fatores motivacionais para o uso de tecnologia: … · “engessamento” da criação, 65 4.1.9....

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FATORES MOTIVACIONAIS PARA O USO DE TECNOLOGIA: UM ESTUDO JUNTO A DIRETORES DE ARTE DE AGÊNCIAS DE PROPAGANDA DO RIO DE JANEIRO Michelle Cinn-Yi Chao Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas – CCJE Ins tituto COPPEAD de Administração Mestrado Orientador: Professor Donaldo de Souza Dias, D.Sc. Rio de Janeiro 2004

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FATORES MOTIVACIONAIS PARA

O USO DE TECNOLOGIA: UM ESTUDO JUNTO

A DIRETORES DE ARTE DE AGÊNCIAS DE

PROPAGANDA DO RIO DE JANEIRO

Michelle Cinn-Yi Chao

Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ

Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas – CCJE

Instituto COPPEAD de Administração

Mestrado

Orientador: Professor Donaldo de Souza Dias, D.Sc.

Rio de Janeiro

2004

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FATORES MOTIVACIONAIS PARA O USO DE TECNOLOGIA:

UM ESTUDO JUNTO A DIRETORES DE ARTE DE AGÊNCIAS DE

PROPAGANDA DO RIO DE JANEIRO

Michelle Cinn-Yi Chao

Dissertação submetida ao corpo docente do Instituto COPPEAD de Administração,

Universidade Federal do Rio de Janeiro / UFRJ, como parte dos requisitos necessários à

obtenção do grau de Mestre.

Aprovada por

______________________________________________

Prof. Donaldo de Souza Dias, D.Sc. (COPPEAD/UFRJ) – Orientador

______________________________________________

Profª. Ursula Wetzel, D.Sc. (COPPEAD/UFRJ)

______________________________________________

Profª. Monica Zaidan Gomes Rossi, D.Sc. (FACC/UFRJ)

Rio de Janeiro

2004

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Chao, Michelle Cinn-Yi.

Fatores motivacionais para o uso de tecnologia: um estudo junto a

diretores de arte de agências de propaganda do Rio de Janeiro / Michelle Cinn-Yi Chao. – Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2004.

190 f.

Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade Federal do

Rio de Janeiro – UFRJ, Instituto de Pós-Graduação em Administração – COPPEAD, 2004.

Orientador: Donaldo de Souza Dias

1. Motivação. 2. Tecnologia. 3. Direção de arte. 4. Agências de

propaganda. 5. Administração – Teses. I. Dias, Donaldo de Souza (Orient.). II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Pós-Graduação em

Administração. III. Título.

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RESUMO

CHAO, Michelle Cinn-Yi. Fatores motivacionais para o uso de tecnologia: um

estudo junto a diretores de arte de agências de propaganda do Rio de Janeiro.

Orientador: Donaldo de Souza Dias. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2004.

Dissertação (Mestrado em Administração).

Esta pesquisa de natureza exploratória se propõe a investigar como diretores de

arte de agências de propaganda do Rio de Janeiro lidam com a tecnologia oferecida

pelos microcomputadores no seu ambiente de trabalho, à luz de fatores motivacionais

intrínsecos (prazer percebido pelo usuário e facilidade de uso) e de fatores

motivacionais extrínsecos (pressão social e utilidade percebidas pelo usuário). Esses

elementos foram extraídos da Theory of Reasoned Action de Fishbein e Ajzen e do

Technology Acceptance Model de Davis. Utilizou-se a metodologia qualitativa de

entrevistas de profundidade, baseadas num roteiro padronizado que continha perguntas

abertas e perguntas com alternativas fixas, para possibilitar a posterior comparação

objetiva de algumas respostas. Foram entrevistados 13 diretores de arte que trabalham

ou trabalharam em agências cariocas de propaganda. Observou-se que os fatores

motivacionais extrínsecos prevalecem sobre os fatores motivacionais intrínsecos, com

uma ênfase maior na pressão do ambiente de trabalho para o uso de microcomputadores.

Além disso, os resultados sugerem que os diretores de arte mais experientes são também

os que têm mais idade e menos facilidade em usar computadores.

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ABSTRACT

CHAO, Michelle Cinn-Yi. Motivational factors affecting the use of technology: a

study on art directors in advertising agencies in Rio de Janeiro. Orientador: Donaldo de

Souza Dias. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2004. Dissertação (Mestrado em

Administração).

This exploratory study attempts to investigate how art directors in advertising

agencies in Rio de Janeiro deal with technology: specifically the technology offered

using computers at work. The study focuses on intrinsic and extrinsic motivational

factors. Intrinsic motivational factors here include perceived pleasure and ease of use

while extrinsic factors include social pressure and usefulness perceived by the user.

These concepts were taken from Fishbein and Ajzen’s Theory of Reasoned Action and

from Davis’ Technology Acceptance Model. A qualitative methodology was used based

on interviews which included open questions and closed questions designed to enable

objective comparison. Thirteen art directors who work or have worked in advertising

agencies in Rio de Janeiro were interviewed. The study concludes that the extrinsic

factors are more important than the intrinsic, with the main motivational factor for the

use of computers being pressure felt within the working environment. Furthermore, the

results suggest that the most experienced art directors are older and also have less

facility with computers.

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AGRADECIMENTOS

Pela orientação valiosa, segura e sempre presente, agradeço ao professor Donaldo

de Souza Dias.

Pelo conhecimento e pela dedicação intelectual, agradeço a todos os professores

do COPPEAD.

Pela gentileza e pela prontidão, agradeço aos funcionários desta intituição,

especialmente os da Biblioteca e da Secretaria.

Pela atenção e pelas indicações bibliográficas, agradeço aos colegas de

COPPEAD Mônica Ferreira da Silva, André Luiz Matos Rodrigues da Silva, Maribel

Carvalho Suarez e Leonardo Marques Gomes.

Pela motivação e pelo carinho, agradeço à minha mãe, ao meu pai e à minha irmã.

Pela inspiração e pelo apoio constante, dedico esta pesquisa a Ricardo de

Carvalho Gualda.

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LISTA DE FIGURAS E QUADROS

Figuras

Figura 1: Ciclo motivacional, 15

Figura 2: Ciclo motivacional com frustração ou compensação, 16

Figura 3: Motivational Model of Microcomputer Usage, 22

Figura 4: Modelo de D. Dias, 23

Quadros

Quadro 1: Demografia dos entrevistados, 48

Quadro 2: Informações selecionadas sobre os entrevistados, 77

Quadro 3: Respostas às perguntas estruturadas, 185

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SUMÁRIO

1. Introdução, 9

1.1. Objetivo desta pesquisa e sua relevância, 9

1.2. Descrição do estudo, 10

1.3. Organização do manuscrito, 11

2. Revisão bibliográfica, 13

2.1. Fatores motivacionais e uso de tecnologia , 13

2.1.1. Motivação humana , 13

2.1.2. Derivações da tecnologia, 16

2.1.3. Pesquisas sobre motivação e microcomputadores, 20

2.2. Agências de propaganda, 25

2.2.1. Publicitários e diretores de arte, 26

2.2.2. Breve história da propaganda no Brasil, 27

2.2.3. Departamento de Atendimento, 34

2.2.4. Departamento de Planejamento, 35

2.2.5. Departamento de Pesquisa, 36

2.2.6. Departamento de Criação, 37

2.2.7. Estúdio ou Departamento de Arte, 38

2.2.8. Departamento de Produção, 39

2.2.9. Departamento de Mídia , 39

2.3. Tecnologia em agências de propaganda , 40

3. Metodologia da pesquisa, 44

3.1. Definição da pergunta desta pesquisa, 44

3.2. Tipo de pesquisa, 45

3.3. Sujeitos da pesquisa, 46

3.4. Coleta e tratamento de dados, 49

3.5. Roteiro de entrevista, 51

4. Análise dos resultados , 52

4.1. Mudanças decorrentes do uso de computadores, 52

4.1.1. Aumento da velocidade, 52

4.1.2. Aumento da carga horária, 54

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4.1.3. Grande número de demissões, 55

4.1.4. Oportunidade de empreendedorismo, 57

4.1.5. Mudanças no trabalho, 59

4.1.6. Aumento da qualidade, 61

4.1.7. Possibilidade de ousar mais, 64

4.1.8. “Engessamento” da criação, 65

4.1.9. Aumento da incerteza e do estresse, 69

4.2. Tempo de experiência profissional e de uso de computador , 76

4.3. Peso da pressão social, 84

4.4. Motivadores extrínsecos e motivadores intrínsecos, 87

5. Conclusão, 91

5.1. Integração de objetivo e resultados, 91

5.1.1. Derivações da tecnologia na propaganda , 91

5.1.2. Fatores motivacionais para o uso de microcomputadores, 94

5.2. Sugestões para pesquisas futuras, 95

6. Referências bibliográficas, 96

7. Anexos , 100

7.1. Resumo da entrevista 1, 101

7.2. Resumo da entrevista 2, 108

7.3. Resumo da entrevista 3, 117

7.4. Resumo da entrevista 4, 125

7.5. Resumo da entrevista 5, 130

7.6. Resumo da entrevista 6, 136

7.7. Resumo da entrevista 7, 142

7.8. Resumo da entrevista 8, 150

7.9. Resumo da entrevista 9, 154

7.10. Resumo da entrevista 10, 159

7.11. Resumo da entrevista 11, 163

7.12. Resumo da entrevista 12, 171

7.13. Resumo da entrevista 13, 176

7.14. Respostas às perguntas estruturadas, 185

7.15. Glossário de termos técnicos citados, 186

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1. INTRODUÇÃO

1.1. Objetivo desta pesquisa e sua relevância

Esta pesquisa de natureza exploratória se propõe a investigar como diretores de

arte de agências de propaganda do Rio de Janeiro lidam com a tecnologia oferecida

pelos microcomputadores no seu ambiente de trabalho. O estudo foi feito com base nas

principais mudanças decorrentes da informatização dessa profissão e na percepção dos

usuários em relação a quatro fatores motivacionais: prazer, facilidade de uso, pressão

social e utilidade (FISHBEIN e AJZEN, 1975; DAVIS, 1986 e 1989).

O advento de ferramentas tecnológicas relacionadas a microcomputadores tem

alterado enormemente o modo como as pessoas vivem, aprendem, trabalham e se

comunicam (LÉVY, 1999). Ao mesmo tempo em que a tecnologia trouxe benefícios

inegáveis — como produtos e serviços mais sofisticados (TURBAN et al., 2003) —, são

evidentes efeitos negativos como o crescimento do desemprego, o aumento do nível de

estresse no trabalho e o surgimento de conflitos diante da possibilidade de alteração do

equilíbrio de poder nas organizações (MORGAN, 2002).

Pesquisas recentes apontam para o fato de que o montante investido na compra de

equipamento informatizado costuma ser apenas a menor parte do custo total de

implementação de um novo sistema de produção, pois os maiores gastos são relativos ao

processo subseqüente de mudança organizacional. Afinal de contas, cada configuração

tecnológica representa somente um potencial de transformação e não uma garantia,

exatamente porque os seus usuários — o fator humano do sistema — têm um papel

ativo na exploração desse potencial, podendo maximizar, minimizar, neutralizar ou

alterar as possibilidades inicialmente oferecidas (BRYNJOLFSSON e HITT, 1998).

Muitos estudos têm sido feitos sobre motivação humana e muita polêmica também

gira em torno desse tema. Um enfoque estritamente estatístico e racional para esse

assunto é a causa de uma série de mitos, crenças e mal-entendidos que se tornam

obstáculos para a evolução do conhecimento sobre motivação (BERGAMINI, 1990).

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A relevância da presente pesquisa reside na ampliação do conhecimento

acadêmico sobre a interação entre pessoas e microcomputadores, tanto na área de

Administração quanto na área de Comunicação Social — especialmente em Propaganda

e Publicidade, contexto (como tantos outros) no qual o processo de trabalho e as

estruturas organizacionais sofreram transformações diante dos avanços tecnológicos

recentes.

Outra peculiaridade deste estudo consiste em examinar um tipo de trabalho que é

diretamente relacionado ao exercício da criatividade. Além disso, esta pesquisa

contribui para a produção de reflexões que levam em consideração aspectos específicos

da realidade brasileira.

Este estudo também tem importância prática para os gestores que possam vir a se

confrontar com o desafio de instituir mudanças significativas nos sistemas usados em

suas empresas.

1.2. Descrição do estudo

A natureza exploratória desta pesquisa de campo é condizente com a utilização de

uma metodologia qualitativa de coleta de dados, por meio de entrevistas de

profundidade aplicadas a uma amostra de conveniência (MALHOTRA, 2001).

As entrevistas foram baseadas num roteiro padronizado que continha tanto

perguntas não-estruturadas quanto perguntas com alternativas fixas dentro de uma

escala de zero a dez, possibilitando a posterior comparação objetiva desse tipo de

resposta e o cálculo estatístico de algumas das indicações apresentadas no capítulo de

análise dos resultados.

Este estudo está fundamentado em conceitos encontrados na revisão da

bibliografia existente sobre os assuntos que compõem o tema em questão.

A análise das respostas colhidas foi feita por meio de uma abordagem

interpretativa, cuja principal vantagem é a obtenção de uma riqueza de detalhes e

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simbolismos muito maior do que a das descrições quantitativas (BENTO e FERREIRA,

1982).

Nesta pesquisa, foram entrevistados 13 diretores de arte que trabalham ou

trabalharam em agências de propaganda do Rio de Janeiro, no modelo atual de dupla de

criação — composta por um diretor de arte e um redator, na qual o primeiro é

responsável por conceber e desenvolver os aspectos visuais e gráficos das peças

publicitárias e o segundo se incumbe dos aspectos textuais do trabalho (FERREIRA e

FURGLER, 1996, p. 34-35, 41). Os integrantes dessa amostra de conveniência são

profissionais com diferentes formações e graus de experiência profissional, além de

serem provenientes de agências de diversos portes.

Esta pesquisa está naturalmente limitada às características da amostra analisada e

à metodologia escolhida para a coleta e o tratamento de dados. Portanto, as conclusões

produzidas não encerram generalizações mas sim reflexões sugestivas sobre o tema

estudado.

1.3. Organização do manuscrito

O texto está distribuído em cinco capítulos, seguidos de um conjunto de

Referências Bibliográficas e Anexos.

A esta Introdução se segue o Capítulo 2, de Revisão Bibliográfica, no qual é

discutido o conceito de motivação humana, são abordadas algumas derivações da

tecnologia na realidade atual e são apresentadas as pesquisas sobre motivação e

microcomputadores nas quais o presente estudo está baseado. Com o objetivo de

contextualizar melhor o campo investigado, também são oferecidas definições sobre as

atividades desempenhadas nos diversos departamentos de uma agência de propaganda,

uma breve história da propaganda no Brasil e uma descrição das ferramentas

tecnológicas de computador atualmente usadas no trabalho de direção de arte.

O Capítulo 3, de Metodologia, contém o detalhamento de todos os elementos

relativos à prática deste estudo: a pergunta, as classificações da pesquisa, os sujeitos da

pesquisa, a coleta e o tratamento dos dados, o roteiro de entrevista.

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12

No Capítulo 4, de Análise dos Resultados, os aspectos mais relevantes das

respostas obtidas são expostos e interpretados à luz das definições oferecidas no

Capítulo 2.

O Capítulo 5, de Conclusão, sintetiza tudo que foi abordado nos capítulos

anteriores deste estudo e fornece algumas sugestões para pesquisas futuras.

Finalmente, estão dispostas nos Anexos todas 13 entrevistas, em forma resumida e

na ordem em que foram realizadas. Após as entrevistas, foram incluídos também um

quadro com as respostas dadas às perguntas estruturadas e um glossário de termos

técnicos citados, esclarecendo brevemente o significado de algumas palavras que não

são de uso comum.

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2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. Fatores motivacionais e uso de tecnologia

Nesta seção, discute-se o conceito de motivação humana, são abordadas algumas

decorrências da tecnologia e são apresentadas as pesquisas sobre motivação e

microcomputadores nas quais a presente pesquisa está fundamentada.

2.1.1. Motivação humana

Muitos estudos têm sido feitos sobre motivação humana e muita polêmica também

gira em torno desse tema. Cecília W. Bergamini (1990), num artigo que visa delimitar a

fronteira “entre aquilo que se deve chamar de ‘pura reação’ (condicionamento) e o que

deve ser reconhecido como ‘motivação autêntica’”, afirma que uma abordagem

exclusivamente estatística e racional para esse assunto é a causa de uma série de mitos,

crenças e mal-entendidos que atrapalham o avanço do conhecimento nesse campo.

De acordo com essa linha de pensamento, alterações de comportamento que

derivem de um condicionamento conseguido por meio de variáveis extrínsecas às

pessoas denotam apenas reações que levam a movimentos, mas não estão baseadas

naquilo que se poderia realmente chamar de motivação. Bergamini (1990, p. 28) alerta

para o risco de se cometer erros grosseiros quando fatores extrínsecos ao indivíduo são

erroneamente considerados como a força motriz de sua motivação: “Quando se

consideram fatores extrínsecos ao indivíduo como elementos que condicionam a reação,

é importante ter em mente que, quando a recompensa ou a punição que estão ligadas a

ela são retiradas, o comportamento do indivíduo desaparece, ou melhor, tal

comportamento não se mantém por si mesmo.”

Um passo fundamental na formação do conhecimento acadêmico sobre motivação

foi dado pela teoria psicanalítica de Sigmund Freud, desviando o foco dos esquemas

puramente fisiológicos e neurológicos do estudo do ser humano e oferecendo uma

dimensão nova e mais profunda: o caráter inconsciente da motivação. Nessa

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perspectiva, a motivação é algo interno ao indivíduo, pois nasce das suas necessidades

intrínsecas, e sua energia se origina das suas emoções. A sensibilidade do cientista para

a percepção das pessoas passa a ser, então, o seu principal instrumento de pesquisa. Ao

mesmo tempo, é preciso saber que, “apesar do seu caráter claramente intrínseco, a

motivação pode servir-se de fatores existentes no meio ambiente como meios de

satisfazer uma necessidade interna, mas isso não significa que sua compreensão possa

ser reduzida à busca desses fatores em si mesmos. E por isso ela não se confina aos

limites de tais fatores.” (BERGAMINI, 1990, p. 29-31).

Tal ponto de vista é complementado pelo de outros teóricos. Para Fremont E. Kast

e James E. Rosenzweig (1970, apud CHIAVENATO, 1994, p. 65), motivo é “tudo

aquilo que impulsiona a pessoa a agir de determinada forma ou, pelo menos, que dá

origem a uma propensão a um comportamento específico”. Num contexto de análise do

comportamento humano na esfera do trabalho, a motivação pode ser definida como “a

vontade de empregar altos níveis de esforço em direção a metas organizacionais,

condicionada pela capacidade do esforço de satisfazer alguma necessidade do

indivíduo” (ROBBINS, 1999, p. 109).

O impulso à ação pode ser estimulado por um elemento externo, oriundo do

ambiente em que o indivíduo se encontra, e pode também ser gerado internamente, em

seus processos mentais. Assim, a motivação está relacionada com o sistema cognitivo

do indivíduo — seus valores pessoais, diante do seu ambiente físico e social, sua

estrutura e seus processos fisiológicos, suas necessidades e suas experiências anteriores.

Como necessidades, valores e capacidades variam de indivíduo para indivíduo, as

pessoas são diferentes entre si no âmbito da motivação. Além disso, as mesmas

necessidades, valores e capacidades variam no mesmo indivíduo ao longo do tempo,

aumentando ainda mais a complexidade da questão (CHIAVENATO, 1994, p. 65-66).

Uma descrição sucinta de como funciona o ciclo motivacional é dada por

Idalberto Chiavenato (1994, p. 67):

“O ciclo motivacional começa com o surgimento de uma

necessidade. A necessidade é uma força dinâmica e persistente que

provoca comportamento. Toda vez que surge uma necessidade, esta

rompe o estado de equilíbrio do organismo, causando um estado de

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tensão, insatisfação, desconforto e desequilíbrio. Esse estado leva o

indivíduo a um comportamento, ou ação, capaz de descarregar a tensão

ou de livrá-lo do desconforto e do desequilíbrio. Se o comportamento for

eficaz, o indivíduo encontrará a satisfação da necessidade e, portanto, a

descarga da tensão provocada por ela. Satisfeita a necessidade, o

organismo volta ao estado de equilíbrio anterior, à sua forma de

ajustamento ao ambiente.”

A figura abaixo representa esses conceitos.

Figura 1: Ciclo motivacional

Fonte: CHIAVENATO, 1999, p. 67.

Chiavenato continua (1994, p. 67-68):

“No ciclo motivacional, contudo, a necessidade nem sempre pode ser

satisfeita. Ela pode ser frustrada, ou ainda pode ser compensada (ou seja,

transferida para outro objeto, pessoa ou situação).

No caso de frustração da necessidade, no ciclo motivacional, a

tensão provocada pelo surgimento da necessidade encontra uma barreira

ou um obstáculo para sua liberação. Não encontrando saída normal, a

tensão represada no organismo procura um meio indireto de saída, por

via psicológica (agressividade, descontentamento, tensão emocional,

apatia, indiferença etc.) seja por via fisiológica (tensão nervosa, insônia,

repercussões cardíacas ou digestivas etc.).

Outras vezes, a necessidade não é satisfeita nem frustrada, mas

transferida ou compensada. Isto se dá quando a satisfação de uma outra

Estímulo ou incentivo

Equilíbrio interno

TensãoNecessidade Comportamento ou ação

Satisfação

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necessidade reduz ou aplaca a intensidade de uma necessidade que não

pode ser satisfeita.”

A figura a seguir resume esse outro tipo de ciclo motivacional.

Figura 2: Ciclo motivacional com frustração ou compensação

Fonte: CHIAVENATO, 1999, p. 68.

E vale a pena destacar o seguinte trecho do artigo de Bergamini (1990, p. 31): “É

justamente esse enfoque sobre a motivação, compreendido como uma predisposição

interna e inerente ao ser humano, que inverte a ordem dos fatores. A grande

preocupação não deve ser a de buscar o que deve ser feito para motivar as pessoas, mas

deve estar particularmente orientada no sentido da busca de estratégias que visem evitar

desmotivar aqueles que chegaram motivados para o seu primeiro dia de trabalho.”

2.1.2. Derivações da tecnologia

De modo geral, tecnologia é o conjunto de técnicas e conhecimentos,

especialmente princípios científicos, que se aplicam a um determinado ramo de

atividade (FERREIRA, 1999, p. 1935; HOUAISS e VILLAR, 2001, p. 2683). Esta

pesquisa se detém no estudo de fatores motivacionais para o uso de ferramentas

tecnológicas relacionadas a microcomputadores.

Nas últimas décadas, a performance dos equipamentos — velocidade de cálculo,

capacidade de memória, taxas de transmissão — vem aumentando exponencialmente,

ao passo que os preços estão caindo continuamente e os softwares têm sido cada vez

mais melhorados em termos conceituais e técnicos (LÉVY, 1999, p. 32). Paralelamente,

Estímulo ou incentivo

Equilíbrio interno

TensãoNecessidade Barreira

Outro comportamento

derivativo

FRUSTRAÇÃO

COMPENSAÇÃO

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os custos de mão-de-obra estão aumentando, o que faz com que cresça também a

proporção entre custo e desempenho dos computadores em relação ao trabalho manual.

Um dos efeitos dessa vantagem comparativa é o desemprego, dado que um número cada

vez maior de tarefas manuais tem sido executado por computadores (TURBAN et al.,

2003, p. 22).

O avanço da tecnologia — somado a uma forte tendência para uma orientação

voltada para o cliente — levou também ao aumento da sofisticação e das expectativas

dos clientes, após tomarem conhecimento da disponibilidade e da qualidade dos

produtos e serviços oferecidos no mercado. A elevação do nível das expectativas leva ao

constante incremento tecnológico, e vice-versa (TURBAN et al., 2003, p. 6):

“As pressões para produzir produtos e serviços com eficiência (com

rapidez e baixo custo) obrigam as organizações a buscar avanços

tecnológicos que lhes dêem uma vantagem sobre os concorrentes. A

tecnologia está desempenhando uma função mais importante nas

empresas manufatureiras e de prestação de serviços. Tecnologias

modernas e aperfeiçoadas (...) permitem que as organizações fabriquem

produtos superiores, personalizem-nos com mais facilidade e

modifiquem rapidamente os processos de produção, conforme determina

o mercado.”

A tecnologia também se faz presente no âmbito das relações organizacionais de

poder, e mudanças tecnológicas encerram um grande potencial de conflito. Gareth

Morgan (2002, p. 201-202) trata o assunto da seguinte forma:

“As organizações, em geral, tornam-se vitalmente dependentes de

algumas formas de tecnologia básica como um meio de converter

insumos organizacionais em resultados. Esta tecnologia pode ser uma

linha de montagem numa fábrica, uma mesa telefônica, um sistema

centralizado de computadores ou de dados, ou talvez uma unidade de

capital intensivo como uma refinaria de petróleo. O tipo de tecnologia

empregado influencia o padrão de interdependência dentro de uma

organização e, portanto, as relações de poder entre diferentes indivíduos

e departamentos. (...)

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O fato de que a tecnologia tem um grande impacto nas relações de

poder é uma importante razão pela qual tentativas de mudar a tecnologia

geralmente criam grandes conflitos entre gerentes e empregados e entre

diferentes grupos dentro de uma organização, pois a introdução de uma

nova tecnologia pode alterar o equilíbrio de poder.”

Outra decorrência do avanço da informática é o aumento do estresse no trabalho,

ao criar uma expectativa de ação instantânea, mesmo diante de problemas difíceis. O

estresse também se deve ao aumento da supervisão. A utilização de sistemas de

informação on-line tornou possível que funcionários estejam submetidos a controle

constante. Sua produtividade pode ser medida e atualizada a cada minuto do dia.

(MORGAN, 2002, p. 323). Outro fator de estresse é a sobrecarga cognitiva que pode

advir do trabalho diante do computador (LÉVY, 1999, p. 29).

As questões do aumento do desemprego e do estresse podem ser colocadas num

contexto ainda maior, no qual alguns teóricos enxergam o surgimento de uma espécie de

“novo brutalismo”. Segundo Morgan (2002, p. 326):

“A tendência para o domínio por parte da administração tem sido tão

drástica e extrema que na Europa continental ela é conhecida como o

‘novo brutalismo’. A busca insensível de eficiência e lucros, às custas de

considerações de ordem humana, está levando o capitalismo de volta aos

moldes do século XIX e começo do século XX. A ideologia da

administração atende às necessidades da acumulação de capital acima de

tudo. Notícias sobre as últimas demissões são freqüentemente

acompanhadas de notícias sobre lucros recordes, salientando o conflito

de interesses entre capital e trabalho.”

Essa situação rende preocupações e críticas que já não se restringem mais aos

defensores de posições políticas de esquerda. As evidências de que a batalha entre

administração e força de trabalho pende para o lado da primeira estão aparecendo em

praticamente todos os países, num mundo cuja economia está cada vez mais globalizada

(MORGAN, 2002, p. 326). E a Internet, a rede de telecomunicações eletrônicas que

conecta computadores no mundo inteiro, tem sido uma força influente nesse processo de

globalização (TURBAN et al., 2003, p. 5 e 554). Nesse ponto, é fundamental frisar que

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a tecnologia não é um ator autônomo, separado da sociedade e da cultura. Uma técnica é

produzida dentro de uma cultura, e uma sociedade encontra-se condicionada — mas não

determinada — por suas técnicas. Além disso, a dificuldade de analisar concretamente

as implicações sociais e culturais da informática ou da multimídia é multiplicada pela

ausência radical de estabilidade neste domínio (LÉVY, 1999, p. 21-27).

O novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial dos

computadores é chamado de “ciberespaço”. Esse conceito abrange não só a infra-

estrutura material da comunicação digital como também o universo de informações que

ela abriga e os seres humanos que navegam e alimentam esse universo (LÉVY, 1999, p.

17). Juntamente com o crescimento do ciberespaço se desenvolve um conjunto de

técnicas (materiais e intelectuais), práticas, atitudes, modos de pensamento e valores,

denominado “cibercultura”. E, especificamente no campo da educação e do trabalho,

cumpre notar que o advento da cibercultura aumentou de tal forma a velocidade de

surgimento e renovação dos saberes que a maioria das competências adquiridas por uma

pessoa no início de seu percurso profissional estarão obsoletas no final de sua trajetória

(LÉVY, 1999, p. 157).

O próprio conceito de trabalho vem sofrendo modificações, enfatizando a

denominação “capitalismo flexível” em detrimento de expressões como “longo prazo”,

“lealdade” e “compromisso mútuo”. A possibilidade de se construir uma carreira inteira

dentro de apenas uma empresa privada é algo que, nos dias de hoje, praticamente se

extinguiu, dando lugar a uma série de diferentes tipos de trabalho. A flexibilidade

passou a ser uma das principais exigências feitas em relação aos empregados, que têm

que ser ágeis, abertos a mudanças no curto prazo, assumir riscos continuamente e

depender cada vez menos de leis e procedimentos formais. E essa mesma flexibilidade

causa ansiedade pelo fato das pessoas não saberem que riscos serão recompensados e

que rumos devem tomar (SENNETT, 2001, p. 9-11). Não é por acaso que um termo

cada vez mais em voga atualmente seja “resiliência”, a resistência a choques.

Muitas outras derivações do uso de microcomputadores poderiam ter sido citadas.

Optou-se por apresentar nesta pesquisa apenas aquelas que têm ligação mais direta com

os assuntos abordados nas entrevistas e cuja análise consta do Capítulo 4.

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2.1.3. Pesquisas sobre motivação e microcomputadores

O investimento massivo em novas tecnologias decorrentes da generalização do

uso de microcomputadores, tanto em ambientes domésticos quanto empresariais, levou

a uma onda de tentativas de medição do impacto dos investimentos feitos sobre a

performance organizacional. Muitas revisões e pesquisas em diversas áreas de

conhecimento (tais como economia, finanças, administração, estratégia e sistemas de

informação) têm sido realizadas nas últimas duas décadas em torno do “paradoxo da

produtividade” — a dicotomia entre a crença de que é preciso investir cada vez mais em

tecnologia da informação e a dificuldade de se demonstrar empiricamente que esses

investimentos de fato levam a um aumento de produtividade ou de qualquer outro

parâmetro para medir agregação de valor aos negócios. A grande maioria dos estudos

não tem encontrado uma correlação consistente entre os investimentos feitos e a

performance organizacional (POZZEBON e PETRINI, 2002).

Analisando uma série de pesquisas, Marlei Pozzebon e Maira Petrini (2002)

sugerem que a fragilidade ou as contradições encontradas nos resultados nem sempre se

devem a fraquezas metodológicas, e sim à adoção de perspectivas incorretas —

notadamente a visão positivista de que existiria uma causalidade unidirecional

decorrente do determinismo tecnológico, ou seja, as estruturas organizacionais

necessariamente seriam transformadas em função da introdução de novas tecnologias

devido à superioridade destas na solução dos problemas das organizações. A falha

residiria, então, na exclusão de dimensões como tempo e contexto, imprescindíveis na

investigação da interação entre tecnologia da informação e performance.

Pesquisas recentes apontam para o fato de que o montante investido na compra de

equipamento computadorizado costuma ser apenas a menor parte do custo total de

implementação de um novo sistema de produção, pois os maiores gastos são relativos ao

processo subseqüente de mudança organizacional. Afinal de contas, cada configuração

tecnológica representa somente um potencial de transformação e não uma garantia,

exatamente porque os seus usuários — o fator humano do sistema — têm um papel

ativo na exploração desse potencial, podendo maximizar, minimizar, neutralizar ou

alterar as possibilidades inicialmente oferecidas. Teóricos como Erik Brynjolfsson e

Lorin Hitt (1998) afirmam que o tema do paradoxo da produtividade pertence a uma

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onda anterior de pesquisas e que o foco atual está se direcionando para a busca de

maneiras de tornar mais eficientes os investimentos em tecnologia baseada em

computadores.

É nesse contexto que podem ser enquadrados os estudos sobre motivação e uso de

tecnologia nas quais a presente pesquisa está fundamentada.

Fred D. Davis (1989) desenvolveu e validou duas variáveis subjetivas para a

aceitação dos usuários em relação à tecnologia da informação: a utilidade percebida e a

facilidade de uso percebida. Realizando dois estudos envolvendo 152 usuários de quatro

softwares nos Estados Unidos, verificou uma forte correlação entre utilidade percebida e

uso da tecnologia — tanto o uso corrente quanto a intenção de uso futuro. Os resultados

também sugeriram que a facilidade de uso percebida seria um antecedente causal para a

utilidade percebida.

Essa e outras duas perspectivas teóricas foram integradas por Magid Igbaria, Saroj

Parasuraman e Jack J. Baroudi (1996):

§ A Theory of Reasoned Action (TRA) de Fishbein e Ajzen (1975, apud

IGBARIA et al., 1996), que sugere que o comportamento humano é

determinado por um componente atitudinal (percepções e crenças individuais)

e um componente normativo (influências sociais expressas por meio de normas

subjetivas).

§ O Technology Acceptance Model de Davis et al. (1989, apud IGBARIA et al.,

1996), que propõe a utilidade percebida como o fator motivacional

preponderante no uso da tecnologia baseada em computador.

§ A distinção entre motivadores extrínsecos e motivadores intrínsecos feita por

Deci (1975, apud IGBARIA et al., 1996), que indica que os indivíduos podem

ser motivados para o uso de microcomputadores devido a recompensas

intrínsecas (prazer e diversão), benefícios percebidos (utilidade) e pressões

externas (pressão social).

O esquema a seguir apresenta o modelo definido por aqueles três autores. De

acordo com esse modelo, três fatores motivacionais — a utilidade percebida, o prazer

percebido e a pressão social percebida — teriam influência direta no uso de

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microcomputadores. Esses três fatores também funcionariam como mediadores dos

efeitos de variáveis antecedentes individuais e organizacionais sobre o uso da

tecnologia. As habilidades individuais, o apoio organizacional e a utilização do sistema

por parte da organização afetariam o uso da tecnologia por meio dos seus efeitos sobre a

complexidade percebida e sobre os fatores motivacionais diretos de utilidade, prazer e

pressão social percebidos.

Figura 3: Motivational Model of Microcomputer Usage

Fonte: IGBARIA et al., 1996, p. 130.

Igbaria, Parasuraman e Baroudi (1996) testaram seu modelo em pesquisa com 471

profissionais de 62 empresas norte-americanas. Os resultados apontaram para a

utilidade percebida como o principal motivador. Além disso, concluíram que a

complexidade percebida de fato era uma ligação-chave entre as variáveis antecedentes

— habilidades individuais, apoio organizacional e utilização organizacional — e os três

fatores motivacionais diretos. Adicionalmente, os resultados sugeriram que as

habilidades individuais têm um papel crítico no uso da tecnologia.

Uma pesquisa brasileira sobre motivação e uso de microcomputadores foi

realizada por Donaldo de Souza Dias (1998), utilizando alguns elementos desse modelo,

dispostos no esquema seguinte.

Apoio organizacional

Habilidades

Complexidade percebida

Uso organizacional

Utilidade percebida

Prazer percebido

Pressão social percebida

Uso do sistema

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Um questionário foi respondido por 79 profissionais com posições de gerência em

55 empresas localizadas no Rio de Janeiro. Essas organizações iam de pequenas firmas

a grandes corporações: 23% eram multinacionais, 58% eram empresas privadas de

capital brasileiro e 19% eram estatais. A pesquisa baseou-se no pressuposto

psicanalítico de que fatores motivacionais intrínsecos teriam precedência sobre fatores

motivacionais extrínsecos. Entretanto, mais uma vez os resultados indicaram a utilidade

— um fator extrínseco — como principal motivador para o uso de tecnologia.

Figura 4: Modelo de D. Dias (1998)

Fonte: DIAS, 1998, p. 339.

Um desdobramento dessa pesquisa ocorreu na forma de um estudo de caso em que

36 dos entrevistados iniciais foram divididos em seis grupos de trabalho e suas

experiências pessoais de uso de tecnologia da informação foram examinadas com mais

profundidade, de acordo com os seguintes aspectos:

§ Resistências pessoais quanto ao uso de computadores.

§ Situações nas quais a tecnologia é usada compulsivamente.

§ Motivações para usar computadores na execução de tarefas.

§ Cultura organizacional.

A existência de uma correlação positiva entre o prazer percebido e a facilidade de

uso percebida foi confirmada, ou seja, quanto maior o prazer no uso de computadores,

maior a facilidade percebida em usá-los. Além disso, tanto o prazer percebido e a

Prazer

Utilidade

Facilidade de uso

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facilidade de uso percebida tiveram influência positiva na percepção de utilidade.

Também foi verificado que a percepção de que computadores são fáceis de usar pode

reduzir a ansiedade em relação ao seu uso.

Outra pesquisa foi posteriormente realizada por Dias (2001), aplicando o mesmo

modelo de três fatores motivacionais em três classes de usuários no Rio de Janeiro:

§ 53 alunos de um curso de MBA Executivo (pós-graduação lato sensu) de uma

universidade pública de renome, com idade média de 36 anos e 11 anos de

experiência profissional; 83% deles tinham uma posição de gerência em 43

empresas de diversos portes.

§ 46 estudantes de graduação em Administração de Empresas, numa

universidade particular, com idade média de 22 anos; alguns deles já estavam

trabalhando em tempo parcial durante o curso.

§ 39 alunos de Ensino Fundamental, 82% dos quais estudavam em escolas

particulares, os demais em escolas públicas.

Os resultados mostraram que indivíduos com diferentes graus de escolaridade

apresentam percepções diferentes em relação aos fatores que motivariam o uso de

microcomputadores. Estudantes do Ensino Fundamental sentem mais prazer com

microcomputadores do que os demais. Já os alunos de MBA foram os que reportaram

menor grau de prazer.

O atributo da utilidade tem uma percepção maior por parte dos estudantes de

graduação, e quem o percebe menos são os alunos do Ensino Fundamental. Finalmente,

a facilidade de uso é maior para os estudantes de graduação, enquanto os de MBA são

os que têm a menor facilidade em relação aos demais. O prazer atuaria como um fator

de automotivação, ao passo que a utilidade parece estar ligada a um sentimento de

obrigatoriedade. Dias conclui que os sistemas de informação se tornarão mais atraentes

para usuários adultos caso sejam mais amigáveis, tenham interfaces mais atualizadas e

sejam desenvolvidos com a participação de usuários, além de incluírem um intenso

programa de treinamento.

A presente pesquisa, objeto central desta dissertação, tem como objetivo analisar a

motivação de profissionais que trabalham com direção de arte em agências de

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propaganda do Rio de Janeiro para lidar com a tecnologia oferecida pelos

microcomputadores. Esta pesquisa exploratória e qualitativa fornecerá subsídios para a

comparação dos resultados obtidos no contexto específico do mercado publicitário

carioca com os resultados das pesquisas anteriormente apresentadas. A interação com a

tecnologia será analisada à luz dos seguintes fatores motivacionais:

§ O prazer percebido pelo usuário — a percepção de que qualquer atividade que

envolva o uso de computador é inerentemente divertida, a despeito de qualquer

antecipação de conseqüências de performance (DAVIS, 1986, apud DIAS,

1998).

§ A facilidade de uso percebida pelo usuário — a crença de que usar computador

não requer esforço mental ou físico (DAVIS, 1986, apud DIAS, 1998).

§ A pressão social percebida pelo usuário — o conjunto de normas subjetivas

que refletiriam a percepção de um indivíduo de que pessoas importantes para

ele consideram um dado comportamento apropriado ou não (FISHBEIN e

AJZEN, 1975, apud IGBARIA et al., 1996). Essa pressão viria de indivíduos

cujas opiniões são relevantes para os usuários, como supervisores, pares e

subordinados (IGBARIA et al. , 1996).

§ A utilidade percebida pelo usuário — a percepção de que o uso de um certo

sistema melhora a performance profissional (DAVIS, 1986, apud DIAS, 1998).

Dessa forma, serão examinados dois fatores motivacionais intrínsecos — o prazer

e a facilidade de uso percebidos — e dois fatores motivacionais extrínsecos — a pressão

social e a utilidade percebidas.

2.2. Agências de propaganda

Nesta seção, são oferecidas definições de agências de propaganda, publicitários e

diretores de arte. Conta-se brevemente a história da propaganda no Brasil e são descritas

as atividades desempenhadas nos diversos departamentos de uma agência de

propaganda, com o objetivo de contextualizar melhor o campo pesquisado nesta

dissertação. Na descrição, entenda-se “cliente” e “empresa” como a organização para a

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qual a agência de propaganda presta serviços, e “consumidor” como o comprador

(efetivo ou potencial) dos produtos da empresa-cliente da agência de propaganda.

2.2.1. Publicitários e diretores de arte

No uso corrente da língua portuguesa, agências de propaganda — também

chamadas de agências de publicidade — são “empresas de prestação de serviços

especializadas no planejamento, organização, execução, distribuição e controle da

propaganda ou publicidade de seus clientes” (FERREIRA, 1999, p. 69; HOUAISS e

VILLAR, 2001, p. 113). Esta definição é estendida pela ABAP (Associação Brasileira

das Agências de Propaganda), que conceitua agência de propaganda como “pessoa

jurídica independente, especializada na arte e na técnica publicitárias, que estuda e

planeja, concebe e executa publicidade e material promocional, avalia, seleciona e

programa os veículos de divulgação necessários à disseminação de mensagens de

natureza comercial e institucional, por ordem e conta de clientes-anunciantes, com o

objetivo de promover a venda de produtos e serviços, difundir idéias, ou informar o

público a respeito de organizações ou instituições colocadas a serviço desse mesmo

público” (FERREIRA e FURGLER, 1996, p. 19-20).

E existem agências que fazem um pouco mais: “não se restringem à prestação de

serviços de propaganda e se propõem a atender seus clientes em todas as atividades de

comunicação, realizando também, de forma direta ou terceirizada, serviços relativos a

atividades de promoção de vendas, edição de relatórios anuais e publicações diversas,

produção de eventos, montagem e administração de estandes em feiras e exposições,

divulgação, relações públicas, marketing institucional e até atividades específicas de

telemarketing, endomarketing, marketing de incentivo etc.” (RABAÇA e BARBOSA,

2001, p. 14).

Uma agência de propaganda normalmente é composta pelos seguintes setores:

Atendimento, Planejamento, Pesquisa, Criação, Arte, Produção e Mídia, além de

departamentos comuns a outros tipos de empresa, como Diretoria, Finanças, Pessoal e

Contabilidade (BAER, 1999, p.17-20; RIBEIRO et al., 1989).

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A designação de publicitário caracteriza todos os profissionais que exercem

regularmente funções de natureza técnica específica dessa especialidade, em agências

de propaganda, veículos de divulgação ou em qualquer outra empresa que produza

propaganda (SANTOS, 1993, p. 189).

O diretor de arte é o profissional responsável pelos aspectos de comunicação

visual e gráfica na criação de uma peça publicitária. Geralmente, o diretor de arte é

integrante de uma dupla de criação, somado ao redator, que se incumbe dos aspectos

textuais do trabalho publicitário (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 229).

2.2.2. Breve história da propaganda no Brasil

Carlos Roberto F. Chueiri (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 264-266) afirma

que o anúncio publicitário entrou na história da comunicação social no Brasil em

setembro de 1808, com a instituição da Imprensa Régia. Durante décadas, os anúncios

de produtos e serviços nos primeiros veículos brasileiros de comunicação de massa

tiveram um cunho semelhante aos atuais classificados.

A propaganda com um caráter mais profissional começou a se revelar no Brasil no

início do século XX, junto com o surgimento das primeiras revistas. Até então, nas

últimas décadas abolicionista e republicana, os jornais haviam sido a tônica da imprensa

brasileira, freqüentemente nascidos da luta política. As revistas marcaram uma nova

atmosfera, na qual predominavam a crônica social, a charge e o soneto. E essas

publicações — semanais, ilustradas, coloridas — eram sustentadas por uma propaganda

regular (RAMOS e MARCONDES, 1996, p. 21-22). Além de trazer avanços em termos

de recursos técnicos, as revistas apresentavam a possibilidade da elaboração de textos

publicitários escritos pelos jornalistas, poetas e romancistas famosos que trabalhavam

na redação. Ao texto acresentava-se o tratamento dado pelos artistas plásticos que já

vinham ilustrando anúncios desde o final do século anterior (CASTELO BRANCO et

al., 1990, p. 266).

As primeiras agências de propaganda apareceram pouco tempo depois. A primeira

firma estruturada de forma a poder ser classificada profissionalmente como tal

chamava-se A Eclética, instalada por Jocelyn Bennaton e João Castaldi em São Paulo,

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entre 1913 e 1914. Em 1918, os fundadores deixaram o ramo e entraram em cena

Eugênio Leuenroth, que foi para o Rio de Janeiro e abriu ali uma filial da agência, e

Júlio Cosi, que veio a fortalecer A Eclética, que foi pioneira em vários aspectos e

atendeu as contas mais importantes da época, como Ford, Texaco, Sabonete Lux, Parker

Pen, Aveia Quaker, Maisena Duryea, entre muitos outros (CASTELO BRANCO et al.,

1990, p. 301-302; RAMOS e MARCONDES, 1996, p. 28).

Entre 1925 e 1926, foi montada a Divisão de Propaganda da General Motors,

considerada um divisor de águas na história da propaganda nacional. Segundo Orígenes

Lessa, que trabalhou lá como redator, a Divisão foi “a primeira grande escola de

propaganda no Brasil”, disseminando a técnica norte-americana de propaganda

comercial no país. Tendo à disposição uma vultosa verba anual para propaganda, foram

produzidas grandes campanhas, que envolviam espetaculares salões de automóveis,

cartazes, outdoors e malas-diretas de alta qualidade gráfica, comerciais no rádio e

anúncios regularmente fornecidos tanto para os jornais das capitais quanto para os do

interior (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 307-308). Em 1927, um ano de vendas

especialmente significativas de automóveis e caminhões, a Divisão foi sendo ampliada e

chegou a contar com 34 funcionários. Em 1929, ela foi desativada, com a vinda da

agência J. Walter Thompson para atender a conta da General Motors, e esses

funcionários foram depois distribuídos entre a Thompson e a N. W. Ayer & Son, outra

agência norte-americana, que se instalou no Brasil em 1931 (RAMOS e

MARCONDES, 1996, p. 32-33; CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 308).

Apesar de ter sido um período agitado na história nacional, com a instauração do

Estado Novo de Getúlio Vargas, a tentativa de Revolução Constitucionalista de 32 em

São Paulo e a instituição da censura no país, muitas agências multinacionais foram

atraídas ao Brasil nos anos 30. Além das já citadas N. W. Ayer & Son e J. Walter

Thompson, vieram ao país a McCann-Erickson em 1935, com Armando de Moraes

Sarmento à frente, o primeiro brasileiro a dirigir um escritório da agência norte-

americana, a Lintas em 1937, após uma curta tentativa em 1931, e a Grant em 1939.

Também nessa época foram fundadas importantes agências nacionais, como a Standard,

criada em 1933 por Cícero Leuenroth, a Interamericana, criada em 1938 por Armando

D’Almeida, e a Bastos Tigre, dirigida por Manuel Bastos Tigre. A década de 30 foi um

período decisivo para a publicidade brasileira em termos de maturidade e

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profissionalização, com a formação de clientes e profissionais de propaganda, a

consolidação do rádio como veículo de comunicação de massa, a crescente utilização de

ilustrações e fotografias nas peças publicitárias, a introdução de modernos métodos de

marketing, a realização das primeiras pesquisas de mercado e de opinião pública feitas

no Brasil e a criação de novas estruturas em agência como estúdios de gravação de

programas de rádio (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 269, 308-333).

A importância que a propaganda assumia confirmou-se com o aparecimento de

entidades profissionais e de uma imprensa especializada no assunto. A primeira revista

publicitária brasileira, Exitus, surgiu por volta de 1932 e durou pouco, mas a segunda, a

revista Propaganda, lançada em novembro de 1937 sob a direção de Jorge Mathias,

com Orígenes Lessa como redator-chefe e Oscar Fernandes da Silva como secretário,

manteve-se por mais tempo. No início do mesmo ano de 1937, havia sido fundada a

Associação Brasileira de Propaganda, com sede no Rio de Janeiro e Aldo Xavier da

Silva como presidente. Foi a primeira associação publicitária do país e está em atividade

até hoje (RAMOS e MARCONDES, 1996, p. 40-41).

Na década de 40, o mercado publicitário continuou a se desenvolver, apesar de ter

passado por um período conturbado durante a Segunda Guerra Mundial, que se refletiu

numa violenta queda no movimento de anúncios. Por outro lado, no pós-guerra, o surto

de industrialização do Brasil — do qual a inauguração da Usina de Volta Redonda

marcou os primeiros passos na indústria de base —, o otimismo característico da época

e o aumento do consumo popular foram acompanhados de um boom do faturamento das

agências. No final da década, começaram a circular as primeiras notícias sobre a

iminente chegada da televisão. O profissionalismo dos publicitários e a qualidade dos

veículos, dos leiautes, dos equipamentos gráficos, da abordagem e da linguagem de

propaganda aumentavam cada vez mais. Data desse período o surgimento de agências

como a Record em 1943, a Norton, fundada por Geraldo Alonso em 1946, e a Publitec,

criada por Gino Carraresi no mesmo ano, entre outras (CASTELO BRANCO et al.,

1990, p. 335-341; RAMOS e MARCONDES, 1996, p. 45-50).

Com a inauguração, em 1950, da TV Tupi — primeira emissora de televisão

brasileira, também a primeira da América Latina —, os anos 50 viram a chegada da

televisão, um órgão de comunicação inteiramente novo, que conjugava imagem e som e

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veio a requerer também o desenvolvimento de novas técnicas de propaganda. Foi

fundamental também a influência de Assis Chateaubriand, repórter que fundou os

Diários Associados e veio a se tornar empresário de iniciativas pioneiras como a criação

de um departamento de propaganda em jornal, vislumbrando a futura publicidade

planejada (RAMOS e MARCONDES, 1996, p. 52-61).

O crescente desenvolvimento do parque industrial nacional aumentou a demanda

pela propaganda como poderoso instrumento de marketing, cujos modernos conceitos

foram trazidos ao Brasil pelas filiais de agências internacionais aqui instaladas. A

concentração de grandes indústrias, como a automobilística, entre outras, em São Paulo

impulsionou o mercado publicitário paulista — até então as iniciativas nesse campo

tinham vindo sempre do Rio de Janeiro (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 342-352).

Em 1951, foi criada em São Paulo a Escola Superior de Propaganda, com uma

orientação muito voltada para o lado prático da profissão (RAMOS e MARCONDES,

1996, p. 53-54). De acordo com Altino João de Barros (CASTELO BRANCO et al.,

1990, p. 129), o I Congresso Brasileiro de Propaganda, realizado no Rio de Janeiro em

outubro de 1957, pode ser considerado um marco na história da propaganda brasileira.

As 61 teses apresentadas no congresso fundamentaram a estrutura da propaganda no

país — alguns exemplos: Código de Ética dos Profissionais de Propaganda;

regulamentação da propaganda; normas para o funcionamento de agências e seu

relacionamento com veículos, corretores e anunciantes; organização da Escola Superior

de Propaganda de São Paulo; criação do IVC (Instituto Verificador de Circulação).

Entre as agências surgidas nos anos 50, destacam-se a Alcântara Machado,

fundada por Caio Alcântara Machado, a Denison, criada em 1957 e dirigida pelo

empresário José Carvalho e pelos irmãos José Luiz e José Cândido Moreira de Souza, e

a MPM, fundada em Porto Alegre, em 1957, por Antônio Mafuz, Petrônio Corrêa e Luiz

Vicente Goulart Macedo (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 343-348).

Na década de 60, as agências nacionais começaram a se sobressair em relação às

multinacionais instaladas no país. Agências como a Interamericana, a Norton, a

Standard, a Alcântara Machado e a Denison, além de absorver das agências

internacionais aquilo que elas tinham de melhor, imprimiram características mais

brasileiras ao trabalho, refletindo um pouco mais a realidade do nosso mercado

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(CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 353). O mercado assistiu à fusão de agências

como a Mauro Salles e a Interamericana; Benson e Panam, e Record. As agências

uniram forças para ter uma presença maior e melhores condições de enfrentar a

concorrência. Agências estrangeiras também adquiriram participações acionárias em

agências brasileiras: Ogilvy & Mather e Standard; Leo Burnett e CIN. Pequenas

agências começaram a florescer, à base de equipes criativas, das quais a mais brilhante

foi a DPZ, que evoluiu de estúdio para agência (RAMOS e MARCONDES, 1996, p.62-

63).

Da parte dos anunciantes, viu-se o crescimento da mentalidade de marketing, ao

mesmo tempo em que começou a surgir um profissional de comunicação polivalente,

fruto do recrutamento maciço feito pelos clientes/anunciantes nas agências para compor

seus departamentos de marketing e da permuta geral de profissionais entre agências,

clientes e veículos. Dentro das agências, os setores de redação e arte começaram a se

integrar e o profissional de criação passou a ter cada vez mais destaque, em detrimento

do pessoal de atendimento. Na propaganda em geral, ocorreu uma ênfase na

criatividade, com uma mudança radical na forma e no conteúdo dos anúncios, que

foram se afastando da sistemática de argumentação racional. Das influências

estrangeiras nesse sentido de renovação da abordagem e da linguagem, talvez a mais

importante tenha sido a da norte-americana DDB (Doyle Dane Bernbach), com as

campanhas da Volkswagen (RAMOS e MARCONDES, 1996, p.61). O conceito de

dupla de criação foi trazido ao Brasil por dois publicitários que haviam tomado contato

com esse tipo de integração após trabalharem em Nova York, na própria DDB: Julio

Cosi Jr. e Alex Periscinoto, que levaram o conceito para a Standard e a Almap,

respectivamente (GANDRA, 1995, p. 49-52).

