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Nº 14 Outubro de 2003 Av. Brasil 4036/515, Manguinhos Rio de Janeiro, RJ 21040-361 www.ensp.fiocruz.br/publi/radis Fórum planeja integração de ações de saúde na Amazônia Legal SÚMULA DA IMPRENSA | TOQUES DA REDAÇÃO O SUS verde O SUS verde Controle Social dá o tom da 1ª Conferência Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêutica Mobilização na Fiocruz para a 12ª CNS

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Page 1: Fórum planeja integração Amazônia Legal · Saúde(SUS) está o Controle Social. É fun-damental, portanto, que todos compreen-dam a importância do SUS para a sociedade e zelem

N º 1 4 � O u t u b r o d e 2 0 0 3

Av. Brasil 4036/515, ManguinhosRio de Janeiro, RJ � 21040-361

www.ensp.fiocruz.br/publi/radis

Fórum planeja integraçãode ações de saúde na

Amazônia Legal

SÚMULA DA IMPRENSA | TOQUES DA REDAÇÃO

O SUS verdeO SUS verde

Controle Social dá o tom da1ª Conferência Nacional deMedicamentos e Assistência

Farmacêutica

Mobilização na Fiocruzpara a 12ª CNS

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Oano já está acabando, mas nuncatarde para se louvar uma linda

iniciativa da Secretaria de Saúde dePernambuco, com o apoio do Labora-tório Farmacêutico do Estado (Lafepe).O Almanaque de Pernambuco é real-mente um almanaque, daqueles quefaziam a alegria de nossos tios cultose versáteis, que vestiam linho brancoe desfilavam sua ‘erudição dealmanaque’ nas festas familiares.

Tem linguagem e estética popu-lar, regional, tem calendário com diassantos e datas cívicas, tem as fasesda lua, tem mil e uma curiosidades,receitas de doce e remédios casei-ros, tem pequenas biografias de no-táveis pernambucanos e tem tambémdicas sobre saúde.

Além de ser útil e divertido, emsua proposta de expressar a diversi-dade cultural da região e ainda trans-mitir conceitos de saúde sem imposi-ção nem ‘didatismo’, o pequeno livroparece reunir um bom potencial dedistribuição e economia.

Esse Almanaque de Pernambuco émesmo muitcho porreta e o Radis jáestá aguardando ansioso a edição 2004!

Almanaqueda Saúde

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Nº 14 — Outubro de 2003

editorialeditorialeditorialeditorialeditorial

Comunicação em Saúde 2

� Almanaque da Saúde

Editorial 3

� Diversidade e integração

Caco 3

Cartas 4

Súmula da Imprensa 5

Toques da Redação 6

Integralidade 7

� Atenção integral à Saúde inspiraciclo de palestras

O SUS Verde 8

� Construindo uma agenda de Saúdepara a Amazônia Legal

1ª Conferência Nacional deMedicamentos 12

� Política de Assistência Farmacêuticana mira da sociedade

12ª Conferência Nacional de Saúde 16

� Fiocruz discute propostas paraa Conferência

Serviços 18

Pós-Tudo 19

� Nossa Mãe

Ora, Pílulas... 19

Capa: Aristides Dutra

Desenhos de Caco Xavier

Agradecimentos a Anderson Leitão

cacocacocacocacocaco

OSUS é legal. A Amazônia também.Quantos países cabem nos cer-

ca de 5.217.250 km² que formam aárea da Amazônia Legal, da qual fa-zem parte os sete estados da Re-gião Norte e mais o Mato Grosso(Região Centro-Oeste) e parte doMaranhão (Região Nordeste) atéoeste do meridiano de 44º? Muitos.Muitas Bélgicas, Franças, Itálias,Suécias. E se pensarmos, não emtermos de área geográfica, mas emtermos de diversidade biológica,social, cultural? Quantos países ca-bem? Quase um mundo inteiro!

Muitos chegam a dizer que aAmazônia “é um outro Brasil”. Naverdade, a diversidade da regiãoespelha fielmente o Brasil, primeiroe único. Não existem ‘vários brasis’;existe um único Brasil, marcado peladiversidade, seja em relação às suascondições territoriais e climáticas,seja em relação à sua mestiça po-pulação de variadas etnias, influên-cias culturais e registros históricos.“O mestiço é que é o bom e o for-te”, dizia Darcy Ribeiro, um dosmaiores pensadores da diversidade-na-unidade brasileira.

Outro pensador, o economis-ta Carlos Lessa, defende a tese deque o brasileiro é “em essênciaantropofágico”, e exemplifica seuponto de vista com a mistura da co-zinha e dos temperos. “Que outro

povo entra num restaurante self-service e ‘monta’ um prato com ar-roz, feijão mulatinho, lasanha, sushi,farofa, carne de sol e camarão e ain-da por cima derrama em cima umapimentinha malagueta?” Nossa ori-gem e destino é a mistura.

A palavra que se assenta portrás de toda essa diversidade éintegração. Nas próximas páginas,você verá os primeiros passos deum grande e nacional projeto deintegração das ações da saúde paraa Amazônia Legal. É um desafio, éuma empreitada de grande risco,face às peculiaridades da Região,tanto geográficas quanto políticas.Mas o Projeto Amazônia Legal apon-ta para o respeito às políticas lo-cais e para o diálogo com, e en-tre, os também diversos atores daRegião. Esse parece ser um ótimocomeço.

O Radis estará acompanhandode perto a construção do ‘SUS Ver-de’ que, a exemplo do Brasil, tam-bém não é ‘um outro SUS’, mas omesmo e único SUS, cujos princípi-os gerais são a universalidade, aintegralidade e a eqüidade. O mes-mo e único SUS brasileiro, mesti-ço, antropofágico e diverso, cujomaior objetivo é assegurar e pro-mover a saúde plena do cidadãobrasileiro, mestiço, diverso e, sim,essencialmente antropofágico.

Diversidade e integração

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RADIS 14 � OUT/2003

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expedienteexpedienteexpedienteexpedienteexpediente

USO DA INFORMAÇÃO — O conteúdo da revista Radispode ser livremente utilizado e reproduzido em qual-quer meio de comunicação impresso, radiofônico,televisivo e eletrônico, desde que acompanhado doscréditos gerais e da assinatura dos jornalistas respon-

RADIS é uma publicação da FundaçãoOswaldo Cruz, editada pelo ProgramaRadis (Reunião, Análise e Difusão de In-formação sobre Saúde), da Escola Nacio-nal de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp).

Periodicidade: MensalTiragem: 42 mil exemplaresAssinatura: Grátis

Presidente da Fiocruz: Paulo BussDiretor da Ensp: Jorge Bermudez

PROGRAMA RADISCoordenador: Rogério Lannes RochaEditor: Caco Xavier

Subeditora: Ana Beatriz de NoronhaSubeditor de Arte: Aristides DutraAssistente de Arte: Hélio NogueiraRedação: Katia Machado e Carlos

Gustavo TrindadeEstudos e Projetos: Justa Helena Franco

(gerência de projetos), JorgeRicardo Pereira e Laïs Tavares

Secretaria de Administração eInfraestrutura: Onésimo Gouvéa,Márcia Pena, Vanessa Santos eCícero Carneiro

EndereçoAv. Brasil, 4036, sala 515 — ManguinhosRio de Janeiro / RJ — CEP: 21040-361Telefone: (21) 3882-9118Fax: (21) 3882-9119

E-Mail: [email protected]: www.ensp.fiocruz.br/publi/radisImpressão e FotolitoEdiouro Gráfica e Editora SA

sáveis pelas matérias reproduzidas. Solicitamos aosveículos que reproduzirem ou citarem conteúdo denossas publicações que enviem para o Radis um exem-plar da publicação em que a menção ocorre, as refe-rências da reprodução ou a URL da Web.

ccccc ararararartttttasasasasas Em defesa do SUSEm defesa do SUSEm defesa do SUSEm defesa do SUSEm defesa do SUS

IRREGULARIDADES DEVEM SER APURADAS

Cidadãos usuários do SUS em Betimestão indignados com os desman-

dos ocorridos durante a ConferênciaRegional de Vianópolis. Entre outrascoisas, eles reclamam que os convi-tes para a Conferência, que deveri-am ser entregues com protocolo,segundo determinação do ConselhoMunicipal de Saúde de Betim, foramentregues apenas a alguns escolhidose sem protocolo. Para completar, oevento marcado para o dia 7 de se-tembro (domingo), foi antecipado deúltima hora para o sábado anteriorsem aviso aos usuários. Os trabalha-dores contratados da prefeitura tam-bém foram ameaçados de demissãocaso não fossem à Conferência e vo-tassem nos candidatos indicados parao Conselho Municipal de Saúde deBetim. Além disso, a eleição dos con-

selheiros que, segundo a pauta e atradição, deveria ser o último acon-tecimento do dia foi feita no iníciodo evento porque um dos candida-tos indicados alegou que precisavair embora. O resultado é que o con-selheiro eleito não participou da Con-ferência Regional de Saúde, contra-riando as normas que dizem que osconselheiros devem participar até ofinal das Conferências. O ConselhoMunicipal de Saúde de Betim tam-bém baixou normas que acabaram li-mitando a participação popular nasconferências (jornal ‘O tempoBetim’, de 29 de agosto a 4 de se-tembro), indo de encontro ao temada 7ª Conferência Municipal de Saú-de que é ‘A sociedade contribuindopara os novos rumos do SUS’.

Alex BezerraPresidente da Associação Comunitá-ria dos Moradores de Vianópolis eRegião (Comvir)

� Segundo o coordenador-geral da12ª Conferência Nacional de Saúde,Eduardo Jorge Martins, todas as de-núncias sobre irregularidades ocorri-das em conferências regionais, mu-nicipais ou estaduais devem serencaminhadas ao Conselho Nacionalde Saúde ([email protected]) para se-rem devidamente apuradas.

Entre os príncípios do Sistema Único deSaúde(SUS) está o Controle Social. É fun-

damental, portanto, que todos compreen-dam a importância do SUS para a sociedadee zelem pelo seu bom funcionamento. Dian-te disso, vale a pena resgatar alguns tre-chos do artigo ‘O SUS é do Brasil’, que ocoordenador-geral da 12ª Conferência Na-cional de Saúde, Eduardo Jorge Martins,publicou na Folha de São Paulo, de 01 deoutubro. Definindo o SUS como “o maiorprograma de inclusão social, a maior refor-ma de Estado em andamento e a únicapolítica pública realmente universalista eigualitária do Brasil”, ele lembra do tem-po em que apenas os servidores públicose os trabalhadores com registro em car-teira profissional tinham direito à saúdegarantido em lei. “O SUS não tem dono e apartidarização o enfraquece”, diz Eduar-do Jorge, explicando que o bom funciona-mento do sistema exige um trabalho con-junto dos governos federal, estaduais emunicipais, e a colaboração e a continuida-de entre administrações de diferentes par-tidos. De acordo com o artigo, 58% do fi-nanciamento do SUS é federal, 18% estaduale 24% vêm dos municípios, que executam,com bons resultados, a maior parte dos ser-viços. “A melhoria na classificação do Brasilno último ranking do IDH da ONU deveu-seà melhoria dos indicadores de saúde”, lem-bra Eduardo Jorge, lamentando que, ape-sar disso tudo, a elite brasileira ignora edespreza o SUS, mesmo usando o sistemanas vigilâncias epidemiológica e sanitária,nas urgências e em atendimentos realmen-te caros. Para ele, somente o desprezo ex-plica os golpes “classistas” que o SUS so-freu nos últimos dez anos — corte de 50% doseu orçamento federal, dificuldade de apro-vação da CPMF e corte de outras fontestradicionais de financiamento — e que estásofrendo agora, quando se descumpre os-tensivamente a Emenda Constitucional (EC29), que prevê recursos crescentes para aárea da Saúde. Pela Constituição, em 2004,o orçamento federal para o SUS deveria terR$ 5,5 bilhões a mais do que o do ano passa-do. “Os R$ 5 bilhões estão lá, porém com oartifício malicioso de incluir neles os R$ 3,5bilhões referentes a ações de assistênciasocial do Fundo de Combate e Erradicaçãoda Pobreza, que tem por lei suas própriasfontes de financiamento”, diz Eduardo Jor-ge, garantindo que, se descontarmos a in-flação, o Orçamento do Ministério da Saú-de/SUS acabou ficando menor do que o de2003. “Para tal atitude contra o povo, eusó encontro uma explicação: a elite brasi-leira continua ignorando o que o SUS repre-senta para o país”, conclui.

