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GESTÃO DO CONHECIMENTO NA SALA DE AULA: LIMITES E POSSIBILIDADES Tânia Mara Trentin Scremin* Marjorie Bitencourt Emilio Mendes** Resumo Este artigo constitui-se no trabalho final produzido para conclusão do Programa de Desenvolvimento Educacional-PDE, proposto pela Secretaria de Estado da Educação do Estado do Paraná. Esta produção objetiva refletir questões referentes à gestão do conhecimento na sala de aula, seus limites e possibilidades. Trata-se de uma produção de cunho bibliográfico e implementação pedagógica que analisa o interior da escola e, mais precisamente, a sala de aula, considerando VYGOTSKY (1989), onde aprender e ensinar só são possíveis pela intervenção e interação com o mundo objetivo, marcado pela atividade humana, pela mediação do outro, onde os sujeitos se apropriam das categorias conceituais. A escola pode ser um lugar em que a proposição de sentidos e de significados seja possível. Ela pode ser, mas ela não vai se tornar assim, através de nenhuma força natural ou tendência histórica irreversível. As ações dos agentes sociais envolvidos nas relações pedagógicas, o professor e o aluno, é que construirão os significados particulares de cada situação escolar específica. Com este artigo pretende-se promover reflexões sobre os entraves existentes na sala de aula, referentes ao processo de ensino-aprendizagem, bem como os protagonistas de direito e de fato: professor e aluno. Palavras-Chaves: conhecimento- ensino- aprendizagem- professor- aluno Abstract This article is based in the final paper produced for the conclusion of the Educational Development Program –EDP, proposed by the Educational Secretary from the State of Parana. This production aims to reflect questions referring to the management of the knowledge in the classroom, its limits and its possibilities. It is about a production based in bibliography, which analyzes the interior of the school and, more precisely, the classroom, taking into account VYGOTSKY (1989), where learning and teaching are only possible through intervention and interaction with the objective world, characterized by the human activity, by others mediation, where the individuals take advantage of conceptual categories. The school can be a place where the proposition of senses and meanings can be possible. It can be, but it won’t make it easier, through non natural force or irreversible historical trend. The actions of the involved social agents in the pedagogical relations, the teacher and the student, it is what will build the particulars meanings of each specific scholar situation. With this article is intended to promote reflections regarding the existents hardships in the classroom, referring to the process of teaching-learning, as well as the protagonists of right and fact: teacher and student. Key-Words: knowledge – teaching – learning – teacher – student *Professora de Didática e Prática de Ensino da Rede Pública Estadual de Ensino Especialista em Educação Contato: taniascremin@ seed. pr.gov.br **Professora Orientadora da produção do artigo Mestre em Educação - Professora da Universidade Estadual de Ponta Grossa Coordenadora do Colegiado do Curso de Pedagogia Contato: [email protected]

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GESTÃO DO CONHECIMENTO NA SALA DE AULA:

LIMITES E POSSIBILIDADES

Tânia Mara Trentin Scremin* Marjorie Bitencourt Emilio Mendes**

Resumo Este artigo constitui-se no trabalho final produzido para conclusão do Programa de Desenvolvimento Educacional-PDE, proposto pela Secretaria de Estado da Educação do Estado do Paraná. Esta produção objetiva refletir questões referentes à gestão do conhecimento na sala de aula, seus limites e possibilidades. Trata-se de uma produção de cunho bibliográfico e implementação pedagógica que analisa o interior da escola e, mais precisamente, a sala de aula, considerando VYGOTSKY (1989), onde aprender e ensinar só são possíveis pela intervenção e interação com o mundo objetivo, marcado pela atividade humana, pela mediação do outro, onde os sujeitos se apropriam das categorias conceituais. A escola pode ser um lugar em que a proposição de sentidos e de significados seja possível. Ela pode ser, mas ela não vai se tornar assim, através de nenhuma força natural ou tendência histórica irreversível. As ações dos agentes sociais envolvidos nas relações pedagógicas, o professor e o aluno, é que construirão os significados particulares de cada situação escolar específica. Com este artigo pretende-se promover reflexões sobre os entraves existentes na sala de aula, referentes ao processo de ensino-aprendizagem, bem como os protagonistas de direito e de fato: professor e aluno. Palavras-Chaves: conhecimento- ensino- aprendizagem- professor- aluno Abstract This article is based in the final paper produced for the conclusion of the Educational Development Program –EDP, proposed by the Educational Secretary from the State of Parana. This production aims to reflect questions referring to the management of the knowledge in the classroom, its limits and its possibilities. It is about a production based in bibliography, which analyzes the interior of the school and, more precisely, the classroom, taking into account VYGOTSKY (1989), where learning and teaching are only possible through intervention and interaction with the objective world, characterized by the human activity, by others mediation, where the individuals take advantage of conceptual categories. The school can be a place where the proposition of senses and meanings can be possible. It can be, but it won’t make it easier, through non natural force or irreversible historical trend. The actions of the involved social agents in the pedagogical relations, the teacher and the student, it is what will build the particulars meanings of each specific scholar situation. With this article is intended to promote reflections regarding the existents hardships in the classroom, referring to the process of teaching-learning, as well as the protagonists of right and fact: teacher and student. Key-Words: knowledge – teaching – learning – teacher – student *Professora de Didática e Prática de Ensino da Rede Pública Estadual de Ensino Especialista em Educação Contato: taniascremin@ seed. pr.gov.br **Professora Orientadora da produção do artigo Mestre em Educação - Professora da Universidade Estadual de Ponta Grossa Coordenadora do Colegiado do Curso de Pedagogia Contato: [email protected]

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Introdução É histórico o discurso de que o professor como um profissional

especializado, por meio do seu longo aprendizado e da sua experiência, é

capaz de dominar seu ofício e de realizá-lo com competência. Assim, o

professor é visto como alguém que conhece e domina sua profissão.

A partir do século XVII, o ensino é pensado como uma profissão. Essa

profissão, no entanto, acabou sendo definida como tendo uma natureza muito

diferente das demais, já que ela envolve um conjunto de objetivos e de

atributos de seus praticantes que a aproximam de missão. Parte dessa

confusão ou mistura de significados parece derivar das origens da escola no

mundo ocidental, ligadas aos estabelecimentos religiosos, tais como o templo,

o mosteiro, o convento, o que acabou deixando a marca permanente de

associação entre magistério e sacerdócio. Essa associação tem sido discutida

e, em alguma medida, amenizada no processo de constituição da profissão

docente, ao longo dos anos.

A partir deste artigo, pretende-se contribuir para o resgate do sentido e

significado do ato de ensinar e os seus componentes: a aula, o ensino, a

aprendizagem, o professor, o aluno, as situações didáticas e o conhecimento

construido no espaço da sala de aula.