As cinco grandes agências surgidas nesse período foram a Proeme, fundada em

1962 por Otto Scherb, os irmãos Plínio e Sérgio Toni, Laerte Agnelli e José Bonifácio

de Oliveira Sobrinho, o Boni; a Mauro Salles, criada em 1966 pelo próprio e por seus

irmãos Luiz e Apolônio Filho; a Artplan, nascida em 1967 como house agency da

Veplan Imobiliária; a DPZ, constituída em 1968 por Roberto Duailibi, Francesc Petit e

José Zaragoza; e a Lage, Stabel, fundada em 1968 por Rony Luiz Lage e José Carlos

Stabel (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 355-359).

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Os anos 70 foram auspiciosos para a propaganda brasileira. O marketing integrou-

se de tal maneira nas empresas que sua prática tornou-se uma rotina administrativa. A

prática da pesquisa deslanchou, principalmente nos departamentos de mídia das

agências. Paralelamente, viveu-se o momento mais forte e tenso da ditadura militar que

havia se instaurado em 1964. A injeção de recursos no país e os imensos planos

institucionais tiveram efeitos na economia; a atividade publicitária acompanhou esse

movimento (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 275-276). O governo surgiu como

grande anunciante.

A valorização das agências como empresas levou à consolidação definitiva da

publicidade como negócio no Brasil. A criatividade e o alto padrão de qualidade dos

trabalhos fizeram com que as peças produzidas no país marcassem presença e

conquistassem muitos prêmios nos festivais internacionais. As grandes agências

brasileiras se desenvolveram acentuadamente em comparação com o desempenho das

multinacionais. O mercado brasileiro atraiu vários grupos estrangeiros, dos quais alguns

exemplos são a Leo Burnett, que adquiriu o controle acionário da CIN em 1975, a

Young & Rubicam, que entrou no país em 1973, a GGK, em 1973, a Siboney, em 1974,

o Grupo Interpublic, que incorporou a Proeme em 1975, e a FCB (Foote, Cone &

Belding), por meio de participação acionária na Tempo de Publicidade, em 1975

(CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 365-367).

Algumas outras agências importantes surgidas nessa época são a CBBA, nascida

em 1971 e cujo principal fundador, Renato Castelo Branco, havia deixado a presidência

da Thompson dois anos antes; a Fischer & Justus, criada em 1978 por Eduardo Fischer,

seu pai Gregório Fischer e Luiz Otavio Gabus Mendes; a Giovanni, fundada em 1973

por Paulo Giovanni e Maurício Nogueira; e a Estrutural, criada em 1975 por Rogério

Steinberg e Armando Strozenberg (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 367-371).

Os anos 80, com altas taxas de inflação, sucessivas crises, congelamento de preços

e salários, margens de lucro fixadas pelo governo, foram um período difícil para as

agências brasileiras. A atividade publicitária foi drasticamente afetada pela estagnação

da economia e pelo grande aumento da carga tributária. Com a redução da rentabilidade

das agências, muitos profissionais foram demitidos. Ao mesmo tempo, verificou-se um

amadurecimento no mercado de comunicação, da parte das agências de propaganda, dos

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veículos, dos grandes anunciantes, dos fornecedores de serviços complementares e dos

cursos profissionalizantes. Quanto aos fatos institucionais que marcaram a década,

destacam-se a queda da censura, a volta das liberdades políticas, as eleições para a

Assembléia Constituinte e para o presidente da República pela vontade popular

(CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 276 e 372).

Data desse período o surgimento de agências como a Talent, de Júlio Ribeiro, em

1980, a Agnelo Pacheco, fundada em 1985 pelo mesmo em sociedade com Dulce

Pimentel, a Contemporânea, criada em 1983 por Armando Strozenberg e Mauro Mattos

e a W-GGK, resultante da associação realizada por Washington Olivetto e a agência

suíça GGK em 1986, posteriormente chamada de W/Brasil, com a aquisição, pelo

primeiro, das ações da GGK, e a entrada dos novos sócios Javier Llussa Ciuret e Gabriel

Zellmeister (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 373-375).

Na década de 90, as empresas brasileiras em geral tiveram que fazer grandes

adaptações diante das dificuldades financeiras que já enfrentavam na década anterior e

devido à entrada de novos competidores estrangeiros após a abertura do nosso mercado.

O consumidor se tornou mais exigente ao dispor de mais alternativas. Em 1994, a

implementação do Plano Real estabilizou a moeda. A participação dos serviços na

economia cresceu intensamente e o comércio varejista se modernizou, seguindo a

tendência mundial de concentração de firmas. Essa tendência de concentração foi

observada também no mercado de propaganda. Novas ligações entre agências nacionais

e estrangeiras foram realizadas, como a fusão da Almap com a BBDO americana e a

entrada oficial da DDB, já então parte do grupo Omnicom, por meio de uma joint-

venture com a DPZ, em 1992. Um forte movimento de desnacionalização das empresas

brasileiras na área de comunicação — passando a pertencer a grupos multinacionais ou

ser afiliadas a eles — pode ser apontado como uma conseqüência da globalização

(GRACIOSO e PENTEADO, 2001, p. 210-235).

A disseminação da Internet e de outros recursos relacionados aos computadores

causou um grande impacto não só na área de comunicação e nas atividades plásticas e

gráficas como também na vida das pessoas em geral. As inovações tecnológicas estão

potencializando uma segmentação de mídia cada vez maior. Tudo indica que essas

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mudanças irão transformar o papel da propaganda na nova ordem do mercado

(GRACIOSO e PENTEADO, 2001, p. 227-244).

Atualmente, existem aproximadamente mil agências associadas à Fenapro

(Federação Nacional das Agências de Propaganda) no Brasil, concentradas na região

Sudeste, conforme dados publicados no site da instituição. Embora esse número de

associados não corresponda à totalidade do mercado, ele oferece uma noção da sua

ordem de grandeza.

2.2.3. Departamento de Atendimento

O profissional de atendimento atualmente é responsável pela coordenação dos

serviços que a agência presta a seus clientes (FERREIRA e FURGLER, 1996, p. 23).

Walter Longo define o profissional de atendimento como alguém capaz de agir como

agência e pensar como cliente. Ele é um elemento catalisador, capaz de fazer o cliente

agir perante o mercado — analisando seu posicionamento em relação aos concorrentes,

definindo objetivos e aprovando a implementação de ações estratégicas — e capaz de

fazer a agência agir perante o desafio de concretizar os serviços e produtos solicitados

— analisando os objetivos propostos, criando alternativas de ação e implementando

taticamente as decisões estratégicas sugeridas e aprovadas (RIBEIRO et al., 1989, p.

316).

Basicamente, as responsabilidades do profissional de atendimento são as seguintes

(RIBEIRO et al., 1989, p. 325-326):

§ Definir, juntamente com o cliente, os objetivos de marketing e de comunicação

a serem alcançados, em vista dos recursos estruturais e financeiros de que o

cliente dispõe.

§ Orientar, por meio do briefing — documento que sintetiza diretrizes e metas do

cliente para uma campanha publicitária, ponto de partida para o trabalho

interno da agência (FERREIRA e FURGLER, 1996, p. 26) —, todos os setores

da agência envolvidos na execução dos pedidos do cliente.

§ Apresentar ao cliente a estratégia de comunicação e as peças publicitárias

desenvolvidas pela agência, e motivá-lo a aprová-las. Uma peça é uma unidade

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de uma campanha — anúncio, comercial, cartaz, filme, jingle etc. — e também

pode designar diversos tipos de material promocional, como folhetos, displays,

crachás, bandeirolas, galhardetes etc. (FERREIRA e FURGLER, 1996, p. 72).

§ Controlar a utilização dos recursos e os prazos de execução das peças e ações

aprovadas.

Essa última função pode também ser desempenhada por um profissional chamado

tráfego, que atua dentro da agência e se responsabiliza pela coordenação do fluxo dos

trabalhos produzidos nos centros de produção da agência, verificando os prazos de

execução de cada etapa até a sua conclusão (BAER, 1999, p. 20).

2.2.4. Departamento de Planejamento

De acordo com Júlio Ribeiro, fazer planejamento consiste essencialmente em

descobrir maneiras de aumentar o potencial dos produtos e da empresa com os quais a

agência de propaganda está lidando. Em síntese, o planejamento se desdobra em três

etapas: apropriação da realidade, montagem do problema e desenvolvimento de

soluções (RIBEIRO et al., 1989, p. 20-22).

Por apropriação da realidade entenda-se a contextualização do cliente, que resulta

da combinação dos seguintes fatores (RIBEIRO et al., 1989, p. 16-50):

§ A análise da economia, do ramo de negócios e da concorrência.

§ As características atuais e os objetivos do cliente, em curto, médio e longo

prazos, em termos de penetração de mercado, market share, segmentação de

mercado, posicionamento e os quatro elementos do composto de marketing

(KOTLER, 1980, p. 87-91):

• Produto: qualidade, características e opções, estilo, marca, embalagem, linha

de produtos, garantias, nível de assistência técnica, outros serviços.

• Praça: canais de distribuição, cobertura da distribuição, pontos-de-venda,

zonas de vendas, níveis e localização dos estoques, transportadoras.

• Promoção: propaganda, venda pessoal, promoção de vendas, publicidade.

• Preço: nível de preço, descontos, formas de pagamento.

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§ A disponibilidade de recursos financeiros da empresa.

§ Os planos estratégicos da empresa em relação a investimentos produtivos e

participação em mercados alternativos.

§ As características do produto em questão, em termos de posicionamento,

segmentação, estágio no ciclo de vida, sazonalidade, funcionamento, aspectos

físicos, imagem da marca e preço.

§ As atitudes, os hábitos, as necessidades e as razões de compra do consumidor

em relação à empresa e aos seus produtos.

A obtenção e a análise dessas informações permitem ao profissional de

planejamento fazer a “montagem do problema” — o desafio que o cliente incumbiu a

agência de propaganda de resolver — e desenvolver então soluções e peças publicitárias

para esse desafio, por meio do trabalho conjunto de todos os demais setores da agência

(RIBEIRO et al., 1989, p. 29-41).

Em muitas agências, as atividades de planejamento e de atendimento são

desempenhadas pelas mesmas pessoas (FERREIRA e FURGLER, 1996, p. 23).

2.2.5. Departamento de Pesquisa

Cabe notar a presença da atividade de pesquisa em parte das atividades de

atendimento e de planejamento, descritas anteriormente. Segundo Vera Aldrighi, a

pesquisa tem importância fundamental no desenvolvimento de uma comunicação mais

eficiente, pois esta será racionalmente planejada, estudada, testada — tendo, portanto,

maior probabilidade de atingir seus objetivos (RIBEIRO et al., 1989, p. 54-56). As

agências de propaganda também podem dispor de pesquisas que são realizadas e

comercializadas por institutos, com periodicidade regular, sobre determinados assuntos

de interesse geral (FERREIRA e FURGLER, 1996, p. 74).

Basicamente, a pesquisa pode contribuir das seguintes maneiras (RIBEIRO et al.,

1989, p. 81-102):

§ Na orientação ao planejamento estratégico. Alguns exemplos:

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• Pesquisa de posicionamento de marcas, mostrando como o conjunto de

marcas em determinada categoria de produtos é percebido pelo público

consumidor.

• Pesquisa de segmentação psicográfica, classificando os consumidores em

grupos com perfis bastante diferenciados e identificando a

representatividade desses grupos e suas tendências na escolha de produtos e

marcas.

• Estudo de conceitos, permitindo testar a resposta do consumidor a

alternativas de conceitos de comunicação.

§ No apoio ao processo criativo, por meio de pesquisas rápidas e geralmente

qualitativas que têm como objetivo dar indicações sobre a receptividade do

consumidor e o poder de atração e envolvimento das formas de viabilizar as

estratégias de comunicação.

§ Na avaliação das peças, fazendo testes que analisem a sua qualidade de

comunicação. Podem ser testadas peças em pré-produção, peças produzidas e

peças em veiculação.

§ No controle de resultados globais, pela avaliação das mudanças que o esforço

de comunicação e marketing como um todo foi capaz de promover no

comportamento e nas atitudes do consumidor da empresa contratante da

agência de propaganda.

Portanto, o setor de pesquisa funciona em duas frentes: externamente,

assessorando clientes da agência com pesquisas motivacionais, de mercado, de

produtos, entre outras, e internamente, oferecendo análises para apoiar a atuação dos

Departamentos de Criação, Mídia e Atendimento (BAER, 1999, p. 19).

2.2.6. Departamento de Criação

O profissional de criação é responsável pela concepção das peças publicitárias, de

acordo com a estratégia de comunicação preestabelecida. O trabalho de criação é

executado por uma dupla de criação, cujos integrantes agem em conjunto no

desenvolvimento conceitual das peças e depois as executam. Cada dupla de criação é

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composta de um redator, que cria os textos, e um diretor de arte, que constrói os

aspectos visuais e gráficos do material de comunicação (FERREIRA e FURGLER,

1996, p. 34-35, 41).

Muitas vezes, as peças criadas requerem o trabalho de profissionais autônomos

externos como fotógrafos e ilustradores, entre outros, que serão escolhidos pelo diretor

de arte e atuarão sob sua coordenação (BAER, 1999, p. 20).

A qualidade e a adequação dos trabalhos desenvolvidos pelas duplas de criação de

uma agência de propaganda são supervisionadas por um diretor de criação (RABAÇA e

BARBOSA, 2001, p. 229). Geralmente, a experiência profissional prévia do diretor de

criação é obtida no próprio Departamento de Criação, em funções de redação ou de

direção de arte.

2.2.7. Estúdio ou Departamento de Arte

Em propaganda, chama-se de “arte” o conjunto de atividades relacionadas à

apresentação gráfica e visual das peças publicitárias (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p.

41). Essas atividades são executadas no Departamento de Arte, também conhecido

como Estúdio, que tem uma função dupla: transformar os esboços da Criação em

leiautes acabados, apropriados para a aprovação dos clientes, e preparar as artes-finais

para dar início à produção gráfica das peças aprovadas (BAER, 1999, p. 20).

Esses esboços são normalmente chamados de “rafes”. A palavra “rafe” se origina

da palavra inglesa “rough”, que se refere ao rascunho inicial no planejamento gráfico de

qualquer trabalho a ser impresso. O rafe corresponde à primeira fase da arte, antes do

leiaute e da arte-final (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 620). “Leiaute” é a forma

aportuguesada da palavra inglesa “layout”, que denomina o esboço — mais elaborado

do que o rafe — produzido para ser submetido à aprovação do cliente da agência antes

da etapa de arte-final. O leiaute contém todos os elementos gráficos e textuais básicos

do trabalho que está sendo criado, já numa forma bastante próxima da definitiva.

(RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 418). E “arte-final” é a designação do acabamento

final de um trabalho de arte que se destina à produção gráfica, com indicações de cor,

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retículas, fotografias, ampliações, reduções etc. Chama-se de arte-final qualquer

trabalho pronto para ser reproduzido (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 41).

Atualmente, os estúdios são eletrônicos e produzem material visual a partir de

sistemas computadorizados. O operador ou arte-finalista integra textos e figuras e

completa o leiaute numa interação com o computador, a tela do monitor e os demais

periféricos. A saída do processo é dada numa impressora ou num dispositivo digital de

armazenamento (BAER, 1999, p. 20).

2.2.8. Departamento de Produção

As etapas de execução ou reprodução, geralmente terceirizadas, são orçadas,

coordenadas e acompanhadas por um produtor gráfico, no caso de peças impressas, ou

por um produtor de vídeo, no caso de comerciais a serem veiculados em televisão, ou

por um produtor de rádio, no caso de mensagens publicitárias a serem difundidas nesse

veículo, e assim por diante.

O profissional de produção gráfica é responsável pela avaliação da qualidade, da

pontualidade e dos custos dos fornecedores que serão contratados para prestar os

serviços e materiais necessários na preparação das artes-finais e nos processos

posteriores de pré-impressão, impressão e pós-impressão. Além do trabalho de

contratação desses fornecedores, é incumbência do produtor gráfico supervisionar a

execução das operações relacionadas à impr essão das peças publicitárias (BAER, 1999,

p. 17).

2.2.9. Departamento de Mídia

No contexto de marketing e comunicação, a palavra “mídia” se refere ao conjunto

de meios de comunicação selecionados para a veiculação de mensagem ou campanha

publicitária. Incluem-se nessa definição todos os possíveis veículos: jornal, rádio,

televisão, cinema, outdoor, folheto impresso, mala-direta, balão inflável, site da Internet

etc. Por extensão, o termo “mídia” denomina o setor da agência de propaganda

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responsável pelo planejamento e pela coordenação de mídia, e também o profissional

desse setor (FERREIRA, 1999, p. 1334).

O profissional de mídia é responsável pelas tarefas relativas à veiculação da

propaganda (FERREIRA e FURGLER, 1996, p. 65): pesquisa, planejamento, avaliação,

compra e execução de mídia. Segundo Edison Benetti, sua função básica é propor

estratégias e táticas para que a mensagem chegue ao público-alvo, por meio de veículos

de comunicação que atinjam o consumidor na qualidade e na quantidade exigidas pelos

objetivos de marketing definidos pelo cliente junto à agência de propaganda (RIBEIRO

et al. , 1989, p. 183-199).

2.3. Tecnologia em agências de propaganda

Esta pesquisa se detém sobre as ferramentas tecnológicas de computador que são

usadas atualmente no trabalho de direção de arte em agências de propaganda.

De acordo com Altino João de Barros (CASTELO BRANCO et al., 1990, p. 133-

139), a primeira vez que um computador — mainframe — foi usado no mercado

brasileiro de propaganda ocorreu em 1969, com a fundação do instituto Audi-TV. Antes

disso, as agências de grande porte já utilizavam sistemas administrativos e financeiros,

mas o computador começou a ser integrado à atividade publicitária propriamente dita

pelo Departamento de Mídia das agências (tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos,

por exemplo), como ferramenta de processamento de dados de avaliação de mídia.

Inicialmente, os programas de avaliação de planos de mídia brasileiros eram

processados na Argentina, com base em cartões perfurados no Brasil, até que, em 1973,

Alberto Arnaldo e Carlos Lombadero, dois analistas de sistemas que desenvolviam

programas de computação de mídia na Argentina, foram trazidos ao Brasil para

trabalhar na Marplan, empresa independente de pesquisa de mídia originada do

Departamento de Pesquisa da agência McCann-Erickson.

Os minicomputadores surgiram no início da década de 60. O primeiro a ser

produzido em massa foi o PDP-8, lançado em 1965 pela Digital Equipment

Corporation. Custava apenas US$ 18 mil e inaugurou a era dos minicomputadores, que

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representavam uma atraente alternativa em termos de preço e capacidade para empresas

médias e pequenas — a quase totalidade do mercado —, para as quais não faria sentido

gastar milhões de dólares na compra de um mainframe. O incrível sucesso de vendas

desse produto tornou a Digital a segunda maior fornecedora de computadores em todo o

mundo, passando de três funcionários a mais de cem mil empregados. A magnitude do

mercado a ser explorado, principalmente no segmento de computadores pessoais, atraiu

empresas concorrentes e impulsionou o avanço das tecnologias envolvidas. Empresas

como IBM, Intel, Apple, Bell Labs, Microsoft, Compaq, Xerox, Hewlett-Packard,

Digital Equipment Corporation, Lotus, Silicon Graphics, Novell, Sun Microsystems,

entre outras, efetuaram grandes investimentos em pesquisa, desenvolvimento e

comercialização de produtos de informática (RANGEL, 1999, p. 31-32).

Assim como organizações de diversos outros campos de atuação, a indústria

gráfica, as agências de propaganda e os escritórios de design absorveram essas

mudanças tecnológicas. Por exemplo, as revistas britânicas i-D e The Face —

referências marcantes na história do design gráfico —, já em 1980, o ano de seu

surgimento, exploravam as novas possibilidades criativas oferecidas pelo computador e

sua capacidade de manipular fontes tipográficas e imagens (HOLLIS, 1994, p. 191-

192).

Os primeiros computadores projetados para desktop publishing — o

desenvolvimento, em computador, do projeto e da produção de arquivos eletrônicos de

matrizes para a reprodução de impressos (ADG, 2000, p. 36) — foram PCs da IBM,

lançados no início dos anos 80 e que operavam apenas programas rudimentares de

composição de texto (BAER, 1999, p. 17).

Em 1984, a Apple lançou sua nova realização: o Macintosh, um microcomputador

de 16 bits baseado no Motorola 68000, com mouse e interface gráfica (elemento que

possibilitava a visualização imediata das operações, facilitando a interação entre o

usuário e a máquina). Sua associação com o PostScript (linguagem de descrição de

página que permitia o redimensionamento automático das letras e o aperfeiçoamento do

seu acabamento) e a impressora a laser Apple LaserWriter faziam com que esse

conjunto funcionasse como uma fotocompositora. Essas características inovadoras,

somadas ao desenvolvimento de soluções ligadas ao PostScript e comercializadas pela

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Adobe, consolidaram o Macintosh como a melhor opção para os profissionais de artes

gráficas — posição que ocupa até hoje (RANGEL, 1999, p. 56). O advento do

computador deu um controle quase total sobre os processos de pré-impressão aos

designers e diretores de arte (HOLLIS, 1994, p. 186).

Um exemplo de como o uso do computador se tornou obrigatório também no

mercado publicitário brasileiro é o seguinte trecho, escrito por J. Roberto Whitaker

Penteado sobre os PCs na sua coluna do Caderno Propaganda e Marketing, em 1992:

“Se V. pretende progredir em sua carreira, é essencial que já esteja trabalhando

normalmente com PC — o seu Personal Computer. Dentro de oito anos, quem não

estiver pilotando o seu micro não terá mais espaço na sociedade econômica do terceiro

milênio.” (GRACIOSO e PENTEADO, 2001, p. 227-228).

Atualmente, nas agências de propaganda, são usados os seguintes tipos de

aplicativo (BAER, 1999, p. 118-119):

§ Programas processadores de texto.

§ Programas de leiaute e diagramação, que reúnem textos e imagens sob a forma

de páginas prontas para reprodução.

§ Programas de retoque de cores, que podem modificar as imagens coloridas que

foram escaneadas para dentro do sistema.

§ Programas de manipulação de imagens, que permitem fazer retoques em

imagens digitalizadas por meio de duplicação eletrônica de pixels, efetuar

distorções ou correções de perspectiva, recortar ou alterar fundos, realizar

fusões cromáticas, aplicar texturas ou degradês e fundir imagens em geral.

§ Programas para geração de fontes tipográficas, que fornecem instrumentos para

desenhar famílias de tipos originais, com todos os pormenores técnicos

necessários, ora modificando fontes convencionais, ora criando fontes novas.

§ Programas de criação de planilhas.

§ Programas de banco de dados.

Também são usados programas de gerenciamento das fontes que organizam as

famílias tipográficas em todas as suas variantes, programas para a coordenação do fluxo

de produção e programas de comunicação interna e externa.

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A típica estação de trabalho para editoração eletrônica ou desktop publishing

conta com os seguintes módulos de hardware (BAER, 1999, p. 119-127):

§ UCP (Unidade Central de Processamento) ou CPU (Central Processing Unit ),

o circuito principal do computador, responsável pelo processamento geral de

dados.

§ Dispositivos de entrada, como teclado, joystick , mouse, trackball, câmera de

vídeo, câmera fotográfica digital, scanner (que converte imagens analógicas

para traços e meios-tons digitalizados), tablet ou mesa digitalizadora (da qual

alguns modelos disponíveis podem chegar a possibilitar a digitalização de

objetos tridimensionais por meio da captação de coordenadas nas três

dimensões).

§ Dispositivos de saída, como monitor e impressora.

§ Dispositivos de armazenamento dos arquivos produzidos.

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3. METODOLOGIA DA PESQUISA

3.1. Definição da pergunta desta pesquisa

A pergunta central que esta pesquisa busca responder é:

Como diretores de arte de agências de propaganda do Rio de Janeiro lidam com

a tecnologia oferecida pelos microcomputadores no ambiente de trabalho?

Essa questão foi abordada por meio das seguintes perguntas secundárias e

suposições.

Pergunta 1

Quais foram as principais mudanças causadas pela introdução do computador nas

agências de propaganda?

Suposição 1.1. O número de profissionais alocados no Estúdio foi reduzido

drasticamente.

Suposição 1.2. O trabalho do diretor de criação foi alterado pelo advento do

computador.

Pergunta 2

Quando e como os diretores de arte começaram a usar computador de modo geral?

Suposição 2.1. O primeiro contato dos diretores de arte com maior tempo de

experiência profissional ocorreu no ambiente de trabalho.

Pergunta 3

Que grau de prazer os diretores de arte sentem ao usar computador?

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Suposição 3.1. Os diretores de arte que começaram a usar computador antes de

ingressar na vida profissional sentem mais prazer em trabalhar com ele.

Pergunta 4

Que grau de pressão social os diretores de arte sentem no sentido de saber usar

computador no ambiente de trabalho?

Suposição 4.1. Todos os diretores de arte sentem um alto grau de pressão social

em relação a saber usar computador no âmbito profissional.

Pergunta 5

Que grau de facilidade os diretores de arte têm em usar computador como

ferramenta de cunho profissional?

Suposição 5.1. Os diretores de arte que aprenderam a usar computador mais tarde

têm menor facilidade em lidar com ele.

Pergunta 6

Que grau de utilidade os diretores de arte atribuem ao computador no ambiente de

trabalho?

Suposição 6.1. A utilidade percebida é o principal fator motivacional para o uso

de computador.

3.2. Tipo de pesquisa

Sylvia C. Vergara (1997) propõe dois critérios básicos para a classificação de uma

pesquisa: quanto aos fins de investigação, uma pesquisa pode ser exploratória,

descritiva, explicativa, metodológica, aplicada, intervencionista; ao passo que, quanto

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aos meios, uma pesquisa pode ser de campo, de laboratório, telematizada, documental,

bibligráfica, experimental, ex post facto, participante, pesquisa-ação, estudo de caso.

De acordo com essa taxonomia, a presente pesquisa pode ser classificada, quanto

aos fins, como uma pesquisa descritiva e exploratória. Descritiva porque cumpre a

função de apresentar as características de determinada população e determinado

fenômeno, ao mesmo tempo em que não tem o compromisso de explicar os fenômenos

descritos, embora sirva de base para tal explicação. E exploratória porque não foram

encontrados estudos que tratassem especificamente do assunto abordado no Brasil.

Quanto aos meios, é uma pesquisa predominantemente de campo, no sentido de

ser uma investigação empírica executada no local onde ocorre um certo fenômeno, para

a obtenção de dados primários por meio da realização de entrevistas. Tem também uma

ênfase bibliográfica, pois está fundamentada em textos acadêmicos publicados em

periódicos e livros.

Em termos de operacionalização das suposições — a transformação dos conceitos

em fenômenos passíveis de medição —, decidiu-se por um método qualitativo como

decorrência natural das características expostas: apesar de conter limitações, fato

inerente a qualquer escolha, sua principal vantagem é possibilitar uma riqueza de

detalhes e simbolismos muito maior do que a das descrições quantitativas (BENTO e

FERREIRA, 1982).

Finalmente, usando uma designação inspirada em Churchman (1971, apud

BENTO e FERREIRA, 1982), que classifica em sugestivas, preditivas, decisivas e

sistêmicas as informações a serem buscadas como resultado de pesquisa, a presente

pesquisa teve como objetivo produzir informações sugestivas sobre o tema estudado.

3.3. Sujeitos da pesquisa

Nesta pesquisa, foram entrevistados 13 diretores de arte que trabalham ou

trabalharam em agências de propaganda do Rio de Janeiro, no modelo atual de dupla de

criação — composta por um diretor de arte e um redator publicitário, na qual o primeiro

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é responsável por conceber e desenvolver os aspectos visuais e gráficos das peças e ao

segundo são atribuídas as mesmas tarefas em relação aos elementos de texto.

A escolha do segmento de direção de arte foi determinada pela intenção de

examinar os conceitos mencionados num contexto em que o exercício da criatividade

fosse parte indissociável da profissão.

Os respondentes foram selecionados com base no critério da acessibilidade, dentro

dos requisitos iniciais mencionados, formando assim uma amostra de conveniência,

compatível com o caráter exploratório e qualitativo desta pesquisa. Essa técnica não-

probabilística foi complementada pelo método de amostragem tipo bola-de-neve, e

assim se chegou a parte dos entrevistados por indicação de entrevistados subseqüentes

(MALHOTRA, 2001).

Para tornar a pesquisa mais rica, foram escolhidos profissionais com diferentes

formações e graus de experiência profissional e provenientes de agências diversas,

grandes, médias e pequenas.

Todos os respondentes residiam na cidade do Rio de Janeiro na época em que as

entrevistas foram feitas. Oito deles (62%) são naturais também da cidade do Rio de

Janeiro.

Dos 13 entrevistados, dez (77%) são do sexo masculino e três (23%) são do sexo

feminino, numa distribuição de gênero coerente com o que se pode observar na prática

atual dessa profissão, nas agências do Rio de Janeiro.

O quadro a seguir oferece mais detalhes sobre os entrevistados quanto a idade,

formação universitária, tempo de experiência em direção de arte em publicidade e

tempo de uso de computador em geral (não apenas no trabalho).

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Quadro 1: Demografia dos entrevistados

Identificação Sexo Idade Naturalidade Experiência em direção de arte em publicidade

Tempo de uso de computador em geral

Formação universitária Observações

Entrevistado 1 Masculino 33 anos Rio de Janeiro, RJ

9 anos (desde 1994) 13 anos (desde 1990) Desenho Industrial —

Entrevistado 2 Masculino 48 anos São Luís, MA 27 anos (de 1975 a 2002)

7 anos (desde 1996) Não tem Não se dedica mais integralmente à direção de arte em publicidade

Entrevistado 3 Masculino 30 anos Rio de Janeiro, RJ

9 anos (de 1993 a 2002)

13 anos (desde 1990) Não tem Não trabalha mais com direção de arte em publicidade

Entrevistada 4 Feminino 30 anos Rio de Janeiro, RJ

10 anos (desde 1993) 9 anos (desde 1994) Desenho Industrial Abriu a própria agência há 1 ano e meio (em 2002)

Entrevistado 5 Masculino 31 anos Porto Alegre, RS

12 anos (desde 1991) 10 anos (desde 1993) Comunicação Social, com habilitação em Propaganda e Publicidade

Entrevistado 6 Masculino 36 anos Ouro Fino, MG 12 anos (desde 1991) 8 anos (desde 1995) Arquitetura É o diretor de criação de uma agência há 4 anos (desde 1999)

Entrevistado 7 Masculino 31 anos São Paulo, SP 8 anos (desde 1995) 10 anos (desde 1993) Desenho Industrial — Entrevistada 8 Feminino 30 anos Rio de Janeiro,

RJ 2 anos e meio (desde 2001)

10 anos (desde 1993) Desenho Industrial —

Entrevistado 9 Masculino 27 anos Rio de Janeiro, RJ

5 anos (desde 1998) 17 anos (desde 1986) Comunicação Social, com habilitação em Propaganda e Publicidade

Entrevistada 10 Feminino 21 anos Rio de Janeiro, RJ

Menos de 1 ano (desde 2003)

8 anos (desde 1995) Desenho Industrial —

Entrevistado 11 Masculino 38 anos Rio de Janeiro, RJ

10 anos (desde 1993) 11 anos (desde 1992) Desenho Industrial —

Entrevistado 12 Masculino 28 anos Rio de Janeiro, RJ

3 anos (desde 2000) 6 anos (desde 1997) Não tem —

Entrevistado 13 Masculino 39 anos São Paulo, SP 14 anos (desde 1989) 7 anos (desde 1996) Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo

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3.4. Coleta e tratamento de dados

Peter H. Mann (1979) define quatro formas gerais de observação de pessoas como

fontes de dados, resultantes do cruzamento de dois fatores: participação e controle. Por

participação, entenda-se o grau de envolvimento real do observador na situação que está

sendo observada; por controle, entenda-se o grau com que a observação é padronizada

no interesse da exatidão científica. Os métodos foram denominados “observação de

pássaros” (incontrolada não-participante), “observação participante” (incontrolada

participante), “observação no laboratório” (controlada não-participante) e “entrevista”

(participação controlada). A coleta de dados para a presente pesquisa foi feita com base

em entrevistas, a opção, dentre as quatro formas citadas, que permite ao mesmo tempo

participação e controle.

As entrevistas foram baseadas num roteiro com questões padronizadas, contendo

perguntas abertas e perguntas com alternativas fixas (SELLTIZ et al., 1975) para as

respostas. O intuito de tal escolha foi possibilitar a posterior comparação objetiva de

algumas respostas (MANN, 1979). A essas perguntas foram intercaladas mais perguntas

não-estruturadas, incentivando uma exposição mais livre e profunda dos entrevistados

sobre as razões que os haviam levado a dar aquelas respostas objetivas, em consonância

com o método de entrevistas de profundidade (MALHOTRA, 2001).

As questões foram formuladas dentro de uma abordagem direta, na qual os reais

objetivos da pesquisa são revelados aos respondentes pela própria natureza das

perguntas (MALHOTRA, 2001).

Desse modo, procurou-se criar um equilíbrio de entrevista formal e informal: as

perguntas fechadas servindo para focalizar a atenção dos respondentes na dimensão do

problema desta pesquisa, e as perguntas abertas servindo para trazer à tona o quadro de

referência no qual os entrevistados percebiam o problema e as motivações subjacentes

às suas opiniões (SELLTIZ et al., 1975).

Apesar de alguns entrevistados, quando contatados para agendar as entrevistas,

terem solicitado uma lista com as perguntas que seriam feitas para se prepararem

antecipadamente, essa lista não foi fornecida. No momento do primeiro contato, apenas

o tema geral da pesquisa foi apresentado, optando-se por expor as perguntas somente no

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ato da entrevista. O objetivo dessa decisão foi preservar uma carga de espontaneidade

que poderia ter se perdido caso os entrevistados tivessem tido mais tempo para avaliar e

elaborar as suas respostas.

As entrevistas foram realizadas pela autora dessa pesquisa, nos meses de agosto a

novembro de 2003, sempre em local e hora escolhidos pelos respondentes. Todos os

diretores de arte contatados aceitaram conceder entrevista. A maioria delas foi feita no

local de trabalho dos entrevistados, durante o horário comercial. A duração média das

entrevistas foi de quarenta minutos. As entrevistas não sofreram interrupções, com

exceção da oitava, que foi suspensa por poucos minutos devido a um telefonema

recebido pela entrevistada.

Todas as entrevistas foram gravadas em fitas cassete, com o consentimento dos

envolvidos. A opção pela gravação foi feita para eximir a pesquisadora da tarefa de

anotar as respostas e, portanto, deixá-la mais livre para observar os entrevistados com

maior acuidade. Estes — e as agências por eles citadas — foram mantidos anônimos,

para manter o sigilo a respeito da sua identidade e, desse modo, deixá-los mais à

vontade para expressar tanto opiniões favoráveis quanto desfavoráveis em relação ao

seu trabalho.

As fitas gravadas foram então transcritas e seu conteúdo foi analisado e

classificado à luz dos conceitos contidos no capítulo de revisão bibliográfica. Também

se dedicou uma atenção especial aos assuntos abordados espontaneamente pelos

entrevistados, que geraram considerações adicionais expostas no final desta pesquisa.

As respostas marcadas em escala de zero a dez foram submetidas a um tratamento

estatístico por meio do aplicativo SPSS 11.0, o que permitiu o cálculo de algumas das

indicações apresentadas no capítulo de análise dos resultados. Entretanto, o pequeno

número de medidas quantitativas realizadas dificultou a obtenção de resultados

quantitativos estatisticamente significantes.

Um resumo de cada uma das 13 entrevistas foi disposto no conjunto de Anexos,

na ordem em que foram feitas. Após as entrevistas, estão incluídos também nos Anexos

um quadro com as respostas dadas às perguntas com alternativas fixas e um glossário de

termos técnicos citados, esclarecendo brevemente o significado de algumas palavras que

não são de uso comum.

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3.5. Roteiro de entrevista

§ Preenchimento das seguintes informações: data, nome, idade e naturalidade.

§ Fale resumidamente sobre a sua trajetória profissional.

§ Se alguém perguntasse qual é a sua profissão hoje, o que você responderia?

§ Como você vê o computador no trabalho, no seu dia -a-dia?

§ Na sua opinião, quais foram as principais mudanças causadas pela introdução do

computador nas agências de propaganda?

§ Quando e como você começou a usar computador, a ter contato com computador?

§ Você gosta de usar o computador? Se você fosse classificar o prazer que você tem

em usar o computador, que grau você daria, de zero a dez? Por quê?

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

§ Se você fosse classificar o quanto você é pressionado pela empresa ou influenciado

pelos seus colegas de trabalho para saber usar o computador, que grau você daria, de

zero a dez? Por quê?

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

§ Se você fosse classificar a facilidade que você tem em usar o computador no seu

trabalho, que grau você daria, de zero a dez? Por quê?

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

§ Se você fosse classificar a utilidade que você vê no computador no seu trabalho, que

grau você daria, de zero a dez? Por quê?

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

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4. ANÁLISE DOS RESULTADOS

4.1. Mudanças decorrentes do uso de computadores

Nesta seção são analisados as principais mudanças atribuídas pelos entrevistados

ao advento dos computadores no âmbito da direção de arte nas agências de propaganda

cariocas: aumento da velocidade, aumento da carga horária, grande número de

demissões, oportunidade de empreendedorismo, mudanças no trabalho, aumento da

qualidade, possibilidade de ousar mais, “engessamento” da criação, aumento da

incerteza e do estresse.

4.1.1. Aumento da velocidade

O aumento da agilidade na execução do trabalho foi mencionado por nove dos 13

entrevistados como uma conseqüência da introdução do computador nas agências de

propaganda. Tarefas que antes eram executadas manualmente por um grande número de

funcionários especializados passaram a ser realizadas em muito menos tempo no

computador. O Entrevistado 3 se refere a esse ponto do seguinte modo:

“A primeira grande mudança foi na questão do prazo. Se você vê que

antigamente o maior departamento de uma agência de propaganda era o

Estúdio, onde você tinha uma pessoa que só marcava letra, você tinha

uma outra pessoa que só ilustrava, você tinha uma outra que só montava

os leiautes, você tinha uma outra que só finalizava trabalho... Então o

computador acabou tirando tudo isso, né, acabou tirando os grandes

artesãos da publicidade, se você for falar de uma forma lúdica. (...) você

tinha às vezes três, quatro dias para desenvolver um trabalho.”

(ENTREVISTADO 3)

Essa percepção é confirmada no depoimento do Entrevistado 1, que também

aborda a disseminação do uso de computador no mercado. Existe uma padronização

mundial no uso de determinados aplicativos.

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“(...) antigamente os prazos eram maiores, já que tinham que dar

conta desse tempo de realização da idéia. Hoje em dia não, se você tem

uma equipe boa, recursos bons, máquinas rápidas, o seu trabalho, a sua

capacidade de realizar aquela idéia, fica muito mais... Acho que agilidade

aí é a palavra-chave, o que mudou mesmo.

Tem um programa que talvez seja universal aí, que é líder no

segmento dele, é o único, na verdade, que é o Photoshop. O Photoshop é

um programa de retoque e manipulação de imagens e é muito bom

naquilo que ele faz. E todo mundo usa, o mundo inteiro, você pode olhar

o mundo inteiro e o cara vai estar sempre lá... O programa de leiaute, que

muitas vezes é o Quark, ou um programa tipo o FreeHand, Illustrator,

esse programa pode variar, mas o Photoshop você vai sempre encontrar

nas agências. E a gente já tem aí quase dez anos de informatização do

mercado, então as pessoas aprenderam a utilizar mais os programas, os

recursos, e usar a capacidade real do programa. Embora eu ache que as

pessoas não usam 100% do que o programa pode.” (ENTREVISTADO 1)

E a velocidade está também ligada à obsolescência, como menciona o

Entrevistado 3. A pressão do mercado obriga as empresas a investir cada vez mais em

novos equipamentos e softwares.

“Mas é 100% o uso da máquina, se faz necessário, criou-se um

sistema, porque você tem fornecedores que se adequaram a isso, que se

estruturaram para essa coisa. E essa indústria é tão poderosa que você

não pode ficar muito tempo sem investir, como empresário. Porque daqui

a pouco, se você fica três, quatro anos sem trocar a máquina, daqui a

pouco essa máquina, o programa que você tem, toda essa confusão, daqui

a pouco ela não serve lá no seu fornecedor, porque ele fez um upgrade,

está investindo. Sabe? E aí? Aí não sai o trabalho. Tudo está dentro do

computador, tudo está dentro desse jogo de mercado. Uma vez que

entrou nisso, não tem como voltar, retroceder.” (ENTREVISTADO 3)

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4.1.2. Aumento da carga horária

A questão da rapidez também se imiscuiu na interação entre a agência e o cliente,

como explica o Entrevistado 7:

“O computador facilitou, é mais rápido de modificar, mas ele é ruim

por causa disso. (...) você mexe muito fácil. Então o cliente acha que

pode modificar o anúncio muito fácil. Então, em cima da hora, o anúncio

com prazo para sair, o jornal esperando, ele acha de modificar! Porque é

tudo mais rápido, entendeu? (...) E as coisas são muito mais rápidas,

aprovou agora, finaliza daqui a pouco, entrega para o veículo via e-mail.

A tecnologia acaba acelerando e, em vez de facilitar, você acaba

trabalhando mais.” (ENTREVISTADO 7)

O incremento na velocidade foi acompanhado por uma diminuição dos prazos de

execução das peças e um conseqüente aumento na carga horária de trabalho — que é

motivo de grande insatisfação, expressada da seguinte forma pelo Entrevistado 3, que

decidiu abandonar a profissão depois de 9 anos.

“E tentar ver essa questão do tempo, né, hoje você tem que ser

rápido, tem que ser dinâmico, mas espera aí. Se você produz dez

campanhas por semana; às vezes você faz uma campanha em uma

semana, a qualidade técnica dessa campanha que você fez em uma

semana é infinitamente melhor do que se você somar as dez que você fez

durante esse período. Então eu acho um tiro no pé essa questão de você

começar a atropelar o tempo. Chegou ao caos de que não há tempo físico

para mais nada. As pessoas passam vinte horas dentro de agência, viram

noite. Se você pegar por segmento as profissões em que a galera mais

trabalha extra, os publicitários estão lá na frente.” (ENTREVISTADO 3)

O problema da carga horária também é mencionado por outros respondentes,

como o Entrevistado 13:

“Porque a gente trabalha fim de semana muitas vezes. Com a conta

de Guaraná Antarctica, a gente ficou quatro finais de semana direto, num

hotel, criando. Teve até que se isolar. Então é uma profissão que não te

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permite. Você vê, hoje, talvez, vou ver se vou sair às oito horas, mas é

muito difícil. Ontem, às oito horas, pintou um trabalho para a gente fazer

e ficamos até onze e meia aqui. Então não é uma profissão em que você

marca, ‘hoje eu vou para casa’, não.” (ENTREVISTADO 13)

4.1.3. Grande número de demissões

A ocorrência de um grande número de demissões no Estúdio — também chamado

Departamento de Arte, onde se faz a finalização das peças concebidas no Departamento

de Criação — é outro fato associado ao advento do computador nas agências por nove

dos 13 entrevistados. Isto confirma a suposição 1.1, de que o número de profissionais

alocados no Estúdio foi reduzido drasticamente, além de confirmar a ligação

mencionada no Capítulo 2 entre o aumento do desemprego e o crescimento da relação

entre custo e benefício dos computadores face aos custos do trabalho manual (TURBAN

et al. , 2003). O Entrevistado 1 conta:

“E antigamente você tinha Estúdios numa agência média, por

exemplo, tinha Estúdios com 30 pessoas. E hoje em dia os Estúdios estão

reduzidos a uma, duas, três, no máximo. É um montador só, o cara que

está ali para montar a peça, quer dizer, a peça sai da impressora, ele passa

cola e monta, faz um mock-up ou outro, mas é uma função mais...

Antigamente não, o Estúdio tinha que suprir essa função toda. Tinha

gente marcando letra, na época não tinha as impressoras coloridas e tal.

Então a informática, a informatização, ela facilitou muito o processo. Ao

mesmo tempo em que ela eliminou muitos postos de trabalho. Você tinha

profissionais de Estúdio que simplesmente não fizeram a ponte. Para um

cara sair de um processo mecânico, analógico, lá de montar, colar, usar

pincel, de usar aerógrafo e tal, esse cara teria que ter aprendido

Photoshop, que é o novo aerógrafo. Muita gente boa, que trabalhava com

propaganda há muito tempo, simplesmente deixou de existir como

necessidade. A função deixou de existir como necessidade.”

(ENTREVISTADO 1)

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O Entrevistado 6 explica com mais detalhes como foi o processo de transição:

“Eu acho que a primeira mudança foi a demissão de algumas pessoas

que não trabalhavam com computador e aí chegaram outras para

trabalhar com o computador ali na função. É aquela velha história do

Estúdio, né, na agência você tem a Criação, que cria, e você tinha o

Estúdio que executava os leiautes, tinha ilustrador, layout man, o arte-

finalista, que faziam a artesania da coisa. Em geral, essas pessoas tinham

um desenvolvimento, uma habilidade manual grande no desenho, na

montagem e tal. Como o computador chegou para substituir isso, essas

pessoas nem todas foram aproveitadas — ou a agência julgou que elas

eram capacitadas para usar o computador. E os computadores chegavam

com os programas em inglês, e eu acho que pouquíssimas dessas pessoas

falavam inglês. Então as pessoas que foram contratadas para trabalhar

com computador nessa época eram pessoas ainda oriundas do mundo da

informática. Então a primeira coisa que aconteceu foi essa: saíram esses

profissionais especializados e entraram caras de informática.

O problema é os caras de informática entendiam de computador, só

que não entendiam nada de publicidade, nem do mundo gráfico, eles não

tinham o olho gráfico, não sabiam o que era uma tipologia, um

espacejamento, um corpo de letra, uma cor, um espaço, uma forma, uma

composição. Isso deu trabalho demais para a turma da Criação, porque

eles eram os interlocutores — era assim: a Criação, o homem do

computador e o leiaute ali. E eles não tinham essa prática, não

conseguiam entender. Isso foi a primeira mudança. Uma mudança ruim,

acho que as agências não souberam pegar essas pessoas que já

trabalhavam, que já tinham essa formação, e investir na capacitação

delas, fazer com que elas aprendessem a trabalhar com computador.”

(ENTREVISTADO 6)

As demissões atingiram também o Departamento de Criação:

“Quando eu falei para você que, nesse advento da informatização aí

das agências, se perderam muitos postos de trabalho para Estúdio, alguns

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diretores de arte também não fizeram essa ponte. No momento em que o

Estúdio foi trazido para a sua mesa de trabalho, o seu desktop, os

diretores de arte tiveram que... — ‘Eu tenho que me virar com isso aqui.’

Então, muitos caras com formação que, né, imagina você trabalhar 20

anos de uma maneira e no 21º ano: ‘Olha, esquece aquilo, o negócio

agora é assim... agora você tem que leiautar de uma outra maneira.’

Muita gente não fez essa ponte.” (ENTREVISTADO 1)

Efetivamente, o mercado todo foi afetado. O Entrevistado 7 relata que as

empresas que trabalhavam para as agências fornecendo fotolito também passaram por

esse processo:

“E não dava vazão também, mesmo que todos conseguissem se

adaptar à tecnologia, o mercado não ia absorver essa gente toda, era

muita gente. As agências eram enormes. Os fotolitos antigamente eram

enormes. Hoje em dia um fotolito tem dez cabeças trabalhando,

entendeu? Então, quer dizer, a tecnologia é legal, é bacana, mas, de certa

forma, ela não foi muito humanitária.” (ENTREVISTADO 7)

4.1.4. Oportunidade de empreendedorismo

Um único entrevistado enxerga algo positivo nessa onda de demissões. Segundo

ele, embora muitos profissionais tenham sido definitivamente eliminados da

publicidade, outros que não também tinham mais lugar nos Estúdios das agências

conseguiram se manter no mercado, passando a trabalhar como free lancers ou

montando pequenas empresas que prestam serviços às grandes agências de propaganda .

“Porque, por outro lado, o trabalho também não diminuiu. O trabalho

aumentou. Tem muita oportunidade por aí. Então eu vejo alguns amigos

meus que partiram para abrir seus próprios Estúdios. Eles saem dessas

estruturas tradicionais de agência e abrem seus Estúdios, abrem suas

pequenas agências, pequenos escritórios, por conta própria. Eu posso

citar três casos de pessoas que trabalharam comigo, que foram abrir seus

Estúdios e estão felizes. (...) Eles não se encaixavam mais naquela

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estrutura reduzida, afunilada das agências. (...) Eu acho que, por outro

lado, apesar das agências terem encolhido, o desktop publishing, o design

gráfico estão cada vez mais sendo usados, cada vez mais você tem

recursos disponíveis para isso, em termos de impressão, em termos de

técnica.

Tem umas [pessoas] que desistiram mesmo, foram ‘vender cocada

em Itacaré’. Mas (...) você tem o trabalho de propaganda propriamente

dito, tem o trabalho de ponto-de-venda e uma série de ações

promocionais etc. e nem sempre isso é absorvido pela agência, porque às

vezes não compensa ela colocar um profissional simplesmente para fazer

esse projeto. Agora, supercompensa uma pessoa que tem um escritório

ágil, né? E são orçamentos de três milhões de reais por ano, bruto. Dá

para você viver muito bem. Você rala para caramba, é você e você

mesmo. Você S.A., né, que nem o nome da revista.

Eu acho que realmente o ambiente é sinistro para caramba, mas você

tem que viver, cara. Se eu conheci trinta colegas como eu, que eram

diretores de arte também, hoje tem quinze, talvez dez. Tem muito menos

gente. Mas isso é a ordem natural da economia. O ambiente capitalista é

muito severo em relação a isso, né? Melhor do que a gente para saber

disso, impossível, né, porque na verdade a gente serve também para girar

esse sistema, né, o publicitário é o grande óleo dessa engrenagem. E o

engraçado é que a gente está pagando por ter azeitado uma engrenagem

que está espremendo a gente cada vez mais. Espremendo salários,

espremendo a quantidade de pessoas e tal, mas tem muita gente ali

procurando caminhos alternativos e achando.” (ENTREVISTADO 5)

O parágrafo final desse depoimento está em total consonância com a percepção de

que estaria se configurando um “novo brutalismo” (MORGAN, 2002), conceito exposto

no Capítulo 2. A ironia apontada pelo respondente é que ao mesmo tempo em que a

publicidade potencializa a lucratividade das empresas ao incentivar o consumo dos

produtos e serviços anunciados por seus clientes, os próprios profissionais de

propaganda sofrem as conseqüências dos movimentos de enxugamento dos quadros de

pessoal que vêm afetando o sistema capitalista como um todo.

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Ainda no âmbito positivo da oportunidade, vale destacar que o próprio

computador, como recurso produtivo relativamente acessível, contribui para o

empreendedorismo:

“(...) o diretor de arte faz muito frila, então eu, em casa, posso ter

uma estrutura de agência, um mini-estúdio, posso fazer quase que o

mesmo trabalho que eu faço na minha agência, porque eu tenho uma

maquininha lá. Então, é uma ferramentinha muito poderosa.”

(ENTREVISTADO 1)

4.1.5. Mudanças no trabalho

A suposição 1.2, de que o trabalho do diretor de criação foi alterado pelo advento

do computador, também foi confirmada pelos respondentes. As profissões mudaram,

tanto no Estúdio quanto no Departamento de Criação, como se vê nos depoimentos a

seguir:

“As profissões mudaram. O arte-finalista hoje em dia tem que saber

computador, tem que saber inglês — alguma coisa, alguma noção ele tem

que ter —, tem que saber montar um trabalho. O cara tem que ser mais

curinga, o cara não pode ser só montador.” (ENTREVISTADO 11)

“Antigamente (...), com essa história de Estúdio, o diretor de arte

fazia um rafe, desenhava, passava para o Estúdio, o Estúdio leiautava a

idéia dele. Aquela história que eu te falei, que perderam-se posições de

trabalho no Estúdio, é porque o diretor de arte chamou um pouco para si

essa função de leiautar, né? Tudo bem que você tem assistente e tal, mas

o diretor de arte foi sentar no computador. O diretor de arte, que só

leiautava e entregava tudo para alguém, só criava no papel, ele começou

a entrar no Estúdio. Ele começou a criar no Estúdio, o Estúdio veio para

a mesa do diretor de arte, na verdade, né?

(...) Imagina que pegaram aquelas 20 pessoas que trabalhavam no

Estúdio e botaram essas 20 pessoas em cima de cada mesa. O processo

ficou mais simples para o diretor de arte, né? Acho que ficou mais

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simples. Em relação à execução. A criação continua difícil. A criação é

matar um leão por dia, cara. Papel branco... O zero. E diariamente você

olha para o zero, o zero olha para você, você tem que ter uma relação boa

com ele também.” (ENTREVISTADO 1)

Ou seja, parte dos procedimentos de arte-finalização foi transferida do Estúdio

para o Departamento de Criação. O diretor de arte, que antes apenas se ocupava da

concepção de idéias e delegava a execução dos leiautes para o Estúdio, coordenando o

trabalho desse setor, passou a ter também a atribuição de construir ele mesmo os

leiautes no seu computador. Mesmo assim, existe uma distinção entre esses dois

aspectos:

“Eu acho que o grande barato é a criação mesmo. O computador é

uma etapa do processo e ele não está relacionado diretamente à criação.”

(ENTREVISTADO 1)

O trecho seguinte demonstra claramente que a tecnologia de fato modificou as

relações organizacionais de poder (MORGAN, 2002), conforme mencionado no

Capítulo 2:

“Tinha um rapaz na AGÊNCIA 29* que era chefe de Estúdio, ele me

disse que na época ele coordenava uma equipe de vinte pessoas no

Estúdio. Acima dele estava o diretor de arte. E ele ganhava um salário tão

bom quando o do diretor de arte da AGÊNCIA 29 nessa época. E ele ficava

disputando, o cara comprava um carro novo, ele comprava também, se

ganhava muito dinheiro, entendeu? E de uma hora para outra, quando

chegou o computador, ele viu a equipe dele ser reduzida pela metade,

depois não sei o quê, até sobrar ele e mais outro. E o salário dele hoje em

dia é superbaixo, virou um simples operador. Ele não é mais um chefe de

Estúdio.” (ENTREVISTADO 7)

∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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O Entrevistado 1 mostra que a mudança atingiu inclusive os fornecedores que

prestam serviços de apoio no processo de criação de leiautes. O trabalho deles também

teve que se tornar digital.

