fratura exposta - dez/2010

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  • 8/8/2019 Fratura Exposta - Dez/2010

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    Dezembro/2010

    Pg. 3Aprendizado ou turismo? Crescimento ou pacificao?

    UPP: Periferia de Marlia ou do Rio?

    EditorialDe uma nova gesto para um novo Diretrio. Pg. 2

    Ateno Bsica

    Das origens crise. Quais so as razes dessa greve?Pg. 7

    Fratura HistricaA evoluo do conceito de sade e a crtica ao modelobiopsicossocial. Pg 4

    Fratura Cruzada Pg. 9

    Homenagem ao Tonico Pg. 2

    O (co)modismo da Humanizao

    Afinal, o que humano? Pg. 5

    Residncia Multiprofissionalna viso de um residente Pg. 8

    Ps-graduaoA cincia de muletas. Pg. 6

    Tirinhas Pg. 9

    Novo site:

    daca.org.br

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    Fratura Exposta, Dezembro/2010 Diretrio Acadmico Christiano Altenfelder

    Editorial

    A Gesto 23 de Setembro mostra neste FraturaExposta um pouco sobre sua viso acerca das questescomuns aos estudantes. Notando que o MovimentoEstudantil percebido, no raro, com certo preconcei-

    to pela comunidade acadmica, julgamos pertinenteexplicitar para a mesma a principal inteno deste Mo-vimento na Famema: a reflexo sobre os temas quecontornam o cotidiano da sociedade e, portanto, doestudante de Medicina. Para isto, mostra-se necessrioconhecermos, previamente, os fatos que corroborarampara a construo desta sociedade. Assim, a valoriza-o da Histria, neste Fratura, caracteriza bem a facedesta Gesto, ou seja, a retomada histrica a fim decompreender, e enfim, pr em prtica. A crtica, emltima anlise, a via mais efetiva para que os estu-dantes mostrem suas necessidades e alcancem melho-rias, para a sociedade e, portanto, para si.

    Esta Gesto busca isso neste Fratura, em suasreunies, em seus eventos, em seus movimentos.

    Gesto 23 de Setembro

    Coordenador Geral: Tiago Cherbo

    Coordenador Financeiro: Laura Cantisano

    Coordenador Administrativo: Vinicius

    Coordenador de Comunicao e Propaganda:

    Joo Gabriel

    Coordenador Cientfico: Diego Caldeira

    Coordenadores de Educao Mdica:Yuri Barnab e Isabela Galiano

    Coordenador de Extenso: Jos Igncio

    Coordenadores de Eventos:

    Marcelo Amoretti e Caio Marson

    Coordenadores de Cultura:

    Lucas Pocebon e Luiz Zanella

    Coordenadores de Formao Poltica:

    Caio Esper e Rodrigo Muniz.

    Homenagem ao Tonico

    H dez anos era publicada no Fratura notciasobre a perda de um grande amigo, um smbolo dafaculdade, o Tonico. Reproduziremos ento, com oobjetivo de reavivar estas histrias ehomenagear opersonagem, o texto Au, Au, Au, as ltimas palavrasde um grande amigo,de autoria de Barney, Juca(XXVIII) e Caz (XXXIII), da edio de Abril/Maiode 1999, ano VII, nmero 2, que teve como mancheteos dizeres Valeu, Tonico!.

    Esperamos que Srgio Carnevalli, Brucutu,Serginho, Montanha, V, Flavinho, Vanessa, Janana,Vio e outros recebam muito bem em seu hall maisesta lenda que deixa a FAMEMA, velho TONICO.

    Aqui mesmo, na Av. Monte Carmelo, nascianosso mascote, que serviu de presente a um vizinho.Esse vizinho o criava solto, e o cachorrinho vivia entreos estudantes de medicina. Em sua adolescncia, apai-xonou-se pela vida acadmica, e quando seu dono mu-dou-se para longe daqui, TONICO preferiu ficar. Por

    trs vezes o rapaz o levou, mas Tonico sempre volta-va. J estava decidido seu lugar conosco.

    Sobrevivendo de repblica em repblica, TO-NICO, sinnimo de Kapeta, acompanhava nossa Fa-culdade aonde quer que fosse: Pr-Intermed (Ribeiro,Jundia, Campinas, Batatais, Itu, etc), Intermed-Sul(Londrina, Florianpolis e Curitiba) e Intermedona(Agua e Americana), sempre torcendo e fazendo baru-lho. Que o digam certos deputados que, na estadualiza-o da faculdade, aturaram seus latidos durante a As-semblia.