“O SUS é do Brasil”

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SÚMULA DA IMPRENSASÚMULA DA IMPRENSASÚMULA DA IMPRENSASÚMULA DA IMPRENSASÚMULA DA IMPRENSA

APROVADO O ESTATUTO DO IDOSO

As pessoas com 60 anos ou maispassam a contar com um meio

legal de proteção de seus direitos.No dia 01 de outubro, na Câmara Fe-deral, foi aprovada, por unanimidade,o Projeto de Lei 3.561/97, que insti-tui o Estatuto do Idoso, de autoriado senador Paulo Paim (PT-RS). No tex-to, destacam-se os seguintes pontos:a transformação em ato criminoso,com penas de até 12 anos, dos maustratos a pessoas idosas; a gratuidadenos transportes coletivos para os mai-ores de 65 anos que pode, conformea legislação local, ser extendida às pes-soas entre 60 e 65 anos de idade; areserva de duas vagas gratuitas paraidosos com renda igual ou inferior adois salários mínimos e a concessãode desconto de 50% para as vagas ex-cedentes nos transportes públicosintermunicipal e interestadual; a pri-oridade aos idosos na compra de uni-dades em programas habitacionais ousubsidiados com recursos públicos;descontos para os idosos em ativida-des culturais e de lazer, incentivandoos estados a criarem leis que estabe-leçam o desconto para cinemas e te-atros; redução da idade de 67 para 65anos para requisição do benefíciomensal de um salário mínimo, previstona Lei Orgânica de Assistência Social(Loas); e a prioridade para pessoasacima de 60 anos em processos e dili-gências judiciais.

No que diz respeito à área daSaúde, o Estatuto proíbe que os pla-nos de saúde cobrem mais caro dosidosos e assegura o fornecimento demedicamentos, especialmente os deuso continuado. Para o Ministro daSaúde Humberto Costa, essas são

questões que incidem sobre a Lei dosPlanos de Saúde. “Além de ser redun-dante, vai resultar em um custo adici-onal que, certamente, será rateadoentre as pessoas mais jovens”, expli-cou em entrevista ao Jornal O Globo,em 02/10/2003. A crítica de Humbertodeve-se ao fato de sua pasta não tersido consultada durante a tramitaçãodo texto no Congresso.

GOVERNO L I B ERA O PLANT IO DE

TRANSGÊNICOS NO PAÍS

Assinada em 25 de setembro pelo vice-presidente José Alencar, publicada

e republicada com correções no dia se-guinte, a Medida Provisória (MP 131), queestabelece normas para o plantio ecomercialização do plantio de soja dasafra de 2004, continua gerando muitapolêmica. No dia 30, durante uma pa-lestra no Tribunal de Alçada Criminalde São Paulo, a ministra do Meio Ambi-ente, Marina Silva, que chegou a cho-rar quando a medida foi assinada, aca-bou criticando a discussão, segundo ela,fundamentalista, que está sendo trava-da entre os opositores e os adeptos doplantio de transgênicos. A Ministra vol-tou a dizer que não é contra a sojatransgênica, mas sim contra a falta deestudo de impacto ambiental dessa cul-tura. Marina Silva chegou a considerarque a MP representa um avanço, umavez que resguarda áreas estratégicas parapreservação da biodiversidade, reservasindígenas e áreas de abastecimento demananciais, e estabelece um termo deajuste de conduta, no qual produtoresassumem o compromisso com essas clá-usulas e com a rotulagem dos produtos.

Os elogios da Ministra, no entanto,não chegam a arrefecer os ânimos daque-

les que são contra a medida. Diversos de-putados da bancada do PT estão acusan-do o governo de não cumprir o programaeleitoral que defendia o estudo de im-pacto ambiental para os transgênicos epregava a repressão ao plantio clandesti-no e ilegal dos transgênicos do país. Numanota intitulada ‘Não à medida provisóriados transgênicos’, os deputados afir-mam que “a MP foi editada dentro deuma lógica completamente contrária ao‘princípio da precaução’, mundialmen-te aceito como princípio fundamentalda preservação ambiental”. O governoalega que a autorização para o plantiode soja transgênica no Brasil foi umaestratégia para evitar a destruição denove milhões de sacos do produto jáexistentes no país.

De acordo com a MP 131, os pro-dutores só poderão utilizar as semen-tes geneticamente modificadas que jáforam compradas; estão proibidos deadquirir novas semente; e responderãona justiça por eventuais danos causa-dos ao ambiente, aos produtores de sojaorgânica e a terceiros. Quanto aos es-toques de sementes transgênicas, se-rão incinerados todos aqueles que nãotiverem sido utilizados até o dia 31 dedezembro deste ano.

As discussões sobre o tema ocor-rem principalmente entre os que de-fendem a liberação, alegando que ain-da não é possível comprovar que oconsumo de transgênicos causa danosà saúde e que a possibilidade de ha-ver cruzamento natural entre plantastransgênicas e orgânicas é reduzida, eos que condenam o uso por acredita-rem, entre outras coisas, que ainda nãoforam feitos estudos suficientes sobreos possíveis danos à saúde das pessoase dos animais e que também não se podegarantir que as plantas transgênicas nãocontaminem o ambiente podendo, in-clusive, acabar com as plantas existen-tes na natureza. Muitos também se pre-ocupam com a questão da dependênciaeconômica e tecnológica, por conta domonopólio da empresa Monsanto, quedomina cerca de 90% do mercado desoja transgência no mundo.

FUNDO DE SAÚDE DO R IO PODE SERUSADO EM PROJETOS ASSISTENCIAIS

No último mês, o estado do Rio deJaneiro deparou-se com uma

forte polêmica no que diz respeito

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CADÊ OS USUÁRIOS? — Durante umadas mesas-redondas realizadas naConferência Municipal de Niterói,Luiz Odorico Monteiro de Andrade,presidente do Conselho Nacional deSecretários Municipais de Saúde(Conasems) perguntou quantos eramusuários e quantos eram trabalhado-res da saúde. Ao ver, pelos braçoslevantados, que o número era quaseigual, o secretário de Saúde de Niteróicontou que aquilo não era surpresa,pois o fato tem se repetido em váriasconferências municipais, e afirmou:“Precisamos ‘conquistar’ os usuáriospara o debate”. Ao mesmo tempo, nosbastidores, uma conhecida e ativa voz‘usuária’ comentou: “Uma coisa ébracinho levantado de trabalhadoresda saúde, outra coisa é saber quemrealmente representa entidades, queé o que interessa!”.

ABAIXO A CENSURA! — Na segunda-feira, 29 de setembro de 2003, a Fo-lha de São Paulo publicou uma maté-ria sobre a resolução do ConselhoFederal de Medicina (CFM) que obri-ga os médicos a exigir dos jornalis-tas que apresentem os textos desuas entrevistas antes que elas se-jam publicadas. A norma já recebeuinúmeras críticas e está sendo con-siderada por muitos como uma for-ma de cerceamento e até mesmode censura prévia. No mínimo, elapode atrapalhar bastante o trabalhodos jornalistas que trabalham comprazos muito curtos. Para quem ale-ga que isso pode corrigir possíveisdistorções entre o que é falado e oque é publicado, a professora titu-lar da Faculdade de Direito da USPOdete Medauar, responde: “Não sedeve legislar com base em exceções.Além disso, tanto profissionais quan-to veículos de comunicação podemser responsabilizados se causaremqualquer tipo de prejuízo”. Para ojornalista Cláudio Weber Abramo, se-cretário-geral da entidade Transpa-rência Brasil e conselheiro da Trans-parência Internacional, “essa medidaé típica de uma corporação cuja dis-ponibilidade para o esclarecimentodo público é, no mínimo, reduzida”.O CFM se defende afirmando que oseu papel é o de “zelar pelo perfei-to desempenho ético da medicina epelo prestígio e bom conceito daprofissão e dos que a exercem legal-mente”. Discussões à parte, fica atriste constatação de que o traba-lho dos jornalistas comprometidoscom a construcao da cidadania ficacada vez mais difícil. Fica uma per-gunta: quem autoriza o CFM a legis-lar sobre o exercício do jornalismo?

CLIQUE E LEIA — Já está disponível naInternet (www.ensp.fiocruz.br/csp) aúltima edição dos Cadernos de SaúdePública, revista bimestral publicadapela Escola Nacional de Saúde Pública(Ensp/Fiocruz). O vol. 19 (suplemento1) de 2003 é dedicado ao tema ‘A tran-sição nutricional e a epidemiologia daobesidade na América Latina’ e foieditado por Gilberto Kac e GustavoVelásquez-Meléndez.

ao uso das verbas destinadas à áreada Saúde. A governadora RosinhaMatheus propôs usar parte do dinhei-ro do Fundo Estadual de Saúde que,este ano, é de R$ 1,8 bilhão, parapagar as contas de projetos sociais,como o Cheque-Cidadão da TerceiraIdade, Cheque-Saúde Cidadão, Farmá-cia Popular e Suplementaçao Alimen-tar. A proposta foi transformada em pro-jeto de Lei, aprovada pela AssembléiaLegislativa no dia 23 de setembro, per-mitindo a transferência de até R$ 473milhões do Fundo de Saúde, ou seja25% dos recursos, para programas so-ciais. De acordo com a promotoraGláucia Maria Santana, essa medida éinconstitucional e fere as regras doSistema Único de Saúde (SUS). Ela ex-plicou que os recursos do Fundo sópodem ser gastos de acordo com oPlano Estadual de Saúde, que deve pre-ver as ações de assistência relaciona-das diretamente à saúde, o que nãoacontece com o Plano do Rio. Alémdisso, o Ministério da Saúde proibiu,desde o dia 8 de maio, o uso de re-cursos da saúde em projetos sociais.Em entrevista ao Jornal O Globo, nodia 25/09/2003, Gláucia informou queo Ministério Público pretende agircontra o projeto e irá recorrer da de-cisão tomada pelo presidente do Tri-bunal de Justiça, Miguel Pachá, quesuspendeu a liminar concedida em 19de setembro pela juíza Geórgia Vas-concelos, da 10ª Vara de Fazenda, im-pedindo o governo do estado do Riode Janeiro de usar os recursos doFundo em programas de assistênciasocial. Além do Ministério Público, odeputado Paulo Pinheiro (PT), em en-trevista ao Jornal do Brasil de 24/09/2003, disse que o PT pretende tam-bém entrar com ação direta deinconstitucionalidade no Supremo Tri-bunal Federal.