“Porque até o trabalho do fotógrafo mudou muito com o

computador, né? O fotógrafo, hoje em dia, o que se pede do fotógrafo é

que o cara já entregue a foto em CD. Então as fotos já estão vindo

tratadas. Em alguns casos, já manipuladas.” (ENTREVISTADO 1)

“Hoje em dia o cara não faz mais a ilustração toda na mão. Ele vai,

faz um rabisco, passa uma caneta Futura, bota num scanner. Escaneado o

traço, ele abre no Illustrator, começa a vetorizar o traço, que aí deixa de

ser um traço, uma imagem, passa a ser um cálculo matemático, um vetor.

Fez aquele vetor ali, você pode ampliar do tamanho que você estiver a

fim que não vai distorcer, não vai acontecer nada — você está mexendo

em escala, ele vai sair de tanto para tanto —, e aí você vai colorir no

computador, você vai dar um negocinho aqui, outro ali no computador,

uma sombrinha, um brilho, e aí tem gente que já está ilustrando no

computador, mais rápido, direto, o cara já faz em vetor. Então é 100%. O

que não for, no segundo passo você vai... esse trabalho já foi digitalizado.

Ou se é um artesanato, ou se é uma ilustração, uma fotografia, não vai

demorar muito para esse material entrar num scanner ou numa fotografia

digital para ser captado para essa ferramenta.” (ENTREVISTADO 3)

4.1.6. Aumento da qualidade

O incremento na precisão dos leiautes também é apontado pelos entrevistados

como uma decorrência do uso do computador no trabalho de direção de arte,

corroborando a afirmação — apresentada no Capítulo 2 — de que um dos impactos

causados pelo avanço da tecnologia é o aumento da sofisticação e das expectativas dos

clientes (TURBAN et al., 2003).

“(...) você gerou mais velocidade, os leiautes ficam mais precisos,

você não tem mais aquela coisa: ‘Ah, aqui vai entrar não sei o quê.’ Não,

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você está vendo lá e até isso acaba gerando a exigência de que eles [os

leiautes] fossem cada vez mais precisos. Porque o cara está vendo a

imagem como ela vai ficar, praticamente, né? Você pode indicar para o

cliente que aquilo é só um exercício: ‘Isso aqui vai melhorar, vai ser mais

estudado, vai ter uma luz diferente, uma sombra diferente, mas é mais ou

menos isso daqui.’ E não é muito diferente daquilo, não, porque senão

você não está valorizando o leiaute. E o cara vai ver com uma qualidade

de impressão que também é estupenda. As impressoras são fantásticas,

em termos de calibragem de cor etc. Isso foi um incremento técnico do

computador.” (ENTREVISTADO 5)

“E eu acho que as apresentações melhoraram muito. Você tem

impressoras cada vez melhores, você tem os custos. Eu acho que o que

mais mudou foi a saída, principalmente as impressoras, os scanners,

porque os computadores mudaram, ganharam mais força e tal, mas os

softwares continuaram fazendo, com mais ou menos presteza, as mesmas

coisas. Mas essa parte de impressão, hoje em dia você — dependendo do

que você estiver fazendo — você pode apresentar um leiaute para o

cliente muito próximo do que seria uma peça final, produzida. É óbvio

que vai depender de fatores aí, você pode dar uma referência do que você

vai buscar, o material que você vai estar usando. Mas você pode

apresentar para o cliente uma coisa muito próxima da peça final. E isso é

graças ao computador. Sem o computador isso não seria... Antigamente

você trabalhava com fotocomposição, tinha uma terceira pessoa que

arrumava a disposição das letras, dos títulos para você, você trabalhava

com pincéis, com pinceladas, então o leiaute forçosamente era mais livre,

era mais... poético até, entendeu? Hoje em dia não, o leiaute, ele pode ser

bem cravadinho com o que vai sair no final.” (ENTREVISTADO 1)

No entanto, de acordo com alguns respondentes, essa melhoria de qualidade de

apresentação teve conseqüências negativas na interação entre as agências e seus

clientes.

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“Antigamente era legal porque você mostrava, fazia tudo na mão,

tinha aquela coisa mais artística, era muito mais arte, e aí quando você

mostrava o produto finalizado para o cliente você gerava uma expectativa

muito maior, e o cliente achava aquilo ‘uau, muito melhor’. Hoje em dia,

não, o leiaute que você mostra para ele é exatamente o que ele quer, ele

já vê o trabalho praticamente finalizado, ele só não vê o trabalho em alta

resolução, no papel que ele quer.” (ENTREVISTADA 8)

“Antigamente você apresentava um leiaute e existia uma mágica, né?

Você apresentava um leiaute cheio de cola, todo colado, todo não sei o

quê, e o cara olhava. E quando ele via impresso, quando ele via aquilo na

prova de prelo, já era aquilo transformado, uma obra acabada. Você via

um projeto e depois você via a obra acabada. Hoje não, você já começa

pela obra acabada, o que é muito bom mas é um problema também.

Quando você chega para apresentar uma peça, você tem que ter a obra

acabada. Tem que ter o texto, tem que ter... tem que estar tudo lá. E isso é

muito ruim, porque você faz um leiaute que é um recorte de fotos, uma

montagem de fotos, que a gente chama de monstro, são fotos em que

você tenta simular uma foto que você vai fazer, e corre o risco de você

ter que fazer aquilo igual, ipsis literis, entendeu? Corre o risco de você

ter que botar o cara na mesma posição... Por isso que hoje em dia você

começa a trabalhar muito com foto recortada, pega o fundo de outra

coisa, ou manipula o fundo... Então eu acho que perdeu muito da magia,

acho que a magia ficou prejudicada. Aquele momento de transformação

não tem mais, você não tem surpresa. (...) O trabalho já começa no final,

a sensação que se tem é essa.” (ENTREVISTADO 11)

“E o cliente também já vê o negócio quase pronto. Por exemplo, esse

anúncio que você está olhando aqui, ele, quando viu, viu isso aqui. No

máximo, o que pode ter mudado é uma coisinha ou outra na foto. Então

fica muito mais fácil para o cliente, porque ele antigamente tinha que

abstrair muito. Ele nunca sabia como ia ser o resultado. A gente tinha

uma vantagem na hora de apresentar.” (ENTREVISTADO 13)

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4.1.7. Possibilidade de ousar mais

Quase metade dos entrevistados afirma que o computador permitiu uma

experimentação maior na criação, em decorrência do aumento da velocidade de

execução do trabalho e devido aos recursos oferecidos pela tecnologia. Os Entrevistados

11 e 13 falam sobre esses dois aspectos:

“Mas eu sou de uma outra época, sou um animal jurássico, eu peguei

papel ainda, montagem de leiaute em papel, uma porção de coisas no

papel eu fazia, fazia arte-final no papel. Então, o que eu vejo no

computador? Eu acho o computador uma ferramenta maravilhosa, uma

ferramenta que veio realmente resolver muita coisa, muitos problemas,

muitas questões, que para a gente viravam questões físicas. ‘Ah, eu quero

fazer isso, isso e isso.’ Não, às vezes você nem fazia, você fazia uma

coisa que era mais fácil do que fazer com xerox, guache, lápis de cor,

tudo ao mesmo tempo. Então eu acho que o computador veio resolver

essa questão.” (ENTREVISTADO 11)

“(...) você não podia ousar tanto. Tinha a dificuldade manual de você

fazer as coisas, sem dizer depois também na produção. Porque o

computador não veio só para ajudar a fazer leiaute — hoje em dia você

consegue fazer qualquer coisa com uma foto: manipular, juntar uma

pessoa na outra, e antigamente você não tinha esse recurso. Então o

computador ajudou não só para você criar, porque ele permite você em

questão de minutos mudar a fonte dez vezes, e antigamente você tinha

que marcar à mão dez vezes a fonte, era muito complicado. E se você

tinha que mudar a cor de fundo era fazer tudo de novo, né?

(...) Por exemplo, a gente pensou numa peça que era um caminhão

do Corpo de Bombeiros no meio da areia, e todo vermelho, com as

logomarcas da Coca-Cola, era para o verão Coca-Cola. Só que esse

caminhão — ele chegou a sair na revista Archive, que é uma revista

alemã, ganhou vários prêmios —, quando a gente foi fotografar o

caminhão do Corpo de Bombeiros, a gente viu que o caminhão que a

gente queria não existia, porque o que tem escada em cima não tem a

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parte de trás. Tem várias composições, então a gente fotografou seis

caminhões, usamos os pneus de um, a parte da frente de outro, a escada

Magirus de outro, todas aquelas coisas cromadas, ou seja, para compor,

só o computador faria isso. (...) Ele te ajuda não só na criação como na

produção também. Até mesmo em filme também. (...) Então hoje o

computador te dá asas, você pode produzir o que você imaginar. Essa é a

grande diferença entre você trabalhar com o computador e a época em

que você não o tinha.” (ENTREVISTADO 13)

4.1.8. “Engessamento” da criação

Se por um lado o computador permite vôos criativos mais ousados, por outro ele

traz o risco de limitar o processo criativo por acomodação. Essa opinião é compartilhada

tanto por diretores de arte que começaram a exercer a profissão antes da chegada do

computador nas agências quanto por diretores de arte cuja experiência data da época

pós-computador. Os trechos a seguir tratam dessa questão e foram retirados dos

depoimentos dos Entrevistados 11 e 9, representantes dessas duas classes citadas,

respectivamente.

“O que eu vejo também com o computador é que para a geração

nova existe uma dificuldade muito grande de eles compreenderem isso,

porque eles nasceram no computador e aí eu acho que vira uma fórmula,

você começa a trabalhar com fórmulas, o próprio computador passa a ser

uma coisa auto-referente. Eu acho que nas universidades ainda se puxa

muito a conceituação fora do computador, para depois você passar para o

computador. Acho que para termos educativos é bom, porque são dois

processos diferentes, entendeu? Por mais que você possa resolver tudo no

computador hoje em dia, você tem que ter uma conceituação fora dessa

realidade, dentro da sua cabeça. Ou no papel, ou no scan, ou rabiscando,

acho que o processo fica melhor, você consegue fechar mais.”

(ENTREVISTADO 11)

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“Eu vejo que o pessoal que vem mais novo, que está com 15, 17

anos, eles são a juventude totalmente século XXI, digital boy mesmo, os

moleques com 15 anos sabem muito de computador, muito, muito, muito

mesmo, muito mais que a gente até, né, com 15 anos. Só que é o que eu

te falei, você sabendo muito computador, de repente te dá tanto recurso,

tanta coisa, que você se afasta da essência da coisa, da arte, de você parar

para pensar, parar para desenhar, parar para... tudo. Tudo na sua vida, né,

você acaba ficando muito... até escravo do computador. Então, de repente

essa galera que vem não é uma galera muito pensante, já é uma galera

meio robotizada de computador, entendeu? ‘Ah, vou apertar um botão,

vai ter um filtro, vai ter isso, vai ter isso, vai ter isso pronto para mim.’ A

galera não vai pensar muito...” (ENTREVISTADO 9)

A pasteurização é outro aspecto da acomodação que alguns respondentes

associam à disseminação do uso do computador:

“Fica tudo com a mesma cara. Muitas vezes as coisas ficam com a

mesma cara... Assim... quem gosta de ficar manipulando muito o

anúncio... botando muito efeito, fazendo muito... O Photoshop, se não

tiver cuidado, vai ficando tudo ‘photoshopado’, a gente fala. Fica tudo...

com aquela cara. O Jair falava assim para mim: ‘Isso é um perigo na mão

das pessoas que não têm muito conhecimento gráfico.’ Porque hoje todo

mundo faz, é muito fácil. (...) Porque o programa você aprende e... abre

uma página, põe uma imagem para um canto, uma imagem para o outro

e... procura uma tipologia e... sai por aí dizendo e fazendo... um monte de

coisa igual. Você senta direto [no computador] e leva mais tempo com

aquela página aberta para fazer alguma coisa do que você parar antes

para pensar, rafear no papel, para sentar já tendo noção do que você quer.

(...) Então eu acho que isso tudo ainda está se adequando, uma coisa à

outra.” (ENTREVISTADO 2)

Outros entrevistados também têm uma opinião semelhante. O Entrevistado 3

associa o “engessamento” da criação à drástica redução dos prazos de execução do

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trabalho e à mudança nas expectativas do cliente diante do aumento da qu alidade dos

leiautes, abordadas anteriormente. O Entrevistado 6 corrobora essa afirmação.

“E com isso o cliente já quer ver a peça dele pronta, na frente dele.

Antes de ser publicada, ele quer ver exatamente o que vai ser. E aí o que

é que acontece? O diretor de arte recebe um briefing às cinco da tarde

que é para o dia seguinte. Ele vai, cria com seu dupla, concebe uma idéia

e vai correr atrás das referências. Eu costumo brincar e dizer que

publicitário e empregada doméstica são as duas únicas profissões que

precisam de referência. (Risos.) O publicitário não consegue viver hoje

sem uma referência. Então, qualquer coisa que ele vai criar, ele vai

buscar em algum site, algum livro, alguma coisa e jogar isso na peça

dele. E aí ele vai, pega a foto linda lá de Nova York, ou Paris, aquele

preto-e-branco maravilhoso, joga no trabalho dele, o cliente acha lindo,

aprova. Aí essa peça, essa foto que já existiu para um outro trabalho,

você vai acabar pegando os mesmos conceitos dessa referência e

seguindo. Quando você não tinha esse recurso, você tinha que

desenvolver esse conceito próprio. Você tinha que desenvolver essa

questão, essa condição. E hoje não, hoje você vai em cima da referência

da referência, então daqui a pouco você vê uma empresa processando a

outra porque tem uma foto de uma modelo com um casaco de gola rulê

que é igual à do concorrente. De repente os dois pegaram a mesma

referência e usaram, né? Então eu acho que acabou a coisa ficando mais

num gesso, ficou mais presa.” (ENTREVISTADO 3)

“(...) é claro que o computador trouxe mais agilidade. E os leiautes

começaram a ficar mais próximos das artes-finais. Isso foi um benefício

muito grande. Antes você fazia uma ilustração, depois ia produzir uma

foto e tal. Então, com o computador, você pôde escanear uma foto e essa

foto já ser próxima da foto que você vai utilizar. Mas isso também

engessou um pouco mais a criação. Porque muitas vezes o leiaute passa a

ter que ser seguido à risca para fazer a foto final, por exemplo. E nem

sempre o leiaute é a referência que está na sua cabeça, mas é a referência

que você encontrou, numa revista, num livro, que deu para você usar.

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Então, ao mesmo tempo em que isso foi um benefício, de estar mais

próximo, foi um prejuízo também, pelo fato de engessar um pouco a

criação.” (ENTREVISTADO 6)

O grande número de idas e vindas no processo de aprovação das peças

publicitárias também acentua, muitas vezes, as limitações criativas típicas desse

trabalho — a atividade da propaganda, por ser uma prestação de serviço, não permite

total liberdade de criação —, chegando a configurar um antagonismo entre criativos e

clientes:

“ENTREVISTADO 2: (...) Em agência, a gente sofre muito, entendeu?

(Risos.) Sofre muito em agência.

PESQUISADORA: (Risos.) Explica um pouco o sofrimento da agência

de propaganda.

ENTREVISTADO 2: Ó, você pega um pedido, de uma campanha, e

você vai, pensa e mostra e não, o conceito é esse, e faz tudo legal para c...

E chega lá, eu não sei, ou é mal apresentada, ou o cliente mesmo é um

cara que nunca entende nada, não gosta de coisa boa, só aprova coisa

mais ou menos... E aquilo volta... E a primeira reação da Criação são as

patadas, só falta querer jogar o negócio fora. E mexe um pouquinho...

tenta salvar. Vai e depois volta de novo... Enfim, a gente também, tinha

uma época em que achava que tudo a gente tinha razão, mas às vezes...

de um tempo para cá eu comecei a pensar também no cliente, também.

Tanto que eu sempre fui contra uma coisa: de ficar premiando anúncio só

porque ele é criativo e só por isso. Eu acho que deveria ser premiado pelo

resultado também.”

Vale a pena ressaltar que as possibilidades de criação nessa profissão nunca foram

ilimitadas também porque a linguagem publicitária necessariamente tem que ser

acessível ao grande público para cumprir sua função de ajudar a vender os bens ou

serviços anunciados:

“Não é onde eu jogo a minha total criatividade, porque é uma

criatividade limitada, você tem que atender a uma demanda, você tem

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que atender a um pedido, você tem que estar comunicando alguma coisa,

entendeu? É uma criatividade meio quadrada, sabe, você tem que se

encaixar naquele modelo criativo, você não pode propor coisas que não

tenham cara de publicidade, você tem que estar naquele padrão de

publicidade, na velha fórmula da publicidade — que ela repete as

mesmas fórmulas sempre. (...) A publicidade trabalha com aquilo que já

está no dia-a-dia das pessoas, ela não lança moda, a publicidade vai atrás

do que já existe e dá àquilo uma cara publicitária, ela não cria tendências,

ela vem logo atrás das tendências.” (ENTREVISTADO 7)

O Entrevistado 11, assim como alguns outros, fala dessa característica da

publicidade em comparação com uma liberdade maior que ele afirma encontrar no

campo do design:

“Eu falo que sou diretor de arte e designer. Eu gosto da palavra

design, eu lembro de quando eu estudei na minha faculdade

[ESDI/UERJ], na época tinha professores que eram formados por uma

escola descendente da Bauhaus, e eles falavam que ‘publicidade é

prostituição’ [fala imitando sotaque alemão]. (Risos.) (...) Eu achava

engraçado isso. Mas eu acho que o design é um campo mais rico, em

termos de pesquisa, de aprofundamento, em termos de liberdade, até,

criativa. Não que a publicidade não seja, mas é muito difícil você vender

carne, produtos de limpeza e ser uma coisa ‘vanguardinha’, botar uma

coisa ilegível só porque acha bonito, não vai rolar isso lá.”

(ENTREVISTADO 11)

4.1.9. Aumento da incerteza e do estresse

A incerteza quanto ao futuro é um aspecto recorrente no discurso dos

respondentes, que a apresentam como algo inerente ao trabalho do publicitário que

pertence ao Departamento de Criação. A predominância de pessoas jovens nas funções

criativas leva à comparação dessa profissão com as de modelo e jogador de futebol,

cujas carreiras também têm na brevidade uma característica marcante. Os entrevistados

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associam essa incerteza ao ritmo intenso de trabalho, à rapidez com que as referências

mudam, à alta rotatividade do mercado e ao tamanho limitado do mercado, como se

verifica no depoimento do Entrevistado 7:

“(...) a publicidade toma muito tempo, ela rouba muito o teu tempo,

então você não tem tempo para se dedicar a outras coisas, você não tem

tempo para mais nada, ainda mais você tendo família. É por isso que cada

vez as pessoas estão trabalhando mais novas em publicidade. É uma

profissão que te suga como se você fosse uma laranja, entendeu? Depois

que acaba o suco, nego te joga fora e te substitui pela laranja nova. Mas é

isso, olha a idade das pessoas. A pessoa mais velha daqui tem 33, eu

acho. É a mais velha aqui da Criação. Infelizmente. É que nem jogador

de futebol: quando não serve mais é substituído. Ou vira diretor de

criação, ou abre a sua própria agência ou vai trabalhar em outra coisa.

Isso é uma constatação, você pode ver. E as pessoas mais velhas não

conseguem mais ter referência — e a publicidade trabalha muito com as

tendências, com as coisas que estão acontecendo, então é difícil a pessoa

ter as referências.

E também o cargo que ela vai ocupando, ela vai ganhando cada vez

mais. Quando a pessoa ganha muito, fica muito mais difícil ela se mover,

e publicidade trabalha muito com contas, né? Conta de luz, de água,

telefone, e conta mesmo. Então, tipo assim, se as coisas aumentarem na

agência, de grana, nego manda embora, nego demite, entendeu? Perdeu

uma conta, demite, manda embora. Então, quando o cara tem um baita

salário, é muito mais difícil ele se mover. O cara que ganha dois, três mil,

ele consegue outro emprego — mesmo assim com dificuldade —, agora

o cara que ganha quinze? O cara que ganha dez? É difícil, não existe

muito espaço para essa gente.

(...) E chega uma hora em que o cara quer prestar mais atenção na

família, quer outros planos, e o cara não consegue mais acompanhar

aquilo, o cara não consegue mais sair às três horas da manhã de uma

agência, entendeu? Vai ficando difícil para uma pessoa de 40, 50 se

adaptar. Então o grande lance da publicidade é você saber que é uma

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profissão temporária. Ou você vai ser o cara — que é um em um milhão

— que vai arrebentar e abrir a sua própria agência, ou vai ser um p...

diretor de criação, ou vai ser um cara premiadíssimo, vai ser a história da

publicidade — e mesmo assim correndo um risco, porque tem várias

‘histórias da publicidade’ aí na rua, entendeu, caras que fizeram história e

que estão com a sua agenciazinha, com seu escritoriozinho minúsculo,

sobrevivendo pegando clientezinho, entendeu, para tentar pagar as contas

em casa. Conheço pelo menos uns três casos de caras que nos anos 70

foram o top da publicidade. Hoje em dia, um deles tem uma agência

minúscula no centro da cidade. Luta, sobrevive pegando continhas. Então

é meio cruel. Por isso é que eu tento me dedicar também a uma outra

profissão — eu sou maluco, né? Masoquista. É uma outra profissão que

não dá dinheiro, é complicado e é um mercado muito difícil, artes

plásticas, mas, enfim, eu tento.” (ENTREVISTADO 7)

Dois bons exemplos de como a rotatividade é alta no setor de propaganda podem

ser encontrados nos depoimentos dos Entrevistados 7 e 2. A modalidade temporária de

trabalho e a mudança constante de empresa são eventos bastante comuns nesse meio,

desde antes do advento da informatização — que veio por sua vez acentuar essa

situação, ao possibilitar a proliferação de trabalhadores free lancers, visto que o

microcomputador é um artigo relativamente acessível, em termos de distribuição e

preço, a uma parcela considerável da população economicamente ativa.

“Enfim, passei por muitas agências, trabalhei muito tempo como

frila, às vezes cobrindo férias. Teve dois anos na minha vida em que eu

não fiquei em agência fixo, ficava um mês numa, dois meses na outra,

teve um ano em que eu cheguei a trabalhar em nove agências. Então é

legal, eu conheci muita gente.” (ENTREVISTADO 7)

“Eu saí, voltei para a AGÊNCIA 4, fiquei mais um tempo, depois eu

fui para a AGÊNCIA 8, da Nádia. Quem me chamou foi o Heleno e o

Rinaldo. Aí eu fiquei lá uns dois anos com a Nádia. Depois a agência

acabou, essa AGÊNCIA 8, virou... AGÊNCIA 9, que hoje é associada com a

AGÊNCIA 10... fiquei na AGÊNCIA 9 mais um ano e pouco. Depois essa

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agência também sumiu, virou uma outra, que é a AGÊNCIA 11, AGÊNCIA

11-b de São Paulo com a AGÊNCIA 11-c internacional. Aí ficamos um

tempo lá no Centro, depois fomos para Ipanema, e aí ficou mais um

ano... aí nós fomos demitidos, eu e uma galera, não sei por quê, mas

continuamos trabalhando na agência como free lancer, mas...

Depois, enfim, depois passou mais um tempinho e aí a Nádia abriu a

agência dela, que é a AGÊNCIA 12. Aí, além de ter feito a logomarca da

agência e ter já todo esse tempo com a Nádia, acabei ficando lá mais um

ano e pouco.

Depois eu saí, eu pedi demissão. Eu e o meu dupla, o Eduardo. Aí eu

fiquei um tempo assim, desempregado, uns três meses. Depois eu fui na

AGÊNCIA 13 mostrar meu portfólio, aí tinha uma vaga, eu fiquei lá na

AGÊNCIA 13. Na AGÊNCIA 13 eu fiquei uns dois anos e pouco. Foi a

última agência em que eu fiquei fixo. Depois disso eu fiz free lance, fiz

na AGÊNCIA 14, fiz na AGÊNCIA 15, fiz na AGÊNCIA 13 novamente... E já

fiz coisas assim de design mesmo, capa de CD, para outras pessoas, é...

anúncio, coisinha para agência pequena e... é isso.” (ENTREVISTADO 2)

Esse trecho selecionado do Entrevistado 2 também exemplifica outro aspecto da

rotatividade característica do mercado publicitário: o dinamismo dos movimentos de

surgimento, extinção, fusão e aquisição de agências.

O Entrevistado 6 faz uma associação entre essa instabilidade e o baixo nível de

investimento das agências no treinamento de seus profissionais:

“Claro, tem vários modelos de agência, tem as agências pequenas, as

multinacionais e tal, mas acho que no geral elas investem pouco na

qualificação dos profissionais, até porque o mercado é muito rápido,

muito volátil — era até mais, as pessoas mudavam de agência com mais

velocidade, então: ‘Deixa que ele se especializa, não vou investir nele,

daqui a seis meses ele não está mais trabalhando aqui e tal.’ Ao mesmo

tempo em que as agências sempre tiveram essa cultura, ou pelo menos

esse mito de que pagam bem, também tem essa história de que elas não

investem no profissional para que ele fique na agência: ‘Deixa ele lá, vai

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trabalhando e tal, se ele quiser, ele que se especialize fora.’”

(ENTREVISTADO 6)

O Entrevistado 9, assim como outros, tem total consciência de que não vai

conseguir trabalhar como diretor de arte em publicidade a vida inteira, ilustrando

claramente a questão da rapidez com que o saber técnico dos profissionais atuais está

sujeito à obsolescência (LÉVY, 1999), abordada no Capítulo 2.

“É, acho que a própria tecnologia está numa virada aí, de repente

sabe lá que direção vai ser. Pode acontecer comigo.” (ENTREVISTADO 9)

Curiosamente, essa percepção do caráter inesperado dos rumos que a tecnologia

pode tomar foi mencionada pelo respondente que tem o maior tempo de uso de

computador — o Entrevistado 9, que, aos 27 anos de idade e 5 de profissão, declara ser

usuário de informática já há 17 anos.

O Entrevistado 13 completa a abordagem desse assunto falando também do alto

nível de cobrança existente na profissão. Confirmando informações encontradas na

literatura acadêmica, o depoimento a seguir mostra o efeito intensificador do estresse no

trabalho que a tecnologia causou ao criar uma expectativa de ação instantânea, mesmo

diante de problemas difíceis (MORGAN, 2002).

“Porque é muito estressante essa profissão. Você não almoça

seguidamente, fica até as três, quatro da manhã. Imagina você ter quatro

horas para criar um filme, criar um anúncio. Uma coisa é uma coisa

mecânica, que você pega e... Agora criação ninguém domina, né? Acaba

saindo, com a experiência sai, mas é uma pressão. O que acontece nessa

profissão é o seguinte: se você foi muito bom durante um ano e se no ano

que vem você não for bom, o seu salário também não vai ser bom,

porque independentemente de você estar no mercado, não é o que você

foi, é o que você está sendo. É tipo um jogador de futebol. Tem

profissões em que você pode — um médico pode ficar anos e anos como

médico, não tem aquela pressão. Tem que estudar sempre, né, mas não

tem aquela pressão. O jogador de futebol tem. A gente é muito parecido

com modelo e jogador de futebol. Se você está ganhando muitos prêmios,

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está fazendo um bom trabalho, você é valorizado. Você pode ter sido o

melhor diretor de arte do mundo, se em dois anos o seu trabalho não está

legal, você começa a descer ladeira abaixo. Incrível. Foi o que aconteceu

quando veio o computador. Muitos diretores de arte já mais antigos

relutaram com o computador e hoje em dia estão fora do mercado. Todo

o mundo que foi contra o computador está fora do mercado. Não

sobreviveu.” (ENTREVISTADO 13)

Esses depoimentos dão uma idéia bem clara de como são fragmentados os laços

de compromisso entre as agências de propaganda e seus profissionais de criação, dentro

do conceito de “capitalismo flexível” (SENNETT, 2001), exposto no Capítulo 2.

Por outro lado, mesmo com tantos aspectos negativos da prática do trabalho, a

profissão de publicitário continua sendo muito procurada e a habilitação em Publicidade

e Propaganda dos cursos de graduação em Comunicação Social continua tendo uma das

mais altas relações candidato-vaga do vestibular. Os dois trechos selecionados a seguir

mostram que, do ponto de vista dos diretores de arte, a possibilidade de exercer a

criatividade é um dos principais motivos para a ocorrência desse fato. O Entrevistado 12

tem 28 anos de idade e 3 de experiência nessa função, já o Entrevistado 13 tem 39 anos

e 14 de experiência profissional.

“Na verdade, eu trabalho nessa área — eu, particularmente —

porque eu aprendi a fazer isso. Um amigo meu me chamou para trabalhar

em agência e aí é que eu comecei a desenvolver. Depois passei a gostar

muito. Acho que uma coisa que é muito interessante é você criar uma

peça e você estar em casa e receber essa peça. Então, isso cada vez mais

foi motivante [sic] para eu continuar nessa área. Estou trabalhando

porque eu gosto muito do que eu faço mesmo e acho que é... o salário é

legal, você poder comparar com determinadas profissões... Eu acho que o

salário é legal e é criativo, eu gosto. Acho que é você poder viajar, não

viajar só com o trabalho, viajar com a cabeça das pessoas, nas reações, é

interessante.” (ENTREVISTADO 12)

“O meu pai tinha restaurante e eu ficava no restaurante dele, aí dos

quinze aos dezoito anos era dono de restaurante. Odiava aquilo, de

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segunda a segunda. (...) Acordar às quatro da manhã e dormir às onze

horas. Aqui também acontece a mesma coisa, mas eu não gostava

daquilo, né? Aí tinha um primo meu que morava no Rio e era médico,

tinha muito sucesso. Na época a gente era uma família muito humilde, e

tinha aquele negócio: ‘Ah, se você for médico vai ganhar dinheiro.’

Médico, engenheiro, advogado eram profissões que davam dinheiro. E eu

vim para o Rio para fazer medicina. Só que eu escrevia poesia, adorava

escrever e esse meu primo — que já tinha filho da minha idade — disse:

‘Poxa, eu estou achando que você é não é muito para medicina. Você

devia fazer jornalismo, não sei o quê.’ Aí eu acabei não passando no

vestibular de medicina, porque eu estava há muito tempo parado, sem

estudar, tinha me preparado só por seis meses, e para não ficar parado

resolvi fazer um vestibular para comunicação, para jornalismo, né? Eu

fui fazer, passei, liguei para o meu pai e falei: ‘Vou ser jornalista.’ Ele

desligou o telefone, né? (...) (Risos.) Eu falei: ‘Pai, caiu a ligação.’ Não,

não caiu, né? Na cabeça dele, ele achava que com jornalismo eu ia

morrer de fome.

Na faculdade, você entrava para fazer jornalismo ou propaganda e só

optava depois do quarto período. Eu entrei com a idéia de fazer

jornalismo, só que o primeiro estágio que pintou foi numa editora e lá eu

vi mais alguma coisa de propaganda e comecei a gostar daquilo. Depois

pintou um estágio na AGÊNCIA 4. Comecei a gostar muito mais de

propaganda; jornalismo, para mim, não dava para exercer a minha

criatividade. Você criar, inventar coisas, né? Fazer de uma maneira

diferente. E o jornalismo não te permitia isso. E a propaganda permitia.

(...) E por coincidência é uma profissão que eu adoro, acho que não me

via em outra profissão.

(...) é uma profissão também que... ela mexe muito com o teu ego,

porque cada peça que você faz, aquilo vai para o teu portfólio. É uma

coisa que você criou, você pode ganhar prêmio, que te valoriza

profissionalmente, é uma profissão em que cada vez é uma coisa

diferente, mesmo que seja a mesma conta, um desafio diferente, né?

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Então, tem isso de bacana na profissão, sabe? Ela não é enfadonha.

Imagina se eu fosse um arquiteto e tivesse que esperar um ano para

terminar um projeto, dois anos! Ah, a gente aqui, se o negócio passa de

uma semana a gente já fica desesperado, ‘meu Deus, isso não está

pronto!’, né? Para você ter uma idéia, a gente está com doze filmes em

produção nessa semana. É muito dinâmico o negócio, mas por outro lado

é uma cachaça. Porque, no fundo, eu trabalho por prazer. Ao mesmo

tempo em que eu sou um ‘vendedor’, tem um lado também de prazer, de

você falar: ‘Caramba, como é que eu criei isso?’ Você vê o papel em

branco e quando a campanha fica pronta, ‘ah, como é que isso saiu?’.”

(ENTREVISTADO 13)

4.2. Tempo de experiência profissional e de uso de computador

O quadro a seguir apresenta informações relativas à idade, ao tempo de

experiência profissional em direção de arte, ao tempo de uso de computador em geral e

à formação universitária dos entrevistados. O Anexo 7.14 contém um quadro com as

respostas dadas às perguntas com alternativas fixas.

A suposição 2.1, de que o primeiro contato dos diretores de arte com maior tempo

de experiência profissional ocorreu no ambiente de trabalho, foi confirmada pelo relato

dos quatro entrevistados mais experientes — o Entrevistado 2, com 27 anos de

experiência em direção de arte; o Entrevistado 13, com 14 anos de experiência; o

Entrevistado 5 e o Entrevistado 6, ambos com 12 anos de experiência nessa área.

Já a suposição 5.1, de que os diretores de arte que aprenderam a usar computador

mais tarde têm menor facilidade em lidar com ele, não foi confirmada na análise dos

resultados obtidos.

Foram constatadas uma correlação positiva (C = 0,090 e S = 0,000) entre a idade e

a experiência profissional dos entrevistados, uma correlação negativa (C = –0,593 e S =

0,033) entre a experiência profissional e a facilidade de uso percebida e uma correlação

positiva (C = 0,546 e S = 0,050) entre a motivação extrínseca (a pressão social e a

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utilidade percebidas) e a experiência profissional, indicando que os diretores de arte

mais experientes são também os que têm mais idade, acham mais difícil usar o

computador no seu trabalho e são mais motivados por fatores extrínsecos em relação ao

uso dessa tecnologia. A existência dessas duas últimas correlações corrobora o resultado

encontrado por Dias (2001) de que os estudantes de MBA, que eram também os que

tinham maior experiência profissional, tinham a menor facilidade de uso de sistemas de

informação em relação às duas outras classes analisadas. Não se encontraram

correlações significantes entre o tempo de uso de computador e a percepção de

facilidade de uso.

Quadro 2: Informações selecionadas sobre os entrevistados

Idade (anos) Experiência

profissional em

direção de arte (anos)

Tempo de uso de

computador em

geral (anos)

Formação

universitária

Entrevistado 1 33 9 13 Desenho Industrial

Entrevistado 2 48 27 7 Não tem

Entrevistado 3 30 9 13 Não tem

Entrevistada 4 30 10 9 Desenho Industrial

Entrevistado 5 31 12 10 Prop. e Publicidade

Entrevistado 6 36 12 8 Prop. e Publicidade

Entrevistado 7 31 8 10 Desenho Industrial

Entrevistada 8 30 2,5 10 Desenho Industrial

Entrevistado 9 27 5 17 Prop. e Publicidade

Entrevistada 10 21 0,7 8 Desenho Industrial

Entrevistado 11 38 10 11 Desenho Industrial

Entrevistado 12 28 3 6 Não tem

Entrevistado 13 39 14 7 Jornalismo

Média 32,46 9,40 9,92

Tais aspectos podem ser notados claramente nos depoimentos dos Entrevistados 2

e 13. O Entrevistado 2 é o mais velho dos respondentes (tinha 48 anos de idade na época

em que as entrevistas foram realizadas) e o que tinha o maior tempo de experiência

profissional em direção de arte — 27 anos, dos quais 20 foram decorridos sem o uso do

computador no trabalho (ao mesmo tempo, ele é um dos que usam computador há

menos tempo: apenas 7 anos). Esse Entrevistado 2 atribuiu apenas cinco, numa escala

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de zero a dez, à sua facilidade de uso de computador. Sobre esse aspecto, ele diz o

seguinte:

“(...) ainda tenho muita dificuldade. (...) Mas eu procuro o tempo

todo mais, falo assim: ‘Não, não posso ser distraído.’ Eu tenho que, em

determinadas coisas, pegar e anotar. Agora eu já tenho mais cuidado. Eu

acho que a gente está meio numa decadência também, em relação a...

deixa eu explicar: não é o trabalho do diretor de arte, é como as agências

estão agindo, botando você praticamente quase para finalizar o trabalho,

acho que diretor de arte está aqui é para criar e para fazer, mas não.

Agora você tem que se preocupar com tanta coisa! Se a imagem está em

alta [alta resolução], com a burocracia do negócio. Eu sempre detestei

burocracia. E o computador tem burocracia no meio. Esse é o problema.

Tem burocracia. (...) Eu estou fazendo um anúncio, sozinho. Eu vou ter

que finalizar ele. Uns tempos atrás, há um ano e pouco, eu ficava em

pânico. Às vezes eu pegava e dava um tanto para um amiguinho, alguém

finalizar, só para eu não fazer aquilo. (Risos.)

Mas já tenho mais segurança com isso. Estou cada vez tendo mais. E

cada vez mais estou vendo que vou ter que fazer sozinho. (...)

Acho que o... medo mesmo, isso... isso já passou. Eu tenho é que...

cada dia que passa emburacar mais. Às vezes eu fico pensando assim:

agora eu não estou podendo fazer isso, mas eu quero aprender a mexer no

Flash, que eu acho importante à beça, eu gosto de animação... (...) Eu fico

vendo o Tocha, ele começou a mexer no Flash assim sem fazer curso,

sem nada, até porque o Tocha já está há muito tempo mexendo em

computador, para o Tocha não é problema, entendeu? Tem gente que é

assim, para ele aquilo não é problema.” (ENTREVISTADO 2)

É interessante notar que o Entrevistado 2 menciona a palavra “pânico” em relação

ao computador nada menos que seis vezes no decorrer da entrevista. Ele menciona

também outros termos relacionados a esse sentimento, tais como “rejeição”,

“obstáculo”, “lamentava”, “bloqueando”, “dificuldade”, “medo”, “chato”, “falta de

paciência”.

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“Aí ficava assim: os que entravam, os que já estavam mexendo mais,

ficavam mais tempo com o computador. E eu assim, ó, só ficava

rafeando, passando para o operador e ficando do lado. Mas ainda com

uma rejeição muito grande, achando aquilo muito, muito chato. E eu

ainda acho, ainda, até hoje, ainda, que alguns programas ainda não

fizeram a coisa pensando mais só no designer, no cara que não tem

paciência, que quer tudo mais... assim, apertar e já estar ali, tudo mais...

rápido. E estão melhorando, os programas cada dia vão ficando mais

simples.

Mas eu lamentava muito (...), ao mesmo tempo em que eu queria

aprender, mas parece... eu ficava com um obstáculo, parece que eu não ia

conseguir. (...)

O pânico. É, o pânico, falava assim: ‘Como é que vai ser (...) se eu

não sei mexer nisso?’ Fico mexendo com o auxílio dos outros, demais...”

(ENTREVISTADO 2)

Aparentemente, esse pânico pertence ao passado:

“Olha, o dia em que eu comprei [um computador] e pus em casa, eu

sabia que ali já tinha... pronto, já tinha passado o... pânico.”

(ENTREVISTADO 2)

Já o Entrevistado 13 tinha 39 anos quando as entrevistas foram realizadas e o

segundo maior tempo de experiência profissional em direção de arte — 14 anos, dos

quais metade foram decorridos sem o uso do computador no trabalho (ele também é um

dos que usam computador há menos tempo: apenas 7 anos). Dentre todos os

respondentes, o Entrevistado 13 foi o que atribuiu o menor grau, quatro, à sua facilidade

de uso de computador. Sobre essa situação, ele diz o seguinte:

“Eu daria quatro, porque há muito tempo eu faço dupla com diretor

de criação, então, na maioria das agências em que trabalhei, eu tinha mais

tempo de criar do que ficar fazendo a parte final mesmo. Porque eu

sempre trabalhei muito com assistente. E às vezes eu não tinha tempo.

Mesmo aqui, no começo, tinha três redatores e eu e o assistente. (...)

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Então, a minha relação com o computador é tipo... o meu foco mais é

criar. É claro que também é legal manipular, você quando vai para o

computador acaba mudando a sua idéia, muitas vezes para melhor, né,

mas eu prefiro criar do que ficar mexendo.

(...) Eu não tenho muita facilidade, não sou muito tecnológico, não.

Por isso é que para mim não serve um som, um telefone com muita

tecnologia, eu não sou curioso para ver essas coisas.

(...) eu acho que hoje em dia o computador é uma grande ferramenta

de trabalho. E se tiver alguém para trabalhar nele para mim, melhor

ainda. (Risos.)” (ENTREVISTADO 13)

Esse respondente faz parte de uma minoria privilegiada: durante sua trajetória, ele

acumulou muitos prêmios e sempre teve uma posição de destaque nas agências em que

trabalhou. Além disso, como essas agências em geral eram de grande porte, o

Entrevistado 13 sempre teve assistentes, uma condição que até hoje o desincumbe da

tarefa de trabalhar diretamente na etapa de construção dos leiautes. Ou seja, ele é um

dos poucos diretores de arte que podem se dedicar quase integralmente ao aspecto

puramente criativo da profissão: o de conceber, junto com o redator com quem compõe

uma dupla de criação, as peças publicitárias que depois serão materializadas pelos

assistentes de direção de arte.

O Entrevistado 5 relata que é cada vez mais raro o diretor de arte dispor de um

assistente:

“Hoje eu tenho que finalizar as coisas, porque eu não tenho

assistente, quer dizer, trabalho isoladamente. Mas essa não é a posição

certa do diretor de arte. O diretor de arte é um criador também. Tanto é

que ele funciona com o redator, ele vai desenvolver conceitualmente,

visualmente a peça. O trabalho de criação tem que ser feito junto com o

redator, ele não pode se isolar. E lá em São Paulo todo diretor tinha o seu

assistente. ‘Olha, eu não vou perder tempo escaneando isso daqui,

manipulando essa imagem. Você trata as coisas para mim, me dá tantas

opções e eu monto o leiaute no final. Você vai preparar para mim.’ Só

que hoje isso é muito raro, os assistentes. Então os diretores de arte têm

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que trabalhar no sábado, trabalhar no domingo... porque são eles que têm

que concluir as imagens.” (ENTREVISTADO 5)

Os resultados também apresentam uma correlação negativa (C = –0,560 e S =

0,047) entre o tempo de uso do computador e a pressão social percebida, sugerindo que

aqueles que usam computador há menos tempo sentem maior pressão social. Isso se

verifica no discurso do Entrevistado 13, que tem a segunda maior experiência

profissional, usa computador há pouco tempo e, como muitos outros, classificou a

pressão social com grau dez:

“Hoje em dia, o diretor de arte que não sabe usar computador não é

diretor de arte. Um exemplo bom é quando alguém vem pegar estágio na

agência. A primeira coisa que eu pergunto é: ‘Você sabe mexer em

Photoshop, manipular bem e trabalhar no Quark?’ Se o cara falar: ‘Não’,

então: ‘Você vai aprender primeiro’. Porque, se eu colocar alguém que

não sabe no mínimo isso, ele não vai me ajudar e eu não vou poder

passar trabalho para ele. Eu não tenho como ensiná-lo. É um requisito

mínimo você saber trabalhar nesses programas.” (ENTREVISTADO 13)

O Entrevistado 2, que atribuiu grau dez à pressão social e é o respondente com a

menor relação entre tempo de uso de computador e tempo de experiência profissional,

também corrobora essa correlação:

“Então eu acho que isso tudo ainda está se adequando, uma coisa à

outra. Mas... a mudança foi... eu me senti muito aliviado quando eu

comecei a ver que eu não precisava, não ficava dependendo de... Porque

muita gente passa a não entender mais, aí trata você... Se você não tiver

cuidado, você vai ficar como uma pessoa ultrapassada, que não

acompanhou.” (ENTREVISTADO 2)

O Entrevistado 9, cuja experiência profissional na área era de 5 anos quando a

entrevista foi feita e sempre trabalhou num ambiente já informatizado, confirma essa

impressão:

“(...) hoje em dia você tem que saber mexer no computador,

entendeu? Você não tem como leiautar uma coisa no papel, cada vez

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você trabalha mais, tem menos prazo, todos os anúncios, todas as peças,

é tudo fechado em computador. É feito no computador, então o cara tem

que saber. Hoje em dia... quem não sabe eu acho que é até malvisto, né,

como um cara atrasado.” (ENTREVISTADO 9)

Essas três últimas citações mostram também um pouco do conflito organizacional

ocorrido no período de transição, frente à modificação do equilíbrio de poder existente

— os diretores de arte mais experientes e que não conseguiram se adaptar ao uso do

computador foram eliminados desse mercado, permitindo a ascensão de um novo tipo

de profissional, muitas vezes menos experiente mas com maior domínio da tecnologia.

Essa nova abertura profissional fica evidente no discurso de alguns respondentes:

“O meu primeiro emprego em propaganda foi como assistente de

computação gráfica. Na época se chamava computação gráfica ainda. A

primeira vez que compraram os meus serviços, compraram o meu

conhecimento técnico, o meu conhecimento de programa e de rede e tal.

Então, eu posso dizer que eu entrei na propaganda, entrei na direção de

arte — não no design —, entrei na propaganda via ele, foi o computador

que me arranjou emprego.” (ENTREVISTADO 1)

“Eu comecei a trabalhar em agência na verdade como assistente de

atendimento. Um amigo meu já trabalhava numa agência, ele era mídia, e

estavam precisando de uma pessoa para dar um suporte para o

atendimento. Então eu comecei a trabalhar com a Nádia Rebouças,

ajudando ela em planejamento, e depois eu passei a estagiar no Estúdio,

na Criação. Esse foi o meu primeiro contato com agência. Dali eu

comecei a trabalhar com os softwares que a agência costumava usar. E

foi quando o Macintosh começou a entrar muito no mercado, pelo menos

aqui no Rio. Aí uma agência internacional incorporou a nossa agência,

muitas pessoas saíram e eu aproveitei esse tempo para aprender

justamente a trabalhar com o Mac. O Mac estava chegando, era uma

novidade. Aí eu fui trabalhar num fotolito — fui trabalhar não, me

ofereci como estagiário —, fiquei lá, aprendi a trabalhar, e essa mesma

agência me chamou depois.” (ENTREVISTADO 12)

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Outro trecho interessante é o que vem a seguir, no qual o Entrevistado 2 associa a

pressão social e a rejeição que ele sentia em relação ao computador, pois significava ter

que reaprender como fazer o seu trabalho e de uma forma totalmente nova, com uma

ferramenta que para ele não era nem um pouco fácil usar.

“Como mais ou menos uma preguiça. E saber que aquela era mais

uma m... que eu ia ter que aprender, que o outro [o método tradicional de

construção de leiautes], eu já tinha mais um dom. E aquele ali, eu estava

sendo obrigado a aprender! Você entendeu? Estava sendo obrigado! Eu

fui me aprimorando, mas eu não tinha dificuldade, porque eu já tinha

aquela coisa de desenhar, já era uma coisa supernata, sabe, eu olhar uma

tipologia e ficar fazendo um título de um anúncio. A gente desenhava na

mão, com lápis mesmo, com manteiga [papel-manteiga], depois passava,

depois pintava... Na hora de pintar, então, eu adorava, porque, pô, fazer

aquele contorninho todo com guache... E a gente trabalhava com material

de primeira. Como hoje a computação também, na época também o nosso

material sempre foi o melhor, tudo era profissional, entendeu? Então eu

falei: ‘P..., de novo? Agora eu vou ter que pegar e ficar abrindo esse

monte de janelinha... ficar descobrindo este monte de m... que parece que

é fácil?’ E vou falar uma coisa: não é fácil p... nenhuma. Ainda mais

quando você fica criando rejeição, que você fica... bloqueando mais. Não

é tão fácil, não. O negócio é você... sentar para fazer mesmo e contar com

a ajuda, né, porque até aqui deu o nosso jeito mesmo, brasileiro, não sei

se em outros lugares também as pessoas começaram a aprender assim.

Do jeito que um cara vai aprendendo, que às vezes é um pouco errado,

ele vai passando para o outro. (Risos.) E é assim que todo mundo foi

aprendendo a mexer em computador.” (ENTREVISTADO 2)

Curiosamente, esse mesmo respondente — que ao longo da entrevista falou

enfaticamente de aspectos de pânico e rejeição ao computador e deixou transparecer um

claro saudosismo da época pré-computador, na qual os leiautes eram feitos à mão —

atribuiu nota máxima ao prazer percebido no uso do computador, quando seria de se

esperar um grau bem mais baixo. Uma explicação para essa aparente contradição

poderia ser justamente a questão da pressão social, o receio de, em suas próprias

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palavras, parecer “uma pessoa ultrapassada, que não acompanhou” a evolução da

tecnologia. Por outro lado, deve-se considerar a possibilidade de que o prazer tenha

aumentado gradativamente com o aprendizado e o passar do tempo.

4.3. Peso da pressão social

A forte influência da pressão social é sentida em todos os depoimentos,

confirmando a suposição 4.1, de que todos os diretores de arte sentem um alto grau de

pressão social em relação a saber usar computador no ambiente profissional. Dos 13

entrevistados, 11 atribuíram grau máximo a esse fator. A comparação entre as médias

dos valores atribuídos a cada um dos quatro fatores analisados apresentou os seguintes

resultados:

§ A importância (S = 0,014) da pressão social (média = 9,77) é maior do que a do

prazer (média = 7,92).

§ A importância (S = 0,023) da pressão social (média = 9,77) é maior do que a da

facilidade de uso (média = 8,31).

§ A importância da pressão social (média = 9,77) é maior do que a da utilidade

(média = 9,15), no entanto não é significante.

Essas informações não confirmam a suposição 6.1, de que a utilidade percebida é

o principal fator motivacional para o uso de computador. Essa suposição se apoiava nas

conclusões de um estudo de Igbaria et al. (1996), que levava em conta todos os aspectos

considerados na presente pesquisa, além de outros. Essa pesquisa, no entanto, não

tratava especificamente de situações em que a tecnologia era uso mandatório, como é o

caso do estudo que está sendo analisado. Além disso, a pergunta sobre utilidade

percebida teve algumas respostas — da Entrevistada 8 e do Entrevistado 12, por

exemplo — que fizeram uma distinção quanto ao âmbito em que essa utilidade estaria

sendo avaliada: na criação ou na execução das peças. Caso a pergunta tivesse sido

formulada de forma mais específica, provavelmente a média das respostas teria sido

ainda mais alta. Ainda assim talvez não chegaria à média atingida pelo fator da pressão

social.

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As inferências listadas podem ser notadas mais claramente nas respostas dos

Entrevistados 2, 3 e 13, que atribuíram grau bastante baixos para o prazer percebido ou

a facilidade percebida e, por outro lado, nota máxima para a pressão social percebida e a

utilidade percebida. O Entrevistado 3 deu a menor classificação (três) de todas para o

fator do prazer:

“Eu acho um mal necessário. Eu não sou apaixonado, não sou aquele

cara que fala n linguagens. Eu não sei nada disso. Eu chego lá, abro um

programinha... Tem uma coisa que me deixa revoltado: tudo é em inglês.

Isso é uma falta de respeito muito grande, um país que consome o que

consome, a gente tem que estar in roaming, web, deletar, download...

Poxa, será que a gente não tem isso no nosso vocabulário? Eu sou

brasileiro, bota aí em português.

É que eu nunca gostei de videogame , dessas coisas eletrônicas,

fliperama. Quem curtia isso na infância provavelmente deve curtir o

computador, deve ficar lá... Como a minha infância era aquela infância

de subúrbio, aquela coisa mais... corre descalço para jogar bola, dá uma

topada no paralelepípedo, vai para casa com o dedo inchado, corre, sobe

na árvore, no fim de tarde vamos no quintal da fulana pegar manga...

Então isso talvez me deixou um pouco longe das tecnologias da época e,

como tudo é um processo, quando chegou aqui eu não ligo muito, não.”

(ENTREVISTADO 3)

Os trechos referentes aos baixos valores atribuídos pelos Entrevistados 2 e 13 ao

fator da facilidade de uso já foram reproduzidos no item 4.2, que trata das relações entre

o tempo de uso de computador e a experiência profissional dos respondentes.

A pressão social é tamanha que pode-se classificar como obrigatório o uso do

computador na profissão de diretor de arte no mercado publicitário. Nas palavras dos

Entrevistados 1 e 11:

“Hoje em dia, o diretor de arte, ele já tem que, além da formação em

comunicação, de conceituação e tal, ele tem que ter uma formação

técnica. Esse cara, ele tem que saber Macintosh, entendeu? (...)