    Na rea mdica, estava presente nas aulas teri-

    cas no Carmelo, formando-se em 1997, trajado de becana colao de grau e roupa social no Coquetel e Baile.Na rea poltica, foi candidato a presidente do DACApor vrias vezes, Atltica e a Diretor do Hospital,tendo sempre um grande nmero de votos.

    Amado pelos estudantes e por muitas pessoasda cidade, atraa a ateno de todos com sua vida aca-dmica, de jogos e gestas, contribuindo com a forma-o de grandes laos de amizade.

    Mesmo aps a amputao de seu membro infe-rior esquerdo em 07 de setembro de 1997, devido a umosteosarcoma (cncer extremamente maligno), via-se

    em sua face o esprito bomio e aventureiro. Entretan-to, aps alguns meses, teve recidiva que selou seu des-tino uma metstase em regio abdominal, sem pers-pectiva de tratamento, tirando-os das ruas; e com mui-ta tristeza recebemos a notcia de seu falecimento, quese deu s 11h43 de 21 de abril de 1999. Na presenade Hiro (XXXII), Carlos P. (XXVIII), Caz (XXXIII),Cesinha (XXIX) e namorada, Neto (XXVIII), Juca(XXVIII), Zulu (XXXII), Buda (XXX) e sua cachorra(que tambm mostrou-se abalada), alm de Barney,Flavinho e outros que choraram em seus plantes eno puderam comparecer. TONICO foi enterrado emfrente Anatomia embaixo da mangueira, onde agora

    descansa em paz.VALEU, VELHINHO.

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    UPP: Periferia de Marlia ou do Riode Janeiro?

    No Rio, as Unidades de Polcia Pacificadora, mais conheci-das como UPPs, fazem parte de um projeto da Secretaria Estadualde Segurana Pblica que tem como objetivo instituir polcias comu-

    nitrias em favelas da capital como forma de desarticular quadrilhasque controlavam esses territrios como um Estado paralelo.Boa parte das favelas do Rio de Janeiro est encravada nos

    morros, de onde se tem vistas maravilhosas. Com assinatura doMinistrio do Turismo e do governo do estado, foi lanado comgrande estardalhao no dia 30 de agosto, no Morro Dona Marta, umprograma batizado de Rio Top Tour, cujo objetivo estimular avisitao das encostas ocupadas pelas favelas. Programas tursticosdesse tipo existem na frica do Sul, onde a misria foi instituciona-lizada como opo de passeio nas favelas de Cape Flats. E existemno prprio Rio de Janeiro onde excurses de turistas sobem a Roci-nha em jipes camuflados, como se fossem entrar numa guerra ounum safri.

    Em Marlia, a Unidade de Prtica Profissional, mais conhe-cida como UPP, iniciada em 2003, resume um movimento que pintao Programa Sade da Famlia como uma estratgia de valorizaoda ateno bsica e espao para a formao profissional atravs daprtica. Grupos de estudantes so inseridos em Unidades de Sadeda Famlia, localizadas prioritariamente em bairros da periferia dacidade.

    Entretanto, sete anos aps, em qualquer roda de conversa possvel perceber o desgosto que toma parte da imensa maioria dosestudantes quando o assunto referente ateno primria e possi-bilidade de futuramente atuar nesse nicho. Para compreender oporqu desse cenrio e iniciar um movimento que impulsione mu-danas, se faz necessrio reconhecer alguns pontos. So eles:

    - As polticas de acesso e de manuteno do estudante noensino superior so extremamente frgeis, tornando o ato de "ser umestudante de medicina", mesmo em instituies pblicas, algo extre-mamente custoso, que demanda grande investimento. Desta forma,h que se reconhecer o estudante de medicina, em sua maior parte,como ser que teve pouco ou nenhum contato com a realidade socialapresentada no cenrio.

    - A imagem do mdico historicamente construda est emxeque. O estudante associa a figura do mdico que quer ser dosmdicos da novela das oito. Mdico, portanto, sinnimo de roupasbrancas impecveis, cabelo arrumado, carros importados e ar condi-cionado. Realidade que extremamente difcil de se implantar emum ambiente com ruas de terra esburacadas e com o calor que alatitude e a continentalidade da cidade nos impe.

    - O trabalho em sade no tema discutido; no discutidaa precarizao que est nos jornais, muito menos a funo social domdico.

    - A taxonomia das necessidades de sade enquanto eixoterico-metodolgico para integralidade, quando tomada comoorientadora apenas da descrio e da operao, extremamentefalha. O aluno inserido na UPP v a realidade babar o seu rosto;consegue, sim, visualizar as "necessidades de sade" e escrev-lasnum papel; consegue, tambm, listar uma srie de aes que podem

    amenizar algumas situaes particulares, abismo onde mora o estilode vida. No consegue, todavia, entender por si s a gnese dosproblemas encontrados, nem consegue avaliar o porqu da maioriade suas inseres individuais no serem seguidas ou no trazeremqualquer resultado ao indivduo, muito menos coletividade.