SÚMULA DA IMPRENSA é produzida a par-tir da leitura crítica dos principais jor-nais diários e revistas semanais do país.

BOLA CHEIA — Segundo o repórterexclusivo desta coluna, Fontes Fide-dignas, a 1ª Conferência Nacional deMedicamentos ultrapassou as expec-tativas, puxando debates para a 12ªConferência Nacional de Saúde epautando inúmeras conferênciasmunicipais. OS delegados saíam daConferência de Assistência Farma-cêutica cheios de gás e muitos íamdireto para as conferências munici-pais, onde reproduziam as discussõesfresquinhas da área.

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Atenção integral à saúdeinspira ciclo de palestras

INTEGRALIDADEINTEGRALIDADEINTEGRALIDADEINTEGRALIDADEINTEGRALIDADE

Katia Machado

Oque se entende por integra-lidade nas práticas de saúde equais os desafios para a cons-trução da atenção integral à

saúde? Para discutir essas questões, o Ins-tituto de Medicina Social da Universidadedo Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), pormeio do Projeto ‘Integralidade, Saberes ePraticas nas Instituições de Saúde’, estáorganizando uma série de palestras sobreo princípio da integralidade, que ganhaenorme importância frente a demanda cres-cente de modelos alternativos de atenção.

Na mesa redonda ‘Integralidade, po-líticas especificas, programas de saúde:desafios para o planejamento e gestão daatenção à saúde’, coordenada por RoseniPinheiro e Ruben Mattos (IMS/Uerj), queocorreu no mês de setembro, o objetivoera identificar os sentidos atribuídos aesse princípio do SUS e qual o papel do Mi-nistério da Saúde na sua construção.

Carmem Teixeira, professora do Insti-tuto de Saúde Coletiva da Universidade Fe-deral da Bahia (ISC/ Ufba), explicou que aintegralidade é um princípio apontado comoobjetivo do SUS e que, de acordo com a Cons-tituição Federal, o atendimento integral àsaúde deve ter como prioridade as ativida-des preventivas, sem prejuízo dos serviçosassistenciais. “Nesse sentido, a integralidadeestá ligada tanto ao planejamento do siste-ma de saúde quanto à organização do mode-lo de atenção à saúde”, completou.

Para Carmem, no que diz respeito aoplanejamento, a idéia de integralidade foivista inicialmente como forma de unificardois sistemas então existentes: o antigoInamps e o Ministério da Saúde, responsávelpela formulação de políticas em saúde. Noque se refere à organização do modelo deatenção à saúde, diz respeito à organiza-

ção das unidades de prestação de serviçosde saúde, à recomposição das práticas desaúde voltadas para a assistência, preven-ção e promoção e à reorientação do pro-cesso de trabalho em saúde, incluindo-seaqui a relação entre médico e paciente.

COMO CONSTRUIRA INTEGRALIDADE

Na opinião de Ruben Mattos, váriossão os sentidos atribuídos à integralidade:

— O termo é usado tanto para falarsobre algumas indignações como, por exem-plo, o atendimento que o médico presta aseu paciente, ignorando todo o conjunto deaspectos do sofrimento do indivíduo, quan-to para apontar alguns caminhos — disse,explicando ainda que no âmbito da formula-ção de políticas públicas, a integralidade foiapresentada como uma forma de rearranjodo sistema, fazendo com que muitas políti-cas se transformassem em programas desti-nados à grupos ou doenças específicas, numprocesso de despolitização que acabou im-pedindo a construção da integralidade naspráticas de saúde.

Segundo Ruben, outro entrave à cons-trução da integralidade é a escassez derecursos: “Existem restrições internaci-onais importantes que exigem contençõesde gastos públicos. Temos, no entanto, quenos mobilizar para aumentar as verbas paraa saúde e podermos conquistar o SUS quesonhamos”, afirmou.

A redução do volume de recursos fi-nanceiros para a saúde imposta pela polí-tica econômica do atual governo; a pres-são do empresariado pela manutenção dofluxo de recursos financeiros para os ser-viços de média e alta complexidades; ademora no processo de regionalização daatenção à saúde; e a a baixa capacidadegerencial e operacional de grande partedas secretarias municipais de saúde tam-bém foram apontadas como empecilhos àconstrução da integralidade.

Como exemplos de fatores favoráveisa esse princípio, foram citados: a ênfase naimplementação de Atenção Básica, com ex-pansão e qualificação do Programa Saúdena Família (PSF) por meio de açõesprogramáticas estratégicas do Ministérioda Saúde; a possibilidade de regionalizaçãoda Atenção à Saúde sob responsabilidadedos gestores estaduais, baseada na NormaOperacional de Assistência à Saúde (Noas);a implantação de ações intersetoriais depromoção da saúde; a perspectiva de for-mação em larga escala dos agentes de vigi-

lância da saúde (Proformar); as novas dire-trizes curriculares dos cursos de gradua-ção na área da saúde; e os programas deeducação permanente.

Para Ruben, no entanto, a constru-ção da integralidade só será realmentepossível se houver fortalecimento da par-ticipação social e mudança de função doMinistério da Saúde.

— O Ministério deve definir possibili-dades de ação e modos de construção derespostas eficazes para os problemas desaúde ao invés de determinar unicamenteo que tem que ser feito — concluiu.

Falando em nome do governo, o dire-tor do departamento de Programa de Saúdeda Secretaria de Atenção à Saúde do Minis-tério da Saúde (SAS/MS), Fernando Vascon-celos, explicou que ao Ministério compete aformulação de políticas, a normatização daspráticas, a capacitação de pessoal, amonitoração e a avaliacão do sistema e que,visando à construção da integralidade, foicriada a Secretaria de Atenção à Saúde, reu-nindo as áreas de Atenção Básica e de Médiae Alta Complexidades. “Nosso papel, enquan-to ação programática, é integrar os servi-ços básicos e especializados”, explicou,acrescentando que, em sua opinião, ofere-cer saúde integral ao indivíduo significa for-mular políticas de saúde a partir do conheci-mento da realidade, com base técnica sólidae participação social.

Completando o ciclo de discussões so-bre o tema, o IMS está organizando mais doispainéis: ‘Linguagens alternativas conceituaise metodológicas para análises no campo daSaúde’, no dia 3 de outubro; e‘Novas formasde atenção à Saúde e a expansão depráticas terapêuticas não convencionais:desafios para institucionalização’. As ativi-dades são realizadas no auditório do IMS/Uerj, das 9h30min às 12h30min.

Lançado em dezembro de 2002 pelaFundação Nacional de Saúde

(Funasa), o Programa de Formaçãode Agentes Locais de Vigilância emSaúde (Proformar) é um curso desti-nado a servidores que atuam no cam-po da Vigilância Sanitária, desenvol-vendo atividades de prevenção econtrole de doenças, epidemiologiae promoção de saúde.Mais informações:Agência SaúdeTel.: (61) 314-6440 / 6439E-mail: [email protected]

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O SUS VERDEO SUS VERDEO SUS VERDEO SUS VERDEO SUS VERDE

Construindo uma Agenda de Saúdepara a Amazônia Legal

Katia Machado

Um fato: quem chega à Ama-zônia se emociona e ficaencantado com a belezae a dimensão dos rios e da

floresta, mas pouco se dá conta dosproblemas que a população local en-frenta, sobretudo no que diz respeitoà área da saúde; quem vive lá conhecebem e sofre na pele os percalços provo-cados pela falta de integração entreas ações nessa extensa região. A pro-posta do atual governo, no entanto, émudar essa situação. Com o objetivode compreender a diversidade existen-te na Amazônia Legal — composta pe-los estados do Acre, Amazonas, Amapá,Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins,localizados na região Norte, e MatoGrosso e Maranhão, localizados, res-pectivamente, nas regiões norte e nor-deste — e dar início à construção deuma agenda de saúde para a região,cerca de 180 pessoas se reuniram, no

mês agosto, na cidade de Manaus. Aidéia é definir prioridades e propostaspara a contrução do que Sérgio Aroucachamava de o SUS Verde.

As discussões fizeram parte da 1ªOficina de Planejamento da Região,que integra o Projeto Amazônia Legal,voltado para a criação de estratégiasque possibilitem um desenvolvimentoregional sustentável, respeitando asespecificidades e potencialidades lo-cais. “A oficina retoma uma idéia jádiscutida nos anos 90 de que somen-te por meio de políticas integradas,

o desenvolvimento sócio-econômi-co sustentável é possível”, falouEdmundo Gallo, diretor de Investi-mento e Projetos Estratégicos daSecretaria Executiva do Ministérioda Saúde (Dipe/SE/MS). Maria LuizaJaeger, secretária de Gestão do Tra-balho do Ministério da Saúde, es-clareceu que a oficina veio aten-der a necessidade de repensar oSUS com a cara de cada lugar.

— Nosso maior compromisso écom o SUS. Nesse sentido, a priori-dade do Ministério da Saúde é implan-tar ações intersetoriais. Em 86, quan-do se pensou nos princípios do SUS,a idéia é que eles deveriam ser iguaispara todos. Hoje, reconhecemos queo país é muito grande e diverso e,por isso, não se pode pensar um sis-tema igual para todos. Temos quegarantir os princípios do SUS segundoas peculiaridades de cada local, eque isso seja feito junto com gestoresestaduais e municipais. Nós do Minis-tério da Saúde não queremos ditar

A Amazônia Legal representa umdos maiores patrimônios na-

turais de grande riqueza biológi-ca. Nela, forma-se um complexoecológico transnacional, integra-do e articulado pela extensa flo-resta e por seu amplo sistema flu-vial, unificando vários subsistemasecológicos da América Latina.

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Usuários, representantes dogoverno e profissionais daSaúde propõem novos caminhose soluções para o SUS naAmazônia Legal.

regras, apenas dar suporte aos esta-dos e municípios. O que viemos dis-cutir nesse fórum é como enfrentaros desafios para a Amazônia Legal.

A iniciativa deve-se à importânciaque a região da Amazônia tem e aosproblemas que apresenta. De acordocom Gallo, apesar de as taxas de mor-talidade infantil terem diminuído emtodo o país, a região norte ainda apre-senta o segundo maior índice, fican-do abaixo apenas da região nordes-te, a região registra um índice dedesenvolvimento humano (IDH) de0,727, estando também abaixo damédia nacional que é de 0,830; sofrecom doenças tidas como erradicadas,como malária, febre amarela, denguee leishmaniose; padece com a faltade oferta de serviços de saúde, aexemplo do número de leitos porhabitantes que registra uma propor-ção média de 1,5 para cada mil habi-tantes quando deveria ser de no mí-nimo 2,5 leitos para cada milhabitantes, e com a insuficiência deapoio clínico de média e alta com-plexidade. “Vale citar que, dos qua-se 425 mil leitos hospitalares e 11 mile 600 leitos de UTI que o SUS dispõepara todo país, apenas 23 mil dos hos-pitalares e 278 de UTI estão na re-gião norte”, informou Gallo.