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Hoje em dia, todo mundo tem que saber. Quer dizer, um profissional

hoje, ele é avaliado segundo vários critérios. O principal é, primeiro, a

criatividade do cara, a capacidade de execução, a qualidade de

referências e tal, e o resultado final do trabalho... Mas tem um pré-

requisito lá que é o seguinte: se o cara não sabe Mac, se não sabe

Photoshop, o diretor de arte, ele já tem que vir de fábrica com esse,

entendeu? Ele já vem de fábrica com o Photoshop, senão... Acho que não

tem mais, assim, diretor de arte que não mexe nada... No mínimo ele tem

que saber o que é que programa pode, o que é que programa possibilita a

ele. Não pode pedir uma coisa esdrúxula, então... tem que saber, tem que

saber.” (ENTREVISTADO 1)

“Ah, eu acho que a pressão é grande. É assim: se a pessoa tem

dificuldade com isso, é melhor não ser diretor de arte.” (ENTREVISTADO

11)

No entanto, se por um lado o mercado exige do diretor de arte que ele saiba

construir leiautes no computador, por outro não requer domínio total dos programas. O

Entrevistado 6 explica esse ponto com detalhes:

“(...) tem etapas diferenciadas. O que é que um computador faz, né,

quais são os usos dele? Primeiro, para o diretor de arte, é o uso do

leiaute, da diagramação. Então são os programas como Quark Xpress,

FreeHand, Illustrator. O domínio desses programas aí é fundamental,

embora no dia-a-dia da agência você não use esses programas com toda a

potência que eles têm; você precisa ter um conhecimento de 80, 90% do

programa em si. Depois tem o Photoshop, que é o programa de

tratamento de imagens, em que você faz retoques, você usa as

fotografias, escaneia. O diretor de arte usa bastante ele, mas ele não

precisa dominar completamente, porque vai usar só para leiaute, na hora

de fazer uma finalização vai ter um ilustrador, vai ter um manipulador de

imagens, que aí, sim, precisa dominar o programa. Então, eu acho que o

diretor de arte precisa conhecer, do Photoshop, 70%. Ele tem que

trabalhar o básico. E tem a parte mais técnica de finalização, de

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calibragem de cores e tal, que os diretores de arte em geral conhecem

muito pouco disso, e é o Estúdio, a finalização que domina mais. O

diretor de arte em geral domina 50% disso. (...)

É impossível você trabalhar numa agência como diretor de arte sem

saber usar o computador. Impossível. Mas tem essas etapas. Então eu

acho que, na média, você tem que — do que ele oferece — dominar ali

70%. Do que ele oferece mesmo, porque ele oferece muito. 70% não é

pouco, não. Ele realmente oferece muita coisa, só que tem pontos aí que

não são necessários no dia-a-dia.

(...) Por mais que criação seja uma coisa nova a cada dia, o processo

é meio repetitivo. Você vai fazer um leiaute, você precisa de imagens,

letras, ilustrações, jogar com isso. Por exemplo, existe o 3D. E em

agência ninguém usa 3D, ninguém sabe usar 3D, praticamente. E não faz

falta. Porque, quando você precisa, você contrata um ilustrador para isso.

(...) claro que o cara que sabe pode até acrescentar isso ao trabalho dele,

se for o caso, né, mas, não sabendo, não vai ser exigido.”

(ENTREVISTADO 6)

4.4. Motivadores extrínsecos e motivadores intrínsecos

A menor variação de resultados ocorreu em relação à pressão social percebida, um

fator extrínseco, seguida da utilidade percebida, outro fator extrínseco. A motivação

extrínseca (média = 9,46), expressa nos fatores da utilidade e da pressão social,

predomina (S = 0,021) sobre a motivação intrínseca (média = 8,12), representada pelos

fatores do prazer e da facilidade de uso. Tal resultado confirma os resultados

encontrados nas pesquisas realizadas por Dias (1998 e 2001), que indicaram como

principal motivador para o uso de tecnologia a utilidade — o único fator extrínseco

considerado — e não os fatores intrínsecos.

Verificou-se também que existe uma correlação positiva entre motivação

extrínseca e tempo e experiência em direção de arte (C = 0,546 e S = 0,050).

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A maior variação de resultados foi apresentada em relação ao prazer percebido,

um fator intrínseco. Alguns respondentes dizem gostar muito de usar computador. O

Entrevistado 5, que atribuiu grau dez ao prazer percebido, é um exemplo:

“Muito. Dez. Eu me divirto. Acho ótimo, sobretudo o Macintosh,

que tem um sistema operacional fantástico. Estou louco para que

instalem um 10 [versão mas atual do sistema operacional] no meu, já fiz

ontem uma solicitação para São Paulo para instalarem o 10 no meu. Acho

lindo, a plataforma, como os ícones se comportam, como você arquiva as

coisas, ponho o meu headphonezinho, adoro.” (ENTREVISTADO 5)

Outros dão classificações bem baixas a esse item, como os Entrevistados 1 e 3,

com graus três e cinco, respectivamente.

Essa variação até poderia ter sido maior caso o Entrevistado 7, por exemplo,

tivesse atribuído um grau ainda menor do que sete a esse fator motivacional, um grau

mais compatível com suas declarações sobre a aversão à tecnologia eletrônica em geral.

“Bom, eu não gosto de tecnologia. Eu sou avesso a aprender coisas

novas, detesto. Chega um programa, uma nova versão fico: ‘Que saco, eu

vou ter que aprender...’ (Risos.) Sabe? Vai mexer na interface que eu já

conhecia, já sabia onde era, vou ter que ficar procurando... Geralmente eu

sou um dependente dos meus amigos, eles todos me sacaneiam quando

eu peço extrato pelo telefone em vez de pegar pela Internet. Eu prefiro

ligar para o banco, gosto de ouvir a voz da pessoa, eu gosto de pagar

conta na fila. Eu não gosto de usar nenhuma máquina, tenho horror a

máquina. Então, eu trabalho no computador por necessidade. Na verdade,

a parte do trabalho que eu acho mais gostosa é criar, não é executar.

Então o computador entra na parte de execução, ele nunca entra numa

parte de criação, entendeu? No máximo numa escolha de fonte, da letra

que eu vou usar no anúncio, para mexer nas cores e tal — tudo bem, isso

também é parte do processo criativo, mas eu gosto de conceituar no papel

antes, pensar bem o que eu vou fazer, para não perder muito tempo com a

máquina.

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Não gosto de navegar na Internet... Entro nos e-mails porque aqui eu

sou obrigado, o nosso sistema de jobs aqui é todo por e-mail. Eu acho

horrível, você tem que ler o e-mail todo, uma pessoa vai passando para

outra, vai colocando adendos no job, você tem que ficar procurando

entender o job, então é meio chato isso.” (ENTREVISTADO 7)

A contradição que emerge do fato de ele ter dado classificação sete ao prazer

percebido pode ser explicada pelo alto grau (dez) de utilidade percebido e por aspectos

da interação com o computador que na verdade não estão diretamente ligados ao

trabalho. O trecho a seguir reúne esses dois elementos do discurso.

“Porque tem coisas assim de diversão, o computador pode te dar

uma certa, fora do trabalho... Sei lá, estar trabalhando com um arquivo

aberto e estar gravando um CD de música para você... Tem umas coisas

legais, não é de todo ruim. Mas jogos eletrônicos, esse tipo de coisa

nunca foi a minha praia, não gosto. E é assim: ele é útil. Eu não gostaria

de fazer tudo na mão de novo. Mas a chegada do computador teve pontos

muito negativos. Sempre gosto de salientar essa parte negativa do

computador. E a gente trabalha com Mac, um excelente computador, que

não costuma dar muito bug, é rápido, potente, mas, enfim, quando eu saio

do trabalho eu procuro não ver mais computador. Eu estou aqui por

necessidade e aproveito e faço as coisas aqui também, sabe, as coisas que

seriam de entretenimento: entrar numa página para ver não sei o quê,

brincar, receber um e-mail, escanear uma foto de família, esse tipo de

coisa, gravar um CD...” (ENTREVISTADO 7)

A suposição feita em relação ao prazer percebido não foi confirmada. A suposição

3.1 era de que os diretores de arte que começaram a usar computador antes de ingressar

na vida profissional sentem mais prazer em trabalhar com ele. Tal fato não ocorre,

indicando que a época na qual o entrevistado ter contato com o computador não

determina o seu grau de percepção de prazer no uso dessa tecnologia. O próprio

Entrevistado 7 é um exemplo claro desse fato: apesar de ter entrado em contato com

computador antes de começar sua vida profissional, ele declara textualmente que não

gosta de tecnologia, conforme os trechos que acabaram de ser citados.

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Já o Entrevistado 11, de 38 anos, tem uma experiência inversa, reforçando a

indicação de que o prazer percebido em relação ao uso de computador vai além de

explicações relacionadas à época em que se começou a ter contato com ele. Seu

primeiro contato com a informática ocorreu quando ele já tinha anos de experiência

profissional no processo artesanal, e no entanto ele afirma ter um grau nove de prazer na

interação com o computador. Desde a infância, era evidente a sua atração pela

tecnologia em geral e por atividades criativas:

“Eu sempre gostei de desenhar. Sempre tem alguém que fala: ‘Desde

pequeno, você sempre gostava tanto de desenhar etc.’ — sempre tem

uma avó. Já fiz pintura durante um tempo da minha vida, fiz curso no

Parque Lage durante dois anos, gosto realmente da coisa gestual e tal.

Engraçado, eu lembro que eu tinha doze anos e eu ia para o trabalho

do meu pai, na época tinha uma máquina de — olha como eu já gostava

de computador —, tinha uma máquina de escrever elétrica. E eu passava

a tarde inteira inventando coisa naquela máquina! Eu escrevia novela, a

gente fazia umas sacanagens com uns colegas de turma, que eram capa

de disco, escrevendo aquelas coisas: “Fulaninho, que era viadinho”,

aquelas coisinhas, inventava músicas, fazia paródias. Eu sempre tive

esse... Se você olhar os meus cadernos de adolescente, tinha muito essa

coisa de gostar de meio de publicidade, de alguma coisa gráfica. (...)

(...) Não é uma coisa que eu precisei fazer muito esforço para ser, foi

uma coisa natural, um processo natural.” (ENTREVISTADO 11)

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5. CONCLUSÃO

5.1. Integração de objetivo e resultados

Esta pesquisa de caráter exploratório teve como objetivo responder a seguinte

pergunta: Como diretores de arte de agências de propaganda do Rio de Janeiro lidam

com a tecnologia oferecida pelos microcomputadores no ambiente de trabalho?

Utilizando uma metodologia qualitativa de entrevistas individuais, foram

contatados 13 diretores de arte que trabalham ou trabalharam em diversas agências

cariocas de publicidade, formando duplas de criação com redatores. Essa amostra era

composta de homens e mulheres de 21 a 48 anos de idade, com diferentes formações,

experiências profissionais de menos de 1 ano a 27 anos e tempos de uso de computador

que vão de 6 a 17 anos.

Foram examinadas as principais mudanças decorrentes da introdução de

ferramentas informatizadas nas agências de propaganda, as circunstâncias nas quais os

respondentes começaram a usar microcomputadores de modo geral e as suas percepções

pessoais de prazer, facilidade de uso, pressão social e utilidade em relação a essa

tecnologia.

Tais percepções se referem a fatores motivacionais intrínsecos (prazer percebido

pelo usuário e facilidade de uso) e fatores motivacionais extrínsecos (pressão social e

utilidade percebidos pelo usuário) extraídos da Theory of Reasoned Action de M.

Fishbein e I. Ajzen (1975) e do Technology Acceptance Model de Fred Davis (1986 e

1989). Esta pesquisa está baseada também em estudos realizados por Magid Igbaria et

al. (1996) e Donaldo Dias (1998 e 2001).

5.1.1. Derivações da tecnologia na propaganda

Alterações profundas, condicionadas pelo advento de ferramentas tecnológicas

relacionadas a microcomputadores, foram verificadas no âmbito da direção de arte em

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propaganda. O mercado de tecnologia vem lançando computadores e programas cada

vez mais potentes, com preços cada vez mais baixos, enquanto os custos de mão-de-

obra em geral estão se tornando cada vez mais altos (LÉVY, 1999). Um dos efeitos

dessa vantagem comparativa é o desemprego, frente à automatização de tarefas manuais

(TURBAN et al., 2003). Na produção de leiautes, houve de fato um grande número de

demissões durante a transição do processo artesanal e realizado em grupo para o

processo informatizado e concentrado em poucas pessoas. No processo antigo, o diretor

de arte concebia as peças publicitárias mas não fazia tarefas de execução. Essa

incumbência era dos profissionais do Departamento de Arte, também chamado de

Estúdio, cujo trabalho era direcionado pelo diretor de arte — daí a sua denominação de

diretor. Inicialmente, os microcomputadores foram instalados no Estúdio e lá,

associados a programas gráficos, impressoras de alta qualidade e dispositivos de

conversão de imagens analógicas em arquivos digitais, passaram a permitir a

concretização dos leiautes em muito menos tempo e usando apenas uma pequena fração

do anteriormente grande número de recursos humanos desse setor.

Após esse primeiro momento de informatização das atividades desempenhadas

pelo Estúdio, os computadores entraram no Departamento de Criação, e grande parte

das tarefas dos profissionais do Estúdio passaram a ser cumpridas pelos próprios

diretores de arte, que hoje em dia se encarregam tanto da criação conceitual das peças

quanto da realização de ações operacionais para a sua materialização.

Por outro lado, um ponto positivo no advento dos microcomputadores é

justamente a possibilidade de se encarar a realidade negativa das demissões como uma

oportunidade de empreendedorismo, visto que a gradativa redução dos preços dos

computadores os torna cada vez mais acessíveis e o mercado publicitário tem uma forte

demanda de serviços e produtos terceirizados.

Na literatura especializada sobre tecnologia, também são encontradas afirmações

de que o seu avanço, associado a uma orientação cada vez mais voltada para o cliente,

tem sido decisivo para o aumento da sofisticação e das expectativas dos clientes

(TURBAN et al., 2003). A presente pesquisa confirma essa relação — a introdução de

computadores no processo produtivo permitiu o aumento do grau de experimentação

criativa e elevou sensivelmente a qualidade de apresentação dos leiautes feitos nas

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agências, que atualmente são praticamente iguais às peças acaba das. Os clientes, por sua

vez, internalizaram a existência desses novos patamares de qualidade e passaram a

exigir leiautes cada vez mais semelhantes aos produtos finais.

A rapidez com que os trabalhos hoje vêm sendo realizados também modificou as

expectativas dos clientes em relação aos prazos de apresentação dos leiautes. Além

disso, como o computador tornou o processo de execução de mudanças muito mais ágil,

os clientes também mudaram seu comportamento na etapa de aprovação dos trabalhos.

A conjunção desses fatores resultou numa diminuição geral dos prazos de criação,

construção, alteração e finalização das peças publicitárias.

O aumento do nível de estresse no ambiente de trabalho, diante da instituição

dessa expectativa de ação quase instantânea trazida pelo uso da tecnologia (MORGAN,

2002) e à qual se junta o crescente enxugamento das estruturas de pessoal, está

intimamente ligado ao considerável aumento da carga horária dos profissionais de

direção de arte, cujo expediente hoje em dia freqüentemente avança noite adentro e

engloba também os fins de semana. Alguns entrevistados chegam a associar a questão

da falta de tempo a uma opinião de que o computador pode limitar o processo de criação

— opinião esta que estaria relacionada também a uma percepção de risco de

banalização estética das peças desenvolvidas, em virtude de uma certa tendência de

acomodação aos recursos gráficos compartilhados por todos os usuários da mesma

tecnologia.

Também ficou patente o acirramento da incerteza quanto ao futuro após o advento

da informatização. Devido ao alto grau de cobrança na profissão e à característica

volátil da própria criação publicitária, que requer o constante acompanhamento das

tendências mais atuais de comportamento, essa incerteza já existia antes, mas aumentou

consideravelmente com a intensificação do ritmo de trabalho que ocorreu com a

introdução do computador.

Tudo isso reflete a fragmentação dos laços entre empregador e empregado no

contexto das agências de propaganda e confirma a ênfase no chamado “capitalismo

flexível”, verificada no mundo empresarial atual (SENNETT, 2001).

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5.1.2. Fatores motivacionais para o uso de microcomputadores

A análise dos resultados, apoiada por cálculos estatísticos aplicados às respostas

dadas para as perguntas com alternativas fixas — ainda que a amostra examinada não

tenha sido definida com o objetivo de atender os requisitos de significância —, permitiu

o desenvolvimento de considerações sugestivas sobre os fatores motivacionais para o

uso de ferramentas de informática no trabalho de direção de arte em agências de

propaganda.

Os fatores motivacionais extrínsecos (a pressão social e a utilidade percebidas

pelo usuário) prevalecem sobre os fatores motivacionais intrínsecos (o prazer percebido

pelo usuário e a facilidade de uso) . Além disso, constatou-se que a pressão do ambiente

de trabalho para o uso de computadores foi o fator motivacional avulso mais influente

dentre os quatro avaliados.

Esses resultados estão diretamente associados ao fato de que as ferramentas

tecnológicas relacionadas a microcomputadores são de uso obrigatório nessa atividade,

por determinação do mercado: não só os clientes querem trabalhos mais imediatos e

refinados, como também o processo posterior de produção gráfica exige insumos

digitais. Assim, a forma artesanal de construção de leiautes e artes-finais analógicos foi

eliminada do contexto atual.

Ao mesmo tempo, é importante não perder de vista a diferenciação existente entre

o que seria “motivação autêntica”, originada de fatores intrínsecos ao indivíduo, e o

mero condicionamento, estimulado por variáveis extrínsecas e portanto gerador de

comportamentos que não se manterão por si mesmos caso a punição ou a recompensa a

eles associadas sejam suprimidas (BERGAMINI, 1990).

Quanto ao aspecto da idade dos entrevistados, foram encontradas indicações de

que os diretores de arte mais experientes são também os que têm mais idade e menos

facilidade em usar computadores.

E, finalmente, verificou-se que o prazer foi o fator motivacional menos influente

de todos. Isso pode ser explicado pela evidência de que a motivação dos entrevistados

em relação à profissão que escolheram não passa necessariamente pelo uso de

computador. Todos enfatizaram a classificação do computador como ferramenta de

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trabalho, e a atividade de direção de arte é composta basicamente de dois aspectos:

conceituação e execução. O primeiro aspecto, essencialmente de criação, não requer o

uso de computador. Ao contrário, alguns entrevistados afirmam que o computador,

nessa etapa do trabalho, pode atrapalhar mais do que ajudar. Somente no segundo

aspecto, o da materialização das idéias concebidas pela dupla de criação, é que o

computador aparece como elemento de uso mandatório, por força das circunstâncias

recentes de evolução tecnológica. Nesse caso, existe um consenso de que o computador

não é apenas uma mera ferramenta — ele é efetivamente a principal ferramenta desse

processo.

5.2. Sugestões para pesquisas futuras

Seguem algumas idéias de continuidade para este estudo:

§ Replicar esta pesquisa em uma amostra mais significativa, permitindo a

obtenção de resultados com maior validade estatística.

§ Reproduzir o presente estudo num ambiente em que o uso da tecnologia não

seja obrigatório. Confrontar os resultados da pesquisa atual com os desse novo

estudo.

§ Investigar o ponto de vista dos executivos que, nas agências em que

trabalhavam, determinaram e presenciaram a transição do processo analógico

para o processo digital.

§ Fazer a mesma investigação do ponto de vista dos clientes das agências.

§ Verificar o quanto a questão da ênfase na velocidade de execução do trabalho

está relacionada com a possibilidade de limitação da criativade.

§ Aprofundar a questão da qualidade de vida dos profissionais de direção de arte

após a instituição do uso de computadores no mercado publicitário.

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7. ANEXOS

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7.1. Resumo da entrevista 1

Sexo: Masculino.

Idade: 33 anos ∗.

Naturalidade: Rio de Janeiro, RJ.

Experiência em direção de arte: 9 anos (desde 1994).

Formação universitária: Desenho Industrial.

PESQUISADORA (P): A primeira coisa que eu vou pedir é para você falar resumidamente sobre o seu trabalho, a sua trajetória. Como começou...

ENTREVISTADO 1 (E1): Já na faculdade, eu abri um escritório de programação visual com

dois amigos da faculdade. Esse escritório durou a minha segunda metade da faculdade e quando eu me formei eu decidi terminar o escritório e fiquei um tempo procurando emprego e fui

chamado para ser assistente de computação gráfica — quando eu comecei na propaganda,

algumas agências ainda estavam implementando a computação. Os Estúdios de agência eram coisas muito grandes, tinham 30 pessoas e tal, e, quando implementaram o uso de computador,

isso reduziu bastante o número de pessoas no Estúdio e os Estúdios começaram a ficar meio

informatizados, então eu fui chamado para trabalhar num Es túdio de uma agência, num novo Estúdio, já informatizado.

Fiquei duas semanas trabalhando como estúdio e aí fui pinçado pelo diretor de criação

para ser assistente dele, então mudei essa condição de estúdio, de assistente de computação gráfica, para ser assistente do diretor de criação. Fiquei como assistente do diretor de criação

durante um ano e meio e depois comecei a já fazer trabalhos sozinho e tal, e passei para uma

condição de diretor de arte júnior.

De diretor de arte júnior eu virei diretor de arte, nessa empresa, a empresa acabou...

Depois que a empresa acabou fiquei um tempinho fazendo free lance — que o diretor de arte

sempre tem (talvez até mais que o redator) mais áreas em que ele pode trabalhar. E a possibilidade de frila é muito maior, você pode fazer frila de design, pode fazer frila de diretor

de arte, pode fazer frila de Estúdio, finalização. Então fiquei fazendo frila, fui trabalhar num

escritório de multimídia, que trabalhava com interfaces para CD-ROM e coisas do gênero. Nesse intervalo comecei a fazer frila de marketing direto na AGÊNCIA 1∗∗, e de frila de marketing direto eu comecei a fazer frila lá, me chamaram para fazer um frila de direção de arte

na agência da AGÊNCIA 2, e estou lá até hoje.

P: Na faculdade você fez Desenho Industrial.

E1: Fiz Desenho Industrial.

∗ Esta entrevista foi realizada em agosto de 2003. ∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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P: Em que ano, mais ou menos, você abriu o escritório?

E1: Eu abri o escritório em 91 e fiquei com o escritório até me formar, em 94.

P: Você vê muita diferença entre o trabalho do diretor de arte e o do designer?

E1: Tem toda a diferença do mundo, porque na direção de arte você tem que conceituar,

você está mais atrelado a um conceito específico. No design não. No design, às vezes você pode

fazer uma peça somente decorativa, mas na direção de arte você está atrelado sempre a um conceito de marca e você trabalha sempre com outra pessoa também, com o redator, né? E o

design... ele talvez seja um trabalho mais solitário, você conceitua até de uma outra forma. Na

direção de arte, você está trabalhando com comunicação, a relação — eu acho — com o consumidor é mais direta. No design, você pode se dar ao luxo de ter uma certa subjetividade,

né? Mas na comunicação não, na direção de arte você tem que ter a intenção de se comunicar, e

essa intenção de se comunicar está na criação da peça.

Outra diferença... eu acho que é essa coisa da conceituação, não é só fazer coisas

bonitinhas, você tem que conceituar e aquilo tem que estar dentro de uma estratégia de

planejamento, que não necessariamente é determinada por você. Você acompanha um trabalho de uma equipe, você cumpre a sua função ali. No design, talvez o trabalho seja mais autoral,

né?... Acho que é isso.

P: Como é que você definiria a sua profissão hoje? Se alguém te perguntasse qual é a sua profissão, você diria o quê?

E1: O trabalho de direção de arte é o que eu faço todo dia, pelo qual eu recebo salário e

tal, mas eu continuo fazendo trabalhos de design também, entendeu? Então eu sou um diretor de arte/designer.

P: Como é que você vê o computador, no trabalho? No dia-a-dia, hoje?

E1: É como eu estava te falando antes. É interessante você fazer essa pergunta, porque quando eu comecei a fazer direção de arte eu tive a chance de participar desse processo de

implementação. Isso é 94, algumas agências se informatizaram mais cedo... 93, 94 foi o ano em que os Estúdios começaram a ser desmontados e o computador veio trazer mais agilidade no processo, né? O computador possibilita um nível maior de experimentação, na medida em que

você pode experimentar e ver o resultado de uma maneira mais rápida. Mas ele nunca vai ser uma ferramenta de criação, ele é uma ferramenta que ajuda na execução. Normalmente, na grande maioria dos casos, você cria com um lápis e uma folha em branco, com a sua dupla,

entendeu? Então, o computador é só num segundo momento, em que você vai realizar, leiautar aquelas peças que você criou.

Hoje em dia você tem um volume de trabalho, os prazos diminuíram em função disso,

dessa agilidade. E antigamente você tinha Estúdios numa agência média, por exemplo, tinha Estúdios com 30 pessoas. E hoje em dia os Estúdios estão reduzidos a uma, duas, três, no máximo. É um montador só, o cara que está ali para montar a peça, quer dizer, a peça sai da

impressora, ele passa cola e monta, faz um mock-up ou outro, mas é uma função mais... Antigamente não, o Estúdio tinha que suprir essa função toda. Tinha gente marcando letra, na época não tinha as impressoras coloridas e tal. Então a informática, a informatização, ela

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facilitou muito o processo. Ao mesmo tempo em que ela eliminou muitos postos de trabalho.

Você tinha profissionais de Estúdio que simplesmente não fizeram a ponte. Para um cara sair de

um processo mecânico, analógico, lá de montar, colar, usar pincel, de usar aerógrafo e tal, esse cara teria que ter aprendido Photoshop, que é o novo aerógrafo. Muita gente boa, que trabalhava

com propaganda há muito tempo, simplesmente deixou de existir como necessidade. A função

deixou de existir como necessidade. Mas eu acho que é uma ferramenta que facilita muito a minha vida, facilita muito a minha vida. Mas é uma ferramenta, é apenas uma ferramenta, não vai fazer nada para você que você não mande, e está ali cumprindo uma função dentro do

processo.

E eu acho que as apresentações melhoraram muito. Você tem impressoras cada vez

melhores, você tem os custos. Eu acho que o que mais mudou foi a saída, principalmente as

impressoras, os scanners, porque os computadores mudaram, ganharam mais força e tal, mas os softwares continuaram fazendo, com mais ou menos presteza, as mesmas coisas. Mas essa parte de impressão, hoje em dia você — dependendo do que você estiver fazendo — você pode

apresentar um leiaute para o cliente muito próximo do que seria uma peça final, produzida. É óbvio que vai depender de fatores aí, você pode dar uma referência do que você vai buscar, o material que você vai estar usando. Mas você pode apresentar para o cliente uma coisa muito

próxima da peça final. E isso é graças ao computador. Sem o computador isso não seria... Antigamente você trabalhava com fotocomposição, tinha uma terceira pessoa que arrumava a

disposição das letras, dos títulos para você, você trabalhava com pincéis, com pinceladas, então o leiaute forçosamente era mais livre, era mais... poético até, entendeu? Hoje em dia não, o leiaute, ele pode ser bem cravadinho com o que vai sair no final.

P: Em termos de recursos, você falou que o computador faz a mesma coisa que era

feita antes, né? Então você acha que não tem muita diferença em termos do que você pode fazer, a criação já não era limitada antes.

E1: É. A criação sempre foi uma coisa... A criação, você está de frente para um branco, né, então você... tudo pode, né? Mas antigamente os prazos eram maiores, já que tinham que dar conta desse tempo de realização da idéia. Hoje em dia não, se você tem uma equipe boa,

recursos bons, máquinas rápidas, o seu trabalho, a sua capacidade de realizar aquela idéia, fica

muito mais... Acho que agilidade aí é a palavra-chave, o que mudou mesmo.

Tem um programa que talvez seja universal aí, que é líder no segmento dele, é o único, na

verdade, que é o Photoshop. O Photoshop é um programa de retoque e manipulação de imagens e é muito bom naquilo que ele faz. E todo mundo usa, o mundo inteiro, você pode olhar o mundo inteiro e o cara vai estar sempre lá... O programa de leiaute, que muitas vezes é o Quark,

ou um programa tipo o FreeHand, Illustrator, esse programa pode variar, mas o Photoshop você

vai sempre encontrar nas agências. E a gente já tem aí quase dez anos de informatização do mercado, então as pessoas aprenderam a utilizar mais os programas, os recursos, e usar a

capacidade real do programa. Embora eu ache que as pessoas não usam 100% do que o

programa pode. É uma ferramenta fantástica... O nível de retoques que você pode fazer, as coisas que você pode fazer, é muito impressionante. E computadores cada vez mais rápidos,

com mais memória para você poder justamente trabalhar com imagens maiores e, mais uma vez,

isso vai influir diretamente na sua qualidade de apresentação. Por ser muito maior resolução,

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mais próximo do resultado final vai estar, então você pode entregar um leiaute para o cara,

quase pronto para o cara, quase pronto. Então o cliente, quando vê um leiaute hoje em dia, ele

não tem muita surpresa, assim, é: “Olha, vai sair mais ou menos isso, mais ou menos isso.”

Antigamente o diretor de arte fazia sempre muito rafe, o diretor de arte não... com essa

história de Estúdio, o diretor de arte fazia um rafe, desenhava, passava para o Estúdio, o Estúdio

leiautava a idéia dele. Aquela história que eu te falei, que perderam-se posições de trabalho no Estúdio, é porque o diretor de arte chamou um pouco para si essa função de leiautar, né? Tudo

bem que você tem assistente e tal, mas o diretor de arte foi sentar no computador. O diretor de

arte, que só leiautava e entregava tudo para alguém, só criava no papel, ele começou a entrar no Estúdio. Ele começou a criar no Estúdio, o Estúdio veio para a mesa do diretor de arte, na

verdade, né? E a coisa da experimentação é que eu acho que é o grande ganho, além da

agilidade, porque antigamente você tinha que vir com a idéia mais ou menos criada, já tinha que pensar na realização dela na sua cabeça, antes de botar no papel. É óbvio que o ideal é você já pensar na campanha, pensar na idéia e em como você vai realizá-la, mas no Photoshop, como é

muito rápido, você pode testar uma ou outra coisa, um ou outro recurso gráfico que antigamente seria impossível, né?

P: E quando você começou a usar computador na sua vida, a ter contato com computador?

E1: Eu comecei a usar computador em 90... 89, 90... Eu tinha um irmão que estudava

Informática na PUC e ele viu o computador nascer ainda, ainda viu aqueles TKs, os 64, o Basic. Isso em 83. Em 89, ele montou um computador lá em casa. E tinha softwares gráficos lá, obviamente que naquele tempo eles eram bastante limitados, eram mais limitados ainda, eram

mais crus, e eu descobri uma possibilidade de — eu já gostava de design gráfico —, eu descobri a possibilidade de realizar aquilo que eu gostava de ver, realizar idéias através dele.

E nunca mais parei. O meu primeiro emprego em propaganda foi como assistente de

computação gráfica. Na época se chamava computação gráfica ainda. A primeira vez que compraram os meus serviços, compraram o meu conhecimento técnico, o meu conhecimento de programa e de rede e tal. Então, eu posso dizer que eu entrei na propaganda, entrei na direção de

arte — não no design —, entrei na propaganda via ele, foi o computador que me arranjou emprego. E, por exemplo, o diretor de arte faz muito frila, então eu, em casa, posso ter uma estrutura de agência, um mini-estúdio, posso fazer quase que o mesmo trabalho que eu faço na

minha agência, porque eu tenho uma maquininha lá. Então, é uma ferramentinha muito poderosa. Muito poderosa.

E para o designer gráfico também. Tudo bem que você pode desenhar, você pode pintar,

você pode usar lápis... Mas ele pode ajudar de várias maneiras, até a melhorar um desenho seu ou essa experimentação de cor, por exemplo. Antigamente você tinha que pintar mesmo, você tinha que ir lá no guache, pintar a letra. Então, você já tinha que pensar na tua paleta antes,

entendeu? Hoje em dia, não, você já tem uma idéia, “esse leiaute aqui funciona com vermelho”... mas você pode, vermelho não deu certo, aí pula do vermelho ao verde-abacate em dois minutos, ou até menos.

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P: Em termos de utilidade, se você fosse graduar a utilidade do computador no

trabalho, de zero a cinco, que nota você daria?

E1: Utilidade ou importância? Bom, utilidade, de uso mesmo, né? Quatro. Porque dá para fazer sem. Mas é muito importante. Hoje em dia, o diretor de arte, ele já tem que, além da

formação em comunicação, de conceituação e tal, ele tem que ter uma formação técnica. Esse

cara, ele tem que saber Macintosh, entendeu? Quando eu falei para você que, nesse advento da informatização aí das agências, se perderam muitos postos de trabalho para Estúdio, alguns

diretores de arte também não fizeram essa ponte. No momento em que o Estúdio foi trazido para

a sua mesa de trabalho, o seu desktop, os diretores de arte tiveram que... — “Eu tenho que me vir ar com isso aqui.” Então, muitos caras com formação que, né, imagina você trabalhar 20 anos

de uma maneira e no 21º ano: “Olha, esquece aquilo, o negócio agora é assim... agora você tem

que leiautar de uma outra maneira.” Muita gente não fez essa ponte.

Hoje em dia, todo mundo tem que saber. Quer dizer, um profissional hoje, ele é avaliado

segundo vários critérios. O principal é, primeiro, a criatividade do cara, a capacidade de

execução, a qualidade de referências e tal, e o resultado final do trabalho... Mas tem um pré-requisito lá que é o seguinte: se o cara não sabe Mac, se não sabe Photoshop, o diretor de arte,

ele já tem que vir de fábrica com esse, entendeu? Ele já vem de fábrica com o Photoshop,

senão... Acho que não tem mais, assim, diretor de arte que não mexe nada... No mínimo ele tem que saber o que é que programa pode, o que é que programa possibilita a ele. Não pode pedir uma coisa esdrúxula, então... tem que saber, tem que saber.

Você não tem que saber tudo. Até porque, em alguns lugares, o cara cria — preza-se muito o rafe, a instituição do rafe, da criação no papel... enfim, botar a mão mesmo — e a

realização passa para o Estúdio, ou passa para um assistente. Mas... o cara tem que saber... Ele

tem que saber, não tem jeito.

P: E se você fosse pensar na... você tinha falado importância, né? De zero a cinco?

Quanto você daria?

E1: Cinco.

P: Saber usar é cinco, não tem meio-termo?

E1: Cinco. Cinco. Não ter uma relação, é... tranqüila com o computador, e... assim...

Cinco, cinco, imagina, imagina.

P: Agora, você falou que nem sempre se usa tudo o que o programa permite, né?

Todo o potencial dele. Você acha que isso se deve a quê?

E1: É engraçado. Essa agilidade que o computador trouxe, ela refletiu diretamente em prazos menores. Ela implicou prazos menores. E o trabalho de uma agência de propaganda é

uma coisa muito dinâmica, muito... enfim, é uma loucura aquilo. E ainda mais com os prazos cada vez menores, você tem que se dar, é no mínimo um pedido por dia, um pedido ou dois por dia. Então, muitas vezes você não usa todos os recursos, porque você está com um prazo

também superapertado.

Porque até o trabalho do fotógrafo mudou muito com o computador, né? O fotógrafo, hoje em dia, o que se pede do fotógrafo é que o cara já entregue a foto em CD. Então as fotos já

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estão vindo tratadas. Em alguns casos, já manipuladas. Então os fotógrafos se especializaram

em contratar ilustradores, manipuladores. E então você fala para esse cara: “Olha, eu quero tal

efeito, tal recurso.” Então, esse cara é um hard user de Photoshop, sabe? O diretor de arte não precisa saber tudo do Photoshop, enfim. Tem que saber o que é possível, né, mas ainda tem

sempre uma pessoa ou outra... Na direção de arte, você tem sempre assistente, você tem

sempre... O próprio nome diz, você dirige uma série de pessoas, entendeu? Você vai acompanhar o seu leiaute na mão de várias pessoas. E vai guiar ele.

P: Em termos de facilidade de uso, de programa, do próprio computador, como é que você vê isso? Porque você — no seu caso, né, específico —, você tem contato há muito tempo, né? Como você iria pontuar, de zero a cinco, a facilidade que você tem em explorar

o computador?

E1: Acho que cinco, cinco. É que, na verdade, é um programa que é uma ferramenta que vai realizar aquilo que você pede para ela fazer, então não tem muito... não tem muito mistério,

sabe? E o que eu não sei fazer ou um recurso que eu imagino que eu diretamente não consiga realizar, eu chamo um ilustrador, enfim, eu dou um outro jeito. Mas... mais uma vez: é uma ferramenta, entendeu? É só um lápis mais bacana, quer dizer, é um Estúdio inteiro na sua mesa.

Imagina que pegaram aquelas 20 pessoas que trabalhavam no Estúdio e botaram essas 20 pessoas em cima de cada mesa. O processo ficou mais simples para o diretor de arte, né? Acho que ficou mais simples. Em relação à execução. A criação continua difícil. A criação é matar

um leão por dia, cara. Papel branco... O zero. E diariamente você olha para o zero, o zero olha para você, você tem que ter uma relação boa com ele também.

P: (Risos.) Deve dar uma angústia, né, porque... você olha aquilo e...

E1: (Risos.) Mas todo criativo é angustiado, entendeu? Eu acho que o cara só é criativo

porque ele é angustiado por natureza!

P: É, deve ser verdade. (Risos.)

E1: É! A criação, ela, ela, a criação, ela... tem uma angústia implicitada aí que é... Na boa.

Todo criativo é! Todo criativo é. (Risos.)

P: Agora, saindo dessa coisa da utilidade, dos recursos... você gosta de computador?

E1: Cara, gostar?

P: Gosta de usar computador, de trabalhar com ele?

E1: Cara, é uma relação de amor e ódio às vezes, né? Porque... quando dá pau, você quer... Assim, você quer matar ele, jogar aquela m... no chão, quebrar aquilo tudo. Mas na

maioria das vezes a gente se dá bem, assim, somos amigos e tal. Ele não costuma me deixar na mão, não. Gostar, a gente gosta de pessoas, né?

P: (Risos.)

E1: (Risos.) Eu me dou bem com ele, eu... Mas... Eu acho que o grande barato é a criação mesmo. O computador é uma etapa do processo e ele não está relacionado diretamente à

criação. Então... Mas eu me dou bem com ele, digamos que eu me dou bem com ele.

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P: E se você fosse pensar no grau de prazer que te dá trabalhar no computador?

Você se diverte?

E1: Sim, sim, a coisa do... Até o e-mail, que é uma outra etapa do processo, é uma coisa... Às vezes é mais engraçado um negócio escrito do que falado. Teve uma época em que eu tinha

um diretor de criação chato... (risos) e eu estava com a minha dupla e a gente queria falar coisas

que ele não podia escutar e então a gente usava um messengerzinho, sabe? Era muito divertido, quando você vê assim como é que a ferramenta possibilita a diversão nesse sentido... E existe

um prazer de você... que é conseqüência, acho que dessa agilidade, dessa rapidez de ver o

resultado, entendeu? Você experimenta e você já tem o resultado, então tem um prazer aí de você ver a coisa acontecendo, a coisa acontecendo rápido, né? Acho que é isso, pô, facilita

muito, facilita muito a vida de um criativo.

P: Você daria, de zero a cinco, em relação ao que você sente...

E1: Acho que dois e meio, ali, no meio, ali...

P: No meio.

E1: É. Acho que no meio, ali. É que... aí é que está, o barato é criar. O que dá prazer mesmo para a gente é a gente vencer a angústia, a gente matar esse leão. E o computador é só uma etapa aqui para esse processo, é uma... Então eu acho que dar mais importância para ele do

que dois e meio, pelo menos numa relação de prazer, né, satisfação, é muito, então ele fica ali no meio mesmo.

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7.2. Resumo da entrevista 2

Sexo: Masculino.

Idade: 48 anos ∗.

Naturalidade: São Luís, MA.

Experiência em direção de arte: 27 anos (de 1975 a 2002).

Formação universitária: Não tem.

Observação: Não se dedica mais integralmente à direção de arte de publicidade.

PESQUISADORA (P): Bom, para começar, queria pedir para você falar um resumo da

sua vida profissional. Como começou, como foi... o que você faz hoje?

ENTREVISTADO 2 (E2): Eu comecei em São Luís foi 70 e... deixa eu ver... 74. 74... 74 não. 75. Lá para o final de 75, eu fiz um estágio numa agência.

P: Lá [em São Luís]?

E2: É. Foi curto, comecei a trabalhar... Fiquei nesse trabalho ao todo acho que uns seis meses. Na época eu tinha um envolvimento com teatro amador também, eu acabei perdendo

esse lugar porque eu fiz uma viagem, passei um fim de semana fora, enfim. Aí o cara não

gostou muito, me mandou embora. Peguei, fui para outra agência, de uma outra pessoa que tinha trabalhado nesse lugar. E passei mais uns dois meses. Como eu já tinha viajado para São

Paulo numa época com o grupo de teatro, de dança, aí eu resolvi vir para o Rio.

Em 76 eu cheguei aqui, fiquei uns dois meses trabalhando de office-boy, depois eu consegui um estágio numa agência chamada AGÊNCIA 3∗∗ e lá é que foi que eu aprendi mais

coisas mesmo. Já tinha uma certa idéia do que é que era, lá de São Luís, que também foi muito

importante, e nesse lugar eu conheci o Falcon, que teve uma agência depois aqui no Rio chamada AGÊNCIA 4, muita gente aqui conhece, muita gente do mercado hoje, que tem nome,

trabalhou lá. Fernando Campos, o Rinaldo... o próprio Heleno Bernardi mesmo, lá da AGÊNCIA

2, e outro... Gianini, da AGÊNCIA 5, várias pessoas, acho que trabalharam lá nessa agência. Aí eu trabalhei com o Falcon nessa AGÊNCIA 3 cinco anos. Quase cinco anos.

Depois eu saí, no final dos anos 70, e fui para a AGÊNCIA 6. Na época a gente nem

chamava AGÊNCIA 6, a gente chamava AGÊNCIA 6-b (risos). Aí eu fui... já anos 80. Na AGÊNCIA 6 eu fiquei nove anos. Desde o Estúdio, que era a minha formação das outras

agências, no Estúdio... depois eu fui chefe de Estúdio uma época, depois eu fui trabalhar num

departamento de merchand [merchandising] que tinha lá, que atendia a Pepsi... Dali eu deslanchei, comecei a ficar mais na Criação, aí arrumei trabalho na Criação... aí eu saí da

agência em 91, por aí. Fiquei um tempinho enrolado, acho que uns meses.

∗ Esta entrevista foi realizada em agosto de 2003. ∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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Depois eu trabalhei numa agência chamada AGÊNCIA 7, por pouco tempo. Depois eu fui

para a AGÊNCIA 4, essa já do Falcon, desse Falcon da outra agência, ele já tinha aberto essa

AGÊNCIA 4, já tinha um tempo. Aí eu fui para lá e trabalhei lá quase um ano, depois eu saí. Trabalhei com o Jair de Souza, o designer que todo mundo conhece, diretor de arte também, Jair

de Souza. Ele... foi quanto tempo... foi um projeto, Coca-Cola 50 Anos com Arte, o projeto foi

uns quatro meses.

Eu saí, voltei para a AGÊNCIA 4, fiquei mais um tempo, depois eu fui para a AGÊNCIA 8,

da Nádia. Quem me chamou foi o Heleno e o Rinaldo. Aí eu fiquei lá uns dois anos com a

Nádia. Depois a agência acabou, essa AGÊNCIA 8, virou... AGÊNCIA 9, que hoje é associada com a AGÊNCIA 10... fiquei na AGÊNCIA 9 mais um ano e pouco. Depois essa agência também

sumiu, virou uma outra, que é a AGÊNCIA 11, AGÊNCIA 11-b de São Paulo com a AGÊNCIA 11-c

internacional. Aí ficamos um tempo lá no Centro, depois fomos para Ipanema, e aí ficou mais um ano... aí nós fomos demitidos, eu e uma galera, não sei por quê, mas continuamos trabalhando na agência como free lancer, mas...

Depois, enfim, depois passou mais um tempinho e aí a Nádia abriu a agência dela, que é a AGÊNCIA 12. Aí, além de ter feito a logomarca da agência e ter já todo esse tempo com a Nádia,

acabei ficando lá mais um ano e pouco.

Depois eu saí, eu pedi demissão. Eu e o meu dupla, o Eduardo. Aí eu fiquei um tempo assim, desempregado, uns três meses. Depois eu fui na AGÊNCIA 13 mostrar meu portfólio, aí

tinha uma vaga, eu fiquei lá na AGÊNCIA 13. Na AGÊNCIA 13 eu fiquei uns dois anos e pouco.

Foi a última agência em que eu fiquei fixo. Depois disso eu fiz free lance, fiz na AGÊNCIA 14, fiz na AGÊNCIA 15, fiz na AGÊNCIA 13 novamente... E já fiz coisas assim de design mesmo,

capa de CD, para outras pessoas, é... anúncio, coisinha para agência pequena e... é isso.

P: E hoje, é... se alguém te perguntar qual é a sua profissão...

E2: Eu nem sei direito. (Risos.) É, eu ainda sou, me considero publicitário, diretor de arte. Eu até lamento muito, assim, eu tenho uma experiência que é bem grande mesmo, desde 75,

vamos colocar assim, até hoje. Até 2002, direto, só agência, agência, entendeu? Então... eu sou publicitário.

P: E a parte de DJ [disc-jóquei]...

E2: DJ veio surgindo, já... já tem uns quatro anos, no começo era tudo... meio assim. Não é que eu fizesse na brincadeira, mas soava... soava como na brincadeira pelo próprio

amadorismo mesmo, não tocava em equipamento, assim, era... Eu juntava dois CDs de casa com um mixer, eu sempre tive vontade de ter um mixer. Sempre achei legal, assim, você ter como... estar tocando uma música e você passar de uma para outra, sabe? Eu tenho um amigo que é DJ,

o Vulcano, ele tinha um mixer que ele comprou e es tava vendendo o mixer com outro CD, da Gemini. Aí eu peguei, comprei, quer dizer que eu já fiquei com uma coisinha que já servia para fazer uma festa.

Aí eu comecei a tocar nas brincadeiras e fazer lá no [Bar do] Mineiro, aniversário dos amigos... Nunca ganhava nada com isso, lógico, mas eu estava começando ali. Aí, considerando, assim, dois anos para cá, eu já comecei a ter um cachê. Eu já tenho. E eu acho

que já está mais sério mesmo... sei lá, tem um ano e pouco, um ano e meio.

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P: E hoje em dia você faz as duas coisas.

E2: Faço as duas coisas. E essa coisa hoje tem... está me rendendo mais trabalho do que a publicidade. Você vê, vários lugares estão se acabando e várias pessoas estão saindo fora. Quer dizer que até são lugares em que eu até já mostrei... Eu já mostrei para quase todo mundo que

me conhece. Eu acho que muita gente aí do mercado já viu meu portfólio. Já me chamaram, já

me chamaram em alguns lugares em que eu nem precisei mostrar, entendeu? Na época em que eu mostrei não me chamaram, aí me chamaram depois sem ver mais. Porque eu acho que quem

conhece não precisa mais ver, não. Não precisa. Até porque mostrar portfólio... uma coisa é

você fazer um portfólio, caprichar, separar tudo bonitinho. Outra coisa é o dia -a-dia. O dia-a-dia não é aquilo bonitinho que está no portfólio. O dia-a-dia é o... é coisa chata, entendeu?

P: (Risos.)

E2: É mexe, faz uma vez, e mexe de novo. E vai e mexe novamente, e tem que ser rápido. Enquanto portfólio você pode pegar e ficar fazendo... E cheio de fantasma [anúncio-fantasma], como eu vejo, tem um monte de portfólio com fantasma para caceta. Agora eu quero ver é o dia-

a-dia, que fantasma não existe... (Risos.) Brincadeira.

Eu comecei a estagiar num lugar porque um vizinho, minha mãe mostrou uns desenhos e

o cara me levou. Porque, naquela época, até você... assim, você tinha que ter uma queda por

desenho. Aí eu fui estagiar, o cara colocou lá uma prancheta, um material para eu ficar... usando, entendeu? Por causa disso, porque o vizinho viu, aí olhou, me deu umas canetinhas, e às vezes, à noite ele... chegava em casa, e começava, que ele era um cartunista também, ele fazia

cartum para um jornal e trabalhava numa agência. Aí ele me dava sobras de papéis, deixava eu mexer no material dele, ele foi vendo que eu era cuidadoso, não pegava a caneta de qualquer jeito. Naquela época, aquelas canetas caras, com aquelas penas. Sabe? 01, 02, 03, tudo aquilo eu

fui aprendendo a lidar, eu usava com nanquim, depois tinha que lavar para não endurecer. E eu sempre fui caprichoso com essa, sempre tive muito cuidado com esse material. Quer dizer que

não foi difícil. Foi muito rápido e eu já estava me acreditando, me levando para esse estágio.

Depois desse tempo todo, depois de fazer teatro, dança, e depois ter parado, chegado aqui no Rio, aí comecei a me envolver com publicidade e depois fiquei. Porque também foi uma fase assim boa, assim, de grana mesmo. Até mesmo, até na AGÊNCIA 13 mesmo. Era legal,

entendeu? E hoje tem ainda coisa legal, mas hoje está muito reduzido, eu não sei direito no que vai dar, tudo isso. Está muito reduzido.

P: Queria que você falasse um pouco como, quando você começou a mexer com

computador... no trabalho, né?

E2: Ah, isso tudo ainda foi meio assim... eu peguei toda essa mudança, eu participei de

toda essa mudança.

P: Você começou, não tinha computador...

E2: Eu comecei numa época em que não tinha isso, ficava nas pranchetas. Era uma época

muito boa. Eu tenho até uma pena de que as coisas não estejam tão juntas, entendeu? Os caras tenham detonado. Tudo está muito enxugado, muito, parece que vai ficar se reduzindo. Era muito bonito quando o Estúdio era, ah, aqueles papéis, aquela linha de montagem, com letristas

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e tal — tudo bem que hoje não precisaria mais que o computador, aquilo era uma parte até

muito chata, ficar marcando letra, entendeu? Ficava fazendo determinados trabalhos que hoje

você faz num computador muito mais rápido, num programa, no Quark ou no Photoshop, enfim.

Mas eu peguei exatamente quando começou, que era assim: um computador para vários...

No início, algumas agências tinham PC... Até levei um tempo para começar a ter computador,

eu comecei a usar computador mesmo... na AGÊNCIA 11. Eu trabalhei lá, acho que foi em 96, por aí.

P: Que a agência começou a...

E2: É, não, as outras já tinham. Como todas as outras agências já tinham computador. Mas eu nunca tinha trabalhado ainda em nenhuma agência ainda que tivesse computador para

todas as pessoas.

Mesmo essa fase mesmo da Nádia Rebouças, lá já tinha... Entendeu? Tivemos uma fase que era PC. Depois, quando entrou a... a AGÊNCIA 9, mudou tudo. Fomos passando do PC para

o Macintosh. E aí já tinha, assim, uns dois computadores. Depois três computadores. Ficavam

com dois operadores e um era para quem... era para a turma se digladiar por ele. (Risos.) Aí ficava assim: os que entravam, os que já estavam mexendo mais, ficavam mais tempo com o

computador. E eu assim, ó, só ficava rafeando, passando para o operador e ficando do lado. Mas

ainda com uma rejeição muito grande, achando aquilo muito, muito chato. E eu ainda acho, ainda, até hoje, ainda, que alguns programas ainda não fizeram a coisa pensando mais só no designer , no cara que não tem paciência, que quer tudo mais... assim, apertar e já estar ali, tudo

mais... rápido. E estão melhorando, os programas cada dia vão ficando mais simples.

Mas eu lamentava muito, ficava muito p..., ao mesmo tempo em que eu queria aprender,

mas parece... eu ficava com um obstáculo, parece que eu não ia conseguir. Num determinado

momento, numa agência, o cara falou assim: “P..., bicho, é o seguinte: todo mundo tem que saber mexer nessa p... e você é um dos únicos que não sabe e...”. “Sabe, eu estou até fazendo um curso”. Eu fazia um curso de FreeHand, do lado, na Power Image. O cara falou: “É, pô, eu

vou colocar um computador na tua mesa”. Eu falei: “Pois é, cara, que todo mundo fala assim: ‘Ah, é que você não mexe’, mas ninguém põe um computador.” Os outros diretores de arte com mais experiência nisso tinham os seus. Aí ficavam sobrando assim eu e mais uns outros três, que

mexiam também, mas que não tinham. Aí os mais espertos ficavam mexendo o tempo todo e a gente ficava meio sobrando. Enfim, mas aí chegou um momento em que foi todo mundo tendo o

seu, porque em muitas agências todo mundo já tinha os seus também.

E eu hoje eu não sou nenhum bambambam, ainda pergunto muito, ligo muito quando eu estou com dúvida. Eu ligo para os meus amiguinhos operadores, que são f... mesmo, assim, o Tocha, o Alê... vou tirando as minhas dúvidas. Mas acabou o pânico. O pânico acabou! (Risos.)

Mas eu ainda acho chato para c... nego pegar e estar... dispensando as outras... Porque, por outro lado, você vê nego que não sabe fazer um desenhinho, tem gente que não sabe montar um

trabalhinho quando fica pronto e... a galera que mexe muito tem que ter muito cuidado também para não ficar pasteurizando, fica tudo muito igual.

P: No computador?

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E2: É. Fica tudo com a mesma cara. Muitas vezes as coisas ficam com a mesma cara...

Assim... quem gosta de ficar manipulando muito o anúncio... botando muito efeito, fazendo

muito... O Photoshop, se não tiver cuidado, vai ficando tudo “photoshopado”, a gente fala. Fica tudo... com aquela cara. O Jair falava assim para mim: “Isso é um perigo na mão das pessoas

que não têm muito conhecimento gráfico.” Porque hoje todo mundo faz, é muito fácil — “Não,

eu sou webdesigner, eu... sou designer, eu... faço isso...” Porque o programa você aprende e... abre uma página, põe uma imagem para um canto, uma imagem para o outro e... procura uma tipologia e... sai por aí dizendo e fazendo... um monte de coisa igual. Você senta direto [no

computador] e leva mais tempo com aquela página aberta para fazer alguma coisa do que você parar antes para pensar, rafear no papel, para sentar já tendo noção do que você quer. Eu, pelo menos, sou muito dif ícil de sentar direto. Então eu acho que isso tudo ainda está se adequando,

uma coisa à outra. Mas... a mudança foi... eu me senti muito aliviado quando eu comecei a ver que eu não precisava, não ficava dependendo de... Porque muita gente passa a não entender

mais, aí trata você... Se você não tiver cuidado, você vai ficar como uma pessoa ultrapassada, que não acompanhou.

P: Mas, assim, no fundo mesmo, se você fosse dar... um grau de zero a cinco em

relação a gostar de usar computador no trabalho, você daria, de zero a cinco, quanto?

Opinião pessoal.