    - O modelo biopsicossocial como forma de compreender asade e o adoecimento falho ao no apresentar hierarquia entreseus fatores. Ao atendermos um paciente com determinada nosoco-mia e ao utilizarmos de tal modelo para guiar nossa anlise e condu-ta, conseguimos compreender a questo biolgica; a questo psico-lgica, por muitas vezes patologizada, tambm trabalhada; a ques-to social, por sua vez, tratada com enorme desdm: o paciente pobre e a questo social horrvel. Ponto. Em momento algum essaest localizada como produtora da doena. considerada, sim, comofenmeno paralelo, que s se encontra com a doena aps sua insta-lao, no seguimento da conduta. Acredita-se ainda que parasitoses

    se tratam com albendazol.- O Programa de Sade da Famlia no a salvao de

    todos os males da sade, e a resolutividade de 80% dos casos, noBrasil, dado para ingls ver. Trata-se sim de um desdobramentodas polticas neoliberais e prevista pelo relatrio do Banco Mundi-

    al de 1995: mdicos generalistas responsveis por encaminhamen-tos, listas de espera, assistncia domiciliar, limitao da tecnologiaou do acesso tecnologia e a transferncia de um volume maior daassistncia para o setor privado. A ausncia de viso crtica quantoao tema afasta a possibilidade de mudana, apresentando-o lustradoe sagrado.

    - As diretrizes curriculares que norteiam o ensino da Fame-ma (ou nossa soberba nos traz o contrrio?) tem origem que cursacom o barateamento da formao mdica sobre uma perspectivatecnicista. Sabemos o necessrio para a prtica. No somos respon-

    sveis pela cincia (cincia?) que utilizamos, no temos aprofunda-mento no conhecimento das matrias bsicas. Somos meros consu-midores de tecnologia, no produtores.

    A insero do estudante no cenrio da ateno primria tempotencial para ser riqussimo. Riqussimo se tratarmos com devidaateno o fato que mais bate nossa cara no cenrio de UPP: arealidade social que nos incomum. A sensibilizao da vista deveser analisada, isenta de qualquer idealismo, e desta forma alicerada.O ato de ir deve ser a partida de um treinamento para anlise deoutras realidades.

    Dentro dessa anlise, deve estar clara a funo do mdico, afuno dos sistemas de sade, a funo da escola, a determinaosocial do processo sade-doena, etc. O estudante deve ser capaz decompreender a realidade de forma que a repulsa no ocorra. O moti-vo de tanta angstia reside exatamente na iseno de anlise profun-da e da consequente transformao do contato com a realidade em

    alheamento, em distanciamento. O impulso pela mudana freadoao se colocarem resolues meramente superficiais e improvveiscomo resolutivas para melhorar a sade do indivduo.

    Se j no recebemos dinheiro de nenhuma fbrica de cere-ais, se no respondemos, por enquanto, a nenhum magnfico reitor,se estamos soltos no cenrio do ensino pblico estadual e se nin-gum est contente (docentes, estudantes e usurios) com o que estposto, por que manter? Por que manter o sorriso no rosto enquanto arealidade manchada com abraos e sorrisos amarelos? A Famematem que mudar. Ficarmos parados s trar a amizade das fbricas dejipes, de roupas camufladas e de culos escuros; os estudantes estocansados desse safri.

    As UPPs, tanto as do Rio, como as de Marlia, tem umpapel semelhante: pacificar. Enquanto as cariocas pacificam osmorros enfiando goela abaixo rifles e fardas, sem combater o realmotivo da criminalidade, a mariliense pacifica o estudante. Blinda-

    dos num "caveiro" ideolgico, so limitadas nossa viso, nossopensamento e nossas aes.

    Fratura Exposta, Dezembro/2010 Diretrio Acadmico Christiano Altenfelder

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    Fratura Exposta, Dezembro/2010 Diretrio Acadmico Christiano Altenfelder

    Fratura HistricaA tentativa do Homem de definir um conceito de

    sade to antiga quanto prpria histria das civilizaes eacompanha o desenvolvimento da Medicina desde seus pri-mrdios. Desse modo, desde o perodo pr-cientfico quandoa doena era encarada como a perda da alma do paciente

    com a penetrao mgica de um objeto ou a possesso pormaus espritos, passando pela Medicina Hipocrtica da Gr-cia antiga que se baseava no desequilbrio dos humores cor-porais para explicar as doenas e chegando mais moderna-mente a teoria microbiana de Pasteur, Koch e Klebs do scu-lo XIX, podemos observar que sempre foi uma discussocentral na Medicina o entendimento do processo sade-doena.

