrica, onde se observou que a maioria das

    adolescentes provm de famlias com um baixo nvel socioeconmico e de habitaes

    superpovoadas e promscuas, o que as leva a passarem muitas horas fora de casa. Outras

    provm de famlias com melhor nvel, mas onde, em geral, o equilbrio est alterado, ou

    por divrcio dos pais, ou pela ausncia da figura de um dos progenitores, mais

    frequentemente da figura paterna (Almeida, 1987).

    A citao supra citada, embora j no muito recente, continua bastante actual,

    uma vez que a maternidade na adolescncia, tem vindo a assumir contornos de

  • problema social, inclusivamente devido s repercusses que estes acontecimentos tm

    na vida das adolescentes, nas suas famlias e na sociedade em geral.

    Assim, podemos afirmar que a gravidez na adolescncia pode estar associada a

    variados factores, como: as transformaes da sociedade, nomeadamente a maior

    liberalizao da sexualidade; os factores socio-econmicos, como pertencerem a um

    agregado familiar multiproblemtico, residirem em contextos de pobreza e de excluso

    social, com grande destaque para os baixos nveis de escolaridade e pouco

    conhecimento das prticas contraceptivas (apesar do grande investimento na rea); e

    ainda a factores psicolgicos, onde a gravidez poder funcionar como uma forma de

    compensao e de preenchimento de um vazio de sentimentos e de afectos.

    curioso que, de acordo com alguns registos da literatura, consegue-se aferir

    que muitas adolescentes encaram os seus bebs como uma forma de compensao

    narcsica, pela vida dura e m que tiveram De alguma forma, conseguem assim ter

    algum que as ama incondicionalmente e que pelo menos numa primeira fase da vida,

    depende delas (mes). Estes bebs possibilitam aquisio de status. A minha me

    sempre me tratou mal, por isso que eu tive este bebe. Assim, pelo menos, posso

    demonstrar e manifestar todo o meu amor por ele, um sentimento que nunca ningum

    manifestou por mim (Musick, 1993, traduo livre).

    Alheias s alteraes que a condio de mes lhes ir provocar no percurso de

    vida, poder ser interessante perceber o que leva estas jovens a prosseguir com a

    gestao, considerando que em Portugal, desde Abril de 2007 (Lei n 16/2007, de 17 de

    Abril), j possvel proceder-se interrupo voluntria da gravidez, por opo da

    mulher, at s 10 semanas de gestao.

    Independentemente das motivaes, percebe-se claramente que o papel da

    famlia de grande destaque em todo este processo e certamente existiro situaes em

    que houve um manifesto apoio s adolescentes, e outras, porm, em que poder ter sido

    necessrio recorrer a auxlio extra-familiar.

    A adolescncia trata-se de um perodo da vida que merece toda a ateno social,

    atendendo a que desta transio da infncia para a idade adulta, podem advir, ou no,

    problemas futuros para o desenvolvimento dos indivduos em causa. O termo

    adolescncia, provm do latim adolescere que significa crescer, fazer-se

    homem/mulher (Muuss, 1979), sendo que apenas a partir do final do sculo XIX foi

    entendida como uma etapa distinta do desenvolvimento. uma fase da vida que pode

    ser definida pelas suas dimenses psicobiolgica e histrica, poltica, econmica, social

  • e cultural. A definio da Organizao Mundial de Sade (OMS), refere-se dimenso

    biolgica e psicolgica da adolescncia.

    Actualmente a adolescncia vista como um perodo balizado entre a infncia e

    a idade adulta, no qual ocorrem inmeras transformaes, quer fsicas, quer psicolgicas,

    que propiciam o surgimento de comportamentos irreverentes e o questionamento dos

    modelos e padres infantis que so necessrios ao prprio crescimento.

    Para a OMS, a adolescncia compreende a faixa etria que vai dos 10 aos 19

    anos. Caracteriza-se por mudanas fsicas aceleradas e caractersticas da puberdade,

    diferentes do crescimento e desenvolvimento que ocorrem em ritmo constante na

    infncia. Essas alteraes surgem influenciadas por factores hereditrios, ambientais,

    nutricionais e psicolgicos (OMS, 1965).

    De acordo com Littr (Loureno, 1998) a partir do perodo da adolescncia que

    os indivduos se tornam aptos a procriar. Para Justo (2000) o contexto social em que os

    adolescentes crescem tambm palco de inmeras modificaes ligadas directamente

    ao fenmeno da reproduo, pois uma das facetas que mais se desenvolveu na nossa

    sociedade foi a sexualizao da cultura.

    A tendncia actual de iniciar mais precocemente a actividade sexual aumentou,

    como bvio, o risco de maternidade na adolescncia (Canavarro & Pereira, 2001 cit in

    Canavarro, 2001). Para justificar este facto, podemos, de forma geral, apresentar

    factores como a maior disponibilidade de contracepo, a crescente erotizao de

    diversos aspectos sociais, a mudana de valores relativamente sexualidade, a famlia,

    aos padres da nupcialidade e a prpria fase da adolescncia (Hardy e Zabin, 1991;

    Stevens-Simon e Kaplan, 1998 cit in Canavarro, 2001).

    Ao abordar-se a questo da gravidez na adolescncia imprescindvel

    centrarmo-nos e debruarmo-nos sobre o modo de vida dos adolescentes, a sua classe

    social, a sua cultura e costumes, para alm dos aspectos psicolgicos inerentes prpria

    condio de adolescente.

    Uma rapariga que engravida durante a adolescncia considerada em risco de

    excluso social, pelo risco em termos de sade e pelo facto de a maioria destas jovens se

    encontrarem inseridas em famlias desestruturadas, possurem problemas emocionais e

    scio-econmicos e ausncia de uma educao sexual adequada. Depreende-se pois, que

    surjam repercusses ao nvel da prpria adolescente, do pai da criana, da famlia,

    nomeadamente, dos pais do jovem, do meio social, da sade da me e da criana que

    nasce. Alis, podemos afirmar que as gravidezes no desejadas representam o fracasso

  • das estruturas sociais em providenciar alternativas adequadas para que essas pudessem

    ser evitadas. Autores referem que pode se atribuda uma responsabilidade social pelo

    crescente nmero de gravidezes no planeadas/desejadas, na medida em que a sociedade

    no providencia a informao necessria s mulheres acerca do seu corpo, sexualidade,

    reproduo e nascimentos, atravs do acesso a mtodos contraceptivos e servios

    eficientes (Silva, 1998).

    A maior parte dos estudos disponveis, conduzidos em Portugal e nos restantes

    pases ocidentais, d conta que, se bem que em todos os estratos sociais existam

    adolescentes a engravidar, tendencialmente encontramos com maior taxa de

    probabilidade uma adolescente grvida em famlias provenientes de meios socialmente

    mais desfavorecidos. O mesmo dizer: habitao carenciada ou do tipo social;

    famlias numerosas (grandes fratrias e vrios nveis familiares agregados no mesmo

    agregado familiar); nvel de escolaridade baixo ou nulo (tanto para a adolescente que

    engravidou, como para com os que a rodeiam); formao profissional inexistente (tanto

    para a adolescente como para os seus progenitores); desemprego crnico, etc. (Justo,

    2000). Muitas das adolescentes, ao engravidarem, j no se encontram inseridas em

    qualquer sistema de ensino nem to pouco possuem um projecto de vida definido

    (Canavarro e Rolim, 2000). Nveis elevados de envolvimento com a escola esto

    associados a um adiamento da experincia da gravidez. Jovens com nveis mais

    elevados de desempenho e de aspiraes escolares tm menor probabilidade de serem

    sexualmente activas e maior probabilidade de utilizarem mtodos contraceptivos

    (Manlove, 1998, in Canavarro & Pereira, 2001).

    As condies sociais e econmicas desfavorveis com maior frequncia

    assinaladas como estando na gnese da gestao na adolescncia so as seguintes:

    pobreza, baixos nveis educacionais e a excluso do sistema escolar e do emprego.

    Impor referir que qualquer uma das condies anteriormente assinaladas so

    regularmente citadas em estudos sobre a temtica, realizados quer no nosso pas

    (Almeida, 1987; Grande, 1997; Jongenelen, 1998, Pacheco, Costa e Figueiredo, 2003,

    Pacheco, Figueiredo, Costa e Magarinho, 2003, Silva e Nbrega, 1983, cit in Figueiredo,

    et al. 2006), quer nos restantes pases ocidentais (e.g. Alvarez, Burrows, Zvaighat e

    Santiago, 1987; Coley e Chase-Lansdale, 1998; Stevens-Simon e McAnarney, 1996, cit

    in Figueiredo, et al., 2006).

    A pobreza um factor antecedente especialmente importante, chegando mesmo

    a existir alguns autores que a apontam como, talvez o melhor preditor da gravidez na

  • adolescncia (cit in Canavarro & Pereira, 2001). A pobreza no propicia um ambiente

    familiar de harmonia e recursos suficientes que permitam cuidados parentais adequados.