E2: É... Não, não daria nem, não daria nada de z... Eu daria cinco para ele, mas junto com

as outras coisas. Eu acho...

P: Mas, assim, de gostar de usar?

E2: Ah, eu gosto, agora eu, eu já gosto. Mas eu gosto das duas coisas. Dos dois. Eu acho

que computador e uma prancheta do lado é a melhor companhia que tem. Entendeu? É o

computador, pincel, caneta, tudo junto, com scanner e impressora. Fez uma coisinha legalzinha, escaneia e faz, entendeu? Mas não pode, sabe, uma coisa não detona a outra.

P: Entendi.

E2: Pô, imagina, antigamente, a gente sofria muito para marcar títulos em anúncio. É gostoso fazer letra, mas, assim, pegar letra que já está pronta e repetir é uma coisa. Porque

desenhar uma letra, inventar uma letra é legal, às vezes eu pego, eu já fiz tipologia no Quark, só

com quadradinhos, assim. Já montei, já fiz umas maluquicezinhas, entendeu? Então eu acho que é legal, eu não... não tenho... a nota para ele para mim é... é dez mesmo, acho o computador o máximo.

P: Você gosta de trabalhar com ele?

E2: Agora gosto, eu gosto, gosto. Eu só não sou é tão aficionado com isso, mas eu não tenho paciência, mas isso é uma coisa minha. Mas eu gosto, gosto. Eu acho legal ter toda essa

parafernalinha junta, entendeu? Do computador, você senta ali. Sabe? Eu sempre fiquei pensando... acho que o legal mesmo é assim: pô, você ter um Estúdio onde você pudesse ter

assim o computador ali e ali no meio você ter uma p... mesa com só papéis bacanas lá embaixo... Que depois é o gostoso, quando você pega o trabalho, você monta ele, passa cola para montar, entendeu, botar um acetato... Sei lá, eu acho ruim porque... faz falta aquele cheiro

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de papel, o cheiro da tinta. Acho que os grandes artistas, eu acredito que têm os dois lados. Eu

só quero dizer que os dois são superbons, eu acho que ele é mais uma ferramenta que veio

para...

P: Ajudar...

E2: Para ajudar. Mas, assim, enfim, voltando à história da computação. Eu sempre conto

para a galera, digo: “Galera, essa história que eu vejo do computador hoje, como se o resto das outras tivesse se acabado, vi exatamente na música, quando apareceram os teclados, os sintetizadores.” No Fantástico, o Cid Moreira falava: “Ah, este sintetizador vai substituir uma

orquestra de não sei quantos músicos.” Então falaram tanto essa besteira, e não substituiu p... nenhuma. As orquestras continuam, os músicos... os acústicos vieram, né? Ele que falava, parece que não ia ter mais nada, não ia ter mais mais violão, não ia ter mais sax, não ia ter mais

baixo acústico. Esse foi o terror que implantaram na época. Só que nada! Tem a música eletrônica, quer dizer que o computador tem a sua, faz aquela música toda eletrônica, o techno, e

mesmo a música eletrônica agora, que... você pega uma coisa gravada e... uma coisa de vinil e passa para o computador, e programa e mexe e não sei o quê, tem o seu mercado. E tem outro lado que não tem nada disso. Que ele ajudou na parte técnica, na parte de gravação.

P: Então...

E2: Faz ficar melhor.

P: ...quando você fala da época em que você tinha rejeição ao computador, era... a

essa...

E2: Como mais ou menos uma preguiça. E saber que aquela era mais uma m... que eu ia ter que aprender, que o outro, eu já tinha mais um dom. E aquele ali, eu estava sendo obrigado a

aprender! Você entendeu? Estava sendo obrigado! Eu fui me aprimorando, mas eu não tinha

dificuldade, porque eu já tinha aquela coisa de desenhar, já era uma coisa supernata, sabe, eu olhar uma tipologia e ficar fazendo um título de um anúncio. A gente desenhava na mão, com

lápis mesmo, com manteiga [papel-manteiga], depois passava, depois pintava... Na hora de

pintar, então, eu adorava, porque, pô, fazer aquele contorninho todo com guache... E a gente trabalhava com material de primeira. Como hoje a computação também, na época também o

nosso material sempre foi o melhor, tudo era profissional, entendeu? Então eu falei: “P..., de

novo? Agora eu vou ter que pegar e ficar abrindo esse monte de janelinha... ficar descobrindo este monte de m... que parece que é fácil?” E vou falar uma coisa: não é fácil p... nenhuma. Ainda mais quando você fica criando rejeição, que você fica... bloqueando mais. Não é tão fácil,

não. O negócio é você... sentar para fazer mesmo e contar com a ajuda, né, porque até aqui deu o nosso jeito mesmo, brasileiro, não sei se em outros lugares também as pessoas começaram a aprender assim. Do jeito que um cara vai aprendendo, que às vezes é um pouco errado, ele vai

passando para o outro. (Risos.) E é assim que todo mundo foi aprendendo a mexer em computador. Ninguém... Raramente você foi vendo nego fazendo curso... Hoje sim, você vê

mais... você vê mais, assim, não sei.

No início, os diretores de arte mesmo, que criavam mesmo, os caras não mexiam. Muita gente não mexia. Sempre tinha um assistente, os operadores, foram os caras que começaram a

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vir de fotolito para dentro de agência. Que sabiam mexer na máquina mas não tinham às vezes o

olhar, às vezes ele põe um negócio lá no meio, você chega e olha, eu sempre olho e vejo que um

lado está muito diferente do outro.

E eu quero aprender mais ainda, preciso aprender muito mais.

P: E quando você pensa essa coisa da facilidade de uso, né, de usar o computador.

Você acha que você tem facilidade? Pouca, média, sei lá. Se você fosse falar assim, de zero a cinco?

E2: De zero a cinco? Ah, é média, ainda tenho muita dificuldade.

P: É uma coisa pessoal, mesmo, né?

E2: É. Médio, eu sei disso, é média. Mas eu procuro o tempo todo mais, falo assim: “Não,

não posso ser distraído.” Eu tenho que, em determinadas coisas, pegar e anotar. Agora eu já

tenho mais cuidado. Eu acho que a gente está meio numa decadência também, em relação a... deixa eu explicar: não é o trabalho do diretor de arte, é como as agências estão agindo, botando você praticamente quase para finalizar o trabalho, acho que diretor de arte está aqui é para criar

e para fazer, mas não. Agora você tem que se preocupar com tanta coisa! Se a imagem está em alta [alta resolução], com a burocracia do negócio. Eu sempre detestei burocracia. E o computador tem burocracia no meio. Esse é o problema. Tem burocracia. E agora o que é que

faço? Eu faço um trabalho aqui, eu estou fazendo um anúncio, sozinho. Eu vou ter que finalizar ele. Uns tempos atrás, há um ano e pouco, eu ficava em pânico. Às vezes eu pegava e dava um

tanto para um amiguinho, alguém finalizar, só para eu não fazer aquilo. (Risos.)

Mas já tenho mais segurança com isso. Estou cada vez tendo mais. E cada vez mais estou vendo que vou ter que fazer sozinho.

P: Agora, isso de... essa pressão, né? Você tem que porque o mercado... exige. A pressão do mercado em cima dessa coisa do computador, se você fosse dizer de zero a cinco, você ia classificar como?

E2: Acho que a pressão também tem o seu lado bom, porque senão ninguém vai aprender. Se não pressionassem tanto... pô, assim, eu... praticamente eu não lembro, assim, de alguém, acho que tem uns dois aí que não... não fazem nada. Até sabem, mas não sentam. A pressão?

Não sei se pressão é bom, né? A Nádia sempre falava: “Vocês gostam, a Criação gosta de trabalhar na pressão. Se é para daqui a um mês, vocês não vão mexer nisso, vocês só vão mexer, quando chegar uma semana antes, eu vou perguntar: ‘Ei, tem alguma coisa?’, ‘Ainda não, ainda

tem tempo’.” Então quando vê que está em cima da hora é que nego senta e faz. Então a pressão, se a pressão é válida? Ih, é difícil falar, de responder.

P: Você acha que a pressão é que faz você procurar... saber mais sobre computador, né? Por você, você não...

E2: Não iria sair correndo atrás. Olha, o dia em que eu comprei [um computador] e pus em casa, eu sabia que ali já tinha... pronto, já tinha passado o... pânico.

P: (Risos.) Engraçado o... o nome que você, né, que você dá, “o pânico” mesmo.

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E2: (Risos.) O pânico. É, o pânico, falava assim: “Como é que vai ser com essa p... se eu

não sei mexer nisso?” Fico mexendo com o auxílio dos outros, demais... Ah, estar perto dos

outros, trabalhando, alguma coisa: “Fulano?” Como eu já falei, às vezes eu ligo para perguntar, mas não é mais nem o... Meus amigos brincam comigo, com isso. Pela minha falta de paciência.

“Faz esse favor de dar uma bica no computador!”

Acho que o... medo mesmo, isso... isso já passou. Eu tenho é que... cada dia que passa emburacar mais. Às vezes eu fico pensando assim: agora eu não estou podendo fazer isso, mas

eu quero aprender a mexer no Flash, que eu acho importante à beça, eu gosto de animação... É.

Fico vendo às vezes, tem um monte de gente que sabe mexer no Flash, aí fazem umas coisas tão... caretinhas, entendeu? Eu fico vendo o Tocha, ele começou a mexer no Flash assim sem

fazer curso, sem nada, até porque o Tocha já está há muito tempo mexendo em computador,

para o Tocha não é problema, entendeu? Tem gente que é assim, para ele aquilo não é problema. Tudo, praticamente tudo, vai ser raro ter uma m... que ele não resolva.

P: E quando você pensa que uma coisa é legal você fazer, você pensa na utilidade, né? Como é que você pensa o computador em relação à utilidade?

E2: Dá para fazer uns clipezinhos, às vezes até pegar assim... Poxa, no Flash, eu fiquei vendo umas vezes o Tocha fazer uma animação dele e do JB, assim, eles fizeram vários

pontinhos dele nadando, daqui a pouco quando eu vi o negocinho pronto, na tela, parecia uma vinhetinha da MTV, uma coisa assim. Sabe? Ele deu um tratamento na imagem, que ela ficou

meio, parecia um desenho... sabe, aquilo caminhava. São coisas que eu gosto, adoro arte gráfica, adoro programação visual, tudo isso.

P: Entendi. Você acha que o computador é útil para você?

E2: Como assim?

P: Você pode fazer com computador e pode fazer sem computador, né?

E2: O quê, o...

P: O trabalho de diretor de arte.

E2: O quê, o trabalho? Ah, só com, só com computador agora, como é que eu vou apresentar... Não, não se apresenta mais leiaute como era, não tem jeito, é só no computador,

não. Quer dizer, quer ver uma coisa em que eu não estou usando computador? Para música. A

única coisa que eu faço é copiar CD, mas eu não estou usando ele para fazer nada. Mas é uma coisa que eu quero futuramente. É um mundo... parece que sem fim. Então é superválido, não

quero... Nossa! Acho que vai ser difícil sobreviver daqui a um tempo sem isso.

P: E do que é que você mais gosta no seu trabalho? Como diretor de arte?

E2: O trabalho de direção de arte de agência, eu já não acho tão bacana hoje, não. Não

acho mais tão... Eu prefiro o... o trabalho do design mesmo.

P: E qual a diferença que você vê entre o designer e o diretor de arte?

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E2: É não ficar criando anúncio, aquela burocracia de agência. Acho que eu queria era...

uma coisa mais de coisa de arte. Não ficar vendendo sabão em pó. Em agência, a gente sofre

muito, entendeu? (Risos.) Sofre muito em agência.

P: (Risos.) Explica um pouco o sofrimento da agência de propaganda.

E2: Ó, você pega um pedido, de uma campanha, e você vai, pensa e mostra e não, o

conceito é esse, e faz tudo legal para c... E chega lá, eu não sei, ou é mal apresentada, ou o cliente mesmo é um cara que nunca entende nada, não gosta de coisa boa, só aprova coisa mais ou menos... E aquilo volta... E a primeira reação da Criação são as patadas, só falta querer jogar

o negócio fora. E mexe um pouquinho... tenta salvar. Vai e depois volta de novo... Enfim, a gente também, tinha uma época em que achava que tudo a gente tinha razão, mas às vezes... de um tempo para cá eu comecei a pensar também no cliente, também. Tanto que eu sempre fui

contra uma coisa: de ficar premiando anúncio só porque ele é criativo e só por isso. Eu acho que deveria ser premiado pelo resultado também. Devia ganhar um prêmio quem fizesse uma

campanha boa mas ela tivesse um bom resultado também.

P: No marketing direto eles levam isso em conta, né?

E2: É, porque... bom, você não está fazendo só para você. Que... o que acontece é que o...

a galera é muito egocêntrica, então a maior parte das pessoas fazem uma coisa pensando em prêmio, fazem para si e para os amiguinhos. Eu vejo direto. Eu até parei de discutir isso, quando você começa a discutir parece que você é careta, que você não quer... fazer as idéias

mirabolantes, você quer... está igual cliente.

“Não, gente, propaganda é... é resultado também.” De que adianta um filme aí que todos os amiguinhos gostaram e ninguém na rua entendeu direito?... Tudo bem, você não pode nivelar

por baixo, mas tem que ter as duas coisas. Eu vejo declarações de outros caras mesmo, do Marcelo Serpa, desses caras poderosos, o cara acha a mesma coisa também. A Criação deveria até parar mais de falar mais e trabalhar. Deixar de ficar fazendo só coisas só para... os próprios,

entendeu? Para os amiguinhos deles verem — “Olha, ah, que criativo”.

P: E só.

E2: E só. De que adianta se chega aí na casa da pessoa e ela nem parou para ver?

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7.3. Resumo da entrevista 3

Sexo: Masculino.

Idade: 30 anos ∗.

Naturalidade: Rio de Janeiro, RJ.

Experiência em direção de arte: 9 anos (de 1993 a 2002).

Formação universitária: Não tem.

Observação: Não trabalha mais com direção de arte de publicidade.

PESQUISADORA (P): Para começar, fale resumidamente sobre a sua trajetória

profissional.

ENTREVISTADO 3 (E3): A minha trajetória profissional começou aos 15 anos, na AGÊNCIA 4∗∗. Comecei como office-boy e fiquei lá bastante tempo, mais ou menos uns quatro

anos, cinco. E de lá fui para a AGÊNCIA 2, onde fiquei também bastante tempo. Em seguida fui para o Rio Grande do Sul, trabalhei na AGÊNCIA 16. E da AGÊNCIA 16 – eu fiquei três anos lá no Sul, foi uma experiência maravilhosa – voltei para o Rio, trabalhei na AGÊNCIA 17 e é isso

aí.

P: Se alguém te perguntasse a sua profissão hoje, que resposta você daria?

E3: Fotógrafo.

P: Como você vê o computador no trabalho de direção de arte, no dia-a-dia?

E3: Olha, eu vejo o computador como uma... ele não passa de uma ferramenta. A visão que eu tenho do computador hoje é talvez a que o Ziraldo tinha, ou tem, da prancheta, do bloco.

Sabe? Para mim, ele não passa de uma ferramenta que às vezes complica mais o trabalh o do que

ajuda. Mas, como qualquer coisa que é evolução, acho que isso é natural também. Você tem é que saber dosar até que ponto essa ferramenta vai te levar para um caminho bem-sucedido do trabalho ou até que ponto ela vai detonar com o teu trabalho. É isso.

P: Essa coisa de complicar é como?

E3: Complicar é, por exemplo, quando você começa a usar os recursos gráficos que o computador te oferece, e na verdade são coisas que você acaba banalizando o teu trabalho. Você

acaba tornando ele falso, cheio de coisas que não precisava. Hoje em dia, você tem um programa chamado Photoshop, que teoricamente resolve quase tudo. Então, hoje você tem uma foto do rosto de uma pessoa e você não tem um rosto, você tem uma plástica. Hoje em dia,

ninguém tem ruga. Todas as mulheres lá da Playboy são perfeitas, porque o sujeito pega,

∗ Esta entrevista foi realizada em setembro de 2003. ∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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fotografa lá a fulana. Fotografou e a bunda da fulana é ruim, pega uma bunda que está no

estoque, na mesma posição, e substitui. Aí a fulana já ficou com a bunda da outra, o peito da

outra. Eu estou sendo até grosseiro, mas é em miúdos, em nuances, que isso ocorre. Você pega uma foto, começa a tirar ruga, daqui a pouco você descaracterizou a pessoa. Você tirou os traços

da pessoa tentando suavizar, tentando buscar uma perfeição que não existe. Acho uma tolice

você ir atrás de uma perfeição, de um detalhe de um grão que você só está tirando a força de uma presença, você está maquiando tanto a coisa que isso não está passando uma coisa real para o consumidor ou aquele que vai estar diante do seu trabalho no futuro.

P: E, na sua opinião, quais foram as mudanças que o computador causou nas agências de propaganda?

E3: As mudanças... A grande mudança foi a questão do prazo, né? Eu peguei bem essa

chegada do computador em agência de propaganda. Talvez eu tenha sido da primeira geração dessa história.

P: Em que ano?

E3: 90. É. 90, 90 e... até 95 começou a entrar. Em 95 já estava dominado, já.

P: Você entrou na AGÊNCIA 4 quando?

E3: Em que ano? 88, mais ou menos, 89. Qual era a pergunta mesmo?

P: Na sua opinião, quais foram as mudanças causadas pelo computador?

E3: Ah! A primeira grande mudança foi na questão do prazo. Se você vê que antigamente

o maior departamento de uma agência de propaganda era o Estúdio, onde você tinha uma pessoa que só marcava letra, você tinha uma outra pessoa que só ilustrava, você tinha uma outra que só montava os leiautes, você tinha uma outra que só finalizava trabalho... Então o computador

acabou tirando tudo isso, né, acabou tirando os grandes artesãos da publicidade, se você for falar

de uma forma lúdica. Mas o que é que aconteceu? Eu acho que esse prazo — que você tinha às vezes três, quatro dias para desenvolver um trabalho, desenvolver um... O diretor de arte fazia

mais um rafe, isso descia para o Estúdio, o Estúdio ia, marcava a letra... A agência que tinha

uma grana a mais tinha um fotógrafo dentro da agência... Porque não tinha computador. Você precisa de uma cesta de frutas, ou você fotografa ou você ilustra. Então, se você tinha um

fotógrafo, o fotógrafo fazia a foto e você aplicava no leiaute. Se você não tinha um fotógrafo, o

ilustrador ilustrava, fazia uma mancha gráfica desse trabalho e isso aí saía. E, diante disso, eu acho que a coisa ficou muito... isso na questão do prazo.

E tem uma outra questão, que eu acho que as pessoas ficaram mais engessadas. Então, se

você comparar a publicidade de hoje com a publicidade antes do computador, você vai ver que existia mais um trabalho gráfico do que hoje. Hoje é uma fonte lá, e o cara bota um efeito do

computador, um blur, um... sabe, alguma coisinha e está pronto. Antes do computador as

pessoas desenvolviam fontes, desenvolviam letras, tinham um trabalho mais pessoal. Hoje em dia você não sabe o que é o quê, o que é de quem. Então existe sempre um padrão, hoje é um anúncio de mobiliário, tem que ter aquele monte de papéis com sombrinha aplicada, aquela

letra. E numa outra era na propaganda você tinha que desenvolver de uma outra forma isso, você trabalhava mais um bico de pena, você trabalhava mais uma xilogravura, então você

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buscava mais os recursos. Hoje não, você senta num computador, você precisa de uma

referência, você vai num site de imagem; você precisa de gato, o site te dá quinhentos gatos,

você vai lá, escolhe um, põe no teu leiaute, está pronto.

E com isso o cliente já quer ver a peça dele pronta, na frente dele. Antes de ser publicada,

ele quer ver exatamente o que vai ser. E aí o que é que acontece? O diretor de arte recebe um

briefing às cinco da tarde que é para o dia seguinte. Ele vai, cria com seu dupla, concebe uma idéia e vai correr atrás das referências. Eu costumo brincar e dizer que publicitário e empregada

doméstica são as duas únicas profissões que precisam de referência. (Risos.) O publicitário não

consegue viver hoje sem uma referência. Então, qualquer coisa que ele vai criar, ele vai buscar em algum site, algum livro, alguma coisa e jogar isso na peça dele. E aí ele vai, pega a foto linda

lá de Nova York, ou Paris, aquele preto-e-branco maravilhoso, joga no trabalho dele, o cliente

acha lindo, aprova. Aí essa peça, essa foto que já existiu para um outro trabalho, você vai acabar pegando os mesmos conceitos dessa referência e seguindo. Quando você não tinha esse recurso, você tinha que desenvolver esse conceito próprio. Você tinha que desenvolver essa questão,

essa condição. E hoje não, hoje você vai em cima da referência da referência, então daqui a pouco você vê uma empresa processando a outra porque tem uma foto de uma modelo com um casaco de gola rulê que é igual à do concorrente. De repente os dois pegaram a mesma

referência e usaram, né? Então eu acho que acabou a coisa ficando mais num gesso, ficou mais presa. Não é mais solto, mais gráfico mesmo, igual àqueles leiautes da década de 70, aqueles

leiautes maravilhosos, né, aqueles all types lindos.

E aí, mais uma história que aconteceu. Na publicidade antigamente você tinha redatores, né, que faziam textos e títulos e... Na época lá do Rogério Steinberg, era uma época bem legal, que tinha a Marina Colassanti que fazia redação na agência de publicidade. E aí os caras tinham

que vender um apartamento na avenida Atlântica de, sei lá, estou chutando, quinhentos metros quadrados, aí os caras vêm com essa: “More longe de tudo.” Se referindo a que a sala é longe do

quarto, o quarto é longe da cozinha... Então, eu acho que é isso que falta hoje, é título, sabe? Trabalhos mais... você pára, lê e fala: “Caramba!” Aí hoje a publicidade é simplesmente visual. O que é a publicidade hoje? Se você pegar os três últimos anuários, você vai ver cinco anúncios

all types, cinco anúncios de título e todo o resto é uma imagem distorcida ou manipulada de alguma forma, que vai fechar com uma amarração. Então publicidade hoje está resumida a: “Você não vai viver sem isso. Fulano de tal. Imagina o seu mundo sem a sicrana de tal. Sua vida

mudou.” O cara ganha o que ganha, fica horas e horas, e põe no anúncio “Sua vida mudou”? Por quê? Porque tem uma força da imagem, tem essa imagem que é o Pão-de-Açúcar lindo, com aquela luz européia, né, nego faz aquela luz, e aí eu não sei se isso é legal. Acho que essa

chegada desse instrumento, da máquina, acabou distanciando um pouco de uma publicidade

mais humana, mais de fala mesmo. Hoje em dia é tudo uma p... imagem e um textinho embaixo.

P: Como foi o seu primeiro contato com computador? Quando você começou a usar?

E3: Eu lembro bem. Ele chegou na agência, foi um PC, um 286, nada mais do que isso, e todo mundo olhava, falava assim: “Caramba!” O computador chegou na agência de propaganda

via Estúdio, ele não chegou via Criação. Ele não chegou como uma ferramenta para Criação, ele

era uma ferramenta para o Estúdio. Porque antigamente, para você fazer um anúncio qualquer,

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você criava, desenvolvia, fazia o leiaute e tal, aí o cliente falava: “Tá, vamos finalizar. Vamos

produzir.” Aí o produtor gráfico pegava o telefone e passava esse texto via fax e o título às

vezes via telefone, também via fax, e aí era calculado, a fotocomposição e fototraço. Fototraço era nada mais, nada menos que fotografia das letras ou de qualquer outro traço em ampliador,

que você montava os títulos. E a fotocomposição era um computador em que o cara digitava

aquilo na fonte que você queria, e isso saía. Só que esse processo demorava quatro horas, cinco horas. As empresas que depois se transformaram em fotolitos e deram seqüência, algumas viraram birôs hoje, elas tinham oitenta motoqueiros para atender o mercado publicitário do Rio

de Janeiro. Tinha uma fotocomposição que se chamava Letra, ali na Senador Dantas, número 40, a calçada ia de moto do número 40 até a Cinelândia. E na agência era aquela loucura, esperando esse material chegar. E daqui a pouco chega uma maquininha, que você vai lá, faz

isso, imprime numa laser, pronto, sua fotocomposição está na mão em quinze minutos. Fantástico. E aí foi para o Estúdio mesmo. E aí foram aparecendo novas máquinas, foram

desenvolvendo mais e mais, e aí o Estúdio já se equipou... e agora? E agora vamos passar essas máquinas para os diretores de arte.

P: Do Estúdio para a Criação?

E3: Para a Criação. Pelo menos foi assim lá na AGÊNCIA 4. As primeiras máquinas foram para o Estúdio, que era uma questão mais da produção, não da criação. E eu acho que é de onde elas não deveriam ter saído. O computador tinha que parar no Estúdio como uma ferramenta de

finalização, de produção. Hoje ela é uma ferramenta de criação em função do tempo e de tudo mais, mas se você tiver um diretor de arte bacana, que faça o rafe e que passe o rafe para o Estúdio, eu acharia isso sensacional. E se eu fosse ter uma agência hoje, eu ia ter esse perfil de

profissional. Vai para a Criação e na Criação é bloco de papel-manteiga, caneta, lápis, grafite, o

que você quiser. Deixa o computador lá para o Estúdio. Ele chega com o rafe, o cara que faz o leiaute, o arte-finalista, ele faz o teu rafe no computador, te apresenta e é isso.

E tentar ver essa questão do tempo, né, hoje você tem que ser rápido, tem que ser dinâmico, mas espera aí. Se você produz dez campanhas por semana; às vezes você faz uma campanha em uma semana, a qualidade técnica dessa campanha que você fez em uma semana é

infinitamente melhor do que se você somar as dez que você fez durante esse período. Então eu

acho um tiro no pé essa questão de você começar a atropelar o tempo. Chegou ao caos de que não há tempo físico para mais nada. As pessoas passam vinte horas dent ro de agência, viram

noite. Se você pegar por segmento as profissões em que a galera mais trabalha extra, os

publicitários estão lá na frente.

P: E foi por essa insatisfação que você resolveu mudar de atividade?

E3: Também. Foi mais pelo estresse que é gerado. Você buscar uma perfeição de você

olhar e falar: “Não, mas essa textura de madeira não está tão madeira...” Pô, não é madeira, isso foi feito no computador, textura de madeira você vai lá e fotografa! E aí você não precisa estar criando os veios, porque isso já existe. Esse cuidado, essa coisa, e você morre para fazer um

anúncio que no dia seguinte está embrulhando peixe. Então eu não posso chegar aos quarenta anos acabado porque passei a minha vida inteira produzindo embrulhos para peixe. Sacola para

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jogar lixo... (Risos.) Sabe? Então eu acho que é sério, tem toda essa questão, mas há o exagero

no publicitário, nessa busca.

E eu fiquei meio decepcionado também, fui amadurecendo, fui crescendo, tendo mais uma opinião. No começo não, tudo vai te influenciar. Depois você começa a... “Não, isso aqui

não é por aí, isso aqui também não funciona.” E eu fiquei meio decepcionado porque os caras

passaram a não trabalhar para o cliente, passaram a trabalhar para eles próprios. Se você entrar nos sites do mercado, você vai ver que os caras estão se promovendo com anúncios de... de

lançamento imobiliário no Encantado... Sabe? Publicitário adora criar peças filantrópicas.

Rapaz, eu tenho um ódio a isso!... Porque na verdade isso é “pilantropia”, é coisa de pilantra. Por quê? Porque o cara pega um sujeito que está f... na rua, pega um ceguinho, um velhinho, um

deficiente físico, pega essa galera, expõe de uma forma dramática para se promover, ganhar um

prêmio com essa campanha, para chegar na sala do chefe dele e pedir um aumento, e a galera, meu irmão, está se lascando em bandas. Acho que isso é uma falta de responsabilidade muito grande. Acho que você pode crescer em cima de um monte de coisas, e vai crescer logo em

cima de quem não tem um pingo de perspectiva? Ou, se tem, sabe, é muito mais difícil para ele do que para mim? E aí eu vou sugar isso, eu vou ser um vampiro? Eu acho isso cruel demais. Muito sério e eu não faço. Nunca fiz, não me arrependo e pretendo não... A menos que eu veja

que é uma coisa séria mesmo, de fato, e que eu estou fazendo para aquela causa ali. Se bobear, eu nem quero divulgação de nome, de nada, porque não é isso. Primeiro o cara divulga que está

criando uma campanha filantrópica, olha só. É um absurdo muito grande.

P: Agora eu vou pedir para você pontuar, mais para ter uma referência...

E3: Numa escala, é isso? De zero a dez...

P: É. Se você gosta de usar computador, de trabalhar com ele. Gostar no geral

mesmo. Se você fosse classificar, que grau você daria?

E3: Eu não gosto nem desgosto. Eu acho um mal necessário. Eu não sou apaixonado, não

sou aquele cara que fala n linguagens. Eu não sei nada disso. Eu chego lá, abro um programinha... Tem uma coisa que me deixa revoltado: tudo é em inglês. Isso é uma falta de respeito muito grande, um país que consome o que consome, a gente tem que estar in roaming,

web, deletar, download... Poxa, será que a gente não tem isso no nosso vocabulário? Eu sou

brasileiro, bota aí em português.

P: Então, se você fosse dar nota para o gostar, o prazer, quanto você daria?

E3: Uns quatro, três. Radical.

P: Qual dos dois?

E3: Três, vai. “Ah, vou chegar em casa, que eu vou entrar no computador!” Estou fora,

não quero.

P: Nem para coisas sem ser do trabalho? É geral?

E3: Não. O que eu fazia no computador sem ser trabalho era um joguinho. Mas aí só tem joguinho de matar. (Risos.) É que eu nunca gostei de videogame, dessas coisas eletrônicas,

fliperama. Quem curtia isso na infância provavelmente deve curtir o computador, deve ficar lá...

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Como a minha infância era aquela infância de subúrbio, aquela coisa mais... corre descalço para

jogar bola, dá uma topada no paralelepípedo, vai para casa com o dedo inchado, corre, sobe na

árvore, no fim de tarde vamos no quintal da fulana pegar manga... Então isso talvez me deixou um pouco longe das tecnologias da época e, como tudo é um processo, quando chegou aqui eu

não ligo muito, não.

P: E se você fosse pensar na pressão do ambiente para a pessoa saber usar computador? No trabalho, né, na agência de propaganda. Se você dar uma nota para a

pressão da empresa, da agência, do cliente em quem trabalha em direção de arte, que grau você daria?

E3: Ah, eu acho que é muito grande. Qualquer empresa, você entra hoje em qualquer escritório, qualquer empresa, o computador está na mesa de cada um. A caixa de supermercado

tem um computador.

P: E para o diretor de arte também?

E3: Tem. Porque o trabalho todo é assim. Tem agências que passam... é tudo eletrônico. O pedido de criação vem por e-mail... É tudo digital. Você tem que saber, você tem que utilizar essas ferramentas. E aí você utiliza só para montar as coisas, aí vai usando mais, descobre que

ele faz um efeitinho. Aí, como ninguém é perfeito, você gosta do efeitinho, daqui a pouco você bota o efeitinho lá, e bota outro e bota outro e fica tudo um efeito só. O diretor de arte, hoje, que não opera computador, ele não se coloca no mercado.

P: Então, de zero a dez, seria quanto?

E3: Dez. Porque com nove... não rola, com oito não rola.

P: E agora de volta a você, pessoalmente, a facilidade que você tem em usar o computador, quanto você daria?

E3: Ah, normal...

P: Porque as pessoas têm graus de facilidade diferentes, né? Usando ou não.

E3: Eu tenho um grau de domínio dos programas que eu uso, é... Os programas gráficos

eu domino relativamente bem, assim, nove a oito. O Photoshop requer um pouco mais de técnica e aí eu peguei o básico do Photoshop, que é para o meu dia-a-dia — e que também não

dá para eu te um tratamento de finalização na minha criação, senão eu não vou cumprir o prazo

—, eu pego o básico dele, que foi o que eu aprendi, recortar e fazer uma gracinha aqui, outra ali. Aí eu colocaria uns sete ou seis, ou cinco, conhecimento geral para fazer o trabalho. Escaneou, recortar e tal, trocar uma cor, ajeitar, melhorar um pouco o foco, isso eu sei fazer, mas eu não

utilizo a carga máxima do programa, eu não tenho um conhecimento... Mas eu também não me interessei, eu não quis focar nisso.

P: Mas se você fosse dizer da facilidade que você teria...

E3: Oito. Oito.

P: E a questão da utilidade, se você fosse falar da utilidade do computador no

trabalho de direção de arte, que grau você daria?

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E3: Olha, baseando-se no que toda agência de propaganda ou outras empresas que estão

nesse mesmo nicho... eu acho que é 100%. Nada é feito... Qualquer outro sistema ou qualquer

outra situação em que você queira utilizar, você vai entrar no computador. Por exemplo, a fotografia. Falam da fotografia: “Ah, o cromo vai acabar porque tem a foto digital.” Só que o

cromo, a fotografia que você faz em película, ela vem, vem, vem, daqui a pouco vira digital,

porque você vai digitalizar essa película. E eu acho que ela tem um resultado infinitamente superior ao da digital, que já nasce digital, sem isso. Mas é 100% o uso da máquina, se faz necessário, criou-se um sistema, porque você tem fornecedores que se adequaram a isso, que se

estruturaram para essa coisa. E essa indústria é tão poderosa que você não pode ficar muito tempo sem investir, como empresário. Porque daqui a pouco, se você fica três, quatro anos sem trocar a máquina, daqui a pouco essa máquina, o programa que você tem, toda essa confusão,

daqui a pouco ela não serve lá no seu fornecedor, porque ele fez um upgrade, está investindo. Às vezes o cara faz um trabalho em Macintosh, aí vai mandar para o fornecedor e às veze s o

fornecedor é PC. Sabe? E aí? Aí não sai o trabalho. Tudo está dentro do computador, tudo está dentro desse jogo de mercado. Uma vez que entrou nisso, não tem como voltar, retroceder.

P: Utilidade mesmo, para fazer o trabalho, seria 100%?

E3: É... É 100%, porque, por exemplo, uma ilustração. Hoje em dia o cara não faz mais a ilustração toda na mão. Ele vai, faz um rabisco, passa uma caneta Futura, bota num scanner. Escaneado o traço, ele abre no Illustrator, começa a vetorizar o traço, que aí deixa de ser um

traço, uma imagem, passa a ser um cálculo matemático, um vetor. Fez aquele vetor ali, você pode ampliar do tamanho que você estiver a fim que não vai distorcer, não vai acontecer nada — você está mexendo em escala, ele vai sair de tanto para tanto —, e aí você vai colorir no

computador, você vai dar um negocinho aqui, outro ali no computador, uma sombrinha, um

brilho, e aí tem gente que já está ilustrando no computador, mais rápido, direto, o cara já faz em vetor. Então é 100%. O que não for, no segundo passo você vai... esse trabalho já foi

digitalizado. Ou se é um artesanato, ou se é uma ilustração, uma fotografia, não vai demorar

muito para esse material entrar num scanner ou numa fotografia digital para ser captado para essa ferramenta.

P: Então, no geral, você daria quanto?

E3: Daria 10. E na verdade essa utilidade foi imposta, sem dó nem piedade. Mas é isso, apesar de não ser favorável a determinada função... Por exemplo, o que eu sou contra é esse uso do computador na criação publicitária, a interferência dele na sua criação. Agora, essa

ferramenta na execução do trabalho, isso aí é inegável, isso acelera e vai te dar mais qualidade final para o teu trabalho. Agora, quanto à parte de criação... Hoje você tem diretores de arte que não têm a mínima noção de história gráfica e de cultura gráfica, não têm. Porque o cara já tem

computador em casa — antigamente para você montar um portfólio para iniciar numa agência de propaganda, putz!... — hoje em dia o cara pega meia dúzia de imagens, bota, bota uma

frasesinha lá, bota uma marquinha desse tamanho, tem um portfólio. Aí vai fazer uma mala-direta, é aquela mala-direta de uma dobra, em papel cuchê fosco para ficar bacana, sabe? Então não tem mais referências de papel, de... Se você falar no papel Scholler, essa galera nem sabe.

Scholler era o papel, o papel em que você mandava ver na ilustração final, no trabalho, o papel

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que as pessoas usam para fazer arte até hoje. Eu acho isso, que está cada vez mais deixando a

coisa mais fraca, mais aguada, vamos dizer assim.

E aí você começa a ver também uma outra história. De certa forma, as fotos publicitárias estão deixando de ser foto e estão virando ilustração de novo. Só que em vez de ser aquela

ilustração dos anos 70, 50, 60, passaram a ser as ilustrações modernas, editoriais. A Malu Mader

lá, lindona, fazendo propaganda para a Wella com a pele toda plastificada. É o preço que se paga. É isso.

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7.4. Resumo da entrevista 4

Sexo: Feminino.

Idade: 30 anos ∗.

Naturalidade: Rio de Janeiro, RJ.

Experiência em direção de arte: 10 anos (desde 1993).

Formação universitária: Desenho Industrial.

Observação: Abriu a própria agência há 1 ano e meio.

PESQUISADORA (P): Primeiro, eu quero pedir para você falar resumidamente sobre

a sua trajetória profissional. Como começou, quanto tempo faz, o que você faz hoje...

ENTREVISTADA 4 (E4): Tem dez anos, eu tinha uns 20, 21. A escolha foi Desenho Industrial, já senti que era realmente essa parte que eu queria trabalhar, né, visual. E a partir do

quinto período da faculdade eu já comecei a estagiar. Trabalhei em escritórios de design. Aí começa a reputação da “marca Renata”, né?

A empresa mudou de nome, ampliaram o que faziam. Depois disso trabalhei na

Manchete, por pouco tempo. Depois disso, por uma insistência contínua — eu ligava insistentemente, todos os dias, para a AGÊNCIA 10∗∗: “Quero estagiar aí. Quero estagiar aí.” E lá, naquela época, era “quem indica”. E eu falava: “Sou eu que indico! Eu quero trabalhar aí.” E

chegou um ponto em que: “Que saco, vem!” Aí eu fui estagiar na AGÊNCIA 10. Foi quando um diretor de arte falou: “Olha, você não está fazendo já isso.” Eu fui explicando: “Eu estou começando agora...” E ele pedia para eu fazer alguns trabalhos esporádicos, como frila mesmo.

E nisso eu recebi um convite da AGÊNCIA 18, através desses trabalhos esporádicos; o dono da

AGÊNCIA 18 me chamou para ser diretora de arte, já entrar como diretora de arte, e o outro era estágio, apesar do salário da AGÊNCIA 10 ser muito maior do que o que eu ia receber na

AGÊNCIA 18.

Fui para a AGÊNCIA 18. Fiquei lá três anos — estou com a memória hoje um pouco fraca —, fiquei muito tempo, até que ela foi comprada pela AGÊNCIA 19. Dez dias antes, o Sabóia,

que fazia parceria com a AGÊNCIA 18, me chamou para trabalhar na AGÊNCIA 20, e eu saí

antecipadamente. Da AGÊNCIA 20 eu fui puxada por uma empresa que hoje é uma empresa de design de homepage, de comércio eletrônico, foi onde eu estagiei primeiro, era só design antes.

P: Aí é em que época?

E4: Deixa eu ver... Foi no ano de 95. Enfim, fui trabalhar lá como chefe, eu coordenava a área visual das páginas. Fiquei um mês, foi quando eu percebi que eu não queria aquilo. Falei,

vou marcar uma entrevista na AGÊNCIA 2. E foi com o Otávio, na época, e não com o Marcos.

∗ Esta entrevista foi realizada em outubro de 2003. ∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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Fui para trabalhar com propaganda, no caso, né, mas o Otávio viu minha pasta e falou: “Olha,

dentro do que você tem aqui, há uma vocação nítida para o marketing direto”, que hoje é

marketing de relacionamento. O Otávio me fez uma proposta, entrei. Fui para a AGÊNCIA 1, trabalhei lá anos e fiz frilas com várias outras agências. Quatro anos. Depois tornou-se AGÊNCIA

21, marketing direto e tecnologia. Foi excelente essa atuação, apesar de que ali não houve um

portfólio efetivo, e sim um conhecimento de tecnologia e planejamento. Sempre me interessei por planejamento, fazia questão de participar de planejamento quando era permitido.

Aí a AGÊNCIA 21 foi-se. E para mim foi ótimo, porque eu já planejava abrir a AGÊNCIA

22, eu e a minha sócia, com foco estratégico em marketing de relacionamento, do início ao fim, e a propaganda acaba vindo por conseqüência.

P: E a AGÊNCIA 22 existe desde quando?

E4: Maio de 2002.

P: E, se alguém te perguntasse qual é a sua profissão hoje, o que você responderia?

E4: Se eu fosse posicionar hoje a AGÊNCIA 22, ela é uma agência de comunicação. Ela

não vende solução. A minha atuação é publicitária? Administradora.

P: E como você vê o computador no trabalho de direção de arte?

E4: Fundamental. Fundamental, ele propicia a agilidade, a rapidez, porque quando eu

comecei eu trabalhava manualmente. A história de que o computador vem para atrapalhar é como você delegar poder ao computador. Isso é balela. Inclusive por depoimentos de amigos

publicitários que, por serem top, eles têm assistentes. Eles têm muitas idéias mas, em compensação, se eles vão mexer no Photoshop, querem fazer alguma coisa diferente, já não sabem. Então ele é facilitador sim, ele tem recursos, você ousa. Qualquer coisa que eu queira

fazer manualmente, como uma mancha de vinho — eu faço questão de não perder o requinte na criação, que eu sinto que causa impacto na hora de mostrar o portfólio ao cliente —, eu sou capaz de fazer, pego a mancha e escaneio, coisa que o computador é até capaz de fazer, mas aí

vai demorar muito tempo.

P: E, na sua opinião, quais foram as principais mudanças que o computador causou nas agências de propaganda? Ou no trabalho de direção de arte, em geral?

E4: Eu acho que o que mudou na agência foi o comportamental das pessoas, entendeu?

Eu vou falar da pessoa, depois do trabalho. Os antigos, por resistência, por medo, enfim, “não sei trabalhar, não posso trabalhar”, essa cultura de que atingir a maturidade ou a velhice pode

causar algum problema, entendeu? Ao invés de olhar por um lado “ah, vamos crescer”. Então o

jovem chegando, com mais experiência, com mais expertise — eu dei aula de Macintosh, agora me recordo, muito jovem ainda, na época do estágio —, era uma ameaça a eles. Teve até um

caso de um diretor de arte, ele era mais velho, foi medir o banner, ele botou a régua no

computador, foi curioso o fato, né? Aí eu acho que tinha relação até com a inteligência. E para o jovem sempre foi muito bem-aceito, porque eles percebem a vantagem nisso. É saber usar.

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O que pode acontecer e que não acontecia é um pouco a banalização, puxar para baixo,

canibalizar o mercado gráfico que, por mais que fosse conservador, era mantido. Agora não,

qualquer filtro do Photoshop faz uma coisa muito ruim, né? É vista... muita coisa, muita coisa.

P: Você fala em termos de qualidade estética?

E4: Certamente. Certamente. E peca, no caso, o cliente, que não percebe isso. Eu sinto

mais pelas agências especializadas em design ou qualquer coisa assim. “Ah, tem gente que faz mais baratinho”, isso eu ouvia. Aqui na AGÊNCIA 22 nunca vivenciamos isso. Mas eu sinto isso, que o computador permitiu a promiscuidade de um design que é elaborado. Eu fiz curso nos

Estados Unidos de tipologia, porque tem que ter uma harmonia, fiz de cores, porque tem cores que aproximam, não é à toa que o McDonald’s se criou em amarelo e vermelho, entendeu? Tem toda uma concepção para atrair clientes, seja para o que for. E isso é a parte ruim do

computador.

P: E, no seu caso, quando foi que você começou a ter contato com computador? E

como foi o contato?

E4: Olha, foi no estágio, eu tinha um PC e foi em 94. Tem quase dez anos. Eu comecei a trabalhar em 93, 92 para 93. Então ali eu conheci o PC e na época eu me relacionava com uma

pessoa que já tinha familiaridade com Macintosh. Ele me provocou, ele vendeu o Macintosh para mim. E eu vendi para a AGÊNCIA 23, trabalhavam basicamente com quatro clientes, porém grandes, e eles decidiram comprar o Macintosh. Eu lembro exatamente o dia em que chegaram

os Macs, o Marcos Figueira olhou para mim e falou: “E agora?” Eu nova... o que é que eu fiz? Eu virei noites estudando Macintosh para poder saber. Eu fiz manualmente muitos trabalhos, de régua, de escala... lembra daquelas tarjinhas do Bob’s? Vermelhas...

P: Assim na diagonal?

E4: Exato! O cliente da gente era o Bob’s. Tudo, tudo daquela época, daquele ano de 93, tudo foi feito manualmente. Então era tarjinha por tarjinha... E esquadro, pintando com

nanquim, aerógrafo.

P: Bom, agora, nessas próximas perguntas, deixa eu te mostrar essas gradações. Você gosta de usar o computador, de trabalhar com o computador? E se fosse classi ficar o prazer — não a utilidade, a praticidade, o prazer mesmo — que grau você daria e por

quê?

E4: É dez. Dez. Prazer dez. Sem dúvida nenhuma. Gosto, gosto, com os paus que ele dá... Está me desafiando, vamos lá, vamos usar, vamos fazer diferente, eu e ele, vamos nos entender.

Enfim, eu tinha uma resistência a PC, que era até rotulado “Pouca Coisa”, eu achei isso pouca coisa, pouca coisa, e hoje eu adoro PC. Adoro.

P: E se você fosse classificar quanto uma pessoa que trabalha com direção de arte é pressionada pelas empresas — pelos clientes e pela agência, se ela trabalhar numa agência — a saber usar o computador, que grau você daria, de zero a dez?

E4: Eu daria uns... Dependendo do perfil da pessoa... Sabe por que eu segmento? É porque se querem uma pessoa muito boa — como tem diretores de arte muito bons —, eles

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pegam a pessoa e dão treinamento. Ou pedem que aprenda. Uma grande agência, uma AGÊNCIA

15 da vida, hoje em dia não tem ninguém que eu saiba, mas se for o caso eles te ensinam. Mas a

sua pergunta é grau de exigência, oito e meio.

P: Se fosse ou oito ou nove...

E4: Nove.

P: E se você fosse classificar a facilidade que você, pessoalmente, tem em usar o computador no seu trabalho, que grau você daria?

E4: Dez! Sem problema nenhum! Se eu tiver que descobrir, tranqüilíssimo, instalar... E

eu gostaria de voltar no ponto de classificar o quanto você é pressionado. No caso dos diretores de arte, né? Um redator, até releva-se, porque ele usa o Word, mas o diretor de arte sem computador... Deixa eu ir para o nove e meio, dez.

P: Nove ou dez?

E4: Eu daria dez. Porque é necessário, sim. Pressão total. A tecnologia. O que as

empresas querem? Uma AGÊNCIA 24. Ele quer um excelente profissional e tem quem saiba executar. Mas, se não tiver o executador ali, o diretor de arte tem que saber, entendeu? Isso no nosso segmento de direção de arte. Assim como para o atendimento hoje, diferente de

antigamente, é realizada prova de português, de inglês. Então, se perguntarem: “O inglês é necessário em agência?” Sim. É feita uma prova!

P: E se você fosse falar da utilidade que você vê no computador, que grau você

daria? A utilidade do computador para fazer o trabalho de direção de arte.

E4: Deixa eu perceber. Eu estou colocando tudo dez, fica muito alusivo, mas eu sou muito capr ichosa, eu gosto do Photoshop, porque ele permite um requinte, uma sofisticação, que

pode-se elaborar no leiaute e não dá para fazer sem o computador. O meu apelido era Renata

Blur, Renata Origami, né, das dobras. É Renata Blur mesmo, porque é um efeito do Photoshop, um pouco geral, mas teve uma situação muito curiosa na AGÊNCIA 2, em que eu fiz um arquivo,

e ele ficou tão grande, por causa dos efeitos, que eu não tinha como gravar e mandar, não tinha

CD, não tinha zip, não dava para repartir... E isso era às quatro horas da manhã, mais ou menos. Isso pela sofisticação e requinte que ele permite, não que um trabalho de tipologia só, all type

não... é maravilhoso, acho lindo... Eu ponho dez, porque eu não tenho vivenciado outra coisa a

não ser trabalhar com computador. A não ser um fundo, uma mancha, que eu faço à mão, fotografar para fazer leiaute, texturas, eu não quero texturas em background, não, fotografo um armário. Lembro o último trabalho que eu fiz, eu estava na casa de amigos, olhei um armário

belíssimo e fiquei ali enquadrando — parecia uma “tereteté”, né? — e, pô, isso aqui é um fundo! Eu peguei e fotografei aquele fundo. Entende a mescla?

P: Então, no geral, de zero a dez, você se posicionaria onde em relação à utilidade?

E4: Eu não vivo sem o computador! Enfim, faço trabalhos sem computador se for necessário, mas vou gastar mais dinheiro, mais tempo, não vai ficar tão bem-acabado, porque os

recursos estão menos disponíveis, então, dez.

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P: E o que é que te move no trabalho de direção de arte?

E4: Paixão. Paixão...

P: Se você fosse explicar, você consegue definir?

E4: A direção de arte? Porque como hoje eu tenho uma visão global...

P: É, hoje você está numa coisa muito mais abrangente.

E4: Abrangente. Você me perguntou: “O que é que você é?” E eu demorei. Hoje eu sou administradora, né?

P: Você dirige a sua firma, né?

E4: Exatamente. Agora, o que me move na direção de arte? O elemento motivacional é o prazer, é o gostar de fazer isso. A paixão pela estética, pelo visual, pelo componente, por

agregar valor para construir junto com o texto... dar vida, entendeu? Mas o que move é a paixão.

É isso que você está perguntando?

P: É.

E4: É paixão, é paixão. Eu sinto que eu entro um pouco em estado de criança, onde você

literalmente delibera. Você fica sem restrição, entendeu? Vamos criando, vamos criando! Sai besteirol... Eu sinto isso porque antes eu me resguardava para criar texto, afinal de contas os redatores são sempre melhores, e eu tenho um redator que é excelente, o Ricardo Gualda, e

como ele é que fazia e eu duplei com ele muito tempo, era “Uau! Uau!”. E hoje eu compartilho com ele que nessa deliberação sai muita coisa legal. Há pouco tempo eu fiz um trabalho para um

cliente, simples, simples. No caso, eu poderia pegar uma ilustração. Não, fiz questão de fazer à mão, para passar mais realidade... e fiz o título. O presidente do Clube de Criação... “Perfeito, não ouso modificar, o trabalho está irretocável.” Depois disso, então, é um elixir, né? Foi um

elogio sem igual.

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7.5. Resumo da entrevista 5

Sexo: Masculino.

Idade: 31 anos ∗.

Naturalidade: Porto Alegre, RS.

Experiência em direção de arte: 12 anos (desde 1991).

Formação universitária: Comunicação Social, com habilitação em Propaganda e Publicidade.

PESQUISADORA (P): Para começar, eu queria que você resumisse a sua trajetória profissional. Falasse um pouco sobre como começou...

ENTREVISTADO 5 (E5): Ontem mesmo eu tive que fazer uma biografia para mandar para a

França... Eu resumi muito. Eu comecei em agência pequena, então acaba não fazendo muito peso no currículo, digamos assim. Depois eu passei muito tempo numa agência média e depois

muito tempo aqui, que é há seis anos, praticamente. Então, eu comecei no quarto período da

faculdade, eu tinha 19 anos, mais ou menos isso, aí eu fui trabalhar na AGÊNCIA 25∗∗, que tinha a conta da Warner, fazia lançamento de filmes, fazia aqueles materiais de apoio, promocionais,

aí eu fui trabalhar num birôzinho de design, onde eu aprendi para caramba, chamava AGÊNCIA

26. Na época tinha uma conta grande que era a Sloper, aquela loja que não existe mais, agência de varejo e tal. Mas era ainda a época do paste-up, das bolas de borracha, marcação de leiaute com guache, isso tudo eu acho interessante, é muito o aspecto artesanal da direção de arte, que

ficou meio perdido com o lance do computador. E aí eu trabalhei algum tempinho ali e depois fui para a AGÊNCIA 27, na época era uma agência média, atendia aquelas bebidas Kovak, São João da Barra... Enfim, era uma casa enorme em Botafogo, da época áurea da propaganda, né,

na mesma rua Dona Mariana você tinha a AGÊNCIA 27 na porta, a AGÊNCIA 28 no meio e essa maior agência brasileira, a AGÊNCIA 6 ficava num casarão logo ali perto também, a AGÊNCIA 29 era na praia, enfim, o bochicho de Botafogo.

E aí depois a gente se mudou para o Centro, e isso foi já no meio da década de 90. E aí muita agência quebrando, as agências violentamente passando por downsizing, aí entrou o computador, e os departamentos de Estúdio, aquela insanidade, as pessoas sendo demitidas e tal,

os diretores de arte tendo que correr atrás do atraso tecnológico, né, ou, enfim, tentando emparelhar. E eu me lembro de quando veio o Macintosh, a plataforma da minha agência era toda PC e todas as principais agências do Rio, as maiores, puseram Macintosh. Eu comprei um

Macintosh para mim, comecei a aprender, estudar e tal, e aí pintou essa oportunidade aqui, na AGÊNCIA 30, na época era a antiga AGÊNCIA 31, que sempre foi uma agência grande brasileira,

mas que depois foi comprada pela AGÊNCIA 30, que é uma das maiores agências da Europa, hoje do mundo. Então eu vim trabalhar aqui seis anos atrás. E é mais ou menos isso.

∗ Esta entrevista foi realizada em outubro de 2003. ∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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P: Então, ao todo...

E5: Doze anos.

P: E se alguém perguntasse hoje qual é a sua profissão, o que você responderia?