Inicialmente, foram pesquisados e analisados subsídios para esclarecer

as relações e implicações que envolvem a idéia de ensinar. Para entender as

diversas configurações com que essas questões de ensino aparecem, deve-se

concentrar toda atenção no núcleo da atividade da escola que é a aula.

Na sequência, são analisados os aspectos que tratam da identidade

profissional do professor, como um espaço de construção das maneiras de ser

e de estar na profissão.

Discute-se no texto, a concepção de aluno a partir da noção de

transitoriedade que vai da condição de “paciente”, aquele que recebe a ação

do trabalho institucional e pedagógico da escola, até a situação de “agente”,

aquele que durante o processo de aprendizagem e com base nele, conquista

sua liberdade por meio da aquisição de um conjunto de instrumentos,valores,

modos de agir, pensar e se relacionar com o mundo, com a sociedade e com

as pessoas.

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Objetiva-se uma breve discussão do espaço da sala de aula como uma

célula que representa o todo da escola: o currículo, o projeto da área de ensino

e o planejamento da disciplina.

Pretende-se também refletir sobre algumas possibilidades no trabalho

pedagógico, apesar dos limites impostos pelo próprio sistema escolar.

O interesse pelo tema em pauta surge da própria experiência

profissional da autora, no trabalho como professora de Didática e Prática de

Ensino junto aos Cursos de Formação de Docentes e do enfoque trazido pelas

Diretrizes Curriculares Estaduais do Ensino Profissionalizante no que se refere

à relevância da gestão do conhecimento na sala de aula.

A abordagem adotada para o desenvolvimento desse trabalho foi

pautada na pesquisa de cunho bibliográfico, entendendo que as concepções

teóricas, os escritos já efetivados pelos autores: ABREU e MASSETO (1990),

BOING (2002), CONTRERAS (2002), CORDEIRO (2007), FREITAS (2003),

LIBANEO (1990), MELLO (1992), MOURA (2001), NOVOA (1992), PATTO

(1991), PARANÁ (1992), PIMENTA (1997), SACRISTÁN (1998), SAVIANI

(1995), VEIGA (1998), ZABALA (1998), dentre outros, subsidiam os conceitos

e compreensões aqui apresentados na perspectiva de melhor entender o

contexto escolar e seus determinantes.

Assim, é fundamental discutir a sala de aula, como um espaço de

investigação de tudo o que se passa no processo de ensino-aprendizagem: os

sujeitos envolvidos, as relações de poder, as experiências vividas, o objeto do

conhecimento oferecido, a metodologia e as formas de avaliação.

Sala de aula: ”locus” principal da gestão do conhecimento Como professora de Didática e Prática de Ensino da Rede Pública do

Estado do Paraná, em constante aprimoramento profissional, principalmente

através de pesquisas sobre os fundamentos teóricos e práticos do trabalho

pedagógico na sala de aula, observa-se que é histórico o processo de ensino

centrado no professor, valorizando assim, apenas o conhecimento. Na sala de

aula, o ensino ganhou autonomia em relação à aprendizagem, criando seus

próprios métodos. Atualmente faz-se necessário estabelecer a unidade entre

ensino e aprendizagem.

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Sendo a aprendizagem um projeto social é fundamental destacar a

importância das interações e procedimentos de ensino, bem como focar as

ações nos gestores do processo, o professor e o aluno.

É necessário ir além dos paradigmas que têm insistido na idéia do

professor reflexivo para instalar definitivamente um processo em que os

diversos profissionais da área, tanto individual quanto coletivamente possam

vivenciar processos de discussão e de reflexão a respeito dos diversos

aspectos que dão os contornos atuais dessa profissão. Esses processos

podem e devem se instaurar o mais cedo possível, de preferência nos próprios

Cursos de Formação Inicial, embora se possa admitir que grande parte do que

se precisa saber para o exercício da docência só será de fato elaborado

durante o próprio exercício profissional.

Aprender e ensinar só são possíveis pela intervenção e interação com o

mundo objetivo, marcado pela atividade humana, pela mediação do outro,

onde segundo VYGOTSKY(1994), os sujeitos se apropriam das categorias

conceituais. São, portanto, atividades que se desenvolvem por meio de uma

relação de cumplicidade. No caso da relação com o saber, ela é ao mesmo

tempo, relação consigo próprio, com o outro e com o mundo, na medida em

que esse saber e essa relação ajudam a constituir a identidade do sujeito, a

sua particularidade diante dos outros sujeitos e também permitem organizar,

pôr em ordem e interpretar o mundo circundante.

Tentando vislumbrar este novo fazer pedagógico que inicia pela

superação do fazer individual e descomprometido emergindo da reflexão sobre

a prática, e tendo como ponto de chegada uma escola pública de qualidade

para a maioria da população, surge uma polêmica causadora de conflitos no

interior da escola, ora acusando o trabalho pedagógico de tecnicista, ora de

politicista que conduzem ao risco de um certo romantismo, onde confundem o

saber bem ou fazer bem, com conhecer o bem ou fazer o bem.

SAVIANI, denuncia o romantismo no interior da escola, quando cita a fase romântica da defesa do compromisso político em educação. Nessa fase, os elementos da luta contra a concepção técnico-pedagógica restrita e supostamente apolítica se dilataram morbidamente por causa do contraste e da polêmica. É necessário passar à fase clássica, encontrando nos fins a atingir, a fonte para a elaboração das formas adequadas de realizá-los. Ora, a identidade dos fins

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implica imediatamente competência política e mediatamente competência técnica. A elaboração dos métodos para atingi-los implica por sua vez, imediatamente competência técnica e mediatamente competência política. Logo, sem competência técnica e política não é possível sair da fase romântica (1991, p.12).

Com a citação acima, fica nítida em alguns casos, a situação do fazer

pedagógico atual. Existe muito professor preocupado em fazer, sem levar em

conta o saber bem ou fazer bem.

Isto explica a situação do professor “bonzinho” que mantém um ótimo

relacionamento com seus alunos, mas não ensina os conteúdos necessários e

significativos; o pedagogo que ora “passa a mão” na cabeça do aluno,

protegendo-o das exigências do professor e, em outro momento faz “quase

tudo” para o professor. Neste enfoque, o fazer da escola tem sido prejudicado

pela falta de reflexão e romantismo acentuado na sua ação.

Ao mesmo tempo, o processo didático, espaço-tempo em que se dão as

relações diretas e imediatas do ensinar, aprender, pesquisar e avaliar não

existe em si mesmo e por si, mas na correlação, na dinâmica interna da sala

de aula, seu lugar social, pois não são dimensões isoladas e estanques, não

apenas coexistem, mas se interpenetram. Portanto, nenhuma delas pode ser

relegada a segundo plano. Cada uma precisa ser compreendida, analisada e

valorizada para que se organizem na unidade do processo didático.