    Pelo contrrio, fomenta um ambiente comunitrio e mais desfavorecido (Canavarro &

    Pereira, 2001). Experincias de vida associadas com a pobreza, a alienao da escola,

    modelos de parentalidade fora do casamento, desemprego, falta de oportunidades

    educativas e ausncia de perspectiva de carreiras estveis (Coley e Chase-Lansdale,

    1998, cit in Canavarro & Pereira, 2001), so aspectos que contribuem para percepcionar

    os custos de uma gravidez precoce como baixos.

    Os factores sociais e culturais so fulcrais na forma como a gravidez na

    adolescncia vivenciada. Muitos destes factores restringem a liberdade pessoal e

    social das jovens e a sua capacidade de escolha e construo em relao ao seu projecto

    de vida, atendendo a que muitas destas jovens no planeavam nem desejavam ser mes

    to cedo. A questo escolar um bom exemplo destas restries na medida em que ao

    no atingirem os resultados pretendidos, iniciam precocemente actividade laboral, numa

    situao bastante precria (Almeida, 1987).

    Estudos mais recentes verificam que iguais circunstncias desfavorveis so

    facilmente constatveis junto dos pais dos bebs das mes adolescentes (Ekeus e

    Christensson, 2003; Pirog-Good, 1995 cit in Figueiredo et al., 2006).

    Ambiente familiar caracterizado por stress, presso e conflito (Ravert e Martin,

    1997, cit in Canavarro & Pereira, 2001), maior disfuncionalidade e rigidez (Garrett e

    Tdwell, 1999; Loureno, 1996, cit in Canavarro & Pereira, 2001), abuso fsico, sexual e

    emocional e baixa qualidade da relao entre pais e filhas, podem ser factores de risco

    de uma gravidez precoce (Canavarro & Pereira, 2001). Verifica-se que o risco de uma

    gravidez na adolescncia aumenta exponencialmente medida que aumenta o nmero

    de condies adversas durante a infncia, as quais tm um efeito cumulativo e so, na

    opinio de alguns autores, as principais circunstncias de risco para a gestao na

    adolescncia (Hillis, Anda, Felitti, Marchbanks e Marks, 2004, in Figueiredo et al.,

    2006).

    Importa ainda mencionar o factor da transgeracionalidade do fenmeno da

    gravidez na adolescncia, atendendo a que estudos comprovam que filhas de mes

    adolescentes com histrias de gravidez na adolescncia (Manlove, 1998, in Canavarro

    & Pereira, 2001; Card, 1981; Furntenberg, Levine & Brooks-Gunn, 1990) e irms de

    mes adolescentes (Records, 1993, in Canavarro & Pereira, 2001) tm maior

    probabilidade de serem tambm elas, mes adolescentes. Numa perspectiva social

  • poder-se-ia explicar a gravidez na adolescncia enquanto assumpo, no consciente, de

    um novo papel na famlia/comunidade, isto , tal como anteriormente referido, um papel

    idntico ao das suas mes, irms e vizinhas, repetindo o ciclo de excluso e

    evidenciando comportamentos imediatistas, de no planeamento, que conduzem

    manuteno dos ciclos de excluso pela no aquisio de competncias de auto-

    determinao e de construo de projectos de vida.

    Em termos de acompanhamento mdico, no mbito das consultas de pr-natal,

    tambm frequente verificar-se que em muitos casos as gravidezes no so vigiadas o

    que por si s acarreta srias consequncias tanto para as futuras mes como para os

    bebs. Consequentemente as grvidas adolescentes apresentam maior predisposio

    para partos antes de fim de tempo, com o nascimento de bebs com pesos baixos, e

    muitas vezes com graves problemas de sade associados (Chandra, Schivello, Ravi,

    Weinstein & Hook, 2002).

    Devido ao desenvolvimento fsico, especfico da adolescente e grande

    probabilidade de existncia de problemas orgnicos durante a gestao, no parto e no

    ps-parto, a OMS qualificou de alto risco as gravidezes em adolescentes. Este problema

    assenta essencialmente na deficiente maturidade biolgica das adolescentes, menores de

    15 ou 16 anos, cujos bebs tm maior probabilidade de nascer prematuros, com baixo

    peso para a sua idade gestacional, com maior mortalidade nos dias a seguir ao parto e no

    primeiro ano de vida. Alguns autores referem ainda que estas crianas podem estar mais

    susceptveis a sofrerem de problemas neurolgicos, epilepsia, paralisia cerebral, surdez

    e cegueira.

    Nas adolescentes mais velhas, os aspectos psicolgicos e sociais apresentam

    maior relevncia, associados a todas as questes inerentes s mudanas que da adviro.

    Devido a todas as condicionantes acima referidas, Callau (1985) caracteriza a gravidez

    na adolescncia como de alto risco, pelas suas dificuldades obstetrcias, psicolgicas e

    sociais.

    Conseguir equilibrar a gravidez/maternidade com o prprio desenvolvimento,

    exige maturidade e um grande apoio familiar e social. A maternidade condicionada

    pelas caractersticas do filho, pelo tipo de recursos e suportes sociais existentes e pelas

    caractersticas psicolgicas (Sampaio, 1998). So estes suportes existentes que vo

    influenciar o futuro sustentado da jovem, do seu filho e do pai, da a sua elevada

    importncia e necessidade de existncia.

  • Face a este problema social transversal a todas as sociedades, importa tentar

    aferir algumas respostas para o facto de na poca dos anticoncepcionais existirem ainda

    tantas adolescentes a engravidar? Muitos autores apontam que a habilidade ou a falta

    dela, das adolescentes usarem os meios anticoncepcionais de forma adequada est

    intimamente relacionada com a satisfao das necessidades psicolgicas.

    Do ponto de vista psicolgico, a gravidez e o feto podem representar uma

    tentativa de superar um dfice narcsico e o preenchimento de um vazio dele resultante.

    A necessidade imperativa que se traduz no desejo de um beb, resulta de desejos

    psicolgicos insatisfeitos. A gravidez, neste contexto, denota imaturidade psquica,

    uma forma de auto satisfao quando outras possveis compensaes no funcionam,

    como por exemplo, o sucesso escolar.

    Isabel Leal (1990) chama a ateno para o facto de a gravidez na adolescncia

    poder ser uma forma de confirmao da feminilidade da adolescente, mas no

    corresponder a nenhum projecto de ser me. Por isso importante ter em conta que

    gravidez e maternidade so noes completamente distintas e que por si s com

    diferentes sentimentos e sensaes associados. A gravidez refere-se ao perodo, de

    mais ou menos 40 semanas, que medeia entre a concepo e o parto. Nesta fase, toda a

    espectacularidade vai para as alteraes fsicas. Estas acarretam, obviamente, vivncias

    psicolgicas particulares. Entretanto, as repercusses sociais deste acontecimento so,

    nas gravidezes desejadas, reduzidas. Tudo se passa dentro da prpria mulher (Leal,

    1990). A maternidade assume-se como sendo um projecto de longo prazo (no mnimo

    18 anos), envolvendo a suficiente prestao de cuidados e ddiva de amor que

    possibilitem um desenvolvimento sadio e harmonioso, criana recm-nascida. Como

    projecto de longo prazo que , distancia-se em quase tudo do nascimento biolgico que

    a gravidez. Requer que, mais do que se deseje ter um filho, se deseje ser me. Ora, o

    desejo de ter um filho e o desejo de ser me, no so desejos sempre coincidentes (Leal,

    1990).

    Aspectos de origem inconsciente tambm devero ser considerados na

    compreenso da gravidez na adolescncia, sendo que as jovens podem utilizar a

    gravidez como forma de auto-afirmao, preenchimento de carncias afectivas,

    conseguir a ateno dos pais para a desestruturao da famlia entre muitos outros

    motivos (Guimares, 2001). Tratando-se a adolescncia de uma fase desorganizao

    psquica, a adolescente no possui ainda a capacidade de organizar os seus conflitos e

    aspectos primitivos que emergem e ao lidarem com estes impulsos agressivos e sexuais,

  • ao invs de elabor-los internamente, eles, muitas vezes descarregam-se numa aco

    para satisfazerem os seus desejos mais imediatos.

    Borges (sd, cit in Melo, 2001) verificou, ao longo de uma pesquisa que

    desenvolveu, que muitas adolescentes engravidam porque alimentam um sonho de

    serem reconhecidas como mulheres, porque acreditam que isso que o namorado quer,

    revelando que a socializao e valorizao da menina passa pela maternidade futura,

    pois o papel de me grandemente valorizado e desejado na sociedade. Como tal, a

    gravidez pode permitir adolescente a possibilidade de estruturar a sua vida a partir de

    uma perspectiva nova, ainda que no planeada.