E5: Eu sou diretor de arte. Eu tenho um cargo aqui dentro, que não é um cargo

oficializado, de carteira, que é de Diretor de Criação Adjunto para uma marca daqui. Quando

me perguntam eu falo publicitário, se me dão espaço para especificar, eu falo diretor de arte. Diretor, né, minha mãe achava que eu já era diretor quando eu tinha 18 anos (risos), parece ser

um cargo assim — que deve dar um pouco de frustração nos redatores, “ah, eu sou redator”,

“redator de quê”, né? Diretor já basta por si próprio. Quando me perguntam eu falo publicitário.

P: E como você vê — você já falou um pouquinho — o computador no trabalho, no dia-a-dia, hoje?

E5: Essencial. Eu tenho um caderninho em que eu anoto as minhas idéias e só depois eu passo para o computador, disso eu não abro mão. Eu vejo diretores de arte que são eminentemente idéia — aí eles pegam toda essa parte técnica e delegam para os seus assistentes,

para o Estúdio, que dominam fortemente a técnica — e diretores de arte que “lambem a cria”, ficam horas no leiaute, burilando, manipulando a imagem, têm a parada de tirar foto para o leiaute, não sei o que lá. Eu me sinto mais no número um, por exemplo, no ano passado eu tinha

um assistente, mas com esse downsizing todo na agência demitiram muita gente e tal, e não tenho mais assistente. Mas eu chegava para o Caio e falava: faz tal coisa, faz tal imagem, funde

tal imagem com tal imagem, pega aquela referência e me dá três opções de fundo. Aí a gente vai montar o leiaute. Eu prefiro assim. As idéias partem de um croqui, de um rafe, geralmente de papel. Eu não sou muito de ficar: tec, tec, tec.

Agora, independentemente disso, o computador é uma ferramenta fundamental em termos

de pesquisa também, de imagens, né? Você tem uma série de sites, você pensa numa forca cor-de-rosa, aí você vai lá, põe lá o termo geralmente em inglês, aí vem uma pesquisa de imagens

desses sites que abastecem os diretores de arte.

P: E, na sua opinião, quais foram as principais mudanças que o computador causou nas agências?

E5: Downsizing, sem dúvida, a redução do número de pessoas que trabalhavam — que trabalham — nas agências. Raramente você tem um ilustrador e isso era supercomum. Para você ter uma idéia, aqui, que é uma das maiores agências do Rio, você tem quatro pessoas

propriamente na finalização, e eventualmente mais free lancers. É evidente que você gerou mais velocidade, os leiautes ficam mais precisos, você não tem mais aquela coisa: “Ah, aqui vai entrar não sei o quê.” Não, você está vendo lá e até isso acaba gerando a exigência de que eles

[os leiautes] fossem cada vez mais precisos. Porque o cara está vendo a imagem como ela vai

ficar, praticamente, né? Você pode indicar para o cliente que aquilo é só um exercício: “Isso aqui vai melhorar, vai ser mais estudado, vai ter uma luz diferente, uma sombra diferente, mas é

mais ou menos isso daqui.” E não é muito diferente daquilo, não, porque senão você não está

valorizando o leiaute. E o cara vai ver com uma qualidade de impressão que também é estupenda. As impressoras são fantásticas, em termos de calibragem de cor etc. Isso foi um

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incremento técnico do computador. E por outro lado, no aspecto humano, reduziu para caramba

o número de pessoas. Isso é um fato. O profissional de propaganda hoje é um profissional cada

vez mais raro. E as agências estão todas se fundindo, fundindo e fundindo. As coisas estão meio que se aglutinando.

P: E para onde vão as pessoas? As pessoas que saíram dos Estúdios, naquela época?

E5: Tem muita gente trabalhando como free lancer. Porque, por outro lado, o trabalho também não diminuiu. O trabalho aumentou. Tem muita oportunidade por aí. Então eu vejo alguns amigos meus que partiram para abrir seus próprios Estúdios. Eles saem dessas estruturas

tradicionais de agência e abrem seus Estúdios, abrem suas pequenas agências, pequenos escritórios, por conta própria. Eu posso citar três casos de pessoas que trabalharam comigo, que foram abrir seus Estúdios e estão felizes. Trabalham para caramba, existe toda a insegurança

inerente ao fato de você ser free lancer, de ser um empreendedor, né, mas estão bem. Eles não se encaixavam mais naquela estrutura reduzida, afunilada das agências. E, como os recursos

gráficos também se desenvolveram bastante nos últimos tempos, hoje em dia, quando você tem que fazer uma promoção do seu negócio, você pensa logo em fazer um material promocional legal, você tem o teu vizinho, o teu concorrente, que está fazendo também; então você procura

ter esse aparato técnico, de design gráfico, você procura uma pessoa que conheça — nem que seja aquele menino que tem um computador em casa, com uns programinhas tipo CorelDraw mesmo. Então eu acho que, por outro lado, apesar das agências terem encolhido, o desktop

publishing, o design gráfico estão cada vez mais sendo usados, cada vez mais você tem recursos disponíveis para isso, em termos de impressão, em termos de técnica.

P: Então as pessoas continuam por aí.

E5: Tem umas que desistiram mesmo, foram “vender cocada em Itacaré”. Mas eu vejo

muitos amigos que partiram para os seus próprios negócios. Você tem o trabalho de propaganda propriamente dito, tem o trabalho de ponto-de-venda e uma série de ações promocionais etc. e

nem sempre isso é absorvido pela agência, porque às vezes não compensa ela colocar um

profissional simplesmente para fazer esse projeto. Agora, supercompensa uma pessoa que tem um escritório ágil, né? E são orçamentos de três milhões de reais por ano, bruto. Dá para você

viver muito bem. Você rala para caramba, é você e você mesmo. Você S.A., né, que nem o

nome da revista.

P: Você é a primeira pessoa, dos entrevistados, que fala uma coisa positiva sobre

essa diminuição.

E5: Eu acho que a gente tem que viver. Eu acho que realmente o ambiente é sinistro para caramba, mas você tem que viver, cara. Se eu conheci trinta colegas como eu, que eram diretores de arte também, hoje tem quinze, talvez dez. Tem muito menos gente. Mas isso é a

ordem natural da economia. É assim. Se você não se ajustar, você tem que procurar outra coisa para fazer. Vai para o interior, vai fazer um curso, eu estava passando agora na banca de jornal e

tinha o edital do concurso para a Petrobras, sei lá, entendeu? O ambiente capitalista é muito severo em relação a isso, né? Melhor do que a gente para saber disso, impossível, né, porque na verdade a gente serve também para girar esse sistema, né, o publicitário é o grande óleo dessa

engrenagem. E o engraçado é que a gente está pagando por ter azeitado uma engrenagem que

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está espremendo a gente cada vez mais. Espremendo salários, espremendo a quantidade de

pessoas e tal, mas tem muita gente ali procurando caminhos alternativos e achando. Acho isso

legal.

P: Você estava falando um pouco que você comprou um Mac, né, quando foi?

E5: Foi pouco antes de lançarem o i-Mac bonitinho, eu tenho um i-Mac bonitinho. Eu

preciso até dar uma calibrada nele. E eu me lembro que eu comprei por R$ 1.250.

P: Sério?!

E5: Sério. E hoje é um computador que, se você comprar uma placa legal, uma memória

RAM de 50, mais um pente de 128 megas ou alguma coisa assim, vai ficar um p... computador, sobretudo porque em casa eu só uso computador para Internet. Eu me recuso, ultimamente eu nem uso computador em casa. Eu tenho o meu palmtop, em que eu ajeito a minha vida e tal,

minha agenda, tiro minhas fotinhas, ouço meu MP3, mas ligar o computador no final de semana eu me recuso, senão eu vou parar de ler, parar de ir ao cinema, parar de namorar, parar uma

série de coisas por causa do computador. Mas no início mesmo eu comprei o avô do i-Mac e logo em seguida eu comprei o i-Mac.

P: Em 96?

E5: Não, por volta de 98.

P: Então você começou a usar computador por conta própria? Ou foi pelo trabalho?

E5: Eu usava PC. No início os diretores de arte tinham pessoas que eram contratadas da

agência, que sacavam muito de PC. Aí você chegava lá com o seu rafezinho tradicional, em papel-manteiga e meio que ficava lá “de flanelinha”: “Não, mais para cima; não, mais para baixo; não, troca a fonte; não sei o quê, não sei o que lá.” Aí, de tanto observar — eu nunca fiz

curso, eu sou autodidata, Excel eu aprendi sozinho, PowerPoint eu não aprendi, porque eu acho

ele horroroso —, a gente acabava aprendendo, aí eu acabei tendo o meu PC. Naquela época era Corel que a gente usava no PC. E as outras agências todas trabalhavam com Macintosh e eu

comprei meu Macintosh para poder entrar nas outras agências. E foi uma das perguntas na

entrevista: “Você domina bem o Quark?” “Claro.” Aí o primeiro dia — óbvio —, o Macintosh tem um barulhinho, né, quando você comete algum erro, o do meu computador era um pato,

fazia “Qüé!”, e quando eu descobri, porque eu errava muito — eu tinha experiência de brincar

em casa, com Quark e tal, mas não era... um pilotaço, né —, aí eu tirei o pato, matei o pato (risos), continuava errando, mas o computador mudo, ele só piscava. Mas isso foi o quê, uns cinco, seis anos atrás, hoje estou numa boa. Eu não tenho a velocidade de manipulação da

Selminha, por exemplo, a operadora daqui, ela me mostra uns comandos que eu nem sabia que existiam, mas também não me interessa ficar...

P: Agora vou passar para uma segunda parte. Tem aqui uma escala de zero a dez, e a primeira coisa que eu vou perguntar é se você gosta de usar o computador, de trabalhar com ele — mas é gostar mesmo, sem pensar na utilidade, na praticidade...

E5: Do computador? Muito. Dez. Eu me divirto. Acho ótimo, sobretudo o Macintosh, que tem um sistema operacional fantástico. Estou louco para que instalem um 10 [versão mais atual

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do sistema operacional] no meu, já fiz ontem uma solicitação para São Paulo para instalarem o

10 no meu. Acho lindo, a plataforma, como os ícones se comportam, como você arquiva as

coisas, ponho o meu headphonezinho, adoro.

P: E se você fosse classificar a pressão do meio publicitário — as empresas, as agências, os outros diretores de arte —, a pressão que o meio faz para a pessoa saber usar

o computador no trabalho, você daria, de zero a dez...

E5: Dez, dez. É um pouco aquilo que eu falei. Eu ouço falar — não tenho experiência direta em relação a isso — que em agências como AGÊNCIA 24, em São Paulo, a minha... a

AGÊNCIA 30 mesmo em São Paulo era assim — agora deve ter sido todo mundo demitido —, mas todos os diretores de arte tinham o seu assistente. Então isso eu acho fantástico, entendeu? Hoje eu tenho que finalizar as coisas, porque eu não tenho assistente, quer dizer, trabalho

isoladamente. Mas essa não é a posição certa do diretor de arte. O diretor de arte é um criador também. Tanto é que ele funciona com o redator, ele vai desenvolver conceitualmente,

visualmente a peça. O trabalho de criação tem que ser feito junto com o redator, ele não pode se isolar. E lá em São Paulo todo diretor tinha o seu assistente. “Olha, eu não vou perder tempo escaneando isso daqui, manipulando essa imagem. Você trata as coisas para mim, me dá tantas

opções e eu monto o leiaute no final. Você vai preparar para mim.” Só que hoje isso é muito raro, os assistentes. Então os diretores de arte têm que trabalhar no sábado, trabalhar no domingo... porque são eles que têm que concluir as imagens.

Então a pressão depende de como a agência se estrutura. Se ela tiver uma estrutura para o diretor de arte ser um criativo, fantástico. Agora, se não for uma agência que tenha esse aparato, aí, meu amigo, é você e você. Aí a pressão é máxima, é dez.

P: E, no geral, não tem, né?

E5: No geral não. Depende. Depende.

P: Do tamanho?

E5: Não... Depende. Em algumas agências tem sim. Aqui, por exemplo, tem uma designer , a gente não faz trabalho de design gráfico, marca, essas coisas, é o designer que faz.

P: E se você fosse classificar a sua facilidade de usar o computador, de zero a dez, quanto você daria?

E5: É complexa essa pergunta, porque depende de qual programa...

P: Em geral.

E5: Eu diria nove. Eu diria nove. Eventualmente tem uma coisa num programa que eu

não sei usar, aí eu peço ajuda ou mando fazer. Nove, nove.

P: E a utilidade que você vê no computador, para o trabalho?

E5: Dez. Dez. Absoluta. Tudo passa. É evidente que... Tem um trabalho que ganhou

[prêmio no Festival de] Cannes nesse ano, que eu acho tão maravilhoso, tão maravilhoso, que é um anúncio para a Levi’s que são rostos de pessoas, todos feitos com pedaços de tecido. É maravilhoso. Aquilo ali não foi feito no computador, aquilo ali foi finalizado no computador.

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Mas o cara pegou uma porção de recortes de tecido — ou então contratou, geralmente o diretor

contrata um cara, um ilustrador faz isso para ele, mas ele teve, ele concebeu a idéia. E é de

chorar, é bom demais. Agora, teve um computador para finalizar aquilo ali, para corrigir uma cor, um canal de cor, uma sombra etc. Mas a concepção, evidentemente ainda não tem uma

máquina para fazer — que aí não ia ser nem downsizing, ia ser no size, né, não ia sobrar espaço

para mais nada. (Risos.) Tudo passa pelo computador, tudo, tudo, tudo. É essencial, a gente não pode mais viver sem isso. Um filme, por exemplo, vai ser chamado um ilustrador, que vai fazer um storyboard, que vai ser montado no computador, que vai ser alterado, montado junto com o

texto, aí um dia isso vai para uma ilha de edição, quer dizer, até o filme vai passar por isso.

P: E uma última pergunta: o que te move no teu trabalho? Por que você trabalha

nisso?

E5: Olha, primeiro porque eu não sei fazer outra coisa. Se eu soubesse fazer outra coisa... Não, acho que eu faria isso, sim. Acho que eu nunca me arrependi de ter feito Comunicação, e

de ter feito Propaganda. Até porque eu consegui um nicho dentro da minha profissão, um direcionamento, que é um pouco diferente de vários profissionais de criação. Por ter sido colocado como responsável por uma conta, isso me leva a ter contato direto com essas pessoas

[o cliente], me leva a ter que apresentar coisas, me leva a ter que receber delas, comunicar, quer dizer, acho que o nosso negócio é comunicação, antes de tudo, né, e isso se perde um pouco quando você só fica atrás do computador, quando você se perde atrás de uma mesa. Desde a

faculdade eu já tinha essa percepção, de que publicidade é isso, você ter contato tanto com o cliente quanto com o consumidor. E, na minha posição hoje, eu tenho. Todos os trabalhos que eu faço são calcados em pesquisas quali [qualitativas], são pesquisas em que você fica atrás do

espelho, vendo a consumidora falar do produto ou falar da peça que você criou, é muito legal.

Essa mobilidade eu consegui porque estou nessa posição, se eu não estivesse nessa posição talvez eu já estivesse começando a enjoar, sabe, de ficar só brincando de fazer designezinho.

Agora, essa parada de me comunicar, de apresentar coisas, esse aspecto que até seria mais de

atendimento, para mim é essencial para me estimular a continuar. E também porque é uma multinacional, me dá a possibilidade de lidar com gente de fora, participar de seminário lá, ficar

lá um pouquinho e tal. É isso.

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7.6. Resumo da entrevista 6

Sexo: Masculino.

Idade: 36 anos ∗.

Naturalidade: Ouro Fino, MG.

Experiência em direção de arte: 12 anos (desde 1991).

Formação universitária: Arquitetura.

Observação: É diretor de criação há 4 anos.

PESQUISADORA (P): Eu queria te pedir primeiro para falar um pouco da sua

trajetória — um resumo, né, como começou...

ENTREVISTADO 6 (E6): Bom, eu estudei Arquitetura, depois eu comecei a trabalhar com programação visual de lojas, programação visual de vitrines, de embalagens, tudo ligado a

moda. Trabalhei uns três anos nessa área. E só depois é que fui para agência. Eu estou em agência há doze anos. Entrei na AGÊNCIA 4∗∗ já como diretor de arte júnior e de lá até aqui já trabalhei numas dez agências, inclusive numa agência em Madri, foram umas dez ou onze

agências.

P: E você está aqui na AGÊNCIA 2 há...

E6: Estou aqui há quatro anos.

P: E se alguém perguntasse hoje qual é a sua profissão, o que você responderia?

E6: Publicitário. Eu não digo “criativo”, porque “criativo” é uma função, né? Acho que publicitário, apesar de, nas agências, as pessoas fazerem muita distinção entre quem é de

criação, quem é de atendimento e tal — mas a profissão é publicitário, é pensar o negócio da

publicidade, as estratégias, as soluções, e a função é criativo, né, e o cargo é diretor de criação. Até porque eu nunca trabalhei com arquitetura mesmo, eu estudei arquitetura mas nunca fui arquiteto.

P: E você é diretor de criação há quanto tempo?

E6: Há quatro anos. A única agência onde eu fui — e sou (risos), tenho sido — diretor de criação é aqui, a AGÊNCIA 2; até então eu era diretor de arte.

P: E como é que você vê o computador no trabalho do diretor de arte, no dia-a-dia?

E6: Quando eu comecei, estava exatamente na transição da direção de arte análoga [sic; analógica] para a digital. As agências estavam começando a comprar equipamento e tal, em

1991, 1992. Antes disso, tinha até uma reserva de mercado de computadores, o Brasil não era

∗ Esta entrevista foi realizada em outubro de 2003. ∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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informatizado. Você não podia importar equipamentos e tal, só existia o que era fabricado aqui

e para publicidade, para design, praticamente não servia, não funcionava. Em 91, 92, é que

começaram a chegar os computadores e rapidamente eles se instalaram pelo mercado como um todo. Eu peguei exatamente essa transição, então o meu desenvolvimento, o meu crescimento

dentro da publicidade foi sempre já ao lado do computador. Mas, como eu tinha um passado de

programação visual sem computador, eu vi bem essa diferença. Ou seja, o computador hoje, para o diretor de arte, é uma ferramenta, claro, né, mas é mais do que uma ferramenta, ele é a ferramenta, ele é o carro do taxista (risos), ele não é o bisturi do médico, mas, enfim, ele é a

ferramenta fundamental, ele é o serrote do marceneiro... Ele é isso, é com ele você faz as coisas. Você pode até pensar, idealizar, mas na hora de construir é com ele que se constrói.

P: E, na sua opinião, quais foram as mudanças principais que o computador causou nas agências?

E6: Eu acho que a primeira mudança foi a demissão de algumas pessoas que não

trabalhavam com computador e aí chegaram outras para trabalhar com o computador ali na função. É aquela velha história do Estúdio, né, na agência você tem a Criação, que cria, e você tinha o Estúdio que executava os leiautes, tinha ilustrador, layout man, o arte-finalista, que

faziam a artesania da coisa. Em geral, essas pessoas tinham um desenvolvimento, uma habilidade manual grande no desenho, na montagem e tal. Como o computador chegou para subst ituir isso, essas pessoas nem todas foram aproveitadas — ou a agência julgou que elas

eram capacitadas para usar o computador. E os computadores chegavam com os programas em inglês, e eu acho que pouquíssimas dessas pessoas falavam inglês. Então as pessoas que foram contratadas para trabalhar com computador nessa época eram pessoas ainda oriundas do mundo

da informática. Então a primeira coisa que aconteceu foi essa: saíram esses profissionais

especializados e entraram caras de informática.

O problema é os caras de informática entendiam de computador, só que não entendiam

nada de publicidade, nem do mundo gráfico, eles não tinham o olho gráfico, não sabiam o que era uma tipologia, um espacejamento, um corpo de letra, uma cor, um espaço, uma forma, uma composição. Isso deu trabalho demais para a turma da Criação, porque eles eram os

interlocutores — era assim: a Criação, o homem do computador e o leiaute ali. E eles não

tinham essa prática, não conseguiam entender. Isso foi a primeira mudança. Uma mudança ruim, acho que as agências não souberam pegar essas pessoas que já trabalhavam, que já tinham

essa formação, e investir na capacitação delas, fazer com que elas aprendessem a trabalhar com

computador.

Depois, é claro que o computador trouxe mais agilidade. E os leiautes começaram a ficar

mais próximos das artes-finais. Isso foi um benefício muito grande. Antes você fazia uma

ilustração, depois ia produzir uma foto e tal. Então, com o computador, você pôde escanear uma foto e essa foto já ser próxima da foto que você vai utilizar. Mas isso também engessou um

pouco mais a criação. Porque muitas vezes o leiaute passa a ter que ser seguido à risca para

fazer a foto final, por exemplo. E nem sempre o leiaute é a referência que está na sua cabeça, mas é a referência que você encontrou, numa revista, num livro, que deu para você usar. Então,

ao mesmo tempo em que isso foi um benefício, de estar mais próximo, foi um prejuízo também,

pelo fato de engessar um pouco a criação. Mas a velocidade sem dúvida é evidente.

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P: E quando e como você começou a usar computador? Foi para trabalhar ou foi em

casa...

E6: Foi em agência mesmo. Nas primeiras agências onde eu trabalhei, o departamento de Criação ainda não tinha os computadores. O Estúdio tinha. Então o diretor de arte continuava

trabalhando com papel-manteiga, uma caneta Pilot, fazendo os rafes e tudo o mais, e tinha um

cara especializado em computador que transformava aquilo em leiaute. Acho que eu trabalhei assim desde 92 até... 94. Nossa! Desde até... (Risos.) Dois anos, quase três anos eu trabalhei

assim. Só em 95 entrei numa agência em que tinha computador para os diretores de arte. E

assim mesmo o treinamento que eu fiz foi completamente individual, a agência não fez nenhum treinamento para mim. Fui fazer cursos particulares fora da agência, fui buscar por conta própria

cursos que me ensinassem os programas ali.

P: E isso é comum, né?

E6: É comum, as agências... Claro, tem vários modelos de agência, tem as agências pequenas, as multinacionais e tal, mas acho que no geral elas investem pouco na qualificação

dos profissionais, até porque o mercado é muito rápido, muito volátil — era até mais, as pessoas mudavam de agência com mais velocidade, então: “Deixa que ele se especializa, não vou investir nele, daqui a seis meses ele não está mais trabalhando aqui e tal.” Ao mesmo tempo em

que as agências sempre tiveram essa cultura, ou pelo menos esse mito de que pagam bem, também tem essa história de que elas não investem no profissional para que ele fique na

agência: “Deixa ele lá, vai trabalhando e tal, se ele quiser, ele que se especialize fora.”

P: Agora eu vou passar para uma parte que tem essa gradação de zero a dez.

E6: Hum-hum.

P: Então primeiro eu queria te perguntar: você gosta de usar computador?

E6: Gosto.

P: Independemente da utilidade e da praticidade, né? Você gosta de...

E6: Gosto, mas não sou um apaixonado pelo uso do computador. Numa escala de zero a dez, eu estou em sete, oito, por aí.

P: Se fosse sete ou oito seria quanto?

E6: Acho que oito, pode ser oito.

P: E se você fosse classificar isso que você estava falando um pouco antes, a pressão do meio para as pessoas saberem usar o computador. Pressão das agências, dos clientes... de zero a dez, quanto você acha que seria essa pressão sobre o diretor de arte?

E6: Bom, tá, aí você tem que entender o seguinte: tem etapas diferenciadas. O que é que um computador faz, né, quais são os usos dele? Primeiro, para o diretor de arte, é o uso do

leiaute, da diagramação. Então são os programas como Quark Xpress, FreeHand, Illustrator. O

domínio desses programas aí é fundamental, embora no dia -a-dia da agência você não use esses programas com toda a potência que eles têm; você precisa ter um conhecimento de 80, 90% do programa em si. Depois tem o Photoshop, que é o programa de tratamento de imagens, em que

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você faz retoques, você usa as fotografias, escaneia. O diretor de arte usa bastante ele, mas ele

não precisa dominar completamente, porque vai usar só para leiaute, na hora de fazer uma

finalização vai ter um ilustrador, vai ter um manipulador de imagens, que aí, sim, precisa dominar o programa. Então, eu acho que o diretor de arte precisa conhecer, do Photoshop, 70%.

Ele tem que trabalhar o básico. E tem a parte mais técnica de finalização, de calibragem de

cores e tal, que os diretores de arte em geral conhecem muito pouco disso, e é o Estúdio, a finalização que domina mais. O diretor de arte em geral domina 50% disso.

P: Mas, no geral, saber usar computador, não totalmente...

E6: É impossível você trabalhar numa agência como diretor de arte sem saber usar o computador. Impossível. Mas tem essas etapas. Então eu acho que, na média, você tem que — do que ele oferece — dominar ali 70%. Do que ele oferece mesmo, porque ele oferece muito.

70% não é pouco, não. Ele realmente oferece muita coisa, só que tem pontos aí que não são necessários no dia-a-dia.

P: Então, entre saber usar e não saber, seria tipo dez mas...

E6: É, exatamente.

P: …mas dentro do que o programa oferece não precisa saber... ser dez.

E6: Não, você não precisa, você não vai usar. Por mais que criação seja uma coisa nova a cada dia, o processo é meio repetitivo. Você vai fazer um leiaute, você precisa de imagens, letras, ilustrações, jogar com isso. Por exemplo, existe o 3D. E em agência ninguém usa 3D,

ninguém sabe usar 3D, praticamente. E não faz falta. Porque, quando você precisa, você contrata um ilustrador para isso, você faz até uma simulação de um 3D usando 2D; faz uma ilustração bidimensional que simula o 3D, mas na hora de finalizar você contrata um ilustrador

que faça em 3D de fato. O 3D nenhum diretor de arte sabe usar, e eu nunca vi isso fazer falta —

claro que o cara que sabe pode até acrescentar isso ao trabalho dele, se for o caso, né, mas, não sabendo, não vai ser exigido.

Na prática são exigidos dois tipos de programa só, para o diretor de arte. Photoshop, fundamental, e o programa de diagramação, de desenho, né, na verdade. Que pode ser o Quark, ou o FreeHand ou o Illustrator.

P: E, voltando para você, se você fosse dar, de zero a dez, um grau para a sua

facilidade de usar o computador, de modo geral, quanto você daria?

E6: A facilidade ou o conhecimento?

P: A facilidade.

E6: Eu acho que eu tenho 80, 90%. Facilidade, conhecimento menos. Mas facilidade eu acho que 90%.

P: E a utilidade que você vê no computador, para o trabalho do diretor de arte hoje,

quanto você acha que seria?

E6: Olha, às vezes — para você ter uma idéia de como é um pouco relativo isso —, claro que é importantíssimo, muitas vezes a gente ainda apresenta uma campanha, não uma campanha

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inteira, mas um anúncio, uma peça ou outra, em ilustração, como um rafe quase, como se fazia

antigamente. Porque preciso de uma referência e quero usar uma imagem que é, por exemplo,

um homem amarrando o sapato no banco do metrô. Bom, posso ir ali e fazer uma foto do homem amarrando o sapato no banco do metrô, mas de repente não tive tempo, não deu certo,

tal. Eu não vou encontrar essa foto pronta num banco de imagens. Então, faço uma ilustração, o

ilustrador faz uma ilustração. Então muitas vezes a gente apresenta uma campanha onde o computador pouco existiu. Mas... mais ou menos, porque essa ilustração também geralmente é escaneada ou já é feita até digitalmente, e depois ela é tratada com os recursos da computação

também. Não vai ser nunca mais uma aquarela feita na mão, vai ser uma aquarelada no computador. Então, desculpa, não sei se eu me perdi um pouco na pergunta que você fez.

P: Qual seria, de modo geral, a utilidade do computador para o trabalho?

E6: É, é. Acho que aí é 100%. A utilidade é 100%. Não dá para trabalhar sem. Apesar de eventualmente mostrar alguma coisinha ou outra sem, você não vai conseguir prosseguir com

aquilo, sabe? Pode até uma etapa você fazer em desenho, você contar apenas a história, mas depois você não consegue prosseguir.

P: E, como última pergunta, queria saber o que é que te move no trabalho de

direção de arte. Qual é o... Do que é que você mais gosta, por que você escolheu isso,

profissionalmente?

E6: Antes de tudo, porque eu gosto de criação. Independente se a criação é publicitária ou

não. Eu acho que o que mais estimula as pessoas de criação é a criação em si, e não a publicidade. A publicidade acaba sendo um canal, um veículo para elas colocarem ali a criação. O que pode ser um defeito também, pode ser uma coisa ruim, os criativos que gostam em

princípio de criação e não de publicidade. Porque, no final das contas, o fim é a publicidade.

Então, se você tem como objetivo muito mais a publicidade, e a criação é só um veículo, talvez você tenha até mais chance de atingir os objetivos publicitários, porque você já é mais

publicitário. E a turma de criação até gosta de se definir um pouco como “de criação” e não tão

publicitário assim — “Ah, não, trabalho com criação, posso fazer cinema, posso escrever um livro, posso pintar um quadro, posso fazer uma música e tal. Publicidade é mais um veículo.”

Acho que isso é muito comum. Eu também não nego isso. Para mim, a criação é mais

importante, está mais na veia do que a publicidade pura e simples. Mas é claro que a criação, ao longo do tempo, vai se associando à publicidade, na carreira você vai desenvolvendo — até porque as escolas de publicidade são fracas, todo mundo aprende publicidade em agência. Então

é natural que se tome mais gosto pela propaganda em si ao longo do tempo que vai passando. E na função do diretor de arte, também, a criação em si não pode ser mais importante do que a publicidade; o objetivo tem que ser muito bem cumprido em todos os pontos.

De qualquer forma, é a criação, né, o fato de você poder colocar uma idéia nova — que é para isso que você se esforça o tempo todo. Criar formas, e criar conceitos e criar aplicações. Eu acho que o que move é o fato de poder criar algo novo, de mostrar algo novo, de desenvolver

uma linguagem. E aí pode ser a estética, pode ser a palavra, pode ser o som, né, pode ser o tempo, o filme, acho que pode ser tudo. É comum pessoas de criação passarem para outras áreas. Quer dizer, não que isso aconteça com freqüência, mas não é nada anormal uma pessoa

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de criação ir trabalhar em cinema e ser diretor. É comum, acontece. Ou o diretor de arte

trabalhar mais com design, ou seja, ele deixa a publicidade para trabalhar com design, ou vai

trabalhar mais ligado à Internet... Mas é muito difícil uma pessoa de atendimento virar criação. Acontece até de pessoas de criação irem trabalhar com planejamento, ou seja, ela mostrou que a

publicidade estava mais forte nela. Mas é mais comum uma pessoa de criação publicitária sair

para trabalhar com cinema, sair para trabalhar com música, sair para trabalhar com música, sair para trabalhar com design, sair para trabalhar com outras áreas de criação do que sair para trabalhar com outras áreas de publicidade, o que prova de certa forma que ela é mais interessada

em criação do que em publicidade. Acho essa observação bem interessante. (Risos.)

P: É! Eu não tinha ouvido ainda. (Risos.) E, no seu caso, você tem outras atividades,

fora a publicidade?

E6: Tenho. Eu não tenho outra profissão. A minha profissão é ser publicitário mesmo, mas eu tenho outra atividade que é de artista plástico. Mas é uma atividade, não é um hobby, é

muito mais do que um hobby, eu tenho interesses profissionais, embora não seja uma profissão, mas eu tenho interesses sérios — qual seria a palavra? É uma atividade que eu desenvolvo, mais do que um hobby. É um circuito que eu freqüento, outras pessoas que eu conheço, cursos que eu

faço, exposições que eu participo e tal, tudo isso.

E que eu acho que não tem nada a ver com publicidade, mas de forma alguma. Publicidade é arte? Mas de jeito nenhum, nem pensar. Claro que pode até existir uma peça

publicitária que seja artística, que tenha conceitos artísticos. Assim como em outras áreas que não têm nada a ver com arte pode haver um conceito artístico; a ciência pode ser arte em algum momento, a matemática pode ser arte, a medicina pode ser arte, o futebol-arte, assim como a

publicidade-arte. O que acontece é que a publicidade, por lidar com elementos com que a arte também lida, com estética, com imagem, com movimento, as pessoas confundem um pouco. Mas o propósito é completamente diferente, o princípio é diferente, o objetivo é diferente, o

processo é diferente; só alguns meios é que são iguais. A publicidade usa fotografia, a arte também usa, usa imagem, usa palavra, né, usa os veículos, mas para fins completamente diferentes.

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7.7. Resumo da entrevista 7

Sexo: Masculino.

Idade: 31 anos ∗.

Naturalidade: São Paulo, SP.

Experiência em direção de arte: 8 anos (desde 1995).

Formação universitária: Desenho Industrial.

PESQUISADORA (P): Primeiro eu queria te pedir para falar resumidamente sobre a sua trajetória, como começou...

ENTREVISTADO 7 (E7): Bom, eu fazia Faculdade da Cidade e eu trabalhava com uma

coisa que não tinha nada a ver com propaganda. Eu trabalhava em escritório, era auxiliar de escritório, depois fui secretário e tal, tal, tal. Mas já pegava alguns frilas — eu já fazia

faculdade, então pegava free lance de design. Aí surgiu uma vaga para trabalhar de assistente de

um designer e eu trabalhei com ele um tempo, tal, tal, tal, depois surgiu uma vaga de diretor de arte e eu acabei pulando. Como a trajetória mais fácil em propaganda é você começar

estagiando, você já começa nas boas agências, você faz estágio, você aprende, você faz

amizade, e aí fica mais simples, né, de você seguir, eu fui pelo caminho mais difícil, porque eu já era casado, então precisava ganhar dinheiro, não podia estagiar. Então fui pelas agências muito ruins, para depois passar para as ruins, depois passar para as mais ou menos, aí chegar nas

médias e depois nas boas, nas legais. Mas, enfim, é um processo que eu não indico para ninguém, não é legal, porque você fica muito tempo, fica estigmatizado, né? Como é um mercado muito pequeno, as pessoas não querem nem te receber para mostrar portfólio, porque é:

“Ah, o cara vem de onde?” “Vem da AGÊNCIA 32∗∗.” “Ih!... Deve ser uma porcaria.” Nego não quer perder tempo vendo a pasta de gente ruim, teoricamente. Eu conheço poucas pessoas que vieram de agências ruins e estão nas agências boas hoje. Existe realmente um preconceito muito

grande.

Enfim, passei por muitas agências, trabalhei muito tempo como frila, às vezes cobrindo férias. Teve dois anos na minha vida em que eu não fiquei em agência fixo, ficava um mês

numa, dois meses na outra, teve um ano em que eu cheguei a trabalhar em nove agências. Então é legal, eu conheci muita gente. Eu tenho oito anos de publicidade, fora design. Tem uma diferença muito grande entre design e direção de arte, as pessoas pensam que é mais ou menos a

mesma coisa, mas não é. Tem uma diferença de conceituar, de trabalho mesmo entre o diretor de arte e o designer.

P: E você é formado em Desenho Industrial?

∗ Esta entrevista foi realizada em outubro de 2003. ∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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E7: Eu me formei em Desenho Industrial pela Faculdade da Cidade em 95. Desde 95 para

cá eu comecei a trabalhar em propaganda. No ano em que eu me formei foi a primeira vez que

eu trabalhei.

P: E antes foi quanto tempo, como designer?

E7: Antes uns dois anos e meio. Oito anos de publicidade, né? Então eu peguei o

finalzinho da época em que as pessoas trabalhavam na mão. Com fotoletra, com aquela letrinha que decalca, como é que se chama? Letraset. Trabalhei com aerógrafo. Queria ser ilustrador antes de trabalhar em design e publicidade. Fiz muita marca na mão, entendeu? Era um saco.

(Risos.) Quando o cliente mudava então era pior ainda. Então, quer dizer, trabalhei muito na mão. O que eu acho legal de você trabalhar na mão é que você pega o ato de conceituar, entendeu? Você pega a idéia e vai conceituando, vai fazendo rafes na mão, e vai fazendo os

croquis e tudo mais, pensando na mão. O computador eu acho que te limita a você pensar, conceituar a peça como direção de arte. Então, basicamente essa é a minha história até hoje.

Trabalhei na AGÊNCIA 14, na AGÊNCIA 29, trabalhei na AGÊNCIA 5, trabalhei na AGÊNCIA 2, na AGÊNCIA 17, na AGÊNCIA 33. Das grandes, passei por essas. A AGÊNCIA 2 é média. São tantas que eu já per di a conta de quantas eu passei, quanto tempo eu fiquei em cada uma, eu não sei te

dizer ao certo. Eu estou aqui na AGÊNCIA 34 há quase dois anos.

P: E se alguém perguntasse hoje qual é a sua profissão, o que você responderia?

E7: Publicitário. Pelo menos é o que eu respondo na hora de fazer crediário. (Risos.) Eu

não ponho diretor de arte porque é um cargo muito pomposo e ninguém sabe o que é que é. Diretor de arte parece uma coisa muito importante, é tipo presidente de ala de escola de samba, é presidente mas não é muita coisa assim.

P: E como é que você vê o computador no trabalho, no dia-a-dia?

E7: Bom, eu não gosto de tecnologia. Eu sou avesso a aprender coisas novas, detesto. Chega um programa, uma nova versão fico: “Que saco, eu vou ter que aprender...” (Risos.)

Sabe? Vai mexer na interface que eu já conhecia, já sabia onde era, vou ter que ficar

procurando... Geralmente eu sou um dependente dos meus amigos, eles todos me sacaneiam quando eu peço extrato pelo telefone em vez de pegar pela Internet. Eu prefiro ligar para o

banco, gosto de ouvir a voz da pessoa, eu gosto de pagar conta na fila. Eu não gosto de usar

nenhuma máquina, tenho horror a máquina. Então, eu trabalho no computador por necessidade. Na verdade, a parte do trabalho que eu acho mais gostosa é criar, não é executar. Então o computador entra na parte de execução, ele nunca entra numa parte de criação, entendeu? No

máximo numa escolha de fonte, da letra que eu vou usar no anúncio, para mexer nas cores e tal — tudo bem, isso também é parte do processo criativo, mas eu gosto de conceituar no papel antes, pensar bem o que eu vou fazer, para não perder muito tempo com a máquina.

Não gosto de navegar na Internet... Entro nos e-mails porque aqui eu sou obrigado, o nosso sistema de jobs aqui é todo por e-mail. Eu acho horrível, você tem que ler o e-mail todo, uma pessoa vai passando para outra, vai colocando adendos no job, você tem que ficar

procurando entender o job, então é meio chato isso. Eu não gosto de ficar mandando nem

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recebendo e-mail, sabe, eu respondo porque tenho que ser educado, as pessoas, amigos mandam

piadinha, aí eu vou só repassando. Mas eu não fico buscando coisas para... entendeu?

Às vezes eu pesquiso, comecei a trabalhar melhor com o Google agora, que é legal para pesquisar. Mas, enfim, eu não gosto muito de máquina, mas mexo bem. Para o que eu tenho que

aprender, eu mexo, mas eu não procuro ir além disso — “Ah, existe um novo programa”, não,

eu mexo no Photoshop, em Quark e Illustrator. Eu acho que é o básico para eu trabalhar. Se tem que fazer uma coisa em 3D, eu peço para alguém fazer, eu procuro me informar para saber

como se faz. Agora eu estou fazendo um site meu, pessoal — que eu sou artista plástico também

—, então eu estou fotografando os trabalhos novos e estou montando um site. Então eu não me preocupei em pesquisar como funciona o programa com que se faz o site. Fiz um escambo,

troquei com um amigo meu um quadro, e eu fiz a programação visual toda, como eu queria que

o site funcionasse, e ele fez com que o site funcionasse, ficou com a parte de tecnologia. E eu realmente não pesquiso, não gosto. Vou por necessidade.

P: E, na sua opinião, quais foram as principais mudanças que o computador causou nas agências? Ou no trabalho de direção de arte em geral?

E7: Olha, em primeiro lugar, demissões. Eu lembro que eu conheci um chefe de Estúdio que era realmente um chefe de Estúdio. Por que é que o diretor de arte tem esse nome? Porque

antigamente, nas agências, ele coordenava uma equipe de arte, ele trabalhava separado do redator. A AGÊNCIA 6 é que começou a fazer as duplas de redação e direção de arte.

P: Quando foi isso?

E7: Ah, eu acho que foi na década de 60, se eu não me engano. Final dos 60. Antes era separado. Eles copiaram o modelo americano. O redator, ele fazia, ele criava, conceituava a

peça, e o diretor de arte executava. E ele era diretor de arte porque ele coordenava uma equipe onde tinha o layout man, o letrista, onde tinha o manchador. O manchador era um cara que fazia uma espécie de ilustração para dizer como seria aquela foto. “Ah, eu preciso de uma foto de um

cara com um celular na mão — celular nem existia naquela época, mas enfim, com um telefone na mão — e sorrindo, pá, pá, pá, nesse clima.” Aí o cara ia lá, com o hidrocor, né, e fazia as manchas. Era uma coisa assim meio impressionista, não era uma coisa acadêmica, era meio

rabiscado, para o cliente sacar qual era a do anúncio, ele entender. Aí vinha o letrista e colocava

a letra no estilo que o diretor de arte estava querendo. Aí vinha o layout man e montava aquilo, tal, tal, tal, de uma forma bacana, botava a logo, ajeitava. E levava para o cliente uma idéia do

que seria o anúncio. Então a peça era muito mais solta. Hoje em dia, a gente faz um leiaute e o

cliente quer exatamente aquilo que ele viu no leiaute. Isso é muito ruim. Porque muitas vezes você não consegue a melhor referência para marcar o leiaute, entendeu?

Quando eu trabalhei na AGÊNCIA 5, a gente aprovava as coisas pelo sistema de rafe. Isso

era muito bacana, porque a gente tinha um dia para criar, o cliente dizia quais seriam as ofertas do encarte — não sei se você já viu o encarte do [supermercado] Zona Sul — e a gente tinha

que criar em cima daquilo e produzir a foto no dia seguinte; tinham dois dias para aprovar e

produzir. Então a gente aprovava por rafe a idéia. Passava um fax. Isso era maravilhoso, porque não prendia, não tolhia a peça. Hoje em dia, o cliente vê, você arranjou uma foto com uma

modelo, mas na hora de produzir a foto, na hora de escolher a modelo, você achou que aquela

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modelo não é a melhor, você quer, sei lá, uma mulher negra em vez de morena. Mas, pô, o

cliente já viu a morena, entendeu? E aí, se você chegar lá com uma negra, ele vai ficar: “Ah,

não, não foi isso que eu aprovei”, entendeu? De repente, a produtora da foto chega com milhares de idéias, mas o cliente já viu outra coisa no leiaute. E isso era uma coisa que não

existia antes do computador. O computador facilitou, é mais rápido de modificar, mas ele é ruim

por causa disso. Ele te limita muito, você está fadado a ter que produzir idêntico ao leiaute, entendeu?

Outra coisa: o computador, você mexe muito fácil. Então o cliente acha que pode

modificar o anúncio muito fácil. Então, em cima da hora, o anúncio com prazo para sair, o jornal esperando, ele acha de modificar! Porque é tudo mais rápido, entendeu? Então

antigamente tinha aquelas coisas de virada de noite na publicidade para fazer as coisas, mas o

diretor de arte ainda conseguia sair cedo, porque o Estúdio é que ia executar, ele depois dava uma passada de madrugada para dar uma olhada. Hoje em dia o diretor de arte praticamente já faz o anúncio quase que para finalizar. Existe ainda a finalização, mas as coisas são muito, sabe,

em carreira. Uma coisa é meio que pré-requisito da outra, não dá para você deixar solto no Estúdio e depois ir lá dar uma olhada. E as coisas são muito mais rápidas, aprovou agora, finaliza daqui a pouco, entrega para o veículo via e-mail. A tecnologia acaba acelerando e, em

vez de facilitar, você acaba trabalhando mais.

Eu gostaria de ver um dia em que o diretor de arte não trabalhasse no computador. Já se tentou fazer isso numa agência em São Paulo, não me lembro o nome, em que o diretor de arte

tem um assistente de arte, e o assistente de arte é o cara que escaneia a foto, que faz a manipulação. E ele vai lá e acompanha, ele senta no computador e tal, mas ele fica o tempo todo com o redator — que, ao contrário daquilo que eu tinha te dito, hoje em dia o redator é o dupla

do diretor de arte. Os dois pensam juntos, os dois conceituam juntos. O diretor de arte tem idéias de texto também, o redator também tem idéias de imagem, então é uma coisa muito mais

criativa, é uma troca. Antigamente, o diretor de arte era o “leiautador” das idéias do redator.

P: Como é que você começou a usar computador? Quando foi, como foi? Foi no trabalho?

E7: Por necessidade. Foi no trabalho. Porque eu lembro que a galera da minha faculdade — foi mais ou menos no terceiro ou quarto período —, todo mundo comprou o tal do 386. E estava saindo o 486. Eu não podia comprar computador nessa época. Então a gente tinha aula de

PageMaker, bem ralé mesmo, aquela aula na faculdade bem noção, isso era mais ou menos 92, 93, por aí. Era um nada, então para mim o computador era um bicho de sete cabeças, eu continuava fazendo as coisas na mão mesmo já com a chegada do computador, entendeu? A

galera já mexendo em CorelDraw, eram os programinhas que se usava naquela época,

CorelDraw e PageMaker. Photoshop poucas pessoas mexiam.

Então, eu lembro que surgiu uma vaga, no mural da faculdade, para ser assistente de um

designer , foi o primeiro emprego meu na área, antes eu só pegava frila e fazia em casa. Então na hora da entrevista eu mostrei minhas peças finalizadas e disse para o cara que eu fazia tudo aquilo no computador já. Eu menti. E ele: “Ah, é?” Aí mostrei coisas, mostrei fotolito, e mostrei

que eu tinha noção de finalização, noção de produção gráfica, e o cara me chamou. E ele era um

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designer que atendia os próprios clientes, ele ia acompanhar a produção gráfica, então ele

parava muito pouco. E eu ficava no escritório finalizando as coisas dele. Algumas coisas

menores, ele botava na minha mão. Então a minha primeira semana foi um inferno. Eu ficava fazendo tudo na mão e mostrando para ele, perguntando: “E aí, está legal?” “Ah, tá, pode partir

para o computador, pode finalizar.” E eu: “Não, acho que vou pensar mais um pouco.” Aí ficava

lá rafeando até ele sair do escritório para resolver alguma coisa na rua. Quando ele saía, eu ligava para Deus e o mundo: “Cara, pelo amor de Deus, como é que eu faço isso aqui?” (Risos.) Aí nego falava: “Vai lá, cara, abre o CorelDraw.” “Como é que abre?” “Você vai lá, clica duas

vezes no programa, tal, tal, tal.” “Então beleza.” “Agora vai lá em File.” Aí eu: “Vai lá onde? Está escrito ‘Filé’. Ah, tá.” E nego ia me dando aula por telefone, sabe, eu perturbava meia dúzia de amigos da faculdade, mas, assim, em uma semana eu já estava operando legal o

CorelDraw.

E depois o PageMaker eu fui pegando, que é um programa um pouco mais complicado. Levava dúvida para os amigos da faculdade: “Pô, cara, eu queria fazer essa parada assim, assim,

mas não consegui, como é que você faz?” Sabe, eu fui fuçando. Mas a princípio foi meio no tapa mesmo. E muitas pessoas ficaram à margem, porque não conseguiram se adaptar, demitidas das agências. Tinha um rapaz na AGÊNCIA 29 que era chefe de Estúdio, ele me disse que na

época ele coordenava uma equipe de vinte pessoas no Estúdio. Acima dele estava o diretor de arte. E ele ganhava um salário tão bom quando o do diretor de arte da AGÊNCIA 29 nessa época.

E ele ficava disputando, o cara comprava um carro novo, ele comprava também, se ganhava muito dinheiro, entendeu? E de uma hora para outra, quando chegou o computador, ele viu a equipe dele ser reduzida pela metade, depois não sei o quê, até sobrar ele e mais outro. E o

salário dele hoje em dia é superbaixo, virou um simples operador. Ele não é mais um chefe de Estúdio.

E não dava vazão também, mesmo que todos conseguissem se adaptar à tecnologia, o

mercado não ia absorver essa gente toda, era muita gente. As agências eram enormes. Os fotolitos antigamente eram enormes. Hoje em dia um fotolito tem dez cabeças trabalhando, entendeu? Então, quer dizer, a tecnologia é legal, é bacana, mas, de certa forma, ela não foi

muito humanitária.

P: Nessa segunda parte, tem uma gradação de zero a dez. Eu queria te perguntar primeiro se você gosta de usar o computador. Você já falou um pouco, né?

E7: O prazer? Vou botar, sei lá, sete. Porque tem coisas assim de diversão, o computador pode te dar uma certa, fora do trabalho... Sei lá, estar trabalhando com um arquivo aberto e estar gravando um CD de música para você... Tem umas coisas legais, não é de todo ruim. Mas jogos

eletrônicos, esse tipo de coisa nunca foi a minha praia, não gosto. E é assim: ele é útil. Eu não

gostaria de fazer tudo na mão de novo. Mas a chegada do computador teve pontos muito negativos. Sempre gosto de salientar essa parte negativa do computador. E a gente trabalha com

Mac, um excelente computador, que não costuma dar muito bug, é rápido, potente, mas, enfim,

quando eu saio do trabalho eu procuro não ver mais computador. Eu estou aqui por necessidade e aproveito e faço as coisas aqui também, sabe, as coisas que seriam de entretenimento: entrar

numa página para ver não sei o quê, brincar, receber um e-mail, escanear uma foto de família,

esse tipo de coisa, gravar um CD...

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P: E se você fosse classificar a pressão que os diretores de arte recebem das agências,

dos clientes, no sentido de eles saberem usar computador? De zero a dez?

E7: Dez seria total pressão...

P: E zero, nenhuma.

E7: Dez. Dez. Hoje em dia não tem mais espaço para quem não saiba mexer no

computador.

P: E se você fosse classificar a facilidade que você tem em usar o computador?

E7: Sete. Sete.

P: E a utilidade que o computador tem no trabalho?

E7: No trabalho? Dez. Hoje em dia não dá mais para você não usar o computador.

P: E o que é que te move no trabalho de direção de arte? Por que você trabalha

nisso?

E7: Bom, eu acho que é um trabalho criativo, é um trabalho que combina mais com a minha personalidade, entendeu? É... Eu não poderia trabalhar num ambiente rígido. É um

ambiente em que você pode, sei lá, usar uma tatuagem e tal. E trabalhar com criatividade, né, não é um ambiente burocrático, em que você tenha que, sabe, carimbar papéis e fazer aquelas coisas metódicas, sem ser criativo. Não é onde eu jogo a minha total criatividade, porque é uma

criatividade limitada, você tem que atender a uma demanda, você tem que atender a um pedido, você tem que estar comunicando alguma coisa, entendeu? É uma criatividade meio quadrada,

sabe, você tem que se encaixar naquele modelo criativo, você não pode propor coisas que não tenham cara de publicidade, você tem que estar naquele padrão de publicidade, na velha fórmula da publicidade — que ela repete as mesmas fórmulas sempre. É uma coisa que eu... no trabalho

de artes plásticas, não existem fórmulas, entendeu? Até existem, mas você pode transgredir e tal, tal, tal, na publicidade já não. A publicidade trabalha com aquilo que já está no dia-a-dia das pessoas, ela não lança moda, a publicidade vai atrás do que já existe e dá àquilo uma cara

publicitária, ela não cria tendências, ela vem logo atrás das tendências. Então... até me perdi. Qual era mesmo a pergunta?

P: Por que você trabalha nisso?

E7: Ah, porque, enfim, é difícil ganhar dinheiro com arte no Brasil e, já que é difícil, eu

prefiro não trabalhar num banco, trabalhar como vendedor de loja, sabe — eu já trabalhei com muitas coisas antes de publicidade. Mas eu acho que publicidade é o que pelo menos dá um

pouco mais de prazer do que outras áreas, é um pouco mais criativo do que outros trabalhos.

P: E por que publicidade e não design, por exemplo?

E7: Ah, eu acho design muito chato. (Risos.)

P: (Risos.) Muito chato?

E7: Eu já gostei muito de design, mas hoje em dia eu não tenho mais paciência de ficar — a única coisa que eu gosto de design é logomarca —, eu não tenho paciência de ficar

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estruturando uma revista, de ficar pensando num folder, sabe, eu prefiro as peças ali, cartaz, o

anúncio, o outdoor, criar um filme. É muito mais do caramba, é uma mensagem direta. O design

tem outro conceito, o conceito dele é um conceito estético, o conceito publicitário é um conceito... de idéias, sabe, de venda. Ou seja, a estética vem sempre atrás desse conceito.

Enquanto no design não, no design o conceito visual está na frente, ele não respeita tanto uma

idéia, entendeu? Ele dá uma cara àquilo, uma embalagem, ele faz uma embalagem para as coisas, ele dá alma àquelas coisas. Tipo, sabão em pó vai te r que ter cara de sabão em pó, então o designer vai ter que pensar nisso, né, o logotipo de uma churrascaria vai ter que ter cara de

churrascaria, o logotipo de uma loja vai ter que ter a cara daquela loja de roupas. Então, ele procura dar corpo a uma alma que já existe, entendeu? A propaganda não, a propaganda procura vender coisas que já têm uma cara, que já têm um corpo, já têm uma alma, a principal

preocupação da publicidade é vender, é vender. Muitos publicitários se esquecem disso. A preocupação principal é comunicar e vender. Então é muito mais direto que o design. O design

realmente eu acho muito chato. Imagina, pegar um folder de dez dobras para fazer? Eu fico maluco, é muito chato.

P: Por último, eu vou te pedir para falar um pouco dessa relação com artes plásticas,

como começou, qual é o lugar que isso ocupa na sua vida.

E7: Ah, é o objetivo, trabalhar com isso, ganhar dinheiro com isso, encarar isso como um trabalho, mas enquanto isso não chega eu vou pagando as contas com a publicidade. E começou

na faculdade, eu comecei a ter aula de história da arte, então eu comecei a me interessar muito por arte, aula de ilustração, aula de desenho, de modelo vivo. Então eu comecei a me interessar muito mais por artes plásticas do que por design, por propaganda. Eu venho pintando desde 95.

