fichamento - dicionário enciclopédico - todorov

4
Dicionário enciclopédico das ciências da linguagem (p.269 270). (p. 293 296) DUCROT, Oswald e TODOROV, Tzvetan Mestranda Geovanna dos Passos OS CONCEITOS DESCRITIVOS p.269 O caso da narrativa (p.269 270) A narrativa é um texto referencial com temporalidade representada. E. Kongas e P. Maranda classificam as narrativas segundo o resultado a que chega o processo de mediação. Distinguem quatro subespécies: 1) Ausência de mediador. 2) Fracasso do mediador. 3) Êxito do mediador: anulação da tensão inicial. 4) Êxito do mediador: inversão da tensão inicial. Claude Bremond se baseia, na sua tipologia das sequências narrativas, nos diferentes meios pelos quais se realiza uma mediação que, ela mesma, não muda. Oporseá primeiramente processo de melhora e de degradação, segundo se passe de um estado insatisfatório (para a personagem) ou inversamente. Os processos de melhoria, por sua vez, se subdividem em: cumprimento de uma tarefa pelo herói e recebimento de uma ajuda da parte de um aliado. Para distinguir, num tempo ulterior, entre as diferentes realizações da tarefa, levamse em conta os seguintes fatores: 1) momento, na cronologia narrativa, em que o herói adquire os meios que lhe permitem alcançar seu objetivo; 2) a estrutura interna do ato de aquisição; 3) as relações entre o herói e o antigo possuidor desses meios. [...] É igualmente possível especificar [...] a natureza da própria mediação. No início, as análises da narrativa procuraram descobrir aí uma inversão do positivo para o negativo, ou inversamente. Todavia, numerosas outras transformações podem ser observadas: passase da obrigação ou do desejo ao ato, da ignorância ao conhecimento, do conhecimento à sua enunciação, do ato à sua avaliação etc. [264 e s.]. Por outro lado, a complexificação das sequências se faz não apenas por subdivisão, mas também por adição de proposições facultativas. p.270 As combinações de várias sequências se presta facilmente a uma tipologia formal. Os casos seguintes são possíveis: ENCADEAMENTO, quando as sequências são dispostas em ordem 12; ENCAIXAMENTO: ordem 121; ENTRELAÇAMENTO (ou alternância): ordem 1212. Esses três tipos fundamentais podem ainda se combinar entre si ou com outras instâncias do mesmo tipo. O encadeamento global das sequências no interior de um texto

Upload: geovanna-passos

Post on 06-Dec-2015

229 views

Category:

Documents


8 download

DESCRIPTION

Fichamento - Dicionário Enciclopédico - Todorov

TRANSCRIPT

Page 1: Fichamento - Dicionário Enciclopédico - Todorov

Dicionário enciclopédico das ciências da linguagem (p.269 ­270). (p. 293 ­ 296) DUCROT, Oswald e TODOROV, Tzvetan

Mestranda ­ Geovanna dos Passos

OS CONCEITOS DESCRITIVOS p.269 ­ O caso da narrativa (p.269 ­270) A narrativa é um texto referencial com temporalidade representada. E. Kongas e P. Maranda classificam as narrativas segundo o resultado a que chega o processo de mediação. Distinguem quatro subespécies: 1) Ausência de mediador. 2) Fracasso do mediador. 3) Êxito do mediador: anulação da tensão inicial. 4) Êxito do mediador: inversão da tensão inicial. Claude Bremond se baseia, na sua tipologia das sequências narrativas, nos diferentes meios pelos quais se realiza uma mediação que, ela mesma, não muda. Opor­se­á primeiramente processo de melhora e de degradação, segundo se passe de um estado insatisfatório (para a personagem) ou inversamente. Os processos de melhoria, por sua vez, se subdividem em: cumprimento de uma tarefa pelo herói e recebimento de uma ajuda da parte de um aliado. Para distinguir, num tempo ulterior, entre as diferentes realizações da tarefa, levam­se em conta os seguintes fatores: 1) momento, na cronologia narrativa, em que o herói adquire os meios que lhe permitem alcançar seu objetivo; 2) a estrutura interna do ato de aquisição; 3) as relações entre o herói e o antigo possuidor desses meios. [...] É igualmente possível especificar [...] a natureza da própria mediação. No início, as análises da narrativa procuraram descobrir aí uma inversão do positivo para o negativo, ou inversamente. Todavia, numerosas outras transformações podem ser observadas: passa­se da obrigação ou do desejo ao ato, da ignorância ao conhecimento, do conhecimento à sua enunciação, do ato à sua avaliação etc. [264 e s.]. Por outro lado, a complexificação das sequências se faz não apenas por subdivisão, mas também por adição de proposições facultativas. p.270 ­ As combinações de várias sequências se presta facilmente a uma tipologia formal. Os casos seguintes são possíveis: ENCADEAMENTO, quando as sequências são dispostas em ordem 1­2; ENCAIXAMENTO: ordem 1­2­1; ENTRELAÇAMENTO (ou alternância): ordem 1­2­1­2. Esses três tipos fundamentais podem ainda se combinar entre si ou com outras instâncias do mesmo tipo. O encadeamento global das sequências no interior de um texto