    Partindo desse sinttico resgate histrico, possvelentender porque mesmo com todo o desenvolvimento tecno-lgico da Medicina, principalmente nas ltimas dcadas, adeterminao das razes da sade ou doena de um indiv-duo continua a carecer de um consenso tendo variadas ver-tentes para sua explicao. necessrio, desse modo, com-preender que a Medicina como qualquer cincia fruto deuma construo histrica, isto , que possui influncias cul-turais e polticas das diferentes sociedades onde se desenvol-ve e, desse modo, se constitui e se apresenta de acordo comas relaes sociais que so estabelecidas.

    Dentro desse contexto, realizando-se uma anlise daspolticas de Sade Pblica e Educao Mdica no Brasil possvel observar que as grandes discusses tericas sobre adeterminao do processo sade-doena e as aplicaes reaisde aes governamentais orbitam em torno do eixo biomdi-co que tem sido progressivamente superado e do eixo multi-fatorial (biopsicossocial) que ganha grande espao nos lti-mos anos. Esse fato reflete a conjuntura nacional, pois com areforma sanitria e o estabelecimento do SUS no final dadcada de oitenta foi possvel atravs de organizao e pres-

    so popular realizar modificaes no cenrio da ateno asade. A superao do modelo biomdico pelo modelo demltiplos fatores teve sua importncia e no pode ser despre-zada. Ao alar a importncia do psicolgico e do social noentendimento das doenas ao nvel do biolgico se podeoferecer ao paciente um tratamento que levasse em conta deforma mais completa as suas necessidades.

    Diante dessa anlise, ao se tomar como base paradiscusso a realidade social brasileira podemos observarclaramente a limitao do modelo biomdico, mas no so-mente deste, pois o modelo biopsicossocial apesar de tercontribudo de certa forma na superao do primeiro no setorna completo ao colocar sobre um mesmo nvel de relevn-cia as questes sociais e as questes biolgicas e psicolgi-

    cas. inegvel que a biologia e a psicologia tm grandeimportncia nas doenas e o prprio desenvolvimento cient-fico no permite a negao desta relevncia, contudo em umpas que tem uma sociedade marcada por desigualdadesgrandiosas quem determina em ltima instncia o adoeci-mento so os fatores sociais. Prova disso so os mais varia-dos dados sobre como os nveis de sade variam em diferen-tes classes sociais. Abaixo um grfico extrado do relatriofinal da Comisso Nacional Sobre Determinantes Sociais DaSade (CNDSS) que ilustra essa afirmao.

    Alm disso, abaixo se encontra um trecho do relat-rio final da Comisso Nacional Sobre Determinantes SociaisDa Sade (CNDSS):

    Apesar dos importantes avanos dos ltimos anosna melhoria do valor mdio de seus indicadores de sade, oBrasil est entre os pases com maiores iniqidades em sa-de, ou seja, desigualdades de sade entre grupos populacio-

    nais que alm de sistemticas e relevantes so tambm evit-veis, injustas e desnecessrias. Estas iniqidades em sadeso produto de grandes desigualdades entre os diversos es-tratos sociais e econmicos da populao brasileira. Segundoo Relatrio do Programa das Naes Unidas para o Desen-volvimento de 2007, com dados de 2005, o Brasil est situa-do em 110 lugar entre os mais desiguais do mundo em ter-

    mos de distribuio da renda, superado apenas por seis pa-ses da frica e quatro da Amrica Latina.

    ... o extraordinrio aumento da riqueza produzida e amodernizao da economia no significaram melhoria na distribui-o de renda. Segundo dados do censo, no ano 2000 cerca de 30%da populao tinham uma renda familiar per capita menor que meiosalrio mnimo e 75% uma renda familiar per capita menor quedois salrios mnimos, situando-se no outro extremo 3% da popula-o com uma renda familiar per capita superior a 10 salrios mni-mos.

    Apesar da fria aparncia que esses indicadores pare-cem possuir e de em um primeiro momento aparentaremligao muito mais ampla com uma discusso econmica doque de sade, eles so essenciais para que possamos compre-ender e explicar como e porque as pessoas adoecem. Utili-

    zando o conceito de sade presente na Constituio Federalapresentado em seguida possvel entender o que esses n-meros querem dizer:

    Em seu sentido mais abrangente, a sade resultante dascondies de alimentao, habitao, educao, renda, meio-ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso eposse da terra e acesso a servios de sade. , assim, antes de tudo,resultado das formas de organizao social da produo, as quaispodem gerar grandes desigualdades nos nveis de vida.