Mas, enfim, duas exposições, três exposições foi o que eu fiz até agora, três coletivas. Porque a

publicidade toma muito tempo, ela rouba muito o teu tempo, então você não tem tempo para se dedicar a outras coisas, você não tem tempo para mais nada, ainda mais você tendo família. É

por isso que cada vez as pessoas estão trabalhando mais novas em publicidade. É uma profissão

que te suga como se você fosse uma laranja, entendeu? Depois que acaba o suco, nego te joga fora e te substitui pela laranja nova. Mas é isso, olha a idade das pessoas. A pessoa mais velha

daqui tem 33, eu acho. É a mais velha aqui da Criação. Infelizmente. É que nem jogador de

futebol: quando não serve mais é substituído. Ou vira diretor de criação, ou abre a sua própria agência ou vai trabalhar em outra coisa. Isso é uma constatação, você pode ver. E as pessoas mais velhas não conseguem mais ter referência — e a publicidade trabalha muito com as

tendências, com as coisas que estão acontecendo, então é difícil a pessoa ter as referências.

E também o cargo que ela vai ocupando, ela vai ganhando cada vez mais. Quando a

pessoa ganha muito, fica muito mais difícil ela se mover, e publicidade trabalha muito com

contas, né? Conta de luz, de água, telefone, e conta mesmo. Então, tipo assim, se as coisas aumentarem na agência, de grana, nego manda embora, nego demite, entendeu? Perdeu uma conta, demite, manda embora. Então, quando o cara tem um baita salário, é muito mais difícil

ele se mover. O cara que ganha dois, três mil, ele consegue outro emprego — mesmo assim com dificuldade —, agora o cara que ganha quinze? O cara que ganha dez? É difícil, não existe muito espaço para essa gente.

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E, geralmente, a galera, quando vai chegando a uma certa idade, as pessoas fizeram parte

de um outro tempo da publicidade, ela muda a cada minuto. Ela repete as mesmas fórmulas,

mas mudando a cara com que essas fórmulas são aplicadas, entendeu? Então essa galera que é mais velha, eles são um pouco arredios, porque realmente muitas vezes você não consegue

acompanhar, as coisas mudam muito rápido. E chega uma hora em que o cara quer prestar mais

atenção na família, quer outros planos, e o cara não consegue mais acompanhar aquilo, o cara não consegue mais sair às três horas da manhã de uma agência, entendeu? Vai ficando difícil para uma pessoa de 40, 50 se adaptar. Então o grande lance da publicidade é você saber que é

uma profissão temporária. Ou você vai ser o cara — que é um em um milhão — que vai arrebentar e abrir a sua própria agência, ou vai ser um p... diretor de criação, ou vai ser um cara premiadíssimo, vai ser a história da publicidade — e mesmo assim correndo um risco, porque

tem várias “histórias da publicidade” aí na rua, entendeu, caras que fizeram história e que estão com a sua agenciazinha, com seu escritoriozinho minúsculo, sobrevivendo pegando

clientezinho, entendeu, para tentar pagar as contas em casa. Conheço pelo menos uns três casos de caras que nos anos 70 foram o top da publicidade. Hoje em dia, um deles tem uma agência minúscula no centro da cidade. Luta, sobrevive pegando continhas. Então é meio cruel. Por isso

é que eu tento me dedicar também a uma outra profissão — eu sou maluco, né? Masoquista. É uma outra profissão que não dá dinheiro, é complicado e é um mercado muito difícil, artes plásticas, mas, enfim, eu tento.

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7.8. Resumo da entrevista 8

Sexo: Feminino.

Idade: 30 anos ∗.

Naturalidade: Rio de Janeiro, RJ.

Experiência em direção de arte: 2 anos e meio (desde 2001).

Formação universitária: Desenho Industrial.

PESQUISADORA (P): Eu queria pedir para você falar resumidamente sobre a sua trajetória, como começou...

ENTREVISTADA 8 (E8): Essa é a primeira vez que eu trabalho em agência. Eu já estou

aqui há três anos, mas eu não trabalhava em agência. Eu comecei trabalhando no Globo [jornal O Globo], como relações públicas, depois eu virei ilustradora. E, antes de eu ser ilustradora de

fato, eu trabalhei na gráfica do Globo, antes da gráfica do jornal passar para a rodovia

Washington Luís. Então, eu peguei exatamente o início da digitalização do jornal, eu entrei lá para fazer a digitalização do jornal, para mudar o conceito dos gráficos e passar para eles como

é que eles teriam que começar a trabalhar com o computador, diagramar, fazer a fotolitagem,

aquela coisa, foi uma loucura. Eu fui na verdade a primeira mulher a trabalhar lá, no meio de 53 homens, nunca tinha trabalhado mulher lá.

P: Em que ano foi isso?

E8: Isso foi em 93, 94, mais ou menos quando entraram os Macintoshs lá. Foi uma experiência muito legal, eram quatro Quadras só, aqueles enormes assim, que todo mundo achava um bicho de sete cabeças, com um bando de coroas, 53 coroas gráficos, que não

conheciam nada, não queriam trabalhar com computador de jeito nenhum — todo mundo trabalhava colando, recortando paste-up, recortando tijolinho de classificado, eles nunca se imaginaram trabalhando com computador, né?

Fiquei lá um tempo, passei isso para várias pessoas — quem não se adaptou acabou indo embora ou se aposentando —, fiquei lá por dois anos e aí é que eu passei para a redação, para fazer ilustração, na verdade. Ao todo, de jornal, eu fiquei lá dez anos. E aí eu vim aqui para

fazer a direção de arte de um projeto, que estava começando, fiquei aqui de 99 a 2000. Aí fiz outro projeto e aí sim eu vim para cá, para trabalhar na agência da casa. Na verdade, não tem três anos, tem dois anos e meio que eu estou aqui, mais ou menos.

P: E, se alguém te perguntasse qual é a sua profissão hoje, o que você responderia?

∗ Esta entrevista foi realizada em outubro de 2003.

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E8: Eu sou designer . Eu fiz Desenho Industrial e eu fiz um curso de pós, lá dentro do

jornal mesmo, em Jornalismo, era jornalismo e imagem. Então eu sou jornalista também, mas a

minha formação é de designer.

P: E você concluiu essa formação quando?

E8: De Desenho Industrial foi em 97, 98.

P: E como você vê o computador no trabalho de direção de arte?

E8: Hoje em dia, é fundamental. Para você mostrar o leiaute para o cliente, porque antigamente o cliente não via exatamente como vai ficar o trabalho. Isso é bom e ruim, né?

Antigamente era legal porque você mostrava, fazia tudo na mão, tinha aquela coisa mais artística, era muito mais arte, e aí quando você mostrava o produto finalizado para o cliente você gerava uma expectativa muito maior, e o cliente achava aquilo “uau, muito melhor”. Hoje em

dia, não, o leiaute que você mostra para ele é exatamente o que ele quer, ele já vê o trabalho praticamente finalizado, ele só não vê o trabalho em alta resolução, no papel que ele quer. Eu

daria assim uma nota oito de importância do computador para a direção de arte.

P: E, na sua opinião, pensando em agência de propaganda, né, quais foram as mudanças que o computador causou?

E8: Foi essa coisa mesmo do leiaute, que eu te falei. E as pessoas que não se adaptaram saíram do mercado, com certeza. Acho que todo mundo que hoje em dia trabalha em agência trabalha com computador. Não existe essa coisa de não ter computador. Todo mundo. Até o

fotógrafo usa computador.

P: Quando você começou a usar computador?

E8: Foi lá, naquela época que eu te falei, 93, 94. Eu não entendia nada.

P: Antes você não tinha contato, né? Foi no trabalho?

E8: Foi no trabalho. Porque quando eu era RP eu pegava as minhas horas de almoço e passava lá embaixo, estudando, aprendendo. Tinha Quark, Photoshop e tinha um outro

programa que o jornal fez exatamente para fazer os anúncios de classificado, eles mandaram

fazer um software, que era praticamente igual ao Quark. Então eu passava o almoço inteiro aprendendo a mexer nos programas.

P: E você era RP. Você já sabia que ia mudar?

E8: Isso, eu já sabia que ia mudar. Eu tinha seis meses para aprender, para mudar, porque eles queriam me botar no projeto para melhorar a qualidade, eles queriam provar que, com esses quatro Quadras entrando lá no jornal, eles iam, em um ano, ganhar um prêmio de excelência de

qualidade da Abigraf [Associação Brasileira da Indústria Gráfica] e mostrar que realmente a qualidade de impressão do jornal melhorou — e na verdade melhorou, lógico, né?

P: E ganharam?

E8: Ganhamos o prêmio, graças a Deus, senão eu não estava aqui hoje! (Risos.)

P: E você aprendeu com alguém?

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E8: Não, eu ia lá, ligava o computador sozinha e ficava chutando, queimando os

computadores, reiniciando quinhentas vezes porque dava bomba, aprendi sozinha. Tanto que a

minha primeira experiência foi com Macintosh, não foi com PC. A maioria das pessoas aprende em PC para depois pegar Mac.

P: Eles tinham encomendado o programa, né? E não tinha um treinamento?

E8: Não, teve, até teve um treinamento, mas era assim: os caras fizeram o programa, pararam lá seis meses, ensinavam umas duas horas para mim, depois me largavam e eu tinha que fazer sozinha. E, na verdade, os caras que fizeram o software eram caras de programação,

eles não entendiam de diagramação. Eu estava acostumada a pegar o paste-up, eu sabia as medidas do jornal, fazia tudo recortadinho, a gente diagramava, eu e os coroas lá que trabalhavam, diagramavam fazendo aquelas contas todas. Então, para a gente passar isso para os

programadores, era impossível, tanto que programa não deu certo exatamente por isso, porque ele não foi feito por uma pessoa lá de dentro. Na verdade, depois passou para o Quark e hoje em

dia é um outro programa, também semelhante ao Quark, mas é muito melhor. Eu peguei o que os caras ensinaram e aí fui no tapa para adaptar à diagramação do jornal. Nossa, e para passar isso para pessoas que nunca viram computador na vida! Sabe? Gráficos que achavam aquilo um

absurdo, aquela mudança toda. Nossa! Até hoje, lá no jornal, existem dois ilustradores que não trabalham com o computador de jeito nenhum. Só trabalham na mão e depois escaneiam o trabalho. Eles acham que não existe arte no computador, na verdade. Eles pensam assim. Eu até

acho que você tem como fazer arte no computador, mas isso é uma outra questão. O computador para mim não serve para fazer arte, é uma ferramenta, é diferente.

P: Agora, quando eu perguntei da sua profissão, você falou “designer”; você se considera publicitária?

E8: Eu me considero publicitária porque eu estou trabalhando no ramo, mas eu gosto de fazer tudo de design, eu gosto de fazer produto também — aqui é muito difícil fazer produto —,

eu faço vários outros frilas por fora. Eu gosto de ilustrar, de desenhar, entendeu? Meu barato

mesmo é desenhar.

P: E aí, aqui na agência...

E8: É, aí foi o seguinte: eu vim para cá com um dupla, para fazer Internet, a idéia do

nosso diretor era fazer uma dupla de Internet que ia centralizar todos os sites aqui na agência.

P: Todos?

E8: A gente não iria fazer todos, a gente iria fazer os principais e de repente terceirizar os

outros, dirigir os outros . Esse outro dupla não deu certo aqui dentro, aí ele saiu e aí eu fiquei sozinha, e eu sozinha não daria conta de fazer isso tudo. Aí eu vim para cá para fazer mais essa coisa de banner, multimídia, DVD, esses trabalhos mais interativos, né? Mas não só, eu faço

outros trabalhos com todo mundo, os anúncios, as campanhas, tudo.

P: E agora a gente vai passar para essa parte de pontuar de zero a dez. Zero para

nada, dez para total. Quero te perguntar se você gosta de usar computador, de trabalhar

com ele, sem pensar na utilidade, na praticidade, gostar mesmo.

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E8: Gosto, é... nove.

P: Você usa fora do trabalho também? Ou é mais só aqui?

E8: Não, hoje em dia eu estou sem computador em casa, mas quando eu tinha em casa eu usava. Hoje não, hoje eu não uso, hoje é zero.

P: E se você fosse classificar — você já falou um pouco, né? — a pressão do

ambiente publicitário, as agências, os clientes, para o diretor de arte saber usar o computador? De zero a dez?

E8: Ah, é dez, é dez. É fundamental. O diretor de arte hoje em dia, se não souber usar

computador, ele não está empregado.

P: E a facilidade que você, especificamente, tem em usar o computador? Você diria

que, de zero a dez, é quanto?

E8: Ah, eu acho que é nove, porque existem vários programas no PC que eu não sei... É nove, nove, daria nove.

P: A facilidade de aprender…

E8: Acho que nove, não dou dez porque ninguém é perfeito (risos), é nove.

P: E a utilidade do computador no trabalho? De zero a dez.

E8: Utilidade... Eu acho que o meu trabalho depende de criatividade também, não é só do computador. O computador é a ferramenta, então eu acho que metade é a ferramenta e metade é a criatividade. Eu acho que é cinco. Porque não adianta eu ser criativa só e não ter a ferramenta

para fazer, né?

P: E qual é a razão pela qual você trabalha com isso? Qual é a sua motivação?

E8: Na propaganda?

P: É.

E8: Eu gosto, é motivação sim, eu gosto. Eu gosto de pegar... Acho que é mais pelo desafio, você pegar uma campanha, pegar uma coisa nova e saber que ela vai ter retorno —

ainda mais aqui, que a gente está trabalhando com um público enorme. Você vai saber o retorno

que aquele trabalho te deu, sabe, se alguém gostou, se não gostou...

P: E você se vê trabalhando em outra coisa?

E8: Eu me veria trabalhando como ilustradora, tipo assim num futuro muito distante,

velhinha, coroa, cheia de netos, lá, trabalhando como ilustradora num sítio (risos), aí vendendo os meus trabalhos para um veículo de massa também. É o que eu gostaria de fazer, o meu sonho é esse. Um sonho muito distante, porque eu ainda tenho que aprender muito a desenhar, sabe?

Apesar de eu já ter feito essa coisa toda. Eu gostaria muito de voltar a fazer isso, mas viver disso, só isso. É o que eu mais gosto de fazer, e hoje em dia eu não faço mais isso. O que eu mais gosto de fazer é ilustrar.

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7.9. Resumo da entrevista 9

Sexo: Masculino.

Idade: 27 anos ∗.

Naturalidade: Rio de Janeiro, RJ.

Experiência em direção de arte: 5 anos (desde 1998).

Formação universitária: Comunicação Social, com habilitação em Propaganda e Publicidade.

PESQUISADORA (P): Eu queria primeiro te pedir para falar resumidamente sobre a sua trajetória, como começou...

ENTREVISTADO 9 (E9): Bom, eu já mexia com computador, com ilustração, em casa,

amadoristicamente mesmo. Aí entrei na faculdade de Comunicação, aí tinha lá: Publicidade ou Jornalismo. Preferi Publicidade. Fui seguindo, fui conhecendo o trabalho que é, aí comecei a

estagiar no laboratório da faculdade, fiz um estágio em agência, e da agência... Assim, eu nem

cheguei a rodar muito em agência, fiquei um tempo numa agência e já parti para cá, comecei a trabalhar aqui.

P: E esse estágio na faculdade foi quando? Você lembra?

E9: Eu estou aqui há uns três anos e meio... Uns quatro anos, cinco anos atrás.

P: Então você está nessa área há uns cinco anos.

E9: É, uns cinco anos, mais ou menos.

P: E, se alguém te perguntasse qual é a sua profissão, o que você responderia? O que você responde normalmente?

E9: Respondo publicitário assim meio... Não sei como eu me encaixo, assim, mas, como

eu trabalho aqui com publicidade e direção de arte — e sou formado em Publicidade também... —, falo que sou publicitário. É, é isso.

P: E como você vê o computador no dia-a-dia? No trabalho de direção de arte?

E9: É, ele ajuda. É como se diz, o computador é ferramenta, né? Você parte de uma idéia — e idéia não costuma ter muito, né (risos) — e normalmente faz um rafe, joga no papel, ou

não, tem gente que gosta muito de desenhar no papel e tem gente que vai direto para o computador. O ENTREVISTADO 7 diz que atrapalha — “Não, você tem que desenhar primeiro” —, mas como aqui é tão corrido, às vezes você está fazendo um trabalho tão um em cima do

outro, então às vezes você vai direto no computador, já desenvolve, já cria mais ou menos, já direto no computador para o trabalho estar pronto mais rápido. Então ele te auxilia na velocidade, né?

∗ Esta entrevista foi realizada em outubro de 2003.

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P: E para você não é pior ir direto no computador, né? Você sente alguma

diferença?

E9: Pior? Com certeza, quando você começa no papel, a chance de dar errado... é muito difícil, né? Você já vai para o computador para executar. No nosso tipo de trabalho é para

executar. Se você parte direto do computador, às vezes você começa a se perder, é tanta

ferramenta, o computador te dá tanta coisa para fazer que às vezes você se perde e sai do seu objetivo, da sua idéia. Se você partir do papel, sempre, sempre é melhor. O computador às vezes

pode te embolar, embolar o meio-de-campo para você ali.

P: E, na sua opinião, quais foram as mudanças que o computador causou no trabalho de direção de arte?

E9: Mudanças na direção de arte...

P: Você chegou a pegar a mudança?

E9: Não, eu... É que eu sou meio novo, mas o que eu posso dizer é assim: antigamente as coisas se resolviam mais assim... Por exemplo, você batia uma foto, você escolhia uma foto, aí

ela já não tinha muito retoque, era uma foto final para sair no seu anúncio, na sua peça publicitária. Hoje em dia, você bate uma foto, aí o pessoal ainda joga no computador para corrigir luz, para manipular, para tirar uma estria, uma ruga, entendeu? Então, eu acho que o

computador entrou também para auxiliar, acho que ele auxilia nessa parte. Antigamente você tinha que ser mais artista, o fotógrafo tinha que ser muito bom, o diretor de arte tinha que ser

muito bom, você não podia errar muito. Hoje o computador te dá essa margem assim, você tem mais facilidade para trabalhar. Esse lance de retocar foto, escolher fonte, né, as letras, a fonte. Antigamente você tinha um catálogo, eu acho, você escolhia... Era uma fonte ou outra. Agora o

computador te dá milhões de fontes. Você pode ter uma gama maior para trabalhar, mas também tem uma gama maior para se atrapalhar, né? Se confundir. Mas acho que o computador foi uma coisa boa para a direção de arte. Refina o trabalho, coisas em 3D, entendeu, virtuais.

Até televisão, né, você vê um filme publicitário, tem ETzinho, tartaruguinha... Então, antigamente, você tinha que fazer com maquete, com boneco, com massinha, sei lá como. Hoje em dia você pode viajar mais alto, que a tecnologia te permite, né, chegar a isso.

P: E como e quando você começou a usar computador?

E9: Cara, eu comecei a usar computador há muito tempo, 17 anos atrás, mais ou menos. Um amigo meu tinha, aí eu ia na casa dele e comecei a me interessar. Aí compraram um

computador mais moderno, aí eu ia lá. E depois eu fui comprar um MSX, um computador que

tive aí, era da Gradiente. Sempre me interessando, mexendo, mexendo com Basic e tal. Já tinha um programa gráfico, de arte, para você pintar, colorir, spray. Aí de lá para cá foi vindo o PC...

Nessa época eu nem sonhava, nem sabia o que era publicidade e tal. Era mais hobby mesmo,

diversão...

P: Então você teve o primeiro contato com dez anos.

E9: Mais ou menos com dez anos, que eu me lembre. É. Se não foi um pouco antes, mas

com dez anos eu lembro.

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P: Tem aqui escalas de zero a dez, zero é nada e dez é total. Aí eu vou te perguntar

quatro coisas para você dar uma nota e dizer mais ou menos por quê. E a primeira é se

você gosta de usar computador, de trabalhar com ele... Independentemente da praticidade, do que ele permite você fazer. Se você gosta...

E9: Como...

P: Prazer mesmo.

E9: Gosto, gosto. De zero a dez, eu diria que nove, porque me dou superbem com

computador, gosto de ficar no computador, se você não tem coisa para fazer, você vai para a

Internet, vai procurar alguma coisa para ler, para aprender, para estudar. Só não é dez porque tem aquela hora em que você está de saco cheio mesmo, você não agüenta mais olhar para o

computador, aquilo está fritando o teu olho e você... Mas no geral mesmo é nove, tranqüilo, é.

P: E se você fosse classificar a pressão que os diretores de arte sofrem para saber usar o computador hoje em dia? No meio publicitário, das agências, dos clientes... De zero

a dez, você diria que é quanto?

E9: Pressão... Eu acho que eu diria hoje sete. Sete, porque sempre o pessoal que é mais da antiga, que é mais... uns têm aversão mesmo, uns não conseguem mesmo, têm dificuldade de se adaptar, e outros têm até aversão — “Ah, não quero saber disso, o meu negócio é prancheta, é

lápis de cor...” —, mas hoje em dia você tem que saber mexer no computador, entendeu? Você não tem como leiautar uma coisa no papel, cada vez você trabalha mais, tem menos prazo, todos

os anúncios, todas as peças, é tudo fechado em computador. É feito no computador, então o cara tem que saber. Hoje em dia... quem não sabe eu acho que é até malvisto, né, como um cara atrasado.

P: Então, de zero a dez.

E9: De pressão? Sete seria o quê? Bastante pressão? Média, né?

P: Zero é nenhuma e dez é total.

E9: Sete. Oito. Oito. Põe muita, oito.

P: E, no seu caso, se você fosse classificar a sua facilidade para usar o computador? De zero a dez.

E9: Para usar o computador? Ah, eu diria oito. Oito porque... nove, assim. Oito, porque

tem um ponto que é coisa que você não sabe mesmo, por falta de conhecimento, e o outro ponto seria porque o computador é louco, tem hora que ele não... É máquina, entendeu, ele não

funciona, não vai funcionar, você vai ficar maluco... Então, eu daria oito. Ele só funciona

quando quer mesmo.

P: E, de zero a dez, quanto você daria para o computador em termos de utilidade para a direção de arte?

E9: Utilidade?

P: É. Para executar o trabalho.

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E9: Sete. Sete? É. Para executar, não, para executar é oito, né, você parte de uma idéia,

entendeu? O computador não vai fazer nada para você se você não tiver uma idéia, se não tiver

uma coisa para fazer. Então… Para executar… De repente para você mostrar para o cliente, você pode mostrar… Tem gente que aceita — ou aceitava ainda —, uma coisa, você com

colagem, com papel rabiscado, você consegue passar uma idéia, entendeu? Mas para ir para os

finalmentes, vamos dizer assim, aí você tem que pegar o computador de qualquer jeito. Não, pode botar oito, oito. É. Você não consegue fugir, entendeu? Você vai ter que cair no computador de qualquer jeito.

P: E uma última pergunta. Duas últimas. Quando você começou a trabalhar em publicidade, já era tudo computadorizado?

E9: Tudo. É. Cinco anos atrás é o que eu te falei, né? Já era tudo computadorizado. Parti

já aprendendo a fazer leiaute, já era... quer dizer, te diziam para fazer rafe, te ensinam a fazer tudo isso. Mas o computador não deixa de entrar logo de início, mostrar o que é fonte, o que é

cor, como o computador mistura as cores na tela, entendeu? Foto, o que você pode fazer com a foto, trocar a cor também, distorcer, mudar. Então, direto, a gente já caiu no computador.

P: E a última pergunta é por que é que você trabalha com isso? Por que você

escolheu essa profissão, quais foram os motivos?

E9: Eu acho que foi meio o que casou, assim, de eu... É uma forma de você botar a sua criatividade para fora — podia ser música, podia ser pintura — com a facilidade que eu já tinha

com o computador... Como tinha que escolher alguma coisa para trabalhar, me direcionar na faculdade, achei que publicidade junta algumas qualidades minhas que eu posso usar para o trabalho no futuro também. Então, eu tenho um pouco de criatividade, sei um pouco de

computador, o que é que eu posso fazer com isso? Ah, publicidade. Vou pensar, vou trabalhar

com idéia... aí eu parti para a public idade.

P: E você se imagina fazendo outra coisa no futuro?

E9: Imagino, acho que sim. Quer dizer, não imagino, mas acho que eu não trabalharia

com isso a vida inteira, não.

P: Por quê?

E9: Ah, não sei, cara... tudo. O mercado é ruim, a publicidade é diferente, muda, como eu

vou explicar? Essa é difícil, hein? É difícil falar.

INTERVENÇÃO ESPONTÂNEA DE COLEGA DE TRABALHO DO ENTREVISTADO: Acho que o

próprio mercado requer uma certa jovialidade do profissional. Você vê aí no mercado muita

gente desempregada com uma certa idade... Teve essa transição, né, da galera da antiga que não conseguiu fazer essa transição, teve até alguns que conseguiram, mas com o tempo o próprio

mercado... é como jogador de futebol mesmo, tem uma vida útil. Chega lá pelas tantas, o cara

ou é diretor de criação, ou é um gerente de criação, ou a carreira dele vai chegando ao fim, chega a um fim rápido, né?

E9: E o trabalho é desgastante, tem hora que você, “que saco, quero fazer outra coisa da

minha vida, não vou ficar de frente para o computador a minha vida inteira”, pelo menos para

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isso não, entendeu? Mas esse lance que você falou aí é interessante, da reciclagem, né, hoje em

dia eu vejo um meio-termo aí. Eu vejo que o pessoal que vem mais novo, que está com 15, 17

anos, eles são a juventude totalmente século XXI, digital boy mesmo, os moleques com 15 anos sabem muito de computador, muito, muito, muito mesmo, muito mais que a gente até, né, com

15 anos. Só que é o que eu te falei, você sabendo muito computador, de repente te dá tanto

recurso, tanta coisa, que você se afasta da essência da coisa, da arte, de você parar para pensar, parar para desenhar, parar para... tudo. Tudo na sua vida, né, você acaba ficando muito... até escravo do computador. Então, de repente essa galera que vem não é uma galera muito

pensante, já é uma galera meio robotizada de computador, entendeu? “Ah, vou apertar um botão, vai ter um filtro, vai ter isso, vai ter isso, vai ter isso pronto para mim.” A galera não vai pensar muito...

COLEGA DO ENTREVISTADO: É um monte de tecnologia por trás.

E9: É, acho que a própria tecnologia está numa virada aí, de repente sabe lá que direção

vai ser. Pode acontecer comigo.

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7.10. Resumo da entrevista 10

Sexo: Feminino.

Idade: 21 anos ∗.

Naturalidade: Rio de Janeiro, RJ.

Experiência em direção de arte: Menos de 1 ano (desde 2003).

Formação universitária: Desenho Industrial.

PESQUISADORA (P): Eu queria te pedir primeiro para falar resumidamente sobre a sua trajetória, como começou...

ENTREVISTADA 10 (E10): Eu faço Desenho Industrial na PUC, bacharelado em

Comunicação Visual, já fiz alguns estágios, e depois no sétimo período da faculdade eu me inscrevi no projeto para estagiar na AGÊNCIA 34∗∗. Participei de algumas dinâmicas, de provas,

aí fui selecionada para estagiar... E estou estagiando aqui desde fevereiro desse ano e participo

na parte de criação, finalização.

P: E esses estágios anteriores eram na área de propaganda?

E10: Não, não eram na área de design. Na área de propaganda, esse é o primeiro.

P: Quando alguém te pergunta qual vai ser a sua profissão, o que você responde?

E10: Qual vai ser a minha futura profissão?

P: É. “Ah, você trabalha em quê? Qual é a sua profissão”?

E10: Eu sou designer.

P: Responderia que é publicitária?

E10: Não...

P: Ou diretora de arte.

E10: É, se, futuramente, eu estiver trabalhando numa agência de propaganda, aí diretora de arte sim, mas publicitária não, acho que entre publicitária e designer tem uma grande

diferença. O limite às vezes é muito próximo, mas acho que existe diferença.

P: Para você, qual é a diferença?

E10: Eu acho que o publicitário atua mais na parte de campanhas, de anúncios, e o designer eu acho que está mais na criação, aí entra até a criação de anúncios mas acho que entra também a criação de logomarcas...

∗ Esta entrevista foi realizada em outubro de 2003. ∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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P: E aqui o trabalho que você faz é direção de arte de anúncios, essas coisas?

E10: É, aqui, o que eu faço é criação de leiaute às vezes e finalização dos leiautes, dos que já vêm prontos, pelos diretores de arte.

P: Você chega a fazer algum trabalho com redator, dupla?

E10: Sim, tem uma dupla que é uma estagiária também, ela entrou agora e às vezes tem

alguns trabalhos em que eu duplo com ela.

P: E como você vê o computador no trabalho?

E10: Para mim é uma peça fundamental. Acho que existem até grandes designers que não

usam computador, né — até porque começaram numa época em que o computador ainda não tinha tantos recursos, ainda não era tão usado. Eu admiro, mas acho que para mim o computador

é fundamental, eu não consigo criar nada sem computador. Quer dizer, criar não, mais finalizar,

acho que na hora da criação é até bom rabiscar no papel, mas na hora de fazer o leiaute mesmo eu acho melhor o computador.

P: Você começou nesse ano, então foi sempre no computador, né? Não pegou a fase anterior.

E10: Não, não peguei, já entrei nessa era.

P: E, para você, quais são as mudanças que o computador causou nas agências, no trabalho do diretor de arte?

E10: Eu acho que talvez tenha ficado mais ágil, seja mais rápido, hoje em dia, fazer os

leiautes e tal, porque eu acho que, antigamente, para você escrever um texto, mesmo ilustrar, eu acho que demora muito mais tempo, acho que o computador é mais ágil.

P: Quando é que você começou a ter contato com computador? Você lembra do

ano? Como é que foi?

E10: Do ano não. Eu lembro que eu comecei... Profissionalmente ou não?

P: Não, em geral mesmo.

E10: Em geral, quando criança, assim, mas mexia muito básico, né, Word, Internet.

P: Você tinha quantos anos?

E10: Uns... 13, 14, por aí.

P: Então era em casa.

E10: Era em casa.

P: Bom, aqui tem uma gradação que vai de zero a dez. Zero é nada e dez é total.

E10: Tá.

P: E aí eu vou te perguntar e vou pedir para você pontuar, classificar. Primeiro, quanto você gosta de usar computador? Indepentemente da utilidade. Gostar mesmo, prazer de mexer no computador.

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E10: Nove.

P: E no trabalho também, seria nove?

E10: No trabalho, nove também.

P: E se você fosse classificar hoje em dia a pressão que o diretor de arte sofre para saber usar computador no trabalho, quanto você acha que é, de zero a dez?

E10: Pressão que ele sofre?

P: É. Do ambiente mesmo, né, de publicidade.

E10: Acho que a pressão é grande, porque hoje em dia tudo é feito com computador, né?

Mas eu acho que ainda tem grandes diretores de arte que não usam, mas eu acho que é uma grande minoria, assim, acho que a maioria usa e a pressão é grande. Acho que oito, nove.

P: Entre um e outro seria qual?

E10: Ah, nove.

P: E se você fosse classificar a sua facilidade em usar o computador? De zero a dez.

E10: Nove também. (Risos.)

P: Não é… Não daria dez.

E10: Nessa?

P: É.

E10: É, não. Acho que entre nove e dez. Acho que eu tenho facilidade, mas tem algumas coisas que eu não sei, mas eu acho que eu tenho facilidade para aprender. Não facilidade para

aprender, mas é porque o computador eu me interesso muito, sabe? Me agrada. Então, acho que, como eu gosto, a facilidade é maior.

P: E se você classificasse a utilidade do computador no trabalho de direção de arte, de zero a dez, você daria quanto?

E10: Dez.

P: E uma última pergunta. Por que você escolheu essa profissão?

E10: Ah, não tem um porquê específico, mas eu acho que eu... eu gosto muito de criação,

gosto de estar sempre criando e eu acho que design é uma área que me interessa muito. Exatamente por isso, por eu poder criar e... imaginar e colocar isso no papel ou em qualquer

outra mídia que for. Eu acho interessante... (Risos.) É isso.

P: Você se imagina trabalhando em outra coisa?

E10: Não, eu não imagino. Já até pensei se eu não fizesse design o que eu faria, mas acho que é só isso mesmo. (Risos.)

P: E gostaria de trabalhar com propaganda mesmo ou mais com design?

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E10: Ah, isso eu ainda não decidi, porque o design é uma área tão ampla que não sei,

agora eu estou numa agência de publicidade para conhecer mas eu também me interesso pela

criação de logomarca, me interesso por fotografia, então eu acho que abrange muita coisa, e eu não sei se eu gostaria de ficar numa coisa só, sabe? Eu acho legal ficar mudando, saber um

pouco de tudo, dentro do design, claro. Eu ainda não decidi qual é a área que eu vou focar.

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7.11. Resumo da entrevista 11

Sexo: Masculino.

Idade: 38 anos ∗.

Naturalidade: Rio de Janeiro, RJ.

Experiência em direção de arte: 10 anos (desde 1993).

Formação universitária: Desenho Industrial.

PESQUISADORA (P): Primeiro eu queria te pedir para falar resumidamente sobre a sua trajetória.

ENTREVISTADO 11 (E11): Bom, na verdade eu sou formado em Design, Design de

Produto e Design Gráfico.

P: Os dois?

E11: É, eu fiz os dois, na época em que eu fiz era assim, né, hoje em dia é separado. E o

meu projeto de formatura também era nas duas áreas. E eu comecei trabalhando como autônomo, eu trabalhei no Circo Voador (risos) cinco anos, eu comecei pintando painel, que na

época não tinha plotter, né, não existiam essas tecnologias de impressão. Eu fazia o painel da

fachada, um painel grande, pintava tudo na mão, eu fazia cenário, fazia cartaz, filipeta, fazia tudo. Fazia desde o cenário até a parte gráfica. Eu fiquei lá cinco anos, e eu tinha uma amiga de faculdade, a gente começou a fazer trabalhos juntos, até que um dia enchi o saco de lá, porque

era bem livre lá. Eu tinha um espaço lá, depois a gente foi para um escritório, foi na época da transição para a Fundição, a gente ficou lá com eles, só que era muito difícil, porque só tinha um telefone, a gente teve dificuldades. Atender mais gente de fora compensava mais do que atender

a eles dentro da casa.

A gente saiu, abriu um escritório, uma empresa, e começou a trabalhar para empresas, fazendo endomarketing, umas campanhas internas. Eu trabalhei muito com produção artística

também, que era a minha praia, né, desde show, peça de teatro, evento no CCBB [Centro Cultural do Banco do Brasil], esse nicho de mercado. E fazendo muita apresentação de venda de projeto para patrocínio. Mas eu cuidava realmente mais da parte gráfica. Essa integração entre

texto e imagem não era uma coisa muito constante no trabalho. No trabalho de design normalmente não tem muito isso, porque a gente recebe a coisa pronta, você trabalha em cima da coisa pronta. Isso não é uma regra, é em geral. Normalmente é uma viagem mais gráfica.

Lá pelas tantas, cada um queria um negócio, e a minha sócia casou e foi morar nos Estados Unidos, ficou fora dois anos... E eu continuei com o escritório, foi uma “rabuda” danada, porque era só dívida, né? (Risos.) Mas eu consegui levar e tal. Quando ela voltou, eu já

∗ Esta entrevista foi realizada em novembro de 2003.

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estava fazendo free lance para a AGÊNCIA 35∗∗, eu tinha acabado de passar um mês fazendo um

free lance lá. Aí eu ia lá, ia lá e ia lá, e lá pelas tantas eu falei: “Olha, não me interessa mais esse

formato, você fica com o escritório”, que era um puxadinho na casa dela, “eu vou seguir o meu caminho, vou abrir um escritório em casa e tal”. Fiz um escritório em casa e tal, mas ficou lá.

(Risos.)

Aí eu comecei a engrenar o trabalho novo [na AGÊNCIA 35] e comecei a ficar lá dentro. Desde então, trabalhei muito com catálogo, mas em paralelo fazia outros free lances, como me

pagavam por mês, quando acabava o catálogo me davam folheto, fiz também apresentação

multimídia em PowerPoint para gerência... Aí a conta saiu e eu ia sair junto. Já tinha um outro catálogo dentro da casa, que a gente tem até hoje. E eu falei: “Olha, estou indo embora, e tal.”

Aí cobriram a minha proposta e eu virei supervisor de criação do dia para a noite. (Risos.) Não,

realmente, eu já trabalhava com isso, já tinha experiência e tal... Aí eu fiquei até a AGÊNCIA 35 acabar. E hoje em dia eu estou aqui [na AGÊNCIA 36] como supervisor, mas eu sou supervisor de mim mesmo, porque não tem ninguém para eu supervisionar (risos), a não ser o

ENTREVISTADO 12, mas aqui é muito mais “todos juntos somos fortes”, não tem assim... é um espírito mais de “está todo mundo no mesmo barco”, não tem muito “ah, eu mando em você”. Existe uma hierarquia juramentada, mas ela não é praticada, não tem espaço, né? E eu acho que

isso nem é importante. Para mim o importante é ter um salário razoável, que me sustente, e fazer um trabalho. O nome do cargo para mim não é uma coisa tão importante. E é isso, na verdade o

meu foco publicitário foi muito para marketing direto.

P: E há quanto tempo você trabalha com propaganda, com marketing direto?

E11: É difícil separar as coisas, porque, quando eu trabalhava com design, como atendia

muita coisa editorial e muito a parte cultural, realmente não era publicidade. Era uma coisa mais de design, informação, fazer um folheto, um informativo, fazer cartaz de peça. A publicidade surgiu... Volta e meia a gente fazia anúncio, dependendo do cliente a gente fazia alguma coisa

mais de venda, um folheto, um mostruário, um catálogo de produto, isso eu já faço há algum tempo, sei lá, mais ou menos uns dez anos.

P: E como supervisor de criação?

E11: Uns dois anos. Com marketing direto full time, estou trabalhando há cinco anos.

Antes eram experiências, eu não sou publicitário formado. Na verdade o meu campo é gráfico, mas a gente fazia, né, fazemos tudo, né? Então sempre fiz anúncio, às vezes criava texto

também, se houvesse necessidade.

P: Isso tipo há dez anos?

E11: Exatamente. Sempre tinha alguma coisa para fazer, fazia anúncio, fazia bastante

coisa. Era bem engraçado, bem aventureiro, né, mas dava certo, as pessoas gostavam. Não era

nada assim incrível mas atendia ao que se prestava.

P: Quando alguém te pergunta hoje qual é a sua profissão, o que você responde?

∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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E11: Eu falo que sou diretor de arte e designer. Eu gosto da palavra design, eu lembro de

quando eu estudei na minha faculdade [ESDI/UERJ], na época tinha professores que eram

formados por uma escola descendente da Bauhaus, e eles falavam que “publicidade é prostituição” [fala imitando sotaque alemão]. (Risos.)

P: (Risos.) Assim, é?

E11: É. Eu achava engraçado isso. Mas eu acho que o design é um campo mais rico, em termos de pesquisa, de aprofundamento, em termos de liberdade, até, criativa. Não que a publicidade não seja, mas é muito difícil você vender carne, produtos de limpeza e ser uma

coisa “vanguardinha”, botar uma coisa ilegível só porque acha bonito, não vai rolar isso lá. Claro que tudo tem um conceito, a questão do conceito é uma coisa pertinente desde a publicidade até o design. Vai estar sempre trabalhando em cima de conceituação.

P: E como é que você vê o computador no trabalho de direção de arte, no dia-a-dia?

E11: Olha, sobre isso eu posso falar um pouco de cadeira, porque eu dei curso durante

dois anos de design gráfico. E a gente dava lá no Parque Lage, onde não tinha condição nenhuma de nada, não existia computador no Parque Lage. Agora existe, mas eram dois, o que eu vou fazer com uma turma de oito com dois computadores? Então a gente procurava trabalhar

toda hora em cima da conceituação. O que eu acho? Eu, particularmente, faço tudo no computador, realmente hoje em dia faço tudo no computador. Mas eu sou de uma outra época, sou um animal jurássico, eu peguei papel ainda, montagem de leiaute em papel, uma porção de

coisas no papel eu fazia, fazia arte-final no papel. Então, o que eu vejo no computador? Eu acho o computador uma ferramenta maravilhosa, uma ferramenta que veio realmente resolver muita coisa, muitos problemas, muitas questões, que para a gente viravam questões físicas. “Ah, eu

quero fazer isso, isso e isso.” Não, às vezes você nem fazia, você fazia uma coisa que era mais

fácil do que fazer com xerox, guache, lápis de cor, tudo ao mesmo tempo. Então eu acho que o computador veio resolver essa questão. Essa questão ele resolveu.

Eu acho que o computador é uma ferramenta, ele não é, obviamente, o criador. O criador é você. E eu acho que o papel, essa coisa de você rafear, fazer o rafe, é bom. Muitas vezes eu não faço, eu já vou direto, são trabalhos que já têm uma coisa muito fechada, é mais fácil, mas

eventualmente a gente vai para um rafe. Quando a gente está discutindo a peça, a gente está

desenhando, está vendo isso acontecer, ou mesmo dobrando papel, entendeu?

O que eu vejo também com o computador é que para a geração nova existe uma

dificuldade muito grande de eles compreenderem isso, porque eles nasceram no computador e aí eu acho que vira uma fórmula, você começa a trabalhar com fórmulas, o próprio computador passa a ser uma coisa auto-referente. Eu acho que nas universidades ainda se puxa muito a

conceituação fora do computador, para depois você passar para o computador. Acho que para

termos educativos é bom, porque são dois processos diferentes, entendeu? Por mais que você possa resolver tudo no computador hoje em dia, você tem que ter uma conceituação fora dessa

realidade, dentro da sua cabeça. Ou no papel, ou no scan, ou rabiscando, acho que o processo

fica melhor, você consegue fechar mais — para determinados trabalhos. Tem trabalhos que, ah, uma filipeta, você vai lá e faz, entendeu?

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Mas eu não posso também separar o que eu já fazia antes com papel, quando eu peguei

computador eu também estava mais treinado na profissão. Não tem como separar, dizer: “Olha,

o computador é um problema, olha, o computador é legal.” Obviamente é muito legal. E trouxe para a gente mais responsabilidade também. O próprio cliente... O que acontece? Antigamente

você apresentava um leiaute e existia uma mágica, né? Você apresentava um leiaute cheio de

cola, todo colado, todo não sei o quê, e o cara olhava. E quando ele via impresso, quando ele via aquilo na prova de prelo, já era aquilo transformado, uma obra acabada. Você via um projeto e depois você via a obra acabada. Hoje não, você já começa pela obra acabada, o que é muito bom

mas é um problema também. Quando você chega para apresentar uma peça, você tem que ter a obra acabada. Tem que ter o texto, tem que ter... tem que estar tudo lá. E isso é muito ruim, porque você faz um leiaute que é um recorte de fotos, uma montagem de fotos, que a gente

chama de monstro, são fotos em que você tenta simular uma foto que você vai fazer, e corre o risco de você ter que fazer aquilo igual, ipsis literis, entendeu? Corre o risco de você ter que

botar o cara na mesma posição... Por isso que hoje em dia você começa a trabalhar muito com foto recortada, pega o fundo de outra coisa, ou manipula o fundo... Então eu acho que perdeu muito da magia, acho que a magia ficou prejudicada. Aquele momento de transformação não

tem mais, você não tem surpresa.

P: Até isso é uma coisa que eu ia até te perguntar depois: quais são, na sua opinião, as mudanças que o computador causou no trabalho das agências de propaganda? Essa é

uma, né? Tem alguma outra?

E11: Essa é uma, acho que essa é a principal, o processo de trabalho, o processo de interação com o cliente. Dentro do processo próprio do trabalho, internamente, né, você tinha a

figura do montador, você tinha a figura do ilustrador e isso tudo existe hoje em dia mas de outra

forma. Eles não estão presentes mais na agência, mas estão presentes como terceirizados. Você usa um ilustrador hoje em dia para determinadas coisas — que você utilizava antigamente —,

para fazer um passo-a-passo, ilustrar um folheto e tal, mas o que antigamente tinha era o

ilustrador do leiaute, a pessoa que simulava o leiaute, simulava determinadas imagens que precisava no leiaute. Isso é uma coisa que não existe mais. Certas coisas sumiram.

A própria montagem, que era uma coisa importante, montagem de arte-final etc., que

eram coisas superfundamentais dentro da agência, não tem mais, a arte-final morreu — vamos dizer assim, né? Você tem a finalização, que é o processo de final, mas você não tem mais

aquela figura do cara que pegava, botava a prancha, colava todas as letras ali e tal, existe só um

fechamento do trabalho. O trabalho já começa no final, a sensação que se tem é essa. Hoje em dia cada vez mais você compra foto, não se faz foto, então o processo fica muito... a ilustração

vira digital, você usa mais foto, a ilustração vira uma coisa com foto, existe muita simulação da

realidade, dentro dessa nova linguagem. Pegar um cara numa foto, pegar uma outra foto e é como se ele estivesse naquela foto, entendeu? Isso você não tinha como fazer antigamente. Você tinha que realmente ir para o Estúdio e montar isso. Quer dizer, fazia, mas era mais

truncado, era mais difícil. Você acabava fazendo a foto inteira. [Hoje em dia] existe muito essa coisa de falsear a realidade, é uma coisa impressionante.

E eu acho que mudou muito esse trabalho interno, não só o processo criativo como o

processo de trabalho. As profissões mudaram. O arte-finalista hoje em dia tem que saber

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computador, tem que saber inglês — alguma coisa, alguma noção ele tem que ter —, tem que

saber montar um trabalho. O cara tem que ser mais curinga, o cara não pode ser só montador.

Talvez em agências grandes você até tenha essa figura de montador, porque tem muitos trabalhos e tal, pode ser só um cara para montar. Mas em geral o cara faz tudo. Então eu acho

que deu um upgrade para a camada que ganhava menos. E acho que no trabalho da direção de

arte você também teve que ter um upgrade, teve que se inteirar mais, saber muito mais de computador, saber muito mais de todos os programas, enfim.

O que eu ainda acho que ainda existe do processo passado, dentro das agências maiores,

médias e grandes, que é esse processo de “ah, eu faço o leiaute, depois o fulano termina para mim”, é uma coisa que no design não acontece, você começa, termina, faz tudo. Eu acho que o

design trata a produção como conceito, a direção de arte de agência não trata muitas vezes a

produção como conceito. Claro que hoje em dia tem muito mais gente usando isso, mas isso na verdade são princípios de design, não da publicidade. O designer trabalha em cima de materiais, de formas de produção, aprende isso na faculdade, coisa que na formação publicitária não

existe. A formação publicitária deveria ter especializações, porque fica uma coisa solta: você pode ser atendimento, pode ser redator, pode ser... não é? (Risos.)

P: E quando e como você começou a ter contato com computador?

E11: Foi a partir de 92... É, 91, 92. A minha sócia tinha um namorado que tinha grana, era mais rico e tal, hoje em dia é diretor de filme publicitário. Ele tinha uns amigos que mexiam

com vídeo e comprou um computador Amiga, na época era um computador que se usava em ilha de edição e tal. E a gente começou a trabalhar. Era um computador superinteressante — não existe mais, e naquela época você rodava o programa num disquete, depois tirava o disquete e

botava para gravar, era assim. Mas ele tinha programas interessantes, tinha um programa de animação superfácil e tinha programas de editoração, que a gente usava e tinha que imprimir num lugar aqui no Centro da Cidade, para usar era um negócio! (Risos.) Mas a gente achava o

máximo, porque era econômico e a gente tinha domínio. Antigamente a gente não tinha domínio, a gente mandava assim: “Olha, eu quero esse texto, corpo tal, linha tal...” Aí, quando era título e tinha uma coisa assim mais... você precisava fazer um “tchan”, aí você inventava

umas coisas da sua cabeça, não sabia se aquilo dava certo, né, e mandava fazer. Era feito num

computador imenso, numa sala, várias pessoas digitando, e aquilo vinha numa tira e você colava. Então o que você leiautava muito era a cara geral. Mas detalhes de texto, você tinha

que... Era tudo em comando, você pegava aquela folha de texto e começava: caixa-alta, corpo

tal, entrelinha tal, bitola tal, entendeu? Ah, esse título você abre, faz... enfim.

Aí, quando eu comecei a usar o computador, tinha o domínio daquilo, eu via aquilo.

Tinha limitações, obviamente, mas para a gente era... Eu me lembro que eu fui uma das

primeiras pessoas a mexer com computador no meu círculo de conhecimentos, se não fui a primeira. Principalmente na área gráfica. A maioria das pessoas até então mexia para banco de

dados, contabilidade. Sei lá, meu pai mexia, ele trabalhava na Fundação Getúlio Vargas, mas

eram aqueles computadores imensos, com cartelas perfuradas.

Então eu comecei em 91, 92. Depois a gente teve o PC e aí começou: o CorelDraw,

algumas pessoas já estavam se inteirando, e teve um boom realmente, em que todo o mundo

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pegou esse trem. E o Mac também, eu comecei a usar logo, em 96, por aí. Você vê que essa

história tem muito pouco tempo, né? Para mim já tem, mas para a maioria das pessoas não tem

dez anos. Mas, como a interface é muito rápida e hoje em dia tudo é muito rápido, parece que tem vinte, né?

P: É, os lançamentos, né? Agora eu tenho umas perguntas que têm uma escala de

zero a dez. Então eu vou te perguntar, pedir para você classificar a sua opinião e dizer mais ou menos o porquê da escolha.

E11: Hum-hum.

P: Primeiro eu queria te perguntar se você gosta de usar o computador, de trabalhar com ele...

E11: Eu adoro.

P: ...independentemente da utilidade, sabe ...

E11: Eu adoro. Computador para mim é... Acho que sou casado com o computador.

P: (Risos.)

E11: Mais do que com a minha mulher, com a minha família, eu sou casado com o computador. Se bobear, eu chego em casa, ainda ligo o computador e vou para a Internet.

Computador para mim é uma fonte de trabalho, de lazer, enfim.

P: Gosta mesmo.

E11: Gosto mesmo. Não sou aquela pessoa assim: “Ah, quero saber dos últimos

lançamentos.” Quero um computador para poder trabalhar, que funcione... Os lançamentos eu vou me inteirando do que eu preciso, não sou frenético com essa coisa do mundo do computador. Mas eu gosto. Para mim é a grande invenção do século, né? Então agora eu tenho

um palm também, quer dizer, vou ficar cada vez mais digital.

P: E se você fosse dizer, de zero a dez, qual é o seu prazer em usar o computador, quanto você daria?

E11: Eu tenho que dar uns oito ou nove, né, porque dez também é meio difícil, né? Acho

que a vida é muito maior do que isso, maior do que o computador. Eu gosto de conhecer pessoas, de conversar com as pessoas. Acho que eu daria uma nota... sei lá, oito ou nove, bota

nota nove, só não ponho dez porque acho que é sacanagem com a humanidade. (Risos.)

P: (Risos.) E se fosse classificar — você até já falou um pouco disso — a pressão que os diretores de arte têm do meio, do mercado, para saber usar o computador hoje em dia?

E11: Ah, eu acho que a pressão é grande. É assim: se a pessoa tem dificuldade com isso, é

melhor não ser diretor de arte. Eu acho. Porque diretor de arte de filme, por exemplo, tudo bem. Mas diretor de arte de publicidade... acho que é nota dez. Obviamente, se o cara é bom, não sei o quê, e não souber todos os programas, mas alguns ele vai ter que saber... Eu conheço uma

pessoa por exemplo, que seria legal você entrevistar, que trabalha na AGÊNCIA 13, ele é de uma

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época em que também não se usava computador e ele usa menos o computador, usa menos, tem

mais dificuldade. Ele é um cara muito legal, é um cara muito gente boa.

P: E se você fosse classificar, de zero a dez, a facilidade que você, especificamente, tem em usar o computador?

E11: Olha, eu dou nota oito, porque eu só não dou dez porque vão me achar muito o rei

da cocada preta. (Risos.)

P: Não...

E11: Eu nem te contei que, nesse meio-tempo, além de dar curso de design, eu dei cursos

também de treinamento de Macintosh. Uma época em que eu estava duro e tal, eu descolei uma empresa, era terceirizado e ia. Foi assim que eu entrei na AGÊNCIA 35, comecei a dar curso de Photoshop. Eu já mexia, eu já sabia mexer — primeiro eu comecei a mexer, as pessoas: “Ah,

esse programa.” Aí eu ia lá e ficava fuçando e mexendo. Tirava print, tirava impressão, fotolito, eu fazia tudo. Quando eu cheguei nesse lugar, eu não sabia nada, eu sabia a teoria do programa.

Aí eu estudei, peguei o tutorial, peguei os livros do programa, estudei sozinho, fui lendo, aí dei curso...

P: Então não é oito a sua facilidade em geral, né? É mais do que isso.

E11: É mais do que isso, sim, mas hoje em dia eu não fico lendo livros de programa, não fico me inteirando tanto, porque não tenho tempo para isso, hoje em dia eu me concentro mais no trabalho que eu preciso fazer. Antigamente eu acompanhava mais os lançamentos e tal, era

mais focado nisso; hoje o meu foco é mais no trabalho. Por isso é que eu digo que não seria nota dez porque eu não sou uma pessoa... não tenho tempo para ficar tão inteirado, entendeu?

P: Mas sem pensar em conhecimento, mas na facilidade natural.

E11: Ah, eu tenho muita facilidade. É nota dez. Tem algumas coisas assim: PC, quando

dá pau, eu prefiro chamar alguém, porque eu acho um saco PC. É chato, você fica naquela tela preta. (Risos.)

P: (Risos.) E se você fosse classificar a utilidade que o computador tem no trabalho

de direção de arte?

E11: Ah, eu acho que é nota dez. Para o campo de direção de arte, de agência. Como eu

falei, em direção de filme e tal é outra coisa, você tem referências, você tem livros, você tem

milhares de outras coisas que vão te ajudar. E sem computador a direção de arte hoje em dia não é nada, entendeu? Porque, se você tirar isso, por mais que tenha uma idéia bacana, por mais que você saiba rafear tudo na mão, sem computador não tem nada, não vai chegar a lugar nenhum. É

a ferramenta principal do processo. Qualquer agência, para abrir, tem que ter um computador para cada pessoa. Não dá para trabalhar sem, então eu acho que é nota dez, é fundamental.