Page 2: Fichamento - Dicionário Enciclopédico - Todorov

produz a INTRIGA; essa noção é muitas vezes aplicada exclusivamente aos textos dominados pela ordem causal. p.293 ­ 24. Visão na ficção (p. 293 ­ 296) Histórico O termo VISÃO ou PONTO DE VISTA refere­se à relação entre o narrador e o universo representado. Categoria ligada, portanto, às artes representativas (ficção, pintura figurativa, cinema; num grau menor: teatro, escultura, arquitetura); e categoria que concerne ao próprio ato de representar em suas modalidades, ou seja,no caso do discurso representativo, ao ato de enunciação em sua relação com o enunciado. p.294 ­ [...] Assim, Otto Ludwig distingue entre narrativa propriamente dita e narrativa cênica (em que os acontecimentos são “dados a ver” como no teatro); Percy Lubbock entre visão panorâmica (o narrador abarca numa olhada anos inteiros e “assiste” simultaneamente ao acontecimento em vários lugares) e visão cênica (os acontecimentos se desenrolam, tais quais, diante de nossos olhos); na mesma época, Tomachevski escreve: “A narração é apresentada seja objetivamente, em nome do autor, como uma simples informação, sem que nos seja explicado como tomamos conhecimento desses acontecimentos (narrativa objetiva); seja em nome de um narrador, de uma certa pessoa bem definida. Assim, existem dois tipos principais de narração: narrativa objetiva e narrativa subjetiva”. Mais recentemente, Uspenski propôs reduzir tudo à oposição entre pontos de vista interno e externo (ao universo representado).

Autores Tipos

Otto Ludwig Narrativa propriamente dita Narrativa cênica

Percy Lubbock

Visão panorâmica

onipresença “assiste” simultaneamente ao

acontecimento em vários lugares

Visão cênica

os acontecimentos se desenrolam, tais quais, diante de nossos olhos

Tomachevski

Narrativa objetiva Em nome do autor, como uma simples informação

Narrativa subjetiva Em nome de um narrador

Page 3: Fichamento - Dicionário Enciclopédico - Todorov

Uspenski Oposição entre pontos de vista interno e externo

Processo narrativo ­ três protagonistas

1. a personagem (ele) ou ­ aquele de que se fala 2. o narrador (eu) ou ­ aquele que fala 3. o leitor (tu) ou ­ aquele a quem se fala

[...] tão logo o narrador é representado no texto, devemos postular a existência de um AUTOR­IMPLÍCITO ao texto, aquele que escreve e que não deve em caso algum confundir com a pessoa do autor, em carne e osso: apenas o primeiro é representado no livro. O autor­implícito é aquele que organiza o texto, queé responsável pela presença ou pela ausência de determinada parte da história, aquele cuja instância a crítica psicológica esmaga ao identificá­lo com o “homem”. [...] o narrador pode ser uma das personagens principais (numa narrativa em primeira pessoa), ou então simplesmente emitir um julgamento de valor (em relação ao qual, num outro ponto do texto, o autor mostrará seu desacordo) e ter acesso assim à existência. [...] O leitor real aceita ou não esse papel: lê (ou não lê) o livro na ordem que lhe foi proposta, associa­se ou não aos julgamentos de valor implícitos do livro, que são feitos sobre as personagens ou os incidentes etc. As relações entre autor implícito, narrador, personagens e leito implícito que definem a problemática da visão:

O contexto da enunciação

“a narrativa pode apresentar­se como evidente, natural e transparente, ou então, ao contrário, o ato de enunciação pode encontrar­se representado no texto.”

(p. 295) distingue­se os textos em que o interlocutor está igualmente presente dos textos em que está ausente e que podem:

a. confrontar diretamente o leitor ao discurso do narrador;

b. representar o próprio ato da escritura ­ é dito explicitamente que aquilo que lemos é um livro e descreve­se o processo de criação.

Identidade do narrador

há um ou vários narradores que se situam no mesmo nível ou em níveis diferentes.

os níveis da narração dependem do tipo de relação entre as sequências no interior de uma mesma narrativa (encaixamento ou encadeamento)

Page 4: Fichamento - Dicionário Enciclopédico - Todorov

Presença do narrador

a. presente ao nível do universo evocado ou ao da narrativa

primeiro caso: existe contiguidade entre personagens e narrador

segundo caso: narrador não intervém no universo representado, mas se descreve explicitamente, escrevendo o livro.

b. narrador representado ao nível das personagens (sendo agente ou TESTEMUNHA). Ambos os termos descrevem de fato dois limites extremos: o narrador é algumas vezes a personagem principal, outras vezes um ser anônimo cuja existência pouco se conhece.

As distâncias do narrador

podem funcionar: de autor implícito a narrador; de narrador a personagens; de narrador a leitor implícito; de autor implícito a leitor implícito; de autor a personagens etc.

natureza da distância pode variar, sendo: de ordem moral e afetiva (diferença no julgamento de valor); intelectual (diferença no gral de compreensão dos acontecimentos) ; temporal e espacial (distanciamento relativo aos termos).

podem ser mais ou menos explícitas ou de maneira mais ou menos sistemática e etc.

A “ciência” do narrador

a. Visão interna e externa: o narrador descreve o universo mental da personagem do interior ou do exterior. A preocupação de justificar os conhecimentos do narrador é reduzida ao mínimo, que se fala de um autor (ou narrador) onisciente.

b. (p.296) [...] ele descreve apenas comportamentos e se contenta com observar; ou relata os pensamentos da personagem; ou nos dá conhecimento do processo a respeito do qual a própria personagem ignora tudo.

c. [...] visão defeituosa do ponto de vista da verdade. d. [...] devem ser distinguidas dos meios linguísticos que asseguram

sua expressão. [...] é importante que a narrativa seja conduzida na primeira ou na terceira pessoa (ou na segunda) [...] a “ciência” e as “distâncias” do narrador: a narrativa em terceira pessoa [...] não impede nem a forte presença do narrador, nema redução da distância entre ele e as personagens, nem o caráter limitado de seu conhecimento sobre as motivações do herói.

DUCROT, Oswald e TODOROV, Tzvetan. Dicionário enciclopédico das ciências da linguagem. São Paulo: Perspectiva, 2001. (p.269 ­270). (p. 293 ­ 296).