    Diante disso, se uma pessoa no consegue consumiro mnimo de nutrientes indispensveis para que consigarealizar as tarefas essenciais a vida, se no possui uma habi-tao adequada para protegla das agresses do ambiente,se no tem acesso a uma educao que permita que ela possater acesso ao conhecimento historicamente produzido permi-

    tindo que, desse modo, entenda de que maneira a sociedadefunciona e de que maneira ela pode ser transformada paraatender as suas necessidades de sade, se no trabalha e,assim, no consegue mesmo que minimamente recursosfinanceiros para sua subsistncia, ela adoece tanto biologica-mente quanto psicologicamente e fica presa a uma realidadede excluso e explorao. As classes baixas adoecem maisem nosso pas porque a estruturao da nossa sociedadeatravs do seu sistema econmico vigente cria um cruel ce-nrio de misria para a grande maioria dos indivduos queso explorados para alimentar a riqueza da classe dominante.

    Diante de tudo isso, necessrio entender que quemdetermina em ltima instncia o processo sade-doena omodelo de organizao econmica, poltica e cultural de uma

    determinada sociedade. Que sade o desenvolvimentoeconmico e social justo. Somente desse modo ser poss-vel garantir ao conjunto da populao um atendimento a suasade que seja digno e que no prive a grande maioria deconquistar a sua liberdade atravs do seu pleno desenvolvi-mento.

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    Fratura Exposta, Dezembro/2010 Diretrio Acadmico Christiano Altenfelder

    O (co)modismo da Humanizao

    O processo de humanizao da Sade tem suasorigens nos movimentos de reformas sanitrias, nasConferncias de Sade e nos grupos militantes volta-dos a aes em prol do desenvolvimento de uma cons-

    cincia cidad e cujas atuaes se tornaram, a partir dadcada de 1980, gradativamente influentes, estrutura-das e articuladas.

    A institucionalizao desse processo, com aConstituio de 1988 e a estruturao do SUS, inaugu-rou o reordenamento terico, paradigmtico e opera-cional da Sade que a levou a ser compreendida nombito da Segurana Social. Nesse contexto, a idia deHumanizao passou a ser entendida como a valori-zao dos diferentes sujeitos implicados no processode produo de Sade (SUS/PNH 2004).

    No plano de sua realizao poltico-institucional, a humanizao recebeu acolhimento, na

    gesto do presidente Fernando Henrique Cardoso, coma implantao do Programa Nacional de Humanizao,e continuidade e incremento, no Governo do Presiden-te Lula, quando o Programa foi alado a uma dimen-so de Poltica Nacional de Humanizao. Esse passono foi sem importncia, como se refere explicitamen-te o Ministro Humberto Costa: para isto estamosconstruindo uma poltica que nomeamos Poltica Na-cional de Humanizao da Ateno e Gesto no Siste-ma nico de Sade Humaniza SUS (Brasil-MS,2004, p. 9).

    Todavia, quando se depara com textos produ-zidos pelas polticas de humanizao e a literatura per-

    de-se o conceito inicial de: o que ser humano?Ser humano matar? Ser humano morrer de

    fome? Ser humano cobiar? Ser humano ser cari-doso?...

    Para falar de ser humano se comea em suavida que produzida em sociedade. Para obter tudoque precisam, os homens, juntos, produzem bens deconsumo como roupas, alimento, moradia, meio detransporte, de comunicao entre outras.

    A produo possvel pela diviso social dotrabalho. Cada setor com seu produto se tornam inter-dependente um do outro, pois assim todos podem pos-suir bens que sozinho o homem no conseguiria fabri-

    car.A sobrevivncia humana a partir da nature-

    za, todavia o homem no subordinado ao meio ambi-ente, porque o mesmo modifica e subordina a seusdesgnios e assim, produz seus meios de sobrevivn-cia. O homem no apenas extrai da natureza, masconstri equipamentos a partir dela para explor-la.

    Aquilo que o homem retira da natureza setorna objeto de ao (exemplo: um toco de rvore setorna uma lana). E assim a humanidade consegueproduzir cada vez mais recursos com menos esforos,portanto produz-se uma nova realidade.

    Com novas tcnicas diminui-se a mortalidade,aumenta a longevidade, o desenvolvimento e se garan-te a sobrevivncia a mais pessoas. Todavia o homem

    no mais produto da natureza, mas sim da civilizaoe sua condio arraigada com tudo o que a sociedadeacumulou.

    um ser que agora precisa utilizar os objetoshumanos produzidos para adquirir o grau da humani-dade que a humanidade atingiu.