O ensino e suas relações no cotidiano escolar Não se pode compreender o ensino atendendo apenas aos fatores

visiveis visíveis da sala de aula, pois segundo CONTRERAS “o ensino é um

jogo de práticas aninhadas, onde fatores históricos, culturais, sociais, ins-

titucionais e trabalhos tomam parte junto com os individuais “(2002,p.75). O que impulsiona o ensino é, por um lado, a contradição entre as

atividades teóricas e práticas resultantes dos processos de ensinar e, de outro,

o nivel de conhecimento mediante a aprendizagem do aluno. O objetivo maior

do ensino passa a ser a construção do conhecimento contando com o

envolvimento do aluno. O resultado do ensino é dar resposta a uma outra

necessidade: a do aluno que procura aprender. O professor aparece como

protagonista responsável pelo ensino, onde orienta, coordena, estabelece uma

relação pedagógica com o aluno, mediada pelo conhecimento.

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O professor na relação com os alunos proporciona-lhes o encontro com

a realidade, levando em consideração a experiência e os saberes que já

possuem, procurando articulá-los a novos saberes e práticas. O ensino é

também um ato interpessoal, intencional e flexível, conectado em seu contexto

mais amplo. O ensino não existe por si mesmo, mas na relação com a

pesquisa e a aprendizagem.

Desse modo percebe-se que ensinar envolve a interação profunda entre

professores e alunos. Trata-se de um processo dinâmico e interdependente. É

um processo relacional que comporta a interação dialética do ensinar e

aprender.

A intencionalidade educativa está presente no processo de ensino,

sendo indicadora das concepções de quem a propõe. Nesse sentido, LA

TORRE afirma que “ensinar significa mais que transmitir conhecimentos,

significa desenvolver as potencialidades de uma pessoa. Ensinar é

intercambiar, confrontar, debater idéias e mediante estas atividades o sujeito

transcende seus conhecimentos adquiridos, gerando novas estruturas mentais:

aprende”. (1993, p.58)

Nesta perspectiva chamamos a atenção para três características

básicas do ensino: apreensão da realidade, ensino como processo articulado à

aprendizagem e ensino como prática social.

A primeira característica é que o ensino exige a apreensão da realidade.

A esse respeito RIOS “afirma que tratar o fenômeno do ensino como uma

totalidade concreta, buscar suas determinações, pensá-lo em conexão com

outras práticas sociais é o que se procura fazer, do ponto de vista de uma

concepção crítica do trabalho pedagógico” (2001, p.55). Analisar e revisar o

processo de ensino à luz do contexto social, às mudanças ocorridas na

instituição educativa e às condições objetivas do exercício profissional é uma

tarefa do professor. Essas mudanças exercem uma influência no planejamento

e no desenvolvimento do processo pedagógico.

A segunda se baseia na idéia do ensino como processo que se articula

à aprendizagem. É uma ação consecutiva de aprendizagem.

A terceira característica diz respeito à visão de ensino como prática

social específica que determina o desenvolvimento social e cognitivo dos

alunos, sujeitos de aprendizagem. O ensino como prática social é uma

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atividade profissional complexa que exige preparo, compromisso e

responsabilidade do professor para instrumentar política e tecnicamente o

aluno, ajudando-o a constituir-se como sujeito social.

Os objetivos do ensino visam melhorar os resultados de aprendizagem

dos alunos e elevar a qualidade de sua formação. Para tanto, os professores

devem ter conhecimento da como os estudantes aprendem e sob quais

condições a aprendizagem é encaminhada para o sucesso. Uma preocupação

essencial é a que diz respeito à heterogeneidade de estudantes na sala de

aula, os quais têm diversos interesses, diversas motivações, capacidades e

expectativas. A tarefa-chave do professor é garantir a organicidade e coerência

ao processo de ensinar e aprender.

Dizer que o professor ensina algo que os alunos devem aprender e que

muitas vezes, de fato aprendem, não implica assumir que ensinar seja igual

apenas a transmitir conhecimento, este pensado como um conjunto de

proposições a respeito de determinado assunto, tema ou fato. Também não

implica admitir que o professor só ensina os alunos a fazer alguma coisa, como

se imagina em certas versões das pedagogias renovadas.

Ensinar é um termo de grande alcance, que pode recobrir diversos

significados e produzir diferentes resultados naqueles que aprendem,

conforme insiste PASSMORE quando cita que “os meios que permitem saber

se alguém é um bom professor não consiste em verificar se escreve com

clareza no quadro, se mantém a disciplina ou se sabe utilizar o mais recente

apoio visual, mas se os alunos aprendem o que lhes tenta ensinar” (2001,

p.65).

A aula: núcleo da atividade na escola Hoje, o que chamamos de escola ou sistema escolar é algo muito

semelhante no mundo todo. Se algum estudante do século XVII pudesse ser

transportado numa viagem pelo tempo até os dias de hoje e, por acaso, caísse

numa sala de aula, ele se encontraria no que lhe pareceria um ambiente

familiar. Alguns detalhes poderiam parecer diferentes, mas muitos seriam

reconhecidos: uma sala retangular, com cadeiras e mesas, um quadro negro, à

frente um adulto controlando e supervisionando as atividades, várias crianças

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ou jovens, todos mais ou menos da mesma idade, cumprindo algumas tarefas,

instrumentos e suportes para receber a escrita (antes, giz e pequenas lousas

de ardósia e o grande quadro-negro; mais recentemente lápis, caneta,

cadernos), livros e, eventualmente, outros instrumentos que poderiam ser

percebidos com alguma facilidade como sendo escolares, tais como mapas,

quadros, ilustrações.

Voltando o pensamento para a escola pública atual, questiona-se de

que forma as atividades de ensino podem cumprir sua intenção inicial que é a

de produzir aprendizagem significativa para todos os seus alunos?

Inicialmente é preciso que se admita que há algo relevante para se

ensinar e que deve ser aprendido pelos alunos. Mas, é preciso que na

organização do ensino fique indicada a possibilidade de que o aluno aprenda o

conteúdo proposto.

Acontece que, se o ensino é uma atividade diretamente ligada ao

conteúdo que é ensinado, há, no entanto, um conjunto de problemas e de

questões comuns que envolvem quase todos os tipos de ensino, em especial o

que se pratica nas escolas e que não dependem exclusivamente do conteúdo

daquilo que se ensina como, por exemplo, os fatores que envolvem os agentes

de ensino e da aprendizagem, o professor e alunos, a relação pedagógica no

sentido mais amplo, os problemas da disciplina e da indisciplina, as

dificuldades ligadas à avaliação dos resultados da aprendizagem.

Para entender as diversas configurações com que essas questões de

ensino aparecem, devemos concentrar nossa atenção nesse núcleo da

atividade que é a aula.