Para o presidente do ConselhoNacional de Secretários Municipais deSaúde (Conasems), Luiz OdoricoMonteiro de Andrade, nos últimos 11anos, o SUS foi tão perverso com aregião norte quanto com o nordes-te. Avançou-se com o arcabouço ju-rídico, mas não se conseguiu mexercom a lógica do repasse financeiro,que deve ser tratada de forma dife-rente para cada região, segundo suasnecessidades e particularidades.

— Nós temos algumas vacas sa-gradas que não foram mexidas e aca-baram se transformando em vacas depresépio. O financiamento da regiãonorte é uma delas. Segue uma lógicabancária, ou seja, de crédito e débi-to. Não podemos pensar financiamen-to para a região norte na lógica deprodução de serviços. Ë preciso pla-nos ascendentes considerando asrealidades locais — explicou Odorico.

RESULTADO DA OFICINARepresentantes da Organização

Pan-Americana de Saúde (OPAS), daOrganização Mundial de Saúde (OMS),do Ministério da Saúde, dos Conselhosde Secretários Estaduais de Saúde(Conass) e de Secretários Municipaisde Saúde (Conasems), de instituiçõesde pesquisa e lideranças de usuáriosrepresentando os Conselhos Munici-

Espero que na12ª CNS possa-mos d i s cut i rum novo mode-lo de saúde ba-seado na pre-venção, menostecnicista e mais voltado parahumanização do atendimentoe para a integração entre osprofissionais e gestores desaúde e os usuários do SUS.

Bevenuto Juliano Gazzi, far-macêutico e conselheiroestadual de Saúde. Francis-co Beltrão – PR

pais e Estaduais de Saúde dos noveestados brasileiros que formam a Ama-zônia Legal se dividiram em seis gru-pos de trabalho, resgatando proble-mas e propondo soluções para as áreasde Educação e Trabalho em Saúde, Vi-gilância em Saúde, Gestão em Saúde,Atenção à Saúde, Ciência, Tecnologiae Inovações de Saúde de Grupos emSituação de Vulnerabilidade, como aspopulações indígenas, ribeirinhas equilombolas.

No que se refere à Vigilância Sa-nitária, identificou-se a necessidade decapacitação de pessoal, principalmen-te para a inclusão de dados referentea vigilância epidemiológica; de fortale-cer a vigilância ambiental em saúde eas políticas de saneamento básico, ga-rantindo o acesso a água potável; deintegrar as ações das Vigilâncias Sani-tária, Epidemiológica e Ambiental nasações básicas de saúde; de fomentar odesenvolvimento de iniciativas regionaise locais; de reestruturar as ações dosProgramas Saúde da Família (PSF) eAgentes Comunitários em Saúde (PAC’s),incorporando as ações de vigilância ede controle das doenças endêmicas daregião; e de implementar pesquisasepidemiológicas voltadas para essasdoenças. Para solucionar o proble-ma da baixa qualidade e da altarotatividade de profissionais de Vi-gilância em Saúde, foi proposta aregulamentação da profissão deagente de vigilância em saúde e acapacitação dos agentes comuni-tários em Saúde e dos profissionaisde outras áreas, como os militares,que atuam constantemente na Ama-zônia Legal. Para dar conta da in-suficiência técnica no diagnósticolaboratorial em vigilância, propôs-se, sobretudo, a implantação de La-boratórios Centrais (Lacens) esta-duais e laboratórios de fronteira.

Sobre gestão participativa e des-centralizada, a idéia é criar mecanis-mos que possibilitem dotar a região derecursos necessários para a Saúde. Deacordo com o grupo que discutiu otema, a região precisa de parâmetrosespecíficos de alocação de recur-sos que levem em consideração a dis-tância entre os vários municípios, acomposição geográfica e a dispersãopopulacional; da adequação de valo-res da tabela do SUS; do fortalecimentodos conselhos de saúde, por meio daintegração, da regulamentação dosconselhos, de dotação orçamentáriaprópria, da implantação de uma redede informação e da criação de políti-cas de educação; e de um novo mo-delo de regionalização.

Devido ao impacto que as novastecnologias causam na saúde e nomeio-ambiente, ficou estabelecida anecessidade de se incluir o Minis-tério da Ciência e Tecnologia comoparceiro no projeto. As propostas,nesse sentido, voltaram-se, entreoutras coisas, para a instalação de

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OObservatório de InteligênciaEpidemiológica da Amazônia,

fruto de uma parceria entreFiocruz Amazônia, Sipam, Susam,Semsa, Funasa/AM e Datasus, ca-racteriza-se como um espaço vir-tual de colaboração solidário emultidisciplinar. Ele tem o objetivode desenvolver análises da relaçãoentre condições de vida e situa-ções de saúde, com ênfase emabordagens sócio-epidemiológicase ambientais, investigando agravosde importância epidemiológica,analisando situações de saúdedas populações indígenas, pro-movendo a avaliação de sistemase serviços de saúde, com baseem geoprocessamento, entreoutras ações.

laboratórios; o mapeamento genéti-co da biodiversidade da Amazônia; acriação de pólos avançados de pes-quisas; o desenvolvimento de insumospara a Saúde; a produção de medi-camentos e de fitoterápicos; acapacitação de pessoal para o usodas novas tecnologias; a implanta-ção de programas de investimentostecnológicos que dêem conta dosserviços de média e alta complexida-des; e a criação de sistemas de infor-mação para monitoramento dos agra-vos e ações em saúde, como o Sistemade Proteção da Amazônia (Sipam).

Em relação à Atenção à Saúde,buscou-se encontrar soluções quedessem conta da dificuldade geográ-fica, da atenção especializada, denormas que respeitem a região, do fi-nanciamento e da gestão tecnológica.A estratégia proposta envolve o au-mento do teto financeiro dos estadosda região, de acordo com a médianacional, respeitando o que está or-çado em 2003, para que eles possamdar conta dos serviços especializadose desenvolver uma política decapacitação para a gestão do SUS naregião. Como ações essenciais, fica-

ram estabelecidas: o cadastramentode unidades móveis de saúde da fa-mília nas áreas de difícil acesso; aadequação do número de unidadesbásicas de saúde de acordo com anecessidade da população; a revisãodo modelo de atenção básica para aregião; a implantação de unidadesbásicas de internação; a expanção einteriorização dos serviços de médiae alta complexidade por meio deações intinerantes; a criação de umapolítica de financiamento diferenci-ada para a Amazônia; e a capacitaçãoem gestão tecnológica, entre outras.

No eixo Educação e Trabalho emSaúde, percebeu-se a necessidade dese criar e implantar escolas técnicas;incentivar a mudança na graduaçãoe nos currículos dos profissionais desaúde, formando docentes e profis-sionais destinados aos serviços doSUS; implantar pólos de educaçãopermanente; promover ações de ar-ticulação entre academia, serviços desaúde e população; fomentar pesqui-sas voltadas para o SUS na Amazônia;instituir, incentivar e apoiar mesas denegociação do trabalho; capacitarconselheiros de saúde, fortalecendoassim o controle social; e promoverespaços para a formulação de políti-cas em recursos humanos, criando,por exemplo, câmaras técnicas deeducação e formação em saúde.

Outra preocupação da Oficinafoi pensar políticas, focais, transver-sais e universais, que dessem contadas necessidades dos grupos em si-tuação de vulnerabilidade na região,como é o caso dos quilombolas, índi-os, acampados e assentados e popu-lações de periferias das grandes ci-dades. Foi sugerida a criação depolíticas intersetoriais e a implanta-ção de infra-estrutura; o aumentoda capacidade de intervenção polí-tica desses grupos; a organização eestruturação da rede do SUS na re-gião; a revisão das bases de atençãoà saúde indígena; e a implementaçãode políticas multilateriais que garan-tam a atenção à saúde da populaçãode fronteira entre países amazônicos.

Wagner Martins, coordenador-geral de Investimentos em Saúde doDepartamento de Investimento e Pro-jetos Especiais (Dipe/SE/MS) e coor-denador do Projeto Amazônia Legal,esclareceu que a oficina foi o pontode partida para a construção deações que atendam as necessidadesdos estados que formam a AmazôniaLegal. “A experiência demonstrou atotal viabilidade de se construir umapolítica pública fundamentada nasreais necessidades da sociedade, um

processo de pactuação para a obten-ção de consensos operativos quepoderá mudar a lógica de organiza-ção e elaboração de políticas soci-ais”, explicou.

Na opinião de Luciano Toledo,diretor regional da Fiocruz/Amazônia,a oficina permitiu o encontro de vá-rias instituições e segmentos, ultra-passando os limites da área da saúde.“Nesse projeto, a Fiocruz desempe-nha um importante papel, contribu-indo com pesquisas e mapeamento daregião”, disse.

Segundo Paulo de Tarso, repre-sentante do MS para coordenar oprojeto Amazônia na região e coor-denador da Unidade de Apoio Téc-nico Regional Norte e Centro Oes-te, da Dipe, a oficina possibilitouuma articulação inédita dos atoresda gestão e do controle social doSUS na região e de parceiros deoutros ministérios, como do MeioAmbiente; a integração de gestoresdo SUS no Amazonas, do Ministérioda Saúde, representado pela Funasae pela Fiocruz, das secretarias es-taduais e municipais da região; a am-pliação do conhecimento sobre aspotencialidades e dificuldades re-gionais; além de inaugurar uma ex-periência inédita que foi a criaçãodo Observatório de InteligênciaEpidemiológica da Amazônia.

DO DISCURSO PARA A PRÁTICATransformar essas discussões em

ações efetivas e eficazes é uma gran-de preocupação de todos. Uma cer-teza é que isso só será possível com aparticipação de vários segmentos,instituições e representantes da áreada saúde da Amazônia Legal. Para

Ligado à Casa Civil, tem o obje-tivo de integrar, avaliar e difun-

dir conhecimentos que permitamações globais e coordenadas dosórgãos governamentais na regiãoamazônica, a fim de potencializaros resultados decorrentes daimplementação das diretrizes po-líticas. A base tecnológica doSipam, antigo Sistema Vigilânciada Amazônia (Sivan), consiste emum avançado sistema de meiostécnicos e de vigilância, com-posto por satélites, plataformade coletas de dados, estaçõesmeteorológicas, aeronaves de vi-gilância, estações radar e explo-ração de comunicações. Mais in-formações: www.sipam.gov.br

O RADIS ADVERTE:

O descaso do meio ambiente ea agressão à natureza causamdanos irreparáveis à saúde doplaneta.

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Florestania:uma nova relação do

homem com a natureza

Se a idéia do projeto AmazôniaLegal é respeitar a diversidade

e as peculiaridades de cada re-gião, o Acre aponta a necessida-de de valorizar a cidadania dospovos da floresta. Nesse sentido,o governador do Acre, JorgeViana, em sua primeira gestão,lançou a idéia da ‘Florestania’,junção dos termos floresta e ci-dadania. A proposta foi apresen-tada inicialmente no Fórum Soci-al Mundial 2002, pelo governador,durante sua apresentação noseminário sobre estratégias deconservação e desenvolvimentopara a Amazônia.