    Os avanos na medicina tm permitido ao longo dos tempos, mudanas ao nvel

    das respostas disponveis no mbito das gravidezes no planeadas. Exemplo disso foi a

    introduo da plula do dia seguinte no mercado portugus, ao abrigo da Lei n 12/2001,

    de 29 de Maio o que veio permitir uma interveno imediata aquando suspeita de

    possibilidade uma gravidez no planeada. No entanto, j anteriormente, em 1998

    aquando realizao do referendo acerca da legalizao do aborto at s 10 semanas de

    gestao (Concorda com a despenalizao da interrupo voluntria da gravidez, se

    realizada, por opo da mulher, nas 10 primeiras semanas, em estabelecimento de sade

    legalmente autorizado?), tentava-se dar passos no sentido de procurar respostas mais

    adequadas, do que as praticadas muitas vezes em condies desumanas e com serias

    implicaes na sade e bem-estar das mulheres. Importa relembrar que nesse primeiro

    referendo sobre o aborto, os resultados ficaram-se pelos 50,9% de respostas para o no

    (i.e. no concordando com a despenalizao) contra 49,1% de respostas positivas. Em

    Maro de 2004 foram discutidos na Assembleia da Repblica projectos de resoluo

    com vista realizao de novo referendo nacional, todos eles rejeitados. Na mesma

    ocasio foram igualmente rejeitados projectos de lei sobre a despenalizao da IVG,

    tendo sido aprovada a Resoluo n 28/2004 referente a medidas de preveno no

    mbito da IVG, centradas antes na educao, apoio maternidade e planeamento

    familiar (Provedoria da Justia, 2004).

    Atendendo especificidade do assunto em questo e tambm ao facto de os

    resultados do primeiro referendo terem deixado bem claro que a vitria do no em

    nada se revelou inequvoca, aps nova auscultao em 2007, foi aprovada a Lei n

    16/2007 de 17 de Abril que regulamente a excluso de ilicitude nos casos de interrupo

    voluntria da gravidez. Para alm dos casos em que j estava prevista a possibilidade de

    interrupo da gravidez, esta lei veio possibilitar que a IVG fosse realizada, por opo

  • da mulher, nas primeiras 10 semanas de gravidez (corpo da Lei n 16/2007, de 17 de

    Abril), em estabelecimento autorizado para o efeito.

    Ora, atendendo a esta alterao legislativa, torna-se interessante aferir de que

    forma poder ter infligido repercusses ao nvel do nmero de nascimentos de bebs de

    mes adolescentes. A partir de Abril de 2007, ficou acessvel a qualquer

    adolescente/mulher a possibilidade de interromper a gravidez at s 10 semanas de

    gestao, ou seja, em teoria, j no deveriam existir bebs a nascer que no apenas os

    desejados. No entanto, bem sabemos que tal no se verifica desta forma to taxativa e

    da considerarmos pertinente aferir se de facto, a alterao da lei produziu ou no efeitos

    no nmero de nascimentos de filhos de mes adolescentes e em que moldes estas

    consubstanciam as suas opes.

    De acordo com dados da Direco Geral de Sade (DGS) o nmero de

    interrupes voluntrias da gravidez, legalmente efectuadas em hospitais durante o ano

    2007 foi de 6107, contrariando uma tendncia de valores consideravelmente inferiores

    (ver quadro na pgina seguinte). Os valores aumentam exponencialmente quando

    apresentados os dados referentes ao ano 2008, em que as interrupes voluntrias da

    gravidez atingiram as 18.014. No ano 2009 registou-se um aumento de cerca de 937

    intervenes, resultando num total de 18951. O aumento das interrupes voluntrias da

    gravidez tem que ser analisado com cuidado e inserido no contexto das alteraes

    legislativas, em particular de 2006 para 2007.

    No que concerne aos dados especficos das interrupes voluntrias da gravidez

    no concelho de Cascais, foi possvel aferir atravs de informao disponibilizada pela

    DGS que apenas existem dados para as IVG concretizadas no ano 2007, no Centro

    Hospital de Cascais, e que correspondeu a um total de 34. Para os anos de 2008 e 2009

    no existe informao disponvel atendendo a que por motivos deontolgicos, o corpo

    mdico do Centro Hospital de Cascais declarou-se objector de conscincia, no

    efectuando IVG. Face a esta situao as mulheres so encaminhadas para outras

    unidades de sade pblicas e privadas devidamente certificadas para o efeito, tornando

    inquantificvel o nmero de IVG realizadas a mulheres residentes em Cascais.

    Relativamente faixa etria, e no ano 2007, a IVG em jovens com idades

    inferiores a 20 anos representou um total de 662. Para o ano de 2008 registou-se um

    valor total de 2.182 interrupes voluntrias da gravidez; e finalmente, no ano transacto,

    2.357 jovens com idade inferior a 20 anos recorreram aos servios especializados a fim

    de proceder IVG. A ttulo meramente informativo, importa referir que, durante os anos

  • 2007 a 2009, 250 jovens com idades inferiores a 15 anos recorreram aos servios de

    sade a fim de efectuarem a IVG.

    Quadro 1. Interrupes Voluntrias da Gravidez entre os anos 2007 e 2009

    Fonte: Direco Geral de Sade, Ministrio da Sade

    Relatrios dos registos das interrupes da gravidez ao abrigo da Lei 16/2007 de 17 de Abril

    Ano 2007 2008 2009

    Classe etria N IVG N IVG N IVG

    < 15 27 97 126

    15 19 625 2085 2231

    20 -24 1307 3876 4145

    25 29 1345 4071 4228

    30 34 1365 3882 3990

    35 - 39 942 2709 2896

    >= 40 477 1290 1332

    Desconhecida 19 4 3

    Total 6107 18014 18951

  • Panorama internacional e nacional do fenmeno da gravidez na adolescncia e

    interrupo voluntria da gravidez

    consensual que o fenmeno da gravidez na adolescncia continua a constituir na

    actualidade, e de forma intensa, um problema para as sociedades ocidentais

    industrializadas. Nos pases ocidentais, as taxas de prevalncia da gravidez e

    maternidade na adolescncia so motivo de preocupao poltico-social. Os E.U.A

    apresentam a mais elevada taxa de gravidez e maternidade na adolescncia (Soares et al,

    sd).

    A gravidez na adolescncia um dos problemas realados no relatrio sobre o

    estado de sade dos jovens da Unio Europeia, uma vez que implica um aumento do

    risco para o mau funcionamento social, econmico e de sade da me e do beb.

    De acordo com os dados estatsticos mais recentes do Eurostat, que remontam a

    informao relativa ao ano de 2006, a incidncia da gravidez na adolescncia tem vindo

    a diminuir progressivamente. Contudo importante salientar que pases como a Frana

    e a Romnia, ambos Estados Membro da Unio Europeia, apresentavam em 2006

    valores da incidncia da gravidez em jovens at aos 19 anos, na ordem dos 23 mil

    nascimentos, o que por si s revelador de que ainda h um longo caminho a percorrer

    nesta rea.

    Em Portugal, desde o ano de 1997 a 2006, verificou-se um acentuado

    decrscimo do nmero de nados vivos de mes com idades inferiores a 20 anos,

    apontando os ltimos dados disponveis para um valor de 4410 nascimentos.

    Quadro 2. N de nascimentos de crianas de mes com idade inferior a 20 anos em pases da Unio Europeia

    Pas 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

    ustria 3033 2935 2985 2951 2956 2932 2787 2912 2723 2577

    Alemanha -- -- -- -- -- -- -- -- -- 2582

    Dinamarca 1544 1438 1333 1277 1219 795 768 732 763 --

    Finlndia 1293 1339 1424 1502 1567 1602 1477 1509 1468 1359

    Frana -- 19061 20624 22442 23302 22101 21521 21959 21808 21688

    Itlia 7948 -- -- -- -- -- -- -- -- --

    Reino Unido 4442 4477 4545 4007 3978 4003 -- 3507 3123 2724

    Sucia -- 1478 1518 1605 1526 1576 1462 1470 1536 1617

    Portugal 6933 6666 6668 6823 6101 6069 5535 5191 4965 4410

    Fonte: http://appsso.eurostat.ec.europa.eu/

  • Ao nvel da evoluo do nmero de IGV em alguns pases da Unio Europeia,

    verifica-se atravs dos dados disponveis, que o mesmo no teve tendncia para

    aumentar a longo prazo. Foi na dcada de 50 que se iniciou o processo de introduo da

    legislao destinada a permitir a interrupo da gravidez em condies seguras,

    procurando dar resposta evidente percepo de que o aborto em condies

    inapropriadas constitua um elevado risco para a sade das mulheres, provocando em

    muitas situaes a sua morte.

    Quadro 3. Evoluo do n de IVG em pases da Unio Europeia

    Pas Ano de

    despenalizao

    Idade Fetal 10 anos depois ltima

    avaliao

    Tendncia

  • III - Metodologia

    3.1 Objecto de estudo

    Com a presente dissertao, pretende-se abordar a problemtica da gravidez na

    adolescncia, analisada luz das recentes alteraes legislativas que conferem mulher

    a possibilidade de at s 10 semanas de gestao, proceder interrupo voluntria da

    gravidez (Lei n16/2007, de 17 de Abril). Pretende perceber-se o que impele estas

    jovens a prosseguir com a gravidez, quando existe actualmente uma medida legal qual

    poderiam recorrer para terem esses bebes.

    Face ao objectivo delineado, delimitou-se o objecto de estudo a jovens com

    idades compreendidas entre os 12 e os 19 anos, residentes em fogos municipais sitos

    nos diferentes bairros camarrios do concelho de Cascais e geridos pela Emgha

    Empresa de Gesto da Habitao Social de Cascais, SA., grvidas ou com filhos

    nascidos a partir de Novembro de 2007.