    Contudo, o fato de ser determinado social-mente no inclui apenas a relao do homem e nature-za, mas tambm dos homens entre si.

    A sociedade de classes e as relaes entreclasses determinam diferentes possibilidades e restri-es ao desenvolvimento da vida e, consequentementediferentes formas de adoecer, de viver e de morrer.Nessa sociedade, uma classe detm o meio de produ-o e a outra fora de trabalho. A classe que no pos-sui meios de produo prprios e, portanto, precisavender sua fora de trabalho para sobreviver, ter mai-or ou menor desgaste no trabalho e maior ou menorpossibilidade de acesso aos produtos da produo soci-

    al, na dependncia da forma como se insere na produ-o e no consumo.

    Se entendermos que sade significa estar vivoe em condio de nos objetivarmos como humanos,realizarmos em cada um de ns o que a humanidade jestabeleceu como possibilidade (viver 100 anos, voar,etc.), torna-se muito claro que essa objetivao depen-de da possibilidade de apropriao daquilo que a hu-manidade produziu. O que estamos querendo dizer que a sade, a possibilidade de viver por todo o tempoe na qualidade que caracteriza o gnero humano, de-pende do acesso ao produto da civilizao e esse aces-so se d para cada grupo, de diferentes formas, na de-

    pendncia de como se organiza a vida em cada socie-dade.

    Portanto ser humano, ou humanizado teracesso a todo o equipamento possvel para sua sobre-vivncia. No ficar horas na fila em um hospital sujocom pessoas que no esto dispostas a atender.

    Dar um atendimento humanizado tambmsignifica bons salrios e uma carga horria decente,pois ningum obrigado a ser feliz depois de 12 horasde planto com salrios baixos e pouco aparato tantohumano quanto tecnolgico.

    Nesse sentido, supe-se que a poltica de huma-nizao na sade no venha trazer s pessoas todos

    esses acessos e servios, e sim, mais uma vez, implan-tar na sociedade um conceito jargo, no mnimo in-completo para conter as necessidades da populao emgeral.

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    Ateno BsicaAs notcias acerca da paralisao dos m-

    dicos da Ateno Bsica de Marlia tomaram con-ta da mdia local nas ltimas semanas. Numa dis-cusso que envolvia reposio salarial, a qualida-

    de do servio prestado ou mesmo a estrutura dasUnidades de Sade da Famlia, o que se tornouevidente, e novo, foi o avano da precarizao dosetor.

    Mas aqui cabe ressaltar que, apesar dasdificuldades que todo o sistema de sade enfren-ta, o fato de ter relao direta com o ProgramaSade da Famlia agrega um elemento em parti-cular que demanda maior entendimento quanto aomovimento grevista.

    Aps a Reforma Sanitria da dcada de1980 foram determinados atravs da Constituio

    brasileira e da Lei 8080 uma srie de princpiosdos quais, para a nossa anlise, destacam-se o daHierarquizao e da Descentralizao.

    O modelo de sade vigente at ento seri-a substitudo por outro no qual houvesse nveis decomplexos distintos de ateno a sade para osquais o usurio seria enviado em funo da suanecessidade. Haveria tambm um processo dereorganizao dos servios por demandas locais,o que facilitaria o acesso da populao ao SUS.Seriam assim definidos trs nveis de ateno(primrio, secundrio e tercirio) e surgiria a ne-cessidade de unidades de sade de fcil acesso,com capacidade de servir de porta de entrada do

    sistema.A escolha por tal modelo no veio toa.A crise de superproduo da dcada de 1960 queculminaria com a Crise do Petrleo e uma reces-so em escala global levou grande parte do mun-do adoo de um modelo de Estado mnino, deorientao neoliberal, no qual reas como sade,educao e segurana no seriam poupadas dafria privatizante.

    Somado a isso havia um aumento da de-manda por tecnologia, o que encarecia grande-mente a assistncia, alm do esgotamento da for-

    ma de relao entre mdicos e pacientes em fun-o da lgica centrada na viso biolgica (escola

    biomdica/flexneriana). No se pode esquecer dapresso da indstria mdico-hospitalar, na formade lobbies para venda de produtos ao Estado ouna gnese de um senso comum no qual o hospitale tudo que o envolve se tornam a nica forma

    efetiva no cuidado com a sade.A Assemblia Mundial da Sade (1977)com o lema Sade para Todos no Ano 2000, aConferncia de Alma-Ata (1978) sobre CuidadosPrimrios e a Carta de Ottawa (1986) seriam abase para a reorganizao dos sistemas de sadeao redor do mundo.

    No Brasil, tal movimento tomaria formaatravs de aes como o Programa de AgentesComunitrios de Sade, de 1992, ou a implanta-o do Programa de Sade da Famlia no ano de1994 gerando, assim, a nossa Ateno Bsica.