Durante o 1º Encontro Inter-nacional de Jornalismo Ambientalda Amazônia, ocorrido em setem-bro, no Acre, ele voltou a defen-der a idéia:

— Não podemos aceitar oconceito de cidadania, pois issolembra cidade, coisa urbana. Nóssomos um povo da floresta e de-fendemos a florestania, que é acidadania do ponto de vista dequem vive na região amazônica.

De acordo com o jornalistaacreano e ex-presidente da Fun-dação de Cultura do Acre, An-tônio Alves, o Toinho, presentena palestra de encerramentodo encontro, a florestania é atentativa de chamar a atençãopara o fato de que a humani-dade não é o centro, mas simparte integrante e dependen-te da natureza. “Ela busca umnovo pacto social e natural,onde a humanidade chegará aum novo arranjo com a nature-za”, concluiu.

Wagner Martins, o Ministério da Saúdesabe que não pode realizar sozinho asmudanças necessárias. Ele acreditaque é preciso pensar na gestão daagenda ou do plano de ações e for-talecer o recém-criado núcleo deintegração para o desenvolvimentodas estratégias da Amazônia legal, queficará responsável por coordenar umgrupo de técnicos que estarão a fren-te de cada ação proposta e de defi-nir as fontes dos recursos.

Nesse sentido, Paulo de Tarso,informou que o Ministério da Saúdeestá revendo as atividades já exis-tentes, as que estão programadasaté o final do governo e as que fo-ram sugeridas pelo seminário de acor-do com o Plano Plurianual (PPA) paraque possa garantir o financiamentodas ações. “Pediremos aos estadosque informem a sua capacidade deinvestimentos naquilo que o MS estápropondo que feita uma articulaçãocom outros atores governamentais”,esclareceu.

AGENDA AMAZÔNIA LEGALDa oficina, formou-se ainda um

grupo de trabalho (GT) ampliado, oNúcleo de Integração e Desenvolvi-mento do Plano ‘Saúde para a Ama-zônia Legal’, cuja proposta é darcontinuidade ao trabalho iniciadoem Manaus. Além de elaborar o do-cumento ‘Saúde para a Amazônia Le-gal’, contemplando as propostas da1ª Oficina, o grupo definiu umaagenda de trabalho que inclui: aconstrução de uma Política de Co-municação para o Plano e sua divul-gação na 1ª quinzena de novembro;a realização de um encontro das co-missões intergestores bipartite (CIB)da região norte para discutir estra-tégias de implantação do Plano; oapoio ao encontro de conselheirosde saúde da região Norte, que serárealizado em outubro, em Belém; aconstrução de uma política de ava-liação e acompanhamento do pla-no que contemplem as iniciativasdo Ministério do Meio Ambiente; ainclusão nas conferências estadu-ais de Saúde da região norte dosseis macro-eixos que compuserama oficina; a constituição, junto aoSipam, de três núcleos macro-regi-onais de integração, desenvolvimen-to, acompanhamento e avaliação doplano de saúde para a Amazônia, emManaus, Porto Velho e Belém; acom-panhamento do seminário sobre C&Tem saúde, realizado em outubro,em Belém; e criação de uma ‘Biblio-teca Virtual’ que reúna o acervo demateriais sobre a Amazônia.

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1ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE MEDICAMENTOS1ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE MEDICAMENTOS1ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE MEDICAMENTOS1ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE MEDICAMENTOS1ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE MEDICAMENTOS

Katia Machado

Com o tema ‘Efetivando oacesso, a qualidade e ahumanização na AssistênciaFarmacêutica, com controle

social’, a 1ª Conferência Nacional deMedicamentos e Assistência Farmacêu-tica, realizada entre os dias 15 e 19 desetembro, em Brasília, reuniu mais demil pessoas, entre 906 delegados — re-presentantes de usuários, profissionaisde saúde e dos setores público e pri-vado — e 100 convidados. A Conferên-cia satisfez uma antiga reivindicaçãodos vários segmentos sociais que com-põe o Conselho Nacional de Saúde(CNS). Clair Castilho, coordenadorageral do evento, explicou que essa ini-ciativa tem o objetivo de pensar a As-

Política de Assistência Farmacêuticana mira da sociedade

sistência Farmacêutica segundo as ne-cessidades da população:

— O processo da atual Confe-rência iniciou-se na reunião do

CNS, realizada na Fiocruz, onde foiapresentada a análise do relatório daCPI dos medicamentos. Desde então,começou, no CNS, uma longa e difícil

aCPI dos medicamentos, do relatorNey Lopes, é resultado do tra-

balho realizado pela Comissão Par-lamentar de Inquérito para inves-tigar os reajustes de preços e afalsificação de medicamentos, ma-teriais hospitalares e insumos delaboratórios. No texto, Ney Lopesrecomenda ao Executivo a trans-ferência do poder de instauraçãode inquéritos contra os preçosabusivos de remédios, da área eco-nômica para o Ministério da Saúde,propõe a ampliação de poderes da

Agência Nacional de Vigilância Sa-nitária (Anvisa) para centralizar acondução de inquéritos, sugere ofortalecimento do Conselho Admi-nistrativo do Direito Econômico(Cade) e mantém o aumento do va-lor da cobrança de multas em casode aumento excessivo de preços.O relator da CPI dos Medicamentospropôs ainda a instituição de crité-rio econômico para registro ourevalidação do registro de medica-mentos. O relatório final da CPI foiaprovado em 30 de maio de 2002.

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negociação. Em 2000, o Conselhoaprovou a convocação da Conferên-cia, que foi feita em 2001, pela Re-solução nº 311, baseada na Reco-mendação nº 26. Mas foi apenas em2003, com o novo governo, que seobteve apoio do Ministério da Saú-de (MS), sobretudo da atual Secre-taria Executiva do MS, para a reali-zação do evento. A conferênciarepresenta o começo para se pen-sar e formular uma política de assis-tência farmacêutica sob o olhar, avoz e a perspectiva dos usuários,prestadores, gestores e profissionaisque, desde 2002, vêm debatendo edeliberando propostas nas confe-rências estaduais e municipais.

A Conferência foi dividida em trêssubtemas: ‘Acesso à Assistência Farma-cêutica: a relação dos setores públicoe privado de atenção à saúde’; ‘Pes-quisa e desenvolvimento tecnológicopara a produção nacional de medi-camentos; e ‘Qualidade na Assistên-cia Farmacêutica, formação ecapacitação de recursos humanos’.A partir deles, os participantes sedividiram em grupos de trabalhosque encaminharam quase 680 pro-postas para aprovação na plenáriafinal, programada para o último diado evento. Os temas discutidos ti-nham um só objetivo central: a for-mulação de uma política de Assis-tência Farmacêutica que atenda osprincípios do SUS de universalida-de, integralidade e eqüidade.

Como explicou Clair Castilhos,a Assistência Farmacêutica é um con-junto de ações centradas no medi-camento e executada no âmbito doSUS, visando a promoção, proteçãoe recuperação da saúde da popula-ção, compreendendo seus aspectosindividuais e coletivos. “Portanto”,diz ela, “essas ações devem estarbaseadas no perfil epidemiológico dapopulação e não nas estratégias demarketing das indústrias farmacêuti-cas, que vêem o medicamento comouma mercadoria”. Essas ações com-preendem a padronização, a prescri-ção, a programação, a aquisição, oarmazenamento, a distribuição e adispensação, a produção, o controlede qualidade, a educação em saúde,a vigilância farmacológica, a pesquisae o desenvolvimento de medicamen-tos imunoterápicos. Nesse contexto,é fundamental a atuação do contro-le social, por meio de representan-tes dos conselhos municipais, esta-duais e nacional de saúde.

Segundo a deputada federal peloPCdoB e coordenadora da Sub-comis-são de Assistência Farmacêutica da

Câmara Federal, Jandira Feghali, aAssistência Farmacêutica não podeser concebida como uma simplesdemanda de medicamento. Ela é par-te integrante de uma política nacio-nal de saúde que envolve tanto osetor público quanto o privado deatenção à saúde e que tem comoator principal o controle social, for-mado pela sociedade organizada.Para tanto, “faz-se necessário supe-rar muitos problemas, como a gran-de dependência do país quanto à im-portação de matéria-prima, que hojeé de 80%, os oligopólios de produçãode medicamentos, a atual políticafragmentada, apesar de Leis e Porta-rias, o sucateamento de muitos labo-ratórios públicos oficiais e a falta deincentivo à pesquisa”, concluiu.

De acordo com Maria EugêniaCury, professora da Universidade Fe-deral de Juiz de Fora e membro doConselho Nacional de Saúde (CNS),essa é uma discussão que também dizrespeito à formação e à capacitaçãode recursos humanos. “A Assistên-cia Farmacêutica que queremos éaquela que tem o medicamentocomo um intrumento e, portanto,baseda no uso racional desse pro-duto. Ou seja, o medicamento cer-to, no tempo e uso corretos”, ex-plicou, completanto:

— Se tanto a prescrição acer-tada de um medicamento quantoarmazenamento, o abastecimento ea dispensação são de responsabili-dade de profissionais de saúde, éextremamente importante que elessejam bem preparados e estejam beminseridos em ações multiprofissionaise multidisciplinares.

A sub-comissão tem o objetivode acompanhar, avaliar e for-

mular as políticas de Assistência Far-macêutica, em parceria com a so-ciedade e com o Ministério daSaúde. Cabe a ela acompanhar asações da Secretaria de Ciência eTecnologia e Insumos Estratégicosdo MS, a legislação sobre proprie-dade intelectual e seus reflexossobre a Assistência Farmacêutica,o registro de medicamentos, ocontrole de produção de vacinase hemoderivados e a pesquisa eo desenvolvimento de produçãode fármacos e medicamentos nosetor público e privado, avaliar opapel estratégico dos laboratóri-os oficiais, a capacitação dos re-cursos humanos, e a questão dosfitoterápicos.

PESQUISA EDESENVOLVIMENTO

TECNOLÓGICOUma política eficiente e eficaz

de Assistência Farmacêutica depen-de também de maior investimento naárea de pesquisa e desenvolvimentotecnológico para a produção de me-dicamentos. O assunto, devido a suaimportância, recebeu destaque du-rante a Conferência. Sabe-se, hoje,que o país depende de 80% da impor-tação de insumos, o que eleva o pre-ço dos remédios. Para mudar essequadro, Carlos Alberto Gomes, presi-dente da Associação dos Laboratóri-os Farmacêuticos Oficiais do Brasil(Alfob), chama a atenção para a ne-cessidade de maior investimento noslaboratórios públicos oficiais, queatualmente estão sucateados, e naprodução de insumos (matéria-primado medicamento), seguindo o exem-plo de países como a Índia e a China,que investiram na produção deinsumos livres de patente.

Para Jorge Bermudez, diretorda Escola Nacional de Saúde Pú-bl ica Sergio Arouca da Fiocruz(Esnp) e coordenador da Comissão

A Alfob foi fundada em 1984,agregando sete laboratóri-

os públicos oficiais. Hoje são aotodo 18 laboratórios: quatro fe-derais, cinco universitários enove estaduais. Segundo o pre-sidente da Alfob, eles são capa-zes de produzir 11 bilhões decomprimidos, 40 milhões de am-polas e 47 milhões de pomadas,além de imobiológicos.

S e a n t e s a sConferênc ia saconteciam porpressão popu-lar, a DécimaSegunda estáocorrendo pordesejo de um governo que sepreocupa com a participaçãopopular e com o controle so-cial. Isso traz uma expecta-tiva muito grande para todos.Eu acredito s inceramenteque vai ser um grande mo-mento para se (re)pensar e(re)fazer o SUS.

