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Page 1: Governador do Estado do Rio de Janeiro · Lucindo Ferreira da Silva Filho – pedagogo, especialista em gestão escolar, especialista em educação especial e Mestre em Educação
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Governador do Estado do Rio de Janeiro Sérgio Cabral Vice-Governador do Estado do Rio de Janeiro Luiz Fernando Pezão Secretário de Estado de Planejamento e Gestão Sérgio Ruy Barbosa Guerra Martins Presidente da Fundação Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos do Rio de Janeiro Claudio Mendonça Diretor do Instituto Superior de Administração Pública – ISAPE/CEPERJ Lucindo Ferreira da Silva Filho Responsável pela Transcrição: Carolina Graciosa Palestrantes Ana Canen Ana Gabriela Pessoa Cláudio Mendonça Guiomar Namo de Mello Lina Kátia Lucindo Ferreira da Silva Filho Nigel Brooke Capa Roberta Costa Agradecimentos Vanessa Pires Vera Lúcia Figueiredo de Mello

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“Precisamos contribuir para criar a escola que é aventura, que marcha, que não tem medo do risco, por isso que recusa o imobilismo”. A escola em que se pensa, em que se atua, em que se cria, em que se fala, em que se ama, se adivinha, a escola que apaixonadamente diz sim a vida”... Paulo Freire

Dados técnicos “Seminário Política Educacional para uma Escola Eficaz” Realizado nos dias 23 e 24 de março de 2009, no auditório da Fundação Escola de Serviço Público do Governo do Estado do Rio de Janeiro Palestrantes:

Ana Canen - PhD em Educação pela Universidade de Glasgow e mestre em Educação pela PUC-Rio;

Ana Gabriela Pessoa - bacharel em Política, Filosofia e Economia e mestre em Educação;

Claudio Mendonça – presidente da Fundação Escola de Serviço Público do Estado do

Rio de Janeiro - foi Secretário de Estado e Presidente do Conselho Estadual de

Educação (1994) e Secretário de Estado de Educação (2004-2006);

Guiomar Namo de Mello - Diretora da EBRAPA (Escola Brasileira de Professores)

Doutora em Educação pela PUC/SP, com Pós Doutorado em Educação Comparada

pelo Instituto de Educação da Universidade de Londres, Inglaterra;

Lina Kátia - especializada em Educação para a Matemática e mestre em Educação pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Atualmente é Coordenadora da Unidade de Avaliação da Fundação de Apoio e Desenvolvimento ao Ensino e Extensão; Lucindo Ferreira da Silva Filho – pedagogo, especialista em gestão escolar, especialista em educação especial e Mestre em Educação (UNESA); foi Diretor Técnico do Instituto Benjamin Constant. Atualmente é Diretor do Instituto Superior de Administração Pública da FESP Nigel Brooke - professor convidado da Universidade Federal de Minas Gerais e consultor do Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais da Faculdade de Educação. PhD em Estudos de Desenvolvimento da Universidade de Sussex, Inglaterra.

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SUMÁRIO

APRESENTACÃO..................................................................................................................04 PRIMEIRO DIA CLAUDIO MENDONÇA.......................................................................................................07 ANA GABRIELLA PESSOA....................................................................................................................................32 NIGEL BROOKE....................................................................................................................45 SEGUNDO DIA LINA KÁTIA.............................................................................................................................73 ANA CANEN.............................................................................................................................89 LUCINDO FILHO...................................................................................................................107 GUIOMAR NAMO DE MELLO......................................................................................................................................116

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APRESENTAÇÃO

“Sonhar não é apenas um ato político necessário, mas também uma conotação de forma histórico-social de estar sendo. Faz parte da natureza humana, que dentro da história se acha em permanente processo de torna-se”

Paulo Freire

Vivemos uma conjuntura marcada por profundas e rápidas transformações

na vida social, política e econômica. A velocidade das mudanças é de tal ordem

que um famoso jornal da mídia televisiva brasileira tem como bordão “tudo muda

em 20 minutos”.

É impressionante o avanço da ciência, do conhecimento das forças

produtivas que a cada minuto alargam as fronteiras do possível, caindo uma a uma

as certezas, as verdades, abrindo-se a cada momento um mundo de possibilidades.

Isto se dá de tal forma, em meio a contradições e paradoxos, que enquanto se

encontram inúmeras soluções que prolongam e melhoram a vida humana, metade

da população do planeta ainda não tem acesso a direitos básicos, como saúde,

educação e trabalho ou este acesso se dá de maneira precária.

Mas apesar de tudo, como diria o nosso poeta Chico...”Apesar de você” a

Educação continua sendo vista como possibilidade de transformação, de

superação, de mudança, pois a Escola pelos seus processos e dinâmicas é

semelhante a um organismo vivo.

Vivemos em um mundo global, por isso mesmo padoxalmente cada vez mais

plural. Tudo isto se traduz e espelha na escola e nas nossas visões dos processos

educativos, da educação escolar, do papel de gestores e professores. A

complexidade da educação escolar, face às inúmeras contradições sociais, nos

leva a considerar e valorizar as tensões e conflitos e a não linearidade da

realidade.

Assim as idéias que foram apresentadas no “Seminário Política Educacional

para uma Escola Eficaz”, promovido pela CEPERJ (ex-FESP), e que aqui

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transcritas representam este sentido de pluralidade, de valorização de tensões e

vivências, não se fechando em verdades, mas em um profundo movimento de

leituras e reflexões sobre os caminhos e descaminhos da nossa escola, não àquela

reflexão imobilizadora, mas a que desafia e que leva a avançar, a propor, a

vislumbrar possibilidades.

No primeiro dia o Dr. Cláudio Mendonça analisando a educação e a escola

em diferentes contextos falou da principal missão da escola – a redução das

desigualdades – ou seja, a escola eficaz aquela que leva a expressiva maioria dos

alunos ao sucesso, à aprendizagem, ao máximo desenvolvimento de suas

potencialidades, respeitadas as diferenças, o que nos leva a tentar compreender

nessas experiências bem sucedidas em outras regiões do mundo os diferentes

conhecimentos que articulados possam vir a contribuir para que o Brasil alcance

suas próprias soluções para a construção de uma maior igualdade na Escola. Em

seguida a Prof. Ana Gabriela retoma a questão da desigualdade por meio de um

projeto que enseja a participação comunitária na escola Teach for América onde

a preocupação é justamente o resgate da dignidade de crianças oriundas de

famílias de baixa renda por meio da inserção do jovem universitário na

responsabilização do ensino destas crianças.

Ainda no primeiro dia tivemos as apresentações do Prof. Nigel Brooke que

tratando do primeiro tema abordou a história ou estado da arte no que diz respeito

às pesquisas sobre eficácia escolar, bem como o esforço de melhoria das escolas

com base nos resultados destas pesquisas. No segundo tema abordou a pesquisa

Geração Escolar 2005 – GERES - uma pesquisa longitudinal que acompanha o

desenvolvimento e trajetória de 20 mil alunos no Ensino Fundamental.

O segundo dia começou com a apresentação da Profa Lina Kátia que

abordou a importância dos indicadores escolares e de que forma o conhecimento

destes indicadores responsabiliza os diferentes segmentos para a melhoria da

qualidade da educação. Em seguida tivemos a apresentação da profa Ana Canen

que procurou discutir a importância do currículo e da avaliação da educação na

formação continuada dos professores para uma escola eficaz, o que incluiu

também a abordagem do eixo multicultural e a avaliação nesta perspectiva como

estruturadores de uma proposta curricular de educação e de formação continuada

transformadora.

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Em prosseguimento a programação do Seminário tivemos a exposição que

fiz das ações do Projeto Escola do Professor desenvolvido pela FESP em parceria

com a Prefeitura da Cidade de Itaperuna e que objetivou a formação continuada

do professor na elaboração de seqüências didáticas, a importância desta vivência

se dá em especial pela valorização do saber docente e da oportunização de espaço

de reflexão, tão importante como aponta a educadora portuguesa Isabel Alarcão

sobre a prática docente, no sentido da melhoria dos processos de aprendizagem.

Finalizando a programação fomos brindados com a apresentação da Profa.

Guiomar Namo de Melo que abordou a formação inicial e continuada do professor

com especial foco para a questão do professor iniciante na escola pública,

destacando que o investimento no professor é o mais sustentável e de melhor custo

benefício que tem na educação, em especial o professor que recentemente

concluiu a sua formação inicial, o que está iniciando suas atividades na sala de

aula.

Como podemos ver todas as apresentações tiveram preocupação com a

aprendizagem, com o fato da escola melhor cumprir o seu papel, ou seja, um

espaço onde o professor ensine, seja um facilitador da construção do

conhecimento e efetivamente o aluno aprenda. Não podemos em nome posições

ao redor ora de uma visão civil cidadã, ora posicionados em uma visão

produtivista de educação desconsiderar essa questão, porque está baseada na

realidade e demanda social por uma escola melhor.

Entretanto temos o dever de pensar quando nos deparamos com a

responsabilidade de ensinar, parafraseando Edgar Morin, com a questão da

fragmentação do conhecimento o que muitas vezes torna inútil ou sem sentido

para o aluno o saber que lhe é apresentado, o que torna importante a frase de T.

Eliot “Onde está o conhecimento que perdemos na informação?” Queremos alunos

com excelentes resultados, mas que saibam o que fazer com o conhecimento e

assim enfrentar os grandes desafios do cotidiano e de suas vidas?

Lucindo Filho

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Primeiro Dia

Claudio Mendonça

Presidente da Fundação Escola de Serviço Público do Estado do Rio de

Janeiro - foi Secretário de Estado e Presidente do Conselho Estadual

de Educação (1994) e Secretário de Estado de Educação (2004-2006).

Introdução

Falarei inicialmente, um pouco sobre o evento. A FESP recebeu 246 inscrições e tivemos que

fazer um processo seletivo para preencher as 160 vagas. Entre os selecionados temos 15

doutores, 19 mestres, 59 pós-graduados, 46 com nível superior e 11 com formação no Ensino

Médio e 6 Secretarias Municipais de Educação que mandaram representantes ou confirmaram

representação com secretários ou subsecretários.

Esse seminário tem por objetivo debater a eficácia do sistema educacional, mas também tem

um objetivo institucional para a Fundação. A FESP, como vocês sabem, é a Escola de Governo

do Estado do Rio, um órgão da Secretaria de Planejamento e Gestão que desenvolve

programas e projetos nas diversas áreas, inclusive na área de Educação, para órgãos

municipais, o governo do Estado e alguns órgãos do governo federal.

Dentre os serviços que a FESP presta, temos o concurso público, que é a principal fonte de

arrecadação da Instituição. E é da verba do concurso público, que parte é destinada para

outras ações de capacitação do servidor público, elaboração de publicações, desenvolvimento

de pesquisas, e também para a realização de eventos como este.

Sendo assim, foi o Governo do Estado do Rio de Janeiro, e várias cidades do nosso Estado, que

contrataram a FESP para realização de concurso de magistério ou de apoio administrativo, que

estão possibilitando eventos como este, pois como vocês sabem a FESP não tem nenhuma

finalidade lucrativa, portanto, estamos revertendo uma parte do saldo do concurso público

para a realização de uma atividade de pesquisa como essa e de difusão de informação

relevante sobre a área educacional, que é o que estamos fazendo aqui neste evento.

O seminário gerará um produto, que será a transcrição, a compilação e a sistematização de

todas as informações que forem colocadas aqui pelos palestrantes e que resultará em uma

publicação - isso normalmente demora uns dois meses para ficar pronto - e essa publicação

será distribuída para diretores de escola, para Comissões de Educação da Câmara Municipal,

para os ‘pauteiros’, para os jornalistas dos principais veículos de comunicação do Brasil,

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especialistas em Educação...

A maioria dos jornais não tem a figura do especialista em Educação. Infelizmente, hoje, a

situação financeira não permite que os jornais tenham o seu jornalista especialista em

Educação. Temos para esporte, para segurança, mas a Educação ainda não tem esse status.

Mas já teve. Hoje em dia isso não é possível, somente os grandes jornais como A Folha de São

Paulo, o Estado de São Paulo, O Globo, por exemplo, ainda possuem alguns jornalistas que se

especializaram nessa área, portanto, muitos desses editores e jornalistas irão receber essa

publicação.

Além deles, receberão também as Comissões de Educação da Assembléia Legislativa, do

Parlamento Federal - Senado e Câmara -, prefeitos municipais, enfim, pessoas que formam a

opinião e que são, muitos deles, tomadores de decisão no que diz respeito ao sistema

educacional. O nosso objetivo aqui é discutir a Reforma Educacional e a Escola Eficaz sob os

seus mais diversos aspectos. Vou fazer aqui uma panorâmica sobre a questão do seminário -

com o objetivo essencial de trazer aliados para esse tema tão importante, ou seja, dar aos

formadores de opinião e tomadores de decisão uma consciência maior sobre o que faz uma

escola ser eficaz e como é possível realizar uma Reforma Educacional no nosso país.

Além desta introdução falarei sobre a Reforma Educacional em alguns países do mundo. Tive a

oportunidade de nos últimos dez anos visitar diferentes países onde a Reforma Educacional

aconteceu com maior ou menor intensidade. Nem todos os países que tive oportunidade de

visitar, eu tive o tempo e a competência de colher subsídios suficientes para fazer uma

exposição sobre esse assunto, por isso eu vou falar essencialmente sobre os países em que tive

mais tempo e aonde fui em missão específica para conhecer as iniciativas de Reforma

Educacional.

Vou falar sobre a Colômbia, uma experiência específica que apresentou bons resultados. Vou

falar sobre o Chile, onde tive a oportunidades de visitar em 1998, 2006 e 2008, em três

momentos diferentes do país da América do Sul onde a Reforma Educacional está mais

avançada e talvez, o país do mundo onde a Reforma Educacional acontece com maior

intensidade e menor tempo. A maioria dos países que fizeram a Reforma Educacional levou

muitos anos no processo. O Chile está fazendo várias ações em um período curto de apenas 13

anos.

Também vamos falar um pouco sobre a Irlanda e a Finlândia, que são países muito bem

sucedidos na área de educação. A Irlanda com uma Reforma Educacional mais recente, a

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Finlândia com uma história mais longa de reforma, e também sobre a Coréia que é um país

também emblemático nessa área.

Depois da minha apresentação vamos ouvir a Professora Ana Gabriela Pessoa que fez

mestrado em Harvard e me foi apresentada pelo Professor Rafael Martinez, ex-subsecretário

de Educação do Governo do Estado do Rio de Janeiro. Ela integrou uma das visitas que fizemos

aos Estados Unidos e demonstrou um entusiasmo muito grande com um programa chamado

‘TEACH FOR AMERICA’ que vai ser apresentado aqui. É um programa muito interessante que

envolve a questão da mobilização, enfim, envolve uma parcela importante da sociedade que é

o jovem na sua atividade de formação em nível universitário e que acaba sendo seduzido a

ingressar em uma escola pública e dedicar um ou dois anos da sua vida, ou até mais, para

lecionar para esses alunos. Então tem todo um processo aí de envolvimento da sociedade com

o processo educacional que é extremamente relevante. Essa iniciativa tem chance de se

espalhar por outros países do mundo, por isso a Professora Ana Gabriela vai apresentar o

programa, entre outros objetivos, para seduzir os tomadores de decisão e a sociedade

brasileira quanto à hipótese de se desenvolver uma ação semelhante a essa aqui no país.

O Professor Nigel Brooke, um de nossos palestrantes, eu já conhecia da leitura de artigos e de

alguns livros interessantes - um deles é um livro que eu já li uma porção de vezes, apesar de

ser imenso, chamado Pesquisa em eficácia escolar- origem e trajetória. Ele relaciona os

principais textos sobre o que faz uma escola ser eficaz ou não, o que faz com que uma escola

com igualdade de condições com outra tenha um alto desempenho em relação à anterior.

Quer dizer, o que faz com que alunos tenham alta taxa de aprendizagem, alta taxa de

aprovação e em igualdade de condições em relação à outra escola. Ele analisa documentos

extremamente importantes de pesquisa e depois relaciona, a partir da página 350 em diante,

os itens mais importantes de eficácia no sistema educacional e comenta cada um deles com

base na compilação de vários outros documentos. Além disso, o Professor Nigel é o

responsável pela pesquisa GERES, que pode ser facilmente encontrada na Internet. A GERES é

a única pesquisa longitudinal do processo de alfabetização do nosso país, portanto é um tema

extremamente importante, em especial para os gestores do sistema educacional dos

municípios.

Amanhã, às 9h da manhã, vamos ter a palestra da professora Lina Kátia, atual presidente da

Associação Brasileira das Instituições de Avaliação que, além disso, coordena o CAED da

Universidade Federal de Juiz de Fora, que é uma das instituições que formula, organiza e aplica

o Prova Brasil. Ela vai falar sobre os indicadores educacionais - é inconcebível fazer a política

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social sem indicadores da política educacional, então mais absurdo ainda porque a área de

Educação tem indicadores muito claros, clássicos e universais que podem e devem ser

utilizados -, ela vai falar essencialmente sobre essa questão dos indicadores e sobre a questão

da avaliação externa.

Depois, a segunda palestra que vamos ter no dia 24, é da Professora Ana Canen, que é PhD

pela Universidade de Glasgow. Ela foi a responsável pela elaboração do currículo do Estado do

Rio de Janeiro, que levou dois anos para ser construído, em 2004 e 2005. Ela fez um estudo

comparativo com o currículo do Estado de São Paulo, que acabou de ficar pronto. Esse é um

tema importantíssimo, tem pouca discussão no nosso país. É interessante verificar como

existem algumas coisas que o nosso país ainda não discutiu. A questão do currículo e a questão

da equidade. Raríssimas pessoas discutem sobre isso, pouquíssimas publicações, e nos jornais

são pouquíssimos os artigos que tratam sobre equidade no sistema educacional ou que tratam

sobre currículo. E currículo é tudo. Currículo é o alicerce da sociedade. Se você puder indicar

apenas um alicerce para a sociedade, um único, na minha opinião, não é da Educação, na

minha opinião o alicerce da sociedade é o currículo. O currículo educacional, que efetivamente

deveria congregar os principais valores científicos, humanos e morais. São os valores da

sociedade.

O currículo deveria representar a síntese valorativa da nossa sociedade. Vou falar um pouco

sobre isso porque, na Reforma Educacional, isso é uma coisa muito clara. Os irlandeses têm a

sua identidade pelo processo educacional e a identidade deles se forjou através do currículo. E

o currículo é a única coisa, foi a única trincheira que fez com que eles sobrevivessem 800 anos

de dominação, assim como os finlandeses sobrevivessem à dominação russa e sueca. É o

currículo que faz com que um povo não se transforme em outro. Os egípcios, por exemplo. Se

você for ao Egito, você não vai encontrar egípcio. Não sobreviveram, não existe nenhum

egípcio no sentido cultural da palavra. Uma das civilizações mais antigas do mundo, com 5 mil

anos, foi totalmente exterminada. Não existe mais nenhum que tenha identidade. Existe gente

que nasce no Egito, lógico, claro que tem, mas eles não têm mais nada da sua raiz.

Amanhã, na parte da tarde, vamos ter o Professor Lucindo Ferreira que irá falar sobre uma

experiência que desenvolvemos no município de Itaperuna sobre a elaboração de roteiros

pedagógicos, com a utilização da própria rede pública do município para a elaboração de

roteiros pedagógicos e difusão desses roteiros para os outros profissionais da rede, ou seja,

utilizar a própria rede pública para a melhoria da sua qualidade.

No final do nosso evento a palestra da Professora Guiomar Namo de Mello, que dispensa

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apresentações. Uma dos grandes nomes da educação brasileira dentre todos os demais

palestrantes. A Professora Guiomar tem uma longa trajetória na área de Educação, um

número enorme de livros publicados, e irá debater o que acho que é o tema mais grave da

educação dos países em desenvolvimento, que é a formação do professor. Essa questão, no

meu ponto de vista, talvez seja o ponto principal. A questão é, se a gente tiver que escolher a

prioridade número um do mal estar da educação dos países de Terceiro Mundo e do Brasil,

sem dúvida, a formação do profissional da Educação é a questão mais importante. A não ser

que a gente ache que o problema está no aluno. Se a gente tiver alunos melhores, nós vamos

ter educação melhor. Mas como isso não é possível, até porque a Educação é para fazer com

que os alunos sejam melhores, então a alternativa que nós temos é ter profissionais com uma

qualificação bem mais elevada. E aí tem a questão salarial, motivação... Existem várias outras

questões. Vou falar um pouco sobre isso, até comparando países no seu processo de Reforma

Educacional.

A Reforma Educacional em Vários Países do Mundo

O primeiro país que eu vou fazer referência é a Colômbia.

Aliás, antes disso, eu queria fazer uma pequena observação para vocês, uma pequena

reflexão. No ano de 2006, o jornal The New York Times fez uma série de reportagens, um

especial, sobre a Reforma Educacional ou a proposta de política educacional do No Child Left

Behind, do ex-presidente George Bush. Que pese as enormes críticas que o mundo inteiro, que

a sociedade inteira faz à gestão do ex-presidente Bush, esse programa significou, ao menos,

um aporte substancial de recursos ao sistema educacional americano. Ele investiu bilhões de

dólares em tecnologia educacional e levantou um debate extremamente importante que é a

questão da equidade.

Essa questão da equidade, como diz o livro do professor Nigel Brooke, não é uma questão

recente nos Estados Unidos. Desde 1965, quando já se debatia a questão dos direitos humanos

nos Estados Unidos e a questão das diferenças socioculturais entre negros e brancos – esse

debate era essencialmente em cima dos direitos civis americanos – se discutia se a escola seria

capaz de reduzir as diferenças sociais entre mais pobres e menos pobres, e nos Estados Unidos

isso tem uma conotação étnica muito grande, e a partir daí esse debate cresceu nos Estados

Unidos. E, como vocês sabem, o sistema educacional americano tem indicadores de altíssimo

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desempenho em alguns estados comparáveis com os melhores países, com os mais adiantados

países europeus, mas também têm estados com indicadores de desempenho muito baixo. E o

objetivo, talvez um dos objetivos da política educacional americana é tentar reduzir essas

diferenças entre escolas do mesmo estado e entre sistemas educacionais de diferentes

estados do modelo americano. E dentro dessa ótica, várias ações de redução das diferenças

entre as crianças já aconteceram, mas o No Child Left Behind, pelo próprio nome e pelo

emblema do projeto, ou seja, pelo foco do projeto, ele se fixou na questão da equidade onde

países têm melhor sucesso do que outros como me referi anteriormente. O símbolo mundial

da equidade educacional é a Coréia, aonde a diferença entre as crianças no sistema de

avaliação externa chega apenas a 7%, uma diferença pequena. No nosso país é 54% a

diferença entre os primeiros colocados e os últimos colocados no exame de avaliação externa.

A Finlândia está em torno de 14%, 15%, então a Coréia é o país aonde as crianças chegam

diferentes na escola, claro, o background familiar é diferente entre as crianças, mas ao longo

da trajetória educacional, faz com que aos 15 anos, quando fazem o exame, eles estejam

muito próximos uns dos outros e quase todos no indicador satisfatório. Essa talvez seja a

missão mais importante da escola. Quando a gente fala em mobilidade social que a escola

pode trazer, e a escola é o único instrumento de mobilidade social presente existente na nossa

civilização, aliás, é o único instrumento de mobilidade social lícito na nossa civilização, a não

ser as situações que envolvam as artes e o talento. A civilização mundial trata muito bem os

seus artistas, trata muito bem aquelas pessoas que os entretém. Nós pagamos altíssimos

salários a quem nos faz rir e, às vezes, nem tanto altíssimos salários a quem descobre alguma

coisa importantíssima para a ciência ou dá algum passo importante para o desenvolvimento da

civilização. Muitas vezes aquele reconhecimento nem acontece quando a pessoa está viva,

mas aquele que nos faz rir ganha uma fortuna, aquele que nos faz chorar é muito bem tratado

e a gente fica feliz quando compra aquelas revistas e vê como aquele cara que joga futebol

está sendo tão bem tratado pela sociedade, como ele é bem sucedido, como ele tem carros

legais, anda com mulheres bonitas, como tem uma vida tão legal. Isso não nos incomoda. Pelo

menos a maioria das pessoas não se sente incomodada quando vê muita gente que não

estudou, tendo um resultado social tão grande. Mas essas são as exceções. O instrumento de

mobilidade social que existe no nosso planeta é a educação e essa mobilidade social só vai

acontecer se reduzirmos as diferenças que as crianças naturalmente trazem em função da sua

história de vida, da sua situação sociocultural e por várias outras razões. E aí voltando ao

estudo do No children left behind, esse especial do New York Times começa com uma

pergunta, com uma série de perguntas, que parecem perguntas óbvias, mas são, pelo menos a

mim, muito inquietantes. O que faz uma criança ser mais bem sucedida do que outra, uma

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escola ser melhor sucedida do que outra escola? O que faz uma criança passar de ano e

aprender com maior desenvoltura do que outra em uma sala de aula? E dentro da mesma sala

de aula, ou dentro do mesmo bairro, ou até duas crianças gêmeas, que são criadas em

situações muito semelhantes e têm genes muito parecidos e desempenhos completamente

diferentes no processo de ensino-aprendizagem. O que seria isso? São os genes. O que faz

efetivamente as crianças mais pobres terem um desempenho pior do que as crianças mais

ricas, porque essa talvez seja a única coisa, o único indicador universal que nós temos em

educação. É que as crianças de origem social mais pobre têm uma tendência ao fracasso

escolar maior do que as crianças sociais menos pobres. Esse é o único indicador de todos os

países que nós temos, e esse é o esforço que todos os governos fazem para - ou pelo menos

deveriam fazer - para reverter esse processo socioeconômico. Por que é que as crianças

brasileiras que são pobres, já quando nascem, têm um destino que já está escrito para elas? E

que a escola que é capaz de mudar esse destino, que está escrito com o nascimento dela, é no

meu ponto de vista a escola eficaz. Porque o destino que está escrito para essa criança é um

destino de fracasso escolar, de baixa autoestima, de repetências sucessivas.

Eu li recentemente um livro da Maria Helena Pato, que fala que a repetência tem sujeito

indefinido. Você repetiu, não tem alguém que te repetiu. Você foi reprovado, mas não tem

assim, fulano te reprovou. Ou você se reprovou ou você foi reprovado por alguém que

ninguém sabe quem foi. É uma entidade que reprova, é um ser externo. E quando chega o final

do ano, aquele ente produz aquela mágica do mal, que é a reprovação. Então porque que

crianças ricas e pobres têm essa diferença tão grande? É porque os pais das crianças pobres

não ligam para a educação, os das crianças ricas se importam muito com a educação, essa é

que é a grande diferença? Ou as famílias das crianças pobres são desestruturadas e as das

crianças ricas os pais não se divorciam? São totalmente estruturados ou os genes dos ricos são

melhores que os genes dos pobres, será que é isso? Ou as crianças pobres veem mais televisão

do que as crianças ricas, as crianças ricas leem livros. As crianças pobres veem televisão, então

com isso elas não aprendem, são mal sucedidos. O que é que faz uma criança rica ter melhor

desempenho do que a criança pobre?

Bem, na Universidade de Kansas, dois especialistas chamados Hard e Resly selecionaram 42

famílias e fizeram um estudo vendo e gravando, uma vez por semana, essas 42 famílias, tudo o

que as crianças desde recém-nascidas, ouviram até os 3 anos de idade, ou seja, o pré-escolar.

Gravaram e constituíram uma equipe multidisciplinar que foram ouvir o que é que acontecia

na relação entre pais ou, normalmente, a mãe e a criança até os 3 anos de idade. Bem, eles

constataram e, depois fizeram testes com essas crianças, e constataram que, aos 3 anos de

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idade - fizeram teste de QI, ainda que esteja fora de moda, na época ainda se utilizava muito -

chegando à conclusão que o QI das crianças mais pobres era de 79, o das crianças mais ricas

era de 117. As famílias mais ricas não são ricas, eles chamam de famílias de classe profissional,

de famílias de classe trabalhadora, ou seja, profissional porque que tem carteira assinada, uma

carreira, não são exatamente ricos. E a classe trabalhadora é a mão de obra, assim, mais

braçal, menos qualificada. Essa é a diferença. Vou chamar aqui de mais pobres e menos pobres

para ficar mais clara a definição. Eles constataram que as crianças menos pobres tinham um

vocabulário de 525 palavras e, as crianças menos ricas, tinham um vocabulário pela metade.

As crianças mais pobres tinham menos palavras. Com isso tiveram a constatação do óbvio. Por

que é que elas tinham menos palavras? Porque as crianças que tinham menos palavras ouviam

menos palavras. A elas eram ofertadas menos palavras. E essas palavras não são diálogos, não

é? Nenhuma mãe senta na frente de uma criança de 2 anos e fica dialogando durante uma

hora e meia, não é uma conversa. Isso são expressões, a mãe conversa com a criança como se

ela estivesse entendendo, ela fala às vezes quando o pai está presente que o papai já está

chegando, que está vindo, que hoje ele está nervoso ou não está, enfim, o diálogo acontece.

Ainda que a criança não tenha a capacidade de entender, ela recebe uma quantidade de

palavras e expressões que a mãe traduz para o filho. E, muitas vezes, é a conversa mesmo. A

criança vai começar a andar, a criança vai mamar, a criança vai fazer determinadas atividades,

vai brincar com os primeiros objetos e aí deixa cair, vai pegar a colher, coloca na boca, enfim...

Está trocando a fralda, está conversando... E as crianças de camada mais favorecida, segundo

eles, tiveram 580 mil palavras durante os 3 anos. As crianças de camadas menos favorecida

tiveram 275 mil palavras durante esse período, então oferecer mais palavras produz um ser

humano com vocabulário maior. Eles classificaram essas palavras e constataram que, das 580

mil palavras, 500 mil foram de encorajamento e 80 mil foram de desencorajamento nas

crianças mais favorecidas. E nas crianças menos favorecidas, das 275 mil palavras, 200 mil

foram de desencorajamento e 75 mil apenas foram de encorajamento. Ou seja, as crianças de

0 a 3 anos, segundo o Hard e o Resly da Universidade de Kansas, as crianças mais pobres

ouvem muito mais "Cala a boca", "Para com isso", "Para de mexer", "Tira a mão daí", e as

crianças de camadas mais favorecidas ouvem muito mais "Caiu, não faz mal. Levanta de novo",

"Pode mexer", "Ai, que gracinha! Olha só, está comendo", "Olha, está todo lambuzado. Olha,

que gracinha"! O outro fala "Ai, meu Deus, já está todo lambuzado. Acabei de colocar a

roupa”.

Isso não tem nenhuma relação com amar mais ou amar menos. Isso, provavelmente, tem todo

um contexto social e socioeconômico a que essas mães estão expostas que acabam traduzindo

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ou trazendo essa situação de dificuldade socioeconômica para o dia-a-dia dessas crianças.

Claro, o nível de estresse é muito maior, o nível de tensão, o nível de pressão, o nível de

tensão emocional é muito maior. Isso acaba sendo transmitido para as crianças. Isso com três

anos. As nossas crianças brasileiras entram na escola aos seis. Tem três anos depois, antes de

chegar na escola. Você imagina o desnível que nós temos entre mais pobres e menos pobres

nas escolas do nosso país.

Fui visitar a Colômbia para conhecer uma experiência chamada Escuela Nueva que está no

Brasil também, em alguns estados do Nordeste. É um projeto que tem financiamento do Banco

Mundial e parece que por questão política, em alguns lugares onde o projeto está

acontecendo não estão muito favoráveis ao projeto hoje em dia porque estão com algumas

dificuldades de sustentabilidade do projeto aqui no nosso país. E, todavia, na Colômbia, esse

projeto tem 30 anos. Inimaginável ter qualquer coisa no Brasil durante 30 anos. Durar 30 anos

é coisa para o Exército, para a Igreja Católica ou, enfim, para instituições seculares. A gente

não tem programa social no Brasil que dure 30 anos. Ou que dure três... Mas, enfim, a Escuela

Nueva existe há 30 anos na Colômbia e é um programa que foi desenvolvido essencialmente

para as escolas da comunidade rural. O projeto essencialmente acontece na região das

províncias de cafeicultores, os “cafeteros”. Vocês sabem que a Colômbia é o segundo maior

exportador mundial de café, eles exportam essencialmente café para os Estados Unidos. E

aquele café ralinho que vem naquela ‘xicrona’ que a gente vê em filme nos Estados Unidos. É

um café que tem que ser sempre igual, eles trabalham com a seleção de grãos para garantir

que o café, em qualquer embalagem, qualquer momento, seja igual. Isso para um produto

agrícola é dificílimo. Você ter o mesmo produto de natureza agrícola todas às vezes, exige um

esforço muito grande porque a natureza não é igual. Então os ”cafeteros” de lá, resolveram

investir na formação profissional para ter um profissional melhor, para fazer um processo,

para dar uma contribuição profissional e garantir esse indicador de qualidade no café de lá.

Eles têm um gasto por aluno muito menor do que o nosso. A Colômbia tem um indicador de

repetência muito alto. Esse indicador de 9% é, inclusive, um indicador artificial. Coisa muito

comum no nosso continente, na América do Sul, e até no México também. Muito comum nos

países africanos e do Oriente Médio quando não consegue melhorar o indicador, resolvem o

problema mudando o indicador. Quando lutam muito contra a repetência e não conseguem

resolver o problema da repetência, o que é que fazem? Ou passam todo mundo de ano de

qualquer maneira ou então mudam o indicador da repetência, ou passam a buscar a

informação de outro jeito. Isso é muito comum. O colombiano fez isso para reduzir o indicador

de repetência. Vários países africanos reduziram seu indicador de AIDS dizendo que o doente

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não era doente daquilo. Então, com isso muda, melhora o indicador. Aí o ministro fica bem

sucedido. Mas logo essa farsa acaba vindo à tona. Mas enfim, eles têm indicador de

repetência relativamente alto como nós. O Ensino Médio deles só dura dois anos estão

tentando implementar no Ensino Médio o terceiro ano.

Mas o que é que tem de positivo nessa experiência da Escuela Nueva? O que tem de positivo é

que eles conseguiram utilizar a fraqueza que têm a favor deles. Isso não aconteceu de maneira

racional. Isso aconteceu em um sistema de sobrevivência, isso aconteceu por razões de

sobrevivência. A maioria das escolas da área rural do nosso país e da Colômbia também têm

um sistema multiseriado. É Multiseriado porque não tem alternativa, a escola é pequenininha,

as crianças são de idades diferentes, cada uma tem uma série diferente, não tem professor,

nem teria justificativa para a despesa que teriam para montar uma escola não multiseriada,

com tão poucos alunos por turma. E o fato é que a estruturação das escolas rurais brasileiras,

como as colombianas, é multiseriada. Lá a escola multiseriada tem alto desempenho, aliás,

aqui no Brasil também. Uma das coisas que muito me incomodou durante os seis anos que

analisei os relatórios do Programa Nova Escola aqui no Estado do Rio de Janeiro, eu ficava

sempre intrigado: “Mas por que é que essas multiseriadas conseguem ter resultados tão altos?

Deve haver alguma coisa errada. Deve ser porque são poucos alunos". A gente pensava mil

coisas “Será que é porque o professor ajuda na hora da prova? Só tem três alunos. Não é

possível". E as multiseriadas, muitas ficavam no nível quatro. Mas não ficavam no nível quatro

por causa dos indicadores de gestão, porque é mais fácil administrar uma escolinha pequena

que uma grande. Ficavam no nível quatro porque os alunos tinham alto desempenho na prova.

Eu não posso dizer exatamente porque isso acontece. Creio que isso acontece, e eu vi lá em

Manizales isso acontecer, porque a sala de aula multiseriada impede de se fazer o que eu

estou fazendo aqui agora, que é a pior coisa do mundo em matéria educacional. Palestra.

Ninguém aguenta palestra. Se eu não contar piada, se eu não ficar andando de lá pra cá, se eu

não falar coisas que atinjam o coração de vocês, ninguém aguenta. Vocês já experimentaram

pegar uma criança de sete anos de idade e ir jantar fora? É uma crueldade. Senta à mesa e fica

que nem a gente. Duas horas conversando. Três horas. Já comeu, já tomou café, continua

contando coisa... E todo mundo ali sentado. Isso é totalmente absurdo para uma criança de

sete anos de idade. A aula palestra é uma das coisas mais cruéis que podemos fazer com as

nossas crianças. Você achar que pode pegar um ser humano de nove, dez anos de idade e

colocá-la em uma cadeira desconfortável - essa cadeira é uma poltrona - aquela cadeira de

pau, e deixar essa pessoa 800 horas por ano sentada, assistindo uma palestra de um assunto

que ela não está entendendo, é totalmente absurdo. E muitas vezes com vocabulário que ela

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não domina. Então é como se eu estivesse aqui falando russo, explicando um problema

matemático. Você em uma cadeira dura, sem ar condicionado e não pode olhar pra nada e

tem que olhar pra mim. E não pode conversar e, se ficar se mexendo tem alguma coisa errada

com você. Isso se você tomar 10 Red Bulls porque a criança de 10 anos de idade já tem 10 Red

Bulls quando ela acorda. Só quem nunca teve filho ou não teve contato com criança pode

achar que esse projeto vai dar certo. Não vai! Esse sistema de palestras que fazemos é um

sistema que já nasceu para dar errado. E lá, acabou dando certo pela seguinte razão: não tem

professor pra todo mundo. Então como não tem professor para a primeira, para a segunda,

para a terceira e para a quarta, tem que juntar todo mundo na mesma sala. Se eu juntar todo

mundo na mesma sala, eu não consigo falar pra todo mundo a mesma linguagem. Você tem

uma criança com 10, outra com seis, não adianta. Eles se conscientizaram que não adiantaria,

porque senão você iria fazer uma palestra muito simplesinha para o de seis ou muito complexa

para o de 10. Então, nesse caso, só tinham duas professoras para as duas salas de aula: uma

turma com a primeira e segunda série e outra para a terceira e quarta. Sabem o que

aconteceu? Uma entrou em licença. Só sobrou uma. Eu fui ver e pensei “Essa senhora, coitada,

deve estar tomando alguma droga pesada”. Eu chego à escola e ela está em duas salas de aula.

Ela vai de uma sala para a outra. Eles desenvolveram o material didático, que lá dura 10 anos,

eles não têm grana, então o livro tem que durar 10 anos. Eles qualificaram os professores para

dar aulas pelo sistema de mediação. O que eles sabem fazer é isso. Então, na verdade, ela não

dá aula no sentido tradicional. Ela estimula um aluno a ensinar ao outro. E o que é que ela fez

para que os alunos conseguissem permanecer pelo menos na sala de aula? Porque senão eles

não ficariam dentro da sala de aula, eles sairiam. Para eles ficarem dentro da sala de aula, ela

“empoderou” – deu poder a todos os alunos. Todo mundo tem cargo. Parece o parlamento

brasileiro. Todo mundo é cacique. Então você chama e todo mundo se apresenta. O menino

levanta e ela fala:

- O que é que você faz?

- Eu sou o presidente dos estudos de Matemática.

- E você?

- Eu sou o vice-presidente dos estudos de Matemática.

- E o outro?

- Eu sou presidente do recreio.

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- O que é que você faz no recreio?

- Eu garanto que todos brinquem de maneira integrada, que ninguém se machuque, que

meninos e meninas consigam conviver – porque, sei lá, tem realidades totalmente

diferentes, enfim, todo mundo – e tem o vice, em todas as disciplinas, todo mundo tem

um determinado cargo, uma responsabilidade, e não têm altíssimos indicadores, mas

são as escolas rurais da América do Norte, do Sul e Central, exceto em Cuba, que

apresentam os melhores indicadores de escola rural que nós temos em todos esses

países. Ela faz a mediação com material didático, todo mundo faz trabalhos o tempo

inteiro. Claro que seria muito mais interessante se nós agora fossemos ver como está a

educação na Colômbia. Esse grupo aqui vai montar um projeto sobre a Colômbia, estão

aqui os livros, aí apresenta para o outro. Tem revista usada, tem jornal, vamos recortar,

vamos fazer uma dramatização. Como seria esse processo.

Para não fazer uma história linear desses países todos, até porque isso vai durar muito

tempo, eu vou trazer alguns paralelos.

Há uma pessoa chamada Robert Slavey, que tem uma organização denominada Sucess

for All (Sucesso para todos). Ele é integrante da John Hopkins University, e lá montou

um sistema chamado Cooperative Learning (Educação Cooperativa). Recentemente a

revista, acho que a Nova Escola deste mês, eu não li, mas vi que o título é sobre trabalho

em grupo. E a essência do trabalho desse cara é o trabalho em grupo. Onde o trabalho

dele está indo bem é na Pensilvânia, onde o governo realmente está investindo pesado -

ainda não tem os resultados avaliados de forma externa - mas o fato é que ele

desenvolveu uma teoria que é interessantíssima e óbvia. Ele parte do princípio de que as

crianças não querem, efetivamente, não serem crianças. Então quando elas são crianças

dentro do processo educacional, elas aprendem muito mais. Por isso, ele parte do

princípio de que o trabalho em grupo é a melhor alternativa para o desenvolvimento do

processo de ensino/aprendizagem. Aquele conhecido trabalho em grupo, que todos nós

achamos que é coisa de professor que não sabe nada, ou que não quer ensinar, ou que

quer fazer todo mundo passar de ano. Não são as três hipóteses? A criança chega para o

pai que fala: - O que é que teve?- Trabalho em grupo. - Ah, pronto. É para arrumar os

dois pontinhos que estão faltando. Ou é para ficar todo mundo de farra. Ou é o

professor que não sabe nada e bota a criançada fazendo isso para ele ficar descansando.

E, na verdade, é possível o professor ensinar Ciências sem ter formação em Ciências, até

porque não vai ter formação em todas as áreas, se ele fizer através da aprendizagem

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cooperativa. Se ele tiver que fazer palestra, ele não aguenta fazer. Você não consegue

fazer palestra sobre um assunto que você não sabe, mas você consegue ensinar sobre

um assunto que você não domina, desde que você estimule as pessoas a buscarem a

aprendizagem. Que você tenha o senso crítico de saber se aquelas informações são

valiosas ou não. Isso é possível. A teoria dele é imensa e eu nem conheço a teoria toda.

Eu li um livro dele, mas o que estabelece é mais ou menos o seguinte: o trabalho em

grupo é bem sucedido se, além da missão do grupo, tiver a missão de todo mundo

aprender. E se todo mundo for avaliado coletivamente, ou seja, se a missão, em vez de

se estudar o Escuela Nueva da Colômbia e apresentar o projeto do Escuela Nueva da

Colômbia, se esse for um pedaço da missão, mas a missão mais importante for todo

mundo saber da Escuela Nueva da Colômbia, a ótica do trabalho em grupo muda

completamente porque aí não fica um "Olha, você recorta, você escreve. Eu não faço

nada. Você compra a cartolina e eu ofereço a casa e os biscoitos". Nessa tarefa quem

oferece a casa e os biscoitos só entrou com a casa e os biscoitos. E aí tem um que vai

fazer o trabalho mesmo e o outro só vai recortar não sabe o quê. "Olha, recorta uma

pessoa aí". Então não existe o senso de todo mundo ter de aprender. Então, depois, se

você reunir o grupo e fizer perguntas para todos do grupo e se chamar um grupo para

perguntar ao outro e o outro para perguntar ao um, todo mundo tem que aprender. E se

a minha nota for dividida com a sua nota? Se a nossa nota resultou das suas respostas

mais as minhas, divididas por dois, eu tenho que te fazer aprender senão eu estou frito.

Muitos pais não gostam disso porque os alunos de alto desempenho acabam sendo

prejudicados, e ele não acha que isso tenha que ser 100% do caminho. Tem formas de

você pesar a avaliação, de fazer perguntas mais fáceis para grupos com maior

dificuldade de aprendizagem para tornar a disputa razoável. E o prêmio não precisa dar

dinheiro a ninguém. Nós vamos criar, talvez aqui no nosso país, um histórico de dar

dinheiro as pessoas para aprender. Ele fala que no futebol, por exemplo, no Brasil, as

crianças treinam e jogam muito para ganhar um pedacinho de metal, uma fitinha, um

aplauso, algum tipo de reconhecimento. Então necessariamente a aprendizagem

cooperativa e a recompensa da aprendizagem cooperativa não precisa se sustentar em

algum tipo de premiação financeira, mas o simples reconhecimento já é suficiente.

Agora vou falar sobre o Sistema Educacional no Chile. O Chile tem, como falei

anteriormente, três etapas de Reforma Educacional. A reforma começou em 1996 e tive

a oportunidade de ir ao Chile em 98. E o que caracteriza as três etapas da Reforma

Educacional do Chile? Primeiro, eles entenderam que existiam escolas de baixo

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indicador educacional e outras de alto indicador educacional, numa rede extremamente

heterogênea. A rede do Chile é parecida com a rede do Estado do Rio de Janeiro, em

tamanho e também em heterogeneidade. Nós temos escolas com alto desempenho e

escolas com baixo desempenho também. Temos que tomar cuidado porque, às vezes, as

escolas com alto desempenho têm um exame de ingresso que aí o alto desempenho é

darwinista. Não é um alto desempenho porque a escola é uma ótima escola, mas é um

alto desempenho porque os sobreviventes acabam tendo um alto desempenho. Apesar

disso, nós temos escolas que aceitam matrículas de forma generalizada e, mesmo assim,

conseguem obter alto desempenho, apesar dos indicadores socioeconômicos que essas

unidades têm. No Chile, eles constataram isso e iniciaram um programa chamado P900,

onde selecionaram as 900 escolas com pior desempenho e fizeram investimentos

educacionais na razão inversa dos indicadores das unidades escolares.