    Embora tenham sido interpeladas 21 jovens a fim de se constituram como

    amostra para o estudo, apenas foi possvel aplicar o guio da entrevista semi-estruturada

    a 17, umas vez que, no obstante as inmeras diligncias efectuadas, 4 das jovens

    faltaram sistematicamente aos momentos agendados.

    3.2 Hipteses de Estudo

    A problemtica da gravidez na adolescncia, embora actualmente com contornos menos

    acentuados, continua a apresentar-se como uma questo social que merece de todos ns,

    toda a ateno e cuidado, na medida em a sua existncia acarreta consequncias para

    todos os actores sociais.

    Com a alterao da legislao, essas jovens que engravidam tm agora hiptese

    de no prosseguir com a gravidez, interrompendo-a em equipamento legal e

    devidamente certificado para o efeito, desde que a mesma seja detectada at s 10

    semanas. Porm, ainda so muitas as histrias de vida com desfechos diferentes, e

    porqu?

    Alguns anos de experincia no terreno e aps contacto com realidades em que a

    gravidez na adolescncia atinge propores acentuadas, apraz-nos apresentar as

    seguintes hipteses:

  • a) As jovens optam por prosseguir com a gravidez, apenas porque sim!

    Confrontadas com a notcia e, num rasgo de inconscincia decidem que est na

    altura de serem mes.

    b) A gravidez encarada como uma substituio / compensao emocional. As

    jovens canalizam para este bebe sentimentos de dependncia e de proteco, que

    as faz sentir insubstituveis. De repente surge algum nas suas vidas que

    dependente inteiramente delas e que, por outro lado, ir am-las

    incondicionalmente.

    c) A gravidez entendida como um meio para constiturem a sua prpria famlia.

    Ainda nos tempos de hoje, jovens consideram vivel alterar o percurso natural

    da vida e iniciar uma vida conjugal, que deveria comear por dois elementos,

    com trs elementos. A opo da manuteno da gravidez apresenta-se como uma

    fuga famlia de origem e consequente inicio de uma relao conjugal, nem

    sempre cimentada em valores partilhados.

    3.3 Dimenses de Anlise

    Com vista a obter informao abrangente acerca das vivncias das entrevistas, quer

    antes da gravidez, quer depois da experincia da maternidade, foram colocadas questes

    relativas s seguintes reas:

    1. Contextos familiares de origem

    2. Percursos escolares e profissionais

    3. Conhecimentos e atitudes sobre sexualidade e gravidez

    4. Informaes sobre a nova lei

    5. Motivaes para a gravidez

    6. Situao familiar presente

    7. Trajectos passados e futuros

    A informao obtida em cada uma das dimenses apresentadas permitiu traar um

    perfil individual das vivncias de cada uma das entrevistas, com especial relevncia

    para as implicaes nas suas vidas do nascimento de um filho.

  • 3.4 Mtodos e Tcnicas

    A opo metodolgica com recurso ao mtodo qualitativo, com anlise documental ao

    nvel da recolha da documentao e de dados estatsticos.

    A estratgia de recolha de informao passou inicialmente por uma recolha

    bibliogrfica acerca da temtica. O papel da teoria tornar visvel o invisvel, definir

    padres e conferir significados aos tipos de observaes que normalmente so

    efectuados pelos investigadores sociais quando estudam as sociedades e as culturas

    (Moreira, 1994).

    No que diz respeito aos mtodos de recolha de dados, consideramos que face ao

    objecto de estudo, a opo que maior enriquecimento iria acrescentar seria o recurso

    aplicao de entrevistas semi-estruturadas s jovens.

    Aps a aplicao do guio da entrevista procedeu-se a uma anlise detalhada e

    individual de cada uma das 17 entrevistas, e posterior esquematizao dos aspectos mais

    relevantes a fim de facilitar a anlise global da informao.

    Atravs da entrevista semi-estruturada aplicada s 17 jovens foi possvel aferir

    as diferentes percepes que apresentam sobre a gravidez na adolescncia, as reais

    motivaes para a prossecuo da mesma e implicaes das suas escolhas.

  • IV - Anlise Emprica

    4.1 Caracterizao das Entrevistadas

    Actualmente as 17 entrevistas distribuem-se pelas faixas etrias das menores de 15 anos,

    dos 15 aos 19 anos e dos 20 aos 24 anos. Porm importante frisar que as idades

    apresentadas reportam actualidade, e no idade da concepo, uma vez que apenas

    foram consideradas jovens que tenham sido mes ou que se encontrem grvidas, com

    idade no superior a 19 anos. De facto, data da concepo os intervalos de idades a ter

    em considerao para efeitos da anlise, situam-se entre as jovens menores de 15 e entre

    os 15 e 19 anos. Importa reforar que apenas foram entrevistas jovens grvidas ou com

    filhos com idades at aos 3 anos, uma vez que a nova lei apenas entrou em vigor em

    Abril de 2007.

    No que concerne nacionalidade, constata-se que das 17 entrevistadas, 10 so

    de nacionalidade portuguesa. As restantes nacionalidades aqui representadas

    correspondem s segundas e terceiras geraes residentes em Portugal, que de alguma

    forma esto afastadas das suas razes culturais, contudo ainda no aculturadas. Face a

    esta situao difcil tecer qualquer tipo de inferncia relativamente posio das

    diferentes culturas relativamente gravidez e maternidade precoce.

    Relativamente ao estado civil, as 17 jovens apresentavam uma situao de

    solteiras, mantendo uma relao de namoro com os pais dos seus filhos, porm data da

    experincia da gravidez 2 delas viviam em situao de unio de facto. Actualmente

    apenas 6 das jovens mantm uma relao de namoro com os pais dos filhos e 1 mantm

    a unio de facto.

    A populao entrevistada reside em bairros municipais do concelho de Cascais e

    cuja gesto do patrimnio encontra-se atribuda EMGHA.

  • N Nome

    Fictcio

    Data de

    nascimento Nacionalidade Escolaridade

    Idade na

    gravidez

    Idade

    actual

    N de

    filhos

    Idade da

    me na 1

    gravidez

    Agregado Familiar

    quando engravidou

    Agregado Familiar

    actual

    Situao face ao

    emprego

    Fonte de

    rendimentos

    1 Isabel 27-09-1993 Angolana 7 ano 14 16 1 N/ sabe Sogros, namorado e

    cunhado Sozinha com o filho Desempregada RSI

    2 Carina 12-01-1990 Cabo Verdeana 6 ano 19 20 1 17 Me e 2 irms Me, 2 irms e filha Desempregada Famlia

    3 Diana 16-07-1989 Guineense 11 ano 18 21 2 18 Pais e 5 irmos Pais, 5 irmos, 2

    filhas e namorado Empregada Salrio

    4 Susana 19-07-1992 Portuguesa 9 ano 17 18 1 21 Me, pai e irm Me, irm e filha Desempregada RSI

    5 Carolina 30-07-1990 Portuguesa 9 ano 19 20 1 20 Mo, pai e 3 irmos Mo, pai,3 irmos e

    filha Desempregada Famlia

    6 Sara 14-09-1990 Portuguesa 7 ano 18 19 1 19 Sogro e namorado Sogro, namorado e

    filho Desempregada RSI

    7 Patrcia 26-09-1991 Portuguesa 9 ano 15 18 2 17

    Pai, me, irmo,

    cunhada, sobrinho e

    filha

    Pai, me, irmo,

    cunhada, sobrinho e

    2 filhas

    Desempregada RSI

    8 Elsa 31-10-1989 Cabo Verdeana 6 ano 18 20 1 N/ sabe Me e 2 irmos Me, 2 irmos e filho Empregada Salrio

    9 Marta 09-10-1995 So Tomense 8 ano 13 14 1 16 Me e irmo Me, irmo e filho No se aplica Famlia

    10 Tatiana 21-12-1990 Portuguesa 6 ano 18 20 2 18 Me, padrasto e

    irmo

    Me, padrasto, irmo

    e 2 filhos Empregada Salrio

    11 Cludia 30-04-1990 Portuguesa 12 ano 19 20 1 24 Me e 3 irmos Me, 2 irmos e filha Desempregada Famlia

    Quadro 4 - Caracterizao Social das Entrevistadas

  • 12 Marisa 15-11-1987 Portuguesa 9 ano 19 22 1 18 Me, irmo, 2 irms

    e sobrinha

    Me, irms, sobrinha

    e filha Empregada Salrio

    13 Maria 07-06-1990 Cabo Verdeana 12 ano 19 20 1 16 Me e 2 irmos Me, 2 irmos e filha Desempregada Famlia

    14 Cristina 14-03-1990 Portuguesa 5 ano 17 20 1 18 Me, av, irm e

    irmo

    Av, irmo, irm,

    sobrinho e filho

    Empregada (no

    declarada) RSI e salrio

    15 Ana 21-11-1991 Portuguesa 5 ano 18 18 1 18 Me, av, irm e

    irmo

    Av, irmo, irm,

    sobrinho e filho Desempregada RSI

    16 Neuza 10-10-1987 Guineense 10 ano 19 21 1 18 Me, irmo Me, irmo e filha Empregada (no

    declarada) RSI e salrio

    17 Mafalda 12-06-1990 Portuguesa 6 ano 18 20 1 29 Irm, cunhado, 3

    sobrinhos e pai

    Irm, cunhado, 3

    sobrinhos e filha Desempregada RSI

  • 4.2 As nossas origens

    A opo pela anlise do fenmeno da gravidez nos bairros de habitao social do

    municpio de Cascais, geridos pela Empresa de Gesto de Habitao Social, adiante

    designada EMGHA, permitiu de certa forma, traar um padro de experincias que

    norteiam as vidas das 17 jovens entrevistadas.

