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Page 1: Fragmentos de Memorias- Henrique Ifanger
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Coleção “Crônicas Indaiatubanas”

Fragmentos de Memórias

Henrique Ifanger FUNDAÇÃO PRÓ-MEMÓRIA DE INDAIATUBA

2004

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FUNDAÇÃO PRÓ-MEMÓRIA DE INDAIATUBA Coleção “Crônicas Indaiatubanas” Henrique Ifanger, Fragmentos de Memórias Créditos da Publicação Concepção e preparação dos originais: Denise Aparecida Soares de Oliveira; Fernando Henrique dos Santos; Rodrigo Alexandre Mariotto; Sônia Maria Fonseca Revisão: Analma Queiroz Moura; Antônio Reginaldo Geiss; Denise Aparecida Soares de Oliveira; Sônia Maria Fonseca Fotos: Acervo familiar

Tiragem: 500 exemplares

Diagramação, Fotolito e Impressão: Ottoni Editora

Rua Garcia Moreno, 55 – Centro - Itu Tel. (0--11) 4022 5309/4022 5312

040 Ifanger, Henrique I01f Fragmentos de Memórias/ Henrique Ifanger. Indaiatuba (SP): Fundação Pró-Memória de Indaiatuba, 2004. 101 p.; il. , 15,5 cm (Crônicas Indaiatubanas, 4)

1. Henrique Ifanger – Autobiografia. 2.Indaiatuba – São Paulo (Estado) – História. 3. Ifanger, Henrique. I. Título.

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Sumário

Apresentação – Tio Henrique 07 Memórias de Henrique Ifanger 08 Dizem que recordar é viver 09 Imigração de suíços 11 Recordações 14 Em Indaiatuba 19 Sítio São Miguel 23 Broca do café 26 Sítio Velho 28 Negócios 31 Juca 35 As meninas 37 Não esqueço 39 Máquinas 41 Morro Torto 43 Movimento militar 45 Fazenda Santa Maria 47 Noivo 49 Compra da Fazenda São Mathias 52 Venda da Fazenda São Mathias 56 Oficina de Calhas 61 Reforma da Igreja 63 Maria Cecília Ifanger 68 Carro de boi 72 Como era feito o carro de boi 74 Helvetia, atualmente, Confederação Helvética 77 David Ming 79 Meu passado em Indaiatuba 81 Tragédia 83 Mais memórias 85 Festa das Nações 88

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Árvore genealógica da família de João Ifanger1 90 Índice Onomástico e Toponímico 91

1 Este item existe apenas na edição impressa.

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Tio Henrique A admiração e o respeito por um tio é certamente gerada por laços emocionais familiares, porém com meu tio Henrique Ifanger os detalhes de sua vida transcendem essa normalidade. Sua inteligência, habilidade e cortesia foram características que ficarão inapagáveis na minha memória e em tantas outras que o conheceram. Depois de ler por repetidas vezes o texto aqui elaborado, minha admiração tomou dimensões extraordinárias pelo fato de em linhas ausentes ele nos ter revelado um magnífico ”tesouro”. Descreveu com propriedade, sabedoria e riqueza de detalhes um século e meio de história da imigração suíça, relatou e revelou particularidades da sua família, amigos ou conhecidos e praticamente “documentou” fatos de relevada importância histórica de Indaiatuba e região. Procurou expor tudo com realidade, com a objetividade de um historiador e foi sábio, de propósito ou não, em não revelar as mágoas e tristezas da sua vida pessoal, cujos infortúnios e fatalidades lhe tiraram precocemente quatro de seus queridos filhos que todos amávamos. Uma grande dor sentida e repartida com tia Mena e os outros filhos. Nesse aspecto que me refiro acima ao “tesouro” que ele deixou transparecer: viveu com naturalidade e aceitou os desígnios de Deus; isso foi para mim o maior exemplo de vida deixado por ele. O sobrinho José Paulo Ifanger

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MEMÓRIAS DE HENRIQUE IFANGER

Algo biográfico dos antecedentes (suíços) que dedico aos meus familiares, parentes e amigos, que com eles tive convivência afetiva no passado e no presente, especialmente com minha esposa, D. Philomena, e os filhos. Dizia um grande pensador: "Que todo homem tem três coisas para fazer em sua vida" Escrever um livro Plantar uma árvore e Ter filhos. Já cumpri o meu dever.

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DIZEM QUE RECORDAR É VIVER

Recordar o passado é alguém como eu que tive a felicidade de pertencer a uma família de tradição e muito unida.

Cumpro o desejo de mencionar alguns fatos históricos e interessantes e, talvez, emocionantes. Pois, naqueles tempos não havia meios de comunicação. O único meio era por meio de carta ou telegrama, pelo correio, muito lento, por ser pela via férrea. O jeito era fazer visitas pessoais pelo trem, e esses encontros eram para ficar pelo menos dois dias. Eu gostava muito quando meus tios vinham nos visitar. Ficavam altas horas da noite conversando, contando passagens anteriores referentes à vida e costumes de seus pais e companheiros imigrantes suíços. Era o tempo em que o Brasil estava em regime de escravatura. O que estou escrevendo não vi e muito menos senti, pois eu não existia naquela época. Mas como disse no tópico, as famílias eram unidas, porque pertenciam a uma leva de imigrantes suíços, quase todos parentes e amigos, e não falavam a língua portuguesa. Os que não eram parentes logo ficavam, pois os suíços não consentiam o casamento de seus filhos com os de outra nacionalidade.

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IMIGRAÇÃO DE SUÍÇOS

A imigração de suíços ocorreu no ano de 1849 em diante, em pleno regime da escravatura no Brasil. Entre os parentes e companheiros dos imigrantes destacava-se o inesquecível Antonio Von Zuben. Pode-se dizer que foi o chefe das missões destes imigrantes católicos que foram colocados no município de Jundiaí. Eram essas missões patrocinadas pelos fazendeiros Souza Queiroz, proprietário de três fazendas, sendo uma delas Sítio Grande, onde tinham mais ou menos sessenta escravos e algumas famílias de suíços, como Von Zuben, Sigrist, e outras.

Em 1852, Antonio Von Zuben fez uma viagem para a Suíça, a fim de convidar alguns parentes e conhecidos para imigrarem para o Brasil, pois Von Zuben já previa o fim da escravatura e a necessidade de substituir os escravos por imigrantes estrangeiros. Conseguiu diversas famílias, que chegaram no Brasil no ano de 1854.

Nesta leva de imigrantes vieram João Ifanger, " vovô", com apenas onze anos de idade, e Ana Maria Von Zuben, também de menor de idade, irmã de Antonio Von Zuben. Vieram também as famílias de Inácio Müller e os irmãos Conrado e Maria; ficou ainda na Suíça a órfã Carolina Müller. Mas, ao completar 21 anos, emigrou junto com outro grupo (famílias Bannwart, Wolf, Ambiel, Amstalden, Sigrist e outros).

Antonio Von Zuben casou-se com Tereza Sigrist no ano de 1850 mais ou menos. João Ifanger ,vovô, casou-se com Ana Maria Von Zuben em 1866. Inácio Müller casou-se com Maria Ifanger no ano de 1889, João Ifanger Junior casou-se com Carolina Müller no ano de 1895.

Carolina como era bem preparada, pois teve escola na

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Suíça, participou do grupo de copeiras no navio que os trouxe. Foi uma viagem de 45 dias. No dia da chegada, o navio teve de ficar ancorado bem diante do porto do Rio de Janeiro por haver um movimento militar de ataque à cidade. Só oito dias após foi permitido o desembarque. Isto aconteceu em 1873. Quanto ao motivo, ninguém ficou sabendo.

Chegando em Jundiaí, Carolina estava contratada com emprego de copeira no colégio Florence, que era também de proprietários suíços. Para acreditar o que diziam, aconteceu que Carolina já estava na mira de João Ifanger Júnior. A idade de ambos coincidia: ele com 22 anos e ela com 23. O encontro foi festejado no sítio do irmão de Carolina, Inácio Müller, que era casado com Maria Ifanger, irmã de João. O namoro durou dois anos. E, muitas vezes, era no pátio ajardinado do colégio que, aos domingos, era muito freqüentado pelos familiares dos alunos ali internados. Acontece que o portão de entrada tinha de ser fechado na hora certa e o casal de namorados perdeu um pouco a hora da saída e o responsável de fechar o portão trancou-os. E foi preciso a copeira pedir ao funcionário que abrisse para que os namorados pudessem sair. Quem contava esta história era minha mãe Carolina.

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RECORDAÇÕES

Voltando atrás, recordo que meus pais, amigos e parentes costumavam se encontrar periodicamente em nosso sítio São Miguel, em Indaiatuba, onde eu cresci. Estava com dez anos, podia muito bem ouvir as histórias do passado que os velhos contavam, casos interessantes, que eu e meu irmão jamais pudemos esquecer. Por exemplo, uma delas: Antonio Von Zuben, que administrava as fazendas vizinhas de propriedade dos Souza Queiroz, de vez em quando, precisava tomar o lugar de feitor. Essa pessoa, feitor, era o encarregado de comandar a turma dos trabalhadores escravos. Precisava ser enérgico e forte para ser respeitado pelos sessenta escravos. Geralmente, era um caboclo cujo chicote que trazia no ombro tinha tamanho vantajoso, cabo de madeira roliça, media mais ou menos dois metros e meio. De vez em quando, dava uma estalada no ar para que andassem mais depressa no caminho da roça, e já estava claro o dia. Mas Antonio Von Zuben, homem alto e enérgico, dava suas estaladas no calcanhar daquele que andava mais atrasado.

Estes casos eram bem ao contrário do que se passava com sua irmã, Ana Maria, casada com João Ifanger, vovô. Essa mulher era chamada de madrinha dos escravos. Todos os escravos da fazenda tinham liberdade de não trabalhar aos domingos e dias santos. Faziam seus passeios, divertiam-se dentro das fazendas de propriedade dos Souza Queiroz.

Quando algum escravo fazia algum pedido para a Sinhá Patroa, Sinhô Patrão, Sinhazinha Filha, Sinhozinho Filho, era Ana Maria a portadora do pedido, e sempre conseguia bom resultado. Assim como quando algum escravo cometia falta grave, que merecia castigo, era geralmente acompanhado pela madrinha e sempre amenizava a proporção da falta. Mesmo

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quando o escravo cometia uma falta ainda mais grave e sabia que ia sofrer castigo severo, como ser surrado com um chicote e ainda ficar preso acorrentado por vários dias, sendo o jeito fugir mato a dentro para não ser pego em flagrante, era a madrinha com sua habilidade que mandava um recado para que o escravo voltasse que o defenderia. E logo entrava em contato com o Sinhô ou a Sinhá, conforme o caso, para perdoar e permitir a volta ao trabalho.

Naquele tempo havia grandes extensões de matas, era comum os escravos faltosos de outras fazendas construírem ranchos de sapé que serviam para os fugitivos da região passarem dias escondidos. Esses ranchos eram chamados de "Quilombo".

