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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO GISELE GOMES DE ALMEIDA SENTIDOS COMPARTILHADOS SOBRE O COLÉGIO DE APLICAÇÃO DA UFPE: UM ESTUDO COM PAIS E ESTUDANTES RECIFE 2014

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Page 1: GISELE GOMES DE ALMEIDA - UFPE Gisele... · ainda, que habitus semelhantes produzem estratégias semelhantes para acessar o espaço social pretendido. Nos sentidos compartilhados

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

GISELE GOMES DE ALMEIDA

SENTIDOS COMPARTILHADOS SOBRE O COLÉGIO DE APLICAÇÃO DA UFPE:

UM ESTUDO COM PAIS E ESTUDANTES

RECIFE

2014

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GISELE GOMES DE ALMEIDA

SENTIDOS COMPARTILHADOS SOBRE O COLÉGIO DE APLICAÇÃO DA UFPE:

UM ESTUDO COM PAIS E ESTUDANTES

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós Graduação em Educação da

Universidade Federal de Pernambuco como

requisito parcial para obtenção do grau de

Mestre em Educação.

Orientadora: Profª. Drª. Laêda Bezerra Machado.

RECIFE

2014

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Catalogação na fonte

Bibliotecária Andréia Alcântara, CRB-4/1460

A444s Almeida, Gisele Gomes de.

Sentidos compartilhados sobre o Colégio de Aplicação da UFPE:

um estudo com pais e estudantes / Gisele Gomes de Almeida. – Recife:

O autor, 2014.

285 f. ; 30 cm.

Orientadora: Laêda Bezerra Machado.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Pernambuco, CE. Programa de Pós-graduação em Educação, 2014.

Inclui Referências e Apêndices.

1. Representações sociais. 2. Colégio de Aplicação - UFPE.

3. UFPE - Pós-graduação. I. Machado, Laêda Bezerra. II. Título.

302 CDD (22. ed.) E (CE2014-59)

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

GISELE GOMES DE ALMEIDA

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

TÍTULO: SENTIDOS COMPARTILHADOS SOBRE O COLÉGIO DE APLICAÇÃO

DA UFPE: UM ESTUDO COM PAIS E ESTUDANTES

COMISSÃO ORGANIZADORA

MENÇÃO DE APROVAÇÃO: APROVADA

Recife, 27 de Junho de 2014

____________________________________

Profª. Drª. Laêda Bezerra Machado

1ª Examinadora/ Presidente

____________________________________

Profª. Drª. Lia Matos Brito de Albuquerque

2ª Examinadora

____________________________________

Profº. Drº. José Batista Neto

3ª Examinador

____________________________________

Profª. Drª. Daniela Maria Ferreira

4ª Examinadora

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Dedico à minha avó Euridice Almeida que me ensinou a

não desistir

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AGRADECIMENTOS

Certa vez, no Central, um amigo me sai com uma dessas: “O homem mais

fantástico do mundo não foi aquele que inventou a lâmpada, mas o que inventou a

gratidão”. O Embaixador estava certo. Agradecer é um dos atos mais lindos que se

pratica em vida. É o momento de dizer ao outro que você só conseguiu porque ele

esteve ali. É dar-lhe destaque no seu caminhar.

Toda pessoa sempre é as marcas

Das lições diárias de outras tantas pessoas

E é tão bonito quando a gente entende

Que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá

E é tão bonito quando a gente sente

Que nunca está sozinho por mais que pense estar

Gonzaguinha

Sou imensamente grata a minha avó, Dona Linda. Sim, esta é a mulher mais

linda que conheci.A companhia da Baronesa nos cafés da manhã me deram todo o

gás que eu precisava para produzir. És a mulher de cabelos brancos mais moderna

que conheço, o exemplo mais puro e simples de força, solidariedade, humanidade e

doação.

À minha mãe, irmã mais nova, Gilda- por ter me permitido ser. Pela teimosia,

ousadia e força que compõem o meu DNA, pelo empenho em torna-me alguém

melhor, pelo amor a mim dedicado.

À minha grande família (Branca, Greice, Zé Carlos, Gel, Graça, Lu, Érica, Lili,

Ninho, Vivi, Luca, Chico, Lala, Malu, Edmilson), aqueles que sempre me

compreenderam e impulsionaram. Saibam que vocês têm uma fé em mim que

muitas vezes me falta; eu não seria tão ousada se vocês não tivessem me permitido

ser.

À Xis por chegar na minha vida com o que tinha de melhor. Admiro tua

capacidade de sacudir, confundir, permitir. Obrigada pelo companheirismo de todos

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os dias e por me ajudar a atravessar, Janeiro, Fevereiro, Março... o mestrado e a

vida sem desanimar. És minha mais profunda referência afetiva.

À Doctor Ana Amélia de Carvalho Coelho por todo apoio, consideração,

carinho e incentivo. Num mundo de soluções fáceis e “combinadinhos” teus

exemplos diários de honestidade são atos revolucionários.

À Daniela Maria Ferreira (Dani) por ser quem é. Pela escuta atenta, pelas

considerações e colocações sempre tão geniais e por todo o carinho que demonstra

ter por mim. Por ter sido a inspiração primeira dessa pesquisa, por me apresentar

Bourdieu e seu prazer irrefreável.

Sou grata a Laêda Bezerra Machado, por todas as experiências que nossa

parceria nos proporcionou. Sou grata pelas lições diárias de coerência, paciência e

dedicação. Agradeço por ter aguçado minha vontade de ir além. Por olhar cada uma

de suas orientandas com cuidado, tratando-as em suas diferenças. És uma

profissional dedicada e uma pessoa linda, uma figura que vale a pena conhecer e

conviver. Os que vivem em tua companhia carregam um que de mais feliz e

conhecem um exemplo de civilidade e humanidade em seu grau máximo.

À Aldenize Ferreira de Lima, protagonista das minhas melhores lembranças.

Que tem sentimentos tão bons dentro de si, que as vezes eu nem sei se, de fato, ela

existe ou é uma invenção minha para sobreviver a esse mundo no qual nos

deparamos com pessoas tão cruéis.

Sou grata a Adalgisa Leão por me servir de inspiração. Por ser a figura mais

genial que já conheci. Tua segurança, miúda leonina gigante, muitas vezes foi porto

para eu me assegurar também. Agradeço as inúmeras discussões travadas em

torno dos nossos projetos, os momentos de cuidado, os finais de semana de

passeios gastronômicos,os cafés, o companheirismo nos estudos e, sobretudo, na

vida.

À D. Denize Filha pela sinceridade no olhar e nas palavras. Sou grata por

nossos momentos juntas que sempre me dizem “seja leve e releve!”.

Aos meus amigos da graduação e do mestrado Aldenize Lima, Adalgisa Leão,

Cleiton Barros, Juliana Lima e Silvinha Rodrigues. Estamos caminhando lindamente-

poderíamos ser tudo que somos em separado, mas somos juntos – e isso é muito

bom!

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Ao Embaixador e sua nobre família (Pipa, Marina, Tom, José, Sun, Dani e

Dona Fifi)- o meu muito obrigado pela presença constante. É lindo saber que um

atlântico não é o suficiente para nos separar, a vida precisa ousar mais que um

simples golpe de distância geográfica.

À Dra. B. Manzi, figura ilustre, alegre e diferente como Chanel.

Ao Grupo de Estudos em Representações Sociais pela paciência. Em

especial, sou grata a Andreza pela amizade, apoio e parceria. À Michelle e Thamyris

por serem lindas e presentes na minha vida. À Enivalda e Edneia pelas palavras de

incentivo de sempre. À Amélie por ser minha memória auxiliar. À Lu pela parceria.

À sala 23 da pós-graduação e aos amigos Auta, Talita, Cleiton, Procópio,

Gabriel, Al, Michelle, Thamyris e João.

Ao professor José Batista pela genialidade das colocações na qualificação.

Pela leitura atenta e aguçada do texto. A discussão que travamos em abril de 2013

foi norteadora dessa produção escrita.

À professora Lia pela gentileza e delicadeza das palavras, pela confiança e

por todos os sorrisos incentivadores. Agradeço pelas intervenções e proposições

dispensadas ao nosso trabalho, bem como pela leitura e revisão gramatical do texto.

À Alba Valéria por sua ajuda essencial na finalização da dissertação. “Me diz

o que é sufoco que eu te mostro alguém a fim de acompanhar...” Quem tem amigo

não sofre!

Sou grata aos estudantes e pais participantes desta pesquisa pela

disponibilidade em compartilhar suas experiências, por todas as risadas, cafés e

tardes agradáveis que me proporcionaram.

Aos profissionais do CAp, em especial aos responsáveis pelo SOEP, Viviane

Alves de Lima e José Aécio Chagas. Agradeço a recepção e apoio na pesquisa de

campo.

Sou grata a todo aquele que cruzou o meu caminho tornando este percurso

mais leve e feliz.

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RESUMO

O presente estudo objetivou compreender as Representações Sociais do Colégio de Aplicação da UFPE segundo alunos e pais, caracterizando e analisando os sentidos e significados atrelados as perspectivas de futuro. Partimos do pressuposto de que as famílias que escolhem o CAp da UFPE, as camadas médias intelectualizadas, efetuam certo “malabarismo” para a aprovação na seleção de ingresso e mobilizam estratégias não necessariamente planejadas, mas orquestradas e orientadas para o sucesso escolar dos filhos. Isso ocorre porque carregam consigo uma certeza, uma garantia de sucesso que se deve ao habitus do grupo, e que é reforçada a cada êxito, ou resposta positiva que essas crianças lhes fornecem. Nesse sentido, a escolha do colégio não é aleatória, faz parte do campo dos prováveis, do leque de possibilidades que os pais possuem e está estritamente relacionada às perspectivas de futuro dessas famílias. O referencial teórico-metodológico adotado foi a Teoria das Representações Sociais proposta por Serge Moscovici e a Teoria do Núcleo Central de Jean-Claude Abric. A noção de habitus de Pierre Bourdieu (2007; 2008;2009;2011;2013) e autores como Zago (2002;2008) e Nogueira (2003;2008;2009) também nos serviram de referência teórica.Participaram da pesquisa 120 estudantes e 78 pais de estudantes do Ensino Fundamental do CAp da UFPE.O estudo se apoiou na abordagem da pesquisa qualitativa;para compreender as representações utilizamos como procedimentos de coleta:Teste de Associação Livre, Triagens Hierárquicas Sucessivas e Entrevistas Semiestruturadas. Na primeira fase do estudo, utilizamos o Teste de Associação Livre de palavras e, para análise, o quadro de quatro casas com o auxílio do EVOC. Na segunda fase, utilizamos a técnica de Triagens Hierárquicas Sucessivas, para análise o cálculo de frequências e a Análise de Conteúdo das justificativas. Na terceira fase, realizamos Entrevistas Semiestruturadas, tratamos o material com o suporte da Análise de Conteúdo Categorial. Os resultados indicaram que o Núcleo Central da representação do CAp da UFPE é composto por “Qualidade” e “Futuro”. Os discursos revelam que o CAp é uma instituição bem sucedida, com propostas inovadoras e diferenciadas dos demais estabelecimentos de ensino públicos e privados do estado de Pernambuco, supera os estabelecimentos escolares mais prestigiosos do país. Os sujeitos qualificam o colégio como instituição de excelência que reúne trunfos para construir conhecimento e produzir os melhores resultados nas avaliações das quais participa. Por se diferenciar dos demais estabelecimentos do estado, o colégio desperta o interesse de um público igualmente diferenciado, de pais pertencentes as camadas médias intelectualizadas, em sua maioria, professores universitários, funcionários públicos federais e profissionais liberais. As estratégias de ingresso na instituição ora são explícitas e direcionadas a aprovação, ora são de mobilização das disposições interiorizadas na trajetória escolar e familiar do estudante. O que nos foi possível apreender do habitus do grupo revela agentes dotados das mesmas referências e com perspectivas futuras semelhantes, embora um ou outro contexto de produção se diferencie dos demais. Esse estudo revela, ainda, que habitus semelhantes produzem estratégias semelhantes para acessar o espaço social pretendido. Nos sentidos compartilhados por pais e estudantes compor o grupo de estudantes do CAp da UFPE traz reconhecimento social, funciona como trampolim para realização pessoal, profissional e sucesso futuro dos estudantes. Palavras-Chave: Representação Social. Habitus. Colégio de Aplicação. UFPE.

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ABSTRACT

The present study aimed to understand the Social Representations of the School of Application of second UFPE students and parents, characterizing and analyzing the meanings trailers future prospects. We assumed that families who choose the CAp UFPE, the middle strata intellectualized, perform certain "juggling" to approve the selection of entry and mobilize not necessarily planned strategies but orchestrated and geared towards academic success of children. This is because they carry with them a certainty, a guarantee of success is due to the habitus of the group, and that is reinforced every success, or positive response to these children provide them . In this sense, the choice of school is not random , is part of the field of likely , the range of possibilities that parents have and is strictly related to the future prospects of these families . The theoretical - methodological reference was the Theory of Social Representations proposed by Serge Moscovici and the Central Nucleus Theory of Jean - Claude abric. The notion of habitus of Pierre Bourdieu (2007, 2008 , 2009 , 2011 , 2013), and authors such as Zago (2002 , 2008) and Nogueira (2003 , 2008 , 2009) also served in the theoretical framework . Participated in the survey 120 students and 78 parents of elementary school students from the CAp UFPE. The study relied on qualitative research approach ; to understand the representations used as collection procedures : Free Association Test , Trials and Successive Hierarchical semistructured interviews . In the first phase of the study used the Test of Free Association words and, for analysis , the four-frame houses with the EVOC . In the second phase utilized the technique of Hierarchical Successive Trials for analysis to calculate the frequency and content analysis of the justifications. In the third phase we conducted semi-structured interviews, we treat the material with the support of categorical content analysis. The results indicated that the Central Nucleus of the representation of the CAp UFPE consists of " Quality " and " Future " . The speeches reveal that CAp is a successful institution with innovative and differentiated proposals from other establishments of public and private schools in the state of Pernambuco, surpasses the most prestigious schools in the country. The subjects qualify the school as excellent institution that brings together strengths to build knowledge and produce the best results in evaluations in which it participates. Why differentiate themselves from other establishments of the state, the college awakens the interest of an equally distinguished audience of professionals parents belonging layers highbrow medium, mostly university professors, civil servants and federal. Strategies for admission into the institution are hereby directed and explicit approval, are now mobilizing the provisions internalized in school and family trajectory of the student. What we were able to apprehend the habitus of the group reveals agents with the same results and future prospects with similar, although one or another production context is distinct from the others. This study also reveals that similar habitus produce similar strategies to access the desired social space. In shared by parents and students select group of students from the CAp UFPE senses brings social recognition, works as a springboard for personal fulfillment , professional and future success of students . Keywords : Social Representation. Habitus. College Application. UFPE.

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LISTAS DE QUADROS

QUADRO 01- Modelo explicativo do quadro de quatro casas gerado pelo Software

EVOC.........................................................................................................................99

QUADRO 02-Distribuição dos estudantes participantes por Sexo..........................122

QUADRO 03-Distribuição dos estudantes participantes por idade..........................122

QUADRO 04-Distribuição dos estudantes participantes por composição familiar...123

QUADRO 05-Distribuição dos estudantes participantes por ocupação dos pais....124

QUADRO 06-Distribuição dos estudantes participantes por escola de origem.......124

QUADRO 07- Distribuição dos estudantes participantes por realização de cursos

preparatórios para a seleção de ingresso................................................................125

QUADRO08-Distribuição dos estudantes participantes por atividades

extraclasse...............................................................................................................127

QUADRO 09-Distribuição dos participantes por gênero.........................................132

QUADRO 10-Distribuição dos pais participantes por faixa etária...........................132

QUADRO 11-Distribuição dos pais participantes por nível de Formação

Acadêmica................................................................................................................133

QUADRO 12-Distribuição dos pais participantes por Profissão..............................133

QUADRO 13-Quadro de quatro casas gerado pelo EVOC resultante das evocações.

dos pais à expressão indutora “Colégio de Aplicação”............................................140

QUADRO 14-Quadro de quatro casas gerado pelo EVOC resultante das evocações

dos pais a expressão indutora “Colégio de Aplicação”............................................159

QUADRO 15- Distribuição dos termos que permaneceram na 1ª etapa das triagens

hierárquicas sucessivas dos estudantes com as respectivas frequências..............177

QUADRO 16-Distribuição dos termos que permaneceram na 2ª etapa das triagens

hierárquicas sucessivas dos estudantes com as respectivas frequências..............178

QUADRO 17-Distribuição dos termos que permaneceram na 2ª etapa das triagens

hierárquicas sucessivas dos estudantes com as respectivas frequências..............179

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QUADRO 18-Distribuição dos termos que permaneceram na 1ª etapa das triagens

hierárquicas sucessivas dos pais com as respectivas frequências..........................185

QUADRO 19- Distribuição dos termos que permaneceram na 2ª etapa das triagens

hierárquicas sucessivas dos pais com as respectivas frequências..........................186

QUADRO 20- Distribuição dos termos da 3ª etapa das triagens hierárquicas

sucessivas dos pais com as respectivas frequências..............................................186

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 01- Áreas de residência..........................................................................128

GRÀFICO 02-Áreas de residência das famílias.......................................................135

GRÁFICO 03-Renda familiar mensal.......................................................................137

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LISTAS DE TABELAS

TABELA 01-Grau de vinculação, níveis e modalidades de ensino dos CAps......41

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LISTAS DE SIGLAS

ABA- Associação Brasileira Americana

ANPED- Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação

ANDES- O sindicato Nacional dos Docentes das Instituições do Ensino Superior

BDTD- Biblioteca Digital de Teses de Dissertações

CAp- Colégio de Aplicação

CCAA- Centro Cultural Anglo Americano

COLUNI- Colégio Universitário

CONDICAP- Conselho Nacional dos Dirigentes das Escolas de Educação Básica

das Instituições Federais de Ensino Superior

EF- Educação Fundamental

EF1- Ensino Fundamental I Séries Iniciais

EF2- Ensino Fundamental II

EI- Educação Infantil

EJA- Educação de Jovens e Adultos

EM- Ensino Médio

EMN- Ensino Médio Normal

ENEM- Enxame Nacional do Ensino Médio

ENEU- Encontro Nacional nas Escolas Universitárias

EVOC- Software Ensemble de Programmes Permettant Lánalyse dês Évocations

IDEB- Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

INEP- Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

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ITA- Instituto Tecnológico de Aeronáutica

MEC- Ministério da Educação e Cultura

MF- Médias de Frequência

NC- Núcleo Central

OMC- Ordem Média de Evocação

PPGE- Programa de Pós-graduação em Educação.

PROVOC- Programa de Vocação Científica para Alunos do Ensino Médio

RAP- Relação Aluno Professor

RMR- Região Metropolitana do Recife

RS- Representações Sociais

SENAC- Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial

SOAE- Serviço de Orientação e Apoio ao Estágio

SOE- Serviço de Orientação Educacional

SOEP- Serviço de Orientação e Experimentação Pedagógica

TRS- Teoria das Representações Sociais

UFPE- Universidade Federal de Pernambuco

USP- Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................... 20

CAPÍTULO 2- COLÉGIO DE APLICAÇÃO: ORIGENS, EVOLUÇÃO E PERSPECTIVAS ........................................................................................................38

2.1. HISTÓRICO DO COLÉGIO DE APLICAÇÃO NO BRASIL...............................38

2.1.1.Como nasce uma ilha de excelência? .......................................................... 38

2.1.2.Colégio de Aplicação: o projeto .................................................................... 38

2.1.3.Pensando e repensando os colégios de aplicação ..................................... 42

2.2. O COLÉGIO DE APLICAÇÃO DA DA UFPE: DAS ORIGENS AOS CAMINHOS DA EXCELÊNCIA ..................................................................................................... 45

2.2.1. O Colégio de Aplicação da UFPE hoje ........................................................ 48

2.3. A SELEÇÃO PARA INGRESSO NO CAP ......................................................... 51

2.3.1. Critério neutro na seleção dos “melhores” ................................................ 51

2.3.2. A escolha do colégio ..................................................................................... 53

2.3.3. A corrida é desigual, mas a escola prega como justa ............................... 54

CAPÍTULO 3 - REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E HABITUS: ABORDAGENS, CONCEITOS E APROXIMAÇÕES ........................................................................... 56

3.1. Bases epistemológicas: Das representações coletivas as representações sociais.......................................................................................................................56

3.2. O homem pensa e elabora: A teoria das Representações Sociais .............. 59

3.3. Mas afinal, o que são as Representações Sociais? E por que são construídas?.............................................................................................................62

3.4. O processo de construção das Representações Sociais ............................. 67

3.5. Diferentes abordagens no estudo em RS ...................................................... 70

3.6. Abordagem estrutural das Representações Sociais: a Teoria do Núcleo Central.......................................................................................................................71

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3.7. AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E A NOÇÃO DE HABITUS EM PIERRE BOURDIEU- APROXIMAÇÕES PRELIMILARES..................................................75

CAPÍTULO 4- METODOLOGIA................................................................................84

4.1. Procedimentos de Coleta.................................................................................85

4.1.1. Teste de Associação Livre de Palavras.......................................................88

4.1.2. Triagens Hierárquicas Sucessivas...............................................................89

4.1.3. Entrevistas Semiestruturadas.......................................................................92

4.2. Participantes da pesquisa...............................................................................96

4.3. Procedimento de Análise..................................................................................98

4.3.1. Análises das Evocações provenientes do Teste de Associação Livre-

EVOC.........................................................................................................................98

4.3.2. Análises das Justificativas das Evocações, Triagens e Entrevistas -

Análise de Conteúdo..............................................................................................100

4.4. Percurso em Campo........................................................................................102

4.4.1. A aplicação do Teste de Associação Livre com os estudantes..............105

4.4.2. A aplicação do Teste de Associação Livre com os pais..........................110

4.4.3. O momento das Triagens Hierárquicas Sucessivas com os estudante113

4.4.4. As entrevistas com os estudantes.............................................................116

4.4.5. O contato direto com os pais para Triagens e Entrevistas......................118

CAPÍTULO 5- RESULTADOS: Análise e Discussão ..........................................121

5.1. Perfil do grupo investigado: Quem fala? De onde fala? .............................121

5.1.1. Perfil dos estudantes...................................................................................121

5.1.2. Perfil dos pais...............................................................................................130

5.2. CONTEÚDO GERAL E POSSÍVEL ESTRUTURA DA REPRESENTAÇÃO

SOCIAL DO CAP DA UFPE POR PAIS E ESTUDANTES..................................138

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5.2.1. A Estrutura da Representação Social do Colégio de Aplicação para

estudantes...............................................................................................................138

5.2. 2. A Estrutura da Representação Social do Colégio de Aplicação para pais

de estudantes.........................................................................................................157

5.3. O NÚCLEO CENTRAL DAS REPRESENTAÇÕES DE PAIS DO CAP

SEGUNDO OS ESTUDANTES E SEUS PAIS......................................................176

5.3.1. Triagens Hierárquicas Sucessivas por estudantes..................................176

5.3.2. Triagens Hierárquicas Sucessivas por pais..............................................183

5.4. OS SENTIDOS COMPARTILHADOS SOBRE O CAP DA UFPE POR PAIS E

ESTUDANTES.........................................................................................................191

5.4.1. Buscando Sentidos: Representações Sociais e a Noção de habitus.....191

5.4.2. Caracterização familiar dos estudantes do CAp da UFPE: Sobre a

construção progressiva de práticas, sentidos e disposições duráveis e

favoráveis a escolarização....................................................................................193

5.4.2.1. Processos de Socialização e percursos escolares e profissionais dos

pais..........................................................................................................................194

5.4.2.2. Processo de Socialização e percursos escolares dos estudantes.....200

5.4.3. Sentidos Compartilhados sobre o Colégio de Aplicação da UFPE.........203

5.4.3.1. "O CAp como instituição de excelência"................................................203

5.4.3.2. "O CAp como instituição que preza pela formação integral e

humanização do sujeito.........................................................................................220

5.4.3.3."O CAp como trampolim para a realização pessoal, profissional e

sucesso futuro do estudante"...............................................................................229

CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................248

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 257

APÊNDICES .......................................................................................................... 266

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APÊNDICE 1- Teste de Associação Livre de palavras ....................................... 266

APÊNDICE 2- Carta aos pais.................................................................................272

APÊNDICE 3- Cartelas com os termos das triagens hierárquicas

sucessivas..............................................................................................................273

APÊNDICE 4- Tabelas para Hierarquização ........................................................280

APÊNDICE 5- Roteiro das entrevistas com os pais e estudantes..................284

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20

1. INTRODUÇÃO

A presente pesquisa se insere no âmbito dos estudos sobre êxitos escolares,

estabelecimentos escolares de excelência e escolarização das camadas médias

intelectualizadas. Tomamos como objeto de estudo um colégio da Rede Federal de

Ensino, o Colégio de Aplicação da UFPE, destaque nas avaliações externas das

quais participa e que atrai um público intelectualizado. O estudo adotou como

referencial a Teoria das Representações Sociais, proposta por Serge Moscovici, em

interlocução com o conceito de habitus de Pierre Bourdieu. Além de abordar como

pais e alunos representam o colégio, nos preocupamos com as estratégias

familiares de acesso à instituição.

O interesse em realizar a pesquisa surgiu no curso de pedagogia. Como

educadora em formação, me inquietavam os debates centrados no fracasso escolar

e o pouco contato com estudos sobre êxitos escolares e estabelecimentos de

excelência. Os estabelecimentos de excelência, quando discutidos, eram tomados

como “modelo a seguir”, no entanto, não havia uma problematização dos fatores que

contribuíam para construção e retroalimentação dessa excelência. Nesse momento,

também, desenvolvemos as práticas pedagógicas nas escolas públicas municipais

dos anos iniciais do Ensino Fundamental da cidade do Recife/PE, um cenário em

que prevaleciam as situações de fracasso.

O ensino público brasileiro não consegue escolarizar seus alunos de maneira

satisfatória. Apesar das inúmeras tentativas governamentais para corrigir os

problemas escolares os resultados das avaliações das quais participam estudantes

do Ensino Fundamental público de todo o Brasil, em especial da Região Nordeste,

indicam que grande parcela das crianças não atinge padrões mínimos de leitura e

escrita. Os indicadores apresentados no IDEB mostram que um terço dos alunos da

Região Nordeste chegam aos 08 anos sem estarem alfabetizados1.

Nas séries finais do Ensino Fundamental a crise da educação pública se

agrava e as defasagens tornam-se cumulativas. Mais de 37% das cidades

brasileiras ficaram abaixo da meta estabelecida pelo MEC (3,9) para analisar o

desempenho dos estudantes dos últimos anos do Ensino Fundamental. A região

1 Fonte: http://ideb.inep.gov.br/

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nordeste apresentou os índices mais baixos do IDEB em todos os níveis de ensino

avaliados (INEP, 2012).

Em contraposição aos resultados insuficientes das escolas públicas

(municipais e estaduais) que se referem às avaliações externas de desempenho do

alunado algumas instituições se sobressaem. Dentre elas, os Colégios de Aplicação

(CAps), vinculados às universidades federais que lideram os rankings das

avaliações as quais são submetidos. Além disso apresentam altos índices de

aprovação nos exames públicos de vestibular, obtendo, em alguns dos casos2,

resultados superiores aos das escolas privadas mais conceituadas do país. Tais

colégios funcionam como uma realidade a parte, com resultados que vão além do

esperado, formando as elites intelectuais3 brasileiras.

Um exemplo próximo dessa ilha de excelência, que se distingue das escolas

públicas comuns tem sido o Colégio de Aplicação da Universidade Federal de

Pernambuco (CAp). Localizado na região que tem os piores índices de

desenvolvimento da educação básica (IDEB) do país, o CAp-UFPE mantém o

melhor IDEB do Brasil, pois é o primeiro colocado no exame, desde que este foi

instituído. No ano de 2011, a média do colégio foi de 8,1- mais que o dobro da média

nacional (4,1) e estadual (3,5). Além do alto índice de qualidade da educação

básica, expresso nas avaliações, o colégio lidera o ranking estadual de classificação

no Enem (UFPE, 2012).

Associado a estes resultados, o colégio apresenta boa infraestrutura e quadro

docente bem qualificado4, o que desperta o desejo de inserção das crianças neste

espaço de referência. Ao final do ano letivo, a instituição realiza um rigoroso e

competitivo processo de seleção, para compor as turmas do 6º ano do Ensino

Fundamental, que envolve testes de matemática e português. Cerca de

2.000crianças participam da seleção a cada ano. Esses candidatos enfrentam uma

2O colégio de Aplicação da UFV (Minas Gerais) ocupa o 8º lugar geral no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) 2011, o Colégio de aplicação da UFPE é o primeiro colocado das escolas públicas na classificação estadual e o 2º lugar entre as escolas públicas do Brasil e o Colégio de aplicação da UFRJ (Rio de Janeiro) ocupa o 5º lugar do estado. 3 O termo elite intelectual é aqui utilizado para designar as camadas médias intelectualizadas: grupos

com formação superior ou pós-graduação e que ocupam posições sociais de prestígio na área de

atuação, funcionários públicos, bem como os professores universitários que compõem a elite

acadêmica, por assim dizer. 4 Atualmente o colégio possui 51 professores efetivos e 06 substitutos. Dentre os efetivos, 10 são

especialistas, 24 mestres, 16 doutores e 01 graduado.

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concorrência que supera a dos cursos prestigiosos das universidades mais

conceituadas do país. No ano de 2010, a concorrência foi maior do que a dos cinco

cursos mais procurados no vestibular da Universidade de São Paulo (USP);em

2013, a concorrência foi de 32,3 candidatos por vaga (UFPE, 2013).

No Trabalho de Conclusão de Curso de Pedagogia5, observamos que há por

parte dos alunos um esforço notório à classificação na referida escola, que se deve,

em parte, ao capital simbólico da instituição. Os alunos acreditam que fazer parte do

colégio os possibilita estar em altas condições de competição no vestibular e obter

sucesso futuro. Assim, os estudantes empreendem suas ações em direção ao topo,

ao destaque. Ao conseguir a aprovação, essas crianças constroem uma identidade

de “alunos de sucesso”.

É como se os alunos entrassem numa lógica de sucessos sucessivos. Isso se

dá, inicialmente, pelo fato de que a escola tende a favorecer ainda mais o grupo

seleto, reservando aos “melhores” o que tem de melhor em termos de ensino e

aprendizagem. Esse êxito escolar inicial, conseguir a aprovação, compor o grupo, é

circunstância produtora de sentidos, disposições e práticas, que tendem a reforçar

as práticas iniciais e ensejar novas práticas que promovem o êxito.

A decisão de frequentar um estabelecimento de ensino que ocupa uma

posição privilegiada na hierarquia escolar advém de uma ideia de sucesso futuro

que se concretiza na escola. Tal ideia é pautada na crença meritocrática de que, por

meio da educação, a ascensão social pode ocorrer e depende unicamente do

esforço individual. A escola se apropriou dessa perspectiva seletiva e competitiva

difundindo a ideia de mérito. Os sujeitos passaram a crer que os seus esforços

aliados à escolarização garantiriam uma mobilidade social (DUBET, 2008).

Numa época em que o capital predominante é notadamente escolar (ZAGO,

2008) e os títulos escolares falam por si só, dizem mais sobre os sujeitos do que

eles próprios, os pais dessa elite acadêmica se valem de estratégias, ações

orquestradas e direcionadas para obter um posto de prestígio na cultura escolar

5ALMEIDA, Gisele Gomes de; LIMA; Aldenize Ferreira. “Quer comer poeira ou quer levantar

poeira?” Representações sociais do sucesso por alunos de uma escola de referência do Recife. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Pedagogia)- Centro de Educação, UFPE. Recife, 2011.

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ranqueada (BOURDIEU, 2010). Os sujeitos empreendem as estratégias de forma

consciente, no entanto, as motivações para escolher as estratégias são

inconscientes. A busca pela escola de excelência como destino natural do grupo da

camada média intelectualizada é um dos aspectos que os diferencia dos demais.

Como bem caracteriza Xavier (2011), o grupo que ingressa no colégio de excelência

é possuidor de um senso prático. Um grupo tão envolvido no jogo que chega ao

ponto de esquecer que joga.

As crianças são inseridas desde cedo nessa cultura de competição e os pais,

que vislumbram para os filhos uma escolarização com êxito, não medem esforços

para garantir as condições das crianças nessa corrida por sucesso e entram no “jogo

escolar” esperando obter êxito. Até mesmo os que não possuem os trunfos

suficientes para obter êxito escolar, o almejam. Para os que possuem tais trunfos o

sucesso escolar se torna quase uma certeza e as estratégias e socializações

diferenciadas deixam de ser percebidas, nos fazendo acreditar que as propriedades

são corpo do proprietário (BOURDIEU, 2008; 2009). Nessa lógica que dá ênfase ao

sucesso individual, os pais acabam aderindo ao “jogo escolar” e jogam com o que

tem de melhor.

No Brasil, os estudos que versam sobre êxitos escolares e excelência escolar

ocuparam, por muito tempo, lugar discreto e pouco atraiam os pesquisadores. As

pesquisas em Educação, com ênfase em Sociologia da Educação, que têm como

objetos de estudo o sucesso, a excelência escolar e escolarização das elites

acadêmicas e econômicas são recentes. Tais temáticas começaram a ganhar

visibilidade no cenário nacional há pouco mais de dez anos, momento em que se

iniciam publicações de coletâneas sobre o tema6. O foco das discussões, antes

centrado no fracasso e desvantagem social, dá espaço à investigação de trajetórias

de sucesso, estabelecimentos de excelência e processos de escolarização das

camadas médias intelectualizadas e elites econômicas. Destacamos que são

pontuais os estudos sobre os Colégios de Aplicação, instituições de excelência que

6ALMEIDA, Ana Maria F.; NOGUEIRA, Maria Alice (Orgs.). A Escolarização das Elites: Um

Panorama Internacional da Pesquisa. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. 120-134.

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atraem a camada média intelectualizada. Tais estudos tornam-se ainda mais

escassos nas abordagens simbólicas.

No intuito de buscar referências para compreender o objeto, realizamos,

inicialmente, uma pesquisa na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações

(BDTD) com o descritor “Colégio de Aplicação” para obter um balanço nacional das

produções, a níveis de mestrado e doutorado, que tomaram os CAps como objeto de

estudo e saber como a instituição era abordada nas pesquisas. Foram encontradas

oito dissertações e uma tese, produzidas entre os anos de 2002 a 2011. Destas, seis

tomavam os colégios de aplicação como campo de estudos, outras duas como

objeto. Nenhuma das pesquisas versava sobre o Colégio de Aplicação da UFPE.

As pesquisas que tomaram algum colégio de aplicação como objeto de

estudo foram dissertações realizadas nos anos de 2008 e 2010. Discutiremos, neste

momento, apenas as que tomaram os CAps como objeto de estudo.

Barbalho (2008) tentando compreender como se construiu uma memória

coletiva de histórias de sucesso sobre o Colégio de Aplicação- CAP-COLUNI, da

Universidade Federal de Viçosa, investigou a história da instituição e os relatos

contados por ex-alunos do Ensino Médio. Constatou que a história do colégio se

entrelaça com a história de sucesso dos alunos. Para o autor a memória que conta o

sucesso a partir da vivência na escola é responsável pela difusão da excelência de

ensino ali praticada. Entende, ainda, que a manutenção dessa memória e a

qualidade do ensino é uma via de mão dupla, ambas atuam no sentido de reforçar a

outra.

Os resultados identificaram a existência de redes de relação familiares nas

quais vários membros de um mesmo grupo familiar estudaram no colégio. Assim,

quem ali estudava incentivava outros familiares a fazê-lo. Essas redes familiares se

constituíram como relevantes para a manutenção e reprodução dessa “tradição

inventada”, do discurso de “melhor colégio do mundo”.

Barbalho (2008) destaca que as escolas que oferecem ensino de qualidade

têm seu sucesso reforçado pelo destaque nas avaliações externas, a exemplo do

ENEM. No entanto, ele não se abstém de discutir o fato da seleção de ingresso

constituir um grupo “diferente”, de “destaque”, que comungará dos valores do

colégio e reforçará a sua qualidade.

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O segundo estudo investiga o Colégio de Aplicação da Universidade Federal

de Santa Catarina e foi realizado por Soares Júnior (2010). Com a pesquisa o autor

procurou definir o perfil socioprofissional dos alunos que compuseram as primeiras

turmas de 2º grau do colégio e a relação desses perfis com a cultura escolar. Os

resultados indicaram que os alunos investigados eram oriundos de camadas médias,

filhos de professores universitários e servidores públicos. O autor observou que

havia, de fato, afinidades entre a cultura escolar e o capital cultural dos estudantes.

Ao atrair um perfil de aluno bem-sucedido, a escola recuperava um prestígio que,

por um tempo, tinha perdido na universidade. O autor chega a afirmar que a escola é

dependente desse perfil de estudante para manter o seu prestígio, e que o critério

de seleção abertamente elitista não contribuía para a formação de todo e qualquer

aluno, mas servia a uma pequena parcela da sociedade.

Tendo em vista o pequeno número de estudos que tomaram o colégio como

objeto e a relação da instituição com o sucesso e excelência escolar, decidimos por

realizar esta pesquisa, abordando escolarização das elites, sucesso e excelência

escolar. Acreditamos que tais temáticas precisam ser consideradas para melhor

compreensão do CAp-UFPE.

Pesquisamos no banco de dados da ANPEd7a produção dos últimos dez anos

referentes às temáticas. A escolha pela ANPED se deu por ser o espaço de

referência em produção e divulgação das pesquisas em Educação.

O recorte temporal para a pesquisa considerou a emergência dessas nas

pesquisas em educação no país, ou seja, na primeira década do ano 2000. É

importante destacar que os trabalhos produzidos nessa direção se concentram no

grupo de trabalho de Sociologia da Educação. Todos os trabalhos aqui discutidos

fazem parte deste grupo. Para a pesquisa utilizamos os descritores escolarização

das elites, sucesso e excelência escolar. Foram localizados dezenove trabalhos. O

ano de maior concentração foi o ano de 2008 (seis trabalhos). Nos anos 2002 a

2005, foram encontrados apenas três trabalhos; nos anos seguintes, exceto 2008, a

produção média foi de dois trabalhos por ano. Os trabalhos provem da região

sudeste, os pesquisadores são, predominantemente, das universidades federais do

Rio de Janeiro e de Minas Gerais.

7Associação nacional de pós- graduação e pesquisa em Educação.

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Dois trabalhos tomam como campo de estudo Institutos de Tecnologia e

Escolas Técnicas Federais. Outros dois estudos tomam como campo os colégios

federais do Rio de Janeiro e de Minas Gerais e o fazem numa perspectiva

comparativa com colégios privados e os da rede estadual e municipal de ensino,

considerados de elite.

Organizamos a produção localizada discutindo o significado do termo elite,

“elite acadêmica” que tem sido amplamente utilizado nos estudos de

estabelecimentos escolares de excelência, e suas repercussões no campo da

educação. Em seguida, apresentamos as pesquisas que versam sobre os diferentes

capitais mobilizados durante a escolarização, as estratégias familiares de que se

valem as famílias para além de sobreviver ao “jogo escolar”, nele obter êxito, como a

escolha do estabelecimento de ensino que torna os percursos escolares

diferenciados. Os estudos abordam também a constituição de disposições

favoráveis ao sucesso escolar, que são convertidas em habitus escolares, e os

aspectos que favorecem a construção da excelência escolar.

O debate acerca do significado do termo elite é polêmico. Para Brandão e

Martinez (2005, p.1) conceber a elite num sentido plural seria considerar uma

“variedade de tipos de elites: intelectuais, econômicas, profissionais, etc. Nesse

sentido o termo abrange os setores de camadas médias que ao se matricularem

nestas escolas passam a integrar as elites escolares”.

Na pesquisa que realizamos, não utilizamos o termo elite intelectual ou elite

econômica, mas camadas médias intelectualizadas: grupos com formação superior

ou pós-graduação e que ocupam posições sociais de prestígio na área de atuação,

funcionários públicos, bem como os professores universitários que compõem a elite

acadêmica, por assim dizer.

Lacerda (2008) discute a produção da excelência escolar, a imagem de

excelência construída das instituições de prestígio. A autora o faz a partir de estudo

que toma como campo o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). De acordo com

a pesquisadora, questões como instalações de qualidade, constituição histórica,

princípios seletivos próprios, estilo educativo, rendimento social dos títulos escolares

e o compartilhamento da imagem de excelência pelos estudantes do ITA e

sociedade em geral, colaboram para definição de sua alta qualidade.

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O fator seletividade contribui para a alta qualidade da instituição por produzir

um grupo que possui propriedades sociais homogêneas que os diferenciam de

outros excluídos desse tipo de escola. Os mais aptos escolarmente são separados

dos demais através da rigorosa seleção que ocorre no exame de ingresso. Bourdieu,

apud Lacerda (2008), argumenta que nas escolas de prestígio “[...] há todo um

sistema de meios institucionais, incitações, constrangimentos e controles que

reduzem toda a existência dos alunos a uma sucessão ininterrupta de atividades

escolares intensas” (LACERDA, 2008, p. 08). Tais atividades, rigorosamente

regradas e controladas, fazem com que os alunos sejam constantemente incitados

ao esforço. Essa forma de organização escolar tem efeitos de ordem identitária,

produzindo uma adesão à escola. A autora destaca que a adesão aos valores do

grupo é relevante na produção da excelência escolar.

O capital simbólico engendrado pelo grupo dos eleitos, escolhido para

perpetuar a excelência escolar da instituição, reforça as posições sociológicas de

que as escolas da elite são escolas de chefes. Os títulos adquiridos são rentáveis e

possuem valor e reconhecimento social de excelência. Isso permite aos egressos do

instituto escolher os postos de trabalho que considerem melhores em termos de

chances de progresso profissional.

A autora observa, ainda, que a unificação do grupo de alunos de colégios de

alta qualidade se dá pela imagem compartilhada de excelência acadêmica da

instituição. Os estudantes gozam de um sentimento de altivez, encantamento de si,

reconhecem-se como grupo distinto. Essa marca de reconhecimento de grupo de

exceção é reflexo da constituição de um habitus cultivado, decorrente do processo

de socialização na instituição.

Xavier e Marzocchi (2008) realizaram uma pesquisa em três escolas do Rio

de Janeiro, consideradas como “as elites escolares” por propiciar ensino de

excelência, com o intuito de promover reflexão acerca das particularidades da

relação entre os pares, do planejamento e da rotina que ocorrem nesses espaços.

Os resultados indicam que a clientela das escolas com perfil de elites

escolares é caracterizada pela presença de alunos portadores de autonomia

intelectual; estudantes que são frequentemente estimulados em relação ao

conhecimento, assimilam de maneira satisfatória, são preparados desde pequenos

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para o ritmo de estudos, sabem lidar com uma grande quantidade de informações e

fazer associações. Aliada às características dos discentes, a apresentação do

conteúdo também é diferenciada. Os alunos são estimulados e desafiados em

relação ao que aprendem e recebem uma formação crítica.

No que se refere à constituição de habitus escolares que favorecem o

sucesso escolar e/ ou práticas familiares que contribuem para a constituição desses

habitus, estudos como o de Brandão (2010) e Xavier (2011) se destacam. Brandão

(2010, p. 2) discute as “estratégias e ações que objetivam e/ou favorecem a criação

de determinadas disposições (habitus) para o estudo e o domínio das habilidades

necessárias ao bom desempenho escolar”. O estudo revela que para as famílias

investigadas, a escolha da escola representa um primeiro movimento familiar na

construção da trajetória escolar dos filhos. Dentre os fatores considerados

importantes para a escolha destes estabelecimentos estão a escola ter boas

referências e ensino de qualidade, além de aprovação no vestibular, característica

mais requerida pelo público da rede privada de ensino do que por usuários da rede

pública.

Os dados empíricos obtidos levam a autora a afirmar que o sucesso e o

fracasso escolar não podem ser interpretados como derivados, mecanicamente, dos

perfis familiares, mas precisam ser compreendidos a partir das relações entre as

famílias e as escolas. No contexto da pesquisa, os pais dos estudantes das escolas

municipais possuíam níveis de escolaridade superiores à média da população

brasileira. Eles representam os setores das camadas médias que possuem maior

nível de informação, melhores níveis de renda e maiores expectativas quanto à

educação dos filhos. Isso explica o acompanhamento intenso da escolaridade das

crianças e as tentativas de ampliação cultural (ampliação das fontes de informação,

acesso à internet, escola de qualidade, dentre outros), favorecendo o

desenvolvimento de disposições para o estudo.

Em consonância com os estudos da autora supracitada, Xavier (2011)

investigou o comportamento acadêmico dos alunos das escolas consideradas de

prestígio e suas disposições favoráveis ou não ao bom desempenho escolar,

disposições, que estão explicita e implicitamente convertidas em habitus escolares.

Para a pesquisadora, o habitus e os capitais dos sujeitos se combinam ao contexto

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para se desdobrarem em sucesso ou insucesso escolar. Ela observa que se

quisermos saber o que pensa um estudante matriculado no 8º e 9º ano do Ensino

Fundamental devemos nos perguntar: “Qual é o jogo que se joga nesta escola?”

(XAVIER, 2011, p. 7). A nossa resposta nos conduziria a um comportamento que

pode estar tanto relacionado às atitudes requeridas pela instituição quanto às

perspectivas de futuro que construímos com nossos pais.

Em estudo sobre os perfis familiares e escolha dos estabelecimentos de

ensino, Nogueira et al. (2009) investigaram famílias de colégios privados, colégio

federal, escolas estaduais e municipais, de alto desempenho. A hipótese inicial dos

autores era de que “[...] em cada tipo de escola existiam famílias com graus

diferenciados de mobilidade escolar” (NOGUEIRA et al, 2009, p.4) .

Os dados indicaram que famílias cujos filhos estudam na federal e nos

colégios particulares apresentam um perfil mais favorável à escolarização, conforme

a literatura sociológica na área. A escolha do estabelecimento de ensino continua

associada às características sociais da família. Deste modo, famílias com perfis

sociais diferenciados escolhem tipos de escola adequados aos seus perfis. Os pais

mais escolarizados ou com proximidade maior do universo escolar tendem a utilizar

para a escolha do colégio critérios mais pedagógicos (como qualidade de ensino,

métodos e referências positivas do colégio) e menos questões utilitaristas

(proximidade da residência, horários, dentre outros). Os pais das escolas Estaduais

e Municipais comuns apontam critérios funcionais para escolha da escola dos filhos,

no entanto, aqueles que têm crianças estudando nas escolas de melhor

desempenho atribuem sua escolha a aspectos relacionados à qualidade do ensino e

aprendizagem. Os pais da escola federal escolhem levando em consideração a

qualidade e métodos de ensino, além da recomendação dos amigos. Os pais da

escola privada entendem como importante a qualidade do ensino, mas sobre a

escolha pesam, também, critérios tais como: valor da mensalidade, localização e

formação cristã.

Os autores acreditam estarem continuadamente confirmando a hipótese de

que a “[...] vinculação das famílias da amostra investigada a diferentes tipos de

estabelecimento de ensino está relacionada a formas desiguais de mobilização à

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escolaridade dos filhos” (NOGUEIRA et al, 2009, p. 11). Isso é expresso nas

concepções e estratégias diferenciadas de cada família na escolha da escola.

Quanto ao nível de aspirações escolares e projeto de futuro das famílias para

os filhos, os pais da escola federal apresentam uma ambição escolar bem superior

aos demais, entendem que o filho deve entrar no mundo do trabalho após os 21

anos, e almejam que as crianças alcancem a pós-graduação. São eles também que

mais se dedicam ao processo de escolarização dos filhos, auxiliando-os nos deveres

de casa, esclarecendo dúvidas e sugerindo material de consulta quase todos os

dias.

Em geral, os indicadores de mobilização foram mais evidentes no colégio

Federal do que nas instituições privadas ou nos colégios Estaduais e Municipais.

Apesar do ingresso na instituição ser por sorteio- tido como mais democrático- o

público no colégio é seleto e detentor de capital cultural. Para os pesquisadores isso

é um indicativo de que a seleção por sorteio não atende à diversidade, mas a um

grupo que possui a posse de recursos sociais diferenciados. A escola Federal

atende a famílias já relativamente favorecidas, em relação ao meio social, capital

informacional e práticas culturais rentáveis do ponto de vista educacional.

No que se refere à produção do sucesso escolar, Arco Netto (2001) toma

como campo de estudo um colégio público considerado de excelência, a Escola

Técnica Federal. O objetivo da pesquisa foi “investigar como o vestibulinho para

ingresso na instituição produz uma seleção rigorosa a priore de um público

altamente suscetível a ação pedagógica da instituição”. (ARCO NETTO, 2001, p.1).

O autor atenta, inicialmente, para o fato dos colégios Federais possuírem

características atribuídas às escolas particulares de ensino, pois a seleção que

orienta o egresso dos estudantes compõe “[...] um corpo discente estável e

altamente qualificado, um grupo seleto de estudantes” (ARCO NETTO, 2001, p.2).

Os dados revelam que os alunos desse contexto “[...] cursaram escolas privadas

durante o Ensino Fundamental, possuem um relativo privilégio cultural e econômico

herdado” (ARCO NETTO, 2001, p.3), tem pais que possuem curso superior completo

e são pertencentes à classe média paulistana. Esses concorrentes, com seu capital

simbólico e social, são os que ocupam as vagas do colégio, em detrimento de outros

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grupos das camadas populares, não permitindo a “democratização” do Ensino Médio

de qualidade.

Essa aproximação preliminar com os estudos sobre as elites intelectuais,

sucesso e excelência escolar dá um indicativo de como ocorre a mobilização das

famílias para a escolarização dos filhos, as socializações diferenciadas e as

estratégias empreendidas durante a escolarização, como exemplo da escolha do

estabelecimento de ensino, visando alcançar sucesso escolar e um êxito profissional

futuro. Em geral, os estudos focalizam a constituição de disposições que,

convertidas em habitus escolares, colaboram para o sucesso escolar. Eles atentam,

ainda, para a necessidade de discutir como é produzida a excelência escolar nas

instituições de prestígio. Tais pesquisas têm questões semelhantes as que

abordaremos nesse estudo, estabelecem uma discussão que pretendemos

aprofundar com nossos achados, mas a abordagem teórico-metodológica utilizada

para estudar tais aspectos é o que nos diferencia dos demais estudos aqui

apresentados. O caráter subjetivo das escolhas, a imagem construída dos

estabelecimentos e a relação entre a escolha do estabelecimento de ensino e as

perspectivas futuras de estudantes e pais é uma relação pouco contemplada nas

pesquisas tendo como base as Representações Sociais.

A escolha por tal abordagem teórico-metodológica não foi aleatória. O estudo

em Representações Sociais permite articulações entre a Psicossociologia e a

Sociologia da Educação. Ela nos permite analisar a pertença a um determinado

grupo social e as atitudes e comportamentos diante da escola (GILLY, 2001). As

diferentes representações que se tem de um estabelecimento de ensino podem

influenciar as práticas dos agentes e não apenas precisam ser conhecidas, como

estudadas e discutidas, no âmbito acadêmico, para compreensão dos fenômenos

educativos.

Um viés pouco considerado pelos pesquisadores são as análises subjetivas

aliadas às objetivas que tentam responder aos fenômenos sociais que remetem ao

contexto educativo. Não estamos excluindo os aspectos objetivos da escolha do

estabelecimento, ao contrário, eles exercem influência sobre os aspectos subjetivos,

a autonomia e esperanças subjetivas dos sujeitos quanto ao seu futuro escolar. Os

elementos subjetivos investigados colaborarão para uma maior compreensão das

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representações que os atores têm do colégio e a sua relação com a prática,

mobilização e estratégias de acesso e permanência, sobrevivência com êxito, no

jogo escolar. Entendendo, sobretudo, “as representações como condições das

práticas, e as práticas como agentes de transformação das representações”

(ROUQUETTE, 1998, p.43), almejamos compreender como se dá essa

movimentação em que representações influenciam práticas e práticas transformam

representações.

A importância de analisar os fenômenos educativos à luz da Teoria das

Representações Sociais, como bem reforça Alves-Mazzotti (2008, p.18), se dá por

“[...] suas relações com a linguagem, com a ideologia e, principalmente, por seu

papel na orientação de condutas e das práticas sociais”. Elas se constituem, assim,

em elementos essenciais à análise dos mecanismos que interferem na eficácia do

processo educativo.

A presente pesquisa se insere no debate travado acerca da relação que a

família mantém com a escolaridade dos filhos, mobilizações, estratégias familiares e

socialização das crianças numa época em que as credencias escolares assumem

cada vez mais centralidade na vida dos sujeitos, onde o diploma atesta o valor social

de cada um, provando seu sucesso ou fracasso nos estudos. Mais especificamente,

nossa preocupação está na relação que pais e alunos que formam a elite acadêmica

estabelecem com o colégio em meio a essa dinâmica e com o sentido que é

atribuído à escola quando “[...] a experiência escolar entra no horizonte de suas

expectativas de vida” (DUSCHATZKY, 1999, p.81). Os sentidos estão mais latentes

quando se percebe uma tentativa de escolha do estabelecimento de ensino e

mobilizações para o ingresso em instituições de prestígio.

No entanto, os investimentos escolares, tempo e energia, reúnem significados

que vão além de questões estritamente utilitaristas e se relacionam à subjetividade e

identidade social dos grupos (ZAGO, 2008). O espaço escolar envolve desejos e

subjetividades, carrega consigo um valor simbólico, garantindo reconhecimento

social e realização pessoal a quem deles consegue “tirar proveito”. Conseguir ou

não tirar proveito desse espaço envolve condicionantes sociais e bagagens culturais

próprias que estão longe de se relacionarem a dom e mais próximas às

socializações vivenciadas por cada um.

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A escolha do colégio pensada nesses termos nos leva a considerar em

primeiro lugar quem são os sujeitos que optam por frequentar um estabelecimento

de ensino federal e porque o escolhem. O público predominante do colégio é

possuidor de um habitus, disposições incorporadas, que funcionam como uma

espécie de sentido do jogo; assim eles não têm a necessidade de raciocinar para se

orientar de uma maneira racional no espaço, para selecionar as melhores opções

(BOURDIEU, 2009; 2011).

Se nos questionarmos “Quem chega”? “Por que chega?” e “Como chega?” ao

Colégio de Aplicação da UFPE, teremos as respostas relacionadas a questões

referentes à socialização das crianças, capitais cultural, social e informacional, e ao

habitus comum ao grupo no sentido defendido por Pierre Bourdieu.

A seleção de ingresso permite à escola acolher os alunos mais aptos, mais

bem preparados para vivenciar a ação pedagógica. Participar da seleção do colégio

interessa àqueles que entendem a ação pedagógica que ali ocorre como a mais

adequada aos seus propósitos. Essa “peneira” garante uma adequação das

propriedades sociais e culturais dos alunos selecionados ao estilo da escola. Assim,

a ação escolar se faz numa população já motivada e com habitus favoráveis à sua

atuação.

A primeira barreira que se impõe de acesso ao colégio é a barreira

informacional. As camadas populares nem sabem da existência ou importância do

CAp, e quando sabem ele não integra o horizonte de expectativas possíveis ao

grupo. O capital informacional amplamente discutido por autores como Dantas

(2002) e Brandão (2010) como desdobramento do capital cultural, de que fala Pierre

Bourdieu, exerce importância sobre as escolhas dessas famílias e diferenças sobre

o rendimento dos estudantes. O capital informacional, em conjunto com o capital

cultural e social, torna os diferentes espaços conhecidos, familiares, acessíveis e

possíveis ao grupo possuidor de informação e de uma rede de amigos e familiares

que conhecem e valorizam tais espaços.

Outro aspecto favorável é o espaço doméstico adequado à realização dos

estudos; e a disponibilidade familiar de um tempo maior e “melhor”, por assim dizer,

para investir em práticas educacionais e culturais. A família exerce uma gestão do

cotidiano desses estudantes que possivelmente se desdobram em habitus

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34

favoráveis à escolarização. São valores, práticas, rotinas e modo de valorizar a

cultura e a educação que constroem disposições permanentes favoráveis ao

aprendizado escolar (BRANDÃO, 2010).

Neste estudo, partimos do pressuposto de que as famílias que escolhem o

CAp da UFPE, as camadas médias intelectualizadas, efetuam certo “malabarismo”

para a aprovação na seleção de ingresso e mobilizam estratégias não

necessariamente planejadas, mas orquestradas e orientadas para o sucesso escolar

dos filhos. Isso ocorre porque carregam consigo uma certeza, uma garantia do

sucesso que se deve ao habitus do grupo, e que é reforçada a cada êxito, ou

resposta positiva que suas crianças lhes fornecem. Nesse sentido, a escolha do

colégio não é aleatória, ela faz parte do campo dos prováveis, do leque de

possibilidades que os pais possuem e está, estritamente, relacionada às

perspectivas de futuro dessas famílias.

As escolhas que entendemos ser fruto de uma “tomada de consciência” são,

na verdade, o habitus em ação, tal princípio é gerador e unificador de todas as

práticas e nos faz confundir “escolha” com “vocação” ao associarmos as escolhas

dos sujeitos à ideologia do dom, quando na realidade estas se mostram ajustadas às

condições objetivas e esperanças subjetivas deles. As condições de existência dos

grupos constroem as esperanças subjetivas dos que dele fazem parte, por lembrar a

cada um diariamente seus “destinos” prováveis (BOURDIEU, 2009).

O habitus é um princípio expresso na maneira de ser, de agir e de se

posicionar no mundo comum a membros de um determinado grupo social. Ele diz

das possibilidades individuais, permite ao sujeito afirmar “isso não é para mim”,

“essa escola sempre foi nossa primeira opção”, “eu tinha certeza de que iria passar”.

Podemos dizer, assim como a máxima tomista, que ele leva os sujeitos a viver

“segundo seus gostos” e “conforme a sua posição” (BOURDIEU, 2009, p.107).

Os conceitos de Habitus e Representações Sociais, embora forjados em

contextos epistemológicos diferenciados, nos permitem dialogar sobre a

subjetividade, sua construção a partir de condições objetivas e como as disposições

incorporadas se expressam nas práticas objetivas dos sujeitos. Nosso entendimento

é de que a subjetividade deve ser buscada considerando-se o contexto objetivo e as

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condições de existência dos indivíduos que as expressam, pois a subjetividade

também é fruto dessa objetividade.

Nessa perspectiva, se constituem como de suma importância os estudos

sobre a relação que os diferentes sujeitos estabelecem com a educação escolar e as

condições objetivas para atingir os fins pretendidos. Eles possibilitam pensar nos

processos subjetivos e objetivos que desencadeiam fracassos ou êxitos escolares.

Como dito anteriormente, a excelência escolar das escolas de prestígio torna-

se um atrativo para as famílias que investem no sucesso escolar dos filhos,

manifesta nos pais e nos seus rebentos uma autodeterminação e investimentos

pessoais. Consideramos que a escolha das famílias pelo Colégio de Aplicação da

UFPE não é aleatória; é uma escolha orientada e carregada de sentidos

compartilhados sobre o objeto e relacionada às perspectivas de futuro dessas

famílias. Assim, torna-se relevante compreender como pais e alunos representam

esse colégio de prestígio. Neste sentido, a presente pesquisa procura responder as

seguintes questões: o que pensam pais e alunos sobre o Colégio de Aplicação da

UFPE? Quais crenças e significados são atribuídos ao colégio? Qual a estrutura

dessa representação? Por que tantas mobilizações para estudar na instituição? Por

que esta e não outra escola? Quais estratégias são mobilizadas pelas famílias para

garantir o acesso e a permanência dos filhos no colégio? Quais as perspectivas de

futuro que estão atreladas ao ingresso e a permanência no CAP da UFPE? Quais

relações podem ser percebidas entre o habitus dos estudantes e as representações

sociais que eles têm do colégio? Capturar essas crenças, imagens, desejos e

expectativas associadas ao Colégio de Aplicação é o que pretendemos com o

presente estudo.

Na tentativa de responder aos questionamentos acima propostos, adotamos

como aporte teórico-metodológico para este estudo a Teoria das Representações

Sociais (TRS), que permite investigar “[...] como se formam e como funcionam os

sistemas de referência para classificar pessoas e grupos, e interpretar a realidade

cotidiana” (ALVES-MAZZOTTI, 2008. p. 18). Nesse sentido, os sujeitos constroem

concepções e interpretações próprias sobre um determinado objeto, que levam as

condutas difundidas na sociedade. Daí a importância de estudar nosso objeto,

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36

construído socialmente, e os conceitos que o envolvem, à luz das representações

sociais.

A Teoria das Representações Sociais proposta pelo psicólogo social francês

Serge Moscovici foi o caminho que escolhemos para capturar as produções

simbólicas dos grupos. As produções simbólicas expressam um saber sobre o real,

as identidades, tradições e culturas que dão forma a um modo de vida

(JOVCHELOVITCH, 2005). Por permitir relacionar processos cognitivos e práticas

sociais; e por seu papel na orientação das práticas e condutas, as representações

sociais precisam ser estudadas e compreendidas como sistemas simbólicos que

interferem nas interações intra e extra escolares, influenciam no processo

educativo, contribuindo para a produção de sucessos e fracassos escolares

(ALVES-MAZZOTTI, 2003). Deste modo, é relevante estudar as representações de

pais e alunos sobre o colégio de aplicação da UFPE para compreender qual o valor

simbólico atribuído à instituição pelos sujeitos, se este valor está atrelado às

perspectivas de futuro e se essas representações estão direcionando as condutas

e mobilizando os sujeitos a acionarem o habitus, os capitais e as estratégias

próprias de seu grupo.

A TRS desdobra-se em três correntes complementares que serão

apresentadas mais adiante, a que subsidia a nossa pesquisa é a Teoria do Núcleo

Central proposta por Jean Claude Abric. A escolha por tal abordagem se deu por

possibilitar a identificação do núcleo articulador dessas representações, por permitir

o conhecimento do elemento, ou dos elementos essenciais que permeiam o

universo simbólico do sujeito na relação que estabelece com o objeto representado.

E, principalmente, por nos possibilitar pensar em como tais representações orientam

as práticas desses sujeitos. O forte desta abordagem é permitir a articulação entre

práticas e representações sociais, pois nessa abordagem é irrecusável a relação

entre ambas. Os seus representantes se preocupam, inclusive, em compreender

como ocorrem as transformações das representações em decorrência de novas

práticas sociais.

Com este estudo, busca-se compreender as Representações Sociais do

Colégio de Aplicação da UFPE segundo alunos e pais, caracterizando e

analisando os sentidos e significados atrelados às perspectivas de futuro. E,

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mais especificamente, identificar o conteúdo e a estrutura das representações

sociais de pais e alunos referentes ao colégio de aplicação da UFPE; caracterizar as

razões/ fatores que levam as famílias a escolherem um colégio considerado de

referência para escolarização dos filhos; identificar as perspectivas de futuro de

alunos e pais e sua relação com o ingresso e permanência no colégio; identificar as

estratégias mobilizadas pelos estudantes para fazer parte do quadro de alunos da

referida escola e aquelas que continuam sendo utilizadas para se manter na

instituição; apreender a relação entre habitus e representações a partir das

estratégias utilizadas pelos sujeitos para garantir o acesso e a permanência ao

colégio.

O estudo foi desenvolvido em três fases. Na primeira os sujeitos responderam

a um Teste de Associação Livre de palavras, com o qual tinham que evocar palavras

associadas ao termo indutor “Colégio de Aplicação”. O intuito desta etapa foi

identificar o conteúdo e a estrutura das representações. Anexo ao teste de

associação livre, responderam a um questionário socioeconômico que nos permitiu

traçar um perfil das famílias que acessam a instituição e definir critérios para os

participantes da próxima etapa. Para análise desta etapa, utilizamos o quadro de

quatro casas com o auxílio do software EVOC.

Na segunda fase, nos valemos das Triagens Hierárquicas com a intenção de

confirmar a saliência da representação encontrada na fase anterior. Os sujeitos

tiveram que hierarquizar os termos tidos como centrais ou mais salientes da

representação e selecionar aquele que consideravam mais relevante dentre as que

compunham o repertório. A análise ocorreu de duas formas: cálculo de frequência e

Análise de Conteúdo das justificativas dos sujeitos.

Na terceira fase, realizamos entrevistas Individuais semiestruturadas. No

contato com os sujeitos nos foi possível apreender de forma mais aprofundada os

sentidos que estudantes e pais compartilham do CAp-UFPE . Essa fase nos

permitiu, ainda, identificar as estratégias familiares para acessar a instituição e as

perspectivas de futuro das famílias. Nessa etapa, de forma mais sistematizada,

tratamos sobre a operacionalização do conceito de habitus em aproximação com a

Teoria das Representações Sociais. Para análise das entrevistas utilizamos como

suporte a Análise de Conteúdo de Bardin.

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38

2. COLÉGIO DE APLICAÇÃO: ORIGENS, CONSOLIDAÇÃO E PERSPECTIVAS

2.1. HISTÓRICO DOS COLÉGIOS DE APLICAÇÃO NO BRASIL

2.1.1. Como nasce uma ilha de excelência? Como dito anteriormente, os Colégios de Aplicação caminham na contramão

dos resultados insuficientes das demais escolas públicas (municipais e estaduais).

Tais instituições,ao obterem resultados acima da média, funcionam como uma

realidade à parte, instituições diferenciadas das demais. Elas se sobressaem,

inclusive, por estarem vinculadas às universidades federais e liderarem os rankings

das avaliações às quais seus alunos são submetidos.

Em virtude de discutir neste projeto a excelência escolar e termos tomado

como objeto e campo de pesquisa o CAp da UFPE, faz-se um resgate histórico do

surgimento dos Colégios de Aplicação no Brasil e em especial do CAP-UFPE, no

intuito de compreender como a instituição foi se construindo como “colégio bem

sucedido”. Para recuperar essa trajetória se tomou como instrumentos de apoio

documentos oficiais que certificam sua origem; relatos dos fundadores da unidade

em Recife e de ex-alunos8 e documentos que contam a própria história da

Universidade.

2.1.2. Colégio de Aplicação: o projeto

Os Colégios de Aplicação brasileiros surgiram como projeto em 1944, quando

Lourenço Filho - diretor do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

Anísio Teixeira (INEP)- confiou ao professor Álvaro Neiva a tarefa de iniciar os

primeiros estudos para implantação dos colégios de demonstração, vinculados às

Faculdades de Filosofia.

A concepção de Colégio de Aplicação tem sua origem ligada ao movimento

da escola nova, a partir da filosofia de John Dewey em torno da experiência. Essas

escolas-laboratórios foram concebidas para serem espaços ideais, nos quais os

conhecimentos teóricos se transformariam em prática pedagógica. Tudo isso

8 Os relatos são fruto de um Dossiê publicado pela editora universitária da UFPE “Colégio de

Aplicação da UFPE, 40 anos, 1958-1998: um autorretrato”.

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ocorrendo em contextos reais de ensino-aprendizagem (BISPO, 2011). Desta forma,

sua origem está relacionada à proposta de construir um espaço no interior da

universidade, com condições práticas/experienciais para formar professores.

Inspirado nos colégios norte-americanos, Theacher’s College, e no Institut

Jean- Jaques Rousseau, em Genebra, esse modelo de colégio foi pensado para ser

espaço de destaque na pesquisa educacional e campo experimental. Segundo

Frangella (2000), as discussões em torno da criação de instituições desse tipo

tiveram início em 1939, ano em que o Ministro Gustavo Campanema anunciou a

criação do Colégio José Bonifácio, que só se efetivou em 1942, com orientações que

se assemelhavam ao posterior projeto encomendado por Lourenço Filho.

Os Colégios de Aplicação foram criados através do Decreto Lei nº 9.053 de

12 de março de 1946 que estabeleceu a obrigatoriedade das Faculdades de

Filosofia de manter um Ginásio de Aplicação destinado à prática docente dos alunos

matriculados no curso de Didática (BRASIL, 1946).

Em artigo publicado na Gazeta de São Paulo, em 1957 e reproduzido na

íntegra pela Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos do mesmo ano, o então

Ministro da Educação e Saúde Pública Ernesto Gaspar Campos explica o porquê de

situá-los em ambiência universitária e de estabelecimentos comuns não servirem a

tal propósito:

Impõe-se, para o objetivo da prática magistral, uma instituição intimamente

ligada à Faculdade de Filosofia, recebendo de suas cátedras o influxo de

sua sabedoria, do seu material, do seu aparelhamento e (ponto importante)

condicionada à flexibilidade experimental. Do contrário cairíamos na mesma

rotina que se pretende aperfeiçoar (Revista Brasileira de Estudos

Pedagógicos, 1957, p. 241).

Percebemos, assim, a clara intenção de organizar um campo de

experimentação pedagógica, que fugisse ao comum para influir no comum. Os

objetivos iniciais da criação de tais colégios assim se resumiam:

1º Proporcionar a prática didática em casa de ensino apropriada, dotada de

todos os recursos para tal finalidade.

2° Instituir uma casa de ensino modelar para estímulo e emulação de outras

do mesmo grau.

3° Abrir, sob a égide da Faculdade de Filosofia, um campo experimental

palpitante e evolutivo (Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 1957, p.

242).

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A obrigatoriedade de manutenção dessas instituições não se efetivou

imediatamente por todo o país, ao contrário, a marcha seguiu lenta nos primeiros

dez anos. As Faculdades - cada uma a seu modo e a seu tempo- foram

respondendo à incumbência legal e organizando-se em torno desse projeto. A

natureza do vínculo entre as escolas e instituições de ensino superior, assim como a

estrutura também variaram, conforme o contexto de cada uma delas. Na década da

publicação do referido decreto, dois colégios foram criados (UFRJ e UFBA), nas

duas décadas seguintes, foram criados mais 10, e entre os anos 1970 e 1980 foram

criados mais quatro, o último colégio (CAP de Rondônia) foi criado em 1995.

Conforme o relatório do CONDICAp9 (2011), no ano de 1993 o país abrigava 16

colégios. Atualmente existem 17 Colégios de Aplicação vinculados às universidades

federais. O grau de vinculação com a universidade também é variado, alguns

vinculam-se à Pró-Reitoria de Graduação, aos centros, faculdades ou aos

Departamentos de Educação.

Com o passar do tempo, à denominação “Ginásios de Aplicação” foi dando

lugar a “Colégio de Aplicação” acompanhando as mudanças estruturais/ legais do

Ensino brasileiro. O Primário e o Ginasial foram unificados e a escola passou a ser

organizada em um contínuo de oito séries. Além do mais, esses espaços passaram

a atender outros níveis de ensino além do ginasial (secundário), não cabendo mais a

denominação. Hoje em dia, esses colégios atendem a Educação Infantil (EI);Ensino

Fundamental (EF) - anos iniciais (1º ao 5º ano- EF1) e finais (6º ao 9º ano- EF2);

Ensino Médio (EM); Ensino Médio Normal (EMN) e a Educação de Jovens e Adultos

(EJA).