    Todas provm de contextos familiares carenciados e que de certa maneira,

    condicionam a sua viso sobre os percursos de vida que pretendem delinear para si

    prprias. Relativamente s nacionalidades identificadas, 10 das entrevistadas so de

    nacionalidade portuguesa, enquanto as restantes 7 remetem para nacionalidades de

    pases africanos, como Angola, Guin, So Tom e Prncipe ou Cabo Verde. Importa

    contudo referir, que embora ainda com nacionalidade estrangeira, todas as jovens

    nasceram em territrio portugus, porm atendendo a que aquando do seu nascimento

    os pais mantinham a nacionalidade estrangeira, as crianas foram igualmente registadas

    com as nacionalidades de origem dos pais.

    A corroborar o que descreve a literatura, das 17 entrevistas, 9 encontrava-se

    inseridas em contexto de famlias monoparentais, cabendo ao pai o papel da figura

    ausente. Curiosamente algumas das jovens reforaram que os seus percursos de vida e

    as escolhas que tomaram podero ter sido condicionadas pela ausncia da figura

    masculina de referncia. Uma das jovens afirmou que face inexistncia da figura

    paterna, os 2 irmos mais velhos assumiram o papel parental e com alguma emoo

    abordou a forma como transmitiu famlia a notcia da gravidez. Eles ficaram tristes

    porque sou a caula (a mais nova) e a nica que tinha seguido para a faculdade; entrei

    em enfermagem! Por causa da gravidez, desisti ou melhor, acho que adiei esse sonho

    Sentiram-se trados (Maria, me aos 19 anos).

    No momento da concepo, a grande maioria destas jovens (15) namorava e 2

    encontravam-se em situao de unio de facto. Em qualquer umas das duas ltimas

    situaes, o fundamento para a mudana teve por base dificuldades de relacionamento

    com as suas famlias de origem. Aps o nascimento dos bebes, e em relao s situaes

    de unio de facto, verificou-se uma alterao a este quadro, na medida em que uma das

    jovens regressou a casa da famlia de origem. Curiosamente apenas 6 das jovens

    mantm a relao de namoro com o pai dos seus filhos.

    Extrapolando para a idade em que as mes das jovens tiveram o 1 filho,

    verifica-se uma replicao de comportamentos e atitudes, amplamente retratados na

    literatura, onde vrios estudos comprovam que filhas de mes adolescentes com

  • histrias de gravidez na adolescncia, e irms adolescentes, apresentam maior

    probabilidade de serem elas prprias mes adolescentes. Verifica-se um perpetuar de

    aces, directamente relacionadas com os seus modelos de referncia. 8 das entrevistas

    foram mes numa idade ainda mais precoce do que as suas prprias mes. O desalento

    das mes das jovens, foi com regularidade verbalizado pelas filhas no decurso das

    entrevistas: a minha me no queria isto para mim Ela dizia-me sempre para

    estudar e organizar a minha vida, antes de ser me, porque sofreu muito quando teve o

    meu irmo aos 16 anos (Marta, me aos 13 anos).

    Identificar situaes de gravidez na adolescncia na rede familiar ou de amigos

    traduziu-se numa tarefa de demasiada facilidade de execuo, na medida em que todas

    as jovens apontaram algum conhecido com percurso de vida semelhante.

    Curiosamente, os pensamentos oscilaram entre o no querer ser me to nova, como

    que vo sustentar esse beb e o to bom! Um beb para a famlia!. Houve ainda

    jovens que referiram no ter emanado ou sentido qualquer opinio em relao notcia

    da gravidez.

    A transversalidade do sentimento foi unnime: fizemos o que as mulheres das

    nossas famlias fizeram, mas sabemos que sofreram e que no queriam isto para ns.

    Em suma, as 17 entrevistadas so todas provenientes de famlias residentes em

    bairros municipais do concelho de Cascais e cuja gesto do patrimnio encontra-se sob

    a gesto da Emgha. Os bairros onde residem podem ser caracterizados como bairros

    onde predomina a multiculturalidade atendendo a que o realojamento promove a

    integrao de vrias comunidades num mesmo bairro. Partilham experincias entre si,

    contudo no podemos afirmar que exista uma influncia predominante de uma cultura

    sob a outra. Talvez seja mais adequado afirmar que, a questo gravidez na adolescncia

    ultrapassa culturas e sim, transversal a estas jovens que em comum partilham uma

    histria familiar desestruturada, demasiado tempo desocupado e, a grande maioria, falta

    de empenho e motivao para a escola.

  • 4.3 Breves experincias na escola e no mundo do trabalho

    Existe uma estreita correlao entre gravidez na adolescncia e abandono ou absentismo

    escolar. Das 17 entrevistas apenas 8 frequentavam equipamento de ensino aquando da

    gravidez. importante frisar que destas, 5 apresentaram pelo menos duas retenes ao

    longo do seu percurso escolar, o que por si s revelador do pouco investimento

    atribudo educao formal. A desvalorizao da instituio escola e a replicao de

    comportamentos fica espelhada nos valores identificados em relao aos nveis de

    escolaridade. Das 17 entrevistadas, 2 atingiram o 1 ciclo; 7 completaram o 2 ciclo; 6

    concluram o 3 ciclo e apenas 2 finalizaram o ensino secundrio.

    A expresso desempregadas talvez no retrate de forma mais fidedigna a situao

    de das entrevistas, atendendo a que algumas das jovens ainda no tinham atingido a

    maioridade, nem tinham o nvel de escolaridade mnimo (9 ano) para serem integradas

    no mercado de trabalho. De qualquer forma, 6 das entrevistadas quando engravidaram

    no exerciam actividade profissional e j haviam deixado a frequncia escolar h muito

    tempo, situao esta consubstanciada nos baixos nveis de escolaridade identificados.

    As restantes 3 entrevistadas encontravam-se integradas no mercado de trabalho. De

    referir que uma delas, data da gravidez, encontrava-se em situao laboral estvel,

    pertencendo aos quadros da superfcie comercial, onde ainda hoje exerce actividade

    profissional como caixeira pelo menos quando engravidei j tinha o meu trabalho. No

    sou como aquelas midas que engravidam e ficam a depender dos outros ou do

    rendimento (RSI Rendimento Social de Insero) (Marisa, me aos 19 anos).

    A desvalorizao da aprendizagem formal uma constante no discurso da

    grande maioria destas jovens. Eu no era boa aluna, alis tinha sempre ms notas e as

    professoras j nem queriam saber de mim. Para isso mais valia ficar no recreio com o

    resto da malta (Cristina, me aos 17 anos).

    Importa frisar que de acordo com os relatos das entrevistadas, fora raras

    excepes, no existiu tambm investimento por parte dos seus familiares em que

    frequentassem a escola. No havia envolvimento, nem conhecimento do que era o dia-a-

    dia destas jovens na escola, s vezes havia reunies l na escola, aquelas reunies com

    a directora de turma e os pais, mas a minha me nunca ia. Alis no me lembro da

    minha ter ido pelo menos uma vez. Dizia sempre que j sabia que s ia ouvir as minhas

    asneiras e que para isso tinha mais que fazer (Sara, me aos 18 anos). Sem reforo em

    casa, e sem grande motivao pessoal, no pois de estranhar que grande parte destas

    jovens desvalorizasse a escola.

  • Referem com frequncia que o que importa ter dinheiro para cuidar dos filhos,

    contudo o meio de obteno do mesmo no ter necessariamente de passar por concluir

    pelo menos a escolaridade mnima obrigatria, nem pelo exerccio de uma actividade

    laboral.

    4.4 A nossa sabedoria

    A primeira vez, um momento to importante para umas jovens, para outras, apenas

    mais uma experincia que em nada tem a ver com amor, maturidade e acima de tudo

    respeito por si prpria. A insensibilidade, o desprendimento de umas, a contrastar com a

    inocncia de outras Eu nunca pensei que podia engravidar na minha primeira vez

    (Marta, me aos 13 anos).

    Da amostra tida em considerao para o estudo, 6 admitiram ter iniciado a

    actividade sexual com idade igual ou inferior a 15 anos, tendo apontado como

    motivao a vontade do namorado e o facto das amigas j terem experimentado. A

    urgncia em agradar o outro e a necessidade de pertena e de aceitao num grupo,

    compulsam-nas a tomar decises e a optar por caminhos que, na generalidade, so

    bastante sinuosos!