Resumindo, o que aconteceu na primeira etapa da Reforma Educacional do Chile de

1996 até 2004 foi que eles fizeram tudo que todo mundo acha que dá resultado em

Educação. Pelo menos o senso comum é esse. Eu tenho certeza absoluta que se você

entrar em um supermercado e chamar as pessoas que estão fazendo suas compras e

perguntar o que é que eles acham que deve ser feito na Educação Brasileira, eu tenho

certeza absoluta que ou não respondem nada ou dizem coisas assim, meio

fragmentadas assim como, “pagar melhor aos professores”. Mas a única política

educacional que vai aparecer vai ser “escola em horário integral”. E quando a primeira

pessoa falar isso, todo mundo vai repetir a mesma coisa como se fosse um mantra, e a

solução do problema educacional do nosso país. Vide as pesquisas qualitativas das

campanhas políticas. Eu assisti várias. Fica todo mundo perdido quando se fala em

Educação. Alguns falam do professor, assim, espontaneamente. Tem que valorizar e

pagar melhor! Até que alguém fala em horário integral. Até prepara um discurso... Um

pai, uma mãe, e faz um discurso bacana sobre isso. Na hora cola em todo mundo e não

sai daquilo. Por isso é que os nossos políticos costumam falar sobre esse tema. Porque o

eleitor fala sobre isso. No Chile, todas as escolas têm horário integral. Todas as escolas

têm Internet em banda larga. Aumentou em 150% o salário dos professores.

Infraestrutura completa. Uniforme para todo mundo. Transporte. Quase teve morte por

causa do transporte. Os temas de infraestrutura foram extremamente abordados bem

como o investimento que o Chile fez em educação. O Chile teve um ciclo virtuoso de

exportações por causa da alta do cobre no mercado internacional e enterrou o dinheiro

nisso. O governo chegou a aumentar o seu investimento em educação, percentual ao

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PIB, de 4,5% para 7%. Os grandes gastadores, Japão, Canadá, Estados Unidos, esses são

os que gastam muito em educação. A Finlândia gasta o mesmo que o Brasil, 4,5% do PIB.

Claro que o PIB per capita deles é maior. Mas o que acontece? Eles fizeram isso tudo e

no PISA de 2001, por exemplo, o indicador foi muito abaixo das expectativas da

sociedade. Não quer dizer que isso esteja errado. Citando o livro do Professor Nigel, se

você lê a primeira metade do livro, vai dizer “Bom, não adianta fazer mais nada. Vamos

desistir”. Porque as questões de infraestrutura favorecem, mas não trazem resultados

nos indicadores educacionais. O Chile fez um investimento enorme, isso a um custo da

sociedade, um custo altíssimo, que, para se colocar mais dinheiro em educação, sem

tirar dinheiro de algum outro lugar, exige um aumento da carga tributária da população.

E a população aceita isso pela causa da educação até mais do que aceita por outras

causas. Eu fiz uma pesquisa com o IBOPE sobre esse assunto e a população acha

razoável até ter um imposto extra para a educação. Mas tem que ter resultado, esse

resultado tem que aparecer. Quando não apareceu, houve uma grande decepção da

população chilena e eles iniciaram uma segunda etapa do processo de Reforma

Educacional já em 2008, buscando o início da responsabilização. Essa reforma está

caminhando até hoje e, até o ano passado quando eu estive lá, eles tinham

efetivamente estruturado um sistema de responsabilização mais alta. Como eles acham

que estão dando condições quase ideais para a rede pública chilena, coisa que nós não

temos no Brasil, há um preço muito alto do sistema educacional como um todo, eles

acham que existe um problema muito grave na questão da formação do profissional da

educação e estão estabelecendo um sistema de responsabilização do sistema

educacional.

O programa chileno chama-se Docente Más, cujo material está todo na Internet.

Levaram 11 anos negociando com o sindicato para que o programa fosse aprovado e,

em rápidas palavras, funciona assim: Eles contrataram a Pontifícia Universidade Católica

do Chile e reuniram 400 especialistas, qualificaram e nivelaram esses 400 especialistas

para fazer a análise de uma aula e análise de um professor. Estabeleceram uma relação,

um sistema de carreira, não é um sistema de gratificação, é um sistema de carreira em

que o salário pode ser aumentado de 5% a 25% de acordo com o desempenho do

professor nessa carreira. Como é que ele tem o aumento salarial? Ele primeiro se

inscreve, faz sua inscrição para uma primeira avaliação por esses 400 especialistas. Com

essa avaliação, ele monta um portfólio. O portfólio, ele constrói da seguinte maneira: é

fornecida ao professor uma lista de telefones de filmadores, na cidade ou no próprio

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bairro dele. Ele liga para essa pessoa e fala:

- Você é um dos credenciado do Ministério da Educação?

- Sou.

- Quando é que você pode vir aqui gravar minha aula?

- Quando é que o senhor dá aula?

- Eu dou aula terças e quintas, ou segunda à quarta, ou terça e quinta, em tal horário.

- Está bem, em um desses dias, eu vou aí.

O filmador se organiza, aparece na escola e filma uma aula do professor. Eu assisti

algumas. No início, é um ator. Depois vira um ser humano normal. Ninguém consegue

sustentar 50 minutos sendo o que não é. Não dá. No início, a gente vê que a pessoa está

nervosa, está com o vocabulário um pouco mais elaborado, está preocupada com a aula.

Depois, é a aula da pessoa. A essa aula filmada se junta o material que o professor

xerocopia dos cadernos dos alunos. Ele recebe 100 dólares de bônus para se inscrever

no sistema. Para ter esse trabalhão todo, ganha 100 dólares e, com isso, ele custeia

algumas despesas. Claro que a xerox ele utiliza a da escola mesmo, ele tira xerox do

caderno dos alunos, de alguns trabalhos, além dos trabalhos de caderno, alguns

materiais que ele acha relevante, uma prova que ele fez que achou que foi bem feita,

um trabalho em grupo que achou interessante... Ele reúne uma quantidade de material

e junta com o DVD, que ele depois verifica se foi bem gravado, se a luminosidade está

correta, se o áudio está bom. Além disso, ele procura um avaliador par, que é um

avaliador que tem uma formação acadêmica semelhante à dele, na mesma área do

conhecimento, para fazer uma avaliação do trabalho que ele faz. Pode ser um

conhecido, pode ser da mesma escola ou não. Além disso, ele pega o testemunho do

orientador pedagógico, um texto, uma análise técnica do trabalho dele. Pode ser o

diretor da escola ou o orientador pedagógico, se o diretor da escola tiver formação em

Pedagogia, ele faz uma análise desse profissional. Ele junta isso tudo e manda para a

PUC. A PUC recebe esse material e classifica esse trabalho pelo conteúdo, pela didática,

pela abordagem, interdisciplinaridade, isso tudo, em quatro níveis: destacado, que é o

top, competente, básico e insuficiente. São quatro níveis distintos. No nível básico, ele é

um profissional bom, mas com alguns momentos ruins. Ou seja, ele é irregular na sua

capacidade profissional. Então, com base nisso, ele entra direto no programa de

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capacitação. Se for considerado insuficiente, ele sai de sala de aula porque se ele está

fazendo um trabalho tão desastroso assim, é melhor parar de ensinar e a gente começar

um programa de capacitação do início. Se ele ficar três anos como insuficiente, ele sai do

sistema. Só 4% saíram até agora. É demitido. Se ele for classificado nesse penúltimo

nível, básico, ele entra no sistema de capacitação continuando a dar aulas e tem chance

de progredir. Se ele não progredir, vai permanecer ali, naquele estágio. E se ele for

classificado como competente ou destacado? Ele faz uma prova. E se ele ficar

competente e competente, ele vai ter 15% de aumento. Se ele for classificado como

destacado e destacado, ele vai ter 25% de aumento. E assim sucessivamente. Todo

mundo é obrigado a fazer, mas, como a fila é grande, demora. E a ministra da Educação,

a Professora Gimenez, prometeu que vai punir quem não aparecer um dia para fazer a

sua avaliação. Ninguém sabe se vai fazer mesmo, porque existe toda uma questão

política, etc. A autoavaliação tem 10% do peso e a entrevista com o professor par tem

20% do peso. Esse é o timeline do programa de melhoramento, no início do projeto,

elaboraram material didático específico... A segunda parte em 2006... Acho que é

basicamente o que eu falei. Os valores salariais são altos.

Irlanda.

A Irlanda é um país que paga muito bem os professores. Quando tenho oportunidade de

visitar um país desses ou uma escola em outro país, a primeira coisa que faço é ir ao

estacionamento da escola para ver os carros. Porque se você perguntar ao professor se

ganha bem, todo mundo vai dizer que ganha mal, então a verdade está no

estacionamento. Vendo o carro das pessoas. E na Irlanda os carros no estacionamento

são excelentes. Eu andei no carro do diretor de escola, um carro alemão. A Irlanda

esteve 800 anos sob dominação inglesa, as escolas são essencialmente administradas

pela Igreja Católica. Ser católico na Irlanda não é uma opção religiosa no meu ponto de

vista. Ser católico na Irlanda é ser irlandês. Ser protestante é ser contra o seu país. Não é

uma questão de crença. Porque o invasor era protestante, então ser católico é ser

contra o invasor. É a mesma coisa que se a Argentina invadisse o Brasil durante 600

anos, levasse as nossas reservas, desse os melhores postos nos governos, os melhores

postos nas indústrias aos argentinos durante séculos e a gente aprendesse espanhol.

Voluntariamente não acontece isso. Os países que lutaram contra os invasores,

simplesmente, lutam contra tudo o que pode vir daquela cultura. E a questão religiosa

foi muito importante para a resistência do povo irlandês, para que eles mantivessem a

língua. Inclusive, eles ensinam na escola o irlandês, que é dificílimo, mas mantém a

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identidade cultural. E mantiveram a identidade cultural com o maior tempo de

dominação da História da humanidade até hoje, 800 anos. E a escola é administrada

pela Igreja Católica. Existem várias razões para o sucesso da Irlanda, mas o fato é que

eles são grandes detentores de marcas e patentes e fazem um investimento muito

grande na área da formação científica, mas há um fato que eu quero destacar na

educação irlandesa. O número de imigrantes é muito grande hoje na Irlanda e os

salários são muito altos. Por isso tem muita gente, muitos estrangeiros indo para a

Irlanda. Eu conversei com pessoas do Conselho Nacional de Educação para tentar

entender como acontecia o processo dos imigrantes. O que acontece lá é que quando

chega uma pessoa de outro país, ele não entra direto em sala de aula. Ele vai para a sala

de aula, mas antes passa a ter uma quantidade enorme de classes de reforço no idioma.

O idioma é a única forma de aprender. Aquela história que eu falei de ensinar

Matemática em russo, ainda que Matemática seja uma linguagem universal, não dá para

aprender. Você imagina um brasileiro ir para a Irlanda sem falar inglês para assistir uma

aula? Não vai aprender absolutamente nada. E o que acontece na Europa com muita

intensidade, e na Irlanda com enorme intensidade. E qual é a grande preocupação dos

irlandeses? É que um asiático ou um latino americano, ou um africano vá para a Irlanda

em busca de uma oportunidade. Chegando lá, ele não possui uma formação alta, mas

ele sabe ser bombeiro e consegue ganhar bom salário porque o irlandês não quer

trabalhar consertando cano. Qual é a primeira coisa que ele faz? Traz a família. E eles

vão morar onde? Em uma rua aonde já mora alguém do mesmo país dele. Ele vai ser

vizinho de um filipino, que já foi há mais tempo, que, aliás, foi quem deu a dica que na

Irlanda há mercado de trabalho para bombeiro. Aí ficam as duas casas de filipinos, um

do lado do outro. As mulheres, claro que são países de Terceiro Mundo, são impedidas

de trabalhar. E também têm certos receios, querem cuidar da família, e acabam tendo

uma vida de dona de casa, o que é possível em um país como esse. Aí o que acontece? A

filipina com a filipina fala o quê? Tagalo. Claro! Os dois vão falar tagalo. Ou sebuano,

dependendo da região de onde eles vêm. Os filhos vão falar o quê? Inglês, irlandês? Vão

falar tagalo. E o pai? O pai fala tagalo o tempo todo com os amigos e um pouquinho de

inglês, só o necessário para cobrar conta, dizer qual é o serviço que será feito. O mínimo.

E ali vai começar a se formar um grupo de filipinos, daqui a pouco um bairro de filipinos.

E esses filipinos vão acabar desenvolvendo valores sociais das Filipinas. E vão se sentir

na Irlanda de passagem. O dinheiro que eles ganham, eles mandam para a Filipina. E o

sonho deles é voltar com grana para as Filipinas, ou seja, aquilo ali é um país de aluguel.

Então cometer um crime, pagar impostos, contribuir para a sociedade, se relacionar com

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o sistema social, não é comum. Vocês acham que isso é um problema europeu? Esse

problema tem enorme semelhança com o que acontece no nosso país. O Brasil tem essa

situação também. A barreira do idioma acontece entre as camadas extremamente

desfavorecidas e a categoria do magistério. Porque a categoria do magistério tem

habilidades de leitura e compreensão de texto razoáveis. Não são maravilhosas,

infelizmente, mas são de razoáveis para cima. O professor fala a linguagem culta. A

criança das camadas extremamente desfavorecidas do nosso país fala uma linguagem

própria. Não sei se alguns de vocês já tiveram contato, eu já tive várias vezes, é um

idioma muito diferente. O ‘já é”, a rapidez e a pobreza de vocabulário é imensa. Talvez

nós tenhamos uma parcela de crianças nas nossas salas de aula que não entendem o

português que o professor está falando. Peguem o filme em DVD “Pro dia nascer feliz”.

Vejam como os estudantes falam entre si. Tem um pedaço de uma aula em que o

professor fala sobre a Revolução de 30, a oligarquia rural dissidente. O que é isso? O

tenentismo. O tenentismo é uma coisa de tenente. PM talvez. Oligarquia rural e

dissidente. Oligarquia. E a política do café com leite. E falar de Getúlio Vargas! A

professora ainda fala "Porque Getúlio Dorneles Vargas".

A maneira, a abordagem e o idioma, eu acredito que pode estar na base de muitas

situações, não digo que sejam todas, ou problemas da Educação brasileira, mas, talvez,

estejam na base de muitos fracassos escolares. Isso é enfrentado na Irlanda da seguinte

maneira: eles investem no idioma e dão classes especiais do idioma e colocam dois

alunos ou três, que não falam aquele idioma, aprendendo, aprendendo, aprendendo

porque é no idioma que está a raiz da integração social. E a desintegração social que nós

temos no nosso país pode estar aí, pode ter como uma das causas as diferenças

idiomáticas que nós achamos que não temos. Mas creio que temos. E se você vê essa

criança conversando com os amigos dele durante 8 horas por dia, falando com a mãe

dele durante 3 ou 4 horas por dia, com o pai dele, quando tem contato com o pai, 1 ou 2

horas por dia, e quando ele chega na escola, o idioma que ele recebe é quase outro.

Existem diferenças graves em quantidade de vocabulário, em estrutura fonética que ele

tem que passar pelo menos 800 horas por ano, ouvindo outro idioma.

Finlândia.

É lá que estão os melhores indicadores educacionais do planeta. Melhores até que dos

da Coréia. Eles entram na escola aos sete anos e não aos seis. Eles chegam a ter dois

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anos acima da média européia. Eles têm, pelo menos, quatro anos de escolarização

acima do Brasil, ou seja, uma criança com 14 anos na Finlândia tem um indicador de

solução de problemas de Matemática ou de linguagem e interpretação de texto melhor

do que uma criança brasileira com 14 anos, que tem o indicador pior do que uma de 10

anos na Finlândia. Não vai dar tempo de mostrar, mas vai estar na Internet para vocês,

mostrando entre os municípios do Rio de Janeiro, crianças com 10 anos, crianças com 14

anos de idade com indicador de Língua Portuguesa e de leitura inferior a uma criança de

10 anos. No Estado do Rio, em redes públicas diferentes. E o indicador de gasto por

aluno, vocês vão ver que o gasto por aluno não tem uma relação direta com o

desempenho dessas crianças.

Na Finlândia, eles trabalham muito a questão da equidade, não tanto quanto os outros

países, como faz a Coréia. Na Finlândia, eles trabalham com um professor a mais em sala

de aula para fazer o acompanhamento das crianças que têm determinadas dificuldades,

que podem ser dificuldades de natureza neurológica, cognitiva ou emocional, ou pela

questão socioeconômica, dão aulas de reforço e, efetivamente, um esforço coletivo e

uma visão da sociedade contra essas dominações de que falei anteriormente. A

Finlândia tem altos indicadores educacionais, porém a única coisa que eu vi

efetivamente boa é uma grande autonomia dos diretores de escola. Podem contratar e

demitir os professores diretamente. Eles é que fazem a folha de pagamento. Isso é uma

diferença administrativa enorme entre a escola pública desse país e de vários países do

mundo. Eles têm a questão do amparo ao aluno com dificuldade de aprendizagem, por

isso é muito comum ter um biombo na sala de aula. O professor auxiliar chamam 2, 3 ou

4 alunos que ele está vendo que não estão acompanhando, chama-os no meio da aula

para trás do biombo e dá uma aula paralela àquela que está acontecendo para fazer a

recuperação simultânea. Não é recuperação paralela. É recuperação em tempo real.

Porque, às vezes, o aluno não tem a base. Está faltando um pouco mais da

aprendizagem daquele assunto para fazer o click. Se conseguir, muito bem. Se não, vai

para a aula de reforço. E não tumultua a aula, eu achei que isso era absolutamente

impossível. Falei “Bom, não vai conseguir”, mas são cochichos. E, às vezes, o professor

auxiliar senta do lado do aluno. Eu pensei que esse aluno iria ser ridicularizado, falando

"Olha aí, o cara do lado dele. Olha lá o burro". Eu não vi isso. Porque criança é cruel

mesmo, não é? Isso faz parte, isso tem que ser trabalhado no sistema educacional.

Muitas escolas conseguem fazer isso e eles, de certa forma, conseguiram.

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Nova York

Eles fizeram uma Reforma Educacional na cidade de Nova York bastante ampla. Vou

falar de alguns fundamentos mais importantes. Eles dividiram as escolas em, no

máximo, 300 alunos. Aliás, isso é presente em todos os países que eu visitei até hoje, e

que tiveram sucesso nos sistema educacional. Escola com mais de 300 alunos é tido

como escola que não funciona. As escolas de 1000 alunos, 1500 alunos nos Estados

Unidos foram fracionadas em 3. Tinham 3 andares, tem uma escola em cada andar. Aí

não tem banheiro de professor naquele andar, não tem sala de professor naquele andar.

É assim que está rolando. A explicação que o diretor da Secretaria de Educação deu é

que, se você acha que não pode ter mais de 40 alunos na sala de aula, o diretor não

pode ter mais de 40 professores porque, se ele é um professor dos professores, se ele

tiver 150 professores ou 150 alunos, ele não consegue administrar o processo de

ensino/aprendizagem, não consegue participar do processo de ensino/aprendizagem

com 150 funcionários. No encerramento vou falar mais um pouco sobre isso.

Eles fizeram um investimento enorme na qualificação de diretores, criaram uma

academia New York City Leadership Academy ou New Leaders for New Schools. São

duas academias, uma é não governamental, pequenininha, mas de excelência. A outra é

grandona, do governo, porém não tão boa. Mas estão qualificando diretores de escola,

não é qualificar diretor de escola contando história e fazendo palestra mais uma vez.

Eles fazem estudo de caso o tempo inteiro. Eles chamam pais que, na verdade, são os

funcionários da instituição que se fingem de pais de alunos e testam como é que o

diretor se sairia em uma discussão. Eles falam assim “Ah, porque estão brincando com o

nome do meu filho. O nome dele é...” - e é um nome engraçado mesmo. Tem diretor

que ri. Aí o cara fala “Isso é um absurdo. Minha família é tradicional, não sei quantos

anos"... Começa a gritar e vê como é que o diretor se sai. Eles filmam o diretor e

mostram a ele. Como é que ele estava agindo diante dessa circunstância. “Está

acontecendo preconceito com o meu filho”, enfim, pessoas que demonstram um

enorme nervosismo e vê como o diretor se sai.

Um desses diretores é o psicólogo Ky Adderley, que tem toda uma característica

especial. Ele mudou o gabinete dele para o corredor da escola, botou a mesa e o

computador no corredor da escola para ver os alunos o tempo inteiro. Quem chega

depois do horário. A aula começa às 7h, quem chega às 7:05h. Se não chegar às 7:05h,

ele liga para os pais. Celular ou para a casa. Se o aluno chega 3 vezes atrasado, ele vai na

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casa. Bate, sem avisar. E chega para tomar um café. Ele quer mostrar que se importa

tanto ou mais com a educação dos filhos deles do que os próprios pais. E a visita do

diretor da escola nessas famílias é uma autoridade que está chegando.

Esse professor pegou uma escola com 20% de graduação no Ensino Médio. Eles têm um

indicador de graduação, eles pegam o orçamento da escola e dividem pelo número de

graduados. E a escola é boa, quanto mais graduados possuir na escola, quanto mais

alunos chegarem ao Ensino Médio. No Brasil, a escola tem seis turmas de primeira série,

três de segunda e uma de terceira com 18 alunos. Lá eles têm três turmas de primeira,

três de segunda e, estranhamente, três de terceira. A taxa de graduação que esse

diretor conseguiu passou de 20% para quase 100%. Estão com 97%, 98%. Por ter

conseguido essa proeza, ele é uma pessoa até festejada nos Estados Unidos. Mas o que

é que esse diretor fez de diferente? A diferença foi por ele e a equipe dele terem

algumas crenças. É basicamente ideológico o trabalho que essas pessoas fazem. Eles

acreditam que o aluno precisa aprender para realizar a sua mobilidade social, que todo

mundo é capaz de aprender, que a tarefa de educar não é responsabilidade solitária do

professor e sim coletiva, que os indicadores educacionais refletem o nível de proficiência

dos alunos - as pessoas têm que acreditar nisso, que os indicadores favorecem a

construção de uma estratégia eficaz, ou seja, é possível desenvolver projetos

educacionais e que os professores são capazes de elaborar e executar esses projetos.

Eles falam de forma coletiva o tempo inteiro. Eles colocam fotos por todos os corredores

dizendo que todos vão aprender. O que é algo que não é comum no ambiente escolar

do Brasil. Eu vi o diretor de uma escola conceituadíssima, quase número um no ENEM,

particular, levantar em uma reunião de professores e falar “Recuperação onde todo

mundo passa, tem alguma coisa errada aí". Ah tem alguma coisa errada. Como é que

todo mundo passou? Ou seja, para nós, todo mundo passar de ano é porque o professor

é frouxo. Ele nem é respeitado pelos seus colegas, pelos alunos, pelos pais. O professor

que tem 100% de aprovação tem perda de status. O status está na repetência. O status

profissional, ele é conquistado na base do alto indicador de repetência, dos nove zeros

no primeiro bimestre que ele distribui pela turma. Eu vi outro professor que faz uma

curva - é um professor de Matemática -, faz uma parábola: “Todo ano eu faço a mesma

coisa, eu pego as provas e tem um percentil que vai repetir, tem o percentil que vai ter

tal nota, tem o percentil que vai estar aqui e tem o percentil que vai ficar em

recuperação, não tem jeito. Seja lá quem forem as pessoas, o meu jeito é esse”. O

resultado vai ser o mesmo, ele é estável na repetência anual.

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Finalmente, a Coréia.

A Coréia é um modelo de igualdade e oportunidades. É um país que pode ser

questionado no seu modelo educacional porque existe uma verdadeira histeria pela

educação na Coréia. O Congresso de Educação, inclusive, teve várias críticas e uma das

críticas muito sólidas no meu ponto de vista, é que o aluno, a criança, o jovem da Coréia

estuda 16 horas por dia e tem um indicador não tão melhor que uma criança da

Finlândia, que estuda 6 horas por dia. Então se você pegar o PISA (Programa

Internacional de Avaliação Comparada – cuja principal finalidade é produzir indicadores

sobre a efetividade do sistema educacional avaliando o desempenho de alunos na faixa

dos 15 anos, idade em que se pressupõe o término da escolaridade básica obrigatória na

maioria dos países) e comparar com o número de horas, você vai ver que, na verdade, o

indicador da Coréia não é tão alto assim. Porque o esforço social, o esforço coletivo, o

esforço das famílias nesse processo é um esforço extraordinário. E a educação na Coréia

tem todo um sistema educacional, mas existe uma enorme competitividade pelas

universidades de excelência, como o Brasil já teve no tempo do vestibular unificado. A

classe média tinha uma verdadeira histeria com relação ao vestibular - hoje ainda tem

um pouco - uma verdadeira histeria pelos postos nas melhores universidades porque

aquilo garantia o futuro daquele jovem. Hoje em dia não garante tanto. Aquele que

passava para Medicina na UFRJ, a mãe dizia "Bom, minha missão acabou. Agora é só ter

a glória de um filho médico formado pela UFRJ, que vai ter um salário maravilhoso e

pronto". Hoje existe de maneira menor, mas na Coréia é exatamente isso. O nirvana está

em determinadas universidades, as famílias investem pesado e, inclusive a comunidade

participa da seguinte forma: Se uma criança de baixa origem social, em uma

determinada comunidade, consegue ter altos indicadores educacionais, a comunidade

se reúne em torno desse jovem, ou quando um determinado jovem de uma família está

no ano do vestibular, todos os irmãos sabem que a atenção vai ser para ele. O melhor

lugar, o que tiver, vai ser para ele. Eles passam a ser cidadãos de segunda classe na

própria família e são diferenciados dentro desse processo. A família coreana gasta, em

média, 22% do seu orçamento com escola, com reforço escolar que, às vezes, é dado na

própria escola e às vezes, é dado em casa. 22% do orçamento. Imagina se isso

acontecesse no Brasil. A Reforma Educacional aconteceria assim, na hora. Sabem por

quê? Porque se você for falar com uma mulher da classe trabalhadora, que acredita que

a educação é o caminho para a mobilidade social dos seus filhos, e não quer que eles

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repitam o ano, existem várias. Ela contrata uma explicadora por R$10,00. E o que é que

ela faz? Vê a hora em que a explicadora chega e vê a hora que a explicadora sai. Ela vê

se está tendo brincadeira ou se está estudando, ou se a criança está prestando atenção,

se a professora está efetivamente passando exercícios. Ela pergunta ao filho se ele está

indo bem, se ele está aprendendo, se está gostando. E o que é que ela quer? Saber se no

final do bimestre a nota aumentou. Não é assim? Isso é só da camada popular? Não, na

classe média é a mesma coisa. As mães de classe média contratam professor particular e

têm uma postura extremamente vigilante com o horário de entrada e de saída, com a

aprendizagem que está acontecendo, se a nota está acontecendo... Se a nota não está

acontecendo, ela está deixando de comprar alguma coisa para ela e está botando

dinheiro naquilo ali. Mas a escola também não é assim? Ou só cobramos do professor

particular que a gente paga? A postura pró-ativa das famílias brasileiras com os seus

professores explicadores, professores particulares, é uma postura extremamente

consciente, participativa, às vezes até agressiva. Não é a mesma postura em relação à

escola.

Essa mobilização que acontece em algumas escolas desse modelo de Reforma

Educacional, nesses países, é o que faz diferença no processo de Reforma Educacional.

Essas famílias, professores, diretores e orientadores educacionais, alguns ganham

salários enormes, outros ganham salários muito baixos, uns têm realidades excelentes,

outros têm realidades terríveis. O que eles têm em comum não é infraestrutura, não é o

salário e nem é a formação, que é importantíssima. É efetivamente a geração de altas

expectativas nas crianças e jovens. Eles trazem um profissional formado, um dentista e

falam “Nessa cadeira aí onde você está sentado, esse cara aqui sentava aí. E tinha aula

com essa professora aqui. E o quadro negro era esse aqui. O banheiro era o mesmo e o

pátio também. Olha aonde esse cara chegou. Você também é capaz”. Primeiro: são

capazes então de gerar altas expectativas no jovem. Ele não precisa estudar o

Absolutismo para ser caixa. Não precisa saber o que é mitocôndria para ser caixa. Se nós

não gerarmos altas expectativas, eles não vão enfrentar o desafio da complexidade

curricular do Ensino Médio. Segundo: apesar das suas dificuldades, apesar do seu

desamparo, eles tentam criar uma rede de relacionamento positiva na escola. Se entrar

uma pessoa na sala de aula e destilar todas as suas frustrações, amarguras, todas as

suas tristezas que teve ao longo do dia, ao longo da semana, ao longo da vida, aquilo se

espalha pela escola em uma rede de relacionamentos e contamina as outras salas,

contamina todas as áreas da escola. Aquilo é expelido e absorvido por quem sabe

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absorver, que são as crianças, que vão expelir para os seus colegas, que vão transmitir

para as suas famílias, e aquele sentimento de frustração e derrota se autoalimenta. Em

terceiro lugar: os diretores dessas escolas não acham que são diretores de centros

sociais. Eles acham que são diretores de escolas e que o ramo é aprendizagem. Porque a

escola, ela é um centro social, aliás, ela é um centro social que, às vezes, ensina. E não é

uma escola que, às vezes, funciona como centro social. Não é um lugar onde se aprende

que, às vezes, tem uma festinha. É, muitas vezes, um centro social onde eventualmente

se aprende. Se você pegar um cronômetro e andar com uma criança em muitas escolas

durante uma semana e bater no cronômetro o tempo de aprendizagem efetiva, de

atividade cognitiva real, você vai se surpreender como pouco isso acontece. Porque a

demanda do centro social, ela é presente, a demanda educacional é invisível. Aliás, a

demanda educacional, muitas vezes, não acontece. A demanda do centro social é real.

São 150 funcionários, um entra de licença, o outro fica doente, o outro não veio, o outro

chega atrasado, o outro é maluco, o outro é chato, o outro é revoltado. Tem que

administrar esse mundo de gente. Os pais não vão à escola para reclamar que as

crianças não estão aprendendo porque isso aí é normal. Vêm reclamar porque faltou

merenda, porque um brigou com o outro, porque estão achincalhando com o filho...

Vem reclamar disso. Nervosíssimos, tensos. Aí, a escola tem um restaurante que serve

600 refeições por dia. Sabe o que é servir 600 refeições por dia? Tem muito restaurante

que não serve 600 refeições por dia. Então tem a compra de alimento, tem controle de

estoque, tem que controlar a limpeza, tem que controlar os vetores. Se tiver alguma

coisa estragada ali dentro, você vai preso. Se alguém ficar doente, uma criança dessas

pode morrer. Muitas escolas possuem cozinha que é como se fosse um restaurante de

600 refeições por dia, que está te demandando o tempo todo. Faltou panela, quebrou

não sei o quê, faltou gás, estourou o cano d'água, está voltando esgoto para dentro da

cozinha. Se faltar merenda, é passeata batendo panela. Se todo mundo for reprovado, é

tranquilo, são preguiçosos mesmo. Esse é o processo, então é natural que aquela equipe

gestora administrativa vá atender o aluno que está gritando pelo histórico escolar ali

fora. O debate educacional acaba não acontecendo. Porque é dificílimo ensinar

Matemática. Exige muito, exige demais! Do professor, do aluno, do pai, da mãe, de todo

mundo. E ninguém sente dor quando não aprende. Não dói. Se você vai ao hospital e

não é tratado e não toma o remédio, o que é que acontece? Dói. Quando dói, a mãe fica

louca, quebra o hospital. A família vai reclamar do médico. O médico ficou de chegar às

6h, não chegou. São 6:30h. O médico ficou de chegar às 8h e não chegou. Cadê a

enfermeira? Cadê o médico? Está doendo. A ignorância não dói na hora, só dói depois.

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Então, se você receber uma criança na sua escola, e fizer muitas coisas importantíssimas

de verdade, como escovar o dente, ensinar a tocar violão, colocar em um grupo de

teatro. Depois ele almoça e aprende hábitos de higiene, aí vai ao dentista para ver se o

dente dele está legal, faz exame de vista para ver se ele está enxergando bem, vai no

médico para saber se o peso dele está legal, enfim, ele pode ter uma agenda intensa

durante a semana inteira de coisas relevantes e importantes... Uma palestra sobre DST,

sobre drogas, jogar bola... Coisas relevantes. O esporte é fundamental, a saúde também,

lógico. Ele pode ter uma agenda intensa, chegar em casa e contar um monte de coisa

que ele fez. Ele só não sabe multiplicar. E ele aprende cidadania, que é uma coisa

importante, a visão crítica do mundo, a História do Brasil, os problemas brasileiros, mas

não sabe ler jornal porque ele não sabe ler. E ele não sabe nem quando é uma opinião

do dono do jornal ou quando é uma notícia que está sendo narrada, então ele não tem

cidadania porque, na verdade, ele não sabe identificar as opiniões que estão ali sendo

colocadas. Ele não pode criticar aquilo que ele está recebendo. É uma cidadania oca, de

mentira. Então, a diferença que esses diretores de escola fazem é que eles se debruçam

sobre uma coisa que pouca gente se debruça: o processo de ensino e aprendizagem e

veem quem é que está aprendendo, quem é que está ensinando e buscam os alunos que

têm dificuldade de aprendizagem e trabalham com eles de forma individual, igual a

quando você vai a uma academia de ginástica. O que é que a pessoa faz quando vai à

academia de ginástica? “Qual é a sua expectativa? Quer diminuir a barriga? Quer

aumentar a perna? Quer ficar mais forte, mais magro? O que é que você quer? Qual é a

sua expectativa? É alta ou baixa”? Não é assim na academia? Aí, de acordo com a sua

expectativa, ele vai ver a sua potencialidade. Você vai fazer os seus testes, vai levantar

um peso, está aguentando, não está, está aguentando? Com base na sua expectativa, na

sua potencialidade, ele faz o quê? Uma ficha, que é o seu plano individual de ginástica. A

pessoa tem que ter o seu plano individual de estudo, feito de acordo com a sua

expectativa e com a sua capacidade. Do jeito que você está. Funciona na academia de

ginástica e deveria funcionar no processo educacional.

Ana Gabriela Pessoa

Bacharel em Política, Filosofia e Economia e mestre em Educação.

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Teach for America

Primeiro eu queria agradecer essa oportunidade. Agradecer ao Claudio e à FESP por terem me

convidado para falar sobre o Teach for America que eu conheci quando estava fazendo

mestrado em Políticas Educacionais nos Estados Unidos e, realmente fiquei fascinada por esse

programa. E mais que tudo, o que eu quero fazer uma apresentação breve do Teach for

America, pois tenho muito mais interesse em saber o que vocês acham e se tiverem alguma

pergunta específica, porque acho que é um modelo que pode ser adaptado no Brasil, mas,

claro, tem uma série de barreiras aí que terão que ser enfrentadas.

Antes de falar especificamente sobre o Teach for America, tem dois slides que eu queria

mostrar que eu acho que tem tudo a ver com a palestra que o Claudio acabou de dar. Primeiro

é esse gráfico que vocês já devem ter visto ou já devem ter ouvido falar em algumas pesquisas

que fazem aqui no Brasil. É um gráfico do PISA que é uma avaliação do OECD, Organização dos

Estados Europeus que fez uma pesquisa no mundo inteiro, com diversos países, sobre a

situação do desempenho acadêmico dos alunos. O Claudio falou bastante sobre a Coréia,

Finlândia, Irlanda e os países aqui da OECD. Estados Unidos também. Mas o que é que ele

mostra? Que por exemplo, na Finlândia, a maioria dos alunos está muito acima da média. Eles

atingem alto nível de proficiência. Aqui, no caso, é leitura nível cinco. Eles são muito bons

alunos. Vocês podem ver que, por exemplo, Uruguai, Brasil e México estão bem atrás. Muitos

estão abaixo do nível 1 e até abaixo do nível zero. Mas não é só isso, poucos alunos atingem o

nível cinco. Esse estudo aqui inclui alunos com 15 anos de idade. Esse teste foi feito com

alunos de 15 anos de idade. Então verificamos que a gente está muito mal. Quer dizer, os

nossos melhores alunos não chegam nem à metade do que a Finlândia é. A Coréia é. Por isso

achei importante falar sobre isso depois da apresentação do Claudio para mostrar como é que

a gente está em relação ao mundo. Esse outro gráfico mostra o gasto por aluno, relativo ao

desempenho acadêmico. Também da pesquisa do PISA – verifica-se o seguinte, países como a

Finlândia, gastam bastante com os alunos, mas têm um desempenho acadêmico muito alto.

Agora vamos ver os Estados Unidos. Ele gasta muito por aluno e não tem um desempenho tão

bom. Outro exemplo, o México. O Brasil é comparável ao México. O México gasta muito

pouco e o desempenho é muito ruim. Aqui demonstra que tem certa correlação entre gasto e

desempenho, mas que países que não gastam tanto, têm um melhor desempenho acadêmico.

E aí entra todas as discussões que o Claudio já levantou, que são as políticas educacionais, por

exemplo, por que é que a Finlândia, Japão, Suécia e outros gastam menos que os Estados

Unidos e têm melhor desempenho acadêmico? Então enfim, são duas questões que eu coloco.

Primeiro que o Brasil está muito mal em relação ao resto do mundo e, segundo, essa questão

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do gasto por aluno.

Agora vou falar do Programa Teach for America.

O problema aqui é o seguinte: na maioria dos casos, a origem da criança determina o

desempenho acadêmico. Esse é o problema que o Teach for America quer enfrentar. Então o

que é o Teach for America? É uma organização sem fins lucrativos, uma ONG, que foi fundada

em 1989, nos Estados Unidos, com a missão de acabar com a desigualdade de acesso ao

ensino de qualidade, a desigualdade acadêmica nos Estados Unidos. Ela foi fundada por uma

jovem, na época, ela tinha 23 anos, uma moça que se formou da Universidade de Princeton e

não queria trabalhar em banco, nem em consultoria, nem nos empregos mais valorizados. Ela

quis começar outro tipo de movimento onde recrutava os jovens, começando pelos amigos

dela, para fazerem uma coisa totalmente diferente que era darem aula em uma escola pública.

Ela entendeu que o maior problema da sociedade, em 1989, quando ela começou esse

programa, era a desigualdade acadêmica. Então, como é que esse objetivo é alcançado?

Exatamente isso, ela recruta e treina esses jovens, ela recruta jovens das melhores faculdades

americanas, como Harvard, Yale, Princeton, Pen, Standford. Só recrutava das melhores, para

serem professores em escola pública durante dois anos. Importante dizer que eles não eram

formados em Pedagogia. São formados em qualquer matéria. Pode ser Economia, Biologia, etc.

A ideia é a seguinte: se você é um bom aluno em uma excelente universidade americana, você

é capaz de dar aula sobre aquele conteúdo para o Ensino Médio e o Ensino Fundamental. Essa

é a teoria que ela propôs. Então esses jovens saem da universidade e vão dar aula em uma

escola pública, em comunidades de baixa renda, durante dois anos, no mínimo. E qual é o

impacto desse programa até hoje? Mais de 17 mil pessoas fizeram parte desse programa de

treinamento. Fizeram o Teach for America desde 1990, com mais de mil escolas e mais de três

milhões de alunos atingidos. Esse é o mapa dos Estados Unidos e as cidades onde o Teach for

America está presente. No ano escolar de 2007 para 2008, mais de cinco mil co-members e

eu deixei mesmo em inglês porque é como eles são chamados. São membros desse corpo. A

tradução seria isso: membros desse corpo - trabalham em 26 regiões urbanas e rurais dos

Estados Unidos. Agora, por que é que eles não estão em todas as cidades se é um programa

tão bom? Os Estados Unidos é dividido diferente do Brasil em termos de política. Ele é

descentralizado. Cada estado tem que aprovar se quer implantar ou não o Teach for America e

é por isso que ele não está presente em todos os estados.

O que é essa teoria de mudança? Eles propuseram que o desempenho escolar é resultado de

vários fatores. O primeiro fator é a questão socioeconômica. A pobreza, a discriminação, a

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falta de possibilidade de mobilidade social causam esses desafios. Então, voltamos à primeira

premissa de que a origem da criança é parte do problema, quer dizer, já determina se essa

criança vai ter sucesso acadêmico ou não.

O segundo ponto é a questão do sistema escolar. Nos Estados Unidos as escolas não tinham

estrutura suficiente para atingir a todos os alunos, alunos que têm mais dificuldade ou alunos

que demandam mais atenção, com isso, nem todas elas atingem o seu potencial. E,

finalmente, o terceiro fator são algumas ideologias já ultrapassadas, principalmente, em

política pública. Havia muita resistência das pessoas que já estavam no sistema.

Para o pessoal do Teach for America, estes são os três fatores: socioeconômico, sistema

escolar e a ideologia. Eles diziam - “Bom, esses são os nossos problemas, então esses são os

problemas que vamos atacar e enfrentar com o Teach for America”. E qual era a solução?

Como é que se resolve esse problema? Eles criaram esse movimento e, hoje em dia, o Teach

for America é um dos 15 lugares mais procurados para se trabalhar nos Estados Unidos, dentre

todas as empresas, incluindo todos os bancos, Google, enfim, todas as grandes empresas. Eles

têm uma percepção muito grande de qualidade. As pessoas querem fazer parte do Teach for

America.

Quais são os objetivos do Teach for America? Em curto prazo, eles querem recrutar os jovens

que nunca pensaram em entrar em uma realidade de educação pública para serem

professores nas escolas mais difíceis, onde existem maior número de problemas, ou seja,

trazer os melhores para atender os piores alunos. E eles ficam no programa durante dois anos,

no mínimo. Os “co-members” são responsáveis por demonstrar desempenho acadêmico dos

alunos, e são muito cobrados por isso. Ao final do primeiro ano de programa, eles têm que

fazer a certificação para serem professores da rede. O segundo passo é o seguinte: quando

esses jovens saem desse programa ou, enquanto estão fazendo parte desse programa, eles

estão completamente transformados porque, muitos deles, nunca viram essa realidade e não

conhecem de perto uma situação que é muito precária, uma série de problemas. E como são

os agentes de mudança, eles é que têm que mudar, eles é que terão que fazer o sistema

funcionar e são cobrados por isso. Então é claro que isso afeta a cabeça das pessoas, como

eles se relacionam com educação no futuro, nas profissões que eles vão seguir após terminar o

programa. E, a longo prazo, esses jovens seguem e alguns escolhem carreiras fora de

Educação, mas seguem com essa paixão por melhorar a educação. Isso permanece para

sempre. Muitos vão abrir escolas, vão fazer coisas ligadas à política educacional, etc. O bom é

que isso tudo leva a excelência educacional.

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Como é que acontece o programa Teach for America?

A seleção é rigorosa. Mais ou menos vinte mil pessoas participam dessa seleção, por ano, para

no final serem selecionados apenas cerca de cinco mil pessoas. Eles passam por um

treinamento de cinco semanas intensivas durante o verão. Lá o ano escolar começa em agosto,

que corresponde ao verão americano. Eles simulam situações reais do que pode acontecer

dentro de uma escola. Como eles não possuem formação em Pedagogia têm que aprender em

cinco semanas o que uma pessoa aprende em anos, estudando em uma faculdade.

O primeiro ponto desse treinamento e a questão de dar aulas. O primeiro passo é o seguinte:

eles ensinam alunos, sob a supervisão de outros professores. O segundo passo é a questão de

observação e feedback, quer dizer, os instrutores do Teach for America estão lá o tempo todo

monitorando o progresso desse pessoal. Eles oferecem feedback e comentários ao longo do

programa. Sempre que alguém está dando aula, o professor está lá, analisando e orientando:

“faz assim, não faz assado, é melhor assim, a prática diz isso, a teoria fala aquilo". O

treinamento é calcado na prática. Depois, passam para uma sessão de reflexão, onde analisam

os dados de desempenho acadêmico dos alunos e o que efetivamente podem fazer para

melhorar esse desempenho. Por exemplo: O aluno está mal em Matemática. Quais serão as

estratégias a serem usadas? Concretamente, o que é que a gente vai fazer? E aí, põe em

prática. Depois eles ensaiam em pequenos grupos, que é o que o Claudio estava falando, não

é? Por exemplo, vem um pai, reclama do sistema. E aí, o que é que eu faço? Isso tudo é

documentado, é gravado, é monitorado. Tem um forte componente aí de avaliação. E,

finalmente, eles têm essa questão do planejamento em sala de aula, que é um termo muito

usado nos Estados Unidos - classroom manegement - que é a gestão de sala de aula e isso é

uma arte. Vocês que dão aula sabem que gerir uma sala de aula é difícil e que já existem

muitos estudos sobre isso e eles põem em prática o que já está comprovado na teoria e,

enfim, levam isso para a sala de aula.

Tem outra parte aqui que é a questão mais específica de conteúdo. Então, por exemplo, se

uma pessoa se forma em Economia na faculdade, ela vai dar aula, vamos supor, de

Matemática, mas ela tem que saber qual é o conteúdo de Matemática que tem que ser dado

naquele ano para aquele nível. E, lógico, que ela formada em Economia, não necessariamente

vai saber isso, então ela tem que ser treinada nisso. Então eles passam por todo um

treinamento específico do conteúdo que eles vão ensinar durante aquele ano. Esse é o

treinamento durante essas 5 semanas anteriores à entrada na sala de aula. Ao longo do ano,

tem treinamento freqüente. Com professores, com pessoas que já fizeram o Teach for America

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e voltam para ajudar, enfim, a rede de relacionamento é bastante forte.