E ainda sobre Ana Maria: comentavam que, nos dias de folga - isto é, nos domingos e dias santos - os escravos não trabalhavam e alguns deles iam na casa da madrinha pedir uma comida diferente daquela de todos os dias; não tendo às vezes o que dar, não deixava que saíssem sem dar um torrão de açúcar, que era fácil encontrar nos sacos de açúcar "Pernambuco" que existia naquele tempo.

Recordo mais uma dos fazendeiros Souza Queiroz: os suíços que estavam morando na fazenda para substituir os escravos que iam ser libertados, viviam em casas próprias e separadas, tipo colônia, perto da sede da fazenda. Como eram todos católicos muito unidos, costumavam rezar o terço todas as noites, inclusive a ladainha de Nossa Senhora, tudo conforme os costumes suíços. O fazendeiro Queiroz ficava escutando no pretório do sobrado; quando na ladainha o chefe da família declamava o nome do santo e os outros respondiam "rogai por nós" em suíço, comentava: – "Eu gosto muito destes suíços, são formidáveis, escutem o

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que estão dizendo: "O café do Queiroz...", diz o puxador da reza, e os outros respondem: "...está carregado". “O café do Queiroz está carregado.”

E o pessoal que estava assistindo gozava a morrer. Quanto a família de João Ifanger, meu avô, casado com

Ana Maria Von Zuben pelos anos de 1860, o casal teve dez filhos, que são os seguintes: Maria, casada com Inácio Müller; Josefa, com Luiz Sigrist; Carolina, com Joaquim de Oliveira; Francisca, que ficou solteira; Henrique, com Delaide; João Ifanger Junior, com Carolina Müller - que são meus pais, casados em 1895; Augusta, casada com Otávio Fonseca, Maneco - faleceu picado de cobra; Laura, com Marcos; José (o Juca), com Maria Sigrist. No mesmo ano do seu casamento, meu pai foi convidado para assumir o cargo de escriturário na fazenda Sítio Grande, dos Souza Queiroz, permanecendo no emprego até 1898.

Nesse ano, o casal tinha os seguintes filhos: Maria, falecida; João Ifanger Neto; Inácio, falecido; Henrique, que é quem escreve este memorial e que nasceu no dia 18 de setembro de 1899, no sítio de Luiz Sigrist, situado no bairro Felipão em Campinas; Ernestina, que nasceu no ano de 1905, ano em que mudamos para Indaiatuba. Nessa ocasião, Indaiatuba era uma Vila com mais ou menos oito mil habitantes. O município era pouco povoado, a maioria dos habitantes concentrava-se nas fazendas de café. Vou citar algumas fazendas: Bela Vista, Pau Preto, Engenho D’agua, Grama, Morungaba, Cachoeira, Barreiro, Sta. Maria, a dos padres de Itaici, Morro Torto e Bentoca. As duas últimas ainda não eram bem exploradas. Por exemplo, o Bairro Bentoca era uma propriedade que estava sendo vendida em glebas para a formação de sítios, por haver muitas matas e

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pastos sem tratamento para a criação de eqüinos, como éguas, burros, jumentos e garanhões.

Lembro-me de alguns momentos de minha infância. Tinha apenas seis anos de idade, quando aconteceu a morte trágica do tio Maneco, irmão de meu pai, solteiro, com 21 anos de idade, vítima de picada de cobra cascavel quando colhia milho na roça. Lembro-me que havia um movimento fora do normal e tristeza. Vi meu pai e minha mãe chorando, sentados em um banco. Perguntei porque estavam chorando. – “Maneco morreu”, foi a resposta. Eu fiquei na mesma, não entendia o que era a morte.

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EM INDAIATUBA

Em casa, tinha uma menina preta que meus pais criavam. Era órfã e ajudou a minha mãe a criar os filhos, que já eram cinco.

Meu pai tinha um cunhado por nome Sebastião Müller, casado com Maria Müller, irmã de minha mãe, que morava em um sítio, comprado em Indaiatuba e com boa parte em matas, situada no Bairro Bentoca, como era conhecido. Sebastião ofereceu a meu pai uma pequena gleba de terras, atingindo oito alqueires, por dois contos e oitocentos mil réis.

Como meu pai tinha algum dinheiro que ganhou na lavoura e mais uma pequena herança que recebeu de um sítio que seu pai tinha no município de Jundiaí, acumulou a importância de 6 contos de réis, eu creio. Assim, comprou essas terras e deu início à mudança para Indaiatuba.

O negócio foi bom, mas nessa época não tinha casa para morar. Sebastião já tinha a sua casa, de tamanho regular, e com poucos filhos. Prometeu acomodar nossa família até construirmos a nossa casa. Chegou a hora de mudar. Isto aconteceu no dia 24 de maio de 1906. Nosso meio de transporte do pessoal foi a carroça e mais um cavalo chamado Lazão. Postas as peças de mais necessidade na carroça, D. Carolina cozinhou uma dúzia de ovos, pegou um garrafão de água, leite e broa. E seguimos viagem. Éramos seis menores e o casal. A Ernestina era a menor e ainda mamava. Passamos pelo bairro Barro Preto, seguimos e atravessamos o campo de Viracopos, adiante Serra d'Água, onde paramos para dar água para o cavalo. Meu pai foi comprar alguns doces, tipo peixinho, no armazém do Sr. José Von Ah, que serviu-o e desejou boa viagem, sem cobrar nada.

A mudança mais volumosa foi feita pelo Sr. João

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Angarten, morador do bairro Estiva, com dois carros de boi, um deles carregado de milho em palha. Foi alcançado por nós na chegada do destino: eram cinco horas da tarde.

Nos primeiros dias, depois de pôr as coisas mais ou menos em ordem, meu pai foi escolher o lugar para construir a casa, que deveria ser feita de madeira e coberta de telhas. Escolhido o local, começou a derrubada da mata, onde havia muita madeira para a construção. Com dois empregados e um carpinteiro, limparam a área e deram início ao levantamento, fazendo ali mesmo, de pau a pique e barro, coberto de telhas. O interior foi feito com terra batida, o carpinteiro assentava as portas e janelas. O pedreiro passou reboco nas paredes, acompanhando as curvas que a madeira roliça deixava. No fim, a caiação e a pintura das portas e janelas. Em menos de dois meses pudemos mudar em nossa casa.

Começamos a preparar as terras onde não havia mato. Ficamos neste sítio três anos. Foi vendido para o Sr. Von Ah, pessoa conhecida há muito tempo, que sempre nos visitava e ficou gostando do sítio. Isto aconteceu em 1909. E, nesta mesma ocasião, meu pai comprou um pequeno sítio mais perto de Indaiatuba, onde está instalado hoje o sistema de água do Capivari Mirim.

Foi aí que comecei a freqüentar a escola municipal com meus irmãos João e Juca. O primeiro professor foi o Sr. Carlos Tancler. A escola funcionava onde é hoje a Escola de Comércio Nossa Senhora da Candelária.

O sítio a que estou me referindo também não tinha casa, apenas um casebre localizado em lugar impróprio. A casa construída por meu pai era bem melhor e bem localizada, de onde se podia avistar a vila. Moramos ali dois anos. E foi dali que pude ver, a olho nu, o cometa Halley. Meu pai, como era assinante do jornal O Estado de São Paulo, estava a par

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deste acontecimento e nos acordou para ver o cometa, que estava bem visível, na forma de um leque semi-aberto, em posição perpendicular, com uma parte mais clara. Isto às quatro horas da manhã, mais ou menos, no ano de 1910. Neste local nasceu a Izabel.

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SÍTIO SÃO MIGUEL

Em 1911, meu pai comprou o Sítio São Miguel, vizinho ao nosso e pertencente ao Sr. Teófilo de Almeida Ferraz, que residia na vila. O sítio estava meio abandonado por ter pouca água, apenas uma vertente pouco distante e um poço. Este poço tinha 18 metros de profundidade, era estreito e produzia pouca água.

Começamos a reconstruir. Eu estava com 11 anos, o Joãozinho com 13, Juca com 9, Juventina com 8 e os outros ainda eram pequenos para trabalhar. Mas havia a facilidade para encontrar trabalhadores. Pagava-se mil e quinhentos réis por dia, dava-se comida e café com pão. Trabalhavam sol a sol. No lugar mais alto do sítio, plantamos quatro mil pés de café, assim como cereais, milho, arroz, feijão, batata. Existia produzindo: duas mangueiras, diversas laranjeiras São Sebastião, abacaxi, cem árvores de seringueira mal formadas e abandonadas. No ano de 1912, nasceu Paulo, no dia 12 de fevereiro. Em 15 de março de 1913, foi inaugurado o serviço de energia elétrica e iluminação pública em Indaiatuba, com grande festa. De nossa casa via-se bem a luz, que antes era fraca por ser de lampião de querosene em coluna de ferro. O responsável pelos lampiões era o Sr. João B. T. Pedroso de Barros2, cujos familiares ainda moram nesta cidade, sendo um dos filhos Waldemar, que é muito estimado entre nós.

Nesta época, conhecemos também o Sr. Nabor Pires de Camargo. Foi meu colega de classe, sentamos juntos na mesma carteira da escola, que já era grupo escolar. Ele estava se preparando para ir a São Paulo, para estudar música, pois

2 De acordo com Dilermando Pedroso de Barros, o nome correto é José (Nenê) Pedroso.

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tinha vocação para essa arte. Também nesse período nasceu Eduardo, o caçula. Em 1914, começou a grande guerra, Conflagração

Européia. Em 1918, houve uma grande geada que atingiu muitos cafezais em áreas baixas e também foi inaugurado o ramal da estrada de ferro de Itaici a Campinas.

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BROCA DO CAFÉ

Em 1920, apareceu a broca do café: um besouro que atacava o grão do café e com a desova danificava o fruto antes de secar. Para combater a praga o Instituto do Café descobriu um meio de eliminá-la, utilizando estufas. O governo criou uma lei que obrigava todos os produtores de café do Estado de São Paulo a construir uma estufa. O modelo foi publicado e desenhado no jornal, dando explicações de como deveria ser construído. Era para levantar quatro paredes de tijolo de espessura, uma só porta, guarnecidas com fitas de borracha, seis parafusos com porca tipo borboleta, teto de lajotas, tudo com bom acabamento, para que não escapasse o gás venenoso, que exalava de um líquido chamado formicida, colocado interiormente em uma latinha aberta, dependurado no teto. O café é posto ensacado na estufa à tarde quando chega da roça. Quando tudo dentro, fecha-se a porta parafusando bem, permanecendo assim até o dia seguinte, uma duração de 12 horas. De manhã é retirado e esparramado para secagem, depois de lavado. Em nossa propriedade eu é que fiz a estufa, que foi a primeira do município. Diversos vizinhos, que tinham café e sabiam que eram obrigados a construir a sua estufa, vieram ver como foi construída a nossa. O modelo, eu já tinha visto no jornal O

Estado de São Paulo. E assim foi fácil de construir e dar as informações necessárias aos que vieram ver a estufa.