O grau de vinculação desses colégios com a universidade e os níveis e

modalidades de ensino a que atendem estão organizados na tabela a seguir.

9Conselho Nacional dos Dirigentes das Escolas vinculadas às Instituições de Ensino Superior.

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Tabela 1-Grau de Vinculação, níveis e modalidades de ensino dos CAps

Fonte: CONDICAp, 2011.

Nome/ Universidade Ano de

Criação

Vinculação Nível e

modalidade de

Ensino

ensino Colégio de Aplicação, UFRJ 1948 Centro de Filosofia e

Ciências Humanas EF1- EF2- EM

Colégio de Aplicação da

UFRGS

1954 Gabinete do Reitor

EF1-EF2-EM-

EJA

Centro Educacional- CP, UFMG 1954 Faculdade de

Educação EF1-EF2-EM-EJA

Colégio de Aplicação CAP,

UFPE

1958 Centro de Educação EF2-EM

Colégio de Aplicação- CODAP-

UFS

1959 Pró-Reitoria de

Graduação EF2-EM-EJA

Colégio de Aplicação da UFSC 1961 Centro de Ciências da

Educação EF1-EF2-EM-EJA

Núcleo de Desenvolvimento

Infantil, UFSC

1961 Centro de Ciências da

Educação EI

Colégio de Aplicação, UFPA 1963

Centro de Educação EI-EF1-EF2-EM-

EMN-EJA

Colégio de Aplicação João

XXIII, UFJF

1965 Pró-Reitoria de

Graduação EF1-EF2-EM-EJA

Colégio de Aplicação- COLUNI,

UFV

1965 Pró-Reitoria de Ensino EM

Centro de Ensino e Pesq.

Aplicada- CEPAE, UFG

1968 Centro de Ensino e

Pesquisa Aplicada à

Educação

EF1-EF2-EM

Colégio Universitário – COLUN,

UFMA

1968 Reitoria EF1-EF2-EM

Escola de Educação Básica-

ESEBA, UFU

1968 Pró-Reitoria de Ensino EI-EF1-EF2-EJA

Núcleo de Educação Infantil,

UFRN

1979 Centro de Ciências

Sociais Deptº de

Educação

Educação

EI-EF1

Colégio de Aplicação, UFAC 1981

Centro de Educação EI-EF1-EF2-EM

Colégio de Aplicação, UFRR 1995 Centro de Educação EF1-EF2-EM

Colégio Universitário Geraldo

dos Reis, COLUNI, UFF

2006 Pró-Reitoria de

Graduação EI-EF1-EM

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Os ginásios de aplicação, além de servirem de campo de formação para os

professores,teriam outro objetivo ambicioso: desenvolver práticas pedagógicas

inovadoras. Assim, não se tratava, apenas, de funcionarem como locus de

formação, mas, sobretudo, espaço de experimentação pedagógica, de novas

orientações técnicas e metodológicas para a renovação e melhoria do ensino nos

segmentos conhecidos, hoje, como Fundamental e Médio. Deriva, dentre outros

aspectos, do caráter simbólico desse objetivo, a forte tendência ao ensino de

excelência em tais colégios. No entanto, tratadas um pouco mais adiante, neste

texto, outras questões que também colaboram para estes colégios se diferenciarem

dos demais, tais como: a instância a que estão relacionados, o fato de se

localizarem em ambiência universitária, a qualificação dos profissionais e, em alguns

casos, alta seletividade do alunado.

Segundo Castro (1993) apud Santos (2004) essas escolas foram muito

procuradas por pessoas com grau de instrução elevada, intelectuais e professores,

que almejavam para seus filhos a experiência diferenciada do colégio piloto. O

investimento necessário de recursos materiais e humanos para atingir os objetivos

propostos e o valor simbólico que essas instituições vêm adquirindo em função de

seus resultados contribuíram para que tais colégios se diferenciassem cada vez

mais das escolas públicas com as quais convivemos.

2.1.3. Pensando e repensando os Colégios de Aplicação

Apesar de lograrem êxito na esfera do desempenho e avaliações

institucionais, os Colégios de Aplicação atravessam uma crise, que não é recente,

pois há anos essas instituições vivem sobre a ameaça de extinção e

desfederalização. Encontros e seminários são realizados, na tentativa de discutir

alternativas as demandas urgentes desses colégios. Tais encontros constituem

momentos de troca de experiências entre profissionais e alunos em contextos

diferenciados; espaços de reflexão sobre a importância de tais colégios; socialização

de ideias; organização e mobilização a nível nacional, visando garantir o ensino de

excelência em tais espaços.

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Esses eventos não são recentes, pois ocorrem desde a década de 1980.

Questões como a função dos CAps e condições necessárias para garantir a

educação pública gratuita e de qualidade que eles oferecem são pautas de tais

encontros. Os colégios continuam a ser pensados e (re) pensados para não

perderem sua essência, mas, ao mesmo tempo, alinharem-se aos desafios atuais.

De acordo com Santos (2004), o período de redemocratização do Brasil e o

processo de abertura política permitiram aos profissionais da educação

movimentarem-se no sentido de reivindicar melhores salários, reconquistar a

democracia no interior das escolas e lutar contra as ameaças de extinção. Nesse

contexto, meados dos anos 1980, professores realizaram greves em vários pontos

do país, reivindicando não apenas melhores condições salariais e de ensino, mas

uma definição do papel dessas instituições e uma política de inserção e interação

dos colégios com a universidade, seus institutos e com o sistema de ensino estadual

e municipal, bem como um enquadramento profissional específico.

No decorrer dos anos, alguns encontros aconteceram com o intuito de

responder às demandas específicas de tais colégios. Dentre os destaques está o

primeiro encontro de professores das Escolas de Aplicação, que ocorreu em

Florianópolis, em outubro de 1985. Naquela ocasião, os professores tentam se

organizar, visando uma maior autonomia didática, pedagógica e administrativa.

Outro marco importante para a história dessas escolas foi o III Encontro

Nacional das Escolas Universitárias (III ENEU), que ocorreu no Rio Grande do Sul

em 1990. Ali se realizaram discussões e definições acerca do papel dos colégios,

sua inserção na universidade, o ingresso e a permanência dos alunos na instituição,

dentre outros aspectos. Os princípios que nortearam a criação de tais colégios são

expressos no relatório deste evento, alinhando-se aos do eixo universitário ensino-

pesquisa-extensão, no sentido de superar os problemas educacionais da

comunidade.

O III ENEU teve como resultados uma reafirmação do papel do colégio como

campo de estágio; necessidade de articulação com a comunidade acadêmica e as

demais instituições de ensino; além de atentar para a luta em tornarem-se unidades

autônomas, alcançando tal objetivo em todas as dimensões: autonomia didática,

pedagógica, administrativa e financeira. Alguns aspectos, tais como: filosofia e

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proposta curricular, deveriam ser definidos por cada instituição, conforme as

diferentes realidades vivenciadas e o acesso ao colégio. Esse último teve como

orientação comum ser um ingresso democrático.

No âmbito da campanha de elaboração do Plano Decenal de Educação para

Todos, foi realizado pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), em 1993, o

seminário “Repensando as Escolas de Aplicação”. Esse evento tinha por objetivo

formular um programa de apoio aos Colégios de Aplicação, estabelecendo linhas de

ação para o desenvolvimento de uma educação básica de qualidade (SANTOS,

2004). Tal apoio se materializou numa proposta conjunta (MEC e diretores dos

CAp´s de todo Brasil) de redimensionamento e redirecionamento dos papéis e

funções dessas instituições.

Nos dias atuais, várias questões inquietam os profissionais dos CAps, tais

como: a identidade dos colégios, diretrizes e normas de funcionamento,

democratização do acesso, avaliação, financiamento, autonomia universitária,

carreira docente única, déficits de professores efetivos, tendência de precarização

das condições de trabalho com o estabelecimento de metas e a tentativa da

administração desses colégios ficar a cargo dos estados e dos municípios. Essas

questões continuam a ter como fórum legítimo de debates os encontros nacionais.

Em março de 2011, tornou-se pública a versão preliminar de uma portaria do

MEC que trata da regulamentação dos Colégios de Aplicação. O Sindicato Nacional

dos Docentes das Instituições do Ensino Superior (ANDES) designou uma comissão

para analisar o documento e chegou a conclusão de que ele representa uma

ameaça de reconfiguração dos colégios, fato que causou muita polêmica e foi motivo

de vários debates. O texto, ainda não publicado oficialmente, está sendo criticado

por ferir a autonomia universitária dos Colégios de Aplicação (ADUFRJ, 2011).

A discussão tem sido acirrada, em especial sobre a ameaça de transferir a

responsabilidade pela manutenção e administração de tais instituições para a esfera

dos estados e dos municípios. Os debates têm abarcado questões como a

precarização das condições de trabalho, estabelecimento de metas que serão

avaliadas, padronização dos colégios e estabelecimento do aumento dos RAP

(Relação Aluno Professor), dentre outros aspectos.

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Em resposta à proposta do governo de reconfiguração dos colégios, foi

realizado em 2011 o seminário “Em defesa da autonomia universitária: colégios de

aplicação, formação docente e educação pública de qualidade”, em Brasília-DF, na

sede do ANDES-SN, nos dias 22 e 23 de agosto. O evento conseguiu reunir

representantes de 13 colégios devido à urgência na elaboração de uma contraposta.

Nesse encontro, as questões da autonomia universitária e da carreira única foram

amplamente discutidas, bem como os demais aspectos da portaria preliminar. O

relatório final do seminário ressalta o caráter universitário dos CAps, a efetiva

participação dos seus professores no desenvolvimento da pesquisa, ensino e

extensão e, principalmente, seu papel fundamental na formação docente, tanto

inicial quanto continuada (BARROS, 2011). Tal posição nega as colocações do

Governo Federal que justifica as medidas a serem implementadas porque os CAps

não estão cumprindo a sua função de formação de professores.

As discussões não cessaram, os professores continuam mobilizados junto

aos sindicatos por melhores condições de trabalho, regulamentação dos colégios,

defesa da carreira única e a continuidade do ensino de qualidade ministrado nessas

instituições. Passados quase 70 anos da criação dos CAps, a (re) definição da

função e regulamentação desses espaços, ainda, constituem desafios a serem

enfrentados.

2.2. O Colégio de Aplicação da UFPE: das origens aos caminhos da

excelência10.

O Colégio de Aplicação da UFPE foi fundado aos 10 de março de 1958,

anexo à Faculdade de Filosofia, tendo assumido a função de laboratório

experimental. Voltado para elaboração de técnicas pedagógicas e educacionais que

seriam repassadas às escolas das redes de ensino municipais, estaduais e

instituições privadas, bem como para servir de campo de estágio aos estudantes do

curso de licenciatura da UFPE e de outras instituições superiores.

10

Este item foi construído com base nos relatos que constam no Dossiê publicado pela editora universitária da UFPE “Colégio de Aplicação da UFPE, 40 anos, 1958-1998: um autorretrato”, e a partir das informações fornecidas na página eletrônica do colégio http://www.ufpe.br/CAp/

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Nas palavras da primeira orientadora Educacional do Serviço de Orientação

Educacional (SOE) o CAP da UFPE:

Surgido por força de dispositivo legal, destinava-se ao estágio futuro de

professores do ensino de 1º e 2º graus, servindo-lhes de laboratório. De

modo análogo ao funcionamento da Faculdade de Medicina com os

hospitais-escolas. Aos responsáveis pelas disciplinas Didática Geral e

Didáticas Especiais, dos cursos ministrados pela Faculdade de Educação

coube pensar essa instituição como órgão de orientação dos conteúdos

programáticos, testando a validade dos vários métodos de educação e de

ensino com o compromisso da investigação e da experimentação

pedagógicas. Daí se pode imaginar a responsabilidade da equipe de

educadores no sentido da criação das metodologias mais adequadas à

produção do aprendizado nos vários campos do conhecimento oferecidos

aos alunos do 1º e 2º graus (p.14).

Um terceiro objetivo do CAP-UFPE seria “promover a formação integral dos

alunos do ensino fundamental e médio”. É comum entre os relatos dos educadores,

publicado no dossiê mencionado na nota Nº4, a afirmação de que todas as aulas

eram pensadas visando à formação do aluno em sua totalidade. Assim, criou-se um

clima propício a educação integral desenvolvendo os aspectos intelectual, físico,

competências artísticas (musical, plástica e literária), social e emocional. Havia um

incentivo à fala, à livre expressão do pensamento, à verbalização das reivindicações

e protestos, ao pensar crítico.

Os alunos vivenciavam uma educação que era um misto de ensino de

qualidade, autonomia e disciplina11. Cada aluno possuía voz e vez, mas também

estava ciente de suas responsabilidades, limites e consequências de suas ações.

Construiu-se um espaço de cobrança mútua, em que alunos e professores se

exigiam e se responsabilizavam pelo processo de ensino-aprendizagem. Naquele

espaço não existia apenas um responsável por ensinar e outro por aprender, mas

ambos os sujeitos estavam envolvidos com o processo. Havia, pois, um espírito de

corresponsabilidade de toda a comunidade escolar. No dizer da orientadora

educacional do SOE entre 1958 e 1972, “Direção, orientação educacional e

orientação pedagógica convergiam para os ideais de liberdade e autonomia,

11A disciplina nesse contexto é no sentido de um comprometimento com os estudos, disciplina intelectual e organização pessoal, de horários de estudos, acompanhamento das matérias, dentre outros. Uma responsabilização pela própria aprendizagem. Uma disciplina interiorizada, que também envolve aspectos comportamentais, mas sem necessariamente, implicar um outro que ordene ou vigie.

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47

trabalhando dinamicamente nos limites consensuais dos princípios de liberdade e

disciplina” (UFPE, 1998, p.14). Um dos educadores recordando a missão da escola,

afirma que esta consistia em:

Formar, educar atentos às diferentes personalidades individuais, um homem

no sentido genérico, capaz de vivenciar o dia a dia. Nosso trabalho consistia

em manter um grupo coeso de mestres, tornando o ensino atraente, capaz

de fazer com que os alunos descobrissem por si mesmos as verdades

inerentes (p.30).

Ao desenvolver projetos interdisciplinares, desafiadores, polêmicos a

instituição exercia fascínio sobre os educadores e conquistava também os alunos,

promovendo uma pedagogia crítica e de liberdade, ensinando-os a questionar, a

sempre perguntar o porquê das coisas. Emídio Ferreira12 (ex-aluno) relembrando a

educação que recebeu no CAP afirma: “Reconheço e relembro quão eficazes foram

nossos educadores no método de fazer-nos pensar”(UFPE, 1998, p.56). O caráter

experimental do colégio dava liberdade ao professor de elaborar o seu currículo

escolar, desenvolvendo práticas pedagógicas diversificadas e criativas. Um espaço,

que no dizer da professora de língua portuguesa Kátia Leite, não era para dar

aula/frequentar aulas, mas um lugar para ensinar/aprender, construir e aplicar o que

se estudava.

Ainda, no que se refere ao aspecto experimental, os professores relembram

que tudo quanto faziam era testado, discutido, avaliado, passo a passo. E o colégio

progredia tanto, que os alunos daquela instituição não necessitavam de cursinhos

particulares para enfrentar o ensino superior. Professores recordam, sem grandes

surpresas, de turmas de 3º ano aprovadas integralmente no vestibular.

O CAp foi construindo um Capital simbólico, uma maneira diferenciada de

atuar nos anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio ao longo dos anos,

através de práticas reflexivas e metodologias adequadas visando à aprendizagem

satisfatória de seus membros, fossem eles discentes ou docentes em exercício ou

em formação. Por ser um colégio laboratório, campo de experimentação para

estudantes de licenciatura, o colégio passa a representar uma escola pública bem

sucedida destinada a alunos selecionados.

12

Depoimento contido na publicação “Colégio de Aplicação da UFPE, 40 anos, 1958-1998: um autorretrato”.

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48

A clientela do colégio era composta, predominantemente, por crianças da

classe média, filhas de educadores, professores universitários e funcionários

públicos. Essas crianças e jovens já revelavam um bom nível de instrução, pois a

seleção de ingresso sempre se fez rigorosa e competitiva. Conforme divulgado na

citada publicação, os alunos que passaram pelo CAp reconhecem que pertenceram

ao grupo dos privilegiados, ainda que, na época, “[...] não entendessem em sua

totalidade a experiência pedagógica que estava em curso” (UFPE, 1998, p.58). Os

profissionais também eram de uma competência ímpar, e se na época da fundação

do colégio foram indicados os de renome para assumir as disciplinas ginasiais, a

exigência por uma melhor qualificação foi reforçada com a posterior seleção de

profissionais provenientes de cursos de mestrado e doutorado.

Como aponta o documento, o fato de ser mantido e desenvolvido pelo

sistema público federal e localizar-se em ambiência universitária, também, contribuía

para sustentar seu um status de colégio modelo. O espaço não era milagroso, os

problemas estruturais estiveram presentes como na maioria das escolas públicas,

mas, com um pouco de boa vontade, foram sendo contornados. Mas, se é verdade

que a construção da excelência depende, em grande parte, das pessoas, o colégio

possuía recursos humanos de qualidade que se beneficiaram dos currículos

inovadores e dinâmicos - a soma desses fatores o fez adquirir o status de escola

pública de sucesso, colégio modelo.

2.2.1. O Colégio de Aplicação da UFPE hoje13

Atualmente, o Colégio de Aplicação da UFPE oferece os anos finais do

Ensino Fundamental e o Nível médio. A instituição atende a um total de 413 alunos,

destes 245 estão cursando o Ensino Fundamental e 168 o Ensino Médio. Os

estudantes ingressaram no colégio através da seleção pública, que o CAp realiza ao

final de cada ano letivo para compor as turmas de 6º ano do ano seguinte.

A seleção de ingresso supracitada funciona como um verdadeiro

“vestibulinho”. Os candidatos submetem-se a testes de português e matemática com

13

Este item foi construído com base no Projeto Político Pedagógico do Colégio de Aplicação da UFPE, atualizado em Dezembro de 2012, que se encontra disponível em: http://ufpe.br/CAp /

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49

questões elaboradas por comissão composta pelos próprios professores do colégio.

A disputa é acirrada. As quase duas mil crianças que se inscrevem a cada ano são

oferecidas apenas 55 vagas. Esse quantitativo se deve ao fato da escola trabalhar

com duas turmas por ano oferecido, em regime de jornada ampliada, e por serem as

turmas compostas de no máximo 30 alunos. Para as demais séries há

oportunidades de ingresso extra, quando do surgimento de vagas ociosas.

O número de estudantes por turma, limitado a 30, permite que o professor dê

maior suporte ao aluno em suas aprendizagens. Aliado a isto, a alta seletividade faz

com que o colégio componha grupos de alunos diferenciados. A prova dessa

diferenciação é que a instituição obteve, pelo terceiro ano seguido, o melhor Índice

de Desenvolvimento da Educação Básica do País- IDEB. Ainda, ocupa lugar de

destaque no ENEM e os alunos são classificados para olimpíadas nacionais e

internacionais de diversas áreas de conhecimento.

O êxito também é explicado, em parte, pelo quadro docente qualificado e

comprometido. São 51 professores efetivos e 06 substitutos14. Dentre os efetivos, 10

são especialistas, 24 mestres, 16 doutores e um graduado. Alguns dos docentes

estão articulados com a universidade, atuando na graduação e programas de pós-

graduação. Dos seis professores substitutos, cinco são mestres e um especialista.

Os professores de cada área se reúnem, semanalmente, para avaliação: são

engajados e colaborativos. Os pais são participativos, os alunos têm atividades

extraclasses e a equipe técnica empresta sua experiência em serviços como

orientação educacional.

Os serviços de orientação educacional, pedagógica e disciplinar também

apoiam o aprendizado dos discentes. A equipe do Serviço de Orientação

Educacional (SOE) é composta por seis docentes, doutores e mestres, além de dois

psicólogos e três pedagogos. Esses técnicos atuam no sentido de auxiliar na

escolha profissional, autoconhecimento, tomadas de decisão e crescimento pessoal

dos estudantes. O setor promove, ainda, reuniões com os pais no sentido de facilitar

a adaptação do estudante ao colégio. Além do SOE, há o Serviço de Orientação e

Experimentação Pedagógica (SOEP). Este setor é responsável pelas pesquisas

14

As informações foram recolhidas junto ao CAp em 2012 e constam no Projeto Político Pedagógico da instituição.

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50

realizadas no interior do colégio, pelo intercâmbio dos estudantes, pela avaliação e

acompanhamento dos projetos, que são realizados por pesquisadores externos.

O Serviço de Orientação e Apoio ao Estágio(SOAE) é o setor responsável por

receber e acompanhar os licenciandos e estagiários vinculados às Práticas de

Ensino I e II das diversas licenciaturas oferecidas pela UFPE. O colégio atende de

180 a 220 estagiários por semestre.

A proposta do ensino do CAp da UFPE é diferenciada. Há o incentivo da

criatividade, criticidade e autonomia. Os alunos vivenciam, além das aulas de

disciplinas convencionais, aulas de música, teatro, dança e língua estrangeira.

Também realizam atividades práticas em laboratórios de biologia, química e

informática e têm acesso às bibliotecas do Colégio e de todo o campus da UFPE.

Nas aulas de língua estrangeira os alunos são divididos: 15 alunos por sala e

cada turma é, ainda, subdividida por níveis a medida que avançam no domínio da

língua. No sexto ano, os estudantes são sorteados para compor a turma de inglês ou

francês. No Ensino Médio os estudantes aprendem uma segunda língua estrangeira.

O colégio atua com base no tripé Ensino-Pesquisa-Extensão. Como exemplos

das atividades de Pesquisa e Extensão, identificamos o Programa de Vocação

Científica para Alunos do Ensino Médio (PROVOC), a cooperação entre o Instituto

de Formação de professores de Montpellier e o CAp da UFPE, o projeto “Aids &

Escola: Prevenção e Solidariedade”, promoção de festivais de arte e cultura, dentre

outros.

O título de Colégio Federal e o ensino de excelência ministrado pelo CAp não

o tem poupado de vivenciar problemas estruturais, de financiamento, ou ameaças de

estadualização/ municipalização. Como já dito, atualmente, a mobilização é no

sentido de que a responsabilidade pela manutenção e administração dos Colégios

de Aplicação do país não seja transferida para os estados e municípios.

Outras questões de precarização estrutural, problemas de financiamento e

quadro de funcionários reduzido são observadas no atendimento aos alunos em

horário integral de aula. Os estudantes que têm turnos ampliados duas vezes por

semana tiveram o fornecimento de merenda interrompida no ano de 2012. Isso

ocorre devido à escola não ter estrutura para armazenar os alimentos, nem

profissional específico para o preparo, a alimentação dos estudantes ficava a cargo

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51

da Secretaria Municipal de Educação. Em novembro de 2011, o colégio foi

comunicado pela Prefeitura da Cidade do Recife de que não mais receberia essa

alimentação.

As questões acima referidas poderiam ser resolvidas se houvesse uma

definição de responsabilidades. No entanto, o receio dos gestores do CAP da UFPE

é que o colégio seja assistido pelo estado e/ou município, e com isso a qualidade do

ensino, enquadramento dos professores, e demais aspectos fiquem comprometidos.

Dentre as atuais discussões em pauta no CAp-UFPE está a ampliação de

oferta dos níveis de ensino. A proposta prevê oferecer a Educação infantil e o

Ensino Fundamental (1º ao 5º ano), o que em alguns anos substituiria

gradativamente a seleção de ingresso por sorteio, tornando o acesso à escola, como

recomendado no III ENEU, democrático.

Como já afirmado, desde a sua criação,o ingresso no CAp se dá por meio de

acirrada seleção de ingresso. Os resultados apresentados são inegáveis: o colégio

está no rol dos melhores do país, o que torna a instituição atrativa para os pais. Há

uma cultura seletiva escolar que perpassa o ingresso no CAp da UFPE (ALMEIDA;

LIMA, 2011). É sobre esse aspecto que vamos tratar no próximo tópico.

2.3. A SELEÇÃO PARA INGRESSO NO CAP

2.3.1. Critério neutro na seleção dos “melhores”

Estudos revelam a crença dos sujeitos de que o sucesso escolar oferece

condições ao alcance de sucesso em outras áreas(ACOSTA, 2005;NOVA, 2011;

NAIFF; NAIFF e SÁ, 2008). A decisão dos pais para que seus filhos façam parte de

uma instituição de referência advém de uma ideia de sucesso que se concretiza na

escola, uma ideia de cunho meritocrático.

A crença meritocrática tem suas raízes na massificação escolar, que rompeu

com a ideia de que a cada classe social é destinada um tipo de escola. As

desigualdades decorrentes de nascimento e da herança não mais impedem as

crianças de acederem à educação (DUBET, 2008). A seleção que ocorria antes da

escola deu lugar a uma seleção tida como mais justa, que ocorre no próprio

percurso escolar a partir da avaliação do mérito, qualidade e esforço individual dos

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52

estudantes. Neste sentido, são aprovados os que mais se adéquam às exigências

da instituição e da seletividade, que se torna uma cultura na atual sociedade

meritocrática. (ALMEIDA; LIMA, 2011). No entanto, a igualdade de oportunidade não

garante igualdade de resultados entre os alunos que vivenciaram socializações

diferenciadas.

Num discurso de “imparcialidade”, em que a escola aparentemente é neutra e

objetiva e que age com justiça, utilizando o mesmo peso e a mesma medida em sua

apreciação, os alunos são progressivamente incluídos e/ou excluídos do sistema

escolar numa dinâmica que se faz necessária ao bom funcionamento social. Pois, os

diferentes postos de trabalho precisam existir, as diferenças de classe e de

aspirações futuras, também. Deste modo, a escola precisa ignorar que os indivíduos

foram socializados de forma desigual. E o faz quando desconsidera o que cada um

já possui além ou aquém dos demais, em termos de familiarização com a cultura

difundida pela instituição escolar, e avalia os estudantes valendo-se dos mesmos

critérios (BOURDIEU, 2008; DUBET, 2008).Com isso a instituição legitima a

distinção entre os “melhores” e “piores”. Essa seleção contrapõe vencedores e

vencidos, reforça posições sociais, formando identidades durante o percurso escolar

(ALMEIDA; LIMA, 2011). Esse modelo faz da vida escolar uma vasta competição,

podemos, assim, temer que a escola perca, cada vez mais, o seu papel

efetivamente educativo (DUBET, 2003).

No entanto, a crença na justiça escolar implica aceitar que a competição

escolar é justa. E para os que aspiram obter êxito nessa competição, se faz

necessário manter-se no sistema e tirar um bom proveito dele. Desta forma, como

afirma Dubet (1998), os alunos constroem uma relação de utilidade com os estudos.

Nesta relação, que advém de um modelo de economia neoliberal, os sujeitos são

incentivados a se perceber como consumidores e a escola aparece como meio para

se obter recursos no dia de amanhã. Nessa perspectiva, o colégio, selecionado para

os filhos alcançarem os objetivos de êxito futuro, deve estar à altura de estabelecer

uma conexão entre os “esforços” dos estudantes e os benefícios que esperam em

termos de posições sociais e status econômico.

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2.3.2. A escolha do colégio

Todos os estabelecimentos escolares carregam consigo uma imagem, uma

reputação de acordo com o papel que desempenham e os resultados que

apresentam. Ao estabelecimento é atribuído um valor social em função de todas as

crenças e representações que se tem sobre ele. Assim, como afirma Jay (2002), o

valor atribuído a um colégio é definido pelos trunfos, capitas simbólicos, que ele

possui e que fazem a diferença em relação aos demais.

A instituição, que nos serve de campo de estudos e objeto de pesquisa, por

estar vinculada à esfera federal e ser uma instituição de ensino de referência

nacional, por si só é considerada prestigiosa. Este status lhe é conferido, ainda, por

estar dentro do campus da universidade e permitir que as crianças partilhem desde

cedo dos valores deste espaço social, ser composta por alunos altamente

selecionados, ter condições privilegiadas de ensino e capacitação dos profissionais

(NOGUEIRA, 2008). Desta forma, como apontam Almeida e Lima (2011, p.21):

A instituição não apenas leva os pais e alunos a desejarem fazer parte deste universo como a se sentirem, quando já pertencentes a ele, em altas condições de competição no vestibular e, ainda, a anteciparem um sucesso futuro.

No entanto, essas aspirações escolares se definem em relação às

oportunidades objetivas de cada um. Segundo Bourdieu (2008), os sujeitos

aprendem a desejar o provável e a excluir o improvável. Cria-se um campo dos

possíveis, no qual os indivíduos vão se familiarizando e adquirindo gostos que são

confundidos com vocação. Nesse processo, o leque de possibilidades do sujeito

torna-se maior ou menor de acordo com a socialização obtida. Deste modo, as

informações que se tem sobre as instituições escolares e as vantagens de

pertencimento ao grupo influenciam as aspirações escolares e contribuem, em parte,

para a inserção nestes espaços, à medida que estratégias são empreendidas para

este fim.

A decisão dos pais em submeter seus filhos à seleção do CAp da UFPE

ultrapassa a ideia de continuidade do ensino privado, visto que os índices de

sucesso desses alunos nas avaliações externas superam os dos estudantes de

instituições privadas, a exemplo do IDEB.

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54

2.3.3. A corrida é desigual, mas a escola prega como justa

Os exames de admissão que algumas instituições realizam funcionam como

uma peneira social, em que apenas os “melhores” conseguirão ocupar a vaga,

demarcar seu espaço, sua posição. Interessante constatar que essa seleção de

ingresso, numa falaciosa tentativa de proporcionar igualdade de oportunidades,

acaba por reforçar as desigualdades socialmente produzidas, pois as condições de

igualdade dos candidatos, se eles já eram “predispostos” a aprovação ou não, não

são consideradas. Ainda sobre essa questão:

Ser apto a competir, “predispondo-se ao sucesso”, significa investimento

nos estudos, hábitos e comportamentos culturalmente adquiridos diante da

escolarização. Entretanto, circula como verdade que esse saber é natural,

“o menino já nasceu assim, inteligente”, e esta ideia inatista desconsidera a

socialização da criança e as oportunidades que lhe foram oferecidas

(ALMEIDA; LIMA, 2011. p. 6).

De acordo com Vasconcellos (2006), o êxito escolar pode ser, em grande

parte, explicado pelos trunfos familiares socioculturais e linguísticos que a criança

possui fruto do investimento de seus pais em sua escolaridade. Ao selecionar os

“melhores” estudantes, a partir de seus desempenhos nos exames de admissão, o

colégio formata um grupo de alunos com status de sucesso. Compõe um grupo de

fácil trato, pois, as crianças, além de possuírem uma familiaridade com a cultura

escolar, já trazem na bagagem uma identidade de alunos de sucesso, que o colégio

tende a reforçar a partir das oportunidades e vivências nesse espaço.

A instituição, com infraestrutura necessária e um quadro de professores

qualificados tende a favorecer, ainda mais, o desenvolvimento dos seus alunos de

alta performance, colaborando para o sucesso desses estudantes no futuro que, em

tese, poderão ocupar as carreiras mais prestigiosas. Neste caso, o colégio, com os

elementos favoráveis ao trabalho pedagógico, define a qualidade não só da

instituição, mas dos estudantes. Como afirma Peregrino (2006, p. 100): “Os

melhores espaços oferecem melhores condições para que os “melhores”

mantenham suas posições”.

No caso da seleção de ingresso que acontece no colégio em foco, só nos

resta constatar que os “melhores” ocupam os melhores colégios. Desta forma: “É

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55

previsível que os grupos sociais com menos recursos econômicos e capital cultural-

no sentido de Bourdieu- tenham de recorrer a escolas carentes de benefícios e com

professorado desmotivado” (SANTOMÉ, 2001. p.12). No entanto, para jogar o “jogo

institucional” é necessário ter um mínimo de crença nele (BOURDIEU, 2008). Para

aqueles que aderem a essas medidas seletivas e restritivas de acesso à educação

de qualidade, porque se beneficiam ou “entram na dança” acreditando não ter

opção, cria-se uma verdadeira corrida por credenciais escolares.

A aprovação das crianças, inicialmente, é esclarecida ao analisar a

composição da clientela do Colégio de Aplicação que é composta, em sua grande

maioria, de alunos provenientes das instituições privadas mais prestigiosas da

cidade do Recife, localizadas em bairros tradicionais e centrais da cidade. A

pesquisa de Almeida e Lima (2011) indicou, ainda, que é ínfimo o número de alunos

da instituição oriundos da escola pública. Isto mostra como está demarcada a

clientela da escola.

Cumpre reafirmar que a nossa pesquisa se insere numa investigação das

dimensões simbólicas do objeto -Colégio de Aplicação. Deste modo, não

poderíamos ficar alheios à discussão da seleção de ingresso, as condições

favoráveis à aprovação na instituição e a crença meritocrática difundida de que a

ascensão social ocorre por meio da educação escolar. Nosso estudo, como dito

anteriormente, adota como aporte teórico-metodológico a Teoria das

Representações Sociais, que será apresentada no capítulo a seguir.

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56

3. REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E HABITUS: ABORDAGENS, CONCEITOS E

APROXIMAÇÕES

3.1. Bases epistemológicas: Do coletivo ao Social / Das representações

coletivas as representações sociais

A noção de representações sociais (RS) foi introduzida na década de 1960

pelo psicólogo social francês Serge Moscovici, que iniciou um processo de

elaboração teórica, retomando o conceito de representação coletiva proposto por

Émile Durkheim. As representações coletivas foram empregadas na elaboração de

uma teoria da religião, da magia e do pensamento mítico. Era um conceito que

abarcava uma gama de conhecimentos, para evidenciar o pensamento social da

humanidade, sem explicar os processos que dariam origem à pluralidade de modos

de organização desse pensamento. Tal abrangência, portanto, tornava o conceito

pouco operacional.

De acordo com a visão funcionalista de Durkheim, os fenômenos coletivos

não poderiam ser explicados em termos de indivíduo, pois ele por si só não pode

inventar uma religião ou uma língua, que são produtos de uma comunidade ou de

um povo. Durkheim teorizou que as categorias básicas do pensamento têm origem

na coletividade, e o conhecimento só pode ser encontrado na experiência social.

Para esse autor a individualidade se forma a partir da sociedade (NÓBREGA, 1990;

ALEXANDRE, 2004; MOSCOVICI, 2009).

Com esse referencial em mente, o modelo de sociedade pensado por

Durkheim era estático, com representações uniformes e impermeáveis às mudanças

individuais, determinadas exclusivamente pelo social. Elas serviam, pois, a uma

sociedade na qual a mudança se processava lentamente e, de certa forma, isenta de

confronto com a ciência. Moscovici (2009) entende que as representações coletivas

se viam isoladas do fluxo de intercâmbios sociais, não sendo possível observar

como as operações psíquicas se articulavam na vida concreta. Nesse contexto,“[...]

todo tipo de comportamento e cognição parece ser conformado pelo núcleo mítico e

ritual da tradição de um povo”(MOSCOVICI, 2009, p. 195). O conceito de

representações coletivas respondia a essa concepção de sociedade, na qual as

produções sociais se distinguiam de qualquer sensação ou consciência

particular,pois era mais lógico falar em reprodução do que em produção. O sociólogo

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Émile Durkheim assim se posiciona sobre o processo de construção das

representações coletivas: “Para produzi-las uma multidão de espíritos diversos

associaram, misturaram, combinaram suas ideias e seus sentimentos; longas séries

de gerações acumularam aí a sua experiência e o seu saber” (DURKHEIM, 1989, p.

11).

É interessante notar aqui que expressões como “uma multidão de espíritos” e

“longas séries de gerações acumularam”, indicam que, para o sociólogo, as

representações coletivas não eram realizações de um indivíduo isolado, não

dependiam dele para se produzirem, nem para se reproduzirem. É entendida como

produto de uma cooperação que ultrapassa o individual e se estende no tempo,

tendo leis próprias e pertencendo a outra natureza, diferenciada e até mais

“complexa” que a do pensamento individual. As representações coletivas eram

estáveis em sua transmissão e reprodução, e impostas às consciências individuais.

Nesse sentido, elas formam uma realidade “[...] sui generis com dinâmica própria, e

se impõem aos sujeitos de maneira coercitiva e genérica, como formas de

expressão, reconhecimento e explicação do mundo”(RÊSES, 2003, p. 191). Dessa

forma, essas representações conduzem os homens pensarem e agirem da mesma

maneira, adquirindo um status de objetividade (NÓBREGA, 1990).

Durkheim, segundo Duveen (2009), defendia uma separação radical entre

representações individuais e representações coletivas, entendendo a primeira como

do campo da psicologia e a segunda, do campo da sociologia. Essa separação se

deve, em parte, a tentativa de manter a sociologia como uma ciência autônoma; uma

sociologia que mantenha as sociedades coesas, conservando-as e preservando-as

de toda forma de fragmentação ou desintegração.

Rêses (2003, p.190) atenta para o fato de Durkheim entender que“[...] o

substrato da representação individual era a consciência própria de cada um, sendo,

portanto, subjetiva, flutuante e perigosa à ordem social”, enquanto o substrato das

representações coletivas era impessoal, garantia a coesão e harmonia social,

possibilitando a integração dos indivíduos e da sociedade como um todo. Essas

representações coletivas, impostas aos sujeitos como forças exteriores, atuam como

uma espécie de consciência coletiva, na qual as diferenças individuais são postas de

lado, são tidas como secundárias, dando lugar e importância à “unidade” social, ao

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“pensar” coletivo que logo mostra sua ascendência sobre o indivíduo (RÊSES, 2003;

MOSCOVICI, 2009).

Moscovici amplia o debate e traz um novo conceito, ao afirmar que o sujeito é

ativo, construtivo e autônomo no processo de construção da sociedade, bem como é

criado por ela. O termo “coletivo” não respondia mais à complexidade de uma

sociedade cada vez mais dinâmica e fluida, sendo substituído pelo termo “social”,

mais adequado a uma sociedade que produz ao passo que é produzida pelos

sujeitos. A mudança proposta por Mocovici não foi apenas uma mudança de termo,

mas uma nova maneira de pensar a sociedade e as relações que nela se

estabelecem, enfatizando o papel do sujeito nesse contexto. Como ressalta Alves-

Mazzotti (1994, p.23), nas Representações Sociais

parte-se da premissa de que não existe separação entre universo externo e

o universo interno do sujeito: em sua atividade representativa, ele não

reproduz passivamente um objeto dado, mas de certa forma, o reconstrói e,

ao fazê-lo, se constrói como sujeito, pois ao apreendê-lo, de uma certa

maneira, ele próprio se situa no universo social e material.

Essa mudança de termo se justifica pela diversidade dos indivíduos e dos

grupos,e pelo reconhecimento da comunicação como fenômeno que possibilita que

o individual torne-se social ou vice-versa. Outro fato importante nas RS é o seu

caráter criativo e construtivo, inexistente nas representações coletivas, nas quais o

pensamento social era reproduzido, determinado (NÓBREGA, 1990). Para Durkheim

as representações eram formadas em relação à realidade e não em relação à

comunicação com outros, aspecto que na teoria proposta por Moscovici ganha

centralidade. A comunicação é, pois, responsável pela movimentação dessas

representações, pelo compartilhamento de valores, imagens e modelos simbólicos.

O termo social enfatiza o caráter dinâmico das representações. Moscovici, ao

entender que o ato de representar não é passivo, ao contrário, é um processo ativo

e dinâmico que ocorre porque os indivíduos se vinculam simultaneamente a diversos

grupos no decorrer de suas vidas, focaliza o fenômeno e elabora a Teoria das

Representações Sociais (TRS), com a qual se propõe a compreender e considerar

os sujeitos como pensadores ativos em contraposição à passividade que eles

adquiriram na teoria anterior.

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Afirmar que o autor apenas mudou o termo, ou trouxe um novo conceito para

à discussão da época, pode carregar um que de ingenuidade. Segundo Duveen

(2009), Moscovici passou a considerar como fenômeno o que antes era entendido

como conceito. Propõe teorizar sobre um conhecimento que circula socialmente, se

constrói e se modifica nesse caminho, um conhecimento inacabado, processo, mas

que orienta, nos serve de guia. Ele se interessa, pois, por um conhecimento que é

marcado pelo ontem e cresce com o hoje, um saber que nos identifica como grupo e

que, quando partilhado, já não é mais quem era antes, transformou-se ao lidar com

o novo. Assim, as representações ganham toda a dinamicidade que lhes é própria e

vem à tona com a Teoria das Representações Sociais.

3.2. O homem pensa e elabora: A Teoria das Representações Sociais

A Teoria das Representações Sociais surgiu com o estudo pioneiro realizado

por Serge Moscovici, no final dos anos 1950, com o objetivo de levantar as

representações sociais da população parisiense sobre a Psicanálise. A pesquisa deu

origem à obra intitulada “La psycanalise: son image et son public”, publicada na

França, no ano de 1961. O intuito de Moscovici era compreender o que ocorre

quando um saber do conhecimento científico passa para o domínio comum. Tal

inquietação intelectual se deu por ele ter percebido que termos originados na

Psicanálise eram utilizados, recorrentemente, nas comunicações dos parisienses de

diversos estratos sociais. Isso ocorreu quando foram difundidas informações acerca

da psicanálise na França do pós-guerra, momento ideal para a elaboração de

diferentes representações sobre o objeto.

Para capturar essas representações e compreender como e por que eram

formadas, o pesquisador se aproximou de diversos segmentos da sociedade –

população em geral, profissionais liberais, estudantes secundaristas e universitários.

As conclusões do estudo indicaram que as representações sobre o objeto eram

diferenciadas em função dos grupos de pertença do sujeito e da relação que esses

estabeleciam entre si e com o objeto. Moscovici chamou atenção, sobretudo, para a

tentativa dos sujeitos de familiarizar-se com o desconhecido. Quando se viram

bombardeados pelos termos da psicanálise e com a difusão de informações parciais

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sobre ela, os grupos assumiam o objeto conferindo-lhe novos significados e

características próprias. Termos originados na psicanálise como “complexo”,

“repressão” e “ato falho”, dentre tantos outros, passaram a fazer parte da linguagem

dos grupos, mas num processo que envolvia sua (re) interpretação pelos sujeitos

(MOSCOVICI, 2012).

Nóbrega (1990, p. 6) observa que o interesse de Moscovici era pela“[...]

inovação de um social móvel do mundo moderno transformado com a divisão social

do trabalho e a emergência de um novo saber: a ciência”. Neste momento a

sociedade francesa do pós-guerra vivenciava uma ordem social pautada na intensa

divisão do trabalho e circulação do saber; uma sociedade na qual a especialização e

a informação tomam lugar central na vida das pessoas e dos grupos. De acordo com

a autora referida, nesse contexto o conhecimento “[...] veiculado por uma minoria de

“experts” é consumido por uma maioria de “sábios amadores””(NÓBREGA, 2006,

p.6), como ocorreu com os parisienses ao representar a psicanálise.

A cisão existente entre o saber científico e o saber do senso comum foi

profundamente posta em discussão com essa nova forma de compreendê-lo.

Inicialmente tal saber era considerado como o pensamento da massa, um saber

desarticulado, confuso e inconsistente. Quando comparado ao saber científico,

assumia o polo oposto, ganhava status inferior e características como ingênuo,

selvagem, profano. Entendido erroneamente como um conhecimento infundado em

contraposição ao pensamento lógico propiciado pelo saber científico, o que

diferencia, na verdade, esses dois conhecimentos é que “possuem lógicas que

operam com regras distintas” (CAMARGO, 2007) e não a existência ou ausência de

lógica. Ao compreender isto, o saber do senso comum passou a ser considerado

por Moscovici como um conhecimento popular que tinha seu devido valor por servir

às necessidades cotidianas dos grupos e operar com lógica própria.

O senso comum, segundo Moscovici (2009), é um conhecimento tão legítimo

quanto o científico, devido à sua importância na vida social. É um saber espontâneo,

que nos fornece o conhecimento e as explicações necessárias para entender e

organizar as experiências, nos proporciona suporte para pensar e agir na vida

cotidiana. É justamente na oposição existente de “conhecimento científico versus

conhecimento popular”, fato inquietante para Moscovici, que o pesquisador encontra

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campo fértil para discutir a transformação de um saber científico em saber do senso

comum e vice-versa.

Com o estudo, anteriormente citado, publicado em 1961, Moscovici propõe

“uma ciência do senso comum,uma análise científica do que se chama de senso

comum, atribuindo uma lógica a esse conhecimento que tem uma organização

psicológica autônoma” (NÓBREGA, 1990, p. 8). O autor busca reconhecer na

“epistemologia popular” características diferentes das atribuídas a ela, até então, e

mais condizentes com a sua função social; Moscovici busca a legitimidade de tal

saber.

Na referida obra, o autor operacionaliza o conceito de representações sociais,

torna-o teoria. A elaboração teórica serviria não apenas para explicar o fenômeno

especifico das representações sociais da Psicanálise na França, mas como modelo

teórico a ser aplicado a outros fenômenos sociais.

Para Moscovici, as sociedades têm maneiras diversas de pensar e estruturar

suas representações, não havendo uma universalização. A partir da percepção das

pessoas analisadas em sua pesquisa inicial, ele entende que as representações,

que se encontravam no campo da sociologia, se deslocam para a Psicossociologia.

Nesta, o individual e o social são indivisíveis. Assim, estudar a emergência de uma

RS esclarece as dimensões da realidade social associadas às suas produções.

(ARAÚJO, 2003).

Para Alexandre (2004) a grande virada proposta por Moscovici, que muda o

rumo da própria Psicologia Social, ocorre no sentido de:

Explicar como as cognições, no nível social, permitem a uma coletividade

processar um dado conhecimento, veiculado pela linguagem,

transformando-o numa propriedade impessoal, pública, permitindo a cada

indivíduo seu manuseio e utilização de forma coerente com os valores e as

motivações sociais da sociedade a qual pertence (ALEXANDRE, 2004,

p.133)

Essa mudança de rumo ocorre quando Moscovici tenta resgatar as

dimensões culturais e históricas da pesquisa psicossocial. Ele defendia que a

Psicologia Social, que se desenvolveu como uma subdisciplina da psicologia,

deveria se descentrar exclusivamente do indivíduo e considerá-lo num nível social.

O que ele buscava, na verdade, era uma psicologia mais socialmente orientada, que

de fato estivesse no cruzamento das ciências psicológicas e sociais, e não que

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atuasse num viés predominantemente psicológico. Fornecer uma teoria a esta área

de conhecimento significou, pois, uma grande contribuição de Moscovici para

Psicologia Social.

Como dito anteriormente, Moscovici passou a considerar que a Psicologia

Social deveria se interessar pelos universos consensuais. Isso porque coexistem

nas sociedades contemporâneas dois tipos de pensamento: os consensuais e os

reificados. No universo reificado, produzem-se as ciências em geral e no universo

consensual produzem-se as Representações Sociais. Na intersecção desses dois

universos, a TRS se situa.

3.3. Mas afinal, o que são as Representações Sociais? E por que são

construídas?

O conceito de Representações Sociais não é de fácil apreensão nem ao

menos passível de explicações simplistas e aligeiradas. Isso se dá, especialmente,

pelo fato da noção de RS se situar no que Moscovici chama de situação “carrefour”,

num cruzamento, numa encruzilhada, entre conceitos psicológicos e sociológicos.

Há, pois, uma pluralidade de concepções anexas à noção de RS que são aplicadas

por diferentes campos do conhecimento e merecem ser consideradas.

Tornou-se consenso entre os pesquisadores o caráter multifacetado das RS,

porque funcionam como processo e produto, como estrutura estruturante e estrutura

estruturada. Seu processo de construção se confunde com o processo de

construção da realidade pelos sujeitos. Importante destacar que aqui, nosso sujeito

construtor também é construído nas relações sociais.

As representações são, assim, no entender de Abric, produto e processo de

uma atividade mental, onde o indivíduo reconstitui o real com o qual é confrontado e

lhe confere um significado particular (SANTOS, 2005). Em conformidade com a

autora, Jodelet (2001) afirma que as RS constituem a apropriação pelos sujeitos da

realidade exterior ao pensamento, momento em que eles realizam uma elaboração

psicológica e social dessa realidade.

Nessa linha de pensamento, podemos dizer que representação social é a

reconstrução do objeto pelo sujeito. É o momento em que ele elabora e reelabora,

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alterando significados daquilo e daqueles com os quais interage no ambiente social.

É entendida, também, como a adesão do sujeito ao social, momento em que os

diferentes grupos tecem um consenso sobre a realidade, a constroem e se

constroem no processo. Representar é dar resposta ao incontornável e torna-se

ponto de partida para tantos outros questionamentos e entendimentos.

É relevante destacar que conceitos isolados como imagem, opinião, atitude,

crenças, valores e normas sociais não conseguem abarcar a noção de RS cunhada

por Moscovici. O próprio teórico fez um esforço de refutar tais conceitos como

vinham sendo formulados e alinhá-los às novas formas de se pensar o processo de

construção do conhecimento na sociedade.

Podemos começar a diferenciar o conceito de RS do de opinião e imagem tal

como foram comumente difundidos/ utilizados. Difere de opinião por ser possível

explicitar o contexto de formação, os conceitos que lhe subsidiam e os julgamentos

emitidos. Distingue de imagem por não ser reprodução do real tal como ele é; não se

processar numa perspectiva reprodutivista e passiva da realidade e não possuir

aspecto engessado; ao contrário, a reprodução que temos é uma reacomodação do

dado. Nesse sentido, podemos afirmar que estímulo e resposta se constroem juntos,

o que implica negar a noção de imagem em RS como um reflexo interno de uma

realidade externa. Difere, assim, dos dois por ser um fenômeno contextualizado,

singular e dinâmico (CRUZ, 2006).

De acordo com Nóbrega (1990, p.14), Moscovici define representações

sociais como um

sistema de valores e de práticas tendo uma dupla tendência: antes de tudo instaurar uma ordem que permite aos indivíduos a possibilidade de se orientar no meio ambiente social, material e o dominar. Em seguida de assegurar a comunicação entre membros de uma comunidade propondo-lhe um código para as suas trocas e um código para nomear e classificar de maneira unívoca as partes do seu mundo, de sua história individual e coletiva.

Neste sentido, as RS são entendidas como“[...] modos de pensar

compartilhados pelos diferentes grupos que mediam a interação dos sujeitos sociais

com a realidade, com os objetos e com os fatos sociais que a compõem” (CRUZ,

2006, p.100). Cumpre reafirmar que são socialmente construídas, partilhadas por

grupos, influenciam a construção de uma realidade comum que possibilita a

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comunicação entre os indivíduos. Elas são formadas a fim de nos familiarizarmos

com o estranho, com a novidade, e para reduzir o “vago” que se impõe na

comunicação quando nos deparamos com situações não familiares; uma RS nasce

da tendência de buscarmos o “equilíbrio” através de um certo grau de consenso

entre os membros do grupo (MOSCOVICI, 2009).

Moscovici (2009) reconhece o potencial das representações e de sua

influência no pensamento e na conduta social. Ao apresentar, inicialmente, a teoria

percebia as representações com tendo precisamente duas funções:

convencionalizam os objetos e são prescritivas. Elas convencionalizam os objetos

na medida em que os colocam como modelo a ser partilhado pelo grupo, quando

estes assumem determinada forma definitiva para ser compreendido, decodificado

pelos sujeitos. Nosso pensar é condicionado pelas nossas representações e

culturas; partilhamos crenças e significações que não são estáticas, mas permitem

certa estabilidade, pois ocorre uma síntese de entendimentos. Tais modelos de

entendimento, convenções, nos permitem conhecer o que significa determinado

objeto para o grupo. O significado atribuído não é arbitrário, nem construído

aleatoriamente, depende de outras representações prévias e concorrentes.

Elas são prescritivas devido à força que exercem sobre o grupo. A

representação prescreve, a partir de estruturas e tradição, o que imaginamos. Nossa

maneira de pensar irá depender das representações que elaboramos, das que

compartilhamos com outros grupos e das já existentes no sistema de significação

que encontramos pronto ao nascer. Elas se constituem como um ambiente real,

concreto; uma vez difundido e aceito, seu conteúdo passa a ser parte de nós, de

nossos relacionamentos, julgamentos, comportamentos. Entretanto, esse poder

prescritivo das representações não exclui o caráter criativo dos sujeitos.

Enquanto essas representações que são partilhadas por tantos, penetram e influenciam a mente de cada um, elas são pensadas por eles; melhor, para sermos mais precisos, elas são repensadas, recitadas e reapresentadas (MOSCOVICI, 2009, p. 37).

As representações regulam, antecipam e justificam as relações sociais

estabelecidas. Por serem prescritivas de comportamentos e de práticas, definem o

que lícito ou não em um determinado contexto (SÁ et al, 2001). A representação

prepara para a ação, pois conduz o comportamento, modifica e reconstitui os

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elementos do meio ambiente em que o comportamento deve ter lugar. Esse é um

dos motivos que permite afirmar que as representações facilitam as relações sociais.

Assim, as interações entre grupos podem modificar as representações que as

pessoas formam delas mesmas, do grupo social e de outros grupos e membros

(ALVES-MAZZOTTI, 2008).

As RS devem ser estudadas e compreendidas em seu contexto de produção,

pois não são homogêneas, elas se relacionam com o nível social, econômico e

cultural de cada grupo (ARAÚJO, 2003). “Conhecimento e realidade deverão ser

conhecidos e estudados dentro de contextos sociais específicos e suas relações

analisadas nestes contextos”(ALEXANDRE, 2004, p.132). Esse saber elaborado na

prática é circunscrito a interações sociais específicas e corresponde à inserção do

sujeito em determinadas referências. Segundo Rêses (2003, p.194) “Grupos

diferentes podem e tendem a produzir representações diferenciadas sobre o mesmo

objeto”.

Conforme Moscovici, o homem pensa, elabora questões e busca respostas e,

ao mesmo tempo, compartilha realidades por ele representadas (ALEXANDRE,

2004). As Representações sociais são formadas quando os sujeitos se encontram

para discutir o cotidiano, são expostos aos meios de comunicação, aos mitos e,

ainda, à herança histórico-cultural das sociedades. Essas interações geram

informações, que exigem compreensão dos termos usados para argumentar, julgar e

discutir sobre temas do cotidiano (GUARESCHI; JOVCHELOVITCH, 2008). Desta

forma, os grupos criam “universos consensuais”, teorias do senso comum, com o

intuito de explicar a realidade, facilitar a comunicação e orientar condutas (ALVES-

MAZZOTTI, 2008).

O ato de representar no social é o ato de reelaborar, portanto, os significados

não nos são dados, mas construídos numa pluralidade de relações de poder e de

interações sociais.

Para Nóbrega (1990, p. 9),“[...] as representações são elaboradas no âmbito

dos fenômenos comunicacionais e repercutem sobre as interações e as mudanças

sociais”; circulam nos discursos dos grupos e nos meios de comunicação de massa.

Num jogo de poder onde o que está em cheque é a quantidade de informação que

se tem sobre determinado objeto e a capacidade de veiculação dessas informações,

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são estruturadas modalidades de comunicação que objetivam difundir, propagar ou

propagandear determinados objetos, provocando a construção de representações

sociais sobre eles.

Dentre as três formas de comunicação que contribuem para a produção das

RS, a difusão refere-se à comunicação sem modificações entre emissor e receptor

da mensagem. Aqui, os diferentes pontos de vista expressos podem ser

contraditórios e causar a instabilidade e fluidez da posição assumida pelos sujeitos,

tal como ocorre na formação de uma opinião. Um segundo fator, a propagação,

exige uma organização mais elaborada da mensagem. Esse processo requer a

adaptação de outros conhecimentos a uma visão de mundo já organizada. Em

outros termos, é quando há a acomodação de outros saberes a um quadro pré-

estabelecido. A propagação possui efeito sobre as reações do individuo, atua,

assim, na formação de atitude do sujeito frente ao objeto. Por fim, a propaganda é

uma forma de comunicação conflituosa. Está inserida dentro de relações sociais

antagônicas, que ocorrem no sentido de incompatibilizar o verdadeiro e o falso

saber, um pertencendo à fonte de informação, e o outro à parte antagônica. Na

propaganda são forjados os estereótipos com características generalistas, rígidas e

reducionistas dos fatos.

As representações construídas são diferentes por refletirem o acesso desigual

às informações, se alinharem aos interesses e às implicações do grupo. Neste

caso, as comunicações tornam-se determinantes para a formação das RS, exigindo

dos sujeitos, em meio a um “bombardeio” de informações, uma resposta, uma

interpretação dos fenômenos que estão ao seu redor. Isso não é posto em questão

quando se vive imerso num mundo que, constantemente, requer de nós a

construção de significados.

Sá (1998) reforça serem três condições peculiares às situações sociais que

concorrem para a emergência das RS: dispersão da informação, focalização e

pressão à inferência.

A dispersão da informação refere-se às diversas versões da informação que

circulam sobre o fenômeno em questão. Elas circulam na sociedade através de

fontes diversas e estão dispersas, por assim dizer, fragmentadas e há uma

impossibilidade de apreender todos os elementos do objeto. Isso requer dos sujeitos

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certo consenso, que pactuam uma versão, adotam-na e se inserem numa “zona de

conforto”. Santos (2005) alerta que tal dispersão não se refere, apenas, à

diversidade de informações, mas às condições objetivas de acesso a elas, como

barreiras educativas, obstáculos na transmissão e efeitos de especialização,

aspectos que contribuirão para diferenciar as versões pactuadas.

A segunda condição é a focalização que o sujeito coloca sobre algum ou

alguns aspectos do objeto em detrimento de outros. Essa focalização é orientada

pelos interesses diferenciados dos grupos, mas não se refere, apenas, ao nível de

escolaridade que eles possuem; ela é, sobretudo, regida pelo crivo moral, cultural e

ideológica dos grupos, de seus hábitos lógicos e linguísticos. Essa atenção variada

também exercerá influência sobre o modo como os sujeitos apreendem as

informações, pois o novo depende de conhecimentos anteriores (NÓBREGA, 1990;

SANTOS, 2005).

A pressão à inferência refere-se a uma necessidade do sujeito de reagir à

dinâmica social, tomar partido, dar uma resposta às incitações do grupo, realizando

inferências acerca do objeto. É uma forma de responder a pressão do social para

alcançar o consenso, portanto, um entendimento que reduza o desconforto causado

pelo não familiar. Resulta num esforço do sujeito em obter certo domínio sobre o

objeto, saber falar sobre ele, agir e tomar posição diante de situações semelhantes

(SANTOS, 2005).

3.4. O processo de construção das Representações Sociais

As análises da representação dos parisienses sobre a Psicanálise

despertaram em Moscovici a compreensão de que a atividade de representar era

tornar o não familiar, familiar aos sujeitos. As transformações e os ajustes de objetos

e ideias não familiares, para que se tornem conhecidos pelos sujeitos, exigiram do

psicossociólogo a sistematização do como se processa o ato, ou atividade de

representar.

Deste modo, as RS têm em sua gênese dois processos psicossociais:

objetivação e ancoragem. Através deles, Moscovici explica a imbricação e relação

entre atividade cognitiva e as condições sociais, nas quais são elaboradas e

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funcionam as RS. Eles explicam a atividade de transformação de saber científico em

saber do senso comum, do não familiar em familiar; tais conceitos operam de forma

dialética (ALMEIDA, 2001; NÓBREGA, 1990). Podemos afirmar que tudo se passa

como se superássemos um problema, visto que “[...] depois de uma série de

ajustamentos, o que estava longe, parece ao alcance de nossa mão; o que parecia

abstrato, torna-se concreto e quase normal” (MOSCOVICI, 2009, p.58). O processo

de tornar o desconhecido conhecido, fazer conhecer, confirma e conforta os sujeitos,

pois “restabelece um sentido de continuidade no grupo ou no indivíduo ameaçado

com descontinuidade e falta de sentido” (MOSCOVICI,2009,p.59).

A objetivação torna concreto e significativo aquilo que é abstrato, a partir de

concepções que são familiares aos sujeitos. Moscovici (2009) diz que é semelhante

ao ato de comparar, pois já está em circulação uma série de palavras e

significações, de sentidos que nós atribuímos, anteriormente, a tudo que existe,

resta-nos encher o que está naturalmente vazio, com substância; cabe a nós inserir

o novo em esquemas prévios, encontrar equivalentes não verbais para ligar o objeto

a algo já existente e familiar.

Cruz (2006) compreende que a objetivação facilita a comunicação por

dissociar um determinado conceito ou enunciado da concepção científica e atribuir-

lhe um significado do senso-comum, por meio de uma “filtragem” inicial de

informações que preserva a coerência do objeto com os valores do grupo.

Na objetivação ocorre, simultaneamente, a classificação ou seleção das

informações, a formação de um núcleo figurativo e a naturalização. Esse processo

ocorre, enfatizando algumas informações, simplificando-as e dissociando-as do

contexto original que foram produzidas. As informações transformadas são

ajustadas, assumindo um papel mais importante que outras, ou diferente da

estrutura original (ALMEIDA, 2001; ALVES-MAZZOTTI, 2008). A seleção é

influenciada por critérios socioculturais e normativos dos grupos que estão a

objetivar.

O núcleo figurativo é a visualização de um complexo de ideias sobre a forma

de um complexo de imagens. Essa estrutura de imagem reproduzirá uma estrutura

conceitual, concretizando os elementos representados, o que os permite fazer parte

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das coisas reais. No processo, o objeto é naturalizado quando o sujeito incorpora,em

seu discurso, os elementos do núcleo figurativo, quando ele o integra à vida comum.

A ancoragem, base na qual se constrói a representação, é o processo de

apropriação do novo ou desconhecido, que permite integrar o objeto da

representação em um sistema de valores conhecido pelo sujeito, denominando e

classificando-o em função da afinidade que o objeto mantém com sua inserção

social. Um novo objeto é ancorado ao fazer parte de um sistema de categorias

usuais mediante alguns ajustes (ALMEIDA, 2001; ALVES-MAZZOTTI, 2008).

Em outros termos, ancorar é classificar e dar nome a algo. As coisas que não

podemos nomear são estranhas e ameaçadores. Precisamos, pois, sintonizar a

nova informação a uma já existente, atribuindo ao novo, um nome, uma identidade e

um significado que estará atrelado a este nome. Conforme Moscovici (2009, p.66)

Ao nomear algo, nos libertamos de um anonimato perturbador, para dotá-lo de uma genealogia e para incluí-lo em um complexo de palavras específicas, para localizá-lo, de fato, na matriz de identidade de nossa cultura.

No entanto, esse ato não é unicamente de nomeação, pois nomear envolve

uma apropriação, amarração do conceito formado sobre o objeto. De acordo com

Jodelet (2001) a ancoragem implica atribuição de sentido; instrumentalização do

saber- atribuição de um valor funcional à representação, compreensão do mundo; e

enraizamento no sistema de pensamento- as novas representações se inscrevem

num sistema de representações já existentes.

Na ancoragem não restam dúvidas do sentido dado ao que antes não existia

no mundo consensual. O objeto torna-se tão natural aos sujeitos, que eles chegam a

esquecer que, em algum momento, o objeto já foi estranho.

De algum modo, o novo objeto, ao ser associado ao sistema cognitivo anterior, perde o caráter de novidade, de desconhecido, e adquire um aspecto de déjà vu, de conhecimento “que sempre esteve lá”, portanto, familiar (CAMPOS, 2003, p. 34).

A ancoragem não está presente apenas na gênese das representações,

segundo Campos (2003) é um processo permanente e que mantém viva suas raízes

no sistema cognitivo. Almeida; Santos e Trindade (2011) atentam para o fato de que

Jodelet e Doise não pouparam esforços em estudar as ancoragens, por acreditarem

que elas funcionam como uma “chave” para entender a dinâmica do jogo.

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Jodelet (2005) defende que a ancoragem diz respeito à inserção da

representação no social. A autora considera, assim, que o desvelamento desse

processo nos informa como a representação é utilizada para interpretar o mundo e

como ela integra a novidade.

Doise propõe três tipos de ancoragem: a ancoragem psicológica- estudo de

como a representação enraíza nas atitudes e nos valores do indivíduo; a ancoragem

sociológica- relacionada às vivências do sujeito no grupo, às pertenças; e a

ancoragem psicossociológica- diz respeito ao estabelecimento de relações entre os

grupos sociais e como os grupos percebem o meio social (CAMPOS, 2003).

3.5. Diferentes abordagens no estudo em RS

A teoria, desenvolvida por Moscovici, apresenta hoje algumas abordagens

que a complementam.

Jodelet é a representante de uma perspectiva antropológica das

representações sociais, perspectiva mais fiel à teoria original. A “Escola de Paris”

ocupa-se da descrição das representações, utilizando-se de metodologias

qualitativas. Busca, ainda, compreender como as representações são veiculadas na

vida cotidiana; e, para além do discurso, como se manifestam no comportamento e

nas práticas sociais. Jodelet (2001) adverte que a produção científica no campo das

representações deve estar atenta a três questões: “Quem sabe e de onde sabe?”,

“O que e como se sabe?”, e “Sobre o que sabe e com que efeito?”. Essas questões

se referem, pois, às condições de produção e à circulação das representações, à

descrição do conteúdo e à natureza epistêmica da representação em relação ao

saber dominante.

A “Escola de Genebra”, que tem como líder Willem Doise, articula uma

perspectiva mais sociológica das RS. Os adeptos dessa perspectiva consideram as

representações como princípios organizadores, em função dos quais, os diferentes

grupos se posicionam, com suas ancoragens sociológicas ou ideológicas. Nessa

perspectiva, a posição e/ ou inserção social do indivíduo é determinante para as

representações sociais. Eles entendem, desta forma, que o conteúdo de uma

representação tem a marca do determinante social (Sá, 1998).

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A terceira abordagem, adotada nesta pesquisa, enfatiza a dimensão

sociocognitiva das representações a partir de um enfoque estrutural. O

representante do Grupo Midi, Jean-Claude Abric, busca em suas pesquisas estudar

as representações, seu conteúdo e estrutura, para compreender seu funcionamento.

De tradição metodológica experimental, mas visando compreender como as

variáveis culturais interferem na construção das representações e orientam o

comportamento dos sujeitos, o Grupo Midi se consolidou por dedicar-se ao estudo

da estrutura das representações e, também, por ter desenvolvido a Teoria do Núcleo

Central.

Abric entende que as representações são socialmente produzidas e marcadas

por valores referentes ao sistema sócio-ideológico e a história de vida de

determinados grupos. Elas são, inclusive, elementos essenciais na construção da

visão de mundo desses grupos. O autor procura entendê-las como um “[...] conjunto

organizado de informações, opiniões, atitudes e crenças a respeito de um

determinado objeto”. Como “conjunto organizado” ela possui dois componentes que

precisam ser conhecidos e estudados: conteúdo e estrutura (ABRIC, 2003).Essa

abordagem subsidia a presente pesquisa.

3.6. Abordagem Estrutural das Representações Sociais: a Teoria do Núcleo

Central

A Teoria do Núcleo Central nasce com a tese de doutoramento de Jean-

Claude Abric em 1976, defendida na Université de Provence. A hipótese geral

formulada pelo autor foi que as representações sociais se organizam em torno de

um Núcleo Central, composto de um ou mais elementos, que determinam a

significação da representação e a sua organização interna. Com ela e a partir dela, o

representante da Aix-en-Provence assume que toda a representação possui um

núcleo que a determina, lhe confere identidade e assegura a sua “sobrevivência”. O

fundamento da teoria proposta é a existência de um componente central, que

estrutura os sentidos e significados atribuídos ao objeto, determinando, em parte, o

comportamento dos sujeitos.

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72

Conforme a teoria, os elementos de uma RS são hierarquizados e assumem

valor em função da posição que ocupam e, a depender dessa posição, exercem ou

continuam a exercer por um bom tempo influência, em maior ou menor intensidade,

sobre a representação dos grupos. Abric defende, assim, que o crucial para o

conhecimento, compreensão e ação sobre uma representação é apreender a

hierarquia de seus elementos constituintes e as relações que esses elementos

possuem entre si.

As estruturas representacionais nos permitem compreender a tendência da

estabilidade e, ao mesmo tempo, da flexibilidade das RS. O núcleo central tem a

propriedade de estabilidade, enquanto o periférico representa o caráter móvel e

flexível das representações. De acordo com Almeida (2001, p. 7) os elementos

centrais e periféricos designam que

[...] a representação social é, ao mesmo tempo, estável e instável, rígida e flexível; é tanto consensual como marcada por fortes diferenças

interindividuais.

Para Abric (2003) há, nas representações, elementos mais significantes, que

ele denominou de núcleo central e outros mais secundários, intitulados de sistema

periférico. Assim, ele desenvolveu a Teoria do Núcleo Central através da qual uma

RS é um sistema sociocognitivo que apresenta uma organização específica em

função do e pelo núcleo central, além disso, é submetida ao contexto discursivo e

social.

O núcleo central é o elemento que determina o significado e a organização

interna da representação, entendido, assim, como o elemento fundante. Campos

(2003) defende que o sistema central está estritamente relacionado às condições

históricas, sociológicas e ideológicas, às normas e aos valores radicados no grupo.

É constituído de um ou mais elementos, mais estáveis, coerentes, consensuais, e

historicamente definidos que estruturam as RS, sem ele a representação seria

destruída ou teria outro significado.

Para o autor supracitado, a noção de núcleo central, proposta por Abric, faz

avançar o que Moscovici entendia por “núcleo figurativo”, pois vai além da gênese

para estudar uma representação já estabelecida.

Os elementos do núcleo central são classificados em dois tipos: elementos

normativos e elementos funcionais. Os primeiros estão relacionados aos sistemas

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de valores dos indivíduos, ou seja, à história e à ideologia do grupo, determinando o

julgamento e os posicionamentos relativos ao objeto. Os elementos funcionais

relacionam-se aos aspectos descritivos e à inscrição do objeto nas práticas sociais,

determinando as condutas (ABRIC, 1998).

Ao núcleo central são atribuídas três funções: geradora- por ser o elemento

que cria ou transforma a significação de outros elementos da representação;

organizadora- por determinar a natureza da ligação que os elementos irão

estabelecer entre si; e a função estabilizadora- por serem seus elementos

resistentes à mudança (ABRIC, 2003). O sistema central constitui-se na parte não

negociável da representação (ALMEIDA, 2001).

De acordo com Abric (2000), identificar o conteúdo de uma representação não

é suficiente para defini-la. Para realizar o reconhecimento e a especificação de uma

RS, devemos identificar os elementos que compõem o núcleo central. Tomar

conhecimento desses elementos e da hierarquia,na qual estão envoltos, permite-nos

diferenciar representações de mesmo conteúdo; conhecer o núcleo central permite,

assim, um estudo comparativo.