Um resumo do impacto do Teach for America: Em 2008/2009, nesse ano cerca de 6.200

pessoas foram selecionadas. Acho que foram mais de 20 mil pessoas que tentaram se

inscrever no programa. Vinte e nove regiões atingidas, mais de 1600 escolas. Só nesse ano, 400

mil alunos atingidos. E, desde 1990 foram três milhões de alunos. Esse é o número de pessoas

que já fizeram o Teach for America: 14.400. E aqui, 93% das pessoas que fizeram o Teach for

America continuam envolvidas de alguma forma, seja por filantropia, trabalho voluntariado,

treinando, enfim, permanecem com o programa. Aqui é o resultado do desempenho

acadêmico porque aí, claro, surgem as perguntas "Mas será que funciona"? Bom, algumas

pesquisas mostram que sim. Em 2008, essa pesquisa do Urban Institute mostrou que um

professor do Teach for America é três vezes mais eficiente do que um professor com 3 anos ou

mais de experiência. Então o resultado, o impacto do desempenho acadêmico escolar - aqui a

gente está falando do desempenho escolar do aluno -, com o professor do Teach for America,

é três vezes superior. Em 2004, esse outro instituto, Matematica Policy Research, mostrou

que, em um ano, os professores do Teach for America conseguiram dar um salto de 10% no

resultado de Matemática dos alunos. E aqui, em 2004, uma outra pesquisa, feita por um

instituto independente, mostrou que 94% dos diretores das escolas acham que os professores

do Teach for America têm um impacto positivo no desempenho acadêmico e na escola. Então,

o que quer dizer? Os diretores estão felizes, eles querem contratar mais gente do Teach for

America. Esses são os dados.

Bom, e aí o que é que acontece com esse pessoal depois desses dois anos. O que é que eles

fazem? Esse gráfico aqui mostra o seguinte: 67% ficam em Educação, 8% vão para Direito, 5%

Medicina, 4% Administração, 4% Política Pública, e aí os menores, ONG’s, Ciências da

Tecnologia, Humanas. Mas o importante a dizer é o seguinte: depois desses dois anos, pessoas

que nunca pensaram em entrar nesse setor de Educação, no amplo sentido da palavra, ficam

em Educação, quer dizer, alguma coisa acontece porque eles gostam, não é? E aqui, desses

que ficam em Educação, 50% permanecem como professores, o que é muito curioso. Então,

quer dizer, eles ficam na sala de aula, querem ficar como professores na sala de aula. E 16%

vão ocupar outros cargos dentro das escolas, 9% vão para ONG’s e outras áreas de Educação,

6% viram diretores de escola, 6% vão para o ensino superior, 2% vai para a Secretaria de

Educação e 1% fazer mestrado, doutorado em Educação. Mas esse dado é muito importante.

São pessoas que nunca pensaram em trabalhar em Educação. Nosso problema é que a gente

está dizendo “Bom, como é que a gente atrai as melhores pessoas para pensar em Educação,

para melhorar a Educação”? Isso pode ser uma solução.

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Bom, e aí é o seguinte, o Teach for America, em 2007, começou a receber muita demanda do

mundo inteiro, pessoas que queriam levar esse modelo, que já estava funcionando nos

Estados Unidos, para outros países. Eles montaram essa rede chamada Teach for all, que é

exatamente isso, para replicar o modelo do Teach for America em outros países. Esse é o

primeiro ano do Teach for all nesses países. Isso aqui é uma matéria só do Enseña Chile, que é

o nome do programa, como eles colocaram no Chile, que vai começar agora. Eles já fizeram

uma seleção, estão com 50 pessoas para começar agora, quer dizer, já começaram em março.

Cinquenta jovens das melhores faculdades para dar aula nas escolas mais carentes. Então aqui

“A revolução das salas de aula”. Então falam que o programa que veio dos Estados Unidos está

sendo replicado agora no Chile. Outro é o Teach for India que está também começando na

Índia. Eu queria trazer isso porque são alguns dos cartazes que eles estão usando para

propaganda, para recrutar essas pessoas. Esse aqui diz o seguinte: "1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8,9, 10!

Somente 40 de cada 100 crianças nesse país podem contar até 10" na Índia. Aqui diz:

“Quarenta por cento das crianças na Índia não sabem escrever o seu nome”. É uma campanha

que fala sobre liderança, que é um chamado, que você tem que melhorar sua nação

recrutando para o Teach for India. Enfim, a Índia é diferente do Brasil, mas também nem tanto.

Acho que a gente tem coisas similares aí. Essa é a frase - eu deixei em inglês -, essa, na

verdade, é a visão da Wendy quando ela começou o Teach for America e o livro que ela

escreveu sobre a história dela com o Teach for America. Esse é o nome do livro: “Um dia todas

as crianças terão a oportunidade de atingir uma educação de excelência”. E é isso.

Se alguém tiver alguma pergunta, alguma dúvida...

Espectador 1:

Os co-members são remunerados pelo Teach for America? E outra coisa que eu queria saber

também... Provavelmente, é muito diferente daqui para eles conseguirem entrar nas escolas

públicas porque eu acho que, até o Claudio já tinha dito que lá eles têm autonomia para

contratar de fora os professores, não é?

Ana Gabriela:

Ótima pergunta! É importante dizer o seguinte: nem todas as escolas têm autonomia para

contratar e demitir professor. No Estados Unidos tem um negócio chamado Charter School e

as Charter Schools são escolas públicas administradas de maneira privada. O que é que isso

quer dizer? "Ah, eu sou uma associação de pais e eu quero fazer uma escola aqui que vai ser a

melhor escola dos Estados Unidos de Matemática". Aí você tem que fazer um projeto, uma

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apresentação para a Secretaria de Estado local e você é cobrado praticamente diariamente no

resultado. Então essas são as Charter Schools. Essas sim têm autonomia para fazer o que

quiserem: currículo, administrativo, enfim... Eles recebem o mesmo dinheiro por aluno do

governo. Exatamente a mesma coisa é transferida. Agora, no momento em que a escola não

está dando resultado, tchau, acabou, fecha as portas. Essa é uma maneira bastante criativa

que os Estados Unidos encontrou. Começou mais ou menos nessa época, 15 anos atrás. Todo

esse movimento de Reforma Educacional nos Estados Unidos começou há 15 anos atrás. Uma

maneira criativa dar mais autonomia a empreendedores de Educação e têm escolas excelentes

que são Charter Schools. Agora, só representam 3% das escolas nos Estados Unidos, que é uma

parcela bem pequena, bem pequena ainda. A grande maioria está na rede que não tem

autonomia, como é aqui. Então esse é o primeiro ponto. O segundo ponto é sobre o

pagamento dos professores do Teach for America. O Teach for America recebe exatamente o

mesmo valor que recebe um outro professor. Exatamente. Então se o professor recebe X por

ano, o Teach for America vai receber exatamente igual, não há diferença no salário. Agora, eles

têm incentivos, é claro. Porque como é que você pega uma pessoa que se formou de uma

super universidade, que larga um emprego em que iria ganhar uma fortuna, para dar aula em

uma escola pública? Aí quais são os incentivos? O governo consegue dar uma bolsa de estudos

para depois eles fazerem um mestrado. E o Teach for America, como organização, tem contato

com as melhores faculdades americanas, então, as pessoas que depois querem fazer mestrado

têm uma carta de recomendação, entendeu? Eles têm toda uma entrada para depois fazer

esse mestrado. Essa é a primeira coisa: a bolsa. A segunda coisa é que, como o Teach for

America é uma ONG, ela é independente, ela pode arrecadar fundos também, então eles

fazem isso, fazem uma campanha agressiva com as empresas. Hoje eles não têm problema de

dinheiro, mas, no início, era muito difícil arrecadar fundos porque ninguém acreditava nessa

idéia. Quando a Wendy começou falaram que ela era uma maluca, nunca ia conseguir fazer

nada. Mas então ela começou a arrecadar dinheiro, então eles recebem, no máximo, 1500

dólares a mais. E esse é o gasto em treinamento, passagens aéreas, enfim, coisas práticas para

a realidade de lá que eles precisam. Mas o ponto é: não é diferente do que ganha um

professor regular em uma escola pública.

É, outro ponto importante é que, como esse programa ficou tão prestigiado, muitas dessas

grandes empresas, recrutam esses jovens talentos, os recém-formados das faculdades, mas se

eles passarem no processo seletivo da própria empresa e do Teach for America, eles são

liberados para dar os dois anos de aula no Teach for America, depois são recrutados de novo

para essa empresa, no terceiro ano, com bônus extra. Então dizem assim “Olha, vá fazer esse

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programa que é bom para você e para a sociedade, que depois você vai ter o emprego

garantido e vai ganhar mais por isso”, não é? Alguns bancos estão fazendo isso, a Google

também, a GE... Algumas grandes empresas já estão envolvidas nesse projeto.

Espectador 2:

Essa adesão dos países, eu achei muito pequena. Diante de tudo que eles podem apresentar.

Então eu gostaria de saber se eles ofereceram a todos os países informações ou se os países

que procuraram informação com eles e como fica o nosso país nessa situação.

AG: A seleção de países é exatamente como você descreveu aí na segunda opção. São os

países que têm que procurá-los. Eles têm problemas suficientes para resolver nos Estados

Unidos. Como a gente viu, os Estados Unidos gastam muito e a Educação não tem tanto

resultado, então eles estão enfrentando um monte de problemas. Agora, o que é que

acontece? O mundo inteiro está vivendo uma crise educacional, então os países que

demonstrarem interesse, eles dão apoio. Eles também tem que passar por um processo de

seleção. Não pode chegar qualquer um "Ah, vou fazer aqui". Não. É um negócio super

estruturado, organizado, mas enfim, esses foram os primeiros países que quiseram fazer o

Teach for America. E, normalmente, como acontece? Alguém que está estudando,

provavelmente nos Estados Unidos, fazendo algum tipo de pós-graduação, vê o modelo, acha

interessante, fala “Caramba, quero levar isso para o meu país”. E aconteceu em todos esses

casos, foi exatamente assim. Também no Brasil, a gente tem que saber como é que vai fazer,

se é possível fazer e aí alguém tem que levantar a bandeira e fazer, não é?

Espectador 3:

Se eu entendi bem, não tem custo para a escola. A escola não precisa dispensar professor para

poder contratar o voluntário do Teach for America? Quem arca de fato com os custos, quem

paga o salário é a ONG que faz a seleção e a contratação dos professores selecionados? Estou

certo nessa premissa? A minha pergunta virá depois de confirmado.

AG: O salário é pago pelo governo. O salário do professor é pago pelo governo. Inteiramente

pago pelo governo.

Espectador 3:

Mas não o governo no sentido de autoridade educacional local.

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AG: Sim, autoridade educacional local.

Espectador 3:

Então há um custo para o governo local, mas não para a escola especificamente?

AG: Isso é o que o Teach for America é capaz de fazer. Os custos de seleção, recrutamento e

treinamento, o Teach for America faz. Ele capta recursos e faz. Agora, no momento em que

essa pessoa está inserida na realidade da sala de aula, é por conta do governo. Ele vira um

funcionário do governo, tanto é que para ele permanecer o segundo ano, tem que fazer a

certificação.

Espectador 3:

Mas esse recurso não sai do orçamento da escola, é do governo local. Entendi.

AG: Não sai do orçamento na escola. Custos de recrutamento, seleção, treinamento, sai do

orçamento do Teach for America. Ele tem um orçamento, ele sai de lá. A única coisa que sai do

orçamento do governo é o pagamento do salário dos professores. Só isso. Não sai nada da

escola. Exatamente. Eles têm problema como a gente tem de falta de professor. Em muitas

áreas, não tem gente para dar aula, então o pessoal vai lá dar aula. Como a gente tem.

Matemática, Ciências...

Espectador 3:

Essa engenharia financeira com a distribuição dessas responsabilidades, distribuição desses

recursos é, vamos dizer, é uma peça fundamental para entender o funcionamento do

programa. A questão que se levanta nesses outros países onde estão implementando esse

mesmo programa, a questão que surge... Será que eles conseguem imitar essa mesma

engenharia? Eles conseguem recursos públicos suficientes para fazer a contratação desses

professores ou se há, em determinado momento, necessidade de aportes de outras fontes que

possam, em determinado momento, substituir essa engenharia?

AG: É um dos pré-requisitos do Teach for all. Quer dizer, se você quiser fazer em outro país, é

seguir o modelo deles. Então na Índia eles estão fazendo a mesma coisa e no Chile eles estão

fazendo a mesma coisa. Com os mesmos problemas de professores que a gente tem. Os

problemas são similares no mundo inteiro, não é? As dificuldades de se entrar em uma escola,

quer dizer, se você não faz parte do sistema, é parecida no mundo inteiro. Mas é um dos pré-

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requisitos do Teach for all. “Bom, o nosso modelo é esse e vocês têm que seguir o mesmo

modelo”. Agora eles têm todo um apoio, uma rede de apoio, grandes consultorias que ajudam.

Eles conseguem movimentar muita gente para ajudar quem quer fazer. Eles dão essa

assistência.

Espectador 4:

Me pareceu que esse é um processo de intervenção na escola, não é? Se a escola está com

problemas, vem esse grupo e intervém na problemática da escola, seja sala sem professor, etc.

E parece que é no período de dois anos, se entendi bem. E exatamente a minha dúvida é como

interage a própria escola com esse grupo que vem de fora, quer dizer, é a escola que solicita a

intervenção? A intervenção é do estado? E como... Se dura dois anos, o que acontece quando

esse grupo sai?

AG: É importante dizer o seguinte, que são poucos co-members por escola. Não é assim um

grupo que chega com 30 pessoas e vamos mudar a escola toda. Tudo bem, então são um ou

dois, no máximo, por escola. É a escola que pede. A escola sente necessidade e pede. Lógico

que eles fazem um levantamento e eles identificam as áreas que têm mais necessidade, eles

também podem propor “Olha, eu acho que na sua escola, você poderia ter alguém do Teach

for America. Você quer”? Mas eles só entram se tiver autorização da escola, se estiver tudo de

acordo. Essa questão de bolsa para os professores depois, isso não existe porque isso é um

programa separado da carreira normal de professor. Agora, eu não tenho os estudos aqui, mas

enfim, existe muita interação com o pessoal Teach for America com os professores que já

estão na escola. Porque, normalmente, esse pessoal sai com muito gás para transformar o

mundo, então eles mesmos estão dispostos a dar treinamento, tudo o que eles recebem de

treinamento nos institutos, na formação deles, eles ficam além do tempo sempre nas escolas,

treinam, ajudam... Isso por experiência, que eu vi funcionando nos Estados Unidos, então,

realmente, não existe os mesmos incentivos para os professores que já estão na rede, é um

programa paralelo. Agora, que existe essa integração, existe. E muitos professores que já estão

lá pedem para virem mais professores do Teach for America porque muda a escola. A escola

fica mais alegre, mais dinâmica. Isso são relatos que eu li e vi pessoalmente lá.

Claudio Mendonça:

Deixa eu fazer uma observação rápida. A gente tem que pensar que isso não é bom só para a

escola. As empresas não estão fazendo isso porque elas querem ajudar a Educação

exclusivamente. As empresas estão pensando que ter um profissional recém-formado. Só

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recém-formado é uma coisa, mas ter um profissional recém-formado, mas que vai lecionar em

uma escola pública durante dois anos, ele recebe uma pessoa com uma visão social muito

maior. Com um compromisso ambiental muito maior, com a capacidade formativa e de

difusão dentro da empresa muito maior. Com uma capacidade verbal também maior, ou seja,

ela recebe um profissional melhor depois. Quer dizer, é um investimento que a escola ganha,

mas o profissional também ganha. Essa coordenadora do Teach for America, ela contou, por

exemplo, o caso de uma recém-formada que mora em um bairro chamado Beverly Hills, não

sei quem já ouviu falar, acho que é o bairro mais caro do planeta, não é? Em Los Angeles onde

moram os artistas aí de Hollywood. E ela estava há mais de dois anos - você pode ficar um

pouco mais de tempo se quiser. Ela estava há mais de dois anos dando aula em uma escola

indígena em South Dakota. Ela nunca saiu de Beverly Hills, vivia uma vida extremamente rica e

isso trouxe um choque de realidade tão grande que ela se apaixonou. Então muitos gestores

acabam ficando na escola e ajudando no aspecto não só educacional, mas administrativo. E

tem outra questão também que é interessante. Lá nos Estados Unidos, como no Brasil, tem

carência de professor de Física, de Química, de Biologia, de Geografia... Existe essa carência,

então, às vezes, o profissional ele pode ajudar. Muitas vezes... Eu imagino que aqui no Brasil

tenha toda uma legislação sobre esse assunto e essa questão já foi discutida pelo Conselho

Nacional de Educação, enfim esse tema tem um aspecto legal muito importante, mas ele tem

um outro aspecto que é o aspecto, não é o de não ter o professor de Física ou de tirar o

professor de Física que está lá dando a sua aula maravilhosamente bem e botar um

engenheiro no lugar. É colocar quando não tem, mas, talvez, ter também o profissional

apoiando porque ele pode contextualizar muito determinados conhecimentos, não é? Eu

imagino que um jovem do Ensino Médio teria grande entusiasmo em discutir determinados

temas da termodinâmica com um engenheiro, ou da cinética, não é? Enfim... Com um

engenheiro contando alguns casos do cotidiano profissional dele ou falar um pouco de

programa de saúde com um médico contando situações que ele vivenciou, enfim, desafios que

ele enfrentou. Acho que isso traz um entusiasmo, um interesse, uma abordagem maior, uma

contextualização bastante interessante que pode trazer algum benefício para o dia a dia da

escola, quer dizer, na verdade, nós estamos aqui trazendo uma experiência que pode ser

trazida para o Brasil, mas algumas ideias que podem ser discutidas com vocês que são

formadores de opinião e são do meio acadêmico, sobre o aspecto legal, mas também sobre

como trazer profissionais para o ambiente escolar, não para fazer palestra vocacional

exclusivamente, mas para discutir temas efetivos do currículo. Isso, talvez, seja algo

extremamente interessante para a segunda fase do Ensino Fundamental e para o Ensino

Médio também.

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Espectador 5:

Bom, eu queria cumprimentar a palestrante pelo tema. Aproveitar, pegar dois pontos que você

falou e que eu achei muito importante. Quando você fala que os graduandos saem da

universidade ou estão na universidade com muito gás, não é? Eu achei o termo interessante,

que a gente, colegas de trabalho, sabem que a motivação é um fator essencial na

aprendizagem. Portanto, se os jovens estão nas universidades com muito gás, isso já tem uma

possibilidade enorme de a gente promover um processo de aprendizagem, não é? Outro ponto

importante que você fala é sobre esse modelo das ONG’s em que trabalham com profissionais

de diferentes áreas de conhecimento e, de fato, não trabalham com o especialista em si.

Então, veja bem, você reúne uma multidisciplinar, com vários conhecimentos e dali surge - a

gente não ficou por causa do tempo também claro -, mas dali surge, como produto, uma

metodologia multidisciplinar. Que a gente sabe que processo de aprendizagem, quando você

lida com o menino lá, é preciso ter toda uma metodologia para que isso seja construído e o

terceiro setor tem muito esse perfil, não é? De não trabalhar com os especialistas, mas sim

trabalhar com uma equipe multidisciplinar com várias aprendizagens. Como a colega ali falou

da área da escola, existe também no Brasil essa interface do terceiro setor, com projetos de

ações complementares de fortalecimento à educação pública, no viés de fazer uma educação

integral. Uma educação com atividades complementares. Esse é um dos pontos que a gente

coloca. E puxando um pouco para o contexto, para a nossa prática do dia a dia, no Brasil,

especificamente no Rio de Janeiro, existem projetos pelo Brasil afora que já trabalham com

essa interface, não é? Muito próximo a nós, na Baixada Fluminense, está surgindo um projeto

chamado Bairro Escola e que trabalha com as células de saberes e que está chamando os

universitários e graduandos da UFRJ, da UERJ, para que eles participem das ações da escola.

De fato, o que a gente como professor e como pesquisador que precisamos ser, eu acho

interessante no seu gráfico colocar que a maioria desses profissionais ficaram só na prática da

Educação e a gente aqui sabe o quanto é importante a pesquisa também para a nossa

formação. Então, quer dizer, esse projeto tem essa interface de trabalhar com a escola pública

e em uma educação integral no processo de participação coletiva. Eu acredito que pelo Brasil

afora - tenho referências na Bahia, em Recife e no Rio de Janeiro - que tem uma enorme

possibilidade de funcionar isso. Agora fiquei bastante curiosa como educadora - eu sou

pedagoga - qual é a metodologia, qual o produto que é criado daí para que de fato isso tenha

impacto que tenha que você apresentou e apresente resultados. A gente vê que é uma coisa

de longo prazo e construído nessa relação coletiva de saberes, não é? É preciso para uma

instituição assim estar aí até hoje, em outros países, construir uma metodologia muito efetiva,

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não é? Porque a gente que está na sala de aula sabe que é... Quer dizer, primeiro você falou na

vocação, na motivação de ensinar. E segundo que tem de fato uma metodologia muito

peculiar para que a gente possa aprender qualquer coisa.

AG: Não, e tem, você está certíssima. Há uma metodologia e ela é muito rigorosa. Lógico que

eu não pude trazer aqui nem apresentar detalhadamente. São livros e livros. Mas é

basicamente transmitida durante aquelas cinco semanas, durante a escola de verão e depois,

ao longo do ano, ela é reforçada. Mas aquelas cinco semanas são super intensas, as pessoas

realmente absorvem aquilo e vão para a sala de aula, quer dizer, eles têm um treinamento em

serviço muito desenvolvido também. Porque não dá para ensinar tudo em cinco semanas, não

é? Então, em serviço, eles continuam. Obrigada!

Nigel Brooke

Professor convidado da Universidade Federal de Minas Gerais e consultor do Grupo de

Avaliação e Medidas Educacionais da Faculdade de Educação. PhD em Estudos de

Desenvolvimento da Universidade de Sussex, Inglaterra.

As origens da pesquisa em eficácia escolar e as tentativas de estabelecer processos de

melhoria com base nos seus achados.

Boa tarde a todos! O professor Claudio fez uma propaganda tão elogiosa do meu livro que eu

preciso esclarecer uma coisa. Primeiro, eu fiz o livro junto com outro colega da UFMG, o

professor Francisco Soares e, segundo, a bem da verdade, o livro nem é nosso. O livro conta

uma história sobre a evolução da pesquisa nesta área chamada de eficácia escolar, mas

através dos artigos, capítulos e outras coisas escritas por outros pesquisadores ao longo desse

tempo. Em vez de tentar descrever esse volume imenso de trabalho acadêmico nas nossas

próprias palavras, escolhemos fazer esse trabalho através da escolha criteriosa de documentos

históricos que pudessem contar, relatar essa história da maneira mais clara possível. Então o

livro é isso. Mas é um livro que tenta aprofundar a discussão desse tema: Eficácia escolar.

Escola eficaz. Que é um tema que está surgindo e eu vejo o uso desse termo de forma cada vez

mais frequente e acho que é necessário parar para determinar o que é que nós estamos

falando, de onde é que veio esse termo, qual é a sua utilidade para nós. Eu falo nós,

responsáveis pela discussão da política educacional e, em determinado momento, de tentar

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levar à prática alguns dos resultados desse campo de pesquisa que veio evoluindo ao longo

dos últimos 50 anos.

Então primeiro passo vamos apresentar algumas definições. Eficácia escolar - “Uma escola

eficaz é aquela em que os alunos progridem mais do que se poderia imaginar, levando em

consideração as características dos alunos”. Isso é uma definição operacional, vamos dizer

assim, não é tanto uma definição filosófica sobre o que é que se espera da escola. Nós vamos

chegar nesse ponto. Essa é uma definição operacional, a escola só é eficaz se ela consegue

fazer mais do que você esperaria dessa escola, levando em consideração os antecedentes dos

seus alunos. Quais são esses antecedentes? Bom, hoje de manhã tivemos sorte de entrar

nessa discussão sobre o impacto do nível ou as origens socioeconômicas dos alunos. Nós

sabemos que essa origem vai, em grande medida, determinar a probabilidade de sucesso

escolar do aluno. Se a escola só recebe alunos de nível socioeconômico mais alto, nós

podemos esperar resultados melhores dessa escola. E o inverso também é verdadeiro. Se a

escola só recebe alunos de nível socioeconômico mais baixo, de origens mais humildes, de

classes subalternas, do jeito que você quiser nomear esse grupo de alunos cujos pais são mais

pobres, obviamente o que se esperaria desse aluno é um resultado pior. Talvez não do aluno

no singular, mas dos alunos de modo geral, falando da probabilidade de um grupo

socioeconômico mais baixo ter resultados escolares piores. Não sou eu que estou dizendo isto

por convicção pessoal, é a Sociologia que, através de muitos anos de pesquisa desse

fenômeno, pode nos atestar a natureza dessa relação entre nível socioeconômico e

desempenho. E vocês, com experiência em magistério, vocês que lidam no dia a dia com o

ensino sabem o que eu estou falando. Mas também a origem do aluno não é só origem sócio

econômica. É aquilo que ele já aprendeu na hora de entrar para a nossa escola. Por exemplo,

se eu sou responsável por uma escola de Ensino Médio, eu sei muito bem a diferença que faz o

aluno vir de uma escola versus outra, o aluno vir de uma escola de Ensino Fundamental onde o

nível é melhor e um aluno que vem de um Ensino Fundamental onde o nível é pior. Para eu

saber se essa escola de Ensino Médio está sendo eficaz ou não, eu também preciso saber qual

é o nível de aprendizagem dos alunos quando eles entraram para aquela escola. Para eu saber

o que é que eu esperaria desses alunos em termos de desempenho. Quando os alunos

ultrapassam aquilo que eu esperaria - e aqui eu estou falando em termos de probabilidade, eu

estou falando em termos de uma realidade estatística de uma população em geral -, para

poder saber se a escola está ultrapassando os seus limites ou aquilo que se colocaria como

normal na rede como um todo, eu preciso saber quem são esses alunos, de onde vêm e o que

eles sabiam quando entraram para a escola.

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E mais para o final eu quero abordar a questão que eu não sei se, em realidade, podemos

chamar de melhoramento escolar ou se deveria chamar de melhoria escolar. A definição é “um

processo coletivo de revisão e reforma dos procedimentos organizacionais e curriculares da

escola, muitas vezes liderados por agentes externos, voltado para a melhoria nos padrões de

qualidade e nos resultados dos alunos". Estou falando de um processo instalado na escola,

onde há uma tomada de consciência a respeito das dificuldades, dos problemas e, de alguma

maneira, um trabalho coordenado e colaborativo para superar essas dificuldades e levar a

escola a outro patamar. Depois nós vamos discutir se esse tipo de movimento, de fato, existe

no Brasil. Se temos essa cultura de trabalhar as questões de melhoria na escola ou ainda

estamos presos a um sistema muito centralizado de discussão de política educacional que

inibe, de fato, essa tomada de decisão, essa iniciativa em nível educacional.

Isso, como o professor Claudio falou de manhã, tem um ponto de partida. A pesquisa realizada

nos anos 60, nos Estados Unidos, cujo relatório tem o nome do relatório Coleman (Coleman

Report). Coleman, um pesquisador que trabalhou com um grupo que foi contratado pelo

Congresso dos Estados Unidos para fazer um grande estudo da situação educacional do país.

Isso quando do lançamento da nova lei de direitos civis nos Estados Unidos, no ano de 64. Um

momento de muita turbulência - vocês devem lembrar - a história da luta para os direitos civis,

a história de criar pela primeira vez na legislação americana, a igualdade para os diferentes

grupos raciais nos Estados Unidos. E a briga que foi... E a determinação, uma vez estipulada e

estabelecida essa lei no Congresso, a determinação de eliminar as fontes não legais das

desigualdades raciais e sociais da sociedade americana. E havia convicção naquela época que

uma grande parte dessas desigualdades era um produto das desigualdades dentro do sistema

educacional dos Estados Unidos. Desigualdades em termos de distribuição de recursos,

desigualdades em termos da probabilidade de acesso às escolas de diferentes grupos, negros e

brancos, e diferenças na qualidade da educação. Então o Coleman e colegas receberam essa

encomenda de sair por aí e fazer uma grande pesquisa da situação educacional nos Estados

Unidos para colocar o dedo em cima dessas desigualdades e, a partir daí, naturalmente, a

política educacional fluiria no sentido de corrigir essas desigualdades e produzir resultados

mais iguais no sistema educacional.

Quando foi publicado o relatório Espectador, depois dessa imensa pesquisa social em grande

escala, com base no instrumental tipicamente questionário aplicado a um grande número de

pessoas. Nós usamos essa palavra em português, mesmo sendo uma palavra da Sociologia,

palavra em inglês. Esse foi feito com 645 mil alunos, 60 mil professores, quatro mil escolas.

Nunca na história da Sociologia da Educação, tinha sido feito uma coisa tão grandiosa.

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Estabeleceu novas metodologias, novos processos. A Sociologia da Educação, antes e depois

do Coleman, são coisas inteiramente diferentes. Mas o que é que o Coleman descobriu? Que

aquilo que tinha provocado essa pesquisa não se constatou. Que, no fundo, as escolas não

variavam tanto quando se imaginava. Não havia aquelas diferenças imensas que se

imaginavam que existiam entre as escolas do Sul e as escolas do Norte, entre as escolas do

negro e as escolas do branco. O que o Coleman descobriu foi de que as variações entre as

escolas não explicavam a variação no desempenho dos alunos. O que é que explicava a

variação no desempenho dos alunos? Seus antecedentes sociais, as condições

socioeconômicas das suas famílias. As diferenças no desempenho dos alunos, segundo as

medidas do Coleman, essas diferenças se explicavam com base em fatores socioeconômicos.

Como se pode imaginar, isto caiu como uma bomba naquele ambiente de tanto entusiasmo, a

cruzada que se empenhava naquela época a favor da equidade social, a favor da eliminação

das desigualdades raciais. De repente, o instrumento fundamental dos reformadores, parecia

que não ia produzir os resultados desejados. Inclusive, logo depois da publicação do trabalho

vieram outras publicações. O do Jenkis, outro pesquisador americano, olhando os dados de

novo, descobriu que, mesmo se equalizasse, mesmo se distribuísse os recursos para Educação

de uma forma exatamente igual para todos os alunos, de Norte a Sul, grupos negros e brancos,

não iria afetar ou só iria afetar os resultados dos alunos em 1%. E o relatório na Inglaterra, com

resultado parecido. Quando você está fazendo esse tipo de estudo, você tem os grupos

diferentes, grupos de alunos diferentes, e você está tentando explicar a diferença nos

resultados desse grupo de alunos versus esse outro grupo de alunos. Você está querendo

explicar a variação nos resultados desses alunos. E o que é que conseguiu mostrar? Que 39%

da diferença, no caso alunos de quarta série, 39% da diferença entre esses diferentes grupos,

se deve à atitude dos pais, à forma dos pais entenderem, enxergarem a educação, a

importância que dava à educação, o que eles transmitiam para os seus filhos em relação à

educação. Dezessete por cento da diferença nos resultados dos alunos se deve as diferenças

entre as casas desses alunos em termos materiais, em termos, vamos dizer, do nível

econômico da família. E somente 12% da diferença no desempenho dos alunos se deve,

efetivamente, à ação da escola. A escola trabalha, trabalha, trabalha, trabalha, trabalha,

trabalha e só afeta 12% na variação do desempenho de diferentes grupos de alunos. Enquanto

esses outros fatores, tipo, os pais, suas atitudes e seu nível econômico, têm uma influência

muito maior. Então, usando outra metodologia em outra parte do mundo, chegou-se a uma

conclusão muito parecida com a do Coleman. Que o que impacta mesmo e o que você precisa

mesmo para explicar a diferença entre os alunos são as condições socioeconômicas e

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familiares desses alunos.

Daí se instalou um certo pessimismo, inclusive, eu acho que aqui, nessa fase que se seguiu a

essas primeiras pesquisas, esse pessimismo se chamava pessimismo pedagógico. Era fácil

chegar à conclusão de que não faz diferença em qual escola o indivíduo estuda, ou seja, a

escola não faz diferença. Se a explicação da diferença entre os alunos é socioeconômica, a

escola não está fazendo o seu trabalho de eliminar as desigualdades, de fazer da sociedade

mais igualitária. E havia toda uma série de outras teorias marxistas que, de certa forma, dava

explicação para esse fenômeno em termos estruturais, em termos do próprio sistema,

funcionamento capitalista, que era inevitável de algum modo que as escolas cumprissem essa

função de reproduzir as desigualdades pré-existentes na sociedade. Então, por um lado, os

dados sociológicos, por outro lado, os argumentos dos marxistas, e caímos nessa de achar que

a escola não podia fazer diferença. Que era uma tarefa inglória, quase que inútil.

Mas havia muita gente, como nós, que trabalhamos mais perto das escolas, que conhecemos

as diferenças entre as escolas, que sabemos que tem escolas que são melhores que outras.

Sabemos da nossa própria experiência. E os pais sabem disso também, os pais sabem muito

bem que eles preferem matricular seus filhos nesta escola do que nessa outra. Inclusive,

mesmo precisando colocar no ônibus e levar distante de casa, preferem fazer a matrícula

nessa outra escola. Por quê? Porque sabem que essa escola é melhor. Se a nossa intuição ou a

nossa certeza como educadores de que há diferenças entre as escolas, como se pode então

explicar toda essa evidência sociológica de que a escola não faz diferença? Bom, agora começa

toda uma fase já na época de 70, uma fase de desconstrução da pesquisa do Coleman para

apontar algumas das dificuldades dessa pesquisa, apesar de ser muito influente e continuar

muito influente, de apontar as dificuldades dessa pesquisa e, talvez, algumas das conclusões

erradas a que se chegou nesse primeiro momento. Por exemplo, o Coleman estava olhando

coisas muito pontuais, questões do próprio, vamos dizer, das condições. Ele usou como

variáveis: número de livros na biblioteca, número de alunos por professor, gastos médio por

aluno. Por que ele usou essas variáveis? Porque eram fáceis de medir. Quando você está

fazendo uma pesquisa dessa natureza, nessa escala, você não pode andar por aí pedindo

muitas opiniões. Você tem que levantar dados concretos: número de livros na biblioteca,

número de alunos na sala de aula, os gastos, etc. Portanto, eles não olharam valores, atitudes

ou a vida interna da escola. Eles não olharam aquilo que de fato distingue uma escola de outra.

Esses fatores intangíveis. Portanto, a conclusão do Coleman ou a falta de correlação entre

diferenças entre as escolas e o desempenho dos alunos pode ser simplesmente que ele estava

medindo as coisas erradas. Ele estava tomando como suas variáveis de entrada coisas que não

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são tão relevantes de fato na explicação do desempenho dos alunos. Agora, o que é que ele

estava medindo? Ele estava medindo, portanto, insumos mensuráveis, os insumos

manipuláveis, e não atividades ou processos escolares. E o que é que ele estava medindo em

termos do impacto da escola na aprendizagem? Ele estava medindo a aprendizagem em todas

as áreas do currículo: Matemática Língua...? Não. Ele usou uma única medida de desempenho

que era uma medida de fluência verbal que, já por si, é um problema porque nós sabemos -

inclusive, o professor Claudio enfatizou essa questão hoje de manhã -, nós sabemos que,

muito daquilo que o aluno é capaz de falar e o seu raciocínio verbal, vem, não tanto da escola,

mas da casa. Vem da sua convivência do seu lar, Enquanto a Matemática é muito mais uma

área curricular escolar. Medindo o desempenho em Matemática, você está medindo muito

mais o efeito da escola do que o efeito da família. Mas Coleman não fez isso. E ele também

não fez aquilo que nós enfatizamos na definição de escola eficaz. Ele não mediu nada daquilo

que os alunos sabiam antes de entrar para aquela escola. Eles podiam entrar sabendo muito

ou sabendo pouco. Ele não teve esse controle, vamos dizer, do ponto de partida dessa

medição que ele fez da fluência verbal dos alunos estudados nessa pesquisa. Então há uma

série de questionamentos metodológicos que permitiu que as pessoas começassem a refletir

sobre essas conclusões precipitadas que as escolas não fazem diferença e queriam mostrar.

Havia outras metodologias, aquilo que se sabe instintivamente, de que há diferenças entre as

nossas escolas. Nem todas elas são iguais. Mesmo com os mesmos tipos de aluno, uns

conseguem resultados melhores que outros. Então começou, o que se pode dizer, a reação a

essa fase pessimista da pesquisa em educação. Essas pessoas dizendo que essas pesquisas,

tipo Coleman, refletiam uma visão muito economicista, não entravam na questão dos

processos escolares, só ficavam medindo insumos e produtos. Não tentaram entender, de

fato, as relações e o próprio funcionamento da instituição escolar, fenômeno extremamente

complexo como nós sabemos. E é bom lembrar que essa é uma questão que, talvez, fique

esquecida nessa discussão, o como, em momento algum no trabalho dele, falava que a escola

não fazia diferença. Foram os intérpretes, os que vieram depois e que usaram a pesquisa de

Coleman, que chegaram a essa conclusão. O que o Coleman diz é que a escola não faz tanta

diferença quanto se esperava. A influência da família é muito maior, talvez, quatro vezes

maior, mas não significa que a escola não tem impacto. Então quando nós vemos esse debate,

a gente tem que lembrar que não foi o Coleman propriamente que descartou a escola como

um instrumento de equalização.

Aí começa, então, com novas metodologias, uma tentativa de resgatar a idéia de que as

escolas são diferentes entre si, que umas podem fazer mais para os alunos do que outras.

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Começa - eu não vou entrar nesses detalhes todos - diferentes metodologias para estudar isto,

escolas que estão nos extremos da distribuição, ou escolas que estão no extremo sendo

comparadas com escolas que estão mais perto da média, tem vários, vamos dizer, modelos

para pesquisa nesta área.

Uma das pesquisas mais famosas desta época da reação e que, inclusive, deu um impulso a

essa nova linha de trabalho, foi a pesquisa do Harter e colegas em escolas de Ensino Médio na

cidade de Londres. O que é que o Harter quis fazer? Bom, primeiro, ele não estava nem um

pouco satisfeito com essa ideia de que você mede os resultados, todo o trabalho complexo da

escola, com uma única medida, no caso, um teste de fluência verbal. Não, o Harter está

dizendo “Olha, nós temos que medir o impacto da escola em muitas dimensões diferentes”.

Não só nas dimensões acadêmicas, como o do desempenho cognitivo, mas também em uma

série de dimensões comportamentais. A escola não está aí também para socializar? Para criar

o cidadão, para desempenhar essas outras funções? Então temos que medir se a escola está

cumprindo essas outras funções também. Dentro do modelo de pesquisa, portanto, tinha

também essas outras medidas, facilitado, de certa forma, pelo fato de que na Inglaterra, pelo

menos naquela época, havia colaboração entre as escolas e a polícia em questões de

delinquência juvenil e havia, portanto, um registro minucioso de todos os alunos da escola

que, de alguma forma, estavam envolvidos com a polícia. Ele também usou medidas, falando

com os próprios professores sobre o comportamento dos alunos, tinha uma visão bastante

mais completa do impacto da escola em todas essas dimensões, as dimensões, as diferentes

escolas. Claro, ele estava, me parece, usando uma amostra de uma dúzia de escolas diferentes.

E o que é que ele descobriu? Ele achou diferenças no desempenho dos alunos nessas

diferentes dimensões que não podiam ser exclusivamente explicados com base nas

características dos alunos. Nem em termos do nível socioeconômico dos alunos, nem em

termos daquilo que os alunos sabiam quando eles foram para essas escolas. Bom, então, só

sobrou a escola como explicação pela diferença entre os alunos. Ele achou diferenças entre as

escolas na ênfase que eles faziam nas questões acadêmicas. Umas escolas enfatizaram

esportes, outras questões mais sociais, enquanto outras escolas tinham uma ênfase

nitidamente na aprendizagem dos alunos naquelas dimensões tradicionalmente consideradas

mais importantes: o desempenho acadêmico cognitivo.

Ele achou diferença entre as escolas e é interessante porque - esse é um fenômeno que o

professor Claudio também fez referência -, achou diferença entre as escolas que se

correlacionavam com as diferenças no desempenho dos alunos, em termos da própria

estruturação da instituição escolar. As escolas que tinham mais funções ou responsabilidades

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para os alunos, presidência disso, presidência daquilo, para os próprios alunos e que cobravam

essas responsabilidades dos alunos, tinham resultados diferentes. O grau de envolvimento dos

professores na tomada de decisão na escola, também variava muito entre as escolas e se

correlacionava com a diferença no desempenho dos alunos dessas escolas. E ele achou uma

diferença entre as escolas no que se refere à própria gestão da sala de aula, ou seja, essa é

uma das primeiras pesquisas que começa a colocar o dedo em cima das diferenças entre as

escolas que explicam as diferenças nos desempenhos dos alunos. Ainda é um estudo

preliminar, também tem seus problemas, mas, pela primeira vez, a gente vê tentativa de

distinguir entre as escolas, em termos daquilo que torna umas mais eficazes do que outras.

É interessante que ele também, pela primeira vez, introduz a ideia da diferença entre as

escolas em termos do seu clima. Ele não usou essa palavra clima, ele usou a palavra ethos, mas

a forma em que ele usou esse conceito é parecido com esse outro conceito que é clima. O que

ele está dizendo é que quando você junta todas essas coisas, você tem um ambiente moral,

legal, humano, cívico, diferente em umas escolas em comparação com outras. E ele chamou

esse fator, que ele também mostrou super importante na explicação da diferença entre as

escolas, ele chamou esse fator de ethos escolar. Bom, somando esses resultados, ele estava

dizendo, para todos os efeitos, que a escola, sim, faz diferença. Para o pai que manda para

uma escola em vez de outra, faz diferença. A escola mesmo com, aparentemente, as mesmas

condições físicas e financeiras. Diferentes escolas com essas condições iguais, alunos, para

todos os efeitos, iguais, vindos das mesmas condições socioeconômicas, umas escolas

conseguem melhores resultados do que outras.

Teve outras pesquisas, e eu não vou investir tempo demais nisso. Mas tiveram outras

pesquisas que tentaram chegar mais perto ainda de entender esses processos internos da

escola, de entender como é que se produz climas diferentes em diferentes escolas. O

pesquisador americano, um dos pais da pesquisa em eficácia escolar, de nome Brooke, tentou

entrar mais profundamente criando escalas e instrumentos para medir autoconceito

acadêmico, expectativas dos professores, clima acadêmico, senso de utilidade acadêmica.

Parece curioso esse nome, mas o que ele quis dizer é o grau em que os alunos e seus

professores acham que o investimento em educação vai render algum fruto posterior. Em que

medida as pessoas na escola acham que aquilo é um bom investimento, que vai levar a uma

mobilidade social, que vai levar a um melhor emprego, etc. E na medida em que a escola

transmite essa mensagem ou não, ele estava medindo com essa escala de senso de utilidade

acadêmica. Eu acho que ele poderia ter arrumado um nome um pouco melhor para essa

escala, mas a ideia é clara. Tem a escola que enfatiza, que trabalha muito mais essa noção da

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mobilidade, do futuro promissor, de quem investe em educação há chances melhores de vida

após a escola. E outras escolas que tomam por dado que os alunos não vão sair daquele lugar,

que eles vão viver e morrer na sua cidadezinha ou na sua favela ou onde for, que a escola não

vai fazer diferença para eles. Essa diferença é uma diferença significativa porque se transmite

todo dia, dentro da sala de aula, essa expectativa do professor, esse pensar do professor a

respeito do futuro provável dos alunos. E se o professor não tem essa expectativa, não

acredita muito na probabilidade ou na possibilidade de um avanço real para esse indivíduo,

acaba influenciando a visão de mundo desse indivíduo e, mais proximamente, a visão da

escola, da utilidade daquilo que ele faz na escola.

Agora estamos falando do final da década de 70, princípio da década de 80 - tentativas de

resumir essas pesquisas em termos daquilo que faz diferença, Daquilo que distingue entre as

escolas eficazes das escolas menos eficazes ou escolas ineficazes. E essa lista de cinco fatores

imperou durante algum tempo como o melhor resumo possível dessas pesquisas. A idéia de

que a escola eficaz tem uma liderança educacional forte. Liderança educacional, não liderança.

Eu acho que gestor, diretor escolar, de certa forma, exerce liderança em muitas direções ou

pode exercer liderança em muitas direções diferentes ao mesmo tempo, mas aqui estamos

falando de liderança educacional. O diretor é o que olha o trabalho do professor e que, na

medida do possível, ajuda aquele professor. Nós sabemos que no nosso caso, muitos dos

nossos diretores têm funções ou assumem funções quase que exclusivamente administrativas,

financeiras, e se preocupam muito menos com a dimensão pedagógica, educacional. Aqui

estamos falando de liderança educacional.

A ênfase na aquisição de competências básicas. Isso, posteriormente, deu uma certa confusão.