Ângela Guadagnin, presi-dente da Comissão deSeguridade Social e Famíliada Câmara dos Deputados

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Temática e de Programação daConferência, enquanto a lógica deprodução de insumos e medica-mentos não mudar não há comotermos uma política que atenda aeqüidade e, conseqüentemente,que a maioria da população tenhaacesso aos medicamentos que ne-cessitam. “Na situação atual, é im-possível termos eqüidade, pois aÁfrica, a América Latina e o Orien-te Médio, que representam 80% dapopulação mundial, respondem porapenas 20% do mercado farmacêu-t ico, que está concentrado naAmérica do Norte e na Europa”.Nesse sentido, ele apontou, como

A Declaração de Doha é resulta-do da 4ª Conferência Mundial

do Comércio (OMC), realizada nacidade de Doha, no Qatar, em 2001.Ela estabelece que a Trips (siglainglesa do Acordo sobre Aspectosdos Direitos de Propriedade Inte-lectual relacionados ao comércio)não deve se sobrepor às questõesde saúde pública, que a produ-ção de medicamentos deva estaracima dos interesses comerciais.Esse documento cria, por exem-plo, mecanismos de negociaçãocom os laboratórios detentores depatentes, legitima a concessão delicenças compulsórias de paten-tes a laboratórios locais e abreespaço para outras medidas quegarantam o acesso da populaçãoà saúde e a medicamentos.

prioridade, a discussão sobre os di-reitos de propriedade intelectual,que permite ao detentor da mar-ca e da patente, o domínio exclu-sivo sobre a criação, a produção ea comercialização durante um pe-ríodo de 20 anos.

Para Jorge Raimundo Filho,representando a Associação da In-dústria Farmacêutica de Pesquisa(Interfarma), os direitos de pro-priedade intelectual justificam-sepelo investimento realizado pelaindústria farmacêutica. “Esse é osetor que mais gasta em pesquisa,cerca de 21%”, informou. JorgeRaimundo explicou que a validadeda patente é de 20 anos porque otempo médio para se desenvolverum medicamento, entre o períodode inveção e desenvolvimento doproduto, podo ir de 2 a 10 anos.

Na opinião de Gérman Velásquez,coordenador do Programa de Dro-gas e Medicamentos Essenciais daOrganização Mundial de Saúde(OMS), essa é uma questão impor-tante a ser pautada pelos acordosintenacionais, que devem assegu-rar o acesso a medicamentos e va-cinas para as milhões de pessoasque deles necessitam. Velásquezfalou sobre a Declaração de Doha,lembrando que esse documentoresolveria parte do problema doacesso a medicamentos se tivessesaído do papel. “O impasse”, ex-plicou, “diz respeito ao parágrafoseis desse documento, que per-

Os grandesdebates...

Durante o evento muitas discus-sões foram travadas em mesas-

redondas e painéis. Os temas queatraíram maiores atenções foram:

1) Relação dos setores público e pri-vado no acesso à Assistência Farma-cêutica;

2) Atenção Farmacêutica no Brasil;

3) Pesquisa e desenvolvimentotecnológico para a produção demedicamentos;

4) Qualidade na Assistência Farma-cêutica, formação e capacitação.

5) Acordos internacionais e acessoa medicamentos;

Além desses, falou-se ainda so-bre: a atuação do poder judiciárioe do controle social no acesso aos

medicamentos; a Farmácia Popular;o uso de plantas medicinais efitoterápicos na Assistência Farma-cêutica; a diferença entre medica-mentos de referência, genéricos esimilares; e a implantação de um sis-tema de farmacovigilância.

...e as decisõesfinais da

Conferência

Não houve tempo para que aConferência votasse as mais de

600 propostas enviadas para a ple-nária final. Caberá ao Conselho Na-cional de Saúde (CNS) a aprovaçãodo relatório final. Entre tantas su-gestões, foram propostas: a alocaçãode recursos financeiros para garan-tir a Assistência Farmacêutica; a ga-rantia de financiamento para a com-pra de medicamentos essenciais e

excepcionais; a formação de umapolítica de Assistência Farmacêuti-ca para a área da saúde mental; arevisão da farmacopéia brasileira;a criação de uma política nacionalde medicamentos fitoterápicos; aimplementação de laboratórios depesquisa; medidas voltadas para ouso de plantas medicinais; o inves-timento na estruturação dos Labo-ratórios Oficiais; maior regulaçãodo mercado em relação aos au-mentos abusivos dos medicamen-tos; a capacitação dos conselhei-ros de saúde com relação aoacompanhamento e avaliação dosindicadores das políticas de me-dicamentos e assistência farma-cêutica; a implantação de mesaspermanentes de negociação doSUS; e várias outras medidas vol-tadas para a capacitação dos pro-fissionais que atuam na área da As-sistência Farmacêutica.

mite a terceiros produzir, vendere exportar medicamentos paten-teados e de interesse da SaúdePública da população”. SegundoVelasquez, isso significa que vári-os países teriam maior liberdadede produzir e comercializar a pre-ços mais baratos medicamentos pa-tenteados.

A Radis estará acompanhan-do o tema. Nas próximas edições,matérias sobre Farmácia Populare outras discussões sobre Políticade Medicamentos e AssistênciaFarmacêutica.

A 12a CNS deveser um espaçode referênciapara o SUS no pró-ximo período,com a perspecti-va de ressigni-ficar o Controle Social na saú-de. Isso poderá acontecer pormeio de uma prática legiti-madora desse controle social eque servirá, por exemplo, parao Conselho Nacional de Saúdeser um paradigma do ControleSocial em saúde no país.

Luís Carlos Bolzan, presiden-te do Conselho Estadual deSaúde do Rio Grande do Sul

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Assistência Farmacêutica:parte integrante da Política Nacional de Saúde

Opinião: Norberto Rech, chefe do de-partamento de Assistência Farmacêu-tica, do Ministério da Saúde, durantea I Conferência de medicamentos eAssistência Famacêutica

APolítica de AssistênciaFarmacêutica deve estar

inserida na Política Nacionalde Saúde, assim como a Polí-

tica de Medicamento, de Ciência eTecnologia, de Formação de RecursosHumanos e Industrial do país. Enquantoações, a Assistência Farmacêutica nãopode ser entendida como simples aten-dimento da demanda de medicamentosque é gerada no Sistema Nacional deSaúde (SUS). Há a necessidade de en-tendermos que Assistência Farmacêuti-ca compreende um conjunto de açõesvoltadas para a proteção, promoção erecuperação da saúde das pessoas, ten-do o medicamento como instrumento es-sencial, ou seja, como um insumo essen-cial ao implemento da saúde. Portanto,ela não é uma atividade privativa de umúnico profissional, e sim resultado deuma ação multiprofissional, da qual par-ticipa vários profissionais, entre eles ofarmacêutico. As preocupações ineren-tes à área não estão voltadas para omedicamento em si, mas para as pesso-as que utilizam o medicamento.

O primeiro grande problema quehoje a Saúde enfrenta é a ausência deuma política formulada de Assistênciafarmacêutica. Daí, a importância da re-alização da I Conferência Nacional deMedicamentos. A partir dela, define-sediretrizes essenciais que irão para es-paços formais de controle social, comoo Conselho Nacional de Saúde (CNS). Se-gundo, a limitação que a área da Assis-tência Farmacêutica ganhou nos últimosanos, resumindo-se a medicamentos.Pelo contrário, essa é uma área que en-volve um amplo processo de trabalhovoltado para atenção e cuidado da saú-de das pessoas, na perspectiva inclusi-ve da não utilização de medicamentos.Um terceiro grande problema é a neces-sidade, neste momento, de superar asfragmentações dos programas que en-volvem medicamentos do Ministério daSaúde. Tais questões vêm sendo apon-tadas pelo Departamento de Assistên-cia Farmacêutica do MS e pela Secreta-ria de Ciência e Tecnologia e InsumosEstratégicos, criados nesta gestão.

A definição de uma Política de Assis-tência Farmacêutica eficaz depende tam-bém da atuação do controle social. Ele é

fundamental e insubstituível já que cabeao controle social encaminhar as diretri-zes para as instâncias deliberativas quesão os conselhos municipais, estaduais enacional de saúde. Nenhuma política pú-blica, em especial uma política de saúde,pode ser formulada sem efetivo controlesocial e participação da sociedade. Nãoimagino que uma política publica de saúdepossa e deva implementada de forma ade-quada sem que o conjunto da sociedade,a partir da ação do controle social, este-ja presente.

Para a implantação dessa política,precisamos ainda de uma readequação doarcabouço legal na medida em que estamospropondo uma inversão da lógica de atua-ção. Ao invés de estarmos com as aten-ções centradas no produto medicamentoe, portanto, nas ações de logística, deprogramação, de aquisição e distribuiçãodos medicamentos, é importante privile-giar as ações não apenas curativas comotambém as preventivas e de promoção dasaúde. A legislação existente, no que pesesua importância, precisa ser adaptadaa essa realidade.

ACESSO A MEDICAMENTOSAmpliar e garantir o acesso da po-

pulação aos medicamentos são açõesfundamentais para a Saúde. Para resol-ver essa questão nos deparamos com aLei de Patentes, que certamente gerareflexos negativos sobre esse proces-so. Há a necessidade, portanto, derelativizar o interesse dos produtoresdetentores das patentes de medica-mentos frente a necessidade da popu-lação. É o caso hoje dos medicamentosantiretrovirais, dos quais três delesimpactam em 63% do gasto total do pro-grama de Aids brasileiro que é de, apro-ximadamente, R$ 516 milhões. Essa é umasituação insuportável para um país queefetivamente tem cobertura em 100%das pessoas soropositivas cadastradasno SUS. Isso significa que temos que en-frentar, de forma muito clara, a ques-tão das patentes, propondo aos labora-tórios detentores delas que exerçam apossibilidade da licença de produção vo-luntária. Se não, o país precisa lançarmão de mecanismos como a licença com-pulsória, garantindo o interesse nacio-nal e da população. É inviável que o paísfique refém de uma ou duas empresasinternacionais que detêm a patente des-se ou daquele produto.

A ampliação do acesso aos medica-mentos diz respeito também à maiores in-vestimentos nos Laboratórios Oficiais,

transformando-os em referências em ter-mos de custo e qualidade de tudo que éproduzido, ou em práticas que tenham acooperação de centros de pesquisas, uni-versidades e setor farmacêutico privadoinstalado no país. Isso significa investir nãoapenas na produção de medicamentos,como também no fomento à indústriafarmoquímica de base, ou seja, de gera-ção de insumos para a indústria farmacêu-tica. Hoje, ainda importamos cerca de 80%dos insumos, embora grande parte dessamatéria-prima não esteja mais sob o domí-nio de patentes, elevando o custo do MScom medicamentos. Além disso, precisamosvalorizar a Relação Nacional de Medicamen-tos Essenciais (Rename), que assume umpapel de racionalização desse processo namedida em que definimos os medicamentosnecessários para cobrir os principais pro-blemas de doença da população para asdiferentes regiões do país. A partir daRename, é possível planejar estrategica-mente processos de compra e distribui-ção, de prescrição, dispensação e acom-panhamento de medicamentos. Isso geraeconomia, ampliando o acesso de mais pes-soas aos medicamentos e ao SUS.