Interessante destacar que a centralidade de um elemento não é atribuída

apenas a aspectos quantitativos. Desta forma, sua presença maciça não irá garantir

que ele seja central, mas a sua significação na representação. A questão da

centralidade está fortemente relacionada à dimensão qualitativa, como a importância

do elemento no discurso dos sujeitos e a implicação/relação dele com outros

elementos (ABRIC, 2000).

Claude Flament (2001) defende a existência de dois tipos de representação:

uma com um núcleo definido, formando um “sistema único”, que ele denominou de

representações autônomas, e outra com vários conjuntos organizados, ao invés de

um único núcleo central, chamada de representação não autônoma. O autor atenta,

ainda, para a importância de estudar o sistema periférico, pois ele nos permite

compreender os elementos que parecem diferentes, divergentes e contraditórios.

O sistema periférico possui uma relação direta com o núcleo central,

complementando-o. No entanto, seus elementos foram, durante muito tempo,

tomados como circunstanciais ou acessórios em relação aos elementos do núcleo

central. Como dito anteriormente, o interesse dos pesquisadores residia no estudo

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do núcleo central, com o advento dos trabalhos de Flament o sistema periférico

passou a ser focalizado. Seu papel no funcionamento da representação é importante

diante das práticas sociais ligadas ao objeto, pois, os elementos da periferia

permitem as variações individuais, em função de estarem ligados ao contexto

imediato e à história de vida dos sujeitos, e por serem menos estáveis e mais

permeáveis à realidade (CAMPOS, 2003). Os elementos periféricos são mais

acessíveis, mais vivos e mais concretos (ABRIC, 2000, p.31), portanto, nos

permitem agir nas situações do cotidiano sem questionar os elementos do núcleo

central. Por isso, o sistema exerce a função de concretização, regulação, prescrição

de comportamentos, modulações personalizadas e proteção do sistema central.

A primeira, função de concretização, diz respeito ao papel que os elementos da

periferia exercem, ancorando a representação na realidade. Esses elementos são as

representações em funcionamento no cotidiano e proporcionam sua formulação em

termos concretos e compreensíveis; podemos dizer que esta função nos permite

assistir a representação “operando” nas ações vivenciadas pelo grupo. A reguladora

se refere à adaptação das representações às evoluções do contexto. Ela faz com

que novas informações sobre o objeto e transformações ocorridas no ambiente, com

as quais o grupo é confrontado, sejam apreendidas e incorporadas à representação.

Tal função permite que as representações evoluam, se adaptem à nova

realidade,sem necessariamente sofrerem mudanças bruscas. A função de

prescrição de comportamentos permite que o sistema funcione como guia de leitura

de uma dada situação. Indica o que fazer, como agir; conduz a um comportamento

aceitável e esperado pelo grupo; possibilita e orienta, assim, as tomadas de posição.

As modulações personalizadas permitem a elaboração de formulações

individualizadas relacionadas à história individual e experiências pessoais. Por fim, a

função de defesa está diretamente relacionada à função reguladora, atua no sentido

de proteger o núcleo central de transformações bruscas que provoquem uma

alteração completa da representação. Flament entende que o sistema periférico

funciona como “para-choque” da representação (ABRIC, 2003).

Como anteriormente anunciado, adotamos a abordagem estrutural na presente

pesquisa. A escolha por tal abordagem se deu por possibilitar a identificação do

núcleo articulador dessas representações, o que permite conhecer o elemento, ou

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os elementos essenciais, que permeiam o universo simbólico do sujeito na relação

que estabelece com o objeto. E, principalmente, por nos possibilitar pensar em como

tais representações orientam as práticas do sujeito.

Considerando como irrecusável a relação entre práticas e representações

sociais, entre condições objetivas e subjetivas,discutimos, na seção a seguir, as

aproximações entre a Teoria das Representações Sociais proposta por Serge

Moscovici e a Noção de Habitus de Pierre Bourdieu.

3.7. As Representações Sociais e a noção de Habitus em Pierre Bourdieu-

Aproximações Preliminares

Esta seção é fruto das incursões que realizamos em torno da relação entre a

Teoria das Representações Sociais e a noção de Habitus de P. Bourdieu. Um escrito

preliminar, de articulação teórica, do qual não poderíamos escapar em função da

complexidade e dos conceitos polêmicos que perpassam o objeto estudado, tais

como: escolarização das camadas médias intelectualizadas, sucesso e excelência

escolar, perspectivas de futuro, desigualdades escolares, dentre outros.

Não somos os primeiros a realizar referida aproximação, Domingos Sobrinho

(2000), Albuquerque (2007), Abdalla (2005) e Campos (2013), foram alguns dos

pesquisadores que arriscaram articulações teóricas semelhantes no intuito de

buscar, nesse diálogo, respostas para os questionamentos que o campo de

pesquisa de cada um lhes suscitou, inquietações de cunho intelectual e prático

oriundas de problemáticas específicas. Tais diálogos ocorreram, ainda, porque estes

pesquisadores almejarem, de certa forma, romper com a dicotomia objetivista e

subjetivista das ciências sociais, ampliando, assim, a visão da realidade ao estudá-la

de forma integrada (Loyola, 2002).

A construção dessa articulação objetivou tornar legítima a relação entre as

representações construídas pelos sujeitos e o habitus comum ao grupo, relações

previstas no desenho inicial desta pesquisa e, posteriormente, percebidas em

campo. Tal diálogo permitirá uma leitura mais apurada do objeto com o qual

estamos lidando.

A relação entre a TRS e a noção de habitus torna-se para nós

verdadeiramente perceptível, quando realizamos o esforço de apreender o habitus

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do grupo, de compreender a lógica que foge a própria lógica das estratégias de

acesso e permanência na instituição, de identificar os aspectos subjetivos e

objetivos que perpassam a escolha do estabelecimento de ensino feita pelas

famílias. Para além de conhecer as crenças, os sentidos e significados atribuídos à

instituição, os desejos, as expectativas e as perspectivas de futuro dessas famílias

em relação ao sucesso escolar dos filhos, o compromisso foi também o de analisar

tais dimensões simbólicas considerando as condições de existência do grupo

pesquisado; os gostos; a socialização; os diferentes capitais construídos, adquiridos

e mobilizados pelas famílias; as tomadas de posição em função da posição

ocupada; as escolhas realizadas durante a escolarização do filho que levaram a

decisão por esse estabelecimento para prosseguir os estudos; as estratégias de

acesso e permanência no estabelecimento de ensino em questão, enfim,

consideramos toda uma gama de disposições e mobilizações do sujeito frente ao

objeto- neste caso um legítimo “objeto de desejo” das famílias que participaram do

estudo.

Os pesquisadores que lançam um olhar apurado para esses dois quadros

teóricos, aparentemente distantes, percebem certo paralelismo. Isso se deve, em

parte, ao fato de Bourdieu e Moscovici terem tido influências bem próximas de

contemporâneos, professores e amigos da École Normale Supérieure, como a do

psicanalista Daniel Lagache, que dirigia um laboratório de psicologia social, além de

terem frequentado os seminários de Lèvi-Strauss. Esses autores também rejeitam

fundamentalmente um marxismo determinista que dominava a sociologia francesa a

época e o estruturalismo tal qual Lèvi-Strauss fazia (CAMPOS, 2013). A constatação

dessas influências próximas nos assegura de que há entre tais quadros teóricos

construídos aspectos que, de certo, se tocam e podem contribuir para a inovação do

quadro teórico em Representações Sociais, por isso tal aproximação não apenas é

possível como necessária. Como já mencionamos, não somos os primeiros nem os

últimos a buscar a aproximação entre essas duas teorias; há tantas pontes, ainda,

por realizar, nos responsabilizaremos então de fazer deste texto a nossa

composição primeira de tantas outras.

A noção de habitus foi empregada inicialmente nos escritos de Bourdieu como

uma espécie de reação ao estruturalismo e sua filosofia da ação que tomavam o

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sujeito como suporte da estrutura. O uso que fez do termo possibilitou ao sociólogo

“romper com o paradigma estruturalista, sem apelar para a filosofia do sujeito ou da

consciência” (BOURDIEU, 2011, p.61), e sem anular o agente na sua verdade de

operador prático. Ao se valer do termo habitus, Bourdieu traz à tona as capacidades

geradoras, criativas, inventivas e ativas do habitus e do agente, dando relevo ao

“lado ativo do conhecimento prático” (BOURDIEU, 2011).

No entendimento de Bourdieu (2010), habitus é o conjunto de esquemas

interiorizados, disposições duráveis que foram aprendidas, cultivadas pelo sujeito

em sua experiência de socialização; gera estratégias objetivas e eficazes em

contextos idênticos ou semelhantes aqueles de que o habitus é produto; permite ao

agente estar predisposto ou prevenido para atuar no único mundo que lhe foi dado a

conhecer.

O habitus possui três dimensões que operam em conjunto- ethos, eidos e

hexis. O ethos é a dimensão ética do habitus, que faz os agentes respeitarem

princípios, normas, valores, possibilitando, assim, uma convivência harmoniosa entre

pares.Funciona como um conjunto sistemático de princípios práticos que o grupo

compartilha, pois se trata de ética prática, não necessariamente consciente, difere

da ética da qual comumente se fala com seus princípios explicativos. O ethos é a

dimensão responsável pelas atitudes frente à escola e à escolarização dos filhos,

pela maior ou menor valorização dos estudos, “por estas e não por aquelas atitudes

e escolhas”, é o que faz o sujeito agir conforme o esperado dele, mas não

necessariamente declarado.O Eidos é o sistema lógico e cognitivo de classificação

dos objetos do mundo social. Esta dimensão se traduz em distinções de gosto,

estilos de vida, diferentes maneiras de ser e de estar no mundo, principalmente de

pensar o mundo. Traduzem-se em sinais distintivos, classificadores e classificáveis.

O habitus tomado como hexis, indica uma postura, uma disposição incorporada;

uma maneira de ser, de agir, estar e se posicionar no mundo, que se confunde tanto

com o sujeito a ponto de ser naturalizada.Os agentes estão tão ajustados às

disposições que estas lhes parecem naturais, como uma espécie de herança

genética. A hexis é exatamente essa disposição corporal do habitus, é a

incorporação do social, o corpo socializado (BOURDIEU, 1983).

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Se num primeiro momento a noção de habitus parece permanente e de

caráter reprodutivista, em escritos posteriores, Bourdieu introduz a possibilidade de

transformação e constantes ajustes do habitus e de transformação do espaço social

pelos agentes. Ele nos diz que apesar de duradouras essas disposições

incorporadas não são estáticas, pois atuam numa relação dialética de interiorização

da exterioridade e exteriorização da interioridade (BOURDIEU, 2013).

Bourdieu (2013, p.57-58), assim explica o seu entendimento de habitus:

[...] sistema de disposições duráveis e transponíveis que, integrando toda experiência passada, funciona a cada momento como uma matriz de percepções, de apreciações e ações- e torna possível a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças as transferências analógicas de esquemas, que permitem resolver os problemas da mesma forma, e às vezes correções incessantes dos resultados obtidos, dialeticamente produzidas nesse resultado.

O habitus está fortemente relacionado às práticas e estratégias que os

sujeitos empreendem para se movimentar no espaço social. A tese central do

Bourdieu é que os homens não apenas constroem os sentidos do mundo como

disputam esses sentidos (BOURDIEU, 2011). Nesse entendimento, a ideia de

habitus está fortemente relacionada à noção de campo social, como espaço de

forças e lutas, no qual os agentes disputam os sentidos do mundo e as posições

ocupadas de acordo com as regularidades e regras deste espaço (BOURDIEU,

2009; 2013). É preciso pensar relacionalmente tais conceitos, pois o que existe no

mundo são relações, a tríade conceitual - habitus, campo e capital- foi a maneira que

o autor encontrou para pensar de forma relacional o espaço social.

De acordo com essa tese de Bourdieu, os sujeitos disputam os sentidos do

mundo, portanto não podemos nos isentar de compreender os objetos de disputa, a

predisposição dos agentes e espaço em que essas disputas ocorrem. No jogo

social, a posse de um ou mais tipos de capitais e disposições são passíveis de

manipulação pelos agentes, definem as possibilidades de jogar, os lances a realizar

e a posição assumida dentro do jogo (CAMPOS, 2008). Um jogo em que “alunos e

pais” possuidores de habitus semelhantes tentam ingressar num espaço social de

práticas específicas (campus). As práticas de ingresso e permanência num espaço

social específico são favorecidas pelos capitais que foram construídos em trajetórias

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de socialização. Nesse sentido, o acesso e a permanência dependem da

capacidade do sujeito de mobilizar as disposições favoráveis.

Quanto mais o sujeito consegue assimilar o que Bourdieu chama de Le sense

pratique, quanto mais consegue compreender o sentido do jogo e ajustar seu

habitus ao campus, mais chances terá de obter as melhores posições nesse espaço

social, que é disputado e hierarquizado. Importante atentar para o fato de que a

posição ocupada pelo sujeito no espaço social nos permite antecipar como nomeará

o mundo, os objetos sociais; a partir de uma ótica própria, construída naquele

espaço, ele nos dirá como vê o mundo.

Essa disputa de sentido do mundo remete à construção de RS, que ocorre

quando os sujeitos atribuem sentido aos objetos sociais. Tais significados não são

dados, mas construídos numa pluralidade de poder e de interações sociais. Os

sujeitos inseridos em espaços sociais específicos, por conseguinte, as

representações construídas e os sentidos atribuídos ao mundo, muito devem às

condições de existência e aos habitus do grupo. Assim, as diferentes maneiras de

representar, pensar, agir, dependem da posição social ocupada pelo grupo e do

habitus interiorizado. Conforme Domingos Sobrinho (2000), as representações

sociais dizem sempre do habitus interiorizado pelos sujeitos representacionais,

portanto, podem, assim, ser uma via de acesso ao habitus do grupo e às condições

objetivas que o engendraram.

O agente que dispõe de certo habitus possui suas disposições ajustadas à

posição que ocupa no espaço social. No entanto, para atuar o habitus precisa de um

ambiente familiar que lhe faça funcionar, fora de sua realidade as disposições que

os agentes podem entrar em choque, não servem a contextos muito distantes dos

seus, dos espaços nas quais os habitus foram construídos. Para tornar-se eficiente,

operante, ele necessita de condições idênticas ou análogas aquelas das quais é

produto (BOURDIEU, 2009).

Araújo (2003) atenta para o fato de que as representações não são

homogêneas e se relacionam ao nível social, econômico e cultural de cada grupo.

Para a autora, o saber elaborado na prática é circunscrito às interações sociais

específicas e correspondentes à inserção do sujeito em determinadas referências.

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As representações são formadas por sujeitos possuidores de habitus diferenciados e

servem aos contextos em que são construídas.

O habitus construído é produto de situações concretas e mobiliza práticas

sociais específicas, condizentes ao habitus que as engendrou. Assim, os que

constroem as representações o fazem também em função de condições objetivas,

de existência, pois os agentes sociais falam, se posicionam de um lugar que lhes é

próprio, expressam um ponto de vista, uma visão assumida junto ao grupo, uma

tomada de posição. Jodelet (2001) chamou atenção dos pesquisadores em RS

para as seguintes questões: “Quem sabe e de onde sabe?” “O que e como sabe?” e

“Sobre o que sabe e com que efeito?”. O habitus nos diz das condições de produção

das representações e de seu conteúdo em relação ao saber dominante. Jodelet

(2001) ressalta a necessidade de considerar o lugar social de onde se produzem as

representações. Na mesma ótica dessa autora, Bourdieu (2004) acredita que se faz

necessário considerar de onde falam os sujeitos sociais, para saber o que dizem,

fazem ou pensam.

Moscovici também considera importante saber o que dizem, fazem ou

pensam os agentes sociais. Ele considera que “[...] uma pessoa apenas se informa e

representa alguma coisa em função de uma posição tomada”. De acordo com Sá et

al (2011) os sentidos atribuídos aos objetos exercem influência na prática dos

sujeitos, orientam comportamentos, definem o que é lícito ou não em determinado

contexto. Quando dizemos que uma representação prepara para a ação estamos a

dizer que seu conteúdo, uma vez difundido e aceito, passa a ser parte de nós, de

nossos relacionamentos, julgamentos e ações. A função de orientação da prática

atribuída às RS não fica distante das que Bourdieu atribuía ao habitus:

Os “sujeitos” são, de fato, agentes que atuam e que sabem dotados de um senso prático, de um sistema adquirido de preferências, de princípios de visão e de divisão (gosto), de estruturas cognitivas duradouras (produto da incorporação de estruturas objetivas) e de esquemas de ação que orientam a percepção da situação e a resposta dada (BOURDIEU, 2013, p. 42).

Para Bourdieu, o habitus funciona como uma “espécie de senso prático do se

deve fazer em casa situação” (BOURDIEU, 2013, p. 42), o equivalente no esporte ao

“sentido do jogo”. As famílias que escolhem um estabelecimento de ensino para os

filhos não agem totalmente de forma consciente, dotadas de um planejamento

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racional. Estas decidem, escolhem e agem em função de um senso prático, pois

suas ações antecipam o futuro inscrito no jogo social, o futuro provável, possível ao

grupo, o desejado. De acordo com Bourdieu (2007), o sentido do jogo é

imediatamente ajustado ao futuro do jogo, tornando as práticas orquestradas, sem

necessariamente serem produto de um projeto consciente. Tudo se passa como se

o agente ignorasse o ajuste de suas ações às condições de existência de que é

fruto. Essa propriedade está tão presente nas ações dos sujeitos que exclui a

possibilidade de que os resultados esperados não sejam atingidos. É como se

instituísse em cada um deles um feeling, poder de antecipação, não fruto da

intuição, mas de aprendizagens práticas. Pois, conforme Bourdieu (2013), aprende-

se a jogar o jogo social, jogando; é neste espaço em que habitus são construídos e

os diferentes capitais mobilizados.

Conforme Moscovici (2012, p. 46) a RS “[...] reconstitui os elementos do

ambiente no qual o comportamento deve acontecer”, isso é um pouco da função do

habitus, do poder de antecipação de um futuro inscrito no jogo social. O habitus tem

lógica e dinâmica própria, mas uma vez identificado num grupo percebemos as

regularidades das ações. Bourdieu fala em regularidades não no sentido de regra,

mas de propensão, inclinação. As estratégias que os agentes empreendem são os

usos que fazem do habitus, independente de sua vontade o agente faz escolhas que

são tão automáticas quanto o próprio jogo. Tais escolhas são conscientes, no

entanto, o que as motivou permanece inconsciente (BOURDIEU, 2007). Quando os

agentes são dotados de habitus semelhantes, há grandes chances de suas ações

serem antecipadas, pois estão predispostos a determinadas ações; há uma

tendência natural para aquela maneira de ser, aquele estado habitual que orienta

suas ações.

Bourdieu sugere que o habitus poupa os sujeitos da insegurança, “dizendo”

como eles devem agir, fazendo-os apostar. Há, contudo, segundo Bourdieu (2009),

uma parcela de indeterminação no habitus que prevê determinada maneira de agir,

mas, também, é o lugar do vago e do improviso.Essa parcela de indeterminação se

faz necessária, à posse de disposições e capitais precisa assegurar o mínimo de

ganhos para mobilizar o sujeito, despertar a ilusio [interesse no jogo], fazendo o

agente investir no jogo social. Esse investimento, associado à incerteza faz os

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sujeitos se sentirem vivos, envolvidos no jogo, e apostarem suas melhores fichas.

No entanto, esse grau de incerteza deve ser limitado. Para manter o agente

interessado no jogo, é necessário que “[...] as chances de ganhar não sejam nulas

(perde-se em todos os lances) nem totais (ganha-se em todos os lances), ou melhor,

que nada seja absolutamente seguro sem que, por outro lado, tudo seja

possível.”(BOURDIEU, 2007, p.261).

Outro ponto de aproximação entre esses dois quadro teóricos é o fato de que

Moscovici consegue pensar as Representações Sociais como estrutura

estruturante e estrutura estruturada tal qual Bourdieu fazia com a noção de

habitus. Para Moscovici as Representações Sociais são processo e produto de uma

atividade mental, na qual o indivíduo reconstitui o real que o confronta e lhe confere

um significado particular (SANTOS, 2005). Com essa perspectiva, Jodelet (2011)

afirma que as representações constituem a apropriação pelos sujeitos da realidade

exterior ao pensamento, momento em que realizam uma elaboração psicológica e

social dessa realidade.

Nessa linha de pensamento, podemos afirmar que RS é a reconstrução do

objeto pelo sujeito. É o momento em que ele elabora, reelabora e altera significados

daquilo e daqueles com os quais interage no ambiente social. É a resposta as

demandas de entendimento que a própria realidade impõe, resposta dada

interiorizando o externo e exteriorizando o internalizado. O sujeito de que fala

Moscovici é construtor e construído nas relações sociais (ALMEIDA; MACHADO,

2013).

Como dito anteriormente, o habitus está inscrito numa relação dialética

defendida por Bourdieu de interiorização da exterioridade e exteriorização da

interioridade, relação que não se faz distante do conceito de RS.

Para Bourdieu, o habitus é produtor e gerador de representações, tem dupla

função: produto das relações estabelecidas nos diversos espaços sociais e produtor

dessas relações (MACEDO; PASSOS, 2006). Como estrutura estruturada faz a

ponte entre as condições objetivas e o mundo subjetivo. Atua como princípio de

divisão em classes lógicas, organizando a percepção do mundo social, portanto, é a

própria incorporação do mundo social. Tomado como estrutura estruturante, gera

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práticas e representações afinadas aos determinados contextos; organiza as

práticas e as percepções da prática.

A prática como produto do habitus torna-se, por vezes, difícil de ser

percebida, pois os grupos estão tão ajustados que as entendem como naturais,

aceitando-as sem questionar o porquê de agirem deste e não de outro modo.

Vinculadas ao conceito de habitus, as Representações Sociais nos dizem que

as relações entre os sujeitos e a construção da realidade por parte dos sujeitos são

essencialmente orientadas pelas suas referências. Assim, cabe levar em conta as

condições de existência, os sistemas de valores, normas e símbolos que expressam

as representações de grupos determinados e questionar como tais relações são

estabelecidas, como ocorrem as aproximações e os distanciamentos entre as

representações dos grupos em função da posição que ocupam no espaço social.

As construções simbólicas e tomadas de posição dos grupos dizem de suas

possibilidades, de seu lugar no mundo, e expressam a compreensão dos sujeitos de

uma realidade por eles observada. Esse posicionamento nos sugere uma relação de

imbricação entre objetividade e subjetividade, entre condições de existência, habitus,

práticas e representações sociais.

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4. METODOLOGIA

Esta pesquisa, que tem como objetivo compreender as Representações

Sociais do Colégio de Aplicação da UFPE segundo alunos e pais,

caracterizando e analisando os sentidos e significados atrelados às

perspectivas de futuro é, predominantemente, qualitativa, pois a natureza do

objeto pesquisado envolve elementos do campo da subjetividade, dos valores,

concepções e atitudes dos atores envolvidos (MINAYO, 2004). Essa abordagem

responde ao objeto da pesquisa e às representações sociais, que são, sobretudo,

produções simbólicas.

O nosso objeto “CAp da UFPE” também nos serviu de campo de pesquisa.

No plano inicial da pesquisa, pensamos em duas possibilidades de sujeitos: aqueles

que estão se preparando para ingressar na instituição e os que são aprovados na

seleção de ingresso. Se escolhêssemos os primeiros, nosso campo de pesquisa

seriam os cursinhos preparatórios para ingresso no CAp, espalhados pela cidade do

Recife e Região Metropolitana. Escolhemos os pais e estudantes do Ensino

Fundamental, aprovados na seleção de ingresso do CAp, como sujeitos investigados

e, para acessá-los, o CAp também seria nosso campo de pesquisa.

O Cenário investigado é um colégio situado em Recife que compõe o grupo

de estabelecimentos escolares da Rede Federal de Ensino. A instituição tem

colocações privilegiadas nas avaliações de larga escala, sendo considerada uma

escola pública de excelência.Como dito em seção específica, o colégio possui 51

professores efetivos, destes 10 são especialistas, 24 mestres, 16 doutores e um

graduado. A escola tem laboratórios de química, biologia, matemática, física e

informática, sala ambiente para música e artes, quadra de esportes e biblioteca.

De ambiência universitária, o CAp está vinculado ao Centro de Educação da

Universidade Federal de Pernambuco, atende aos acadêmicos das diversas

licenciaturas, em suas habilitações e se propõe a elaborar novas técnicas

pedagógicas e educacionais para serem repassadas as demais redes de ensino-

Estaduais, Municipais e Privadas.

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A instituição compõe turmas de no máximo 30 estudantes. Abriga

anualmente, em média, 420 alunos distribuídos em Ensino Fundamental (6º a 9º

anos) e Ensino Médio (1º ao 3º ano). O ingresso regular dos estudantes ocorre no

sexto ano do Ensino Fundamental (antiga quinta série), por um concorrido exame de

seleção com provas de português e matemática. A excelência expressa nos

resultados das avaliações e a notoriedade da instituição no âmbito nacional

mobilizam, anualmente, cerca de 2.000 famílias que disputam uma das 60 vagas

ofertadas. Há, neste processo, crenças, desejos e expectativas associadas ao

ingresso e permanência na instituição.

4.1. Procedimentos de coleta

A pesquisa em RS, por envolver uma gama de informações sobre o objeto,

requer um caráter plurimetodológico. Assim, utilizamos mais de um procedimento

para acessar essas produções simbólicas que não são facilmente Capturadas.

Trabalhamos em três momentos, com a adoção do refinamento progressivo dos

dados (CRUZ, 2006). Deste modo, a análise de cada etapa serviu para subsidiar a

seguinte.

Desenvolvemos o trabalho de campo em três fases e utilizamos três

instrumentos: O Teste de Associação Livre de Palavras, As Triagens Hierárquicas

Sucessivas e as Entrevistas Semiestruturadas. Destacamos que essas fases são

interdependentes, pois a análise de cada uma delas serviu para subsidiar a

organização dos procedimentos de coleta e a análise da etapa seguinte.

Na primeira fase da pesquisa foi utilizado o Teste de Associação Livre de

Palavras com o termo indutor “colégio de aplicação”, posteriormente realizou-se a

hierarquização das respostas. A associação livre é crucial para pesquisar os campos

semânticos das RS, fornece o material de base para a pesquisa da estrutura da

representação, nos possibilitando entender a organização do seu conteúdo, ou seja,

seus sistemas central e periférico (ABRIC, 2003). Neste sentido, a primeira etapa

permitiu acessar o material simbólico mais relevante referente a essa estrutura de

forma mais espontânea, rápida e objetiva.

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A Técnica de Associação Livre consistiu em solicitar aos sujeitos que

produzissem todas as palavras ou expressões, que lhes viessem à mente, para cada

termo indutor apresentado. A hierarquização diz respeito à ordenação da produção

do sujeito em função da importância que ele atribui a cada termo para definir o

objeto em questão. Assim, os sujeitos receberam um protocolo (Apêndice 1) no qual

tiveram que evocar, para cada termo indutor, seis palavras ou expressões que lhes

viessem, imediatamente, à mente quando pensassem no termo “Colégio de

Aplicação”. Em seguida, solicitamos que selecionassem a palavra considerada mais

relevante e, por último, que justificassem o termo indicado como tendo maior

importância. O Teste foi acompanhado de um questionário socioeconômico para

caracterização geral do grupo e seleção dos sujeitos que participariam das próximas

etapas da pesquisa.

Na segunda fase da pesquisa, utilizamos outro procedimento associativo

com a finalidade de confirmar a saliência da representação identificada na primeira.

Para desenvolvê-la, lançaremos mão das Triagens Hierárquicas Sucessivas, com as

quais procuramos detectar os elementos, que de fato são organizadores ou centrais

da representação.

Com as Triagens Hierárquicas Sucessivas, os sujeitos foram convidados a

individualmente hierarquizar, valorar, as palavras tidas como centrais capturadas na

etapa anterior. A técnica permitiu identificar se as cognições inicialmente levantadas

com a associação compõem efetivamente o núcleo central do objeto estudo eram

protótipos, que conviviam na zona do núcleo central, juntamente com seus

elementos. Em suma, com as hierarquizações foi possível testar ou evidenciar o

núcleo central da representação. Partimos do pressuposto de que a propriedade

fundamental das cognições centrais consiste no laço simbólico que as liga ao objeto

de representação (SÁ, 2002). Assim, objetivamos avançar no estudo e na

compreensão da estrutura das RS, confirmando sua saliência, explicitando seu valor

simbólico na representação do colégio.

Para desenvolver as Triagens Hierárquicas Sucessivas, apresentamos aos

sujeitos, individualmente, um conjunto de palavras que alcançaram maior frequência

e baixa ordem de média de evocação na associação livre, em forma de cartelas

(APÊNDICE 3). Decidimos que 08 seria o número máximo de termos a serem

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hierarquizados; selecionamos, assim, os termos pertencentes ao suposto Núcleo

Central e os termos localizados na primeira periferia- do quadro de quatro casas

gerado pelo software EVOC- que tivessem maior frequência e baixa ordem média de

evocação, garantindo um número máximo de oito termos. Aos estudantes foram

apresentadas oito palavras, uma delas seria o possível núcleo central, sete delas

pertenciam à primeira periferia. No caso dos pais, foram apresentadas apenas seis

palavras, as duas que ocupavam posição de Núcleo Central e as outras quatro que

ocupavam a primeira periferia.

Após a apresentação das palavras, solicitávamos que os sujeitos

procedessem as triagens hierárquicas. Os estudantes receberam as seguintes

orientações: 1º) retire três palavras desse conjunto deixando apenas aquelas cinco

sem as quais não se poderia pensar o colégio de aplicação; 2º) agora, nessa

segunda rodada, retire mais três palavras dessas cinco que ficaram, deixando

somente duas sem as quais não seria possível pensar no colégio de aplicação; 3º)

Olhe e pense sobre essas duas palavras e escolha aquela que você considera

indispensável para pensar o colégio de aplicação e 4º) Feito isto, justifique o porquê

de você ter feito exatamente a escolha dessa palavra, no conjunto das oito, como

sendo indispensável.

No mesmo molde das orientações dos estudantes, os pais receberam as

seguintes orientações: 1º) retire duas palavras desse conjunto, deixando apenas

aquelas quatro sem as quais não se poderia pensar o colégio de aplicação; 2º)

agora, nessa segunda rodada, retire mais duas palavras dessas quatro que ficaram,

deixando somente duas sem as quais não seria possível pensar no colégio de

aplicação; 3º) Olhe e pense sobre essas duas palavras e escolha aquela que você

considera indispensável para pensar o colégio de aplicação e 4º) Feito isto, justifique

o porquê de você ter feito exatamente a escolha dessa palavra, no conjunto das

seis, como sendo indispensável.

A utilização das Triagens Hierárquicas Sucessivas como procedimento

associativo permitiu, de maneira menos racionalizada, o acesso a uma material mais

espontâneo para identificação dos elementos normativos e funcionais do núcleo

central da representação do Colégio de Aplicação entre os sujeitos.

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Na terceira fase da pesquisa, realizamos entrevistas individuais

semiestruturadas. Essas entrevistas foram baseadas em um roteiro de perguntas

abertas, permitindo ao investigador, na dinâmica de sua condução, refazer e

reelaborar questões de acordo com as respostas e interação estabelecida com os

sujeitos. Essa técnica nos possibilita cercar o objeto de estudo, a partir de

questionamentos baseados nas teorias, hipóteses e aspectos que interessem a

pesquisa em foco (TRIVINÕS, 2011). A utilização deste recurso em Representações

Sociais é de suma importância, pois, conforme Moscovici (2003) nas comunicações

são veiculados valores, crenças, interpretações e explicações da realidade, que

permitem ao pesquisador se aproximar ainda mais dos objetos simbólicos. As

questões propostas no roteiro das entrevistas (Apêndice 5) serão delineadas em

função dos resultados das etapas anteriores. Os depoimentos da entrevista

permitiram aprofundar as informações sobre as crenças, atitudes e percepções do

grupo em relação ao objeto focalizado.

4.1. 1. Teste de Associação Livre de Palavras

O Teste de Associação Livre de Palavras é uma técnica que se caracteriza

como um tipo de investigação aberta, estruturada na evocação de palavras ou

expressões a partir de um estímulo indutor. Esse recurso metodológico permite o

acesso rápido e objetivo ao conteúdo da representação e à sua possível estrutura;

indica ao pesquisador como os elementos da representação se relacionam entre si,

as aproximações e os afastamentos dos termos periféricos em relação aos termos

centrais. Para Abric (1994) apud Oliveira (2005) a técnica permite apreender os

conteúdos implícitos ou latentes que seriam mascarados em produções discursivas

convencionais.

Conforme Oliveira (2005) a referida Técnica de Associação Livre tem suas

origens na Psicologia Clínica, tendo por objetivo auxiliar a localização das zonas de

recalque e bloqueio de uma pessoa, ou seja, na exclusão da consciência de

determinadas ideias, pensamentos, sentimentos, desejos que fazem parte da vida

psíquica do sujeito mesmo que este não admita.

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O instrumento utilizado para Técnica de Associação Livre de palavras é de

fácil utilização, compreensão e operacionalidade e, de modo geral, é composto por

duas partes. Numa das partes, consta os dados de identificação do sujeito; na outra,

o teste propriamente dito com o estímulo indutor, conforme os objetivos da pesquisa.

O teste consiste em solicitar as pessoas que falem/ escrevam livremente o

que lhes vem a cabeça quando são apresentados os estímulos indutores

previamente definidos. A quantidade das evocações fica a cargo do pesquisador, no

entanto, é recomendado que não ultrapasse de seis palavras para não perder o

caráter espontâneo das evocações livres (Oliveira, 2005). O tempo gasto para

realização do teste pode variar e a aplicação pode ser tanto individual quanto

coletiva. Cumpre destacar que o teste deve ser realizado de forma a garantir que os

sujeitos evitem reformulações, pesquisas ou elaborações demasiadas sobre o objeto

em questão que anulem o caráter espontâneo do teste.

Conforme Abric (1994) apud Sá (1998, p.91) a técnica pode ser

complementada “[...] pedindo ao participante que efetue sobre sua própria produção

um trabalho cognitivo de análise, comparação e hierarquização”.O pesquisador pode

utilizar procedimentos que complementem o Teste de Associação Livre de palavras

como solicitar aos sujeitos: enumerar as evocações de acordo com a ordem de

importância e justificar a palavra indicada como mais importante.

4.1.2. Triagens Hierárquicas Sucessivas

Nesta etapa da pesquisa, objetivamos confirmar quais cognições identificadas

na primeira fase compõe efetivamente o Núcleo Central das RS do CAp da UFPE

para pais e alunos. De acordo com Sá (2002), verificar a hipótese de centralidade é

determinante para o desenvolvimento da própria teoria do NC, pois conduz a uma

apreensão mais consistente da estrutura da representação estudada permitindo ao

pesquisador analisar a centralidade do ponto de vista eminentemente qualitativo.

Ao contrário dos elementos periféricos, que aceitam contradição, os termos

do NC da representação não são negociáveis, assim, questionar os elementos

centrais nos dá indicativos de reforço ou negação da centralidade das cognições

inicialmente capturadas (SÁ, 2002). No Teste do Núcleo Central, ao invés de

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90

produzir os termos referentes ao objeto, os sujeitos são confrontados com termos já

produzidos por eles e seus pares, e considerados consensuais no grupo. Constitui o

momento em que o sujeito se posiciona, indicando o valor simbólico do termo na

representação.

Foi Pascal Moliner o primeiro a elaborar técnicas de questionamento do

Núcleo Central. O referido autor (1994), citado por Sá (2002), afirma que a saliência

e o grau de conexidade do termo na estrutura representacional não asseguram sua

pertença definitiva ao NC da representação. O pressuposto básico do autor é que a

propriedade fundamental das cognições centrais reside no laço simbólico que liga os

termos ao objeto representado. Nesse sentido, não é porque uma cognição é

fortemente ligada a todas as outras, que ela é central, mas por ser central ela está

fortemente ligada a tantas outras. Moliner (1994)15 busca recuperar a concepção

teórica essencialmente simbólica do Núcleo Central, na qual saliência e conexidade

são decorrentes da centralidade e não determinantes de centralidade. O autor atenta

para a importância de não confundir índices quantitativos- saliência e grau de

ligação, com a propriedade qualitativa- valor simbólico.

A confirmação do NC seria possível questionando a imprescindibilidade de

seus termos. A técnica consiste em questionar os sujeitos se com a ausência do

elemento na representação, o objeto mantém sua identidade. As estratégias

utilizadas para o questionamento da centralidade ficam a cargo da criatividade do

pesquisador, no entanto as estratégias devem conservar o princípio da

imprescindibilidade do elemento.

No presente estudo, o Núcleo Central foi testado tomando como base as

Triagens Hierárquicas Sucessivas. A referida técnica foi criada por Abric (1994) em

sua pesquisa de representação social do artesão e do artesanato. As Triagens

Hierárquicas Sucessivas consistem em construir, com os elementos produzidos na

evocação, um conjunto suficientemente grande de itens (são sugeridos 32)

abarcando tanto os mais frequentes quanto os poucos frequentes, (re) apresentar os

itens aos sujeitos em forma de fichas e pedir que eles separem em dois grupos-

dezesseis mais característicos e dezesseis menos característicos do objeto. Feito

15

MOLINER, Pascal. Les méthodes de répérage et d´identification Du noyau des représentations sociales. In: GUIMELLI, C. (Ed.) Structures et transformations des représentations sociales. Neuchâtel, Delachaux et Niestlé, 1994, p. 199-232.

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91

isto, é solicitado aos sujeitos que repitam a operação até sobrarem oito em cada

grupo, em seguida, quatro e assim sucessivamente até chegarem ao item

indispensável.

Nesta pesquisa, utilizamos as Triagens Hierárquicas Sucessivas no intuito de

identificar se as cognições inicialmente levantadas compõem efetivamente o Núcleo

Central ou são protótipos que convivem na Zona do NC juntamente com outros

elementos. Assim, objetivamos avançar no estudo e na compreensão da estrutura

das RS, confirmando sua saliência e seu valor simbólico na representação social do

CAp da UFPE.

Como são permitidas variações para testagem do NC, para testar e evidenciar

os elementos centrais, optamos por uma variação da técnica. No caso desta

pesquisa, os termos utilizados para a efetivação das Triagens pelos sujeitos foram

aqueles que, com o processamento do EVOC, integraram o possível NC e a primeira

periferia do quadro de quatro casas. Como se obteve um número reduzido de

palavras, os alunos contaram com os oito termos de menor OME para triagens e

com os pais utilizamos seis termos. Nossas escolhas respondem a configuração

específica da estrutura, ao reduzido número de sujeitos, e de termos com elevada

frequência e baixa OME. O critério de escolha dos elementos para as triagens foi

baixa OME e elevada frequência, respectivamente. A ideia foi garimpar da primeira

periferia as palavras mais próximas ao NC e compor um conjunto de palavras

hipoteticamente centrais.

Para desenvolver as Triagens Hierárquicas Sucessivas, apresentamos aos

sujeitos, individualmente, um conjunto de oito palavras (aos estudantes) e seis

palavras (aos pais), que alcançaram menor ordem média de evocação e maior

frequência na associação livre, em forma de cartelas (APÊNDICE 3), e solicitamos

que procedessem as triagens hierárquicas. Os estudantes receberam as seguintes

orientações: 1º) retire três palavras desse conjunto deixando apenas aquelas cinco

sem as quais não se poderia pensar o colégio de aplicação; 2º) agora, nessa

segunda rodada, retire mais três palavras dessas cinco que ficaram deixando

somente duas sem as quais não seria possível pensar no colégio de aplicação; 3º)

Olhe e pense sobre essas duas palavras e escolha aquela que você considera

indispensável para pensar o colégio de aplicação e 4º) Feito isto, justifique o porquê

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de você ter feito exatamente a escolha dessa palavra, no conjunto das oito, como

sendo indispensável.

No mesmo molde das orientações dos estudantes, os pais receberam as

seguintes orientações: 1º) retire duas palavras desse conjunto deixando apenas

aquelas quatro sem as quais não se poderia pensar o colégio de aplicação; 2º)

agora, nessa segunda rodada, retire mais duas palavras dessas quatro que ficaram

deixando somente duas sem as quais não seria possível pensar no colégio de

aplicação; 3º) Olhe e pense sobre essas duas palavras e escolha aquela que você

considera indispensável para pensar o colégio de aplicação e 4º) Feito isto, justifique

o porquê de você ter feito exatamente a escolha dessa palavra, no conjunto das

seis, como sendo indispensável.

Nossos resultados foram tabulados, considerando duas variáveis, a

frequência absoluta (frequência de permanência do termo na rodada) e frequência

relativa (frequência percentual do termo em relação ao número total de ocorrências

em cada etapa de escolha)16. As justificativas de estudantes e pais foram gravadas e

posteriormente transcritas para subsidiar a análise.

4.1.3. Entrevistas Semiestruturadas

Nesta fase da pesquisa, realizamos entrevistas individuais

semiestruturadas17, baseadas em um roteiro de perguntas abertas, o que nos

permitiu investigar, na dinâmica de sua condução, refazer e reelaborar questões de

acordo com as respostas e interação estabelecida com os sujeitos.

Essa técnica nos possibilita cercar o objeto de estudo a partir de

questionamentos baseados nas teorias, hipóteses e aspectos, que interessavam a

pesquisa em questão (TRIVINÕS, 2011). A utilização deste recurso em

Representações Sociais é de suma importância, pois, conforme Moscovici (2003)

nas comunicações são veiculados valores, crenças, interpretações e explicações da

realidade, que permitem ao pesquisador se aproximar ainda mais dos objetos

16Construímos uma tabela (Apêndice 4) para nos auxiliar no momento das Triagens Hierárquicas Sucessivas. A partir dela conseguimos quantificar a frequência de permanência do item em cada rodada das hierarquizações 17

Apresentamos o roteiro das entrevistas no Apêndice 2

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simbólicos. Os depoimentos da entrevista permitiram aprofundar as informações

sobre as crenças, atitudes e percepções do grupo em relação ao objeto focalizado.

Ainda, por se constituir em um discurso de outra natureza nos possibilitou encontrar

elementos não capturados pelos outros instrumentos utilizados e apreender a não

aparente rede de significados e sentidos atribuídos ao objeto.

Com as entrevistas, objetivamos identificar quais perspectivas de futuro

dessas famílias estavam atreladas ao ingresso e à permanência dos estudantes no

CAp da UFPE, identificar as estratégias mobilizadas para acesso e permanência das

crianças na instituição e quais as relações iniciais, que poderiam ser percebidas

entre o habitus dos estudantes e as representações sociais, que pais e alunos têm

do colégio. Desde o inicio da pesquisa, pensávamos ser este o momento de

compreender as mobilizações para ingresso no CAp, e o porquê da escolha desta e

não de outra instituição pública ou privada para escolarização dos filhos.

A técnica de entrevista individual pode ser descrita como um processo

interativo entre duas pessoas, o entrevistador, munido de objetivos e questões que

orientaram o diálogo e o entrevistado com seus valores, crenças, percepções, ideias

e interpretações acerca do objeto representado (PAREDES, 2005). No intuito de

aprofundar o conteúdo geral das representações capturadas, preliminarmente, na

Associação Livre de Palavras, o pesquisador empreende o que Paredes (2005,

p.132) afirma ser um “contrito e devotado mergulho no outro”.

Entrevista em pesquisa social é um termo genérico, que pode ser decomposta

em entrevista estruturada, semiestruturada e não estruturada. Minayo (2000) diz que

a primeira delas envolve roteiros fechados, as duas últimas envolvem diferentes

graus de orientação. Enquanto a não estruturada discute a problemática a partir de

um tema proposto discutido, livremente, a entrevista semiestruturada roteiriza as

questões a serem levantadas. Menos dirigidas do que as entrevistas estruturadas,

as semiestruturadas permitem ao entrevistador a flexibilidade de realizar as

adaptações necessárias e aos sujeitos de colocar questões não levantadas (LUDKE

e ANDRÉ, 1986). Como em uma conversação, a entrevista semiestruturada torna-se

espaço privilegiado de identificação de Representações Sociais.

Triviños (2011) afirma terem as entrevistas estruturadas foco no objeto,

enquanto as não estruturadas tem como foco o sujeito. Uma das vantagens do uso

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de entrevistas semiestruturadas é a possibilidade de focar, ao mesmo tempo, no

sujeito e no objeto em questão, mantendo a presença consciente do pesquisador e o

protagonismo do sujeito, favorecendo a descrição dos fenômenos e a explicação e

compreensão de sua totalidade. As entrevistas semiestruturadas nos permitiram ao

mesmo tempo individualizar percursos, atentando para as regularidades e situando-

os numa totalidade.

Como bem descreve Paredes (2005), a entrevista é o momento não apenas

de recolher ideias, opiniões, depoimentos e testemunhos, mas a possibilidade de o

pesquisador, pela via do discurso, aproximar-se das circunstâncias da vida em

códigos de percepção, de um mapa de memória e afetividade dos depoentes. No

território dos questionamentos para estabelecer um proveitoso diálogo com os

sujeitos, o grande trunfo que tínhamos era a clareza da nossa intenção de coleta e a

definição dos critérios para selecionar os participantes desta fase. Para saber o que

perguntar, a quem perguntar e o que fazer com os dados coletados, tomamos como

epicentro de resoluções o objeto.

O roteiro das entrevistas (Apêndice 05) foi elaborado, previamente, e

modificado em função da interação com os sujeitos. A organização do roteiro resulta,

como propõe Triniños (2011), da teoria que orienta o pesquisador e das informações

a serem levantadas sobre o objeto estudado. A construção do roteiro objetivou

aprofundar o conteúdo da representação; caracterizar os fatores que levam as

famílias a escolherem um colégio considerado de referência para escolarização dos

filhos; identificar as perspectivas de futuro de alunos e pais e sua relação com o

ingresso e permanência no colégio; identificar as estratégias mobilizadas pelos

estudantes para fazer parte do quadro de alunos da referida escola e as que

continuam sendo utilizadas para manter-se na instituição; apreender a relação entre

habitus e representações a partir das estratégias utilizadas pelos sujeitos para

garantir o acesso e a permanência ao colégio.

Elaboramos dois roteiros, um para os pais e outro para os estudantes. No

entanto, com os estudantes, inicialmente, buscávamos uma caracterização da

composição familiar, formação acadêmica e ocupação dos familiares, incluindo a

família extensa (avós, primos, tios), também questionávamos sobre as redes de

amizades estabelecidas antes e após o ingresso no colégio. Em seguida, passamos

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a questioná-los sobre os colégios frequentados anteriormente, sobre hábitos

familiares de leitura, de estudo e culturais (teatro; cinema; livraria; museus; viagens

que realizam, para que lugares, e com qual finalidade), sobre as atividades

extracurriculares que realizavam (esporte, curso de idiomas, aulas particulares,

dentre outros). Feito isto, questionamos os sujeitos sobre como tiveram acesso a

informações sobre o colégio, a primeira vez que haviam ouvido falar em Colégio de

Aplicação, em que circunstâncias e como se deu a decisão de participar do processo

seletivo de ingresso no CAp. Questões como as expectativas que eles têm/ tinham

do colégio, em que o CAp se diferenciava das demais escolas, como se sentiam

frente a colegas que estudam em outros colégios, o que pensavam do futuro, e em

que o CAp pode ajudar a alcançarem os objetivos futuros, também, foram

levantadas. Não deixamos de investigar o processo de preparação para a seleção

de ingresso (as estratégias utilizadas para a aprovação no colégio) e o que eles

pensavam ser essencial ter ou fazer para ingressar num colégio de referência

nacional (estratégias que consideram favoráveis ao ingresso no CAp). Discutimos,

também, sobre o que havia mudado em suas vidas após a aprovação, os hábitos, a

rotina diária e a rotina de estudos, as atividades realizadas antes do ingresso na

instituição e as que permaneceram ou foram modificadas após a aprovação, sobre

os elementos que o Colégio havia trazido para suas vidas e sobre o que foi preciso

deixar para trás.

Semelhante ao que tratamos com os estudantes, a entrevista com os pais

buscou caracterizar a composição familiar, a formação acadêmica e ocupações da

família extensa (irmãos, pais, avós, tios, primos), a composição das redes de

amizades na infância e atualmente; os lugares onde estabeleceram residência na

infância, hábitos familiares de leitura e culturais. Questionamos, também, sobre os

colégios frequentados, os cursos realizados e as universidades. Após essa

panorâmica, questionávamos sobre o Colégio de Aplicação, como obtiveram

informações e como se deu a decisão de submeter os filhos ao processo seletivo de

ingresso no CAP. Perguntamos quais as expectativas que tinham do colégio, em

que a instituição se diferencia das demais e a relação do CAp-UFPE com as

perspectivas de futuro para seus filhos.

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Os sujeitos foram convidados, ainda, a falar como se deu o processo de

preparação de suas crianças (estratégias para a aprovação no colégio). Quando

todos esses pontos eram abordados, questionamos sobre os hábitos de sua prole, a

rotina diária e a dinâmica de estudos, que atividades extraclasse realizavam antes

do ingresso, os tipos de passeios e viagens realizadas e com que finalidade

ocorriam. Buscávamos, ainda, informações sobre os hábitos familiares antes e

depois do ingresso no CAp e por fim, indagávamos sobre o que as famílias precisam

ter ou fazer para suas crianças sejam aprovadas num colégio de referência nacional.

4.2. Participantes da pesquisa

Os participantes da pesquisa foram pais e estudantes18 matriculados do 6º ao

9º ano do Ensino Fundamental do Colégio de Aplicação da UFPE. A escolha pelos

alunos do 6°ano do Ensino Fundamental (EF) se deu por eles terem vivenciado

recentemente a seleção de ingresso e as tensões decorrentes desse processo.

Admitimos que eles ainda estavam repletos de expectativas, que recaem sobre o

colégio e as possibilidades que se abrem por acederem à instituição, sentidos que,

provavelmente, compartilhavam com os familiares.

Optamos por incluir no grupo os alunos do 7º, 8º anos(fase intermediária do

EF) e 9º ano (fase final do EF), pois admitimos que eles vivenciam essas

expectativas e compartilham dos projetos dos pais. Além do mais, sobre eles recai a

responsabilidade de manutenção de um perfil acadêmico, que lhes permite

permanecer no colégio. Assim, com esse grupo foi possível saber mais sobre a

intensificação, manutenção, ou não, das estratégias iniciais que levaram ao êxito na

seleção e ingresso na escola. Esse grupo nos informou sobre suas mobilizações e

estratégias utilizadas para manter-se no colégio e se as expectativas em relação à

escola e ao futuro mudam ou são reforçadas com o ingresso e permanência na

instituição.

Da primeira fase- Teste de Associação Livre de Palavras- participaram120

estudantes e 78 pais. O Teste de Associação Livre foi aplicado com 30 alunos por

18

Os alunos serão questionados sobre a disponibilidade em participar da pesquisa e será solicitada a

autorização dos pais para o estudo.

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ano do Ensino Fundamental, totalizando 120 estudantes que participaram da

seleção regular do colégio e os respectivos pais, que desejaram participar.

Obtivemos a adesão de 78 dos pais destes estudantes. No momento da análise

traçaremos um perfil dos sujeitos investigados.

Para a segunda fase- Triagens Hierárquicas Sucessivas- realizamos uma

seleção entre aqueles estudantes e pais que participaram da etapa anterior e se

disponibilizaram a participar desta. Foram selecionados 20 estudantes e 20 pais. Na

seleção dos estudantes, almejávamos garantir a seguinte composição do grupo:

estudantes de diferentes faixas etárias e turmas; alunos provenientes de escolas

públicas e privadas; bairros de residência diversos; filhos de pessoas com diferentes

níveis de formações e profissões diversas. Tais escolhas visavam considerar as

estratégias que estão sendo mobilizadas pelas famílias e o habitus do grupo que

acessa a instituição. Os pais que participarem desta etapa foram selecionados,

considerando os seguintes aspectos: renda familiar, formação, profissão, número de

filhos no colégio. Nos interessou, ainda, a participação de pais que vivenciaram a

aprovação, de apenas, um dos filhos submetidos à seleção de ingresso do CAp,

aqueles que tiveram toda a prole aprovada no teste de ingresso, e pais que se

autodeclararam ex-alunos do CAp, no momento de preenchimento do questionário

socioeconômico na fase do Teste de Associação Livre.

Da terceira fase- Entrevistas Semiestruturadas- participaram desta fase da

pesquisa 10 estudantes e 10 pais que estiveram presentes nas etapas precedentes

e se disponibilizaram a continuar participando. Os critérios de participação desta

etapa foram os mesmos da etapa anterior, garantindo a composição de grupos de

alunos: com faixa etária e turmas diversificadas; bairros de residência diversos,

provenientes de escolas públicas e privadas e também com pais de diferentes

formações e profissões. A composição dos pais de modo a atender aos seguintes

aspectos: diferentes rendas familiares, formação, profissão e números de filhos no

colégio, além de considerar, os pais que vivenciaram a aprovação de apenas um

dos filhos submetidos a seleção de ingresso do CAp, os que aprovaram toda a prole

e pais auto intitulados ex-alunos da instituição.

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4.3. Procedimento de análise dos dados

4.3.1. Análise das Evocações provenientes do Teste de Associação Livre-

EVOC

Para análise dos dados da associação livre fizemos uso do software

Ensemble de programmes permettant lánalyse dês évocations (EVOC), elaborado

por Pierre Vérges. O software vem sendo utilizado em diversas pesquisas, que

adotam a abordagem estrutural de uma representação. O recurso oferece condições

para que o pesquisador, lidando com um grande número de sujeitos, capture com

maior facilidade a estrutura da representação dos objetos.

O EVOC considera simultaneamente a frequência e a ordem média das

evocações. Este programa, ao informar a ordem média de evocação, nos diz do

grau de saliência da palavra e, ao contabilizar a frequência com que foi evocada,

nos permite saber o grau de compartilhamento, que determinada palavra tem no

grupo. Importa reforçar que apesar de gerar a ordem de frequência das palavras (em

números ou quantitativos) os dados serão analisados qualitativamente.

A análise recaiu sobre a frequência dos itens e a ordem de importância que

os sujeitos atribuíram a eles. O elemento central da RS tem toda chance de ser mais

frequentemente verbalizado pelos sujeitos, no entanto, a frequência de aparição

deve estar associada às informações, de ordem mais qualitativas, encontradas

quando o sujeito hierarquiza os termos atribuindo-lhe importância.

O software, ao cruzar as informações, nos fornece um quadro como

demonstramos no modelo a seguir:

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QUADRO 1. Modelo explicativo do quadro de quatro casas gerado pelo

software EVOC

Como ilustramos o Quadro 1, gerado após o processamento do EVOC,

apresenta em quatro quadrantes a diagramação da estrutura da representação. No

1º quadrante ficam situados os termos mais estáveis e significativos para os sujeitos

e que constituem, provavelmente, o núcleo central da representação. Nele estão

localizados os elementos mais frequentes e mais importantes, no entanto, nem tudo

que se encontra nessa casa é central. Mas o núcleo central está convivendo na

primeira casa com outros elementos “sinônimos” ou protótipos associados ao objeto.

As palavras localizadas no quadrante superior direito são os elementos

periféricos mais próximos que mediam e protegem as relações entre os elementos

do núcleo central. Nele, estão os elementos periféricos mais importantes, os da

primeira periferia, que podem ser no futuro elementos do núcleo central ou podem

dele ter feito parte mais recentemente.

O quadrante inferior esquerdo comporta os elementos de contraste e os

enunciados com frequência baixa. Esse quadrante revela a existência de subgrupos

portadores de representações diferentes. No entanto, pode-se encontrar neste

quadrante, elementos que complementam a primeira periferia. Os termos localizados

no quadrante inferior direito fazem parte da segunda periferia, constituem os

elementos periféricos mais distantes da representação (ABRIC, 2003).

1º QUADRANTE

Zona do Núcleo Central

Prováveis elementos do

núcleo central

2º QUADRANTE

Primeira periferia

Elementos do sistema

periférico

3º QUADRANTE

Elementos de contraste

Elementos do sistema

periférico

4º QUADRANTE

Segunda Periferia

Periferia distante

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100

4.3.2. Análise das Justificativas das evocações provenientes das Triagens

Hierárquicas Sucessivas e das Entrevistas Semiestruturadas- Análise de

Conteúdo

A análise do material recolhido das justificativas da segunda etapa da coleta-

Triagens Hierárquicas Sucessivas e da terceira etapa- Entrevistas Semiestruturadas,

foi feita com base na Análise de Conteúdo de Bardin (2009). Na segunda fase, a

finalidade dessa análise foi ir em busca de esclarecer os elementos que são

“normativos” ou “funcionais” da representação do Colégio de Aplicação da UFPE.

Lembramos que Abric (2003) evidencia a existência, no núcleo central, desses dois

tipos de elementos. Assim, os elementos centrais desempenham papeis de

avaliação ou julgamento (normativos) ou de orientação para a ação (funcionais).

Tais elementos são ativados de forma diferente segundo a natureza do objeto, a

finalidade da situação e a o tipo de relação entre aqueles que representam mantêm

com o objeto representado.

A análise de conteúdo de Bardin perpassa todo o nosso trabalho de análise,

foi utilizada para interpretar as justificativas das palavras evocadas na Associação

Livre, as justificativas dos termos considerados imprescindíveis à representação nas

Triagens Hierárquicas Sucessivas. No entanto ganha mais centralidade e se torna

mais sistemática na terceira etapa. Esse tipo de análise consistiu em descobrir os

núcleos de sentido, que compõem uma comunicação. A busca desses núcleos de

sentindo implica considerar a presença ou frequência de um termo que tenham

significado para os objetivos analíticos visados.

Conforme Triviños (2011), o pesquisador que usa a técnica precisa [...]

“possuir amplo campo de clareza teórica. Isto é, não será possível inferência, se não

dominarmos os conceitos básicos das teorias que, segundo nossas hipóteses,

estariam alimentando o conteúdo das mensagens” (TRIVIÑOS, 2011 p. 160).

Devemos estar atentos à coerência teórica e metodológica da pesquisa e ter clara a

intencionalidade para justificar as decisões tomadas durante o processo.

A análise de conteúdo não é uma abordagem teórica, ela precisa de uma

abordagem para se manter, pois consiste num conjunto de técnicas de análise das

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101

comunicações. Muitos são os domínios de aplicação desta técnica: escritos, orais,

icônicos, códigos semióticos diversos (música, comportamentos, espaços, etc).

Bardin (2009) a entende não como um instrumento de análise, mas um conjunto de

vários apetrechos, formas de analisar dados obtidos no vasto campo das

comunicações; um procedimento que trata os dados coletados primeiramente,

descompondo-os para posterior recomposição com base na abordagem teórica e

metodológica que orienta a pesquisa. A decomposição é o momento da codificação

e só é realizada com base no problema de pesquisa.

A análise de conteúdo nos permite identificar os conteúdos manifestos nas

mensagens, indo além das aparências do que está sendo comunicado, desvendar o

conteúdo latente (BARDIN, 2009). A compreensão dos dados ocorre de forma

dinâmica, devendo ser realizada não apenas durante a análise propriamente dita,

mas durante todo o processo, revendo os objetivos e as perguntas de pesquisa.

A análise de conteúdo abrange três fases, envolvendo desde a preparação do

material até a análise propriamente dita, que serão apresentadas a seguir:

A primeira fase é a pré-análise – consiste em organizar o material, escolher

os documentos a serem analisados. É o momento de retomar as hipóteses e

objetivos iniciais da pesquisa. A pré-análise objetiva uma sistematização para que o

pesquisador possa conduzir as demais fases da pesquisa. Nesta etapa, realizamos

leituras flutuantes do material que possuímos deixando-nos “invadir” por impressões

e orientações, formulamos os objetivos gerais da pesquisa, as hipóteses amplas e o

que irá compor o corpus da investigação.

A segunda fase é a Descrição analítica – algumas ações desta etapa têm

início já na etapa anterior, o corpus é submetido a um estudo aprofundado, orientado

pelas hipóteses e referenciais teóricos, que o pesquisador traz consigo. É o

momento de codificar, classificar e categorizar os dados. A organização da

codificação compreende escolher as unidades de registro e de contexto que serão

utilizadas, bem como as regras de contagem e categorias. Nós escolhemos o

Na terceira fase -Interpretação inferencial – reflexão sobre os materiais

disponíveis. Nesse momento, o pesquisador, em interação com os materiais, já

“impregnado” dos dados, irá sobre eles tecer um fio condutor; estabelecer relações;

inferir; tirar conclusões; explicar a realidade, informando e discutindo sobre o porquê

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de tais elementos serem recorrentes e atentando para o “diferente”, para as

singularidades que surgem no meio do consenso. (TRIVIÑOS, 2011).

Essa análise não se reduz à descrição do que acontece, o que importa numa

mensagem não é meramente o conteúdo, mas o que ele expressa graças ao

contexto e às circunstâncias em que tal discurso é realizado. Por isto, no momento

da análise, devemos ir além do superficial de forma que ao perguntar sobre o objeto,

também, se questione os sujeitos sobre o contexto no qual o objeto está inserido e,

também, contexto, no qual as mensagens estão sendo produzidas.

Diante das opções que a análise de conteúdo oferece, decidimos

sistematizar a segunda etapa, descrição analítica, da seguinte forma: focarmos as

respostas dos entrevistados correspondentes aos objetivos da pesquisa. Em

seguida, selecionarmos os segmentos: unidades de contexto, que respondem aos

nossos objetivos e dentro dessas, nas unidades de registro. Os elementos, unidade

de registro, foram agrupados por temas, formando, assim, unidades de sentido e

significado. Atribuirmos uma categoria específica para cada uma dessas unidades

de sentido e significado. Como de praxe, para a contagem, fazemos uso da

frequência e, para categorização utilizarmos o critério semântico.

4.4. O Percurso em Campo

Os primeiros contatos com o campo e autorização para realizar a pesquisa

Como já mencionamos, o trabalho de campo foi dividido em três fases que

aconteceram nos meses de maio a novembro de 2013, envolvendo um total de 120

alunos e 78 pais do Ensino Fundamental do Colégio de Aplicação da UFPE.

O primeiro contato com o campo se deu na semana após a qualificação do

mestrado, ainda no mês de abril, ocasião em que solicitamos a concessão da

diretoria do colégio para realização do trabalho de coleta junto a alunos e pais. Isto

feito mediante ofício à direção, acompanhado de uma versão do projeto de

pesquisa, protocolados na secretaria do CAp da UFPE, espaço de recepção dessas

propostas de pesquisa, para posterior encaminhamento para análise aos

departamentos responsáveis.

A pesquisa ocorreu sob a supervisão do Serviço de Orientação e

Experimentação Pedagógica (SOEP), que é responsável pelas investigações, que

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103

são realizadas no interior do colégio, pelo intercâmbio dos alunos, avaliação e

acompanhamento dos projetos a serem realizados por pesquisadores externos

como nós.

Fomos informados pela secretaria do colégio de que o calendário de aulas

das crianças havia sido alterado devido a greve das Universidades Federais, no ano

de 2012, por isso naquele exato mês, abril de 2013, os alunos estavam vivenciando

um período de recesso escolar, inviabilizando assim a nossa entrada em campo no

período antes planejado. As aulas apenas recomeçariam na segunda quinzena de

maio de 2013, desta forma a pesquisa de campo foi adiada.

O SOEP nos contatou no início do mês de maio com um parecer favorável à

realização da pesquisa e demonstrando interesse pela temática a ser desenvolvida,

desta forma o aval de entrada em campo nos foi concedido. Almejávamos iniciar a

coleta dos dados o quanto antes, se possível, no dia seguinte à qualificação, em

função das escolhas metodológicas realizadas que, de certo, gerariam um volume

de dados considerável a ser analisado, no pouco tempo estabelecido pelo Programa

de Pós-graduação.

Após o retorno das aulas, planejamos junto ao SOEP, como se dariam as

etapas da pesquisa de forma a interferir o mínimo possível na rotina dos estudantes.

Acordou-se que a primeira fase – aplicação do Teste de Associação Livre com os

estudantes ocorreria nas salas de aula, no período da manhã, no início ou ao final

das aulas, com a concessão do professor desses horários. Convém dizer que

havíamos estabelecido que participariam da pesquisa os estudantes do Ensino

Fundamental ingressos no colégio por meio de processo seletivo. O colégio possui

oito turmas, duas de cada ano, intituladas de A e B. Devido à dificuldade de

trabalhar com toda essa população (total de 240 estudantes) e do volume de dados

que geraria, optamos por incluir como participantes apenas os estudantes das

turmas B.

Durante os acertos iniciais com o SOEP, nos informamos acerca do

calendário de reuniões com os pais do EF, a reunião mais próxima ocorreria no dia

09 de agosto, momento ideal para acessar os sujeitos, pois há um histórico de

efetiva participação dos pais nesses encontros. Desta forma, ficou acertada a

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apresentação da pesquisa e aplicação do teste junto aos pais para o momento inicial

da referida reunião.

Combinamos, ainda, que a segunda fase momento de aplicação da técnica de

Triagens Hierárquicas Sucessivas- seria realizada no próprio colégio com uma

pequena parcela dos estudantes em horários flexíveis, no início, ao final ou no

intervalo das aulas, de preferência nos dias em que as aulas ocorressem em horário

integral para garantir maior comodidade dos alunos. Esta etapa seria realizada com

os pais, que se disponibilizassem a participar em suas próprias residências, no CAP

ou no local de trabalho, se assim preferissem. Na terceira etapa realização das

Entrevistas Individuais Semiestruturadas – procederíamos nas mesmas condições

da segunda, com pais e alunos, ou seja, no colégio, na residência, ou nos locais de

preferência dos sujeitos.

De início, nosso projeto ambicioso não nos desanimou, mesmo sendo

composto por três fases a serem realizadas em pouco tempo e envolvendo um

número significativo de sujeitos. No entanto, muitos foram os percalços encontrados,

os atrasos, os desencontros, as falhas de comunicação. O campo se mostrou uma

“caixinha de surpresas” sempre a nos presentear com o inesperado. As

expectativas eram muitas: esperávamos maior receptividade e valorização da

pesquisa científica por parte dos alunos e dos pais, no entanto isso não ocorreu. Os

alunos demonstraram maior abertura para participar, auxiliando, inclusive, no

convencimento dos pais mais resistentes à pesquisa. Essa constatação não

abrangente todas as turmas, em algumas delas a participação foi intensa, tanto de

pais quanto de alunos, em especial as turmas de alunos ingressantes, 6º ano. As

famílias destes últimos faziam questão de participar, mesmo quando não eram

solicitados entravam em contato com a pesquisadora para serem entrevistados.

Importante destacar que por terem os filhos aprovados no CAP recentemente

participar de uma pesquisa como esta para eles era uma satisfação muito grande.

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4.4.1. Primeira fase do trabalho de campo: A aplicação do Teste de Associação

Livre de Palavras com os estudantes

A aplicação do Teste de Associação Livre com os estudantes ocorreu no mês

de maio e se deu em três encontros. Os alunos respondiam ao teste no início ou ao

final das aulas e na própria sala de aula. O protocolo era composto de duas partes:

na primeira o Teste de Associação Livre, propriamente dito, na segunda dados de

identificação dos participantes (Apêndice 1).

Tornou-se inviável o acesso às quatro turmas em um único dia em função do

ritmo das aulas dos estudantes e dos ritos próprios da instituição. Em alguns dias, as

turmas se dividiam em aulas distintas, sendo inviável o acesso a todos eles, ou

estavam a participar de aulas que, segundo o pessoal do SOEP, possuía um ritual

de entrada, que requeria uma concentração difícil de interromper, em geral, eram

aula de música e teatro.

Nos três encontros, chegamos ao colégio antes do início das aulas, num dos

momentos foi possível entrar na primeira turma antes das 10h da manhã, nos outros

dois momentos, esperamos até o final da aula para aplicar o referido teste.

A realização desta etapa seguiu o mesmo ritual em todas as turmas: a

pesquisadora era apresentada ao professor e aos estudantes por um dos membros

da equipe do SOEP, em seguida a mesma apresentava os objetivos da pesquisa,

entregava os protocolos aos alunos, explicava sobre como deviam ser respondidos

e, após esse contato, os sujeitos se concentravam para respondê-los. Os

estudantes não se negaram em nenhum momento a responder, três deles chegaram

a perguntar se a participação na pesquisa era obrigatória, informados de que a

participação era opcional, os três aderiram e seguiram respondendo ao teste. Em

nenhum momento houve dúvidas referentes aos comandos escritos do Teste de

Associação Livre ou em responder aos dados de identificação. Mesmo que a

pesquisadora tenha se disponibilizado a esclarecer as dúvidas, eles não

demonstraram dificuldades e chegaram a afirmar que o teste era “autoexplicativo”.

Iniciamos a aplicação do teste em uma turma do 7º ano. Tal escolha não foi

da pesquisadora, mas do SOEP que justificou dizendo ser naquele horário a turma

do professor mais acessível. Nossa entrada nas turmas ficou a depender fortemente

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do professor do dia, do relacionamento deste com a equipe do SOEP e com os

pesquisadores que frequentavam o estabelecimento.

A entrada na primeira sala de aula ocorreu de modo tranquilo pois fomos

recepcionados pela professora que nos deixou a vontade para explicar as crianças

do que se tratava a pesquisa e aplicar os protocolos. Os alunos foram bastante

receptivos e demonstraram curiosidade na técnica a ser utilizada, pois segundo eles

“nunca tinham respondido a um teste como aquele”, Ficaram curiosos para saber em

que consistia e como os resultados se combinariam às outras fases; os

questionamentos também envolveram a Teoria das Representações Sociais.

Na medida do possível, fomos dialogando sobre a pesquisa com os

estudantes, explicando os objetivos propostos, esclarecendo sobre a teoria e dos

objetivos do teste. Importante destacar que se o contexto exigiu de nós esses

esclarecimentos, não poderíamos negar aos estudantes que suas dúvidas fossem

respondidas, nem nos isentar de discutir a importância da pesquisa científica para o

contexto no qual os estudantes estavam inseridos e para a sociedade. A curiosidade

das crianças, desenvoltura e autonomia para estabelecer diálogo, impressionou e

explica o que mais tarde seria bastante declarado por pais e alunos “Esse colégio

ajuda os alunos a pensar sobre o mundo, sobre a vida, e, para além de pensar,

questionar o mundo e a vida. Vou mais além, para além de pensar e questionar o

mundo e a vida, o CAP os ajuda a se posicionar no mundo e na vida”.