A aula é a concretização do ensino. É o momento em que o professor

executa os procedimentos preparados anteriormente. Supostamente, um

planejamento bem realizado deveria garantir o sucesso e a eficiência desse

empreendimento. No entanto, sabemos que não é bem assim. A nossa

experiência com alunos já nos fez perceber que uma aula é uma atividade que

se realiza sob risco permanente: um acontecimento imprevisto, uma gracinha,

uma pergunta tendenciosa de um aluno, ou qualquer outro acontecimento

pode fazer uma aula desviar-se de seu foco principal.

De acordo com CORDEIRO “para entender as diferenças de

expectativas com que os alunos vêem para a escola e também os diferentes

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níveis de resultados efetivos que se consegue em termos de aprendizagem

dos alunos, num primeiro momento o professor deve deter-se de modo mais

demorado na aula. O que acontece ali? O que é proposto e o que se consegue

fazer efetivamente?” (2007, p.37 ).

Acredita-se que na sala de aula, as atividades físicas ou mentais devem

permitir a interpretação da realidade e a construção de significados, tanto para

o aluno quanto para o professor, permitindo novas possibilidades de ação, de

reconstrução de conhecimento. Nesse processo de interação com o objeto do

conhecimento, o aluno e o professor, como sujeitos, constroem novas

representações.

Com esta conotação, a concepção de ensino e de aprendizagem deve

ser concebida como um ato de confronto, de perspectivas inacabadas, que

provoca a passagem de um lugar para outro, ou seja, o professor e o aluno

poderão entender que o conhecimento resulta do trabalho coletivo e

historicamente construído. Portanto, o conhecimento pode ser revisto,

enriquecido, transformado pelas múltiplas relações estabelecidas na sala de

aula.

Percebe-se que é fundamental discutir o espaço da sala de aula como

um espaço de investigação de tudo o que se passa no processo de ensino e

aprendizagem: os sujeitos envolvidos, as relações de poder, as experiências

vividas, o objeto de conhecimento oferecido, a metodologia, as formas de

avaliação, os sinais que emergem. Para tal, é necessário haver troca entre

professor e aluno. Sem trocas não há como criar, investigar, crescer e produzir

conhecimento. O professor e o aluno devem construir juntos a experiência de

aprender. A pedagogia dialética condiciona o contexto da sala de aula, na qual

eles vivenciam o fenômeno educativo.

A sala de aula é um espaço privilegiado, pois pode igualar o discurso do

professor e do aluno, traduzindo-se em uma proposta educacional que

compreende a dinâmica da igualdade, pois é na relação professor-aluno que

se estabelece a oportunidade para a construção do processo de ensino e

aprendizagem.

Na atuação do professor estão em jogo valores ligados aos próprios

conteúdos escolares e valores referentes às questões sociais que permeiam

toda a ação educativa. Na aula, o professor precisa estar atento às

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interferências, pois ele se posiciona e incentiva atitudes, influencia as relações

de respeito e a construção de auto-estima dos alunos, ou não. Nesse enfoque,

a sala de aula não é apenas um local para transmitir conteúdos teóricos, é

também, local de aprendizado de valores e comportamentos, de aquisição de

uma mentalidade científica, lógica e participativa que poderá possibilitar ao

aluno bem orientado, interpretar e transformar a sociedade e a natureza em

um benefício do bem estar coletivo.

Professor: discurso e expectativas SAVIANI (1995) passa um recado aos professores para que se

empenhem no domínio de formas que possam garantir às camadas populares

o ingresso na cultura letrada, vale dizer, a apropriação dos conhecimentos

sistematizados. E, no interior das escolas, lembrem-se sempre de que o papel

próprio dos professores será provê-las de uma organização tal que cada

criança, cada educando, em especial aquele das camadas trabalhadoras, não

veja frustrada a sua aspiração de assimilar os conhecimentos metódicos,

incorporando-os como instrumento irreversível a partir do qual será possível

conferir uma nova qualidade às lutas no seio da sociedade.

Tal como aparece hoje, a profissão docente exibe, mesmo aos olhos do

observador comum, sinais evidentes de precariedade, visíveis pela simples

comparação com datas passadas. Atualmente, os usuários da escola vivem

nostalgias, que em geral valorizam mais o que já passou (a minha escola, a

minha professora), onde não é difícil constatar a perda de prestigio, de poder

aquisitivo, de condições de vida e, sobretudo de respeito e satisfação no

exercício do magistério.

Todas as vezes que se lastima o declínio da profissão docente acaba-se

por voltar, em última instância, ao fator econômico, que se encontra na base

do processo de decadência do magistério, aliado a outros fatores a ele

agregados. Há 30 ou 40 anos atrás, o salario do professor representava

garantia de vida digna para o profissional celibatário, ou uma ajuda

considerável no orçamento familiar dos casados.

Em sã consciência, será que alguém poderia condenar um profissional,

de qualquer área, por ficar desmotivado trabalhando numa situação ao menos

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próxima à que vive hoje o professor brasileiro? E ainda assim, a motivação é

grande, verdadeiro milagre, face às barreiras e dificuldades que enfrentam.

Muitos estão adoecendo na profissão, a chamada síndrome de Bournout. Há,

sim, professores deprimidos, há os que emigram para outras profissões, enfim,

há o que é natural que haja em tal situação. Mas, por incrível que pareça, há

ainda muitos motivados e prontos para assumir mais e mais tarefas

educacionais. São esses que lotam auditórios, participando de cursos,

seminários e congressos para discutir problemas, inventar hipóteses, tentar

soluções, trocar experiências, bem ou mal sucedidas.

O professor na verdade é um herói, o grande herói brasileiro anônimo,

movido por uma espécie de convicção interior, que o domina e faz continuar

tentando, tentando, tentando. Sem essa abençoada compulsão, o que seria do

sistema educacional brasileiro?

Afinal, de que profissão se está falando quando se trata do magistério?

Hoje, sua preparação pode ser feita em diferentes instituições formadoras, até

mesmo em níveis de ensino diferentes. Assim, convivem agora os cursos

oferecidos pelas Universidades, como os de Pedagogia e de Licenciatura, o

Curso Normal Superior, dentro dos Institutos Superiores de Educação, e ainda

o antigo Curso Normal, em nível médio. Essa é apenas uma das dificuldades

que se levantam quando tentamos entender o magistério como uma profissão.

O contato com vasta literatura sobre o tema permite ao mesmo tempo,

perceber características mais ou menos consensuais entre os especialistas no

assunto, quando se trata de conceituar uma profissão, mas também certos

traços quase incompatíveis, ao tentar aplicar esse conceito ao magistério.