    Asa Cristina Laurell, pesquisadora darea da Medicina Social, geraria diversas refle-xes acerca da implantao dos Cuidados Prim-rios ao redor do mundo atravs do seu livro Esta-do e Polticas Sociais no Neoliberalismo. Nestaobra, a autora derrubaria o mito dos 80% de reso-lutividade, vivel apenas numa sociedade como acanadense, por exemplo. Como vimos no casobrasileiro, at a traduo seria prejudicada emfuno de necessidades polticas. Explicitariatambm o papel do Banco Mundial, rgo inter-nacional cujo objetivo maior o de garantir a ma-

    nuteno do modelo atual de organizao scio-econmica.

    No seu relatrio de 1995, sobre a sade, oBM sugeriria fortemente o uso de uma atenodiferenciada entre aqueles que podem e aquelesque no podem pagar. A quem no pudesse, o usode filas de espera, de co-pagamento de servios, agesto do servio pelos prprios mdicos, otimi-zao (reduo) do nmero de leitos e do acesso atecnologia, a criao de um mercado interno deservios de diagnsticos alm, claro, da limita-o da cobertura da assistncia em termos de di-agnstico e tratamento. Portanto, uma cesta bsi-ca de servios que tornaria uma sade pobre parapobre.

    No um exerccio que demanda muitoesforo observar a nossa Ateno Bsica, ver oquanto ela se distingue dos Primaries Cares domundo desenvolvido. A luta por melhores condi-es de trabalho, melhor organizao, financia-mento e estrutura fsica no so demandas disso-ciadas da realidade. Importante no fazer vistasgrossas ao processo de construo histrica da

    sociedade e garantir que, no futuro, os mesmoserros no se repitam.

    Fratura Exposta, Dezembro/2010 Diretrio Acadmico Christiano Altenfelder

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    Residncia Multiprofissionalna viso de um residente

    Em 2006, criada o Programa de Re-sidncia Multiprofissional em Sade da Fa-

    mlia da Faculdade de Medicina de Marlia(Famema), contemplando cinco profissesque esto inseridas na ateno bsica e suasaes deveriam ser norteadas levando emconsiderao as atenes s necessidades in-dividuais, coletivas e gesto ou processo detrabalho.

    Sabe-se que uma das prioridades noprocesso ensino-aprendizagem nesta institui-o formar profissionais que atuem na lgi-ca do modelo biopsicossocial. No entanto, aoinvs dessa ps-graduao aproximar e con-tribuir para que tal formao seja preconizadatambm neste cenrio, no integrada com agraduao, mas sim ilhada e esquecida pelosdirigentes.

    A metodologia utilizada tenta camu-flar o descompromisso de alguns membrosformadores com o programa, alm das fragi-lidades tcnicas dos mesmos. Tais fatos soexemplificados nas ausncias deles nas ativi-

    dades prticas e tericas, desconhecimento e/ou no aprofundamento de noes bsicas desade coletiva bem como da realidade dasUSFs (Unidades de Sade da Famlia). Tudoisso repercute numa formao deficiente, a-crtica, sobretudo, de extenso assistencialistaem detrimento da extenso transformadora.

    A parceria com a Secretaria Munici-pal de Sade de Marlia no pactuada deforma clara, concomitantemente, est rechea-da de contradies. Em alguns momentos,

    no nos consideram como membros da equi-pe de sade, nem do servio, negando-nosoportunidades de realizar capacitaes e atmesmo estgio eletivo, enquanto em outrosmomentos nos consideram como trabalhado-res e mo-de-obra barata.

    O que mais espantoso que tal fra-gilidade vista, tambm, na parceria para osplantes com a prpria instituio Famema eseus cenrios de atuao, tais como: HCI, HCII e HC III. Nestes espaos encontramos

    grande dificuldade de aceitao por parte dosprofissionais que l trabalham, bem como

    dificuldade de aceitao para abertura dosespaos para nossa atuao, ao mesmo tem-po, em determinadas reas (fisioterapia e en-fermagem) delegam inmeras atividades aosresidentes e se tornam rgidos a abrir as por-

    tas dos refeitrios para estes.Em relao aos cenrios de prticas,

    as Unidades de Sade da Famlia (USF) apre-sentam pssimas condies de trabalho, es-cassez de recursos materiais e humanos, bai-xssimas participao social nas decises egrandes fragilidades na integrao entre osdiversos nveis de complexidade dos serviosde sade municipal.

    Conseqentemente, h residentes frus-trados e insatisfeitos com a formao e a rea-lidade que encontram, os mesmos reforam omodelo fragmentado e reducionista dos pro-fissionais da rede e at mesmo alguns apre-sentam quadro de adoecimento.