    As escolhas dos parceiros sexuais so por vezes to aleatrias, como quando

    escolhem o local para se divertirem por uma noite. Encontros fugazes que por vezes

    redireccionam vidas e as transformam, sem que para tal tenha existido algum aviso

    prvio. Abordadas sobre a forma como conheceram os pais dos seus filhos, 4 das 17

    jovens referiram que nem os conheceu na verdadeira acepo da palavra. A gravidez

    resultou de trs ou quatro encontros, sem que tivesse havido tempo e at mesmo

    vontade de saberem algo mais intimo um do outro, do que os nomes e nmeros de

    telemvel. Uma vez sai com as minhas amigas. Fomos a um bar e estavam l vrios

    rapazes que se comearam a meter connosco e ns demos conversa. Aconteceu tudo to

    depressa e s o vi mais duas vezes. Quando soube que estava grvida fui ao mesmo bar

    vrios dias seguidos, mas ele nunca mais apareceu e o nmero de telemvel que eu tinha

    nunca mais esteve disponvel (Susana, me aos 17 anos).

    As conversas sobre sexualidade ocorrem com maior vontade e regularidade,

    pelas declaraes prestadas, no seio do grupo de pares, contrariando esteretipos

    associados ao facto da diferena de idades entre mes e filhas ser potenciador de

  • conversas mais abertas entre elas. Porm, e tratando-se as amigas as conselheiras de

    eleio, 5 das entrevistas referiu no abordar esta temtica com ningum.

    Embora as questes da sexualidade estejam h muito includas nos programas

    educativos, nem sempre a informao transmitida assimilada na sua plenitude, da que

    algumas das jovens no tenham atribudo grande relevncia a esta eventual fonte de

    informao escola.

    Contrariamente ao esperado e tendo em conta o investimento existente na rea

    da divulgao de questes relacionadas com a sade reprodutiva, em particular com a

    sexualidade, comportamentos de risco e preveno, 8 das 17 entrevistas afirmou nunca

    ter recorrido a consultas de planeamento familiar. Na verdade, 3 referiram total

    desconhecimento da existncia destes servios especializados.

    A boa prtica de recurso a um mtodo contraceptivo, cingido plula ou ao

    preservativo, no ocupa lugar de destaque quando pensam no acto sexual em si.

    Inclusivamente consideram a preveno de uma gravidez no desejada, a mais-valia do

    uso de qualquer um dos mtodos contraceptivos existente no mercado, desvalorizando

    quase na totalidade a imperiosa preveno contra doenas sexualmente transmissveis

    (DSTs). O mtodo contraceptivo hormonal - plula foi apontado por 8 das jovens

    como o mais frequentemente utilizado, contudo todas, sem excepo, tambm

    afirmaram que com bastante regularidade negligenciam a sua administrao,

    potenciando acentuadamente a sua taxa de ineficcia.

    Os encontros e desencontros fugazes, o desconhecimento do funcionamento do

    seu corpo, o desconhecimento da existncia de servios especializados na rea da

    sexualidade e a m administrao de mtodos contraceptivos so factores cruciais

    apontados por estas jovens que as suas vidas se pautem por trilhos sinuosos.

  • 4.5 Informadas, contudo fora de tempo

    A alterao legislativa impressa pela entrada em vigor da Lei n 16/2007, de 17 de Abril,

    que determinou a Excluso de Ilicitude nos Casos de Interrupo Voluntria da

    Gravidez, veio permitir mulher uma escolha: querer ou no prosseguir com uma

    gravidez, desde que identificada at s 10 semanas de gestao. Se anteriormente apenas

    as situaes salvaguardadas no artigo 1 da Lei n 6/84 de 11 de Maio, onde se procedeu

    a uma alterao dos artigos 139, 140 e 141 do Cdigo Penal, permitiam que se

    concretizasse uma interrupo da gravidez em local devidamente credenciado para o

    efeito, hoje em dia a legislao mais condescendente.

    Do universo das 17 jovens consideradas para efeitos do presente estudo, 13

    assumiram ter conhecimento da introduo da nova lei, contra apenas 4 que referiram

    desconhecer tal alterao legislativa.

    A comunicao social impem-se como o melhor veculo de difuso da

    informao, tendo sido apontada por 10 entrevistadas, a fonte atravs da qual tiveram

    conhecimento da alterao legislativa.

    Importa reforar que das 4 jovens que desconheciam totalmente a alterao ao

    corpo da lei, duas tiveram acesso informao aquando da primeira consulta em

    instituio especializada (hospital/centro de sade), porm, por motivaes diferentes

    prosseguiram com a gravidez.

    Apenas uma das jovens referiu, directamente, ter tido conhecimento da alterao

    legislativa em consequncia de ter j efectuado um aborto. Eu no sabia que a lei tinha

    mudado e estava juntar dinheiro para fazer um aborto com uma senhora que me

    indicaram, mas houve um dia em que tive muitas dores e tive de ir ao hospital. Estava

    com 9 semanas e l puseram-me a par de tudo. Eu no hesitei! O pai desse bebe no

    prestava para nada (Mafalda, me aos 18 anos).

    Embora a grande maioria estivesse a par da alterao legislativa, em termos de

    efeitos prticos, e nas suas situaes especficas tal no se revelou uma mais-valia,

    especialmente porque em quase todas as situaes analisadas a gravidez foi

    diagnosticada num tempo de gestao superior s 10 semanas previstas na lei para

    efeitos da interrupo voluntria.

  • 4.6 Fomos mes!

    Foram apontadas vrias hipteses que fundamentassem a opo destas jovens em

    prosseguir com a gravidez, nomeadamente:

    a) Porque sim!

    b) Substituio/compensao em termos emocionais

    c) Constituio da sua prpria famlia

    As motivaes para a prossecuo da gravidez baseiam-se em fundamentos

    diferentes. O planear da gravidez no fez, decididamente, parte do imaginrio destas

    jovens, j que 16 assumiram que a gravidez foi resultado de um descuido, de um

    esquecimento do uso de contraceptivo. Apenas 1 jovem declarou que a gravidez foi

    planeada; curiosamente a mesma que referiu ter anteriormente recorrido ao Servio

    Nacional de Sade para proceder interrupo da primeira gestao.

    Relativamente postura perante o aborto, 11 manifestaram-se a favor da

    possibilidade da mulher poder escolher, considerando-a uma prtica legitimadora,

    contra 6 que se declararam contra a medida, alegando tratar-se de uma questo de

    princpios e crenas religiosas.

    Contudo, embora a maioria das jovens se tenha posicionado a favor da interrupo

    voluntria da gravidez, nenhuma optou por essa via. Um contra-senso? No! Na

    realidade das trs hipteses inicialmente apontadas, apenas uma foi efectivamente

    verbalizada, especificamente a que diz respeito a considerar a gravidez como uma forma

    de substituio, de compensao em termos emocionais. O meu filho no foi planeado,

    mas quando soube que estava grvida, fiquei muito feliz! Pelo menos tenho algum que

    me vai amar para sempre e que precisa de mim (Elsa, me aos 18 anos).

    Embora num outro contexto de compensao, uma das jovens teve a segunda filha

    aos 17 anos, ainda que alegadamente resultado de uma gravidez no planeada, para

    confirmar se conseguiria ter um bebe saudvel. Foi me aos 15 anos e dessa gravidez

    nasceu uma menina, com graves problemas neurolgicos (paralisia cerebral). De facto,

    esta segunda filha veio colmatar um vazio deixado pela primeira experincia, pelo que a

    jovem nunca to pouco equacionou a hiptese de recorrer interrupo voluntria da

    gravidez. Claro est que neste caso em particular, a rede familiar, em especfico os pais

    da jovem tm sido o seu grande suporte financeiro, embora com grandes dificuldades,

    mas acima de tudo, o grande apoio emocional.

  • Na gnese destas situaes que deram lugar ao nascimento destas crianas, esteve

    associado um factor dominante 12 das jovens foram confrontadas com a notcia da

    gravidez com um tempo de gestao superior ao legalmente permitido para se proceder

    IVG, ou seja, o tempo gestacional era superior s 10 semanas. Houve, inclusivamente,

    uma das entrevistadas que soube da gravidez com 10 semanas e 5 dias, tendo de

    imediato sido excluda a possibilidade de proceder IVG. Ainda assim, e porque

    considerava no ter condies para ser me, tentou o recurso a comprimidos, contudo os

    mesmos no surtiram o efeito desejado Emocionada, referiu que passou o restante

    tempo da gravidez preocupada com os efeitos colaterais que a administrao dos

    referidos comprimidos poderiam provocar na sade da sua bebe tomei tantos, tantos

    comprimidos, mas ainda assim a minha bebe resistiu. Estava com muito medo de lhe ter

    provocado alguma deficincia (Carina, me aos 19 anos).

    Na generalidade dos casos, referiram que fisicamente no se apercebiam de grandes

    alteraes, especialmente porque muitas continuaram menstruadas e supostamente a sua

    falta que deveria constituir motivo para preocupao/alarme.