Entre os vários estudiosos, destaca-se BOURDONCLE (1991 e 1993), com

dois artigos que, numa visão ao mesmo tempo histórica e sociológica,

desvelam o panorama no qual vem se desenvolvendo o grupo ocupacional

dedicado ao magistério, ao longo dos tempos. O autor traz à tona as

dificuldades de conceituação do que seja uma profissão e procura identificar os

atributos essenciais comuns a todas as profissões: a) uma profunda base de

conhecimentos gerais e sistematizados; b) o interesse geral acima dos

próprios interesses; c) um código de ética controlando a profissão pelos

próprios pares; d) honorários como contraprestação de um serviço e não a

manifestação de um interesse pecuniário.

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Tratando do aspecto estratégico e da desvalorização do saber docente,

conclui-se que essa relação é, no mínimo, ambígua. Ao mesmo tempo em que

se evidencia a importância do saber docente na sociedade da informação,

percebe-se que a profissão de professor não mantém o mesmo prestigio

social. Primeiro, por uma divisão de trabalho na qual os professores

universitários foram assumindo a pesquisa e professores da educação básica,

a formação. Segundo, por causa da relação moderna entre saber e formação,

deslocando o foco dos saberes em si para procedimentos de transmissão

desses saberes. Terceiro, o aparecimento das Ciências da Educação, fazendo

com que a Pedagogia passasse a se subdividir em muitas especialidades.

Quarto, pelo fato de as instituições escolares serem tratadas como uma

questão pública. Finalmente, a desconfiança dos diversos grupos sociais com

relação aos saberes transmitidos pela escola, por avaliarem que estes têm

pouca aplicabilidade na sociedade atual.

Os discursos e as expectativas recaem sobre o professor como se ele

fosse o salvador da pátria, mas, na prática, não são dadas a esse profissional

as condições necessárias de responder adequadamente ao que se espera

dele.

Aluno: a vivência coletiva na escola Se o professor constitui sua identidade, tanto a profissional quanto a

pessoal, com base na sua relação com a escola, o mesmo acontece com a

criança e o jovem na sociedade moderna.

A experiência mais duradoura e mais comunitária, por assim dizer, que

tem marcado a vida de quase todos nos tempos recentes é a da passagem e

da vivência coletiva na escola.

Isso pode ser percebido com bastante clareza quando são selecionadas

nas obras literárias aquelas que se ocupam de expor as memórias de autores

e autoras. Percebe-se, em grande parte delas, que as referências ao período

da infância costumam ser fortemente marcadas pelas lembranças dos tempos

de escolas. Neste sentido, ser criança e ser jovem é, em larga medida, ser

estudante, ser aluno.

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É preciso reconhecer o aparecimento de um novo modelo de

estudante, para quem a experiência da escolarização já deixou de ser a

principal maneira de construção da sua identidade e das representações de

criança e jovem.

Progressivamente, o currículo, compreendido enquanto todo o

conjunto de atividades e de experiências formadoras tende a se desvincular da

escola, passando esse papel a ser exercido predominantemente pelos

conteúdos veiculados na indústria cultural, principalmente, a televisão e a

internet. Como as novas gerações estão se formando num momento em que

se perdeu o sentido de continuidade entre passado, presente e futuro, ou seja,

o próprio sentido da história, se ocupando apenas com o presente, o diálogo

com as gerações anteriores da qual provém os próprios professores torna-se,

no mínimo, tenso.

O tempo destinado a uma aula pode parecer excessivamente

monótono para quem foi programado desde muito cedo para se mover num

outro ritmo e numa outra percepção de tempo. A escola continua operando

com a temporalidade do momento anterior e diante das dificuldades

encontradas, tenta se adaptar ou seduzir os alunos, acenando com algumas

modificações superficiais que tornem o currículo escolar mais atraente ou

interessante.

A passagem pela escola foi durante muito tempo, para a grande

maioria das crianças, a principal e mais importante experiência de

socialização, mas na sociedade atual, outras instâncias sociais contribuem

com grande força para essa socialização.

Admitindo-se que exista hoje uma outra instância, muito poderosa

dessa socialização, a qual se constitui e opera no universo da cultura da mídia,

a escola continua tendo bastante peso, embora ela tenha que ser ponderada

juntamente com esses outros espaços e instituições, onde se acrescenta a

própria família.

Na escola, a maioria dos alunos se encontra com colegas de mesma

idade e de condições físicas, emocionais e intelectuais muito mais próximas,

tanto no espaço do recreio, do pátio e da quadra de esportes, quanto na sua

própria classe, durante os intervalos, oficiais ou inventados pelos alunos,

diante dos ritmos diferenciados de realização das tarefas escolares. É nessa

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instância de socialização entre os iguais, que se constituem e onde se afirmam

aspectos importantes da construção da personalidade de cada um dos alunos.

Do ponto de vista dos alunos, a escola possui uma dimensão afetiva e

relacional que é percebida por eles, muitas vezes e em diversos momentos,

com o mais relevante e significativo do que aquilo que a escola formalmente se

propõe a cumprir em termos do ensino e da aprendizagem de um conjunto de

saberes propriamente escolares. Do ponto de vista da escola e dos

professores, seria importante levar isso em consideração.

CORDEIRO afirma que “as soluções para diversos problemas

enfrentados hoje nas escolas e que são entendidos como exclusivamente

pedagógicas, pudessem ser mais claramente percebidas se fossem levadas

em consideração esses aspectos sociais e se fosse aproveitado esse ímpeto

ou essa vontade que move os alunos para a escola, para além das obrigações

impostas pelos pais e das cobranças dos demais adultos” (2007, p.84).

Ser aluno, portanto, só pode ser compreendido a partir da noção de

transitoriedade que vai da situação de paciente, daquele que recebe a ação do

trabalho institucional e pedagógico da escola, até a situação de agente, aquele

que durante o processo da aprendizagem e com base nele, conquista sua

liberdade por meio da aquisição de um conjunto de instrumentos, modos de

agir, valores, pensar e se relacionar com o mundo, com a sociedade, com as

pessoas.

Compreender o aluno por meio desta perspectiva da transição, de uma

situação que se transforma continuamente, pode ajudar os professores a rever

seus juízos e atenuar a rigidez das suas classificações: aluno bom, mau, forte,

fraco, pois conforme PATTO, “rever os juízos sobre os alunos também pode

conduzir os professores a serem mais flexíveis nas cobranças que eles

acabam impondo a si próprios”. (1991, p.98)

Isso não deve implicar, obviamente, rebaixar a qualidade do trabalho.

Mas pode e deve atenuar o tipo de exigências impostas por um tipo de

perfeccionismo que costuma caracterizar a profissão docente e que resulta nos

fortes sentimentos de culpa que nos têm marcado nos últimos tempos.