A pesquisa parecia estar dizendo que você tem que enfatizar aquilo que é básico,

conhecimentos básicos de Matemática e Língua, e menos, aparentemente, a evolução, o

desenvolvimento dos processos cognitivos mais avançados. Mas esse pode ser produto

também da forma em que esses pesquisadores estavam medindo os resultados das escolas. Se

a medida só procurava o domínio desses processos básicos, então, obviamente, as escolas que

mais enfatizavam isso, melhor saíam nessas provas. Havia muita discussão, portanto, sobre a

maneira em que o próprio instrumental, a própria metodologia da pesquisa estava

influenciando esse resultado. O ambiente ordeiro e seguro pareciam uma constante dessas

pesquisas e a escola mais tranquila, mais segura, onde eu não sei se usavam medidas próprias

de acidentes. A questão era o nível de barulho, número de brigas, essas coisas é que

aconteciam nas escolas. E a escola com mais controle, mais ordem, melhor resultado tinha.

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Altas expectativas, nós já conversamos sobre isso, e a avaliação frequente da aprendizagem

aparecia nessa época também. Quanto mais os professores avaliavam os seus alunos,

tomavam conhecimento, monitoravam o avanço da aprendizagem dos alunos, mais

probabilidade que no final do processo o nível desses alunos aparecia mais alto. Mas essas

foram as primeiras tentativas. A verdade, aos poucos, foi se jogando fora algumas das

conclusões das primeiras pesquisas, tipo a pesquisa do Harter. O Harter achava que quando

uma escola era eficaz em uma dimensão, que essa mesma escola ia ser eficaz em todas as

dimensões. Se a escola era eficaz naquelas questões sociais, de desenvolvimento da cidadania,

socialização, então a escola também ia ser eficaz no ensino da Matemática, da Língua e das

outras áreas curriculares. Mas logo, logo se descobriu que uma escola pode ser eficaz em uma

dimensão e não em outra. Dependendo da natureza da instituição, dependendo da ênfase,

dependendo do trabalho histórico nas diferentes áreas, uma escola pode sair como

sobressalente ou eficaz em uma dimensão e muito abaixo da média em outras. Essa é uma

pesquisa de um dos pais da pesquisa Escola Eficaz, em um bocado de escolas de Ensino

Fundamental na Inglaterra. O que é que ele estava medindo resultados cognitivos. Cognitivos

aqui, testes de Matemática, Língua, etc. Isso no vertical e, no horizontal, medidas não

cognitivas: medidas de comportamento, atitudes, outras finalidades educacionais, vamos

dizer. E o que é que você vê aqui? Você vê que tem algumas escolas que são ruins em todas as

dimensões. Elas conseguem baixa pontuação na parte não cognitiva e baixa pontuação na

parte cognitiva, enquanto você tem aqui algumas escolas que estão nos extremos das duas

distribuições. Bons resultados cognitivos e bons resultados não cognitivos, mas também tem

um monte de escolas em outros lugares, bons em uma, mas não tanto na outra. Ou boas

escolas na dimensão cognitiva, mas não tão boas na parte não cognitiva. Vocês estão me

entendendo? Nós estamos vivendo em um mundo muito mais complexo do que o Harter e

seus colegas imaginavam. Também essa pesquisa mostrou que outra conclusão do Harter

estava errada. O Harter esteve pesquisando suas escolas durante 3, 4 anos e ele achava que

isso era um período suficientemente longo de tempo para poder dizer “Olha, as minhas

escolas eficazes, ou as escolas que eu identifiquei como eficazes, são eficazes desde o princípio

da minha pesquisa até o fim, portanto, eu acho que a eficácia é uma característica quase que

permanente da escola. Uma vez eficaz, sempre eficaz”. Uma escola pode se destacar em

determinado momento pode, em função de questões conjunturais, produzir bons resultados e,

em poucos anos, ter perdido essa excelência, ter perdido essa distinção que permitiria chamar

de eficaz. Que a eficácia não é garantida como característica permanente, é produto do

trabalho contínuo dos indivíduos que compõem essa instituição, é alguma coisa que se

conquista a cada dia. Essa falta de permanência da eficácia também um resultado importante

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dessa pesquisa, dessa segunda fase, vamos dizer.

E uma outra coisa que o Harter tinha esquecido é que, talvez, a escola que tenha eficácia,

vamos supor, na dimensão cognitiva, não está sendo igualmente eficaz para todos os alunos

daquela escola. Se você usar exclusivamente a média, você pode chegar a uma conclusão

errada. É possível que a escola seja mais eficaz para uns do que para outros. O que é que esse

gráfico nos mostra? Nos mostra quatro escolas diferentes. A escola D, a escola que tem alunos

de todos os diferentes níveis sociais, mas que tem um nível de resultado muito baixo para

todos eles. A escola C não é uma escola boa para os alunos de nível social mais baixo, mas ela é

um pouco melhor para os alunos de nível social mais alto. Estamos vendo aqui que essa escola

trata de forma diferenciada os alunos de acordo com o seu nível social. Não que esteja fazendo

isso de forma consciente, de forma deliberada, mas os resultados dessa escola não são

resultados equitativos.

Agora vamos olhar escolas A e B. B é uma versão muito melhorada da escola D. A escola B está

muito mais alta na escala de resultados e tem um desempenho razoavelmente equitativo para

todos os alunos dos diferentes níveis sociais. Esses alunos aqui do nível social mais baixo estão

com desempenho só ligeiramente inferior aos alunos de nível socioeconômico mais alto.

Enquanto a escola A, que tem os melhores resultados de todos em termos da média, você vê

que essa escola prejudica esses alunos de nível socioeconômico mais baixo ao procurar

melhorar o nível desses alunos de nível socioeconômico mais alto, ou seja, a nossa definição

de escola eficaz que nós começamos está incompleta. Precisamos incorporar àquela definição

alguma coisa sobre equidade. Temos que dizer que a escola que consegue melhores resultados

para todos os alunos do que você esperaria, levando em consideração os seus antecedentes

sociais e acadêmicos. Porque não nos adianta uma escola melhorar a sua eficácia se só está

melhorando para um grupo de alunos e não para todos.

Mais uma década de pesquisa e eu acho que, de certa forma, o campo de escola eficaz está se

repetindo. Mostrou que não é um fenômeno para sempre, a escola pode perder a sua eficácia.

Mostrou que não é um fenômeno igual para todos os alunos. Mostrou que tem a ver com os

processos internos da escola, tem muito a ver com o ethos, o clima, e tem a ver com uma série

de outros fatores que, em grau maior ou menor, vêm se repetindo nas diferentes pesquisas de

escola eficaz. Então é possível chegar a uma espécie de listão onde você tem os fatores que

você pode ter relativa certeza que vão aparecer de uma forma mais ou menos enfatizada nas

pesquisas sobre o que é que faz a diferença, o que faz que uma escola seja mais produtiva,

mais competente, produza melhores resultados do que outra escola, mesmo quando os alunos

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são iguais. E aqui você tem uma lista já mais desenvolvida, já com 10 fatores. Todos eles, de

alguma maneira, enfocando os processos muito mais do que as condições físicas, estruturais,

de equipamento, de recursos. Continuamos enfatizando os processos de liderança. Os

processos de ensino já estão em segundo lugar, talvez até superando a questão da liderança. A

pesquisa, durante os anos 80 e 90, acaba descobrindo que a escola eficaz não é a escola eficaz,

é o professor eficaz. Que por trás das diferenças entre as escolas, você tem alguns processos

institucionais sim, mas o fator principal é o professor na sala de aula. O professor sendo um

bom professor. Usando metodologias, materiais, de forma apropriada motivada é que explica,

em grande medida, a diferença entre uma escola e outra. Esse professor, desenvolvendo e

mantendo o foco na aprendizagem, ajudando a produzir uma cultura escolar positiva, tendo

sempre expectativas altas em relação ao desempenho dos seus alunos, enfatizando as

responsabilidades e direitos dos alunos, monitorando o progresso dos alunos. Quantas vezes

aparece essa idéia de que se for para ajudar o professor através de cursos, de treinamento,

cursos de reciclagem, muito melhor fazer isto na escola? Onde se trata o corpo docente como

tal e onde se lida no contexto, no ambiente, apropriado com os problemas específicos daquele

local. Por essa lição, o que nós estamos fazendo aqui está totalmente errado. Nós não

deveríamos estar aqui. Se fôssemos um grupo de professores discutindo prática pedagógica,

nós deveríamos estar na escola. Discutindo diretamente, claro, o diretor e as outras

autoridades, junto com a gente discutindo esses problemas no âmbito da escola.

Envolvendo os pais e a ênfase na equidade. Mas tem alguma coisa faltando. O que está

faltando é a ligação entre essa pesquisa - agora suficientemente repetida e mastigada, que a

gente sabe mais ou menos quais são as diferenças entre as escolas, como levar essa pesquisa

para dentro da escola? Como fazer com que essa pesquisa tenha ressonância junto às pessoas

que possam alterar a prática de sala de aula ou da escola, de modo a incorporar essas

mudanças sugeridas pela pesquisa? Como é que isto vai acontecer? Não é tanto que a escola

seja uma instituição resistente a mudança, mas pode até fazer parte desse problema. Não é só

a falta de ideias ou disseminação de ideias, mas isso também tem que acontecer. Não é falta

de pessoas motivadas para fazer essa mudança, essas pessoas existem. Precisamos, portanto,

estudar melhor como fazer esse processo de mudança, como permitir a produção de mudança

no âmbito da escola. E essa questão é um outro campo de pesquisa que está correndo paralelo

à pesquisa em eficácia escolar, pelo menos, pelos últimos 30 anos, nos Estados Unidos e em

outros países. A questão é como você muda a escola? É isso que eu queria chamar de

melhoramento escolar ou melhoria escolar, mas a ideia é relativamente simples. Você tem

boas ideias, você tem convicção de que há necessidade de mudar, mas como é que essa

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mudança efetivamente se instala na escola e produz finalmente os resultados desejados? Isso

é um campo de pesquisa desde os anos 70. Você tem no princípio, uma certa ignorância ou

desinteresse por esses processos mais institucionais e achava-se que a única maneira ou a

maneira mais direta e fácil de fazer a escola mudar era entupir a escola com novos materiais

curriculares. Havia série de projetos de produção de novos materiais, muitos bastante

inovadores, e era só levar esses materiais até a porta da escola para garantir uma

transformação. Claro, não funcionou. Apesar da qualidade dos materiais.

Tivemos muitos estudos sobre esses fracassos nesses primeiros anos, nos anos 70. Nos anos

80, você vê um processo um pouco mais pensado sobre essa mudança, onde você descobre

que a política educacional em si não altera o funcionamento das escolas. Que é o processo de

implementação das reformas que determina os resultados. E que a variação local, a variação

entre as escolas, é a regra, não é a exceção. É muito difícil tratar a rede como uma rede. Como

se fosse uma coisa única, como se fosse, de alguma maneira, uma expressão de uma vontade

central. O que você tem é a ideia de que em cada escola haverá processos de mudança com

diferentes fases, acontecendo em diferentes momentos, um cavalado no outro, uns

avançando, outros menos. Mas as fases de iniciação, implementação e institucionalização de

qualquer mudança têm que acontecer em cada instituição. Cada instituição tem que estar

iniciando a sua própria mudança. A mudança não vem do órgão central, a mudança vem da

própria escola. E essas fases são inevitáveis para qualquer processo de mudança se efetivar no

âmbito da escola. Como é que vamos fazer? Eu acho que a escola eficaz pode nos ajudar. Além

de sinalizar para nós quais são os temas do diagnóstico que nós precisamos realizar ao nível de

cada escola, eu acho que a própria escola eficaz ou esse conjunto de pesquisas também dá

algumas indicações.

Precisamos de dados quantitativos. Não adianta imaginar que nós vamos desenvolver um

processo de mudança na escola sem estar muito ciente da situação em que nós estamos, da

nossa linha de base e aquilo que nós almejamos em termos do produto final do nosso

processo de mudança. Em toda etapa, em todo instante desse caminhar está sempre

coletando informação. Informação confiável, informação quantitativo sobre o processo de

desenvolvimento. Escola eficaz mostra que esse cuidado, essa preocupação em colocar o dedo

em cima da evidência é vital para o processo de mudança local. A pesquisa também nos

mostra que, por mais que a opinião e a participação do professor seja a peça central do

processo de mudança, a mudança que se deseja é a aprendizagem dos alunos. Então, é de olho

nos resultados medidos por nós ou por outros, dos sistemas internos ou externos, mas são os

resultados dos alunos que vão efetivamente guiar esse processo de mudança local.

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E a metodologia que nós vamos usar na escola: treinamento, específico, prolongado,

assistência na sala de aula, observação de outros projetos. Todo mundo da escola saindo da

escola e indo lá para outra escola ver como é que estão fazendo lá, voltando, rediscutindo...

Esse processo de troca entre as escolas que estão em comum é que faz parte da

implementação bem sucedida do processo de mudança na escola. Reuniões regulares,

professores participando o tempo todo nas decisões do projeto, desenvolvimento local dos

materiais - há necessidade sempre de estar produzindo novos materiais para abastecer os

professores, mas essa produção, em vez de virem os pacotes bonitos, produzidos na escola - e

participação do diretor junto com os professores nos treinamentos.

Mas... Agora a hora da verdade... A pesquisa indica que tanto na pesquisa Escola Eficaz quanto

na pesquisa em melhoramento escolar, nós temos, de certa forma, uma metodologia já

razoavelmente bem definida de como produzir melhoramento de modo a incorporar os

resultados da pesquisa. Mas nós temos condições de deslanchar esse processo? Eu acho que

nós estamos batalhando a favor de mudança em um ambiente que não é muito propício para

isto. E daí, de certa forma, a explicação pela não existência no Brasil de uma área de pesquisa

que se poderia chamar de melhoramento escolar. Se eu procuro na literatura, nas revistas

especializadas, eu não vou achar descrições bem ou mal feitas de tentativas das escolas de

introduzirem mudanças e de como essas mudanças foram ou não bem sucedidas, de acordo

com os indicadores necessários para medir esse processo. Nós não temos isso. Por que não?

Bom, em parte porque nós padecemos de sistemas extremamente centralizados onde a

iniciativa não resta com o diretor ou com o corpo docente das escolas. Se há desejo ou

desenho de mudança, isso sempre vem de fora. Estimulados não se sabe exatamente por

quem nem por que, mas que vem por ordem central. E isso obviamente não é a maneira

apropriada de instituir um processo autêntico, orgânico, de mudança na escola. A falta de

autonomia da escola, e não só a falta de autonomia funcional, administrativa, mas autonomia

financeira, de poder, em determinado momento, contratar uma ou mais de uma pessoa para

ajudar a escola a repensar suas atividades.

O peso da burocracia dos sistemas públicos. Mesmo se a escola chegasse a conclusões sobre o

que mudar, como mudar, como implementar as mudanças, na maioria das vezes, ele não teria

autoridade para fazer essas mudanças. Mais uma vez estamos inibidos pelo próprio processo e

o peso da burocracia. Eu não quero terminar nessa fala tão pessimista porque eu acho que nós

estamos começando esse processo, ou estamos engajados nesse processo, com uma série de

vantagens que não estavam sempre presentes historicamente no Brasil, e nem presentes em

outros lugares onde o processo de melhoramento escolar tenha avançado. A proporção de

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professores com nível superior capaz de fazer esse tipo de diagnóstico e capaz de entender,

compreender o efeito do seu trabalho no conjunto da escola, de entender todos os conceitos e

operacionalizar esses conceitos de escola eficaz no seu contexto específico, tem recursos que,

talvez, não estejam sendo guiados ou direcionados para as escolas, para essas atividades, mas

tem recursos no sistema que poderiam em determinado momento ser usado para essa

finalidade. E na medida em que a gente vai mostrando cada vez mais a necessidade de

mudança, fazendo comparações entre os nossos resultados e os resultados dos outros,

mostrando o impacto de determinados projetos, nós criamos uma motivação de que há

capacidade no sistema de melhoria e de que nós podemos atingir esses resultados melhores a

partir dos nossos próprios esforços. Eu acho que a Escola Eficaz contribui para essa discussão,

mas no final do dia, o que conta é a motivação de cada indivíduo dentro da sua escola para

fazê-la funcionar.

O Claudio me deu um segundo tema para continuar, mas um momento para intervalo e

depois a gente introduz o próximo tema.

Apresentador:

Informamos a todos que o material que foi exposto aqui no audiovisual estará disponível na

página da FESP. O endereço é www.fesp.rj.gov.br e vai estar no link “Seminário de Eficácia

Educacional”.

Dando continuação à palestra, o Doutor Nigel Brooke.

NB:

A idéia agora é de entrar nos detalhes de uma pesquisa, não é bem uma pesquisa sobre escola

eficaz, mas ela faz parte dessa tradição de pesquisa que tenta discriminar quais são os fatores

que incidem, impactam, influenciam o desempenho dos alunos. Eu vou falar sobre a pesquisa

Geres. Geres é a abreviatura de um nome mais comprido: Geração Escolar 2005. É uma

pesquisa longitudinal, significa que nós estamos acompanhando os mesmos alunos ao longo

da sua trajetória no que se refere ao Ensino Fundamental. Chamado um estudo de painel, esse

é um painel de alunos que estamos vendo ao longo de um período de tempo. Começamos com

eles em 2005, daí o nome, e terminamos de medir o seu desempenho pela última vez no final

do ano passado. Daqui a pouco nós vamos ter os resultados finais dessa última avaliação e

vamos começar, a partir daí, uma série de análises sobre o que impactou a diferença no

desempenho desses diferentes alunos, proximamente 20 mil.

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Os objetivos dessa pesquisa, identificar as características escolares que mais promovem o

aprendizado dos alunos e identificar as características escolares que minimizam o impacto da

origem social dos alunos em seus resultados escolares. Aqui, os dois objetivos claramente

separados. É possível ter fatores escolares que elevam, que promovem o aprendizado, e

outros fatores que produzem uma equidade de resultados na mesma escola. Você lembra

aquele gráfico das escolas A, B, C e D. Podemos identificar o que é que altera a média para

cima e podemos também identificar os fatores que produzem aquela curva mais achatada

onde a equidade é maior.

Bom, eu não vou entrar em todos os detalhes, mas vocês conhecem os sistemas de avaliação

SAEB, Prova Brasil, provinha, etc. Esses sistemas de avaliação são muito importantes. O avanço

que tem havido nas últimas décadas nessas avaliações tem permitido uma série de análises

sobre a própria evolução do sistema educacional brasileiro, tem permitido identificar

dificuldades, tem permitido fazer comparações que antes era impossível de fazer. Mas não

tem sido possível com essas avaliações fazer uma análise muito clara dos fatores escolares

responsáveis pelas diferenças nos resultados dos alunos de um lugar para outro, de um

momento para outro. Por quê? Porque essas avaliações são o que você pode chamar de

transversais. Eles pegam os alunos e as suas escolas em determinado momento, em

determinado ponto no tempo, coletam informação interessante, importante sobre quem são

os professores, quantos livros que tem na biblioteca, se tem pátio coberto, se não tem, um

monte de informação, ao mesmo tempo em que estão medindo o desempenho dos alunos

nessas escolas naquele dia. Mas você não pode argumentar de que as condições que você

pesquisou contabilizaram naquele dia em que você estava medindo o desempenho do aluno,

são as condições responsáveis por aquele nível de desempenho. Porque o desempenho do

aluno, o aprendizado do aluno, vem de longa data. Estamos falando de quarta série, oitava

série do Ensino Fundamental ou terceira série de Ensino Médio. Aquela aprendizagem medida

naquele dia, no final do Ensino Médio, é fruto de todo um histórico, de toda uma trajetória

através do sistema educacional. Da mesma forma que na quarta série, aquilo que o aluno

mostrou naquele dia não é fruto somente daquele professor que está naquela sala de aula.

Também é fruto do trabalho do professor do ano anterior, na terceira série, do ano anterior,

na segunda, e assim por diante. A única maneira em que você vai fazer uma conexão certa

entre as condições de ensino e aprendizagem, dos professores responsáveis por esse ensino,

das condições físicas, dos próprios processos escolares, a única maneira que você vai fazer a

conexão entre esses fatores e a aprendizagem do aluno é se você acompanha o aluno ao longo

dessa trajetória, olhando o que é que ele está recebendo ao longo desse processo. Esse é o

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60

propósito da pesquisa longitudinal. Para poder em determinado momento fazer a conexão e

atribuir responsabilidade por determinados fatores para a aprendizagem do aluno.

A pesquisa Geres foi desenhada em 2003, 2004 e iniciada em 2005, e obedece as regras para

esse tipo de pesquisa. As regras foram expressas em diferentes momentos, diferentes pessoas.

Eu estou dando somente as regras oferecidas em 1997. A pesquisa desse tipo tem que saber

quem são esses alunos, de onde é que eles vêm. Você lembra? Nós estávamos discutindo isso

agora a pouco em relação à escola eficaz. Nós temos que saber quem são esses alunos, sua

procedência socioeconômica e quem são esses alunos em termos daquilo que eles já sabiam

fazer quando nós começamos a estudar o efeito, o impacto da escola. Por isso é que nós

medimos o desempenho desses alunos quando da entrada na primeira série do Ensino

Fundamental em 2005. No princípio do ano. Essa foi a nossa linha de base.

A partir desse ponto da aprendizagem deles é que nós vamos tentar estudar o efeito da escola.

Nós estamos também usando uma análise estatística, você pode imaginar a complexidade. Eu

não chego nem a metade dessa complexidade. Felizmente, dentro da pesquisa nós temos

estatísticos que entendem do uso dos modelos multiníveis, mas a complexidade disso quando

você vai avançando ao longo do tempo, vai acumulando cada vez mais informação sobre o

indivíduo e sobre as experiências desse indivíduo nas diferentes salas, com os diferentes

professores, nos diferentes momentos da sua carreira. Eu não imaginava o quão complexo

seria a manutenção da base de dados dessa pesquisa. Nós subestimamos por completo o

esforço, o tempo e o recurso necessário para a manutenção dessa base de dados porque

acontece de tudo com esses alunos. Em um primeiro momento estão presentes na pesquisa e

depois eles desaparecem sem a gente sabe o motivo, reaparecem em um momento depois. Os

alunos fazem um crochê com a gente que é inacreditável. E, de alguma maneira, a gente tem

que manter controle sobre isso para poder, na hora apropriada, separar a influência de

diferentes fatores na movimentação deles. Uma das regras que nós estamos seguindo é que

nós temos que repetir as nossas medidas. Você lembra que nós estávamos falando que a

escola, ela nunca é a mesma escola de um dia para o outro e, muito menos, de um ano para o

outro, então é absolutamente vital que a gente venha acompanhando não só os alunos, mas

também a escola. Fazendo medidas, coletando informações regularmente sobre a instituição.

Mas então, resumindo, o que é que é essa pesquisa Geres? É uma pesquisa de desenho

longitudinal. Ela tem essa abordagem multinível, é uma abordagem estatística que leva em

consideração, ao mesmo tempo, que o aluno é influenciado em vários níveis. Ele é

influenciado pelo ambiente político em que a sua escola se insere. Nós estamos estudando

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escolas no Rio de Janeiro e também em Belo Horizonte. E em outras cidades como Salvador,

Campinas e Campo Grande. Mas há uma diferença entre a política educacional do Rio de

Janeiro e a política educacional de Belo Horizonte. E a escola vai ser influenciada por essas

diferenças e, se a escola é influenciada, nós podemos esperar algum efeito na sala de aula.

Portanto, é importante a gente lembrar que existe esse ambiente ou esse contexto político em

que a escola se insere. A escola também é outro nível de influência, a maneira em que a escola

é organizada e dirigida, a própria influência do diretor na gestão pedagógica da escola, esse

nível também precisa ser medido. Obviamente o nível da sala de aula, nós precisamos levar em

consideração o que é que o professor faz, o que é que o professor pensa, a maneira do

professor organizar o seu dia a dia. Então nós temos aí três níveis de influência: o nível do

contexto, o nível da escola e o nível da sala de aula. Esses três níveis, nós temos que levar em

consideração na hora de tentar destrinchar a influência de diferentes fatores na explicação da

variação no desempenho dos alunos.

A amostra de escolas é uma amostra não muito grande quando você considera o número de

escolas em um país tão grande quanto o nosso, mas, pelo menos no que se refere a essas

cinco cidades que eu mencionei, é uma amostra suficientemente grande que permite a gente

poder falar das redes pública e privada dessas cidades. E na medida em que essas cidades são

importantes, de certa forma representativas de diferentes regiões do país, Centro-Oeste,

Nordeste, Sudeste, nós vamos poder, pelo menos intimar ou sugerir que aquilo que nós

descobrimos na nossa pesquisa tenha relevância para uma população muito maior de escolas.

Nós não vamos estar falando somente das nossas 303 escolas que nós estamos seguindo na

nossa pesquisa. Nós vamos falar sobre uma população de escolas muito maior. Nós estamos

usando medidas de desempenho cognitivo, aquelas tradicionais de pesquisa desse tipo,

estamos avaliando o desempenho dos alunos em Matemática e em Língua Portuguesa. E

estamos também usando medidas não cognitivas, na medida do possível, tentando medir o

desenvolvimento das crianças em outras dimensões, não só o aprendizado de Matemática e

Português. E estamos levantando informações o tempo todo dos pais, dos professores, dos

diretores, sobre a instituição e a sala de aula.

Não vou entrar nisso, só para mostrar que nós estamos fazendo um levantamento da

bibliografia nacional para identificar quais são os fatores que nós deveríamos estar

pesquisando porque, em uma hora dessas, você tem que decidir o que é que você vai

perguntar ao professor, o que é que você vai perguntar ao diretor. Não dá para perguntar tudo

nem interessa perguntar tudo. Você tem que estar perguntando coisas que você tem alguma

informação a priori que esse fator vai ser relevante na explicação da avaliação do desempenho

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dos alunos. Então nós fizemos essa pesquisa dentro da bibliografia e identificamos fatores

provavelmente importantes. Por exemplo, é interessante em relação a uma discussão que

estávamos tendo antes. Nos Estados Unidos ou na Inglaterra, talvez vocês não encontrem

muita diferença entre as escolas no que se refere às suas condições de funcionamento. Todas

elas vão ter computador, todos os professores têm nível superior, as salas estão bem

equipadas, existem espaços, bibliotecas, etc. Então em uma pesquisa como essa nos Estados

Unidos, talvez não desse muita importância às condições de funcionamento da escola porque,

como a diferença é pequena, a contribuição dessas pequenas diferenças, as diferenças no

desempenho dos alunos também seriam muito pequenas. Talvez fosse essa uma das

explicações maiores pela falta de correlação nos dados do Collman entre condições de

funcionamento da escola e desempenho dos alunos. Não se espera realmente muita variação

em um país mais rico, as condições de funcionamento das escolas estão dadas. Não se justifica

grande variação no desempenho dos alunos em função dessa variação nas condições. Mas no

caso do Brasil, descobrimos logo de cara, na revisão da literatura, exemplos de pesquisas

mostrando que as diferenças nas condições de funcionamento da escola eram responsáveis

por diferenças significativas no desempenho dos alunos. Aqui sim, quando você compara

escolas públicas com escolas privadas, quando você compara escolas públicas de uma cidade

com outra cidade, ou quando se compara escolas públicas de duas redes diferentes dentro de

uma mesma cidade, você encontra diferenças significativas nas condições de funcionamento

dessas escolas, tipo de equipamento, tipo de pessoal, números de professores, número de

alunos por professor. Há variações significativas que precisam ser levadas em consideração.

Bom, afinal, aqui estamos em 5 municípios brasileiros - Belo Horizonte, Rio de Janeiro,

Campinas, Campo Grande, Salvador -, 303 escolas, excluindo as escolas rurais, as

multiseriadas, escolas noturnas e escolas com menos de 20 alunos. Acabamos definindo

escolas maiores e menores, mas uma vez definidas essas escolas, pegamos todas as turmas

que tinha na primeira série. Ficamos com alguma coisa em torno de 880 turmas, nessas 303

escolas, nas 5 cidades. Alunos da primeira série em 2005. Aí deu o primeiro problema. O nosso

teste para medir o ponto de partida desses alunos no princípio da primeira série em 2005,

pressupunha que os alunos tinham o mínimo de domínio sobre a escrita, tinha que colocar X, e

tinha que entender as instruções faladas pelo aplicador dos testes e tinha que descriminar

entre gravuras. Tinha que ter alguma noção da leitura e da escrita. Então colocamos como pré-

condição que os nossos alunos tinham que ter passado, pelo menos, um ano de pré-escola. Em

todas as cidades, menos Salvador, isso era tranquilo. Mesmo na rede pública, na cidade de

Belo Horizonte, todos os alunos da primeira série, em 2005, já tinham alguma pré-escola. Rio

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de Janeiro idem, Campinas, Campo Grande. A única cidade que falou "Opa, muitos dos nossos

alunos de primeira série estão sendo expostos pela primeira vez à escrita e à leitura. Não

tiveram pré-escola". Então nesse caso de Salvador, nós tivemos que alterar a situação e pegar

alunos que estavam começando na segunda série. Então Salvador sempre esteve um ano a

frente das outras cidades. Agora que terminamos a pesquisa, o que nós podemos fazer é o

ajuste para trás dos dados - para trás não, ajuste para frente dos resultados das outras cidades

- para comparar os resultados de Salvador.

Foi a primeira pesquisa no Brasil de criar um instrumento para medir o desempenho, o nível de

aprendizado dos alunos em leitura e escrita na primeira série. A metodologia que nós

desenvolvemos, esse é um exemplo positivo de como que a pesquisa pode ajudar na

formulação e execução de políticas. Dois anos depois, essa metodologia foi desenvolvida para

uma política da Secretaria de Educação de Minas Gerais, que instituiu uma prova para ver o

grau de alfabetização de alunos de oito anos, com base nos sistema que nós desenvolvemos e,

eventualmente, o próprio Ministério da Educação também usando essa tecnologia para a

Provinha Brasil.

Obviamente não vou falar desses números. Era só para mostrar que nós começamos em 2005,

com 19 mil alunos e, na medida em que a gente vai avançando na pesquisa, a gente vai

agregando alunos. Isso por quê? Porque vêm alunos, se juntam às nossas turmas, são alunos

que vêm transferidos de outras escolas. Mas esse dado aqui é que mais interessa. Alunos que

fizeram com a pesquisa a primeira medição, a segunda medição, a terceira medição e a quarta

medição - esse dá até o final da quarta medição -, se nós começamos com 19 mil alunos, agora

estamos só com 9 mil. O que é que aconteceu? O que é que está acontecendo? Bom, às vezes

faltam no dia da prova, às vezes saem da escola, às vezes saem da escola e voltam, às vezes

faltam, saem da escola. Todas as combinações possíveis e imagináveis. Somente 9.999 alunos

que começaram com a gente e que têm repetido todas as provas, esse é que vai ser o filé

mignon da nossa pesquisa. Nós fizemos uma quinta avaliação no final do ano passado que não

está refletida aqui. Esses 9.999 já devem ter caído para 8 mil, 8.500 talvez. Felizmente ainda é

um número suficientemente grande para a gente desenvolver as análises que eu estava

falando, as multiníveis. Você precisa de um bom número de casos para poder ver o impacto

dos diferentes fatores. É um número suficiente. Mas é uma medida, queira ou não, é uma

medida do que está acontecendo no nosso sistema. A perda, nós sabemos quantos dos nossos

20 mil foram perdidos. Nós não estamos jogando fora alunos que ficam retidos. De forma

alguma. Os alunos que ficam retidos, por exemplo, quando nós passamos para a segunda, eles

ainda estavam na primeira, ou quando nós passamos para a terceira, eles ainda eram na

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segunda ou na primeira e assim por diante, nós sempre fomos atrás. Nós temos o nome deles,

nós temos o código deles, nós podemos aplicar as nossas provas mesmo eles estando em

séries já com atraso escolar. E é absolutamente vital para a pesquisa continuar aplicando as

provas nesses alunos senão nós estaríamos incorporando um viés terrível de só estar

estudando os alunos melhores, os alunos que conseguem passar regularmente sem atrasos.

Mas nós não podemos ir atrás, desafortunadamente, dos alunos que saem da escola, que vão

para outros lugares. Isso já foge da nossa capacidade. Talvez se tivéssemos um mundo de

dinheiro e pudéssemos ir atrás mesmo estando em outras escolas, mas isso não é o caso. O

que a gente tem que ver é qual é a probabilidade do aluno sair da pesquisa de acordo com o

nível de desempenho anterior dele. Para ver se os que estão saindo representam algum grupo

ou se é aleatório, se são os melhores ou se são os piores.

Eu já tinha falado desses instrumentos cognitivos, estamos testando a Matemática e a Língua

Portuguesa desses alunos. E os instrumentos contextuais, estamos aplicando questionários

para os diretores, para os professores, para os pais e para os próprios alunos. Há um certo

ritual na pesquisa, todo ano nós estávamos desempenhando as mesmas funções, formulando

os testes, dando o relatório para as escolas. Caímos, depois do primeiro ano, caímos em um

procedimento regular que tinha todas as etapas que precisavam ser cumpridas dentro de certo

cronograma para poder, no final do ano, sempre estar aplicando as novas provas para as

escolas.

Agora um pouco de resultado. Nós chamamos de onda cada aplicação de testes. É mais do que

uma aplicação de testes, é uma aplicação de questionários, é uma organização para chegar na

escola, para completar a pesquisa todo ano, então é uma onda de coleta de informação. Na

quarta onda, que os alunos estão no final da terceira série, é a distribuição de competência ou

de proficiência dos alunos em leitura. Aí você vê que a média das escolas privadas, que é essa

linha no meio da caixa, essa linha é aproximadamente a mesma que a média das escolas que

nós estamos chamando de faixa especial. CAPE UFRJ, CAPE UERJ, são as escolas federais que

nós temos aqui no Rio, temos em outras cidades, que é uma escola pública, mas que é uma

escola pública diferenciada. Completamente diferente das outras escolas públicas. Nós

incluímos essas escolas para poder justamente acompanhar os alunos e ver em que medida

elas se diferenciam das outras. As escolas privadas têm uma média muito próxima, mas

inferior às escolas federais que eu estava falando. Não são só federais porque tem a CAPE UERJ

que também é uma escola estadual, mas tem características parecidas com as escolas federais.

E aqui no meio são essas duas da caixa. A média mais baixa são das escolas municipais e a

média um pouco superior a essa é a médias das escolas estaduais. Aqui no Rio de Janeiro não

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tem, mas as outras cidades da pesquisa todas têm escolas estaduais. Portanto as escolas

públicas, nitidamente, em um patamar bem diferente das escolas do extrato especial e das

escolas privadas. Essa aqui, essa escala vertical é a escala que nós criamos para a nossa

pesquisa, essa escala Geres. Equivalente à escala SAEBE. Inclusive, a partir da quinta onda que

os alunos estão no final da quarta série, vai dar para comparar a nossa escala com a escala

SAEBE, fazer uma equalização de modo que nós vamos poder dizer se os nossos alunos estão

na média dos alunos do país inteiro. Nós vamos poder comparar os nossos alunos com os

outros alunos de outros lugares.

Essa distribuição é de Matemática. Aqui estamos com o mesmo fenômeno, as escolas públicas

bem mais baixas, escola privada e a escola com extrato especial mais alto. Bom, eram esses

resultados que eu queria discutir com vocês. Ainda nós não estamos o impacto de fatores

escolares, nós não chegamos a esse ponto de poder discriminar quais são as condições de

funcionamento ou tipo de professor, tipo de pedagogia que influencia a aprendizagem dos

alunos. Esses são gráficos que simplesmente mostram o percurso, a trajetória da

aprendizagem dos alunos nas diferentes redes. Aqui nós estamos falando. Do lado esquerdo,

estamos falando da progressão da aprendizagem em leitura. Eu não deveria ter escolhido

amarelo aqui, mas a linha mais baixa, abaixo do roxo, a linha amarela é a escola municipal. A

linha roxa é a escola estadual, a linha azul é a escola privada e a linha preta é a escola da faixa

do extrato especial. Chamamos de especial, poderíamos ter chamado de outra forma, são

escolas de aplicação ligadas às universidades federais ou estaduais. Ou, por exemplo, o colégio

militar em Belo Horizonte. São escolas públicas, mas com características completamente

diferentes, colocamos essas juntas em uma faixa separada. O que eu queria mostrar aqui é que

nós estamos falando de dois universos completamente diferentes. O universo da escola

pública, começando em um ponto muito mais baixo da escala na primeira onda. Subindo

aproximadamente no mesmo ritmo que as escolas privadas, mas sempre em um curso

paralelo. Separado por 20 pontos ou mais na escala Geres. Agora o que é que acontece do lado

de cá? Isso é um fenômeno que eu não encontro discussão na literatura sobre isto e vocês

como educadores talvez consigam me ajudar a interpretar. O que se vê nitidamente é uma

paradinha no ensino da Matemática na segunda série. Só lembrando. Um aqui representa o

ponto de partida dos alunos no princípio da primeira série, não é? O dois, a onda dois,

representa aonde que eles chegaram no final da primeira série. Essa aprendizagem, no caso

Matemática, é o que aconteceu ao longo da primeira série. Três, onda 3, representa

aprendizado deles no final da segunda série. E você vê em comparação com a escola privada

que vai em uma reta só, a escola pública de repente tem um degrau. E só na terceira série que

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retoma a inclinação anterior. Passou por esse degrau e continua subindo. Nós podemos ver

esse resultado de outras maneiras. Aqui, especificamente nas escolas municipais. E agora

estamos falando de todas as cidades, talvez, menos em Belo Horizonte. Esse degrau é menos

acentuado no caso de Belo Horizonte e muito acentuado no caso de Salvador, Campo Grande

e Rio de Janeiro. O que esse gráfico está me dizendo é que os professores estão deixando o

ensino da Matemática de lado na segunda série. É isso mesmo? É isso que acontece? A minha

interpretação é que a urgência ou a premência de garantir a educação dessas crianças até o

final da segunda série está obrigando os professores a concentrar seus esforços e seus

recursos em cima da alfabetização e isso está redundando na redução da importância do

ensino da Matemática. A razão da preocupação dos professores está dada pelo gráfico

anterior. Esse ponto em que os alunos chegaram no final da primeira série em termos da

escala de leitura. Esse ponto aqui, 120 aproximadamente na escala Geres, é inferior ao ponto

de partida dos alunos das escolas privadas no princípio da primeira série. Na escola pública, o

domínio da leitura é inferior, no final do primeiro ano de alfabetização, ao ponto de partida

dos alunos das escolas privadas no princípio do ano.

Mesmo com o esforço especial durante a segunda série, o ponto em que os alunos chegam à

escola pública é aproximadamente equivalente ao ponto de partida dos alunos das escolas

privadas no princípio da primeira série. Estamos falando, portanto, de dois anos de atraso no

que se refere aos nossos alunos Geres, na escala de leitura. A preocupação em garantir esse

avanço aqui, portanto, é justificada. O problema é que quando você deixa de ensinar

Matemática nesse mesmo período, você não recupera depois. Que, uma vez criada essa

distância, essa distância aqui, entre as escolas públicas e as escolas privadas, é muito superior

a essa distância aqui. E essa distância, agora, as duas linhas, as duas curvas, vão continuar em

paralelo. A distância está estabelecida. Se não recupera esse tempo perdido. Então se, além de

dois anos de atraso na parte de leitura, o que nós criamos foi um atraso de dois anos em

Matemática onde só havia um atraso menor anteriormente. Parece mesmo que o dado está

contra o aluno da escola pública. O professor está naturalmente preocupado em garantir a

alfabetização. Somente 40% dos alunos das escolas municipais e 33% dos alunos das escolas

estaduais ainda estavam nos níveis 3 e 4 da escala Geres, nesse ponto aqui, no final da terceira

série. Ainda não tinha habilidades estáveis de codificação e decodificação. Não eram capazes

de recuperar informação explícita localizada no final de pequenos textos, e não conseguiam

inferir o sentido de palavras a partir do contexto. Ou seja, após 3 anos de alfabetização e esses

esforços especiais durante a segunda série, os alunos das escolas públicas, somente 60% deles,

isso após 3 anos, têm dominado o básico da alfabetização.

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Espectador 1:

Eu não entendi se 40% dos alunos das escolas municipais e 33% dos alunos das escolas

estaduais é que conseguiram chegar ao nível desejado no final ou é o contrário. Então 60%

conseguiram chegar, não é isso?

NB:

Quem é alfabetizador vai saber o que eu estou falando. Que essas competências e habilidades

estáveis de codificação e decodificação. Recuperar informação explícita localizada no final de

pequenos textos ou inferir o sentido de palavras a partir do contexto. Eu não sou especialista

em Educação, mas me garantem que essas são as primeiras habilidades que se adquirem no

processo de alfabetização. O que nós estamos dizendo é que, mesmo até o final da terceira

série, 40% dos alunos ainda não têm.

Bom, essa discussão é sobre o que está havendo. Deixando de lado, pelo menos por enquanto,

a diferença entre esses dois universos que são o universo das escolas privadas e o universo das

escolas públicas, você vê por esses dois gráficos que as escolas privadas estão atingindo já

nível 170, bem superior. Em todo o trajeto a escola privada se mantém distante e, pelo visto,

cada vez mais distante das escolas públicas. Mas deixando de lado esse resultado, que de certa

forma era esperado, o que eu queria era discutir esse fenômeno. Aqui eu estou mostrando

para as escolas estaduais, escolas municipais, escolas privadas, escola de extrato especial, qual

que é a contribuição de cada ano de aprendizagem, isso na área de Matemática. E como o que

eu estava mostrando. Isso aqui é o que o aluno já tinha quando ele entrou na escola, nós

estamos testando ele no princípio da primeira série, então, de certa forma, isso ele já tem. Já

veio com isso da pré-escola, ele já tem esse nível de competência na nossa escala. O vermelho

escuro é o que ele aprendeu de Matemática na escola municipal ao longo da primeira série. E

essa pequena faixa amarela é o que ele aprendeu na segunda série. Em Matemática. Mas se vê

nitidamente que, tanto na escola estadual quanto na escola pública, o quanto que esse

aprendizado foi achatado Em comparação com as escolas da faixa especial, escolas privadas,

cujo acréscimo de aprendizagem seguiu em um ritmo pré-estabelecido. É isso mesmo que nós

estamos identificando aqui? Que há um problema. Há um problema de alfabetização ou é a

pressão.

Nigel Brooke:

Alguém tem uma opinião sobre isso?

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Espectador 2: Nova Friburgo, Rio de Janeiro.

As escolas particulares, pelo menos em Friburgo, que a gente tem acesso na pré-escola já se

inicia o processo da aquisição dos conceitos matemáticos, não é? Então a criança, a partir de 3

anos, ela já inicia um processo concreto na linha da Matemática. E creio que lá na nossa

cidade, posso falar com relação ao privado, quando se chega no primeiro ano, já não é mais o

ciclo. Primeiro ano já seriação, segundo ano já é seriação. Isso no privado. Já o município não,

entra em um processo que a pré-escola fica ainda um pouco perdida, não é? Não tem ainda

uma definição da função dessa pré-escola e o ciclo, primeiro e segundo ano, eles são uma

continuação. Eu creio que naquela região, Monjardim, Cordeiro, Cantagalo, Friburgo,

adjacências, estão passando por isso, ou seja, a pré-escola tem uma função fundamental não

só na socialização, mas no processo também dessa aquisição de conceitos que a criança vai

brincando, ao brincar, ela desenvolve o processo. E a gente tem que trabalhar essa pré-escola.

Eu creio que pode ser um dos fatores que fazem com que a primeira e segunda série, ocorra

essa questão com a escola pública estadual.

NB:

Eu acho que a gente vai poder testar essa hipótese. Quando da entrega das últimas

proficiências, os resultados dessa última onda no final do ano passado, nós vamos ter o nosso

banco de dados completo sobre todas essas etapas de medição do aprendizado dos alunos.

Nós vamos ter todos os dados sobre processo de enturmação, todas as decisões tomadas ano

por ano, cada escola, as opiniões dos professores sobre a evolução da aprendizagem dos seus

alunos. Nós vamos poder destrinchar isso e identificar. Eu posso adiantar que nós já sabemos

alguns dos resultados por alguns estudos preliminares usando esses dados, por exemplo, aqui

no Rio de Janeiro foi defendida uma tese recentemente, mostrando claramente o impacto do

livro didático no ritmo de aprendizagem dos alunos. Mas não tanto o livro didático em si, o

importante é o tempo que o professor tem de uso daquele livro didático. Não importa qual é o

livro. O importante é o grau de familiaridade, a facilidade com que o professor utiliza aquele

livro é que faz a diferença. Você vê nitidamente que os alunos cujo professor tem usado o

mesmo livro durante algum tempo, os alunos aprendem com ritmo maior. Isso onde o livro

didático é usado. Mas isso demonstra que nós vamos poder entrar em uma discussão sobre

cada um desses fatores para tentar discriminar o que é que de fato está contribuindo, o que é

que o professor faz ou deixa de fazer que está incidindo no avanço ou o ritmo de avanço dos

seus alunos.

Espectador 3:

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Queria saber se vocês já pesquisaram como o professor tem trabalhado a Matemática na

escola, porque eu não sei como é nas outras regiões, mas onde a gente trabalha, em Rio das

Ostras, vejo os professores com pouca habilidade para trabalhar o ensino da Matemática,

como se a Matemática fosse outra linguagem. Na Matemática, chega ao ponto dos

professores quererem se dividir, tipo: “Você fica com a Matemática, eu fico com a Língua

Portuguesa”. E eu percebo que o professor está sempre deixando a Matemática de lado.

NB:

Você está dizendo que o professor tem menos familiaridade, menos facilidade com o ensino

da Matemática.