No momento em que respondiam ao teste, os alunos fizeram alguns

comentários, tais como: “Ela quer saber como vemos o colégio, gente” “A

pesquisadora está interessada em saber como representamos o colégio, como o

percebemos, o que ele significa para nós e para os nossos pais”. Ao concluir a

aplicação do questionário em sala, os sujeitos eram questionados sobre a

disponibilidade para participar da etapa posterior da pesquisa; nesta turma, em

particular, a adesão foi bastante significativa.

Na mesma ocasião, aplicamos o teste com parte dos estudantes do 6º ano.

Neste dia, a turma estava dividida, uma parcela na aula de teatro, outra na de

informática e fomos direcionados para a aula de teatro. Esperamos a chegada dos

alunos junto ao professor da turma, um profissional simpático, competente e querido

pelos estudantes. Enquanto esperávamos a chegada deles, o professor comentou

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que, por ser composta de alunos ingressantes, a turma estava em fase de

adaptação e repleta de expectativas “sem saber direito a dinâmica daquela

instituição”, mas que aos poucos “estavam se adaptando, se conhecendo,

transitando nos diferentes espaços com maior autonomia e tranquilidade, afinando-

se aos demais”.

A chegada dos estudantes foi agitada, no entanto, em poucos minutos eles se

tranquilizaram, tiraram os sapatos e sentaram em círculo no chão num ritual próprio

daquela aula. O professor apresentou a pesquisadora às crianças e separou caneta

e lápis para que elas respondessem ao teste, enquanto isso os pequenos, curiosos

com minha presença, ouviam de forma atenta sobre a pesquisa. Na medida em que

se organizavam para responder ao teste, o professor questionou os estudantes

sobre a ausência de um dos colegas na aula e foi informado de que o garoto tinha

sido convidado a conversar com os profissionais do SOE por ter entrado em conflito

com um dos professores. Em seguida, por solicitação de um profissional do colégio,

o professor de teatro se ausentou da sala, e nessa ocasião, inicia-se um curioso

diálogo entre os alunos a respeito de um colega. Eles comentaram:

Estudante1- “Ele está no SOE pela terceira vez, minha

gente”

Estudante 2- “Ele vai acabar sendo expulso do colégio”

Estudante 3- “Eu acho que ele deveria ser expulso porque

acaba atrapalhando a gente. Quem acha que ele deve ser

expulso levanta a mão?” (Apenas dois dos alunos não

levantam as mãos.)

Estudante 4- “Eu não acho justo ele ser expulso, há outras

medidas antes disso, como suspensão... ou outras”.

Estudante 5- “Eu acho justo porque ele atrapalha a turma”

Estudante 4- “Mas, ele, assim como nós, se esforçou para

passar, merece estar aqui”

Estudante 3- “Mas ele não se esforça para se adaptar. Pra

mim só deve ficar no colégio quem quer estudar. Se ele não

se adapta, não se esforça....”

Percebemos, fortemente, nesse diálogo, a ideia de meritocracia. Os alunos

ingressantes se veem como merecedores daquele espaço por terem realizado os

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esforços necessários para aprovação. No entanto, é tácito que, além do ingresso,

faz-se necessário o esforço para se adaptar ao espaço e corresponder às

expectativas dos pares.

Nessa turma, ao ler o título da pesquisa e a expressão indutora “COLÉGIO

DE APLICAÇÃO” um dos alunos comenta: “É o melhor do Brasil, claro!” E continua:

“Já está respondida a sua pesquisa, Gisele. É excelente, o melhor do Brasil!” Todos

parecem concordar acenando positivamente com a cabeça, enquanto outros

lançavam sorrisos de aceitação à afirmação do colega.

Nas demais turmas, a aplicação do teste não foi diferente. Alguns

questionamentos, comentários positivos sobre a escolha do objeto, em tais

colocações foi bastante expressiva a ideia da instituição como referência de ensino.

Por vezes, em seus comentários, os sujeitos nos levavam a crer que eram

conscientes de que faziam parte de um grupo seleto de estudantes da instituição,

com um dos melhores indicadores de qualidade do país.

Como dito anteriormente, o teste foi aplicado numa parte da turma de

estudantes do 6º ano, ficando para outro momento os demais alunos porque

estavam naquele dia, em aulas distintas. Uma semana após a aplicação do teste

nesta parcela da turma, tivemos a oportunidade de encontrar os demais. Estes nos

foram confiados pelo professor na saída da aula de informática, deveríamos nos

dirigir com eles até a sala de aula, os que já haviam participado estavam liberados

para saída. No caminho da sala de aula, os sujeitos questionavam a pesquisadora

sobre o teste: “Responderemos a uma avaliação a esta hora?” “Moça, é olimpíada

de que?” “Qual a competência que estás avaliando?”. Informamos aos alunos que

não se tratava de uma avaliação externa, mas de uma pesquisa acadêmica. Após

ouvirem atentamente a fala da pesquisadora, os estudantes respiraram aliviados e

um deles comentou: “É que temos que estar preparados pra tudo!” Outra aluna

completou: “Só estávamos preocupados com o horário, de não termos tempo de

resolver as questões”.

Na turma do 8º ano, os alunos reconheceram de imediato a pesquisadora,

pois, há dois anos, alguns deles foram sujeitos de sua pesquisa de conclusão de

curso. Com este grupo em particular, os questionamentos foram no sentido da

pesquisadora continuar tendo por campo o colégio. Em meio aos comentários, uma

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das alunas se pronuncia relembrando a pesquisa: “Lembra quando cruzamos com

você no corredor ontem? Ficamos conversando sobre como foi legal naquele dia...

do grupo focal... Foi fantástico!” A estudante relembrava a pesquisa anterior19 em

que estudantes ingressantes e concluintes tiveram a oportunidade de discutir sobre

sucesso e sucesso escolar. Tendo por mote a fala da aluna, explicamos a turma que

a pesquisa atual diferia da anterior, pois nesta o colégio seria tomado como campo e

objeto de pesquisa, antes apenas como campo.

Os alunos do 9º ano demonstraram interesse pela pesquisa, mas não se

mostraram tão disponíveis para participar das próximas etapas quanto os demais.

Vale destacar que esses alunos haviam participado de outras pesquisas

desenvolvidas no colégio, mas, segundo membros do SOEP, sem o devido retorno

ou socialização dos resultados. Tendo sido tomado conhecimento dessa

participação dos alunos em estudos anteriores, voltamos à turma do 9º ano e

informamos que pretendemos, após a conclusão da pesquisa organizar, junto com o

SOEP, um encontro com a participação de pais, alunos, professores e funcionários

do colégio para socializar seus resultados. Possivelmente essa atitude tenha

motivado um maior número de estudantes do 9º ano a participar das etapas

posteriores.

Observamos que durante essa fase, quando um membro do SOEP nos

apresentava às turmas procedia da seguinte forma: “a mestranda está realizando

uma pesquisa sobre as Representações Sociais de sucesso e gostaria de alguns

minutos de sua aula para aplicar um protocolo de associação livre”. Nessa ocasião,

alguns professores também nos apresentavam assim aos alunos, mesmo após

explicarmos os objetivos da pesquisa-o termo SUCESSO era declarado de forma

quase que automática.

Percebemos assim, uma forte associação do Colégio ao termo Sucesso por

parte dos profissionais que ali atuam. Isto pode apontar para uma possível

representação que o grupo possui do colégio, ou ainda, uma forte ligação da

imagem da pesquisadora ao seu estudo anterior. Apostamos na primeira opção.

19

ALMEIDA, Gisele Gomes de; LIMA; Aldenize Ferreira. “QUER COMER POEIRA OU QUER LEVANTAR POEIRA?” Representações sociais do sucesso por alunos de uma escola de referência do Recife. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Pedagogia)- Centro de Educação, UFPE. Recife, 2011.

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4.4.2. Primeira fase do trabalho de campo: A Aplicação do Teste de

Associação Livre com os pais

O Teste de Associação Livre foi aplicado com pais durante os meses de

agosto a setembro de 2013. Como dito anteriormente, essa etapa seria realizada no

momento da reunião com os pais, com data definida para o dia 09 de agosto, no

entanto, por uma falha na comunicação entre a pesquisadora e a equipe do SOEP

chegamos no dia da reunião, uma hora antes do início, mas não conseguimos

contato com a equipe.

Enquanto aguardava, impressionou a pesquisadora a quantidade de carros

estacionados, de pais e mães que chegavam aos pares ou sozinhos. As pessoas

eram participativas, conversavam entre si e com os profissionais do colégio, se

conheciam, trocavam informações, comentavam dos rodízios de festas realizadas

pelos filhos na casa de cada um deles. Havia uma sintonia e parceria entre pais e

professores, e entre os próprios pais, difícil de explicar para quem ali não estivesse.

A sensação era de que os presentes eram, de fato, pertencentes ao espaço comum

e assim se sentiam. Nenhum deles, fosse novato ou veterano, aparentou estar

nervoso ou apreensivo, muito menos deslocado, como ocorre com algumas pessoas

quando ingressam em espaços desconhecidos. Era como se houvesse uma rede de

relações simbólicas próprias daquele ambiente que, a priori, parecia difícil explicitar.

Passada uma hora do início da reunião, conseguimos contatar um dos

responsáveis pelo SOEP, fomos informados que deveríamos ter comparecido a uma

reunião anterior com professores e coordenadores, na qual havia sido definida a

pauta dessa reunião com os pais. Nossa ausência, impossibilitou de sermos

incluídos na pauta, desta forma não nos seria destinado um minuto que fosse de

tempo para a aplicação do teste com os pais ali presentes. Insistimos,

argumentamos que havia ficado definido apenas nossa chegada com antecedência

ao local para confirmação da pauta. Em conversa anterior com o mesmo

responsável pelo SOEP, havíamos acordado que se reservaria um espaço para a

nossa pesquisa. Definiu-se, inclusive, a utilização de alguns minutos iniciais, o

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suficiente para explicarmos os objetivos da pesquisa, distribuir os protocolos e

recolhê-los quando respondidos, isso não tomaria muito tempo da reunião.

Neste colégio, a reunião se dá em três momentos: o primeiro ocorre no pátio

coberto. É um momento coletivo, ocasião em que são dados informes gerais e

discutidas questões comuns a todas as turmas. No segundo momento, os pais se

dirigem à turma do filho, lá os informes e discussões destinam-se aquele grupo

particular. Nesse momento, os responsáveis recebem o feedback do

desenvolvimento do estudante e discutirem, no geral, o parecer do filho, tal parecer

é disponibilizado aos pais dias antes da reunião. Por último, os professores das

diversas disciplinas são dispostos em turmas distintas rotuladas com o nome da

disciplina, momento de dispersão dos pais, que vão ao encontro do professor da

disciplina com o qual deseja estabelecer diálogo, discutindo o desempenho do filho

naquela área de conhecimento.

A notícia de que não realizaríamos o teste naquele momento nos

desestabilizou, pois não seria possível encontrar esses sujeitos em tempo hábil para

conclusão da coleta, pois a próxima reunião tinha data marcada para o final do ano

letivo. Receosos em perder a oportunidade de contatar os pais, fomos novamente

conversar com o SOEP a fim de fazer um novo agendamento. Após conversa, e

esclarecido o mal entendido, definiu-se que a pesquisadora poderia ir de encontro

aos pais nas salas de aula correspondes. No entanto, tínhamos plena convicção de

que o acesso a todos não seria possível em função da dispersão dos sujeitos.

Conseguimos contatar os pais da turma do 9º ano que estavam vivenciando o

segundo momento da reunião.

A recepção dos pais e do professor da turma foi bastante cordial. Estes

respondiam positivamente com sorrisos e expressões faciais de curiosidade e

interesse na medida em que a pesquisadora explicava os objetivos da pesquisa.

Importante destacar que todos os sujeitos ali presentes marcaram ter interesse em

participar da segunda etapa da pesquisa. No total, foram respondidos 20 protocolos.

Como previsto, não foi possível acessar as demais turmas. Voltamos à sala do

SOEP que nos propôs definir com a orientadora outro modo de acesso aos pais.

As demandas e imprevistos do campo fizeram com que repensássemos as

escolhas anteriores e reorganizássemos nossos instrumentos. Neste mesmo dia, em

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reunião com a orientadora, definimos que escreveríamos uma carta aos pais

(Apêndice 2), que seria anexada ao protocolo e entregue aos alunos nas turmas.

Tínhamos consciência de que estávamos correndo vários riscos: o primeiro seria um

baixo retorno desses testes, o segundo uma possível demora na entrega e recolha

deste material, por ser o acesso às turmas complicado. Além do mais, a literatura em

RS sugere a realização do Teste de Associação Livre de forma presencial, longe de

nossos olhos os pais poderiam não responder prontamente ao teste, ficar tentados a

realizar elaborações que de certo influenciariam nos resultados da pesquisa.

Decidimos apostar no bom senso destes pais, inclusive na carta explicávamos sobre

os objetivos de um teste como este, solicitando que evitassem as elaborações e

consultas.

Esta etapa da coleta se mostrou a mais difícil, mesmo sendo uma ação

relativamente simples a de solicitar aos alunos que repassassem os protocolos aos

pais. Para fazer essa solicitação, por vezes passávamos o dia todo até conseguir

entrar numa das turmas. Isto fez com que demorássemos um tempo considerável

em campo. Foram entregues 240 protocolos nas oito turmas do Ensino

Fundamental. Decidimos entregar em todas as turmas do EF a fim de garantirmos

uma margem mínima de retorno que nos possibilitasse prosseguir com a pesquisa.

Esta etapa foi marcada por idas e vindas ao Colégio, tanto para entregar os

protocolos quanto para recolhê-los. No total para entrega dos protocolos dos pais

estivemos no colégio em nove momentos. A recolha desse material foi mais difícil

ainda, muitos alunos esqueciam os protocolos respondidos em casa ou mesmo de

entregá-los aos responsáveis, também chegaram a perder alguns. Houve momentos

de sairmos do CAP com apenas dois protocolos em mãos. O trabalho de

formiguinha não nos desanimou, apenas para recolher esse material fizemos

quatorze (14) visitas ao colégio. No dia 09 de setembro um dos membros do SOEP

enquanto nos direcionava a turma dizia: “Tem professor que não facilita a entrada,

alguns não permitem que interrompa a aula deles e não cedem nem ao menos um

espaço, por isso temos que ter paciência”. Para não atrapalhar em demasiado as

aulas dos professores e as atividades das turmas, resolvemos passar em todas as

salas pedindo aos representantes que recolhessem o material e entregassem na

sala do SOEP. Um dos responsáveis pelo SOEP nos confessou ter sentido, a partir

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de nosso trabalho, que se fazia necessário uma conscientização destes pais da

importância de tais pesquisas para a comunidade escolar, bem como trazê-los para

participar ativamente das pesquisas e algo a ser reforçado nas reuniões seria de que

estes tem seus filhos inseridos em um campo produtor e produto de pesquisa

científica.

Não consideramos a adesão dos pais satisfatória. Como discutido com o

SOEP, por ser o colégio tradicionalmente campo de pesquisa esperávamos um

maior retorno por parte dos pais. Foram encaminhados cerca de 240 protocolos,

tivemos um retorno de apenas 58. Foi necessário um mês e quinze dias para

finalizar esta etapa com o grupo.

Apesar de não terem orientação presencial, os pais que participaram desta

etapa não apresentaram dificuldades para responder. No entanto, a realização do

teste a distância nos privou de capturar os comentários realizados pelos sujeitos

enquanto respondiam ao protocolo, as expressões faciais, dentre outros aspectos

que se combinam as evocações para conferir sentido ao objeto.

4.4.3. Segunda fase do trabalho de campo: O momento das Triagens

Hierárquicas Sucessivas com os estudantes

A segunda etapa da pesquisa foi realizada com os estudantes no mês de

setembro de 2013, em apenas um encontro. A presente fase dependia fortemente

da anterior, assim só a iniciamos após análise dos dados recolhidos com o Teste de

Associação Livre. Após análise desses dados, retornamos ao colégio numa terça-

feira, nas primeiras horas da manhã, visitamos uma a uma as turmas B com uma

lista em mãos, nela continha os nomes dos estudantes escolhidos para participar

desse momento da pesquisa. Assim, indicávamos aos estudantes quais deles

haviam sido escolhidos para participar das Triagens Hierárquicas.

Para a segunda etapa selecionamos estudantes que participaram da etapa

anterior e se disponibilizaram a prosseguir participando da pesquisa. Foram

selecionados 20 estudantes que atendiam aos critérios: faixa etária e turmas

diferenciadas; provenientes de escolas públicas e privadas; bairros de residência

diversos; pais com diferentes formações e profissões. Tais escolhas visam

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considerar as estratégias que estão sendo mobilizadas e do habitus que estão

sendo reforçados. Decidimos que participariam desta etapa cinco estudantes de

cada uma das 4 turmas B do EF. Desta forma, teríamos um total de 20 estudantes

participantes com representação equivalente de todas turmas. No entanto,

resolvemos que nossa lista precisaria de nomes reservas, caso algum dos

selecionados não estivesse frequentando as aulas naquele período em específico

por algum motivo. Cada lista era composta assim, por 10 estudantes que atendiam

aos critérios estabelecidos pela pesquisadora. Apenas os cinco primeiros nomes

eram convidados, caso algum deles não pudesse participar ou estivesse ausente era

substituído por alguém que também respondesse aqueles critérios. Poucos foram os

casos em que tivemos que substituir sujeitos, apenas dois alunos, 6º e 7º ano, foram

substituídos por não estarem presentes naquela ocasião.

Os estudantes foram previamente comunicados que nem todos

participariam desta etapa. Antes de informarmos os nomes dos alunos participantes

reforçamos as informações repassadas na primeira fase, explicamos que a presente

etapa seria composta por um número reduzido de alunos, que ocorreria no horário

da aula, seria individual e teria duração aproximada de 10 minutos, sendo assim,

inviável a participação de todos. Agradecemos aos estudantes pela aceitação e

disponibilidade, informamos que ainda poderíamos contatá-los, ou aos seus pais,

para a fase da entrevista.

As Triagens Hierárquicas Sucessivas ocorreram numa quarta-feira, na sala 23

da pós-graduação, foram realizadas em apenas um encontro com esses estudantes.

A escolha por este dia da semana se deu em função de três turmas do EF (6º, 7º e

8º) terem aula em horário estendido, das 7h15 às 16h. Desta forma, foi combinado

com os estudantes que eles procurariam a pesquisadora em qualquer momento de

disponibilidade, no intervalo entre as aulas e turnos.

A mestranda chegou à sala por volta das 7h da manhã para preparar o

ambiente, organizou as cartelas (Apêndice 3), o gravador, as tabelas que auxiliariam

na coleta de dados, as cadeiras para melhor posicionar os estudantes e afixou

indicações na porta e nos corredores do local onde ocorreria a pesquisa. A sala

havia sido reservada, informamos à coordenação do Programa que realizaríamos ali

uma etapa de nossa pesquisa, e naquele dia, em particular, haveria um maior

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número de estudantes do CAP transitando no corredor. Informamos, também, da

importância de não sermos interrompidos. A coordenação atendeu ao nosso pedido,

não houve interrupções. Os sujeitos transitavam perfeitamente naquele espaço

acadêmico, esperando tranquilamente a sua vez de entrar na sala, enquanto

aguardavam alguns conversavam com os colegas, outros preferiam ler sentados no

banco do corredor.

Os estudantes chegavam em pares, grupos ou sozinhos. O primeiro grupo

chegou por volta das 09h da manhã, era composto por 5 meninas do 6º ano, destas

apenas 3 haviam sido selecionadas, as demais estavam ali apenas por curiosidade,

interessadas em saber como seria a dinâmica. Uma a uma essas estudantes

entravam na sala e realizavam o teste, as demais ficavam a espera no corredor. Ao

final, convidei as outras duas garotas para explicar o procedimento.

A realização das triagens, como previsto, durava cerca de 10 minutos. Os

estudantes do 6º ano demoravam mais para hierarquizar as palavras do que os

demais. A cada solicitação de retirada do trio de palavras os estudantes nos

olhavam de forma apreensiva e exclamavam expressões do tipo: “Sério?” “Não!”

“Puxa!” “Tá ficando mais difícil!” “Nossa!”. Tais expressões indicavam que as

palavras ali colocadas tinham cada qual sua importância para os sujeitos, ficando

difícil escolher as “essenciais”. Todos os estudantes fizeram comentários sobre a

forte conexidade entre palavras, um dos comentários impressionou a pesquisadora

pela clareza das ideias: “Elas possuem conexão, de alguma forma está tudo

interligado, todas me fazem pensar no colégio, quando a gente exclui um trio deixa

no conjunto aquelas que possuem mais conexões entre si e com as outras. Para

mim, essas duas aqui representam o colégio brilhantemente” (9º ano). As duas

palavras escolhidas pelo estudante foram “Futuro” e “Qualidade”, destas o garoto

considerou Futuro como sendo a mais representativa.

Os oito termos ali expostos foram bem recebidos pelos estudantes. Estes

lançavam sorrisos de aceitação quando explicávamos que o Software nos havia

dado aquela configuração, sendo tais palavras amplamente evocadas e

consideradas mais importantes pelo conjunto de estudantes do EF. No entanto,

cinco alunos, do 6º e 7º ano, ao se depararem com os termos questionaram estar

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faltando Melhor e Excelente. Segundo esses estudantes, tais palavras foram

evocadas por eles e pensavam ser uma evocação comum aos demais colegas.

Após concluir as triagens, alguns alunos continuavam na sala conversando

com a pesquisadora, e demonstraram curiosidade pela dinâmica da pós-graduação,

questionavam sobre como estavam divididas as temáticas de estudo do mestrado, a

qual linha de pesquisa o estudo estava vinculado, que temáticas o PPGE estudava

atualmente, como era o relacionamento entre mestrandos, doutorandos e docentes

do programa, a dinâmica das aulas e pesquisas em campo. Alguns docentes da

Pós-graduação em Educação e da Graduação em Pedagogia eram inclusive citados

pelos estudantes, que afirmavam conhecê-los de palestras e debates ocorridos no

auditório ou no hall do Centro de Educação.

A pesquisadora passou o dia a espera dos 20 estudantes selecionados para a

referida etapa, que compareceram nos horários que lhes eram convenientes. Ao

final do dia, por volta das 17h30min, enquanto organizava o material para encerrar

as atividades apareceu uma estudante do 7º ano acompanhada do pai. O pai,

professor universitário, também demonstrou interesse na temática e em participar

tanto desta etapa quanto da posterior. Atendendo ao pedido de ambos

reorganizamos o material e realizamos a hierarquização com a estudante e

agendamos a entrevista com pai e filha. No total, participaram desta etapa 21

estudantes. Lembramos que as Triagens Hierárquicas Sucessivas com os pais

ocorreu na mesma ocasião em que realizamos as entrevistas.

4.4.4. Terceira fase do trabalho de campo: As Entrevistas Semiestruturadas

com os estudantes

A terceira etapa do trabalho de campo foi realizada nos meses de outubro e

novembro de 2013. Utilizando os mesmos critérios da segunda fase selecionamos

aproximadamente 20 alunos e estabelecemos contato com os pais. Alguns destes

haviam participado da etapa anterior, outros tinham sido escolhidos com base nos

protocolos do Teste de Associação Livre.

Para realizar as entrevista, primeiramente, entrávamos em contato com os

responsáveis por telefone, que definiam junto aos filhos o local e horários

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disponíveis para concedê-las, portanto, poderíamos alinhar tais horários à nossa

agenda. As entrevistas eram marcadas com, no mínimo, uma semana de

antecedência e confirmadas nos dois dias que antecediam a data acertada.

Além de contatar os pais por telefone, pedíamos para falar com o filho e

confirmar sua participação, pois, embora com alguns deles houvesse um laço de

confiança estabelecido nas etapas anteriores, outros participaram apenas da

primeira etapa. Ao conversar com os estudantes por telefone íamos capturando o

real interesse em participar, o que se fazia necessário para facilitar o diálogo.

Muitas foram as desistências e remarcações seja por motivos de viagem,

doença, imprevistos familiares ou compromissos assumidos no meio do caminho

pelos pais que interferiam na rotina daquelas crianças e jovens. Importante destacar

que os alunos ingressantes demonstraram maior interesse em participar do que os

demais. Enquanto os veteranos precisavam ser lembrados do compromisso, os

alunos do 6º ano ficavam tão ansiosos por este momento que inúmeras vezes

ligavam para a pesquisadora no intuito de confirmar a entrevista.

Parte dessas entrevistas foi realizada na casa dos estudantes em dias úteis

ou finais de semana, como preferiram. Algumas vezes chegávamos a essas

residências e encontrávamos o filho juntamente com os pais a nossa espera,

aproveitávamos para também entrevistar os responsáveis. Na maioria das vezes, os

estudantes nos aguardavam sem a presença dos pais, apenas com funcionários da

família.

Algumas dessas entrevistas foram realizadas no recesso escolar dos

estudantes em suas residências, mas alguns deles preferiam que fossem realizadas

no colégio, no pós-horário ou em horário de descanso. Dos 20 contatos

estabelecidos, conseguimos entrevistar 10 crianças.

As entrevistas mais tocantes foram realizadas com os alunos do 6º e 7º ano,

por sua memória recente do processo de seleção e pela gama de expectativas que

possuem acerca do colégio. Os estudantes do 8º e 9º, também, não negaram a

paixão pela instituição e a relevância de fazer parte do grupo seleto de alunos, no

entanto, estabeleciam relações mais maduras com o CAP do que os demais.

Em média as entrevistas tiveram duração de 20 a 30 minutos. Após desligar

os gravadores a conversa se estendia, muitas vezes, por igual período. Em quatro

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dessas entrevistas, a conversa se estendeu por uma tarde inteira. Neste momento,

nos eram apresentados os álbuns de família, as medalhas e prêmios recebidos, os

instrumentos musicais que tocavam, materiais de leitura, projetos realizados ou

encaminhados. Conseguimos capturar, assim, uma parcela dos interesses e do

cotidiano dessas crianças e jovens.

4.4.5. O contato direto com os pais para Triagens Hierárquicas Sucessivas e

Entrevistas Semiestruturadas com os pais

As Triagens Hierárquicas Sucessivas com os pais foram realizadas nos no

momento de realização das entrevistas. Isto ocorreu em função do atraso da

primeira etapa, da demora em recolhermos os protocolos do Teste de Associação

Livre.

Foram recuperados, na primeira etapa, 20 protocolos presencialmente e 58

após encaminharmos a carta aos pais, totalizando 78 protocolos. Desses,

selecionamos inicialmente 30 que atendiam aos critérios pré-estabelecidos pela

pesquisadora de modo a atender: diferentes rendas familiares, formação, profissão e

números de filhos no colégio, além de considerar os pais que vivenciaram a

aprovação de apenas um dos filhos submetidos a seleção de ingresso do CAp, os

que aprovaram toda a prole e pais auto intitulados ex-alunos da instituição. Após

selecionar os participantes, fizemos contato por telefone. Obtivemos 15 recusas,

alguns pais foram bem claros informando que não tinham interesse em participar,

outros marcavam conosco e não davam retorno, não atendiam aos nossos

telefonemas, ou desmarcavam a entrevista de véspera e alguns, simplesmente, não

compareciam ao local marcado. No entanto, os sujeitos que se disponibilizavam de

fato a participar se envolveram por completo na pesquisa, nos contatavam por

telefone ou presencialmente nos corredores do colégio e da pós-graduação,

chegando a reorganizar suas agendas para nos receber em suas residências.

Selecionamos mais 5 sujeitos para completar os 20 previstos. Desta vez

obtivemos sucesso em todos os contatos. De início, o contato não necessariamente

ocorria para marcar a entrevista, mas para nos informar da disponibilidade de

horários de cada um deles e alinhar aos nossos horários. Ao completar 20 sujeitos

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passamos a contatá-los semanalmente para saber de sua disponibilidade e agendar

as datas.

A maior dificuldade dessa fase foi encontrar tempo na agenda desses sujeitos

que tinham pouco tinham tempo livre para nos atender. Não apenas devido à

jornada de trabalho, mas pela vida social, viagens, reuniões programadas e outras

atividades. Em conversa com a orientadora, brincava e dizia que nossos sujeitos

tinham agenda de “presidente” e que isto estava nos atrasando cada vez mais. Nos

finais de semana, era praticamente inviável realizar essas entrevistas, pois muitos

viajavam para casa de praia, campo ou tinham compromissos sociais como festas e

reuniões com parentes e amigos, nos clubes que frequentavam. Uma das mães

interessada em participar disse que disponibilizaria o motorista para conduzir a

pesquisadora até a sua residência localizada na Zona Norte da cidade. Foram várias

tentativas e datas acertadas, mas a entrevista não ocorreu por contratempos na

agenda dessa família.

Por inúmeras vezes, o deslocamento da pesquisadora se deu rumo a Zona

Norte da cidade, lá se concentrava a maior parte dos endereços das famílias dos

estudantes do CAP. Por vezes, tivemos que cruzar a cidade no mesmo dia, indo da

Zona Norte a Zona Sul, segundo local de maior concentração de residência de

alunos. Em dois momentos, fomos de encontro a uma realidade que destoava das

demais, alunos moradores de periferias da cidade, com o diferencial de serem estas

famílias de referência no bairro ou na localidade em que residiam.

No total foram 20 encontros, quinze ocorreram na residência, quatro deles no

próprio CAP e um no local de trabalho desse pai. Em todos os encontros realizamos

as Triagens Hierárquicas Sucessivas. Em, apenas, 10 dos casos,seguimos

realizando as entrevistas, pois alguns pais ou se negavam a gravar (dois casos) ou

não dispunham de tempo suficiente para um diálogo aprofundado. Aconteceu, ainda,

de um casal de professores universitários, participar da triagem e apenas um deles

prosseguir com a entrevista.

Inicialmente, realizávamos as Triagens Hierárquicas Sucessivas, caso aquele

sujeito estivesse disposto a participar prosseguíamos com a entrevista. Os pais

realizaram as triagens com mais desenvoltura que os estudantes, demoravam

apenas por estabelecer maior diálogo com a pesquisadora justificando cada retirada

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120

de pares de palavras. Assim como os alunos, os pais percebiam uma conexão entre

as palavras e, por vezes, comentavam isto.

Vale ressaltar que apesar de não termos entrevistado formalmente metade

desses sujeitos, pudemos capturar no diálogo estabelecido os sentidos e

significados que atribuíam ao colégio. Nas triagens e entrevistas era evidenciado o

orgulho e satisfação de ter filhos frequentando um estabelecimento de ensino como

o CAP.

As entrevistas tiveram duração média de 40 minutos. Assim como ocorreu

com os alunos, após desligarmos o gravador a conversa continuava por uma

manhã/tarde inteira. Alguns nos recepcionavam com chás da tarde e café, se

esforçavam para que nos sentíssemos confortáveis em suas casas e demonstravam

curiosidade e interesse pela pesquisa. O grupo de pais nos deixou bastante a

vontade pelo tratamento cordial da recepção. Passados alguns minutos iniciais da

entrevista a sensação era de estar entre conhecidos, essa sensação não foi apenas

da pesquisadora, pois ao final da entrevista os pais agradeciam pela oportunidade

de participar e pelo “bate-papo” agradável. Isso foi essencial para que a entrevista

fluísse como uma conversa intencionada.

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5. RESULTADOS: ANÁLISE E DISCUSSÃO

5.1. Perfil do grupo investigado: Quem fala? De onde fala?

Um estudo em Representações Sociais deve atentar para quem são os

sujeitos que representam. Convém evitar caracterizações pouco aprofundadas de

quem constrói essa representação. Nesta pesquisa, intentamos capturar variáveis

que nos permitiram compreender os sentidos que os sujeitos atribuem ao mundo,

mas considerando sua socialização em determinado segmento social.

A inserção social e o contexto específico dos participantes são aspectos a

considerar para compreensão da reconstrução do objeto por parte dos sujeitos.

Assim, entendendo ser relevante compreender quem fala e de onde fala, fatores que

intervém diretamente na representação construída pelos grupos, traçamos aqui um

perfil dos estudantes e dos pais investigados para tecer uma rede de significados e

interpretações sobre o objeto. Inicialmente traçamos um perfil dos estudantes do EF,

combinado com as análises do Teste de Associação Livre de Palavras deste grupo,

em seguida, realizamos procedimento semelhante com os pais, mas atentando para

os elementos comuns e singulares dessas representações.

Aproximar os leitores do universo daqueles que construíram o objeto

estudado é dar-lhes a oportunidade de compreender porque os estudantes e pais

falam o que falam e não apenas de conhecer as representações de tal grupo.

5.1.1. Perfil dos estudantes

O grupo participante da pesquisa foi constituído por120 alunos do Ensino

Fundamental do Colégio de Aplicação da UFPE. Uma parcela desses estudantes

(30) vivenciou recentemente a seleção de ingresso realizada pelo colégio, exprime

as tensões decorrentes desse processo e está repleta de expectativas que recaem

sobre o CAP e as possibilidades que se abrem por adentraram a instituição.Os

demais estudantes fazem parte do grupo seleto de alunos há mais tempo, no

entanto, ainda, guardam recordações da preparação para os exames de ingresso e

projetam para si um futuro promissor, relacionado diretamente ao estabelecimento.

Os veteranos estabelecem uma relação mais madura com a instituição, participam

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de gincanas, projetos, iniciação científicas, olimpíadas nas diversas áreas de

conhecimento e outra avaliações nacionais e internacionais.

Foi possível traçar esse perfil do grupo porque,na primeira fase da pesquisa

juntamente com o Teste de Associação Livre, os estudantes responderam a um

questionário com questões de natureza socioeconômica e outras mais relacionadas

à seleção de ingresso e atividades realizadas colégio (APÊNDICE). Os resultados

foram sistematizados nos quadros 2 e 3 apresentados a seguir.

Quadro 02.Distribuição dos estudantes participantes por Sexo

Sexo

f

F

56

M

64

Total

120

Quadro 03.Distribuição dos estudantes participantes por Idade

Idade

f

10 - 12 anos

70

13 - 14 anos

50

Total

120

Conforme se mostra no Quadro 2, o grupo é composto por 53.3% de

estudantes do sexo masculino e 46.7% do sexo feminino. Dentre estes, 58.3%

possuem idade entre 10 e 12 anos, cursando os 6º, 7º, 8º ano, como podemos

observar no Quadro 3. Cabe destacar que a seleção realizada no final do ano letivo

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para compor as turmas de 6º ano do ano seguinte permite o ingresso de crianças de

no máximo doze anos de idade.

Quadro 04. Distribuição dos estudantes participantes por

composição familiar

Com quem reside

Quant

Pais 23

Pais e avós 15

Pais e irmão(s) 61

Mãe ou pai 15

Pais, avós, irmãos, tios 06

Total 120

A maior parte dos estudantes, 50.8%, reside com pais e irmão(s), os demais

moram apenas com os pais, dividem moradia com pais e avós, ou convivem com a

família extensa (pais, avós, irmãos e tios), alguns possuem pais separados residindo

apenas com um deles. Para Bourdieu (1998, p.42) “A ação do meio familiar sobre o

êxito escolar é quase exclusivamente cultural”. O autor considera necessário

conhecer a composição familiar em tamanho e nível cultural global para

compreender os diferentes graus de êxito obtidos. O êxito escolar da criança não diz

respeito, apenas, ao nível de escolarização dos pais, mas ao nível cultural global da

família e do conjunto de membros da família extensa. Boa parte desses estudantes

tem como referenciais familiares pais, tios, primos ou irmãos ex-estudantes do CAP

e/ou frequentadores da UFPE. Mais de 97% dessas crianças convivem com

familiares de nível de formação superior, e/ou pós-graduados, com pais e tios

concursados (80%) e bem sucedidos profissionalmente. As aspirações construídas

não são apenas futuras, mas são compartilhadas pelos familiares nos diversos graus

de descendência.

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Quadro 05. Distribuição dos estudantes participantes por ocupação dos pais

Profissão dos pais

Quant

Professores Universitários 15

Funcionários públicos

Federais 40

Funcionários públicos

Estaduais 15

Profissionais liberais 83

Professores dos demais

seguimentos 11

Total 164

O resultado desse levantamento indicou, ainda, que os alunos investigados

são oriundos de camadas médias, filhos de professores universitários (12.5%),

professores dos demais segmentos (9.1%), servidores públicos federais (33.3%) e

estaduais (12.5%), e profissionais liberais (69,1%) - em sua maioria, médicos,

advogados, jornalistas e arquitetos. O colégio atrai um grupo de alunos bem

sucedido em nível cultural global familiar e em cultura livre adquirida em

experiências extraescolares, como apontam os dados que apresentaremos a seguir.

No quadro abaixo, questões como escola anteriormente frequentada,

realização de curso preparatório para a seleção e atividades realizadas no pós-

horário são exploradas.

Quadro 06. Distribuição dos estudantes participantes por escola de origem

Escola Anterior f

Privada 119

Pública 01

Total 120

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Quadro 07. Distribuição dos estudantes participantes por realização de cursos preparatórios

para a seleção de ingresso

Frequentou

curso

preparatório

f

Sim

110

Não

10

Total

120

Do conjunto dos cento e vinte (120) alunos apenas um (01)era oriundo de

escola pública. Este achado aponta para uma tendência à elitização do ensino no

colégio, expressa também um caráter excludente do processo seletivo, pois muitos

alunos estudaram em escolas consideradas instituições de qualidade, tiveram

oportunidades de frequentar curso preparatório no 3º e/ou 4º ano das séries iniciais

do Ensino Fundamental e/ou convivem com grupos socioculturais que já conhecem

a escola e seus segmentos.

Importante destacar que entre os alunos de escola privada, existem

diferenças quanto ao tipo de instituição. Algumas escolas da cidade são

consideradas prestigiosas, localizadas em bairros nobres ou centrais, com

mensalidades elevadas; professores qualificados (formação superior e/ou pós-

graduados) recursos materiais, instalações confortáveis e adequadas, índices

positivos em avaliações externas, e de destaque em aprovações no vestibular, e,

normalmente, oferecem todos os níveis de ensino. Existem, ainda, instituições de

médio porte, localizadas em bairros centrais e ou periferias da cidade, com

mensalidades razoáveis, mas com instalações confortáveis e professores com

formação adequada para o nível de ensino ofertado, que normalmente oferecem da

educação infantil até o final do EF, podendo também ofertar o Ensino Médio. Em

parte ainda do total de alunos oriundos da rede privada, aqueles que frequentavam

as pequenas instituições próximas às suas residências, as chamadas “escolas de

bairro” ou “escolinhas”. Essas instituições têm mensalidades mais acessíveis,

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modestas instalações, com professoras polivalentes, na maioria das vezes com

formação superior em curso, e que atendem da educação infantil até as séries

iniciais do EF.

Do total de estudantes investigado, prevalece o grupo proveniente de

instituições prestigiosas (98). Uma parcela (12) frequentou escola privadas de médio

porte e, um menor número (08) faz parte do grupo daqueles oriundos de escolas

privadas de bairro.

Além da base educacional adquirida na escola privada, o cursinho

preparatório parece ser “regra” de ingresso no colégio. Como podemos perceber no

Quadro 7, há apenas dez (10) pequenas “exceções”. No entanto, mesmo sem ter

realizado o cursinho não podemos falar de “exceção”, muito menos de “regra”, pois

os sujeitos pertenciam às instituições privadas de prestígio da cidade do Recife e

Região Metropolitana, além de serem detentores de outras vantagens sociais que

facilmente explicam o rendimento positivo nos estudos, tais como: atividades

extracurriculares como cursos de línguas, artes, música, esportes; grupos de estudo;

viagens; cultura livre; estudos direcionados. Além disso, adotaram uma rotina diária

específica para seleção que enfrentariam, que envolviam resolução de questões,

estudos em família e individuais e estabelecimento de horários de estudo.

A “exceção” que salta aos olhos, por assim dizer, ocorre com a estudante dos

anos finais do EF que, a priori, nos parece um caso improvável de sucesso na

seleção de ingresso, em decorrência de fatores que, de forma cumulativa, poderiam

colocá-la em desvantagem em relação aos demais: oriunda de escola pública, sexo

feminino, negra e não frequência ao curso preparatório para seleção. Tais fatores

não impediram a estudante de conseguir a aprovação no colégio. No momento da

entrevista,identificamos como essas desvantagens foram superadas por aspectos

favoráveis da socialização e herança cultural familiar da estudante, que contribuíram

para seu êxito. Tais aspectos serão tratados de forma mais aprofundada quando

discutimos as entrevistas, momento em que tratamos dos percursos sociais e

escolares dos sujeitos a fim de aprofundar os sentidos atribuídos ao colégio.

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Quadro 08. Distribuição dos estudantes participantes por atividades extraclasse

Atividades pós-horário

f

Curso de inglês 60

Atividades esportivas 43

Culturais 89

Lazer 36

Cursos de Francês,

espanhol ou chinês

12

Total

240

Do total de crianças, 50% frequentam cursos de língua inglesa em espaços

como Cultura Inglesa, ABA, CCAA, SENAC, Yázigi, Wizard e Britanic; alguns

realizam atividades esportivas, as mais recorrentes são: Tênis, Dança, Ballet, Vôlei,

Futebol e Natação. Os esportes são praticados, em sua maioria, nos clubes e

academias dos bairros prestigiosos da Zona Norte (Casa Forte, Jaqueira, Madalena,

Espinheiro- bairro do Clube Alemão) e em bairros da Zona Sul (Boa Viagem e

Piedade). Dentre as atividades culturais, os alunos elencaram música (fruição),

aulas de música. (Com destaque para aulas de piano que ocorrem em suas próprias

residências) conservatório de música ou espaços específicos nos bairros de

residência dos estudantes; os alunos elencaram ainda visitas a museus e espaços

culturais e de ciência (Brennand, Museu do Homem do Nordeste, Museu da

Abolição, Museu de Arte Moderna, Museu do Estado de Pernambuco, Oficina

Brennand, Caixa Cultural, Espaço Ciência) livrarias e bibliotecas, cinema, atividades

de leitura individual e em família, além de viagens. Parcela do grupo faz aulas de

outras línguas além do inglês como Francês, Espanhol e Chinês. A atividade de

lazer mais expressiva foi navegar na internet, assistir a filmes e seriados

internacionais; alguns alunos informaram jogar videogames, participar de gincanas

online, passeios em parques e praças públicas (Praça da Jaqueira e o Parque Dona

Lindú), assistir a TV e brincar com amigos.

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128

Conforme Bourdieu (1998) a cultura “livre” é condição implícita do êxito

escolar de estudantes, a familiaridade com cultura, manejo da língua, domínio de

outras línguas, cinema, arte, música, dentre outros aspectos que criam nas crianças

disposições favoráveis à escolarização. Para Bourdieu a classe culta investe em

condutas escolares, isto se aplica as camadas médias intelectualizadas. A

construção de vantagens culturais ou a diminuição das desvantagens aparece

quando questionamos as atividades realizadas no famoso “tempo livre” que parece

ser utilizado para acumulação de capitais culturais e simbólicos. Apesar dos

estudantes possuírem “ferramentas” desiguais ligadas às condições objetivas de

origem, o recrutamento do colégio não fez mais do que nivelar e diminuir as

possíveis diferenças entre esses estudantes. E os pais continuam a investir nesse

“tempo livre” para diminuir possíveis desigualdades futuras.

O próximo aspecto a ser analisado diz respeito aos bairros de origem, local

onde ocorre a socialização dessas crianças.

Gráfico 01. Áreas de residência

A maior parte dos estudantes reside em bairros prestigiosos localizados na

Zona Norte da cidade do Recife (43.3%) como Casa Forte, Poço da Panela,

Apipucos, Jaqueira, Espinheiro, Madalena, Parnamirim e Torre, seguido de bairros

localizados na Zona Sul da cidade e na região metropolitana (25%) em bairros como

Boa Viagem, Piedade e Candeias. Parcela do grupo (20.8%) reside na Cidade

44%

25%

19%

8% 4%

RESIDÊNCIAS

Zona Norte

Zona Sul do Recife e RMR

CDU e proximidades

Periferias

RMR

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129

Universitária, Várzea e outros bairros próximos à universidade: Iputinga e Torrões.

Um grupo pequeno de estudantes (10.8%) reside nas periferias da cidade do Recife,

mais precisamente no Barro, Estância, Ibura e Jardim São Paulo.

Vale ressaltar o caráter diferencial de algumas famílias residentes em bairros

de periferia no quesito “reconhecimento social”. As famílias são respeitadas nos

bairros servindo de referencial aos demais moradores do local. Encontramos pais

que são professores universitários, proprietários de estabelecimentos comerciais

(Petshop, Mercadinhos e Depósitos de água e gás) e fundadores de associações de

bairro.

Para Bourdieu (2008) o conhecimento das atividades extracurriculares que as

crianças realizam, níveis de escolarização e profissão de seus pais,espaços de

socialização que frequentam, maior ou menor familiaridade com museus, cinema,

arte, música, dentre outros, bem como dos demais processos de socialização das

crianças, podem nos servir de subsidio para explicar como as aspirações de pais e

alunos foram construídas e a “predisposição” ou não dos filhos ao sucesso na

seleção de ingresso.

O cruzamento dessas variáveis nos permite, desde já, afirmar que há

afinidades entre a cultura escolar e o capital cultural e social dos estudantes, no

sentido expresso pelo sociólogo Pierre Bourdieu. Esse grupo representa o colégio a

partir da ótica de quem sempre o enxergou como possibilidade real. Os estudantes

atribuem o pertencimento à instituição ao mérito e o percebem como fator

diferenciado. Poderíamos arriscar dizer que o ingresso no colégio está atrelado às

perspectivas de futuro dessas famílias e que, de certa forma, torna-se o projeto de

vida desses estudantes.

É inegável a ideia do CAp-UFPE como objeto de desejo de pais e alunos.

Afinal, a cada ano cresce o número de inscritos no processo seletivo de ingresso, o

que nos dá indícios desse desejo, antes de qualquer intuito de pesquisa.

Expectativas foram criadas em torno dos pequenos, que, também, chegam ao

colégio repletos de desejos e esperançosos com as possibilidades que se abrem por

ingressarem na instituição. Tais expectativas podem ser reforçadas ou reformuladas

em decorrência das relações que se estabelecem com o objeto, não mais como

possibilidade, mas como realidade. Como os estudantes representam esse colégio

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130

de prestígio? Qual a estrutura dessa representação? É o que veremos a seguir ao

analisar o que dizem as crianças quando pensam no Colégio de Aplicação da UFPE.

5.1.2. Perfil dos Pais

Participaram da pesquisa 78 pais de estudantes do Ensino Fundamental do

Colégio de Aplicação da UFPE. Desse grupo, 35 tiveram filhos aprovados na última

seleção, portanto, vivenciaram recentemente o processo de escolha do

estabelecimento, investimentos e mobilizações para ingresso. Uma parcela de pais

participantes da pesquisa (12) já possuía filhos frequentando a instituição. Alguns

tinham dois (09) ou três filhos (03) e outros (13), apenas um deles aprovados na

escola ou estavam a espera das próximas seleções para pleitear a vaga dos filhos

menores.

O grupo de pais demonstrou estar repleto de expectativas, desejos e

aspirações para com seus descendentes, em busca da excelência acadêmica e

sucesso dos filhos. Essas famílias se mobilizaram por um ano ou mais no intuito de

preparar as crianças para a seleção do CAP,vivenciaram maratonas de estudo e

privações de lazer; estudaram junto aos filhos; acompanhamento aos cursinhos,

simulados, grupos de estudos. Tiveram sua vida e rotina modificadas por um tempo

em prol da aprovação dos pequenos. Mas, em contraponto também integram esse

grupo famílias que não empreenderam grandes esforços para que seus filhos

conseguissem êxito nas provas. Para essas pessoas, seus filhos não necessitavam.

Afirmavam: “já nasceu pronto”, “nasceu pra coisa”; “tem uma facilidade

extraordinária para aprender sem se esforçar” “José tinha o perfil da instituição, não

teve erro!”. Essas famílias, acreditavam terem filhos bem preparados, dedicados aos

estudos e com predisposição inata, prontos para qualquer desafio. Nas análises das

entrevistas, ao se individualizar os percursos distinguimos esses três entendimentos

(criança bem preparada, criança dedicada aos estudos e criança prodígio) e

entendemos que, apesar das distinções, há muito em comum entre as famílias que

estabelecem tais classificações.

Os pais, em especial os veteranos, estabelecem uma relação de identificação

com o CAP. As justificativas oferecidas por esse grupo, nas diferentes etapas da

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131

pesquisa vão revelando um sentimento de pertencimento à instituição e de

identificação com o tipo de ensino ali oferecido. O colégio aparece como instituição

que responde aos anseios daquele grupo, com características alinhadas por

excelência às características e anseios dessas famílias, com potencial para garantir

aos estudantes o que há de melhor em termos de rendimentos escolares. O CAP

aparece ainda como espaço de espaço privilegiado de socialização. Esse sentido de

pertença faz as famílias desejarem a todos os seus descendentes o ensino do CAP

em detrimento de qualquer outro ensino público ou privado. A satisfação é justificada

por estarem suas crianças entre “iguais”. Durante as entrevistas, os pais revelaram

que os filhos “se encontraram” após o ingresso no colégio. No discurso de alguns

deles, a instituição parece ter sido pensada para atender às necessidades daquele

grupo específico de crianças que ali habita.

Importante destacar que do total de pais, participantes da pesquisa, 12

frisaram terem sido ex-alunos do colégio. Lembramos que não havia tal

questionamento no protocolo, mas a referida informação se torna relevante para a

pesquisa, pois esse grupo de pais fez questão de se identificar como parte da

história do colégio. Os pais ex-alunos tendem a perpetuar a sua história, pois

participam ativamente da instituição a partir dos seus filhos. Os bancos escolares

antes por eles ocupados passam a ser ocupados por eles. Um dos ex-alunos formou

os dois filhos mais velhos no colégio e responde a pesquisa pelo terceiro. Ele

ressaltou que o filho possui dupla responsabilidade: ser aluno do CAP e ser filho de

ex-aluno do CAp. O pai nos confidenciou: “na seleção nós sabíamos da dupla

responsabilidade demandada ... Tentamos amenizar isso, mas ele mesmo se

cobrava e não desapontou em rendimentos”.

Da mesma forma que os estudantes, os pais responderam ao Teste de

Associação Livre e um questionário socioeconômico(Apêndice 1). O referido

questionário levanta alguns elementos para caracterização do grupo como sexo,

faixa etária, formação acadêmica, profissão, número de filhos, número de filhos

submetidos e aprovados nas seleções de ingresso, bairros de residência, renda

mensal familiar. Essa caracterização pode ser melhor visualizada nos Quadros 09 ,

10 , 11e 11 e nos Gráficos 2 e 3 apresentados a seguir.

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132

Quadro 09: Distribuição dos pais participantes por gênero

Gênero f

Masculino 50

Feminino 28

Total 78

Quadro 10: Distribuição dos pais participantes por faixa etária

Faixa etária f

26-35

08

36-45

38

46-55

28

56-65

04

Total 78

O grupo participante é composto por 64% de pais e 36% de mães de alunos

do colégio. Dentre os participantes, 48.7% possuem idade entre 36 e 45 anos, 36%

tem 46-55 anos, uma parcela de pais (10.2%) tem entre 26-35 anos e um número

reduzido de participantes (5.1%) está na faixa etária de 56 a 65 anos.

No que se refere à variável formação acadêmica, percebemos que é ínfimo o

percentual de pais com nível médio de formação (3.8%), boa parte concluiu curso de

graduação (33.4%), a maioria concluiu pós-graduação (62,8%) distribuída entre em

especialização (61.2%), mestrado (22.5%) e doutorado (16.3%).

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133

Quadro 11: Distribuição dos pais participantes por nível Formação Acadêmica

O elevado nível de formação desses pais pode estar relacionado à

valorização da educação escolar, da vida acadêmica, dos títulos e certificados de

ensino. Não devemos, no entanto, reduzir essa valorização à questão utilitarista do

diploma rentável, pois a necessidade de formação de cada grupo envolve

subjetividades e identidade social. Tudo se passa como se o reconhecimento obtido

através de uma formação em nível de pós-graduação fosse uma necessidade

daquele grupo em específico. O nível de escolarização dos pais tem um papel

importante na vida escolar do filho na medida em que é tributada a herança de

alcançar a mesma escolarização do pai ou superá-lo.

A ocupação dos pais é outro aspecto a considerar na socialização do grupo

que compõe o CAP. No Quadro a seguir apresentamos as profissões desses

sujeitos.

Quadro 12: Distribuição dos pais participantes por Profissão

Formação acadêmica

F

Ensino Médio

03

Ensino Superior

26

Especialização

30

Mestrado

11

Doutorado

08

Total

78

Profissão

f

Professor Universitário

07

Professor de Educ. Básica

08

Funcionário público Federal

27

Funcionários públicos Estadual

07

Profissional liberal

29

Total 78

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Participaram do estudo 07 desses pais, que são professores universitários

(8,9%) dos investigados; 08 pais lecionam nos demais segmentos de ensino de

escolas públicas privadas ou exercem cargos de gestão ou coordenação nessas

instituições(10.2%); 27 (34.6%) pais são funcionários públicos federais, eles são

servidores da própria universidade, do Tribunal de Justiça de Pernambuco (Juízes,

Oficiais de Justiça), Ministério do Trabalho, Ministério da Fazenda, Tribunais

Regionais Eleitorais, Tribunais Regionais Federais, Fóruns, Forças Armadas

(Coronel e Major da Aeronáutica, Coronel do Exército). Do total de pais investigados,

8.9% são funcionários públicos estaduais. Eles atuam na área de saúde pública,

segurança pública (delegados, agentes de polícia civil e policiais militares),

secretaria de administração e educação do estado. A maioria dos pais (29) é de

profissionais liberais (37.1%). No grupo prevaleceram médicos, advogados,

jornalistas, arquitetos, designers, engenheiros, nessa ordem. A maioria desses

profissionais afirmou possuir clínicas ou escritórios próprios.

Identificamos que a maioria das famílias investigadas (42) possui dois filhos.

Do total pesquisado, 53 delas submeteram apenas um dos filhos à seleção.

Importante frisar que destes 53, 33 têm dois ou mais filhos, mas não submeteram os

demais por terem ultrapassado a idade da seleção quando os genitores tomaram

conhecimento e passaram a se interessar pelo ensino do CAP, alguns justificaram

ainda não terem suas crianças menores alcançado o nível de ensino ofertado,

sendo, portanto, são futuros pretendentes a vaga.

Além dos que estão à espera do momento certo para preparar o próximo filho,

temos uma parcela considerável de pais (25) que apostou mais de uma vez no

colégio submetendo dois ou mais filhos, destes 12 obtiveram êxito. Aqueles que não

conseguiram, matricularam os demais em escolas privadas e lamentam por terem

que custear um ensino que “... não se equipara ao do CAp”. As insatisfações são,

ainda, sobre a imaturidade das crianças no momento da seleção “A menina foi

aprovada, o meu rapazinho não. Na época, ele era imaturo demais, não se dedicou

o suficiente, além do mais gostava dos amiguinhos do colégio... Não sabia ele, o que

estava perdendo. Hoje o danado se arrepende!”

Do total de famílias participantes do estudo, 03 possuem três crianças

frequentando a instituição. Uma representante dessas famílias participou de todas

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135

as etapas da pesquisa, e apresenta o seguinte perfil: mãe de três meninas,

funcionária pública, duas de suas crianças aprovadas e estava a espera do

resultado da terceira, submetida ao último exame. No mês de dezembro, após as

entrevistas, tivemos a informação de que a terceira filha havia sido aprovada.

Como pudemos perceber até o presente momento, o colégio atrai famílias

bem sucedidas, uma clientela diferenciada da que compõe a maioria das escolas

públicas estaduais e municipais, bem como de algumas instituições privadas,

optamos por nos referir a esse grupo como as camadas médias intelectualizadas.

Nos dados a seguir, aspectos como bairros de residência e renda familiar mensal

tendem a confirmar que o colégio é composto por um grupo de habitus favorável ao

êxito escolar, e, também, um grupo com disposições, condições de existência e

perspectivas de futuro semelhantes e alinhadas às características da escola.

No Gráfico 02, a seguir, apresentamos os bairros de residência das famílias

pesquisadas. Como discutido no perfil dos estudantes os bairros em que as famílias

estabelecem moradia, nos quais as crianças são socializadas constitui uma

propriedade sociocultural importante e diz das possíveis relações estabelecidas por

esses grupos, suas redes familiares e de amizades.

Gráfico 2. Áreas de Residência das famílias

38%

33%

9%

13%

7%

RESIDÊNCIA

Zona Norte

Zona Sul do Recife e RMR

CDU e bairros próximos

Bairros de Periferia

RMR

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O Gráfico 02 mostra que as famílias investigadas residem em sua maioria na

Zona Norte, mais precisamente, nos bairros de Casa Forte, Poço da Panela,

Apipucos, Jaqueira, Espinheiro, Madalena, Parnamirim e Torre. Seguido da Zona

Norte temos grande incidência de estudantes residindo na Zona Sul da cidade do

Recife e na Região Metropolitana. Na zona sul a maioria reside em Boa Viagem,

Piedade e Candeias. Nesses bairros as famílias do CAP possuem residências à

beira mar e em ruas paralelas. Uma parcela dessas famílias reside próximo à

universidade, na Cidade Universitária, Várzea e, em menor número, nos bairros de

Torrões e Iputinga. Há ainda os que residem nas periferias da cidade como Barro,

Estância e Jardim São Paulo, bairros próximos a BR 101 que dá acesso a UFPE.

Em número inferior estão os alunos que residem em bairros centrais de cidades da

RMR como Olinda, Paulista e Jaboatão dos Guararapes.

Como evidenciado no Gráfico 03 a maior parte (34%) dessas famílias possui

renda mensal de 14 a 22 salários mínimos, seguido de famílias com rendas que

variam de 08 a 14 salários mínimos (24%). Merece destaque a presença no grupo

de um número considerável de famílias com renda superior a 28 salários mínimos

(18%). Desse grupo, três participantes declararam possuir renda igual ou superior a

40 mil reais mensais. Há uma equivalência percentual (12%) entre as famílias que

recebem de 02 a 08 salários mínimos e aquelas com renda entre 22 a 28 salários

mínimos.

Importante destacar a diferença entre a menor renda declarada (R$1.200,00)

e a maior (R$40.000,00). No entanto, o grupo parece não se distanciar tanto quando

os demais aspectos acima considerados. Ressaltamos que apenas uma dessas

famílias possui renda de 2 salários mínimos, é composta por mãe e filha, a renda

seguinte em ordem crescente é de dois mil reais.

Estamos diante de um grupo homogêneo no habitus, que adotam estratégias

diferenciadas relativas às perspectivas futuras comuns. Percebemos que, por hora,

as aspirações dessas famílias se concretizam na inserção de seus filhos numa

instituição pública, de ensino e corpo docente diferenciado. Além do mais o “melhor”

ensino está dentro de uma escola pública, local onde a moeda de troca é apenas a

“competência” do filho para ali estar, pois a aprovação na seleção o deixa apto a

fazer parte do grupo.

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Gráfico 03. Renda Familiar Mensal

Por ser o CAP uma instituição pública federal o prestígio lhe é inerente, mas

há uma identificação desses pais com a instituição e demais aspectos subjetivos e

objetivos que os levaram a escolha do estabelecimento Discutimos tais aspectos, a

seguir.

Inferimos que o perfil dessas famílias constitui um dos indicativos para

entender a preferência pelo CAp e não por outra escola e nos diz das condições de

aprovação e permanência das crianças na instituição. Traçado esse perfil nos

preocupamos, agora, em responder como os pais representam esse colégio de

prestígio? Qual a estrutura dessa representação? O que dizem os pais quando

pensam no Colégio de Aplicação da UFPE?

12%

24%

34%

12%

18%

RENDA FAMILIAR MENSAL

02 A 08 Salários Mínimos

08 a 14 salários mínimos

14 a 22 salários mínimos

22 a 28 salários mínimos

superior a 28 salários mínimos

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138

5.2. CONTEÚDO GERAL E POSSÍVEL ESTRUTURA DA REPRESENTAÇÃO

SOCIAL DO CAP DA UFPE POR PAIS E ESTUDANTES

5.2.1. A Estrutura da Representação Social do Colégio de Aplicação para os

estudantes

Após aplicação do teste, já explicitado no capítulo anterior, quantificamos a

frequência de todas as palavras evocadas, mediante apresentação do termo indutor

“Colégio de Aplicação”. A dispersão das palavras foi pequena, pois os estudantes

evocaram um total de setecentas e vinte (720) palavras, destas oitenta (80) eram

diferentes entre si. Compuseram a estrutura da representação cinquenta e quatro

(54) destes termos.

Os termos foram agrupados por similaridade semântica, no entanto isto não

alterou o formato das evocações, pois as palavras de mesmo sentido foram

aglutinadas quando as variações eram de conjugação verbal, ou quando apareciam

ora, como substantivos, ora, como verbos, portanto o repertório não foi alterado.

Descartamos aquelas de frequência inferior a 3 (três) evocações. O Software EVOC

produziu os resultados: frequência média dez (10) e a OME dois e meio (2,5) como

referenciais de análise. O cruzamento desses dois critérios combinados, a MF

(frequência média) e a OME (ordem média de evocação), define a relevância dos

elementos na representação.

A MF é de natureza coletiva, representa a frequência com que a palavra foi

evocada pelos participantes; a OME, de natureza individual, expressa a ordem de

evocação de cada termo pelo sujeito. Esse calculo é possível a porque cada sujeito

dispõe as palavras em uma determinada ordem. No nosso caso houve uma variação

do cálculo da OME. Os sujeitos selecionaram um termo considerado por eles mais

importante (representativo). O termo escolhido ocupa a primeira ordem de evocação,

os demais foram considerados como de segundo, terceiro... e sexto lugar na ordem

de evocação dos participantes.

O Software EVOC gera, conforme Vergés (2002) um quadro de quatro

casas, Na primeira casa, localizam-se os elementos mais relevantes da

representação, na segunda e terceira situam-se os elementos menos salientes da

estrutura e a quarta casa concentra os termos menos evocados com prioridade na

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hierarquização. Segundo Oliveira et al. (2005) as palavras localizadas no quadrante

superior esquerdo (1ª casa) são, possivelmente, os elementos do núcleo central das

representações socias do objeto investigado. Aquelas situadas no quadrante

superior direito (2ª casa) são consideradas como elementos da primeira periferia, ou

seja, aqueles mais próximos do núcleo central. Esses termos têm frequência alta,

porém foram atirados tardiamente. No quadrante inferior esquerdo (3ª casa) situam-

se os elementos da zona de contraste, esses foram os de baixa frequência, mesmo

que evocados em primeira mão. No quadrante inferior direito (4ª casa) estão

localizados os elementos da periferia distante, dizem respeito aqueles termos que se

encontram mais afastados do núcleo central. Na última casa, os termos têm baixa

frequência e foram tardiamente evocadas. A análise das palavras mais recorrentes

e relevantes elencadas pelos estudantes do EF feita com o auxílio do EVOC

possibilitou compor a essa configuração apresentada no Quadro 10, logo abaixo.

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Quadro 13 - Quadro de quatro casas gerado pelo EVOC resultante das evocações

dos alunos à expressão indutora “Colégio de Aplicação”

Frequência Mínima- 03 MF: 10/ OME: 2,5

F>= 10/ OME < 2,5 F>=10/ OME >=2,5

F OME F OME

Estudo 43 2.163

Alunos Amigos Aprendizado Aula Disciplina Educação Ensino Excelência Futuro Livros Melhor Professores Prova Qualidade Responsabilidade Sucesso Universidade Ótimo

24 45 16 20 10 20 22 15 14 12 42 43 11 26 12 16 33 33

4,167 2,867 3,063 3,900 2,900 2,600 2,818 3,533 2,929 3,250 4,000 3,744 4,364 3,423 3,250 4,250 3,485 3,333

F<10/ OME <2,5 F< 10/ OME >=2,5

F OME F OME

Prisão Referência União

03 04 03

2,333 2,000 1,667

Alegria Aplicação Biblioteca Cansaço Conhecimento Conquista Dedicação Dificuldade Diversão Elite Esforço Etapa Federal Felicidade Grande Inteligência Legal Leitura Liberdade Objetivo Orgulho Parecer Pessoas Preguiça Prestígio Público Seleção Sonho Tarefas Trabalho Turmas Vida

05 07 03 04 07 03 05 07 09 03 06 04 03 09 03 08 03 04 03 04 03 08 03 03 06 03 07 07 04 06 04 03

4,400 2,714 5,000 3,250 3,857 3,333 3,600 4,429 4,667 4,000 3,667 2,500 4,333 4,556 4,333 3,125 3,000 4,500 4,000 4,750 3,000 4,000 3,000 3,667 4,167 2,667 3,429 3,714 4,000 3,000 3,000 3,667

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No Quadro 13, temos informações importantes para compreender a

organização interna da Representação Social do Colégio de Aplicação da UFPE

construída por seus estudantes. Constatamos, de imediato, que o quadrante

superior esquerdo é composto por apenas um elemento- “estudo”. Este seria o

possível elemento central da representação. A saliência do termo estudo indica que

este o termo é estruturador, apresenta maior conexidade, rege as conexões

existentes entre os demais elementos, portanto assegura a unidade e estabilidade

do campo. Conforme Abric (2003), os elementos centrais determinam a significação

e organização interna de uma representação, e são os mais resistentes a

transformações. Assim, caso ocorra mudança, no Núcleo Central, a representação

será transformada completamente.

O termo estudo foi evocado 43 vezes e foi considerado, como a palavra mais

importante, por 15 estudantes. Os sujeitos justificavam sua escolha dizendo:

Estudamos muito para passar20

(69;M;6)21

Como o colégio é a melhor escola pública do estado tem que estudar muito para passar (72;F;6)

Para ficar no colégio tem que estudar muito e ter responsabilidade (61;F;7)

Nas justificativas o colégio é indicativo de estudo e representa, na vida dessas

crianças, um duplo desafio: ingressar nesse grupo seleto e manter-se nele. Isso faz

com que os alunos sejam constantemente incitados ao esforço. A função deles é

estudar, foram selecionados porque estudaram e estão ali para continuar

empreendendo esforços.

Os alunos de 6º e 7º ano ao associarem o colégio a estudo parecem refletir, o

que vivenciaram recentemente: uma seleção de ingresso acirrada e as maratonas

de estudo para alcançar a aprovação. Como estão em fase de adaptação, iniciando

a vida no colégio, a palavra também está relacionada ao que continuam ali

vivenciando - estudos intensos para corresponder às expectativas que lhes foram

lançadas, após a aprovação e para responder as demandas da instituição. Para

20

As justificativas foram transcritas para a dissertação do modo como foram escritas pelos participantes da pesquisa. 21Nas justificativas da primeira fase os estudantes foram identificados pelos seguintes códigos: nº do protocolo respondido; F ou M conforme o sexo; nº do ano escolar

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eles,o CAp é sinônimo de estudo para garantir os resultados expressivos da

instituição.

Um dos estudantes justifica “estudo” fazendo referência a uma norma

constante. Conforme o documento há um limite máximo de idade para cada ano

escolar a cursar. Caso o aluno seja reprovado uma única vez, mas se estiver no

limiar de idade poderá se matricular novamente no mesmo ano. Porém, se tiver

ultrapassado a idade considerada ideal para a turma, estará impedido de se

matricular e transferido para outra. Os alunos mais novos beneficiam-se desse

regimento, pois poderá ser reprovado uma única vez, na segunda reprovação o

aluno é impedido de prosseguir os estudos no colégio. No registro a seguir,

percebemos o papel preponderante da palavra “estudo” para o ingresso e

permanência dos estudantes na instituição:

Sem estudar você não entra, sem estudar você sai, se reprovar de ano está fora do colégio (04;M;7)

Na justificativa do estudante há tensão não apenas para ingressar, mas para

se manter no colégio, correspondendo aos investimentos da instituição e da família.

Embora não declarada, a possibilidade da reprovação existe e, como podemos

perceber, inquieta os alunos.

O termo estudo aparece, também, atrelado às expectativas de um futuro

melhor. As justificativas para o termo estudo trazem a ideia de “melhor” colégio,

espaço de socialização e formação que será o diferencial na vida dessas crianças.

Estudar é muito importante para a formação do nosso futuro, para conseguirmos um trabalho e com isso uma renda estável. Sou aluno do melhor colégio do Brasil daqui pra frente só depende de mim (10;M;7).

Sem estudos não somos capazes de viver dignamente (17;F;9)

Minha família não poderia ter escolhido lugar melhor para minha formação. Tenho que estudar, preciso corresponder aos investimentos do CAP, da minha família. Tenho que aproveitar ao máximo o que recebo aqui para no futuro colher bons frutos. A única forma de aproveitar é estudando, estudando e me dedicando ao máximo (24; F;9).

Importante destacar que a palavra “melhor” perpassa muitas das

justificativas dos estudantes mesmo sem ter sido indicada por eles, como a mais

importante. Apesar de “estudo” ter sido a palavra mais saliente e relevante da

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representação, com MF (42) e OME (2,163), a palavra “melhor” teve 42 evocações-

ocupando a posição privilegiada na 2ª casa, primeira periferia, devido a elevada

OME. O número expressivo de evocações advém do grupo de alunos ingressantes,

que focou no termo “melhor”. No entanto, tal termo não ganhou relevância geral na

estrutura da representação, apesar de evocar “melhor” com uma frequência

considerável, “estudo” era considerado por essas crianças como mais importante,

possivelmente por ter sido uma experiência recente e marcante em suas vidas em

momento próximo a realização da pesquisa.

A palavra “Melhor” foi aglutinada de expressões que apareceram, tais como:

Melhor do mundo, Melhor do Brasil, Melhor Colégio, O Melhor. Isso reflete a

liderança assumida pelo CAP nas avaliações do IDEB, ENEM e demais avaliações

externas de desempenho do alunado. A ideia CAP como “o Melhor” colégio, aparece

fortemente no discurso midiático e nas comunicações das famílias, que têm

conhecimento do trabalho ali realizado e sonham com uma vaga para os filhos.

Conforme mostrado no perfil, esses estudantes frequentaram cursinhos

preparatórios que estimulam o esforço para pleitear uma vaga no melhor colégio do

Brasil. As crianças se apropriam dessas crenças, que lhes circundam e empreendem

esforços para fazer parte do grupo de estudantes do “melhor” colégio. Justificam

assim suas escolhas dizendo:

[...] o Colégio de Aplicação é a melhor escola pública do estado e penso: tem que estudar muito para fazer a prova (64; M;6).

Escolho dedicação. Tem que se dedicar- afinal estamos na melhor escola do país (79;M;6).

É a melhor de todos que já conheci (67; M;6).