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SÍTIO VELHO

Em 1919, veio a questão do Sítio Velho. Talvez era uma fazenda de cana-de-açúcar, pelos vestígios que se podiam observar: alguns troncos de madeira antigos fincados pela beira do riacho que ali existia. Os proprietários dos 150 alqueires, mais ou menos, eram ex-escravos que receberam em doação do próprio patrão, quando foi abolida a escravatura no Brasil. Ele fez doação desta grande área conforme documento manuscrito, citando o nome de todos os beneficiados, que eram o total de 25. O feitor, como era chamado, era aquele que comandava os escravos, geralmente um caboclo. Era o Sr. Pedro Jacinto Gonçalves cujos familiares ainda residem em nossa cidade.

O documento assinado pelo doador, que cheguei a ler em parte, identificando os nomes de alguns, era um papel comum mas muito estragado de tanto passar de uma mão para outra. Alguns nomes eram: Roberto, Silvério, Bentão, Guerino, Luiz Fonseca, Marcelino. Eles trabalhavam, diversos deles, para meu pai, como empregados diaristas. Outros arrendaram suas terras, suas partes, pois eram todas em comum, por qualquer bagatela. Uma grande área estava abandonada e era queimada todo ano. Sem construção decente, era muito comum haver brigas entre eles, bebedeira, imoralidade, dando muito trabalho para a polícia. O delegado pouco podia fazer com apenas quatro policiais, sem viaturas dada a distância e ainda eram muitos violentos.

O então prefeito da cidade Sr. Alfredo de Camargo Fonseca, e o delegado de polícia por diversas vezes sugeriram a meu pai a compra das partes para pôr fim àqueles focos de brigas que surgiam freqüentemente no local. Foi quando meu pai começou a dar início, com ajuda do advogado José da

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Silva, à compra da maioria das partes, propondo uma divisão judicial da área, legalizando inclusive as partes dos que não quiseram vendê-las. Assim, foi posto em execução o levantamento de toda a área. Para esse trabalho foi indicado o agrimensor oficial, José Gastão, nomeado pelo juiz da comarca de Itu. Foi dividida em partes iguais. Os que não quiseram vender permaneceram no local, com o título de propriedade. E as partes restantes, vendidas a meu pai, foram anexadas ao sítio São Miguel. Os custos desta operação não foram pequenos, por ser o judiciário instalado em Itu. Dois advogados foram escalados para acompanhar o processo, um de Indaiatuba, o outro de Itu. Para o agrimensor foram colocados à disposição dois empregados e a "bóia". Eu tive o encargo de ir na frente, conferindo as demarcações dos vizinhos e estabelecendo as nossas com grande precisão, para que não houvessem margem de dúvidas. Concluído o trabalho, todos ficaram satisfeitos, com as escrituras legalizadas.

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NEGÓCIOS

Continuo recordando os negócios importantes que meu pai realizou na época. Comprou do comerciante Cesare Lizoni uma área de sete e meio alqueires de pastos, localizada próxima ao cemitério velho, atualmente bairro Aparecidinha, no valor de sete contos de réis. E, em seguida, comprou outro sítio denominado Galrão, cujo o proprietário residia em Monte Mor. Atualmente, pertence à família de Luiz Emílio Bannwart.

Obedecendo um pouco à memória, vou citar algumas passagens típicas de nossa vida no Sítio São Miguel. Eu tinha uns quinze anos, trabalhava na roça com meus irmãos e empregados, cujos ordenados eram mil e quinhentos réis por dia e mais a bóia, que era igual para todos. A bóia vinha numa marmita grande. Às nove horas, a Ernestina e a Francisca apareciam na roça com o almoço. Cada um servia o seu prato e sentava no chão, sempre na sombra de uma árvore próxima. Em diversos setores da roça existia um rancho de sapé para quando chovesse.

Tinha em casa uma empregada, a Benedita. Não era bem empregada, pois foi criada por meus pais desde os seis anos, por ser órfã de mãe. Na época, eu tinha um ano de idade. Foi bom para a minha mãe, pois assim ela ajudou a criar os garotos. Com vinte e um anos, ela se casou com um rapaz bom e trabalhador e com alguns recursos. Era prendada, possuía valores, educação e sabia falar suíço e alemão; por isso, era admirada por todos. Criou diversos filhos, bem educados, que residem nesta cidade.

Quem era eu então? Era o faz tudo. Gostava de fazer serviços variados, menos carpir à enxada, coisa que eu não gostava muito. Muitas vezes eu tinha que ir, principalmente,

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semear sementes de batata, milho, feijão, arroz. Trabalhava com arado, carroça, carpideira, etc. O que eu mais gostava era do serviço de carpintaria ou pedreiro, em que trabalhava sozinho. No Sítio São Miguel, tinha muito serviço desse gênero. Isto porque estávamos em franco progresso, construindo casas para colonos, tulha para café, paiol, chiqueiro, curral para as vacas leiteiras, galinheiro. Nos dias chuvosos, eu trabalhava na oficina de carpintaria. Meu pai comprou algumas ferramentas novas e, com isso, fiquei mais ativo. Construía porteiras para estradas, portões com diversas trancas, idealizadas por mim. As casas dos colonos, eu que as fiz, de tijolos, cobertas de telhas. Fiz o madeiramento, portas, janelas, com pinturas, caiação, tudo simples mas resistente. A sede era muito antiga. Encontramos já muito velha mas o madeiramento estava perfeito, os batentes grossos, portas de cedro, com dobradiças importadas. A fechadura da porta da frente era de origem portuguesa e ainda funcionava com perfeição. Estava com sérios defeitos nas partes externas, que eram construídas de madeira, sentido pau a pique. Neste caso, para construir a parede de tijolos, tive o auxílio de meu irmão Juca. Ele era forte e corajoso. Primeiro escoramos um lado de casa, para que a parede ficasse livre. Destruímos duas laterais e construímos o primeiro pilar com as duas alas quase completas. O mesmo fizemos com os outros cantos, sem dificuldade. Esta casa continua inteiramente conservada no tamanho original. O atual proprietário, Eduardo Ambiel, é de origem suíça, pertencente à família Inácio Ambiel, imigrante do mesmo grupo de Carolina, minha mãe. Ele alterou a frente, num estilo mais moderno, sem prejudicar a parte antiga. Fez uma varanda bem espaçosa, com ampla vista para a cidade. A cem metros dela foi feito um loteamento de elite, tendo as casas novas normas especiais para a construção. É a Vila

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Suíça, que tem uma de suas ruas o nome de João Ifanger Junior. E ainda no mesmo bairro foi construído um grupo escolar com o nome da professora Maria Cecília Ifanger, minha filha falecida tragicamente.

Recordo que a madeira para s construções, que necessitava ser serrada em vigoras, tábuas, ripas, era assim repartida no próprio local, onde era abatida a árvore desejada, geralmente peroba ou cedro. Ali mesmo armava-se o estaleiro, levantava-se a tora a dois metros de altura, em condições de ficar uma pessoa em baixo para puxar a serra, a outra em cima para levantar e equilibrar o corte, conseguindo desta forma retalhar a tora em vigotas, tábuas e ripas. Este serviço era feito pelo Joãozinho, serrador muito prático chamado João Borges, que marcava a madeira desejada. Quando o Joãozinho tinha outros compromissos de trabalho, eu o substituía.

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JUCA

José ou Juca era dois anos mais novo que eu. Era trabalhador, forte e alto. Era o mais novo de todos. Gostava de estar com pessoas simples. Aos domingos, combinava caçadas e pescaria com os amigos. Não ligava para passeios.

Em casa, o serviço efetivo era feito na parte da manhã. Havia entregas de leite na cidade em um cabriolé, condução esta que se usava muito naquele tempo. As compras caseiras eram feitas com esse tipo de transporte. Por exemplo, com 25 litros de milho, traziam-se 25 litros de fubá. Era a troca feita no moinho de fubá, da família Cainelli. O lucro do moinho era a diferença do produto antes e depois, pois 25 litros de milho produzem 35 litros de fubá; lucro de 40%. As compras para o abastecimento da casa eram ensacadas: açúcar Pernambuco de 50 Kg, sal, trigo de 40Kg. Agora, arroz, feijão, milho, verdura eram produzidos no sítio. Carnes de porco e frango era as únicas que se tinha.

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AS MENINAS

Quanto às meninas, a Juventina aprendeu a bordar na máquina de costura; a Ernestina aprendeu a costurar, cozinhar, fazer melado e açúcar batido. A Francisca lidava com os animais; montava a cavalo para reunir os outros e dar ração. Com um semi-trole que ela dirigia, junto com a Ernestina e minha mãe, ia fazer algumas compras de panos para fazer roupas de serviço, calças para nós homens. Costurava muito bem. A Francisca tinha uma tarefa muito especial no abastecimento de água. A máquina de tirar água era engenhosa, acionada por força animal (no caso, um burro, de nome Tôco). Ele girava em torno do poço, por meio de balancim. Uma corrente dupla, rebatida em canecas de dois litros, subia de um lado com elas cheias de água e, do outro lado, descia com elas vazias. Eram ao todo quarenta canecas. No prazo de meia hora, o burro conseguia encher o depósito. Francisca acostumou o Tôco a girar a máquina sem assistência. A cada dez minutos ele parava de girar sem autorização e começava a girar de novo também sem ordem nenhuma. E assim ia até encher o tanque. Com o barulho da água caindo pelo ladrão, em razão do excesso de água, o Tôco parava definitivamente.

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NÃO ESQUEÇO

Tenho ainda coisas a comentar sobre o meu passado, coisas que nunca poderia esquecer. Por exemplo, eu era muito ocupado nos dias chuvosos ou que tivesse alguma folga do trabalho normal. Atendia minha mãe para fazer prateleiras, consertar cadeiras ou bancos, que naquele tempo eram muitos usados ao redor da mesa de refeições, fazer suporte para coar café, utensílios de cozinha, brinquedos para as crianças menores, etc. Tem mais: nos dias chuvosos, em que não se podia trabalhar, meu pai mandava fazer porteiras para estradas onde tinha animais no pasto, fazer concertos de arados, grades, carpinteiras, carrinhos de mão para esterco e outros serviços de carpintaria. Fiz até caixão funerário para pessoas pobres ou quando empregados da casa faleciam. A tulha para café em coco foi construída por pedreiro profissional por ser necessária uma construção resistente. Quanto ao madeiramento, o assoalho, as portas, eu que fiz, com madeira peroba. As vigotas para o assoalho, assim como as tábuas, foram serradas no mesmo local onde se encontraram as toras, no meio das matas, caídas há muitos anos. Como eram destinadas a reforço especial, para uma tulha que iria suportar milhares de alqueires de café em grão por tempo indeterminado, convinha madeira mais velha, seca, forte. Como já ma referi antes, este trabalho de serraria era feito pelo Joãozinho e pelo mestre João Borges. Isto aconteceu no ano de 1920 e ainda pode ser visto atualmente após 66 anos de construção. Continua intacto e bem conservado.