Claudio Mendonça:

Eu quero fazer uma observação em cima exatamente do que ela está dizendo. Eu acredito que

na segunda série, a Matemática ganha uma característica menos intuitiva e começa a ganhar

uma natureza mais procedimentalista, mas repetitiva, que é o fundamento da Matemática que

vai permear todas as séries até o final da Aritmética. Então nas escolas de natureza especial

privada, o professor, por ter uma base metodológica mais eficiente, ele consegue trazer

melhor resultado a esse caráter procedimentalista, onde ele tem que ser dedutivo, e na

Matemática das escolas públicas, a ausência de método faz com que a repetição não traga

bons resultados porque não tem metodologia que sustente essa repetição.

NB:

Com essa tese, como você explicaria a retomada na série seguinte? É porque é outro

professor?

CM:

Os professores mais velhos escolhem o horário de acordo com a antiguidade da matrícula. A

escolha da turma na matriz curricular é feita de acordo com a antiguidade da matrícula.

Quanto mais velha é a matrícula, maior o direito de escolher a turma e o horário. Então os

professores mais jovens, com menos metodologia, com menos prática, menos tarimbados,

eles são designados para as turmas de primeira série, de alfabetização e, naturalmente,

também a primeira série da Matemática. Os professores com uma formação mais antiga, já

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com uma base metodológica intuitiva criada ou através do livro, da familiaridade com o livro, é

que vão para as turmas mais adiantadas.

NB:

Muito bem, então agora temos uma segunda hipótese para explicar esse fenômeno. Na minha

hipótese era o professor alfabetizador sentindo a pressão por resultados ou pela melhoria na

competência em leitura do seu aluno, estava deixando o ensino da Matemática de lado. Na

hipótese do professor Claudio é porque é um professor alfabetizador e que, por formação ou

por preferência, ele se vê como alfabetizador e não como professor de Matemática. E mesmo

se tivesse tempo, ele não seria tão eficiente no ensino da Matemática, portanto esse degrau

não é a Matemática sendo deixada de lado, é a Matemática sendo mal ensinada. A diferença

está aí. Enquanto aqui, na terceira série, você tem um professor de terceira série cuja

formação é para o ensino da Matemática e não para a alfabetização de criança. É isso?

CM:

Ele é mais antigo na escola.

NB:

E pode ser porque ele é mais antigo na escola, já que ele pode escolher qual série que... Então

nós temos duas hipóteses. Alguém quer levantar mais alguma?

Espectador 4:

Posso sugerir uma terceira hipótese, Doutor Nigel?

NB:

Pesquisa acaba levantando mais hipóteses do que resolve.

Espectador 4:

Posso sugerir uma terceira hipótese?

NB:

Pode.

Espectador 4:

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71

Eu sou professora que já trabalhei desde classes de pré-escola até o segundo grau agora. E o

que eu vejo dentro da escola pública, municipal ou estadual, é a falta da pré-escola. Então os

alunos da rede privada em especial, eles já chegam com o raciocínio estruturado lá nas

primeiras séries, e o aluno da escola pública municipal ou estadual, por ele não ter as classes

de pré-escola, chega ainda com a estrutura mental dele não preparada para uma metodologia

da Matemática da segunda série que já é cobrada. No primeiro ano, na alfabetização e na

primeira série, ele pode trabalhar de forma lúdica e forma intuitiva, mas quando chega ao

terceiro ano quando tem que usar as estruturas cognitivas já formadas, ele não tem isso.

NB:

Muito bem. Eu acho que nessa discussão, claro, nós não vamos chegar a nenhuma conclusão.

Tem mais alguém.

Espectador 4:

Bem, Eu não sei se eu estou viajando, mas, pensando assim nas outras falas, eu fico pensando

na questão dos ciclos que a gente tem na rede municipal e na rede estadual. Eu não sei se esse

problema na Matemática tem a ver com o tipo de trabalho que está sendo realizado nesses

ciclos, se eles realmente estão alcançando o objetivo de alfabetizar esse aluno, se essa questão

do ciclo está sendo bem entendida e está sendo bem trabalhado a ponto da segunda série, de

repente, retomar e seguir em frente. Então eu acredito, não é? Não tem nem tanta base, eu

penso que esse trabalho de ciclo pode estar causando essa estagnação na segunda série na

Matemática. Para o professor tentar retomar e dar um desfecho na questão da Língua

Portuguesa, na questão da leitura. Eu acho que pode estar aí. De certa forma, esse trabalho de

ciclo ainda não é bem compreendido. Fala-se muito, defende-se muito, mas eu acho que ainda

falta uma estrutura maior.

NB:

Eu estou falando série sempre, mas, em verdade, em duas, aliás, três das nossas cidades

implantou-se o sistema de ciclos. Só no Brasil para ter um sistema tão confuso, tão complexo.

Agora, às vezes, ciclo, às vezes é série, às vezes, é ano, ninguém se entende mais sobre como

chamar os diferentes momentos da escolarização. É mais um nível de complexidade na própria

pesquisa. Mas eu aceitei esse convite de apresentar a pesquisa Geres, primeiro porque eu

acho interessante mostrar que é possível fazer pesquisa nessa tradição da escola eficaz. Ele

não é propriamente uma pesquisa desenhada para entender por que determinadas escolas

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são eficazes e outras não. Ela não tem exatamente essa estrutura, mas inegavelmente ela

segue a tradição da escola eficaz na medida em que está tentando identificar aqueles fatores

que incidem ou contribuem para a aprendizagem dos alunos. É uma pesquisa em andamento -

vocês podem se informar mais caso se interessarem -, tem um site que é www.geres.ufmg.br,

que fornece os documentos, os relatórios e outras informações sobre a pesquisa. Eu espero

que ao longo deste ano, estaremos publicando os resultados finais da pesquisa, em termos

desse modelo, os resultados desse modelo multinível. Muito obrigado!

Segundo dia

Lina Kátia

Especializada em Educação para a Matemática e mestre em Educação pela

Universidade Federal de Juiz de Fora. Atualmente é Coordenadora da Unidade de

Avaliação da Fundação de Apoio e Desenvolvimento ao Ensino e Extensão.

A Importância dos Indicadores Educacionais

Eu queria inicialmente agradecer ao Claudio Mendonça pelo convite e dizer que é uma feliz

oportunidade a gente estar aqui discutindo esse tema tão importante que gira em torno da

avaliação educacional, que é a equidade e a qualidade da educação e o que esses indicadores

estão dizendo sobre a nossa realidade.

Vou me sentir em uma situação muito confortável. Eu vou iniciar a minha fala no lugar de

professora da rede pública, 22 anos professora da rede pública do estado de Minas, passei por

uma experiência como diretora de escola, cheguei à secretária municipal de Educação e hoje

coordeno o CAED. O CAED é o Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação na

Universidade Federal de Juiz de Fora. O CAED vem desenvolvendo com o Rio de Janeiro, com a

Secretaria do Estado do Rio de Janeiro desde a época do Claudio como secretário, que

depositou todo voto de confiança ao CAED, a avaliação externa do programa Nova Escola e

hoje do SAERJ, não só no Estado do Rio, como no Estado de Minas Gerais, Ceará, Pernambuco,

Rio Grande do Sul e estamos entrando agora no Espírito Santo. Vou falar de um lugar que é

muito igual ao de vocês. A gente acredita que a educação é algo muito complexo. Eu acho que

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é bom a gente situar um pouco antes de começarmos a trabalhar com os indicadores, para a

gente perceber que lugar que a gente pensa e o que é que a gente tem em comum, para até

entender o que é que a minha fala pode contribuir com a gestão de vocês.

Bom, a gente acredita que a educação é algo muito complexo. Não é verdade? Que vários

fatores interferem na educação. Seja ele extraescolar. Vamos pensar em alguns fatores

extraescolares que vocês acham que podem interferir no desempenho do aluno. Falem

qualquer um. Socioeconômico. Outro? Político, familiar, não é isso? As relações familiares, o

capital social, o capital cultural, vários fatores interferem nesse desempenho. Mas também

vamos falar que existem alguns fatores intraescolares que interferem no desempenho.

Vejamos alguns desses fatores, vamos parar para pensar comigo. Que fatores dentro da escola

interferem no resultado do desempenho escolar. Vejamos: Burocracia na escola, o

relacionamento, falta de professor, qual outro? Falta de liderança do diretor, gestão escolar é

um dos fatores que mais interfere em um desempenho. O compromisso com o professor com

a aprendizagem, a sua formação, não é? Então as pesquisas têm mostrado o seguinte, que

65% estão relacionados ao fator extraescolar, têm um compromisso político com a sociedade,

mas 35% têm os fatores intraescolares. Esses fatores podem fazer essa diferença, está certo?

Então a gente acredita que essa complexidade toda que eu estou dizendo, em termos dos

fatores extras e intraescolares, estão atrelados a um desempenho. E quando você começa a

pensar em um desempenho escolar “Olha, a avaliação no Brasil está praticamente

consolidada”. Desde a década de 90, com a implementação do SAEBE.O SAEBE começou em

uma amostral. Todo mundo aqui entende o SAEBE? Sistema Nacional de Avaliação da

Educação Básica. Ele foi implementado no início de 90. Até 93, 95, a última avaliação, o SAEBE

só tinha um objetivo: verificar se o currículo estava sendo cumprido, uma questão mais

curricular e uma amostra de escolas. A partir de 97, 99, o SAEBE implementou uma matriz de

referência para avaliação, onde nessa matriz todos os descritores apresentam o que é avaliado

e, a partir de 2005, ele deu um salto, em vez de ser amostral, em vez de dar um retrato geral,

começa a entrar na escola, porque é a escola que faz a diferença”. Ele começa a ter uma

avaliação censitária que é a Prova Brasil que vocês participam de alguma forma.

Bom, eu vou voltar nessa questão da complexidade. Quando eu digo que vários fatores

interferem, vocês vão dizer "Poxa, mas como então esse desempenho é medido? Como isso é

medido, não é? O aluno do Rio é a mesmo coisa no Ceará. Esse pessoal faz o teste lá no Ceará.

Ou o aluno aqui com o aluno do interior. Da zona urbana, a zona rural, não é”? Quanta

diversidade tem no estado, imagina quanta diversidade no Brasil. Quando se pensa no

desempenho escolar, em uma avaliação externa, o que está em foco são as habilidades básicas

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e essenciais que um aluno precisa ter vencido em determinadas etapas de escolaridade. Quer

ver? Quarta série, quinto ano do Ensino Fundamental de nove anos. As habilidades básicas em

Matemática que um menino tem que ter. Vocês vão falar para mim, não importa onde ele

está, ele tem que sair sabendo as quatro operações fundamentais, processo operatório. Não

tem como, não é isso? Ele não pode sair sem saber identificar, localizar, classificar e seriar. Eu

fui para o lado da Matemática sem querer porque a minha área é Matemática. Então vamos

identificar, localizar, classificar e comparar. Ter noção de espaço e tempo. Identificar uma

informação, ler uma informação básica em um gráfico de coluna e tabela. Vocês podem dizer

para mim onde nesse país um menino pode terminar cinco anos de escolaridade sem saber

isso? Tem, não é? Mas termina. Quando a gente pensa em uma avaliação do desempenho

nesse nível, toda a questão da complexidade foi por água abaixo. Nós não estamos falando em

complexidade, nós estamos falando em condição mínima porque se eu não der condição

mínima para esse aluno desse processo, para essa criança, não é? O que é que a gente está

fazendo? Contribuindo cada vez mais para uma exclusão social. E o abandono e a repetência e

a evasão. É expulsar o aluno da escola. Imaginem vocês se eu ficar aqui a manhã toda

conversando com vocês, vocês virarem para o Claudio e falarem “Claudio, não traz mais essa

mulher não, não entendi nada do que ela falou. Não faz sentido”. Imagina um menino na

escola, o tempo todo, com esses 5 anos, não é? Cinco anos, muito tempo na escola, e ele não

conseguir desenvolver essas habilidades em Matemática e como não saber decodificar

palavras, associar palavras a imagem, decodificar frases, ler uma informação simples, em um

texto simples, uma informação explícita. "Pelé é o melhor jogador do mundo. Quem é o

melhor jogador do mundo"? É isso que se está cobrando nas séries iniciais. Então quando eu

disser desempenho escolar, quando eu disser com vocês "esses são os indicadores de

desempenho do SAEBE”, agora vocês vão entender do lugar que eu estou falando, está bom?

Então eu vou fazer o seguinte, eu vou começar aqui a trabalhar com os indicadores, vou fazer

uma rápida apresentação, a gente vai tentar conjugar isso com a ideia e a realidade da escola e

também em nível de gestão municipal ou gestão estadual. O que é que os gestores podem

fazer. E depois a gente dá um tempinho para a gente conversar, está legal?

Bom, a gente vai trabalhar com os indicadores de uma forma geral, educacionais, e por último,

vamos tentar fechar com os indicadores sociais. Vamos parar para pensar um pouco em uma

função do indicador. Para que serve o indicador? Ela é uma medida objetiva e sintética, básica,

simples que exprime o resultado da ação, do fenômeno. A gente agiu sobre algo, nós todos

trabalhamos para que o aluno aprenda e quero saber qual é o desempenho desse aluno. Eu

vou ter uma medida nos testes padronizados das avaliações externas, como eu também vou

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ter uma medida, um indicador de qualidade, em termos da evasão, em termos da repetência,

em termos do abandono, da distorção idade/série. A gente vai fazer todo esse comando. Eu

fiquei pensando. E para quê? Para atingir um determinado objetivo. Qual que seria o objetivo

na área da educação hoje? Forte. Olhe bem, o início da década de 80 e a década de 90

marcaram o Brasil com várias reformas, inclusive com a nova LDB. Qual que era o ponto chave

da nova LDB, qual é o ponto principal dessas reformas educacionais que a gente viveu? Um

deles é a universalização do ensino. Toda criança na escola, permanência e o acesso. E o

outro? Acabar com o analfabetismo, erradicar o analfabetismo. Eram dois pontos fortes. E hoje

o que é que a gente tem forte? Eu tenho que acabar com o analfabetismo, mas é importante

saber o quê? O desempenho das habilidades básicas essenciais. Eu não posso pensar em um

indicador, simplesmente, que vai dizer que o menino de 15 anos é analfabeto ou não? Essa

condição é muito pouca para a gente, a gente não merece isso. A gente merece o quê? Que

todo brasileiro aprenda e que tenha uma condição digna de vida. E um caminho para isso é o

quê? Eu acredito piamente nisso. É a educação e o que a educação pode contribuir para

melhorar. Eu acho que antes de parar para a gente começar a conversar sobre esse indicador,

fiquei pensando em dizer para vocês com sinceridade que passei como secretaria municipal de

Betim, 6 anos, e nunca tinha olhado para um indicador educacional. Isso em 82, 83. Eu fiz uma

gestão razoável, eu entendo isso, pelo menos não tinha estatuto do magistério, eu consegui

fazer isso. Não tinha uma proposta curricular, eu consegui fazer isso. Mas eu nunca naquela

época, eu não sei se eu não tinha maturidade, eu estou dizendo francamente para vocês, eu

nunca parei para pensar que indicador educacional tinha Betim, tinha o Brasil, tinha Minas.

Não tinha forte essa questão da avaliação, que indicação de desempenho tinha. Era 86, 83,

não havia avaliação da educação, essa avaliação externa dessa forma. Não tinha indicador de

desempenho que eu comparasse Betim com Minas e com outras cidades, eu não tinha isso. Eu

estava conversando com uma pessoa lá do CAED e disse que fiquei olhando, eu estava no

avião, fiquei olhando aquela quantidade de botões e disse assim: “Eu acho que eu administrei”

Aí comentando que eu ia fazer um bate papo com vocês sobre isso, virei para ele e disse assim:

“Eu acho que o negócio era o seguinte, quando eu fui secretária municipal devia ter um monte

daqueles botões ali. Me perguntaram assim, o que é que você sabe? Deve ter um monte aí,

mas eu só pilotei a secretaria olhando esse aqui, só um. O resto eu não quis nem saber”. Eu

não sabia, eu não tinha conhecimento, mas eu fiz uma administração razoável, eu deixei

alguma contribuição, mas poderia ter deixado outras melhores. Eu poderia ter ido a frente, eu

poderia ter ido no rumo certo, com um planejamento melhor, eu poderia ter lançado mão de

várias ferramentas que hoje eu lançaria, não é? O voo aconteceu, era a mesma coisa se eu

perguntasse ao piloto e dissesse assim: “Olha, tem vários aqui, mas eu só vou olhar esse botão.

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não se preocupa com os outros, não que não tenha importância". Claro, se tem ali, tem a sua

importância. E tem sua utilização. Aí eu disse assim: "Se ele me dissesse isso, a gente ia chegar

e eu ia passar pelo voo tremendo de medo”. Mas se ele chegasse perto de mim e dissesse

assim: “Eu tenho esse botão que me indica isso, eu controlo esse para isso, eu faço isso por

isso”, eu tinha certeza que eu ia chegar e ia sentir a maior segurança nesse piloto. Eu acho que

é isso. Hoje a gestão escolar tem vários indicadores que ela pode tomar como referência e

pode seguir um rumo mais eficaz. É o tema do encontro hoje, não é? Vamos trabalhar com a

educação tendo em vista o quê? Uma escola eficaz? O que é que é uma escola eficaz

basicamente? O que é que é uma escola eficaz? Uma escola que todo aluno está nessa escola e

que todo aluno aprenda. A gente pode entrar em várias discussões da importância da

formação, da importância da escola na inserção cultural, social, e é importante, eu não vou

tirar essa relevância, mas sem com que o menino aprenda, eu não vejo possibilidade disso

acontecer. Como é que a criança e o jovem vão ser críticos e participativos e ativos na

sociedade se eles não sabem nem ler e interpretar uma informação básica no jornal, em um

meio de comunicação, não é verdade? Então eu acho que o forte da escola é justamente isso.

Eu estava lendo o prefácio do livro do Claudio e ele dizia isso “Olha, eu preciso do quê? O foco

da escola tem que ser a aprendizagem”. Então nós vamos trabalhar com esses indicadores

dessa forma: “Olha, eu tenho vários indicadores e como esses indicadores podem contribuir

para melhorar a gestão escolar”.

Então vamos situar o Brasil? O que é que vocês observam ali? Taxa de analfabetismo no Brasil.

Que análise vocês fariam desse quadro? Ali no primeiro tem a faixa etária, tem o período. A

primeira análise que a gente faz em relação? Que a taxa do analfabetismo está caindo, está

certo? Bom, está caindo. À medida que evolui a idade, que a gente fica mais velho, o que é que

acontece com a taxa de analfabetismo? Aumenta. Essas são as duas análises que a gente faz.

Mas o que é que é taxa de analfabetismo? Como que eu verifico que a taxa...? Eu falei em

desempenho escolar no início, eu não falei em taxa de analfabetismo. Que é que vou, vou

verificar o quê? Se o menino sabe o quê? Ler e escrever. Mas simplesmente não, ele não chega

nesse nível. É se ele sabe escrever o nome e se ele sabe ler alguma coisa muito simples. Não é

nesse nível que a gente vai trabalhar do desempenho escolar. E a taxa de analfabetismo no

Brasil, os indicadores podem ter dois pontos chaves. O primeiro, eu posso fazer um indicador

como exemplo desse, da taxa de analfabetismo no Brasil, uma visão macro. Não importa se ele

está na escola, se ele não está na escola. É o brasileiro, não é? E eu posso ter o indicador

quando a gente fala do desempenho escolar com o foco no quê? De análise de quem está

estudando, de quem está na escola. Então esses são os indicadores do Brasil. Vocês acham que

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o do Rio está muito mais alto, está menor? Que posição vocês acham que o Rio de Janeiro

ocupa em relação às taxas de analfabetismo? Menor? Nós temos aí 15 milhões, em torno de

15 milhões de habitantes, não é isso? Olha a taxa do Rio de Janeiro. O que é que vocês

acharam? Menor, um pouco menor? Vamos voltar lá para comparar? Vamos comparar 2007 e

a evolução? Olha, 1.3 e 0,9. Bem menor. Está certo? Agora vamos ver acima de 24 anos. Bem

menor. Então, em comparando com o Brasil. Olha, para você ver, para que serve o indicador?

Primeiro momento que eu falei com vocês é o quê? Eu vou verificar a dimensão, não é isso? O

segundo, qual é o movimento que eu fiz? Regionalizar. Quando eu regionalizei, o que é que eu

fiz? Eu fui lá, fui e voltei, eu estabeleci uma comparação, não é? Então eu posso situar ele, o

Brasil com o Brasil, mas eu posso situar não só o Rio de Janeiro, como os estados e as regiões

em relação ao Brasil e também o Brasil em relação a outros países, não é? Então os

indicadores são uma medida sintética, simples, que, além de você identificar um fenômeno,

verificar uma situação dada em um processo até de intervenção, você tem ao longo do tempo.

Quando você tem essa medida ao longo do tempo, qual que é a função que está explícita

nisso? A de monitoramente. Eu posso monitorar para ver se eu estou evoluindo, se eu não

estou evoluindo, o que é que está acontecendo. Outra taxa importante. O que é que significa

analfabetismo funcional? A gente vê isso nos meios de comunicação. Eu falei de analfabetos, a

gente chegou aqui para verificar se eles sabem ler e escrever, e a gente tem outra taxa. Qual

é? Analfabetismo funcional. Várias pessoas já ouviram falar isso. O Brasil tem tantos por cento

de analfabetos, ou seja, 21,7% da população brasileira estão nessa situação. Simplesmente são

pessoas que enfrentam uma terrível dificuldade para redigir um bilhete simples. Para fazer as

quatro operações fundamentais. Aí não importa se ele está na escola. Até então nós estamos

falando de quê? De uma dimensão de indicadores. Não importa se está na escola, se não está,

é da população como um todo. Até aí nós estamos conversando sobre isso. E quantos por

cento no Rio de Janeiro? 14,4%. Então a relação do Brasil com o Rio de Janeiro, até então, a

gente viu que é uma situação que está melhor que a do Brasil como um todo. Agora depois do

final a gente vai questionar se essa é a melhor? O que é que é isso, o que significa isso?

Eu falei como é um todo, agora quero começar a entrar na população estudantil. E aí eu parei

para pensar um pouco o seguinte: tem uma população que está fora da escola, mas os dados

estão mostrando que 9,4%, 9,8%, acho que no Rio de Janeiro, os alunos estão na escola no

Ensino Fundamental. Em torno de 60% no Ensino Médio, não é isso? Mas e quem não está? E

quem entra e que sai? A questão do abandono é uma questão muito séria. Dá para analisar

aquele quadro ali? Vocês conseguem perceber? Que relação vocês tirariam daquele quadro ali

para mim? O abandono é maior e muito mais significativo nas últimas séries. A questão do

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Ensino Médio é uma questão que preocupa todos os educadores do país. Não é isso? Olha

bem, nas séries iniciais, 3% acontece, mas, se você pensar em 15%. Se você pensar em um

contingente de alunos, na faixa de 200 mil alunos das séries iniciais, 3% é um número

significativo. Você não está falando 3% em 50, você está falando 3% em um universo muito

grande, não é? E quando chega às últimas séries? Eu estou mostrando do Rio de Janeiro.

Quando chega nas últimas séries do Ensino Fundamental, o que é que acontece com o

abandono? Dobra. Eu tenho de 3%, nas últimas séries eu passei para quanto? 6%. E lá no

Ensino Médio, o que é que acontece. No primeiro ano, 17%, no segundo 13%, e no terceiro

9%. O índice é muito alto de abandono no Ensino Médio. Então por que é que eu disse isso

para vocês? A minha ideia foi a seguinte: eu tenho um diagnóstico da população com um todo,

eu tenho um diagnóstico da população, a que eu vou entrar agora, na população estudantil.

Que a gente vai entrar no desempenho escolar. E o que é que eu tenho ali antes de pensar

isso? Uma séria situação. Qual é o papel da educação escolar hoje? Por que é que essa criança

e esse adolescente, ou um adulto, entra na escola e sai da escola, o que é que essa escola está

fazendo? Eu sei de todas as dificuldades. Quando eu disse para vocês que trabalhei muitos

anos, eu fui do Ensino Fundamental e do Ensino Superior, eu sei de todas as dificuldades. Eu

sei até das dificuldades que é uma pessoa ter que dar 52 aulas por semana. Por semana, ou

seja, trabalhei de manhã, de tarde e de noite. Mas eu sei também do compromisso que você

tem. Se você está nessa, você tem que cumprir com a responsabilidade do seu compromisso.

Você tem que fazer com que seja útil o que você faz, não é isso? Então, olha bem, essa taxa de

abandono, ela é muito significativa. E agora a gente vai entrar no desempenho da rede e,

pensando que eu estou falando de uma população que ficou na escola, falando de uma

situação que retrata um abandono em um percentual muito significativo no Ensino Médio e, se

você pensar bem, no Ensino Fundamental também. Por quê? Eu estou falando em abandono,

mais os que estão fora, não é? A gente tem que refletir sobre a nossa realidade. Olha, esse

quadrinho ali, talvez não vá fazer muito sentido para vocês olharem assim, mas eu vou

explicar. A última avaliação que o CAED fez no que agora é o SAERJ, Sistema de Avaliação do

Estado do Rio de Janeiro, ali está o retrato da distribuição de percentual de alunos por faixa de

proficiência da rede estadual. Então é um indicador, um indicador de desempenho. Eu vou

colocar a média para vocês da Prova Brasil. Até 125, 125 a 150, de 150 a 175, de 175 a 200. O

que é que significam esses números? Significam a média de proficiência. A média de

proficiência em uma escala do sistema nacional de avaliação. Se você tem 125, 125 - 150, 150 -

175, isso reflete um conjunto de habilidades que um aluno é capaz de desenvolver. Todo

mundo pode entrar no site da Prova Brasil, no site do INEP, www.inep.gov.br, e vocês vão

verificar a média da escola. Isso aqui é do estado na Prova Brasil para vocês entenderem

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melhor ali. Eu estou falando que são médias comparadas na quarta série em Matemática. Eu já

vou dizendo, na Prova Brasil, esse é o resultado do que é que tem ali? Olha, naquela primeira

tarja amarela, o que é que está escrito? Na segunda amarela? Seu estado é o Rio de Janeiro, eu

tirei os resultados do Rio de Janeiro. E o outro? Município. Eu tirei o município do Rio de

Janeiro como exemplo. E o outro? Sua escola. Então o que é que eu tenho aí em relação?

Chamam médias comparadas. Eu tenho uma média que vai retratar o quê? O desempenho em

uma avaliação feita na Prova Brasil. Que habilidades foram avaliadas? O que nós acabamos de

falar no início. São justamente as habilidades que nós denotamos direitinho aqui na

Matemática. Essas habilidades. Então eu tenho uma média. Qual foi a média total do Brasil?

Cento e oitenta e nove. E acima está dividido por quê? Por rede estadual, municipal, não é

isso? Do seu estado, qual que é a média? Cento e noventa e dois. Do município do Rio de

Janeiro? Duzentos e dois. E dessa escola que eu não vou dizer o nome quanto é? Cento e

oitenta e sete. O que é que eu estou dizendo com isso? Eu estou situando. É um indicador de

quê? De desempenho escolar. Que está avaliando algo mais complexo, ele está avaliando o

que a gente disse em Matemática e o que a gente falou no início da conversa em Língua

Portuguesa. Esse é o meu desempenho. De cara você vai situar. Vai falar assim: “Ah, não, Kátia,

o Rio de Janeiro está melhor do que o Brasil”, não é isso? O município do Rio está melhor que

o estado e essa escola, que análise que você faria? Essa escola está o quê? Com o desempenho

menor que o do Brasil, menor do que o seu estado e menor do que o seu município. Eu

comparo essas medidas. Mas muito mais do que saber a média, é o que é que essa média

significa. Que média essa escola que está com 187 pontos, que habilidades os meninos são

capazes de desenvolver? O que ele é capaz de fazer? Você vai à escala de proficiência, que tem

no site, e lá vai estar escrito: de 125 a 150, o que ele é capaz de fazer, de 150 a 175, o que ele é

capaz de fazer, de 175 a 200, o que ele é capaz de fazer. Então eu tenho um quadro de médias

comparadas e também, em cada nível de proficiência, a gente chama isso nível, o que é capaz

de fazer. Abaixo de 175 pontos é uma situação crítica, é uma situação que depende de uma

intervenção muito imediata. Abaixo de 175 pontos, um menino só sabe adicionar com apoio

gráfico, aquela coisa de contagem que tem um apoio gráfico, ele sabe identificar a hora no

relógio, ele sabe localizar um gráfico de coluna maior ou menor e ele identifica números. O

processo de avaliação externa passa, como qualquer processo de avaliação, por 3 etapas. O

que é avaliado, como é avaliado e o que os resultados são alcançados. O que é avaliado em um

processo em larga escala, a gente encontra na matriz de referência para avaliação. Essa matriz,

ela é composta por um conjunto de descritores que recebem essa codificação: D1... Por

exemplo, D1 de quarta série, é localizar objetos e pessoas no espaço, o D2 é identificar formas

e figuras geométricas. Qual que é o indicador de desempenho? Está relacionado com o que foi

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avaliado e o que foi avaliado está na matriz de referência. Então, olha bem, na página 43, o

que é que está escrito? Escala de proficiência em Matemática. Vamos pegar o exemplo

daquela escola? Qual é a média dela? 187, ela está em que intervalo? Aqui, está vendo 125?

Significa que é de 125 a 150. Quando está escrito 150 é o início. Então o início é quanto? 150 a

175. Não está 175 no meio? Que intervalo é esse? 175 a 200. São de 25 em 25 pontos. Então

187 está onde? Muito bem, está de 175 a 200. Então a média desses alunos está nesse nível

aqui. Os alunos sabem nessa escola, em média, o que está nesse quadro branco e o que está

no quadro cinza superior. É isso que eles sabem fazer. As habilidades dali para baixo ainda não

foram desenvolvidas em média, está bom? Deu para entender? Eu tenho um dado - média

comparada, essa média comparada é da Prova Brasil. Ela compara o estado, o Brasil, o

município e a escola. Ela tem uma interpretação qualitativa para eu produzir um diagnóstico

da escola. Se eu quiser chegar na minha escola, acessar o site que eu dei para vocês, eu vou ter

um quadrinho com a média da minha escola. E eu vou saber situar a média da minha escola. E

muito mais! Quais as habilidades em média que meus alunos sabem. Eu vou lá nessa escala de

proficiência, que tem uma escala para Língua Portuguesa e outra para Matemática, como tem

uma tabelinha. Vamos fazer um exerciciozinho de Língua Portuguesa com o material? Qual que

é a média do Brasil? 170. Qual que é a média do seu estado total? E da rede estadual? 172. E

da rede municipal? 177. No Rio de Janeiro, a média da rede municipal das séries iniciais é

melhor que a do estado. Quando chega na oitava, nas séries finais, e no Ensino Médio, Reverte

isso: a média do estado é melhor que a do município. O que você atribui com o processo, de

repente, de municipalização, o Claudio pode explicar isso melhor. E, de repente, as escolas

com menor desempenho podem estar situadas na rede. Então, olhem bem, os indicadores

apontam. E qualitativamente podem ser interpretados, está certo? Vamos tomar como

referência essa escola? Se a gente trabalhasse nessa escola. Qual que é a média dela? 1,77. Ela

está em que intervalo? 175 e 200. Onde é que eu vou saber que habilidades elas

desenvolveram? Onde? Na escala de proficiência que está aí. Na página anterior, de Língua

Portuguesa está na página 40, está certo? Eu vou verificar nesse nível, os alunos em média

desenvolveram essas habilidades e aqui estão anterior, que é cumulativa, e dali para baixo é o

que precisa ser trabalhado. Agora, para mim, mais importante que a média, é distribuição

dessa média. Está vendo essa escadinha? Vamos ver o desempenho dessa escola. Olhem bem!

Língua Portuguesa, qual foi a média mesmo que a gente viu lá atrás? 177, está onde? Entre

175 e 200. Viu a escadinha que a menina está? Média 177. Agora, olha bem, na oitava série,

qual foi a média dessa escola? Está lá o menino indicando, olhem, média na oitava série, o que

é que está escrito lá em cima? O 232 está em que intervalo? 225 -250. Eu vou verificar onde

está a interpretação qualitativa desse desempenho? Na escala de proficiência aí. Eu vou

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verificar na escala de proficiência, o que é capaz de fazer. Nesse nível e outro. Agora, para mim

mais importante do que essa média é a distribuição do percentual de alunos em cada nível.

Olha outra interpretação que a gente faz. Está vendo o verdinho? O verdinho é quarta série, eu

vou pegar a quarta como referência. Língua Portuguesa: verdinho, quarta série. O primeiro ali

tem quantos por cento? Olha lá, 8%. Depois? 12%. Depois? 20%. Vamos somar? Vinte mais

doze, 32. Com 8? Quarenta. O que é que essa escola tem? A média dela é 77, mas ela tem 40%

dos alunos abaixo da média. Ela tem 8% dos alunos que terminam a quarta série sem saber ler

palavra. Porque menos de 125, ele não lê palavra. Ele está com 8%, com 12% até 150, 12%,

que só codifica frases. Então, gente, deu para perceber a importância desse indicador? Eu

tenho indicador em nível macro, do analfabetismo no Brasil, das pessoas que estão na escola e

fora da escola. Eu tenho o indicador do analfabetismo funcional, ou seja, eu não consigo,

tenho dificuldade em redigir um bilhete, fazer as operações básicas. E eu tenho um indicador

que vai desde o país até a escola. Quando fui secretária, não usei isso porque não havia. Não

tinha essa ferramenta para a escola utilizar. Então eu estou conseguindo e essa evolução

requer da gente uma formação contínua, não é? Como estudar essa tabela, como ler, como

utilizar e eu acho que é esse momento que está sendo proporcionado aqui. Então, esse

desempenho do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, chega também às redes.

Olhem o que é que eu mostrei para vocês lá na avaliação do SAERJ. Olha aí, percentual de

proficiência dos alunos, quinto ano, esse de Matemática. É o primeiro? O primeiro foi de

Matemática. O outro é de Língua Portuguesa. Eu estou mostrando da rede estadual, da

avaliação feita na rede estadual. Eu cheguei com vocês ali no plano da escola, Aquela

distribuição era da escola. Essa distribuição é da rede estadual do Rio. Olha bem, quantos por

cento eu tenho abaixo de 150? 19% mais 4% dá 23%. 23% estão terminando a quarta série

nessa condição, de não codificar frases. Quando eu acrescento os 25%, eu vou ter 23% mais

25%, em torno de 48% que não localiza uma formação explícita no texto. Que tipo de

intervenção a gente pode fazer, que tipo de intervenção a escola pode dar, que tipo de

intervenção as políticas públicas do estado e do município podem fazer? É um esforço. Eu

tenho que unir esforços. A responsabilidade é conjunta. Já está aí todo o movimento do Brasil,

o compromisso de todos pela educação, não está excluindo ninguém, não é? Então que

movimento é esse que a gente pode fazer em face desse diagnóstico? Deu para perceber os

indicadores em nível macro até chegar à escola?

Então se eu perguntasse a vocês para que servem esses indicadores educacionais, vocês

conseguiram perceber isso? Dimensionar a nossa realidade educacional. Com a minha fala

vocês conseguiram perceber isso? Segundo, qual que é outro? Monitorar a evolução ou

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involução de um fenômeno. Vocês conseguiram ver isso? Vocês observaram de 2005, 2006 e

2007 a involução que teve em termos do analfabetismo. Qual o outro? Comparar diferenças.

Onde é que vocês observaram essa comparação das diferenças? No estado, município, Brasil, o

próprio quadro fala. Quadro das médias comparadas, ou seja, indicadores de desempenho

para vocês estabelecerem a comparação. E o outro? Subsidiar tomadas de decisão. Eu disse

para vocês naquela escola que a média era 177 e 44% dos alunos não sabem ler e vou ter que

tomar uma decisão na minha escola. Eu não posso deixar esse quadro. Eu como diretora de

uma escola, como professora de uma escola, eu vou tomar uma decisão, Eu, como gestora

municipal, tenho que tomar outra decisão em outro nível. E como gestora da rede pública

estadual, em outro nível, não é? Políticas públicas educacionais em nível estadual, municipal,

em nível do Brasil. O livro didático foi uma política pública implementada em função dos

desempenhos. Observou-se o quê? Que as escolas que adotavam o livro didático tinham um

melhor desempenho em relação as que não adotavam. O que é que estava em jogo quando

era livro didático? E o que é que se está propondo hoje? Eu acho que a Ana vai falar isso muito

bem. Quando começou a ter o livro didático, o livro didático estava dizendo pelo menos o

foco: “Olha, pelo menos precisa ensinar isso, tem um caminho a ser trilhado. Não sai dando

tiro para todo lado porque não vai dar certo”. Hoje qual que é o movimento? Precisamos ter

uma proposta curricular adequada. Para ficar com clareza o que o professor precisa ensinar

em cada etapa de escolaridade.

Bom, quando eu junto em um liquidificador muitos indicadores, começa a ser criado o quê?

Os índices educacionais. Até então nós falamos de um único indicador, que era o

analfabetismo, que era o desempenho. Mas eu posso falar da distorção idade em série, que

era o abandono. Então eu tinha simplesmente o quê? Um indicador. Agora eu vou entrar em

uma esfera mais complexa. Eu tenho também o quê? Os índices educacionais. Olha bem, a

associação de vários indicadores, eu tenho uma metodologia específica, eu tenho vários

aspectos ou dimensões do desenvolvimento educacional em um único número e conjugo as

dimensões da realidade com a causa, não é? Olha, vamos fazer o seguinte: a gente leu isso

aqui, eu vou explicar dois índices que eu acho importante Qual que é esse índice? O que vocês

entendem por isso? Distorção idade-série. Eu acho que esse índice é um índice muito

importante para a gente na gestão escolar, na gestão da educação pública. Levando em conta

crianças e adolescentes com idade superior em até 2 anos para a série adequada. Então até

dois anos significa que houve o quê? Dois anos de repetência ou que abandonou e depois

voltou. E tem mais gente, quanto maior o índice distorção idade-série, menor o desempenho,

entendeu? Porque se você dissesse assim: "Não, está repetindo porque está tendo

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investimento. O menino está recuperando, ele está evoluindo. Ele não passou porque ele vai

aprender mais na escola. Ele precisa estar no estado de latência. A gente precisa de uma

atenção especial para ele prosseguir com sucesso às séries finais do Ensino Fundamental”,

você diria: “Puxa vida, tem uma distorção, mas tem uma causa justa”. O problema é que

acontece a distorção e a causa não é justa. Quanto maior o índice de distorção idade-série,

menor é o desempenho. Quando você tem um índice alto, um número alto, um percentual

alto, o desempenho cai. Então, olha bem, no Brasil, quantos por cento? Olha, que análise que

você faz disso? Olha para você ver como é que vai dando nó na cabeça da gente, não é? Você

tem o Rio em uma posição ”privilegiada” em relação ao Brasil. Na taxa de analfabetismo, na

taxa de desempenho. Olha a distorção idade-série o que é que acontece? 28% dos alunos

concluem em uma faixa, sem estar no período regular, normal de escolaridade. A gente tem

25% no Brasil, na região, 16%. Eu coloquei São Paulo, 10%, que é o menor. E coloquei o Rio,

28.8% que é o maior. Então é essa a distorção idade-série. É uma questão que precisa de uma

política de investimento, não é isso? Tanto em nível da escola quanto em nível de uma gestão

educacional.

Bom, e esse índice? Que está todo mundo comentando aí, os meios de comunicação, as

pessoas já dizem que existe. O IDEB. Que diagnóstico que você diria? Teve dois pontos que eu

toquei na minha fala até então. Qual que é ele? Forte, qual foi? O desempenho escolar, não

foi? O centro, se eu parasse agora, vocês iam dizer o quê? O que é que ela falou mais? Sobre o

quê? O desempenho escolar, não foi isso? Esse é um indicador importante, o desempenho

escolar. Depois eu disse da importância da distorção idade-série e falei do abandono. Foram

esses 3. Então distorção em série está em jogo o quê? A repetência e o abandono escolar, não

é isso? E falei que o mais importante é que toda criança e jovem esteja na escola, mas que

toda criança aprenda. Foi essa a minha fala central, concordam comigo? Quando juntamos isso

tudo, criou-se o IDEB. Esse diagnóstico do desempenho escolar conjugado com o fluxo escolar

foi que deu origem ao IDEB, Índice de Desenvolvimento da Educação Básica. Ele é um

indicador de qualidade que permite uma informação por escola, por município e por estado,

combina resultados. De quê? Proficiência média dos alunos em Língua Portuguesa e

Matemática. Onde é que vocês viram isso na minha fala? Proficiência média dos alunos em

Língua Portuguesa e Matemática. Em que quadro? Na escalinha, no degrau a gente viu, mas

onde é que estava isso? Nas médias comparadas, não é isso? Lembra aquele quadro para o

Brasil, por estado, por município, por escola? Olha bem o que é que eu falei, o indicador de

educação básica tem como referência o quê? A escola, o município e o estado, concordam

comigo? Lembra da média comparada? Que tem lá o Brasil, o seu estado, o município, a

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escola. É daquela média, que tem uma interpretação qualitativa na escala que vocês viram,

interpretação pedagógica na escala, e que também diz respeito a uma distribuição na

escadinha que ela disse. É daqueles resultados que eu tenho que interpretar para entender o

IDEB. E qual é o outro? Resultado do fluxo escolar, da taxa aprovação, reprovação, repetência,

abandono, está tudo misturado. Que recado que o IDEB está dando? A gente pode até ter uma

discussão sobre a medida do IDEB. É uma outra questão, ele privilegia a média, não privilegia a

distribuição. Mas que recado esse índice está dando? Toda criança e adolescente tem que

estar na escola porque o IDEB é do Ensino Fundamental. Toda criança e adolescente tem que

estar na escola, não é isso? E o outro? Tem que o quê? Aprender. Não adianta eu expulsar os

piores e ter uma média proficiência que o IDEB vai ser baixo, está certo? Se eu tenho um alto

índice de abandono, um alto índice de repetência vai interferir no IDEB, eu posso ter com isso

um índice de proficiência. Índice de proficiência e desempenho escolar é a mesma coisa. É

aquela media que eu falei com vocês. Eu posso ter aquele desempenho alto. Eu posso ter o

desempenho alto jogando os alunos que não sabem para fora da escola. Aí o que é que

acontece com o IDEB? Fica baixo. Como eu posso ficar todo mundo na minha escola e o índice

de desempenho, a média de desempenho baixo. O que é que acontece com o IDEB? Baixa.

Então o IDEB está dizendo. Eu acho que o recado forte do IDEB é esse. Toda criança tem que

estar na escola e temos que assegurar o direito da criança a aprender. É isso que nós temos

que fazer, é isso que esse indicador vem dizer. Você pode melhorar o índice da escola muito

boa, melhorando os melhores. É a crítica que eu faço ao IDEB. Ele privilegia simplesmente a

média, ele não privilegiou como o Programa Nova Escola, que privilegiava o desempenho dos

alunos como um todo e o progresso da escola com ela mesma, ou seja, a quantidade, o nível, a

quantidade de alunos que sai do nível baixo, não é? Lembra aquela distribuição, 40%? Eu acho

que o importante era ter um índice de desenvolvimento da educação básica que privilegiasse

esse desafio. Quantos por cento nós temos que tirar dos alunos do baixo, não é? Qual é o

percentual de alunos que tem que avançar? Esse é que eu acho que é o desfio, o verdadeiro

índice da educação básica, entendeu? E por quê? Essa questão da média, eu não sei se estou

dizendo uma complexidade para vocês, mas eu posso melhorar uma média de desempenho da

escola melhorando os melhores alunos, não posso? Eu posso pegar os dez melhores e vamos

melhorar a média de desempenho e deixo todo mundo lá. Quando eu faço isso, eu promovo a

desigualdade na escola maior e isso é um fator muito negativo. O que é que eu acho

interessante em termos de índice de educação básica no Brasil? Era um movimento de tirar os

alunos do crítico, um desempenho crítico que eu estou dizendo, aqueles 40% que eu disse

para vocês. Tirar esses alunos do crítico e colocar em uma situação de um leitor, de um aluno

que tenha condição de prosseguir os estudos, está bom? Mas eu vou mostrar para vocês de

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forma geral o que é que o IDEB, como ele é calculado.

Então, isso é a título de conhecimento. Eu acho que recadinho legal do IDEB é esse. Precisa a

criança estar na escola, do adolescente, toda criança aprender. Eu vou usar esse indicador

como isso, tá? Mas eu trouxe a medida, até mesmo para conhecimento de vocês. O que é que

acontece? O M é a média de proficiência dos estudantes em Língua Portuguesa e Matemática

que vocês viram lá, só que ela é padronizada de 0 a 10 pontos. E também a gente tem a taxa

de aprovação média dos alunos de 0 a 1. Eu tenho do lado direito os resultados do Rio de

Janeiro, rede estadual, na Prova Brasil 2007, de Língua Portuguesa. E do outro lado Língua

Portuguesa e Matemática, quarta e oitava. E do outro lado Língua Portuguesa e Matemática da

oitava série. Olha bem, resultados da Prova Brasil em 2007, Língua Portuguesa e Matemática,

quarta série, qual que foi? 172. Lembra o geral que a gente viu? E 188. Do lado de cá, o que é

que eu tenho? Do SAEBE, 97. Língua Portuguesa e Matemática. O que é que eu quero dizer

para vocês? Está vendo aquela fórmula ali? Eles padronizaram a média, fizeram o cálculo

levando em consideração o desvio padrão e chegaram a uma média de 0 a 10 pontos. A

fórmula padrão para todo mundo. 172 pontos não foi a média de Língua Portuguesa dele? Está

vendo ali 49? Eles pegaram a média do SAEBE em 2007, a média do SAEBE em 97, que foi a

primeira avaliação que eles tiveram como referência, e verificaram três desvios padrão

menores. Chegaram no 49. Depois pegaram três desvios padrão maiores e chegaram em 324.