O termo “melhor” aparece, assim como ensino, relacionado a diversos

elementos da representação. Tal palavra é justificada pelos resultados expressivos

no IDEB e nas avaliações das quais participa. Eles citam também o fato do Colégio

prepara-los para aprovação em concursos públicos. Observe os registros transcritos

abaixo:

Ele tem um bom ensino, está sempre entre os cinco melhores colégios e lidera o IDEB, isso é muito legal e importante (63;M;6).

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Estudando no melhor colégio o grau de dificuldade de passar em concurso público é quase zero (77;F;6).

Uma das justificativas está relacionada ao mérito, os alunos revelam ser

merecedores da vaga por terem empreendido os esforços necessários para

aprovação. No registro abaixo, percebemos esse núcleo de sentido, no qual os

melhores merecem o melhor colégio. Justificou um participante:

É o melhor colégio de todos do Brasil e acho importante estar no melhor colégio pelo esforço que os alunos fizeram (75;F;6).

Os elementos dos quadrantes superior direito, inferior esquerdo e inferior

direito fazem parte do Sistema Periférico da RS. O adjetivo “periférico” induz a

considerar que seus componentes, são irrelevantes ou de menor valor. No entanto,

Campos (2003) observa que os elementos desse sistema tem relevância para a

representação como um todo e possuem funções específicas: concretização,

regulação, defesa, prescrição de comportamentos, modulações personalizadas e

proteção do núcleo central. Cada elemento ou conjunto de elementos periféricos

mais próximos ou longínquos, em relação ao centro, podem ser ativados nas mais

diversas situações, tornando a representação viva nas práticas, fornecendo uma

visão dinâmica e flexível, possibilitando a percepção de suas nuances. Esses

elementos possibilitam, assim, a conexão entre a RS e as práticas concretas ligadas

ao objeto representado.

O quadrante superior direito, ou segunda casa do Quadro 10 é composta

pelos elementos: “alunos”, “amigos”, “aprendizado”, “aula”, “disciplina”,

“educação”, “ensino”, “excelência”, “futuro”, “livros”, “melhor”,

“professores”, “prova”, “qualidade”, “responsabilidade”, “sucesso”,

“universidade” e “ótimo. Na terceira casa, o quadrante inferior esquerdo,

identificamos três elementos “prisão”, “referência” e “união”. O quadrante

inferior direito, ou quarta casa, abarcou um número maior de termos como “alegria”,

“aplicação”, “biblioteca”, “cansaço”, “conhecimento”,“conquista”,

“dedicação”, “dificuldade”, “diversão”, “elite”, “esforço”, “etapa”, “federal”,

“felicidade”, “grande”,“inteligência”, “legal”, “leitura”, “liberdade”, “objetivo”,

“orgulho”, “parecer”, “pessoas”, “preguiça”, “prestígio”, “público”, “seleção”,

“sonho”, “tarefas”, trabalho”, “turmas” e “vida”.

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A primeira informação que a periferia nos traz é a predominância de

características positivas atribuídas ao objeto - Colégio de Aplicação da UFPE. Com

exceção da zona de contrate, que discutiremos mais adiante, no conjunto dos

termos presentes nas periferias do Quadro 10, predomina uma representação

positiva do colégio.

No intuito de proporcionar ao leitor uma melhor compreensão do papel dos

termos em relação à posição ocupada na estrutura, da conexidade destes com o NC

e demais elementos, dos sentidos e significados por nós inferidos, discutiremos seus

componentes em pequenos grupos.

Na “primeira periferia” do Quadro 10 localizam-se as palavras que, assim

como o Núcleo Central, tiveram alta frequência, mas alcançaram ordem média de

importância igual ou superior a referência (2,5). Cumpre relembrar que quanto maior

a frequência e menor a ordem de evocação maiores serão as chances de no quadro

a palavra vincular-se, ao quadrante superior esquerdo, possível Núcleo Central.

Desta forma, com MF alta e OME baixa essas palavras passaram a compor a

primeira periferia.

Na primeira periferia encontram-se os elementos mais relevantes dentre os

periféricos. Os termos que a compõem podem ter feito parte do NC dessa

representação, ou vir a fazer parte dele, devido à proximidade e conexidade com os

elementos centrais.

No referido quadrante, os termos “educação”, “ensino”, “amigos”,

“disciplina”, “futuro”, “aprendizado”, “livros” e “responsabilidade” estão mais

próximos do NC. Essas evocações parecem apontar ser ali um espaço onde a boa

educação acontece, onde estudantes vivenciam o “melhor ensino” que poderiam

ter; um espaço disciplinador, de aprendizado, estritamente voltado para o futuro

dessas crianças. Esse espaço requer dos alunos responsabilidade, esforço e

estudo. Para corresponder aos investimentos.

Interessante destacar que a palavra “ensino” foi aglutinada de expressões

tais como: “excelente ensino”, “melhor ensino”, “ótimo ensino”, “bom ensino”,

“ensino dos bons”, “ensino de primeira” e “ensino maravilhoso”. Esse ensino

aparece como um indicador de qualidade do colégio e fator diferencial em relação às

demais instituições públicas e privadas. O “ensino diferenciado” ali vivenciado

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garante resultados expressivos nas avaliações e torna a instituição desejada por

pais e estudantes, que almejam um futuro de sucesso profissional e pessoal para os

filhos. Alguns registros dos estudantes explicam melhor a significação da palavra:

Para mim o Colégio é sinônimo de ensino porque ele sempre fica no topo, no ranking das avaliações como IDEB, ENEM e outras do estado e do país (92;M;8).

O ensino é maravilhoso, digo maravilhoso porque ele é o colégio que tem a maior aprovação no vestibular (30;M;7)

Num colégio de ótimo ensino teremos menos dificuldade de no futuro passarmos em concursos públicos, vestibulares, seleções... (78;F;6)

[...] o motivo de “nós” termos estudado tanto, em vários cursos do Brasil foi para termos o ensino diferenciado do CAP (117;F;8).

Ensino. Porque é o que ele tem de melhor. É inegável a qualidade do ensino que vivenciamos... os resultados nas avaliações Brasil a fora não mentem (59;M;9)

Minha mãe fala que se tivermos bom ensino vamos ter uma boa profissão e viver a vida bem, não precisa ser rico, mas ter uma vida estável. (66;M;6)

Nesses registros, a ideia de hierarquia é muito forte. O colégio que tem o

“melhor” ensino está no topo e permite aos estudantes chegar ao topo; lidera

rankings e corresponde às expectativas futuras de pais e alunos quanto à aprovação

no vestibular e concursos públicos. Mesmo não fazendo parte da filosofia do Colégio

há uma visão mercadológica expressa no discurso desses estudantes. O

pertencimento à instituição é tido como garantia de aprovação no vestibular e

concursos públicos, uma garantia de estabilidade financeira futura. Como podemos

perceber, as palavras estão conectadas ao NC, os estudos intensos proporcionaram

aos estudantes o ensino diferenciado do CAP e “garantem” o sucesso futuro.

A “educação” aparece estritamente relacionada às relações diferenciadas

entre os estudantes e profissionais do CAP. Conforme os alunos, as relações ali

estabelecidas são responsáveis por uma educação diferente da que ocorre em

outros estabelecimentos. As justificativas indicam o Colégio como responsável por

uma formação integral dos alunos, como capazes de enfrentar a vida. Eis os

registros:

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Educação, porque não adianta ter escola, alunos, professores, cadeiras, mesas, quadros, data-show, secretaria, salas de aula e etc. se não existir educação, formação. Seja escola pública federal, estadual, municipal ou particular, a educação é o que acontece entre aluno e professor. No CAP temos uma relação diferente com os professores, diferente da que acontece nos outros colégios que faz com que a Educação seja diferente também (74;M;6).

Educação porque aqui os professores focam em relações e não apenas no ensino. Educação é mais abrangente, envolve ensino e aprendizagem... Sinto que o colégio nos melhora para a vida e enquanto pessoas. Educação é formação completa, sem dúvidas a essencial (100;M;8).

Para este grupo, o CAP representa também um lugar de fazer novos

“amigos”, as crianças se vinculam a uma turma ao ingressarem no colégio e sua

composição é mantida até o final do Ensino Médio. Além do mais, a convivência é

intensa, pois eles passam grande parte de seu tempo na escola em horário

estendido, e, em dois dias na semana, têm atividades em horário integral. A palavra

amigos é justificada como suporte emocional, necessário para conseguirem

corresponder positivamente ao clima intenso de estudos. Alguns estudantes

afirmam:

Os amigos nos ajudam a superar as dificuldades e fazem a vida viver a pena (98;F;8)

Amizade porque de todas as coisas boas que acontecem na nossa vida depois que ingressamos no colégio essa é a mais legal (22;F;7)

É o que mais tem relevância na minha vida e forma a minha personalidade

(40;M;9).

Uma das participantes revela que, no CAp, os concorrentes do cursinho

passaram a ser seus amigos de hoje. O discurso da estudante sugere a lógica

competitiva que a sociedade como um todo nos impõe, na qual se tona difícil

estabelecer laços de amizade com o próximo. No colégio, o clima é diferente do

imposto pelo cursinho preparatório, pois a competição dá lugar à cooperação. Os

alunos se conhecem e se reconhecem como grupo, se apoiando em suas

dificuldades. Como podemos perceber na justificativa abaixo transcritas:

Aqui fazemos amigos verdadeiros e para a vida toda. Lembro do primeiro dia de aula e de como meus amigos de hoje eram apenas (des) conhecidos do cursinho, hoje eles são os meus amigos. A gente não compete, não disputa mais vaga, hoje nos ajudamos, nos apoiamos e nos divertimos juntos (50;F;9).

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Somos uma família. Quando digo “amigos” os professores e os funcionários estão incluídos (101;M;8).

A “disciplina” aparece nos registros não como atributo da escola, mas como

atributo desenvolvido pela escola e família a fim de que alcancem seus objetivos.

Disciplina - no sentido acadêmico, disciplina nos estudos, conforme pudemos

perceber.

Para tornar um sonho realidade precisamos de disciplina (P35=EM9)

Para ser aprovada precisei de muita disciplina nos estudos, disciplina que aprendi com meus pais. Hoje o colégio me ajuda a ser ainda mais disciplinada. Achei que depois da aprovação não precisaria mais me dedicar tanto, mas minha rotina de estudos não diminuiu, ela foi ampliada. A diferença é que consigo respeitar mais os horários e fazer meu tempo render (99;F;8).

Disciplina é a mais importante, pois o Colégio de Aplicação é no campus da UFPE, lugar das pessoas se formarem, estagiarem, correrem atrás dos objetivos de vida (80;M;6).

Sobre o elemento “aprendizado” um dos alunos considera ser a instituição

responsável por fazer os alunos aprenderem a aprender. O termo aprendizado está

relacionado diretamente ao desenvolvimento de autonomia nos estudantes. Nas

análises seguintes, perceberemos que pais e alunos não conseguem, ao certo,

explicar o que ali vivenciam. Como ressalta a mãe (arquiteta) de um estudante do 8º

ano: “Eu não sei te dizer ao certo o que eles fazem. Mas que os meninos

aprendem... Ah! Isso aprendem. E aprendem brilhantemente porque não

desaprendem”. Os estudantes seguem reforçando o sentido de aprendizado com

autonomia, um aprendizado diferenciado. Um dos registros corrobora esse sentido:

Eles não estão preocupados com que a gente aprenda o que eles ensinam, mas muito mais com que a gente aprenda a aprender. Aprendemos diferente aqui. Aprendemos a correr atrás da informação, do conhecimento. Nada no CAP nos é dado, nada! (75;M;9)

O CAP, na visão de um grupo pequeno de alunos, está relacionado aos

“livros”, por contribuir para a ampliação do interesse pelo universo letrado. Muitas

vezes os pais afirmaram, em entrevistas ou conversas informais, que a família

passou adquirir um número maior de livros e intensificar as leituras desde o ingresso

do filho no CAP. Esses informantes pertencem às famílias, cujos filhos estudavam

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em colégios privados de pequeno porte, colégios de bairro, e que consideravam as

leituras recomendadas insuficientes. Nos registros abaixo os estudantes alegam:

Considerei livros mais importantes, pois temos uma afinidade com a leitura que aqui é potencializada (28;F;7)

Desde que me tornei aluna do colégio adquiri e li vários livros. Antes eu também lia, mas agora eu leio e faço ler, minha mãe que o diga! (95;F;8)

Minha biblioteca aumentou. Estou no CAP há dois anos e já perdi a conta de quantas vezes tive que reorganizar minhas prateleiras de livros, sempre chegava mais um e depois mais um, era uma agonia. Esse ano meus livros ganharam uma estante linda e foram para a sala junto com os dos meus pais. Vejo o colégio nos meus livros (07;F;7).

Não lemos apenas o paradidático do 5º ano, lemos cada vez mais (73;F;6)

No que se refere ao termo “Futuro” os estudantes parecem manter

expectativas positivas associadas à vinculação ao CAp. O ingresso na instituição

significa portas abertas para alcançar objetivos futuros como estabilidade financeira,

realização pessoal e profissional e constituição de família. Tudo se passa como se o

colégio fosse uma ponte para alcançar tais objetivos. Eis a explicação do termo

futuro por um dos alunos:

Coloquei a palavra futuro no sentido de ter um bom futuro, tudo que coloquei é em relação a esta palavra, pois como o Aplicação é o melhor colégio de PE... Se eu tiver muito “estudo”, “inteligência”, “dedicação”, “trabalho” e bons “amigos” é mais provável, quase uma certeza, que eu tenha um bom futuro, uma boa profissão, uma família, essas coisas (90;M;8).

O CAP fará nada mais e nada menos que me fazer seguir o meu futuro de forma concreta, com êxito. (44;M;9)

Para esses sujeitos pertencer ao CAp configura-se como um privilégio. O

colégio fornecerá aos estudantes as ferramentas necessárias para alcançar o futuro

desejado. Um dos alunos expressou ter consciência de que pertence a um grupo

seleto e nem todos têm a sorte/ competência/ oportunidade de fazer parte deste

grupo. O estudante afirma de forma categórica:

O CAP oferece tudo que preciso pra ser o que eu quiser no futuro. Ele dá as ferramentas, agora só depende de mim. Mas nem todos tiveram a sorte/competência/oportunidade de ter acesso às ferramentas. Eu tive. (105;M;8).

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Esse futuro inscrito no presente é facilmente visualizado por alguns, enquanto

para outros é promessa, mas não incerteza. Percebemos no registro abaixo que os

pais exercem influência na representação dos estudantes, que de certa forma,

assumem o discurso da família mesmo, quando não tem dimensão das implicações

de tais esforços e mobilizações.

Minha mãe fala que o colégio me abriu portas, mas ainda não sei a dimensão disso tudo. Mais pra frente, no FUTURO, saberei o que do colégio de aplicação se concretizou em mim. O CAP será o grande responsável, depois de mim e de minha família, por quem serei e pelo que terei daqui há uns 20 anos (102;M;8).

O termo “futuro” está estritamente relacionado à “universidade”, elemento

que também faz parte da primeira periferia. A evocação dessa palavra e a posição

de importância por ela assumida não causam surpresa. Isto ocorre por ser o colégio

ambientado no espaço universitário e, também, porque as crianças, ao evocarem a

universidade, estão a projetar um futuro provável, ou seja, cursar a universidade se

impõe como destino natural daqueles que fazem parte do seleto grupo de alunos do

CAP. Esse núcleo de sentido pode ser percebido no trecho a seguir:

Porque pra mim a universidade é a extensão do Colégio. A universidade é a serie que vem após o terceiro ano do ensino médio, apenas mudamos de prédio. Meu maior contato é com o CE, CFCH, CAC, não me desloco muito por medo. Gosto de pesquisa científica, minha tia leciona aqui e diz que passarei no mínimo mais uns 16 anos no campus... É que tem a graduação, o mestrado, o doutorado e se for lecionar, o ensino e a pesquisa (113;M;8).

Interessante constatar que o estudante acima, apesar da pouca idade,

consegue vislumbrar no futuro uma carreira acadêmica. No início de sua escrita o

aluno diz gostar da pesquisa científica e cogita a possibilidade de lecionar. Entende

que lecionar não se resume a ensino, mas envolve a pesquisa, o professor é antes

de tudo um pesquisador. O entendimento do estudante pode estar relacionado às

influências familiares (tia professora da UFPE) e ainda a vivência no colégio,

expressando, assim, os sentidos atribuídos ao ensino ministrado pelos seus

professores.

Os estudantes podem participar ativamente das atividades no campus, estão

mais próximos das informações sobre os cursos, das bibliotecas, palestras, eventos

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e em contato com pessoas de diversas áreas de conhecimento. Assim, em tal

espaço o desejo de frequentar a universidade é potencializado. A preparação

recebida pelos alunos do CAP e o fato de “viverem a universidade”, os faz sentir que

podem prestar vestibular para qualquer curso e escolher qualquer profissão, pois

não ficam reféns das dificuldades e defasagens em determinada área de

conhecimento. Os estudantes assim se posicionam:

Estudar no aplicação, estar na UFPE, me faz sentir que eu posso ser o que eu quiser- entende? (26;F;7)

O colégio nos prepara bem para escolher o curso que quisermos. Eu ainda não escolhi, não tenho pressa, mas não tem como não pensar nisso, pois estamos todos os dias aqui. Por isso a palavra mais importante é universidade (109;M;8).

O desejo de fazer parte da UFPE é naturalizado pelos estudantes, que

sentem que sempre desejam ir para a universidade. O registro a seguir é

esclarecedor nesse sentido: “Sempre desejei estudar na Universidade Federal” (11;F;6).

O Ensino Superior aparece como um desejo que sempre foi da criança, no

entanto, os desejos são construídos socialmente. As crianças aprenderam a querer

a universidade. Bourdieu (2008) afirma que as condições objetivas se tornam

esperanças subjetivas. Assim, quando a criança diz “com esse colégio a gente

consegue passar”, ela nos diz de suas esperanças subjetivas, fruto das condições

favoráveis que vivencia. Percebemos o valor simbólico que o “melhor” colégio

representa na vida desses sujeitos e sua relação com as expectativas futuras de

conseguir aprovações em concursos públicos, exame e vestibular, e frequentar a

universidade.

Em alguns momentos os resultados expressivos do colégio são facilmente

explicados pelos alunos ao justificarem os termos “aulas” “prova”

“responsabilidade” “professores” “alunos”. Eis os registros:

Tem que ter muita responsabilidade para estar aqui. Os resultados positivos do colégio reforçam isso. É preciso responsabilidade em todas as tarefas que enfrentamos na vida e no CAP principalmente (56;M;9).

As melhores aulas são as nossas. Acho que melhor que muitas outras escolas do país. Ao menos nos saímos bem nas avaliações (13;M;7)

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As provas trazem as notas e se a nota for baixa podemos chegar até a repetir de ano. E esse colégio não é de alunos que reprovam (115;M;8).

Persiste a preocupação dos alunos com a reprovação e com a necessidade

de corresponder às expectativas, que lhes são impostas. Quando o aluno diz que,

neste colégio os alunos não reprovam, remete ao caráter de excelência do ensino da

instituição e de seus alunos.

Sobre o termo “professores”, a maioria dos estudantes acredita que “os

professores fazem o colégio”, são os responsáveis pela imagem prestigiosa da

instituição. Entretanto, que os sujeitos ora atribuem os resultados expressivos aos

“alunos”, ora aos “professores”, alguns consideram que o CAP é a soma dessas

duas forças.

Um colégio é composto por alunos, e no caso do Aplicação esse é o diferencial da escola (47;F;9)

A palavra alunos é o mais importante porque os alunos do colégio é o que o fazem tão especial e importante (53;F;9).

Acredito que os professores sejam a parte mais importante porque são eles que fazem a diferença no colégio, não apenas na forma de passar o conteúdo, como também em experiências diárias para a vida (33;F;9)

Os professores são importantes, mas os alunos também. Marquei os dois como mais importantes, mas como tem que escolher um fico com os alunos. Os alunos são um ponto forte. Mas na minha cabeça o CAP é a soma desses dois (120;M;8).

Há, ainda, uma associação do CAP aos termos “melhor”, “excelência”,

“qualidade”, “sucesso” e “ótimo”. Como dito anteriormente, o termo melhor, apesar

de não pertencer ao NC, perpassavárias justificativas dos estudantes especialmente

acompanhado das características excelência, qualidade, ótimo, sucesso. O colégio

aparece como aquele de melhor ensino e aprendizagem expressos nos resultados

positivos das avaliações. Isto justifica ser um colégio de sucesso, reservado às

pessoas de sucesso. Para os sujeitos, trata-se de uma instituição de qualidade que

os fará atingir o sucesso futuro. Esses núcleos de sentido e significado podem ser

melhor observados nos trechos a seguir:

O colégio é ótimo! Escolhi ótimo porque pra mim ótimo é o colégio que não nos fará ter dificuldades no futuro (70;F;6)

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Aqui é uma instituição de referência em ensino e aprendizagem. É sinônimo de excelência nos dois. O colégio dos sonhos, mas a estrutura física é uma realidade não muito boa. O meu colégio anterior era excelente, mas apenas na estrutura, o resto não era tão bom. (62;F;6).

O colégio aparece novamente atrelado às perspectivas de futuro dessas

crianças. É percebido como “lugar ideal de educação”, um colégio de “qualidade”

que apesar da estrutura oferece um ensino de excelência aos alunos, realidade que

deveria se estender as demais escolas públicas do país. Observem os registros

desses estudantes:

O Colégio é sério e tem muita qualidade. Qualidade é quando temos um colégio no qual é fácil de aprender e que tem os melhores resultados do Brasil (18;F;7).

Quando tu pensa em qualidade o que te vem a cabeça? Tudo de melhor, claro! Roupa de qualidade- os melhores tecidos, sapato de qualidade- o melhor couro, música de qualidade- o melhor arranjo, comida de qualidade- gosto refinado, Colégio de qualidade- os melhores alunos e professores. Tem que ter estrutura também, seria melhor se tivesse um espaço mais confortável, mas a gente dá um jeito. (104;M;8).

Há, claramente, um esforço em definir o que seria essa qualidade e o porquê

desse colégio se diferenciar dos demais. Contudo, a falta de estrutura é apontada

pelos estudantes em diversos momentos com pesar. No entanto, essa suposta

dificuldade não afeta a imagem da instituição, pois os estudantes compreendem que

esta é uma realidade a ser enfrentada.

Para os alunos quanto mais qualificados forem os professores e mais bem

selecionados os alunos, maiores serão os índices do colégio e os resultados

positivos seguem numa crescente. O colégio de qualidade aparece destinado

aqueles, que se preocupam com o futuro. O sentido atribuído à palavra nas

justificativas dos estudantes aparenta estar estritamente ligado a um futuro

promissor, de sucesso, almejado por esse grupo de alunos. O CAP é visto como

“trampolim” para um futuro de bem estar, para as pessoas alcançarem profissões de

prestígio, acumularem trunfos para competir e obter êxito nos concursos públicos.

Os registros a seguir corroboram esses sentidos:

Aqui é um colégio de qualidade. Professores são qualificados, alunos são bem selecionados. O produto disso é mais e mais resultados positivos (102;M;8).

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Qualidade porque o Colégio de Aplicação é um indicativo de qualidade, uma instituição que visa a importância da boa educação, a formação de bons cidadãos e que se preocupam com o futuro (01;F;7).

É sucesso no ENEM, no IDEB, nas olimpíadas, em tudo que faz. E nos leva ao sucesso também (09;F;7).

O quadrante inferior esquerdo do Quadro 10 é denominado de Zona Muda ou

Zona de Contraste das Representações Sociais. Neste espaço, estão as palavras

com menor frequência, mas consideradas importante pelos sujeitos que as

evocaram. O papel desses elementos na representação pode ser, como bem

discute Oliveira et al (2005), o de reforçar as noções presentes na “primeira periferia”

ou simplesmente explicitar as variações de RS de subgrupos.

A Zona Muda representa, ainda, “espaços de representações que embora

sejam comuns a um determinado grupo e nele partilhadas não se revelam facilmente

(MENIN, 2006. 43), pois, uma vez explicitadas, tais crenças e sentidos podem entrar

em conflito com os valores morais e normas do grupo em questão. Esta parte da

representação seria, assim, diferente da permitida, revelada, verbalizada e

facilmente capturada; a Zona Muda pode ser então o que chamamos de “o não dito

de uma representação social”.

Para Abric (2003), os elementos do NC de uma representação podem ser

funcionais (ligados à prática) ou normativos (valores e normas do grupo). Para

Menin (2006), os elementos que compõem a Zona Muda da RS são normativos por

estarem relacionados às avaliações, julgamentos e valores e ainda por serem

impublicáveis, e dificilmente, expressos pelo grande grupo.

Neste quadrante estão presentes três termos “prisão” “referência” e “união”.

O primeiro termo “prisão” seria o não dito, não explicitado pela maioria dos

estudantes, mas que, de alguma forma, tem peso na representação de um grupo, de

um subgrupo específico. Os sujeitos que o evocaram também evocaram termos

como: hospício, manicômio, cansaço, doideira, tempo, irritação, aperreio, tédio e

pressão; e expressões do tipo: “que horas são?” “falta de tempo” “nenhum lazer,

nem sono” “me consome por inteiro” “não ter vida”.

A associação a estes termos, (com carga negativa) possivelmente se deve ao

fato dos estudantes passarem muito tempo no colégio, o ritmo intenso de estudos,

que dedicação, que os leva à exaustão, ao cansaço e toma todo o tempo livre. Os

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sujeitos expressam uma inquietude própria da idade, que os coloca em dúvida sobre

se dedicar e corresponder às expectativas do colégio e da família, ou realizar

atividades, próprias da sua idade, ter mais tempo livre, fazer atividades que lhes

oferecem outros prazeres, viver o ócio, se divertir e aproveitar esta etapa da vida.

Para muitos, a situação parece ainda mais complicada por residir longe do

CAP, ter que acordar muito cedo, por vezes, sair de casa antes das 06:00h da

manhã e retornam, apenas, no turno da tarde. Enquanto para alguns o colégio é

motivo de alegria, segundo lar, espaço para encontrar os amigos e se divertir para

outros a instituição é sinônimo de prisão, cansaço e os consome por inteiro.

As crianças que justificaram como mais associado ao CAP o termo “prisão”

não eram da mesma turma, estavam distribuídos entre os grupos do 7º e 9º anos.

Nem todos do grupo registraram “prisão”, mas, ainda assim, trouxeram para a

representação um dos termos ou expressões acima elencados. Isso significa dizer

que, dentre os estudantes do CAP, há um pequeno grupo negando a lógica dos

demais. Trata-se de um grupo questionador do ritmo de estudos demandado, o que

expressa certa tensão em pertencer ao grupo dos “melhores”.

Ao contrário de “prisão”, os termos “união” e “referência” também presentes

na Zona de Contraste, reforçam o conteúdo da Primeira Periferia. O termo “união”

está associado às palavras amigos e futuro, enquanto que “referência”, reforça um

número maior de termos como excelência, qualidade, ótimo, sucesso, melhor, futuro,

professores, alunos, ensino e educação. Sobre o primeiro termo os alunos

observam:

Num lugar em que alunos, professores e funcionários são unidos, há respeito mútuo, amor e alcance de objetivos comuns e individuais (110;F;8)

Em relação à instituição, como espaço de referência, os alunos atribuem essa

visibilidade aos diversos termos discutidos anteriormente:

Ele tem um significado maior, não apenas para mim que sou aluno, mas também para aqueles que não são. É referência no Brasil inteiro. Referência pela qualidade do ensino, pelo sucesso nas avaliações... por tudo! (91;F;8)

Temos uma boa educação, ótimos professores e alunos. Somos referência para outros alunos, estamos numa escola de referência com professores qualificados... (55;M;9)

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156

Na segunda periferia, estão localizados os elementos de menor frequência e

considerados pouco importantes no campo da representação, portanto, menos

justificados pelos estudantes. No nosso caso, nesse quadrante, encontramos

palavras como “objetivo”, “sonho”, “tarefas”, “trabalho”, “esforço”, “dedicação”,

“seleção” e “conquista”. Juntas dizem de um percurso percorrido pelos estudantes

para a aprovação na seleção de ingresso e de um percurso ainda a percorrer, de um

porvir diretamente relacionado a permanência no CAp. Tal percurso é permeado por

objetivos e sonhos, pois o colégio foi um objetivo alcançado pela aprovação na

seleção, por isso os alunos remetem a palavra “conquista”; ele também representa

um “sonho” para os que desejam o ingresso. Os alunos são categóricos:

(...) para conseguir tirar proveito do que o colégio tem para oferecer é preciso de dedicação, disciplina e esforço (76;F;6)

Conforme destacam, as palavras “cansaço” e “dificuldade” fizeram do

percurso e do esforço empreendido para a aprovação no colégio e, vencida esta

etapa, o esforço para se manter no grupo dos “melhores”.

Dedicação considero importante porque tenho que me dedicar para me dar bem afinal é o Colégio de Aplicação! Cansa e não é fácil, mas com disciplina consegue. Tem que ter disciplina aqui, não estamos em qualquer lugar (20;M;7)

Nos trechos “(...) afinal é o Colégio de Aplicação!” e “(...) não estamos em

qualquer lugar”, há o caráter diferencial e prestigioso de um espaço, que é sinônimo

de estudo e de Melhor Colégio.

A “seleção” dos estudantes é uma das marcas do colégio de prestígio, que

possibilita ao grupo ser composto de crianças com disposições mais ou menos

homogêneas; selecionar é alinhar as propriedades socioculturais dos alunos às

características da escola. Um dos alunos considerou como mais importante à

palavra “conquista” e assim a justificou:

Porque conquista tá relacionada à vitória merecida, eu estudei muito para passa (14;M;6)

Tudo se passa como se esses estudantes acreditassem que aos melhores

se destina o melhor, que é uma crença meritocrática da educação difundida pela

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escola. Essa crença os faz empreender esforços e realizar investimentos escolares,

objetivando uma ascensão social através da escola. Os resultados escolares são

atribuídos, apenas, ao mérito individual, confundido com características inatas ou

esforço realizado para superar as dificuldades. Estimular a crença de que, os

resultados escolares se relacionam a aspectos inatos, é falacioso, pois ás variáveis

exteriores ao sujeito interferem no seu desempenho escolar. No entanto, as

disposições criadas pelas condições objetivas após incorporadas parecem tão

naturais, que não percebemos, que são fruto de aprendizagem. Tais disposições

são criadas nos diversos processos de socialização podem ser favoráveis, ou não, a

educação.

Quando as palavras “alegria”, “diversão”, “legal”, “felicidade”, “orgulho”,

“liberdade” e “vida” são evocadas pelos estudantes, expressam a sensação de

fazer parte de uma instituição de “prestígio”, como também o clima vivenciado com

amigos e profissionais do CAP. Um espaço “legal”, que os deixa “alegres”, um

colégio que requer deles muito estudo, mas que, ainda assim, é um espaço de

diversão. Espaço que está associado à felicidade a uma nova “etapa” da “vida” e a

um futuro de muitas possibilidades.

Palavras como “aplicação”, “público”, “grande”, “prestigioso” e “federal”

são palavras que demarcam o diferencial da instituição frente aos demais colégios,

sejam eles públicos ou privados. O CAP é um colégio público federal de excelência

em ensino, composto por professores qualificados e pelos alunos mais bem

selecionados do estado, um espaço prestigioso, de aplicação do que se aprende e

se ensina, local de construção de conhecimento.

Termos como “Inteligência” e “elite” foram evocados fortemente pelos alunos

ingressantes, acreditamos que em parte, decorrente do processo seletivo, da ideia

de compor um grupo de melhores, grupo de “elite acadêmica”, de crianças

inteligentes.

5.2.2. A Estrutura da Representação Social do Colégio de Aplicação para pais

de estudantes

A análise do corpus das evocações dos pais para coma expressão indutora

“Colégio de Aplicação”, revelou que foram evocadas quatrocentas e sessenta e oito

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(468) palavras, destas oitenta e uma (81) eram diferentes entre si. A composição da

estrutura representacional contou com cinquenta e um (51) destes termos.

De modo semelhante a dos estudantes, na análise de evocações dos pais,

os termos foram agrupados por similaridade semântica, no entanto, o repertório não

foi alterado. Na mesma linha de tratamento dos dados, descartamos as palavras

com frequência inferior a três evocações. O Software EVOC nos informou a

frequência média dez (10) e a OME dois e meio (2,5) como referenciais de análise.

O cruzamento desses dois critérios combinados, a MF e a OME, definiu a relevância

dos elementos na representação e, consequentemente, a configuração da estrutura.

Quando falamos em relevância do elemento na representação, estamos a dizer da

força de associação deste ao termo indutor.

Após o processamento do material no software EVOC, obtivemos o Quadro

13, de quatro casas, que revela o conteúdo geral e a possível estrutura interna da

representação do “Colégio de Aplicação” para pais dos estudantes da instituição.

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Quadro 14 - Quadro de quatro casas gerado pelo EVOC resultante das evocações

dos pais à expressão indutora “Colégio de Aplicação”

Frequência Mínima- 03 MF: 10/ OME: 2,5

F>= 10/ OME < 2,5 F>=10/ OME >=2,5

F OME F OME

Futuro

Qualidade

19

29

2,421

1,931

Educação Estudo Pesquisa Responsabilidade

12

13 10 10

2,833 3,462 3,500 3,800

F<10/ OME <2,5 F< 10/ OME >=2,5

F OME F OME

Compromisso Construção Referência Saber

05 03 04 03

2,200 2,333 1,500 2,333

Alegria

Amizade Aplicação Aprendizado Cidadania Competência Concorrência Conhecimento Conquista Coragem Criticidade Cultura Dedicação Desenvolvimento Disciplina Economia Eficiência Elite Ensino Excelência Federal Felicidade Formação Gratuidade Inteligência Liberdade Maturidade Melhor Modelo Oportunidade Organização Parceria Preparação Professores Público Realização Segurança Seleção Socialização Sucesso Universidade

03 04 03 05 05 08 04 08 03 03 04 03 06 04 07 03 06 05 09 08 04 04 04 06 05 09 03 06 04 08 04 03 08 03 08 04 07 03 04 07 04

3,000 4,500 4,667 3,000 3,400 2,750 2,750 3,625 4,000 4,667 2,750 5,000 3,333 3,000 3,286 3,333 2,833 4,000 3,000 2,625 3,500 3,750 4,000 3,333 3,600 3,556 5,667 3,333 3,250 3,125 3,500 5,000 3,375 4,333 3,500 4,250 4,286 3,000 5,250 2,714 3,750

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O Quadro 14 indica a organização interna da Representação Social do

Colégio de Aplicação da UFPE construída pelos pais dos alunos. Destacamos que

para Abric (2003), identificar o conteúdo de uma RS não é o suficiente para

conhecê-la e defini-la; é preciso atentar para sua organização interna. Desta forma,

nosso conteúdo geral será discutido, da mesma forma que com os estudantes,

considerando a estrutura interna da representação (o quadro de quatro casas).

Nesta pesquisa, constatamos que alguns aspectos da representação dos

estudantes do “Colégio de Aplicação” podem ser percebidos também na

representação, que seus pais construíram do colégio. No entanto, conforme Abric

(2003, p.38) “duas representações podem ter o mesmo conteúdo e, entretanto,

serem radicalmente diferentes, se a organização desse conteúdo for diferente”. Isso

nos permite afirmar que as RS irão diferir, apenas, se os seus núcleos centrais forem

diferentes. No nosso caso, as representações de pais e estudantes apesar de

apresentarem pontos em comum, conteúdos próximos e interligados, são

estruturalmente diferentes. Essas variações e possíveis aproximações serão

descritas a seguir.

Conforma consta no quadro 14, o quadrante superior esquerdo é composto

por dois elementos- “Qualidade” e “Futuro”. Estes dois termos determinam a

significação e organização interna de uma representação e são os mais resistentes

a transformações. Eles seriam, os possíveis elementos centrais da representação.

Dentre eles o mais saliente é “qualidade”, que indica ser o termo estruturador, com

maior conexidade, rege as conexões existentes entre os demais elementos e

assegura a unidade e estabilidade do campo.

O termo “futuro” também se faz presente no NC da representação,

confirmando, de certa forma, nossa hipótese de que as representações sociais do

Colégio de Aplicação da UFPE estão estritamente relacionadas às perspectivas de

futuro dessas famílias. As RS dos pais estão relacionadas às perspectivas de futuro

e também , a palavra “futuro” perpassa várias justificativas desses pais e alunos.

Futuro relaciona-se a tantos outros componentes representacionais e tem lugar

central na representação.

Do conjunto de pais investigados (78), vinte e nove (29) evocaram

“Qualidade” e dezessete (17) indicaram a referida palavra como sendo a mais

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representativa dentre as evocadas. Por ter a menor OME (1,931) representacional

podemos afirmar, inicialmente ser “qualidade” o termo mais importante dentre os

evocados.

Há um debate no âmbito acadêmico sobre os fatores que fazem uma escola

ser considerada de qualidade, quais as características atribuídas a tais instituições.

Nas justificativas os pais indicaram elementos e características de uma escola de

qualidade. Esses elementos surgem quando os pais revelam o significado do CAP

como instituição fundamental na educação de suas crianças pela qualidade do

ensino, dos profissionais, da clientela, dentre outros aspectos. Vejamos a seguir no

discurso desses sujeitos como o atributo “Qualidade” está associado ao CAP:

A qualidade do ensino foi o que estimulou a realização do teste para o colégio. Acreditamos que nosso filho terá uma experiência muito rica, com uma visão ampla do conhecimento e da vida

22. (59;F;E;FPE)

23

Qualidade no ensino é construir conhecimento com autonomia, preparando para a vida (36;F;E;PEB)

Não é apenas uma palavra(qualidade) está precisa de seu complemento nominal (ensino). Por ser um modelo em eficiência no desenvolvimento cognitivo de seus alunos, o CAP tornou-se referência entre as escolas de ensino gratuito. (56;M;E;FPF).

O CAP tem sido, ao longo dos anos, referência em ensino. Por isso justifico a minha escola. (05;F;D;PU)

A referida “qualidade do ensino” foi o fator que despertou o interesse dessas

famílias pela instituição, sendo também responsável pela decisão dos pais de

inscrever suas crianças na seleção de ingresso e por uma gama de mobilizações

familiares, que, posteriormente, serão discutidas. Apesar do termo “qualidade” não

compor o núcleo central da representação do CAP por estudantes, eles também

22As justificativas foram transcritas para a dissertação do modo como foram escritas pelos participantes da pesquisa. 23

Nas justificativas os pais foram identificados pelos seguintes códigos: nº do protocolo

correspondente; (F ou M) conforme o sexo indicado; seguido da formação acadêmica: (EM) ensino

médio, (G) graduação, (E), especialização, (M) mestrado, (D) doutorado, (PHD) pós-doutorado;

acrescentado a estas o código de qualificação da profissão de cada um deles, sendo (PU) professor

universitário, (PEB) professor da educação básica, (FPF) para funcionários públicos federais, (FPFM)

para funcionários públicos federais militar (FPE) funcionários públicos estaduais e (PL) profissionais

liberais.

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associam a instituição à qualidade, na estrutura da representação desse grupo o

termo ficou situado na primeira periferia.

A qualidade do ensino oferecido é responsável por produzir a imagem de

“colégio modelo”. Nesse sentido, o CAP aparece como referencial para as demais

escolas públicas do estado. No decorrer da análise, perceberemos que “qualidade”

é o termo commaior capacidade associativa da representação. Mas, o atributo não

se restringe apenas ao ensino. No trecho a seguir o termo “qualidade” começa a

ganhar características mais definidas/ específicas, vejamos:

Uma escola de qualidade se traduz por altos índices de aprovação de seus alunos nas avaliações externas das quais participa (ex. vestibular, olimpíadas, entre outros), professores qualificados (pós-graduados), biblioteca diversificada, gestão participativa, etc.(63;M;M;PF). Escolhi qualidade pelo fato do colégio ter boa colocação no ENEM, excelência na qualidade de ensino e corpo docente (08;F;M;PL)

É difícil escolher apenas uma palavra, pois considero o colégio um conjunto de vários aspectos que contribuem para o desenvolvimento do aluno. Escolho a qualidade, a forma como os conteúdos são passados, por profissionais nem sempre dedicados, mas com ótima formação acadêmica, sem a pressão da semana de prova, dando oportunidade do aluno refazer seus erros, utilizando a prova como instrumento de aprendizado e não de punição, tornando os alunos críticos e seguros de suas decisões (28;F;M;EPEB)

No entendimento desses pais, “qualidade” envolve diversos aspectos como

resultados positivos nas avaliações, qualificação dos profissionais, modelo de

avaliação dos estudantes, recursos materiais e didáticos, filosofia de ensino e

modelo de gestão adotado na instituição. Para os sujeitos, o colégio conjuga bem

todos esses aspectos, e a excelência no processo pode facilmente explicar a

excelência nos resultados. Destacamos que os pais não declaram como positivos

apenas os resultados expressos nas avaliações, mas a formação completa e

humanizada proporcionada pelo CAP. A seguir os sujeitos ressaltam o caráter ímpar

do colégio por estimular a autonomia e formar alunos questionadores:

[...] O CAP, ao meu ver, busca transmitir conhecimento de uma forma ímpar, além de despertar e orientar alunos questionadores. No CAP, os alunos são “educados” de forma a não temer desafios, muito pelo contrário, todos os desafios são muito bem vindos! Por isso e muito mais, acredito no CAP como sinônimo de qualidade. (57;F;E;PL)

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Ensino de qualidade em uma instituição pública que prepara para a vida e não só para o vestibular (21;F;E;FPF) É muita soma. Não há desvantagens! É soma - qualidade é soma de vantagens (02;M;E;FPF).

A referência ao “caráter ímpar” do colégio reforça a instituição como

diferenciada pela qualidade do ensino ofertado, modelo para as demais escolas

públicas. Essa qualidade de ensino, como dito anteriormente, decorre de diversos

aspectos que existem e atuam em conjunto. Tudo se passa como se o colégio

acumulasse vantagens, atributos positivos, que se unem às disposições da clientela

renovada a cada ano. É a roda viva de proporcionar o “melhor” aos

“melhores”alimentada de forma constante. Inclusive um dos estudantes justifica o

termo qualidade da instituição, associando-o a palavra qualidade a tudo que há de

melhor, ao conjunto de aspectos positivos (profissionais, estudantes, ensino, dentre

outros).

Embora os resultados de avaliações externas foquem na formação cognitiva

dos estudantes, a instituição preza, para além do desenvolvimento cognitivo, por

uma formação crítica e humanizada, priorizando a cooperação em detrimento da

competitividade, e preparando as crianças e jovens para os desafios impostos pela

vida, estimulando-os a se posicionarem diante dos acontecimentos. Para os

estudantes, o Colégio também aparece como responsável por uma formação

integral, preparando-os para “enfrentar a vida”. A seguir alguns trechos das

justificativas dos pais corroboram com esses sentidos:

Sempre que observava e observo uma criança do Aplicação via e vejo uma criança diferenciada, mais serena. Como tive amigos que nele estudaram eles sempre me passavam isso: um sujeito ativo na sociedade, questionador, com posições diante dos acontecimentos, com mais firmeza dentro do que defendem. (37;M;E;FPF) O CAP apresenta um excelente nível de qualidade na área de conhecimento, vejo um rendimento significativo quanto aos assuntos trabalhados, mas para além disso vejo a formação de pessoas humanizadas (73;F;E;PEB)

Não sei explicar exatamente o que é feito na instituição. Mas o trabalho é bem feito, de qualidade, as crianças entram apenas com vantagens cognitivas [alguns acumulam vantagens socioeconômicas e socioculturais], mas saem de lá [tenho dois formados e uma frequentando] com vantagens/ aprendizagens que vão além das de

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ordem cognitiva, culturais ou materiais. Os jovens têm posturas diferenciadas perante a vida. (01;M;E;FPF)

Chama atenção o trecho que diz serem os estudantes do CAp “crianças

diferenciadas, mais serenas”. A qualidade atribuída à instituição, também é atribuída

aos estudantes que a frequentam. A seleção, que compõe um grupo com

características mais ou menos homogêneas, aliada à socialização ocorrida na

própria escola, parece influenciar nos gostos e, de certa forma, na personalidade

dos alunos. O caráter diferenciado dos estudantes do CAP é evidenciado, ainda, na

justificativa a seguir:

Um colégio de qualidade atrai crianças diferenciadas e produz homens e mulheres com posturas diferenciadas, na contramão da loucura social, da competitividade, do despreparo para a vida, da superficialidade das formações e das informações (...) produz pessoas com preocupações reais e não alienados sociais (012;M;E;FPF).

São diversos os fatores, que atestam a qualidade do ensino, do processo

formativo, dos resultados, dos recursos materiais e humanos, dos títulos dos que lá

atuam, das disposições dos que chegam para somar. O fato de ser ambientado no

espaço universitário, também, é fator que confere status ao colégio e diferencial na

qualidade do ensino. No trecho, a seguir, um pai afirma ser a qualidade uma

característica apontada por todos, “É unânime para a comunidade”. Seu discurso

revela o caráter compartilhado desse atributo para a representação do CAP por pais

e estudantes. O sentimento do sujeito que assim justificou, é tão fortemente

internalizado a ponto de garantir, que esse sentimento é partilhado por todos os

pares. Segue o trecho:

A qualidade do ensino é a principal característica do Colégio de Aplicação. É unânime para a comunidade. (P13PM=EFPF)

Cumpre destacar que os estudantes também pensam ser “qualidade” um

termo partilhado por todos, um deles referencia nesse sentido “[...] É inegável a

qualidade do ensino que vivenciamos... os resultados nas avaliações Brasil a fora

não mentem” (59;M;9).

Uma instituição de qualidade, no entendimento dessas famílias, promete

sucesso “futuro”, termo que também faz parte do provável núcleo central da

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representação do CAp construída pelos pais. Diversas justificativas, de pais e

estudantes, remetem à ideia de futuro. Alguns sujeitos afirmam:

A partir do ingresso de nossos filhos no CAP almejamos um futuro promissor, mediante um estudo de excelência, construído por estímulos do colégio, capacidade e responsabilidade dos alunos. Porém, tudo isso exige como fator direcionador ao sucesso a supervisão dos pais (55;F;E;PFF).

Acredito que é essa palavra que buscamos de melhor para os nossos filhos, ou seja, um futuro melhor engloba todas as outras palavras por mim pensadas. Quer dizer, almejamos e damos todo apoio para que nossos filhos consigam entrar no CAP, pois sabemos de sua referência como colégio. Lá estando, encontramos muitas novidades em termos de metodologias, responsabilidade, sociabilização, além de outros meios capazes de formarem e aprimorarem a inteligência dos jovens que no CAP estudam (11;F;E;PL)

O CAp corresponde aos anseios das famílias pelas particularidades que

possui, trunfos que o diferenciam das demais escolas públicas do estado e, também,

o colocam à frente de diversas instituições privadas. Esses sujeitos relacionam o

colégio a um futuro promissor para seus descendentes, pois aprimora as

disposições que as crianças trazem consigo, extraindo delas o que têm de melhor e

proporcionando o desenvolvimento de habilidades e posturas exigidas futuramente,

crescimento pessoal, intelectual e profissional. O termo futuro surge, por inúmeras

vezes, atrelado às palavras promissor, sucesso e brilhante. Nos registros abaixo os

pais alegam:

Diante de tantos outros conceitos e do cenário que vivemos atualmente (aumento da concorrência e competitividade no mercado profissional), acredito ser este colégio de aplicação uma porta bem direcionada para um futuro brilhante. Indivíduo humanizado, cidadão crítico e com uma excelente bagagem de conhecimento construído (5;F;E;PL) O acesso ao CAP abre uma excelente oportunidade para seus alunos seguirem os estudos numa Universidade Federal pública, com qualidade e conceito reconhecidos, como é o caso da UFPE, oferecendo um futuro melhor para os seus filhos (03;M;D;PL)

De maneira semelhante aos pais, as crianças associam o CAp ao termo

futuro e enfatizam que o colégio é um espaço destinado àqueles que “[...] se

preocupam com o futuro" (01;F;7). Cabe aqui destacar que a afirmação dos sujeitos

desconsidera o fato de nem todos ou tão poucos conseguirem ter acesso a escola

de qualidade. A preocupação com o futuro não se restringe apenas àqueles que

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tiveram oportunidades para tal acesso. Em nosso entendimento o peso do termo

“destinado” dá ao trecho um quê de elitização do público e do ensino ali vivenciado.

No quadrante superior direito quatro elementos ganham destaque por

fazerem parte da primeira periferia, são eles: “educação” “estudo” “pesquisa” e

“responsabilidade”. Dois destes termos, educação e responsabilidade, também

fizeram parte da primeira periferia na estrutura representacional do CAp por

estudantes. Outros termos como “estudo” ocupou posição central, “pesquisa” foi,

apenas, citada, mas não compôs a estrutura representacional dos estudantes.

Para os pais, “educação” constitui princípio básico, necessário para atuação

na sociedade. A “boa educação” aparece ora como construção ora como herança,

de responsabilidade da família, da escola e atributo que podemos legar aos nossos

descendentes. Os pais entendem a educação como fruto do esforço da criança e da

família para acessá-la e ser gradativamente adquirida, mas, também como uma

herança a ser transmitida aos filhos “É o melhor bem que posso deixar para a minha

filha”. Alguns registros explicitam melhor este entendimento:

O melhor bem que posso deixar para a minha filha é a educação. Saber que ela está na melhor escola de Pernambuco é gratificante. Através de sua dedicação ela está estudando lá (54;F;E;FPF)

Educação é o princípio básico para obtenção (e busca permanente) para qualquer individuo de qualquer idade. É preciso desenvolver um cidadão produtivo que busque uma sociedade mais justa e eficiente, bem como um humano integrado a sua família, as necessidades e valores de seus semelhantes, buscando plenitude. Encontramos essas bases no CAp (64;F;E;PL).

Educação é o que pretendemos deixar para nossa menina quando não mais existirmos. Desde que nasceu passamos os nossos valores, as nossas crenças, o nosso modo de ver o mundo e perceber as pessoas. Hoje ela está no colégio para receber reforço de valores e crenças alinhados aos nossos (53;F;M;FPF)

O último trecho é revelador de um sentimento de identificação com o ensino

ali vivenciado, com a educação proporcionada aos filhos, um compartilhamento de

valores e crenças com as da instituição. Para os pais, o colégio tem

“responsabilidade” com a formação dos discentes e, consequentemente,

desenvolve o sentimento de responsabilização para com os “estudos”. Vejamos os

registros:

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Os alunos aprendem a manter uma rotina de estudos, mesmo que não tenham atividades para nota, fazendo com que aprendam a serem responsáveis por sua aprendizagem e pelo sucesso futuro (49;F;E;PEB). Eles focam nos alunos, isso é notório. O objetivo do CAp é proporcionar o melhor ensino aos estudantes, são muito responsáveis no que acreditam e servem de exemplo para as crianças (48;M;E;PL)

O termo “pesquisa”, citado, apenas pelos estudantes, tem destaque na

estrutura representacional dos pais. Para esses sujeitos, vincular ensino à pesquisa

é o diferencial do colégio, que o aproxima dos preceitos universitários. No entanto,

cumpre frisar que este entendimento é de pais que valorizam a educação superior,

de professores universitários e pós-graduados. Assim, embora não mencionem

diretamente o termo pesquisa, para os que vivenciam o universo acadêmico a

pesquisa científica se faz necessária em toda a escolarização. Desta forma os pais

estão a falar de um mundo que não lhes é estranho. Afirmam:

Para mim o ensino deve ser vinculado à pesquisa, o aluno deve ser levado a fazer uma crítica da realidade e desvendá-la. Pois só assim teremos possibilidade de entendê-la e mudá-la. Na pesquisa ele poderá obter dados que o auxiliem a demonstrar como as condições sociais, políticas, psicológicas influenciam o dia a dia da população. Obtendo assim algumas respostas que podem ser repensadas para implementação de políticas públicas (45;F;M;FPF)

Pesquisa. O CAp referencia em ensino e pesquisa, produz e possibilita que as crianças produzam conhecimento (75;M; M;PU)

Os elementos “compromisso”, “construção”, “referência” e “saber”

compõem a zona de contraste da representação do CAp para os pais dos alunos.

Os termos presentes no quadrante inferior esquerdo reforçam o conteúdo da

primeira periferia, como bem observa Oliveira et al (2005).“Referência” foi o termo

de menor OME (1,500), relaciona-se fortemente aos elementos anteriormente

discutidos, a qualidade do ensino e aos resultados expressivos apresentados pela

instituição. Da mesma forma que o elemento “modelo”, o termo “referência” confere

um caráter de destaque a instituição, um exemplo a ser seguido. A ambientação

universitária também ganha destaque, fator que agrega valor simbólico à instituição.

Eis os registros que corroboram com os sentidos mencionados:

Referência por ser esta instituição, diferente das demais, um colégio com normas e práticas da faculdade (65;F;G;PL)

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O Colégio de Aplicação tem sido referência na educação pernambucana e nacional. Daí a busca da família, na sociedade, pelas melhores instituições de ensino. A prática pedagógica do colégio não é voltada para o aspecto cognitivo, mas o de construção de valores, necessários a formação do indivíduo, do bom cidadão, na escola e nos demais espaços da sociedade com os serviços de orientação oferecidos (27;F;E;PEB)

“Compromisso” refere-se à responsabilidade do colégio para com a

aprendizagem de seus alunos, reforçando os sentidos contidos nos registros

anteriores nos quais responsabilidade foi justificada. O compromisso é percebido

pelos pais como fator essencial para o sucesso acadêmico atual e sucesso futuro

dos estudantes. Esse elemento aparece fortemente atrelado ao termo “futuro”. Eis

alguns dos registros:

O compromisso da instituição para garantir o futuro brilhante dos alunos (20;F;G;FPE) Considero “compromisso” a palavra mais importante por representar um dos papeis considerados essenciais para o sucesso no ensino-aprendizado engloba tanto professor como aluno (52;M;E;FPE)

Para reforçar os termos já mencionados, “saber” e “construção” aparecem

associados também nas justificativas dos estudantes e tiveram OME de mesmo

valor (2,333).

Por ser uma instituição que valoriza a construção do saber cultural e científico (42;M;E;PU) Construção por estarmos num mundo em que todos os dias construímos e reconstruímos conceitos para inovar nosso dia a dia (32;F;G;PEB)

Diversas são as palavras que compõem a segunda periferia da estrutura

representacional: “Alegria”, “Amizade”, “Aprendizado”, “Cidadania”,

“Competência”, “Concorrência”, “Conhecimento”, “Conquista”, “Coragem”,

“Criticidade”, “Cultura”, “Dedicação”, “Desenvolvimento”, “Disciplina”,

“Economia”, “Eficiência”, “Elite”, “Ensino”, “Excelência”, “Federal”,

“Felicidade”, “Formação”, “Gratuidade”, “Inteligência”, “Liberdade”,

“Maturidade”, “Melhor”, “Modelo”, “Oportunidade”, “Organização”, “Parceria”,

“Preparação”, “Professores”, “Público”, “Realização”, “Segurança”,

“Seleção”, “Socialização”, “Sucesso”, “Universidade”. Destes (41) termos, (19)

foram encontrados na estrutura representacional dos estudantes, (08) deles

ocupando a primeira periferia como foi o caso de “Aprendizado”, “Amizade”,

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169

“Educação”, “Ensino”, “Excelência”, “Professores”, “Sucesso”, “Universidade”, os

demais (11) também ocuparam a segunda periferia, dentre eles “Alegria”,

“Aplicação”, “Conquista”, “Dedicação”, “Elite”, “Federal”, “Felicidade”,

“Inteligência”, “Liberdade”, “Público”, “Seleção”.

O objeto é pensado a partir de atributos positivos, que complementam a os

sentidos do que seja colégio de qualidade, modelo, referência em ensino-

aprendizagem, melhor colégio. São temos fortemente associados às perspectivas

futuras dessas famílias, ao futuro desejado e possível. Os elementos da segunda

periferia são facilmente encontrados nas justificativas dos termos referentes ao

Núcleo Central, primeira periferia e Zona de Contraste. A representação entre os

pais e estudantes aparenta ser homogênea, sem divergência entre os grupos, com

termos interligados e os quadrantes são complementares em sentidos e significados.

Dada a sua quantidade e variedade, decidimos discutiros termos da última

periferia em conjuntos de acordo com a afinidade que parecem trazer referentes aos

sentidos subjacentes partilhados. O primeiro conjunto de palavras é composto por

“aplicação”, “aprendizado”, “cidadania” “conhecimento”, “criticidade”, “cultura”,

“desenvolvimento”, “disciplina”, “liberdade” “socialização” “coragem”. Tais

palavras demonstram fazer parte da representação, pois são aspectos e atributos,

que o CAp desenvolve nos estudantes e/ou oportunidades próprias oferecidas

naquele espaço.

Por se tratar de um colégio renomado, ser um dos melhores de Pernambuco, o colégio de Aplicação traz uma bagagem e uma história de grandes oportunidades, tanto para o corpo docente quanto para os discentes, no que diz respeito ao CONHECIMENTO repassado e conquistado (18;F;G;FPF)

Através da trajetória de CONHECIMENTO vivenciada no CAp vem crescimento pessoal, profissional e intelectual (78;F;G;PL)

Percebo que meu filho se preocupa em buscar CONHECIMENTO. Não compreendo, muitas vezes, a cobrança dos professores para que alcance este conhecimento de forma autônoma. Parece abandono, parece que o professor busca a saída mais fácil dentro do seu emprego. Porém não posso negar o objetivo é atingido, o aluno (meu filho) aprende e apreende lições importantes para toda vida (74,F;G;FPF)

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170

Conhecimento teve frequência (08) e OME (3,286), foi também a palavra mais

justificada dentre as que compõem este quadrante. O termo foi associado ao objeto

como atributo adquirido através de sua história enquanto instituição educativa. Esse

conhecimento permite o “desenvolvimento” dos estudantes e dos profissionais que

dela fazem parte. A aproximação com a “cultura” e com o “conhecimento”

científico se dá, conforme o entendimento desses pais a partir de “Aplicação” dos

conteúdos, tratando-os em sua complexidade.

As justificativas nos permitiram identificar que, na perspectiva dos pais, a

instituição está mais preocupada com os fins da educação do que com os conteúdos

propriamente ditos, ou seja, o CAP prioriza a formação integral do sujeito. A

instituição assume a responsabilidade educativa de formar pessoas humanizadas,

portanto tal compromisso se torna primordial para atingir os demais objetivos

educativos. O engajamento dos profissionais, a forma de tratar o conhecimento

científico, a cultura que envolve os alunos e o conhecimento do mundo, parecem

diferir das demais instituições. O “aprendizado” no CAp ocorre com “liberdade” e

“criticidade”, permite ao aluno responsabiliza-se pela própria aprendizagem.

Vejamos o que dizem as justificativas destes sujeitos:

O Colégio dá LIBERDADE para o aluno questionar qualquer aspecto, qualquer questão. Mesmo que ele esteja errado ele pode se posicionar (69;M;G;PL)

Acredito que a palavra chave é o APRENDIZADO completo e humanizado. O Cap se diferencia, para mim, das outras escolas públicas por ensinar o aluno a ser Capaz, mas o aluno é Capacitado de forma mais humana, aprende a pensar, refletir sobre seus atos e como eles podem incidir sobre os outros; a pensar a sua cultura, a conhecer a cultura do outro (07;F;M;PEB)

O Colégio estimula com todas as possibilidades disponíveis o SENSO CRÍTICO do aluno (24;F;E;ME)

Os pais considerem que as características positivas da instituição e os

métodos de ensino deveriam se estender às demais escolas públicas do estado.

Com tal comentário os pais revelam que se sentem privilegiados em fazer parte de

uma realidade à parte do ensino público estadual.

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171

As inquietações desses sujeitos são também nossas como educadores que em

algum momento da trajetória profissional, nos questionamos se, apenas, melhorias

nas condições de trabalho e mudanças nos métodos de ensino seriam suficientes

para alavancar o ensino público. Pensamos ser insuficiente, apenas, a mudança nas

práticas educativas e nas condições de ensino para aumento de chances de êxito

dos estudantes e para tornar toda e qualquer escola pública uma instituição de

referência. O problema é social, estrutural e, em grande parte, foge ao controle de

educadores herdeiros de uma pedagogia política e crítica.

Deve-se ter em mente que uma parte considerável das crianças

frequentadoras do ensino público (municipal e estadual) foram socializadas em

contextos distintos dos participantes da pesquisa, um público com gostos,

preocupações e horizontes também distintos. É inegável que não podemos continuar

com o discurso da reprodução social, mas a existência de uma rede de forças

políticas, sociais e ideológicas, que atua para manter a estrutura tal qual ela se

apresenta a nós, reservando o melhor, em recursos humanos e materiais, aos

melhores e relegando as demais instituições de ensino.

Não foi um propósito desta pesquisa discutir as desigualdades escolares, ao

nesse momento. Esperávamos fazê-lo no momento da entrevista. No entanto, já

nessa primeira etapa, os pais questionaram de forma direta a qualidade do ensino

público municipal e estadual. Observe os registros:

O APRENDIZADO acontece. Diferente da rede municipal e estadual de ensino. Isso se deve, em grande medida, ao fato de ser federal. Toda escola pública deveria ser um CAp (02;M;E;PL) CIDADANIA, pois é a oportunidade do meu filho estudar em uma escola modelo que deveria se estender para todas as escolas públicas do nosso estado. Aqui no Aplicação a escola é de inclusão independente da classe social, etnia ou religião. Tudo isso proporciona ao meu filho a oportunidade de amadurecer dentro da realidade de seus colegas, professores e do próprio sistema de ensino público de qualidade (40;F;D;PU)

No trecho anterior a mãe, professora universitária, ressalta para a

necessidade de ampliar a qualidade do ensino público a fim de que ela não fique

restrita às instituições federais de ensino. Aponta que, apesar da seleção, o CAp é

um espaço democrático, acolhe crianças de diferentes classes sociais, etnias,

religião e fatores que possibilitam ao seu filho exercer a sua cidadania, partilhando

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de um ensino público de qualidade com crianças de origens sociais, culturais e

econômicas diversas. No entanto, a própria seleção não permite que a escola seja

considerada um espaço de inclusão total, pois ao selecionar alguns estudantes

estamos, automaticamente, a excluir outros, que não tem as disposições exigidas

para ingresso em tal estabelecimento de ensino.

Os elementos “Competência”, “Economia”, “Eficiência”, “Ensino”,

“Excelência”, “Federal”, “Elite”, “Formação”, “Preparação”, “Gratuidade”,

“Organização”, “Parceria”, “Oportunidade” “Público”, “Universidade”, “Melhor” e

“Modelo” complementam o núcleo central “qualidade”. Tais termos, possivelmente,

exerceram influências na escolha do estabelecimento de qualidade. Seguem os

registros dos sujeitos que as consideraram representativas:

A competência da escola diz do futuro dos estudantes. Sem competência não se chega a lugar algum... O Colégio, em sua competência, influencia positivamente no futuro no meu filho (76;M;E;PL) A formação considerei a mais importante pois houve uma grande maturidade. O meu filho amadurecei muito e rápido (71;M;E;FPF) Excelência no ensino dos conteúdos das matérias e na preparação para a vida (60;F;D;PL) O método de ensino Capacita esses jovens a lutar pelos seus ideais tanto na vida pessoal quanto na profissional, levando-os a alcançarem seus sonhos (29;F;G;FPE) Diante do cenário de competitividade que vivenciamos devemos sempre buscar novas fontes de conhecimento para estarmos em sintonia com as novas exigências que a vida nos impõe. Devemos buscar a excelente preparação para nos posicionarmos não dentro da média, mas acima dela (19;M;E;PL)

Como mencionado anteriormente, o CAp ressurge como instituição de

referência pelo método de “ensino” diferenciado; “excelência” em ensino,

qualificação dos profissionais, e seleção dos alunos sua “competência” para efetivar

aprendizagens e formar um corpo discente preparado para os desafios futuros. Os

pais, assim como os estudantes, reconhecem no termo “melhor” um sinônimo para

o que a instituição representa na vida e no futuro destes.

Simplesmente porque ela [palavra melhor] representa o que o colégio apresenta nos resultados de pesquisa- o melhor colégio em resultados do ENEM de Pernambuco e de IDEB do Brasil. O melhor em corpo docente e

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discente, pois neste último há uma seleção criteriosa dos alunos. Todos entram por mérito próprio (43;F;E;FPF) Um colégio de poucos e para poucos. O CAp é uma instituição de prestígio e responsável por formar a elite intelectual do estado de Pernambuco (77;M;E;PL)

O registro anterior é revelador de que alguns pais acreditam que a instituição

é destinada a uma parcela privilegiada da sociedade. Um dos pais afirma ser o

colégio responsável por formar a elite intelectualiza a quem se deve destinar um

ensino diferenciado, mais condizente com as características do alunado e posições

sociais a serem assumidas.

Há entre os estudantes ingressantes a cada ano crianças que, se não fossem

aprovadas na seleção, possivelmente, estariam nas bancas escolares de instituições

públicas estaduais ou municipais do estado. A “gratuidade” do ensino de qualidade

parece ser o aspecto mais democrático da instituição: “ensino gratuito e de

qualidade”, declara um dos pais dos estudantes recém- aprovados. Os que não

possuem meios para financiar a escolarização dos filhos são aqueles que mais se

beneficiam com a aprovação, caso suas crianças não fossem aprovadas seria pouco

provável conseguir recursos para custear um ensino que se aproximasse do ali

vivenciado. Entretanto, esse grupo representa uma minoria dentre as famílias

investigadas, pois a maioria possui recursos suficientes para custear os estudos dos

filhos nas melhores escolas da região. Mas a aprovação no referido colégio

representou para além de aspectos subjetivos uma “economia” familiar significativa.

Essas famílias reconhecem que a educação de qualidade em nosso país, em geral,

é destinada a uma minoria e que os filhos são privilegiados com um ensino gratuito e

de qualidade proporcionado pelo CAp. Eis os trechos:

Considero a educação dos filhos importante. Mas a educação no nosso país se transformou em comércio, no qual uma minoria tem acesso. Minha filha é aluna do Colégio de Aplicação, gratuito. Um sonho realizado, uma vez que não tenho condições financeiras para proporcioná-la uma educação de qualidade. No CAp ela tem ensino gratuito e de qualidade (48;F;E;PL) Acredito que nossos filhos tiveram uma experiência e oportunidade única de participar de uma escola pública [que deveria ser aberta para toda população] com um sistema de ensino diferenciado e de excelência, que abre horizontes e novas possibilidades futuras (67;F;E;PL)

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Chama atenção a estreita ligação desencadeada pelas palavras “seleção”,

“concorrência”, “dedicação”, “inteligência”, “realização”. Conforme enunciado nas

justificativas, para a realização dos objetivos se faz necessário dedicação e

inteligência. Merece destaque, no segundo trecho abaixo o fato da mãe acreditar

que o sucesso na seleção se deve à dedicação do estudante, mas, sobretudo, à

inteligência. Tal aspecto pode ser observado nas transcrições a seguir:

Parece existir no CAp uma união de esforços. Os estudantes com sua dedicação e garra conseguiram a aprovação. O colégio dá o incentivo intelectual de que eles precisam para continuar empreendendo esforços (10;F;G;FPF)

A seleção é acirrada e exige muito dos estudantes. O preparo nos estudos deve ser proporcional a concorrência a ser enfrentada, mas a criança precisa ser inteligente para passar. Ao meu ver tem que ser dedicada, mas não passa se não for inteligente. (04;F;G;PL)

Nos trechos, há um conflito entre características biológicas/individuais e

sociais/culturais das crianças, desencadeando o sucesso na seleção. Ora a

dedicação parece conduzir à aprovação, ora a predominância é biológica, ser

inteligente é fundamental para pleitear a vaga e obter êxito.

“Sucesso”, “Segurança” e “Felicidade” são termos da segunda periferia que

representam a instituição em sua estreita relação com as perspectivas futuras

dessas famílias. Tais termos apareceram expressos nas justificativas anteriormente

registradas. Nos trechos a seguir tais termos ganham destaque:

Sucesso porque os objetivos estão sendo alcançados...colocar o filho no Colégio de Aplicação: no vestibular e consequentemente na vida (66;F;E;PL) O CAp representa a segurança de um futuro melhor. Melhor até do que nós tivemos (70;M;G;FPE) Felicidade por considerar que minha filha terá um grande futuro, pois foi preparada para uma escola de qualidade reconhecida em todo país. A felicidade hoje é minha, amanhã será dela (35;F;G;PL)

Porque o CAp irá tornar minha filha uma pessoa que saberá futuramente fazer suas escolhas, avaliar todas as suas atitudes, atitudes estas que a levem para um caminho de sucesso e felicidade (38;F;EM;PEB)

O estabelecimento foi escolhido pelos pais devido a “qualidade” do ensino

por almejarem um futuro promissor para as crianças, um futuro de sucesso

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profissional e pessoal. Os pais demonstram acreditar que o sucesso escolar conduz

ao sucesso em outras áreas. Essa crença gera expectativas quanto à escola de

qualidade, faz com que essas famílias empreendam esforços para pleitear uma vaga

em estabelecimentos de prestígio visando o êxito profissional e financeiro

[segurança] deles no futuro.

A escolha do CAp mantém estreita relação com as aspirações de sucesso

futuro e felicidade para os filhos, como expresso nas justificativas. Mas, tal escolha

se deu essencialmente pelos aspectos que diferenciam esta instituição de ensino

das demais. Podemos afirmar que as escolas se diferenciam em função de suas

particularidades e objetivos educacionais. O CAp parece recorrer a um modelo

autônomo, distinto das demais escolas públicas do estado. Busca a autonomia dos

estudantes, é composto por um grupo selecionado em suas características sociais e

culturais, não permite a superficialidade dos estudos, aprofunda os conhecimentos,

insere o aluno na pesquisa, preza por uma formação humanizada e crítica.

Os atributos descritos acima são trunfos que o colégio possui, que o

diferenciam dos demais estabelecimentos de ensino, fator reconhecido pelos que

frequentam a instituição e pela comunidade acadêmica. Como podemos perceber a

“Qualidade” é tomada como a marca do colégio, atraindo estudantes com

disposições favoráveis à escolarização e famílias de uma classe média

intelectualizada. Estes juntamente com os profissionais qualificados colaboram para

que o prestígio, a notoriedade e reputação da instituição sejam constantemente

realimentados.

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176

5.3. O Núcleo Central das Representações do CAp segundo os

estudantes e seus pais

5.3.1.Triagens Hierárquicas Sucessivas por estudantes

Participaram desta etapa do estudo vinte e um estudantes do Ensino

Fundamental do CAp da UFPE.