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MÁQUINAS

O café de nossa produção, como já era de aproximadamente mil sacas, meu pai preferia vender beneficiado, por ser produto de primeira, com secagem perfeita; a máquina de beneficiamento mais próxima estava na fazenda Bela Vista. O transporte era feito com carroça e, às vezes eu, quem o fazia. Eu gostava muito do serviço. Toda a viagem eu dava uma olhada na máquina, nos seus movimentos, com muitas polias e correias que, às vezes, cruzavam para dar rotação contrária. Condutores de caneca cheia de café apareciam subindo e despejando no descascador, com o ventilador soprando a palha para fora. Havia um grande cilindro de chapas com furos diversos para separar o tamanho e dar os tipos desejados. A força motriz era um locomóvel, alimentado à lenha. Quem cuidava desta máquina era o Sr. José Miniolli.

Voltando a outros acontecimentos de minha família, lembro-me que no dia 11 de Maio de 1920 meus pais comemoraram Bodas de Prata. Festejaram com grande alegria e animação. Receberam manifestação de amizade e carinho dos familiares, amigos e parentes. Foi servido um lauto jantar, regado com boas bebidas. Naquele dia havia um único carro de aluguel, que também era particular e pertencia ao jovem Felipe Almeida, um colega meu de escola. Ele fez um bom movimento de ida e volta, em toda a parte da tarde.

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MORRO TORTO

Nessa época, meu pai e mais três proprietários que possuíam sítio nessa região resolveram comprar a fazenda Morro Torto, que era de Antonio Ferreira do Amaral. As condições que foram acertadas para a compra entre estes quatro proprietários eram dividi-la em partes iguais, porque todos eles eram vizinhos com limites na fazenda Morro Torto. Eram eles João Ifanger Junior, Luiz Von Ah, Carlos Linder e João Fanger. A área do Morro Torto era mais ou menos de duzentos alqueires entre matas e pastos. Não havia benfeitorias, a não ser ranchos, mangueirões e uma cachoeira. A fazenda era de criação de eqüinos. Tinha os seguintes animais: 60 éguas de cria, 2 garanhões, um jumento. O negócio foi fechado por trinta e seis contos de réis. Os animais foram divididos. Meu pai ficou com 12 éguas e dois burros. As éguas meu pai deu de presente para empregados e amigos pobres. As terras foram anexadas às dos sócios. Meu pai ficou com 16 alqueires de matas e outra parte em terras de pasto, que vendeu para terceiros, por serem um pouco distante de nossa propriedade. Na primeira roça que fizemos foi preciso derrubar um alqueire de matas. O curioso foi quando nós pusemos fogo para limpar o terreno para cultivar milho. As primeiras vegetações que nasceram foram mamona e gengibre, aquela plantinha que produz a raiz com que se faz quentão nas festas juninas. O solo era todo ondulado. Acreditamos que houve o cultivo de cana de açúcar anteriormente. Encontramos pedaços de cerâmica, louças, vidros, troncos de madeira junto a um córrego que ali existia, sinal de que naquele local tinha sido instalado um engenho de cana. Era o que parecia.

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MOVIMENTO MILITAR

Voltando a outro tipo de fato, em 1924, houve um movimento militar em São Paulo, provocado pelo general Isidoro Dias Lopes e o tenente Cabanas. Era presidente do Estado de São Paulo Arthur Bernardes. O movimento armado estava no vigésimo dia quando houve um bombardeio pelos federais sobre São Paulo, provocando pequenas destruições e algumas vítimas. Quando os rebeldes começaram a fugir em direção ao norte do Estado de São Paulo, como acontece sempre, surgiram os boateiros dizendo que uma coluna de fugitivos ia passar por nossa cidade em um trem da Sorocabana, em direção a Piracicaba, cometendo desordens, roubos, quebra-quebras. Enquanto os boatos corriam, nosso prefeito, que era o Sr. Alfredo Camargo Fonseca, fugiu para sua fazenda Santa Maria, ficando três dias oculto. A cidade tinha cinco vereadores nomeados pelo prefeito, conforme lei municipal. Eram eles Antonio Fermiano de Souza, Antonio Ambiel, Luiz Coppini, João Ifanger Junior e Antonio Pinheiro, que exercia o cargo de delegado de polícia. Mas quem ficou na atividade da prefeitura foi meu pai e o delegado de polícia, sendo o destacamento de quatro soldados. No final, nada aconteceu de anormal por aqui.

No ano de 1925, meu pai vendeu o sítio São Miguel para dois agricultores de Capivari, Srs. Izachi e João Forti. Mudamos para a cidade onde já possuíamos uma casa. Como haviam algumas parcelas de terreno que não entraram no negócio, como a Lagoa Preta, Morro Torto e outras pequenas áreas, ficamos residindo na cidade até o ano de 1926.

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FAZENDA SANTA MARIA

Nesse ano, meu pai comprou a fazenda Santa Maria, no município de Campinas, região de Joaquim Egídio, que era servido pelo ramal férreo para carga e passageiros, com final na estação de Cabras. Mudamos para a fazenda sem a participação de Joãozinho por ele estar comprometido com uma sociedade na instalação da primeira bomba de gasolina em Indaiatuba, local onde hoje está o estacionamento do Banco Bradesco3. Essa sociedade criou também a primeira linha de jardineira para duas viagens diárias para Campinas. Os sócios foram os seguintes: Francisco Xavier de Almeida Campos, João Ifanger Neto e Paulo Von Ah.

Na fazenda Santa Maria a única lavoura que tinha era a de café, com terreiro grande e bom, com lavrador para separar os pedregulhos. O que eu gostava era beneficiar o café. A máquina era antiga mas eu a reformei substituindo peças. Coloquei novas correias. Com a reforma produzia mais por hora de trabalho e melhorou a separação dos tipos pois, naquele tempo, o café tinha que ser classificado para obter bons preços nas exportações.

3 O estacionamento não é o do Bradesco e, sim, o Dois Irmãos, próximo de onde situava-se o Banco do Brasil e, hoje, é a Optica Ipanema.

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NOIVO

Em 1927, eu fiquei noivo da senhorita Philomena Von Zuben, filha do Sr. Luis Von Zuben e dona Maria Sigrist Von Zuben, residentes na fazenda Capim Fino, no município de Jaguariúna. Eu fazia viagem a cada vinte dias, durante dois anos, tempo que dona Maria me impôs para aceitar o noivado, alegando que a filha ia fazer muita falta, pois era ela que a ajudava a cuidar dos doze filhos, entre grande e pequenos, o último com apenas um ano de idade. Valter, com 25 anos, seguindo Philomena, Terezinha, Arnaldo, Basílio, Carmelita, Silvio, Albertina, Oswaldo, Luiz Gonzaga, Cecília, Mathilde, Antonio e Clemente.

Em 1929, o Juca meu irmão casou-se com a Srta. Julieta Rossignati, filha de Pedro Rossignati e Clara Campregher, residentes em Indaiatuba com serviço de relojoaria. Também em 1929, o casal apresentou a primeira neta a meus pais, a garotinha Estela, nascida na fazenda Santa Maria. Naquele ano, meu sogro Luis Von Zuben vendeu a fazenda Capim Fino e mudou com toda a família para Campinas. Alugou uma chácara no bairro Guanabara, local em que foi realizado meu casamento com Philomena. Isto aconteceu no dia 15 de Maio daquele mesmo ano; celebrado na Igreja Coração de Jesus, no Bairro Botafogo, celebrado pelo Vigário da paróquia Padre Jóia. Os padrinhos do noivo foram o casal João Sigrist e Emília Gutt, no civil, e, na igreja, o casal João Amstalden e Christina Von Zuben Amstalden. Da parte da noiva, serviram de padrinhos os casais Simão Von Zuben e senhora Nêna e Oscar Leme e senhora Maria das Dores Cavalheiro.

Em seguida, os cumprimentos, com manifestações de alegria e felicidade, seguindo até a residência dos familiares

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da noiva, onde foi servido aos convidados um jantar, regado a bebidas de boa qualidade e procedência. Finalizado os festejos, em seguida a despedida de todos os parentes.

Muito emocionado também com os pais e irmãos, seguimos viagem até a fazenda Santa Maria, onde começamos a vida conjugal. Ainda naquele ano, meu pai vendeu a fazenda Santa Maria, por motivo de saúde de minha mãe, que não se acostumava com o clima daquela região que era muito atingido pelos ventos fortes e frios.

Em 1930, mudamos para Campinas, meu pai imaginava comprar outra propriedade que fosse mais próxima de qualquer cidade para colocar dois filhos casados.

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COMPRA DA FAZENDA SÃO MATHIAS

Ainda no ano de 1930, meu pai comprou a fazenda São Mathias, localizada no município de Capivari, nas proximidades de Mombuca, do Sr. José Escodro. Eu e meu irmão Juca fomos designados para assumir a administração da propriedade. O Juca assumiu o controle da lavoura, que era mista: café, algodão, batata e outros cereais. Esta fazenda tinha luz elétrica própria, com 5Hp de força e 220 watts4, gerados a partir de uma grande represa em que era acionada uma turbina hidráulica. Iluminava toda a fazenda e a colônia... Havia uma oficina de carpintaria, ferraria, moinho de fubá e outras máquinas agrícolas.

A máquina de café era nova; a de arroz era menor, mas produzia bem. Estas duas máquinas por dependerem de mais força eram acionadas por um locomóvel de 8 Hp vapor. Todas estas máquinas estavam sob minha responsabilidade, assim como a escrituração do controle diário de trabalhadores e colonos.

No dia 19 de setembro de 1930, nasceu a minha primeira filha, que recebeu o nome de Carolina do Carmo. Este nome foi lembrado por ter ocorrido neste mesmo momento, sem eu poder assistir, o falecimento de minha mãe que também se chamava Carolina, e residia na mesma casa dos avós em Capivari. Foi um momento emocionante para toda a família. Por estas circunstâncias meu pai e outros filhos, que estavam morando na cidade de Capivari, mudaram para a fazenda e assim convivemos unidos até que, no ano de 1939, também faleceu meu pai. Para nós foi uma perda muito grande pois ele ainda nos ajudava muito com sua presença e

4 Provavelmente, o valor correto seria de 220 kilowatts.

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sabia as resoluções mais adequadas para certos problemas. Gostava muito dos netos, Orlando, Vivaldo e Carolina, que estava estudando em Campinas na casa dos avós maternos.