Então foi essa medida, eles tiveram como referência a média da Prova Brasil desse ano,

tiveram como referência o SAEBE 1997, a sua média, mas em relação ao desvio padrão 3

inferior e 3 superior, e achou aquele número ali: 4,49. Ele multiplicou para ter em uma escala

de 0 a 10. Então a mesma coisa foi feita para Matemática, depois somou os dois e dividiu por

dois. Qual é que é o IDEB em relação... Qual que é o índice 4.7? Foi esse o índice que conseguiu

em uma escala de 0 a 10, ele conseguiu no índice de desempenho, 4.7. Mas eu não falei com

vocês que o IDEB conjuga o desempenho com o fluxo? Vamos ver o que é que aconteceu com

esse 4,7? Olha bem ali o que é que aconteceu. P é a taxa de aprovação média da fase avaliada,

então nós não estávamos como referência a quarta série? Então olha bem, 86%, 87%, 67%,

90% e 76%. Que porcentual é aquele? Porcentual de quê? Aprovação média. Então eu tenho

nas séries iniciais, quando conta o Ensino Fundamental de 9 anos, eu tenho a parte de

aprovação de 86. Na primeira série é o quê? Por que é que vocês acham que na segunda série

cai tanto? 67 por quê? O processo de alfabetização. E espera-se que está construído, não está,

há um processo de retenção. Depois 90, depois 76. Tirou a média disso, quanto que achou?

81% que deu 0,81. Multiplicou com aquele 4,7, foi onde que saiu o IDEB do Rio de Janeiro: 3,8.

Olha, gente, eu deixei os cálculos para vocês terem uma noção, mas o que é importante

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entender do IDEB ao meu ver? Que o IDEB é o índice de desenvolvimento da educação básica.

Na minha opinião, tem suas limitações quanto às medidas. Nós trabalhamos o tempo todo

com a média. Eu acho que o esforço da educação brasileira deve ser em direção a tirar o

percentual dos alunos para baixo e melhorar a média. É lógico que quando eu faço isso a

média melhora, claro, e melhora muito e pode melhorar. Só que eu acho que tinha que ter um

monitoramento de controle ali. Eu tenho que melhorar a média. Mas eu tenho que melhorar a

média tirando os piores da condição de insuficiência. Eu acho que tinha que ter um registro,

em minha opinião, um registro de controle disso. E ele conjuga taxa de aprovação, criou-se um

índice em uma escala de 0 a 10 pontos. Hoje, então, quando falar do IDEB, vocês já vão ter

uma noção do que é o IDEB? Já sabem que desempenho ele está se referindo? Nesse material

que vocês estão recebendo, tem um capítulo dedicado a ele com algumas situações e estudos

de caso.

Bom, antes de terminar, acho que ficaria muito difícil para mim falar dos indicadores

educacionais sem pensar nos indicadores sociais, sem a gente pensar na nossa sociedade

como um todo, então escolhi para trazer para vocês o IDH, o índice de desenvolvimento

humano, para dizer o que significa esse índice e qual é a relação desse índice com os índices

educacionais. O que é que conjuga o IDH? E a gente já falou que índice conjuga o quê? Vários

indicadores. Então na cabeça de vocês, vocês sabem que tem outros indicadores. O IDH

conjuga quais índices? Pelo menos a área. Qualidade de vida, não é? Perspectiva de vida,

então a gente tem um indicador na área da saúde. Longevidade. É esse. O outro? Moradia está

em que? Lazer, moradia está em quê? Na renda per capita. Essa condição econômica e social

está na renda per capita. Então a gente já viu dois indicadores. E o nosso, gente? Onde é que

está no IDH? Nossos, os educacionais. Temos os índices educacionais. Quais são eles? Taxa de

analfabetismos a partir dos 15 anos de idade, número de pessoas matriculadas em todos os

graus de ensino, então o IDH está conjugando aqueles dois indicadores ali na área educacional.

O outro, expectativa de vida, que reúne vários outros, como mortalidade, salubridade. E o

outro, indicador da renda per capita do país. A gente está falando de desempenho de escola

em período de escolaridade em que o menino tem que vencer as principais habilidades e

competências o quê? Na idade certa. Nós conversamos sobre a distorção. Temos que ter muito

cuidado em analisar os indicadores. Quando estamos dizendo de uma taxa de analfabetismo

em torno de quê? 15 anos de idade. Quinze anos de idade, ele deve estar terminando o quê?

O Ensino Fundamental, não é isso? Esse é o patamar em uma dimensão, não é?

Multidimensional onde fizeram esse corte para comparar o quê? Países, não é? Os estados,

entre os estados. E a gente vai ver agora a situação do Rio. O que é que vocês acham do IDH do

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Rio? Primeiro vou dizer, não é? Ele valia de 0 a 1e a gente tem aquela codificação ali, não é

isso? De 0 a 5, país com baixa qualidade, de 5 a 8 com média e acima de 8, com alta qualidade.

O que é que vocês acham. Onde é que o Rio está encaixado aí? Ninguém sabe o IDH do estado

do Rio de Janeiro é Zero vírgula... em 2000. E 2005 que foi o último? 0,83. O que é que

aconteceu com o IDH do Rio? Aumentou. Em relação ao Brasil ele está situado em que lugar?

Quarto lugar. Eu fiz a classificação. Quem tem o IDH maior que o Rio? Distrito Federal, Santa

Catarina e São Paulo. Eu falei de 3 indicadores que calculam o IDH. Olhem bem os indicadores

naqueles 3 pontos que eu falei com vocês: o IDH da longevidade, o IDH da educação e o IDH da

renda, não é isso? O que é que vocês observam? Vamos olhar 2005 porque houve um

crescimento em todos eles, não é? Só a renda per capta que abaixou. A renda per capta

abaixou, o IDH da educação aumentou e da expectativa de vida também aumentou. O que é

que vocês observam ali? O índice da educação é que puxou o resultado do Rio para o IDH

melhor, mas há uma reflexão a fazer. Leva-se em consideração analfabetismo com 15 anos. Eu

acho que o nosso compromisso com educação vai muito além disso. O nosso compromisso

com a educação vai o quê? Toda criança na escola, toda criança e jovem assegurado a eles o

direito a aprender. O direito a aprender, ou seja, aquele desempenho que a gente viu no

SAEBE de 177 e 182 deixa muito a desejar. O nosso compromisso é com a responsabilização de

todos, de gestores, professores, governantes públicos, pais, família, comunidade, para a

melhoria da qualidade da educação. Então quando a gente vê o IDH, a gente tem que fazer

uma reflexão dizendo “Olha, essa é uma medida de comparação”, a gente tem que ser crítico a

isso, não é verdade? Porque senão a gente começa a dizer “Não, mas o índice de IDH do Rio é

assim porque...”. Não é dessa forma. É dessa forma quando tem como comparabilidade esse

nível de patamar, mas esse patamar, eu tenho certeza que não é o que nós almejamos para

todo brasileiro e muito menos para as escolas do Rio de Janeiro, não é verdade? Então a taxa a

partir de 15 anos e o número de pessoas matriculadas em todos os graus de ensino, mas deixa

uma reflexão. Observa-se o abandono escolar, não é? A gente tem que observar ali porque eu

posso ter uma matrícula alta em um determinado momento e ter um alto índice de abandono

e vai refletir esse resultado. Bom, eu espero que os indicadores educacionais contribuam aí

com vocês.

Pediram para eu voltar ao quadro que eu prometi.

Observaram isso? Os índices. Qual que é o primeiro ali? Associação de vários indicadores.

Quais que são os indicadores que o IDEB associou? Desempenho escolar, taxa de aprovação,

não é isso? Que indicadores que estão em volta do IDEB? O aluno tem que estar na escola e

tem que aprender. É isso que está. E o IDH? Quais foram os índices, que indicadores foram

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associados? Longevidade e per capta. Vocês viram que tinham indicadores na área da saúde,

na área da educação, economia e social, econômica-social. Metodologias especiais. Eu mostrei

para vocês a metodologia do IDEB. Aquela fórmula que leva em consideração a Prova Brasil

2007, o SAEB 2007, o desvio padrão, colocou em uma métrica de 0 a 10 pontos, depois

multiplicou esse número do desempenho com o percentual de aprovação e aonde que saiu o

número do IDEB. Vários aspectos ou dimensão do desenvolvimento educacional em um único

número. No final eu disse assim: “Olha, o IDEB do Rio é 3,8. O IDH é 0,8, não é”? Conjuga as

dimensões da realidade com a causa. Olhem bem, eu tenho uma realidade da criança na

escola, eu tenho uma realidade da universalização do Ensino Fundamental, mas eu tenho uma

realidade muito cruel de dizer que esses meninos precisam aprender muito ainda.

Bom, eu acho que é isso e espero ter contribuído com alguma coisa Muito obrigada!

Ana Canen

PhD em Educação pela Universidade de Glasgow e mestre em Educação pela PUC-Rio;

Proposta Curricular

Bom dia a todos! Eu fico muito feliz de estar aqui na FESP, então, antes de iniciar queria falar

da enorme alegria de estar aqui com vocês dividindo essas reflexões sobre currículo que nós

vamos fazer agora. Quero agradecer à FESP, ao professor Carlos Guimarães, ao Doutor Claudio

Mendonça pelo gentil convite. Fiquei muito feliz de ver a palestra ontem do Doutor Claudio

Mendonça e hoje da professora Lina Kátia. E o que nós vamos conversar, de uma forma

bastante consistente eu diria, vai continuar onde ela parou um pouquinho e vai trazer alguns

dos aspectos que o Doutor Claudio colocou ontem quando ele comparou as escolas, quando

ele falou do currículo como garantindo a identidade de um povo, de um país, de uma nação,

então de certa forma, a nossa fala nesse momento vai um pouco desenvolver a partir de onde

a professora Lina Kátia parou. A proposta curricular para uma escola eficaz. Como ele falou, eu

sou Ana Canen, eu tirei o PhD em Educação na Universidade de Glasgow e, atualmente, sou da

UFRJ e pesquisadora do CNPq. E estamos aqui nesse importante seminário congregando

professores e gestores de vários municípios do Brasil, então nós temos aqui uma diversidade

cultural muito bem representada.

Bom, quais são os objetivos do que eu vou falar hoje? Primeiro objetivo, eu queria discutir a

importância do currículo e da avaliação. Discutir a importância do currículo e da avaliação na

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educação e na formação continuada de professores para uma escola eficaz. Foi uma

experiência muito importante que tivemos enquanto o Doutor Claudio era da Secretaria de

Educação e pensar no currículo eficaz. Acho que isso tem tudo a ver com o que a professora

Lina discutiu porque agora vamos entrar na intimidade da escola, na intimidade da formação

dos professores, da avaliação que se faz dentro da escola. Uma vez que a gente tem esses

grandes índices, o que fazer? O que é que um gestor pode fazer? Então é aqui que a gente vai

começar a discutir o currículo como âmago do que nós podemos fazer para melhorar esses

índices, então o primeiro objetivo é justamente discutir a importância do currículo e dessa

avaliação que nós fazemos em cada uma das nossas escolas. Essa avaliação institucional a

partir desses índices, como é que a gente agora procede avaliar, o que é que está funcionando,

o que é que não está funcionando dentro da escola, e que currículo nós poderíamos pensar,

que ações curriculares poderíamos pensar para melhorar cada vez mais os nossos índices. O

segundo objetivo é analisar o eixo multicultural e a avaliação multicultural como

estruturadores de uma proposta curricular de educação e de formação continuada

transformadora. Eu vou tentar explicar um pouco o que é essa coisa do multiculturalismo, o

que é que é a gente entender a diversidade da nossa rede. A diversidade de escolas, de alunos,

de professores, de localidades e como responder a essa diversidade de modo a contemplar

aqueles índices, melhorar aqueles índices que são de avaliações larga escalas homogêneas.

Não é impossível. O que eu vou defender aqui o tempo todo é que não é impossível nós

trabalharmos com a diversidade, com o currículo que em alguns momentos leva em conta essa

diversidade e, ao mesmo tempo, melhoramos os índices dessas escolas diversificadas em

avaliações larga escala homogêneas, não é? Que usam os mesmos instrumentos para todos.

Então eu vou tentar defender isso e mostrar como nós fizemos isso comparando, inclusive,

propostas curriculares mais recentes, tanto daqui da Secretaria de Educação em 2005, como

de São Paulo, e vendo como é que a gente poderia avançar para melhorar cada vez mais as

nossas escolas. E vou falar da formação de professores também como uma dessas ações.

Finalmente a gente vai debater ilustrações de uma proposta curricular para uma escola eficaz.

Porque na verdade a gente fez uma proposta cultural levando em conta essa diversidade

cultural e se teve uma avaliação muito positiva. Então basicamente a gente vai estruturar um

pouco a minha fala nesses três momentos.

Bem, por que é que o currículo, tanto na formação docente como na escola propriamente dita,

e eu vou começar falando da formação docente, da formação de gestores, por que é que ele é

central? O currículo, ele é uma seleção da cultura, ele não é toda a cultura, não é? Então ás

vezes você tem o currículo em um determinado estado, em um determinado país, que enfatiza

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certos aspectos que não são os mesmos de outro país. Então por que é que eu estou falando

isso? Se é uma seleção da cultura, ele pode ser ressignificado o tempo todo. A gente pode ter

as diretrizes mais gerais, mas dependendo dos alunos, das escolas, da linguagem que eles

utilizam, a gente tem que ter essa habilidade de ressignificar, de tentar falar a linguagem

daquela comunidade onde a escola está inserida para que nós possamos ser compreendidos.

Então se o currículo é uma seleção da cultura, ele não é a cultura como um todo, então vamos

tentar fazer dialogar esse currículo com as culturas dessas escolas, com a diversidade cultural.

E eu já vou falar de um exemplo já.

Como é que a gente está pensando o currículo, tanto da formação inicial, como continuada de

professores e gestores? Ora, nós temos esses índices, que são índices importantes que a

professora Lina Kátia falou. Nós temos os indicadores. Vamos agora olhar do ponto de vista de

uma Secretaria de Educação, do ponto de vista de gestores, que ações nós vamos tomar.

Então, primeira coisa, observar o currículo da escola e observar também ações de formação

continuada. Quando vocês estão aqui, colegas professores, colegas gestores, de certa forma

vocês estão em uma ação de formação continuada. Estão tentando se atualizar, tentando ver

como melhorar cada vez mais as escolas, então o currículo, ele faz parte das ações para

melhorar esses índices, mas esse currículo, eu estou defendendo aqui que ele tem que

articular não apenas os conteúdos, mas tem que articular conteúdos, habilidades,

competências e uma sensibilidade para diversidade cultural, para o contexto concreto das

nossas escolas. Depois eu vou ilustrar como é que nós pensamos isso em uma proposta

concreta. Não adianta a gente pensar “Bom, eu quero que meus alunos melhorem no

desempenho de Matemática, então vamos melhorar os conteúdos, então vamos formar, dar

cursos de formação em serviço para professores que enfatize a Matemática”. Não adianta

muito se nós não articularmos esse currículo de formação continuada com habilidades, com

competências. O que é que eu quero do meu aluno? Eu não quero só que ele decore o

conteúdo, eu quero que ele seja capaz, por exemplo, que ele tenha habilidade de aplicar esse

conteúdo em uma notícia de jornal, que ele seja capaz de analisar uma estatística que ele lê.

Isso nós já estamos no domínio das competências e das habilidades e é isso que está sendo

requisitado no mundo atual e também nessas avaliações de larga escala. Então se nós vemos

os índices, aquela escola que a Lina deu o exemplo, não está indo muito bem em Matemática,

então vamos ver o que nós dentro da avaliação dessa escola, como gestores, podemos fazer

para incrementar o currículo de modo que o currículo articule melhor os conteúdos e as

habilidades desses alunos. Para isso nós temos que trabalhar com os professores. O professor,

nós todos, as nossas expectativas, o que é que a gente espera do nosso aluno, não é? O

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Claudio deu o exemplo, se a gente tem o clima institucional na nossa escola e que a gente

acredita que sim, que aqueles alunos podem crescer, que eles podem aprender, a gente vai

adaptar a diversidade cultural, a diversidade linguística, o nosso currículo, já que ele é uma

seleção da cultura. Então, para isso, a gente acredita que a formação, o currículo de formação

de professores, ele tem que levar em conta o contexto cultural da diversidade das nossas

escolas e articular sempre competências, habilidades. Então, por exemplo, eu dou um trabalho

em grupo na minha sala. Eu estou no laboratório, eu estou com computadores, estou

querendo que os meninos trabalhem. O que é que eu quero? Eu quero que um menino

daquele grupo faça o trabalho todo e aí eu vou dar a nota do grupo pelo produto ou eu vou

circular pela sala e vou ver se aquele menino que sabe mais, se ele tem habilidade, a

competência de dividir o conhecimento, se os outros desenvolvem habilidade de cooperação,

de cidadania. E eu tenho que avaliar isso, é isso que a gente vai defender. A avaliação na sala

de aula tem que dar pontos, tem que premiar isso também. Então o conteúdo lá é o que

menos importa. O produto final do trabalho daquele grupo é o que menos importa porque eu

vou articular a nota daquele conteúdo também vendo as habilidades que aquele grupo está

desenvolvendo, o crescimento desses alunos. Então o currículo, ele inclui tudo isso, não é? A

gente tem que trabalhar com esse contexto concreto e, para isso, é preciso uma sensibilidade

grande de todos nós, professores e gestores. Inclusive na avaliação, por isso que eu disse que

em um dos meus objetivos a gente vai discutir também a avaliação. O que é que a gente quer?

A gente não quer dar cursos dentre as ações para melhorar esses índices, não é? Dentre essas

ações, as ações de formação continuada dos professores, dos gestores. A gente não quer

também, por exemplo, a universidade ou a secretaria de cima para baixo, conhecimentos

doados? Os professores, eles têm saberes. Todos nós construímos saberes nas nossas práticas,

vários autores, vários discutem isso. Então não podemos conceber uma ação para melhorar

aqueles índices, uma ação que melhore o currículo de formação em serviço, por exemplo, eu

dizer o que fazer, amanhã vem outro professor da universidade. Não é assim que funciona. A

gente tem que trabalhar com a questão do professor pesquisador. O professor, ele também é

um aluno naquele momento da formação continuada, então o currículo vai ter que trabalhar

com esse professor como professor pesquisador, fazendo a pesquisa ação, ou seja, ele vai para

a escola, ele traz os casos da escola, ele dialoga conosco e a gente constrói esse currrículo

juntos. É claro que tem alguns temas principais, importantes, projeto político pedagógico, eu já

vou falar já quando a gente ilustrar como a gente fez isso. Tem uns temas, a avaliação, o

currículo, o projeto político pedagógico, mas esses temas, embora eles possam trazer algumas

contribuições teóricas, eles têm que trabalhar no sentido de transformar todos os professores

e gestores em pesquisadores e problematizadores. Não pode ser uma coisa de cima para

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baixo. Então esse, no nosso entender, é um currículo eficaz para uma escola eficaz, um

currículo de formação continuada, de formação em serviço de professores. Um currículo que

trabalhe com os saberes desses professores no diálogo e que faça esses professores voltarem

para as suas escolas e pesquisarem e agirem. E eu já vou depois, como eu estou prometendo,

não é, dar o exemplo concreto. Por enquanto a gente está só nos princípios que balizam a

concepção de um currículo eficaz. Depois a gente vai ver como que esses princípios, nós

tentamos em algumas ações que foram bem sucedidas, transformar isso em ações realmente

na rede. Claro, por que qual é a meta de um currículo desse tipo da formação docente? É a

transformação da escola via a transformação das práticas curriculares dos professores e dos

gestores. A gente não pode transformar esses índices e fazer com que essas crianças tenham

um desempenho melhor se a gente não trabalha com quem está ensinando, com quem está

gerindo a escola. Todo mundo é responsável. Então a gente está pegando os índices e a

avaliação de larga escala e agora estamos entrando na intimidade da escola, do currículo, para

ver como é que a gente pode trabalhar.

O que é que quer dizer esse eixo multicultural no currículo? Tanto da escola como na formação

de professores e de gestores. O que é que eu estou pensando nas dimensões? Como

transformar esse currículo que articula competências, habilidades, conteúdos, que leva em

conta a diversidade cultural, como é que a gente pode transformar isso em algumas

dimensões? Bem, não é algo do outro mundo, não é a gente dizer “Agora eu vou falar sobre

diversidade cultural, agora eu vou falar sobre multiculturalismo”. Não se trata disso. Todos os

assuntos da escola são assuntos que têm a ver com a diversidade cultural. O gestor, ele é um

mediador. Ele está lá, o diretor da escola, o coordenador, o orientador pedagógico, o

supervisor, eles está em um fogo cruzado. Ele tem que mediar os saberes dele, os professores

que ele coordena, que tem seus saberes, que tem raça, etnia, cultura. Ele tem que mediar isso

com a comunidade onde a escola está inserida porque ele tem que também promover esse

diálogo com os responsáveis pelos alunos. Ele tem que entender quem são esse alunos, e

dialogar com as secretarias porque nós estamos aqui no momento falando de escola pública.

Então ele tem que levar em conta esses índices, as avaliações em larga escala, ao mesmo

tempo, ele tem que entender a especificidade dos alunos que ele tem, até onde ele pode ir,

quais as potencialidades, então a escola por si só é o que a gente chama de uma organização

multicultural querendo ou não. E o gestor, o professor, muito mais o gestor no caso, a

identidade dele é de um mediador cultural, então a gente investir nos gestores, em vocês, em

nós professores, é investir em uma escola eficaz. A gente tem que levantar as expectativas,

criar um clima positivo. Já houve pesquisas. Duas escolas com as mesmas dificuldades de

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infraestrutura, salários baixos e aquela jornada de trabalho, tudo igual. Os fatores

extraescolares. Uma consegue ter resultados muito bons no SAEBE, consegue alfabetizar seus

alunos e a outra não. Por quê? Porque nós temos ali, em uma escola, uma gestão que respeita

a diversidade de seus professores, que tem políticas de valorização, que tem um currículo

dinâmico, e a outra que vai levando, às vezes é uma gestão nem tanto democrática, então isso

faz a diferença. Então não é algo fora de série, quer dizer, se a gente articula disciplinas

convencionais, currículo é uma disciplina boa que a gente costuma trabalhar, tanto na

formação inicial de professores como de gestores, a gente articula isso, a diversidade cultural,

avaliação, PPP - projeto político pedagógico. Se a gente discute o tempo todo, por exemplo,

quais os dilemas entre o universal e o diverso. Em cada uma dessas áreas a gente está

levantando a sensibilidade de gestores, de professores, a gente está trabalhando para uma

escola eficaz. Vou dar um exemplo, na ação que nós fizemos de formação continuada de

gestores em 2005. Um dos temas era, por exemplo, projeto político pedagógico, então nós

atingimos 2.100 coordenadores pedagógicos e 76 turmas no Estado do Rio de Janeiro. Um dos

temas dessa formação continuada era o projeto político pedagógico. Como é que a gente

discutiu de forma multicultural isso? Primeiro nós vimos, o que é um projeto político

pedagógico? Será que ele está na gaveta? Será que é só para isso que serve um projeto político

pedagógico? Para ficar na gaveta por uma exigência burocrática? Levantamos essa discussão,

depois em conjunto chegamos à conclusão que não é o ideal. O ideal seria, em cada escola,

termos um projeto político pedagógico que refletisse a identidade daquela escola. O que é que

deveria ter esse projeto político pedagógico? Começamos a trabalhar com os gestores. Deveria

ter o principal. Deveria ter o currículo, a avaliação da aprendizagem e o que a gente espera

daquela escola, que aluno a gente quer formar. Simples. Então vamos pensar, como é que a

gente vai trabalhar então esse projeto para levar em conta a diversidade cultural? Vamos ver,

em que momentos a gente tem que pensar em algo mais universal? Competências, habilidades

que os nossos alunos têm que ter, que todos têm que ter. E em que momentos essas

competências e habilidades mais universais vão ter que dialogar com a especificidade daquela

escola? Então nós começamos a trabalhar com a questão do universalismo e da diversidade

em cada um desses assuntos. Por exemplo, quando a gente falava de avaliação, é outro

assunto que a gente discutia com professores e gestores nessa ação para melhorar os índices.

Avaliação da aprendizagem e avaliação da escola. Como é que a gente pode, um professor em

uma turma, ele em algum momento tem que usar um instrumento universal homogêneo, em

algum momento ele tem que usar uma prova igual para todos os alunos. Mas será que ele não

pode também mesclar o universal com o diversificado? Em alguns momentos valorizar, por

exemplo, alunos que têm a oralidade muito bem desenvolvida, mas que não escrevem tão

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bem? Por que nós não podemos fazer uma dramatização e pontuar isso? Quer dizer a gente

discute temas mais convencionais, mas que se submetem a essa questão. Momentos de

universalismos e momentos em que a gente pode sim valorizar aqueles alunos concretos.

Parece uma coisa pequena, mas faz toda diferença do mundo, não é? Eu vou dar um exemplo.

A Teresa Pena Firme é uma autora, que ela fala que tinha um aluno em uma escola da Rússia -

não sei se vocês já leram sobre isso -, que ele só pulava. Pulava o tempo todo, pulava, saltava,

e os professores escreveram “Esse aluno...”, um relatório muito duro, “...não vai dar em nada.

Esse aluno só pula, não faz nada...". Vocês sabem quem era esse aluno? Ainda bem que ele

não deixou a auto-estima baixar. Quem que vocês acham que era? Era o bailarino Nureyev.

História real. Quer dizer você vê um currículo e uma avaliação que não levou em conta os

talentos da diversidade cultural daquela escola, então, quer dizer, se houvesse um outro tipo

de avaliação ou de currículo em que alguns momentos, claro, a habilidade, competências

matemáticas, em língua, mas em outros momentos também valorizasse os saberes específicos

desses alunos, a gente teria uma escola que estaria trabalhando a favor das potencialidades

desses alunos. E aí até aquelas competências e habilidades mais universais ficam melhor

absorvidas porque você está trabalhando com a autoestima desses alunos. Então a gente

discutiu tudo isso dentro desse currículo de formação de professores. Então quando a gente

fala diversidade cultural, não é uma coisa acrescentada. Cada tema, ele pode ser trabalhado

dessa maneira.

Bom, trabalhamos também com a pesquisa ação. É o que eu estou dizendo, não adianta a

gente fazer uma formação continuada se a gente não diz no final “Agora vocês vão para a

escola...” e era isso o que a gente fazia no final: “Agora vocês vão para a escola. Vocês têm

duas semanas até o nosso próximo encontro. Nós discutimos a avaliação, discutimos alguns

autores, falamos de momentos mais homogêneos, momentos mais diversificados. Fizemos a

mesma coisa com a construção do projeto político pedagógico. Agora vocês têm duas

semanas, vocês vão voltar para a escola e vão tentar mobilizar alguma ação sobre esse

assunto. Pode ser qualquer coisa. Pode ser uma reunião com os professores, uma reunião com

os pais dos alunos, começar a fazer a parte do projeto político pedagógico referente à

avaliação nessa escola, como é que ela é feita, quais os critérios, qualquer coisa. Vão trazer

daqui a duas semanas essa ação e esta ação vai ser objeto de reflexão em conjunto”. Então

eram 11 módulos, eu já estou usando até o exemplo ao mesmo tempo, em que nós utilizamos

essa perspectiva de multiculturalismo, de respeitar a diversidade das escolas porque cada

gestor ia para a sua própria escola, e respeitando aquela identidade, ele iria aplicar esses

conhecimentos em diálogo com aquela realidade e trazer a sua reflexão. Isso é uma pesquisa

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ação. Nós também pedimos estudos de caso. Estamos falando em educação inclusiva, estamos

falando em currículo e avaliação? Traga-me um caso. Um caso na sala de aula em que o aluno

não se deu muito bem nas provas, não está indo muito bem. O que é que você faria a

respeito? Como é que você vai entender esse aluno? Então a gente pedia casos, quer dizer,

embora a gente tivesse uma estrutura teórica inicial sobre esses assuntos e trabalhássemos

nessa perspectiva universal e diversificado, nós pedíamos que isso fosse articulado com os

saberes que nós todos, vocês, os professores e gestores, produzem.

A gente também fazia uma avaliação. Como é que a gente concebe a avaliação para esse

currículo de uma escola eficaz? É uma articulação da avaliação da aprendizagem, da avaliação

institucional e da avaliação de sistemas. O que é que eu quero dizer com isso? Nós não

podemos trabalhar na escola, embora nós estejamos falando em valorizar a diversidade, nós

não podemos esquecer daqueles momentos mais universais também. Toda escola, ela tem a

obrigação de dar para a sociedade satisfação do que os alunos estão aprendendo lá. Isso é

uma obrigação nossa. Assim como as escolas em geral, elas têm uma obrigação de mostrar

para a secretaria o que está acontecendo, a secretaria para o MEC, o MEC para a sociedade

brasileira, comparar com relação ao contexto internacional como nós estamos, isso é uma

obrigação. Então por mais que nós falemos na diversidade, eu sou contra pensarmos em um

currículo para cada escola, um currículo de acordo com cada cultura. Eu trabalho muito com

essa categoria articulação. Momentos em que você vai articular uma avaliação em que você

respeita a oralidade do aluno, que você atribui pontos, que você não dá só provas escritas,

mas momentos também em que você tem que levar em conta como é que está com relação ao

seu município, com relação ao seu estado e aí que eu dou a continuação com o que a

professora Lina falou antes, não é? Então, a avaliação que o professor faz na sala de aula.

Porque muitos professores dizem assim “Ah, por que é que a gente tem que submeter a um

SAEBE, a uma Prova Brasil? É um absurdo, é uma avaliação homogênea”. Cá para nós, vamos

conversar! A gente também não faz isso na sala de aula? Qual é o professor que não dá uma

prova homogênea para todos os seus alunos em algum momento? Mas a gente tem muita

dificuldade de reconhecer isso, que nós também fazemos isso, costumamos criticar quando é

avaliação de sistema, mas a gente tem que entender que em algum momento, tanto em nível

de avaliação de aprendizagem, que é o que eu acho da avaliação que a gente faz na sala de

aula, como na avaliação institucional, que é a avaliação da nossa escola, esse mergulho que a

gente faz na nossa escola, como a avaliação dos sistemas, que são essas avaliações SAEBE, de

larga escala, em algum momento a gente tem que ter um índice comparativo. Depois a gente

tem que também ter, no meu entender, outros instrumentos que valorizem a autoestima

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daqueles alunos, a especificidade, mas isso tem que ser com aquela palavrinha mágica que eu

falei, uma articulação. Então eu acho que isso é que a gente tem que buscar para um currículo

eficaz. A gente tem que trabalhar áreas convencionais levando em conta essa questão do

universal e do diversificado, trabalhar com pesquisa ação e trabalhar com uma avaliação que

não perca de vista esses índices maiores, vá para escola ver o que é que está acontecendo

naquela escola e vá para sala de aula nesses três níveis fazendo isso. Alguns momentos de

instrumentos mais comparativos e outros momentos em que a gente entenda quem é esse

aluno, valorize o saber dele. Trabalhar sempre aquela dialética objetivismo/subjetivismo. Uma

avaliação que tem que ser objetiva, mas reconhecendo o subjetivo, nós mesmos, não é? Quais

são as nossas expectativas, isso é o nosso subjetivo. Será não está interferindo na nota que a

gente está dando? Qual é o subjetivo desses alunos? Será que não tem uma maneira de a

gente diversificar a avaliação que a gente faz em sala de aula? E a avaliação somática e

diagnóstica. Somática é aquela que a gente faz no final e a diagnóstica são vários instrumentos

que você vai utilizando no decorrer do ano para poder tentar captar o universo cultural desses

alunos. Parece que não, mas esse somatório de ações resultam em uma melhoria daqueles

índices porque você está trabalhando no dia a dia da escola, você está trabalhando com o

currículo em ação. O que é que é o currículo em ação? São os saberes que os professores

desenvolvem, que os gestores desenvolvem, o clima que se cria naquela escola. E agora eu vou

falar um pouquinho mais que a escola eficaz, ela é uma organização multicultural. O professor

e o gestor são mediadores de identidades culturais. Não nos iludamos, não existe neutralidade

nisso. A gente tem que ser diplomada nas nossas funções, a gente tem que criar um clima de

crescimento na escola senão a gente não melhora os índices. Não adianta você ter professores

competentes, que sabem muito bem aquela matéria se não existe esse clima dentro da escola

de tentar entender a diversidade dos alunos, de tentar trabalhar momentos mais uniformes,

momentos mais diversificados, não adianta que a escola não cresce, ela não melhora os seus

índices. Por que é que eu estou dizendo que a avaliação, ela é um instrumento para uma

escola eficaz? Não só a avaliação larga escala, mas a avaliação que a gente faz o tempo todo

dentro da sala de aula. Um pouco quando a gente vai dizer assim “Olha, como é que a gente

vai avaliar a escola”? O gestor resolve que está satisfeito com os índices, mas eles poderiam

melhorar. Vamos mergulhar dentro da escola. Uma justificativa, a primeira coisa é sensibilizar

a comunidade da escola para a necessidade daquela avaliação. Todo mundo tem que sentir

que a avaliação não é o inimigo. Ela é uma aliada. Quais são os princípios que vão reger a nossa

avaliação?”A gente quer avaliar para excluir professor, para excluir aluno ou a gente quer

avaliar para somar? Esses princípios têm que estar mais ou menos consensuados. Qual é

abrangência que eu acho que tem que ter uma avaliação da escola? Vamos dizer aquela escola

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X que a professora Lina botou. Está com o índice abaixo do município, escola tal. Vamos ver

que ela quer fazer uma avaliação para melhorar esses índices. No meu entender, os três

pontos principais que essa escola vai ter que ter e o gestor, como mediador cultural, pode

mobilizar isso na sua escola junto com os professores, é um esforço coletivo, é o currículo em

ação, a avaliação que os professores estão fazendo em sala de aula e a escola como

organização multicultural. Esses são os três aspectos mais importantes de um projeto político

pedagógico e mais importantes para melhorar o desempenho de uma escola. Como é que o

currículo está sendo colocado em ação? E eu vou dar um exemplo que perguntas nós podemos

fazer para ver se isso está acontecendo. Como é que a gente pode ver a avaliação que os

professores estão fazendo em sala de aula? Está tendo uma consistência ou professor é muito

leniente, outro é muito rígido, não tem paciência, gosta de reprovar. Tem que ter uma certa

consistência. O projeto político pedagógico bem feito, ele não precisa ser extenso, mas esse

aspecto poderia estar muito bem amarrado. O que é que a gente entende por avaliação. Será

que os professores têm uma perspectiva mais ou menos coerente entre si ou a gente tem

muita discrepância, não é? Então esses três aspectos, eu consideraria importantes e depois eu

vou falar um pouquinho. O que é que vai ser feito com os resultados? Não adianta a gente

chegar à conclusão que essa escola está falhando no currículo em ação, ela está deixando de

contemplar as crianças reais que vêm ou os professores estão com avaliações discrepantes, a

gente não está tendo uma unidade ou a escola não está sendo uma organização multicultural,

ela não está beneficiando igualmente todos que correm a ela. A gente chegou a essa

conclusão. O que é que vamos fazer? Tem que se pensar o que é que é que vai acontecer com

esses resultados. Isso também tem que ser um esforço coletivo da escola, não é? Para isso a

gente tem que ter questões avaliativas, o que é que a gente vai perguntar para essa escola, o

que é que a gente quer perguntar, quais são as questões que nós queremos responder, quais

os indicadores que vão mostrar para a gente onde essa escola está falhando, quer dizer, a

lógica é a mesma daquela avaliação larga escala, mas somos nós agora perfazendo aquela

avaliação no segundo nível, a avaliação institucional. Nessa avaliação institucional nós estamos

perguntando como a avaliação da aprendizagem na sala de aula está sendo feita, como o

currículo está sendo feito e se essa escola tem um clima que valoriza a diversidade de alunos

que a ela chegam. Se não está existindo bullying, não sei se vocês já ouviram falar. É um

assunto que eu tenho até pesquisado, é o oposto do multiculturalismo. São crianças

debochando porque uma veio do Nordeste ou porque acham que uma parece ser

homossexual ou é negra. Uma escola que tem esse clima, ela não consegue trabalhar com a

potencialidade dos alunos. Não pense que é só com crianças. A gente tem bullying também

dentro do corpo docente. Você entra em uma sala de professores e, em muitas escolas, não há

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o comportamento da escola como organização multicultural. Não há uma valorização da

diversidade dos professores. Você tem: “Lá vai ele falando de novo! Ih, é ela”! Nas reuniões.

Então a gente tem que estar muito consciente de que isso prejudica até o desempenho dos

professores, de nós todos. Então os gestores têm essa responsabilidade, de serem

protagonistas na avaliação se essa escola está sendo eficaz, então avaliar se a escola está

sendo eficaz, para mim, é avaliar o currículo, verificar como a avaliação da aprendizagem está

sendo feita na sala de aula, se valoriza ou não os alunos, e se o clima dessa escola é o clima de

uma organização multicultural. Então para isso a gente tem os indicadores. O que é que a

gente vai considerar como indicador? Como é que vai ser feito o registro? Os gestores podem

fazer comissões, professores, coordenadores, comissões internas na escola para tentar

viabilizar o registro desses dados. Porque é só assim que a gente consegue transformar a

escola, não é? A gente trabalhando dentro, de forma coletiva, e isso é uma coisa importante, o

clima de uma organização multicultural. Alguém me perguntou, a gente tem até um livrinho da

Ciência Moderna, não é sobre escola propriamente dita. Eu fiz com o meu marido que é de

Engenharia de Produção de Logística. Não é sobre escola propriamente dita, é sobre

organizações multiculturais. Quer dizer, a escola como organização multicultural, a empresa,

que tipo de workshops a gente pode fazer para desenvolver esse clima positivo. Não é uma

coisa que muita gente fale, mas é, na minha experiência, nas minhas leituras, o principal para a

gente ter professores engajados com expectativas positivas.

Bem, e, finalmente, avaliar essa avaliação que nós fizemos, não é? Ela cumpriu os objetivos?

Que obstáculos surgiram? Como superá-los? Porque é uma negociação política a gente fazer

uma avaliação da nossa escola nessa perspectiva multicultural. Bom, vamos dar um exemplo.

Como é que a gente avalia se uma proposta curricular é eficaz? É aí eu já vou ilustrar. Eu não

falei que a gente para avaliar currículo, avaliar a avaliação da aprendizagem e avaliar o clima

da escola, a gente tem que fazer algumas perguntas, depois buscar os indicadores e registrar

os dados? Então eu vou dar um exemplo na perspectiva que a gente trabalhou nesses

programas, tanto da reforma curricular, como da capacitação de orientadores pedagógicos,

esses foram os princípios que por nós utilizados em 2005 para bolar esse currículo e para bolar

então esse curso. O que é que a gente faria para avaliar? Os conteúdos na nossa escola estão

sendo trabalhados pelos professores de forma contextualizada? Eles estão permitindo que a

criança faça uma crítica cultural? Por exemplo, o professor de Biologia ou o professor de

Ciências, ele vai falar da pele. “Pele é melanina, são as células tal". Acabou? É um currículo um

pouco abstrato para a criança. Será que ele não faria melhor, como uma pesquisa que eu fiz

em que nós observamos uma professora de Ciências, e ela falava assim: “Agora a gente vai

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discutir qual é a diferença da pele branca para a pela negra, a simples diferença. Vamos trazer

textos que questionam o preconceito”, quer dizer, ela está articulando. Ela não está deixando

de falar da Biologia, mas ela está contextualizando nas discussões atuais sobre raça, etnia, nas

discussões sobre cotas. Ninguém está dizendo para dizer que é a favor ou que é contra, mas

contextualizar, fazer esse aluno se posicionar com relação aos conteúdos de forma crítica. Isso

é conteúdo, competência, habilidade. Isso cai em ENEM, em provas que são preocupadas, não

querem só saber se o aluno entende o que é pele, se ele sabe contextualizar esse crescimento,

se ele aplicar, então a gente não pode pedir que a avaliação dê um resultado bom se no

currículo do dia a dia a gente não trabalha nessa perspectiva. Uma outra questão avaliativa.

Será que eu estou trabalhando o currículo integrado? Uma idéia de matriz curricular ou eu

estou trabalhando com disciplinas em caixinhas muito isoladas? Quer dizer se o ENEM, se o

SAEBE estão falando em matriz, conteúdo, habilidade, competência, a gente tem que trabalhar

também nessa perspectiva. Trabalhar, por exemplo, um tema, o lixo ou o meio ambiente ou o

calor. Vamos trabalhar com a Geografia, com a História, com a Ciências, vamos tentar

trabalhar com a escola nesse clima interdisciplinar. Eu acho que isso é importante para uma

escola eficaz. Uma outra coisa, será que eu tenho uma perspectiva nessa escola que desafia

preconceitos? Eu tenho crianças que são humilhadas porque falam diferente, porque vêm mais

sujas, ou eu tenho professores que não estão conseguindo se expressar. Isso tudo tem que ser

pensado para a gente pensar em uma escola eficaz. Será que estou trabalhando com a

avaliação naqueles três níveis? A avaliação macro que me dá os índices, os indicadores, a

avaliação da escola para eu poder melhorar os indicadores, e a avaliação que os professores

fazem nas salas de aula? Eu estou trabalhando com esses três níveis. Será que eu estou

trabalhando com a gestão para uma escola aberta a diferenças ou eu estou trabalhando com

uma escola muito voltada só àquele aluno classe média que necessariamente é bem sucedido

e não uma escola inclusiva.

Bom, para a gente não se delongar muito, eu vou agora para a última parte. Vou falar como

essas coisas aconteceram em duas propostas que faziam parte das ações que nós trabalhamos

com a Secretaria de Educação na gestão do Doutor Claudio, e um pouco do que fizemos

recentemente comparando propostas curriculares. A do Rio de Janeiro, que é a proposta da

rede, é a proposta que está aí, e a proposta de São Paulo. Vocês dirão “Puxa, tanta coisa, não

é? Será que a gente consegue uma escola eficaz, um currículo eficaz, trabalhar com

professores e gestores para entender tudo isso? Que em cada um dos assuntos tem o

universal, tem o diversificado, tem que mesclar. Como é que a gente faz isso”?

Primeira dimensão. Eu acho que uma primeira dimensão de um currículo eficaz tem que

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trabalhar com as disciplinas. Por mais que a gente fale da interdisciplinaridade, cada disciplina

tem a sua construção de conhecimento, que foi feita durante anos, eu tenho a Química, tenho

a Biologia, a Matemática... Então um primeiro nível seria disciplinas trabalhadas de forma

contextualizada, multicultural, sempre tendo em conta conteúdos, competências e

habilidades. Eu não quero só um aluno que saiba Informática, eu quero um aluno que respeite

as diferenças, eu quero um aluno que ajude o próximo, eu quero um aluno ético. Uma

jornalista me entrevistou no Jornal do Brasil esse domingo, saiu na parte Internacional. Ela

estava me mostrando como era na Indonésia e queria saber o que eu achava disso. Que, de

acordo com a Transparência Mundial - a ONG, a Indonésia é um dos países mais corruptos,

mas eles estão fazendo um esforço enorme para começar da escola, um clima de escola

multicultural e ética. Então eu respondi "Claro, a gente tem que trabalhar com a escola".

Começa porque é uma questão cultural, você achar que é Gerson, vai levar vantagem em tudo,

obrigação da escola é trabalhar isso também. A gente não quer só aluno que saiba

Matemática, Português, mas que não contextualize isso, que não tenha uma atitude ética. Isso

são habilidades, são competências, então essa primeira dimensão seria o trabalho com as

disciplinas articuladas a essas perspectivas éticas e multiculturais.

Uma segunda dimensão de uma proposta curricular seria a gente trabalhar em algum

momento... Se você imagina círculos, um círculo com as disciplinas, sempre articulando com a

multiculturalidade, outro círculo, áreas interdisciplinares, projetos que envolvam várias

disciplinas, a Geografia, a Matemática, Português. Você pede para um aluno ler, por exemplo,

uma notícia de jornal em dois jornais diferentes, com dois editores diferentes, olha como vai

mudar. Em uma, você vai ver que são terroristas, na outra são grupos minoritários. O próprio

vocabulário, a partir de uma notícia de jornal, você já vê. O professor de Português pode

trabalhar a questão multicultural do preconceito ao mesmo tempo em que está trabalhando

com a língua. O professor de Geografia, onde ficam esses países, esses povos, não é? Então

você tem como trabalhar áreas interdisciplinares. Eu acho que seria uma segunda dimensão de

uma proposta curricular. Projetos ambientais, comunitários. As crianças irem para as suas

comunidades, conhecerem as culturas, os alunos trazerem seus pais. Fazer feira de cultura.

São áreas que você consegue trabalhar.