Tendo em vista a aplicação individual, a técnica requerer um tempo de maior

interação com os sujeitos portanto, selecionamos os participantes desta etapa de

forma a contemplar os seguintes critérios: incluir estudantes de diferentes faixas

etárias e turmas; alunos provenientes de escolas públicas e privadas, bairros de

residência diferenciados, frequentam ou não em cursinhos preparatórios e filhos de

pais com diferentes formações e profissões.O grupo foi composto por cinco

estudantes de cada uma das quatro turmas B do EF. Neste conjunto, havia filhos de

professores da educação básica e do ensino superior, filhos de militares,

profissionais liberais (engenheiros, advogados, médicos), comerciantes e

funcionários públicos estaduais e federais. Os estudantes residiam nos bairros de

Boa Viagem, Piedade, Casa forte, Jaqueira, Madalena, Prado, Casa Amarela,

Aldeia, Iputinga, Várzea, Torrões, Estância, Jardim São Paulo e Jiquiá. Foram

selecionadas crianças que estudaram em colégios privados de prestígio como

exemplo do Ethos, Instituto Capibaribe, Damas, Motivo, Santa Maria, Colégio Apoio;

também compuseram o grupo ex-estudantes do Arco-Íris, Grande Passo, Dourado e

da EIA; no grupo havia alunos oriundos de escolinhas de bairro, como é o caso do

Colégio Ana Cecília, e de escola pública, a Escola Municipal São José, localizada na

Vila de Vera Cruz-Aldeia. Escolhemos também duas crianças que não tinham

participado de cursinhos preparatórios, as demais haviam frequentado um dos dois

cursos preparatórios com maior índice de aprovação para ingresso no colégio.

Para a realização das Triagens Hierárquicas Sucessivas foram apresentados

aos alunos oito termos em cartelas. Com as seguintes palavras: Estudo, Educação,

Ensino, Amigos, Futuro, Aprendizado, Livros e Qualidade. Como já mencionamos,

neste trabalho, a realização das triagens durava cerca de 10 minutos.

Na primeira rodada das hierarquizações, os termos que mais permaneceram

foram nesta ordem: “Futuro”, “Aprendizado”, “Estudo”, “Qualidade”, “Educação” e

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“Ensino”. Termos como “Amigos” e “Livros” foram eliminados logo no primeiro

bloco de palavras por 10 e 15 estudantes, respectivamente.

Lembramos que, na primeira fase, o possível Núcleo Central da

representação dos estudantes é composto por apenas um elemento “Estudo” (F=43;

OME 2,16). Neste primeiro momento, podemos dizer que o elemento central

permaneceu com uma frequência de permanência considerável (13), o que

representa que o termo foi priorizado por 61.90 % dos estudantes. Contudo,

elementos da primeira periferia ganharam destaque como Futuro (76.19%),

Aprendizado (76.19%) e Educação (71,42%), apesar de ter menor frequência e

maior OME que o elemento “Estudo”, Futuro (F=14; OME 2,929) Aprendizado

(F=16; OME 3,063) Educação(F=20; OME 2,600) foram os mais escolhidos pelos

sujeitos. Outro termo que ganhou visibilidade foi “Qualidade” (F=26; OME 3,423),

apresentando frequência relativa equiparada a “Estudo”, 61.90%, indicando ser este

termo também um atributo fortemente relacionado ao colégio. Na quadro 15, é

possível visualizar a frequência dos termos que permaneceram após a primeira

triagem e a frequência relativa, ou seja, o percentual de frequência baseado no total

de estudantes participantes desta etapa da pesquisa.

Quadro 15. Distribuição dos termos que permaneceram na 1ª etapa das triagens hierárquicas sucessivas dos estudantes com as respectivas frequências

Na segunda rodada das triagens, conforme mostramos na Quadro 16, houve

queda da frequência de permanência do termo “Estudo” (f=03), o que indica que

apenas. 14,28% do total de estudantes ,decidiram pela permanência do termo entre

TERMO F %

ESTUDO 13 61,90

EDUCAÇÃO 15 71,42

ENSINO 12 57,14

AMIGOS 10 47,61

FUTURO 16 76,19

APRENDIZADO 16 76,19

LIVROS 05 23,80

QUALIDADE 13 61,90

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os dois mais importantes. “Aprendizado” também teve queda considerável de

frequência (f=03). Novamente três palavras se destacaram “Futuro”, “Qualidade” e

“Educação”. Estas compuseram a maioria das duplas de palavras consideradas

indispensáveis ao pensarem no CAp-UFPE. “Futuro” e “Qualidade”, formaram

juntas 05 duplas de palavras. “Futuro” e “Educação” formaram três duplas. O termo

“Livros” foi descartado, definitivamente, neste momento da hierarquização.

Quadro 16. Distribuição dos termos que permaneceram na 2ª etapa das triagens hierárquicas sucessivas dos estudantes com as respectivas frequências

Após os sujeitos efetuarem duas hierarquizações consecutivas, e

permanecessem apenas dois termos, questionávamos sobre qual destes termos era

considerado indispensável para se pensar o colégio de aplicação da UFPE. Os

resultados estão sistematizados no Quadro 17, a seguir:

TERMO f %

ESTUDO 03 14,28

EDUCAÇÃO 08 38,05

ENSINO 02 9,52

AMIGOS 03 14,28

FUTURO 14 66,66

APRENDIZADO 03 14,28

LIVROS 00 00

QUALIDADE 09 42,85

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Quadro 17. Distribuição dos termos que permaneceram na 2ª etapa das triagens hierárquicas sucessivas dos estudantes com as respectivas frequências

Como podemos perceber, a hipótese de centralidade se voltou totalmente

para o termo “Futuro”. Do grupo, 66.6% dos estudantes, a consideraram por duas

vezes “futuro” imprescindível quando pensam no CAp da UFPE. De acordo com

esses resultados, percebemos que a saliência do elemento supostamente central

“Estudo” não pode ser comprovada.

Esse resultado, aparentemente, contraditório nos chamou atenção. Tínhamos

a seguinte dúvida: “será que dentre os sujeitos selecionados para esta segunda fase

estariam exatamente os 14 sujeitos que evocaram Futuro na primeira etapa?” A fim

de esclarecê-la, recorremos aos protocolos da fase inicial no intuito de identificar os

termos que cada estudante do grupo selecionado para as Triagens Hierárquicas

Sucessivas havia evocado e considerado mais importante. No confronto de dados

percebemos que dos 21 estudantes, apenas 02 haviam evocado e considerado

Futuro o termo mais importante, enquanto os demais (19) haviam eleito “Estudo” o

termo mais representativo.

Outro fato intrigante ocorreu com o termo “Amigos”, que, apesar de ter sido

evocado 45 vezes e obter ordem média de importância (2,86), na etapa anterior,

(F=45; OME 2,86), no processo final de hierarquização foi totalmente descartado,

como termo indispensável ao pensarem no CAp.

Os resultados encontrados com as Triagens Hierárquicas dos estudantes

alertam para o uso cuidadoso dos métodos associativos e para a importância de

TERMO f %

ESTUDO 02 9,52

EDUCAÇÃO 01 4,76

ENSINO 01 4,76

AMIGOS 00 00

FUTURO 14 66,66

APRENDIZADO 01 4,76

LIVROS 00 00

QUALIDADE 03 14,28

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utilização de técnicas complementares, que confirmem a centralidade dos termos.

“Estudo” inicialmente fez parte do NC talvez por uma situação de contexto: estas

crianças vivenciaram recentemente maratonas de estudos para aprovação na

seleção de ingresso do colégio, ou estado em fase de adaptação a uma rotina de

muito estudo e dedicação. Se no primeiro momento “Estudo” parece ser o termo

central e mais importante da representação do objeto “Colégio de Aplicação da

UFPE”, no segundo momento, foi “Futuro” que traduziu o objeto representado.

As justificativas dos estudantes para escolha do termo “Futuro” como

indispensável ao pensarem no CAp ajudou a melhor compreender o caráter central,

que assumiu na RS. Vejamos como os estudantes justificaram24 a escolha do termo

“Futuro” como indispensável para se referir ao colégio:

Escolhi Qualidade e Futuro. Porque, primeiro: Eu não posso falar do Colégio de Aplicação sem falar de qualidade. E segundo: Ele, pra mim... Quando você entra no Colégio de Aplicação, você já tá... No futuro já tá guardado pra uma coisa boa. Ele vai encaminhar você pra uma coisa boa (F;6;EPR;PEB/PL)

25

Eu acho que é por que... Todo mundo diz que... O Aplicação é a melhor Escola de Pernambuco... Assim, essas coisas. O melhor aprendizado, melhor aprendizado que os outros colégios. Escolhi futuro, porque a maioria das pessoas que estudam no Aplicação têm o futuro bom (M; 8;EPR;PL). Futuro. Porque eu acho que é um Colégio que prepara muito pra... Carreira e tal, lhe influencia a pensar. E educação, justamente tá ligado ao futuro, porque faz você saber que a pessoa que está do seu lado e tão importante quanto você. Faz você pensar... Aqui também não tem essa coisa de você ter que ir pra aula, como nos outros Colégios tem. Se você quiser, você não vai pra aula, você tem que ter sua própria responsabilidade pra ir, você tem que ter sua própria responsabilidade pra ir atrás dos assuntos e tal. Então eu acho que isso também faz parte da educação que eles dão lá (F;8;EPR;FPE/PL).

24

As justificativas dos estudantes foram gravadas e posteriormente transcritas. 25

Os estudantes foram identificados pelos seguintes códigos: (F ou M) conforme o sexo indicado;

seguido de número correspondente ao ano/série atual; (EPR) Escola privada, (EPU) Escola pública

para indicar a rede de ensino de que são provenientes; Acrescentado a estas o código de

qualificação da profissão dos pais do estudante, sendo (PU) professor universitário, (PEB) professor

da educação básica, (FPF) para funcionários públicos federais, (FPFM) para funcionários públicos

federais militar, (FPE) funcionários públicos estaduais e (PL) profissionais liberais; (ME)

Microempresário.

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Como podemos perceber, para os estudantes, o termo Futuro está fortemente

relacionado à qualidade do ensino vivenciado no colégio. Novamente, a ideia do

CAp oferecer “algo a mais” que as demais instituições e ser sinônimo de garantia de

bom futuro para os estudantes justifica o desejo de frequentar o espaço.

Por estar a frente das demais instituições de ensino, o CAp garante aos

estudantes vantagens significativas em relação aos colegas vindos de outras

escolas. Estar a frente dos demais colégios não significa vivenciar ritmo acelerado

de estudos, antecipar conteúdos ou estabelecer um cronograma rígido, intenso e

conteudista. O “algo a mais” de que tanto falam pais e alunos diz respeito à

valorização do conhecimento por si só, negar o pragmatismo, que nos leva a

aprender para passar nas provas, mas aprender para desenvolver-se como ser

humano. A instituição parece despertar nas crianças o desejo de conhecer,

priorizando o estudo aprofundado, o questionamento e a pesquisa em detrimento da

superficialidade com a qual o conteúdo é tratado nas demais instituições públicas.

No entanto, as consequências de um ensino diferenciado refletem nos

resultados da instituição, que compõe um grupo de excelência, de destaque, um

grupo pronto para ocupar seu espaço no Ensino Superior. Apesar da proposta

pedagógica do colégio não priorizar a preparação para o vestibular, é inegável que

os estudantes concluem o ensino médio com condições para lograr êxito em

qualquer avaliação. O colégio aprovou, por anos, 100% de seus alunos em

Universidades Públicas. No ano de 2013, 80% dos 50 estudantes do último ano do

Ensino Médio foram aprovados na UFPE, a maioria em cursos prestigiosos, (04)

deles em Medicina, incluindo o 5º lugar geral, (08) em Direito e (11) em Engenharias.

Convém dizer que esses estudantes aprovados não frequentaram cursinhos

preparatórios (UFPE,2013)26.

Por construir junto aos estudantes autonomia e excelência intelectual, o

colégio é um espaço, no qual se vislumbra uma continuidade ou superação futura

das propriedades culturais da família. Um espaço, no qual aspirações são

construídas e realimentadas a cada êxito dos estudantes, a cada processo de

amadurecimento intelectual. Os núcleos de sentido do termo “Futuro” estão

26

Fonte:http://www.ufpe.br/agencia/index.php?option=com_content&view=article&id=45857:colegio-

de-aplicacao-tem-80-de-aprovacao-no-vestibular-2013-da-ufpe&catid=153&Itemid=72

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articulados ao desejo de acesso dos estudantes ao Ensino Superior gratuito e, mais

que isso, garantia de vaga nos cursos de maior prestígio dessas universidades,

desejo que é compartilhado com seus pais. Nos trechos, a seguir, apresentamos

mais justificativas dos estudantes para a escolha do termo “Futuro”:

Porque ele proporciona mais... Vamos dizer... Ele tem uma rotina que quando você tiver no terceiro ano, você já vai ter ela pra estudar, pra talvez até passar em alguma Universidade e passar na Universidade e ser aplicado, você pode ter um bom futuro (F;6;EPR;FPF/PL).

Futuro, porque eu penso muito que... Estudando nessa escola, que hoje eu estudo é pra um dia eu ter um futuro ótimo, assim... Eu adoro pintar, essas coisas... Mas, minha mãe vive dizendo: - Você vai ser médica ou juíza. Aí eu fico pensando, eu quero realmente um emprego bom e a escola vai me ajudar nisso (F;8;EPR;PL). Eu acho que elas se interligam [ Qualidade e Futuro] . Porque, tipo... Quando eu passei no Aplicação eu realmente não estava a fim de ir e as vezes quando eu peço pra sair, minha mãe diz que o Aplicação tem muita qualidade, que vai me ajudar no futuro, pra eu passar na faculdade, que é o melhor, tem uma qualidade melhor que os outros Colégios aqui de Recife e que o ensino que eu tenho até o terceiro ano, muda muito meu ensino no futuro (F;7;EPR;FPF/PL). Porque os professores exigem muito, então pode se preparar pra uma Universidade. A gente já encontrou alguns alunos do Aplicação que foram para a Universidade e falaram que... Nós temos alguma coisa a mais que os outros estudantes não têm. Porque as regras que são prescritas nos trabalhos... você tem que fazer formatação certa, pesquisa e tudo mais...já lhe ajuda! [...] Eu quero fazer neuropsiquiatria. Eu acho muito interessante como o cérebro funciona e como o seu cérebro pode ser alterado por algum tipo de doença... Eu não sou uma pessoa muito sociável entendeu? Então trabalhar pesquisando é o meu sonho [risos] (F;9;EPU;PEB/ME)

Os sujeitos veem esta escola em conexão direta com a aprovação no

vestibular e, sobretudo, com uma carreira de prestígio social no futuro. Podemos

dizer até que a instituição assume papel central para o alcance dos anseios

profissionais. A vinculação à esfera federal faz da instituição referência nacional de

ensino, permite às crianças partilhar desde cedo dos valores deste espaço social:

gosto pela leitura, pesquisa, acesso à biblioteca, seminários e conhecimento da

rotina acadêmica. Mas, sobretudo, frequentar o CAp transforma cada vez mais as

condições objetivas desses estudantes em esperanças subjetivas. Os sujeitos

desejam os postos mais elevados no mercado de trabalho, não apenas porque

foram socializados para querer, mas, principalmente, porque essa socialização os

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183

fez interiorizar valores, que os fazem crer que são capazes de consegui-los

(BOURDIEU, 2008).

A preocupação com a profissionalização e o vestibular pode ser explicada

pela valorização do grupo parece com o Ensino Superior e devido a situação de

aprovação dos ex-alunos em processos seletivos. Não podemos esquecer que o

grupo pesquisado é composto por filhos de pais que tem familiaridade com o Ensino

Superior, graduados, pós-graduados, mestres e doutores, funcionários públicos

federais, estaduais, profissionais liberais e professores da educação básica e do

Ensino Superior. Para os estudantes, o Ensino Superior não apenas é possível, mas

necessário.

A ideia predominante nas justificativas dos estudantes é que o CAp leva a um

futuro de sucesso. De acordo com Nogueira (2008), uma vez inseridos nos espaços

de prestígio, os estudantes se veem em condições de competição no vestibular e,

ainda, antecipam um sucesso futuro. Tudo se passa como se pertencer ao CAp

garantisse os melhores postos de trabalho, o privilegio de escolher o curso que

deseja e ingressar na universidade pública, a capacidade de obter sucesso em

concursos e seleções das quais participe. Tal entendimento gera expectativas, em

particular, entre os pais que cuidam da educação escolar dos filhos, acreditando que

ela é a responsável pelo seu êxito profissional e financeiro no futuro. O CAp é

representado, pelos estudantes nessa projeção de futuro possível e desejado.

5.3.2. Triagens Hierárquicas Sucessivas por pais

Nesta etapa do estudo contamos com a participação de vinte (20) pais do

Ensino Fundamental do CAp da UFPE. Nos mesmos termos dos estudantes,

selecionamos os participantes desta etapa de modo a considerar os seguintes

critérios: renda familiar, grau de instrução e profissões diferenciadas. Incluímos pais

de crianças ingressantes e de veteranos; pais com apenas uma criança

frequentando o colégio, duas ou mais, aqueles que submeteram mais de um dos

filhos, mas apenas um deles foi aprovado; os que optaram pelo cursinho e aqueles

que se valeram de outras estratégias de preparação para a seleção e famílias

residentes em diversos bairros da cidade do Recife e da RMR.

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184

O grupo foi composto por pais que participaram da primeira fase (Técnica de

Associação Livre) e que se disponibilizaram a participar das demais etapas da

pesquisa. A partir dos protocolos, selecionamos aqueles pais que atendiam aos

critérios acima expostos e que se dispuseram a nos receber.

Compomos um grupo de sujeitos com diferentes níveis de formação: ensino

médio, ensino superior, especialização, mestrado e doutorado. Havia militares,

professores universitários e professores da educação básica, profissionais liberais

(arquiteto, advogados, médicos), funcionários públicos estaduais e federais. A renda

familiar do variava de R$ 2.000,00 a R$ 40.000 mil reais. Os bairros de residência

foram Boa Viagem, Piedade, Casa forte, Jaqueira, Madalena, Espinheiro, Iputinga,

Várzea, Cidade Universitária, Torrões, Estância, Jardim São Paulo e Jiquiá.

Como já mencionamos, participaram pais com apenas um filho matriculado no

colégio; aqueles que inscreveram mais de um no teste, mas só obtiveram a

aprovação de um deles e os que tiveram duas e três crianças aprovadas; compôs

também o nosso grupo pais ingressantes e veteranos, uns já haviam formado os

filhos mais velhos na instituição, que já estavam frequentando universidade ou

realizando cursos no exterior. Nosso grupo foi composto por pais de crianças

provenientes de colégios do prestígio da cidade do Recife e RMR (Ethos, Instituto

Capibaribe, Damas, Motivo, Santa Maria, Colégio Apoio, São Bento, Santa Emília)

colégio de menor porte (Visão, Dourado, Arco-Íris) e escolinhas de bairro (ETC e

Ana Cecília). Integraram, também, o grupo dois pais, que não inscreveram os filhos

em cursinhos preparatórios.

Segundo os mesmos procedimentos adotado com os estudantes, para a

realização das Triagens Hierárquicas Sucessivas foram apresentados aos sujeitos

seis termos em cartelas. Os termos que compuseram o conjunto a ser hierarquizado

pertenciam ao Núcleo Central e a primeira periferia evidenciados na estrutura da

representação do CAp, identificados na primeira fase deste estudo e apresentados

no quadro de quatro casas. Com o grupo de pais utilizamos os termos “Qualidade”,

“Futuro”, “Educação”, “Estudo”, “Pesquisa” e “Responsabilidade” foram postos

em cheque durante as triagens.

Na primeira rodada das hierarquizações, descartados dois termos,

permaneceram: “Qualidade” (100%), “Futuro” (95%) e “Educação” (95%). Termos

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185

como “Pesquisa” (50%) e “Responsabilidade” (55%) tiveram permanência

considerável se considerarmos a frequência e OME obtidas na Associação Livre. O

termo de baixa frequência absoluta e relativa foi “Estudo” foi priorizado por apenas

dois destes pais.

Quando efetuamos uma comparação entre os resultados obtidos nesta etapa

por pais e estudantes, os termos “Futuro”, “Educação” e “Qualidade” também

foram bastante priorizados pelos estudantes na primeira rodada das triagens. No

entanto, diferente do ocorrido com os estudantes, na primeira rodada das triagens o

núcleo central permaneceu em destaque não sendo ofuscado pelos termos da

primeira periferia, como podemos perceber no Quadro 18.

Quadro 18. Distribuição dos termos que permaneceram na 1ª etapa das triagens hierárquicas sucessivas dos pais com as respectivas frequências

Na segunda rodada, o elemento “Qualidade” continuou com alta frequência

absoluta e relativa. Dos sujeitos participantes 90% reforçaram que este o termo era

mais representativo do objeto. “Futuro” (F=19; OME 2,421) que foi o elemento mais

evidenciado nas Triagens Hierárquicas Sucessivas com os estudantes e segundo

elemento mais importante do NC da estrutura representacional construída por pais,

teve a segunda maior frequência absoluta (f=11). Nenhum dos elementos foi

totalmente descartado na hierarquização nesse primeiro momento.

Qualidade” formou 18 duplas de palavras, sendo 09 destas com futuro.

“Futuro” formou nove duplas de palavras com qualidade, uma com responsabilidade

e outra com educação. Os indicadores de permanência estão apresentados no

Quadro 19 a seguir:

TERMO F %

QUALIDADE 18 90

FUTURO 11 55

EDUCAÇÃO 05 25

ESTUDO 02 10

PESQUISA 02 10

RESPONSABILIDADE 02 10

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186

Quadro 19. Distribuição dos termos que permaneceram na 2ª etapa das triagens hierárquicas sucessivas dos pais com as respectivas frequências

Quando solicitados que escolhessem dentre os dois elementos aquele

considerado indispensável para se pensar o Colégio de Aplicação da UFPE, houve

uma estabilidade do termo “Qualidade”, que é um dos elementos constitutivos do

NC da representação social do CAp da UFPE. Os resultados dessa segunda fase

mostraram que, diferente dos estudantes, a centralidade da representação por pais

foi confirmada. De certa forma, a evidência de centralidade dos estudantes é

complementar a dos pais, se considerarmos que o termo que consideraram central

(Futuro) corresponde a um suposto elemento central na representação desses pais

e perpassa algumas de suas justificativas.

Quadro 20. Distribuição dos termos da 3ª etapa das triagens hierárquicas sucessivas

dos pais com as respectivas frequências

No Quadro 20, “Qualidade” foi eleita por 75% dos estudantes como a palavra

mais representativa. Os demais termos obtiveram baixa frequência relativa, como

TERMO F %

QUALIDADE 20 100

FUTURO 19 95

EDUCAÇÃO 19 95

ESTUDO 02 10

PESQUISA 10 50

RESPONSABILIDADE 11 55

TERMO f %

QUALIDADE 15 75

FUTURO 02 10

EDUCAÇÃO 02 10

ESTUDO 00 00

PESQUISA 00 00

RESPONSABILIDADE 01 05

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“Futuro” (10%) “Educação” (10%) e “Responsabilidade” (05%). “Estudo” e

“Pesquisa” são descartadas totalmente, neste momento das Triagens. O que para

alguns pode parecer idealização de uma instituição, para estes pais são

características próprias do colégio centralizadas num só termo.

A confirmação do NC da representação foi expressa por 75% dos sujeitos

participantes. Quando questionados sobre a termo de maior valor simbólico na RS

do CAp da UFPE, os pais não tiveram dúvidas em apontar “Qualidade” e facilmente

justificavam sua escolha. Contudo, nas argumentações, há uma associação dos

termos “Qualidade” e “Futuro”, o que indica uma confirmação total do NC da

representação dos pais, composta por esses dois elementos. Além do mais, reforça

a ideia de que dos sentidos e significados atribuídos à instituição são compartilhados

por pais e estudantes, tendo em vista que “Futuro” foi o termo de maior valor

simbólico para esse segundo grupo. Eis alguns dos depoimentos dos pais que

corroboram com tais afirmações:

É...Porque o Colégio de Aplicação, eu vejo ele assim... É... Como um todo assim... O tipo de ensino que eles dão pros alunos. A maneira como eles abordam a matéria, os assuntos, os temas, “né”? É de uma maneira diferenciada, eles fazem o aluno pensar. Você observando as aulas que eles trazem pra casa, os slides, tudo... Eles dão o assunto, eles dão o conteúdo, eles cumprem com o que deve ser feito, mas só que de uma maneira diferente. Não é aquela coisa de o aluno ficar decorando não. Eles ensinam o aluno a pensar, e isso é o que eu classifico como uma educação de qualidade. Porque você não tem que decorar, você tem que aprender, pra você poder levar isso pra vida toda “né”? Pra você levar esses ensinamentos, esse conteúdo que você tem que ter ali, pra vida toda. E a partir disso aqui, a partir dessas duas (palavras escolhidas) como consequência você vai ter as outras (palavras não escolhidas). Eles têm a cobrança com relação as avaliações, aos trabalhos, tem as apresentações... A partir daí os alunos têm que cumprir “né”? com o tempo em que deve ser, a data em que deve ser entregue os trabalhos e isso faz com quê o aluno tenha responsabilidade. É... Se a gente tem uma educação de qualidade, o aluno vai ter um futuro, não é? A partir dessas duas [QUALIDADE, FUTURO] a gente tem como consequência essas outras que eu tirei (F; D; PU)

27

27

Os pais foram identificados pelos seguintes códigos: (F ou M) conforme o sexo indicado; seguido da

formação acadêmica: (EM) para Ensino Médio; (G) para Graduação; (E) especialização; (M) Mestrado; (D) Doutorado; (PHD) Pós-doutorado; Acrescentado a estas o código de qualificação da profissão destes, sendo (PU) professor universitário, (PEB) professor da educação básica, (FPF) para funcionários públicos federais, (FPFM) para funcionários públicos federais militar, (FPE) funcionários públicos estaduais e (PL) profissionais liberais; (ME) Microempresário.

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Eu coloquei meu filho, fiquei muito satisfeita... Coloquei não, “né’? Ele passou (sorrir)... Aí a gente também investiu na outra pra entrar, porque... Dessa educação eu vejo que tem qualidade. Da forma do ensino, da maneira que eles comandam... Eu digo assim, pra entrar no Colégio de Aplicação, o aluno também tem que ser aplicado. Porque... É tipo a faculdade, é o tempo todo trabalho, pesquisa. Então, o aluno tem que procurar aprender. Inclusive a gente sempre escuta, porque não é só tirar nove, dez... Porque estudou o livro, respondeu a prova perfeita. E lá não tem isso, ele estimula o aluno a pensar... Vamos dizer: história- Tinha o assunto, mas dentro do conteúdo tinha uma frase... Uma frase de internet, de jornal, relacionado aquilo. Então, tem que a partir daquela frase, dentro do conteúdo fazer uma crítica, positiva ou negativa. Aí ela sentiu um pouquinho de dificuldade nisso, porque estava acostumada ao que tinha estudado no livro, só caia aquilo e as escolas são assim, mesmo dizendo que é construtivista, mas são. E lá, não. Se torna de qualidade por isso, porque faz com que o aluno procure “né”? Pesquise, procure aprender, pensar... (F;E;PEB)

Para as duas entrevistadas, uma pesquisadora e professora da UFPE e para

a professora (pesquisadora) da Educação Básica, o diferencial na instituição diz

respeito à forma de apresentação dos conteúdos; os estudantes são

constantemente estimulados em relação ao conhecimento, são desafiados o tempo

inteiro a analisar, questionar e avaliar as coisas que olham. Cumpre destacar que,

aliado às características da escola, a criança, chega preparada e apta para lidar com

uma quantidade considerável de informações, fazer associações e ligações

necessárias para ampliar o conhecimento, fatores que poderão levá-la à excelência

escolar.

Na associação dos termos “Qualidade” ao “Futuro”, um desencadeia o outro.

Estudar no CAp seria condição para ter o futuro desejado, desta forma os pais

empreendem os esforços necessários para acessar o colégio e garantir um futuro

de realizações para os filhos. Esse entendimento pode ser observado no trecho a

seguir:

Porque qualidade pra mim, já está dentro desse... Se você me perguntasse: O que seria a qualidade do Colégio? Aí seria: Pesquisa, ter responsabilidade. É o futuro da minha filha. O futuro dela dentro de um Colégio de qualidade. A qualidade é aquilo que eu lhe falei: quando você procura futuro, você procura primeiro qualidade. (M;E;FPFM)

Qualidade aparece como a ponta da lança da representação do objeto. O

termo está tão associado à instituição, que os pais a consideram como um termo

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“autoexplicativo” ou “autoelucidativo” do que ali ocorre, do ensino vivenciado. Como

podemos perceber na justificativa de um dos pais:

Bem, é... Até mais ou menos auto... Como é que eu diria? Qualidade... Você aqui estuda e tem qualidade. Eu acho que são mais ou menos assim, autoexplicativas ou autoelucidativas. Porque quando eu penso em Aplicação eu penso em estudo de qualidade. Porque pesquisa e educação... Educação é muito de casa “né”? Porque tem gente que tem estudo, mas não tem educação. Veja quanta gente rica suja a rua aí, ou não considera o semelhante como tal, se acha melhor do que todo mundo... (M;G;FPF)

Assim como os estudantes, os pais estão a vislumbrar um futuro promissor

para seus filhos e acreditam que a “Qualidade” do ensino vivenciado no CAp

proporciona um futuro de possibilidades a essas crianças. Eis mais um dos

depoimentos:

Bom, primeiro eu penso que é a qualidade do ensino do Colégio. Independente de quaisquer outras falhas que existam, a qualidade da escola é um ponto muito forte do Colégio. E isso é que diz o futuro do universitário, do profissional, eu acho (F;E;PL)

Dentre os participantes desta etapa, apenas um tinha formação de Ensino

Médio, mas era funcionário público federal; cinco eram graduados; muitos deles

superavam este nível de escolaridade, sendo oito pós-graduados, cinco mestres e

dois doutores. A escolaridade e ocupação dos pais participantes sinalizam o padrão

sociocultural diferenciado da grande massa da população brasileira. Tais variáveis

contribuem para que os estudantes sejam “herdeiros” de uma cultura acadêmica, o

que indica que eles são socializados em meios culturalmente privilegiados. Para

Brandão (2003), os elevados níveis de escolarização e profissões de prestígio dos

pais, também, influenciam as escolhas e estratégias de escolarização de suas

crianças, conferem um sentido do jogo que dá sentido e direção à gestão escolar da

prole.

Em síntese, para os pais a “Qualidade” da instituição de ensino é o termo

de maior relevância na representação. No entanto, nas argumentações, os termos

“Qualidade” e “Futuro” aparecem com sentidos imbricados. No entendimento dos

pais, acessar o colégio de qualidade é condição primeira para alcançar o futuro

desejado. O colégio configura-se como instância produtora de sentidos

relacionados às perspectivas de futuro familiares.

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190

Cumpre reafirmar que os resultados obtidos nas Triagens Hierárquicas

Sucessivas desta pesquisa alertam para o uso cuidadoso dos métodos

associativos e para a importância de utilização de técnicas complementares que

confirmem a centralidade dos termos. Abric (1994) apud Sá (1998), afirma que há

necessidade de realização de testes do núcleo central. O referido autor, ainda,

confere importância as entrevistas em profundidade, destacando que o

questionário de associação livre foi utilizado por muito tempo como principal

instrumento de levantamento das representações, mas, às entrevistas se

constituem métodos indispensáveis para qualquer estudo em RS.

Sobre o núcleo central das representações, Abric (2003) afirma que dois ou

mais grupos apenas terão representações iguais de determinado objeto se

partilharem o mesmo núcleo central. Desta forma, núcleos centrais diferentes

indicam representações diferentes do objeto. Nesta fase do estudo, detectamos RS

diferentes, porém complementares. O discurso de pais e estudantes acerca do

objeto em análise se complementa, indicando o compartilhamento de sentidos e

significados sobre o CAp da UFPE, como veremos de forma mais aprofundada no

capitulo a seguir.

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191

5.4. Os sentidos compartilhados sobre o CAp da UFPE por pais e

estudantes

5.4.1. Buscando Sentidos: Representações Sociais e a noção de Habitus

Os sentidos compartilhados pelos pais e alunos indicam o CAp da UFPE

como sinônimo de qualidade e futuro. A busca pelo ensino de excelência está

relacionada às perspectivas de futuro das famílias para suas crianças, algo que,

também, é interiorizado por elas.

O desejo de pertencer à instituição de prestígio mobilizou pais e filhos, fazendo-

os empreender os esforços necessários à aprovação na seleção de ingresso. Essas

estratégias são empreendidas para tal fim, como é o caso dos cursinhos

preparatórios, definição de horários de estudo, direcionados à antecipação da

matéria e resolução de provas anteriores, no intuito de reduzir uma possível

desvantagem da criança frente aos demais concorrentes, para familiarizá-la com o

estilo da prova e garantir seu êxito. Essas estratégias são de mobilização das

disposições interiorizadas, na trajetória escolar e familiar do estudante, portanto, não

são conscientes ou intencionais, pois são aprendizagens práticas, decorrentes da

bagagem cultural e social familiar. As visitas a museus, viagens, escolas de

prestígios, cursos de línguas ,viagens, socialização, relação com as redes familiares

e de amizade são práticas costumeiras e naturais do grupo, que são eficazes e

favoráveis à escolarização das crianças, pois permitem uma maior familiaridade com

o universo letrado.

Durante toda a pesquisa e, de forma mais apurada, na etapa das entrevistas,

conseguimos capturar as afinidades entre a cultura escolar e capital cultural dos

estudantes, no sentido expresso por Pierre Bourdieu. No processo de decisão para

submeter o filho à seleção de ingresso e na sua preparação, são mobilizados

diversos capitais [social, cultural, escolar, econômico] e disposições cultivadas. Tais

mobilizações nem sempre são racionais ou intencionais, pois conforme Bourdieu

(2009) nesses casos, o senso prático é prontamente acionado. Esse mesmo senso

prático é utilizado para avaliar e classificar o mundo em que vivemos. Daí

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192

estabelecermos uma relação estreita entre as RS, as práticas do grupo e a noção de

habitus de Pierre Bourdieu.

O material recolhido com as entrevistas nos aproximou, ainda mais, do objeto

simbólico, crenças, atitudes e percepções do grupo, além de nos possibilitar traçar

um perfil da configuração familiar dos sujeitos e reconstituir as condições objetivas

das famílias do CAP da UFPE que explicam, em parte, a aptidão dos filhos, a

escolha da instituição e os sentidos e significados atribuídos ao objeto estudado.

Com os depoimentos captados com as entrevistas, conseguimos aprofundar

os sentidos anteriormente delineados e capturar o material simbólico ainda não

acessado, momento no geral trajetórias e lembranças foram mobilizadas

reconstituindo o percurso de cada um deles para compreender quais práticas são

orientadas pelo habitus do grupo e pela representação que estes possuem do objeto

em foco. As entrevistas possibilitaram, também presentes nas práticas, escolhas,

socializações, mobilizações, desejos e perspectivas futuras dos sujeitos da

pesquisa.

É inegável o valor simbólico que a instituição possui para os sujeitos

pesquisados. A imagem de excelência do CAp da UFPE é compartilhada por todos

os entrevistados e revela as perspectivas de futuro de pais e estudantes que optam

por frequentar a instituição. Pertencer ao grupo seleto de estudantes, do Colégio de

Aplicação dá a esses sujeitos uma margem de segurança de sucesso futuro e

realização profissional. Significa acessar o melhor ensino, obter uma excelente base

educacional e estar em condições de ocupar os cursos mais disputados das

Universidades públicas, pleitear cargos públicos e posições privilegiadas no

mercado de trabalho. A vivência na instituição permuta uma experiência educativa

marcada pela individualização das aprendizagens, possibilitando aos estudantes

desenvolver-se em todas as suas potencialidades e construir uma relação positiva

[investigativa, crítica e criativa] com o conhecimento.

A sistematização e reflexão que intentamos realizar, neste momento do texto,

não está isenta das impressões do processo de coleta, transcrições das entrevistas

e de etapas anteriores. Ao contrário, a interpretação dos resultados, mesmo que de

forma preliminar, foi sendo produzida desde nossa entrada em campo e em cada

contato com o grupo participante. Na medida em que apresentamos e analisamos os

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trechos imbuídos de aspirações, estamos considerando o conjunto de recursos

sociais e culturais incorporados, as distinções de gosto, atitudes, estratégias,

práticas, maneiras de ser e de estar no mundo, o habitus.

Como dito anteriormente, o senso prático orienta certo porvir, que se

desdobra em possibilidades, “chances” e esperanças subjetivas [aspirações,

motivações, mobilizações]. Vale reafirmar, que partimos do pressuposto de que as

escolhas dessas famílias pelo CAp da UFPE não eram aleatórias, mas orientadas

por um habitus comum ao grupo e relacionadas as perspectivas de futuro dessas

famílias. A partir noção de habitus,consideramos cada estudante do CAp como

detentor de disposições sociais de ordem prática, produto de incorporações

objetivas, materiais e também simbólicas. Entendemos que tais disposições estão

organizando as percepções de mundo social desses sujeitos. O foco de análise

não é o habitus do grupo, mas as representações sociais que pais e estudantes

construíram do CAp-UFPE, no entanto, insistimos em respaldar nossas

interpretações nas disposições incorporadas destes estudantes, pois se anularmos o

entendimento de que o senso é prático orientador das ações do grupo, anulamos,

também, a análise sociológica dessa representação. Tal fator não pode ser negado,

tendo em vista que o acesso a instituição funciona como um “filtro” sociocultural.

Assim, acessar o habitus do grupo é primordial para o entendermos quem chega,

como chega e porque chega à instituição; que valores atribui ao CAp da UFPE,

como esse grupo o representa.

5.4.2. Caracterização familiar dos estudantes do CAp da UFPE: Sobre a

construção progressiva de práticas, sentidos e disposições duráveis e

favoráveis a escolarização

Neste item, realizamos um passeio pelos percursos escolares e profissionais

dos pais e da família extensa dos estudantes, atentando para sua socialização

primária no âmbito doméstico e nas demais instâncias de socialização, que

participaram [educativas, religiosas, sociais]. Especialmente, focamos nos habitus

familiares distribuídos em capital linguístico, social, cultural e econômico. Sem a

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194

pretensão de realizar uma caracterização aprofundada dos percursos individuais,

realizamos um apanhado geral de características comuns aos sujeitos pesquisados.

Pensamos ser este o momento de apreender os recursos sociais e culturais

das famílias que frequentam o CAp e constroem a Representação do Colégio.

Juntamente com a panorâmica familiar, lançamos um olhar sobre a trajetória escolar

das crianças até o momento da seleção de ingresso, atentando para a composição

diferenciada deste grupo de estudantes de Escola Pública. Nossa observação

procurou apreender os costumes e práticas dessas famílias, os valores e o senso

estratégico, quase imperceptível ao portador e ao observador por aparentar ser fruto

de hereditariedade. De certa forma tal “herança” é legada aos descendentes, mas

está longe de ser biológica.

5.4.2.1. Processos de Socialização e percursos escolares e profissionais dos

pais

Os relatos dos pais e estudantes demonstram uma variedade de práticas

culturais que ocorrem na família, na escola e nos demais espaços de socialização

em que estes transitaram. Tais práticas se mostram mais frequentes nos ambientes

domésticos, tornam-se costumeiras e naturais ao grupo, perdendo qualquer tom de

aprendizagem sistemática.

A gente morou um tempo na casa de minha avó e meu tio tinha uma biblioteca. Meu tio era muito intelectual assim... E ele tinha uma biblioteca na casa e aquilo me impressionava assim... Mas era muito livro de política, de socialismo... Coisa assim que eu não entendia muito bem. De medicina... Mas eu achava bacana aqueles livros. Mas aí eu comecei a ler “né”? Viriato Correia, Monteiro Lobato, Machado de Assis... O que caia na mão eu lia! E tinha uma revistinha na época chamada Círculo do Livro, Então a gente comprava aquelas revistas através... O livro através daquela revista “né”? Não se tinha assim... O hábito de se ir a livraria, mas a gente comprava sempre na revista, nem que fosse o livro de promoção do mês “né”? Mas sempre comprava alguma coisa

28 (F;D;PU).

28

Os pais foram identificados pelos seguintes códigos: (F ou M) conforme o sexo indicado; seguido da

formação acadêmica: (EM) para Ensino Médio; (G) para Graduação; (E) especialização; (M) Mestrado; (D) Doutorado; (PHD) Pós-doutorado; Acrescentado a estas o código de qualificação da profissão destes, sendo (PU) professor universitário, (PEB) professor da educação básica, (FPF) para funcionários públicos federais, (FPFM) para funcionários públicos federais militar, (FPE) funcionários públicos estaduais e (PL) profissionais liberais; (ME) Microempresário.

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Perdi as contas do quanto viajamos quando eu era criança. Todas as férias...duas vezes por ano, nas férias e nas viagens de final de ano. Meu pai, minha mãe, meus irmãos e eu... Brasil e exterior... viajei muito e a sensação é de sempre ter conhecido tudo (risos) (M; D; FPF) Éramos três irmãos, todos nós estudávamos no Damas. Meu pai era bancário, minha mãe professora primária... Todos amantes da leitura. Meu pai recebia bronca no trabalho por ler em serviço- já pensou? (risos) Hoje as pessoas acessam face e twitter e está tudo certo... A leitura me acompanhou, cresci com isso. Não lembro de época em que não se lia em casa... penso que líamos todos os dias, estávamos sempre em meio a livros, a cultura, a arte. Meus tios nos visitavam bastante, todo final de semana iam até nossa casa... Tia Cecília era médica, o tio João trabalhava na rádio, nos visitavam pois papai organizava o campeonato de Xadrez, eles vinham com as famílias, os primos, os amigos da família... Meu pai vencia a maioria dos campeonatos (risos). Meu pai tinha duas paixões, o Xadrez e o jornal... O jornal era o companheiro do café da manhã de meu pai, ele lia alto, todos na mesa liam junto, mesmo que não quiséssemos estávamos a par de todas as notícias... E isso se tornou um hábito nosso de todas as manhãs como os encontros de Xadrez com os parentes e amigos aos sábados. Eu não lembro a primeira vez que meu pai leu para nós, acho que ele sempre lia... Meus filhos... Minha família é a continuidade disso, entende? Eu trago um pouco dos meus pais em mim, na educação de meus filhos (M; M;PL ).

Os três depoimentos revelam que estamos diante de um grupo diferenciado

de pais de escola pública em termos de bagagem cultural. Os bens culturais que

quando criança tiveram acesso ao residir na casa da tio, as viagens realizadas com

a família para conhecer diversos lugares do Brasil e no exterior e as práticas

familiares de leitura e ganhos simbólicos na relação com a família e amigos são

alguns dos exemplos dos capitais acumulados por este grupo, que constitui o

patrimônio familiar a ser repassado.

No último depoimento, o entrevistado estava tão ajustado à prática de leitura

do pai, que a percebia como natural, sentido revelado no trecho “A leitura me

acompanhou, cresci com isso. Não lembro de época em que não se lia em casa...

penso que líamos todos os dias, estávamos sempre em meio a livros, a cultura, a

arte[...] Eu não lembro a primeira vez que meu pai leu para nós, acho que ele

sempre lia”. Esse entrevistado estava rodeado do que Bourdieu chama de

“propriedades” culturais e sociais, por exemplo: literatura, leituras diárias de jornais,

campeonato de Xadrez, que envolvia a família extensa (tia médica, tio radialista) e

amigos. Tais práticas parecem ter sido internalizadas pelo sujeito, que tende a

reproduzi-las com os seus, com a sua família, sem nem ao menos ter consciência de

porque o faz, como fica evidenciado no trecho “Meus filhos... minha família é a

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continuidade disso, entende? Eu trago um pouco dos meus pais em mim, na

educação de meus filhos”

Os sujeitos citam, ainda, práticas familiares de acompanhamento de sua vida

escolar por parte dos pais. Tais condutas são expressões de um habitus familiar,

que valoriza a escolarização, exercendo um acompanhamento da aprendizagem do

estudante.

Na minha casa todos frequentavam a igreja e lá as pessoas tinham uma vida organizada, de invejar... Inveja branca, sabe? A minha família era invejada no bairro porque não passávamos o dia na rua brincando livremente com os demais, tínhamos horários, uma rotina organizada mesmo... Papai não descuidava dos nossos estudos e devo muito do que tenho hoje a esse cuidado dele com a minha educação, com a educação de meus irmãos. Ele era da Marinha, chegava em casa todas as noites, final da tarde... Sentava com os filhos para saber das atividades escolares, para tomar a lição do dia, a tabuada, propor questões de raciocínio lógico, brincar de adivinhações, ler, conversar, nos acompanhar. Nesse momento minha mãe descansava porque ao longo do dia essa tarefa era dela (F; D; PL).

A socialização ocorrida na família, na igreja e com os parentes próximos

parece instaurar, no grupo práticas, favoráveis à escolarização das crianças. Para

Nogueira (2008), os pais usam de diversos recursos para otimizar o capital escolar e

o rendimento dos filhos. O acompanhamento escolar, as tomadas de lição, o

momento de atividades extraescolares, que o pai realizava diariamente, práticas que

complementam ou antecipam a ação escolar revelam essa otimização.

Destacaram-se, nos relatos dos pais e dos estudantes, recordações de um

percurso escolar linear e permeado de sucessos sucessivos. As escolarizações

ocorriam, na maior parte, na rede privada de ensino e estabelecimentos prestigiosos

(05), alguns casos em instituições públicas federais (04), incluindo as escolas

mantidas por empresas, ligadas ao governo federal como as Escolas da Chesf e

uma delas em escola pública estadual. Eis o que dizem os sujeitos sobre os

estabelecimentos escolares frequentados:

Eu sempre estudei em Escola Pública. Eu estudei em Escola Pública e depois fiz o que hoje em dia é o IFPE, “né”? Na época era Escola Técnica Federal da Bahia, aí... Eu não pensava em fazer Universidade. Aí um amigo foi que me falou que tinha que fazer, que era importante fazer e tal... E aí eu fui estudar em São Paulo... Fiz o vestibular e entrei na Universidade Federal de São Carlos no curso de Química. Depois fiz Pós-graduação também por lá... Fiz o pós-doc. Trabalhei um tempo por lá, porque na época que eu me formei não abria concurso, era na época do governo de Fernando Henrique. Aí depois, em 2004 fiz o concurso aqui, em 2005 eles me chamaram. Aí nós viemos pra cá (F;D;PU)

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Eu iniciei em escola privada, era um colégio de bairro, no IPSEP. Depois, como todos os meus irmãos tiveram formação no Santos Dumont, que é uma escola pública, né? Eu fui e passei seis meses no colégio, porque eu estava além do que se estava dando lá, na época. Apesar de eu ter chegado na classe equivalente, eu estava muito, muito além. Aí meu pai disse: - Olha, você vai ficar desestimulada. Aí me tirou e eu perdi realmente um ano. Poderia ter tido... Poderia ter feito vestibular já com dezesseis anos de idade e eu fiz com dezessete... dezessete pra dezoito anos. Depois, então... Eu fui pra colégio particular e toda minha formação então, foi em colégio particular ( F;E;PL) Eu tinha direito a escolas da CHESF, porque a gente morava no interior e meu pai era funcionário da CHESF. Então, eu tinha direito a essas escolas, que eram escolas de qualidade e sem pagar... Estilo um Aplicação. Meu marido também estudou... Ele estudou numa escola da CHESF e depois fizemos faculdade... Federal, os dois! Ele em Campina Grande e eu aqui. Eu só me formei depois que casei, ele já tinha se formado antes. (F;M;PB)

Como já dissemos antes, os níveis de escolarização dos pais é elevado. Dos

entrevistados dois são doutores, três mestres, três pós-graduados, um graduado e

um graduando. Destes quatro são Funcionários Públicos Federais, dois Professores

Universitários, um Militar, um Médico, uma Professora da Educação Básica-

funcionária estadual e (01) Auxiliar de Desenvolvimento Infantil- funcionária

municipal. Eles entendem que seus percursos escolares e profissionais foram

exitosos graças a valorização e incentivo dos pais:

Mamãe era nossa maior incentivadora. Se virava a pobrezinha... Ela corria pra lá e pra cá... leva pra escola, busca na escola, leva pra aula de música, pro clube... Ela trabalhava fora, quando voltava do trabalho, exausta, corria para nos auxiliar nas atividades escolares. Meu pai viajava muito, não tinha tanto tempo para nos acompanhar... Mãe fazia isso, o trabalho diário e tudo mais. E hoje, eu e meus irmãos, nossos êxitos acadêmicos e profissionais devemos ao empenho da nossa mãe... (F; M; FPF)

O nível de instrução dos pais, avós, da família restrita e extensa, também,

chama a atenção no discurso dos entrevistados. Um deles atribui à formação e à

ocupação dos pais o sucesso de seu percurso escolar.

Mamãe e papai nos criaram investindo tudo que tinham, nos deram o que podiam, mas muito mais que condições econômicas para custear nossos estudos nas melhores instituições privadas da região tínhamos condições de frequentar a melhor instituição pública. Mamãe era professora universitária, Gisele... o espaço universitário não nos era distante, ao contrário era nossa própria casa. O fato dela ser professora da UFPE foi um empurrão, penso eu. (M;M;PL)

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Nascido em uma família de classe média, José era o mais velho de três

irmãos e o primeiro a ser aprovado na seleção de ingresso do colégio. Filho de uma

professora universitária e de um médico, ele fez questão de reforçar que o fato da

mãe ser professora universitária e a confortável situação econômica da família

favoreceram seu ingresso dele e dos irmãos na instituição.

No total, os sujeitos citaram pais, irmãos e parentes próximos com as

seguintes profissões: oito médicos, seis Professores Universitários, seis

Funcionários Públicos Federais, cinco advogados, quatro Militares, três Empresários

dois Jornalistas, dois professores de Educação Básica, dois Bancários, um Auditor

Fiscal, um Promotor, um Engenheiro, um Contador, um radialista, um Comerciante.

Meu pai era formado em contabilidade, “né”? Trabalhava em empresas. Trabalhou na Orthe Martins, depois trabalhou numa empresa chamada Alfa, em Salvador, porque nós morávamos lá.... O pai do Fernando era representante comercial e a mãe dele era professora (F;D; PU). Minha mãe teve o técnico de contabilidade, que é... As mulheres naquela época não tinha faculdade pra elas, não é? Então ela fez o colégio... A parte do técnico de contabilidade. E meu pai... Ele atuou na área de educação física e ensinando na Universidade Federal e na Escola Técnica. Inclusive ele é o fundador do curso na escola técnica, que era no Derby... Ele é um dos fundadores do curso de Educação Física (F; E; PL). Minha mãe era professora universitária, meu pai pesquisador. Ele trabalhava num instituto de pesquisa... Não recordo o nome agora... Meus avôs também eram professores. Meus irmãos são formados em Direito, um deles é promotor, mas não atua no nosso estado. Na nossa família todos estão organizados financeiramente porque tiveram percursos escolares ajustados também... Os irmãos, os primos... Eu sou formada em jornalismo, mas trabalho como Funcionária Pública há seis anos (F; E; PL). Sou filha de médicos, sobrinha de médicos (risos)... não tinha como fugir da medicina (F; M; PL). O avô dela, por parte da minha esposa, era... Trabalhava em rádio e tal, mas ele trabalhava com publicidade. Fazia, vendia as propagandas dos rádios, trabalhava na rua, no comércio, vendendo. Era publicitário, vendia... A mãe dela era dona de casa. Então, ele era publicitário, trabalhava em rádio e ela dona de casa. O meu pai tinha uma firma de fazer... Faz janelas de alumínio, trabalha com ferragem, tipo uma serralheria, só que bem grande... Tem dez empregados, uma coisa maior, tem dois galpões. Antes ele era marceneiro, trabalhava numa fábrica de marcenaria, depois montou esse serralheria e foi crescendo e tem até hoje. E a minha mãe ela é doméstica também. Por parte da mãe o avô é publicitário e meu pai empresário ( M; E; M). Meus pais eram funcionários públicos federal... Meus irmãos são funcionários públicos, todos os três ( F; E; FPF).

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O meu pai é militar e a minha mãe, antes de... Eu acho que até uns dois anos de idade, ou um ano que eu tinha, ela era “instrumentadora” cirúrgica. Só que ela teve que parar pra cuidar de mim e do meu irmão. Aí, agora ela é dona de casa (F; 6; EPR; FPFM/PL)

29.

Os espaços de socialização não se restringiam aos escolares e familiares, os

pais e estudantes citaram igrejas, clubes, conservatórios de música como

experiências que, de certa forma, somaram-se ao percurso escolar.

Os bairros de residência na infância, em sua maioria, eram na cidade do

Recife: Bairros Centrais (01), na Zona Norte (05) ou Sul da cidade (02). Dois (02)

desses sujeitos residiam no sudeste do país, Rio de Janeiro e São Paulo.

Atualmente esses pais residem nas seguintes localidades: Zona Norte (05) Bairros

de Casa Forte, Espinheiro, Madalena, Jaqueira; Zona Sul (02), bairros de Piedade e

Boa Viagem; Várzea e Cidade Universitária (02) e Periferia da Cidade do Recife

(01), bairro do Jiquiá. Estes bairros dizem dos espaços em que os sujeitos transitam,

da vizinhança e da possível rede de amizades e estabelecimentos a frequentar. Para

Bourdieu (1998) as relações de vizinhança podem ser produto de estratégias de

investimento social consciente ou inconsciente, orientadas para a reprodução das

relações sociais diretamente utilizáveis a curto ou em longo prazo. Os trechos a

seguir trazem essa relação de bairros de residência e espaços de socialização e da

rede de amizades que vão se construindo:

Por minha parte devido a eu ser militar, a gente tem alguns casais que frequentam aqui. Morávamos na vila militar... Devido a minha profissão a gente tem amigos... E eu tinha também amigos na época em que eu morava na vila, também tinha outros amigos. E aqui... A gente esta aqui a pouco tempo, mas já tem as amizades aqui... Tem os nossos vizinhos aqui de baixo, que a gente já fez até algumas confraternizações. Então, nessa área aqui a gente esta criando amizade. Mas a gente tem muito amigo, mais por parte da minha profissão. A maioria dos meus amigos são militares, tirando os parentes né? ( M; E; FPFM) Geralmente pessoas do trabalho que também não são de Recife. Professores da universidade... E assim... pessoas de Recife que a gente

29

Os estudantes foram identificados pelos seguintes códigos: (F ou M) conforme o sexo indicado;

seguido de número correspondente ao ano/série atual; (EPR) Escola privada, (EPU) Escola pública para indicar a rede de ensino de que são provenientes; Acrescentado a estas o código de qualificação da profissão dos pais do estudante, sendo (PU) professor universitário, (PEB) professor da educação básica, (FPF) para funcionários públicos federais, (FPFM) para funcionários públicos federais militar, (FPE) funcionários públicos estaduais e (PL) profissionais liberais; (ME) Microempresário.

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tem mais amizade, geralmente são daqui, são os nossos vizinhos. Nossos vizinhos são pessoas muitos legais, muito agradáveis... A gente tem muita amizade na vizinhança ( F; D; PU) Nossos amigos são os outros pais do CAp... Um deles é médico, tem um jornalista... os pais do Lucas são professores... A gente vai ampliando essa rede de amizade, estreitando os laços... Tem os meus amigos do CAp... os vizinhos do prédio... Aqui no prédio somos três médicos, a conversa flui, não tem como não se aproximar, o papo flui... (M; M; PL)

O nível de escolaridade dos pais, os bairros de residência, os espaços de

socialização e os vínculos sociais estabelecidos são, conforme Bourdieu (2010),

indicadores que permitem situar o nível cultural da família, embora sozinhos não

informem sobre o conteúdo da herança e/ou via de transmissão. Alguns destes

percursos serão tratados para apreensão de um possível habitus familiar favorável a

educação.

5.4.2.2. Processo de Socialização e percursos escolares dos estudantes

Das dez crianças entrevistadas, apenas, uma era proveniente de escola

pública e outra de escola privada de bairro. Aquela que havia frequentado escola

pública é filha de professora e de um microempresário, a de escola de bairro é filha

de uma Auxiliar de Desenvolvimento Infantil (ADI) e de um Engenheiro da Petrobrás.

As demais (08) haviam frequentado estabelecimentos de ensino da rede privada de

prestígio, colégios de renome e tradicionais na cidade. Estas crianças foram e

continuam sendo socializadas em ambientes otimizados, espaços providos de

recursos materiais, sociais ou simbólicos, que as credenciais escolares, o capital

cultural da família e as profissões dos pais, de certa forma, tornam possível.

Dos estudantes (06) possuem pais mestres ou doutores, (02) pais com

especialização, e uma tem pai graduado e outra tem pais cursando a graduação. Um

aspecto que chama atenção são as prestigiosas profissões dos pais: médicos,

advogados, arquitetos, professores universitários, professores da educação básica,

instrumentador cirúrgico, militar, empresários, funcionários públicos federais e

estaduais.

O grupo é composto por uma clientela envolvida em práticas culturais

constantes. Todos os estudantes citaram que frequentam (mais de quatro vezes ao

mês) livrarias, cinemas, praticam leituras de jornais, livros e revistas informativas.

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Sete dos estudantes revelaram que vão ao teatro, museus, exposições, shows de

música, eventos públicos e viagens, pelo menos, uma vez ao mês. Cinco deles

citaram frequentar eventos eruditos como ópera, Ballet e musicais quando têm

oportunidade, na cidade que vivem ou quando viajam.

Quando tem espetáculos de dança, musicais, ópera e concertos nós vamos. Não é sempre que tem também. Meus pais falam que a oferta não é legal aqui em Recife... Em São Paulo sempre tem. Digo não é todo mês que tem aqui... Cinema por exemplo sempre tem lançamentos e se quisermos vamos umas quatro vezes ao mês... Mas esses espetáculos não... tem que ver a qualidade também... Mas sempre que tem e nos interessa nós vamos(F; 7; EPR; PU) . Geralmente a gente vai no shopping, pega um cinema. Vai no... Livrarias “né”? Paço Alfândega ou na Saraiva. É... Se vai no shopping tem que ir na livraria, tem que ficar lá uma hora na livraria, a moça vendo e revendo tudo lá ( F; D; PU). Eu acho que eu sou a pessoal que talvez incentive mais, porque o pai, apesar de gostar de ler, ele não é muito sensível a livros, ele costuma ler mais revistas, jornais... Eu sim, eu gosto de ler... Eu sempre fui estimulada por meu pai e eu acho que ela pegou um pouco essa veia de mim. Sempre que ela ia pra shoppings a primeira coisa eu ela pedia era: - Mainha deixa eu ir na livraria?Sempre, desde pequena. E até hoje ela é assim, quando a gente chega no shopping ela pede logo: - Vamos pra Cultura? Sempre ela pede pra ir, todo mês a gente estar comprando livro pra ela... Quatro, cinco livros ( F; E; PL). Eu acho que a gente não tem uma oferta muito boa de espetáculos. Que nem agora na viagem a gente assistiu o Fantasma da Opera, na Broadway. Nunca imaginei que fosse fazer isso na minha vida, mas... Tá aí. Fantástico! Camila acompanhou o tempo inteiro também, gostou. E, é... basicamente isso que a gente faz. Quando dá a gente se programa e faz uma viajem como a gente fez agora de férias, aí saí um pouco daqui , aí vai conhecer outras coisas. Mas o nosso final de semana é basicamente... Ou sai a noite, pega um cinema, vai no teatro quando tem alguma coisa pra ver, ou vai durante o dia no shopping, passeia, vai ver umas coisas ( F; D; PU).

Conheço vários países... Estados Unidos, que eu fui agora. Europa... França, Espanha, Itália e Inglaterra. Um pouco da Suíça, Argentina e Uruguai. Foram viagens de férias..E aí também conhecemos alguns museus: O Louvre, em Paris. O Museu de História natural, na Florida... Não! Nova York. É... Deixa eu ver... A gente vai assim, os nomes eu não lembro, mas a gente vai... Se tem, assim, a gente vai ( F; 7; EPR; PU).

Os trechos revelam que as atividades culturais e o acesso a práticas da “alta

cultura” são próprios desse grupo. As viagens realizadas nas férias, no suposto

tempo livre, são utilizadas para acumular propriedades sociais. As famílias tendem a

converter as propriedades sociais em capital social (BOURDIEU, 1989). Há um

acúmulo de capital linguístico, cultural, social e simbólico nas práticas de nosso

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grupo. O que definem a forma de vida dessas famílias. Expresso em forma de

capitais, o habitus do grupo começa a se delinear e a sinalizar gostos, maneiras de

ser, agir, estar no mundo e pensá-lo.

Merecem destaque as redes de ensino e os estabelecimentos frequentados

por esses estudantes antes de ingressarem no CAp da UFPE. Embora uma das

estudantes frequentasse escola privada de bairro, a garota acrescenta no seu

depoimento que a família se valia de estratégias extras para diminuir suas possíveis

desvantagens escolares:

Olha eu estudava no Ana Cecília, um colégio de bairro... aqui perto! Mas eu fazia inglês também e aulas extras, cursinho...(F; 7; EPR; FPF)

Como dito anteriormente boa parte dos entrevistados, dezessete (08

entrevistados e 09 filhos de entrevistados) eram provenientes de colégios

tradicionais e prestigiosos da cidade, frequentados pela classe média e classe média

alta da cidade, instituições renomadas, nas quais são cobradas altas mensalidades

escolares. Tais escolas carregam um status de escolas de qualidade, atraem um

perfil de famílias possuidoras de elevado capital cultural e, por vezes, econômico. A

Referência a esses estabelecimentos aparece nos trechos dos entrevistados:

Bom, ela estudava no Instituto Capibaribe, caso não fosse aprovada no CAp continuaria no instituto até concluir o ensino fundamental ( F; M; FPF) . No Damas. Todos os três estudaram no Damas. Minha família tem cadeira cativa na instituição (M; M; PL). Estávamos definindo isso... Possivelmente o Equipe... não tínhamos nada fechado. Ela estudava no Ethos, as amiguinhas iriam para o Equipe e ela queria acompanhar. Moramos em Casa Forte, estávamos nesse impasse... (F; M; PL) Eu estudava no Arco-Íris, antes dele eu frequentei uma creche na Universidade de São Paulo (F; 7; EPR; PU)

A filha de professores universitários frequentou a creche da USP, quando lá

residiam, o que de acordo com os pais, despertou o desejo de submetê-la ao exame

de seleção para o Colégio de Aplicação. Alegaram que a experiência na USP de

almoçar todos os dias com a família e poder acompanhar a filha nas atividades

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diárias era muito gratificante. Ao ingressarem na UFPE, não quiseram abrir mão

deste privilégio.

Em resumo, a escola atrai um perfil de estudantes bem-sucedido

provenientes das camadas médias intelectualizadas. Em sua maioria, o grupo é

composto por filhos de professores universitários e servidores públicos, pais com

elevada escolaridade, tendo a maioria diplomas de especialistas, mestres e

doutores. A composição do grupo explica, em parte, a excelência da instituição. O

mérito da excelência não pode ser creditado, unicamente, a escola, mas advém da

união de diversos fatores favoráveis à escolarização. A instituição federal de ensino,

a titulação de seus profissionais, os métodos de ensino e a ambiência universitária

aliados as características do grupo, que acessa escolas de excelência são fatores

determinantes dos êxitos escolares e do prestigio institucional.

5.4.3. Sentidos compartilhados sobre o Colégio de Aplicação da UFPE

Dos depoimentos resultantes das entrevistas realizadas com pais (10) e

estudantes (10) emergiram três categorias, a saber: “O CAp como instituição de

Excelência”, “O CAp como instituição que preza pela formação integral

[desenvolvimento das potencialidades individuais, aprendizagem

individualizada] e humanização do sujeito” e “ O CAp como trampolim para a

realização pessoal, profissional e sucesso futuro dos estudantes”. Ressaltamos

que essas categorias são interdependentes e tecem a rede simbólica, que perpassa

o objeto estudado. Desta forma, nenhuma categoria deve ser tomada de forma

isolada.

5.4.3.1. “O CAp como instituição de Excelência”

Nos depoimentos dos pais e estudantes o CAp da UFPE, aparece como

instituição pública bem sucedida, com propostas inovadores e diferenciadas. Para os

sujeitos, o fato de ocupar lugar privilegiado na hierarquia escolar estadual e nacional

confere ao CAp-UFPE o título de instituição de excelência. “Um colégio público de

qualidade” que deveria servir de modelo às demais instituições públicas de ensino.

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Conforme os participantes, instituição de qualidade é aquela que consegue reunir

recursos humanos qualificados, construir uma proposta educacional desafiadora e

diferenciada em “currículo, programas, metodologias, normas e atos concretos do

dia a dia escolar”; trata os alunos em sua individualidade, permite que estes

vivenciem processos educacionais integrais e, como consequência, obtenham

resultados exitosos. O atributo qualidade, de difícil conceitualização, aparece como

desencadeador de excelência escolar.

Apesar de ter sido um termo pouco evocado na primeira fase da pesquisa

“excelência” aparece no discurso dos nossos sujeitos com bastante ênfase no

momento da entrevista. Esse termo precede qualquer explicação acerca dos fatores

que diferenciam o CAp-UFPE das demais instituições de ensino públicas e privadas.

A excelência é o principal termo do discurso, está presente em toda e qualquer

tentativa de tornar inteligível o processo de ensino e aprendizagem que ali ocorre e,

como dito anteriormente, aparece atrelada a qualidade.

É unânime no discurso de pais e estudantes que o grande trunfo do CAp-

UFPE está nas pessoas. O fato de possuir uma equipe de profissionais qualificados

e alunos altamente selecionados impressiona pais e estudantes, estes seriam em

conjunto com outros fatores a razão maior da excelência do ensino e da

aprendizagem que ali ocorrem. Eis alguns depoimentos que atribuem a excelência

escolar à qualidade dos profissionais e à seleção dos estudantes:

O melhor ensino. A excelência está no ensino e na aprendizagem. Excelentes professores, excelentes alunos, excelência no processo e nos resultados. Não tem como ser diferente- eu acho!( F; M; FPF) Ele se diferencia pela formação dos professores. Porque, você sabe, são praticamente todos com mestrado e doutorado... A grande maioria é doutorado, então a gente tem uma preparação boa e que muitos colégios não conseguem ter esse nível de professor em sala de aula. Não desmerecendo nenhum deles... (F; E; PL) O CAp pra mim é sinônimo de excelência. O ensino de qualidade, os professores, os alunos, tudo aqui é de excelência com exceção da estrutura... (M; E; FPF) Porque... Lá no... Lá no Colégio... É uma educação diferenciada. A maioria lá tem formação até o doutorado, o método de ensino é diferente também... Lá é uma escola que deixa você com a mente bem aberta. E... deixa eu ver... Nós temos um SOE. O SOE é bem legal que... Tipo, quase... Tipo, quase nenhuma Escola eu acho que tem esse... Pelo menos eu nunca ouvi falar de nenhuma Escola que tem o SOE. Tipo... Que tenha aulas com o SOE (F; 7; EPR; FPF).

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Antes de ser aprovada eu pensava que o colégio era assim: todos matando aulas e bons professores dando aulas igual a faculdade. Quando cheguei lá eu encontrei que... Praticamente ninguém matava aula, os professores ficavam na sala de aula. Era tudo muito disciplinado, nada bagunçado. Ham... Eu pensei que tinha diretor também, só para ser diretor, que o diretor não era professor... Mas os coordenadores, diretores, são todos professores (F; 6; EPR; FPFM/PL). O coordenador é o professor do meu filho. Eu acho muito legal isso de professor, diretor, orientador do SOE estarem em sala de aula, fazerem junto a escola. Eles e suas qualificações... o que fica para mim é a integralidade do processo mesmo (M; M; PL)

Nos trechos anteriores, a qualificação dos profissionais faz parte das

representações dos pais e estudantes do colégio de excelência. O diferencial da

instituição é, em parte, explicado pela qualificação desses profissionais, que atuam

na sala de aula e na gestão escolar. Chama atenção a fala da aluna que pensava

encontrar na instituição práticas “universitárias” de frequentar a aula quando lhe

conviesse, que se depara com a seriedade acadêmica e disciplinar da instituição. No

trecho merece destaque ainda a clareza de que “todos fazem a escola” na qual o

diretor, orientador do SOE, ou coordenadores são também professores, funções que

associadas aos títulos de mestre e doutores parece creditar maior fidedignidade ao

ensino.

Os estudantes enfatizam a autonomia dos profissionais do colégio, fator

que confere ao profissional maior liberdade crítica e criatividade para utilizar

metodologias, que considerar favoráveis ao aprendizado dos estudantes. Eis

algumas das passagens que reforçam essa afirmação:

Eu acho... Assim, sempre que a gente tá em sala e tal, os professores falam isso com a gente. Eles falam que... E eu entendi depois de um tempo, que os professores aqui têm a liberdade de fazer os que eles querem, as propostas que eles acham mais interessantes, eles podem perguntar a gente o que a gente acha das coisas e a gente pode opinar também. E essa liberdade de trabalhar o material, o conteúdo, vai nos ajudar a compreender melhor e também pode ajudar o professor a fazer coisas que ele acha mais interessante. Não, não sei... Cumprir um cronograma, ou um calendário já proposto pela escola não torna a aprendizagem mais fácil, entende? Interessante mesmo é ir moldando no processo... (F; 9; EPU; PEB)

No colégio de Aplicação, por exemplo... Quando que você vai poder pegar uma aula pra assistir um filme? Outro dia ela, ano passado, ela assistiu um filme: Procurando Nemo. A gente já assistiu várias vezes Procurando Nemo. A professora foi e colocou Procurando Nemo... Gisele, mas veio cada pergunta cabeluda daquele tal de Procurando Nemo! Que você... Você... Você... Eu passei a olhar o filme com outros olhos. Então, o assunto de

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geografia abordava o fundo do mar, aquela parte mais escura do mar... Hidrografia. Então ela fazia uma série de perguntas... E eu falava: - Mas isso está em procurando Nemo? Entendeu? E eu vejo que isso não acontece nas escolas públicas. Onde que você pode, onde que um professor numa escola pública, desculpa, particular, ou até pública que seja, pode deixar os alunos assistirem um filme? Provavelmente a direção vai dizer que ele estar enrolando... E lá eles botam pra assistir o filme e... eles que não assistam pra vê se eles conseguem responder aquelas perguntas lá, entendeu? ( F; D; PU) Fico impressionada com a condução das disciplinas pelos profissionais. Eles têm liberdade para fazer escolhas junto aos estudantes... Outro dia minha filha chegou em casa e relatou um momento em que o professor questionou os alunos sobre qual atividades eles preferiam. Não lembro ao certo, mas eram duas sugestões de atividades... Uma livre e outra mais direcionada... penso que só daria tempo de fazer uma pois estavam concluindo o semestre ou algo do tipo. Minha filha relatou como se fosse algo habitual esse diálogo entre professor e aluno. Isso foi no primeiro ano dela no CAp, depois eu também me acostumei com esse processo (F; E; PL). A autonomia do professor do CAp também é a autonomia do estudante... Eles dizem assim- vai lá e faz, pesquisa o conteúdo, corre atrás. Numa instituição privada a direção detonaria o profissional, numa instituição pública municipal ou estadual provavelmente ele seria rotulado de preguiçoso, mas ao contrário ele faz o aluno se responsabilizar por sua própria aprendizagem... Assim, mas eles têm um público que acompanha o ritmo, a metodologia deles, entende? ( F; E; PEB)

O incremento dessa autonomia é o diálogo aberto com os estudantes e o

desenvolvimento de atitudes responsivas. Responsabilizar-se pela própria

aprendizagem, dialogar abertamente com os profissionais constituem elementos

imprescindíveis a aprendizagem dos alunos. A autonomia inclui ouvir o estudante

em sua individualidade, questioná-lo sobre o processo, deixá-lo construir junto aos

profissionais seu repertório teórico, seus conhecimentos científicos. Quando a mãe

afirma “Eles dizem assim - vai lá e faz, pesquisa o conteúdo, corre atrás!” E, em

seguida diz que aquele público acompanha esse tipo de metodologia, ela está a nos

dizer que os profissionais conferem aos estudantes tarefas que eles têm maturidade

intelectual para cumprir, constroem o conhecimento, realizam associações e

discutem com os docentes.