    Verifica-se uma estreita correlao entre o no planear a gravidez e o no se

    aperceber da existncia da mesma, na medida em que, as jovens tornam-se menos

    expeditas a identificar quaisquer sinais que apontem para a existncia de um ser humano

    a crescer, a desenvolver-se dentro delas. Quando finalmente percebem que alguma coisa

    mudou, passaram as 10 semanas previstas na lei e ou se resignam ou tentam caminhos

    alternativos, com consequncias incalculveis para a sua sade e bem-estar.

    Os tempos da lei no so efectivamente coadunantes com as distraces destas

    jovens e de outras, que antes ainda de conhecerem o seu prprio corpo, o emprestam e

    utilizam sem pensar nas consequncias

  • 4.7 O antes e o agora

    Promover um regresso ao passado no um exerccio fcil, principalmente porque estas

    jovens vivem essencialmente o presente O lema o passado j l vai, e o futuro

    ainda demora, por isso a nica preocupao o hoje, o imediato.

    Embora 9 das jovens j no frequentasse equipamento de ensino, na sua maioria

    verbalizaram que antes da gravidez pretendiam voltar a estudar, dando preferncia a

    formaes e posteriores profisses relacionadas com crianas, como por exemplo

    educadores de infncia ou auxiliares de aco educativa.

    Hoje em dia e aps a experincia da maternidade, apenas 6 referiram empatizar

    com a ideia de voltar a estudar, muito embora em termos concretos apenas a mais nova

    das entrevistas, com 14 anos, tenha efectivamente procedido a todas as diligncias para

    retomar os estudos no presente ano lectivo 2010-2011.

    Em relao ao namoro, a postura foi unnime, no pensavam muito no assunto,

    pois consideravam algo natural e prprio das suas idades.

    Hoje pensam que talvez pudessem ter aproveitado mais a adolescncia se no

    tivessem comeado a namorar to cedo. Uma das jovens chegou a afirmar: comecei a

    namorar aos 13 anos e perdi a virgindade aos 14. Hoje olho para trs e penso que nem

    sabia bem o que era ter relaes sexuais S espero que a minha filha seja mais

    inteligente do que eu! (Susana, me aos 17 anos).

    J em relao conjugalidade, em partilhar a vida com outra pessoa, algumas

    jovens fizeram questo de afirmar que antes sonhavam com um casamento de sonho,

    com uma vida a dois, maravilhosa! Outras, em funo do que eram as suas realidades

    familiares, afirmaram que casar, morar com algum, nunca fez parte dos seus planos.

    Cada um no seu espao, com uma relao de namoro! Nada mais do que isso, pois

    queria ser senhoras do seu nariz, sem maridos a comandar as suas vidas.

    Agora com os seus filhos, algumas mudaram de opinio em relao

    conjugalidade. Das entrevistas, 8 considera que um dia gostaria de refazer a sua vida

    amorosa, valorizando o papel do pai e da me no crescimento e formao das crianas,

    ainda que ressalvem que o pai poder no ser o biolgico, desde que d amor, carinho

    e educao. O meu filho quase de certeza que nunca vai conhecer o pai verdadeiro,

    mas tambm nem vale a pena, porque j se percebeu que no vale o ar que respira.

    Assim um dia quando tiver um bom namorado, pode ser que o meu filho encontre

    tambm um bom pai (Susana, me aos 17 anos). De facto, foi curioso perceber que

    cerca de 10 das entrevistas no mantm actualmente qualquer relacionamento com o pai

  • dos seus filhos. As restantes mantm a relao de namoro, iniciada antes da gravidez.

    Ainda assim, e no que diz respeito actual situao familiar, excepo feita a uma das

    jovens que, data da gravidez residia com os sogros e namorado e actualmente reside

    sozinha com o filho, no fogo municipal do qual titular, todas as outras mantiveram

    residncia nas habitaes dos pais e familiares. Embora o desejem, nenhuma conseguiu

    autonomizar-se, quer por motivos financeiros, quer por motivos relacionais.

    Embora provenientes de famlias tendencialmente numerosas, com pelo menos

    trs irmos, excepo feita a uma jovem que antes da gravidez dizia desejar ter sete

    filhos, as restantes afirmaram que nunca pensaram em ter mais de dois ou trs filhos.

    Justificavam-no, acima de tudo, com questes financeiras e com o facto de quererem

    dar-lhes mais do que elas prprias tiveram. Valorizaram tambm as questes

    emocionais, na medida em que reforaram que com muitos filhos no possvel dar

    ateno a todos e h sempre os que so mais prejudicados.

    Presentemente, das 3 jovens que j tm dois filhos, apenas uma manifestou

    vontade em aumentar a prole, contudo frisou vrias vezes no decorrer da conversa, que

    desejavelmente esse desejo s se concretizaria pelo menos num prazo de 10 anos,

    curiosamente sentindo-se aqui a carga cultural da procriao as gmeas ainda so

    pequenas e precisam de muita ateno, mas na nossa cultura ter s dois filhos muito

    pouco. Eles so uma bno e eu vou querer mais, mas s daqui a uns bons anos

    (Diana, guineense, me aos 18 anos). As restantes manifestaram inteno de ter apenas

    mais um filho, contudo sem grande convico do que verbalizavam.

    Tal como referido anteriormente, ao nvel do enquadramento profissional, estas

    jovens manifestavam interesse em actividades associadas infncia. Na sequncia da

    gravidez, para a maioria delas as prioridades alteraram-se. Embora grande parte sem

    desempenhar qualquer tipo de actividade remunerada, as que pretendem ser

    independentes so unnimes num pensamento: apenas pretendem ter um emprego que

    lhes permita proporcionar bem-estar, cuidados de sade e educao aos seus filhos,

    independentemente do sector de trabalho.

    importante referir que ainda que sem emprego, 8 destas jovens beneficia de

    prestao social Rendimento Social de Insero traduzindo esta na sua fonte de

    rendimento. Ora, reportamo-nos para jovens de 16, 17, 18 ou 19 anos, que antes j viam

    as mes a beneficiar de subsdios, ficando em casa. E qual a resposta da sociedade?

    Manter e fomentar esta subsdio dependncia, em jovens perfeitamente capazes de

    lutar por um futuro melhor para si e para os seus. Um aspecto relevante a enunciar

  • facto de termos registado duas situaes em as jovens so simultaneamente

    beneficirias do RSI e auferem um rendimento no declarado, ainda que baixo, da

    actividade de empregada de limpeza. Verifica-se a existncia de um mercado paralelo,

    no qual estas jovens se movem to facilmente, de alguma ludibriando tambm os

    servios de forma a manterem subsdios sociais que de outro modo no conseguiriam

    manter. Se eu disser s doutoras que trabalho nas limpezas umas horas, elas cortam-

    me o rendimento. E depois, como que eu e o meu vivemos? Assim olha, so

    enganadas! Mas no sou s eu! Nem imaginas o que as pessoas fazem H ai muita

    gente com grandes carros a viver do rendimento! (Ana, me aos 18 anos).

    Apenas 4 das entrevistas desenvolvem actividade profissional devidamente

    regularizada, cingindo-se as actividades laborais a reas relacionadas com a prestao

    de servios, como empregada de limpeza, auxiliar de cozinha e caixeira.

    Acresce informar que todas as jovens, sem excepo beneficiaram/beneficiam

    dos abonos pr-natal e de famlia, sendo os mesmos com frequncia utilizados para

    adquirir o enxoval dos bebes e posteriormente para os gastos em funo das

    necessidades da criana.

    Confrontadas com a existncia de filhos, todas as jovens apontaram como uma

    grande dificuldade o acesso a equipamentos sociais onde possam integrar os seus filhos.

    Curioso que, se para algumas das jovens a integrao das crianas seria uma forma de

    estarem mais disponveis para o mercado de trabalho, para outras seria apenas para os

    filhos estarem com outras crianas e terem uma professora para lhes ensinar coisas

    importantes. Em algumas situaes a creche ou jardim-de-infncia tida como pelo

    menos umas horas descanso, porque ser me o dia inteiro tambm cansativo! (Sara,

    me aos 18 anos). Em contraste, existem situaes relatadas que referem que sendo as

    mes beneficirias de RSI, tm maior dificuldade em conseguir a vaga no equipamento,

    atendendo a que supostamente se beneficia do subsdio e no trabalham, podem

    perfeitamente ficar com as crianas em casa para dar lugar a famlias que efectivamente

    necessitem.

  • V - Consideraes Finais

    A gravidez na adolescncia constitui-se como um problema social na medida em que

    afecta no s as jovens directamente envolvidas, como tambm as suas famlias e a

    prpria sociedade que de alguma forma procura dar respostas com vista integrao

    social das mes adolescentes e dos seus filhos.

    Globalmente e de acordo com os dados disponveis (Eurostat e INE), podemos

    afirmar que os nmeros da gravidez na adolescncia em Portugal tm vindo

    progressivamente a decrescer desde 1997, sendo que data registava-se um total de

    6993 nascimentos de crianas com mes com idade inferior a 20 anos e em 2008 o total

    de nascimentos cifrava um total de 4551.