Nesta época, já estavam estabelecidos com um armazém de secos e molhados e uma farmácia na fazenda, pertencentes a João Batista Barroso e um sobrinho seu, que chamavam de João Pequeno mas também de “Barroso”, como auxiliar no armazém. Não era tão pequeno assim; ele tinha 17 anos, tinha sido bem preparado nas escolas de Santo Amaro e era muito ativo no comércio daquele local. Foi convidado pelo Sr. Barroso um seu primo farmacêutico, de nome João de Oliveira, pessoa muito competente para abrir uma farmácia na fazenda. O lugar era próprio para esta atividade por ser distante de Capivari 8 Km e haver muitos vizinhos de sítios e fazendas que seriam beneficiados. Montou a farmácia bem servida de remédios. Ele, com muita prática, atendia os pacientes com urgência. Nos casos mais graves, fez convênio com um médico de Capivari, que atendia com presteza, assim conseguindo créditos e amizades por todo este bairro. Ele foi infeliz no seu trabalho e, por este motivo, foi acometido por uma grave moléstia que provocou a sua morte. E este caso triste, acontecido na fazenda, também repercutiu na cidade de Capivari. Pouco tempo depois, já teve interessados em comprar a farmácia da viúva do Sr. João B. de Oliveira. Seriam dois irmãos, filhos do Sr. Alfredo Moraes, profissionais formados a pouco tempo. O mais velho chamava-se Odilon e o outro Vivaldo (Vadico), compraram e trabalharam juntos um certo tempo. Odilon casou-se com uma moça de Mombuca, comprou outra farmácia e mudou pra lá, ficando Vivaldo (Vadico), só na fazenda, com a farmácia por diversos anos. O armazém também foi vendido ao João Pequeno pelo seu tio João Barroso.

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Em 1943, João Pequeno, ou João Barroso Sobrinho, casou-se com minha irmã Izabel. Atualmente, ele é um cerealista muito bem estabelecido na rua Santa Rosa em São Paulo e possui uma bela família.

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VENDA DA FAZENDA SÃO MATHIAS

Em 1944, resolvemos vender a fazenda concluindo um negócio realista. A importância apurada foi repartida entre cada um dos irmãos. Nós mudamos e cada um foi cuidar de sua vida. Mas todos estão morando nesta Indaiatuba querida. Enquanto isso, eu recebi um recado do Sr. Porfírio Pimentel de uma fecularia nesta cidade que estava à venda e seria um bom negócio para mim. Quanto à fecularia eu já conhecia. Há tempos pertenceu a família do Sr. Hildebrando Pinfari. Resolvi viajar de trem de Mombuca a Indaiatuba; quando cheguei ao destino, para minha surpresa, estava à minha espera o Sr. Júlio Escodro, irmão de José Escodro, para me convencer de não comprar a fecularia, que não era bom negócio mas fiz questão antes de tudo de acompanhá-lo até a fábrica de cabos de guarda-chuvas, denominada Artefatos de Madeira Cida Ltda. estabelecida bem perto da estação onde desembarquei. Isto aconteceu em setembro de 1944. Neste negócio, afirmou o Sr. Júlio, tinha urgência, pois esta indústria estava parada por pertencer a dois sócios que se desentenderam. Uma das partes pertencia ao Sr. José Escodro e filhos. Outra a Francisco Xavier de Almeida Campos. O Sr. Júlio Escodro, irmão de José, é que estava tentando acalmar os ânimos dos filhos de José.

Tanto é que um deles, o mais velho, de nome Otávio, havia se suicidado na fábrica dias antes. Percorrendo as instalações, notei todas as máquinas paradas e muito serviço inacabado, pequenos estoques de madeira, existia ainda máquinas para a produção de raspas de mandioca, já desativadas há mais de dois anos, por estar fora da comercialização deste produto.

Voltando para casa, contei tudo o que vi com certo

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otimismo. Os familiares ficaram animados. Finalmente, conclui o negócio ficando sócio do Sr. Francisco Xavier de Almeida Campos com 50% das cotas.

Em 12 de outubro de 1944, mudei para esta cidade com Dona Philomena e os 7 filhos: Carolina, Orlando, Vivaldo, Maria Aparecida, Tereza, Luiz Roberto e Cecília.

A propriedade da fábrica era um conjunto de salões e um escritório, e ainda uma casa ampla, onde eu fui morar, pertencente até hoje à família David Ming. Esta sociedade durou apenas um ano. Já, no ano seguinte, o nosso técnico de cabos de guarda-chuvas, Sr. Arnaldo Pedroso, comprou a parte de Francisco Campos ficando ele meu sócio. Nesta circunstância, foi criado um novo critério e contratados o contador Felipe Nazário, a auxiliar Carolina do Carmo, minha filha, o vendedor Teodoro Barnabé, na pintura Ermenegildo Pinto e na embalagem Riciere Delboni.

Essa sociedade durou 6 anos, quando Arnaldo vendeu a sua parte a meu cunhado Vivaldo Almeida Morais (Vadico). Esta sociedade durou pouco por motivo de ter sido nomeado professor de química no ginásio local. Passou sua parte a meu outro cunhado, Antonio Von Zuben. Esta sociedade também foi curta. Resolvi ficar somente com meus filhos, alterando o contrato social, admitindo meu filho mais velho Orlando que era casado com Maria Candelária Von Ah e tinha capacidade de dirigir a indústria. Os principais produtos que fabricávamos, cabos de guarda-chuvas para homens, senhoras e crianças; bengalas e acessórios do ramo. Para este tipo de indústria, o principal para obter êxito é criar novidades, um trabalho de artesanato, ter empregados conscientes e com capacidade de criar novidades em tipos e desenhos uniformes para que possa dar o seu número e são negociados pelo mostruário.

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Em 1968, Orlando assumiu a responsabilidade da firma como gerente, continuando o mesmo sistema, apesar de nesta época haver introdução de artigos de plástico, e atingiu em parte os produtos de madeira que era a nossa principal matéria prima. Mas Orlando, com sua atividade também comercial, descobriu que surgiu um material no Rio de Janeiro, um produto novo com probabilidade de substituir a madeira: o acrílico. Pois deu certo e, apesar de ser bem mais caro que a madeira, também vendia com preço melhor. Em 1972, Orlando junto com um freguês de bengalas e que também comercializava artigos ortopédicos conseguiu amostras de muletas de madeira, vindas do exterior, foi o bastante para que ele começasse a fabricar com madeira especial, que somente existia no estado do Mato Grosso: marfim. Foi um sucesso. Com isso, a procura de bengalas também aumentou.

Orlando tem dois filhos trabalhando no escritório: Paulo Henrique e Maurício. João, meu filho, fazia as entregas em São Paulo e também nas empresas de transportes inter-estaduais de Campinas com um furgão especial. As cidades que mais consomem nossos artigos são: Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Recife, Manaus, Brasília, Curitiba, Blumenau e Porto Alegre.

A família de Henrique e Filomena constitui de 10 filhos: 5 homens e 5 mulheres. Todos estudaram em colégio e alguns em faculdades. São eles: Carolina, professora, casada com Walter Boselli, e tem duas filhas, Cristina e Cecília; Orlando, casado com Maria Candelária, e tem dois filhos, Paulo Henrique e Mauricio; Vivaldo, ex-padre, casado com Vandir, 3 filhos, Fernanda, Gisele e Guilherme; Maria Aparecida, casada com Guido A. Ming, filhos Liliana e Gustavo; Maria Tereza, casada com Jaime Ciciliato, filhos Marcos, Marcelo e Raquel; Luiz Roberto, casado com Marilza

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Santiago, filhos Willian, Ana Cecília, Rogério; Maria Cecília faleceu; Ana Maria, solteira; João Alberto, solteiro; José Henrique, casado com Terezinha Munhoz, filhos Heloisa, Luiz Henrique e Daniel. Henrique com 86 anos e Philomena com 81 anos. Com labutas, mas muito felizes.

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OFICINA DE CALHAS

No ano de 1967 comprei algumas máquinas para fabricar calhas e condutores, sendo uma cortadeira de chapas de dois metros, uma viradeira e um cilindro. Máquinas usadas, mas em bom estado. Adquiri também ferramentas e todo material necessário para montar uma oficina. Registrei na junta comercial com o nome de Oficina de Calhas de Henrique Ifanger e fiz anúncio na Tribuna de Indaiá.

Controlei diversos anos com os empregados, às vezes, alguns desonestos e não cumpriam as suas obrigações. Eu não tinha mais condições de galgar telhados para ver se estava em condições de entregar o serviço. José Henrique, o Ike, que conhecia bem o serviço, porque já tinha trabalhado com um profissional na oficina, resolveu aceitar a proposta por mim apresentada anteriormente. Ike perguntou-me: Papai a proposta que me fez está de pé? Vendia as máquinas e o material existente no valor aproximado de 60.000,00 (sessenta mil cruzeiros) nas condições seguintes sem documentos específicos. Negócio de pai para filho. Não pagar nada em dinheiro, mas se comprometer a dar uma contribuição mensal aos pais, durante as suas vidas, baseando-se no salário mínimo atual, nesta época em seiscentos cruzeiros. Atualmente, em 1986, ele me dava Cz$ 1.150,00 (hum mil, cento e cinqüenta cruzados). Hoje, de acordo com os dizeres acima, a oficina pertence a José Henrique Ifanger, que ampliou e registrou a Casa do Encanador, conseguindo grande movimento, e já criou outra firma (Calha Nova). Por ser moderna, já comprou e vai receber um conjunto para moldar seis metros de calhas sem emendas. A nova firma Calha Nova está estabelecida no centro da cidade e vende os produtos que sua oficina produz.

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REFORMA DA IGREJA

Nestes últimos tempos houve um acontecimento a considerar. Trata-se da reforma da Igreja Nossa Senhora da Candelária. Fui então convidado pelo Padre Hermínio Bernasconi, vigário da Matriz, para uma reunião formada por vários colaboradores da igreja, todos bastante competentes, com a finalidade de estudar a reforma da Matriz Candelária. Ela se encontrava com sérios problemas, exigindo medidas urgentes para a sua conservação. Os convidados eram poucos. Isto porque era necessário uma vistoria global, desde o piso até o teto. Tratava-se de fazer abertura para a entrada de mais luz, de eliminar alguns altares e o revestimento interno. Na reunião, o padre disse que já tinha consultado dois engenheiros para a reforma, inclusive da prefeitura. Nenhum deles quis se responsabilizar pela obra. Aconselharam o padre que derrubasse a velha igreja, por ser construída de taipa, há mais de 150 anos. Disseram que a engenharia moderna não tinha conhecimento desse tipo de construção. O padre pediu votação nominal; foram escolhidos: eu, Henrique Ifanger, Estanislau Sigrist e Henrique Lins, para um estudo o mais simples possível e a apresentação do projeto.

Verificamos tudo, inclusive o forro, que encontrava-se em péssimo estado, atacado por cupins. Apresentamos o projeto na reunião seguinte, sendo aprovado por unanimidade.