Uma característica muito forte destacada pelo grupo pesquisado é no CAp-

UFPE: professor e aluno trocar ideias sobre os diversos assuntos e consultar em

seus domínios científicos. A instituição concebe o estudante como ator do processo

de ensino aprendizagem, promovendo a quebra da relação instrumental “um ensina,

o outro aprende” e possibilitando ao discente construir-se como sujeito do próprio

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conhecimento. Ao ter atitudes como “consultar o aluno em seu domínio” a instituição

parece considerar o diálogo como facilitador da aprendizagem, negando a relação

verticalizada entre professor e aluno, onde o professor é a principal fonte do

conhecimento verdadeiro, na qual não há diálogo com outras formas de

conhecimento. No contexto cibernético que essas crianças vivem não cabe mais

“oráculos”, pois elas são constantemente bombardeadas com informações de fontes

diversas, necessitando da mediação de aprendizagens a construir. Como sugere

Cunha (1998), as novas demandas sociais requerem outras formas de conceber o

conhecimento, o ensino e a pesquisa, consequentemente práticas pedagógicas

exitosas.

A seleção de ingresso realizada no colégio também aparece como fator de

excelência, que formata um grupo de alunos predispostos à ação pedagógica do

colégio. Os participantes da pesquisa creditam não apenas aos professores, mas,

também, aos alunos o mérito dos resultados escolares, conforme revelam os trechos

que se seguem:

É que assim... Eu acho que... Se ele é um Colégio que tem a seleção, não é qualquer um que entra lá. Eu acho que e por isso também que ele tem a qualidade, porque esse exame ele seleciona os melhores ( F; E, PEB). Penso que os melhores estudantes e os melhores professores são os responsáveis por produzir a excelência escolar. A gente tem isso no CAp... alunos que não tem as dificuldades frequentes aos demais estudantes... ao contrário tem muito potencial a desenvolver e estão habituados a maratona de estudos, as exigências e estímulos cognitivos da própria escola (M; E, FPF). A clientela é diferenciada demais! Sempre observava o comportamento dos estudantes do colégio de aplicação e percebi que eles tem posturas diferenciadas, eles não dão muita trela para as pessoas... Pode perceber- os meninos se relacionam entre si. Perceba as conversas também, os papos pelo campus... Também tive amigos que estudaram no aplicação, são pessoas altamente articuladas e que sabem se posicionar na vida... Eu quis isso para o meu filho. (M; E, FPF)

A excelência escolar do CAp é atribuída, em parte à autonomia intelectual

dos estudantes. Eles estão aptos a fazer associações, a lidar com grande volume

de informações, assimilam de maneira satisfatória os conteúdos, participam do

debate, se expressam com mais autonomia e clareza e são, frequentemente,

estimulados em todos esses fatores são favoráveis ao êxito escolar.

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A triagem promovida, na seleção de ingresso, faz com que a escola receba

um grupo de estudantes com disposição para o estudo, bem preparado para a ação

pedagógica da instituição, permite a adequação das propriedades socioculturais dos

selecionados ao estilo da escola. A ação escolar faz-se sobre uma população já

motivada e com habitus favoráveis à sua atuação.

Nos depoimentos, merecem destaque as inquietações dos sujeitos, no que se

refere à imagem que a comunidade acadêmica e a sociedade em geral construíram

deles por pertencerem a uma instituição de excelência. Os estudantes, por vezes,

são rotulados de “nerds” e “prodígios”, no entanto alguns não se reconhecem com

esse perfil. Em tais associações, a inteligência aparece como tendo suas raízes em

aspectos unicamente biológicos, visão que desconsidera a socialização das

crianças, os estímulos familiares e a preparação, que fizeram para ingressar no

colégio. Assim, a aprovação no processo seletivo é atribuída às manifestações de

“inteligência” e do “dom”. Nos trechos a seguir, podemos perceber como pais e

estudantes se posicionam em relação a essa rotulação:

É... Algumas pessoas quando me perguntam qual o Colégio que eu estudo, quando eu falo fica... Já tem aquela imagem de que quem estuda no Colégio de Aplicação é inteligente, “né”? Conseguiu fazer a prova e passou-pronto. É um prodígio! Eu não sou prodígio, nem gênio, nem sei lá o que! Eu não nasci sabendo... As pessoas pensam isso, sério! ( F; 8; EPR, FPF) Assim... A principal diferença é quando você vai e fala que é do Aplicação, aí eles olham pra você e fala: - Nerd! Mas, fora isso... Não. Talvez eu seja, mas não me sinto superior, ou algo do tipo... Deles! (F; 9; FPU; PEB) A gente não paga é claro! É pública. Olha, a gente tem que ter muito cuidado porque as pessoas... Tem pessoas que vêem como se a gente tivesse... – Estuda onde? – No colégio de Aplicação. Aí pensam que as meninas são inteligentes demais... Ou... É difícil de lidar com, isso, porque a gente quando diz, as pessoas pensam que a gente esta querendo se vangloriar disso. A gente tem que ter certo cuidado... A gente sentiu isso, sentiu muito isso. Tiveram muitas crianças que concorreram e não conseguiram passar, as pessoas devem pensar: as duas estudam lá? A terceira está se preparando também? Como elas conseguem? Tem colégio que não consegue colocar ninguém. Então, a gente teve que se precaver enquanto a isso também... (F; E; FPF)

Separados dos alunos de outras escolas pela marca distintiva que carregam

de “alunos do Aplicação” os estudantes parecem possuir propriedades, que os

diferenciam “naturalmente” dos das escolas de fora (LACERDA, 2008). Mesmo não

se reconhecendo como superiores, os estudantes reconhecem que são privilegiados

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por fazer parte do grupo seleto de alunos da instituição, como podemos perceber no

depoimento de uma estudante do CAp:

Eu me sinto igual a todos os outros. Claro, tive o privilégio de ser aprovada na seleção, de meus pais pagarem um cursinho, me ajudarem a passar... Na outra escola eu me considerava a mais inteligente, a melhor da turma. Hoje eu sou igual a todos porque estudo com pessoas tão inteligentes ou mais do que eu. Talvez a gente esteja a frente dos alunos dos outros colégios, mas isso não me torna melhor do que ninguém (F; 8; EPR; PEB)

A produção de qualidade das escolas consideradas de excelência deve-se

muitas vezes a fatores externos ao ensino. Brandão (2007, p.17) acredita que “há

uma via de mão dupla no processo de escolha da escola/ alunos”. As famílias e os

estudantes escolhem, mas também, são escolhidos. A escolha como via de mão

dupla nos foi primeiramente apresentada nos escritos de Bourdieu (1989, p.198):

“[...] não é jamais possível, em todo caso, dizer com segurança quem, entre o

agente e a instituição, escolhe realmente; se é o bom aluno que escolhe a escola ou

se é a escola que o escolhe”. Tal escolha é própria do perfil institucional. A

característica das instituições de excelência requer uma formatação do grupo seja

por altas mensalidades ou seleções de ingresso no intuito de garantir a

homogeneidade do alunado. O fato das práticas educativas familiares e escolares

estarem ajustadas, serem coerentes e convergentes faz dessas instituições “ locus

de produção das elites escolares” (BRANDÃO, 2007).

Nos trechos a seguir, há, fortemente, uma identificação com o tipo de ensino

vivenciado na instituição. Por inúmeras vezes, no diálogo com pais e estudantes,

percebemos que suas falas revelam um sentimento de pertença e identificação com

as concepções, valores e ensino praticados no CAp-UFPE. Afirmam:

Eu procurei saber também, entrei no site, pesquisava. Vi que a maioria dos professores tem, realmente, doutorado, tem mestrado... Então, eu tive a certeza que estávamos almejando o lugar certo. A excelência do ensino do CAp é perceptível nos alunos, nos professores, no processo todo- entende? (M; E; FPFM) Veja bem, é... Até então eu não conhecia... Eu conhecia o colégio do que eu ouvia falar do pessoal. Quando a Maria Eduarda entrou pro colégio, eu tive... Participei de reuniões, eu vi a postura dos professores, eu vi o interesse... O modo como eles nos receberam, a postura, as ideias. Aí isso tudo cativou, eu pensei: “Estou no lugar certo!” Então, eu acho que é por aí. E eu sempre que posso e tem uma reunião eu vou, vou participo... Ela

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(esposa) nem vai, eu que gosto de ir, eu comecei a acompanhar desde o início, então eu gosto de ir. E... eu entendi isso, isso é que é importante também... A responsabilidade do Colégio com os alunos, a preocupação, é... é... O diferencial dos professores. A coisa pública e tudo, mas eles são diferentes. Até onde eu pude perceber nas reuniões, eles são realmente diferentes, eles são dedicados ao colégio e isso faz uma diferença muito grande. E junto disso tudo, o que eu estou notando é a qualidade da coisa, sabe? Até então, até o momento estou satisfeito. Até a gente conversa e eu pergunto isso pra ela, se ela esta gostando, se ela quer sair e ir por GGE. E ela fala: “ Não. Quero não. Quero ficar lá!” (M; E; FPFM)

Outro trecho que reafirma o fato das famílias se identificarem com a

instituição é revelado a seguir:

Eu costumo dizer que Ana se encontrou quando chegou no CAp. A impressão que temos é que o colégio foi feito para ela, para aquele grupo de estudantes. É impressionante a diferença entre o desempenho dela na escola anterior e na atual. No CAp ela conseguiu se afinar e se alinhar aos demais, aos professores, às metodologias. Apesar de todas as pequenas diferenças que possivelmente existam entre os alunos de ordens econômicas, culturais... Sabemos que existem crianças que moram na zona sul, zona norte, pais médicos, doutores, trabalhadores, alguns casos até de crianças vindas de escolas públicas, penso eu... Enfim, há uma diversidade, mas elas de certa forma têm muito em comum... É isso que percebemos... A Ana se encontrou no CAp, ela adora aquilo ali. Os colegas são ótimos, todos de boa família. E nós estamos extremamente satisfeitos (M; D; PHD; PU) .

Esse sentimento de identificação surge como afinidade espontânea (vivida

como simpatia), é o que “aproxima os agentes dotados de habitus ou gostos

semelhantes, logo, produtos de condições e condicionamentos sociais semelhantes”

(BOURDIEU, 2009, p.90). A seleção de ingresso realizada pelo CAp formata um

grupo distinto, também, em escolhas, alunos com propriedades sociais e culturais

próximas nas aspirações e nas perspectivas de futuro, que estão estritamente

relacionadas à escolha do CAp como instituição de ensino.

Os alunos se reconhecem pertencendo a uma instituição de excelência, a um

grupo distinto. Como grupo homogêneo prezam pela convivência entre si, constroem

laços de amizade e solidariedade, que extrapolam os muros da instituição. Muitos

deles são amigos em horário integral, convivem nos finais de semana, promovem

festas e encontros semanais com a turma, estudam juntos, constroem uma amizade,

que se estende por toda uma vida. Os transcritos abaixo explicitam as afirmações:

Tem as festas. Praticamente toda semana temos que levá-la nas festas. Daí, semana passada foi na casa da Bia, já fizemos aqui no prédio e por aí

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vai. Festinha sabe... Eles colocam música, se divertem, compram bolo, refrigerante, saem para comer pizza, marcam piscina, viagens... Isso é muito bom, nos relacionamos com outros pais, trocamos uma ideia bacana... Conversamos... Com alguns, temos mais afinidade pela profissão e tal, mas no geral temos gostos comuns e a maneira de conduzir os meninos... É legal conhecer a fundo os amigos da nossa filha. O nosso grupo de amigos é pequeno, tem o pessoal do prédio e os familiares. Após a aprovação de Ana convivemos com outros pais do CAp ( F; D; PU). Meus amigos são todos herança da convivência no CAp. Percebo que com meu filho acontece o mesmo... Os garotinhos vem até nossa casa para estudar, trocam ideias... Fico admirando os laços que vão se formando e se fortalecendo com o tempo. Eles são todos amigos, uns mais próximos, outros menos, mas se dão muito bem ( M; M; PL). Porque no Arco-Íris eu tentei... Era uma turma pequena, eram sete alunos no final. Agora não, agora a gente tem aquela comunidade do CAP sabe? Eles programam festas, nós vamos, vão outros pais... Então, até o nosso ciclo de amizade aumentou por conta do Colégio, porque os pais estão sempre ali... A gente solta, mas está ali de olho, aquela coisa. Então, nosso ciclo de amizade aumentou, nós conhecemos pessoas muito interessantes, muito bacanas. E... eu acho que abriu mais assim pra gente, né? (F; D; PU)

O convívio dos alunos do CAp amplia a rede de relações familiares. E, nessa

convivência, há um acúmulo de capital social. Este capital é adquirido através de

relações objetivas de proximidade pautadas em trocas simbólicas. Essa proximidade

envolve sentimentos de reconhecimento e respeito, relações de reciprocidade e

confiança entre os membros (CAZELLI; FRANCO, 2006). A convivência, para

Bourdieu (1980), traz benefícios materiais ou simbólicos, agrega recursos atuais e

potenciais qualitativos ao sujeito. O volume do capital social dependerá da extensão

da rede de relações, que o agente poderá efetivamente mobilizar.

Os sujeitos atribuem, ainda, à excelência do CAp ao trato aprofundado e

interdisciplinar dos conteúdos e incentivo à pesquisa. Os pais reconhecem que

a instituição preza por trabalhar os conteúdos de maneira complexa, evitando

superficialidades, de forma diferenciada para atender a todos, promovendo de fato a

aprendizagem, as relações entre os conteúdos, as inferências, as diferentes

interpretações, soluções e não a simples memorização. Os discentes são

estimulados constantemente a questionar os conteúdos, a tratá-los em sua

complexidade, aprofundando-os, buscando os sentidos e vivenciando o processo de

transposição didática junto aos professores.

A pesquisa articula-se ao ensino no dia a dia da escola, portanto,

transformam conhecimento cientifico em conhecimento escolar junto com os

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docentes. Os alunos também produzem conhecimento ao promover oficinas de

robótica, semana da ciência, e através dos grupos de pesquisa orientados por

profissionais do CAp. Vejamos como esses sujeitos percebem tal trato aprofundado

e interdisciplinar dos conteúdos e o incentivo à pesquisa no CAp-UFPE:

Eu acho que é essa questão do método de ensino... Que eu acho que é justamente isso... Eu querer... Na verdade eles fazem lá um curso de pesquisa... Procure aprender! Eu assim... Gosto disso. Leitura... Ela, agora mesmo em português, tem trinta alunos, então cada aluno no início do ano teve que levar um livro, pedido pela professora. E isso está fazendo rodízio, quer queira, quer não, esse ano eles vão ler trinta livros, no mínimo. Isso faz com que o aprendizado seja melhor, né? Então, a escola mesmo estipula dois, três paradidáticos, faz uma prova em cima daquilo e ali acabou. Eles não. Eles têm o debate na sala, estuda o livro, faz resenha. Eu acho que o diferencial é isso, é o método mesmo de ensino ( F; E; PEB)

A proposta de ensino deles é boa nessa questão do incentivo à pesquisa, de colocar uma aula de música com uma proposta de entender o universo de música, como se estivesse fazendo até uma universidade de música... Eu vejo assim. Quer dizer, você só vai ter noção do universo de música se você entrar no conservatório, né? Mas dentro de escola é: - Ah... Vamos cantar! Não tem aquela coisa de você ver a nota musical, de você começar com flauta, que eu nem sabia que tinha que ter um princípio com flauta, depois ir pra violão, pra depois evoluir pra um outro aparelho, outro equipamento. Eu realmente não sabia... Vejo o trabalho de educação de artes, também bastante diferenciado, te dá um universo de traçado, de composição de cor. Eu acho... Eu acho diferente nesse... Estou citando essas duas, mas eu vejo que existe um diferencial nesse aspecto: aprofundamento do aluno ao conhecer cada matéria (F;E;PL) Na educação. O Arco-Íris, ele é legal... Mas, só que assim... Às vezes eu achava ele muito atrasado. Assim, se você comparar com o CAp. Por exemplo, meu vô mesmo brinca comigo, antes minha tarefa era: uma maçã mais duas maçãs. Agora no CAp é a raiz quadrada de trinta e cinco. É tipo isso! (F;8;EPR;PU) Ele se diferencia de qualquer outra instituição pela qualidade do ensino. Isso é notório. Na escola anterior tudo era mais fácil, mais leve, mas também mais superficial. Aqui tudo é mais difícil [ no sentido de você pensar mais], mais complexo, mas não pesa porque a gente entra no ritmo (F; 9; EPU; PEB) A... Eu... Eu queria sempre me livrar de ter que estar botando ela pra fazer tarefa. Como ela falou, as atividades do Arco-Íris, assim... Claro, sem questionar a qualidade do ensino, nada. Mas eram assim: Eu tinha três picolés, chupei dois. Com quantos fiquei? Aí depois vem a tarefa do Colégio de Aplicação: Eu tinha três picolés, acrescentei mais cinco, chupei dois, comprei outros cinco e depois emprestei mais três pro meu amigo... Num sei que. Quantos picolés eu fiquei? Entendeu? A complexidade que vem, que bota os alunos pra pensar mais. Esse estímulo que eles dão para as Olimpíadas, pra os alunos fazerem as Olimpíadas nas diferentes áreas, né. Eu acho que tudo isso estimula o raciocínio do aluno (F; D; PU).

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É... é... Eu acho que... Porque... é... Os outros colégios você, por exemplo, você tá estudando história, aí você ler o livro, vê as perguntas e responde, e na prova você bota tudo decorado, exatamente o que você leu. Os professores lá, eles... É... Eles perguntam coisas que eles falaram só, conversou, não pergunta nada do livro, ou fichas que eles dão pra gente ler. Aí eu acho que eles não querem que você responda decorado, quer que vocês responda o que você entendeu (F; 8; EPR; PEB).

Como podemos perceber nos trechos precedentes, a capacidade de manter

os estudantes motivados e desenvolver o seu senso crítico e criativo torna-se

perceptível aos sujeitos nos atos concretos do dia a dia escolar. A instituição

mantém os alunos envolvidos no processo, garantindo sua adesão ao projeto

educativo.

Nos diálogos, os sujeitos comparam a instituição federal com as estaduais e

municipais. As comparações perpassam de certa forma todas as entrevistas e

referem-se às condições estruturais, destinação de recursos, ambientação,

qualificação dos profissionais e ao público diferenciado. Tais fatores conferem êxito

ao ensino público. A diferenciação ocorre também em relação ao colégio privado,

ganham destaque as finalidades da educação, a crítica à educação mercadológica e

resultados, que parecem comprovar ter o ensino público nacional condições de

superar o ensino privado.

Pais e estudantes recorrem à ambientação universitária para explicar os

êxitos escolares dos estudantes e o leque de possibilidades de escolhas

profissionais, que se abrem para o futuro. O fato de ser mantido e desenvolvido pelo

sistema público federal contribui para sustentar o status de colégio modelo. As

justificativas abaixo são esclarecedoras quanto a essa questão:

Eu acho muito interessante toda a dinâmica do Colégio, principalmente pelo fato que ele se encontra dentro de uma Universidade. Você tem uma vivência de um mundo maior e você... Você tem seus horizontes expandidos. Você não fica dentro de uma caixinha (F; 9; EPU; EPB). Sempre ouvia das pessoas... É um Colégio muito bom, muito puxado. As pessoas de lá sempre sabem mais, elas vão passar na Universidade e etc... (M; 6; EPR; FPF) Além dele ficar dentro de uma Faculdade Federal, o ensino dele é melhor, tem atividades diferentes... (M; 7; EPR; PL) Veja bem, é um colégio de qualidade e público, entendeu? Então foi uma coisa financeira junto com a qualidade. Porque se fosse só financeiro não teria ido, porque meu filho estuda no GGE e ela já estava se preparando também pra ir pro GGE. A gente já ia tirar ela do Dourado, porque a gente...

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Ela já estava numa idadezinha que a gente queria passar ela pro GGE. O GGE tem umas atividades a mais, o colégio tem mais... Não que o Dourado... O Dourado também é um bom colégio, tenho nada que dizer do Dourado, não. A gente gostou muito, ela estuda lá desde os dois anos, muito bom o colégio. Mas, a gente já estava numa visão de passar ela pro GGE, porque a gente também já estava gostando do GGE e tudo. Mas... É a qualidade e ser público, né? O grande motivo é esse: é um colégio público, não vamos pagar nada e é um colégio de qualidade, ou seja, é como todos os colégios públicos deveriam ser. A verdade é essa (.M; E; FPFM) É o melhor ensino, não há dúvidas disso. Deveria servir de modelo para as demais escolas públicas... E se isso não ocorre é triste porque é uma experiência de excelência que deveria ser levada a todas as instituições públicas municipais e estaduais. Bom, mas sabemos também que por ser federal, estar dentro da universidade, ter professores qualificados e alunos criteriosamente selecionados a coisa pública funciona com outra cara. Por isso não dá pra comparar o CAp com a escola municipal do meu bairro, nem com as privadas que estampam outdoors por todo o Recife ( M; G; PL)

Ainda nos dois últimos trechos, os pais criticam o fato de outras escolas

públicas não terem a mesma qualidade do CAp, mas acreditam que a ambientação

universitária, juntamente, com a qualificação dos profissionais e a seleção dos

alunos explicam a diferenciação da instituição e conferem qualidade ao ensino

público. Importante enfatizar que não há um único modelo de escola pública, ainda,

que a sociedade tenha esse entendimento. As diferenciações não se limitam à

polaridade entre os segmentos público e privado, mas no interior do próprio sistema

público de ensino, há uma hierarquia perceptível, que coloca os colégios públicos

federais em destaque pelos desempenhos alcançados e por possuírem

características atribuídas ao ensino privado. A polaridade se desloca do público

versus privado e passa a ser, então, entre a escola pública de qualidade e a escola

pública precária (ALMEIDA, 2009).

Aliado ao fato de proporcionar ensino de qualidade, ao terem seus filhos

aprovados no CAp, os pais conseguem se libertar das altas mensalidades cobradas

pelas instituições escolares de prestígio da região, isto de início é um atrativo para

os pais. Eis o que dizem os pais do CAp:

O fato de não pagarmos mensalidade é um dos atrativos. Depois que os meninos são aprovados você percebe que é apenas um deles... (M; G; PL)

A excelência escolar das escolas de prestígio não é gratuita, não há

gratuidade nas escolas públicas porque alguém sempre paga a conta. A educação é

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um bem pago por toda a sociedade, o público usuário da rede privada paga pelo

bem duas vezes. Enquanto um grupo seleto de estudantes se beneficia com o

ensino de excelência, a milhões de crianças e adolescentes é reservada a escola

pública de baixa qualidade onde estes sequer conseguem aprender a ler e escrever.

Importante sublinhar a afirmação de um dos pais que prevê turmas pequenas,

máximo 30 alunos, pode ser uma estratégia de ensino da instituição, estratégia que

possibilita ao professor “educar individualidades”. O CAp aparece assim como local

onde individualidades são educadas, promotor de aprendizagens individualizadas.

Eis o trecho do depoimento:

Percebo que ali há uma individualização das aprendizagens. Isso é perceptível quando conversamos com os professores nas reuniões, todos conhecem o desempenho de nosso filho, as particularidades dele. Claro, isso só é possível em turmas pequenas. Um professor que tem 50 alunos por turma perde isso, esse contato mais individual... (M; E; FPF)

Os sujeitos fazem referência ainda às atividades diferenciadas realizadas

na instituição. Conforme pais e estudantes, o CAp utiliza as metodologias mais

adequadas à produção do conhecimento. As propostas educativas buscam a

participação dos alunos com aulas dinâmicas e o estimulo a criatividade. Os alunos

são envolvidos em atividades práticas, interdisciplinares e criativas. Os sujeitos

assim as descrevem:

Eu acho que ele não traz aquele conteúdo predeterminado, eles vão construindo... Eu não sei dizer como é, eu sei que as crianças elas se desenvolvem pelo interesse que eles despertam nelas. Não é uma coisa bitolada, é uma coisa que você vai fazendo... Minha filha já fez curta metragem, já fez várias coisas. Num colégio tradicional, num colégio particular que nós temos agora, não oferece esse tipo de atividade, são atividades diferenciadas que tem aqui (F; E; FPF) E tem muitas atividades assim... Eles passam uns trabalhos, te umas resenhas, tem uma série de eventos... Como se fosse uma feira de ciências, mas com outro nome. São eventos assim, que vem do aluno, vem da criatividade do aluno, não tem nenhum professor conduzindo. Vai fazer a festa de São João? Vai! É vocês que vão fazer, não vai ter nenhum professor que venha conduzindo. Então, aquilo que a gente vê, bonito ou feio, partiu dos alunos. Não teve nenhuma orientação. Então, eu acho que isso estimula a criatividade deles, a responsabilidade deles, e isso é que vai garantir um futuro melhor pra eles (F; E; PEB). Eu nunca pensei que meu filho aprenderia Robótica. Chego no CAp e ele [o mais velho] começa a estudar robótica... Aquilo pra mim parecia surreal de acontecer na educação básica (M; M; PL).

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É uma amostra da universidade. A gente brinca aqui em casa que as meninas são mini universitárias... Isso pra mim só é possível porque eles tratam os conteúdos de forma diferenciada e os alunos nem percebem, mas eles os tornam cada vez mais complexos e os alunos conseguem acompanhar (F; E; FPF).

Para os pais, as atividades são diferenciadas também por incluir no

currículo escolar estudos aprofundados de música, arte, língua inglesa e

francesa, algo incomum no ensino público nacional e, até mesmo, em

instituições privadas. Os depoimentos a seguir são esclarecedores do que

dizem a esse respeito:

Eu acompanho o ensino, vejo o desenvolvimento dela, no escrever, nessa parte de arte que eu achei interessante. Ela já está com a flauta aí aprendendo a tocar, já sabe notas musicais... Eu estou achando legal... A convivência, às vezes as amigas dela comparecem aqui, as meninas bem bacaninha. Eu acho que tá legal, é isso aí! Realmente atingiu a minha expectativa (M; E; FPFM). A fluência no francês é um diferencial, as aulas de teatro, as aulas de arte e de música... Deixa ver o que mais... Os meninos escrevem, produzem redações em francês, tocam instrumentos musicais... Eles aprendem de fato não é apenas para cumprir tabela (M; PHD; PU). Tem atividades diferentes porque, em outros colégios tem artes, mas não é como o nosso... Porque no Dourado tinha no sexto ano... Que eu fiquei no início do ano porque eu fui remanejada. Aí lá tinha artes, só que não era a mesma coisa, não ia pra uma sala e ficava mexendo com tinta, com cola. A gente meio que desenhava e vi algumas palestras. Aí tem isso, tem aula de música, teatro, que eu nunca pensei na minha vida ter. Ham... Informática. Que informática é diferente, não é tipo... O professor dá uma atividade pra você fazer no Power Point, você faz e depois vai jogar. Lá não, você meio que aprende bites, bytis, esses troços aí. Ham... O ensino também, que eu já falei. Ham... Acho que só! (F; 6; EPR; FPFM)

Chama atenção a fala do pai, que destaca que os estudantes realmente

aprendem, não é apenas “para cumprir tabela”. Isso demonstra o empenho dos

professores em construir conhecimento junto com os estudantes e a capacidade de

mobilizá-los e envolvê-los no projeto educativo institucional.

Os alunos são constantemente instigados e estimulados a pesquisar, a

questionar, a aprofundar os conteúdos, que compõem o programa de ensino.

“Contribuir para a formação crítica do estudante.”, frases como esta que fazem parte

de todos os projetos políticos pedagógicos de instituições públicas e privadas,

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ganham sentido prático na instituição. Todos os sujeitos entrevistados enfatizam que

a formação crítica é o grande trunfo da instituição. Para eles os “alunos pensam de

forma integral e são questionadores porque há uma interdisciplinaridade real”, o

colégio tem como “prioridade a formação crítica”.

Essa formação crítica faz parte das intenções formativas da instituição.

Conforme Masetto (2008), a sala de aula deve ser “espaço que permita, favoreça e

estimule a presença, a discussão, o estudo, a pesquisa, o debate e o enfrentamento

de tudo o que constitui o ser (...), existindo numa realidade contextualizada temporal

e espacialmente” (p. 74). Os trechos das falas abaixo transcritos nos ajudam a

compreender o que os sujeitos entendem por formação crítica:

Somos desafiados em tudo! A nossa formação crítica vem desse desafio, do desafio que os professores nos propõe, eu acho! De superar e ampliar a nossa capacidade de aprender. Nós buscamos aprender, pesquisamos, nem sempre é o professor que chega com tudo arrumadinho, se ele chegar, a turma desarruma tudo (risos) ( F; 8; EPR; FPE) Eles ensinam a gente a pensar, a questionar, a voltar atrás, a pensar sobre o que dizemos e fazemos. A pensar sobre o que dizem de nós e o que fazem com a gente. A pensar sobre a pressão da mídia, as imposições sociais, a alienação da população... A pensar sobre o porquê de estarmos aqui e sobre a própria necessidade do conhecer... Nesse sentido... (M; 8; EPR; PL)

No relato dos pais e estudantes a orientação pedagógica dos professores leva

os alunos a questionar o que aprendem, a conhecer diversas culturas, visões de

mundo, a expressar opiniões sobre o que pensam da realidade. Conforme podemos

perceber, o CAp tem como papel educativo a formação a educação humanizada; há

uma veia ética e estética compondo o currículo institucional prescrito, que é

efetivamente praticado, permitindo diferenciar-se das demais instituições.

O ensino é pautado em preceitos universitários, nos quais a pesquisa e a

extensão são práticas correntes. A investigação e a divulgação do conhecimento é

algo recorrente na instituição mediante a tríade ensino-pesquisa-extensão, comum

aos espaços universitários. A eficácia do ensino do ponto de vista qualitativo advém,

em grande parte, da capacidade do educador de mobilizar os estudantes, da

sedução exercida sobre eles, das relações estabelecidas em sala de aula, e

especialmente, da relação estabelecida entre os sujeitos e o conhecimento.

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(PIMENTA & ANASTASIOU, 2008). O trecho da entrevista que transcrevemos a

seguir é revelador de que os pais reconhecem na instituição esse processo:

A gente percebe a importância que a pesquisa tem para a instituição. É reflexo da universidade também, né? E da formação dos professores... Formar o aluno pesquisador é de certa forma seduzi-lo para isso... É o mesmo que dizer: “olha, mais legal descobrir por conta própria” É por aí... (M; G; PL)

A forma como os estudantes são avaliados também, aparece no discurso dos

entrevistados. A avaliação de desempenho do alunado enfatiza aspectos

qualitativos em detrimento dos quantitativos e, também, aparece como ponto forte

da excelência por redirecionar o processo de ensino aprendizagem, proporcionando

ao aluno e professor um feedback das aprendizagens construídas, parcialmente

construídas e a construir. Valendo-se de pareceres individuais, os professores

avaliam os estudantes e informam os resultados ao conselho de classe, que são

discutidos em conjunto pelos profissionais e repassados aos pais. A instituição

realiza cinco conselhos de classe, um para fins de planejamento das atividades, três

de acompanhamento do desempenho e o final para fins de promoção do estudante

(UFPE, 1998). A seguir os trechos revelam como os sujeitos percebem a avaliação

realizada pelo colégio:

Somos avaliados por conceito, não por notas. Os nossos resultados são traduzidos em pareceres. Eu acho interessante. Eu acho bem interessante. É melhor do que uma rotulação por nota, eu acho... Porque você atinge os objetivos, ou atinge parcialmente, ou não atinge. Então, eu não sei... Você pode fazer um tipo de prova e tirar sete, só que não faz diferença você tirar sete, você tirar sete e meio, porque você atingiu os objetivos. Não tem aquela... Não tem aquele rótulo. E também tem o comentário do professor do que você fez, do que você não fez, do que você não fez tão bem (F; 9; EPU; PEB). E também, que lá eles não usam nota, só usam A, AP e NA, que é: atingiu, atingiu parcialmente e não atingiu. E eu acho isso bom também, porque você não precisa saber quanto você acertou ou quanto você errou. Você precisa saber se você atingiu a meta, ou não (F; 8, EPR; PEB).

Os indicadores da excelência escolar aparecem ou ganham maior visibilidade

nos resultados expressos nas avaliações externas/ institucionais das quais o

CAp participa como em Olimpíadas das quais os estudantes participam e

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conquistam medalhas em diversas áreas do conhecimento30, nos resultados

positivos no IDEB31 e ENEM32. Esses resultados surgiram nos depoimentos como

fatores, que comprovam a excelência da instituição. Participar destas seleções

representa, ainda, para os entrevistados mais do que a possibilidade de receber

elogios ou prêmios, mas uma resposta aos esforços de professores e estudantes,

confirmando assim a qualidade do processo de ensino aprendizagem. Os

entrevistados se posicionam:

A maioria das olimpíadas é bem diferente, tipo: Tem a olimpíada brasileira de matemática de escolas públicas, que é OBMEP e tem a OBM, que é a olimpíada brasileira de matemática. Aí você vê os níveis que muda e etc... E também funciona como meio de avaliação, pela parte dos professores... Pra saber como você tá nesses testes (F; 6; EPR; PL). Às vezes a gente chega e de surpresa tem uma olimpíada ou avaliação externa. Pronto! Teve a OBMEP... Eu nunca havia participado de nenhuma. Fui lá e fiz e acho que me dei bem (F; 6; EPR; FPFM) Não é a toa que é o melhor IDEB do país, que todos os anos está no ranking do ENEM... Ali tudo é diferenciado, ensino, professores, estudantes...(M; G; PL) Existe o aluno medalhista. Há muitos alunos medalhistas. E, ao contrário das outras instituições, as medalhas não são apenas nos esportes, as medalhas são de conhecimento, mesmo. Eu nunca ganhei medalha, mas me considero boa aluna e deve ser gratificante ganhar uma porque você mostra pra você e para os outros os resultados positivos da sua escola (F; 7; EPR;PEB) .

Em síntese, podemos dizer que os dados desta categoria reforçam os

resultados da segunda etapa do estudo, no qual “qualidade” aparece como núcleo

central das representações dos pais e perspectiva de “futuro”, núcleo central das

representações dos estudantes, além de enfatizar a “excelência” escolar, expressão

recorrente no discurso dos sujeitos, unificadora dos atributos comuns que

caracterizam as representações sociais de uma instituição de qualidade.

A excelência escolar aparece como resultante da confluência de diversos

fatores já discutidos nesta seção e que reiteramos: qualificação dos profissionais,

30

No ano de 2013 o colégio recebeu 25 medalhas na OBMEP. Dentre elas, 14 foram de menção honrosa, 03 de Bronze, 06 de prata e 02 de ouro. Dentre os estudantes que receberam a medalha de Ouro está aquele que obteve a maior nota nacional na Olimpíada. 31

O colégio obteve em 2012 pela terceira vez o melhor IDEB do Brasil. 32

O CAp da UFPE conseguiu, em 2012, a 2ª colocação entre as escolas públicas do país no ENEM. No Ranking geral o colégio ocupa a 9ª posição. No ranking da redação, o CAp obteve a melhor média do Brasil entre as escolas públicas e a 10ª posição geral.

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autonomia docente, autonomia intelectual dos estudantes, o trato aprofundado e

interdisciplinar aos conteúdos, incentivo à pesquisa, ambientação universitária, a

individualização das aprendizagens, realização de atividades diferenciadas,

avaliação qualitativa, desempenho do alunado em avaliações externas. Tudo se

passa como se o CAp-UFPE unisse as peças de um mosaico produzindo a cada ano

a melhor composição possível, desenvolvendo o aluno em todas as suas

potencialidades garantindo-lhe a efetiva construção do conhecimento.

5.4.3.2. “O CAp como instituição que preza pela formação integral e

humanização do sujeito”

Dos vinte sujeitos entrevistados, oito pais e seis alunos afirmaram de forma

categórica, que a educação diferenciada da escola de excelência é decorrente da

intenção pedagógica de formar integralmente o sujeito, desenvolvê-lo em suas

potencialidades, humanizá-lo. Diversos são os trechos, nos quais os entrevistados

caracterizam o CAp como instituição, que contribui para humanização dos

estudantes. Para o grupo pesquisado, as intenções formativas da instituição não se

esgotam na aquisição intelectual de conhecimentos, pois abrangem maturação

intelectual e emocional.

Uma educação integral só é possível se o educador conseguir a adesão dos

estudantes, conforme Röhr (2007, p.58) “a educação deve exigir: identificação e

comprometimento por livre decisão, por convencimento íntimo”. Pelo que

percebemos a instituição permite aos alunos construir-se como humanos,

incentivando atitudes responsivas, formando nos estudantes uma postura de

autodeterminação. Nos depoimentos a seguir, pais demonstram compartilhar desse

entendimento:

Essa... Como é que eu vou explicar? Essa maturidade dela. A gente trabalha muito isso e eu acho que o colégio também acompanha isso... Dá uma liberdade, não assim... Uma libertinagem, mas uma liberdade, uma liberdade... Digamos... Controlada entre aspas. Controlada, tipo... Meio vigiada, fica ali... As vezes a pessoa acha o colégio de Aplicação meio solto. Mas, não... Não é bem assim. Do que eu pude perceber, do que ela diz... É isso, é fazer pensar, né? A pessoa já ter essa maturidade e... Dentro de um ensino bom. Também acho que é importante, porque não adianta ter... As matérias que tem que ser dadas, ser dada com qualidade. E eu espero isso,

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ou seja, ela ter um estudo de qualidade e ao mesmo tempo o colégio me ajudar na educação dela, entendeu? Porque eu nunca quis passar essa responsabilidade da educação para o colégio, entendeu? Mas, eu acho que o colégio é fundamental. Eu nunca pensei assim, eu acho que a educação do meu filho, principalmente comigo, eu acho que nós, eu e minha esposa é que somos os grandes responsáveis por isso. Mas, eu acho que o colégio pode ajudar e muito e que esse colégio vai me ajudar muito. Como eu também achava que o colégio Militar poderia me ajudar muito nisso. O colégio Militar já é aquela coisa mais vigiada e tal... E eu tinha, inicialmente, um receio do Colégio de Aplicação por causa dessa liberdade... Até onde vai essa liberdade? Mas, eu vi que não é bem assim e está sendo ótimo isso, liberdade vigiada, acompanhada e... Eu estou satisfeito. É isso que eu quero, ou seja, eu estou vislumbrando que ele está me ajudando na educação dela, crescer com responsabilidade e com ensino de qualidade, ou seja, a parte é... Humana da coisa, eu vejo lá sabe? Eu acho legal... As duas coisas, ensino, responsabilidade, atividades de companheirismo e amizade, de ser humano... Ser, ser humano como um todo, né? É isso que eu estou gostando, que até o momento eu tenho acompanhado e tenho visto isso, ou seja, estão me ajudando mesmo na educação dela (M; E; FPFM) Assim, eu... Eu noto que ela está mais madura... As coisas em casa, ela tem as posições dela, sabe? E mesmo em relação aos colegas né? Ela respeita o outro, se respeita. O exercício é de crescimento pessoal e humanização do sujeito (M; E; FPFM). O CAp pra nós consegue se diferenciar pela sua formação integral. Toda a excelência esta exatamente nisso, em formar pessoas. Eles formam pessoas que pensam no coletivo, pessoas com posturas, práticas e ideias próprias... Pessoas que podem escolher, que estão ali para trabalhar o todo e ver no que se destacam, quais os seus interesses, quais as suas dificuldades... E para superar as dificuldades também! Eu vejo isso, essa compreensão do humano na intenção do colégio. Os educadores se responsabilizam por essa formação e fazem os alunos se responsabilizarem também, esse é o barato da coisa, sabe? As crianças tem uma liberdade para de certa forma se autoconduzirem e eles aprendem de um jeito que o conteúdo científico, cultural, social... seja lá qual for! O conteúdo ele passa a fazer parte deles próprios... Eles interiorizam as aprendizagens, eles de fato aprendem... é isso! (M; PHD, PU)

Os sujeitos demonstram acreditar na contribuição da instituição para a

formação integral do sujeito e para efetivação das aprendizagens através da

interiorização dos conteúdos estudados. A educação integral está relacionada ao

desenvolvimento de diversos aspectos do ser: aspectos individuais, relações

subjetivas dentro de casa um- o eu; o exterior individual, o olhar de fora do indivíduo,

os comportamentos observados- o ISTO; convivência com o mundo, grupal, as

percepções subjetivas e intersubjetivas, sentimentos compartilhados, o nós; e a

dimensão social, formas e comportamentos observados, externos, do grupo e da

sociedade, os istos. (WILBER, 2006; 2008). Na perspectiva de educação integral

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todas essas dimensões são consideradas evitando a fragmentação dos conceitos,

da concepção de mundo e dos sujeitos.

Todo aquele que têm a intenção pedagógica de tornar o homem mais humano

não compreende o processo como meramente maturação natural, amadurecimento

psíquico e desenvolvimento cognitivo, tal processo abarca uma dupla compreensão

do humano, implica a crença de que a realização de todas as potencialidades

humanas seja possível (RÖRH, 2007.p.57). A instituição que assume como tarefa

educativa a humanização e a busca da integralidade do ser, compreendendo que o

ato de conhecer como busca de plenitude, preenchimento de lacunas e

entendimento de mundo, propõe aos estudantes um conhecer para se

autoconhecer. Cabe, pois, ás famílias e aos estudantes exercerem sua liberdade de

aderir ao processo. Os depoimentos dos sujeitos reforçam esse entendimento e

explicitam o convencimento íntimo dos sujeitos:

O mais legal do CAp é que meu filho pode ser quem ele quiser. Aquilo lá é um teste de limites e possibilidades... Ele pode ser dançarino, por que não? Médico, Jornalista, Artista... Eu sinto que lá ele será trabalhado como um todo, no afetivo, na postura, no cognitivo... Será um adulto feliz, pleno, realizado. A sensação que tenho é que ele pode ser quem ele quiser porque o colégio se esforça para propiciar o desenvolvimento de todo potencial dos meninos. Qual pai não quer que o filho seja feliz? A instituição me passa total segurança nesse sentido... (M;G;FPF) Eu gosto de estudar, eu tenho uma dificuldade de me concentrar, mas depois que eu me concentro eu consigo fazer as coisas. Então, foi bom porque as estratégias cativam você. As que os professores usam... Então, é mais fácil você dominar aquele assunto. Nem sempre a aula é expositiva, nem sempre há uma aula pra determinado assunto poder ser tratado. Na minha vida, eu acho que eu consegui crescer mais como pessoa também... Tipo aprender a me relacionar com o outro e comigo mesmo. Aqui você encontra muitas pessoas diferentes de você e... Isso melhora você como pessoa, porque você tem que aprender a conviver com elas... Elas te trazem coisas boas, as vezes ruins, mas funciona como aprendizado mesmo.. Os laços estabelecidos são fortes e a forma de nos relacionar... O colégio também influencia na forma de nos relacionarmos com os nossos em casa, eu era tímida e não expressava opiniões e sentimentos... Mudou muito depois que eu vim p cá (F; 9; EPU; PEB) Eu me sinto como sendo preparada para a vida, muito mais do que para o trabalho ou para a universidade e gosto disso. Mas não é jargão não! “Preparar para a vida!” (risos) O colégio nos dá suporte para compreender o nosso lugar no mundo, para olhar o mundo de forma crítica e construtiva. Sim, precisamos de trabalho, de profissão... Vamos conseguir tudo isso! Agora a preocupação é com aprender e nos melhorar (F9; EPU; PEB).

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Essa formação humanizada está na contramão da educação mercadológica

que domina os colégios privados do estado, tornando o CAp referência de ensino

para escolas públicas e privadas. Para os pais, isso se deve ao fato de a instituição

estimular o desenvolvimento de todas as potencialidades do discente enquanto

sujeito, preparando-o para lidar com o conhecimento e estimulando-o a atribuir

sentido a aprendizagem. Eis o depoimento de um dos sujeitos:

Você já reparou quão curiosas são essas crianças? Há uma sede de conhecimento, eles querem saber, evoluir, aprender... Isso não se percebe em outras instituições... Não com todo o alunado. Essa vontade de aprender não é para passar no ENEM, no vestibular, nem pra caprichar no IDEB... Acho que isso é consequência. O diferencial é como eles concebem o aluno, a educação, o papel da escola. Essa curiosidade deve ser aguçada e o colégio faz isso... Os meninos internalizam que é importante o conhecer, não de forma instrumental, dominar o conhecimento para fazer uma prova, mas compreendem o valor do conhecimento em si (M; PHD; PU)

Como pudemos observar, no trecho acima transcrito, a mãe atenta para a

resignificação da aprendizagem que ocorre na instituição. Essa novo sentido ocorre

a partir da reflexão do processo de ensino-aprendizagem, que a instituição propõe

junto aos alunos, educadores em exercício e em formação. Os sujeitos

compreendem que a plenitude estar em conhecer, em aprender pelos benefícios do

saber em si mesmo, não cabendo uma relação instrumental com o conhecimento.

O trecho a seguir é uma das entrevistas mais lúcidas de nossos dados. José,

ex-aluno do CAp e atual pai de aluno da instituição, expõe de forma esclarecedora o

seu percurso escolar e os valores compartilhados entre a família e as instituições de

ensino escolhidas. José fala ainda, de seus recursos sociais e culturais, da profissão

de seus pais e da importância do filho fazer parte do quadro de alunos do colégio,

como fizeram ele e seus irmãos.

Sempre me destaquei na escola, estive entre os primeiros da turma, mas no final das contas isso não importava, o que importava mesmo era trilhar um caminho de aprendizagem. Na primeira infância estudava no Instituto capibaribe, fui muito feliz por lá. Lembro do respeito com que éramos tratados, da individualização das aprendizagens, da nossa arte, das rodas de leitura e de como me sentia em casa, pois em casa também líamos, era tratados “olho no olho”, nos interessávamos por arte, principalmente por música e pintura [meu avó era um artista, pintava quadros primorosos]... Em casa não havia pressa, a leitura era deleite e não obrigação, era a extensão da escola e vice-versa, partilhávamos daqueles valores... Digo dos valores do capibaribe. Isso só se tornou compreensível após ter passado pelo CAp, lá também encontramos o capibaribe, mas com algo a mais, a gente refletia

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sobre os porquês daquilo tudo, a gente era convidado a pensar e ser sujeito do nosso próprio processo, de nossa construção. Quando me tornei aluno do CAp da UFPE ampliei minha visão de mundo, agucei a crítica, fui sacudido, instigado... E como orgulhei aos meus pais! O CAp passou a ser nossa referência de instituição. Minha mãe, professora da UFPE, hoje aposentada, sempre nos falava da proposta diferenciada do CAp e não tinha como querer outra instituição, o CAp era aquela com a qual mais nos identificávamos para prosseguir os estudos... A que escolhemos para dar continuidade a educação na qual acreditávamos. Dois anos depois de meu ingresso, minha irmã foi aprovada na seleção e não cabia em nós tanta felicidade. Mesmo sabendo dos feitos da instituição, Mamãe ainda se surpreendia com a metodologia do colégio, e hoje com o meu filho estudando no CAp eu ainda me surpreendo com a capacidade do colégio de nos trabalhar enquanto pessoas, de nos possibilitar desenvolver todas as nossas potencialidades. Meu pai, o Dr. Augusto, o avô do João, tinha um orgulho danado de mim. Hoje o orgulho é ver o João trilhando um caminho parecido com o meu, mas um caminho dele, só dele. Meu filho ocupa uma das bancas escolares que um dia foi minha e não há mensalidade que custei isto! (M, M, PL). .

O CAp atendia e atende aos anseios e valores desta família, envolta em

práticas culturais e familiarizada com o espaço universitário. Outro aspecto se

destaca na fala de José: o valor simbólico atribuído à instituição inscrito no trecho

“não há mensalidade que custei isto!”. Fazer parte do grupo de alunos do CAp da

UFPE aparece como impagável.

Nos trechos seguintes, os pais revelam que a aposta na instituição era

decorrente de dois desejos: fugir das altas mensalidades cobradas pelos

estabelecimentos de ensino privado do estado e obter ensino público de qualidade.

Quando confrontados com suas expectativas, e sobre os porquês da escolha da

instituição afirmam:

Então, o que eu tinha de expectativa era ter uma escola boa, um ensino bom... Fugir dessas altas mensalidades das escolas particulares e ter um ensino de qualidade. E acho que eles até superam viu? Acho não! Posso te garantir que eles superam (F; E; PL) Eu acho que se diferencia em muita coisa! Porque eu não sei... No fundo, no fundo, os colégios particulares eles são muito voltados... Eles tem um fundo assim... Comercial. Sempre por detrás tem algo de comercial nas atividades que eles fazem. Não sei é a minha impressão (M; G; PL) A proposta do colégio é outra também, foge a lógica mercadológica... O CAp é apenas um exemplo [uma pena ser um!] mas é apenas um exemplo de como pode dar certo o ensino público e de como a educação deveria acontecer em todas as escolas. Educação não é comércio, ao meu ver não é! (F; E; PL)

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Os pais criticam o caráter instrumental do ensino e da aprendizagem e a

comercialização da educação, que ocorre nas instituições privadas de ensino. Os

colégios privados considerados de prestígio, além das mensalidades elevadas,

promovem uma verdadeira “corrida” a aprovação no vestibular. Os pais questionam

se esse tipo de ensino é sadio, que consequências negativas podem trazer para os

jovens em formação. O trecho a seguir é ilustrativo do que afirmamos:

Olha, não podemos esquecer que as personalidades estão se formando... Eu não quero criar um monstro competitivo, ou um adolescente que vive no quarto, praticamente em cativeiro estudando para ser um dos primeiros colocados no vestibular... A ideia é formativa mesmo, formação integral, formação humana da coisa- sabe? Temos isso no CAp e não pagamos mensalidades exorbitantes para ter esse tipo de ensino com o qual nos identificamos (M, PHD, PU).

Cumpre destacar, no entanto, que esses pais parecem ser afetados por uma

contradição interna, os mesmos sujeitos que repudiam comportamentos

competitivos, “corrida a aprovação”, e prezam por uma educação integral,

discordando que a educação se transforme em comércio, são aqueles que não

mediram esforços para pagar cursinhos preparatórios para suas crianças estudarem

no CAp, submetendo os pequenos a regras e horários de estudo e incitando

esforços com frases do tipo “ Estuda um pouco mais... você está cansada, filha? A

essa hora tua concorrente está estudando!”. Portanto, aderiram, mesmo que pelo

período de um ou dois anos, ao mesmo sistema, que hoje criticam.

De forma paralela, devemos considerar que a instituição exerce um

convencimento sobre essas famílias, permitindo que haja certo “ajuste de

intenções”. Alguns dos sujeitos entrevistados atribuem essa nova forma de pensar a

educação ao ingresso na instituição, outros já compartilhavam de uma formação

mais humanizada.

De modo geral, no discurso dos pais há uma identificação com os valores e

com o ensino praticados pelo CAp. Muitos compartilham dos objetivos educativos da

instituição, percebe-se isto na fala de pais que são ex-alunos do colégio e/ ou

daqueles que, simplesmente, foram seduzidos pela proposta. Há, sobretudo, uma

familiarização cultural e com as maneiras de ser na vida social, que a escola propõe,

de certa forma, uma continuidade da educação familiar. O pertencimento a um grupo

à parte, diferente dos outros e, ao mesmo tempo de indivíduos oriundos de uma

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mesmo grupo sociocultural, permite que se estabeleçam prioridades muito próximas

em relação à escolarização dos filhos, eliminando outros estabelecimentos como

possibilidade (JAY, 2002), como ocorre com o pai que declara a seguir:

Caso Sérgio não fosse aprovado eu tinha pensado no Equipe, mas talvez não. Talvez continuaria no Instituto Capibaribe mesmo e depois não sei... Eu tenho muito pé atrás com o Equipe enquanto instituição de ensino... Eu pensei no Equipe pela grandiosidade mesmo, pois não queria que ele ficasse decepcionado caso não passasse na seleção do CAp, mas tinha reservas quanto a instituição. O pé atrás eram referentes a... um Bugaloo dentro da instituição, as viagens programadas para Disney, aos quinze anos e referências não muito legais, não compartilho dos valores daquela instituição (M; E; FPF).

No entendimento dos pais, o CAp é a aposta dessas famílias, um espaço

considerado ideal para escolarização dos filhos, de valor simbólico incomparável.

Vejamos:

Minha esposa é ex-aluna do CAp. Vivenciou o melhor ensino do estado, o melhor do país. Hoje nosso filho faz parte do grupo de alunos do CAp. Não é questão financeira entende? Se você me perguntar “o senhor tem condições financeiras de custear o melhor ensino do estado para seu filho? Eu te respondei: Não! Não- porque o melhor ensino do estado é gratuito, é o vivenciado no CAp da UFPE.” Condições para pagar mensalidades escolares, para fazer o mercado escolar girar eu tenho. Mas, isso nunca foi e nunca será a nossa aposta (M, G, PL).

Apesar dos resultados expressivos do Colégio não há pressão sobre notas,

aprovação no vestibular, conquistas de pódios, ou outras exigências nesse sentido.

Ao contrário, a ênfase na leitura, o estímulo à pesquisa e aprofundamento dos

conteúdos são constantes. O processo de aprendizagem é, de fato, um contínuo, os

discentes são preparados para enfrentar os desafios acadêmicos desde que entram

no colégio, não sendo necessária qualquer pressão de “véspera”, tendo em vista

que a época das olimpíadas ou seleções os estudantes estarão preparados. Essa

ideia aparece clara no discurso de pais e estudantes, para os quais a correria da

preparação ao ensino superior, nos três anos finais da educação básica não faz

sentido. Afirmaram:

O investimento nos estudantes é contínuo e de forma intensa. Eu não duvido das potencialidades da minha filha porque sei que ali ela está sendo preparada gradativamente e da melhor forma possível, o colégio não deixa a desejar para termos necessidade de um reforço fora de lá... Talvez uma aula sobre determinado conteúdo aqui, grupos de estudos ali, mas nada de um complemento pesado, acho que não precisa disso... Estávamos até

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conversando essa semana aqui em casa, sem cursinho... Será Medicina, por enquanto é a escolha dela, né? Pois se for será sem cursinho (M, G, PL).

Penso que eles estarão livres da correria do ensino médio para aprender o que não se aprendeu... Acho que o ensino de excelência desde o início evita isso... (F, E, PL)

Quando questionados “você se considerava o melhor aluno da turma no

colégio anterior ao CAp? Todos os alunos responderam imediatamente que sim. As

justificativas foram no sentido de obter as melhores notas, concluir as atividades

antes dos demais, estar sempre a frente nos conteúdos, ser representante de turma,

escrever as melhores redações, em resumo, destacar-se frente aos demais. Ao

serem indagados se ainda se consideravam os melhores alunos estudando no CAp,

nove dos dez estudantes negaram, justificando que estão em processo de

aprendizagem. Reconhecem que há aprendizagens por construir, e por mais

domínio que algum deles possa ter em determinada matéria, sempre, há algo por

aprender.

O fato de estar num grupo de destaque, porém homogêneo e a ideia de

compor o grupo dos “melhores” de início assustam os estudantes, após algum

tempo eles não mais assumem este rótulo e utilizam a convivência para

potencializar e partilhar seus conhecimentos. Vários são os relatos dos estudantes

que dizem não precisar consultar o professor, podendo recorrer primeiro a um

colega de turma. Eles não sentem que perderam o posto de “melhor aluno”, ao

contrário, resignificam essa ideia de “melhor aluno” ao eliminar a concorrência e

consultarem-se, mutuamente, em seus domínios específicos.

Apesar da existência dos “alunos medalhistas”, anualmente premiados em

olimpíadas, entre os estudantes não parece existir uma explícita hierarquia

intelectual. Estes reconhecem, em si e nos demais, potencialidades e limites.

Conforme os sujeitos, essa postura se deve ao fato do colégio não estimular à

competição, ao contrário, na instituição, vive-se um clima colaborativo, não havendo

lugar para sentimentos de superioridade. Os estudantes assim se posicionaram:

Levamos aquele choque quando entramos aqui. Você era a melhor da sua turma, aí você entra no Aplicação e vê... Meu Deus, eu não sou muito boa! Mas, depois de um tempo... Acostuma. Assim, diferente do Militar, por

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exemplo, aqui não estimula a competição. Então, você não tem essa coisa: Ah! Eu quero ser o melhor da turma! A não ser que, não sei... Você tenha uma inclinação natural pra entender essas coisas, ou não sei... Você seja uma pessoa competitiva demais. Mas, quanto a ser a melhor da turma, eu não me preocupo muito com isso, as aprendizagens são individualizadas, mas há um apoio mútuo (F;9; EPU; PEB). Fica difícil dizer quem é melhor porque todo mundo é bom! (risos) (F;6; EPR; FPF) Se tem uma coisa que eu aprendi no CAp e não esqueço é que ninguém é melhor que ninguém. Não podemos nos sentir superiores isso gera sentimentos de arrogância, prepotência... Sou bom em determinada área? Massa! Mas não sou bom em tudo, ninguém é... Temos que trabalhar para tirar o melhor proveito do que somos e desenvolver o que precisa ser desenvolvido... É muita gente boa! Mas, ninguém preza competitividade lá não, ao contrário cooperamos entre nós e com os professores. A ideia é que todos aprendam, que cada um consiga se desenvolver ao máximo. Só porque eu passei não quer dizer que eu sou melhor que o outro que não passou ou que ainda não aprendeu determinado conteúdo. As vezes tem gente que não passa porque estava nervoso na hora, ou queria terminar primeiro, ou chegou atrasado e não conseguiu fazer... São tantos percalços... Mas, eu sou igual a todo mundo, acho que não tem diferença não (M; 8; .EPR; PL) No colégio aprendemos isso “você pode ser melhor [ter mais facilidade] em linguagem, em raciocínio lógico, com cálculos... Mas isso não te faz melhor que o outro.” Temos que focar em nossas qualidades e tentar reduzir as nossas dificuldades. Não dá pra ser bom em tudo e não há o melhor. Sofre um bocado nessa vida quem pensa ser um SER superior (F; 9; EPU; PEB).

Para os estudantes é libertador não precisar competir com os colegas,

observe:

Olha, você não tem noção... A minha melhor amiga hoje é foi a minha maior concorrente no cursinho. É tão bom não precisar mais competir com ela, tão bom! Sempre ficávamos pau a pau, eu tinha medo até de perder a vaga pra ela, tipo tinha pesadelo com ela sendo o último lugar e eu eliminada! (risos) Hoje trocamos figurinhas (risos)... Conversamos, estudamos juntas, tem tanta coisa que ela não sabe, tem tanta coisa que eu não sei... (F; 6; EPR; PL)

Nove dos dez estudantes, também, não se consideram melhores dos que os

concorrentes da seleção de ingresso ou demais instituições de ensino pelo fato de

pertencer ao CAp da UFPE. Essa ideia de “melhor aluno”, “aluno excelente” parece

tributária da ideia de melhor colégio, colégio de excelência. Chama atenção a fala de

uma das alunas ingressantes que, por ter passado recentemente pelo processo

seletivo, ainda, apresenta um brio exaltado pela aprovação e postura competitiva,

considerando-se superior aos demais. Afirmou:

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Eu me sinto superior estudando no colégio de aplicação. Eu não fico jogando na cara das pessoas, eu só me sinto, sei lá... Mais importante! (risos) (F; 6; EPR; M)

No que tange a identificação das representações sociais do CAp-UFPE, nesta

categoria, há, mesmo que de forma indireta, uma confirmação da centralização em

dois elemento centrais futuro e qualidade, já identificados nas etapas anteriores

deste estudo. A instituição de qualidade com toda a excelência discutida na

categoria anterior, possibilita aos estudantes construir-se como sujeitos humanos.

Os pais reconhecem que educação oferecida pela instituição não se reduz a uma

habilitação técnica, mas, fundamentalmente, é um investimento formativo na

humanização dos filhos. Preocupados com o futuro, pais e alunos buscam garantir

uma educação que os possibilite segurança em escolhas acertadas que garantam a

realização pessoal e profissional. No presente, acreditam que isso é possível na

instituição, que busca o valor do saber em si mesmo, na qual o aluno tem liberdade

para pensar, existir no mundo. A maneira singular que a instituição encontrou de

pensar aluno, conhecimento, ensino, pesquisa e aprendizagem, aliada aos

resultados expressivos que apresenta, seduzem os sujeitos, pois está em

consonância com o projeto de vida dessas famílias.

5.4.3.3. “O CAp como trampolim para a realização pessoal, profissional e

sucesso futuro dos estudantes”

A imagem de excelência construída pela comunidade acadêmica e sociedade,

em geral, as experiências de sucesso de alunos e ex-alunos e os resultados

expressivos nas avaliações externas tornaram o CAp da UFPE “objeto de desejo” de

diversas famílias. O desejo de pertencer a instituição de prestígio mobilizou nossos

sujeitos a empreender esforços direcionados a aprovação no exame de ingresso. De

certa forma, essas famílias “avaliaram” a instituição antes de decidir qual

estabelecimento de ensino seria o responsável por formar suas crianças. Os

resultados sinalizados nesta categoria revelam, que tal escolha envolve, para além

de informações sobre a instituição, uma identificação do habitus familiar com a

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instituição de ensino e, sobretudo, um alinhamento das características da escola às

expectativas e perspectivas futuras dessas famílias.

A seguir, apresentamos os trechos de duas entrevistas, nas quais os pais

expressam a felicidade, que sentiram ao tomarem conhecimento da aprovação dos

filhos na seleção de ingresso do CAp. Essas passagens são reveladoras do que a

instituição representa no futuro dessas famílias.

Mudou muita coisa com essa aprovação, muito... Em letras garrafais: FE LI CI DA DE! Uma felicidade que não é só por conta da aprovação, mas ela é permanente. No dia de pegar o resultado ele ligou pra mim: “pai, você já foi pegar a minha nota?” Cheguei no Colégio de Aplicação o portão fechado a professora dele lá dentro, do curso... Quando ela falou o nome dele seguido de “passou!”. Vixe Maria!! Meu coração... Chorei! Não foi nada de drama não, chorei comigo... Não quero fazer inveja a ninguém, mas aquilo me preencheu! Vê que meu filho tem futuro apesar das faltas que existem na vida dele... No final você percebe que isso vale a pena, a mãe dele onde quer que ela esteja deve estar muito feliz também. O colégio será, sem dúvidas, determinante para o futuro de Gabriel... Sem dúvidas! (M; G; FPF) As referências que eu tinha da instituição eram as melhores possíveis... excelentes, excelentes... Amigos, conhecidos, familiares estudaram no CAp da UFPE. Assim, e... todos que eu conheço que são crias daquele colégio são pessoas altamente articuladas, inteligentes, críticas, bem sucedidas na vida e na profissão. Eu não sei... As minhas referências foram muito boas e passei a querer para Laura isso também... Aquele ensino, aquele futuro, por que não? Daí a gente correu atrás para conseguir a aprovação, foi difícil, mas passamos! O pai dela e eu fomos até o colégio e olhamos na lista o nome da Laurinha... Ela estava um pouco atrás de nós, apreensiva tadinha... Foi emocionante! Fui até ela, dei um abraço apertado e disse: “passamos, filha, nós passamos!” O pai se emocionou também, foi muita luta, um ano de esforços e privações da rotina diária que tínhamos até então e do lazer que estávamos acostumados... Mas, valeu muito a pena! Então... voltando para minha escolha (risos) Que mãe não quer o melhor para os filhos? O CAp era esse nosso melhor e possibilitará o melhor para nossa filha... Cada dia que passa eu tenho mais certeza disso... Dela estar no caminho certo, do colégio estar fazendo um excelente trabalho e que ela será sim uma profissional realizada, de sucesso, uma pessoa feliz, bem sucedida... (F; E, FPF)

As informações que obtiveram sobre os resultados expressivos do CAp e o

sucesso de alunos e ex-alunos indicavam aos pais que tipo de ensino seus filhos

teriam acesso e que tipo de alunos seriam. Portanto, inferir que o panorama de

excelência funcionou como indicativo das possíveis carreiras acadêmicas e

profissionais dessas crianças, dos cursos universitários que estarão aptas a acessar

e das profissões de prestígio a ocupar após vivenciado o percurso escolar de

excelência.

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A ideia de pertencer a uma instituição de destaque no ensino público nacional

antecipa, assim, um futuro de sucesso a partir de um presente de sucessivos

sucessos, escolares. Esse êxito se inicia com o ingresso do estudante na instituição,

seguido do pertencimento do sujeito ao grupo seleto com expressivos ganhos

culturais, sociais e simbólicos e reforços positivos ao longo do percurso. O sucesso

envolverá medalhas, premiações, reconhecimento dos pares pela aprendizagem

com êxito, viagens e envolvimento em pesquisa científica, uma vivência, que

proporciona ao estudante se desenvolver ao máximo em competências escolares e

sociais. Por fim, a universidade seria o destino natural do grupo, cabendo, apenas, a

escolha do curso, tendo em vista que as condições para aprovação são próprias a

esses discentes.

As famílias estão envoltas no “jogo da cultura” em sua dimensão escolar, no

qual a escola se torna incremento do patrimônio cultural do grupo. Ao aderirem ao

jogo, lançam mão de estratégias para acumular patrimônio simbólico e cultural,

incluindo espaços sociais a transitar, instituições a frequentar, grupos com os quais

conviver e credenciais escolares a possuir (BOURDIEU, 2011). As escolhas nem

sempre deliberadas são ajustadas às condições das quais aquele grupo é produto.

Poderíamos afirmar que há, pois, um alinhamento das aspirações e competências

dessas famílias às suas escolhas institucionais. Nosso grupo é formado por uma

classe média intelectualizada que deve “à instrução tudo aquilo que têm e dela

espera tudo que aspira ter” (NOGUEIRA, 2007, p.03). Assim, o interesse das

famílias por uma instituição de ensino de prestígio mostra-se, fortemente,

influenciado pela bagagem cultural, estilo de vida e trajetória desses sujeitos,

demonstrando a relação estrita entre as hierarquias escolares e as características

familiares.

De forma direta todos os vinte sujeitos entrevistados relacionaram o CAp da

UFPE às perspectivas futuras familiares. As oportunidades futuras vislumbradas

pelos sujeitos parecem estar condicionadas a ocupação das vagas na instituição de

excelência. Tudo se passa como se um aluno que ingressa numa Escola Pública

Federal como o CAp aumentasse, consideravelmente, suas chances de percorrer

um circuito subsequente de instituições prestigiosas, universidades públicas, e

posteriormente assumir cargos públicos e/ou as posições mais privilegiadas na

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hierarquia social. Como afirma COSTA (2010, p.232) “os estabelecimentos de

ensino definem as chances escolares dos estudantes”. No nosso caso, parece

definir também as chances de realização pessoal, profissional e o sucesso futuro

dos sujeitos. Haveria, assim, um destino social reservado a esses egressos? Afirmou

um dos entrevistados:

Minha amiga, eu acho que todo pai e toda mãe deseja um melhor futuro pra o filho, né? Eu desejo que ela tenha sucesso profissional, que ela... Decida a profissão dela, que eu acho que é sempre muito difícil, porque eles são muito jovens. A época do vestibular é uma época da saída ainda de uma adolescência... É considerado adolescente! Você só é adulto hoje com vinte e um anos, praticamente né? Então, é um caso difícil de opção, de escolha. Mas, ela tem sempre falado um pouco, desde pequena, desde sete, oito anos, que quer ser pediatra. Mas, ela esta mudando muito esse ano. Ora ela diz que vai ser outra coisa, depois vai ser isso, vai ser aquilo outro... Mas, assim... A escolha é dela, e eu desejo que seja de profundo sucesso. As vezes ela diz que quer fazer fora, quer fazer curso fora e isso é uma vivência dali, muito comum... Se escuta muito isso de fazer mestrado, intercâmbio. Acho que é muito do universo ali da Universidade... E desejo isso, que ela tenha muito sucesso em todos os aspectos, inclusive no profissional. E eu acho que o colégio contribui quando eles estimulam exatamente isso, de ir atrás, de pesquisar, de estudar... Não ficar aquela coisa... Meramente de fazer uma provinha e acabou. Mas, ir atrás pra conhecer, pra pesquisar... Estimular eles a irem pra fora, sim! Por que, não? Se você pode vivenciar outro universo, outras culturas, aprimorar teu currículo, aprimorar tuas línguas. Isso é muito incentivador (F; E, PL).

O depoimento da mãe revela a crença de que o colégio está associado a um

futuro promissor, contribui para estimular o estudante a trilhar um caminho de

sucesso profissional e pessoal, quando incentiva a pesquisa, o trato diferenciado

com o conhecimento e desperta no discente o desejo de recorrer ao internacional

para ampliar sua bagagem cultural. A vivência na universidade por si só parece ser

fator determinante das escolhas profissionais desses estudantes, a mãe cita

inclusive o interesse da filha por “estudar fora, fazer curso fora” e ressalta: “Se

escuta muito isso de mestrado, de intercâmbio. Acho que é muito do universo ali da

Universidade...” De acordo com Nogueira (2007) as famílias mais dotadas de capital

cultural, econômico e social são aquelas que tendem a lançar mão do recurso ao

internacional. Dos vinte sujeitos investigados, oito indicaram a internacionalização

dos estudos como futuro provável dos estudantes do CAp da UFPE. Eis uma

passagem que reforça essa afirmação:

Eles já saem do colégio, viajam... Minha filha não, mas coleguinhas da turma já foram para o exterior pelo colégio. Eles têm maior possibilidade de conseguir bolsas, de fazer intercâmbio. Muitos dos pais podem custear

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também... Tem isso, essa maior chance de realizar cursos, de se especializar fora... isso pode ser na graduação, no mestrado, doutorado... É bem provável de acontecer com eles (F; E; PL).