Uma terceira dimensão, eu acho que área de reforço. Eu acho que o nosso currículo para uma

escola eficaz tinha que pensar como trabalhar com as crianças para as habilidades de estudo

individual e de pesquisa. As crianças ficam perdidas na pesquisa. O que é que vão pesquisar,

entram no computador, vão até hiperlinks. Não! Eu acho que o professor, assim como eu falei

que nós temos que fazer formação continuada dos professores, deveriam ser pesquisadores,

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os nossos alunos também. Para isso tem que ter um fio condutor. Se você diz assim, como

exemplo, "Eu quero que vocês pesquisem romanos". Isso não é uma pesquisa, ele vai ficar

perdido, ele vai olhar tudo que é material, vai imprimir uma coisa enorme para você. Agora se

você diz assim "Como os romanos garantiram uma globalização já na época deles? O que é que

eles fizeram? Estradas? Como é que eles lidaram com os povos? A língua. Pesquise”. Ele já tem

um problema, ele parte de uma pergunta. Não existe pesquisa sem problema. Então isso é

uma área de reforço, de estudo individual, de pesquisa, que eu acho que tem que contemplar

no currículo de uma escola eficaz. Para isso tem vários projetos e sei que já existem projetos

de você implementar estágios, monitores das universidades, não é? Ou professores

aposentados ou estagiários que podem trabalhar nessa área para uma escola eficaz, para a

gente poder colocar tudo isso de uma forma positiva.

A quarta dimensão, eu acho que em algum momento, dentro desse currículo a gente tem que

trabalhar com carreiras. Claro que você vai trabalhar com criança pequenininha até

adolescente, mas o que é que existe em termos de carreiras? Porque existem tantas coisas

interessantes para serem feitas. Você pode trabalhar com as habilidades, com a diversidade

cultural desses alunos. Às vezes eles só sabem que tem Engenharia, Medicina ou eles não têm

perspectiva nenhuma. Vai ser caixa, vai ser isso... Levantar as expectativas dessa escola,

trabalhar com as opções de carreira, isso dá um incentivo muito grande, não é? Ele conhecer o

que é uma Oceanografia. Você trabalha com uma criança que talvez nunca ouviu falar nisso e

só na escola vai ter a oportunidade de ouvir falar. De repente ele acha que é outra coisa. Por

que é que você não vai apresentar isso para ele? Eu acho que isso tem que fazer parte do

currículo de uma escola eficaz. Não podemos só ficar com aquela visão muito tradicional. Isso

é uma coisa importante.Eu não estou dizendo que a gente consegue fazer isso tudo. Eu não

consigo, ninguém consegue, mas eu acho que, como diz o Gandin, se a gente tem um projeto

de árvore, todo dia a gente rega a árvore, põe o fertilizante, ainda que aquela árvore nunca

chegue como a imagem de árvore ideal, o fato de a gente ter uma meta e estar lutando por ela

já melhora bastante. Eu acho que a gente tem que pensar na articulação vertical e horizontal

desse currículo. Como é que esse currículo evolui no decorrer dos anos? Para isso nós temos

que ter momentos de pensar professores de Matemática conversando juntos, de Português a

mesma coisa. Será que a gente não está repetindo, será que está tendo uma coerência tanto

vertical como horizontal? Claro que isso é o ideal, mas se a gente tem que pensar em escola

eficaz, a gente tem que começar, ao avaliar as nossas escolas, tentar pelo menos melhorar. A

gente não vai conseguir. Claro que tem os fatores extraescolares e ninguém aqui está iludido

que a gente vai conseguir fazer tudo isso, mas eu acho que a gente pode fazer a diferença e

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pode fazer melhor do que a gente está fazendo. E outra vez a gente vê se a escola está

funcionando como uma organização multicultural.

Bem, então como é que a gente pensou nisso? A Secretaria de Cultura entrou em parceria com

a gente. A professora Angela Rocha, que era do Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza

na UFRJ e eu coordenei uma das ações, o Claudio Mendonça era o secretário. Vamos trabalhar

por uma escola mais eficaz. Quais são as ações a partir desses índices? Uma das ações, a

reorientação curricular. Um currículo não pode continuar sendo uma lista de conteúdos se as

provas de larga escala pedem conteúdos, habilidades e competências, então o currículo tem

que trabalhar assim também. Então em cada um dos documentos, nós trabalhamos com

Português, quinta série, sexta série, quais as competências, quais as habilidades, o que a gente

quer dessa criança e a questão da cultura. A gente quer que ele conheça só contos de fada ou

a gente quer que ele conheça o cordel, as outras manifestações culturais, então a gente

começou a embutir as várias áreas, foram várias equipes de Matemática, a UFRJ participou

ativamente nisso, e fizemos uma proposta curricular. Isso foi uma das ações. Outra ação foi,

não adianta de cima para baixo, temos que envolver os professores. Então a secretaria

também elaborou momentos em que os professores da rede, um pouco assim sob a liderança

dos professores da UFRJ nas diversas áreas, produziam roteiros didáticos, produziam as aulas a

partir daquele currículo, também pensando em competências, habilidades e diversidade

cultural. E pensamos a secretaria em parceria conosco, elaborou um curso de capacitação, de

formação continuada dos gestores e dos professores. Dos gestores foi esse que mais

especificamente eu coordenei que a gente falou sobre todos esses assuntos, a avaliação, o

currículo, e que era a pesquisa ação, o coordenador iria para a sua escola, voltava, e a

avaliação foi muito positiva. A gente acredita nessa avaliação porque a gente sabe que todos

nós somos muito críticos e é assim que devemos ser. Nós ficamos muito encantados porque

eram avaliações qualitativas e anônimas, então foram muitos elogios e as pessoas queriam

mais, queriam que a gente continuasse com outros temas. Foi uma experiência gratificante. A

gente tinha receio, 2.100 coordenadores, 76 turmas, mas foi muito positiva, produzimos o

currículo. Recentemente, tivemos a ocasião de ver aqui na FESP, que fez um estudo

comparando essa proposta que a gente tinha, o currículo de Matemática... Foram produzidos

materiais didáticos com os professores, sempre seguindo esses princípios, por isso eu dei esses

princípios antes para vocês verem. Não existe proposta neutra. Nós trabalhamos nessa

proposta a partir da idéia do professor sendo pesquisador em ação, a partir da ideia de que

uma escola eficaz para melhorar os seus índices tem que trabalhar com os seus gestores, tem

que haver um esforço coletivo, e a partir da ideia que os professores têm que produzir esse

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material. Ainda que a gente possa da universidade liderar um pouquinho, a gente tem que

trabalhar com os saberes, não é? Então a FESP fez uma comparação entre a proposta

curricular de São Paulo, e esse nosso currículo. O que é que nós vimos? Que o nosso currículo

propõe essa articulação conteúdos, habilidades, competências. Nem sempre a proposta de São

Paulo realiza isso. No entanto, a proposta de São Paulo tem uns caderninhos que são bem

práticos para as escolas. Qual foi a idéia dessa comparação? Só para encerrar, nós produzimos

esse material em azul que foi o que a gente chama de reorientação curricular com todos os

professores da rede daqui do Rio de Janeiro. Nós tínhamos grupos de professores de

Matemática, de Ciências e fizemos um novo currículo, um currículo para uma escola eficaz. Se

vocês olharem, em alguns pedaços, esse nosso currículo contempla áreas interdisciplinares.

Vocês lembram que nós tínhamos trabalhado com essas dimensões. O que é que nós

propusemos nessa proposta curricular? É isso o que vocês vão encontrar. A gente trabalhou

primeiro com as disciplinas e com áreas interdisciplinares. Esse currículo do Rio de Janeiro

contempla projetos interdisciplinares, contempla competências, habilidades, contempla

também áreas de reforço, estudo individual. Tem alguns pedacinhos que eles dizem “Você,

professor, agora, pode propor exercícios...”. Ele propõe, ele é propositivo. O currículo de São

Paulo, ele é mais por conteúdos, então a gente sentiu que o nosso chega mais perto porque foi

construído por todos vocês, por todos nós. Chega mais perto daquilo que a gente espera de

um currículo para uma escola eficaz. Mas, como a gente sempre aprende, nós achamos que o

próximo passo seria transformar esses volumes que são mais elaborados, que explicam a

filosofia, em caderninhos simples. Vocês concordam, não é? Vocês que estão com a mão na

massa. Então é isso que a gente fez nesse momento. A gente tentou unir o útil ao agradável.

Uma proposta multicultural que articula conteúdos, competências, habilidades, diversidade

cultural com o formato mais acessível. Acessível para o manuseio no dia a dia da sala de aula.

Não será um currículo para uma escola eficaz prescritivo, de receita de bolo, mas ao mesmo

tempo ele não se furta em mostrar algumas coisas, algumas ideias, orientações que surgiram

desse coletivo. Por que é que a gente não pode aproveitar um professor que tem uma

experiência positiva, que colocou uma ideia legal de uma experiência? Por que é que a gente

não pode socializar e colocar isso em um documento curricular, não é? Exato. Ainda que cada

um possa ter a liberdade de trabalhar, se a gente está falando de avaliações em larga escala,

que em algum momento a gente quer avaliar a escola por esse instrumento, vamos tentar

socializar como fazer isso melhorar.

Enfim, esses foram os princípios que vocês vão ver na proposta do Rio de Janeiro. São os

princípios que a gente trabalhou. Essas dimensões todas e o tempo todo pensando na

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organização multicultural. A gente pensou em materiais dialógicos. O material didático é

importante. Eu acho que era o outro princípio que a gente buscou. Não adianta só falar esses

princípios lindos que eu falei agora se a gente não consegue tentar colocar em prática isso,

então o que a gente tentou foi fazer essas colunas. Cada disciplina tem colunas: conteúdo,

habilidade, competência, proposta de exercícios... Agora, ele pode ficar mais fininho, além

desse, a gente pode fazer como São Paulo fez, uma coisa mais fininha, mas prática, mas não

reduzir a conteúdos. Eu achei uma coisa um pouco, da minha parte, conteudista. Eu acho que

o nosso, sem viés nenhum, em uma análise bem técnica, acho que em termos de trabalho

ficou mais interessante porque ele foi fruto de um esforço coletivo. Eu não sei se o de São

Paulo envolveu tanta gente assim nessa construção, sem desmerecer evidentemente o

esforço.

Bom, a partir disso tudo, o que é que a gente poderia concluir desse paralelo, disso tudo? A

primeira conclusão é que é possível sim a gente tentar melhorar os índices, é necessário a

gente ter algum momento em que a gente veja esses índices. Mesmo quem acredita no

multiculturalismo, na diversidade, não pode achar que a gente vai trabalhar um currículo para

cada escola, não tem nem na nossa sala de aula a gente faz isso com os poucos alunos, tem

algum momento em que a gente faz uma prova, a gente exige... Isso é o que nós somos

chamados a fazer, mas isso articulado com um momento mais multicultural e isso a gente

tentou fazer nesse currículo que vocês têm aí nas mãos. Por que é que a gente está falando

que a formação continuada é uma estratégia central? A gente acaba a faculdade, vai embora

para os nossos locais de trabalho. É necessário que a gente, o tempo todo, se articule com

esses cursos, com a universidade, com a secretaria. Ver o que é que está acontecendo, senão a

gente fica parado no tempo e acaba usando a homogeneização na nossa escola e em sala de

aula. Não tem como a gente melhorar se a gente não respeita a diversidade. Se a gente não

aposta no clima, se a gente não aposta na autoestima dos alunos. Não tem como a gente

melhorar nada sem isso, não é? A gente considera nesse milênio agora de tecnologia, de

pluralidade, a competência de lidar com a diversidade é uma competência importante. A

competência ética. Nós temos que ser éticos. Como esse projeto na Indonésia que eu fiz essa

entrevista. A gente tem que trabalhar isso nas escolas. Não é possível a gente só pensar em

conteúdo, vestibular e desperdiçar esses anos todos em um clima que não fomenta nenhum

valor. Nisso eu sou muito apaixonada com essa questão. E a gente pode sim articular isso com

as diversas áreas do saber. Para isso é importante as parcerias que a gente faz. Com vocês,

gestores, professores, que estão colocando a mão na massa. Não adianta eu da universidade

ficar lá falando só para os meus pares. A gente tem que trabalhar junto e tentar articular o que

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está produzindo com o que vocês estão produzindo e melhorar. O esforço é para todos, é para

o país todo. Tem que ter um esforço coletivo senão a gente não avança. Eu acho que a gente

tem que trabalhar conteúdos, metodologia e ambiente multicultural. A escola eficaz como

essa organização que valoriza a diversidade. Só para terminar, eu vou contar um caso para

vocês que vai mostrar direitinho como é que a gente expulsa da escola crianças que sabem. Eu

vou contar uma história que aconteceu comigo e com os meus filhos, quando eu estava na

Escócia fazendo doutorado, e aí vocês vão entender o que é que quer dizer esse

multiculturalismo direitinho. Bom, a minha filha aqui aprendeu a Matemática. Assim,

dezenove, menos oito, põe aquilo direitinho, tira um emprestado. Uma craque, não é? Dez em

Matemática. Vou fazer o paralelo com um menino do Nordeste que foi objeto de uma

pesquisa de uma colega nossa, que ele vendia na feira e fazia rapidamente a Matemática

mental. Você dava dez reais, a coisa custava 8,85, na hora ele te dava o troco. Mas ele era

reprovado em Matemática. Ao contrário da minha filha, ele era reprovado em Matemática

sempre. A pesquisadora pergunta para ele “Mas por que você é reprovado em Matemática?

Você faz contas complicadas na feira”. Ele disse “Não, professora, isso não é Matemática.

Matemática é o que a professora me explica e isso eu não entendo. O que eu faço é o

seguinte: 8,85 para 9, 10 menos 9, então 1,25, é assim que eu faço as contas”, ou seja ele fazia

por aproximação. Muito bem, voltemos à Escócia, a minha filha craque naquelas continhas

todas, aí a professora disse assim “Você leva, três pounds, e vai para o supermercado comprar

alguma coisa”, vamos dizer à guisa de analogia. Não foi bem isso, mas é só para vocês

entenderem. Um e oitenta e cinco e você leva dez. Qual é o troco? Aí lá foi ela arrumar. A

professora disse “Pencils down. Eu quero o lápis na carteira. Vocês têm que fazer isso mental

arithmetics”. Aritmética mental. Era isso... Por isso que eu digo que o currículo é uma seleção

da cultura. Lá o que era valorizado até a criança ter 12, 13 anos, é o raciocínio matemático,

não é a transformação simbólica da Matemática porque é muito abstrato para as crianças, ou

seja, o menino, se fosse na Escócia, tiraria dez em tudo. Ainda bem que lá não tem reprovação,

não é? Outro assunto que eu vou discutir em outra oportunidade para vocês. Aqui ele é

reprovado, ali a minha filha não foi reprovada porque no Reino Unido não tem reprovação.

Eles trabalham em grupos. Uma professora, ela não dá uma aula frontal. Ela trabalha com os

grupos, então a criança pode estar em um grupo muito adiantado em Matemática, na aula de

Inglês ela vai para outro grupo e tem o reforço. Não é uma aula expositiva, então a minha filha

se safou disso. É uma outra metodologia para o currículo. Mas o que eu quero dizer é isso, o

fracasso escolar, às vezes, tem a ver com uma ideia de currículo, um endeusamento do que

está no currículo, sem a gente se aperceber que as crianças têm saberes. Aquele menino sabia

Matemática, ele tinha um outro caminho. Ele tinha um caminho mais mental e isso é

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valorizado em outro contexto. Então a gente deve se sensibilizar um pouquinho mais disso e

tentar entender que essas questões não são questões acabadas.

Bom, isso aqui foi só um início, tem muita coisa que a gente pode falar, mas foi mais ou menos

o recorte que eu quis dar para vocês quando a gente fala em currículo. Ali tem o meu e-mail,

[email protected]. Agora, quem se interessar pelo assunto, hoje em dia a gente não tem

mais segredo, pelo menos acadêmico, uma vez que a gente tem o nosso currículo lattes

exposto, não é? Uma vez eu falei isso, aí um colega disse assim “Acadêmicos, Ana”, eu falei “É

verdade”, então agora eu falo “Não temos segredos acadêmicos. É só vocês entrarem

www.cnpq.br, plataforma lattes, aí põe assim, currículo Ana Canen. Aí vai aparecer tudo o que

eu tenho feito sobre essa área que a gente não consegue explorar em um dia só. Moral da

história, o que eu tentei fazer aqui? Articular a avaliação maior ao que a gente pode fazer

dentro das nossas escolas para a gente ter um currículo eficaz e vocês viram que isso é

possível. A gente produzir um currículo com todas as potencialidades e com todos os limites,

tentando dar conta. Então, no mais, obrigada e a gente espera ter contribuído. Obrigada!

Lucindo Filho

Pedagogo especialista em gestão escolar, especialista em educação especial e Mestre em

Educação (UNESA)

Apresentação de Programas e Experiências Educacionais

Inicialmente quero dizer da minha satisfação de estar aqui presente, compartilhando este

momento com várias pessoas com quem eu já tive a oportunidade de debater os assuntos que

têm sido a minha preocupação ao longo desses últimos anos. Atualmente venho trabalhando,

principalmente, com a questão da inclusão na educação, mais especificamente com o tema da

igualdade, que é uma questão que bastante me preocupa, e a questão da emancipação que é

outra categoria que também tenho me dedicado. Nessa oportunidade, nos cabe apresentar

um projeto que foi desenvolvido em 2008, e que nasceu em uma interface da presidência da

FESP, Doutor Claudio Mendonça, a vice-presidência à época, professora Terezinha Lameira e a

diretoria de treinamento, juntamente com a cidade de Itaperuna, através da secretária

municipal de Educação da época que era exercida pela professora Esmeralda Bussade, que

várias pessoas certamente conhecem pelo seu trabalho não só em prol da educação em

Itaperuna, como também no Conselho Estadual de Educação do Estado do Rio de Janeiro. E o

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que nos animava nessa proposta era justamente estar desenvolvendo um trabalho, um

projeto, voltado para a questão da valorização do saber docente. Como nós poderíamos em

uma determinada realidade, trabalhando com os saberes de professores de uma rede

municipal, do interior do Estado do Rio, noroeste fluminense, provocar, formar, discutir, fazer

uma reflexão sobre a sistematização desses saberes, visando, vamos dizer assim, a preparação

de material didático que pudesse servir de estímulo, de orientação, a outros professores dessa

mesma rede? Tudo isso gerou um material, uma contribuição bastante densa. Nós tínhamos a

meta de construir 312 sequências didáticas, nós alcançamos um número maior que esse.

Aproximadamente, 350 sequências didáticas e duas mil fichas de atividade da autoria de 26

professores da rede de Itaperuna. Depois esse material vai circular, as sequências didáticas

irão circular entre vocês, para que vocês possam manusear.

Bom, esse trabalho foi feito com o apoio de uma equipe técnica. Eu, aqui nesse momento,

estou tendo a primazia de estar representando esse grupo que esteve sob a coordenação à

época da professora Teresinha Lameira. Participaram desse esforço, a professora Alba Cruz, a

professora Beatrice Costa, a professora doutora Jussara que foi consultora desse projeto, uma

doutora, inclusive, da comunidade local. Nós tivemos o cuidado de convidar para a consultoria

duas doutoras que fossem do local, que estivessem trabalhando naquela realidade, então foi o

caso da doutora Jussara Badin e da doutora Patrícia Vargas. Eu somei nesse esforço, mais a

professora Raquel e lá por Itaperuna as supervisoras de ensino Élen de Oliveira, Solange e

Teresa Cristina do Carmo.

Escola do Professor. O que constituiu essa experiência? Constituiu o desenvolvimento de ação

de formação continuada fundamentada na abordagem do saber docente, implementada em

parceria pela Fundação Escola de Serviço Público do Rio de Janeiro, FESP - RJ, e a Prefeitura

Municipal de Itaperuna. O objetivo teve como foco valorizar e sistematizar as práticas

pedagógicas, as vivências, as experiências do dia a dia desenvolvidas por esses professores. E

proporcionando a eles essa oportunidade de estarem debatendo, refletindo, fazendo uma

confrontação das suas experiências com outros saberes, com um enfoque mais sistematizado.

Saber docente. Muito do que a gente vai falar aqui agora já foi tratado pela Ana Canen, por

outros palestrantes que trouxeram temas que constituem também a nossa preocupação.

Quando pensamos em roteiros didáticos, em sequências didáticas, nós estamos com uma

grande preocupação que é transversal a várias das questões que já foram aqui tratadas, em

termos de matriz curricular, de planejamento, projeto político pedagógico,de contextualização

do objeto do conhecimento.

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Então o nosso referencial de saber docente, entre as diferentes abordagens, adotou o sentido

do saber docente como uma compreensão do saber na sua relação com o docente enquanto

sujeito de práticas, destacando-se a dimensão do fazer, da experiência, da ação, de uma

prática social reflexiva. E isto envolve os saberes múltiplos, os disciplinares e curriculares, o

saber da formação pedagógica, o saber da experiência profissional e os saberes da cultura e do

mundo vivido na prática social.

São saberes articulados pelo docente no contexto do processo de ensino e aprendizagem

frente à complexidade do conhecimento. Porque antes que eles passassem a sistematizar as

suas práticas, construírem essas sequências, o projeto seguiu uma metodologia de realizar

vários encontros, provocando vários debates, várias reflexões, inclusive uma das pessoas

convidadas foi a professora Teresa Pena Firme que esteve lá falando sobre avaliação. Então em

várias oportunidades nós estivemos discutindo intensamente todos esses aspectos que vão

incidir nesse processo relacional, na busca de uma melhor qualidade, de igualdade, de uma

melhoria da participação no processo de educação.

Bem, epistemologicamente, valorizando o saber docente, pensamos em três eixos. A prática

docente entendida como um princípio educativo, construída na produção do humano com o

humano. Aquele sentido em que você transforma sua realidade, você também aprende nesse

processo de transformação. A prática docente enquanto ato político de situar a educação no

seio da comunidade, mediando a construção de conhecimento e da cidadania. E a prática

docente como ato plural e produto de uma identidade, os profissionais de educação.

O grande objetivo desse projeto era criar oportunidade aos professores do espaço da reflexão.

Sabemos que, normalmente, no planejamento, no calendário do ano letivo de diversas redes,

são estabelecidas datas para o grupo de estudo, mas muitas vezes isso não acontece dessa

forma como planejado, então o professor no seu dia a dia, muitas vezes, não se percebe nem

como professor da escola. Ele muitas vezes é o professor da disciplina, de determinada área de

conhecimento, não trazendo para si todo contexto, todas as preocupações, todas as

realidades, as dificuldades do dia a dia, do cotidiano de uma escola. Então muitas vezes esse

professor vai lá, dá sua aula de Inglês, dá sua aula de Matemática porque já tem outro horário

em uma escola privada ou trabalha na rede municipal ou na rede estadual e ele acaba não se

envolvendo na escola como um projeto, como um todo, o que reforça o velho projeto de

escola fragmentada, tão comum na nossa realidade. Então, talvez, assim, em um primeiro

momento, a grande oportunidade que esse projeto criou na rede municipal de Itaperuna foi a

oportunidade do debate, da reflexão, de cada professor envolvido repensar a sua prática.

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Parar e olhar para o seu trabalho e fazer uma crítica, uma reflexão do seu trabalho, não é?

Como é que eu estou desenvolvendo os processos de avaliação, como é que eu estou

planejando? Como é o meu relacionamento com o aluno? Foco meu trabalho no ensino ou na

aprendizagem? Quer dizer, oportunizar ao professor a sistematização do seu trabalho docente,

ou seja, do seu saber, sua cultura pedagógica, sua racionalidade, por meio da constituição de

espaço de reflexão e debate, com vistas a estimular a autoria docente na elaboração de

roteiros didáticos.

Então não somente a equipe tinha esse interesse de estar provocando essa reflexão, esse

debate, essa sistematização, mas também no final tínhamos o desejo de um produto. Nós

gostaríamos de alcançar um produto e o que foi conseguido foi compilado em forma de um

livro, que é esse material que está circulando aí por vocês no auditório.

Itaperuna. Não sei se todos conhecem, é uma cidade do noroeste fluminense, com

aproximadamente 94 mil habitantes, e que apresenta as seguintes características no campo da

educação. Itaperuna é um grande centro universitário daquela região. Hoje nós temos

aproximadamente 40 cursos de graduação e 14 ou 15 instituições localizadas naquela região.

Isso significa que são 15 mil alunos universitários, em uma cidade que tem 94 mil habitantes.

São diversos cursos de graduação, então ela é uma referência naquela região em termos de ser

um centro de formação na área universitária. A rede pública municipal de educação em

números aproximados tem 80 escolas, 500 professores e 9.500 matrículas na educação infantil

e Ensino Fundamental e alcançou em 2007 o indicador 5 no IDEB. O que comparando com

outras realidades é um indicador bastante razoável, considerando aí que nós temos alguns

municípios com 3,2, 2,8, 3, não é? Um município acima da média estadual e nacional.

Objetivos específicos do projeto Escola do Professor. Desenvolver nos professores

competências e habilidades para a elaboração de sequências didáticas, desenvolver nos

professores competências para a apresentação das sequências didáticas a seus pares e a

promoção de debates. Isso era uma grande dificuldade. Eu achava graça às vezes... a gente

conseguiu ter uma boa relação, toda a equipe junto com os professores de Itaperuna, como é

que eles tinham medo de falar! Eu dizia sempre: advogado e professor, o principal

instrumento, um dos principais instrumentos é a palavra, a fala, não é? Mas havia uma timidez

muito grande, uma grande dificuldade de expor para os seus pares e também a questão da

elaboração do texto. Isso quem tem a oportunidade de trabalhar no meio acadêmico sabe

como é um grande problema. Normalmente você tem colegas no mestrado, chegam até ao

doutorado, muitas vezes, com muita dificuldade na elaboração do texto e isso foi uma

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realidade que nós encontramos. Nós tivemos que promover vários exercícios, vários

momentos. É como se você fosse buscar o texto que existe dentro de cada pessoa, quer dizer,

o texto oral, às vezes, ele sai fácil, o texto oralizado, mas na hora que você pede para passar

para o papel, para utilizar o computador e colocar o texto, sistematizar um conhecimento, aí

isso começa a ser bastante difícil, não é? Levar os professores da rede municipal de Itaperuna

a praticar uma pedagogia ativa e participante, melhorar os resultados de aprendizagem nos

alunos da rede municipal. E não poderíamos esquecer o objetivo final que, embora Itaperuna

tenha uma média, um índice 5 de IDEB, mas é preciso melhorar isso, não é? Quer dizer, isso é

razoável dentro de todo um quadro de grandes dificuldades da educação nacional, mas não é

o desejável. É preciso melhorar bastante esse resultado em termos de aprendizagem que os

alunos apresentam.

Produto final. Como eu disse, de início nós tivemos 110 candidatos em uma rede de 500

professores, nós tivemos 110 candidatos interessados em participar conosco nesse projeto.

Eles foram selecionados através de uma entrevista e também com base na elaboração de uma

sequência didática. Cada um escolheu um bom roteiro didático que já tivesse trabalhado,

desenvolvido com os seus alunos e colocou isso no papel. Então foi assim que foi o processo de

seleção. O objetivo era escolher 25 professores, acabamos trabalhando com 26 porque em

uma determinada disciplina não tinha ninguém e nós tivemos que aproveitar mais um

professor. Dentro dessa disciplina foi o único. Então nós buscamos a formação desses 26

professores no domínio de competências e habilidades para a sistematização de suas práticas

e produção de material didático acessível aos demais professores. A elaboração de 350

sequências didáticas e de duas mil fichas de atividades e todo esse trabalho, é lógico, foi

devolvido à rede através de vários momentos. Em vários momentos do trabalho, os próprios

professores que elaboraram essas sequências, apresentaram aos seus pares nas escolas, em

diferentes escolas. Então houve uma segunda oportunidade de estar sendo debatido pelos

demais companheiros todo esse trabalho, como ele foi elaborado, as dificuldades, sugestões,

de maneira que o trabalho foi aperfeiçoado em todo o seu desenvolvimento.

Referências que nós colocamos na busca de estar elaborando as sequências didáticas. Não

poderíamos esquecer dos objetivos da educação nacional, dos objetivos debatidos no projeto

político pedagógico, dentro daquelas velhas perguntas “que escola é que nós queremos, que

aluno nós queremos formar”? Então esse era uma referência. As políticas de educação,que

vem sendo implementadas pelo sistema, que se considerassem também, em especial a política

de educação inclusiva, a presença e valorização da diversidade na educação. Eu até não gosto

dessa coisa de rotular a educação de inclusiva, eu prefiro ver mais a inclusão como um

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movimento amplo que começa a contagiar gradativamente o processo da educação. A matriz

curricular, a contextualização social, a realidade da escola, os princípios éticos que foram tão

falados pela Ana Canen, o reconhecimento e valorização da “alteridade”, a questão das

diferenças. Muitas vezes os professores apontam como é difícil trabalhar com a diferença. A

diferença cultural e a diferença étnica, a diferença de competências e habilidades, enfim,

diferenças de todos os tipos. Na escola ainda vigora muito um sentido de educação

homogênea, não é? Quer dizer padrões sócio-culturalmente estabelecidos. O professor de

maneira geral, na sua formação, ainda é muito pouco trabalhado para encarar a "alteridade"

tão presente na realidade.

Outra questão é a promoção do acesso e igualdade, inclusive, vemos esses roteiros

didáticos como oportunidades de promoção do sentido de igualdade. Quer dizer não adianta

você garantir o acesso, mas você não garantir formas de participação que contemple as

diferenças, as desigualdades, a não atenção a isto é o que a Acácia Kuenzer vai chamar de

inclusão excludente, quer dizer, você está incluído pela garantia do acesso, mas está excluído

do processo pela dificuldade na participação. A questão da qualidade educacional... Qualidade

é uma palavra polissêmica, se a gente fizer aqui rapidamente uma pergunta sobre o que cada

um de nós entende sobre qualidade de educação, as respostas serão várias, não é? Quer dizer,

ocorrerão respostas conservadoras, ocorrerão respostas mais revolucionárias ou

transformadoras. O que nós entendemos realmente por qualidade de educação? É tema para

muito debate, muita reflexão.

A questão do projeto político pedagógico, como foi dito, muitas vezes o projeto nem existe e

outras vezes é só uma peça feita por uma equipe de sabichões da escola ou de consultores e

uma vez apresentado às autoridades do sistema, é guardado em uma gaveta. A maioria dos

professores lá em Itaperuna não conhecia o projeto político pedagógico das suas escolas, não

haviam participado, lógico. Não conheciam, além de não terem participado, eles nem

conheciam os projetos políticos pedagógicos. Então qual é o norte do trabalho? Como vamos

construir uma nova escola?

A questão da avaliação diagnóstica ou formativa. A complexidade do conhecimento, foi uma

tecla muito batida por nós, como também a questão da interdisciplinaridade. Não vamos falar

em transdisciplinaridade que aí já é um salto muito grande, mas batemos muito nessa tecla da

interdisciplinaridade, da complexidade do conhecimento, inclusive, trabalhamos bastante

aquele texto do Edgar Morin “Cabeça bem feita”, que é um texto excelente na área de

formação, de reflexão, para fazer o professor pensar. Não basta ter o conhecimento. O que é

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que você vai fazer com esse conhecimento? Quer dizer, não podemos ficar em uma visão

produtivista da educação. É você saber realmente o cidadão que você está formando, o que é

que ele vai fazer com esse conhecimento. O que mais hoje a gente encontra? Encontramos

muito na área acadêmica, um número expressivo de estudantes profissionais, fazendo

mestrado, doutorado, mas não sabem o que é que vão fazer com o conhecimento.

Infelizmente encontramos muito isso.

O foco no desenvolvimento de inteligências, competências e habilidades. Eu senti ontem e

hoje muita a falta dessa palavrinha inteligência. Quer dizer falamos muito em competências,

habilidades, mas não falamos nas inteligências. Realmente, na educação, muitas vezes, o

professor não tem essa dimensão de que está trabalhando no sentido do desenvolvimento de

inteligências através do desenvolvimento de competências e habilidades. Então trabalhamos

muito essa ideia de que esses roteiros estivessem voltados para essas questões.

Bom, tivemos alguns cuidados na elaboração das sequências didáticas. Eu não vou ler isso tudo

senão fica exaustivo. São dois slides nesta apresentação em que colocamos o de mais

importante para o que o pessoal tivesse cuidado. Ainda há uma grande confusão entre

objetivo, estratégia, justificativa. Como é difícil trabalhar esta questão, inclusive estão aqui

vários colegas que tiveram a oportunidade de estar conversando, refletindo sobre a

elaboração de projetos, e isso também era uma dificuldade. Bons professores, bem formados,

mas não tinham essa experiência de trabalhar com projeto e tinham muita dificuldade de

entender o que era objetivo, o que é que era estratégia, o que era recurso. Isso foi um

exercício que tivemos de trabalhar bastante. Eu imagino que conseguimos alcançar um bom

resultado, dado alguns projetos que foram desenvolvidos, então podemos concluir que isto foi

resolvido. Assim de maneira geral nós listamos alguma questões para as quais pedimos aos

professores o máximo cuidado quando da elaboração de sequências. Eu diria que o principal

desses cuidados é porque se está muito enfocado na questão do ensino e não na

aprendizagem, é a questão da mobilização, dos alunos participarem da elaboração das

sequências e do desenvolvimento delas, quer dizer, é muito importante buscar nesse processo

de mediação, desenvolver um roteiro de atividades que envolvam crescentemente a

participação dos alunos. Senão o que se vê como em inúmeras outras ações são as pracinhas

em frente às escolas ganharem os alunos e as escolas ficarem vazias. A sala de aula está vazia e

o barzinho em frente da escola está cheio. A sala de aula está vazia, mas a pracinha em frente

da escola está cheia. E quando temos a chance de observar a prática do professor desta

escolas, é aquela aula - discurso, não é? A aula da palestra que tanto o Claudio colocou aqui

no primeiro dia, então essa talvez, de todas aquelas principais recomendações, seja a mais

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importante. Se nós conseguirmos realmente na elaboração de um roteiro didático discutir,

mobilizar, provocar debates sobre as escolhas, sobre as opções e envolver os alunos em todo

esse processo, então certamente a construção do conhecimento acontecerá.

Etapas em que esse projeto se desenvolveu. Inicialmente nós tivemos um seminário de

lançamento do projeto na cidade de Itaperuna, um edital de seleção dos professores tutores, a

seleção das consultoras de metodologia que eram da cidade de Itaperuna, a formação desses

professores tutores, houve uma fase de discussão da formatação das sequências, essa

formação passou também pelo uso da Informática. Como o professor de maneira geral, não

tem acesso ainda à Informática e não sabe usar os recursos da Informática. Então, boa parte

também dessa discussão passou por essas oportunidades de se preparar uma apresentação,

um material, de saber utilizar adequadamente essa ferramenta.

Outras etapas do Projeto constituíram: envolvimento dos diretores e equipes pedagógicas;

formatação e aperfeiçoamento de um modelo de sequência didática; definição de conteúdos

relevantes. Foi feito um mapa conceitual daqueles conteúdos mais relevantes, onde pelas suas

práticas eles percebiam o que os alunos tinham mais dificuldade no alcance de determinadas

competências e habilidades, utilizando aqueles conteúdos como estratégias. Elaboração das

sequências didáticas, a fase de orientação e correção dessas seqüências; a apresentação das

sequências didáticas nas escolas aos demais professores e a elaboração e formatação do livro

final em CD ROM contendo as sequências e as fichas de atividades.

Algumas dificuldades. Uma delas eu já falei que é a questão da produção do texto. É muito

difícil, a nossa escola não trabalha a construção do texto, não forma produtores de texto, nem

o texto oral muitas das vezes. Encontramos muitas vezes as pessoas com dificuldade de estar

desenvolvendo um raciocínio, de fazer uma exposição porque justamente boa parte do

trabalho que é feito nas escolas não procura desenvolver isso. A falta de foco no objetivo.

Muitas ainda, fazem um trabalho, mas não sabem o que querem finalmente alcançar com

aquele trabalho, projeto, roteiro didático, com aquela atividade que foi proposta. O foco no

ensino e não na necessidade de aprendizagem dos alunos. Como é que os alunos aprendem?

Essa é uma discussão bastante interessante de você provocar. Diferentes caminhos da

aprendizagem. Não se sai da academia com uma consciência clara sobre diferentes

possibilidades, sobre diferentes caminhos. Muitas vezes as pessoas ficam 10, 15, 20 anos

trabalhando, fazendo o que elas acreditam com toda honestidade, mas não percebem ainda

com clareza como relacionar objetivos com estratégias de forma a alcançar um determinado

resultado. A inexperiência na apresentação do trabalho aos seus pares. Já falei isso aqui. O

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tempo de ser professor da escola, e não só da disciplina e da área de conhecimento, a

dificuldade de trabalhar com a interdisciplinaridade, o rompimento com a visão conteudista,

esse é uma das coisas mais difíceis. Boa parte das sequências que foram produzidas, ainda tem

muito esse vínculo com o conteúdo. Parece que o objetivo é o conteúdo, mas na verdade o

objetivo é a inteligência, são as competências, são as habilidades. Isso levou à desistência de

alguns professores. Nós não tivemos sucesso total, seis professores desistiram, foram

substituídos por outros professores que foram até o final. Nós lamentamos muito que seis

professores tenham desistido.

Algumas falas... Inclusive, aí no livro que está circulando tem vários depoimentos dos

professores, mas eu separei algumas. “A elaboração de sequências didáticas abriu caminhos

para o despertar da reflexão crítica sobre a importância da busca constante de resignificação

da prática pedagógica e da sistematização dessa prática”. “Novas ideias surgem uma vez que

esse modo de preparar aulas ativa a imaginação criadora do professor e ainda permite e

viabiliza uma prática nos caminhos da interdisciplinaridade”. “Nesse trabalho tive a

oportunidade de avaliar a minha prática e confrontá-la com novas idéias e experiências”.

Bom, deixo aqui nesse final de apresentação algumas ideias, buscando inspiração no nosso

Lulu Santos:

“Tudo muda o tempo todo, não adianta fugir nem mentir pra si mesmo”.

Trago também o nosso velho mestre Paulo Freire

“Ai de nós, educadores, se deixamos de sonhar sonhos possíveis. Os profetas são aqueles ou

aquelas que se molham de tal forma nas águas de sua cultura e da sua história, da cultura e da

história do seu povo, que conhece o seu aqui e o seu agora e, por isso, podem prever o

amanhã que eles mais do que adivinham, realizam". Paulo Freire.

E, por fim, o nosso Miguel Arroio:

“Descobrimos, os educandos, crianças, adolescentes e jovens como gente e não apenas como

alunos. Mais do que contas onde depositamos os nossos conteúdos, vendo os alunos como

gente, fomos redescobrindo-nos como gente, humanos e ensinantes de algo mais do que a

nossa matéria”.

Fica aí para reflexão.

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Conclusão, o projeto Escola do Professor construiu excelentes oportunidades de participação

dos professores na articulação horizontal e vertical do currículo, como também da valorização

e concretização de saberes e material didático. Isso foi uma intencionalidade, os professores

de Matemática tiveram a oportunidade de se encontrar em grupo e também de participar das

discussões dos professores da área de Códigos e Linguagens, da área de Estudos Sociais e isso

foi muito enriquecedor para uma visão mais complexa do conhecimento, das atividades que

eles pudessem vir a desenvolver.

Os professores tutores. Na educação infantil, nós tivemos cinco professores lá da rede. Os

professores tutores do primeiro segmento foram 13 professores. E no segundo segmento

foram nove professores.

Bom, a nossa homenagem a todos que trabalharam no projeto, a professora Esmeralda

Bussade, que realmente colocou a Secretaria Municipal de Educação à disposição, mobilizando

para que esse trabalho pudesse ser realizado. Nós tivemos todas as facilidades no sentido de

estar desenvolvendo essa atividade, mas principalmente a facilidade do querer aprender, do

aprender fazendo por parte dos professores de Itaperuna. Na oportunidade deixo o meu email

para quem desejar entrar em contato [email protected] - Obrigado a todos vocês

pela atenção!

Guiomar Namo de Mello

Diretora da EBRAPA (Escola Brasileira de Professores) e Doutora em Educação pela

PUC, SP com Pós Doutorado em Educação Comparada pelo Instituto de Educação da

Universidade de Londres, Inglaterra.

Os Problemas Relacionados à Formação de Professores

Boa tarde! Eu quero dizer que é uma satisfação muito grande estar aqui, agradeço muito ao

Claudio e toda equipe aqui da FESP que tem uma atuação dinâmica, inspiradora e dá

esperança para a gente, e eu gostaria muito de dizer que a minha fala de hoje tem um

conteúdo de muita provocação, aliás eu tenho ficado cada vez mais provocadora com a idade.

Eu acho que a gente passa de um tempo assim, que a gente começa a achar que tem direito de

dizer tudo o que pensa. E nem fazer tantas alianças como as que o Claudio está tão

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preocupado. Acho que isso é ótimo, no jovem precisa ser feito assim mesmo. Então essa é uma

questão, eu tenho falado tanto em formação de professor que eu comecei a ser mais

provocativa para ver se realmente a gente deixa de falar e começa eventualmente a tentar

fazer alguma coisa. Porque quem sabe também depois de 45 anos trabalhando com educação

a paciência histórica da gente começa a ficar mais curta. E a segunda coisa é que eu estou

falando sobre formação de professores no contexto que o Brasil vive hoje. Eu acho que isso é

muito importante, quer dizer, não é um discurso teórico sobre formação de professor. Ele leva

em conta as restrições, as condições que nós vivemos hoje. Um país que vem de uma herança

educacional absolutamente colonialista. Teve na herança lusitana uma chaga enorme do ponto

de vista do acesso à cultura e à educação, haja vista que aqui na Praia Vermelha vocês têm a

primeira instituição educacional do nosso país, que é uma universidade, não é? Que Dom

Pedro tratou de criar logo, logo porque teve que vir para os trópicos fugindo de Napoleão e aí

tinha que arrumar lugar para os homens da corte estudarem. Eram homens e eram da corte,

nem eram mulheres. Então é nesse contexto de um país que vem com essa herança que

universaliza a educação básica praticamente. Traz para dentro do sistema uma

heterogeneidade enorme e encontra nesse sistema uma escola que é uma civilização em

camadas, uma escola onde está presente o século XVI, o XVII, o XVIII, o XIX e ela está entrando

no XXI trazendo ainda todo o ranço que ela herdou do colonialismo. Então é para este

momento que eu estou falando, acho que esse discurso poderia ser muito diferente em um

outro lugar e em um outro tempo, mesmo que fosse no Brasil.

Sobre o professor eu vou passar rápido, eu fiz só um apanhado. O que é que dizem os estudos

recentes feitos na educação? Primeiro de que a qualidade de um sistema de ensino se mede

não é pelo desempenho do aluno nem pelos prédios escolares, é pela qualidade de seus

professores. Nenhum sistema de ensino consegue ser melhor do que os professores que tem.

Isso é uma obviedade, mas que vale a pena a gente assumir como ponto de partida. O

investimento no professor é o mais sustentável e de melhor custo benefício que tem na

educação. Se eu invisto bem em um professor que está entrando no sistema, eu estou

investindo 25 anos vezes 35 alunos por ano. Embora o grande enfoque da gente seja sobre o

aluno porque é óbvio, ele é o último elo dessa cadeia e é o nosso objetivo, quem melhor

multiplica o esforço, o dinheiro, a emoção que eu vou colocar na educação é o professor. Nós

temos uma tendência a pensar mais no material do aluno, na situação do aluno. Eu estou

chamando aqui a atenção para o outro foco.

A variação na qualidade do professor, ela explica bem mais os resultados da avaliação externa

do que outros fatores que a gente considere mais charmosos ou politicamente corretos, por

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exemplo, é mais importante a diferença entre professores do que a diferença em números de

aluno por sala de aula para o rendimento. Eu quero dizer que um bom professor com mais

alunos é melhor do que um professor ruim com metade dos alunos que tem o bom professor.

Esses estudos todos têm dados, eu não coloquei aí porque acho que não é o caso. O professor

com curso superior é uma das variáveis que melhor alavanca o rendimento dos alunos. Um

professor com curso superior e um professor sem curso superior, o que tem curso superior faz

muita diferença, ou seja, vale a pena investir na educação superior dos professores. Mas o

curso de formação de professores de nível superior não apresenta nenhuma diferença, em

alguns casos, o desempenho do aluno é pior do que se ele tivesse feito o curso de formação.

Vocês viram ontem a experiência aqui que a Ana Gabriela apresentou sobre o Teach for

America, não é? No jantar até estávamos discutindo um pouco isso. Se eu tenho um

engenheiro que resolve ser professor e que tem uma boa formação em Ciências Exatas, o fato

de ele ter essa formação e querer ser professor já fala um pouco do compromisso dele. Então,

talvez seja por isso, que os estudos tanto do Brasil como de fora, dão este dado que é

surpreendente para muitos de nós. Ter curso superior é importante, ter curso superior de

formação de professor não faz diferença. O advogado, o assistente social, o engenheiro e os

licenciados em Matemática têm o desempenho. Você não nota diferença no desempenho

deles. Isto é para chamar a atenção da gente para o problema da formação do professor.

Por que então que, apesar de ser a principal solução, ainda é uma parte do nosso problema e

não é uma parte da nossa solução? A formação do professor. Eu vou ser bem provocadora e

vou dizer que tem 4 problemas. Primeiro lugar ela não sabe quem é, ela não tem identidade.