ATUAÇÃO DOMINISTÉRIO DA SAÚDE

Já começamos a investir na produ-ção de medicamentos, direcionandoesse ano a quantia de R$ 36 milhões paraos laboratórios farmacêuticos oficiais.Incluímos no orçamento do próximo anoR$ 80 milhões para investimento nesseslaboratórios. Ampliamos em 50% o piso doincentivo da Assistência FarmacêuticaBásica, que hoje era de R$ 1,00 por habi-tante/ano repassado pelo governo fede-ral aos estados e municípios. Isso signifi-ca que chegaremos no ano que vem a umtotal de, aproximadamente, R$ 250 mi-lhões destinados aos medicamentos bá-sicos da atenção primária. Para os muni-cípios incluídos nos Programa Fome Zero,o aumento do piso de incentivo da Assis-tência Farmacêutica Básica foi de R$100%, passando para R$ 2,00. No que serefere aos medicamentos de alto custo,estamos discutindo junto com os Conse-lhos Nacional de Secretários Estaduais eMunicipais de Saúde, Conass e Conasems,uma política racional para esses tipo deremédios. Estamos também ampliandoem torno de 40% os recursos para osprogramas estratégicos do Ministérioda Saúde, entre eles o Pro-grama de Combate a Tuber-culose, a Hanseníase e a ou-tras endemias focais.

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12ª Conferência Nacional de Saúde12ª Conferência Nacional de Saúde12ª Conferência Nacional de Saúde12ª Conferência Nacional de Saúde12ª Conferência Nacional de Saúde

Fiocruz discute propostas para a Conferência

Ana Beatriz de Noronha

Na opinião da maioria dosespecialistas da área daSaúde, a 12ª ConferênciaNacional de Saúde (Con-

ferência Sérgio Arouca) tem tudo parareeditar o sucesso da emblemática‘Oitava’. O momento político é pro-pício e o Ministro da Saúde tem assu-mido publicamente o compromisso deacatar as resoluções aprovadas pelaplenária. Mais do que nunca, pareceser hora de se avaliar o SUS e corrigiros desvios de rota.

Para fomentar discussões sobreo assunto, a Fiocruz se propôs a or-ganizar diversas atividades voltadaspara a ‘Doze’. Entre essas atividades,foi realizada, no dia 4 de setembro, amesa-redonda ‘Os grandes desafios daReforma Sanitária para a 12ª Confe-rência Nacional de Saúde’, que con-tou com a presença do secretárioexecutivo do Ministério da Saúde,Gastão Wagner, do presidente do Con-selho Nacional de Secretários Muni-cipais de Saúde (Conasems), LuizOdorico Monteiro de Andrade, e docoordenador geral da 9ª ConferênciaNacional de Saúde, Nélson Rodriguesdos Santos. Na abertura do evento,diante de trabalhadores, pesquisado-res e estudantes presentes, o presi-dente da Fiocruz, Paulo Buss, desta-cou o importante papel da instituiçãono debate sobre as propostas para aConferência. “Estamos empenhadosem fazer com que a 12ª Conferênciatenha o brilho que ela deve ter pararepresentar o espírito empreendedorde Sérgio Arouca”, afirmou.

CORRIGINDO DESVIOS“Na idade em que estou, já me

dou o direito de traçar um panora-ma do Movimento da Reforma Sani-tária Brasileira, que a minha gera-ção iniciou com muita garra, muitacrença e muita utopia nos anos 70.Acho importante deixar para vocêsum testemunho sobre esse movi-mento que se reproduziu e se qua-lificou, gerando um fato inédito, nãosó na história deste país, mas devários países que lutam por políti-cas públicas de cidadania”.

Foi assim, com essas palavras, queNélson Rodrigues dos Santos, o lendá-rio ‘Nelsão’, iniciou sua reflexão so-bre os 30 anos de ReformaSanitária e sobre os dozeanos de SUS. Segundo ele,o movimento da ReformaSanitária Brasileira come-çou muito encravado nomeio universitário, mas con-tava com a participação detécnicos especialistas epensadores que, atuandona administração pública, agiam comoportadores de mensagens, estudos epropostas de transformação do setorsaúde numa visão de grande sistema.

De acordo com Nelsão, aos pou-cos o movimento engrossou e ganhoualiados importantes, entre eles os se-cretários municipais de saúde que co-meçavam a se organizar num grande con-selho nacional. Nos anos 80, o movimentocresceu e se multiplicou em número,em instituições e também em qualida-de. A prática da transformação das ins-tituições de saúde, as estratégias e opragmatismo inevitável foram acompa-nhados de um grande volume de conhe-cimentos novos e do real intercâmbiocom outras áreas de saber.

— Hoje, o Conasems puxa atrásdele uma infinidade de assessores etécnicos capazes de produzir, comose viu no Congresso da Abrasco, umenorme volume de trabalhos sobre oSUS. Isso é gratificante, pois provaque vale a pena se organizar e lutar

por políticas públicas e de cidadania— afirmou Nelsão, lembrando que acriação do SUS inaugurou uma nova

etapa do movimento queprecisava formular rapida-mente estratégias e práti-cas que concretizassemseus ideais. Segundo ele,a partir dos anos 90, a lutajá não era para conquistarcorações e mentes e nempara seduzir o legislativo. Aquestão nesse momento

era como exercer o poder, contrari-ando interesses profundamente enrai-zados na sociedade e como vencer aideologia neoliberal que tomava con-ta do mundo, pregando, entre outrascoisas, a idéia do Estado mínimo.

— Os erros que ocorreram sãoplenamente justificáveis. Atualmente,no entanto, com o novo governo dacoligação popular, precisamos criar no-vas macro-estratégias que corrijam al-guns desvios ocorridos nesses primei-ros doze anos de SUS — explicouNelsão, sugerindo a todos a leitura dolivro ‘O desenvolvimento do SUS noBrasil: avanços, desafios e reafirmaçãode princípios e diretrizes’, publicadopelo Conselho Nacional de Saúde (http//conselho.saude.gov.br/biblioteca/livro.htm) e destacando a importânciade se voltar o SUS para as reais neces-sidades da população, muitas vezes pre-terida em favor dos fabricantes deinsumos, dos prestadores de serviçose até mesmo dos próprios profissionais

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do sistema. Nelson Rodrigues tambémfalou sobre a importância da luta pormais recursos para o SUS.

— Até hoje não conseguimos pas-sar de cerca de U$ 180 anuais por ha-bitante, enquanto nos países desen-volvidos o gasto é de cerca de U$ 2000por habitante. Não precisamos chegara isso. Podemos ter um ótimo sistemacom bem menos — justificou.

OS PONTOS CRÍTICOSPara Luiz Odorico Monteiro de

Andrade, poucos modelos de políticaspúblicas são tão ‘redondos’ quanto oSUS. Isso, entetranto, não significa quenão existam problemas a serem resol-vidos na 12ª Conferência.

— Nós não podemos chegar naConferência com conceitos falsos queagradam a todos e sair de lá com umrelatório enorme sem conseguir apli-car nada. Eu acho que a gente temque ir pro debate com divergências etem que sair de lá com um consensoe com um relatório bastante objetivo— disse Odorico, antes de definir ossete pontos que considera fundamen-tais para a discussão.

Para começar, ele falou do gran-de tema ‘Saúde como direito de to-dos e dever do Estado’, no qual des-tacou a discussão sobre a eqüidade.

— A etapa da inclusão nós já cum-primos. Por pressão dos conselhos muni-cipais e dos usuários, conseguimos atéampliar a integralidade. O problema daeqüidade, no entanto, continua semsolução, principalmente por conta damoral, da subjetividade de uma socieda-de que escravizou durante quatrocen-tos anos e que acha normal o pobre terum espaço e um tratamento diferentedo rico — explicou Odorico, afirmando:“É preciso que se produza uma ética doSus contra essa moral que permite a de-sigualdade existente no país”.

Como segundo ponto, Odoricofalou da questão do financiamento.Para ele, é necessário que se crie umnovo modelo de alocação de recur-sos que leve em consideração as ini-qüidades existentes no Brasil. “Esse éum bom dever de casa para o pessoalda economia da saúde”, brincou.

A questão da comunicação tambémganhou destaque na fala de Odorico.“Todo sábado, o Tom Cavalcanti faz natelevisão uma enorme propaganda con-tra o SUS e isso ainda não gerou nenhummovimento”, reclamou, completando:

— As pessoas riem e acabam acei-tando aquilo como algo normal. Nóstemos que pensar uma política naci-onal de comunicação articulada como Ministério da Saúde, com os esta-dos e os municípios na defesa do sis-

tema. Nós precisamos de um sistemade contra-hegemonia no campo dacomunicação, no qual o Radis podeexercer um importante papel.

Segundo Odorico, outras ques-tões que precisam ser consideradassão: a intersetorialidade, como instru-mento ideal de promoção da saúde;os recursos humanos, para o qual de-fende a criação de uma carreira naci-onal de base local; a consolidação daestratégia na área de Ciência eTecnologia (C&T); e a ampliação e apri-moramento da gestão participativa. “Asubjetividade democrática que essesistema tem é fantástica!”, concluiu.

A MILITÂNCIAÉ FUNDAMENTAL

Fechando a mesa, Gastão Wagner,secretário executivo do Ministério daSaúde, enumerou alguns desafios queprecisam ser vencidos para que sepossa levar o SUS a um novo patamar.

— A União Democrática Nacional(UDN) dizia que o preço da liberdadeé a eterna vigilância. Adaptando issoao SUS, eu digo que o preço do SUSé a eterna militância — afirmou Gastão,completando: “Eu não sou paranói-co, mas acredito que muita coisaconspira contra o SUS”.

Para o Secretário, um dos maio-res desafios que o SUS enfrenta é asua dependência do governo. Na suaopinião, isso é um pouco assustador,pois se pelos menos alguns setoresda sociedade não tiverem motivaçãopra militar nesse espaço, a Conferên-cia pode acabar servindo apenas parapactuar interesses e para definir no-vas as forma de repasses de verbas.Para ele, é preciso resgatar amilitância dos profissionais da saúdee dos diversos setores da sociedade.“Temos muito a aprender com o pes-soal da saúde mental e da Aids. Eles

praticam uma militância polifônica ea polifonia é o segredo das políticaspúblicas que dão certo”, garantiu.

O segundo desafio tem a vercom a intersetorialidade e com adisparidade que existe entre a Saú-de e outros setores.

— É insustentável que 50% dosrecursos federais sejam gastos com aatenção à saúde. É preciso criar mo-vimentos sociais que garantam a ex-pansão de políticas sociais eficazes,para além da atenção à saúde. Masisso deve ser feito sem que se distri-bua a pobreza entre os pobres. Osrecursos para essas políticas não po-dem vir da redução dos recursos dasaúde. Eles têm que sair do superá-vit externo, da renegociação com oBanco Mundial — explicou.

De acordo com Gastão, tambémé preciso solucionar os impasses queexistem na área de recursos huma-nos. Ele afirmou que se isso nãoocorrer, não será possível melhorara qualificação dos profissionais e,conseqüentemente, melhorar ehumanizar os serviços.