    O Programa de Residncia Multiprofis-sional em Sade da Famlia tem cumprido afuno pela qual foi criada pelo Ministrio daSade? Ou seja, ser que tem contribudo pa-ra a formao de profissionais diferenciados eque possam contribuir para a mudana do

    modelo assistencial de sade, auxiliando naconcretizao os princpios do SUS e efetiva-o do ESF em nosso pas e municpio?

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    Fratura Exposta, Dezembro/2010 Diretrio Acadmico Christiano Altenfelder

    Fratura Cruzada

    a - (...) longitudinal anterior - faixa fibrosa forte e larga que cobre as faces ntero-laterais dos corpos vertebrais e discosintervertebrais (IV).

    b - constrio dos maxilares, produzida pela contratura dos msculos da mastigao; um dos sinais do ttano.

    c - aumento de volume de um tecido, rgo ou parte do corpo, podendo ser provocado por um processo inflamatrio deordem tumoral ou por uma infiltrao edematosa.

    d - princpio do SUS que garante o acesso de todos os cidados aos servios de sade no pas.

    e - Christophe (...) - psiquiatra e psicanalista francs, pesquisador das relaes entre trabalho e doenas mentais.

    f - grupo de enzimas envolvidas no metabolismo do cido araquidnico, levando sntese de prostaglandinas.

    g - um tumor do tecido cromafim, em geral, produtor de catecolaminas e responsvel, na maioria dos casos, por quadro

    clnico de hipertenso arterial associada ou no a paroxismos adrenrgicos.h - qualquer erro sistemtico no delineamento, conduo ou anlise de um estudo que resulta numa estimativa equivocadado efeito da exposio no risco da doena; geralmente, referem-se a falhas de seleo ou de informao.

    i - Sndrome de (...) - doena inflamatria auto-imune, crnica, que acomete principalmente as glndulas de secreoexcrina, especialmente as lacrimais e as salivares, e rgos como a pele, o fgado, etc.

    j - mdico sanitarista e poltico brasileiro, cuja participao foi fundamental para os debates em sade da dcada de 80.

    k - quarto (IV) par de nervos cranianos; inerva o msculo oblquo superior (olhar para baixo e para dentro).

    l - cidade do Cazaquisto que recebeu a Conferncia Internacional sobre Cuidados Primrios de Sade da OMS em 1978.

    m - base de dados que favorece a definio de prioridades nos programas de preveno e controle de doenas, sendoelaborada a partir das Declaraes de bito (DO) coletadas pelas Secretarias Estaduais de Sade.

    n - doena infecciosa de evoluo crnica, que compromete principalmente os pulmes; entre as medidas profilticas, est avacinao com o bacilo de Calmette-Gurin (BCG).

    o - Doena de (...) - tambm conhecida como Osteognese Imperfeita, decorre de um defeito gentico na sntese decolgeno.

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    Fratura Exposta, Dezembro/2010 Diretrio Acadmico Christiano Altenfelder

    p - acmulo patolgico de lquido na cavidade abdominal; a principal causa a hipertenso porta associada cirroseheptica.

    q - membrana (...) - estrutura derivada do dobramento da regio caudal do embrio.

    r - " A (...) no pode prever o que vai acontecer. S pode prever a probabilidade de algo acontecer." Csar Lattes

    s - (...) Ocupacional - toda alterao de pele, mucosa e anexos direta ou indiretamente causada, condicionada ou agravada

    por elementos existentes no ambiente de trabalho; a dermatite de contato a forma mais comum.t - um dos pilares da relao profissional de sade-paciente.

    u - Ponto de (...) - situado no quadrante inferior direito do abdome, entre a cicatriz umbilical e a crista ilaca ntero-superior.

    v - Fibrilao (...) - uma taquiarritmia supraventricular e uma das arritmias mais frequentes na prtica clnica; todavia,pode se comportar clinicamente como uma taquicardia ou uma bradicardia, dependendo da capacidade de conduo do nAV.

    w - (...) Uterino - tipo mais comum de tumor benigno ginecolgico, incidindo em at 30% das mulheres em idadereprodutiva.

    x - (...) Trombticas - grupo de entidades que rene prpura trombocitopnica trombtica (PTT), Sndrome hemoltico-urmica (SHU), Pr-eclmpsia/HELLP e Coagulao intravascular disseminada.

    y - Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais da Associao Americana de Psiquiatria.

    z - (...) Social do processo sade-doena . Referencial de estudos em sade pblica que considera as condies de vida

    como fundamentais no processo de adoecer. [email protected]