Isso é Brasil, hein? Ela é bicéfala, ela é esquizofrênica e ela é autista. E nós vamos passar por

essa agonia toda. Por que é que falta identidade à formação do professor? Desde a origem. O

Brasil não conseguiu ter uma instituição dedicada à formação de professor. Nunca! Só no

ensino de nível médio, na modalidade normal. Aí sim, o Brasil inteiro teve grandes escolas

normais. O Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro, o Caetano de Campos e o Padre

Anchieta em São Paulo, um grande colégio em Belo Horizonte, um grande colégio no Paraná...

As professoras que saíam de lá eram professoras de alta qualidade. Nunca conseguimos ter no

nível superior uma outra instituição. Tem uma longa história atrás disso. A história é do Afrânio

Peixoto querendo transformar o Instituto de Educação do Rio de Janeiro em Instituto Superior

de Educação, que seria formador de professor e estabeleceria uma referência para a formação

do professor no país inteiro. É tudo o que eu acho que nós precisamos, mas que naquele

momento, o projeto do Afrânio Peixoto não foi para frente por uma série de razões políticas e

predominou o modelo importado por São Paulo. São Paulo estava saindo da Revolução

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Constitucionalista perdendo com o rabo no vão das pernas e resolveu construir sua hegemonia

em cima do intelectual, que está correto, importou aquela missão francesa da qual fazia parte

Levi-Strauss. Que trouxe para cá o modelo da escola francesa. Qual é o modelo do sistema de

ensino francês? É o modelo da universidade e das grandes escolas de nível superior. O que é a

universidade? É o lugar onde se estuda Filosofia, Ciências e Letras. É daí que nós herdamos

esse nome. E o que são as grandes escolas? É o lugar onde se formam as pessoas que vão

trabalhar: o engenheiro, o médico, o professor, o advogado, o administrador de empresa, o

arquiteto. Nenhum desses se forma na universidade, modelo napoleônico. Então você tem a

Sorbonne, que é a Sorbonne onde se formam os filósofos, os bel-letrados, como a gente

costuma dizer, e os cientistas. O grande físico, o grande químico, o grande psicólogo está na

Sorbonne. Onde é que se forma o engenheiro que usa Física? Na Polyechnique, não é na

Sorbonne. E esta questão permeou o nascimento quase que da formação do professor no

Brasil. Por quê? Porque vindo o modelo da Sorbonne, não tinha mais condições de transformar

a escola Caetano de Campos no Instituto de Formação de Professores, logo incorporou a

formação de professores dentro da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras como um

subproduto da Filosofia, Ciências e Letras. Vocês lembram, provavelmente vários de vocês aqui

estudaram nessa época, você fazia quatro anos de bacharelado e um ano de licenciatura. Três

de bacharelado e um de licenciatura, o famoso modelo 3 + 1. O que é que acontece quando a

universidade se expande e vira essa coisa que ela virou no Brasil que é quase uma república

separada. Com toda a autonomia e etc. Cada um montou o seu feudo: Instituto de Geografia, a

Faculdade de Letras, o Instituto de Matemática, a Faculdade de Filosofia, o curso de História. E

nesse feudo é que começou a se formar os professores. Quando chegava na hora de ensinar

como ensinar, mandava para a Faculdade de Educação, onde ele iria aprender a ensinar uma

coisa que não tinha nada a ver com o que ele tinha aprendido. Então, do ponto de vista

epistemológico, esse corte, ele é fatal porque você separa o objeto de conhecimento do objeto

de ensino. E esse movimento de transformar o objeto de conhecimento em objeto de ensino,

de pegar a Física e tornar a Física a disciplina, a área de estudo que você tem na escola, este

caminho tem que ser feito concomitante, no paralelo. Porque é o mesmo caminho que faz o

médico quando ele tem que aprender a entubar alguém. Ele tem que aprender a entubar

alguém. Não adianta primeiro ele ter aula "anatomia do pescoço e etc." e, lá no fim do ano, no

fim do curso, no quarto ano, colocarem ele no pronto-socorro para entubar uma pessoa

porque ele não vai conseguir entubar com todo conhecimento que ele possa ter do que é o

aparelho da garganta onde ele vai enfiar aquele instrumento. Fazendo um paralelo, é mais ou

menos isso. O caso do médico deixa mais visível essas coisas.

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Então esta falta de instituição, falta de lugar institucional, gerou um curso que é separado por

toda a universidade, não tem um lugar que forma professor. Quando foi para formar o

professor que antes estava lá na escola normal, que dava certo, foi um bom projeto que o

Brasil teve, serviu os propósitos dele em um determinado momento, passa isso para o Ensino

Superior, foi depois da Lei 5692, tem toda uma história aí, onde vai por esse professor que tem

uma atuação multidisciplinar? Não tem onde por. Não dá para por na Geografia, não dá para

levar para o Instituto de Matemática, não dá para por na Faculdade de Letras. Põe onde? Na

Pedagogia. Mas a Pedagogia não tinha sido criada para formar professor. Então nós ficamos

com um sistema. Por isso a gente diz que ele não tem identidade, por quê? Porque você tem

um sistema onde você tem um professor que aprende conteúdo e não aprende a Pedagogia. E

você tem um professor que aprende a Pedagogia sem aprender o conteúdo e isto dá uma falta

de projeto pedagógico e de articulação muito grande na formação do professor. É isto que ela

não tem lugar na estrutura da universidade brasileira e ela acabou rejeitando por

contingências sua institucionalização mais recente através do ISE. É a segunda vez que o

Instituto Superior de Educação no Brasil é rechaçado e deixa de ser implantado. A primeira vez

com Afrânio Peixoto por conta de toda a circunstância histórica e agora porque, de repente, o

curso de Pedagogia se tornou o privilegiado da formação do professor de educação infantil e

do professor de primeira à quarta. Os próprios militantes da área da educação não quiseram

assumir o Instituto Superior da Educação como sendo lugar para a formação de professores. A

USP teve uma tentativa dessa interessante. Não sei quem de vocês lembra o nome da Carolina

A Carolina foi uma grande psicóloga experimentalista, ela morreu há pouco tempo, e

trabalhava em Brasília. Ela saiu de Brasília quando teve aquela limpeza na Universidade de

Brasília, a ditadura mandou todos os professores embora, a Carolina voltou para São Paulo e

ela quis montar uma escola, chamava Escola de Professores da Universidade de São Paulo.

Também não conseguiu, quem me relatou isso muito depois foi o Lobo, o Leal Lobo que é um

físico e que foi reitor da USP.

Bom, o bicefalismo dela vem exatamente disto. A sua falta de identidade faz com que ela

tenha duas cabeças. Então você pega professor de atuação multidisciplinar, põe na Pedagogia

onde você ensina os fundamentos da educação: História da Educação, Filosofia da Educação,

Sociologia da Educação, Psicologia da Educação, Planejamento Educacional, Teoria do

Currículo. Tudo isso ele aprende. Ele não aprende Língua Portuguesa. E não aprende mais

ainda gora porque ela sai de um curso médio muito ruim em termos de qualidade. Então ele

entra na escola com muito “pedagogês”, mas sem substância. E aí você pega o professor da

atuação disciplinar que só conhece a sua disciplina. Eventualmente ele conhece muito bem,

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mas ele conhece só aquilo. Aí você põe esses dois juntos, chacoalha bem e mandam eles

fazerem interdisciplinaridade na escola,e daí vem a dificuldade que a gente tem da

interdisciplinaridade. Por quê? Porque eles sequer estudaram debaixo do mesmo projeto

pedagógico. Mesmo que não fosse na mesma classe, que fosse em uma instituição onde

houvesse o mínimo de contato entre os professores.

Bom, a esquizofrenia. Ela também decorre dessa história. Por quê? Porque levou aqui o

professor de atuação disciplinar, a prática dele seja inteiramente alienada da sua formação

teórica. Ele estuda Geografia, depois ele vai estudar didática, mas ninguém vai dizer para ele

como é que pega aquele tópico de Geografia e como é que transforma em uma sequência

didática como é essa que a gente acabou de ver. Isso ele não vê. Ora, era para um trabalho

como esse que foi feito em Itaperuna, ser feito nos cursos de formação de professores. É lá

que é a hora de você aprender a fazer isso, depois você aperfeiçoa, você melhora, mas você já

sai da faculdade com alguma coisa. Não sai! Não sai da faculdade com nada que tenha a ver

com sequência didática por exemplo. E aí você separa inteiramente o que se ensina, do como

se ensina e dá essa enorme briga com conteúdo, com a Pedagogia.

Bom, autismo. É o pior deles. Por que é autista? Porque apesar de ser o principal insumo da

educação básica, não tem comunicação com a educação básica, tem uma questão inata do

ponto de vista institucional. Há pessoas maravilhosas que, obviamente, mantém essa relação,

fazem a ponte e que pelo menos levam para dentro da instituição. Mas a instituição não tem

nada a ver com a educação básica. Eu percebi isso de um jeito tão nítido no Conselho Nacional

de Educação. Reúnem os principais educadores do país que são aqueles tais, que estão no

conselho. Vamos fazer diretriz para a formação do professor da educação básica. Vamos!

Onde? “Ah, no ensino superior. O pessoal da educação básica não tem nada a ver”. Mas como

não tem nada a ver? Para conseguir no conselho que as diretrizes de formação do professor

fosse um projeto bicameral como a gente chama, ou seja, com a participação da educação

básica e do ensino superior, foi uma luta, foram várias sessões de discussão para convencer

uma criatura maravilhosa, que foi o melhor dentista da cidade dele, que foi o grande

catedrático de Odontologia, virou reitor de universidade federal. O que ele conhece da

educação básica, de repente é a dos filhos dele. Então ele quer regular a formação do

professor, ele quer discutir só entre eles se a formação do professor tem que ser 2 anos, 3

anos, como é que tem que ser a carga horária, o estágio. Trazer o grupo da educação básica

para a caixa foi um progresso bastante razoável. O nosso diálogo em um projeto bicameral

desse era um diálogo de surdos. Eles dizendo que a gente era um bando de pedagogo que

falava um monte de coisas que eles não entendem e a gente dizendo que eles têm que levar

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em consideração a relação entre teoria e prática. Relação entre teoria e prática? Exatamente o

que é isto? É, o que é isso para um cara que foi dentista e virou reitor da melhor universidade

federal do país? Porque ele é dentista, quer dizer, a universidade é o lugar das pessoas que

têm profissão, então eu não estou exigindo que ele seja mais do que um grande dentista para

ser reitor. Eu estou exigindo que ele lembre que a universidade dele não é um grande curso de

Odontologia. E assim a gente pode redobrar. Chegamos na hora de fazer as diretrizes

específicas. Fizemos uma geral, vamos fazer as específicas por disciplinas. Está bom, convoca

os especialistas de História. Lá vão os especialistas de História. Formação de professor? Por

quê? Por que vocês querem discutir a formação de professor? Vocês não estão contentes com

os professores de História? É um autismo. Isso é autismo. O que faz nesse país uma criatura

que faz curso de História sem ser professor? Gostaria de saber. Onde é que trabalha? Só pode

ser professor. E como é que pode ter um grupo de especialistas de História convocado pelo

MEC que diz “Ah, mas no nosso curso só forma historiador. A gente não forma professor. Nós

formamos um geógrafo". Tem interdisciplinaridade com Geografia? História e Geografia? "Ah,

mas isso é coisa de Estudos Sociais. Isso já ficou para trás". Não, não é. "Olha, já mudou",

sabe? O diálogo era nesse nível. Ou então era o diálogo com o pessoal de Artes que quer criar

o curso de balé. Ele quer criar licenciatura de balé, ele só está lá porque ele quer criar

licenciatura de balé. Ele não sabe onde esse professor vai trabalhar, ele não sabe se as escolas

têm instalação para fazer curso de balé, isso não interessa. Essa é a experiência do Conselho

Nacional de Educação, para vocês verem o quanto é alienado o ensino superior da educação

de base.

Ele é irresponsável pela aprendizagem de alunos que serão os responsáveis pela aprendizagem

dos alunos da educação básica. Quer dizer, muito difícil, mesmo no Conselho Nacional de

Educação, que a universidade se sinta formadora de professor. Eu sou professor do professor,

então eu tenho que fazer valer com ele aquilo que eu acho que ele tem que fazer valer com

seu aluno quando ele for formado. Porque ele não constitui capacidade de continuar

aprendendo, os seus alunos, e este aluno é alguém que tem a obrigação de desenvolver nos

seus alunos a capacidade para aprender segundo a lei, no artigo 32, ou a capacidade de

continuar aprendendo segundo a lei, no artigo 35. Não há nenhuma atividade nos cursos de

formação de professores. O último levantamento foi feito pela Bernadete da Fundação Carlos

Chagas, mas ele está no site da revista Nova Escola e da Fundação Vitor Civita. Não há uma

atividade de aprender a aprender nos cursos de formação de professor. Os professores que

chegaram lá já sabiam aprender. Tinham aprendido na educação básica porque eles vieram de

uma educação básica de altíssima qualidade. Aí a gente os põe na escola e fala para eles “Mas

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o seu aluno não está aprendendo a aprender”. Claro que o aluno dele não está aprendendo a

aprender. Ele não aprendeu. E ele não sabe ensinar.

Não leva em conta a experiência e o conhecimento prévio de seus alunos egressos da

educação básica e insiste que esses professores, no futuro, considerem a experiência prévia de

seus alunos. Ensina o que é zona proximal sem aplicar este conceito para ensiná-lo. Não há nos

cursos de formação de professor que eu conheço pelo menos, um diagnóstico do grupo que

está chegando para tentar entender qual é a história deste aluno. Por que é que ele fez

magistério? O que é que ele aprendeu na educação básica? Já trabalhou como professor? Qual

é a experiência que ele tem como professor? Para ver se eu posso regular o meu currículo.

Então fica uma coisa muito autista mesmo, quer dizer, totalmente separada. Porque eu faço

um discurso sobre a zona proximal, sobre o conhecimento prévio, etc. e ele sequer sabe que

não está usando isto com ele, porque ele não sabe o que é zona proximal e vai continuar sem

saber. Então ele lê Vigotsky. Outro dia eu estava entrevistando uma menina porque a Marisa

Lajolo assumiu a Secretaria da Educação de Atibaia e estava fazendo entrevistas e pediu para

eu ajudar a fazer as entrevistas. Eu estava fazendo as entrevistas, e uma menina que fez para

mim um discurso sobre o Batkin O Batkin é um linguista, não é isso? Acho que é linguista. Que

não tinha absolutamente nada a ver com a prática dela porque o Batkin é uma coisa muito

sofisticada. Ela aprendeu o Batkin em algum lugar, não é? Ou então o mais terrível que é a

menina de Pedagogia que eu vi, que ela dizia “Lá em Durkheim, em Durkheim não é assim”,

em Durkheim é diferente, em Durkheim...”. E eu descobri depois de entrar em um diálogo mais

próximo com ela que ela achava que Durkheim era o nome de uma cidade, por isso que ela

dizia "em Durkheim". Porque, provavelmente, a professora de Sociologia passou ali... Não, eu

me dei ao trabalho de ver depois. A professora de Sociologia daquela faculdade dava

Durkheim, Weber e Marx para economistas, administradores, psicólogos, em curso de

Pedagogia, no curso de História, no curso de Sociologia, era um curso que ela dava de

introdução à Sociologia. Introdução à Sociologia serve para qualquer modalidade. Do jeito que

ela dava Introdução à Sociologia para os professores, ela dava para os administradores de

empresa. É melhor então a gente ter um curso básico onde ainda nem sabe o que é que o

aluno vai fazer e a gente procura dar curso básico com outra característica.

Bom, emprega metodologias funcionalistas e frontais para ensinar metodologias cognitivistas,

construtivistas e ativas e é por isso que o nosso discurso sobre o construtivismo é vazio.

Nenhum de nós viveu o construtivismo. E nenhum de nós se deu ao trabalho de perguntar

para o nosso aluno da Pedagogia, de não sei onde, Como é que foi a sua escola? Como é que a

experiência que você traz da sua vida escolar? Não vamos esquecer, o magistério é a única

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profissão onde o exercício é a situação inversa da formação. Se eu formo um médico, ele

jamais será professor de Medicina, quer dizer, poderá até ser professor de Medicina, mas a

relação de trabalho que ele vai manter é uma relação médico-paciente de outra natureza.

Quando eu formo um professor, o aluno está aqui na minha frente, eu estou de professor,

amanhã ele está aqui no meu lugar. Então tudo aquilo que eu fizer com ele será uma

referência da atuação profissional dele, da prática dele. Então essa é uma questão séria que

implicaria em a gente mudar toda a metodologia de formação de professor, pelo menos, para

torná-la mais coerente, senão com nada, com as normas nacionais, com as diretrizes ou com

qualquer outra coisa. Mas não de aprender o que é parâmetro. Aprender o que é parâmetro é

fácil. Viver a metodologia e os princípios pedagógicos que estão nos parâmetros curriculares é

outra coisa.

E ela tem um autismo curricular seríssimo. Por quê? Porque o currículo da educação básica é

organizado por competências. A competência é um organizador curricular. A gente vai ver isso

um pouco melhor mais tarde. Então lá na competência, por exemplo, na proposta de São

Paulo, do Rio ou nos parâmetros, o aluno deve aprender a aplicar o conhecimento em

situações X. Ou, diz a lei, o aluno deve fazer a relação entre teoria e prática em cada disciplina

do currículo. Isso é artigo o 35, 36 da LDB. Como no caso da formação do professor, a gente

não acha que ele é aluno? E acha que ele nasceu sabendo fazer a relação entre teoria e

prática? A gente não ensina o professor a competência que ele tem que desenvolver no aluno

depois, então a gente não ensina o professor a fazer a relação entre teoria e prática. E depois o

coordenador pedagógico da escola dele vai cobrar isto dele. Acontece que a alienação é tão

grande, o autismo é tão profundo, que ele não percebe isso. Porque se ele percebesse, ele

deveria estrilar com isso. Se você agregar isto, que 90% desses professores pagaram pelos seus

cursos, porque eles vêm do ensino particular, eles vêm de uma esfera de regulação que não

tem nada a ver com a educação básica, quer dizer, se eu sou um secretário da educação, eu

não posso determinar como vai ser a formação dos professores da minha rede. Pelo menos

não a formação inicial porque a formação inicial responde a critérios que são do Ministério da

Educação no caso de privadas, ou que fazem parte da autonomia universitária, no caso das

universidades públicas, então eu não tenho a menor condição de fazer esta negociação com o

ensino superior de um perfil profissional. Um aluno não sabe que ele não recebeu. Então ele

faz de conta que ele entendeu o que você está dizendo para ele em sala de aula, por isso que

quando ele descobre que Durkheim é uma pessoa e uma corrente de pensamento e não é um

lugar, porque ele sequer percebeu que ele não sabia, porque até para a gente saber que a

gente não sabe, a gente tem que ter algum nível de conhecimento e de metacognição. Se não

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tiver essa metacognição a gente não sabe que não sabe. Aliás, dizem que o sábio é aquele que

sabe que sabe, não é? Nós temos que mudar essa situação, por isso que eu fico fazendo estas

provocações, parecendo uma rebelde meio sem causa, mas enfim. Quais são as tarefas? São

enormes! A questão da formação do professor eu acredito que é, não só a mais séria, como a

mais difícil que nós vamos encontrar. Por quê? Porque ela envolve duas esferas de governo,

dois níveis de regulação, muito sindicato, muito interesse privado (por causa da iniciativa

privada mesmo no ensino) e uma iniciativa privada que tem um acordo de cavalheiros com a

universidade pública: vocês não abrem vaga e dão um ensino de excelência, deixam a massa

para a gente, que a gente sapeca qualquer coisa para eles. De modo que todos nós somos

cúmplices, como disse o Sartre sobre a Simone de Beauvoir. Metade vítima sim, mas metade

cúmplice, a mulher também, quando ele falou sobre o livro dela, da condição feminina. Nós

somos todos cúmplices, os que estamos no ensino particular, de um jeito, os que estamos no

ensino público, de outro.

No plano normativo o que é que temos que fazer? Nós temos que consolidar, complementar e

construir algum consenso sobre o paradigma curricular prescrito pela LDB para a educação

básica e, portanto, ser refletido no paradigma curricular de formação do professor. Nós não

podemos mais continuar formando um professor num currículo totalmente disciplinarista para

depois praticar a interdisciplinaridade. Porque o trabalho que vai dar para desfazer e refazer o

caminho para a interdisciplinaridade poderia ter sido economizado lá, quando o aluno chega

verdinho no primeiro ano do curso, com a cabeça aberta para receber outras propostas. Além

disso, nos últimos anos, em função de divergências, algumas procedentes, outras, na minha

opinião, totalmente levianas, várias legislações conflitivas foram feitas. Então você tinha uma

legislação que regulava os institutos superiores de educação e os cursos normais superiores.

Saiu aquele grupo do conselho, entrou o grupo da Pedagogia, que fez outra regulação, que são

os pareceres da Pedagogia, que desfazem mas não revoga aquilo que estava, então hoje em

dia a gente não sabe o que é que está valendo, porque convivem regulações diferentes. Nós

tentamos ainda no finalzinho da gestão do Fernando Henrique, quando estava para trocar o

grupo do conselho, eu e o professor Arthur Fonseca, queríamos fazer uma consolidação da

legislação sobre a formação de professores, até para se ter uma certa orientação. Nem isso foi

possível fazer. Acontecem coisas fantásticas nessa área. Durante 1 ano o MEC produziu um

enorme projeto para a formação de professores à distância com uma escola nacional de

formação de professores porque esta era uma promessa que o Fernando Henrique fez para o

Darcy Ribeiro no leito de morte. Vocês lembram como era o Darcy, não é? O Darcy deve ter

dito para ele “Se você não fizer eu venho puxar o teu pé”. Tanto que assim que quando o

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Darcy morreu, ele criou o grupo de trabalho, arrumou dinheiro e a gente fez. Desapareceu

dentro do conselho. Eu nunca consegui achar. Eu cheguei a entrar em sala e ficar abrindo as

gavetas para ver onde estava. Ninguém sabe onde está isso. Ninguém sabe onde estão as

diretrizes para a carreira do professor que foram aprovadas. Se você entra no site do conselho

este parecer não tem. Quer dizer, são coisas que são inexplicáveis. Nós não podemos

continuar legislando sobre professor desse jeito.

No plano da gestão, nós precisamos alinhar a formação do professor com as competências e

habilidades que os alunos da educação básica têm que constituir. Todos os estudos sobre

como é eficaz formar o professor, inicial ou em serviço, dizem: o melhor modo, e eu repito, o

melhor modo, no Brasil, neste momento, de formar professor seria pegar o currículo da

educação básica do Rio de Janeiro e dizer “Aqui no Rio de Janeiro estas são as competências,

habilidades, inteligências, conhecimentos a constituir. Os professores serão formados para

usar este currículo”. Não é o currículo nem de Marte nem de São Paulo nem do Rio Grande do

Sul. É este que existe aqui porque nós temos que ir a um país como este. Se nós tivermos um

currículo nacional, aí teremos outra ordem de coisas. Nós vamos ter que rever o federalismo e

entramos em outras esferas. Mas enquanto for assim, as diretrizes curriculares nacionais não

dizem nada de currículo. Elas dão grandes princípios filosóficos, pedagógicos. O currículo é

muito mais do que isso, inclusive, eu acho que na exposição da Ana, hoje cedo, ficou muito

claro: o currículo tem a ver com a disciplina, se vai ser por disciplina, se vai ser por área de

estudo, se tem sequência didática, se não tem, se é mais diretivo, se é menos diretivo. Muitas

opções são possíveis nisso. A gente tem que ser muito fléxivel do ponto de vista teórico

porque nós estamos numa área que não é ciência exata. Não dá para a gente dizer: só tem

esta solução. Agora tem que ter uma, e esta uma tem que estar abraçada por todo o mundo.

Provavelmente, acho que o Claudio deve estar coberto de razão quando diz que tem que ser

comprada por um conjunto maior de professores da rede, tudo bem. Essa é uma estratégia já

de elaboração e implementação, mas a decisão política de ter um currículo é da gestão. Os

professores por si só não vão se reunir e elaborar um currículo. Alguém terá que tomar essa

decisão porque essa decisão é política, é da liderança. Eu vejo, inclusive, que essa é uma

decisão do governador. Ela não deveria nem ser uma decisão do Secretário da Educação

porque ela tem a ver com a identidade regional, com identidade nacional, com o papel que

esse estado tem no conjunto da federação, com aquilo que a gente quer para o Brasil no

conjunto das nações no mundo de hoje. Enfim, são questões que são muito maiores até do

que o âmbito da própria Secretaria da Educação, então ter um currículo é fundamental e,

neste momento, vem a minha opinião pessoal, ter um currículo detalhado, onde o professor

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possa encontrar uma sequência didática como esta, que ele saiba como é que ele vai fazer

amanhã, porque amanhã ele tem que entrar na sala de aula e eu tenho que estar respondendo

pela aprendizagem do João amanhã. Eu não posso estar respondendo pela aprendizagem do

João que vai estar aqui nesta carteira daqui a 5 anos quando este professor estiver mais

preparado. Em termos de política pública, tem dois ritmos que eu tenho que articular. Eu

tenho o ritmo do amadurecimento do professor, das grandes mudanças da educação, mas eu

tenho o ritmo da criança. Eu não posso continuar perdendo gerações e gerações... Por isso que

eu gosto muito da abordagem que, por exemplo, a Lina de manhã fez. Por quê? Porque é uma

abordagem que, primeiro de tudo, nós temos o compromisso com a aprendizagem da criança

hoje! Hoje nós temos matriculadas na educação básica quase 50 milhões de almas! É muita

gente! Depende delas o futuro que esse país vai ter. Então eu não posso dizer assim “O

professor tem que se formar.” Não! Hoje eu mando dizer para ele “Faz assim”! E eu não tenho

nenhum pudor se eu tiver que dizer isso e dar o passo a passo com a receitinha. Até que ele,

de tanto fazer a receita, começa a inventar. Que é o que a gente faz. A gente faz uma vez uma

receita, a outra vez a gente põe menos sal, na outra vez a gente resolve botar um pouquinho

de limão porque o vinagre não ficou bom. O mundo é assim. O outro dia, por acaso me

perguntaram “Ah, mas você acha que tem receita pronta para professor”? Não tem! Tem

receita feita. Eu faço uma vez depois eu mudo, não é? Por isso mesmo, eu vejo os alunos todo

o dia durante um ano, depois todos os anos durante a educação básica e tenho tempo de

consertar o desastre que eu eventualmente venha a cometer. É melhor do que não ter atuação

nenhuma.

No plano das instituições formadoras, nós temos que abrir um espaço para o protagonismo da

gestão da educação básica. Se não for das escolas, pelo menos dos organismos de gestão

intermediária das secretarias: órgãos de orientação pedagógica, etc. Tem que perder o pudor e

tem que sentar com a educação superior e dizer “Olha, o professor que nós queremos não é

esse que vocês estão colocando no mercado. O que vocês estão colocando no mercado não

nos serve”. E o pior: eu não tenho alternativa. Eu tenho que usar esse professor porque falta

professor. Esse é um mercado de trabalho que entra crise, sai crise, não tem desemprego, não

é? É um mercado de trabalho que ocupa todo o mundo. Portanto nós temos que regular esse

mercado por outro jeito porque na competição não vai dar. Eu acho que tem que ser com as

instituições formadoras.

No plano da concepção e da formulação, nós precisamos de mais estudos sobre currículo,

sobre formação de professor, sobre compatibilização entre essas duas coisas. Nós temos que

nos apropriar do estágio probatório. Existe essa figura. Vocês conhecem? O estágio probatório,

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que hoje não serve para nada e que é uma oportunidade que as secretarias estaduais e

municipais têm de colocar, de tentar elaborar outro perfil para esse professor. Porque ele saiu

do ensino superior e está entrando no magistério. O estágio probatório é exatamente o

período que ele fica em observação. Aliás, estou ajudando o Claudio, em se pensar num

projeto, para ver se dá para pensar num estágio probatório de outra natureza, com residência

pedagógica, etc. Esse negócio do estágio probatório é muito interessante porque imaginem se

a gente pegasse um médico recém-formado e jogasse numa sala de cirurgia. Não quer um

médico? Pega um piloto de avião. Ele acabou o treinamento dele nesse novo Boeing. Põe ele

sozinho para pilotar. Quem faz isto? Quem andaria nesse Boeing? Quem moraria num edifício

que foi calculado, cuja estrutura foi calculada por um menino que acabou de sair do curso de

engenharia? Nem pode, por lei. Ele só pode assinar planta, ser responsável pelos cálculos de

uma planta, depois de certo tempo de registo no CREA. O professor é o único, que sai verdinho

do curso de formação e é jogado de paraquedas no segundo ano de Física noturno. Nem isto

da gente tentar ver, pelo menos antes dele começar, se dá para recuperar alguma coisa, a

gente faz, não é? O estágio probatório é formal. Eu só descobri que ele existia quando fui

secretária. Porque eu acho que se eu não tivesse sido secretária eu nem sabia que existia o tal

estágio probatório porque é automático. Entra, passa o estágio probatório e ficam efetivos,

ninguém sabe.

Nós precisamos de muita coragem política para mexer na carreira, não vou falar disso agora.

Porque a carreira do professor, por outro lado, como ninguém dá bola para a formação dele,

na verdade eu acho que nós tratamos os nossos professores muito pior do que eles tratam os

alunos deles, muito pior. Com muito menos respeito do que o que eles têm com os alunos

deles. Não respeitamos a diversidade, não respeitamos o conhecimento prévio, não

respeitamos as condições em que ele foi educado antes, a experiência, a vivência que ele tem

de sala de aula como aluno, não é? Façam essa experiência se vocês derem aulas em curso de

magistério. Peçam no primeiro dia para eles chegarem e fazerem um uniforme, um relato de

como foi a vida escolar deles: quem foi o professor que me impressionou mais, como é que era

a minha escola? É muito interessante, dá coisas muito interessantes.

Aqui eu coloquei, assim, alguns elementos para formular um projeto pedagógico de formação

de professor. É esse aqui, abordagem por competências para além do debate. É esse que está

naquele livro que eu falei. O livro é organizado por outro, mas esse foi o artigo que eu mais me

baseei.

A competência. Eu acho que a gente precisava estar discutindo um pouco mais o que é que é

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esse negócio da competência porque a gente tem confusões aí. Competência, habilidade. Eu

não vou resolver, mas vou dar alguns alinhamentos que talvez sejam úteis. A ideia de

competência evolui de pedagogias anteriores que eram baseadas em outras concepções de

conhecimento com as suas possíveis implicações para o currículo e para o ensino. Você teve a

tradição dos grandes pensadores. Um classicismo antigo e medieval, onde o currículo, se é que

ele era formalizado deste jeito, na verdade, era o contato, a familiaridade, a leitura, a

interpretação e o comentário dos grandes textos, dos grandes pensadores. Aí nós temos toda

a tradição da antiguidade. O currículo era identificar esses textos fundadores, digamos assim,

ensinar seria guiar o aluno nesse percurso ou na crítica a esse percurso, como fazia o Sócrates,

por exemplo e é um momento de primazia da filosofia mesmo e das letras. Você tem depois

como grande demarcação o modernismo clássico que é basicamente o enciclopedismo, onde o

conhecimento é o conjunto dos saberes legitimados pela comunidade científica, pela

inteligência de uma nação ou de um grupo social. Houve momentos em que o conhecimento

era aquilo que estava na enciclopédia. O Iluminismo. O currículo era melhor, na verdade ele

era um programa que seria a seleção desses saberes e os diferentes estágios de aprendizagem.

Ensinar seria basicamente transmitir e é o momento em que você tem a primazia da

Matemática que começa das ciências naturais. E o modernismo científico experimental que

começa quando as ciências humanas começam a se afirmar como ciências propriamente ditas.

Onde conhecer é, sobretudo, ter formas de transformar um conceito numa coisa observável.

Conhecimento só é válido se ele puder ser visto, se ele puder ser tocado, avaliado, etc.

Basicamente é o momento de predominância do Behaviorismo e de todas as abordagens,

digamos, mais funcionalistas da aprendizagem. Ensinar é aplicar a pedagogia do domínio, que

seria traduzir o conhecimento em comportamentos cada vez menores. E o currículo não é mais

uma lista de conteúdos porque não é suficiente você saber. Você tem que saber fazer para que

seja visto. Está aí o Bruner, o Thorndike, o grande Behaviorista Skinner e as competências

estariam neste, que é uma evolução super grosseira que está aí, mas enfim, que dá uma

orientação, no pós-modernismo já, quer dizer, a abordagem por competência, a organização

do currículo por competências ela é bastante recente, porque ela não é aquela organização

dos objetivos observáveis, dos comportamentos observáveis. Não! Quer dizer, ela nasce de

muitas críticas diferentes que foram feitas às abordagens anteriores. Vem uma crítica forte do

Cognitivismo, do Piagetianismo, os pedagogos de um modo geral, os socioconstrutivistas,

inclusive, são tendências muito diferentes entre si, todas elas contrárias à tradição

funcionalista, behaviorista, experimental. E ela também nasce, ela se associa desde muito cedo

com a educação profissional porque é na educação profissional que você precisa transformar

os conhecimentos não apenas em coisas observáveis mas em ações onde o indivíduo entre de

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modo pertinente dentro de uma situação e consiga usar os conhecimentos como recursos,

agora não mais como simplesmente reprodução ou como transformação de coisas

observáveis.

Conhecer não é apenas dominar os saberes e o saber fazer observáveis e avaliáveis, mas é ser

capaz de mobilizar de modo pertinente para resolver situações, problemas ou tarefas

complexas. Pela primeira vez a questão educacional passa a ser situacional também, quer

dizer, você tem que ter um ensino onde a situação de aprendizagem permita mobilizar os

conhecimentos e resolver um problema ou executar uma tarefa complexa ou produzir alguma

coisa, seja um texto, uma maquete, um projeto, e eventualmente até interferir mesmo, e por

isso é que com esta abordagem, que não é a abordagem dos ‘skills behavioristas’, com esta

abordagem começa a surgir também o ensino por projetos, o ensino por soluções de

problemas. Que seriam já os desdobramentos metodológicos desta visão. O currículo se

organiza a partir de situações ou tarefas que o educando terá que resolver. Obviamente esta

abordagem já nasce rompida com o disciplinarismo porque no momento em que você está

pensando na situação e na resolução de tarefas ou de problemas, você não consegue muito

espremer isso ou limitar isso a uma única disciplina. Em geral as situações são complexas! E

por serem complexas, elas envolvem recursos que vêm das diferentes disciplinas. Esse livro

que eu utilizei é bastante interessante porque depois disso ele vai entrar em toda a discussão

de como você compatibiliza a lógica das competências com a lógica das disciplinas e que dá

indicações bastante interessantes da compatibilidade disso ou não. Em alguns casos não. O

que emerge, o que eu vejo que é um passo para a frente, inclusive, da abordagem das

competências é aquilo que hoje na Europa e nos Estados Unidos se está falando muito que são

as competências do século XXI. Por quê? Porque ao mesmo tempo em que o pós-modernismo

facilita a emergência de um currículo por competências e situacional, ele também se dá num

momento em que a revolução tecnológica produz mudanças muito profundas na sociedade e

onde o acesso à informação começa a ficar cada vez mais massificado, etc., e que você tem

uma sociedade do conhecimento onde a questão de lidar com a informação torna o continuar

a aprendendo e a autonomia a coisa talvez mais importante, que é o que nos Estados Unidos

eles chamam de “long life skills”, as competências que você vai usar para toda a sua vida.

Quais são as competências que você vai usar para toda a sua vida? Capacidade de resolver

problemas, a capacidade de lidar com a informação, de continuar aprendendo, de trabalhar

em grupo, de se comunicar com os outros, que não são competências de uma área do

conhecimento. Você trabalha com elas em todas as disciplinas. E isso dá uma lógica diferente

da lógica das disciplinas no currículo. E essas são as novas competências, ou as competências

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do século XXI, que na verdade, elas têm que estar colocadas pelos nossos alunos hoje. Quer

dizer, este país do qual nós estamos falando é um país, que além de ter universalizado a

educação básica, ou está a caminho da universalização, é um país que incorporou grandes

massas ao mercado de trabalho, ao mercado de consumo nos últimos 10, 15 anos e que

precisa para merecer mesmo sentar lá com os 20 e se dizer emergente, o que falta para o

Brasil, sobretudo, é educação. E não é qualquer educação mais. Porque nós estamos no

momento de massificar uma educação, mas não é mais a educação do experimentalismo, já é

esta educação, de você municiar o aluno com competências que permitam a ele continuar

sobrevivendo, já que a perspectiva é que daqui a 30 anos o conhecimento vai mudar a cada

dois, três meses. Quer dizer as profissões que os alunos que estão entrando na escola hoje vão

ter ainda não existem, muitas delas. Quer dizer, o ritmo da mudança está acelerado demais

para a gente continuar acreditando naquele currículo que só depositava informação e

armazenava para o indivíduo devolver como era, ele tem que estar pensando em outro tipo de

competência e habilidade. É outro mercado de trabalho! Os desafios são esses: complexidade,

a constituição e exercício da cidadania é diferente, quer dizer, ser cidadão hoje implica

dominar conhecimentos que os nossos avós nunca precisaram dominar. Quais dos nossos avós

contavam as calorias na hora que iam comer? Hoje você controlar as calorias é parte da

cidadania porque cidadania começa pelo seu corpo. Se você não sabe cuidar do seu corpo,

você não sabe cuidar do ambiente, você não sabe cuidar dos outros lugares. É uma coisa que

está aqui, que está posta, não é? O mercado de trabalho é incerto, é imprevisível, competitivo

e em constante mutação. Nós substituímos toda a base da pirâmide produtiva por processos

automatizados e deixamos uma grande massa de pessoas que precisam ser reeducadas para

assumir postos mais avançados. A nossa competitividade no futuro depende da gente ter mais

gerentes, mais pessoas que concebem, mais pessoas que lideram, do que pessoas que

apertam parafusos, já não precisamos mais, quer dizer, nem chegamos a precisar, porque

quando nós começamos a entrar numa fase mesmo de industrialização acelerada, o mundo já

estava no pós-industrialismo. Então a gente está realmente enfrentando outro paradigma de

desenvolvimento, com novas formas de produzir, acumular, investir, distribuir, consumir,

enfim. Quais seriam os pré-requisitos para você ter um currículo por competências para os

professores? Em primeiro lugar nós temos que ter um acordo nacional sobre o perfil de bom

professor. Se não for nacional, pelo menos estadual. Não é possível que este país não tenha o

mínimo de unidade ao pensar. O Chile acabou de fazer a guia do bom ensino. “La guía de la

buena enseñanza”. Está bom, o Chile é pequenininho, sim. Mas o Chile é do tamanho do Rio

de Janeiro. Se não dá para fazer no Brasil, dá para fazer aqui, ou dava para fazer em São Paulo,

ou dava para fazer num município. O que não pode é não ter nada. Então cada um forma o

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professor do jeito que quer, como quer ou não forma. Também ninguém sabe o que é um bom

professor ou o que é um mau professor, e continuamos assim.

A elaboração de currículos pelos sistemas de ensino público ou privados nos macros das LDB’s

e das DCN’s. As LDB’s e DCN’s são diretrizes. Quer dizer, propostas curriculares como esta que

foram feitas aqui, as que estão sendo feitas em São Paulo e devem estar sendo feitas outros

lugares é urgente. Nós vivemos um período de vácuo curricular porque achamos que os

parâmetros eram suficientes. Não são! Eu mesma percebi logo porque estava na Nova Escola,

já fiz os parâmetros fáceis de entender. Até ontem o Nigel falou disso. É porque todo o mundo

pegava porque aquele tijolos de 14 volumes, não havia professor que desse conta de ler,

correto? Mas não é bem na Nova Escola que nós vamos fazer o currículo nacional. Nós

precisávamos de outras coisas e isso não teve. Aquilo que eu fiz na Nova Escola devia ter sido

iniciativa das várias prefeituras, estados, quer dizer, vamos pegar esses parâmetros e vamos

ver aqui o que é que quer dizer porque aí é que nós vamos ver como vamos fazer a

aprendizagem contexto. Eu não posso pular das diretrizes para a solidão no interior de

Pernambuco e dizer “Façam a aprendizagem contexto”. Quer dizer, como é que você

contextualiza? Você tem que ter mediações para conseguir contextualizar. Então assim, na

elaboração de currículo pelos sistemas de ensino privados, você tem as competências para

aprender, tem que continuar. Em São Paulo, por exemplo, a gente manteve as competências

do ENEM. Essas competências são transversais, todas as disciplinas são obrigatória que elas

trabalhem as 5 competências do ENEM. As competências em nível de disciplina, os conteúdos

que devem servir à constituição dessas competências e as metodologias para tratar os

conteúdos de modo a serem disponíveis para serem utilizados pelos alunos. É basicamente

isso que as propostas curriculares têm que dar conta. E aí você tem como você vai alinhar a

formação do professor na primeira aula de didática deveria ser, ler a proposta curricular do

estado, do município onde eu vou trabalhar. Até hoje na USP tem um exemplar dos

parâmetros na biblioteca da Pedagogia se vocês quiserem saber. Na Pedagogia da USP. Por

quê? “Ah, mas os parâmetros, os parâmetros, isso é coisa do MEC, das escolas, aqui é outra

coisa”. Não é? É assim que funcionam as cabeças. Se as competências e habilidades do ENEM

forem as aprendizagens esperadas na educação básica, como é que deve ser a formação do

professor? Como é que eu formo um professor para dar conta de formar um aluno que tem as

competências do ENEM? Primeiro de tudo ele tem que ter as competências do ENEM. Acho

que é uma coisa mais ou menos óbvia. Se ele não souber formular questões, formular

propostas de intervenção solidária na realidade, fica muito bonito ali na competência do

ENEM. Ele não vai ensinar o aluno dele. Pode ser outras, agora tem que ser uma. Quais seriam

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os princípios pedagógicos? Os mesmos que a gente prega nas escolas para eles seguirem com

os alunos deles. Partir do conhecimento prévio do aluno. Sempre quando eu faço isso, assim,

do aluno, entre vírgulas, professor informação. E para lembrar o aluno do qual eu estou

falando é o meu aluno, o professor, não o aluno da educação básica. Ele constituiu as

competências da educação básica, ele aprendeu a aprender, são coisas que nós temos que

descobrir. Definir as competências que o aluno terá que constituir como professor, gerar e

apurar o estudo de disciplina, não é de disciplina Física, Química, Matemática, mas é de

disciplina do curso de formação do professor. Porque o currículo do curso de formação do

professor tem que ser organizado com a mesma lógica do currículo da educação básica. E nós

não temos nas faculdades equipes que sentem e pensem o currículo do curso de formação

integradamente, Ana. Eu não sei aqui se eu estou falando coisas que não se aplicam, mas eu

não conheço. Eu já vivi experiências de alunos de Geografia, História, etc. que se unem e

convidam a gente para falar como deveria ser uma licenciatura integrada porque eles não

conseguem dialogar no curso de Geografia, com seus professores, no curso de História com

seus professores. Aí sim nós temos que selecionar os conteúdos curriculares necessários para

essas competências na formação do professor. Aí a gente tem que ver que sentido tem dar

Durkheim, Weber e Marx para um professor, para um aluno que será professor. Eu acho que

tem, mas não acho que é cuspindo Durkheim, Weber e Marx em cima deles. Se for para cuspir,

é melhor eu mandar ele descansar em casa. Ele pelo menos não dá o vexame de achar que

Durheim é o nome de um lugar, não é? Então, se você for dar aula de Psicologia para um

professor, o que é que a Psicologia...? Quer dizer, se nós estamos falando que a teoria do

currículo para a educação básica é isso tudo que a Ana diz. Tem que levar em conta a

diversidade. Tem que levar em conta o significado das coisas, para o professor vale a mesma

coisa. Quando o professor vai continuar sempre no faça o que eu mando e não faça o que eu

faço? Nós temos que transversalizar, na minha opinião, as competências de leitura e escrita

por todas as áreas de estudo. Dos professores! Quer dizer, em Sociologia, ele vai

transversalizar. Em didática, ele tem que transversalizar isso. E os professores do curso têm

que ser responsáveis por formar professores que pelo menos, saibam produzir um pequeno

texto. Saibam fazer uma pequena exposição, simples, não é? E isso não é responsabilidade dos

cursos de Letras. Isso é responsabilidade da didática, da Psicologia, da Filosofia, ou das

disciplinas específicas de Física, Química, Matemática, que eu não conheço, mas que também

deveriam estar solidárias nisso.

Nunca dissociar o estudo dos conteúdos curriculares a serem ensinados da transposição

didática. Nunca! Nós estamos começando tudo errado. Desde o primeiro dia de aula, o

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professor chegou ao curso de Biologia, a primeira coisa que ele fizer, se é um curso para ser

professor, ele vai ver o conteúdo e a transposição didática. Desde o primeiro dia. Da mesma

forma que no curso de Medicina, desde o primeiro dia, ele vai para o pronto-socorro, ele vai

com o médico para o hospital nem que seja para segurar a maletinha do médico. Ele começa a

penetrar na cultura institucional onde ele vai atuar e a assumir definitivamente essa de

processos, ou seja, eu estou formando um aluno que será um professor e, portanto, eu tenho

que fazer com ele aquilo que eu digo que ele tem que fazer com o aluno dele.

Aí nós podemos colocar as questões metodológicas, quer dizer, situações problema, atividades

por projetos, contextualização, interdisciplinaridade, tudo isso será muito importante se eu

tiver este currículo.

Muito obrigada!