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Gestão do conhecimento na sala de aula A partir dos anos 90, as Políticas Públicas Educacionais no Brasil

afirmam, de forma explicita, a importância de garantir aos cidadãos uma

igualdade de oportunidades face à educação. Esta preocupação tem sido

atendida progressivamente por meio de diferentes medidas tomadas e que

tentam contribuir para que as crianças oriundas das classes populares tenham

uma igualdade de acesso à escola.

De fato, muitas crianças, adolescentes e jovens entram e

permanecem, pelo menos algum tempo, na escola. É também discutível que

os grupos socioculturais de origem desses alunos são muito diversificados. No

entanto, através de pesquisas na realidade escolar percebe-se que essa

igualdade de acesso que a escola pública tenta oferecer não é geralmente

acompanhada de uma igualdade de sucesso dos alunos que a freqüentam.

As pesquisas revelam ainda, que o sucesso acontece de modo

desigual, nos diferentes grupos socioculturais que constituem a população

escolar. Quem tem mais sucesso na escola são, sobretudo, os alunos da

classe media e da classe alta, face às oportunidades de acesso à múltiplas

formas de conhecimento.

A escola oferece habitualmente um tipo único de processo de ensino,

embora a população escolar seja bem heterogênea quanto às origens sociais,

étnicas e culturais. A escola constrói-se e funciona para o aluno ideal. A

presença da participação de grupos com comportamentos diferentes é por

vezes perturbadora de seu funcionamento. A distância entre as propostas, as

exigências da escola e o tipo e nível de saberes e interesses dos alunos é

demasiada grande. As linguagens e os interesses divergem. Assim, se poderá

em parte explicar o pesado insucesso que acontece na escola pública ou

particular, no meio urbano ou rural.

No entanto cada um destes grupos de crianças são detentoras de

saberes específicos e se posicionam, face aos problemas do cotidiano de uma

maneira própria. Não pode, portanto deixar de se pensar como será

enriquecedor para todos que o “diferente”, em vez de ser considerado estranho

ou ignorante, seja tido como alguém que tem muito a desvendar para o grupo,

tem uma contribuição própria no processo educativo.

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No momento em que o professor passa a conhecer os seus alunos e se

dá conta de suas diversidades poderá desenvolver propostas flexíveis e

variadas de ensino e, é na gestão destas propostas na sala de aula que o

conhecimento necessário e significativo se faz presente no processo de ensino

e aprendizagem.

Na sala de aula, as atividades físicas ou mentais devem permitir a

interpretação da realidade e a construção de significados, tanto para o aluno

quanto para o professor, permitindo novas possibilidades de ação, de

apropriação de conhecimento. Nesse processo de interação com o objeto do

conhecimento, o aluno e o professor constroem novas representações. É

nessa relação que o professor e aluno estabelecem a oportunidade para

construção do processo de ensino e aprendizagem.

Na atuação do professor sempre estão em jogo valores, tanto ligados

aos próprios conteúdos escolares, quanto referentes às questões sociais que

permeiam toda ação educativa. O professor precisa estar atento às

interferências, pois ele se posiciona e incentiva atitudes, influencia as relações

de respeito e a construção de auto-estima dos alunos.

MOURA (2001), ao falar da gestão do conhecimento pedagógico,

enfatiza entre outros aspectos, o processo de tomada de decisões pelo

professor sobre: que conteúdo trabalhar? Com qual objetivo? De que forma?

Com quais recursos? Em que tempo? Para qual aluno? Para que tipo de

sociedade?

Ao enfatizar o processo de tomada de decisões, MOURA destaca de

modo especial a figura do professor, profissional que administra grande parte

dessas decisões. Ser um professor mediador não pode significar ser um

observador passivo dos fatos que se desenrolam na sala de aula. Mediar é

essencialmente decidir, dirigir, intervir, avaliar, reconduzir, desencadear ações

de apoio ao aluno para que a aprendizagem efetivamente aconteça.

É preciso conhecer a realidade para planejar e tomar decisões quanto às

estratégias de trabalho, pois o professor é quem, em última instancia, decide

os aspectos a serem desenvolvidos na classe, especificando quanto tempo

dedicará a uma determinada matéria, que tópicos vai ensinar, a quem os

ensina, quando e quanto tempo conceder-lhe-á e com que qualidade serão

aprendidos.

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Confrontando a teoria com a realidade escolar

Para melhor relacionar a fundamentação teórica com o contexto real

da escola, foi proposta uma ação de intervenção contemplando o Projeto PDE-

PR, no Instituto de Educação Professor Cesar Prieto Martinez, no primeiro

semestre de 2009. A intervenção foi realizada sob a forma de grupo de

estudos com 30 professores e Oficina Pedagógica com 50 alunos do Curso de

Formação de Docentes para a Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino

Fundamental. Inicialmente, para fins de diagnóstico, foi aplicado um

questionário para todos os participantes com a finalidade de verificar os limites

e possibilidades da ação pedagógica no interior da sala de aula, numa reflexão

sobre a trajetória de cada um e de todos.

Após análise comparativa e reflexiva entre o referencial teórico e a

prática pedagógica dos professores, foi constatado que 90% demonstraram

uma preocupação em articular a competência, a técnica e a política existente

no seu trabalho docente, reforçando o pensamento de MELLO (1992), quando

cita que a competência profissional envolve várias características as quais são

importantes indicar. Em primeiro lugar, o domínio adequado do saber escolar a

ser transmitido, juntamente com a habilidade de organizar e transmitir esse

saber, de modo a garantir que ele seja efetivamente apropriado pelo aluno. Em

segundo lugar, uma visão relativamente integrada e articulada dos aspectos

relevantes mais imediatos de sua própria prática, ou seja, um entendimento

das múltiplas relações entre os vários aspectos da escola, desde a

organização dos períodos de aula, passando por critérios de matrícula e

agrupamento de classes, até o currículo e os métodos de ensino. Em terceiro,

uma compreensão das relações entre o preparo técnico que recebeu, a

organização da escola e os resultados de sua ação. Em quarto, uma

compreensão mais ampla das relações entre escola e a sociedade, que passa

necessariamente pelas questões de suas condições de trabalho e de

remuneração.

O restante dos professores, ou seja, 10% responderam com evasivas,

demonstrando preocupação com o fazer, sem levar em conta o saber bem ou

fazer bem. Esses professores são denunciados por SAVIANI (1991) como

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pertencentes de uma fase romântica, onde os mesmos estão sempre

ocupados com seus fazeres fragmentados, tornando fragil o processo

pedagógico.

No mesmo período foi entregue um questionário evidenciando as

questões que envolvem o processo de ensino e aprendizagem para os alunos.

Após análise das respostas foi constatado que mesmo possuindo uma visão

romântica da educação escolar, 100% dos alunos indicaram a competência

técnica e o compromisso político, fundamentais para o profissional da

educação.