Ressaltamos que os pais creditam as escolhas futuras dos filhos à vivência na

instituição, enfatizam que o colégio forma jovens maduros e seguros de si, como

podemos observar no trecho a seguir:

O mais velho, o Lucas, após concluir o médio no CAp não fez vestibular, foi uma escolha dele. Ele preferiu viajar, mesmo tendo capacidade para ser aprovado em qualquer instituição que pretendesse. Ele não quis. Falou: “pai eu quero viajar, morar fora...” Ele viajou, passou alguns meses na Europa aperfeiçoando o inglês, o francês... Fez uma dezena de cursos... Estava vivendo, entende? Quando voltou fez um concurso pra nível médio federal e foi um dos primeiros colocados, assim... Sem precisar estudar nem nada. Depois fez vestibular... está concluindo o curso de direito. Fez escolhas acertadas, foram as escolhas dele... Está morando sozinho, tem independência financeira e está realizado. Ele quer apostar, quer avançar, vai prestar outro concurso mais concorrido na carreira jurídica e estamos certo de mais essa aprovação. Ele tem uma banda e tudo mais, mas é super focado, não quis enveredar pela carreira artística... Eu conversava com a minha esposa e pensava que ele estudaria música, mas não... Optou por outro curso. Dá um orgulho danado de vê-lo caminhando com as próprias pernas e acertando o passo a cada passo dado... É dele, entende? De nossa contribuição, da formação no CAp... E o segundo penso que também vai pelo mesmo caminho, pela firmeza das decisões e tudo mais. O CAp desenvolve essa maturidade... ( M; E, PL)

É recorrente, nas justificativas de pais e estudantes, que a formação

proporcionada pela instituição é capaz de desenvolver a maturidade dessas

crianças, tornando-os adultos seguros de si e de suas escolhas. Como discutido na

categoria anterior, essa ideia remonta à formação integral do sujeito, que vai além

de CApacitá-lo cognitivamente, mas envolve um trabalho emocional, de

conhecimento de si e autodeterminação. O posicionamento do estudante é

esclarecedor nesse sentido:

O colégio nos ajuda a escolher porque ajuda a nos conhecer mais assim... Eu consigo falar de mim e das minhas escolhas... elas podem mudar (risos). Se fosse pra escolher agora eu escolheria jornalismo porque gosto de escrever e correr atrás de notícia deve ser muito bacana. Daqui para o último ano eu posso mudar de opinião e escolher outro curso, mas eu vou saber exatamente porque eu estou fazendo aquela e não outra escolha (M; 8; EPR, PL)

Em geral, os estudantes acreditam que a instituição oferece condições

cognitivas e emocionais para que sejam sujeitos de suas escolhas, escolhendo por

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afinidade, não acreditando a uma formação precária. Alguns reconhecem, ainda,

que ser aluno do CAp lhe possibilita optar pelos cursos mais disputados e seguir as

carreiras profissionais mais prestigiosas. Apesar dos sujeitos afirmarem, que os

estudantes do CAp da UFPE podem escolher o curso que quiserem, eles tendem a

escolher os cursos mais prestigiosos, pois se sentem seguros da sua competência

para aprovação. O trecho a seguir é revelador disso:

Na turma da minha sobrinha foram quatro aprovados em Medicina, oito em Direito, e uns onze em Engenharia. Teve aprovação em Jornalismo, Designer, Ciências da Computação e outros cursos concorridos, não lembro bem porque conversávamos sobre isso lendo uma matéria publicada no jornal até... Acho que eles escolhem porque sentem a segurança na aprovação. Claro que há um ou outro que deve optar por cursos menos concorridos, sempre tem. Mas, acho que a maioria tende a querer superar. Minha filha só fala em Pediatria, caso não mude será a área dela (F, E, PL).

As crianças e jovens destacam que a boa educação proporcionada pelo CAp é

a base de todas as conquistas posteriores, como fica evidenciado nos trechos a

seguir:

O CAp é o pontapé inicial... Base de tudo que virá depois... Assim... Uma boa base educativa é essencial para as conquistas futuras. Eu sinto como se eu pudesse ser qualquer coisa que eu quiser porque sou aluna do CAp, não sei se você me entende... qualquer curso, qualquer profissão... Penso assim, posso não estar certa, mas penso assim. (F, E, PEB)

Eu quero ser jornalista. Há... Assim, é... em Português, a minha professora ela não dá só a gramática. Eu acho que em todas as matérias tem muito disso, eles não dão só a regra. É como minha mãe falou, não tem o decorado. Então, assim... A gente aprende mais com literatura, fazendo interpretação do que decorando as regras da gramática. A gente não usa muito a gramática, sabe? Eu acho que isso ajuda também, porque para escrever é bom eu ter uma base nisso, não só como escrever tal palavra (F;7;EPR; PU) Uma boa educação é a base de tudo, então... Estar aqui e... eu não sei... fazer os trabalhos como se faz aqui... Porque os professores exigem muito, então pode se preparar pra uma Universidade. A gente já encontrou alguns alunos do Aplicação que foram pra Universidade e que falaram que... A gente já tem alguma coisa a mais que os outros não têm. Porque as regras que são prescritas nos trabalhos, há... você tem que fazer na formatação certa e tudo mais... Já lhe ajuda! (F;9; EPU; PEB) Eu acho que ele é um Colégio muito bom e vai me ajudar muito, porque eu quero fazer medicina... E é um curso bem concorrido. Aí, eu acho que com o ensino de lá eu consigo. Assim... Ele representa algo mais, algo que pode me ajudar. Eu acho que estudando em outro colégio teria mais dificuldade para passar em Medicina (F; 6; EPR; FPFM/PL)

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Eu quero fazer uma faculdade... Ham...Na Federal mesmo, ou na Inglaterra, pra eu conhecer o One direction (sorrir). Ou... Quero fazer medicina! (F; 6; EPR; PEB/PL)

Os estudantes têm como futuro provável o ensino superior, demonstram não

ter dúvidas quanto à aprovação nas seleções das Universidades Federais e, por

vezes, almejam cursar universidade no exterior. O contato com ex-alunos da

instituição, hoje estudantes universitários, os faz confirmar que possuem “algo a

mais” que os demais estudantes de escola pública ou, até mesmo, das instituições

privadas de ensino, estando aptos a obter êxito também durante o curso do ensino

superior. Laurens apud Viana (2008) afirma que êxitos escolares iniciais produzem

sentidos, disposições e práticas, que tendem a reforçá-los, como se os sujeitos

entrassem numa “lógica de sucesso”, na qual o sucesso inicial abre caminhos para

sucessos subsequentes. Tudo se passa como se os estudantes após a aprovação

no CAp internalizassem essa lógica de sucessos sucessivos, na qual a instituição de

prestígio os levará quase que, de forma automática, a percursos acadêmicos

exitosos.

Os pais também entendem que pertencer ao CAp da UFPE possibilita aos

filhos realizarem escolhas mais precisas de cursos universitários e carreiras

profissionais. Eles acreditam que a instituição de excelência desenvolve, em grau

máximo, todas as potencialidades de seus estudantes, competências escolares,

sociais e emocionais do alunado e fornece um leque de escolhas profissionais

possíveis e prováveis. Foi recorrente, na fala dos entrevistados, o poder de decidir

acerca do próprio futuro com competência e maturidade, a liberdade de “Poder

escolher qualquer curso que ele/eu quiser” “Poder ser o que ele/ eu quiser”. Ao

serem questionados sobre as perspectivas de futuro e em que o colégio os ajudaria

a alcançar tais aspirações, os depoimentos dos sujeitos sugerem a certeza de

realização pessoal e profissional futura, que parece dizer a cada um desses

estudantes: “Escolhe o que quiser, sem medo de ser feliz! [...] sem medo de

fracassar!” Alguns títulos das falas dão indicativos dessa certeza:

Fazer escolhas acertadas na vida. Ele pode escolher a profissão que ele quiser, ser artista, dançarino, médico, fazer doutorado, não fazer, não sei... Poder ser o que quiser é o que mais me deixa feliz... Ele não precisa se

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importar com o que vão falar dele, o que ele decidir... ter segurança nas escolhas, sustentá-las diante dos outros (M, G, FPF). Eles estão sempre aptos aos desafios propostos. E isso me deixa tranquila quanto ao futuro que almejamos pra ele. Aquele medo de não dar certo de não estarmos no caminho certo, nós não sentimos mais... Eu vejo pelo desenvolvimento dele mesmo que vem coisa boa por aí (F, M, PL). Penso que ele pode abrir o leque de oportunidades, elas podem ver o quê é que existe por aí e não ficar habituadas a uma coisa só. E como é dentro daqui da Federal, elas podem ver mais de perto o que se faz realmente em cada profissão, no futuro... Pra elas verem o que elas querem e vê se aquilo vai favorecer elas. Elas terem a certeza que é aquele caminho que elas querem seguir, pra depois não fazer um curso sem saber se gostava, se não... Perder tempo (F, G, FPF). Eu acho que o Colégio de Aplicação, as tarefas, a maneira de ensinar. A proposta deles faz o aluno pensar, coloca o aluno pra pensar e isso eu acho que faz eles amadurecerem. Vai dando mais maturidade aos alunos. E a parti disso, de eles terem essa maturidade é... de certa forma essa cobrança , de fazer isso, de fazer aquilo, de fazer tarefas, de fazer os passeios... Eu acho que isso é uma coisa assim, que vai... ampliando né, o... o... A visão deles, né? De uma maneira geral né? Eu acho que isso é essencial para amanhã escolher uma profissão e se dar bem e não pensar assim: - O que dá dinheiro é isso. Não! Pensar em uma coisa que vá satisfazê-la, né? Por exemplo, que nem eu falo, que minha profissão é meu brinquedo predileto. Eu vou lá e me sinto bem, eu vou dormir tarde, mas... É o que eu gosto de fazer. Eu acho que isso é que é importante pra o Colégio de Aplicação, ele abre a cabeça das crianças e faz com que eles busquem é... A profissão que eles querem (F; D, PU)

A ênfase no sucesso futuro ou realização profissional não está no aspecto

financeiro, mas em acessar carreiras, que deem ao sujeito certa visibilidade social,

tornando os estudantes adultos, satisfeitos, ocupantes de posições sociais

esperadas, adultos que possuem certa segurança financeira, mas que são,

sobretudo, pessoas realizadas. Em geral, ao acessarem a instituição, essas famílias

antecipam futuros prováveis ao grupo, pois regularam suas práticas em função do

futuro, do desejo de dominá-lo e das condições para exercer tal domínio; o futuro

tem início no presente, num porvir já contido no presente imediato (BOURDIEU,

2007). As esperanças desses sujeitos estão harmonizadas às suas condições

objetivas, faz com que as possibilidades de obter um futuro promissor tornem-se

esperanças subjetivas de obtê-lo.

Conforme Bourdieu (2007, p. 265), as vontades acabam se ajustando às

possibilidades, os desejos ao poder de satisfazê-los. O habitus do grupo é esse

“poder ser” que diz aos estudantes que eles podem acessar os cursos universitários

e as carreiras escolares que pretenderem. Esse habitus institui nos corpos

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disposições duráveis de ser à altura das potencialidades dessas crianças e encontra

no CAp da UFPE, condições favoráveis para se desenvolver.

Como dito anteriormente, nosso grupo é composto por famílias para as quais

o reconhecimento social vem através da educação. Para Nogueira (2008) as

condutas de valorização da educação são típicas das camadas médias

intelectualizadas. Esse público acompanha de perto o percurso escolar dos filhos,

num treinamento para excelência e autonomia intelectual. É como se eles

“gerenciassem” a carreira escolar de suas crianças, evitando desvios de um futuro

pretendido e provável.

As estratégias utilizadas pelas famílias para aprovação no CAp da UFPE

dizem desse esquema de apreciação e visão de mundo das famílias, que foi

adquirido através da socialização, ao longo da trajetória desse indivíduos.

Responder a questões práticas do tipo: em qual escola colocaremos essas

crianças? Eles farão aula de línguas? Com quais crianças elas irão se relacionar?

Que ambientes frequentarão? requer que o sujeito acione o habitus do grupo. Todas

as estratégias de escolarização ou acúmulo de capital cultural e escolar são

reveladores desse habitus. Tais estratégias nos dizem de como o habitus se formou,

de sua matéria prima e origem. A partir das práticas do grupo é que o habitus se

materializa.

A escolha do estabelecimento escolar faz parte de um conjunto de estratégias

familiares para manutenção ou ampliação da posição social e cultural familiar

(SYNGLE, apud ROMANELLI, 2008). Para auxiliar os filhos a alcançarem as

perspectivas profissionais e pessoais futuras familiares os sujeitos empreenderam os

esforços necessários à aprovação na instituição. Como adiantamos no início deste

capítulo, as estratégias familiares ora aparecem claras e empreendidas para tal fim,

como os cursinhos preparatórios, rotina de estudos em casa, horários regrados

direcionados a antecipação da matéria e resolução de provas dos anos anteriores;

ora essas estratégias são de mobilização das disposições interiorizadas na trajetória

escolar e familiar do estudante, momento em que os sujeitos acionam naturalmente

a bagagem cultural e social familiar.

Dos vinte sujeitos entrevistados dezoito se valeram dos cursinhos

preparatórios para a seleção de ingresso do CAp da UFPE. Regra geral, esses pais

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não legaram apenas ao cursinho a preparação para a prova. No discurso dos

sujeitos o “cursinho” serve para orientar e treinar as crianças para o estilo de prova

que a instituição costuma realizar. Mas, sozinho, o preparatório não é eficaz, é

necessário o apoio e complemento familiar. Em todos os depoimentos os sujeitos

expressam que os pais e demais familiares acompanharam de perto os estudos

dessas crianças; além de frequentarem as aulas preparatórias, em casa foi

estabelecida uma rotina de estudos para acompanhamento das atividades do curso

e resolução de provas anteriores. Ainda, há relatos de pais que antecipavam os

conteúdos do próprio cursinho para a criança ir se familiarizando com a

complexidade dos mesmos e antecipando possíveis dificuldades. A passagem a

seguir é representativa de como se deu o processo de preparação deste grupo para

a seleção de ingresso da instituição e que disposições os pais mobilizavam nesse

processo. Afirmaram os pais:

Inicialmente, a gente já sabia... Como eu já tinha uma experiência com o João Mateus, o meu filho mais velho... As matérias que cairiam na prova seriam além do que ela estava dando lá no colégio, um nível superior. Aí a gente colocou ela no CICA um ano antes do concurso, o próprio CICA já tem isso... Pra ir acostumando. E... a gente não forçou muito isso em cima dela, ela que vinha, fazia aquelas tarefinhas básicas que o colégio passava... Então, esse primeiro ano foi mais uma adaptação do que seria. Quando foi o ano mesmo do concurso, o colégio... O CICA não começou mesmo num ritmo muito forte, começou num ritmo tranquilo... A gente foi deixando ela, foi acompanhando e tal. Aí eu já nesse ano, no ano do concurso que foi ano passado, eu comecei a vigiá-la de mais perto: - Não vai ver televisão, tá na hora, vai estudar! Fui acompanhando, fiz um levantamento de provas anteriores, dos colégios militares, todos... Ficava junto com ela: - Tem dúvida? Acompanhava... Ainda dentro da matéria do CICA, ou seja, dúvidas que tinham que aparecer... Ela dizia: - Olha papai, ajuda aqui. É um exercício tal... E... sem eu passar uma coisa extra por fora. Quando chegou mais perto, eu comecei a buscar, ela começou a resolver provas, não só de colégio, mas... Eu baixava a prova, ela ia e fazia, eu deixava ela fazer sozinha, se ela tinha dúvida eu sentava e resolvia com ela. E a gente começou nesse ritmo, ou seja, ela estudando, fazendo os exercícios, eu acompanhando os exercícios do cursinho, monitorando ela, ela estudava e quando eu via que ela estava parando por alguma coisa, eu falava: - Olha filha, tua concorrente essa hora não está parada não, está lá estudando. Aí ela ia... E não me deu trabalho, sabe? A vantagem foi essa. O João Mateus, meu filho, já tinha que ficar o tempo todo em cima dele. Ela, não. Eu falava, ela já ia fazer... Não me aborreci com isso. Mas, sempre estava ali monitorando: - Ah, estou cansada! – Não minha filha, fique mais um pouco, estude mais um pouco. Mas eu não tive trabalho. Aí no final eu comecei a fazer isso, eu levantava as provas, ela resolvia e sentava: - Opa! Faltou essa aqui, vamos estudar esse exercício. Aí resolvia com ela. Os que ela fazia da prova, eu verificava pra ver se estava certo, dava acompanhamento... A gente começou nesse ritmo de prova, como estava assim dentro de um cronograma do colégio, ou seja, eu poderia ter feito,

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mas eu não quis fazer porque eu estava deixando isso com o próprio CICA. O CICA vai acompanhando as matérias e eu vou vendo isso aqui com essas provas extras, trabalhando com ela. E no final o que é que eu percebia? Que, inicialmente, as questões ela resolvia umas e outras ela não sabia porque a matéria não tinha sido dada ainda. Aí alguma coisa eu já adiantava: - Olha, essa equação funciona assim, o volume do cubo é dessa maneira... Aí já ia adiantando pra quando ela fosse lá estudar no CICA, ela já sabia. Então, algumas matérias quando ela foi estudar no CICA ela já conhecia por causa dessas provas que nós fizemos. E eu fui percebendo que no final, quando eu fui pegando as provas, próximo a seleção... um mês antes já, ela já conseguia pegar as provas e ir levando até quase o final e sentia, as vezes, dentro da própria matéria que ela já tinha estudado, alguma dificuldade. Mas, foi assim, toda vez que eu pegava a matéria dentro da prova, que tinha uma questão e que ela não tinha visto, eu já adiantava aquele assunto. Dava uma pincelada, mostrava como ia ser. As vezes pulava: - Olha, esse aqui você já viu, essa aqui está contigo, faz. Aí ela ia, as vezes resolvia, as vezes travava em algum lugar. Mas a minha idéia foi essa, eu deixei para o CICA fazer o cronograma deles e aquilo que aparecia que ela não tinha visto, eu já adiantava. E sempre dentro de prova, ela já ia fazendo... Foi dando certo, no final ela estava quase resolvendo a prova todinha. E a parte de português, o quê que eu fiz? Eu... A gente estudou muito a área de matemática, inicialmente, porque ela estava interessada no colégio militar, então foi onde a gente pegou. Português eu deixei mais com ela, ela foi estudando, ela não tinha muita dificuldade na área de português, estudava sozinha... O português a gente foi mais conversando assim... Dia a dia, eu via uma coisa né? A leitura também e ela é desenroladinha, ela escreve bem, faz uma redação legal. Aí eu só dentro da redação dela pega: - Olha, essa vírgula aqui tem que ser por causa disso. E ia explicando pra ela e fui fazendo esse tipo de coisa com ela, mas em estudar em cima realmente de português. Quando deu... ela fez colégio militar, ela tinha que estudar agora português... Aí o quê é que eu fiz, eu pegava... Sempre deitava ali nós dois na cama, eu pegava uma prova do colégio militar, ou qualquer outro tipo de prova desses concursos, e a gente estudava, lia o texto. Só que eu já olhava, essa aqui é resposta minha, letra B... Aí a gente ia lendo junto e eu perguntava: - Maria, o quê é que você acha? Letra B? Aí ela: - C e tal... E eu: -B!Qual é a tua? B! A minha também é B. Vamos vê? E tal... Quando não dava certo a minha com a dela, eu perguntava a ela o que foi que tinha levado ela a responder isso e ela me explicava, e eu dizia: - Presta atenção, de repente não é assim. Chegou uma hora que a gente fazia tudo junto, quase tudo junto, quando eu errava ela errava também (sorrir) Aí é isso, trabalhei mais essa parte de texto com ela (M; E; FPFM).

No depoimento de Armando, militar, há uma participação ativa na preparação

da filha para a seleção de ingresso. Este que já havia submetido o filho mais velho à

seleção de ingresso da instituição, sem êxito, acompanhou, de perto os, estudos de

Maria. Além de organizar uma rotina de estudos, promovendo momentos em que a

menina estudava sozinha e acompanhada dele, Armando empreende esforços ao

solicitar que a filha não desistisse, quando se sentia cansada e ao alertá-la da

concorrência da prova.

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Constatamos que este pai, e outros participantes da pesquisa realizavam um

convencimento destas crianças, uma espécie de sedução para que os filhos se

envolvessem na preparação para a seleção. Muitos relatam que, de nada adianta,

todo o processo se a criança não quiser ser aprovada, uma mãe assim se posiciona:

A criança tem que querer, não adianta. A gente pode insistir, mostrar pra ela que é importante para o futuro dela esse esforço, mas se ela não se convencer disso, não adianta, ela não vai estudar, prestar atenção no curso, se esforçar... A minha filha abraçou a causa, a gente quis primeiro, ela passou a querer de tanto a gente falar bem do CAp... Levamos ela lá pra conhecer e tudo mais... (M; E;FPFM)

Os filhos internalizaram esse desejo de pertencer à instituição por

compartilharem das perspectivas de futuro dos pais. Tais perspectivas de futuro são

construídas e internalizadas pelas crianças no processo de socialização. Observe

mais um trecho do depoimento de Armando:

A Maria não me deu trabalho, sempre foi muito interessada responsável. Menina também, né? Sempre mais paciente, cuidadosa, dedicada, persistente, autônoma... A impressão que eu tenho é que ela já nasceu pronta. E... ela quis passar. Ela comprou o nosso desejo também... Se empenhou para que a aprovação acontecesse e correspondeu aos nossos investimentos. No fundo, acho que ela compreendeu nossa preocupação com o futuro deles, compreendeu mais cedo do que o irmão. Hoje ele fala “eu poderia estar no CAp e tal”, mas a Maria ela chegou primeiro na coisa, a ficha dele veio cair depois... (M; E; FPFM)

O relato anterior nos diz que, na mesma família, a socialização dos filhos não

os envolve da mesma forma. Embora tenham sido socializados nos mesmos

ambientes, frequentado a mesma escola, as crianças podem acionar disposições

diferenciadas. Isso não quer dizer que as disposições legadas pelos familiares são

diferentes para cada filho, ao contrário, as disposições, percepção, valores e visão

de mundo são muito semelhantes. Mas, apesar de socializada na mesma cultura de

classe ou de grupo, a criança pode valorizar e incorporar determinadas disposições,

em detrimento de outras.

As expectativas que são projetadas em cada um dos filhos é um aspecto que

pode diferir. De acordo com Glória (2005), há diferenças entre o envolvimento,

desempenho e trajetória escolar das crianças em função de questões afetivas, de

gênero ou lugar ocupado na fratria. Assim, os pais podem lançar expectativas

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diferenciadas em relação a cada filho. No caso em foco questão, Maria parece ter

incorporado o que lhe foi projetado, ao contrário do irmão, que segundo o pai “a

ficha veio cair depois”. Para Armando, o fato de Maria ser menina, paciente e

cuidadosa fez com que ela se envolvesse, empenhasse e correspondesse aos

investimentos familiares. Diferente do irmão, Maria expressava autonomia,

dedicação, paciência, atenção e persistência. As expectativas de aprovação e

perspectivas de futuro lançadas sobre Maria parece ter feito com que esta

incorporasse desde cedo disposições favoráveis à aprovação.

Como dito anteriormente, dois dos participantes da pesquisa não

frequentaram cursos preparatórios, e organizaram estratégia rotina de estudos em

casa, nas quais resolviam questões dos anos anteriores e recebiam de pais e irmãos

apoio com os conteúdos que ainda não haviam tido contato ou não dominavam por

completo. Eis o que disse a estudante de escola pública, que não fez cursinho

preparatório:

Estudei na Escola Municipal São José. Lá em... É em Vera Cruz, Aldeia... dois quilômetros e tem as vilas. Lá era só ensino básico, até a alfabetização. Não... A partir da alfabetização até a quarta série. Nesta escola pública só fiz a quarta série. Antes eu estudei em Camaragibe, que eu morava lá também. Depois que eu mudei pra Aldeia que eu mudei pra escola de lá. Em Camaragibe a escola era particular e maior, tinha o fundamental e médio (...) Eu era terceira série... Aí a minha mãe queria me inscrever no Militar, porque meu tio, que é da policia, estudava lá. Aí ela também soube do Colégio de Aplicação, porque algumas pessoas da família são daqui, e eu tenho um tio que ensina aqui (...) Aqui no Aplicação. Aí a gente foi... Eu comecei a estudar na terceira série, pra o Aplicação e pra o Colégio Militar. Em casa... sem cursinho. Minha mãe me deu livros e a gente estabeleceu horários... Assim, durante o ano. Uma coisa progressiva, no começo do ano eu estudava um pouco, tipo... meia hora por dia e depois no final eu já estava estudando mais, umas duas horas. Diariamente. (...) No começo minha mãe dava o material e eu ficava com a minha irmã mais velha. Mas, só que eu... Consigo me entreter no que eu estou fazendo. Então, depois de um certo tempo minha mãe tinha que avisar: “- Olha, Marina... Já acabou o horário!” Aí, eu: - Ah! Tá bom! (F; 9; EPU; PEB/PL)

A seguir, o depoimento da mãe da estudante de uma escola privada de

prestígio, que também não frequentou cursinho preparatório para a seleção de

ingresso do CAp.

Cursinho pra seleção do Aplicação, não! Ela tinha uma rotina boa no

Colégio Santa Maria. Isso ela tinha... Uma rotina boa, porque é um colégio

que exige bastante também. Não tem o mesmo parâmetro que o Aplicação,

são posturas completamente diferenciadas. Mas, tinha uma rotina bem

puxada de estudos. Eu acredito que isso foi assim... Muito fundamental pra

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o bom desempenho dela na prova, pra ela passar. Eu acho que com a soma

de tudo, né? E... Laura também sempre foi uma garota que gostou muito de

ler e eu acho que isso contribui muito pra formação do jovem, da criança ter

uma boa postura... Cursos ela fez outros ao longo do fundamental... Kumon,

Inglês, mas não uma preparação direcionada para a seleção do Colégio de

Aplicação... Resolveu as provas dos concursos anteriores em casa mesmo

com a prima (F, E, PL)

As duas estudantes que não tiveram a preparação do cursinho revelam

trajetórias escolares e de socialização favoráveis à aprovação na instituição. A

primeira delas era estudante da Escola Municipal São José, filha de uma professora

de educação básica e de um microempresário. A estudante alega ainda ter estudado

apenas no quarto ano em escola pública, tendo anteriormente frequentado

instituições privadas de ensino. Estabelecimentos escolares de excelência não são

distantes da família de Marina, o fato do primo ser estudante do Colégio Militar e do

tio ser professor do CAp da UFPE despertou o desejo da estudante de participar das

seleções de ingresso destas instituições. Assim como Maria, a filha do militar, a

preparação de Marina para a seleção de ingresso da instituição teve início no

terceiro ano do ensino fundamental, o que garantiu a essas crianças dois anos de

preparação para o teste. Ambas parecem ter realizado um percurso de ensino

fundamental inicial, que garantia as condições para aprovação, ou seja, um percurso

de sucesso escolar.

A segunda entrevista é da mãe de Laura. A jovem é filha de contadores,

moradora da zona sul da cidade e estudava em um dos colégios mais prestigiosos

da região, o Colégio Santa Maria. Diferente dos demais, Laura não se preparou

deliberadamente para o exame de ingresso com tanta antecedência. A mãe alega

que o direcionamento para o estudo veio seis meses antes da seleção, mas que a

filha mobilizou as disposições, que possuía para a aprovação. Ela cita o bom

desempenho escolar, o fato do “colégio ser puxado” e da filha possuir uma rotina de

estudos, ter frequentado cursinhos como Kumon, curso de línguas e possuir hábitos

de leitura.

No geral, há toda uma mobilização familiar para acesso e permanência na

instituição. Dos vinte sujeitos entrevistados, dezenove alegam que o processo de

preparação envolveu todos, modificando a rotina não, apenas, do estudante como

também da família. Por um período, as famílias tiveram suas rotinas ajustadas a

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rotina do estudante, pais e irmãos abdicaram de lazer e de horas de descanso para

acompanhar essas crianças. Questões aparentemente simples são reveladoras

dessa mobilização, tais como: pais se revezarem ou solicitarem da ajuda de

familiares e vizinhos para levar e buscar essas crianças aos cursinhos, simulados e

aulas extras; acordar às seis horas da manhã, no sábado para levar as crianças

para os simulados; cancelar viagens de finais de semana em função das aulas,

simulados ou para cumprir um cronograma de estudos; e evitar barulhos em casa

que interferissem no estudo do estudante. Tais fatos são exemplos dessa

mobilização das famílias durante o processo de preparação dos filhos. Eis alguns

trechos nos quais os sujeitos descrevem esse processo:

A gente se prendia muito no cursinho pra não faltar aula. Então, a gente não fazia nada se aquilo que a gente fosse fazer envolvesse, aquela... Aquela... Vai ter aula no sábado, então tudo que tivesse programado pro sábado... Várias vezes aconteceu. – A gente vai pra praia amanhã. Não vamos porque Maria vai ter uma aula agora no sábado... Ou então, na sexta feira... – Vamos pra tal lugar na sexta? Não, Maria só vai depois. Ou seja, a gente começou a fazer nossos programas em função dela. Aí chega um ponto que fica fácil, porque você já sabe... O que sobrou a gente vai fazer alguma coisa, se der pra fazer. Mas, realmente influenciou muito, a gente fazia tudo pra não perder nenhuma aula, realmente. E no finalzinho ela ficou pra estudar mesmo, a gente não fazia nada (M; E; FPFM) Também... Totalmente, a gente mudou totalmente. Porque a gente deixou de passear, a gente deixou muita coisa de lado pra que elas tivessem tempo pra estudar. A gente realmente mudou. Até hoje ainda... (F; G; FPF)

Olha, na verdade foi um período atípico assim, na nossa vida. Porque, esse ano minha mãe faleceu, tinha falecido no ano anterior... Aí ela foi se preparando... 2011... Fernando estava fazendo o pós.doc lá na França, estava fora. Então era eu, ela, meu pai e nosso anjo da guarda né, que é Betânia, que era a mãe de Nayara. Então a gente revezava, a Betânia levava ela pro curso e eu ia buscar. Foi um período assim... Puxado. Eu lembro que na época choveu muito em Recife, eu nunca dirigi tanto na minha vida, porque eu moro aqui do lado né? Mas eu não modifiquei tanto, inclusive ela fazia os simulados e ela tinha um bom desempenho. E o diretor do cursinho me chamou pra conversar, aí me falou assim: - Olha, a Camila tem potencial pra passar, ela precisa fazer mais simulados pela internet. Ela faz alguma atividade extra? Faz, faz curso de Inglês. Agente aconselha tirar. Aí eu falei assim, não! Eu respeito muito a sua opinião, mas eu não vou tirar ela do curso. (F; D; PU)

Na última entrevista, a mãe relata que chegou a receber conselhos para tirar

a filha do curso de inglês e focar na seleção do CAp. Esse tipo de estratégia é

utilizada por alguns dos pais, que, por um período, cancelam cursos de línguas,

Ballet e esporte para que a criança se dedique à preparação para o exame. Uma

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das entrevistadas revela que, em acordo com a direção da escola, encerrou o quarto

ano letivo da criança meses antes do término oficial. A seguir, apresentamos o

depoimento dessa criança, revelando um pouco da rotina de estudos que a família

estabeleceu para ela, em seguida temos o posicionamento da mãe:

A Minha rotina era assim, todo dia de manhã na escola. Segunda, quarta e sexta no curso à tarde e quando chegava do curso estudava... Até tarde com meu pai, até as 22h mais ou menos. No início ela ficava apenas realizando as atividades do curso e algumas questões. Na terça e na quinta ela começava a estudar a tarde em casa, das 15h às 22h porque não tinha cursinho. Passado quase um semestre ficou mais acelerado o estudo. Eu tinha aulas a tarde e a noite no curso, aí eu tinha aula no curso segunda, quarta e sexta de tarde e de noite e terça e quinta de noite, aí eu sai da escola... Porque no caso eu acordava um pouquinho mais tarde e ficava estudando até dar minha hora de ir para o curso (F; 7; EPR; PEB;FPF) Como as notas delas eram muito boas, ela estava aprovada na escola e tudo mais... A gente conversou com a diretora da escola e disse que estava muito puxado pra ela... Isso já era setembro por aí... Aí a diretora autorizou, e Bia não ia mais pra escola... Ela sempre esteve envolvida em curso de inglês, aulas extras, tudo mais... Mas esse ano foi muito puxado pra ela... (F; E; PEB)

A mãe de Bia é Auxiliar de Desenvolvimento Infantil e está cursando

pedagogia, o pai é engenheiro da Petrobrás. A estudante realizou as séries iniciais

do fundamental numa escola privada de pequeno porte no bairro em que reside. Os

pais desejavam a aprovação da criança e a encerraram numa rotina de estudos de

“gente grande” semelhante às rotinas que os vestibulandos dos cursos mais

concorridos possuem. A família explica que esse processo foi necessário para

garantir o futuro da estudante, que pensa em fazer medicina ou jornalismo. A

estudante relatou que o curso preparatório ficava longe de sua residência, e fazia o

trajeto de ônibus, num deslocamento, também, exaustivo, sua situação era diferente

da dos coleguinhas de curso que eram deixados pelos pais de carro e residiam

próximos ao estabelecimento. Uma das melhores amigas de Bia é filha de

professores universitários, vive num contexto econômico, totalmente, diferenciado do

dela. No entanto em entrevista com a mãe da coleguinha percebemos que as

famílias são amigas, possuem bastante afinidade e realizam programas juntos,

levam as garotas para lançamento de livros e livrarias e promovem reuniões

familiares.

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Destacamos que no momento da entrevista, a mãe de Bia informa, com muito

orgulho, que a filha mais velha tinha passado no curso de direito no vestibular da

UFPE. Quando a filha primogênita, também, havia realizado a seleção de ingresso

do CAp da UFPE, não logrando êxito, submeteram a filha á seleção de ingresso do

Colégio do Recife, estabelecimento no qual à garota cursou o fundamental e médio.

No grupo que opta pelo Colégio de Aplicação da UFPE, existem contextos

familiares nos quais pais empreendem mais esforços que os demais, na tentativa de

superar possíveis defasagens, que uma escolarização num estabelecimento privado

de bairro ou em escola pública possa acarretar. Eles se esforçam para reduzir as

possíveis distâncias de desempenho escolar de suas crianças frente às demais

concorrentes. Nos relato precedente, a família moradora da periferia da cidade, cuja

filha era estudante de uma escolinha de bairro foi aquela que mais abdicou de sua

rotina habitual, empreendendo esforços direcionados unicamente para o processo

seletivo, e mobilizando também no decorrer do processo os recursos sociais e

culturais de que sua família dispunha. As estratégias de que a família fez uso

chamam atenção: rotina exaustiva de estudo e aulas preparatórias foram superiores

as demais, até mais do que da estudante de escola pública, filha de uma professora

de educação básica e pai microempreendedor, sobrinha de professor do CAp, e que

apresentava um histórico de sucesso escolar em escolas privadas de grande porte,

além de elevado capital cultural familiar.

Cumpre citar que para conseguir acessar, a qualquer custo, o colégio de

excelência o comportamento dos pais nem sempre é honesto, para realizarem o

sonho e ter os filhos aprovados no CAp da UFPE, alguns deles chegam a burlar o

próprio sistema de ensino. Quando suas crianças são reprovadas na seleção de

ingresso, mas percebem que “faltou pouco para serem aprovadas”, se encantam

com as chances de êxito e não aceitam desperdiçá-las; realizam, desta forma,

acordos com diretores das instituições em que os filhos estudavam para reprovarem

esses estudantes, desta forma a criança pode realizar novamente o teste no ano

seguinte. Esta vivencia mais um ano de preparações e lhes é dada mais uma

chance para garantir uma vaga no colégio.

Nos relatos a implicação de todos os membros da família impressiona.

Percebemos que os investimentos de tempo, energia e acompanhamento dos

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estudos não se encerram com a aprovação do estudante, pois persistem para

garantir a permanência com êxito na instituição. A permanência na instituição,

também, promove um reajuste na rotina familiar como apontam os trechos a seguir:

Quando eu penso que eu ia descansar, aí era trabalho em cima de trabalho. Eu também tive que ajudar no início, a mais velha, né? Aí ela conseguiu fazer tudo aquilo que ela não tinha habilidade, ela precisou fazer slides, precisou usar Power Point. Uma coisa que ela não... Tinha aula de informática, mas aquilo bem bobo não é? Ela precisou de ajuda também... Aí eu ainda tive que acompanhar um pouquinho (F; G; FPF)

Os horários daqui de casa mudaram um pouco. Levantamos mais cedo para levá-la no colégio porque é distante, tem o trânsito louco da cidade... Nos revezamos, um dia eu levo, no outro meu marido faz o serviço (risos)... Antes almoçávamos juntos... Hoje em dia ela não almoça mais com a gente. Quando chega da escola almoça com a avó, as vezes sozinha... Ela chega por volta das 14h... Tem dois dias na semana que o horário é estendido e ela chega quase noite. Nesses dias nós saímos do trabalho mais cedo e jantamos juntos... As vezes não dá para estar em casa em horários fixos, mas a gente faz o esforço para acompanhar, saber da escola, dos amigos, chegamos junto nas atividades também, pro desempenho não cair... Essas coisas. Daí tem muito pra estudar também, pesquisas e trabalho nas amiguinhas e nós ficamos pra cima e pra baixo com ela. Não viajamos se ela tiver um trabalho na casa das amigas, por exemplo. A nossa rotina ainda é em função da rotina dela (F;M, FPF) Bom... Mudou, sim. Porque agora... Aqui o colégio dela era perto, então acordava mais tarde, agora acorda mais cedo, muito mais cedo. Minha esposa acorda cinco horas da manhã, acorda, levanta, faz café da manhã pra ela. Tem que está pronta de cinco e meia porque a condução passa às seis horas. Então, antes a gente não acordava tão cedo. A condução saí às seis horas pra estar lá as sete, porque a condução ainda tem pegar outras pessoas e... Na volta a mesma coisa, ela chega em casa às duas horas da tarde, ela sai de lá meio dia, quase uma hora... Só que... Quando a condução sai no início de Boa Viagem eu já saio e pego ela ali, pego o Hiper Bompreço aqui, porque senão a condução ainda vai deixar não sei quem... Dá uma hora eu estou chegando com ela, porque se eu fosse esperar... Eu já vou antes porque já ganha uma hora em casa. Aí eu já vou antes, porque se eu for esperar a condução passar... Mas, eu não vou buscar ela lá. Então tem esse negócio aí. É... outra coisa, assim... Mudou, ela esta sempre fazendo trabalho, sempre na casa das amigas. E ela não fazia muito isso... Nem me lembro se tinha no Dourado, algum trabalho de equipe. Então eles cobram muito isso, tem muito isso. É parte de música, é dança pra isso, trabalho de... todo tipo de trabalho. Praticamente toda semana ela tem que ta na casa... Aí vem as amiguinhas dela pra cá pra fazer trabalho, aí ela vai. Essa semana ela foi duas ou três vezes já, pra treinar dança de teatro. Então, mudança tanto dela, quanto no movimento da família. E feliz né? Porque ela esta feliz, o colégio eu estou gostando né? A expectativa... Mudança pra melhor! Talvez, mais trabalho, mas compensador, né? Uma satisfação, a satisfação está sendo maior que o trabalho, trabalho tem e você faz com prazer. Gostaria de estar fazendo pro outro também, mas infelizmente ele não passou na época... Mas é isso aí! (M; E; FPFM)

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Diante do exposto, percebemos que as estratégias das famílias são

semelhantes no que tange à preparação de suas crianças para a seleção de

ingresso do CAp da UFPE. A família parece reunir esforços para a aprovação, pois

durante um ou dois anos, os entrevistados tiveram sua rotina modificada, abdicaram

de seus momentos de lazer habituais para acompanhar os filhos nos cursinhos e

simulados e organizar espaço, esforços e tempo propícios aos estudos das crianças.

A preparação envolveu também, a necessidade de acionar as disposições

adquiridas na trajetória de socialização familiar e escolar dos pequenos,

especialmente para o estudante que não se preparou tão antecipadamente quanto

os demais, direcionando os estudos apenas seis meses antes da seleção.

Os relatos apresentados indicam que a mobilização para aprovação na

instituição se dá porque a clientela, que escolhe o CAp da UFPE, acredita que

compor o grupo traz reconhecimento social, funciona como um trampolim para a

realização profissional, pessoal e sucesso futuro desses estudantes.

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6. CONDIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa teve como objetivo compreender as Representações Sociais do

Colégio de Aplicação da UFPE segundo alunos e pais, caracterizando e analisando

os sentidos e significados atrelados as perspectivas de futuro. Partimos do

pressuposto de que as famílias que escolhem o CAp da UFPE, as camadas médias

intelectualizadas, efetuam certo “malabarismo” para a aprovação na seleção de

ingresso e mobilizam estratégias não necessariamente planejadas, mas

orquestradas e orientadas para o sucesso escolar dos filhos. Isso ocorre porque

carregam consigo uma certeza, uma garantia do sucesso que se deve ao habitus do

grupo, e que é reforçada a cada êxito, ou resposta positiva que suas crianças lhes

fornecem. Nesse sentido, a escolha do colégio não é aleatória, pois faz parte do

campo dos prováveis, do leque de possibilidades, que os pais possuem e está

estritamente relacionada às perspectivas de futuro dessas famílias.

Nossos resultados confirmam esse pressuposto. Em primeiro lugar, o colégio

atrai famílias bem sucedidas, uma clientela diferenciada da que compõe as escolas

públicas estaduais e municipais, bem como de algumas instituições privadas; em

segundo, os resultados indicam que há uma regularidade das estratégias utilizadas

por esse grupo para acesso e permanência na instituição de excelência. Contudo,

constatamos que, dentro do grupo estudado, existem contextos familiares nos quais

alguns pais empreendem mais esforços do que outros para superar possíveis

defasagens que uma escolarização em estabelecimentos privados de pequeno porte

ou escolas públicas possa acarretar. Tais famílias acionam as disposições mais

favoráveis à aprovação, fazendo uso dos trunfos de que dispõem.

As práticas de ingresso e permanência em espaços de escolarização de

excelência são favorecidas pelos capitais construídos nas trajetórias de socialização

dos sujeitos. No processo de decisão para submeter o filho à seleção de ingresso e

na preparação, são mobilizados diversos capitais [social, cultural, econômico],

credenciais escolares e disposições cultivadas nos sujeitos, porém tais mobilizações

nem sempre são deliberadas e intencionais. Os sujeitos acionam o habitus do grupo

no qual foi socializado, uma espécie de senso prático, aprendizagens práticas

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decorrentes da bagagem cultural e social familiar, que orienta a ação desses

sujeitos, e como avaliam e classificam o mundo.

Na primeira fase do estudo, almejávamos identificar conteúdo e estrutura das

Representações Sociais de pais e alunos referentes ao Colégio de Aplicação da

UFPE. Traçamos também, nesta etapa, um perfil do grupo investigado o que trouxe

os primeiros indicativos dos habitus do grupo. Os resultados nos trouxeram indícios

preliminares de confirmação de nosso pressuposto teórico, o núcleo central das

representações dos pais está composto por duas palavras “Qualidade” e “Futuro”,

confirmando a hipótese de que as representações do CAp estão atreladas as

perspectivas de futuro dessas famílias. O termo “Qualidade” apareceu como

estruturador, confirmando os indicativos da literatura que esses pais escolhem os

estabelecimentos escolares pela qualidade que reúnem. A estrutura da

representação do colégio por estudantes aponta “Estudo” como possível núcleo

central, necessário para garantir os resultados expressivos, que a instituição possui

e para permanência com êxito do estudante no colégio. As justificativas do termo

trazem a ideia do CAp como diferencial na vida dessas crianças e que o acesso ao

“melhor” ensino lhes possibilitar a estes alcançar suas aspirações futuras.

Na segunda fase do estudo, atendendo aos preceitos de teoria, intentamos

confirmar se as cognições inicialmente levantadas compunham efetivamente o

núcleo central da representação do CAp para pais e alunos. Ao nos depararmos

com os resultados das Triagens Hierárquicas Sucessivas, percebemos que a

saliência do termo central “Estudo” não foi contornado. O termo “Futuro” surge

como indispensável à RS do colégio. Esses resultados nos alertaram para o uso

cuidadoso dos métodos associativos e da importância da utilização de métodos

complementares, que testem a centralidade dos termos. A evidenciação do

elemento “Futuro” mais uma vez confirma nosso pressuposto teórico. No caso dos

pais, “Qualidade” é eleita a palavra mais significativa da representação. No entanto,

as argumentações para com os termos “Qualidade” e “Futuro” aparecem com

sentidos imbricados.

Na terceira fase do estudo, aprofundamos os sentidos anteriormente

delineados. Neste momento, tomando como referência as fases anteriores,

procuramos caracterizar as razões/ fatores que levam as famílias a escolher um

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estabelecimento considerado de referência para os filhos; identificar as perspectivas

de futuro de alunos e pais; relação com o ingresso e permanência na instituição;

identificar as estratégias mobilizadas para fazer parte do grupo de alunos da referida

escola e as que continuavam sendo utilizadas para manter-se na instituição e

apreender a relação entre habitus e Representações Sociais a partir das estratégias

percebidas.

Na análise das entrevistas, emergiram três categorias: “O CAp como

instituição de excelência”, “O CAp como instituição que preza pela formação integral

e humanização do sujeito” e o “CAp como trampolim para a realização profissional,

pessoal e sucesso futuro dos estudantes”. Os discursos revelam que para os

sujeitos, o CAp é uma instituição bem sucedida, com propostas inovadoras e

diferenciadas dos demais estabelecimentos de ensino. Eles qualificam o colégio

como de excelência, um colégio público diferente dos demais por ser “um colégio

público de qualidade”, uma instituição que supera, até mesmo, os estabelecimentos

privados mais prestigiosos do país. Foi unânime no discurso de pais e estudantes

que o grande trunfo institucional está nas pessoas. O CAp é composto por

profissionais altamente qualificados e alunos rigorosamente selecionados o que,

para os entrevistados, confere excelência à instituição. A escola de excelência

também tem outras características incomuns, tais como: trato aprofundado e

interdisciplinar dos conteúdos e incentivo à pesquisa, ambientação universitária,

atividades diferenciadas, ensino pautado em preceitos universitários e resultados

expressivos nas avaliações externas. A excelência aparece, assim, como uma

confluência de fatores que se unem para produzir o melhor ensino possível,

garantindo a efetiva construção do conhecimento.

Pais e estudantes reconhecem que a instituição oferece um ensino que não

se limita à habilitação técnica, mas promove e garante a formação e humanização

das crianças e jovens. Os sujeitos revelam que a instituição está na contramão da

educação mercadológica do estado, que se evidencia pela alta competitividade dos

cursinhos pré-vestibulares e outdoors de estabelecimentos prestigiosos de ensino

espalhados pela cidade. Eles concordam, ainda, que o ensino de excelência do CAp

desenvolve, nos estudantes, uma maturidade e segurança de si, garantindo sua

realização pessoal e profissional futura.

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Apesar de questionarem a competitividade e a educação mercadológica

promovida pelos estabelecimentos privados de ensino, as condutas dos pais são

contraditórias quando aderem, mesmo que por um ou dois anos, ao sistema que

eles criticam, submetendo suas crianças a cursinhos preparatórios e rotinas de

estudo estressantes, semelhantes a de vestibulandos das escolas privadas.

As estratégias de que essas famílias se valem são explícitas e direcionadas à

aprovação, tais como: cursos preparatórios, definição de horários de estudo,

direcionados a antecipação da matéria e resolução de provas anteriores; ora são de

mobilização de disposições interiorizadas na trajetória escolar e familiar do

estudante, aprendizagens práticas decorrentes de sua bagagem cultural e social. A

mobilização torna-se compreensível, pois esse grupo é composto de uma classe

média intelectualizada, que almeja reconhecimento social e realização pessoal e

profissional futura, através da escolarização de excelência. Percebemos, assim, que

os habitus do grupo, aspirações e competências estão alinhados às suas escolhas

institucionais.

É possível concluir, que a aprovação no exame de ingresso provoca uma

satisfação, nessas famílias, que supera os esforços empreendidos para acesso e

permanência na instituição. Ser selecionado no CAp, bem mais que um projeto de

indivíduo, passa a ser um projeto de família, que requer a implicação de todos no

processo. Por se diferenciar dos demais estabelecimentos de ensino público e

privado do estado, o CAp da UFPE desperta o interesse de um público igualmente

diferenciado, de pais pertencentes às camadas médias intelectualizadas, em sua

maioria, professores universitários, funcionários públicos federais; pais com níveis de

escolarização elevado, a maioria com especialização, mestrado e doutorado. As

famílias empreendem estratégias semelhantes para fazer parte desse grupo seleto.

O grupo acredita que o estabelecimento reserva aos estudantes bem mais do que

um ensino de excelência, mas reconhecimento social e realização pessoal e

profissional.

O que nos foi possível apreender do habitus do grupo revela agentes dotados

das mesmas referências e com perspectivas futuras semelhantes, embora um ou

outro contexto de produção dessa representação apresentasse diferença em relação

aos demais,por exemplo, as famílias que residem nas periferias da cidade e aquelas

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de bairros de prestigio da zona norte, a mãe que é Auxiliar de Desenvolvimento

Infantil e os pais Professores Universitários. Em geral, o grupo possui disposições e

aspirações próximas, e uma bagagem cultural perceptível na fala articulada no

momento da entrevista. Esses sujeitos revelam que habitus semelhantes produzem

estratégias semelhantes para acessar o espaço social pretendido.

O habitus do grupo e as representações do CAp que dele decorrem foram

determinantes para escolha da instituição e revelam uma afinidade quase

espontânea com o ensino ali vivenciado. A percepção de mundo desses sujeitos os

fez escolher a instituição mais adequada aos seus, a que mais corresponde às suas

expectativas e perspectivas futuras. Em síntese, a Representação Social do CAp da

UFPE está orientada e carregada de sentidos construídos e atrelados ao futuro

pretendido pelas camadas médias intelectualizadas.

Os colégios de aplicação foram pensados para ser espaços de destaque na

pesquisa educacional e campo de aplicação pedagógica. Essas funções foram

constantemente reforçadas no decorrer dos anos, mas apesar de servir de campo

de estágio e estar dentro da universidade, encontramos dificuldade de acesso. A

análise do projeto, rotina de qualquer instituição, tornou-se um obstáculo para nossa

entrada em campo, a morosidade para análise atrasou o andamento da pesquisa.

Por estar o CAp situado no interior da universidade as condições de acesso aos

pesquisadores poderiam ser mais facilitadas. Sugerimos, assim, que a sua função

como espaço de produção do conhecimento seja repensada e reavaliada.

Sobre a função desses espaços, devemos pensar se realmente cumprem a

função a que se propõe. Inicialmente, foram pensados para servir de modelo às

escolas públicas estaduais e municipais de ensino, campo de formação de docentes

e socialização de metodologias inovadoras. No projeto político pedagógico da

instituição está previsto colaborar com outras instituições na partilha de informações.

No entanto, em nenhum momento, alunos ou pais se referem a experiências

desenvolvidas com outros alunos de rede pública. Os sujeitos não se referiram a

interações que pudessem ter ocorrido com essas escolas. A interação parece

restrito ao espaço universitário. Ficamos a pensar, se não caberia à universidade

pensar em atividades mais sistemáticas de extensão e aproximação com as

secretarias municipais e estaduais de educação. Tentar levar para esses espaços as

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experiências de sucesso do CAp. Essas escolas permitem aos estagiários observar

e desenvolver abordagens pedagógicas inovadoras, porém, mais que isto poderiam

levar tais abordagens à escola, aos professores em exercício, possibilitando com

que abordagens educacionais inovadoras, mais não fossem direcionadas apenas

aos estudantes e discentes daquele lócus. Os professores da rede pública municipal

e estadual tem acesso ao ensino que ali ocorre? Com esta investigação não

conseguimos identificar experiências de socialização da instituição com as redes

municipais e estaduais de ensino do estado.

A importância de se realizar estudos sobre os estabelecimentos escolares de

prestígio é que estes nos ajudam a compreender como as hierarquias escolares são

construídas, como a desigualdade social tem consequência nos diferentes

desempenhos escolares das crianças. Eles nos fazem pensar sobre o mercado

escolar, o mundo social e as fronteiras sociais impostas pelo sistema educacional

brasileiro.

O CAp da UFPE é uma instituição pouco estudada dentro da universidade,

serve aos pesquisadores bem mais como campo de estudos do que objeto de

análise. Estabelecimentos de excelência como esses precisam ser melhor

estudados, pois funcionam como ilhas de excelência no interior da educação

pública, contrasta com todo o caos dos sistemas municipais e estaduais de ensino.

Constatamos que o sentido dessa excelência tem uma serie de razões que precisam

ser conhecidas e debatidas.

Estudar e pesquisar mais o CAp implica explicitar essa excelência, o que

constitui excelência no meio à precariedade e à calamidade de resultados escolares.

Cumpre relembrar que o CAp da UFPE está localizado na região que tem o pior

IDEB do país e, ainda, assim mantém o melhor IDEB do Brasil. Enquanto os

estudantes do CAp são premiados em olimpíadas e viajam para competições no

exterior, milhares de alunos concluem o ensino fundamental público do estado sem

saber ler ou escrever. No estado de Pernambuco, um milhão e meio de estudantes

do ensino fundamental encontra-se na rede municipal do estado, servindo-se do

ensino de baixa qualidade atribuído ao ensino público.

A excelência do CAp não é encontrada no espaço público comum, isto é tão

verdade que a instituição mobiliza uma classe diferenciada, que afirma que a escola

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pública não seria opção, caso seus filhos não tivessem sido aprovados no exame

para ingresso da instituição. Em nenhum momento, os pais do CAp questionam que

a instituição que os filhos frequentam, assim como as demais instituições públicas,

não é gratuita. A gratuidade salta aos olhos porque eles sempre tiveram o parâmetro

de pagar por um bem, pagavam duas vezes por um bem e ficaram livres desse 2º

pagamento com o ingresso no CAp. Esses pais parecem não enxergar, que a classe

que não acessa à educação de qualidade que eles têm, é aquela que custeia sua

educação.

O presente estudo viabilizou compreender, especialmente, como as famílias

mobilizam, em função de seus recursos sociais, estratégias para acessar e garantir a

permanência de seus filhos na instituição de excelência. A classe média

intelectualizada, que acessa o CAp da UFPE, não hesita em concorrer aos cursos

mais disputados do vestibular das universidade públicas, pois a vivência no colégio

permite-lhes circular em espaços de socialização, que a ajuda a incorporar

exatamente toda essa lógica do que é universidade, academia. A ambiência

universitária é de fundamental importância no momento de escolha profissional,

impacta o horizonte dessas crianças e lhes abre um leque de possibilidades de

cursos a serem escolhidos.

A fala de nossos sujeitos é, por vezes, contraditória, ao passo que criticam o

mercado escolar e competitividade exacerbada, inscreveram os filhos nos cursinhos

de maior fama em aprovação no CAp da UFPE, se submetendo à dinâmica

competitiva que esses cursos impõe, e incitando esforços, lembrando as crianças

da concorrência e submetendo as crianças a rotina semelhantes a de vestibulandos.

O caráter contraditório é revelado, ainda, quando os pais relatam que a instituição

tem um caráter humanizador, mas expressam também intenções pragmáticas.

Nesse ponto, percebemos a dimensão contraditória das representações do grupo.

O sentimento que essas crianças manifestam é de excelência de si, de poder

ser o que quiser. Por mais que a proposta da instituição não estimule á

competitividade, compor grupos seletos e que se identificam como alunos de

excelência ela fortalece a divisão entre quem sabe e quem não sabe, quem é melhor

e quem não é. O estímulo à participação nas olimpíadas é saudável? Tais medalhas

não seriam semelhantes aos quadros de honra que são criticados pelos educadores

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e que ainda resistem em algumas instituições? A participação nas olimpíadas consta

no projeto político pedagógico do colégio como atividade de extensão do grupo.

Nós nos questionamos, ainda se a excelência do CAp pode ser creditada

exclusivamente a equipe e a ambientação universitária ou o crédito não seria

atribuído muito mais ao público, a comunidade que se serve desse espaço e que

mobiliza um arsenal de capitais e disposições favoráveis a educação? A excelência

do colégio é sustentada por todo o capital mobilizado pelas famílias. A bagagem

cultural familiar parece ser o braço que dá sustentação a essa excelência. Isso nos

faz pensar, ainda, que a escola privada não é melhor que a escola pública, mas há

todo um arsenal mobilizado de disposições e capitais, e expectativas diferenciadas.

A relação escola-família aparece, mais uma vez, como condição indispensável à

consecução do projeto educativo escolar.

A pesquisa nos fez empreender esforços teóricos para tentar realizar

aproximações entre a perspectiva sociológica de Pierre Bourdieu e a Teoria da

Representação Social de Moscovici. Ao estabelecer o conceito de habitus, Bourdieu

constantemente, nos apresenta a relação entre condições objetivas e dimensões

subjetivas; Moscovici ao atentar para o caráter multifacetado das representações,

afirma pensá-las como processo e produto, estrutura estruturante e estrutura

estruturada. O processo de construção dessas representações se confunde com a

construção da realidade pelos sujeitos.

A ideia de aproximar quadros teóricos aparentemente distantes se deu por

acreditarmos que a interlocução poderia contribuir para pensar o objeto e fenômenos

como escolarização das camadas médias intelectualizadas, sucesso e excelência

escolar de forma não fragmentada, considerando as dimensões objetivas e

subjetivas envolvidas. A aproximação dos dois quadros teóricos nos possibilitou

respaldar, através do habitus, as representações, inicialmente, capturadas e que, no

decorrer da pesquisa foram aprofundadas no contato direto com os sujeitos. A

incursão, que realizamos em torno da relação dessas duas teorias, nos permitiu

cruzar os recursos sociais e culturais dos sujeitos com as representações que

construíram acerca do colégio.

Em síntese, podemos dizer que a pesquisa traz contribuições para as

Representações Sociais serem repensadas em dois aspectos (1) Estudos estruturais

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devem se limitar unicamente a capturar conteúdo e estrutura? Ao decidir por uma

abordagem plurimetodológica, realizando Triagens Hierárquicas Sucessivas e

entrevistas para confirmar e aprofundar as cognições previamente levantadas,

obtivemos dados que confirmaram a importância de se investigar a estrutura de uma

representação indo além de testes associativos. (2) Em que as pesquisas em

educação contribuem para o desenvolvimento da teoria? Ao propor um diálogo entre

as representações sociais e habitus, atentamos para a necessidade dos estudos em

representação proporem novas perspectivas de análise dos problemas sociais que

não fragmentem a realidade social, que quebrem a dicotomia objetivista e

subjetivista e nos possibilite responder questões, tais como: o que há por trás da

representação de pais e estudantes do CAp da UFPE? Uma gama de mobilizações

familiares sobre as quais não teríamos conhecimento substancial, caso não

realizássemos esse diálogo entre as duas teorias.

Contudo, reiteramos que a referida aproximação entre as duas teorias que

intentamos realizar, demanda por investigações de maior aprofundamento, uma vez

o tempo institucional e o volume de dados da pesquisa não nos permitiram

aprofundar os aspectos teóricos e estabelecer relações mais refinadas sobre a

construção das representações sociais, sua dinâmica e a relação com o habitus do

grupo.

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21&catid=17:concursoAcesso em: 20/ 10/2012.

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266

8. APÊNDICES

APÊNDICE 1

TESTE DE ASSOCIAÇÃO LIVRE DE PALAVRAS

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

PESQUISA: SENTIDOS COMPARTILHADOS SOBRE O COLÉGIO DE

APLICAÇÃO DA UFPE: UM ESTUDO COM PAIS E ESTUDANTES

PESQUISADORA: Gisele Gomes de Almeida

ORIENTADORA: Profª Drª Laêda Bezerra Machado

PROTOCOLO Nº _________

TESTE DE ASSOCIAÇÃO LIVRE

COLÉGIO DE APLICAÇÃO

___________________ ( )

____________________ ( )

____________________ ( )

____________________ ( )

____________________ ( )

_____________________ ( )

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267

2- MARQUE UM ( X ) NA PALAVRA QUE VOCÊ CONSIDERA A MAIS

IMPORTANTE.

3- JUSTIFIQUE A PALAVRA CONSIDERADA MAIS IMPORTANTE:

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

_______________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

_______________________________________________________

DADOS DE IDENTIFICAÇÃO DOS PARTICIPANTES (PAIS):

1-SEXO: ( ) FEMININO ( ) MASCULINO

2-IDADE: _________

3-NÚMERO DE FILHOS : ( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ou mais

4-NÚMERO DE FILHOS FREQUENTANDO OU QUE FREQUENTARAM O

COLÉGIO:

( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ou mais

5-NÚMERO DE FILHOS QUE SE SUBMETERAM AO EXAME DE SELEÇÃO DE

INGRESSO NO COLÉGIO DE APLICAÇÃO:

( ) 1 ( ) 2 ( ) 3 ( ) 4 ou mais

6-PROFISSÃO: __________________________________________________

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268

7-INSTITUIÇÃO/ EMPRESA ONDE TRABALHA: ________________________

8- FORMAÇÃO ACADÊMICA:

ENSINO MÉDIO: Sim ( ) Não ( )

GRADUAÇÃO Sim ( ) Não ( )

Se sim, qual o curso? ___________________________

PÓS-GRADUAÇÃO Sim ( ) Não ( )

Especialização ( ) : _______________________________________

Mestrado ( ) :________________________________________

Doutorado ( ) :________________________________________

9- RENDA MÉDIA MENSAL DA SUA FAMÍLIA:__________________________

10 ENDEREÇO:__________________________________________________

_______________________________________________________________

TELEFONE PARA CONTATO: ______________________________________

EMAIL: _________________________________________________________

DESEJA PARTICIPAR DA PRÓXIMA ETAPA DA PESQUISA:

Sim ( ) Não ( )

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269

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

PESQUISA: SENTIDOS COMPARTILHADOS SOBRE O COLÉGIO DE

APLICAÇÃO DA UFPE: UM ESTUDO COM PAIS E ESTUDANTES

PESQUISADORA: Gisele Gomes de Almeida

ORIENTADORA: Profª Drª Laêda Bezerra Machado

PROTOCOLO Nº _________

TESTE DE ASSOCIAÇÃO LIVRE

COLÉGIO DE APLICAÇÃO

___________________ ( )

____________________ ( )

____________________ ( )

____________________ ( )

____________________ ( )

_____________________ ( )

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270

2- MARQUE UM ( X ) NA PALAVRA QUE VOCÊ CONSIDERA A MAIS

IMPORTANTE.

3- JUSTIFIQUE A PALAVRA CONSIDERADA MAIS IMPORTANTE:

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

_______________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

_______________________________________________________

DADOS DE IDENTIFICAÇÃO DOS PARTICIPANTES (ALUNOS):

1-SEXO: ( ) FEMININO ( ) MASCULINO

2-IDADE: _________

3- SÉRIE:_________

4- ANTES DE INGRESSAR NO COLÉGIO DE APLICAÇÃO ESTUDAVA NO

COLÉGIO: ______________________________________________________

5- FEZ CURSINHO PREPARATÓRIO PARA INGRESSAR NO COLÉGIO DE

APLICAÇÃO?

Sim ( ) Não ( )

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271

6- BAIRRO ONDE MORA: _________________________________________

7-COM QUEM MORA? ____________________________________________

_______________________________________________________________

8- PROFISSÃO DOS PAIS: _________________________________________

9- NO PÓS-HORÁRIO DO COLÉGIO QUE OUTRAS ATIVIDADES VOCÊ

REALIZA? ______________________________________________________

_______________________________________________________________

TELEFONE PARA CONTATO: ______________________________________

EMAIL:_________________________________________________________

DESEJA PARTICIPAR DA PRÓXIMA ETAPA DA PESQUISA:

Sim ( ) Não ( )

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APÊNDICE 2 - CARTA AOS PAIS

Senhores pais,

Fazemos parte do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Educação

de Pernambuco (PPGEDU- UFPE) e estamos realizando uma pesquisa de Mestrado que toma o

Colégio de Aplicação como objeto e campo de estudo. Trata-se de uma pesquisa na área de

representações sociais com a qual objetivamos compreender as RepresentaçõesSociais do Colégio

de Aplicação da UFPE segundo alunos e pais, caracterizando e analisando os sentidos e

significados atrelados às perspectivas de futuro dessas famílias. O referido estudo é composto

por três fases. A primeira é a solicitação que lhes fazemos agora, ou seja, responder ao Teste de

Associação Livre e informações de natureza socioeconômica, necessárias a caracterização dos

participantes. No entanto, essas informações dos sujeitos individuais não serão divulgadas, pois

nenhum participante terá sua identidade revelada.

Convidamos a vocês pais, mães e alunos do CAP a participarem desta pesquisa. Informamos que seus

resultados serão socializados num encontro específico organizado pela pesquisadora e a orientadora

da pesquisa que contará com a presença da equipe pedagógica, pais, alunos e funcionários do colégio.

A socialização não tem data exata, mas deve ocorrer após a defesa pública da mestranda que

acontecerá até o último dia do mês de Fevereiro do ano de 2014.

O material que lhes enviamos é composto por duas partes: o Teste de Associação Livre e Dados de

Identificação. Para uma maior eficiência da técnica aplicada neste questionário que chega às suas

mãos pedimos que respondam ao Teste (Primeira Página) o mais rápido que puderem, as palavras

devem ser aquelas que lhes vêm à mente de imediato, é preciso evitar, desta forma – as

racionalizações que costumamos fazer como pensar, fazer consultas, apagar, refazer. Contamos com o

seu bom senso seguindo as orientações aqui apresentadas.

Segue abaixo algumas instruções para a realização do Teste de Associação Livre:

(1) A partir do termo COLÉGIO DE APLICAÇÃO

(2) Escreva as seis primeiras palavras que veem a sua mente quando pensam no COLÉGIO DE

APLICAÇÃO

Após pensar e escrever as palavras é só seguir respondendo as - perguntas 2 e 3, estas questões são

autoexplicativas. Feito isto, dê continuidade ao questionário respondendo aos dados de identificação.

O questionário é individual e só poderá ser respondido uma única vez. Assim, se você pai ou mãe já o

respondeu favor desconsiderar e devolvê-lo. Esta é apenas a primeira fase da pesquisa e, caso deseje

participar das demais etapas é só marcar (X) Sim quando solicitado, posteriormente entraremos em

contato.

Sexta- feira, dia 09 de agosto- passaremos na sala de aula de seu (s) filho(s) recolhendo esse teste.

Contamos com a colaboração de todos! Esperamos encontrá-los na próxima etapa da pesquisa.

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APÊNDICE 3

CARTELAS COM OS TERMOS DAS TRIAGENS HIERÁRQUICAS SUCESSIVAS DOS ESTUDANTES

ESTUDO

EDUCAÇÃO

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ENSINO

AMIGOS

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FUTURO

APRENDIZADO

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LIVROS

QUALIDADE

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CARTELAS COM OS TERMOS DAS TRIAGENS HIERÁRQUICAS SUCESSIVAS DOS PAIS

QUALIDADE

FUTURO

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278

EDUCAÇÃO

ESTUDO

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279

PESQUISA

RESPONSABILIDADE

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280

APÊNDICE 4

TABALA PARA HIERARQUIZAÇÕES DOS PAIS

Nº Nome Profissão Nº

Filhos Nº

Seleção

Série Filho

(s)

Colégio Anterior

Filho fez cursinho

preparatório

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Nº Eliminadas na

1ª rodada Eliminadas na

2ª rodada

Duas consideradas Mais importantes Indispensável

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282

TABALA PARA HIERARQUIZAÇÕES DOS ESTUDANTES

Nº Nome Profissão dos pais

Bairro em que reside

Colégio anterior a seleção de ingresso

Fez Cursinho

preparatório

Contato próxima

fase

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283

Nº Eliminadas na

1ª rodada Eliminadas na 2ª

rodada

Duas consideradas Mais importantes Indispensável

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284

APÊNDICE 5

ROTERIO DA ENTREVISTA COM OS PAIS

Questionar sobre:

-Composição familiar – família extensa- e composição das redes de amizades,

atualmente;

- Colégios que frequentaram, lugares onde viveram na infância, hábitos familiares de

leitura e culturais;

- Como obtiveram informações sobre o colégio;

- Como se deu a decisão de participar do processo seletivo de ingresso no CAP;

- Em que esse colégio se diferencia dos demais;

- As expectativas que eles têm/ tinham do colégio;

- A relação do colégio de aplicação e as perspectivas de o futuro que eles têm para

seus filhos;

- Se utilizaram estratégias para a aprovação no colégio, quais, e que estratégias

familiares consideram favoráveis ao ingresso num colégio de referência nacional;

- O que mudou na vida dessas famílias após a aprovação dos filhos no colégio;

- Os hábitos das crianças, a rotina, o que costumavam fazer antes do ingresso,

quais as atividades extraclasse que tinham antes e as que permaneceram ou

modificaram com a aprovação no colégio;

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ROTERIO DA ENTREVISTA COM OS ALUNOS

Questionar sobre:

-Composição familiar – família extensa- e composição das redes de amizades,

atualmente;

- Colégios que frequentaram anteriormente

- Hábitos familiares de leitura, de estudo e culturais (teatro; cinema; livraria; museus;

viagens que realizam, para que lugares, e com qual finalidade);

- Atividades extracurriculares que realizavam: esporte, curso de idiomas, aulas

particulares, dentre outros;

- Como obtiveram informações sobre o colégio;

- Como se deu a decisão de participar do processo seletivo de ingresso no CAp;

- As expectativas que eles têm/ tinham do colégio;

-Em que esse colégio se diferencia dos demais;

-Como se sentem frente a outros colegas que estudam em outros colégios;

- O que eles pensam do futuro e em que esse colégio pode ajudar a alcançarem os

objetivos futuros;

- Se utilizaram estratégias para a aprovação no colégio, quais, e que estratégias

consideram favoráveis ao ingresso num colégio de referência nacional;

- O que mudou na vida deles após a aprovação no colégio;

- Os hábitos das crianças, a rotina, a rotina de estudos e atividades que tinham

antes da aprovação do colégio e o que mudou ou permaneceu após a aprovação;