Foram nomeados os seguintes diretores: Henrique Ifanger, como presidente, Estanislau Sigrist como tesoureiro. Como a reforma ia ser muito grande, a igreja tinha que ser desativada por pelo menos um ano, ter autorização da diocese de Campinas e apresentar o plano de reforma. Conseguida a autorização, em poucos dias demos início à reforma.

A Igreja Matriz é do tipo colonial. O forro era todo de

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madeira moldada por artista de grande capacidade. Aconteceu que o tempo tão prolongado e a falta de conservação, nos últimos tempos, provocou a infiltração de cupins e a formação de goteiras. As paredes eram revestidas em reboco espesso que ficou solto na altura das paredes de taipa. Havia muitos retoques descobertos quando desprendia parte dos blocos de revestimentos.

A opinião geral dos que estavam trabalhando na demolição era revestir de tijolos todo o interior da nave. Mas isto eu não concordei, pois tiraria o estilo colonial. Este trabalho ia ficar muito caro e demorado, além de complicar nos portais do andar superior que são guarnecidos com grades de ferro, servindo como parapeito, característica principal do estilo colonial que o padre desejava conservar.

Além do mais, existiam seis altares com suas imagens que o padre Hermínio queria suprimir por estarem instalados bem em frente de janelas amplas, impedindo a passagem de luz no interior. Depois de removidos os altares, o espaço aumentou e anulou os dois corredores laterais que existiam. Tornou-se um ambiente claro e espaçoso.

Quanto aos serviços de demolição do forro e dos altares, coube a um grupo de Marianos que ainda existia naquele tempo. Ofereceram para desarmar com todo o cuidado, guardar todos os pertences em lugar seguro, onde o padre daria custódia.

Concluindo a demolição dos altares, pudemos observar a maior penetração de luz no interior e acreditamos que depois de aumentar os espaços das aberturas que foi planejado, melhorará ainda mais. Assim comentou o encarregado do serviço de pedreiros, Sr. Sebastião Romão.

Quanto ao sistema por mim idealizado, em um domingo que ninguém estava trabalhando, eu estava só na

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igreja, descasquei mais ou menos um metro quadrado de um lugar na parede, deixando livre de qualquer acabamento antigo.

Nesta pequena área, para experiência, com um martelo, finquei nada menos que 100 pregos 20 x 30, deixando apenas 2 centímetros fora. Apliquei massa mista com cimento, cobri os pregos, deixando a área em condições de receber o acabamento final. Foi um sucesso e aprovado por todos. Quanto à quantidade de pregos que seriam gastos, foram 400 maços que comprei em uma fábrica em São Paulo. Com esse sistema, foi evitado o revestimento das paredes com tijolos, que muitos construtores achavam a solução.

O forro foi feito com madeira peroba para evitar novamente o cupim, acompanhando o estilo colonial e envernizado pelo pintor José Henrique Ifanger. O piso foi feito com lajotas da Cerâmica Ciciliato. O sistema elétrico é embutido com o sistema de som, dirigido pelo Sr. Raffaello Fantelli. O altar foi vendido por não ser mais necessário, assim como outras peças de altares, molduras, portas e janelas, com isso ajudou a cobrir as despesas. Os bancos novos foram fabricados na oficina do Sr. Guerino Lui. O meu companheiro de trabalho, nomeado na reunião final com o cargo de secretário e tesoureiro, Sr. Estanislau Sigrist, desempenhou o cargo condignamente, acompanhou os trabalhos diariamente dando suas sugestões sempre acertadas. Arquivou todos os movimentos contábeis com muita precisão. Os recursos para atender as despesas da reforma foram conseguidos do seguinte modo e lembrado pela minha irmã, Francisca Ifanger: conseguir 100 famílias com recursos para contribuir com cem cruzeiros mensais daria uma receita mensal de dez mil cruzeiros, suficiente para o andamento prolongado da obra, mas esta previsão ultrapassou o limite.

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Conseguimos 130 contribuintes. No dia 12 de fevereiro de 1969, foi liberada e coincidiu

com a festa da Padroeira Nossa Senhora da Candelária, terminando com concorrido leilão de gado que rendeu o suficiente para pagar o restante das despesas.

Poucos meses depois, o Padre Hermínio foi removido para outra cidade. Em seguida tomou posse o Padre Álvaro Ambiel.

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MARIA CECÍLIA IFANGER

Em 1969, a Maria Cecília já tinha comprado dois lotes no bairro Cidade Nova, na rua Alberto Santos Dumont.

Começamos a construir a casa, financiada pela Caixa Econômica Federal da cidade de Salto. Ela foi planejada pelo meu genro Walter Boselli. A construção foi dirigida por mim, e terminou em 1970, ano em que também mudamos para a residência nova, onde freqüentamos a Igreja Santa Rita que seria a nossa paróquia e como vigário encontramos o Padre Francisco, que nos recebeu com muito carinho, dando lugar que a Maria Cecília ingressasse nas atividades religiosas da paróquia, principalmente na catequese e nas celebrações normais da igreja.

Após dois anos, vendemos a casa que, na realidade, era distante da fábrica, em que eu tinha alguns compromissos para o bom andamento das indústrias e a fábrica de calhas. Mudamos para onde estamos, na casa de nossa neta Christina Boselli, na rua Siqueira Campos n.º 131, que fica perto da fábrica, onde já podemos ter telefone e outros recursos comerciais por estar localizados no centro da cidade.

Com o dinheiro restante, comprei um terreno também no bairro Cidade Nova, rua Paul Harris, em nome de Maria Cecília, que em pouco tempo ficou muito valorizado. Não posso esquecer de uma excursão que a Cecília promoveu para Brasília, onde participaram 12 pessoas, somente Ifanger, em que deu a maioria absoluta entre os participantes da excursão em uma brincadeira criada pela direção da empresa turística. A animadora da companhia era Cecília, quem mais animava os ocupantes do ônibus. A campanha era para escolher o casal mais simpático da excursão, em que Henrique e Philomena também participaram. No ônibus só haviam dois casais

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candidatos, mas Henrique e Philomena ganharam com maioria absoluta. Sem dúvida, com uma animadora como a Cecília, é para valer.

O resultado foi um presente ornamental da empresa e a imposição de uma faixa de vitória que tive de conservar uma boa parte da viagem de volta. A excursão foi linda e divertida, gostamos muito, ficamos conhecendo Brasília. Na parte oficial, para que foi construída é muito importante. Mas posso afirmar que não tenho nenhuma intenção de vê-la novamente.

Após um ano desta excursão, passamos uma fase muito triste com a morte trágica que sofreu a querida filha Maria Cecília num passeio com suas amigas Amstalden na Fazenda Bela Vista.

Um pouco sobre a família Scachetti. No ano de 1917, meu pai, não sei explicar como, ficou conhecendo alguns membros da família Scachetti. Eu sei que eram colonos da fazenda Capivari Grande, em Campinas. Esta fazenda é vizinha da fazenda Palmeiras, que era de Antonio Von Zuben, local que meu pai sempre freqüentava. Meu pai era incumbido de vender um pequeno sítio de 10 alqueires pertencentes ao Sr. João Egli, nosso vizinho, pela importância de quatro contos de réis, tendo só uma casa e dois ranchos. Entrou em contato com a família Scachetti, que eram ao todo de doze a dezoito pessoas, com adultos e crianças, alguns casados e outros solteiros. A família possuía algumas economias em dinheiro e mais cinqüenta libras esterlinas que, pelo cálculo que meu pai fez pelo câmbio do dia, isto é, de 16.500 mil réis cada libra, deu o valor total de 825.000 réis. O negócio ficou fechado nas seguintes condições: meu pai devia ceder uma casa de colonos no nosso sítio e dar trabalho de um ano na lavoura de café. A família Scachetti era em número de seis homens, sendo quatro casados e dois solteiros: Ágide e Atílio.

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O Ágide ficou combinado de trabalhar com carroça e arado, a dois mil réis por dia. No segundo ano de emprego, ele casou-se com a filha de Vitório Lui, pai também de Guerino Lui, O Atilio casou-se com Matilde Müller, que é minha prima, filha de Maria Müller, irmã de Carolina, e de Sebastião Müller, mais conhecido por Bosche, sabendo-se que Bosche, em alemão, quer dizer Sebastião. Esta prima, Matilde, vive até hoje, com 93 anos de idade, morando ao lado do Indaiatuba clube, cujo terreno era exatamente dela e de Atílio. Na família Scachetti tem professores, médicos, comerciantes, sérios e muito bem relacionados em Indaiatuba.

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CARRO DE BOI

Em 1919, as famílias de João e José Amstalden compraram a fazenda Bela Vista, que era de propriedade do Sr. Guilherme Cotching, negócio de que meu pai foi intermediário. A compra foi negociada por cem contos de réis. A comissão rendeu dois contos de réis. Com esse dinheiro, ele comprou um carro de bois com oito bois amestrados, do Sr. Juca Balduíno, com todos os equipamentos necessários e em condições para trabalhar.

O primeiro empregado que tinha prática em conduzir o carro de boi, chamava-se Franquito Canali; quando casou-se, foi substituído por seu irmão João Canali. Como este era muito violento com os bois, meu pai dispensou-o e, no lugar vago, meu irmão João Netto substituiu-o. Como Joãozinho conhecia os nomes dos bois e das vacas leiteiras que estavam no mesmo mangueirão cuidado pela Benedita, que tirava o leite, era só chamá-los que cada um ia chegando no seu lugar; depois era só levantar a canga no pescoço do boi, travar a brocha, prender a chifradeira em cada par, e estava pronto para o trabalho. O carro de boi era muito útil para o transporte pesado, como toras de madeira, lenha, cereais ensacados. Só que era muito lento, nem todos os dias podia trabalhar, pois tínhamos uma carroça com dois burros que fazia pequenos transportes e mais rápidos. O Joãozinho tinha que controlar os empregados, distribuir serviço para onde era mais necessário. Aos sábados, ele preparava a tarefa para todos. Concluído o trabalho, estavam livres; iam para casa com o pagamento semanal.

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COMO ERA FEITO O CARRO DE BOI

Quanto ao carro de boi vamos falar alguma coisa. Como era feito.

O carro de boi era um veículo construído quase totalmente de madeira de boa qualidade, constituído por um par de rodas, fixado em um eixo, formando um grande carretel. Cada roda é formada por três pranchas inteiriças, primeiro juntadas com cavilhas e depois serradas com serra curva em forma circular. A madeira usada era geralmente a cabreúva. Era construída por carpinteiro bem prático, para juntar as três pranchas, que eram de dez centímetros de espessura. A junção das pranchas se faz por meio de duas cavilhas, unindo as duas laterais, chamadas cambotas, à do centro, que possui então quatro furos para a colocação das cavilhas. Estas medem 3x6 cm, e são bem ajustadas e batidas com uma marreta. A roda deve ter um metro e vinte centímetros de diâmetro. Com um compasso marca-se o rodigio e o centro. Com serra curva faz a circunferência e com a ferramenta chamada enchó desbasta-se a madeira para deixar, a partir dos dez centímetros da área central, uma espessura de cinco centímetros na periferia, correspondente à largura da ferragem.