Entre outras coisas, Gastão fa-lou sobre a necessidade de se criarnovos modelos de gestão e novas for-mas de organização pública menosburocratizada, menos engessadas ecom maior autonomia; estabelecerprioridades de investimentos e au-mentar a resolutividade dos serviçosde maneira a viabilizar economica-mente o SUS; e da urgência de secriar uma rede de apoio institucional,governamental que consiga revertera situação de desestruturação dasinstituições públicas de saúde.

Leia no site do Radis, a íntegra dasfalas de Gastão Wagner, Luiz Odoricoe Nelson Rodrigues dos Santos.www.ensp.fiocruz.br/publi/radis.htm

2ª Teleconferênciarepete sucesso da primeira

Realizada no dia 30 de setembro, a 2ªTeleconferência sobre a 12ª Confe-

rência Nacional de Saúde contou com aparticipação do coordenador-geral da‘Doze’, Eduardo Jorge Martins, do se-cretário de Atenção à Saúde do Ministé-rio da Saúde, Jorge Solla e com os repre-sentantes de usuários e trabalhadoresde saúde no Conselho Nacional de Saú-de, Gyselle Tannous e Alfredo Boa SorteJúnior. Durante aproximadamente umahora, eles responderam inúmeras per-guntas enviadas de todo o Brasil sobre steses do governo para a Conferência,apresentadas pelo secretário Executi-

vo do Ministério, Gastão Wagner, e so-bre a prática do Controle Social,explicada por Maria Leda Dantas, mem-bro do Conselho Nacional. Para quemse interessar, a teleconferência fica-rá disponível no site do Canal Saúde(www.canalsaude.fiocruz.br) e asdúvidas que não puderam seresclarecidas ao vivo serão res-pondidas no site da Conferência(www.12conferencia.saude.gov.br).Outras informações podem ser obtidaspelo e-mail [email protected] pelos telefones (61) 315-3624 e315-3625.

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EVENTOS

SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE AVA-LIAÇÃO DE EXPOSIÇÃO OCUPACIONALA CANCERÍGENOS

OSimpósio discutirá métodos e estra-tégias de avaliação de exposições

ocupacionais a cancerígenos, debaten-do sistemas de vigilância para exposiçõese analisando a aplicação desses métodosem estudos epidemiológicos e vigilância.Data: 23 e 24 de outubroLocal: São Paulo / SPMais informações:Associação Brasileira de HigienistasOcupacionais (ABHO)Alameda dos Araés, 857, Planalto PaulistaSão Paulo / SP — Cep: 04.066-002Tel.: (11) 5052-3426E-mail: [email protected]: www.abho.com.br

9º S I M P Ó S I O I N T E R N A C I O N A L D EE SQU I STOSSOMOSE

Organizado pela Centro de PesquisaGonçalo Moniz (Fiocruz/BA), esse

evento deverá representar uma grandeoportunidade para troca de experiênci-as sobre idéias e estratégias de controledesse importante problema de saúde pú-blica que, no Brasil atinge cerca de 10milhões de pessoas.Data: de 2 a 5 de novembroLocal: Salvador / BAMais informações:Praxis Comunicação e EventosRua Ewerton Visco, 324/407Caminho das Árvores, Salvador / BACEP: 41.820-020Tel.: (71) 342-4759 / 341-4751E-mail: [email protected]: www.cpqgm.fiocruz.br/9sis

1ª JORNADA DE ECONOMIA DA SAÚDE

Realizado pela Associação Brasileirade Economia da Saúde (Abres) e

pela Universidade do Vale do Rio dosSinos (Unisinos), o evento está divi-dido em dois eixos temáticos: ‘Eqüi-dade, Eficácia e Eficiência em Eco-nomia da Saúde’ e ‘Economia eGestão da Política de Saúde’. Os tra-balhos poderão ser enviados até odia 15 de outubro.Data: 20 e 21 de novembroLocal: São Leopoldo / RSMais informações: Linha Direta UnisinosTel.: (51) 591-1122Site:www.economicas.unisinos.br/jornadaE-mail:[email protected]

SIMPÓSIO INTERAMERICANO SOBRE APLICA-ÇÕES DE SENSORIAMENTO NO CONTROLE DEDOENÇAS INFECCIOSAS

Oevento, organizado pela Fiocruze pelo Instituto Interamericano de

Pesquisas em Mudanças Globais, visa atu-alizar conhecimentos sobre o uso des-tas tecnologias na vigilância ambientale na vigilância epidemiológica. Dentreos palestrantes estão cientistas deinstituições governamentais e acadê-micas brasileiras, inglesas e norte-americanas. O acesso ao evento seráfeito mediante convite.Data: de 19 a 21 de novembroLocal: Rio de JaneiroMais informações:Tel.: (21) 3882 9159

1º SIMPÓSIO INTERDISCIPLINAR EM SAÚ-DE DA FAMÍLIA

OSeminário, que tem apoio do Minis-tério da Saúde, da Sociedade Brasi-

leira de Medicina de Família (SBMFC) eda Secretaria Municipal de Saúde de BeloHorizonte (SMS/BH), reunirá estudantese profissionais que trabalham no SistemaÚnico de Saúde em Atenção Básica.Data: 22 e 23 de novembroLocal: Belo Horizonte / MGMais informações:Ícaro Organização de EventosTel: (31) 3222-7266Comissão OrganizadoraTel.: (31) 3274-0911Sociedade Mineira de Medicina deFamília e Comunidade (SMMFC)Site: www.smmfc.org.br

6º CONGRESSO BRASILEIRO DE MEDICINADE FAMÍLIA E COMUNIDADE

Oevento de porte nacional deveráenvolver cerca de 2 mil profissi-

onais da área da saúde, gestores desaúde e de educação dos setores pú-blico e privado, bem como professo-res e alunos de graduação e pós-gra-duação. O prazo para a inscrição dostrabalhos vai até o dia 15 de janeirode 2004.Data: de 3 a 6 de abril de 2004Local: Rio de Janeiro / RJMais informações:Sociedade Brasileira de Medicina deFamília e Comunidade (SBMFC)Centro Amrigs — Av. Ipiranga, 5311Porto Alegre / RS — CEP 90.610-001Tel.: (51) 3339-2899Site: www.sbmfc.org.br

SSSSSERERERERERVIÇVIÇVIÇVIÇVIÇOSOSOSOSOS

PUBLICAÇÕES

LANÇAMENTOS: EDITORA F IOCRUZ

Saúde Mental é um dos li-vros da Série ‘Trabalho eFormação em Saúde’, or-ganizada pela Escola Poli-técnica Joaquim Venâncio(EPJV/Fiocruz), com co-laboração da (Opas), com o objeti-vo de ampliar a capacidade críticade profissionais de nível médio quetrabalham em Saúde Pública. Deacordo com Pedro Gabriel Delgado,coordenador de Saúde Mental doMinistério da Saúde, o livro ganhaimportância no momento em que apsiquiatria hospitalocêntrica ésubstituída por novas formas deatendimento que exigem novas ha-bilidades técnicas dos trabalhado-res e construção coletiva de umnovo espaço público do cuidado emsaúde mental.

O livro Promoção da Saú-de: conceitos, reflexões,tendências, organizadopor Dina Czeresnia e CarlosMachado de Freitas, re-cupera a história e con-ceitos básicos desse movimento. ParaRita Barradas Barata, professora da Fa-culdade de Ciências Médicas da San-ta Casa de São Paulo, o livro é um gran-de instrumento para que profissionaisde saúde, docentes e pesquisadoresaprofundem sua reflexão crítica sobrea promoção da saúde, tanto como mo-vimento político sanitário quanto comotemática de investigação.

Organizado por Maria Ce-cília de Souza Minayo eEdinilsa Ramos de Souza, olivro Violência sob o olharda Saúde: a infrapolíticada contemporaneidadebrasileira trata do impacto da violên-cia na saúde das pessoas e no sistemade saúde. Os textos trazem uma visãointerdisciplinar da questão e mostrama importância das ações intersetoriaispara solucionar o problema que, namaioria das vezes, é tratado apenas den-tro do campo da segurança pública.

Mais informações: Editora FiocruzAv. Brasil, 4.036/ 112—ManguinhosRio de Janeiro / RJ — CEP: 21.040-361Tel.: (21) 2590-9122 ramais 106, 107 e 139TeleFax: (21) 2590-9122 ramais 106 e 107E-mail: [email protected]: http://www.fiocruz.br/editora/

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Nossa Mãe

PÓS-TUDOPÓS-TUDOPÓS-TUDOPÓS-TUDOPÓS-TUDO

Caco Xavier

Li não sei onde. Foi no ventre de uma mulher índia quese nutriu e se formou o brasileiro. Da fenda de

uma índia emergimos para a vida. Tem a ver com estu-dos genéticos, acho. Tem a ver com nossa matriz.

Pra não ficar no ‘acho’, uma rápida busca em recortesde jornais me fornece nome e endereço: é ogeneticista Sérgio Danilo Pena, da Universida-de Federal de Minas Gerais, o autor da pes-quisa que mostra que “a mulher indíge-na está na origem materna do homembrasileiro” e que “a miscigenação émaior do que se supunha”.

Não precisavam extensas pes-quisas pra nos dizer isso, mas, bem,sempre haverá os céticos, aquelesque necessitam de, como se diz,‘dados concretos’. Gilberto Freyre,que nunca estudou haplogrupos ougenealogia por DNA, já nos aponta-va para a mãe índia, já nos lançavainteiros em seu colo farto e quente.Os banhos, a rede, a cor vermelha, anudez, os badulaques, as plantas, as re-zas, o sim, o sempre e sonoro sim nos lábi-os, o sorriso também. Heranças de nossa mãe.

Por outro lado, o respeito aos avós,os cantos, os espíritos, os bichos e, sim, onão: a roupas apertadas, a coisas sem cor, a pés calça-dos, ao acúmulo, ao futuro, à rigidez, à dominação, atoda e qualquer dominação. Heranças de nossa mãe.

Vem dessa mãe vermelha, redonda e úmida nossavocação libertária e nossa coragem. “Tu choraste em pre-sença da morte? Em presença de estranhos choraste? Nãodescende o cobarde do forte! Pois choraste, meu filhonão és!”. Não, mãe, não choramos.

Não precisamos das pesquisas de Sérgio Danilo Pena,nem dos tomos de Gilberto Freyre, nem mes-

mo dos versos de Gonçalves Dias para nossabermos filhos de nossa mãe. Ainda mais

se cruzamos algum estado do Nortedo país, algum dia. Ela está aqui,

na nossa melancolia doce, nossamãe. Está aqui, no balanço in-terno de nossas horas. Aqui, naforça do braço. No riso da alma,zombeteiro, zombador, zunidor,destruidor de certezas. Aquidentro, nossa mãe.

Mavutsinim, nos contam oskamaiurás, não tinha ninguém, era

só. Um dia fez uma concha virarmulher e casou com ela. Nasceu um

filho homem e Mavutsinim o levou em-bora. A mulher chorou e voltou a ser

concha na lagoa. “Nós”, dizem os índios,“somos netos do filho de Mavutsinim”.

Nós, dizemos nós, somos paridos da mulher-con-cha que até hoje chora em sua lagoa doce. Por nós. Aindaassim, ela nos acolhe, nos protege, nos espera. Ela, nossoremanso, nossa mãe.