Na continuidade dos trabalhos, durante a Oficina Pedagógica, os alunos

demonstraram a preocupação com uma boa formação profissional propulsora

do espírito de equipe, trabalho em colaboração, construção coletiva, exercício

responsável da autonomia profissional e adequadas condições de trabalho.

Nos dias em que foram realizados os grupos de estudos com

professores, foi feita a leitura e análise do Caderno Temático do PDE/2008,

oriundo da produção didático-pedagógica da professora autora deste artigo. Os

textos contidos no Caderno Temático forneceram suporte e elencaram

subsídios para as discussões sobre a gestão do conhecimento na sala de aula,

propiciando assim, elementos para os encaminhamentos metodológicos da

intervenção pedagógica.

O grupo de estudos entre os professores do Instituto de Educação

resultou em maior conscientização de cada um e de todos no processo de

melhoria da qualidade do Curso. Assim, foram pontuadas algumas questões

fundamentais para a melhoria do Curso de Formação de Docentes do já

referido estabelecimento de ensino:

• uma adequada gestão da heterogeneidade constituída através do

posicionamento do professor e também da organização de turmas

poderá contribuir para um maior sucesso escolar dos diferentes tipos

de alunos e uma maior aproximação do que se designa por escola

democrática;

• numa escola em que esta gestão não é feita, em que a diversidade não

é valorizada, sobrevivem com mais facilidade os alunos que pela sua

origem sociocultural, estão naturalmente mais próximos dos saberes,

valores e das normas que vigoram na escola;

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• se a educação escolar tem como objetivo fundamental promover, de

forma intencional, o desenvolvimento de certas capacidades e a

apropriação de determinados conteúdos da cultura, necessários para

que os alunos possam ser membros ativos, em seu âmbito sociocultural

de referência, o professor deve conseguir o difícil equilíbrio de oferecer

uma resposta educativa, tanto compreensiva quanto diversificada,

posicionando uma cultura comum a todos os alunos, que evite a

discriminação e a desigualdade de oportunidades e, ao mesmo tempo,

que respeite suas características e suas necessidades individuais;

• as dimensões do processo de ensino e aprendizagem através da

dimensão lingüística mediadora do diálogo na sala de aula, a dimensão

pessoal estabelecendo vínculos afetivos e relacionais entre professor e

alunos e a dimensão cognitiva com base na relação triática, isto é,

numa relação entre professor, aluno e conhecimento;

• a gestão do conhecimento poderá contribuir para uma educação

escolar de qualidade para todos, pois redimensiona o papel dos

professores e exige uma formação muito superior à atual, que não

atende mais às reais necessidades dos usuários do sistema educativo.

É relevante o papel dos professores para a formação dos alunos e,

consequentemente, é urgente uma formação adequada ao exercício

profissional e condições necessárias para um trabalho educativo eficaz.

• não se trata de responsabilizar pessoalmente os professores pela

insuficiência das aprendizagens dos alunos, mas de considerar que

muitas evidências vem revelando que a formação de que dispõem não

tem sido suficiente para gestar o conhecimento imprescindível para que

crianças e jovens não só conquistem sucesso escolar, mas,

principalmente, capacidade pessoal que lhes permita plena participação

social num mundo cada vez mais exigente sob todos os aspectos. Além

de uma formação inicial consistente, é preciso proporcionar aos

professores oportunidades de formação continuada: promover seu

desenvolvimento profissional é também intervir em suas reais

condições de trabalho;

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• uma boa formação profissional, inicial e continuada, aliada a um

contexto institucional que favoreça o espírito de equipe, o trabalho em

colaboração, a construção coletiva, o exercício responsável de

autonomia profissional e adequadas condições de trabalho, são

ingredientes sem os quais não se alcançará a qualidade pretendida na

educação. São, na verdade, direitos dos profissionais da educação,

principalmente se a meta for a qualidade real. E devem ser objeto de

sua luta se a meta da categoria for a conquista de níveis superiores de

profissionalização, não apenas o salario e as condições de trabalho,

que são reivindicações históricas, mas, também , as demais condições

que permitam aos educadores não só oferecer um ensino que de fato

promova a aprendizagem, mas, também, intervir nos destinos da

educação e da profissão.

Estas considerações poderão contribuir para fundamentar reflexões sobre as

decisões referentes à organização do trabalho na sala de aula, reconhecendo

que poderão ter efeitos muito importantes no significado e nos resultados de

todo o processo pedagógico.

O descortinar das possibilidades para uma gestão do conhecimento no espaço da sala de aula

Segundo MOREIRA, Há que se valorizar a escola pública, guardá-la no coração e defendê-la de

quaisquer ataques que possa vir a sofrer. Ela é uma instituição que temos procurado com muito esforço construir, e que precisamos preservar , atualizar e aperfeiçoar. Ainda que não mude o mundo, a escola pode ajudar o estudante a melhor entender como o mundo opera, o que é condição indispensável para se operar neste mundo. (2009, p. 12)

A escola pública é um dos lugares privilegiados onde as crianças e

jovens podem ampliar os seus saberes, em face da complexidade da

sociedade contemporânea, e assim tornarem-se capazes de exercerem a sua

condição de cidadãos, num país marcado por profundas desigualdades

sociais.

Nesse propósito, o professor enquanto gestor do conhecimento, deve

colocar sua competência técnica e pedagógica a serviço do coletivo da escola,

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zelando pela aprendizagem de todos os seus alunos, pois disso depende os

rumos da educação brasileira.

Assim, a formação de professores destaca-se como um tema crucial e,

sem dúvida, uma das mais importantes dentre as políticas públicas para a

educação, pois os desafios colocados à escola exigem do trabalho educativo

outro patamar profissional, muito superior ao hoje existente.

Faz-se necessário analisar as possibilidades dos limites no Curso de

Formação de Professores, com a finalidade de alterar a situação hoje vivida,

no interior das escolas e, principalmente, nas salas de aula.

Constata-se algumas positividades que apontam também alternativas e

desafios, presentes nas Diretrizes Curriculares dos Cursos Formadores de

Professores, quais sejam:

a) A realidade educativa em que o professor atua é complexa, mutável, frequentemente conflituosa, e apresenta problemas que não são facilmente categorizáveis e nem sempre possibilitam soluções a priori.

Nesse sentido, o êxito profissional do professor depende de sua

capacidade de manejar a complexidade da ação educativa e resolver

problemas, por meio de uma interação inteligente e criativa.