Os dois furos da roda, que medem 20 centímetros, na forma de um óculos, servem de degrau para subir até a mesa do carro e ajeitar a carga. Os furos das rodas não tem nada a ver com os cantos das mesmas. O canto só acontece com o movimento lento e o peso da carga.

A pedido de meu pai fiz um eixo de carro - o outro foi gasto pelo uso - com uma tora de jacarandá, com dois metros de comprimento, lavrada em forma oitavada, acompanhando a peça anterior, com duas cavidades para girar o eixo da mesa.

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O encaixe da roda tem que ser bem ajustado e estar bem no esquadro para que as rodas girem alinhadas. Para comprovar com exatidão é só verificar o rastro que o carro deixa no chão.

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HELVETIA, ATUALMENTE, CONFEDERAÇÃO HELVÉTICA

Tenho que lembrar que existia também a colônia

Helvetia, que foi criada por uma comunidade de suíços. Antes chamavam aquela localidade de Sampaio, por ser uma das propriedades de um senhor com sobrenome Leite Sampaio. Mas não foi esta propriedade adquirida pelos suíços, também a Serra D'água, e Santa Maria. Os suíços que adquiriram estas propriedades eram imigrantes vindos nos anos de 1854 em diante, como colonos da fazenda Sítio Grande, em Jundiaí. As terras compradas localizam-se, parte, no município de Campinas e, parte, em Indaiatuba, divididas pelo rio Capivari Mirim. Eram as famílias Wolff, Ambiel, Amstalden e Bannwart. Quando já estavam bem acostumados em suas terras, criaram uma sociedade estilo suíça, uma escola, uma linda igreja, que tinha como padroeira Nossa senhora de Lourdes, e um capelão suíço.

Entre todos, o que melhor falava o português era o Sr. Antonio Ambiel, Engenheiro Civil. Ele que fazia levantamento da área e medição de terras em zonas próximas a Indaiatuba. Foi vereador em nossa cidade e o único a importar as sementes de batata da Alemanha, diretamente para os lavradores de Indaiatuba.

Lembro-me muito bem, Antonio Ambiel vinha seguidamente à cavalo para Indaiatuba onde pretendia fazer os seus negócios e, em poucos minutos, aparecia um menino para segurar seu cavalo pela rédea para ganhar um trocadinho, que o Sr. Antonio Ambiel guardava no colete, uma moeda de mil réis de prata. Se tivesse mais alguns meninos por perto também ganhavam.

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DAVID MING

Tenho mais pessoas para considerar: o Sr. David Ming, também suíço, mas creio que não é do mesmo grupo que acabo de citar. Casou-se com Catharina Ignez Amstalden e tiveram vários filhos. Um deles, o caçula, é meu genro Guido, casado com Maria Aparecida Ifanger e residente na fazenda Saltinho, na região de Paulínia, pertencente a família Ming.

Guido tem um casal de filhos, Gustavo e Liliana. Tem uma propriedade na fazenda Estiva que pertence a seu pai David; a outra parte é a sede da fazenda e ficou para o Sr. Leão Ming. E mais uma gleba de terras para a irmã, Zélia Ming, viúva. Estas propriedades estão situadas no bairro de Viracopos.

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MEU PASSADO EM INDAIATUBA

No ano de 1910, comecei a frequentar as Escolas Reunidas desta cidade que funcionavam e eram mantidas pela prefeitura e dirigida pelo Professor Sr. Galdino Chagas. Meu primeiro professor foi o Sr. Carlos Tancler, filho do tenente José Tancler, representante do consulado italiano nesta cidade. No ano seguinte, passou a Grupo Escolar N. S. Candelária de Indaiatuba5, daí em diante foram nomeados professores estaduais.

Lembro-me das professoras: Dona Esmeralda, Dona Olimpia, Dona Esther e, quando passei para o 3o ano, tive os professores José Nogueira, Nestor Pereira Leite, Wenceslau Arco e Flecha, que era descendente de índio. O servente da escola era o Nhô Sampaio. Nesta época, as aulas não eram mistas; os meninos tinham aula no período da manhã e as meninas no período da tarde.

5 Embora o autor o denomine dessa forma, em todos os documentos e publicações o referido estabelecimento aparece como “Grupo Escolar de Indaiatuba”, que, naquela época, funcionava no prédio ao lado da Igreja Matriz Nossa Senhora da Candelária, onde atualmente funciona o Colégio Candelária.

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TRAGÉDIA

No ano de 1911, houve um caso incomum em nossa cidade. Havia um viajante comercial de São Paulo, Sr. Domenico de Lucca, que fazia viagens frequentes para a compra e venda de produtos agrícolas e bens de consumo. Costumava hospedar-se na pensão de Dona Mérita Bortolotti. Um dia ele foi convidado por três elementos do comércio, por telegrama, que viesse com dinheiro para a compra de cereais que estavam em estoque para serem negociados com urgência. Chegando na pensão, deixou a maleta e foi para o negócio. Passaram-se três dias e a família do viajante de São Paulo reclamou pois ele nunca ficava mais de um dia fora. Indagando a Dona Mérita, respondeu que Domenico de Lucca chegou, deixou a maleta e não veio retirá-la. Foi procurado por toda a parte e não o encontraram. Houve queixa na polícia e descobriram que, no quintal de um dos elementos, foi entupido um poço por um preto velho conhecido; ele contou que foi pago pelo fulano para executar o serviço. Quando removeram a terra, encontraram o cadáver de Domenico de Lucca. Os criminosos foram julgados e condenados a trinta anos de prisão.

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MAIS MEMÓRIAS

Lembro-me de muitos nomes de pessoas, comerciantes, funcionários públicos, autoridades e outros, que freqüentavam e tinham seus afazeres na vila. Por exemplo, pequenos comerciantes Cesare Lizoni, Ambrozio Lizoni, Ernesto Günter, Juca Balduíno, Celso Brunelle, Adamo Strada, Arthur Tomazi, Francisco Boselli, Miguel Nicolau, Casa Feres, José Tancler, Miguel João, Juca Pires de Camargo, pai do Sr. Nabor Pires de Camargo e seu irmão Miloca, Francisco Xavier da Costa, farmacêutico ou boticário como era chamado naquele tempo.

Naquele tempo, não havia médico na vila; toda semana vinha um médico de Itu pela sorocabana e dava consultas. Conforme a moléstia do paciente, a receita era detalhada e o farmacêutico tinha que preparar a fórmula, e isto demorava uma hora. Mas muitos doentes não estavam em condições de esperar o médico. O Sr. Chiquinho Boticário preparava o remédio; quando o caso era de pneumonia, a primeira aplicação era a ventoza. É simples: coloque num copo um pouco de álcool e um pequeno pedaço de papel aceso, ponha o copo de boca sobre a região do pulmão doente, mais ou menos cinco minutos. Retire o copo, a bexiga formada dentro do copo estoura e é só a água que sai proveniente do pulmão e o paciente melhora.

O cartório civil era do Sr. Luiz Teixeira de Camargo, casado com a senhora Donária; tinha cinco filhos: Luiz, Sebastião, José, Benedito e Sylvia. Outros: Luiz Lyra, pai de Humberto, Dona Maria, Benjamim, Daniel, Jacob. Pessoas que tinham sítios ou fazendas: Luiz Coppini, Benjamim X. de Campos, Barrinho de Paula, Felipe de Almeida, Guilherme Cotching, Capitão Josias, Antonio Estanislau do Amaral, João

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Bicudo, Domingos Benedetti, Pascoal Petrilli, Bento Roque e grande família Barnabé.

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FESTA DAS NAÇÕES

No ano de 1950, o pároco de nossa cidade era Padre Carlos Menegazi. Foi com ele que fizemos a primeira Festa das Nações em benefício da Igreja Nossa Senhora Candelária. Seriam os seguintes pavilhões: Suíço-Alemão, Italiano, Brasileiro, Sírio-Libanês. Na reunião, convocada no salão paroquial, foram escolhidos os responsáveis pelo movimento. Suíço-Alemão, presidente Henrique Ifanger, secretário Constantino Denny e Carlos. Com a mesma equipe, nos anos seguintes, com a participação do padre Carlos realizamos a festa.

Só houve a terceira festa com o padre Claret. Em 1965, com o padre Hermínio, foi incluída mais uma barraca, a japonesa. As quatro festas das nações continuaram com os mesmos promotores.

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ÍNDICE ONOMÁSTICO E TOPONÍMICO Nome Página Alemanha 77 Almeida, Felipe 41 Almeida, Felipe de 85 Amaral, Antonio Estanislau do 85 Amaral, Antonio Ferreira 43 Ambiel (Família) 11, 77 Ambiel, Álvaro (Pe.) 66 Ambiel, Antonio 45, 77 Ambiel, Eduardo 32 Ambiel, Inácio 32 Amstalden (Família) 11, 69, 77 Amstalden, Catharina Ignez 79 Amstalden, Christina Von Zuben 49 Amstalden, João 49, 72 Amstalden, José 72 Angarten, João 29, 30 Aparecidinha (Bairro) 31 Arco e Flecha, Wenceslau 85 Artefatos de Madeira Cida Ltda. (Fábrica de cabos de guarda-chuvas) 56 Bairro Barro Preto 19 Balduíno, Juca 72, 85 Bannwart (Família) 11, 77 Bannwart, Luiz Emílio ( Família) 31 Barnabé (Família) 86 Barnabé, Teodoro 57 Barreiro (Fazenda) 16 Barroso Sobrinho, João (“João Pequeno” ou “Barroso”) 53

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Barroso, João Batista 53 Bela Vista (Fazenda) 16, 41, 69, 72 Belo Horizonte (Município) 58 Benedetti, Domingos 86 Benedita 31, 72 Benjamim 85 Bentão 28 Bentoca (Bairro) 16, 19 Bentoca (Fazenda) 16 Bernardes, Arthur 45 Bernasconi, Hermínio (Pe.) 63, 64, 66, 88 Bicudo, João 85, 86 Blumenau (Município) 58 Borges, João (Mestre) 33, 39 Bortolotti, Mérita 83 Boselli, Cecília 58 Boselli, Cristina (ou Christina) 58, 68 Boselli, Francisco 85 Boselli, Walter 58, 68 Botafogo (Bairro de Campinas) 49 Bradesco (Banco) 47 Brasil (país) 9, 11, 28 Brasília (Município) 58, 68, 69 Brunelle, Celso 85 Cabanas (Tenente) 45 Cabras (estação) 47 Cachoeira (Fazenda) 16 Cainelli ( Família) 35 Caixa Econômica Federal 69 Calha Nova 61