    Provenientes de contextos familiares com algumas fragilidades do ponto de vista

    emocional e financeiro, estas jovens acabam por replicar comportamentos. As suas

    mes tiveram o primeiro filho muito novas e, salvo algumas excepes, o mesmo se

    passa com as suas filhas. A grande diferena subsiste no facto de hoje em dia existir

    mais informao sobre formas de prevenir uma gravidez no desejada, assim como se

    verificou uma alterao legislativa introduzida em Abril de 2007, que conferiu mulher

    o poder de decidir por espontnea vontade se quer ou no prosseguir com a gravidez,

    desde que detectada at s 10 semanas de gestao.

    De facto, das premissas apresentadas como eventuais fundamentos para

    hipteses de estudo, apenas uma delas (gravidez como forma de substituio /

    compensao emocional) se confirmou e ainda assim, sem relevncia de maior atribuda

    pelas entrevistas. Concluiu-se ento que para a maioria das jovens entrevistas, a

    prossecuo da gravidez ficou a dever-se a um desconhecimento do seu prprio

    metabolismo, do funcionamento do seu corpo, na medida em que apenas detectaram a

    gravidez num tempo gestacional superior s 10 semanas.

    Se por um lado, com frequncia apontamos a existncia da gravidez, um factor

    determinante para que estas jovens deixem de frequentar estabelecimento de ensino, por

    outro lado, ficou claro que, na grande maioria das vezes, parte destas jovens aquando da

    gravidez j deixou h muito de frequentar a escola.

    Ainda que com a informao e com os programas escolares a abordar questes

    relacionadas com a sexualidade, existem, hoje em dia, jovens que desconhecem

    totalmente estas matrias. Onde que a sociedade est a falhar?

    Algumas, so jovens sem ambies, que dificilmente sairo dos limites do bairro,

    para quem o Rendimento Social de Insero e subsdios congneres constituem-se como

  • suficiente forma de subsistncia. Outras, outrora com sonhos mais arrojados, tentam

    contrariar as poucas expectativas que pairam sobre si e lentamente vo lutando por um

    futuro melhor para si e para a sua famlia. Pena , que estas, sejam to poucas!

    Com grande dificuldade em tecer quaisquer comentrios sobre o futuro, quase

    no conseguindo vislumbrar para alm do dia que vivem, verbalizam sonhos, como ser

    rica ou ganhar o euro milhes. Ainda assim e aps repetidamente se questionar

    acerca de um sonho ou de uma aspirao acabam por admitir que apenas desejam o que

    todas as pessoas desejam: sade para si para os seus filhos, um trabalho e uma casa; a

    sua independncia.

    Partindo da realidade, ou seja, assumindo na plenitude a existncia desta

    problemtica necessrio que desde cedo se verifique um grande investimento na

    formao das nossas adolescentes.

    Claro que questes culturais so difceis de alterar, contudo necessrio

    encontrarem-se respostas para as situaes que vo surgindo.

    A simples atribuio de subsdios no constitui uma resposta vivel para

    promover o crescimento e formao destas mes. Contrariamente, dever ser

    incentivado o regresso formao escolar, para que possam beneficiar de um leque

    mais alargado de oportunidades de trabalho.

    Paralelamente, imperioso o investimento em respostas sociais, em

    equipamentos com valncia de creche e jardim-de-infncia, onde os filhos destas jovens

    possam crescer, brincar, socializar. Esta necessidade foi consequentemente verbalizada

    pelas jovens mes que participaram no presente estudo.

    Nem todos os solos so arveis, contudo com o devido tratamento, ateno e

    investimento, muitos deles do lugar a lindo pomares

  • VI Referncias Bibliogrficas

    ALMEIDA, Jos Miguel Ramos (1987), Adolescncia e Maternidade, Lisboa,

    Fundao Calouste Gulbenkian (3 Edio, 2007).

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    adolescncia: perspectivas tericas, In Canavarro (Ed.) Psicologia da gravidez

    e da maternidade, Coimbra, Quarteto Editora.

    CARLOS, Ana et al. (2007), Comportamento parental de mes adolescentes,

    Anlise Psicolgica 2 (XXV)

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    Lei n 6/84 de 11 de Maio - Excluso de ilicitude nos casos de interrupo

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    Lei n 16/2007 de 17 de Abril Excluso de ilicitude nos casos de interrupo

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    SILVA, J.P (1998), Pregnancy during adolescence: Wanted vs. unwanted,

    International Journal of Ginecology & Obstetrics

  • VII Anexos

  • Questionrio

    O presente questionrio tem como objectivo contribuir para melhorar a

    percepo do fenmeno da gravidez / maternidade na adolescncia e ainda aferir

    se a alterao legislativa de Abril de 2007, alterou padres.

    O questionrio ser aplicado a jovens at aos 21 anos de idade grvidos e/ou

    com filhos at aos 3 anos de idade.

    O questionrio annimo e as respostas absolutamente confidenciais.

    Muito obrigada pela sua Colaborao

  • A) Dados pessoais

    1. Diga-nos os seus dados pessoais e do pai da criana

    Dados pessoais Grvida / Me Pai da Criana

    Data de nascimento

    Naturalidade

    Nacionalidade

    Estado civil

    Habilitaes literrias

    Freguesia de residncia

    2. Em relao aos seus pais

    Idade Profisso /

    Ocupao

    Empregada (o) /

    Desempregada (o)

    Habilitaes

    Literrias

    Me

    Pai

  • B) Percursos escolares e profissionais

    3. Situao face escola

    Grvida /

    Me

    Pai da

    Criana

    Situao

    Frequenta a escola

    Frequentava a escola mas abandonou quando soube

    da gravidez

    No frequentava a escola

    3.1 Se frequentava a escola, que idade tinha aquando da gravidez? ______________

    3.2 Qual o ano de escolaridade que frequentava? ____________________________

    3.3 Existiram retenes? Sim No

    Se sim, quantas e em que anos? _________________________________________

    ___________________________________________________________________

    3.4 Identificava-se com as colegas de turma? Sim No

    3.5 data, que planos formativos tinha para o futuro? _______________________

    ______________________________________________________________________

    ______________________________________________________________________

    ______________________________________________________________________

    4. Situao face ao emprego

    Situao Grvida / Me Pai da Criana

    Est empregada (o)

    Sim No Sim No N/S

    Profisso / Ocupao

    H quanto tempo

  • C) Contextos familiares de origem

    5. Quando engravidou, o seu agregado familiar apresentava a seguinte composio

    Grau de

    parentesco

    Idade Profisso / Ocupao Empregada (o) /

    Desempregada (o)

    6. Quantos anos tinha a sua me quando teve o primeiro filho? ________________

    7. Houve na sua famlia ou rede de amigos prxima, experincias de gravidezes em

    jovens adolescentes? Sim No

    7.1 Se sim, qual o grau de parentesco? ____________________________________

    7.2 Que idade tinha essa jovem quando engravidou? _________________________

    7.3 Recorda-se do que sentiu quando soube que essa sua familiar/amiga, ainda to

    jovem, estava grvida? _____________________________________________

    ________________________________________________________________

    ________________________________________________________________

    ________________________________________________________________

  • D) Conhecimentos e atitudes sobre sexualidade e gravidez

    8. Abordava questes sobre sexualidade com os seus pais? Sim No

    8.1 Se No, com quem conversava acerca das suas dvidas:

    Ningum

    Amigas

    Namorado

    Professores

    Especialistas e planeamento familiar (Centro de Sade)

    Outros. Quem? ________________________________________________

    9. Com que idade iniciou a sua vida sexual? _______________________________

    10. Quantos namorados teve? ___________________________________________

    11. Recorria ao uso de algum mtodo contraceptivo quando tinha relaes sexuais?

    Sim No

    11.1 Se sim, quais?

    Plula

    Preservativo

    Implante Cutneo

    Outros. Quais? ________________________________________________

    12. Alguma vez recorreu ao Servio Nacional de Sade, nomeadamente s consultas

    de planeamento familiar, a fim de obter mais informaes acerca de questes

    relacionadas com a sexualidade? Sim No

    12.1 Se No, porque motivo?

    Desconhecimento

    No sentiu necessidade

    Vergonha

    Outro. Qual? _________________________________________________

  • E) Situao relativa gravidez

    13. Em relao ltima gravidez:

    Foi planeada

    No foi planeada, porque no utilizou qualquer mtodo contraceptivo

    Usou o mtodo contraceptivo _________________________, contudo no

    foi eficaz porque _____________________________________________________

    14. Quando soube que estava grvida, ficou:

    Feliz

    Triste

    Preocupada

    Indiferente

    Com medo. Do qu / de quem? ____________________________________

    15. As suas maiores preocupaes foram (assinalar as mais relevantes):

    Relacionamento com os seus pais

    Relacionamento com o pai da criana

    Relacionamento com os amigos / conhecidos /vizinhos

    Relacionamento com os professores e outros tcnicos

    Como sustentar o filho

    Ter de interromper os estudos

    Ter de comear a trabalhar

    Como cuidar do beb

    O futuro do seu filho

    A sade do seu filho

    O parto

    O seu aspecto