Toda essa complexidade da atuação do professor diz respeito mais

especificamente ao seu trabalho docente. No entanto, existe ainda sua

atuação como membro da equipe pedagógica, sua participação no projeto

educativo da escola e na comunidade educacional. Isso implica uma ação

compartilhada e um trabalho coletivo dentro da própria escola e com diferentes

escolas, o que significa participar de eventos, estabelecer intercâmbios,

registrar, sistematizar, ser produtor de conhecimento. Portanto, sua ação

demanda trabalho coletivo, cooperativo, envolvendo diálogo com a

comunidade.

b) Ao buscar explicitar a natureza da atuação pedagógica para construir caminhos para a formação de professores no que diz respeito

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aos níveis de conhecimento, muitos estudiosos citam que esses conhecimentos nas ações são inconscientes e mecânicos.

É necessário que o professor, ao confrontar suas idéias, teorias e

crenças com a prática imediata, atue com sensibilidade, esteja flexível e aberto

para compreender e tomar decisões afinadas com sua intencionalidade e com

o que percebe de seus alunos e da situação educativa. A esse processo

chama-se reflexão na ação. Essa reflexão na ação é parte essencial no

trabalho do professor e não substitui a análise que se pode realizar a posteriori

sobre as características e processos da ação desenvolvida, a chamada

reflexão sobre a ação da competência.

c) A formação na perspectiva dos professores os levam a aprender um discurso que não modifica sua atuação junto aos alunos.

Uma verdadeira construção de competência profissional exige

experiência de atuação aliada à reflexão sistemática. Trazida para o processo

de formação de professores, a perspectiva de competência permite realizar a

formação prática sem ater-se aos limites do tecnicismo, de modo que o

professor aprenda a criar e recriar sua prática, apropriando-se de teorias,

métodos, técnicas e recursos didáticos desenvolvidos por outros educadores,

sem submeter-se a um receituário, nem à mera aplicação de teorias ou de um

repertorio de ações prévias e externamente programadas por outros. O

desenvolvimento da competência profissional permite ao professor uma

relação de autonomia no trabalho, criando propostas de intervenção

pedagógica, lançando mão de recursos e conhecimentos pessoais e

disponíveis no contexto, integrando saberes, sensibilidade e intencionalidade

para responder a situações reais, complexas, diferenciadas. Em síntese,

favorece uma verdadeira apropriação dos saberes já produzidos pela

comunidade educativa para elaborar respostas originais.

d) Os formadores de professores em suas diferentes inserções profissionais, em escolas de nível médio, em institutos superiores e universidades, nas secretarias de educação e nas próprias escolas do

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sistema educacional, muitas vezes não estão inseridos em um processo de desenvolvimento profissional continuo.

Na verdade o trabalho dos formadores referenda-se em situações

educacionais distintas: o processo de formação de professores e a realidade

em que esses vão atuar. Assim, os formadores precisam não apenas

compreender as questões da formação de professores como também

conhecer e dominar questões das salas de aula e escolas de educação básica

nas quais trabalham ou trabalharão os professores.

A competência do formador passa fundamentalmente pela capacidade

de analisar o trabalho dos professores com vistas a uma constante revisão e

desvelamento das crenças subjacentes às ações dos professores, de modo a

intervir com sucesso no desenvolvimento da competência profissional.

O trabalho de formação requer para os formadores espaços de

interlocução nos quais possam analisar a própria prática de formação, a de

outros formadores, e também as atividades dos professores. No caso dos

formadores que atuam nas escolas de formação inicial, a vigência de um

projeto educativo da escola viabiliza a existência desse espaço e a utilização

do tempo de trabalho dos profissionais para desenvolvimento curricular,

planejamento e atualização. Os professores das escolas de formação precisam

de atualização, discussão, planejamento, avaliação e replanejamento do

trabalho de formação que desenvolvem e o tempo destinado a isso deve estar

previsto em sua jornada regular de trabalho.

Tudo parece indicar, portanto, que uma boa formação profissional,

aliada a um contexto institucional que favoreça o espírito de equipe, o trabalho

em colaboração, a construção coletiva, o exercício responsável de autonomia

profissional e adequadas condições de trabalho são ingredientes sem os quais

não se alcançará a qualidade pretendida na educação. São, na verdade,

direitos dos profissionais da educação, principalmente se a meta for a

qualidade real que poderá levar à gestão do conhecimento na sala de aula,

seus limites e possibilidades.

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Considerações finais

O professor precisa ser reconhecido como o intelectual orgânico das

diversas classes sociais, um profissional que compreende a natureza do

trabalho coletivo na escola e que percebe a necessidade de pensar a

educação neste processo de contradição contra-hegemônico, que toma por

base as condições concretas e articula a educação às relações sociais,

democráticas e emancipadoras.

É um profissional que necessita pensar o papel da escola

historicamente e deve mediar as relações pedagógicas: aluno, currículo,

metodologia, processo de avaliação, processo de ensino e aprendizagem e

organização curricular. Precisa fazer, contudo, à luz de uma concepção de

educação voltada a um projeto de sociedade não excludente, não alienador,

não reacionário ou conservador. Um projeto de educação coletivo, democrático

e comprometido com o acesso das diversas classes sociais ao conhecimento

sistematizado. A função do professor, portanto, se delineia na ação intencional

que orienta a prática docente à luz de uma concepção de educação

progressista. Concepção esta voltada para a emancipação e cidadania dos

usuários da escola, comprometida com a formação cultural, com a difusão do

conhecimento vivo e com um projeto de sociedade de fato democrático.

Segundo FRANCO,

sempre imaginamos que uma política educacional pública deve expressar os anseios da comunidade a que se destinam, suas diretrizes e propostas, assim como imaginamos que uma política pública deve estar atenta e oferecer respostas às necessidades geridas e construídas na práxis histórica dos sujeitos que convivem em suas dimensões; no caso das políticas educacionais, referimo-nos aos educadores, aos que militam nas diversas esferas por onde a educação transita. Pressupomos ainda que uma política educacional, num estado de direito democrático, deve buscar canais de diálogo com os que estão implicados, direta ou indiretamente, com as conseqüentes normatizações de suas legislações. Acreditamos, eu e milhares de educadores, que as intencionalidades de uma política fundamentalmente a educacional, devem ser explícitas e dialogantes; devem ser expressas claramente e devem se reger por princípios e valores que fundamentam tais intencionalidades. Enfim, imaginamos que políticas públicas educacionais devem se pautar em pressupostos e expressar valores que justifiquem as escolhas e procedimentos tomados. Se não forem explícitos, tais pressupostos deixam de ser justificantes e passam a ser oportunistas, pois mudam de valor quando a situação se altera. (1996,p.72)

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Hoje, mais do que sempre, há um desafio para as bases da formação

dos professores que devem possuir ferramentas teóricas e práticas

necessárias que permitam aos alunos navegar pelas diversas realidades da

educação. Um caminho que lhes permitam colocar em seu horizonte

profissional, o projeto da escola e sociedade que acreditam e para os quais

orientam sua atuação e compromisso, mediante o agir de forma criativa e

transformadora na escola de educação básica, com suas contradições,

limitações e possibilidades.

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