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Camargo, Alziro Pires de (“Miloca”) 85 Camargo, Benedito Teixeira de 85 Camargo, Donária Teixeira de 85 Camargo, José Teixeira de 85 Camargo, Juca Pires de 85 Camargo, Luiz Teixeira de 85 Camargo Jr., Luiz Teixeira de 85 Camargo, Nabor Pires de 23, 85 Camargo, Sebastião Teixeira de 85 Camargo, Silvya Teixeira de 85 Campinas (Município) 16, 24, 47, 49, 50, 53, 58, 63, 69, 77 Campos, Benjamim X. de 85 Campos, Francisco Xavier de Almeida 47, 56, 57 Campregher, Clara 49 Canali, Franquito 72 Canali, João 72 Capim Fino (Fazenda) 49 Capivari (Município) 45, 52, 53 Capivari Grande (Fazenda de Campinas) 69 Capivari Mirim ( rio) 77 Capivari Mirim (Sistema de Abastecimento de Água) 20 Carlos 88 Casa do Encanador 61 Casa Feres (loja de tecidos e armarinho) 85 Cavalheiro, Maria das Dores 49 Cemitério Velho 31 Chagas, Galdino 81 Ciciliato, Jaime 58 Ciciliato, Marcelo 58 Ciciliato, Marcos 58 Ciciliato, Raquel 58

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Cidade Nova (Bairro) 68 Conrado 11 Coração de Jesus (Igreja) 49 Costa, Francisco Xavier da (“Chiquinho Boticário”) 85 Cotching, Guilherme 72, 85 Coppini, Luiz 45, 85 Curitiba (Município) 58 Daniel 85 Delboni, Ricieri 57 De Lucca, Domenico 83 Delaide 16 Denny, Constantino 88 Dumont, Alberto Santos (rua) 68 Eduardo ( caçula, Ifanger ?) 23 Egli, João 69 Engenho D’ água (Fazenda) 16 Escodro, José 52, 56 Escodro, Júlio 56 Escodro, Otávio 56 Escola de Comércio Nossa Senhora da Candelária 20 Escolas Reunidas 81 Esmeralda (professora) 81 Estado de São Paulo, O (jornal) 20, 26 Esther (professora) 81 Estiva (Bairro) 20 Estiva (Fazenda) 79 Fanger, João 43 Fantelli, Raffaello 65 Ferraz, Teófilo de Almeida 23 Festa das Nações 88 Filipão (Bairro de Campinas) 16 Florence (Colégio) 12

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Fonseca, Alfredo de Camargo 28, 45 Fonseca, Luiz 28 Fonseca, Otávio 16 Forti, Izachi 45 Forti, João 45 Galrão (Sítio) 31 Gastão, José (Agrimensor oficial) 29 Gonçalves, Pedro Jacinto 28 Grama (Fazenda) 16 Grupo Escolar Nossa Senhora da Candelária de Indaiatuba 81 Guanabara (Bairro de Campinas) 49 Guerino ( Lui ?) 28 Guinter, Ernesto 85 Gutt, Emília 49 Halley (cometa) 20 Harris, Paul (rua) 68 Helvetia (colônia) 77 Ifanger, Ana Cecília 58 Ifanger, Ana Maria 59 Ifanger, Augusta 16 Ifanger, Carolina (Tia) 16 Ifanger, Carolina do Carmo 53, 57, 58 Ifanger, Daniel 59 Ifanger, Ernestina 16, 19, 31, 37 Ifanger, Estela 49 Ifanger, Fernanda 58 Ifanger, Francisca 16, 31, 37, 65 Ifanger, Gisele 58 Ifanger, Guilherme 58 Ifanger, Heloísa 59

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Ifanger, Henrique 16, 23, 53, 57, 58, 59, 63, 68, 69, 88 Ifanger, Henrique (Tio) 16 Ifanger, Inácio 16 Ifanger, Izabel 20, 54 Ifanger, João 11, 14, 16 Ifanger Jr., João 11, 12, 16, 33, 43, 45 Ifanger Neto, João 16, 20, 23, 47, 58, 72 Ifanger, João Alberto 59 Ifanger, José (Juca) 16, 20, 23, 32, 35, 49, 52 Ifanger, José Henrique (“Ike”) 59, 61, 65 Ifanger, Josefa 16 Ifanger, Juventina 23, 37 Ifanger, Laura 16 Ifanger, Luiz Roberto 57, 58 Ifanger, Luís Henrique 59 Ifanger, Maneco (Tio) 16, 17 Ifanger, Maria (Irmã) 11, 12, 16 Ifanger, Maria (Tia) 16 Ifanger, Maria Aparecida 57, 58, 79 Ifanger, Maria Cecília 33, 57, 59, 68, 69 Ifanger, Maurício 58 Ifanger, Orlando 53, 57, 58 Ifanger, Paulo Henrique 58 Ifanger, Rogério 58 Ifanger, Tereza (ou Maria Tereza) 57, 58 Ifanger, Vandir 58 Ifanger, Vivaldo 53, 57, 58

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Ifanger, William 58 Iluminação pública 23 Indaiatuba Clube 71 Instituto do Café 26 Itaici (Bairro) 16 Itaici (Estrada de Ferro) 24 Itu (Município) 29 Itu (Comarca) 29 Jacob 85 Jaguariúna ( Município) 49 João, Miguel 85 Joaquim Egídio (Distrito de Campinas) 47 Jóia (Pe.) 49 Josias (capitão) 85 Jundiaí (Município) 11, 12, 19, 77 Lagoa Preta (imóvel) 45 Leite Sampaio 77 Leite, Nestor Pereira 81 Leme, Oscar 49 Linder, Carlos 43 Lins, Henrique 63 Lizoni, Ambrozio 85 Lizoni, Cesare 31, 85 Lopes, Isidoro Dias (General) 45 Lui, Guerino 65, 70 Lui, Vitório 70 Humberto, Luiz 85 Lyra, Luiz 85 Manaus (Município) 58 Marcelino 28 Marcos 16

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Maria 85 Maria (Müller?) 11 Mato Grosso (Estado) 58 Menegazi, Carlos (Pe.) 88 Ming (Família) 79 Ming, David 57, 79 Ming, Guido A. 58, 79 Ming, Gustavo 58, 79 Ming, Leão 79 Ming, Liliana 58, 79 Ming, Zélia 79 Miniolli, José 41 Mombuca (Município) 52, 53, 56 Monte Mor (Município) 31 Moraes, Alfredo 53 Moraes, Odilon 53 Moraes, Vivaldo Almeida (“Vadico”) 53, 57 Morro Torto (Fazenda) 16, 43, 45 Morungaba (Fazenda) 16 Müller, Carolina 11, 12, 16, 19, 32, 52, 70 Müller, Inácio 11, 12, 16 Müller, Maria 19, 70 Müller, Matilde 70 Müller, Sebastião (ou “Bosche”) 19, 70 Munhoz, Terezinha 59 Nazário, Felipe 57 Nho Sampaio 81 Nicolau, Miguel 85 Nogueira, José 81 Nossa Senhora da Candelária (Igreja) 63, 88 Nossa Senhora de Lourdes (Igreja) 77

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Oficina de Calhas de Henrique Ifanger 61 Olimpia (professora) 81 Oliveira, João de (ou João B. de Oliveira) 53 Oliveira, Joaquim de 16 Padres de Itaici (Fazenda dos) 16 Palmeiras (Fazenda) 69 Pau Preto (Fazenda) 16 Paula, Barrinho de 85 Paulínia (Município) 79 Paulo ( Ifanger ?) 23 Pedroso, Arnaldo 57 Pedroso de Barros, João B. T. 23 Petrilli, Pascoal 86 Pimentel, Porfírio 56 Pinfari, Hildebrando 56 Pinheiro, Antonio 45 Pinto, Ermenegildo Pinto 57 Piracicaba (Município) 45 Pizza, Claret de Toledo (Pe.) 88 Porto Alegre (Município) 58 Queiroz (Fazendeiro) 15 Quilombo 15 Recife (Município) 58 Rio de Janeiro (Estado) 57 Rio de Janeiro (Município) 12, 58 Roberto 28 Romão, Sebastião 64 Roque, Bento 86 Rossignati, Julieta 49 Rossignati, Pedro 49 Salto (Município) 68 Saltinho (Fazenda) 79

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Sampaio (Bairro) 77 Santa Maria (Fazenda – Joaquim Egídio – Campinas) 16, 45, 47, 49, 50, 77 Santa Rita (Igreja) 68 Santiago, Marilza 58 Santo Amaro (Bairro de São Paulo) 53 São Mathias (Fazenda de Capivari) 52, 56 São Paulo (estado) 26, 45 São Paulo (Município) 23, 26, 45, 54, 58, 65, 83 São Sebastião (laranjeiras) 23 Scachetti (Família) 69, 70 Scachetti, Ágide 69, 70 Scachetti, Atílio 69, 70 Serra d’ Água 19, 77 Sigrist ( Família) 11 Sigrist, Estanislau 63, 65 Sigrist, João 49 Sigrist, Luiz 16 Sigrist, Maria 16 Sigrist, Tereza 11 Silva, José da 28, 29 Silvério 29 Sinhá Patroa 14, 15 Sinhô Patrão 14, 15 Sinhazinha Filha 14 Sinhozinho Filho 14 Siqueira Campos (rua) 68 Sítio Grande (Fazenda) 11,16, 77 Sítio São Miguel 14, 23, 29, 31, 32, 45 Sítio Velho 28

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Sorocabana (Estrada de Ferro) 45 Souza, Antonio Ferminiano de 45 Souza Queiroz (Família) 11, 14, 15, 16 Strada, Adamo 85 Suíça 11 Suíços 11, 15, 77 Tancler, Carlos 20, 81 Tancler, José (Tenente) 81, 85 Tomazi, Arthur 85 Tribuna de Indaiá (Jornal) 61 Vila Suíça 32, 33 Viracopos (Bairro) 79 Viracopos (Campo) 19 Von Ah, José 19 Von Ah, Luiz 20, 43 Von Ah, Maria Candelária 58, 59 Von Ah, Paulo 47 Von Zuben (Família) 11 Von Zuben , Ana Maria 11, 15, 16 Von Zuben, Albertina 49 Von Zuben, Antonio 11, 14, 49, 57, 69 Von Zuben, Arnaldo 49 Von Zuben, Basílio 49 Von Zuben, Carmelita 49 Von Zuben, Cecília 49 Von Zuben, Clemente 49 Von Zuben, Luis 49 Von Zuben, Luiz Gonzaga 49 Von Zuben, Maria Sigrist 49 Von Zuben, Mathilde 49

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Von Zuben, Nena (?) 49 Von Zuben, Oswaldo 49 Von Zuben, Philomena 49, 57, 59, 68, 69 Von Zuben, Silvio 49 Von Zuben, Simão 49 Von Zuben, Terezinha 49 Von Zuben, Valter 49 Waldemar (Pedroso de Barros ?) 23 Wolf (Família) 11 Wolff (Família) 77