P: E a última pergunta: por que você trabalha nisso? Qual é a sua motivação, quais são as razões?

E11: Eu sempre fui... Eu sempre gostei de desenhar. Sempre tem alguém que fala: “Desde

pequeno, você sempre gostava tanto de desenhar etc.” — sempre tem uma avó. Já fiz pintura

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durante um tempo da minha vida, fiz curso no Parque Lage durante dois anos, gosto realmente

da coisa gestual e tal.

Engraçado, eu lembro que eu tinha doze anos e eu ia para o trabalho do meu pai, na época tinha uma máquina de — olha como eu já gostava de computador —, tinha uma máquina de

escrever elétrica. E eu passava a tarde inteira inventando coisa naquela máquina! Eu escrevia

novela, a gente fazia umas sacanagens com uns colegas de turma, que eram capa de disco, escrevendo aquelas coisas: “Fulaninho, que era viadinho”, aquelas coisinhas, inventava músicas,

fazia paródias. Eu sempre tive esse... Se você olhar os meus cadernos de adolescente, tinha

muito essa coisa de gostar de meio de publicidade, de alguma coisa gráfica. Eu lembro que, quando eu fiz um trabalho na oitava série, sétima série, do Ariano Suassuna, O auto da

compadecida, era um trabalho que tinha que fazer uma pesquisa, fazer também uma

apresentação, eu fiz um folheto com capinha, com logo, com tudo, sabe? E na época não tinha nada, era máquina de escrever elétrica.

Então eu sempre gostei, eu meio que fui talhado para isso, tinha essa tendência realmente.

Quando eu escolhi design, o que era design? Hoje em dia você fala design e todo o mundo sabe o que é, mas designer era como se fosse um E.T., entendeu, ninguém sabia nada. Eu sempre

gostei disso. Não foi uma coisa assim: “Ah, eu descobri.” Eu sempre, no fundo eu sempre gostei

disso. Eu fiz teatro três anos, e dentro do teatro eu fazia o cartaz, fazia a filipeta, foi sempre assim: onde eu estava, eu já tinha essa vertente. E não era só porque eu desenhava — eu fazia já os gráficos, a parte de lettering, era tudo junto, logotipo, já estava ali. Desde adolescente, desde

os doze anos, eu gostava disso, que eu me lembre. Não é uma coisa que eu precisei fazer muito esforço para ser, foi uma coisa natural, um processo natural.

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7.12. Resumo da entrevista 12

Sexo: Masculino.

Idade: 28 anos ∗.

Naturalidade: Rio de Janeiro, RJ.

Experiência em direção de arte: 3 anos (desde 2000).

Formação universitária: Não tem.

PESQUISADORA (P): Primeiro eu queria pedir para você falar um resumo da sua trajetória profissional.

ENTREVISTADO 12 (E12): Tá. Eu comecei a trabalhar em agência na verdade como

assistente de atendimento. Um amigo meu já trabalhava numa agência, ele era mídia, e estavam precisando de uma pessoa para dar um suporte para o atendimento. Então eu comecei a trabalhar

com a Nádia Rebouças, ajudando ela em planejamento, e depois eu passei a estagiar no Estúdio,

na Criação. Esse foi o meu primeiro contato com agência. Dali eu comecei a trabalhar com os softwares que a agência costumava usar. E foi quando o Macintosh começou a entrar muito no

mercado, pelo menos aqui no Rio. Aí uma agência internacional incorporou a nossa agência,

muitas pessoas saíram e eu aproveitei esse tempo para aprender justamente a trabalhar com o Mac. O Mac estava chegando, era uma novidade. Aí eu fui trabalhar num fotolito — fui trabalhar não, me ofereci como estagiário —, fiquei lá, aprendi a trabalhar, e essa mesma

agência me chamou depois. De lá, fui pulando para várias agências até aqui.

P: E você começou em que ano? Você lembra?

E12: Eu comecei em... em 1998. 1997 mais ou menos.

P: Seis anos.

E12: É.

P: E, quando alguém te pergunta hoje qual é a sua profissão, o que você responde?

E12: Eu respondo publicitário. Não falo diretor de arte, falo publicitário.

P: E você é diretor de arte há quanto tempo?

E12: Como diretor de arte estou trabalhando há três anos. Trabalhava no Estúdio, depois passei para direção de arte.

P: E como você vê o computador no trabalho de direção de arte, no dia-a-dia? Hoje.

E12: Eu vejo ele como um braço meu. O braço direito que usa o mouse. Se eu não tivesse o computador é como se eu não tivesse o braço para conseguir trabalhar. Não dá para trabalhar

∗ Esta entrevista foi realizada em novembro de 2003.

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hoje sem o computador. Não existe essa possibilidade. Não tem como. Criar, você pode até

rafear, pode conceituar, mas na hora de executar você precisa do computador. Se não dá, se tem

um pau no trabalho, se você tem que usar outro [computador], você corre para casa, termina em casa e vai fazer. Não existe mais a possibilidade de você viver sem computador no trabalho.

P: E, na sua opinião, quais foram as principais mudanças que o computador causou

no trabalho de direção de arte, nas agências em geral?

E12: Eu acho que facilitou muita coisa. Por exemplo, para você trabalhar com cor, isso facilita. Agilizou. Não se limitando só à agência, você faz um trabalho e precisa dar uma saída

especial, então você grava no seu computador e manda para um birô. Isso é mais uma novidade que já chegou mas está crescendo cada vez mais. Mudanças na agência? Acho que eu já peguei todo o mundo trabalhando no computador. O que eu vejo mais é... por exemplo, a pessoa nunca

sabe tudo do software no computador. Por exemplo, às vezes o cliente manda para a gente um relatório para fazer com várias marquinhas de fornecedores dele. Às vezes tem um que manda

em Word, tem um que manda em Corel, e no caso a gente trabalha com Mac. Na verdade a gente está descobrindo a cada dia que a gente já pode abrir um determinado arquivo de um programa num outro programa. E a gente vai buscando, o computador vai te mostrando que

você pode resolver coisas. Porque antes você falava: “Manda [o cliente] mandar em Adobe Illustrator, manda mandar em FreeHand, porque eu só consigo abrir assim.” Mas aí você descobre que se você abrir no Word você consegue salvar ele no programa que você precisa.

Cada vez mais ele vai estar mostrando que existem soluções para diversas coisas que às vezes você não imagina que você consegue. Eu acho que na verdade todo o mundo está descobrindo ainda, ninguém sabe tudo o que você pode puxar, aproveitar do computador.

P: Quando você começou, mesmo no Estúdio, já era tudo computadorizado, né?

E12: É. Já era computadorizado, eu já venho da época moderna, não sou da época das cavernas.

P: (Risos.) A Idade da Pedra.

E12: (Risos.) É, pelo menos é assim que eu enxergo. Porque quando falam de como funcionava, não sei o quê, eu acho isso tudo muito esquisito, não dá para imaginar. (Risos.) Era

tudo muito esquisito.

P: (Risos.) Fazer na mão...

E12: É maravilhoso você ver o trabalho que era feito e não sei o quê, mas era uma coisa muito primária.

P: Quando e como você começou a usar computador? Foi no trabalho mesmo ou foi fora?

E12: Não, foi no trabalho mesmo. Na verdade, não tinha Internet naquela época e tal,

então era mais para você... Usava até o DOS para fazer texto, essas coisas todas. O meu primeiro contato foi assim. Aí, quando eu fui para a agência eu usava Word e Excel,

PowerPoint, eu era ligado com atendimento. Aí, depois que eu fui para o Estúdio comecei a ver o primeiro programa gráfico que foi o Corel. Não, mentira, foi o Paint Brush. Tinha o Paint

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Brush e era o máximo. Aí depois foi o Corel, o Photoshop aos pouquinhos. Fui pegando... Foi

na agência, o Corel 4. E depois... eu uso agora mais Macintosh, FreeHand, outros programas

que costumam ser mais utilizados na plataforma Mac.

P: Aqui tem uma escala de zero a dez, vou te pedir para classificar, de acordo com algumas perguntas, e falar por que você escolheu.

E12: Tá.

P: Então primeiro eu queria te perguntar se você gosta de usar o computador, de

trabalhar com ele, independentemente do que ele faz, sabe? Gostar mesmo, de prazer de usar.

E12: É muito difícil — por exemplo, eu tenho Mac em casa também e tem um amigo meu que está montando um escritório. Eu peguei o meu Mac e emprestei para ele, falei: “Vai lá, leva

para lá, se eu precisar fazer algum frila você devolve.” É muito difícil eu não usar só para trabalho, é muito difícil eu ficar na Internet, é muito difícil eu ficar vendo e-mail. Então eu uso

mais para o trabalho mesmo, entendeu, o computador. E... acho que eu estava fugindo um pouquinho da tua pergunta.

P: Não... É de modo geral mesmo.

E12: De modo geral, eu gosto de usar para o trabalho, é a minha ferramenta de trabalho. Eu gosto de usar para o trabalho. Agora eu não fico assim... tem pessoas que eu conheço, que chegam em casa, fazem as coisas que têm que fazer e “Ah, vou ligar o computador para ver o e-

mail”. Eu não faço isso. Vejo até... sei lá, eu saio do trabalho às oito horas. E fico até o dia seguinte, na hora em que chego no trabalho para ver. A não ser que tenha alguma coisa importante, mas não vejo o e-mail. Então, computador em casa, para mim, só se tiver um frila

para fazer, aí eu vou e ligo. Senão, não uso. Eu não gosto muito de ficar na frente do

computador, não. Adoro ficar na frente dele para trabalhar, porque eu não consigo fazer isso sem ele. Agora, se tem um tempinho, parei de trabalhar, eu levanto, vou tomar um café, não fico

buscando o que fazer no computador, não. Não gosto, me cansa um pouco.

P: Então se você fosse classificar, de zero a dez, para você, o prazer de usar o computador?

E12: O prazer de usar o computador? É assim: tenho que fazer uma pesquisa para o meu

sobrinho que está fazendo um trabalho, aí eu vou na Internet, pô, é maravilhoso pesquisar — agora tem que ter, acho que precisa ter um objetivo. Se eu tiver uma coisa realmente importante para fazer, eu uso. Senão, não fico procurando o que fazer. Não procuro mesmo. Porque eu acho

chato ter que ficar caçando o que fazer no computador. Eu acho desnecessário, na verdade.

P: Então, de modo geral, gostar de usar o computador, para você, é quanto?

E12: Gostar de usar? Se eu for falar para o trabalho, vou dar dez. Agora, por diversão, de

repente coloco quatro. Então, sei lá, vamos botar sete. A gente soma e divide. Pronto. Sete.

P: E se você fosse classificar, de zero a dez, a pressão que o diretor de arte hoje tem

em saber usar o computador, você daria quanto?

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E12: Pressão? Dez. É muito pressionado, porque se a pessoa não souber utilizar, não

entender, não conseguir ser ágil, já era. Não tem como sobreviver. Não dá. Acho que todo o

mundo já conhece alguém que se deu mal no trabalho porque não sabia mexer no software. Um amigo meu mesmo, ele passou numa entrevista e tal, foi trabalhar no marketing de uma

empresa, só que lá era só Mac e ele só trabalhava com PC, tentou mas não se adaptou ao

software, foi demitido... É pressão total.

P: E se você fosse classificar, a facilidade que você especificamente tem em usar

computador, de zero a dez?

E12: Facilidade? Eu acho que eu me daria dez. Porque eu nunca fiz nenhum curso de nenhuma plataforma, nem Mac, nem PC, nem nada, e de nenhum software também. Quer dizer, a única coisa que eu fiz foi para webdesign, aí eu fiz cursos para webdesign. Mas eu acho que

não é complicado.

P: Você sempre aprendeu sozinho?

E12: Eu sempre aprendi sozinho. E é isso que estava falando antes: cada vez mais, ele te mostra que existem ferramentas dentro dele com que você consegue resolver, então, você pesquisando, é fácil, não é nada complicado. Tem que ter vontade. Ainda mais para quem nunca

mexeu, é disco voador. (Risos.)

P: Se você fosse classificar a utilidade que o computador tem no trabalho de direção de arte, você daria...

E12: A utilidade? Eu uso ele para executar uma idéia. Então ele é dez para execução, mas, se eu for falar de criação, posso dar zero para ele, porque eu não preciso dele para criar. Eu tenho escalas de cores, posso trabalhar na mão; se eu for pensar numa faca, eu posso trabalhar

no papel e fazer uma faca para depois transformar essa faca em faca mesmo no computador. Eu

posso rafear, conceituar, tudo fora dele, trabalho nele para executar. Para criar, eu não preciso dele, agora para executar eu dou dez. É para criação ou só para execução?

P: A pergunta é bem aberta mesmo, então, no geral...

E12: Eu só colocaria isso: dez para execução e zero para criação. Porque até você começa a ficar viciado, se você pegar ele e só ficar criando, trabalhando nele, você vicia, você não

consegue desenvolver mais. Porque você tem um limite ali. Se você ficar criando no

computador, você não vai passar daquele limite. Se você trabalhar fora, você abre mais, você tem mais espaço — mesmo o monitor sendo grande. (Risos.)

P: (Risos.) Tá.

E12: Então, para executar eu dou dez, para criar, dou zero. Não sei. O que você prefere: para executar ou para criar?

P: Era geral.

E12: Geral? Qual é a pergunta mesmo?

P: Se você fosse classificar a utilidade que você vê no computador no trabalho,

quanto você daria?

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E12: Vamos botar oito, senão, se for dez, ele [o computador] pode ficar muito metido.

P: E, como última pergunta, eu queria saber por que você trabalha nisso. Qual é a

sua motivação, o que te levou a trabalhar nessa área?

E12: Na verdade, eu trabalho nessa área — eu, particularmente — porque eu aprendi a

fazer isso. Um amigo meu me chamou para trabalhar em agência e aí é que eu comecei a

desenvolver. Depois passei a gostar muito. Acho que uma coisa que é muito interessante é você criar uma peça e você estar em casa e receber essa peça. Então, isso cada vez mais foi motivante [sic] para eu continuar nessa área. Estou trabalhando porque eu gosto muito do que eu faço

mesmo e acho que é... o salário é legal, você poder comparar com determinadas profissões... Eu acho que o salário é legal e é criativo, eu gosto. Acho que é você poder viajar, não viajar só com o trabalho, viajar com a cabeça das pessoas, nas reações, é interessante. É. Não sei, é mais ou

menos isso.

P: E você se imagina trabalhando nisso por muito tempo?

E12: Por muito tempo? É, na verdade, eu me imagino trabalhando, conseguir ficar trabalhando nisso até sair o meu plano de previdência, porque eu já programei. (Risos.) Porque se sair antes eu estou um pouco ferrado... Mas é... eu espero que sim. Apesar de em várias rodas

de amigos meus também publicitários a gente ficar discutindo que... às vezes a gente vê até um redator mais velho trabalhando. Até aqui na agência tem. Agora para ser diretor de arte já é um pouco mais complicado. Só se for o diretor de criação ou o dono da agência, o que é muito

difícil. Eu não sei onde isso vai dar. Tenho outros projetos também de montar coisas, não um escritório de design, de repente uma coisa mais voltada para birô mesmo, voltada para coisas de suporte, não de repente um birô, mas uma coisa de suporte. Porque eu acho que é uma coisa

muito complicada, muito fechada mesmo. Chega uma hora em que você começa a ter um salário

maior, você vai tendo mais experiência e é óbvio que você mereça um salário maior, e acabam te cortando. Redator você até encontra, mas diretor de arte é muito difícil. Acho que o mais

velho que eu já encontrei tem 42 anos. Não sei se foi só a minha visão, mas eu acho que de

repente se a gente der uma olhadinha com calma a gente vai começar a reparar nisso.

P: Que não tem mais velhos trabalhando?

E12: Que não tem mais velhos trabalhando. Então eu acho que a resposta para até quando

eu pretendo trabalhar com isso é até quando deixarem eu trabalhar com isso. Porque eu gosto.

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7.13. Resumo da entrevista 13

Sexo: Masculino.

Idade: 39 anos ∗.

Naturalidade: São Paulo, SP.

Experiência em direção de arte: 14 anos (desde 1989).

Formação universitária: Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo.

PESQUISADORA (P): Primeiro eu queria pedir para você falar um resumo da sua trajetória profissional, como começou...

ENTREVISTADO 13 (E13): Tá. Eu comecei numa agência pequena chamada AGÊNCIA 4∗∗,

que estava começando mas já estava fazendo algum sucesso, e na época eu era redator, e pintou uma vaga para direção de arte. Eu não sabia desenhar — na época precisava saber desenhar, não

tinha computador...

P: Era em que ano?

E13: Foi 1989 mais ou menos. Eu acabei entrando, pensando que estava pegando uma

vaga de redator e era de diretor de arte. Só que quando eu estava lá eu já tinha passado por todas

as agências, então pensei: “Se eu perder esse emprego, acabou, né?” E tinha um amigo meu que era desenhista, ele na época era manchador, trabalhava no Estúdio, né, então ele começou a me ensinar a desenhar, ele desenhava para mim, marcava letra, né? Naquela época, você tinha que

fazer tudo à mão. Ou seja, você escolhia uma fonte pa ra determinado anúncio, você tinha que marcar ela à mão, o máximo que você tinha era uma xerox para ampliar e reduzir. Tudo era mostrado em desenho, né, e... eu acabei gostando de direção de arte e de lá um redator que

trabalhava comigo — eu fiquei lá uns sete meses — foi mostrar a pasta na AGÊNCIA 37, o cara gostou de alguns cartazes meus e me chamou para trabalhar. Na época eu tomei um susto, porque o cara me contratou e era para trabalhar para McDonald’s e Coca-Cola, e eu estava lá há

seis meses, começando — “Ai, meu Deus”, né?

P: (Risos.) Ah! “Só” isso, né?

E13: Foi muito legal, deu certo, né? Eu fiquei na AGÊNCIA 37 uns dois anos e meio e ganhei alguns prêmios assim... pela primeira vez a AGÊNCIA 37... nós fizemos dois cartazes que foram exportados para os Estados Unidos, e geralmente era o contrário. E de lá fui para a

AGÊNCIA 38, que era a melhor agência da época no Rio, há cinco anos. Foi na AGÊNCIA 38 que eu comecei a fazer dupla com o André Pedroso e a gente ganhou dois prêmios em Cannes, a gente ganhou várias peças do Clube de Criação de São Paulo, e de lá eu saí para ser diretor de

∗ Esta entrevista foi realizada em novembro de 2003. ∗∗ Todas as agências mencionadas nas entrevistas estão anônimas.

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criação da AGÊNCIA 19, para atender O Dia, Creditec. Fiquei um ano na AGÊNCIA 19 e fui

convidado de volta para ir para a AGÊNCIA 37, nessa época já era também para atender Coca-

Cola e Esso. E fiquei na AGÊNCIA 37 mais um ano e meio, quando me chamaram para a AGÊNCIA 39, fui para a AGÊNCIA 39 para atender Telefónica. Fiquei três meses e esse meu

antigo dupla estava na AGÊNCIA 17 e me chamou para a AGÊNCIA 17. Fui para a AGÊNCIA 17

com ele, ficamos lá seis meses, quando ele recebeu uma proposta para ir para a AGÊNCIA 39 de novo. E eu fui para a AGÊNCIA 39 de novo — que agora tem o nome de AGÊNCIA 40 só para atender Telefónica. Fiquei lá um ano e meio e aí me chamaram para cá, que é a AGÊNCIA 15, a

agência estava começando, e a gente aqui começou com a conta da Oi. Pela primeira vez eu pude pegar uma conta do zero. A gente começou do zero a Oi, né, foi muito boa a experiência, e a Oi foi um grande sucesso, porque a previsão era de vender 500 mil telefones e passamos

1.650.000. Foi o recorde mundial, saiu até na capa da Istoé. Aí ganhamos também a conta do Guaraná Antarctica, que é uma conta de São Paulo, concorremos com várias agências — São

Paulo é grande, né? E a gente acabou conseguindo essa conta, ou seja, a gente conseguiu pegar uma conta grande para o Rio, geralmente é o contrário, né? A gente atende também a TAM Viagens, atende a revista Capricho, a MTV Rio... Então estou aqui há um ano e meio. Essa é a

minha trajetória.

P: Então é desde 89 em propaganda, direto.

E13: É.

P: E já no começo você estava como diretor de arte, praticamente, né?

E13: É, eu era mais redator. Tanto é que hoje em dia eu acho que não existe diferença entre diretor de arte e redator. A gente senta pa ra criar e eu faço filme, faço anúncio, às vezes

penso em título, né? Às vezes o redator também pensa na parte visual. Só na hora que a gente se

separa para fazer o leiaute, ou para fazer o roteiro, cada um tem sua especialidade, né? Mas já foi época em que o diretor de arte só fazia o leiaute e quase não criava, algum tempo atrás.

P: E, se alguém te perguntasse qual é a sua profissão hoje, o que você responderia?

E13: Eu sou vendedor. Por que é que eu falo que sou vendedor? As pessoas acham que propaganda é arte e propaganda não é arte, a gente até se utiliza de arte, cinema, teatro e várias

coisas, né, mas propaganda no fundo é vendas. Ou seja, a única diferença é que o vendedor vai

de porta em porta, um a um, e eu uso um instrumento, que são os veículos de comunicação, através de um filme, através de uma revista, para vender alguma coisa, um conceito, uma idéia, um produto. Então eu sou um vendedor. Só que eu utilizo ferramentas diferentes.

P: E aqui você é diretor de arte?

E13: Eu sou diretor de arte.

P: Como é que você vê o computador no seu trabalho, no dia-a-dia?

E13: O computador é um milagre. (Risos.) Até hoje eu não entendo como é que as coisas passam por aquele fiozinho e aparecem na tela, né? Bem, como eu peguei as duas fases, né, vou

explicar como era antigamente. Você tinha que... a gente chamava de manchar. Manchar era fazer um desenho. Tinha pessoas que desenhavam muito bem, no Estúdio, e pessoas que

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marcavam letra muito bem. Às vezes a gente, diretor de arte, também tinha que fazer isso. Na

AGÊNCIA 37, por exemplo, tinha vários manchadores e letristas, né, e você tinha a idéia, e o

cliente sempre via a peça num desenho, correto? Era mais difícil de fazer? Era, mas também tinha um detalhe: você não podia ousar tanto. Tinha a dificuldade manual de você fazer as

coisas, sem dizer depois também na produção. Porque o computador não veio só para ajudar a

fazer leiaute — hoje em dia você consegue fazer qualquer coisa com uma foto: manipular, juntar uma pessoa na outra, e antigamente você não tinha esse recurso. Então o computador ajudou não só para você criar, porque ele permite você em questão de minutos mudar a fonte

dez vezes, e antigamente você tinha que marcar à mão dez vezes a fonte, era muito complicado. E se você tinha que mudar a cor de fundo era fazer tudo de novo, né?

Se ele agilizou o trabalho da gente, por um lado sim, por outro lado, não sei se as

agências hoje de repente têm menos gente, mas a gente continuou com muito trabalho, né? Uma boa do computador é que, antes de criar, você mostra para o cliente uma coisa já pronta, quase. Então, quando eu estou fazendo um anúncio, eu vou ter que pegar referências de vários lugares

para montar uma foto e ali eu já vou estudando mais ou menos como é que vai ficar a foto final. E o cliente também já vê o negócio quase pronto. Por exemplo, esse anúncio que você está olhando aqui, ele, quando viu, viu isso aqui. No máximo, o que pode ter mudado é uma coisinha

ou outra na foto. Então fica muito mais fácil para o cliente, porque ele antigamente tinha que abstrair muito. Ele nunca sabia como ia ser o resultado. A gente tinha uma vantagem na hora de

apresentar.

Você pode pensar em muito mais coisas. O computador te dá acesso à Internet, correto? Então, hoje em dia, para mim, achar uma referência, eu entro num site de foto, digito lá, por exemplo, hoje eu estava fazendo um leiaute em que eu precisava de um quarto de menina

teenager. Eu entrei lá e achei vários quartos — coisa que eu ia ter que ficar buscando em livros —, aí juntei três quartos e fiz um quarto só. Aí comecei a mexer nas cores, botar elementos, eu

poderia ter manchado isso, mas nunca fica igual. Quando esse trabalho for aprovado, eu já vou ter uma idéia muito melhor de como fazer essa foto. Porque eu faço dupla com o redator; quando eu vou produzir o anúncio, eu vou fazer dupla com o fotógrafo. Ou seja, uma idéia boa

mal realizada acaba virando uma idéia ruim, e o computador te ajuda a fazer qualquer coisa. Por exemplo, a gente pensou numa peça que era um caminhão do Corpo de Bombeiros no meio da areia, e todo vermelho, com as logomarcas da Coca-Cola, era para o verão Coca-Cola. Só que

esse caminhão — ele chegou a sair na revista Archive, que é uma revista alemã, ganhou vários prêmios —, quando a gente foi fotografar o caminhão do Corpo de Bombeiros, a gente viu que o caminhão que a gente queria não existia, porque o que tem escada em cima não tem a parte de

trás. Tem várias composições, então a gente fotografou seis caminhões, usamos os pneus de um,

a parte da frente de outro, a escada Magirus de outro, todas aquelas coisas cromadas, ou seja, para compor, só o computador faria isso. Então, o computador te dá a liberdade de fazer o que

você quiser. Qualquer coisa que você imaginar. Você pode mudar a cara de uma pessoa, dar mil

retoques... Ele te ajuda não só na criação como na produção também. Até mesmo em filme também. Seria impossível a gente fazer alguns filmes que a gente faz hoje, como por exemplo

até um filme que não é nosso: o filme da tartaruga, da Brahma. Impossível fazer aquilo sem

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computador. Então hoje o computador te dá asas, você pode produzir o que você imaginar. Essa

é a grande diferença entre você trabalhar com o computador e a época em que você não o tinha.

P: E — você já falou um pouco — quais foram as principais mudanças, na sua opinião, que o computador causou? Além dessa.

E13: Principais mudanças? O computador, como uma ferramenta, te deu recursos

ilimitados. Ou seja, você tem muito mais chance de testar, de trabalhar, desde tipologia, foto, leiaute, né, do que era possível antigamente só na mão. E, por outro lado também, te deu muito mais como ferramenta, para depois você produzir isso, você criar coisas que seriam impossíveis,

né, hoje em dia posso muito bem pegar uma foto do banco de imagens de uma neve e de repente fotografar uma artista famosa e aplicar lá, e vai dar a impressão de que ela está lá. Seria impossível de repente mandar alguém, fotografar, e você economiza também muito mais tempo

— fazer uma foto complicada, né? —, tanto quanto o custo. Vou dar um exemplo: o nosso dir etor está fazendo uma campanha em que precisava fotografar ele dentro de um supermercado,

e ele estava viajando. A gente fez uma foto dele na sexta-feira, no Estúdio, nas posições, e então fotografamos ontem a loja no supermercado. Então montando você jura que ele está no supermercado! Ou seja, seria impossível fazer essa foto antes do computador.

P: No seu caso, quando é que você começou a ter contato com computador? Como

foi?

E13: Foi assim: eu estava na AGÊNCIA 38, começou a era do computador, botaram o

computador na minha frente — eu não sabia nem apertar uma tecla e botaram na minha frente. Aí eu comecei a aprender.

P: Isso foi em que ano?

E13: Isso foi uns sete anos atrás, eu acho.

P: E você aprendeu sozinho? Teve aula?

E13: Não, tipo assim, tinha um pessoal já preparado que começou a explicar... porque a

gente trabalha basicamente com três programas aqui: o Quark Xpress — a gente trabalha tudo

com Macintosh, né? —, que é um programa para você montar o leiaute, ou seja, você bota a tipologia, você bota a foto; você tem outro programa chamado Photoshop, que é o programa

para você manipular, mexer em foto, tirar cor, botar cor, fazer — esse também é um programa

fantástico, né? —; e o Illustrator, ou o FreeHand — são dois programas um pouco parecidos —, que são programas feitos para montagem de leiaute e montagem de fontes, de desenho, para você desenhar e fazer algumas coisas em cima.

P: Mas foi tranqüilo? O que você achou?

E13: Foi. Eu achei ótimo, não sabia desenhar, para mim foi maravilhoso. (Risos.)

P: (Risos.) Bom, aqui tem uma escala de zero a dez.

E13: Tá.

P: Eu vou te fazer algumas perguntas, pedir para você classificar e dizer mais ou

menos por que você escolheu. Então, eu queria te perguntar primeiro se você gosta de usar

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o computador, de modo geral, sem pensar na praticidade, na utilidade. E não só no

trabalho, mas em geral.

E13: Olha, eu uso o computador no trabalho, né, eu não... assim, eu gosto do resultado que ele dá, mas eu não entendo muito da máquina fora os programas. Então às vezes eu ficava

muito irritado com a máquina, porque acho que máquina não pode dar problema, né, quem pode

dar é o ser humano. E às vezes, quando dá problema, é um porre, né? Mas eu acho que... a minha relação com o computador é boa.

P: Mas só para ter uma idéia, de zero a dez...

E13: Ah, de zero a dez? Acho que a minha relação com o computador seria sete. Por exemplo, eu não gosto de ler na Internet. Eu gosto de ler livro, revista. Eu não entro na Internet

para ficar lendo. Às vezes eu até imprimo. Porque eu não gosto de ficar lendo na tela, não me

agrada. E no banheiro não dá nem para levar então.

P: (Risos.) E se você fosse classificar a pressão que o diretor de arte hoje tem em

saber usar o computador?

E13: Hoje em dia, o diretor de arte que não sabe usar computador não é diretor de arte. Um exemplo bom é quando alguém vem pegar estágio na agência. A primeira coisa que eu pergunto é: “Você sabe mexer em Photoshop, manipular bem e trabalhar no Quark?” Se o cara

falar: “Não”, então: “Você vai aprender primeiro”. Porque, se eu colocar alguém que não sabe no mínimo isso, ele não vai me ajudar e eu não vou poder passar trabalho para ele. Eu não tenho

como ensiná-lo. É um requisito mínimo você saber trabalhar nesses programas.

P: De zero a dez, seria...

E13: Dez. A importância.

P: E se você fosse dar um grau para a sua facilidade — sua especificamente — em

usar o computador, de zero a dez você daria quanto?

E13: Eu daria quatro, porque há muito tempo eu faço dupla com diretor de criação, então,

na maioria das agências em que trabalhei, eu tinha mais tempo de criar do que ficar fazendo a parte final mesmo. Porque eu sempre trabalhei muito com assistente. E às vezes eu não tinha tempo. Mesmo aqui, no começo, tinha três redatores e eu e o assistente. Então, o tempo não

dava para fazer tudo, às vezes a gente criava, fazia o rabisco e tal, passava para o XXXX [nome

ininteligível], o XXXX é que fazia a direção de arte, ele criava, em cima do que ele tinha que fazer, né? Então, a minha relação com o computador é tipo... o meu foco mais é criar. É claro

que também é legal manipular, você quando vai para o computador acaba mudando a sua idéia,

muitas vezes para melhor, né, mas eu prefiro criar do que ficar mexendo.

P: Em termos de facilidade...

E13: Eu não tenho muita facilidade, não sou muito tecnológico, não. Por isso é que para

mim não serve um som, um telefone com muita tecnologia, eu não sou curioso para ver essas coisas.

P: Então vai pôr quatro mesmo?

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E13: Quatro.

P: E a última pergunta de classificar. Se você fosse dar um grau para a utilidade que

o computador tem no trabalho do diretor de arte, quanto você daria de zero a dez?

E13: A utilidade? Dez. Dez, porque o computador permite você pegar a tua idéia e

maximizar ela. Até tem uma coisa que eu não falei e que é importante, é o seguinte: hoje em dia

a gente está entrando na era digital. Então, a maioria dos fotógrafos está mudando para digital, por causa do computador. Muitas vezes, você ia para uma foto, o fotógrafo fazia a luz e você olhava ali mas você não sabia o resultado que ia sair — só o fotógrafo, conforme ele mexia na

lente, isso e aquilo —, depois mandava revelar, para você ver vários cromos, para depois você escolher. Hoje em dia, com a foto digital, você coloca um objeto ali, ó, ele clica, e em dez minutos, dez segundos , está na tela já. Em alta [alta resolução]. Então, você tem uma

mobilidade muito grande com foto digital. E uma qualidade muito melhor. Então você tem rapidez, tem qualidade, você vai poder fazer mais opções, né, e tudo isso graças ao computador.

Agora, não sei em outras profissões, em que o cara usa o computador só para ler ou para

entrar na Internet, como deve ser. No nosso caso, o computador é um grande brinquedo também. Então às vezes eles pagam a gente para ficar brincando aí, de manipular imagem... Às vezes até falam: “Pô, eles pagam vocês para desenhar, né?” Para a gente é legal o computador,

porque é uma ferramenta, uma grande... é como a tela para o artista, para a gente. Às vezes você pega uma imagem e vai manipulando, você chegou lá com uma idéia para a máquina, chega lá e

começa a transformar, a ficar melhor do que você imagina! Aí de lá vai para o fotógrafo, que tem uma visão às vezes muito maior do que a tua, de luz e tudo, né? E quando sai você olha e “caramba, como é que saiu?” Começou de uma maneira, né, e às vezes acontece também o

contrário. Mas geralmente a gente melhora. Então eu acho que hoje em dia o computador é uma grande ferramenta de trabalho. E se tiver alguém para trabalhar nele para mim, melhor ainda. (Risos.)

P: (Risos.) Ah, é, a parte chata.

E13: É. A parte que eu não gosto é essa parte com a tela, não tenho muita paciência para a máquina, não. Minha relação é com pessoas, nunca tive uma boa relação com máquina.

P: E tem uma coisa que eu ia te perguntar no final: por que você escolheu essa

profissão, escolheu trabalhar nisso, qual foi a motivação?

E13: Desde pequeno eu queria ser médico.

P: É mesmo?

E13: O meu pai tinha restaurante e eu ficava no restaurante dele, aí dos quinze aos dezoito anos era dono de restaurante. Odiava aquilo, de segunda a segunda.

P: No Rio mesmo.

E13: Não. São Paulo. Odiava aquilo. Acordar às quatro da manhã e dormir às onze horas. Aqui também acontece a mesma coisa, mas eu não gostava daquilo, né? Aí tinha um primo meu que morava no Rio e era médico, tinha muito sucesso. Na época a gente era uma família muito

humilde, e tinha aquele negócio: “Ah, se você for médico vai ganhar dinheiro.” Médico,

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engenheiro, advogado eram profissões que davam dinheiro. E eu vim para o Rio para fazer

medicina. Só que eu escrevia poesia, adorava escrever e esse meu primo — que já tinha filho da

minha idade — disse: “Poxa, eu estou achando que você é não é muito para medicina. Você devia fazer jornalismo, não sei o quê.” Aí eu acabei não passando no vestibular de medicina,

porque eu estava há muito tempo parado, sem estudar, tinha me preparado só por seis meses, e

para não ficar parado resolvi fazer um vestibular para comunicação, para jornalismo, né? Eu fui fazer, passei, liguei para o meu pai e falei: “Vou ser jornalista.” Ele desligou o telefone, né?

P: Nossa! Assim? (Risos.) Você não tinha avisado, né?

E13: (Risos.) Eu falei: “Pai, caiu a ligação.” Não, não caiu, né? Na cabeça dele, ele achava que com jornalismo eu ia morrer de fome.

Na faculdade, você entrava para fazer jornalismo ou propaganda e só optava depois do

quarto período. Eu entrei com a idéia de fazer jornalismo, só que o primeiro estágio que pintou foi numa editora e lá eu vi mais alguma coisa de propaganda e comecei a gostar daquilo. Depois pintou um estágio na AGÊNCIA 4. Comecei a gostar muito mais de propaganda; jornalismo, para

mim, não dava para exercer a minha criatividade. Você criar, inventar coisas, né? Fazer de uma maneira diferente. E o jornalismo não te permitia isso. E a propaganda permitia. As pessoas hoje em dia são muito mais informadas, acho que um garoto de 17 anos hoje tem como ter

informações de todas as profissões, né? Você está ligado com o mundo inteiro com a Internet. Então, o que acontece? Naquela época, eu nem sabia que anúncio era feito em agência, pensei

que era feito no próprio veículo, no jornal, não tinha a menor idéia. Então propaganda foi sem querer. E por coincidência é uma profissão que eu adoro, acho que não me via em outra profissão. A não ser cantor de rock.

P: (Risos.)

E13: (Risos.) Realmente, essa profissão é a melhor que tem. Na outra encarnação vou vir cantor de banda famosa.

P: É, tem que ser famosa, senão...

E13: Senão, não.

P: Mas então você não se imagina mesmo fazendo outra coisa.

E13: Não. Tem um lado meu assim que... eu estudo medicina chinesa, faço chi-kong, tem

um lado meu esotérico, de esoterismo, né, em que eu tento me aprimorar e tudo, porque eu gosto muito dessa parte humana. Porque é muito estressante essa profissão. Você não almoça

seguidamente, fica até as três, quatro da manhã. Imagina você ter quatro horas para criar um

filme, criar um anúncio. Uma coisa é uma coisa mecânica, que você pega e... Agora criação ninguém domina, né? Acaba saindo, com a experiência sai, mas é uma pressão. O que acontece

nessa profissão é o seguinte: se você foi muito bom durante um ano e se no ano que vem você

não for bom, o seu salário também não vai ser bom, porque independentemente de você estar no mercado, não é o que você foi, é o que você está sendo. É tipo um jogador de futebol. Tem profissões em que você pode — um médico pode ficar anos e anos como médico, não tem

aquela pressão. Tem que estudar sempre, né, mas não tem aquela pressão. O jogador de futebol tem. A gente é muito parecido com modelo e jogador de futebol. Se você está ganhando muitos

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prêmios, está fazendo um bom trabalho, você é valorizado. Você pode ter sido o melhor diretor

de arte do mundo, se em dois anos o seu trabalho não está legal, você começa a descer ladeira

abaixo. Incrível. Foi o que aconteceu quando veio o computador. Muitos diretores de arte já mais antigos relutaram com o computador e hoje em dia estão fora do mercado. Todo o mundo

que foi contra o computador está fora do mercado. Não sobreviveu.

P: Você falou que você gosta da criação, né? De criar. Você tem alguma outra atividade nesse sentido, fora da propaganda?

E13: Gostaria de ter, mas não dá tempo. O tempo que dá eu me dedico um pouco ao chi-

kong, me dedico um pouco à leitura, meus filhos e... A gente em propaganda é meio médico também, sabia? Porque a gente trabalha fim de semana muitas vezes. Com a conta de Guaraná Antarctica, a gente ficou quatro finais de semana direto, num hotel, criando. Teve até que se

isolar. Então é uma profissão que não te permite. Você vê, hoje, talvez, vou ver se vou sair às oito horas, mas é muito difícil. Ontem, às oito horas, pintou um trabalho para a gente fazer e

ficamos até onze e meia aqui. Então não é uma profissão em que você marca, “hoje eu vou para casa”, não.

Agora, é uma profissão também que... ela mexe muito com o teu ego, porque cada peça que você faz, aquilo vai para o teu portfólio. É uma coisa que você criou, você pode ganhar

prêmio, que te valoriza profissionalmente, é uma profissão em que cada vez é uma coisa diferente, mesmo que seja a mesma conta, um desafio diferente, né? Então, tem isso de bacana

na profissão, sabe? Ela não é enfadonha. Imagina se eu fosse um arquiteto e tivesse que esperar um ano para terminar um projeto, dois anos! Ah, a gente aqui, se o negócio passa de uma semana a gente já fica desesperado, “meu Deus, isso não está pronto!”, né? Para você ter uma

idéia, a gente está com doze filmes em produção nessa semana. É muito dinâmico o negócio, mas por outro lado é uma cachaça. Porque, no fundo, eu trabalho por prazer. Ao mesmo tempo em que eu sou um “vendedor”, tem um lado também de prazer, de você falar: “Caramba, como

é que eu criei isso?” Você vê o papel em branco e quando a campanha fica pronta, “ah, como é que isso saiu?”.

P: Da minha cabeça...

E13: Exatamente. “Como é que saiu, que legal essa idéia, né?” E o mercado também tem

os prêmios, tem várias premiações, e isso de certa maneira serve para motivar as pessoas a criar cada vez mais. Essa agência, a gente montou ela há um ano e quatro meses. Em um ano e quatro

meses, a gente foi a agência do ano, a gente ganhou dois grand prix também, já ganhou o

prêmio XXXX [nome ininteligível], ou seja, na maioria dos prêmios em que a gente tem entrado, a gente tem um resultado muito bom. E a gente era uma agência pequenininha, como é

que a gente ia ganhar prêmio? E a equipe aumentou, né? É uma coisa muito recompensadora.

Eu não me vejo fora de propaganda. Às vezes eu falo: “Ah, estou de saco cheio, não sei o quê, estou cansado”, mas é o tipo da coisa que eu estou de férias, estou em casa, vem uma idéia e eu anoto. Tem campanha que eu estava dormindo, sonhei com o negócio, fiz uma campanha.

P: (Risos.)

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E13: (Risos.) Tanto é que o meu analista é um analista publicitário, só ele entende a

cabeça da gente.

P: Não dá problema? Ele conhece todo o mundo, isso não interfere?

E13: Não, porque... Eu comecei a fazer análise e o terapeuta falava: “Não, você tem que

sair cedo, tem que descansar.” E eu tinha que explicar para ele que não era assim, então não

funcionava. Esse cara não, ele entende de propaganda, ele sabe de propaganda, então ele sabe que a realidade é aquela. Como se adaptar a essa realidade, né?

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7.14. Respostas às perguntas estruturadas

Prazer percebido Pressão social

percebida

Facilidade de uso

percebida

Utilidade

percebida

Entrevistado 1 5 10 10 8

Entrevistado 2 10 10 5 10

Entrevistado 3 3 10 8 10

Entrevistada 4 10 10 10 10

Entrevistado 5 10 10 9 10

Entrevistado 6 8 10 9 10

Entrevistado 7 7 10 7 10

Entrevistada 8 9 10 9 5

Entrevistado 9 9 8 8 8

Entrevistada 10 9 9 9 10

Entrevistado 11 9 10 10 10

Entrevistado 12 7 10 10 8

Entrevistado 13 7 10 4 10

Resultado médio 7,92 9,77 8,31 9,15

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7.15. Glossário de termos técnicos citados

3D: Interface para aplicativos que permite a manipulação de objetos em três dimensões

(comprimento, largura e profundidade) no computador (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 738).

Aerógrafo: Instrumento de pressão, de formato parecido com uma caneta-tinteiro, que borrifa

tinta por meio de ar comprimido. Usado manualmente para criar efeitos de gradação de tom,

ilustrações e retoques de imagens (ADG, 2000, p. 10).

All-type: [Ing.] Anúncio de jornal, revista, outdoor ou qualquer outro tipo de material impresso apenas com frases escritas, sem nenhum tipo de ilustração (ADG, 2000, p. 11).

Arte-final: Acabamento final de um trabalho de arte destinado à produção gráfica, com indicações referentes a áreas de cor, retículas, fotografias, ampliações, reduções etc. Chama-se

de arte-final qualquer trabalho pronto para ser reproduzido (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 41).

Banner: Bandeira, estandarte ou flâmula com mensagem publicitária, confeccionado em papel,

plástico ou tecido, impresso de um ou de ambos os lados. Geralmente é exposto em espaços

públicos ou em pontos-de-venda, pavilhões de exposições etc. (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 60).

Birô: Do fr. bureau. Empresa que se dedica à prestação de serviços (como design, projeto

gráfico, finalização, pré-impressão, produção etc.) envolvendo recursos de editoração eletrônica e computação gráfica. Diz-se também birô eletrônico (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 71).

Bitola: Largura das linhas na composição de um texto (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 72).

Blur: [Ing.] Comando, em edição de cores, que permite reduzir o contraste de valores pixel na imagem para dar-lhe suavidade — enevoar, embaçar, reduzindo a nitidez do seu contorno

(ADG, 2000, p. 17).

Caixa-alta: Letra maiúscula ou versal. Por serem normalmente menos usados do que os minúsculos, convencionou-se colocar os tipos maiúsculos na parte alta da caixa utilizada em composição manual. As expressões “caixa-alta” e “caixa-baixa” consagraram-se pelo uso e

continuaram a ser empregadas, mesmo depois de adotadas novas maneiras de distribuição dos tipos na caixa, e inclusive nos processos de composição mecânica, de fotocomposição e de

editoração eletrônica (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 92).

Caixa-baixa: Letra minúscula, em qualquer processo de composição. Nas primeiras caixas de tipos, os minúsculos eram colocados na parte mais baixa, a fim de ficarem mais à mão

(RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 92).

Criativo: Profissional de publicidade que se dedica a atividades de criação. Usa-se como substantivo (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 199).

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Cromo: Fotografia colorida em positivo, revelada sobre uma película transparente de celulóide

(RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 201).

Croqui: Esboço, em breves traços, de desenho ou de pintura (FERREIRA, 1999, p. 585).

Design gráfico: Termo utilizado para definir, genericamente, a atividade de planejamento e

projeto relativos a linguagem visual. Atividade que lida com a articulação de texto e imagem, podendo ser desenvolvida sobre os mais variados suportes e situações. Compreende as noções de projeto gráfico, identidade visual, projetos de sinalização, design editorial, entre outras

(ADG, 2000, p. 36).

Desktop publishing: [Ing.] Editoração eletrônica; desenvolvimento, em computador, do projeto e da produção de arquivos eletrônicos de matrizes para a realização de impressos — folhetos,

cartazes, jornais, revistas etc. (ADG, 2000, p. 36).

Dupla de criação: Formação composta de um diretor de arte e um redator, na qual o primeiro é responsável por conceber e desenvolver os aspectos visuais e gráficos das peças publicitárias e o

segundo se incumbe dos aspectos textuais do trabalho (FERREIRA e FURGLER, 1996, p. 34-35, 41).

Endomarketing: Modalidade de marketing voltada para todos os segmentos de público

diretamente envolvidos com a empresa e que podem funcionar como mensageiros da imagem

institucional. Por meio de ações de comunicação interna, o endomarketing procura fixar positivamente a imagem corporativa junto a seus funcionários, fornecedores, prestadores de

serviço, acionistas, revendedores, franqueados etc., gerando um clima propício ao melhor

desempenho (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 268).

Entrelinha: Medida vertical do espaço entre a linha de base de uma linha de texto e a linha de base da seguinte (ADG, 2000, p. 43).

Escanear: Do ing. scan (examinar, explorar, percorrer uma superfície com os olhos). Digitalizar informações por meio de um scanner, que converte informações analógicas em

dados digitais, para serem armazenados e trabalhados em computador (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 277).

Filipeta: Volante, impresso de pequenas dimensões distribuído para propaganda política ou

comercial (ADG, 2000, p. 108).

Finalização: Processo de aperfeiçoamento de um trabalho cinematográfico, televisivo ou publicitário, por meio de efeitos especiais obtidos principalmente com recursos de computação

gráfica. Conjunto das providências finais de preparação de um trabalho gráfico antes das etapas de fotolito e impressão. Envolve, entre outros detalhes, a arte-final e a preparação de arquivos digitais para fotolito eletrônico (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 308).

Flash: Software utilizado pelos programadores de sites para criar interfaces de navegação

redimensionáveis e compactas, ilustrações técnicas, animações em formulários e outros efeitos (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 312).

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Folder: 1. Pasta de arquivos eletrônicos. 2. Folheto constituído por uma única folha, com uma

ou mais dobras (ADG, 2000, p. 48).

Fonte: Conjunto de caracteres de uma mesma família tipográfica, ou seja, cujo desenho segue um padrão básico de construção (ADG, 2000, p. 49).

Fotocomposição: Sistema de composição mecânica, a frio, que emprega matrizes planas gravadas em filme, fita magnética, fita perfurada, disco etc. e produz, por meios fotográficos ou fotoeletrônicos, textos destinados à impressão, fornecidos em suporte de filme ou papel.

Fabricadas comercialmente a partir de 1950, as máquinas de fotocomposição substituíram o emprego do chumbo fundido ou de outros metais, tendo sido depois substituídas pelos sistemas de editoração eletrônica (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 325).

Fotocompositora: Máquina de fotocomposição (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 325).

Fotoletra: Sistema de composição a frio, que utiliza meios fotográficos a partir de matrizes selecionadas manualmente. O montador de fotoletras recolhe das fontes os caracteres

necessários e os justapõe para serem copiados em papel fotográfico nas medidas e demais especificações indicadas pelo diagramador (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 328).

Fotolito: Película transparente, de acetato, onde se registra, por meios fotomecânicos, a imagem

(texto, foto, desenho etc.) que se deseja imprimir. Filme (positivo ou negativo) ou jogo de

filmes que reproduz textos e ilustrações e serve de matriz para gravação de chapas destinadas à impressão pelo sistema ofsete, para o preparo de telas destinadas a serigrafia etc. Diz-se também

filme e acetato (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 328).

FreeHand: Software de ilustração fabricado pela Macromedia (ADG, 2000, p. 50).

Ilha: Unidade (ambiente e conjunto de equipamentos) de edição eletrônica de vídeo (RABAÇA

e BARBOSA, 2001, p. 376).

Illustrator: Software de ilustração fabricado pela Adobe Systems (ADG, 2000, p. 59).

Infográfico: Criação gráfica que utiliza recursos visuais (desenho, fotografias, tabelas etc.) conjugados a textos curtos, para apresentar informações jornalísticas de forma sucinta e atraente

(RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 388).

Job: [Ing.] Trabalho, serviço. 1. Tarefa ou conjunto de tarefas relativas a um determinado

trabalho, em agência de publicidade ou birô. 2. Ordem de serviço emitida às diversas seções de uma agência ou a firmas e profissionais terceirizados para que um determinado trabalho seja executado (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 402).

Leiaute: Do ing. layout. Denomina o esboço — mais elaborado do que o rafe — produzido para

ser submetido à aprovação do cliente da agência antes da etapa de arte-final. O leiaute contém todos os elementos gráficos e textuais básicos do trabalho que está sendo criado, já numa forma

bastante próxima da definitiva (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 418).

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Letraset: Marca registrada de um processo de transferência de letras e sinais a seco e por atrito

(ADG, 2000, p. 67).

Letrista: Artista gráfico, desenhista ou gravador, especializado no traçado de letras. Pintor de letras (em tabuletas, faixas, fachadas etc.) (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 424).

Mancha: Espaço útil de impressão de uma página determinado pela diagramação, ou seja, o traçado da ocupação tipográfica de uma página, desconsiderando-se elementos complementares como numeração de página que usualmente se localizam nas margens (ADG, 2000, p. 71).

Macintosh: Série de computadores pessoais criados e produzidos pela Apple Computer (ADG,

2000, p. 71).

Mala-direta: Mensagem publicitária ou de marketing direto, geralmente sob a forma de folheto, enviada pelo correio ou por portadores (ADG, 2000, p. 71).

Marketing direto: Conjunto de atividades de promoção de vendas e de comercialização em que se desenvolve um relacionamento direto entre a empresa e o consumidor. Suas principais

modalidades são as vendas pelos sistemas de telemarketing e reembolso postal, por demonstradores de porta-em-porta ou pela divulgação através de qualquer veículo, condicionando-se a entrega do produto em domicílio, mediante pedido feito por telefone ou por

via postal. Diz-se também marketing de relacionamento (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p.

468).

Merchandising: 1. Exposição comercializada de uma marca comercial em espaço ou tempo editoriais de veículos de comunicação, como, por exemplo, inseridos em telenovelas ou na

cobertura jornalística de eventos esportivos. 2. Criação e produção de material promocional para ser exibido em pontos-de-venda, complementando as campanhas publicitárias (ADG, 2000, p. 74).

Mock-up: Modelo de um produto ou embalagem em qualquer escala, utilizado para avaliações em geral e, muitas vezes, para produção fotográfica (ADG, 2000, p. 74).

Montador: Profissional de artes gráficas especializado em qualquer serviço de montagem

(RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 497).

PageMaker: Software de editoração eletrônica produzido pela Adobe Systems (ADG, 2000, p. 81).

Papel Schoeller: Papel de qualidade superior, para desenho, de procedência alemã. Sua extrema resistência permite raspar o desenho à vontade e usar borracha ou fita adesiva, sem danificar -lhe

a superfície (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 548).

Paste-up: Trabalho de montagem de artes-finais por colagem, hoje bastante substituído pelo trabalho desenvolvido em computadores (ADG, 2000, p. 84).

PC: [Ing.] Personal computer. Computador pessoal. Composto por monitor, teclado e CPU

(ADG, 2000, p. 84).

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Photoshop: Software de manipulação de imagens fabricado pela Adobe Systems (ADG, 2000,

p. 84).

Quark Xpress: Software de editoração eletrônica fabricado pela Quark (ADG, 2000, p. 91).

Rafe: Do ing. rough. Rascunho inicial no planejamento gráfico de qualquer trabalho a ser

impresso. O rafe corresponde à primeira fase da arte, antes do leiaute e da arte-final (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 620).

Storyboard: [Ing.] Seqüência de desenhos que indicam e orientam, visualmente, determinadas

tomadas descritas no roteiro de um filme, anúncio ou programa a ser realizado (RABAÇA e

BARBOSA, 2001, p. 694).

Tijolo: Cada uma das notas ou anúncios de pequeno formato, em jornais, publicadas geralmente em seções de serviços ou lazer. Diz-se também tijolinho (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p.

725).

Tipologia: 1. Estudo sistemático dos diversos caracteres tipográficos, quanto a sua forma,

classificação, criação, desenvolvimento, evolução histórica, utilização, aplicações etc. 2. Estudo dos componentes tipográficos da impressão e sua relação com os processos gráficos. 3. Repertório de caracteres selecionado pela diagramação para um determinado trabalho gráfico,

em mídia impressa, eletrônica etc. (RABAÇA e BARBOSA, 2001, p. 728).

Webdesign: Área especializada de design, responsável pelo planejamento e projeto de websites. Sua competência diz respeito à definição de padrões visuais para interfaces e da estrutura de navegação própria a essa natureza de problema (ADG, 2000, p. 109).